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Bel Besse Edição Especial Rio de Janeiro 2008

Pintura a tempera

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Livro ensina técnica. É acompanhado por um encarte com as demonstrações

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Bel Besse

Edição Especial

Rio de Janeiro

2008

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Copyright© 2008 por Maria Izabel Besse

Título Original: Pintura a têmperaEditor-chefe: Tomaz AdourRevisão: Sonia CamaraEditoração Eletrônica: Bernardo FrancoCapa: Fernanda Novaes

Conselho Editorial:

Henrique VolpiTatiana BerlimTomaz AdourBarbara CassaráMariana Volpi

Editora T+8 Ltda.Rua Visconde de Pirajá, 142 sala 903Ipanema – 22.410.003 – Rio de Janeiro – RJTel: (21) 3298-9570 / Fax: 3298-9573

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SUMÁRIO

Prefácio ............................................................................ 5Resumo ............................................................................ 8Sobre a autora ................................................................. 9Sobre a técnica .............................................................. 11Vantagens e desvantagens da têmpera ....................... 13Limitações ..................................................................... 16Limitações imaginárias ............................................... 18Superfície no método tradicional .............................. 19Preparação das tábuas ................................................. 20Encolamento ................................................................. 22Entelamento .................................................................. 24Capa de gesso ............................................................... 25Método moderno: tela texturizada ............................ 27Desenho – a base da pintura a têmpera .................... 30O desenho no método tradicional ............................. 31Modelando no método tradicional ............................ 33O desenho no método moderno ................................ 33Modelando no método moderno ............................... 36Preparo da tinta ............................................................ 36Temperando ................................................................. 37Para pintar .................................................................... 39Testando ........................................................................ 40Pintando ........................................................................ 41Pintando no método tradicional ................................ 43Pintando mo método moderno .................................. 46Aguada inicial .............................................................. 47Fundação, sub-pintura ................................................ 47Pintura ........................................................................... 48

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Transparência, veladura ............................................. 49Opacidade ..................................................................... 50Matizando ..................................................................... 51Pintando céu ................................................................. 52Pintando nuvens .......................................................... 53Drapeados e outros objetos ........................................ 54Pintando texturas ......................................................... 54Chapiscar ...................................................................... 55Gotejar ........................................................................... 57Pontilhar ........................................................................ 57Esponjar ......................................................................... 58Borrar ............................................................................. 59Borrifar com escova de dente ..................................... 59Pincel seco ..................................................................... 60Raspar ............................................................................ 60Batidas ........................................................................... 61Pinceladas de seixo ...................................................... 62Espatular ....................................................................... 62Esfregar ......................................................................... 62Sulcar ............................................................................. 63Miscelânea .................................................................... 63Máscaras ........................................................................ 63Refinando texturas ....................................................... 64Correções ...................................................................... 64Cuidados com a pintura .............................................. 65Conclusão ...................................................................... 66Referências .................................................................... 67Fornecedor .................................................................... 69######

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PREFÁCIO

Este livro foi planejado com o objetivo de divulgar noBrasil a antiga técnica de pintura que utiliza a gema doovo como aglutinante, preenchendo uma lacuna com aqual se deparam os estudantes de artes, uma vez quenão dispomos de literatura a respeito do assunto emnosso idioma.

Embora seja um livro didático, requer alguns conheci-mentos sobre pintura, perspectiva, volume, profundi-dade e outros conceitos básicos que não são aquiensinados: apenas explicamos como produzir tais efei-tos na têmpera.

Esta edição especial destina-se principalmente a serdistribuída, sob a forma de doação, aos departamentosde artes das seguintes universidades e faculdades:

– Faculdade de Belas Artes de São Paulo– Faculdade Paulista de Artes – São Paulo– Fundação Armando Álvares Penteado – São Paulo– Universidade de Brasília– Universidade Federal da Bahia – Salvador– Universidade do Estado da Bahia– Universidade Federal do Espírito Santo – Vitória– Universidade Federal de Juiz de Fora– Universidade Federal de Minas Gerais – Belo Horizonte– Universidade Federal da Paraíba – João Pessoa– Escola de Música e Belas Artes do Paraná – Curitiba– Universidade Federal do Rio de Janeiro

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– Escola de Artes Visuais do Rio de Janeiro– Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Porto Alegre– Universidade do Estado de Santa Catarina – Florianópolis– Centro Universitário Nossa Senhora do Patrocínio – Itu– Faculdade Santa Marcelina – São Paulo– Universidade Braz Cubas – Mogi das Cruzes– Universidade Estadual Paulista – São Paulo– Universidade de Franca– Universidade Tiradentes – Aracaju– Universidade Campinas– Pontifícia Universidade Católica de Campinas– Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul– Faculdade Santa Cecília dos Bandeirantes– Universidade Estadual Paulista – UNESP Bauru– Universidade do Anhembi – São Paulo– Universidade Mackenzie – São Paulo– Faculdade Cásper Líbero – São Paulo– Faculdade de Artes Visuais UFG – Goiânia

Ao por este material à disposição dos professores eestudantes universitários que se preparam para atuarno campo da pintura, a intenção da autora é a de res-gatar a memória e difundir conhecimentos que se en-contram esquecidos entre nós, ao mesmo tempo, intro-duzir materiais e métodos modernos, que tornam atécnica mais atraente e compatível com os dias atuais.

Acompanha cada exemplar um CD com fotos ilustrati-vas dos materiais e métodos utilizados na técnica, e detrabalhos realizados pela autora e por outros artistasplásticos temperistas que disponibilizaram seus traba-lhos na internet, sendo que o leitor disporá da indica-

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ção do site, sempre que for utilizada foto do trabalhode outros artistas.

Este trabalho é fruto de vários anos de pesquisa daautora e de outros temperistas, e não poderia ter sidorealizado sem a colaboração de vários amigos quepatrocinaram financeiramente esta edição especial, e aquem somos profundamente agradecidas e honradaspela confiança que nos depositaram.

Agradeço especialmente a minha irmã, Maria IaraBesse Vicente Coelho, e meu cunhado, Nélson VicenteCoelho, pelo apoio que sempre me prestaram, neste eem outros momentos.

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Resumo: Eu amo trabalhar com a têmpera de ovo egostaria de ver esse antigo médium usado pelos artis-tas brasileiros da atualidade. A têmpera de ovo não éum médium conhecido no Brasil, e não dispomos deliteratura sobre ela em nosso idioma. Este trabalho temcomo objetivo auxiliar aqueles que estiverem interes-sados em aprender a técnica, tanto o modo clássicocomo o moderno. Cada artista aborda a têmpera demodo diferente em seu trabalho, pois cada um tem seutoque único, senso de cor e idéia sobre forma e compo-sição. Este trabalho é um guia, não uma fórmula, eespero que ele possa encorajá-los a iniciar sua própriajornada na pintura a têmpera.

Abstract: I Love using egg tempera, and would like tosee this ancient medium use among today’s Brazilianartists. Egg tempera is unknown in Brazil, and wehaven’t any book about it in our language. This workis intended to help those interested in this lesser-known medium, in the classical and modern method.Everyone has a different approach to their painting,each with a unique touch, color sense, and idea ofform. This work is intended as a guide, not a formula,and I hope that it will encourage you to start on yourown journey with egg tempera painting.

Palavras chave: arte; pintura; médium de pintura;tempera de ovo; técnicas; materiais; métodos.

Key words: art; painting; painting mediums; egg tem-pera; techniques; materials; methods.

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Sobre a autora

Maria Izabel Besse, nome artístico Bel Besse, naturalde Espírito Santo do Pinhal, estado de São Paulo. Deformação acadêmica em Pedagogia e com mestradoem Segurança Pública, policial militar por profissão,iniciei o aprendizado na pintura em um curso ofere-cido pelo SENAI-Pinhal, no ano de 2000, onde aprendias noções básicas da pintura em tinta acrílica. Posteri-ormente, tomei contato com a pintura a têmpera porintermédio de uma amiga, que me ensinou as noçõesbásicas da escrita de ícones bizantinos, técnica queaprimorei estudando à distância, pela internet, com ospadres do Atelier Saint-André, na Suíça, discípulosdo padre Egon Sandler. A partir de então, me torneiautodidata, pesquisando na literatura estrangeira (nãoexiste literatura sobre têmpera em nosso idioma, emnosso país) e trocando correspondência com váriosartistas temperistas, como são denominados aquelesque se dedicam à técnica.

De espírito pesquisador e inconformada com as difi-culdades técnicas e materiais da têmpera, que desesti-mulavam os artistas que me procuravam para apren-der a técnica, empreendi seis anos pesquisando formasalternativas para a pintura a têmpera, utilizando mate-riais economicamente mais viáveis e modernos, emétodos mais simples e mais fáceis de serem aplica-dos, reuni extenso material. Este livro é um resumo domaterial coletado, testado e adaptado por mim, e foi

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elaborado para auxiliar os artistas que se interessamem conhecer a técnica, e para divulgá-la, popularizá-laem nosso país.

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Sobre a técnica

A têmpera de ovo (egg tempera), ou simplesmentetêmpera1, é um médium antigo, que remonta aotempo dos egípcios e dos gregos, pouco usado atual-mente, depois do advento da pintura a óleo, e poucoconhecido no Brasil2 mas com muitos seguidores naEuropa, Canadá e Estados Unidos. É feita com gemade ovo, água destilada e pigmentos puros (em pó). Éapresentada, geralmente, como sendo de difícil execu-ção, limitada por rígidas regras que, segundo algunsacadêmicos, se não forem estritamente observadas, atécnica estará descaracterizada. A têmpera é omédium usado para a pintura de ícones bizantinosque, contudo, seguem outra técnica, baseada na teolo-gia da Igreja Católica Ortodoxa.

Neste trabalho temos a intenção de explicar o maisdetalhadamente possível a técnica da pintura a têm-pera, mas sabemos que nenhum livro pode ensinar,sozinho, qualquer método de pintura: é necessáriaalguma prática para se obter sucesso com estes escri-tos, sobretudo uma prática orientada por um bom ins-trutor. Os ensinamentos aqui registrados resultam dogrande conhecimento e da exaustiva prática de diver-sas pessoas dedicadas a esta arte, tendo sido colhidos

1. Existem outros tipos de têmpera, como a acrílica, a vinil, a caseína, oguache, a de clara de ovo etc.2. Tivemos um renomado temperista, Volpi, na segunda fase de suacarreira, e também Jorge Mori, que posteriormente trocou a têmperapelo óleo.

