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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Sidney Gomes Campanhole
Linguagem visual: percepção, cognição e suportes tecnológicos
DOUTORADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA
SÃO PAULO
2015
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA – PUC
LINGUAGEM VISUAL: PERCEPÇÃO, COGNIÇÃO
E SUPORTES TECNOLÓGICOS.
Tese apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, como exigência parcial para obtenção
do título de Doutor em Comunicação e
Semiótica, Área de Concentração: Signo e
significação nas Mídias, sob a orientação da
Profa. Dra. Maria Lúcia Santaella Braga
SÃO PAULO
2015
SIDNEY GOMES CAMPANHOLE
LINGUAGEM VISUAL: PERCEPÇÃO, COGNIÇÃO
E SUPORTES TECNOLÓGICOS
Este trabalho foi julgado adequado à obtenção do grau de
Doutor em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia
Universidade Católica, na área de Signo e significação das
mídias.
São Paulo, _____ de _________________ de 2015.
____________________________________________
____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________
DEDICATÓRIA
A minha Mãe Alzira,
...in memoriam do meu Pai Adriano e da querida Viviane .
AGRADECIMENTOS
A Profa. Dra. Maria Lúcia Santaella Braga pela paciência e pelos rumos apontados.
A minha irmã, a minha família, a minha Iyá e amigos pelo constante apoio.
A Eunice Santos Lima pelas interlocuções e revisões.
Aos amigos, Elizabeth Domingos da Silva, Vera Lucia Domingos da Silva e Michel
Muller pela assessoria nas traduções.
Ao Sr. Rubens Micheloni pela abertura de caminhos.
A Comissão Central da Bolsa Mestrado da SEE-SP por reconhecer na Semiótica
embasamentos fundamentais para os processos de ensino-aprendizagem.
Aos professores e funcionários da EE Frei Paulo Luig e da Rede de Ensino da
Região Centro.
Aos profissionais da Diretoria de Ensino Centro.
Aos alunos colaboradores da EE Frei Paulo Luig.
Existir é estar numa relação. É tomar um lugar
na infinita miríade das determinações do
Universo.
Charles Sanders Peirce
RESUMO
Os sinais de falta de qualidade na rede de ensino pública, notados através de
pesquisas, sentidos nos discursos da mídia, compartilhados nas redes de internet e,
principalmente, quando deparamos com os cognoscentes dessa cultura de aprendizagem, não
podem ser creditados apenas à eficiência de professores, comportamento e realidade sociais
dos alunos ou instituições de ensino, mas urgem de uma necessidade de rever como os
processos de comunicação, produção de linguagem e os respectivos suportes, que nos
circundam, afetam comportamento cognitivo, neste caso, o visual.
O presente trabalho parte de um diagnóstico levantado sobre práticas de linguagem
visual no tocante a novos suportes tecnológicos, exatamente aqueles que constituem a
imagem por emissão direta da luz e redução do campo visual. A análise quantitativa e
qualitativa foi realizada sobre o material coletado e questionário-pesquisa junto de um grupo
de alunos da rede de ensino pública do Estado de São Paulo. A opção por essa amostragem
decorreu da constatação pré-estudo e in loco de um comportamento passivo na produção de
imagens, da predominância da função da linguagem narrativa como produto de práticas de
ensino aprendizagem, em detrimento dos esforços para a função argumentativa, justamente
quando o contexto educacional propõe a intertextualidade verbal-visual, a interpretação de
diagramas e arsenal fílmico para qualificar práticas de ensino. O percurso da pesquisa, após
diagnóstico seminal, seguiu da análise às bases orientadoras, leis, decretos e outros, sobre
ensino aprendizagem na rede estadual que, de algum modo, referenciam a visualidade e a
cognição. Para subsidiar o tratamento cientifico na compreensão desta problematização,
recorreu-se a conceitos da Filosofia de Peirce (semiose, hábito, percepção, memória, e as
categorias cenopitagóricas) por tratar-se de um fenômeno da linguagem e cognição, cujo
suporte epistemológico identifica, explica e projeta ações, quiçá, diagnósticas e prognósticas
na relação visualidade e suportes tecnológicos nas ações de aprendizagem. Para tanto, houve a
necessidade de delimitar a linguagem visual, com base nas categorias fenomenológicas para
extrair categorias e engendrar tópicos sintáticos e morfológicos inferidos pelo postulado da
Gestalt de Marx Wertheimer e os processos visuais estudados pelas Neurociências. Por fim, a
fase inicial foi retomada e verificada a conduta da cognição visual, expressa na produção de
linguagem visual da população de amostra. O método para diagnóstico foi questionário
pesquisa, com tratamento de dados sob o modo quantitativo e análise de potência de impacto
de variantes nas interpretações através de observação de conduta do grupo; apontou-se que
novos suportes da visualidade insistem no emprego de determinados tópicos da sintaxe visual,
mobilizam estados de atenção e valoram exponencialmente a função narrativa, além de
gerarem comportamentos sociais como a socialização virtual em prejuízo do presencial.
Palavras chaves: Visualidade, imagem, linguagem visual, suportes visuais e cognição visual.
ABSTRACT
The signs of lack of quality among the public education area, that can be noticed
through researches, shown by the media speech, shared among the social media and mostly
when we face people inserted in this area, it can't be credited to the teachers's efficiency, to
the student's social behavior and reality or to the teaching institutions, because it demands a
review of the communication processes, language production and their supports, that
surround us and affect the cognition behavior, case in point, the visual area.
This paper starts from studies on visual language pratices, regarding new technology
supports, exactly those that make images through direct light emission and the decrease of
the visual area. The quantitative and qualitative analysis was made through collected
material and questionaries presented to a group of students from the public teaching area in
the state of São Paulo. I chose this sample because of a pre-study and an in loco passive
image production behavior, because of the predominance of narrative language as a result of
teaching and learning pratices, regarding efforts on the argumentative function, specially
when the educational context suggests a relation between verbal and visual aspects, the
interpretation of diagrams and a filmic material, in order to qualify teaching practices. This
research, after diagnosises on a week basis, kept going on from the analysis to the orientation
bases, laws, acts and others, regarding teaching and learning in the state area that in a way
approaches the visual cognition. In order to support the theory approached during this paper,
it was used concepts from the Pieirce philosophy (semiose, hábito, percepção, memória, e as
categorias cenopitagóricas) because it regards language and cognition phenomenon, which
epistemological support identifies, explains and project actions, diagnostics and predictions
in the visualization relation and technological supports amoung learning actions. In order to
do so, it was necessary to create limits to the visual language, based on phenomenological
categories in order to extract categories and create syntatic and morphologic topics inferred
by Gestalt de Marx Wertheimer and the visual processes approached by the neuro science. In
a conclusion, the initial fase was reapproached and the visual cognition was checked,
expressed by the production of the visual language population sample. The method used to
the diagnosis was research questionary, processing data considering the quantitative mode
and power impact analysis of different forms of interpretation through the observation of the
group behavior; it was concluded that new visualization supports insist on applying certain
visual syntax topics, mobilize warning states and exponentialy value the narrative function
and create social behaviors such as the virtual socialization in comparison to the formal one.
Key words: Visuality, image, visual language, visual support and visual cognition.
11
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 13
CAPÍTULO 1- A VISUALIDADE NO CONTEXTO EDUCACIONAL ............................................ 19
1.1 - Documentos orientadores na estância federal ........................................................................... 20
1.2 - Documentos orientadores: estância estadual ............................................................................. 28
1.3 - O cotidiano escolar ................................................................................................................... 35
1.4 - Tecnologias: negação ou incorporação ..................................................................................... 42
1.5 - Uma síntese capitular ................................................................................................................ 45
CAPÍTULO 2 - COGNIÇÃO, COGNITIVISMO E FLUXO. ............................................................. 46
2.1- Cognição: apreensão, compreensão e autorreferência. .............................................................. 47
2.2 - Breve perspectiva científica sobre a cognição no século 20 ..................................................... 50
2.2.1 - Identificação de estruturas................................................................................................. 53
2.2.2 - O fluxo cognitivo ............................................................................................................... 54
2.2.3 - A tipologia do produto cognitivo ....................................................................................... 56
2.3 - A cognição e aprendizagem ...................................................................................................... 60
2.4 - A cognição visual ..................................................................................................................... 63
CAPITULO 3 – PRINCÍPIOS SEMIÓTICOS DA COGNIÇÃO ......................................................... 66
3.1 - A realidade do mundo ............................................................................................................... 68
3.2 - A teoria do signo ....................................................................................................................... 71
3.3 - Os tipos de raciocínio................................................................................................................ 73
3.4 - Questões sobre a cognição ........................................................................................................ 74
3.5 - Uma conclusão capitular ........................................................................................................... 81
CAPÍTULO 4 - LINGUAGEM VISUAL ............................................................................................. 85
4.1 - Evolução da visualidade ........................................................................................................... 85
4.2 - Visualidade e imagem ............................................................................................................... 91
4.2.1 - Dimensões: a emolduração ................................................................................................ 94
4.2.2 - A “fisicalização” da imagem ............................................................................................. 95
4.2.3 - A conduta percepto-cognitiva ............................................................................................ 96
4.3 - Expansão dos suportes .............................................................................................................. 96
4.4 - A linguagem Visual ................................................................................................................ 100
4.4.1 - Forma na visualidade ....................................................................................................... 106
4.4.2 - A sintaxe visual ................................................................................................................ 112
12
4.4.3 – Intencionalidade Visual ................................................................................................... 130
CAPITULO 5 – COMPORTAMENTO COGNITIVO E VISUALIDADE ....................................... 132
5.1 - Cognição, mediação e suportes ............................................................................................... 133
5.2 - Comportamento cognitivo e âmbito escolar ........................................................................... 135
5.3 - Estudos do comportamento cognitivo ..................................................................................... 137
5.3.1 - Acompanhando o cotidiano escolar ................................................................................. 137
5.3.2–A realidade dos alunos ...................................................................................................... 143
5.4 – A imersão sob efeito da luz, dimensão e narração ................................................................. 151
CONCLUSÃO .................................................................................................................................... 154
REFERENCIAS .................................................................................................................................. 158
13
INTRODUÇÃO
Este estudo, na sua primeira fase, partiu do diagnóstico de algumas práxis
educacionais que envolveram tratamentos da visualidade nos âmbitos da educação básica,
privada e pública e, paralelamente, no segmento universitário em cursos de graduação
(Design e Arquitetura)1 e pós-graduação (Design Gráfico)
2. Nesses contextos, foram
percebidos objetivos de aprendizagem direcionados à apreensão do objeto visual, a
organização da linguagem visual e a geração de sentidos, tanto na leitura como na produção.
Na apreensão do objeto visual, eram realizadas ações para desenvolver a
expressão visual: desenho de memória, desenho de observação, reorganização de formas
impressas ou digitalizadas e manipulação de cores. Nessas ações, no nível da Educação
Básica, parecia implícita a seus propositores a crença em um fenômeno natural de habilidades
possuídas por uns em detrimento de outros. Já nos cursos de graduação dependentes da
expressão visual, passava-se para a ideia de habilidade a ser devolvida, obviamente, dada a
necessidade de domínio da forma.
A organização da linguagem visual, ou seja, os elementos de uma possível
“gramática” visual eram praticamente ignorados, exceto na formação da graduação cuja
intensidade dependia da singularidade dos respectivos regentes de curso. Tal fato implicava a
redução de se reconhecer efeitos que, no segmento acadêmico, geralmente, eram indicados
por expressões “falta alguma coisa” ou “precisa limpar”, mas sempre sem a clareza dos
elementos geradores desses sentidos.
Por fim, as leituras, sustentadas na polissemia de sentidos da imagem, pendiam ao
exercício nominal com maior evidência, salvo os casos cujas representações não figurativas
eram traduzidas em sentimentos também verbalizados. A produção, na maioria das vezes,
estava sujeita ao domínio de criação de imagens, seja pelo manuseio das materialidades
(suportes, ferramentas e interferentes) ou na desenvoltura das habilidades viso-motoras.
A priori, na esfera da graduação, não se tratava apenas de uma lacuna curricular
singular de algumas instituições, respeitadas as devidas justificativas de cada uma, mas de
1Disciplinas ministradas entre no curso de Design e Arquitetura na Universidade Bandeirante (2008 a 2011) e
Universidade Anhanguera (2012). 2Disciplina ministrada desde 2010 no Curso de Pós Graduação em Design Gráfico do Centro Universitário
SENAC
14
literatura direta e coesa3 sobre o conteúdo, da consciência do fato nos cursos de graduação
que envolvem a visualidade. Todavia, a graduação é um fluxo de aprendizagem em
continuidade que parte da educação básica, portanto essa anterioridade foi tomada como
epicentro para adentar a educação da visualidade.
Na educação básica, no segmento público, a visualidade é intrínseca a muitas
práticas de ensino: atividades de interpretação intertextual, na ilustração de conteúdos, nas
alegorias para exaltar alguns eventos, sempre na subordinação ao produto verbal, e no escopo
disciplinar dos conteúdos de Artes ainda resta o caráter de produção mais enfática numa
gramática própria, mas não tão consciente dessa existência. As expectativas de aprendizagem,
com absoluto foco na competência da leitura e da escritura, reduzem o fenômeno da
linguagem visual e, consequentemente, a especificidade de sua cognição.
Programas, cursos, orientações são propostos nas instituições públicas sempre na
preocupação do desenvolvimento da argumentação verbal, a tipologia dissertativa, nas
diversas variantes, e uma segunda, aliás, um fantasma da atual educação nacional, o ensino de
matemática que, para tais programas, também está sujeito à interpretação textual. Isso deve
ser fruto de pressupostos teóricos que partem da linguagem verbal nela mesma, ignorando
outras intersecções com níveis mais elementares do pensamento e concepções mais
interdisciplinares sobre a cognição e a linguagem.
Tal preocupação, aparentemente equivocada, deve implicar os insucessos dos
índices educacionais apontados nos diversos relatórios avaliativos da qualidade de ensino na
rede. No centro dessa situação, aparece a deficiência de aprendizagem, cujas possíveis causas
são levantadas e expressas de acordo com os seguintes pontos de vista: os métodos
empregados, docentes despreparados para um novo tipo de comportamento, descomprometido
do aluno, a política de aprovação e a superlotação das turmas. Não importam quais são as
visões, há um traço de convergência, apesar das abordagens diferenciadas: a presença das
tecnologias da comunicação no cotidiano do aluno, da escola, enfim, no âmbito cultural.
Estabeleceu-se, a partir disso, um paradigma: educar pela tecnologia ou para a tecnologia, que
parece facilmente definido tendo em vista o caráter formativo. Porém, a situação não é tão
simples! As tecnologias da comunicação são formas de linguagem em novos suportes,
veiculam saberes, assim como afetam a percepção de modos distintos, geram novas
3 A verificação de referencias bibliográficas significativas sobre a linguagem visual será retomada no capitulo
sobre o tema.
15
possibilidades de apresentação da forma visual e respectivas organizações. Essas alterações
do suporte criam novas condutas, geram novos hábitos cognitivos.
Tendo isso em vista, este trabalho decidiu pesquisar os efeitos de novos suportes
para a visualidade e possíveis hábitos percept-cognitivos identificados empiricamente. Para
essa identificação, o percurso deste tema envolveu primeiramente uma observação de campo
com a finalidade de compreender as práticas do sujeito que está imerso na nova realidade
tecnológica, jovens entre 14 a 19 anos. Foram desconsideradas as faixas etárias que
antecedem e sequenciam, pois, para o primeiro caso, ainda estão em maturação as reflexões
mais abstratas e as faixas posteriores não estariam mais vinculadas ao âmbito de educação
básica. O intuito de observar práticas da visualidade desagua na proposição, que é objetivo
desta pesquisa, de revisão dessas práticas, o que pressupõe levantar conceitos teóricos que
possam iluminar as avaliações, como será visto no decorrer deste estudo. Isso para nós
constitui-se em fato imprescindível para ações primárias que pertencem à educação no nível
básico. Deste modo, a população de amostra incidiu sobre jovens estudantes da rede pública,
submetidos a um conjunto de ações com homogeneidade didática e abrangência massiva.
A rede de ensino pública, sob a jurisdição do estado de São Paulo, tem as
unidades escolares sob a coordenação de Diretorias Regionais de Ensino - DE. Cabe a estas
orientarem, acompanharem e promoverem a qualificação dessas unidades. As unidades
escolares sob a jurisdição das Diretorias de Ensino que representam a Grande São Paulo, dada
a condição da metrópole, são constituídas, do ponto de vista sociocultural, por grupos de
alunos mais heterogêneos em relação à rede que se estende pelo estado paulista. Assim, as
escolas desta região apresentam maior diversidade, que favorecem uma população de amostra
mais ampla em oposição à homogeneidade que ocorre em determinadas localidades, sujeita a
análises mais restritas. Este foi o primeiro critério para selecionar a população de amostragem,
a diversidade. O segundo foi uma unidade escolar que desenvolvesse as três modalidades de
ensino básico para compreender melhor a continuidade dos objetivos e práticas de
aprendizagem que envolvem a visualidade. Diante deste critério a seleção incidiu sobre o
grupo de jovens do ensino médio da EE Frei Paulo Luig pertencente à Diretoria regional
Centro.
Sobre essa escola: na classificação econômica da comunidade, de acordo com
documentos internos constitutivos do Projeto Político Pedagógico (PPP) há a dominância da
classe “C” na unidade escolar. É formada por procedências diversas, além dos paulistanos e
16
alunos do interior do estado, da região sul, nordeste, outros estados da região sudeste e
bolivianos e descendentes. Possui um fluxo permanente que são alunos matriculados nas
séries inicias e estende-se até o ensino médio, assim como recebe indivíduos por mudança de
domicílio, transferidos de escolas particulares em decorrência de dificuldades financeiras e de
outras escolas públicas pelo crédito dos responsáveis na qualidade difundida entre a
comunidade escolar. Sob os olhos das avalições externas (melhor explicadas no primeiro
capítulo), a unidade escolar obteve índices abaixo das médias da unidade regional e estadual
para as modalidades de Ensino Fundamental nos anos iniciais, finais e Ensino Médio4.
No primeiro momento, que fundamentou o nosso diagnóstico; ocorreram diálogos
sistematizados com docentes, registro de atividades e levantamento qualitativo dos produtos
das atividades envolvendo a visualidade. Os diálogos-entrevistas foram realizados através de
ambiente online, no primeiro semestre de 2014, com profissionais exclusivos da unidade
escolar e outros da rede Diretoria Regional, totalizando trinta e três profissionais, sob o
critério de interesse de participação, após receberem o convite classificatório de perfil
necessário para a efetivação da entrevista. As perguntas tinham como objeto comparar as
experiências com tecnologias da comunicação presentes na vida dos docentes; na vida privada
e profissional, assim como detectar a presença da visualidade nas práticas pedagógicas. Na
sequência, as sínteses sob aspectos qualitativos foram extraídas de seminários de socialização
de produtos das escolas em nível regional (Diretoria de Ensino) e estadual (Secretaria de
Educação), ocorridos em 2013. Essa conexão unidade escolar, unidade regional e estado, foi
intencional para verificar o quanto a amostragem escola é representativa. Em 2014 e 2015, foi
realizada, através de pesquisa-questionário digital, uma nova análise, mais concisa e focada
no comportamento visual de quarenta e cincos alunos do Ensino Médio da referida escola. A
seleção se deu por resposta ao convite e ocorreu com acompanhamento presencial dos
entrevistados durante o processo. O objetivo deste instrumento foi verificar se há produção de
sentidos visuais em relação ao campo visual e apresentação sintática da composição. Os dados
foram interpretados sob aspecto indutivo de uma lei mais geral sobre a suscetibilidade dos
suportes na conduta cognitiva.
Simultaneamente, as pesquisas de referências veiculadas nas unidades nortearam
autores, bases epistemológicas a serem explicitadas nos capítulos que veem na sequência, e o
4 Para Ensino Fundamental anos iniciais : unidade escolar – 4,69, unidade regional – 4,91 e estadual 4,76. Para
Ensino Fundamental anos finais: unidade escolar –2,10, unidade regional – 2,44 e estadual 2,62. Para Ensino
Médio: unidade escolar – 1,34, unidade regional – 1,95 e estadual 1,93. Fonte: Boletim IDESP 2015 disponível
em http://idesp.edunet.sp.gov.br/arquivos2014/001521.pdf.
17
material orientador: legislação, documentos formativos e informativos para docentes,
veiculados na rede através de impressos, material online e reuniões presenciais na Diretoria de
Ensino. Enquanto o primeiro grupo fortaleceu a compreensão científica do fenômeno, o
segundo trata de indicadores de como a visualidade é concebida na cultura de ensino-
aprendizagem.
O objeto da pesquisa, compreender o efeito cognitivo dos suportes visuais das
tecnologias de comunicação, estudados no âmbito ensino-aprendizagem do nível básico nas
escolas da rede de ensino pública, teve como meta revisar tratamentos dados à visualidade
desdobrada em mais dois níveis: a imagem e a linguagem visual. E neste aspecto, da
linguagem visual, precisam ser dados esclarecimentos para se entender o processo de ensino
aprendizagem que integra formas de comunicação sem se inclinar para a estrutura de uma
única forma, usando a mera concretude ou alegoria de conteúdos. O olhar proposto é singular
quando toma o comportamento palpável na conduta de leitura e produção da linguagem visual
para compreender o comportamento cognitivo mais amplo que os jovens apresentam e, de
modo profético, repensar a transição da escola pontuada nos saberes que potencializam
propriedades da cognição, instauradas na nossa mente.
Tendo isso em vista, o primeiro capítulo, de função diagnóstica, tem como meta
investigar a visualidade presente no âmbito escolar, apropriando-se da trajetória histórica na
análise de leis operativas para compreender as atuais práticas que ocorrem através de
observações sobre o segmento unidade escolar e regional. Nele se confirmam os julgamentos
abdutivos sobre as lacunas da educação visual que serviram de ponto de partida deste estudo.
Trata-se de uma denúncia ao tratamento nominal e desprovido de conteúdos gramaticais que
são próprios da imagem. O verbal se aperfeiçoa na relação oralidade com seu suporte escrito
regido por sistemas organizativos a serem apreendidos, e a visualidade é tomada como
pressuposta na velada ideia de condição inata do sujeito.
O segundo capítulo traz uma apresentação sintética sobre algumas referências à
cognição no século vinte. Assumida textualmente pela psicologia cognitiva e subsidiária para
o desenvolvimento da tecnologia e dos processos de ensino aprendizagem. O objetivo é
apresentar a cognição como fenômeno intrínseco à linguagem, percepção e memória. A rede
de ensino sofre de certos modismos, como afirma Vasconcelos (2013, p 176): “Não estamos
absolutamente criticando estas várias contribuições (até porque participamos pessoalmente de
algumas delas), mas a forma como frequentemente são jogadas à escola e aos educadores”.
18
Fragmento de pensamentos e bases teóricas que permanecem ineficazes em decorrência do
desprendimento do todo ou por equívocos semânticos.
O terceiro capítulo, em consequência da presença do signo no cerne do fenômeno
cognitivo, sintetiza questões epistemológicas da Filosofia de Charles Sanders Peirce para
compreender a cognição como fenômeno mediado, não antropocêntrico, cujos signos e classes
de signo são níveis de apreensão do mundo. São formas de semiose que sustentarão a
revelação da gramática visual.
Enquanto o terceiro capítulo é o principal esteio teórico para a pesquisa, o quarto
capítulo, no papel de inventário da linguagem visual numa leitura constituída nas categorias
fenomenológicas, é fundamental para o objeto da pesquisa. Parte-se de relações
interdisciplinares para revelar categorias que fundam a linguagem visual: apresentação,
movência e integração. Não se pode falar de suportes de uma linguagem sem antes definir seu
campo gramatical. A visualidade, a imagem são fenômenos constitutivos da linguagem visual
que é revelada em momentos diferentes e contextos científicos diferentes. A sintaxe está para
os postulados da Gestalt, assim como os estudos no campo das Neurociências sobre o “olhar”
estão para a forma e o discurso nos engendramentos com outras formas de linguagem e níveis
de semioses.
No quinto capítulo são apresentados os dados levantados e analisados no decorrer
do acompanhamento das práticas de visualidade na unidade escolar e órgãos adjacentes. Esse
foi um período constituído de observação de documentos de orientação pedagógica e algumas
ações didáticas, reuniões com docentes para verificação de resultados e elaboração conjunta
de outras ações e aplicação de questionário-entrevista com docentes e discentes. O objetivo
foi confrontar a proposição escolar e a realidade discente, mediante os novos meios de
tecnologia da informação e da comunicação, com ênfase no desempenho dos suportes visuais.
Por fim, a cultura da visualidade, que abarca os discentes, estudada pela teoria do
signo, pela elucidação classificatório das categorias fenomenológicas de Peirce, sugere novas
condutas de aprendizagem que são discrepantes de modelos hoje praticados em âmbitos
escolares. Parecem indícios de uma nova ideia de aprendizagem, cujos saberes culturais são
consequência de habilidades cognitivas adquiridas. Não se trata de algo que surge sem
antecedentes, mas da condição epistemológica , neste caso da cognição visual, em decorrência
da sua gramática própria, articuladora de condutas e sentidos.
19
CAPÍTULO 1- A VISUALIDADE NO CONTEXTO EDUCACIONAL
As práticas de ensino realizadas no âmbito da escola pública são articuladas de
duas maneiras: fluxo de orientações que partem dos órgãos de gestão pedagógica, que dadas
as necessidades plurais de gerenciar um processo em rede, massivo, não contempla situações
particulares; e formação do professor que tende a ser múltiplo em decorrência da
universidade em que realizou seus estudos. Tendo em vista que as leis do país (abordadas
mais à frente) instituem a liberdade de pensamento pedagógico e o nível estadual é parte do
todo, portanto, é uma instituição que tem uma corrente de pensamento para a respectiva rede
de ensino, não pode ser confundido como território gerenciado pedagogicamente à luz da
formação do professor. Assim, neste momento cabe um olhar sobre como a visualidade se
apresenta no decorrer da legislação e alguns documentos de orientação. Na sequência, a
constatação da visualidade inserida na realidade das práticas escolares na população de
amostra será bem-vinda para a contraposição entre a orientação e práticas.
O termo educação, derivado do latim educare, por sua vez ligado a educere, verbo
composto do prefixo ex (fora) + ducere (conduzir, levar), significa literalmente “conduzir para
fora”, isto é, ações externas sobre estruturas internas. Deste modo, as ações podem ser
estabelecidas de diversos modos, mas uma dicotomia é mais enfática: a não sistematizada,
volátil, e a sistematizada, guiada por alguma forma de controle, um método. Esta última seria
o modo mais plausível para as práticas que se dão no âmbito escolar.
No Brasil, os âmbitos escolares, privados ou públicos, estão sujeitos a mesma
ordem instituída por leis, documentos norteadores, dependentes do universo de valores e
crenças culturais, mas a diferenciação se dá na qualificação dos recursos humanos, na relação
entre pressupostos teóricos e condução de ações, no espaço físico, na quantidade de
educandos, entre outros. Cabe aos sistemas escolares públicos a responsabilidade da maioria
de alunos que se formam na Educação Básica e, pesquisas internacionais delegam ao país
péssima classificação, como exemplo a consultoria da Economist Intelligence Unit5 que
analisou habilidades cognitivas e desempenho escolar dos alunos em 40 países. O Brasil foi
classificado em penúltimo lugar em um ranking sobre a qualidade da educação. No último
relatório elaborado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
5 É uma empresa de mídia vinculada a multinacional The Economist Group, sediada em Londres ,
Reino Unido, especializada em negócios internacionais e assuntos mundiais.
20
Cultura (UNESCO, 2014), referente ao índice de desenvolvimento da Educação, realizado em
128 países, o Brasil surge na 88ª posição, atrás de alguns menos desenvolvidos como
Honduras (87ª), Equador(81ª), Bolívia(79ª) e bem mais distante de países adjacentes
como Argentina (38ª), Uruguai (39ª) e Chile(51ª).O documento revela que há por volta de
175 milhões de jovens em países de baixa renda, que equivale a cerca de um quarto da
juventude mundial, não sabem ler nada ou simplesmente lêem parte de uma sentença. Assim,
nota-se que a questão verbal escrita é um grande norte da qualificação do ensino-
aprendizagem no âmbito mundial, em que o Brasil é extensão desse pensamento. Assim, a
indagação sobre um ensino que também tem a ciência e a valoração da visualidade parece
comprometido na respectiva relevância.
1.1 - Documentos orientadores na estância federal
A partir da referência do universo legislativo como primeiro organizador da política
educacional e, obviamente, formado pelas ideologias culturais, a recuperação desse histórico é
importante para construir o desenvolvimento ou a ignorância de uma educação da visualidade.
O Brasil, desde 1824, teve sete Constituições (uma no Império e as demais na
República), porém a história da educação institucionalizada tem anterioridade às
constituições, mas foi o advento republicano que tornou público, gratuito e obrigatório o
ensino. A Lei de Diretrizes e Bases (LDB) é citada a partir da Constituição de 1934, ganhou
texto em 19616, foi revista em 1971
7 e, após a Constituição de 1988, assumiu o texto regente
em 19968.
Existe uma abertura interpretativa nos textos legislativos que permite certa distância
entre a enunciação das Leis e a constituição do currículo, cuja ultima LDB é mais incisiva em
defini-lo. Mas, desde o século 19 existiram preocupações com o ensino das formas visuais,
desatreladas das escolas de Artes e voltadas para uma formação integral do indivíduo,
conforme foi a preocupação de Rui Barbosa9:
Vai-se começando a encarar o desenho como ramo essencial da educação
geral em todos os graus, e, ainda, como a base de toda a educação técnica e
industrial. Vai-se percebendo que ele constitui uma coisa útil em todas as
6 Lei no 5.692, de 11 de agosto de 1971.
7 Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961
8 Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996
9 Rui Barbosa (1849-1923) foi um dos organizadores da República e coautor da constituição da Primeira
República juntamente com Prudente de Morais
21
partes do trabalho e em todas as condições da vida; que é o melhor meio de
desenvolver a faculdade de observação, e produzir o gosto do belo nos
objetos da natureza e de arte, que é indispensável ao arquiteto, ao gravador,
ao desenhador, ao escultor, ao mecânico; que, em suma, dá à mão e ao olho
uma educação, de que todos têm necessidade. (BARBOSA, R. apud
AMARAL, 2010, p. 2)
Apesar da integração entre as metas da mão de obra requeridas pelo processo de
industrialização que se iniciava no país e a “educação estética”, o ensino do desenho técnico
dividiu espaço em menor escala com o desenho copista e seguiram como modelos únicos até a
normatização do ensino de Artes, que explora outras formas de expressão além da visual.
A LDB de 1961 trouxe como fatos que interessam a este estudo: a ausência de
orientações com vistas mais claras sobre o fenômeno de ensino aprendizagem, a diversidade
curricular e a ênfase nos estudos dos conteúdos linguísticos, históricos e literários, porém, um
vigésimo sexto artigo arbitrava que:
Art. 26. O ensino primário será ministrado, no mínimo, em quatro séries
anuais. Parágrafo único. Os sistemas de ensino poderão estender a sua
duração até seis anos, ampliando, nos dois últimos, os conhecimentos do
aluno e iniciando-o em técnicas de artes aplicadas, adequadas ao sexo e à
idade. (BRASIL, Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961)
Segundo Barbosa (1975), esse fato contribuiu para equalizar a relação entre a
Técnica e a Arte, pois o ensino do desenho geométrico estava instalado no currículo e, ao
coexistir com a Artes Aplicadas, reinaugurou um paradigma: o domínio técnico e a
exploração do ato criador. Até então, o ensino de Artes ocorria em segmentos fora de um
currículo orientado pelo Estado para a formação básica.10
O conceito de Artes Aplicadas
rendeu uma diversidade de trabalhos manuais, que sinteticamente restringiu a visualidade à
experiência de suportes, ferramental e interferentes, cuja eficiência das habilidades motoras
eram o limite exultado.
A LDB de 1971 trouxe no texto a preocupação com a cidadania, o objetivo do ensino
primário e segundo grau11
de preparar o aluno para o trabalho, intensificou a aprendizagem
da língua nacional, a preocupação com o núcleo comum curricular e, no sétimo artigo,
sancionou: “Será obrigatória a inclusão de Educação Moral e Cívica, Educação Física,
Educação Artística e Programas de Saúde nos currículos plenos dos estabelecimentos de lº e
10
Os Liceus de Artes e Ofícios mantidos pelo Estado tinham metas mais profissionalizantes. 11
Nomenclaturas atualizadas para Ensino Fundamental e Ensino Médio pela LDB de 1996
22
2º graus, observado quanto à primeira o disposto no Decreto-Lei n. 369, de 12 de setembro de
1969.”(BRASIL, Lei no 5.692, de 11 de agosto de 1971).
A Educação Artística resgatou o estudo das formas de expressão da Arte: plástica,
cênica e musica12
. Tais mudanças de perspectivas exigiram uma variação de especializações
para os docentes, as licenciaturas para Música, Artes Cênicas, Plástica diferenciada de
Desenho, além da incorporação do saldo anterior de especialistas de Artes Aplicadas. Na
passagem dos anos oitenta para a década seguinte, a especialização de Artes Plásticas e
Desenho se esgotou entre si e surgiu a modalidade as Artes Visuais. Nesse ambiente de
ampliação dos conteúdos curriculares de Artes, Barbosa (1984) identificou práticas de arte-
educação e as denominou de Polivalência, Concêntrica e Alocêntrica. A Polivalência,
decorrente da formação em curto prazo para atender a demanda criada pela lei, gerou docentes
com domínio raso para manipulação de formas de linguagens distintas: plástica, teatro e
música, criando uma formação descartável. A questão concêntrica era caracterizada por
práticas que dialogavam com mais de uma das linguagens da Arte, mas verticalizavam em
apenas uma, enquanto que a Alocêntrica, respeitava a complexidade gramatical, histórica e
produtiva de cada forma de Arte, exigindo a parceria interdisciplinar entre docentes
específicos. Foi o período sob a influência de teóricos e estudiosos, tais como Viktor
Lowenfeld, Hebert Read, Robert Saunders, cujas pesquisas e ideias subsidiaram instituições
privadas de educação básica ou formação livre, que se estendiam desde os anos sessenta. A
grade curricular das escolas públicas foi criando divisas entre a Educação Artística e o
desenho Geométrico, duas maneiras embrionárias da visualidade: a primeira favorecendo com
fins expressivos e a segunda com intuito da lógica espacial.
No decorrer dos anos oitenta, para o objeto da visualidade no ambiente escolar,
mediante as inovações no Ensino de Arte, em grande destaque estava a proposta triangular13
defendida por Barbosa14
que deu maior expressão à preocupação com imagem artística, pois
segundo a arte-educadora, no ensino de Artes no Brasil predominava mais a questão do fazer
em detrimento da leitura.
12
O ensino da música já havia ocorrido no período Getúlio Vargas na modalidade do Canto Orfeônico. 13
Foi a primeira brasileira com doutorado em Arte educação (Universidade e Boston) e a manifestar a
preocupação do ensino de Arte em Museus. 14
A Proposta Triangular consiste em três abordagens para se construir conhecimentos em arte: a contextualização
histórica (conhecer), o fazer artístico (fazer) e a apreciação artística (fluir).
23
Temos que alfabetizar para a Leitura da imagem. (diz:) Através da leitura
das obras de Artes Plásticas estaremos preparando a criança para a
decodificação, da gramática visual, da imagem fixa e, através da leitura do
cinema e da televisão, a preparemos paragramática da imagem em
movimento. (BARBOSA M 1991 p 34)
Faz-se necessário esclarecer que, no decorrer dessas perspectivas históricas das leis
da educação, existia uma indústria educacional evoluindo e produzindo materiais impressos,
livros, apostilas, que traziam reproduções de fotografias, ilustrações, gráficos, em menor
escala slides fotográficos, transparências para projetores, que abordavam objetos visuais, mas
não eram tratados na condição potencial da sintaxe visual.
A vigente LDB de 1996: organizou a educação brasileira em duas modalidades
Educação Básica e Superior, dividiu a Educação Básica em Educação Infantil, Ensino
Fundamental e Ensino Médio, fez usos dos termos competência e habilidades com vistas
semânticas correlacionadas com o desenvolvimento do ensino aprendizagem, a flexibilidade
de avanços nos anos ou séries da educação Básica, a progressão continuada, porém é bem
mais eficaz na preocupação em especificar conteúdos curriculares. Tais leis refletem a
ideologia das classes socialmente dominantes no nosso país e a consciência crescente de
inserção no contexto global, que envolvem enfaticamente a mão de obra para o mercado de
trabalho. Também é preciso salientar que essas Leis, quando criadas, trazem lacunas ou
revisões complementadas por legislação futura, ou seja, através de decretos, resoluções,
pareceres e medidas provisórias, mas não há a necessidade de estendermos a essas teias
legalistas.
De volta à visualidade, segue o levantamento das vezes em que se apresenta de modo
explícito ou implícito no texto da LDB de 1996, dada a sua vigência e sua originalidade de
orientar o currículo.
O segundo parágrafo do terceiro artigo, classificado na segunda titulação, “Dos
princípios e fins da educação nacional”, determina entre os princípios que o ensino será
ministrado que “[...]II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o
pensamento, a arte e o saber”(BRASIL, Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, grifo
nosso). Entende-se que a visualidade está explícita no que se refere a arte e também se trata
de forma de saber.
O primeiro e segundo parágrafos do vigésimo sexto artigo que retratam disposições
gerais da Educação Básica diz:
24
[...]§ 1º Os currículos a que se refere o caput devem abranger,
obrigatoriamente, o estudo da língua portuguesa e da matemática, o
conhecimento do mundo físico e natural e da realidade social e política,
especialmente do Brasil.
§ 2º O ensino da arte, especialmente em suas expressões regionais,
constituirá componente curricular obrigatório nos diversos níveis da
educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos
alunos..(BRASIL, Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996)
Mais uma vez, o modo explícito está no termo Arte, mas será a sorte dos tratamentos
de objetos de aprendizagem no banco escolar que poderá demonstrar a existência de uma
preocupação com a visualidade. Ainda nesse mesmo artigo, o sexto parágrafo15
declara que o
ensino de Arte é obrigatório, a música, mas não como conteúdo exclusivo e, no oitavo
parágrafo16
, que devem ser exibidos filmes de produção nacional na condição de componente
curricular complementar integrado à proposta pedagógica da escola, cuja exibição obrigatória
por, no mínimo, duas horas mensais.
Ciente de que o ensino de Arte, frente às atuais concepções e a história da Arte-
educação no Brasil, envolve as modalidades visuais, cênicas, música e, a partir de então,
reclama a dança, tem destaque no último modo determinado pela lei: compreender a
visualidade como fato sempre subentendido, entretanto, a leitura de filmes, principalmente
nacionais, mas não se trata aí apenas da valoração da nossa cultura, mas uma preocupação em
fortalecer a indústria do entretenimento brasileiro. O exemplo de ações desenvolvidas após
2007, no segmento escolar público de São Paulo, em prol de formar um leitor de cinema,
indica essa possibilidade. A Cinemateca Brasileira17
desenvolveu projetos em parceria com a
Secretaria de Estadual de Educação de São Paulo observando a preocupação em formar um
público que estava em declínio, provavelmente por fatores como: o aumento de espaços de
exibição de filmes, tanto pela oferta de novos espaços (shoppings) como a reforma de que
dividiram salas maiores em mais espaços, porém menores, o que provocou,
consequentemente, a redução de telas; o mercado cinematográfico sofreu com a facilidade de
reprodução de filmes fora do cinema, seja pela venda oficial ou mercado irregular (pirataria) e
os recursos tecnológicos de reprodução de imagem com dimensões maiores da imagem e
melhoria na qualidade sonora destinados ao domicilio residencial. Mas, é inegável que a Lei
15
Parágrafo acrescido pela Lei nº 11.769, de 18/8/2008 16
Parágrafo acrescido pela Lei nº 13.010, de 26/6/2014 e retificado no DOU de 4/4/2014 17
. Trata-se da criação do Clube de Cinema de São Paulo, em 1940, que foi fechado pelo Estado Novo, foram
realizadas tentativas de reabertura e finalmente em 1984 foi incorporada ao governo federal como um órgão do
então Ministério de Educação e Cultura (MEC) e hoje está ligada à Secretaria do Audiovisual.
25
traz a questão visual como conteúdo de aprendizagem, independente dos interesses
motivadores.
O trigésimo segundo artigo, que especifica o Ensino Fundamental, objetiva a formação
básica mediante:
[...] I - o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios
básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo;
II - a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da
tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade;
III - o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a
aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores;
(BRASIL, Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996)
Os termos leitura, escrita e cálculo não são redutíveis a certas disciplinas, porém,
a leitura associada à escrita, implica a valoração da forma verbal. Se adiantarmos a concepção
que será vista noutro capítulo, os três termos são encapsulados pelo fenômeno da linguagem,
a lógica é um extremo da própria linguagem.
Enquanto o primeiro item utiliza o verbo “desenvolver”, o segundo usa o
“compreender”, o que demonstra uma distinção de ordem processual. O indivíduo desenvolve
a linguagem para compreender o seu mundo físico, natural e cultural, porém a Arte, locada no
segundo item, parece enfraquecida no reconhecimento como fenômeno de linguagem,
portanto desfocada da condição desenvolvível e cognoscível para um sujeito em estado de
apreensão. Percebe-se a intenção de preparar um leitor de arte, o espectador, em detrimento
do produtor.
