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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Sidney Gomes Campanhole Linguagem visual: percepção, cognição e suportes tecnológicos DOUTORADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA SÃO PAULO 2015

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC … Gomes... · organização da linguagem visual e a geração de sentidos, tanto na leitura como na produção. Na apreensão

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Sidney Gomes Campanhole

Linguagem visual: percepção, cognição e suportes tecnológicos

DOUTORADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA

SÃO PAULO

2015

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA – PUC

LINGUAGEM VISUAL: PERCEPÇÃO, COGNIÇÃO

E SUPORTES TECNOLÓGICOS.

Tese apresentada à Banca Examinadora da

Pontifícia Universidade Católica de São

Paulo, como exigência parcial para obtenção

do título de Doutor em Comunicação e

Semiótica, Área de Concentração: Signo e

significação nas Mídias, sob a orientação da

Profa. Dra. Maria Lúcia Santaella Braga

SÃO PAULO

2015

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SIDNEY GOMES CAMPANHOLE

LINGUAGEM VISUAL: PERCEPÇÃO, COGNIÇÃO

E SUPORTES TECNOLÓGICOS

Este trabalho foi julgado adequado à obtenção do grau de

Doutor em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia

Universidade Católica, na área de Signo e significação das

mídias.

São Paulo, _____ de _________________ de 2015.

____________________________________________

____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________

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DEDICATÓRIA

A minha Mãe Alzira,

...in memoriam do meu Pai Adriano e da querida Viviane .

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AGRADECIMENTOS

A Profa. Dra. Maria Lúcia Santaella Braga pela paciência e pelos rumos apontados.

A minha irmã, a minha família, a minha Iyá e amigos pelo constante apoio.

A Eunice Santos Lima pelas interlocuções e revisões.

Aos amigos, Elizabeth Domingos da Silva, Vera Lucia Domingos da Silva e Michel

Muller pela assessoria nas traduções.

Ao Sr. Rubens Micheloni pela abertura de caminhos.

A Comissão Central da Bolsa Mestrado da SEE-SP por reconhecer na Semiótica

embasamentos fundamentais para os processos de ensino-aprendizagem.

Aos professores e funcionários da EE Frei Paulo Luig e da Rede de Ensino da

Região Centro.

Aos profissionais da Diretoria de Ensino Centro.

Aos alunos colaboradores da EE Frei Paulo Luig.

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Existir é estar numa relação. É tomar um lugar

na infinita miríade das determinações do

Universo.

Charles Sanders Peirce

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RESUMO

Os sinais de falta de qualidade na rede de ensino pública, notados através de

pesquisas, sentidos nos discursos da mídia, compartilhados nas redes de internet e,

principalmente, quando deparamos com os cognoscentes dessa cultura de aprendizagem, não

podem ser creditados apenas à eficiência de professores, comportamento e realidade sociais

dos alunos ou instituições de ensino, mas urgem de uma necessidade de rever como os

processos de comunicação, produção de linguagem e os respectivos suportes, que nos

circundam, afetam comportamento cognitivo, neste caso, o visual.

O presente trabalho parte de um diagnóstico levantado sobre práticas de linguagem

visual no tocante a novos suportes tecnológicos, exatamente aqueles que constituem a

imagem por emissão direta da luz e redução do campo visual. A análise quantitativa e

qualitativa foi realizada sobre o material coletado e questionário-pesquisa junto de um grupo

de alunos da rede de ensino pública do Estado de São Paulo. A opção por essa amostragem

decorreu da constatação pré-estudo e in loco de um comportamento passivo na produção de

imagens, da predominância da função da linguagem narrativa como produto de práticas de

ensino aprendizagem, em detrimento dos esforços para a função argumentativa, justamente

quando o contexto educacional propõe a intertextualidade verbal-visual, a interpretação de

diagramas e arsenal fílmico para qualificar práticas de ensino. O percurso da pesquisa, após

diagnóstico seminal, seguiu da análise às bases orientadoras, leis, decretos e outros, sobre

ensino aprendizagem na rede estadual que, de algum modo, referenciam a visualidade e a

cognição. Para subsidiar o tratamento cientifico na compreensão desta problematização,

recorreu-se a conceitos da Filosofia de Peirce (semiose, hábito, percepção, memória, e as

categorias cenopitagóricas) por tratar-se de um fenômeno da linguagem e cognição, cujo

suporte epistemológico identifica, explica e projeta ações, quiçá, diagnósticas e prognósticas

na relação visualidade e suportes tecnológicos nas ações de aprendizagem. Para tanto, houve a

necessidade de delimitar a linguagem visual, com base nas categorias fenomenológicas para

extrair categorias e engendrar tópicos sintáticos e morfológicos inferidos pelo postulado da

Gestalt de Marx Wertheimer e os processos visuais estudados pelas Neurociências. Por fim, a

fase inicial foi retomada e verificada a conduta da cognição visual, expressa na produção de

linguagem visual da população de amostra. O método para diagnóstico foi questionário

pesquisa, com tratamento de dados sob o modo quantitativo e análise de potência de impacto

de variantes nas interpretações através de observação de conduta do grupo; apontou-se que

novos suportes da visualidade insistem no emprego de determinados tópicos da sintaxe visual,

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mobilizam estados de atenção e valoram exponencialmente a função narrativa, além de

gerarem comportamentos sociais como a socialização virtual em prejuízo do presencial.

Palavras chaves: Visualidade, imagem, linguagem visual, suportes visuais e cognição visual.

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ABSTRACT

The signs of lack of quality among the public education area, that can be noticed

through researches, shown by the media speech, shared among the social media and mostly

when we face people inserted in this area, it can't be credited to the teachers's efficiency, to

the student's social behavior and reality or to the teaching institutions, because it demands a

review of the communication processes, language production and their supports, that

surround us and affect the cognition behavior, case in point, the visual area.

This paper starts from studies on visual language pratices, regarding new technology

supports, exactly those that make images through direct light emission and the decrease of

the visual area. The quantitative and qualitative analysis was made through collected

material and questionaries presented to a group of students from the public teaching area in

the state of São Paulo. I chose this sample because of a pre-study and an in loco passive

image production behavior, because of the predominance of narrative language as a result of

teaching and learning pratices, regarding efforts on the argumentative function, specially

when the educational context suggests a relation between verbal and visual aspects, the

interpretation of diagrams and a filmic material, in order to qualify teaching practices. This

research, after diagnosises on a week basis, kept going on from the analysis to the orientation

bases, laws, acts and others, regarding teaching and learning in the state area that in a way

approaches the visual cognition. In order to support the theory approached during this paper,

it was used concepts from the Pieirce philosophy (semiose, hábito, percepção, memória, e as

categorias cenopitagóricas) because it regards language and cognition phenomenon, which

epistemological support identifies, explains and project actions, diagnostics and predictions

in the visualization relation and technological supports amoung learning actions. In order to

do so, it was necessary to create limits to the visual language, based on phenomenological

categories in order to extract categories and create syntatic and morphologic topics inferred

by Gestalt de Marx Wertheimer and the visual processes approached by the neuro science. In

a conclusion, the initial fase was reapproached and the visual cognition was checked,

expressed by the production of the visual language population sample. The method used to

the diagnosis was research questionary, processing data considering the quantitative mode

and power impact analysis of different forms of interpretation through the observation of the

group behavior; it was concluded that new visualization supports insist on applying certain

visual syntax topics, mobilize warning states and exponentialy value the narrative function

and create social behaviors such as the virtual socialization in comparison to the formal one.

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Key words: Visuality, image, visual language, visual support and visual cognition.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 13

CAPÍTULO 1- A VISUALIDADE NO CONTEXTO EDUCACIONAL ............................................ 19

1.1 - Documentos orientadores na estância federal ........................................................................... 20

1.2 - Documentos orientadores: estância estadual ............................................................................. 28

1.3 - O cotidiano escolar ................................................................................................................... 35

1.4 - Tecnologias: negação ou incorporação ..................................................................................... 42

1.5 - Uma síntese capitular ................................................................................................................ 45

CAPÍTULO 2 - COGNIÇÃO, COGNITIVISMO E FLUXO. ............................................................. 46

2.1- Cognição: apreensão, compreensão e autorreferência. .............................................................. 47

2.2 - Breve perspectiva científica sobre a cognição no século 20 ..................................................... 50

2.2.1 - Identificação de estruturas................................................................................................. 53

2.2.2 - O fluxo cognitivo ............................................................................................................... 54

2.2.3 - A tipologia do produto cognitivo ....................................................................................... 56

2.3 - A cognição e aprendizagem ...................................................................................................... 60

2.4 - A cognição visual ..................................................................................................................... 63

CAPITULO 3 – PRINCÍPIOS SEMIÓTICOS DA COGNIÇÃO ......................................................... 66

3.1 - A realidade do mundo ............................................................................................................... 68

3.2 - A teoria do signo ....................................................................................................................... 71

3.3 - Os tipos de raciocínio................................................................................................................ 73

3.4 - Questões sobre a cognição ........................................................................................................ 74

3.5 - Uma conclusão capitular ........................................................................................................... 81

CAPÍTULO 4 - LINGUAGEM VISUAL ............................................................................................. 85

4.1 - Evolução da visualidade ........................................................................................................... 85

4.2 - Visualidade e imagem ............................................................................................................... 91

4.2.1 - Dimensões: a emolduração ................................................................................................ 94

4.2.2 - A “fisicalização” da imagem ............................................................................................. 95

4.2.3 - A conduta percepto-cognitiva ............................................................................................ 96

4.3 - Expansão dos suportes .............................................................................................................. 96

4.4 - A linguagem Visual ................................................................................................................ 100

4.4.1 - Forma na visualidade ....................................................................................................... 106

4.4.2 - A sintaxe visual ................................................................................................................ 112

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4.4.3 – Intencionalidade Visual ................................................................................................... 130

CAPITULO 5 – COMPORTAMENTO COGNITIVO E VISUALIDADE ....................................... 132

5.1 - Cognição, mediação e suportes ............................................................................................... 133

5.2 - Comportamento cognitivo e âmbito escolar ........................................................................... 135

5.3 - Estudos do comportamento cognitivo ..................................................................................... 137

5.3.1 - Acompanhando o cotidiano escolar ................................................................................. 137

5.3.2–A realidade dos alunos ...................................................................................................... 143

5.4 – A imersão sob efeito da luz, dimensão e narração ................................................................. 151

CONCLUSÃO .................................................................................................................................... 154

REFERENCIAS .................................................................................................................................. 158

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INTRODUÇÃO

Este estudo, na sua primeira fase, partiu do diagnóstico de algumas práxis

educacionais que envolveram tratamentos da visualidade nos âmbitos da educação básica,

privada e pública e, paralelamente, no segmento universitário em cursos de graduação

(Design e Arquitetura)1 e pós-graduação (Design Gráfico)

2. Nesses contextos, foram

percebidos objetivos de aprendizagem direcionados à apreensão do objeto visual, a

organização da linguagem visual e a geração de sentidos, tanto na leitura como na produção.

Na apreensão do objeto visual, eram realizadas ações para desenvolver a

expressão visual: desenho de memória, desenho de observação, reorganização de formas

impressas ou digitalizadas e manipulação de cores. Nessas ações, no nível da Educação

Básica, parecia implícita a seus propositores a crença em um fenômeno natural de habilidades

possuídas por uns em detrimento de outros. Já nos cursos de graduação dependentes da

expressão visual, passava-se para a ideia de habilidade a ser devolvida, obviamente, dada a

necessidade de domínio da forma.

A organização da linguagem visual, ou seja, os elementos de uma possível

“gramática” visual eram praticamente ignorados, exceto na formação da graduação cuja

intensidade dependia da singularidade dos respectivos regentes de curso. Tal fato implicava a

redução de se reconhecer efeitos que, no segmento acadêmico, geralmente, eram indicados

por expressões “falta alguma coisa” ou “precisa limpar”, mas sempre sem a clareza dos

elementos geradores desses sentidos.

Por fim, as leituras, sustentadas na polissemia de sentidos da imagem, pendiam ao

exercício nominal com maior evidência, salvo os casos cujas representações não figurativas

eram traduzidas em sentimentos também verbalizados. A produção, na maioria das vezes,

estava sujeita ao domínio de criação de imagens, seja pelo manuseio das materialidades

(suportes, ferramentas e interferentes) ou na desenvoltura das habilidades viso-motoras.

A priori, na esfera da graduação, não se tratava apenas de uma lacuna curricular

singular de algumas instituições, respeitadas as devidas justificativas de cada uma, mas de

1Disciplinas ministradas entre no curso de Design e Arquitetura na Universidade Bandeirante (2008 a 2011) e

Universidade Anhanguera (2012). 2Disciplina ministrada desde 2010 no Curso de Pós Graduação em Design Gráfico do Centro Universitário

SENAC

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literatura direta e coesa3 sobre o conteúdo, da consciência do fato nos cursos de graduação

que envolvem a visualidade. Todavia, a graduação é um fluxo de aprendizagem em

continuidade que parte da educação básica, portanto essa anterioridade foi tomada como

epicentro para adentar a educação da visualidade.

Na educação básica, no segmento público, a visualidade é intrínseca a muitas

práticas de ensino: atividades de interpretação intertextual, na ilustração de conteúdos, nas

alegorias para exaltar alguns eventos, sempre na subordinação ao produto verbal, e no escopo

disciplinar dos conteúdos de Artes ainda resta o caráter de produção mais enfática numa

gramática própria, mas não tão consciente dessa existência. As expectativas de aprendizagem,

com absoluto foco na competência da leitura e da escritura, reduzem o fenômeno da

linguagem visual e, consequentemente, a especificidade de sua cognição.

Programas, cursos, orientações são propostos nas instituições públicas sempre na

preocupação do desenvolvimento da argumentação verbal, a tipologia dissertativa, nas

diversas variantes, e uma segunda, aliás, um fantasma da atual educação nacional, o ensino de

matemática que, para tais programas, também está sujeito à interpretação textual. Isso deve

ser fruto de pressupostos teóricos que partem da linguagem verbal nela mesma, ignorando

outras intersecções com níveis mais elementares do pensamento e concepções mais

interdisciplinares sobre a cognição e a linguagem.

Tal preocupação, aparentemente equivocada, deve implicar os insucessos dos

índices educacionais apontados nos diversos relatórios avaliativos da qualidade de ensino na

rede. No centro dessa situação, aparece a deficiência de aprendizagem, cujas possíveis causas

são levantadas e expressas de acordo com os seguintes pontos de vista: os métodos

empregados, docentes despreparados para um novo tipo de comportamento, descomprometido

do aluno, a política de aprovação e a superlotação das turmas. Não importam quais são as

visões, há um traço de convergência, apesar das abordagens diferenciadas: a presença das

tecnologias da comunicação no cotidiano do aluno, da escola, enfim, no âmbito cultural.

Estabeleceu-se, a partir disso, um paradigma: educar pela tecnologia ou para a tecnologia, que

parece facilmente definido tendo em vista o caráter formativo. Porém, a situação não é tão

simples! As tecnologias da comunicação são formas de linguagem em novos suportes,

veiculam saberes, assim como afetam a percepção de modos distintos, geram novas

3 A verificação de referencias bibliográficas significativas sobre a linguagem visual será retomada no capitulo

sobre o tema.

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possibilidades de apresentação da forma visual e respectivas organizações. Essas alterações

do suporte criam novas condutas, geram novos hábitos cognitivos.

Tendo isso em vista, este trabalho decidiu pesquisar os efeitos de novos suportes

para a visualidade e possíveis hábitos percept-cognitivos identificados empiricamente. Para

essa identificação, o percurso deste tema envolveu primeiramente uma observação de campo

com a finalidade de compreender as práticas do sujeito que está imerso na nova realidade

tecnológica, jovens entre 14 a 19 anos. Foram desconsideradas as faixas etárias que

antecedem e sequenciam, pois, para o primeiro caso, ainda estão em maturação as reflexões

mais abstratas e as faixas posteriores não estariam mais vinculadas ao âmbito de educação

básica. O intuito de observar práticas da visualidade desagua na proposição, que é objetivo

desta pesquisa, de revisão dessas práticas, o que pressupõe levantar conceitos teóricos que

possam iluminar as avaliações, como será visto no decorrer deste estudo. Isso para nós

constitui-se em fato imprescindível para ações primárias que pertencem à educação no nível

básico. Deste modo, a população de amostra incidiu sobre jovens estudantes da rede pública,

submetidos a um conjunto de ações com homogeneidade didática e abrangência massiva.

A rede de ensino pública, sob a jurisdição do estado de São Paulo, tem as

unidades escolares sob a coordenação de Diretorias Regionais de Ensino - DE. Cabe a estas

orientarem, acompanharem e promoverem a qualificação dessas unidades. As unidades

escolares sob a jurisdição das Diretorias de Ensino que representam a Grande São Paulo, dada

a condição da metrópole, são constituídas, do ponto de vista sociocultural, por grupos de

alunos mais heterogêneos em relação à rede que se estende pelo estado paulista. Assim, as

escolas desta região apresentam maior diversidade, que favorecem uma população de amostra

mais ampla em oposição à homogeneidade que ocorre em determinadas localidades, sujeita a

análises mais restritas. Este foi o primeiro critério para selecionar a população de amostragem,

a diversidade. O segundo foi uma unidade escolar que desenvolvesse as três modalidades de

ensino básico para compreender melhor a continuidade dos objetivos e práticas de

aprendizagem que envolvem a visualidade. Diante deste critério a seleção incidiu sobre o

grupo de jovens do ensino médio da EE Frei Paulo Luig pertencente à Diretoria regional

Centro.

Sobre essa escola: na classificação econômica da comunidade, de acordo com

documentos internos constitutivos do Projeto Político Pedagógico (PPP) há a dominância da

classe “C” na unidade escolar. É formada por procedências diversas, além dos paulistanos e

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alunos do interior do estado, da região sul, nordeste, outros estados da região sudeste e

bolivianos e descendentes. Possui um fluxo permanente que são alunos matriculados nas

séries inicias e estende-se até o ensino médio, assim como recebe indivíduos por mudança de

domicílio, transferidos de escolas particulares em decorrência de dificuldades financeiras e de

outras escolas públicas pelo crédito dos responsáveis na qualidade difundida entre a

comunidade escolar. Sob os olhos das avalições externas (melhor explicadas no primeiro

capítulo), a unidade escolar obteve índices abaixo das médias da unidade regional e estadual

para as modalidades de Ensino Fundamental nos anos iniciais, finais e Ensino Médio4.

No primeiro momento, que fundamentou o nosso diagnóstico; ocorreram diálogos

sistematizados com docentes, registro de atividades e levantamento qualitativo dos produtos

das atividades envolvendo a visualidade. Os diálogos-entrevistas foram realizados através de

ambiente online, no primeiro semestre de 2014, com profissionais exclusivos da unidade

escolar e outros da rede Diretoria Regional, totalizando trinta e três profissionais, sob o

critério de interesse de participação, após receberem o convite classificatório de perfil

necessário para a efetivação da entrevista. As perguntas tinham como objeto comparar as

experiências com tecnologias da comunicação presentes na vida dos docentes; na vida privada

e profissional, assim como detectar a presença da visualidade nas práticas pedagógicas. Na

sequência, as sínteses sob aspectos qualitativos foram extraídas de seminários de socialização

de produtos das escolas em nível regional (Diretoria de Ensino) e estadual (Secretaria de

Educação), ocorridos em 2013. Essa conexão unidade escolar, unidade regional e estado, foi

intencional para verificar o quanto a amostragem escola é representativa. Em 2014 e 2015, foi

realizada, através de pesquisa-questionário digital, uma nova análise, mais concisa e focada

no comportamento visual de quarenta e cincos alunos do Ensino Médio da referida escola. A

seleção se deu por resposta ao convite e ocorreu com acompanhamento presencial dos

entrevistados durante o processo. O objetivo deste instrumento foi verificar se há produção de

sentidos visuais em relação ao campo visual e apresentação sintática da composição. Os dados

foram interpretados sob aspecto indutivo de uma lei mais geral sobre a suscetibilidade dos

suportes na conduta cognitiva.

Simultaneamente, as pesquisas de referências veiculadas nas unidades nortearam

autores, bases epistemológicas a serem explicitadas nos capítulos que veem na sequência, e o

4 Para Ensino Fundamental anos iniciais : unidade escolar – 4,69, unidade regional – 4,91 e estadual 4,76. Para

Ensino Fundamental anos finais: unidade escolar –2,10, unidade regional – 2,44 e estadual 2,62. Para Ensino

Médio: unidade escolar – 1,34, unidade regional – 1,95 e estadual 1,93. Fonte: Boletim IDESP 2015 disponível

em http://idesp.edunet.sp.gov.br/arquivos2014/001521.pdf.

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material orientador: legislação, documentos formativos e informativos para docentes,

veiculados na rede através de impressos, material online e reuniões presenciais na Diretoria de

Ensino. Enquanto o primeiro grupo fortaleceu a compreensão científica do fenômeno, o

segundo trata de indicadores de como a visualidade é concebida na cultura de ensino-

aprendizagem.

O objeto da pesquisa, compreender o efeito cognitivo dos suportes visuais das

tecnologias de comunicação, estudados no âmbito ensino-aprendizagem do nível básico nas

escolas da rede de ensino pública, teve como meta revisar tratamentos dados à visualidade

desdobrada em mais dois níveis: a imagem e a linguagem visual. E neste aspecto, da

linguagem visual, precisam ser dados esclarecimentos para se entender o processo de ensino

aprendizagem que integra formas de comunicação sem se inclinar para a estrutura de uma

única forma, usando a mera concretude ou alegoria de conteúdos. O olhar proposto é singular

quando toma o comportamento palpável na conduta de leitura e produção da linguagem visual

para compreender o comportamento cognitivo mais amplo que os jovens apresentam e, de

modo profético, repensar a transição da escola pontuada nos saberes que potencializam

propriedades da cognição, instauradas na nossa mente.

Tendo isso em vista, o primeiro capítulo, de função diagnóstica, tem como meta

investigar a visualidade presente no âmbito escolar, apropriando-se da trajetória histórica na

análise de leis operativas para compreender as atuais práticas que ocorrem através de

observações sobre o segmento unidade escolar e regional. Nele se confirmam os julgamentos

abdutivos sobre as lacunas da educação visual que serviram de ponto de partida deste estudo.

Trata-se de uma denúncia ao tratamento nominal e desprovido de conteúdos gramaticais que

são próprios da imagem. O verbal se aperfeiçoa na relação oralidade com seu suporte escrito

regido por sistemas organizativos a serem apreendidos, e a visualidade é tomada como

pressuposta na velada ideia de condição inata do sujeito.

O segundo capítulo traz uma apresentação sintética sobre algumas referências à

cognição no século vinte. Assumida textualmente pela psicologia cognitiva e subsidiária para

o desenvolvimento da tecnologia e dos processos de ensino aprendizagem. O objetivo é

apresentar a cognição como fenômeno intrínseco à linguagem, percepção e memória. A rede

de ensino sofre de certos modismos, como afirma Vasconcelos (2013, p 176): “Não estamos

absolutamente criticando estas várias contribuições (até porque participamos pessoalmente de

algumas delas), mas a forma como frequentemente são jogadas à escola e aos educadores”.

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Fragmento de pensamentos e bases teóricas que permanecem ineficazes em decorrência do

desprendimento do todo ou por equívocos semânticos.

O terceiro capítulo, em consequência da presença do signo no cerne do fenômeno

cognitivo, sintetiza questões epistemológicas da Filosofia de Charles Sanders Peirce para

compreender a cognição como fenômeno mediado, não antropocêntrico, cujos signos e classes

de signo são níveis de apreensão do mundo. São formas de semiose que sustentarão a

revelação da gramática visual.

Enquanto o terceiro capítulo é o principal esteio teórico para a pesquisa, o quarto

capítulo, no papel de inventário da linguagem visual numa leitura constituída nas categorias

fenomenológicas, é fundamental para o objeto da pesquisa. Parte-se de relações

interdisciplinares para revelar categorias que fundam a linguagem visual: apresentação,

movência e integração. Não se pode falar de suportes de uma linguagem sem antes definir seu

campo gramatical. A visualidade, a imagem são fenômenos constitutivos da linguagem visual

que é revelada em momentos diferentes e contextos científicos diferentes. A sintaxe está para

os postulados da Gestalt, assim como os estudos no campo das Neurociências sobre o “olhar”

estão para a forma e o discurso nos engendramentos com outras formas de linguagem e níveis

de semioses.

No quinto capítulo são apresentados os dados levantados e analisados no decorrer

do acompanhamento das práticas de visualidade na unidade escolar e órgãos adjacentes. Esse

foi um período constituído de observação de documentos de orientação pedagógica e algumas

ações didáticas, reuniões com docentes para verificação de resultados e elaboração conjunta

de outras ações e aplicação de questionário-entrevista com docentes e discentes. O objetivo

foi confrontar a proposição escolar e a realidade discente, mediante os novos meios de

tecnologia da informação e da comunicação, com ênfase no desempenho dos suportes visuais.

Por fim, a cultura da visualidade, que abarca os discentes, estudada pela teoria do

signo, pela elucidação classificatório das categorias fenomenológicas de Peirce, sugere novas

condutas de aprendizagem que são discrepantes de modelos hoje praticados em âmbitos

escolares. Parecem indícios de uma nova ideia de aprendizagem, cujos saberes culturais são

consequência de habilidades cognitivas adquiridas. Não se trata de algo que surge sem

antecedentes, mas da condição epistemológica , neste caso da cognição visual, em decorrência

da sua gramática própria, articuladora de condutas e sentidos.

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CAPÍTULO 1- A VISUALIDADE NO CONTEXTO EDUCACIONAL

As práticas de ensino realizadas no âmbito da escola pública são articuladas de

duas maneiras: fluxo de orientações que partem dos órgãos de gestão pedagógica, que dadas

as necessidades plurais de gerenciar um processo em rede, massivo, não contempla situações

particulares; e formação do professor que tende a ser múltiplo em decorrência da

universidade em que realizou seus estudos. Tendo em vista que as leis do país (abordadas

mais à frente) instituem a liberdade de pensamento pedagógico e o nível estadual é parte do

todo, portanto, é uma instituição que tem uma corrente de pensamento para a respectiva rede

de ensino, não pode ser confundido como território gerenciado pedagogicamente à luz da

formação do professor. Assim, neste momento cabe um olhar sobre como a visualidade se

apresenta no decorrer da legislação e alguns documentos de orientação. Na sequência, a

constatação da visualidade inserida na realidade das práticas escolares na população de

amostra será bem-vinda para a contraposição entre a orientação e práticas.

O termo educação, derivado do latim educare, por sua vez ligado a educere, verbo

composto do prefixo ex (fora) + ducere (conduzir, levar), significa literalmente “conduzir para

fora”, isto é, ações externas sobre estruturas internas. Deste modo, as ações podem ser

estabelecidas de diversos modos, mas uma dicotomia é mais enfática: a não sistematizada,

volátil, e a sistematizada, guiada por alguma forma de controle, um método. Esta última seria

o modo mais plausível para as práticas que se dão no âmbito escolar.

No Brasil, os âmbitos escolares, privados ou públicos, estão sujeitos a mesma

ordem instituída por leis, documentos norteadores, dependentes do universo de valores e

crenças culturais, mas a diferenciação se dá na qualificação dos recursos humanos, na relação

entre pressupostos teóricos e condução de ações, no espaço físico, na quantidade de

educandos, entre outros. Cabe aos sistemas escolares públicos a responsabilidade da maioria

de alunos que se formam na Educação Básica e, pesquisas internacionais delegam ao país

péssima classificação, como exemplo a consultoria da Economist Intelligence Unit5 que

analisou habilidades cognitivas e desempenho escolar dos alunos em 40 países. O Brasil foi

classificado em penúltimo lugar em um ranking sobre a qualidade da educação. No último

relatório elaborado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a

5 É uma empresa de mídia vinculada a multinacional The Economist Group, sediada em Londres ,

Reino Unido, especializada em negócios internacionais e assuntos mundiais.

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20

Cultura (UNESCO, 2014), referente ao índice de desenvolvimento da Educação, realizado em

128 países, o Brasil surge na 88ª posição, atrás de alguns menos desenvolvidos como

Honduras (87ª), Equador(81ª), Bolívia(79ª) e bem mais distante de países adjacentes

como Argentina (38ª), Uruguai (39ª) e Chile(51ª).O documento revela que há por volta de

175 milhões de jovens em países de baixa renda, que equivale a cerca de um quarto da

juventude mundial, não sabem ler nada ou simplesmente lêem parte de uma sentença. Assim,

nota-se que a questão verbal escrita é um grande norte da qualificação do ensino-

aprendizagem no âmbito mundial, em que o Brasil é extensão desse pensamento. Assim, a

indagação sobre um ensino que também tem a ciência e a valoração da visualidade parece

comprometido na respectiva relevância.

1.1 - Documentos orientadores na estância federal

A partir da referência do universo legislativo como primeiro organizador da política

educacional e, obviamente, formado pelas ideologias culturais, a recuperação desse histórico é

importante para construir o desenvolvimento ou a ignorância de uma educação da visualidade.

O Brasil, desde 1824, teve sete Constituições (uma no Império e as demais na

República), porém a história da educação institucionalizada tem anterioridade às

constituições, mas foi o advento republicano que tornou público, gratuito e obrigatório o

ensino. A Lei de Diretrizes e Bases (LDB) é citada a partir da Constituição de 1934, ganhou

texto em 19616, foi revista em 1971

7 e, após a Constituição de 1988, assumiu o texto regente

em 19968.

Existe uma abertura interpretativa nos textos legislativos que permite certa distância

entre a enunciação das Leis e a constituição do currículo, cuja ultima LDB é mais incisiva em

defini-lo. Mas, desde o século 19 existiram preocupações com o ensino das formas visuais,

desatreladas das escolas de Artes e voltadas para uma formação integral do indivíduo,

conforme foi a preocupação de Rui Barbosa9:

Vai-se começando a encarar o desenho como ramo essencial da educação

geral em todos os graus, e, ainda, como a base de toda a educação técnica e

industrial. Vai-se percebendo que ele constitui uma coisa útil em todas as

6 Lei no 5.692, de 11 de agosto de 1971.

7 Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961

8 Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996

9 Rui Barbosa (1849-1923) foi um dos organizadores da República e coautor da constituição da Primeira

República juntamente com Prudente de Morais

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partes do trabalho e em todas as condições da vida; que é o melhor meio de

desenvolver a faculdade de observação, e produzir o gosto do belo nos

objetos da natureza e de arte, que é indispensável ao arquiteto, ao gravador,

ao desenhador, ao escultor, ao mecânico; que, em suma, dá à mão e ao olho

uma educação, de que todos têm necessidade. (BARBOSA, R. apud

AMARAL, 2010, p. 2)

Apesar da integração entre as metas da mão de obra requeridas pelo processo de

industrialização que se iniciava no país e a “educação estética”, o ensino do desenho técnico

dividiu espaço em menor escala com o desenho copista e seguiram como modelos únicos até a

normatização do ensino de Artes, que explora outras formas de expressão além da visual.

A LDB de 1961 trouxe como fatos que interessam a este estudo: a ausência de

orientações com vistas mais claras sobre o fenômeno de ensino aprendizagem, a diversidade

curricular e a ênfase nos estudos dos conteúdos linguísticos, históricos e literários, porém, um

vigésimo sexto artigo arbitrava que:

Art. 26. O ensino primário será ministrado, no mínimo, em quatro séries

anuais. Parágrafo único. Os sistemas de ensino poderão estender a sua

duração até seis anos, ampliando, nos dois últimos, os conhecimentos do

aluno e iniciando-o em técnicas de artes aplicadas, adequadas ao sexo e à

idade. (BRASIL, Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961)

Segundo Barbosa (1975), esse fato contribuiu para equalizar a relação entre a

Técnica e a Arte, pois o ensino do desenho geométrico estava instalado no currículo e, ao

coexistir com a Artes Aplicadas, reinaugurou um paradigma: o domínio técnico e a

exploração do ato criador. Até então, o ensino de Artes ocorria em segmentos fora de um

currículo orientado pelo Estado para a formação básica.10

O conceito de Artes Aplicadas

rendeu uma diversidade de trabalhos manuais, que sinteticamente restringiu a visualidade à

experiência de suportes, ferramental e interferentes, cuja eficiência das habilidades motoras

eram o limite exultado.

A LDB de 1971 trouxe no texto a preocupação com a cidadania, o objetivo do ensino

primário e segundo grau11

de preparar o aluno para o trabalho, intensificou a aprendizagem

da língua nacional, a preocupação com o núcleo comum curricular e, no sétimo artigo,

sancionou: “Será obrigatória a inclusão de Educação Moral e Cívica, Educação Física,

Educação Artística e Programas de Saúde nos currículos plenos dos estabelecimentos de lº e

10

Os Liceus de Artes e Ofícios mantidos pelo Estado tinham metas mais profissionalizantes. 11

Nomenclaturas atualizadas para Ensino Fundamental e Ensino Médio pela LDB de 1996

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2º graus, observado quanto à primeira o disposto no Decreto-Lei n. 369, de 12 de setembro de

1969.”(BRASIL, Lei no 5.692, de 11 de agosto de 1971).

A Educação Artística resgatou o estudo das formas de expressão da Arte: plástica,

cênica e musica12

. Tais mudanças de perspectivas exigiram uma variação de especializações

para os docentes, as licenciaturas para Música, Artes Cênicas, Plástica diferenciada de

Desenho, além da incorporação do saldo anterior de especialistas de Artes Aplicadas. Na

passagem dos anos oitenta para a década seguinte, a especialização de Artes Plásticas e

Desenho se esgotou entre si e surgiu a modalidade as Artes Visuais. Nesse ambiente de

ampliação dos conteúdos curriculares de Artes, Barbosa (1984) identificou práticas de arte-

educação e as denominou de Polivalência, Concêntrica e Alocêntrica. A Polivalência,

decorrente da formação em curto prazo para atender a demanda criada pela lei, gerou docentes

com domínio raso para manipulação de formas de linguagens distintas: plástica, teatro e

música, criando uma formação descartável. A questão concêntrica era caracterizada por

práticas que dialogavam com mais de uma das linguagens da Arte, mas verticalizavam em

apenas uma, enquanto que a Alocêntrica, respeitava a complexidade gramatical, histórica e

produtiva de cada forma de Arte, exigindo a parceria interdisciplinar entre docentes

específicos. Foi o período sob a influência de teóricos e estudiosos, tais como Viktor

Lowenfeld, Hebert Read, Robert Saunders, cujas pesquisas e ideias subsidiaram instituições

privadas de educação básica ou formação livre, que se estendiam desde os anos sessenta. A

grade curricular das escolas públicas foi criando divisas entre a Educação Artística e o

desenho Geométrico, duas maneiras embrionárias da visualidade: a primeira favorecendo com

fins expressivos e a segunda com intuito da lógica espacial.

No decorrer dos anos oitenta, para o objeto da visualidade no ambiente escolar,

mediante as inovações no Ensino de Arte, em grande destaque estava a proposta triangular13

defendida por Barbosa14

que deu maior expressão à preocupação com imagem artística, pois

segundo a arte-educadora, no ensino de Artes no Brasil predominava mais a questão do fazer

em detrimento da leitura.

12

O ensino da música já havia ocorrido no período Getúlio Vargas na modalidade do Canto Orfeônico. 13

Foi a primeira brasileira com doutorado em Arte educação (Universidade e Boston) e a manifestar a

preocupação do ensino de Arte em Museus. 14

A Proposta Triangular consiste em três abordagens para se construir conhecimentos em arte: a contextualização

histórica (conhecer), o fazer artístico (fazer) e a apreciação artística (fluir).

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Temos que alfabetizar para a Leitura da imagem. (diz:) Através da leitura

das obras de Artes Plásticas estaremos preparando a criança para a

decodificação, da gramática visual, da imagem fixa e, através da leitura do

cinema e da televisão, a preparemos paragramática da imagem em

movimento. (BARBOSA M 1991 p 34)

Faz-se necessário esclarecer que, no decorrer dessas perspectivas históricas das leis

da educação, existia uma indústria educacional evoluindo e produzindo materiais impressos,

livros, apostilas, que traziam reproduções de fotografias, ilustrações, gráficos, em menor

escala slides fotográficos, transparências para projetores, que abordavam objetos visuais, mas

não eram tratados na condição potencial da sintaxe visual.

A vigente LDB de 1996: organizou a educação brasileira em duas modalidades

Educação Básica e Superior, dividiu a Educação Básica em Educação Infantil, Ensino

Fundamental e Ensino Médio, fez usos dos termos competência e habilidades com vistas

semânticas correlacionadas com o desenvolvimento do ensino aprendizagem, a flexibilidade

de avanços nos anos ou séries da educação Básica, a progressão continuada, porém é bem

mais eficaz na preocupação em especificar conteúdos curriculares. Tais leis refletem a

ideologia das classes socialmente dominantes no nosso país e a consciência crescente de

inserção no contexto global, que envolvem enfaticamente a mão de obra para o mercado de

trabalho. Também é preciso salientar que essas Leis, quando criadas, trazem lacunas ou

revisões complementadas por legislação futura, ou seja, através de decretos, resoluções,

pareceres e medidas provisórias, mas não há a necessidade de estendermos a essas teias

legalistas.

De volta à visualidade, segue o levantamento das vezes em que se apresenta de modo

explícito ou implícito no texto da LDB de 1996, dada a sua vigência e sua originalidade de

orientar o currículo.

O segundo parágrafo do terceiro artigo, classificado na segunda titulação, “Dos

princípios e fins da educação nacional”, determina entre os princípios que o ensino será

ministrado que “[...]II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o

pensamento, a arte e o saber”(BRASIL, Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, grifo

nosso). Entende-se que a visualidade está explícita no que se refere a arte e também se trata

de forma de saber.

O primeiro e segundo parágrafos do vigésimo sexto artigo que retratam disposições

gerais da Educação Básica diz:

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[...]§ 1º Os currículos a que se refere o caput devem abranger,

obrigatoriamente, o estudo da língua portuguesa e da matemática, o

conhecimento do mundo físico e natural e da realidade social e política,

especialmente do Brasil.

§ 2º O ensino da arte, especialmente em suas expressões regionais,

constituirá componente curricular obrigatório nos diversos níveis da

educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos

alunos..(BRASIL, Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996)

Mais uma vez, o modo explícito está no termo Arte, mas será a sorte dos tratamentos

de objetos de aprendizagem no banco escolar que poderá demonstrar a existência de uma

preocupação com a visualidade. Ainda nesse mesmo artigo, o sexto parágrafo15

declara que o

ensino de Arte é obrigatório, a música, mas não como conteúdo exclusivo e, no oitavo

parágrafo16

, que devem ser exibidos filmes de produção nacional na condição de componente

curricular complementar integrado à proposta pedagógica da escola, cuja exibição obrigatória

por, no mínimo, duas horas mensais.

Ciente de que o ensino de Arte, frente às atuais concepções e a história da Arte-

educação no Brasil, envolve as modalidades visuais, cênicas, música e, a partir de então,

reclama a dança, tem destaque no último modo determinado pela lei: compreender a

visualidade como fato sempre subentendido, entretanto, a leitura de filmes, principalmente

nacionais, mas não se trata aí apenas da valoração da nossa cultura, mas uma preocupação em

fortalecer a indústria do entretenimento brasileiro. O exemplo de ações desenvolvidas após

2007, no segmento escolar público de São Paulo, em prol de formar um leitor de cinema,

indica essa possibilidade. A Cinemateca Brasileira17

desenvolveu projetos em parceria com a

Secretaria de Estadual de Educação de São Paulo observando a preocupação em formar um

público que estava em declínio, provavelmente por fatores como: o aumento de espaços de

exibição de filmes, tanto pela oferta de novos espaços (shoppings) como a reforma de que

dividiram salas maiores em mais espaços, porém menores, o que provocou,

consequentemente, a redução de telas; o mercado cinematográfico sofreu com a facilidade de

reprodução de filmes fora do cinema, seja pela venda oficial ou mercado irregular (pirataria) e

os recursos tecnológicos de reprodução de imagem com dimensões maiores da imagem e

melhoria na qualidade sonora destinados ao domicilio residencial. Mas, é inegável que a Lei

15

Parágrafo acrescido pela Lei nº 11.769, de 18/8/2008 16

Parágrafo acrescido pela Lei nº 13.010, de 26/6/2014 e retificado no DOU de 4/4/2014 17

. Trata-se da criação do Clube de Cinema de São Paulo, em 1940, que foi fechado pelo Estado Novo, foram

realizadas tentativas de reabertura e finalmente em 1984 foi incorporada ao governo federal como um órgão do

então Ministério de Educação e Cultura (MEC) e hoje está ligada à Secretaria do Audiovisual.

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traz a questão visual como conteúdo de aprendizagem, independente dos interesses

motivadores.

O trigésimo segundo artigo, que especifica o Ensino Fundamental, objetiva a formação

básica mediante:

[...] I - o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios

básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo;

II - a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da

tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade;

III - o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a

aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores;

(BRASIL, Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996)

Os termos leitura, escrita e cálculo não são redutíveis a certas disciplinas, porém,

a leitura associada à escrita, implica a valoração da forma verbal. Se adiantarmos a concepção

que será vista noutro capítulo, os três termos são encapsulados pelo fenômeno da linguagem,

a lógica é um extremo da própria linguagem.

Enquanto o primeiro item utiliza o verbo “desenvolver”, o segundo usa o

“compreender”, o que demonstra uma distinção de ordem processual. O indivíduo desenvolve

a linguagem para compreender o seu mundo físico, natural e cultural, porém a Arte, locada no

segundo item, parece enfraquecida no reconhecimento como fenômeno de linguagem,

portanto desfocada da condição desenvolvível e cognoscível para um sujeito em estado de

apreensão. Percebe-se a intenção de preparar um leitor de arte, o espectador, em detrimento

do produtor.