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da bibliografia que consta ao final do trabalho, e lon-gamente testados, incorporados, absorvidos e adapta-dos pela autora, bem como de inovações inseridas pelamesma, testadas pelo período de quatro anos até a pre-sente data (2008).

Não abordamos a técnica da têmpera no contexto dahistória da arte, concentrando-nos apenas nos mate-riais e métodos, na sua prática e aplicação, sendoexplicadas tanto a técnica tradicional como a moderna.

São princípios básicos da pintura a têmpera: deve seraplicada em camadas finas, ou seja, com tinta rala ecom pouca tinta no pincel, para evitar que se formemcharcos que, após secarem, formarão manchas impos-síveis de serem corrigidas; quando aplicada no mé-todo tradicional, tem uma aparência linear, achatada,porém, no método moderno, o efeito tridimensional éconseguido alternando-se camadas transparentes (gla-zes, veladuras) com camadas opacas (scumble), coresquentes com cores frias; transparência se refere à apli-cação de cor escura sobre cor clara, resultando em umefeito vitrificado; opacidade se refere à aplicação decor clara (cor com adição de branco) sobre cor escura,resultando em um efeito de opalescência3; quando atinta é aplicada sobre uma camada de mesmo valortonal, o resultado será de opacidade; qualquer cor teráa aparência de opacidade se for colocada em repetidas

3. Interessante para pintar fumaça, chuva, cenas noturnas, névoa,neblina, nuvem. Também é útil para atenuar cores de objetos colocadosao fundo, no terceiro plano, criando o efeito de profundidade.

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camadas; qualquer cor terá a aparência de opacidadese for usado excesso de pigmento, o resultado será aaparência da tinta guache; para corrigir o efeito opacobasta esperar a camada secar bem (por uma hora) eaplicar sobre ela uma veladura em cor mais escura; ascores devem ser obtidas por mistura ótica (sobreposi-ção na tela) e não por mistura física (misturadas napaleta), pois o resultado da mistura física será uma cor“encardida”; deve ser aplicada sobre superfície rígida,ou rachará ao secar quimicamente; seca rapidamenteao toque, permitindo a aplicação de várias camadasem um mesmo dia, mas demora seis meses para asecagem química (em locais de clima quente); a opaci-dade e transparência dos pigmentos é relativa, estácondicionada aos valores tonais (acréscimo de brancoou preto) com os quais a mistura é aplicada.

Vantagens e desvantagens da têmpera

A têmpera é um médium com muitas vantagens: éseguro, não tóxico e permanente. Ao contrário da pin-tura a óleo, não amarelece, não muda a cor e não setorna transparente com o tempo, pois os pigmentossão puros e permanecem em seu estado natural depoisque a água evapora. Ao contrário do acrílico, passouno teste do tempo. Mostra a beleza dos pigmentospuros com grande vantagem sobre as outras técnicas.As cores são claras, brilhantes e puras. Ao fazer suaprópria tinta, o artista sabe tudo o que há nela, não

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haverá nenhuma receita ou ingrediente secreto quecomprometerá sua arte. Se aplicada corretamente, pro-duz um efeito maravilhoso de transparência e lumino-sidade que não se obtém com nenhum outro médium.Permite interessantes efeitos de texturas, difíceis defazer no óleo e impossíveis na tinta acrílica. Trata-se deuma textura ótica, não física. Nenhum outro médiumoferece a luminosidade da têmpera, que é obtida pelasrepetidas camadas de cor transparente. Se alguma áreada pintura secar sem a luminosidade, basta aplicarmais veladuras no local, pois não existe um limite detempo ou de aplicação de veladuras, antes que a pin-tura seque quimicamente. Luminosidade incandes-cente e texturas sutis são a essência da têmpera, ummédium ótimo para realçar a beleza e isto é o que estaautora acredita ser o significado da arte.

No entanto, tem alguns inconvenientes e não é paratodos. Deve ser pintada em superfície rígida. Tradicio-nalmente não pode ser aplicada em papel ou tela, pois,embora ao secar forme uma película resistente, tam-bém é frágil, e se lascará em superfície flexível, razãopela qual é tradicionalmente aplicada sobre painéis demadeira revestidos com gesso crê. A superfície degesso pode se quebrar se sofrer pancadas ou quedas.Dá muito trabalho preparar a superfície, usa-se gessocrê, de secagem rápida, especial para produzir umasuperfície lisa, branca e absorvente, que o gesso acrí-lico comum não propicia. Não se pode pintar espesso(impasto), pois a pintura rachará. Também não permite######

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a aplicação da técnica “molhado sobre molhado”4,como no óleo, temos que esperar a primeira camadade tinta secar antes de aplicar a segunda (caso contrá-rio a primeira será eliminada pelas pinceladas da se-gunda)5. Deve-se pintar em várias camadas finas, natécnica da veladura, o que dificulta a sua execução aoar livre. Impastos, espatulados, pinceladas pesadas etexturas devem ser deixados para outros médiuns.Como em toda a pintura de secagem rápida, é melhortrabalhar com misturas ópticas e efeitos lisos. Outralimitação da têmpera é a dimensão dos quadros, pois atécnica não se adapta a painéis de grande dimensão(meus painéis maiores são os de 50X70 cm).

Além das já mencionadas, a têmpera também é limi-tada no que se refere a cores: não é possível fazer assombras muito escuras (os pigmentos são usados bemlíquidos, diluídos) ou usar cores muito quentes, pois,para obtermos o efeito de transparência e luminosi-dade (que são a sua característica), é necessário fazera veladura com a cor mais escura ao final, o que tira aintensidade das cores quentes. Se a intenção for pintarquadros grandes, escuros ou com cores ricas e quentes,

4. Porém, se usarmos a técnica do chapiscado ou do borrifo (explicadasposteriormente), será possível aplicar a técnica do molhado sobre mo-lhado, e as cores se matizarão juntas. Para mim, a secagem rápida datêmpera é qualidade e não defeito, pois me permite aplicar várias cama-das de tinta em um mesmo dia.5. É possível aplicar a técnica do “molhado-sobre-molhado” para fazertexturas de rochas, por exemplo, usando uma escova de dentes comopincel, técnica que será explicada mais adiante. No entanto, os “puristas”não aceitam essa técnica, uma vez que a forma tradicional de se pintar atêmpera é com pinceladas hachuradas.

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o pintor deverá procurar outro médium, pois não lheserá possível trabalhar com a têmpera, embora muitodos rigores dos pintores mais tradicionalistas tenhamsido atenuados pelos modernos pintores à têmpera.Superadas as limitações (e por causa delas afirmamosque a pintura à têmpera não é para todos), a técnicaagradará aos pintores que apreciam o processo artís-tico com muita disciplina.

Depois de terminada a obra, pode-se envernizá-la ouencerá-la, com o objetivo de ressaltar as cores e prote-ger a pintura da atmosfera, luz e umidade. Usar cerade abelha dissolvida em terebintina e, depois de seca,escovar de tempos em tempos para tirar o pó e dar bri-lho. Usar uma parte de cera de abelha pura e umaparte de essência de terebintina, dissolver em banho-maria até estar bem misturado e passar ainda líquidosobre a pintura, delicadamente e com pinceladas ligei-ras, usando um pincel macio e largo.6

Limitações

Impastos: a têmpera tem que ser aplicada em camadasfinas, senão rachará e sairá do painel em poucas sema-nas. Portanto, não se pode usar a técnica do impasto. Apintura tem que ser elaborada em muitas camadas

6. Pessoalmente, prefiro não envernizar, pois a principal característicada têmpera é a luminosidade e transparência, que se perde com o verniz.

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finas.7 Isto impede que o artista pinte ao ar livre (plenair), a têmpera é uma técnica de atelier.

Misturas de tintas: não se trabalha com mistura física natêmpera, mas com misturas ópticas.Matizar: é difícil matizar os tons na têmpera, pelamesma razão que não é possível trabalhar com mis-turas físicas. A têmpera seca muito rapidamente e,por outro lado, passar o pincel no mesmo local e coma tinta úmida, faz com que as camadas inferioressaiam, aparecendo o gesso. Para pintar o céu, usarmais escuro no alto e ir clareando gradualmente atéo horizonte, e é necessário fazer faixas irregulares pri-meiramente. É uma habilidade que se desenvolvecom a prática.

Cores brilhantes: as sombras não são tão escuras na têm-pera, não é possível fazer sombras profundas.8

Linearidade: a têmpera seca com uma aparência acha-tada, um tom mate. Isto nem sempre é consideradouma limitação, segundo SULTAN (1999), trata-se deuma qualidade.

7. No mínimo 10 camadas na base (underpainting), e de 10 a 15 cama-das na pintura (overpainting).8. Não gosto de sombras profundas, então, para mim, isto é qualidadee não limitação.

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Limitações imaginárias

Nossa experiência com a têmpera, bem como a deoutros artistas, revela que algumas limitações, ensina-das em aulas de arte e em alguns livros, são imaginá-rias. Por exemplo:

Rigidez na aplicação da técnica: não é obrigatório fazerum desenho detalhado e segui-lo fielmente até o final,é possível pintar a partir de um esboço, como em qual-quer outra técnica, e é possível fazer correções duranteo trabalho, ao contrário do que afirma THOMPSON JR(1973), um dos mais tenazes defensores da técnica tra-dicional, que foi trazida por ele aos nossos tempos,tendo traduzido e adaptado aos nossos dias o Tratadode Pintura, de Cennini, onde a técnica é descrita pelaprimeira vez.

Escala pequena: é um equívoco pensar que a têmperanão permite pintar em grandes superfícies. É possívelusar grandes superfícies quando se toma cuidadospara que ela não empene e quando se usa outras téc-nicas além das pinceladas hachuradas (difíceis de se-rem aplicadas em grade escala)9. O MDF não empena.Se for usado papel de aquarela em substituição ao pai-nel de gesso, resolve-se o problema de aplicar gessoem larga escala – tarefa difícil mas não impossível:

9. No entanto, a maioria dos temperistas trabalha com pequenas super-fícies (geralmente painéis de 40X50cm), sendo que, para grandes dimen-sões, é preferível usar a técnica do afresco.

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deve ser feita rapidamente, antes que o gesso seque eforme divisões. Também é possível usar tela texturi-zada, técnica criada por esta autora e que será expli-cada posteriormente.