Outro dado destacável nesse parágrafo é a ideia de divisão dos conteúdos em
conhecimento, habilidades e formação de atitude e valores, que anunciam a influência dos
educadores que atuaram na reforma educacional da Espanha em prol da inserção desse país no
mercado europeu comum, entre eles Coll (1998) e Zaballa (1998) que também foram
consultores para a organização dos parâmetros curriculares brasileiros.
No trigésimo sexto parágrafo, que se refere às diretrizes do Ensino Médio, é
ressaltado que:
[...]I - destacará a educação tecnológica básica, a compreensão do
significado da ciência, das letras e das artes; o processo histórico de
transformação da sociedade e da cultura; a língua portuguesa como
instrumento de comunicação, acesso ao conhecimento e exercício da
cidadania;
[...]§1º Os conteúdos, as metodologias e as formas de avaliação serão
organizados de tal forma que ao final do ensino médio o educando
demonstre:
26
I - domínio dos princípios científicos e tecnológicos que presidem a
produção moderna; II - conhecimento das formas contemporâneas de
linguagem; [...](BRASIL, Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996)
A língua é o epicentro do fenômeno da linguagem que a educação brasileira
valora e “o termo conhecimento” para as formas contemporâneas de linguagem parece
regredir na possibilidade operatória.
Tendo em vista que se trata do principal documento orientador das práticas
educacionais em nosso país, pode-se dizer que pelo conceito de linguagem subtende-se que as
formas verbais são a maior meta do desenvolvimento cognitivo e outras manifestações da
linguagem sempre estão na condição de expectador, de leitor, como a Arte, a música e os
audiovisuais.
A originalidade da atual LDB foi a preocupação com a definição curricular, assim,
foi criado o documento denominado Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) sob a
competência da União em estabelecer, em colaboração com estados, distrito federal e
municípios, diretrizes para os currículos e seus conteúdos mínimos, de modo a garantir uma
formação básica comum.
O termo “parâmetro” visa comunicar a ideia de que, ao mesmo tempo em
que se pressupõem e se respeitam as diversidades regionais, culturais,
políticas, existentes no país, se constroem referências nacionais que possam
dizer quais os “pontos comuns” que caracterizam o fenômeno educativo em
todas as regiões brasileiras. (BRASIL, 1998, p. 49)
O surgimento de um currículo, mínimo, plural e singular, desenhou o território das
disciplinas:
O termo “currículo”, por sua vez, assume vários significados em diferentes
contextos da pedagogia. Currículo pode significar, por exemplo, as matérias
constantes de um curso. Essa definição é a que foi adotada historicamente
pelo Ministério da Educação e do Desporto quando indicava quais as
disciplinas que deveriam constituir o ensino fundamental ou de diferentes
cursos do ensino médio. Currículo é um termo muitas vezes utilizado para se
referir a programas de conteúdos de cada disciplina. Mas, currículo pode
significar também a expressão de princípios e metas do projeto educativo,
que precisam ser flexíveis para promover discussões e reelaborações quando
realizado em sala de aula, pois é o professor que traduz os princípios
elencados em prática didática. Essa foi a concepção adotada nestes
Parâmetros Curriculares Nacionais. (ibid ,p 49)
O conjunto de textos desses parâmetros, com fins introdutórios e determinantes de
conteúdos, no tocante à visualidade, apresenta: como fato integrado as demais formas de
27
linguagem no tratamento do objeto de conhecimento; a importância de novos suportes da
imagem como mediação de conteúdos (audiovisuais) e, mais restrito ao Ensino de Artes,
dividiu com a cultura da visualidade a metalinguagem visual. Ficou evidente o caráter
funcional e, somente, numa parcela o estudo da forma de linguagem.
Todas as linguagens trabalhadas pela escola, portanto, são por natureza
“interdisciplinares” com as demais áreas do currículo: é pela linguagem –
verbal, visual, sonora, matemática, corporal ou outra – que os conteúdos
curriculares se constituem em conhecimentos, isto é, significados que, ao
serem formalizados por alguma linguagem, tornam-se conscientes de si
mesmos e deliberados.(BRASIL, 2000, p. 77)
O caráter interdisciplinar ampliou as relações de intertextualidade e as formas de
texto, que ascendeu a importância das imagens nas práticas de ensino-aprendizagem, mas,
mesmo assim, os estudos sintáticos (quando ocorrem) ficaram confinados no currículo do
ensino de Artes. Este manteve as modalidades previstas na LDB de 1971, acrescidas
oficialmente da dança e do audiovisual. A indústria editorial também passou por mudanças
diagramáticas favorecendo a visualidade nos meios de organização e ilustração de conteúdos.
Os parâmetros desenharam os currículos não menos importantes e intrínsecos, a
metodologia também foi rascunhada implicitamente. Duas palavras que passaram a compor o
cotidiano das práticas educacionais: competências e habilidades, colaboraram para os
conteúdos enunciados por substantivos e, em menor escala, por adjetivos, fossem
apresentados por verbos, conforme observado na leitura de escrituração de planejamentos
escolares e documentos orientadores. As práticas deslocaram o acúmulo de informação
descontextualizada para situações operacionais.
O uso do termo competência, muitas vezes acrescido dos termos: social, intelectual e
cognitivo, denotam certa ideologia de sistemas de produtividade que requerem mão de obra
cada vez mais complexa, ou seja, a formação tem vistas a uma inserção ao mercado. A
palavra em si tem conotação de competir, logicamente, depende de uma comparação com
outro, nem que seja um indivíduo consigo mesmo, mas em tempos distintos, porém, o
celeuma conceitual foi instalado nos próprios documentos: “Não há receita, nem definição
única ou universal para as competências – qualificações humanas amplas, múltiplas que não
se excluem entre si – ou para a relação e a distinção entre competências e habilidades.”
(BRASIL, 2002, p. 12)
[...] Pode-se, de forma geral, conceber cada competência como um feixe ou
uma articulação coerente de habilidades. Tomando-as nessa perspectiva,
observe-se que a relação entre umas e outras não é de hierarquia. Também não
28
se trata de gradação, o que implicaria considerar habilidade como uma
competência menor. Trata-se mais exatamente de abrangência, o que significa
ver habilidade como uma competência específica. Como metáfora, poder-se-ia
comparar competências e habilidades com as mãos e os dedos: as primeiras só
fazem sentido quando associadas às últimas. (ibid p.16)
A recursividade metafórica pode ser um índice da impotência de conceituação, que
para este estudo precisará ser resolvido no decorrer dos argumentos sobre a cognição. O
embasamento oferecido é uma flutuação na ausência de conhecimento coerente sobre
processos cognitivos, pois, além das formas de linguagem, anuncia a importância da memória,
tipos de memória em relação a natureza do estimulo perceptivo, enfim, elementos da
processualidade cognitiva que exigem dialogo mais extensos com as estudos sobre as aspectos
do signo e neurobiológicos da cognição.
Pode-se concluir que o conjunto dos documentos que constituem os parâmetros
foram sem dúvida a tomada de consciência da relação entre linguagem e cognição, que
mesmo quando se impõe a valorização da linguagem verbal nas grandes metas: competência
leitora e escritora, permitiu brechas para a revisão de dimensionamento das outras formas de
linguagem.
1.2 - Documentos orientadores: estância estadual
De acordo com a LDB, é responsabilidade dos estados membros da união a
responsabilidade do Ensino Fundamental e Ensino Médio, assim como, no terceiro item do
décimo artigo da constituição em voga, prevê que: “[É incumbência do estado] elaborar e
executar políticas e planos educacionais, em consonância com as diretrizes e planos nacionais
de educação, integrando e coordenando as suas ações e as dos seus Municípios.” A partir
desses princípios o Estado de São Paulo, pioneiramente, através da secretaria Estadual da
Educação passou a aplicar desde 1996 uma avaliação denominada SARESP (Sistema de
Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo) – com intuito de avaliar o Ensino
Básico na rede estadual. Esse sistema opera através de amostragem e vem aprimorando cada
vez mais a execução.
29
Em 2007 sofreu uma reformulação para atender a realidade de processo avaliativo de
larga escala: passou a utilizar a metodologia dos exames nacionais (SAEB e Prova Brasil18
)
para equiparação de dados e a preocupação em estabelecer conteúdos mínimos para diminuir
as variantes de amostragem. As avaliações são: aplicadas em dois dias; avaliam conteúdos de
língua portuguesa e matemática de modo contextualizado e com proposições
interdisciplinares com as demais matérias; o grande volume de avaliações é com questões
objetivas, mas existe a minoria subjetiva para fins qualitativos; nas versões dos últimos anos
são aplicadas redações num grupo de amostragem; a cada ano são alternadas avaliações das
disciplinas de: história, geografia, ciências ou ciências da natureza (Química Física e
Biologia), estendem-se ao segmento municipal e opcionalmente ao privado e são aplicadas
nas séries ou anos finais de cada ciclo, mas alguns anos estendem-se as outras séries ou anos.
Através do documento Matrizes de referências para avaliação: documento Básico
(SÃO PAULO, 2009), foi estabelecido para o sistema de avaliação do SARESP o
engajamento de três aspectos: as habilidades cognitivas, conteúdos e competências cognitivas.
Os conteúdos são recortes do currículo, aparentemente se trata do universo conceitual, as
competências são formas de raciocínio e tomada de decisão, estruturadas sobre as habilidades,
que funcionam como indicadores do nível de aprendizagem dos proporcionado pela relação
conteúdos e competências. Infere-se que a as habilidades cognitivas são o meio por onde flui
a aprendizagem. São tangíveis e mensuráveis, indicadoras e descritoras do desempenho das
competências. As competências são modalidades estruturais da inteligência que permitem
verificar a proficiência da condição de reconhecer, relacionar e operar sobre o conteúdo
curricular. Enfim, são três aspectos intrínsecos (fig1)
Figura 1 - Critérios de avaliação do SARESP
Fonte: http://saresp.fde.sp.gov.br/2009/pdf/Saresp2008_MatrizRefAvaliacao
_DocBasico_Completo.pdf
18
SAEB é o primeiro sistema de avaliação da educação em escala nacional. Aplicado pela primeira vez em 1990
e foi reformulado em 1995, quando passou a permitir a comparação de resultados de diferentes edições.
Atualmente, o SAEB e a Prova Brasil participam da composição do Índice de Desenvolvimento da Educação
Básica (IDEB).
30
Partindo deste principio, as competências foram classificadas três níveis e agruparam
as habilidades pertinentes: Grupo 1 – Esquemas presentativos, grupo 2 – Esquemas
procedimentais e Grupo 3 – Esquemas operatórios. (vide fig2) .
Figura 2- Distribuição das competências SARESP
Fonte: http://saresp.fde.sp.gov.br/2009/pdf/Saresp2008_MatrizRefAvaliacao
_DocBasico_Completo.pdf
Os próprios verbos que anunciam as habilidades são indicadores semânticos de outra
faceta, segue revista:
O Grupo I, Competências para observar, aludem aos esquemas presentativos ou
representativos, demonstrados por Jean Piaget: “Graças a eles, os alunos podem ler a prova,
em sua dupla condição: registrar perceptivamente o que está proposto nos textos, imagens,
tabelas ou quadros e interpretar este registro como informação que torna possível assimilara
questão e decidir sobre a alternativa que julgam mais correta.” (ibidem, p16). Seguem as
habilidades: observar para levantar dados, descobrir informações nos objetos,
acontecimentos, situações etc. e suas representações; identificar, reconhecer, indicar,
apontar, dentre diversos objetos, aquele que corresponde a um conceito ou a uma descrição;
identificar uma descrição que corresponde a um conceito ou às características típicas de
objetos, da fala, de diferentes tipos de texto; localizar um objeto, descrevendo sua posição ou
interpretando a descrição de sua localização, ou localizar uma informação em um texto;
descrever objetos, situações, fenômenos, acontecimentos etc., e interpretar as descrições
correspondentes; discriminar, estabelecer diferenciações entre objetos, situações e
fenômenos com diferentes níveis de semelhança; constatar alguma relação entre aspectos
observáveis do objeto, semelhanças e diferenças, constâncias em situações, fenômenos,
palavras, tipos de texto etc.; representar graficamente (por gestos, palavras, objetos,
desenhos, gráficos etc.) os objetos, situações, sequências, fenômenos, acontecimentos etc.;
31
representar quantidades por meio de estratégias pessoais, de números e de palavras. Os grifos
enunciam a condição mais perceptiva do desempenho das habilidades, o contato mais
imediato com os objetos de aprendizagem em detrimento da mediação puramente verbal e as
possíveis decodificações, cuja visualidade propendera à ordem primária dos eventos.
O Grupo II, as Competências para realizar, são as habilidades pelas quais o aluno
realizar os procedimentos cogentes às suas escolhas de decisão. Seguem as habilidades:
classificar – organizar (separando) objetos, fatos, fenômenos, acontecimentos e suas
representações, de acordo com um critério único, incluindo subclasses em classes de maior
extensão; seriar – organizar objetos de acordo com suas diferenças, incluindo as relações de
transitividade; ordenar objetos, fatos, acontecimentos, representações, de acordo com um
critério; conservar algumas propriedades de objetos, figuras etc. quando o todo se modifica;
compor e decompor figuras, objetos, palavras, fenômenos ou acontecimentos em seus
fatores, elementos ou fases etc.; fazer antecipações sobre o resultado de experiências, sobre a
continuidade de acontecimentos e sobre o produto de experiências; calcular por estimativa a
grandeza ou a quantidade de objetos, o resultado de operações aritméticas etc.; medir,
utilizando procedimentos pessoais ou convencionais; interpretar, explicar o sentido que têm
para nós acontecimentos, resultados de experiências, dados, gráficos, tabelas, figuras,
desenhos, mapas, textos, descrições, poemas etc. e apreender este sentido para utilizá-lo na
solução de problemas. Os termos grifados explicitam a condição de relacionar representações,
sonoras, visuais, verbais, mas ainda conectada a certa imediaticidade do objeto de
aprendizagem.
O Grupo III, as Competências para compreender, provocam o uso de esquemas
operatórios com vistas ao pensamento mais sintético e abstrato, proposicional e combinatório,
obliterando para os níveis hipotéticos dedutivos do raciocínio. As habilidades propostas são:
analisar objetos, fatos, acontecimentos, situações, com base em princípios, padrões e valores;
aplicar relações já estabelecidas anteriormente ou conhecimentos já construídos a contextos e
situações diferentes; aplicar fatos e princípios a novas situações, para tomar decisões,
solucionar problemas, fazer prognósticos etc.; avaliar, isto é, emitir julgamentos de valor
referentes a acontecimentos, decisões, situações, grandezas, objetos, textos etc.; criticar,
analisar e julgar, com base em padrões e valores, opiniões, textos, situações, resultados de
experiências, soluções para situações-problema, diferentes posições assumidas diante de uma
situação etc.; explicar causas e efeitos de uma determinada sequência de acontecimentos;
apresentar conclusões a respeito de ideias, textos, acontecimentos, situações etc.; levantar
32
suposições sobre as causas e efeitos de fenômenos, acontecimentos etc.; fazer prognósticos
com base em dados já obtidos sobre transformações em objetos, situações, acontecimentos,
fenômenos etc.; fazer generalizações (indutivas) a partir de leis ou de relações descobertas
ou estabelecidas em situações diferentes, isto é, estender de alguns para todos os casos
semelhantes; fazer generalizações (construtivas) fundamentadas ou referentes às operações
do sujeito, com produção de novas formas e de novos conteúdos; justificar acontecimentos,
resultados de experiências, opiniões, interpretações, decisões etc. É claro que os indicadores
semânticos da visualidade diminuem nesse segmento, cujo privilégio é o modo verbal.
Tendo em vista que é um documento orientador para o que deve ser avaliado19
,
consequentemente expressa o que deve ser ensinado. Não se trata mais de ensinar apenas
dados, fatos, conceitos, mas de formas de processá-los, entretanto a lacuna na constituição
desta tríade das competências está na falta de clareza na relação entre elas:
As competências relativas a esse Grupo III devem ser analisadas em duas
perspectivas. Primeiro, estão presentes e são mesmo essenciais às
competências cognitivas ou às operações mentais destacadas nos Grupos I e
II. Porém, quando referidas a eles, têm um lugar de meio ou condição, mas
não de fim. Ou seja, atuam de modo a possibilitar realizações via esquemas
procedimentais (Grupo II) ou leituras via esquemas de representação (Grupo
I). (SÃO PAULO, 2009 p.17)
A ideia de integração dos grupos predispõe o Grupo III, na condição velada da sua
natureza hipotética dedutiva, mediar as representações e as relações. Obviamente, se são
integrados influem sobre si, porém não na condição paralela-intersecionada, como é
argumentado, mas na relação de contiguidade conforme demonstração da figura 3:
Figura 3 - Comparação da integração das competências - SARESP
Modelo paralelo intersecionado Modelo contíguo
Interpretação do autor a partir do documento orientador. (SÃO PAULO , 2009)
19
É importante destacar ainda que muitas competências e habilidades indicadas na Proposta Curricular da SEE
SP não foram contempladas nas Matrizes por não serem passíveis de avaliação em instrumentos formais de
provas realizadas em larga escala, como é o Saresp
33
O processo de qualquer aprendizagem se constituiu nos processos de representação,
portanto, as relações entre objetos de aprendizagem dependem das representações e inferência
hipotética das relações. Enquanto as matrizes de avaliações se resvalam na visualidade
implícita, que traduz de certo modo a condição do concreto para o abstrato, na política
educacional estadual, valora a insistências nas metas da competência leitora e escritora; a
normatizações através de leis e pareceres com ênfase para as disciplinas de língua portuguesa
e matemática, aliás, tão visíveis nos peso das grades curriculares, pois somadas correspondem
a 40% da grade das turmas do Ensino Fundamental – Anos Finais e 33% das grade das turmas
do Ensino Médio na carga horária de uma semana; nas propostas de recuperação de
conteúdos, entre outras.
A reformulação do SARESP, em 2007, trouxe a definição curricular, denominado
inicialmente de “Proposta Curricular” e mais atualmente de “Currículo”. Trata-se de um
conjunto de três edições: o documento base, o Caderno do Professor com orientações de ações
didáticas e o caderno do Aluno com atividades. Segundo a Secretaria Estadual de Educação,
era um material reivindicado pelos professores, para eles, docentes, foi recebido com críticas,
e em alguns casos a negação ao uso. Na realidade, trata-se de material necessário para atender
a avaliação massiva desejada pelo mecanismo do SARESP, que necessita de território em
comum - os conteúdos e de acordo com os Paramentos Curriculares Nacionais
O conflito gerado na implantação do Currículo, no tocante aos aplicadores, os
professores, decorreu da falta de compreensão por partes deles e da ideia de “currículo
mínimo”, que está sujeito à complementação. O “Caderno do Aluno”, que é o mais
consumível dos três, está organizado em tópicos denominados situações de aprendizagem, que
comparado ao livro didático, assume mais a aparência de um caderno de atividades, mas não
é, são situações de aprendizagem. O conflito, referente aos idealizadores, também tem sua
parcela de demérito, por alguns tratamentos de conteúdos elaborados fora da realidade da
escola pública, conforme constatado em entrevistas com professores da rede.
O material, no seu aspecto mais positivo, lida direto com conteúdos procedimentais,
habilidades cognitivas, que não são claras para a maioria dos atuantes na própria rede, mas
recupera proposição dos parâmetros e coloca as ações de ensino-aprendizagem frente a
questões bem contemporâneas: a fluência cognitiva.
É tangível a preocupação com a visualidade presente nesse novo âmbito escolar: as
diagramações dos “cadernos do Alunos” são proposições de design instrucional, a presença de
imagens ilustrativas e diagramáticas, a complementaridade com audiovisuais, mas a
34
metalinguagem visual, quando não ignorada, fica circunscrita à disciplina de Arte. A
funcionalidade desse material tem a aplicação comprometida, pois, na discrepância de
opiniões entre organizadores e aplicadores, a falta de consciência destes últimos que a
condição pública do ensino não exclui da autoridade institucional de determinar métodos e
modelos pedagógicos.
Assim como os critérios de avaliação do SARESP revelam uma concepção do
processo cognitivo, o Currículo também revela a sua. Sustentado nas pesquisas de Zabala20
(1998), a organização do Caderno em Situações de Aprendizagem, também denominadas de
Sequências Didáticas, são uma das modalidades organizativas das quatro práticas
educacionais21
propostas pelo autor. Diferente da sequência de conteúdos, que regem ordem
mais linear dos saberes, referem-se “o que deve ser ensinado” a SD, o “como devem ser
ensinado”, refere-se ao percurso que o cognoscente executa para construir seu conhecimento.
Zabala acompanhou práticas educacionais relacionadas à tipologia dos conteúdos (conceitual
e factual, procedimental e atitudinal), as atividades desenvolvidas e os êxitos atingidos. Após
verificar as etapas percorridas nas atividades que atingiam maior expectativa de
aprendizagem, fundamentado nas zonas de desenvolvimento de aprendizagem do pensador
russo Vygotsky22
(1896-1934), retomou a ideia da sequência didática.
Na análise qualitativa realizada nos exemplares “Cadernos do Aluno”, distribuídos
no período letivo de 2014, foram identificados os seguintes recursos de tratamento dos
saberes: diagramas de conceitos, diagramas ilustrados, tabelas de dados, gráficos, mapas,
reproduções de obras de arte, ilustrações, fotografias e textos. Esses recursos podem ser
agrupados de acordo com a intenção de aprendizagem: os diagramas, as tabelas, os gráficos e
os mapas – relacionam ideias, são dados ou fatos na dependência de uma complementaridade;
as reproduções de arte, fotografias e textos dividem ora em apresentar uma situação, ora para
uma relação intertextual; e os textos têm como meta a síntese dos saberes, que funciona como
indicador do grau de apreensão. Com exceção dos textos verbais, a natureza visual predomina
nas outras formas de tratamento.
O Currículo proposto pela rede estadual, em consonância com os parâmetros
nacionais, reconhece a visualidade como aspecto dos processos de ensino-aprendizagem, mas
sempre na condição de atingir resultados processados na modalidade verbal da linguagem. O
20
Antoni Zabala é um educador espanhol que, igualmente a Cesar Coll, teve papel significativo na Reforma
Educacional da Espanha e influenciou ou assessorou países da América Latina. 21
As outras práticas são: projetos, atividades permanentes e situações independentes. 22
Lev Semenovitch Vygotsky precursor no conceito de que o desenvolvimento intelectual das crianças acontece
em função das interações sociais e condições de vida.
35
espaço que a visualidade poderia ser estudada na estrutura como linguagem, o ensino de
Artes, continuou dividindo espaço com as demais formas de linguagem e se manteve muito
mais na leitura em detrimento da produção. A preparação do leitor é mais simpática a
ideologia do sistema educacional preocupado em modelar discentes na expectativa de
ascensão cultural espelhada nas culturas dominantes globais.
1.3 - O cotidiano escolar
Durante o período entre 2013-2014, acompanhando uma escola da rede pública, da
Região Centro de São Paulo, a Escola Estadual Frei Paulo Luig, e as respectivas reuniões de
formação dos gestores pedagógicos da mesma junto ao órgão Central, ficou evidente a
preocupação com dois aspectos do déficit de aprendizagem, um mais claro, demarcado pelas
expectativas de aprendizagem não atendidas, ou seja, os conteúdos definidos pelo Currículo, e
outro, menos palpável e visível para as equipes pedagógicas: a capacidade da retenção da
memória, os modos de raciocínio e as formas efetivas de organização do pensamento.
Segundo os fatos contabilizados ao longo desse acompanhamento, as expressões
proferidas sobre “o que os alunos não conseguiam fazer”, ou melhor, as competências
cognitivas: a interpretação de textos escritos, a interpretação de enunciados de matemática,
produzir letras legíveis para facilitar a compreensão ortográfica e semântico, a dificuldade de
estabelecer relações intertextuais (texto-texto, texto-imagem), a dificuldades na leitura de
gráficos e mapas, dificuldades de leitura e a organização de argumentos. Esse quadro anuncia
um vazio entre as orientações teórico-práticas e as expectativas alcançadas na rede de ensino
Obviamente, há uma lacuna entre as orientações teórico-práticas e as expectativas
não atingidas, que podem ser justificadas de modo imprudente na maneira como os docentes
agem ou nos discentes: na reorganização da estrutura familiar ou falta dela, na falta de
expectativa de ascensão social, na dispersão gerada pelas novas tecnologias móveis e
portáveis, etc. São fatores culturais, possivelmente temporais, que influem, mas não são
unicamente determinantes, aliás, os mais superficiais.
Destarte, se fecha a trilogia “O que se ensina” (o Currículo), “Como se ensina”
(metodologia, ação dos professores) e “Como se aprende” (o cognoscente), sendo que este
último é o território em que os processos cognitivos se efetivam e, portanto, a compreensão
dessa dimensão guia as metodologias. Assim, no período de convivência no cotidiano escolar,
o segundo foco foi no comportamento dos alunos. Um número mínimo, porém indicativo dos
36
discentes somava as seguintes atitudes: literalmente dormiam em sala de aula, não estavam
organizados com materiais para registro de conteúdos ou realização de atividades,
manipulavam celulares ou similares, estavam com fones nos ouvidos e conversavam sobre
assuntos diferentes do tema da aula. O grupo de alunos, cujas expectativas de aprendizagem
não atendidas, encapsulava esse grupo que apresentava o comportamento descompromissado,
cuja totalidade configurava o cenário de desinteresse pela escola, uma situação que se
multiplica nos relatos de demais unidades. Tal situação não é uma realidade isolada da
unidade visitada, ou da rede pública da grande São Paulo, ou Estadual ou até mesmo nacional,
pois Willingham23
(2011), escreveu Why Don't Students Like School?, demonstra que é um
sintoma que se repete no contexto cultural estadunidense. O autor apresenta nove princípios
da mente, porém, não se trata de uma defesa ou crítica aos seus argumentos, mas de relevar o
sintoma que evidencia. Numa rápida incursão, as hipóteses sobre as causas do desinteresse
escolar propostas por Willingham (ibidem), podem ser agrupadas em: as estruturas existentes
- predisposição do pensamento a reconhecer em detrimento do refletir; o modo processual – a
memória como resíduo do pensamento, a precedência do conhecimento factual (conceitual)
sobre as habilidades, a acomodação da cognição em cognições anteriores, a facilidade do
conhecimento concreto sobre o abstrato; e o modo final - a necessidade de adquirir
proficiência pela prática; a condição das diferenças individuais da inteligência serem
modificadas através de trabalho esforçado e continuado e meta de ensinar, como habilidade
cognitiva complexa, tem que ser exercitada de modo a poder ser melhorada.
A proposta de Willingham a princípio - um diálogo horizontal entre fatos
relacionados a aprendizagem de alunos e com fins justificados em melhorar a prática dos
professores, através de conceitos que, para ele, a psicologia cognitiva estuda isoladamente
enquanto nos bancos escolares se apresentam simultaneamente - demonstra comportamentos
presentes na realidade da rede pública, pois os adolescentes precisam de estratégias
perceptivas e motivacionais para desenvolverem foco de atenção; mais apreendem,
reconhecem, relatam, do que sistematizam e sintetizam; apresentam dificuldade de
memorização que comprometem os saberes e operam com o concreto em dois aspectos
“objetos cognitivos visualizáveis” e ou “experiências aqui e agora”, ou seja, experiências
vivenciadas e não mediadas pela oralidade de outro.
23
Aniel T. Willingham é psicólogo da Universidade de Virginia, onde leciona no Departamento de Psicologia. A
pesquisa de Willingham incide sobre a aplicação das conclusões da psicologia cognitiva e neurociência na
educação.
37
A classificação ternária sobreposta aos princípios de Willinghan é a arquitetura dos
percursos cognitivos: a estrutura pré-existente; o meio, a forma, o modo que leva a estrutura
se transformar e a finalidade que se estabelece, ou seja, o sujeito, a mediação do objeto e
produto. Entretanto, os princípios que vêm sustentando desde o fim da década de oitenta até
as atuais práticas da rede, decorrem das extensões do pensamento de Jean Piaget, Lev
Vygotsky, denominadas de Construtivismo, Sócio Construtivismo, Interacionismo e
Construtivismo Interacionista, e David Ausubel com a concepção da Aprendizagem
significativa, embora, nem todos os responsáveis da rede pela gerência desses princípios na
efetivação da aprendizagem dominem tal conhecimento, conforme constatado no
acompanhamento da mesma, reconhecem a linguagem como mediadora, mas não oferecem
maior compreensão do fenômeno.
A relevância da linguagem está no cerne desses pensamentos, tanto como espelho de
desenvolvimento, como expectativa de proficiência a ser atingida, todavia, a linguagem verbal
é o aspecto relevante, principalmente, na questão da proficiência. Outro traço comum é a
natureza da interação do ambiente com os processos cognitivos e o estudo centrado nas
estruturas perceptivas, cognitivas e mentais do cognoscente. Por outro lado, há outro aspecto a
ser compreendido: a linguagem como fenômeno independente, passível de apreensão e de
sentidos possíveis. Os indícios apontam para a linguagem como espécie de ponto nevrálgico
da aprendizagem, porém o subsidio teórico, pelos menos da rede, parece ignorar a extensão da
relação fenomenal da cognição-linguagem. Neste sentido, a recuperação de uma teoria
semiótica é necessária para o entendimento do tema desta pesquisa: cognição e visualidade,
que será objeto de outro capítulo.
Para uma compreensão mais vertical, foram copiladas as atividades que ocorreram
nessa unidade escolar entre a transição semestral 2013 e 2014. A escolha pelo período de
transição foi na intenção de reconhecer se havia mudanças pela troca de professores na virada
do ano letivo, pois é uma realidade das escolas publicas. Nesta unidade, foi registrado apenas
26% de mudança no quadro de profissionais e somados os resultados entre os anos não houve
alteração nos dados que serão tabelados mais adiante. Partindo da análise das proposições de
aulas que envolviam o uso da imagem, foi registrado um universo de itens para todo o
segmento. Foi considerado o uso de imagem em qualquer atividade que se apresentava
significativa para apreensão de determinado objeto de conhecimento, excluindo situações
38
experimentais concretas por envolverem imagens “naturais”24
, percepção de diagramação de
mídias impressas para acessar a imersão na leitura e imagens na condição alegórica para
ambientação temática da sala de aula. Também, foi diferenciado se a abordagem era um ato
de leitura da imagem ou de outro autor ou produção de imagem, pois evocam relações
cognitivas distintas. Entre os temas que se apresentaram existiu uma predisposição natural
entre aqueles que atendem a leitura e os que atendem a produção, portanto, não teriam como
se efetivar. Seguem os temas definidos na análise: atividades envolvendo técnicas de
animação em suportes digitais; audiovisual montados a partir do PowerPoint; filmes; colagem
de imagens impressas, composições com sucata, desenhos livres e temáticos, diagramas e
gráficos25
, imagens publicitárias e ilustração de texto informativo ou literário, obras de artes
visuais bidimensionais, história em quadrinhos e maquetes. A relação proporcional entre a
amostragem da unidade escolar e a rede estadual é sujeita a uma intermitência de variações,
portanto, para diminuir essa lacuna na sequência foi comparado às socializações de produtos
que ocorreram em amostras de práticas exitosas de âmbito regional26
e estadual27
.
Seguem as tabelas demonstrativas enunciando apenas a ocorrência “não quantitativa”
do evento para cada item levantado a partir da somatória de atividades comum aos dois
segmentos: Ensino Fundamental me Ensino Médio.
Tabela 1 - Atividades observadas no Ensino Fundamental Anos Iniciais
24
Conceito a ser apresentado no capitulo 3. 25
O gráfico também é um raciocínio diagramático, mas para atender o discurso predominante no senso comum
da rede de ensino foi diferenciado. 26
Foram dois eventos ocorridos nas dependências Diretoria de Ensino Região Centro-SEESP (São Paulo) em
20/08/13 – “Seminário Descentralizado: Melhor Gestão, Melhor Ensino”, e em 10/12/2014 o “I Seminário de
Boas Práticas – Uma Escola para todos”. 27
A SEE-SP criou em 2013 o Projeto “MGME - Melhor gestão, melhor ensino”. Foi um curso semipresencial
para gestores que culminou com a socialização de práticas exitosas a partir do Currículo na cidade de Serra
Negra (São Paulo).
Item Leitura Produção
ocorrência. disciplina ocorrência. disciplina
Animação digital - - - -
Audiovisual ( com fotos) x História
Audiovisual (filme) x Português - -
Colagem - - x Artes
Composição com sucata - - x Artes
Desenho livre - - x Artes
Desenho temático - - x Artes
Diagramas - - - -
Gráficos x Matemática - -
Imagens publicitárias x Português
História em quadrinhos x Português x Artes
Ilustração de texto
informativo-literário
- - x Português
Maquetes - - x Ciências
39
Esse segmento, constituído de crianças de seis a dez anos de idade, distribuídas
entre doze turmas, as atividades são realizadas pelos professores polivalentes (formação em
pedagogia) e especialistas nas disciplinas de Artes e Educação Física. É evidente o ensino de
Artes na produção de imagem, provável consequência de um sistema de orientação que é
incisivo na produção de linguagem na forma verbal. Em contraponto na leitura, a imagem é
usada mais proeminente em decorrência da apresentação mais concreta do objeto de
conhecimento.
Tabela 2 - Atividades observadas no Ensino Fundamental Anos Finais
Neste seguimento, formado por turmas, com adolescentes entre onze a dezessete
anos, houve maior equilíbrio entre a presença da imagem para leitura e produção, porém,
manteve o ensino de Artes na função mais produtiva, semelhante aos anos iniciais.
Tabela 3 - Atividades observadas no Ensino Médio
Obras de arte x Artes x Artes
Item Leitura Produção
ocorrência disciplina ocorrência disciplina
Animação digital - - x Artes
Audiovisual ( com fotos) x História, geografia e
Ciências
x Ciências
Audiovisual (filme) x Português, História,
Geografia, Artes
- -
Colagem - - x Artes
Composição com sucata - - - -
Desenho livre - - x Artes
Desenho temático - - x Artes
Diagramas - Ciências - -
Gráficos x Matemática, Geografia,
Ciências.
- -
Imagens publicitárias x Português, Inglês
História em quadrinhos - - x Português, Artes
Ilustração de texto
informativo
- - - -
Maquetes - - x História e Ciências
Obras de Arte x Artes x Artes
Item Leitura Produção
Ocorrência Disciplina Ocorrência Disciplina
Animação digital x História
Audiovisual ( com fotos) x Hist. Geo. Port. Ingl.
Filo.
x Bio, Hist. Filo. Geo.
Audiovisual (filme) x Hist. Port. Ingl. Filo.
Colagem - - x Artes
Composição com sucata - - - -
40
Nesta modalidade de ensino, constituída por seis turmas do período matutino, com
jovens de quatorze a dezenove anos, manteve-se mais próximo dos anos finais e bem mais
distantes da realidade dos anos iniciais. Tendo em vista que não está sendo levada em questão
a quantidade de vezes que as ocorrências aconteceram, mas o modo que a imagem entrar na
prática pedagógica dessa escola, é sensível a percepção do crescimento do uso da imagem na
leitura sobre a produção. Será que este fato é passível de preocupação para estudos sobre a
cognição da visualidade? Para tanto, urge de um aprofundamento nos registros das atividades
do Ensino Médio.
A produção de imagens, por sua vez, teve como intenção de aprendizagem, na maior
parte das atividades, a síntese e/ou ilustração de conteúdos, algo similar ao resumo textual, e,
em menor escala, a releitura de um conteúdo, apresentação de um conteúdo estudado
extraclasse e exercício de expressão. Em nenhum dos casos de produção de imagem foi
constatada a preocupação com orientações sobre os suportes, além de alguma sugestão
material, e uma possível gramática da visualidade. É inevitável o paradoxo, é como um aluno
que lê um texto e ao pedir para comentá-lo, nada consegue expressar, pois não entendeu! Os
intentos incansáveis dos objetivos educacionais em extrair argumentos, síntese, sob o modo
verbal da linguagem, assim como localizá-la exclusivamente na base de todo e qualquer
processo de aprendizagem, parecem contribuir para maior ineficácia da exploração da
visualidade. A imagem assume um papel apresentativo para tradução simbólica-nominal,
cujas mediações que se interpolam essa passagem ficam exauridas, quando degeneradas
dificultam os argumentos.
A priori, a condição de naturalidade da imagem não é diferente da oralidade, mas
ambas estão sob algum tipo de organização e modos de representação que as diferenciam, e
dependem de suportes naturais, mentais e reprodutores, entretanto, pelos menos no contexto
Desenho livre - - - -
Desenho temático - - x Artes
Diagramas x Bio. Geo. Hist. - -
Gráficos x Mat. Bio. Geo. - -
Imagens publicitárias x Port. x X
História em quadrinhos - - - -
Ilustração de texto
informativo
- - - -
Maquetes - - x Geo. Bio
Obras de Arte x Artes x Artes
41
atual, a oralidade é aperfeiçoada através do seu suporte gráfico (a escrita), mas a visualidade
fica na condição inativa do individuo, pelo menos na prática escolar em questão.
A Secretaria Estadual da Educação reuniu em 2013, seiscentos e trinta profissionais
da educação, entre gestores, professores de matemática e português para um Simpósio sobre
práticas exitosas desenvolvidas em decorrência do curso “MGME- Melhor gestão, melhor
ensino”, direcionado a qualificar as unidades escolares. Este encontro foi precedido por outro,
em âmbito regional, nas respectivas Diretorias de Ensino28
.
Foi objetivado na gestão escolar e no processo de ensino de aprendizagem de língua
portuguesa e de matemática. O intuito era melhorar o desempenho dos alunos dos anos finais
do Ensino Fundamental nessas duas áreas do conhecimento que, para os gestores da educação
pública estadual, são a base para aprendizagem das demais disciplinas e, para esse estudo, se
trata de absoluta reducionismo da linguagem e da lógica, que terminam por extensões de uma
fenômeno: a semiose.
A própria sistematização do evento, apresentação de uma prática, impôs um registro
visual do processo que não pode ser confundido com a presença da imagem no processo de
ensino aprendizagem. Por exemplo, as atividades de cunho mais cênico. Nos resultados deste
evento mediante a: extensão, o controle de registro e o foco na questão da visualidade, foi
observada a visualidade: como mera ilustração, alegórica; como forma concreta de
apresentação dos conteúdos e, em algumas atividades, como caráter puramente expressivo.
Redundando: as sínteses qualitativas indicaram orientações sem a menor
preocupação em compreender a sintaxe própria de algumas formatações como a história em
quadrinhos ou filmes, assim, como técnicas sobre materialidade, no caso das maquetes e
protótipos, que, na transição de demanda de alunos, pouco muda nos resultados plásticos. São
sintomas da cultura de ensino-aprendizagem centrada na competência leitora e produtora de
linguagem verbal. Não há avanço, pois não reconhecem claramente a gramática articuladora
de cada forma de linguagem, exceto a verbal. No decorrer da aprendizagem organizada em
série, há linearidade para a linguagem verbal, enfaticamente no suporte que a escrita
representa para a oralidade, tornando-a cada vez mais complexa: parte da alfabetização a
apropriação das intenções de descrição, narração e argumentação. Enquanto a linguagem
visual, percebida na maioria das vezes na condição “apresentativa” da imagem, fica restrita às
28
No caso da Diretoria de Ensino envolvida participaram 63 escolas sob sua jurisdição.
42
habilidades daqueles que desenvolveram sem auxílio de processos sistematizados na
competência para produzi-las ou a evocação nominal das representações. Isto é o que a nossa
educação oferece em termos de linguagem visual!
Esta é uma condição do sistema educacional público sobre o sujeito cognitivo. De
um lado, temos documentos norteadores, projetos de aprimoramento, reconhecimento de
práticas exitosas, práticas repetitivas, práticas inovadoras aos olhos dos gerenciadores do
ensino-aprendizagem e, do outro, um sujeito pertencente ao universo cultural, cujo âmbito
escolar é apenas fração de espaço-tempo do todo que o envolve. O dialogo não pode ser
apenas aberto entre gerenciadores e a realidade imediata do sujeito, como se tem proposto nas
unidades escolares, mas na realidade cultural, neste caso da visualidade, que engloba todos.
1.4 - Tecnologias: negação ou incorporação
O uso do Celular no espaço escolar é um exemplo do confronto de ações: quem
proíbe e quem insiste em usar, mas, atualmente, surge uma intenção mediadora representada
por educadores mais aptos à tecnologia.
No estado de São Paulo, em 2007, foi promulgada a Lei n° 12.730, seguida do
decreto 52.625, em 2008 que regulamentam o uso do celular durante o horário das aulas. Na
contramão, o caderno do aluno, posterior a essas datas, trazia atividades que envolvia o uso do
celular para captação de imagem e, nos últimos anos, se multiplicam a divulgação de práticas
favorecendo a incorporação do celular como ferramenta de aprendizagem devido a diversas
funções que foram inseridas: ouvir músicas, gravar imagens em movimento, fotografar,
conexões simultâneas, etc. Durante o acompanhamento na rede, 2013-2014, foram registrados
que os docentes lamentaram o fato de os alunos ficaram mais dispersos durante as aulas, não
atendem a solicitação para desativarem o aparelho e usam para diversos fins: registros das
mais diversas intenções - condutas de professores na sala de aula, situações promiscuas,
brigas reais ou encenadas; entretenimento – jogos, ouvir musicas e conectivo – diálogos com
colegas e pesquisa na internet, sendo que este último depende do acesso à internet no
ambiente escolar, cuja rede pública é muito rudimentar ou nula. Esse contexto ilustra o
conflito entre nativos na tecnologia, denominação dada por Marc Prensky (apud PALFREY
2011) e os imigrantes digitais, alunos e professores, que não estão circunscritos apenas aos
43
celulares e suas variantes, mas a todas as novas tecnologias, que são produtos da própria
cultura e engendram novos comportamentos. A ausência de maior domínio dos recursos
aplicativos se interpõe entre alunos e professores, dificultando aproveitamento de novos
suportes da linguagem e os respectivos desdobramentos: processos cognitivos.