Outro dado destacável nesse parágrafo é a ideia de divisão dos conteúdos em

conhecimento, habilidades e formação de atitude e valores, que anunciam a influência dos

educadores que atuaram na reforma educacional da Espanha em prol da inserção desse país no

mercado europeu comum, entre eles Coll (1998) e Zaballa (1998) que também foram

consultores para a organização dos parâmetros curriculares brasileiros.

No trigésimo sexto parágrafo, que se refere às diretrizes do Ensino Médio, é

ressaltado que:

[...]I - destacará a educação tecnológica básica, a compreensão do

significado da ciência, das letras e das artes; o processo histórico de

transformação da sociedade e da cultura; a língua portuguesa como

instrumento de comunicação, acesso ao conhecimento e exercício da

cidadania;

[...]§1º Os conteúdos, as metodologias e as formas de avaliação serão

organizados de tal forma que ao final do ensino médio o educando

demonstre:

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I - domínio dos princípios científicos e tecnológicos que presidem a

produção moderna; II - conhecimento das formas contemporâneas de

linguagem; [...](BRASIL, Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996)

A língua é o epicentro do fenômeno da linguagem que a educação brasileira

valora e “o termo conhecimento” para as formas contemporâneas de linguagem parece

regredir na possibilidade operatória.

Tendo em vista que se trata do principal documento orientador das práticas

educacionais em nosso país, pode-se dizer que pelo conceito de linguagem subtende-se que as

formas verbais são a maior meta do desenvolvimento cognitivo e outras manifestações da

linguagem sempre estão na condição de expectador, de leitor, como a Arte, a música e os

audiovisuais.

A originalidade da atual LDB foi a preocupação com a definição curricular, assim,

foi criado o documento denominado Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) sob a

competência da União em estabelecer, em colaboração com estados, distrito federal e

municípios, diretrizes para os currículos e seus conteúdos mínimos, de modo a garantir uma

formação básica comum.

O termo “parâmetro” visa comunicar a ideia de que, ao mesmo tempo em

que se pressupõem e se respeitam as diversidades regionais, culturais,

políticas, existentes no país, se constroem referências nacionais que possam

dizer quais os “pontos comuns” que caracterizam o fenômeno educativo em

todas as regiões brasileiras. (BRASIL, 1998, p. 49)

O surgimento de um currículo, mínimo, plural e singular, desenhou o território das

disciplinas:

O termo “currículo”, por sua vez, assume vários significados em diferentes

contextos da pedagogia. Currículo pode significar, por exemplo, as matérias

constantes de um curso. Essa definição é a que foi adotada historicamente

pelo Ministério da Educação e do Desporto quando indicava quais as

disciplinas que deveriam constituir o ensino fundamental ou de diferentes

cursos do ensino médio. Currículo é um termo muitas vezes utilizado para se

referir a programas de conteúdos de cada disciplina. Mas, currículo pode

significar também a expressão de princípios e metas do projeto educativo,

que precisam ser flexíveis para promover discussões e reelaborações quando

realizado em sala de aula, pois é o professor que traduz os princípios

elencados em prática didática. Essa foi a concepção adotada nestes

Parâmetros Curriculares Nacionais. (ibid ,p 49)

O conjunto de textos desses parâmetros, com fins introdutórios e determinantes de

conteúdos, no tocante à visualidade, apresenta: como fato integrado as demais formas de

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linguagem no tratamento do objeto de conhecimento; a importância de novos suportes da

imagem como mediação de conteúdos (audiovisuais) e, mais restrito ao Ensino de Artes,

dividiu com a cultura da visualidade a metalinguagem visual. Ficou evidente o caráter

funcional e, somente, numa parcela o estudo da forma de linguagem.

Todas as linguagens trabalhadas pela escola, portanto, são por natureza

“interdisciplinares” com as demais áreas do currículo: é pela linguagem –

verbal, visual, sonora, matemática, corporal ou outra – que os conteúdos

curriculares se constituem em conhecimentos, isto é, significados que, ao

serem formalizados por alguma linguagem, tornam-se conscientes de si

mesmos e deliberados.(BRASIL, 2000, p. 77)

O caráter interdisciplinar ampliou as relações de intertextualidade e as formas de

texto, que ascendeu a importância das imagens nas práticas de ensino-aprendizagem, mas,

mesmo assim, os estudos sintáticos (quando ocorrem) ficaram confinados no currículo do

ensino de Artes. Este manteve as modalidades previstas na LDB de 1971, acrescidas

oficialmente da dança e do audiovisual. A indústria editorial também passou por mudanças

diagramáticas favorecendo a visualidade nos meios de organização e ilustração de conteúdos.

Os parâmetros desenharam os currículos não menos importantes e intrínsecos, a

metodologia também foi rascunhada implicitamente. Duas palavras que passaram a compor o

cotidiano das práticas educacionais: competências e habilidades, colaboraram para os

conteúdos enunciados por substantivos e, em menor escala, por adjetivos, fossem

apresentados por verbos, conforme observado na leitura de escrituração de planejamentos

escolares e documentos orientadores. As práticas deslocaram o acúmulo de informação

descontextualizada para situações operacionais.

O uso do termo competência, muitas vezes acrescido dos termos: social, intelectual e

cognitivo, denotam certa ideologia de sistemas de produtividade que requerem mão de obra

cada vez mais complexa, ou seja, a formação tem vistas a uma inserção ao mercado. A

palavra em si tem conotação de competir, logicamente, depende de uma comparação com

outro, nem que seja um indivíduo consigo mesmo, mas em tempos distintos, porém, o

celeuma conceitual foi instalado nos próprios documentos: “Não há receita, nem definição

única ou universal para as competências – qualificações humanas amplas, múltiplas que não

se excluem entre si – ou para a relação e a distinção entre competências e habilidades.”

(BRASIL, 2002, p. 12)

[...] Pode-se, de forma geral, conceber cada competência como um feixe ou

uma articulação coerente de habilidades. Tomando-as nessa perspectiva,

observe-se que a relação entre umas e outras não é de hierarquia. Também não

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se trata de gradação, o que implicaria considerar habilidade como uma

competência menor. Trata-se mais exatamente de abrangência, o que significa

ver habilidade como uma competência específica. Como metáfora, poder-se-ia

comparar competências e habilidades com as mãos e os dedos: as primeiras só

fazem sentido quando associadas às últimas. (ibid p.16)

A recursividade metafórica pode ser um índice da impotência de conceituação, que

para este estudo precisará ser resolvido no decorrer dos argumentos sobre a cognição. O

embasamento oferecido é uma flutuação na ausência de conhecimento coerente sobre

processos cognitivos, pois, além das formas de linguagem, anuncia a importância da memória,

tipos de memória em relação a natureza do estimulo perceptivo, enfim, elementos da

processualidade cognitiva que exigem dialogo mais extensos com as estudos sobre as aspectos

do signo e neurobiológicos da cognição.

Pode-se concluir que o conjunto dos documentos que constituem os parâmetros

foram sem dúvida a tomada de consciência da relação entre linguagem e cognição, que

mesmo quando se impõe a valorização da linguagem verbal nas grandes metas: competência

leitora e escritora, permitiu brechas para a revisão de dimensionamento das outras formas de

linguagem.

1.2 - Documentos orientadores: estância estadual

De acordo com a LDB, é responsabilidade dos estados membros da união a

responsabilidade do Ensino Fundamental e Ensino Médio, assim como, no terceiro item do

décimo artigo da constituição em voga, prevê que: “[É incumbência do estado] elaborar e

executar políticas e planos educacionais, em consonância com as diretrizes e planos nacionais

de educação, integrando e coordenando as suas ações e as dos seus Municípios.” A partir

desses princípios o Estado de São Paulo, pioneiramente, através da secretaria Estadual da

Educação passou a aplicar desde 1996 uma avaliação denominada SARESP (Sistema de

Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo) – com intuito de avaliar o Ensino

Básico na rede estadual. Esse sistema opera através de amostragem e vem aprimorando cada

vez mais a execução.

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Em 2007 sofreu uma reformulação para atender a realidade de processo avaliativo de

larga escala: passou a utilizar a metodologia dos exames nacionais (SAEB e Prova Brasil18

)

para equiparação de dados e a preocupação em estabelecer conteúdos mínimos para diminuir

as variantes de amostragem. As avaliações são: aplicadas em dois dias; avaliam conteúdos de

língua portuguesa e matemática de modo contextualizado e com proposições

interdisciplinares com as demais matérias; o grande volume de avaliações é com questões

objetivas, mas existe a minoria subjetiva para fins qualitativos; nas versões dos últimos anos

são aplicadas redações num grupo de amostragem; a cada ano são alternadas avaliações das

disciplinas de: história, geografia, ciências ou ciências da natureza (Química Física e

Biologia), estendem-se ao segmento municipal e opcionalmente ao privado e são aplicadas

nas séries ou anos finais de cada ciclo, mas alguns anos estendem-se as outras séries ou anos.

Através do documento Matrizes de referências para avaliação: documento Básico

(SÃO PAULO, 2009), foi estabelecido para o sistema de avaliação do SARESP o

engajamento de três aspectos: as habilidades cognitivas, conteúdos e competências cognitivas.

Os conteúdos são recortes do currículo, aparentemente se trata do universo conceitual, as

competências são formas de raciocínio e tomada de decisão, estruturadas sobre as habilidades,

que funcionam como indicadores do nível de aprendizagem dos proporcionado pela relação

conteúdos e competências. Infere-se que a as habilidades cognitivas são o meio por onde flui

a aprendizagem. São tangíveis e mensuráveis, indicadoras e descritoras do desempenho das

competências. As competências são modalidades estruturais da inteligência que permitem

verificar a proficiência da condição de reconhecer, relacionar e operar sobre o conteúdo

curricular. Enfim, são três aspectos intrínsecos (fig1)

Figura 1 - Critérios de avaliação do SARESP

Fonte: http://saresp.fde.sp.gov.br/2009/pdf/Saresp2008_MatrizRefAvaliacao

_DocBasico_Completo.pdf

18

SAEB é o primeiro sistema de avaliação da educação em escala nacional. Aplicado pela primeira vez em 1990

e foi reformulado em 1995, quando passou a permitir a comparação de resultados de diferentes edições.

Atualmente, o SAEB e a Prova Brasil participam da composição do Índice de Desenvolvimento da Educação

Básica (IDEB).

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Partindo deste principio, as competências foram classificadas três níveis e agruparam

as habilidades pertinentes: Grupo 1 – Esquemas presentativos, grupo 2 – Esquemas

procedimentais e Grupo 3 – Esquemas operatórios. (vide fig2) .

Figura 2- Distribuição das competências SARESP

Fonte: http://saresp.fde.sp.gov.br/2009/pdf/Saresp2008_MatrizRefAvaliacao

_DocBasico_Completo.pdf

Os próprios verbos que anunciam as habilidades são indicadores semânticos de outra

faceta, segue revista:

O Grupo I, Competências para observar, aludem aos esquemas presentativos ou

representativos, demonstrados por Jean Piaget: “Graças a eles, os alunos podem ler a prova,

em sua dupla condição: registrar perceptivamente o que está proposto nos textos, imagens,

tabelas ou quadros e interpretar este registro como informação que torna possível assimilara

questão e decidir sobre a alternativa que julgam mais correta.” (ibidem, p16). Seguem as

habilidades: observar para levantar dados, descobrir informações nos objetos,

acontecimentos, situações etc. e suas representações; identificar, reconhecer, indicar,

apontar, dentre diversos objetos, aquele que corresponde a um conceito ou a uma descrição;

identificar uma descrição que corresponde a um conceito ou às características típicas de

objetos, da fala, de diferentes tipos de texto; localizar um objeto, descrevendo sua posição ou

interpretando a descrição de sua localização, ou localizar uma informação em um texto;

descrever objetos, situações, fenômenos, acontecimentos etc., e interpretar as descrições

correspondentes; discriminar, estabelecer diferenciações entre objetos, situações e

fenômenos com diferentes níveis de semelhança; constatar alguma relação entre aspectos

observáveis do objeto, semelhanças e diferenças, constâncias em situações, fenômenos,

palavras, tipos de texto etc.; representar graficamente (por gestos, palavras, objetos,

desenhos, gráficos etc.) os objetos, situações, sequências, fenômenos, acontecimentos etc.;

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representar quantidades por meio de estratégias pessoais, de números e de palavras. Os grifos

enunciam a condição mais perceptiva do desempenho das habilidades, o contato mais

imediato com os objetos de aprendizagem em detrimento da mediação puramente verbal e as

possíveis decodificações, cuja visualidade propendera à ordem primária dos eventos.

O Grupo II, as Competências para realizar, são as habilidades pelas quais o aluno

realizar os procedimentos cogentes às suas escolhas de decisão. Seguem as habilidades:

classificar – organizar (separando) objetos, fatos, fenômenos, acontecimentos e suas

representações, de acordo com um critério único, incluindo subclasses em classes de maior

extensão; seriar – organizar objetos de acordo com suas diferenças, incluindo as relações de

transitividade; ordenar objetos, fatos, acontecimentos, representações, de acordo com um

critério; conservar algumas propriedades de objetos, figuras etc. quando o todo se modifica;

compor e decompor figuras, objetos, palavras, fenômenos ou acontecimentos em seus

fatores, elementos ou fases etc.; fazer antecipações sobre o resultado de experiências, sobre a

continuidade de acontecimentos e sobre o produto de experiências; calcular por estimativa a

grandeza ou a quantidade de objetos, o resultado de operações aritméticas etc.; medir,

utilizando procedimentos pessoais ou convencionais; interpretar, explicar o sentido que têm

para nós acontecimentos, resultados de experiências, dados, gráficos, tabelas, figuras,

desenhos, mapas, textos, descrições, poemas etc. e apreender este sentido para utilizá-lo na

solução de problemas. Os termos grifados explicitam a condição de relacionar representações,

sonoras, visuais, verbais, mas ainda conectada a certa imediaticidade do objeto de

aprendizagem.

O Grupo III, as Competências para compreender, provocam o uso de esquemas

operatórios com vistas ao pensamento mais sintético e abstrato, proposicional e combinatório,

obliterando para os níveis hipotéticos dedutivos do raciocínio. As habilidades propostas são:

analisar objetos, fatos, acontecimentos, situações, com base em princípios, padrões e valores;

aplicar relações já estabelecidas anteriormente ou conhecimentos já construídos a contextos e

situações diferentes; aplicar fatos e princípios a novas situações, para tomar decisões,

solucionar problemas, fazer prognósticos etc.; avaliar, isto é, emitir julgamentos de valor

referentes a acontecimentos, decisões, situações, grandezas, objetos, textos etc.; criticar,

analisar e julgar, com base em padrões e valores, opiniões, textos, situações, resultados de

experiências, soluções para situações-problema, diferentes posições assumidas diante de uma

situação etc.; explicar causas e efeitos de uma determinada sequência de acontecimentos;

apresentar conclusões a respeito de ideias, textos, acontecimentos, situações etc.; levantar

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suposições sobre as causas e efeitos de fenômenos, acontecimentos etc.; fazer prognósticos

com base em dados já obtidos sobre transformações em objetos, situações, acontecimentos,

fenômenos etc.; fazer generalizações (indutivas) a partir de leis ou de relações descobertas

ou estabelecidas em situações diferentes, isto é, estender de alguns para todos os casos

semelhantes; fazer generalizações (construtivas) fundamentadas ou referentes às operações

do sujeito, com produção de novas formas e de novos conteúdos; justificar acontecimentos,

resultados de experiências, opiniões, interpretações, decisões etc. É claro que os indicadores

semânticos da visualidade diminuem nesse segmento, cujo privilégio é o modo verbal.

Tendo em vista que é um documento orientador para o que deve ser avaliado19

,

consequentemente expressa o que deve ser ensinado. Não se trata mais de ensinar apenas

dados, fatos, conceitos, mas de formas de processá-los, entretanto a lacuna na constituição

desta tríade das competências está na falta de clareza na relação entre elas:

As competências relativas a esse Grupo III devem ser analisadas em duas

perspectivas. Primeiro, estão presentes e são mesmo essenciais às

competências cognitivas ou às operações mentais destacadas nos Grupos I e

II. Porém, quando referidas a eles, têm um lugar de meio ou condição, mas

não de fim. Ou seja, atuam de modo a possibilitar realizações via esquemas

procedimentais (Grupo II) ou leituras via esquemas de representação (Grupo

I). (SÃO PAULO, 2009 p.17)

A ideia de integração dos grupos predispõe o Grupo III, na condição velada da sua

natureza hipotética dedutiva, mediar as representações e as relações. Obviamente, se são

integrados influem sobre si, porém não na condição paralela-intersecionada, como é

argumentado, mas na relação de contiguidade conforme demonstração da figura 3:

Figura 3 - Comparação da integração das competências - SARESP

Modelo paralelo intersecionado Modelo contíguo

Interpretação do autor a partir do documento orientador. (SÃO PAULO , 2009)

19

É importante destacar ainda que muitas competências e habilidades indicadas na Proposta Curricular da SEE

SP não foram contempladas nas Matrizes por não serem passíveis de avaliação em instrumentos formais de

provas realizadas em larga escala, como é o Saresp

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33

O processo de qualquer aprendizagem se constituiu nos processos de representação,

portanto, as relações entre objetos de aprendizagem dependem das representações e inferência

hipotética das relações. Enquanto as matrizes de avaliações se resvalam na visualidade

implícita, que traduz de certo modo a condição do concreto para o abstrato, na política

educacional estadual, valora a insistências nas metas da competência leitora e escritora; a

normatizações através de leis e pareceres com ênfase para as disciplinas de língua portuguesa

e matemática, aliás, tão visíveis nos peso das grades curriculares, pois somadas correspondem

a 40% da grade das turmas do Ensino Fundamental – Anos Finais e 33% das grade das turmas

do Ensino Médio na carga horária de uma semana; nas propostas de recuperação de

conteúdos, entre outras.

A reformulação do SARESP, em 2007, trouxe a definição curricular, denominado

inicialmente de “Proposta Curricular” e mais atualmente de “Currículo”. Trata-se de um

conjunto de três edições: o documento base, o Caderno do Professor com orientações de ações

didáticas e o caderno do Aluno com atividades. Segundo a Secretaria Estadual de Educação,

era um material reivindicado pelos professores, para eles, docentes, foi recebido com críticas,

e em alguns casos a negação ao uso. Na realidade, trata-se de material necessário para atender

a avaliação massiva desejada pelo mecanismo do SARESP, que necessita de território em

comum - os conteúdos e de acordo com os Paramentos Curriculares Nacionais

O conflito gerado na implantação do Currículo, no tocante aos aplicadores, os

professores, decorreu da falta de compreensão por partes deles e da ideia de “currículo

mínimo”, que está sujeito à complementação. O “Caderno do Aluno”, que é o mais

consumível dos três, está organizado em tópicos denominados situações de aprendizagem, que

comparado ao livro didático, assume mais a aparência de um caderno de atividades, mas não

é, são situações de aprendizagem. O conflito, referente aos idealizadores, também tem sua

parcela de demérito, por alguns tratamentos de conteúdos elaborados fora da realidade da

escola pública, conforme constatado em entrevistas com professores da rede.

O material, no seu aspecto mais positivo, lida direto com conteúdos procedimentais,

habilidades cognitivas, que não são claras para a maioria dos atuantes na própria rede, mas

recupera proposição dos parâmetros e coloca as ações de ensino-aprendizagem frente a

questões bem contemporâneas: a fluência cognitiva.

É tangível a preocupação com a visualidade presente nesse novo âmbito escolar: as

diagramações dos “cadernos do Alunos” são proposições de design instrucional, a presença de

imagens ilustrativas e diagramáticas, a complementaridade com audiovisuais, mas a

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metalinguagem visual, quando não ignorada, fica circunscrita à disciplina de Arte. A

funcionalidade desse material tem a aplicação comprometida, pois, na discrepância de

opiniões entre organizadores e aplicadores, a falta de consciência destes últimos que a

condição pública do ensino não exclui da autoridade institucional de determinar métodos e

modelos pedagógicos.

Assim como os critérios de avaliação do SARESP revelam uma concepção do

processo cognitivo, o Currículo também revela a sua. Sustentado nas pesquisas de Zabala20

(1998), a organização do Caderno em Situações de Aprendizagem, também denominadas de

Sequências Didáticas, são uma das modalidades organizativas das quatro práticas

educacionais21

propostas pelo autor. Diferente da sequência de conteúdos, que regem ordem

mais linear dos saberes, referem-se “o que deve ser ensinado” a SD, o “como devem ser

ensinado”, refere-se ao percurso que o cognoscente executa para construir seu conhecimento.

Zabala acompanhou práticas educacionais relacionadas à tipologia dos conteúdos (conceitual

e factual, procedimental e atitudinal), as atividades desenvolvidas e os êxitos atingidos. Após

verificar as etapas percorridas nas atividades que atingiam maior expectativa de

aprendizagem, fundamentado nas zonas de desenvolvimento de aprendizagem do pensador

russo Vygotsky22

(1896-1934), retomou a ideia da sequência didática.

Na análise qualitativa realizada nos exemplares “Cadernos do Aluno”, distribuídos

no período letivo de 2014, foram identificados os seguintes recursos de tratamento dos

saberes: diagramas de conceitos, diagramas ilustrados, tabelas de dados, gráficos, mapas,

reproduções de obras de arte, ilustrações, fotografias e textos. Esses recursos podem ser

agrupados de acordo com a intenção de aprendizagem: os diagramas, as tabelas, os gráficos e

os mapas – relacionam ideias, são dados ou fatos na dependência de uma complementaridade;

as reproduções de arte, fotografias e textos dividem ora em apresentar uma situação, ora para

uma relação intertextual; e os textos têm como meta a síntese dos saberes, que funciona como

indicador do grau de apreensão. Com exceção dos textos verbais, a natureza visual predomina

nas outras formas de tratamento.

O Currículo proposto pela rede estadual, em consonância com os parâmetros

nacionais, reconhece a visualidade como aspecto dos processos de ensino-aprendizagem, mas

sempre na condição de atingir resultados processados na modalidade verbal da linguagem. O

20

Antoni Zabala é um educador espanhol que, igualmente a Cesar Coll, teve papel significativo na Reforma

Educacional da Espanha e influenciou ou assessorou países da América Latina. 21

As outras práticas são: projetos, atividades permanentes e situações independentes. 22

Lev Semenovitch Vygotsky precursor no conceito de que o desenvolvimento intelectual das crianças acontece

em função das interações sociais e condições de vida.

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espaço que a visualidade poderia ser estudada na estrutura como linguagem, o ensino de

Artes, continuou dividindo espaço com as demais formas de linguagem e se manteve muito

mais na leitura em detrimento da produção. A preparação do leitor é mais simpática a

ideologia do sistema educacional preocupado em modelar discentes na expectativa de

ascensão cultural espelhada nas culturas dominantes globais.

1.3 - O cotidiano escolar

Durante o período entre 2013-2014, acompanhando uma escola da rede pública, da

Região Centro de São Paulo, a Escola Estadual Frei Paulo Luig, e as respectivas reuniões de

formação dos gestores pedagógicos da mesma junto ao órgão Central, ficou evidente a

preocupação com dois aspectos do déficit de aprendizagem, um mais claro, demarcado pelas

expectativas de aprendizagem não atendidas, ou seja, os conteúdos definidos pelo Currículo, e

outro, menos palpável e visível para as equipes pedagógicas: a capacidade da retenção da

memória, os modos de raciocínio e as formas efetivas de organização do pensamento.

Segundo os fatos contabilizados ao longo desse acompanhamento, as expressões

proferidas sobre “o que os alunos não conseguiam fazer”, ou melhor, as competências

cognitivas: a interpretação de textos escritos, a interpretação de enunciados de matemática,

produzir letras legíveis para facilitar a compreensão ortográfica e semântico, a dificuldade de

estabelecer relações intertextuais (texto-texto, texto-imagem), a dificuldades na leitura de

gráficos e mapas, dificuldades de leitura e a organização de argumentos. Esse quadro anuncia

um vazio entre as orientações teórico-práticas e as expectativas alcançadas na rede de ensino

Obviamente, há uma lacuna entre as orientações teórico-práticas e as expectativas

não atingidas, que podem ser justificadas de modo imprudente na maneira como os docentes

agem ou nos discentes: na reorganização da estrutura familiar ou falta dela, na falta de

expectativa de ascensão social, na dispersão gerada pelas novas tecnologias móveis e

portáveis, etc. São fatores culturais, possivelmente temporais, que influem, mas não são

unicamente determinantes, aliás, os mais superficiais.

Destarte, se fecha a trilogia “O que se ensina” (o Currículo), “Como se ensina”

(metodologia, ação dos professores) e “Como se aprende” (o cognoscente), sendo que este

último é o território em que os processos cognitivos se efetivam e, portanto, a compreensão

dessa dimensão guia as metodologias. Assim, no período de convivência no cotidiano escolar,

o segundo foco foi no comportamento dos alunos. Um número mínimo, porém indicativo dos

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discentes somava as seguintes atitudes: literalmente dormiam em sala de aula, não estavam

organizados com materiais para registro de conteúdos ou realização de atividades,

manipulavam celulares ou similares, estavam com fones nos ouvidos e conversavam sobre

assuntos diferentes do tema da aula. O grupo de alunos, cujas expectativas de aprendizagem

não atendidas, encapsulava esse grupo que apresentava o comportamento descompromissado,

cuja totalidade configurava o cenário de desinteresse pela escola, uma situação que se

multiplica nos relatos de demais unidades. Tal situação não é uma realidade isolada da

unidade visitada, ou da rede pública da grande São Paulo, ou Estadual ou até mesmo nacional,

pois Willingham23

(2011), escreveu Why Don't Students Like School?, demonstra que é um

sintoma que se repete no contexto cultural estadunidense. O autor apresenta nove princípios

da mente, porém, não se trata de uma defesa ou crítica aos seus argumentos, mas de relevar o

sintoma que evidencia. Numa rápida incursão, as hipóteses sobre as causas do desinteresse

escolar propostas por Willingham (ibidem), podem ser agrupadas em: as estruturas existentes

- predisposição do pensamento a reconhecer em detrimento do refletir; o modo processual – a

memória como resíduo do pensamento, a precedência do conhecimento factual (conceitual)

sobre as habilidades, a acomodação da cognição em cognições anteriores, a facilidade do

conhecimento concreto sobre o abstrato; e o modo final - a necessidade de adquirir

proficiência pela prática; a condição das diferenças individuais da inteligência serem

modificadas através de trabalho esforçado e continuado e meta de ensinar, como habilidade

cognitiva complexa, tem que ser exercitada de modo a poder ser melhorada.

A proposta de Willingham a princípio - um diálogo horizontal entre fatos

relacionados a aprendizagem de alunos e com fins justificados em melhorar a prática dos

professores, através de conceitos que, para ele, a psicologia cognitiva estuda isoladamente

enquanto nos bancos escolares se apresentam simultaneamente - demonstra comportamentos

presentes na realidade da rede pública, pois os adolescentes precisam de estratégias

perceptivas e motivacionais para desenvolverem foco de atenção; mais apreendem,

reconhecem, relatam, do que sistematizam e sintetizam; apresentam dificuldade de

memorização que comprometem os saberes e operam com o concreto em dois aspectos

“objetos cognitivos visualizáveis” e ou “experiências aqui e agora”, ou seja, experiências

vivenciadas e não mediadas pela oralidade de outro.

23

Aniel T. Willingham é psicólogo da Universidade de Virginia, onde leciona no Departamento de Psicologia. A

pesquisa de Willingham incide sobre a aplicação das conclusões da psicologia cognitiva e neurociência na

educação.

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37

A classificação ternária sobreposta aos princípios de Willinghan é a arquitetura dos

percursos cognitivos: a estrutura pré-existente; o meio, a forma, o modo que leva a estrutura

se transformar e a finalidade que se estabelece, ou seja, o sujeito, a mediação do objeto e

produto. Entretanto, os princípios que vêm sustentando desde o fim da década de oitenta até

as atuais práticas da rede, decorrem das extensões do pensamento de Jean Piaget, Lev

Vygotsky, denominadas de Construtivismo, Sócio Construtivismo, Interacionismo e

Construtivismo Interacionista, e David Ausubel com a concepção da Aprendizagem

significativa, embora, nem todos os responsáveis da rede pela gerência desses princípios na

efetivação da aprendizagem dominem tal conhecimento, conforme constatado no

acompanhamento da mesma, reconhecem a linguagem como mediadora, mas não oferecem

maior compreensão do fenômeno.

A relevância da linguagem está no cerne desses pensamentos, tanto como espelho de

desenvolvimento, como expectativa de proficiência a ser atingida, todavia, a linguagem verbal

é o aspecto relevante, principalmente, na questão da proficiência. Outro traço comum é a

natureza da interação do ambiente com os processos cognitivos e o estudo centrado nas

estruturas perceptivas, cognitivas e mentais do cognoscente. Por outro lado, há outro aspecto a

ser compreendido: a linguagem como fenômeno independente, passível de apreensão e de

sentidos possíveis. Os indícios apontam para a linguagem como espécie de ponto nevrálgico

da aprendizagem, porém o subsidio teórico, pelos menos da rede, parece ignorar a extensão da

relação fenomenal da cognição-linguagem. Neste sentido, a recuperação de uma teoria

semiótica é necessária para o entendimento do tema desta pesquisa: cognição e visualidade,

que será objeto de outro capítulo.

Para uma compreensão mais vertical, foram copiladas as atividades que ocorreram

nessa unidade escolar entre a transição semestral 2013 e 2014. A escolha pelo período de

transição foi na intenção de reconhecer se havia mudanças pela troca de professores na virada

do ano letivo, pois é uma realidade das escolas publicas. Nesta unidade, foi registrado apenas

26% de mudança no quadro de profissionais e somados os resultados entre os anos não houve

alteração nos dados que serão tabelados mais adiante. Partindo da análise das proposições de

aulas que envolviam o uso da imagem, foi registrado um universo de itens para todo o

segmento. Foi considerado o uso de imagem em qualquer atividade que se apresentava

significativa para apreensão de determinado objeto de conhecimento, excluindo situações

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38

experimentais concretas por envolverem imagens “naturais”24

, percepção de diagramação de

mídias impressas para acessar a imersão na leitura e imagens na condição alegórica para

ambientação temática da sala de aula. Também, foi diferenciado se a abordagem era um ato

de leitura da imagem ou de outro autor ou produção de imagem, pois evocam relações

cognitivas distintas. Entre os temas que se apresentaram existiu uma predisposição natural

entre aqueles que atendem a leitura e os que atendem a produção, portanto, não teriam como

se efetivar. Seguem os temas definidos na análise: atividades envolvendo técnicas de

animação em suportes digitais; audiovisual montados a partir do PowerPoint; filmes; colagem

de imagens impressas, composições com sucata, desenhos livres e temáticos, diagramas e

gráficos25

, imagens publicitárias e ilustração de texto informativo ou literário, obras de artes

visuais bidimensionais, história em quadrinhos e maquetes. A relação proporcional entre a

amostragem da unidade escolar e a rede estadual é sujeita a uma intermitência de variações,

portanto, para diminuir essa lacuna na sequência foi comparado às socializações de produtos

que ocorreram em amostras de práticas exitosas de âmbito regional26

e estadual27

.

Seguem as tabelas demonstrativas enunciando apenas a ocorrência “não quantitativa”

do evento para cada item levantado a partir da somatória de atividades comum aos dois

segmentos: Ensino Fundamental me Ensino Médio.

Tabela 1 - Atividades observadas no Ensino Fundamental Anos Iniciais

24

Conceito a ser apresentado no capitulo 3. 25

O gráfico também é um raciocínio diagramático, mas para atender o discurso predominante no senso comum

da rede de ensino foi diferenciado. 26

Foram dois eventos ocorridos nas dependências Diretoria de Ensino Região Centro-SEESP (São Paulo) em

20/08/13 – “Seminário Descentralizado: Melhor Gestão, Melhor Ensino”, e em 10/12/2014 o “I Seminário de

Boas Práticas – Uma Escola para todos”. 27

A SEE-SP criou em 2013 o Projeto “MGME - Melhor gestão, melhor ensino”. Foi um curso semipresencial

para gestores que culminou com a socialização de práticas exitosas a partir do Currículo na cidade de Serra

Negra (São Paulo).

Item Leitura Produção

ocorrência. disciplina ocorrência. disciplina

Animação digital - - - -

Audiovisual ( com fotos) x História

Audiovisual (filme) x Português - -

Colagem - - x Artes

Composição com sucata - - x Artes

Desenho livre - - x Artes

Desenho temático - - x Artes

Diagramas - - - -

Gráficos x Matemática - -

Imagens publicitárias x Português

História em quadrinhos x Português x Artes

Ilustração de texto

informativo-literário

- - x Português

Maquetes - - x Ciências

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39

Esse segmento, constituído de crianças de seis a dez anos de idade, distribuídas

entre doze turmas, as atividades são realizadas pelos professores polivalentes (formação em

pedagogia) e especialistas nas disciplinas de Artes e Educação Física. É evidente o ensino de

Artes na produção de imagem, provável consequência de um sistema de orientação que é

incisivo na produção de linguagem na forma verbal. Em contraponto na leitura, a imagem é

usada mais proeminente em decorrência da apresentação mais concreta do objeto de

conhecimento.

Tabela 2 - Atividades observadas no Ensino Fundamental Anos Finais

Neste seguimento, formado por turmas, com adolescentes entre onze a dezessete

anos, houve maior equilíbrio entre a presença da imagem para leitura e produção, porém,

manteve o ensino de Artes na função mais produtiva, semelhante aos anos iniciais.

Tabela 3 - Atividades observadas no Ensino Médio

Obras de arte x Artes x Artes

Item Leitura Produção

ocorrência disciplina ocorrência disciplina

Animação digital - - x Artes

Audiovisual ( com fotos) x História, geografia e

Ciências

x Ciências

Audiovisual (filme) x Português, História,

Geografia, Artes

- -

Colagem - - x Artes

Composição com sucata - - - -

Desenho livre - - x Artes

Desenho temático - - x Artes

Diagramas - Ciências - -

Gráficos x Matemática, Geografia,

Ciências.

- -

Imagens publicitárias x Português, Inglês

História em quadrinhos - - x Português, Artes

Ilustração de texto

informativo

- - - -

Maquetes - - x História e Ciências

Obras de Arte x Artes x Artes

Item Leitura Produção

Ocorrência Disciplina Ocorrência Disciplina

Animação digital x História

Audiovisual ( com fotos) x Hist. Geo. Port. Ingl.

Filo.

x Bio, Hist. Filo. Geo.

Audiovisual (filme) x Hist. Port. Ingl. Filo.

Colagem - - x Artes

Composição com sucata - - - -

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Nesta modalidade de ensino, constituída por seis turmas do período matutino, com

jovens de quatorze a dezenove anos, manteve-se mais próximo dos anos finais e bem mais

distantes da realidade dos anos iniciais. Tendo em vista que não está sendo levada em questão

a quantidade de vezes que as ocorrências aconteceram, mas o modo que a imagem entrar na

prática pedagógica dessa escola, é sensível a percepção do crescimento do uso da imagem na

leitura sobre a produção. Será que este fato é passível de preocupação para estudos sobre a

cognição da visualidade? Para tanto, urge de um aprofundamento nos registros das atividades

do Ensino Médio.

A produção de imagens, por sua vez, teve como intenção de aprendizagem, na maior

parte das atividades, a síntese e/ou ilustração de conteúdos, algo similar ao resumo textual, e,

em menor escala, a releitura de um conteúdo, apresentação de um conteúdo estudado

extraclasse e exercício de expressão. Em nenhum dos casos de produção de imagem foi

constatada a preocupação com orientações sobre os suportes, além de alguma sugestão

material, e uma possível gramática da visualidade. É inevitável o paradoxo, é como um aluno

que lê um texto e ao pedir para comentá-lo, nada consegue expressar, pois não entendeu! Os

intentos incansáveis dos objetivos educacionais em extrair argumentos, síntese, sob o modo

verbal da linguagem, assim como localizá-la exclusivamente na base de todo e qualquer

processo de aprendizagem, parecem contribuir para maior ineficácia da exploração da

visualidade. A imagem assume um papel apresentativo para tradução simbólica-nominal,

cujas mediações que se interpolam essa passagem ficam exauridas, quando degeneradas

dificultam os argumentos.

A priori, a condição de naturalidade da imagem não é diferente da oralidade, mas

ambas estão sob algum tipo de organização e modos de representação que as diferenciam, e

dependem de suportes naturais, mentais e reprodutores, entretanto, pelos menos no contexto

Desenho livre - - - -

Desenho temático - - x Artes

Diagramas x Bio. Geo. Hist. - -

Gráficos x Mat. Bio. Geo. - -

Imagens publicitárias x Port. x X

História em quadrinhos - - - -

Ilustração de texto

informativo

- - - -

Maquetes - - x Geo. Bio

Obras de Arte x Artes x Artes

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atual, a oralidade é aperfeiçoada através do seu suporte gráfico (a escrita), mas a visualidade

fica na condição inativa do individuo, pelo menos na prática escolar em questão.

A Secretaria Estadual da Educação reuniu em 2013, seiscentos e trinta profissionais

da educação, entre gestores, professores de matemática e português para um Simpósio sobre

práticas exitosas desenvolvidas em decorrência do curso “MGME- Melhor gestão, melhor

ensino”, direcionado a qualificar as unidades escolares. Este encontro foi precedido por outro,

em âmbito regional, nas respectivas Diretorias de Ensino28

.

Foi objetivado na gestão escolar e no processo de ensino de aprendizagem de língua

portuguesa e de matemática. O intuito era melhorar o desempenho dos alunos dos anos finais

do Ensino Fundamental nessas duas áreas do conhecimento que, para os gestores da educação

pública estadual, são a base para aprendizagem das demais disciplinas e, para esse estudo, se

trata de absoluta reducionismo da linguagem e da lógica, que terminam por extensões de uma

fenômeno: a semiose.

A própria sistematização do evento, apresentação de uma prática, impôs um registro

visual do processo que não pode ser confundido com a presença da imagem no processo de

ensino aprendizagem. Por exemplo, as atividades de cunho mais cênico. Nos resultados deste

evento mediante a: extensão, o controle de registro e o foco na questão da visualidade, foi

observada a visualidade: como mera ilustração, alegórica; como forma concreta de

apresentação dos conteúdos e, em algumas atividades, como caráter puramente expressivo.

Redundando: as sínteses qualitativas indicaram orientações sem a menor

preocupação em compreender a sintaxe própria de algumas formatações como a história em

quadrinhos ou filmes, assim, como técnicas sobre materialidade, no caso das maquetes e

protótipos, que, na transição de demanda de alunos, pouco muda nos resultados plásticos. São

sintomas da cultura de ensino-aprendizagem centrada na competência leitora e produtora de

linguagem verbal. Não há avanço, pois não reconhecem claramente a gramática articuladora

de cada forma de linguagem, exceto a verbal. No decorrer da aprendizagem organizada em

série, há linearidade para a linguagem verbal, enfaticamente no suporte que a escrita

representa para a oralidade, tornando-a cada vez mais complexa: parte da alfabetização a

apropriação das intenções de descrição, narração e argumentação. Enquanto a linguagem

visual, percebida na maioria das vezes na condição “apresentativa” da imagem, fica restrita às

28

No caso da Diretoria de Ensino envolvida participaram 63 escolas sob sua jurisdição.

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habilidades daqueles que desenvolveram sem auxílio de processos sistematizados na

competência para produzi-las ou a evocação nominal das representações. Isto é o que a nossa

educação oferece em termos de linguagem visual!

Esta é uma condição do sistema educacional público sobre o sujeito cognitivo. De

um lado, temos documentos norteadores, projetos de aprimoramento, reconhecimento de

práticas exitosas, práticas repetitivas, práticas inovadoras aos olhos dos gerenciadores do

ensino-aprendizagem e, do outro, um sujeito pertencente ao universo cultural, cujo âmbito

escolar é apenas fração de espaço-tempo do todo que o envolve. O dialogo não pode ser

apenas aberto entre gerenciadores e a realidade imediata do sujeito, como se tem proposto nas

unidades escolares, mas na realidade cultural, neste caso da visualidade, que engloba todos.

1.4 - Tecnologias: negação ou incorporação

O uso do Celular no espaço escolar é um exemplo do confronto de ações: quem

proíbe e quem insiste em usar, mas, atualmente, surge uma intenção mediadora representada

por educadores mais aptos à tecnologia.

No estado de São Paulo, em 2007, foi promulgada a Lei n° 12.730, seguida do

decreto 52.625, em 2008 que regulamentam o uso do celular durante o horário das aulas. Na

contramão, o caderno do aluno, posterior a essas datas, trazia atividades que envolvia o uso do

celular para captação de imagem e, nos últimos anos, se multiplicam a divulgação de práticas

favorecendo a incorporação do celular como ferramenta de aprendizagem devido a diversas

funções que foram inseridas: ouvir músicas, gravar imagens em movimento, fotografar,

conexões simultâneas, etc. Durante o acompanhamento na rede, 2013-2014, foram registrados

que os docentes lamentaram o fato de os alunos ficaram mais dispersos durante as aulas, não

atendem a solicitação para desativarem o aparelho e usam para diversos fins: registros das

mais diversas intenções - condutas de professores na sala de aula, situações promiscuas,

brigas reais ou encenadas; entretenimento – jogos, ouvir musicas e conectivo – diálogos com

colegas e pesquisa na internet, sendo que este último depende do acesso à internet no

ambiente escolar, cuja rede pública é muito rudimentar ou nula. Esse contexto ilustra o

conflito entre nativos na tecnologia, denominação dada por Marc Prensky (apud PALFREY

2011) e os imigrantes digitais, alunos e professores, que não estão circunscritos apenas aos

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celulares e suas variantes, mas a todas as novas tecnologias, que são produtos da própria

cultura e engendram novos comportamentos. A ausência de maior domínio dos recursos

aplicativos se interpõe entre alunos e professores, dificultando aproveitamento de novos

suportes da linguagem e os respectivos desdobramentos: processos cognitivos.