Qualidade bidimensional: algumas autoridades em têm-pera consideram que o médium não é adequado parapintura naturalista. Isto era correto nos primórdios datêmpera, quando se pintava apenas com a cor local esem perspectiva. O artista que usar a técnica da vela-dura e opacidade não terá problemas para criar efeitostridimensionais.

Assim, a única regra verdadeira é a imposição química(que não permite impastos), porém, todos os médiunspossuem limitações. VICKREY (1973) afirma que épossível, sim, improvisar na pintura a têmpera. Natêmpera, é possível usar outras técnicas além dashachuras, possível pintar diretamente no painel (sem arepetição tediosa do desenho no papel e no painel), épossível abandonar as regras medievais e tornar atêmpera relevante para nossa época.

Superfície no método tradicional

A tinta é feita com a mistura de pigmentos em pó, agema do ovo como aglutinante e água desminerali-zada que lhe serve de veículo. Muitos elementos con-tribuem para o grau de facilidade com que se pode

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manipular ou controlar uma tinta e um deles é a natu-reza da superfície ou fundo onde é aplicada. SegundoMAYER (2002), nenhuma boa tinta é feita simples-mente misturando-se veículo e pigmento: é essencial amoagem com pressão forte. No entanto, nossa experi-ência (e a de outros temperistas) comprova que, com atecnologia atual, os pigmentos são moídos tão fina-mente que não necessitam a moagem recomendadapor Mayer em seu “Manual do Artista”: podem sersimplesmente misturados com a emulsão, usando-se opincel. As tintas podem ser retiradas do pincel pelasirregularidades do fundo e também pela absorção,como alternativa para a rugosidade; em fundos muitolisos a absorção da superfície funciona como alterna-tiva para a aspereza, apanhando a tinta do pincel eespalhando-a. A pintura à têmpera necessita de umgrau elevado de absorvência para seu funcionamentoadequado, e a superfícies não precisam ser rugosas. Assuperfícies adequadas para a pintura à têmpera na téc-nica tradicional são os painéis de gesso. Na técnicamoderna, a têmpera pode ser pintada sobre papel deaquarela de boa qualidade (acima de 300 gramatura),sobre painel de gesso em MDF, ou sobre tela texturi-zada (técnica desenvolvida por esta autora).

Preparação das tábuas

Tradicionalmente, se ensina que a pintura a temperanão pode ser feita sobre tela, pois esta tem muita fle-

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xibilidade e movimento, o que a têmpera não su-porta. Não adianta colocar gesso sobre a tela, pois estanão pode oferecer proteção contra umidade, que pe-netra pelo verso. Desvantagens dos painéis de ma-deira: sua tendência a emitir vapores ácidos (out-gas-sing, emanação de gases), prejudica as películas detinta. Desde os tempos mais antigos, eram usadastábuas de madeira, em geral, álamo, olmo, castanheiroe tília. Não se usam tábuas resinosas. Os italianos usa-vam álamo, os nórdicos carvalho e mogno. Os ita-lianos usavam painéis espessos, os demais painéismais delgados. Para pintar ícones uso painéis grossosde madeiras duras como a imbuia, a sucupira, ou ocedro10. Uso madeiras certificadas, de manejo ecoló-gico e sustentável.

Alternativamente, se usa MDF ou madeira compen-sada para o ensino e a prática, tendo em vista o altocusto da madeira de lei. A madeira deve ser rígida,livre de nós, seca e estacionada (há três anos), ter de2,0 a 2,5cm de espessura, a face deve estar livre deimperfeições (nós, rachaduras, buracos etc.), do tipo“boa de um lado”, cortada com serra de fita (para nãopartir nas bordas). Devido à existência de grande vari-edade de cupins que atacam a madeira, é preciso pro-tegê-la, por exemplo, submergindo-a em vinagre, por24 horas. Secar em superfície lisa e com um peso emcima, para não empenar. A cola animal (pele de coe-lho) e o gesso crê usados na preparação da madeira

10. Madeiras de lei são mais resistentes à umidade.

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formam uma barreira contra os vapores emanados damesma, mas devem ser aplicados corretamente, obser-vando todos os passos da técnica. Não usar madeiraempenada, que é incompatível com a técnica.11 Se for-mos utilizar uma madeira de grande dimensão, deve-mos colocar traves na parte detrás, para não empenar.A madeira deve ser riscada em quadriculados, paramelhor absorver a cola.

Encolamento

A cola não é um revestimento; é um líquido (gela-tinoso leve) empregado para preencher os poros damadeira, para isolar camadas ou tornar superfíciesadequadas para receber revestimentos. Não aplicarcamada de cola muito espessa na madeira, pois a colatem pouca estabilidade, provocando a descamação dapintura. Lixar bem as arestas. Fazer cortes diagonaissobre toda a superfície, formando quadriculado, paramelhorar a aderência da cola. Preparar várias tábuasao mesmo tempo, para aproveitar a cola, embora estapossa ser conservada por várias semanas sob refrigera-ção; a cola deve ser usada quente, mas se deve evitarexcessivos reaquecimentos, que farão com que a colaperca a força.

11. Depois de seco, o gesso trinca, quebra. O gesso acrílico é quimica-mente incompatível com a têmpera.

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Usar cola de pele de coelho12 (vendida em placas,grãos ou escamas), que deve permanecer de molho emágua fria durante 12 horas,13 o que fará a cola dobrarde volume e se dissolver mais facilmente, não for-mando grumos. Derreter a cola em banho-maria, semdeixar ferver (a fervura fará a cola perder suas propri-edades), batendo bem com um batedor (de cozinha),para evitar eventuais grumos. Passar a camada de colasobre toda a tábua, em um único sentido e sem fazermovimento de vai-e-vem, usando pincel macio e largo.Evitar deixar diferentes espessuras. Encole todos oslados da tábua, para protegê-la. Lave o pincel e o bate-dor em água quente. Deixar secar por 24 horas. No diaseguinte, passar mais uma camada de cola na madeira,repetindo o processo, em seguida fazer o entelamento.

Receita da cola:

• 1 medida de pele de coelho• 7 medidas de água. Deixar de molho por 12 horas,

para expandir o volume.• 4 gotas de óleo de cravo14.

Usar vasilhame de vidro. Dissolver em banho-maria,não deixar ferver (a cola perderá se poder aglutinante).Passar sempre em um só sentido. Manter a espessurauniforme. Deixar secar por 24 horas.

12. Alternativamente se usa cola de peixe ou cola de osso, mais baratas,ou ainda, gelatina sem sabor: 21g dissolvida em 250cc água. A cola depele de coelho é melhor, pois é mais elástica.13. Fazer à noite, para usar no dia seguinte.14. Óleo de cravo é fungicida.

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Entelamento

O entelamento consiste em colar um tecido de algodãosobre a face da tábua, com o objetivo de evitar queeventuais rachaduras na madeira atinjam o gesso, bemcomo para manter a base de gesso unida, uma vez quea madeira nunca cessa de movimentar-se15.

Após a primeira camada de cola seca, passar mais umacamada, fixar o tecido de algodão. Evite usar tecidomuito grosso, que reage com a umidade e pode formargretas. Prepare um pedaço de tecido um pouco maiorque a tábua, para facilitar cortar após estar seca a pre-paração. Cubra a tábua com a tela, do centro para fora(para evitar bolhas de ar), alise bem com os dedos.Deixar secar por 12 horas.

Depois de seca, examine a tábua com cuidado, es-fregando-a fortemente com os dedos; se as fibras dotecido se moverem com a pressão, significa que hábolhas de ar. Faça um corte em cruz sobre as bolhas,levante a tela naquele local e encole a tábua nova-mente. Passar uma camada de cola sobre o tecido jácolado, alisando do centro para fora. Passar sempre nomesmo sentido. Deixar secar por 12 horas. Depois deseco o encolamento, corte a tela excedente com gilete.Proteja os lados da tábua com uma fita adesiva, paraevitar que se manche com o gesso ou com a tinta.

15. Se for usada MDF não é necessário o entelamento, pois essa madeiraé estável. Proteger com seladora.

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Capa de gesso

A têmpera necessita de superfície rígida e absorvente,devido a relativamente fraca propriedade aglutinantedo ovo. É aplicada sobre uma base de gesso16, em trêscamadas, com intervalos de 24 horas para secar, sendoas camadas progressivamente mais finas, para aliviar atensão – gesso grosso, gesso médio e gesso fino, obede-cendo ao princípio do “gordo sobre magro”, uma vezque quanto mais finas as camadas, há menos gesso emais cola (gordura).

Primeira camada (gesso grosso): 1 medida cola pelede coelho, 12 medidas de água, 4 gotas de óleo decravo – repetir o processo de elaboração da cola anteri-ormente descrito.

Uma medida da cola acima, 2 e 1/2 medidas de gessocrê, 4 gotas de óleo de cravo. Incorpore o gesso de-vagar, preferencialmente despejando a cola sobre ogesso, espere penetrar na cola antes de mexer. Nãodeixar ferver. Mexer bem para dissolver grumos, masdevagar, para não formar bolhas de ar (que produzi-rão os pinholes). Passar sobre a madeira entelada,usando pincel largo e macio, sempre no mesmo sen-tido e não fazer movimento de vaivém com o pincel.Esperar secar, passar outra camada (uma no sentido

16. Usar o gesso crê, que demora mais para endurecer. O gesso acríliconão é tão absorvente nem quimicamente compatível com a têmpera, quenão adere sobre sua superfície.

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vertical, outra no sentido horizontal). Passar 4 cama-das e deixar secar por 24 horas. O gesso seca muitorápido e é necessário passá-lo quente, para que não seespesse. As camadas devem ser finas, para evitar a for-mação de gretas. Se esfriar, deve ser aquecido e revol-vido bem, para que a cola, que é mais pesada que ogesso, não fique no fundo do recipiente. Se formarbolinhas de ar, passar o dedo molhado na água morna,eliminando os furinhos formados (pinholes). Evita-sea formação de pinholes tomando cuidado na primeiracamada. Caso contrário, lavar a tábua com água esabão e retirar tudo, começando novamente, pois ospinholes não são cobertos por novas camadas degesso, nem pela tinta. Outra forma de reduzir ospinholes é adicionar Liquitex Flow Aid no gessogrosso (primeira camada, onde geralmente ocorrem ospinholes), ou deixar a mistura na geladeira por umanoite, para dispersar as bolhas de ar.

