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PONTÍFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS
FUNDAÇÃO DOM CABRAL Mestrado Profissional em Administração
CULTURA ORGANIZACIONAL E INOVAÇÃO: o caso da Drogaria Araujo.
Diocélio Dornela Goulart
Belo Horizonte 2010
Diocélio Dornela Goulart
CULTURA ORGANIZACIONAL E INOVAÇÃO: o caso da Drogaria Araujo
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Administração da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do grau
de Mestre. Área de concentração: Estratégia e Inovação
Orientadora: Profª Drª Liliane de Oliveira Guimarães
Belo Horizonte
2010
FICHA CATALOGRÁFICA Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
Goulart, Diocélio Dornela G694c Cultura organizacional e inovação: o caso da Drogaria Araujo / Diocélio
Dornela Goulart. Belo Horizonte, 2010. 166f. : il. Orientadora: Liliane de Oliveira Guimarães Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais,
Programa de Pós-Graduação em Administração 1. Cultura organizacional. 2. Cultura – Brasil. 3. Inovações. 4. Arquétipo.
Tipologia. 5. Farmácias, drogarias, etc. I. Guimarães, Liliane de Oliveira. II. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Administração. III. Título.
CDU: 658.01
A meu filho, Gabriel,
a meu amor Renata,
a meu querido Yves e
minha mãe,
meus grandes incentivadores e inspiradores.
AGRADECIMENTOS
Gostaria de agradecer primeiramente a Deus por ter me iluminado e sempre
me mostrado a direção, de forma a conseguir vencer mais este desafio, em um
momento da minha vida de tantas mudanças e transformações.
Dedico um agradecimento especial à Professora Liliane, minha orientadora,
pelo seu carinho, empenho, paciência e dedicação, sem dúvida, inestimáveis e
fundamentais para que eu pudesse concluir esta empreitada.
Ao Prof. Afonso Cozzi, da Fundação Dom Cabral, pela grande ajuda para que
esta pesquisa fosse viabilizada junto à Drogaria Araujo.
Agradeço à Drogaria Araujo, em especial a seu Presidente, Modesto
Carvalho Araujo Neto, líder empresarial brilhante e carismático, que tive
oportunidade de conhecer com maior proximidade durante a nossa histórica
entrevista de mais de quatro horas. Ao Pedro Paulo, Janaina e Silvia, um especial
agradecimento por terem facilitado os meus contatos e acesso para a realização da
pesquisa junto à organização, A todos os entrevistados, Bruno, Antônio, Andre,
Jorge, Jarbas, Sr. Davi, Sr. Irineu e Sra. Maria Felix, o meu muito obrigado pelos
preciosos e valiosos momentos que me propiciaram.
Confesso que fiquei muito surpreendido e admirado com a grandiosidade da
Drogaria Araujo e também extremamente lisonjeado com a acolhida tão gentil e
agradável que tive.
Aos professores e funcionários da PUC e FDC, pelos valiosos ensinamentos
e pelo atendimento e disponibilidade sempre existente.
A Renata Livramento, minha amiga e psicóloga, que tanto me apoiou e me
incentivou para que esta empreitada se tornasse realidade.
Aos colegas do Mestrado, sou grato pela oportunidade única que tivemos de
conviver e trocar experiências e lições de vida, em especial, ao Vinicius, que dividiu
e compartilhou comigo de perto todos os desafios para vencermos mais esta etapa.
Aos companheiros da NetService, meu agradecimento pela compreensão e
interesse demonstrados pela realização deste meu trabalho, em especial, à Roseane
e Stela.
O meu profundo agradecimento à minha Mãe, grande incentivadora e
admiradora dos meus passos, e também a meu Pai: hoje temos a oportunidade de
renovar o nosso encontro.
Agradeço ao meu amor, Renata, companheira, confidente, amiga e mulher.
Quantas vezes teve que me ver “viajando” nas minhas elucubrações, sempre
interessada, pronta a escutar e contribuir, e principalmente valorizar o meu empenho
e reconhecer o meu esforço. Eu amo você.
Minha gratidão ao meu querido Yves, que Deus concedeu a graça de surgir
em minha vida, pelo seu respeito e admiração, que é recíproco.
E ao meu filho amado, Gabriel, razão de ser e inspiração da minha vida, que
sempre me orgulha pelo grande homem que acredito que será.
Sinto-me realmente realizado por esta oportunidade de pesquisa. Para mim,
foi um grande aprendizado, tanto como pesquisador e principalmente como
empresário e consultor, pelas lições que tive oportunidade de receber e de valores
nos quais acredito e que estão tão presentes na organização pesquisada: ética,
seriedade, comprometimento, honestidade, atenção aos detalhes, pioneirismo,
inovação e valorização das pessoas. Espero de alguma forma prestar a minha
humilde contribuição para a comunidade acadêmica e empresarial, apresentando os
resultados desta pesquisa.
“Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.”
Fernando Pessoa
RESUMO
O presente estudo teve por objetivo analisar a relação entre cultura organizacional e inovação. Para tanto, foi realizado um estudo de caso, de natureza qualitativa, em uma empresa centenária, do setor de comércio farmacêutico, localizada em Belo Horizonte. Realizou-se, primeiramente, uma revisão da literatura da área, considerando os temas – cultura organizacional e inovação – e posteriormente acrescentou-se o tema cultura brasileira e sua influência na cultura organizacional. A partir da revisão da literatura, elaborou-se um modelo teórico para análise dos dados que contemplou os principais elementos discutidos por estudiosos de cultura e inovação. Tendo como referência este modelo teórico, buscou-se identificar a relação entre cultura e inovação, e o impacto que elementos da cultura – nacional e organizacional - podem produzir sobre os tipos de inovação desenvolvidos na organização. Assim, os elementos culturais da empresa foram identificados, bem como as inovações – incrementais e radicais - implementadas ao longo de sua trajetória. Foram estabelecidas as relações entre os elementos culturais e os tipos de inovação e analisadas as influências da cultura brasileira na cultura organizacional da empresa. Em linhas gerais, os resultados evidenciaram elementos da cultura nacional na cultura organizacional e que estas exercem influência no processo de inovação da empresa. Além disso, constatou-se que as inovações radicais ocorreram principalmente no estágio inicial da empresa. A partir da terceira geração no comando da empresa, prevalecem as inovações incrementais, com foco no sistema e ênfase na melhoria dos processos. Em suma, a consolidação e expansão da empresa são decorrentes de uma estratégia de ocupação de território bem sucedida e não propriamente de um modelo organizacional que estimula o desenvolvimento de inovações radicais. Palavras-chave: Cultura Organizacional. Cultura brasileira. Inovação. Modelo de gestão.
ABSTRACT
This study aimed to examine the relationship between organizational culture and innovation. For that, we performed a case study of qualitative nature in a century-old company, of the sector of the pharmaceutical trade, located in Belo Horizonte. In a first moment, we did a review of the literature, considering the issues - organizational culture and innovation - and later added the theme Brazilian culture and its influence on organizational culture. From the literature review was conducted a theoretical model for analyzing the data which included the main elements discussed by researchers of culture and innovation. With reference this theoretical model, we sought to identify the relationship between culture and innovation, and the impact that elements of culture - national and organizational - can produce in the types of innovation developed in the organization. Thus, the cultural elements of the company were identified as well as innovations - incremental and radical - deployed along its trajectory. We defined the relations between cultural elements and the types of innovation and analyzed the influences of Brazilian culture in organizational culture. In general, the results showed elements of national culture on organizational culture and that these influence the innovation process the company. Moreover, it was found that radical innovations have occurred mainly in the initial stage of the company. From the third generation to run the company, the prevailing incremental innovations, focusing on system and emphasis on process improvement. In short, the consolidation and expansion of the company are the result of a strategy for successful occupation of territory and not exactly an organizational model that fosters the development of radical innovations.
Keywords: Organizational Culture. Brazilian culture. Innovation. Management model.
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 - Atividades de adaptação externa e integração interna............. 29
QUADRO 2 - Características da Inovação ..................................................... 47
QUADRO 3 - Arquétipos de inovação incremental e radical .......................... 54
QUADRO 4 – Resumo da estratégia de coleta de dados .............................. 70
QUADRO 5 - Relação de Diretores e Gerentes entrevistados....................... 73
QUADRO 6 - Atividades de adaptação externa ............................................. 96
QUADRO 7 - Atividades de adaptação externa e integração interna............. 97
QUADRO 8 - Relação das inovações, responsáveis e tipo.......................... 129
QUADRO 9 – Tendência da organização de acordo com os arquétipos
definidos .................................................................................................................. 136
LISTA DE GRÁFICOS
FIGURA 1 - Construto capacidade de inovação............................................. 14
FIGURA 2 - Modelo teórico dos estudos de cultura ....................................... 24
FIGURA 3 - Níveis de análise da cultura organizacional................................ 30
FIGURA 4: Manifestações da cultura ............................................................. 32
FIGURA 5: Sistema de ação cultural brasileiro .............................................. 34
FIGURA 6 - Tipos de Inovação: radical e incremental ................................... 40
FIGURA 7 - Inovação disruptiva ..................................................................... 41
FIGURA 8 - A série contínua da inovação...................................................... 42
FIGURA 9 - Mapa das relações entre temas, baseado no modelo de Schein
(2004) ........................................................................................................................ 53
FIGURA 10 - Mapa das relações entre temas incorporando as categorias de
adaptação externa e integração interna de Schein (2004)........................................ 56
FIGURA 11 - Mapa das relações entre temas com a influência do sistema
cultural brasileiro, conforme Tanure (2007)............................................................... 57
FIGURA 12 – Organograma atual da empresa .............................................. 79
FIGURA 13: Questões de adaptação externa e integração interna da
organização pesquisada............................................................................................ 97
FIGURA 14: Artefatos visíveis, valores compartilhados e pressupostos
básicos da organização pesquisada ....................................................................... 109
FIGURA 15: Valores, heróis, rituais e símbolos da organização pesquisada
................................................................................................................................. 114
FIGURA 16: Sistema de ação cultural Brasileiro.......................................... 119
FIGURA 16 - Mapa das relações entre temas, baseado no modelo de Schein
................................................................................................................................. 137
FIGURA 17 - Mapa das relações entre temas, baseado no modelo de Schein
com a classificação de adaptação externa e integração interna............................. 140
FIGURA 18 - Mapa das relações entre temas, baseado no modelo de Schein
(2004), com a influência do sistema cultural brasileiro, conforme Tanure (2007)... 142
FIGURA 19 - Mapa das relações entre temas, baseado no modelo de Schein
(2004) com a classificação de adaptação externa e integração interna ................ 149
FIGURA 20 - Mapa das relações entre temas, baseado no modelo de Schein
(2004) com a influência do sistema cultural brasileiro, conforme Tanure (2007)... 150
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABRAFARMA Associação Brasileira de Redes de Farmácias e
Drogarias.
BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento
DDR Discagem Direta ao Ramal
INDG Instituto Nacional de Desenvolvimento Gerencial
ISO International Organization for Standardization
NACDS National Association of Chain Drug Stores
OECD Organisation for Economic Co-operation and
Development
PDCA Plan Do Check Act
SPC Serviço de Proteção ao Crédito
SESC Serviço Social do Comércio
SENAC Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial
TI Tecnologia da Informação
TV Televisão
SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .......................................................................................... 13
1.1 O problema de pesquisa e a sua justificativa...................................... 13
1.2 Objetivos da pesquisa ......................................................................... 21
1.2.1 Objetivo geral ................................................................................ 21
1.2.2 Objetivos específicos .................................................................... 21
2 REFERENCIAL TEÓRICO........................................................................ 22
2.1 Cultura organizacional......................................................................... 22
2.2 A relação entre cultura organizacional e os tipos de inovação ........... 38
2.2.1 Tipos de inovação ......................................................................... 39
2.2.2 Cultura e inovação ........................................................................ 44
2.2.3 Um modelo conceitual para o entendimento da cultura organizacional e sua relação com os tipos de inovação..................................... 48
3 METODOLOGIA DE PESQUISA .............................................................. 60
3.1 Estratégia, tipo e método de pesquisa ................................................ 60
3.2 Unidade Empírica................................................................................ 64
3.3 Estratégia de coleta............................................................................. 68
3.4 Estratégia de análise........................................................................... 73
4 DESCRIÇÃO E ANÁLISE DE DADOS: ESTUDO DE CASO ................... 77
4.1 Apresentação e caracterização da empresa....................................... 77
4.2 Descrição e análise da cultura organizacional da empresa estudada 85
4.2.1 A adaptação externa e integração interna: as atividades da Drogaria Araujo................................................................................................... 85
4.2.2 Cultura organizacional: análise dos artefatos ou símbolos, valores, pressupostos básicos, heróis e rituais da Drogaria Araujo................................. 98
4.2.3 Características da cultura brasileira presentes na organização.. 114
4.3 Descrição e análise dos tipos de inovação da empresa estudada ... 121
4.3.1 Inovações da organização: histórico e classificação por tipos.... 121
4.4 Elementos da cultura da organização e os tipos de inovação: análise dessa relação ....................................................................................................... 132
4.4.1 Elementos que compõem a dinâmica organizacional e sua relação com os tipos de inovação ................................................................................. 132
4.4.2 Influências da cultura organizacional e nacional nesses elementos....... .................................................................................... ..............136
5 CONCLUSÕES ....................................................................................... 145
5.1 Introdução ......................................................................................... 145
5.2 Resultados da pesquisa .................................................................... 145
5.3 Modelo de pesquisa: proposta de melhoria ...................................... 148
5.4 Contribuições, limitações e pesquisas futuras .................................. 151
REFERÊNCIAS ............................................................................................ 153
APÊNDICE E ANEXO .................................................................................. 162
1 INTRODUÇÃO
1.1 O problema de pesquisa e a sua justificativa
A existência de pesquisas internacionais que abordam a cultura
organizacional e a inovação, visando entender e elucidar a relação das variáveis ou
fatores que podem facilitar a capacidade de inovação de uma empresa tem sido
objeto de estudo de vários autores (AFSANEH, 1993; BASS; AVOLIO, 1993;
JAMROG; VICKERS; BEAR, 2006; KOTTER, 1998; KOTTER; HESKETT, 1992;
SCHEIN, 1985,1992, 2004).
Teóricos no campo da inovação sugerem que a cultura organizacional pode
afetar a disposição das empresas em serem inovativas, e discutem aspectos que
ajudam a compreender a longevidade de determinadas organizações (ANCONA;
CALDWELL, 1987; BEAR, 2006; BLUEDORN; LUNDGREN, 1993; CHRISTENSEN,
2003; JAMROG; VICKERS; KUCZMARSKI, 1998; KOTTER; HESKETT, 1992).
Schein (1985) é um dos autores que desenvolveram o conceito de cultura,
identificando-a como um conjunto de premissas que um grupo aprendeu a aceitar,
como resultado da solução de problemas de adaptação ao ambiente e de integração
interna. Ora, essas premissas, quando bem sucedidas e transmitidas ao longo da
existência do grupo, podem possuir uma relação estreita com a capacidade de
inovação de uma organização.
Esse conjunto de premissas possui natureza subjetiva e, com isto, supõe-se
que ainda não há uma resposta consensual sobre a dinâmica interna das variáveis
que compõem o próprio construto capacidade de inovação e a sua relação com os
elementos da cultura organizacional. E, muito menos, uma forma de mensurar seu
impacto no desempenho empresarial para a compreensão da extensão do
fenômeno.
13
1 INTRODUÇÃO
1.1 O problema de pesquisa e a sua justificativa
A existência de pesquisas internacionais que abordam a cultura
organizacional e a inovação, visando entender e elucidar a relação das variáveis ou
fatores que podem facilitar a capacidade de inovação de uma empresa tem sido
objeto de estudo de vários autores (AFSANEH, 1993; BASS; AVOLIO, 1993;
JAMROG; VICKERS; BEAR, 2006; KOTTER, 1998; KOTTER; HESKETT, 1992;
SCHEIN, 1985,1992, 2004).
Teóricos no campo da inovação sugerem que a cultura organizacional pode
afetar a disposição das empresas em serem inovativas, e discutem aspectos que
ajudam a compreender a longevidade de determinadas organizações (ANCONA;
CALDWELL, 1987; BEAR, 2006; BLUEDORN; LUNDGREN, 1993; CHRISTENSEN,
2003; JAMROG; VICKERS; KUCZMARSKI, 1998; KOTTER; HESKETT, 1992).
Schein (1985) é um dos autores que desenvolveram o conceito de cultura,
identificando-a como um conjunto de premissas que um grupo aprendeu a aceitar,
como resultado da solução de problemas de adaptação ao ambiente e de integração
interna. Ora, essas premissas, quando bem sucedidas e transmitidas ao longo da
existência do grupo, podem possuir uma relação estreita com a capacidade de
inovação de uma organização.
Esse conjunto de premissas possui natureza subjetiva e, com isto, supõe-se
que ainda não há uma resposta consensual sobre a dinâmica interna das variáveis
que compõem o próprio construto capacidade de inovação e a sua relação com os
elementos da cultura organizacional. E, muito menos, uma forma de mensurar seu
impacto no desempenho empresarial para a compreensão da extensão do
fenômeno.
14
Drucker (2006) afirmava que só por milagre as empresas ultrapassam 30
anos de vida. É um ciclo quase inelutável para cerca de 70% dessas entidades
econômicas. Ele usava a metáfora “empresas não crescem até o céu”. Queria dizer
que as organizações obedecem a um ciclo de vida, que vai da criação ao
crescimento, desenvolvimento, estabilidade, maturidade, declínio e morte.
Neely e Hii (1998) defendem que a capacidade de uma empresa conseguir
sustentar-se durante um longo período ou de agregar valor para ser adquirida no
futuro é um elemento característico da sua competitividade e está diretamente
relacionada à sua capacidade de inovação.
Para esses autores, a capacidade de inovação de uma empresa pode ser
definida como “[...] o potencial interno para gerar novas ideias, identificar novas
oportunidades no mercado e desenvolver uma inovação comercializável através dos
recursos existentes e competências” (NELLY; HII, 1998, p. 7).
A partir dessa definição, pode-se dizer que a capacidade de inovação de uma
empresa é um construto formado pela inter-relação sinérgica de sua cultura
organizacional, de seus processos internos e de suas relações inter-organizacionais.
A FIG. 1 apresenta o construto de Neely e Hii (1998) para explicar os fatores que
interferem na capacidade de inovação, dentre os quais a cultura da organização:
FIGURA 1 - Construto capacidade de inovação Fonte: Adaptado de Neely e Hii (1998, p. 7).
Numa economia baseada no conhecimento, a inovação desempenha um
papel preponderante, porém, o complexo processo de inovação não é, ainda,
suficientemente compreendido (NELLY; HII, 1998; OECD, 1997). Isto leva a uma
reflexão sobre a possibilidade de a capacidade bem desenvolvida, então, de uma
15
organização de reter conhecimentos de forma tácita ou explícita e transmiti-los ao
grupo e às futuras gerações ajudar a determinar a longevidade empresarial.
A partir da análise de aspectos presentes numa organização, percebe-se a
existência dos elementos culturais e suas implicações. Como a cultura
organizacional pode influenciar nos processos de inovação de uma organização e
também nesse processo de transmissão e retenção do conhecimento? O que é
cultura e suas implicações? Schein (2004) fornece a definição abaixo:
A cultura organizacional é o conjunto de pressupostos básicos compartilhados que um grupo inventou e que demonstram como lidar com os seus problemas de adaptação externa e integração interna e que funcionou bem o suficiente para serem considerados válidos e, então, passam a ser ensinadas a novos participantes do grupo como o modo correto para perceber, pensar e sentir em relação a esses problemas. (SCHEIN, 2004, p. 37, tradução nossa)
Essa definição parece nos direcionar ao papel da cultura organizacional nos
processos de inovação. Ou seja, a cultura do grupo e suas concepções sobre
adaptação a mudanças e soluções de problemas podem facilitar ou restringir a sua
capacidade de inovação.
Em outras palavras, os processos de uma organização, sua cultura
organizacional e sua capacidade de adaptar-se e sobreviver frente às adversidades
e crises podem ter uma relação com a capacidade de inovação e consequente
adaptação às mudanças, seja assimilando o novo que surge, seja mudando suas
estruturas no sentido de flexibilizá-las, evitando as potenciais crises.
Este trabalho visou identificar elementos da cultura de uma organização do
setor de comércio farmacêutico, analisando a sua relação com os processos de
inovação da empresa investigada.
O tema da dissertação – cultura organizacional e inovação – foi definido a
partir da experiência do pesquisador como consultor no setor, da observação das
alterações competitivas radicais ocorridas no segmento nos últimos anos, bem como
do contato preliminar com a literatura da área.
A análise de elementos da cultura organizacional – artefatos, valores e
pressupostos -, segundo proposição de Schein (2004), ajudam na compreensão da
dinâmica da empresa, dos fatores que fundamentam o seu modelo de gestão e das
práticas que norteiam o comportamento organizacional. Outros autores, como
16
Hofstede (1991), apresentam as manifestações da cultura a partir da análise dos
valores, heróis, rituais, símbolos e práticas da organização.
Considerando a inovação nas empresas, Christensen (2003) propõe dois
tipos básicos - a incremental, que diz respeito à melhoria de processos ou produtos
existentes, e a radical, que considera ideias novas de produtos e mercados,
reinventando o conceito do negócio e, em alguns casos, modificando a forma como
o mercado está constituído e operando.
Visando ao entendimento da relação entre os dois conceitos – cultura
organizacional e inovação -, por meio de uma perspectiva mais ampla e que integre
os dois elementos, foi explorado o conceito de arquétipos1 (GREENWOOD;
HININGS, 1993), que apresenta um esquema interpretativo através de um conjunto
de estruturas e sistemas. A perspectiva de cultura organizacional apresentada por
Schein (2004) tem conformidade com esse esquema interpretativo.
Autores como McLaughlin, Bessant e Smart (2005) propuseram um modelo
dinâmico para a análise das posições da cultura organizacional para cada tipo de
inovação – incremental ou radical –, conforme definição de Christensen (2003).
O modelo proposto parte do conceito dos arquétipos (GRENWOOD;
HININGS, 1993), definido em duas linhas gerais. Em primeiro lugar, a estrutura
organizacional e os sistemas de gestão são melhor compreendidos através da
análise dos padrões gerais, do que quando limitam a propriedades especificas da
organização. Em segundo lugar, os padrões são uma função associada às ideias,
crenças e valores que compõem, dessa forma, um esquema interpretativo que
sustenta e embasa as estruturas organizacionais e sistemas. Dessa maneira, os
arquétipos são um conjunto de estruturas e sistemas relacionados a um esquema
interpretativo.
Com base nessa definição, chega-se então aos dois tipos de arquétipos,
conforme modelo proposto por McLaughlin, Bessant e Smart (2005), que
apresentam posições ideais para a cultura organizacional de acordo com cada tipo
1 • substantivo masculino
1. modelo ou padrão passível de ser reproduzido em simulacros ou objetos semelhantes 2. ideia que serve de base para a classificação dos objetos sensíveis 3. derivação: por extensão de sentido.
a. qualquer modelo, tipo, paradigma (HOUAISS, 2008).
17
de inovação. O arquétipo tipo I tem uma perspectiva incremental para inovação, ou
seja, tendência em manter ou introduzir aperfeiçoamentos, típico de uma
organização madura. Já o tipo II utiliza a perspectiva de inovação radical, ações de
explorar, atravessar fronteiras, típico de uma organização empreendedora.
Assim sendo, pode-se entender melhor os elementos de cultura inovadora,
através dos arquétipos propostos, analisando qual tipo de cultura caracteriza melhor
uma posição de inovação incremental para inovação radical.
Neste trabalho, foi realizada uma pesquisa qualitativa do tipo exploratória,
utilizando como método o estudo de caso, tendo como objeto empírico a Drogaria
Araujo, organização do setor de comércio farmacêutico, com mais de 100 anos de
existência.
A Drogaria Araujo, objeto do nosso estudo, é uma empresa do setor de
comércio farmacêutico, fundada em 1906, na cidade de Belo Horizonte,
originalmente com o nome de Pharmácia Mineira, de propriedade de Aberlardo
Alvim, depois adquirida por Modesto Araujo, vindo a denominar-se Drogaria Araujo.
Atualmente, continua uma organização familiar, dirigida pela terceira geração da
família Araujo. Como é uma organização que tem mais de 100 anos, supõe-se que
práticas de inovação subsidiadas e influenciadas por uma cultura organizacional
nutritiva podem ter contribuído para a sua sobrevivência durante todo este tempo
(DROGARIA ARAUJO, 2008).
Em função da própria história do Brasil e de suas sucessivas crises
econômicas e constantes mudanças no cenário político, supõe-se que a Drogaria
Araujo tenha desenvolvido uma capacidade de adaptação ao longo de todos os anos
e crises que enfrentou. Ademais,, dentro desse contexto histórico, por meio da
inovação, conseguiu lidar com as possíveis adversidades e não só manter-se no
mercado, mas também expandir-se. Internamente, supõe-se que a organização
soube lidar com a perda dos seus primeiros líderes e transferência do poder para as
gerações subsequentes (BRASIL; ARRUDA, 2006).
Para Schein (2004), os fundadores da organização têm um papel importante
no processo de moldar seus padrões culturais. Os primeiros líderes, ao
desenvolverem formas próprias de equacionar os problemas da organização,
imprimiriam não só a sua visão de mundo aos demais, como também a visão do
papel que a organização deve desempenhar no mundo.
18
Desde o início de suas operações, a Drogaria Araujo, objeto desta pesquisa,
buscou diferenciais competitivos, que foram sendo mantidos e aprimorados ao longo
dos seus 100 anos de existência. São características que podem ter sido moldadas
pelo seu fundador e que, de certa forma, parecem coincidir com os seus valores e
princípios, desde os primeiros anos de funcionamento da empresa (BRASIL;
ARRUDA, 2006).
Analisando o setor de comercio farmacêutico, segundo dados do BNDES
(2001), as farmácias e drogarias constituem-se no principal canal de distribuição de
medicamentos para a população brasileira. Existe, no Brasil, um universo de pouco
mais de 50 mil farmácias (país com o maior número de farmácias em todo o mundo),
com uma proporção de 2,99 farmácias para cada 10 mil habitantes, considerando
uma população de, aproximadamente, 167 milhões de habitantes (SAAB, 2001).
Para efeito de comparação, os Estados Unidos possuem aproximadamente 39.000
farmácias (NACDS, 2006) para uma população de 304 milhões de habitantes, o que
equivale a uma proporção de 1,28 farmácias para cada dez mil habitantes.
O estudo do BNDES também demonstra que esse é um setor que passa por
um processo de aumento da concorrência, pois, além da competição entre as
farmácias independentes e as de grandes redes, há a disputa do varejo farmacêutico
com os supermercados, principal concorrente na disputa pelo mercado de
cosméticos e perfumaria. Isto se deve ao fato de que a comercialização de
medicamentos, por parte dos supermercados, é estritamente proibida pela legislação
vigente (SAAB, 2001).
Em relação aos produtos de cosméticos e perfumaria, as farmácias
concorrem em desvantagem, pois o tamanho de suas lojas é limitado, o que
restringe, por sua vez, o número de itens a serem comercializados, que podem
alcançar 40 mil nos supermercados (SAAB, 2001)
Grandes empresas do setor passam por dificuldades, como a Drogamed, do
Paraná, que entrou com pedido de falência no dia 5 de maio de 2008. Empresa
fundada em 1975, chegou a ter mais 100 lojas (STAVISKI, 2008).
Já a Drogaria Araujo teve seu faturamento crescente, de 2001 a 2006, que foi
de 136,4%, nesse período de 5 anos. Portanto, mais do que dobrou, a uma taxa
média anual de 18,74%, bem maior do que a inflação acumulada do mesmo período,
19
conforme índice IGP-M da Fundação Getulio Vargas de 61,83% (BRASIL; ARRUDA,
2006).
A ABRAFARMA –Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias -,
que congrega as 30 maiores redes de farmácias do Brasil, nos seus balanços
consolidados de 2005, apresenta Lucro Líquido depois da provisão de Imposto de
Renda de 0,17%, ou seja, um valor bem menor do que aquele de 1,6% auferido pela
Drogaria Araujo no mesmo período (BRASIL; ARRUDA, 2006).
No ranking dessas redes, a Drogaria Araujo é a maior de Minas, a sétima
maior em faturamento e em número de lojas do Brasil, e a segunda maior do Brasil
de faturamento por número de lojas (ABRAFARMA, 2007).
A Drogaria Araujo completou 100 anos em 2006, com 85 lojas na grande BH,
sendo 27 lojas 24 horas, atendendo dois milhões de clientes por mês e com 3.500
funcionários. No seu plano de expansão, elaborado em 2006, pretendia abrir novas
lojas na capital e no interior de Minas, com o objetivo de ter 100 lojas em 2008
(DROGARIA ARAUJO, 2008).
Ainda há de se destacar a importância empresarial da Drogaria Araujo,
considerando o pequeno número de empresas centenárias do Brasil de capital
privado predominantemente nacional, segundo dissertação de Mestrado de Roso
(2004). De acordo com o autor, elas constituem um total de seis empresas – O
Estado de São Paulo, Hering, Guerdau, Dohler, Karsten e Eberle -, cuja identificação
para estudo foi retirada dos anuários 500 Melhores e Maiores (EXAME, 2003) e As
500 maiores Sociedades Anônimas do Brasil (FGV,2003), sendo que nenhuma
delas é do setor de comércio farmacêutico2.
Deparou-se, então, neste estudo, com um caso de uma empresa que
conseguiu sobreviver, crescer e se sustentar, possivelmente utilizando-se de
práticas inovadoras, ao longo de cem anos em cenários cada vez mais competitivos.
O autor desta dissertação considerou que a inovação poderia ter sido um fator
importante para a sua sobrevivência e que a cultura organizacional deveria ter
facilitado a criação de um ambiente propício à inovação.
2 O autor desta dissertação, através de pesquisas na Internet, constatou a existência de fontes que citam outras empresas centenárias, como o Grupo Ypioca – fundado em 1846 - e a Cedro Cachoeira – fundada em 1872 (ALMEIDA, 2008). A Drogaria Araujo não foi citada na dissertação de Roso (2004), pois completou 100 anos em 2006.
20
A partir desses pressupostos, emergiram então algumas questões que foram
consideradas para a realização da pesquisa:
a) Quais os elementos organizacionais e gerenciais que
compõem a cultura da empresa pesquisada?
b) Quais as práticas que podem ser consideradas inovadoras no
modelo de gestão e prestação de serviços adotados na
empresa pesquisada?
c) Qual a relação entre a cultura organizacional e as inovações
no modelo de gestão e na prestação de serviços
implementados na empresa pesquisada?
d) Quais os elementos que compõem a cultura da organização a
ser pesquisada que possuem alguma relação com os tipos de
inovação – incremental e radical -, propostos por autores da
área?
Acredita-se então que a realização do trabalho sobre a cultura da organização
e suas relações com os tipos de inovação implementados na Drogaria Araujo,
identificando elementos que compõem essa cultura e as práticas que possam ser
consideradas inovadoras no seu modelo de gestão e prestação de serviços (dada a
singularidade da organização, por ter conseguido sobreviver e crescer durante todo
este período e neste setor competitivo) pode trazer mais subsídios para a
compreensão das relações entre cultura organizacional e inovação.
Pretendeu-se, em resumo, com esta dissertação, identificar os elementos da
cultura da organização a ser investigada, com base na perspectiva proposta por
Schein (2004) e Hofstede et al (1991), e também por meio de um esquema
interpretativo fundamentado no conceito dos arquétipos de Greenwood e Hinings
(1993). O modelo foi desenvolvido pelo autor da dissertação e adaptado de
McLaughlin, Bessant e Smart (2005). Este modelo apresenta também a relação com
os tipos de inovação propostos por Christensen (2003). Em complemento, foram
identificados os aspectos da cultura brasileira que podem ter exercido influência
nesse modelo, com base nas definições de Tanure (2007).
21
1.2 Objetivos da pesquisa
1.2.1 Objetivo geral
O objetivo deste estudo foi identificar os elementos que compõem a cultura da
organização pesquisada e analisar a sua relação com os tipos de inovação
implementados na empresa, conforme modelo proposto por McLaughlin, Bessant e
Smart (2005).
1.2.2 Objetivos específicos
A partir do objetivo geral, depreende-se os seguintes objetivos específicos:
Identificar os elementos organizacionais e gerenciais que compõem a
cultura da empresa pesquisada.
Identificar as práticas que possam ser consideradas inovadoras – no
seu modelo de gestão e prestação de serviços –, adotadas na empresa
pesquisada.
Analisar a relação entre a cultura organizacional e as inovações no
modelo de gestão e na prestação de serviço, tendo como referência
teórica o modelo proposto por McLaughlin, Bessant e Smart (2005).
A dissertação foi estruturada da seguinte forma. Após esta introdução, onde
se estabelece o problema, a justificativa e os objetivos, discute-se, no Capítulo 2, o
referencial teórico do trabalho. O Capítulo 3 apresenta a metodologia utilizada. No
Capítulo 4, os dados são descritos e analisados. Por fim, no Capítulo 5, as
conclusões são apresentadas, bem como as limitações do trabalho e sugestões para
novos estudos.
22
2 REFERENCIAL TEÓRICO
Neste capítulo, serão apresentados os temas ou perspectivas teóricas que
embasaram a análise dos dados da pesquisa. Inicialmente, abordaremos o tema
cultura organizacional, buscando discutir alguns dos modelos desenvolvidos para a
análise dos elementos que caracterizam determinada organização. Em seguida, será
abordado o tema inovação, discutindo os tipos de inovação e suas implicações para
as organizações. Por fim, serão relacionados os dois temas, utilizando-se como base
o modelo teórico proposto por McLaughlin, Bessant e Smart (2005).
2.1 Cultura organizacional
O termo cultura não surgiu originalmente na teoria das organizações. Ele foi
utilizado por antropólogos como referência aos costumes e rituais que as sociedades
desenvolvem ao longo do curso de sua história. Entretanto, tem sido utilizado
também nas últimas décadas por determinados pesquisadores organizacionais para
se referenciar às práticas que as organizações utilizam para lidar com as pessoas ou
criar valores e normas para as organizações (SCHEIN, 1985, 1996, 1997, 2004).
Geertz (1989) é um dos antropólogos que estabeleceu a relação entre o
estudo da cultura e as ciências humanas e sociais em geral. Seu trabalho foi
elaborado dentro dos pressupostos da pesquisa etnográfica, não com o objetivo
empirista de reduzir e prever, mas de compreender de forma profunda, porém
inteligível e racional, o significado das especificidades das diferentes sociedades ou
comunidades. Em complemento, para Schein (2004), a cultura pode ser um conceito
abstrato, mas, suas consequências comportamentais e atitudinais podem ser
concretamente verificadas.
23
A cultura organizacional tem sido objeto de um debate intenso nos últimos
anos com diferentes visões e definições (ASHKANASY; WILDEROM; PETERSON,
2000; BEYER, 1993; CAMERON; QUINN, 1999; DEAL; KENNEDY, 1999;
HOFSTEDE, 1991; MARTIN, 2002; TRICE; SHULTZ, 1995). Esses debates ratificam
a importância que o conceito de cultura adquiriu para a compreensão dos valores e
comportamentos de determinado grupo social, mas, ao mesmo tempo, causam
confusão e dificuldades dadas as suas inconsistências (SCHEIN, 2004). No entanto,
observa-se que, de maneira geral, os conceitos relacionam ou tratam a cultura como
algo que os membros de um grupo compartilham ou têm em comum.
O conceito de cultura foi introduzido nos estudos organizacionais no final da
década de 50. A expansão geográfica das empresas multinacionais justificou esse
interesse de pesquisa, pois as mesmas pretendiam reproduzir suas estruturas em
outros países, ao mesmo tempo em que obtinham vantagens competitivas, tais
como mão de obra barata, novos mercados, proximidade a matérias primas, entre
outras. Mesmo reproduzindo as estruturas e os principais programas da empresa
matriz, os resultados não foram os mesmos e os administradores se depararam com
problemas que não existiam em seus países de origem. Atribuíram esses problemas
às diferenças culturais entre países (HOFSTEDE, 1991; TANURE, 2007; ZANDER,
1997).
Dessa forma, uma das primeiras concepções de cultura empregada pelas
ciências administrativas é semelhante à concepção das culturas nacionais, segundo
a qual se procura identificar quais elementos culturais da sociedade foram
incorporados às organizações, influenciando nas crenças e valores dos empregados
(SCHEIN, 2004).
Smircich (1983) também representou essa linha de estudos da cultura nas
organizações conforme apresentado na FIG. 2. Nela, cada membro da organização
(representado por um círculo) é identificado como elemento de transmissão da
cultura adquirida em um contexto cultural externo - país ou região -, influenciando no
seu comportamento no ambiente organizacional e contribuindo para a constituição
dos valores que irão nortear a cultura da organização.
