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Dissertação de Mestrado (em Artes Visuais) do artista Roberto Moreira Junior (Traplev) apresentado em 2007 na UDESC, Centro de Artes, Florianópolis, SC Brasil.
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recibo 5/7
t rap lev orçamentos &half dinar empreendimentos
Edição Especial: Dissertação de Mestrado
Impresso em Berlim 5 exemplares assinados e numerados
PRÁTICAS ARTÍSTICAS CONTEMPORÂNEAS:articulação entre asd i f e r e n t e s esferas do circuito
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1. destacar esta folha e espalhar sobre o chão em dia e local de lançamento;2. destacar todas as folhas e espalhar em ônibus, metrôs ou barcos e taxis;3. deixar como um todo arquivado em seu arquivo;4. destacar qualquer folha e presentear um amigo;5. virar do avesso e utilizá-lo como bloco de anotação de telefone;6. comprar exemplares depois do lançamento e vendê-los mais caros;7. Pensar uma tática melhor e fazer o que quiser.
sugestão traplev pf:
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recibo 5/7
Von Roberto Moreira JuniorInsel unsichtbar, 2007.
PRÁTICAS ARTÍSTICAS CONTEMPORÂNEAS:articulação entre asd i f e r e n t e s esferas do circuito
D i s s e r t a ç ã o a p r e s e n t a d a a oPrograma de Pós -Graduação em Artes Vi suai s - Mest radona Linha de Pesquisa: Poéticas, História e Teoria das Artes Visuaisdo Centro de Artes da Universidade Estado de Santa Catarina,como exigência parcial para obtenção do Ttítulo de Mestre em Artes Visuais,s o b a O r i e n t a ç ã o d a P r o f ª D r ª R e g i n a M e l i m
Banca Examinadora:
Prof.ª Dr.ª Yara GuasqueUniversidade do Estado de Santa Catarina
Prof. Dr. Paulo R. O. Reis (Prof. Convidado) Universidade Federal do Paraná
Prof.ª Dr.ª Regina Melim (Orientadora)Universidade do Estado de Santa Catarina
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Valor da Avaliação*:
Espaço reservado ao preenchimento pela Banca Examinadora após a apresentação desta...
(* em Euros)
traplev orçamentos & half - dinar empreendimentos
5
6
Esclarecimentos iniciais:
Esta primeira versão da dissertação para a banca examinadora da apresentação da defesa do mestrado está centrada a partir de um projeto “fictício” de publicação. Recibo é um projeto que ao longo de alguns anos, existiu na forma utópica de ser uma revista de arte visuais e que agora, cinco anos de sua primeira edição (realizada em 2002), começa (talvez – vielleicht) a ter uma identidade e circulação maior. A questão que se propõe é o desenvolvimento de estratégias para uma dispersão do conteúdo que se coloca aqui, partindo da prerrogativa pública e profissional que é a realização de um mestrado em artes visuais. Com isso pergunto-me: quais são os pontos de atuação de um pesquisador em artes visuais nesse Estado1 que nos encontramos? Que necessidade há do artista fazer pesquisa e desenvolver hipóteses dentro do circuito de arte2? Dentre vários fatores, o mestrado possibilitou3 o desenvolvimento da pesquisa sobre práticas artísticas no qual pude realizar alguns trabalhos que auxiliaram na reflexão desse estudo, atuando nas diversas camadas do circuito de arte, testando a permissividade das Instituições envolvidas. O Programa de Pós-graduação em Artes Visuais trouxe a possibilidade para os interessados em desenvolver um novo espaço de opinião crítica e de atuação no exercício de artista, educador ou teórico, para inovar os meios em que atuamos, ou mesmo insistir para que os demais percebam a mudança de paradigmas. Gostaria de parabenizar a equipe técnica do Programa de Pós-graduação do Mestrado (a secretária Sandra Lima e a coordenadora e minha orientadora Regina Melim), pela seriedade e o esforço em trazer, disponibilizar e viabilizar ferramentas para encontrarmos mecanismos de inserção num campo tão complexo quanto o das artes visuais hoje. Agradeço ao Paulo Reis, convidado para esta banca e a Yara Guasque pela atenção e cuidado que tiveram na Qualificação. A Regina Melim pela afinidade, atenção e liberdade de acreditar nas possibilidades do artista para uma dissertação de mestrado. A Helmut Batista pela generosidade de me receber em sua casa nas estadas no Rio de Janeiro e disponibilizar para pesquisa seus materiais de arquivos e biblioteca. O convívio na residência de artista – Capacete, e as conversas nesse meio foram muito ricos para compreender e buscar desafios. A Teresa Riccardi pelas conversas e diálogos que estabelecemos desde o primeiro encontro, (no Rio de Janeiro, depois em Florianópolis e Buenos Aires), contribuindo muito também no entendimento de minha produção e as iniciativas de artistas e suas práticas. A Néri Pedroso pela dedicação e apoio nos projetos que realizei desde os primeiros artigos publicados no jornal até a revisão deste texto da dissertação. No final agradeço as amigas que acompanham e colaboram nos projetos que já realizei, em especial Julia Amaral e Nara Milioli e aos meus pais Maria Augusta Nhoatto Moreira e Roberto Moreira pelo amor, insistência e apoio. Agradeço também a Roseline Rannoch pelo amor e carinho (liebe und zärtlich) recebido. Muito obrigado a todos.
1 Santa Catarina e outras metáforas. 2 Questões já levantadas principalmente nas dissertações de Dora Longo Bahia e Carla Zaccagnini defendidas na ECA/USP. 3 Tendo recebido a Bolsa do Promop/Udesc no período de 1 ano.
7
8
(...) As práticas artísticas são “maneiras de fazer” que intervêm na
distribuição geral das maneiras de fazer e nas relações com maneiras
de ser e formas de visibilidade.
Jacques Ranciére
A partilha do sensível
2005.
Forçar os limites de permissividade do circuito
é uma das tarefas da produção contemporânea.
Ronaldo Brito
Análise do Circuito
1975.
9
PRÁTICAS ARTÍSTICAS CONTEMPORÂNEAS:
ARTICULAÇÃO ENTRE AS DIVERSAS ESFERAS DO CIRCUITO
Palavras Chaves:
Práticas artísticas, Crítica e Permissividade do Circuito.
Resumo:
A dissertação de mestrado Práticas Artísticas Contemporâneas:
articulação entre as diversas esferas do circuito compreende de descrição
e análise de atuação no circuito de arte empreendida por ações artistícas, ações
curatoriais e ações críticas, tendo em vista as diferentes posições que vêm
tomando desde o princípio da década de 1960.
Os mecanismos que desenvolvem práticas para expandir as atividades
institucionais são versões possíveis de uma estrutura insatisfatória. O que move
a maioria dos projetos aqui abordados é uma necessidade de criar espaços de
discussão para produção artística, configurando e constituindo um circuito. Tais
práticas, sejam vinculadas a instituições ou não, formam um importante núcleo
de atividades que desencadeiam outras possibilidades de leitura, entendimento
e circulação de arte, estabelecendo zonas temporárias de intercâmbio por meio
de proposições artísticas tais como: publicações, exposições, seminários,
encontros, palestras, passeios, viagens, entre outros.
A ação de reunir, negociar, produzir, organizar e difundir, envolve etapas
imprescindíveis que se tornaram práticas recorrentes no atual circuito de arte.
Aquela posição do artista que produz em seu ateliê, longe dos processos que
antecedem a publicação/exposição/recepção de sua obra, não é mais a única
condição. A hibridização das funções entre artista – curador – critico –
agenciador – professor - etc, são princípios para se pensar a produção artística
na atualidade.
Neste sentido, insiro minha própria produção de artista, como um
deflagrador de situações e processos que dizem respeito às relações híbridas da
contemporaneidade. As múltiplas possibilidades existentes neste contexto
fizeram com que os trabalhos realizados durante a pesquisa, estivessem
sempre no limite, tencionando a permissividade frente ao circuito.
10
Índice:
Introdução...........................................................................................11
1. Esferas do Circuito (modos e formatos)................................................13
Movimento Dada - Francis Picabia 391, Tristan Tzara DadaPhone.................................14
Fluxus – Dicky Higgins...........................................................................................15
Interfunktionen – Wolf Vostell.................................................................................16
Xerox Book, March 1969 - Seth Siegelaub.................................................................17
REX Gallery & Sons - Grupo Rex, 1968 (São Paulo, Brasil)...........................................17
Cildo Meirelles – Inserções em Circuitos Ideológicos, 1970 (Rio de Janeiro, Brasil)..........18
Panorama da Arte Brasileira 2001 (São Paulo, Brasil)..................................................19
Manifesta 6 (Chipre, Nicosia)...................................................................................20
InSite (Tijuana, México e San Diego, Estados Unidos).................................................21
unitednationsplaza (Berlim, Alemanha).....................................................................25
4ª Bienal de Berlim Von Mäusen und Menschen (Berlim, Alemanha)..............................26
The Next Documenta Should be Curated by an Artist (e-flux) e Exposición en Palabras - Jens
Hoffmann - Revista Pulgar (Caracas, Venezuela)..........................................................29
Conversa Infinita, Do it, Point d’ironie - Hans Ulrich Obrist...........................................31
Encuentro de Espacios y Grupos Independientes de América Latina y el Caribe - Duplus e
Trama (Buenos Aires, Argentina).............................................................................34
Hoffmann’s House (Valparaíso, Chile).......................................................................34
Capacete Entretenimentos (Rio de Janeiro, Brasil)......................................................35
Istmo Arquivo Flexível (São Paulo, Brasil).................................................................35
2. Práticas Políticas no Campo Estético....................................................37
La Política de la Estética - Jacques Ranciére.............................................................38
Thomas Hirchhorn.................................................................................................39
Superflex (Dinamarca)...........................................................................................40
La Practica Artística mas allá del Dispositivo de Exhibicion – Duplus..............................42
Projeto ROAD – Capacete (Rio de Janeiro, Brasil).......................................................43
Projeto Contramão (Florianópolis, Brasil)..................................................................45
Como brindar un servicio artístico: una introdución - Andrea Fraser.............................47
3. Proposições de Insistência Prática........................................................48
a dívida não está paga!..........................................................................................49
Traplev.................................................................................................................52
Traplev Agenciamentos...........................................................................................68
Bibliografia...........................................................................................75
Apêndices:
Plano C. (dossiê) Câmara Setorial de Artes Visuais Funarte e demais projetos
Publicação recibo (coleção)
11
Introdução:
Na primeira parte, denominada Esferas do Circuito (modos e
formatos), contextualizo a recente produção artística na história, no âmbito da
crítica de arte, situando o Brasil nesse panorama e penetrando numa reflexão
promovida por instituições (em eventos) como: Manifesta 6, InSite05 e 4ª
Bienal de Berlim, que abordam as relações das práticas artísticas refletindo
sobre outros formatos de exibições e curadorias.
