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Piracicaba, seu rio, seus peixes

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Piracicaba, seu rio, seus peixes. Nelson de Souza Rodrigues e Luccas Longo.

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Patrocínio Cultural RealizaçãoApoio

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Em gentil deferência pediu-nos o colega Engº Agrº Nelson de Souza Rodrigues para que eu fizes-se a apresentação de seu livro, “Piracicaba, Seu Rio, Seus Peixes”, tarefa sobremodo honrosa que espero poder cumprir, para assim fazer jus à grande admira-ção por sua pessoa e à amizade que nos une.

Conheço Nelson de Souza Rodrigues desde os idos de 1947, ao tempo de memoráveis lutas polí-ticas em prol dos interesses do Centro Acadêmico Luiz de Queiroz, órgão de classe dos estudantes de Agronomia da Universidade de São Paulo, quando já despontavam suas qualidades de líder estudantil. A partir dessa época, após a formatura na ESALQ, seguimos caminhos diferentes em de-corrência das atividades a que viemos nos dedicar na carreira profissional: ele como técnico e pes-quisador cientifico da Secretaria de Agricultura do Estado de São Paulo.

Este livro, que ora vem de ser publicado, reflete muito de seus trabalhos realizados como pesqui-sador na área de piscicultura, tanto no Posto de Piscicultura do Instituto de Pesca da Secretaria de Agricultura, como também na Estação de Biologia e Piscicultura de Pirassununga, subordinada ao Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimen-to, e posteriormente, após a aposentadoria, no Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA), em Piracicaba.

Porém, vai mais longe, pois, em ultima aná-lise, como bem diz o seu título, representa uma completa revisão das tradições históricas e cultu-rais da cidade de Piracicaba, ligadas ao seu im-portante rio, descritas com as minúcias próprias de um abalizado conhecedor do assunto, de um pescador inveterado, cheio de entusiasmo pelo

Nossa intenção ao conceber este livro foi educativa, ao dar conhecimento de dados geográficos de nosso rio e da biologia dos peixes; histórica, ao ressaltar a importância de seus peixes na própria história de Piracicaba

Apresentaçãovelho ofício, e pelas glórias e acontecimentos de um passado já distante, pleno de muitas alegrias e conquistas, às vezes eivadas de algumas desi-lusões e amarguras, mas relatadas sempre com sabedoria e bom humor.

O livro engloba catorze capítulos tendo como tema principal, uma espécie de pano de fundo, a importante influência exercida pelo rio sobre o de-senvolvimento da cidade e a região de Piracicaba, desde as primeiras etapas de sua fundação, em meados do século 18, até os dias atuais. Como salienta o autor ao dizer nas páginas iniciais, “nos-sa intenção ao conceber este livro foi educativa, ao dar conhecimento de dados geográficos de nosso rio e da biologia dos peixes; histórica, ao ressaltar a importância de seus peixes na própria história de Piracicaba; folclórica, ao relacionar “causos” verdadeiros ocorridos com os mesmos peixes e apresentar uma coletânea de verbetes do palavreado dos pescadores profissionais do nos-so rio de décadas passadas”.

Os capítulos iniciais incluem uma introdução histórica e os dados geográficos sobre o rio, onde se salienta desde logo a importância da mudança da primeira povoação da margem direita para a esquerda em 1784, tendo em vista aproveitar as melhores condições de solo desta última ,relacio-nadas à sanidade do local e a uma boa qualidade da terra para plantio, sem dúvida, de grande in-centivo e garantia para a atividade pesqueira que, na época, já despontava promissora. Os dados geográficos, que destacam a extensão da bacia de 177 quilômetros e 450 metros e superfície de 1.245.000 hectares, revelam a importância do rio para a região central do Estado.

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Nos capítulos intermediários, de início o autor, após discorrer sobre algumas generalidades so-bre a vida dos peixes, indispensáveis para a boa compreensão do que vem a seguir, faz menção sucinta à ictiometria, à reprodução e à determina-ção das idades da espécie, para em seguida tratar da descrição dos principais peixes do rio Piraci-caba. Este capítulo VII deverá ser o preferido dos apreciadores da pesca esportiva, não somente pela quantidade das informações disponíveis so-bre peixes de renome, hoje em dia pouco encon-tradiços, mas que já foram destaque na produção pesqueira do rio em anos passados, bem como pela descrição pormenorizada de técnicas utili-zadas em diferentes modalidades de pescaria de bote ou de barranco, quase sempre entremeadas de “causos” ou histórias de pescador que já fa-zem parte do folclore da atividade.

Primeiros Registros

“Historia Naturalis Brasiliae (História Natural do Brasil) (1648) -Guilherme Piso e George Marcgrave”

Para completar o assunto, o autor descreve os da-dos referentes ao levantamento feito em 1979-1980 sobre a pesca de barranco (com vara), da linha de mão, do sondar, do espinhel, do pindacuema, da rede de espera, e de rodada, que apresenta gran-de importância para um confronto com a situação atual em relação à permanência ou não de diversas espécies. Segue-se outro capítulo assaz interes-sante e instrutivo sobre a terminologia adotada pe-los pescadores na região de Piracicaba. A propósi-to, foi elaborado um pequeno glossário constituído por mais de 50 termos populares, alguns curiosos e pitorescos, que, com certeza, já devem ter sido catalogados como expressões típicas de nosso fol-clore caipiracicabano. E finalmente, para completar as informações geográficas fornecidas inicialmen-te, houve o cuidado especial de incluir um capítulo muito especial sobre os chamados trechos do rio, definidos como locais ao longo de seus 111 quilô-metros, da cidade até a foz no Tietê, assinalados por denominações conhecidas pela ocorrência de situações diversas como irregularidades rochosas, maior presença de pedras agrupadas no leito do rio ou nas margens, diversidade de correnteza das águas na calha, curvas mais abertas ou fechadas do curso, presença de pequenas ilhas ou edifica-ções ribeirinhas, ou ainda devido aos “causos” sin-gulares acontecidos e transmitidos ao longo dos anos pelas gerações de pescadores. Um pequeno croqui anexo permite assinalar os locais menciona-dos, em número de 40.

Os três últimos capítulos são dedicados à luta pela sobrevivência do rio. A discussão do assun-to é importante porque o homem, embora seja o maior admirador das belezas físicas e naturais do rio, bem como da produção de magnífico pesca-do, continua sendo o seu grande predador, direta-mente, ao não observar de forma correta a regula-mentação aprovada para garantir a sobrevivência

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Primeiros Registros

“Historia Naturalis Brasiliae (História Natural do Brasil) (1648) - Guilherme Piso e George Marcgrave”

das redes hidrográficas do país, ou indiretamente, quando permite que cursos sejam desviados ou aproveitados para atender a outros interesses fora da região a que pertencem ou são destinados. No primeiro caso, muita coisa já foi corrigida median-te a severa fiscalização implantada que vem coi-bindo as práticas prejudiciais à sanidade dos rios, como a manutenção correta da mata ciliar dentro dos limites fixados, a proibição de lançamento de esgotos comunitários e industriais na bacia, e o aproveitamento da vinhaça como fertilizante do solo, eliminando de vez o seu descarte em águas fluviais, para citar apenas três exemplos de me-didas protetoras dos cursos d’água. No segundo caso, porém, os prejuízos decorrentes são mais sérios e difíceis de enfrentar porquanto envolvem a salvaguarda ou a garantia do direito à vida de populações carentes de suficiente água potável.

A leitura dos capítulos XII e XIII nos oferece uma ideia mais precisa daquelas duas situações de perigo para a sobrevida do rio Piracicaba. Os dizeres da lápide de inauguração da “Praça do Protesto Ecológico”, em 1979, transcritos ao fi-nal do capítulo XII, são por demais eloquentes para nos transmitir a gravidade dos fatos nele narrados com muita veracidade: “Este marco representa o protesto de um povo em defesa de um bem que, dado por Deus, foi conspurca-do pelos homens: o rio Piracicaba. É o protesto contra a ineficiência, a incompetência dos ór-gãos saneadores e fiscalizadores; a apatia dos governadores, a ganância do poder econômico e, contra aqueles que, de uma forma ou de ou-tra, contribuem para poluir o meio ambiente”.

O capítulo XIII cuida especificamente de descre-ver a “Campanha Ano 2000 – Redenção Ecológica da Bacia do Piracicaba” e todos os fatos impor-tantes que precederam seu lançamento em circu-lar de 4/10/1985, da Associação dos Engenheiros

e Arquitetos de Piracicaba (AEAP). O lançamento da Campanha teve ampla repercussão na imprensa local, e de outras cidades dentro da bacia do Pira-cicaba, e a princípio se desenvolveu de modo infor-mativo e educativo, mediante palestras em escolas, clubes de serviço, artigos e reportagens em jornais. Entre os objetivos visados estava a implantação de um organismo intermunicipal tendo como represen-tantes os prefeitos das cidades da bacia dos rios Pi-racicaba, Capivari e Jundiaí que, uma vez eleito, se constituiu no mais importante órgão para solicitar a adoção de várias medidas consideradas prioritárias para o saneamento hidrográfico na região. Muitas dessas reivindicações, infelizmente, ainda não fo-ram atendidas, mas em compensação a luta empre-endida para alcançá-las valeu para Piracicaba uma referência muito especial na defesa de seu patrimô-nio natural, e se transformou em um exemplo a ser imitado por outros movimentos ambientalistas que se seguiram a esse pioneirismo de sua gente.

Prof. Dr. Aristeu Mendes Peixoto (In Memorian)

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BORREGODo nome de nascido, ninguém SABIADesde jovem, a Rua do Porto era a suaMORADIAMuito popular, todo mundo oCONHECIAPela alcunha de Borrego é queATENDIAA roupa única, mal cheirosa, via água quandoCHOVIAO beiço rachado, vez por outra, atéSORRIAA mão trêmula, de pele crestada, mal lheSERVIAA voz rouca, da boca, malSAÍAZelando os botes, a orla do rioPERCORRIAComo primogênito dos flanelinhas, levou

Borrego na beira do Piracicaba

PRIMAZIATornou-se “FLEX” total, pelas pingas queBEBIAViver sua vida era o que maisQUERIAIndiferente ao que ao seu redorOCORRIAAté o dia que, em todas as bocas virouNOTÍCIAO Borrego morreu, saiu da paisagem queVIVIAE assim, tornou-se o rio, mais pobre, de luto pelaAUSÊNCIADo antigo símbolo que já não EXISTIA

Borrego era uma figura singular que durante décadas, fa-zia parte dos personagens folclóricos da Rua do Porto. A essa figura, dedico essa homenagem.

Nelson de Souza Rodrigues.

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Ao saudoso Hugo Pedro Carradore (i.m.), ba-charel em Direito Jurídico, que durante muitos anos, contribuiu de maneira brilhante para o en-riquecimento da literatura nacional, em múltiplas áreas como no teatro, folclore, meio ambiente, po-esia, cordel, etnografia e outras. Sempre presente em movimentos sociais, sua dolorosa ausência será parcialmente compensada pelo conteúdo de suas dezenas de obras publicadas, inclusive esta última “Memórias do Rio Piracicaba” (2009), que a fatalidade de sua morte, não permitiu que viesse a usufruir todas as merecidas glórias pela excelên-cia da obra.

Euclides Buzetto (i.m.), professor aposentado, ex-vereador, líder do PT na gestão do prefeito José Machado, onde teve atuação destacada em todas as ações defensoras do rio Piracicaba e sua Ba-cia. Como professor emérito, era chamado “Cli-dão” pelos seus alunos, aos quais nunca deixava de transmitir princípios conservacionistas. Como idealizador do Fórum Permanente em Defesa do Rio Piracicaba, sua ação se fez presente na luta pelos princípios que abraçou.

- À Yonne de Toledo Martins Rodrigues, minha falecida esposa, pelos anos de de-dicação, apoio, amor e companheirismo, sem o qual não poderia ter me dedicado ao longo dos 58 anos de casamento as causas em defesa da natureza.

- Agradeço ao meu neto primogênito e coautor dessa obra, Luccas Guilherme Rodrigues Longo, meu grande incentiva-dor e colaborador a cada detalhe deste livro, e pelas dezenas de ilustrações de caráter científico, ou de humor, todas de sua autoria.

- Á Marília Martins Rodrigues de Barros Neto, minha neta, pela digitação e ordena-ção do texto e colaboração nos temas;

- Á Mariana Hortelani Carnececa Lon-go, pela produção do mapa hidrográfico do Rio Piracicaba e idéias;

- Á Jocelyne Martins Rodrigues, minha filha, pelos incentivos, idéias e tratamento das imagens;

- Ao Fausto Guilherme Longo, pelo apoio na captação de recursos para pu-blicação desse livro.

- Ao Luigi Rodrigues Longo, meu neto, pelo incansável trabalho de concretizar a captação de recursos para a publicação dessa obra.

- Ao Marcel Rodrigues Nascimento, meu neto, pelo tratamento digital nas ima-gens e por ter enriquecido esse livro com suas belas fotos;

- Á Monica Rodrigues, minha filha, pelo incentivo e contato com os pescadores do rio Piracicaba, figuras essenciais para o relato de alguns dos causos que compõe esse livro;

- Aos demais filhos, Pedro Francisco

Homenagem AgradecimentosRodrigues e Márcio Martins Rodrigues; netos, Leonardo (Léo) Rodrigues Longo, Ariel Rodrigues, Lívia Maria Rodrigues e Marina Rodrigues e demais familiares, pe-los apoios e incentivos;

- Ao Luiz Fernando Carneseca, por ter me contado o causo da piava, ocorrido em terras araraquarenses;

- Ao Sinésio Cursio, antigo morador e pescador da Rua do Porto, pelo incentivo e identificação dos trechos do rio;

- Ao colega e amigo, Professor Dr. Aris-teu Mendes Peixoto (i.m.), pela apresen-tação do livro e pela sábia orientação na confecção deste trabalho.

- Aos meus antigos companheiros de pescaria, Hélio (i.m), Dinival (i.m.), Wil-son (i.m.), Júlio (i.m.), Armando (i.m.), pelos dias de gratas lembranças que me proporcionaram.

- Ao Marcio Alves e demais amigos da ABCD Cultural, pelo grande apoio, e de-dicação que possibilitaram que essa obra se concretizasse.

- “Gostaria de agradecer ao Grupo Pi-zzinatto, representado pelo Sr. Fabio Pi-zzinatto, por acreditar e entender a rele-vância desta publicação. A tranquilidade desta parceria permitiu tornar nosso pro-jeto grandioso.”

E para finalizar, agradeço a minha pro-genitora, Maria de Souza Rodrigues por desde minha infância ter plantado em mim seu testemunho de amor e respeito pela natureza, o que me levou a seguir a carrei-ra de agrônomo.

Nelson de Souza Rodrigues

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Nelson de Souza Rodrigues, engenheiro agrô-nomo e pesquisador, tem sua vida intimamente ligada às questões do meio ambiente. Sua forma-ção e sua paixão pelas pesquisas foram determi-nantes para que se tornasse um dos pioneiros na luta pela conservação dos recursos naturais, em especial nossos rios. Destacam-se, entre seus inúmeros estudos, aqueles relativos à fauna aquá-tica, aos processos alternativos de tratamento de efluentes e, também, a idealização de uma das primeiras mobilizações ambientais em defesa dos nossos rios, qual seja, a Campanha pela Reden-ção Ecológica da Bacia do Piracicaba, lançada em 1985 e que resultou numa verdadeira revolução na forma de pensar a gestão dos recursos hídricos em nosso país.

Este livro é um importante legado desse pes-quisador, profundo e consciente conhecedor da Bacia do Piracicaba, e que sempre compartilhou com a sociedade o seu saber. Uma publicação ri-camente comentada e ilustrada, consubstanciada em pesquisas científicas, informações biológicas, ecológicas e culturais, relacionadas às principais espécies da fauna aquática desse curso d’água,

Se o rio deu vida à cidade, com certeza Nelson de Souza Rodrigues contribui para garantir a longevidade deste rio que tanto ama e por ele vive!

Prefácioque influenciou, inclusive, a formação do primeiro povoado que deu origem à bela cidade que carre-ga seu nome, Piracicaba!

O livro propõe ainda, por meio de comentários e ilustrações, artigos e verbetes, o resgate da cul-tura pesqueira. A contribuição técnica, conceitual e artística de Luccas Longo, biólogo, mestre em conservação da natureza e artista gráfico, foi es-sencial para completar o sentido e a intenção con-tidos nesta obra.

Disseminar o conhecimento sobre o rio Piraci-caba e sua rica e peculiar fauna certamente irá contribuir significativamente para ampliar a consci-ência quanto à necessária e recomendável preser-vação e utilização sustentável de seus recursos. Esta publicação, por sua importância documental e de pesquisa, com certeza, irá cumprir seu papel e tornar-se referência de alto valor pedagógico na área da educação ambiental.

Se o rio deu vida à cidade, com certeza Nelson de Souza Rodrigues contribui para garantir a lon-gevidade deste rio que tanto ama e por ele vive!

Prof. Dr. Antonio Carlos de Mendes Thame

A todos que: Dedicaram suas vidas ao estudo da natureza;Que transferiram aos seus filhos, alunos e público os conhecimentos adquiridos;Que, como guardiões da sobrevivência humana, sempre estiveram presentes na defesa dos princípios ecológicos;Oferecemos este trabalho, que consideramos um fruto de suas atividades.

Dedicatória

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Sumário Apresentação 7Borrego 10Homenagem 11Agradecimentos 11Dedicatória 13Prefácio 13Capítulo I 17Introdução Histórica 17Capítulo II 23Rio Piracicaba – Dados Geográficos 23Capítulo III 27Peixes – Generalidades 27Ictiometria 31Reprodução dos Peixes 35Determinação da Idade dos Peixes 41Principais Peixes do Rio Piracicaba 45Canivete 46Cascudo 48Curimbatá 52Dourado 56Jaú 62Jurupoca 66Lambari 68Mandi 70Pacu 72Peixe-Sapo 74

Piapara 76PIava 78Pintado 80Piracanjuba 82Tamboatá 86Traíra 88Ictiologia do Rio Piracicaba (1979-1980) 93 Capítulo IV 101Pesca e Legislação 101Capítulo V 105Terminologia Pesqueira – Rio Piracicaba 105Capítulo VI 113O Rio e Seus Trechos 113Capítulo VII 123A Luta pelo Rio 123Capítulo VIII 129Campanha Ano 2000 129Capítulo IX 137História Noticiada 137Capítulo X 149Festa do Divino 149 Sr. Nelson 152Autores 154Relação de fotos e ilustrações 155Bibliografia 156

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Capítulo I

HistóricaIntrodução

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Piracicaba sempre esteve ligada, desde sua ori-gem, ao seu rio e aos seus peixes. Embora os pei-xes sejam consequência do rio, deve-se a eles a primazia da escolha da localidade, como também por várias circunstâncias que contribuíram para o prestígio e o desenvolvimento da cidade. A dificul-dade de transposição do salto favoreceu, à sua jusante, a concentração de cardumes de diversas espécies, oriundos de sua barra com o Tietê, a cerca de 100 km. Essa circunstância determinou, desde período imemoriável, a instalação de uma aldeia paiaguá que, pela fartura de peixes e pela facilidade com que eram apanhados, geraram o nome, “Pira-cycaba”, em que pira = peixe e cyca-ba = lugar ou modo de cercar ou apanhar o peixe, sendo essa a primeira correlação peixe/cidade. Desde a descoberta do “Novo Mundo” (Brasil), os peixes despertaram grande interesse nos meios acadêmicos da Inglaterra e da França principal-mente, cujos escritos, através de relatórios por ve-zes muito fantasiosos, descreviam e ilustravam espécimes vegetais e animais de nossa terra. En-tre muitos, George Moregrave, em 1648, com o precioso e raro livro contendo a descrição e a ilus-tração de peixes existentes em nossa região, como mandis e principalmente o nosso pintado, todos sob a denominação de bagre e grande bagre, e o historiador português Gabriel Soares de Souza, estudioso da biologia brasílica, que lançou em 1587 o Tratado Descriptivo. Somente após 1758, quando Lineu (Carolus Linnaeus) apresentou a 10ª edição do seu trabalho Systema Natural, de ordenação sistemática dos seres vivos e botâni-cos no 10º Congresso Internacional de Nomencla-tura, foi que a identificação científica deixou de ser unicamente descritiva. Por volta de 1693, período das Entradas e Bandeiras, a região começou a ser percorrida e desbravada, devido à solicitação de Pedro de Morais Cavalcanti por uma sesmaria que

prometeu povoar juntamente com sua família “de uma banda a outra, ficando o salto no meio”. Visi-tando-a, encontrou o aldeiamento paiaguá na margem direita do rio, com sua ampla subsistên-cia de peixes. A promessa não foi cumprida e só em 1718, dada a insegurança da viagem por via fluvial (nos rios Tietê e Paraná), foi aberto um pica-dão entre São Paulo e a região do salto, para o abastecimento das minas de ouro de Cuiabá. Esse picadão favoreceu o trânsito de aventureiros, co-merciantes e condenados da Corte, que deram origem à pequena povoação que, por não terem provimento agrícola devido à recente chegada, se estabeleceram graças à caça e à contribuição va-liosa dos variados cardumes ali aglomerados e facilmente apanhados, inequívoco fator de perma-nência no local. Com o desenvolvimento da Vila de Itu, novo traçado de estrada foi proposto partindo de Itu, seguindo o caminho do rio Capivari e daí, o rio Piracicaba, em 1725, quando então Piracicaba seria uma “paragem” no caminho a Cuiabá, devi-do às privilegiadas condições já encontradas pela povoação existente. Com a decadência da mine-ração em Mato Grosso, a navegação fluvial foi abandonada e novamente, em 1765, quando foi restabelecida a Capitania de São Paulo, Piracica-ba voltou a aparecer na história dos caminhos paulistas pelo desenvolvimento de sua agricultura, principalmente da cana, a que Belmont denomi-nou “Pequeno Ciclo do Açúcar”, exigindo a lavou-ra canavieira uma rede de transportes, fossem eles fluviais ou mesmo terrestres. Para tanto, pelo governador Morgado de Matheus, foi solicitada a Antônio Corrêa Barbosa a criação de novas povo-ações de que seria diretor, sendo umas delas na barra “que faz o rio Piracicaba”. Entretanto, Corrêa Barbosa, achando o local indicado impróprio, su-biu o rio até onde já se encontrava a povoação criada anteriormente (no salto) não só pelas condi-

Com o desenvolvimento da Vila de Itu, novo traçado de estrada foi proposto partindo de Itu, seguindo o caminho do rio Capivari e daí, o rio Piracicaba, em 1725, quando então Piracicaba seria uma “paragem” no caminho a Cuiabá, devido às privilegiadas condições já encontradas pela povoação existente

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ções privilegiadas de antigamente, como também pela facilidade de atracações para o transporte fluvial. E, assim, foi fundada oficialmente a Povoa-ção de Piracicaba (Neme, M ., 1940), em 1º de agosto de 1767, na margem direita do rio, que era de propriedade de Antônio Corrêa Barbosa, e onde já se achavam estabelecidos ranchos de pescadores, de sertanejos e áreas cultivadas com hortas e pomares. Antônio Corrêa Barbosa, como construtor de barcos e botes para pesca, criou na freguesia a primeira indústria piracicabana. Já que toda atividade estava voltada à margem direita do rio, portanto sem muito interesse em atravessá-lo para a margem esquerda, deduz-se que a fabrica-ção dos barcos era destinada mais à pesca, sur-gindo assim, mais uma vez, o peixe influindo na história piracicabana. Sob a alegação de que, gra-ças ao grande desenvolvimento da Freguesia de Piracicaba, o lugar já não era suficiente para abri-gar a povoação e por estar “cheyo de Pantanos e a terra estéril para plantaçoens e pouco saudável por sujeito a maleystas”, os moradores da Fregue-sia, encabeçados por Corrêa Barbosa, solicitaram a transferência para a margem esquerda, em feve-reiro de 1784, ao capitão-mor Vicente da Costa Taques Goes e Aranha. Em julho do mesmo ano, veio a aprovação pelo mesmo capitão-mor que a justificava por ser “capaz de fundar muitíssimas fábricas de açúcar, pois produz todo o tipo de cul-tura”. Aos 2 de agosto de 1784, após missa reali-zada por Frei Tomé de Jesus na capela da mar-gem direita, o capitão-mor, o povo e o mestre entalhador e armador Corrêa Barbosa foram ao lugar destinado, “logo abaixo do Salto ou em todo o intervalo deste até defronte a barra do Ribeirão Corumbatahy”. E assim, subindo pela picada de-pois chamada rua Direita e agora rua Moraes Bar-ros, foi ordenado “que se roçasse a chapada entre o ribeirão Itapeva e o rio Piracicaba”, para se pro-

ceder ao alinhamento do terreno delineado por Nicolau Pereira de Campos Vergueiro e executado pelo alferes José Caetano Rosa, constante de “cinco ruas com seus nomes e outras tantas tra-vessas com os seus nomes, ficando a igreja com seu pátio de 50 braças de comprimento e 40 de largo, e também uma praça destinada para a ca-deia” (Torres, M.C.T.M, 2003). A transferência para a margem esquerda trouxe problemas aos pesca-dores, pois, além de terem seus ranchos com to-das as suas tralhas e os pontos para “apoitar” os seus botes na margem direita, o peixe, diariamen-te, era levado para lá e o seu comércio tornou-se mais difícil, já que os compradores moravam na margem esquerda. Como alternativa, iniciaram a transferência para a margem esquerda, a partir da rua direita, para então ficar o produto mais acessí-vel aos seus compradores. Assim, mais uma vez o

Casa do povoador

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peixe interfere na já Vila da Nova Constituição, dando outra direção ao seu desenvolvimento com a rua da Praia e posteriormente com o desenvolvi-mento da navegação, na conhecida rua do Porto. Essa rua era interrompida próximo da atual ponte da Nova Piracicaba por um brejal, alimentado por nascentes existentes no final da Loja Maçônica e que se constituía num ótimo viveiro de rãs, além de, para os pescadores, oferecer para a pesca do dourado; depois de devidamente saneado e dre-nada a sua água para o rio, o brejal deu origem ao lago do parque da rua do Porto. A sucessão de casas de pescadores, que se estendia por toda a rua, constituía uma verdadeira colônia, que, inva-riavelmente, todas as manhãs era transitada por particulares e comerciantes para a compra de pei-xe. As casas, geralmente com a frente caiada de branco, erguidas na linha da frente do lote, com uma ou duas janelas, às vezes azuis, outras vezes verdes, davam acesso aos compradores que, da própria janela, escolhiam o peixe deixado sobre o piso cimentado, frio, para melhor preservá-lo, onde era coberto com um pano de aniagem molhado. Na parede oposta, todas as tralhas do pescador, como motores, redes (em sacos), tarrafas, galões de gasolina. As varas eram dispostas por baixo do beiral à direita de um corredor fechado por peque-no portão de ferro, que dava entrada para a porta da frente e da cozinha, e desta para o dormitório do fundo. No quintal do fundo, algumas frutíferas. Quase todos os pescadores moradores da rua do Porto tinham um rendimento extra, muito necessá-rio quando o rio estava ruim de peixe. Guardavam, mediante pagamento, motores e tralhas de outros pescadores de fora, como também tomavam con-ta de seus botes. Normalmente serviam de piloto, e ainda providenciavam iscas para a pescaria. Além do salário mensal, também recebiam um ex-tra pelo dia de pescaria e parte do pescado. Infe-

lizmente, o complexo da rua do Porto, que por mais de um século constituiu uma referência para a cidade sob o ponto de vista social, histórico e econômico, foi paulatinamente alterado, tornando-se um centro econômico de degustação, devido à grande valorização dos lotes e à baixa piscosida-de do rio. Outra questão também ligada aos pei-xes, na década de 1940, era o número de botes. A começar da frente do ex-Regatas (ou porto de ex-tração de areia) até a proximidade da ponte da Nova Piracicaba, a área se constituía num com-pacto estacionamento (ou apoitamento) de botes. Fossem eles de pescadores profissionais ou de operários do Engenho Central, que também os usavam para pescar, sabiam que “quem saísse perdia o lugar”. Isso tornou obrigatório o uso de se levar fortemente presa ao bote uma corrente de cerca de 6 m dotada de cadeado e ligada a um trilho com cerca de 2 m, para conseguir apoitar no difícil lugar que encontrassem. Como as três linhas de bondes inauguradas já atendiam a bairros dis-tantes, como Vila Rezende, Paulista e ESALQ (Es-cola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”), que tinha seus alunos e professores por eles trans-portados (1940), o número de carros particulares e mesmo de táxis (um ponto ao lado da Igreja Santo Antônio) era muito reduzido, dando margem a pre-dizer que o número de botes era maior do que o número de carros na cidade. Outra circunstância que prestigiou Piracicaba, em razão de seus pei-xes, foi a criação pelo secretário da Agricultura de São Paulo, Dr. Fernando Costa, de uma comissão de professores da faculdade de medicina de São Paulo e da ESALQ, sob a presidência do Dr. Ro-dolpho Von Ihering, para pesquisar piracemas do rio Piracicaba entre 1928 e 1929. Contou essa co-missão com a valiosa colaboração do conhecido Conde Lara Campos que, além de arcar com to-das as despesas de hospedagem, construiu um

Aldeiamento paiaguá

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barco de 10 m, o “São Paulo”, com chapas de fer-ro, e laboratório para exames expeditos, compor-tando dez pesquisadores. Exames complementa-res eram feitos nos laboratórios do Engenho Central. No período das piracemas, o barco, com motor de 40 cavalos, com o rio mais cheio, percor-ria 18 km rio abaixo a partir da rua do Porto, trecho julgado suficiente para as pesquisas. Graças tam-bém a pesquisas realizadas no rio Mogi Guaçu, Ihering, proclamado “pai da piscicultura moder-na”, conseguiu anunciar ao mundo científico a descoberta da reprodução induzida dos peixes (por hipofização) (Ihering et.al, 1936), como prê-mio da obstinada intenção profetizada vários anos antes: “Haveremos de criar peixes, como se criam galinhas”. Fora uma previsão extrapolada, pois, na ocasião, não existia chocadeira elétrica. Entre os peixes, as maiores preferências dos turistas eram o dourado e o pintado que, posteriormente, foram mal substituídos pelo filhote. Outras circunstâncias em décadas passadas também contribuíram para o prestígio de Piracicaba, principalmente o doura-do. A fábrica de gelo do Maluf (situada na esquina da São José com Alferes), durante décadas, des-pachou por via férrea dourados embutidos em barras de gelo, perfeitamente condicionados em serragem e envoltos em tecido de embalagem, para vários municípios vizinhos, como presente para parentes e amigos, com uma média de 70 kg/dia e, nas vésperas de Natal, mais de 100 kg/dia. O Mercado Municipal de São Paulo, no perío-do da piracema, colocava faixas externas com os dizeres “dourado de Piracicaba”, prestigiando o peixe e a cidade. O melhor reconhecimento da im-portância dos peixes na história de Piracicaba está estampado em seu brasão. Ladeados por um ramo de café e uma palma de cana, sabiamente dispostos no escudo central, sobre um leito repre-sentando o rio em posição prestes a saltar e trans-

por o salto, estão cinco peixes, representando o dourado, o mais afamado do rio.

Nossa intenção ao conceber este livro foi tri-pla: EDUCATIVA – ao dar conhecimento de da-dos geográficos de nosso rio e da biologia dos peixes; HISTÓRICA – ao ressaltar a importância de seus peixes na própria história de Piracicaba; FOLCLÓRICA – ao relacionar “causos” verdadeiros ocorridos com os peixes e apresentar uma cole-tânea de verbetes do palavreado dos pescadores profissionais do nosso rio, de décadas passadas.

Acreditamos que o conhecimento destes ele-mentos tornará o “caipiracicabano” mais orgulho-so de sua terra; o nosso visitante, mais admirado pelas singularidades conhecidas; e o brasileiro, mais brasileiro, por ver integrados em sua pátria, Piracicaba, seu rio e seus peixes.

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Rio Piracicaba

Capítulo II

Dados Geográficos

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Formação: pela junção dos rios Jaguari (MG) e Atibaia (SP), a partir de Americana (SP).

- Extensão: 177 km e 450 m.- Desembocadura: no rio Tietê, à margem di-

reita, no reservatório de Barra Bonita, no limite de Santa Maria da Serra, São Manoel, Botucatu e Anhembi.