24
FIGURA 2 - Modelo teórico dos estudos de cultura Fonte: Smircich (1983).
Duas grandes linhas de pesquisa ou perspectivas para analisar cultura
organizacional foram definidas por Smircich (1983). Na visão do autor, a primeira
abordagem considera a cultura como uma variável (algo que a organização tem)
dependente ou interna, e a segunda como uma metáfora, independente ou externa.
A perspectiva de cultura como uma variável defende que os valores e crenças da
sociedade na qual a organização está inserida são trazidas pelos seus membros
para o ambiente da empresa. Já a perspectiva de metáfora compreende que as
organizações produzem bens, serviços e também elementos culturais como lendas,
ritos, símbolos. No primeiro caso, a cultura é parte do ambiente, e, no segundo, ela é
concebida como fruto da atuação e das representações dos indivíduos nas
organizações (SMIRCICH, 1983).
A perspectiva de análise da cultura como variável interna a considera como
um elemento de coesão. As discussões por essa via tendem a visualizar o fenômeno
cultural como um amálgama, um elemento que favorece a união, deixando de lado
as diferenças entre os indivíduos. Na avaliação crítica de Smircich (1983), tenta-se,
nessa perspectiva, compreender a cultura organizacional sem, no entanto, se
conseguir atingir a real complexidade de que se reveste a dinâmica das
25
organizações, em função das interações e das adaptações que existem nas mesmas
em decorrência da influência do ambiente em que organização está inserida.
A cultura organizacional como uma variável considera a cultura como
característica da organização. Nesse contexto, enfatiza-se a eficácia, tendo em vista
a aceitação, por parte dos indivíduos, dos objetivos organizacionais, ressaltando a
tentativa de homogeneização de valores a partir dos rituais, histórias e linguagem
que caracterizam a cultura (SMIRCICH, 1983).
A perspectiva de análise da cultura como uma metáfora defende que a
formação desta se dá dentro de um processo histórico, no qual as pessoas, em
interação entre si, com o ambiente e o trabalho, vão absorvendo valores, princípios e
desenvolvendo interpretações sobre pessoas e situações que vão permear o
pensamento, os sentimentos e ações específicas em uma determinada organização
(SMIRCICH, 1983).
Morgan (l996) é outro autor que discute as diversas formas de refletir sobre o
universo das organizações, e propõe um tipo de análise também baseado em
metáforas para identificar ou ressaltar aspectos-chave da situação em diferentes
lentes. Uma delas é a metáfora da cultura, que vê a organização como um conjunto
de valores, ideias, crenças, ritos e mitos, que sustentam a organização a partir de
uma realidade social construída.
Morgan (1996) observa que o significado, sentido e compreensão dos
indivíduos sobre a empresa representam uma forma de se identificar a cultura da
organização, porque, ao se falar da cultura, ocorre um processo de organização de
elementos, ou seja, um processo de construção da realidade. Na visão do autor,
pode-se afirmar que a natureza da cultura encontra-se nas suas normas sociais e
costumes e que, quando há a adesão por parte de um indivíduo a essas regras de
comportamento, ele constrói uma realidade social adequada ao seu equilíbrio
psicológico.
Nas palavras de Morgan (1996, p. 125), “as crenças e valores compartilhados,
fragmentados ou integrados, e suportados pelas normas sociais e costumes podem
exercer uma influência decisiva na capacidade da organização de lidar com os
desafios que surgem”.
Para Smircich (l983), a corrente que concebe a cultura como uma metáfora
analisam-na em seus aspectos simbólicos, ideais e expressivos. Esses estudos
26
analisam a cultura como uma forma de expressão humana, visando à compreensão
dos significados e dos processos que proporcionam a existência da organização.
Dessa forma, destaca-se uma congruência de pontos de vista de diversos
autores sobre a dimensão simbólica como uma categoria privilegiada para o estudo
da cultura das organizações, que privilegia os valores e pressupostos básicos que
carregam um significado particular, o que é reconhecido por aqueles que
compartilham determinado espaço.
O fato é que, para Aktouf (1993), o estudo da cultura, seja como uma variável
ou metáfora, pressupõe analisar os elementos que favorecem a união entre os
membros da organização, buscando sustentação e o alcance dos objetivos
organizacionais. Nesse sentido, a cultura apresenta-se como instrumento adequado
para possibilitar a harmonia entre dirigentes e empregados, num processo de
interação.
Diversos autores definem então cultura organizacional como padrões de
comportamento quando as pessoas interagem: a linguagem que utilizam, os
costumes e tradições envolvidos e os rituais que norteiam as diferentes situações
(GOFFMAN, 1967; JONES; MOORE; SNYDER, 1988; TRICE; BEYER, 1993; VAN
MAANEN, 1979), também como normas do grupo, que são os padrões e valores
implícitos existentes em determinados grupo de trabalho (HOMANS, 1950;
KILMANN; SAXTON, 1983), ou como pressupostos básicos, que são os princípios e
valores articulados, anunciados e difundidos pelo grupo e que são disseminados
(DEAL; KENNEDY, 1982).
A cultura também pode ser reconhecida por meios formais como as políticas e
princípios que norteiam as ações do grupo e stakeholders3 (OUCHI, 1981;
PASCALE; ATHOS, 1981; PACKARD, 1995).
Por outro lado, cultura pode ser compreendida como as regras do jogo, ou
seja, as regras não escritas ou implícitas existentes na organização, e as quais os
novatos devem aprender para serem aceitos como membros (RITTI E
FUNKHOUSER, 1987; SCHEIN, 1978; VAN MAANEN, 1979).
3 Alguém que tem uma participação ou interesse em um determinado empreendimento ou
organização. Podem ser os acionistas, diretores, gerentes, empregados, fornecedores, governo e a comunidade (DICTIONARY, 2009, tradução nossa).
27
Neste sentido, destaca-se a compreensão da cultura através dos ritos, rituais
e celebrações da vida corporativa: a maneira através da qual o grupo celebra os
eventos-chave e que refletem valores ou momentos importantes, como datas
significativas, promoções, a finalização de projetos marcantes, dentre outros (DEAL;
KENNEDY, 1982; TRICE; BEYER, 1993).
Segundo Schein (2004), ao se analisarem os diversos elementos formais e
informais que caracterizam a cultura organizacional - normas, valores, padrões de
comportamento, rituais, tradições e demais -, existem características que podem ser
observadas, tais como a estabilidade estrutural, profundidade, extensão e
padronização ou integração.
Sobre a primeira característica, Schein (2004) defende que a cultura implica
na existência de determinado nível de estabilidade estrutural no grupo. Quando há
a referência de que algo é cultural, não significa que este algo é somente
compartilhado, mas, também, estável, porque define a identidade do grupo. Nesse
sentido, a cultura é algo difícil de mudar, pois os membros do grupo valorizam a
estabilidade que promove previsibilidade e tranquilidade às pessoas (SCHEIN, 2004,
grifo nosso).
Nas palavras de Schein (2004, p. 14, grifo nosso), “a cultura é a parte de
maior profundidade e muitas vezes inconsciente de um grupo, sendo assim, menos
tangível e visível do que as outras partes”. O autor comenta que é perceptível em
um grupo a característica de que seus membros têm uma história em comum, e
qualquer grupo que compartilha uma história desenvolve valores e pressupostos que
se traduzem na cultura. Todos temos uma noção clara da existência deste
fenômeno, mas, defini-lo com clareza nem sempre é tarefa fácil.
Outra característica da cultura, segundo SCHEIN (2004), é que, na medida
em que é desenvolvida e consolidada, ela se dissemina por todo o grupo, com alto
grau de extensão. Já a característica de padronização ou integração está
relacionada à organização dos elementos culturais – rituais, clima, valores e
comportamentos – em um conjunto coerente, e advêm da necessidade humana de
tornar o seu ambiente o mais sensato, organizado e previsível (WEICK, 1995, grifo
nosso).
E como a cultura se forma? Basicamente, a cultura se forma de duas
maneiras. Segundo Schein (2004), a cultura é construída através das interações
28
espontâneas num grupo não estruturado, e gradualmente conduzem a padrões e
normas de comportamento que acabam se constituindo na cultura do grupo.
Para Schein (2004), em grupos mais formais, como nas organizações, a
cultura se forma a partir do fundador. Este indivíduo fundador, através de suas
visões, objetivos, crenças, valores e concepções pessoais, acaba influenciando a
maneira pela qual os processos devem ocorrer. Ele ou ela inicialmente irá impor, ao
grupo, as suas ideias e valores, e iniciar o processo de se criar estabilidade
estrutural para a organização. Na medida em que o comportamento resultante das
crenças iniciais leva a resultados positivos, os padrões e valores do fundador são
confirmados e reforçados, e passam a ser reconhecidos como adequados (SCHEIN,
2004).
O processo contínuo de reforçar crenças e valores, que se mostraram
essenciais para o funcionamento do grupo ou organização, leva o grupo a considerá-
los como elementos inegociáveis, dotados de características inquestionáveis. Esses
elementos que fundamentam a cultura organizacional são denominados por Schein
(2004) de pressupostos básicos.
O processo dinâmico de criação, consolidação e gerenciamento da cultura
pode ser considerado como a essência do trabalho da liderança. Segundo Schein
(2004), a construção da cultura se inicia com líderes que são capazes de impor seus
valores, crenças e percepções para o grupo. A habilidade de perceber as limitações
de uma determinada cultura e adaptá-la ao ambiente é a essência e maior desafio
da liderança, segundo ele. Percebe-se, então, que a cultura é resultado de um
complexo aprendizado em grupo, mas fortemente influenciado pelo comportamento
do líder/fundador.
A partir do momento que um grupo compartilha uma cultura, passa a existir
um processo de socialização, que significa transmitir elementos dessa cultura para
as novas gerações de membros do grupo (LOUIS, 1980; SCHEIN, 1968; VAN
MAANEN, 1979).
A cultura pode então ser definida como uma internalização de concepções
básicas e compartilhadas que são aprendidas por um grupo, de forma a resolver os
problemas relacionados à adaptação externa ou integração interna. O Quadro 1
sintetiza os elementos que compõem os processos de adaptação de determinada
29
organização ao ambiente – adaptação externa -, bem como os fatores utilizados
para se obter a integração interna (SCHEIN, 2004, grifo nosso).
Adaptação externa Integração interna
A missão, funções e tarefas primordiais
da organização perante o seu ambiente.
A linguagem comum, incluindo conceitos
básicos de tempo e espaço.
Os objetivos específicos a serem
atingidos pela organização.
As fronteiras do grupo e critérios para
inclusão de novos membros.
Os métodos a serem utilizados para
acompanhar a consecução dos objetivos.
As estratégias para alocação de status,
poder e autoridade.
Os critérios utilizados para medir
resultados.
As ações para promover a intimidade,
amizade e relacionamentos no trabalho.
As estratégias emergenciais ou
corretivas a serem adotadas caso os
objetivos não estejam sendo alcançados.
Os critérios para recompensa e punição.
As estratégias para gerenciar, por
exemplo, as diferenças interpessoais no
âmbito ideológico e religioso.
QUADRO 1 - Atividades de adaptação externa e integração interna Fonte: Adaptado de Schein (1985).
As concepções básicas, quando funcionam bem no sentido de promover a
adaptação externa e a integração interna, são transmitidas para os novos membros
como a forma correta de perceber, pensar e sentir com relação aos problemas
(SCHEIN, 2004). Na verdade, o autor elaborou um conceito de cultura
organizacional, concebendo-o como um modelo dinâmico, que possa ser aprendido,
transmitido e adaptado, quando necessário.
Segundo Schein (2004), há três diferentes níveis através dos quais a cultura
de uma organização pode ser identificada, como se pode ver na FIG. 3.
30
FIGURA 3 - Níveis de análise da cultura organizacional
Fonte: SCHEIN (2004).
O primeiro nível, o dos artefatos visíveis, como o próprio nome sugere,
representa o Layout da organização, o comportamento e vestuário das pessoas, os
rituais, os mitos organizacionais, assim como as crenças expressas em documentos
– fáceis de serem percebidos, mas difíceis de serem interpretados, pois fazem parte
do cotidiano, mas ninguém reflete sobre eles (SCHEIN, 2004, grifo nosso).
Já o segundo nível - valores compartilhados - aponta o problema da
diferença existente entre os valores aparentes e os valores em uso. Para identificar
esses valores, é difícil fazê-lo apenas através de uma observação direta, é preciso
entrevistar os membros-chave da organização, ou realizar a análise de conteúdo de
seus documentos formais. Entretanto, ao identificar esses valores, verifica-se que
eles expressam o que as pessoas reportam ser a razão do seu comportamento, o
que, na maioria das vezes, são idealizações ou racionalizações. As razões
31
subjacentes ao seu comportamento permanecem, entretanto, escondidas ou
inconscientes (SCHEIN, 2004, grifo nosso).
Por fim, o terceiro nível, o dos pressupostos básicos, são normalmente
inconscientes, mas, na realidade, determinam como os membros do grupo
percebem, pensam e sentem. À medida que certos valores compartilhados pelo
grupo conduzem a determinados comportamentos, e esses comportamentos se
mostram adequados para solucionar problemas, o valor é gradualmente
transformado em um pressuposto inconsciente de como as coisas realmente devem
ser (SCHEIN, 2004, grifo nosso).
Schein (2004) ainda esclarece que o modelo da FIG. 3 não é apenas uma
forma de se obterem informações sobre a cultura organizacional. Os níveis nela
apresentados interagem entre si, ou seja, a compreensão dos níveis “inferiores” é
fundamental para se entenderem e interpretarem os artefatos visíveis.
O autor exemplifica que os empregados de uma empresa formal e
burocratizada podem compartilhar valores e pressupostos básicos semelhantes aos
de uma empresa menos rígida e horizontalizada. Por essa razão, para o autor, os
estudos de cultura organizacional não podem restringir-se à observação dos
artefatos visíveis. É necessário dialogar com os membros de uma organização para
melhor compreensão do significado que atribuem aos elementos que constituem a
cultura da empresa.
Mesmo assim, as explicações dos membros da organização para os aspectos
visíveis ainda não são suficientes, porque existem pressupostos subjacentes
considerados tão óbvios para o grupo que nunca são enunciados. Esses
pressupostos influenciam todo o processo de interação dos membros da empresa,
bem como o seu comportamento, sem que eles se percebam disto a maior parte do
tempo (SCHEIN, 1992).
Dada a natureza subjacente e internalizada da cultura, os membros de uma
organização podem não conseguir de forma imediata refletir sobre a sua cultura e
descrevê-la. Daí, a dificuldade de se mensurar ou avaliar a cultura, como também de
se identificarem valores e principalmente pressupostos básicos.
Schein (1996) ainda comenta sobre a dificuldade de se identificarem
elementos culturais:
32
Eu penso que este é um processo muito difícil e nossas teorias são ainda incipientes, porque não temos praticado o suficiente. Especialmente em relação à cultura, quando eu vejo meus colegas inventando questionários para "mensurar” a cultura, penso que eles não irão, simplesmente, ver o que está ali, e isto é particularmente perigoso quando se está lidando com uma força social invisível e tão poderosa (SCHEIN, 1996, p. 11).
Hofstede (l99l) também fornece alguns dos principais elementos que estão na
base de muitos estudos atuais sobre esse tema. Para ele, a palavra cultura tem
diversos significados, todos derivados de sua origem latina, que se refere ao cultivo
do solo. Na maioria das línguas ocidentais, cultura significa civilização ou
refinamento da mente.
Nesse caso, o autor considera limitado o sentido de tal definição, e aceita o
conceito preconizado pela antropologia social de que a cultura é uma palavra-chave
para todos os padrões de pensamento, sentimento e ação dos grupos e categorias
humanas diferentes.
Em um estudo de âmbito organizacional, Hofstede et al (1990) comparam a
cultura de 20 empresas que operavam na Dinamarca e na Holanda e que possuíam
características culturais semelhantes. Nessa pesquisa, são analisadas as
manifestações da cultura em quatro categorias (símbolos, heróis, rituais e valores),
segundo o modelo a seguir:
FIGURA 4: Manifestações da cultura Fonte: Hofstede et al (1990).
De acordo com Hofstede et al (1990), os símbolos são palavras, gestos,
figuras ou objetos que trazem um significado específico sobre a cultura. Os heróis
33
são pessoas, vivas ou mortas, reais ou imaginárias, que possuem características
admiradas pelo grupo e servem como modelos de comportamento. Os rituais são
atividades coletivas socialmente desenvolvidas dentro da cultura. Ritos, rituais e
cerimônias são exemplos de atividades planejadas que reforçam a cultura.
Os símbolos, heróis e rituais podem ser resumidos, para o autor, pelo termo
práticas, porque eles são visíveis para um observador, ao passo que o significado da
cultura reside na forma que ela é percebida pelos seus membros. O núcleo da
cultura, de acordo com a FIG. 4, é formado pelos valores, que são normalmente
inconscientes e raramente discutidos, não podem ser observados, mas,
interpretados a partir dos comportamentos.
Esses quatro termos são encontrados na literatura de cultura (DEAL;
KENNEDY, 1982) e de maneira geral têm definições próprias, mas similares entre
diferentes autores (HOFSTEDE et al, 1990).
Tanure (2007, p. 1) ampliou os estudos de Hofstede (1990), tendo em vista a
realidade brasileira. A autora defende a hipótese de que “a cultura brasileira, com
suas características e especificidades, impacta o modelo de gestão das empresas”.
A autora analisa as quatro dimensões identificadas por Hofstede (1980 apud
TANURE, 2007), que são: (1) a distância do poder; (2) a necessidade de controlar as
incertezas; (3) a forma como os indivíduos interagem nos grupos; e (4) a
masculinidade versus a feminilidade. Posteriormente, há uma quinta dimensão,
modelada a partir de valores orientais, que é a orientação de longo prazo versus
orientação de curto prazo.
Na pesquisa realizada, Tanure (2007) constata que as organizações
brasileiras são influenciadas pelas características de concentração de poder e
personalismo, e tendem a assumir posições mais coletivistas do que individualistas.
Para a autora, há uma predominância também, na cultura brasileira, de
valores masculinos, como competição e interesse pelo sucesso material, em
contraposição aos femininos, como ternura, generosidade e cooperação, o que se
reflete também na gestão organizacional
A postura organizacional brasileira, de maneira geral, é também de uma
tendência à orientação de longo prazo, ou seja, ainda não adota metas e objetivos a
serem cumpridos rigorosamente em curto espaço de tempo, e os executivos
34
acreditam que a construção das relações sociais internas e empresariais demanda
período maior de tempo para se consolidarem (TANURE, 2007).
Por fim, a autora apresenta o que denomina sistema de ação cultural
brasileiro, e considera que a flexibilidade é o seu fator fundamental, sendo esta
característica é um traço que permite a articulação entre os subsistemas
“institucional e pessoal” e “Líder e liderados”, conforme a FIG. 5. Ou seja, a partir
dos resultados de sua pesquisa, a autora desenvolve uma matriz – sistema de ação
cultural brasileiro – com os elementos que, na sua visão, caracterizam o padrão de
comportamento nas organizações brasileiras.
FIGURA 5: Sistema de ação cultural brasileiro Fonte: Tanure (2007).
Segundo a autora, o modelo proposto de ação cultural brasileira pode ser
caracterizado como um sistema composto de quatro subsistemas – o institucional,
pessoal, dos líderes e dos liderados.
O subsistema institucional está relacionado com os traços culturais que
encontramos na “rua”, como conceituado por Da Matta (1987 apud TANURE, 2007).
O subsistema pessoal diz respeito ao espaço da “casa” ou organização, sendo que o
subsistema de líderes e o de liderados correspondem aos grupos dos que detêm o
poder e aos grupos dos subordinados ao poder, respectivamente.
Esses subsistemas apresentam interseções entre si, encontrando-se nessas
interseções traços culturais comuns, que são: a concentração de poder – na
interseção dos subsistemas líderes e formal; a postura de espectador – na
interseção dos subsistemas liderados e informal; o personalismo – na interseção dos
35
subsistemas líderes e pessoal, e o evitar conflitos – na interseção dos subsistemas
liderados e pessoal.
Esses subsistemas, ademais, estão articulados por meio de traços culturais
especiais que são responsáveis pelo equilíbrio/manutenção do sistema cultural e, ao
mesmo tempo, são também os elementos que podem ser alterados para tornar
possível uma significativa mudança cultural. Os traços culturais especiais são o
paternalismo, a lealdade a pessoas, o formalismo e a flexibilidade.
A combinação desses dois conjuntos – formal ou institucional e pessoal ou
informal - compõe a estrutura do modelo representativo do sistema de ação cultural
brasileiro, que apresenta, segundo Tanure (2007), no seu epicentro, o traço da
impunidade. Isto significa que, para a autora, tais elementos culturais tendem a
favorecer a característica de impunidade através de uma sociedade tolerante e
permissiva com os delitos, prevalecendo uma sensação compartilhada entre seus
membros de que a punição é rara ou insuficiente.
Utilizando de outra terminologia, Freitas (l991), baseada em Deal e Kennedy
(1982), define a cultura organizacional a partir de elementos que fornecem
significados para os membros da organização. Os mais importantes desses
elementos são representados por:
a) valores, que são os princípios básicos na organização; estes estabelecem
os padrões que devem ser perseguidos na organização e representam a essência
de sua filosofia, uma vez que fornecem um senso de direção comum para todos os
empregados e um guia do comportamento diário;
b) crenças e pressupostos, que caracterizam aquilo que é tido como verdade
na organização, são conceitos internalizados nas organizações e inquestionáveis.
Este elemento é condizente com a perspectiva apresentada por Schein (1992), que
destaca que a chave para a compreensão da cultura está em decifrar o conjunto de
pressupostos compartilhados e descobrir como os mesmos se encaixam num
modelo cultural;
c) ritos, rituais e cerimônias, que são exemplos de atividades planejadas que
têm consequências práticas e expressivas, na valorização e explicitação dos valores
e crenças, tornando a cultura organizacional mais visível e coesa;
d) histórias e mitos, sendo as primeiras narrativas baseadas em eventos
ocorridos que informam sobre a organização, reforçam o comportamento existente e
36
enfatizam como esse comportamento se ajusta ao ambiente organizacional. Já os
mitos se referem a histórias construídas e enriquecidas de forma consistente com os
valores da organização;
e) tabus, que também orientam o comportamento, demarcando áreas de
proibições, e colocam em evidência o aspecto disciplinar da cultura, com ênfase no
não-permitido;
f) heróis, pessoas que personificam os valores e condensam a força da
organização;
g) norma, que é o comportamento sancionado, através do qual as pessoas
são recompensadas ou punidas, confrontadas ou encorajadas;
h) comunicação, processo fundamental na formação da cultura, sustentando-
a, transmitindo-a e promovendo alterações, quando necessário;
i) símbolos são os objetos, atos, eventos, que servem de veículo para
transmissão dos valores.
Já Fleury (l997) apresenta um conceito de cultura, acrescentando as
dimensões ideológicas e de poder:
Cultura é um conjunto de valores e pressupostos básicos expressos em
elementos simbólicos que em sua capacidade de ordenar, atribuir
significações, construir a identidade organizacional, tanto agem como
elemento de comunicação e consenso, como ocultam e instrumentalizam as
relações de dominação (FLEURY, 1997, p. 22).
Essa inserção do dimensionamento político sugere a dificuldade de
integração interna proposta por Schein (2004), e defende que relações de poder e
arenas de conflito são uma constante nas relações de trabalho. Nessa perspectiva,
os elementos simbólicos, que constituem os valores e pressupostos básicos de uma
organização, agem como elemento que oculta e instrumentaliza o polo dominante da
relação.
Assim, Fleury (1997) desenvolveu uma proposta metodológica para
desvendar a cultura de uma organização a partir das seguintes dimensões:
37
a) o histórico das organizações: consiste na recuperação do momento de
criação e inserção da organização no contexto político e econômico da época. Tem-
se como propósito compreender a sua natureza, suas metas e objetivos;
b) o processo de socialização de novos membros, ou seja, a análise das
estratégias de integração do indivíduo à organização. Os rituais de socialização
delimitam a área de inclusão dos indivíduos aos grupos, bem como a sua exclusão;
c) as políticas de recursos humanos, que revelam os elementos culturais que
são valorizados e objetos de premiação e os comportamentos considerados
indesejáveis;
d) o processo de comunicação, que transmite e cristaliza o universo simbólico
de uma organização;
e) a organização do processo de trabalho no seu componente social e
tecnológico possibilita identificar as características presentes na relação de trabalho,
bem como o mapeamento das relações de poder entre as categorias de empregado
e entre áreas da organização.
Martin (l992) faz uma análise das diferentes concepções sobre cultura, e as
categoriza em três modelos: integração, fragmentação e diferenciação. No
paradigma da integração, a cultura é considerada como um mecanismo aglutinador,
sendo a chave para o controle gerencial, para obter o compromisso do trabalhador e
para a eficácia organizacional. Para o autor, esse modelo pode ser visualizado na
proposta de Schein (2004), que considera a cultura na perspectiva de grupo e a
concebe como mecanismo de controle.
O modelo de fragmentação questiona a perspectiva da integração proposta
por Schein (2004), e defende que o consenso e a clareza são conceitos que não
existem nas relações de trabalho. No modelo identificado como diferenciação,
admite-se a existência de múltiplas culturas e enfoca-se que os grupos não são
homogêneos. As subculturas coexistem algumas vezes em harmonia, algumas
vezes em conflitos, e algumas vezes são indiferentes umas com as outras.
A principal referência teórica dessa pesquisa para análise da cultura
organizacional foi o modelo proposto por Schein (2004), entendendo a cultura como
elemento integrador e não enfocando as questões relacionadas por Fleury (1997),
sob as relações de poder, dominação e fragmentação e diferenciação propostas por
Martin (1992). A pesquisa considera ainda o sistema de ação cultural brasileiro,
38
conforme modelo proposto por Tanure (2007) e a sua possível influência na cultura
organizacional da empresa a ser pesquisada. O modelo proposto pela autora foi
concebido a partir dos estudos e pesquisa realizados por Hofstede et al (1990).
A pesquisa identificou os elementos que compõem a cultura da organização
pesquisada e analisou a sua relação com os tipos de inovação implementados na
empresa. No próximo item apresentamos a relação entre cultura e tipos de inovação.
2.2 A relação entre cultura organizacional e os tipos de inovação
Schumpeter (1985) foi um dos precursores da discussão da importância da
inovação para o desenvolvimento econômico. O autor considerava que mudanças
geradoras de desenvolvimento econômico eram decorrência, em certa medida, de
casualidades, tais como a mudança de hábito e comportamento dos indivíduos
empreendedores.
Ainda nesta linha de raciocínio, o autor destaca uma questão: o processo de
inovação, ou nas palavras dele, novas combinações, que geram desenvolvimento, é
objeto de um tipo especial de função, a empreendedora.
Para ele, novas combinações representam a introdução de um novo bem ou
produtos com o qual os consumidores ainda não estão familiarizados; a introdução
de um novo método de produção; a abertura de um novo mercado; a conquista de
uma nova fonte de matérias-primas ou insumos e o estabelecimento de um novo
modelo de organização através de uma posição de monopólio ou fragmentação.
Essas inovações, quando materializadas ou implantadas pelo empresário ou
empreendedor, alteram as estruturas vigentes e desencadeiam um processo de
mudança no mercado com consequências econômicas positivas.
Percebe-se, então, nesse raciocínio, que Schumpeter (1985), um dos
precursores da discussão sobre a importância da inovação para o desenvolvimento
econômico, apresenta, nos seus textos iniciais, uma relação de casualidade de
origem não econômica. Para ele, o fator motivador para as mudanças (inovações)
39
está associado ao comportamento e conduta dos indivíduos, sendo estes os
principais promotores de novas combinações ou inovações.
Finalmente, o autor aproxima-se da definição de cultura quando destaca que:
[...] todo conhecimento e todo hábito, uma vez adquirido, incorporam-se tão firmemente em nós como um terrapleno ferroviário na terra. Não requerem ser continuamente renovados e conscientemente reproduzidos, mas, afundam nos extratos do subconsciente. São transmitidos normalmente quase sem conflituoso, pela herança, pelo ensino, pela educação, pela pressão do ambiente (SCHUMPETER, 1985, p. 60).
2.2.1 Tipos de inovação
Inovação é o termo que define como as organizações criam valor
desenvolvendo conhecimento novo ou usando conhecimento existente de novas
maneiras. O termo é usado frequentemente para significar o desenvolvimento de
produtos novos ou serviços dentro de uma organização (GARTNER, 1990), mas as
organizações também podem inovar de outros modos, pela adoção de novos
processos, por novos modelos de negócio, técnicas de administração e estruturas
organizacionais (BEAR, 2006; JAMROG; VICKERS; SCHUMPETER, 1985)
Kuczmarski (1998, p. 63) define inovação como uma “atitude que permite às
empresas enxergar o presente pelo olhar do futuro”. Segundo ele, inovar não se
resume em lançar novos produtos, nem somente dar vida nova aos antigos. A
inovação representa, para ele, uma maneira de vencer a concorrência, diferenciar-se
das empresas de um setor, e apresentar novidades para o mercado, aumentando a
competitividade da empresa.
Para Kuczmarski (1998), as organizações já esgotaram seus recursos
possíveis para reduzir mão de obra, cortar custos unitários e simplificar processos. O
desafio das organizações agora é maximizar os lucros, aumentar a produtividade e
garantir a satisfação de funcionários e acionistas. Para isso, é preciso que a
organização desenvolva mentalidade voltada para inovação. O autor defende que a
adoção de mentalidade e práticas inovadoras é o que permite que organizações
transformem seus negócios e apresentem crescimento. Nesse sentido, a inovação é
40
importante para a manutenção da competitividade das organizações ou mesmo
como origem ou fonte de desenvolvimento econômico (SCHUMPETER, 1985).
March (1991) usa uma perspectiva de aprendizagem organizacional para
distinguir entre inovações que exploram um conhecimento novo e inovações que
acham novas formas inteligentes para explorar um conhecimento existente.
Empresas que exploram um conhecimento podem buscar melhorias incrementais
para servir mercados existentes ou podem, no caso de conhecimento novo, encerrar
o ciclo de vida de produtos, implementando ideias arrojadas para serviços ou
produtos.
A despeito do reconhecimento de que inovação representa um elemento
essencial de competitividade (CHRISTENSEN, 1997; SCHUMPETER, 1985;
UTTERBACK, 1954), Christensen (2003) alerta que as empresas privilegiam
normalmente incrementar tecnologicamente seus produtos para atender aos clientes
da carteira e com isto não ficam atentas às oportunidades de inovação para ampliar
mercado.
Por outro lado, ele acredita que determinados clientes podem demandar
produtos que eventualmente podem ser tecnologicamente menos sofisticados do
que os produtos atuais dessas empresas, representando outro nicho que não pode
ser menosprezado.
Nesse sentido, Cyrino (2007) desenvolveu uma matriz, representada pela
FIG. 6, que reproduz os diferentes níveis e tipos de inovação propostos por
Christensen (2003) e sua abrangência:
FIGURA 6 - Tipos de Inovação: radical e incremental Fonte: Cyrino (2007).
41
Nas palavras de Christensen (2003), a inovação incremental com foco no
componente representa um processo de melhoria contínua dentro da organização,
buscando otimizar determinadas atividades, normalmente em busca de melhor
desempenho do produto ou redução de custos.
Já a inovação incremental com a abrangência do sistema visa reformular
e promover uma melhoria nos processos da organização como um todo. Ambas as
estratégias de inovação incremental têm por objetivo melhorar um produto ou
processo existente ou lançar um produto melhor em um mercado tradicional ou
otimizar processos de negócios, mas não se preocupando em desenvolver novos
mercados ou promover mudanças mais significativas (CHRISTENSEN, 2003, grifo
nosso).
A inovação radical ou disruptiva, da mesma forma que a incremental, possui
dois focos de atuação, no componente ou no sistema. Quando se foca no
componente, a estratégia é buscar clientes que queiram um produto ou negócio de
baixo custo, daí a denominação de disrupção de baixo mercado. Com a
abrangência no sistema, a inovação radical visa trabalhar no conceito do negócio e
com isto buscar um novo mercado e novos consumidores. Este tipo de inovação
denomina-se disrupção de novo mercado (CHRISTENSEN, 2003, grifo nosso).
A FIG. 7 apresenta o conceito de inovação disruptiva no eixo
tempo/desempenho:
FIGURA 7 - Inovação disruptiva Fonte: Christensen (2003, p. 58).
42
Analisando-se a FIG. 7, identificam-se os três modelos de inovação –
sustentação, baixo mercado e novo mercado. Na estratégia de sustentação,
buscam-se melhorar continuamente os produtos para se manter competitivo no
mercado tradicional.
Já na disrupção de baixo mercado, as organizações atuam com modelos de
negócios de baixo custo, identificando clientes dispostos a adquirir um produto com
desempenho inferior e, em contrapartida, com menor custo. Na disrupção em novo
mercado, as empresas visam criar novos hábitos de consumo ou atrair, com novos
produtos, aquele cliente que não é consumidor.
Observa-se que o posicionamento não é permanente. Pode-se perceber o
processo de inovação de uma organização como uma força contínua, indo da
inovação radical para a incremental, ou seja, as empresas que hoje criam novos
mercados ou padrões de consumo ou criam modelos de negócios com baixo custo
poderão, no futuro, ser alvo de disrupção, quando estiverem privilegiando suas
estratégias de sustentação.
Quanto à possibilidade de se gerenciarem os processos de inovação, a FIG. 8
demonstra a ideia de série contínua dos tipos de inovação, conforme proposta de
MClaughlin, Bessant e Smart (2005), que se baseia na tipologia de Christensen
(2003), demonstrando as especificidades de cada modelo.
FIGURA 8 - A série contínua da inovação Fonte: MClaughlin, Bessant e Smart (2005, p. 2).
43
Para os autores, o gerenciamento do processo de inovação é mais utilizado
no tipo incremental do que no tipo radical, pois é baseado em rotinas, sistematizado
e pode ser modelado de forma relativamente simples. As organizações, durante
períodos de inovações incrementais, podem se basear em unidades com papéis e
responsabilidades formalizados, procedimentos centralizados, estruturas funcionais,
culturas orientadas para a eficiência, homogeneidade nas capacidades de produção
e de vendas, e equipes mais experientes e antigas.
Já no tipo radical, o processo é pouco definido e sua modelagem mais
complexa, pois as organizações necessitam de times empreendedores, com
unidades pequenas, procedimentos descentralizados e pouco definidos, culturas
baseadas na experimentação, alta competência técnica e empregados relativamente
mais jovens e heterogêneos (MCLAUGHLIN; BESSANT; SMART, 2005).
As organizações podem também inovar em termos de suas estruturas, ou
quando elas buscam mercados novos, ou estabelecem metas estratégicas mais
ousadas. Esse processo pode envolver fusões e aquisições, e está frequentemente
associado ao objetivo de incorporação das inovações de alguma outra companhia.
Para organizações maiores, pode significar também uma reestruturação para tentar
obter algumas das vantagens de organizações menores ou mesmo criando
estruturas que não existiam anteriormente (HAMEL, 2006).
Outros tipos de inovação organizacional também são apontadas na literatura
da área. A inovação de cultura empresarial é aquela na qual uma empresa tenta
desenvolver sistematicamente uma cultura corporativa inovadora, ou seja, dotar o
sistema de capacidade de adaptação a mudanças (JAMROG; VICKERS; BEAR,
2006).
Observa-se, entretanto, que qualquer sistema de classificação, como, por
exemplo, por tipos incremental e radical, tem limitações, em função da evolução e
mudanças presentes nas organizações, conforme aponta Greenwood e Hinings
(1993). Segundo eles, um assunto complexo como a inovação tende a desafiar um
sistema de categorização, tornando-se um dificultador para as organizações que
buscam adotar um modelo que estimule a inovação.
44
2.2.2 Cultura e inovação
A visão da cultura como facilitadora para a inovação é mais facilmente
percebida quando se trata de analisar culturas de nações ou regiões, pois a
proximidade geográfica, bem como as características de uma determinada região,
parecem facilitar a geração e transferência de conhecimento tácito (RYCROFT;
KASH, 2002).
Schumpeter (1985), quando no início do século XX, discutindo os
mecanismos que propiciavam desenvolvimento econômico, enfatizou muito o papel
das novas combinações ou inovações desencadeadas pelo empreendedor. A
palavra cultura não é utilizada na discussão apresentada pelo autor, no entanto,
percebe-se a existência da relação de casualidade entre mudança econômica e
situação total precedente, ou elementos do contexto que servem como propulsores,
o que nos remete a pensar na relação de inovação e cultura respectivamente.
Já na década de 60, existia um pensamento corrente, principalmente nos
Estados Unidos e Europa, contrapondo-se à visão da cultura como facilitadora para
inovação, apregoando a existência de um modelo superior para a gestão das
organizações e que poderia ser aplicado de forma universal, independente das
particularidades e da cultura de cada nação, denominado de convergente (TANURE,
2007).