Na apresentação das iniciativas de artistas, que organizam e geram suas
próprias ações (publicações, curadorias, encontros, workshops, palestras,
intercâmbios), articulo as relações históricas e sua institucionalização hoje. Esse
mapeamento das práticas artísticas é um estudo específico sobre iniciativas
institucionais e não-institucionais que provocam outros percursos de atuação no
circuito de arte.
Na segunda parte, no tema Práticas Políticas no Campo Estético,
realizo uma análise da produção artística no campo político abordando os
organismos de artistas, Capacete, Duplus, Projeto Contramão, e os trabalhos e
textos de Thomas Hirchhorn, Superflex e Andrea Fraser. Neste capítulo,
desenvolvo a análise a partir das publicações de Jacques Ranciére, sobretudo,
na relação entre estética e política.
Ranciére irá dizer que as práticas artísticas jogam um papel fundamental na
partição do perceptível, na medida em que suspendem as coordenadas ordinárias da
experiência sensível e re-marcam a rede de relações entre espaços e tempos, sujeitos e
objetos, o comum e o singular.
Na terceira parte, denominada Proposições de Insistência Prática,
abordo justamente minha prática como artista nesse contexto (entre as
demandas de produção e articulação), apresentando documentação dos
projetos realizados: organização de exposições como proposições curatoriais,
organização de seminário, textos publicados, projetos de política cultural,
publicação (recibo) e outros trabalhos de participação em exposições individual,
coletivas, e salões de arte.
12
Algumas dessas práticas surgiram da necessidade de se articular a
produção recente de arte contemporânea com instituições em cidades que
carecem de um programa específico para as artes visuais. A ação de reunir,
negociar, produzir, organizar e difundir, é uma etapa imprescindível e se tornou
prática recorrente nas minhas atividades.
Aquela posição do artista que produz em seu ateliê, longe dos processos
que antecedem a publicação/exposição/recepção de sua obra, não é mais a
condição dentro do circuito de arte hoje4. A hibridização das funções do artista
– curador – critico – agenciador – professor – etc., são princípios para se
pensar a produção artística na atualidade. Vejo minha produção (nesse
contexto que me insiro de artista etc5), como um deflagrador de situações e
processos que dizem respeito às relações híbridas da contemporaneidade. As
múltiplas possibilidades de produção fizeram com que os trabalhos durante a
pesquisa, estivessem sempre no limite, tencionando a permissividade frente ao
circuito.
4 Em alguns exemplos desses processos podemos ver nos trabalhos de Hans Haacke, Andréa Fraser, Cildo Meirelles, entre outros. 5 Referência ao texto de Ricardo Basbaum, I Love Artist etc. que discorre sobre as múltiplas funções do artista hoje, publicado originalmente no site e-flux The Next Documenta Schould be Curated by na Artist, projeto de Jens Hoffmann.
13
(modos e formatos)Esferas do Circuito
1.
PRÁTICAS ARTÍSTICAS CONTEMPORÂNEAS:articulação entre asd i f e r e n t e sesferas do circuito
14
1.
Esferas do Circuito (modos e formatos)
A partir de algumas práticas que atuam no limite das funções do artista,
curador, crítico ou outro mediador do sistema da arte, reúno uma série de
atividades como uma espécie de mapeamento dessas práticas que desenvolvem
uma abordagem investigativa, criando referências para um estudo específico
sobre modos de atuação e crítica no circuito de arte.
Num olhar para a América Latina algumas iniciativas geridas por ou para
artistas desenvolvem estratégias de funcionamento por meio de diversas ações
que configuram e constituem um circuito. É o exemplo das atuações de
Capacete Entretenimentos (RJ), Istmo Arquivo Flexível (SP), Trama, Duplus
(Buenos Aires), a Publicação Ocasional Pulgar de Caracas, Venezuela, e o
espaço Lugar a Dudas, de Cali, na Colômbia6. Pretendo analisar alguns de seus
trabalhos e reflexionar sobre as possibilidades de produção no campo estético e
político.
O mesmo capítulo merecerá uma análise apurada de quatro projetos
institucionais: Manifesta 6 (Bienal Européia de Arte Contemporânea Itinerante),
unitednationsplaza que ocorre em Berlim como decorrência da Manifesta 6;
InSite projeto realizado entre Tijuana no México e San
Diego nos Estados Unidos; e a 4ª Bienal de Berlim. Eles
abordam temas pertinentes para uma revisão das práticas
artísticas e formatos de reflexão no campo oficial do
circuito de arte.
Num breve histórico7 sobre a autonomia8 do artista
no circuito de arte, menciono o movimento Dada do início
do século e sua produção de revistas que articulavam
idéias reflexionando sobre uma atuação de arte e política
no contexto europeu e americano pós-primeira guerra mundial.
6 Podendo citar ainda neste grupo, Hoffmanns House e Galeria Metropolitana no Chile, Espacio La Rebeca na Colômbia, Exo – SP no Brasil, El Basilisco na Argentina, OPA no México, entre outros. 7 Não pretendo aqui fazer um embasamento histórico da prática do artista, apenas situar historicamente alguns destaques que considero importante para pensar a prática contemporânea de circulação e reflexão sobre esses intercâmbios. 8 A autonomia aqui é abordada no sentido de iniciativas advinda de um grupo de artistas e ou escritores dentro de um contexto específico da arte desvinculado de instituições museológicas e ou comerciais. Este conceito de autonomia do artista e espaços independentes serão abordados novamente mais à frente.
15
Entre os artistas que produziram estas publicações estão: Tristan Tzara,
Hugo Ball (Dada Phone), Kurt Schwiters (Merz), Francis Picabia (391), Marcel
Duchamp (The Blind Man) entre outros. A edição das revistas vai basear e
influenciar toda arte produzida no século XX e XXI, especialmente às questões
de circulação e difusão de idéias. A produção gráfica de impressos, jornais,
revistas e múltiplos que acompanham a produção artística é um importante
núcleo e meio para o desenvolvimento das
linguagens que vão se seguir ao longo dos
tempos. Na década de 1960 e 1970 são
freqüentes as manifestações com estas
linguagens: (...) os conceitualistas objetivaram a
propagação da informação artística – isso quer dizer
que os melhores deles repensaram o papel do artista
com relação às mídias, aos museus e aos
colecionadores. Disso resulta o fato de o interesse não
se encontrar centrado sobre o conteúdo, mas sim,
como na teoria da informação, sobre a própria
natureza da informação9. (Mohtari 2002:98)
Projetos específicos irão acontecer somente neste meio, como veremos adiante.
Na década de 1960/70, Dick Higgins (1938/1998), participante do grupo
Fluxus, desenvolveu a idéia do “artista intermídia”, no qual este atua em
diferentes frentes a cada situação deflagrada. A prática dessas atividades
(artista como mediador etc.), repercute no circuito desde a década de 1960,
fazendo operar um sistema de encontro mediado pelo próprio artista ou
propositor. Experiências em apartamentos, casas e outros lugares semiprivados
já eram eventuais no cenário da época. Hoje a necessidade de realizar projetos
curatoriais em espaços específicos, com determinadas situações é uma
reinvenção contínua possibilitando a troca, na qual o encontro entre o
inesperado e o comum são desdobramentos das práticas organizadas dentro e
fora das instituições.
9 Citado no texto Revistas de Art[istas] dos anos 1968-79, Sylvie Mohtari in Revista do Programa de Pós-graduação em Artes Visuais EBA UFRJ, 2002.
16
Nesta época, o grupo Fluxus produziu muitos múltiplos de edições
limitadas assinadas por vários artistas. Cartões, caixas, revistas, jornais e
objetos eram alguns dos trabalhos disponíveis para venda e circulação. O
destaque de um dos jornais publicado na época é o cc TER vv, editado pelo
mentor do Fluxus, George Maciunas.
Sendo o foco da pesquisa as iniciativas de artistas10, vale destacar a
criação da revista, Interfunktionen, coordenada por Wolf Vostell em Colônia,
onde Friedrich Wolfram Heubach, então assistente de W. Vostell, participa da
concretização, em 1968, das condições de uma ação
coletiva em torno da revista.
O grupo que se estabelece (já), sob a forma de uma
organização sem fins de lucro – Labor – criada pouco antes
da abertura pública da Documenta IV de Kassel, em 1968.
Fundada em janeiro de 1968 por quatro membros, o artista
Wolf Vostell, o compositor Mauricio Kagel, o cineasta Alfred
Feusser e a artista Ursula Burghardt, a associação declara
seu interesse por um conjunto de práticas acústicas e
audiovisuais em sentido amplo, como os meios
experimentais da época gostavam de considerar. Os três primeiros números de
Interfunktionen (que passa da tiragem de uma centena de exemplares no primeiro
número a cerca de 1000 exemplares nos 11 números seguintes), evidenciam claramente
a radicalidade das posições artísticas e políticas de seus membros por meio das dé-
coll/ages de W. Vostell, das ações sociais de Joseph Beyus ou das declarações de
Geoge Maciunas publicadas na número 2 (1969). (...) Sem restrições nem critérios
estéticos predeterminados, Interfunktionen enriquece suas páginas com um registro sem
fronteiras de produções aparentadas às partituras musicais de Steve Reich, a cenários
como o de Catalyst, feito por Dennis Oppenheim, ou ainda a cadernos inteiros de
fotografias ligadas a uma ação. As cerca de 150 páginas, reproduzindo na revista
alemã as ações que Joseph Beuys executou entre 1968 e 1971, são disso um exemplo
preciso11. (Mohtari 2002:95)
10 Entre muitos outros destaques apontado no artigo de Sylvie Mohtari, sobre revistas de artistas, outro destaque relevante para essa discussão foi a revista Art-Language publicada pelo coletivo inglês Art & Language em maio de 69, com o subtítulo O Jornal de Arte Conceitual, essencial para chamar atenção na idéia de que o aparato conceitual, filosófico, analítico e lingüístico não pode estar dissociado da prática artística. 11 Revistas de Art[istas] dos anos 1968-79, Sylvie Mohtari in Revista do Programa de Pós-graduação em Artes Visuais EBA UFRJ, 2002.