Para verificar melhor esse indício, foi aplicado, no segundo semestre de 2014, uma –
entrevista-questionário, via online através da plataforma Surveymonkey, entre duas
amostragens: professores da rede de ensino que atuam na jurisdição da Diretoria de Ensino
Região Centro e alunos da Escola Estadual Frei Paulo Luig, que pertence a mesma diretoria
de ensino. O intuito foi espelhar o comportamento frente às novas tecnologias da informação
e comunicação. Na pesquisa, a área de formação acadêmica foi bem heterogênea e cerca de
32% dos docentes eram formados anterior a 1996, 29% entre 1996 a 2005, ou seja, numa
geração distinta dos atuais nativos, entretanto o perfil tecnológico não estava muito distante
do grupo de discentes. Conforme demonstra a tabela (4) abaixo, os domínios dos recursos que
favorecem a forma verbal são vultuosos, seguidos da forma visual e a sonoridade esta no
contraponto dos menores domínios.
Tabela 4- Relações do grupo de discentes com a tecnologia
Ao serem investigadas sobre os suportes de linguagem que utilizam nas práticas de
sala de aula (tabela 5), aquelas que denotam o uso da forma verbal prevaleceram: como os
impressos e o giz e lousa, etc. Apesar da proximidade entre o domínio tecnológico e a prática
44
em sala de aulas valorarem o sistema verbal, há a realidade dos recursos e espaços
educacionais disponíveis na rede. As escolas são providas de suportes digitais como aparelhos
de computadores (salas de informática), aparelhos de data show, notebooks, televisões, e
também é possível encontrar resquícios de suportes analógicos: projetores de slides,
aparelhos de televisão e retroprojetores. As salas de informática, cuja operacionalidade,
manutenção e potencialidade de conexão, são situações variáveis, pois dependem da
combinação de fatores: gestão, operantes e usuários.
Esses espaços são quase uma sala para várias salas de aulas, por exemplo: a escola
em questão, considerada mediana, possui uma sala de informática e uma sala de audiovisual
contra quatorze salas de aula comum. A oferta tecnológica não é extensiva a todas as turmas,
mas a singularidade dos trabalhos de alguns docentes.
Tabela 5 – Linguagem utilizadas na sala de aula
Os relatórios da pesquisa aplicada entre os alunos, na faixa etária entre 14 a 18 anos
apresentaram os seguintes indicadores relevantes: sobre o uso do tempo diário - os
entrevistados depois de horas dedicadas ao estudo, ficam mais de quatro horas diárias
conectados na internet em salas de bate papo; nenhum deles fica sem acesso a internet; dados
que denotaram: a comunicação virtual imediata é mais praticada em atividades que não
requerem o contato mais imediato. Os dados elevados afirmando que “nunca jogam games”
necessitou uma revisitação através de diálogo direto com o grupo de amostragem e alegaram
que, para eles, game não se tratava de games online, mas de jogos eletrônicos; sobre o
interesse em aparelhos tecnológicos– com cerca de 40% de afirmações, não possuem
interesse em terem scanner, gravador de som digital e celular sem internet; 81% possuem
45
“Iphone, Smartphone ou similares”, seguido de 69% de notebook e 58% de máquina
fotográfica digital, os aparelhos que permitem a conexão e a fusão de funções, com ênfase na
imagem são mais desejados, também há a predileção pelo aparelho mais portátil.
1.5 - Uma síntese capitular
A visualidade no contexto educacional está atrelada às orientações documentais,
legislativas e treinamento de docentes, que envelhecem, rejuvenescem e se reciclam, mas a
crença na valorização do modo verbal da linguagem persiste. A portabilidade da escrita é mais
fácil e econômica que a muitas opções de suportes para imagem. As atividades que envolvem
a visualidade são praticadas com intenção: alegórica, expressiva, entretenimento e de
experiências concretas.
O contexto histórico das leis demonstra como ainda é recente, no caso da rede
pública, o deslocamento do pensamento da aprendizagem centrado em estruturas mentais de
visões mais amplas da linguagem e na cognição como processo, em consequência das raízes
na transmissão dos “saberes” determinados culturalmente.
Além dessas questões, educação sempre foi um meio dominante, determinante do
saber, mas agora se debruça mais sobre o sujeito no aspecto científico, reconhecendo a
diversidade cognitiva, e no esforço de criar uma escola protagonizada por ele, como sugerem
as políticas mais atuais da SEE SP. Porém, esse sujeito está imerso num contexto cultural
tecnológico que implica em comportamentos cognitivos diferentes daqueles que a rede de
ensino propõe.
Essa situação de alteridade de intenções, escola – sujeito, embora com esforços de
equalização, são tangíveis nas expectativas e na ineficácia de instituições de ensino,
decepções dos docentes, no desconforto do discente. Como a visualidade participa, interfere e
contribui para adequação dessas diferenças? Será uma questão de recursos tecnológicos,
suportes ou reconhecimento de um sistema de linguagem? Por ora, segue para o entendimento
da cognição.
46
CAPÍTULO 2 - COGNIÇÃO, COGNITIVISMO E FLUXO.
O capítulo anterior tratou de uma análise das intenções da instituição educacional no
reconhecimento da visualidade como objeto de aprendizagem sob o contraponto do mundo
real: práxis e protagonismo discente. Neste capítulo, a proposta é retomar alguns aspectos da
cognição, que na literatura subsidiária das propostas educacionais da rede de ensino publica,
está sob uma concepção antropocêntrica, dependente da condição mental humana, além de
tratamentos seccionados dos ambientes epistemológicos que lhe dão origem ou ainda de
emendas teóricas até mesmo contraditórias. Por exemplo: a confusão terminológica e,
consequentemente operacional, sobre habilidade e competência; ações orientadas em
referências a teóricos cognitivistas, mas, na prática, tratando o cognoscente como tábula rasa
(Behaviorismo clássico).
Atualmente, o termo cognição foi transportado para outras probabilidades de
estruturas inteligentes, no mundo animal, por exemplo, são divulgados experimentos com
demonstração de abelhas que aprendem relações arbitrárias (MORENO, 2012). Mas,
obviamente a cognição humana abriga o predicativo de ser mais complexa. Assim, como
cognição é um fenômeno além do humano, também não se limita à condição da
arbitrariedade.
A priori, a cognição será definida como situação de coisas sujeitas a se influenciarem e
gerarem um efeito de regularização entre si. É um fenômeno que prediz “algo afetando algo”,
“algo sendo afetado” e “dois eventos que se tocam e se alteram”. Isso pode ocorrer numa
relação entre células, no adestramento de um cão, no corpo humano, no diálogo entre pessoas.
Relações orgânicas do corpo humano podem, de certo modo, estabelecer uma relação
cognitiva, mas, noutro nível, na esfera da linguagem, está aquilo que o senso comum da
psicologia adjetivou como “cognições superiores”. Nessa esfera mais palpável, a forma verbal
foi o principal evento de reflexo dos processos cognitivos no âmbito ensino aprendizagem.
A ideia de cognição traz em si o reconhecimento entre coisas, que embute um
princípio de alteridade, de “distintos que se distinguem”, de uma consciência entre eles, os
quais só se completam porque há algum tipo de mediação. Esta sutileza dos níveis da
cognição será tratada com maior propriedade sob o ângulo do pensamento de Peirce na
sequência do próximo capitulo, pois é no bojo desse arcabouço de conjunto de doutrinas que
se resolvem as principais complexidades do fenômeno.
47
Comumente, referências à cognição conotam a mente do aprendiz, parece algo interno,
mas, se pensarmos que ela cria conduta e comportamento, a cognição é um fenômeno externo
ao aprendiz. A perspectiva “interna” é fruto de um objeto tratado unilateralmente, e a externa
está apta a afetar a mente, pois se trata aí de representações. Esta é a crítica que se faz neste
momento: não há como compreender este fenômeno unilateralmente.
A materialidade dos processos cognitivos encontra-se ncérebro, com suas extensões
neurais (neurônios e sinapses) e, se há um processo, há produtos, o cérebro expandido que
gera novos processos. Não se trata de um argumento sobre a massa cerebral, mas das funções
que este executa e cada vez mais se externalizam em suportes criados por ele mesmo. A
memória é o melhor exemplo dessa informação, pois a invenção da escrita foi um passo
fundamental para expandir a capacidade de arquivamento e, assim, segue como a expansão
das linguagens e desenvolvimento das tecnologias da comunicação, de amplificação dos
sentidos etc.
O princípio dos “eventos que se afetam” existe desde as informações registradas, na
memória ou na sua expansão, que se dão existem desde a localização da primeira apreensão
perceptiva. Tem-se aí dois fenômenos atrelados à cognição: percepção e memória, que
estabelecem um ciclo de retroalimentação com desenvolvimento construtivo e espiral frente
ao mundo das experiências. Um dado perceptivo é incorporado ao outro dado acumulado na
memória, que resultará em novo dado e assim segue. São processos dinâmicos, intrínsecos e
evolutivos, cujo núcleo é a menor unidade da linguagem (para efeitos de estudo): o signo.
2.1- Cognição: apreensão, compreensão e autorreferência.
Tomando como exemplo duas situações: a reação febril do corpo mediante a entrada
de alguns vírus na corrente sanguínea e a corrida disparada de um homem na pré-história ao
avistar seu predador, são situações sígnicas, mas há diferença entre dois sistemas orgânicos: a
autodefesa das células humanas e o mecanismo que conecta o homem ao seu meio social e
natural. Tanto a reação das células como a motora do homem contribuem para a existência
desse sujeito, mas a partir do conceito de semiose, um signo gerando outro signo, seriam aí
semioses distintas, operando sobre sensores, suportes e códigos diferentes. O segundo
exemplo refere-se à questão do nível da mente autorreferencial, processos autocognitivos que
48
referenciam o próprio organismo. Assim, o estudo da cognição segue agora para a
compreensão do “cérebro-mente”.
Não é uma questão nuclear deste trabalho aprofundar essa questão, inclusive, porque o
conceito de mente adotado é o de Peirce no próximo tópico capitular. Entretanto alguns
pontos de vistas são interessantes. Há uma tendência em se tratar a mente como substrato do
cérebro, definindo concepções como órgão e funcionalidade, o hardware e o software.
Teixeira (2000), ao tratar o panorama da conceituação pelo viés filosófico, apresenta visões
classificadas como monistas, dualistas e as provenientes do conceito de mente. Também está
implicado nessa questão o que é consciência, self, algo que a priori decorre da mente como
propõe Damásio (2009).
Para efeitos didáticos, dois aspectos da cognição são observados agora, a primeira, do
idealismo objetivo e a outra, ou melhor, na continuidade da anterior, cujos estados mentais
chegam à condição autorreferencial, que se instala, por exemplo, na psique humana.
A relação cérebro-mente implica a discussão sobre “qual a natureza da mente” ou
“como é possível a relação entre mente e cérebro” que tem sido objeto de discussão filosófica
dos monistas e dos dualistas. Teixeira (2000) afirma que o monismo é a tese alimentadora de
um tipo de substância no universo e esclarece que existem várias formas de monismo, de que
o materialismo é a concepção mais comum e define-se pelo que chamamos de processos e
estados mentais. São simplesmente processos e estados elaborados por um complexo sistema
físico. Em contraponto, o dualismo, também com variações, apresenta o cérebro e mente
como descontínuos entre si. De um lado, a materialidade e de outro, a substância. Apesar do
uso comum do pensamento dualista, os estudos que avançam sobre o cérebro e a cognição
encontram mais sustentabilidade argumental no monismo.
Para alguns estudiosos, Damásio (2006) e o self biográfico, Popper (1999) e Ecccles
(1999) e a mente autoconsciente, as relações entre mente e a sua autorreferência é um fato
decorrente do sistema de linguagem verbal, porém, não é a questão a ser desenvolvida, apenas
ilustrativa da farta associação das representações arbitrárias para a cognição.
Popper (1992) questionou, em seus diálogos com John Eccles, mas sem propor
aprofundamentos ou explicações, sobre um tipo de consciência puramente visual, não
enquadrável no seu conceito de mente autoconsciente. Se há uma consciência, há cognição,
porém, não atingir níveis de significação arbitrária que se dá no modo verbal parece, a priori,
49
um inexistente. Isto seria logocentrismo. Mediante os diálogos expostos até aqui, há a ideia de
uma consciência gerada por representações verbais, reconhecida e validada, mas há estágios
anteriores, a ideia de consciência reativa, uma cognição de um fenômeno visual que ainda não
está traduzível no signo verbal. Um exemplo desta condição está nos reflexos corporais
mediante uma situação de perigo informada pela circunstância espacial que ainda não tenha
sido processada no nível da autorreferência. Assim, as funções cognitivas superiores, ou seja,
associadas aos sistemas de linguagem, teriam, no tocante à visualidade, dois níveis: um
reativo e outro encapsulado pela forma verbal da linguagem que nós humanos possuímos.
As intersecções cognição e linguagem são mais claras a partir da noção do signo, pois
confluem na predisposição cognoscível e na meta comunicante, tanto para si como para o
outro, portanto, todo sistema de linguagem é um sistema cognitivo. As formas de linguagem
que existem no homem, conforme já dito, são decorrentes das relações evolutivas, situações
de ambientação, assim o fluxo externo tem influência quando considerados os milhões de
anos sujeitos a alterações, dadas a possíveis rupturas e instalação de novas regularidades no
genoma. Contudo, numa determinada fração de tempo, há um organismo existente e
equipado, sujeito à formatação do fluxo externo somente naquilo que ele mesmo possibilita.
Justificam-se os comentários empíricos sobre o uso parcial do nosso cérebro-mente. Trata-se
de uma estrutura interna pré-existente.
O uso do termo aprendizagem, a capacidade de aprender, muitas vezes obscurece o
termo cognitivo e elucidá-lo é algo fértil para dinamizar a compreensão de facetas do
fenômeno. A cognição está para uma conexão entre existentes e a aprendizagem para a ideia
de retenção, ou melhor, de um sujeito que retém alguma coisa, portanto, todo processo de
aprendizagem é realmente um fenômeno cognitivo, porém, na literatura, o vocábulo favorece
mais proeminentemente o sentido de desenvolvimento do indivíduo junto a sua espécie, ou
seja, é modelado pelo seu contexto. A fusão de ambos os termos dá à cognição papel de inata
e à aprendizagem, o congênito, sujeita a uma sistematicidade, que demonstra o cognoscente
como receptáculo de saberes culturais. Enfim, os termos são sutilidades da aparência de um
mesmo fenômeno.
Em síntese, é um fenômeno dependente da externalidade, mesmo quando constrói
representações com função autorreferencial, pois se desloca no campo mental; da
internalidade as estruturas plásticas do cérebro (percepção e processamento) e da fluência,
50
acomodação de memória; sua materialização se dá na representação, linguagem, semioses, ou
seja nos signos.
A perspectiva histórica do tratamento científico do fenômeno cognitivo, com vistas à
transposição para ambientes de ensino e aprendizagem, mesmo que sucinto, aponta como
esses olhares transitam: a dependência externa do comportamentalismo, a introspecção
cognitivista, a compreensão na externalização da linguagem. Passemos, pois, ao panorama
histórico.
2.2 - Breve perspectiva científica sobre a cognição no século 20
A preocupação com o fenômeno cognitivo existe implicitamente desde os filósofos da
antiguidade ao investigarem a natureza do raciocínio e avançou pelos séculos associado à
lógica, mas é só após o advento da Psicologia que se torna objeto mais expressivo.
O status da Psicologia como ciência se dá quando os pensadores constituem o seu
objeto de análise, fato que se inicia no século 19, pois até então ela estava enraizada nos
estudos filosóficos. No século vinte, algumas das teorias da Psicologia: o Behaviorismo, a
Gestalt e Psicanalise29
, preocupadas com a legitimidade científica, deram maior ênfase ao fato
psicológico, respectivamente: decorrente de ação externa (comportamento), a estrutura
psicofísica envolvida, a totalidade do fenômeno e as estruturas do “aparelho” psíquico. Destas
teorias, pode se dizer que duas correntes de pensamento seguiram para compreender os
processos de ensino aprendizagem: o comportamentalismo e o mentalismo. Na base dessa
discussão, a cognição aparece como dependência do mundo objetivo e para o segundo, do
mundo subjetivo, obviamente que refletem o modo de tratamento fenomênico, os métodos de
observação experimentais sofreram, principalmente, com advento das Neurociências que
permitiram compreender níveis mais ínfimos dos processos de cognição.
O behaviorismo (comportamentalismo), enunciado em 1914, através do "Manifesto
Behaviorista" publicado por Watson (2008), propõe uma psicologia do comportamento que é
experimental, observacional e não introspectiva. Desde 1930, houve uma resistência ao
mecanicismo inicial behaviorista, com vistas às pesquisas sobre aprendizagem por outros
cientistas, preocupados com o rigor científico e metodológico da ciência e de suas práticas
29
A citação da Psicanálise no corpus deste estudo tem fins panorâmicos no campo das principais teorias da
psicologia no século 20, mas não há necessidade de relacioná-la mais além, dado o enfoque do objeto.
51
experimentais, que rendeu, entre outras, a teoria da aprendizagem intencional de Tolman
(apud LOPES, 2009) e o "Behaviorismo radical" de Skinner (1974), ao afirmar que a
organização do comportamento não se localiza no indivíduo, mas nas suas relações: é o que
ele vai chamar de "contingência tríplice": estímulo - resposta - consequência reforçadora.
Para Skinner (1974), o reforço era o único responsável para a aprendizagem, e as
coisas não se aprendem de forma dinâmica através da experiência. Tolman discordou sob o
argumento de que os organismos aprendem apenas através da experiência, e o reforço só
levou a um melhor desempenho, mas não se aprende melhor. O objetivo do destaque desses
dois expoentes do Behaviorismo não é equalizar a divergência, mas o traço comum que
atribuíram à cognição: fenômeno decorrente da ação externa, reagente, que torna implícita a
observação de certa repetição, regularidade. A perspectiva behaviorista enfatizou a cognição
como um fenômeno externo, um tratamento social, que resistiu a boa parte do século 20 e
ainda insiste nas bases teóricas de documentos norteadores sobre ensino-aprendizagem que
alimentam algumas instituições de ensino. Em termos de ensino aprendizagem, o
behaviorismo implicou no conceito de tábula rasa para o indivíduo, ou seja, a folha em branco
a ser preenchida (pela experiência comportamental).
A Psicologia da Gestalt, com maior ênfase nos estudos sobre percepção de
Wertheimer (1923), Kofka (1975) e Köhler (1968), baseada na observação de conduta, dada a
tecnologia rudimentar de sua época, concluiu questões observadas de “fora para dentro” que
enunciavam a existência de estruturas perceptivas pré-existentes, ou seja, independentes do
mundo externo. As suas bases teóricas foram minimamente aplicadas sobre a aprendizagem
como foi o behaviorismo. Aparentemente, o principal destaque se deu nos estudos sobre
aprendizagem da visualidade. A priori, a Gestalt foi o início pouco cônscio do olhar de
“dentro para fora” dos processos cognitivos. Uma observação de índices de uma conduta
interna do cérebro-mente. A cognição é fenômeno que não pode ser pensado somente naquilo
que tem de exterioridade para um organismo, mas também naquilo que o organismo tem
como estrutura para a exterioridade.
Ainda no século 20, ocorre uma reação ao comportamentalismo, cuja perspectiva
evolutiva agrega uma extensão de pensadores agrupados por concepções em comum. Tal
reação, caracterizada como Cognitivismo, requer cuidados para esclarecimentos
terminológicos, pois, também designa uma área menor dentro da Psicologia.
Cognitivism is big. So big that it seems to be turning up in almost every
corner of psychology these days. In addition to "standard" (viz., human adult
experimental) cognitive psychology there is cognitive development,
52
cognitive therapy, cognitive neuropsychology, social cognition, animal
cognition, and so forth (GREEN, 1996, p. 31)
Green (1996) partiu dos estudos sobre a imprecisão do termo cognição nas áreas de
filosofia, psicologia e diversos desdobramentos no século vinte que geraram, entre outras, a
Neurociências, a Ciências Cognitivas. Ele apresenta o Cognitivismo como movimento que
permeia várias áreas do conhecimento com vistas à compreensão da cognição como objeto de
estudo da própria cognição humana. Apesar do corpus e objetos de pesquisa sobre cognição
pertencerem ao campo da Psicologia, foram os avanços tecnológicos externos que
desenrolaram as novas ideias dentro de uma psicologia que se volta para a cognição:
A interpretação tradicional das condições de surgimento da ciência cognitiva e
do Cognitivismo afirma que a psicologia cognitiva como campo de pesquisa e
o Cognitivismo como movimento, apesar de não terem sido criados fora da
psicologia, só conseguiram revolucionar o mainstream psicológico em virtude
de avanços científicos ocorridos além de suas fronteiras. Esses avanços seriam
basicamente seis: o advento da computação, a teoria da informação, a
cibernética, as novas teorias neurológicas, as novas descrições de síndromes
neuropsicológicas e a teoria linguística de Noam Chomsky. (GARDNER,
1996; MAYER, 1981; BAARS, 1986 apud CASTANON 2007, p277).
O comportamentalismo e o cognitivismo não são territórios extremamente
delineados, pois, o segundo sofreu influências durante várias décadas e se reveste de ênfases
variáveis, mas mantém a singularidade sobre a cognição humana a partir das relações cérebro-
mente: realismo-idealismo, monista-dualista. Numa breve horizontalidade histórica, pode-se
citar fontes de influências ou epistemes para o movimento cognitivista: a abordagem
construtivista proposta pela Epistemologia Genética de Jean Piaget (e desenvolvedores) e o
interacionismo estudado por I. Vygotskii e continuado por Luria; a ciência da computação,
que segundo Teixeira (2008), inicia com os estudos matemáticos de Alan Turing a partir de
1930, fomentou a IA-Inteligência Artificial que se definiu nos anos 50 e esta influenciou uma
nova etapa da robótica, que possuía estudos anteriores, desde o início do século, voltados para
os sistemas de produção com necessidade de aumentar a produtividade e melhorar a qualidade
dos produtos.
A organização de eventos científicos de difusão de ideias, pesquisa e teorias sobre a
mente e a cognição a partir dos anos 50, marcaram as dicussões que desenvolveram as
ciências cognitivas como área interdiscplinar. No bojo deste evento, destacam-se Donald
Hebb (Neurociências), Noam Chomsky (linguística cognitiva), Allen Newell e Hebert Simon
(Inteligência Artificial e Psicologia Cogntiva), George A. Miller (Psicologia Cognitiva), Ulric
Neisser (Psicologia Cognitiva), entre outros; os avanços tecnológicos na compreensão do
53
cérebro em conjunto com as descobertas de Roger Sperry sobre lateralidade cerebral
(Neurociências) nos anos 60 que se estenderam aos esforços promovidos pelos cientistas para
a década do cérebro, os anos 90, quando Gardner (1994) sintetizou seu trabalho sobre a Teoria
das Inteligências Múltiplas. Também decorre desse percurso ainda, nos anos 70, a cognição
sob o ponto de vista biológico apresentado pelos chilenos Maturana e Varela (2008), a
Teoria da Autopoeises. Porém vale destacar, na segunda metade do século vinte, o
neurocientista Marr (2010) que sustentou argumentos inéditos sobre o processamento visual,
mais no tocante à morfologia visual e o piscólogo Ausubel (apud MOREIRA, 1999), com
foco mais específico na aprendizagem, elaborou a proposta da Aprendizagem Significativa
com ênfase na associação de ideias.
Desses enfoques, há recortes com vistas ao objeto de análise: aqueles com maior
impacto nos ambientes de aprendizagem da rede estadual (Piaget, Vygotsky, Gardner,
Ausubel) e outros que contribuíram para a compreensão do processamento neuronal (Hebb,
Marr). Também se observam nessa breve abordagem, temas mais comuns entre a pluralidade
de estudiosos sobre a cognição: a identificação de estruturas de acomodação, o fluxo
processual e o produto cognitivo. Assim, há mais singulares na negação do cérebro-mente
como espaço vago à mercê da externalidade, ensaios sobre a forma de elaboração cognitiva e,
em menor consenso, a síntese cognitiva como algo palpável pela verbalização.
2.2.1 - Identificação de estruturas
As passagens dos estudos sobre a cognição, como “ação exclusivamente externa”,
sem considerar as estruturas pré-existentes, para a compreensão destas, se dá, inicialmente na
mensuração cognitiva manifestada através da linguagem. Dois expoentes clássicos dessa
passagem são Piaget e Vygotsky que, apesar das diferenças entre ambos, tomam o
pensamento externalizado através da linguagem como índices de estruturas pré-existentes.
As estruturas cognitivas levantadas por Piaget (1987) indicam processos que se
acomodam a estruturas padrões, ou seja, há uma conduta cognitiva predisposta a faixa etária.
Para Vygotsky (1991) as relações sócio-culturais estão na base do processo de formação do
pensamento conceptual, a linguagem se dá na interação social, mas, também há etapas,
padrões a serem deflagrados pelo fluxo cognitivo no cognoscente. Dentre as diferenças entre
os dois pontos de vista, ressaltam-se respectivamente o engessamento e a flexibilidade das
54
estruturas cognitivas em faixas etárias. Por outro lado, as semelhanças estão na forma da
linguagem que reflete o efeito cognitvo: prevalce a verbal sobre a visual. As considerações
piagetianas que deram suportes às análises dos estágios do desenho infantil (KELLOGG,
1969; MEREDIEU, 1974) e as vygostikianas, que sugerem o desenho com certa relatividade
ao domínio do ato motor, registro do gesto, depois da imagem e como precursor da escrita,
ambas predispõem a visualidade sob a perspectiva verbal. A exemplificação do tratamento
dado à cognição por esses dois pensadores demonstra, nessa fase, a cognição estudada através
da materialidade verbal e, em menor intensidade, nas expressões visuais. Caratcteriza-se por
um olhar de fora sobre as possivéis estruturas preexistentes tangíveis na linguagem.
2.2.2 - O fluxo cognitivo
A Psicologia Cognitiva, influenciada pelas Ciências da Computação, a Cibernética, as
Teorias da informação, a Robótica, a Inteligência Artificial, passou a preocupar-se com o
processamento de informações e, nota-se, tanto na preocupação de Neisser (1976), ao definir
o objeto da Psicologia Cognitiva, como processo pelo qual o input sensório é transformado,
reduzido, elaborado, armazenado, recuperado e usado, demosntra o processamento cognitivo.
Na percepção, os estímulos são recebidos com alguma potência de regularidade o que já
enuncia uma atividade cognitiva, assim como a armazenagem da experiência é o registro de
efeitos de regularização e está empenhada a subsidiar novos eventos perceptivos, oferendo
base para uma nova regulagem, entretanto dois elementos precisam ser vistos: o interno –
cérebro-mente e o externo - mente-cultura.
Começando pelo segundo caso, por ser mais aparente, tem-se exemplo na proposição
da aprendizagem mecânica e significativa de Ausubel (apud MOREIRA, 1999). A descrição
dos subsunçores, conceito central na teoria de Ausubel, é um processo por meio do qual uma
nova informação inclui-se, de maneira substantiva (não-literal) e não-arbitrária, a um aspecto
proeminente da estrutura de conhecimento do cognoscente.
A teoria de Ausebel, entre os pesquisadores do seu tempo, foi a que mais desenvolveu
estudos com intencionalidade explícita para a aprendizagem e propôs duas formas: a
mecânica, sujeita a repetições exaustivas passível de tornar-se algo significativo e outra
decorrente de processos associativos entre pré-existentes e existentes. Para Ausubel, os pré-
55
existentes são denominados de subsunçores e tendem à conotação de conceitos verbais, aliás,
a ideia de significação que ele apresenta em sua obra é dual: significante e significado, que
remonta a semiologia de Saussure. O esteio verbal que se apresenta na forma de
aprendizagem de Ausubel reflete a intenção de aplicação educacional cuja linguagem verbal
tem sido a opção de material palpável da cognição30
.
O primeiro aspecto, a internalidade cérebro-mente é a fase em que a processualidade
adquire uma investigação mais interna ao cérebro e associa ao fenômeno cognitvo a
percepção, a memória e a linguagem como situações intrínsecas. Decorrente dos avanços das
Neurociências, soma-se a essa etapa o processamento mais infimo da cognição, ou seja, a
conexão dos neurônios pelas sinapses. São estudos que enfatizaram a cognição como
fenômeno dotado de temporalidade, processual, que não se restringe apenas ao seu potencial
de síntese no ato de apreensão. Implica na mínima presença de regulares, portanto há
acumulação anterior, transformação e acumulação posterior, assim como chegam aos
processos cognitivos encarnados na materialidade cerebral. Segundo Novak (1981), esse
caminho atrelado à Neurobiologia é refutado por Ausubel, cuja justificativa era de tratar de
caminhos especulativos e enganosos. Nessa esfera mais infima, destaca-se o conexionismo
que trata do processamento de informação:
O conexionismo é um pardigma porque oferece uma solução para a eterna
discussão entre os mentalistas, que defendem que o entendimento da mente
não está ligado ao conhecimento do cérebro, e dos nervistas, que defendem
ser a mente um produto da fisiologia cerebral. (CÂMARA, 2010, p 15).
Retoma-se o monismo idealista. A questão do conexisnismo, inicialmente denominado
de processamento em distribuição paralela, tem, conforme Câmara (2010), no legado do
psicólogo Donald O. Hebb o postulado dos três princípios das conexões cerebrais:
1 – Princípio de formação das conexões neurais. Quando um axônio da
célula A está próximo o bastante para excitar B, e repetidamenteou
persistentemente a estimula, algum processo de crescimento ou alguma
mudança metabólica ocorre em uma ou ambas as células, tal que a eficiência
de A, como uma célula que excita B, aumenta.
2 – Princípio das redes neurais. A base cerebral para as representações
mentais são grupos de neurônios (cell-assembly) auto-organizados (redes
neurais) que tendem a disparar ao mesmo tempo (ativação conjunta) devido
à aprendizagem Hebbiana. O disparo de neurônios em uma rede pode
persistir após o evento gatilho, e esta persistência é uma forma de memória.
(ibid, p16 )
30
As práticas de mapa conceitual como forma de organização e registros e estudos praticados na educação, na
singularidade didática de alguns docentes, são originários das proposições de Ausubel, expandido por Novak
(1981). São raciocínios diagramáticos inspirados no fluxo neuronal.
56
3 – Principio da sequência de fase. [...] Toda estimulação particular,
frequentemente repetida, levará a um lento desenvolvimento de uma rede
neural (cell assembly), uma estrutura difusa que compreende células no
córtex e diencéfalo (e talvez na ganglia basal do cérebro), capaz de atuar
brevemente como um sistema fechado, favorecendo o disparo de outros
sistemas semelhantes e comumente tendo uma facilitação motora específica.
Uma série de tais eventos constitui uma “sequência de fase”, base do
processo do pensamento.Cada ação de uma congregação deve ser despertada
por uma congregação precedente, por um evento sensorial, ou – o que é mais
comum – ambos. [...] (ibid, p.16 ). (HEBB apud CAMARA, 2010 p.16 ).
Tal postulado, exaltado, depois parcialmente esquecido e, por fim, retomado no bojo
das Neurociências, apresenta o fluxo cognitivo: da ação excitatória sincrônica do neurônio, a
expansão em rede que cosntitui a representação mental, neste caso, a natureza das
representações mentais, o signo, adquire palpabilidade (mental), a propriedade de
armazenamento dada a condição de estar para um existente que dispara a sequência de redes,
o fluxo do pensamento, ou melhor, a semiose.
Retomando os modelos de aprendizagem de Ausubel, que atua na esfera mais externa
da cognição, a aprendizagem mecânica indicializa a aprensão exaustiva da repetição e os
subçunsores de associação de ideias, a “congregação precedente” que ocorre na “sequência de
fase” proposto por Hebb. A relação entre esses dois cognitivistas, salvo as divergências, tem
como meta demonstrar reflexos externos daquilo que é infimo no evento cognitivo que se dá
na esfera humana.
Os processos associativos que ocorrem no fluxo cognitivo, disparados por algum tipo
de anterioridade, não são privilégios apenas de sistemas verbais, basta recuperar experiências
de confusão imagética, quando uma coisa aparenta ser outra, há uma associação de eventos
anteriores que guiam intensamnete o fluxo. Ao recuperar estâncias infimas da cognição, cujos
eventos de anterioridade não são reduzidos a conceitos verbais, o que se apresenta é a
intenção de recuperar a compreensão mais eficiente da cognição visual.
2.2.3 - A tipologia do produto cognitivo
Uma das primeiras palavras associadas à meta da cognição é o termo conhecimento,
que implica na existência de um produto verbal, entretanto, o fenômeno cognitivo não se
57
reduz apenas a esse aspecto. Existe uma miríade de apreensões que não são necessariamente
tangíveis pela linguagem verbal, mas são cognoscíveis pela nossa mente.
Segundo Mota e Zimmer (2007) foi Gilbert Ryle, filósofo inglês, o primeiro que
observou o conhecimento humano categorizável como sendo sobre “as coisas” e sobre “como
fazer as coisas”. É oportuna a sequência dessas autoras sobre a ideia do Filosofo Karl
Haberlandt:
A memória declarativa é factual e caracteriza-se como um sistema que retém
conhecimento explícito, acessível à consciência e verbalizável
(HABERLANDT, 1994). Em contraste, a memória procedimental contém
conhecimento implícito, que não está disponível à consciência e, portanto,
não pode ser verbalizado. O conhecimento procedimental pode ser
recuperado e utilizado de forma muito mais rápida do que o conhecimento
declarativo. (MOTA; ZIMMER, 2007, p. 159)
Outra forma que a expressão “conhecimento procedimental” passou a ter, ora como
sinonímia, ora como aproximação conceitual, foi o termo habilidades, que ocasionou alguns
equívocos entre motoras e mentais ao ser reduzido a seus contextos argumentais científicos.
Mas, ainda existe certa vagueza, portanto, recorrer ao sentido lato do termo, que vem do
latim, habilitatis, qualidade de habilis, que designa “o que se tem”, é o primeiro passo para
elucidar a natureza do objeto de cognição.
No início, o conceito de cognição foi apresentado como algo que está orquestrado
sobre certa regularidade, assim, tanto como o fato como a habilidade decorrem do princípio
regular. Mas, se insere outra situação, as regularidades se desenvolvem porque há essa
possibilidade entre A (estrutura apreensiva) e B (objeto de apreensão), ou seja, preexistem,
estão apenas sujeitas ao estado de potenciação, e há outra decorrente do contexto externo que
se desenrola nas condições preexistentes. Os aspectos genoma (preexistente) e cultura
(interação) se entrelaçam. Um exemplo do preexistente pode ser a condição da percepção
visual ao reagir a ritmos presentes em certo campo visual. Adquirir o léxico de uma língua
exemplifica uma interação. Outro exemplo é a fórmula de memorização dos textos sagrados
de Ifá na etnia yorubá: os léxicos são armazenados pelo exercício do ritmo oral. Tomar a
ideia de conhecimento como finalização do ato cognitivo requer dimensionamento do próprio
conceito de “saber”.
A “recuperação mais rápida” (MOTA, ZIMMER, 2007) do produto armazenado
como memória procedimental em detrimento da memória declarativa, aponta para a facilidade
de recuperação do que já somos dotados. Destarte, essa natureza posiciona o produto
procedimental anterior ao declarativo já que não podem ser territórios distintos, mas em ação
58
de encapsulamento, ordem evolutiva. O simples fato de “saber fazer as coisas” é prepositivo
de “saber as coisas”. Uma análise comparativa de dados requer processos associativos de
igualdade e diferenças. O que pode ser observado são procedimentos que dependem de
declarações. O estado movente e pontual do produto cognitivo reforça sua concretude na
semiose, ou seja, o signo triádico, que será abordado no próximo capítulo.
Dando maior dimensão a esta discussão, a exposição de Gardner (1994) no intuito de
rever a proposição de desenvolvimento cognitivo piagetiana, sob a análise de David Feldman,
registra que os domínios cognitivos são universais e singulares, os que são gerais à condição
humana e, em oposição, os que são circunscritos aos grupos culturais. Implicitamente, nota-se
que há um mundo comum, decorrente da condição preexistente na espécie humana e que esta,
na extensão do seu limite, apresenta setorizações, ou seja, há valorização e desvalorização de
percursos cognitivos.
São estudos que enfatizam a cognição como fenômeno dotado de temporalidade,
processual, que não se restringe apenas ao seu potencial de síntese no ato de apreensão.
Implica na mínima presença de regularidades, portanto, há acumulação anterior,
transformação e acumulação posterior. Os exemplos dados como tangíveis, também possuem
indicação de processualidade, entretanto, tratam de identificar estruturas, etapas, enquanto os
processuais se sustentam na concepção do neurônio, dos sistemas cerebrais, dotados do poder
de avançar sobre situações mais ínfimas do processamento cognitivo traduzem explicita ou
implicitamente os processos cognitivos encarnados na materialidade cerebral.
O fluxo cognitvo entre sinapse e neurônios é incessante, assim, pensar em produto
cogntivo como algo finalizado é inconcebivel, o que existe são comportamentos adquiridos,
habilidades exercitadas e elaboração de representações, sempre em estado de deslocamento.
Este aspecto é pensado pelo viês das estruturas infimas da cognição, que partem das estruturas
existentes reagindo a eventos, porém, há outro aspecto, de ordem externa que se assenta sobre
essas estruturas: saberes culturais. Deste modo, há duas ordens de síntese cognitiva: a interna
alicerçada na estrutura mente-cérebro que possuimos e outra, de ordem cultural, mutável pelas
ideologias sociais. Esta última, mais especificamente, constitui-se nos modelos de
organização e na instituição de ensino-aprendizagem, desde as sistematizadas até as mais
desprovidas de conduta científica. Todos são os saberes culturais.
O aspecto do produto da cognição, os saberes, os conteúdos das metas dos sistemas de
ensino-aprendizagem, sofrem, desde os anos noventa, uma revisão de natureza estimulada por
avanços nos entendimentos do funcionamento do cérebro e a extensão do território da linguagem.
59
A prática de ensino sistematizado, a escola, passou a se preocupar com os fatores que não seriam
apenas os saberes culturais. Um dos indicadores dessa revisão, talvez o mais expressivo, encontra-
se na introdução da ideia de habilidades cognitivas.
A inteligência, termo compartilhado na literatura sobre cognição, cujo sentido
etimológico justifica a intersecção e sentido prático, tem conotação de produto, tem uma
singularidade desde a primeira metade do século vinte, que segundo Schelini (2006), data dos
estudos do psicólogo britânico Raymond Cattell, com a taxionomia de inteligência fluida e
cristalizada. As teorias de Cattel (datadas de 1941), complementadas pelos estudos de outros
dois psicólogos americanos, John L. Horn31
e John Bissel Carroll, foram sintetizadas por
McGrew e Flanagan em 1998, no denominando de Modelo CHC (Cattell-Horn-Carroll) sobre
a teoria psicológica das habilidades cognitivas humanas com vistas aos estudos de psicometria
da inteligência. Justifica-se esta breve introdução com o objetivo de contextualizar o conceito
de habilidades cognitivas e subentender as semelhanças de dualidade entre inteligência fluida
e cristalizada, estruturas e saberes.
Os testes de psicometria do CHC tem, na inteligência fluida, uma das camadas do
segundo substrato32
, é a capacidade de se adaptar e lidar com novas situações com
flexibilidade, sem a aprendizagem prévia o que é uma fonte de apoio importante para sua
manifestação. Está associada a componentes não-verbais, pouco condicionados aos
conhecimentos assimilados e da influência de aspectos culturais, pois está mais sob a
determinação dos aspectos biológicos (genéticos). Basicamente, configura as habilidades
principais de: indução, dedução e classificações de relacionamento figurativo, extensão da
memória associativa e velocidade intelectual, entre outros. A inteligência cristalizada é o
conjunto de recursos, estratégias e conhecimento, o que representa o nível de
desenvolvimento cognitivo alcançado através da aprendizagem da história do sujeito. Esta
consiste principalmente de habilidades relativas à compreensão verbal, estabelecendo relações
semânticas, de avaliação e de melhoria da experiência, o estabelecimento de juízos e
conclusões, o conhecimento mecânico ou de orientação espacial. A duas formas podem ser
entendidas sequecialmente como ação cognitiva e sintese cognitiva, a primeira pertencente ao
legado genético e a segunda ao contexto cultural do qual a linguagem verbal é o principal
expoente. Outra capacidade cognitiva que se apresenta nesse substrato é o processamento
31
Horn foi pioneiro na observação de múltiplas inteligências. 32
A teoria do CHC divide o fenômeno da inteligência, sob a meta da observação e mensuração em três camadas
(ou substrato) e estas em diferentes quantidades dos aspectos cognitivos.
60
visual, cuja condição ativa é pertinente para compreensão de uma cognição visual e seus
desdobramentos.
A ideia de múltiplas inteligências reaparece em Gardner (1994), porém com outra
classificação, subjugada por outros fins de análise e suporte teórico, valorando a idiossincrasia
genética e suas interdependências culturais. Gardner também determina uma inteligência para o
segmento visual, denominada por ele de inteligência espacial33. Para Gardner, as operações
visuais são, antes de tudo, operações espaciais, são todos os modos de compreender, classificar e
operar o fenômeno espacial, cuja percepção é o principal modo de processamento.
