PP-Os lusíadas-Mensagem

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  • 8/2/2019 PP-Os lusadas-Mensagem

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    Os Lusadas / Mensagemnotas para o estudo

    L. Cames / F. Pessoa

    - Colgio de So Gonalo- 12 ano

    - Prof. Antnio Costa

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    RENASCIMENTO - contextualizao

    um grande movimento de mudanas culturais, queatingiu as camadas urbanas da Europa Ocidental entre ossculos XIV e XVI;

    caracterizado pela retomada dos valores da cultura greco-romana, ou seja, da cultura clssica.

    um importante perodo de transio envolvendo asestruturas feudo capitalistas.

    As bases desse movimento eram proporcionadas por umacorrente filosfica reinante, o humanismo, que descartavaa escolstica medieval, at ento predominante, epropunha o retorno s virtudes da antiguidade.

    Plato, Aristteles, Virglio, Sneca e outros autores greco-romanos comeam a ser traduzidos e rapidamentedifundidos.

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    RENASCIMENTOISMOSDO RENASCIMENTO

    Assim como os gregos, os homens "modernos" valorizaram o Antropocentrismo:"O homem a medida de todas as coisasProtgoras

    Humanismo: o entendimento do mundo passava a ser feito a partir da importncia do serhumano, o trabalho, as guerras, as transformaes, os amores, as contradies humanastornaram-se objectos de preocupao, compreendidos como produto da aco do homem.

    Racionalismo: a convico de que tudo pode ser explicado pela razo do homem e pelacincia, a recusa em acreditar em qualquer coisa que no tenha sido provada.

    o Experimentalismo e a cincia conheceram grande desenvolvimento.

    o Individualismo reflectiu a emergncia da burguesia e de novas relaes de trabalho. A ideiade que cada um responsvel pela conduo de sua vida, a possibilidade de fazer opes ede manifestar-se sobre diversos assuntos, tomando decises.

    Hedonismo: calcado na viso do prazer e da felicidade como bens supremos, o homem pregaa busca pela satisfao material.

    Heliocentrismo: Coprnico nega o centrismo da Terra.

    Expansionismo: movimento de expanso martima que teve como ponto alto osDescobrimentos portugueses.

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    RENASCIMENTO

    Valores do Renascimento:

    - Sociedade antropocntrica,

    - Optimismo do Homem face sua Razo;

    -

    Homem como criador do seu prprio destino;- Valorizao das letras, das artes e cultura greco-latinas;

    - Humanismo: afirmao e interesse pelo homem;

    - Naturalismo: observao da Natureza e acesso aos seussegredos;

    - a nvel social: defesa de uma sociedade perfeita;- Atitude religiosa: cristos com uma atitude crtica quanto Igreja oficial; redescoberta da Bblia e dos Evangelhos;

    - nova mundividncia.

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    Poema pico / Os Lusadas

    Caractersticas gerais

    Estrutura: externa e interna

    (ver manual Plural, LisboaE

    ditora: pginas 22, 23, 24; 104)

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    Os Lusadas / Mensagem

    Cames Os Lusadas

    O pico camoniano um cntico de exaltao e deenaltecimento do povo portugus:

    -pelos hericos feitos de guerra,-pelas conquistas;

    -pela epopeia dos descobrimentos. Essa valorizao exclusiva da histria nacional era o gnero

    mais elevado e mais apreciado pelos antigos.

    ...eu canto o peito ilustre lusitano

    A quem Neptuno e Marte obedecem

    Foram muitos os autores que tentaram retratar os feitoshericos do povo portugus, mas foi Cames o seu maiorrepresentante.

    (o estmulo inicial veio de Garcia de Resende, no prlogo do

    seu Cancioneiro Geral)

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    Os Lusadas / Mensagem O eixo do Poema a viagem de Vasco da Gama, mas Os Lusadas no so

    a viagem do Gama. Os Lusadas so todos os seus reis, todos os seus heris, todos os seus

    gloriosos bares.

    As armas e os bares assinalados()

    E tambm as memrias gloriosasDaqueles Reis que foram dilatando()

    E aqueles que por obras valerosasSe vo da lei da Morte libertando; (I , 1, 2)

    O Gama, na sua notcia ao rei de Melinde, deu conta dos queenobreceram a Nao at aquele momento em que fazia a sua exposio,comeando naturalmente pelos reis e pelos que estiveram mais prximosdos reis.

    uma narrativa poetizada da histria antiga de Portugal, a comear em

    Luso e a acabar em 1497, com D. Manuel.

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    Os Lusadas / Mensagem

    Lus Vaz de Cames pouco tem a ver com aideologia burguesa europeia de sua poca.