17
Um nome essencial também para pensar sobre os modos e práticas de
exibição é Seth Siegelaub, (marchand e propositor de outros modos de
exposição), que a partir de 1968/69 produziu as primeiras edições dos livros e
revistas não mais como registro de exposições, mas como espaços expositivos.
Um de seus primeiros projetos foi o Xeroxbook em 1968, quando convidou sete
artistas a produzirem um trabalho específico que fosse a obra primária
fotocopiada em suas páginas. Com isto Siegelaub ampliou os modos e conceitos
de edição, transformando publicações, antes tomadas apenas como reprodução
e informação secundária, como origem mesma da própria mostra.
Tendo como prática a colaboração com os artistas, Siegelaub dá
seqüência à idéia com a exposição, (também em livro),
March 1969 - one month, para a qual convidou 31 artistas,
um para cada dia do mês, para realizar um trabalho
específico para o projeto. Na entrevista com Hans Ulrich
Obrist, no livro Interviews Vol.I (Projeto Conversa Infinita),
Siegelaub evidencia a criação de estruturas flexíveis que
correspondem às necessidades reais. Seth Siegelaub
coordenou um espaço físico de exposição pelo período de 18 a 20 meses
(1964/66), mas logo notou que não poderia mais continuar bancando aquela
estrutura. Então, decidiu continuar seus projetos de outra maneira inventando e
possibilitando outras maneiras de reflexão sobre o objeto artístico.
No Brasil, na década de 1960 destaca-se a criação da
REX Gallery & Sons, fundada em 1966 pelos artistas Nelson
Leirner, Wesley Duke Lee, Geraldo de Barros, José Resende e
Carlos Fajardo. Efêmera, a galeria que durou apenas um ano
editou também o jornal REX TIME divulgando e informando
suas idéias e propostas estéticas.
Por uma série de motivos relacionados ao mercado de
arte e seu público a Rex Gallery formou seu próprio espaço expositivo e
comercial. Na última mostra, Exposição Não Exposição, de Nelson Leirner, as
pessoas poderiam levar as obras, isto é se conseguissem retirá-las, pois todas
estavam acorrentadas e ou cimentadas. Os visitantes tinham à disposição
algumas ferramentas (martelos, pás, etc.). No final, até a polícia interveio no
evento.
18
Cildo Meirelles em 1970, produziu Inserções em circuitos ideológicos:
Projeto Coca-Cola e Projeto cédula, que introduz uma noção de circulação e
circuito, (...) os projetos nasceram da necessidade de criar um sistema de circulação,
de intercâmbio de informações que não dependesse de nenhum tipo de controle
centralizado.(...) Isto é a inserção é exercida por uma elite que tem acesso aos níveis em
que ela se desenvolve: sofisticação ideológica, altas somas de dinheiro e poder. (...) O
trabalho começou com um texto que fiz em abril de 1970 e que parte exatamente disso:
1. existem na sociedade determinados mecanismos de circulação (circuitos);
2. esses circuitos veiculam evidentemente a ideologia do produtor, mas ao
mesmo tempo são passíveis de receber inserções em sua circulação;
3. isso ocorre sempre que as pessoas os deflagrem12. (...).
A noção de circuito
introduzida por Cildo se torna
uma referência internacional,
além do trabalho participar da
importante exposição no Museu
de Arte Moderna de Nova York,
em abril de 1970 - Information.
Ele instaura uma nova relação entre meios e suporte na arte. As inserções em
circuitos ideológicos tinham esta presunção: fazer o caminho inverso ao dos ready-
mades. Atuar no universo industrial. Não mais o objeto industrial colocado no lugar do
objeto de arte, mas o objeto de arte atuando no universo industrial. Possibilitavam
(eram) a interação entre linguagem & fala de sujeito anônimo – sua eficácia
independente do meio da arte. E essa eficácia não se funda mais na quantidade de
ocorrências, mas no seu próprio enunciado: ela se cumpre ao enunciar-se, ao explicitar-
se. Uma prática eminentemente social e perceptível como prática artística13. (Meirelles
1970/2002:108, 109)
No mapeamento de esferas e circuito (modos e formatos), o trabalho de
Cildo Meirelles reforça a idéia da multiplicidade do artista, atuando, em
princípio, independente do circuito de arte. Ele entra na instituição como
modelo de inserção e crítica no contexto social de circulação e assume a
possibilidade de atuar anonimamente.
12 Cildo Meirelles Inserções em Circuitos Ideológicos 1970-75 – Catálogo Cildo Meirelles, Cosac & Naify Edições, São Paulo, 2000; 13 Cildo Meirelles, Information 1970-89. Idem.
19
A discussão institucional sobre práticas artísticas e iniciativas de artistas
surge recentemente, (ou aparece pela primeira vez), no 18º Panorama da Arte
Brasileira, realizado em 2001 no Museu de Arte Moderna (MAM), de São Paulo.
Além da exposição e do eventual catálogo, os três curadores: Ricardo Basbaum,
Paulo Reis e Ricardo Resende, apresentaram, pela primeira vez, uma publicação
paralela com projeto editorial de Ana Paula Cohen, reunindo propostas de
artistas, além daquelas incluídas nas salas do MAM.
A mostra do Panorama também teve como norteadores, dois artistas da
década de 1970 para contextualizar alguns de seus projetos, Paulo Bruscky
(pioneiro da arte postal no Brasil), e Artur Barrio com o trabalho 4 dias e 4
noites, registrados na proposta editorial. O plano curatorial privilegiou a
atuação de grupos de artistas e organizações “independentes”, reunindo no
espaço de exposição e no livro uma série de trabalhos que refletissem a
necessidade sobre as relações com a Instituição e seus desdobramentos nos
projetos artísticos.
Hoje, seis anos depois, nota-se a dificuldade de se manter organizações
deste tipo (coletivos, espaços de exposições, grupos, publicações e outros). O
seu desaparecimento se deve, muitas vezes, a carência de fomento por parte
de órgãos públicos de cultura. Uma iniciativa ou projeto artístico não necessita,
já de princípio, de um respaldo de órgãos públicos para acontecer, e nem seria
o caso. O ideal para a continuidade e subseqüente mantimento das propostas
seria uma estrutura mínima para desenvolver projetos no que se diz respeito à
própria condição profissional do artista. Os grupos e iniciativas acima de tudo
surgem por necessidades específicas de cada região e circuito, e o tempo de
vivência ocorre conforme as condições. Muitas vezes o interessante é ser
temporário, flexível e portátil. Os projetos e iniciativas que conseguem driblar
as dificuldades em decorrência de parcerias
muitas vezes com órgãos de fora do País, como
ocorre com Capacete Entretenimentos14 (RJ),
EXO Experimental (SP), entre outros, são
exemplares e importantes no próprio
reconhecimento dos trabalhos.
14 Imagem da banca nº2 de Capacete com projeto de Marie-Ange Gilleminot na Bienal de São Paulo de 2002.
20
No período que envolve a investigação do mestrado, os
estudos sobre práticas artísticas, as reflexões de formatos de
exposições e outros tipos de agenciamentos, o projeto da
Manifesta 6 (Bienal Européia de Arte Contemporânea), chama
a atenção pelo seu particular dispositivo de propor sua edição
dentro de uma universidade15. A exposição como uma escola.
Seriam constituídos três departamentos transdisciplinares compostos de cursos,
palestras, publicações, mostras de cinema, performances, exibições, programas
de rádio e televisão, oficinas e outras atividades. Na abertura da 4ª Bienal de
Berlim, foi lançada a primeira publicação da Manifesta 6, Notes for an Art
School, uma antologia de ensaios e entrevistas com artistas, curadores, teóricos
e educadores com o foco para arte educação.
Nas Notas para uma Escola de Arte, os
colaboradores reconsideram os objetivos e a estrutura
de uma escola de arte, de seu contexto ideológico, de
posicionar seus estudantes para o mundo da arte, de
seu relacionamento às circunstâncias sociais e políticas,
e do nível de sua participação discursiva, extraindo
exemplos específicos em suas próprias experiências
para interrogar e re-apropriar a validade de modelos
escolares existentes.
A Manifesta 6 aconteceria entre 17 de setembro e 23 de dezembro de
2006, em Nicosia, nos dois lados da ilha de Cyprus, curada por Mai Abu
ElDahab, Anton Vidokle e Florian Waldvogel. Foi cancelada pela desistência da
Fundação Nicosia for Art Ltda., que, descumprindo o contrato firmado com os
curadores e com a Fundação Internacional Manifesta, nos 6 meses de produção
causou prejuízo e mal estar para todos os envolvidos. De qualquer forma, a
Manifesta 6 é tida como uma importante plataforma de atuação e reflexão
sobre diferentes formatos de exposição e discussão sobre as práticas artísticas
no atual contexto político. No início de junho de 2006, os curadores dirigiram
um email para a comunidade internacional de arte através do mailing do e-flux,
15 (As imagens que aparecem a partir do texto da Manifesta nas páginas 20 e 23, respectivamente é a marca registrada da Manifesta 6, e imagens do livro Notes for an Art School).
21
explicando o projeto e seus desdobramentos enquanto pesquisa e o fatal
cancelamento.
Depois de ocorrer a suspensão da mostra pelas diferenças políticas entre
os lados de Cyprus (grego e turco), as discussões sobre formatos de bienais e
projetos de arte e suas relações sócio-econômicas repercutiram por todo
circuito de arte internacional (simpósios e artigos) em torno da questão da
Manifesta 6.
Até que ponto a permissividade de um circuito oficial se relaciona
com as questões reais de situações extremas entre as regiões e suas
políticas?
Nesse âmbito, o InSite, que acontece na fronteira dos Estados Unidos com
México (San Diego e Tijuana), aborda questões sociais e políticas, envolvendo
os artistas e a comunidade em projetos específicos para a região.
A eficácia dessa colaboração (comunidade e
produção artística) é revista no texto Produzindo a
Economia Cultural, A Arte Colaborativa do InSite
de George Yúdice, e nesta condição nos
deparamos com essa ilimitada prática artística que se infiltra em outras
reflexões que não a artística. A questão toda dentro desse contexto é: quais
objetivos dessas práticas? Em alguns projetos há uma relação equivocada da
produção artística querer resolver questões sociais. Neste âmbito, a discussão
foge do foco principal. Essas ilimitadas práticas artísticas das apropriações da
comunidade local transformam o evento de arte como uma maquiladora artística cujos
executivos (os diretores do evento) contratam os gerentes (os curadores) para planejar o
programa dos assalariados flexíveis (artistas) que por sua vez, extrai capital (cultural)
processando uma variedade de materiais: a região (especialmente a fronteira e as
ecologias urbanas vizinhas); os públicos e comunidades que investem sua colaboração
no êxito de um “projeto”; as questões sociais transformadas em “arte”; as culturas
locais e as tendências artísticas internacionais que constituem os dois pólos de uma
nova divisão internacional do trabalho cultural. (Yúdice, 2004:402).