Gardner também propõe um conceito de habilidades, mas enredadas em classificações
como a Teoria do CHC. Suas ideias de habilidades mentais como processos singulares agem
isoladas ou agrupadas e as competências como a mobilização das habilidades valorizadas na
especificidade de cada grupo cultural com a meta intelectual. As habilidades estão para certa
verticalidade, enquanto as competências na horizontalidade e na valoração externa pelo grupo
social. Gardner parte de que todo indivíduo está numa condição capaz para desenvolver
habilidades, assim, compõe-se sob o olhar das categorias fenomenológicas uma tríade:
capacidade – a possibilidade de ser, habilidade – singular, dependente das relações de cada
contexto associadas à predisposição genética e, por fim, a competência, que apesar de individual,
oblitera para o plural pelo intento da mensuração. É notória a condição da habilidade como
potência de atrito, movimento, transformação.
As habilidades estão para as estruturas cognitivas pré-existentes numa imensa gama de
situações exercitáveis pelos inputs e os contextos culturais, como fontes de dados externos,
sujeitos a idealizações culturais para serem armazenados.
Para fins de compreensão, a cognição humana, em sua finalização palpável, apresenta
três possibilidades de produto: a instauração de regularidade, que se torna existente no âmbito do
exercício de habilidades (Inteligência fluida, habilidades cognitivas, habilidades mentais) e se
torna uma realidade na aquisição de conhecimento (inteligência cristalizada, saberes culturais,
âmbito das ideias). As habilidades estão sempre em situações proposicionais, na dependência de
algo para complementá-las.
2.3 - A cognição e aprendizagem
33
Tem-se criado, pelo menos em âmbito brasileiro, ligeiras discussões para separar essa visual de espacial,
porém, não se trata de verificar uma funcionalidade da experiência, mas de localização cerebral especifica
conforme Gardner (1994) afirma nos critérios de identificação das suas modalidades.
61
Urge uma separação, pelo menos no uso terminológico, entre cognição e
aprendizagem, apesar do largo uso com intenção de sinonímia. Redundando, a colocação
sobre cognição trata de um fenômeno que coincide com a evolução para o idealismo
objetivo34
, do estado de mente que o universo conspira, portanto, também é uma propriedade
humana encarnada nos neurônios e sinapses, aptos a desenvolver condutas e armazenar
eventos externos nas malhas da representação mental, a linguagem-pensamento. O termo
aprendizagem, variante do verbo aprender, literalmente traz a ideia de retenção de alguma
coisa, cuja prática está mais norteada por uma sistematização de apreender os saberes
culturais. Não se pode negar a condição cognitiva, mas culturalmente implícita nas intenções
exclusivamente externas. O uso terminológico, de aparência indiferente, sinaliza territórios
sutis, enquanto a cognição prevê um objeto cognitivo, a aprendizagem prevê conteúdos
reclamando tacitamente a ideia de receptáculo. São os resquícios behavioristas que ainda
circulam entre as nossas preocupações com a maturação humana.
Os saberes culturais organizados como conteúdos, objeto do psicólogo Cesar Coll
(1998) e parceiros, classificaram a tipologia dos conteúdos de aprendizagem do âmbito:
conceitual (e factuais), procedimental e atitudinal, demonstram uma preocupação com as
metas de aprendizagem: conhecimento, habilidades mentais (e motores) e comportamento.
Os conteúdos nominais são apresentados por Coll como conceituais e factuais, são intrínsecos
aos procedimentais e atitudinais, o que ocorre na prática é a priorização de um sobre outro,
como se pode verificar até mesmo em ações didáticas extremamente mecânicas, como na
concepção de educação bancária proposta por Freire (1983). As habilidades mentais precisam
da concretude nominal das coisas para atingir êxito. O caráter operacional da nominação
também se apresenta com níveis de distinção que Moretto (2010), entre alguns especialistas,
decompõe em: dados, informações e conhecimento. Para o autor: dado é signo ou conjunto de
signos com possibilidade de significados diversos, dependendo do contexto; a informação é
conjunto de dados organizados em sentença com significado lógico e o conhecimento é a
informação ou conjunto de informações das quais o sujeito se apropria, atribuindo-lhe
significado em sua estrutura cognitiva.
Apesar do foco no processamento computacional, é extensiva a proposta de Setzer
(2012) em vincular tal tríade, que depende da forma verbal, em dados com aspecto sintático,
informações com semântica e o conhecimento com aspecto pragmático. Dados são meras
34
Trata-se de uma doutrina da Filosofia de Peirce abordada na sequência capitular.
62
possibilidades, sujeitos a uma ordenação, a informação produz mais sentidos pela conexão
dos dados e o conhecimento permite a manipulação de informações.
Na primeira década do século 21, a rede pública de ensino de São Paulo, incumbida
de elaborar uma ferramenta de análise do desempenho da qualidade de ensino aprendizagem
desenvolvida na rede, constituiu um documento norteador com valoração da competência
leitora (SÃO PAULO, 2009), ou seja, a possível concretude indicativa do signo verbal como
modalidades estruturais da inteligência, pois expressam o que é imprescindível para
compreender ou deliberar sobre um problema. Este documento reafirmou nesse segmento de
ensino aprendizagem a presença de três termos: conteúdos, habilidades e competência
cognitiva.
Os conteúdos são os saberes culturais organizados em disciplinas, as habilidades
aparecem definidas como: “elas funcionam como indicadores ou descritores das
aprendizagens que se espera os alunos terem realizado no período avaliado.” (SÃO PAULO,
2009, p.14), e competências cognitivas como: “[...] as modalidades estruturais da inteligência,
ou melhor, o conjunto de ações e operações mentais que o sujeito utiliza para estabelecer
relações com e entre os objetos, situações, fenômenos e pessoas que deseja conhece” (ibid,
p.15). Diagramadas através de uma relação triádica, explicitada no capitulo anterior, as
competências sistematizadas em três grupos: GI presentacionais- competências para observar
sob a influência direta do pensamento piagetiano, GII relacionais – competências para realizar
e GIII operacionais – competências para compreender, são constituídas de grupo de verbos
que reforçam a cognição como fluxo. Porém, indaga-se, é um movimento de onde para onde?
Os pontos assertivos desses conceitos estão na ideia de habilidade como indicador de
competência, inclusive pela coerência de serem verbos, indicadores de ações mentais,
entretanto, evidenciam como as práticas que envolvem o fenômeno cognitivo, na ponta mais
extrema, tratamento ideológico cultural, a aprendizagem sistematizada por um agente,
enfatiza a arbitrariedade da representação como única fonte de conhecimento, além do estreito
conceito de competência.
Passa despercebido nessa orientação que o diagrama triangular tem uma relação
concêntrica, pois os grupos de competências apresentados demonstram a trajetória natural da
cognição: observação, relação, mediação. A arbitrariedade perpassa pelo concreto, cuja
visualidade se antecipa ao modo verbal. As práticas educacionais apenas esbarram em
soluções mais plausíveis com a naturalidade da cognição humana, tanto que o cotidiano do
ensino aprendizagem prega a automação e vem reconhecendo, há alguns anos, a preocupação
63
com novos objetos cognitivos, a equalização entre os saberes culturais e a exercitação de
conexões cérebro-mente.
Zaballa (1998), a partir da tipologia dos conteúdos de Coll (1998) e da análise de
sequência de conteúdos, propôs quatro modalidades organizativas educacionais e uma destas,
denominada de sequência didática ou de aprendizagem, apoiada no conceito de Zona de
desenvolvimento proximal de Vygotsky, traduz literalmente uma coerência com o fluxo
cognitivo. Não se trata de trabalho classificado sob o pensamento cognitivista, assim como se
trata de olhar de fora para dentro. Zaballa ordena as etapas em uma sequência a partir da troca
de posição de sujeitos: não de quem ensina, mas de quem aprende. Na realidade, sempre
haverá uma sequência didática, o que difere é a eficiência gerada pelas etapas de tratamento
do conteúdo, apresentadas de maneira singular neste estudo: a fase de sensibilização
(levantamento de conhecimento prévio, problematização); a fase dialógica (comparação,
inferência e checagem) e a fase conclusiva (sistematização e auto avaliação). A relevância de
Zaballa deve-se ao êxito da sequência de aprendizagem como guia de tratamento do objeto de
cognição que vem sendo discutido e praticado nas instituições educacionais, na demonstração
do fluxo cognitivo, embora não trate nominalmente da questão e valore o produto verbal da
cognição. A ideia da sequência didática está comprometida com a automação da
aprendizagem, com indivíduos que “aprendam a aprender”, portanto, parece no primeiro
momento obtuso no reconhecimento da excelência da nossa natureza cognitiva, mas na
realidade é uma retomada daquilo que a educação sistematizada abafou no afã behaviorista.
A proposta de sequências de conteúdos é distribuída dentro de sequência didática,
que se desenvolve de maneira espiralada, enquanto o primeiro se apresenta de modo linear,
denotando uma natureza frasal. A condição espiralada evoca uma aprendizagem de
habilidades, limitadas na sua totalidade pelo aparato cerebral, mas expansivas na exercitação.
As práticas de aprendizagem tateiam em fenômenos que se apresentam
aparentemente desconectadas, nos vãos entre teorias, pela vagueza de compreender a
cognição como fenômeno do signo e suas semioses, que elucidam estruturas, fluxos e
sínteses.
2.4 - A cognição visual
64
A discussão sobre a cognição sustentada na estrutura mais ínfima, ou seja, na
conduta de regularidade entre elementos A e B, implica três etapas: a insistência de repetição,
a identificação com pré-existentes e a mediação, como resultado da conexão A e B, portanto
C. É uma relação de continuum, descontinuum e novo continum, pois, algo que se repete é
aquilo que se apresenta à percepção pelo geral e não pelo particular; a junção do que se tem
com o que insiste implica a relação passado-presente e terá nova conduta. Essas etapas são
claramente sincretizáveis com o postulado de Hebb e com a Teoria do protoplasma de Peirce
(será abordado no próximo capítulo).
Pensando de modo mais internalizado, no aspecto do cérebro-mente, sob os temas de
investigação dos diversos momentos da Psicologia Cognitiva, tem-se a percepção, associações
decorrentes da memória e a aquisição da linguagem.
A ideia de representação, que acompanha substancialmente o Cognitivismo, aparece
como ideia de signo, mas não aprofunda níveis mais específicos do signo e tende a considerar,
do ponto de vista peirceano, o nível de lei do signo, o que predispõe a linguagem na ordem
exclusiva do modo verbal. Os estudos sobre os processos mentais superiores (percepção,
cognição, memória, linguagem) são focados como fatos distintos, ações mentais desatreladas
do processo de significação, mas estão numa relação de contiguidade, intrínseca, cuja
cognição é o esteio principal e acompanhar a obliquidade do signo a torna mais
compreensível.
Antecipando conceitos a serem apresentados no próximo capítulo, a cognição, como
processo de evolução do signo em direção ao arbitrário, é anterior à máxima de lei, que se dá
no modo verbal, também se observa que a consciência, como estado da mente, não atinge a
autorreferencialidade desprovida do modo verbal. Essas duas condições permitem interpretar
que há uma cognição visual que não perpassa pela mente autorreferente, não se traduz em
signo verbal e nem por isso é inexistente. Vejamos:
Figura - Composição abstrata: agrupamento por semelhança
Fonte: produção do autor
65
A leitura da imagem acima está apta a produzir efeitos de uma cognição visual e
verbal. O olhar pode produzir traduções nominais para as cores, talvez as formas, de acordo
com a experiência, a língua, mas há outra força atuando, o agrupamento por semelhança de
cor e formato, sujeito a criar atração ou refutação, de acordo com a experiência. Entretanto, o
primeiro efeito está sujeito aos saberes culturais e o segundo está para o exercício das
habilidades contidas no aparelho receptor. Mas, certamente, o domínio nominal sobre essas
práticas das habilidades elevará a condição na consciência para a autorreferência, o que
melhor facilitará a compreensão dos mecanismos que envolvem a leitura e produção de
linguagem visual. Essa acessibilidade, que o modo verbal dá às organizações da percepção
visual, é a fundação do processo denominado “alfabetização visual”, cuja ineficácia
terminológica será debatida nos estudos de linguagem visual a serem abordados no capítulo 4.
Essa condição impalpável da consciência destituída de autorreferencialidade faz com que o
tratamento da linguagem visual adquira erroneamente a sensação de algo áurico, artístico e
contemplativo.
O modo visual e verbal presente nas estruturas cognitivas superiores reflete duas
naturezas evolutivas decorrentes de estruturas cognitivas orgânicas: a orientação espacial e a
arbitrariedade necessária para a vida social.
Retomando a ideia de externalidade, internalidade e fluência do fenômeno cognitivo,
resta avançar na base eficiente para contemplar esse conjunto: uma Teoria do signo, mas uma
teoria abrangente das mais diversas formas de linguagem, com malhas permissíveis de
compreender os mais ínfimos processos cognitivos. Eis Charles Sanders Peirce.
66
CAPITULO 3 – PRINCÍPIOS SEMIÓTICOS DA COGNIÇÃO
No bojo da discussão cognitiva, conforme antecipado no capítulo anterior, não há
outro caminho que não seja o suporte de uma ciência dos signos, pois o processo cognitivo
prima pela natureza mediada entre existentes, ou seja, estruturas possíveis de se afetarem
entre si e, consequentemente, provocarem algum tipo de transformação. É um processo
arquitetado na trilogia intrínseca ação, reação e mediação, portanto não existe se não houver o
terceiro elemento, o signo. A importância deste capítulo não está atrelada apenas à
apresentação da teoria do signo, mas a uma sequência de doutrinas que constituem a filosofia
de Peirce enquanto respostas a lacunas, neste caso, para o fenômeno da cognição, linguagem e
percepção.
Neste sentido, a Semiótica, “como ciência que tem por objeto de investigação todas
as linguagens possíveis, ou seja, que tem por objetivo o exame dos modos de constituição de
todo e qualquer fenômeno como fenômeno de produção de significação e de sentido”
(SANTAELLA, 2007, p.15), propõe fundamentos teóricos para compreender o processo de
mediação estabelecido pelo signo. É senso comum o fato de que a ciência dos signos foi
pensada por dois pioneiros quase contemporâneos, desconhecidos entre si, oriundos um do
campo da linguística e outro da Filosofia. Com metas distintas de estudo, Ferdinand Saussure
(1857-1913) e Charles Sanders Peirce (1839-1914) foram um marco nos estudos sobre o
signo.
O legado de Saussure, sistematizado pós-morte, trouxe a concepção de um signo
diádico, uma lógica binária, significante e significado, uma imagem acústica que se liga a um
conceito na mente do intérprete. Focado na compreensão social da língua, esse modelo
apresenta como significado o conjunto de conceitos arquivados em nossa mente e como
significante a imagem acústica e psíquica da palavra, ambos os aspectos são inseparáveis. A
sistematização dicotômica e centralizada no modo verbal reduz a significação à esfera de
representações arbitrárias, potencialmente simbólicas, esgotando outros níveis de
compreensão da linguagem. Mesmo com a extensão das ideias de Saussure em Louis
Hjelmslev (1899-1965), Roland Barthes (1915-1980), Algirdas J. Greimas (1917-1992), entre
outros, o tratamento dos signos visuais tendem a processos nominais que estabeleceram a
concepção que a apreensão do mundo visual é sempre mediada pela palavra. A base do
pensamento de Saussure, as leis da semiologia, se dá sobre o estudo da língua, uma parte do
67
fenômeno da linguagem, consequentemente, a teoria abarca apenas o objeto em que se
debruça. A dependência do significante e do significado à condição mental, também, reduz a
ação sígnica à ocorrência exclusiva do maquinário humano, ou seja, não a desloca como
fenômeno para além da condição antropocêntrica.
Sobre o pensamento de Peirce: “Logic, in its general sense, is, as I believe I have
shown, only another name for semiotic (σημειωτική), the quasi-necessary, or formal, doctrine
of signs.” (CP 2.227) O objeto dos seus estudos dirigia-se ao desenvolvimento da lógica e,
para tanto, engendrou um sistema filosófico original. A Semiótica proposta por ele contém
elementos teóricos para o estudo da cognição visual. Ao investigar a questão cognitiva como
fenômeno semiótico, não pode se incorrer em erros como adverte Santaella (2008, p.94):
Infelizmente, os conceitos semióticos de Peirce costumam ser simplificados
e repetidamente reduzidos à famosa tríade dos ícones, índices e símbolos até
o limite da esterilidade. Isso se dá porque são comumente ignorados os
propósitos filosóficos e cognitivos desses e outros conceitos, assim como de
suas inseparáveis inter-relações.
Portanto, para se fazer a ponte dos signos para os consequentes processos cognitivos
que eles acionam, devemos tomar como ponto de partida sua fenomenologia, uma quase
ciência que está na base de todos o seu edifício filosófico e, especialmente, de suas definições
e classificações de signos.
A Fenomenologia ou Farenoscopia35
é a primeira divisão da Filosofia que deve
trazer no seu bojo a potência hipotética de extrair dos fenômenos seus traços formais mais
universais. Peirce (CP.1.284) assim a define: “Phaneroscopy is the description of the
phaneron; and by the phaneron I mean the collective total of all that is in any way or in any
sense present to the mind, quite regardless of whether it corresponds to any real thing or not.”
Portanto, fenômeno é qualquer coisa de qualquer espécie que se apresenta na experiência,
afetando a mente. A passagem a seguir complementa a explicação.
What I term phaneroscopy is that study which, supported by the direct
observation of phanerons and generalizing its observations, signalizes
several very broad classes of phanerons; describes the features of each;
shows that although they are so inextricably mixed together that no one can
be isolated, yet it is manifest that their characters are quite disparate; then
proves, beyond question, that a certain very short list comprises all of these
broadest categories of phanerons there are; and finally proceeds to the
laborious and difficult ask of enumerating the principal subdivisions of those
categories. (CP 1.286)
35
Nomenclatura dada por Peirce a partir do termo grego φανερός, phaneros - visível.
68
A tarefa da fenomenologia é lidar com os infindáveis fenômenos, observá-los para
generalizá-los em suas grandezas, discerni-los e submetê-los a um número reduzido de
categorias fenomenológicas, pois, caso contrário, se não houvesse algo de universal nelas, se
fossem uma constante relação de fatos díspares, não haveria modo de sistematizá-los. Após
exaustivas pesquisas e de análises empreendidas por Peirce, ele chegou a três elementos
formais onipresentes em todo e qualquer fenômeno: primeiridade, secundidade e terceiridade.
Um modo de compreender a categoria da primeiridade é a condição de
imediaticidade, o momento presente, em que não há nada de anterior, nem posterior ao
fenômeno, só ele, nele mesmo. O que se tem aí é a mônada, qualidade de sentimento, um
universo de meros possíveis. Na categoria da secundidade, o termo usado por Peirce para
referenciá-la, struggle, é bem elucidativo: é a categoria do conflito, da insistência, da
polaridade da consciência (o “eu” e “não eu”), do aqui e agora. Dotada de um princípio dual,
é a monada que se individualiza, é a força bruta.
Ao afirmar que “it is impossible to resolve everything in our thoughts into those two
elements [of Firstness and Secondness].” (CP 1343), Peirce atenta para a terceira categoria. A
natureza fundamental desse modo de ser é a mediação: “Thirdness, in the sense of the
category, is the same as mediation” (CP 1.328). É o que faz o elo entre o primeiro e o
segundo, é o liame inteligível da ação e reação da causa bruta. Conforme comentam Merrel e
Queiroz (2008, p. 293) “a terceiridade inclui ‘mediação’, ‘transformação’ e ‘evolução’,
‘crescimento vital’ [...]. Esta categoria tem sua ‘força motriz’ nos hábitos, leis, e
regularidades”, ou seja, são atributos que implícitam o processo de mediação. Esta sucinta
apresentação das categorias é a porta de entrada para compreender um universo fenomênico
que evolui para a condição da mediação.
3.1 - A realidade do mundo
Segundo Ibri (1992), para Peirce, no aspecto mais metafisico, o mundo que nos
aparece também se sujeita às categorias: o Acaso, a Existência e a Lei. “Acaso, então, como
um fenômeno objetivo, é a propriedade de uma distribuição. Suponha-se uma grande coleção
consistindo, digamos, de coisas coloridas e coisas brancas. Acaso é a maneira particular de
69
distribuição de cores entre todas as coisas” (PEIRCE CP 6.30 apud IBRI, 1992, p.40). Já na
probabilidade há existentes, que agem sobre outros (CP 8.191), modos de resistir (CP 1.457)
que estão sujeitos à indeterminação de possíveis relações. A terceira categoria, como
mediação, se apresenta na generalização dos existentes, estabelecendo uma Lei sobre aquilo
que for regular entre os existentes, capaz de criar uma determinação, também sujeita a um
confronto de outro existente irregular que a torne falível. Neste sentido, Peirce introduziu a
doutrina do falibilismo “é a doutrina de que nosso conhecimento nunca é absoluto, mas é
como se sempre flutuasse em um continuum de incerteza e indeterminação” (CP 1.171 apud
IBRI, 1992, p.52). Essa condição é a matriz evolucionista que predispõe o fluxo de
crescimento e que desenvolve, no campo epistemológico, o conhecimento humano.
A concepção de continuum de Peirce predispõe todas as coisas, do pensamento e da
matéria, a um fluxo incessante: “Nature only appears intelligible so far as it appears rational,
that is, so far as its processes are seen to be like processes of thought” (CP 3.422). Este
argumento vai se correlacionar com seu amplo conceito de mente, cuja inteligibilidade não é
particularidade humana: “The old dualistic notion of mind and matter, so prominent in
Cartesianism, as two radically different kinds of substance, will hardly find defenders to-day.
Rejecting this, we are driven to some form of hylopathy, otherwise called monism” (CP 6.24).
O pensamento de Peirce nega a dualidade cartesiana, o logocentrismo que insuflou o
pensamento ocidental, ao propor sobre outras bases a recuperação do conceito de mente, um
estado inteligível, presente existente em toda e qualquer matéria.
[...] Then the question arises whether physical laws on the one hand and the
psychical law on the other are to be taken - (a) as independent, a doctrine of
ten called monism, but which I would name neutralism; or, (b) the psychical
law as derived and special, the physical law alone as primordial, which is
materialism; or, (c) the physical law as derived and special, the psychical
law alone as primordial, which is idealism. (CP 6.24)
Peirce define a matéria também como mente, porém exaurida, confinada a hábitos
inveterados. A mente se define como estado de mediação, que vai desde os mais rudimentares
aos mais complexos. Assim, o conceito de mente unifica os aspectos pensamento-matéria cujo
esteio está no princípio de continnuum. “Por isso, postulou também a continuidade entre o
físico e o psíquico na similaridade que estes exibem, embora com diferenças de frequência e
intensidade, nos seus modos de acolher a mudança e o devir.” (SANTAELLA, 2007 p. 147).
É possível imaginar um diagrama para ilustrar o fato:
70
Figura 5 - Diagrama sobre a fluência matéria-mente
Alguns exemplos de hábitos e quebra de hábitos como: um meteorito que vagueia no
espaço, numa trajetória determinada por leis de gravidade de um conjunto de corpos celestes
(mediação de um terceiro), está na condição de hábito inveterado, obviamente que sujeito a
uma ruptura gerada por qualquer instabilidade que afete a mediação existente; a planta que
cresce esguiamente para adquirir maior luminosidade solar; as formigas que têm seu caminho
interrompido ao levarem resíduos de folha para o formigueiro por algum odor que interfira na
comunicação estabelecida pelos seus feromônios; refeições com certos tipos de alimentos em
detrimentos de outros, demonstram níveis de hábitos e uma possível constância que pode ser
cortado por rupturas.
If I may be allowed to use the word “habit,” without any implication as to
the time or mannerin which it took birth, so as to be equivalent to the
corrected phrase “habit or disposition,” that is, as some general principle
working in a man’s nature to determine how he will act, then an instinct, in
the proper sense of the word, is an inherited habit, or in more accurate
language, an inherited disposition. But since it is difficult to make sure
whether a habit is inherited or is due to infantile training and tradition, I shall
ask leave to employ the word “instinct” to cover both cases. (CP 2.170)
Peirce apresenta a ideia de hábito distinguindo a condição de algo herdado,
predisposição, instinto, daquilo que é adquirido e capaz de guiar ações. Nesse caso, as
condutas estabelecidas na mais tenra idade ainda são hábitos e diferem daquilo que já estava
na natureza do existente. Enquanto a distinção de hábito e predisposição atendem à visão mais
metafisica, o termo crença presta-se mais ao universo epistemológico: “Belief is not a
momentary mode of consciousness; it is a habit of mind essentially enduring for some time,
and mostly (at least) unconscious; and like other habits, it is (until it meets with some surprise
that begins its dissolution) perfectly self-satisfied” (CP 5.417). Mais: A crença não nos faz
agir imediatamente, mas coloca-nos numa posição em que nos comportaremos de certa forma,
quando surge a ocasião” (PEIRCE, 1987, p 3). Está no cerne do conceito de hábito a noção de
conduta de ação, mesmo quando se trata de crer em uma concepção.
O objetivo das discussões até aqui foi de apresentar suscintamente conceitos mais
amplos de Peirce que permitem se perceber as bases cognitivas de sua filosofia, a principal
71
delas a lei da mediação que torna o mundo cognoscível. Através da mediação, o universo de
variáveis - continuum - gerais, tem singularidades generalizadas que se tornam concebíveis.
3.2 - A teoria do signo
A semiótica ou lógica é a terceira das três ciências normativas e que, seguindo as
categorias, seriam responsáveis pela evolução do sentimento, da ação e do pensamento
humanos: a Estética, a Ética e a Lógica. Esta última, como investigação da verdade, retomará
a Ética, não no sentido do bem e do mal, mas na condição que temos para adotar e aprovar um
ato moral. Mas a Ética encontra seu fim último na Estética, como provedora do admirável que
atrai o sentimento humano sem qualquer razão ulterior. Para ficarmos apenas na lógica, esta
encontra sua base na concepção do signo.
A minha definição de signo é: Signo é um cognoscível, que, de um lado, é
assim determinado (isto é, especializado, bestimmt) por algo diverso dele,
chamado seu objeto, enquanto por outro lado, ele próprio determina uma
Mente existente ou potencial, determinação essa que denomino o
Interpretante criado pelo Signo, i e onde essa Mente Interpretante se acha
assim determinada mediatamente pelo Objeto. (PEIRCE, 1983, p. 121)
O representamen é o primeiro que intenta representar algo, seu objeto. Por isso é
signo, por estar no lugar de uma outra coisa, o objeto. Este é a causa ou determinante do signo
que, por sua vez, produz um efeito em uma mente que Peirce chama de interpretante. O signo
em si mesmo, naquilo que lhe dá fundamento para funcionar como signo, pode ser um
qualisigno – o elemento qualitativo de alguma coisa, um tom, um som, um cheiro; pode ser
um sisnsigno, um existente no tempo e espaço; por fim legisigno – é uma lei, que só pode
atuar como signo quanto se encarna em um sinsigno de tipo especial, ou seja, uma réplica.
O objeto do signo tem dois níveis, um interno ao signo, o outro externo a ele, a saber,
o objeto imediato e o dinâmico. Enquanto este determina o signo, deve haver dentro do signo,
em si mesmo, algo que possa estabelecer algum tipo de relação com o objeto externo que o
determina. Na relação que o qualisigno mantém com o objeto ele é chamado de ícone, o
sinsigno de índice e o legisigno de símbolo. O interpretante do signo, que não pode ser
confundido com intérprete, é o efeito que o signo produz numa mente. Este se desdobra em
três níveis: imediato (potencialidade de produzir um efeito), dinâmico36
(efeito efetivamente
produzido a mente) e final (efeito que o signo deveria provocar no longo curso do tempo).
36
As divisões do interpretante dinâmico são: emocional, energético elógico.
72
Os interpretantes finais, remático, dicente e argumento, são respectivamente o tipo
de efeito que o qualisigno provocará, ou seja, uma conjectura, uma hipótese, o rema, o efeito
que o sinsigno provocará, a saber, uma proposição verdadeira ou falsa, um dicente, e, por fim,
o efeito do legisigno, um argumento.
Considerando esses três níveis do signo: qualisisgno, sinsigno, legisigno – ícone,
índice, símbolo – remático, dicente, argumento, Peirce estabeleceu as dez classes de signos37
(fig. 6), entretanto a totalidade de níveis obtém sessenta e seis classes.
Figura 6 - Trecho do manuscrito de Peirce para as dez classes de signo
Fonte: (MS 540.17 disponível em
http://www.cspeirce.com/backgrnd/backgrnd/MS540-17.jpg )
As dez classes de signos não se apresentam como uma simples taxonomia, mas como
princípios de compreensão dos percursos da semiose, de possibilidades de processos
cognitivos. O signo legítimo, que é aquele expoente máximo de um fenômeno de mediação, é
o nível máximo de abstração que se dá no nível do legi-simbolo-argumental. As demais
classes decrescem, ou usando o léxico peirceano, degeneram em direção à primeiridade,
quali-ícone-remático que, neste nível, tem a função de apresentar e não a de representar, pois
qualidades só se apresentam, sem poder de representação. Elas só podem estabelecer
semelhanças com possíveis objetos, devido à sua potência qualitativa. Desse modo, o caráter
monádico da qualidade não estabelece referência, mas se abre à contemplação. A função
indicativa do signo se instala a partir da atuação da indexicalidade, enquanto a função
representativa se instaura apenas no legisigno simbólico argumental. O quadro abaixo (Figura
7) pode esclarecer melhor essas relações.
Figura 7 - Agrupamento por predominância da semiose
37
Queiroz (2007) observa os textos mais centrais em que Peirce desenvolveu a ideias das categorias, fase
iniciada em 1867, registrado em “On a New List of Categories” e “On the Algebra of Logic”, e outra em 1903,
apontada no “Syllabus of CertainTopics of Logic”. Nesta ultima Peirce introduziu as tricotomias mais
conhecidas e as dez classes de signois.
73
REPRESENTAMEN OBJETO REMÁTICO
Qualisigno icônico remático
Sinsigno icônico remático
Sinsigno indicial remático
Sinsigno indicial discente
Legisigno icônico remático
Legisigno indicial remático
legisigno indicial discente
legisigno simbólico remático
legisigno simbólico indicial
legisigno simbólico argumental
Legenda:predominância da semiose no nível da primeiridade,predominância da semiose no nível da
secundidadepredominância da semiose no nível da primeiridade
Fonte: adaptação do diagrama de Peirce para as classes de signo ( disponível em
http://www.cspeirce.com/backgrnd/backgrnd/MS540-17.jpg )
3.3 - Os tipos de raciocínio
A Lógica ou Semiótica também apresenta subdivisões: a gramática especulativa
(teoria dos signos), a lógica crítica e a Metodêutica38
. Para o discurso sobre cognição proposto
para este estudo, a lógica crítica é, para nós, o ponto final desta síntese. Enquanto a gramática
especulativa estuda a classificação dos signos, a lógica crítica analisa os níveis de raciocínio: :
a abdução, a indução e a dedução:
Abduction is the process of forming an explanatory hypothesis. It is the only
logical operation which introduces any new idea; for induction does nothing
but determine a value, and deduction merely evolves the necessary
consequences of a pure hypothesis. Deduction proves that something must
be; Induction shows that something actually is operative; Abduction merely suggests that something maybe. (CP 5.171)
Enquanto os estudos sobre tipos de inferência que ocorrem no segmento da Filosofia
estabelecem a indução (premissas particulares geram uma premissa geral) e a dedução
(premissas gerais encapsulam premissas particulares), para atender a indagações sobre os
efeitos práticos de um conceito, na constituição da soma total do conceito39
, fundado nas
categorias fenomenológicas, Peirce propôs três tipos de raciocínio, ou seja, acrescentou aos
dois anteriores a questão da abdução, que está na formação da hipótese. Na inferência
abdutiva, nada estaria em nosso intelecto que não passasse primeiro pelos sentidos. Estes são
os filtros sensórios ligados à mente, na qual os processos cognitivos são acionados.
38
A metodêutica é a teoria do método científico, decorrente da interrelação dos tipos de raciocínio. 39
Esse evento decorreu na série de palestras que Peirce realizou em Havard, em 1903, a convite de William
James
74
3.4 - Questões sobre a cognição
O objetivo deste capítulo, ao apresentar parcial e sinteticamente o legado peirceano,
é apresentar dados que agora serão retomados para a abordagem da cognição na linguagem
visual. Os estudos de Peirce para a cognição começam a partir dos textos publicados entre
1868 a 1869, no The Journal of Speculative Philosophy: “Questões Referentes a Certas
Faculdades Reivindicadas pelo Homem” (CP 5.213-63), “Algumas Consequências das Quatro
Incapacidades” (CP 5.264-317) e “Fundamentos para a Validade das Leis da Lógica: Outras
Consequências das Quatro Incapacidades”. (CP 5.318-57), um conjunto de ensaios
conhecidos como “cognition series” e anti-cartesianos. A base da Filosofia de Peirce é,
portanto, uma filosofia da cognição, esta baseada em signos.
Enquanto a tradição dos estudos sobre a cognição40
partem sempre do sujeito, a
originalidade peirceana encontra-se em centrar os processos cognitivos no signo. A cognição
no sentido mais amplo está fundada na categoria da terceiridade, a mediação entre os
existentes, e, no sentido mais operativo, em termos da perspectiva ensino-aprendizagem, nos
tipos de inferência, portanto a Semiótica é de natureza essencialmente cognitiva.
No texto para o “The Monist” (CP, 6.238) Peirce desenvolveu a doutrina sinequista
(Continuum), da continuidade entre os aspectos físicos e mentais que consequentemente lança
luzes sobre o problema mente-corpo. Na análise da constituição da matéria e da teoria
molecular do protoplasma, a tríade no mundo fisiológico, Peirce associou as principais
características físicas de protoplasma com os três principais tipos de ação mental:
As funções do Sistema Nervoso são três, correspondentes às três classes de
consciência. São primeiro, a Irritabilidade, já que a capacidade de uma
célula nervosa para entrar em condição de excitação é indubitavelmente a
base fisiológica da sensação; segundo, o poder de transmitir perturbações
nervosas às fibras nervosas, já que é por essa propriedade dos nervos pela
qual estamos em relação com o mundo exterior; e terceiro, o poder de
adquirir hábitos, que é a base da nossa capacidade de aprender. As
propriedades do protoplasma em geral são três, primeiro, sua capacidade
entrar em um estado mais líquido e tem ao mesmo tempo uma coesão mais
forte e uma tensão na superfície; segundo, a tendência dessa condição de
estender-se por toda a massa; e terceiro, seu poder, quando entra e sai dessa
condição, de assimilar nova matéria, sempre que estase apresente de tal
modo que está sujeita às mesmas forças que produzem o transtorno, em
outras palavras, o poder de crescimento como é tudo o que isso implica. (CP
6.133).
40
Piaget e Vygotsky, mais recentes, Ausubel e Gardner, são os autores que estão na base das orientações do
pensamento educacional brasileiro
75
A conduta “entrar e sair”, “de assimilar nova matéria”, que Peirce identifica como
terceiro, uma generalização, é uma extensão do sinequismo. O universo flui para o
desenvolvimento de hábitos. Estes são processos de regularidade em um universo de
particulares: “The most important operation of them is that of generalization” (CP 1.82).
Onde há hábito, há mente, há generalização operacional concreta e abstrata: “The intimate
connection between generalization and continuity is to be pointed out” (CP 184).
O processo imprescindível para a mediação é a transposição do singular em
generalização, uma conduta operante entre mentes, pois, caso contrário, um universo de
singularidades não estabeleceria conexões, consequentemente condutas. Destarte, a mediação
(cognição) é um fenômeno do continuum, condição que reclama para si um “antes”, “agora” e
“depois”. Ao transpor para a semiose humana, a processualidade cognitiva estará sempre
atrelada à cognição anterior para subsidiar cognições posteriores.
Na série de texto, sistematizados como “A Guess at the Riddle”, a referência sobre a
tríade na psicologia, Peirce faz considerações à cognição iniciando pelos tipos de consciência:
It seems, then, that the true categories of consciousness are: first, feeling, the
consciousness which can be included with an instant of time, passive
consciousness of quality, without recognition or analysis; second,
consciousness of an interruption into the field of consciousness, sense of
resistance, of an external fact, of another something; third, synthetic
consciousness, binding time together, sense of learning, thought.(CP 1.377)
Sobre essa tríade, Peirce (CP 3.778) segue relacionando-as às três formas da lógica:
qualidade, relação e síntese. Nesta última se justifica a mediação na consciência plural,
processual e o sentido de aprendizagem. Aparentemente, a primeira consciência, dada sua
imediaticidade, não tem nada que a guie. O segundo estado interrompe o imediato para torná-
lo pretérito, a consciência reativa. A polaridade das reações em um traço de regularidade
predispõe aos processos associativos e, por fim, segue a equalização. Queiroz (2001) fornece
termos (Figura 8) que definem as três formas de consciência.
Figura 8 - propriedades associadas às três categorias
Consciência de
Primeiridade ou monádica
Consciência de Secundidade
ou diádica
Consciência de Terceiridade
ou triádica
Feeling, não-análise, não-
comparação, instante, sem
partes, simples, qualidade
possibilidade
Experiência, hard fact
oposição, esforço, ocorrência
nowness, resistência, hereness
volição, dualidade
Representação, mediação,
processo, cognição, hábito,
generalidade, continuidade,
crescimento, difusão, semiose
Fonte: QUEIROZ, J. (2001, p 215)
76
Peirce, na sequência daquilo que funda seu pensamento, as estruturas lógicas, propõe
duas subdivisões para a consciência polar:
Note, too, that just as we have seen that there are two orders of Secondness,
so the polar sense splits into two, and that in two ways, for first, there is an
active and a passive kind, or will and sense, and second, there are external
will and sense, in opposition to internal will (self-control, inhibitory will)
and internal sense (introspection). In like manner, just as there are three
orders of Thirdness, so there are three kinds of synthetical consciousness.
(CP 1.383)
A consciência, como o princípio de alteridade “eu-não eu”, reativa, que reúne sentido
e volição, da ação e reação, passivo e ativo, é uma consciência polar. No nível da
inteligibilidade, a consciência sintética apresentará duas formas de associação por
contiguidade e similaridade. Nas palavras de Peirce (apud JORGE, 2014 p. 81): “Por outro
lado, a associação, ao invés de ser uma disposição natural da mente, pode ser um hábito
adquirido da mente. Isso faz supor que ideias semelhantes tenham sido unidas na experiência
até que elas tenham se tornando associadas. Isto é chamado de associação por contiguidade.”
A contiguidade se estabelece na mente pela experiência que “é o elemento imposto
pela história de nossas vidas” (CP 5.581). Ela é guiada por um poder. A similaridade é guiada
por forças internas. Ao esboçar os níveis de consciência sob o viés peirceano, com vistas a
compreender as instâncias da cognição, dois conceitos insistem: a percepção e a memória. A
percepção está para a secundidade, assim como a cognição está para a terceira categoria.
Inserir a memória na secundidade é fato a ser visto com parcimônia. Sobre a percepção,
Peirce argumenta:
Nada podemos saber sobre o percepto a não ser pelo testemunho do
julgamento de percepção, exceto o fato de que nós sentimos o golpe do
percepto, a reação dele contra nós, assim como vemos os conteúdos dele
arranjados num objeto, na sua totalidade – executando-se também,
certamente, o que os psicólogos são capazes de extrair inferencialmente.
Mas, no momento em que fixamos nossa mente sobre ele e pensamos sobre
o menor detalhe dele, é o juízo perceptivo que nos diz o que nós assim
percebemos. Por esta e outras razões, proponho considerar o percepto, tal
como ele é imediatamente interpretado no juízo perceptivo, sob o nome de
percipuum. (CP 7.643 apud SANTAELLA, 2012, p. 92-93)
Os três níveis do processo perceptivo estão postos: o percepto, percipuum e juízo
perceptivo. Não há outro modo de traduzirmos o percepto que não seja pela generalidade
empírica pré-existente no juízo perceptivo (o signo), essa tradução se dá do seguinte modo:
objeto dinâmico (o percepto), o percipuum (objeto imediato) estabelecerá aquilo que é
77
singular para a confirmação e julgamento perceptivo (asseveração sobre aquilo que é
percebido, o percepto) (Figura 9). As generalidades funcionam nas extremidades categoriais,
o percepto e “juízo perceptivo” ou “Asseveração”. A passagem do objeto dinâmico (percepto)
pelo imediato (percipuum) até o juízo perceptivo equivale a um filtro equalizador, de
confronto, entre o pré-existente e o novo insistente.
Figura 9 - Semiose perceptiva
Fonte: adaptação de Santaella, 2008
A cognição se manifesta nas estruturas mais ínfimas [...] For reaction is existence
and the perceptual judgment is the cognitive product of a reaction (CP 5.156), o julgamento
está tanto na recepção do estímulo como na finalização. Outra afirmação de Peirce é que toda
cognição é guiada por uma cognição anterior, assim surge a questão do preexistente, daquilo
que é pretérito para uma experiência, a conduta interrompida e regenerada em novo hábito.
Disso se infere que a mente é dotada de condições preexistentes (os órgãos sensoriais e os
esquemas mentais) e os hábitos já instaurados seriam o equivalente à memória.