    Em Os Lusadas, ele exalta a expanso

    portuguesa, conduzida nos padres damonarquia, a favor das classes dominantes.

    Essa aristocracia que o pico propeimortalizar tem a conscincia de promoveruma revoluo no mundo; assim, o poetaatribui-lhe um significado poltico, religioso ecientfico, de que muito se orgulha.

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    Os Lusadas / Mensagem

    Para representar a epopeia da ptria e expanso dela,Cames recorre aos deuses mitolgicos que estaropresentes na viagem de Vasco da Gama.

    Somente a viagem no bastava a Cames para estruturar

    uma epopeia clssica, por isso, ele leva os acontecimentosa uma aco crucial, envolvendo os protagonistas dasviagens em vrios episdios marcantes:

    - Baco ope-se ousadia dos portugueses, que soprotegidos porVnus, que intercede aJpiterem favordo povo na sua trajectria;

    - Os heris de Cames raramente parecem decarne; faltam-lhes carcter e paixo.

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    Os Lusadas / Mensagem

    Por isso, Cames cria uma dinmica ao seu poema,tomando como base a expresso dos deuses greco-romanos, que lhe fornecem subsdios suficientes para umaintriga de deuses apaixonados.

    A mitologia nOs Lusadas:

    - meramente alegrica;- desempenha uma funo central;- enriquece a obra com uma genuna unidade deaco e de enredo dinmico;

    - dota o poema de contrastes, emoes, clmax edesfecho.

    Essa esttica camoniana proporcionou a perpetuao deum pico que teve como objectivo central a exaltao deum povo na poca das grandes descobertas.

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    Mensagem F. Pessoa

    D' OS LUSADAS MENSAGEM

    Os poemas de Cames e de Fernando Pessoa sobrePortugal situam-se respectivamente no incio e nafase terminal do longo processo de dissoluo doimprio.

    Diferenas e afinidades:

    - Ao gizar a Mensagem, Fernando Pessoa tinha OsLusadas no mbito das suas referncias culturais assimcomo a mitologia colectiva vinda de Cames e dohumanismo quinhentista.

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    Mensagem F. Pessoa

    Ambos se mostram impregnados duma concepomstica e missionria da Histria portuguesa:

    D. Sebastio, n' Os Lusadas, um enviado de Deusincumbido de alargar a Cristandade: Vs, novo

    temor da Maura lana, / Maravilha fatal da nossaidade, / Dada ao mundo por Deus, que todo o mande, /Para do mundo a Deus dar parte grande (I, 6).

    Na Mensagem, Portugal um instrumento de Deus, aHistria ptria obedece a um plano oculto, os heriscumprem um destino que os ultrapassa: Fosse Acaso,ou Vontade, ou Temporal/ A mo que ergueu o fachoque luziu, / Foi Deus a alma e o corpo de Portugal / Damo que o conduziu.

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    Mensagem F. Pessoa Se, n' Os Lusadas, o nosso pas qual cume da cabea / Da Europa, na

    Mensagem, em descrio semelhante, Portugal o seu rosto, e adiferena reside na personificao da Europa, figura feminina, de olhosnegros, romnticos cabelos, o rosto apoiado na mo direita, atitudeesttica, pensativa. Haver aqui sugestes do clebre soneto de Unamunodedicado a Portugal, simbolizado numa mulher que, descala, na praia, emfrente do Atlntico, olha absorta em nostalgia e esperana:

    Dice de luengas tierras y de azaresmientras ella sus pis en las espumasbaando suea en el fatal imperio,que se le hndi en los tenebrosos mares;

    y mira como entre agoreras brumasse alza Don Sebastian, rey del misterio.

    A Europa jaz, posta nos cotovelos:

    De oriente a Ocidente jaz, fitando,

    E toldam-lhe romnticos cabelos

    Olhos gregos, lembrando.

    O cotovelo esquerdo recuado;

    O direito em ngulo disposto.

    Aquele diz Itlia onde pousado;

    Este diz Inglaterra onde, afastado,

    A mo sustenta, em que se apoia o rosto.

    Fita, com olhar esfngico e fatal,

    OOcidente, futuro do passado.

    O rosto que fita Portugal. (I, 1)

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    Os Lusadas / Mensagem

    Cames e Pessoa so cantores da ptria, so poetasda ausncia.

    Eles so poetas do que foi (Cames) ou do quepoder vir a ser (Pessoa).

    Mas as situaes divergem:

    - No Cames pico- predomina o elemento viril a viagem, a aventura, o

    risco;- tradicionalmente, a mulher a que fica, esperando,

    imvel, na felicidade e no sonho do regresso: comoPessoa e as figuras em que se desdobra, de olhosfitos no indefinido.