22
Apesar do evento ser apontado por Yúdice como maquiladora - que são
locações de produção flexível que na era pós-fordista dependiam de três princípios-
chave: primazia do conhecimento, flexibilidade trabalhista e mobilidade.
As participações intelectualmente interativas do InSite guardam certa semelhança
com a produção do conhecimento necessário para gerar a inovação ou o “intercâmbio
imprevisível”, como o definem os diretores. Onde o InSite se distancia – mas apenas
parcialmente – do modelo da maquiladora é quando des-dicotomiza a divisão entre o
trabalho intelectual e o manual, característica das operações das empresas trans-
nacionais, produzindo conhecimento do lado “desenvolvido” da divisão e disseminando
o trabalho pelo mundo “em desenvolvimento”. O InSite extrai seu capital intelectual-
artístico mais ou menos igualmente da América do Norte e da América do Sul. Mas uma
nova orientação do InSite é limitada porque a produção intelectual, apesar de difundir-
se além da fronteira, está nas mãos de pessoas (curadores, artistas, críticos), com um
alto capital institucional cujo trabalho os leva através de um arquipélago de centros
encravados no mundo em desenvolvimento, mesmo quando eles procuram,
presumivelmente, dar participação e poder aos públicos não tradicionais (ou seja os
desfavorecidos). (Yúdice, 2004:415).
o InSite se distingue dos outros eventos de arte por ser um programa de
reflexão a longo prazo, além de assegurar exposições em instituições nos dois
lados da fronteira. Alguns artistas são convidados a permanecerem por um
período de residência (nos dois lados), que se estende até por dois anos em
temporadas de aproximadamente um mês, para acompanhar a realidade do
local e produzir um trabalho específico. Ao colocar em discussão temas
polêmicos como: as fronteiras de nações, a produção de arte, as identidades, a
circulação de capital, é que aparecem essas frestas para a crítica, importantes
paradigmas para se pensar a produção contemporânea.
Embora George Yúdice apresente essa contra crítica do método de
trabalho desses eventos de arte, o projeto do InSite contribui em âmbito
institucional para ampliar o campo dos formatos de projetos de produção
artística. O que vemos hoje, com artistas e curadores que rodam o mundo com
as bienais, são possibilidades de discussões de um modelo globalizado de
cultura (que ainda é questionável).
23
Retomando reflexões em torno da
Manifesta 6 que propunha outro formato de
exposição que envolveria questões sociais e
políticas da região na qual se realizaria o
evento, os objetivos eram realmente colocar
em evidência sobre os princípios que regem a
produção artística hoje, revisitando as eficácias
de uma escola de arte.
Em seu texto Exhibition as School in a Divided City, Anton Vidokle
defende sua pesquisa da exposição como escola de arte e desenvolve a idéia de
relacionar a produção artística no campo de entendimento público, (...) uma
exposição, não é o assunto de como ambicionar o veículo mais eficaz para uma
maneira de compromisso?16 Vidokle cita o manifesto de André Breton e Diego
Rivera, de 1937, Para uma Arte Revolucionária Independente, exemplificando
maneiras de entendimento17.
Essa chamada ‘verdadeira arte da qual não é satisfação jogar variações de
modelos de ready-made, insiste preferivelmente em expressar as necessidades internas
do homem e da humanidade em seu tempo - a arte verdadeira é incapaz de não ser
revolucionária, e não aspira a uma completa reconstrução radical da sociedade.'
O que pode parecer ser uma chamada ingênua para todos ou ninguém, volta
incluir uma revolução sutil e uma justificativa importante para essa demanda que exige
de nós – como artistas, curadores, escritores, a necessidade de comprometer-se com a
sociedade a fim de criar determinadas liberdades, para produzir as circunstâncias
necessárias para a atividade criativa ocorrer em todos os lugares.
Mas o que precisamente isto significa, o desejo que a arte deve incorporar todos
os aspectos da vida social? É um desejo trazer a arte fora dos espaços rarefeitos e
privilegiados, ou é meramente mais um movimento para a instrumentalização adicional
da prática da arte?
Com estas questões (e entre outras), discute-se que, talvez a exposição
não seja o lugar de início. A equipe da Manifesta 6 propunha uma volta à escola
para educar. O envolvimento com a ilha de Cyprus e suas relações
internacionais de comércio, religião, ética e trabalho de alguma forma foram
16 But is an exhibition, no matter how ambitious, the most effective vehicle for such engagement? (Vidokle 2006:1) 17 Citado neste texto de Anton Vidokle.
24
enfrentados nesta proposta na qual se redefiniriam os limites políticos
particulares. Mesmo sendo apenas no campo da arte, envolveria a sociedade
como conseqüência das reflexões.
(...) Pode-se discutir que esta aproximação é aplicável a uma situação muito
maior, distante e além dos limites do Chipre. Pode-se dizer que a posição do artista-
como-comentarista-social/crítico funcionou nesse curso. Talvez é hora de considerar as
formas da arte (e de práticas culturais mais largas) que podem continuar a ser viáveis
mesmo na ausência de pontos de referência tais como as instituições, que podem
remanescer relevantes mesmo na presença excessiva da paisagem politizada, e que
deveriam remanescer produtivos dentro dos centros da produção da arte e fora dele.
Mas o que são especificamente uma escola de arte, e o que é uma escola de arte neste
ponto do tempo? Minha pesquisa para a escola da Manifesta 6 rendeu uma relação de
modelos, de academias da arte e das escolas experimentais aos projetos colaborativos,
acompanhados pelas vozes insistentes dos críticos que lamentam a crise `da escola de
arte'. (Vidokle 2006:1,2,3)
Nesse sentido, Anton Vidokle enumera em sua pesquisa uma Cronologia
Incompleta dessas Escolas Experimentais de Arte propondo um ensino livre
articulado com as diversas etapas da criação artística, revendo e evidenciando o
processo de reflexão acerca dessas práticas artísticas. A tarefa, segundo ele, é
um ato subjetivo, essencialmente experimental para questionar, e incentivar a
formação de subjetividade. Produzir os resultados tangíveis que se movam além dos
comentários requer pesquisa, trabalho de campo e um contínuo processo de
envolvimento e produção. Vamos chamar este trabalho de homework. E este pequeno
sarcasmo homework nunca feriu ninguém18. Neste texto que inaugura as discussões
da Manifesta 6, Vidokle apenas sugere o início da discussão do projeto.
18 Citações do texto Exhibition as School in a Divided City. Notes for an Art School de Anton Vidolke traduzido livremente por mim.(versão em inglês disponibilizado no site do unitednationsplaza)
25
Em novembro de 2006, Anton Vidokle organiza, em colaboração com Liam
Gillick, Boris Groys, Martha Rosler, Walid Raad, Jalal Toufic, Nikolaus Hirsch,
Natascha Sadr Haghighian e Tirdad Zolghadr, a plataforma
unitednationsplaza, considerada uma exposição como escola para funcionar
durante o período de um ano. Estruturado como um programa de
seminário/residência baseado na cidade de Berlim, que envolveu a colaboração
de aproximadamente 60 artistas, escritores, teóricos e uma extensa audiência
pelo período de um ano. Na tradição de Universidade Livre, vários eventos
foram abertos para todos os interessados na continuidade desta discussão. A
conferência inaugural da nova plataforma - Histories of Productive Failures:
From French Revolution to Manifesta 6, centrava na reflexão sobre o fantasma
da Manifesta em Cyprus. Como palavras-chaves de introdução ao seminário, no
site encontra-se uma extensa lista de adjetivos expressando o contexto de
crítica ao ocorrido.
Atualmente, além dos eventos com música e filmes no espaço em Berlim,
os textos dos seminários estão disponíveis no site. Em abril de 2007, segue-se
a edição da revista Printed Project19, que anuncia a edição de número 6
intitulada, I Cant Work Like This, co-editada por Anton Vidokle e Tirdad
Zolghardr. A revista é baseada na conferência de abertura de
unitednationsplaza, que referencia mais uma vez o fantasma da Manifesta 6.
O interessante nesse caso é a polêmica em torno do cancelamento da
Manifesta 6 dentro do circuito internacional de arte contemporânea, re-
colocando em evidência vários temas correntes das práticas estéticas, como a
discussão e reflexão dos formatos de exposições, contextos políticos e sociais,
crítica, crise econômica e cultural, etc. Na verdade nada novo para o circuito de
arte, se formos comparar com as práticas dos anos 1960 e 1970, mas a revisão
desses tópicos é muito pertinente para o desenvolvimento e a reflexão sobre
nosso tempo.
19 Jornal publicado por Visual Artists Ireland três vezes ao ano e editado por diferentes curadores e editores convidados. http://www.visualartists.ie.
26
A atualização das práticas artísticas (institucionais) aqui exemplificadas
pelas iniciativas de curadores e editores contribui para uma expansão das
possibilidades subjetivas no campo da produção artística.
Das últimas curadorias no ano
de 2006 que se realiza como
diferencial dentro do contexto institucional de
bienais é a 4ª Bienal de Berlim of mice and men, curada por
Maurizio Cattelan (artista), Massimiliano Gioni (curador e editor da revista Flash
Art) e Ali Subotnick (editora). Os curadores desta quarta edição da Bienal,
produzida desde sua primeira edição pelo Instituto de Arte Contemporânea
Kunst-Werke - KW, selecionaram uma série de locais incomuns em uma rua
central de Berlim, Auguststrasse.
O KW e a antiga Escola Judaica de Meninas, situados um em frente ao
outro, foram os espaços que concentraram o maior número de obras da Bienal.
Além deles, três apartamentos privados, escritórios, galerias de arte, uma
igreja, uma antiga fábrica e um cemitério estavam entre os outros lugares da
mostra.