Were member it [sensation]; that is to say, we have another cognition which
professes to reproduce it; but we know that there is no resemblance between
the memory and the sensation, because, in the first place, nothing can
resemble an immediate feeling, for resemblance supposes a dismemberment
and recomposition which is totally foreign to the immediate, and in the
second place, memory is an articulated complex and worked-over product
which differs infinitely and immeasurably from feeling. (CP 5.379)
Na própria sensação, tem-se algo de cognitivo funcionando para o processo de
mediação. O sentir, que está na base de qualquer tipo de consciência, traz sempre presente
algum nível de cognição (CP 1.381). Observando a ideia original:
Here then, we have indubitably three radically different elements of
consciousness, these and no more. And they are evidently connected with the
ideas of one-two-three. Immediate feeling is the consciousness of the first;
Signo
Juízo perceptivo
Objeto dinâmico Percepto
(externo a nós)
Objeto Imediato - Percipuum (corretivo)
Asseveração do
Juízo perceptivo
1
2 3
78
the polar sense is the consciousness of the second; and synthetical
consciousness is the consciousness of a third or medium. (CP 1.382)
Brunson (2007) faz asserções sobre o conceito de memória na obra de Peirce. Ao
inventariar a relação do conceito com o pragmatismo, observa a tendência sinequista do
conceito, a generalidade presente tanto na precedência como na conduta. Nas semioses
perceptivas “…every memory of a sensation is more or less vague, that is, general” (CP
7.407), nos níveis de pretérito da consciência, na anterioridade da cognição, assim como se
expande na inteligibilidade provocada pela mediação.
Pragmaticism consists in holding that the purport of any concept is its
conceived bearing upon our conduct. How, then, does the Past bear upon
conduct? The answer is self-evident: whenever we set out to do anything, we
"go upon," we base our conduct on facts already known, and for these we
can only draw upon our memory. It is true that we may institute a new
investigation for the purpose; but its discoveries will only become applicable
to conduct after they have been made and reduced to a memorial maxim. In
short, the Past is the storehouse of all our knowledge. (PEIRCE, 2013, p
123)
A memória é o hábito adquirido, que oferece certa condutibilidade à sensação e à
consciência. É o potencial das nossas experiências acumuladas a guiarem nossos
pensamentos, é uma substância sob a constante ação da cognição. Tendo em vista que todas as
experiências podem ser submetidas à classificação das categorias, cabe uma contextualização
fenomênica das relações entre: percepção, cognição, memória e consciência.
A condição que reveste a percepção de primeiridade é indubitável, assim como a
cognição de uma terceiridade. A consciência no seu ímpeto de alteridade, a memória, na sua
condição pretérita, assume a secundidade, mas, enquanto geral, como vago material do juízo
perceptivo e hábito adquirido, está na primeiridade e na terceiridade.
Entretanto, não se trata de locar conceitos numa ou outra categoria, pois, conforme
foi explicitado até o momento, existe algo de cognitivo desde o julgamento perceptivo até as
esferas da consciência sintética, os processos de cognição em desenvolvimento dependem de
experiências pretéritas e presentes. A simples taxonomia pode ser estática, portanto é viável
como esses aspectos se comportam frente às propriedades de cada categoria (Figura 10).
Figura 10 - Relações categoriais
FEELINGS ALTERIDADE MEDIAÇÃO
PERCEPÇÃO Juízos perceptivos Objeto Asseveração
79
CONSCIÊNCIA Imediata Polar Sintética por
associação similar ou
contigua
MEMÓRIA Latente Referencial Condutora
COGNIÇÃO Vagueza Concreta Operativa
Para verificar a sistematização, é prudente contextualizar a partir de um fato
concreto, singular, um possível gerador indutivo, que possa dar pistas. Cientes de que os
termos traduzem fenômenos de natureza para além do caráter antropocêntrico, segue a análise
de um processo de aprendizagem sem o predicativo ensino, pois se assim fosse supõe a
análise de dois sujeitos: cognoscente e mediador.
Numa determinada turma de adolescentes na faixa de 14 anos, foi dado o conteúdo
de planificação de um cubo. (a) O contato inicial dos alunos com o objeto de aprendizagem
foi através de desenho de um cubo em perspectiva (forma bidimensional dando ilusão de
tridimensional) apresentado na lousa com giz branco, somado à mediação verbal do professor:
explicação do significado da palavra planificação. (b) Alguns alunos logo inferiram e, como a
resposta deveria ser dada através de um esboço gráfico, apresentaram desenhos com apenas
quatro faces. (c) Diante da lacuna foi retomado o desenho do cubo como se fosse um dado,
portanto, foram apontados os números de cada face de um dado para as faces aparentes,
exceto duas ausentes pela representação gráfica. (d) Alguns alunos realizaram autocorreção e
outros conseguiram rascunhar atendendo às expectativas. Porém, um número bem menor
ainda não compreendia a quantidade de faces necessárias para atender à ideia de planificação.
(e) Foi apresentada uma caixa de papelão aberta na frente dessa minoria, depois conseguiram
compreender a planificação, mas, houve um caso, que ainda estava ineficaz, e (f) o
cognoscente só conseguiu avançar após, linearmente, tocar face após face da caixa, montá-la e
desmontá-la duas vezes.
Figura 11 - Simulação das etapas das atividades de planificação do cubo
A.
B.
C.
D. E. F.
80
Do ponto de vista da percepção, os perceptos centrais desse contexto, as formas de
estímulos, que foram apresentados com o intuito de ponto de partida do processo de cognição,
referem-se aos conteúdos e expectativa de aprendizagem a serem alcançados (produto
cognitivo). Estes foram aqueles que mobilizam os campos sensoriais da visão e audição,
através do desenho e das sentenças verbais proferidas – ícones, índices e símbolos. Não se
pode imaginar a percepção como fluxo estancado, mas como fluxo continuum, sujeito a
vigorar, degenerar ou provocar hábitos na mente. Há um caso especifico em que a percepção
precisou do estimulo cutâneo para iniciar o processo de degeneração de um hábito, aquele
adolescente que não conseguia executar o rascunho. A apreensão estava limitada a alguma
conduta anterior que impedia deliberar processos associativos.
A questão flexível da percepção precisa ser evidenciada: a semiose perceptiva é
dependente do equipamento sensorial, ela flui para um estado de consciência imediata, que
poderá ou não evoluir para o estado de consciência polar e, depois para a sintética. No
decorrer do incessante fluxo perceptivo, outros estímulos estão se apresentando, mas muitas
vezes a condição seletiva ou poder de controle de uma consciência polar impele os demais na
imediaticidade. As dificuldades de compreensão que levaram o aluno a manipular o objeto
para atender às expectativas de aprendizagem, denotam a degeneração da consciência
sintética. Aqueles que precisaram da relação com o dado operaram com a consciência
sintética, associando outra experiência para guiar aquela que se apresentava naquele
momento. O próprio fato da autocorreção também é um processo associativo, cujos erros para
a expectativa desejável, requerem a alteridade relacionada à similaridade.
Tendo em vista que a experiência é guiada pela sua anterioridade, a memória não
está presente apenas na associação com o dado, tão fácil de notá-la nas reações de
referencialidade provocadas pelo signo. O próprio fato de domínio dos códigos da língua faz
uso do recurso da memória. Toda memória está como segundo em relação à efetivação
cognitiva, porém, na condição de pré-disponível, passado, é habito instalado.
81
A cognição é processual, está presente de modo conectivo entre as experiências
desde a percepção sensorial, no modo reagente das formas de consciência, na sistematização
de dados da memória, portanto, ao finalizá-la estamos falando de produto cognitivo, que não
pode ser traduzido no simples domínio fixado em algum suporte de linguagem, mas
primeiramente numa conduta de raciocínio exclusiva para determinados conteúdos ou
extensiva à diversidade de outros conteúdos.
Mediante essas descrições que mais enredam do que separam os termos, aliás, o que
é esperado, dada as relações intrínsecas, cabem algumas inferências: na base delas estão -
ação, reação e mediação, que correspondem à percepção (o estado externo age sobre o
interno), pensamento (atitude gerada pelo estado interno dotado de repertório) e conexão
(estados internos e externos). A cognição exemplificada para este estudo, sob o recorte mais
especifico em relação de argumento geral sobre o fenômeno, as práticas de aprendizagem.
Estas são ambientes de cognição que envolvem dois elementos - objeto de aprendizagem e
sujeito de aprendizagem. Os sujeitos de aprendizagem operam naturalmente, independente de
sujeitos de ensino, caso contrário, seria a negação dos princípios semióticos desenvolvidos até
agora. Essa autonomia do sistema de aprendizagem pode ser deliberada ou controlada por
aquele que aprende, ou ainda conduzida por orientação externa sistematizada, a escola e o
norteio de práticas didáticas. Existem, pois, perfis cognitivos definidos a partir do modo
sensorial.
3.5 - Uma conclusão capitular
A breve socialização do pensamento peirceano se justifica na forma de subsidiar
conceitos para a compreensão de um processo cognitivo que se processo a partir de algo
externo ao cognoscente, o signo. O processamento cerebral é, por extensão, uma das possíveis
materialidades deste elemento externo: o signo.
A análise peirceana de Nöth (2013) sobre os “signos educadores” demonstra a
“metodologia de ensino de Peirce” (NÖTH, 201 p. 94) na eficiência de aprendizagem através
de diagramas, muitas vezes, ignorada na fundamentação da práxis educacional que ocorre na
rede de ensino. O autor adverte sobre a crença para os educadores dos signos como meros
instrumentos da aprendizagem. Ele reconhece, ao contrário, o signo como agente de
82
aprendizagem, por si só, independente da ação docente, que, para este estudo, explica a
automação da aprendizagem pelo sujeito. A autoaprendizagem, prenunciada como processo
inato do sujeito nas sequências didáticas, que se alargam na práxis, pode ter como causa o
caráter autônomo da cognição do signo.
Para Nöth (ibid, p.79), as premissas semióticas são:
Primeiro, a definição de signo: signos ocorrem em processos de semiose nos
quais eles representam um objeto, um termo que inclui imagens mentais e
ideias, e eles criam um interpretante, uma ideia, um sentimento ou uma ação
que é resultado do signo, Segundo, as premissas cognitivas que “todo
conhecimento chega até nos por observação” (CP 2.444, 1903) e que “todo
nosso pensamento e conhecimento se dá em signos” (CP 8.332, 1904), e,
Terceiro, provavelmente a maior premissa de todas, a premissa do
agenciamento do signo, ao menos dos signos verbais, de acordo com a qual
“todo símbolo é uma coisa viva, num sentido muito estrito que não é mera
figura de linguagem”. (CP 2.222)
Partindo dos argumentos e, a priori do nível simbólico, Nöth analisa em três
instâncias: o signo como agente, como educador e em que níveis ele processa a aprendizagem.
Como agente: o fenômeno de terceiridade, da inteligibilidade, possui propósito – um signo
predispõe a ser interpretado por outro signo, autorreplicação – um símbolo se inscreve em
diversas materialidades, mantendo a lei interpretante, autopoiesis – o símbolo gera outro
símbolo e autocontrole – a condição da ruptura da conduta, a equalização entre significados
passados frente aos novos. Ainda sobre a autopoiesis do signo:
Entretanto, os “fazedores” de símbolos não podem criar símbolos
independentemente do sistema semiótico, a sintaxe, a semântica e a
pragmática dos sistemas simbólicos que ditam as regras de produção de
símbolos. Assim, na medida em que a mente humana e suas expressões
simbólicas são moldadas por leis dos sistemas semióticos subjacentes, então
os “fazedores” de símbolos são restringidos e determinados pelos símbolos
que acreditam estar fazendo. Neste sentido, os símbolos são os coautores das
mensagens humanas e os homens que criam mensagens simbólicas são
apenas agentes semiautônomos, ainda que acreditem que, através dos
símbolos, estão se expressando “eles mesmos”. (NOTH, 2013, p. 83)
Os sistemas em que os sensores se especializaram dependeram da experiência, da ação
do mundo externo sobre o organismo. Os signos crescem em direção à padronização,
adquirem organizações semânticas a partir da estrutura receptora do sujeito, mas que foi
modelada no processo evolutivo pela internalização do próprio signo no sujeito.
O signo, como educador, é a relação entre as categorias da secundidade e da
terceiridade. Para Peirce (apud Nöth, 2013) não se pode aprender somente com as impressões
sensoriais, simples experiência de sentimentos reativos, mas do seu efeito interpretante. A
83
alteridade, a causa eficiente dos fenômenos, não possui propósito; a mediação, a causação
final dos fenômeno, é operativa; a experiência não se restringe apenas à secundidade.
Como os signos ensinam é o terceiro argumento de Nöth (2013), exposto nas classes
de signos: os níveis do objeto do signo sob efeitos interpretantes remáticos apresentam, os
níveis do signos sob efeito interpretante dicente estão aptos à transmissão e,
consequentemente, à aprendizagem, mas com ação didática aberta pela sua indexicalidade e,
na contrapartida, os efeitos interpretantes de lei se constituem como hábito que: “Para um
aluno que não internalizou o hábito pelo qual se associa o símbolo desconhecido ao seu
objeto, o signo novo é à primeira vista incompreensível, deve ser aprendido por uma mudança
de hábito” (NÖTH, 2013 p 92), ou seja, a aprendizagem é ineficaz.
A eficiência da aprendizagem dependeria do não esvaziamento dos níveis do objeto do
signo: ícone, índice e símbolo. Os diagramas, mais que as metáforas, são para Peirce “o mais
perfeito dos signos” pelo modo que engendram os três níveis do objeto.
No decorrer desta síntese, exemplos pululam, entre eles a difundida crise do ensino da
disciplina de matemática, também denominada de lógica simbólica para os especialistas, tem
nascitura espacial, portanto imagética, mas é ensinada através de símbolos esvaziados dos
índices e dos ícones. Tanto que sistemas alternativos intentam ensinar com a utilização de
objetos concretos em vez de símbolos de quantificação.
A ideia de uma semiótica da cognição propõe exatamente contrapor a compreensão do
fenômeno cognitivo a partir do sujeito, seja na ótica de dentro para fora dos cognitivistas ou
de fora para dentro dos comportamentalistas, assim como a linguagem, mais valorizada na
forma verbal, assume sempre a posição de refração desse processo e a visualidade, a que cabe
um papel de indicadora do estágio do pensamento de natureza verbal.
A abrangência de doutrinas engendradas em prol de revelar o fenômeno cognitivo é
complexa, porém, estende-se e enreda-se, do particular ao plural. Concepções como a
“equilibração” de Piaget, desenvolvimento proximal de Vygotsky, mapas conceituais de
Ausubel, e as orientações didáticas de Zabala, tipologia do conteúdo de Coll, são explicáveis
sob um arsenal teórico unificado, com a diferença do deslocamento da causa para além do
sujeito e objeto, para a lei da mediação que rege o mundo.
Em suma, o ato de aprendizagem se constitui de relações entre apresentações e
sínteses, diagramas são eficientes, mas outras possibilidades didáticas, que aludam a esse
percurso terão efeitos mais positivos que a educação processada apenas no nível simbólico.
Signos simbólicos precisam referenciar seus níveis antecessores e encapsulados.
84
Neste sentido, a imagem, enquanto corpus da visualidade, é signo, portanto enreda
semioses, estabelece processos cognitivos e, logo, deve subsidiar formas de raciocínio, mas
para isso precisa ser compreendida na sua lei, no seu estatuto de linguagem: sintaxe, forma e
discurso. A aprendizagem se constitui da experiência sensorial que se torna operativa na
construção de novos hábitos. Portanto, na decodificação nominal de imagens. E estabelecer
conjecturas desse ato é um processo de aprendizagem, mas alicerçada no modo verbal. Na
cognição de objetos visuais, há uma gramatica visual latente, circunscrita e a experiência,
carente de ser reconhecida no nível simbólico, cujos tratamentos de ensino aprendizagem, na
grande maioria, não acessam esse banco de dados. A hipótese que se estabelece nesses
argumentos é: se os diagramas são educadores perfeitos pela sua integração dos níveis do
signo, se o nível simbólico ou indicial cegos são ineficazes, a cognição visual das imagens
seria mais potente se as estruturas de lei que a constitui fossem mais operacionalizadas, além
do campo das experiências.
85
CAPÍTULO 4 - LINGUAGEM VISUAL
A visualidade tem sido objeto de investigação de algumas áreas: registro de
memória, a História (da Arte) e a antropologia (visual); objeto de discurso estético, na
filosofia; desenvolvimento cognitivo no sujeito, psicologia; no processamento da imagem, nas
Neurociências e demais ramos das Ciências Cognitivas; nas ciências da significação e nas
ciências da Comunicação sobre o percurso de sentidos; em outras áreas interdisciplinares
como a atual Cultura Visual sobre condutas sociais, enfim, mas para o momento é preciso
compreender alguns fatos. Neste momento, o objetivo é definir primeiramente o que é
linguagem e verificar se a visualidade está encapsulada por esse conceito. Em caso positivo, a
segunda etapa é qual é o território sintático, morfológico e discursivo da visualidade? Como
ela aparece na evolução da espécie? Como ela se inscreve no mundo replicador do signo, os
suportes?
Na sequência da doutrina do signo triádico, visto no capitulo anterior, a ação do
signo, a interpretação de um signo noutro signo, semioses são sistemas de linguagem, são
pensamento. É um fenômeno da mediação que se estende e se instala entre mentes. Se a
Mente é a continuidade da matéria, portanto, dado a diversidade de matéria, haverá tipos de
mentes, por exemplo, a condição que diferencia as nossas semioses daquelas de alguma outra
espécie animal ou, até mesmo, vegetal.
4.1 - Evolução da visualidade
Dagalarrondo (2011) inicia seus estudos sob a perspectiva evolucionista do cérebro,
questionando a concepção de progresso sob forte antropocentrismo decorrente do pensamento
científico, principalmente a partir do século 18. Afirma que a evolução de toda e qualquer
espécie é guiada pela reprodução e sobrevivências que implicam na melhor adaptação. Um
exemplo são as eliminações de certos órgãos sensoriais em valoração de outros, como é caso
daqueles que são “cegos” decorrentes da adaptação a ambientes subterrâneos, economia
metabólica ou a vida noturna, para garantirem a sobrevivência e continuidade da espécie.
A ideia de evolução deve ser entendida como adaptação em um mundo de
possibilidades, que as coisas estão sujeitas a ação de outras coisas, reagindo através de um
86
modo mediativo, inteligente. Hábitos são formados, desaparecem, novos se instalam. Esta
perspectiva antropológica propõe hábitos na condição de invertebrados, transmitidos por
código genético, que nos chega como instintos, predisposição da máquina biológica. Estes se
estabelecem e perduram no decorrer de um prazo temporal bem diferente dos hábitos
adquiridos no hiato da nossa existência.
Outra relevância do estudo panorâmico de Dalgalarrondo é ressaltar a trajetória não
linear da evolução. O estudo sobre a questão se apresenta numa sequência de fatos que não
ocorrem sob a constância de variáveis, mas de situações irregulares. O autor extrai das ideias
de Georg Striedter três princípios da organização e evolução do sistema nervoso e do cérebro
(em mamíferos):
O primeiro princípio, possivelmente um dos mais relevantes para a
evolução do cérebro, é o que afirma que muitos aspectos da estrutura e da
função do cérebro são conservados ao longo da evolução das espécies
animais [...]. Um segundo princípio, também muito importante, está
relacionado ao tamanho absoluto dos cérebros. Ao focar não as semelhanças
entre os cérebros de duas espécies (baseadas na “conservação”), mas nas
diferenças nas novidades que produzem, constata-se que o importante
principio de que os cérebros tendem a mudar suas organizações internas à
medida que mudam de tamanho. [...] São três tipos: 1) mudanças
desproporcionais no tamanho de certas substruturas como aumento global; 2)
mudanças da organização interna das subestruturas; e 3) mudanças no
padrão de conectividade. [...] Por fim, um terceiro princípio diz respeito a
relação entre cérebro do organismo, todo o espectro de comportamento que
ele utiliza em sua vidas e as condições e desafios ambientais impostos pelo
seu nicho ecológico especifico, pelo seu habitat.(DALGARRONDO, 2011 p
24-25-27)
Apesar de não enfatizar uma situação intrínseca, estão implícitos três princípios na
modelagem matricial: a insistência da preservação da estrutura, a dimensão absoluta e a
influência dos meios. Do terceiro para o primeiro, o cérebro não é algo à mercê apenas da
exterioridade, possui uma estrutura mutável dentro da diversidade que o constitui e é fruto da
especialização sobre sua origem matricial. Striedter, exposto por Dalgarrondo (ibid), revela a
análise a partir dos mamíferos, mas é interessante ressaltar que a condição movente de
qualquer espécie aumenta a de predisposições à mediações.
A perspectiva evolutiva dos seres unicelulares e a complexidade do cérebro humano:
percepção, reação, associação de informações, decorreram de um fluxo fascinante, cuja
propulsão foi mérito da movimentação e mediação:
87
[...] Ao longo da evolução vão se diferenciando células especializadas em
receber mensagens (inicialmente química se físicas) do ambiente exterior e
células com funções contrateis voltadas as ações no ambiente, como, por
exemplo, a movimentação necessária a obtenção e nutrientes. (ibid.,p. 67)
Avançando desse fato comum entre invertebrados e vertebrados, fixa-se sobre os
primatas, que desenvolveram readaptações do corpo decorrentes da provável necessidade de
sobrevivência, entre elas a condição de viver nas árvores para fugir aos predadores. Algumas
dessas características que interessam a este estudo foram: o desenvolvimento de estruturas
musculares e ósseas que aumentaram a flexibilidade e movimento; a redução dos aparatos
olfativos; tendência à manutenção ereta do corpo e os olhos dirigidos para frente. Essa
sequência de reações incitou a sofisticação do nosso aparelho ocular em relação às outras
espécies.
Em suma, sob o viés ontológico peirceano, as ideias de co-evolução é a causa bruta,
mecânica, cujos existentes se apresentam em estado de conflito, reagentes entre si, guiados
por uma causa inteligente, ou seja, a mediação que instalou hábitos transmitidos no DNA.
Este processo seria uma espécie de semiose da evolução.
Tendo em vista que este aprofundamento foge a questão nuclear do estudo, fixamos no
observável nas espécies moventes, inclui-se ai a espécie humana, conexões que colaboram no
funcionamento biológico maquinal e outras que a inserem em estado de comunicação com o
meio, ambas interdependentes.
Santaella (1998, p. 12-13) faz afirmações ao questionar possíveis fatores que levaram
à dominância de alguns sentidos: como o olho e o ouvido, as conexões que os dinamizaram
em relação ao cérebro:
Depois de muito pensar sobre isso, comecei a fazer uma pergunta que, a meu
ver, deve ser levantada anteriormente a qualquer outra. Por que será que só o
olho e o ouvido foram premiados pela invenção de extensões que lhes
aumentam o potencial? A tentativa de resposta a essa questão,
presumivelmente anterior, nos leva à curiosa constatação de que só o olho e
o ouvido são órgãos dos sentidos diretamente ligados ao cérebro, ou melhor,
são buracos que se conectam diretamente com o cérebro, em oposição aos
outros sentidos, que são buracos ligados as vísceras, sendo sentidos mais
viscerais, portanto.
Essa caracterização da natureza dos sensores estabelece semioses distintas, uma que
predispõe o organismo em estado mediativo com o mundo em aspectos mais comunicacionais
e outro, que não deixa de ser mediação, que privilegia a funcionalidade orgânica, a semiose
no mundo biológico, ambas são interdependentes. Um descontrole do tato na regulação
88
térmica, ou a ingestão de certa substância inadequada ingerida, ou ainda, um aviso ignorado
do olfato pode provocar a alteração no corpo e, logo, afetar órgãos como audição e visão.
Se não é abusivo, pode-se dizer, consequentemente, que olho e ouvido,
embora também corporais, são sentidos mais cerebrais, enquanto os outros
sentidos são mais corporais do que cerebrais, oque não quer dizer que eles
não sejam capazes de criar formas de pensamento ou quase-pensamento que
lhes são próprias. (ibid, p. 13)
Do ponto de vista da Teoria do Signo, os órgãos “mais viscerais” possuem uma
mediação, apresentam qualidades como: temperatura, calor, cheiro, sabores, e
consequentemente rementem a outras representações indexicais, porém, sujeitas a maior
integração das representações que afetam os sistemas sensoriais.
A nossa evolução fez dos olhos e dos ouvidos órgãos extremamente complexos: “mas
em verdadeiros órgãos codificadores e decodificadores das informações emitidas e recebidas,
de modo que parte da tarefa que seria de responsabilidade do cérebro já começaria a ser
realizada dentro desses dois órgãos, para ser completada no cérebro.” (ibid, p. 13).
Talvez, no campo aberto das hipóteses, associado à perspectiva evolutiva, a causa
dessa diferenciação poderia decorrer da relação tempo espaço. A hipótese do habitat rude que
geraria risco de sobrevivência (DALGARRONDO, 2011), levou os primatas a saírem do chão
em busca das árvores, assim, o olho e o ouvido estariam mais alertas à seletividade de
identificar comida ou predador e fundamentais à respectiva sobrevivência, sem a proximidade
corporal com outros existentes também móveis, pois demais sentidos urgiriam de maior
proximidade corporal.41
Obviamente que alimento e predador gerariam movimentos
diferentes, o alimento localizado causaria a aproximação e o predador a fuga ou estado de
alerta ao ataque.
Apesar da similaridade da arquitetura histológica do cérebro humano e o cérebro dos
primatas não humanos, a diferença crucial está na capacidade para a linguagem articulada e
complexa (ibid, 2011). Nos antecessores do homo sapiens são encontrados indícios das áreas
de Broca e de Wernicke, responsáveis respectivamente pela fala e pelo conhecimento,
interpretação e associação das informações, mais especificamente a compreensão da
41
Há espécies em que o olfato e paladar são capazes de sofrerem a estimulação a longa distância do objeto de
estimulo.
89
linguagem42
. Entretanto a constituição celular estabeleceu as diferenças. Trata-se do hiato que
explicaria a passagem da capacidade de desenvolver a linguagem simbólica. Superada a
ruptura inicial, o Cérebro e linguagem co-evoluíram em ciclo autoalimentado, de tal forma
que um aumento da eficácia e da complexidade de um levava aos mesmos aumentos no outro,
portanto, a unidade mínima da linguagem, o signo, na sua condição de afetar alguma coisa, é
a manifestação mais rudimentar da cognição no cérebro-mente.
Este estudo não se aplica a elucidar tal hiato, mas precisa de um posicionamento
terminológico do predicativo simbólico ao termo linguagem. O movimento do signo noutro
signo, que segue sucessivamente, é a processualidade do signo triádico, é um processo que
permeia as dez classes de signos, cujos quali-ícone-remático está na base e os legi-símbolo-
argumental no final, esta última considerada a tríade genuína do signo, é neste nível que se
reconhece uma semiose simbólica (QUEIROZ, 2003).
Os estudos a respeito da questão são contundentes sobre a exclusividade humana na
condição simbólica (DEACON,1997; ECCLES, 1989; TOMASELLO apud ALLAN,
BARBOSA, 2009; entre outros) porém, contrapondo essa exatidão, tem-se, em menor alarde,
a critica seminal de Queiroz43
(2003) sobre a semioses indiciais em evolução para simbólicas
em primatas não humanos. Na realidade, este paradoxo ilustra que é inegável a comunicação
entre os primatas, portanto é inegável a presença da linguagem, cerne de qualquer processo de
comunicacional, e a semiose simbólica é apenas um aspecto da linguagem. Destarte, a ideia
de linguagem que nos subsidia é ação do signo, semiose, sujeita a diferenciações de acordo
com a natureza do signo: icônica – apresentativa, indexical – representativa e simbólica –
“condutiva”.
Sob a perspectiva evolutiva, a visualidade e a produção de sons guturais estão na
ancestralidade da palavra, ápice de semioses simbólicas no homem. Provavelmente, o som
produzido pela garganta não foi a única sonoridade produzida pelos ancestrais da nossa
espécie, mas o mais próximo de ser praticado como algum tipo de alerta, de sinalizador de
situações.
As análises do percurso evolucionista da espécie indicam fatos para compreender a
visualidade humana: a dependência da luminosidade, a posição binocular e os movimentos.
42
O uso do termo linguagem em diversos segmentos cientificos, inclusive a neurociencias, é revestido
de carater socializante, arbitrário, simbólico, que é próprio da modalidade verbal. Essa forma de
linguagem deslocou o homem no tempo e no espaço, permitiu a autorreferência. 43
Queiroz (2003) propôs uma critica seminal sobre essa relação, mais especificamente, demonstra um
exemplo do efeito de signo simbólico sobre um primata não humano.
90
A evolução do olho, conforme relata Lamb (2011), foi acompanhada por duas teorias:
a complexidade irredutível na evolução, quando um sistema não opera na ausência de
quaisquer dos componentes que o constitui, não poderia ter evoluído naturalmente de uma
forma mais primária; porém, a outra tese, darwiniana da evolução, mesmo sem evidências
para a época, o que a Neurociências confirmou posteriormente, ou seja, estava sob a
orquestra da evolução. Dada a discussão exaustiva, o que interessa para o momento é o “olho
receptor de luz” que evoluiu para o “olho câmera”, captador de imagens. Um fato desta
mudança foi o aparecimento do cristalino para captar a luz e focar imagens. Bear (2008)
apresenta o olho com as funções de detectar, localizar e analisar a luz, vai da percepção à
mediação da luz. Porém, o que se denomina de luz precisa da prerrogativa “visível”, ou seja,
a “luz visível”, aquilo que é captável pelo olho humano na parcela das ondas
eletromagnéticas. Outras espécies, como serpentes, com estrutura ocular diversa, percebem o
infravermelho, ondas de calor, que podem sustentar nos hábitos noturnos. O feixe de luz que é
captado insere a espécie na evolução que se adaptou para o “dia”.
Outra importante adequação dos primatas à vida nas árvores foi o fato dos olhos
estarem próximos entre si, situados na região frontal do crânio, miram um mesmo objeto sob
uma diferença angular que permite o cérebro calcular distâncias. Uma das justificativas mais
aceitas para essa condição foi a necessidade de precisão de foco exato para saltos. A posição
binocular, numa ação conjunta de reações do corpo em prol de adaptação, garantira vantagens
aos primatas: o recurso unifocal caso corresse a falência bifocal, o alargamento da
abrangência visual e a paralaxe na construção da profundidade de campo.
O olho integrado ao corpo apresenta três possibilidades de movimento: na
dependência das articulações de giro da cabeça, o giro do globo ocular em si e variação de
velocidade dos raios de luz que afetam a retina.
A soma dessas características tanto demonstra a capacidade limítrofe do olho humano
como a funcionalidade. A natureza do olhar esta para as variações que ocorrem em uma
determinada área de alcance, uma área que se expande na vertical, no horizontal e na
profundidade, puramente tridimensional e no papel de alerta; nessa área de abrangência
seleciona o foco, algo estático ou em deslocamento, sujeito a gerar um comportamento visual
também estático ou acompanhante do foco. Esta análise remonta a uma cena do homem na
inicio da pré-história observando ao seu redor tanto para a fuga de um possível risco de vida
como na busca de alimentos; e o homem moderno ainda estaria sobre esses efeitos? Do ponto
de vista de encapsulamento das experiências históricas, é afirmativo, mas a visualidade
91
passou a ocupar novas intenções que a tornou mais complexa, como outras situações da vida
moderna. É oportuno introduzir a partir de agora a definição de imagem.
4.2 - Visualidade e imagem
Para Santaella e Nöth (1998):
O primeiro é o domínio das imagens como representações visuais: desenho,
pintura, gravuras, fotografias e as imagens cinematográficas, televisivas,
holo e infográficas pertencem a esse domínio. Imagens, nesse sentido, são
objetos materiais, signos que representam o nosso ambiente visual. O
segundo é o domínio imaterial das imagens na nossa mente. Neste domínio,
imagens aparecem como visões, fantasias, imaginações, esquemas, modelos,
ou, em geral, como representações mentais. [...] Não há imagens como
representações visuais que não tenham surgido de imagens da mente
daqueles que as produziram, do mesmo modo que não há imagens mentais
que não tenham alguma origem do mundo concreto dos objetos visuais.
((SANTAELLA e NÖTH 1998, p15)
Em outro discurso, ao introduzir a modalidade visual da Teoria das matrizes da
Linguagem e do Pensamento, Santaella (2001, p. 186) afirma: “as modalidades das formas
visuais cobertas por minha classificação não se reportam ao mundo visual e nem ao campo
visual”, e observa outro aspecto da imagem, que parte de um mundo visível concreto, natural,
de um campo visual que contem a imagem. Para eles existem três aspectos da imagem
entrelaçados a aquele que decorre do mundo natural que esta em nosso campo de visão,
diferente daquele elaborado na intencionalidade de fenômeno de linguagem, na manipulação
de representações e as que estão em nossa mente.
Catalá (2011) expressa a ideia de imagem a partir da funcionalidade e dos modos de
ver, a primeira ideia está para a intencionalidade enquanto a segunda parece mais primária, ou
seja, como a visualidade se apresenta: a visão natural – o visual, a visão cultural - o visível e a
visão tecnical – visualizável. Para ele, a visão natural está sob a ordem cultural que está sob a
ordem física, material das representações. A única congruência está na base natural da
imagem, porém, não localiza o papel das imagens mentais. Os filtros culturais e materiais são
determinantes na produção de imagens, mas a produção é alimentada pelas interpolações
mentais.
92
Retomando o viés antropológico, a imagem é a representação que permitiu aos
ancestrais pré-históricos se organizarem frente às necessidades de sobrevivência. O fruto
distante que lhe serviria de alimento estava em sua mente através da representação, assim
como os dados de distância e outros orientadores espaciais, processando um pensamento
sobre o fato. Ao representar formas a partir das ferramentas como extensores dos membros ou
quiçá reconhecer semelhanças em objetos naturais foram os primeiros vestígios da
representação imagética mediada por uma materialidade que trataria mais da material natural
original. A imagem adquiriu a função socializante, externou o pensamento, habilidades
perceptivas e motoras.
O surgimento dos suportes para as imagens resultou na produção de imagem estática,
prevalecendo a forma em detrimento do conjunto do campo visual; favoreceu a intenção
contemplativa, correspondente a linguagem na função descritiva. Entretanto, a orientação
presente na gênese da visualidade humana está para o tempo e o espaço, fundantes da função
narrativa da linguagem. Do ponto de vista semiótico, das classes de signos, a natureza da
imagem é um ícone por apresentar algo por semelhança do objeto e um índice por que sinaliza
certo espaço-tempo, está para alguma relação além dela, assim, a imagem em si reafirma o
caráter descritivo-narrativo.
O arsenal histórico da imagem demonstra um inventário de produção de significados:
a modelagem tridimensional, a síntese de planos bidimensional, a condição estática e a
imagem em movimento. Traduz um empenho de diversas materialidades e os respectivos
meios de manipulação, efeitos que retroalimentaram a produção de imagens até a atual
condição.
Toda produção de imagem externalizada requer um suporte, uma materialidade que
possa se fixar. Comumente, no campo das Artes Plásticas, é ordinário a ideia de: suporte –
material que recebe o interferente, por exemplo, uma tela; o interferente – material que cria a
imagem, por exemplo, a tinta e o instrumento – que é responsável pela manipulação da tinta
sobre a tela; porém, essa concepção está mais para o produto em detrimento do fluxo de
elaboração. A questão da holografia, por exemplo, complica o engendramento desses termos,
ao ser decomposta em: base, interferente e instrumento. Também é o caso das esculturas em
gelo, pois ele é o suporte ou interferente? Ou estão fundidos? Atestar que o suporte seria o
espaço que o circunda é uma incoerência com a bidimensionalidade. As fontes do Burj
93
Khalifa Lake44
(Figura 12) são um elemento natural, manipulado com intencionalidade
estética, cria formas, linhas, estão sujeitas a interferência de luzes, é uma produção de imagem
tridimensional, então, como fica a relação suporte e interferente? Novamente vem a questão,
para visão aérea o suporte se apresenta como o lago artificial, a topografia, e para o frontal o
entorno, o cenário não topográfico? Deste modo, toda escultura estaria na condição de
interferente para um suporte que seria seu local. Parece fugaz generalizar este pensamento.
Não evidencia a anterioridade mental e essa observação didática é insólita frente à
modernidade e contemporaneidade das artes visuais.
Figura 12 - Imagens da fonte Burj Khalifa Lake em período diurno (visão área)
E noturno (visão frontal).
Fonte: http://casavogue.globo.com/LazerCultura/noticia/2012/10/maior-fonte-luminosa-do-mundo.html
A ideia de suporte em questão é o conjunto material e as respectivas propriedades dele
mesmo que tornam físicas as imagens mentais. São suportes de uma imagem pensada. Os
suportes caracterizam produção de imagens, impõe simultaneamente restrições ou ofertam
miríades, as semioses do próprio ato criador, produtor de linguagem. Alguns exemplos são
esclarecedores: a imagem mental que antecede o ato de um pintor, ao ser tornar palpável,
sofrerá caracterizações distintas mediante o uso de materiais como: pigmentos naturais e uma
placa de madeira, folha de papel e lápis de cor, e assim segue.
A imagem produzida não é sinônimo de bidimensionalidade, ela também se manifesta
de modo tridimensional, esta é a primeira divisão de categorias da imagem: aquelas que se
apresentam prontas para observação em uma única face e outra que tem vários ângulos para
serem lidas. A primeira, que sugere a sensação de superfície (Figura 13) ou faz uma síntese de
planos (Figura 14). A outra não economiza nos planos (Figura 15).
Figura 13 - Superfície plana Figura 14 - Cartaz publicitário
44
Trata-se de uma das maiores fontes luminosas localizadas em Dubai, planejada por Wet Design.
94
Fonte: Elaboração do autor
Fonte: http://www.cutedrop.com.br/2012/10/posters-de-
viagem-de-1920-a-1950/
Figura 15 - Detalhe da escultura de Ron Muek
Fonte:http://fondation.cartier.com/#/en/art-contemporain/26/exhibitions/866/ron-mueck/862/ron-mueck/
A partir de análise geral dos suportes, parece que há alguns princípios que os regem:
todo suporte está subordinado a uma dimensão limítrofe, bordas, moldura; todo suporte
singulariza a imagem apresentada, todo suporte determina uma conduta percepto-cognitiva.
Não se pode confundir esses princípios por situações decorrentes, os estilos, das intenções de
discurso, da mimese, etc.
4.2.1 - Dimensões: a emolduração
A produção de imagem requisita um intérprete para seu discurso, portanto, a sua
extensão é a captação do olho, assim, a condição “emoldurante” é intenção de delimitar o
espaço que a imagem se apresentará. Esses espaços são fruto da relatividade distal entre
imagem e observador nas mais diversas intenções.
Após o evento do quadro, nos meados do século 14, a portabilidade da imagem, livre e
solta das paredes é um exemplo. Reforçada pela distribuição dos elementos visuais (sintaxe),
o quadrilátero se efetivou como formato insistente, mas não único, até os dias de hoje,
95
conforme se observa nos monitores, telas de computadores, outdoor, etc. Até então, estavam
atrelados a arquitetura ou objetos utilitários (baixo relevo).
A emolduração da tridimensionalidade é peculiar, pois objetos utilitários são
tridimensionais, que também podem servir de suporte para imagens bidimensionais, cuja
emolduração passa a ser o formato determinado pelo viés da usabilidade; os demais casos não
experimentam uma rigidez emoldurante: ora como formas orgânicas, ora exatas, tão presentes
na bidimensionalidade.
A emolduração é uma junção da área a ser captada pelo olho e os limites da
materialidade que a fiscaliza. Ao afirmar isto, a ideia de intenção de autoria parece atrelada a
questão, mas se fosse assim, para o pintor impressionista valeria o conceito de suporte
somente naquilo que atendesse aos efeitos criados pelos raios luminosos de sua pintura. A
intenção é manipuladora do suporte, mas as regras que o constituem estão além disso.
4.2.2 - A “fisicalização” da imagem
A materialidade traz suas qualidades no desempenho de tornar a imagem palpável:
maciez, elasticidade, luminosidade, estados da luz sobre a matéria (transparente, translúcido e
opaco), heterogeneidade ou homogeneidade de substâncias, entre outros, que dão às cores,
linhas, áreas, texturas, os mais diversos aspectos. Uma pintura em aquarela sobre um papel
mais fino será diferente de outro mais grosso. A transparência de um vitral jamais será a
mesma se o vidro for uma peça de acrílico.
Parafraseando Santaella ao tratar da escrita (2012, pg. 2) “Além do código alfabético
ou de qualquer outro sistema de codificação, a escrita pressupõe algum tipo de suporte para a
sua inscrição”, os elementos matriciais da imagem: cor, linhas, áreas, volume, textura,
também necessitam de suportes materiais e nele se caracterizam. A materialidade impregna
sua origem histórica, seu modo de manipulação e as propriedades físicas e químicas que a
constituí, como também fica sujeita a crenças de seus manipuladores, como se observa em
momentos das Artes Visuais, exemplo: o Neoclassicismo.
96
4.2.3 - A conduta percepto-cognitiva
A possibilidade do suporte cria condutas, tem que ser compreendida na perspectiva da
materialidade que torna a imagem concreta: pigmentos, fontes de luz, instrumentos, bases, etc.
Não se trata do teor das imagens construídas, mas do que ele se utiliza para existir, por
exemplo: um determinado cartaz pode ser impresso, impresso transparente submetido a
efeitos luminosos por trás da imagem e digitalizados. No primeiro caso, a cor chega aos
nossos olhos por reflexo, o pigmento é responsável em rebater luzes e absorver a outras,
chamaremos de processo indireto, no outro, a emissão direta da luz atende à grande
predisposição que nossos olhos possuem para captá-las. A tendência deste tipo de suporte é
desencadear maior imersão da leitura dada a sua conexão perceptiva.