Segunda camada (gesso médio): 1 medida de cola, 2medidas de gesso crê, 4 gotas de óleo de cravo. Repetiro processo de aplicação da primeira camada. Deixarsecar por 24 horas, com lixa grossa (220). Lixe com aajuda de um pedaço de madeira coberta com o papelabrasivo, para reduzir as irregularidades. Faça movi-mentos circulares e regulares.17

Terceira camada (gesso fino): 1 medida de cola, 1medida de gesso crê, 4 gotas de óleo. Aplicar como nas

17. Usar máscara protetora ao lixar. Não tocar o painel de gesso com asmãos, a oleosidade estragará o painel.

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camadas anteriores. Deixar secar por 3 dias, lixar comlixa fina (lixa d’água, lixa 600). Fazer o polimento comuma “boneca” de tecido ligeiramente umedecida sobrea superfície, em movimentos circulares, para deixá-lacompletamente lisa, sem nenhuma estria. Fazer movi-mentos firmes, mas sem apertar muito, para não tirar aúltima camada de gesso.18 Aguardar duas semanasantes de pintar: se não aparecerem defeitos nesse perí-odo, é seguro que não aparecerão mais. Se apareceremtrincas e gretas durante a aplicação, é necessário lim-par a tábua e começar novamente, pois camadas suple-mentares não cobrirão os defeitos. Fazer a cola àmedida que for usar, pois, se for aquecida muitasvezes, perderá o poder de aglutinação.

Método moderno: tela texturizada

Em nossa experiência com a têmpera, percebemosque o método tradicional era muito difícil de aplicar,caro e demorado, o que contribuía para o desinte-resse dos artistas pela técnica: alguns nos procurarampara aprendê-la e desistiram diante das dificuldades.Mesmo sabendo que esta era uma das razões pelasquais se diz que a têmpera não é para todos, resolve-mos pesquisar formas que tornassem a têmpera maisatraente para os artistas, e mais popular no Brasil.

18. Se quiser um efeito rústico, não lixar.

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Durante dois anos (2004 e 2005) trabalhamos na têm-pera sobre papel de aquarela, usando o Fabriano 400gramatura, e obtivemos bons resultados, tecnicamentefalando. Entretanto, ainda não era a solução ideal, porvárias razões: o brasileiro não valoriza trabalhos empapel (sei que a questão é polêmica, mas estou apenasrelatando a minha experiência com o assunto); as pes-soas que manipulam os trabalhos de arte nos salões deartes visuais não têm o devido cuidado que se deve tercom obras de arte, e os painéis feitos com papel podemser danificados, rasgados, fato que já ocorreu com estaautora várias vezes; se a colagem do papel sobre opainel de madeira não for feita de forma adequada,podem surgir bolhas de ar posteriormente, quando oquadro já está iniciado, e todo o trabalho será perdido. Para os que escolherem esta técnica, apesar dos aspec-tos negativos, a instrução é a colagem de papel paraaquarela de boa qualidade e de gramatura acima de300, sobre painel de MDF, obtendo-se, dessa forma, asuperfície rígida que a têmpera requer. Nos climas tro-picais, a umidade contida na atmosfera, combinadacom a luz e o calor, provocam a decadência do papel,pelo seu escurecimento e pelo desenvolvimento defungos. Para quem pretende trabalhar com papel paraaquarela, é importante o tratamento preventivo do pa-pel, contra fungos e insetos. Consiste em passar nopapel uma solução de pentaclorofenol a 2%, dissol-vido em água, antes de iniciar o trabalho, deixandosecar por completo. Contra o escurecimento, deve-seevitar a sua exposição à luminosidade natural direta.De qualquer modo, o papel é uma boa solução para os

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iniciantes testarem a técnica e descobrirem se irãoadotá-la ou não, pois é de baixo custo. Ao se pintarsobre papel, é necessário aplicar a primeira camadaem veladura, por questões de absorvência.

Quanto à tela texturizada, esta foi a melhor soluçãoencontrada pela autora, e é a única superfície que utili-zamos atualmente, com exceção da pintura de íconesque, por ser uma tradição da igreja católica ortodoxa,continuamos pintando sobre madeira e sem introduzirnenhuma inovação.

Podem ser usadas telas comercializadas prontas, outelas feitas pelo próprio artista. Aplicar quatro cama-das de massa acrílica na superfície da tela, e na partede trás, alternadamente, para ajustar a tensão damesma. Preparar a massa acrílica na proporção 80% demassa acrílica e 20% de verniz acrílico brilhante19, mis-turando bem. Aplicar com pincel largo e macio, e dei-xar secar por 1 hora aproximadamente. Não usar gessoacrílico, pois é muito fluído, não oferece a rigideznecessária para a têmpera. Se desejar trabalhar umatextura, aplicar a massa acrílica com espátula. Nósusamos a massa acrílica da marca Suvinil.

Tendo em vista que a têmpera é incompatível quimica-mente com o acrílico e não adere a essa superfície,

19. BARCELOS (disponível em www.joaobarcelos.com.br, p.3) alertaque não é aconselhável diluir o gesso acrílico com água, que poderáenfraquecer a função da resina acrílica do gesso, recomendando o uso doverniz acrílico brilhante, que é uma mistura da resina acrílica com água.

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aplicar sobre a tela já seca, duas ou mais camadas(dependendo do resultado) de gesso crê fino, con-forme a receita da terceira camada do método tradicio-nal. Deixar secar por 24 horas, e a tela estará prontapara receber a pintura. Cuidar para que o gesso crêcubra bem a massa acrílica.

Como se pode observar, nosso método acelera o pro-cesso do preparo da superfície para apenas um dia,reduz os gastos (uma vez que a cola de coelho é cara,mas aqui é usada apenas na última camada, a de gessofino), facilita o trabalho, torna a obra mais atraentepara o público brasileiro (que aprecia trabalhos emtela) e permite ao artista usar com propriedade osmateriais que a moderna tecnologia colocou à nossadisposição.20

Desenho – a base da pintura a têmpera

Historicamente afirma-se que, pelas características datêmpera, não se pode pintar ao ar livre, ou “alla prima”,porém, os artistas que apreciarem esse modo de traba-lho, podem fazer a marcação inicial na tela, usandolápis aquarelável (ou mesmo aquarela), e terminar otrabalho no atelier, como nos mostrou a experiência.O desenho é um dos elementos da pintura, seja qualfor o médium escolhido pelo pintor. O desenho é

20. Nosso método pode ser usado por qualquer pessoa, desde quecitada a fonte.

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essencial para a pintura a têmpera, por causa de suanatureza linear. A forma de matizar limites e contor-nos, usada na pintura a óleo, não é possível de seraplicada na têmpera, no entanto, não é necessáriofazer esboços detalhados no papel e depois transferi-los para o painel, o desenho pode ser feito diretamenteno painel.

O desenho no método tradicional

Segundo o método tradicional, descrito por Cenniniem seu Tratado de Pintura (traduzido por THOMPSONJR, op. cit.) devido as suas características, a têmperanão pode ser feita de modo espontâneo, requer muitoplanejamento (claro/escuro, perspectiva etc.), por-tanto, sua base é um bom desenho. 21

No método tradicional, recomenda-se que o desenhoseja feito detalhadamente no papel22 e depois sejatransferido para o painel com nanquim e que todas asmarcações de claro/escuro sejam feitas com nanquim,geralmente em duas camadas para que o desenhofique bem reforçado — esta será a base sobre a qualserá feita a pintura. Na pintura, os traços do desenhonão serão reforçados, mas servirão para separar cada

21. No entanto, os pintores modernos atestam que é possível pintar semtanto planejamento e com espontaneidade, desde que se tenha uma idéiabem clara do que vai ser pintado. 22. Não se trata de esboço, mas de desenho detalhado, com marcaçõesclaro/escuro, forma e perspectiva.

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área que será trabalhada separadamente, o que facilitao trabalho dos pintores iniciantes, uma vez que, nestatécnica, é mais fácil trabalhar em pequenas áreas.23

Quando se pretende ter esse controle sobre a pin-tura, evitando a espontaneidade, é aconselhável divi-dir o desenho em áreas de igual tamanho, para nãoenfatizar alguma que não seja do interesse do pintor:as áreas de interesse, naturalmente, serão enfatiza-das por tamanhos maiores ou menores do que essasáreas gerais. 24

Etapas do método clássico, de Cennini (THOMPSONJR. op. cit.):

Passo 1 – desenho em papel; marcação de luz, meio-tom e sombra usando tinta preta, branca e suas gra-dações (escala tonal), com pinceladas hachuradas25.Quando o desenho estiver pronto, estará terminado oprocesso criativo, que não poderá sofrer alterações. Éusada tinta nanquim.

Passo 2 – transferir o desenho para o painel de gesso,usando papel carbono.

23. Os pincéis pequenos, as pinceladas curtas, e a própria característicado médium dificultam cobrir áreas extensas de uma vez.24. Esta técnica é interessante para os pintores iniciantes, mesmo aque-les que escolheram pintar no método moderno, pois evita que o pintor“se perca” quando estiver distribuindo os claro/escuro/meio-tom, umavez que, por ser pintada em camadas finas, demora um pouco para queos diferentes tons sejam percebidos.25. Pinceladas hachuradas: linhas finas, paralelas, próximas uma dasoutras. Também podem ser cruzadas. Em desenho, servem para modelara forma e proporcionar volume.

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Passo 3 – refinar o desenho meticulosamente, repe-tindo as pinceladas hachuradas e modelando detalha-damente a forma.

Modelando no método tradicional

Considerando que “modelar” é dar a forma tridimen-sional, esta é obtida por meio de hachuras, ou seja,linhas paralelas e cruzadas, que acompanham o tra-çado do objeto desenhado. No painel, o desenho deveestar bem detalhado, com as áreas de sombra/luz/meio-tom bem definidas. Esta será a base, sobre a qualserá feita a pintura no método tradicional. Sobre odesenho detalhado será aplicada a têmpera.