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    Os Lusadas / Mensagem

    E

    m Cames, pem-se no mesmo plano a memria e aesperana.

    Em Pessoa, no, porque o objecto da esperana setransferiu para o sonho, a utopia, e da uma concepodiferente de herosmo.

    Pessoa identifica-se com os heris da Mensagem, ouneles se desdobra, num processo lrico-dramtico.

    Na Mensagem, o amor da ptria converte-se numaatitude metafsica definvel pela decepo do real, pelo

    anelo absoluto, por uma loucura consciente, pela buscado que no existe, pela demanda que s tem finalidadeem si prpria, porque atingir estagnar, ser vencido.

    Est, naMensagem, a lio do Encoberto.

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    Os Lusadas / Mensagem

    A Mensagem, onde os elementos picos surgemfiltrados, transfigurados, pela contemplaolrica, no se situa muito longe do clima d' OMarinheiro, drama esttico, onde a SegundaVeladora nos fala do marinheiro que se perdeu

    numa ilha remota:Como ele no tinha meio de voltar ptria, ecada vez que se lembrava dela sofria, ps-se asonhar uma ptria que nunca tivesse tido.

    Revivendo a f no Quinto Imprio, Pessoainventou uma razo de ser, um destino, fugindo angstia dum quotidiano absurdo, genialmenteexpresso por ele e por lvaro de Campos.

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    Os Lusadas / Mensagem Cames ainda conheceu o imprio no concreto da sua

    grandeza e das suas misrias, era-lhe fcil ainda teresperana

    D. Sebastio a quem Cames se dirige um jovem decarne e osso, vale a pena mostrar-se, exibir os seus

    prstimos, para que oR

    ei o distinga, confie nele, se lancena conquista do Norte de frica levando-o consigo.

    Outro imprio terreno ainda parece possvel, como apressaga mente vaticina, o prprio Velho do Restelo

    sanciona a aventura, e Cames prepara-se para cantar anova empresa.

    O D. Sebastio da Mensagem, elaborado longamente pelosebastianismo e pela humilhao, esse o Encoberto, o

    Desejado, uma sombra, um mito.

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    Os Lusadas / Mensagem Pessoa sobrevive na aridez dos dias vcuos:

    - j lhe faltam razes para acreditar,- o seu desejo est no limite, calcinado pela espera dequatro sculos.- Refaz o trajecto camoniano da evocao para a invocao.- perante o Rei ausente, (exilado na ilha encantada), comose fosse o menino rfo, abandonado, que, na desolao dasua prpria intimidade, dirige me uma derradeirasplica:Screvo meu livro beira-mgoa /Meu corao no temque ter. // Ah, quanto querers, voltando, / Fazer minhaesperana amor? / Da nvoa e da saudade quando? / Quando, meu Sonho e meu Senhor? (Terceiro d' Os Avisos).- o seu enorme anseio tornou-se insuportvel,- s pela palavra potica ilude o silncio o vazio.

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    Os Lusadas / Mensagem #Estruturas

    Em Os Lusadas: Jorge de Sena valoriza o extraordinrio equilbrioconstrutivo (capacidade e preocupao arquitectnicas).

    Em Mensagem, os textos que compem a obra distribuem-se em grupose subgrupos, obedecendo a um plano cuidadosamente estabelecido.

    Diferenas

    Os Lusadas so, pela forma, que no s pela substncia, uma epopeiaclssica, narrao onde se enlaam a viagem de Vasco da Gama, acomdia dos deuses e a Histria de Portugal, mediante alternncias ediscursos dentro do discurso, uns retrospectivos, outros prospectivos.

    A Mensagem integra 44 poesias breves, datadas de vrias pocas earrumadas em trs partes principais: Braso, Mar Portugus e OEncoberto.

    A primeira e a terceira partes ainda esto subdivididas: a primeira em OsCampos, Os Castelos, As Quinas, A Coroa e O Timbre,reproduzindo assim os elementos da bandeira nacional; a terceira osSmbolos, Os Avisos e Os Tempos.

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    Os Lusadas / Mensagem Mensagem vs Os Lusadas

    Da face interna, emblemtica, desta arquitectura,alis de sentido ocultista, da Mensagem infere-se umcarcter menos narrativo e mais interpretativo, maiscerebral, que o d' Os Lusadas.