- Desnível: 69 m, da altitude 522 m para 453 m.- Afluentes: Margem direita – Ribeirão Tatu,

Ribeirão Coqueiros, Ribeirão Palmeiras, Ribei-rão Guamium, Rio Corumbataí, Ribeirão Ara-

guá, Ribeirão Samambaia, Ribeirão do Meio, Ribeirão Vermelho. Margem esquerda – Ribeirão Quilombo, Ribeirão dos Toledos, Ribeirão Lam-bari, Ribeirão Tijuco Preto, Córrego da Figueira, Ribeirão Dois Córregos, Ribeirão Piracicamirim, Ribeirão Itapeva, Ribeirão do Enxofre, Ribeirão dos Marins, Ribeirão de Itaperú. Total: 9 na mar-gem direita, 11 na margem esquerda.

- Salto: altura de 14 metros.- Largura média: 70 m. Na desembocadura,

entre 70 m e 120 m, em Santa Maria da Serra.- Vazão média: 120 m3/s.- Vazão média mínima: estipulada pelo Siste-

ma Cantareira em 40 m³/s.- Vazão mínima já ocorrida: 16 m³/s.- Situação geográfica: ocupa parte central

do Estado de São Paulo, a noroeste da capi-tal, correndo no sentido leste-oeste, a 22º40’ de latitude Sul em quase todo o seu percurso, e entre as longitudes de 46º e 48º30’ Oeste. Corresponde a uma superfície de 1.245.000 hectares, dos quais 1.138.800 em território paulista (91,5%) e 106.200 hectares (8,5%) em Minas Gerais.

- Municípios que banha: Americana, Limeira, Santa Bárbara d’Oeste, Piracicaba, São Pedro, Anhembi, Santa Maria da Serra.

- Deságua na margem direita do rio Tietê, a cerca de 155 km da cidade de Piracicaba.

- Cobertura vegetal: em 1854, cobria 82% do seu território.

- Uso do solo: 70% da área total, sendo 68% ocupação rural e 2% ocupação urbana.

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Bacia do Rio Piracicaba

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Peixes

Capítulo III

Generalidades

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Os peixes são os animais mais antigos entre os vertebrados e habitantes do maior ecossistema da Terra: os oceanos, rios e lagos. Possuem o sangue frio, retirando oxigênio da água através de órgãos especiais: as brânquias. Há cerca de 25.000 espé-cies conhecidas internacionalmente (Fooler, 1951). No Estado de São Paulo, de água doce, estimam-se 261 espécies, e no rio Piracicaba, 101 espécies naturais (Rodrigues, N.S., 2002, 3º volume). Apre-sentam corpo fusiforme e hidrodinâmico, para fa-vorecer o deslocamento no meio hídrico, e perten-cem à classe Osteichthyes – de esqueleto ósseo. Podem ter o corpo coberto de escamas (exoes-queleto) ou de couro. A locomoção no meio onde vivem é feita por nadadeiras peitorais (par), abdo-minais (par), dorsal, anal, caudal e adiposa facul-tativa. A caudal, de acordo com seu formato, pode ser: dificerca – quando simetricamente arredonda-da na extremidade; homocerca – quando dividida em dois lobos iguais; e heterocerca – quando com dois lobos desiguais. O mussum e a piramboia não possuem as nadadeiras peitorais e dorsais. A fe-cundação dos óvulos é externa (no meio líquido) na grande maioria das espécies, e interna na fa-mília Poecilidae (guaru-guaru). A idade dos peixes pode ser determinada pelo exame de escamas e por peças ósseas, como esporões peitorais e dor-sais, vértebras e opérculo e o otólito (do sistema de audição). A dentição é variável de acordo com a espécie: dentículos em faixas (cascudos), em série semelhante a incisivos (pacu), em série e pontiagu-dos (traíras), semelhante à de roedores (piava). Ao longo do corpo os peixes de escamas apresentam a linha lateral, formada por escamas diferenciadas por pequena proeminência tubular, em cujo inte-rior incidem terminações nervosas que permitem a captação de sons e vibrações, a acomodação a variações de temperatura, pressão osmótica, e ele-trocondutividade da água. Atribui-se também a es-

sas perfurações tubulares a função de espalharem sobre a superfície do corpo o produto de glândulas excretoras, um muco gorduroso que protege os peixes de doenças, de variações bruscas de tem-peratura e de ferimentos abertos. Essas glândulas existentes na derme e na epiderme, também se acham presentes nos peixes de couro e em cascu-dos, ao longo do corpo ou em outras regiões. A be-xiga natatória exerce importantes funções: permite a estabilidade hidrostática do peixe no meio líquido, reduz o seu próprio peso pela ação da flutuação, e, em certas espécies, funciona como reservatório de ar (e de oxigênio), além de facilitar sua locomoção e ajudar na estabilidade em qualquer profundidade. Pela posição dos olhos, sem pálpebras, a visão é lateral. Células pigmentadas da derme, chamadas células cromatóforas, dão coloração aos peixes. A coloração pode ser permanente ou involuntária, de acordo com a coloração e a iluminação do ambien-te. Um pouco antes da nadadeira anal, situa-se a papila anogeniturinária que contém os orifícios ex-cretores do reto, das glândulas sexuais e da ure-tra. A fecundidade de uma fêmea é calculada pelo número de ovócitos (média) contados em 1 (um) grama do ovário, multiplicado pelo peso total do ovário. A fecundidade de uma fêmea pode ser ab-soluta (FA) quando o número total de óvulos é pro-veniente de uma desova total, como ocorre com o dourado ou o curimbatá. A fecundidade é relativa (FR) quando o número de ovócitos contados cor-responde a uma das desovas parceladas, como a das piavas. De acordo com o regime alimentar, os peixes são classificados como: iliófagos – quando se alimentam de organismos contidos no leito dos rios ou lagos (curimbatá); herbívoros – quando se alimentam de plantas como macrófitas aquáticas ou não aquáticas (ximboré, taquara); carnívoros quando se alimentam de organismos vivos, como os ictiófagos, que se alimentam de peixes (doura-

Devido a problemas técnicos e econômicos, na produção de alimentos em criatórios de peixes para consumo as espécies mais viáveis são as onívoras, pela diversidade de alimentos, e as herbívoras, pela facilidade de alimentação

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do, tabarana, jaú, pintado); onívoros – quando se alimentam de várias espécies de organismos vivos ou não (pacu, tambaqui); insetívoros – quando têm predileção por larvas e insetos (lambari). Devido a problemas técnicos e econômicos, na produção de alimentos em criatórios de peixes para consumo as espécies mais viáveis são as onívoras, pela diversi-dade de alimentos, e as herbívoras, pela facilidade de alimentação. Nas espécies carnívoras, além das dificuldades da produção de alimentos, há o pro-blema de canibalismo entre os próprios alevinos, desde alguns dias de vida livre: quando não é pela ingestão, é pelo engasgamento, com dupla morte, do predador e de sua vítima. Tendo por base expe-rimentos com carpas, estima-se que o peixe ingere por dia, de 5% a 10% do peso vivo. A conversão alimentar é de 2,5: 1 ou 2,5 kg de alimento para produzir 1 kg de peso vivo. A questão do oxigênio dissolvido (OD) na água é de grande importância para os peixes. Em regiões serranas, por exemplo Campos do Jordão - SP, com altitudes maiores de 1.000 metros e temperaturas baixas próximas de 0 ºC, o OD pode atingir níveis maiores do que 10

mg/L, propício à existência da truta. Em nosso meio (Piracicaba), com altitude pouco superior a 500 me-tros e temperatura em torno de 30 ºC- 32 ºC, a taxa de OD máxima, em águas límpidas, sem nenhum despejo poluente, é de 8 mg/L. Efluentes de ori-gem doméstica e industrial rebaixam essa taxa a níveis em torno de 1 mg/L, ou mesmo menos, quando ocorrem as mortandades de peixes. O nível mínimo tolerável é de 4 mg/L. A determina-ção prévia da taxa de DBO – demanda bioquí-mica de oxigênio – de efluentes é de grande im-portância para a preservação dos rios e de seus peixes. Indica quantos miligramas de oxigênio por litro serão retirados com seu lançamento. O esgoto comunitário tem uma DBO média de 45 mg/L e a vinhaça, de usinas de açúcar, 13.000, em média. Se o manancial onde forem lançados esses poluentes tiver um OD de 6 mg/L, o esgoto necessitará de 7,5 litros de água por litro lança-do, para que não cause dano; e a vinhaça, 2.166 litros. Com estes dados em mãos e a vazão do rio, pode-se calcular o volume de poluente que pode ser lançado sem prejuízo à fauna íctia.

Peixe - anatomia externa

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Ictiometria

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A ictiometria é um ramo da ictiologia, destina-da ao estudo das medidas corporais dos peixes e suas relações com outros índices. Na piscicultura, essas mensurações são muito úteis para determi-nar o desenvolvimento das espécies através de vários parâmetros, como também, sob o ponto de vista econômico, permite uma avaliação entre es-pécies com melhor desenvolvimento e seu gasto com o arraçoamento e o período de manutenção. Naturalmente, devem ser também avaliados os fa-tores físicos e químicos da água e do ambiente com possibilidade de influírem nos resultados obtidos. Essas medidas devem ser tomadas obedecendo o sistema métrico, segundo homologação inter-nacional, em centímetros para peixes menores ou de porte médio, e em metros e suas frações para peixes maiores. As determinações (mensurações) normalmente são restritas às partes externas dos peixes, e eventualmente, em casos especiais (da cavidade abdominal e da capacidade volumétrica) de exemplares fêmeas, excluindo-se o volume das vísceras e do ovário. Os dados obtidos relaciona-dos a pesos e idades fornecem ao pesquisador, e principalmente ao criador, os elementos para uma criteriosa avaliação. A forma mais comum dos pei-xes é a fusiforme, que sofre menor resistência aos deslocamentos no meio hídrico e favorece uma melhor avaliação nas mensurações, por apresen-tar uma simetria bilateral, contrariamente aos das espécies assimétricas, como o aramaçá (Soles reticulatus), as arraias (gen. Dasyatis) e outros. A representação esquemática das mensurações, geralmente tem por base exemplar a família Cha-racidae, de escama típica, não só por apresentar o maior número de espécies de água doce, como também a maioria dos elementos externos encon-trados nas espécies da fauna íctia. Alguns desses parâmetros são representados por siglas, a saber (Castagnolli,N. et.al., 1986):

CC – comprimento da cabeça – da ponta do foci-nho à borda do opérculo.CP – comprimento-padrão – da ponta do focinho ao fim do pedúnculo.CF – comprimento Fork – da ponta do focinho ao vértice da nadadeira caudal.CT – comprimento total – da ponta do focinho à maior extremidade da nadadeira caudal.Altura (h) – do início da nadadeira dorsal à re-gião ventral.Perímetro – medido na região da altura.

Essas medidas, entretanto, terão validade se relacionadas às idades dos peixes, pois diferente-mente dos outros animais, não param de crescer durante sua existência.

Por região:Região cefálica – corresponde ao comprimento da cabeça (CC).Região do tronco – do fim do opérculo ao início da nadadeira anal.Região caudal – do início da nadadeira anal até a maior extremidade da nadadeira caudal.

Outros caracteres eventuais:Linha lateral – ao longo do corpo; contínua ou truncada.Nadadeira adiposa – presente.Nadadeiras – dorsal, caudal, anal e par de peito-rais e ventrais; descrever comprimento, altura, e eventualmente o formato;Nadadeira caudal – tipo heterocerca, dificerca ou homocerca.Nadadeira dorsal e caudal – número de raios e tipo duro ou mole.Dentição – número de dentes e formato.Arcos branquiais – número e formato.Escamas – formato e número ao longo da linha lateral e número acima e abaixo dela.

Na piscicultura, essas mensurações são muito úteis para determinar o desenvolvimento das espécies através de vários parâmetros, como também, sob o ponto de vista econômico, permite uma avaliação entre espécies com melhor desenvolvimento e seu gasto com o arraçoamento e o período de manutenção

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Perfil – longitudinal e transversal (formato do corpo).Perfil transversal – comprimido, deprimido, trun-cado, achatado.

Outros caracteres poderão ser anotados como auxiliares das mensurações, principalmente quan-do as espécies coletadas forem condicionadas em soluções conservantes, geralmente soluções

de formol, prejudicando uma avaliação posterior. Estes caracteres são tão importantes que chegam até mesmo a figurarem na classificação científica, como o mandi (Pimelodus maculatus) pelas má-culas ao longo do corpo; o guaru-guaru (Phalloce-ros caudimaculatus) pelas máculas da região cau-dal; o lambari (Astynax bimaculatus) pelas duas manchas humerais.

Peixe - ictiometria

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dos peixesReprodução

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O ciclo reprodutivo dos peixes, que se repe-te todos os anos quando adultos, está intima-mente relacionado a alterações ambientais sa-zonais, culminando com a reprodução. Tanto os peixes que vivem em ambientes lênticos (lagos e lagoas) como os de ambientes lóticos (rios) sofrem essas influências, mas, como vivem em ambientes totalmente diferentes, também têm seu modo reprodutivo diferenciado. A desova em ambiente lêntico, por razão da água parada, é mais segura por vários motivos. Os óvulos, ge-ralmente depositados num trecho previamente limpo, a pouca profundidade para receber luz e calor solar, são fecundados pelos espermas diretamente ejaculados pelos machos, após so-brenadar a desova. Durante todo o período de desenvolvimento do embrião, e mesmo depois do nascimento das larvas e da fase de alevino, são protegidos pelos pais. Em algumas espé-cies da família Ciclidae, a qualquer sinal de peri-go, os alevinos procuram a proteção da boca ou o espaço aberto dos opérculos dos pais como refúgio. Diante de tanto amparo paterno, e com um índice de sobrevivência acima de 85%, algu-mas dezenas de óvulos contidos em uma deso-va já serão suficientes para garantir a perpetua-ção da espécie. Para os peixes de piracema, de escama, denominados reofílicos, as condições do ambiente de reprodução são totalmente di-ferentes. A desova e a fertilização dos óvulos se processam em águas torrentosas, em que, num determinado momento, machos e fêmeas do cardume ejaculam suas células reprodutivas e, como num verdadeiro orgasmo, são levados em estado de êxtase pela corrente. Algumas es-pécies, como o curimbatá (Prochilodus scrofa), chegam a emitir roncos, audíveis à distância. A partir desse exato momento, cessa toda a ação paternal, cabendo unicamente aos princípios

divinos da natureza a continuidade do proces-so. O espermatozoide milimétrico, com frenética agitação de sua cauda, procura vencer a cortina d’água em busca de um óvulo, também milimé-trico. Na imensidão da água em que estão mer-gulhados, não basta, porém, encontrá-lo. Há necessidade do encontro da única e micros-cópica entrada possível oferecida pelo óvulo, a micrópila, para que se realize a fecundação. E isso é premente, pois a energia do pequeno ser dura poucos minutos e o óvulo, ao se hidra-tar, aumenta de volume, torna-se mais pesado e fecha a micrópila, tornando-se infecundo. As perdas são grandes, estimadas acima de 80%. Dos fecundados, estima-se que 1/10.000 atin-girá a fase adulta. Para compensar essas per-das, a natureza inseriu atenuantes, como o de 1 (um) grama de ovário de fêmea de dourado (de água doce) conter milhares de óvulos; 1 (um) kg desse mesmo peixe representa, em mé-dia, 140.000 óvulos e portanto, uma fêmea de dourado, de 25 kg potencialmente pode gerar 3.500.000 óvulos, de acordo com estimativas de Ihering (1936). Os ovos (óvulos fecundados) que permanecerem ao sabor da corrente não desenvolverão seus embriões pela ausência de condições propícias. Por essa razão, e preci-samente por ela, é que os peixes de piracema, embora já “maduros” para a reprodução, só a efetuam quando o rio, já com água abundante, sofre um “repique”, tem pequena elevação em seu nível, proporcionando o encaminhamento dos ovos às margens vegetadas e, principal-mente, às lagoas marginais, consideradas ver-dadeiras maternidades, onde as larvas encon-trarão o plâncton necessário para as primeiras alimentações, o calor necessário ao pleno de-senvolvimento e maior proteção contra o seu maior predador, o lambari.

Diante de tanto amparo paterno, e com um índice de sobrevivência acima de 85%, algumas dezenas de óvulos contidos em uma desova já serão suficientes para garantir a perpetuação da espécie. Para os peixes de piracema, de escama, denominados reofílicos, as condições do ambiente de reprodução são totalmente diferentes

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Reprodução

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O eminente cientista brasileiro Rodolpho Von Hiering (1883 – 1939), conclamado “Pai da Pis-cicultura Nacional”, bacharel em Ciências e Le-tras, ingressou no Museu Paulista primeiramen-te como assistente do diretor e depois curador, quando desenvolveu 34 trabalhos sobre a fau-na brasileira que lhe valeram o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade de Giessen na Alemanha; ainda estagiou durante dez anos em cursos de aperfeiçoamento, na Europa. De volta ao Brasil, dedicou-se especialmente ao estudo de aves e peixes do país, criando em 1926 o Serviço de Piscicultura do Ministério da Agricultura e desenvolvendo trabalhos de coor-denadoria, junto ao Conselho Técnico de Pisci-cultura do Nordeste, do DNOCS (Departamen-to Nacional de Obras contra as Secas). Graças ao constante contato com pesquisadores de entidades oficiais, envolvidas em pesquisas sobre nossos peixes, procurou desenvolver tecnologia capaz de obter a reprodução de peixes de água doce, de piracema, em labora-tório. Como grande conhecedor da biologia de nossos peixes, por vários anos acompanhou a piracema de nossos peixes nobres (em Piraci-caba, o dourado) a fim de desvendar o enigma daqueles que, por não completarem a migra-ção, mesmo maduros sexualmente, não conse-guiam a reprodução. Outro fator relevante era o conhecimento da fantástica perda de óvulos, durante a reprodução, como também, possivel-mente, a degradação do meio hídrico de nos-sos principais rios e seu seccionamento para fins energéticos, que diretamente atingiriam nossos peixes mais nobres, como o piracanju-ba, o dourado, o pacu, o pintado, o tambaqui,

Desenvolvimento embrionário

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o matrinchã, além dos peixes forrageiros, como lambaris e saguirus. As primeiras pesquisas foram feitas com o amazônico curimatã-pacu (Prochilodus argenteus) com injeções de urina de égua em gestação, por conter gonadotrofi-na coriônica, capaz de estimular a hipófise dos peixes, na maturação sexual e na reprodução. Com a obtenção de resultados não satisfató-rios, iniciou novas pesquisas usando hipófises de peixes em avançado estágio de maturação sexual. Com resultados discordantes, positi-vos e negativos, procurou estabelecer as do-sagens necessárias para conseguir a completa extrusão de óvulos e ejaculação de esperma-tozoides, graças a uma leve pressão sobre a região abdominal, e tendo por base o núme-ro de hipófises por peso vivo (PV) dos peixes receptores, o sexo, o estágio de maturação e, em doses crescentes, com intervalos de 6 a 8 horas. A publicação da pesquisa, juntamente com o pesquisador Pedro Azevedo, do antigo Departamento de Caça e Pesca da Secretaria da Agricultura de São Paulo, nos Arquivos do Instituto Biológico (SP), em 1936, levou ao co-nhecimento internacional a possibilidade da reprodução induzida de peixes reofílicos, em laboratório, determinando um elevado cresci-mento da piscicultura internacional. A crescen-te procura por hipófises de salmão e carpa que abasteciam o mercado despertou o interesse de pesquisadores e laboratórios comerciais, para a fabricação de hormônios sintéticos de alta potencialidade, aplicados em doses de 1 a 5 unidades internacionais (UI) por grama de PV. Os óvulos extruídos, recebidos em recipien-te asséptico, com pequena quantidade de água

e totalmente desmembrados delicadamente, após receberem diretamente a ejaculação dos espermatozoides, pela compressão abdominal nos machos fertilizados, após alguns segundos de revolvimento são levados a incubadoras com água corrente, límpida, rica em oxigênio, com controle rigoroso da temperatura, até a eclosão das larvas, quando são conduzidas aos berçá-rios ou diretamente a tanques, ricos em plânc-ton. A descoberta da tecnologia para a reprodu-ção induzida dos peixes pelo cientista brasileiro Rodolpho Von Ihering, além de ter contribuído para o desenvolvimento da piscicultura atual, apresenta os seguintes aspectos positivos:

- Alta fertilização dos óvulos (mais de 80%) ante uma perda de cerca de 80% quando as desovas ocorrem em ambientes naturais;

- Permite a escolha das matrizes, para o me-lhoramento genético e a obtenção de híbridos;

- Antecipa a reprodução de peixes de am-bientes lênticos;

- Proporciona maior segurança na reprodu-ção de peixes nobres;

- Contribui para a obtenção de grande nú-mero de alevinos para o povoamento de lagos, rios e engorda para fins comerciais;

- Favorece a preservação de espécies no-bres, ante a crescente poluição fluvial e o sec-cionamento de importantes rios para fins ener-géticos, impedindo a reprodução de peixes reofílicos;

- É uma tecnologia inteiramente acessível a países pouco desenvolvidos, principalmente empregando hipófises de peixes nativos;

- Pode se constituir numa grande fonte de pro-teínas, de baixo custo, a populações carentes.

As primeiras pesquisas foram feitas com o amazônico curimatã-pacu (Prochilodus argenteus) com injeções de urina de égua em gestação, por conter gonadotrofina coriônica, capaz de estimular a hipófise dos peixes, na maturação sexual e na reprodução

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da idade dos peixesDeterminação

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A determinação da idade dos peixes é de suma importância, não só para efeito de pesquisas cien-tíficas, como também comerciais. A determinação científica da idade permite trazer aproveitar uma relação muito importante: peso-idade. É possível, através de inúmeras e sucessivas determinações, estabelecer um ganho de peso gradativo, de acor-do com a idade, facilmente compreensível se mos-trado graficamente. Essa informação também é de grande valor para o criador. Tendo conhecimento da relação quilos de ração X ganho de peso vivo, ele poderá facilmente, com base no preço da ra-ção, saber até que idade ou por quanto tempo é econômica a manutenção de um lote de peixes para ser comercializado. A determinação da idade dos peixes pode ser feita por diferentes proces-sos: por escamas, pelos otólitos, por ossos ver-

tebrais, operculares, ou pelo primeiro raio ósseo (ferrão) das nadadeiras peitorais e da dorsal dos Siluriformes. Segundo estudiosos, os peixes nunca deixam de crescer durante toda a sua vida. Esse crescimento é “registrado” em algumas partes ós-seas, gradativamente, ano a ano. O método mais comum é a determinação por escamas, ciência conhecida por Lepidologia ou Escalemetria. Exis-tem quatro tipos de escamas: ctenoide, ganoide, placoide e cicloide. A grande maioria dos peixes de escama, como a de nosso rio, possui a esca-ma cicloide, e por isso a ela vamos nos ater. A lei-tura pela escama apresenta a inconveniência de, ao ser destacada por acidente durante a vida do peixe, faz surgir outra, que não oferece segurança na leitura, o que não acontece com os outros mé-todos. O local ideal para a retirada da escama é no dorso, acima da linha lateral, no meio da região entre o opérculo e o início da nadadeira dorsal, e no lado esquerdo. O curimbatá (Prochilodus scro-fa) de nosso rio possui a forma típica de escama cicloide de formato arredondado na parte poste-rior, de inserção membranosa com pigmentação (melanóforos), punctiformes e estelares, que fica inserida na camada que cobre o corpo. Na parte central, apresenta o focus de onde partem raios até a margem posterior. A partir do focus, em dire-ção à parte anterior que delimita a região que fica exposta da cobertura das escamas, são encontra-das finas ranhuras concêntricas, acompanhando o perfil da escama, chamadas circulus, e, mais espaçadamente, ranhuras mais espessas acom-panhando o desenho das anteriores, os annulus. Os circulus indicam o crescimento normal do pei-xe durante o correr do ano, podendo inclusive mostrar, de acordo com o seu número (ou largura da faixa), se foi um ano bom ou mau. Os annulus indicam os anos de vida, a partir do focus. Como na maioria dos peixes mais importantes, como o

Determinação da idade - escama

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dourado, o curimbatá, a piapara etc., as fêmeas começam a reproduzir com dois anos, sendo o primeiro annulus correspondente a 2 anos de vida. Para os machos, já reproduzindo no primeiro ano, cada um equivale a um ano. O surgimento dos annulus está ligado a um período de reprodução que acontece uma vez por ano. Durante esse pe-ríodo, o peixe praticamente não se alimenta, seu metabolismo fica alterado, deixando de crescer, alterando o surgimento dos circulus. Passado o período, mais magro e esgotado, ativa o regime alimentar, dando origem aos annulus pela concen-tração de circulus. A escama substituta de uma original não apresenta o focus; em comparação com outras, originais, pode indicar com quantos anos foi perdida, por qualquer acidente, pelo con-fronto de annulus. É denominada “escama rege-nerada”. Após a retirada, as escamas devem ser limpas delicadamente (água, sabão, detergente), secas, pinceladas com solução de gelatina apro-priada e colocadas entre lâminas de vidro em sé-ries de quatro a cinco. A leitura dos anos pode ser feita através de um projetor ou por transparência, com auxílio de uma lente sobre um vidro com foco de luz. Escamas muito pequenas podem ser “li-das” com microscópio ou lupas. Os otólitos são pequenas deposições calcárias, situadas na base do cérebro, pertencente ao ouvido interno dos peixes. Através de vibrações da bexiga natatória dos peixes, transmitidas a ossículos do aparelho de Weber, eles recebem as vibrações sensoriais. O crescimento do otólito é descontínuo, apresentando alternância de circulus claros e escuros, de acordo com as estações do ano, e, portanto, representan-do em cada ano os períodos de descanso e de re-produção. Diferentemente das escamas, os circulus e os annulus apresentam-se em círculos em torno do focus, que é central. Através de polimento ou do corte de lâminas em micrótomos, por transparência

determina-se a idade. A determinação da idade com ossos operculares se dá graças ao crescimento e à formação de pequenas franjas com o crescimento, a partir da inicial, permitindo a leitura. A determinação da idade através do primeiro raio das nadadeiras peitorais e dorsal dos peixes Siluriformes, como o pintado, o jaú e o mandi de nosso rio, a piraíba e a pirarara do Amazonas, vulgarmente conhecidos por ferrões ou arpões, é feita através de lâminas da par-te próxima da base, com micrótomos. A milimétrica espessura da lâmina permite verificar, por transpa-rência, as camadas concêntricas de crescimento a cada ano, e assim, a determinação da idade.

Determinação da idade - vértebra e otólito

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do Rio PiracicabaPrincipais peixes

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Canivete - Characidium sp.

Canivete

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Pequenos e graciosos peixinhos pertencentes à ordem dos Characiformes, com três gêneros: Paradon, Apareiodon e Characidium e com sete espécies. Com pequenas diferenças morfológi-cas para o leigo, apresentam o corpo fusiforme, que tem de 7 a 15 cm, com pequenas pintas ou faixas estreitas transversais, nadadeiras hialinas, sendo as peitorais e as ventrais bastante desen-volvidas, cabeça acarneirada com boca voltada para baixo. Encontrados em todos os rios de São Paulo, assim como em outros Estados sulinos, com exceção aos de clima muito frio. Embora o pequeno tamanho não apresente valor econô-mico como alimento, na área da aquariofilia é cada vez mais procurado. Com a parte anterior do corpo elevada, apoiada nos raios das nada-deiras peitorais, causa admiração dos presen-tes, principalmente se estiver em cima de uma pedra ou tronco. Nessa posição, parecem vigiar os arredores e, segundo alguns técnicos, têm a possibilidade de movimentar a cabeça. Essa posição é também praticada nas águas de ribei-rões e rios, geralmente em águas com corren-teza. Sua alimentação na natureza é fitoplanc-tônica e também, por vezes, zooplanctônica. Sob o ponto de vista ambiental e ecológico, tem um grande valor, pois está sempre presente nos hábitos alimentares de todas as espécies piscí-voras, sendo assim considerado um peixe forra-geiro. No meio ambiente é muito arisco: basta que se sinta ameaçado para que se desloque. As espécies são ovulíparas – põem óvulos que são fecundados no meio hídrico. São peixes de piracema, com reprodução a partir de outubro. Geralmente aparecem antes do dourado, seus grandes apreciadores, como se estivessem fu-

gindo de seu grande inimigo. Seu nome popular foi dado por justa causa, pela semelhança com um pequeno canivete. Pode ser encontrado em vários países sul-americanos como Argentina, Paraguai, Bolívia, Uruguai, Equador, e recebe várias denominações no Brasil; também é co-nhecido por vários nomes: canivete e tanchim, no rio Piracicaba – SP; piau (NE); tambiú (RJ). De uma reprodução em aquário, foi observado que a desova é parcelada, com seis a oito óvu-los por vez, entre a vegetação do fundo.

Encontrados em todos os rios de São Paulo, assim como em outros Estados sulinos, com exceção aos de clima muito frio

Vida no aquário

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Cascudo - Plecostomus sp.