Alguns pesquisadores, como Parker e Savary (1994, 1997 apud TANURE,
2007), realizaram estudos em 11 diferentes países, onde destacam efeitos nulos ou
escassos da cultura na inovação, reforçando a teoria convergente. Naturalmente as
críticas a essa corrente estão no fato de que sua abordagem apresenta um aspecto
reducionista, descartando a força dos elementos culturais defendidos pela corrente
que se opõe à convergente.
No entanto, a partir da década de 70, a perspectiva denominada de
divergente adquiriu proeminência, destacando que diferenças culturais afetam a
forma de administrar e demonstrando as diferenças entre países e regiões nos
modelos de gestão. Nos anos 80, o tema foi colocado em intenso debate,
principalmente pelo sucesso do modelo japonês de administrar (TANURE, 2007).
45
Tal discussão tem reflexos até os dias atuais, no entanto, a autora identifica
uma terceira corrente, que admite o convívio das duas dimensões - convergente e
divergente -, uma abordagem mais integradora, onde as diferenças entre países e
regiões são mais evidenciadas quando se trata de valores, e que outras dimensões,
como a estrutura organizacional, não sofrem impactos consideráveis do ambiente
cultural do país.
Tanure (2007, p. 23) destaca que a “a empresa é um espaço sociocultural. A
cultura nacional é um dos pilares da cultura organizacional”. Naturalmente não é o
único, há de se destacar também o papel dos líderes e fundadores, que, através das
suas ações, imprimem características peculiares a cada organização.
A autora ressalta a necessidade de se diferenciar entre mudança de
operacionalização de valores e a mudança de valores em si, que de fato representa
a mudança cultural. Na mudança de operacionalização de valores, há a
permanência dos valores centrais, base da cultura da organização; apenas os
comportamentos que correspondem a esses valores evoluem ou mudam e passam a
ser expressos de forma diferente (TANURE, 2007).
Tanure (2007, p. 24) destaca que “a mudança de cultura é um processo
longo, duro e nada fácil, porém possível. Na maioria das vezes, ela ocorre em
função de alguma mudança radical, do ponto de vista do negócio ou da gestão”.
Os temas flexibilidade, adaptabilidade e inovação passaram então a compor a
discussão sobre cultura organizacional, a partir do momento que características da
cultura foram consideradas essenciais para promover ou inibir iniciativas de
mudança efetivas e estratégias (BLUEDORN; LUNDGREN, 1993).
Segundo Kotter e Heskett (1992), as organizações que possuem culturas
flexíveis têm uma tendência a se adaptar às mudanças, turbulências e incertezas
dos ambientes externos. A visão desses autores é que organizações com cultura
flexíveis e adaptativas são mais eficazes, na medida em que estimulam e nutrem a
inovação, o que pode garantir desempenho superior por períodos longos de tempo.
Bass e Avolio (1993) também destacaram a importância da cultura
organizacional adaptável e flexível para facilitar processos de inovação. Esses
autores utilizam a distinção entre cultura organizacional transformacional e
transacional para identificar as organizações que encorajam a inovação,
transformação e mudança - cultura transformacional - e aquelas que buscam manter
46
seu modus operandi, baseado em regras e estruturas preestabelecidas e que
inspiram níveis limitados de compromisso e motivação - cultura transacional.
As culturas transformacionais encorajam e apoiam a inovação e a discussão
aberta de assuntos e ideias de forma que os desafios se tornem oportunidades em
lugar de ameaças (BASS, 1998). Dessa forma, na visão do autor, este tipo de cultura
caracteriza-se pela flexibilidade e adaptabilidade.
Um fator essencial para que uma cultura organizacional possa ser identificada
como transformacional é o grau no qual ela apoia e promove a inovação e o
empreendedorismo, o que em contextos dinâmicos é considerado crucial para a
sobrevivência a longo prazo de uma organização (ANCONA; CALDWELL, 1987).
Da mesma forma, supõe-se que a cultura da empresa é um fator influente na
promoção do empreendedorismo (MOON, 1999; ZAHRA 1993), e investigações
empíricas identificaram os efeitos favoráveis de um clima organizacional satisfatório
na inovação (ABBEY; DICKSON, 1983). Os autores examinaram a relação entre
clima organizacional e inovação nos Departamentos de Pesquisa e Desenvolvimento
das indústrias de semicondutores dos Estados Unidos, considerando que estas
indústrias foram, durante o período de 1970-1980, os principais propulsores de
inovações tecnológicas.
O estudo apresentou uma correlação forte entre a quantidade de inovações
produzidas e o sistema de valorização e reconhecimento das equipes de pesquisa e
desenvolvimento, como também uma flexibilidade e disponibilidade do grupo para
assumir riscos com novas ideias e experimentos.
Outro fator destacado como significativo para o desenvolvimento de
inovações é a presença, nos grupos de lideranças, técnicas criativas e com
liberdade de atuação dentro da organização.
A inovação incremental usualmente enfatiza melhorias de custos ou
funcionalidades nos produtos existentes, baseada no conceito de utilização
intensiva. Em contraste, a inovação radical, por sua característica de
desenvolvimento de novos negócios ou linhas de produtos, baseada em novas
ideias ou tecnologias, utiliza o conceito de exploração intensiva (LEIFER et al, 2000).
O Quadro 2 resume as diferenças básicas, relacionadas a procedimentos,
estrutura, pessoa, cultura e foco de uma organização, entre um posicionamento que
47
tende mais para inovações do tipo incremental e outro com foco em inovações do
tipo radical, na perspectiva de MClaughlin, Bessant e Smart (2005).
A análise do quadro dos autores mostra que uma organização com uma
cultura mais voltada para inovações incrementais pode não apresentar os mesmos
elementos facilitadores para permitir inovações radicais, mas que o movimento entre
uma posição e outra é possível.
INCREMENTAL RADICAL
Formalizados
Centralizados
Sistemáticos
Procedimentos Contingentes
Descentralizados
Pouco estruturados
Funcional
Orientada para a eficiência
Estrutura Tolerante aos riscos e experimentações
Orientada para o conhecimento
Homogêneas
Experientes
Pessoas Heterogêneas
Empreendedoras
Questionadoras
Maturidade
Alta inércia
Foco na eficiência
Foco no trabalho em equipe
Melhoria contínua do sistema
Cultura Organizacional Empreendedorismo
Foco na descoberta
Cooperação entre indivíduos
Quebra das fronteiras do sistema
Redução de custos
Funcionalidades adicionais
Eficiência
Foco Novos métodos e tecnologias
Experimentação
Novas ideias
Criação
Existentes Produtos/Tecnologia Novos
Utilização intensiva Gerenciamento Exploração intensiva
QUADRO 2 - Características da Inovação Fonte: MClaughlin, Bessant e Smart (2005, p. 5).
Em resumo, a literatura sugere que a cultura organizacional é um dos
elementos que facilitam ou inibem a propensão de uma organização para ser
inovadora, mas que há especificidades na cultura da empresa que favorecem
apenas a introdução de aperfeiçoamentos e pequenas melhorias, e outras
características que permitem mudanças e inovações mais vigorosas (AHMED, 1998;
KANTER, 1988; MARTINS; TERBLANCHE, 2003).
48
No próximo item, apresentamos o modelo conceitual, elaborado a partir da
revisão da literatura que orientou a análise dos dados empíricos.
2.2.3 Um modelo conceitual para o entendimento da cultura organizacional e
sua relação com os tipos de inovação.
A base para a criação do modelo conceitual para a análise e compreensão da
cultura organizacional e sua relação com os tipos de inovação parte do conceito de
arquétipos4. Um arquétipo é definido em termos de duas declarações gerais.
Primeiro, estruturas organizacionais e sistemas de gestão são melhor entendidos por
análise de padrões gerais do que por análise de propriedades da organização. Isto é
o que Miller e Friesen (1984) denominam de perspectiva holística. Segundo, padrões
são uma função das ideias, crenças, e valores - os componentes de um "esquema
interpretativo" (RANSON; HININGS; GREENWOOD, 1980) - que estão embutidos
em estruturas organizacionais e sistemas. Um arquétipo é, assim, um conjunto de
estruturas e sistemas que reflete um único esquema interpretativo.
A definição de arquétipos como forma de classificar o ambiente
organizacional prosseguiu paralelamente ao estudo de mudança organizacional. De
fato, supõe-se que arquétipos são importantes para entender mudanças. As
dinâmicas desse processo, no entanto, são bastante complexas, principalmente
tratando-se de mudanças que envolvem toda a organização, quando há o
movimento de um arquétipo a outro (GREENWOOD; HININGS, 1993).
Segundo Lammers (1978), o desenvolvimento de interesse na definição de
arquétipos, subsidiado pelo interesse nos processos de mudança das organizações,
4Arquétipos: modelo ou padrão passível de ser reproduzido em simulacros ou objetos semelhantes;
ideia que serve de base para a classificação dos objetos sensíveis. Derivação: por extensão de sentido: qualquer modelo, tipo, paradigma. Rubrica: psicologia; para C. G. Jung (1875-1961), conteúdo imagístico e simbólico do inconsciente coletivo, compartilhado por toda a humanidade, evidenciável nos mitos e lendas de um povo ou no imaginário individual, esp. em sonhos, delírios, manifestações artísticas etc.; imagem primordial (HOUAISS, 2008).
49
representa um retorno a um impulso central de teoria de organização, que é a
necessidade entender a diversidade de organizações por tipologias.
Nas palavras de Greenwood e Hinings (1993):
O conceito de um arquétipo encerra alguma forma de classificação. A ideia de coerência entre os elementos de arranjos organizacionais é central a tipologias, e a classificação de organizações é feita de acordo com diferenças e semelhanças em padrões gerais (GREENWOOD; HININGS, 1993, p. 1.053, tradução nossa).
Arquétipos são o que McKinney (1966) chamou de um "tipo construído", um
propósito, uma seleção planejada, a abstração, combinação, e (às vezes)
acentuação de um conjunto de critérios que serve como uma base para comparação
de casos empíricos.
Descobrir padrões de organização, no entanto, envolve duas tarefas: primeiro,
definição dos elementos que compõem a dinâmica organizacional; segundo,
resolução de como reconhecer e interpretar um padrão nesses elementos para
definir um arquétipo da organização (GREENWOOD; HININGS, 1993).
A ideia central do estudo dos autores é de que as combinações
organizacionais são melhor compreendidas como um conjunto completo, ou um
todo, do que coleções de elementos distintos. O conjunto de ideias, crenças e
valores formam os elementos que compõem esse conjunto completo ou os padrões
gerais da organização. Um conjunto de estruturas e sistemas congruente com um
esquema interpretativo constitui um arquétipo.
Nas palavras de Greenwood e Hinings (1993), delinear elementos de projeto
de organização vai de encontro ao conceito inicial de que:
“[..] estrutura e sistemas de gerência são melhor entendidos em termos de padrões gerais do que por análise de conjuntos isolados de propriedades de organização, pelo fato de que estes padrões permitem a comparação entre diferentes organizações, seja por similaridade ou divergências” GREENWOOD; HININGS, 1993, p. 1.055, tradução nossa). .
Mas, segundo os autores, um problema central dentro do conceito de arquétipo é
como descobrir padrões coerentes de se organizar.
Mintzberg (1979, 1983) é outro autor que cria uma tipologia para facilitar a
compreensão de padrões organizacionais. Ele definiu cinco tipos de organizações
50
por uma combinação de dedução analítica e uma extensa, embora seletiva, síntese
de pesquisa existente – estrutura simples, burocracia mecanizada, burocracia
profissional, forma divisionalizada e adhocracia.
No entanto, segundo o autor, tais estruturas representam unicamente
modelos de orientação e explanação de características, pois muito dificilmente se
encontrará uma organização com uma estrutura “pura”. Isso se deve à complexidade
interna e externa que envolve as organizações.
Segundo Greenwood e Hinings (1993), para realizar a identificação e
classificação de arquétipos e elaborar uma tipologia, é necessária a identificação do
esquema interpretativo e a maneira como que este relaciona atributos estruturais e
processos.
Conforme mencionado anteriormente, o padrão de conduta e operação de
organização é função de um esquema interpretativo subjacente, ou um conjunto de
crenças e valores, embutido nas estruturas da organização e sistemas. “Um
arquétipo é assim um conjunto de estruturas e sistemas que coerentemente
abrangem um único esquema interpretativo” (GREENWOOD; HININGS, 1993, p.
1.053, tradução nossa).
Definir um arquétipo exige dois passos. Primeiro, os esquemas interpretativos
subjacentes dentro de um setor institucional têm que ser isolados, aqueles que não
condizem com o contexto central e que provocam divergências ao se discutir um
sistema de classificação geral, ou seja, buscam-se esquemas interpretativos que
permitem um forte consenso. Segundo, as estruturas e processos destes esquemas
interpretativos têm que ser descobertos (GREENWOOD; HININGS, 1993).
O modelo conceitual proposto por McLaughlin, Bessant e Smart (2005),
baseado no conceito de arquétipos de Greenwood e Hinings (1993), parte da
identificação e definição de nove temas centrais. Esses temas emergiram a partir de
um processo indutivo no qual os pesquisadores continuamente refinaram o seu
sentido, através de um processo de validação, com a realização de grupos de foco,
com equipes de desenvolvimento das empresas pesquisadas. Eles representam
aspectos relacionados à cultura organizacional, com base no modelo proposto por
Schein (2004), e estão diretamente associados como facilitadores para a inovação
radical.
51
Para se chegar nos nove temas ou elementos centrais, os autores partiram de
metodologia baseada em pesquisa de campo com os equipes de desenvolvimento
de pequenas e médias organizações da indústria de tabaco do Reino Unido e
pesquisa-ação com foco em questões para verificar a presença e intensidade de
atributos culturais que podem facilitar ou inibir a inovação radical.
O método utilizado para se identificarem as características da cultura
organizacional foi estabelecer uma questão para atrair a atenção dos membros para
um determinado evento ou ação específica.
Conforme relatado anteriormente, as manifestações mais visíveis da cultura
são artefatos, mais fáceis de visualizar e difíceis de decifrar. Os valores e
pressupostos básicos tendem a permanecer escondidos (SCHEIN, 2004).
Segundo os autores, o foco numa questão permitiu emergir os componentes
ocultos da cultura. Isto foi obtido solicitando aos membros das equipes de
desenvolvimento que discutissem exemplos de mais ou menos sucesso em
inovações radicais.
Segundo os autores, dois softwares foram utilizados para se fazerem a
organização, classificação e análise dos dados. O Decision Explorer foi utilizado
para desenhar os mapas cognitivos. Ele apresenta os construtos e relações entre os
mesmos, representando um significado de explanação e consequência.
O outro software, o Nvivo, facilitou a análise dos dados qualitativos. Ele
permite a codificação e subsequente análise dos atributos de uma série de
documentos. Após a identificação dos aspectos culturais que exerciam influência nas
inovações radicais de produtos, foi realizada uma entrevista de acompanhamento
com cada participante.
A primeira análise produziu 58 categorias de dados que influenciavam nas
inovações radicais. Com o objetivo de validar e refinar esses dados, foi realizada
uma série de quatro grupos de foco, e com isto, através de um processo de
agregação de temas por similaridade, chegou-se nos nove temas ou elementos
centrais que representam aspectos da cultura organizacional, que, nas conclusões
dos autores, estão positivamente associados com as inovações radicais.
Os temas centrais definidos pelo autores, depois da agregação para definir os
arquétipos, foram: (1) a estrutura da organização; (2) a confiança externa; (3) a
clareza dos objetivos; (4) a constituição das equipes; (5) a perspectiva externa; (6) a
52
liberdade de ação; (7) a atitude perante o risco; (8) a confiança interna; e (9) o
crescimento e desenvolvimento.
Vale ressaltar que o universo dos temas foi obtido através de entrevistas e
seminários com profissionais responsáveis pelo desenvolvimento de novos produtos
ou com pessoas de departamentos envolvidos nos processos de inovação da
pequena e média indústria de tabaco da Inglaterra.
O primeiro tema, estrutura da organização, está relacionado ao estilo de
gestão e recursos disponibilizados para o desenvolvimento de novos produtos. A
confiança externa, segundo dos nove temas, representa a percepção que outros
grupos da organização têm sobre o time de desenvolvimento, em particular a
percepção da alta gestão. O terceiro tema - clareza de objetivos - está vinculado à
existência de objetivos claros e bem definidos para o time de especialistas, e metas
rígidas durante o tempo de desenvolvimento de um projeto, normalmente
estabelecidos pela alta direção. A constituição das equipes representa, como
quarto tema, o arranjo interno de organização do grupos de trabalho. A perspectiva
externa, quinto tema, representa a ideia de como o grupo se relaciona com o
ambiente externo à organização. O sexto tema, liberdade de ação, está relacionado
à autonomia conferida ao grupo para o desenvolvimento de inovações. A atitude
perante o risco, como sétimo dos nove temas, refere-se à atitude do grupo ao
assumir riscos. A confiança interna representa o oitavo tema e está associada à
coesão do grupo e confiança nos pares para resolver os problemas. Por fim, o
crescimento e desenvolvimento refere-se à forma como o grupo adquire
conhecimentos e experiência e à exploração de potenciais soluções.
(MCLAUGHLIN; BESSANT; SMART, 2005, grifo nosso).
Os temas e suas relações foram mapeados pelos pesquisadores,
demonstrando que um tema posto na parte inferior exerce influência sobre outro na
parte superior, como por exemplo a atitude perante o risco é influenciada pela
confiança interna e externa, a liberdade de ação e o crescimento e desenvolvimento.
Este último, por sua vez, é influenciado pela constituição das equipes e perspectiva
externa.
Os temas também foram categorizados como artefatos ou valores, com base
no modelo de Schein (2004). O mapa é apresentado na FIG. 9, sendo que temas
53
apresentados em elipse representam valores, e os temas postos em retângulo
representam artefatos.
FIGURA 9 - Mapa das relações entre temas, baseado no modelo de Schein (2004) Fonte: McLaughlin, Bessant e Smart (2005, p. 17).
Apesar dos autores não detalharem a classificação dos temas em valores e
artefatos, eles dão indicativos de que a constituição das equipes, por exemplo, que é
classificada como um artefato, pode ser identificada através de elementos visíveis,
como organograma, dados do grupo, como escolaridade e experiência, e padrões de
comportamento, da mesma forma que outros temas estão intrinsecamente ligados a
valores compartilhados pela organização, como a atitude do grupo perante o risco.
Dessa forma, McLaughlin, Bessant e Smart (2005), baseando-se nos nove
temas derivados de suas pesquisas sobre cultura organizacional e tipos de
inovação, bem como no conceito dos arquétipos de Grenwood e Hinings (1993),
propuseram o modelo do tipo I e tipo II de arquétipos. Eles descrevem uma posição
ideal para dois arquétipos organizacionais em conformidade com os nove temas, o
que é apresentado no Quadro 3.
54
ARQUETIPOS
Tipo I Tipo II
Temas que compõem a dinâmica organizacional
Incremental “Fazer melhor”
Manter
Radical “Fazer diferente”
Explorar
Liberdade de Ação
Desnecessária, já que sistemas e procedimentos podem ser utilizados para controlar a melhoria contínua, em que a mesma é encorajada e recompensada.
Necessária para permitir o pensamento fluir para o além do habitual. Exploração e descoberta são parte de como as coisas são feitas.
Atitude perante o risco
O risco é minimizado ou evitado. Processos ou procedimentos subseqüentes asseguram a existência do mínimo de exposição à incerteza.
Assumir riscos é encorajado. A incerteza é considerada parte do ambiente e para as novas descobertas é aceitável arriscar.
Crescimento/ Desenvolvi-mento
Desnecessário para atividades de melhoria continua. Podem retardar os procedimentos que estão sendo seguidos.
Um desejo de crescimento e desenvolvimento das habilidades e conhecimento do grupo. Um apetite por saber mais e saber o porquê.
Confiança externa
As melhorias incrementais são geradas e controladas dentro do grupo e não são afetadas pela percepção externa.
A confiança externa suporta a habilidade do grupo em fazer diferente e perseguir inovações radicais.
Confiança interna
A confiança é baseada na crença de seguir o sistema ou trabalhar numa especificação definida levara a melhorias incrementais. Os membros do grupo são componentes do sistema.
A confiança entre os membros do grupo é o que os possibilita chegar a inovações radicais. Os membros do grupo são unidades autônomas que acreditam que podem fazer de forma diferente.
Perspectiva externa
Alguma relevância com a comparação externa, no entanto, a tendência do grupo é estabelecer um objetivo a ser atingido. Ela reforça a mentalidade de “fazer melhor” do grupo.
Essencial para promover perspectivas alternativas e a consciência de novas tecnologias. Impulsiona o “fazer diferente” que leva as inovações radicais.
Clareza dos objetivos
Necessários para fornecer uma meta de trabalho.
Objetivos muito específicos podem inibir a descoberta de alternativas. Objetivos não tão específicos e claramente definidos podem encorajar os questionamentos e permitir avanços no conhecimento.
Constituição das equipes
É parcialmente necessário para este grupo indivíduos que estejam dispostos a seguir os processos. A experiência tecnológica é somente necessária para aplicação de ferramentas e métodos conhecidos. Preferencialmente os membro do grupo devem ser indivíduos de mesma opinião que vão trabalhar bem em conjunto.
As equipes são constituídas por um mix de indivíduos criativos que tem experiência suficiente na área em questão e por outros capazes de pensar de forma diferente e com isto promover inovações radicais. O grupo precisa ser constituído de indivíduos capazes de lidar com um certo grau de incerteza e conflito como parte de suas atividades do dia-a-dia.
Estrutura da organização
Requer um estilo de gestão que encoraja a conformidade com regras e procedimentos. Recursos e tempo são necessários para completar as tarefas de melhoria incremental.
Requer um estilo de gestão que encoraja assumir riscos. Burocracia ou autocracia podem ser inibidores para esse grupo. Algumas restrições de recursos são necessárias para estimular a criatividade.
QUADRO 3 - Arquétipos de inovação incremental e radical Fonte: McLaughlin, Bessant e Smart (2005, p. 17).
55
Os nove temas apresentados podem ser identificados tanto interna como
externamente ao grupo e podem ser visíveis (artefatos) ou percebidos (valores).
Vale ressaltar que os autores ponderam que os temas não são e nem têm a intenção
de representar uma visão completa da cultura organizacional do grupo e, sim,
elementos da cultura que influenciam na tendência da empresa em promover
inovações do tipo radical ou incremental (MCLAUGHLIN; BESSANT; SMART, 2005).
As relações entre os temas na área interna e percebida (valores) do modelo
refletem a influência que os artefatos têm nos valores e vice-versa. Desta forma,
agindo um sobre o outro é que a cultura organizacional se desenvolve (HATCH,
1993).
A utilização dos arquétipos é a base para a interpretação da cultura que apoia
a inovação e permite o desenvolvimento de duas posições básicas. O tipo I
representa uma cultura que possibilita a inovação incremental. O tipo II, a inovação
radical. Os autores ressaltam que estes são tipos ideais e isto não significa que uma
organização possua as características de um tipo exclusivamente. No entanto, a
análise com base nos arquétipos estabelece um ponto de referência no qual
qualquer processo ou atividade de mudança pode ser direcionado de forma a facilitar
a adoção de características desejadas para promover a inovação incremental ou
radical (MCLAUGHLIN; BESSANT; SMART, 2005).
A transição entre os arquétipos tem sua compreensão facilitada utilizando-se
o modelo de Schein (2004). A dinâmica do processo é diferente de
aperfeiçoamentos incrementais para a mudança em maior profundidade, ou seja,
radical (GREENWOOD; HININGS, 1993).
Atuando no nível dos artefatos e valores, é possível a transição entre
arquétipos, pois significa a adoção de novos valores. Na medida que um valor é
adotado como adequado, ele é introjetado pelo grupo e pode facilitar uma mudança
na cultura organizacional. Esta mudança significa a transição entre os arquétipos
(MCLAUGHLIN; BESSANT; SMART, 2005).
Em resumo, o modelo de Schein (2004) serve de guia para o gerenciamento e
monitoramento da transição entre arquétipos. Qualquer intervenção proposital com a
intenção de mudar a cultura de inovação pode ser baseada no nível dos artefatos e
valores.
56
O modelo conceitual proposto por McLaughlin, Bessant e Smart (2005)
utilizando o conceito de arquétipos, conforme proposto por Greenwood e Hinnings
(1993), permite a compreensão da influência da cultura organizacional nos
processos de inovação e com isto identificar as características que compõem a
cultura da empresa e analisar a sua relação com os tipos de inovação
implementados na trajetória empresarial.
Considerando as questões relacionadas à adaptação externa e integração
interna, conforme proposto por Schein (2004), o pesquisador acrescentou ao modelo
a classificação de cada elemento, identificando se o mesmo está mais relacionado a
uma questão ligada a um processo de adaptação da organização ao ambiente –
adaptação externa - ou fatores utilizados para se obter a integração interna. O
pesquisador entendeu que essa classificação permite a melhor identificação desses
elementos dentro contexto organizacional e cultural. A FIG. 10 apresenta esta
representação.
FIGURA 10 - Mapa das relações entre temas incorporando as categorias de adaptação externa e integração interna de Schein (2004) Fonte: Elaborado pelo autor desta dissertação.
57
Observa-se que os elementos - liberdade de ação, confiança interna,
crescimento e desenvolvimento e constituição de equipes - tem mais relação com os
fatores de integração interna, pois endereçam, segundo a definição de Schein
(2004), as fronteiras do grupo e critérios para inclusão de novos membros; as
estratégias para alocação de status, poder e autoridade; as ações para promover a
intimidade, amizade e relacionamentos no trabalho e os critérios para recompensa e
punição.
Já os elementos – atitude perante o risco, objetivos claros, confiança externa,
estrutura da organização e perspectiva externa – apresentam uma conexão maior
com questões da organização para promover a adaptação externa, endereçando,
conforme Schein (2004), a missão, funções e tarefas primordiais da organização
perante o seu ambiente; os objetivos específicos a serem atingidos pela
organização; os métodos a serem utilizados para acompanhar a realização dos
objetivos; os critérios definidos para medir resultados; as estratégias emergenciais
ou corretivas a serem adotadas caso os objetivos não estejam sendo alcançados.
Considerando ainda as questões relacionadas à influência da cultura
nacional, em especial a cultura brasileira para a cultura organizacional, o
pesquisador destaca os fatores, em complemento ao modelo conceitual de
McLaughlin, Bessant e Smart (2005), conforme sistema de ação cultural proposto
por Tanure (2007), que podem influenciar de forma positiva ou negativa nos
elementos que compõem a dinâmica organizacional, conforme FIG. 11.
FIGURA 11 - Mapa das relações entre temas com a influência do sistema cultural brasileiro, conforme Tanure (2007) Fonte: Elaborado pelo autor desta dissertação.
58
A Concentração de poder – baseada numa estrutura fortemente hierarquizada
e de submissão – característicos da cultura brasileira (TANURE, 2007), pode exercer
influência de forma negativa nos elementos da estrutura da organização e liberdade
de ação, o que por sua vez inibe a capacidade de desenvolvimento de inovações do
tipo radical e cria uma dependência dos líderes para o seu desenvolvimento.
O Paternalismo (segundo a autora, é a combinação da concentração do poder
com o personalismo, através do qual o indivíduo se diferencia pela hierarquia e pelas
suas relações pessoais) leva a duas vertentes: o patriarcalismo, baseado na figura
do patriarca, aquele que tudo pode, e a quem os membros do grupo pedem e
obedecem, e o patrimonialismo, que é o lado hierárquico e absoluto do
paternalismo, não fazendo distinção entre o público e o privado (TANURE, 2007).
Supõe-se que tal característica da cultura brasileira também pode exercer
influência negativa sobre os elementos do modelo proposto – liberdade de ação,
estrutura da organização e constituição das equipes.
A contraparte do paternalismo é o medo de errar. Este traço também reforça a
postura de espectador e de evitar o conflito. A vontade de sempre acertar e de obter
reconhecimento pelo poder central é a origem desse traço. O medo de errar pode
estagnar a organização e ser negativo para o seu desempenho, como também pode
ser manejado pela liderança no sentido da busca do seu aperfeiçoamento e
superação (TANURE, 2007).
Com isto, essa característica pode exercer uma influência negativa nos
elementos liberdade de ação e atitude perante o risco, e positiva com relação ao
elemento crescimento e desenvolvimento do grupo. Quando bem manejada, supõe-
se que exerça influência positiva sobre a perspectiva externa da organização.
A concentração do poder e o paternalismo induzem a uma postura do
espectador, segundo Tanure (2007). São traços culturais típicos da postura do
espectador: o mutismo, a baixa consciência crítica, baixa iniciativa, pequena
capacidade de realização e tendência a transferir responsabilidades sobre
dificuldades para as lideranças. Com esses traços, acredita-se que a liberdade de
ação fique também comprometida.
A ambiguidade é apresentada no sentido de uma aceitação aparente das
normas e regras estabelecidas, mas com uma prática distorcida, apoiada em outros
procedimentos programados para burlar essas normas. Na realidade, existe um
59
hiato entre a norma e o fato, que caracteriza a ambiguidade (TANURE, 2007).
Supõe-se que a ambiguidade pode afetar de forma negativa os elementos
relacionados à confiança externa e interna, como também os objetivos que deveriam
ser claros.
A lealdade contribui para sedimentar a coesão social no Brasil que, segunda a
autora, é muito marcada por esse traço cultural. O membro do grupo valoriza mais
sua lealdade ao líder e aos outros membros do grupo do que às causas, obrigações
e responsabilidades perante o próprio grupo (TANURE, 2007). Na perspectiva do
pesquisador, essa característica pode contribuir de forma positiva para a confiança
externa e interna.
Já a característica de evitar conflito – a relação entre pessoas, em situação de
desigualdade de poder que evitam o confronto e o debate direto -, segundo a autora,
tende a criar um certo grau de alienação, baixa motivação e consequente
passividade, e baixa capacidade de iniciativa. Essa mesma desigualdade de poder e
forte dependência podem representar uma fonte permanente de conflito, que, no
caso brasileiro, é tratado pelo recurso de relações pessoais de intermediação
(triangulação) entre líderes e liderados, buscando uma permanente conciliação de
conflitos. Com isto, supõe-se que a liberdade de ação fique comprometida.
A flexibilidade, segundo Tanure (2007), representa uma categoria que pode
ser analisada sob dois enfoques: Adaptabilidade e Criatividade. A Adaptabilidade é
uma capacidade criativa que se exercita dentro de limites pré-fixados. Este contorno
restritivo é o processo que decorre às regras e normas do subsistema institucional. A
Criatividade é essencial para a inovação. Ocorre, fundamentalmente, em ambientes
organizacionais onde há liberdade de expressão e com isto o pesquisador supõe
que a flexibilidade pode exercer uma influência positiva na atitude do grupo perante
os riscos.
Realizando-se a junção de todos esses elementos, traços e características da
cultura brasileira (TANURE, 2007) com o modelo conceitual proposto por
McLaughlin, Bessant e Smart (2005), acredita-se que este modelo possa orientar a
análise e compreensão das características culturais de uma determinada
organização brasileira e suas relações com a inovação.
60
3 METODOLOGIA DE PESQUISA
Neste capítulo, será apresentada a metodologia de pesquisa utilizada para
elaboração do trabalho. A primeira seção apresenta a estratégia, tipo e método de
pesquisa utilizado. Em seguida, são caracterizados o objeto de pesquisa e os
critérios utilizados para a sua escolha. Por último, são explanados os instrumentos
que foram empregados para a coleta de dados, bem como a maneira como os dados
foram analisados.
3.1 Estratégia, tipo e método de pesquisa
A estratégia adotada para a realização da pesquisa foi a qualitativa, pois
entendeu-se que ser a mais adequada ao problema de pesquisa, que visa identificar
os elementos que compõem a cultura da organização pesquisada, analisando-se a
sua relação com os processos de inovação implementados na empresa. Vale
ressaltar que o pesquisador encontrou poucos estudos relacionando diretamente
com os dois temas – cultura organizacional e inovação -, e não encontrou nenhum
estudo realizado por outros pesquisadores brasileiros.
Dentre as pesquisas encontradas que discutem a relação entre os temas –
cultura organizacional e inovação -, destaca-se o estudo de Mclaughin, Bessant e
Smart (2005). Os autores utilizaram uma abordagem qualitativa, com participação
ativa dos pesquisadores, através da realização de grupos de foco, com as equipes
de pesquisa e desenvolvimento das indústrias de tabaco de médio e pequeno porte
do Reino Unido. Com o objetivo de refinar e agrupar os temas, através da
elaboração de mapas mentais, utilizaram-se os softwares Decision Explorer e Nvivo
para a análise qualitativa dos dados obtidos nas discussões em grupo, realizadas
com os representantes das empresas.
A partir dos dados, os autores destacaram a importância de se estabelecer
uma tipologia de organizações para que pudessem elaborar um esquema
61
interpretativo, através de temas, e com isto caracterizar a tendência de uma
determinada organização para promover inovações do tipo incremental ou radical.
Para o estabelecimento de uma tipologia, utilizaram-se do conceito de arquétipos,
conforme proposição de Greenwood e Hinings (1993).
Estes autores, por sua vez, utilizaram-se de uma combinação de métodos
para a verificação de suas hipóteses de pesquisas relacionadas ao estabelecimento
de um esquema interpretativo de organizações baseado na definição de arquétipos.
A estratégia de pesquisa de Greenwood e Hinings (1993) resumiu-se em: (1) análise
documental para a identificação de esquemas interpretativos dentro de um setor
institucional; (2) entrevistas semi-estruturadas com gerentes seniores de
aproximadamente 100 organizações; (3) análise documental da população de
organizações do setor, produzindo amostra de 24 organizações; (4) questionário
estruturado dirigido para essa amostragem; (5) análise documental de organizações
específicas; (6) análise de pesquisa acadêmica; (7) análise longitudinal de
organizações específicas; (8) entrevistas semiestruturadas com acadêmicos e
diretores, que eram membros proeminentes da comunidade em estudo; (9)
questionário estruturado para validação final. Assim, através desta combinação de
métodos, a validação final foi obtida, e estabelecidos dois arquétipos, ou tipos, que
competem entre si.
Entende-se que, na pesquisa qualitativa, o pressuposto é obter dados sobre
pessoas, lugares e processos, o que inclui o contato direto do pesquisador com a
situação estudada, considerando sempre a perspectiva dos participantes da situação
em estudo (GODOY, 1995a).
Para Bonoma (1985), o uso da pesquisa qualitativa pode favorecer o estudo
de variáveis intangíveis, mas com possível relação ou conexão, com poucos dados
ou teorias disponíveis a respeito de um determinado fenômeno e que necessitam ser
identificadas dentro de um contexto social. A pesquisa qualitativa permite explorar
com profundidade o impacto das variáveis estudadas, considerando “[...] o principal
ou mesmo o único artifício de conhecimento válido aberto a cientistas cujos
interesses estão focados no comportamento humano” (BONOMA, 1985, p. 5).
Tal metodologia é considerada também a melhor estratégia para descobrir e
explorar novas áreas do conhecimento, como também possibilitar o desenvolvimento
62
de hipóteses. Ademais, é uma forma indicada para permitir reinterpretar e ampliar
um estudo com base em informações quantitativas (MILLER, HUBERMAN, 1994).
Considerando, então, a existência de duas variáveis intangíveis e
potencialmente relacionadas - elementos culturais presentes na organização e os
tipos de inovação - e ainda possíveis elementos de cultura nacional influenciando
diretamente nesse contexto, entendeu-se que a pesquisa qualitativa melhor se
aplicaria a este estudo, pois os processos desse fenômeno, no caso, pareciam estar
diretamente condicionados.
Destacam-se as principais características que nortearam o estudo, a saber:
(a) compreensão dos significados que as pessoas têm do seu mundo e de suas
experiências; (b) o processo que foi basicamente indutivo; (c) a descrição dos relatos
de maneira detalhada; (d) o fato de ter sido o pesquisador o principal instrumento de
coleta e análise de dados (GODOY, 1995c).
Buscou-se, assim, explorar o objeto de estudo em profundidade, com base no
modelo conceitual proposto por McLaughlin, Bessant e Smart (2005) para o
entendimento da cultura de inovação, que é baseado nas definições de Schein
(2004) sobre cultura organizacional e considerando a influência da cultura brasileira,
conforme sistema de ação cultural desenvolvido por Tanure (2007).
Vale ressaltar que o pesquisador não seguiu os mesmos passos de pesquisa
propostos por McLaughlin, Bessant e Smart (2005), mas utilizou-se do modelo
teórico desenvolvido por esses autores. Conjugou-se a este modelo, o de
Christensen (2003), para identificação dos tipos de inovação.