Para verificar melhor esse indício, foi aplicado, no segundo semestre de 2014, uma –

entrevista-questionário, via online através da plataforma Surveymonkey, entre duas

amostragens: professores da rede de ensino que atuam na jurisdição da Diretoria de Ensino

Região Centro e alunos da Escola Estadual Frei Paulo Luig, que pertence a mesma diretoria

de ensino. O intuito foi espelhar o comportamento frente às novas tecnologias da informação

e comunicação. Na pesquisa, a área de formação acadêmica foi bem heterogênea e cerca de

32% dos docentes eram formados anterior a 1996, 29% entre 1996 a 2005, ou seja, numa

geração distinta dos atuais nativos, entretanto o perfil tecnológico não estava muito distante

do grupo de discentes. Conforme demonstra a tabela (4) abaixo, os domínios dos recursos que

favorecem a forma verbal são vultuosos, seguidos da forma visual e a sonoridade esta no

contraponto dos menores domínios.

Tabela 4- Relações do grupo de discentes com a tecnologia

Ao serem investigadas sobre os suportes de linguagem que utilizam nas práticas de

sala de aula (tabela 5), aquelas que denotam o uso da forma verbal prevaleceram: como os

impressos e o giz e lousa, etc. Apesar da proximidade entre o domínio tecnológico e a prática

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em sala de aulas valorarem o sistema verbal, há a realidade dos recursos e espaços

educacionais disponíveis na rede. As escolas são providas de suportes digitais como aparelhos

de computadores (salas de informática), aparelhos de data show, notebooks, televisões, e

também é possível encontrar resquícios de suportes analógicos: projetores de slides,

aparelhos de televisão e retroprojetores. As salas de informática, cuja operacionalidade,

manutenção e potencialidade de conexão, são situações variáveis, pois dependem da

combinação de fatores: gestão, operantes e usuários.

Esses espaços são quase uma sala para várias salas de aulas, por exemplo: a escola

em questão, considerada mediana, possui uma sala de informática e uma sala de audiovisual

contra quatorze salas de aula comum. A oferta tecnológica não é extensiva a todas as turmas,

mas a singularidade dos trabalhos de alguns docentes.

Tabela 5 – Linguagem utilizadas na sala de aula

Os relatórios da pesquisa aplicada entre os alunos, na faixa etária entre 14 a 18 anos

apresentaram os seguintes indicadores relevantes: sobre o uso do tempo diário - os

entrevistados depois de horas dedicadas ao estudo, ficam mais de quatro horas diárias

conectados na internet em salas de bate papo; nenhum deles fica sem acesso a internet; dados

que denotaram: a comunicação virtual imediata é mais praticada em atividades que não

requerem o contato mais imediato. Os dados elevados afirmando que “nunca jogam games”

necessitou uma revisitação através de diálogo direto com o grupo de amostragem e alegaram

que, para eles, game não se tratava de games online, mas de jogos eletrônicos; sobre o

interesse em aparelhos tecnológicos– com cerca de 40% de afirmações, não possuem

interesse em terem scanner, gravador de som digital e celular sem internet; 81% possuem

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“Iphone, Smartphone ou similares”, seguido de 69% de notebook e 58% de máquina

fotográfica digital, os aparelhos que permitem a conexão e a fusão de funções, com ênfase na

imagem são mais desejados, também há a predileção pelo aparelho mais portátil.

1.5 - Uma síntese capitular

A visualidade no contexto educacional está atrelada às orientações documentais,

legislativas e treinamento de docentes, que envelhecem, rejuvenescem e se reciclam, mas a

crença na valorização do modo verbal da linguagem persiste. A portabilidade da escrita é mais

fácil e econômica que a muitas opções de suportes para imagem. As atividades que envolvem

a visualidade são praticadas com intenção: alegórica, expressiva, entretenimento e de

experiências concretas.

O contexto histórico das leis demonstra como ainda é recente, no caso da rede

pública, o deslocamento do pensamento da aprendizagem centrado em estruturas mentais de

visões mais amplas da linguagem e na cognição como processo, em consequência das raízes

na transmissão dos “saberes” determinados culturalmente.

Além dessas questões, educação sempre foi um meio dominante, determinante do

saber, mas agora se debruça mais sobre o sujeito no aspecto científico, reconhecendo a

diversidade cognitiva, e no esforço de criar uma escola protagonizada por ele, como sugerem

as políticas mais atuais da SEE SP. Porém, esse sujeito está imerso num contexto cultural

tecnológico que implica em comportamentos cognitivos diferentes daqueles que a rede de

ensino propõe.

Essa situação de alteridade de intenções, escola – sujeito, embora com esforços de

equalização, são tangíveis nas expectativas e na ineficácia de instituições de ensino,

decepções dos docentes, no desconforto do discente. Como a visualidade participa, interfere e

contribui para adequação dessas diferenças? Será uma questão de recursos tecnológicos,

suportes ou reconhecimento de um sistema de linguagem? Por ora, segue para o entendimento

da cognição.

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CAPÍTULO 2 - COGNIÇÃO, COGNITIVISMO E FLUXO.

O capítulo anterior tratou de uma análise das intenções da instituição educacional no

reconhecimento da visualidade como objeto de aprendizagem sob o contraponto do mundo

real: práxis e protagonismo discente. Neste capítulo, a proposta é retomar alguns aspectos da

cognição, que na literatura subsidiária das propostas educacionais da rede de ensino publica,

está sob uma concepção antropocêntrica, dependente da condição mental humana, além de

tratamentos seccionados dos ambientes epistemológicos que lhe dão origem ou ainda de

emendas teóricas até mesmo contraditórias. Por exemplo: a confusão terminológica e,

consequentemente operacional, sobre habilidade e competência; ações orientadas em

referências a teóricos cognitivistas, mas, na prática, tratando o cognoscente como tábula rasa

(Behaviorismo clássico).

Atualmente, o termo cognição foi transportado para outras probabilidades de

estruturas inteligentes, no mundo animal, por exemplo, são divulgados experimentos com

demonstração de abelhas que aprendem relações arbitrárias (MORENO, 2012). Mas,

obviamente a cognição humana abriga o predicativo de ser mais complexa. Assim, como

cognição é um fenômeno além do humano, também não se limita à condição da

arbitrariedade.

A priori, a cognição será definida como situação de coisas sujeitas a se influenciarem e

gerarem um efeito de regularização entre si. É um fenômeno que prediz “algo afetando algo”,

“algo sendo afetado” e “dois eventos que se tocam e se alteram”. Isso pode ocorrer numa

relação entre células, no adestramento de um cão, no corpo humano, no diálogo entre pessoas.

Relações orgânicas do corpo humano podem, de certo modo, estabelecer uma relação

cognitiva, mas, noutro nível, na esfera da linguagem, está aquilo que o senso comum da

psicologia adjetivou como “cognições superiores”. Nessa esfera mais palpável, a forma verbal

foi o principal evento de reflexo dos processos cognitivos no âmbito ensino aprendizagem.

A ideia de cognição traz em si o reconhecimento entre coisas, que embute um

princípio de alteridade, de “distintos que se distinguem”, de uma consciência entre eles, os

quais só se completam porque há algum tipo de mediação. Esta sutileza dos níveis da

cognição será tratada com maior propriedade sob o ângulo do pensamento de Peirce na

sequência do próximo capitulo, pois é no bojo desse arcabouço de conjunto de doutrinas que

se resolvem as principais complexidades do fenômeno.

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Comumente, referências à cognição conotam a mente do aprendiz, parece algo interno,

mas, se pensarmos que ela cria conduta e comportamento, a cognição é um fenômeno externo

ao aprendiz. A perspectiva “interna” é fruto de um objeto tratado unilateralmente, e a externa

está apta a afetar a mente, pois se trata aí de representações. Esta é a crítica que se faz neste

momento: não há como compreender este fenômeno unilateralmente.

A materialidade dos processos cognitivos encontra-se ncérebro, com suas extensões

neurais (neurônios e sinapses) e, se há um processo, há produtos, o cérebro expandido que

gera novos processos. Não se trata de um argumento sobre a massa cerebral, mas das funções

que este executa e cada vez mais se externalizam em suportes criados por ele mesmo. A

memória é o melhor exemplo dessa informação, pois a invenção da escrita foi um passo

fundamental para expandir a capacidade de arquivamento e, assim, segue como a expansão

das linguagens e desenvolvimento das tecnologias da comunicação, de amplificação dos

sentidos etc.

O princípio dos “eventos que se afetam” existe desde as informações registradas, na

memória ou na sua expansão, que se dão existem desde a localização da primeira apreensão

perceptiva. Tem-se aí dois fenômenos atrelados à cognição: percepção e memória, que

estabelecem um ciclo de retroalimentação com desenvolvimento construtivo e espiral frente

ao mundo das experiências. Um dado perceptivo é incorporado ao outro dado acumulado na

memória, que resultará em novo dado e assim segue. São processos dinâmicos, intrínsecos e

evolutivos, cujo núcleo é a menor unidade da linguagem (para efeitos de estudo): o signo.

2.1- Cognição: apreensão, compreensão e autorreferência.

Tomando como exemplo duas situações: a reação febril do corpo mediante a entrada

de alguns vírus na corrente sanguínea e a corrida disparada de um homem na pré-história ao

avistar seu predador, são situações sígnicas, mas há diferença entre dois sistemas orgânicos: a

autodefesa das células humanas e o mecanismo que conecta o homem ao seu meio social e

natural. Tanto a reação das células como a motora do homem contribuem para a existência

desse sujeito, mas a partir do conceito de semiose, um signo gerando outro signo, seriam aí

semioses distintas, operando sobre sensores, suportes e códigos diferentes. O segundo

exemplo refere-se à questão do nível da mente autorreferencial, processos autocognitivos que

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referenciam o próprio organismo. Assim, o estudo da cognição segue agora para a

compreensão do “cérebro-mente”.

Não é uma questão nuclear deste trabalho aprofundar essa questão, inclusive, porque o

conceito de mente adotado é o de Peirce no próximo tópico capitular. Entretanto alguns

pontos de vistas são interessantes. Há uma tendência em se tratar a mente como substrato do

cérebro, definindo concepções como órgão e funcionalidade, o hardware e o software.

Teixeira (2000), ao tratar o panorama da conceituação pelo viés filosófico, apresenta visões

classificadas como monistas, dualistas e as provenientes do conceito de mente. Também está

implicado nessa questão o que é consciência, self, algo que a priori decorre da mente como

propõe Damásio (2009).

Para efeitos didáticos, dois aspectos da cognição são observados agora, a primeira, do

idealismo objetivo e a outra, ou melhor, na continuidade da anterior, cujos estados mentais

chegam à condição autorreferencial, que se instala, por exemplo, na psique humana.

A relação cérebro-mente implica a discussão sobre “qual a natureza da mente” ou

“como é possível a relação entre mente e cérebro” que tem sido objeto de discussão filosófica

dos monistas e dos dualistas. Teixeira (2000) afirma que o monismo é a tese alimentadora de

um tipo de substância no universo e esclarece que existem várias formas de monismo, de que

o materialismo é a concepção mais comum e define-se pelo que chamamos de processos e

estados mentais. São simplesmente processos e estados elaborados por um complexo sistema

físico. Em contraponto, o dualismo, também com variações, apresenta o cérebro e mente

como descontínuos entre si. De um lado, a materialidade e de outro, a substância. Apesar do

uso comum do pensamento dualista, os estudos que avançam sobre o cérebro e a cognição

encontram mais sustentabilidade argumental no monismo.

Para alguns estudiosos, Damásio (2006) e o self biográfico, Popper (1999) e Ecccles

(1999) e a mente autoconsciente, as relações entre mente e a sua autorreferência é um fato

decorrente do sistema de linguagem verbal, porém, não é a questão a ser desenvolvida, apenas

ilustrativa da farta associação das representações arbitrárias para a cognição.

Popper (1992) questionou, em seus diálogos com John Eccles, mas sem propor

aprofundamentos ou explicações, sobre um tipo de consciência puramente visual, não

enquadrável no seu conceito de mente autoconsciente. Se há uma consciência, há cognição,

porém, não atingir níveis de significação arbitrária que se dá no modo verbal parece, a priori,

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um inexistente. Isto seria logocentrismo. Mediante os diálogos expostos até aqui, há a ideia de

uma consciência gerada por representações verbais, reconhecida e validada, mas há estágios

anteriores, a ideia de consciência reativa, uma cognição de um fenômeno visual que ainda não

está traduzível no signo verbal. Um exemplo desta condição está nos reflexos corporais

mediante uma situação de perigo informada pela circunstância espacial que ainda não tenha

sido processada no nível da autorreferência. Assim, as funções cognitivas superiores, ou seja,

associadas aos sistemas de linguagem, teriam, no tocante à visualidade, dois níveis: um

reativo e outro encapsulado pela forma verbal da linguagem que nós humanos possuímos.

As intersecções cognição e linguagem são mais claras a partir da noção do signo, pois

confluem na predisposição cognoscível e na meta comunicante, tanto para si como para o

outro, portanto, todo sistema de linguagem é um sistema cognitivo. As formas de linguagem

que existem no homem, conforme já dito, são decorrentes das relações evolutivas, situações

de ambientação, assim o fluxo externo tem influência quando considerados os milhões de

anos sujeitos a alterações, dadas a possíveis rupturas e instalação de novas regularidades no

genoma. Contudo, numa determinada fração de tempo, há um organismo existente e

equipado, sujeito à formatação do fluxo externo somente naquilo que ele mesmo possibilita.

Justificam-se os comentários empíricos sobre o uso parcial do nosso cérebro-mente. Trata-se

de uma estrutura interna pré-existente.

O uso do termo aprendizagem, a capacidade de aprender, muitas vezes obscurece o

termo cognitivo e elucidá-lo é algo fértil para dinamizar a compreensão de facetas do

fenômeno. A cognição está para uma conexão entre existentes e a aprendizagem para a ideia

de retenção, ou melhor, de um sujeito que retém alguma coisa, portanto, todo processo de

aprendizagem é realmente um fenômeno cognitivo, porém, na literatura, o vocábulo favorece

mais proeminentemente o sentido de desenvolvimento do indivíduo junto a sua espécie, ou

seja, é modelado pelo seu contexto. A fusão de ambos os termos dá à cognição papel de inata

e à aprendizagem, o congênito, sujeita a uma sistematicidade, que demonstra o cognoscente

como receptáculo de saberes culturais. Enfim, os termos são sutilidades da aparência de um

mesmo fenômeno.

Em síntese, é um fenômeno dependente da externalidade, mesmo quando constrói

representações com função autorreferencial, pois se desloca no campo mental; da

internalidade as estruturas plásticas do cérebro (percepção e processamento) e da fluência,

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acomodação de memória; sua materialização se dá na representação, linguagem, semioses, ou

seja nos signos.

A perspectiva histórica do tratamento científico do fenômeno cognitivo, com vistas à

transposição para ambientes de ensino e aprendizagem, mesmo que sucinto, aponta como

esses olhares transitam: a dependência externa do comportamentalismo, a introspecção

cognitivista, a compreensão na externalização da linguagem. Passemos, pois, ao panorama

histórico.

2.2 - Breve perspectiva científica sobre a cognição no século 20

A preocupação com o fenômeno cognitivo existe implicitamente desde os filósofos da

antiguidade ao investigarem a natureza do raciocínio e avançou pelos séculos associado à

lógica, mas é só após o advento da Psicologia que se torna objeto mais expressivo.

O status da Psicologia como ciência se dá quando os pensadores constituem o seu

objeto de análise, fato que se inicia no século 19, pois até então ela estava enraizada nos

estudos filosóficos. No século vinte, algumas das teorias da Psicologia: o Behaviorismo, a

Gestalt e Psicanalise29

, preocupadas com a legitimidade científica, deram maior ênfase ao fato

psicológico, respectivamente: decorrente de ação externa (comportamento), a estrutura

psicofísica envolvida, a totalidade do fenômeno e as estruturas do “aparelho” psíquico. Destas

teorias, pode se dizer que duas correntes de pensamento seguiram para compreender os

processos de ensino aprendizagem: o comportamentalismo e o mentalismo. Na base dessa

discussão, a cognição aparece como dependência do mundo objetivo e para o segundo, do

mundo subjetivo, obviamente que refletem o modo de tratamento fenomênico, os métodos de

observação experimentais sofreram, principalmente, com advento das Neurociências que

permitiram compreender níveis mais ínfimos dos processos de cognição.

O behaviorismo (comportamentalismo), enunciado em 1914, através do "Manifesto

Behaviorista" publicado por Watson (2008), propõe uma psicologia do comportamento que é

experimental, observacional e não introspectiva. Desde 1930, houve uma resistência ao

mecanicismo inicial behaviorista, com vistas às pesquisas sobre aprendizagem por outros

cientistas, preocupados com o rigor científico e metodológico da ciência e de suas práticas

29

A citação da Psicanálise no corpus deste estudo tem fins panorâmicos no campo das principais teorias da

psicologia no século 20, mas não há necessidade de relacioná-la mais além, dado o enfoque do objeto.

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experimentais, que rendeu, entre outras, a teoria da aprendizagem intencional de Tolman

(apud LOPES, 2009) e o "Behaviorismo radical" de Skinner (1974), ao afirmar que a

organização do comportamento não se localiza no indivíduo, mas nas suas relações: é o que

ele vai chamar de "contingência tríplice": estímulo - resposta - consequência reforçadora.

Para Skinner (1974), o reforço era o único responsável para a aprendizagem, e as

coisas não se aprendem de forma dinâmica através da experiência. Tolman discordou sob o

argumento de que os organismos aprendem apenas através da experiência, e o reforço só

levou a um melhor desempenho, mas não se aprende melhor. O objetivo do destaque desses

dois expoentes do Behaviorismo não é equalizar a divergência, mas o traço comum que

atribuíram à cognição: fenômeno decorrente da ação externa, reagente, que torna implícita a

observação de certa repetição, regularidade. A perspectiva behaviorista enfatizou a cognição

como um fenômeno externo, um tratamento social, que resistiu a boa parte do século 20 e

ainda insiste nas bases teóricas de documentos norteadores sobre ensino-aprendizagem que

alimentam algumas instituições de ensino. Em termos de ensino aprendizagem, o

behaviorismo implicou no conceito de tábula rasa para o indivíduo, ou seja, a folha em branco

a ser preenchida (pela experiência comportamental).

A Psicologia da Gestalt, com maior ênfase nos estudos sobre percepção de

Wertheimer (1923), Kofka (1975) e Köhler (1968), baseada na observação de conduta, dada a

tecnologia rudimentar de sua época, concluiu questões observadas de “fora para dentro” que

enunciavam a existência de estruturas perceptivas pré-existentes, ou seja, independentes do

mundo externo. As suas bases teóricas foram minimamente aplicadas sobre a aprendizagem

como foi o behaviorismo. Aparentemente, o principal destaque se deu nos estudos sobre

aprendizagem da visualidade. A priori, a Gestalt foi o início pouco cônscio do olhar de

“dentro para fora” dos processos cognitivos. Uma observação de índices de uma conduta

interna do cérebro-mente. A cognição é fenômeno que não pode ser pensado somente naquilo

que tem de exterioridade para um organismo, mas também naquilo que o organismo tem

como estrutura para a exterioridade.

Ainda no século 20, ocorre uma reação ao comportamentalismo, cuja perspectiva

evolutiva agrega uma extensão de pensadores agrupados por concepções em comum. Tal

reação, caracterizada como Cognitivismo, requer cuidados para esclarecimentos

terminológicos, pois, também designa uma área menor dentro da Psicologia.

Cognitivism is big. So big that it seems to be turning up in almost every

corner of psychology these days. In addition to "standard" (viz., human adult

experimental) cognitive psychology there is cognitive development,

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cognitive therapy, cognitive neuropsychology, social cognition, animal

cognition, and so forth (GREEN, 1996, p. 31)

Green (1996) partiu dos estudos sobre a imprecisão do termo cognição nas áreas de

filosofia, psicologia e diversos desdobramentos no século vinte que geraram, entre outras, a

Neurociências, a Ciências Cognitivas. Ele apresenta o Cognitivismo como movimento que

permeia várias áreas do conhecimento com vistas à compreensão da cognição como objeto de

estudo da própria cognição humana. Apesar do corpus e objetos de pesquisa sobre cognição

pertencerem ao campo da Psicologia, foram os avanços tecnológicos externos que

desenrolaram as novas ideias dentro de uma psicologia que se volta para a cognição:

A interpretação tradicional das condições de surgimento da ciência cognitiva e

do Cognitivismo afirma que a psicologia cognitiva como campo de pesquisa e

o Cognitivismo como movimento, apesar de não terem sido criados fora da

psicologia, só conseguiram revolucionar o mainstream psicológico em virtude

de avanços científicos ocorridos além de suas fronteiras. Esses avanços seriam

basicamente seis: o advento da computação, a teoria da informação, a

cibernética, as novas teorias neurológicas, as novas descrições de síndromes

neuropsicológicas e a teoria linguística de Noam Chomsky. (GARDNER,

1996; MAYER, 1981; BAARS, 1986 apud CASTANON 2007, p277).

O comportamentalismo e o cognitivismo não são territórios extremamente

delineados, pois, o segundo sofreu influências durante várias décadas e se reveste de ênfases

variáveis, mas mantém a singularidade sobre a cognição humana a partir das relações cérebro-

mente: realismo-idealismo, monista-dualista. Numa breve horizontalidade histórica, pode-se

citar fontes de influências ou epistemes para o movimento cognitivista: a abordagem

construtivista proposta pela Epistemologia Genética de Jean Piaget (e desenvolvedores) e o

interacionismo estudado por I. Vygotskii e continuado por Luria; a ciência da computação,

que segundo Teixeira (2008), inicia com os estudos matemáticos de Alan Turing a partir de

1930, fomentou a IA-Inteligência Artificial que se definiu nos anos 50 e esta influenciou uma

nova etapa da robótica, que possuía estudos anteriores, desde o início do século, voltados para

os sistemas de produção com necessidade de aumentar a produtividade e melhorar a qualidade

dos produtos.

A organização de eventos científicos de difusão de ideias, pesquisa e teorias sobre a

mente e a cognição a partir dos anos 50, marcaram as dicussões que desenvolveram as

ciências cognitivas como área interdiscplinar. No bojo deste evento, destacam-se Donald

Hebb (Neurociências), Noam Chomsky (linguística cognitiva), Allen Newell e Hebert Simon

(Inteligência Artificial e Psicologia Cogntiva), George A. Miller (Psicologia Cognitiva), Ulric

Neisser (Psicologia Cognitiva), entre outros; os avanços tecnológicos na compreensão do

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cérebro em conjunto com as descobertas de Roger Sperry sobre lateralidade cerebral

(Neurociências) nos anos 60 que se estenderam aos esforços promovidos pelos cientistas para

a década do cérebro, os anos 90, quando Gardner (1994) sintetizou seu trabalho sobre a Teoria

das Inteligências Múltiplas. Também decorre desse percurso ainda, nos anos 70, a cognição

sob o ponto de vista biológico apresentado pelos chilenos Maturana e Varela (2008), a

Teoria da Autopoeises. Porém vale destacar, na segunda metade do século vinte, o

neurocientista Marr (2010) que sustentou argumentos inéditos sobre o processamento visual,

mais no tocante à morfologia visual e o piscólogo Ausubel (apud MOREIRA, 1999), com

foco mais específico na aprendizagem, elaborou a proposta da Aprendizagem Significativa

com ênfase na associação de ideias.

Desses enfoques, há recortes com vistas ao objeto de análise: aqueles com maior

impacto nos ambientes de aprendizagem da rede estadual (Piaget, Vygotsky, Gardner,

Ausubel) e outros que contribuíram para a compreensão do processamento neuronal (Hebb,

Marr). Também se observam nessa breve abordagem, temas mais comuns entre a pluralidade

de estudiosos sobre a cognição: a identificação de estruturas de acomodação, o fluxo

processual e o produto cognitivo. Assim, há mais singulares na negação do cérebro-mente

como espaço vago à mercê da externalidade, ensaios sobre a forma de elaboração cognitiva e,

em menor consenso, a síntese cognitiva como algo palpável pela verbalização.

2.2.1 - Identificação de estruturas

As passagens dos estudos sobre a cognição, como “ação exclusivamente externa”,

sem considerar as estruturas pré-existentes, para a compreensão destas, se dá, inicialmente na

mensuração cognitiva manifestada através da linguagem. Dois expoentes clássicos dessa

passagem são Piaget e Vygotsky que, apesar das diferenças entre ambos, tomam o

pensamento externalizado através da linguagem como índices de estruturas pré-existentes.

As estruturas cognitivas levantadas por Piaget (1987) indicam processos que se

acomodam a estruturas padrões, ou seja, há uma conduta cognitiva predisposta a faixa etária.

Para Vygotsky (1991) as relações sócio-culturais estão na base do processo de formação do

pensamento conceptual, a linguagem se dá na interação social, mas, também há etapas,

padrões a serem deflagrados pelo fluxo cognitivo no cognoscente. Dentre as diferenças entre

os dois pontos de vista, ressaltam-se respectivamente o engessamento e a flexibilidade das

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estruturas cognitivas em faixas etárias. Por outro lado, as semelhanças estão na forma da

linguagem que reflete o efeito cognitvo: prevalce a verbal sobre a visual. As considerações

piagetianas que deram suportes às análises dos estágios do desenho infantil (KELLOGG,

1969; MEREDIEU, 1974) e as vygostikianas, que sugerem o desenho com certa relatividade

ao domínio do ato motor, registro do gesto, depois da imagem e como precursor da escrita,

ambas predispõem a visualidade sob a perspectiva verbal. A exemplificação do tratamento

dado à cognição por esses dois pensadores demonstra, nessa fase, a cognição estudada através

da materialidade verbal e, em menor intensidade, nas expressões visuais. Caratcteriza-se por

um olhar de fora sobre as possivéis estruturas preexistentes tangíveis na linguagem.

2.2.2 - O fluxo cognitivo

A Psicologia Cognitiva, influenciada pelas Ciências da Computação, a Cibernética, as

Teorias da informação, a Robótica, a Inteligência Artificial, passou a preocupar-se com o

processamento de informações e, nota-se, tanto na preocupação de Neisser (1976), ao definir

o objeto da Psicologia Cognitiva, como processo pelo qual o input sensório é transformado,

reduzido, elaborado, armazenado, recuperado e usado, demosntra o processamento cognitivo.

Na percepção, os estímulos são recebidos com alguma potência de regularidade o que já

enuncia uma atividade cognitiva, assim como a armazenagem da experiência é o registro de

efeitos de regularização e está empenhada a subsidiar novos eventos perceptivos, oferendo

base para uma nova regulagem, entretanto dois elementos precisam ser vistos: o interno –

cérebro-mente e o externo - mente-cultura.

Começando pelo segundo caso, por ser mais aparente, tem-se exemplo na proposição

da aprendizagem mecânica e significativa de Ausubel (apud MOREIRA, 1999). A descrição

dos subsunçores, conceito central na teoria de Ausubel, é um processo por meio do qual uma

nova informação inclui-se, de maneira substantiva (não-literal) e não-arbitrária, a um aspecto

proeminente da estrutura de conhecimento do cognoscente.

A teoria de Ausebel, entre os pesquisadores do seu tempo, foi a que mais desenvolveu

estudos com intencionalidade explícita para a aprendizagem e propôs duas formas: a

mecânica, sujeita a repetições exaustivas passível de tornar-se algo significativo e outra

decorrente de processos associativos entre pré-existentes e existentes. Para Ausubel, os pré-

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existentes são denominados de subsunçores e tendem à conotação de conceitos verbais, aliás,

a ideia de significação que ele apresenta em sua obra é dual: significante e significado, que

remonta a semiologia de Saussure. O esteio verbal que se apresenta na forma de

aprendizagem de Ausubel reflete a intenção de aplicação educacional cuja linguagem verbal

tem sido a opção de material palpável da cognição30

.

O primeiro aspecto, a internalidade cérebro-mente é a fase em que a processualidade

adquire uma investigação mais interna ao cérebro e associa ao fenômeno cognitvo a

percepção, a memória e a linguagem como situações intrínsecas. Decorrente dos avanços das

Neurociências, soma-se a essa etapa o processamento mais infimo da cognição, ou seja, a

conexão dos neurônios pelas sinapses. São estudos que enfatizaram a cognição como

fenômeno dotado de temporalidade, processual, que não se restringe apenas ao seu potencial

de síntese no ato de apreensão. Implica na mínima presença de regulares, portanto há

acumulação anterior, transformação e acumulação posterior, assim como chegam aos

processos cognitivos encarnados na materialidade cerebral. Segundo Novak (1981), esse

caminho atrelado à Neurobiologia é refutado por Ausubel, cuja justificativa era de tratar de

caminhos especulativos e enganosos. Nessa esfera mais infima, destaca-se o conexionismo

que trata do processamento de informação:

O conexionismo é um pardigma porque oferece uma solução para a eterna

discussão entre os mentalistas, que defendem que o entendimento da mente

não está ligado ao conhecimento do cérebro, e dos nervistas, que defendem

ser a mente um produto da fisiologia cerebral. (CÂMARA, 2010, p 15).

Retoma-se o monismo idealista. A questão do conexisnismo, inicialmente denominado

de processamento em distribuição paralela, tem, conforme Câmara (2010), no legado do

psicólogo Donald O. Hebb o postulado dos três princípios das conexões cerebrais:

1 – Princípio de formação das conexões neurais. Quando um axônio da

célula A está próximo o bastante para excitar B, e repetidamenteou

persistentemente a estimula, algum processo de crescimento ou alguma

mudança metabólica ocorre em uma ou ambas as células, tal que a eficiência

de A, como uma célula que excita B, aumenta.

2 – Princípio das redes neurais. A base cerebral para as representações

mentais são grupos de neurônios (cell-assembly) auto-organizados (redes

neurais) que tendem a disparar ao mesmo tempo (ativação conjunta) devido

à aprendizagem Hebbiana. O disparo de neurônios em uma rede pode

persistir após o evento gatilho, e esta persistência é uma forma de memória.

(ibid, p16 )

30

As práticas de mapa conceitual como forma de organização e registros e estudos praticados na educação, na

singularidade didática de alguns docentes, são originários das proposições de Ausubel, expandido por Novak

(1981). São raciocínios diagramáticos inspirados no fluxo neuronal.

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56

3 – Principio da sequência de fase. [...] Toda estimulação particular,

frequentemente repetida, levará a um lento desenvolvimento de uma rede

neural (cell assembly), uma estrutura difusa que compreende células no

córtex e diencéfalo (e talvez na ganglia basal do cérebro), capaz de atuar

brevemente como um sistema fechado, favorecendo o disparo de outros

sistemas semelhantes e comumente tendo uma facilitação motora específica.

Uma série de tais eventos constitui uma “sequência de fase”, base do

processo do pensamento.Cada ação de uma congregação deve ser despertada

por uma congregação precedente, por um evento sensorial, ou – o que é mais

comum – ambos. [...] (ibid, p.16 ). (HEBB apud CAMARA, 2010 p.16 ).

Tal postulado, exaltado, depois parcialmente esquecido e, por fim, retomado no bojo

das Neurociências, apresenta o fluxo cognitivo: da ação excitatória sincrônica do neurônio, a

expansão em rede que cosntitui a representação mental, neste caso, a natureza das

representações mentais, o signo, adquire palpabilidade (mental), a propriedade de

armazenamento dada a condição de estar para um existente que dispara a sequência de redes,

o fluxo do pensamento, ou melhor, a semiose.

Retomando os modelos de aprendizagem de Ausubel, que atua na esfera mais externa

da cognição, a aprendizagem mecânica indicializa a aprensão exaustiva da repetição e os

subçunsores de associação de ideias, a “congregação precedente” que ocorre na “sequência de

fase” proposto por Hebb. A relação entre esses dois cognitivistas, salvo as divergências, tem

como meta demonstrar reflexos externos daquilo que é infimo no evento cognitivo que se dá

na esfera humana.

Os processos associativos que ocorrem no fluxo cognitivo, disparados por algum tipo

de anterioridade, não são privilégios apenas de sistemas verbais, basta recuperar experiências

de confusão imagética, quando uma coisa aparenta ser outra, há uma associação de eventos

anteriores que guiam intensamnete o fluxo. Ao recuperar estâncias infimas da cognição, cujos

eventos de anterioridade não são reduzidos a conceitos verbais, o que se apresenta é a

intenção de recuperar a compreensão mais eficiente da cognição visual.

2.2.3 - A tipologia do produto cognitivo

Uma das primeiras palavras associadas à meta da cognição é o termo conhecimento,

que implica na existência de um produto verbal, entretanto, o fenômeno cognitivo não se

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reduz apenas a esse aspecto. Existe uma miríade de apreensões que não são necessariamente

tangíveis pela linguagem verbal, mas são cognoscíveis pela nossa mente.

Segundo Mota e Zimmer (2007) foi Gilbert Ryle, filósofo inglês, o primeiro que

observou o conhecimento humano categorizável como sendo sobre “as coisas” e sobre “como

fazer as coisas”. É oportuna a sequência dessas autoras sobre a ideia do Filosofo Karl

Haberlandt:

A memória declarativa é factual e caracteriza-se como um sistema que retém

conhecimento explícito, acessível à consciência e verbalizável

(HABERLANDT, 1994). Em contraste, a memória procedimental contém

conhecimento implícito, que não está disponível à consciência e, portanto,

não pode ser verbalizado. O conhecimento procedimental pode ser

recuperado e utilizado de forma muito mais rápida do que o conhecimento

declarativo. (MOTA; ZIMMER, 2007, p. 159)

Outra forma que a expressão “conhecimento procedimental” passou a ter, ora como

sinonímia, ora como aproximação conceitual, foi o termo habilidades, que ocasionou alguns

equívocos entre motoras e mentais ao ser reduzido a seus contextos argumentais científicos.

Mas, ainda existe certa vagueza, portanto, recorrer ao sentido lato do termo, que vem do

latim, habilitatis, qualidade de habilis, que designa “o que se tem”, é o primeiro passo para

elucidar a natureza do objeto de cognição.

No início, o conceito de cognição foi apresentado como algo que está orquestrado

sobre certa regularidade, assim, tanto como o fato como a habilidade decorrem do princípio

regular. Mas, se insere outra situação, as regularidades se desenvolvem porque há essa

possibilidade entre A (estrutura apreensiva) e B (objeto de apreensão), ou seja, preexistem,

estão apenas sujeitas ao estado de potenciação, e há outra decorrente do contexto externo que

se desenrola nas condições preexistentes. Os aspectos genoma (preexistente) e cultura

(interação) se entrelaçam. Um exemplo do preexistente pode ser a condição da percepção

visual ao reagir a ritmos presentes em certo campo visual. Adquirir o léxico de uma língua

exemplifica uma interação. Outro exemplo é a fórmula de memorização dos textos sagrados

de Ifá na etnia yorubá: os léxicos são armazenados pelo exercício do ritmo oral. Tomar a

ideia de conhecimento como finalização do ato cognitivo requer dimensionamento do próprio

conceito de “saber”.

A “recuperação mais rápida” (MOTA, ZIMMER, 2007) do produto armazenado

como memória procedimental em detrimento da memória declarativa, aponta para a facilidade

de recuperação do que já somos dotados. Destarte, essa natureza posiciona o produto

procedimental anterior ao declarativo já que não podem ser territórios distintos, mas em ação

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de encapsulamento, ordem evolutiva. O simples fato de “saber fazer as coisas” é prepositivo

de “saber as coisas”. Uma análise comparativa de dados requer processos associativos de

igualdade e diferenças. O que pode ser observado são procedimentos que dependem de

declarações. O estado movente e pontual do produto cognitivo reforça sua concretude na

semiose, ou seja, o signo triádico, que será abordado no próximo capítulo.

Dando maior dimensão a esta discussão, a exposição de Gardner (1994) no intuito de

rever a proposição de desenvolvimento cognitivo piagetiana, sob a análise de David Feldman,

registra que os domínios cognitivos são universais e singulares, os que são gerais à condição

humana e, em oposição, os que são circunscritos aos grupos culturais. Implicitamente, nota-se

que há um mundo comum, decorrente da condição preexistente na espécie humana e que esta,

na extensão do seu limite, apresenta setorizações, ou seja, há valorização e desvalorização de

percursos cognitivos.

São estudos que enfatizam a cognição como fenômeno dotado de temporalidade,

processual, que não se restringe apenas ao seu potencial de síntese no ato de apreensão.

Implica na mínima presença de regularidades, portanto, há acumulação anterior,

transformação e acumulação posterior. Os exemplos dados como tangíveis, também possuem

indicação de processualidade, entretanto, tratam de identificar estruturas, etapas, enquanto os

processuais se sustentam na concepção do neurônio, dos sistemas cerebrais, dotados do poder

de avançar sobre situações mais ínfimas do processamento cognitivo traduzem explicita ou

implicitamente os processos cognitivos encarnados na materialidade cerebral.

O fluxo cognitvo entre sinapse e neurônios é incessante, assim, pensar em produto

cogntivo como algo finalizado é inconcebivel, o que existe são comportamentos adquiridos,

habilidades exercitadas e elaboração de representações, sempre em estado de deslocamento.

Este aspecto é pensado pelo viês das estruturas infimas da cognição, que partem das estruturas

existentes reagindo a eventos, porém, há outro aspecto, de ordem externa que se assenta sobre

essas estruturas: saberes culturais. Deste modo, há duas ordens de síntese cognitiva: a interna

alicerçada na estrutura mente-cérebro que possuimos e outra, de ordem cultural, mutável pelas

ideologias sociais. Esta última, mais especificamente, constitui-se nos modelos de

organização e na instituição de ensino-aprendizagem, desde as sistematizadas até as mais

desprovidas de conduta científica. Todos são os saberes culturais.

O aspecto do produto da cognição, os saberes, os conteúdos das metas dos sistemas de

ensino-aprendizagem, sofrem, desde os anos noventa, uma revisão de natureza estimulada por

avanços nos entendimentos do funcionamento do cérebro e a extensão do território da linguagem.

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A prática de ensino sistematizado, a escola, passou a se preocupar com os fatores que não seriam

apenas os saberes culturais. Um dos indicadores dessa revisão, talvez o mais expressivo, encontra-

se na introdução da ideia de habilidades cognitivas.

A inteligência, termo compartilhado na literatura sobre cognição, cujo sentido

etimológico justifica a intersecção e sentido prático, tem conotação de produto, tem uma

singularidade desde a primeira metade do século vinte, que segundo Schelini (2006), data dos

estudos do psicólogo britânico Raymond Cattell, com a taxionomia de inteligência fluida e

cristalizada. As teorias de Cattel (datadas de 1941), complementadas pelos estudos de outros

dois psicólogos americanos, John L. Horn31

e John Bissel Carroll, foram sintetizadas por

McGrew e Flanagan em 1998, no denominando de Modelo CHC (Cattell-Horn-Carroll) sobre

a teoria psicológica das habilidades cognitivas humanas com vistas aos estudos de psicometria

da inteligência. Justifica-se esta breve introdução com o objetivo de contextualizar o conceito

de habilidades cognitivas e subentender as semelhanças de dualidade entre inteligência fluida

e cristalizada, estruturas e saberes.

Os testes de psicometria do CHC tem, na inteligência fluida, uma das camadas do

segundo substrato32

, é a capacidade de se adaptar e lidar com novas situações com

flexibilidade, sem a aprendizagem prévia o que é uma fonte de apoio importante para sua

manifestação. Está associada a componentes não-verbais, pouco condicionados aos

conhecimentos assimilados e da influência de aspectos culturais, pois está mais sob a

determinação dos aspectos biológicos (genéticos). Basicamente, configura as habilidades

principais de: indução, dedução e classificações de relacionamento figurativo, extensão da

memória associativa e velocidade intelectual, entre outros. A inteligência cristalizada é o

conjunto de recursos, estratégias e conhecimento, o que representa o nível de

desenvolvimento cognitivo alcançado através da aprendizagem da história do sujeito. Esta

consiste principalmente de habilidades relativas à compreensão verbal, estabelecendo relações

semânticas, de avaliação e de melhoria da experiência, o estabelecimento de juízos e

conclusões, o conhecimento mecânico ou de orientação espacial. A duas formas podem ser

entendidas sequecialmente como ação cognitiva e sintese cognitiva, a primeira pertencente ao

legado genético e a segunda ao contexto cultural do qual a linguagem verbal é o principal

expoente. Outra capacidade cognitiva que se apresenta nesse substrato é o processamento

31

Horn foi pioneiro na observação de múltiplas inteligências. 32

A teoria do CHC divide o fenômeno da inteligência, sob a meta da observação e mensuração em três camadas

(ou substrato) e estas em diferentes quantidades dos aspectos cognitivos.

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60

visual, cuja condição ativa é pertinente para compreensão de uma cognição visual e seus

desdobramentos.

A ideia de múltiplas inteligências reaparece em Gardner (1994), porém com outra

classificação, subjugada por outros fins de análise e suporte teórico, valorando a idiossincrasia

genética e suas interdependências culturais. Gardner também determina uma inteligência para o

segmento visual, denominada por ele de inteligência espacial33. Para Gardner, as operações

visuais são, antes de tudo, operações espaciais, são todos os modos de compreender, classificar e

operar o fenômeno espacial, cuja percepção é o principal modo de processamento.