Cascudo

Peixe da família Loricariidae, tem seu nome derivado da couraça que reveste o seu corpo, como uma casca de árvore. Habitante de rios com leito lajeado ou de grandes pedras, vive em suas tocas para se proteger de seus preda-dores; ou nas superfícies lajeadas ou das gran-des pedras para se alimentar. Para tanto, a boca voltada para baixo, provida de grossos

lábios com tecido áspero, ao mesmo tempo em que se fixam por sucção, vencendo a força da corrente, vão “raspando” as algas da superfí-cie. Depois da família Characidae, é a que pos-sui maior número de espécies. Segundo Fooler (1951), tem quatro subfamílias, 39 gêneros e 249 espécies. Durante muitos anos teve baixo valor comercial, procurado mais por pescado-

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favorece a entrada da mão. E quando isso acontece (e acontece várias vezes), com uma entrada estreita e um cascudo mais corpulen-to, a mão do pescador fica entalada contra a pedra e a áspera couraça do peixe. Sua retira-da exige grande esforço, causando ferimentos muito dolorosos. Se estiver com a cabeça mer-gulhada, há risco de vida se não conseguir um rápido socorro. Entre 1955 e 1965, no rio Pira-cicaba foram encontrados vários cascudos pretos com pigmentação alterada, manchas brancas tomando parte do corpo e também exemplares totalmente brancos, albinos. De acordo com Monteiro (1953), do Instituto de Pesca, foram capturados para estudo 341 exemplares. A quantidade de “esbranquiça-dos” foi tanta que não prejudicou sua procura. Os exemplares para pesquisa foram mantidos em tanques com água corrente, sendo que 16, em adiantado estágio de maturação sexual, fo-ram hipofisados (técnica de reprodução induzi-da), mas não chegaram a reproduzir. A pesqui-sa, que resultou em um boletim técnico, continha as seguintes observações: entre 50-60 dias, exemplares totalmente despigmenta-dos voltaram à coloração normal; a ocorrência nunca foi observada anteriormente a 1955, e foi relativamente frequente até o ano de 1960; al-guns exemplares morreram sem retornar à co-loração natural; um exemplar totalmente bran-co permaneceu em cativeiro por 123 dias. A prolificidade (capacidade de reprodução) pode ser considerada baixa quando comparada a outras espécies, principalmente as reofílicas, que chegam a gerar, numa só ovulação, mais de uma centena de milhares de óvulos. Nomu-ra (1984) relata o caso de uma fêmea da espé-cie Hypostomus fluvialis, com 13 centímetros, com 61 óvulos, e outra de Loricaria piracica-

A prolificidade (capacidade de reprodução) pode ser considerada baixa quando comparada a outras espécies, principalmente as reofílicas, que chegam a gerar, numa só ovulação, mais de uma centena de milhares de óvulos

res profissionais para servir como isca e even-tualmente pela população ribeirinha como ali-mento de baixo custo. Devido à escassez de peixes mais nobres, a partir de 1953 a carne deliciosa e rosada dos cascudos começou a ser procurada pela população de maior renda, que os adquiriam limpos e sem a carapaça, não só na rua do Porto como também nas pei-xarias e no Mercado Municipal. Segundo Mon-teiro (1953), o volume de pescado de cascudo, que por vários anos se manteve em 6º ou 7º lugar, a partir de 1953 foi galgando posições, passando nos anos finais da década de 1960 para a primeira colocação do pescado em Pira-cicaba com 12.129 kg, cerca de 20% do total, derrotando peixes de consumo tradicional como curimbatá, dourado, pintado e mandi. Entre as dezenas de espécies do rio Piracica-ba, o cascudo-preto, gênero Hypostomus e es-pécies H. albopunctatus, paulinus e aspera, eram os mais encontrados, não só pela beleza da carne rosada como também pelo seu volu-me, que podia chegar a 3 kg. Por essas exce-lentes razões, em anos posteriores a 1960, pela antiga Divisão de Caça e Pesca da Secretaria de Agricultura do Estado, foi introduzido no rio Mogi-Guaçu e no rio Paraíba, onde depois de seis anos já era também muito procurado. A pesca dos cascudos é feita com tarrafa, quan-do o rio está cheio, capturando os exemplares que se encontram na superfície dos lajeados, ou por redes de espera, quando eventualmente vagueiam pelo rio, e à mão, quando o rio está com nível baixo, diretamente em suas tocas. Para tanto, a toca, à profundidade de um braço ou um pouco mais, com a cabeça mergulhada, o pescador procura os cascudos. Estes, ao se-rem tocados, normalmente assustados, procu-ram fugir por uma abertura lateral, ou pela que

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bae, pouco maior, com 207 óvulos. Isso, po-rém, não significa uma baixa prolificidade ao saber que o número de sobreviventes pode chegar, na maioria das vezes, a um total muito maior do que as reofílicas. Isso porque a deso-va é concentrada e protegida pela fêmea e pelo macho, e a fertilização dos óvulos pelo macho é direta (ejacula diretamente sobre os óvulos), garantindo total fertilização. Os ovos já fertiliza-dos são permanentemente protegidos, assim como os alevinos resultantes. Técnicos em pis-cicultura citam o fato que a espécie H. piracica-bae adere ao seu próprio corpo os ovos já fer-tilizados e em desenvolvimento embrionário na região ventral, protegendo (machos e fêmeas) as larvas geradas e os alevinos. Pescadores profissionais também citam casos de fêmeas adultas carregando seus ovos sobre a própria cabeça, aderidos por substância mucilaginosa, Mão entalada

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restando a dúvida: como foram parar na cabe-ça, se foram gerados na outra extremidade e no lado inverso? De acordo com seu formato, coloração ou estrutura externa, recebem seus nomes populares. Em Piracicaba, as espécies Loricaria piracicabae e L. macrodon recebem a denominação de cascudo-espada ou cascudo-viola, e eventualmente cascudo-lima, devido à forma do corpo. A espécie Pterygopliplichthys gigas, o nome do cascudo-espinho, pelas es-pículas da carapaça, alcança o tamanho de até 6 kg. As espécies Hipostomus margatifer e H. strigaticeps, pode ser o cascudo-chita, devido à semelhança das pintas dos tecidos. A espé-cie H. ancistroides, tem o nome de cascudo-bugio, devido à coloração semelhante a do macaco, pardo-violáceo. A espécie Hemipsili-chthys gobio é conhecida como cascudo-bar-bado, pela série de espinhos nos cantos da boca. As espécies H. albopunctatus, H. pauli-nus e Revinelepsis aspera pela cor preta opa-ca, dão os cascudos pretos. A espécie do gê-nero Loricaria sp., pelo nome de cascudo-viola, dado o formato longilíneo do corpo, largo e achatado na cabeça, tem semelhança com o instrumento musical. No Paraná, os índios tupi-guarani lhe deram o nome de yaru-itaguara, onde ita = pedra e guará = buraco. No campo da aquariofilia, os cascudos, principalmente os de pequeno porte, têm sido bem apreciados por múltiplas razões. São pacíficos (não bri-gam) com outros peixes, são graciosos pela aparência, são permanentemente responsáveis pela eliminação de algas sobre os vidros, tron-cos e pedras, consomem os restos de comida e mesmo as fezes dos companheiros do aquá-rio, evitando problemas de eutrofização (meio anaeróbio) do aquário, consomem pouco oxi-gênio da água, não prejudicam o meio. O siste-

ma mais comum de consumo do cascudo é o ensopado ou escabeche, pois uma vez “des-cascado”, sua delicada e deliciosa carne não se presta para ser assada. No entanto, os pe-quenos, uma vez limpos, descouraçados e fri-tos, transformam-se em apreciados “tira-gos-tos” em bares e restaurantes ribeirinhos. Em ranchos, muitas vezes, devido à precariedade de utensílios (panelas), é empregado o sistema aprendido com nossos indígenas, assando-o em braseiro na própria casca. Uma vez aberta a parte ventral e limpa (os índios não o faziam), tempera-se o interior e de costas coloca-se so-bre o braseiro. A própria “casca” protege a car-ne do fogo direto e deixa passar o calor para um excelente assado. Além dos sistemas tradi-cionais de pesca do cascudo, a excelente e in-felizmente não mais editada revista Caça e Pes-ca, de agosto de 1942, em artigo do Dr. Manoel de Abreu Campanário, sob o título “A Pesca do Cascudo-Barbado pela Fisga”, nos revelou um outro sistema. O apetrecho a ser usado consta-va de uma taquara ou bambu, maduros, com cerca de 5 cm de diâmetro e 2 metros de com-primento, tendo numa das extremidades rebai-xadas um anzol com cerca de 3 cm de abertura, firmemente encastoado. De posse da fisga e so-bre o lajeado com água pelo joelho ou à meia-coxa, com uma das mãos o pescador procura a toca. Uma vez localizada, introduz-se lentamen-te a extremidade sem anzol na toca, para saber se muito funda ou rasa, e, pelo toque, conhecer onde é pedra e onde está o peixe. Este, assim que é tocado, reage com um movimento. Sa-bendo onde ele está, introduz-se a extremidade com o anzol, chega-se ao peixe e, num brusco puxão, ferra-se o cascudo. Para evitar o vai-e-vem no barranco, mantém-se um saco amarra-do à cintura para recolher os “fisgados”.

No entanto, os pequenos, uma vez limpos, descouraçados e fritos, transformam-se em apreciados “tira-gostos” em bares e restaurantes ribeirinhos. Em ranchos, muitas vezes, devido à precariedade de utensílios (panelas), é empregado o sistema aprendido com nossos indígenas, assando-o em braseiro na própria casca

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Curimbatá - Prochilodus scrofa.

Curimbatá

Também conhecido por corimbatá, da família Prochilodontidae, nome científico Prochilodus scrofa. Peixe de bom porte, pode atingir 8 kg com 72 cm de comprimento total aos 23 anos. Encontrado em todo o território nacional e tam-bém nos países vizinhos. Peixe essencialmente limnófago (comedor de limo), o que confere à

sua carne o sabor de barro. Por essa razão, é mais consumido pela população de baixa ren-da, devido ao baixo preço. Os machos, com 22 a 23 cm aos 2 anos já podem reproduzir, e as fêmeas, ao terceiro ano, quando medem entre 26 e 27 cm. É um peixe bastante prolífi-co, pois os ovários das fêmeas podem pesar

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com isso que a dinâmica do rio é fundamental para os peixes de piracema. Experimentos de marcação e captura posterior de peixes, reali-zados por técnicos da mesma Estação nos rios Mogi, Piracicaba, Grande e Paraná, revelaram que o curimbatá, durante o período migratório, pode percorrer até 700 km ou 1.400 km em ru-mos ascendente e descendente, dependendo de sua bacia hidrográfica; que a velocidade de migração é maior na ascendente (ou reprodu-tiva); que a velocidade pode variar de 5 km/dia a 39 Km/dia; que durante esse período de migração o peixe deixa de se alimentar, possi-velmente por uma sábia prevenção da natureza de preservação (pois passa a não ser captura-do pelo anzol). O acúmulo de gordura adqui-rido durante o período de permanência no lar de alimentação favorece o jejum no período de reprodução. Com o jejum, seu crescimento fica prejudicado, o que é assinalado nas escamas, com seus “annulus” (um por piracema). Se-gundo crença de velhos pescadores da rua do Porto, o gosto de barro da carne do curimbatá pode ser anulado “tirando-se o fio”. Esse “fio” pertence ao sistema nervoso do peixe e está situado ao longo e logo abaixo da linha lateral. Para retirá-lo, basta fazer um corte transversal ao peixe, logo atrás do opérculo, e com a aber-tura do corte, aparece o comentado “fio”. Com o dorso da lâmina de uma faca, é suspendido; uma vez puxado, sai facilmente em toda a sua extensão. Essa crença, também citada por Ihe-ring (1929), é seriamente defendida por pes-cadores nas suas “histórias”, mas inteiramente descomprovada por todos de bom paladar. Por ser um peixe essencialmente comedor de limo dos rios (limnófago), por isso também conhe-cido pela alcunha de “papa- -terra”, sua boca é inteiramente voltada para baixo, totalmente

Segundo especialistas, o próprio dispêndio de energia favorece o “amadurecimento” das glândulas sexuais, com alterações endógenas, como o teor de ácido láctico que, em excesso no sangue, ativa a hipófise e a liberação de hormônios gônado-estimulantes, os quais favorecem a maturação dos gametas e sua própria liberação

até 27% do peso total, com exemplares de 60 cm, à razão de 1.400 óvulos por grama. A eclo-são das larvas ocorre de 22 a 26 horas após a fertilização. Como peixe reofílico (de piracema) efetua duas migrações por ano: a migração re-produtiva (ou ascendente), e a migração trófica (ou descendente). A reprodutiva, quando pro-curam atingir o “lar” de reprodução. A trófica, após a reprodução, quando voltam ao lar de alimentação e engorda. As migrações se pro-cessam uma vez ao ano e são estimuladas por um complexo conjunto de fatores de natureza física, química e endógena ou hormonal, como pluviosidade (chuvas), foto-período (insola-ção), turbidez e temperatura da água, oxigênio da água (OD), pH, grau de poluição (DBO) e o progressivo desenvolvimento dos ovários e dos testículos, até atingirem o estágio de reprodu-ção. Esse processamento é iniciado a partir de julho ou agosto, dependendo das condições climáticas. Segundo especialistas, o próprio dispêndio de energia favorece o “amadureci-mento” das glândulas sexuais, com alterações endógenas, como o teor de ácido láctico que, em excesso no sangue, ativa a hipófise e a li-beração de hormônios gônado-estimulantes, os quais favorecem a maturação dos gametas e sua própria liberação. Experimentos efetua-dos na Estação de Piscicultura do Ministério da Agricultura, em Pirassununga, comprova-ram que peixes (curimbatás, piavas, mandis, lambaris) mantidos em lagoas, por dois a três anos, desenvolviam até certo ponto os está-gios de maturação sexual durante o período da piracema, sem, entretanto, atingirem o es-tágio final. E o interessante foi que alguns des-ses peixes, uma vez marcados e soltos no rio Mogi, e recapturados, posteriormente demons-traram que tinham reproduzido, evidenciando

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desprovida de dentes, provida de um tecido áspero e coriáceo, que lhe permite “mamar” o limbo. Por essa razão, dificilmente é pescado com anzol. Ihering, entretanto, relata que no rio Guamium, afluente do Piracicaba, que recebia o esgoto de um matadouro próximo, curimba-tás eram pescados com anzóis pequenos, mas muito fortes, com pequenos pedaços de coá-gulos de sangue ou bucho de porco como isca. Para tanto, era necessário o uso de uma vara bem fina, para sentir o peixe “mamando” a isca, o que contribuiria extraordinariamente para au-mentar a sensação do pescador ao usar uma vara tão branda, própria para lambaris, ao se-gurar um peixe de alguns quilos. Outro sistema usado é a colocação de uma pequena pelota de massa feita com farinha de trigo na linha, pouco acima do anzol tridente (garateia). Ao perceber que o peixe está “mamando” a mas-sa, dá-se o chascão que pode ferrar o curim-batá. Em Piracicaba, como na maioria dos rios onde é encontrado, o curimbatá geralmente re-presenta cerca de 50% da população existente, o que o torna de maior valor. Em Piracicaba é comum considerar os curimbatás maiores, com peso acima de 5 kg, um peixe de outra espécie, chegando a chamá-los de curimbatá-uvú, deri-vado de açu = grande, em tupi. Entretanto, de acordo com especialistas em taxonomia, não há diferenças que justifiquem a origem de uma nova espécie. Nomura (1984) relaciona outras espécies do mesmo gênero, como o curimatá – pacu (P. argenteus) dos rios São Francisco e das Velhas; o P. marcgrave do rio São Francisco e na Argentina; o P. nigricans, de rios amazôni-cos e também da Bolívia, do Paraguai e da Co-lômbia; o P. cearensis, do Ceará, em rios e açu-des; o P. curimbata encontrado no Rio Grande do Norte, no Ceará e na Paraíba. Em Piracicaba

é encontrado ainda o conhecido curimbatá-de-lagoa (Prochilodus vimboides), de menor tama-nho que o do rio, corpo fusiforme, coloração pardo-amarelada, visto preferencialmente em lagoas marginais e por vezes, no rio, devido ao extravasamento de lagoas durante as enchen-tes, e de baixo valor comercial. A reprodução do curimbatá pode ocorrer entre os meses de novembro a janeiro, embora, como todos os outros peixes de piracema, caso se encontre no estágio “maduro”, a reprodução nunca se processa se o nível do rio se mantiver estável ou rebaixando. Durante esse período, os exem-plares machos emitem um ronco, audível até das margens, muito conhecido pelos pescado-res profissionais. O Departamento de Tecnolo-gia Rural da ESALQ (Escola Superior de Agri-cultura “Luiz de Queiroz”) empreendeu ensaios visando a conservação da carne do curimbatá e de outros peixes, para transformá-la em ali-mento de maior valor, face à grande produção, e sua salga, secagem e defumação. A salga, através da salmouragem, foi mais eficiente quando a concentração da salmoura foi acima de 25% de sal, ou seja, acima de 70% da solu-ção saturada. Os de defumação e os não de-fumados tiveram a mesma conservação, sendo que os primeiros apresentaram melhor aroma, sabor e cor nos ensaios organolépticos, e de maneira geral, foram mais apreciados. Porém, após uma exposição ao ar por 12 meses, sur-giu um ranço oxidativo, percebido desde os três primeiros meses de conservação, sendo mais pronunciado nos exemplares maiores de 1.200 gramas, devido à gordura. Foi observado ainda que, embora exemplares de 800 g se conservem bem, a quantidade de espinhas se torna mais presente devido ao menor volume de músculos, que diminuem mais com a secagem.

Por essa razão, dificilmente é pescado com anzol. Ihering, entretanto, relata que no rio Guamium, afluente do Piracicaba, que recebia o esgoto de um matadouro próximo, curimbatás eram pescados com anzóis pequenos, mas muito fortes, com pequenos pedaços de coágulos de sangue ou bucho de porco como isca

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Papa terra

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Dourado - Salminus maxillosus

Dourado

Desde o período do descobrimento do Brasil, por volta de 1.500, o dourado já impressionava os primeiros colonizadores. Relatório da época, de Cabeza de Vaca, citava que o pirajuba (peixe de cabeça amarela) era usado pelos índios guara-nis na medicina tribal. Sua gordura, usada pelos índios, uma vez esfregada nas canelas, evitava

o bicho-do-pé (Tunga penetrans) e também tinha poderes para a cura da sarna e da lepra.

Morais Fº e Schubart (1955) relatam que, em 1884, por sugestão de D. Pedro II, foi tentada a introdução do dourado no rio Paraíba, no tempo do pleno florescimento econômico do vale. Entre-tanto, tal tentativa não foi coroada de sucesso, o

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despertou a cobiça dos pescadores por saltar das águas, quando fisgado, por cerca de 2 m, levando ao pico sua adrenalina. Era tão apreciada sua pesca que pela oficina de marcenaria dos irmãos Adamoli, de Piracicaba, foi criado o bote piracica-bano tipo “oga”, especial para a pesca de “roda-da” do dourado. Tinham cerca de 9 m de compri-mento para abrigar as varas de 8 m de cana-da-índia que, uma vez deitadas, não ultra-passavam a ponta do barco para não se quebra-rem. As pontas, devido à grande força exercida pelo pescador na luta contra o dourado, levavam um “cabresto”, feito de um fio de aço (de 6 a 12 fios) encastoado com um fio fino de cobre que, por sua vez, era encastoado nos dois ou três seg-mentos da ponta da vara. O cabresto era dobrado deixando uma alça, onde era transpassada a linha de aço da vara, obrigatória na pesca do dourado. O bote levava o piloteiro (ou piloto) sentado na popa, geralmente tendo entre as pernas uma vara (de pesca) controlada com a mão esquerda, e na direita um remo para impedir que o bote fosse le-vado pela corrente, como também o conduzia a locais que acreditava serem mais favoráveis para encontrar o peixe. Na proa, geralmente outro pes-cador, mais favorecido, e geralmente o dono do bote (patrão), com a frente toda livre para encami-nhar a isca. Eventualmente, levava um convidado que ficava sentado no meio, com todo o cuidado para não atrapalhar os outros pescadores. Con-trolada pela altura da vara, a isca ia à frente dos pescadores, à meia-água, isto é, nem se arrastan-do pelo fundo, para não enroscar, e nem na super-fície, avançando muito, pois era levada pela cor-renteza. Uma vez “pegada” pelo peixe, era logo sentida pelo pescador que, apesar de toda a emo-ção, deveria ter o máximo controle para não agitar a vara e espantar o peixe. O dourado, depois de “mordiscar” a isca algumas vezes (2, 3, 5) e apro-

Era tão apreciada sua pesca que pela oficina de marcenaria dos irmãos Adamoli, de Piracicaba, foi criado o bote piracicabano tipo “oga”, especial para a pesca de “rodada” do dourado. Tinham cerca de 9 m de comprimento para abrigar as varas de 8 m de cana-da-índia que, uma vez deitadas, não ultrapassavam a ponta do barco para não se quebrarem

que ocorreu somente em 1945, com alevinos dos rios Mogi-Guaçu e Piracicaba, introduzidos por técnicos da antiga seção de Caça e Pesca da Se-cretaria da Agricultura de São Paulo e da Estação Experimental de Biologia e Piscicultura de Piras-sununga, do Ministério da Agricultura. Foram lan-çados ao todo 500 douradinhos com cerca de 25 cm de comprimento, divididos em dois lotes: um em Pindamonhangaba e outro em Guaratinguetá. Terminam o relato esclarecendo: “Hoje se encon-tra o dourado completamente adaptado no trecho médio do rio Paraíba”, isto dito no ano de 1955.

A criação artificial do dourado, através da téc-nica de hipofisação, embora fosse ideal para ob-tenção de alevinos destinados a povoação de rios ou criatórios, apresenta séria dificuldade devido ao seu canibalismo. Desde que se encontre em local confinado, durante seu crescimento após a fase larval, já apresenta tal tendência. Com cin-co dias, já são observadas lutas em tentativas do animal “um pouco maior” tentar engolir o “um pouco menor”, e com isso ocorrem muitas mor-tes por engasgo.

Peixe pertencente à família Characidae, subfa-mília Salmininae, gênero Salminus, espécie S. ma-xillosus, era bem conhecido desde período remoto pelos nossos índios. Era usado na medicina tribal e apreciado como alimento. Rodolpho Von Ihering, considerado pai da piscicultura nacional, que es-tudou sua biologia por várias décadas, assim o distinguia: “O dourado é sem dúvida o peixe máxi-mo destas águas, cabendo-lhe todos os bons pre-dicados. Seu belo colorido é inconfundível, doura-do, com subtil desenho de laivas vermelhas” (Ihering 1929). É um peixe típico da bacia do rio da Prata (Argentina) em toda a sua extensão de 3.209.000 km², e na bacia do Paraná com 1.415.000 km². Não é encontrado na bacia amazônica. Devi-do ao seu grande valor para a pesca esportiva,

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vá-la, abocanha-a resolutamente e geralmente dispara rio abaixo puxando a vara violentamente. Este momento exige toda a perícia do pescador para decidir o tipo de “ferrada” que vai dar: “de braço” ou de “ponta de vara”. São somente alguns segundos, mas decisivos para conseguir ferrar o peixe. Exige que o anzol penetre logo acima do osso maxilar, na abóbada palatina, e sua ponta com a farpa atravesse a parte óssea. A ferrada “de braço” é dada quando a vara se encontra em rela-ção à água em ângulo bem aberto (mais do que 45º), permitindo um brusco movimento para cima. A ferrada “ponta de vara” ocorre quando a ponta da vara ou mesmo parte dela se acha mergulhada e o pescador pratica um forte puxão contrário ao deslocamento do peixe, que é rio abaixo. Os an-zóis, geralmente importados, das marcas Sobey ou Mustad, de tamanho variado, também devem ser “adequados” ao porte do dourado. Um anzol de número grande, dificilmente consegue “ferrar” um dourado pequeno, como também um anzol pequeno, ferrar um exemplar grande. O dourado é essencialmente piscívoro (comedor de pequenos peixes), mas não desdenha outras espécies, prin-cipalmente se estão se debatendo na água, como pequenas cobras, camundongos, filhotes de pás-saros e especialmente andorinhas surfando a su-perfície hídrica para beber água. Entre os peixes pequenos, os mais apreciados são, pela ordem: tuvira, cascudinhos, lambaris, saguiru. Sua larga abertura bucal (e voracidade) permite deglutir pre-sas avantajadas em relação ao seu porte. Em re-gistro constante da Estação de Pirassununga (SP), consta o encontro de uma piava já semidigerida no estômago de uma fêmea de dourado, que cor-respondia a 54,8% do comprimento total da sua predadora. Embora muitos técnicos em piscicultu-ra admitam que somente 2% a 3% de uma desova sejam fertilizados, o índice de ovulação (gramas X

número de óvulos) é elevado, garantindo um bom número de alevinos. O registro de uma fêmea de dourado com 18,50 kg de peso e ovário com 2.071 g, revelou um índice de 1 g = 1.247 óvulos e 2.582, 537 total de óvulos. Estima-se que esse índice em média, oscile entre 1.000 e 1.200 óvulos por gra-ma de ovário, que representam de 15% a 24% do peso total das fêmeas e de 1% a 1,5% dos testícu-los dos machos que, aos 2 anos, já atingem idade reprodutiva, e as fêmeas, aos 3 anos. Durante seu desenvolvimento, o dourado passa por vários regi-mes alimentares: como larva = planctófago (fito e zooplâncton); alevino = planctófago e larvófago (classe insecta); juvenil = insetívoro; adulto = car-nívoro (piscívoro). Ao longo de sua existência, to-dos os anos efetuam uma migração conhecida como piracema. Deslocando-se da região conhe-cida como lar de desenvolvimento e engorda, exe-cutam a migração reprodutiva rio acima, até atingir o lar de reprodução. Após a reprodução, retornam ao seu lar de desenvolvimento e engorda: é a mi-gração trófica, onde permanecem até a próxima migração. Esses deslocamentos, de acordo com a bacia hidrográfica a que pertence o peixe, po-dem representar até milhares de quilômetros. O pesquisador Manoel Pereira de Godoy, da Esta-ção de Biologia e Piscicultura de Pirassununga, entre 1954 e 1963, nos períodos de piracema, com a concentração de peixes na cachoeira de Emas do rio Mogi-Guaçu, procedeu à marcação de vá-rios milhares de exemplares de diferentes espé-cies a fim de investigar os trajetos migratórios, os quilômetros percorridos e a velocidade nos trans-cursos, de preferência em 704 exemplares do dourado examinados. Entre as milhares de anota-ções registradas, concluiu que o dourado apre-senta uma velocidade de deslocamento entre 2 e 10 km/dia e que pode migrar, em trânsito de ida e volta até 2.060 km. Já para o pacu, de configura-

O dourado é essencialmente piscívoro (comedor de pequenos peixes), mas não desdenha outras espécies, principalmente se estão se debatendo na água, como pequenas cobras, camundongos, filhotes de pássaros e especialmente andorinhas surfando a superfície hídrica para beber água

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Pesca de rodada

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ção menos favorável ou menos hidrodinâmico, re-gistrou a velocidade de 3,3 km/dia durante um percurso de 100 km. Entre os “causos” relatados por pescadores, relativos ao dourado, figurava um atribuído ao pescador Bico-fino. Certa feita, ele descia lentamente de rodada, na corredeira “que-bra-canela”, famosa pelo encontro de grandes dourados, quando sentiu a “pegada” de um peixe que, em ziguezague, mordiscava a isca como se a estivesse experimentando. O coração do pes-cador palpitava ao máximo, quase saindo pela boca. E o peixe continuava a brincar com a isca até que resolveu “sair”. A vara que se encontrava alta, acompanhou o movimento do peixe rio abai-xo, mergulhando sua ponta n’água. Saiu em “ponta-de-vara”. Bico-fino, reunindo toda a for-ça de seus braços, deu a ferrada indicada para a situação, contrária ao movimento do peixe e imediatamente suspendeu a vara a fim de que a força de mola, ao envergar, evitasse que o anzol se soltasse da boca do peixe. Nesse movimen-to, ouviu um estalido, e a vara subiu chicotean-do, com a linha de aço quebrada no cabresto que a prendia ao anzol. Não chorou na hora por-que homem não chora, mas amargou profunda-mente a perda do anzol Sobey, que o acompa-nhava já por dezenas de anos. Era uma relíquia que afiava carinhosamente todas as semanas, e tão extraordinário era o número de dourados que ferrara para seu dono que tinha o nome de “matador”. Passaram-se vários meses, até pro-messas foram feitas para o encontro de outro que, pelo menos, se igualasse ao “matador”. Certa manhã, novamente “rodando” no “quebra-canela”, recordando e lamentando a perda do seu “matador”, sentiu uma pegada. E o peixe mordiscando a isca vai de um lado para o outro sem sair. O coração aos trancos aguarda a cor-rida final. Sai o peixe vigorosamente rio abaixo.

Dourado na banheira

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Vara já mergulhada, ferrada em ponta-de-vara, toda a força para cima para amortecer a força do peixe, que num esplêndido salto, mais de 2 metros da água, se revela: um belo dourado. Nos saltos seguintes mostra certa diferença em sua cabeça, um apêndice saindo da boca. E fi-nalmente, ao embarcar o pescado, prontamente Bico-fino soltou vigoroso grito: reconhecera o seu “matador” atravessado no “canivete” da boca do dourado, ainda com um resto do ca-bresto. Estava atendida a promessa que fizera a Nossa Senhora com tanto fervor para reaver o seu precioso “matador”.

Em décadas passadas, era muito conhecido e afamado o cidadão alcunhado João da Cur-va, pelas histórias que contava, afirmando com a maior “cara de pau” serem verdadeiras, mas que não passavam de inverossímeis. A própria alcunha teve sua origem na história de que, para matar um veado que sempre fugia na curva de uma trilha, entortou o cano de sua espingarda, do mesmo lado da curva e, com tiro certeiro, abateu o fugitivo. No rol de suas histórias havia uma envolvendo o dourado. Certa vez, no trecho do rio, abaixo do “vai-e-vem”, pescou um dou-rado de uns 4 kg, muito bonito, tão belo que re-solveu levar para casa para criar. Encheu a velha banheira de ferro, de quatro pés, e lá instalou sua presa, que era alimentada várias vezes por dia com lambaris comprados na rua do Porto. E cada vez que o alimentava, treinava-o por algum tempo, progressivamente, a ficar com a cabeça fora d’água. Como os períodos de treino foram se alongando, e se cansava de ficar segurando o peixe, instalou uma pequena plataforma na su-perfície da água para que, sem esforço, o peixe ficasse instalado. Certa ocasião, decorrido um bom tempo, quando o treinamento fora d’água já durava horas, deixou o dourado na plataforma

e foi à cidade fazer umas compras. Encontrou-se com um velho amigo e, na prosa, esqueceu do dourado. Quando se lembrou, dando toda força às pernas, saiu correndo para casa e lá chegan-do deparou com uma grave visão: o dourado caíra da plataforma e morrera afogado.

Certa ocasião, descíamos o rio de “rodada”, no trecho conhecido por “ondas”, na esperança de ferrar um dourado. O Hélio, na popa, de pi-loto, eu no meio, e na proa, o Zico. Sol a pino, o silêncio quebrado pelo bater da água nas late-rais do bote, nos preocupávamos em manter as varas em boa altura, para evitar que os anzóis enroscassem nas pedras. Inesperadamente, com grande alarido, o Zico, solta um vibrante “atchimmm”, seguido de um também vibrante, “f.d.p”, pois sua dentadura, descrevendo um semicírculo, foi cuspida por uns três metros à frente do bote, mergulhando na água. Com grande esforço, conseguimos segurar as garga-lhadas, lamentando o companheiro pelo ocorri-do, que, aliás, nos pediu para não revelar com receio de gozações. Na verdade nem foi preciso nenhuma revelação aos companheiros, pois a insistência do Zico, de falar com a mão cobrindo a boca, prontamente revelou o ocorrido e com ele o surgimento de piadas que se alastraram como rastilho de pólvora, de um dourado com uma dentadura no bucho ou de outro com uma dentadura entalada na boca, substituindo sua dentição natural. A história atingiu tamanha pro-porção que chegou ao noticiário do “O Diário”, um dos jornais da cidade, o curioso anúncio:

“Dentadura à Prova de Espirro.Executa-se com perfeição e segurança, den-

tadura à prova de espirro, mantida por delicada correntinha de ouro ou prata presa a uma cor-rente no pescoço. Facilita-se o pagamento. Tratar com Mateus pelo telefone 0195”.