A tipologia baseada nos arquétipos de Greenwood e Hinnings (1993) para
caracterização das organizações permitiu categorizar dois tipos de organização. A
primeira, com tendência para o desenvolvimento de inovações do tipo incremental; a
segunda, com tendência para o estabelecimento de inovações do tipo radical, o que
facilitou a análise e entendimento da organização e de suas características culturais,
e sua relação com os processos de inovação.
Com isto, entendeu-se que, utilizando-se a pesquisa qualitativa, obteve-se um
guia para ser validado em futuros projetos e estudos por meio da realização de
estudos quantitativos (BONOMA, 1985; GODOY, 1995b; EISENHARDT, 1989; YIN,
1994).
63
O enfoque empregado foi do tipo exploratório, em que, por meio do referencial
teórico elaborado, fez-se a codificação, classificação e a categorização dos dados a
serem analisados, o que encontra-se detalhado nos itens estratégia de coleta e
análise. Neste movimento de teoria para os dados e vice-versa, as categorias foram
evidenciadas de maneira mais clara (BARDIN, 1977). O caráter exploratório da
pesquisa permitiu maior flexibilidade na pesquisa e na adoção do modelo aberto,
onde as categorias foram tomando forma no decorrer do processo de análise
(LAVILLE; DIONNE, 1999).
O método de pesquisa utilizado foi o estudo de caso, baseado no exame em
profundidade do objeto empírico, a fim de prover o seu mais amplo e completo
entendimento (EISENHARDT, 1989; GREENWOOD, 1973; GODOY, 1995b;
GOODE; HATT, 1973; SELLTIZ et al, 1963; SOY, 1998; YIN, 1994). Godoy (1995b),
ao apresentar a pesquisa qualitativa e seus tipos fundamentais, defende que o
estudo de caso – análise de uma unidade em profundidade - é o método adequado
para o entendimento de fenômenos sociais.
É preciso enfatizar que, em estudos de casos, o objetivo não é enumerar ou
quantificar, mas descrever, classificar (tipos), desenvolver uma teoria e verificar os
limites dessa teoria (BONOMA, 1985). Os estudos têm também o intento de explorar
e descobrir problemáticas novas, renovar visões existentes ou sugerir novas
hipóteses, preparando assim o caminho para outras pesquisas (BRUYNE; HERMAN;
SCHOUTHEETE, 1977). Essa dimensão de profundidade permitida pelo estudo de
caso possibilita hipóteses úteis para um completo estudo do caso a posteriori
(GOODE; HATT, 1973).
Quando o estudo de caso visa explicar um fenômeno, utiliza-se a técnica de
se construirem explanações, que consiste de: (a) uma visão acurada dos fatos do
caso; (b) algumas considerações ou explanações alternativas destes fatos; e (c) uma
conclusão baseada numa explicação que se mostre congruente com os fatos. Essa
técnica não possui uma receita fixa e pode ser comparada a um trabalho de um
detetive investigando um crime (YIN, 1994).
Yin (1994) enumera as justificativas para escolha do método do estudo de
caso ao ressaltar que essa é a estratégia adequada quando questões do tipo “como”
e “por que” são apresentadas, há pouco controle sobre os fatos e eventos, tratam-se
64
de problemas contemporâneos, e a pesquisa é realizada no contexto dos eventos e
nas condições em que o fenômeno se apresenta.
3.2 Unidade Empírica
Um estudo de caso considera como objetos de análise pessoas, situações
específicas, programas ou organizações. As possibilidades a serem estudadas e a
complexidade do estudo estão relacionadas a questões políticas, sociais, históricas
e pessoais dos objetos de análise. Conforme mencionado, o estudo de caso com
análise qualitativa visa investigar em profundidade, utilizando-se de vários métodos
de coleta de dados, evidências que permitam a compreensão do caso e respostas
aos problemas de pesquisa (GODOY, 1995b; SOY, 1997).
O estudo de caso realizado neste trabalho foi de uma organização do setor de
comércio farmacêutico de Belo Horizonte - a Drogaria Araujo. Por se tratar de um
caso único, este estudo, conforme já mencionado, teve por objetivo geral analisar a
relação entre cultura organizacional e tipos de inovação (BRUYNE; HERMAN;
SCHOUTHEETE, 1977).
Desde a sua fundação em 1906, a Drogaria Araujo S.A. é uma empresa que
apresenta um crescimento tanto em lojas quanto em faturamento. No início, era
apenas uma loja localizada na Praça Rio Branco, centro de Belo Horizonte.
Atualmente está presente em quase todos os bairros, e ainda nas cidades de Betim,
Nova Lima, Contagem, Santa Luzia, Lagoa Santa e Sabará.
Com mais de 100 anos de existência, a Drogaria Araujo possui mais de 85
lojas na grande Belo Horizonte, 3.500 funcionários, 27 lojas 24 horas, e atende a
mais de dois milhões de clientes por mês. Atualmente, é administrada pela terceira e
quarta gerações de seu fundador (DROGARIA ARAUJO, 2008).
Em 1927, a Araujo iniciou o serviço de entrega em domicílio em automóveis.
Em 1933, sua loja-matriz passou a funcionar 24 horas, sendo o primeiro plantão
noturno da cidade. Em 1963, o serviço de entrega em domicílio Drogatel Araujo
funcionava 24 horas e foi o primeiro serviço de telemarketing do Brasil. E, no final da
65
década de 90, inaugurada no bairro Cidade Nova, Região Nordeste da capital, a
primeira drogaria do país com serviço de atendimento Drive Thru5 (DROGARIA
ARAUJO, 2008).
Na falta de qualquer medicamento, a Central de Atendimento ao Cliente se
compromete a encontrá-lo em qualquer parte do Brasil ou até no exterior. O cliente
Araujo também tem, a sua disposição, a Farmácia de Manipulação Araujo, que
possui dois laboratórios (DROGARIA ARAUJO, 2008).
Além do comércio varejista de medicamentos, a Drogaria Araujo, desde a sua
fundação, comercializava produtos para a conveniência de seus clientes, como leite
condensado, coalho e soda cáustica, mostrando sua vocação para o conceito do
Drugstore6 (BRASIL; ARRUDA, 2006).
A Drogaria Araujo é hoje referência em medicamentos no Estado. A empresa
ganhou todos os sete prêmios Top of Mind7 realizados no seu segmento. Na edição
do último ano, foi a drogaria mais lembrada por 81% dos mineiros (DROGARIA
ARAUJO, 2008).
O ritmo acelerado de crescimento verificado nos últimos anos se manteve. A
empresa fechou o ano de 2007 com um aumento de 25% no faturamento em relação
ao ano de 2006, atingindo 490 milhões de reais. O ranking da Associação Brasileira
de Redes de Farmácias e Drogarias (ABRAFARMA) classificou a Araujo como a
primeira rede do Brasil em faturamento por loja em 2007, o que atesta a alta
produtividade da empresa (DROGARIA ARAUJO, 2008).
Os motivos da escolha da realização desta pesquisa, através do método do
estudo de caso, tendo como unidade empírica a Drogaria Araujo, remeteram à
definição da problemática e dos objetivos desta pesquisa. Supôs-se que,
primeiramente pelo propósito teórico da pesquisa, pela longevidade da organização,
pelos relatos disponíveis de suas ações e também pela familiaridade do pesquisador
com o objeto de pesquisa, a mesma oferecia terreno fértil para o entendimento em
profundidade da relação entre cultura organizacional e inovação. Assim, entendeu-
se que a definição do objeto de pesquisa “deve ser uma construção, definida em
5 Sistema de atendimento em que as vendas são realizadas por uma janela, enquanto os clientes
permanecem dentro do veiculo (DICTIONARY, 2004, tradução nossa). 6 Drogaria, farmácia, que vende ao mesmo tempo cosméticos, revistas, balas, sorvetes etc
(MICHAELIS, 2008). 7 Prêmio organizado e promovido pela Revista Mercado Comum.
66
termos que são mais úteis para o problema de pesquisa” (GOODE; HATT, 1972, p.
423).
Desta forma, considerou-se oportuna a escolha da Drogaria Araujo como
unidade empírica de pesquisa, A possibilidade de coleta de uma variedade de
dados, em diferentes momentos, por meio de múltiplas fontes de informações e de
diferentes técnicas, pode-se analisar intensivamente esta unidade social. Os
resultados obtidos deverão permitir uma análise comparativa de caso futura com
maior efetividade (EISENHARDT, 1989; GODOY, 1995).
Pode-se considerar também a possibilidade futura de validação do modelo
conceitual proposto, com a realização de mais pesquisas em outras organizações
com realidades diferentes. Isto permitirá realizar, nas análises futuras, o processo de
triangulação de informações, identificando-se fatores culturais que facilitam ou
dificultam o desenvolvimento das inovações nas organizações.
Para a realização das entrevistas, o pesquisador primeiramente, fez contato,
em maio de 2008, com o Gerente de Tecnologia da Informação, pessoa de seu
relacionamento mais próximo, dentro da organização, com o intuito de obter a
aprovação para a realização da pesquisa na empresa.
Enquanto aguardava a autorização para a realização das entrevistas, buscou-
se coletar o máximo de informações sobre a organização, por meio de consulta a
sites na Internet e de um caso de ensino elaborado anteriormente sobre a
organização pelos pesquisadores Carlos Arruda e Haroldo Vinagre, da Fundação
Dom Cabral.
Após uma conversa com o pesquisador Carlos Arruda, soube-se da existência
de um projeto de um livro que estava sendo escrito pela pesquisadora Nísia
Werneck, também da Fundação Dom Cabral, com lançamento previsto por ocasião
do centenário da empresa. O pesquisador aguardou o momento oportuno para
solicitar a autorização de acesso a esse material, já que ele não havia sido publicado
ainda.
Esse primeiro momento foi fundamental para que o pesquisador coletasse
informações preliminares e fizesse uma preparação adequada para a realização da
fase das entrevistas.
67
Em setembro de 2008, após a aprovação do seu projeto de pesquisa, foi
realizado o contato diretamente com a secretária do presidente da organização, com
explicações sobre o objetivo da pesquisa e o que seria demandado da empresa.
Em paralelo a esta ação, foi enviada, por e-mail, correspondência para o
presidente, explicando sucintamente os objetivos da pesquisa, solicitando
autorização para a sua realização, estabelecendo regras de confidencialidade e as
oportunidades para a organização decorrentes deste estudo.
Em outubro de 2008, o pesquisar fez contato com o gerente de Programas do
MBA da Fundação Dom Cabral, Sr. Afonso Cozzi, solicitando seu apoio e
intermediação ao presidente da Drogaria Araujo.
O gerente do MBA intercedeu então junto ao presidente, explicando os
objetivos para a realização da pesquisa de Mestrado e o que ela poderia trazer de
benefícios para a organização.
Em meados de outubro de 2008, o pesquisador recebeu a informação,
através da secretária da Presidência, de que a filha do presidente, sua assessora,
entraria em contato, após o término de suas férias, para fins de entendimento e
aprovação para a realização da pesquisa. Contudo, o presidente diretamente, em
meados de novembro, realizou uma ligação telefônica para o pesquisador.
Nesse contato, ele externou sua preocupação para a realização da pesquisa
de que determinadas informações, consideradas estratégicas para a organização,
pudessem, inadvertidamente, por meio dos resultados, facilitar a ação da
concorrência.
O pesquisador explicou que se tratava de um projeto acadêmico com
circulação predominantemente nesse meio e que as informações a serem coletadas
não iriam causar qualquer prejuízo concorrencial para a organização. Explicou que,
se caso a organização desejasse, poderia assinar termo de confidencialidade,
garantindo a omissão do nome da organização no estudo e como também de seus
dirigentes, hipótese que foi descartada e considerada desnecessária pelo
presidente.
Após este contato então, o presidente solicitou que fosse realizada uma
primeira entrevista com ele e que então, após a realização dessa entrevista, ele
indicaria quais áreas e gestores poderiam ser entrevistados, tomando como
referência as informações que fossem solicitadas pelo pesquisador.
68
O pesquisador considerou oportuna a solicitação, tendo em mente que, antes
da utilização de qualquer instrumento de coleta, é desejável realizar um pré-teste ou
teste piloto para verificação da validade do instrumento, se o instrumento de coleta
consegue endereçar a problemática de pesquisa, se o entendimento do mesmo está
claro e também se o tempo é adequado para as entrevistas (SOY, 1998).
Foi elaborado, então, com base na revisão de literatura sobre cultura
organizacional e inovação, um roteiro de entrevistas semiestruturadas, direcionado
aos gestores da empresa em estudo. Esse roteiro está apresentado no APÊNDICE
A e possui 31 questões.
O roteiro de entrevista foi baseado também nos nove temas definidos no
referencial teórico, conforme modelo proposto por McLaughlin, Bessant e Smart
(2005), para o entendimento das características da cultura organizacional e sua
relação com os tipos de inovação, tendo por base os arquétipos tipo I e II.
3.3 Estratégia de coleta
A coleta de dados aconteceu durante o período de setembro/2008 a
fevereiro/2009, quando foi realizada entrevista em grupo com os três funcionários
mais antigos da organização8, última etapa da pesquisa.
Foram realizadas dez visitas na organização, sendo a primeira para explicar
os objetivos da pesquisa para o gerente de Tecnologia da Informação, oito para
realização de entrevistas, inclusive considerando a entrevista realizada com o
presidente, com duração de aproximadamente quatro horas. A última visita foi para a
realização da entrevista em grupo com os funcionários mais antigos.
O pesquisador realizou também vários contatos telefônicos e por e-mail para
fins de esclarecimento de dúvidas e validação de informações. Visitou algumas lojas
8 Por sugestão da empresa, a entrevista com os três funcionários mais antigos foi realizada no
formato “entrevista em grupo”, ou seja, numa reunião, onde o pesquisador atuou como moderador perante o grupo, direcionando as perguntas de forma que as respostas fossem livres e espontâneas, com base no roteiro de entrevistas elaborado, de forma a facilitar a participação dos funcionários, em função da disponibilidade para conseguir agendar com todos e da idade avançada dos entrevistados, o que, segundo a empresa, poderia causar um desgaste, se fosse realizada de forma individual.
69
da empresa com o intuito de observar elementos e símbolos visuais presentes na
organização. Pôde contar ainda com a familiaridade conquistada por ter sido
prestador de serviços por mais de dez anos para a empresa.
Em resumo, as informações para a pesquisa foram obtidas através das
entrevistas e entrevista em grupo, observação, material documental e institucional
cedidos pela empresa e por meio de consulta a sites disponíveis na Internet.
Sendo assim, foram utilizadas quatro técnicas de coletas de dados: (a) a
entrevista em profundidade com os diretores e os gerentes seniores; (b) entrevista
em grupo com os funcionários mais antigos da organização; (c) a pesquisa
documental no acervo construído por ocasião das comemorações do centenário da
organização e disponível em sites na Internet; e (d) a observação direta das
instalações. A coleta de dados encerrou-se, após a realização da entrevista em
grupo, quando o pesquisador constatou que as respostas e esclarecimentos obtidos
eram suficientes para a análise do caso e dos objetivos de pesquisa, não se
justificando ampliar o número de entrevistas.
A observação direta não participante das instalações da empresa, lojas e
respectivos artefatos foi realizada ao longo de toda a coleta, procurando-se
acrescentar maiores subsídios à pesquisa.
Neste sentido, foram observados mobiliários, adornos, lay-out, sinalização,
eventos e/ou comportamentos, em que o pesquisador atuou como observador,
sempre atento aos objetivos da pesquisa, fazendo registros por meio de anotações
escritas, combinando com perguntas curtas e rápidas, em tom informal (GODOY,
1995c).
O estudo de caso gera uma grande quantidade de dados de fontes diversas -
entrevistas, entrevista em grupo e documentos. Desta forma, a sistematização do
processo de coleta foi importante para evitar que o sentido da pesquisa inicial se
perdesse. A categorização, classificação e armazenamento dos dados coletados
num banco de dados textual foram fundamentais para o processo de análise (SOY,
1998).
Nestes termos, as informações foram agrupadas em três categorias,
relacionando respectivos objetivos e questões relacionadas do roteiro de entrevista
elaborado, para facilitar o processo de análise de dados, conforme o Quadro 4:
70
Categorias Centrais Objetivo Questões do roteiro de referência
Descrição e análise da cultura organizacional
Identificar as questões de adaptação externa e integração interna presentes na
organização, considerando também os artefatos, valores e pressupostos básicos existentes na empresa (SCHEIN,2004),
identificar os valores, heróis, rituais e símbolos, permeados pelas práticas, conforme
modelo proposto por Hofstede (1991) e por último, verificar característica da cultura
brasileira presente na organização, conforme modelo de sistema de ação cultural definido
por Tanure (2007).
1 a 23.
Descrição e análise dos processos de inovação
Identificar como seu deu o histórico das inovações da organização, identificando os
tipos de inovação predominantes no contexto atual e passado da organização
(CHRISTENSEN, 2003).
24 a 30.
Relacionamento entre os elementos da cultura
organizacional e os tipos de inovação
Identificar os temas, conforme modelo proposto por McLaughlin, Bessant e Smart
(2005) que compõem a dinâmica organizacional, oriundos dos fomentadores
dos processos de inovação e sua relação com os tipos de inovação e questões de adaptação
externa ou integração interna. Verificar a influência dos elementos da cultura brasileira
definidos por Tanure (2007), conforme modelo proposto pelo pesquisador.
9 a 20 e 24 a 30.
QUADRO 4 – Resumo da estratégia de coleta de dados Fonte: Elaborado pelo autor da dissertação.
A entrevista com o presidente teve a duração de aproximadamente quatro
horas, sendo uma hora e quarenta e quatro minutos gravada e transcrita
posteriormente. O presidente foi bastante receptivo durante a entrevista,
possibilitando ao pesquisador explicar detalhadamente os passos e objetivos da
pesquisa. Também não colocou nenhum empecilho para que a entrevista pudesse
ser gravada, permitindo ao pesquisador concentrar-se totalmente em sua condução.
Mesmo considerando o roteiro de entrevista elaborado previamente, o
pesquisador preferiu permitir que a entrevista transcorresse naturalmente, deixando
o entrevistado livre para expor as suas ideias na ordem que bem entendesse,
realizando intervenções para resgatar o roteiro original somente quando necessário.
Essa estratégia permitiu que a entrevista fluísse, como também possibilitou
um maior engajamento e entrosamento entre entrevistador e entrevistado. O
pesquisador considerou previamente esta abordagem para a execução da
entrevista.
71
Após a realização da entrevista, o pesquisador e o presidente discorreram
sobre quais área e gestores seriam entrevistados. O presidente então indicou que
deveria ser entrevistada toda a diretoria, composta pela Assessoria da Presidência,
Diretoria Comercial e Superintendência Administrativa. Além disto, indicou os
representantes das áreas Administrativa, Tecnologia da Informação, Drogatel e
Marketing.
Os membros do Conselho de Administração, oriundos da família, foram
descartados, pois, segundo o presidente, não desempenham papel ativo na
organização.
O presidente disponibilizou-se em agendar as entrevistas, através de sua
secretária, para facilitar e agilizar o acesso aos gestores. Causou estranheza ao
pesquisador o presidente não ter incluído a Gerência de Vendas, Produtos e
Recursos Humanos.
Segundo o presidente, ele estava adotando como critério o tempo de casa.
Observou que estas pessoas recomendadas tinham grande comprometimento com a
organização, que o gerente de Vendas e Produtos era recente na empresa e o
gestor de Recursos Humanos estava em processo de contratação.
Quando questionado se não seria importante a entrevista com o gerente de
Produtos, já que o tema tratava de inovações e que esta área eventualmente poderia
ter uma participação ativa no processo, o presidente prontamente informou que a
inovação, na organização, estava centrada na pessoa dele, fato confirmado ao longo
das entrevistas. Acrescentou que a área de produtos basicamente realizava o
denominado gerenciamento de categorias dos produtos existentes e não o
desenvolvimento de novos produtos.
O pesquisador indagou ao presidente sobre um possível acesso aos
manuscritos do livro que estava sendo escrito em referência ao centenário da
organização. O presidente não considerou oportuno, pois não havia sido realizada
ainda uma revisão do texto e, desta forma, não permitiu o acesso ao livro.
Posteriormente, o pesquisador fez nova tentativa de obter uma cópia, sem sucesso.
Em função disto, a pesquisa documental ficou comprometida, pois o
pesquisador não conseguiu obter acesso ao acervo que foi construído por ocasião
do centenário da empresa, para maior compreensão dos artefatos e valores
compartilhados da organização ao longo da linha do tempo (SCHEIN, 2004).
72
Por outro lado, pôde compensar esta lacuna, por meio da realização da
entrevista em grupo com os funcionários mais antigos, e com isto, conseguiu
identificar práticas adotadas ao longo dos anos, consideradas inovadoras no seu
modelo de gestão e prestação de serviços.
As pessoas escolhidas para as entrevistas foram baseadas num processo de
preferência pessoal do presidente, considerando o tempo de trabalho na
organização, mas o desenvolvimento da pesquisa não foi prejudicado, pois,
realmente, contribuíram para esclarecer os objetivos e problemas estabelecidos.
Após a realização das entrevistas, dada a recorrência da citação dos três
funcionários mais antigos por todos os entrevistados e tendo em vista a
oportunidade de enriquecimento do trabalho, o pesquisador considerou a
possibilidade de entrevistá-los. Devido à experiência de vida e vivência desses
funcionários dentro da organização, o pesquisador percebeu que eles poderiam
contribuir para o entendimento dos aspectos culturais e inovações ao longo dos
anos. Sendo assim, o pesquisador solicitou à Assessora do Presidente a
possibilidade de realização de uma entrevista em grupo com tais funcionários, o que
foi prontamente atendido.
O pesquisador seguiu para a realização da entrevista em grupo, com o
mesmo roteiro utilizado, buscando contextualizar os temas nos momentos históricos
e relevantes da organização, e com isto pôde concluir que o trabalho havia atingido
seu ponto de saturação, pois havia um grande número de respostas recorrentes
para as perguntas formuladas aos participantes da entrevista em grupo em
comparação com as respostas dos entrevistados anteriormente. A entrevista em
grupo propiciou ao pesquisador a certeza de que as informações fundamentais para
a pesquisa puderam ser coletadas através das fontes utilizadas.
As entrevistas individuais e a entrevista em grupo tiveram em média uma hora
e trinta minutos de duração, perfazendo um total de 116 páginas de texto transcritas.
Cada entrevista foi gravada, após esclarecer sobre sua destinação, e foi assumido,
com cada entrevistado, um compromisso de confidencialidade com relação às
informações prestadas.
O Quadro 5 apresenta a relação dos cargos das pessoas entrevistadas, bem
como a sua relação de parentesco com o fundador e tempo de empresa.
73
Cargo do Entrevistado Parentesco Tempo de Empresa
Diretor Presidente Neto do fundador da empresa. 24 anos
Diretor Superintendente Bisneto do fundador da empresa e sobrinho do presidente atual.
25 anos
Diretor Comercial Bisneto do fundador da empresa e sobrinho do presidente atual.
15 anos
Assessora da Presidência Bisneta do fundador da empresa e filha do presidente atual.
3 anos
Gerente Administrativo - 20 anos
Gerente de Marketing - 7 anos
Gerente de Tecnologia da Informação
- 22 anos
Gerente do Drogatel - 15 anos QUADRO 5 - Relação de Diretores e Gerentes entrevistados Fonte: Elaborado pelo autor da dissertação.
A entrevista em grupo foi realizado com o Sr. Davi Oliveira, que atua hoje
como assessor da Diretoria, com 63 anos de empresa, Sra. Maria Felix, que atua no
departamento de tesouraria e Sr. Irineu Silveira, que atua no departamento de
compras, com 60 e 66 anos de casa respectivamente.
3.4 Estratégia de análise
O processo de análise constituiu-se em explorar os níveis através dos quais a
cultura da organização poderia ser aprendida, a partir dos elementos e categorias
culturais estabelecidas por autores como Schein (2004), Hofstede (1991) e Tanure
(2007). Compreendeu também entender quais deles poderiam contribuir em menor
ou maior grau para um tipo de inovação – incremental ou radical, conforme proposto
por Christensen (2003).
Visando ao entendimento da relação entre os dois conceitos – cultura
organizacional e inovação -, através de uma perspectiva mais ampla e que
integrasse os dois elementos, foi explorado o conceito de arquétipos
(GREENWOOD; HININGS, 1993), que apresenta um esquema interpretativo através
de um conjunto de estruturas e sistemas. A perspectiva de cultura organizacional
apresentada por Schein (2004) tem conformidade com esse esquema interpretativo.
74
Foram utilizados dois tipos de arquétipos, conforme modelo proposto por
McLaughlin, Bessant e Smart (2005), que apresentam posições para a cultura
organizacional de acordo com cada tipo de inovação. O arquétipo tipo I tem uma
perspectiva incremental para inovação, e o tipo II utiliza a perspectiva radical.
Não houve o intuito, na pesquisa, de estabelecer comparações, o que levaria
a um estudo de caso múltiplo, mas, sim, de entender em profundidade um contexto,
bem como “a multiplicidade de dimensões presentes numa determinada situação,
uma vez que a realidade é sempre complexa” (GODOY, 1995c, p. 25).
O pesquisador realizou adaptações no modelo interpretativo de Mclaughlin,
Bessant e Smart (2005), de forma a facilitar o seu entendimento e análise dos dados
coletados, conforme mencionado no capítulo anterior. O pesquisador também não
utilizou os mesmos métodos e softwares de análise qualitativa utilizados por esses
autores, já que o conteúdo a ser analisado era menor, dispensando o uso de uma
ferramenta mais elaborada e complexa, como o Nvivo, adotado por eles.
Foi analisado o conteúdo das transcrições das entrevistas individuais e em
grupo, procurando identificar temas comuns e relacionados com as variáveis cultura
organizacional e inovação, procurando centrar-se na problemática de pesquisa.
A expectativa foi de que, a partir dos resultados, fosse possível desenvolver
algumas sugestões e recomendações para melhor entendimento da complexidade
do fenômeno e contribuir também para outras organizações que pretendam lidar
melhor com os aspectos culturais e as inter-relações com os tipos de inovação.
A técnica de análise de conteúdo foi empregada considerando os dados
obtidos, tendo em vista a complexidade que cerca os ambientes, em épocas
diferentes, buscando tornar mais perceptíveis as diferenças qualitativas que
envolvem tradições e símbolos da organização (GODOY, 1995c).
A organização e análise de todo o material obtido por meio dos documentos,
observações e entrevistas, utilizando a técnica de análise de conteúdo, possibilitou o
entendimento de que, por trás de todo discurso claro, oculta-se outro sentido, não
tão claro (LAVILLE; DIONNE, 1999). Isto permite o entendimento dos pressupostos
básicos, conforme o conceito de cultura de Schein (2004), nível não visível e não
claramente identificado.
Entende-se então a análise de conteúdo como uma ferramenta de
compreensão da construção do significado que os atores sociais imprimem nos seus
75
discursos, ou seja, uma visão interpretativa da realidade sobre o ponto de vista dos
indivíduos em estudo (BERGER; LUKMAN, 1966).
Foram identificados, então, três níveis de análise para facilitar a compreensão
das relações existentes entre cultura organizacional e inovação. O pressuposto da
pesquisa é de que elementos da cultura organizacional, que podem ser influenciados
pela cultura nacional, exercem influência sobre o posicionamento da empresa com
relação aos tipos de inovação, indicando uma tendência para o desenvolvimento de
inovações do tipo incremental ou radical.
Nesses termos, o primeiro nível de análise considerado visou identificar e
caracterizar a cultura organizacional da empresa pesquisada, buscando o
entendimento de:
a) como a empresa lida atualmente e lidou no passado com as questões
de adaptação com relação ao ambiente externo, procurando identificar
como as metas e objetivos são estabelecidos e os resultados são
medidos; qual a forma de atuação da empresa frente às mudanças e
quando os objetivos não estão sendo alcançados (SCHEIN, 2004);
b) como a empresa lida atualmente e lidou no passado com as questões
relacionadas a promover a integração interna: linguagem comum,
critérios para inclusão de novos membros, alocação de status poder e
autoridade, ações para promover intimidade, amizade e
relacionamentos, critérios de recompensa e punição e estratégias
adotadas para gerenciar diferenças interpessoais (SCHEIN, 2004);
c) quais são os artefatos visíveis, valores compartilhados e pressupostos
básicos presentes na organização (SCHEIN, 2004);
d) quais são os valores, heróis, rituais e símbolos permeados pela
práticas cotidianas da organização (HOFSTEDE, 1991);
e) quais características da cultura brasileira encontram-se mais presente
no contexto da organização (TANURE, 2007).
O primeiro nível de análise permitiu identificar quais os elementos
organizacionais e gerenciais compõem a cultura da empresa pesquisada.
O segundo nível de análise visou descrever a analisar os processos de
inovação da empresa pesquisada, buscando identificar como seu deu o histórico das
76
inovações da organização, identificando os tipos de inovação predominantes no
contexto atual e passado da organização (CHRISTENSEN, 2003).
Este nível de análise permitiu identificar quais as práticas podem ser
consideradas inovadoras no modelo de gestão e prestação de serviços adotados na
empresa pesquisada.
E por último, o terceiro nível de análise buscou identificar o relacionamento
entre os elementos da cultura organizacional e os tipos de inovação, através das
questões a seguir:
a) identificação dos temas presentes na organização pesquisada,
conforme modelo proposto por McLaughlin, Bessant e Smart (2005),
que compõem a dinâmica organizacional, oriundo dos fomentadores
dos processos de inovação e sua relação com os tipos de inovação e
questões de adaptação externa ou integração interna;
b) verificação da possibilidade de influência dos elementos da cultura
brasileira definidos por Tanure (2007), conforme modelo proposto pelo
pesquisador.
Este último nível de análise serviu para identificar qual a relação entre cultura
organizacional e as inovações no modelo de gestão e na prestação e serviços
implementados na empresa pesquisada. Pôde-se identificar também quais os
elementos que compõem a cultura da organização possuem alguma relação com os
tipos de inovação – incremental e radical - propostos pelos autores da área. No
próximo capítulo, será apresentada a análise de descrição dos dados.
77
4 DESCRIÇÃO E ANÁLISE DE DADOS: ESTUDO DE CASO
Neste capítulo, será apresentada e caracterizada a organização pesquisada,
a Drogaria Araujo.
Será descrita e analisada a cultura organizacional da empresa, analisando as
questões de adaptação externa e integração interna presentes na organização, bem
como os principais artefatos, valores e pressupostos básicos presentes, conforme
definições de Schein (2004). Serão analisados, além disso, os valores, heróis, rituais
e símbolos, considerando a perspectiva de Hosfstede (1991).
Serão também apresentados os principais elementos e traços característicos
da cultura brasileira identificados na organização, buscando avaliar a sua influência
no modelo de gestão da empresa.
Em seguida, serão apresentados e analisados os principais processos de
inovação da empresa, como também o histórico dessas inovações ao longo de sua
trajetória, caracterizando os tipos de inovação que foram adotados na organização.
Por último, será avaliado o relacionamento existente entre os elementos da
cultura da organização e os tipos de inovação, identificando os elementos que
compõem a cultura da organização e que apresentam alguma relação com os tipos
de inovação.
4.1 Apresentação e caracterização da empresa
Conforme apresentado na introdução e metodologia deste trabalho, a
Drogaria Araujo é uma empresa fundada em 1906, que sempre se destacou por sua
capacidade de inovação no seu segmento de atuação, o varejo farmacêutico. Em
todos os seus anos de história, aproveitou bem as oportunidades de mercado,
oferecendo serviços diferenciados para a cidade de Belo Horizonte, sendo pioneira
em vários deles, como o atendimento e venda por telefone, a entrega a domicílio, o
78
plantão 24 horas e o serviço de conveniência drive-thru. Vale ressaltar também o
modelo de negócio baseado no conceito drugstore, onde a empresa procura
oferecer aos seus clientes, além de medicamentos, itens de conveniência,
oferecendo um mix de produtos amplo (BRASIL; ARRUDA, 2006; DROGARIA
ARAUJO, 2008).
Neste sentido, destaca-se a fala do presidente da Araujo sobre anúncio
publicado em 1927 (Anexo 1):
Eu estou falando desse anúncio de 27, a gente vê aqui que já tinha a parte de mix, de Drugstore, a gente já vendia procedência, que era falada que era importação direta, já vendia preço, já vendia serviço, dando consulta médica grátis e já vendia serviço com entrega a domicílio (Presidente).
Em 2009, a empresa completou 103 anos. Ela é hoje gerenciada pela terceira
geração. Durante todos estes anos, experimentou um processo de gestão
superposta de Modesto Carvalho de Araujo para seu filho Antônio Martins de Araujo
(em caráter informal), que transferiu para seu filho Eduardo Mauro Velloso Araujo,
até chegar em Modesto Carvalho de Araujo Neto, irmão de Eduardo. Este processo
de gestão superposta parece ter facilitado a transição entre gerações sem maiores
transtornos (BRASIL; ARRUDA, 2006).
Modesto, o fundador, trabalhou sempre em conjunto com Antônio Martins, até
1942. A partir daí, embora Modesto estivesse sempre presente nas decisões
importantes, coube a Antônio Martins ficar a cargo das principais operações da
empresa (BRASIL; ARRUDA, 2006). No ano de 1979, ambos vieram a falecer.
Quando Antônio já era o principal executivo da empresa, Eduardo estava por
perto, realizando tarefas a ele delegadas e participando ativamente da
administração. Quando Eduardo assumiu, trouxe para a organização o atual
presidente Modesto Neto, seu irmão, que trabalhava fora da firma, como seu
principal assessor. Em maio de 2004, Eduardo veio a falecer e, em junho do mesmo
ano, Modesto Neto assumiu a Presidência da empresa (BRASIL; ARRUDA, 2006).
E, na continuidade desse processo, hoje o Modesto Neto envolve na gestão
a sua filha Silvia e os sobrinhos Antônio e Bruno, que integram a Direção da
organização, em um processo educativo de desenvolvimento de acordo com as
vocações individuais, dando continuidade ao modelo de gestão superposta,
conforme apresentado por Brasil e Arruda (2006). A expectativa é de que o próximo
79
líder surja naturalmente, sem crises ou abalos, dando continuidade e longevidade
aos negócios da organização.
O organograma atual da empresa é apresentado na FIG. 12 a seguir.
FIGURA 12 – Organograma atual da empresa Fonte: Elaborado pelo autor da dissertação.
A missão da empresa é destacada em quadro afixado na sala de espera da
Diretoria e afirma que é “encantar e satisfazer às necessidades dos nossos clientes,
criar valor para os acionistas, zelar pela realização de nossos colaboradores e pelo
bem-estar da sociedade”. A missão e as políticas de compromisso social, lucro e
crescimento com medida de desempenho são reforçadas também através de
palestras internas realizadas pela direção da organização (Presidente).
O compromisso social pode ser comprovado por fatos constantes na história
da empresa. Durante a epidemia de “gripe espanhola”, que atacou o país entre 1914
e 1918, a Araujo buscou financiamento em um banco para importar um importante
remédio da Alemanha, e o vendeu a preço de custo para a população, com o intuito
de ajudar no combate à epidemia (DROGARIA ARAUJO, 2009).
Atualmente, a empresa participa de ações sociais que promovem educação,
lazer, saúde e preservação do patrimônio histórico e cultural. Dentre os projetos,
destacam-se, como exemplos (DROGARIA ARAUJO, 2009):
80
Hospital da Baleia - Criada em dezembro de 2004, a campanha “Adote o
Hospital da Baleia” incentiva os clientes da empresa a doarem o seu troco ou
parte dele para essa instituição.
Playground da Longevidade – A empresa doou para a cidade de Belo
Horizonte em 2006 aparelhos de ginástica e de alongamento, que foram
instalados na Praça JK e no Centro de Saúde Eduardo Araujo, no Bairro
Miramar.
Palestras de Saúde – A empresa promove, em suas lojas, palestras sobre
temas relacionados à saúde, tais como diabetes, hipertensão, asma e curso
para gestantes.
Curso para gestantes - A empresa promove,periodicamente, em parceria com
a clínica Leite Meu e a empresa Vacsim, um curso gratuito para gestantes. O
curso inclui: cuidados com a gravidez, pré-natal, aleitamento materno, teste
do pezinho, primeiros cuidados com o bebê, vacinação para gestantes e para
o bebê.
Patrimônio Histórico - A empresa patrocinou a restauração de duas casas que
ajudam a preservar a história e a cultura da capital, na Rua da Bahia, no
centro e na Avenida do Contorno, na Savassi.
Preservação de Praças - A empresa também ajuda a conservar e manter
praças públicas em Belo Horizonte, como a Praça da Rodoviária.
Valores de Minas – A empresa participa do programa do Governo de Minas
Gerais, contribuindo com a doação de kits de higiene pessoal.