Composta por um conjunto de iniciativas, a 4ª Bienal de Berlim
apresentou uma série de projetos e outras ações. A primeira manifestação foi a
inserção da coluna five questions (Füng Fragen), no jornal local de Berlim Zitty,
em março de 2005, entrevistando artistas que moram em Berlim ou outros que
estavam de passagem pela cidade. O projeto abriu o diálogo com a produção
cultural de Berlim antecipando algumas questões sobre as reflexões dos
artistas. Em novembro de 2005, a 4° Bienal publicou "Checkpoint Charlie". Com
o mesmo formato da série Charley editada também pelos três curadores, reuniu
imagens e outros trabalhos de mais de 700 artistas, encontrados durante a
pesquisa para o mesmo evento.
Outro projeto dos curadores para a quarta edição da Bienal foi a abertura,
em setembro de 2005, da Gagosian Gallery Berlim, como uma franquia de
guerrilha da marca registrada Gagosian. A idéia era realizar exposições
organizadas por curadores e artistas independentes como uma extensão
alternativa de manifestação do evento. As mostras mudavam a cada quatro
semanas e o espaço era tido como espontâneo e intuitivo para diversas ações.
27
Investia-se numa forma de apresentar um circuito off/on, evidenciando a cena
corrente, informal e espontânea de Berlim, em lugares que muitas vezes são os
próprios estúdios dos artistas.
Numa visão geral dessas proposições, a Bienal de Berlin chama a atenção
pelo fato da curadoria estar nas mãos de um artista (Maurizio Cattelan) e de
mais dois editores (Massimiliano Gioni e Ali Subotnick); por sua concentração
em espaços históricos e inusuais para exibições de arte, numa mesma rua; por
seu tema: dos ratos e homens, um pouco obscuro, como possibilidade de
discorrer sobre um conceito e não sobre um critério, como esclarecem os
curadores na entrevista com Nancy Spector no catálogo da exposição.
A idéia de realizar várias etapas no processo de uma bienal (livro de
pesquisa, galeria, coluna no jornal, utilização de espaços históricos fechados,
etc.), possibilita uma série de entendimentos sobre a produção artística e seu
tempo e esta bienal estava justamente nesta referência de refletir sobre a vida,
desde espaços que remetem à traumas de memória coletiva até apartamentos
privados que guardam outros sentimentos como uma arqueologia do cotidiano.
As práticas estéticas sempre estão à disposição para o questionamento de
suas eficácias específicas e de sua recepção pública, podendo sugerir, como a
4ª Bienal de Berlim, um olhar sobre as possibilidades de uma curadoria de
artista.
Neste sentido, a direção do Kunst-Werk (KW) de Berlim, na figura de seu
diretor fundador Klaus Biesenbach, é exemplar para instituições deste porte, na
sustentação de propostas de riscos e outros desafios, enfrentando etapas
políticas e burocráticas que antecedem um grande evento e contribuindo para
avançar em novos paradigmas20. Biesenbach, fundador da Bienal de Berlim e do
KW, logo em 1991, logo após a queda do muro de Berlim, aluga na
Augststrasse, a antiga fábrica de margarina. Com a aproximação da Documenta
9, teve-se a idéia de realizar ao longo de uma semana na Augststrasse a
exposição 37 Rooms, com 37 curadores e profissionais da arte convidados as
obras nos 37 quartos. A exposição abriu em junho de 1992 e recebeu uma larga 20 Em outros momentos, a sustentação de propostas de um diretor e/ou curador de uma instituição foi determinante para a realização (ou não) de práticas artísticas e curatoriais, tais como: Jan Van der Mark, diretor do Museu de Arte Contemporânea de Chicago e Christo no empacotamento desta instituição em 1969; Edward Fry, diretor do Guggenhein e Daniel Buren com a suspensão da exposição Shapolsky et al. em 1971 e, 26 anos mais tarde, Catherine David, curadora da X Documenta de Kassel, em 1997, possiblita que Daniel Buren apresente finalmente Shapolsky et al. acrescida de posters: Quem paga manda. Não somos filantropos. Queremos algo em troca do dinheiro que gastamos, e estamos obtendo.
28
visitação que afirmou o KW como uma venerável instituição artística. O prefácio
do projeto descrevia o entorno de Augststrasse como “praticamente deserta e
com prédios em terrível estado de conservação”. Nos anos seguintes a área foi
sendo revitalizada. Hoje abriga diversas galerias de arte contemporânea e
outros pontos comerciais sendo uma referência na cidade. O Kunst-Werk
contribui assim, para Berlim ser destaque novamente, entre outros países, na
produção de arte contemporânea21.
De alguma forma trata-se de um dos diferenciais presentes em algumas
instituições fora do Brasil. Lamentavelmente, não há muitas chances no país de
se avançar em favor de uma certa autonomia institucional22. Museu de Arte
Moderna (MAM), do Rio de Janeiro, na década de 1960/70 foi uma espaço
chave na produção dos artistas da época (Opinião 65, Nova Objetividade
Brasileira, entre outras), ou como o Museu de Arte Contemporânea, MAC – USP,
de São Paulo, que na mesma década, com o diretor Walter Zanini, foi um
importante núcleo para a arte conceitual no Brasil. O episódio do Panorama da
Arte Brasileira de 2001 é um outro bom exemplo. A obra da artista Carla
Zaccagnini, refletia sobre a própria condição do MAM e a especulação do prédio
– sede.23 O enfrentamento provocado pelo trabalho, refletiu no poder político e
econômico da instituição promotora do evento. Depois deste episódio, não só a
direção do museu foi despedida das funções24 (na época Ivo Mesquita e
equipe), mas a própria instituição entrou numa revisão administrativa que
engessou o museu e suas curadorias. O fato ficou muito claro no Panorama
seguinte, em 2003, que desviou o assunto Panorama da Arte Brasileira,
tornando-se uma mostra internacional. Fica a pergunta: qual exposição ou
projeto curatorial depois do Panorama da Arte Brasileira de 2001, que trouxe e
enfrentou questões relevantes para uma discussão autoral ou para o
desenvolvimento da produção em termos de curadoria e projeto artístico em
instituições de porte, no circuito de arte no Brasil?
21 Klaus Biesenbach - KW, 37Roms, and the berlin biennial – Von Mäusen und Menschen, bb4, 2006. 22 A modificação ou insistência em outros modos de atuação no circuito ou sistema das artes necessita de uma autonomia maior que não percebemos nas instituições que regem a produção artística no país. 23 Sobre esse episódio sugiro a leitura do Catálogo e do livro editado do Panorama da Arte Brasileira de 2001 e da revista Item – 5, onde Carla Zaccagnini entrevista várias pessoas envolvidas no processo do Panorama, que ajudam a entender o trabalho. 24 Também é da mesma época a polêmica da Bienal dos 500 anos e o caso Brasil Connections. Mais informações no livro As Bienais de São Paulo: da era dos museu à era dos curadores, 1951-2001) /Francisco Alambert, Polyana Lopes Canhête. SP: Boitempo, 2004.
29
Outra discussão sobre o papel do curador nestes meios surgiu no canal e-
flux, em 2003, quando Jens Hoffmann inaugura o
Projeto The Next Documenta Should be Curated by
an Artist que disponibilizava na web e num livro da
editora alemã Revolver, a questão debatida por
vários artistas25. Hoffmann falava que não era sua
intenção articular uma critica para o próximo
curador da Documenta e sim provocar esse
caminho do artista com a profissão do curador.
No Brasil, Jens Hoffmann realizou um projeto semelhante na Escola de
Artes Visuais do Parque Lage que denominou de A Exposição como Obra de
Arte. Ele convidou uma série de artistas e curadores a responderem a pergunta:
Pode uma exposição ser uma obra de arte? As reflexões transformaram-se em
uma publicação que registrou a discussão sobre o conceito empregado pelo
curador. Ana Paula Cohen, curadora convidada a refletir sobre tais questões,
cita uma série de obras que lidam com diferentes aspectos da estrutura de uma
mostra de arte, questionando os limites entre a obra e a exposição, entre elas o
museuMuseu de Mabe Bethônico (BH, 2001); Musée d’Art Moderne.
Departement des Aigles, Marcel Broodthaers, Bruxelas, 1968/1972; A Banca
nº2 (capa-móvel) Capacete Entretenimentos; RJ, 2002, Boite-em-valise, Marcel
Duchamp, (NY, 1941/1963); Exposição não – exposição de Nelson Leirner (SP,
1967).
Outro projeto editorial produzido na mesma linha por Jens Hoffmann foi
Una Exposición em Palabras, na revista Pulgar26 de Caracas na Venezuela. Doze
curadores internacionais foram convidados para curar uma exposição com
palavras, ligada a André Mauraux e a sua proposição Le Musée Imaginaire,
consistindo em doze textos sobre uma exposição ideal ou ainda a reflexão sobre
produzir uma mostra imaginária.
Listo abaixo citações de alguns textos enviados pelos curadores convidados a
participar do projeto, que sugerem possibilidades de difusão na ocupação
espacial imaginativa do projeto editorial de Jens Hoffmann – Exposición en
Palabras:
25 O texto de Ricardo Basbaum, I Love Artist etc, vem desta seleção. 26 Revista Pulgar é produzida em Caracas pelo artista venezuelano Luis Romero com suporte de Prince Claus Found for Culture and Development.
30
Nancy Spector27
(...) Muchas decisiones estéticas y conceptuales dependen de aquello que
puede o no calzar em um espacio particular y lo que su contexto puede
implicar. Por ello imagino uma arquitectura absolutamente flexible, una que se
transmute em vapor para envolver todo lo que se desea mostrar.
Chus Martinez28
Practicas anárquicas em la superfluidez del espacio
I. Um espacio surge cuando la libertad y la apertura son producidas.
Hacer espacio es proporcionar lugares, lugares abiertos-libres donde el
hombre puede reconocerse a sí mismo positiva o negativamente.
Hacer espacio significa establecer tales lugares, hacer lugar para
romper con la idea de la “paz perpetua” como verdad política. Por otro
lado, necessitamos crear estrategias de oposición, más que
plataformas teatrales29.(...)
María Lind30
Escoge un campo – un area de interés donde la curiosidad y la duda se fusionen
– y un grupo de personas. No más de 10 individuos, por lo menos al principio.
Selecciona un lugar o un contexto, incluyendo una possible audiencia. Un
compañero de trabajo para discutir ideas. Luego agrega el presupuesto deseado
y deja que el processo fluya. Que obtendrias?(...).
As diferentes propostas de reflexão nesta publicação possibilitam refletir sobre
múltiplas possibilidades de atuação de práticas no campo estético. Aqui
especificamente são os curadores que divagam sobre essas alternativas
editoriais, mas poderia citar o projeto de Maurizio Cattelan Permanent Food, o
Jornal Planeta Capacete, outras edições da própria Revista Ocasional Pulgar, a
exposição-publicação PF31,entre outras.