O movimento que se possuí em relação à visão, gira parcial da coluna cervical e o
desolamento do globo ocular, construídos no percurso seletivo em função do movimento
necessário para a sobrevivência, são mais imersivos em suportes que apresentam a imagem
em movimento. Suportes estáticos diferem de suportes em movimento.
A Física explica o fenômeno de acomodação visual, o mecanismo fisiológico que
tolera nosso órgão visual ao se adaptar às necessidades para obter uma visão nítida a diversas
distâncias. Este fato implica em outra natureza da nossa visualidade, a predisposição à
tridimensionalidade, portanto, imagens instaladas em suportes bidimensionais experimentam
diferenças imersivas das tridimensionais. Esses três percursos de conduta, fluxo luminoso,
movimento e a profundidade são estruturas intrínsecas, com predominância variante entre si e
as mais ínfimas condições de gerar semioses visuais. Redundando a fala anterior, hábitos
adquiridos e entranhados pelo nosso devir no fenômeno da linguagem.
A “emolduração”, a “fiscalização” e a conduta perceptiva estão na anterioridade do
discurso que a imagem produzirá, sejam figurativas ou não figurativas, assim como a própria
técnica ou tecnologia na manipulação da materialidade. Um exemplo: as atuais imagens em
movimento são frutos do evento da tecnologia digital, que permitem tratamentos a essas
imagens, propõem enquadramentos do campo visual, criam novos comportamentos de leitura.
4.3 - Expansão dos suportes
97
Tratar de uma expansão recupera a ideia de origem, porém, mais desafiante é analisar
pelos mais atuais, que inserem essa discussão. A questão da holografia: fundamentada em
princípios óticos, parte de uma estrutura plana, mas a imagem registrada nele que é
tridimensional. Neste caso, não interessa o processo da produção da imagem, mas como ela se
apresenta. Podemos nos mover e percebermos a profundidade da imagem, portanto é um
território fértil para verificar essas categorias. Atentamos o processo holográfico (Figura16):
um feixe de luz laser (1) é disseminado em direção a um objeto. No meio da passagem (2), o
feixe é dividido ao cruzar um espelho semitransparente. Parte da luz segue em direção ao
objeto e outra parte é desviada em outra direção. A luz que chega ao objeto (3) é refletida em
direção ao filme. A luz que não passou pelo objeto (4) também é refletida em direção ao
filme, com a ajuda de um espelho. Esses dois feixes de luz se deparam (5), forma-se a
imagem no filme sensível à luz.
Figura 16 - Processo de formação da imagem holográfica
Fonte: http://www.etcfilmes.com.br/holografia/
A “emolduração” é instituída pela própria potência luminosa do objeto.
“Fisicalização” é fruto do raio laser separado e confrontado, não se trata de uma cor pigmento,
mas de uma cor luz. A conduta perceptiva não é outra se não a extrema sensibilidade dos
ativada. Porém, duas outras questões aparecem: sem tal tecnologia não haveria esse suporte de
imagem e a tecnologia está circunscrita a questão da cultura.
Diz Belting (apud CATALÁ, 2011, p. 43): “Nossa percepção está submetida à
mudança cultural, enquanto nossos órgãos sensoriais não e modificam desde tempos
imemoriais”, o papel da cultura é imprescindível no olhar: formatações, extensões para o
olhar, expansão da visibilidade, são modificações que intercambiaram a nossa visão.
98
Não cabe, para o momento, uma introspecção profunda no conceito cultura, porém, a
sua origem semântica, latina, na antiguidade humana, designava o cultivo da terra, depois,
passou a ser aplicada em analogia da alma com o cultivo da terra – cultura animi. Segundo
Schurmann (1989), esta ideia de cultura, como cultivo de alguma coisa, persistiu até meados
do século 18, sempre na dependência de termo complementar. Posteriormente, a conotação de
processo passou para substância de uma coisa ou realidade. O conceito de cultura sofreu,
histórica e antropologicamente, restrições e alargamentos. Noutra visão unilateral, a ideia de
algo civilizatório45
evoluiu para visões mais especificas como a produção dos conhecimentos
científicos. Enfim, optando pela visão mais ampla, a cultura como ações desenvolvidas pelo
grupo social com intuído de compreender e operar no seu meio ambiente, seja físico ou
mental, portanto o caráter socializante requer o comunicante que requer a linguagem. Na base
da cultura está a linguagem, que ao nascermos já existe, somos inseridos nesse contexto, que
nos modeliza e poderemos modalizá-lo, mas sem descaracterizar o que está em posição
primária.
As técnicas e as tecnologias desenvolvidas são produtos da cultura, nascem das
concepções humanas para atender as diversas intenções, mas, ao mesmo tempo em que tem
alvo próprio, podem reinventar as intenções iniciais mediante novas possibilidades. Definir
tecnologia é preciso:
Técnica, no sentido estreito, significa saber fazer (know-how),ter
conhecimento ou habilidade para realizar um dado trabalho ou atividade de
maneira especifica, um modo de realizar eficientemente uma tarefa.”
Literalmente, tecnologia, por seu lado, é campo de estudo referente aos
conhecimentos e usos das ferramentas e instrumentos utilizados pelos seres
humanos ao longo de sua história Entretanto, conforme a produção de
ferramentas e instrumentos cresceu, estes foram multiplicando-se e
tornando-se progressivamente sofisticados, viraram maquinas e passaram a
se inserir praticamente em todas as atividades que realizamos.
(SANTAELLA, 2007, p. 205)
A técnica é tão antiga quanto a humanidade, há um consenso entre antropólogos
que a presença de instrumentos fabricados distinguiria os restos fossilizados do homem dos de
um hominídeo. A habilidade remonta ao uso de ferramentas pelos primeiros humanos,
portanto a eficiência é circunscrita ao tempo. É a passagem de um comportamento pré-
histórico de passivo para ativo, ou seja, o homem deixa de usar o que a natureza poderia lhe
dar naturalmente para dominar a elaboração de utilitários, ferramentas. Na técnica, está a
45
A ideia civilizatória nasce com as cidades estados gregas em oposição a barbárie.
99
natureza instrumental, primária, a simples realização, que a distingue da tecnologia, não por
oposição, mas como etapa inicial das exigências da complexidade da vida humana. O que
seria esta complexidade?
O termo tecnologia perdeu a literalidade, seu emprego generalizou-se e se
campo de referencia hoje abrange não apenas as ferramentas e instrumentos,
mas todos os tipos de recursos, dispositivos e maquinas empregados na
produção, assim, como abrange infra-estruturas e o comando e controle das
estruturas sociais(ibid, id, p.205)
A tecnologia abarca a utilização científica de ferramentas, máquinas e demais
instrumentos que impulsionam o conhecimento humano e, consequentemente o domínio do
seu meio. Com a tecnologia, é plausível utilizar a técnica com maior ciência, pois ela inclui
todo o processo dinâmico que a técnica carece para a sua aplicação.
O que interessa são as relações entre as tecnologias que produzem imagens e a
retroalimentação da conduta da visualidade. As imagens produzidas pelos aparatos
tecnológicos atendem às mais diversas preocupações, mas que podem ser agrupadas em:
acesso ao não visível pelo olhar comum, como aquelas que dão aparato à medicina, revelam
as constelações, demonstram ínfimos aos fenômenos biológicos, químicos ou físicos, etc.; o
acesso ao visível pelo olhar comum, exploradas pelo entretenimento, pelo segmento
instrucional, etc. e o hibridismo de ambas.
A complexidade cultural e, consequentemente tecnológica, reforça como a simples
identificação de suporte das artes visuais é imprópria. Mesmo quando a produção da imagem
resgata práticas primárias, a necessidade da tecnologia logo se insere. Por exemplo: nas
últimas décadas, a tecnologia digital expandiu e novos recursos de corporificação da imagem
foram implementados, porém, outro modo de corporificação, desprovido dessa tecnologia,
ganha as ruas, a pintura em “3 D”46
(Figura 17). É atribuído a Kurt Wenner, pintor
estadunidense, a invenção da atual pintura de rua em 3D que optou como materialidade tintas
e os planos dos espaços públicos abertos. Atualmente, para evitar o desaparecimento dessas
imagens devido às transformações pavimentais dos espaços públicos, estão sendo realizadas
em materialidade transportável através do uso de tecnologias.
46
Também denominada Street Painting, cuja origem remota estaria em práticas italianas do século XIV, e na
atual transição secular passou a aproveitar recursos da perspectiva anamórfica: distorções criadas para se tornar
tridimensional de um único ângulo.
100
Figura 17 - Pintura de rua 3D de Kurt Wenner (Mântua, Itália)
http://kurtwenner.com/galleries/pavement/pavement_1/pages/StreetPaintingGallery1.001.htm
Santaella (2006) relata que os suportes expandidos em meios técnicos e tecnológicos,
cuja linguagem assumiu relações mais inextricáveis com a sua materialidade, passaram a ser
denominados de “meios de comunicação”, aponta para a superação do conceito primário dos
suportes visuais, os que mantêm a ideia exposta de suportabilidade material da imagem
produzida atualizada. Até o presente momento avançamos da visualidade para a imagem e,
agora, sobre a linguagem visual, cujos suportes são inseparáveis.
4.4 - A linguagem Visual
Visualidade, imagem e agora a linguagem visual, este é o percurso proposto. O termo
linguagem remete, no momento mais imediato, ao modo verbal. A própria evolução de
pesquisas sobre linguagens em novas áreas usa a linguagem com conotação mais verbal que
visual. É intensaa tradição cientifica que classifica as linguagens em verbais e não verbais. É
extensão de uma visão logocêntrica, dicotômica e consequentemente incapaz de esteio para
compreender as formas de linguagem que se desenvolvem no humano. Os aparatos que
possuímos para se inserir nas formas de linguagem são claros, a predisposição da natureza
visual e a dependência, menos natural, dos sítios lexicais para a linguagem verbal. Mesmo que
a contiguidade cultural imprima mediações na recepção da imagem, não são tão intensas
101
como a língua. A forma verbal é o cerne de semioses simbólicas, portanto, arbitrárias, que
dependem das convenções sociais.
A dicotomia impressa em várias tratamentos científicos, verbal e não verbal, tem na
Teoria das Matrizes da Linguagem e Pensamento (SANTAELLA, 2000), que elucida, com
extrema originalidade, uma relação contigua das formas de linguagem. Para a autora, a
intersecção desses três modos matriciais é comprovada na sobreposição das categorias
fenomenológicas: a sonoridade para a primeiridade, a visualidade para a secundidade e a
verbal para a terceiridade. A construção dessa relação parte de elementos que caracterizam o
fenômeno da linguagem: “[...] um sistema perceptivo deve conter legi-signos (organização
hierárquica, sistematicidade), deve ser passível de registro, nem que seja o registro da
memória (recursividade) e, sobretudo, deve ser capaz da metalinguagem (auto-
referencialidade, metáfora).” (SANTAELLA, 2001, p 79). Estes tópicos são: a sistematicidade
que conhecemos por sintaxe, a “fisicalização” nos remete à forma e à autorreferência, à
manifestação do poder de intenção da linguagem. Esses três eixos se aplicam às três
modalidades: a sintaxe sonora, a forma visual e o discurso verbal, que não são independentes
e obedecem a evolução fenomênica Peirceana, progridem da primeiridade-sonora-sintática
para a terceiridade-verbal-discursiva. Mas, se a linguagem é um fenômeno da terceiridade,
como pode haver um nível de primeiridade? As categorias copulam e tecem estruturas
analíticas progressivamente. Dentro de um fenômeno da terceira categoria haverá, na sua
análise, o reconhecimento de níveis de primeiridade e secundidade para aquele terceiro:
A lógica da matriz sonora, sob a dominância da sintaxe, é mais primordial,
estando na base das outras matrizes. A lógica da matriz visual, englobando a
sintaxe e sob a dominância da forma, está na base da matriz verbal cuja
lógica discursiva se constitui pela incorporação da sintaxe e da forma.’
(SANTAELLA, 2001, p 79).
A autora ressalva que o caráter material não está necessariamente numa relação de
contiguidade progressiva, exceto em alguns casos singulares. A identificação dos eixos tem a
função de caracterizar as três modalidades como formas de linguagem sob a predominância
qualitativo, indexical e a lei. Mas, nos vemos obrigados a exaltar como essa relação triádica
corresponde a evolução antropológica da condição simbólica: sinalizações guturais
associadas aos fatos e objetos, fixados no verbal, assim como as questões da
interdependência verbal e o território gramatical.
102
Para compreender melhor essa interdependência verbal, recorremos a exemplos, uma
análise de possíveis efeitos de uma imagem (Figura 18) figurativa.
Figura 18 - Feira. Gravura de Carybé, 50x70 cm
Fonte: http://www.espacoarte.com.br/obras/5159-carybe-hector-julio-paride-bernabo
Ao contemplar esse exemplo, lemos linhas, direções, cores, que constroem formas e
deliberam em nosso pensamento fragmentos ou sentenças nominais. Esta primeira associação,
durante o processo de leitura de imagem figurativa, é muito comum, mas existe uma
organização entres as cores, certa distribuição dos elementos no espaço, formas que controlam
o tempo de leitura, etc. Na segunda imagem (Figura 19), não figurativa, ao ser contemplada,
também existem elementos visuais que lhe constituem, porém, a condição não figurativa
disparará outro grupo semântico verbal, aqueles que representam comentários sobre os
elementos visuais ou, às vezes, sob a força de signo remático a projeção de similaridades com
o intuito de recuperar alguma possível nominalização.
Figura 19 - Movimento em preto branco de Miguel Couto. Pintura
http://manuelcouto.arteblog.com.br/499755/Movimentos-em-preto-e-branco/
As semioses disparadas são incessantes na fluência de signos visuais para verbais,
exceto quando a semiose é apenas apresentativa, não há fugacidade para o indexical. Os dois
casos, figurativo e não figurativo, são exemplos de uma acessibilidade à imagem através de
103
mediações verbais. A interdependência verbal seria outro aspecto: a lógica permissiva pelo
modo verbal sobre a gramática visual. Se a sintaxe apresenta percepção, a forma referencia e a
intenção é um controle sobre as duas primeiras, um ato lógico.
Apesar da relutância terminológica, é prudente retomar a ideia de “alfabetização
visual” para essa lógica visual interdependente. Mais, especificamente sobre o conceito de
dois autores Dondis (2000) e Catalá (2011), cuja difusão tem sido significativa.
Segue primeiramente o significado do termo alfabetização. No uso comum traduz a
ideia de alguém que irá escrever e ler. A fala é independente da alfabetização, porém, esta
última pode ser definida como criação de código para servir de suporte à oralidade. Quando a
língua passou a ter outros suportes de registro externos ao sistema fonológico, com metas
extremamente socializantes, surgiu a técnica de codificação gráfica, que passou por vários
estágios. Foram sinais que representavam conjunto de ideias ou coisas, unidade de ideia ou
coisas e sonoridade vocal (HIGOUNET, 2003). De signos pictográficos (coisas e movimento
da boca) passou para ideográficos. Neste último estágio, uma herança grega configurava o
alfabeto (ocidente) como se conhece hoje. O termo nasceu da junção das duas primeiras letras
Alpha e Beta e implica no processo de aquisição dos códigos gráficos para representar a
oralidade, fica evidente a natureza verbal e difere profundamente do mecanismo de
compreensão da linguagem visual.
Dondis (2000, p 19) diz: “O alfabetismo visual jamais poderá ser um sistema tão
lógico e preciso como a linguagem. As linguagens são sistemas inventados pelo homem para
codificar, armazenar e decodificar informações”. Partindo desta concepção limítrofe de
linguagens, antropocêntrica, com indicadores para compreender o fenômeno sob a ótica
verbal, a autora propõe a ideia de mensagem visual e considera três características para elas:
input visual (miríades de signo), o material representacional e a estrutura abstrata, seja natural
ou intencional.
A ideia de símbolo para explicar a linguagem desenvolvida pela autora propõe um
sistema (verbal) que apura uma noção lógica, ou seja, a capacidade regulativa da forma verbal
para entender fenômenos. O material representacional trata da experiência direta,
independente de mediações de sistema codificáveis. A estrutura abstrata, com a qual ela
prepara o argumento para falar de sintaxe visual, se trata de algo elementar e de difícil
tangibilidade. Apoia-se na Teoria para dar continuidade. Dondis extrai categorias da
104
mensagem visual sem rever bases semióticas que permitem visões mais amplas sobre o
fenômeno da linguagem. A ideia da visualidade como experiência direta, que liga
estreitamente o individuo a realidade, é minimamente impossível, pois a cultura já estabeleceu
camadas de mediações desde que nascemos. Aliás, quando afirma: “Às vezes basta ver um
processo para compreender como ele funciona.” (DONDIS, 2000, p.21), implícita a ideia de
conhecimento prévio de uma estrutura Com a ideia de estrutura abstrata, elenca elementos
visuais (sintaxe e forma) do ponto de vista da produção visual bidimensional, apresenta
tópicos que estão na condição de efeito de sentido (semântica). O conceito de alfabetização
visual de Dondis trata de reconhecer e manipular a estrutura abstrata da composição. Não se
trata da natureza lato sensu do termo. Em síntese, duas proposições quase coerentes precisam
ser revisitadas: e reajustadas: (1) a necessidade de códigos para o modo verbal e a experiência
direta da visualidade e (2) a estrutura preexistente. Os códigos são signos simbólicos,
dependem de uma lei para serem decodificados, mas a experiência direta também é mediada
pelos signos, no caso de natureza icônica. Entretanto, penetrando nas fissuras perceptivas,
temos neuro-receptores aptos a capturarem determinadas situações do mundo visível
(avançaremos mais a frente) no processo de formação da imagem. Quanto a ideia de
estruturas preexistentes, a visualidade como experiência direta, leva a crer que a autora
esbarra em dois tipos de situação: a artificial dos códigos verbais e natural da visão. Tal fato
denota grande desconforto teórico para equalizar a discussão.
Catalá (2011, p 15), inicia sua conceituação a partir da potencialidade semântica: “Por
intermédio da língua, vamos do exato ao polissêmico, enquanto com a imagem do
polissêmico nos dirigimos ao concreto por um processo de compreensão de sua estrutura
visual.” Catalá observa aspectos unilaterais das duas formas de linguagem: a convenção do
signo verbal, aspecto simbólico, aparentemente exato, predispõe na sua arbitrariedade
deflagrar certa gama discursiva, enquanto que o signo visual, de natureza apresentativo,
aberto ao campo da experiência do leitor, representa algo como ele é.
Pontualmente, o autor extrai a sua ideia da interação de dois paradigmas,
aparentemente opostos para cuja interação conceitua:
Enquanto aprender a ler significa aprender a apagar o suporte material do
escrito para internalizar e automatizar seus mecanismos simbólicos, aprender a
ver implica tornar visível o material do figurado para construir sobre ele uma
nova simbologia. Trata-se de dois mecanismos cognitivos antagônicos,
embora ambos confluam para um processo de conhecimento parecido.
(ibid,id)
105
A confluência de Catálá explica a necessidade da forma verbal para organizar as
estruturas sintáticas da linguagem visual. Fato que também preocupa Dondis, mas não são tão
articuladas. A priori não fica claro na ideia do autor, mesmo quando ele usa o argumento de
negação, o que não é alfabetização: a organização verbal do visível, o uso do alfabeto para
descrever a estrutura da imagem, então, o que revela a condição de alfabetizar-se
visualmente? A afirmação: “a alfabetização visual significa, portanto, aprender a conhecer os
fenômenos visuais, ou seja, aprender a expressar verbalmente o que se produz visualmente.”
(ibid, p. 15) é bem mais esclarecedora, principalmente, quando ele reforça com a expressão
“aprender a linguagem da imagem”. Entretanto, não é intenção do autor construir o território
gramatical, mesmo que falacioso, como Dondis, para demonstrar o que seria essa linguagem
da imagem.
Destarte, a “alfabetização” é um termo impróprio para um fenômeno real. Talvez a
proposição de termos como “Educação visual” ou “gramatização ou gramaticalização visual”
fossem mais indicativos para a aprendizagem da linguagem visual, entretanto, manterei em
uso “alfabetização” pelo fato do conhecimento socializado que já acumula e a mudança de
nomenclatura não é fundamental para resolver o problema.
A linguagem visual é a compreensão leitora e operacional da produção de sentidos
gerados pela imagem na base da sua estrutura não pode ser confundida com a decodificação
nominal de formas figurativas e não figurativas. É tornar um fenômeno que insiste sobre a
percepção em estado consciente, manipulável, porém, os meios de produção de imagem,
desde lápis para o desenho sobre o papel até o “crtl C” e “Ctrl V”47
nos meios digitais,
favorecem a proliferação de imagens sem a preocupação do papel gramatical nos efeitos de
sentidos. As imagens, como signos visuais, estão mais próximas da natureza dos nossos
aparatos sensoriais que a palavra dependente dos nichos idiomáticos, porém isto pode gerar
uma falácia em questão de condição a ser apreendida.
Sob essa aparente “naturalidade” do signo visual para com as estruturas que
possuímos, iniciamos a construção de três tópicos da linguagem visual: a sintaxe, a forma e a
intenção. Nesta sequência dos termos estão imbuídos das relações fenomênicas
cenopitagóricas, elucidadas nos estudos de Santaella (2010).
47
Nome popular as opções de copiar e colar imagens, textos, nos suportes digitais.
106
A imagem, ao contrário da escrita, não se apresenta de forma linear, mas, holística, um
todo que se apresenta, cujo acesso não é pela forma-unidades ou partes, mas pelas relações
travadas entre elas – a sintaxe; a imagem apresenta unidades mínimas que a constituem – a
forma e produzem sentidos – a intenção. O emprego de termos tão comuns á área de
linguística não é exclusividade da mesma. São muitos mais palpáveis na linguagem verbal,
mas, preservadas as suas caraterísticas, estendem-se a visualidade. Na sequência,
começaremos pelo segundo, a forma, para entender a unidade.
Antes, é preciso esclarecer duas questões sobre dois aspectos da imagem - dimensão e
“em movimento”: a sintaxe e a morfologia da imagem bidimensional é a mesma da
tridimensional, assim como será a mesma aplicada às imagens estáticas e as imagens em
movimento? Até o presente momento, foi demonstrada a natureza tridimensional e móvel da
captação visual, portanto, o bidimensional e o estático estão numa posição menos natural que
as outras. Isso soa estranho, porém, foi a primeira imposição que os suportes restringiram à
nossa visualidade, tem-se a impressão que o contrário é o natural. A diferença entre
bidimensional e tridimensional são sínteses de planos e no estático-movimento a síntese de
tempo, o congelamento. Assim, as tentativas de sistematizações da sintaxe sobre a
bidimensionalidade estática na sua natureza sintética e geral explicam as anteriores. Um
exemplo é a linguagem do cinema. São imagens, bidimensionais em movimento, que só
existiram após o advento tecnológico de um suporte específico e permitiu a recuperação para
si de níveis sintáticos que somam aos anteriores, exemplo: sequência de cena entre outras.
Toda a linguagem visual sofrerá expansão da sua estrutura no encontro de novos suportes,
mas não eliminação, talvez uma redução sem deixar de existir.
4.4.1 - Forma na visualidade
A grande maioria dos estudiosos que retrata a linguagem visual, o desenho, a pintura,
define a forma visual a partir dos elementos: ponto, linha, cor e plano. Isso é um enfoque mais
matemático do que perceptivo. Kandinsky (2005) devaneia sobre o ponto por tratá-lo em três
perspectivas: a concepção geométrica, como equivalência do zero dada à condição
indivisível; a sua função na linguagem verbal como enunciativo do silencio da fala, impõe o
estado abrupto de percepção; e sugere o crescimento de dentro para fora criando forma. Nessa
evocação do ponto, está tangível um discurso que parte da produção de imagem, mas anterior
107
a elas existem as imagens no mundo natural e lá o ponto não é nada mais que a mais ínfima
redução da percepção da imagem. O ponto é o primeiro sinal de movimento dentro de um
campo visual, seja por deslocamento no campo ou por velocidade da luz emitida em direção
ao olho.
As figuras 20 a e 20 b apresentam duas figuras contendo duas circunferências, porém,
na figura 8 b apresenta uma das circunferências reduzida até um nível perceptivo que
normalmente será denominado de ponto.
Figuras20 a e 20 b - Comparações sobre o ponto
Fonte: elaboração do autor
Para a imagem, o ponto é um localizador espacial, uma qualidade perceptível no devir
de algo mais tangível. Para uma longa história tradicional da produção manual de imagem, é o
primeiro toque do instrumento que lança um interferente sobre uma base. A gênese da sua
inscrição está junto com a liberação das nossas mãos. A geometria deu-lhe ênfase como
convenção de unidade mínima da representação visual para constituir medidas do espaço,
porém, a fluência perceptiva é uma área ínfima em expansão de significação.
Áreas ou planos se apresentam na percepção em decorrência da luz refletida por
objetos ou emanadas diretamente de fontes de luz e, em ambos os casos, sofrem a refração na
retina. Áreas são pontos expandidos, cujo olhar é capaz de detectar partes mais internas em
contraponto com partes periféricas numa única unidade fórmica. (Figura21).
Figura 21 - Relações nucleares e periféricas da área.
108
Fonte: elaboração do autor
A morfologia visual inicia nos limites da estrutura sensorial, aparentemente
delimitada, mas com forte potencial polissêmico. A verificação da gramática visual deve
iniciar por uma investigação sob viés das Neurociências, mesmo quando este campo ainda
assume a existência do hiato entre a percepção e conexão para com a produção de imagens.
As linhas, definidas como trajetória de pontos ou registro do movimento do ponto no
censo comum da literatura sobre visualidade, também precisam de revisões. A linha, pensada
a partir do traço sobre um papel ou de uma escultura de arame, também parte da sua inscrição
no suporte e, assim como o ponto, atrelada ao nascimento do nosso desempenho motor fino.
Mas, antes dessa linha, há outra. Aquela que está no vinco de um papel, no encontro de duas
cores distintas, numa área que expande em duas direções opostas, caracterizando uma
estrutura linear. Está sujeita a uma organização evolutiva (Figura 22): anterior a linha criada
por pincel (C), decorrente dos suportes, está uma área em expansão linear (B) e antes dela a
sútil linha que surge do encontro de áreas distintas (A).
Figura 22 - Natureza da linha
Fonte: Elaboração do autor
O intuito deste argumento é apresentar uma forma visual com nascitura no mundo
perceptivo, em oposição a aquele singularizado nas características da produção: os suportes.
Deste modo, a forma visual é fundada primeiramente pela cor-luz e pigmento, que
estabelecem áreas, cujas dimensões configuram ponto e linhas. As texturas visuais são
variações da luminosidade que preenchem as áreas perceptíveis.
109
Este discurso não é original, Marr48
em suas pesquisas computacionais sobre o
processamento da informação visual, propôs a percepção e estímulos visuais em três níveis
(Figura 23): o esboço primário (bidimensional), primeiro nível de organização perceptiva
visual, caracterizado pela identificação de areas em função da luz: cores, texturas, bordas,
etc.); um segundo nivel, o 2½D (bi-e meio-dimensional), saliências, cocanvidades,
recombinações do esboço primário criam minima sensação de profundidade. As formas, em
estado de alteridade em relações umas com as outras, criam estados de atenção diferentes, “o
que vem primeiro”, o “que vem em segundo”. O terceiro nivel, oModelo em 3D
(tridimensional) versa na construção de um modelo estável, que comporta "rotações mentais"
da forma.
Figura 23 - Ilustração do esboço da visão proposta David Marr
Fonte: Imagem adaptada da obra de Eysenck, M. W.,e M. T.Keane. (2000, p. 96)
Para Marr (1982), se tratam de processos autônomos de formação da imagem, a
natureza das suas ideias partiu de experiências biológicas para modelos de inteligência
artificial, porém muito se assemelha a processos humanos, mas que são contíguos. Esta
citação sob a concepção de Marr é para ressaltar algo que muitas vezes ocorre despercebido
nos tratados dos elementos da forma visual: a tridimensionalidade. Um provável fruto da
alienação em analisar a produção visual apenas na faceta bidimensional. O tridimensional se
constitui na variação luz-sombra sobre áreas – movimento luminoso e depois na
particularidade bifocal. Kandel (1997) ressalta que Marr, ao escrever seu livro “Vision”,
partiu do “o que é que significa ver” e entendeu que a visão é processo e descoberta, pautada
nas imagens, do “que” está presente no mundo visual e “onde está.” A forma não é percebida
quando destituída do seu contexto visual.
48
David Marr (1945 - 1980) foi um neurocientista e psicólogo britânico com pesquisas na área de
processamento visual. Seu trabalho teve grande influência na neurociência computacional e levou a
um ressurgimento de interesse no campo.
110
Essas considerações nos levam a crer na necessidade de pensar a linguagem visual
fundada muito além de inventário da produção de imagens. Se há uma ordem das imagens
naturais para mentais e depois para constituídas em suportes, resgatar as anterioridades é
pertinente para não compreender o fenômeno a partir da apreciação de metade do seu evento,
como ocorre com Dondis e Kandisnky. Inclusive, porque o papel da motricidade (mãos), na
produção de linguagem, na herança de suportes tradicionais, sempre valorou a primeira, a
criação da forma unidade, em detrimento da forma composicional.
Nas Neurociências, na anatomia das vias visuais, existem áreas diferentes para
processar a imagem:
[...] a área V5 (MT) diz respeito primariamente ao movimento no campo
visual, enquanto V4 é mais implicada na cor e na orientação dos bordos.
Assim, o sistema visual (como o sistema sensorial somático) tem várias
representações distintas de sua camada receptiva, a retina, e cada uma está
envolvida no processamento de diferentes aspectos das informações visuais.
(KANDEL, SCHWARTZ E JESSELL, 1997p. 315)
A distribuição de informações se dá por processamento em paralelo, grupos de
neurônios processam simultaneamente a imagem, porém não se trata de um acordo consensual
nessa área e abre uma questão a ser explicada: como processos separados de cor, movimento,
profundidade, se tornam coesos na produção de imagem. Treisman e Julesz (apud KANDEL,
SCHWARTZ E JESSELL, 1997), procuram responder a síntese através da atenção focalizada.
Sugerem dois processos distintos na percepção visual: pré-atento, um sistema de
escaneamento veloz do contorno do objeto e outro, atento, subsequente, selecionando,
evidenciando e articulando qualidades do objeto. É impulsivo ler esses dois processos sob a
semiose perceptiva, no nível do objeto do signo: o acesso que temos ao mundo externo
depende de um objeto que é imediato e implica no objeto dinâmico. O que nos põe no
continuum da semiose são os elementos gerais da representação, que pertence ao objeto
dinâmico, enquanto o imediato restitui a singularidade do objeto. Assim, fluxo da atenção
visual de Treisman e Julesz, corresponde, de certo modo, ao fluxo perceptivo dos objetos: o
estado de pré-atento já tem a presença do objeto imediato, mas que flui vigorosamente para o
objeto dinâmico, mas atenção é uma condição do “deparar-se com”, que retroage o fluxo ao
objeto imediato.
Não cabe estender sobre o assunto para dentro das Neurociências, pois o intuito desta
discussão é comparar para reforçar os elementos que constituem a forma visual entre aquilo
que está no mundo passível de ser visível e aquilo que o corpo humano está dotado. O que
111
interessa para o momento é a sensibilidade natural que o sujeito possuí e se estrutura numa
relação intrínseca, mas tem hierarquia velada: sem luz não há forma, sem forma não há
movimento. Sobre os mapas da distribuição paralela observa-se a figura abaixo. :
Figura 24 - Comparação da distribuição paralela -
Autor (es) Nível 1 Nível 2 Nível 3 Nível 4
Treisman Cor Orientação Tamanho Distância
KandelSchwartz
e Jessell Cor
Forma e
profundidade
Movimento e
profundidade -
Marr
Relações de
luminosidade
na elaboração
da área
Área com relações
mínimas de
volume
Forma em 3 D -
A proximidade conceitual é menos acentuada com Treisman, que através do termo
orientação (a posição no espaço) e distância (a relação espacial objeto do objeto, sujeito do
objeto) podem ser aproximadas por predisporem o objeto em conexão com o todo. A cor
revela uma forma contida num espaço. Aqui está engendrada a relação dual que irá
predominar na sintaxe visual: a figura-fundo discutida mais a frente.
A teoria da percepção seletiva, evocada a pouco com a ideia da percepção focalizada,
é uma discussão pertinente nas Neurociências, tangível na evolução dos primatas, por isso não
pode ser apenas entendida como um olhar sobre a imagem estanque, mas também como foco
em deslocamento.
Bear (2008) sobre as pesquisas, ainda inconclusivas, do mapeamento dos neurônios
sobre o movimento, apresenta três funções da percepção no movimento: a navegação - de
caráter geral, direções e velocidades de objetos que fluem em nossa visão periférica;
orientação do movimento dos olhos - o movimento dos olhos captados pelo estado de
atenção sobre um objeto; percepção do movimento - a, operacionalidade desta captação num
mundo que se movimenta e do sujeito dependente da interpretação do objeto.
Na apreensão do objeto visual, podemos experimentar algumas combinações: o objeto
que se desloca em relação ao sujeito, o sujeito que se desloca em relação ao objeto, ambos em
deslocamento, mas quando a estática se estabelece na apreensão, finda o movimento? Não,
ainda existem os ínfimos movimentos dos raios de luz e da provocada pela sintaxe visual. O
movimento envolve algo além da forma, o conjunto contextual, portanto a única coisa que lhe
112
cabe na condição de singularidade formal, na tentativa de extrair a uma análise formal,
desconectada da visualidade geral, é enunciar a posição (Figura 25).
Figura 25 - Esferas ou cavidades: efeitos da luz e posição.
Fonte: http://to-campos.planetaclix.pt/visio/ilusao/sombras.htm
A imagem da direita traz a sensação de esferas convexas enquanto a esquerda de
côncavas. Tratando-se de imagens semelhantes apenas em posição diferente, a conduta
interpretativa que a luz vem de cima resolve a questão. Não, se enfrentarmos o objeto,
também experimentaremos uma confusão entre definir o côncavo e o convexo. A forma-
posição assume o aspecto absoluto e outro, relativo, que a predispõe sempre com alguma
coisa. Essa relatividade traz à baila a questão da experiência visível anterior que cada sujeito
traz consigo, que contribuirá para a percepção seletiva, mas que por ora não será tratada.
Esta identificação dos elementos constituintes da forma visual a partir de pressupostos
da percepção é claro na questão luz-luminosidade (cor), área-dimensão (linhas, planos,
volumes) e a conexão com o espaço (posição), a relação cenopitagórica das categorias
fenomenológicas.
4.4.2 - A sintaxe visual
Indícios sobre a sintaxe visual foi objeto de estudo de alguns pesquisadores, como:
Kepes49
(1969) enunciado na obra editada em 1944 - Linguage of vision, que influenciou os
estudos de Scott50
(1978) expresso na publicação Design Fundamentals - publicado em 1958.
Estes dois autores são os mais extensos no inventário dos tópicos, mas não reconhecem o
sistema sintático. Kepes avançou para a expressão bidimensional e Scott incluiu aspectos da
49
György Kepes (1906 - 2001) pintor de origem húngara, desenhista, educador e teórico de arte. Emigrou para os
EUA em 1937, ele ensinou design no New Bauhaus em Chicago. 50
Robert Gillam Scott desenhista, escritor e professor na Universidade de Yale..
113
expressão tridimensional. Arnheim51
(1974), discípulo de Wertheimer, publicou sua primeira
obra relevante a questão da sintaxe em 1954 - Artand Visual Perception, desenvolveu os
tópicos da visualidade em prol capacidade criativa e o pensamento visual sob viés da Gestalt;
Dondis52
(2000) publicou A primer of visual literacy em 1973, sob um olhar bidimensional
da imagem, porém assumiu terminologias até então pertinentes ao modo verbal da linguagem,
como alfabetização e sintaxe; e Wong53
(2001) publicou Principles of form and design em
1993, seus estudos partem da forma unidade para forma composicional e, em oposição às
ideias deste estudo, afirma que a linguagem visual não tem nenhuma lei evidente. Sobre a
questão, poderia ser adicionado o nome de Kandisnky (2005), porém o seu estudo, apesar de
ambientado no pensamento da Gestaltista fluente na Bauhaus, implica um olhar muito mais
sobre a forma. O objetivo deste quadro é apresentar alguns indicadores da horizontalidade da
incongruência que se dá ao reconhecimento da sintaxe. Territórios confusos que não
identificam claramente forma e sintaxe, por falta de compreender a lógica geradora dessa
gramática.
Recorrendo a etimologia: do grego syntaxis, “ato de colocar em ordem, de
arranjar”,composta por syn - “junto” e tassein - “ordenar, arrumar”. A sintaxe visual é objeto
privado de estudos mais intensos, pois a tendência de compreenderem a linguagem visual no
aspecto da imagem contribui para enredar elementos visuais da forma com modos de
organização dos elementos visuais. Dentre os estudos que se aproximam da discussão da
linguagem visual podem ser destacados dois tempos: um primeiro, marcado pela história da
Arte, cujo principal foco foi as expressões bidimensionais (pintura, gravura, desenhos, etc.) e
um segundo, iniciado pelos estudos da forma desenvolvido com a Psicologia da Gestalt.
A evolução da linguagem visual pode ser observada pela evolução das Artes Visuais,
ambas se confundem pelos parâmetros do conceito de Arte (GOMBRICH, 1985), evoluem
intrínsecas e se definirão ao longo da história nas metas da intencionalidade do discurso
estético e o comunicacional.
Cientes que a imagem se apresenta de modo holístico à nossa mente e depois são
definidos estados de atenção, o reconhecimento da linguagem na visualidade tangível na
produção de imagem, surgiu uma preocupação com a forma (Paleolítico e Neolítico), depois
51
Rudolf Arnheim Berlim (1904 - 2007) foi um psicólogo alemão behaviorista, que emigrou em 1940 para os
EUA. Foi através de estudos sobre as Artes que passou a Psicologia da forma. 52
Donis A. Dondis (1924-1984) foi designer e lecionou na Universidade de Boston (EUA). 53
Wucius Wong (1936) chinês com estudos realizados nos EUA investigou a linguagem expressa através de
linhas, texturas, luz e composição
114
com a diagramação (Antiguidade), o fundo como delineador do campo visual (Antiguidade e
Idade Media), a relação figura-fundo com percepção da profundidade por justaposição ou
variação de proporção (antiguidade e idade média), profundidade por perspectiva (Idade
Média e Moderna), conjunto composicional (fim da Idade Média e Idade Moderna) a
luminosidade e cor (Idade Moderna e Contemporânea), decantação54
da imagem pela cor, pela
forma e pela convenção da figura (Idade Contemporânea) e a decantação da materialidade
(século 20). Não se tratam de momentos estanques, mas etapas permeáveis, cuja produção
nem sempre foi equivalente a consciência operativa das estruturas do fenômeno da linguagem
Esta perspectiva é delineada pela expressão bidimensional, por vários fatores, mas que para
esta reflexão ressaltamos a mobilidade de suportes após o advento do quadro, a imagem
independente dos planos arquitetônicos e o aparecimento de uma cultura impressa.
O segundo momento, mais efetivo, consciente sobre a linguagem visual se dá num
contexto cronologicamente marcado, a passagem do século 19 para o século 20. Duas
naturezas contextuais são importantes de destacar: de um lado a produção de imagem marcada
pelos efeitos da decantação da cor e da forma (Impressionismo e Pós Impressionismo),
somada ao convívio do ocidente com os elementos pictóricos africanos55
,engendrados nas
causas da decantação da forma desenvolvida nas Vanguardas Europeias; e do outro – a
evolução dos estudos científicos sobre a psicofísica, percepção da forma, a Psicologia da
Gestalt. Os enunciados dessa ciência influenciaram desde artistas, professores e instituições
de ensino de Arquitetura e Design como a Bauhaus.
O termo Gestalt aparece, Segundo Westheimer (1999, p 5) “has played an important
role in discussions of perception ever since it was used by Ernst Mach in his Analysis of
Sensation, first published in 1886”, mas é atribuído a Christian Von Ehrenfels (1859-1932) a
responsabilidade efetiva pelo conceito da Gestalt. Assim como, ele sofreu influência de Mach,
ele influenciou Marx Wertheimer, Kurt Koffka e Wolfgang Köhler, responsáveis pelo
surgimento da Psicologia da Gestalt56
, entre 1910 e 1912, na Alemanha. Baseados em
tratamentos anteriores sobre a percepção da forma, realizaram estudos psicofísicos – os quais
54
A decantação é um processo existente nas ciências química e física sobre a separação de resíduos em
substâncias heterogênea. Na segunda metade do século XX passou a ser usado nas Artes Visuais como meio de
desconstrução dos sentidos figurativos e conceituais em prol de elementos mais qualitativos da composição, ou
mais recentemente, na convencionalidade de alguns suportes. 55
Na virada do século 19 para o século 20, elementos materiais da cultura de algumas etnias africanas saqueadas
pelos colonizadores europeus eram levadas e comercializadas em Paris, assim como, foram organizados
exposições com intuito antropológico. 56
Os termos, em português, que mais se aproximam para traduzir a palavra alemã são “forma”,
“configuração”.