A empresa enfatiza para os seus clientes, através de anúncios publicitários, o
que denomina de “Padrão Araujo de Medicamentos”, que visa assegurar a atenção
da empresa em todas as etapas de comercialização dos seus produtos. A
organização procurar garantir a procedência do seus medicamentos, assegurada por
meio das compras, diretamente das indústrias farmacêuticas e dos grandes
distribuidores do país e por preços baixos, pela sua capacidade de aquisição de
maiores volumes do que a concorrência (DROGARIA ARAUJO, 2009).
O espaço físico da empresa é constituído pela matriz, localizada na Praça Rio
Branco, no centro de Belo Horizonte, e de aproximadamente 90 lojas espalhadas
pela Grande Belo Horizonte. A empresa possui um centro de distribuição localizado
81
em Contagem, e ainda uma loja, localizada na Avenida Olegário Maciel, que é
especializada na comercialização de produtos agroveterinários.
Além de medicamentos, as lojas oferecem várias opções de serviços e
produtos, incluindo:
agroveterinária - completa linha de produtos para o campo e atendimento
de agrônomo;
Araujo Foto - revelação de filmes / imagens;
Araujo Cópias - serviço de fotocópias e envio de fax;
caixas eletrônicos;
Dr. Scholl - podologia e tratamento dos pés;
drive-thru;
Espaço Dermo-cosméticos - atendimento personalizado e marcas
mundialmente famosas;
Espaço Mais beleza - aplicação de coloração de cabelos;
Espaço Viver Diet - atendimento especializado a diabéticos;
pagamento de contas;
plantão 24 Horas;
Quiosque Araujo Foto - revelação foto digital em segundos e fotoprodutos;
Vacsim - aplicação de vacinas em adultos e crianças.
Localizada na Matriz, em um prédio de três andares, com uma construção de
expansão ao fundo, estão a Presidência, Assessoria da Presidência, Diretoria
Comercial, Superintendência Administrativa, Gerência Administrativa e Financeira,
Gerência de Recursos Humanos, Gerência de Tecnologia da Informação, Gerência
de Marketing, Gerência de Produtos, Gerência de Compras, Gerência de Vendas,
Gerência do Drogatel e Laboratório de Manipulação. Funciona, também, nesse
endereço, a primeira e principal loja da empresa.
As áreas físicas estão distribuídas entre os três andares, com exceção do
laboratório de manipulação e o Drogatel, que ocupam o prédio anexo ao prédio
principal. O layout é composto por ilhas de trabalho, não existindo divisórias entre os
departamentos, com cores predominantemente claras. Com exceção de algumas
salas, como a Presidência, Diretoria e salas de reuniões, o acesso é amplo e
irrestrito, oferecendo possibilidades de interação entre as pessoas. Existem ainda
82
áreas de convivência, com jardins de inverno, fonte de água e televisão, para
permitir aos funcionários momentos de pausa e descanso durante suas atividades.
Segundo os entrevistados, a empresa possui um sistema estruturado de
gestão matricial de receitas e despesas, implantado e subsidiado através da
empresa de consultoria INDG (Instituto Nacional de Desenvolvimento Gerencial). A
metodologia é baseada no ciclo PDCA (plan, do, check, act), oriundo dos sistemas
de gestão da qualidade, sendo constituída por meio do estabelecimento de
indicadores e metas, elaboração de planos de ação, acompanhamento e
monitoramento, verificação do alcance das metas, revisão dos insucessos e
padronização e treinamento das ações de sucesso.
A Superintendência Administrativa, dentro do conceito implantado pelo INDG
de gerenciamento matricial de despesas e receitas, responde, no tocante ao
orçamento, pela gestão dos gastos – custos e despesas - da empresa. Ela
compreende as áreas administrativa e financeira, contabilidade, custos, compras,
recursos humanos, tecnologia da informação e o centro de distribuição, que gerencia
os estoques e logística da organização.
A Diretoria Comercial responde pelo gerenciamento matricial das receitas,
englobando as áreas de vendas - lojas e Drogatel, produtos e marketing. A
Gerência de Produtos realiza o planejamento do leque e distribuição dos produtos
nas gôndolas das drogarias, através do estudo de gerenciamento de categoria, que
é baseado tanto em dados de pesquisa de mercado e de preferências do
consumidor, realizada pela empresa norte-americana Nielsen, quanto nas demandas
identificadas internamente na Drogaria Araujo.
Com base nesses estudos, é planejada a disposição dos produtos nas
gôndolas das drogarias, organizando-os pela maior preferência do consumidor e
rentabilidade para a empresa, de forma que estejam diretamente no campo de visão
do consumidor. Os produtos com menor rentabilidade, em contrapartida, ficam
expostos em prateleiras inferiores. Desta forma, a empresa promove também uma
negociação mais efetiva junto aos fornecedores, de forma que, caso eles tenham
interesse em maior exposição e visibilidade do seu produto, necessariamente terão
que possibilitar uma rentabilidade maior para a Drogaria Araujo.
83
A Diretoria encontra-se instalada no segundo andar, no prédio da matriz, em
uma área separada, com padrão de decoração e mobiliário distinto dos demais
setores, com acesso específico, que é controlado através de recepção própria.
O pesquisador observou que, apesar da aparente separação, os gestores e
alguns empregados, principalmente os mais antigos, têm acesso livre e irrestrito aos
diretores, mediante solicitação de agendamento, informação confirmada durante as
entrevistas.
Isso permite que determinadas áreas, como Marketing e Tecnologia da
Informação, por exemplo, tenham um contato bastante estreito com a Presidência,
deliberando e despachando diretamente com Modesto Neto. Mas vale ressaltar a
dificuldade também mencionada pelos entrevistados de conseguir agenda com o
presidente.
De maneira geral, a empresa possui uma estrutura organizacional
horizontalizada, com poucos níveis hierárquicos, considerando-se que possui
aproximadamente 3.500 funcionários, o que, de certa forma, parece possibilitar,
conforme mencionado pelos entrevistados, maior agilidade para a tomada de
decisões.
Não foi identificado um grupo na organização que trabalhe na pesquisa e
desenvolvimento de inovações, conforme citados pelos entrevistados e pelo próprio
presidente. As inovações e mudanças partem comumente da Diretoria, em especial
do presidente.
Não há também a evidência de existência de muitos procedimentos
documentados, tanto para processos produtivos quanto administrativos. Existem
manuais com normas e treinamentos introdutórios e periódicos. A comunicação
interna não ocorre também de forma sistemática e planejada.
Não foram observadas evidências de existência de quadros de gestão com
informações de metas e resultados. Os indicadores de desempenho estão baseados
no gerenciamento matricial de receitas, permitindo o desdobramento do resultado
por lojas ou por categoria de medicamentos e em custos, com base num modelo e
visão orçamentário proposto pela consultoria do INDG.
Não foi encontrada nenhuma evidência de indicadores de perspectivas de
clientes e mercado, como, por exemplo, satisfação e participação de mercado,
perspectivas de processos, com o intuito de determinar a qualidade dos processos
84
internos, como também com relação à expectativa de pessoas, como satisfação dos
empregados ou índices de turn-over, por exemplo.
A empresa não possui nenhuma certificação relacionada a qualidade, como
ISO 9000, e também não participa de nenhum grupo ou comitê que trate sobre o
assunto, como também não concorre a premiações nesse sentido.
Neste contexto, destaca-se que a gestão considerada participativa com
envolvimento dos empregados é praticamente inexistente, mas sua política de
gestão de pessoas inclui a participação dos funcionários em lucros e resultados.
A empresa possui uma participação ativa como membro da ABRAFARMA e o
seu presidente faz parte do atual Conselho Diretivo da organização (2008–2010),
sendo Diretor de Relações Institucionais (ABRAFARMA, 2009).
Mesmo tendo uma posição e faturamento considerável no cenário nacional,
ainda é uma empresa de capital fechado, de controle totalmente familiar e não conta
com a presença, no seu Conselho de Administração, de representantes externos.
Normalmente financia o seu crescimento através de capital próprio, com
endividamento pequeno, mas o que hoje, na visão do seu diretor superintendente,
tem se tornado um obstáculo e um limitador para o seu desenvolvimento.
Apesar do ritmo considerado acelerado de expansão, também não define os
seus projetos de expansão através uma metodologia de gestão de projetos
estruturada. Possui uma experiência adquirida ao longo dos anos e uma
padronização relativa das suas lojas, o que permite rápida abertura de um ponto
comercial.
Na opinião do pesquisador, o planejamento estratégico privilegia o
crescimento, onde a visão da direção é baseada no aumento de lojas, objetivando
crescimento ocupacional de forma a minimizar e dificultar a entrada de novos
concorrentes no mercado de Belo Horizonte.
Por outro lado, apesar do sucesso desta estratégia, a sua atuação junto a
outros estados e mesmo outras cidades do estado de Minas Gerais é restrita ou
inexistente, representando uma dependência do mercado de Belo Horizonte.
Muitas lojas e o serviço Drogatel trabalham no regime de 24 horas, em que os
empregados revezam-se em turnos para garantir o atendimento aos clientes. Os
demais departamentos trabalham somente durante o horário comercial, de segunda-
feira a sexta-feira.
85
A empresa possui aproximadamente 3.500 empregados, sendo que a
Presidência representa a maior instância de poder dentro da organização, seguida
pela Assessoria que apoia a Presidência e funciona como uma espécie de ouvidoria
da organização. Apesar de ter sido mencionada a existência de um conselho
administrativo, não percebeu-se a clareza ou efetividade de sua atuação. O nível
gerencial intermediário da empresa é composto por nove gerentes.
4.2 Descrição e análise da cultura organizacional da empresa estudada
Considerando os objetivos deste trabalho de avaliar os elementos da cultura
que possam ter facilitado a adoção de inovações na organização e a sua
sobrevivência em mercado tão competitivo, esta parte do trabalho visa caracterizar
os principais elementos da cultura organizacional.
4.2.1 A adaptação externa e integração interna: as atividades da Drogaria
Araujo
Schein (2004) considera, conforme apresentado no capítulo do referencial
teórico, como questões de adaptação externa, a missão e funções primordiais da
empresa perante o seu ambiente, os objetivos a serem atingidos pela organização,
os métodos a serem utilizados para atingir estes objetivos, os critérios para se
medirem os resultados e as estratégias emergenciais ou corretivas adotadas, caso
os objetivos não estejam sendo alcançados. Com base nisso, analisou-se cada um
desses aspectos presentes na organização.
Iniciando-se pela missão da empresa, observa-se primeiramente que ela é
explicitada e visível somente na parede da sala da Diretoria. Não se observaram
evidências de divulgação da missão nos setores e lojas, seja nas paredes dos
86
estabelecimentos ou nos quadros de avisos existentes. O site da Internet de 2008
continha uma referência à missão, sem valorização mais expressiva. O novo site,
desenvolvido em 2009, não contém mais esta referência. Não foi identificado
também nenhum jornal ou comunicado interno que reforce ou divulgue a missão da
empresa. Não foi constatado também nenhum material institucional, cartilha de
empregados ou manual do colaborador que divulgue missão. Durante a entrevista, o
presidente afirmou que “a nossa missão é encantar e satisfazer a necessidade do
nosso cliente”, contudo, os demais entrevistados não fizeram menção a ela. O
presidente também mencionou que, através das palestras motivacionais que ele
realiza para os empregados, sem especificar com qual frequência, o tema da missão
é recorrentemente abordado. Rapidamente também afirmou que missão e valores
são reforçados no treinamento introdutório.
Todavia, observa-se um grau de alinhamento razoável entre os gestores, com
relação ao propósito da organização de encantar e satisfazer a necessidade dos
clientes. Apesar da missão não estar evidenciada como um artefato visível,
conforme definição de Schein (2004), ou símbolo para Hofstede (1991), e de não
terem sido encontradas provas de reforço do seu sentido por parte dos gestores
para os empregados, observa-se que a organização, considerando-se o que foi
verbalizado pelos seus gestores, tem uma orientação voltada para o atendimento e
satisfação da necessidade dos seus clientes.
Neste sentido, cabe destacar a atuação da Assessoria do Presidência, que
funciona como uma espécie de ouvidoria da organização, através do programa
intitulado “Fale com o Presidente”. Este programa consiste num serviço de
atendimento ao consumidor, acessado através de um canal telefônico ou pela
Internet, onde o consumidor tem a possibilidade de manifestar uma critica, sugestão
ou reclamação da organização.
Segundo a assessora do presidente, no momento em que o cliente demonstra
insatisfação com o serviço, é a oportunidade para a empresa conseguir fidelizar,
encantar e mostrar que a organização está preocupada com ele e que vai resolver o
problema. Nas palavras dela, “o negócio é encantar e fazer o cliente sair bem e
satisfeito”.
87
Perspectiva semelhante demonstrou o gerente de Marketing quando explicou
que o foco está no cliente, pois, atendê-lo bem e ver o seu problema são os
principais valores da organização.
Ele ainda acrescentou que “a cultura da empresa é resolver logo, e é para o
vendedor resolver. Se ele não conseguir, passa para o gerente, e se ele não
conseguir, passa para o gestor, mas alguém tem que resolver”.
Já o diretor superintendente destaca que o que norteia o negócio é o produto
disponível para o cliente, garantindo a sua satisfação e encantamento ao assegurar
para o consumidor de que, na empresa, ele encontra medicamentos ou produtos de
conveniência de que necessita.
Historicamente, observa-se a preocupação com o atendimento ao cliente, no
depoimento de um dos funcionários mais antigos, quando ele ressalta que na
organização existe uma tradição de que “todo cliente é igual, bonitinho, gravatinha,
engraxate, todos têm que ter o mesmo atendimento, é um ser humano, é a
humildade”.
Desta forma, percebe-se que, mesmo não divulgando a missão por meio de
elementos visuais ou canais de comunicação, ela representa um pressuposto básico
da organização (DEAL; KENNEDY, 1982; SCHEIN, 2004), pois satisfazer o cliente
de qualquer maneira parece já se constituir elemento natural da cultura
organizacional. Isto parece facilitar a adaptação da organização com o seu ambiente
e norteia as ações do grupo (OUCHI, 1981; PASCALE; ATHOS, 1981; PACKARD,
1995; SCHEIN, 1985).
Considerando-se, então, as questões relacionadas aos objetivos a serem
atingidos pela organização, observa-se uma ênfase em aspectos econômico-
financeiros.
O presidente e o diretor superintendente destacaram a solidez financeira da
organização e apontaram o lucro como principal indicador de bom desempenho. O
presidente esclareceu que a organização é a segunda melhor em rentabilidade do
estado, segundo ranking publicado pela revista Mercado Comum e a primeira em
faturamento por rede e lojas, segundo ranking da ABRAFARMA.
O diretor superintendente acrescentou que a empresa possui baixo grau de
endividamento, que normalmente não se utiliza de financiamentos bancários e que
88
pela primeira vez na sua história realizou um empréstimo de longo prazo com o
BNDES devido às condições favoráveis para obtenção desse crédito.
No entanto, não observou-se, por ocasião da pesquisa, a evidência de
elementos visíveis que demonstrem o bom desempenho da empresa. Durante a
visita às instalações, com exceção da área de vendas, nenhuma outra área
apresentava os seus resultados através de um quadro de acompanhamento.
Segundo os entrevistados, os objetivos de lucratividade são discutidos e
acompanhados nas reuniões de Diretoria, sem periodicidade definida. A equipe de
vendas trabalha com reuniões mensais para discutir seus resultados.
Segundo o presidente, existe um encontro anual da Diretoria para elaboração
de planejamento estratégico, tendo como principal objetivo estabelecer os seus
planos de expansão e abertura de lojas. Mas não se encontraram evidências da
realização de um acompanhamento sistemático da implementação deste
planejamento.
Nessa reunião, o presidente apresenta o que ele denomina de modelo de
estratégia ocupacional da organização, dando destaque para a abertura de lojas e
para a agilidade com a qual a empresa consegue abrir novos pontos comerciais,
intimidando a concorrência e ocupando pontos estratégicos na Grande Belo
Horizonte. Reforça ainda a necessidade de se estruturar para conseguir suprir
produtos com qualidade e em tempo hábil para as suas lojas, através do seu centro
de distribuição.
Percebe-se então a adoção de um modelo expansionista para atingir os seus
objetivos de receita e lucratividade. Esse modelo vem sendo aprimorado
recentemente com a introdução de novos canais de venda, como o comércio
eletrônico e os quiosques de vendas. A introdução de novos serviços, como o Araujo
Foto, que consiste em dispor equipamentos para ampliação de fotos digitais nas
lojas, foi apresentado pelo presidente como uma oportunidade para o
desenvolvimento de novos serviços, como também para permitir a participação de
membros da família no negócio.
Constata-se que a organização tem também o objetivo de prover
oportunidades para os membros da família, seja aproveitando o talento de alguns na
gestão e condução do negócio, como é o caso da assessora do presidente, que é
sua filha e potencial sucessora, e os dois diretores, que são sobrinhos, ou permitindo
89
a existência de negócios de familiares complementares ao negócio principal. Neste
sentido, passa a existir um processo de compartilhamento da cultura do grupo,
transmitindo elementos culturais relacionados à gestão da organização para as
novas gerações (LOUIS, 1980; SCHEIN, 1968; VAN MAANEN, 1979).
Existe ainda a situação de dois familiares que não participam da gestão do
negócio, mas que são membros do Conselho de Administração da organização. Vale
ressaltar que o pesquisador não constatou a existência de um plano formal de
sucessão e sua respectiva divulgação para todos os membros, apesar da existência
de um consenso entre os gestores de que a assessora do presidente está sendo
preparada para sucedê-lo.
O planejamento da organização não prevê, conforme depoimento dos seus
gestores, um plano de profissionalização da gestão, com a contratação de
executivos de mercado ou mesmo a adoção de um modelo de governança
corporativa, tendo como premissa futura abertura de capital para capitalizar o seu
crescimento.
Percebe-se uma informalidade na condução dos projetos a serem
implementados e nos processos gerenciais com vistas a atingir os objetivos.
Segundo o gerente de TI – Tecnologia da Informação, o principal método que a
empresa utiliza para acompanhar e medir seus objetivos e resultados é a matriz de
gerenciamento de receitas e despesas, implementada através da consultoria do
INDG, mas sem acompanhamento sistemático dos planos de ação.
Nas palavras do gerente de TI, as estratégias que a empresa utiliza para
medir os seus resultados são:
Matriz de gerenciamento de despesas e matriz gerenciamento de receitas. São as duas estratégias utilizadas. Ou seja, nós temos metas de receitas e temos metas de despesas. Nós fazemos isso através da consultoria do INDG, são utilizadas algumas metodologias e a principal é o PDCA, se atingiu a meta do mês e se não atingiu você tem que ir lá fazer uma espinha de peixe e explicar por que não atingiu, quais são as causas de você não ter atingido e qual o plano de ação proposto. Existe também uma deficiência aí. Se propõe o plano de ação, mas depois nas reuniões você nunca vê se o plano de ação funcionou ou não. Logicamente o resultado é a receita. Conseguiu aumentar sua receita? Sim, fiz isso e deu resultado. Mas as vezes fica no ar. Porque você só vê as pessoas que não atingiram metas com o plano de ação. Aí você não sabe se esse plano de ação foi executado, que resultado que deu.
90
Sendo assim, segundo os gestores, os indicadores econômico-financeiros,
que são os critérios utilizados para medir os resultados, são evidenciados através do
sistema de gerenciamento de receitas e despesas, que é o método que a empresa
utiliza para verificar se os seus objetivos estão sendo atingidos.
Vale ainda destacar a existência do Grande Prêmio Eduardo Araujo, que é um
programa desenvolvido para a equipe de vendas, onde se utiliza um quadro, com
uma pista de corrida, com o nome dos vendedores, que vão ganhando posições, na
medida que o seu desempenho vai evoluindo. Os resultados são comemorados pelo
grupo de vendas de maneira entusiástica, quando os objetivos são atingidos.
Quanto às estratégias emergenciais ou corretivas a serem adotadas, caso
objetivos não estejam sendo alcançados, os gestores, de maneira geral, fazem
pouca menção a situações de fracasso. Percebe-se que o grupo lida bem com as
situações adversas e adota a estratégia de analisar o que deu errado, reformular e
seguir em frente.
“Curtir o erro” é uma expressão recorrentemente utilizada pelo presidente,
demonstrando a predisposição da organização de aprender com os erros.
Nas palavras do diretor comercial:
O Modesto sempre fala: “erramos, mas o mais interessante do erro é aprender com ele.”. É uma coisa que a gente tem também na cultura nossa. O problema não é errar, o problema é persistir no erro e não aprender com ele. Então cada erro nosso, o Modesto fala que a gente tem que curtir muito, o que é curtir o erro? O que eu fiz errado que não deu certo. Onde foi, o que não deu certo? A gente faz isso muito junto. A gente fez, não deu certo a gente senta e curte o erro. A gente faz isso informalmente. Fazemos uma análise crítica do que aconteceu, então o erro na Araujo é muito curtido. A gente tem o direito de errar. A gente não é obrigado a acertar, mas, tem que aprender com o erro.
Referindo-se a situações de fracasso, o gerente de TI complementa:
Eu acho que aqui aconteceu pouquíssimas vezes. Nesses 102 anos nós abrimos várias lojas, mas e quantas nós fechamos? Acho que fechamos 2 lojas. É difícil fechar uma loja, as vezes a loja fica lá, não tem tanto retorno, uma hora vai, outra hora não vai. Foi difícil de lidar aqui, que é considerado um fracasso fechar uma loja. Uma loja foi fechada porque era uma loja extremamente antiga e ficava ali na Praça da Estação. E essa loja ficou num ponto muito ruim e sem mais movimento de pessoas. E a outra foi na Raja Gabáglia, fechou depois que mudamos pra nova que tem DriveThru. Fechamos mais duas, mas eram internas dentro da FIAT. As negociações foram um fracasso. Então são coisas que acontecem e são tratadas de uma
91
maneira vamos pra frente, as pessoas não ficam remoendo, não deu, não deu, vamos pra frente.
Alguns casos de insucesso mencionados pelo presidente referem-se à
fiscalização da vigilância sanitária, que impediu o funcionamento dos salões de
beleza nas lojas e a parceria rompida unilateralmente com a empresa de telefonia
Vivo, que assim que assumiu as operações da Telemig Celular, retirou os quiosques
de venda de linhas e aparelhos que funcionavam dentro das lojas da Drogaria
Araujo. Em ambos os casos, a empresa utilizou-se dos recursos administrativos e
jurídicos para reinvidicar os seus direitos, conforme o entendimento do presidente,
demonstrando que a empresa reage quando confrontada em situações de litígio.
Outro aspecto a ser analisado com relação à cultura da organização
pesquisada são as questões de integração interna. Referindo-se então a estas
questões, Schein (2004), conforme mencionado no capítulo do referencial teórico,
defende que estão relacionadas à linguagem comum, incluindo conceitos básicos de
tempo e espaço; os critérios para inclusão de novos membros no grupo; as
estratégias para alocação de status, poder e autoridade; as ações para promover
intimidade, amizade e relacionamentos no ambiente de trabalho; os critérios para
recompensa e punição e as estratégias utilizadas para gerenciar as diferenças no
âmbito ideológico e religioso, por exemplo.
Quanto às questões relacionadas à linguagem comum utilizada pelo grupo,
observa-se a recorrência do uso de expressões como “encantar o cliente”, repetida
por praticamente todos os gestores, demonstrando o sentido e razão de ser da
organização.
Outra expressão comum, cunhada pelo presidente, é “curtir o erro”, conforme
mencionado anteriormente, demonstrando que a organização está sujeita a falhas,
mas sobretudo aprende com os erros, pois entende que eles são oportunidades para
o seu crescimento.
“Atenção ao detalhe” faz parte também do cotidiano e linguajar das pessoas.
Demonstra, na visão dos gestores, uma ideia de perfeccionismo naquilo que é feito,
em que, na própria fala do presidente, há a preocupação com a minúcia para o
funcionamento de uma loja. Se algo está fora do lugar, precisa ser arrumado.
Costumeiramente, o presidente visita as lojas, sem aviso prévio, para verificar como
está o funcionamento e a organização do espaço.
92
Os gestores também utilizam de forma rotineira a expressão “tem que
resolver”, demonstrando o senso de imediatismo e pragmatismo da organização,
evidenciado pela agilidade que ela tem para a abertura de lojas.
O que fica claro é que o presidente, através do seu carisma pessoal, acaba
por influenciar o linguajar e expressões utilizadas pelo grupo e aquilo passa a fazer
parte do cotidiano da organização. Observa-se então que a organização é muito
voltada para as ações e posicionamento do presidente. De maneira geral, a
linguagem empregada pelas pessoas é simples, sem termos sofisticados ou
rebuscados, mas com repetições que indicam o comportamento esperado das
atitudes valorizadas.
Quanto ao processo de inclusão de novos membros no grupo, percebe-se
que a empresa funciona como uma grande família, ou uma extensão da própria
família do fundador, a começar pelo próprio nome da organização, Drogaria Araujo,
sobrenome do clã.
Critério como tempo de casa e lealdade e dedicação à família apresentam-se
como valores fundamentais e de destaque para os membros do grupo, que inclusive
são premiados com broche de brilhante, representando, cada diamante, dez anos de
serviços prestados à empresa. Ou seja, a cada dez anos de trabalho o broche ganha
um novo brilhante. Tal artefato é ostentado com orgulho pelos funcionários mais
antigos, entrevistados em conjunto, sendo todos com mais de 50 anos de tempo de
serviços na empresa.
Percebe-se, também, pelo discurso do presidente, uma preocupação com
determinados membros que ainda não introjetaram esses valores de forma mais
profunda. É o caso do gerente de Produtos e de Vendas, que não foram
entrevistados, pois, na visão do presidente, não estavam totalmente integrados e
familiarizados com a empresa e seus valores, podendo pouco contribuir sobre as
questões culturais do grupo.
Observa-se, na organização, a característica marcante de paternalismo,
conforme definição de Tanure (2007), e que será explorada com maiores detalhes
em item posterior, destacando-se o carisma e magnetismo exercido pelo presidente,
por meio de seu discurso e relacionamentos pessoais. Desta forma, percebe-se que
o líder é determinante no processo de inclusão e aceitação de novos membros ao
93
grupo e ele determina os critérios para este processo. Aos seus seguidores cabe
adotar a postura de espectador, tendendo a acomodação em alguns aspectos.
Quanto às questões relacionadas às estratégias para alocação de status,
poder e autoridade, percebe-se, na organização, a concentração e centralização do
poder no presidente, constatado pelo pesquisador desde o início, quando solicitou a
autorização para a realização da pesquisa de mestrado. Apesar do pesquisador ser
conhecido há muitos anos na instituição, somente após exaustivas tentativas de
contato com o presidente conseguiu obter a autorização para a realização dos
trabalhos.
Com isto, identifica-se na empresa que os gestores adotam, em muitas
situações, uma postura de espectador, aguardando as decisões ou orientações do
presidente, com flexibilidade restrita para assumir determinadas posições, sempre
com o intuito de atender àquilo que o presidente espera. Percebe-se também que o
senso de lealdade dos gestores à figura do presidente também é grande, havendo
respeito e admiração por sua pessoa e administração.
Desta forma, os relacionamentos acabam tornando-se pessoais,
identificando-se característica do personalismo nas relações (TANURE, 2007). Os
liderados têm uma tendência também a evitar o conflito com o presidente, que é uma
pessoa com grande poder de argumentação, convencimento e persuasão.
O presidente comporta-se em muitas situações como um grande pai para os
funcionários, prestando apoio no caso de dificuldades financeiras e enfermidades,
atitudes estas que vêm sendo transmitidas através das gerações que se sucederam
na gestão da organização, conforme relatado pelos entrevistados.
Observa-se, assim, como prática gerencial, o cuidar dos interesses da família
e atender também às necessidades dos empregados, procurando valorizar e
preservar essas relações no longo prazo, fato evidenciado pelo tempo de serviço
dos gestores e funcionários entrevistados.
Outro fato digno de menção é a posição dos diretores quando um cliente
necessitado procura a loja precisando adquirir um medicamento e sem condições
para tal. O comportamento rotineiro é, após analisar a solicitação da pessoa e
acreditar que ela está sendo honesta, o diretor disponível paga do próprio bolso o
medicamento para o cliente, dando o exemplo pessoal de ajuda humanitária e
caridade, mas sem penalizar a organização.
94
Na composição da Diretoria, não há a presença também de executivos
externos, todos são membros da família. A empresa é uma sociedade anônima, mas
de capital fechado, controlada hoje quase na sua totalidade pelo presidente, que
inclusive fez o movimento recente de adquirir a participação de outros membros da
família com a intenção deliberada de poder exercer maior controle e determinar, a
seu critério, o processo sucessório, dentro da organização. A única influência
externa admitida é da consultoria do INDG, que possui forte aceitação pelos
gestores, mas restrita ao controle do desempenho econômico-financeiro da
organização, através da metodologia implantada de gestão matricial de receitas e
despesas.
De maneira geral, o presidente exerce a autoridade, mas, ao que parece, sem
ter um comportamento autoritário, sendo tolerante com os erros e aberto ao
aprendizado. Tende a ser centralizador e confere a autonomia que julga necessária
para os gestores. Considera que a sua atuação é que é fundamental para o
desenvolvimento, crescimento e processos de inovação da empresa, o que de fato
vem ocorrendo, considerando os resultados alcançados pela organização.
Quanto às ações relacionadas para promover a intimidade, amizade e
relacionamentos no local de trabalho, observa-se que a organização, conforme
relato dos entrevistados, não impõe impedimentos para a contratação de casais,
mas a evita.
Não há ações para promover intimidade, amizade e relacionamentos no
ambiente de trabalho; os grupos se reúnem de forma informal. A empresa promove
somente o encontro anual, onde realiza sorteio de brindes para os funcionários,
inclusive carros.
Por outro lado, a empresa não admite pessoas que tenham relacionamentos
de casamento ou intimidade com outras que trabalhem em empresas concorrentes,
conforme o exemplo citado pelo presidente de um gerente de vendas que foi
trabalhar numa empresa concorrente e que era casado com a gerente de laboratório.
Em função disto, foi convidada a se desligar da empresa.
Segundo o presidente, a empresa prefere contratar, para determinadas
funções, como operadora de caixa, mulheres com filhos, acreditando haver maior
comprometimento deste grupo, em função da responsabilidade com um filho, do que
pessoas sem filhos e com faixa etária menor.
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Atualmente, a organização tem contratado, para o seu centro de distribuição,
pessoas portadoras de necessidades especiais, como, por exemplo, pessoas com
deficiência auditiva. Pretende iniciar um projeto para contratação de pessoas com
Síndrome de Down.
A empresa mostra-se tolerante aos erros dos empregados, e tem um
baixíssimo índice de turnover, segundo os entrevistados, procurando sempre
oportunidades para que o empregado possa se desenvolver. No entanto, não admite
desonestidade, punindo severamente com advertências e demissão.
Existem premiações para o desempenho de vendas. A empresa possui
também um programa de participação em lucros e resultados, que normalmente
remunera os empregados anualmente através de um 14o. salário. Através do
programa de melhorias, os empregados também têm a oportunidade de divulgar as
suas ideias e sugestões para a organização e com isto receberem algum tipo de
premiação, como, por exemplo, um certificado de honra ao mérito, conforme relatado
pelo gerente do Drogatel. Aparentemente, o programa encontra-se pouco
disseminado, ou ainda em fase embrionária, com opiniões controversas dentro do
grupo. O pesquisador não encontrou evidências de outros programas de premiação
para os gestores, como opções de ações, bonificações e distribuição de dividendos.
Não há discriminação de crença religiosa e nem preferência por contratação
de pessoas de determinada religião, mas não há evidência de estímulos ou
incentivos a práticas religiosas. Há presença de elemento do cristianismo,
predominante da igreja católica, como o crucifixo presente nas lojas.
Dentro do objetivo de caracterizar como a empresa lida e lidou no passado
com as questões de adaptação ao ambiente externo e quais ações emprega para
promover a integração interna, o pesquisador concluiu que, no que diz respeito às
práticas para promover a adaptação externa, aquelas encontradas na empresa
pesquisada são as especificadas no Quadro 6 a seguir.
Adaptação externa Encontrados na Empresa
A missão, funções e tarefas primordiais da organização perante o seu ambiente.
A missão formalizada da empresa exprime o seu foco de atuação, mas, é divulgada somente na parede da sala da Diretoria e no treinamento introdutório. Era divulgada no portal da empresa na versão de 2008.
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Os objetivos específicos a serem atingidos pela organização.
Há um alinhamento entre os gestores quanto aos objetivos da empresa com relação à satisfação da necessidade dos cliente e na busca dos resultados econômicos. A organização é voltada também para atender os interesses da família e promover oportunidades de negócios para os seus membros. O pesquisador não encontrou evidências de existência de um plano formal de sucessão para a 4
a. Geração. A empresa
promove ações de cunho social buscando atender às comunidades.
Os métodos a serem utilizados para acompanhar a consecução dos objetivos.
O planejamento estratégico privilegia ações de crescimento da rede e abertura de lojas e o método para a acompanhamento de resultados é a matriz de gerenciamento de receitas e despesas implantado pelo INDG. Há uma certa informalidade na condução dos projetos.
Os critérios utilizados para medir resultados. Os critérios são baseados em indicadores econômico financeiros.
As estratégias emergenciais ou corretivas a serem adotadas caso os objetivos não estejam sendo alcançados.
A empresa promove o aprendizado com os erros, corrige e dá continuidade aos projetos.
QUADRO 6 - Atividades de adaptação externa Fonte. Elaborado pelo autor com base em Schein (1985).
Já em relação às atividades e práticas gerenciais para promover a integração
interna, foram identificadas aquelas especificadas no Quadro 7 a seguir:
Integração interna Encontradas na empresa
A linguagem comum, incluindo conceitos básicos de tempo e espaço.
“Encantar o cliente”, “curtir o erro”, “atenção ao detalhe”, “tem que resolver” são expressões comuns utilizadas na empresa.
As fronteiras do grupo e critérios para inclusão de novos membros.
O grupo comporta-se como um grande família, valorizando os membros mais antigos. Dá-se preferência para a contratação de mulheres casadas com filhos para funções, como caixa.
As estratégias para alocação de status, poder e autoridade.
Percebe-se paternalismo e personalismo nas relações, com a centralização do poder no Presidente. Os gestores adotam uma postura de espectador. Não há a presença de executivos externos na Direção da empresa, somente familiares.
As ações para promover a intimidade, amizade e relacionamentos no trabalho.
A empresa convive com a presença de casais, mas se evita a contratação. Não se admite que o cônjuge trabalhe em empresa concorrente. Não há ações promovidas pela Direção para promover intimidade, amizade e relacionamentos no ambiente de trabalho, os contatos se dão de maneira informal. Há somente um encontro anual de confraternização promovido pela organização. Ela promove ações sociais envolvendo os empregados.
Os critérios para recompensa e punição. A organização promove premiações para as áreas de vendas. Possui um plano de participação em lucros anual para todos os
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empregados e um programa de melhorias, que busca premiar ideias e projetos dos funcionários. Há a premiação por tempo de casa. Não se admite desonestidade.
As estratégias para gerenciar as diferenças interpessoais no âmbito ideológico e religioso, por exemplo.
Admitem-se vários credos e religiões, mas, existe símbolo cristão nas lojas – o crucifixo.
QUADRO 7 - Atividades de adaptação externa e integração interna Fonte: Elaborado pelo autor com base em Schein (1985).
A FIG. 13, a seguir, resume como a empresa lida com as questões de
adaptação externa e integração interna, conforme apresentado neste item de análise
de cultura organizacional, demonstrando que o presidente centraliza o poder,
prevalece um modelo de gestão baseado no paternalismo e de personalismo nas
relações, busca melhores resultados e o crescimento da empresa, procura encantar
os clientes e atender aos interesses da família. Os gestores, por sua vez, ficam
passivos frente às decisões do presidente e buscam resolver logo as questões e
aprender com os erros. Assumem o objetivo do presidente – comportamento que
remete ao fundador - de buscar encantar os clientes e atender aos interesses da
família. Com isto, percebe-se a tendência da empresa, com relação às questões de
integração interna, de evitar o conflito nas suas relações, e com relação à adaptação
externa, de buscar o aprendizado e aprender com os erros.
FIGURA 13: Questões de adaptação externa e integração interna da organização pesquisada Fonte: Elaborado pelo autor a partir das definições de Schein (2004).
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4.2.2 Cultura organizacional: análise dos artefatos ou símbolos, valores,
pressupostos básicos, heróis e rituais da Drogaria Araujo
Este item de análise tem por objetivo identificar os artefatos visíveis ou
símbolos, mas de difícil interpretação. Têm-se como exemplos a tecnologia
empregada, os padrões de apresentação visual e de comportamento, como também
os valores compartilhados. Da mesma maneira, os pressupostos básicos, que são
tidos como verdadeiros, mas contidos nas entrelinhas, invisíveis e inconscientes,
frutos da relação com o ambiente, a realidade, natureza, atividade e relações
humanas, e por último, os heróis e rituais da Drogaria Araujo (DEAL; KENNEDY,
1982; FREITAS, 1991; HOFSTEDE et al, 1990; SCHEIN, 1985, 2004).