27 Curadora de arte contemporânea do Museu Guggenhein de Nova York. 28 Curadora espanhola atualmente dirige o Kunstverein em Frankfurt na Alemanha. 29 Pulgar12, Caracas, Venezuela, 2004:17. 30 Curadora sueca atualmente dirige o IASPIS – International Artist Studio Program in Sweden 31 PF é a forma desdobrada e abreviada de uma exposição-publicação organizada por Regina Melim, lançada em 2006, cujo codinome inicial foi intitulado: por fazer. A idéia era apresentar obras ou situações tendo como estratégia a noção
31
Ainda nesta questão, o suíço Hans Ulrich Obrist também trabalha em
projetos de atualização de formatos e práticas curatoriais e artísticas. Entre os
seus projetos editoriais estão Do it de 1993; Point d’Ironie, de 1997; e sua
maratona de entrevistas no projeto denominado Conversa Infinita, cujo
lançamento do primeiro volume ocorreu, na 49ª Bienal de Veneza. Por si - o
livro de entrevistas com artistas - também é considerado como o próprio espaço
de exposição32.
Perguntado se ele acredita que as posições, de curador e de artista, são
apenas questões de escolhas, Obrist responde que a fronteira entre esses
diferentes campos tem se tornado muito porosa, há artistas que também realizam
curadorias hoje com diferentes maneiras de pensar, e acho uma idéia interessante essa
perda de fronteiras. Mas do meu ponto de vista, sempre estive interessado em
curadorias e publicações, minhas mídias são as exibições e os livros; (...) se formos
olhar para a história das exibições durante o século XX, há uma permanente revisão das
regras do jogo, com uma série de invenções, como as de Marcel Duchamp, Yves Klein e
sua galeria vazia, Arman e sua galeria cheia. Muitas galerias e museus foram testados e
os papéis trocados, para a criação de exposições33. (Rezende 2006:107)
A reflexão acerca do espaço e das possibilidades de discussão relacionada às
práticas artísticas no campo estético, é muito rica e dispõe de infinitos
desdobramentos. Com o princípio da discussão e reflexão, a publicação
potencializa o acontecimento fazendo circular os vários pontos de vistas que
asseguram oportunidades do contínuo questionamento sobre as práticas.
Nesse contexto, a discussão de curadoria vem se tornando cada vez mais
difundida entre os próprios artistas. No texto artista como curador34, Ricardo
Basbaum evidencia essa prática não mais como uma função fechada: o trânsito
do artista através de funções que ultrapassam a sua posição como simples produtor de de projeto. Algo que estaria por fazer e que, uma vez inseridos neste espaço-publicação, estabelecido como lugar de experimentação, estes projetos se colocariam efetivamente à disposição do público que poderia acessá-los e realizá-los. Portátil, poderia portanto ser transportada e acessada para a realização de uma obra em qualquer lugar, a qualquer hora, em diferentes contextos. 32 Hans Ulrich Obrist fala que seu projeto de entrevistas é de alguma maneira, uma espécie de projeto transgeracional. Não se trata apenas de entrevistas com artistas e arquitetos de minha geração; tento também prosseguir naquilo que o historiador britânico Eric Hobsbawm chamou de “protesto contra o esquecimento”;(...) Resistir a esse esquecimento é parte essencial dos livros de entrevista. A idéia é registrar as conversas e registrar a história de nosso tempo. Conversa com Hans Ulrich Obrist por Marcelo Rezende. 33 Entrevista de Marcelo Rezende com Hans Ulrich Obrist no livro Arte Agora! Editora Alameda : SP, 2006. 34 Do catálogo do Panorama da Arte Brasileira de 2001 – MAM – SP.
32
obras de arte. O artista hoje atua em diferentes frentes também fazendo parte
de um projeto maior, na medida que ele também assume o papel de curador ou
iniciador de outras propostas e projetos, não ficando mais somente na condição
de fazedor de obras. Volta-se aqui ao debate sobre a possível autonomia do
artista neste circuito.
(...) Além da disponibilidade para refletir sobre suas escolhas poéticas e de
linguagens numa matriz que contempla a recepção e a acolhida do outro, estes
artistas também se inserem como propositor para administrar a dimensão política
de seus deslocamentos e atitudes.
Basbaum fala de uma reinvenção de estruturas de pertencimento e narrativas
legitimadoras: há um desejo de escrever (ou reescrever) inscrições, deslocar certos
acomodamentos para um arranjo mais dinâmico e produtivo, movimentar e reinventar
mecanismos e circulações. (Basbaum, 2001:39)
Isso, em outras palavras, vem estabelecer a possibilidade do artista estar
participando de um conjunto de ações para transbordar os limites do circuito e
estar reescrevendo a inserção dessas práticas artísticas35.
Ainda sobre estas iniciativas de artistas, como uma atividade
independente36 das estruturas que regem a possível escrita da história da arte,
pode-se defini-las especificamente como uma ação autoral coletiva e/ou
individual que aglutina projetos de reflexão, exposição e circulação da
produção, visando ao intercâmbio entre artistas, teóricos, críticos e público
(por mais específico que seja).
Os conceitos de independência e autonomia são distintos e supõem uma
discussão apurada, levantando questionamentos às próprias obras e sujeitos
tidos como tais.
Nesse sentido, é interessante a relação temporária da autonomia
assinalada no livro TAZ – Zona Autônoma Temporária, de Hakin Bey, nos
múltiplos movimentos marginais a partir da pirataria nos mares do século XVIII
35 Creio que aqui se encontram os principais pontos da pesquisa que convergem com o pensamento de Basbaum: possibilitar espaços de discussão para produção artística configurando e constituindo um circuito, estabelecendo zonas temporárias de intercâmbio por meio de proposições artísticas (publicações, exposições, curadorias, seminários, shows, encontros, palestras, passeios, etc). 36 A palavra “independente” aqui compreende dessa relação institucional dos grandes museus e instituições que por seus modos inscrevem e legitimam a história da arte. Como exemplificado acima, referenciando texto de Basbaum, as estruturas das iniciativas de artistas aqui abordadas flertam com uma certa “independência” no que concerne esse âmbito, gerando outros percursos de atuação no circuito de arte e se inscrevendo como alternativas de leitura da produção, não aguardando somente as ações dessas instituições para ditar a produção artística realizada hoje.
33
até os movimentos dentro da web e contra-net. De acordo com Hakin, só é
possível algum tipo de autonomia dentro de algum grupo ou organização,
temporariamente, pois logo tudo se modifica e a autonomia já vira uma certa
dependência de algum setor para funcionar, quer seja no campo da arte, na
net, ou qualquer movimento social de revolução, levante ou etc.
A autonômia no campo da arte e nas iniciativas de artistas está
implicitamente ligada a uma relação de autoprodução, pois pensar sobre a
independência de um espaço de arte ou projeto, exige retomar questões
especulatórias a respeito e a partir do que e onde ela se origina. O mesmo vale
para o conceito de autonomia. Podemos empregá-la neste sentido temporário,
mesmo que ainda possamos abrir a discussão para averiguar a autonomia de
espaço ou gestão. Os projetos relacionados às iniciativas de artistas, de algum
modo discursam sobre a autonomia ou ainda sobre a possibilidade de, por si só,
inscrever uma nova trajetória no contexto da arte. E aí justifica-se por um
momento essa autonomia, a geração do próprio circuito, mesmo que essas
iniciativas ainda tenham um apoio institucional para realizar seus projetos.
No meio desse circuito de arte há uma determinação “independente” por
não estar dentro de uma estrutura institucional vinculada a um setor
comprometido. As questões elencadas supõem desafios para a permanência de
práticas ainda relevantes para esse contexto, que se formam a partir de novas
estruturas geridas por artistas, ou melhor, de reinvenções contínuas do
processo: um espaço de arte, uma publicação, um seminário, uma exposição,
entre outras possibilidades de agenciamentos.
Em entrevista na revista Exit Express nº21, no verão de 2006, Hans Ulrich
Obrist fala sobre a relação de trabalhos e projetos realizados na atualidade,
estando em relação direta com as práticas dos anos 1960 e 70. Se há um
interesse geral pelas vanguardas e pelas práticas dos anos 60 e 70 como reação frente
a um déficit real, como um signo de atenção e revisão necessária da história, de não
esquecer e de recuperar a memória, o certo é que uma das coisas que se desprende
precisamente dessas práticas históricas, dessas experiências é a inexistência de um
modelo único. O que acontece é que cada projeto venha determinado por uma
experiência e está relacionado com uma situação específica... Não existe uma escola
única, é um processo de reinvenção contínua, em movimento, que trata do inesperado e
de que nada é preconcebido – felizmente.(Exit Express, 2006:9)
34
Na conversa com a artista Roseline Rannoch, coordenadora do espaço de
arte Montgomery, em Berlim, ela relata que na realização do Ciclo de Discussão
sobre Práticas Artísticas no Museu Hassis (janeiro de 2007), uma das questões
levantadas foi exatamente à relação de autonomia que girava em torno de uma
proposição artística dentro desse contexto. Como se sugere a autonomia do
artista inserido em um circuito de espaços e monopólios? Pode se seguir uma
idéia de atuação do artista dentro desse contexto37?
O Encuentro de Espacios y Grupos de Arte Independiente realizado em Buenos
Aires, em 2003, pela Fundación Proa, organizado por Duplus38 em parceira com
Trama39, foi um dos primeiros a reunir espaços “independentes” de iniciativas
de artistas da América Latina e Caribe40. Os projetos convocados representam
organizações que promovem a realização ou esboçam suas próprias políticas
artísticas, curatoriais, não necessariamente em salas de exposições. Entendemos
o conceito de curadoria num sentido mais amplo que organiza a leitura em torno de um
corpo da obra artística em um espaço determinado (seja exposição em sala, projetos no
espaço público, na Internet, etc.). Dentro de nossa perspectiva, a prática curatorial
pode se desdobrar incluindo âmbitos não artísticos, e não ser exclusivamente uma
operação de seleção de um corpo na construção de um relato, mas da invenção de
condições de possibilidades para a criatividade social41. (Duplus, 2003:55)
Em março de 2005, no Chile, em Valparaíso, Hoffmann’s House42
organizou o I Encuentro Internacional de Espacios de Arte Independientes,
reunindo 15 espaços, entre eles dois do Brasil, Capacete e EXO. Este encontro
funcionou sobre três plataformas: um centro de documentação instalado na
Galeria Puntágeles; a participação “in situ” dos 15 espaços que mostraram
37 Nesse sentido não cessando essa discussão e dando continuidade ao desenvolvimento do mapeamento voltarei a abordar especificamente esse contexto na publicação recibo edição especial a ser lançada. 38 DUPLUS (Buenos Aires) é uma equipe de investigação e experimentação de processos criativos e de pensamento, não necessariamente gerados no campo da arte. Constitui e promove práticas relacionadas com pessoas e entidades desvinculadas ou pouco vinculadas entre si, mediante a organização de oficinas do pensamento, da produção posta em circulação de textos e arquivos, na reutilização do espaço. 39 TRAMA é um programa internacional de intercâmbio de pensamento artístico originado em Buenos Aires, Argentina. 40 Nesta ocasião foi lançado em forma de cartilha o Cuestionário Duplus com os Espaços Participantes do Encontro na Argentina com questões de financiamento de projetos, desenvolvimento editorial, propostas curatoriais, figuras jurídicas, produção artística e modo de circulação global, entre outros. 41 El pez, la bicicleta y la máquina de escribir. Encuentro de proyectos de gestión independiente, Fundación Proa, Buenos Aires – Duplus, 2003. 42 Hoffmann’s House é um fórum para discutir e situar parte da produção artística chilena contemporânea.