O desenho no método moderno

Os pintores medievais criavam usando a cor local.Cor local é a cor do objeto sem a influência dos outrosque o rodeiam (sem a cor refletida). Por exemplo, flo-res azuis vistas num ambiente branco, sob luz branca,se mostrarão completamente azuis. Naturalmente, émuito difícil observar-se um objeto em situação tãocontrolada, sem a influência do ambiente nas flores.Os pintores medievais produziam formas bi-dimen-sionais (comprimento e altura, sem profundidade),não se preocupavam com perspectiva e volume, usa-

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vam as hachuras apenas para indicar luz e sombra.Atualmente, os temperistas trabalham com perspec-tiva e uma das formas de obtê-la é alternar opacidadee transparência, alternando cores quentes e cores frias– a repetição do processo faz com que as diferentescores pareçam se mover através da pintura, dando ailusão tridimensional. Ao alternar as camadas, é neces-sário esperar a anterior secar.26

Segundo VICKREY (op. cit.), as regras impostas porCennini podem ser quebradas e é possível ser tempe-rista com outras técnicas além das hachuras e da corlocal, usando volume, perspectiva e profundidade,sem descaracterizar a técnica. É possível aplicar-setodas as técnicas da pintura a óleo, exceto o impasto, etodas as da aquarela. O desenho pode ser feito direta-mente no painel, usando lápis levemente, e recobertocom ocre-médio com pincel fino. Não é necessário usarnanquim, a marcação de luzes e sombras pode ser feitadiretamente com a têmpera. Não usar fixativo, poisnão será coberto pela têmpera. A modelagem da formaé desenvolvida gradualmente, usando-se três tons dacor (claro, cor local, escuro), ou mesmo os cinco tonssugeridos por Cennini (a preferência é do artista), umem cada camada, por meio de pinceladas hachuradas,o que dará a ilusão de uma gama de tons.

26. Os temperistas clássicos rejeitam o processo de opacidade/transpa-rência e consideram que volume e perspectiva não devem ser usados natêmpera, que deve ter uma aparência “chapada”. São fundamentalistas.

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Na pincelada hachurada, o pincel é usado como umlápis (pincel filete, de ponta fina). Mergulhar o pincelna tinta e tirar o excesso com papel toalha. Dar pince-ladas com o pincel quase seco, na direção que se pre-tende dar ao objeto retratado. Também se pode pintarem aguadas, sem usar as pinceladas hachuradas.

Fazer as primeiras camadas em tom claro, estabele-cendo as formas a serem desenvolvidas — o que per-mitirá a correção de erros sem deixar marcas e fa-cilitará a transição tonal. Dar pinceladas hachuradasem diferentes direções, mais densas (mais próximasuma da outra) nas regiões das sombras. Depois deestabelecidas as formas, fazer as sombras fracasusando as mesmas pinceladas e aumentado os valorestonais para as sombras.27

Terminado o desenho, estará pronta a base: esperarsecar antes de iniciar a pintura com as diferentes cores.Esta fase requer dez ou mais camadas para estarpronta: ela termina quando o pintor se considerarsatisfeito. A pintura final requer vinte ou vinte e cincocamadas em veladuras, e é isto que dá luminosidade etransparência à têmpera. Outros tipos de pinceladaspoderão ser usadas, conforme explicamos adiante.Esta autora trabalha com a técnica moderna, eventual-mente misturando a moderna e a clássica.

27. Na base iniciar do claro para o escuro, para evitar que o tra-balho fique muito escuro, pois, nesta técnica, até as sombras devem serluminosas.

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Modelando no método moderno

Depois do esboço monocromático em cinza, quedefine os padrões de luz, meio-tom e sombra, aplicar asombra com a cor complementar (por exemplo, som-bra verde para a maçã vermelha, sombra azul paraa laranja); modelar com cor quente e cor fria, usar aquente nos pontos em que a forma é abaulada e poristo está mais exposta à luz, e a cor fria nos pontosmais recuados e na sombra; observar que a luz nemsempre é branca, pois incorpora as cores que cercam oambiente (por exemplo, em dia ensolarado a luz ébranco azulado, refletindo o azul do céu e a luz artifi-cial é branco amarelado).

Preparo da tinta

A tinta é preparada com pigmentos puros (em pó),gema de ovo (sem a pele), água destilada, vinagre(conservante natural do ovo) e quatro gotas de óleo decravo (fungicida e para encobrir o cheiro da gema).28

A própria gema do ovo, por sua característica, é umaemulsão, a água é apenas o veículo, que logo se eva-pora, permanecendo apenas o aglutinante (a gema) e o

28. A tinta se conserva por muito tempo sem a emulsão de ovo. Depoisde colocada a emulsão, pode ser conservada em geladeira por algunsdias, desde que não seque: não adianta colocar mais água depois quesecou, pois o ovo terá perdido seu poder aglutinante.

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pigmento. VICKREY (op. cit.) não usa água destilada,pois usa água sem flúor; ele também não usa vinagrepara conservar o ovo, prefere descartar o que sobroude cada sessão de pintura, justifica, alegando que al-guns pigmentos não reagem bem com o vinagre (eupercebo isso com o azul ultramar). Eu faço minhaemulsão com 1 gema, 1 colher de vinagre de maçã29 e1 colher de água destilada. A gema deve ser separadada clara, e ter a pele que a envolve retirada, o que épossível fazer-se segurando a gema pela pele, delica-damente, e furando sua parte inferior para que o con-teúdo escape para uma vasilha. Acrescenta-se o vina-gre e a água destilada, mistura-se bem e armazena-seem um vidro com conta-gotas, conservando a emulsãoem geladeira.

Para experimentar se a têmpera é o médium idealantes de adquirir os pigmentos em pó, o principiantepode usar tinta para aquarela em tubo, de boa quali-dade, ou adquirir a própria tinta para têmpera emtubo, contudo, este produto não é produzido no Brasile é disponibilizado em poucas cores (paleta restrita).

Temperando

A maioria dos pintores mói seus pigmentos com ante-cedência, fazendo uma pasta que é guardada em vasi-

29. Gosto do vinagre de maçã por ser mais claro, mas é apenas umaquestão de gosto pessoal.

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lhas tampadas (sem colocar o ovo, dura indefini-damente), sendo misturadas pequenas porções àemulsão na hora de pintar. Eu prefiro moer pequenasquantidades no momento em que vou usar, e guardaros pigmentos em pó. Alguns pigmentos (por exemplo,o azul da prússia e o carmim alizarim) não se dissol-vem bem na água (são hidrófilos, conforme MAYER,op. cit.), então, devem ser moídos com álcool, depoisse coloca a água – o álcool logo se evapora, permane-cendo a pasta. Os pigmentos modernos são finamentemoídos pelos fabricantes, e podem ser apenas mistura-dos com água em um frasco bem tampado, e depoissacudido energicamente.

Depois de colocada a emulsão, a tinta assim formadanão deve ser armazenada, uma vez que, tão logo o ovoseque, ele perde seu poder aglutinante se for molhadonovamente. De início, por não saber disto, eu guar-dava as tintas em geladeira, pensando que assim con-servava o ovo: quando a tinta secava, eu acrescentavamais água e continuava usando. Quando o quadroficou seco, depois de seis meses, a tinta se soltou e euperdi o trabalho. A pintura a têmpera, quando quimi-camente seca30 é relativamente resistente à água (masnão é à prova d’água).

Durante seus trabalhos, se você errar, consegue apagare corrigir com uma esponja umedecida em água.

30. No Brasil, em razão do nosso clima quente, percebi que a pintura ficaquimicamente seca no período de 5 a 6 meses; nos países de clima maisfrio, a secagem demora no mínimo 1 ano.

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Para pintar

Coloque uma pequena quantidade de pasta de pig-mento em uma paleta. Se for usar o pigmento empó, coloque uma pequena quantidade de pigmento(1/2 colherinha plástica de café) e quatro gotas daemulsão. Se a tinta ficar muito encorpada, acrescenteágua aos poucos.

Adicione igual volume de ovo e mexa bem, certifi-cando-se que não ficaram grumos de pigmento. Al-guns pigmentos pedem mais ovo, você aprenderá naprática. A consistência deve ser igual à maionese rala.A proporção deve ser 1 ovo/1 pigmento.

Adicione água para dar liquidez e o pincel deslizar.A quantidade de água não importa, pois a água se

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evapora – o que importa é a quantidade de ovo.Para resolver a questão da falta ou excesso de ovo, de-senvolvi uma fórmula: faço a emulsão com 1 gema/1 colher vinagre/1 colher água destilada e uso 4 gotasda emulsão para uma pontinha da colherinha de plás-tico para café.

Testando

Se a pintura demorar a secar e estiver muito brilhante,há excesso de ovo, devemos juntar mais pasta. Se ficarembotada e com aparência de cal (ou de guache), faltaemulsão. É melhor mais emulsão do que faltar, pois,nesse caso, a pintura esfarela quando seca, por falta deaglutinante. Ao pintar, molhar o pincel em água, paraaplicar camadas finas.

Segundo BERGT (1995, p.15-21), embora geralmentetodos os pigmentos em pó possam ser usados na pin-tura a têmpera, os que funcionam melhor nesta téc-nica são: todos os pigmentos terra, branco de titânio,branco zinco, negro de marte, amarelo cádmio, ver-melho cádmio, verde óxido cromo, verde cobalto,

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viridian, azul ultramar e azul manganês. Algunspigmentos são tóxicos e todos requerem cuidados namanipulação, razão pela qual recomendamos a lei-tura atenta de MAYER (op. cit.) antes da aquisição dospigmentos.

A diferença entre têmpera, guache e aquarela é a trans-parência: a têmpera fica entre a transparência da aqua-rela e a opacidade do guache, e tem a flexibilidade doóleo, que as outras duas não têm, e a secagem rápidada acrílica. A têmpera não é para ser pensada comoum tipo de material, mas como uma técnica que exigemuita disciplina. É possível pintar com pigmento,muito ovo e nenhum branco: teremos o efeito guache.

O segredo da têmpera é: temperar corretamente,manter a cor líquida e usar pincel com pouca tinta.

Pintando

A técnica consiste em um processo de pintura emcamadas (não permite a pintura alla prima). A secagemrápida31 impede o trabalho em grandes superfícies. Ascamadas devem ser finas (tinta rala). Para pintar gran-des espaços, esperar secar, borrifar água e passar aveladura. Deixar a camada de tinta secar completa-mente antes de passar outra camada. Não usar o pin-

31. Alguns artistas usam glicerina para retardar a secagem da têmpera,o que é um desastre: é melhor pintar a óleo.

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cel seco diretamente na tinta, primeiro molhe-o emágua e tire o excesso. Separe um pincel para cada cor,para evitar manchas.

Os efeitos luminosos da pintura a têmpera são produ-zidos pela técnica. Com exceção do branco, que é sem-pre completamente opaco, os demais pigmentos va-riam de semi-transparente a semi-opaco. Mesmo coma adição de branco, as cores não se tornam totalmenteopacas. Quando se aplica uma capa translúcida (semi-transparente) sobre uma capa seca de cor semi-opaca,a primeira cor aparecerá através da segunda, criandouma cor diferente das duas primeiras.