Gardner também propõe um conceito de habilidades, mas enredadas em classificações

como a Teoria do CHC. Suas ideias de habilidades mentais como processos singulares agem

isoladas ou agrupadas e as competências como a mobilização das habilidades valorizadas na

especificidade de cada grupo cultural com a meta intelectual. As habilidades estão para certa

verticalidade, enquanto as competências na horizontalidade e na valoração externa pelo grupo

social. Gardner parte de que todo indivíduo está numa condição capaz para desenvolver

habilidades, assim, compõe-se sob o olhar das categorias fenomenológicas uma tríade:

capacidade – a possibilidade de ser, habilidade – singular, dependente das relações de cada

contexto associadas à predisposição genética e, por fim, a competência, que apesar de individual,

oblitera para o plural pelo intento da mensuração. É notória a condição da habilidade como

potência de atrito, movimento, transformação.

As habilidades estão para as estruturas cognitivas pré-existentes numa imensa gama de

situações exercitáveis pelos inputs e os contextos culturais, como fontes de dados externos,

sujeitos a idealizações culturais para serem armazenados.

Para fins de compreensão, a cognição humana, em sua finalização palpável, apresenta

três possibilidades de produto: a instauração de regularidade, que se torna existente no âmbito do

exercício de habilidades (Inteligência fluida, habilidades cognitivas, habilidades mentais) e se

torna uma realidade na aquisição de conhecimento (inteligência cristalizada, saberes culturais,

âmbito das ideias). As habilidades estão sempre em situações proposicionais, na dependência de

algo para complementá-las.

2.3 - A cognição e aprendizagem

33

Tem-se criado, pelo menos em âmbito brasileiro, ligeiras discussões para separar essa visual de espacial,

porém, não se trata de verificar uma funcionalidade da experiência, mas de localização cerebral especifica

conforme Gardner (1994) afirma nos critérios de identificação das suas modalidades.

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61

Urge uma separação, pelo menos no uso terminológico, entre cognição e

aprendizagem, apesar do largo uso com intenção de sinonímia. Redundando, a colocação

sobre cognição trata de um fenômeno que coincide com a evolução para o idealismo

objetivo34

, do estado de mente que o universo conspira, portanto, também é uma propriedade

humana encarnada nos neurônios e sinapses, aptos a desenvolver condutas e armazenar

eventos externos nas malhas da representação mental, a linguagem-pensamento. O termo

aprendizagem, variante do verbo aprender, literalmente traz a ideia de retenção de alguma

coisa, cuja prática está mais norteada por uma sistematização de apreender os saberes

culturais. Não se pode negar a condição cognitiva, mas culturalmente implícita nas intenções

exclusivamente externas. O uso terminológico, de aparência indiferente, sinaliza territórios

sutis, enquanto a cognição prevê um objeto cognitivo, a aprendizagem prevê conteúdos

reclamando tacitamente a ideia de receptáculo. São os resquícios behavioristas que ainda

circulam entre as nossas preocupações com a maturação humana.

Os saberes culturais organizados como conteúdos, objeto do psicólogo Cesar Coll

(1998) e parceiros, classificaram a tipologia dos conteúdos de aprendizagem do âmbito:

conceitual (e factuais), procedimental e atitudinal, demonstram uma preocupação com as

metas de aprendizagem: conhecimento, habilidades mentais (e motores) e comportamento.

Os conteúdos nominais são apresentados por Coll como conceituais e factuais, são intrínsecos

aos procedimentais e atitudinais, o que ocorre na prática é a priorização de um sobre outro,

como se pode verificar até mesmo em ações didáticas extremamente mecânicas, como na

concepção de educação bancária proposta por Freire (1983). As habilidades mentais precisam

da concretude nominal das coisas para atingir êxito. O caráter operacional da nominação

também se apresenta com níveis de distinção que Moretto (2010), entre alguns especialistas,

decompõe em: dados, informações e conhecimento. Para o autor: dado é signo ou conjunto de

signos com possibilidade de significados diversos, dependendo do contexto; a informação é

conjunto de dados organizados em sentença com significado lógico e o conhecimento é a

informação ou conjunto de informações das quais o sujeito se apropria, atribuindo-lhe

significado em sua estrutura cognitiva.

Apesar do foco no processamento computacional, é extensiva a proposta de Setzer

(2012) em vincular tal tríade, que depende da forma verbal, em dados com aspecto sintático,

informações com semântica e o conhecimento com aspecto pragmático. Dados são meras

34

Trata-se de uma doutrina da Filosofia de Peirce abordada na sequência capitular.

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possibilidades, sujeitos a uma ordenação, a informação produz mais sentidos pela conexão

dos dados e o conhecimento permite a manipulação de informações.

Na primeira década do século 21, a rede pública de ensino de São Paulo, incumbida

de elaborar uma ferramenta de análise do desempenho da qualidade de ensino aprendizagem

desenvolvida na rede, constituiu um documento norteador com valoração da competência

leitora (SÃO PAULO, 2009), ou seja, a possível concretude indicativa do signo verbal como

modalidades estruturais da inteligência, pois expressam o que é imprescindível para

compreender ou deliberar sobre um problema. Este documento reafirmou nesse segmento de

ensino aprendizagem a presença de três termos: conteúdos, habilidades e competência

cognitiva.

Os conteúdos são os saberes culturais organizados em disciplinas, as habilidades

aparecem definidas como: “elas funcionam como indicadores ou descritores das

aprendizagens que se espera os alunos terem realizado no período avaliado.” (SÃO PAULO,

2009, p.14), e competências cognitivas como: “[...] as modalidades estruturais da inteligência,

ou melhor, o conjunto de ações e operações mentais que o sujeito utiliza para estabelecer

relações com e entre os objetos, situações, fenômenos e pessoas que deseja conhece” (ibid,

p.15). Diagramadas através de uma relação triádica, explicitada no capitulo anterior, as

competências sistematizadas em três grupos: GI presentacionais- competências para observar

sob a influência direta do pensamento piagetiano, GII relacionais – competências para realizar

e GIII operacionais – competências para compreender, são constituídas de grupo de verbos

que reforçam a cognição como fluxo. Porém, indaga-se, é um movimento de onde para onde?

Os pontos assertivos desses conceitos estão na ideia de habilidade como indicador de

competência, inclusive pela coerência de serem verbos, indicadores de ações mentais,

entretanto, evidenciam como as práticas que envolvem o fenômeno cognitivo, na ponta mais

extrema, tratamento ideológico cultural, a aprendizagem sistematizada por um agente,

enfatiza a arbitrariedade da representação como única fonte de conhecimento, além do estreito

conceito de competência.

Passa despercebido nessa orientação que o diagrama triangular tem uma relação

concêntrica, pois os grupos de competências apresentados demonstram a trajetória natural da

cognição: observação, relação, mediação. A arbitrariedade perpassa pelo concreto, cuja

visualidade se antecipa ao modo verbal. As práticas educacionais apenas esbarram em

soluções mais plausíveis com a naturalidade da cognição humana, tanto que o cotidiano do

ensino aprendizagem prega a automação e vem reconhecendo, há alguns anos, a preocupação

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com novos objetos cognitivos, a equalização entre os saberes culturais e a exercitação de

conexões cérebro-mente.

Zaballa (1998), a partir da tipologia dos conteúdos de Coll (1998) e da análise de

sequência de conteúdos, propôs quatro modalidades organizativas educacionais e uma destas,

denominada de sequência didática ou de aprendizagem, apoiada no conceito de Zona de

desenvolvimento proximal de Vygotsky, traduz literalmente uma coerência com o fluxo

cognitivo. Não se trata de trabalho classificado sob o pensamento cognitivista, assim como se

trata de olhar de fora para dentro. Zaballa ordena as etapas em uma sequência a partir da troca

de posição de sujeitos: não de quem ensina, mas de quem aprende. Na realidade, sempre

haverá uma sequência didática, o que difere é a eficiência gerada pelas etapas de tratamento

do conteúdo, apresentadas de maneira singular neste estudo: a fase de sensibilização

(levantamento de conhecimento prévio, problematização); a fase dialógica (comparação,

inferência e checagem) e a fase conclusiva (sistematização e auto avaliação). A relevância de

Zaballa deve-se ao êxito da sequência de aprendizagem como guia de tratamento do objeto de

cognição que vem sendo discutido e praticado nas instituições educacionais, na demonstração

do fluxo cognitivo, embora não trate nominalmente da questão e valore o produto verbal da

cognição. A ideia da sequência didática está comprometida com a automação da

aprendizagem, com indivíduos que “aprendam a aprender”, portanto, parece no primeiro

momento obtuso no reconhecimento da excelência da nossa natureza cognitiva, mas na

realidade é uma retomada daquilo que a educação sistematizada abafou no afã behaviorista.

A proposta de sequências de conteúdos é distribuída dentro de sequência didática,

que se desenvolve de maneira espiralada, enquanto o primeiro se apresenta de modo linear,

denotando uma natureza frasal. A condição espiralada evoca uma aprendizagem de

habilidades, limitadas na sua totalidade pelo aparato cerebral, mas expansivas na exercitação.

As práticas de aprendizagem tateiam em fenômenos que se apresentam

aparentemente desconectadas, nos vãos entre teorias, pela vagueza de compreender a

cognição como fenômeno do signo e suas semioses, que elucidam estruturas, fluxos e

sínteses.

2.4 - A cognição visual

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64

A discussão sobre a cognição sustentada na estrutura mais ínfima, ou seja, na

conduta de regularidade entre elementos A e B, implica três etapas: a insistência de repetição,

a identificação com pré-existentes e a mediação, como resultado da conexão A e B, portanto

C. É uma relação de continuum, descontinuum e novo continum, pois, algo que se repete é

aquilo que se apresenta à percepção pelo geral e não pelo particular; a junção do que se tem

com o que insiste implica a relação passado-presente e terá nova conduta. Essas etapas são

claramente sincretizáveis com o postulado de Hebb e com a Teoria do protoplasma de Peirce

(será abordado no próximo capítulo).

Pensando de modo mais internalizado, no aspecto do cérebro-mente, sob os temas de

investigação dos diversos momentos da Psicologia Cognitiva, tem-se a percepção, associações

decorrentes da memória e a aquisição da linguagem.

A ideia de representação, que acompanha substancialmente o Cognitivismo, aparece

como ideia de signo, mas não aprofunda níveis mais específicos do signo e tende a considerar,

do ponto de vista peirceano, o nível de lei do signo, o que predispõe a linguagem na ordem

exclusiva do modo verbal. Os estudos sobre os processos mentais superiores (percepção,

cognição, memória, linguagem) são focados como fatos distintos, ações mentais desatreladas

do processo de significação, mas estão numa relação de contiguidade, intrínseca, cuja

cognição é o esteio principal e acompanhar a obliquidade do signo a torna mais

compreensível.

Antecipando conceitos a serem apresentados no próximo capítulo, a cognição, como

processo de evolução do signo em direção ao arbitrário, é anterior à máxima de lei, que se dá

no modo verbal, também se observa que a consciência, como estado da mente, não atinge a

autorreferencialidade desprovida do modo verbal. Essas duas condições permitem interpretar

que há uma cognição visual que não perpassa pela mente autorreferente, não se traduz em

signo verbal e nem por isso é inexistente. Vejamos:

Figura - Composição abstrata: agrupamento por semelhança

Fonte: produção do autor

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A leitura da imagem acima está apta a produzir efeitos de uma cognição visual e

verbal. O olhar pode produzir traduções nominais para as cores, talvez as formas, de acordo

com a experiência, a língua, mas há outra força atuando, o agrupamento por semelhança de

cor e formato, sujeito a criar atração ou refutação, de acordo com a experiência. Entretanto, o

primeiro efeito está sujeito aos saberes culturais e o segundo está para o exercício das

habilidades contidas no aparelho receptor. Mas, certamente, o domínio nominal sobre essas

práticas das habilidades elevará a condição na consciência para a autorreferência, o que

melhor facilitará a compreensão dos mecanismos que envolvem a leitura e produção de

linguagem visual. Essa acessibilidade, que o modo verbal dá às organizações da percepção

visual, é a fundação do processo denominado “alfabetização visual”, cuja ineficácia

terminológica será debatida nos estudos de linguagem visual a serem abordados no capítulo 4.

Essa condição impalpável da consciência destituída de autorreferencialidade faz com que o

tratamento da linguagem visual adquira erroneamente a sensação de algo áurico, artístico e

contemplativo.

O modo visual e verbal presente nas estruturas cognitivas superiores reflete duas

naturezas evolutivas decorrentes de estruturas cognitivas orgânicas: a orientação espacial e a

arbitrariedade necessária para a vida social.

Retomando a ideia de externalidade, internalidade e fluência do fenômeno cognitivo,

resta avançar na base eficiente para contemplar esse conjunto: uma Teoria do signo, mas uma

teoria abrangente das mais diversas formas de linguagem, com malhas permissíveis de

compreender os mais ínfimos processos cognitivos. Eis Charles Sanders Peirce.

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66

CAPITULO 3 – PRINCÍPIOS SEMIÓTICOS DA COGNIÇÃO

No bojo da discussão cognitiva, conforme antecipado no capítulo anterior, não há

outro caminho que não seja o suporte de uma ciência dos signos, pois o processo cognitivo

prima pela natureza mediada entre existentes, ou seja, estruturas possíveis de se afetarem

entre si e, consequentemente, provocarem algum tipo de transformação. É um processo

arquitetado na trilogia intrínseca ação, reação e mediação, portanto não existe se não houver o

terceiro elemento, o signo. A importância deste capítulo não está atrelada apenas à

apresentação da teoria do signo, mas a uma sequência de doutrinas que constituem a filosofia

de Peirce enquanto respostas a lacunas, neste caso, para o fenômeno da cognição, linguagem e

percepção.

Neste sentido, a Semiótica, “como ciência que tem por objeto de investigação todas

as linguagens possíveis, ou seja, que tem por objetivo o exame dos modos de constituição de

todo e qualquer fenômeno como fenômeno de produção de significação e de sentido”

(SANTAELLA, 2007, p.15), propõe fundamentos teóricos para compreender o processo de

mediação estabelecido pelo signo. É senso comum o fato de que a ciência dos signos foi

pensada por dois pioneiros quase contemporâneos, desconhecidos entre si, oriundos um do

campo da linguística e outro da Filosofia. Com metas distintas de estudo, Ferdinand Saussure

(1857-1913) e Charles Sanders Peirce (1839-1914) foram um marco nos estudos sobre o

signo.

O legado de Saussure, sistematizado pós-morte, trouxe a concepção de um signo

diádico, uma lógica binária, significante e significado, uma imagem acústica que se liga a um

conceito na mente do intérprete. Focado na compreensão social da língua, esse modelo

apresenta como significado o conjunto de conceitos arquivados em nossa mente e como

significante a imagem acústica e psíquica da palavra, ambos os aspectos são inseparáveis. A

sistematização dicotômica e centralizada no modo verbal reduz a significação à esfera de

representações arbitrárias, potencialmente simbólicas, esgotando outros níveis de

compreensão da linguagem. Mesmo com a extensão das ideias de Saussure em Louis

Hjelmslev (1899-1965), Roland Barthes (1915-1980), Algirdas J. Greimas (1917-1992), entre

outros, o tratamento dos signos visuais tendem a processos nominais que estabeleceram a

concepção que a apreensão do mundo visual é sempre mediada pela palavra. A base do

pensamento de Saussure, as leis da semiologia, se dá sobre o estudo da língua, uma parte do

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fenômeno da linguagem, consequentemente, a teoria abarca apenas o objeto em que se

debruça. A dependência do significante e do significado à condição mental, também, reduz a

ação sígnica à ocorrência exclusiva do maquinário humano, ou seja, não a desloca como

fenômeno para além da condição antropocêntrica.

Sobre o pensamento de Peirce: “Logic, in its general sense, is, as I believe I have

shown, only another name for semiotic (σημειωτική), the quasi-necessary, or formal, doctrine

of signs.” (CP 2.227) O objeto dos seus estudos dirigia-se ao desenvolvimento da lógica e,

para tanto, engendrou um sistema filosófico original. A Semiótica proposta por ele contém

elementos teóricos para o estudo da cognição visual. Ao investigar a questão cognitiva como

fenômeno semiótico, não pode se incorrer em erros como adverte Santaella (2008, p.94):

Infelizmente, os conceitos semióticos de Peirce costumam ser simplificados

e repetidamente reduzidos à famosa tríade dos ícones, índices e símbolos até

o limite da esterilidade. Isso se dá porque são comumente ignorados os

propósitos filosóficos e cognitivos desses e outros conceitos, assim como de

suas inseparáveis inter-relações.

Portanto, para se fazer a ponte dos signos para os consequentes processos cognitivos

que eles acionam, devemos tomar como ponto de partida sua fenomenologia, uma quase

ciência que está na base de todos o seu edifício filosófico e, especialmente, de suas definições

e classificações de signos.

A Fenomenologia ou Farenoscopia35

é a primeira divisão da Filosofia que deve

trazer no seu bojo a potência hipotética de extrair dos fenômenos seus traços formais mais

universais. Peirce (CP.1.284) assim a define: “Phaneroscopy is the description of the

phaneron; and by the phaneron I mean the collective total of all that is in any way or in any

sense present to the mind, quite regardless of whether it corresponds to any real thing or not.”

Portanto, fenômeno é qualquer coisa de qualquer espécie que se apresenta na experiência,

afetando a mente. A passagem a seguir complementa a explicação.

What I term phaneroscopy is that study which, supported by the direct

observation of phanerons and generalizing its observations, signalizes

several very broad classes of phanerons; describes the features of each;

shows that although they are so inextricably mixed together that no one can

be isolated, yet it is manifest that their characters are quite disparate; then

proves, beyond question, that a certain very short list comprises all of these

broadest categories of phanerons there are; and finally proceeds to the

laborious and difficult ask of enumerating the principal subdivisions of those

categories. (CP 1.286)

35

Nomenclatura dada por Peirce a partir do termo grego φανερός, phaneros - visível.

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68

A tarefa da fenomenologia é lidar com os infindáveis fenômenos, observá-los para

generalizá-los em suas grandezas, discerni-los e submetê-los a um número reduzido de

categorias fenomenológicas, pois, caso contrário, se não houvesse algo de universal nelas, se

fossem uma constante relação de fatos díspares, não haveria modo de sistematizá-los. Após

exaustivas pesquisas e de análises empreendidas por Peirce, ele chegou a três elementos

formais onipresentes em todo e qualquer fenômeno: primeiridade, secundidade e terceiridade.

Um modo de compreender a categoria da primeiridade é a condição de

imediaticidade, o momento presente, em que não há nada de anterior, nem posterior ao

fenômeno, só ele, nele mesmo. O que se tem aí é a mônada, qualidade de sentimento, um

universo de meros possíveis. Na categoria da secundidade, o termo usado por Peirce para

referenciá-la, struggle, é bem elucidativo: é a categoria do conflito, da insistência, da

polaridade da consciência (o “eu” e “não eu”), do aqui e agora. Dotada de um princípio dual,

é a monada que se individualiza, é a força bruta.

Ao afirmar que “it is impossible to resolve everything in our thoughts into those two

elements [of Firstness and Secondness].” (CP 1343), Peirce atenta para a terceira categoria. A

natureza fundamental desse modo de ser é a mediação: “Thirdness, in the sense of the

category, is the same as mediation” (CP 1.328). É o que faz o elo entre o primeiro e o

segundo, é o liame inteligível da ação e reação da causa bruta. Conforme comentam Merrel e

Queiroz (2008, p. 293) “a terceiridade inclui ‘mediação’, ‘transformação’ e ‘evolução’,

‘crescimento vital’ [...]. Esta categoria tem sua ‘força motriz’ nos hábitos, leis, e

regularidades”, ou seja, são atributos que implícitam o processo de mediação. Esta sucinta

apresentação das categorias é a porta de entrada para compreender um universo fenomênico

que evolui para a condição da mediação.

3.1 - A realidade do mundo

Segundo Ibri (1992), para Peirce, no aspecto mais metafisico, o mundo que nos

aparece também se sujeita às categorias: o Acaso, a Existência e a Lei. “Acaso, então, como

um fenômeno objetivo, é a propriedade de uma distribuição. Suponha-se uma grande coleção

consistindo, digamos, de coisas coloridas e coisas brancas. Acaso é a maneira particular de

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distribuição de cores entre todas as coisas” (PEIRCE CP 6.30 apud IBRI, 1992, p.40). Já na

probabilidade há existentes, que agem sobre outros (CP 8.191), modos de resistir (CP 1.457)

que estão sujeitos à indeterminação de possíveis relações. A terceira categoria, como

mediação, se apresenta na generalização dos existentes, estabelecendo uma Lei sobre aquilo

que for regular entre os existentes, capaz de criar uma determinação, também sujeita a um

confronto de outro existente irregular que a torne falível. Neste sentido, Peirce introduziu a

doutrina do falibilismo “é a doutrina de que nosso conhecimento nunca é absoluto, mas é

como se sempre flutuasse em um continuum de incerteza e indeterminação” (CP 1.171 apud

IBRI, 1992, p.52). Essa condição é a matriz evolucionista que predispõe o fluxo de

crescimento e que desenvolve, no campo epistemológico, o conhecimento humano.

A concepção de continuum de Peirce predispõe todas as coisas, do pensamento e da

matéria, a um fluxo incessante: “Nature only appears intelligible so far as it appears rational,

that is, so far as its processes are seen to be like processes of thought” (CP 3.422). Este

argumento vai se correlacionar com seu amplo conceito de mente, cuja inteligibilidade não é

particularidade humana: “The old dualistic notion of mind and matter, so prominent in

Cartesianism, as two radically different kinds of substance, will hardly find defenders to-day.

Rejecting this, we are driven to some form of hylopathy, otherwise called monism” (CP 6.24).

O pensamento de Peirce nega a dualidade cartesiana, o logocentrismo que insuflou o

pensamento ocidental, ao propor sobre outras bases a recuperação do conceito de mente, um

estado inteligível, presente existente em toda e qualquer matéria.

[...] Then the question arises whether physical laws on the one hand and the

psychical law on the other are to be taken - (a) as independent, a doctrine of

ten called monism, but which I would name neutralism; or, (b) the psychical

law as derived and special, the physical law alone as primordial, which is

materialism; or, (c) the physical law as derived and special, the psychical

law alone as primordial, which is idealism. (CP 6.24)

Peirce define a matéria também como mente, porém exaurida, confinada a hábitos

inveterados. A mente se define como estado de mediação, que vai desde os mais rudimentares

aos mais complexos. Assim, o conceito de mente unifica os aspectos pensamento-matéria cujo

esteio está no princípio de continnuum. “Por isso, postulou também a continuidade entre o

físico e o psíquico na similaridade que estes exibem, embora com diferenças de frequência e

intensidade, nos seus modos de acolher a mudança e o devir.” (SANTAELLA, 2007 p. 147).

É possível imaginar um diagrama para ilustrar o fato:

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70

Figura 5 - Diagrama sobre a fluência matéria-mente

Alguns exemplos de hábitos e quebra de hábitos como: um meteorito que vagueia no

espaço, numa trajetória determinada por leis de gravidade de um conjunto de corpos celestes

(mediação de um terceiro), está na condição de hábito inveterado, obviamente que sujeito a

uma ruptura gerada por qualquer instabilidade que afete a mediação existente; a planta que

cresce esguiamente para adquirir maior luminosidade solar; as formigas que têm seu caminho

interrompido ao levarem resíduos de folha para o formigueiro por algum odor que interfira na

comunicação estabelecida pelos seus feromônios; refeições com certos tipos de alimentos em

detrimentos de outros, demonstram níveis de hábitos e uma possível constância que pode ser

cortado por rupturas.

If I may be allowed to use the word “habit,” without any implication as to

the time or mannerin which it took birth, so as to be equivalent to the

corrected phrase “habit or disposition,” that is, as some general principle

working in a man’s nature to determine how he will act, then an instinct, in

the proper sense of the word, is an inherited habit, or in more accurate

language, an inherited disposition. But since it is difficult to make sure

whether a habit is inherited or is due to infantile training and tradition, I shall

ask leave to employ the word “instinct” to cover both cases. (CP 2.170)

Peirce apresenta a ideia de hábito distinguindo a condição de algo herdado,

predisposição, instinto, daquilo que é adquirido e capaz de guiar ações. Nesse caso, as

condutas estabelecidas na mais tenra idade ainda são hábitos e diferem daquilo que já estava

na natureza do existente. Enquanto a distinção de hábito e predisposição atendem à visão mais

metafisica, o termo crença presta-se mais ao universo epistemológico: “Belief is not a

momentary mode of consciousness; it is a habit of mind essentially enduring for some time,

and mostly (at least) unconscious; and like other habits, it is (until it meets with some surprise

that begins its dissolution) perfectly self-satisfied” (CP 5.417). Mais: A crença não nos faz

agir imediatamente, mas coloca-nos numa posição em que nos comportaremos de certa forma,

quando surge a ocasião” (PEIRCE, 1987, p 3). Está no cerne do conceito de hábito a noção de

conduta de ação, mesmo quando se trata de crer em uma concepção.

O objetivo das discussões até aqui foi de apresentar suscintamente conceitos mais

amplos de Peirce que permitem se perceber as bases cognitivas de sua filosofia, a principal

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delas a lei da mediação que torna o mundo cognoscível. Através da mediação, o universo de

variáveis - continuum - gerais, tem singularidades generalizadas que se tornam concebíveis.

3.2 - A teoria do signo

A semiótica ou lógica é a terceira das três ciências normativas e que, seguindo as

categorias, seriam responsáveis pela evolução do sentimento, da ação e do pensamento

humanos: a Estética, a Ética e a Lógica. Esta última, como investigação da verdade, retomará

a Ética, não no sentido do bem e do mal, mas na condição que temos para adotar e aprovar um

ato moral. Mas a Ética encontra seu fim último na Estética, como provedora do admirável que

atrai o sentimento humano sem qualquer razão ulterior. Para ficarmos apenas na lógica, esta

encontra sua base na concepção do signo.

A minha definição de signo é: Signo é um cognoscível, que, de um lado, é

assim determinado (isto é, especializado, bestimmt) por algo diverso dele,

chamado seu objeto, enquanto por outro lado, ele próprio determina uma

Mente existente ou potencial, determinação essa que denomino o

Interpretante criado pelo Signo, i e onde essa Mente Interpretante se acha

assim determinada mediatamente pelo Objeto. (PEIRCE, 1983, p. 121)

O representamen é o primeiro que intenta representar algo, seu objeto. Por isso é

signo, por estar no lugar de uma outra coisa, o objeto. Este é a causa ou determinante do signo

que, por sua vez, produz um efeito em uma mente que Peirce chama de interpretante. O signo

em si mesmo, naquilo que lhe dá fundamento para funcionar como signo, pode ser um

qualisigno – o elemento qualitativo de alguma coisa, um tom, um som, um cheiro; pode ser

um sisnsigno, um existente no tempo e espaço; por fim legisigno – é uma lei, que só pode

atuar como signo quanto se encarna em um sinsigno de tipo especial, ou seja, uma réplica.

O objeto do signo tem dois níveis, um interno ao signo, o outro externo a ele, a saber,

o objeto imediato e o dinâmico. Enquanto este determina o signo, deve haver dentro do signo,

em si mesmo, algo que possa estabelecer algum tipo de relação com o objeto externo que o

determina. Na relação que o qualisigno mantém com o objeto ele é chamado de ícone, o

sinsigno de índice e o legisigno de símbolo. O interpretante do signo, que não pode ser

confundido com intérprete, é o efeito que o signo produz numa mente. Este se desdobra em

três níveis: imediato (potencialidade de produzir um efeito), dinâmico36

(efeito efetivamente

produzido a mente) e final (efeito que o signo deveria provocar no longo curso do tempo).

36

As divisões do interpretante dinâmico são: emocional, energético elógico.

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Os interpretantes finais, remático, dicente e argumento, são respectivamente o tipo

de efeito que o qualisigno provocará, ou seja, uma conjectura, uma hipótese, o rema, o efeito

que o sinsigno provocará, a saber, uma proposição verdadeira ou falsa, um dicente, e, por fim,

o efeito do legisigno, um argumento.

Considerando esses três níveis do signo: qualisisgno, sinsigno, legisigno – ícone,

índice, símbolo – remático, dicente, argumento, Peirce estabeleceu as dez classes de signos37

(fig. 6), entretanto a totalidade de níveis obtém sessenta e seis classes.

Figura 6 - Trecho do manuscrito de Peirce para as dez classes de signo

Fonte: (MS 540.17 disponível em

http://www.cspeirce.com/backgrnd/backgrnd/MS540-17.jpg )

As dez classes de signos não se apresentam como uma simples taxonomia, mas como

princípios de compreensão dos percursos da semiose, de possibilidades de processos

cognitivos. O signo legítimo, que é aquele expoente máximo de um fenômeno de mediação, é

o nível máximo de abstração que se dá no nível do legi-simbolo-argumental. As demais

classes decrescem, ou usando o léxico peirceano, degeneram em direção à primeiridade,

quali-ícone-remático que, neste nível, tem a função de apresentar e não a de representar, pois

qualidades só se apresentam, sem poder de representação. Elas só podem estabelecer

semelhanças com possíveis objetos, devido à sua potência qualitativa. Desse modo, o caráter

monádico da qualidade não estabelece referência, mas se abre à contemplação. A função

indicativa do signo se instala a partir da atuação da indexicalidade, enquanto a função

representativa se instaura apenas no legisigno simbólico argumental. O quadro abaixo (Figura

7) pode esclarecer melhor essas relações.

Figura 7 - Agrupamento por predominância da semiose

37

Queiroz (2007) observa os textos mais centrais em que Peirce desenvolveu a ideias das categorias, fase

iniciada em 1867, registrado em “On a New List of Categories” e “On the Algebra of Logic”, e outra em 1903,

apontada no “Syllabus of CertainTopics of Logic”. Nesta ultima Peirce introduziu as tricotomias mais

conhecidas e as dez classes de signois.

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REPRESENTAMEN OBJETO REMÁTICO

Qualisigno icônico remático

Sinsigno icônico remático

Sinsigno indicial remático

Sinsigno indicial discente

Legisigno icônico remático

Legisigno indicial remático

legisigno indicial discente

legisigno simbólico remático

legisigno simbólico indicial

legisigno simbólico argumental

Legenda:predominância da semiose no nível da primeiridade,predominância da semiose no nível da

secundidadepredominância da semiose no nível da primeiridade

Fonte: adaptação do diagrama de Peirce para as classes de signo ( disponível em

http://www.cspeirce.com/backgrnd/backgrnd/MS540-17.jpg )

3.3 - Os tipos de raciocínio

A Lógica ou Semiótica também apresenta subdivisões: a gramática especulativa

(teoria dos signos), a lógica crítica e a Metodêutica38

. Para o discurso sobre cognição proposto

para este estudo, a lógica crítica é, para nós, o ponto final desta síntese. Enquanto a gramática

especulativa estuda a classificação dos signos, a lógica crítica analisa os níveis de raciocínio: :

a abdução, a indução e a dedução:

Abduction is the process of forming an explanatory hypothesis. It is the only

logical operation which introduces any new idea; for induction does nothing

but determine a value, and deduction merely evolves the necessary

consequences of a pure hypothesis. Deduction proves that something must

be; Induction shows that something actually is operative; Abduction merely suggests that something maybe. (CP 5.171)

Enquanto os estudos sobre tipos de inferência que ocorrem no segmento da Filosofia

estabelecem a indução (premissas particulares geram uma premissa geral) e a dedução

(premissas gerais encapsulam premissas particulares), para atender a indagações sobre os

efeitos práticos de um conceito, na constituição da soma total do conceito39

, fundado nas

categorias fenomenológicas, Peirce propôs três tipos de raciocínio, ou seja, acrescentou aos

dois anteriores a questão da abdução, que está na formação da hipótese. Na inferência

abdutiva, nada estaria em nosso intelecto que não passasse primeiro pelos sentidos. Estes são

os filtros sensórios ligados à mente, na qual os processos cognitivos são acionados.

38

A metodêutica é a teoria do método científico, decorrente da interrelação dos tipos de raciocínio. 39

Esse evento decorreu na série de palestras que Peirce realizou em Havard, em 1903, a convite de William

James

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3.4 - Questões sobre a cognição

O objetivo deste capítulo, ao apresentar parcial e sinteticamente o legado peirceano,

é apresentar dados que agora serão retomados para a abordagem da cognição na linguagem

visual. Os estudos de Peirce para a cognição começam a partir dos textos publicados entre

1868 a 1869, no The Journal of Speculative Philosophy: “Questões Referentes a Certas

Faculdades Reivindicadas pelo Homem” (CP 5.213-63), “Algumas Consequências das Quatro

Incapacidades” (CP 5.264-317) e “Fundamentos para a Validade das Leis da Lógica: Outras

Consequências das Quatro Incapacidades”. (CP 5.318-57), um conjunto de ensaios

conhecidos como “cognition series” e anti-cartesianos. A base da Filosofia de Peirce é,

portanto, uma filosofia da cognição, esta baseada em signos.

Enquanto a tradição dos estudos sobre a cognição40

partem sempre do sujeito, a

originalidade peirceana encontra-se em centrar os processos cognitivos no signo. A cognição

no sentido mais amplo está fundada na categoria da terceiridade, a mediação entre os

existentes, e, no sentido mais operativo, em termos da perspectiva ensino-aprendizagem, nos

tipos de inferência, portanto a Semiótica é de natureza essencialmente cognitiva.

No texto para o “The Monist” (CP, 6.238) Peirce desenvolveu a doutrina sinequista

(Continuum), da continuidade entre os aspectos físicos e mentais que consequentemente lança

luzes sobre o problema mente-corpo. Na análise da constituição da matéria e da teoria

molecular do protoplasma, a tríade no mundo fisiológico, Peirce associou as principais

características físicas de protoplasma com os três principais tipos de ação mental:

As funções do Sistema Nervoso são três, correspondentes às três classes de

consciência. São primeiro, a Irritabilidade, já que a capacidade de uma

célula nervosa para entrar em condição de excitação é indubitavelmente a

base fisiológica da sensação; segundo, o poder de transmitir perturbações

nervosas às fibras nervosas, já que é por essa propriedade dos nervos pela

qual estamos em relação com o mundo exterior; e terceiro, o poder de

adquirir hábitos, que é a base da nossa capacidade de aprender. As

propriedades do protoplasma em geral são três, primeiro, sua capacidade

entrar em um estado mais líquido e tem ao mesmo tempo uma coesão mais

forte e uma tensão na superfície; segundo, a tendência dessa condição de

estender-se por toda a massa; e terceiro, seu poder, quando entra e sai dessa

condição, de assimilar nova matéria, sempre que estase apresente de tal

modo que está sujeita às mesmas forças que produzem o transtorno, em

outras palavras, o poder de crescimento como é tudo o que isso implica. (CP

6.133).

40

Piaget e Vygotsky, mais recentes, Ausubel e Gardner, são os autores que estão na base das orientações do

pensamento educacional brasileiro

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A conduta “entrar e sair”, “de assimilar nova matéria”, que Peirce identifica como

terceiro, uma generalização, é uma extensão do sinequismo. O universo flui para o

desenvolvimento de hábitos. Estes são processos de regularidade em um universo de

particulares: “The most important operation of them is that of generalization” (CP 1.82).

Onde há hábito, há mente, há generalização operacional concreta e abstrata: “The intimate

connection between generalization and continuity is to be pointed out” (CP 184).

O processo imprescindível para a mediação é a transposição do singular em

generalização, uma conduta operante entre mentes, pois, caso contrário, um universo de

singularidades não estabeleceria conexões, consequentemente condutas. Destarte, a mediação

(cognição) é um fenômeno do continuum, condição que reclama para si um “antes”, “agora” e

“depois”. Ao transpor para a semiose humana, a processualidade cognitiva estará sempre

atrelada à cognição anterior para subsidiar cognições posteriores.

Na série de texto, sistematizados como “A Guess at the Riddle”, a referência sobre a

tríade na psicologia, Peirce faz considerações à cognição iniciando pelos tipos de consciência:

It seems, then, that the true categories of consciousness are: first, feeling, the

consciousness which can be included with an instant of time, passive

consciousness of quality, without recognition or analysis; second,

consciousness of an interruption into the field of consciousness, sense of

resistance, of an external fact, of another something; third, synthetic

consciousness, binding time together, sense of learning, thought.(CP 1.377)

Sobre essa tríade, Peirce (CP 3.778) segue relacionando-as às três formas da lógica:

qualidade, relação e síntese. Nesta última se justifica a mediação na consciência plural,

processual e o sentido de aprendizagem. Aparentemente, a primeira consciência, dada sua

imediaticidade, não tem nada que a guie. O segundo estado interrompe o imediato para torná-

lo pretérito, a consciência reativa. A polaridade das reações em um traço de regularidade

predispõe aos processos associativos e, por fim, segue a equalização. Queiroz (2001) fornece

termos (Figura 8) que definem as três formas de consciência.

Figura 8 - propriedades associadas às três categorias

Consciência de

Primeiridade ou monádica

Consciência de Secundidade

ou diádica

Consciência de Terceiridade

ou triádica

Feeling, não-análise, não-

comparação, instante, sem

partes, simples, qualidade

possibilidade

Experiência, hard fact

oposição, esforço, ocorrência

nowness, resistência, hereness

volição, dualidade

Representação, mediação,

processo, cognição, hábito,

generalidade, continuidade,

crescimento, difusão, semiose

Fonte: QUEIROZ, J. (2001, p 215)

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Peirce, na sequência daquilo que funda seu pensamento, as estruturas lógicas, propõe

duas subdivisões para a consciência polar:

Note, too, that just as we have seen that there are two orders of Secondness,

so the polar sense splits into two, and that in two ways, for first, there is an

active and a passive kind, or will and sense, and second, there are external

will and sense, in opposition to internal will (self-control, inhibitory will)

and internal sense (introspection). In like manner, just as there are three

orders of Thirdness, so there are three kinds of synthetical consciousness.

(CP 1.383)

A consciência, como o princípio de alteridade “eu-não eu”, reativa, que reúne sentido

e volição, da ação e reação, passivo e ativo, é uma consciência polar. No nível da

inteligibilidade, a consciência sintética apresentará duas formas de associação por

contiguidade e similaridade. Nas palavras de Peirce (apud JORGE, 2014 p. 81): “Por outro

lado, a associação, ao invés de ser uma disposição natural da mente, pode ser um hábito

adquirido da mente. Isso faz supor que ideias semelhantes tenham sido unidas na experiência

até que elas tenham se tornando associadas. Isto é chamado de associação por contiguidade.”

A contiguidade se estabelece na mente pela experiência que “é o elemento imposto

pela história de nossas vidas” (CP 5.581). Ela é guiada por um poder. A similaridade é guiada

por forças internas. Ao esboçar os níveis de consciência sob o viés peirceano, com vistas a

compreender as instâncias da cognição, dois conceitos insistem: a percepção e a memória. A

percepção está para a secundidade, assim como a cognição está para a terceira categoria.

Inserir a memória na secundidade é fato a ser visto com parcimônia. Sobre a percepção,

Peirce argumenta:

Nada podemos saber sobre o percepto a não ser pelo testemunho do

julgamento de percepção, exceto o fato de que nós sentimos o golpe do

percepto, a reação dele contra nós, assim como vemos os conteúdos dele

arranjados num objeto, na sua totalidade – executando-se também,

certamente, o que os psicólogos são capazes de extrair inferencialmente.

Mas, no momento em que fixamos nossa mente sobre ele e pensamos sobre

o menor detalhe dele, é o juízo perceptivo que nos diz o que nós assim

percebemos. Por esta e outras razões, proponho considerar o percepto, tal

como ele é imediatamente interpretado no juízo perceptivo, sob o nome de

percipuum. (CP 7.643 apud SANTAELLA, 2012, p. 92-93)

Os três níveis do processo perceptivo estão postos: o percepto, percipuum e juízo

perceptivo. Não há outro modo de traduzirmos o percepto que não seja pela generalidade

empírica pré-existente no juízo perceptivo (o signo), essa tradução se dá do seguinte modo:

objeto dinâmico (o percepto), o percipuum (objeto imediato) estabelecerá aquilo que é

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singular para a confirmação e julgamento perceptivo (asseveração sobre aquilo que é

percebido, o percepto) (Figura 9). As generalidades funcionam nas extremidades categoriais,

o percepto e “juízo perceptivo” ou “Asseveração”. A passagem do objeto dinâmico (percepto)

pelo imediato (percipuum) até o juízo perceptivo equivale a um filtro equalizador, de

confronto, entre o pré-existente e o novo insistente.

Figura 9 - Semiose perceptiva

Fonte: adaptação de Santaella, 2008

A cognição se manifesta nas estruturas mais ínfimas [...] For reaction is existence

and the perceptual judgment is the cognitive product of a reaction (CP 5.156), o julgamento

está tanto na recepção do estímulo como na finalização. Outra afirmação de Peirce é que toda

cognição é guiada por uma cognição anterior, assim surge a questão do preexistente, daquilo

que é pretérito para uma experiência, a conduta interrompida e regenerada em novo hábito.

Disso se infere que a mente é dotada de condições preexistentes (os órgãos sensoriais e os

esquemas mentais) e os hábitos já instaurados seriam o equivalente à memória.