Encontrou-se com um velho amigo e, na prosa, esqueceu do dourado. Quando se lembrou, dando toda força às pernas, saiu correndo para casa e lá chegando deparou com uma grave visão: o dourado caíra da plataforma e morrera afogado

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Jaú - Paulicea luetkeni

Jaú

Enquanto a piraíba (Brachyplatistoma filamento-sum), com seus 3 metros de comprimento e 150 kg de peso, reina na bacia amazônica como o maior peixe, o jaú (Paulicea luetkeni), na bacia parano-platense, com seus 2 metros e cerca de 120 kg, as-sume esse posto. Da família Pimelodidae, de couro como seus congêneres, possui a cabeça igual ao da parte mais volumosa do corpo, de cor pardacen-ta no dorso e esbranquiçada na parte ventral. Tem boca larga que atinge toda a largura da cabeça, ar-mada na parte superior e inferior por faixa de cente-

nas de fortes dentículos voltados para o interior da boca, que garantem a segurança dos peixes abo-canhados. Devido a essa capacidade, certos auto-res admitem que, antes de engolir suas presas, o jaú pratica uma espécie de mastigação por meio de suas fortes mandíbulas. Nos exemplares adultos, o primeiro raio das nadadeiras peitorais atinge a gros-sura de um dedo indicador humano e pode ter mais de um palmo de comprimento, todo farpado na sua parte posterior, constituindo perigosa arma de defe-sa, pois uma vez penetrada, dilacera inteiramente o

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(principalmente se for linha de náilon), ou mesmo o bote emborcado, como já consta de vários “cau-sos”. Se depois de ferrado conseguir alcançar uma “loca” (toca entre pedras), resiste a qualquer pres-são, restando ao pescador paciência por muitas horas ou a opção de abandonar o peixe. Eventual-mente, o jaú pode pegar um espinhel (corda forte amarrada no barranco com poita pesada na ponta e vários anzóis). Além de deslocar a poita, dificilmente as linhadas dos anzóis seguram o peixe. É comum também, ao tentar abocanhar um peixe emalhado em uma rede de barranco (de espera), pela fragili-dade dela, o peixe levar “tudo no peito”, como se diz popularmente. Do ponto de vista comercial tem bom valor, seja pelo peso e também pela carne branca, delicada, sem espinhas, que pode ser preparada de várias maneiras ou disposta em mantas que, secas ao sol, tomam uma coloração avermelhada, seme-lhante ao pirarucu. Magalhães (1931), Monografia Brasileira de Peixes Fluviais, nos dá conhecimento sobre a análise da carne fresca e do “azeite”:

Análise da carne fresca (%):Matéria graxa .... 13,5340Cinzas .... 10,2920Fosfatos .... 0,1637Calorias .... 510Azeite – Composição centesimal:Água .... 2,104Insolúveis no éter .... 0,076Matéria gorda .... 97,82Cinzas .... 000O mesmo autor ainda esclarece que “tudo se

aproveita do peixe. Um jaú de 60 kg, por exemplo, poderá dar, em condições normais, 20 kg de carne, 15 kg de azeite, 5 kg de cola e 15 kg de resíduos”. O azeite tem muitas aplicações nas indústrias, prin-cipalmente na de couros finos. Ihering (1934) que, entre centenas de espécies de peixes estudados, também o fez com o jaú revela que um exemplar

Enquanto a pesca com o sistema pindacuema não oferece perigo, a pesca com sondar, se a linhada for forte e resistir à força do peixe, é perigosa, pois pode representar o perigo de arrastar o pescador para dentro d’água, o corte nas mãos (principalmente se for linha de náilon), ou mesmo o bote emborcado, como já consta de vários “causos”

ferimento ao ser retirada sem recurso médico. Sua força extraordinária, quando dentro d’água, faz parte de grandes histórias de pescadores como as revela-das por Magalhães (1931), sobre um pescador tar-rafeando no Salto de Piracicaba, com a corda amar-rada ao pulso, quando atingiu um jaú. Foi arrastado correnteza abaixo e desapareceu. Ele também fala do cadáver de um pescador, boiando e subindo rio acima, tendo na extremidade da corda presa ao seu pulso, um grande jaú, “emalhado” num resto de tar-rafa!!! Sua pesca mais normal é feita pelos sistemas conhecidos de pindacuema, sonda (ou sondar), também conhecida por linha de mão, e o espinhel. O pindacuema consiste em se utilizar um galho pen-dente sobre o rio, onde se amarra uma corda, de preferência de linho ou hoje em dia de fios plásticos, sendo a rabeira, com boa folga, amarrada ao tronco da árvore. Na ponta pendente no rio, um anzol gran-de é iscado com um peixe ainda vivo (pelas costas) que fica se debatendo na superfície da água. Como isca, de preferência, curimbatás de tamanho médio (600 g), piavas e eventualmente cascudos que, por não se debater muito, não seriam indicados. O ga-lho pendente servirá de mola. O peixe pegando a isca e se deslocando rio acima, arqueia o galho, que em seu retorno, o ferra . A tensão do galho, sempre contrária à força do peixe, faz o peixe cansar e não tentar escapar. A linha de mão ou sondar, como os próprios nomes já indicam, é executada no meio do rio, com o bote “apoitado” e a linha manejada com as mãos, em movimentos iguais ao de empinar “pa-pagaio”, sondando o leito do rio com o anzol iscado e a chumbada adequada à força da correnteza. Por isso é mais apropriada para peixes de fundo, ou de couro, como o jaú. Enquanto a pesca com o sistema pindacuema não oferece perigo, a pesca com son-dar, se a linhada for forte e resistir à força do peixe, é perigosa, pois pode representar o perigo de arrastar o pescador para dentro d’água, o corte nas mãos

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fêmea de 70 kg, com ovários pesando 4 kg, pode conter 3.640.000 óvulos. No rio Tietê, embora tenha vários afluentes favoráveis à subida de peixes, prin-cipalmente para fins de reprodução, o rio Piracica-ba sempre foi privilegiado, possivelmente devido à qualidade de suas águas (antes de 1970) tanto física como quimicamente. Sua fauna, por possuir nume-rosas espécies, algumas de grande porte, em dé-

cadas passadas era uma atração para pescadores de diferentes origens. Há muitos anos, o pescador Leonardo me relatou que seu irmão, Manuel San-tos Lamera, vulgo Português, pescador profissional, morador do trecho do rio conhecido por “prainha”, conseguiu pescar um jaú de 180 kg. Ante minha ex-pressão de dúvida, asseverou que ainda no rancho do seu irmão era guardado o anzol que fora feito por Pesca do jaú

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um ferreiro, como comprovante da pesca inusitada. Como não tive a oportunidade de checar a existên-cia do anzol e a comprovação do autor da proeza, aqui fica o seu registro, com dúvidas se verdadeira, ou como mais uma história de pescador. Relato do pescador Sinésio Cursio revelou que um jaú fêmea, pescado no rio Vermelho (MT) pesou depois de lim-po, 115 kg, e seus ovários 4,5 kg. Se considerarmos a barrigada como 20% do peso vivo (PV), o exemplar pesaria pouca mais de 140 kg. Outro “causo” regis-trado por vários autores, foi o de um jaú de 120 kg, “acontecido” de formas diferentes. Uma delas cons-tava que os pescadores da rua do Porto, durante meses (período da piracema) sofriam com o ataque de um grande peixe, que destroçava todo o artefato de pesca, fosse pindacuema, espinhel e principal-mente redes de espera; sem falar na linha de mão “sondá”, que tinha de ser solta quando ferrado o peixe, para o pescador não ser puxado para dentro d’água. Para pôr fim às ocorrências que causavam grande prejuízo aos pescadores, pela baixa produ-ção do pescado e a perda dos artefatos de pesca, mandaram fazer na Oficina Dedini um anzol de aço, de tamanho especial, cerca de “palmo e meio”, para segurar o bicho. Encastoado em um cabo de aço de doze fios, iscado com um curimbatá de 4 kg, foi o cabo amarrado a um grosso galho de ingá, penden-te sobre o rio, e sua extremidade ao tronco da mes-ma árvore, no fim de uma tarde. Lá pelas tantas, um grande alvoroço no rio. A escuridão da noite, mais um certo temor da luta no escuro, fez permanecer os pescadores nas suas casas, aguardando com certa curiosidade o amanhecer. Dia claro, dois botes com pescadores acercaram-se do cabo de aço, tenso, sem movimento nenhum. Bastou, porém, um leve toque, para começar a luta. Solto o cabo do pinda-cuema da árvore, o peixe, sem rebojar, rebocava um dos botes hora para cima, hora para baixo, ante a es-tupefação dos pescadores. Passaram-se horas até

que o peixe, já cansado, começou a rebojar. Porém, a cada rebojo e recolhimento do cabo que prendia o peixe, havia uma perigosa reação, com a ameaça de puxar o pescador para dentro do rio ou mesmo emborcar o bote. Depois de horas da luta ferrenha, a solução foi a convocação da Guarda Municipal que, com tiros de fuzil na cabeça do peixe, embarcaram o jaú. Pesou 120 kg. Dessa extraordinária façanha vieram também participar os habitantes de Piracica-ba. O jaú colocado numa carroça, com seu focinho roçando o rabo do burro, atravessava o comprimen-to do transporte e a ponta da cauda ainda raspava o chão. Várias ruas da cidade foram percorridas ante as palmas de seus moradores, enobrecendo seus pescadores. Essa inusitada ocorrência foi citada por Ihering (1929) em seu livro Da Vida dos Peixes, as-sim como por outros credenciados autores. Por volta da 2ª Guerra Mundial, devido ao racionamento da gasolina, os pescadores deviam se registrar na pre-feitura para ter direito a uma magra cota de gasolina por mês. A alternativa dos pescadores era descer o rio remando e só usar o motor na subida, portanto gastando menos gasolina. Os motores pequenos, até uns 10 cavalos, conhecidos pelo barulho que faziam como “tip-top”, na época das enchentes, da piracema, tinham dificuldade de subir o rio, princi-palmente quando estavam levando uns bons quilos de peixe. A solução era que só o piloto subia com o bote e os outros retornavam a pé. Na região do rio conhecida por matadouro, a transposição era com-plicada devido à quantidade de pedras submersas. A passagem favorável era pela margem esquerda, próxima do barranco, e sempre transposta com mui-ta apreensão, pois era comum o fato de grandes jaús abocanharem a hélice do motor e quebrarem o pino, deixando o bote inteiramente ao sabor da cor-renteza. Sabíamos perfeitamente que não era pedra pelo rebojo do peixe, provavelmente atordoado pela força da batida da hélice em sua boca.

Há muitos anos, o pescador Leonardo me relatou que seu irmão, Manuel Santos Lamera, vulgo Português, pescador profissional, morador do trecho do rio conhecido por “prainha”, conseguiu pescar um jaú de 180 kg. Ante minha expressão de dúvida, asseverou que ainda no rancho do seu irmão era guardado o anzol que fora feito por um ferreiro, como comprovante da pesca inusitada

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Jurupoca - Hemisorubim platyrhynchus.

Jurupoca

Peixe de couro da família Pimelodidae, ocor-rente nas bacias amazônica, do Prata e do Pa-raná, pode atingir 60 cm e 4 kg de peso. Sua carne amarelada é apreciada por seu sabor. Tem o corpo roliço, quase uniforme, e por essa razão também é conhecido por “braço-de-moça”. Por viver em bocas de lagoas e poços, tem coloração escura com manchas irregulares

no dorso, um pouco mais claras nas laterais, e branca na parte inferior. A cabeça é peque-na com quatro pares de barbilhões sensoriais. Apresenta prognatismo acentuado, com a man-díbula maior do que o maxilar superior, tornando a boca virada para cima, e dotada de uma fai-xa de dentículos voltados para seu interior. Seu corpo é recoberto por muco, que o torna difícil

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Como peixe de fundo, é pescado principalmente em espinhel, em pesca de barranco, e às vezes por sondá. Por ser um tanto raro e de coloração escura, não é apreciado etem pouco valor comercial

tre os peixes de pele é o melhor para a mesa, atingindo preços vantajosos no mercado, para os que conhecem”. O pescador Sinésio, apre-ciador de jurupoca, adverte sobre o perigo que representa para o pescador inexperiente. Se for segurá-lo com as mãos junto à base das nadadeiras peitorais, ele as fecha com grande pressão, causando dolorosos ferimentos. Com a prática adquirida em sua pesca, garante que quando se pesca um, é só insistir um pouco mais para pegar outro. Segundo sua observa-ção, quando adulto o jurupoca é monogâmico, característica nunca citada anteriormente.

de ser segurado com as mãos. O Hemisorubim platyrhynchus alimenta-se de peixes e inverte-brados. Como peixe de fundo, é pescado prin-cipalmente em espinhel, em pesca de barran-co, e às vezes por sondá. Por ser um tanto raro e de coloração escura, não é apreciado e tem pouco valor comercial. É mais apreciado por pescadores, por conhecerem o sabor de sua carne e porque não apresenta espinhos como os demais peixes de escama. Sua pele, depois de bem limpa e feita em tiras, uma vez frita, é apreciada pelos pescadores como tira-gosto. Magalhães (1931), porém, assevera que “en-

Ferroada

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Lambari - Astyanax fasciatus

Lambari

Pequeno peixe do rio Piracicaba, amplamente presente em todas as bacias do Estado, como tam-bém em Estados vizinhos. De pequeno porte, pode atingir cerca de 15 cm e peso de 35 g. É a espécie que, para a alegria dos pescadores, está sempre presente no rio. Em determinados trechos, mesmo em períodos fora da piracema, quando então forma grandes cardumes, em esplendoroso e cintilante es-petáculo, os lambaris procuram vencer a impetuosi-dade das águas do salto. Esses peixes se alimentam principalmente de insetos e pequenos crustáceos e também de algumas espécies de algas e pequenos frutos. Ecologicamente, em todos os rios onde estão

presentes constituem um importante elo na cadeia trófica dos peixes carnívoros (ou piscívoros), como peixe forrageiro. Por essa razão, por serem muito atacados por outros peixes – dourado, tabarana, pintado, os pequenos cardumes se agrupam próxi-mos às margens, entre a vegetação, e se qualquer inseto ou mesmo uma pequena folha ou fragmen-to vegetal atinge a superfície, saem do esconderijo, para verificarem de perto se é algo comestível ou não. Os pescadores com maior experiência, muni-dos de varas frágeis de ponta bem fina, e usando linhas finas de náilon com pequeno anzol, conhecido pelo nome de “mosca”, iscado com pequeno peda-

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dúnculo caudal em sua parte final até a reentrância da caudal bifurcada. A espécie é encontrada desde a América Central até a Argentina. O lambari-de-nadadeiras-vermelhas, Astyanax trierythropterus, de menor tamanho, corpo prateado, constitui bom or-namento na aquariofilia, assim como o lambari-olho-de-fogo, Hemigrammus ocellifer, disputado para aquários ornamentais. O tambiú, Astyanax bimacu-latus lacustris, como o nome indica é um peixe de lagoa, frequentemente é encontrado em rios, devido a transbordamentos de lagos, mas provavelmente não encontram aí ambiente propício à reprodução. Segundo Nomura (1984), que estudou sua biolo-gia, é o mais desenvolvido entre os lambaris. Tem o corpo prateado, nadadeiras amareladas, mancha umeral forte e faixa longitudinal ao longo do corpo. É encontrado também em rios de Minas Gerais. Por pescadores amadores, para consumo próprio ou mesmo por esporte, são pescados “de barranco” onde sempre estão protegidos pela vegetação. Por pescadores profissionais, são pescados com tarra-fas de malha “fina”, de 5 cm entre nós. Malhagem inferior a essa é proibida, somente autorizada para profissionais, para pesca de isca com malha de até 2 cm. Entre as espécies de menor valor, popular-mente conhecido como “peixe-branco”, o lambari é a mais frequente, servindo mais à população de bai-xa renda ou a restaurantes onde, depois de frito, é servido (e muito apreciado) como tira-gosto. Embo-ra o lambari constitua um importante elo da cadeia trófica dos peixes carnívoros, pode ser também clas-sificado como um importante predador por ocasião da piracema. Ganhando o meio do rio, logo abaixo dos trechos em que as espécies reofílicas se encon-tram em pleno ato reprodutivo, como um verdadeiro enxame, ficam “caçando” a guloseima dos óvulos e ovos dispersos na corrente. E com essa predação, como num ato de vingança, os pequenos lambaris atingem seus principais predadores, os dourados.

Rua do Porto tem cuscuz mais verdadeiroFeitado em sua vortade lambari de rabo vermeio

ço de minhoca, larva de inseto (tenébrio) ou massa, mesmo sem chumbada, precisam ser rápidos na fisgada, pois a ligeireza como o lambari pega a isca assim que toca a água e sai numa arrancada não permite nenhuma “moleza” do pescador. A desova é parcelada, isto é, pode ocorrer mais de uma vez durante o período da piracema, mais precisamente de novembro a fevereiro. Não desovam em ninhos ou outro substrato do meio aquático, mas nas águas correntes dos rios, sendo os óvulos, após fecunda-dos, levados pela correnteza à vegetação submersa ciliar ou para lagoas ciliares, onde se desenvolverão os embriões para o surgimento das futuras larvas e alevinos. Popularmente é conhecida mais de uma dezena de lambaris, pertencentes a dois gêneros: Astyanax e Hemigrammus. A denominação popular é dada pela coloração das nadadeiras, dos olhos e pelo tamanho. Assim, o Astyanax fasciatus, lambari-de-rabo-vermelho, é um belo exemplar de nosso rio, seja pelo seu tamanho ou principalmente pelo seu belo prateado e a coloração vermelho-sanguínea de seu rabo. Embora atualmente já um tanto raro, devi-do principalmente à poluição e à ausência de vege-tação ciliar, constituiu durante décadas, ou mesmo mais de um século, um importante fator de atração turística: o cuscuz da rua do Porto, assim louvado por violeiros:

Rua do Porto temcuscuz mais verdadeiroFeitado em sua vortade lambari de rabo vermeioDe fato, as petisqueiras, entre elas a menina preta,

faziam a diferença. Embora os ingredientes fossem os mesmos, o cuscuz com lambaris de rabo verme-lho era o mais procurado e, portanto, mais caro. Mon-tados com lambaris abertos ao meio e espalmados, o prateado do corpo e o vermelho do rabo limitavam cada bocado. A espécie apresenta mancha umeral difusa e mancha escura estendendo-se desde o pe-

O cuscuz verdadeiro

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Mandi - Pimelodus maculatus

Mandi

Nome dado a diferentes espécies de peixes da família Pimelodidae, gênero Pimelodus. De porte pe-queno, como o mandi-chorão, a porte médio, como o mandi-gonçalo, ou como o maior, o mandi-ama-relo, cujos exemplares maiores são conhecidos por mandiúva, cientificamente denominados Pimelodus maculatus, estão sempre presentes no rio Piracica-ba, onde, devido à poluição, tiveram sua aparição bastante reduzida. Em décadas passadas, o mandi chegou a representar o terceiro lugar no volume de pescado de Piracicaba. Devido à sua grande proli-ficidade, foram introduzidos no Nordeste, em 1933, provenientes do rio São Francisco; e no rio Paraíba, vindos do rio Piracicaba em 1955, com cerca de 3.500 exemplares adultos. Em 1958, começaram a

surgir exemplares filhotes (Nomura, 1984). Uma fê-mea de 45 cm chega a atingir 1 kg de peso. Com 30 cm pode gerar 22.000 óvulos. O P. maculatus apre-senta o dorso castanho-amarelado, laterais amarela-das e a parte ventral branca. Sobre todo o corpo, há pequenas manchas escuras. Por muito tempo, essa espécie foi denominada P. clarias. Tanto a nadadei-ra dorsal como as duas peitorais são armadas por fortes acúleos (ou ferrões) que produzem dolorosos ferimentos a quem não está familiarizado com esse perigo, quando é pescado. Normalmente, o pesca-dor profissional quebra os ferrões, assim que cap-tura o mandi. Em tempos passados, era impressio-nante o modo como os pescadores profissionais se livravam dos perigosos ferrões dos mandis, quando

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se encontravam tarrafeando no salto, em locais de perigo e de difícil acesso. Com uma das mãos, pe-gavam o mandi pelo dorso, quando ainda “emalha-do”, levavam o ferrão à boca e, uma vez preso entre os dentes, davam uma torção no corpo do peixe, e o quebravam, um ferrão de cada vez, e depois os jo-gavam para dentro do saco preso à cintura, com só uma das mãos, pois a outra segurava a tarrafa para não ser levada pela força da água. Agora, um “cau-so” verdadeiro envolvendo o mandi: como sempre acontecia nas sextas- feiras à noite, eu e mais um pe-queno grupo de amigos pescadores nos encontrá-vamos no jardim, defronte ao Passarela, para “trocar conversas”. Numa delas, durante o inverno, o amigo Armando lá apareceu convidando um de nós para ir pescar na manhã do dia seguinte, um sábado, pois estava louco de vontade de comer um cuscuz reche-ado com mandi. Em pleno inverno, tentar pescar um mandi todos sabiam que era uma loteria. Por mais que insistisse, não conseguiu o companheiro. No dia seguinte, sábado à noite, novamente na reunião, encontramos o Armando todo eufórico, pois conse-guira pescar quatro mandiúvas, num poço que ele bem conhecia e que não falhava. Quase babando, ia lembrando como a esposa ia preparar o cuscuz com os mandis, que já estavam num tempero capri-chado. Tirou da despensa o velho cuscuzeiro feito de lata por funileiros, constante de uma só peça. A parte inferior recebia a água, cujo vapor depois de fervida, cozinhava o cuscuz. A parte superior, cônica, recebia a massa que era cozida pelo vapor d’água ao atravessar o tampo intermediário, todo perfurado. Providenciou igualmente uma boa rolha para fechar a abertura por onde era colocada a água, que pre-cisava ser retirada para “emborcar” o cuscuz numa travessa. Domingo cedo, depois da missa e antes do almoço, o assunto durante novo encontro só era o cuscuz do Armando. E todos nós, em provocação, prometíamos ir visitá-lo e outras coisas mais, ante a

negativa de que, como não tínhamos participado da pescaria, tínhamos perdido a oportunidade de sabo-rear o quitute. E ainda nos atiçava: já tinha compra-do três Antárticas, colocando-as no lugar certo na geladeira, para ficarem bem geladas. E recomen-dou: “Nada de fazer outra comida, só quero esse cuscuz”. No domingo à noite, uma vez reunidos, estávamos ansiosos para saber como tinha sido o almoço do cuscuz tão bem planejado. A expectativa era grande, e o Armando não aparecia. Conjecturas eram feitas: será que de tanto comer, passou mal? Depois de um bom tempo, ainda longe, foi visto o Armando. Vinha devagar, uma das mãos no bolso, meio cabisbaixo. Nossos olhares de interrogação e admiração se cruzavam. Ao chegar, todos fizemos uma só pergunta: “Então, como foi o cuscuz, estava muito gostoso?” Respostas imprecisas, balbuciadas, nada esclareciam. Depois de algum tempo, levantan-do a cabeça, inflando o peito, o Armando começou a falar: “Tudo estava perfeitamente certo. Troquei a roupa, vesti um pijama, sentei à mesa, abri a cerve-ja, empunhei o garfo e falei ‘manda brasa’. A esposa rapidamente apagou o fogo, embrulhou o cuscuzeiro numa toalha e tirou a rolha para sair a água. E, com a água, saíram quatro baratas cascudas!!!”. Em toda a praça foram ouvidas estrondosas gargalhadas...

Cuscuz incrementado

Nossos olhares de interrogação e admiração se cruzavam. Ao chegar, todos fizemos uma só pergunta: “Então, como foi o cuscuz, estava muito gostoso?” Respostas imprecisas, balbuciadas, nada esclareciam

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Pacu - Colossoma mitrei

Pacu

O pacu, cujo nome científico é Colossoma mitrei, teve gêneros diferentes ao longo dos séculos, como Pacu em 1877, Myletes em 1880 e só em 1928 o nome atual. Seu nome popular também sofreu va-riações de acordo com a região onde se encontra-va, desde simplesmente pacu, até pacu-caranha, caranha e pacu-guaçu. Chega a atingir até 82 cm de comprimento e peso de 18,5 kg. Embora tenha o dorso mais escuro e a parte ventral esbranquiçada, pode adquirir coloração bem escura, razão pela qual foi classificado como Pacu Níger, por volta do século XIX. Devido ao formato discoide de seu corpo, evita corredeiras, preferindo remansos com certa profun-didade. Embora seja encontrado nos principais rios

sul-americanos, abaixo de Mato Grosso do Sul, Goiás e Minas Gerais, até na Argentina, em certos rios, sem uma explicação ou razão, surgiram apenas mais re-centemente. Assim, no rio Pardo – SP, sua presença é registrada apenas após o peixamento (transplante), em 1966. No rio Mogi-Guaçu, só após 1970. Na bacia amazônica, há registro de uma captura, em Santa-rém, em 1915. Tendo em vista a época e as prová-veis dificuldades para uma exata classificação, esse registro merece dúvidas. O formato discoide de seu corpo talvez explique a razão de sua inexistência em certos rios de baixo calado e muitas corredeiras. O longo tubo do aparelho digestivo indica uma digestão diversa e prolongada. Exames do trato estomacal re-

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velaram restos vegetais secos e verdes, sementes va-riadas, penas de aves, diversos vermes e pequenos peixes. Por esses elementos vegetais, frutas, peixes e vermes, concluímos que o pacu é onívoro. Para tal diversidade de alimentos, possui uma potente denti-ção, semelhante aos incisivos do homem, mas com uma larga superfície de contato que funciona como os dentes molares, úteis para cortar, triturar e moer. Por essa razão, são apreciadores de coquinho. Pes-cadores experientes sabem que quando encontram um coqueiro com cacho debruçado sobre o rio, se existirem pacus, eles estarão lá, esperando pelos fru-tos caídos. Por isso, “apoitando” o barco bem próxi-mo, isca-se o anzol com coquinho e, com auxílio da longa vara, o faz cair do mesmo modo que ele cai do coqueiro. A pegada e a corrida são instantâneas, só dando tempo para uma boa “ferrada” e muita força para tirá-lo da água, pois, segundo testemunho de vários pescadores, fica nadando de lado, em círculos, podendo dar croca na linha de aço e quebrá-la se não tiver um rodízio no cabresto do anzol. Sua pesca é facilitada pelo formato largo do seu corpo. Seja com tarrafa, com rede de espera, ou de barranco, logo são “emalhados”, ao contrário das espécies com corpo fusiforme que, quando pequenas ou com rede de malha aberta, transpassam com facilidade. Embora a reprodução em meio natural dos peixes reofílicos (de piracema) seja conhecida, para o pacu ainda restam muitas dúvidas. Já para os processos de reprodução induzida, a técnica é bem conhecida e atualmente seus produtos já representam boa parte, senão o to-tal, do encontrado no comércio, onde recebe grande valor. E este é plenamente justificado pelo sabor de sua carne. Depois de assado, a sua costela constitui o ponto alto de muitos restaurantes especializados. Ihering (1968), já em 1940, em seu excelente trabalho Dicionário dos Animais do Brasil, assim se manifes-ta sobre o pacu: “Sua carne é excelente e, por todos os motivos, é uma das espécies mais promissoras

da piscicultura nacional”. E, quando fez essa profe-cia, a reprodução induzida dos peixes era um alvo ainda a ser atingido pelos pesquisadores. Do ponto de vista de produção (de carne), o pacu oferece uma característica excepcional quando comparado a ou-tras espécies de peixes. Sua pequena cabeça deve representar apenas 5% do peso total, restando por-tanto 95% quase todo de carne, já que sua ossatura é pequena. A mesma família possui mais uma espécie de pacu, o Mylophus asterias, vulgarmente conheci-do por pacu ou pacu-rosa. De menor tamanho que o descrito acima, a maior fêmea capturada alcançou 32,5 cm de comprimento e peso de 690 g, e o maior macho, 28 cm e peso de 450 g. De coloração clara, apresenta após o opérculo e no início da linha lateral uma mancha arredondada rosa, mais acentuada e maior no macho. Outro caráter de dimorfismo sexu-al é apresentado na nadadeira anal do macho, que é bilobada. Os exemplares pequenos sempre pos-suem o corpo marchetado com pequenas manchas irregulares mais escuras. Pesquisas por Travassos (In Ihering, 1968) revelaram intenso parasitismo so-frido pela espécie. Ihering, em seu Dicionário (1968), assim comenta a ocorrência: “Curioso é que várias espécies de pacu são vítimas de intenso parasitis-mo de vermes do gênero Rondonia, que lhe enchem completamente o estômago; contudo, aparentemen-te não lhe causam mal”. O conteúdo estomacal de vários exemplares revelou uma predominância herbí-vora. Por seu pequeno porte, pouca carne e muitas espinhas, apresenta pouco valor comercial quando adulto. Porém, quando pequeno, de 4 a 8 cm, é bom ornamento para aquários. Devido ao formato corpo-ral, tem grande dificuldade de transpor obstáculos do meio hídrico. De acordo com a sabedoria dos velhos pescadores, quando depara com obstáculos, pro-cura um trecho com maior vazão de água, arreme-te fortemente rio acima e “prancheia” (nada de lado) vencendo a correnteza.

Pacuquinho

Do ponto de vista de produção (de carne), o pacu oferece uma característica excepcional quando comparado a outras espécies de peixes. Sua pequena cabeça deve representar apenas 5% do peso total, restando portanto 95% quase todo de carne, já que sua ossatura é pequena

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Peixe-sapo - Pseudopimelodus raninus

Peixe-sapo

Peixe de couro da família Pimelodidae, nome científico Pseudopimelodus raninus, é encontrado em vários rios brasileiros, inclusive nos das ba-cias do Tietê e do Paraná. Sua cabeça um tan-to achatada, acompanhando a largura do corpo, semelhante à de um sapo, deu origem ao nome popular, em tupi-guarani, piracururu, onde pira = peixe, cururu = sapo cururu. Tem um colorido pardo com manchas irregulares escuras e es-branquiçadas ao longo das nadadeiras dorsal e

anal. A nadadeira dorsal é armada, como o corpo, com acúleo recoberto com muco pegajoso. As nadadeiras peitorais também têm um primeiro raio duro com farpas. O corpo é cilíndrico por igual, com pequena depressão no pedúnculo. A nada-deira caudal é redonda. A boca é armada com pequenos dentes viliformes que facilitam a captu-ra de pequenos peixes, de que se alimentam. Os olhos são pequenos, situados na parte superior da cabeça. A mandíbula e a maxila têm pares de

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Geralmente sua pesca é feita com sondá, com vara com boa chumbada e espinhel, usando como iscas pedaços de peixe, de coração de boi e principalmente minhocuçu

pequenos barbilhões. Têm hábitos noturnos; pre-ferem poços dos rios e locas (tocas) em pedras. Nos períodos de grandes chuvas, com as águas dos rios bastante turvas por enxurradas, são en-contrados durante o dia. Sua biologia é desconhe-cida. Diferentemente dos outros peixes, sua pes-ca com anzol não oferece nenhuma sensação ao pescador, pois ao abocanhar a isca, a engole de imediato, o que só é sentido pelo pescador quan-do puxa a linha e percebe certa pressão contra a retirada. Para não perder o anzol, normalmen-te é preciso abrir a barriga do peixe e retirá-lo de dentro do estômago. Alimenta-se de pequenos peixes, moluscos, detritos e vermes. Geralmente sua pesca é feita com sondá, com vara com boa chumbada e espinhel, usando como iscas peda-ços de peixe, de coração de boi e principalmente minhocuçu. Embora seu aspecto não seja atrativo para a maioria das pessoas, sua carne rosada é apreciada pelos pescadores, depois de retirado o muco que o recobre com muito limão. Em al-gumas regiões é conhecido pelo nome de “paca-mão”. Atinge pouco mais de 60 cm e peso entre 4 e 5 kg, quando adulto. Sobre o peixe-sapo, um amigo pescador relatou o seguinte “causo”: certa feita foi pescar num dia após muita chuva, com as águas do rio bem barrentas. Por essa razão, sabia que a pescaria seria de peixes de fundo: jurupo-ca, mandi e possivelmente até peixe-sapo. Iscado o anzol de tamanho médio, com boa porção de um minhocuçu e boa chumbada, lançou longe a linhada da vara com carretilha, onde sabia ter um grande poção. Depois de algum tempo, ao levan-tar um pouco a vara, sentiu certa pressão, como de um enrosco. Aguardou um pouco e novamente sondou a isca com maior pressão, que cedeu um pouco com pequenos solavancos, como se esti-vesse reagindo. Depois de alguns minutos sem movimento, recolheu mais um pouco de linha com

certa resistência e sempre com alguns solavan-cos, como para se livrar do anzol. Cada vez que recolhia a linha, o “peixe” se aproximava mais do barranco, rio abaixo. Os palpites dos pescadores ao lado eram bem diversos, mas pelo “jeito do peixe”, só podia ser peixe-sapo. Depois de outras tentativas, sem saber o que havia “ferrado” e com a linha já cruzando com as dos pescadores abai-xo, resolveu recolher toda ela. Com a vara bem “embodocada” pelo peso do peixe foi recolhendo toda a linha restante, sempre com resistência e solavancos, até surgir na superfície o “misterioso” peixe. Com grandes gargalhadas dos presentes, um enrugado botinão que, pelo tamanho, devia ser número 42 ou 43.

Pesca inesperada

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Piapara - Leporinus elongatus

Piapara

A piapara (Leporinus conirostris), da família Anos-tomidae, a que também pertencem as piavas, em-bora encontrada com menos frequência nos rios Pi-racicaba, Paraíba, Mogi-Guaçu, Doce (ES) e mesmo no Prata (Argentina), é considerada um peixe nobre, pelo tamanho que pode alcançar, 60-70 cm, e peso entre 7 e 8 kg, e pelo sabor de sua carne. Aos exem-plares de 8 kg davam o nome de piapara-ussu ou piaparão, quando a altura do corpo atinge cerca de 25 cm . Embora seja preferencialmente vegetaria-na, a espécie não rejeita pequenos vermes e frutos. Apresenta várias faixas transversais no corpo, o foci-nho acarneirado, boca voltada para baixo, e, abaixo da linha dos olhos, é armada com dentes incisivos voltados para frente, o que lhes facilita o corte da

vegetação submersa, para alimentação. Tem prefe-rência por cursos de água limpa e de correnteza, de pouco calado (60-70 cm) onde efetuam a reprodu-ção logo no início da piracema, com as primeiras en-xurradas. Os óvulos fertilizados permanecem entre a vegetação do leito ou das lagoas marginais, até a eclosão. O nome original, em tupi, era pirapara, em que pira = peixe, e para = rio, ou literalmente = pei-xe do rio. Embora não salte como o dourado quando “ferrado” pelo pescador, oferece grande resistência como as demais espécies da família, principalmente as piavas. Sua pequena boca, voltada para baixo, exige um anzol pequeno, iscado com massa, fruti-nhas, talo de folhas de couve, ou milho verde; exige perícia do pescador para conseguir tirá-la da água.

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A ocorrência, porém, logo se espalhou entre os pirangueiros, tornando-se mote na comunidade, até chegar ao conhecimento do senador

As barbatanas hialinas, bem desenvolvidas, favore-cem a grande resistência oferecida. Pelo bom desen-volvimento em tanques, facilidade de alimentação e excelente sabor de sua carne, é uma espécie mui-to propícia à criação em tanques ou tanques-rede nos próprios rios. Devido à poluição de nossos rios, atualmente encontra-se extinta nos rios Piracicaba, Mogi-Guaçu e Paraíba. Ihering, em seu raro e exce-lente livro, Da Vida dos Peixes – Ensaios e Cenas de Pescarias (1929), relata um “causo” envolvendo a piapara. Certa ocasião, um senador de alto prestígio solicitou a um pirangueiro, excelente cozinheiro, que lhe preparasse uma piapara, para mostrar à comiti-va que o acompanhava a excelência de sua carne.