De acordo com Hofstede et al (1990) e apresentado no capítulo do referencial
teórico, os símbolos são palavras, gestos, figuras ou objetos que trazem um
significado específico sobre a cultura. Os heróis são pessoas, vivas ou mortas, reais
ou imaginárias, que possuem características admiradas pelo grupo e servem como
modelos de comportamento. Os rituais são atividades coletivas socialmente
desenvolvidas dentro da cultura. Ritos, rituais e cerimônias são exemplos de
atividades planejadas que reforçam a cultura.
Os símbolos, heróis e rituais podem ser resumidos, para o autor, pelo termo
práticas, porque eles são visíveis para um observador, ao passo que o significado da
cultura reside na forma que ela é percebida pelos seus membros. O núcleo da
cultura, de acordo com a FIG. 4, é formado pelos valores, que são normalmente
inconscientes e raramente discutidos, não podem ser observados, mas, sim,
interpretados a partir dos comportamentos.
O primeiro nível, o dos artefatos visíveis ou símbolos para Freitas (1991) e
Hofstede (1990), conforme mencionado anteriormente no referencial teórico,
representa o layout da organização, o comportamento e vestuário das pessoas, os
rituais, os mitos organizacionais, assim como as crenças expressas em documentos
– fáceis de serem percebidos, mas nem sempre fáceis de serem interpretados
(SCHEIN, 2004, grifo nosso). Neste sentido, o processo de funcionamento das lojas
será descrito de forma a permitir identificar melhor os elementos que têm significado
simbólico.
99
Com relação, então, aos artefatos visíveis, a primeira impressão que fica
evidenciada ao se visitarem as lojas é a padronização do seu layout, todas com uma
identidade bem próxima, com exceção de algumas lojas temáticas, como a
Centenário, que foi especialmente construída por ocasião dos 100 anos da
organização. Essa loja, em específico, apresenta um visual mais limpo e conta com
a presença da “vaquinha gripada”, escultura arrematada pelo Presidente em um
leilão beneficente.
As lojas, de maneira geral, possuem um estacionamento para veículos na sua
frente, estão localizadas nas vias à direita, que fazem o fluxo de retorno do local de
trabalho para as residências nos bairros, permitindo, desta forma, uma fácil parada e
estacionamento para o consumidor. Segundo as pesquisas realizadas pela
organização, o momento de maior concentração de compras é quando as pessoas
estão voltando para a casa, após o expediente de trabalho.
Desta forma, a localização das lojas é sempre um fator considerado
estratégico para a organização e existe um trabalho intensivo de ocupação das
principais vias de acesso de Belo Horizonte, através de estudos de
geoprocessamento e também de busca intensiva da própria Diretoria. Com esta
atuação, a empresa busca inibir a atuação da concorrência no setor.
Normalmente, os imóveis são próprios, não são alugados, salvo algumas
exceções. A empresa preferencialmente instala-se fora de grandes shopping
centers, a não ser quando esta presença faz-se necessária.
As lojas possuem, na entrada, um sistema para detecção de furtos, piso claro,
gôndolas com predominância na cor azul, o balcão para atendimento localizado nos
fundos da loja e os caixas logo à frente ou na lateral, próximo à saída.
Geralmente, ao se adentrar na loja, um atendente dirige-se ao cliente e
oferece ajuda para localizar os produtos necessários. Se é algum medicamento
contido em algum receituário, o cliente é conduzido até os fundos da loja e atendido
no balcão. Os medicamentos ficam armazenados em gavetas fechadas, com um
sistema de identificação para facilitar a localização. Os medicamentos de uso
controlado estão em ambiente protegido e trancado e, quando necessário, sob
refrigeração ou condições específicas de armazenamento. Os atendentes não
vendem, em hipótese alguma, medicamentos de uso controlado sem o respectivo
receituário e evitam fazer qualquer prescrição para os clientes, sempre sugerindo
100
consultar um médico. Normalmente um farmacêutico de plantão fica presente nas
maiores lojas e atendendo por telefone as lojas menores, para tirar dúvidas ou
prestar esclarecimentos. Alguns atendentes são treinados para aplicar injeções e as
lojas possuem local reservado para que o cliente possa receber este tipo de
atendimento.
As gôndolas possuem um sistema de classificação e organização dos
produtos, tanto os medicamentos, quanto os artigos de conveniência, cosméticos e
produtos agroveterinários. A empresa possui um sistema que permite organizar os
produtos nas gôndolas, garantindo maior visibilidade para aqueles produtos que
trazem maior rentabilidade para a organização. Com base nestas definições, os
produtos são dispostos nas gôndolas. Com isto, produtos com menor rentabilidade
ficam menos visíveis para os consumidores. Isto acaba causando, entre os
fornecedores, uma disputa pelo locais mais visíveis de forma obterem maior giro dos
seus produtos.
As lojas, de maneira geral, não possuem um sistema de climatização, mas
são construídas de forma a garantir uma boa ventilação, normalmente com pé direito
mais alto e uma ampla fachada. A empresa não instala teto de gesso para esconder
a tubulação utilizada para cabos, sistemas de iluminação e hidráulico, pintando todo
o teto e respectiva tubulação na cor preta. Segundo os entrevistados, pintando
nessa cor, o cliente não percebe o fato de que o teto está descoberto.
Todos os caixas são automatizados, permitindo o pagamento através de
diferentes tipos de cartões de débito e crédito, consultas ao SPC – serviços de
proteção ao crédito -, emissão de cupom fiscal e leitura do código de barras da
etiquetas dos produtos, possuindo todos os dispositivos eletrônicos para garantir o
seu funcionamento. As lojas possuem uma área pequena para a embalagem dos
produtos, e na frente e atrás dos caixas são oferecidos produtos adicionais, como
pilhas, lanternas, pen drives e CDs. Em frente ao caixa, na maior parte das lojas,
existe uma área demarcada para se formar uma fila de atendimento e onde o cliente
tem também acesso a revistas e periódicos. O pagamento é normalmente rápido e
não há longas filas. O cliente pode optar, ao pagar, em doar o troco para o Hospital
da Baleia.
Algumas lojas possuem serviços adicionais, como cópias, ampliação de fotos,
salão de beleza, e também produtos específicos para pessoas com restrições
101
alimentares, como diabetes, e um espaço destinado a produtos cosméticos
importados.
A retaguarda da loja, que funciona nos fundos, abriga os computadores,
servidores e equipamentos de comunicação de dados que centralizam o controle e
interligação com a matriz. Todas as lojas possuem enlaces de comunicação de
dados com a matriz e a maioria delas, um enlace redundante. A empresa possui um
sistema DDR – discagem direta a ramal -, integrando todas as lojas, para facilitar a
comunicação por voz. O correio eletrônico é utilizado somente no computador que
funciona na retaguarda e tem seu acesso restrito ao gerente da loja, que encarrega-
se de divulgar as informações da matriz para os empregados.
Conforme mencionado, há uma predominância de mulheres na função de
caixa, com idade acima de 25 anos e com filhos. Os funcionários normalmente têm o
ensino médio completo.
Toda loja possui um gerente responsável pelo acompanhamento de todos os
processos administrativos e de vendas do estabelecimento. Ele é o ponto de
comunicação com a matriz e está subordinado ao gerente de Vendas e à Diretoria
Comercial.
As lojas possuem banheiros reservados para os empregados, separando o
feminino do masculino, segundo o Presidente, sempre com itens de conforto de
forma a garantir o bem-estar dos empregados. Nas lojas 24 horas, é adotado o
sistema de turno para garantir o seu pleno funcionamento.
As lojas exibem também o retrato dos fundadores – Modesto Carvalho Araujo
e Antônio Araujo – e do último presidente, antecessor ao Modesto Neto, Eduardo
Araujo, que faleceu em 2004. Ostentam também um crucifixo na parede e há a
predominância, nas paredes e mobiliários, das cores azul e vermelha, que compõem
o logotipo da organização.
Os funcionários das lojas usam uniforme de cor clara, com as cores azul e
vermelho em destaque. A funcionária que faz o atendimento dos dermo-cosméticos
possui uniforme diferenciado.
A sede está localizada na área central de Belo Horizonte, na Rua Curitiba,
próximo à rodoviária. Situa-se em prédio antigo, que passou por uma modernização
e reforma recentes. Prédios vizinhos também foram adquiridos, de forma a garantir
um espaço maior para a empresa. Avistando-se do lado de fora, não se tem uma
102
ideia precisa do tamanho da organização, mas, no seu interior, percebe-se que ela
ocupa praticamente um quarteirão.
De maneira geral, as instalações são confortáveis, bem organizadas e
ergonomicamente distribuídas, mas sem nenhuma sofisticação ou ostentação. Não
utilizam ar condicionado e, sim, climatizador de ar, de forma a garantir uma
temperatura adequada para o ambiente de trabalho.
O retrato dos fundadores e do último presidente, como também o crucifixo,
podem ser vistos em alguns ambientes da matriz. O prédio não possui muitas salas
de reunião, e os gerentes não possuem salas reservadas e compartilham a mesma
área do seu grupo de trabalho. Somente os diretores possuem salas reservadas,
mas também com mobiliário simples e o acesso a eles é controlado por um grupo de
secretárias. Mas são, aparentemente, receptivos aos gestores e colaboradores.
Percebem-se algumas dificuldades de integração e comunicação de todo o
grupo, pelo fato da empresa não possuir muitas salas de reunião e nenhum auditório
no prédio. Não se visualizaram elementos de divulgação de desempenho à vista, e
os quadros de aviso apresentam basicamente algumas informações de cunho
administrativo, tal como agenda de férias, data de distribuição de benefícios, entre
outros.
Apesar da ênfase dos gestores no sistema de gerenciamento matricial de
receitas e despesas, não se percebeu a evidência de que estes resultados sejam
compartilhados com todo o grupo de colaboradores. Aparentemente também as
reuniões gerenciais têm um caráter mais informal ou são agendadas de acordo com
a demanda, não possuindo, desta maneira, um calendário específico e um sistema
mais robusto de acompanhamento. A Diretoria está em contato permanente, até pelo
fato de serem todos da mesma família.
De maneira geral, os funcionários possuem computadores interligados em
rede para realizar os trabalhos, mas possuem o acesso à Internet e correio
eletrônico restrito somente aos níveis gerenciais, compras ou de algum setor que
possua a necessidade justificada de contato com clientes, parceiros ou fornecedores
externos.
Os funcionários da sede não utilizam uniformes como vestuário, com exceção
daqueles que trabalham na loja e nos laboratórios de manipulação. Adotam um estilo
mais informal de vestir, mas com tons mais sóbrios, sem ostentação. Os diretores
103
também não adotam o terno como vestimenta. Não se observam pessoas utilizando
roupas mais extravagantes ou curtas, e os homens utilizam cabelo curto e as
mulheres, o cabelo preso. Não se identificou nenhuma recomendação específica de
como as pessoas deveriam se vestir, mas o estilo de todos é bem parecido, ou seja,
um estilo simples, o que poderia ser classificado de profissional, em harmonia com o
ambiente de trabalho e as instalações.
A organização não utiliza meios mais sofisticados para disseminar
informações, diretrizes e valores, como TV Corporativa, sistemas de telefonia e voz
integrados com a rede de dados e sistemas de áudio e vídeo conferência.
A rede de dados e telefonia percorre toda a extensão do prédio central e a
empresa possui também um sistema de rede wireless, permitindo o acesso de
dispositivos móveis aos gestores e empregados, como notebooks e palmtops.
Utiliza-se um sistema de gestão empresarial desenvolvido internamente,
porém ainda se convive com algumas funções de um sistema antigo. O sistema de
vendas, através do Drogatel, permite a venda de forma ágil pelo telefone e a
identificação do cliente, através da digitação do seu telefone, que aparece no
sistema de identificação de chamadas. Entretanto, ainda não tem algumas funções
mais avançadas de grandes call centers, como um controle ativo de filas e a
integração automática do sistema de vendas com a telefonia que permite o
reconhecimento instantâneo do cliente pelo atendente. O sistema atual permite
consultar o estoque de qualquer loja em tempo real e com isto realizar uma
programação adequada de entrega. Observa-se, contudo, que o processo de
entrega tem levado mais tempo do que ocorria anteriormente, provavelmente pelo
aumento do número de pedidos por telefone, sem a ampliação da rede de
motoqueiros que fazem a entrega.
O sistema de estoques mostra-se eficiente, conseguindo suprir a lojas de
todos os produtos, permitindo que o cliente encontre aquilo que precisa, com um giro
adequado dos estoques. Ainda não se utiliza um sistema de identificação digital,
baseado na tecnologia de leitura através de radiofrequência (RFID), devido ao alto
custo das etiquetas que permite o uso de tal tecnologia.
No entanto, observa-se que algumas lojas, talvez pela gestão local e por falta
de fiscalização da matriz mais intensiva, apresentam uma atuação mais precária em
termos de atendimento ao cliente e disponibilidade de produtos em estoque. Apesar
104
de existirem mecanismos para reportar à matriz o fato de um cliente ir até a loja e
não encontrar o produto que precisa, como também de procurar identificar em outra
loja o produto, algumas lojas não adotam este tipo de procedimento, prejudicando a
qualidade de atendimento esperada, e desta forma comprometendo a missão da
empresa e as atividades para permitir a adaptação externa (SCHEIN, 2004).
O site de comércio eletrônico entrou em funcionamento recentemente e
pretende expandir as vendas para locais que antes não eram atendidos. Em função
do estágio inicial da nova modalidade de vendas, o pesquisador não tem
informações sobre o sucesso ou não deste empreendimento.
A empresa possui um centro de dados, que abriga todos servidores,
dispositivos de armazenamento e back-up de dados e equipamentos de
comunicação, organizado e protegido, com sistemas de controle de acesso,
climatização, proteção contra incêndio e disponibilidade de energia de forma
ininterrupta através de sistemas de no-breaks. O cabeamento de dados e voz é
organizado e concentrado nesse centro de dados, através de armários
especialmente projetados para essa acomodação.
Ainda assim, a proteção aos dados e os sistemas de redundância podem ser
melhorados, pois não se encontraram evidências de um plano de contingenciamento
e recuperação de falhas, como também a empresa não possui um back-up externo
dos seus dados para permitir o seu funcionamento caso ocorra uma falha ou dano
nas suas instalações.
Percebe-se então, com relação aos artefatos visíveis, que a empresa procura
atender a um padrão estético, demonstrando organização e funcionalidade, mas
sem sofisticação, transmitindo valores de frugalidade e humildade, empregando a
tecnologia, mas não de maneira intensiva, com padrões de comportamento
orientados para uma rotina, sem um controle mais rigoroso e planejado, o que tem,
aparentemente, funcionado para a manutenção dos negócios da organização.
Já o segundo nível - valores compartilhados –, conforme mencionado no
referencial teórico, aponta o problema da diferença existente entre os valores
aparentes e os valores em uso. Para identificar esses valores, é difícil fazê-lo apenas
utilizando-se de uma observação direta, é preciso entrevistar os membros-chave da
organização, ou realizar a análise de conteúdo de seus documentos formais.
Entretanto, ao identificar esses valores, eles expressam o que as pessoas reportam
105
ser a razão do seu comportamento, o que na maioria das vezes são idealizações ou
racionalizações. As razões subjacentes ao seu comportamento permanecem,
entretanto, escondidas ou inconscientes (SCHEIN, 2004, grifo nosso).
Quanto aos valores compartilhados, vale destacar a fala do presidente:
Fazer bem feito, colocar o cliente em primeiro lugar, ética, responsabilidade, seriedade, honestidade, pioneirismo, inovação, qualidade e detalhe em tudo o que faz, transparência e comprometimento em suas relações. Compromisso social, lucro e crescimento como medida de desempenho.
Realmente, os gestores evocam continuamente estes valores e parecem
orientados a agir tomando-os como referência. Constata-se um grande alinhamento
neste sentido entre os gestores.
Observa-se que “fazer bem feito” e “qualidade e detalhe em tudo o que faz”
são valores similares. Há realmente uma preocupação com a ordem e organização
dos ambientes de trabalho, incluindo as lojas, que estão sempre com os produtos
dispostos de forma adequada, conforme mencionado na análise dos artefatos
visíveis, atendendo a um padrão estético e demonstrando funcionalidade. Contudo,
a empresa não adota sistemas de gestão da qualidade e, consequentemente, não
possui um processo sistematizado de implementação de melhorias contínuas e nem
mesmo se submete a auditorias externas para validar se o seu modelo de qualidade
está adequado ou se precisa ser aperfeiçoado.
Inovação e pioneirismo parecem também conceitos similares. Na história da
empresa, percebem-se movimentos da organização no sentido de introduzir
inovações no seu modelo de negócios e prestação de serviços, como, por exemplo,
a adoção do plantão 24 horas, farmácias com médico ou farmacêutico responsável,
loja de conveniências e o atendimento pelo sistema de drive-thru, que serão
analisados no item posterior. Entretanto, a empresa não possui atualmente um
departamento ou área voltada para o desenvolvimento de novos negócios, produtos
e serviços, e muito menos processos sistematizados para garantir o
desenvolvimento ou aperfeiçoamento das inovações. As inovações nasceram a
partir da iniciativa dos presidentes, de suas ideias e decisões. Apesar de existir um
programa de melhorias para incentivar a participação dos funcionários, a
participação e resultados são pequenos.
106
Já ética, honestidade, responsabilidade, comprometimento, seriedade e
transparência são valores complementares. Quanto às questões éticas, percebe-se
que este valor é mencionado principalmente ao se referir à preocupação da empresa
com a garantia de procedência dos medicamentos e também por não se adotar a
postura, comum em muitas farmácias, de fazer prescrições de medicamentos e
vender sem receituário médico. Observa-se, no entanto, que a empresa, apesar de
não ter um código de ética formal, é transparente nas suas relações, com
funcionários, clientes, fornecedores, comunidade e governo. Não há evidências de
envolvimento ou participação da empresa e de seus gestores em atos ilícitos, o que
indica seriedade, comprometimento, honestidade e responsabilidade nas suas
relações, conforme verbalizado pelos gestores. Foi citado, inclusive, pela grande
maioria, que o que não é admitido na organização é a desonestidade.
Há realmente uma visão disseminada entre os gestores de “colocar o cliente
em primeiro lugar”, inclusive destaca-se a atuação da assessoria da Presidência,
conforme mencionado anteriormente, que realiza um papel de ouvidoria da
organização. No entanto, não se perceberam evidências de que há treinamentos
frequentes para os colaboradores, no sentido de aprimoramento do atendimento aos
clientes. Foi mencionada, pelos entrevistados, a existência somente do treinamento
introdutório. Neste sentido, tal valor parece ser reforçado na prática e no cotidiano da
organização, mas sem uma sistematização, o que acaba gerando distorções, como
as evidenciadas pelas lojas, como mencionado anteriormente, que não procuram
identificar em outras locais o produto que o cliente necessita, deixando o cliente sem
o atendimento. Isto não condiz com a missão da empresa de sempre “encantar o
cliente”.
Quanto ao compromisso social, percebem-se algumas ações de cidadania
empresarial realizadas pela empresa, com maior destaque para a campanha de
doação do troco para o Hospital da Baleia. Palestras e cursos são também
oferecidos para a comunidade e a empresa atua ainda na recuperação de praças e
do patrimônio histórico. Este valor é identificado também como um objetivo
específico da organização no que diz respeito à adaptação externa.
No entanto, percebe-se que a disseminação dos valores encontra limitação
através dos processos de comunicação interna existentes atualmente na
organização, pois não há uma sistematização para divulgação e reforço dos mesmos
107
com palestras, treinamentos, reuniões, e não se encontraram evidências da
existência de materiais de apoio a divulgação, como um código formal de ética e
conduta ou o manual do colaborador. A Intranet existe, mas tem seu conteúdo e
acesso restritos. Na visão dos gestores, a área de recursos humanos é quem
deveria tomar a frente dessas ações e não tem uma atuação eficiente. Por ocasião
das entrevistas, a empresa estava buscando a contratação de um novo gestor para
a área.
E, finalizando a discussão sobre os valores compartilhados, existe, na prática
e cotidiano dos gestores, a busca da qualidade nas suas ações, a inovação partindo
principalmente da visão da Presidência, a ética, honestidade, comprometimento,
seriedade e transparência, o compromisso social e, por último, a visão compartilhada
de se ter o lucro e o crescimento como medidas de desempenho. O sistema de
gerenciamento matricial de receitas e despesas é a ferramenta utilizada para o
monitoramento desses resultados, e percebe-se de fato a sua utilização como
instrumento de medida. Há um certo informalismo para tratar dos objetivos, quando
estes não estão sendo alcançados, conforme mencionado pelo gerente de TI, pois
os planos de ação são elaborados, mas não são adequadamente acompanhados e
monitorados.
Por fim, o terceiro nível, o dos pressupostos básicos, são normalmente
inconscientes, mas, na realidade, determinam como os membros do grupo
percebem, pensam e sentem. À medida que certos valores compartilhados pelo
grupo conduzem a determinados comportamentos, e esses comportamentos se
mostram adequados para solucionar problemas, o valor é gradualmente
transformado em um pressuposto inconsciente de como as coisas realmente devem
ser (SCHEIN, 2004, grifo nosso).
Quanto aos pressupostos básicos, percebem-se algumas características, que
não são explicitadas, mas as pessoas tender a agir desta forma dentro da
organização. A primeira delas é a humildade. As pessoas realmente não procuram
ostentar e apresentar uma imagem superior, característica que vem sendo
transmitida através das gerações, o que ficou evidenciado no discurso dos
funcionários mais antigos. Esta característica fica também evidente na apresentação
das instalações, na linguagem e no jeito de falar dos entrevistados, como também na
forma de se vestir e de se comportar.
108
Por outro lado, tem-se a impressão que a empresa, por sua característica
mais fechada e pouco aberta às opiniões externas, pode cair na armadilha do
sucesso, perdendo oportunidades de desenvolver novos produtos ou serviços e
inovar de forma radical, pelo fato de, nos dias atuais, priorizar a exploração intensa
dos produtos e serviços desenvolvidos no passado e que, até então, têm um
histórico de sucesso (CHRISTENSEN, 2003).
Desta forma, a empresa fica presa às ideias concebidas no passado e
percebe-se que a inovação fica centralizada na pessoa do presidente. Com isto, há
pouco estimulo à criatividade, o que pode limitar em algum momento o seu
crescimento.
A busca por encantar o cliente realmente parece um valor bastante introjetado
na cultura da organização e se percebe tanto os gestores, quanto os colaboradores,
de maneira geral, compromissados, a ponto de que se pode considerar que tal valor
seja um pressuposto básico da organização. Há de se ressaltar, no entanto, a
existência de lojas que não se preocupam em atender aos clientes da melhor forma,
conforme já mencionado, não buscando identificar os produtos em outros locais,
quando não encontrado no estoque próprio.
Contudo, de forma subjacente, percebe-se o pressuposto básico da
organização de atender às necessidades e expectativas da família e mais, de criar e
manter uma grande família, juntos aos seus gestores e colaboradores mais
próximos, como se fossem um grande clã, protegidos por uma sociedade patriarcal.
É uma organização com características familiares bem presentes e que não cogita
possibilidades de crescimento através da profissionalização de sua gestão ou
abertura do seu capital. Tem-se a impressão, pela fala do presidente, que ações
como estas representam uma ameaça a esse núcleo familiar constituído e coeso.
Agindo como uma grande família, a organização procura suprir também
necessidades dos seus colaboradores, provendo apoio no caso de enfermidades ou
dificuldades financeiras, como também oferecendo oportunidades de emprego para
as pessoas próximas, como parentes e filhos.
Com o objetivo de se identificar quais são os artefatos visíveis, valores
compartilhados e pressupostos básicos presentes na organização, constituiu-se,
então, neste item, a explanação de elementos que permitem caracterizar melhor os
aspectos culturais da organização pesquisada, conforme resumido na FIG. 14 a
109
seguir, e desta forma permitir o avanço na análise para o entendimento do
relacionamento desses aspectos culturais com os tipos de inovações encontradas na
empresa.
FIGURA 14: Artefatos visíveis, valores compartilhados e pressupostos básicos da organização pesquisada Fonte: Elaborado pelo autor a partir das definições de Schein (2004).
Hofstede et al (1990) não fazem a distinção entre o conceito valores e
pressupostos básicos, conforme a definição de Schein (2004). O conceito de valores
dos autores aproxima-se mais do conceito de pressupostos básicos de Schein
(2004). Neste sentido, destacam-se então os aspectos subjacentes apontados no
item anterior, que se pode observar com relação à humildade das pessoas,
denotada através do linguagem, vestuário e comportamentos, a orientação da
organização e de seus colaboradores, no sentido de atender ao cliente, encantando
e satisfazendo as suas necessidades. O direcionamento em atender às expectativas
da família é outro pressuposto básico da organização, tanto do ponto de vista do
crescimento do negócio, como da possibilidade de desenvolvimento de uma carreira
110
profissional, tanto diretamente na empresa ou por meio de negócios em torno do
negócio principal.
Os símbolos, palavras, gestos, figuras ou objetos que trazem alguma
representação sobre a cultura são também os que foram explorados nos itens
anteriores. As expressões comumente utilizadas, como “encantar o cliente”, “curtir o
erro” e “atenção ao detalhe”, a foto dos fundadores presente nas instalações, o
crucifixo, que é colocado em lugar de destaque, são exemplos destes símbolos da
cultura da organização.
Os heróis, pessoas vivas ou falecidas, admiradas pelo grupo e que servem
como modelo de comportamento, que foram evidenciados pelos entrevistados, são o
Modesto Carvalho Araujo, conhecido como Modesto Fundador, já falecido, avó do
Modesto Carvalho Araujo Neto, atual presidente, e que é sempre lembrado pelos
mais antigos. As histórias a seu respeito giram em torno principalmente da
disponibilidade para o atendimento dos “fregueses”, quando ele instalou uma
campainha do lado da cama do seu quarto, que ficava nos fundos da loja, assim
qualquer cliente poderia tocar a campainha, mesmo com a loja fechada e durante à
noite teria atendimento. Foi um dos pioneiros também na implantação dos serviços
de conveniência, trazendo artigos, como coalho e soda cáustica, para o mix de
produtos da farmácia (BRASIL, ARRUDA, 2006). Foi visionário ao adquirir e assumir
as operações da antiga Pharmácia Mineira e então transformá-la em Drogaria
Araujo, nos idos tempos de início de Belo Horizonte. Soube realizar a sua sucessão
com relativa tranquilidade, atuando em parceria com as gerações subsequentes e
desta forma assegurar a continuidade dos negócios da empresa.
Antonio Araujo, pai de Modesto Neto, foi atuante dentro e fora da
organização. Foi diretor da Federação do Comércio, e é considerado pelos
entrevistados uma pessoa com visão de futuro. Ele buscou treinamentos e
capacitação externa para os empregados, inclusive no exterior, para melhoria e
aprimoramento dos serviços. Isto, há 30 anos atrás. Nas palavras da entrevistada D.
Maria Felix, “o senhor Antonio tinha uma coisa muito bonita. Ele chamava a atenção
das pessoas conversando. E não alterava a voz, não maltratava. A pessoa que ele
estava chamando a atenção é que ficava com vergonha pelo forma que ele lidava
com as pessoas‟‟.
111
Outra pessoa também já falecida e que é recorrentemente lembrada é o
presidente anterior e irmão de Modesto Neto, Eduardo Araujo. A criação, ampliação,
modernização e aprimoramento dos serviços de entrega Drogatel têm o mérito
creditado a ele. Era uma pessoa que se destacava pelo seu carisma, como também
pelo bom humor; boa parte dos entrevistados têm recordações afetivas do convívio
com ele. Era uma pessoa, segundo relato dos entrevistados, contagiante e que tinha
aptidão para motivar e ajudar seus colaboradores. Sua perda, de forma inesperada,
vítima de uma doença grave, causou abalo na organização, mas não chegou a
causar uma crise de sucessão, pois Modesto Neto soube administrar e conduzir o
processo sucessório, principalmente por ter trabalhado por anos junto com o irmão.
Modesto Neto é o grande herói dos tempos atuais e a referência dentro da
instituição, influenciando o linguajar, a forma de se comportar e agir das pessoas. É
a figura principal da empresa em termos de inovação e o grande responsável pelo
crescimento que a empresa atingiu nos últimos anos. Modesto atuou fora da
empresa no mercado financeiro durante 13 anos, como superintendente
administrativo de um grupo empresarial, mas salienta que sempre teve como meta
atuar na organização, pois isto “estava no seu sangue”. Quando entrou na
organização, por convite do seu irmão, Eduardo, assumiu a Diretoria Administrativa
e Comercial e o grupo tinha apenas oito lojas. Foi o responsável pela estruturação
do conceito Drugstore, buscando referências nos Estados Unidos e principalmente
convencendo os gestores de que este era o caminho a seguir. Criou os serviços
drive-thru e foi ele quem trouxe a consultoria e metodologia do INDG para dentro da
instituição.
Sua filha, Silvia, parece estar trilhando os caminhos do pai. Acompanha o pai
em todos os assuntos, tem o respeito e consideração dos gestores e é apontada por
todos como referência, pelo seu carisma e suas atividades. Está à frente dos
serviços de ouvidoria da organização, envolvendo todas as áreas quando há a
necessidade de prover uma resposta em tempo hábil para os clientes, sobre uma
solicitação, sugestão, reclamação ou crítica.
Bruno, que é o diretor comercial, privilegia a área de Vendas e vem
demonstrando a habilidade necessária para o desenvolvimento deste setor. Antônio,
que é o superintendente administrativo, atua de perto na gestão da empresa, com
uma postura compromissada e rigorosa na visão dos gestores.
112
Os funcionários mais antigos, Davi, Irineu e Maria Felix, são recorrentemente
citados como exemplos vivos de dedicação e comprometimento com a organização.
São tratados de forma carinhosa e respeitosa, não só pelos diretores, como também
pelos demais gestores.
O Sr. Irineu está na empresa desde 1948, entrou com 16 anos e demonstra
grande apreço pela organização. Trabalhou como entregador para todos os setores
da empresa. Começou suas atividades profissionais em 46, e em 48, um diretor da
organizou o convidou para trabalhar em compras, onde permaneceu por
praticamente toda a sua carreira. Quando chegou à empresa, trabalhava
diretamente com o pai do Modesto Neto, e com isto, teve várias oportunidades para
participar de treinamentos, ampliando os seus horizontes de conhecimentos. É
chamado carinhosamente por todos de „tio‟ e é tido como um exemplo de
honestidade. Hoje, apesar de não exercer nenhuma atividade na organização, sua
presença é sempre requerida e, nas palavras dele, “eu venho aqui mais pra passear,
porque eles não querem que eu vá embora. Então, estou aqui”.
A Sra. Maria Felix iniciou suas atividades na empresa em 1948. Trabalhou
anteriormente na Padaria Brasileira, que ainda existe na Rua Goitacases, e os
diretores da Drogaria passavam todo dia na padaria onde ela trabalhava para
comprar pão. Recebeu um convite, através de um sócio, na ocasião, o Sr. Duarte,
para trabalhar na empresa. Trabalhou como caixa numa filial que existia na Rua
Tupinambás e depois foi transferida para o prédio central, quando ele foi adquirido.
Ficou no caixa por um certo tempo, e depois foi transferida para a tesouraria, local
onde trabalha até os dias atuais. Ela demonstra um grande afeto pela empresa e
relata que tem um tratamento especial da parte de todos. E pretende continuar
trabalhando na empresa “até quando der”.
O Sr. Davi iniciou suas atividades na empresa em 1945. Começou com 13
anos de idade, como entregador. Naquele tempo, usava boi ou bicicleta. Nas suas
palavras, foi campeão de entrega e ganhava um centavo por cada entrega para a
matinê do domingo. Ficou bastante tempo como entregador, depois foi para o
laboratório, ajudando na limpeza, lavando vidro e ajudando os farmacêuticos. Depois
foi para o atacado, fazia despacho, assumiu a chefia de atacado, depois passou
para a gerência, trabalhando ali durante 20 anos, de meio-dia as duas da
madrugada. Foi gerente de balcão geral, saiu e assumiu a função de atendimento à
113
criança, atendimento a empresas, coleta de preço, e negociação de empresas.
Durante o tempo que ficou no plantão, o método de vendas empregado na época, no
balcão, era manter as mercadorias escondidas. Embaixo do balcão. Propôs colocar
a mercadoria na mão e na visão do cliente para facilitar o seu acesso. Foi criticado
por muitos ao adotar este procedimento, com o receio do aumento de furtos, em
função da facilidade de acesso às mercadorias. O faturamento dobrou, mesmo com
a existência de alguns furtos, e com isto a ideia caiu no apreço da Diretoria e é
mantida até hoje, com os refinamentos atuais.
Além destes três funcionários, o gerente de TI e o gerente administrativo são
funcionários com mais de 20 anos de casa e também possuem toda uma história
dentro da empresa, sendo frequentemente citados como exemplos de conduta.
Quanto aos rituais que existem na organização, o que pode reforçar a sua
cultura, destaca-se a tradicional festa de final de ano. Pelo grande número de
funcionários, ela é realizada num espaço amplo. Tradicionalmente, nesta
celebração, os funcionários que atingem dez anos de casa recebem um broche com
diamante comemorativo. O presidente faz questão de cumprimentar pessoalmente a
todos, e é feita uma fila, para que todos tenham essa oportunidade. São realizados
sorteios, inclusive de automóveis, com apoio e patrocínio dos fornecedores. A festa
é restrita aos funcionários e não é extensiva aos familiares. A empresa organiza
esse momento de confraternização e comemoração pelos resultados alcançados ao
longo do ano.
As reuniões do grupo de vendas são também tradicionais e acontecem com
certa frequência, no sentido de avaliar estratégias e formas de incrementar os
resultados. Periodicamente acontecem também visitas e encontros nas lojas,
promovidos pelo presidente, quando ele realiza uma palestra ou um discurso em tom
mais informal e descontraído, que é a sua característica. Estes são os principais
rituais mencionados pelos entrevistados e que fazem parte do cotidiano da
organização.
114
Assim, ficam caracterizados os aspectos da cultura da organização
relacionados aos valores, heróis, símbolos e rituais presentes, conforme
apresentado na FIG. 15 a seguir.
FIGURA 15: Valores, heróis, rituais e símbolos da organização pesquisada Fonte: Elaborado pelo autor a partir das definições de Hofstede et al (1990).
4.2.3 Características da cultura brasileira presentes na organização
Conforme descrito no referencial teórico, Tanure (2007, p. 1) ampliou os
estudos de Hofstede (1980), tendo em vista a realidade brasileira. A autora defende
a hipótese de que “a cultura brasileira, com suas características e especificidades,
impacta o modelo de gestão das empresas”.
Esta afirmação parece ter sentido quando se observa e se analisa a
organização, objeto desta pesquisa, que apresenta muitas das características e
115
dimensões propostas pela autora e que influenciam diretamente o seu modelo de
gestão.
A autora, conforme descrito no referencial, analisa as quatro dimensões
identificadas por Hofstede (1980 apud TANURE, 2007), que são: (1) a distância do
poder; (2) a necessidade controlar as incertezas; (3) a forma como os indivíduos
interagem nos grupos; (4) masculinidade versus feminilidade. Posteriormente, há
uma quinta dimensão, modelada a partir de valores orientais, que é a orientação de
longo prazo versus orientação de curto prazo.
Com relação à distância do poder, observa-se que, na organização em
estudo, conforme a visão dos entrevistados, a concentração do poder é notória, na
figura do presidente. Os próprios gestores têm autonomia reduzida. Ninguém tem
dúvidas sobre quem é responsável por tomar as decisões e quem deve implantar o
que foi decidido. A estrutura é hierárquica, com as decisões centralizadas no topo da
pirâmide, sendo que os gestores aparentemente não consideram trabalhar com base
em estruturas mais flexíveis, no estilo matricial, por exemplo. Têm internalizado
realizar as tarefas com base nos princípios hierárquicos – quem tem o poder – e
funcional – quem conhece da função. Não há um sistema participativo de
administração e os gerentes não reclamaram da submissão a hierarquia e falta de
autonomia, característica que pode ser constatada pela entrevista com os
funcionários mais antigos, que afirmaram que a empresa é o melhor lugar para se
trabalhar. Apesar do poder estar concentrado na figura do presidente, o acesso aos
diretores e ao presidente não é difícil, conforme afirmado anteriormente.
Em sua pesquisa, Tanure (2007) constata que as organizações brasileiras
são influenciadas pelas características de concentração de poder e personalismo e
tendem a assumir posições mais coletivistas do que individualistas.