Were member it [sensation]; that is to say, we have another cognition which

professes to reproduce it; but we know that there is no resemblance between

the memory and the sensation, because, in the first place, nothing can

resemble an immediate feeling, for resemblance supposes a dismemberment

and recomposition which is totally foreign to the immediate, and in the

second place, memory is an articulated complex and worked-over product

which differs infinitely and immeasurably from feeling. (CP 5.379)

Na própria sensação, tem-se algo de cognitivo funcionando para o processo de

mediação. O sentir, que está na base de qualquer tipo de consciência, traz sempre presente

algum nível de cognição (CP 1.381). Observando a ideia original:

Here then, we have indubitably three radically different elements of

consciousness, these and no more. And they are evidently connected with the

ideas of one-two-three. Immediate feeling is the consciousness of the first;

Signo

Juízo perceptivo

Objeto dinâmico Percepto

(externo a nós)

Objeto Imediato - Percipuum (corretivo)

Asseveração do

Juízo perceptivo

1

2 3

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78

the polar sense is the consciousness of the second; and synthetical

consciousness is the consciousness of a third or medium. (CP 1.382)

Brunson (2007) faz asserções sobre o conceito de memória na obra de Peirce. Ao

inventariar a relação do conceito com o pragmatismo, observa a tendência sinequista do

conceito, a generalidade presente tanto na precedência como na conduta. Nas semioses

perceptivas “…every memory of a sensation is more or less vague, that is, general” (CP

7.407), nos níveis de pretérito da consciência, na anterioridade da cognição, assim como se

expande na inteligibilidade provocada pela mediação.

Pragmaticism consists in holding that the purport of any concept is its

conceived bearing upon our conduct. How, then, does the Past bear upon

conduct? The answer is self-evident: whenever we set out to do anything, we

"go upon," we base our conduct on facts already known, and for these we

can only draw upon our memory. It is true that we may institute a new

investigation for the purpose; but its discoveries will only become applicable

to conduct after they have been made and reduced to a memorial maxim. In

short, the Past is the storehouse of all our knowledge. (PEIRCE, 2013, p

123)

A memória é o hábito adquirido, que oferece certa condutibilidade à sensação e à

consciência. É o potencial das nossas experiências acumuladas a guiarem nossos

pensamentos, é uma substância sob a constante ação da cognição. Tendo em vista que todas as

experiências podem ser submetidas à classificação das categorias, cabe uma contextualização

fenomênica das relações entre: percepção, cognição, memória e consciência.

A condição que reveste a percepção de primeiridade é indubitável, assim como a

cognição de uma terceiridade. A consciência no seu ímpeto de alteridade, a memória, na sua

condição pretérita, assume a secundidade, mas, enquanto geral, como vago material do juízo

perceptivo e hábito adquirido, está na primeiridade e na terceiridade.

Entretanto, não se trata de locar conceitos numa ou outra categoria, pois, conforme

foi explicitado até o momento, existe algo de cognitivo desde o julgamento perceptivo até as

esferas da consciência sintética, os processos de cognição em desenvolvimento dependem de

experiências pretéritas e presentes. A simples taxonomia pode ser estática, portanto é viável

como esses aspectos se comportam frente às propriedades de cada categoria (Figura 10).

Figura 10 - Relações categoriais

FEELINGS ALTERIDADE MEDIAÇÃO

PERCEPÇÃO Juízos perceptivos Objeto Asseveração

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CONSCIÊNCIA Imediata Polar Sintética por

associação similar ou

contigua

MEMÓRIA Latente Referencial Condutora

COGNIÇÃO Vagueza Concreta Operativa

Para verificar a sistematização, é prudente contextualizar a partir de um fato

concreto, singular, um possível gerador indutivo, que possa dar pistas. Cientes de que os

termos traduzem fenômenos de natureza para além do caráter antropocêntrico, segue a análise

de um processo de aprendizagem sem o predicativo ensino, pois se assim fosse supõe a

análise de dois sujeitos: cognoscente e mediador.

Numa determinada turma de adolescentes na faixa de 14 anos, foi dado o conteúdo

de planificação de um cubo. (a) O contato inicial dos alunos com o objeto de aprendizagem

foi através de desenho de um cubo em perspectiva (forma bidimensional dando ilusão de

tridimensional) apresentado na lousa com giz branco, somado à mediação verbal do professor:

explicação do significado da palavra planificação. (b) Alguns alunos logo inferiram e, como a

resposta deveria ser dada através de um esboço gráfico, apresentaram desenhos com apenas

quatro faces. (c) Diante da lacuna foi retomado o desenho do cubo como se fosse um dado,

portanto, foram apontados os números de cada face de um dado para as faces aparentes,

exceto duas ausentes pela representação gráfica. (d) Alguns alunos realizaram autocorreção e

outros conseguiram rascunhar atendendo às expectativas. Porém, um número bem menor

ainda não compreendia a quantidade de faces necessárias para atender à ideia de planificação.

(e) Foi apresentada uma caixa de papelão aberta na frente dessa minoria, depois conseguiram

compreender a planificação, mas, houve um caso, que ainda estava ineficaz, e (f) o

cognoscente só conseguiu avançar após, linearmente, tocar face após face da caixa, montá-la e

desmontá-la duas vezes.

Figura 11 - Simulação das etapas das atividades de planificação do cubo

A.

B.

C.

D. E. F.

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Do ponto de vista da percepção, os perceptos centrais desse contexto, as formas de

estímulos, que foram apresentados com o intuito de ponto de partida do processo de cognição,

referem-se aos conteúdos e expectativa de aprendizagem a serem alcançados (produto

cognitivo). Estes foram aqueles que mobilizam os campos sensoriais da visão e audição,

através do desenho e das sentenças verbais proferidas – ícones, índices e símbolos. Não se

pode imaginar a percepção como fluxo estancado, mas como fluxo continuum, sujeito a

vigorar, degenerar ou provocar hábitos na mente. Há um caso especifico em que a percepção

precisou do estimulo cutâneo para iniciar o processo de degeneração de um hábito, aquele

adolescente que não conseguia executar o rascunho. A apreensão estava limitada a alguma

conduta anterior que impedia deliberar processos associativos.

A questão flexível da percepção precisa ser evidenciada: a semiose perceptiva é

dependente do equipamento sensorial, ela flui para um estado de consciência imediata, que

poderá ou não evoluir para o estado de consciência polar e, depois para a sintética. No

decorrer do incessante fluxo perceptivo, outros estímulos estão se apresentando, mas muitas

vezes a condição seletiva ou poder de controle de uma consciência polar impele os demais na

imediaticidade. As dificuldades de compreensão que levaram o aluno a manipular o objeto

para atender às expectativas de aprendizagem, denotam a degeneração da consciência

sintética. Aqueles que precisaram da relação com o dado operaram com a consciência

sintética, associando outra experiência para guiar aquela que se apresentava naquele

momento. O próprio fato da autocorreção também é um processo associativo, cujos erros para

a expectativa desejável, requerem a alteridade relacionada à similaridade.

Tendo em vista que a experiência é guiada pela sua anterioridade, a memória não

está presente apenas na associação com o dado, tão fácil de notá-la nas reações de

referencialidade provocadas pelo signo. O próprio fato de domínio dos códigos da língua faz

uso do recurso da memória. Toda memória está como segundo em relação à efetivação

cognitiva, porém, na condição de pré-disponível, passado, é habito instalado.

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A cognição é processual, está presente de modo conectivo entre as experiências

desde a percepção sensorial, no modo reagente das formas de consciência, na sistematização

de dados da memória, portanto, ao finalizá-la estamos falando de produto cognitivo, que não

pode ser traduzido no simples domínio fixado em algum suporte de linguagem, mas

primeiramente numa conduta de raciocínio exclusiva para determinados conteúdos ou

extensiva à diversidade de outros conteúdos.

Mediante essas descrições que mais enredam do que separam os termos, aliás, o que

é esperado, dada as relações intrínsecas, cabem algumas inferências: na base delas estão -

ação, reação e mediação, que correspondem à percepção (o estado externo age sobre o

interno), pensamento (atitude gerada pelo estado interno dotado de repertório) e conexão

(estados internos e externos). A cognição exemplificada para este estudo, sob o recorte mais

especifico em relação de argumento geral sobre o fenômeno, as práticas de aprendizagem.

Estas são ambientes de cognição que envolvem dois elementos - objeto de aprendizagem e

sujeito de aprendizagem. Os sujeitos de aprendizagem operam naturalmente, independente de

sujeitos de ensino, caso contrário, seria a negação dos princípios semióticos desenvolvidos até

agora. Essa autonomia do sistema de aprendizagem pode ser deliberada ou controlada por

aquele que aprende, ou ainda conduzida por orientação externa sistematizada, a escola e o

norteio de práticas didáticas. Existem, pois, perfis cognitivos definidos a partir do modo

sensorial.

3.5 - Uma conclusão capitular

A breve socialização do pensamento peirceano se justifica na forma de subsidiar

conceitos para a compreensão de um processo cognitivo que se processo a partir de algo

externo ao cognoscente, o signo. O processamento cerebral é, por extensão, uma das possíveis

materialidades deste elemento externo: o signo.

A análise peirceana de Nöth (2013) sobre os “signos educadores” demonstra a

“metodologia de ensino de Peirce” (NÖTH, 201 p. 94) na eficiência de aprendizagem através

de diagramas, muitas vezes, ignorada na fundamentação da práxis educacional que ocorre na

rede de ensino. O autor adverte sobre a crença para os educadores dos signos como meros

instrumentos da aprendizagem. Ele reconhece, ao contrário, o signo como agente de

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aprendizagem, por si só, independente da ação docente, que, para este estudo, explica a

automação da aprendizagem pelo sujeito. A autoaprendizagem, prenunciada como processo

inato do sujeito nas sequências didáticas, que se alargam na práxis, pode ter como causa o

caráter autônomo da cognição do signo.

Para Nöth (ibid, p.79), as premissas semióticas são:

Primeiro, a definição de signo: signos ocorrem em processos de semiose nos

quais eles representam um objeto, um termo que inclui imagens mentais e

ideias, e eles criam um interpretante, uma ideia, um sentimento ou uma ação

que é resultado do signo, Segundo, as premissas cognitivas que “todo

conhecimento chega até nos por observação” (CP 2.444, 1903) e que “todo

nosso pensamento e conhecimento se dá em signos” (CP 8.332, 1904), e,

Terceiro, provavelmente a maior premissa de todas, a premissa do

agenciamento do signo, ao menos dos signos verbais, de acordo com a qual

“todo símbolo é uma coisa viva, num sentido muito estrito que não é mera

figura de linguagem”. (CP 2.222)

Partindo dos argumentos e, a priori do nível simbólico, Nöth analisa em três

instâncias: o signo como agente, como educador e em que níveis ele processa a aprendizagem.

Como agente: o fenômeno de terceiridade, da inteligibilidade, possui propósito – um signo

predispõe a ser interpretado por outro signo, autorreplicação – um símbolo se inscreve em

diversas materialidades, mantendo a lei interpretante, autopoiesis – o símbolo gera outro

símbolo e autocontrole – a condição da ruptura da conduta, a equalização entre significados

passados frente aos novos. Ainda sobre a autopoiesis do signo:

Entretanto, os “fazedores” de símbolos não podem criar símbolos

independentemente do sistema semiótico, a sintaxe, a semântica e a

pragmática dos sistemas simbólicos que ditam as regras de produção de

símbolos. Assim, na medida em que a mente humana e suas expressões

simbólicas são moldadas por leis dos sistemas semióticos subjacentes, então

os “fazedores” de símbolos são restringidos e determinados pelos símbolos

que acreditam estar fazendo. Neste sentido, os símbolos são os coautores das

mensagens humanas e os homens que criam mensagens simbólicas são

apenas agentes semiautônomos, ainda que acreditem que, através dos

símbolos, estão se expressando “eles mesmos”. (NOTH, 2013, p. 83)

Os sistemas em que os sensores se especializaram dependeram da experiência, da ação

do mundo externo sobre o organismo. Os signos crescem em direção à padronização,

adquirem organizações semânticas a partir da estrutura receptora do sujeito, mas que foi

modelada no processo evolutivo pela internalização do próprio signo no sujeito.

O signo, como educador, é a relação entre as categorias da secundidade e da

terceiridade. Para Peirce (apud Nöth, 2013) não se pode aprender somente com as impressões

sensoriais, simples experiência de sentimentos reativos, mas do seu efeito interpretante. A

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alteridade, a causa eficiente dos fenômenos, não possui propósito; a mediação, a causação

final dos fenômeno, é operativa; a experiência não se restringe apenas à secundidade.

Como os signos ensinam é o terceiro argumento de Nöth (2013), exposto nas classes

de signos: os níveis do objeto do signo sob efeitos interpretantes remáticos apresentam, os

níveis do signos sob efeito interpretante dicente estão aptos à transmissão e,

consequentemente, à aprendizagem, mas com ação didática aberta pela sua indexicalidade e,

na contrapartida, os efeitos interpretantes de lei se constituem como hábito que: “Para um

aluno que não internalizou o hábito pelo qual se associa o símbolo desconhecido ao seu

objeto, o signo novo é à primeira vista incompreensível, deve ser aprendido por uma mudança

de hábito” (NÖTH, 2013 p 92), ou seja, a aprendizagem é ineficaz.

A eficiência da aprendizagem dependeria do não esvaziamento dos níveis do objeto do

signo: ícone, índice e símbolo. Os diagramas, mais que as metáforas, são para Peirce “o mais

perfeito dos signos” pelo modo que engendram os três níveis do objeto.

No decorrer desta síntese, exemplos pululam, entre eles a difundida crise do ensino da

disciplina de matemática, também denominada de lógica simbólica para os especialistas, tem

nascitura espacial, portanto imagética, mas é ensinada através de símbolos esvaziados dos

índices e dos ícones. Tanto que sistemas alternativos intentam ensinar com a utilização de

objetos concretos em vez de símbolos de quantificação.

A ideia de uma semiótica da cognição propõe exatamente contrapor a compreensão do

fenômeno cognitivo a partir do sujeito, seja na ótica de dentro para fora dos cognitivistas ou

de fora para dentro dos comportamentalistas, assim como a linguagem, mais valorizada na

forma verbal, assume sempre a posição de refração desse processo e a visualidade, a que cabe

um papel de indicadora do estágio do pensamento de natureza verbal.

A abrangência de doutrinas engendradas em prol de revelar o fenômeno cognitivo é

complexa, porém, estende-se e enreda-se, do particular ao plural. Concepções como a

“equilibração” de Piaget, desenvolvimento proximal de Vygotsky, mapas conceituais de

Ausubel, e as orientações didáticas de Zabala, tipologia do conteúdo de Coll, são explicáveis

sob um arsenal teórico unificado, com a diferença do deslocamento da causa para além do

sujeito e objeto, para a lei da mediação que rege o mundo.

Em suma, o ato de aprendizagem se constitui de relações entre apresentações e

sínteses, diagramas são eficientes, mas outras possibilidades didáticas, que aludam a esse

percurso terão efeitos mais positivos que a educação processada apenas no nível simbólico.

Signos simbólicos precisam referenciar seus níveis antecessores e encapsulados.

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Neste sentido, a imagem, enquanto corpus da visualidade, é signo, portanto enreda

semioses, estabelece processos cognitivos e, logo, deve subsidiar formas de raciocínio, mas

para isso precisa ser compreendida na sua lei, no seu estatuto de linguagem: sintaxe, forma e

discurso. A aprendizagem se constitui da experiência sensorial que se torna operativa na

construção de novos hábitos. Portanto, na decodificação nominal de imagens. E estabelecer

conjecturas desse ato é um processo de aprendizagem, mas alicerçada no modo verbal. Na

cognição de objetos visuais, há uma gramatica visual latente, circunscrita e a experiência,

carente de ser reconhecida no nível simbólico, cujos tratamentos de ensino aprendizagem, na

grande maioria, não acessam esse banco de dados. A hipótese que se estabelece nesses

argumentos é: se os diagramas são educadores perfeitos pela sua integração dos níveis do

signo, se o nível simbólico ou indicial cegos são ineficazes, a cognição visual das imagens

seria mais potente se as estruturas de lei que a constitui fossem mais operacionalizadas, além

do campo das experiências.

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85

CAPÍTULO 4 - LINGUAGEM VISUAL

A visualidade tem sido objeto de investigação de algumas áreas: registro de

memória, a História (da Arte) e a antropologia (visual); objeto de discurso estético, na

filosofia; desenvolvimento cognitivo no sujeito, psicologia; no processamento da imagem, nas

Neurociências e demais ramos das Ciências Cognitivas; nas ciências da significação e nas

ciências da Comunicação sobre o percurso de sentidos; em outras áreas interdisciplinares

como a atual Cultura Visual sobre condutas sociais, enfim, mas para o momento é preciso

compreender alguns fatos. Neste momento, o objetivo é definir primeiramente o que é

linguagem e verificar se a visualidade está encapsulada por esse conceito. Em caso positivo, a

segunda etapa é qual é o território sintático, morfológico e discursivo da visualidade? Como

ela aparece na evolução da espécie? Como ela se inscreve no mundo replicador do signo, os

suportes?

Na sequência da doutrina do signo triádico, visto no capitulo anterior, a ação do

signo, a interpretação de um signo noutro signo, semioses são sistemas de linguagem, são

pensamento. É um fenômeno da mediação que se estende e se instala entre mentes. Se a

Mente é a continuidade da matéria, portanto, dado a diversidade de matéria, haverá tipos de

mentes, por exemplo, a condição que diferencia as nossas semioses daquelas de alguma outra

espécie animal ou, até mesmo, vegetal.

4.1 - Evolução da visualidade

Dagalarrondo (2011) inicia seus estudos sob a perspectiva evolucionista do cérebro,

questionando a concepção de progresso sob forte antropocentrismo decorrente do pensamento

científico, principalmente a partir do século 18. Afirma que a evolução de toda e qualquer

espécie é guiada pela reprodução e sobrevivências que implicam na melhor adaptação. Um

exemplo são as eliminações de certos órgãos sensoriais em valoração de outros, como é caso

daqueles que são “cegos” decorrentes da adaptação a ambientes subterrâneos, economia

metabólica ou a vida noturna, para garantirem a sobrevivência e continuidade da espécie.

A ideia de evolução deve ser entendida como adaptação em um mundo de

possibilidades, que as coisas estão sujeitas a ação de outras coisas, reagindo através de um

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modo mediativo, inteligente. Hábitos são formados, desaparecem, novos se instalam. Esta

perspectiva antropológica propõe hábitos na condição de invertebrados, transmitidos por

código genético, que nos chega como instintos, predisposição da máquina biológica. Estes se

estabelecem e perduram no decorrer de um prazo temporal bem diferente dos hábitos

adquiridos no hiato da nossa existência.

Outra relevância do estudo panorâmico de Dalgalarrondo é ressaltar a trajetória não

linear da evolução. O estudo sobre a questão se apresenta numa sequência de fatos que não

ocorrem sob a constância de variáveis, mas de situações irregulares. O autor extrai das ideias

de Georg Striedter três princípios da organização e evolução do sistema nervoso e do cérebro

(em mamíferos):

O primeiro princípio, possivelmente um dos mais relevantes para a

evolução do cérebro, é o que afirma que muitos aspectos da estrutura e da

função do cérebro são conservados ao longo da evolução das espécies

animais [...]. Um segundo princípio, também muito importante, está

relacionado ao tamanho absoluto dos cérebros. Ao focar não as semelhanças

entre os cérebros de duas espécies (baseadas na “conservação”), mas nas

diferenças nas novidades que produzem, constata-se que o importante

principio de que os cérebros tendem a mudar suas organizações internas à

medida que mudam de tamanho. [...] São três tipos: 1) mudanças

desproporcionais no tamanho de certas substruturas como aumento global; 2)

mudanças da organização interna das subestruturas; e 3) mudanças no

padrão de conectividade. [...] Por fim, um terceiro princípio diz respeito a

relação entre cérebro do organismo, todo o espectro de comportamento que

ele utiliza em sua vidas e as condições e desafios ambientais impostos pelo

seu nicho ecológico especifico, pelo seu habitat.(DALGARRONDO, 2011 p

24-25-27)

Apesar de não enfatizar uma situação intrínseca, estão implícitos três princípios na

modelagem matricial: a insistência da preservação da estrutura, a dimensão absoluta e a

influência dos meios. Do terceiro para o primeiro, o cérebro não é algo à mercê apenas da

exterioridade, possui uma estrutura mutável dentro da diversidade que o constitui e é fruto da

especialização sobre sua origem matricial. Striedter, exposto por Dalgarrondo (ibid), revela a

análise a partir dos mamíferos, mas é interessante ressaltar que a condição movente de

qualquer espécie aumenta a de predisposições à mediações.

A perspectiva evolutiva dos seres unicelulares e a complexidade do cérebro humano:

percepção, reação, associação de informações, decorreram de um fluxo fascinante, cuja

propulsão foi mérito da movimentação e mediação:

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[...] Ao longo da evolução vão se diferenciando células especializadas em

receber mensagens (inicialmente química se físicas) do ambiente exterior e

células com funções contrateis voltadas as ações no ambiente, como, por

exemplo, a movimentação necessária a obtenção e nutrientes. (ibid.,p. 67)

Avançando desse fato comum entre invertebrados e vertebrados, fixa-se sobre os

primatas, que desenvolveram readaptações do corpo decorrentes da provável necessidade de

sobrevivência, entre elas a condição de viver nas árvores para fugir aos predadores. Algumas

dessas características que interessam a este estudo foram: o desenvolvimento de estruturas

musculares e ósseas que aumentaram a flexibilidade e movimento; a redução dos aparatos

olfativos; tendência à manutenção ereta do corpo e os olhos dirigidos para frente. Essa

sequência de reações incitou a sofisticação do nosso aparelho ocular em relação às outras

espécies.

Em suma, sob o viés ontológico peirceano, as ideias de co-evolução é a causa bruta,

mecânica, cujos existentes se apresentam em estado de conflito, reagentes entre si, guiados

por uma causa inteligente, ou seja, a mediação que instalou hábitos transmitidos no DNA.

Este processo seria uma espécie de semiose da evolução.

Tendo em vista que este aprofundamento foge a questão nuclear do estudo, fixamos no

observável nas espécies moventes, inclui-se ai a espécie humana, conexões que colaboram no

funcionamento biológico maquinal e outras que a inserem em estado de comunicação com o

meio, ambas interdependentes.

Santaella (1998, p. 12-13) faz afirmações ao questionar possíveis fatores que levaram

à dominância de alguns sentidos: como o olho e o ouvido, as conexões que os dinamizaram

em relação ao cérebro:

Depois de muito pensar sobre isso, comecei a fazer uma pergunta que, a meu

ver, deve ser levantada anteriormente a qualquer outra. Por que será que só o

olho e o ouvido foram premiados pela invenção de extensões que lhes

aumentam o potencial? A tentativa de resposta a essa questão,

presumivelmente anterior, nos leva à curiosa constatação de que só o olho e

o ouvido são órgãos dos sentidos diretamente ligados ao cérebro, ou melhor,

são buracos que se conectam diretamente com o cérebro, em oposição aos

outros sentidos, que são buracos ligados as vísceras, sendo sentidos mais

viscerais, portanto.

Essa caracterização da natureza dos sensores estabelece semioses distintas, uma que

predispõe o organismo em estado mediativo com o mundo em aspectos mais comunicacionais

e outro, que não deixa de ser mediação, que privilegia a funcionalidade orgânica, a semiose

no mundo biológico, ambas são interdependentes. Um descontrole do tato na regulação

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térmica, ou a ingestão de certa substância inadequada ingerida, ou ainda, um aviso ignorado

do olfato pode provocar a alteração no corpo e, logo, afetar órgãos como audição e visão.

Se não é abusivo, pode-se dizer, consequentemente, que olho e ouvido,

embora também corporais, são sentidos mais cerebrais, enquanto os outros

sentidos são mais corporais do que cerebrais, oque não quer dizer que eles

não sejam capazes de criar formas de pensamento ou quase-pensamento que

lhes são próprias. (ibid, p. 13)

Do ponto de vista da Teoria do Signo, os órgãos “mais viscerais” possuem uma

mediação, apresentam qualidades como: temperatura, calor, cheiro, sabores, e

consequentemente rementem a outras representações indexicais, porém, sujeitas a maior

integração das representações que afetam os sistemas sensoriais.

A nossa evolução fez dos olhos e dos ouvidos órgãos extremamente complexos: “mas

em verdadeiros órgãos codificadores e decodificadores das informações emitidas e recebidas,

de modo que parte da tarefa que seria de responsabilidade do cérebro já começaria a ser

realizada dentro desses dois órgãos, para ser completada no cérebro.” (ibid, p. 13).

Talvez, no campo aberto das hipóteses, associado à perspectiva evolutiva, a causa

dessa diferenciação poderia decorrer da relação tempo espaço. A hipótese do habitat rude que

geraria risco de sobrevivência (DALGARRONDO, 2011), levou os primatas a saírem do chão

em busca das árvores, assim, o olho e o ouvido estariam mais alertas à seletividade de

identificar comida ou predador e fundamentais à respectiva sobrevivência, sem a proximidade

corporal com outros existentes também móveis, pois demais sentidos urgiriam de maior

proximidade corporal.41

Obviamente que alimento e predador gerariam movimentos

diferentes, o alimento localizado causaria a aproximação e o predador a fuga ou estado de

alerta ao ataque.

Apesar da similaridade da arquitetura histológica do cérebro humano e o cérebro dos

primatas não humanos, a diferença crucial está na capacidade para a linguagem articulada e

complexa (ibid, 2011). Nos antecessores do homo sapiens são encontrados indícios das áreas

de Broca e de Wernicke, responsáveis respectivamente pela fala e pelo conhecimento,

interpretação e associação das informações, mais especificamente a compreensão da

41

Há espécies em que o olfato e paladar são capazes de sofrerem a estimulação a longa distância do objeto de

estimulo.

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89

linguagem42

. Entretanto a constituição celular estabeleceu as diferenças. Trata-se do hiato que

explicaria a passagem da capacidade de desenvolver a linguagem simbólica. Superada a

ruptura inicial, o Cérebro e linguagem co-evoluíram em ciclo autoalimentado, de tal forma

que um aumento da eficácia e da complexidade de um levava aos mesmos aumentos no outro,

portanto, a unidade mínima da linguagem, o signo, na sua condição de afetar alguma coisa, é

a manifestação mais rudimentar da cognição no cérebro-mente.

Este estudo não se aplica a elucidar tal hiato, mas precisa de um posicionamento

terminológico do predicativo simbólico ao termo linguagem. O movimento do signo noutro

signo, que segue sucessivamente, é a processualidade do signo triádico, é um processo que

permeia as dez classes de signos, cujos quali-ícone-remático está na base e os legi-símbolo-

argumental no final, esta última considerada a tríade genuína do signo, é neste nível que se

reconhece uma semiose simbólica (QUEIROZ, 2003).

Os estudos a respeito da questão são contundentes sobre a exclusividade humana na

condição simbólica (DEACON,1997; ECCLES, 1989; TOMASELLO apud ALLAN,

BARBOSA, 2009; entre outros) porém, contrapondo essa exatidão, tem-se, em menor alarde,

a critica seminal de Queiroz43

(2003) sobre a semioses indiciais em evolução para simbólicas

em primatas não humanos. Na realidade, este paradoxo ilustra que é inegável a comunicação

entre os primatas, portanto é inegável a presença da linguagem, cerne de qualquer processo de

comunicacional, e a semiose simbólica é apenas um aspecto da linguagem. Destarte, a ideia

de linguagem que nos subsidia é ação do signo, semiose, sujeita a diferenciações de acordo

com a natureza do signo: icônica – apresentativa, indexical – representativa e simbólica –

“condutiva”.

Sob a perspectiva evolutiva, a visualidade e a produção de sons guturais estão na

ancestralidade da palavra, ápice de semioses simbólicas no homem. Provavelmente, o som

produzido pela garganta não foi a única sonoridade produzida pelos ancestrais da nossa

espécie, mas o mais próximo de ser praticado como algum tipo de alerta, de sinalizador de

situações.

As análises do percurso evolucionista da espécie indicam fatos para compreender a

visualidade humana: a dependência da luminosidade, a posição binocular e os movimentos.

42

O uso do termo linguagem em diversos segmentos cientificos, inclusive a neurociencias, é revestido

de carater socializante, arbitrário, simbólico, que é próprio da modalidade verbal. Essa forma de

linguagem deslocou o homem no tempo e no espaço, permitiu a autorreferência. 43

Queiroz (2003) propôs uma critica seminal sobre essa relação, mais especificamente, demonstra um

exemplo do efeito de signo simbólico sobre um primata não humano.

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A evolução do olho, conforme relata Lamb (2011), foi acompanhada por duas teorias:

a complexidade irredutível na evolução, quando um sistema não opera na ausência de

quaisquer dos componentes que o constitui, não poderia ter evoluído naturalmente de uma

forma mais primária; porém, a outra tese, darwiniana da evolução, mesmo sem evidências

para a época, o que a Neurociências confirmou posteriormente, ou seja, estava sob a

orquestra da evolução. Dada a discussão exaustiva, o que interessa para o momento é o “olho

receptor de luz” que evoluiu para o “olho câmera”, captador de imagens. Um fato desta

mudança foi o aparecimento do cristalino para captar a luz e focar imagens. Bear (2008)

apresenta o olho com as funções de detectar, localizar e analisar a luz, vai da percepção à

mediação da luz. Porém, o que se denomina de luz precisa da prerrogativa “visível”, ou seja,

a “luz visível”, aquilo que é captável pelo olho humano na parcela das ondas

eletromagnéticas. Outras espécies, como serpentes, com estrutura ocular diversa, percebem o

infravermelho, ondas de calor, que podem sustentar nos hábitos noturnos. O feixe de luz que é

captado insere a espécie na evolução que se adaptou para o “dia”.

Outra importante adequação dos primatas à vida nas árvores foi o fato dos olhos

estarem próximos entre si, situados na região frontal do crânio, miram um mesmo objeto sob

uma diferença angular que permite o cérebro calcular distâncias. Uma das justificativas mais

aceitas para essa condição foi a necessidade de precisão de foco exato para saltos. A posição

binocular, numa ação conjunta de reações do corpo em prol de adaptação, garantira vantagens

aos primatas: o recurso unifocal caso corresse a falência bifocal, o alargamento da

abrangência visual e a paralaxe na construção da profundidade de campo.

O olho integrado ao corpo apresenta três possibilidades de movimento: na

dependência das articulações de giro da cabeça, o giro do globo ocular em si e variação de

velocidade dos raios de luz que afetam a retina.

A soma dessas características tanto demonstra a capacidade limítrofe do olho humano

como a funcionalidade. A natureza do olhar esta para as variações que ocorrem em uma

determinada área de alcance, uma área que se expande na vertical, no horizontal e na

profundidade, puramente tridimensional e no papel de alerta; nessa área de abrangência

seleciona o foco, algo estático ou em deslocamento, sujeito a gerar um comportamento visual

também estático ou acompanhante do foco. Esta análise remonta a uma cena do homem na

inicio da pré-história observando ao seu redor tanto para a fuga de um possível risco de vida

como na busca de alimentos; e o homem moderno ainda estaria sobre esses efeitos? Do ponto

de vista de encapsulamento das experiências históricas, é afirmativo, mas a visualidade

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passou a ocupar novas intenções que a tornou mais complexa, como outras situações da vida

moderna. É oportuno introduzir a partir de agora a definição de imagem.

4.2 - Visualidade e imagem

Para Santaella e Nöth (1998):

O primeiro é o domínio das imagens como representações visuais: desenho,

pintura, gravuras, fotografias e as imagens cinematográficas, televisivas,

holo e infográficas pertencem a esse domínio. Imagens, nesse sentido, são

objetos materiais, signos que representam o nosso ambiente visual. O

segundo é o domínio imaterial das imagens na nossa mente. Neste domínio,

imagens aparecem como visões, fantasias, imaginações, esquemas, modelos,

ou, em geral, como representações mentais. [...] Não há imagens como

representações visuais que não tenham surgido de imagens da mente

daqueles que as produziram, do mesmo modo que não há imagens mentais

que não tenham alguma origem do mundo concreto dos objetos visuais.

((SANTAELLA e NÖTH 1998, p15)

Em outro discurso, ao introduzir a modalidade visual da Teoria das matrizes da

Linguagem e do Pensamento, Santaella (2001, p. 186) afirma: “as modalidades das formas

visuais cobertas por minha classificação não se reportam ao mundo visual e nem ao campo

visual”, e observa outro aspecto da imagem, que parte de um mundo visível concreto, natural,

de um campo visual que contem a imagem. Para eles existem três aspectos da imagem

entrelaçados a aquele que decorre do mundo natural que esta em nosso campo de visão,

diferente daquele elaborado na intencionalidade de fenômeno de linguagem, na manipulação

de representações e as que estão em nossa mente.

Catalá (2011) expressa a ideia de imagem a partir da funcionalidade e dos modos de

ver, a primeira ideia está para a intencionalidade enquanto a segunda parece mais primária, ou

seja, como a visualidade se apresenta: a visão natural – o visual, a visão cultural - o visível e a

visão tecnical – visualizável. Para ele, a visão natural está sob a ordem cultural que está sob a

ordem física, material das representações. A única congruência está na base natural da

imagem, porém, não localiza o papel das imagens mentais. Os filtros culturais e materiais são

determinantes na produção de imagens, mas a produção é alimentada pelas interpolações

mentais.

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Retomando o viés antropológico, a imagem é a representação que permitiu aos

ancestrais pré-históricos se organizarem frente às necessidades de sobrevivência. O fruto

distante que lhe serviria de alimento estava em sua mente através da representação, assim

como os dados de distância e outros orientadores espaciais, processando um pensamento

sobre o fato. Ao representar formas a partir das ferramentas como extensores dos membros ou

quiçá reconhecer semelhanças em objetos naturais foram os primeiros vestígios da

representação imagética mediada por uma materialidade que trataria mais da material natural

original. A imagem adquiriu a função socializante, externou o pensamento, habilidades

perceptivas e motoras.

O surgimento dos suportes para as imagens resultou na produção de imagem estática,

prevalecendo a forma em detrimento do conjunto do campo visual; favoreceu a intenção

contemplativa, correspondente a linguagem na função descritiva. Entretanto, a orientação

presente na gênese da visualidade humana está para o tempo e o espaço, fundantes da função

narrativa da linguagem. Do ponto de vista semiótico, das classes de signos, a natureza da

imagem é um ícone por apresentar algo por semelhança do objeto e um índice por que sinaliza

certo espaço-tempo, está para alguma relação além dela, assim, a imagem em si reafirma o

caráter descritivo-narrativo.

O arsenal histórico da imagem demonstra um inventário de produção de significados:

a modelagem tridimensional, a síntese de planos bidimensional, a condição estática e a

imagem em movimento. Traduz um empenho de diversas materialidades e os respectivos

meios de manipulação, efeitos que retroalimentaram a produção de imagens até a atual

condição.

Toda produção de imagem externalizada requer um suporte, uma materialidade que

possa se fixar. Comumente, no campo das Artes Plásticas, é ordinário a ideia de: suporte –

material que recebe o interferente, por exemplo, uma tela; o interferente – material que cria a

imagem, por exemplo, a tinta e o instrumento – que é responsável pela manipulação da tinta

sobre a tela; porém, essa concepção está mais para o produto em detrimento do fluxo de

elaboração. A questão da holografia, por exemplo, complica o engendramento desses termos,

ao ser decomposta em: base, interferente e instrumento. Também é o caso das esculturas em

gelo, pois ele é o suporte ou interferente? Ou estão fundidos? Atestar que o suporte seria o

espaço que o circunda é uma incoerência com a bidimensionalidade. As fontes do Burj

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Khalifa Lake44

(Figura 12) são um elemento natural, manipulado com intencionalidade

estética, cria formas, linhas, estão sujeitas a interferência de luzes, é uma produção de imagem

tridimensional, então, como fica a relação suporte e interferente? Novamente vem a questão,

para visão aérea o suporte se apresenta como o lago artificial, a topografia, e para o frontal o

entorno, o cenário não topográfico? Deste modo, toda escultura estaria na condição de

interferente para um suporte que seria seu local. Parece fugaz generalizar este pensamento.

Não evidencia a anterioridade mental e essa observação didática é insólita frente à

modernidade e contemporaneidade das artes visuais.

Figura 12 - Imagens da fonte Burj Khalifa Lake em período diurno (visão área)

E noturno (visão frontal).

Fonte: http://casavogue.globo.com/LazerCultura/noticia/2012/10/maior-fonte-luminosa-do-mundo.html

A ideia de suporte em questão é o conjunto material e as respectivas propriedades dele

mesmo que tornam físicas as imagens mentais. São suportes de uma imagem pensada. Os

suportes caracterizam produção de imagens, impõe simultaneamente restrições ou ofertam

miríades, as semioses do próprio ato criador, produtor de linguagem. Alguns exemplos são

esclarecedores: a imagem mental que antecede o ato de um pintor, ao ser tornar palpável,

sofrerá caracterizações distintas mediante o uso de materiais como: pigmentos naturais e uma

placa de madeira, folha de papel e lápis de cor, e assim segue.

A imagem produzida não é sinônimo de bidimensionalidade, ela também se manifesta

de modo tridimensional, esta é a primeira divisão de categorias da imagem: aquelas que se

apresentam prontas para observação em uma única face e outra que tem vários ângulos para

serem lidas. A primeira, que sugere a sensação de superfície (Figura 13) ou faz uma síntese de

planos (Figura 14). A outra não economiza nos planos (Figura 15).

Figura 13 - Superfície plana Figura 14 - Cartaz publicitário

44

Trata-se de uma das maiores fontes luminosas localizadas em Dubai, planejada por Wet Design.

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Fonte: Elaboração do autor

Fonte: http://www.cutedrop.com.br/2012/10/posters-de-

viagem-de-1920-a-1950/

Figura 15 - Detalhe da escultura de Ron Muek

Fonte:http://fondation.cartier.com/#/en/art-contemporain/26/exhibitions/866/ron-mueck/862/ron-mueck/

A partir de análise geral dos suportes, parece que há alguns princípios que os regem:

todo suporte está subordinado a uma dimensão limítrofe, bordas, moldura; todo suporte

singulariza a imagem apresentada, todo suporte determina uma conduta percepto-cognitiva.

Não se pode confundir esses princípios por situações decorrentes, os estilos, das intenções de

discurso, da mimese, etc.

4.2.1 - Dimensões: a emolduração

A produção de imagem requisita um intérprete para seu discurso, portanto, a sua

extensão é a captação do olho, assim, a condição “emoldurante” é intenção de delimitar o

espaço que a imagem se apresentará. Esses espaços são fruto da relatividade distal entre

imagem e observador nas mais diversas intenções.

Após o evento do quadro, nos meados do século 14, a portabilidade da imagem, livre e

solta das paredes é um exemplo. Reforçada pela distribuição dos elementos visuais (sintaxe),

o quadrilátero se efetivou como formato insistente, mas não único, até os dias de hoje,

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conforme se observa nos monitores, telas de computadores, outdoor, etc. Até então, estavam

atrelados a arquitetura ou objetos utilitários (baixo relevo).

A emolduração da tridimensionalidade é peculiar, pois objetos utilitários são

tridimensionais, que também podem servir de suporte para imagens bidimensionais, cuja

emolduração passa a ser o formato determinado pelo viés da usabilidade; os demais casos não

experimentam uma rigidez emoldurante: ora como formas orgânicas, ora exatas, tão presentes

na bidimensionalidade.

A emolduração é uma junção da área a ser captada pelo olho e os limites da

materialidade que a fiscaliza. Ao afirmar isto, a ideia de intenção de autoria parece atrelada a

questão, mas se fosse assim, para o pintor impressionista valeria o conceito de suporte

somente naquilo que atendesse aos efeitos criados pelos raios luminosos de sua pintura. A

intenção é manipuladora do suporte, mas as regras que o constituem estão além disso.

4.2.2 - A “fisicalização” da imagem

A materialidade traz suas qualidades no desempenho de tornar a imagem palpável:

maciez, elasticidade, luminosidade, estados da luz sobre a matéria (transparente, translúcido e

opaco), heterogeneidade ou homogeneidade de substâncias, entre outros, que dão às cores,

linhas, áreas, texturas, os mais diversos aspectos. Uma pintura em aquarela sobre um papel

mais fino será diferente de outro mais grosso. A transparência de um vitral jamais será a

mesma se o vidro for uma peça de acrílico.

Parafraseando Santaella ao tratar da escrita (2012, pg. 2) “Além do código alfabético

ou de qualquer outro sistema de codificação, a escrita pressupõe algum tipo de suporte para a

sua inscrição”, os elementos matriciais da imagem: cor, linhas, áreas, volume, textura,

também necessitam de suportes materiais e nele se caracterizam. A materialidade impregna

sua origem histórica, seu modo de manipulação e as propriedades físicas e químicas que a

constituí, como também fica sujeita a crenças de seus manipuladores, como se observa em

momentos das Artes Visuais, exemplo: o Neoclassicismo.

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4.2.3 - A conduta percepto-cognitiva

A possibilidade do suporte cria condutas, tem que ser compreendida na perspectiva da

materialidade que torna a imagem concreta: pigmentos, fontes de luz, instrumentos, bases, etc.

Não se trata do teor das imagens construídas, mas do que ele se utiliza para existir, por

exemplo: um determinado cartaz pode ser impresso, impresso transparente submetido a

efeitos luminosos por trás da imagem e digitalizados. No primeiro caso, a cor chega aos

nossos olhos por reflexo, o pigmento é responsável em rebater luzes e absorver a outras,

chamaremos de processo indireto, no outro, a emissão direta da luz atende à grande

predisposição que nossos olhos possuem para captá-las. A tendência deste tipo de suporte é

desencadear maior imersão da leitura dada a sua conexão perceptiva.