O pirangueiro, honrado com a freguesia, buscou no seu viveiro de peixes por uma bela piapara e não a encontrou. Só havia curimbatás. Desesperado por não poder atender ao honroso pedido, preparou um curimbatá com todo capricho, sem a cabeça, pois a falta dos dentes incisivos denunciaria a troca. Pela saborosa peixada, recebeu cumprimentos de toda a comitiva. A ocorrência, porém, logo se espalhou en-tre os pirangueiros, tornando-se mote na comunida-de, até chegar ao conhecimento do senador. Sem se sentir ludibriado, o senador procurou o pirangueiro e o agraciou pela proeza e a grande experiência de transformar um curimbatá numa excelente piapara servida aos presentes.

A piapara do senador

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Piava - Leporinus copelandii

Piava

Também conhecida por piau, da família Anasto-midae, gênero Leporinus, é encontrada em vários rios do Estado e nos Estados vizinhos, sempre representando uma boa porcentagem da popu-lação íctia. Tem coloração prateada, geralmente com duas manchas escuras nas laterais do cor-po, e três manchas nos exemplares mais velhos. O corpo fusiforme e as nadadeiras hialinas de-senvolvidas favorecem a transposição de obstá-culos com mais de 3 metros de altura, além de conseguirem vencer a velocidade de uma lâmina d’água, graças ao grande esforço de suas nada-deiras peitorais e caudal. Como peixe reofílico (de piracema), atinge a velocidade de até 9 km/dia

nos períodos de migração. A espécie fabriei, an-tes copelandi, como as demais, possui oito den-tes cortantes na maxila superior e oito dentes pon-tiagudos na mandíbula, como os roedores, tendo a capacidade de romper linhadas com facilidade para desespero dos pescadores que necessitam usar cabeçalhos de fios de aço em seus anzois para não perdê-los. As fêmeas podem atingir cer-ca de 50 cm e um peso de 1.400 g, e os machos, 40 cm e peso de 800 g. Aos dois anos de idade, os machos já podem reproduzir e as fêmeas, aos três anos. É considerado um peixe prolífico, pois o ovário das fêmeas no estágio final de reprodu-ção pode representar até 15% do peso total, com

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É considerada forrageira para peixes de bom porte, como o dourado, o pintado, o surubim e o jaú, e, pelo mesmo motivo, como excelente isca viva em pindacuema, ou em pedaços, em espinhel

cerca de 95.000 óvulos. Faz parte da categoria conhecida como “peixes-brancos”, de terceira, devido à grande quantidade de espinhas. Exem-plares acima de 35 cm ainda obtêm melhor valor comercial. Entretanto, pelos pescadores ávidos pela emoção da briga oferecida quando ferrada, a piava é valorizada. Com anzol pequeno, mas resistente, e uma chumbada de peso equivalente à força da correnteza, para manter a isca logo abaixo da superfície, pode ser ferrada com iscas variadas, como larvas de insetos, içás (tanajura), pedaços de peixe, coração de boi ou de moela de frango, insetos variados, milho verde ou co-zido e massas de farinha. Na pesca profissional, é pescada com rede de espera, de lance (proi-bida), com tarrafa ou com covos. É considera-da forrageira para peixes de bom porte, como o dourado, o pintado, o surubim e o jaú, e, pelo mesmo motivo, como excelente isca viva em pin-dacuema, ou em pedaços, em espinhel. Respon-de bem aos procedimentos de reprodução por hipofização. Por Godoy (1975), foi observado em um exemplar capturado no rio Mogi-Guaçu um caso de hermafroditismo duplo, contendo na ca-vidade celomática testículos que apresentavam esperma denso sob pressão e dois ovários sem óvulos visíveis, mas com características de pós-desova. O hábito alimentar é variado, sendo um peixe considerado insetívoro, herbívoro, frugívoro e também carnívoro pela ingestão de pequenos peixes ou alevinos; portanto, onívoro. Das sete espécies conhecidas, a Leporinus obtusidens, adequadamente conhecida pelo nome de piavu-çú, é a de maior tamanho, obtendo maior valor comercial. Também é a mais cobiçada pelos pes-cadores pela “briga” que oferece quando ferra-da. Como exemplo de peixe brigador, lembro do ocorrido em um pesqueiro de Araraquara-SP. Um pescador comodamente sentado em seu banqui-

nho teve sua vara com carretilha violentamente arrancada das mãos, depois de dar uma valente ferrada. De várias maneiras foi tentada a recupe-ração da sua vara e respectiva carretilha. Incon-formado, voltou no dia seguinte, com outra vara armada e a linha com três anzóis garateia com boa chumbada. Depois de alguns lances, sentiu que pegara alguma coisa. Com todo o cuidado, recolheu a linha até fazer surgir, na superfície, a vara perdida. Ao recolhê-la, notou que a linha estava puxando. Bem devagar, foi recolhendo-a até fazer chegar à superfície um belo piavuçú, que roubou de suas mãos a estimada vara com sua carretilha.

Recuperação premiada

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Pintado - Pseudoplatystoma corruscans

Pintado

Peixe de couro, da família Pimelodidae, roliço, com cabeça alongada e achatada, seu compri-mento atinge quase 1/3 do comprimento total. Apresenta três pares de barbilhões sensoriais. Dorso acinzentado, laterais claras e parte ven-tral branca. Ao longo do corpo revela pequenas manchas arredondadas escuras, que lhe vale-ram o nome de pintado. É conhecido em outras localidades por diferentes nomes, como surubim, surubim-pintado e piracajiara (do tupi = peixe pin-tado). O Pseudoplatystoma corruscans pode ser considerado esbelto, pois seu comprimento não corresponde ao seu peso, menor que a maioria dos peixes. Nomura (1984) cita um exemplar cap-

turado com espinhel no rio das Velhas, com 1,79 m de comprimento total, 1,03 m de circunferência na região abdominal e 55 kg de peso. Segundo alguns autores, pode atingir mais de 100 kg. É pis-cívoro por excelência e, embora migre por ocasião das piracemas e do maior volume de água, como no rio Piracicaba, não forma cardumes como os peixes de escamas, preferindo remansos. No in-verno, como outros peixes de couro, procura po-ços ao longo do rio. Tem hábitos noturnos e, como “peixe de fundo”, é bastante capturado em espi-nhel. Outra captura frequente é por pindacuema, e mais raramente por “sondá”, ou mesmo rodada. Sua carne é excelente e, por décadas, até como

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Em décadas passadas, por vários anos, ocupou o 2º lugar em volume de pescado em Piracicaba, depois do dourado, segundo Monteiro (1954)

grande atrativo turístico, no restaurante Miran-te à direita do salto do rio Piracicaba era servido o “pintado no espeto”. Em boa parte do século passado, os peixes para esse prato vinham do próprio rio; posteriormente, após 1960, têm outras origens. Em décadas passadas, por vários anos, ocupou o 2º lugar em volume de pescado em Pi-racicaba, depois do dourado, segundo Monteiro (1954). Na parte frontal da boca apresenta uma faixa superior e outra inferior, equivalentes a bei-ços, com milhares de dentículos voltados para o interior, o que lhe dá a garantia de que as presas, uma vez “bocadas”, só para o interior é que po-dem se deslocar, onde são deglutidas por intei-ro. O depoimento de um pescador relata o caso de um pintado do rio Taquari, no Pantanal (MS), com 12 kg, contendo em seu estômago um cas-cudo de cerca de 30 cm, inteiro e em vias de ser digerido. Porém, um dos esporões peitorais tinha perfurado seu estômago e o ferimento já estava em processo de cicatrização. O manejo do pin-tado, depois de pescado, merece toda a atenção devido aos acúleos existentes, um na nadadeira dorsal e um par nas nadadeiras peitorais. Esses acúleos ou ferrões populares constituem o primei-ro raio das respectivas nadadeiras e podem atingir mais de um palmo em exemplares adultos. Além disso, há dois grandes agravantes: possuem ao longo do comprimento, na face posterior, uma sé-rie de serrilhas que favorecem a penetração, mas dilaceram o tecido ao serem retirados; e, recobrin-do esse acúleo, encontra-se um líquido pegajoso cuja composição causa intensa dor. Um dos atos peculiares dos peixes siluriformes é “armar” (abrir) as nadadeiras e dar uma espécie de cabeçada para o lado. Em certa ocasião, um pintado de uns 35 kg, capturado em um espinhel, foi embarcado e posto no fundo do bote. O pescador, descalço, com cada um dos pés ao lado do pescado, gri-

tava ainda de alegria quando soltou um urro de intensa dor. Numa cabeçada do pintado, o ferrão atravessou o pé que se achava ao seu lado. Ar-rancar o acúleo era totalmente impossível. Foi pre-ciso serrá-lo em sua base e ir para a cidade para sofrer uma intervenção cirúrgica. Certa feita, era novembro, chovia muito, o rio “bufava” de cheio, e eu e mais três colegas da ESALQ estávamos em um rancho, no local conhecido por “pedra-bran-ca”, no rio Piracicaba. Durante o dia, ao entarde-cer, instalamos na margem oposta, onde havia muitos pés de ingá com galhos pendentes para o rio, vários pindacuemas, iscados com piavas e cascudos, todos vivos. Com a chuva fina, o vento gelado, cada um em sua cama “trocava conver-sa” sob a luz bruxuleante da lanterna a carbureto. Cerca de meia-noite, o silêncio foi quebrado por um chacoalhar na água. Suspense de todos, olha-res de interrogação, aguardamos alguns minutos em curiosa expectativa. E novamente, com maior vigor e continuamente, compreendemos que algo se debatia na superfície da água. Enfrentando a chuvinha e o vento, abrimos mais a luz da lanter-na de carbureto para enxergar melhor e rumamos para o bote amarrado na margem do rio. Com a lanterna no bico do bote (proa), o Hélio no remo, vagarosamente rumamos para a margem oposta onde algo se debatia. A luz da lanterna mostrou ao longe uma imagem branca balançando sobre a superfície. Trocamos olhares de indagação e, ao nos aproximarmos mais, verificamos que a ima-gem branca observada nada mais era do que a parte ventral de um pintado, com meio corpo fora d’água, pendurado por dois pindacuemas, um cuja isca havia pegado pouco mais abaixo e outro, que também pegou, pouco acima, cada um deles, forçando o pintado de 35 kg a ficar pendurado e se debatendo na superfície d’água. Esta história, embora de pescador, é verídica.

Pesca de farolete

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Piracanjuba - Triurobrycon lundii

Piracanjuba

Ou também piracanjuva, para qualquer pes-cador antigo, era o peixe-rei do rio Piracicaba. Apesar de toda a fama adquirida pelo dourado, e dos grandes peixes como os pintados e os jaús (de mais de 100 kg), quando se falava em sabor, sempre era lembrada de forma absoluta a piracanjuba. Não formava cardume como o dou-rado, mas quando era pescada por um pesca-

dor profissional não ia para a banca de mercado, mas sim para a mesa dos fregueses que tinham encomenda de forma permanente. Atualmen-te é um peixe raro, praticamente extinto no rio. Embora a poluição dessas águas seja sempre apontada como a causadora disso, antes mes-mo da poluição outro fator já contribuía para seu desaparecimento: a destruição da mata ciliar. A

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De coloração prateada geral, tem dorso mais escuro e a parte ventral clara. Nas laterais, tons rosados, verdes e azuis. A caudal é típica, cor de vinho tinto com uma faixa central escura

ganância por mais um palmo de terra para plan-tar um pé de cana atingiu não só toda a área lin-deira do rio, mas também a dos seus afluentes. Esse procedimento inconsequente determinou a extinção dos elementos primordiais no regi-me alimentar do peixe: pequenas frutas e inse-tos. Acreditamos ser a destruição da mata ciliar o fator preponderante do desaparecimento da piracanjuba, pelo fato de rios como o Piracica-ba, o Mogi e o Pardo, com águas anteriormente bem pouco poluídas, mas com significativo des-matamento ciliar, também terem sofrido o desa-parecimento do precioso peixe. Ihering em Da Vida dos Peixes (1929), relatava: “Há quem lhe conceda a primazia pelo sabor da carne, porém, seu porte nunca ultrapassa 4 palmos de com-primento com 10 kg de peso”. O mesmo autor atribui a baixa porcentagem da pesca da pira-canjuba, em relação ao dourado “ao fato que este pega facilmente a isca, quando esta lhe agrada, ao passo que a piracanjuba, muito mais arisca e cautelosa, é menos fácil de pescar”. A piracanjuba é um peixe reofílico (de piracema) e tem seu regime alimentar constituído de folhas, flores, frutos e insetos. É prolífica, pois uma fê-mea pesando cerca de 5 kg pode conter nos seus ovários cerca de 900.000 óvulos. O valor porcentual de seus ovários em relação ao peso total é de 12% a 20%, enquanto para os testícu-los dos machos é de 1% a 1,2%. As desovas e fertilização dos óvulos se dão em águas corren-tes, com o rio cheio e a temperatura entre 24 ºC e 30 ºC. Em pesquisas de marcação de peixes, pela Estação de Biologia e Piscicultura de Pi-rassununga, foi constatado que uma piracanju-ba, em sua migração reprodutiva e trófica, pode atingir a velocidade média de 8,9 km/dia. As de-sovas e as fertilizações, ocorrendo quando os rios estão prestes a transbordar, tendem a fazer

com que os ovos já fecundados sejam transpor-tadas pelas correntes até as lagoas marginais, onde terão uma temperatura mais amena e pro-pícia ao desenvolvimento do embrião, livres de predadores (principalmente lambaris e larvas). Em meio à abundante vegetação, encontrarão ricos trechos de fito e zooplâncton, para garan-tia de sua sobrevivência até se tornarem juve-nis, quando regressarão ao rio. Sua classifica-ção científica é Triurobrycon lundii, do grego, em que etimologicamente significa tri = três; uro = cauda; brycon = morder, devorar com barulho. A tríade refere-se à característica de três pon-tas na nadadeira caudal. De coloração prateada geral, tem dorso mais escuro e a parte ventral clara. Nas laterais, tons rosados, verdes e azuis. A caudal é típica, cor de vinho tinto com uma fai-xa central escura. Uma fêmea adulta, com cerca de 80 cm, pode pesar 8,5 kg. De acordo com registro da Estação de Biologia e Piscicultura de Pirassununga, de um total de 19.519 peixes es-tudados no rio Mogi-Guaçu, entre 1938 e 1949, somente 83 eram piracanjubas, o que revela sua baixa proporcionalidade frente às demais espécies naturais do rio. Entre os pescadores profissionais do rio Piracicaba, especialistas na pesca de piracanjuba, havia quase uma obriga-toriedade: a criação da fétida barata cascuda. Em caixotes conhecidos como “de querosene” (por serem usados para o transporte de 2 latas de querosene com 18 litros cada) e um tampo com boa vedação, tendo à frente uma tela fina ou mesmo um pano para evitar fugas e dar ven-tilação, criavam as baratas em meio formado por folhas secas, pedaços de mandioca, pão seco, farinha de milho e outros elementos. De vez em quando, borrifavam um pouco de água para manter um certo grau de umidade. Obtida uma “muda”, composta de uma dezena das pe-

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quenas (ainda sem asas) ou uma meia dúzia de adultas, era só jogar no interior do caixão e espe-rar umas semanas para começar a retirá-las. A barata cascuda se constitui, inexplicavelmente, na principal isca para pescar a piracanjuba, de natureza muito esperta e arisca. Qualquer ruído no barranco, se o pescador estiver nele, ou no bote, será motivo para afugentar o peixe. Como “pega” na isca delicadamente, e a isca também é muito delicada, como um pequeno fruto ou in-seto, há necessidade de toda sensibilidade por parte do pescador para notar que tem peixe na linha. Para isso, usa uma vara fina e bem branda, de ponta bem afilada, para sentir o menor toque ou notar na ponta da vara um leve movimento. Precisa ainda de todo o cuidado para dar a fer-rada. A piracanjuba, já pela espécie de alimen-tos que consome, possui a estrutura da boca muito delicada. Uma ferrada muito forte provo-ca a ruptura dos tecidos e a fuga do peixe. Por essa razão, é comum a captura de exemplares cegos de um olho, ocasionada por uma ferrada mal executada. Os pescadores, acostumados a pescar piracanjuba no rio Piracicaba, sabiam os lugares, além daqueles com árvores frutíferas, onde elas mais gostavam de estar. Entre esses, um lugar muito disputado ficava abaixo do sal-to, em frente ao palacete da Fábrica Boyes, cujo terreno chegava até o rio, todo arborizado. O rio, com boa correnteza, escondia a uns 8 metros da margem uma grande pedra que era alcançada pelo pescador. Invariavelmente, sempre que lá estava um pescador, de cócoras na margem, es-tava o conhecido Quinzinho, sem nenhum afazer exceto conseguir “emprestar” do pescador uma piracanjuba para ir vendê-la a uma freguesia já bem conhecida e ganhar uns trocados resultan-tes da diferença do preço entre a venda e o co-brado pelo pescador. Para chegar até a pedra,

o pescador precisava atravessar a “vau” (com água até a cintura) a forte correnteza e os me-tros já citados. Como pescava com a isca predi-leta, ainda na margem, delicadamente como era necessário, já iscava o anzol da vara. Como a isca (a barata) era muito frágil, podendo ser per-dida com o contínuo lançamento na correnteza, para não precisar voltar à margem para pegar outra barata, já levava algumas na boca, presas pela pressão das gengivas sem dentes. Certa ocasião, lá estava o pescador lançando a isca na corrente d’água, e o Quinzinho, ansioso pelo sucesso do pescador e dos trocados que iriam garantir seu almoço, quando, repentinamente, um forte pé-de-vento agitou violentamente todo o maciço de altas árvores, quando o tronco já seco de uma delas, com uma ponta que se er-guia para o céu, desabou atingindo exatamente a cabeça do Quinzinho, que assim morreu com a esperança de ter mais uma piracanjuba para vender e ganhar seu dinheiro. Pouco acima da barranca, uma santa cruz, por muitos anos, “velou” a sua alma. Marcava a existência de uma vida que se extinguiu pela esperança de negociar uma piracanjuba. Alguns pescadores afirmam existir uma variedade conhecida pelo nome de “piracanjuba arrepiada”. O nome é dado devido ao fato de as escamas do peixe, geralmente fêmeas de maior porte, se encon-trarem arrepiadas, isto é, como se as esca-mas, estivessem parcialmente deslocadas. Técnicos não encontraram uma justificativa para o fato. Como, muitas vezes, a pesca de uma “arrepiada” se dá pela ocasião da pira-cema, e as fêmeas, quando capturadas, estão prestes a desovar ou já estão desovando, sur-giu a crença comum entre velhos pescadores que o arrepiado do peixe era para abrigar o produto da desova!!!...

Os pescadores, acostumados a pescar piracanjuba no rio Piracicaba, sabiam os lugares, além daqueles com árvores frutíferas, onde elas mais gostavam de estar. Entre esses, um lugar muito disputado ficava abaixo do salto, em frente ao palacete da Fábrica Boyes, cujo terreno chegava até o rio, todo arborizado

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Com as baratas entre os dentes

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Tamboatá - Callichthys callichthys

Tamboatá

Também conhecido popularmente pelos nomes de tamoatá, tambuatá ou tamatá, pertence à família Calicticidae e tem por nome científico Callichthys calli-chthys, a que pertencem também as corridoras, bem conhecidas pelos aquariofilistas. De maior tamanho, pois chega a atingir 20 cm de comprimento, tem o corpo inteiramente coberto por placas ósseas, ver-ticais, imbricadas, o que lhe confere uma aparência invulgar. Por essa má aparência, raramente é encon-trado à venda, embora pescadores afirmarem que sua sopa é saborosa, mas precisa estar inteiro (com as vísceras), o que lhe confere um sabor especial.

Para reproduzir, primeiramente o macho acumula na superfície d’água detritos vegetais com os quais for-ma um pequeno ninho. A fêmea projeta seus óvulos contra a superfície inferior, onde são imediatamente fertilizados pelo macho. O ninho é protegido pelo ca-sal, não só do ataque de predadores, como também ao reconduzirem ao ninho os ovos que eventualmente se soltarem. As larvas nascidas são protegidas pelos pais durante todo o período em que estiverem com o saco vitelino, no período pós-larva. Uma característica bem conhecida pelos pescadores é a sua resistência fora d’água e sua capacidade de se deslocar quan-

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A ocorrência também era conhecida por “piracema-terrestre”, embora piracema esteja vinculada à motivação reprodutiva, e esta, à questão da água

do seca a água da lagoa ou o lodaçal onde estão. Nossos índios tinham conhecimento desse fato, e até lhe davam o nome de piracurururá, que significa o ca-minho “por terra” feito pelo peixe. A ocorrência tam-bém era conhecida por “piracema-terrestre”, embora piracema esteja vinculada à motivação reprodutiva, e esta, à questão da água. Segundo alguns, esses deslocamentos podem atingir até alguns quilômetros, e se dão em direção a locais onde exista água. Como se orientam favoravelmente para atingir esse objetivo é um mistério... A forte camada de placas que reco-bre o corpo facilita a “caminhada”, mesmo através do mato. Os fortes esporões que guarnecem o par das nadadeiras peitorais, como verdadeiros remos, garantem o deslocamento. A esse respeito, é conhe-cido no nordeste, um velho provérbio: “Tambuatá não emperra... Anda na água e na terra”. Também é do co-nhecimento de antigos caçadores e pescadores uma história a respeito, ocorrida no interior do Estado. Cer-ta ocasião, um experiente caçador chamado Rineu, pegou seu cachorro caçador, sua espingarda calibre 24, o embornal, e foi tentar matar umas perdizes numa pradaria existente na entrada da pequena cidade. Pu-xado pelo perdigueiro, de nome “Boite”, chegou ao local. Desatrelou o companheiro e deu-lhe a ordem “Vamo, Boite”. O cão saiu em disparada, “varrendo” todo o terreno uma vez para a esquerda, outra para a direita, sob o incentivo do seu Rineu, “Vamo Boite”. Depois de horas, já meio cansado, sem caçar nada, notou o Boite parado perto de uma macega mais alta, estático, perna esquerda da frente (mão) levantada, rabo seguindo a linha do corpo, enrijecido. E o Ri-neu logo exclamou: “Até que enfim apareceu uma!”. Cautelosamente chegou a uns três metros do Boite, levantou o gatilho da espingarda, afastou os pés para ter firmeza e ordenou: “Vamo Boite”. E o cachorro não saiu. Com voz mais alta repetiu: “Vamo Boite”. E o cachorro, como uma pedra, não saiu. Já gritando e nervoso repetiu a ordem e o Boite, começou a ganir e

olhar para o dono. O Rineu, com sua experiência, pe-gou um cartucho com chumbo “Paula Souza” e deva-gar foi se achegando da macega que o Boite, de olhar fixo, estava mirando. O burburinho no mato já dava para ser ouvido e predizer que era uma cascavel. A um metro da macega, por entre a vegetação, com o dedo no gatilho, uma grande surpresa: um amontoa-do de peixes varando a vegetação. Estupefato com o achado se perguntava: como era isso possível se na imensa pradaria só ele estava ali??!!... Acarician-do o Boite, como se desculpando da sua braveza, foi “enfieirando” os peixes num cordel do embornal, ainda incrédulo com o acontecido, de a caçada ter se transformado em pescaria. Ao chegar à cidade foi aquele reboliço. Todos queriam saber como, com a espingarda ainda nas costas, uma mão segurando o Boite, na outra sustentando uma fieira com uns vinte peixes ainda vivos, conseguira tal façanha. Por cada casa que passava era obrigado a contar a mesma história, ante a incredulidade e os olhares descon-fiados dos ouvintes. O fato tomou conta da cidade, virou chacota, pois era só sair de casa, que as per-guntas vinham de todo o lado. “Vai pescar hoje? Não se esqueça de levar o Boite”, ou “Como conseguiu transformar a espingarda em vara de pescar?”, ou ainda, “Hoje vai caçar para trazer peixe?”... Por não ter nenhuma testemunha, com medo de retornar ao local e não encontrar peixes, sofreu por certo tempo com as perguntas maldosas, até que um dia, resol-veu enfrentar o desafio de provar que dissera a ver-dade. E, na companhia do Boite e uma de uma de-zena de moradores, foi percorrer o terreno. Depois de algum tempo, depois de levantar três perdizes, o Boite “amarrou” e não cumpriu a ordem: “Vamo Boite”. Para alegria dele e grande admiração dos presentes, encontraram uma dezena de tamboatás procurando caminhar pela vegetação. O Rineu ajo-elhou-se, pegou o Boite pela cabeça, e a beijou em agradecimento por ter-lhe salvo a reputação.

Pesca inusitada

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Traíra - Hoplias malabaricus

Traíra

A traíra ou taraíra, como também é conheci-da, pertence à subfamília Erythrinidae e tem por nome científico Hoplias malabaricus. É encon-trada em todo o Brasil como também em vários países sul-americanos, como as Guianas, a Ar-gentina, o Equador, a Venezuela, o Uruguai, o

Peru e a Bolívia. De preferência é encontrada em ambientes lóticos (de águas paradas), mas eventualmente, devido a transbordamentos em lagos e açudes; também pode ser achada em remansos de águas correntes. É um peixe de carne saborosa, muito apreciada em comuni-

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Não tinha nenhum apetrecho de pesca, como vara, linha, anzol, e muito menos isca. Com um pequeno galho, improvisei uma vara, usando um pedaço de barbante e um pedaço de pano vermelho, para imitar uma presa ou isca

dades de baixa renda, devido ao seu baixo va-lor comercial. Sua baixa cotação no mercado é devida à quantidade de suas espinhas, “em forma de y”, finas e, dessa forma, é um alimen-to desagradável e mesmo perigosa. Dos 615 ossos que compõem seu esqueleto, 100 são em forma de y, incrustados na massa muscu-lar (Godoy, 1935). Os casais formam-se a partir de julho, quando, depois do local escolhido, geralmente na beira de um lago com 25 a 30 cm de profundidade, limpam um espaço com cerca de 60 a 70 cm de diâmetro, cavando no meio uma pequena depressão. Assim está instalado o centro do território do casal, que é defendido vigorosamente. A desova ocorre ge-ralmente de novembro a março e é parcelada, isto é, de 2.500 a 3.000 óvulos por vez, a cada 15 dias, totalizando de 25.000 a 30.000 óvulos. A cada desova, o macho nada por cima dos óvulos, ejaculando o esperma. Após quatro dias de incubação, dá-se a eclosão. Durante esse período, o macho periodicamente sobre-nada vagarosamente a desova, agitando mais as nadadeiras para afastar todos os detritos e também para promover uma maior oxigenação aos ovos. As larvas conservam a vesícula por uns dez dias, quando começam a nadar livre-mente, sob a proteção do macho. Durante todo esse período, a proteção aos ovos e às larvas é rigorosa, não só em relação a peixes, prin-cipalmente lambaris, mas também a qualquer animal que se aproxime. Há casos registrados de banhistas descalços sofrerem ferimentos de certa gravidade devido à numerosa e afiada dentição da espécie. Uma fêmea adulta pode atingir até dois palmos de comprimento, com cerca de 2,5 kg, e os machos, 2 kg. Após a per-da da vesícula, a larva adota o regime planc-tônico, primeiro fito e depois zoo, até atingir

cerca de 12 cm. Após esse período, o regime é insetívoro até atingir 15 cm, quando passa para o regime predominantemente piscívoro, pois basta qualquer ser de pequeno tamanho se agitar na superfície d’água para a traíra apa-recer. Se for muito grande, só espreita, se for pequeno (pássaro, rã, cobra, lagartixas etc.) vira refeição. Certa feita, estava acampado à margem de um lago, quando verifiquei que ele estava bem “povoado” com traíras. Não tinha nenhum apetrecho de pesca, como vara, linha, anzol, e muito menos isca. Com um pequeno galho, improvisei uma vara, usando um pedaço de barbante e um pedaço de pano vermelho, para imitar uma presa ou isca. Com a ponta da vara, agitava a água para “provocar” a curio-sidade da traíra. A seguir, soltando a linha, ou melhor, o barbante, fazia a isca, ou melhor, o pequeno pedaço de pano vermelho, “dançar” na superfície da água. Assim que a traíra ata-cava a isca, ou melhor, o pano, num rápido pu-xão era puxada e atirada longe. Outra tentativa, só seis a oito metros adiante, em território de outro exemplar. Fausto Lex (1941), em O Pes-cador Brasileiro relata o seguinte: “Para pes-car a traíra é preciso fazer muito barulho com o caniço, o que lhe provoca a ira e a faz inchar e se atirar sofregamente à isca”. Em tese de doutorado, Paiva (1983), com exemplares de traíras oriundas de açudes nordestinos, verifi-cou a influência da salinidade das águas devi-do a efeitos da evaporação sobre os óvulos, os ovos, as larvas, os alevinos, quando submeti-dos a significativas variações dessa condição. Esses mesmos efeitos naturalmente também devem ocorrer com a poluição do rio Piraci-caba, influindo na disseminação da espécie. Paiva também determinou que, nas primeiras fases de vida, as fêmeas apresentam tamanho

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Pesca no pano vermelho

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e peso pouco maior que os machos, mas, com o correr dos anos, os machos superam com significativa diferença o tamanho e o peso das fêmeas, ocorrência rara entre os peixes fluviais. Entre os pescadores e técnicos em piscicultura, é bem conhecido o fato da grande resistência da traíra quando fora d’água. Sempre é lem-brado que em lagos e açudes, depois de per-derem totalmente a água por várias semanas, surgem traíras quando eles tornam a se encher. Permanecem vivas, enterradas na lama, abaixo da crosta de sedimentos, cobrindo a superfície do lago seco. Magalhães (1931) também cita esse fato, que ocorre no sul do Brasil durante o inverno, para se protegerem do frio. Outra ca-racterística que protege a traíra em situações críticas é o muco que cobre inteiramente o seu corpo, transudado de poros situados abaixo das escamas. Segundo Magalhães, “é o pei-xe mais liso de nossos rios”. Essa caracterís-tica já é uma importante proteção, pois, uma vez fisgada, a traíra escapa facilmente das mãos do pescador desprevenido. Esse mes-mo muco, além de atuar como termorregulador corporal, em períodos de extrema exposição ao sol, por ocasião de vazantes, seca como uma superfície de verniz, protegendo o peixe contra a dessecação das partes interiores, de acordo com Paiva (1983). Confirmando essas valiosas observações, certa ocasião, depois de pescar numa lagoa, três traíras foram “enfiei-radas” num pequeno ramo e penduradas num galho de arbusto. Expostas ao sol, depois de algumas horas, foram encontradas inteiramen-te rígidas e secas. Para que retomassem um aspecto natural, foram deixadas na beirada da lagoa a menos de um palmo de profundidade. Ao voltar para pegá-las, algum tempo depois, ainda tive a oportunidade de ver a última delas

fugindo, com a minha aproximação. Fausto Lex (1941), em seu precioso livreto sobre pesca Vamos pescar ... e trazer peixe, cita o fato de trabalhadores de uma rodovia, com enxadão, “pescarem” muitas traíras enterradas na lama, em hibernação, como fazem sapos e lagartos.