Ou seja: as cores das duas camadas se misturam opti-camente, não fisicamente, pois cada camada é aplicadasobre a anterior já seca. O resultado é uma pinturavibrante. Há pintores a têmpera que se esforçam paraobter um tom geral que unifique a pintura, por issosuas paletas são limitadas e há o predomínio de umacor. O efeito da mistura óptica é obtido com a aplica-ção de uma aguada inicial, depois é feita a base e,finalmente, a pintura. Os dois primeiros passos usamcores contrastantes, para montar uma harmonia globalde tom. O terceiro passo equilibra e enriquece as cama-das inferiores.

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Pintando no método tradicional

A técnica clássica se inicia com um desenho detalhado,com nanquim ou com têmpera, onde são feitas asmarcações tonais. Tanto a base como a pintura sãofeitas apenas com as pinceladas hachuradas, camadasde pinceladas horizontais alternadas com camadas depinceladas verticais, diagonais etc. O controle das for-mas é feito estabelecendo as regiões de sombra, meio-tom e luz, o que se consegue usando três vasilhas: pri-meira com branco, a terceira com preto e a segundacom uma mistura das outras duas. Alguns temperistasnão gostam de trabalhar com nanquim, pois é difícilde cobrir com tinta posteriormente, nesse caso, se podeusar pigmento preto e branco e sua mistura. Algunstemperistas preferem usar cinco gradações tonais,nesse caso, a proporção será de 5/1, o princípio é omesmo. A modelagem, na técnica clássica (tradicio-nal), será sempre feita em preto/branco. Trata-se dodesenho monocromático, cuja função é facilitar o efeitoopalescente quando da aplicação posterior da cor. Oefeito opalescente é o “scumble” (glaze e scumble sãoefeitos, não pinceladas). A base pede, no mínimo, 10camadas de tinta, quando feita com pigmentos. Se forusado o nanquim, geralmente duas camadas são sufi-cientes, depende do traço de cada um.

Seqüência da pintura: primeiro o desenho monocro-mático, em grisaille (cinza), marcando as áreas de luz,sombra, meio-tom (se houverem figuras humanas, as

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peles devem ficar por último). Preparar cinco tons decada cor a ser usada. Por exemplo, o azul: misture opigmento azul com a emulsão nas cinco vasilhas.Acrescente preto na vasilha à esquerda da vasilha domeio, e duas vezes preto na última vasilha à esquerda,formando os tons escuros. Acrescente branco na vasi-lha à direita da vasilha do meio, e duas vezes brancona última vasilha à direita, formando os tons claros. Avasilha do meio, contendo apenas o pigmento azul,será o meio-tom. Começar pelo terceiro plano. Fazer oslimites entre os planos com o lado do pincel, não com aponta (que proporciona nitidez, o que não se desejanesse caso). Pintar o céu. Modelar as formas. Respeitara marcação luz/sombra em todas as camadas.

Modelar as formas: neste estágio, as formas estão in-completas, os meio-tons estão definidos, mas as luzese as sombras ainda não de forma suficiente. Para defi-nir as sombras, aplicar sobre elas uma camada da corpura, bem diluída e com pincel quase seco. Tomar cui-dado com a transição para o tom mais baixo, para irmodelando as formas cuidadosamente. Modelar naordem: meio-tom, sombra e luz, pois esta seqüênciapermite maior controle sobre as transições. A modela-gem do meio-tom para a sombra está completa, faltamodelar as luzes, o que é feito acrescentando maisbranco. Em determinados locais (luzes altas), colocarbranco puro. As luzes podem ser cobertas com cortransparente e depois refeitas, várias vezes (ilumi-nando águas, por exemplo). Nesse estágio da pin-tura, preparar 5 (ou 3, se preferir) gradações tonais das

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cores que pretende usar, pois cada objeto do quadrodeve ser pintado com a gradação das cores, seguindoos padrões de luz e sombra da base (o desenho emnanquim), completando a modelagem das formas. Aofazer a modelagem, lembrar-se que, na têmpera, osefeitos externos (por exemplo, pregas na roupa) sãofeitos depois que as formas principais foram modela-das: primeiro o pescoço depois o colar, primeiro o céudepois as nuvens, primeiro o tecido depois as pregas,primeiro a cabeça depois o véu que a cobre etc. Osreflexos (luzes altas) são colocados no final.

O método clássico usa somente a cor local dos ob-jetos, não trabalha com luz refletida ou com efeitos detemperatura das cores. A perspectiva e o volume sãotrabalhados com as gradações tonais, por isso, ostemperistas que seguem a técnica clássica são tona-listas. A têmpera clássica tem um efeito “chapado”,bi-dimensional, preocupada apenas com os efeitos deluz e sombra.

Na pintura de pele (pele branca) Cennini usa o verdac-cio, composto por cinco tons de verde: primeiramentecobrir toda a superfície da pele com o meio-tom deverde (geralmente é usado o pigmento terra verde);depois, modelar as luzes e as sombras com os demaistons do verde. Após a modelagem, aplicar o tom depele, uma mistura de amarelo ocre, vermelho de cád-mio claro e branco, usando a mistura mais escura (commais vermelho) para as sombras, e a mais clara para asáreas iluminadas. As luzes altas (testa, nariz e boche-

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chas) são feitas com branco puro. Para dar um brilhoespecial à pintura, aplicar veladuras de verde frio(viridian, por exemplo). Aplicar mais viridian nassombras. Também pode ser usado o azul ultramar.

Pintando no método moderno

A técnica moderna também se inicia com um desenhodetalhado, porém, diretamente no painel, onde são fei-tas as marcações tonais, não necessariamente usandopigmento preto e branco, podendo ser usada a corlocal (para o meio-tom), a cor local mais branco (paraas luzes) e a cor local mais preto (para as sombras).Quanto às pinceladas, além das hachuras, utiliza-setambém outros tipos: aguadas, esponjamento, batidi-nhas, gotejamento, borrifos, veladuras, esfregamentoetc. Embora utilize a mistura física das cores (princi-palmente com o branco), a técnica mais usada é amistura ótica. A perspectiva é obtida trabalhando osefeitos de opacidade e transparência, o que se con-segue alternando camadas de tinta opaca e de tintatransparente, uma camada de cor quente, outra de corfria. Assim se obtém vários efeitos para criar volume,profundidade, perspectiva, tridimensionalidade. Ostemperistas tradicionais não aceitam a técnica da opa-cidade/transparência.

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Aguada inicial

Uma camada inicial de aguada transparente (sembranco) fixa o desenho e sela o painel de gesso. Mis-ture a cor escolhida (geralmente, ocre) com a emulsão,adicione mais água e passe no painel usando um pin-cel largo, com pinceladas amplas, horizontais e sobre-postas. Se ficar alguma falha, não tente consertar, istoserá coberto pelas múltiplas camadas de pintura.

Fundação, sub-pintura, base

O propósito desta fase é construir uma base de cores“sólidas” para sustentar a pintura. Isto significa coresmais próximas do opaco (na verdade, semi-opaco),então, as cores devem ser misturadas com um poucode branco. Depois de aplicar a aguada ocre e esperarsecar, passe uma camada de cinza frio (azul ultramar esiena queimada, com predomínio do azul). O cinzadeve estar no mesmo tom do ocre. Passe com pincela-das não conectadas, para que o ocre apareça através docinza: deverá surgir o efeito de brilho faiscante criadopor duas cores que são quase opostas.

Coloque alguma cor quente sobre as camadas já feitas,usando quente sobre frio e vice-versa, para um efeitomais excitante do que se forem usadas cores com amesma temperatura. Uma boa combinação é ocre,

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verde, sombra queimada e vermelho. Ao final destacamada, esfregue (use o pincel em movimento deesfregar) uma camada de cinza brilhante (tinta bri-lhante sobre cor escura), para o efeito translúcido. Paraesfregar, use um pincel macio e espere a camada infe-rior estar seca, ou a pintura se quebrará e terá que serremovida do painel. Aplique somente camadas finas;se perceber muita tinta, retire o excesso com papel-toa-lha. Forme a base com 10 camadas de tinta fina.

Uma boa base para rochas é feita com ocre, cobalto,alizarim e verde.

Pintura

Veladuras e esfregamentos com cor opaca completamos efeitos ópticos da base. A base deve estar bem seca(5 dias). Usar emulsão suficiente (4 gotas para cadacolherinha de café, de pigmento). Teste em uma pe-quena área: se não estiver bom, limpe antes que seque.Em grandes áreas, borrife suavemente a área comágua, evitando que a veladura seque antes de termi-nada. Com a superfície levemente úmida, use um pin-cel chato grande e carregue-o com bastante tinta trans-parente (sem branco). Passe da esquerda para a direita(pessoas destras), de cima para baixo, passando o pin-cel de uma só vez por toda a área, rapidamente. Nãodeixe espaço entre as pinceladas. Use papel-toalha naoutra mão, para apagar (apertando, não esfregando)

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qualquer erro (gotas de tinta escorrendo, por exem-plo). Não deixe a tinta escorrer. Trabalhe rápido, seminterrupções, pois seca rápido (secagem ao toque; asecagem química demora um ano). Deixe secar antesde aplicar mais tinta (em dias chuvosos pode levar½ hora). Não faça veladuras em luz artificial, pois édifícil de ver.

A separação base/pintura é apenas didática, pois, natêmpera, se pode usar veladura e opacidade nas dife-rentes camadas, uma vez que todas as cores aparece-rão em algum grau, então, é melhor falar em camadastransparentes e camadas opacas de tinta. É necessáriopraticar muito para encontrar o ponto certo. Faça testeem painéis usados para esse fim.

Transparência, veladura

Se consegue usando a tinta mais escura sobre a maisclara, em camadas muito finas (afina-se acrescentandomais água), e o pincel com pouca tinta. Se houvermuita tinta no pincel, ao passá-lo, sairá um pouco datinta da camada inferior, o que pode ser usado deforma intencional, como técnica. Observar a combina-ção quente/frio, pois, se for aplicada uma luz quentesobre uma sombra também quente, não haverá ne-nhum efeito, já que são similares. É preciso usar a som-bra um tom mais escuro do que a luz que a cobrirá.Não use branco e use tinta bem diluída (com mais

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água). Use um pincel chato (não use pincel filete, deponta), do tamanho adequado à área em que se estátrabalhando. Pincele rapidamente, para secagem rá-pida. Faça as veladuras um tom mais escuro do que acor a ser coberta. Por exemplo, se a camada inferior éum meio-tom de azul cobalto e vai ser aplicada umaveladura com ocre, usar um pouco mais de sombra nomeio tom do ocre. Na opacidade usa-se o mesmo prin-cípio, ou seja, acrescentar um pouco mais de luz doque o meio-tom da camada inferior. Usa-se o pincelchato, com movimento em uma única direção. A vela-dura é útil para corrigir um primeiro plano que estejamuito “apagado” em relação ao fundo.