O movimento que se possuí em relação à visão, gira parcial da coluna cervical e o

desolamento do globo ocular, construídos no percurso seletivo em função do movimento

necessário para a sobrevivência, são mais imersivos em suportes que apresentam a imagem

em movimento. Suportes estáticos diferem de suportes em movimento.

A Física explica o fenômeno de acomodação visual, o mecanismo fisiológico que

tolera nosso órgão visual ao se adaptar às necessidades para obter uma visão nítida a diversas

distâncias. Este fato implica em outra natureza da nossa visualidade, a predisposição à

tridimensionalidade, portanto, imagens instaladas em suportes bidimensionais experimentam

diferenças imersivas das tridimensionais. Esses três percursos de conduta, fluxo luminoso,

movimento e a profundidade são estruturas intrínsecas, com predominância variante entre si e

as mais ínfimas condições de gerar semioses visuais. Redundando a fala anterior, hábitos

adquiridos e entranhados pelo nosso devir no fenômeno da linguagem.

A “emolduração”, a “fiscalização” e a conduta perceptiva estão na anterioridade do

discurso que a imagem produzirá, sejam figurativas ou não figurativas, assim como a própria

técnica ou tecnologia na manipulação da materialidade. Um exemplo: as atuais imagens em

movimento são frutos do evento da tecnologia digital, que permitem tratamentos a essas

imagens, propõem enquadramentos do campo visual, criam novos comportamentos de leitura.

4.3 - Expansão dos suportes

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Tratar de uma expansão recupera a ideia de origem, porém, mais desafiante é analisar

pelos mais atuais, que inserem essa discussão. A questão da holografia: fundamentada em

princípios óticos, parte de uma estrutura plana, mas a imagem registrada nele que é

tridimensional. Neste caso, não interessa o processo da produção da imagem, mas como ela se

apresenta. Podemos nos mover e percebermos a profundidade da imagem, portanto é um

território fértil para verificar essas categorias. Atentamos o processo holográfico (Figura16):

um feixe de luz laser (1) é disseminado em direção a um objeto. No meio da passagem (2), o

feixe é dividido ao cruzar um espelho semitransparente. Parte da luz segue em direção ao

objeto e outra parte é desviada em outra direção. A luz que chega ao objeto (3) é refletida em

direção ao filme. A luz que não passou pelo objeto (4) também é refletida em direção ao

filme, com a ajuda de um espelho. Esses dois feixes de luz se deparam (5), forma-se a

imagem no filme sensível à luz.

Figura 16 - Processo de formação da imagem holográfica

Fonte: http://www.etcfilmes.com.br/holografia/

A “emolduração” é instituída pela própria potência luminosa do objeto.

“Fisicalização” é fruto do raio laser separado e confrontado, não se trata de uma cor pigmento,

mas de uma cor luz. A conduta perceptiva não é outra se não a extrema sensibilidade dos

ativada. Porém, duas outras questões aparecem: sem tal tecnologia não haveria esse suporte de

imagem e a tecnologia está circunscrita a questão da cultura.

Diz Belting (apud CATALÁ, 2011, p. 43): “Nossa percepção está submetida à

mudança cultural, enquanto nossos órgãos sensoriais não e modificam desde tempos

imemoriais”, o papel da cultura é imprescindível no olhar: formatações, extensões para o

olhar, expansão da visibilidade, são modificações que intercambiaram a nossa visão.

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Não cabe, para o momento, uma introspecção profunda no conceito cultura, porém, a

sua origem semântica, latina, na antiguidade humana, designava o cultivo da terra, depois,

passou a ser aplicada em analogia da alma com o cultivo da terra – cultura animi. Segundo

Schurmann (1989), esta ideia de cultura, como cultivo de alguma coisa, persistiu até meados

do século 18, sempre na dependência de termo complementar. Posteriormente, a conotação de

processo passou para substância de uma coisa ou realidade. O conceito de cultura sofreu,

histórica e antropologicamente, restrições e alargamentos. Noutra visão unilateral, a ideia de

algo civilizatório45

evoluiu para visões mais especificas como a produção dos conhecimentos

científicos. Enfim, optando pela visão mais ampla, a cultura como ações desenvolvidas pelo

grupo social com intuído de compreender e operar no seu meio ambiente, seja físico ou

mental, portanto o caráter socializante requer o comunicante que requer a linguagem. Na base

da cultura está a linguagem, que ao nascermos já existe, somos inseridos nesse contexto, que

nos modeliza e poderemos modalizá-lo, mas sem descaracterizar o que está em posição

primária.

As técnicas e as tecnologias desenvolvidas são produtos da cultura, nascem das

concepções humanas para atender as diversas intenções, mas, ao mesmo tempo em que tem

alvo próprio, podem reinventar as intenções iniciais mediante novas possibilidades. Definir

tecnologia é preciso:

Técnica, no sentido estreito, significa saber fazer (know-how),ter

conhecimento ou habilidade para realizar um dado trabalho ou atividade de

maneira especifica, um modo de realizar eficientemente uma tarefa.”

Literalmente, tecnologia, por seu lado, é campo de estudo referente aos

conhecimentos e usos das ferramentas e instrumentos utilizados pelos seres

humanos ao longo de sua história Entretanto, conforme a produção de

ferramentas e instrumentos cresceu, estes foram multiplicando-se e

tornando-se progressivamente sofisticados, viraram maquinas e passaram a

se inserir praticamente em todas as atividades que realizamos.

(SANTAELLA, 2007, p. 205)

A técnica é tão antiga quanto a humanidade, há um consenso entre antropólogos

que a presença de instrumentos fabricados distinguiria os restos fossilizados do homem dos de

um hominídeo. A habilidade remonta ao uso de ferramentas pelos primeiros humanos,

portanto a eficiência é circunscrita ao tempo. É a passagem de um comportamento pré-

histórico de passivo para ativo, ou seja, o homem deixa de usar o que a natureza poderia lhe

dar naturalmente para dominar a elaboração de utilitários, ferramentas. Na técnica, está a

45

A ideia civilizatória nasce com as cidades estados gregas em oposição a barbárie.

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natureza instrumental, primária, a simples realização, que a distingue da tecnologia, não por

oposição, mas como etapa inicial das exigências da complexidade da vida humana. O que

seria esta complexidade?

O termo tecnologia perdeu a literalidade, seu emprego generalizou-se e se

campo de referencia hoje abrange não apenas as ferramentas e instrumentos,

mas todos os tipos de recursos, dispositivos e maquinas empregados na

produção, assim, como abrange infra-estruturas e o comando e controle das

estruturas sociais(ibid, id, p.205)

A tecnologia abarca a utilização científica de ferramentas, máquinas e demais

instrumentos que impulsionam o conhecimento humano e, consequentemente o domínio do

seu meio. Com a tecnologia, é plausível utilizar a técnica com maior ciência, pois ela inclui

todo o processo dinâmico que a técnica carece para a sua aplicação.

O que interessa são as relações entre as tecnologias que produzem imagens e a

retroalimentação da conduta da visualidade. As imagens produzidas pelos aparatos

tecnológicos atendem às mais diversas preocupações, mas que podem ser agrupadas em:

acesso ao não visível pelo olhar comum, como aquelas que dão aparato à medicina, revelam

as constelações, demonstram ínfimos aos fenômenos biológicos, químicos ou físicos, etc.; o

acesso ao visível pelo olhar comum, exploradas pelo entretenimento, pelo segmento

instrucional, etc. e o hibridismo de ambas.

A complexidade cultural e, consequentemente tecnológica, reforça como a simples

identificação de suporte das artes visuais é imprópria. Mesmo quando a produção da imagem

resgata práticas primárias, a necessidade da tecnologia logo se insere. Por exemplo: nas

últimas décadas, a tecnologia digital expandiu e novos recursos de corporificação da imagem

foram implementados, porém, outro modo de corporificação, desprovido dessa tecnologia,

ganha as ruas, a pintura em “3 D”46

(Figura 17). É atribuído a Kurt Wenner, pintor

estadunidense, a invenção da atual pintura de rua em 3D que optou como materialidade tintas

e os planos dos espaços públicos abertos. Atualmente, para evitar o desaparecimento dessas

imagens devido às transformações pavimentais dos espaços públicos, estão sendo realizadas

em materialidade transportável através do uso de tecnologias.

46

Também denominada Street Painting, cuja origem remota estaria em práticas italianas do século XIV, e na

atual transição secular passou a aproveitar recursos da perspectiva anamórfica: distorções criadas para se tornar

tridimensional de um único ângulo.

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Figura 17 - Pintura de rua 3D de Kurt Wenner (Mântua, Itália)

http://kurtwenner.com/galleries/pavement/pavement_1/pages/StreetPaintingGallery1.001.htm

Santaella (2006) relata que os suportes expandidos em meios técnicos e tecnológicos,

cuja linguagem assumiu relações mais inextricáveis com a sua materialidade, passaram a ser

denominados de “meios de comunicação”, aponta para a superação do conceito primário dos

suportes visuais, os que mantêm a ideia exposta de suportabilidade material da imagem

produzida atualizada. Até o presente momento avançamos da visualidade para a imagem e,

agora, sobre a linguagem visual, cujos suportes são inseparáveis.

4.4 - A linguagem Visual

Visualidade, imagem e agora a linguagem visual, este é o percurso proposto. O termo

linguagem remete, no momento mais imediato, ao modo verbal. A própria evolução de

pesquisas sobre linguagens em novas áreas usa a linguagem com conotação mais verbal que

visual. É intensaa tradição cientifica que classifica as linguagens em verbais e não verbais. É

extensão de uma visão logocêntrica, dicotômica e consequentemente incapaz de esteio para

compreender as formas de linguagem que se desenvolvem no humano. Os aparatos que

possuímos para se inserir nas formas de linguagem são claros, a predisposição da natureza

visual e a dependência, menos natural, dos sítios lexicais para a linguagem verbal. Mesmo que

a contiguidade cultural imprima mediações na recepção da imagem, não são tão intensas

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como a língua. A forma verbal é o cerne de semioses simbólicas, portanto, arbitrárias, que

dependem das convenções sociais.

A dicotomia impressa em várias tratamentos científicos, verbal e não verbal, tem na

Teoria das Matrizes da Linguagem e Pensamento (SANTAELLA, 2000), que elucida, com

extrema originalidade, uma relação contigua das formas de linguagem. Para a autora, a

intersecção desses três modos matriciais é comprovada na sobreposição das categorias

fenomenológicas: a sonoridade para a primeiridade, a visualidade para a secundidade e a

verbal para a terceiridade. A construção dessa relação parte de elementos que caracterizam o

fenômeno da linguagem: “[...] um sistema perceptivo deve conter legi-signos (organização

hierárquica, sistematicidade), deve ser passível de registro, nem que seja o registro da

memória (recursividade) e, sobretudo, deve ser capaz da metalinguagem (auto-

referencialidade, metáfora).” (SANTAELLA, 2001, p 79). Estes tópicos são: a sistematicidade

que conhecemos por sintaxe, a “fisicalização” nos remete à forma e à autorreferência, à

manifestação do poder de intenção da linguagem. Esses três eixos se aplicam às três

modalidades: a sintaxe sonora, a forma visual e o discurso verbal, que não são independentes

e obedecem a evolução fenomênica Peirceana, progridem da primeiridade-sonora-sintática

para a terceiridade-verbal-discursiva. Mas, se a linguagem é um fenômeno da terceiridade,

como pode haver um nível de primeiridade? As categorias copulam e tecem estruturas

analíticas progressivamente. Dentro de um fenômeno da terceira categoria haverá, na sua

análise, o reconhecimento de níveis de primeiridade e secundidade para aquele terceiro:

A lógica da matriz sonora, sob a dominância da sintaxe, é mais primordial,

estando na base das outras matrizes. A lógica da matriz visual, englobando a

sintaxe e sob a dominância da forma, está na base da matriz verbal cuja

lógica discursiva se constitui pela incorporação da sintaxe e da forma.’

(SANTAELLA, 2001, p 79).

A autora ressalva que o caráter material não está necessariamente numa relação de

contiguidade progressiva, exceto em alguns casos singulares. A identificação dos eixos tem a

função de caracterizar as três modalidades como formas de linguagem sob a predominância

qualitativo, indexical e a lei. Mas, nos vemos obrigados a exaltar como essa relação triádica

corresponde a evolução antropológica da condição simbólica: sinalizações guturais

associadas aos fatos e objetos, fixados no verbal, assim como as questões da

interdependência verbal e o território gramatical.

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Para compreender melhor essa interdependência verbal, recorremos a exemplos, uma

análise de possíveis efeitos de uma imagem (Figura 18) figurativa.

Figura 18 - Feira. Gravura de Carybé, 50x70 cm

Fonte: http://www.espacoarte.com.br/obras/5159-carybe-hector-julio-paride-bernabo

Ao contemplar esse exemplo, lemos linhas, direções, cores, que constroem formas e

deliberam em nosso pensamento fragmentos ou sentenças nominais. Esta primeira associação,

durante o processo de leitura de imagem figurativa, é muito comum, mas existe uma

organização entres as cores, certa distribuição dos elementos no espaço, formas que controlam

o tempo de leitura, etc. Na segunda imagem (Figura 19), não figurativa, ao ser contemplada,

também existem elementos visuais que lhe constituem, porém, a condição não figurativa

disparará outro grupo semântico verbal, aqueles que representam comentários sobre os

elementos visuais ou, às vezes, sob a força de signo remático a projeção de similaridades com

o intuito de recuperar alguma possível nominalização.

Figura 19 - Movimento em preto branco de Miguel Couto. Pintura

http://manuelcouto.arteblog.com.br/499755/Movimentos-em-preto-e-branco/

As semioses disparadas são incessantes na fluência de signos visuais para verbais,

exceto quando a semiose é apenas apresentativa, não há fugacidade para o indexical. Os dois

casos, figurativo e não figurativo, são exemplos de uma acessibilidade à imagem através de

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mediações verbais. A interdependência verbal seria outro aspecto: a lógica permissiva pelo

modo verbal sobre a gramática visual. Se a sintaxe apresenta percepção, a forma referencia e a

intenção é um controle sobre as duas primeiras, um ato lógico.

Apesar da relutância terminológica, é prudente retomar a ideia de “alfabetização

visual” para essa lógica visual interdependente. Mais, especificamente sobre o conceito de

dois autores Dondis (2000) e Catalá (2011), cuja difusão tem sido significativa.

Segue primeiramente o significado do termo alfabetização. No uso comum traduz a

ideia de alguém que irá escrever e ler. A fala é independente da alfabetização, porém, esta

última pode ser definida como criação de código para servir de suporte à oralidade. Quando a

língua passou a ter outros suportes de registro externos ao sistema fonológico, com metas

extremamente socializantes, surgiu a técnica de codificação gráfica, que passou por vários

estágios. Foram sinais que representavam conjunto de ideias ou coisas, unidade de ideia ou

coisas e sonoridade vocal (HIGOUNET, 2003). De signos pictográficos (coisas e movimento

da boca) passou para ideográficos. Neste último estágio, uma herança grega configurava o

alfabeto (ocidente) como se conhece hoje. O termo nasceu da junção das duas primeiras letras

Alpha e Beta e implica no processo de aquisição dos códigos gráficos para representar a

oralidade, fica evidente a natureza verbal e difere profundamente do mecanismo de

compreensão da linguagem visual.

Dondis (2000, p 19) diz: “O alfabetismo visual jamais poderá ser um sistema tão

lógico e preciso como a linguagem. As linguagens são sistemas inventados pelo homem para

codificar, armazenar e decodificar informações”. Partindo desta concepção limítrofe de

linguagens, antropocêntrica, com indicadores para compreender o fenômeno sob a ótica

verbal, a autora propõe a ideia de mensagem visual e considera três características para elas:

input visual (miríades de signo), o material representacional e a estrutura abstrata, seja natural

ou intencional.

A ideia de símbolo para explicar a linguagem desenvolvida pela autora propõe um

sistema (verbal) que apura uma noção lógica, ou seja, a capacidade regulativa da forma verbal

para entender fenômenos. O material representacional trata da experiência direta,

independente de mediações de sistema codificáveis. A estrutura abstrata, com a qual ela

prepara o argumento para falar de sintaxe visual, se trata de algo elementar e de difícil

tangibilidade. Apoia-se na Teoria para dar continuidade. Dondis extrai categorias da

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mensagem visual sem rever bases semióticas que permitem visões mais amplas sobre o

fenômeno da linguagem. A ideia da visualidade como experiência direta, que liga

estreitamente o individuo a realidade, é minimamente impossível, pois a cultura já estabeleceu

camadas de mediações desde que nascemos. Aliás, quando afirma: “Às vezes basta ver um

processo para compreender como ele funciona.” (DONDIS, 2000, p.21), implícita a ideia de

conhecimento prévio de uma estrutura Com a ideia de estrutura abstrata, elenca elementos

visuais (sintaxe e forma) do ponto de vista da produção visual bidimensional, apresenta

tópicos que estão na condição de efeito de sentido (semântica). O conceito de alfabetização

visual de Dondis trata de reconhecer e manipular a estrutura abstrata da composição. Não se

trata da natureza lato sensu do termo. Em síntese, duas proposições quase coerentes precisam

ser revisitadas: e reajustadas: (1) a necessidade de códigos para o modo verbal e a experiência

direta da visualidade e (2) a estrutura preexistente. Os códigos são signos simbólicos,

dependem de uma lei para serem decodificados, mas a experiência direta também é mediada

pelos signos, no caso de natureza icônica. Entretanto, penetrando nas fissuras perceptivas,

temos neuro-receptores aptos a capturarem determinadas situações do mundo visível

(avançaremos mais a frente) no processo de formação da imagem. Quanto a ideia de

estruturas preexistentes, a visualidade como experiência direta, leva a crer que a autora

esbarra em dois tipos de situação: a artificial dos códigos verbais e natural da visão. Tal fato

denota grande desconforto teórico para equalizar a discussão.

Catalá (2011, p 15), inicia sua conceituação a partir da potencialidade semântica: “Por

intermédio da língua, vamos do exato ao polissêmico, enquanto com a imagem do

polissêmico nos dirigimos ao concreto por um processo de compreensão de sua estrutura

visual.” Catalá observa aspectos unilaterais das duas formas de linguagem: a convenção do

signo verbal, aspecto simbólico, aparentemente exato, predispõe na sua arbitrariedade

deflagrar certa gama discursiva, enquanto que o signo visual, de natureza apresentativo,

aberto ao campo da experiência do leitor, representa algo como ele é.

Pontualmente, o autor extrai a sua ideia da interação de dois paradigmas,

aparentemente opostos para cuja interação conceitua:

Enquanto aprender a ler significa aprender a apagar o suporte material do

escrito para internalizar e automatizar seus mecanismos simbólicos, aprender a

ver implica tornar visível o material do figurado para construir sobre ele uma

nova simbologia. Trata-se de dois mecanismos cognitivos antagônicos,

embora ambos confluam para um processo de conhecimento parecido.

(ibid,id)

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105

A confluência de Catálá explica a necessidade da forma verbal para organizar as

estruturas sintáticas da linguagem visual. Fato que também preocupa Dondis, mas não são tão

articuladas. A priori não fica claro na ideia do autor, mesmo quando ele usa o argumento de

negação, o que não é alfabetização: a organização verbal do visível, o uso do alfabeto para

descrever a estrutura da imagem, então, o que revela a condição de alfabetizar-se

visualmente? A afirmação: “a alfabetização visual significa, portanto, aprender a conhecer os

fenômenos visuais, ou seja, aprender a expressar verbalmente o que se produz visualmente.”

(ibid, p. 15) é bem mais esclarecedora, principalmente, quando ele reforça com a expressão

“aprender a linguagem da imagem”. Entretanto, não é intenção do autor construir o território

gramatical, mesmo que falacioso, como Dondis, para demonstrar o que seria essa linguagem

da imagem.

Destarte, a “alfabetização” é um termo impróprio para um fenômeno real. Talvez a

proposição de termos como “Educação visual” ou “gramatização ou gramaticalização visual”

fossem mais indicativos para a aprendizagem da linguagem visual, entretanto, manterei em

uso “alfabetização” pelo fato do conhecimento socializado que já acumula e a mudança de

nomenclatura não é fundamental para resolver o problema.

A linguagem visual é a compreensão leitora e operacional da produção de sentidos

gerados pela imagem na base da sua estrutura não pode ser confundida com a decodificação

nominal de formas figurativas e não figurativas. É tornar um fenômeno que insiste sobre a

percepção em estado consciente, manipulável, porém, os meios de produção de imagem,

desde lápis para o desenho sobre o papel até o “crtl C” e “Ctrl V”47

nos meios digitais,

favorecem a proliferação de imagens sem a preocupação do papel gramatical nos efeitos de

sentidos. As imagens, como signos visuais, estão mais próximas da natureza dos nossos

aparatos sensoriais que a palavra dependente dos nichos idiomáticos, porém isto pode gerar

uma falácia em questão de condição a ser apreendida.

Sob essa aparente “naturalidade” do signo visual para com as estruturas que

possuímos, iniciamos a construção de três tópicos da linguagem visual: a sintaxe, a forma e a

intenção. Nesta sequência dos termos estão imbuídos das relações fenomênicas

cenopitagóricas, elucidadas nos estudos de Santaella (2010).

47

Nome popular as opções de copiar e colar imagens, textos, nos suportes digitais.

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106

A imagem, ao contrário da escrita, não se apresenta de forma linear, mas, holística, um

todo que se apresenta, cujo acesso não é pela forma-unidades ou partes, mas pelas relações

travadas entre elas – a sintaxe; a imagem apresenta unidades mínimas que a constituem – a

forma e produzem sentidos – a intenção. O emprego de termos tão comuns á área de

linguística não é exclusividade da mesma. São muitos mais palpáveis na linguagem verbal,

mas, preservadas as suas caraterísticas, estendem-se a visualidade. Na sequência,

começaremos pelo segundo, a forma, para entender a unidade.

Antes, é preciso esclarecer duas questões sobre dois aspectos da imagem - dimensão e

“em movimento”: a sintaxe e a morfologia da imagem bidimensional é a mesma da

tridimensional, assim como será a mesma aplicada às imagens estáticas e as imagens em

movimento? Até o presente momento, foi demonstrada a natureza tridimensional e móvel da

captação visual, portanto, o bidimensional e o estático estão numa posição menos natural que

as outras. Isso soa estranho, porém, foi a primeira imposição que os suportes restringiram à

nossa visualidade, tem-se a impressão que o contrário é o natural. A diferença entre

bidimensional e tridimensional são sínteses de planos e no estático-movimento a síntese de

tempo, o congelamento. Assim, as tentativas de sistematizações da sintaxe sobre a

bidimensionalidade estática na sua natureza sintética e geral explicam as anteriores. Um

exemplo é a linguagem do cinema. São imagens, bidimensionais em movimento, que só

existiram após o advento tecnológico de um suporte específico e permitiu a recuperação para

si de níveis sintáticos que somam aos anteriores, exemplo: sequência de cena entre outras.

Toda a linguagem visual sofrerá expansão da sua estrutura no encontro de novos suportes,

mas não eliminação, talvez uma redução sem deixar de existir.

4.4.1 - Forma na visualidade

A grande maioria dos estudiosos que retrata a linguagem visual, o desenho, a pintura,

define a forma visual a partir dos elementos: ponto, linha, cor e plano. Isso é um enfoque mais

matemático do que perceptivo. Kandinsky (2005) devaneia sobre o ponto por tratá-lo em três

perspectivas: a concepção geométrica, como equivalência do zero dada à condição

indivisível; a sua função na linguagem verbal como enunciativo do silencio da fala, impõe o

estado abrupto de percepção; e sugere o crescimento de dentro para fora criando forma. Nessa

evocação do ponto, está tangível um discurso que parte da produção de imagem, mas anterior

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a elas existem as imagens no mundo natural e lá o ponto não é nada mais que a mais ínfima

redução da percepção da imagem. O ponto é o primeiro sinal de movimento dentro de um

campo visual, seja por deslocamento no campo ou por velocidade da luz emitida em direção

ao olho.

As figuras 20 a e 20 b apresentam duas figuras contendo duas circunferências, porém,

na figura 8 b apresenta uma das circunferências reduzida até um nível perceptivo que

normalmente será denominado de ponto.

Figuras20 a e 20 b - Comparações sobre o ponto

Fonte: elaboração do autor

Para a imagem, o ponto é um localizador espacial, uma qualidade perceptível no devir

de algo mais tangível. Para uma longa história tradicional da produção manual de imagem, é o

primeiro toque do instrumento que lança um interferente sobre uma base. A gênese da sua

inscrição está junto com a liberação das nossas mãos. A geometria deu-lhe ênfase como

convenção de unidade mínima da representação visual para constituir medidas do espaço,

porém, a fluência perceptiva é uma área ínfima em expansão de significação.

Áreas ou planos se apresentam na percepção em decorrência da luz refletida por

objetos ou emanadas diretamente de fontes de luz e, em ambos os casos, sofrem a refração na

retina. Áreas são pontos expandidos, cujo olhar é capaz de detectar partes mais internas em

contraponto com partes periféricas numa única unidade fórmica. (Figura21).

Figura 21 - Relações nucleares e periféricas da área.

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Fonte: elaboração do autor

A morfologia visual inicia nos limites da estrutura sensorial, aparentemente

delimitada, mas com forte potencial polissêmico. A verificação da gramática visual deve

iniciar por uma investigação sob viés das Neurociências, mesmo quando este campo ainda

assume a existência do hiato entre a percepção e conexão para com a produção de imagens.

As linhas, definidas como trajetória de pontos ou registro do movimento do ponto no

censo comum da literatura sobre visualidade, também precisam de revisões. A linha, pensada

a partir do traço sobre um papel ou de uma escultura de arame, também parte da sua inscrição

no suporte e, assim como o ponto, atrelada ao nascimento do nosso desempenho motor fino.

Mas, antes dessa linha, há outra. Aquela que está no vinco de um papel, no encontro de duas

cores distintas, numa área que expande em duas direções opostas, caracterizando uma

estrutura linear. Está sujeita a uma organização evolutiva (Figura 22): anterior a linha criada

por pincel (C), decorrente dos suportes, está uma área em expansão linear (B) e antes dela a

sútil linha que surge do encontro de áreas distintas (A).

Figura 22 - Natureza da linha

Fonte: Elaboração do autor

O intuito deste argumento é apresentar uma forma visual com nascitura no mundo

perceptivo, em oposição a aquele singularizado nas características da produção: os suportes.

Deste modo, a forma visual é fundada primeiramente pela cor-luz e pigmento, que

estabelecem áreas, cujas dimensões configuram ponto e linhas. As texturas visuais são

variações da luminosidade que preenchem as áreas perceptíveis.

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Este discurso não é original, Marr48

em suas pesquisas computacionais sobre o

processamento da informação visual, propôs a percepção e estímulos visuais em três níveis

(Figura 23): o esboço primário (bidimensional), primeiro nível de organização perceptiva

visual, caracterizado pela identificação de areas em função da luz: cores, texturas, bordas,

etc.); um segundo nivel, o 2½D (bi-e meio-dimensional), saliências, cocanvidades,

recombinações do esboço primário criam minima sensação de profundidade. As formas, em

estado de alteridade em relações umas com as outras, criam estados de atenção diferentes, “o

que vem primeiro”, o “que vem em segundo”. O terceiro nivel, oModelo em 3D

(tridimensional) versa na construção de um modelo estável, que comporta "rotações mentais"

da forma.

Figura 23 - Ilustração do esboço da visão proposta David Marr

Fonte: Imagem adaptada da obra de Eysenck, M. W.,e M. T.Keane. (2000, p. 96)

Para Marr (1982), se tratam de processos autônomos de formação da imagem, a

natureza das suas ideias partiu de experiências biológicas para modelos de inteligência

artificial, porém muito se assemelha a processos humanos, mas que são contíguos. Esta

citação sob a concepção de Marr é para ressaltar algo que muitas vezes ocorre despercebido

nos tratados dos elementos da forma visual: a tridimensionalidade. Um provável fruto da

alienação em analisar a produção visual apenas na faceta bidimensional. O tridimensional se

constitui na variação luz-sombra sobre áreas – movimento luminoso e depois na

particularidade bifocal. Kandel (1997) ressalta que Marr, ao escrever seu livro “Vision”,

partiu do “o que é que significa ver” e entendeu que a visão é processo e descoberta, pautada

nas imagens, do “que” está presente no mundo visual e “onde está.” A forma não é percebida

quando destituída do seu contexto visual.

48

David Marr (1945 - 1980) foi um neurocientista e psicólogo britânico com pesquisas na área de

processamento visual. Seu trabalho teve grande influência na neurociência computacional e levou a

um ressurgimento de interesse no campo.

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Essas considerações nos levam a crer na necessidade de pensar a linguagem visual

fundada muito além de inventário da produção de imagens. Se há uma ordem das imagens

naturais para mentais e depois para constituídas em suportes, resgatar as anterioridades é

pertinente para não compreender o fenômeno a partir da apreciação de metade do seu evento,

como ocorre com Dondis e Kandisnky. Inclusive, porque o papel da motricidade (mãos), na

produção de linguagem, na herança de suportes tradicionais, sempre valorou a primeira, a

criação da forma unidade, em detrimento da forma composicional.

Nas Neurociências, na anatomia das vias visuais, existem áreas diferentes para

processar a imagem:

[...] a área V5 (MT) diz respeito primariamente ao movimento no campo

visual, enquanto V4 é mais implicada na cor e na orientação dos bordos.

Assim, o sistema visual (como o sistema sensorial somático) tem várias

representações distintas de sua camada receptiva, a retina, e cada uma está

envolvida no processamento de diferentes aspectos das informações visuais.

(KANDEL, SCHWARTZ E JESSELL, 1997p. 315)

A distribuição de informações se dá por processamento em paralelo, grupos de

neurônios processam simultaneamente a imagem, porém não se trata de um acordo consensual

nessa área e abre uma questão a ser explicada: como processos separados de cor, movimento,

profundidade, se tornam coesos na produção de imagem. Treisman e Julesz (apud KANDEL,

SCHWARTZ E JESSELL, 1997), procuram responder a síntese através da atenção focalizada.

Sugerem dois processos distintos na percepção visual: pré-atento, um sistema de

escaneamento veloz do contorno do objeto e outro, atento, subsequente, selecionando,

evidenciando e articulando qualidades do objeto. É impulsivo ler esses dois processos sob a

semiose perceptiva, no nível do objeto do signo: o acesso que temos ao mundo externo

depende de um objeto que é imediato e implica no objeto dinâmico. O que nos põe no

continuum da semiose são os elementos gerais da representação, que pertence ao objeto

dinâmico, enquanto o imediato restitui a singularidade do objeto. Assim, fluxo da atenção

visual de Treisman e Julesz, corresponde, de certo modo, ao fluxo perceptivo dos objetos: o

estado de pré-atento já tem a presença do objeto imediato, mas que flui vigorosamente para o

objeto dinâmico, mas atenção é uma condição do “deparar-se com”, que retroage o fluxo ao

objeto imediato.

Não cabe estender sobre o assunto para dentro das Neurociências, pois o intuito desta

discussão é comparar para reforçar os elementos que constituem a forma visual entre aquilo

que está no mundo passível de ser visível e aquilo que o corpo humano está dotado. O que

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interessa para o momento é a sensibilidade natural que o sujeito possuí e se estrutura numa

relação intrínseca, mas tem hierarquia velada: sem luz não há forma, sem forma não há

movimento. Sobre os mapas da distribuição paralela observa-se a figura abaixo. :

Figura 24 - Comparação da distribuição paralela -

Autor (es) Nível 1 Nível 2 Nível 3 Nível 4

Treisman Cor Orientação Tamanho Distância

KandelSchwartz

e Jessell Cor

Forma e

profundidade

Movimento e

profundidade -

Marr

Relações de

luminosidade

na elaboração

da área

Área com relações

mínimas de

volume

Forma em 3 D -

A proximidade conceitual é menos acentuada com Treisman, que através do termo

orientação (a posição no espaço) e distância (a relação espacial objeto do objeto, sujeito do

objeto) podem ser aproximadas por predisporem o objeto em conexão com o todo. A cor

revela uma forma contida num espaço. Aqui está engendrada a relação dual que irá

predominar na sintaxe visual: a figura-fundo discutida mais a frente.

A teoria da percepção seletiva, evocada a pouco com a ideia da percepção focalizada,

é uma discussão pertinente nas Neurociências, tangível na evolução dos primatas, por isso não

pode ser apenas entendida como um olhar sobre a imagem estanque, mas também como foco

em deslocamento.

Bear (2008) sobre as pesquisas, ainda inconclusivas, do mapeamento dos neurônios

sobre o movimento, apresenta três funções da percepção no movimento: a navegação - de

caráter geral, direções e velocidades de objetos que fluem em nossa visão periférica;

orientação do movimento dos olhos - o movimento dos olhos captados pelo estado de

atenção sobre um objeto; percepção do movimento - a, operacionalidade desta captação num

mundo que se movimenta e do sujeito dependente da interpretação do objeto.

Na apreensão do objeto visual, podemos experimentar algumas combinações: o objeto

que se desloca em relação ao sujeito, o sujeito que se desloca em relação ao objeto, ambos em

deslocamento, mas quando a estática se estabelece na apreensão, finda o movimento? Não,

ainda existem os ínfimos movimentos dos raios de luz e da provocada pela sintaxe visual. O

movimento envolve algo além da forma, o conjunto contextual, portanto a única coisa que lhe

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cabe na condição de singularidade formal, na tentativa de extrair a uma análise formal,

desconectada da visualidade geral, é enunciar a posição (Figura 25).

Figura 25 - Esferas ou cavidades: efeitos da luz e posição.

Fonte: http://to-campos.planetaclix.pt/visio/ilusao/sombras.htm

A imagem da direita traz a sensação de esferas convexas enquanto a esquerda de

côncavas. Tratando-se de imagens semelhantes apenas em posição diferente, a conduta

interpretativa que a luz vem de cima resolve a questão. Não, se enfrentarmos o objeto,

também experimentaremos uma confusão entre definir o côncavo e o convexo. A forma-

posição assume o aspecto absoluto e outro, relativo, que a predispõe sempre com alguma

coisa. Essa relatividade traz à baila a questão da experiência visível anterior que cada sujeito

traz consigo, que contribuirá para a percepção seletiva, mas que por ora não será tratada.

Esta identificação dos elementos constituintes da forma visual a partir de pressupostos

da percepção é claro na questão luz-luminosidade (cor), área-dimensão (linhas, planos,

volumes) e a conexão com o espaço (posição), a relação cenopitagórica das categorias

fenomenológicas.

4.4.2 - A sintaxe visual

Indícios sobre a sintaxe visual foi objeto de estudo de alguns pesquisadores, como:

Kepes49

(1969) enunciado na obra editada em 1944 - Linguage of vision, que influenciou os

estudos de Scott50

(1978) expresso na publicação Design Fundamentals - publicado em 1958.

Estes dois autores são os mais extensos no inventário dos tópicos, mas não reconhecem o

sistema sintático. Kepes avançou para a expressão bidimensional e Scott incluiu aspectos da

49

György Kepes (1906 - 2001) pintor de origem húngara, desenhista, educador e teórico de arte. Emigrou para os

EUA em 1937, ele ensinou design no New Bauhaus em Chicago. 50

Robert Gillam Scott desenhista, escritor e professor na Universidade de Yale..

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expressão tridimensional. Arnheim51

(1974), discípulo de Wertheimer, publicou sua primeira

obra relevante a questão da sintaxe em 1954 - Artand Visual Perception, desenvolveu os

tópicos da visualidade em prol capacidade criativa e o pensamento visual sob viés da Gestalt;

Dondis52

(2000) publicou A primer of visual literacy em 1973, sob um olhar bidimensional

da imagem, porém assumiu terminologias até então pertinentes ao modo verbal da linguagem,

como alfabetização e sintaxe; e Wong53

(2001) publicou Principles of form and design em

1993, seus estudos partem da forma unidade para forma composicional e, em oposição às

ideias deste estudo, afirma que a linguagem visual não tem nenhuma lei evidente. Sobre a

questão, poderia ser adicionado o nome de Kandisnky (2005), porém o seu estudo, apesar de

ambientado no pensamento da Gestaltista fluente na Bauhaus, implica um olhar muito mais

sobre a forma. O objetivo deste quadro é apresentar alguns indicadores da horizontalidade da

incongruência que se dá ao reconhecimento da sintaxe. Territórios confusos que não

identificam claramente forma e sintaxe, por falta de compreender a lógica geradora dessa

gramática.

Recorrendo a etimologia: do grego syntaxis, “ato de colocar em ordem, de

arranjar”,composta por syn - “junto” e tassein - “ordenar, arrumar”. A sintaxe visual é objeto

privado de estudos mais intensos, pois a tendência de compreenderem a linguagem visual no

aspecto da imagem contribui para enredar elementos visuais da forma com modos de

organização dos elementos visuais. Dentre os estudos que se aproximam da discussão da

linguagem visual podem ser destacados dois tempos: um primeiro, marcado pela história da

Arte, cujo principal foco foi as expressões bidimensionais (pintura, gravura, desenhos, etc.) e

um segundo, iniciado pelos estudos da forma desenvolvido com a Psicologia da Gestalt.

A evolução da linguagem visual pode ser observada pela evolução das Artes Visuais,

ambas se confundem pelos parâmetros do conceito de Arte (GOMBRICH, 1985), evoluem

intrínsecas e se definirão ao longo da história nas metas da intencionalidade do discurso

estético e o comunicacional.

Cientes que a imagem se apresenta de modo holístico à nossa mente e depois são

definidos estados de atenção, o reconhecimento da linguagem na visualidade tangível na

produção de imagem, surgiu uma preocupação com a forma (Paleolítico e Neolítico), depois

51

Rudolf Arnheim Berlim (1904 - 2007) foi um psicólogo alemão behaviorista, que emigrou em 1940 para os

EUA. Foi através de estudos sobre as Artes que passou a Psicologia da forma. 52

Donis A. Dondis (1924-1984) foi designer e lecionou na Universidade de Boston (EUA). 53

Wucius Wong (1936) chinês com estudos realizados nos EUA investigou a linguagem expressa através de

linhas, texturas, luz e composição

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com a diagramação (Antiguidade), o fundo como delineador do campo visual (Antiguidade e

Idade Media), a relação figura-fundo com percepção da profundidade por justaposição ou

variação de proporção (antiguidade e idade média), profundidade por perspectiva (Idade

Média e Moderna), conjunto composicional (fim da Idade Média e Idade Moderna) a

luminosidade e cor (Idade Moderna e Contemporânea), decantação54

da imagem pela cor, pela

forma e pela convenção da figura (Idade Contemporânea) e a decantação da materialidade

(século 20). Não se tratam de momentos estanques, mas etapas permeáveis, cuja produção

nem sempre foi equivalente a consciência operativa das estruturas do fenômeno da linguagem

Esta perspectiva é delineada pela expressão bidimensional, por vários fatores, mas que para

esta reflexão ressaltamos a mobilidade de suportes após o advento do quadro, a imagem

independente dos planos arquitetônicos e o aparecimento de uma cultura impressa.

O segundo momento, mais efetivo, consciente sobre a linguagem visual se dá num

contexto cronologicamente marcado, a passagem do século 19 para o século 20. Duas

naturezas contextuais são importantes de destacar: de um lado a produção de imagem marcada

pelos efeitos da decantação da cor e da forma (Impressionismo e Pós Impressionismo),

somada ao convívio do ocidente com os elementos pictóricos africanos55

,engendrados nas

causas da decantação da forma desenvolvida nas Vanguardas Europeias; e do outro – a

evolução dos estudos científicos sobre a psicofísica, percepção da forma, a Psicologia da

Gestalt. Os enunciados dessa ciência influenciaram desde artistas, professores e instituições

de ensino de Arquitetura e Design como a Bauhaus.

O termo Gestalt aparece, Segundo Westheimer (1999, p 5) “has played an important

role in discussions of perception ever since it was used by Ernst Mach in his Analysis of

Sensation, first published in 1886”, mas é atribuído a Christian Von Ehrenfels (1859-1932) a

responsabilidade efetiva pelo conceito da Gestalt. Assim como, ele sofreu influência de Mach,

ele influenciou Marx Wertheimer, Kurt Koffka e Wolfgang Köhler, responsáveis pelo

surgimento da Psicologia da Gestalt56

, entre 1910 e 1912, na Alemanha. Baseados em

tratamentos anteriores sobre a percepção da forma, realizaram estudos psicofísicos – os quais

54

A decantação é um processo existente nas ciências química e física sobre a separação de resíduos em

substâncias heterogênea. Na segunda metade do século XX passou a ser usado nas Artes Visuais como meio de

desconstrução dos sentidos figurativos e conceituais em prol de elementos mais qualitativos da composição, ou

mais recentemente, na convencionalidade de alguns suportes. 55

Na virada do século 19 para o século 20, elementos materiais da cultura de algumas etnias africanas saqueadas

pelos colonizadores europeus eram levadas e comercializadas em Paris, assim como, foram organizados

exposições com intuito antropológico. 56

Os termos, em português, que mais se aproximam para traduzir a palavra alemã são “forma”,

“configuração”.