Pesca no enxadão

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do Rio Piracicaba (1979-1980)Ictiologia

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Desde muitas décadas, Piracicaba é conheci-da (e afamada) pela piscosidade de seu rio. Não só o número de espécies, mas também seu volu-me sempre constituíram um grande atrativo para pescadores provenientes de distantes regiões que, por lazer ou mesmo para sua subsistência, ainda afluem à cidade, principalmente durante o período da piracema. O salto, com suas águas borbulhantes, revela como estrelas cadentes seus peixes que, em saltos magistrais, procuram ven-cer a impetuosidade da corrente. E, aos milhares ou milhões, procuram atingir águas de maior salu-bridade para garantir o desígnio da própria vida,

a perpetuação da espécie. Como representante do Instituto de Pesca de São Paulo junto ao CENA (Centro de Energia Nuclear na Agricultura), para o desenvolvimento de assuntos relativos ao meio hídrico (o rio e seus peixes), sempre me ques-tionava: “Quantas espécies de peixes estariam presentes?...” Para tanto, em paciente pesquisa bibliográfica, foi obtida uma listagem da fauna íctia original do rio, praticamente a mesma do rio Tietê. Pela obrigatoriedade do meu serviço junto ao CENA, de ter de transitar quatro vezes por dia (ainda não existia o Parque da Rua do Porto) pela rua do Porto, tinha a oportunidade de verificar as espécies de peixes de pescadores profissionais e amadores e assim, ao longo de 1979 e 1980, a sua ocorrência. Esse levantamento levou o mé-rito de representar o pescado da pesca de bar-ranco (com vara), da linha de mão, do sondá (ou sondar), do espinhel, do pindacuema, da rede de espera e da rodada. Dificilmente um projeto com bases mais técnicas conseguiria obter uma varia-bilidade tão grande, pois, dependendo do tipo de pesca, também teremos a variação do pescado. Do levantamento resultou o seguinte:

Espécies permanentes: 16 - Sigla (P)Temporárias ou quase extintas: 53 - Sigla (T)Espécies extintas: 33 - Sigla (E)Introduzidas: 3 - Sigla (I)No levantamento também foram registrados os

nomes populares e os regimes alimentares das espécies. Embora esse levantamento já tenha 30 anos, sob o ponto de vista ecológico e ambiental constitui um parâmetro valioso não só para o con-fronto atual da permanência ou não de espécies, como também para uma avaliação futura, caso algum especialista se proponha a fazer um levan-tamento íctio, da mesma maneira que o já efetua-do. Foi conservada a nomenclatura científica das espécies vigentes na época.

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1 – Subordem CHARACOIDEI:Família Characidae:Aphyocarax dificillis – piquirão – insetívoro e planctófago – (T)

Cheirodon piaba – piquira – (T)Aphyocheirodon hemigranus – piquira – (T) planctófagoOdontostilbe microcephala – piquira (T)

Holoshestes heterodon – piquira – (T)

Astyanax bimaculatus – lambari-do-rabo-amarelo – (P)Astyanax lacustris – lambari, tambiú – (P)Astyanax fasciatus – lambari – (P) insetívoro e frugívoroAstyanax shubarti – lambari-do-rabo-amarelo – (P)Astyanax scabripinnis – lambari – (P)Astyanax trierythropterus – lambari-da-nadadeira-vermelha – (P)

Bryconamericus stramineus – piquira – (E) planctófago Piabina argentea – piquira – (T) Acestrorhynchus falcatus – peixe-cachorro – (T)Paraligosarcus pintoi – (T) piscívoroCynopotamus humeralis – peixe-cadela – (T)

Serrasalmus rhombeus – piranha-vermelha – (T) carnívoroSerrasalmus marginatus – piranha-branca – (P)

Colossoma mitrei – pacu-caranha – (E) Myloplus asterias – pacu-prata – (E) frugívoroTriurobrycon lundii – piracanjuba – (E)

Salminus maxillosus – dourado – (E) Salminus hilarii – tabarana – (E) carnívoro

O salto, com suas águas borbulhantes, revela como estrelas cadentes seus peixes que, em saltos magistrais, procuram vencer a impetuosidade da corrente

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Família Anostomidae:Leporinus striatus – canivete – insetívoro – (T)Leporinus fasciatus – ferreirinha, piava – insetívoro e frugívoro – (E)Leporinus octofasciatus – ferreirinha – onívoro – (E)Leporinus elongatus – piapara – frugívoro – (E)Leporinus lacustres – piava-de-lagoa – onívoro – (E)

Leporinus copelandii – piava – (T) Insetívoro e frugívoroLeporellus vitatus – solteira – (T)

Leporellus retropinis – (E) insetívoroSchizodon nasutus – taguara – (T)

Família Parodontidae:Paradon tortuosus – canivete – (P) Apareiodon afinis – canivete – (T)Apareiodon ibitiensis – canivete – (E)Apareiodon mogiguaçuensis – canivete – (P) Insetívoro e algívoroCharacidium gomesi – canivete – (T)Characidium fasciatus – canivete – (T)

Família Curimatidae:Curimatus gilberti – saguiru – (T)Curimatus elegans – saguiru – (T) limnófagoCurimatus plumbeus – saguiru-do-rabo-vermelho – (T)

Família Prochilodontidae:Prochilodus scrofa – curimbatá – (T) limnófagoProchilodus vimboides – curimbatá-de-lagoa – (E)

Família Erythrinidae:Hoplias malabaricus – traíra – (T) carnívoroHoplias lacerdae – trairão – (E)

2. Subordem GYMNOTOIDEI:Família Gymnotidae:Gymnotus carapus – tuvira – carnívoro – (T)

“Quantas espécies de peixes estariam presentes?...”

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Família Ramphichthydae:Eigenmannia virescens – tuvira – (T) planctófago e carnívoroSternodigus macrurus – tuvira – (E)

Família Sternarchidae:Sternarchus brasiliensis – tuvira – (E) planctófago e carnívoroSternarhorhymphus hahni – tuvira – (E)

3. Subordem SILUROIDEI:A) Familia Pimelodidae:Paulicea luetkeni – jaú – (E) piscívoroSteindachnerido parahybae – surubim (E)Pseudoplatystoma corruscans – pintado (T)

Pimelodus maculatus – mandi-guassu / mandi-amarelo – (P)Pimelodella lasristriga – mandi-chorão – (P)Bergiaria westermani – mandi-branco – (T)Iheringichthys labrosus – mandi-branco – (T)Rhandia hilarii – bagre – (P)Rhandia sapo – peixe-sapo – (T)Nannorhandia schubarti – bagrinho – (P) piscívoro e carnívoroImparfinis piperatus – mandizinho – (P)Chasmocranus brevior – mandizinho – (P)Caecorhandella brasiliensis – mandizinho – (T)Pseudopimelodus raninus – peixe-sapo – (T)Pseudopimelodus zungaro – (T)

B) Família TrachycorystidaeGlanidium cesarpintoi – filhote-de-jaú – (T) piscívoroTrachycorygthys galeatus – cangati – (E)

C) Família DoradidaeRhinodoras dorbignyi – mandi-serra – carnívoro - (T)

D) Família CetopsidaePseudocetopsis gobioidis – limboso – carnívoro (T)

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E) Família Pygidiidae Paragtegophilus maculatus – bicho-do-dourado, piolho-de-peixe – hematófago – (E)Pygidium brasiliensi – (T)Trhichomycterus proaps – (E)Pseudosteophilus scarificator – (E)Paravandellia oxyptera – (E)

F) Família LoricariidaePlecostomus tietensis – cascudo (T)Plecostomus regani – cascudo – (T) Plecostomus albopunctatus - cascudo – (T)Plecostomus margaritifer – cascudo – (T)Plecostomus paulinus – cascudo – (T)Plecostomus strigaticeps - cascudo – (T)Plecostomus hermani – cascudo – (T)Plecostomus macrops – cascudo – (T)Plecostomus ancistroides – cascudo – (T) limnófago e algiófagoPlecostomus varicatus – cascudo – (E)Plecostomus auroguttatus – cascudo – (E) Plecostomus alatus – cascudo – (T)Plecostomus brevis – cascudo – (T)Plecostomus ihering – cascudo – (T)Plecostomus latirostris – cascudo – (T)Plecostomus plecostomus – cascudo – (T)Ancistrus stigmaticus – cascudo-barbadinho – (E)Pterygoplichthys aculeatus – cascudo-espinho – (E)Microlepidogaster bourguvi – cascudo – (T)Loricaria macrodon – cascudo-viola – (T)Loricaria latirostris – cascudo-espada – (E) Rhinelepis aspera – cascudo-preto – (T)

G) Família CallichthyidaeCorydoras microps – corridora – (E)

4. Subordem CYPRINODONTOIDEIFamília PoeciliidaePhalloceros caudimaculatus – barrigudinho, guaru-guaru – (P) insetívoroPhallocerus jucundus – (T)

Pela obrigatoriedade do meu serviço junto ao CENA, de ter de transitar quatro vezes por dia (ainda não existia o Parque da Rua do Porto) pela rua do Porto, tinha a oportunidade de verificar as espécies de peixes de pescadores profissionais e amadores e assim, ao longo de 1979 e 1980, a sua ocorrência

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5. Sub-=ordem SYMBRANCHIFORMESFamília SymbranchidaeSymbranchus marmoratus – mussum – carnívoro – (T)

6. Subordem PERCOIDEIFamília CichlidaeCrenicihla lacustris – joaninha – (E) carnívoroGeophagus brasiliensis – acará – (P)

7. Espécies introduzidasPoecilia reticulatus – lebiste – insetívoro – (P)Callichthys callichthys – tamboatá ou caborja – carnívoro – (T)Tilapia rendalli – tilápia-comum – herbívoro – (P)

RESUMO6 ordens19 famílias105 espécies Este levantamento consta do verbete “Ictiologia do rio Piracicaba”, de minha autoria, publicado na Enciclopédia Agrícola Brasileira, Vol. 4, p. 29-31, 2002.

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Capítulo IV

e LegislaçãoPesca

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De acordo com a nossa Constituição Federal, em seu artigo 24, a competência para legislar sobre a atividade pesqueira caberá à União, aos Estados e ao Distrito Federal e, em alguns casos específicos, aos municípios. A multiplici-dade de órgãos abrangida por esta atribuição é centrada no Código de Pesca (lei federal), em leis de crimes ambientais e em portarias com-plementares do IBAMA – Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Reno-

váveis. Vários Estados brasileiros editaram legis-lação específica sobre a matéria, como também criaram unidades de fiscalização e repressão às atividades pesqueiras e inclusive de transpor-te e comerciais. Em São Paulo, junto à Polícia Militar, foram criadas Unidades Especializadas no Policiamento Ambiental, conhecidas popular-mente como Polícia Ambiental. De acordo com os dispositivos institucionais, a pesca pode ser praticada visando três objetivos: desportivo, co-mercial e científico, dando origem a três tipos de pescadores: os amadores, os profissionais e os pesquisadores de institutos, devidamente cre-denciados por órgãos oficiais. A cada um deles, na pesca, cabe o uso dos seguintes apetrechos e restrições:

Pescador amador (ou desportivo) – embarca-dos ou não:Apetrechos: linha de mão (sondar), puçá, cani-ço simples ou acoplado a molinetes ou carreti-lha, anzóis simples ou múltiplos, iscas naturais ou artificiais.Restrição: venda de pescado.

Pescador profissional: licença obrigatória.Apetrechos: rede de espera de até 10 m por 2 m (comprimento e altura) com malha igual ou superior a 14 cm entre nós opostos; tarrafa com malha igual ou superior a 8 cm entre nós opostos; espinhéis de cordéis (não metálicos) que atinjam no máximo 1/3 do espaço aquático; rede caça-isca com 10 m por 2 m (comprimento e altura) ), malha com 6 cm entre nós opostos, sendo duas redes por pescador; linha de mão (sondar); caniço simples ou acoplado com carretilha ou molinete; pindacuema sem cabo de aço (de fibra ou náilon); iscas naturais ou artificiais.

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Pesquisador científico:Apetrechos: qualquer tipo dos usuais, desde que sejam imprescindíveis à captura, segundo o interesse das pesquisas.Para todas as classes de pesca é proibida a pesca de lambada (com anzóis múltiplos, sim-ples ou garateias), a rede-de-lance, o uso de explosivos e de substâncias tóxicas orgânicas (como o timbó) ou de origem artificial. No Esta-do de São Paulo (e, portanto, no rio Piracicaba), a pesca é proibida, exceto para fins científicos, a menos de 500 m de saídas de esgotos, a menos de 50 m a jusante e a montante de barragens, a menos de 200 m do final de corredeiras e ca-choeiras, e nos corpos d’água (lagoas) margi-nais. A restrição durante o período da piracema, em nosso Estado, está compreendida entre 1º de novembro e 28 de fevereiro, suscetível de alteração, caso as condições ambientais assim o determinem. A criminalização da pesca, ten-do por base a Lei de Crimes Ambientais, prevê, além de multa pela infração da pesca de exem-plares de tamanho inferior ao permitido ou de espécies preservadas, multa por exemplar pes-cado e mesmo pena de detenção.

Espécie Nome Científico Comprimento Total (cm)

Curimbatá Prochilodus scrofa 30 Piapara Leporinus obtusidens 25Dourado Salminus maxillosus 55 Piau Leoporinus elongatus 30Jaú Paulicea lutknei 80 Piracanjuba Brycon orbignyanus 30Jurupoca Hemisorubim platyrhyncus 30Mandi Pimelodus maculatus 18Pacu Myloplus asterias 40

A restrição durante o período da piracema, em nosso Estado, está compreendida entre 1º de novembro e 28 de fevereiro

Tamanho mínimo de captura para comércio e transporte das espécies mais importantes do rio Piracicaba

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Capítulo V

Rio Piracicaba

Terminologia Pesqueira

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Anzol de esperaArrastãoBate-cu – Ver PromombóBicheiroCabrestarCabrestoCaniveteCevaChasquearChumbadaCincerro

IscaLambadaLócaMalha (rede)MalhagemMosquetãoOvaPatinhoPassaguá – Ver PuçáPegadôPesqueiroPiavaPiauPiava-ussuPiavuçuPindacuemaPoçãoPoitaPonta-de-varaPrancharPromombóPuçáPussaguá – Ver PuçáRabichoRebojoRedeRede de esperaRede de lanceRodadaRufoSamburáSapecar a varaTarrafaTralhaTridenteVara

ColherCorricarCorricoCóvoDe braçoEmalharEncabrestarEncastoarEspinhelGarateiaGiradorSistemas de preparo de iscas

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IscaLambadaLócaMalha (rede)MalhagemMosquetãoOvaPatinhoPassaguá – Ver PuçáPegadôPesqueiroPiavaPiauPiava-ussuPiavuçuPindacuemaPoçãoPoitaPonta-de-varaPrancharPromombóPuçáPussaguá – Ver PuçáRabichoRebojoRedeRede de esperaRede de lanceRodadaRufoSamburáSapecar a varaTarrafaTralhaTridenteVara

O peixe, ao perseguir e abocanhar a isca, é prontamente ferrado. Esse tipo de pesca, embora proveitosa, não traz ao pescador a grande sensação da briga do peixe ao ser ferrado

ANZOL DE ESPERA – vide pindacuema.ARRASTÃO – tipo de pesca proibida. Rede com comprimento e altura adequados ao rio, de malha variável de acordo com a pretensão dos pescadores. É atravessada no rio, em boa extensão de sua largura, e levada pela cor-renteza, com o controle dos pescadores em botes, um em cada extremidade do rio, ou um bote em uma extremidade e uma boia grande na outra. Eventualmente também era usada uma tarrafa, aberta no sentido do comprimen-to do bote e a outra metade debruçada sobre sua borda e, como uma cortina, ia “varrendo” os peixes do rio.BATE–CÚ – vide Promombó.BICHEIRO – utensílio usado na pesca de gran-des peixes. Consta de um cabo com cerca de um metro, tendo na extremidade, encastoado, um grande anzol ou pedaço de varão de aço, com o formato de anzol e ponta bem afiada. Sua grande utilidade é auxiliar o embarque de gran-des peixes no bote, enterrando a ponta afiada no corpo do peixe.CABRESTAR (a vara) – vide cabrestoCABRESTO – artifício feito nas pontas de varas para peixes de grande porte ou grande resistên-cia, para evitar quebras. Uma linha de aço de dez ou doze fios, com cerca de 80 cm, é total-mente encastoada com fios de cobre na parte correspondente à futura alça. Formada a alça, junta-se a parte restante da alça com o restante da linha, encastoando-as à ponta da vara, até o primeiro e o segundo nós. No terceiro segmento, encastoa-se parte na sua metade e, no quarto segmento da vara, conclui-se o encastoamento que pode seguir até um quinto ou sexto, para maior segurança.

CANIVETE – pequenos peixes da família Para-dontidae que, por terem aparência semelhante a um pequeno canivete, receberam esse nome.CÉVA – trecho do rio ou lago, onde periodica-mente são mantidos alimentos para cevar pei-xes. De preferência são locais sem correntes onde são lançados alimentos granulados ou então pequenos galhos com frutos ou espigas de milho verde, amarradas pelas palhas a uma estaca.CHASQUEAR – movimento brusco do pesca-dor, levantando a vara para ferrar o peixe.CHUMBADA – pequeno artefato de chumbo destinado a manter a isca da vara de pesca afundada, ou também auxiliar o afundamento da tarrafa quando lançada, ou manter as redes de espera sobre o leito dos rios ou lagos. Antiga-mente eram feitos artesanalmente com peque-nos talos verdes de folhas de mamão, servindo de moldes, enterrados na areia úmida com um palito no centro. CINCERRO – sinaleiro de lata ou mesmo um pequeno sino, para assinalar a captura de um peixe em um pindacuema, espinhel ou rede.COLHER – apetrecho metálico com formato de colher alongada, contendo um anzol. Usado na pesca de corrico. CORRICAR – praticar a pesca de corrico.CORRICO – sistema de pesca no qual do barco a motor, percorrendo o meio do rio, é lançada uma linha de 20 a 30 metros, contendo na ex-tremidade uma isca artificial, de preferência a conhecida por colher. O peixe, ao perseguir e abocanhar a isca, é prontamente ferrado. Esse tipo de pesca, embora proveitosa, não traz ao pescador a grande sensação da briga do peixe ao ser ferrado.

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COVO – artefato antigamente só feito em talas de bambu amarradas com cipó ou barbante forte. Apresenta uma extremidade com maior diâmetro, com entrada afunilada, a fim de que o peixe, ao atravessá-la, fique aprisionado em seu interior. Na parte posterior, bem afunilada, encontra-se uma abertura de retirada dos pei-xes, protegida por uma pequena tampa do mes-mo material. Atualmente são encontrados covos de arame. São armados próximos à barranca do rio, com a boca voltada a favor da correnteza para aprisionar os peixes subindo o rio. Eventu-almente, para maior atração dos peixes, podem conter em seu interior pedaços de mandioca, de cupim, espigas de milho e frutinhas. DE BRAÇO – tipo de ferrada de peixe, na qual a posição da vara em relação ao nível d’água acha-se em torno de 45º e o pescador, com toda a força dos braços, chasqueia para o alto.EMALHAR – refere-se ao fato de o peixe, ao tentar atravessar as malhas da rede, ficar “ema-lhado”.ENCABRESTAR – ato de fazer cabresto nas varas.ENCASTOAR – operação que tem por fim pro-teger a ponta da vara de pesca, ou o rabicho do anzol, ou ainda a alça do cabresto da vara. É conseguido com o enrolamento compacto de um fio de cobre bem fino.ESPINHEL – corda de vários metros, de acordo com a largura do rio, de grossura e resistência adequada à pesca de mandi, jurupoca e pei-xes de escama, ou para pintado e jaú, destina-do mais à pesca de “peixes de fundo” ou “de couro”. Uma extremidade amarrada na margem (uma estaca ou raiz) e a outra, quase atraves-sando todo o rio, com a poita. Para manter a corda “deitada” sobre o leito, podem ser usa-

das outras poitas intermediárias. Ao longo da corda, com espaçamento variável, de uns 60 cm para mandis ou de 80 cm para pintados ou jaús, são amarrados pequenos cordéis (de 50 a 60 cm para mandis e de 80 a 100 cm para pinta-dos e jaús) com anzóis de tamanho apropria-do à espécie do peixe. Podem ser iscados com minhocuçu, lambaris, cascudinhos, pedaços de peixes maiores. Normalmente, quando destina-dos a peixes maiores, a extremidade da margem leva um cincerro.GARATEIA – anzol com três pontas formado pela junção de três anzóis de igual tamanho, encastoados em posições diferentes feitos ma-nualmente ou fabricados. Uso proibido na pesca de lambada (vide Lambada).GIRADOR – pequena peça metálica aplicada entre o anzol e a linha de aço, ou entre esta e o cabresto da vara, para evitar que a linha de aço, uma vez torcida, forme “cróca” e rebente. Reco-mendado na pesca de pacu.ISCA – atrativo ao peixe aplicado ao anzol. Pode ser produto da natureza, como vermes, insetos, larvas, peixes, frutos ou massas farináceas.LAMBADA – tipo de pesca proibida por lei, de-vido aos cruéis ferimentos causados aos pei-xes, principalmente por ocasião das piracemas, quando estão prestes a gerar milhões de des-cendentes. Consta de um longo e forte cordel que leva na extremidade uma chumbada e um ou mais anzóis tipo tridente (garateia). Arremes-sado o cordel no meio da corrente, aos trancos, vai sendo recolhido com a intenção de que um ou mais anzóis penetrem no dorso ou em outras partes do peixe. Com esse procedimento, gran-de número de exemplares do cardume é ferido mortalmente, sem a captura pelo pescador.

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LÓCA – pequena concavidade ou toca, encon-trada em lajeados ou entre pedras nos rios, onde se refugiam os cascudos.MALHA (rede) – é a distância dos “entrenós” dada em centímetros, de redes e tarrafas.MALHAGEM – refere-se ao tipo de malha de uma rede, ou melhor, à distância dos entrenós da malha.MOSQUETÃO – vide Girador.OVA – ovário de fêmeas prestes a desovar, re-pleto de óvulos.PATINHO – madeira usada, depois de seca, como boia de redes de pesca, antes de surgir a boia de cortiça e isopor. Os pedaços de galhos, com cerca de 10 cm de comprimento e 7 cm ou 8 cm de diâmetro, depois de secos apresen-tam uma perfuração em seu centro, por onde era passado o cordel da parte superior da rede. Esse nome foi originado da flor branca, seme-lhante a um patinho, da árvore também conheci-da por corticeira.PASSAGUÁ – vide Puçá.PEGADÔ – trecho especial do rio que os pesca-dores conhecem como bom para a pesca, prin-cipalmente do dourado.PESQUEIRO – denominação dada a rústicas construções de madeira, sobre certa altura da superfície d’água, ou diretamente sobre o bar-ranco; de acordo com a vontade do proprietário, a denominação pode se estender a construções de alvenaria.PIAU – vide Piava. PIAVA – peixe de porte médio do gênero Lepori-nus, espécie piracicabana friderici. Há cerca de dez espécies nacionais. Devido a suas muitas espinhas tem baixo valor comercial. Muito usa-da em pindacuemas quando pequenas.

PIAVA-USSU – vide Piavuçu.PIAVUÇU – das várias espécies de piavas co-nhecidas, esta, a Leporinus obtusidens, como o próprio nome já indica, é a maior do gêne-ro. Encontrada nos principais rios interiores do Estado. Aos 10 anos de idade atinge 5,5 kg de peso. Cor geral prateada, dorso acinzentado com manchas nas laterais, como as demais.PINDACUEMA – sistema de pesca constante de um forte cordel de 3 a 4 metros, tendo uma extremidade amarrada a um galho pendente so-bre o rio e na outra, de bom tamanho, iscado um peixe de porte médio, vivo, nadando na super-fície d’água.POÇÂO – pequeno trecho do rio, com maior profundidade, onde, no inverno, se refugiam peixes de couro.

Os pedaços de galhos, com cerca de 10 cm de comprimento e 7 cm ou 8 cm de diâmetro, depois de secos apresentam uma perfuração em seu centro, por onde era passado o cordel da parte superior da rede

Apetrechos de pesca

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POITA – pedra pesada com argola para engate, ou mesmo peça metálica usada para diferentes fins. Para “apoitar” barcos no meio do rio, na pesca de sondá, ou para manter esticada a cor-da do espinhel. PONTA-DE-VARA – tipo de ferrada de peixe em que a vara, usada em rodada, após a corrida do peixe, acha-se parcial ou totalmente mergulhada na água e o pescador dá um brusco movimento contrário à corrida do peixe.PRANCHAR – posição que toma o peixe depois de ferrado e, cansado pela luta, se entrega ao pescador. Sinônimo de pranchear.PROMOMBÓ – ou bate-cu – técnica de pescaria que consiste em bater as nádegas fortemente no fundo do bote, para que, com a repercussão den-tro da água, o peixe salte e caia dentro do bote. Para evitar que o salto do peixe ultrapasse a lar-gura do bote, costuma-se abrir um lençol, como uma vela, para o peixe cair dentro do bote.PUÇÁ – semelhante a uma rede de caçar bor-boletas, mas com o tecido, de diferentes tama-nhos, de acordo com o porte das espécies de peixes que se vai captar. Consta de um arco metálico, geralmente circular, de tamanho varia-do, utilizado para retirar o peixe da água, depois de fisgado. Não se presta para peixes de maior porte como surubins ou jaús.PUSSAGUÁ – ver puçá.RABICHO – pequeno pedaço de linha de aço encastoada, com uma alça livre para fixá-la à li-nha de aço da vara e a outra, atravessada na argola do anzol. É essencial em rios com pira-nhas, pacus ou dourados.REBOJO – nome dado ao costume de grandes peixes, principalmente de couro, de atingirem a su-perfície rapidamente e depois mergulharem. Outra

ocasião é observada quando o peixe, depois de fisgado e cansado de lutar, reboja na superfície. REDE – artefato de pesca feito de tecido de malhas, de dimensões (comprimento e altura) variadas. Em décadas passadas eram tecidas com fios de algodão, cânhamo, tucum, linho ou sisal. Atualmente só são encontradas as de fios artificiais. Na parte superior levam as boias, an-teriormente de madeira, chamadas “patinho”, depois de cortiça e agora de isopor. Na parte inferior, ao longo do cordel, levam chumbada que, no passado, eram peças de argila. A ma-lhagem é variada de acordo com as espécies que se pretende pescar e é determinada pela distância entre os nós. A fiscalização estabele-ce as malhagens de acordo com as espécies a serem pescadas, preservando os peixes meno-res ou imaturos, com malhagens maiores. No rio Piracicaba são usadas as redes de espera (ou de barranco) armadas com uma extremidade próxima ao barranco e a outra, distanciada dele e em ângulo com o barranco, para que o peixe penetre no espaço e fique emalhado. A altura e o comprimento variam com os locais onde vão ser armadas. Geralmente são armadas ao en-tardecer e recolhidas na manhã seguinte. As re-des de lance, para a pesca de arrastão, são de maiores dimensões e proibidas por lei.RODADA – tipo de pesca preferencial para o dourado. Com um bote piracicabano tipo “oga”, o piloteiro, sentado no banco da popa, com um remo “à esquerda” ou “à direita”, retarda a velo-cidade do bote, livre na correnteza, orientando-o a pontos mais favoráveis ao encontro dos peixes ou para desviar de pedras ou outros obstáculos. Pode levar um pescador na proa ou no assento do meio do bote. Com pequeno movimento da

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vara, a isca ao sabor da corrente e mais à fren-te do pescador, vai sendo conduzida à “meia- -água” para melhor atrair o peixe. Eventualmen-te pode ferrar outros peixes.REDE DE ESPERA – vide Rede.REDE DE LANCE – vide Rede.RUFO – dobra da rede da periferia da tarrafa, para seu interior, para ensacar o peixe.SAMBURÁ – em décadas passadas, era encon-trado de taquara entrelaçada com cipós. Seu formato lembra uma moringa (um pescoço com a parte inferior arredondada) e tem uma peque-na tampa, presa por um dos lados para não se perder. Geralmente era mantida dentro d’água, com os peixes que iam sendo pescados. Atu-almente são confeccionados com tela metálica, que se distende como sanfona. O nome sam-burá, assim como o conhecimento de seu uso, deve-se aos nossos índios tupis.SAPECAR A VARA – preparar a vara para pes-car. vide Vara.TARRAFA – rede de pesca de formato circular, com diâmetro variado, com cordel com chum-bada em sua periferia e um cordel de vários metros saindo do seu centro, tendo na sua ex-tremidade uma alça para prender no pulso do pescador. Com um especial manejo e a força dos braços, pode ser arremessada a vários me-tros, inteiramente aberta. Ao longo de sua pe-riferia, na parte interior, possui o rufo, formado pela dobra da malha, onde os peixes que não foram emalhados ficam retidos. Pode ser lança-da do barranco, ou com a água até o joelho, ou mesmo de dentro de um bote, exigindo um grande equilíbrio do pescador. Ao cair sobre a superfície d’água, deve estar inteiramente aber-ta para melhor resultado.

TRALHA – nome bastante usado por pescadores, para, genericamente, agrupar todos os utensílios de pesca, como redes, remos, galão de gasolina, almofadas de assento, caixa com anzóis.TRIDENTE – vide Garateia.VARA – embora atualmente se encontrem varas de pescar de diferentes materiais, até de fibra de carbono, há as tradicionais que ainda resistem a toda tecnologia, como a nossa velha conhecida cana-da-índia ou cana-do-reino (Arundo donax). Quando bem escolhida e bem preparada, deve ser leve, flexível, elástica e resistente. Para tanto, precisa ser colhida ainda verde, mas madura, no período da minguante. São cortadas com todo o cuidado para não ferir as fibras do corpo da vara, os brotos que saem dos nós. Após a limpeza, pas-sar sebo de boi em toda sua extensão, deixando uma fina camada, e, a seguir, sapecar em fogo brando (mesmo de alguns jornais) cuidando para não sapecar demais a ponta. Enquanto quente, aproveitar para retificar qualquer tortuosidade. A seguir, deve ser pendurada de pé, com amarrio na ponta e um bom peso no pé. Estará pronta para o uso quando secar (amarelar) fora do sol.

Após a limpeza, passar sebo de boi em toda sua extensão, deixando uma fina camada, e, a seguir, sapecar em fogo brando (mesmo de alguns jornais) cuidando para não sapecar demais a ponta

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Capítulo VI

Seus Trechos

O Rio e

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Como numa via férrea com suas estações, o rio Piracicaba, ao longo dos 111 quilômetros da cidade à sua foz, também tem trechos assina-lados por diversas denominações. Podem ser referentes à sua calha, à correnteza de suas águas, à existência de pedras formando mon-tes ou ilhas, e a “causos” singulares que foram sendo transmitidos ao longo dos anos, de ge-ração a geração de pescadores profissionais, permanecendo até hoje. E eram (e ainda são) tão marcantes que, quando citados por uma ocorrência, a identificação do trecho dispen-sava inteiramente a menção do nome do rio. Graças à piscosidade mais significativa corres-pondente ao trecho do salto até a sua foz, no rio Tietê, a ele nos reportaremos por julgarmos ser de maior interesse ou conhecimento de to-dos. A partir das ilhas do Salto, junto à ponte da Vila Rezende (Irmãos Rebouças), identifica-remos por suas denominações as regiões e os trechos mais significativos.

Ilhas do Salto – Cerca de 50 metros acima da ponte da Vila Rezende (Irmãos Rebouças), tem início um pequeno conjunto de ilhas, generica-mente conhecidas por Ilhas do Salto. A primei-ra, com 6.300 m² recebeu o nome de Ilha dos Namorados. Separada da segunda por um veio d’água, se encontra a Ilha dos Amores, que atin-ge o início da queda do Salto, com 3.600 m², e a menor delas, na altura do Museu da Água, com 1.600 m², conhecida por Ilha da Conceição, devido à outorga dada ao Dr. João Conceição. Essas ilhas, no final do século XIX e início do século XX, constituíram importantes fatores para o maior prestígio da cidade, tanto do ponto de vista turístico como social. Transformaram-se,

juntamente com o salto, num dos recantos mais apreciados pelos habitantes e pelos turistas que aqui chegavam. Essa circunstância foi favoreci-da pela aprovação do pedido de outorga a An-dré Sachs, “por uma das ilhas abaixo da ponte, para instalar um quiosque por 10 anos”, em de-zembro de 1878. O empreendimento, onde eram servidos “alimentos frios e quentes, e bebidas refrigerantes”, tomou tal vulto que passou a ser, em confronto com o próprio salto, um dos locais mais frequentados da cidade. Principalmente nos finais de semana eram realizados saraus e outras atividades sociais, atraindo famílias da classe mais elevada. Através de trilhas e pin-guelas, as ilhas eram inteiramente percorridas. A Gazeta, em 1º de agosto de 1882, entre seus anúncios, publicava:

“Kiosque do André, no Salto.Encontram-se comidas quentes e frias a qual-

quer hora do dia e da noite. Bebidas de diversas qualidades, por preços baratíssimos. Serve-se tudo com prontidão e asseio.”