115
relacionaram a forma e sua percepção, inicialmente, na ilusão de ótica, quando o estímulo
físico notado pelo sujeito tem uma forma diferente da que corresponde à realidade. Köhler
(apud GUILHAUME, 1960), atribuiu à palavra Gestalt o significado de uma entidade
individual e com características concretas, conotando a análise da forma independente do seu
contexto. Porém Wertheimer, como mentor influente do grupo, foi mais longe:
There are entities where the behavior of the whole cannot be derived from its
individual elements nor from the way these elements fit together; rather the
opposite is true: the properties of any of the parts are determined by the
intrinsic structural laws of the whole'' (WERTHEIMER apud
WESTHEIRMER, 1999, p. 6)
Para ele, Wertheimer, a percepção da forma não estava sujeita à singularidade da
forma, e nem às relações que as encaixam para compor o todo imagético, mas às leis de
organização perceptual. A Teoria da Gestalt, enunciada por Wertheimer, subsidiou várias
concepções sobre a leitura de imagens, ele antecipou atuais compreensões das Neurociências,
ou seja, as organizações perceptivas são fruto de grupos de neurônios especializados para
determinadas situações dos estímulos visuais. Enquanto Wertheimer registrou o efeito, dada a
evolução cientifica de seu tempo, a Neurociências localiza a causa dessa conduta: hábitos do
sistema cerebral.
Guillaume (1960 p 57) faz observações sobre a relatividade da experiência acumulada
nas leis da Gestalt, a crítica da teoria da significação adquirida: “[...] Para que o objeto possa
adquirir uma significação, é necessário que já exista como objeto sensível, em virtude de seus
caracteres intrínsecos. A influência da memória é secundária, nesta organização que ela, longe
de explicar, implica.” A memória ter papel secundário é negar processos associativos na
semiose perceptiva, a condição de geral que a terceiridade “linka” a secundidade no processo
de semiose. A Gestalt está mais para a aparência, a visualidade que se apresenta para sob o
julgo de uma ordenação existente no sujeito, mas, ele lê de acordo com suas cognições
anteriores, portanto, é claro que a experiência desempenha um papel na percepção. A questão
é: até que ponto que as leis são infalíveis mediante a experiência existente? Recorremos à
leitura de imagens abaixo (Figuras 26 e 27).
Figura 26 - Radiofoto de 1959 Figura 27 - Imagem invertida
116
Fonte:
http://agenciafm.blogspot.com.br/2010/08/radiofoto
Fonte: adaptada de
http://agenciafm.blogspot.com.br/2010/08/radiofoto
É uma radiofoto tirada no sobrevoo sobre região montonhosa por equipes de
reconhecimento aéreo. Foi publicada num jornal de 1959, nos USA e atingiu repercursão
significativa pela grande massa de leitores que interpretaram a revelçao da face do Cristo. Se
a imagem for apreciada em posição inversa a face desaparece, do ponto de vista do signo esse
fenômeno é claramente explicável pelo interpretante remático, mas, neste momento,
interessam as questões de organização percepctual da Gestalt: a forma central é impregnante,
criando estados de atenção em ambas as imagens, na figura 13 a convenção dos processos de
representação produzem a associação com a imagem do Cristo, enquanto na figura 14 outras
associações estão aptas a surgirem. Também se observa, no segundo caso, a imagem
principal expande para além do campo visual, enquanto a primeira, dada a convenção da
representação, o olhar converge. A predominância da forma central é intensifciada pelo
agrupamento de semelhanaça de área, pela distribuição do espaço, ou seja, significa que as
organizações perceptuais podem ser aspresentar de modo incorporativo, com graus de
predominância, e somada a essa condição a experiência anterior.
Assim, de acordo com o visto, existem hábitos neuronais para aprensão da forma
visual e também haverá outros para ordenação visual (KANDEL, 2014), mas ambos sujeitos a
intensidades, recombinações e efeitos sob a influência da experiência adquirida. Não
podemos nos equivocar em considerar experiências anteriores apenas no campo nominal, pois
tampém é hábito aquele que enxerga mais variações de tons em função de manipulá-las
constantemente.
As divulgações das Leis da Gestalt partiram do texto seminal de Wertheimer, datado
de 1923, cujos tópicos seguem uma ordem gerativa, pelo menos para a explicação do
conceito. Estudos posteriores sobre a questão inseriram observações de Kofka e Köhler,
proliferaram novos termos para traduzir os conceitos, que dificultam manter uma homogenia
117
literária. Tendo em vista que não se trata de uma verticalização na obra de Wertheimer, mas
da relevância dos sintomas da organização perceptual, segue a síntese Schiffman (2005),
atualizada inclusive com referências ao amadurecimento do pensamento pelo próprio
Wertheimer: princípio de proximidade, elementos no campo visual estabelecem arranjos,
porém, a noção espacial de proximidade depende da visibilidade do todo; principio de
semelhança, que dependerá de processos de associativos por algum tipo de similaridade, é
encapsulada pela primeira, pois intervalos são um tipo de semelhança; a junção destas duas
leis proximidade e semelhança, em atritos de predominância, determina o principio The
Factor of Uniform Destiny ou boa continuidade, ou seja, coincidências de linhas, áreas,
planos, que são percebidos por parecerem seguir uma única direção; o principio de destino
comum, diferente do principio anterior, é um agrupamento por elementos distintos cuja
direção os iguala; a Lei de Prägnanz ou principio da boa forma é tendência de se apreender
entre, as possíveis opções perceptuais, formas mais simples e estáveis de todas, para tanto,
não se trata de uma lei de causa, mas de efeito dos outros princípios. Schiffiman (ibid)
atualiza essa relação salientando a simetria e fechamento e inserindo o princípio de
conectividade uniforme57
. Estes princípios apresentam uma diferença em relação aos
primeiros, pois, enquanto os demais se aplicam ao contexto forma-campo visual, a simetria e
o fechamento atendem tanto essa questão como formam unidade. O principio de
conectividade uniforme é ainda um argumento subjetivo.
A percepção não pode ser reduzida apenas a um papel meramente fisiológico, mas é
desses sensores que ela depende, assim, como existem grupos de neurônios para a percepção
da forma. Reforçado nos argumentos de Westheimer, o reconhecimento das Neurociências ao
postulado de Wertheimer, demonstra que as organizações perceptuais são inatas ao cérebro,
um conjunto de leis sujeitas as mais diversas combinações, grupos neuronais condicionados
tanto a recepção da forma como organizá-las, entretanto, não podemos fechar a questão da
percepção, sem considerar a experiência adquirida. Estes aspectos estão no campo do sujeito.
Externo ao sujeito, os signos insistem sobre nós, mas não se trata de uma segregação, sujeito e
signos. As doutrinas do hábito e do falibilismo de Peirce revelam a flexibilidade do
fenômeno, assim, o que está no sujeito não são apenas hábitos adquiridos culturalmente,
existem hábitos vinculados por semioses evolutivas da espécie, são signos corporificados na
materialidade humana desde a sua gênese, portanto o signo, elemento efetivo da mediação, é
o elemento geral, transeunte entre mundo objectual e sujeito. 57
Segundo Schiffiman (2005) este princípio foi aperfeiçoado nos estudos de Rock & Palmer
118
A necessidade de evidenciar estes argumentos é para demonstrar que a sintaxe visual é
determinada pela organização perceptual que é guiada pela principio de mediação.
Retomando que a mediação predispõe o fato singular em plural, caso contrário, não é operante
a sua conexão, são esses traços de generalidade que estão na proposição de Wertheimer.
Primeiramente, percebemos o espaço a partir da forma, desde o mais sútil tom de uma
cor até as definidas em contornos, nosso olhar sofre de estados de atenção provocados pelo
mais ínfimo traço de contraste, o mundo visual determinado pelo tempo e espaço, assim, a
visualidade, a imagem e a linguagem visual, é um fenômeno de mediação, pertencente à
terceira categoria, mas sob intensa predominância de uma secundidade – alteridade,
dualidade.
Os princípios são antes de tudo agrupamentos, cujo critério implica em alguma
regularidade: a “proximidade e semelhança” são olhar captado por alguma forma e sua
relação com outras, que inclui forma-intervalo e igualdades, as semelhanças. Inclui-se a “boa
continuidade” e “direção comum”, pois para agrupar-se também necessita de certa
regularidade. A “boa forma” tem caráter de sintético ao depender das demais, ou seja, síntese
são regularidades. Partindo dessa análise, a sintaxe visual tem algo de semelhanças,
“movência” e unificação, o que sinaliza possíveis categorias da sintaxe visual.
Não é pretensão para o momento alargar a sintaxe, mas é preciso pelo menos um
inicio elucidativo para prever intenções de discursos e, quiçá, condutas perceptivas. Assim,
após estudos nas referidas obras citadas no início deste tópico: Kepes, Scott, Arnheim,
Dondis, observou-se um consenso comum, mais terminológico que conceitual. São eles:
contraste das cores, relação-figura fundo, agrupamentos por semelhança, profundidade,
equilíbrio, distribuição simétrica e assimétrica, tensão espacial e ritmo. Na realidade, exceto a
iniciativa de Dondis, não há a preocupação em distinguir os elementos de uma sintaxe. São
aspectos tratados independente de consciência sistêmica. É possível que seja um sintoma da
concepção do objeto visualidade que tem sido estudado: a natureza psicofísica. Esta será a
pretensão da abordagem semiótica, reconhecer a sistematização sintática.
Observa-se na nascitura da forma visual (quadro1), objeto da sintaxe, de acordo com
as estruturas receptivas do sujeito, que são: a cor,a forma-profundidade e o movimento,
modos de percepção do espaço, cujas formas nascem na cor, construindo áreas, estabelecendo
diferenças de atenção e dependentes de um cenário e um sujeito moventes.
119
Para os Gestaltistas, mais especificamente Wertheimer, os princípios da organização
perceptual podem se apresentar sobrepostos, portanto, compreendê-los como indicadores da
sintaxe visual é assumir essa condição para a sintaxe.
Relembrando que a sintaxe de uma linguagem, sob viés fenomenológico, é o
primeiro de um terceiro, portanto emprenha uma ordem para algo subsequente, exige para si
um predicativo, baseado no postulado, a visualidade exposta, e enuncia modos de
organização, dos mais sutis ao concreto relativo.
Diante dessas reflexões, podemos argumentar sobre características da sintaxe visual:
(1) é dependente do sistema perceptivo do sujeito, (2) está sujeita a experiência adquirida; (3)
é organizadora dos arranjos da forma unidade, compõe a forma composicional; (4) se
apresenta sobrepondo-se e criando graus de predominância; (5) apresenta e representa o
espaço (e tempo); (6) depende das relações de semelhanças e diferenças, comparativas; (7)
está predisposta para há algum tipo de movimento; (8) tem finalidade integrativa, unificadora.
Destas características procuramos identificar um sistema “lógico de ser” a luz das
categorias fenomenológicas: no primeiro nível está o “apresentar-se” com suas propriedades
de arranjos de cores e de formas, no terceiro nível “integra” os elementos sintáticos em prol
da totalidade da imagem. O que seria o segundo? A segunda categoria do fenômeno é reativa,
conflitante, marcada pela alteridade e, ao associarmos a sintaxe visual, devemos lembrar que
o objeto que nós fixamos não é a forma-unidade, mas a composicional, dotada de algum tipo
de movimento, estará sempre na relatividade entre objeto e sujeito, assim, os indicadores da
fluência no espaço visual podem evidenciar ou obscurecer as sobreposições de elementos
sintáticos da linguagem visual. Talvez entenda a afirmação incoerente de Wong (2001) sobre
falta de lei evidente na linguagem visual, existe um conjunto de leis que multiplicam relações,
assim, faz jus a ideia de Català (2011), que a linguagem visual vai do polissêmico ao
concreto. Se a sintaxe é a organização geral das partes, a partir destas três categorias, é preciso
ver como elas se comportam em relação a sua estrutura morfológica: a forma-cor, a forma-
área e a forma-composicional.
4.4.2.1 - A sintaxe da cor
A dependência da luz é indubitável para a existência da visualidade. Ela revela o
espaço que pode ser percebido pela fluência da mesma no espaço, portanto, se houvesse um
único fluxo de luz, homogêneo, sobre nossa retina não haveria nada além de um continuum de
120
luz. A variação da luz, refletida e refratada, constrói o espaço visual, portanto a linguagem
visual é intensamente caraterizada pela presença do contraste “Combinación de cualidades
opuestas, relacionadas; oposicion, variedad. Diferencia essencial de luminosidad” (CRESPI e
FERRARIO, 1995). O contraste são diferenças, que vai da mais arguta alteridade até posições
diametrais.
Retomando a predominância da secundidade nesta forma de linguagem, a primeira
ordenação matricial, que é a alteridade espaço-forma, cuja cor é o primeiro fundante na
qualidade de primeiro determinante da forma. A cor não pode ser pensada simplesmente no
pigmento, inicia na cor luz e termina nos efeitos de reflexo e refração. A cor nunca está
isolada de outra cor (mesmo que seja um corpo acromático), caso contrário seria um
continuum sem distinção forma – espaço, essa relação de diferenças abriga possibilidades de
organizações. Existem três primeiros contrastes (Figura 28): qualidade da cor, a diversidade
do grau de pureza da cor quando sujeita a interferência do Branco, do preto, do cinza ou da
sua complementariedade; luminosidade, claro-escuro, que é fruto das oscilações da cor entre
a luz branca e da ausência de luz; temperatura da cor, quente e fria, enquanto energia, a luz é
fonte de calor, que nos afeta tanto na visualidade como na sensibilidade cutânea à
temperatura. São contrastes evidenciados essencialmente dos elementos qualitativos da cor.
Figura 28 - Contraste de qualidade Contraste claro e escuro Contraste quente-frio
Fonte: elaboração do autor
Um segundo grupo de contrastes (Figura 29) é: a quantidade de cor (ou superfície)
se dá na diferença das dimensões que a duas ou mais cores preenchem o espaço, cujas
observações numéricas de Goethe58
(CRESPI e FERRARIO, 1995) procuram compensar a
velocidade da luz que nos afeta através de variação da dimensão da superfície; “da cor em si”
58
Johann Wolfgang von Goethe (1749 — 1832), escritor alemão, realizou incursões no pelo campo da ciência.
As referências de partes (compensação de valores luminosos) utilizadas a partir dos estudos de Goethe são: 9
para violeta, 8 para azul, 6 para vermelho, 6 para verde, 4 para laranja e 3 para amarelos
121
comparando a ideia de preto e branco, são manifestações acromáticas máximas do claro e
escuro, as três cores geratrizes – verde, ciano e magenta para a cor luz ou amarelo, azul e
vermelho para a cor pigmento são expressão máxima do contraste que perde intensidade a
partir das cores geradas; de simultaneidade é o efeito de uma cor sobre aquela que está na
sua adjacência, por exemplo, duas cores “cores frias” podem tornar uma delas mais “quente”,
assim como duas “cores quentes” podem tornar uma delas mais fria, uma cor pode alterar a
sensação de claridade da outra.
Figura 29 - Contraste de quantidade Contraste da cor em si Contraste de simultaneidade
Fonte: elaboração do autor
Para avançar sobre o terceiro grupo, é preciso recuperar a ideia que a luz branca59
é
uma soma das cores do espectro visível pelo olho humano, que podem ser reduzida a três
matrizes únicas: verde, ciano e magenta. O termo de complementaridade se aplica à
associação de uma geratriz (verde, ciano ou magenta) com outra gerada (violeta, amarelo e
laranja), que reconstituem a luz-branca. O mesmo ocorrerá nas cores pigmentos, porém a
soma será o preto. Agora segue: o contraste sucessivo, não muito reconhecido na literatura
especifica como tipo de contraste, também denominado de fenômeno pós-imagem
(FIGUEIREDO E PIETROCOLA, 2000) e cor inexistente (PEDROSA, 1982), é melhor ser
compreendido através de exemplo: ao fixar o olho numa mancha vermelha e depois de alguns
segundos, deslocamos o olhar para outra superfície e vemos um tom de ciano brilhante. O
vermelho seria a cor refratada na retina por reflexo de algo pigmentado ou emissão direta de
alguma fonte luz. A cor-luz vermelha está num contiguo da luz branca, que só não se forma
porque lhe falta a adição da cor luz ciano, por algum mecanismo ainda em estudo na área de
59
A luz branca é uma convenção da Física, pois a fonte principal do nosso sistema planetário, que é o sol,
pertence a grandeza amarela.
122
contemplação e desnecessário de aprofundamento, o sistema visual compensa a ausência após
o deslocamento. Não se trata de uma imagem unicamente mental, pois se trata de captação da
luz, um instante ínfimo de processos perceptivos. A questão é: como esse contrataste opera
como sintaxe? Na mais sútil das experiências, o estado de latência da nossa percepção, sujeito
a interferir na qualidade luminosa da percepção sob o jogo das áreas e das posições da
imagem. O contraste complementar, conceito já antecipado, está para a cor-luz e a cor
pigmento, são os pares que constituem a soma. O contraste de sequência matizada ou tonal,
muito próxima da ideia de qualidade da cor, mas a passagem das diferenças é harmonizada
pela proximidade tonal ou da mistura de matizes no complexo do espectro, são vizinhas por
ordem espectral, são análogas, enquanto os demais contrastes podem fazer a imagem pulsar
em partes do espaço, a sequência é linear e cria direções de fluxo (Figura30).
Figura 30 - Contraste sucessivo Contraste complementar Contraste de sequência
Fonte: elaboração do autor
4.4.2.2 - Sintaxe da forma
A respeito da leitura da linguagem, o modo verbal, escrito ou oral, obedece a uma
leitura linear, enquanto a imagem parece ser diferente, se apresenta em tempo único ao olho,
mas é um engano. Enquanto a primeira é linear, encadeada (DEHAENE, 2012), cuja noção de
tempo para leitura é óbvia, a segunda não foge a essa natureza, temporal, porém não é
encadeada e nem linear, o todo que se apresenta sofre de variações ínfimas, pulsões de partes
do todo da imagem sobre o sujeito. Não se pode confundir essa afirmação como se, ao
perceber a imagem, parte-se da junção de suas partes, ela se apresenta no todo, com ínfimas
variações temporais, que podem ser demonstradas na sobreposição de elementos sintáticos:
uma imagem que, a priori, se apresenta por um agrupamento de área.
123
A sintaxe da forma é uma sintaxe da forma em trajeto composicional estabelecido
pela velocidade da luz, a mais sutil; pelas áreas menores em relação a dimensão do campo
visual, principio semelhante ao identificado por Dehaene60
(2012) no processo de leitura da
escrita e, também, na propriedade do contraste: projeções contínuas, áreas maiores que o
campo visual dificultam a percepção dos limites; e pela convenção figurativa. Da primeira
para a terceira, são “encapsulantes.” (Figura 31).
Figura 31 - Princípios de alteridade da forma Velocidade da luz Áreas apreensíveis em relação a
projeção e continuidade
Convenção
Fonte: elaboração do autor
Os intervalos entre formas nos espaços geram a tensão espacial, mas não podem ser
reduzidos somente a esse patamar. Intervalos entre formas criam o magnetismo que as agrupa
ou repele, porém, a tensão espacial se projeta além dos intervalos. Cria focos de perceptivos
em relação de “tensionamento.” (Figura 32).
Figura 32 - Tensão espacial– simples
Fonte: elaboração do autor
A noção dual de superfície e profundidade, seja na forma tridimensional como
bidimensional, existe na distinção de planos, é uma ordem movente, interna ao próprio
campo visual, que vai desde os níveis da velocidade da cor até as simulações
60
Dehaenedemonstra que o processo de leitura da escrita depende de um limite focal sobre o conjunto de
palavras, ou seja, um perfeiçoo e outro nuclear que se transmutam na linearidade do ato.
124
perspectivas61
.Outra dualidade, posição e direção62
, são eventos responsáveis pelo
deslocamento vertical (esquerda-direita), horizontal (altura) e diagonais.
Antes de prosseguir, alguns argumentos em prol da convenção no processo de
estabelecimento figuro-fundo na forma composicional. A convenção aqui é tomada como
hábito perceptivo, assim, a convenção não é exclusivamente o legi-símbolo-argumental, o
signo genuíno, mas níveis simbólico-remáticos do signo, constituídos de um lado pela
experiência e do outro pela predisposição dos grupos de neurônios na construção mais básica
da forma.
Seja qual for o nível da apresentação da relação forma espaço, estes estarão sob a
varredura de semelhanças. O critério de semelhança, o primeiro principio percebido por
Wertheimer, evoca as diferenças, a descontinuidade, que evoca associações, agrupamentos de
algum traço de regularidade. Os agrupamentos perceptuais (Figura 33) estão num campo
proposicional, portanto são múltiplos, porém, mapeáveis: preenchimento das áreas (cor,
textura), dimensão das áreas (tamanho e formato) e posição (direção, intervalo e atitude).
Porque agrupamentos estariam sob uma organização sintática movente? Se houvesse só
semelhança, haveria apenas uma variação: a captação da dualidade, forma espaço; a presença
de semelhanças e diferença estabelece agrupamentos, que por sua vez movimenta a percepção
sobre a imagem.
Exemplos de agrupamentos são mais didáticos em formas abstratas, pois, em
elementos figurativos, as mediações simbólicas, nominais, são de tal trama imperativa que
obscurece a sutileza da leitura.
Figura 33- Agrupamentos por semelhança
61
A profundidade na imagem bidimensional pode ser simulada pela: velocidade da cor, pureza do matiz,
sobreposição, proporção e perspectiva 62
A direções “da esquerda para a direita” são hábitos intensificado pela cultura escrita e o “alto-baixo” são
reforçados pelo ambiente natural em relação a luz.
125
Fonte: elaboração do autor
4.4.2.3 –Sintaxe da composição
Enquanto a sintaxe da forma encapsula a sintaxe da cor, por conseguinte a sintaxe da
composição abrigará as demais. A sintaxe da forma são ordenações de eventos a partir de
relações indutivas: a tensão espacial produzida por determinado agrupamento que surge na
relação forma-espaço. Portanto, seguindo o crescimento da lógica, haverá sintaxe da
composição uma lógica dedutiva.
Scott (1978, p. 35) também desenvolve essa ideia: Unidad y variedad
son los conceptos que nos guían en el análisis de la función que cumple la
organización visual en el diseño. La variedad, por su misma naturaleza, no
se presta a la generalización. Los tres puntos que establecimos al definirla
constituyen casi todo lo que podemos decir al respecto. [...]La organización
figura-fondo y el agrupamiento de figuras constituyen importantes factores,
pero forman parte de toda percepción.
126
Campos visuais impõem ao olhar um centro ótico para a composição, a partir desse
centro, as formas visuais enunciam eixos virtuais que permitem compreendê-lo pelo seu foco
central, pois, a sua volta expande por semelhança: simetria [do grego sýn – união, + metr(o)-
medida, iā -qualidade]. Quando o eixo virtual apresentar uma irregularidade entre as partes
que divide, é assimetria, uma descontinuidade na sua expansão, e também pode criar a ideia
de uma falsa simetria ou simetria aproximada quando as irregularidades são superadas por
alguma regularidade do todo. A apresentação funciona sob certa dedução das formas
composicionais. (Figura 34)
Figura 34 – Regularidades e irregularidades de distribuição
Fonte: Elaboração do autor
A forma-composicional tem no peso-leveza (Figura 35) uma experiência quase
imperceptível do movimento, mais sensível, que não pode ser interpretado só na redução
nominal equivalente a gravidade, mas na possibilidade de operar estados de pressão e alivio
que as imagens podem gerar através dos elementos formais e outros níveis sintáticos: matiz,
dimensão da forma, posição e direção, entre outras possibilidades. Na contração-extensão
(Figura 36) numa categoria movente e na ordenação da composição, são as forças que fixam
na obra ou levam o olhar para a exterioridade. O positivo-negativo (Figura 37), reduzido a
inversão de cores, pode ser um equívoco sintático, isso seria relação complementar da cor.
Crespi e Ferrario (1995, p. 100) apontam:
Teniendo em cuentarelación figura-fondo, enlacualla figura se encuentra
sobre elfondo y entre ambos existe interrelación de fuerzas provocada por la
energia de ambas y por laatración y repulsión que la figure sufre por
suposisicón dentro del campo em que se encuentra.
Para eles, a sensação parte da relação figura-fundo e das inter-relações de atração e
repulsa, porém essa sensação é regida pelo choque dos estados de atenção criado entre forma-
espaço de um campo visual, quase imperceptível no nível da cor, lúdicos no não-figurativo e
127
intenso no figurativo. Enquanto moventes apontam para uma integração da composição
(Figura 35).
Figura 35 - Predominância do peso e equalização com leveza
Fonte: Elaboração do autor
Figura 36 - Obras de Naun Gabo – contração e expansão
Fonte: http://pixshark.com/naum-gabo-constructivism.htm
Figura 37 – Pintura deM. S. Escher– Relação positivo-negativo
128
Fonte: http://www.mcescher.com/gallery/paint/no-56-lizard/
Na categoria integrativa, a sintaxe composicional inicia pelo controle temporal. A
priori, função do ritmo. Para Crespi e Ferrario (1995, p 111), o ritmo é: Periodicidad
percibida'. Movimiento virtual provocado a través de La percepción de acentos y pausas o
intervalos. Estos acentos son factores que repiten, crecen, alternan desaparecen y se
manifiestan siempre relacionados entre sí y com un silencio. O ritmo está sempre sob duas
orientações, a totalidade da imagem e alguma coisa em estado de repetição. Se uma imagem
fosse um imenso quadro de uma cor única, não haveria a dualidade relação forma-espaço,
assim, sem unidades para se repetirem, o ritmo estaria ausente. Para que ele exista é
necessário ao menos uma dualidade. O ritmo integra a relação entre o continuum e o
descontinuo: cores, áreas, tensão, agrupamento, contribui para a constituição do ritmo,
portanto ele está definitivamente na integração da imagem. Se a imagem se constitui como
fenômeno espacial no contexto apresentativo e deslocamento no indicial, o ritmo é a
incorporação máxima da sua temporalidade, não no sentido indexical, mas no tempo que a
sintaxe apresenta, movimenta e integra todos os seus componentes: Acentos y pausas
provocan una unidad dinámica y determinan um orden de tiempo. (Ibid, id, p 111). Se o
ritmo fosse definido apenas como repetição formal, seria um agrupamento. Parece-nos
abstrato demais, mas é a sua complexidade gerencial mediante a enorme gama polissêmica da
sintaxe visual. Para efeitos didáticos, vejamos alguns exemplos específicos na forma-unidade
e na relação forma-espaço:
Figura 38 - Possibilidades de ritmo
Fonte: Elaboração do autor
129
É a fluência do percurso sobre a diversidade de formas e as respectivas relações
sintáticas que se posicionam de tal modo que prima pela varredura do campo visual:. Scott
(1978) sugere três organizações: axial, radial e oculto. O equilíbrio axial flui nos eixos
horizontal e vertical do campo visual, equilíbrio radial não possui um eixo, mas um ponto
central, forças partem de um ponto único do campo visual, que converge ou expande.
Enquanto os dois primeiros impõem os eixos horizontal-vertical e ponto radiante, há outro
indeterminado – o equilíbrio oculto: No hay reglas para el equilíbrio oculto: es uma cuestión
de sensibilidad frente a Las atraciones variables existentes(SCOTT, 1978 p. 48), o que
predispõe a situação primária pela ausência de lei.
Figura 39 - Exemplos de equilíbrio: oculto, axial e radial
http://www.ccms.saude.gov.br/revolta/cartazes.html; https://tatielek.wordpress.com/tag/cartaz/
http://www.coisasemanal.com.br/2012/11/os-cartazes-das-cidades-sede-da-copa-do-mundo-no-brasil/
Os três equilíbrios não podem se tratados sob aspecto engessado, cada um em sua
modalidade, como propôs Scott pois em exercícios plásticos de transformação de equilíbrios
foi possível identificar que eles se movem semelhantes ao disco espectral das cores, ou seja,
o equilíbrio pode ser radial com tendência de “vir a ser” oculto e, assim, segue entre eles.
Dado todo este conjunto de itens sintáticos, que elemento caberia para a
finalização? De caráter integrativo, final, mas não absoluto, pois seria ai uma lei única. Este
seria um nível sintático da composição que ascenderia a meta discursiva. Do ponto de vista da
prática da composição na linguagem visual, é possível tanto acrescentar formas ou retirá-las
para atingir algum tipo de êxito intencionado. O emprego do termo “limpar a imagem” é uso
no senso comum com essa finalidade. O mesmo ocorre no campo sintático, opções sintáticas
podem provocar essa sensação. Assim,a ideia de Prägnanz da Gestalt, traduzindo
aproximadamente como boa forma estaria próximo dessa concepção. “A lei de Prägnanz
130
incorpora os efeitos dos princípios de agrupamento da Gestalt. A organização do padrão
visual com base nesses princípios produz as percepções mais simples e eficientes.”
(SCHIFFMAN, 2005 p. 129). A última instância integrativa tem a ver com a eficiência da
meta de sentidos, em total reconhecimento dos singulares e plurais. Para aquele que domina a
sintaxe, será um processo experimental lógico. Naqueles que compreendem a sintaxe:
experiência sensorial conduzirá para acertos de manipulações frente às intenções. Naqueles
que é incompreensível a sintaxe, o caminho estará à sorte do acerto sensível. Nesse nível
sintático, pode se pensar em um pensamento visual indutivo.
No uso das categorias fenomenológicas para compreender fenômenos, não basta
classificar as coisas de acordo com as caraterísticas de cada categoria: primeiridade,
secundidade e terceiridade. Elas precisam estar alicerçadas numa relação evolutiva, ou seja,
uma classificação anterior precisa guiar a posterior. Assim, o quadro abaixo, com função de
sintetizar os tópicos da sintaxe (Figura 40) aqui expostos.
Figura 40 - Síntese da sintaxe visual
APRESENTATIVA MOVENTE INTEGRATIVA
Sintaxe da cor Qualidade
Claro-escuro
Quente-frio
Quantidade
Cor em si
Simultaneidade
Sucessivo
Complementar
Sequência
Sintaxe da forma Espaço-cor
Espaço-forma
Figura-fundo
Tensão espacial
Distinção de planos
Movimentação
Agrupamentos:
Preenchimento,
direção e posição
Sintaxe da
composição
Simetria
Assimetria
Simetria aproximada
Peso leveza
Contração-extensão
Positivo-negativo
Ritmo
Equilíbrio
Boa forma
Se o acesso à forma se dá pela sintaxe, a sintaxe da composição é que nos dá acesso
aos níveis da sintaxe visual. Esses percursos horizontais: sintaxe da cor, da forma e da
composição, são verticalizados por três categorias pensados a partir das cenopitagóricas, a
apresentação dos elementos sintáticos (gerais e possíveis), a relação de espacialidade
(deslocamento de particulares) e integração operada por eles (geral). Segue o discurso visual.
4.4.3 – Intencionalidade Visual
Pensando na linguagem como signo, a natureza da linguagem visual, pelo menos
inicialmente, não pode ser outra senão a orientação do movimento, que para haver tem que vir
primeiro o reconhecimento do espaço. Duas naturezas, espaço e tempo, se constituem. Um
131
olhar é um processo descritivo, o resultado dessa experiência pretérita, mesmo que seja por
instantes de segundo, é um acúmulo memorial. Observar dois caminhos e fazer escolha
implica em estabelecer relações com síntese. São observações que levam a imaginar o sujeito
frente ao mundo das imagens naturais, que são suficientes para prosseguirem a condição de
imagens produzidas pelo sujeito.
Assim, existem três categorias que as imagens podem afetar o sujeito: apresentado,
remetendo e sintetizando, de fundo sensorial, referencial e condutível. Sem incorrer no risco
de um ato incoerente sobre as criticas do logocentrismo para a visualidade, e a intuição que a
tipologia da linguagem verbal: descrição, narração e argumentação são funções da linguagem
integrantes de qualquer forma de linguagem, cuja concretude, metalinguagem lhe garantiram
um falso patenteamento, eis outra categoria para a visualidade. Aproximá-las é inevitável: a
sensorial da descrição, a referencial da narração e a condutível da argumentação.
As intenções atreladas ao nível sensorial descritivo são as apresentações da imagem
em si. As intenções do referencial-narrativo são as apresentações da imagem tempo espaço, a
imagem no seu conteúdo pretérito e presente, imprópria para desenvolver condutas operantes.
A terceira combinação, condutível argumentativo existe na imagem, aliás, é desta que a
matemática espacial é reconhecida. Esses pares sistematizados sob as categorias
apresentariam uma rede mais ínfima para atingir os níveis do discurso visual, porém, no
intuito de evitar a prolixidade e tratar no próximo capitulo a relação “cultura, suportes e
visualidade” sob a perspectiva de produção de linguagem, é necessário encerrar para evitar a
prolixidade. Em tempo, se esclarece que: estes níveis de discursos são análises de caráter
decantativo da imbricação discurso visual e verbal efetivados pela imagem. Parte-se da crença
que existe um discurso puramente visual sujeito a crescer ou não para a interdependência
verbal.
132
CAPITULO 5 – COMPORTAMENTO COGNITIVO E VISUALIDADE
Os dois últimos capítulos tiveram como função estabelecer subsídios semióticos
para a cognição e apresentação do território gramatical da linguagem visual, que agora segue
para a sua junção com a cognição visual ocorrida em processos de aprendizagem na prática
educacional de unidade escolar pública.
Os documentos orientadores, citados no primeiro capítulo, são focados na forma
verbal, provavelmente destituídos de viés semiótico na respectiva elaboração autoral ,
demonstram, através da classificação das competências cognitivas, três funções: identificar,
relacionar e operar, que correspondem à tipologia da linguagem: descrição, narração e
dissertação. A natureza da linguagem no homem, conforme observado no percurso
antropológico, voltou-se para orientar, reagir e comunicar. Essas sequências são facetas que
confirmam a função da linguagem que, de modo mais universal, são as formas de linguagem e
a natureza das semioses que apresentam mais coerência nos termos: apresentar, relacionar e
operar. São níveis de semiose que permitem a cognoscibilidade de um sujeito.
Assim, a cognição processada no nível do signo genuíno: o simbólico-argumental
encapsula outras formas, pois conhecer requer aprender para relacionar, para operar. São
semioses icônicas, indexicais e simbólicas que constituem o fluxo cognitivo e são favorecidas
pela natureza do signo. Vejamos: as semioses proliferadas simbólicas tendem à convergência
das conexões e significados, à autorreplicação e à arbitrariedade operativa; as que expandem
através de relações indexicais tendem ao estado preposicional que gera multiplicidade
conectiva e de sentidos, e as icônicas não são convergentes e nem divergentes, são
potencialmente catalisadoras da percepção e da atenção.
Três aspectos pleiteados, tanto em processo de autoaprendizagem como práticas de
ensino-aprendizagem no sujeito, são explícitos nas características centrais das semioses: o
modo operativo – adquirir conhecimento contextualizável, o modo associativo – adequação
àquilo que possui variáveis, relações de similaridade (alteridade) e contiguidade, e o modo
motivacional – o poder de mobilização da atenção provocado pelo objeto de cognição.
A ausência dessa consciência epistemológica em práticas educacionais é enunciada
nos sintomas correntes na rede de ensino: alunos reconhecem alfabeto, mas não constroem
sentenças, leem textos, mas não compreendem, operam com fórmulas matemáticas, mas não
133
identificam as mesmas em situações-contextos, esquecem constantemente conhecimentos
apreendidos, etc. O uso de recursos tecnológicos, investigações fecundas sobre sequencias de
aprendizagem e atualizações da Neurociências, surgem como potências didáticas, entretanto,
são fragmentos de um mosaico que, conforme se agrupam, apontam para o fenômeno da
semiose como eixo integrativo e indicativo de percursos mais eficientes da aprendizagem.
5.1 - Cognição, mediação e suportes
A cognição se instala no sujeito pela sua natureza sígnica, que o conecta ao mundo
para sua sobrevivência orgânica e social. Deixando essa dualidade já debatida, o social é a
experiência individual e coletiva, compartilhada e operativa para a continuidade da espécie. O
espaço social, que contém o espaço singular do sujeito, está para a linguagem e o pensamento,
e ambos estão para o signo (SANTAELLA, 2001) cuja abstração torna-se mais palpável
nessas situações. Assim, a discussão sobre a causalidade do fenômeno da aprendizagem seria
fruto do ambiente social ou talvez da estrutura do sujeito, e este impasse tem no signo a
solução. Primeiramente, para ilustrar dois aspectos dicotômicos, cultural e inato, recorre-se
aos argumentos de Gardner (1999) que cita a possibilidade de dormência de certas habilidades
mentais em função do ambiente cultural e de Dehaene (2012) sobre a predisposição de formas
para aquisição de sistema alfabéticos. Deste modo, qualquer tipo de isolamento cultural
afetaria as habilidades cognitivas, assim como, do ponto de vista da predisposição, provocaria
avarias no cérebro ou nos sistemas receptores comprometimentos na estrutura apta a processar
a cognição. São duas faces do fenômeno cognitivo que lançam a demanda de fatos singulares,
enquanto o aspecto do signo explica e contempla todas as aparências da cognição. O signo se
apresenta como mediador entre a possibilidade cultural e a singularidade mental do sujeito.
Santaella (2007) estabelece a mediação como conceito epistemológico para a
capacidade humana de acessar o mundo cognoscível, de que a linguagem é a condição
necessária e imprescindível. No âmbito cultural, as mediações são dependentes de processos
comunicacionais e, obviamente, de linguagem. Essa disposição leva a crer em uma
apropriação categorial dentro da terceiridade: mediação- potência, propriedade cognoscível;
linguagem - singularidade de formas e comunicação – um caráter geral, natureza coletiva.
Nesse sentido, o caráter de secundidade da linguagem é atribuído ao caráter transformador das
relações, que são constituídas, por sua vez, pela equalização: do signo, do suporte e da
134
conexão com o sujeito. Aliás, são redundâncias as afirmações anteriores: os signos criam
percursos cognitivos.
Algumas situações: a popularização da internet provocou uma ligeira alteração
“ortográfica”, dados os meios de materializar a linguagem: o “não” passou para “naum”. O
encontro de algumas línguas africanas com a língua portuguesa em solo brasileiro, durante o
processo de escravidão, contribuíram para o “vosmecê” chegar a “você”. Parecem situações
distintas, mas decorrem de variações do suporte: manipulação de teclados e exploração tonal
em decorrência da exploração silábica da oralidade. A comunicação é afetada pela linguagem,
que se expande nos mais diversos suportes. Para serem suportes, pelo menos na condição
externa, precisam ser capazes de afetar os órgãos sensoriais como a luz, o som, o calor, as
substâncias odoríferas, etc.
Os sistemas de suportes da linguagem, desde pinturas parietais e o surgimento da
escrita demonstram a externalidade da memória humana articuladora entre o pretérito e o
futuro. Também são observados: a portabilidade dos suportes, dos quadros aos eletrônicos,
dos melhores reprodutores nesse processo que se instala certa seleção cultural. A
reprodutibilidade da imagem existe de modo embrionário, desde a rigidez visual egípcia, da
invenção dos cânones, pois foram estratégias para reprodução do padrão e técnicas na
dependência viso-motora. Na sequência, as gravuras (xilogravura, calcogravura, água forte e a
litogravura) constituíram técnicas de reprodução da imagem, porém o advento histórico
absoluto se dá na invenção da fotografia, cuja condição icônica-indicial e imediata, entre
outros, favoreceu substancialmente a expansão da imagem. Depois, do cinema para o
audiovisual.
Retomando as questões anteriores: mediação e semiose, tanto a fotografia como o
cinema são suportes condizentes com a natureza imagética do signo, são dependentes de
aparatos tecnológicos e caracterizam semioses apresentativas e relacionais, descritivas e
narrativas, sem negar a possibilidade de relações puramente visuais processarem deduções. A
condição geral da mediação se perpetua por um modo singular dessas condições de linguagem
e produzem um comportamento cognitivo. Os suportes da linguagem são o cerne de tal
processo, pois são os que a tornam perceptível.
Segue um relato hipotético do processo de leitura de uma imagem: para iniciar o
processo é necessária uma imagem fixada em um suporte qualquer, portanto elementos
135
formais e gramaticais estarão inseridos. Na sequência estados de atenção e processos
associativos, evocativos da memória se instalam. Depois, mesmo que a gramática visual não
seja compreendida em seus conceitos ordenativos pelo leitor, ela produzirá efeitos. Exemplos:
as preferências sintáticas aleatórias ou a necessidade destas em prol da intenção de discurso
específico que geram condutas, a apreensão da forma, que se move diante dos olhos, é mais
catalisadora da atenção que as fixas, agrupamentos limpam imagens ruidosas, histórias em
quadrinhos pouco exploram o equilíbrio radial para dar sequência a próximo quadro, etc.
Não obstante, pode ser deixado de lado que os suportes estabelecem formas de
captação de informação, portabilidade e conectividade, que também produzem outros
comportamentos cognitivos, mas para o momento, incide-se sobre o que é decorrente da
linguagem visual que o suporte contém.
5.2 - Comportamento cognitivo e âmbito escolar
Uma das discussões que ainda se mantém atual no âmbito da aprendizagem é a
aproximação da escola com a realidade. Foi nesse bojo que a ideia do conteúdo
contextualizado nos planejamentos escolares foi recebida, desde os anos 90, porém, é uma
preocupação com a operacionalidade dos saberes culturais. Há outra realidade a ser percebida,
mas não de aproximação, e sim de reconhecimento da escola para os novos comportamentos
cognitivos.
A atual educação escolar, na sua idealidade mais eloquente, é: ensinar a pensar, é um
processo comunicacional, de linguagem, portanto depende dos suportes em que os signos se
estabelecem. Perpassa pelo acúmulo de informação, pela memória, pelo registro de saberes
que se dá mais ostensivamente sob a predominância da forma verbal e da escrita, enquanto o
âmbito que o sujeito está circunscrito é um espaço marcado pela imagem.