Opacidade

A opacidade e a transparência dos pigmentos é rela-tiva, está condicionada aos valores tonais com os quaisa mistura é aplicada, pois usa-se o pigmento brancopara diferenciar os valores tonais, e o branco é o pig-mento mais opaco (exceto o branco zinco, que é semi-opaco). Ao se usar o branco, também ocorre o fenô-meno do “esfriamento” da cor, por isso, quando querodar opacidade ou gradação tonal a um pigmento semesfriar a cor, costumo adicionar um pigmento maisclaro da mesma família de cor, ou usar o amarelo denápoles substituto (não trabalho com o verdadeiro, écomposto por chumbo e altamente tóxico). Quando atinta for plicada sobre uma camada de igual valor

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tonal, a superfície não refletirá a luz e o efeito produ-zido será de opacidade. Qualquer cor terá a aparênciade opacidade se for colocada em repetidas camadas. Acor colocada sobre outra mais escura não refletirá a luze a cor terá uma aparência escura, um efeito de nuvem,de fumaça, qualidade que se denomina “opalescên-cia”, útil para nuvens, fumaça, noturnos, nevoeiro etc.A opacidade pode ser feita tanto na base como na pin-tura, mas, geralmente, é feita na base e veladura napintura, para a obtenção do efeito vitrificado. Use cor,acrescente branco, emulsão e pouca água e faça movi-mentos circulares, como se estivesse “ensaboando”.Use pincel bem carregado e não use pincel bom, pois omovimento de esfregar estraga o pincel. Geralmenteusa-se o pincel com o movimento de “esfregar” paratrabalhar a opacidade. A opacidade serve para clarearum fundo que ficou muito destacado, dando a ilusãoda profundidade.

Matizando

Não usar aguadas ou tentar esmaecer a tinta com opincel, como se faz em outras técnicas; cubra toda aárea a ser coberta com pinceladas rápidas e leves,como marcações com pincel; cubra a mesma área comuma segunda camada, aplicada do mesmo modo,com as pinceladas em ângulo diferente, de acordo coma forma a ser dada (seguindo o desenho); continueassim até obter o desenho que deseja, usando o pincel

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como lápis; se a tinta estiver grossa, o pincel não funci-onará como lápis, então, devemos acrescentar água; seo pincel estiver muito carregado de tinta a cor ficaráirregular (o que é impossível de se corrigir); tirar oexcesso de tinta do pincel na borda da paleta e em umpedaço de pano ou de papel; modelar o desenho pri-meiro (sombras e formas), depois aplicar a cor local; oefeito de transparência é obtido com a superposição decamadas claras sobre escuras (ou vice-versa). Clarosobre escuro produz opalescência, técnica boa parapintar céu, neblina, fumaça etc.

Pintando céu

O zênite mais escuro, o horizonte mais claro. Fazera marcação do preto para o branco (base). Usandoazul cobalto: 3 azul/1 branco na primeira vasilha, 3branco/1 azul na terceira vasilha, e uma mistura dasduas na vasilha do meio. Cada vasilha deve ter o seupincel (ou o pincel deve ser lavado cada vez que se forusá-lo). Aplicar primeiro o azul mais forte, desde otopo até o horizonte: ao cobrir a sombra do desenho,ficará opalescente; ao cobrir o meio-tom ficará opaco eao cobrir o branco ficará transparente. Aplicar 3 ou 4camadas finas, ou até cobrir o desenho. Aplicar o azulmeio-tom da mesma forma, porém, começando dolimite do azul mais escuro e descendo até o horizonte.Aplicar o azul claro (luz) da mesma forma, começandodos limites do meio-tom até o horizonte. Aplicar

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branco puro (luz alta) nos limites do horizonte. Fazer atransparência, para dar luminosidade característicada têmpera: aplicar azul puro (ou com um traço debranco, porém, mais escuro do que o já aplicado), combastante água, mas com o pincel quase seco, na parteescura do céu, em camada bem fina, transparente.Repetir o processo com o meio-tom. Se a modelagemnão ficar perfeita, os tons devem ser aplicados nova-mente, na mesma ordem. O segredo é manter o meio-tom opaco. Para dar profundidade ao céu, fazê-lo emuma estrutura de cúpula, com nuvens menores maispróximas entre si, menos nítidas e mais pálidas con-forme mais perto do horizonte, e nuvens maiores emais escuras no alto do papel.

Pintando nuvens

Primeiro deve ser pintado o céu. Para fazer nuvensbrancas, sobrepor camadas de cores quentes e frias,começando pelas cores claras, usando azul ultramar,cerúleo, rosa, amarelo ocre e branco. Para nuvens es-curas, usar azul ultramar, siena queimada, cerúleo,amarelo ocre, negro e vermelho claro. Colocar as coresescuras com pincel, em veladura, e as cores clarascom esponja, para criar o efeito de maciez. Nuvens aopôr-do-sol são feitas com amarelo escuro, rosa, la-ranja, vermelho, cerúleo e ultramar. Para criar o efeitode raios de luz que atravessam as nuvens, passaruma borracha, como se fosse apagar a tinta. Finalizar

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com uma veladura para harmonizar as cores e dartransparência.

Drapeado e outros objetos

Usar o mesmo princípio: desenho com marcação dagradação tonal (a nanquim ou com a própria tinta);preparar três valores tonais (sombra, meio-tom, luz)usando a cor local mais branco; deve haver brancomesmo nas sombras mais escuras, tanto para obter oefeito opalescente como para depois poder aplicar atransparência, com a cor pura (sem o branco); paramatizar, avançar os limites entre claro/escuro quandofor fazer a transparência.

Pintando texturas

Não é possível representar de modo tátil, tridimen-sional, texturas ásperas com têmpera. As texturas de-vem permanecer bi-dimensionais, apenas criando-sea ilusão da textura. A pintura pode ser aplicadade modo diferente do clássico (pinceladas hachura-das), fazendo com que superfícies lisas pareçam esca-vadas, esfiapadas ou esburacadas, com os métodosdescritos a seguir.

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Chapiscado

Foram mostrados vários modos para se fazer a base:uma camada de cor forte, uma camada de brancoopaco, uma camada da cor oposta à da camada inicial.Cada uma dessas camadas pode ser feita usando-se ochapiscado, mas, bases feitas somente com chapiscos(ou com qualquer outro artifício) serão sem substânciae monótonas. Uma ou mais aplicações são boas parapintar paredes, pavimentos ou rochas. As superfícieschapiscadas aparentam ser ásperas ou mais esburaca-das do que quando se pinta com pinceladas regulares.Coloque o painel no chão, já protegido com papéis(chapiscar provoca muita desordem), para evitar que atinta escorra. Cubra o painel (usar máscara para aqua-rela, que é fácil de remover depois de feito o chapisco),deixando descobertas apenas as partes a serem chapis-cadas. Misture um pouco de cor com emulsão e bas-tante água. Com um grande pincel na mão direita,chapisque o local pretendido, batendo-o na sua mãoesquerda, em cima e um pouco acima do local. Asgotas do chapisco devem estar “finas”, não podemescorrer nem “ficar em pé” na superfície, pois assimcraquelarão. Se aplicadas corretamente, não devemficar perceptíveis ao tato.

Não chapiscar toda a superfície com a mesma quanti-dade de tinta, isso deixa o trabalho monótono: façaáreas com mais e outras com menos textura. Se a inten-ção for um chapiscado indistinto, use primeiro as

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cores claras e depois as escuras, enquanto ambasainda estiverem úmidas, o que fará com que as coresse matizem. Se for repetir este passo, varie um poucoas cores para produzir contraste. Um chapiscadopode ser “apagado” com gaze enquanto ainda estiverúmido. Deixe o painel no chão até secar, para que atinta não escorra.

Mais tarde, o chapiscado pode ser trabalhado, se ne-cessário: se as gotas estiverem muito escuras, colocarum pouco de luz no contorno, dando a ilusão de luzcaindo na borda de uma pequena fenda ou buraco. Seo chapiscado ficar muito claro, colocar sombra sobreele, para dar a ilusão de seixos ou pedras.

Quanto às cores, é possível fazer uma mistura ousada(vermelho, azul, verde) e uma mistura mais opaca emseguida, ou vice-versa. Não há regras estritas sobre ascores a serem usadas no chapisco, porém, deve-se evi-tar chapiscar tons muito mais escuros ou muito maisclaros do que as sombras da base — esse princípio valepara todas as outras técnicas, pois a justaposição decada diferente cor tênue ajuda a dar à pintura a têm-pera uma total qualidade de incandescência. Mas estaregra não é inquebrável. Técnica boa para pintar pe-dras, paredes, texturas no solo. Usando pincel grande,é bom para fazer estrelas no céu.

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Gotejamento

Chapiscado e gotejamento apresentam resultados si-milares: a única diferença é que o gotejamento cai dire-tamente no painel para formar círculos redondos e ochapisco forma ovais. É preferível chapiscar do quegotejar, para dar a ilusão de perspectiva: chapiscostêm uma direção, gotejo não; chapisco produz movi-mento e qualidade tridimensional,e gotejamento temqualidade bidimensional, chapada. Gotejamento podeser eventualmente usado para superfícies como pare-des. Mas para superfícies vistas como um ângulo, ochapiscado é melhor. O procedimento para goteja-mento é basicamente o mesmo do chapisco, excetopela posição das mãos: no gotejamento, o pincel deveestar voltado para baixo, verticalmente (para pingar, enão esborrifar, como no chapisco). Bata na mão compouca força, para não caírem gotas grossas.