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relacionaram a forma e sua percepção, inicialmente, na ilusão de ótica, quando o estímulo

físico notado pelo sujeito tem uma forma diferente da que corresponde à realidade. Köhler

(apud GUILHAUME, 1960), atribuiu à palavra Gestalt o significado de uma entidade

individual e com características concretas, conotando a análise da forma independente do seu

contexto. Porém Wertheimer, como mentor influente do grupo, foi mais longe:

There are entities where the behavior of the whole cannot be derived from its

individual elements nor from the way these elements fit together; rather the

opposite is true: the properties of any of the parts are determined by the

intrinsic structural laws of the whole'' (WERTHEIMER apud

WESTHEIRMER, 1999, p. 6)

Para ele, Wertheimer, a percepção da forma não estava sujeita à singularidade da

forma, e nem às relações que as encaixam para compor o todo imagético, mas às leis de

organização perceptual. A Teoria da Gestalt, enunciada por Wertheimer, subsidiou várias

concepções sobre a leitura de imagens, ele antecipou atuais compreensões das Neurociências,

ou seja, as organizações perceptivas são fruto de grupos de neurônios especializados para

determinadas situações dos estímulos visuais. Enquanto Wertheimer registrou o efeito, dada a

evolução cientifica de seu tempo, a Neurociências localiza a causa dessa conduta: hábitos do

sistema cerebral.

Guillaume (1960 p 57) faz observações sobre a relatividade da experiência acumulada

nas leis da Gestalt, a crítica da teoria da significação adquirida: “[...] Para que o objeto possa

adquirir uma significação, é necessário que já exista como objeto sensível, em virtude de seus

caracteres intrínsecos. A influência da memória é secundária, nesta organização que ela, longe

de explicar, implica.” A memória ter papel secundário é negar processos associativos na

semiose perceptiva, a condição de geral que a terceiridade “linka” a secundidade no processo

de semiose. A Gestalt está mais para a aparência, a visualidade que se apresenta para sob o

julgo de uma ordenação existente no sujeito, mas, ele lê de acordo com suas cognições

anteriores, portanto, é claro que a experiência desempenha um papel na percepção. A questão

é: até que ponto que as leis são infalíveis mediante a experiência existente? Recorremos à

leitura de imagens abaixo (Figuras 26 e 27).

Figura 26 - Radiofoto de 1959 Figura 27 - Imagem invertida

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Fonte:

http://agenciafm.blogspot.com.br/2010/08/radiofoto

Fonte: adaptada de

http://agenciafm.blogspot.com.br/2010/08/radiofoto

É uma radiofoto tirada no sobrevoo sobre região montonhosa por equipes de

reconhecimento aéreo. Foi publicada num jornal de 1959, nos USA e atingiu repercursão

significativa pela grande massa de leitores que interpretaram a revelçao da face do Cristo. Se

a imagem for apreciada em posição inversa a face desaparece, do ponto de vista do signo esse

fenômeno é claramente explicável pelo interpretante remático, mas, neste momento,

interessam as questões de organização percepctual da Gestalt: a forma central é impregnante,

criando estados de atenção em ambas as imagens, na figura 13 a convenção dos processos de

representação produzem a associação com a imagem do Cristo, enquanto na figura 14 outras

associações estão aptas a surgirem. Também se observa, no segundo caso, a imagem

principal expande para além do campo visual, enquanto a primeira, dada a convenção da

representação, o olhar converge. A predominância da forma central é intensifciada pelo

agrupamento de semelhanaça de área, pela distribuição do espaço, ou seja, significa que as

organizações perceptuais podem ser aspresentar de modo incorporativo, com graus de

predominância, e somada a essa condição a experiência anterior.

Assim, de acordo com o visto, existem hábitos neuronais para aprensão da forma

visual e também haverá outros para ordenação visual (KANDEL, 2014), mas ambos sujeitos a

intensidades, recombinações e efeitos sob a influência da experiência adquirida. Não

podemos nos equivocar em considerar experiências anteriores apenas no campo nominal, pois

tampém é hábito aquele que enxerga mais variações de tons em função de manipulá-las

constantemente.

As divulgações das Leis da Gestalt partiram do texto seminal de Wertheimer, datado

de 1923, cujos tópicos seguem uma ordem gerativa, pelo menos para a explicação do

conceito. Estudos posteriores sobre a questão inseriram observações de Kofka e Köhler,

proliferaram novos termos para traduzir os conceitos, que dificultam manter uma homogenia

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literária. Tendo em vista que não se trata de uma verticalização na obra de Wertheimer, mas

da relevância dos sintomas da organização perceptual, segue a síntese Schiffman (2005),

atualizada inclusive com referências ao amadurecimento do pensamento pelo próprio

Wertheimer: princípio de proximidade, elementos no campo visual estabelecem arranjos,

porém, a noção espacial de proximidade depende da visibilidade do todo; principio de

semelhança, que dependerá de processos de associativos por algum tipo de similaridade, é

encapsulada pela primeira, pois intervalos são um tipo de semelhança; a junção destas duas

leis proximidade e semelhança, em atritos de predominância, determina o principio The

Factor of Uniform Destiny ou boa continuidade, ou seja, coincidências de linhas, áreas,

planos, que são percebidos por parecerem seguir uma única direção; o principio de destino

comum, diferente do principio anterior, é um agrupamento por elementos distintos cuja

direção os iguala; a Lei de Prägnanz ou principio da boa forma é tendência de se apreender

entre, as possíveis opções perceptuais, formas mais simples e estáveis de todas, para tanto,

não se trata de uma lei de causa, mas de efeito dos outros princípios. Schiffiman (ibid)

atualiza essa relação salientando a simetria e fechamento e inserindo o princípio de

conectividade uniforme57

. Estes princípios apresentam uma diferença em relação aos

primeiros, pois, enquanto os demais se aplicam ao contexto forma-campo visual, a simetria e

o fechamento atendem tanto essa questão como formam unidade. O principio de

conectividade uniforme é ainda um argumento subjetivo.

A percepção não pode ser reduzida apenas a um papel meramente fisiológico, mas é

desses sensores que ela depende, assim, como existem grupos de neurônios para a percepção

da forma. Reforçado nos argumentos de Westheimer, o reconhecimento das Neurociências ao

postulado de Wertheimer, demonstra que as organizações perceptuais são inatas ao cérebro,

um conjunto de leis sujeitas as mais diversas combinações, grupos neuronais condicionados

tanto a recepção da forma como organizá-las, entretanto, não podemos fechar a questão da

percepção, sem considerar a experiência adquirida. Estes aspectos estão no campo do sujeito.

Externo ao sujeito, os signos insistem sobre nós, mas não se trata de uma segregação, sujeito e

signos. As doutrinas do hábito e do falibilismo de Peirce revelam a flexibilidade do

fenômeno, assim, o que está no sujeito não são apenas hábitos adquiridos culturalmente,

existem hábitos vinculados por semioses evolutivas da espécie, são signos corporificados na

materialidade humana desde a sua gênese, portanto o signo, elemento efetivo da mediação, é

o elemento geral, transeunte entre mundo objectual e sujeito. 57

Segundo Schiffiman (2005) este princípio foi aperfeiçoado nos estudos de Rock & Palmer

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A necessidade de evidenciar estes argumentos é para demonstrar que a sintaxe visual é

determinada pela organização perceptual que é guiada pela principio de mediação.

Retomando que a mediação predispõe o fato singular em plural, caso contrário, não é operante

a sua conexão, são esses traços de generalidade que estão na proposição de Wertheimer.

Primeiramente, percebemos o espaço a partir da forma, desde o mais sútil tom de uma

cor até as definidas em contornos, nosso olhar sofre de estados de atenção provocados pelo

mais ínfimo traço de contraste, o mundo visual determinado pelo tempo e espaço, assim, a

visualidade, a imagem e a linguagem visual, é um fenômeno de mediação, pertencente à

terceira categoria, mas sob intensa predominância de uma secundidade – alteridade,

dualidade.

Os princípios são antes de tudo agrupamentos, cujo critério implica em alguma

regularidade: a “proximidade e semelhança” são olhar captado por alguma forma e sua

relação com outras, que inclui forma-intervalo e igualdades, as semelhanças. Inclui-se a “boa

continuidade” e “direção comum”, pois para agrupar-se também necessita de certa

regularidade. A “boa forma” tem caráter de sintético ao depender das demais, ou seja, síntese

são regularidades. Partindo dessa análise, a sintaxe visual tem algo de semelhanças,

“movência” e unificação, o que sinaliza possíveis categorias da sintaxe visual.

Não é pretensão para o momento alargar a sintaxe, mas é preciso pelo menos um

inicio elucidativo para prever intenções de discursos e, quiçá, condutas perceptivas. Assim,

após estudos nas referidas obras citadas no início deste tópico: Kepes, Scott, Arnheim,

Dondis, observou-se um consenso comum, mais terminológico que conceitual. São eles:

contraste das cores, relação-figura fundo, agrupamentos por semelhança, profundidade,

equilíbrio, distribuição simétrica e assimétrica, tensão espacial e ritmo. Na realidade, exceto a

iniciativa de Dondis, não há a preocupação em distinguir os elementos de uma sintaxe. São

aspectos tratados independente de consciência sistêmica. É possível que seja um sintoma da

concepção do objeto visualidade que tem sido estudado: a natureza psicofísica. Esta será a

pretensão da abordagem semiótica, reconhecer a sistematização sintática.

Observa-se na nascitura da forma visual (quadro1), objeto da sintaxe, de acordo com

as estruturas receptivas do sujeito, que são: a cor,a forma-profundidade e o movimento,

modos de percepção do espaço, cujas formas nascem na cor, construindo áreas, estabelecendo

diferenças de atenção e dependentes de um cenário e um sujeito moventes.

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Para os Gestaltistas, mais especificamente Wertheimer, os princípios da organização

perceptual podem se apresentar sobrepostos, portanto, compreendê-los como indicadores da

sintaxe visual é assumir essa condição para a sintaxe.

Relembrando que a sintaxe de uma linguagem, sob viés fenomenológico, é o

primeiro de um terceiro, portanto emprenha uma ordem para algo subsequente, exige para si

um predicativo, baseado no postulado, a visualidade exposta, e enuncia modos de

organização, dos mais sutis ao concreto relativo.

Diante dessas reflexões, podemos argumentar sobre características da sintaxe visual:

(1) é dependente do sistema perceptivo do sujeito, (2) está sujeita a experiência adquirida; (3)

é organizadora dos arranjos da forma unidade, compõe a forma composicional; (4) se

apresenta sobrepondo-se e criando graus de predominância; (5) apresenta e representa o

espaço (e tempo); (6) depende das relações de semelhanças e diferenças, comparativas; (7)

está predisposta para há algum tipo de movimento; (8) tem finalidade integrativa, unificadora.

Destas características procuramos identificar um sistema “lógico de ser” a luz das

categorias fenomenológicas: no primeiro nível está o “apresentar-se” com suas propriedades

de arranjos de cores e de formas, no terceiro nível “integra” os elementos sintáticos em prol

da totalidade da imagem. O que seria o segundo? A segunda categoria do fenômeno é reativa,

conflitante, marcada pela alteridade e, ao associarmos a sintaxe visual, devemos lembrar que

o objeto que nós fixamos não é a forma-unidade, mas a composicional, dotada de algum tipo

de movimento, estará sempre na relatividade entre objeto e sujeito, assim, os indicadores da

fluência no espaço visual podem evidenciar ou obscurecer as sobreposições de elementos

sintáticos da linguagem visual. Talvez entenda a afirmação incoerente de Wong (2001) sobre

falta de lei evidente na linguagem visual, existe um conjunto de leis que multiplicam relações,

assim, faz jus a ideia de Català (2011), que a linguagem visual vai do polissêmico ao

concreto. Se a sintaxe é a organização geral das partes, a partir destas três categorias, é preciso

ver como elas se comportam em relação a sua estrutura morfológica: a forma-cor, a forma-

área e a forma-composicional.

4.4.2.1 - A sintaxe da cor

A dependência da luz é indubitável para a existência da visualidade. Ela revela o

espaço que pode ser percebido pela fluência da mesma no espaço, portanto, se houvesse um

único fluxo de luz, homogêneo, sobre nossa retina não haveria nada além de um continuum de

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luz. A variação da luz, refletida e refratada, constrói o espaço visual, portanto a linguagem

visual é intensamente caraterizada pela presença do contraste “Combinación de cualidades

opuestas, relacionadas; oposicion, variedad. Diferencia essencial de luminosidad” (CRESPI e

FERRARIO, 1995). O contraste são diferenças, que vai da mais arguta alteridade até posições

diametrais.

Retomando a predominância da secundidade nesta forma de linguagem, a primeira

ordenação matricial, que é a alteridade espaço-forma, cuja cor é o primeiro fundante na

qualidade de primeiro determinante da forma. A cor não pode ser pensada simplesmente no

pigmento, inicia na cor luz e termina nos efeitos de reflexo e refração. A cor nunca está

isolada de outra cor (mesmo que seja um corpo acromático), caso contrário seria um

continuum sem distinção forma – espaço, essa relação de diferenças abriga possibilidades de

organizações. Existem três primeiros contrastes (Figura 28): qualidade da cor, a diversidade

do grau de pureza da cor quando sujeita a interferência do Branco, do preto, do cinza ou da

sua complementariedade; luminosidade, claro-escuro, que é fruto das oscilações da cor entre

a luz branca e da ausência de luz; temperatura da cor, quente e fria, enquanto energia, a luz é

fonte de calor, que nos afeta tanto na visualidade como na sensibilidade cutânea à

temperatura. São contrastes evidenciados essencialmente dos elementos qualitativos da cor.

Figura 28 - Contraste de qualidade Contraste claro e escuro Contraste quente-frio

Fonte: elaboração do autor

Um segundo grupo de contrastes (Figura 29) é: a quantidade de cor (ou superfície)

se dá na diferença das dimensões que a duas ou mais cores preenchem o espaço, cujas

observações numéricas de Goethe58

(CRESPI e FERRARIO, 1995) procuram compensar a

velocidade da luz que nos afeta através de variação da dimensão da superfície; “da cor em si”

58

Johann Wolfgang von Goethe (1749 — 1832), escritor alemão, realizou incursões no pelo campo da ciência.

As referências de partes (compensação de valores luminosos) utilizadas a partir dos estudos de Goethe são: 9

para violeta, 8 para azul, 6 para vermelho, 6 para verde, 4 para laranja e 3 para amarelos

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comparando a ideia de preto e branco, são manifestações acromáticas máximas do claro e

escuro, as três cores geratrizes – verde, ciano e magenta para a cor luz ou amarelo, azul e

vermelho para a cor pigmento são expressão máxima do contraste que perde intensidade a

partir das cores geradas; de simultaneidade é o efeito de uma cor sobre aquela que está na

sua adjacência, por exemplo, duas cores “cores frias” podem tornar uma delas mais “quente”,

assim como duas “cores quentes” podem tornar uma delas mais fria, uma cor pode alterar a

sensação de claridade da outra.

Figura 29 - Contraste de quantidade Contraste da cor em si Contraste de simultaneidade

Fonte: elaboração do autor

Para avançar sobre o terceiro grupo, é preciso recuperar a ideia que a luz branca59

é

uma soma das cores do espectro visível pelo olho humano, que podem ser reduzida a três

matrizes únicas: verde, ciano e magenta. O termo de complementaridade se aplica à

associação de uma geratriz (verde, ciano ou magenta) com outra gerada (violeta, amarelo e

laranja), que reconstituem a luz-branca. O mesmo ocorrerá nas cores pigmentos, porém a

soma será o preto. Agora segue: o contraste sucessivo, não muito reconhecido na literatura

especifica como tipo de contraste, também denominado de fenômeno pós-imagem

(FIGUEIREDO E PIETROCOLA, 2000) e cor inexistente (PEDROSA, 1982), é melhor ser

compreendido através de exemplo: ao fixar o olho numa mancha vermelha e depois de alguns

segundos, deslocamos o olhar para outra superfície e vemos um tom de ciano brilhante. O

vermelho seria a cor refratada na retina por reflexo de algo pigmentado ou emissão direta de

alguma fonte luz. A cor-luz vermelha está num contiguo da luz branca, que só não se forma

porque lhe falta a adição da cor luz ciano, por algum mecanismo ainda em estudo na área de

59

A luz branca é uma convenção da Física, pois a fonte principal do nosso sistema planetário, que é o sol,

pertence a grandeza amarela.

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122

contemplação e desnecessário de aprofundamento, o sistema visual compensa a ausência após

o deslocamento. Não se trata de uma imagem unicamente mental, pois se trata de captação da

luz, um instante ínfimo de processos perceptivos. A questão é: como esse contrataste opera

como sintaxe? Na mais sútil das experiências, o estado de latência da nossa percepção, sujeito

a interferir na qualidade luminosa da percepção sob o jogo das áreas e das posições da

imagem. O contraste complementar, conceito já antecipado, está para a cor-luz e a cor

pigmento, são os pares que constituem a soma. O contraste de sequência matizada ou tonal,

muito próxima da ideia de qualidade da cor, mas a passagem das diferenças é harmonizada

pela proximidade tonal ou da mistura de matizes no complexo do espectro, são vizinhas por

ordem espectral, são análogas, enquanto os demais contrastes podem fazer a imagem pulsar

em partes do espaço, a sequência é linear e cria direções de fluxo (Figura30).

Figura 30 - Contraste sucessivo Contraste complementar Contraste de sequência

Fonte: elaboração do autor

4.4.2.2 - Sintaxe da forma

A respeito da leitura da linguagem, o modo verbal, escrito ou oral, obedece a uma

leitura linear, enquanto a imagem parece ser diferente, se apresenta em tempo único ao olho,

mas é um engano. Enquanto a primeira é linear, encadeada (DEHAENE, 2012), cuja noção de

tempo para leitura é óbvia, a segunda não foge a essa natureza, temporal, porém não é

encadeada e nem linear, o todo que se apresenta sofre de variações ínfimas, pulsões de partes

do todo da imagem sobre o sujeito. Não se pode confundir essa afirmação como se, ao

perceber a imagem, parte-se da junção de suas partes, ela se apresenta no todo, com ínfimas

variações temporais, que podem ser demonstradas na sobreposição de elementos sintáticos:

uma imagem que, a priori, se apresenta por um agrupamento de área.

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123

A sintaxe da forma é uma sintaxe da forma em trajeto composicional estabelecido

pela velocidade da luz, a mais sutil; pelas áreas menores em relação a dimensão do campo

visual, principio semelhante ao identificado por Dehaene60

(2012) no processo de leitura da

escrita e, também, na propriedade do contraste: projeções contínuas, áreas maiores que o

campo visual dificultam a percepção dos limites; e pela convenção figurativa. Da primeira

para a terceira, são “encapsulantes.” (Figura 31).

Figura 31 - Princípios de alteridade da forma Velocidade da luz Áreas apreensíveis em relação a

projeção e continuidade

Convenção

Fonte: elaboração do autor

Os intervalos entre formas nos espaços geram a tensão espacial, mas não podem ser

reduzidos somente a esse patamar. Intervalos entre formas criam o magnetismo que as agrupa

ou repele, porém, a tensão espacial se projeta além dos intervalos. Cria focos de perceptivos

em relação de “tensionamento.” (Figura 32).

Figura 32 - Tensão espacial– simples

Fonte: elaboração do autor

A noção dual de superfície e profundidade, seja na forma tridimensional como

bidimensional, existe na distinção de planos, é uma ordem movente, interna ao próprio

campo visual, que vai desde os níveis da velocidade da cor até as simulações

60

Dehaenedemonstra que o processo de leitura da escrita depende de um limite focal sobre o conjunto de

palavras, ou seja, um perfeiçoo e outro nuclear que se transmutam na linearidade do ato.

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124

perspectivas61

.Outra dualidade, posição e direção62

, são eventos responsáveis pelo

deslocamento vertical (esquerda-direita), horizontal (altura) e diagonais.

Antes de prosseguir, alguns argumentos em prol da convenção no processo de

estabelecimento figuro-fundo na forma composicional. A convenção aqui é tomada como

hábito perceptivo, assim, a convenção não é exclusivamente o legi-símbolo-argumental, o

signo genuíno, mas níveis simbólico-remáticos do signo, constituídos de um lado pela

experiência e do outro pela predisposição dos grupos de neurônios na construção mais básica

da forma.

Seja qual for o nível da apresentação da relação forma espaço, estes estarão sob a

varredura de semelhanças. O critério de semelhança, o primeiro principio percebido por

Wertheimer, evoca as diferenças, a descontinuidade, que evoca associações, agrupamentos de

algum traço de regularidade. Os agrupamentos perceptuais (Figura 33) estão num campo

proposicional, portanto são múltiplos, porém, mapeáveis: preenchimento das áreas (cor,

textura), dimensão das áreas (tamanho e formato) e posição (direção, intervalo e atitude).

Porque agrupamentos estariam sob uma organização sintática movente? Se houvesse só

semelhança, haveria apenas uma variação: a captação da dualidade, forma espaço; a presença

de semelhanças e diferença estabelece agrupamentos, que por sua vez movimenta a percepção

sobre a imagem.

Exemplos de agrupamentos são mais didáticos em formas abstratas, pois, em

elementos figurativos, as mediações simbólicas, nominais, são de tal trama imperativa que

obscurece a sutileza da leitura.

Figura 33- Agrupamentos por semelhança

61

A profundidade na imagem bidimensional pode ser simulada pela: velocidade da cor, pureza do matiz,

sobreposição, proporção e perspectiva 62

A direções “da esquerda para a direita” são hábitos intensificado pela cultura escrita e o “alto-baixo” são

reforçados pelo ambiente natural em relação a luz.

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125

Fonte: elaboração do autor

4.4.2.3 –Sintaxe da composição

Enquanto a sintaxe da forma encapsula a sintaxe da cor, por conseguinte a sintaxe da

composição abrigará as demais. A sintaxe da forma são ordenações de eventos a partir de

relações indutivas: a tensão espacial produzida por determinado agrupamento que surge na

relação forma-espaço. Portanto, seguindo o crescimento da lógica, haverá sintaxe da

composição uma lógica dedutiva.

Scott (1978, p. 35) também desenvolve essa ideia: Unidad y variedad

son los conceptos que nos guían en el análisis de la función que cumple la

organización visual en el diseño. La variedad, por su misma naturaleza, no

se presta a la generalización. Los tres puntos que establecimos al definirla

constituyen casi todo lo que podemos decir al respecto. [...]La organización

figura-fondo y el agrupamiento de figuras constituyen importantes factores,

pero forman parte de toda percepción.

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126

Campos visuais impõem ao olhar um centro ótico para a composição, a partir desse

centro, as formas visuais enunciam eixos virtuais que permitem compreendê-lo pelo seu foco

central, pois, a sua volta expande por semelhança: simetria [do grego sýn – união, + metr(o)-

medida, iā -qualidade]. Quando o eixo virtual apresentar uma irregularidade entre as partes

que divide, é assimetria, uma descontinuidade na sua expansão, e também pode criar a ideia

de uma falsa simetria ou simetria aproximada quando as irregularidades são superadas por

alguma regularidade do todo. A apresentação funciona sob certa dedução das formas

composicionais. (Figura 34)

Figura 34 – Regularidades e irregularidades de distribuição

Fonte: Elaboração do autor

A forma-composicional tem no peso-leveza (Figura 35) uma experiência quase

imperceptível do movimento, mais sensível, que não pode ser interpretado só na redução

nominal equivalente a gravidade, mas na possibilidade de operar estados de pressão e alivio

que as imagens podem gerar através dos elementos formais e outros níveis sintáticos: matiz,

dimensão da forma, posição e direção, entre outras possibilidades. Na contração-extensão

(Figura 36) numa categoria movente e na ordenação da composição, são as forças que fixam

na obra ou levam o olhar para a exterioridade. O positivo-negativo (Figura 37), reduzido a

inversão de cores, pode ser um equívoco sintático, isso seria relação complementar da cor.

Crespi e Ferrario (1995, p. 100) apontam:

Teniendo em cuentarelación figura-fondo, enlacualla figura se encuentra

sobre elfondo y entre ambos existe interrelación de fuerzas provocada por la

energia de ambas y por laatración y repulsión que la figure sufre por

suposisicón dentro del campo em que se encuentra.

Para eles, a sensação parte da relação figura-fundo e das inter-relações de atração e

repulsa, porém essa sensação é regida pelo choque dos estados de atenção criado entre forma-

espaço de um campo visual, quase imperceptível no nível da cor, lúdicos no não-figurativo e

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intenso no figurativo. Enquanto moventes apontam para uma integração da composição

(Figura 35).

Figura 35 - Predominância do peso e equalização com leveza

Fonte: Elaboração do autor

Figura 36 - Obras de Naun Gabo – contração e expansão

Fonte: http://pixshark.com/naum-gabo-constructivism.htm

Figura 37 – Pintura deM. S. Escher– Relação positivo-negativo

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Fonte: http://www.mcescher.com/gallery/paint/no-56-lizard/

Na categoria integrativa, a sintaxe composicional inicia pelo controle temporal. A

priori, função do ritmo. Para Crespi e Ferrario (1995, p 111), o ritmo é: Periodicidad

percibida'. Movimiento virtual provocado a través de La percepción de acentos y pausas o

intervalos. Estos acentos son factores que repiten, crecen, alternan desaparecen y se

manifiestan siempre relacionados entre sí y com un silencio. O ritmo está sempre sob duas

orientações, a totalidade da imagem e alguma coisa em estado de repetição. Se uma imagem

fosse um imenso quadro de uma cor única, não haveria a dualidade relação forma-espaço,

assim, sem unidades para se repetirem, o ritmo estaria ausente. Para que ele exista é

necessário ao menos uma dualidade. O ritmo integra a relação entre o continuum e o

descontinuo: cores, áreas, tensão, agrupamento, contribui para a constituição do ritmo,

portanto ele está definitivamente na integração da imagem. Se a imagem se constitui como

fenômeno espacial no contexto apresentativo e deslocamento no indicial, o ritmo é a

incorporação máxima da sua temporalidade, não no sentido indexical, mas no tempo que a

sintaxe apresenta, movimenta e integra todos os seus componentes: Acentos y pausas

provocan una unidad dinámica y determinan um orden de tiempo. (Ibid, id, p 111). Se o

ritmo fosse definido apenas como repetição formal, seria um agrupamento. Parece-nos

abstrato demais, mas é a sua complexidade gerencial mediante a enorme gama polissêmica da

sintaxe visual. Para efeitos didáticos, vejamos alguns exemplos específicos na forma-unidade

e na relação forma-espaço:

Figura 38 - Possibilidades de ritmo

Fonte: Elaboração do autor

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É a fluência do percurso sobre a diversidade de formas e as respectivas relações

sintáticas que se posicionam de tal modo que prima pela varredura do campo visual:. Scott

(1978) sugere três organizações: axial, radial e oculto. O equilíbrio axial flui nos eixos

horizontal e vertical do campo visual, equilíbrio radial não possui um eixo, mas um ponto

central, forças partem de um ponto único do campo visual, que converge ou expande.

Enquanto os dois primeiros impõem os eixos horizontal-vertical e ponto radiante, há outro

indeterminado – o equilíbrio oculto: No hay reglas para el equilíbrio oculto: es uma cuestión

de sensibilidad frente a Las atraciones variables existentes(SCOTT, 1978 p. 48), o que

predispõe a situação primária pela ausência de lei.

Figura 39 - Exemplos de equilíbrio: oculto, axial e radial

http://www.ccms.saude.gov.br/revolta/cartazes.html; https://tatielek.wordpress.com/tag/cartaz/

http://www.coisasemanal.com.br/2012/11/os-cartazes-das-cidades-sede-da-copa-do-mundo-no-brasil/

Os três equilíbrios não podem se tratados sob aspecto engessado, cada um em sua

modalidade, como propôs Scott pois em exercícios plásticos de transformação de equilíbrios

foi possível identificar que eles se movem semelhantes ao disco espectral das cores, ou seja,

o equilíbrio pode ser radial com tendência de “vir a ser” oculto e, assim, segue entre eles.

Dado todo este conjunto de itens sintáticos, que elemento caberia para a

finalização? De caráter integrativo, final, mas não absoluto, pois seria ai uma lei única. Este

seria um nível sintático da composição que ascenderia a meta discursiva. Do ponto de vista da

prática da composição na linguagem visual, é possível tanto acrescentar formas ou retirá-las

para atingir algum tipo de êxito intencionado. O emprego do termo “limpar a imagem” é uso

no senso comum com essa finalidade. O mesmo ocorre no campo sintático, opções sintáticas

podem provocar essa sensação. Assim,a ideia de Prägnanz da Gestalt, traduzindo

aproximadamente como boa forma estaria próximo dessa concepção. “A lei de Prägnanz

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incorpora os efeitos dos princípios de agrupamento da Gestalt. A organização do padrão

visual com base nesses princípios produz as percepções mais simples e eficientes.”

(SCHIFFMAN, 2005 p. 129). A última instância integrativa tem a ver com a eficiência da

meta de sentidos, em total reconhecimento dos singulares e plurais. Para aquele que domina a

sintaxe, será um processo experimental lógico. Naqueles que compreendem a sintaxe:

experiência sensorial conduzirá para acertos de manipulações frente às intenções. Naqueles

que é incompreensível a sintaxe, o caminho estará à sorte do acerto sensível. Nesse nível

sintático, pode se pensar em um pensamento visual indutivo.

No uso das categorias fenomenológicas para compreender fenômenos, não basta

classificar as coisas de acordo com as caraterísticas de cada categoria: primeiridade,

secundidade e terceiridade. Elas precisam estar alicerçadas numa relação evolutiva, ou seja,

uma classificação anterior precisa guiar a posterior. Assim, o quadro abaixo, com função de

sintetizar os tópicos da sintaxe (Figura 40) aqui expostos.

Figura 40 - Síntese da sintaxe visual

APRESENTATIVA MOVENTE INTEGRATIVA

Sintaxe da cor Qualidade

Claro-escuro

Quente-frio

Quantidade

Cor em si

Simultaneidade

Sucessivo

Complementar

Sequência

Sintaxe da forma Espaço-cor

Espaço-forma

Figura-fundo

Tensão espacial

Distinção de planos

Movimentação

Agrupamentos:

Preenchimento,

direção e posição

Sintaxe da

composição

Simetria

Assimetria

Simetria aproximada

Peso leveza

Contração-extensão

Positivo-negativo

Ritmo

Equilíbrio

Boa forma

Se o acesso à forma se dá pela sintaxe, a sintaxe da composição é que nos dá acesso

aos níveis da sintaxe visual. Esses percursos horizontais: sintaxe da cor, da forma e da

composição, são verticalizados por três categorias pensados a partir das cenopitagóricas, a

apresentação dos elementos sintáticos (gerais e possíveis), a relação de espacialidade

(deslocamento de particulares) e integração operada por eles (geral). Segue o discurso visual.

4.4.3 – Intencionalidade Visual

Pensando na linguagem como signo, a natureza da linguagem visual, pelo menos

inicialmente, não pode ser outra senão a orientação do movimento, que para haver tem que vir

primeiro o reconhecimento do espaço. Duas naturezas, espaço e tempo, se constituem. Um

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olhar é um processo descritivo, o resultado dessa experiência pretérita, mesmo que seja por

instantes de segundo, é um acúmulo memorial. Observar dois caminhos e fazer escolha

implica em estabelecer relações com síntese. São observações que levam a imaginar o sujeito

frente ao mundo das imagens naturais, que são suficientes para prosseguirem a condição de

imagens produzidas pelo sujeito.

Assim, existem três categorias que as imagens podem afetar o sujeito: apresentado,

remetendo e sintetizando, de fundo sensorial, referencial e condutível. Sem incorrer no risco

de um ato incoerente sobre as criticas do logocentrismo para a visualidade, e a intuição que a

tipologia da linguagem verbal: descrição, narração e argumentação são funções da linguagem

integrantes de qualquer forma de linguagem, cuja concretude, metalinguagem lhe garantiram

um falso patenteamento, eis outra categoria para a visualidade. Aproximá-las é inevitável: a

sensorial da descrição, a referencial da narração e a condutível da argumentação.

As intenções atreladas ao nível sensorial descritivo são as apresentações da imagem

em si. As intenções do referencial-narrativo são as apresentações da imagem tempo espaço, a

imagem no seu conteúdo pretérito e presente, imprópria para desenvolver condutas operantes.

A terceira combinação, condutível argumentativo existe na imagem, aliás, é desta que a

matemática espacial é reconhecida. Esses pares sistematizados sob as categorias

apresentariam uma rede mais ínfima para atingir os níveis do discurso visual, porém, no

intuito de evitar a prolixidade e tratar no próximo capitulo a relação “cultura, suportes e

visualidade” sob a perspectiva de produção de linguagem, é necessário encerrar para evitar a

prolixidade. Em tempo, se esclarece que: estes níveis de discursos são análises de caráter

decantativo da imbricação discurso visual e verbal efetivados pela imagem. Parte-se da crença

que existe um discurso puramente visual sujeito a crescer ou não para a interdependência

verbal.

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CAPITULO 5 – COMPORTAMENTO COGNITIVO E VISUALIDADE

Os dois últimos capítulos tiveram como função estabelecer subsídios semióticos

para a cognição e apresentação do território gramatical da linguagem visual, que agora segue

para a sua junção com a cognição visual ocorrida em processos de aprendizagem na prática

educacional de unidade escolar pública.

Os documentos orientadores, citados no primeiro capítulo, são focados na forma

verbal, provavelmente destituídos de viés semiótico na respectiva elaboração autoral ,

demonstram, através da classificação das competências cognitivas, três funções: identificar,

relacionar e operar, que correspondem à tipologia da linguagem: descrição, narração e

dissertação. A natureza da linguagem no homem, conforme observado no percurso

antropológico, voltou-se para orientar, reagir e comunicar. Essas sequências são facetas que

confirmam a função da linguagem que, de modo mais universal, são as formas de linguagem e

a natureza das semioses que apresentam mais coerência nos termos: apresentar, relacionar e

operar. São níveis de semiose que permitem a cognoscibilidade de um sujeito.

Assim, a cognição processada no nível do signo genuíno: o simbólico-argumental

encapsula outras formas, pois conhecer requer aprender para relacionar, para operar. São

semioses icônicas, indexicais e simbólicas que constituem o fluxo cognitivo e são favorecidas

pela natureza do signo. Vejamos: as semioses proliferadas simbólicas tendem à convergência

das conexões e significados, à autorreplicação e à arbitrariedade operativa; as que expandem

através de relações indexicais tendem ao estado preposicional que gera multiplicidade

conectiva e de sentidos, e as icônicas não são convergentes e nem divergentes, são

potencialmente catalisadoras da percepção e da atenção.

Três aspectos pleiteados, tanto em processo de autoaprendizagem como práticas de

ensino-aprendizagem no sujeito, são explícitos nas características centrais das semioses: o

modo operativo – adquirir conhecimento contextualizável, o modo associativo – adequação

àquilo que possui variáveis, relações de similaridade (alteridade) e contiguidade, e o modo

motivacional – o poder de mobilização da atenção provocado pelo objeto de cognição.

A ausência dessa consciência epistemológica em práticas educacionais é enunciada

nos sintomas correntes na rede de ensino: alunos reconhecem alfabeto, mas não constroem

sentenças, leem textos, mas não compreendem, operam com fórmulas matemáticas, mas não

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identificam as mesmas em situações-contextos, esquecem constantemente conhecimentos

apreendidos, etc. O uso de recursos tecnológicos, investigações fecundas sobre sequencias de

aprendizagem e atualizações da Neurociências, surgem como potências didáticas, entretanto,

são fragmentos de um mosaico que, conforme se agrupam, apontam para o fenômeno da

semiose como eixo integrativo e indicativo de percursos mais eficientes da aprendizagem.

5.1 - Cognição, mediação e suportes

A cognição se instala no sujeito pela sua natureza sígnica, que o conecta ao mundo

para sua sobrevivência orgânica e social. Deixando essa dualidade já debatida, o social é a

experiência individual e coletiva, compartilhada e operativa para a continuidade da espécie. O

espaço social, que contém o espaço singular do sujeito, está para a linguagem e o pensamento,

e ambos estão para o signo (SANTAELLA, 2001) cuja abstração torna-se mais palpável

nessas situações. Assim, a discussão sobre a causalidade do fenômeno da aprendizagem seria

fruto do ambiente social ou talvez da estrutura do sujeito, e este impasse tem no signo a

solução. Primeiramente, para ilustrar dois aspectos dicotômicos, cultural e inato, recorre-se

aos argumentos de Gardner (1999) que cita a possibilidade de dormência de certas habilidades

mentais em função do ambiente cultural e de Dehaene (2012) sobre a predisposição de formas

para aquisição de sistema alfabéticos. Deste modo, qualquer tipo de isolamento cultural

afetaria as habilidades cognitivas, assim como, do ponto de vista da predisposição, provocaria

avarias no cérebro ou nos sistemas receptores comprometimentos na estrutura apta a processar

a cognição. São duas faces do fenômeno cognitivo que lançam a demanda de fatos singulares,

enquanto o aspecto do signo explica e contempla todas as aparências da cognição. O signo se

apresenta como mediador entre a possibilidade cultural e a singularidade mental do sujeito.

Santaella (2007) estabelece a mediação como conceito epistemológico para a

capacidade humana de acessar o mundo cognoscível, de que a linguagem é a condição

necessária e imprescindível. No âmbito cultural, as mediações são dependentes de processos

comunicacionais e, obviamente, de linguagem. Essa disposição leva a crer em uma

apropriação categorial dentro da terceiridade: mediação- potência, propriedade cognoscível;

linguagem - singularidade de formas e comunicação – um caráter geral, natureza coletiva.

Nesse sentido, o caráter de secundidade da linguagem é atribuído ao caráter transformador das

relações, que são constituídas, por sua vez, pela equalização: do signo, do suporte e da

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conexão com o sujeito. Aliás, são redundâncias as afirmações anteriores: os signos criam

percursos cognitivos.

Algumas situações: a popularização da internet provocou uma ligeira alteração

“ortográfica”, dados os meios de materializar a linguagem: o “não” passou para “naum”. O

encontro de algumas línguas africanas com a língua portuguesa em solo brasileiro, durante o

processo de escravidão, contribuíram para o “vosmecê” chegar a “você”. Parecem situações

distintas, mas decorrem de variações do suporte: manipulação de teclados e exploração tonal

em decorrência da exploração silábica da oralidade. A comunicação é afetada pela linguagem,

que se expande nos mais diversos suportes. Para serem suportes, pelo menos na condição

externa, precisam ser capazes de afetar os órgãos sensoriais como a luz, o som, o calor, as

substâncias odoríferas, etc.

Os sistemas de suportes da linguagem, desde pinturas parietais e o surgimento da

escrita demonstram a externalidade da memória humana articuladora entre o pretérito e o

futuro. Também são observados: a portabilidade dos suportes, dos quadros aos eletrônicos,

dos melhores reprodutores nesse processo que se instala certa seleção cultural. A

reprodutibilidade da imagem existe de modo embrionário, desde a rigidez visual egípcia, da

invenção dos cânones, pois foram estratégias para reprodução do padrão e técnicas na

dependência viso-motora. Na sequência, as gravuras (xilogravura, calcogravura, água forte e a

litogravura) constituíram técnicas de reprodução da imagem, porém o advento histórico

absoluto se dá na invenção da fotografia, cuja condição icônica-indicial e imediata, entre

outros, favoreceu substancialmente a expansão da imagem. Depois, do cinema para o

audiovisual.

Retomando as questões anteriores: mediação e semiose, tanto a fotografia como o

cinema são suportes condizentes com a natureza imagética do signo, são dependentes de

aparatos tecnológicos e caracterizam semioses apresentativas e relacionais, descritivas e

narrativas, sem negar a possibilidade de relações puramente visuais processarem deduções. A

condição geral da mediação se perpetua por um modo singular dessas condições de linguagem

e produzem um comportamento cognitivo. Os suportes da linguagem são o cerne de tal

processo, pois são os que a tornam perceptível.

Segue um relato hipotético do processo de leitura de uma imagem: para iniciar o

processo é necessária uma imagem fixada em um suporte qualquer, portanto elementos

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formais e gramaticais estarão inseridos. Na sequência estados de atenção e processos

associativos, evocativos da memória se instalam. Depois, mesmo que a gramática visual não

seja compreendida em seus conceitos ordenativos pelo leitor, ela produzirá efeitos. Exemplos:

as preferências sintáticas aleatórias ou a necessidade destas em prol da intenção de discurso

específico que geram condutas, a apreensão da forma, que se move diante dos olhos, é mais

catalisadora da atenção que as fixas, agrupamentos limpam imagens ruidosas, histórias em

quadrinhos pouco exploram o equilíbrio radial para dar sequência a próximo quadro, etc.

Não obstante, pode ser deixado de lado que os suportes estabelecem formas de

captação de informação, portabilidade e conectividade, que também produzem outros

comportamentos cognitivos, mas para o momento, incide-se sobre o que é decorrente da

linguagem visual que o suporte contém.

5.2 - Comportamento cognitivo e âmbito escolar

Uma das discussões que ainda se mantém atual no âmbito da aprendizagem é a

aproximação da escola com a realidade. Foi nesse bojo que a ideia do conteúdo

contextualizado nos planejamentos escolares foi recebida, desde os anos 90, porém, é uma

preocupação com a operacionalidade dos saberes culturais. Há outra realidade a ser percebida,

mas não de aproximação, e sim de reconhecimento da escola para os novos comportamentos

cognitivos.

A atual educação escolar, na sua idealidade mais eloquente, é: ensinar a pensar, é um

processo comunicacional, de linguagem, portanto depende dos suportes em que os signos se

estabelecem. Perpassa pelo acúmulo de informação, pela memória, pelo registro de saberes

que se dá mais ostensivamente sob a predominância da forma verbal e da escrita, enquanto o

âmbito que o sujeito está circunscrito é um espaço marcado pela imagem.