35
trabalhos no decorrer do evento; a apresentação, debates e seminários entre os
espaços participantes com curadores, artistas e acadêmicos da universidade.
Tais encontros proporcionaram, de uma forma geral, uma aproximação de
iniciativas que formariam a partir dali uma rede de intercâmbio, possibilitando
trocas de experiências e parcerias entre os participantes. Um exemplo do
desdobramento destas iniciativas no Brasil seriam as ações do Capacete
Entretenimentos43, coordenado por Helmut Batista no Rio de Janeiro desde
1998. Trata-se de uma iniciativa que alia estratégias curatoriais a práticas
artísticas diretamente relacionadas ao território da América Central e do Sul.
Segundo Helmut Batista, um dos principais projetos realizados recentemente: ROAD
consiste no programa de residência móvel, fundamentalmente voltado para os espaços
de convergência entre as práticas artísticas e o seu público, procurando refletir sobre a
recepção e a relevância de projetos de arte dentro de situações geopolíticas específicas.
O programa de residência tem como objetivo o aprimoramento de artistas, assim como
a viabilização de projetos artísticos, além de incentivar atividades de intercâmbio e
aprendizagem procurando sempre valorizar o contexto histórico e cultural das cidades
em que os artistas estarão residindo.44 Em cada uma das edições é feito um
deslocamento de um ponto a outro da América Latina. Na sua forma atual, o
processo de trabalho assume importância crucial: a cada nova proposta o
conceito geral é repensado e reconfigurado em função das necessidades
específicas e da situação sócio-cultural na qual se insere.
O Capacete Entretenimentos busca parcerias com instituições e
investimentos de fundações internacionais para a realização de suas propostas,
gerando inúmeras formas de atuação no contexto brasileiro.
Outro projeto que reflete sobre as implicações de produção e práticas
artísticas é Istmo – arquivo flexível, idealizado pela curadora Ana Paula Cohen e
pelo artista Erick Beltrán (...) que parte de um interesse em um modelo de instituição
de arte contemporânea que possa funcionar como plataforma para produção,
apresentação, circulação e discussão sobre arte. A iniciativa envolve um grupo de
43 CAPACETE atua em quatro modalidades: exposições, residência de artistas, edição de publicações, e galeria móvel que concerne também no projeto Cinema Capacete e que colabora também com outras instituições. CAPACETE dedica-se à pesquisa, à organização e à disponibilização de documentação sobre processos estéticos, culturais, políticos no Brasil e em outros países da América do Sul. O contexto econômico, geopolítico, histórico e urbano da América Latina oferece possibilidades e materiais altamente férteis para a análise e a criação a partir da complexidade do continente em suas múltiplas manifestações. (www.capacete.net) 44 http://www.capacete.net/road.asp
36
artistas e colaboradores criando uma estrutura de pequeno porte, em que
propostas e trabalhos artísticos possam ser realizados, mostrados e arquivados.
Os mecanismos que desenvolvem práticas para expandir as atividades
institucionais são versões possíveis de uma estrutura insatisfatória. O que move
a maioria dos projetos da América do Sul acima mencionados é uma
necessidade de criar espaços de discussão e produção artística, configurando e
constituindo um circuito. Sejam vinculadas a instituições ou não, formam um
importante núcleo de atividades que desencadeiam outras possibilidades de
leitura, entendimento e circulação de arte, estabelecendo zonas temporárias de
intercâmbio por meio de proposições artísticas. A inserção do artista nesse
sistema de negociação e de articulação entre diferentes esferas do meio é uma
prática muito observada merecendo, portanto, uma análise aprofundada.
A extrapolação dos limites e as possíveis contaminações dessas
investigações transcendem o circuito dito oficial das artes visuais, alimentam
outras esferas de inserção e formação de uma possível história e crítica de arte.
37
Práticas Políticas no Campo Estético
2.
PRÁTICAS ARTÍSTICAS CONTEMPORÂNEAS:articulação entre asd i f e r e n t e sesferas do circuito
38
2.
Práticas Políticas no Campo Estético
A partir do texto de Jacques Ranciére, no qual ele discute as relações de
política com práticas estéticas, faço relações com algumas práticas artísticas na
esfera simbólica e outras iniciativas que tendem a uma autonomia no campo
político e estético.
Ranciére conceitua a partilha do sensível como uma distribuição e re-
distribuição de tempos e espaços, lugares e identidades, esta maneira de enquadrar e
re-enquadrar o visível e o invisível, de distinguir a fala do ruído e assim sucessivamente.
Ele fala de uma política que consiste em reconfigurar a partição do sensível para
trazer nesta cena novos objetos e sujeitos para fazer visível o que não era, em
transformar em seres falantes e audíveis a quem somente se ouvia como animais
barulhentos. Na medida em que a política estabelece tais momentos de discenso, cabe
caracterizá-la como atividade “estética”, e isso sem relação alguma com esse adorno
do poder que Benjamim chamava “estetização da política”.
O tópico “estética e política” pode então reformular-se como segue: (há uma
“estética da política” no sentido que ele tem tentado explicar). De maneira
correspondente, há uma “política da estética”. Isto significa que as práticas artísticas
jogam um papel na partição do perceptível, na medida em que suspendem as
coordenadas ordinárias da experiência sensível e re-marcam a rede de relações entre
espaços e tempos, sujeitos e objetos, o comum e o singular. (Ranciére, La Política de
la Estética, 2006:2).
Nesse contexto, citarei alguns exemplos para organizar relação entre
produção artística e práticas políticas. No trabalho de Thomas Hirschhorn, na
produção do grupo Superflex, nas iniciativas de artistas (Capacete, no Rio;
Duplus, em Buenos Aires), e ainda no texto de Andréa Fraser, Como brindar un
servicio artístico: una introdución.
Fraser, aborda a autonomia do artista no campo político e econômico do
circuito de arte que discute uma re-configuração ou um posicionamento nas
práticas do artista hoje perante o sistema.
O deslocamento da produção artística do campo estritamente específico
de suas linguagens para o ambiente ampliado das relações culturais já foi
39
enunciado como sendo uma passagem da arte do campo estético para o político
(...) uma vez que o que se faz hoje tende a estar mais próximo da cultura do que da
arte, é necessariamente uma interferência política. Porque se a estética fundamenta a
arte, é a política que fundamenta a cultura. (Cildo Meireles, 1970).
Thomas Hirschhorn no trabalho apresentado em Portugal em 2005,
Anschool II, afirma que na maioria de sua obra não faz arte política, faz arte
politicamente. E que a arte é inseparável da
crítica política e social45. Fazer arte politicamente,
em lugar de fazer arte política, significa que a feitura
é que é política e não a arte ou a “consciência” da
arte! Fazer arte politicamente significa proclamar a
existência da arte como arte absoluta e com
liberdade absoluta46.(Hirschhorn 2006:3)
O público se identifica pelos materiais utilizados pelo artista para compor
sua obra, como a caneta esferográfica, o papelão, globos terrestres, fita
adesiva, fotocópias com frases manuscritas, jornais, plástico, folhas de
alumínio, faixas, cartazes, etc.
Dessa forma, Hirschhorn rompe a camada do sensível, evidenciando a
natureza consumista da sociedade contemporânea, dominada por informações e
fatos manipulados pela mídia. No espaço que instaura esse campo perceptivo, o
público visitante é tomado por informações e símbolos que fazem ou
possibilitam reformular, ou ainda ao menos, ter conhecimento para o
entendimento da realidade por meio da partilha do sensível defendida por
Ranciére. Por mais cheio que pareça visualmente, suas instalações,
monumentos ou altares são espaços para o encontro com o sensível. E esse
excesso de informação faz parte dessa estratégia do perceptível.
Não se trata de comunicação, trata-se de codificação, precarização, que requer que o
visitante seja implicado. Implicar o visitante significa dar tanto das minhas próprias
formas que o visitante se pode tornar ativo. Não interativo. A atividade do visitante
consiste nos pensamentos dele sobre a posição artística que proclamo e defendo. A
45 Cito aqui o encontro de pensamentos de Hirschhorn com o de Ranciére: A política e a arte não são duas realidades separadas e permanentes sobre o qual havia que perguntar se devem estar conectadas ou não. Cada uma delas é uma realidade condicional, que existe ou não segundo uma partição específica do sensível. (Ranciére 3 : 2006) 46 Texto de Hirchhorn para Anschool e Anschool II, documento em PDF, Museu Serralves, Porto, Portugal 2005/2006.
40
atividade do visitante é o seu próprio pensamento, o seu próprio discernimento e não,
em caso algum, um “pensamento de fazer escola” 47. (Hirschhorn 2006:3)
No embate entre obra e realidade, o público entra em contato com essa
partilha.
Na 27ª Bienal de São Paulo, o trabalho de Hirschhorn concentrava muitos
livros e ferramentas, muitas vezes presas com fita
adesiva. Ferramentas de trabalho como chaves de
fenda, alicates, martelos, marretas, pregos e
parafusos estavam em relação direta com livros de
filósofos como Gilles Deleuze e Félix Guatarri, Michel
Foucault, Jean Paul Sartre, Walter Benjamim entre
outros. Um alto-falante gigante fazia parte da
instalação, que também agrupava imagens de
pessoas mutiladas. A esfera simbólica que se
formava com frases escritas no alto, mãos de
manequins com livros e ferramentas sobre uma mesa, evidencia a fala de
Hirchhorn: Não se trata de comunicação, trata-se de codificação, precarização, que
requerem que o visitante seja implicado.