Esta característica coletivista, que representa a terceira dimensão proposta
por Hofstede (1980 apud TANURE, 2007) - a forma como os indivíduos interagem
nos grupos - é valorizada na organização, que se comporta como uma grande
família, provendo ajuda mútua e proteção, tanto para os familiares quanto para os
colaboradores. As relações entre os indivíduos são fortes, a coesão do grupo é
grande e observa-se que ela representa uma fonte de identidade e segurança para
todos. Com isto, as pessoas que se integram ao grupo passam a ter confiança na
organização. Por outro lado, percebe-se que não há muita competição entre os
116
gestores, o que, segundo Tanure (2007, p. 53), poderia “gerar uma fonte vantajosa
de ideias para mudanças inovadoras”.
Quanto à necessidade de controlar as incertezas, “essa dimensão está
presente, em maior ou menor grau, em qualquer parte do planeta, pois o futuro é
incerto e temos que conviver com essa realidade” (TANURE, 2007, p. 65).
De acordo com pesquisa realizada por Hofstede (1980, 1991, 1993, 2001
apud TANURE, 2007), o estudo da necessidade de controlar incertezas deve
começar com o estresse no trabalho. Quanto maior o nível de estresse dos
colaboradores, decorrente das incertezas do ambiente, eles tendem a ficar mais
tempo na empresa, procurar mais estabilidade e ter mais disposição para cumprir
regras.
No entanto, Tanure (2007), em pesquisa recente, apontou mudança
significativa no índice de necessidade de controle de incertezas, elaborado por
Hofstede (1991), mostrando que ele estava em 76 e caiu para 36 nas últimas três
décadas. Isto demonstra que a sociedade brasileira promoveu uma mudança
cultural nos seus valores centrais, convivendo melhor com a incerteza e
ambiguidade, mas está ainda muita presa a regras e normas sociais.
Apesar de não se ter notado nível alto de estresse na organização, observa-
se que os seus colaboradores tendem a ficar muito tempo na empresa, procuram
estabilidade e têm grande disposição para a aceitação das regras. Pode-se perceber
também que os entrevistados não demonstram muita ambição em avançar na
carreira, talvez pelo fato de que as oportunidades dentro da organização são
limitadas ou que considerem a estabilidade como ponto fundamental. De maneira
geral, conferem um alto grau de lealdade para a organização e também têm o
sentimento de que os gestores mais antigos são os melhores. Há pouca competição
entre os gestores, talvez em decorrência da centralização de poder do presidente.
Apesar disso, seu estilo gerencial não é considerado autoritário e o grupo é ouvido
no processo decisório. Os entrevistados verbalizaram que não imaginam trabalhar
com um gestor externo. Não têm uma visão clara sobre os rumos da empresa e o
que a orienta, aonde pretendem chegar, mesmo que todos nutram por ela um
sentimento de grande admiração, respeito e lealdade.
Com relação à dimensão masculinidade versus feminilidade, para Tanure
(2007), conforme apresentado no referencial teórico, há uma predominância,
117
também, na cultura brasileira, de valores masculinos, como competição e interesse
pelo sucesso material em contraposição aos femininos, como ternura, generosidade
e cooperação, o que, na sua visão, se reflete também na gestão organizacional.
Neste sentido, há uma posição intermediária entre tais valores dentro da
organização, em consonância com a realidade nacional, de acordo pesquisa
realizada por Tanure (2007).
Dentre os valores masculinos, alguns ficam evidenciados na organização,
conforme definição de Tanure (2007), como “herói é quem executa”, demonstrado
pelo culto e valorização das pessoas vivas ou falecidas e que foram ou são
influenciadoras dos padrões de comportamento, conforme apresentado no item
anterior. A valorização de que “o grandioso é bonito” é recorrentemente enaltecida
na organização pelos seus mais de 100 anos de existência, uma rede de comércio
farmacêutico com maior número de lojas em Belo Horizonte e pela sua posição de
destaque no ranking da associação ABRAFARAMA. O valor masculino de “realizar é
mais importante do que estar” também aparece na fala dos entrevistados, quando
afirmam que “tem que resolver”, ao se depararem, por exemplo, com um problema
relacionado ao atendimento de um cliente. Já o valor de “ser agressivo” aparece na
própria estratégia da empresa de ocupação de espaço e crescimento, ofuscando a
ação da concorrência do setor. Por outro lado, o valor masculino de que
“relacionamento é secundário” apresenta-se de forma contraditória na organização.
Não há ações no sentido de promover os relacionamentos, conforme apresentado
nas práticas para promover a integração interna, com exceção da confraternização
de final de ano. Por outro lado, as pessoas que têm tempo maior de casa são
valorizadas e têm um relacionamento mais próximo com a direção da empresa.
Considerando-se, então, os valores femininos, conforme definição de Tanure
(2007), observa-se, na empresa pesquisada, a “ternura, cooperação, boas relações
com os superiores, o viver num ambiente agradável para si mesmo e a família, e
preocupação com a qualidade de vida”, identificados na organização pelo
depoimento dos entrevistados. Sendo assim, percebe-se que a realidade da cultura
organizacional da empresa incorporou características da cultura nacional, mas com
algumas adaptações.
Quanto à quinta e última dimensão - orientação de longo prazo versus
orientação de curto prazo -, a postura organizacional brasileira, de maneira geral, é
118
de tendência à orientação de longo prazo, conforme apresentado no referencial
teórico, ou seja, ainda não adota metas e objetivos a serem cumpridos
rigorosamente em curto espaço de tempo, sendo que os executivos acreditam que a
construção das relações sociais internas e empresariais demandam período maior
de tempo para se consolidarem (TANURE, 2007).
Esta postura é evidenciada na organização em estudo, considerando-se que
os entrevistados manifestaram valorizar os relacionamentos existentes e a utilização
do tempo como forma de construir as relações sociais, conforme definição de Tanure
(2007). A austeridade, persistência e perseverança são valores muito importantes
para a organização, segundo o depoimento dos entrevistados, em conformidade
com a realidade de Minas Gerais, estado que apresenta posição destacada neste
quesito, conforme pesquisa de Tanure (2007).
Há, no entanto, características presentes na organização, de orientação de
curto prazo, como ter o lucro como medida de desempenho e adotar metas e
objetivos mais imediatistas para a empresa, monitoradas de forma sistemática
através do sistema de gerenciamento matricial de receitas e despesas. Por outro
lado, observa-se que a organização tende a ser mais tolerante, quando não
acompanha os planos de ação elaborados para corrigir os desvios nas metas e
objetivos e também pelo seu baixo índice de turnover, pois, normalmente, não pune
com demissões a falta de desempenho, somente as faltas graves com relação à
conduta dos seus gestores e empregados.
Por fim, Tanure (2007) apresenta, conforme mencionado no referencial
teórico, o que denomina sistema de ação cultural brasileiro e considera que a
flexibilidade é o seu fator fundamental, sendo um traço que permite a articulação
entre os subsistemas “institucional e pessoal” e “líder e liderados”. Ou seja, a partir
dos seus resultados de pesquisa, a autora desenvolve uma matriz – sistema de ação
cultural brasileiro – com os elementos que, na sua visão, caracterizam o padrão de
comportamento nas organizações brasileiras, representado na FIG. 16.
119
FIGURA 16: Sistema de ação cultural Brasileiro Fonte: Tanure (2007).
O líder da organização pesquisada apresenta, de forma evidente, as
características de concentração de poder, mesmo quando propõe ações mais
inclusivas, como também o paternalismo e personalismo nas suas relações com os
liderados. Por outro lado, percebe-se que os gestores entrevistados adotam postura
de espectador, demonstrando baixa iniciativa, principalmente para propor mudanças
e inovações no modelo do negócio e gestão da empresa e, assim, evitam o conflito
com o presidente.
O medo de errar é amenizado em função da posição adotada pelo presidente
de aprender com os erros e lidar com os fracassos. O traço de lealdade das pessoas
é bastante evidenciado pelos entrevistados e valorizado pela fala dos funcionários
mais antigos. Já a ambiguidade fica caracterizada pela falta de clareza e regras,
como, por exemplo, a ausência de um código de ética e conduta, o que permite
manobra para os que ocupam posição de poder e diferentes interpretações por parte
dos liderados. Por exemplo, para alguns entrevistados, não há restrições para a
existência de casais na empresa, enquanto que, para outros, casais não são
admitidos.
Quanto à flexibilidade, que representa, segundo Tanure (2007, p. 110), “uma
categoria com duas faces – adaptabilidade e criatividade –, observa-se de forma
mais evidente a característica de adaptabilidade da organização, que lida bem com
os fracassos e aprende com os erros, refaz e continua, após o aprendizado. O fato é
que a empresa sobreviveu e cresceu, num setor bastante competitivo, por mais de
120
100 anos, o que leva a crer que esta característica de adaptabilidade facilitou todo
este processo.
Já a criatividade, parece estar centralizada nos presidentes, que trouxeram
diversas ideias e conceitos para o modelo de negócios da organização, conforme
será descrito no próximo item. Os gestores não apresentaram evidências de
exercitarem sua autonomia e criatividade, como também não há processos
suficientemente sistematizados para dar sustentação a ações neste sentido. No
entanto, os gestores verbalizaram comprometimento com os objetivos determinados
pelo presidente.
Portanto, de forma a permitir ao grupo crescer em termos de participação e
desempenho, considera-se importante, segundo visão de Tanure (2007), “refletir
sobre estes traços relacionados ao poder, de maneira a transformar a relação de
dependência numa relação de interdependência entre líderes e liderados”. Neste
sentido, seria importante que os gestores assumissem um papel mais ativo dentro
da organização e o presidente, em contrapartida, precisaria acreditar na capacidade
deles, dando-lhes maior liberdade de ação.
Em suma, se tomarmos como referência o sistema de ação cultural brasileiro,
desenvolvido por Tanure (2007), perceberemos que a cultura nacional influencia no
modelo de gestão da empresa, comprometendo, em alguns aspectos, o seu
potencial criativo, limitando, desta forma, a sua capacidade de inovar.
A análise dos tipos de inovação da empresa estudada é o tema do próximo
item. Com isto, encerra-se o primeiro nível de análise, que permitiu identificar quais
os elementos organizacionais e gerenciais que compõem a cultura da empresa
pesquisada, considerando as questões de adaptação externa e integração interna;
artefatos visíveis, valores compartilhados, pressupostos básicos; valores, heróis,
rituais e símbolos permeados pelas práticas cotidianas da organização, e elementos
da cultura brasileira que influenciam o modelo de gestão da empresa.
121
4.3 Descrição e análise dos tipos de inovação da empresa estudada
Este segundo nível de análise tem por objetivos descrever e analisar os
processos de inovação da empresa pesquisada, identificando a maneira pela qual se
deu a trajetória das inovações na organização e os tipos de inovação
predominantes.
Neste item, serão identificadas as práticas que podem ser consideradas
inovadoras no modelo de gestão e prestação de serviços adotados na empresa
pesquisada.
4.3.1 Inovações da organização: histórico e classificação por tipos
O histórico das inovações da organização inicia-se com a atuação do seu
fundador, Modesto Carvalho de Araujo, que, segundo o relato dos entrevistados, era
uma pessoa muito preocupada com o atendimento e serviço aos clientes, buscando
de forma recorrente alternativas para melhorar a prestação dos serviços da
organização. Percebe-se que o seu comportamento empreendedor provocou o
desenvolvimento de mudanças com consequências positivas para a organização
(SCHUMPETER, 1985).
O fundador, conforme relatado, morava nos fundos da primeira loja, localizada
na Praça Rio Branco, no centro de Belo Horizonte. Com o intuito de atender melhor
a seus clientes, contam os entrevistados, instalou uma campainha do lado de sua
cama. Desta forma, qualquer horário da noite ou madrugada, mesmo com a Loja já
fechada, ele abria para fazer uma venda ou atendimento. Mais tarde criou o primeiro
plantão noturno da cidade e atendimento 24 horas, que existe até os dias atuais
(BRASIL, ARRUDA, 2006).
122
Ele desenvolveu também o conceito de loja de conveniência, ainda que de
forma incipiente, ressaltava a garantia de procedência dos produtos, oferecia
serviços médicos à população e sempre empregava farmacêuticos responsáveis.
Brasil e Arruda (2006) comentam, sobre anúncio de 1927 publicado e assinado por
Modesto Carvalho Araujo, onde estes diferenciais eram destacados, formando o que
se pode considerar seus pressupostos básicos (SCHEIN, 2004).
Já no início do empreendimento, ele introduziu a entrega em domicílio.
Desenvolveu também uma política de melhores preços através de compras diretas
dos fornecedores nacionais ou estrangeiros. Segundo os entrevistados, Modesto, o
fundador, fazia questão de assinar a propaganda dos anúncios, desta forma, visando
garantir credibilidade para as informações. Dentro do seu objetivo de sempre
atender aos clientes, afixou placa nas lojas com os dizeres: “Se não encontrar o
produto, fale com o gerente” (BRASIL, ARRUDA, 2006).
A garantia de procedência dos seus medicamentos era evidenciada também
desde o início de suas operações. Para tratar, em 1914, da sífilis, doença venérea
transmissível, era utilizado um medicamento denominado Neosalvasan, que estava
em falta em Belo Horizonte, e quando encontrado, custava muito caro. Modesto, o
fundador, conseguiu trazer o medicamento do Rio de Janeiro a um custo inferior, o
que acabou sendo motivo de contestação pelos concorrentes, que espalharam
boatos que o medicamento vendido pela Drogaria Araujo era falso. A empresa
publicou na imprensa um atestado de comprovação de procedência do produto e fez
contatos junto aos médicos, apresentando os documentos de importação (BRASIL,
ARRUDA, 2006).
Outro episódio, que demonstra o espírito de cidadania empresarial e
responsabilidade social da organização, ocorreu durante a epidemia de gripe
espanhola, no final da Primeira Guerra Mundial, em 1914. Modesto, o fundador,
ofereceu quinino de graça à população, que era o medicamento preventivo, e ao
mesmo tempo, vendia os medicamentos para cura a preços módicos (BRASIL,
ARRUDA, 2006).
Já Antonio Martins de Araujo, filho de Modesto Araujo, tinha o perfil daquela
pessoa que segue os passos do pai, mas também cria e inova. Sistematizou os
serviços de entrega a domicílio - o Drogatel Araujo –, que é símbolo da empresa,
procurando ocupar espaços em Belo Horizonte e bloqueando a entrada de
123
concorrentes e ao mesmo tempo reduzindo os investimentos com abertura de
pontos comerciais e custos com estoques (BRASIL, ARRUDA, 2006). Desta
maneira, Antônio, com a introdução deste serviço, diferenciou-se das empresas do
setor, aumentando a competitividade da empresa (KUCZMARKSI, 1998).
Antônio, com o apoio do pai Modesto, criou também, em 1977, a loja para
venda de produtos agroveterinários, adotando o mesmo padrão da Araujo, com
médico veterinário, agrônomos e técnicos agrícolas para atendimento aos clientes.
Mantendo o histórico das inovações da empresa, Eduardo Araujo – filho de
Antônio -,foi o responsável por profissionalizar os serviços Drogatel em um
verdadeiro telemarketing e entrega em domicílio. Durante a sua gestão, foi o
responsável pela instalação de duas drogarias drive thru, as primeiras que foram
instaladas no Brasil. Em 1996, por iniciativa de Eduardo e de Modesto Neto, o qual
já estava na empresa atuando em conjunto com o irmão, um grupo de 59
funcionários foi aos Estados Unidos para estudar os padrões americanos de
Drugstore, em parceria com a Universidade da Flórida. Visitaram redes de drogarias,
assistiram a palestras e tiveram oportunidade de observar como este modelo de
negócios funcionava na prática. Realizaram, com essa viagem, o que March (1991)
denominou encontrar novas formas inteligentes para explorar um conhecimento
existente. Eduardo, que tinha um perfil inventivo, segundo Brasil e Arruda (2006),
desenvolveu também um carrinho com trilhos que permitia o transporte de
medicamentos diretamente do estoque para o balcão da loja matriz, desta forma,
evitando o deslocamento dos atendentes até o estoque e diminuindo o tempo de
atendimento ao cliente, de acordo com o relato dos entrevistados.
O presidente atual, Modesto Neto, entrou para a Drogaria Araujo em 1984,
após trabalhar 15 anos no mercado financeiro. Atuou como diretor administrativo até
o falecimento de Eduardo em 2004, quando assumiu a Presidência da empresa. Ele
promoveu os ajustes acionários necessários, dando condições adequadas de saída
para aqueles membros da família que não desejavam atuar na organização.
Implantou o sistema de gerenciamento por categorias, realizou a informatização do
grupo, implantou o sistema de gestão de estoques, determinou os critérios de
precificação, intensificou o processo de padronização das lojas, facilitou a
aposentadoria de acionistas através de aluguéis provenientes de imóveis utilizados
pela organização e viabilizou a criação de empresas satélites para os membros da
124
família, em especial os mais jovens, que tinham perfil mais empreendedor.
Aprofundou também as ações de responsabilidade social da organização com
campanhas como “Doe o seu troco” para o Hospital da Baleia e implantou a política
de participação nos lucros e resultados para os empregados.
Um dos diferenciais da organização foi a implantação do gerenciamento por
categorias, sistema comercial que faz integração entre compras, vendas, estocagem
de produtos e exposição nas prateleiras das lojas. O software permite projetar o
layout das prateleiras de acordo com as necessidades dos clientes, obedecendo a
níveis de rentabilidade e afinidades de famílias de produtos. Dessa forma, conforme
anteriormente mencionado, induz a uma concorrência entre os fornecedores, que
disputam posição dos seus produtos nos mostruários e espaço promocional nas
lojas e veículos da empresa, através da oferta de melhores margens de
comercialização para a organização (BRASIL, ARRUDA, 2006).
Outra inovação que Modesto Neto trouxe para a gestão da empresa foi o
sistema de gerenciamento matricial de receitas e despesas, implantado pelo INDG,
que, através de um painel de metas e indicadores, orienta quais resultados devem
ser atingidos pela organização, e permite a elaboração de planos de ação para
reverter uma situação onde o resultado esperado não está sendo atingido.
Modesto também inovou na criação de espaços e serviços exclusivos nas
lojas, como o Espaço Viver Diet, com produtos destinados ao público que tem
restrições ao consumo de açúcar, os serviços Araujo Foto de ampliação e revelação
de fotos digitais e os serviços de cópias e fax. Lançou, no final de 2008, o site de
comércio eletrônico, disponibilizando os seus produtos para venda em todo Brasil.
Eles estudam novas iniciativas, como quiosques de vendas em municípios fora da
Grande BH.
Neste sentido, destaca-se o depoimento do diretor comercial:
Eu acho que o grande propulsor disso aí é o Modesto. Ele pesca essas coisas no ar. Nos ensina a sempre buscar esse diferencial. Mas ele sempre fala: “busca coisa diferente, vamos fazer algo mais.”. Então acho que a grande figura disso aí de inovar chama-se Modesto. Nós temos que aprender com ele como se faz isso.
No entanto, percebe-se que a inovação, mesmo nos dias atuais, não é tratada
de forma sistematizada ou orientada através de processos. Percebe-se que
125
predominam elementos e ações informais na cultura da empresa no que se refere a
inovações. Isto se confirma quando o diretor comercial afirma que não há nada
estruturado para orientar o desenvolvimento de produtos e serviços, e quando surge
uma ideia, a empresa procura desenvolvê-la e ver o que acontece.
Conclui-se então que as inovações surgiram, na empresa, ao longo destes
mais de cem anos, principalmente pelo empenho e visão do fundador e seus
sucessores, não por meio de processos sistematizados.
Com intuito de classificar as inovações da organização com base numa
tipologia, Cyrino (2007), a partir da classificação desenvolvida por Christensen
(2003), conforme descrito na referencial teórico, elaborou matriz que apresenta os
diferentes níveis e tipos de inovação. Os tipos de inovação, de acordo com a
definição de Christensen (2003), são o tipo incremental e radical, com foco no
componente ou no sistema.
De acordo com Christensen (2003), a inovação incremental com foco no
componente é percebida como um processo de melhoria contínua dentro da
organização, buscando otimizar determinadas atividades, normalmente em busca de
melhor desempenho do produto ou redução de custos. Neste sentido, observa-se
que o sistema de gestão de estoques, implantado por Modesto Neto, que permitiu
reduzir os custos da operação e de produtos estocados, encaixa-se nesta
classificação.
Já a inovação incremental com a abrangência do sistema visa reformular
e promover uma melhoria nos processos da organização como um todo
(CHRISTENSEN, 2003, grifo nosso). Neste sentido, quando Antônio Araujo criou os
serviços de entrega em domicílio - Drogatel, que depois foi aperfeiçoado por
Eduardo Araujo, estavam justamente aperfeiçoando um processo existente – de
entrega em domicílio – e fazendo uma transformação na empresa como um todo,
pois eles criaram um canal de venda estruturado para atendimento aos clientes por
telefone. Este canal precisava ter acesso em tempo real à posição de estoque das
lojas, como também do depósito. A comunicação dos pedidos precisava fluir de
forma eficiente para atender ao cliente, através da loja mais próxima, e no menor
tempo. Mecanismos de cobrança dos clientes foram criados, de forma a garantir o
recebimento pelo fornecimento dos produtos e tecnologia da informação, segundo a
opinião do gerente da área, precisou dar suporte adequado a todas estas operações.
126
Percebe-se, então, que diversas áreas precisaram ser envolvidas para garantir o
sucesso dessa empreitada, como também essas áreas foram diretamente afetadas,
desta forma, caracterizando-se como uma inovação, abrangendo todo a
organização.
Da mesma maneira, quando Eduardo Araujo e Modesto Neto investiram no
conceito do Drugstore, patrocinando a ida dos seus funcionários para estudar e
melhor entender o modelo americano, eles estavam realizando uma inovação
incremental com foco no sistema, se considerarmos o contexto americano, onde
lojas atuando com este conceito já existiam há mais tempo. No entanto,
considerando o contexto brasileiro, pode-se pensar nesta inovação como radical,
pois tratava-se de um modelo de negócios até então não adotado pelas farmácias da
época, segundo o relato dos entrevistados. Esta inovação afetou a organização
como um todo, porque implicou em rever layout e funcionalidade das lojas para a
adequação aos novos produtos, treinar funcionários para comprar e vender outros
produtos além de medicamentos, desenvolver novos fornecedores e principalmente
mudar toda a estratégia mercadológica da organização, conforme a fala do
presidente abaixo, que procura demonstrar como esta estratégia é fundamental
para a competitividade da empresa.
É um mix de produtos diferenciado, se você for analisar o conceito de Drugstore foi a Araujo que trouxe pro Brasil. E isso é um diferencial grande, porque os concorrentes de fora não tem isso. A Droga Raia por exemplo, ela não tem as coisas que a Araujo tem. Então isso é um grande diferencial. Tem uma filosofia de não ter quantidades, e sim lojas com qualidade. Você pode olhar que os pontos que a Araujo se encontra são pontos extremamente selecionados. São geralmente no retorno pra casa. É um diferencial, você está voltando pra casa é ali que você vai comprar uma coisa. Quando você quer o produto, toda empresa se esforça pra ter o produto, você sempre vai ter motivos pra voltar a Araujo, então a Araujo tem o que mantém a competitividade da empresa. E bom atendimento qualquer um pode ter, você vai num concorrente você é muito bem recebido, muito bem tratado, mas não tem o que você quer, você vai voltar de lá pra cá. Então ter o que o cliente está procurando é realmente uma das coisas que é um diferencial. Outro mecanismo que está relacionado a isso aí, é um processo que a gente internamente tem que chama “Araujo tem”. Se você for em uma loja e não achar esse produto você pode pedir para que entregue em sua casa sem custo se você tiver na hora de entrega do Drogatel. Eu não conheço nenhuma outra empresa no mundo desse negócio que tenha isso.
Os processos de informatização e a adoção do sistema de gerenciamento
matricial de receitas e despesas implantados por Modesto Neto também são
127
exemplos deste tipo de inovação – incremental com foco no sistema - e demonstram
a visão da empresa em otimizar os seus processos de negócios.
Recentemente, a adoção do modelo de vendas através do comércio
eletrônico, ainda que tardiamente, pois os concorrentes da empresa já utilizavam
este modelo, representa uma inovação incremental com foco em sistema, porque
envolve repensar toda a logística do processo, coleta, entrega e recebimento de
pedidos.
Pode-se dizer também que os esforços de Modesto Neto em organizar o
controle acionário da empresa, promover a política de participação em resultados e
desenvolver ações de responsabilidade social são exemplos de inovação
incremental com foco no sistema, visando melhorar a eficiência dos processos como
um todo da organização, de planejamento sucessório, passando pela remuneração e
incentivo aos colaboradores e promovendo ações voltadas para a comunidade,
desta forma, atendendo de forma sistêmica a todos os stakeholders da organização.
A inovação radical ou disruptiva, da mesma forma que a incremental, possui
dois focos de atuação, no componente ou no sistema. Quando se foca no
componente a estratégia, é buscar clientes que queiram um produto ou negócio de
baixo custo, daí a denominação de disrupção de baixo mercado.
Antônio Araujo fornece-nos um exemplo deste tipo de inovação quando criou
a Agroveterinária, possibilitando acesso a clientes que necessitavam deste tipo de
produto. Realizou o que Hamel (2006) denominou criar uma estrutura que não
existia anteriormente com a finalidade de se buscar um mercado novo.
Eduardo Araujo também inovou neste sentido quando criou as vendas através
do sistema de drive thru. Segundo Modesto Neto, este é o canal de vendas desejado
por aquele cliente, que por algum motivo, não quer se expor ou se identificar dentro
da farmácia, aquele que compra, segundo exemplo dele, preservativos ou
medicamentos para tratar da disfunção erétil. A adoção do sistema drive-thru não é
comum no segmento de farmácias.
Já Modesto Neto inovou de forma radical com foco no componente, quando
implantou o sistema de gerenciamento por categorias, permitindo gerenciar a
visibilidade e rentabilidade dos produtos nas prateleiras e estimulando a
concorrência entre os fornecedores. Quando criou os serviços satélites ao negócio,
128
como ampliação de fotos digitais, cópias e envio de fax, Modesto Neto também
inovou nesse sentido.
Com a abrangência no sistema, a inovação radical visa trabalhar no conceito
do negócio e com isto buscar um novo mercado e novos consumidores; este tipo de
inovação denomina-se disrupção de novo mercado (CHRISTENSEN, 2003, grifo
nosso).
Considerando então o momento histórico – primeira metade do século XX – e
ainda a questão de que a cidade Belo Horizonte ainda estava na sua infância,
considera-se que Modesto, o fundador, inovou de forma radical com foco no sistema,
mudando o conceito do negócio, quando criou o plantão 24 horas, morando nos
fundos da loja para poder atender aos clientes em qualquer horário e instalando a
campainha do lado da sua cama; criou o conceito de loja de conveniências,
adotando um portfólio de produtos mais abrangente que somente medicamentos;
promoveu o sistema de entrega em domicílio, ainda que de forma incipiente e
difundiu o conceito de qualidade ao garantir procedência dos produtos, fazendo
divulgação através dos meios de comunicação da época.
Percebe-se que as inovações radicais com foco no sistema podem ser
principalmente atribuídas a Modesto, o fundador, pessoa visionária e à frente do seu
tempo, por antecipar várias tendências que depois viriam a ser adotadas pela
concorrência. Suas ações vão ao encontro do que Christensen (2003) denominou
disrupção em novo mercado, quando as empresas visam criar novos hábitos de
consumo ou atrair, com novos produtos, aquele cliente que não é consumidor.
Já Modesto Neto também é responsável por várias inovações dentro da
empresa, mas no sentido de aperfeiçoamento, procurando promover melhorias
contínuas ou em processos de forma a assegurar resultados melhores para a
organização. É o que Christensen (2003) denomina estratégia de sustentação, onde
se busca melhorar continuamente os produtos ou processos para concorrer no
mercado tradicional
O Quadro 8 a seguir resume todas as inovações citadas, identificando os
responsáveis e estabelecendo tipo, foco e categoria, conforme definido por
Christensen (2003).
129
Inovação Responsável Tipo Foco Categoria
Plantão 24 horas Modesto Fundador
Radical Sistema Inovação no conceito do negócio
Loja de conveniência
Modesto Fundador
Radical Sistema Inovação no conceito do negócio
Entrega em domicílio
Modesto Fundador
Radical Sistema Inovação no conceito do negócio
Garantia de procedência
Modesto Fundador
Radical Sistema Inovação no conceito do negócio
Drogatel Antônio Araujo Incremental Sistema Melhoria de processos
Agro-veterinária Antônio Araujo Radical Componente Inovação descontínua
Drive thru Eduardo Araujo Radical Componente Inovação descontínua
Drugstore Eduardo Araujo e Modesto Neto
Incremental (contexto americano). Radical (contexto brasileiro)
Sistema Melhoria de processos (contexto americano). Inovação no conceito do negócio (contexto brasileiro
Informatização Modesto Neto Incremental Sistema Melhoria de processos
Gestão de estoque Modesto Neto Incremental Componente Melhoria contínua
Gerenciamento de categorias
Modesto Neto Radical Componente Inovação descontínua
Gerenciamento matricial de receitas e despesas
Modesto Neto Incremental Sistema Melhoria de processos
Serviços satélites Modesto Neto Radical Componente Inovação descontínua
Organização controle acionário
Modesto Neto Incremental Sistema Melhoria de processos
Política de participação em resultados
Modesto Neto Incremental Sistema Melhoria de processos
Ações de responsabilidade social
Modesto Neto Incremental Sistema Melhoria de processos
Comércio eletrônico Modesto Neto Incremental Sistema Melhoria de processos QUADRO 8 - Relação das inovações, responsáveis e tipo Fonte: Elaborado pelo autor da dissertação.
Este quadro demonstra que o posicionamento de uma empresa, em termos
de ações inovadoras, não é permanente. Conforme mencionado no referencial
teórico, pode-se perceber o processo de inovação de uma organização como um
processo, podendo caminhar da inovação radical para a incremental, ou seja, as
empresas que hoje criam novos mercados ou padrões de consumo ou criam
modelos de negócios com baixo custo, poderão, no futuro, ser alvo de disrupção,
quando estiverem privilegiando suas estratégias de sustentação (CHRISTENSEN,
2003; MCLAUGHLIN; BESSANT; SMART, 2005).
130
Observa-se que, quanto à possibilidade de se gerenciarem os processos de
inovação, conforme a ideia de série contínua dos tipos de inovação, proposta de
MClaughlin, Bessant e Smart (2005), que se baseia na tipologia de Christensen
(2003), a organização em análise também tende para o tipo incremental, a partir da
gestão de Modesto Neto, em função de sua estratégia deliberada de sustentação e
aperfeiçoamento dos negócios existentes, privilegiando incrementar
tecnologicamente seus produtos para atender aos clientes da carteira. Das dez
inovações listadas, onde Modesto tem responsabilidade, somente duas são
inovações do tipo radical, mesmo a empresa reconhecendo que pioneirismo e
inovação representam elementos essenciais de competitividade (CHRISTENSEN,
1997; SCHUMPETER, 1985; UTTERBACK, 1954).
Para MClaughlin, Bessant e Smart (2005), o gerenciamento do processo de
inovação é mais utilizado no tipo incremental do que no tipo radical, pois é baseada
em rotinas, sistematização de processos e pode ser modelado de forma
relativamente simples.
De maneira geral, outros elementos, tomando como referência o modelo de
MClaughlin, Bessant e Smart (2005), apontam para a tendência da organização de
produzir, no contexto atual, mais inovações do tipo incremental. Os procedimentos
tendem a ser formalizados, centralizados e sistemáticos. A estrutura é funcional e
orientada para a eficiência, baseada no sistema matricial de gerenciamento de
receitas e despesas, que controla os resultados da empresa. Organizações com
procedimentos estabelecidos desta forma e com orientação para a eficiência, na
visão dos autores, são mais voltadas para produzir inovações do tipo incremental.
Os gestores apresentam alinhamento com relação à missão e propósitos da
empresa e os entrevistados têm em média mais de 16 anos de casa, sem considerar
os funcionários mais antigos. Pelo linguajar comum empregado, padrões de
vestuário observados e visões gerenciais compartilhadas, os gestores formam um
grupo mais homogêneo, o que, segundo MClaughlin, Bessant e Smart (2005), é
típico de organizações que tendem a desenvolver mais inovações do tipo
incremental.
A cultura organizacional, com seus artefatos, valores e pressupostos básicos,
conforme apresentado por Schein (2004), é madura, pois foi sendo construída ao
longo de mais de cem anos de história. Percebe-se então que, conforme definição
131
de Schein (2004), possivelmente em função dos pressupostos básicos que
funcionaram bem no passado e, portanto, são considerados válidos, a direção
demonstra resistência em promover mudanças, como profissionalizar a gestão,
através da contratação de executivos que não sejam familiares, não querer buscar
opções para abrir o capital ou considerar outras formas para financiar o seu
crescimento. Nas palavras do diretor superintendente, até então, nesses 102 anos, a
Araujo utilizou uma linha de financiamento do BNDES no ano passado. “Tudo era
recurso próprio, não estava no nosso script essa questão do financiamento, nunca
nos endividamos pra crescer”. O foco é então na busca da eficiência, redução de
custos e no aperfeiçoamento do sistema existente. Utilizam-se intensivamente os
produtos e tecnologia existentes, que é a base do seu gerenciamento. Estas
características da organização, na visão de MClaughlin, Bessant e Smart (2005),
reforçam a tendência da empresa em produzir inovações do tipo incremental.
Observa-se, entretanto, que, conforme mencionado no referencial teórico,
qualquer sistema de classificação, como, por exemplo, por tipos incremental e
radical, tem limitações, em função da evolução e mudanças presentes nas
organizações, conforme aponta Greenwood e Hinings (1993). Segundo eles, um
assunto complexo como a inovação tende a desafiar um sistema de categorização,
tornando-se um dificultador para as organizações que buscam adotar um modelo
que estimule a inovação.
Finda-se, desta forma, o segundo nível de análise da pesquisa que visou
descrever e analisar os processos de inovação da empresa pesquisada,
identificando como se deu o histórico das inovações da organização e os tipos de
inovação ocorridos na sua trajetória. Com isto, identificou-se quais as práticas que
podem ser consideradas inovadoras no modelo de gestão e prestação de serviços
da empresa.
132
4.4 Elementos da cultura da organização e os tipos de inovação: análise
dessa relação
Neste item, será analisada a relação entre os elementos da cultura
organizacional e os tipos de inovação. O primeiro item – elementos que compõem a
dinâmica organizacional e sua relação com os tipos de inovação – visa à
identificação dos temas presentes na organização pesquisada, conforme modelo
proposto por MClaughlin, Bessant e Smart (2005).
O segundo item – influência da cultura organizacional e nacional nesses
elementos – visa verificar a relação dos temas anteriores com as questões de
adaptação externa ou integração interna, conforme definição de Schein (2004), e a
influência dos elementos de cultura brasileira, conforme definido por Tanure (2007),
de acordo com modelo elaborado para a análise dos dados.
4.4.1 Elementos que compõem a dinâmica organizacional e sua relação com
os tipos de inovação
A análise deste item é baseada no modelo de MClaughlin, Bessant e Smart
(2005) acerca dos nove temas que compõem a dinâmica organizacional e que, por
sua vez, demonstram a predisposição da empresa, de acordo com a tipologia
baseada nos arquétipos de Greenwood e Hinings (1993) de tender para tipo I –
produzir mais inovação do tipo incremental -, ou tipo II – gerar inovação do tipo
radical.
O primeiro aspecto a ser considerado é que a empresa não possui um
departamento ou área voltada para a criação e desenvolvimento de produtos e
serviços. Todo o desenvolvimento de novas soluções é centralizado na Diretoria e,
em especial, na figura do presidente da empresa.
133
Desta forma, esta análise, nesta organização, fica prejudicada, de certa
forma, já que se centra nas características pessoais do indivíduo e em suas
decisões, como também no grupo de gerentes, do que propriamente de um grupo
de pesquisa e desenvolvimento, como foi o universo pesquisado pelos autores do
modelo conceitual adotado.
Contudo, o modelo serve como referência para se identificar o
posicionamento atual da organização, no que se refere à adoção de inovações e à
gestão da cultura organizacional.