A linguagem visual, como manifestação tangível da cognição (do signo) em relação

ao sujeito e ambiente, também está sob certa latência de ordenações, que se fixam em suportes

e estabelecem comportamentos operantes. A intenção é notar como a fixação nos suportes é

dotada de propriedades da segunda categoria fenomenológica: particulariza tratamento da

forma e da sintaxe, a condição física da apresentação arma certa alteridade para o sujeito; o

fato de priorizar certos aspectos formais e sintáticos implica a ideia de uma anterioridade: a

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latência das possíveis ordenações sintáticas. Obviamente, seu intento é sua terceiridade.

Posicioná-lo na sua predominância categorial é o primeiro passo.

A degeneração sígnica trata da quebra de um hábito, que é terceiro. O signo passa a

degenera-se em regressão ao ícone. A natureza do signo operativa e representativa reduz ao

efeito apenas apresentativo. Essa é a descrição de uma semiose degenerativa, mas por que o

hábito rompe? Porque as anterioridades também sofreram degenerações no nível da

secundidade e da terceiridade. A degeneração do segundo para o primeiro está na perda da

polaridade de sentidos. Então, a regressão atinge seu ponto primário, que na linguagem em

questão é a pura consciência imediata da imagem. A semiose não genuína é aplicável às metas

da linguagem: descrição, narração e argumentação, as formas de raciocínio: abdução, indução

e dedução. Compreender a semiose não genuína foi o segundo momento.

A terceira etapa, talvez a mais complexa, é o pensamento visual, ou seria mais eficaz

a visualidade no pensamento. O termo pensamento visual conota certo isolamento para um

tipo de signo, que parece contraditório à inter-relação matricial na produção de sentidos e na

dependência verbal para operacionalização produtora da gramática visual. A relação matricial

proposta por Santaella (2001) para a linguagem coloca a forma sonora, visual e verbal na

ordem categorial. Se há uma ordem categorial, estará sujeita à degeneração, assim, o verbal

regride ao visual que regredirá ao sonoro. Neste momento, o que interessa é a viabilidade da

regressão visual destituída da palavra.

Wertheimer (1923), nas pesquisas psicofísicas da percepção, procurava compreender

a estrutura de um pensamento visual, que para ele encontra-se nas organizações perceptuais.

Arnheim (1969), influenciado pela Gestalt, também atrelou pensamento visual a percepção e

discerniu três atitudes de observação:1) a percepção de contexto como um atributo do objeto

em si; 2) o isolamento percebido no estado puro e não alterada pelo objeto no seu contexto; 3)

o objeto revela sua identidade em uma multidão de aparências.

As associações presentes nos estudos de Wertheimer e Arnheim, a proximidade da

percepção ao pensamento visual, é inevitável, pois é esse o percurso de individuação do

pensamento no sujeito, parte da experiência. Os níveis de observação são expansivos para

qualquer processamento de linguagem, como especifica Peirce (1983) sobre a apreensão do

fenômeno: contemplação, discernimento e generalização, assim não se pode cristalizar nessa

compreensão.

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A visualidade no pensamento deflagra níveis de crescimento da percepção à lógica,

mas não necessariamente processado verbalmente. Por sua vez, o verbal que encapsula o

visual, ao esvaziar-se dessa condição, incide no risco cego da pura arbitrariedade. A

experiência extremamente mediada perde sua imediaticidade, que perde sua polaridade. Essa

talvez seja uma das causas da crise da atual aprendizagem, a falta de tratamento visual aos

conteúdos de ensino aprendizagem.

A outra, levantada no início desta pesquisa, partiu das observações dos docentes

sobre a presença de certos recursos tecnológicos de comunicação como dispersivos da atenção

que deveria ocorrer durantes as aulas. A imersão, o desenvolvimento de estados de atenção

não são propriedades da tecnologia, mas das estratégias, basta observar práticas mais lúdicas

independentes de meios tecnológicos.

5.3 - Estudos do comportamento cognitivo

A visualidade como meio de uma cognição mais concreta em prol da operativa, e a

conduta visual guiada por hábitos desenvolvidos por suportes tecnológicos foram os

fenômenos verificados. Para resolver essa questão, a proximidade com docentes e discentes

foi realizada. A metodologia empregada dividiu-se em dois momentos: “aluno dentro da

prática escolar” e o “aluno fora da prática escolar”.

O “aluno dentro da escola” iniciou-se em participação de reuniões com docentes,

proposição de interferências didáticas a serem praticadas por eles, estágios de observação de

aula e avaliação, quantitativa e qualitativa determinada pela relevância do próprio indicador e

mensurada por questionário. O “aluno fora da escola” partiu da aplicação de questionário com

vistas a identificar o comportamento tecnológico e preferências visuais dos cognoscentes. Por

de trás destes dois segmentos, a intenção foi comparar um comportamento de aprendizagem

exigido pela práxis com aquele que o cotidiano desenvolve, mais especificamente, no que

tange a duas propriedades do suporte visual: relação forma-sintaxe e tipologia da linguagem.

5.3.1 - Acompanhando o cotidiano escolar

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Segue análise de situações registradas em campo, durante o acompanhamento de

práticas docentes: de Língua Portuguesa, História e Artes. Não se trata de experimentos, mas

de acompanhamento de projeto proposto sob as bases teóricas desta pesquisa, discutidos e

desenvolvidos pelos docentes em conformidade com sequências de aulas deflagradas pela

proposta curricular na rede de ensino estadual.

A primeira, na disciplina de língua portuguesa: foram duas atividades envolvendo

alunos do primeiro ano do Ensino Médio. O docente solicitou a leitura de um texto narrativo

contido no livro didático. Noutro momento, com intervalos de dois dias, outro texto, um

artigo de opinião extraído do jornal foi lido. Nas duas etapas, as estratégias de ambientação do

grupo foram iguais, ligeira variação de ausência, e ocorreu uma plenária de interpretações

(nome dado pelo docente regente das atividades). Surgiram os seguintes indicadores de

compreensão:

Tabela - Participação leitura verbal

Comentários imediatos

Retomo ao suporte verbal (textos)

Nenhuma manifestação

Narração – 41 alunos 37% 25% 38 Argumentação -38 alunos 5% 40% 55

Após diálogos mantidos com o docente, foram comentadas algumas características

da aprendizagem através da comparação de objetos e novas práticas envolvendo o uso de

comparações entre textos de opinião, texto de opinião e imagem estática, texto de opinião e

imagem em movimento (curta metragem). A seleção do material foi por conta do docente, se

constituía de aplicações na mesma turma, com intervalo totalizado de seis dias entre as

atividades e com a mesma estratégia – plenária no final.

Tabela - Participação leitura verbal

Comentários imediatos

Retomo ao suporte Nenhuma manifestação

Texto e texto – 40 alunos 21% 33% 54% Texto e imagem – 39alunos 26% 29% 45% Texto e audiovisual – 37 alunos 45% 12% 43%

Nas duas ações do docente, algumas variantes se apresentaram: o interesse temático,

relações afetivas, mas não suficientes para inibir a expressividade dos resultados. Entre os

dois momentos, as alterações de quantidade foram significativas para demonstrar índices de

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participação no exercício de raciocínio argumental. No primeiro grupo, a narração se

apresenta mais concreta, pois é tradução do tempo e do espaço. O argumento, de acordo com

a dinâmica do docente, era apreensão de um ponto de vista de um determinado autor. Por

mais que argumentos conflitam ideias, não foram tão intensos como aqueles de autores

distintos.

O segundo momento, o conflito foi mais enfático na procedência dos materiais

trabalhados, assim como foi evidente que durante a plenária os termos refletiram mais a

presença das imagens.

A expectativa de relatos durante a plenária foi: dados- grupo de palavras sem

configurarem uma sentença, mas como índice contemplativo; sentença – frases declarativas

do entendimento parcial; síntese – sentenças com caráter explicativo. A totalidade dos relatos,

do ponto de vista qualitativo, obliterou para as frases declarativas, porém no caso da última

atividade, houve um favorecimento do audiovisual na formação de sínteses. Tendo em vista

que o audiovisual tem a natureza do relato, e em especial o escolhido pelo professor, se

estabeleceu o fato a ser verificado: a facilidade da síntese foi provocada pelo suporte ou pela

estrutura narrativa do filme.

O docente de História do Ensino Médio, comumente utilizava filmes para debater

conteúdos de História, ao compartilhar deste fato, através das reuniões pedagógicas, propôs a

estratégia leitura e plenária, através de dois vídeos: um essencialmente narrativo (duração de

37’) e outro de entrevista que predominava o caráter argumental (20’), para alunos do

segundo ano do ensino Médio, no intervalo de nove dias. Durante a observação da aula, foram

identificados dois modos de condução dada à impossibilidade de recorrer à reprodução

fílmica: comentários imediatos e os induzidos, provocados por perguntas feitas pelo

professor.

Tabela –Inferências sobre o vídeo

Comentários imediatos

Comentários induzidos

Nenhuma manifestação

Vídeo narrativo – 33 alunos 47% 33% 20% Vídeo entrevista – 31 alunos 27% 23% 50%

As variantes temáticas, qualidade de produção, não foram enfáticas, pois, haviam

dois estados de imersão que as sobrepuseram: da narração no tempo e espaço, fundada na

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visualidade e a outra que exigia mais compenetração dos interessados, que apesar da imagem,

predominava a oralidade argumentativa. O docente selecionou outro vídeo entrevista, agora

associado ao tema do vídeo narrativo e o aplicou a outra turma, também, segundo ano do

ensino Médio, porém, utilizou duas aulas seguidas e exibiu na mesma data, primeiro a

narração e depois a entrevista, seguidos de plenária comparativa.

Tabela –Inferências sobre o vídeo

Comentários mais voltados para o Vídeo narrativo – 28 alunos

Comentário mais voltado para o Vídeo entrevista – 28 alunos

Nenhuma manifestação

47% 24% 29%

Desta etapa, configurada na relação visual-verbal, que envolveu os docentes de

Língua Portuguesa e História, a linguagem na sua função narrativa demonstrou maior

eficiência em relação à argumentação, a imagem em movimento também captou mais a

atenção, principalmente na condição de junção da narrativa e imagem em movimento. Os

comentários dos alunos, sob aspecto qualitativo, cresceram da condição de sentenças

declarativas para sínteses conforme à passagem para temas intrínsecos. Comparando as

manifestações, a presença da imagem não é fator fundamental do êxito, mas a combinação

imagem em movimento narrativa.

Outro fluxo de atividades ocorreu na observação das aulas de Artes. O professor

desenvolveu projeto em duas turmas distintas, do terceiro Ano do Ensino Médio. Realizou

apresentações de obras de Picasso, Kandinsky e Mondrian utilizando imagens estáticas e

impressas, depois slides em PowerPoint e depois na tela do computador através de programa

que controla o conteúdo de cada aparelho. O objetivo do professor foi criar estados de

imersão na imagem para compreender as vanguardas europeias. As imagens lidaram com

figurativo (Picasso) e não figurativo (Kandinky e Mondrian) por critério exclusivo do

docente. A sequência do terceiro ano turma A (Figuras 41 - 43):

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Figura 41- Imagens apresentadas através de impressão – Aula do Ensino Médio

Fontes: http://www.wassilykandinsky.net/http:/http://pablopicassoprints.org//pietmondrian.co.uk/

Figura 42 - Imagens apresentadas através de slides PowerPoint (geral) – Aula do Ensino Médio

Fontes: http://www.wassilykandinsky.net/http:/http://pablopicassoprints.org/ /pietmondrian.co.uk/

Figura 43 - Imagens apresentadas através da tela de computador – Aula do Ensino Médio

Fontes: http://www.wassilykandinsky.net/http:/http://pablopicassoprints.org/ /pietmondrian.co.uk/

A sequência do terceiro ano B foi trocada, as imagens impressas foram apresentadas

através da tela de computador e as da tela do computador como impressas.

Seguido de todas as explicações que acompanharam a ação lúdica do professor, foi

aplicado um questionário em cada grupo perguntando quais as imagens que mais agradaram e

se obteve o seguinte resultado.

Tabela 10–Análise de imagens dos terceiros anos

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Imagens

impressas

Imagens em

slides gerais

Imagens na tela

do computador

3 ano A – 27 alunos 6 7 12

3 ano B – 23 alunos 5 9 17

Nem todos fizeram escolha, assim como houve aqueles que escolheram mais de uma

imagem. A variação das imagens foi para evitar o efeito especifico de outra imagem, que

confirmou as expectativas sobre a preferência por aquelas em suportes luminosos em

detrimento das impressas. As imagens em slides gerais mantiveram-se mais ou menos

homogêneas tendo em vista que não foram trocadas. A primeira conclusão é que as imagens

agradaram não exclusivamente pela composição, mas como houve maior tempo de apreensão,

consequentemente devido à leitura em função do estímulo luminoso direto.

O professor de Artes, motivado pela participação dos alunos, aplicou o mesmo

modelo de aula nas duas turmas do segundo ano do Ensino Médio, apenas eliminou as

imagens impressas e selecionou um grupo de imagens (Caravaggio, Turner, Constable) de

acordo com o conteúdo pertinente ao ano. Trabalhou com duas sequências, os slides,

projetados para uma leitura coletiva e depois na tela do computador. (Figuras 44 e 45)

Figura 44 -Imagens apresentadas através de slides PowerPoint (geral) – Aula do Ensino Médio

Fontes: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Caravaggio.emmaus.750pix.jpg

http://www.ipernity.com/blog/maluz/527623/

http://www.arcadja.com/auctions/pt/constable_adam_william/artist/440586/

Figura 45 - Imagens apresentadas através de slides PowerPoint (geral) – Aula do Ensino Médio

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Fontes: http://onlinephoto.xyz/fotos-dos-quadros-de-caravaggioom/blog/maluz/527623/

http://www.arcadja.com/auctions/pt/constable_adam_william/artist/440586/

No segundo momento da aula, com a projeção nas telas individuais, os resultados de

preferência aumentaram, provavelmente pela condição de propriedade visual em função da

distância e da dimensão da tela, o que criou maior estado de atenção.

Tabela 11 – Análise de imagens

Imagens em slides gerais Imagens na tela do

computador

2 ano A – 35 alunos 5 14

2 Ano B – 34 alunos 8 12

5.3.2–A realidade dos alunos

Os alunos das seis turmas do Ensino Médio, do período da manhã, foram convidados

a participar do questionário entrevista através de um site especifico, realizado nas

dependências da escola. Com intuito de considerar uma amostragem por interesse, os critérios

de seleção foram a pré-disposição dos alunos.

A aplicação ocorreu da seguinte maneira: os alunos foram recebidos para responder o

questionário de acordo com os números de computadores disponíveis nesse dia (12 unidades).

O número de interessados foi maior que os questionários respondidos, pois, a demora fez

alguns desistirem. Somaram-se 51 questionários respondidos, aproximadamente 26,2 % da

totalidade de alunos do Ensino Médio período da manhã dessa unidade escolar, sendo 30 do

sexo masculino e 21 do sexo feminino, 23,53% alunos do primeiro ano do Ensino Médio,

21,57% alunos do segundo ano do Ensino Médio e 54,90% do terceiro ano do Ensino Médio.

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Tabela 12- Faixa etária dos entrevistados

Idade

14 anos 13,73%

15 anos 23,53%

16 anos 27,45%

17 anos 27,45%

+ 17 anos 7,84%

Dada a extensão do questionário, seguir-se-ão os focos de informação fundamentais

para o prosseguimento. Os dados demonstram o interesse do grupo nas tecnologias portáteis,

que possuem reprodução de imagens, conectivas à rede de comunicação. A recusa pelas

tecnologias de captação de imagem “não tão instantâneas” ou apenas o som são indicadores

de uma prática de produção de linguagem sujeita à valoração da instantaneidade e da

integração imagem-som. (tab 13)

Tabela 13 - Posse de tecnologia extra escola

– Tem Usa de amigos ou

parentes

Não tem

interesse

Desconhece

–Notebook ou

ultrabook

69,39%

16,33%

12,24%

2,04%

Computador de

mesa

55,32% 23,40% 21,28% 0,00%

Impressora 48,94% 27,66% 23,40% 0,00%

Scanner 28,26% 13,04% 43,48% 15,22%

Filmadora digital 47,92% 6,67% 33,33% 2,08%

Gravador digital 41,67% 8,33% 47,92% 2,08%

Ipod ou similares 27,66% 38,30% 27,66% 6,38%

Máquina

fotográfica digital

58,33%

25,00%

16,67%

0,00%

Celular sem acesso

à internet

33,33%

2,22%

46,67%

17,78%

IPhone,

Smartphone ou

similares

81,25%

10,42%

6,25%

2,08%

Ipad, Tablet ou

similares

54,17%

33,33%

12,50%

0,00%

Analisando o comportamento frente aos hábitos de leitura, o hipertexto e os

audiovisuais são uma preferência do grupo, apesar de um dado expressivo concernente à

leitura de livros. Porém, fica a lacuna sobre a natureza dessa leitura da escrita indiferente do

suporte, que se trata de uma potente variante, mas que será verificada no decorrer das

intepretações integradas deste questionário (tab14).

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145

Tabela 14 - Posse de tecnologia extra escola

– Tem Usa de amigos ou

parentes

Não tem

interesse

Desconhece

–Notebook ou

ultrabook

69,39%

16,33%

12,24%

2,04%

Computador de mesa 55,32% 23,40% 21,28% 0,00%

Impressora 48,94% 27,66% 23,40% 0,00%

Scanner 28,26% 13,04% 43,48% 15,22%

Filmadora digital 47,92% 6,67% 33,33% 2,08%

Gravador digital 41,67% 8,33% 47,92% 2,08%

Ipod ou similares 27,66% 38,30% 27,66% 6,38%

Analisando o comportamento frente aos hábitos de leitura, o hipertexto e os

audiovisuais são uma preferência do grupo, apesar de um dado expressivo concernente à

leitura de livros. Porém, fica a lacuna sobre a natureza dessa leitura da escrita indiferente do

suporte, que se trata de uma potente variante, mas que será verificada no decorrer das

intepretações integradas deste questionário (tab 15).

Tabela 15 – Hábitos de leitura

– Nunca Abaixo de três

vezes por

semana

A partir de três

vezes por

semana

Todos os dias

da semana

Leio livros 25,53%

38,30%

23,40%

12,77%

Leio textos na

internet

12,50%

41,67%

33,33%

12,50%

Leio História em

Quadrinhos

46,81%

29,79%

12,77%

10,64%

Vou ao cinema 17,02%

70,21%

6,38%

6,38%

Vejo DVD na TV

de casa.

12,77%

48,94%

14,89%

7

23,40%

Vejo DVD no

microcomputador

47,83%

34,78%

10,87%

6,52%

A verificação sobre a intensa participação nas redes sociais em detrimento dos e-mails

favorecem a ideia da imediaticidade conectiva. (tab. 16)

Tabela 16–Sobre conexões

Você participa de:

Rede sociais (facebook, Orkut, etc) 94,00%

Salas de bate-papo 30,00%

Lista de e-mail coletivo 24,00%

Não participo porque não gosto 6,00%

Não participo pois não tenho acesso a internet 0%

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A indagação sobre a criação de imagens (tab. 17) confirma a ideia de uma produção

imersa no mundo digital, a manipulação de imagens se dá num sistema já produzido, exceto

na captação através de meios instantâneos, a máquina fotográfica, mas que logo se torna

digital. Também são expoentes os índices de desenho a mão livre e é até mesmo contraditório

com observações informais de alunos que não valoram a habilidade para desenhar a mão livre.

Tabela 17 - Sobre a criação de imagens

Você Cria imagens

Copiando da internet 54,00%

Copiando de arquivos digitais 20,00%

Fotografando 68,00%

Filmando 24,00%

Desenhando a mão livre 46,00%

Não crio imagens 8,00%

Na sequência, com intuito de verificar o comportamento sobre a sintaxe visual, foram

apresentadas três imagens (Figura 46) e solicitada a manifestação de opinião sobre as mais

agradáveis. Os resultados foram: 24 % para A, 20 % para B e 56% para C. Há uma

preferência pela distribuição simétrica e o equilíbrio axial na composição. Ainda para esta

questão foram coletadas manifestações verbais justificando a escolha, de modo mais

qualitativo, a ideia que mais se repetiu para negar as figuras A e B foi a de ser desorganizada.

Não houve nenhum termo mais identificador da sintaxe, apenas da sensação do entrevistado.

Figura 46- Imagens apresentadas no questionário

Fonte: elaboração do autor

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Outra questão, que teve a intenção de verificar julgamento da imagem (Figura 47),

ampliou o leque de referências, exigindo a manifestação de agradável, desagradável e

intermediária.

Figura 47 - Julgamento de imagens

Fonte: elaboração do autor

Os resultados obtidos (tab. 18) favoreceram a imagem A, no entrecruzamento com as

frases de justificativas, a cor é o que mais aparece como justificativa positiva e a sensação de

“borrado” como negativa. No segundo, as justificativas aparecem desagregadas de termos

que definem “boa” ou “ruim”, remetem a sensações topológicas ou animais como a Zebra e o

Tigre. No terceiro caso, as respostas positivas também favorecem a cor ou a distribuição, no

caso negativo, a predominância da cor roxa e depois diversificam. Por outro lado, essas

imagens também confirmam a predileção pelo equilíbrio axial.

Tabela 18 – Analise de imagem

Desagradável Mais ou menos agradável Agradável

Imagem A 22,73% 25,00% 52,27%

Imagem B 21,74% 45,65% 32,61%

Imagem C 16,67% 33,33% 50,00%

Na próxima questão, o intento foi analisar o conceito prático de imagem (Figura 48),

dada a limitação do suporte, as bidimensionais. O reconhecimento foi 92% para A, 24% para

B, 44% para C, 44% para D e 32% para E. Tratando de reproduções digitais e até mesmo na

condição de escrita, todas são imagens.

Figura 48 – Reconhecendo imagem

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Fonte: elaboração do autor

Extraída do material do SARESP (2010), com outros objetivos nesta pesquisa, a

próxima questão foi solicitar que escolhessem, dentre os mosaicos abaixo, aquele que fosse

formado somente por quadriláteros e foi esclarecido que eram figuras com quatros lados. A

resposta errada para esta questão pode operar através de hábitos conceituais, “confundir

quadriláteros apenas como quadrados”, ou hábitos perceptuais “a super valorização da figura

sobre o fundo”, porém, para o momento, não há como discernir quais foram as duas naturezas

de hábitos que incorreram no erro, mas a possibilidade já é um alarme. As respostas foram:

12,24% para A, 38,78% para B, 44,9 % para C e 4,08 para D. (Figura 49)

Figura 49 - Reconhecimentos figura fundo

Fonte: http://matematicaef2.blogspot.com.br/2011/09/saresp-geometria.html

A última questão apresentada propôs avaliar através da oferta de imagens (Figura 50)

a preferida para ser aplicada na “tela de descanso” do seu aparelho de celular, Smartphone,

etc. As intenções verificáveis foram as preferências pelo figurativo e não figurativo, os

equilíbrios e intensidade da figura fundo. As respostas foram 34,69% para A, 6,12% para B,

8,16% para C, 0,00% para D, 6,12% para e 20,41% para F. Nestas opções, as imagens

figurativas seccionadas, que favorecem o close da imagem, sobrepõem as figurativas que

enquadram integralmente. A imagem zerada na sua potência figurativa e suavizada no

contraste de cores atingiu absoluta rejeição. Seria precoce atestar a preferência por imagens

menos potentes no despertar estados de atenção.

Figura 50 - Telas para aparelhos

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Fonte: Adaptação do autor de material digitalizado e socializado na internet.

A síntese equalizadora entre indicadores quantitativos que segue na tabela (tab. 19)

abaixo, tem nos fatos conclusivos os argumentos para análise do perfil.

Tabela 19 – Síntese de dados

Fato conclusivo Indicador “Aluno na

escola”

Indicador “aluno fora da

escola”

Aumento da atenção em função

da emissão da luz direta

Detrimento da leitura imersiva

das imagens impressas em

relação imagens luminosas

Valorização do contraste Não preferencia pelas imagens

com menos contrastes no que se

refere as cores

Maior imersão na narração Maior entendimento de textos

narrativos

Maior manifestação de ideias

após leitura de vídeos

dominantemente narrativos

Inercia do sujeito e

movimentação da imagem

Preferência por vídeos

essencialmente narrativos e do

hipertexto

Aumento do estado de atenção

por suportes de maior

proximidade com o sujeito

Leitura mais imersiva nas telas

de computadores

Aumento do estado de atenção

do campo visual em função da

diminuição do suporte

Leitura mais imersiva nas telas

de computadores

Olhar compulsivo para o centro

da composição

Preferência pela simetria

Preferência pelo equilíbrio axial

Hiper valorização da figura Imagens em close

Não reconhecimento do

quadrilátero menos convencional

no processo da relação figura-

fundo

Os fatos conclusivos passam a ser novos indicadores do comportamento do

cognoscente, tratados sob uma condição estritamente visual. Retomam-se as três categorias

propostas no capítulo anterior sobre a linguagem: apresentação, movência e integração, e uma

plausível classificação dos fatos conclusivos relacionados a essas categorias.

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Os novos suportes intensificam estados de atenção visual pela emissão da luz direta na

apresentação da forma e pela compactação da dimensão. Do ponto de vista da composição

visual, a redução do campo, como se observa em aparelhos portáteis, prima para melhor

entendimento do teor comunicacional a constância de certas sintaxes mais rápidas na

apresentação de imagens: simetria e equilíbrio axial, assim como a figura precisa se

evidenciar em relação ao fundo por close ou centralização. A diminuição do suporte exige a

aproximação do sujeito. Todos esses caracteres estão predominantemente em como a forma se

apresenta.

A natureza da movência, discutida anteriormente, está no movimento da cabeça, do

globo ocular, da imagem em movimento e do movimento na imagem, mas parece que novos

suportes podem levar o leitor a estancar diante da leitura, os suportes movem-se por ele. A

imagem estática traz uma sutileza narrativa, o tempo do olhar compreende os elementos que a

constituem, mas é a força da imagem em movimento que faz com que a narração leve para

dentro de si o terceiro elemento da relação tempo-espaço, o sujeito que a torna mais potente.

A categoria integrativa, já comentada na preferência simétrica e axial, também está

ausente, mas os atenuantes dos suportes são os modos de imersão: luz, dimensão e narração.

Sobre a produção de linguagem, em menor escala que os dados levantados sobre a

leitura, em decorrência da própria metodologia empregada, alguns indicadores foram

relevantes na prática de produção de imagens:

Tabela 20 – Síntese de dados – Produção de linguagem

Fato conclusivo Indicador “Aluno na

escola”

Indicador “aluno fora da

escola”

Limitação ao universo digital - Cópias da internet

Máquina fotográfica

Criaa partir da apropriação de

imagensdigitais

Copias da internet

Máquina fotográfica

Produção de linguagem

centrada na visualidade

Não tem interesse no gravador

digital

O processo de criação de imagens evidenciou a passagem “do lápis para o mouse”,

mas, mediante o número expressivo de alunos que informaram que desenham, foi realizado

um diálogo posterior com o grupo perguntando o que “significava desenhar a mão livre”.

Cruzando dados com as respostas desse diálogo, foi detectado que responderam o

questionário na crença da possibilidade, não na prática existente. Metaforicamente falando, se

o mouse é o lápis para os suportes digitalizados, a máquina digital também é o lápis para o

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processo de digitalização. Como a base da produção é alimentada pela leitura, retomam-se as

questões da leitura.

5.4 – A imersão sob efeito da luz, dimensão e narração

A ideia da imersão é o efeito da mobilização dos sentidos até as especulações do

raciocínio para um determinado fim. É a tenacidade no ato de aprendizagem disparado pela

percepção e fisgado pelo estado de atenção.

No estudo realizado, esses três fatores caracterizam condutas cognitivas que se

formam no sujeito através dos suportes. É impossível não relacioná-los às categorias de

Peirce: como a forma se apresenta, como ocupa o espaço e o discurso que deflagra. Conforme

os resultados avaliativos dos projetos desenvolvidos pelos professores, os estados de atenção

que esses fatores geraram, combinados entre si, captaram potencialmente o olhar.

Na base do ato de aprendizagem estão os estados de atenção. Dentre os estímulos que

bombardeiam os sentidos, existem aqueles que predominam, que insistem na percepção, que

mobilizam os sensores. No cotidiano escolar, a expressão “presta atenção” é usada para

reivindicar a voluntariedade do cognoscente frente ao objeto de aprendizagem, o que seria

atenção forçada, muitas vezes insustentável. Para Lúria (1994) e Vygotsky (1991), numa

visão mais edificada no sujeito, isso é exemplo de atenção voluntária, que se opõe à

involuntária.

Estado de atenção não é sinônimo de percepção, pois perpassa por ela, mas assume um

papel de controle. Dois exemplos: caminhar por uma trilha fazendo uma vigília temerosa de

encontrar algum animal peçonhento, é um estado de atenção. A luz que afeta o olho e o

mobiliza cria um estado de atenção. O primeiro é um hábito gerado na experiência e a

afetação do olho é um hábito inveterado. Este último tem a natureza da voluntariedade do

sujeito esvaziada, que torna a atenção mais potente. No tocante aos suportes visuais, os

impressos refletem luz, os luminosos emitem a luz. Esse diferencial favorece

proeminentemente a luz direta. Uma vez que a atenção é mobilizada, a continuidade

dependerá do resto do contexto.

Santaella (2010) discorre sobre três aspectos da atenção: como órgão sensorial

relatando três tipos de atenção – a orientadora como flashes mentais, a segunda responsiva,

reagente, e a executiva, capaz de conduzir do concreto ao abstrato; a economia da atenção,

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incorporada à desatenção como descanso psíquico e a capacidade da atenção expandir de

acordo com a demanda de estímulos que assolam o cérebro. Analisando sob esse aspecto, o

evento ocorrido na escola, as imagens impressas refletem a luz sob a concorrência da

diversidade de estímulo do ambiente, sujeitos à desatenção, deste modo exigirá maior controle

do sujeito para se fixar, enquanto os suportes luminosos, mais eficientes pela natureza

inveterada, se fixam. O estado de atenção não é algo independente do estímulo, apenas

delegado à reação do sujeito, é a pulsação externa. Neste caso, involuntário na respectiva

conexão.

Nos anos 1980, a indústria do entretenimento lançou o cinema 180 graus, uma imensa

tela esférica que cobria o campo visual criando uma sensação imersiva, as pessoas perdiam

até mesmo a sensação de equilíbrio. Na questão atual é exatamente o contrário: a redução do

campo visual à palma da mão. O que faz dela imersiva? A condição da área apreensível estar

associada a outros elementos. Conforme observação de material disponível no mercado, para

compensar a diminuição, as imagens se apoiam em alguns aspectos da sintaxe: distribuição

simétrica, equilíbrio axial e no close das formas que facilitam a leitura.

A outra questão é a tipologia da linguagem que o suporte favorece. A visualidade,

como foi exposto, assume o estatuto apresentativo, narrativo e, níveis sutis, da argumentação,

mas, o que se percebeu foi a imersão mais eficiente provocada pela narrativa típica dos

suportes das imagens em movimento. Enquanto a luz e a dimensão fisgam por critérios mais

espaciais, a narrativa prende pela proposição de tempo.

Parece que o comportamento cognitivo desejável para aprendizagem, em função do

novo cotidiano mediático, prima cada vez mais por estados de atenção que não se sustentam

mais em diálogos verbais ou a mente está em processo de devaneio decorrente da adaptação

ou, ainda, existem adaptações que não são percebidas. Santaella (2010, p. 307) comenta:

[...] é que o ambiente conforma o desenvolvimento cerebral e, muito

provavelmente, sob o influxo das tecnologias cognitivas, a inteligência

humana encontra-se em processo de adaptação e acomodação devido à

sobrecarga de informação, fazendo emergir, como estratégia evolucionária,

mentes fluidas, híbridas, auto-organizativas em ambientes hiperconectados e

ubíquos.

Adaptar e acomodar só reforça o caráter moldável do fluxo cognitivo, mas o produto

pode estar descompassado com níveis mais eficientes da capacidade cognitiva do cérebro ou a

cultura erigirá novas concepções de eficiência. O conceito de estilo cognitivo

(WILLINGHAN, 2001) enfatiza a ação do sujeito sobre o objeto de aprendizagem, mas, há

outra causa: a reação do sujeito aos signos encorpados em suportes, que favorecem

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determinadas ordens gramaticais em detrimento de outras e modelam o modo de estar, de ser

e de conhecer o mundo.

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CONCLUSÃO

A visualidade tratada mais como fenômeno inato, sujeito a predisposições genéticas,

é um traço velado nos processos educacionais, desde os documentos orientadores até as

práticas pedagógicas. A análise dos documentos orientadores, legislações e normatizações

procedimentais revelam a predominância da forma verbal, mesmo quando resvala em suportes

de linguagem pertinentes a visualidade.

O campo epistemológico, mais comum à rede de ensino pública, opera sobre

concepções de ensino-aprendizagem ainda sob valores behavioristas, que se detém sobre um

sujeito de aprendizagem a ser preenchido pelos saberes culturais em detrimento da devida

valorização das estruturas cognitivas com que está equipado, porém a ascensão de princípios

cognitivistas vem remodelando esse pensamento e permitindo cada vez mais compreender o

fluxo cognitivo sob concepções “neuroprocessuais”. Mesmo assim, com algumas exceções

como os gestaltistas e singularmente Marr, a visualidade ainda ocupa papel mais secundário

quando o termo linguagem enfatiza a forma verbal e práticas leitoras colocam a imagem

apenas subordinada à mediação nominal.

Os estudos sobre acognição permutaram do “olhar de fora para dentro” para “de

dentro para fora”. É aparentemente uma visão dicotômica que se abate sobre elas, mas, na

realidade, sinalizam a ausência de um terceiro aspecto: a mediação entre o mundo do sujeito e

o mundo real que se dá pelo signo. Deste modo, a teoria do signo tríádico, Semiótica de

Peirce, se apresenta como potente epistemologia do ensino aprendizagem. Não engessa faixas

etárias (modelo piagetiano), é flexível, é volátil, referenda as formas de linguagem, atualiza-se

frente à expansão da mesma, requer compreensão dos sistemas perceptivos e reconhece

estruturas pré-existentes na processualidade cognitiva. As semioses são capazes de explicar a

vagueza e a eficiência de práticas de aprendizagem, assim como conferem à visualidade,

corporificada na imagem, um caminho para seu próprio estatuto gramatical.

As classes categoriais da fenomenologia Peirceana aplicadas sobre o fenômeno da

imagem produzida, sob a natureza antropológica do sujeito, revelam estruturas organizativas

da visualidade: a linguagem visual, cujo termo “revelar” é oportuníssimo, pois sinaliza para

um fenômeno existente sujeito a ser elucidado. É deste modo que os experimentos de

Whertheimer anteciparam, a seu tempo, concepções confirmadas pela Neurociência. A junção

destas duas áreas de estudo foi contundente para defender a morfologia e a sintaxe visual.

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A condição da linguagem circundante ao sujeito orienta formatações cognitivas que

estavam prenunciadas desde o movimento interacionista (Vygostky) através dos estudos sobre

odesenvolvimento social da linguagem, mesmo que fundado na forma verbal. As formas de

linguagem, no caso da visualidade, são encorpadas em suportes que modelam

comportamentos cognitivos e, consequentemente, os níveis de raciocínio.

Historicamente, a produção tecnológica da imagem, após a fotografia e o cinema,

vem proporcionando novas condutas, que diferem do longo período em que ficou na clausura

do “pigmento” e do “papel”. No aspecto da morfologia visual, cada vez mais. as formas

luminosas têm maior poder de imersão que se redimensionam ao associarem-se às figuras em

movimento. Na sintaxe, essa propensão seletiva provoca a hipervalorização da figura sobre o

fundo, um olhar cada vez mais focado nos primeiros estados de atenção, sujeita ao

enfraquecimento da conexão com os demais estados de atenção (fundo). Consequentemente,

interferem na qualidade de sentidos produzida por semioses relacionais imediatas e, depois,

dinâmicas.

Essa situação imersiva explica, pelo menos em parte, a conduta do cognoscente que,

para aprender, está cada vez mais dependente de meios envolventes, que catalisam a

percepção, em degeneração de estados de atenção que requerem maior predisposição do

mesmo para envolver-se. A diminuição de apreensão do objeto imediato efetivará menor

possibilidade indexical do objeto dinâmico, portanto, os estados de atenção que acentuam

diametralmente a relação figura-fundo, contribuem para o fato. As semioses aí disparadas

estão mais aptas a apresentar do que representar o objeto de conhecimento.

A redução da dimensão dos suportes, além da individuação da leitura, também

colabora com a situação. Campos visuais reduzidos enfatizam a figura para compensarem a

acuidade visual e exploram os equilíbrios axiais e radiais que facilitam o processo de leitura,

pois, temporalmente falando, são mais rápidos na apreensão do conjunto. A sintaxe se

habilita a valorar efeitos com interesse maior na apresentação da imagem do que gerar

contemplações mais instigadas.

A eficiência da imagem em movimento sobre a imagem fixa, ambas luminosas,

preconizam, mais uma vez, a mobilização perceptiva, a imersão passiva do leitor. Tal

condição, associada à natureza narrativa do suporte em movimento, está na predisposição para

estabelecer níveis da semiose, tanto da apresentação, como da argumentação, porém a

condição passiva, que, neste caso, nada mais é que a leitura contemplativa, favorece muitas

vezes o primeiro caso.

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As observações de campo demonstram como os novos suportes são aparentemente

mais eficientes nos processos de ensino aprendizagem, mas é preciso ressaltar que se trata de

práticas num momento sócio-cultural em que os textos escritos são sobrepostos por textos

imagéticos, portanto, o fluxo contextual favorece. As práticas didáticas anteriores sucumbem

na sua eficiência frente à nova geração de discentes.

Todavia, a eficiência do aprendizado não se dá somente na sua imersão e fixação

(mesmo que temporal), mas na sequência operacional que representa. Para que isso ocorra, a

eficiência do processo, as semioses não podem restringir-se a um dos níveis icônico, indexical

ou simbólico, mas na correlação destes.

O confronto entre a realidade discente e a escola dá-se exatamente no tocante às

semioses. De um lado, as atuais críticas dos docentes são relativas às dificuldades de

aprendizagem crescentes nas unidades escolares: a memória de curto prazo, a dificuldade de

conectar objetos e a extração de argumentos, configura o sintoma das semioses simbólicas,

salvo as práticas singulares de recuperação do concreto no tratamento do objeto de

conhecimento. De outro lado, são jovens inseridos num ambiente comunicacional e

informacional que favorece as semioses com intuito da contemplação de coisas e suas

alteridades.

Numa ordem triádica, as semioses são possibilidades de configuração para seus

suportes que determinam condutas cognitivas, portanto, processos de aprendizagem não estão

apenas na sorte dos meios. Percursos ineficazes, estreitamento entre realidade e metas, são

passíveis de estratégias em prol de desenvolvimento mais holístico do sujeito de

aprendizagem.

Diante da necessidade de otimização do tempo e do espaço que a cultura atual

requer, a visualidade é uma forma de linguagem oportuna, porém, ainda se mantêm ausentes

maiores ações sob o respectivo ensino dessa gramática, ou seja, mudam-se os suportes, mas

algumas concepções se mantêm. A valorização da produção de sentidos em função do

escoamento da compreensão gramatical significa negar a relação de anterioridade da sintaxe

para o discurso. A visualidade ainda é apenas imagem para grande parte das concepções

pedagógicas.

Não há absolutamente nada de novo em afirmar a distância entre a práxis escolar e o

mundo real dos discentes, nem discutir esta aproximação como privilégio ou não da

tecnologia e muito menos solucionar a deficiência explorando conjecturas teóricas unilaterais.

A questão Neurocognitva da visualidade é a descrição processual das estruturas perceptivas e

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associativas, a psicologia cognitiva é a sistematização das habilidades construtoras na

elaboração dos saberes, mas ainda estamos no sujeito. A eficiência está numa teoria da

mediação, uma ampliação da teoria semiótica para a aprendizagem: como os signos produzem

conhecimento.

Em suma, a hipótese de que os suportes visuais geram comportamentos cognitivos

encontra-se no modo que favorece possíveis semioses. Vejamos: as relações sintático-

morfológicas congregam e produzem efeitos sobre as estruturas visuais naquilo em que estas

estão equipadas para os estímulos luminosos se instalarem. São os aspectos da acuidade

(relações dimensionais), da seletividade (relações de movência) que geram sínteses (relações

de sentidos) para contemplar, associar ou operar. A falência desta evolução é um processo

degenerativo da função social da linguagem.

Todavia, o diagnóstico reclama por seu prognóstico, assim, o que se propõe para a

aplicação destas constatações não é a demonização das TICs, muito pelo contrário, mas

recuperar dentro da cultura da visualidade, principalmente nos meios de aprendizagem, uma

gramaticalização visual para o discente não se limitar à apreciação passiva e organizar

soluções sintáticas que, veiculadas em suportes, contribuam para maior exploração dos níveis

das semioses.

Nos âmbitos escolares a pulverização do currículo em disciplinas dá sinais de

esgotamento, tangíveis na constante ideia de integração de metodologia e conteúdos, no

encapsulamento de disciplinas, na pluralidade de habilidades e competências cognitivas. Cada

vez mais se reconhece a dependência da construção de conhecimento como ato de linguagem

e comunicação. Aos poucos, a valorização do modo processual do “ato de pensar” sobrepõe o

acúmulo dos saberes culturais. Estes indícios apontam para um futuro promissor que

engendrará uma visão da educação a partir das máquinas pensantes que somos. Portanto, essa

poderá ser proposta da escola sustentada na ideia de compreender e corrigi-las em prol de

excelência do raciocínio, mesmo quando a força coercitiva da mediação cultural precise ser

reconsiderada.

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