    No poema camoniano h uma tendnciaabstractizante, livresca;

    NOs Lusadas, a ideia de ptria uma nooabstracta, fora da histria, e os heris histricos sereduzem a puras abstraces ou medalhes

    convencionais. Apesar desta afinidade entre Cames e Pessoa, este

    leva o cerebralismo muito mais longe, possui aquilo aque Cesare Pavese chamava o senso herldico, isto, a faculdade de ver smbolos em tudo.

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    Os Lusadas / Mensagem

    Os heris da galeria da Mensagem funcionam comosmbolos, elos duma trajectria cujo sentido Pessoa seprope desvelar at onde o permite o olhar visionrio.

    O assunto da Mensagem no so os portugueses oueventos concretos, mas a essncia de Portugal e a suamisso por cumprir.

    Em fragmento recolhido nas Pginas de Esttica e deTeoria e Crtica Literrias, Pessoa censurava a Os

    Lusadas a falta dum pensamento.

    Ora, na Mensagem a reduo a um pensamento quedescarna, espectraliza as personagens da Histria

    nacional.

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    Os Lusadas / Mensagem Tanto Cames como Pessoa, usam o processo da descrio

    sucessiva, fragmentria, de figuras-padro.

    Nos discursos de Vasco da Gama esta tcnica verifica-se quer naexplicao das bandeiras perante o Catual quer no relato daHistria de Portugal destinado ao Rei de Melinde.

    Os retratos (por vezes auto-retratos) morais da Mensagemfiliam-se no epigrama ou inscrio tumular dos clssicos (quePessoa, alis, cultivou nas Inscriptions).

    Observemos, por exemplo, a figura de Viriato no poemacamoniano: Este que vs, pastor j foi de gado; / Viriatosabemos que se chama, / Destro na lana mais que no cajado; /Injuriada tem de Roma a fama, /Vencedor invencvel, afamado:/No tm com ele, no, nem ter puderam / O primor que comPirro j tiveram (VIII, 6). E ponhamos, em confronto, acomposio intitulada Viriato naMensagem:

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    Viriato,Mensagem

    Se a alma que sente e faz conheceS porque lembra o que esqueceu,Vivemos, raa, porque houvesseMemria em ns do instinto teu.Nao porque reincarnaste,Povo porque ressuscitouOu tu, ou o de que eras a haste -Assim se Portugal formou.

    Teu ser como aquela friaLuz que precede a madrugada,E j o ir a haver o diaNa antemanh, confuso nada.

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    Os Lusadas / Mensagem

    Em Cames, temos to-s a descriolaudatria;

    Em Pessoa, Viriato no j um heri

    confinado no seu tempo, encarna ummomento da vida de uma nao, o momentoda gestao latente; prefigura o que havia devir, o sinal dum plano que tinha de cumprir-se.

    O indivduo apaga-se em favor do entemetafsico chamado Portugal.

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    Os Lusadas / Mensagem Algo semelhante ocorre no tratamento doutra personagem:

    o Rei Dom Dinis. Cames narra, em trs oitavas, o que ns hoje aprendemos

    na escola: o seu reinado foi pacfico e prspero, fundou aUniversidade, que depois transferiu para Coimbra,promulgou novas leis, reformou o pas Com edifcios

    grandes e altos muros (III, 96-98). Falta qualquer aluso a ter mandado semear o pinhal de

    Leiria. Pelo contrrio, na Mensagem este o facto posto em

    relevo pelo seu valor simblico: Dom Dinis surge como

    plantador de naus a haver; encarna outro momento dahistria secreta de Portugal, tambm o instrumento dumavontade transcendente, prepara de longe o Imprio, ouve,de noite, enquanto escreve um cantar, o o rumor dospinhais que, como um trigo / De Imprio, ondulam sem sepoder ver.

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    Os Lusadas / Mensagem Sem dvida, na segunda parte da Mensagem, Mar Portugus,

    perpassa um sopro pico, exalta-se o esforo herico dosPortugueses no domnio dos mares, Pessoa d, por vezes, a rplicaa Os Lusadas.

    O Mostrengo, do mesmo modo que o Adamastor, ope hostilidade bravia da Natureza a energia indmita dos Portugueses:Sou um povo que quer o mar que teu - diz ao Mostrengo o

    homem do leme.

    Na Mensagem retoma-se, embora em diferente registo, o tpico davantagem que levam os Portugueses aos navegadores daAntiguidade: Que o mar com fim ser grego ou romano; / O marsem fim portugus.

    E, como n' Os Lusadas, no se esconde que o reverso da vitria soas lgrimas: a pica integra em claro-escuro a histria trgico-martima: aMensagem tambm um livro-sntese: mar salgado,quanto do teu sal / So lgrimas de Portugal! Mas a perspectivamudou.