O consumo era tão grande que obrigou o ci-dadão André Sachs a abrir na margem oposta (provavelmente onde hoje se encontra a Fá-bricas Boyes), uma fábrica de cerveja e refri-gerantes, com água tirada diretamente do rio. Em dezembro de 1885, o engenheiro civil João Frick, vencedor da concorrência para o abaste-cimento de água à cidade, requereu, entre al-guns imóveis necessários à implantação da fu-tura empresa, a cessão da Ilha da Conceição, que tinha sido aforada ao Dr. João Conceição vários anos antes. A fim de garantir a sanida-de da água, na tomada para o abastecimento da cidade, foi aprovada pela edilidade postura proibindo a retirada de água para fins de venda

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em pontos abaixo do Itapeva, na altura da Ilha dos Namorados, como também a lavagem de roupa, de animais ou qualquer outra matéria, no porto que a Câmara mandou abrir acima da foz do Itapeva, no rio Piracicaba, destinado exclusi-vamente para abastecer de água a cidade, com multa de 5$000 (cinco mil réis). A concessão da

Ilha da Conceição à Empresa Hidráulica, como bem público, favoreceu a entrada de pescado-res e curiosos que, através de uma prancha de madeira, dava acesso à Ilha dos Amores, o que causou pública reclamação do Sr. João Frick, pela perigosa passagem, em carta enviada à Gazeta de Piracicaba, em dezembro de 1895.

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Salto – O promontório com cerca de 150 m de largura que constitui o salto de Piracicaba, por “necessidade de ofício” de antigos pescadores profissionais foi segmentado em pequenas par-tes, geralmente ligadas às suas atividades. Eram tão familiares aos antigos pescadores que, mes-mo com a proibição da pesca no salto, para de-sespero do fiscal Geraldo Toledo, mesmo à noi-te era invadido pelos profissionais que, uma vez satisfeitos com a pescaria, se deixavam levar rio abaixo, com sua tarrafa e o saco cheio de peixes para fugirem da apreensão. A façanha constituía um verdadeiro risco de vida. Um conhecimento

só revelado a companheiros e filhos. A partir da margem esquerda e em direção à direita, com o rio a uma vazão de 200 a 250 m³/s , podem ser visualizados os seguintes pontos:25 – entrada para o salto, nome de origem des-conhecida;Banheira – pequena queda d’água com uma poça lembrando uma banheira;Pilão – onde os mandis costumam ficar aprisionados;Cadeia – vão entre as pedras que aprisiona os peixes;Fervedô – onde o refluxo da água lembra a água fervendo;Poço do Tanque – pouco abaixo da queda d’água onde o peixe para a fim de descansar;Pedrão – com grande pedra e poça boa para pescar mandis;Poço Quadrado – próximo à margem direita com poça d’água de forma quadrada;Pesqueirinho – bem próximo à margem, onde se pesca peixe miúdo;Ponta do Mato – na frente do vertedouro do En-genho Central, na ponta da pequena ilha;Seveiro – local onde o peixe para, descansando para tornar a subir;Véu da Noiva – erroneamente é dado este nome à pequena cascata formada com água que abas-tecia o engenho, semelhante a um véu de noiva;Caixão – pequeno veio d’água proveniente de nascentes e desvio da água;Rego do Pisca – rego no final da vegetação da Ilha da Conceição;Descarga do tratamento D’água – logo abaixo do Museu da Água, resultante do tratamento da água, onde, durante a piracema, com pequenas varinhas, pescam-se muitos mandis;Descarga da Boyes – descarga de água residu-ais da Fábrica Boyes;

Caixão

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Povoador – pequena corredeira em frente à Casa do Povoador. Bom para “pegar” cascudinhos;Vai e Vem – trecho onde as águas tomam dire-ções incertas;Poção – em frente ao antigo Clube Regatas, onde normalmente os afogados nas imediações são encontrados pelos bombeiros. É o poço mais fundo (cerca de 8 m) do rio.Trampolim e porto de Areia – onde, por muitos anos, permaneceu uma armação de ferro, com cerca de 6 metros de altura, com um trampolim; e também por muitos anos, ponto de retirada de areia para construções;Rua do Porto – Primeiramente denominada rua da Praia, posteriormente tomou o nome de rua do Porto, pela atracação de barcos das compa-nhias de navegação fluvial. Foi formada por pes-cadores, após a transferência da cidade (então já Freguesia) em 1784, da margem direita para a esquerda, onde foram construindo seus ran-chos, ao longo do rio, para assim comercializar seus peixes para os moradores da povoação. Embora ao longo de toda a extensão recebesse esse nome, era subdividida pelo nome de anti-gos e famosos pescadores, nos seus portos de atracação, como o do Jéco Tiãozinho, do Tidi-garsel, dos irmãos Bico-Fino (Romeu e Sílvio), do Luís Higiário, do Bigu, do Sinésio, do Tanga-rá, alguns ainda vivos;Morato – após a ponte da Nova Piracicaba, onde existia a fazenda de Francisco Morato;Enxofre – fronteiriço ao morro do enxofre, nome dado pela coloração amarelada;Bongue e Poço do Bongue – onde, segundo pescadores, o rio mais cheio emite um ruído semelhante ao de um tambor africano chama-do bongue;

Caixão – local onde certa ocasião, após enchen-te, foi encontrado numa pequena ilha de mesmo nome um caixão de defunto, vazio;Matadouro ou Guamium – onde, na margem direita, existia o antigo matadouro e os peixes, “cevados” com os seus resíduos, eram pesca-dos com iscas de sangue coagulado, tripas, co-ração e massa;Corumbataí – na barra do rio Corumbataí com o Piracicaba;Onda Grande – local onde o rio se alarga com ondas grandes;Ondinhas – local raso, com muitas pedras e pe-quenas ondas;Ilha do Mirim – onde existe uma pequena ilha de pedregulho que surge quando o rio está bai-xo e onde ocorre a Corredeira do Mirim;Marins – onde deságua o ribeirão dos Marins;Laraya – onde existia um rancho de alvenaria do Sr. Laraya, de São Paulo;Scarranari - trecho do rio em que se localiza-va o rancho do Sr. Júlio Scarranari que, mesmo compartilhando essa propriedade com outros donos cotistas, era o mais antigo. Na margem oposta ao rancho, que costumávamos usar, no meio do alto barranco, corria permanentemente água de uma nascente usada por todos os pes-cadores que por ali passavam, pois provinha di-retamente do lençol freático, sem contaminação. Embora o trecho apresentasse dificuldade de abastecimento, devido à forte correnteza, prin-cipalmente quando o rio estava mais cheio, uma telha paulista, das antigas, fincada no barranco, facilitava o serviço, como também uma grossa raiz pendente, que favorecia a estabilização do bote. Em certa ocasião, convidamos um cole-ga de faculdade, o Dinival, para passar um fim

Na margem oposta ao rancho, que costumávamos usar, no meio do alto barranco, corria permanentemente água de uma nascente usada por todos os pescadores que por ali passavam, pois provinha diretamente do lençol freático, sem contaminação

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de semana no rancho. Não afeito a pescarias ou ranchadas, aceitou o convite meio temeroso, pois tinha pavor de pererecas, lagartixas e prin-cipalmente de cobras. Antes de deitar, vasculha-va todos os recantos do rancho para garantir um bom sono. Numa manhã, como precisávamos de água para beber e cozinhar, Dinival prontifi-cou-se a buscar. Embora apreensivo, Hélio, que iria pilotar o bote até a nascente, explicou a ele que, quando encostassem o bote no barranco, ele deveria segurar fortemente na raiz e, com a outra mão, encher o vasilhame. Com gran-de esforço, devido à correnteza, Hélio foi pouco a pouco atingindo a outra margem até encostar o bote no barranco. E começou a gritar: “Segura, se-gura a raiz!”, enquanto com grande esforço com o remo, não deixava o bote se afastar. Dinival, de pé na proa, só apontava para a nascente, e balbuciava um “a...a....a.....” Quanto mais o bico do bote era jogado contra o barranco, mais espavorido gritava.

Vencido pelo grande esforço, Hélio voltou para o rancho e no caminho ia resmungando contra o Di-nival que xingava de “frouxo” e outras coisas. Sen-tado, pálido e de olhar vago, Dinival nada respondia e, ao chegar no rancho, foi crivado de perguntas e criticado pelo insucesso da operação. Restabeleci-do, ante a expectativa de todos, Dinival falou: “Não segurei a raiz porque dentro do buraco da nascente tinha um rolo de cobra!”. Ante o imprevisto, recebeu de todos os presentes as devidas desculpas.Pedra Branca – onde, na margem esquerda, encontra-se um paredão esbranquiçado e com pedras brancas;Manso da Pedra Branca – local largo com man-sa corrente;Ilha da Sepultura – onde, numa pequena ilha, existia uma cruz;Sbrissa – onde existia o rancho do empresário;Quebra-canela – local largo, raso, com lajeado com muitas tocas de cascudos, onde pescado-res esfolavam a canela durante a pesca;Guaçu e Corredeira – rio grande com seu ribeirão;Ferreirinha – nome dado por antigo morador com seu poço;Nhana Borge – possivelmente devido ao nome da antiga moradora;Cabeça-do-negro – certa manhã, Pedro Chiarini, aposentado e aficionado pescador, estava pes-cando de “rodada” quando bateu no seu remo a cabeça de um negro, afogado. Com esforço, conseguiu levar o defunto para a margem direita, sem saber o que fazer. Era cedo para voltar, não tinha conseguido pescar nada, e assim julgou: “Já que o defunto afogado morreu por ‘causo’ da água, nada importa que nela fique mais um boca-do” (palavras do pescador). Tomando uma fieira de amarrar peixe, passou-a em volta do pesco-

Dinival e o rolo de cobra

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ço e amarrou o defunto numa raiz do barranco. Bem mais tarde, de volta à cidade, comunicou à polícia que, no trecho pouco acima da Ilha das flechas, estava amarrado pelo pescoço, no bar-ranco, um “defunto afogado”. Por vários dias pre-cisou ir prestar depoimentos e o trecho ganhou o nome de “cabeça-do-negro”;Ilha das Flechas – onde, em certa ocasião, foram encontradas várias flechas. A erosão as destruiu;Poço do Garcia – o poço mais profundo do rio, bom para pesca de peixe de couro como mandi, pintado e jaú;Tocas – local com muitas tocas com cascudo;Rebaixo – trecho do rio de baixo calado;Corredeira do Manduca – local do rancho do pescador Manduca;Itaperú – trecho com forte correnteza;Canal Torto e Corredeira – onde o rio faz gran-de curva com corredeiras;Ponte de Ferro – onde existe antiga ponte de ferro cujas ferragens foram trazidas da França para a Estrada de Ferro Sorocabana, em Árte-mis (antigo Porto Ferreira);Ártemis (Porto João Alfredo) – importante por-to para a Companhia de Navegação existente desde 1874;Corredeira do Limoeiro – onde havia um antigo pé de limão. É a última corredeira do rio;Araquá – foz do ribeirão;Paredão Samambaia – nome dado pela exis-tência de samambaias no paredão;Paredão Vermelho – onde existe um grande e afamado paredão de coloração vermelha;Poço do Lúcio e do Guerra – um dos últimos poços do rio, com os ranchos dos antigos pes-cadores Lúcio e o Guerra;

Tanquã – Trecho do rio com grande largura, atin-gindo mais de 250 metros. Essa região também é conhecida como “pantanal piracicabano”, já que além de concentrar muitos peixes e outros animais, se destaca por abrigar centenas de es-pécies de aves entre residentes e migratórias, o que o torna em um importante refúgio ecológico que precisa ser melhor conhecido e conserva-do. O Tanquã também abriga uma das últimas colônias de pescadores da região e que assim como a fauna e a flora, também deveria ser re-conhecida e conservada, pois ela agrega valor a cultura pesqueira e faz parte da própria história de Piracicaba.Barreiro Rico – trecho do Tanquã, em sua mar-gem esquerda, correspondente à fazenda Barrei-

Cabeçã de negro

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ro Rico – propriedade da família Magalhães des-de 1926, que tinha originalmente cerca de 8.000 alqueires, dos quais perto de 5.000 foram inunda-dos pela barragem. Do restante, cerca de 2.300 hectares são constituídos de espécies primárias de Mata Atlântica, entre as quais foram identifica-das 351 espécies de aves, especialmente tinamí-deos, dentre eles o macuco (Tinamus solitarius). A mata que margeia o rio foi transformada em RPP – Reserva Pública Privada por seu alto valor representativo da Mata Atlântica.Barra do Piracicaba – desembocadura no rio Tietê (Barragem de Barra Bonita), em sua mar-gem direita, atingindo o rio Piracicaba 177 km e 450 metros de extensão.

De acordo com a experiência de pescadores pro-fissionais, o leito do rio, até Ártemis (por exemplo, Porto João Alfredo) é de pedra (blocos e lajeados). A partir desse trecho, praticamente é de areia. Graças a essa circunstância (não considerando a migração da piracema), o trecho com pedras (até Ártemis) fa-vorece a permanência de peixes algívoros (comedo-res de algas), como cascudos (família Loricaridae) e canivetes (família Parodontidae), por excelência. Na parte final do rio, após Ártemis, o leito de areia, que favorece a sedimentação de resíduos, convida a presença de peixes liminófagos, como o curimba-tá, (família Prochilodidae) e eventualmente, em tre-chos lênticos, peixes planctófagos (comedores de plâncton), como a tuvira (famílias Ramphichthydae e Apteronotidae). Independentemente do fator “leito”, naturalmente o fator “vegetação ciliar” é de capital importância para a permanência de peixes frugívo-ros (comedores de frutas) e insetívoros (comedores de insetos), que constituem a base alimentar dos peixes piscívoros (comedores de peixes).

1- Rua do Porto2- Morato3- Enxofre4- Bongue e Poço5- Caixão6- Matadouro ou Guamium7- Corumbataí8- Onda Grande9- Ondinhas10- Ilha do Mirim11- Marins12- Laraya13- Scarranari14- Pedra Branca15- Manso da Pedra Branca16- Ilha da Sepultura17- Sbrissa 18- Quebra-canela19- Guaçu e Corredeira20- Ferreirinha21- Nhana Borge22- Cabeça-do-negro23- Ilha das Flechas24- Poço do Garcia25- Tocas26- Rebaixo27- Corredeira do Manduca28- Itaperú29- Canal Torto e corredeira30- Ponte de Ferro31- Ártemis (Porto João Alfredo)32- Corredeira do Limoeiro33- Araquá34- Paredão Samambaia35- Paredão Vermelho36- Poço do Lúcio37- Poço do Guerra38- Tanquã39- Barreiro Rico40- Barra do Piracicaba

Trechos do Rio (a partir da Rua do Porto)

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Trechos do Rio Piracicaba

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Capítulo VII

pelo Rio

A luta

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Embora Piracicaba seja o último município da bacia, recebendo dos situados a montante to-dos os seus efluentes, sempre se destacou em defesa do seu rio e dos problemas ambientais da própria bacia. O traçado da cidade, quando da mudança para a margem esquerda do rio, em 1784, de acordo com as coordenadas geo-gráficas, já previa um melhor aproveitamento da radiação solar e uma existência saudável para seus moradores. Em 1883, por aprovação da Câmara, foi instituído o serviço de coleta de lixo na cidade, evitando que fosse jogado em áre-as desabitadas e no rio. Em 1885, mediante Lei

Municipal, foi iniciada a instalação da rede de esgoto nas moradias. A medida foi bastante sa-lutar ao ambiente da pequena população, pois após cinco anos já atendia 412 moradias ao lon-go de uma rede de 2.108 metros de extensão. Em 1913, foi inaugurado um grande crematório de lixo, visando sanar os problemas da acumu-lação do que já era coletado e da sua destina-ção no rio. Em 1942, o engenheiro agrônomo José Vizioli, prefeito de Piracicaba, ciente dos problemas do lançamento dos esgotos comu-nitários no rio, construiu próximo à rua do Por-to (rua Rangel Pestana), um grande biodigestor para tratar grande parte do esgoto da cidade, evitando sua contribuição à poluição já existente no rio. O efluente do sistema apresentava uma redução de mais de 90% do potencial poluente do esgoto original, e o resíduo orgânico (biofer-tilizante) era vendido a baixo preço a horticulto-res e jardineiros que o disputavam por razões econômicas e pela grande fertilidade conferida ao solo. Apresentava, porém, um inconvenien-te: após alguns dias de aplicação, surgia um verdadeiro “tapete” de pés de tomate, oriundos de sementes nas fezes que não perdiam o po-der de germinação, durante o processo de fer-mentação no biodigestor. Esse fato gerou uma ocorrência de grande repercussão na cidade. A praça José Bonifácio se achava em reforma e a terra entre os seus passeios necessitava de uma boa adubação. Para tanto, foi aplicada uma grossa camada de biofertilizante do biodigestor. Como já era previsto, depois de alguns dias, as áreas de terra estavam totalmente cobertas com um verdejante “tomatal”. Entretanto, com uma intrigante diferença: no meio dele um pé de aba-cate!!! O inusitado acontecimento, naturalmente,

O nascimentoinesperado

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favoreceu desencontrados comentários entre os transeuntes do local, como também de outros que, sabedores do “causo”, lá foram expressar sua opinião. Dos pequenos blocos de pesso-as que se formavam, surgiam as mais variadas explicações e justificativas, umas devido a uma simples ocorrência, outras, pela origem das se-mentes, como um comprovante de fenomenal capacidade de um morador!!! A partir da déca-da de 1930, para atender à demanda por cana de dezenas de usinas de açúcar da região, os canaviais foram invadindo paulatinamente áreas ocupadas com cafezais, culturas anuais e inclu-sive, mananciais, tornando o rio um verdadeiro canal de drenagem do alto poluente das usinas: o vinhoto (ou vinhaça). Na ânsia de mais um palmo de terra para mais um pé de cana, nem mesmo a área ciliar do rio e de seus afluentes foi respeitada. A vegetação arbórea retirada influiu diretamente na temperatura do meio hídrico, anulando a importante função termorregulado-ra, o que prejudicou seriamente a cadeia trófica (alimentar) dos peixes frugívoros pelo desapare-cimento de pequenos frutos (pacu e piracanju-ba); de peixes insetívoros (lambari, piava), pela ausência de insetos, e indiretamente de peixes mais nobres e de maior tamanho, como dou-rado, pintado, jaú, pelo desaparecimento dos pequenos peixes forrageiros. A lei que instituiu o Código Florestal, nº 4.771, infelizmente publi-cada só em 1965, favoreceu essa destruição. O Código, ampliado pela Lei 7.511 de 1986, es-tabeleceu as seguintes larguras para as faixas (ciliares) de preservação permanente (FPP): de 30 m para rios com até 10 m de largura, de 50 m para rios com 10 m a 50 m de largura, de 150 m para rios com 100 m a 200 m de largura e de

igual largura para rios com mais de 200 m de largura. De acordo com essa alteração, o nosso rio deveria ter uma FPP em torno de 100 m. Sem contar com o trecho do Tanquã, com várias cen-tenas de metros.

Devido ao agravamento das condições do rio, a CETESB obrigou todas as usinas a construir lagoas para a deposição da vinhaça produzida, evitando seu lançamento no rio. Inicialmente de-ram resultado, mas devido à impermeabilização do solo e à baixa redução do volume somen-te pela evaporação, tornaram-se um problema, obrigando, a cada safra, à construção de novas lagoas. Outro grande inconveniente também era o rompimento de tais lagoas. Com a safra em pleno período de chuvas, era muito comum o rompimento causado (ou mesmo provoca-do) por enxurradas que sempre atingiam o rio pela usual construção em áreas ribeirinhas. O sério problema foi resolvido, entre 1945-1950, pelo professor da ESALQ – Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, Jaime Rocha de Almeida, especialista na área de Tecnologia Rural, quando descobriu que a vinhaça, devi-damente diluída e aplicada proporcionalmente na área de solo, se transformaria em valioso (e econômico) adubo para os canaviais, contra-riando a ideia de décadas passadas que, se lançada ao solo, o esterilizaria. A aplicação da nova tecnologia demorou mais de uma década para o desenvolvimento da melhor metodologia de aplicação nas lavouras, por aspersão ou sul-cos de irrigação. A retirada da vinhaça do rio trouxe mais tranquilidade para a população de Piracicaba, preocupada depois somente com a questão dos esgotos comunitários e industriais na bacia. Essa “pausa”, entretanto, durou até

A aplicação da nova tecnologia demorou mais de uma década para o desenvolvimento da melhor metodologia de aplicação nas lavouras, por aspersão ou sulcos de irrigação

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1966, quando deputados de Piracicaba tiveram conhecimento de obras já iniciadas nas cabe-ceiras dos rios formadores do Piracicaba. Os deputados José Domingos Aldrovandi e Fran-cisco Salgot Castellon denunciaram obras de barragens nos rios Juqueri e Cachoeirinha, por isso denominado Sistema Juqueri que, comple-mentado pelos rios Jaguari, Atibainha e Atibaia, deu origem ao Sistema Cantareira. Para tanto, houve necessidade da constituição de uma companhia de capital misto, para receber vulto-so empréstimo conseguido junto ao organismo internacional BIRD, estando seus representan-tes, já no Brasil, para a assinatura do emprés-timo. Para desespero do governador Abreu So-dré, nossos deputados “trancaram” o processo exigindo explicações sobre as consequências dessas obras para a nossa bacia. O professor Eduardo Riomei Yassuda, secretário de Obras e um dos autores do projeto, foi convocado pela presidência da Câmara para explicações, ga-rantindo que o rio Piracicaba, na altura do clube Regatas, jamais teria vazões inferiores a 60 m³/s e que o desvio para a capital (São Paulo) seria de 30 m³/s. Requisitado para dar explicações diretas à comunidade piracicabana, em setem-bro de 1969, após cansativa explanação sobre o projeto, prometeu a vazão mínima de 40 m³/s (e não mais os 60 m³/s anteriores) com a mes-ma retirada. Após muitas disputas na Câmara Paulista, o projeto foi aprovado com a criação da COMASP – Companhia Municipal de Águas para São Paulo, substituída pela atual SABESP – Companhia de Saneamento Básico do Esta-do de São Paulo. À medida que aumentava a poluição da água do rio, devido ao aumento da população da bacia, e a gradativa redução da

vazão até a conclusão das barragens do Siste-ma Cantareira em 1970, a população piracica-bana foi se conscientizando cada vez mais da necessidade de uma ferrenha luta em defesa do seu rio e de seus peixes. Assim, primeiramente foi criada a ACOPARP – Associação de Combate à Poluição do Rio Piracicaba, que tinha como principal agente incentivador o Dr. Fortunato Losso, diretor do Jornal de Piracicaba. Análises da água eram feitas semanalmente nos labora-tórios da SEMAE, mediante coletas de técnico do Instituto de Pesca, da Secretaria da Agricul-tura (SP). Seus resultados eram enviados a au-toridades municipais e do Estado, a fim de que tivessem consciência do que vinha acontecendo com o rio Piracicaba. Encontros de música eco-lógica (I e II), confecção de cartazes, passeatas, aulas a alunos, principalmente do 1º grau, fo-ram amadurecendo o espírito defensivo pelo rio e sua bacia. Um bom número de associações foi sendo criado, como a COVALPI – Conselho do Desenvolvimento Integrado dos Municípios do Vale de Piracicaba; o PRODEBAP – Progra-ma de Desenvolvimento Regional da Bacia do Piracicaba; o CONDEVAP – Conselho de De-fesa Ecológica do Vale do Piracicaba; o CEPI-VI – Centro de Estudos de Piracicaba Viva que, em cinco seminários no campus da UNIMEP, discutiu amplamente e relatou os problemas da bacia, abordando as áreas de Educação, Meio Ambiente, Legislação, Desenvolvimento tecno-lógico, Cartas Constituintes Municipais, com a presença, por seminário, de mais de duas centenas de pessoas, entre alunos, jornalistas, ambientalistas e convidados. A organização do evento esteve a cargo do Dr. Paulo Afonso Leme Machado, promotor público internacionalmente

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conhecido como mestre em Direito Ambiental. 1979 foi um ano marcante na luta pelo rio. O Clube da Toca, grupo de empresários amantes da espeleologia (pesquisa de cavernas), que já vinha trabalhando há anos contra a poluição do rio, representado pelo empresário Benedito Longo, em contato com o Dr. Hugo Pedro Carra-dore, então presidente do Conselho Coordena-dor das Entidades Civis de Piracicaba, levou ao conhecimento do então prefeito de Piracicaba, o engenheiro agrônomo João Herrmann Neto, a ideia da realização da “Semana de Protesto Pela Morte do Rio Piracicaba”, por ocasião dos 212 anos da fundação de Piracicaba, no dia 1º de agosto de 1979. Prontamente apoiada a ideia, surgiu outra, a da inauguração também da “Pra-ça do Protesto Ecológico”. Na praça em fren-te ao Hotel Beira Rio, com o comparecimento de autoridades e ambientalistas, foi realizada a cerimônia da inauguração, com o fechamento do comércio das 12 às 13 horas. Sobre lápide de mármore confeccionada especialmente, dis-cursaram além do prefeito, várias autoridades e ambientalistas participantes dos movimentos de repúdio. Dezenas de assinaturas, jornais do dia e moedas foram encerradas em nicho especial na lápide. Em sua frente, uma placa de bronze, expressando a dor pela morte do querido rio Pi-racicaba. Em continuidade à semana de protes-to, foi criada pelo Dr. Paulo Afonso Leme Macha-do a Associação Brasileira de Direito do Meio Ambiente. No mesmo dia, o prefeito João Herr-mann, através do então presidente do SEMAE, José Sérgio Guidotti, entrou com uma ação civil pública contra a SABESP e o Sistema Cantarei-ra. Devido à dificuldade de fornecer água com a potabilidade ideal para a população, o prefeito

João Herrmann recorreu a um projeto de capta-ção de água do rio Corumbataí, de menor vazão que o Piracicaba, mas de boa sanidade. Em 1º de setembro ainda do mesmo ano, pescadores da colônia Z-20, à qual pertenciam os nossos pescadores e que, em número a associados, era a segunda do Brasil, depois da de Santos, encaminhou ao governador Paulo Maluf uma so-licitação para anular a portaria que reverteria o rio Piracicaba, da classe de apto para o lazer para a de categoria destinada à captação de esgotos e resíduos industriais. Além dos pro-testos pela injusta classificação, apresentaram razões de ordem social e econômica para os 1.000 associados, que tinham como garantia da sobrevivência 1.000 kg de peixes diariamente, de variadas espécies.

Este marco representa o protestoDe um povo em defesa de um bemQue, dado por Deus foi conspurcadoPelos homens: o Rio PiracicabaÉ o protesto contra a ineficiênciaA incompetência dos órgãos saneadores,Fiscalizadores; a apatia dos governadoresA ganância do poder econômico e,Contra aqueles que de uma forma ou de outraContribuem para poluir o meio ambiente.

1/8/1979 (Dizeres na lápide de inauguração da “Praça do Protesto Ecológico”)

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Capítulo VIII

Ano 2000

Campanha

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Por volta de 1976, a mobilização popular em de-fesa do rio Piracicaba era grande, em razão da sua poluição, da ausência de providências reparado-ras e das consequências já causadas pela retirada dos 33 m³/s (metros cúbicos por segundo) de água da nossa bacia para garantir 55% das ne-cessidades hídricas da RMSP (Região Metropoli-tana de São Paulo). Graças ao estabelecimento de normas pelo Estado, visando convênios de cola-boração científica entre instituições de pesquisa, foram iniciados entendimentos entre o Instituto de Pesca – IP, da Coordenadoria de Pesquisa dos Re-cursos Naturais, da Secretaria da Agricultura – SP e o Centro de Energia Nuclear de Agricultura – CENA, da USP – Universidade de São Paulo. O estabelecimento do convênio, efetuado em 1975, quando era diretor o saudoso professor Dr. Admar Cervelini, deslocou o engenheiro agrônomo e pes-quisador científico, Nelson de Souza Rodrigues, em exercício no Posto Avançado de Piscicultura, do IP, em Pirassununga – SP, para através do Setor de Ecologia do Meio Hídrico, criado especialmen-te no CENA, fossem desenvolvidas tecnologias visando a melhoria das condições do rio Piracica-ba. Como primeira atividade, o Professor Cervelini, preocupado com os níveis de nitrato que eventual-mente estariam presentes nos afluentes do rio, di-reta ou indiretamente provenientes das águas do lençol freático, e consequentemente, no rio, solici-tou ao pesquisador Rodrigues a elaboração de um projeto para verificação de tal fato. Sua execu-ção se desenvolveu por quatro tipos de solos da região, sob diferentes tipos de coberturas: mata, lavoura, pastagem e cana. Através de coletas quinzenais, diretamente de nascentes, durante dois anos, sua análise constatou a gravidade da poluição pelas amostragens, exceto das amostras

de mata, resultando num trabalho inédito e de re-percussão sob o título Nitrate Concentrations in Ground-waters in Piracicaba Region, State of São Paulo, Brazil, apresentado no Coordinated Resear-ch Program Meeting – IAEA, em maio de 1978, em Viena, Áustria, como também no 1º Simpósio Na-cional de Ecologia, sob patrocínio do Instituto de Terras e Cartografia do Paraná, em setembro de 1978. A essa pesquisa seguiram-se outras sob a coordenadoria do mesmo Setor de Ecologia, sem-pre voltadas direta ou indiretamente para proble-mas do rio, com plantas e peixes (lebistes) nele existentes, para avaliar sua capacidade como bio-indicadores. Por solicitação do então diretor do CENA, professor Dr. Enéas Salati, devido à apo-sentadoria do Dr. Cerveline, foi instalado um proje-to visando a capacidade de fitodepuração de plantas flutuantes em águas poluídas. Para estu-dar o problema, foram escolhidas por Rodrigues três plantas: aguapé (Eichornia crassipes), alface d’água (Pistia stratiotes), salvínia (Salvinia sp.) e lemnia (Lemnia minor). As espécies foram dispos-tas em 32 caixas de 1.000 litros cada, com água bombeada do rio durante um ano. A capacidade fitodepuradora das espécies foi sendo determina-da, consagrando o aguapé como o de maior ca-pacidade. Esse bom resultado deu origem ao Pro-jeto Aguapé, com a instalação de um sistema fitodepurador, com água do ribeirão Piracicamirim, afluente do Piracicaba, pelo menos três vezes mais poluído, em projeto de 1.100 m², elaborado e conduzido por Rodrigues, em área da ESALQ, no qual foram obtidas excelentes taxas de redução da poluição hídrica, cerca de 80%, ao qual foi in-corporado outro de solos filtrantes, idealizado pelo professor Salati, aumentando a capacidade des-poluente para cerca de 95%. Graças aos excelen-

As espécies foram dispostas em 32 caixas de 1.000 litros cada, com água bombeada do rio durante um ano. A capacidade fitodepuradora das espécies foi sendo determinada, consagrando o aguapé como o de maior capacidade

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Lixo e morte do Rio Piracicaba

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tes resultados obtidos, o Projeto Aguapé transfor-mou-se no projeto “Humanização da Bacia do Piracicaba” que visava a sua implantação, não só por particulares como também por vários municí-pios da bacia, contribuindo para a despoluição do rio. Para tanto, o Setor de Ecologia do Meio Hídri-co, sob a chefia de Rodrigues, proporcionou está-gios a enviados por usinas do Estado de São Pau-lo e de outros Estados, cursos (de três meses) a

graduandos de Agronomia, Biologia e Ciências Ambientais, além de palestras (ou conferências) em órgãos interessados como CETESB, DAEE, ESALQ, Lions, Rotary, Faculdade de Agronomia de Botucatu, Assembleia de São Paulo e outros. Além dessas atividades, por intermédio do CENA, era prestada assistência técnica a empresas, ten-do por base a fitodepuração por meio do aguapé, primeiramente através de um projeto-piloto, para conclusões preliminares, e depois a implantação do sistema, tendo por base os dados já obtidos. Entre outras assistências, destacamos a Duratex, pela elevada taxa de poluente do efluente e a Usi-na Leão, em Maceió (Alagoas) que, após os bons resultados do piloto, sob orientação de nosso ex-estagiário engº agrº Márcio Martins Rodrigues, instalou o projeto fito-depurador da usina em área de 11.400 m², que recebia 695 l/s da usina e con-seguiu uma redução de 85%, sendo considerada a maior área com sistema fitodepurador com aguapés do país. O município de Brotas, com nos-sa orientação, instalou o sistema fitodepurador com aguapé que, por dois anos, reduziu a polui-ção do rio Jacaré pepira, em mais de 80%, mas infelizmente, por razões políticas, foi desativado. Durante esse período, além de participar de várias manifestações em defesa do rio Piracicaba, Rodri-gues, como representante do CENA junto ao Con-selho Coordenador das Entidades Civis de Piraci-caba, tornou-se também seu assessor técnico. Em razão do alto prestígio do Conselho perante as autoridades públicas, resolveu (1980) enviar ao deputado federal e ministro Antônio Delfim Neto um trabalho intitulado A Problemática da Preserva-ção e Recuperação do Meio Ambiente: Considera-ções e Proposições. O trabalho era constituído por três teses de autoria do engenheiro agrônomo