A linguagem visual, como manifestação tangível da cognição (do signo) em relação
ao sujeito e ambiente, também está sob certa latência de ordenações, que se fixam em suportes
e estabelecem comportamentos operantes. A intenção é notar como a fixação nos suportes é
dotada de propriedades da segunda categoria fenomenológica: particulariza tratamento da
forma e da sintaxe, a condição física da apresentação arma certa alteridade para o sujeito; o
fato de priorizar certos aspectos formais e sintáticos implica a ideia de uma anterioridade: a
136
latência das possíveis ordenações sintáticas. Obviamente, seu intento é sua terceiridade.
Posicioná-lo na sua predominância categorial é o primeiro passo.
A degeneração sígnica trata da quebra de um hábito, que é terceiro. O signo passa a
degenera-se em regressão ao ícone. A natureza do signo operativa e representativa reduz ao
efeito apenas apresentativo. Essa é a descrição de uma semiose degenerativa, mas por que o
hábito rompe? Porque as anterioridades também sofreram degenerações no nível da
secundidade e da terceiridade. A degeneração do segundo para o primeiro está na perda da
polaridade de sentidos. Então, a regressão atinge seu ponto primário, que na linguagem em
questão é a pura consciência imediata da imagem. A semiose não genuína é aplicável às metas
da linguagem: descrição, narração e argumentação, as formas de raciocínio: abdução, indução
e dedução. Compreender a semiose não genuína foi o segundo momento.
A terceira etapa, talvez a mais complexa, é o pensamento visual, ou seria mais eficaz
a visualidade no pensamento. O termo pensamento visual conota certo isolamento para um
tipo de signo, que parece contraditório à inter-relação matricial na produção de sentidos e na
dependência verbal para operacionalização produtora da gramática visual. A relação matricial
proposta por Santaella (2001) para a linguagem coloca a forma sonora, visual e verbal na
ordem categorial. Se há uma ordem categorial, estará sujeita à degeneração, assim, o verbal
regride ao visual que regredirá ao sonoro. Neste momento, o que interessa é a viabilidade da
regressão visual destituída da palavra.
Wertheimer (1923), nas pesquisas psicofísicas da percepção, procurava compreender
a estrutura de um pensamento visual, que para ele encontra-se nas organizações perceptuais.
Arnheim (1969), influenciado pela Gestalt, também atrelou pensamento visual a percepção e
discerniu três atitudes de observação:1) a percepção de contexto como um atributo do objeto
em si; 2) o isolamento percebido no estado puro e não alterada pelo objeto no seu contexto; 3)
o objeto revela sua identidade em uma multidão de aparências.
As associações presentes nos estudos de Wertheimer e Arnheim, a proximidade da
percepção ao pensamento visual, é inevitável, pois é esse o percurso de individuação do
pensamento no sujeito, parte da experiência. Os níveis de observação são expansivos para
qualquer processamento de linguagem, como especifica Peirce (1983) sobre a apreensão do
fenômeno: contemplação, discernimento e generalização, assim não se pode cristalizar nessa
compreensão.
137
A visualidade no pensamento deflagra níveis de crescimento da percepção à lógica,
mas não necessariamente processado verbalmente. Por sua vez, o verbal que encapsula o
visual, ao esvaziar-se dessa condição, incide no risco cego da pura arbitrariedade. A
experiência extremamente mediada perde sua imediaticidade, que perde sua polaridade. Essa
talvez seja uma das causas da crise da atual aprendizagem, a falta de tratamento visual aos
conteúdos de ensino aprendizagem.
A outra, levantada no início desta pesquisa, partiu das observações dos docentes
sobre a presença de certos recursos tecnológicos de comunicação como dispersivos da atenção
que deveria ocorrer durantes as aulas. A imersão, o desenvolvimento de estados de atenção
não são propriedades da tecnologia, mas das estratégias, basta observar práticas mais lúdicas
independentes de meios tecnológicos.
5.3 - Estudos do comportamento cognitivo
A visualidade como meio de uma cognição mais concreta em prol da operativa, e a
conduta visual guiada por hábitos desenvolvidos por suportes tecnológicos foram os
fenômenos verificados. Para resolver essa questão, a proximidade com docentes e discentes
foi realizada. A metodologia empregada dividiu-se em dois momentos: “aluno dentro da
prática escolar” e o “aluno fora da prática escolar”.
O “aluno dentro da escola” iniciou-se em participação de reuniões com docentes,
proposição de interferências didáticas a serem praticadas por eles, estágios de observação de
aula e avaliação, quantitativa e qualitativa determinada pela relevância do próprio indicador e
mensurada por questionário. O “aluno fora da escola” partiu da aplicação de questionário com
vistas a identificar o comportamento tecnológico e preferências visuais dos cognoscentes. Por
de trás destes dois segmentos, a intenção foi comparar um comportamento de aprendizagem
exigido pela práxis com aquele que o cotidiano desenvolve, mais especificamente, no que
tange a duas propriedades do suporte visual: relação forma-sintaxe e tipologia da linguagem.
5.3.1 - Acompanhando o cotidiano escolar
138
Segue análise de situações registradas em campo, durante o acompanhamento de
práticas docentes: de Língua Portuguesa, História e Artes. Não se trata de experimentos, mas
de acompanhamento de projeto proposto sob as bases teóricas desta pesquisa, discutidos e
desenvolvidos pelos docentes em conformidade com sequências de aulas deflagradas pela
proposta curricular na rede de ensino estadual.
A primeira, na disciplina de língua portuguesa: foram duas atividades envolvendo
alunos do primeiro ano do Ensino Médio. O docente solicitou a leitura de um texto narrativo
contido no livro didático. Noutro momento, com intervalos de dois dias, outro texto, um
artigo de opinião extraído do jornal foi lido. Nas duas etapas, as estratégias de ambientação do
grupo foram iguais, ligeira variação de ausência, e ocorreu uma plenária de interpretações
(nome dado pelo docente regente das atividades). Surgiram os seguintes indicadores de
compreensão:
Tabela - Participação leitura verbal
Comentários imediatos
Retomo ao suporte verbal (textos)
Nenhuma manifestação
Narração – 41 alunos 37% 25% 38 Argumentação -38 alunos 5% 40% 55
Após diálogos mantidos com o docente, foram comentadas algumas características
da aprendizagem através da comparação de objetos e novas práticas envolvendo o uso de
comparações entre textos de opinião, texto de opinião e imagem estática, texto de opinião e
imagem em movimento (curta metragem). A seleção do material foi por conta do docente, se
constituía de aplicações na mesma turma, com intervalo totalizado de seis dias entre as
atividades e com a mesma estratégia – plenária no final.
Tabela - Participação leitura verbal
Comentários imediatos
Retomo ao suporte Nenhuma manifestação
Texto e texto – 40 alunos 21% 33% 54% Texto e imagem – 39alunos 26% 29% 45% Texto e audiovisual – 37 alunos 45% 12% 43%
Nas duas ações do docente, algumas variantes se apresentaram: o interesse temático,
relações afetivas, mas não suficientes para inibir a expressividade dos resultados. Entre os
dois momentos, as alterações de quantidade foram significativas para demonstrar índices de
139
participação no exercício de raciocínio argumental. No primeiro grupo, a narração se
apresenta mais concreta, pois é tradução do tempo e do espaço. O argumento, de acordo com
a dinâmica do docente, era apreensão de um ponto de vista de um determinado autor. Por
mais que argumentos conflitam ideias, não foram tão intensos como aqueles de autores
distintos.
O segundo momento, o conflito foi mais enfático na procedência dos materiais
trabalhados, assim como foi evidente que durante a plenária os termos refletiram mais a
presença das imagens.
A expectativa de relatos durante a plenária foi: dados- grupo de palavras sem
configurarem uma sentença, mas como índice contemplativo; sentença – frases declarativas
do entendimento parcial; síntese – sentenças com caráter explicativo. A totalidade dos relatos,
do ponto de vista qualitativo, obliterou para as frases declarativas, porém no caso da última
atividade, houve um favorecimento do audiovisual na formação de sínteses. Tendo em vista
que o audiovisual tem a natureza do relato, e em especial o escolhido pelo professor, se
estabeleceu o fato a ser verificado: a facilidade da síntese foi provocada pelo suporte ou pela
estrutura narrativa do filme.
O docente de História do Ensino Médio, comumente utilizava filmes para debater
conteúdos de História, ao compartilhar deste fato, através das reuniões pedagógicas, propôs a
estratégia leitura e plenária, através de dois vídeos: um essencialmente narrativo (duração de
37’) e outro de entrevista que predominava o caráter argumental (20’), para alunos do
segundo ano do ensino Médio, no intervalo de nove dias. Durante a observação da aula, foram
identificados dois modos de condução dada à impossibilidade de recorrer à reprodução
fílmica: comentários imediatos e os induzidos, provocados por perguntas feitas pelo
professor.
Tabela –Inferências sobre o vídeo
Comentários imediatos
Comentários induzidos
Nenhuma manifestação
Vídeo narrativo – 33 alunos 47% 33% 20% Vídeo entrevista – 31 alunos 27% 23% 50%
As variantes temáticas, qualidade de produção, não foram enfáticas, pois, haviam
dois estados de imersão que as sobrepuseram: da narração no tempo e espaço, fundada na
140
visualidade e a outra que exigia mais compenetração dos interessados, que apesar da imagem,
predominava a oralidade argumentativa. O docente selecionou outro vídeo entrevista, agora
associado ao tema do vídeo narrativo e o aplicou a outra turma, também, segundo ano do
ensino Médio, porém, utilizou duas aulas seguidas e exibiu na mesma data, primeiro a
narração e depois a entrevista, seguidos de plenária comparativa.
Tabela –Inferências sobre o vídeo
Comentários mais voltados para o Vídeo narrativo – 28 alunos
Comentário mais voltado para o Vídeo entrevista – 28 alunos
Nenhuma manifestação
47% 24% 29%
Desta etapa, configurada na relação visual-verbal, que envolveu os docentes de
Língua Portuguesa e História, a linguagem na sua função narrativa demonstrou maior
eficiência em relação à argumentação, a imagem em movimento também captou mais a
atenção, principalmente na condição de junção da narrativa e imagem em movimento. Os
comentários dos alunos, sob aspecto qualitativo, cresceram da condição de sentenças
declarativas para sínteses conforme à passagem para temas intrínsecos. Comparando as
manifestações, a presença da imagem não é fator fundamental do êxito, mas a combinação
imagem em movimento narrativa.
Outro fluxo de atividades ocorreu na observação das aulas de Artes. O professor
desenvolveu projeto em duas turmas distintas, do terceiro Ano do Ensino Médio. Realizou
apresentações de obras de Picasso, Kandinsky e Mondrian utilizando imagens estáticas e
impressas, depois slides em PowerPoint e depois na tela do computador através de programa
que controla o conteúdo de cada aparelho. O objetivo do professor foi criar estados de
imersão na imagem para compreender as vanguardas europeias. As imagens lidaram com
figurativo (Picasso) e não figurativo (Kandinky e Mondrian) por critério exclusivo do
docente. A sequência do terceiro ano turma A (Figuras 41 - 43):
141
Figura 41- Imagens apresentadas através de impressão – Aula do Ensino Médio
Fontes: http://www.wassilykandinsky.net/http:/http://pablopicassoprints.org//pietmondrian.co.uk/
Figura 42 - Imagens apresentadas através de slides PowerPoint (geral) – Aula do Ensino Médio
Fontes: http://www.wassilykandinsky.net/http:/http://pablopicassoprints.org/ /pietmondrian.co.uk/
Figura 43 - Imagens apresentadas através da tela de computador – Aula do Ensino Médio
Fontes: http://www.wassilykandinsky.net/http:/http://pablopicassoprints.org/ /pietmondrian.co.uk/
A sequência do terceiro ano B foi trocada, as imagens impressas foram apresentadas
através da tela de computador e as da tela do computador como impressas.
Seguido de todas as explicações que acompanharam a ação lúdica do professor, foi
aplicado um questionário em cada grupo perguntando quais as imagens que mais agradaram e
se obteve o seguinte resultado.
Tabela 10–Análise de imagens dos terceiros anos
142
Imagens
impressas
Imagens em
slides gerais
Imagens na tela
do computador
3 ano A – 27 alunos 6 7 12
3 ano B – 23 alunos 5 9 17
Nem todos fizeram escolha, assim como houve aqueles que escolheram mais de uma
imagem. A variação das imagens foi para evitar o efeito especifico de outra imagem, que
confirmou as expectativas sobre a preferência por aquelas em suportes luminosos em
detrimento das impressas. As imagens em slides gerais mantiveram-se mais ou menos
homogêneas tendo em vista que não foram trocadas. A primeira conclusão é que as imagens
agradaram não exclusivamente pela composição, mas como houve maior tempo de apreensão,
consequentemente devido à leitura em função do estímulo luminoso direto.
O professor de Artes, motivado pela participação dos alunos, aplicou o mesmo
modelo de aula nas duas turmas do segundo ano do Ensino Médio, apenas eliminou as
imagens impressas e selecionou um grupo de imagens (Caravaggio, Turner, Constable) de
acordo com o conteúdo pertinente ao ano. Trabalhou com duas sequências, os slides,
projetados para uma leitura coletiva e depois na tela do computador. (Figuras 44 e 45)
Figura 44 -Imagens apresentadas através de slides PowerPoint (geral) – Aula do Ensino Médio
Fontes: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Caravaggio.emmaus.750pix.jpg
http://www.ipernity.com/blog/maluz/527623/
http://www.arcadja.com/auctions/pt/constable_adam_william/artist/440586/
Figura 45 - Imagens apresentadas através de slides PowerPoint (geral) – Aula do Ensino Médio
143
Fontes: http://onlinephoto.xyz/fotos-dos-quadros-de-caravaggioom/blog/maluz/527623/
http://www.arcadja.com/auctions/pt/constable_adam_william/artist/440586/
No segundo momento da aula, com a projeção nas telas individuais, os resultados de
preferência aumentaram, provavelmente pela condição de propriedade visual em função da
distância e da dimensão da tela, o que criou maior estado de atenção.
Tabela 11 – Análise de imagens
Imagens em slides gerais Imagens na tela do
computador
2 ano A – 35 alunos 5 14
2 Ano B – 34 alunos 8 12
5.3.2–A realidade dos alunos
Os alunos das seis turmas do Ensino Médio, do período da manhã, foram convidados
a participar do questionário entrevista através de um site especifico, realizado nas
dependências da escola. Com intuito de considerar uma amostragem por interesse, os critérios
de seleção foram a pré-disposição dos alunos.
A aplicação ocorreu da seguinte maneira: os alunos foram recebidos para responder o
questionário de acordo com os números de computadores disponíveis nesse dia (12 unidades).
O número de interessados foi maior que os questionários respondidos, pois, a demora fez
alguns desistirem. Somaram-se 51 questionários respondidos, aproximadamente 26,2 % da
totalidade de alunos do Ensino Médio período da manhã dessa unidade escolar, sendo 30 do
sexo masculino e 21 do sexo feminino, 23,53% alunos do primeiro ano do Ensino Médio,
21,57% alunos do segundo ano do Ensino Médio e 54,90% do terceiro ano do Ensino Médio.
144
Tabela 12- Faixa etária dos entrevistados
Idade
14 anos 13,73%
15 anos 23,53%
16 anos 27,45%
17 anos 27,45%
+ 17 anos 7,84%
Dada a extensão do questionário, seguir-se-ão os focos de informação fundamentais
para o prosseguimento. Os dados demonstram o interesse do grupo nas tecnologias portáteis,
que possuem reprodução de imagens, conectivas à rede de comunicação. A recusa pelas
tecnologias de captação de imagem “não tão instantâneas” ou apenas o som são indicadores
de uma prática de produção de linguagem sujeita à valoração da instantaneidade e da
integração imagem-som. (tab 13)
Tabela 13 - Posse de tecnologia extra escola
– Tem Usa de amigos ou
parentes
Não tem
interesse
Desconhece
–Notebook ou
ultrabook
69,39%
16,33%
12,24%
2,04%
Computador de
mesa
55,32% 23,40% 21,28% 0,00%
Impressora 48,94% 27,66% 23,40% 0,00%
Scanner 28,26% 13,04% 43,48% 15,22%
Filmadora digital 47,92% 6,67% 33,33% 2,08%
Gravador digital 41,67% 8,33% 47,92% 2,08%
Ipod ou similares 27,66% 38,30% 27,66% 6,38%
Máquina
fotográfica digital
58,33%
25,00%
16,67%
0,00%
Celular sem acesso
à internet
33,33%
2,22%
46,67%
17,78%
IPhone,
Smartphone ou
similares
81,25%
10,42%
6,25%
2,08%
Ipad, Tablet ou
similares
54,17%
33,33%
12,50%
0,00%
Analisando o comportamento frente aos hábitos de leitura, o hipertexto e os
audiovisuais são uma preferência do grupo, apesar de um dado expressivo concernente à
leitura de livros. Porém, fica a lacuna sobre a natureza dessa leitura da escrita indiferente do
suporte, que se trata de uma potente variante, mas que será verificada no decorrer das
intepretações integradas deste questionário (tab14).
145
Tabela 14 - Posse de tecnologia extra escola
– Tem Usa de amigos ou
parentes
Não tem
interesse
Desconhece
–Notebook ou
ultrabook
69,39%
16,33%
12,24%
2,04%
Computador de mesa 55,32% 23,40% 21,28% 0,00%
Impressora 48,94% 27,66% 23,40% 0,00%
Scanner 28,26% 13,04% 43,48% 15,22%
Filmadora digital 47,92% 6,67% 33,33% 2,08%
Gravador digital 41,67% 8,33% 47,92% 2,08%
Ipod ou similares 27,66% 38,30% 27,66% 6,38%
Analisando o comportamento frente aos hábitos de leitura, o hipertexto e os
audiovisuais são uma preferência do grupo, apesar de um dado expressivo concernente à
leitura de livros. Porém, fica a lacuna sobre a natureza dessa leitura da escrita indiferente do
suporte, que se trata de uma potente variante, mas que será verificada no decorrer das
intepretações integradas deste questionário (tab 15).
Tabela 15 – Hábitos de leitura
– Nunca Abaixo de três
vezes por
semana
A partir de três
vezes por
semana
Todos os dias
da semana
Leio livros 25,53%
38,30%
23,40%
12,77%
Leio textos na
internet
12,50%
41,67%
33,33%
12,50%
Leio História em
Quadrinhos
46,81%
29,79%
12,77%
10,64%
Vou ao cinema 17,02%
70,21%
6,38%
6,38%
Vejo DVD na TV
de casa.
12,77%
48,94%
14,89%
7
23,40%
Vejo DVD no
microcomputador
47,83%
34,78%
10,87%
6,52%
A verificação sobre a intensa participação nas redes sociais em detrimento dos e-mails
favorecem a ideia da imediaticidade conectiva. (tab. 16)
Tabela 16–Sobre conexões
Você participa de:
Rede sociais (facebook, Orkut, etc) 94,00%
Salas de bate-papo 30,00%
Lista de e-mail coletivo 24,00%
Não participo porque não gosto 6,00%
Não participo pois não tenho acesso a internet 0%
146
A indagação sobre a criação de imagens (tab. 17) confirma a ideia de uma produção
imersa no mundo digital, a manipulação de imagens se dá num sistema já produzido, exceto
na captação através de meios instantâneos, a máquina fotográfica, mas que logo se torna
digital. Também são expoentes os índices de desenho a mão livre e é até mesmo contraditório
com observações informais de alunos que não valoram a habilidade para desenhar a mão livre.
Tabela 17 - Sobre a criação de imagens
Você Cria imagens
Copiando da internet 54,00%
Copiando de arquivos digitais 20,00%
Fotografando 68,00%
Filmando 24,00%
Desenhando a mão livre 46,00%
Não crio imagens 8,00%
Na sequência, com intuito de verificar o comportamento sobre a sintaxe visual, foram
apresentadas três imagens (Figura 46) e solicitada a manifestação de opinião sobre as mais
agradáveis. Os resultados foram: 24 % para A, 20 % para B e 56% para C. Há uma
preferência pela distribuição simétrica e o equilíbrio axial na composição. Ainda para esta
questão foram coletadas manifestações verbais justificando a escolha, de modo mais
qualitativo, a ideia que mais se repetiu para negar as figuras A e B foi a de ser desorganizada.
Não houve nenhum termo mais identificador da sintaxe, apenas da sensação do entrevistado.
Figura 46- Imagens apresentadas no questionário
Fonte: elaboração do autor
147
Outra questão, que teve a intenção de verificar julgamento da imagem (Figura 47),
ampliou o leque de referências, exigindo a manifestação de agradável, desagradável e
intermediária.
Figura 47 - Julgamento de imagens
Fonte: elaboração do autor
Os resultados obtidos (tab. 18) favoreceram a imagem A, no entrecruzamento com as
frases de justificativas, a cor é o que mais aparece como justificativa positiva e a sensação de
“borrado” como negativa. No segundo, as justificativas aparecem desagregadas de termos
que definem “boa” ou “ruim”, remetem a sensações topológicas ou animais como a Zebra e o
Tigre. No terceiro caso, as respostas positivas também favorecem a cor ou a distribuição, no
caso negativo, a predominância da cor roxa e depois diversificam. Por outro lado, essas
imagens também confirmam a predileção pelo equilíbrio axial.
Tabela 18 – Analise de imagem
Desagradável Mais ou menos agradável Agradável
Imagem A 22,73% 25,00% 52,27%
Imagem B 21,74% 45,65% 32,61%
Imagem C 16,67% 33,33% 50,00%
Na próxima questão, o intento foi analisar o conceito prático de imagem (Figura 48),
dada a limitação do suporte, as bidimensionais. O reconhecimento foi 92% para A, 24% para
B, 44% para C, 44% para D e 32% para E. Tratando de reproduções digitais e até mesmo na
condição de escrita, todas são imagens.
Figura 48 – Reconhecendo imagem
148
Fonte: elaboração do autor
Extraída do material do SARESP (2010), com outros objetivos nesta pesquisa, a
próxima questão foi solicitar que escolhessem, dentre os mosaicos abaixo, aquele que fosse
formado somente por quadriláteros e foi esclarecido que eram figuras com quatros lados. A
resposta errada para esta questão pode operar através de hábitos conceituais, “confundir
quadriláteros apenas como quadrados”, ou hábitos perceptuais “a super valorização da figura
sobre o fundo”, porém, para o momento, não há como discernir quais foram as duas naturezas
de hábitos que incorreram no erro, mas a possibilidade já é um alarme. As respostas foram:
12,24% para A, 38,78% para B, 44,9 % para C e 4,08 para D. (Figura 49)
Figura 49 - Reconhecimentos figura fundo
Fonte: http://matematicaef2.blogspot.com.br/2011/09/saresp-geometria.html
A última questão apresentada propôs avaliar através da oferta de imagens (Figura 50)
a preferida para ser aplicada na “tela de descanso” do seu aparelho de celular, Smartphone,
etc. As intenções verificáveis foram as preferências pelo figurativo e não figurativo, os
equilíbrios e intensidade da figura fundo. As respostas foram 34,69% para A, 6,12% para B,
8,16% para C, 0,00% para D, 6,12% para e 20,41% para F. Nestas opções, as imagens
figurativas seccionadas, que favorecem o close da imagem, sobrepõem as figurativas que
enquadram integralmente. A imagem zerada na sua potência figurativa e suavizada no
contraste de cores atingiu absoluta rejeição. Seria precoce atestar a preferência por imagens
menos potentes no despertar estados de atenção.
Figura 50 - Telas para aparelhos
149
Fonte: Adaptação do autor de material digitalizado e socializado na internet.
A síntese equalizadora entre indicadores quantitativos que segue na tabela (tab. 19)
abaixo, tem nos fatos conclusivos os argumentos para análise do perfil.
Tabela 19 – Síntese de dados
Fato conclusivo Indicador “Aluno na
escola”
Indicador “aluno fora da
escola”
Aumento da atenção em função
da emissão da luz direta
Detrimento da leitura imersiva
das imagens impressas em
relação imagens luminosas
Valorização do contraste Não preferencia pelas imagens
com menos contrastes no que se
refere as cores
Maior imersão na narração Maior entendimento de textos
narrativos
Maior manifestação de ideias
após leitura de vídeos
dominantemente narrativos
Inercia do sujeito e
movimentação da imagem
Preferência por vídeos
essencialmente narrativos e do
hipertexto
Aumento do estado de atenção
por suportes de maior
proximidade com o sujeito
Leitura mais imersiva nas telas
de computadores
Aumento do estado de atenção
do campo visual em função da
diminuição do suporte
Leitura mais imersiva nas telas
de computadores
Olhar compulsivo para o centro
da composição
Preferência pela simetria
Preferência pelo equilíbrio axial
Hiper valorização da figura Imagens em close
Não reconhecimento do
quadrilátero menos convencional
no processo da relação figura-
fundo
Os fatos conclusivos passam a ser novos indicadores do comportamento do
cognoscente, tratados sob uma condição estritamente visual. Retomam-se as três categorias
propostas no capítulo anterior sobre a linguagem: apresentação, movência e integração, e uma
plausível classificação dos fatos conclusivos relacionados a essas categorias.
150
Os novos suportes intensificam estados de atenção visual pela emissão da luz direta na
apresentação da forma e pela compactação da dimensão. Do ponto de vista da composição
visual, a redução do campo, como se observa em aparelhos portáteis, prima para melhor
entendimento do teor comunicacional a constância de certas sintaxes mais rápidas na
apresentação de imagens: simetria e equilíbrio axial, assim como a figura precisa se
evidenciar em relação ao fundo por close ou centralização. A diminuição do suporte exige a
aproximação do sujeito. Todos esses caracteres estão predominantemente em como a forma se
apresenta.
A natureza da movência, discutida anteriormente, está no movimento da cabeça, do
globo ocular, da imagem em movimento e do movimento na imagem, mas parece que novos
suportes podem levar o leitor a estancar diante da leitura, os suportes movem-se por ele. A
imagem estática traz uma sutileza narrativa, o tempo do olhar compreende os elementos que a
constituem, mas é a força da imagem em movimento que faz com que a narração leve para
dentro de si o terceiro elemento da relação tempo-espaço, o sujeito que a torna mais potente.
A categoria integrativa, já comentada na preferência simétrica e axial, também está
ausente, mas os atenuantes dos suportes são os modos de imersão: luz, dimensão e narração.
Sobre a produção de linguagem, em menor escala que os dados levantados sobre a
leitura, em decorrência da própria metodologia empregada, alguns indicadores foram
relevantes na prática de produção de imagens:
Tabela 20 – Síntese de dados – Produção de linguagem
Fato conclusivo Indicador “Aluno na
escola”
Indicador “aluno fora da
escola”
Limitação ao universo digital - Cópias da internet
Máquina fotográfica
Criaa partir da apropriação de
imagensdigitais
Copias da internet
Máquina fotográfica
Produção de linguagem
centrada na visualidade
Não tem interesse no gravador
digital
O processo de criação de imagens evidenciou a passagem “do lápis para o mouse”,
mas, mediante o número expressivo de alunos que informaram que desenham, foi realizado
um diálogo posterior com o grupo perguntando o que “significava desenhar a mão livre”.
Cruzando dados com as respostas desse diálogo, foi detectado que responderam o
questionário na crença da possibilidade, não na prática existente. Metaforicamente falando, se
o mouse é o lápis para os suportes digitalizados, a máquina digital também é o lápis para o
151
processo de digitalização. Como a base da produção é alimentada pela leitura, retomam-se as
questões da leitura.
5.4 – A imersão sob efeito da luz, dimensão e narração
A ideia da imersão é o efeito da mobilização dos sentidos até as especulações do
raciocínio para um determinado fim. É a tenacidade no ato de aprendizagem disparado pela
percepção e fisgado pelo estado de atenção.
No estudo realizado, esses três fatores caracterizam condutas cognitivas que se
formam no sujeito através dos suportes. É impossível não relacioná-los às categorias de
Peirce: como a forma se apresenta, como ocupa o espaço e o discurso que deflagra. Conforme
os resultados avaliativos dos projetos desenvolvidos pelos professores, os estados de atenção
que esses fatores geraram, combinados entre si, captaram potencialmente o olhar.
Na base do ato de aprendizagem estão os estados de atenção. Dentre os estímulos que
bombardeiam os sentidos, existem aqueles que predominam, que insistem na percepção, que
mobilizam os sensores. No cotidiano escolar, a expressão “presta atenção” é usada para
reivindicar a voluntariedade do cognoscente frente ao objeto de aprendizagem, o que seria
atenção forçada, muitas vezes insustentável. Para Lúria (1994) e Vygotsky (1991), numa
visão mais edificada no sujeito, isso é exemplo de atenção voluntária, que se opõe à
involuntária.
Estado de atenção não é sinônimo de percepção, pois perpassa por ela, mas assume um
papel de controle. Dois exemplos: caminhar por uma trilha fazendo uma vigília temerosa de
encontrar algum animal peçonhento, é um estado de atenção. A luz que afeta o olho e o
mobiliza cria um estado de atenção. O primeiro é um hábito gerado na experiência e a
afetação do olho é um hábito inveterado. Este último tem a natureza da voluntariedade do
sujeito esvaziada, que torna a atenção mais potente. No tocante aos suportes visuais, os
impressos refletem luz, os luminosos emitem a luz. Esse diferencial favorece
proeminentemente a luz direta. Uma vez que a atenção é mobilizada, a continuidade
dependerá do resto do contexto.
Santaella (2010) discorre sobre três aspectos da atenção: como órgão sensorial
relatando três tipos de atenção – a orientadora como flashes mentais, a segunda responsiva,
reagente, e a executiva, capaz de conduzir do concreto ao abstrato; a economia da atenção,
152
incorporada à desatenção como descanso psíquico e a capacidade da atenção expandir de
acordo com a demanda de estímulos que assolam o cérebro. Analisando sob esse aspecto, o
evento ocorrido na escola, as imagens impressas refletem a luz sob a concorrência da
diversidade de estímulo do ambiente, sujeitos à desatenção, deste modo exigirá maior controle
do sujeito para se fixar, enquanto os suportes luminosos, mais eficientes pela natureza
inveterada, se fixam. O estado de atenção não é algo independente do estímulo, apenas
delegado à reação do sujeito, é a pulsação externa. Neste caso, involuntário na respectiva
conexão.
Nos anos 1980, a indústria do entretenimento lançou o cinema 180 graus, uma imensa
tela esférica que cobria o campo visual criando uma sensação imersiva, as pessoas perdiam
até mesmo a sensação de equilíbrio. Na questão atual é exatamente o contrário: a redução do
campo visual à palma da mão. O que faz dela imersiva? A condição da área apreensível estar
associada a outros elementos. Conforme observação de material disponível no mercado, para
compensar a diminuição, as imagens se apoiam em alguns aspectos da sintaxe: distribuição
simétrica, equilíbrio axial e no close das formas que facilitam a leitura.
A outra questão é a tipologia da linguagem que o suporte favorece. A visualidade,
como foi exposto, assume o estatuto apresentativo, narrativo e, níveis sutis, da argumentação,
mas, o que se percebeu foi a imersão mais eficiente provocada pela narrativa típica dos
suportes das imagens em movimento. Enquanto a luz e a dimensão fisgam por critérios mais
espaciais, a narrativa prende pela proposição de tempo.
Parece que o comportamento cognitivo desejável para aprendizagem, em função do
novo cotidiano mediático, prima cada vez mais por estados de atenção que não se sustentam
mais em diálogos verbais ou a mente está em processo de devaneio decorrente da adaptação
ou, ainda, existem adaptações que não são percebidas. Santaella (2010, p. 307) comenta:
[...] é que o ambiente conforma o desenvolvimento cerebral e, muito
provavelmente, sob o influxo das tecnologias cognitivas, a inteligência
humana encontra-se em processo de adaptação e acomodação devido à
sobrecarga de informação, fazendo emergir, como estratégia evolucionária,
mentes fluidas, híbridas, auto-organizativas em ambientes hiperconectados e
ubíquos.
Adaptar e acomodar só reforça o caráter moldável do fluxo cognitivo, mas o produto
pode estar descompassado com níveis mais eficientes da capacidade cognitiva do cérebro ou a
cultura erigirá novas concepções de eficiência. O conceito de estilo cognitivo
(WILLINGHAN, 2001) enfatiza a ação do sujeito sobre o objeto de aprendizagem, mas, há
outra causa: a reação do sujeito aos signos encorpados em suportes, que favorecem
153
determinadas ordens gramaticais em detrimento de outras e modelam o modo de estar, de ser
e de conhecer o mundo.
154
CONCLUSÃO
A visualidade tratada mais como fenômeno inato, sujeito a predisposições genéticas,
é um traço velado nos processos educacionais, desde os documentos orientadores até as
práticas pedagógicas. A análise dos documentos orientadores, legislações e normatizações
procedimentais revelam a predominância da forma verbal, mesmo quando resvala em suportes
de linguagem pertinentes a visualidade.
O campo epistemológico, mais comum à rede de ensino pública, opera sobre
concepções de ensino-aprendizagem ainda sob valores behavioristas, que se detém sobre um
sujeito de aprendizagem a ser preenchido pelos saberes culturais em detrimento da devida
valorização das estruturas cognitivas com que está equipado, porém a ascensão de princípios
cognitivistas vem remodelando esse pensamento e permitindo cada vez mais compreender o
fluxo cognitivo sob concepções “neuroprocessuais”. Mesmo assim, com algumas exceções
como os gestaltistas e singularmente Marr, a visualidade ainda ocupa papel mais secundário
quando o termo linguagem enfatiza a forma verbal e práticas leitoras colocam a imagem
apenas subordinada à mediação nominal.
Os estudos sobre acognição permutaram do “olhar de fora para dentro” para “de
dentro para fora”. É aparentemente uma visão dicotômica que se abate sobre elas, mas, na
realidade, sinalizam a ausência de um terceiro aspecto: a mediação entre o mundo do sujeito e
o mundo real que se dá pelo signo. Deste modo, a teoria do signo tríádico, Semiótica de
Peirce, se apresenta como potente epistemologia do ensino aprendizagem. Não engessa faixas
etárias (modelo piagetiano), é flexível, é volátil, referenda as formas de linguagem, atualiza-se
frente à expansão da mesma, requer compreensão dos sistemas perceptivos e reconhece
estruturas pré-existentes na processualidade cognitiva. As semioses são capazes de explicar a
vagueza e a eficiência de práticas de aprendizagem, assim como conferem à visualidade,
corporificada na imagem, um caminho para seu próprio estatuto gramatical.
As classes categoriais da fenomenologia Peirceana aplicadas sobre o fenômeno da
imagem produzida, sob a natureza antropológica do sujeito, revelam estruturas organizativas
da visualidade: a linguagem visual, cujo termo “revelar” é oportuníssimo, pois sinaliza para
um fenômeno existente sujeito a ser elucidado. É deste modo que os experimentos de
Whertheimer anteciparam, a seu tempo, concepções confirmadas pela Neurociência. A junção
destas duas áreas de estudo foi contundente para defender a morfologia e a sintaxe visual.
155
A condição da linguagem circundante ao sujeito orienta formatações cognitivas que
estavam prenunciadas desde o movimento interacionista (Vygostky) através dos estudos sobre
odesenvolvimento social da linguagem, mesmo que fundado na forma verbal. As formas de
linguagem, no caso da visualidade, são encorpadas em suportes que modelam
comportamentos cognitivos e, consequentemente, os níveis de raciocínio.
Historicamente, a produção tecnológica da imagem, após a fotografia e o cinema,
vem proporcionando novas condutas, que diferem do longo período em que ficou na clausura
do “pigmento” e do “papel”. No aspecto da morfologia visual, cada vez mais. as formas
luminosas têm maior poder de imersão que se redimensionam ao associarem-se às figuras em
movimento. Na sintaxe, essa propensão seletiva provoca a hipervalorização da figura sobre o
fundo, um olhar cada vez mais focado nos primeiros estados de atenção, sujeita ao
enfraquecimento da conexão com os demais estados de atenção (fundo). Consequentemente,
interferem na qualidade de sentidos produzida por semioses relacionais imediatas e, depois,
dinâmicas.
Essa situação imersiva explica, pelo menos em parte, a conduta do cognoscente que,
para aprender, está cada vez mais dependente de meios envolventes, que catalisam a
percepção, em degeneração de estados de atenção que requerem maior predisposição do
mesmo para envolver-se. A diminuição de apreensão do objeto imediato efetivará menor
possibilidade indexical do objeto dinâmico, portanto, os estados de atenção que acentuam
diametralmente a relação figura-fundo, contribuem para o fato. As semioses aí disparadas
estão mais aptas a apresentar do que representar o objeto de conhecimento.
A redução da dimensão dos suportes, além da individuação da leitura, também
colabora com a situação. Campos visuais reduzidos enfatizam a figura para compensarem a
acuidade visual e exploram os equilíbrios axiais e radiais que facilitam o processo de leitura,
pois, temporalmente falando, são mais rápidos na apreensão do conjunto. A sintaxe se
habilita a valorar efeitos com interesse maior na apresentação da imagem do que gerar
contemplações mais instigadas.
A eficiência da imagem em movimento sobre a imagem fixa, ambas luminosas,
preconizam, mais uma vez, a mobilização perceptiva, a imersão passiva do leitor. Tal
condição, associada à natureza narrativa do suporte em movimento, está na predisposição para
estabelecer níveis da semiose, tanto da apresentação, como da argumentação, porém a
condição passiva, que, neste caso, nada mais é que a leitura contemplativa, favorece muitas
vezes o primeiro caso.
156
As observações de campo demonstram como os novos suportes são aparentemente
mais eficientes nos processos de ensino aprendizagem, mas é preciso ressaltar que se trata de
práticas num momento sócio-cultural em que os textos escritos são sobrepostos por textos
imagéticos, portanto, o fluxo contextual favorece. As práticas didáticas anteriores sucumbem
na sua eficiência frente à nova geração de discentes.
Todavia, a eficiência do aprendizado não se dá somente na sua imersão e fixação
(mesmo que temporal), mas na sequência operacional que representa. Para que isso ocorra, a
eficiência do processo, as semioses não podem restringir-se a um dos níveis icônico, indexical
ou simbólico, mas na correlação destes.
O confronto entre a realidade discente e a escola dá-se exatamente no tocante às
semioses. De um lado, as atuais críticas dos docentes são relativas às dificuldades de
aprendizagem crescentes nas unidades escolares: a memória de curto prazo, a dificuldade de
conectar objetos e a extração de argumentos, configura o sintoma das semioses simbólicas,
salvo as práticas singulares de recuperação do concreto no tratamento do objeto de
conhecimento. De outro lado, são jovens inseridos num ambiente comunicacional e
informacional que favorece as semioses com intuito da contemplação de coisas e suas
alteridades.
Numa ordem triádica, as semioses são possibilidades de configuração para seus
suportes que determinam condutas cognitivas, portanto, processos de aprendizagem não estão
apenas na sorte dos meios. Percursos ineficazes, estreitamento entre realidade e metas, são
passíveis de estratégias em prol de desenvolvimento mais holístico do sujeito de
aprendizagem.
Diante da necessidade de otimização do tempo e do espaço que a cultura atual
requer, a visualidade é uma forma de linguagem oportuna, porém, ainda se mantêm ausentes
maiores ações sob o respectivo ensino dessa gramática, ou seja, mudam-se os suportes, mas
algumas concepções se mantêm. A valorização da produção de sentidos em função do
escoamento da compreensão gramatical significa negar a relação de anterioridade da sintaxe
para o discurso. A visualidade ainda é apenas imagem para grande parte das concepções
pedagógicas.
Não há absolutamente nada de novo em afirmar a distância entre a práxis escolar e o
mundo real dos discentes, nem discutir esta aproximação como privilégio ou não da
tecnologia e muito menos solucionar a deficiência explorando conjecturas teóricas unilaterais.
A questão Neurocognitva da visualidade é a descrição processual das estruturas perceptivas e
157
associativas, a psicologia cognitiva é a sistematização das habilidades construtoras na
elaboração dos saberes, mas ainda estamos no sujeito. A eficiência está numa teoria da
mediação, uma ampliação da teoria semiótica para a aprendizagem: como os signos produzem
conhecimento.
Em suma, a hipótese de que os suportes visuais geram comportamentos cognitivos
encontra-se no modo que favorece possíveis semioses. Vejamos: as relações sintático-
morfológicas congregam e produzem efeitos sobre as estruturas visuais naquilo em que estas
estão equipadas para os estímulos luminosos se instalarem. São os aspectos da acuidade
(relações dimensionais), da seletividade (relações de movência) que geram sínteses (relações
de sentidos) para contemplar, associar ou operar. A falência desta evolução é um processo
degenerativo da função social da linguagem.
Todavia, o diagnóstico reclama por seu prognóstico, assim, o que se propõe para a
aplicação destas constatações não é a demonização das TICs, muito pelo contrário, mas
recuperar dentro da cultura da visualidade, principalmente nos meios de aprendizagem, uma
gramaticalização visual para o discente não se limitar à apreciação passiva e organizar
soluções sintáticas que, veiculadas em suportes, contribuam para maior exploração dos níveis
das semioses.
Nos âmbitos escolares a pulverização do currículo em disciplinas dá sinais de
esgotamento, tangíveis na constante ideia de integração de metodologia e conteúdos, no
encapsulamento de disciplinas, na pluralidade de habilidades e competências cognitivas. Cada
vez mais se reconhece a dependência da construção de conhecimento como ato de linguagem
e comunicação. Aos poucos, a valorização do modo processual do “ato de pensar” sobrepõe o
acúmulo dos saberes culturais. Estes indícios apontam para um futuro promissor que
engendrará uma visão da educação a partir das máquinas pensantes que somos. Portanto, essa
poderá ser proposta da escola sustentada na ideia de compreender e corrigi-las em prol de
excelência do raciocínio, mesmo quando a força coercitiva da mediação cultural precise ser
reconsiderada.
158
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