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    Os Lusadas / Mensagem

    Austero, absorto, Pessoa no canta aexpanso terrena, menos ainda a guerracontra os Infiis. No catlica apostlica

    romana a sua inspirao.

    O emprego do singular Deus, com maiscula,

    imposto pela matria da obra, no vale mais,como prova de convico pessoal, que oemprego do plural deuses em Ricardo Reis.

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    Os Lusadas / Mensagem

    A atitude tpica dos heris da Mensagem contemplativa e expectante: olham o indefinido,concentram-se na febre do alm que o poeta encarnanos versos admirveis de A Noite: Com fixos olhosrasos de nsia / Fitando a proibida azul distncia.

    Depressa esta atitude significa uma nsia metafsica, abusca duma ndia que no h. A primeira grandemisso cometida por Deus a Portugal, desvendar omundo, chegou ao seu termo: Cumpriu-se o mar, e o

    Imprio se desfez - diz Pessoa em O Infante.

    Ento qual o destino nacional que vem anunciar? Quesentido tem o verso Senhor, falta cumprir-sePortugal?

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    Os Lusadas / Mensagem A inspirao da Mensagem, como foi lembrado, ocultista,

    e o Imprio entrevisto no futuro uma aventura do esprito,viagem sem fronteiras ou limitaes movida pelo amor dodiverso e uma constante inquietao.

    Quando muito (a fala sibilina deixa sup-lo) um imprio da

    lngua portuguesa, superior por natureza ao imprioterreno, que o tempo destruiu. obscuro e carnal anterremedo

    Na terceira parte do livro, o lema Pax in excelsis e adespedida, Valete, Fratres, sugerem um projecto defraternidade universal entre os homens.

    Talvez o que se aponta seja, na verdade, a utopia, e por issoo elogio do heri, ao contrrio do que sucede n' OsLusadas, redunda no elogio da loucura, - essa loucura desinal positivo sem a qual o homem no passa de bestasadia, essa loucura que nos salva da metade de nada

    em que viver morrer.

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    Os Lusadas / Mensagem Em contraste com o realismo d' Os Lusadas (ou do que realista em

    Cames se pretende), a Mensagem reage pela altiva rejeio a umreal oco, absurdo, intolervel, propondo-nos em seu lugar a nicacoisa que vale a pena: o imaginrio.

    Quem no soube - ou no quis - entender a Mensagem ignorouesta diferena essencial; nem soube captar a ironia imanente no

    intertexto pessoano (compare-se o optimismo voluntrio dopoema, incluso na profecia, embora marginada pela dvida, com opessimismo total da Elegia na Sombra, escrita uns seis mesesdepois da publicao do livro, precisamente em 2-6-1935).

    Uma vez mais, o poeta se contradisse, ou disse o que estava latenteno no-dito. Resta saber at que ponto o imaginrio susceptvelde transformar o leitor enquanto homem e lusada, coitado, e emque medida o projecto de Pessoa, cantor de mitos, visava alm dosimples, conquanto nobre e apaixonado, divertimento esttico.

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    Os Lusadas Proposio (canto I, 1-3)As armas e os bares assinaladosQue, da ocidental praia Lusitana,

    Por mares nunca dantes navegadosPassaram ainda alm da Taprobana,Em perigos e guerras esforadosMais do que prometia a fora humana,E entre gente remota edificaramNovo Reino , que tanto sublimaram;

    E tambm as memrias gloriosas

    Daqueles Reis que foram dilatandoA F, o Imprio, e as terras viciosasDe frica e de sia andaram devastando,E aqueles que por obras valerosasSe vo da lei daMorte libertando;Cantando espalharei por toda a parte,Se a tanto me ajudar o engenho e arte .

    Cessem do sbio Grego e do TroianoAs navegaes grandes que fizeram;Cale-se de Alexandro e de TrajanoA fama das vitrias que tiveram;Que eu canto o peito ilustre lusitano ,A quem Neptuno eMarte obedeceram.Cesse tudo o que aMusa antiga canta,Que outro valor mais alto se alevanta.

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    Os Lusadas - Proposio

    Pode esquematizar-se o contedo dessas duas primeiras estrofes daseguinte maneira:

    Atravs da poesia,se tiver talento para isso,tornarei conhecidos em todo o mundo

    os homens ilustresque fundaram o imprio portugus do Oriente

    os reis, de D. Joo I a D. Manuel,que expandiram a f crist e o imprio portugus

    todos os portuguesesdignos de admirao pelos seus feitos.

    Cames apresenta trs grupos de agentes ("agentes" e no heris,porque o heri "o peito ilustre lusitano ; plural: os lusadas).