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Nelson de Souza Rodrigues, do Dr. Paulo Affonso Leme Machado, especialista em Direito Ambien-tal, e o Dr. Paulo Checolli, economista. Infelizmen-te, as exposições e as proposições que envolviam interesses da bacia do Piracicaba não foram con-sideradas e acabaram esquecidas. Com a rees-truturação da Associação de Engenheiros e Enge-nheiros Agrônomos de Piracicaba (AEAP), o engenheiro José Elidiney Pinto, associado e as-sessor técnico da Associação, convidou o tam-bém associado engenheiro agrônomo Nelson de Souza Rodrigues, em 1980, para assumir a presi-dência da Divisão de Meio Ambiente da citada As-sociação. Uma das primeiras preocupações do novo presidente foi constituir junto à Divisão um corpo técnico composto de universitários, enge-nheiros, ambientalistas, professores (não citados nominalmente pelo escrúpulo de esquecer alguns de merecida atuação), para o estudo das resolu-ções e das proposições que viriam a ser adota-das. Desde o princípio, porém, uma resolução foi tomada: “uma luta com bases técnicas a médio e longo prazo” e não somente quando os peixes morriam pela insalubridade da água do rio Piraci-caba. A luta pela bacia com uma base mais sólida e técnica prosseguiu com maior vigor. Um dos pri-meiros enfrentamentos ocorreu quando a CETESB apresentou o programa “Melhor Água para o Rio Piracicaba” ao Conselho Coordenador. Encami-nhado à Divisão de Meio Ambiente, para aprecia-ção, foi posteriormente devolvido com outro pro-grama e com o mesmo nome, por julgar as proposições apresentadas paliativas e não con-cludentes para a bacia. Por circular de 4 de outu-bro de 1985, assinada pelo engº Wanderlei Esma-el, presidente da AEAP e pelo engº agrº Nelson de Souza Rodrigues, presidente da Divisão do Meio

Ambiente da mesma associação, foi lançada ofi-cialmente a “Campanha Ano 2000 – Redenção Ecológica da Bacia do Piracicaba”, já aprovada anteriormente em reunião com todos os presiden-tes das divisões. O lançamento da Campanha, com ampla repercussão na imprensa local, de ou-tros centros da bacia e fora dela, prioritariamente se desenvolveu de modo informativo e educativo, mostrando a que se propunha e para o melhor co-nhecimento dos problemas ambientais. Palestras em escolas, clubes de serviço, entrevistas, artigos e reportagens em jornais foram favorecendo uma maior conscientização dos problemas da bacia, como também serviu de base para mobilizações futuras. Aos 12 de outubro de 1985, o projeto da Campanha foi apresentado em reunião dos mem-bros do Conselho Coordenador das Entidades Ci-vis de Piracicaba, que não só o aprovou, como também o incorporou ao seu programa de ativida-des. Essa segunda fase da Campanha, de maior amplitude, que exigia um grande esforço, contou, como já vinha acontecendo, com a valiosa contri-buição da imprensa local, o Jornal de Piracicaba e o Diário de Piracicaba, nas pessoas do Dr. Rosário Losso Neto e de Cecílio Elias Neto, respectiva-mente. No auge da Campanha, foi alcançada a criação da Frente Parlamentar, com políticos lo-cais e de outras regiões, na Assembleia de São Paulo, através dos deputados Jairo de Mattos, José Machado, Walter Lazarini, Wanderlei Macris; na Câmara Federal, com os deputados Antônio Carlos Mendes Thame e Adhemar de Barros Filho. Além da continuidade das ações durante os dois anos seguintes, Rodrigues trabalhou no alinha-mento de proposições a serem encaminhadas ao Governo do Estado, o clímax da Campanha. Os manuscritos eram levados à apreciação dos mem-

Os manuscritos eram levados à apreciação dos membros da Divisão de Meio Ambiente, e assim, de reunião em reunião, foi sendo composta a “Carta de Reivindicações”, como documento máximo da Campanha. Concluída nos fins de 1986, não foi levada ao governo, por estar prestes a se findar a gestão de Franco Montoro

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bros da Divisão de Meio Ambiente, e assim, de reunião em reunião, foi sendo composta a “Carta de Reivindicações”, como documento máximo da Campanha. Concluída nos fins de 1986, não foi le-vada ao governo, por estar prestes a se findar a gestão de Franco Montoro. Após a posse do go-vernador Orestes Quércia, em cerimônia especial, em 30 de julho de 1987, foi apresentada a “Carta de Reivindicações ao Governo Orestes Quércia”, pelo presidente do Conselho Coordenador, em-presário Angelo Pardi. A comissão especialmente composta para a entrega era composta pelo pro-fessor Dr. Humberto Campos, Diretor da ESALQ, o Dr. Rosário Losso Neto, do Jornal de Piracicaba, Décio Azevedo, representante das Lojas Maçôni-cas, jornalistas, representantes de entidades am-bientalistas e sindicalistas. O engº agrº Nelson de

Souza Rodrigues, em nome da AEAP e como au-tor da Carta, expôs ao governador Orestes Quér-cia as proposições das 32 reivindicações nela in-cluídas, como também suas justificativas e soluções. Em resposta, assim pronunciou-se o governador: “Em toda minha carreira política, nunca recebi uma comissão que, ao apresentar suas reivindicações, as justifica e indica os pro-cedimentos para suas soluções. Me esforçarei para sua concretização”. Entregando-a ao seu secretário, solicitou para que tirasse cópias e as enviasse a todas as secretarias envolvidas. A apresentação do documento agilizou os estudos da nova administração, relativos aos recursos hí-dricos do Estado que vinham se desenvolvendo no DAEE. E assim, em 11 de novembro de 1987, o Decreto 25.576, criou o Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CERH), com a missão primei-ra voltada aos problemas da bacia do Piracicaba. O CERH, em sua primeira reunião em 7 de de-zembro de 1987, através da deliberação CERH nº 5, declarou como crítica a bacia do Piracicaba, determinando ao Comitê Coordenador do Plano Estadual de Gestão dos Recursos Hídricos (CCRHI), a elaboração, dentro de 120 dias, de um “Programa Prioritário para a bacia do Piraci-caba”, tendo por base a Carta de Reivindicações. Para tanto, foram mobilizadas equipes técnicas de doze secretarias: ET – SB – Saneamento Bási-co; ET – AH – Aproveitamento Hidráulico; ET – EI/LA – Efluentes Industriais e Legislação Ambiental; ET – IR – Irrigação; ET – MI – Mecanismos Institu-cionais; ET – PI, Piracicaba. As equipes técnicas – ET envolveram as Secretarias de Obras, Econo-mia, Saúde, Indústria e Comércio, Transportes, Esporte e Turismo, Ciência e Tecnologia, Planeja-mento e Meio Ambiente. Aos 29 de abril de 1988,

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a ET – PI, juntamente com as outras acima rela-cionadas, enviaram ao seu coordenador, engº Hiroaki Makibara, o Relatório de Apresentação dos “Programas Prioritários para a Bacia do Pira-cicaba”, para o encaminhamento ao Secretário Executivo do CORHI, engº Orlando Zuliani Cas-settari. O citado documento, na sua parte inicial, comenta: “Além disso, o documento intitulado ‘Campanha Ano 2000, Redenção Ecológica da Bacia do Piracicaba – Carta de Reivindicações ao Governo Orestes Quércia’, elaborado pela As-sociação dos Engenheiros de Piracicaba, consti-tui-se em um item de consulta constante durante a formulação do presente relatório. O equaciona-mento das 32 reivindicações será objeto de um futuro relatório, juntamente com as propostas de encaminhamento institucional e de mecanismos institucionais necessários para a implementação destes programas”. O relatório dos Programas Prioritários foi oficialmente entregue ao Coorde-nador Técnico da Campanha Ano 2000, engº agrº Nelson de Souza Rodrigues e sua comitiva, pelo engº Paulo Bezerril, superintendente do DAEE, na sede em São Paulo, no dia 14 de julho de 1988. Poucos dias antes, era criada a “Bacia- -Modelo de Gerenciamento Hídrico na Bacia do Piracicaba”, aos 10 de junho de 1988, pelo Decre-to 28.489 (proposição nº 18 da Carta) pelo CERH, para orientar todos os programas hídricos das ba-cias do Estado. Três meses após, o engº Paulo Bezerril, também presidente do CERH, veio a Pira-cicaba proferir palestra sobre o alcance dos “Pro-gramas Prioritários” para as questões ambientais da bacia, na sede da AEAP. Por iniciativa dos pre-feitos de Piracicaba e Americana, José Machado e Nicola Cortez, respectivamente, foram iniciados entendimentos com outros prefeitos, no propósito

de integrar os movimentos em prol da bacia e de seus problemas ambientais comuns. Estes objeti-vos correspondiam aos previstos na Carta da Campanha Ano 2000, na reivindicação nº 19 que propunha a “criação de um organismo intermuni-cipal eleito e representante de um Conselho Dire-tor de Prefeitos da Bacia”. E assim, em 13 de ou-tubro de 1989, foi eleita a primeira diretoria do Conselho Intermunicipal das Bacias dos Rios Pira-cicaba, Capivari (e depois, também o Jundiaí), tendo como presidente José Machado e como vice, Nicola Cortez. De igual importância teve o atendimento da reivindicação nº 31, determinando que “os recursos provenientes à bacia fossem re-colhidos ao organismo Intermunicipal (Comitê) e que, de acordo com a reivindicação nº 30, teriam prioridade de aplicação pela seguinte ordem:

a – tratamento de esgotos comunitários; b – reflorestamento de áreas de preservação

permanente (APP); c – financiamento de projetos de incentivo à

pesquisa; d – financiamento de cursos destinados à edu-

cação e conscientização ambiental das comuni-dades da bacia;

e – financiamento de concursos abordando te-mas ecológicos.

Infelizmente, embora já decorridas mais de duas décadas, algumas destas importantes rei-vindicações ainda não foram contempladas. Da mesma forma que Piracicaba se tornou uma re-ferência de luta de uma comunidade em defesa do seu patrimônio natural, a Campanha Ano 2000 e sua Carta, tornaram-se igualmente referências para equipes técnicas e movimentos ambientalis-tas, na elaboração de projetos multidisciplinares para as bacias hidrográficas.

Estes objetivos correspondiam aos previstos na Carta da Campanha Ano 2000, na reivindicação nº 19 que propunha a “criação de um organismo intermunicipal eleito e representante de um Conselho Diretor de Prefeitos da Bacia”

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Capítulo IX

Noticiada

História

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Piracicaba, embora seja o último município da Bacia Hidrográfica do Rio Piracicaba, recebendo dos 39 municípios a montante seus resíduos do-mésticos e industriais, sempre lutou pela preser-vação de seus rios, por meio de campanhas e proposições aos órgãos competentes.

Com a sangria da água do seu manancial para atender às necessidades do insidioso Projeto Cantareira, a situação do abastecimento de água da bacia bem como a poluição do rio tornaram-se drásticas obrigando a Divisão do Meio Ambiente da Associação de Engenheiros e Arquitetos de

Piracicaba (AEAP), juntamente com outras enti-dades representativas, à elaboração de proposi-ções técnicas com suas respectivas justificativas, de médio e longo prazo, para a solução dos pro-blemas da bacia. O documento gerou no governo de Orestes Quércia, que se instalava para admi-nistrar o Estado de São Paulo, uma nova política com respeito às bacias hidrográficas, tornando-se modelo para outros Estados. As manchetes a seguir, desse capítulo da história, constituem um documento valioso a respeito da luta pela reden-ção do rio Piracicaba.

À elaboração de proposições técnicas com suas respectivas justificativas, de médio e longo prazo, para a solução dos problemas da bacia

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Capítulo X

do Divino

Festa

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Entre as centenas de cidades brasileiras que mantêm sua data festiva religiosa, Piracicaba se destaca seja pela longevidade da data, seja pela repercussão e pelo número de participantes.

A “Festa do Divino Espírito Santo” ou, como é mais conhecida em Piracicaba, “Festa do Divi-no”, tem influência portuguesa e está associada aos festejos realizados em períodos de colheita. Originalmente, tinham um propósito social, pois arrecadavam e distribuíam donativos nos perío-dos de escassez de alimento. Em Piracicaba, a festividade foi realizada pela primeira vez na épo-ca provincial, no ano de 1826, em virtude da rea-lização do primeiro Encontro das Bandeiras, pro-movido por José de Viegas Muniz, que sugeriu que passasse a ser realizada no Rio Piracicaba com intuito simbólico, para pedir pela cura das enfermidades sofridas pela população ribeirinha. Deste então, ela vem transpondo séculos alter-nando períodos de grande participação e fervor e de quase esquecimento.

Em 1965, a festa sofreu um grande golpe, pois foi dissociada da igreja católica, quando o Bispo Diocesano de Piracicaba, Dom Aniger Melillo, jul-gou que a festividade seria profana, pois continha vários aspectos que acabavam sendo contrários a certos princípios religiosos. Sua continuidade foi seriamente comprometida e isso fez com que ela sofresse interrupções. Por volta de 1972, em resposta ao clamor popular, a Prefeitura de Pira-cicaba, tendo como prefeito o Sr. Cássio Pascoal Padovani, procurou o presidente do Centro de Folclore de Piracicaba, João Chiarini, com a in-tenção de juntar-se ao movimento pela volta da festividade com a participação da igreja. Foram então estabelecidas algumas condições e assim, após sete anos, a Festa do Divino voltou a ser

celebrada na cidade. A Festa do Divido é celebrada cinquenta dias

após a Páscoa, no Domingo de Pentecostes, mas, respeitando a tradição, a festividade é realizada em um sábado e um domingo. Durante cada edi-ção, é nomeado o festeiro do ano seguinte com as seguintes condições: deve seguir a religião ca-tólica apostólica romana, estar acompanhado de sua mulher e ter posses suficientes para arcar com as despesas da festividade. Alguns meses antes de cada festa, o festeiro organiza algumas comis-sões para angariar prendas para o leilão. Essas comissões percorrem casas, sítios, fazendas e são compostas dos seguintes figurantes: 1 violei-ro, 1 tocador de triângulo, 1 tocador de caixa e 1 bandeireiro que leva, como símbolo, a bandeira do Divino Espírito Santo. Em cada um dos lugares visitados, eles executam uma música ou cantoria, e depois solicitam uma prenda. Antes de tudo, dei-xam claro que as oferendas são muito poderosas para a obtenção de graças. Nos sítios e fazendas, é costume arrecadarem animais como cabritos, porcos e mesmo bois para o leilão.

No Rio Piracicaba, em frente à Praça do Largo dos Pescadores, sobre dois batelões é armado um grande tablado de madeira com proteções la-terais. Sobre esse tablado uma estrutura em forma de casa é montada para que seja inteiramente en-feitada com bandeirolas multicoloridas e varas de bambuzinho cortados na lua minguante. Nesse ta-blado, com capacidade para cerca de 60 pessoas, embarcam o festeiro, o padre, os coroinhas, auto-ridades civis e militares, e mais algumas pessoas de destaque. Esse conjunto representa a Irmanda-de do Divino. A embarcação é controlada por ma-rinheiros que, com roupa branca e usando quepe, orientam-na com varões de bambu. Rio abaixo,

Sobre esse tablado uma estrutura em forma de casa é montada para que seja inteiramente enfeitada com bandeirolas multicoloridas e varas de bambuzinho cortados na lua minguante

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na curva situam-se três botes com suas bordas enfeitadas com bandeirolas de papel. Cada bote mantem sempre de pé, 6 ou 7 marinheiros com os mesmos trajes dos que estão no batelão. Em suas mãos, um remo todo pintado com várias cores.

No sábado, quando chega a tarde (aproximada-mente às 16h30), é iniciada a procissão do batelão rio abaixo e, rio acima, dos três botes, chamados “Irmãos do Pouso” (ou de Rio Abaixo). Durante a caminhada concomitante, os trabuqueiros (espe-cialistas em disparar trabucos, mas que hoje dis-param rojões) disparam suas armas com grande estrondo, aturdindo e ensurdecendo os acompa-nhantes da margem esquerda do Rio Piracicaba, na Rua do Porto.

A expectativa dos acompanhantes é grande, com o batelão descendo rio abaixo e os três botes subindo rio acima, até o encontro da Irmandade do Divino (ou Rio Acima) e a Irmandade do Pouso. Um grande foguetório indica o momento exato, com a soltura de uma dezena de pombos bran-cos. Estando juntas, sobem o rio até o Clube de Regatas (hoje Agência Torres) e, uma vez no pon-to de partida, todos os marinheiros, com auxílio de seus remos, levantam o mastro do Divino, que é todo pintado e enfeitado, e o implantam em uma cova anteriormente preparada.

Em procissão pela Rua Moraes de Barros, se dirigem até a Praça José Bonifácio, no centro da cidade, e depositam a bandeira do Divino, junto ao altar da Catedral de Santo Antônio, onde é re-alizada a missa solene. No dia seguinte, pela ma-nhã, ocorre uma missa e a distribuição de saqui-nhos de sal benzidos, que depois serão levados em procissão até que todos retornem para o rio, onde se realizará o leilão das prendas oferecidas para a festividade.

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Numa tarde de outono chuvosa, envolvidos numa atmosfera de forte expectativa, chegamos a uma casa com um jardim bem cuidado e uma bela varanda, que nos acolhia da chuva. Ali, es-perando pela entrevista que íamos realizar, estava o Sr. Nelson de Souza Rodrigues. Vestindo uma camisa passada com esmero, em pé e não que-rendo demonstrar sua empolgação, o autor deste livro mal se apresentou e já me fez de pronto pe-gar o gravador e assim dar início a uma enorme distribuição de valiosas informações sobre seu passado repleto de conhecimentos, curiosidade e, o principal, amor à natureza. Uma verdadeira aula informal de consciência ambiental que há muito começou, nos seus 92 anos de idade.

Pelos extintos matagais do Ipiranga, na capital paulista, Nelson desde tenra idade já era fanáti-co por répteis, abundantes naquela região, que recolhia em latas para desespero de sua mãe, e no jardim de sua casa os observava com a curiosidade típica da idade. Às vezes, apareciam cascavéis cuja periculosidade de manuseio a duras penas conseguiu identificar com o tempo. Dessa singela observação, conseguiu captar o mais importante, que é a preservação do habi-tat de todos os animais que podia “estudar”. Daí em diante travou várias lutas para a preservação da natureza, principalmente rios e suas margens, como forma de promover a sustentabilidade do ecossistema, e, já em 1948, levantou a bandei-ra ecológica, quando se formou em Engenharia Agronômica pela ESALQ. Com diploma na mão e uma grande vontade de modificar as diretrizes de utilização do solo, Nelson aplicou sua visão

preservacionista em todas as oportunidades que teve para que profissionais eempresários mudas-sem sua forma de utilizar os recursos naturais, adotando uma nova visão sustentável. Fez vários estudos aplicados, graduou-se em Química Agrí-cola, Piscicultura, e foi um dos pioneiros no Brasil a rever as políticas públicas de conservação do meio ambiente em uma época nada propícia a essa postura. Aliás, colocar aqui seu currículo seria impossível, pois conseguiu agregar tantos valores em cursos dados e recebidos que a lista seria desproporcional.

Em vez de estandartes efêmeros, Nelson le-vantou a bandeira ecológica por meio de traba-lhos sérios, com resultados positivos, e deixou seu legado em manuscritos, tratados, e agora nesta obra de fundamental importância que re-trata a biodiversidade do rio Piracicaba. Com uma detalhada descrição desse ecossistema, oferece ao leitor a possibilidade de entender a importância da revitalização de um curso d’água tão rico e cheio de histórias que forma um dos principais meios de sobrevivência da população ribeirinha de um grande polo urbano do Estado de São Paulo.

Já ao entardecer daquela terça-feira chuvosa, após conhecer seus inúmeros trabalhos como ta-xidermista, fotógrafo, artesão e tantas outras ativi-dades, perguntei a ele se nosso planeta teria sal-vação. Ele respondeu: “Felizmente, as crianças estão bem mais conscientizadas. Vivendo nessa ideia ambiental, só tende a melhorar porque a na-tureza é uma coisa tão eficaz que basta dar um pouco de atenção a ela que ela se recomporá”.

Em vez de estandartes efêmeros, Nelson levantou a bandeira ecológica por meio de trabalhos sérios, com resultados positivos, e deixou seu legado em manuscritos, tratados, e agora nesta obra de fundamental importância que retrata a biodiversidade do rio Piracicaba

Sr. Nelson

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Nelson de Souza Rodrigues e Luccas Longo, avô e neto em um de seus inúmeros momentos de boa prosa

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Nelson de Souza Rodrigues é paulistano e, desde a in-fância, os bens naturais, além da família, constituíram a mo-tivação de sua existência. Peixes, aves e o meio ambiente, sempre estiveram presentes em suas atividades. Paralela-mente, a fim de perpetuar a presença ou a imagem desses elementos, desenvolveu a técnica da taxidermia e da foto-grafia que, por muitos anos, atenderam a seus interesses e aos de terceiros, participando de exposições (taxidermia) e Salões anuais nacionais e internacionais (fotografia), desde a adolescência.

1948 – Graduação na ESALQ – Escola Superior de Agricul-tura “Luiz de Queiroz”, como engenheiro agrônomo, comple-mentada com estágios e cursos de aperfeiçoamento.

1950 – Convidado pelo cineasta Alberto Cavalcanti, dire-tor artístico da Companhia Cinematográfica Vera Cruz, para instalar e chefiar o laboratório de fotografia, com a função de documentar cenas dos filmes e produzir cópias fotográficas para propaganda (cerca de 3.000 por filme) e produzir gran-des ampliações de fotografias (7 m x 10 m) para compor ce-nários. Os três primeiros filmes da “Vera Cruz” contaram com tais serviços.

1951 – Chefia, por direito de concurso público, na Secreta-ria da Agricultura [SA]-SP, do Setor de Documentação e Divul-gação da Divisão de Conservação do Solo da SA, destinada a documentar os serviços de conservação do solo e combate à erosão realizados no Estado, bem como emitir, bimensalmen-te, boletim técnico a respeito.

1954 – a pedido, assume a Chefia da Região Conservacio-nista – Região São Paulo (capital) da SA. Tem então oportuni-dade de desenvolver técnicas conservacionistas para regiões de topografia inclinada, divulgadas em artigos e teses em Congressos (Congresso Nacional de Conservação do Solo – Campinas; cinco teses).

1958 – Chefia da Escola de Tratoristas de Pirassununga – SP, do antigo Departamento de Engenharia Mecânica da

Luccas Guilherme Rodrigues Longo é piracicabano, biólogo, especialista em Bioecologia e Conservação, pela Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP), e Mestre em Conservação de Ecossistemas Florestais, pela Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (ESALQ/USP). Seus trabalhos são dedicados à conservação e à divulgação da fauna silvestre, com ênfase no estudo de aves. É coautor do livro Nosso Rio, Nossas Aves:

Nelson de Souza Rodrigues

Luccas Longo

Agricultura – DEMA – da SA. Durante as aulas práticas dos três cursos anuais, no solo do cerrado branco da região, o maior interesse era desenvolver técnicas de desbravamento não destrutivas, possibilitando pioneiramente o uso do cerra-do para culturas anuais, pastagens e silvicultura, especialmen-te de eucalipto e pinus, favorecendo a alteração de serviços mecanizados e do plantio no cerrado.

1970 – na Chefia do Posto Avançado de Piscicultura, do Instituto de Pesca, da Secretaria da Agricultura de São Pau-lo, em Pirassununga – SP, além de desenvolver pesquisa com peixes do rio Mogi-Guaçu, proporciona elementos de pesqui-sa a outras divisões do mesmo Instituto.

1972 – Promoção, por concurso, à carreira de Pesquisador Científico.

1975 – Chefe do Setor de Ecologia do Meio Hídrico, por convênio entre o Instituto de Pesca da Secretaria da Agricultu-ra – SP e o Centro de Energia Nuclear na Agricultura – CENA – USP, especialmente criado para o desenvolvimento de pes-quisas envolvendo o meio hídrico, de preferência o rio Piraci-caba, resultando no desenvolvimento de processos de fitode-puração de águas e efluentes industriais através do uso de rádioisótopos com peixes e plantas e sua capacidade como biomoduladores.

1980 – Presidente da Divisão de Meio Ambiente da Asso-ciação de Engenheiros e Arquitetos de Piracicaba – AEAP.

1983 – 1º lugar no Concurso de Tecnologia Nacional – área Meio Ambiente, do Banco do Brasil, com o projeto “Unidade Bivalente – Despoluente Geradora de Energia”.

1984 – II Concurso Nacional de Tecnologias Apropriadas – Saneamento Básico – CNPQ – Projeto “Unidade Hidro-agrícola como Fator de Desenvolvimento Rural”, selecionado para aplicação no “Programa de Transferência de Tecnologias Apropriadas ao Meio Ambiente no Meio Rural”.

1985 – Após a aposentadoria, o envolvimento no projeto de redenção da Bacia do Piracicaba foi crescente.

As Margens do Piracicaba, publicação pioneira na divulgação fotográfica e biológica das aves no município. É professor e educador ambiental com experiência em observação de aves (birdwatching), atividade que acredita ser uma importante ferra-menta de conservação ambiental. Além de sua formação como ambientalista, é artista gráfico premiado em Salões de Humor, com trabalhos voltados à temática socioambiental.

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FotosCapa: Garça-moura no Tanquã by Marcel RodriguesContra capa: Nelson e seu companheiro by DesconhecidoPág.06: Tuiuiú no Tanquã By Luccas LongoPág.10: Borrego na beira do Piracicaba estudo by Nelson de Souza Rodrigues Pág.12: Tanquã By Marcel RodriguesPág.14: Engenho Central by Marcel RodriguesPág.16/17: Rio Piracicaba e Engenho central By Nelson de Souza RodriguesPág.21: Casa do Povoador by Nelson de Souza RodriguesPág.22/23: Rio Piracicaba by Nelson de Souza RodriguesPág.24: Museu da Água e Rio Piracicaba by Nelson de Souza RodriguesPág.26/27: Curimbatá by Nelson de Souza RodriguesPág.30/31: Cabeça-seca by Luccas LongoPág.34/35: Salto do Rio Piracicaba by Nelson de Souza RodriguesPág.40/41: Rua do Porto by Nelson de Souza RodriguesPág.44/45: Água do Rio Piracicaba by Marcel RodriguesPág.92/93: Margem do Rio Piracicaba by Marcel RodriguesPág.94: Curimbatá by Nelson de Souza RodriguesPág.97: Pescadores by Marcel RodriguesPág.99: Tanquã by Marcel RodriguesPág.100/101: Pescadores by Nelson de Souza RodriguesPág.102: Pescadores by Marcel RodriguesPág.103: Garças-brancas-grandes by Marcel RodriguesPág.104/105: Alfaces-d’água by Marcel RodriguesPág.111: Garça-branca-grande no Tanquã by Marcel RodriguesPág.112/113: Rio Piracicaba by Nelson de Souza RodriguesPág.115: Pontos do salto do Rio Piracicaba by Nelson de Souza RodriguesPág.122/123: Três crianças na Rua do Porto by Nelson de Sousa RodriguesPág.128/129: Salto do Rio Piracicaba by Nelson de Souza RodriguesPág.131: Morte no Rio Piracicaba by Nelson de Souza RodriguesPág.132: Elias Rocha, o Elias dos Bonecos by Nelson de Souza RodriguesPág.134: Casa do Povoador by Nelson de Souza RodriguesPág.136/137: Tuiuiú na margem do Rio Piracicaba by Marcel RodriguesPág.148/149: Festa do Divino by Nelson de Souza RodriguesPág.151: Ponte pênsil by Marcel RodriguesPág.153: Nelson de Souza Rodrigues e Luccas Longo by Marcel RodriguesPág.155: Nelson de Souza Rodrigues e Luccas by Marcel RodriguesPág.160: Tanquã by Marcel Rodrigues

IlustraçõesPág.08: Primeiros registros by Guilherme Piso & George Marcgrave (1648)Pág.09: Primeiros registros by Guilherme Piso & George Marcgrave (1648)Pág.19: Casa do Povoador by Nelson de Souza RodriguesPág.20: Aldeamento paiaguá by Nelson de Souza Rodrigues

Relação de fotos e ilustrações

Expediente

Pág.25: Bacia do Rio Piracicaba by Luccas LongoPág.29: Ictiometria do dourado by Luccas LongoPág.29: Anatomia externa do dourado by Luccas LongoPág.33: Ictiometria do dourado by Luccas LongoPág.37: Reprodução by Nelson de Souza RodriguesPág.38: Desenvolvimento embrionário by Nelson de Souza RodriguesPág.42: Determinação da idade by Luccas LongoPág.43: Determinação da idade by Luccas LongoPág.46: Canivete by Nelson de Souza RodriguesPág.47: Vida no aquário by Luccas LongoPág.48: Cascudo by Nelson de Souza RodriguesPág.50: Mão entalada by Luccas LongoPág.52: Curimbatá by Nelson de Souza RodriguesPág.55: Papa-terra by Luccas LongoPág.56: Dourado by Nelson de Souza RodriguesPág.59: Pesca de rodada by Nelson de Souza RodriguesPág.60: Dourado na banheira by Luccas LongoPág.62: Jaú by Nelson de Souza RodriguesPág.64: Pesca do jaú by Nelson de Souza RodriguesPág.66: Jurupoca by Nelson de Souza RodriguesPág.67: Ferroada by Luccas LongoPág.68: Lambari by Nelson de Souza RodriguesPág.69: O cuscuz verdadeiro by Luccas LongoPág.70: Mandi by Nelson de Souza RodriguesPág.71: Cuscuz incrementado by Nelson de Souza RodriguesPág.72: Pacu by Nelson de Souza RodriguesPág.73: Pacuquinho by Luccas LongoPág.74: Peixe-sapo by Nelson de Souza RodriguesPág.75: Pesca inesperada by Luccas LongoPág.76: Piapara by Nelson de Souza RodriguesPág.77: Piapara do Senador by Luccas LongoPág.78: Piava by Nelson de Souza RodriguesPág.79: Recuperação premiada by Luccas LongoPág.80: Pintado by Nelson de Souza RodriguesPág.81: Pesca de farolete by Nelson de Souza RodriguesPág.82: Piracanjuba by Nelson de Souza RodriguesPág.85: Com as baratas entre os dentes by Luccas LongoPág.86: Tamboatá by Nelson de Souza RodriguesPág.87: Pesca inusitada by Luccas LongoPág.88: Traíra by Nelson de Souza RodriguesPág.90: Pesca no pano vermelho by Nelson de Souza RodriguesPág.91: Pesca no enxadão by Luccas LongoPág.106: Sistemas de preparo de iscas by Luccas LongoPág.109: Apetrechos de pesca by Luccas LongoPág.116: Caixão by Luccas LongoPág.118: Dinival e o rolo de cobra by Nelson de Souza RodriguesPág.119: Cabeça de negro by Luccas LongoPág.121: Trechos do Rio Piracicaba by Mariana Hortelani Carneseca LongoPág.124: O nascimento inesperado by Luccas Longo

Pesquisador: Nelson de Souza Rodrigues Direção de arte: Rogério Callamari MacaduraDiagramação: Purim Comunicação VisualCoordenação editorial: Marcio AlvesRevisão de textos: Silvia Mourão e Renata Weber NeivaCaptação de recursos: Luigi LongoImpressão: Gráfica Ideal Realização: ABCD Cultural

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Com uma mistura de dados técnicos, folclore, causos e cultura popular, Nelson torna a leitura desse livro fácil e dinâmica. Encoraja-nos até a última linha a saborear cada frase, nunca se esquecendo do bom humor típico brasileiro. Um livro para pescadores, ambientalistas, estudantes e amantes da cultura nacional. “Piracicaba, seu rio, seus peixes” é uma volta ao passado e um esplêndido convite à reflexão.