Pontilhado

O pontilhamento pode ser usado com cor semi-opacaou transparente, na base ou na pintura. Pinceladasconvencionais não podem produzir o efeito de textura,mas o pontilhamento pode, pois permite que a baseapareça mais. A técnica é a seguinte: misture umpouco de cor (um tom mais escuro ou mais claro doque a base) com médium e bastante água. Use um pin-

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cel de pintar parede: cada fio deixará uma gota de corno painel, então escolha um pincel que distribuirá apintura uniformemente. Os pincéis de cerda de nylonsão melhores para pontilhar. Se a área a ser pontilhadafor pequena, cubra o resto com máscara para aquarela.Pontilhe com movimentos curtos, verticais, para cimae para baixo, com o pincel perpendicular ao painel.Quanto mais pontilhar, mais as gotas de cor parecerãounidas na superfície, dando o aspecto macio. Se aintenção for a textura de uma aparência áspera, nãouse o pontilhamento, que é útil para texturas macias(tecido de roupão, por exemplo, pontilhe a área váriasvezes com tinta nítida e úmida). Pontilhe toda a áreade uma vez, o que dará a aparência macia, mais do quefazer uma parte e depois outra (a junção ou a sobrepo-sição dos pontos quando a parte velha encontrar aparte nova, ficará perceptível). A técnica é boa pararetratar objetos móveis como ondulação da água, defolhagens, de tufos de capim.

Esponjamento

Uma esponja grossa é uma boa ferramenta. O esponja-mento (batidinhas ou compressão com esponja) funci-ona melhor quando se coloca cor clara sobre sombra(nuvem no céu, por exemplo). Uma camada de es-ponja escura sobre a base funciona bem para criarasperezas, como texturas em rochas, mas o espon-jamento é excelente para nuvens e cores claras. Molhe

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a esponja com água, aperte para tirar o excesso, mer-gulhe na tinta e dê batidas ou a comprima levementeno painel. É uma técnica boa para fazer nuvens, obje-tos macios.

Borrões

Não importa a técnica usada (chapisco, esponja etc.),os resultados podem ser modificados com borrões fei-tos com gaze, em pequenas pancadas. A gaze nãoabsorve toda a tinta e a redistribui um pouco, dandoum efeito borrado.

Borrifos com escova de dente

A escova de dente é ótima para produzir salpicos.Mergulhe a escova de dente na tinta e passe o polegarsobre ela, acima do painel, produzindo os salpicos.Regule a intensidade por meio da velocidade com quepassa o dedo e o ângulo sobre o painel. Borrifar éuma técnica boa para fazer folhagens: pintar esboça-damente o tronco das árvores e alguns ramos de ar-bustos; esboçar o solo com siena natural e sombraqueimada; borrifar a folhagem com escova de dentes ecom pincéis de diferentes tamanhos, usando amarelos,carmim alizarim e azul da Prússia. A técnica tambémpode ser usada para criar o efeito de neve caindo, bor-

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rifando branco sobre os objetos já pintados e secos;fazer borrifos maiores no alto, no céu, e harmonizar osborrifos em baixo, no solo, para uniformizar a neve noprimeiro plano.

Pincel seco

É a técnica mais usada pelos pintores à têmpera. Car-regue o pincel com bastante tinta, depois tire o excessoem um pano, deixando apenas o suficiente para ficarum pouco sobre o painel quando o pincel deslizarsobre ele. A pincelada será falha e irregular, por causada pouca tinta. É uma técnica para texturas de madei-ras e pedras. Pode ser feita com cor escura, raspadacom gilete e refeita com cor clara e depois vitrificada(veladura). O resultado será um efeito de madeira bri-lhante. É uma técnica boa para obter misturas: umasombra pequena sob o olho ou a narina, e os limitesdevem ser esfumados com pincel seco. Bom para pin-tar madeiras, tábuas.

Raspado

Giletes podem criar efeitos de textura. Usando a pontada gilete, a pintura pode ser raspada para criar textu-ras de madeira, cachos de cabelo ou lâminas de grama.O painel deve estar com a base completamente seca,

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por semanas, se possível, caso contrário a raspagemtirará a pintura, expondo o gesso. Após a raspagem,cubra com uma camada de cor diferente. Ex: para defi-nir cabelos loiros, raspe a cor escura de baixo e cubracoma cor clara. Bom para fazer gramas, cabelos, gretasna madeira e em tronco de árvores, iluminar pequenasáreas. É uma técnica boa para representar gotas dechuva caindo: com a tinta seca, faça riscos com a pontade um estilete para raspá-la e mostrar o branco dogesso, imitando a chuva; faça movimentos vivazes, emuma só direção, sem pressionar demais para não for-mar sulco no gesso. A técnica também é útil para fazerluzes, galhos e capins delicados, teias de aranha, refle-xos do sol sobre a água etc. Em alguns casos, é interes-sante harmonizar o raspado aplicando-se sobre todo oobjeto todo uma camada de veladura.

Batidas

Usada para fazer texturas ásperas. Carregue o pincelcom cor clara (a ser batida sobre o escuro), retire oexcesso (como no pincel seco). Não use um bom pin-cel, de ponta, prefira um pincel chato, e dê batidinhasrápidas no painel, com o lado do pincel (pincel dei-tado, não na vertical como no pontilhamento). Bompara fazer solo arenoso, casca grossa de árvore, folhasno chão (com a ponta do pincel redondo grande); po-ças de água, chão molhado, telhados, folhagens (com olado do pincel).

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Pinceladas de seixo

Para preservar texturas obtidas por métodos não con-vencionais, pintar sobre elas com pinceladas soltas emuito finas, fazendo com que a textura apareça entreelas. As pinceladas lembram seixos sobre a superfície.São feitas da direita para a esquerda, produzindo pin-celadas irregulares.

Espatulado

O uso da espátula dá calafrios nos estudantes dométodo clássico da pintura a têmpera. Os pintores aóleo usam a espátula para impasto, que é proibido natêmpera. Mas, com a prática, é possível espatularcamadas finas e fazer texturas maravilhosas, principal-mente para aplicar luzes no céu. Passe como se fossemanteiga no pão. Se ficar muito grossa, retire o excessocom a espátula antes de a tinta secar.

Esfregado

Aplicar cor opaca em movimentos circulares, com pin-cel macio. Usar pincel velho, para não estragar osnovos. Como essa técnica é usada para obter o efeitode opacidade, alguns autores confundem a técnica da

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opacidade (scumbling, colocar cor opaca sobre veladu-ras escuras), com a pincelada em movimento circular,de esfregar (scrubing), no entanto, são coisas diferen-tes: a primeira se refere a um efeito, a segunda a umtipo de pincelada.

Sulcos

Movimento de rolar o pincel de lado, criando umefeito de sulcos.

Miscelânea

Há duas técnicas difíceis de controlar: tirar o excessode tinta com papel toalha, ou aplicar tinta com umaalmofada. Só se sabe se vai ficar bom ou não depois deaplicada.

Máscaras

Máscara de aquarela, usada sobre uma área que não sepretende pintar (para protegê-la), evitando acidentes.

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Refinando texturas

É necessário refinar a pintura para matizar, com vela-dura e opacidade. Nesta fase, usar bons pincéis parafazer os detalhes. É um processo demorado, mas ne-cessário: trata-se do acabamento.

Correções

Quando se percebe claramente um defeito na com-posição, fica difícil corrigi-lo se tiver usado nanquim.Não usando nanquim, o erro pode ser lavado ou ras-pado e corrigido, sem perder toda a pintura.

Correção com água: molhe suavemente o local compincel macio e aperte com papel toalha para tirar aágua. Repita quantas vezes forem necessárias pararetirar o erro.

Correção com raspagem: cubra as áreas boas com umamáscara de proteção. Raspe o local com gilete até reti-rar o erro.

Correção com lixa: depois de raspar com gilete, passeuma lixa fina para tirar as marcas.

Repintando: depois de lavar, raspar ou lixar o erro,faça a pintura novamente.

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Cuidados com a pintura

Pinturas a têmpera podem ser mais duráveis do quepinturas à óleo, mas requerem alguns cuidados. Se ascamadas de tinta forem grossas, a pintura craquelaráem poucas semanas.

Se for usada tinta que já tinha secado32, depois dealgum tempo a pintura irá esfarelar. É necessário to-mar cuidado com a pintura até que seque quimica-mente (por 1 ano), pois só após esse período estarámais segura de não craquelar.

Alguns pintores envernizam seus trabalhos a têmpera,outros são contrários a esse procedimento, alegandoque o mesmo dá um aspecto de “óculos grossos” àpintura, eliminando sua luminosidade. O verniz enfa-tiza as sombras e não modifica as luzes, ressaltandomuito o contraste. Alguns pintores enceram suas pin-turas, outros não, pelos mesmos motivos.

Mofo: alguns pigmentos (amarelo cádmio, por exem-plo) tendem a mofar. Lugares úmidos também provo-cam mofo na pintura, mas o mofo não é regra, éexceção, e pode ser retirado com vinagre.

32. Depois que se adiciona a emulsão de ovo, não se deve deixar a tintasecar; não adianta colocar mais água, o ovo já terá perdido seu poderaglutinante.

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Polimento: depois de pronta, a pintura pode ser polidacom uma “boneca” de pano limpo: passar firme, semapertar demais (para não tirar a tinta).

Pinturas novas, que ainda não secaram quimicamente,são sensíveis a riscaduras, batidas e outros acidentes,principalmente quando expostas. Para prevenir, usarmolduras que se sobressaiam ao painel, protegendo-o.Alguns revestem a pintura com vidro, mas o re-flexo que eles causam tira o belo efeito da têmpera. Nocaso de usá-lo, não deixe que toque o painel, provo-cando riscos.

O painel deve ser constantemente espanado com umpincel macio, para tirar o pó. É possível usar um panoumedecido, com cuidado. Painéis grandes necessitamescoras para não empenar. Para seguirem pelo correio,as pinturas devem estar bem embaladas em plástico-bolha, protegidas ao toque e arranhões.

Conclusão

A pintura a têmpera não é uma técnica fácil para inici-antes, mas não é tão complicada que impeça a suaprática. Requer algum estudo e disciplina, mas podeser dominada mais facilmente pelos artistas que ado-tarem a técnica moderna, que elimina muitas das difi-culdades apresentadas pelo modo clássico de pintara têmpera.

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REFERÊNCIAS

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SCHADLER, Koo. Egg tempera painting. N.H: KooSchadler, 1998.

SMITH, Ray. Manual prático do artista. Lisboa: Dor-ling Kindersley, 2004.

SULTAN, Altoon. The luminous brush. New York:Watson-Guptill Publications, 1999.

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VICKREY, Robert. New techniques in egg tempera. New York: Watson-Guptill Publications, 1973.

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