O primeiro tema, estrutura da organização, está relacionado ao estilo de
gestão e recursos disponibilizados para o desenvolvimento de novos produtos. O
estilo de gestão da Drogaria Araujo é baseado no desenvolvimento e envolvimento
do núcleo familiar nas decisões e administração da organização. Os familiares
foram, ao longos dos anos, os responsáveis pela gestão da empresa e
desenvolvimento de novos serviços. Hoje, apesar de Modesto Neto conferir mais
liberdade de atuação, ela é assegurada aos membros da Diretoria. São alocados
recursos e tempo necessários para completar as tarefas de melhoria incremental,
como aprimorar o sistema de estoque, conforme citado pelo presidente. Não há
orçamento para o desenvolvimento de novos produtos ou serviços, cabe ao
presidente definir onde e como inovar, conforme mencionado por ele e pelos
entrevistados. As novas ideias são assimiladas pela Diretoria e conduzidas de
maneira informal. Sendo assim, comparando com o modelo proposto por
MClaughlin, Bessant e Smart (2005), a estrutura da organização tende a facilitar o
desenvolvimento de inovação do tipo incremental, já que não há estímulos para a
criatividade do grupo e a prevalência de parentes nos cargos diretivos pode ser um
inibidor para o grupo propor e desenvolver novas ideias.
A confiança externa, segundo dos nove temas, representa a percepção que
outros grupos da organização têm sobre o time de desenvolvimento, em particular a
percepção da alta gestão, conforme a definição de MClaughlin, Bessant e Smart
(2005). No caso específico da organização estudada, considerando que o
desenvolvimento de novos serviços fica a cargo do presidente, a visão dos gerentes,
em função do seu carisma, é positiva, e todos o consideram uma pessoa criativa e
inovadora. No entanto, o histórico das inovações recentes demonstra que o
presidente tende a privilegiar o melhoramento e aprimoramento dos produtos e
134
serviços existentes do que propriamente criar produtos novos ou explorar novos
mercados, fora das fronteiras da Grande Belo Horizonte
O terceiro tema – objetivos claros - está vinculado à existência de objetivos
bem definidos para o time de especialistas e a metas rígidas durante o tempo de
desenvolvimento de um projeto, normalmente estabelecidos pela alta direção. O
presidente, responsável pelas inovações na organização, é orientado, conforme por
ele relatado, a resultados e à busca contínua de desafios, como aumentar o
faturamento e o número de lojas, tendo como comparação as outras redes de
drogarias que compõem a associação ABRAFARMA. Ele fala repetidamente sobre a
necessidade de se criar e inovar, mas percebe-se que não o faz de forma
estruturada e, sim, de acordo com a sua visão e intuição pessoal. Ele não
apresentou, durante a entrevista, metas específicas para o desenvolvimento de
novos serviços. Este posicionamento pessoal, no modelo de MClaughlin, Bessant e
Smart (2005), pode estimular inovações do tipo radical. No entanto, não é o que tem
ocorrido na empresa ao longo da gestão atual, onde a maior parte das inovações
identificadas são do tipo incremental. Talvez porque o modelo de gestão adotado
pelo presidente estabeleça objetivos claros, como ampliação do número de lojas e
resolução das necessidades do cliente, sem, contudo, acompanhar os resultados do
planejamento ou mesmo estabelecer metas rígidas de desempenho.
Isto comprova a argumentação de Mintzberg (1979,1983) de que estruturas e
tipologias representam unicamente modelos de orientação e explanação de
características e dificilmente encontra-se uma organização totalmente aderente a um
modelo, em função da complexidade interna e externa que permeia as organizações.
A constituição das equipes representa, como quarto tema, o arranjo interno
de organização do grupos de trabalho designado para pensar novos produtos ou
serviços. No caso estudado, como não há equipe de pesquisa e desenvolvimento de
produtos, considera-se então o grupo de gestores e a direção como fomentadores
da inovação, o que, conforme o modelo de MClaughlin, Bessant e Smart (2005),
favorece inovações do tipo incremental.
A perspectiva externa, quinto tema, representa a forma como o grupo se
relaciona com o ambiente externo à organização. Considerando também a pessoa
do presidente como fomentador das inovações, ele tem uma tendência a estabelecer
os objetivos a serem atingidos e reforçar a mentalidade de “fazer melhor” do grupo.
135
O presidente tem, através de um trabalho de promoção e publicidade, visibilidade
externa de empreendedor e inovador. Além disto, as ações sociais, o crescimento
superior e rentabilidade da empresa, quando comparadas com outras do setor,
conforme relatado pelo presidente, reforçam este posicionamento. A percepção é de
que organização procurar fazer o melhor e não fazer diferente, o que também gera
inovações do tipo incremental, conforme o modelo de MClaughlin, Bessant e Smart
(2005).
O sexto tema, liberdade de ação, está relacionado à autonomia conferida ao
grupo para agir. Observa-se que este aspecto inexiste na organização, já que toda
criação e desenvolvimento de produtos e serviços é realizada pela Diretoria. Há
iniciativas isoladas, através do programa de melhorias, que visa encorajar os
funcionários a desenvolver ideias, mas que mostram-se, na prática, incipientes.
Mesmo assim, como o próprio nome do programa diz, o objetivo é promover
melhorias e recompensar o proponente, e não existe expectativa de que sugestões
muito criativas ocorram. Mais uma vez, a análise permite dizer que a organização
tende a produzir, desta forma, inovações do tipo incremental.
A atitude perante o risco, como sétimo dos nove temas, refere-se à atitude
do grupo ao assumir riscos. Considerando-se a atuação do presidente e da Diretoria,
não se percebe, mais uma vez, nenhuma ação estruturada no sentido de minimizar
ou mitigar riscos e lidar com incertezas do mercado. Apesar dos erros serem
tolerados, não se identificou, na organização, uma postura de encorajar os diretores
e gerentes a assumirem riscos para promoverem grandes mudanças. A ênfase em é
em desenvolver ou aprimorar aquele produto ou serviço que é conhecido, com isto,
conforme o modelo de MClaughlin, Bessant e Smart (2005), reduzir a exposição da
organização à incerteza. Esta característica também conduz a organização para o
desenvolvimento de inovações do tipo incremental.
A confiança interna representa o oitavo tema e está associada à coesão do
grupo e confiança nos pares para resolver os problemas. Como o presidente
caracteriza-se por adotar ações paternalistas, pelo menos o grupo gerencial
entrevistado e os funcionários mais antigos demonstraram coesão e confiança na
empresa, ao reproduzirem sistematicamente as palavras e bordões do presidente,
como “atenção ao detalhe” e “curtir os erros”. Esta confiança e coesão interna geram
melhorias incrementais, na visão de MClaughlin, Bessant e Smart (2005).
136
Por fim, o crescimento e desenvolvimento refere-se à forma de como o
grupo adquire conhecimentos e experiência e a exploração de potenciais soluções.
Como não há política de treinamento e desenvolvimento que incentive o aumento de
habilidades e aquisição de novas habilidades e conhecimento do grupo, a tendência
é de seguir o que está estabelecido, o que, na visão de MClaughlin, Bessant e Smart
(2005), não representa política para promoção de inovações radicais.
O Quadro 9 resume a tendência da organização em produzir inovações do
tipo incremental, de acordo com o modelo conceitual de MClaughlin, Bessant e
Smart (2005).
ARQUETIPOS
Tipo I Tipo II
Temas Incremental
Radical
Estrutura da organização
Confiança externa
Objetivos claros
Constituição das equipes
Perspectiva externa
Liberdade de Ação
Atitude perante o risco
Confiança interna
Crescimento/ Desenvolvimento QUADRO 9 – Tendência da organização de acordo com os arquétipos definidos Fonte: Elaborado pelo autor da dissertação com base no modelo de MClaughlin, Bessant e Smart (2005).
4.4.1.1 Influências da cultura organizacional e nacional nesses
elementos
O modelo conceitual proposto por McLaughlin, Bessant e Smart (2005)
utilizando o conceito de arquétipos, conforme proposto por Greenwood e Hinnings
(1993), permite a compreensão da influência da cultura organizacional nos
processos de inovação e com isto identificar as características que compõem a
cultura da empresa e analisar a sua relação com os tipos de inovação
implementados na trajetória empresarial.
137
Essa compreensão é facilitada identificando-se cada um dos temas como um
valor compartilhado ou artefato visível, desta forma, permitindo observar na
empresa, através do conjunto de valores e artefatos, qual deles pode eventualmente
possuir alguma relação com os temas, conforme a FIG. 17, onde os artefatos são
representados por retângulos e os valores, por elipses.
FIGURA 17 - Mapa das relações entre temas, baseado no modelo de Schein Fonte: McLaughlin, Bessant e Smart (2005, p. 17).
McLaughlin, Bessant e Smart (2005) definem como artefatos visíveis os
objetivos claros, a estrutura da organização, a perspectiva externa e a constituição
das equipes de desenvolvimento.
Os principais artefatos visíveis que foram identificados com a pesquisa foram
a apresentação visual e layout das lojas e da sede, o padrão de vestuário, tanto de
uniformes, quanto de vestimentas adotadas pelos funcionários, a linguagem comum
empregada e símbolos, como a foto dos fundadores e o crucifixo. Estes elementos
de padronização adotados pela organização ressaltam a admiração, o respeito e
lealdade aos líderes e fundadores e também à hierarquia e à ordem das coisas
(DEAL; KENNEDY, 1982; FLEURY, 1997; FREITAS, 1991; SCHEIN, 2004).
Percebe-se, pela padronização, uma visão de “atenção ao detalhe”, conforme a fala
do presidente, de fazer melhor, com qualidade.
138
A missão e objetivos da organização são norteados pelo bom atendimento ao
cliente, pela busca dos resultados e atendimento às necessidades da família, ou
como consta na placa da missão, “zelar pelo interesse dos acionistas”. Com isto, a
estrutura da organização é voltada para o atendimento a esses objetivos. Tem-se a
perspectiva do grupo de que o presidente é o fomentador das inovações, mas ele
inova principalmente aprimorando e melhorando os produtos e serviços existentes.
Percebe-se que os artefatos contribuem para opção da empresa de desenvolver
inovações incrementais, na medida em que há um reforço subliminar para as
decisões que deram certo e que portanto devem ser repetidas.
Já atitude perante o risco, confiança externa, confiança interna, liberdade de
ação, crescimento e desenvolvimento são considerados por McLaughlin, Bessant e
Smart (2005) como elementos relacionados aos valores compartilhados da
organização.
Dentro deste contexto, foi verbalizados, pelos entrevistados, os valores de
atendimento ao cliente, pioneirismo e inovação, seriedade, transparência,
comprometimento, ética e honestidade, humildade e a orientação para as
necessidade da família. Alguns desses elementos realmente podem ser observados
nas instalações simples da alta administração.
A atitude perante o risco não é encorajada pela direção e, sim, procura-se
minimizá-los, aprimorando os produtos que são conhecidos e que têm sucesso. Os
erros são tolerados, mas não se percebeu que assumir riscos é encorajado. E, em
complemento, só ao presidente cabe criar novas ideias. O pioneirismo e a inovação
pertencem aos fundadores e líderes, não aos gestores, que adotam uma postura de
espectador frente aos acontecimentos.
A organização é voltada para atender ao cliente e, neste sentido gestores e
colaboradores têm certa liberdade de ação para encontrar soluções que atendam
aos interesses do cliente ou propor sugestões ou melhorias para o atendimento.
Fato é que existe uma área de ouvidoria voltada para o serviço de atendimento ao
cliente e, a partir das ações desta área melhorias são implementadas na
organização. No entanto, depara-se, de maneira contraditória, com lojas que não
preenchem este padrão de atendimento, conforme mencionado anteriormente, o que
significa que, em parte, o discurso não está condizente com a prática.
139
A confiança externa e interna pode ser analisada pela atuação do presidente,
como fomentador das inovações. O presidente realmente transmite os valores de
seriedade, transparência, comprometimento, ética e honestidade, que por sua vez
fortalecem a ideia da confiança dos gestores com a capacidade do presidente para
inovar.
O crescimento e desenvolvimento praticamente inexistem dentro da
organização, como já foi comentado, o pioneirismo e inovação são valores que estão
na fala do presidente e não no dia-a-dia da organização, sendo que ela não é
voltada para o aprendizado e, sim, para a melhoria incremental.
Valores, como o foco no atendimento ao cliente, também contribuem para o
posicionamento da empresa em desenvolver inovações do tipo incremental. Atender
ao cliente existente e mercados conhecidos, promovendo aperfeiçoamento
constantes, é, segundo visão de Christensen (2003), um posicionamento de
empresas que produzem inovações incrementais. Não há preocupação clara em
desenvolver novos mercados - para além das fronteiras da Região Metropolitana de
Belo Horizonte - e não há um posicionamento no sentido de encorajar os gestores a
assumir riscos em novas descobertas. Neste sentido, o valor de pioneirismo hoje
não é condizente com a prática da organização, fato que as vendas através de
comércio eletrônico, por exemplo, foram lançadas somente no ano de 2008, não
havendo pioneirismo por parte da organização no lançamento desta modalidade, já
realizada por seus concorrentes.
Considerando as questões relacionadas à adaptação externa e integração
externa, conforme proposto por Schein (2004), o pesquisador acrescentou, ao
modelo, conforme apresentado no referencial teórico, a classificação de cada
elemento, identificando se o mesmo está mais relacionado a uma questão ligada a
um processo de adaptação da organização ao ambiente – adaptação externa - ou a
fatores utilizados para se obter a integração interna. O pesquisador entendeu que
esta inclusão permite a melhor identificação destes elementos dentro contexto
organizacional e cultural. A FIG. 18 apresenta essa representação.
140
FIGURA 18 - Mapa das relações entre temas, baseado no modelo de Schein com a classificação de adaptação externa e integração interna Fonte: Elaborado pelo autor da dissertação.
Observa-se que os elementos: liberdade de ação, confiança interna,
crescimento e desenvolvimento e constituição de equipes têm mais relação com os
fatores de integração interna, pois dizem respeito, segundo a definição de Schein
(2004), às fronteiras do grupo e critérios para inclusão de novos membros; às
estratégias para alocação de status, poder e autoridade; às ações para promover a
intimidade, amizade e relacionamentos no trabalho; e aos critérios para recompensa
e punição.
Neste aspecto, destaca-se, mais uma vez, o comportamento do grupo através
do presidente, que tende a centralizar o poder, utilizando-se de um posicionamento
paternalista e personalista, e dos gestores, que tendem a evitar o conflito e adotar
uma postura de espectador. Com isto, a liberdade de ação e o crescimento e
desenvolvimento do grupo ficam comprometidos, não dando margem para a
criatividade e autonomia.
Já os elementos: atitude perante o risco, objetivos claros, confiança externa,
estrutura da organização e perspectiva externa apresentam uma relação maior com
questões para promover a adaptação externa, tais como a missão, funções e tarefas
141
primordiais da organização perante o seu ambiente; os objetivos estabelecidos pela
organização; os métodos utilizados para acompanhar a realização dos objetivos; os
critérios definidos para medir resultados e as estratégias emergenciais ou corretivas
a serem adotadas caso os objetivos não estejam sendo alcançados (SCHEIN, 2004).
Considerando-se tais aspectos, percebe-se que a gestão se pauta por
resultados e crescimento, adotando objetivos claros, através do sistema de matricial
de gerenciamento de receitas e despesas e procurando se comparar com as
grandes redes do setor de comércio farmacêutico. Os gestores adotam uma postura
de resolver logo os problemas e aprender com os erros e o presidente reforça o
posicionamento de aprendizado com o fracasso, demonstrado por sua fala de “curtir
os erros”. Os gestores verbalizaram confiança nas ações do presidente enquanto
fomentador das inovações, ressaltando a confiança externa. O presidente é visto
fora da organização como pessoa empreendedora e inovadora, conforme estudo
realizado por Brasil e Arruda (2006), destacando a perspectiva externa.
Após a análise, percebeu-se que o elemento estrutura da organização
identifica-se mais como uma questão de integração interna do que de adaptação
externa, porque está relacionado ao estilo de gestão da organização, que, por sua
vez, remete aos critérios de alocação de status e poder, o que, dentro do conceito de
Schein (2004), está relacionado com questões de integração interna.
Considerando-se ainda as questões relacionadas à influência da cultura
nacional, em especial à cultura brasileira para a cultura organizacional, o
pesquisador destaca os fatores que podem influenciar de forma positiva ou negativa
nos elementos que compõem a dinâmica organizacional, conforme apresentado no
referencial teórico e em complemento ao modelo conceitual de McLaughlin, Bessant
e Smart (2005), de acordo com sistema de ação cultural proposto por Tanure (2007),
o que está demonstrado na FIG. 19.
142
FIGURA 19 - Mapa das relações entre temas, baseado no modelo de Schein (2004), com a influência do sistema cultural brasileiro, conforme Tanure (2007) Fonte: Elaborado pelo autor da dissertação.
A Concentração de poder – baseada numa estrutura fortemente hierarquizada
e de submissão –, característica da cultura brasileira (TANURE, 2007), realmente
parece exercer influência negativa nos elementos de estrutura da organização e
liberdade de ação, o que, por sua vez, inibe a capacidade de desenvolvimento de
inovações do tipo radical e cria uma dependência dos líderes para o seu
desenvolvimento, fato que é destacado na organização pesquisada.
O Paternalismo – segundo Tanure (2007) -, que é a combinação da
concentração do poder com o personalismo, através do qual o indivíduo se
diferencia pela hierarquia e pelas suas relações pessoais – também exerce
influência negativa sobre os elementos do modelo proposto – liberdade de ação e
estrutura da organização – da mesma forma existindo uma dependência do líder
para inovar. A influência sobre a constituição das equipes também é encontrada de
forma negativa, pois a equipe com liberdade para desenvolver novos serviços é
basicamente composta por familiares.
A contraparte do Paternalismo é o Medo de errar (TANURE, 2007). Esta
característica também reforça a postura de espectador na gerência média, que evita
143
o conflito com a alta administração. Estas características da organização podem
exercer uma influência negativa nos elementos liberdade de ação e atitude perante o
risco. Podem também ser negativas com relação ao elemento de crescimento e
desenvolvimento do grupo, diferentemente do apresentado no referencial teórico.
Não se identificou que o medo de errar exerça influência sobre a perspectiva externa
da organização.
A Ambiguidade é apresentada no sentido de uma aceitação aparente das
normas e regras estabelecidas, mas com uma prática distorcida, apoiada em outros
procedimentos programados para burlar essas normas (TANURE, 2007). Supõe-se
que a Ambiguidade pode afetar de forma negativa os elementos relacionados à
confiança externa e interna, podendo afetar também os objetivos claros. Não foram
identificadas características de Ambiguidade no grupo de gestores, o que poderia
afetar estes elementos do modelo de McLaughlin, Bessant e Smart (2005). Mas,
através da observação direta, identificou-se, em algumas lojas, uma postura
diferente daquela estabelecida na missão de procurar atender à necessidade do
cliente, em que o atendente não recorreu a outras lojas para encontrar produto não
disponível na sua prateleira e estoque.
A Lealdade contribui para sedimentar a coesão social no Brasil, a qual é muito
marcada por este traço cultural (TANURE, 2007). Na avaliação do pesquisador, esta
característica pode contribuir de forma positiva para gerar a confiança externa e
interna, o que de fato parece ocorrer na organização no que diz respeito à confiança
do grupo gerencial nas decisões e competência do presidente.
Já a característica de Evitar conflito – relação entre pessoas, em situação de
desigualdade de poder -, segundo Tanure (2007), tende a criar um certo grau de
alienação, baixa motivação e capacidade de iniciativa e consequente passividade.
No caso analisado, percebe-se, pelo relato dos gerentes, uma aceitação do modelo
de gestão exercido pelo presidente, com isto, eles evitam apresentar mudança e
sugestões, desta forma, não entrando em conflito com o ponto de vista do
presidente.
A Flexibilidade, segundo Tanure (2007), representa uma categoria que pode
ser analisada sob dois enfoques: adaptabilidade e criatividade. A adaptabilidade é
uma capacidade criativa que se exercita dentro de limites pré-fixados. Este contorno
restritivo é consequência das regras e normas do subsistema institucional. Percebe-
144
se, na organização, a característica de adaptabilidade, reforçada pelo
posicionamento de aprendizado com os erros, refazendo e continuando em frente.
Por outro lado, a criatividade é essencial para a inovação. Ocorre,
fundamentalmente, em ambientes organizacionais onde há liberdade de expressão,
que não é o caso da organização. Analisando-se a organização, observa-se que a
adaptabilidade pode exercer influência de forma positiva na atitude do grupo perante
os riscos, já que, pelo processo de aprendizado com os erros, os riscos acabam por
ser minimizados. No entanto, como não se encontram traços de criatividade no
grupo de gerentes, pressupõe-se que, para ser criativo, de acordo com o modelo de
McLaughlin, Bessant e Smart (2005), é necessário um encorajamento por parte da
direção para que os gestores assumam riscos ao propor novas ideias, o que, na
prática, não ocorre.
Observa-se, então, que elementos da cultura brasileira, conforme definição de
Tanure (2007), exercem influência de forma positiva ou negativa nos temas, de
acordo com modelo proposto por McLaughlin, Bessant e Smart (2005) para
identificação dos tipos de inovação com base em Christensen (2003), segundo a
tipologia baseada nos arquétipos de Greenwood e Hinnings (1993) e baseado no
modelo de Schein (2004) sobre cultura organizacional.
Com isto, encerra-se o último nível de análise da pesquisa, que buscou
analisar a relação entre os elementos da cultura organizacional e os tipos de
inovação, permitindo a identificação dos temas presentes na organização
pesquisada, conforme o modelo proposto por McLaughlin, Bessant e Smart (2005),
como também a influência da cultura nacional nesses elementos.
Desta forma, pode-se identificar a relação entre cultura organizacional e as
inovações no modelo de gestão e prestação de serviços implementados na empresa
pesquisada e os elementos da cultura nacional que possuem alguma relação com os
tipos de inovação – incremental e radical – propostos pelos autores da área.
145
5 CONCLUSÕES
5.1 Introdução
Este capítulo tem por objetivos apresentar as conclusões desta dissertação,
com base na visão do pesquisador, e discutir suas implicações. Ele foi dividido em
partes, de forma a facilitar o entendimento e compreensão. A primeira apresenta os
principais resultados sobre a influência da cultura organizacional no processo de
inovação. Em seguida, discute-se o modelo de pesquisa utilizado para a análise do
caso e são feitas sugestões de melhoria do modelo com base na pesquisa realizada
na empresa. Por fim, são apresentadas as contribuições deste trabalho e sua
limitações, como também algumas sugestões que podem contribuir para pesquisas
futuras sobre os temas.
5.2 Resultados da pesquisa
Os objetivos desta dissertação foram identificar os elementos que compõem a
cultura da organização pesquisada e analisar a sua relação com os tipos de
inovação implementados na empresa, conforme modelo proposto por McLaughlin,
Bessant e Smart (2005).
Neste sentido, primeiramente, a empresa foi caracterizada e foram
identificados os elementos organizacionais e gerenciais que compõem a cultura da
mesma no item 4.2 - Descrição e análise da cultura organizacional da empresa
estudada.
146
Em seguida, as práticas que possam ser consideradas inovadoras – no seu
modelo de gestão e prestação de serviços – adotadas na empresa, foram
identificadas no item 4.3 - Descrição e análise dos tipos de inovação da empresa
estudada.
E, por último, a análise da relação entre a cultura organizacional e as
inovações no modelo de gestão e na prestação de serviços, tendo como referência
teórica o modelo proposto por McLaughlin, Bessant e Smart (2005), foi realizada no
item 4.4 - Elementos da cultura da organização e os tipos de inovação: análise desta
relação.
Esta pesquisa trouxe seis principais constatações sobre os temas cultura e
inovação. A primeira é que a cultura organizacional parece exercer realmente
influência no processo de inovação da empresa. Observa-se que características da
organização visualizadas através do padrão de apresentação visual de suas lojas,
vestuário e uniforme de seus colaboradores, e padrões de comportamento e
linguagem, remetem a esforços maiores no sentido de aperfeiçoamento e melhorias
nos produtos e serviços existentes, representando inovações do tipo incremental.
Da mesma forma, os valores fortemente presentes de encantar o cliente,
fazer bem feito e ter humildade também reforçam este posicionamento de constante
aperfeiçoamento, dando pouca liberdade para a criação de inovações do tipo radical.
A segunda constatação é de que a cultura brasileira também exerce alguma
influência na cultura da empresa e, consequentemente, também no processo de
inovação. Características como centralização do poder, paternalismo, medo de errar,
evitar conflitos, postura de espectador, típicas da cultura brasileira, segundo Tanure
(2007), influenciam de forma negativa no ambiente propício para o desenvolvimento
de inovações do tipo radical e estão presentes dentro da organização pesquisada.
Outra constatação importante, a terceira, é que as inovações não são
fomentadas por uma equipe de desenvolvimento na empresa, mas, sim, pelos
líderes e fundadores da organização, e têm sido assim ao longo de todos os anos de
sua existência. A empresa tem conseguido transpor gerações e passar por
processos de sucessão de maneira tranquila, que inovam de forma radical ou
incremental, e com isto dão continuidade e longevidade ao negócio, mas não
conseguiu, ao longo destes anos, disseminar uma cultura de inovação para os seus
colaboradores e gestores, e desta forma, criar uma equipe de desenvolvimento.
147
Como contribuições para pesquisa futura, poder-se-ia averiguar se esta
característica das inovações fomentadas pelo líderes e fundadores é comum em
outras organizações familiares e se ela influencia de forma negativa ou positiva nas
inovações.
A quarta constatação aponta para o fato de que a organização não tem e
nunca teve um processo sistematizado para lidar com as inovações; elas ocorrem de
forma intuitiva, através de características pessoais de seus líderes. Não há um fórum
para discussão de novas ideias e as ações adotadas para participação dos
colaboradores são incipientes. Mesmo assim, por meio de seu fundador e
sucessores, a empresa tem inovado ao longo dos anos e, na última gestão,
predominantemente de forma incremental. Ela tem obtido sucesso nas sua ações e
no seu posicionamento mercadológico, o que, de certa forma, contradiz os
resultados da pesquisa realizada por McLaughlin, Bessant e Smart (2005), que
destaca a importância das inovações do tipo radical para o sucesso e longevidade
das organizações.
Outra constatação importante, a quinta, demonstra que a empresa é voltada
para atender aos interesses da família, seja através da ação dos membros em
posições executivas, ou da criação de empresas satélites para atender aos
interesses deles. A empresa ainda proporciona, para aqueles que não têm
capacidade empreendedora, uma forma de subsistência através do aluguel de lojas
para a organização.
E a sexta e última constatação é de que o posicionamento da organização
não é estático. Ele se modificou ao longo dos anos, tendo características
diferenciadas nos seus estágios iniciais por meio de inovações radicais e foi se
consolidando ao longo dos anos através de processos de melhorias incrementais. O
crescimento hoje da organização parece ocorrer por meio de uma estratégia de
ocupação de territórios bem sucedida, que dificulta as ações da concorrência no
setor, e não propriamente de um modelo organizacional que fomenta e cria
constantemente inovações do tipo radical.
148
5.3 Modelo de pesquisa: proposta de melhoria
Considerando-se a pesquisa realizada e relacionando os temas cultura
organizacional e inovação, propõe-se uma revisão do modelo, acrescentando a
análise do papel do fundador ou líder, já que inegavelmente os líderes têm
importância na formação da cultura organizacional e nas inovações iniciais da
empresa (SCHEIN, 2004).
É importante analisar os elementos da cultura como artefatos, valores e
pressupostos básicos como questões de adaptação externa e integração interna, e
os tipos de inovação incremental e radical, para depois, através dos nove temas
propostos por McLaughlin, Bessant e Smart (2005), identificar a tendência da
organização em produzir inovações.
No entanto, em organizações familiares, onde a equipe de desenvolvimento
inexiste e são os líderes que inovam o modelo, é preciso suprimir, de sua análise,
temas como confiança interna do grupo de desenvolvimento em seus membros e
constituição das respectivas equipes, pois esses aspectos não serão identificados
neste tipo de empresa.
Outra proposta de melhoria do modelo é que o tema estrutura da
organização, proposto por McLaughlin, Bessant e Smart (2005) e adaptado pelo
pesquisador tem relação com a integração interna e não adaptação externa, porque
está relacionado ao estilo de gestão e recursos disponibilizados para o
desenvolvimento de novos produtos e serviços, que são características internas da
organização.
Desta forma, o modelo conceitual adaptado pelo pesquisador, considerando
questões de adaptação externa e integração interna, fica melhor representado
considerando-se a estrutura da organização como uma questão de integração
interna, conforme apresentado na FIG. 20 a seguir.
149
FIGURA 20 - Mapa das relações entre temas, baseado no modelo de Schein (2004) com a classificação de adaptação externa e integração interna Fonte: Elaborado pelo autor da dissertação.
Analisando-se os aspectos relacionados à cultura nacional, observa-se que a
flexibilidade talvez possa ser melhor analisada separando-se a criatividade e
adaptabilidade – duas de suas características -, pois a organização em questão
possui evidência de adaptabilidade, mas, poucos traços de criatividade, o primeiro
aspecto contribuindo positivamente para a sua atitude perante o risco e outro
negativamente. Já a ambiguidade não foi evidenciada na organização nas
entrevistas com os gestores e antigos funcionários, não tendo influência na análise e
nos elementos do modelo.
Outra consideração importante é que o tema crescimento e desenvolvimento
é influenciado de forma negativa pelo medo de errar, evitar conflito e postura de
espectador, cabendo, desta forma, também, uma revisão do modelo, a fim de
demonstrar a influência destas características culturais, conforme apresentado na
FIG. 21 a seguir.
150
FIGURA 21 - Mapa das relações entre temas, baseado no modelo de Schein (2004) com a influência do sistema cultural brasileiro, conforme Tanure (2007) Fonte: Elaborado pelo autor da dissertação.
Outro aspecto importante está relacionado com o fato de a empresa
desenvolver, de forma predominante, inovações do tipo incremental, na gestão de
Modesto Neto, e ter apresentado, durante este período, o maior crescimento e
resultados de toda a sua história. Isto não está de acordo com a visão de
McLaughlin, Bessant e Smart (2005), que preconizam a importância das inovações
do tipo radical para assegurar o crescimento e resultados das organizações. Esse
crescimento pode estar relacionado a especificidades do mercado brasileiro e suas
características de competitividade e expansão, que são bem diferentes do Reino
Unido, onde a pesquisa desses autores foi realizada.
Destaca-se, então, que a principal contribuição para o modelo está
relacionada com a dificuldade encontrada de pesquisar os temas propostos em
empresas familiares brasileiras que têm características inovadoras, mas não têm
equipes de desenvolvimento e, sim, são os fundadores e sucessores que inovam.
Assim, este elemento é crucial para o entendimento dos processos de inovação e
deve ser considerado na análise.
151
5.4 Contribuições, limitações e pesquisas futuras
Considera-se como a principal contribuição desta pesquisa a possibilidade de
que os resultados obtidos e o modelo conceitual desenvolvido possam contribuir
para o aprimoramento do conhecimento e para a compreensão das relações entre
os temas cultura organizacional e inovação, principalmente considerando os
aspectos relacionados à cultura brasileira e suas especificidades que impactam no
modelo de gestão das organizações nacionais.
Este estudo apresentou evidências de que a cultura organizacional influencia
no processo de inovação e que as características culturais apontam para a
tendência da organização em produzir determinado tipo de inovação. Demonstra-se
aqui que este posicionamento não é estático e pode ser manejado pelos líderes de
forma a influenciar no comportamento e mudança de atitudes das pessoas e, com
isto, obter os resultados desejados para a organização em termos de produção de
inovações, necessárias para a sua competitividade e longevidade.
Considera-se também que este estudo contribui para os pesquisadores dos
temas aprimorarem suas visões, principalmente relacionando os dois assuntos. Para
os profissionais e líderes da área de gestão e também envolvidos nos processos de
inovação, este trabalho permite a compreensão de que elementos culturais são
facilitadores ou dificultadores para o desenvolvimento das inovações, mas, quando
corretamente conhecidos e entendidos, podem ser gerenciados de forma a permitir
uma possível mudança cultural e os consequentes resultados almejados pela
organização.
Naturalmente, além das contribuições, a pesquisa também apresenta as suas
limitações. A principal delas está relacionada ao fato de ter sido realizado um estudo
de caso único, o que não permite generalização dos resultados. Outra limitação se
refere às pessoas entrevistas, indicadas pela alta administração, o que sem sombra
de dúvida, pode caracterizar apenas uma visão da organização e do seu modelo de
gestão.
Este caso permitiu um estudo em profundidade, principalmente considerando-
se o contexto histórico da organização, mas a organização possui limitações, pela
inexistência de uma equipe de pesquisa e desenvolvimento, e o contexto brasileiro
152
pode ter especificidades, conforme mencionado anteriormente, que merecem uma
investigação específica.
Um estudo de caso múltiplo permitiria comparações de hipóteses. Analisar
organizações em diferentes estágios de desenvolvimento, com outros tipos de
cultura e com presença ou não de equipes de desenvolvimento, poderia contribuir
para maior compreensão da relação entre cultura e inovação.
Seria também interessante a realização de um estudo quantitativo, com a
visão dos colaboradores da organização sobre os temas, estabelecendo indicadores
para os elementos do modelo conceitual, o que permitiria o entendimento, em maior
extensão, de características culturais e processos de inovação.
153
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APÊNDICE E ANEXO
Apêndice A – PESQUISA DE CAMPO – ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMIESTRUTURADO Pesquisa de Opinião Prezado(a) Senhor(a), O presente questionário tem por objetivo obter informações para uma pesquisa acadêmica. Sua participação é muito importante para o êxito desse trabalho. Cabe ressaltar que o sigilo das informações será plenamente preservado. Por sua especial colaboração, antecipo o mais sincero agradecimento! Nome do entrevistado: 1. Me fale um pouco da sua história com a Drogaria Araujo: a) Por que você optou por trabalhar na empresa? b) Como você via a empresa antes? E hoje? c) Você está satisfeito em trabalhar na Drogaria Araujo? Por quê? d) Pretende continuar na empresa por mais tempo? Por quê? 2. Na sua avaliação, quais são os valores que norteiam/predominam o comportamento e a cultura organizacional da Drogaria Araujo? 3. Como esses valores são difundidos? E como eles são reforçados? 4. Na sua opinião, esses valores sofreram alterações ao longo dos anos? a. Se sim, como? 5. Quais são os comportamentos profissionais exigidos dos empregados (conduta)? 6. No processo de seleção de funcionários, quais os critérios são mais valorizados? a) Há algum critério que valorize ou discrimine a crença religiosa? b) Vocês contratam parentes? 7. Como a empresa avalia os encontros informais (happy hour) e os relacionamentos de amizade e intimidade no local de trabalho? 8. Vocês admitem casais no ambiente de trabalho? 9. Quando há oportunidades de promoção, o que é levado em consideração?
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10. Quais são as políticas de recursos humanos que você considera diferenciadoras da empresa? 11. Existe valorização e premiação para ideias inovadoras e criativas dos empregados? Se sim, como? 12. Como são tomadas as decisões na empresa? a) Os gerentes participam nas tomadas de decisão? Se sim, como? b) E existe alguma forma de participação dos empregados no processo decisório da empresa? 13. Quais são as estratégias que a empresa utiliza para avaliar seus resultados? 14. E quais instrumentos utiliza para monitorar a concorrência? 15. Quando ocorre um problema na loja com um cliente, como isso é solucionado? (dê exemplos). E com o fornecedor? 16. Quais são os mecanismos e instrumentos que a empresa utiliza para se manter competitiva? 17. Gostaria que você me falasse sobre os eventos, as comemorações e cerimônias que acontecem na empresa. 18. Quais são as formas de premiação da empresa? Em que situações elas ocorrem? Como você gostaria que fossem? 19. Quais são as formas de punição da empresa? Em que situações elas ocorrem? Como você sugeriria que fosse? 20. O que realmente não é admitido na organização? Já aconteceu algum fato assim? 21. Existem histórias ou casos sobre a origem da empresa e seus fundadores e sucessores e que são sempre contadas? Se sim, quais? 22. Para você, quais são os símbolos visuais que a empresa utiliza para firmar a sua identidade e cultura? 23. Existem pessoas (vivas ou falecidas) que são valorizadas e admiradas dentro da organização e servem como modelo de comportamento? 24. Quais são as práticas da organização que você considera inovadoras? (explore incrementais e radicais) a) Como estas práticas foram e são desenvolvidas? b) Como elas são implementadas?
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c) Na sua avaliação, quem ou qual o setor incentiva o desenvolvimento dessas práticas? d) Fale como isso ocorreu ao longo da história da empresa. 25. Como é o processo de desenvolvimento de novos produtos e serviços? 26. E como é feito o planejamento para o lançamento de novos produtos? 27. Como é feito o planejamento de expansão da empresa? 28. Existem inovações que você classifica como organizacionais (ex. Estrutura, política de recursos humanos, processos internos)? 29. Existe algum tipo de acompanhamento de satisfação ou necessidades de cientes? 30. Você teria algum exemplo de ação adotada que resultou em fracasso? Como a empresa lidou com isso? 31. Gostaria de fazer mais algum comentário sobre o assunto abordado?
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Anexo 1 – REPRODUÇÃO DO ANÚNCIO DE 1927.