A metáfora do livro como ferramenta do pensamento é a medida que
suporta o transposicionamento de espaço e tempo, possibilitando aí relações
independentes entre si.
Citando Ranciére: Essa estética não deve ser entendida no sentido de uma
captura perversa da política por uma vontade de arte, pelo pensamento do povo como
obra de arte. (...) É um recorte dos tempos e espaços, do visível e do invisível, da
palavra e do ruído que define ao mesmo tempo o lugar e o que está em jogo na política
como forma de experiência. A política ocupa-se do que se vê e do que se pode dizer
sobre o que é visto, de quem tem competência para ver e qualidade para dizer, das
propriedades do espaço e dos possíveis do tempo. (Ranciére 2006:3)
Superflex, um coletivo de artistas da Dinamarca que também participou
da 27ª Bienal de São Paulo, tem sua produção no limiar do contexto da arte e
suas implicações políticas. O grupo desenvolve uma prática complexa na qual
reúne projetos de arte com o comércio e estruturas econômicas no desafio de
47 Ibdem nota 46.
41
independência. Entre seus trabalhos, está a produção de Biogás, na Tailândia,
em 2002; Free Bier, já distribuído em vários países na Europa a partir de 2005;
Pudim Social de 2004; Guaraná Power, de 2003; entre outros48.
O Guaraná Power49 foi apresentado inicialmente na Bienal de Veneza de
2003, onde se distribuía o refrigerante gratuitamente as pessoas. Para a Bienal
em São Paulo, o projeto era distribuir o guaraná livremente dentro do pavilhão
do Ibirapuera, mas devido a uma censura do presidente da instituição Fundação
Bienal, os artistas foram proibidos de realizar o trabalho, que acabou ganhando
potência pela polêmica gerada.
Na Galeria Vermelho, dias antes da
inauguração da 27ª Bienal de São Paulo, os
visitantes foram surpreendidos com a fachada,
trazendo um enorme slogan em fundo verde e
com uma tarja preta. Tratava-se do logo do
Guarána Power recusado pela Fundação Bienal
“por não ser considerada uma atividade artística”.
Independente da censura, o Superflex distribuiu
livremente seu guaraná com o detalhe da tarja
preta, em locais de exposições paralelas à Bienal,
em São Paulo e no Rio de Janeiro. Outros
trabalhos do grupo discutem a tensão entre as
superestruturas do capital com a distribuição livre
no campo da arte. Por mais que discursem para um tema fora do campo seus
trabalhos sempre estão vinculados ao mercado de arte e conseqüentemente a
um contexto estético e questionável.
O posicionamento político do grupo tem sortido efeito em diversos países
por onde passa, alguns de seus projetos tem um alcance público que realmente
se aproxima de uma questão cotidiana, o que qualifica o projeto nas práticas
políticas do campo estético da criatividade.
48 www.superflex.dk. 49 Em 2003, Superflex foi convidado pelo NIFCA (Nordic Institute for Contemporary Art), pela Fundação Extra Arte baseado em São Paulo e pelo governo da Amazônia a empreender uma residência de pesquisa baseado na cidade de Maués. A proposta do trabalho surgiu de um estudo econômico da comunidade, afetada pela redução dos preços das sementes em decorrência do controle do mercado pelas indústrias de refrigerantes. O trabalho faz referências críticas à indústria de refrigerantes e reflete sobre a atuação das multinacionais sobre produtos naturais. O Guaraná Power foi produzido pela cooperativa de agricultores de guaraná em Maués, na Amazônia brasileira, em colaboração com o grupo Superflex.
42
No texto La Practica Artística mas allá del Dispositivo de Exhibicion, no
livro editado por Duplus50 sobre o Encontro de Espaços e Grupos de Arte
Independentes da América Latina e Caribe em Buenos Aires, eles apontam uma
reflexão a cerca de um questionamento de Gilles Deleuze: o que queremos dizer
com criatividade? Criatividade é a produção, a aparição de uma diferença. De algo que
não estava, de algo que não podia ser simplesmente deduzido a partir do que havia.
Por certo, isto é algo simples de entender, ainda não tão simples de que aconteça. A
criatividade é algo muito raro, escasso. “Ter uma idéia é uma espécie de festa”, disse
Deleuze. A imensa maioria das atividades que ocupam as pessoas e as coisas no mundo
é, desde um ponto de vista, meras reproduções. Reproduções de condições
dadas.(Duplus, 2005:101).
A relação que se coloca com o pensamento de Ranciére é justamente
nesse ato de criatividade na qual o visível e o invisível partem dessa condição
de aparecimento no instante escasso da idéia. Ya hemos dicho algo sobre la idea
de creación como producción de diferencia, especificamente bajo estas condiciones
materiales definidas por la posmodernización econômica. (Duplus 2005:106).
Ainda citando Duplus: (...) Neste sentido, a definição deleuziana de
criatividade está muito próxima da de Duchamp. O que Deleuze agrega é que sempre
que aparece este plus que chamamos arte, há ali um ato de resistência. O que se faz
visível, então, é uma série de correspondências: poder/resistência; reprodução/criação.
O que se sucede é que o poder e resistência partem das mesmas condições materiais,
valem-se das mesmas “coisas”.(...) Nossa pergunta pela condição da arte na era do
capitalismo biopolítico poderia formular-se no mesmo sentido. Quando o capital toma a
vida, quando a produção é produção sobre tudo de linguagem, de comunicação, de
corpos vivos (e isto quer dizer, basicamente, “novas tecnologias”), se trata ao mesmo
tempo de novas condições de controle e de novas condições de liberação51. Poder e
resistência partem das mesmas condições materiais. A diferença radica na absoluta
assimetria que existe entre poder e resistência. É a mesma diferença ontológica que
separa nada de algo. O que é poder? É carência de potência. O paradoxo do capital
chega na era biopolítica a sua máxima expressão. O capital carece de capacidade
produtiva. Só as forças vivas do trabalho podem produzir. Só sujeitos viventes. O capital
50 No Brasil participou do Programa de Residência Capacete de 2004, onde realizaram um projeto a partir do livro de Jacques Ranciére El Maestro Ignorante, na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro e Castelinho do Flamengo. (vide jornal Capacete 12, 2004). Hoje seus integrantes atuam individualmente no campo da critica, curadoria e ensino. 51 Citado em Duplus: Michael Hardt e Antonio Negri, Império, traducción de Alcira Bixio. Buenos Aires: Paidós, 2002.
43
é uma acumulação de trabalho morto que organiza o vivo, mas, em si, carece de
potência. (Duplus 2005:103).
Essas práticas abordadas no livro falam de iniciativas que criam um
espaço de diálogo, de circulação e de re-distribuição de um sistema que
incorpora e absorve todo o movimento de relações políticas que implicam nesse
contexto. Isso não seria negar o sistema de arte. Trata-se de dar outras
possibilidades de discurso, de encontrar um lugar no qual produzir algo seja
possível.
Na seqüência do texto, Duplus pergunta-se: o que seria um artista? Aquele
capaz de agenciar as condições dadas para produzir o próprio, para produzir-se. Aqui
práticas artísticas e pensamento são a mesma coisa. Não se trata de uma aplicação de
um saber, sim de poder pensar a própria prática, de pensar-se. (...) A prática estética
específica passa a ser o processo e a experiência, antes da forma-imagem ou objeto
resultante.(...) não se trata, pois, de uma arte participativa, senão de uma arte de
participação: uma prática deste tipo não pretende fazer participar os outros, senão
permitir aos participantes se envolverem em uma experiência dada. (Esta experiência é
sempre política, no qual mina também a distinção iconográfica, formal e / ou
intencional da chamada “arte política”.). (Duplus 2006:103, 104).
Neste sentido, o Projeto ROAD de
Capacete Entretenimentos é um exemplo
desta recriação de tempos e espaços,
lugares e identidades. Idealizado por
Helmut Batista e iniciado com o artista
Ducha52, em 2005, quando saíram de
carro do Rio de Janeiro indo até o Chile.
O projeto resulta numa espécie de
residência móvel que leva artistas a uma
“expedição” por países da América Latina. No percurso não há uma regra e nem
um objetivo final como obra, o que importa no caminho é exatamente o
processo e a vivência que se desenvolve na captação de imagens para filmes,
gravação de entrevistas, fotos, experiências e o intercâmbio com artistas.
Chegando em Santiago de Chile, apresentariam uma espécie de exposição na
52 Foto do Projeto ROAD 1.1 Diários de Motocicleta, com o artista Ducha. O carro utilizado no primeiro trajeto, Rio – Chile, ficou exposto durante um mês na Galeria Metropolitana.
44
Galeria Metropolitana53. O projeto, além de ser um espaço de vivência e
processos, não fica apenas nesse trabalho interno, se torna público e se coloca
em questão a partir de suas próprias condições. Cada edição modifica a idéia de
curadoria conforme a situação. A cada nova viagem que se segue pela América
Latina, um artista é convidado a seguir do último país que o carro foi deixado, e
assim sucessivamente.
A versão 1.5 do Projeto ROAD de 2006, com Helmut
Batista foi com o artista holandês Gabriel Lester, fazendo o
trajeto de Lima, no Peru, até Quito, no Equador. Em 2007,
ROAD versão 1.6 Gringo Loco Project, ocorreu dentro das
atividades do Encuentros de Medellín 07 (MED07), na
Colômbia, com os artistas Julia Rometi (França) e Victor Costales
(Equador/Belarus). A última etapa do projeto ROAD versão 1.5, junto com o
artista holandês, Gabriel Lester, levou seis semanas indo de Lima para Águas
Verdes e Huaquillas, fronteira entre o Peru e Equador. Tendo o Governo
Peruano confiscado o veículo do projeto, a proposta de Rometti & Costales foi
dar seguimento a esta parada forçada. O Projeto Gringo Loco aconteceu em
duas etapas. A primeira foi o retorno ao local onde o carro havia sido
confiscado, na cidade de Águas Verdes e Huaquillas, fronteira entre Peru e
Equador. A segunda etapa foi apresentada em Medellin durante MED07.
Cada um desses trabalhos é realizado de forma autônoma e podem ser visto,
exibido e compreendido separadamente. No entanto, vistos em conjunto e
acompanhados pelos textos e entrevistas de diferentes autores, proporcionam uma visão
do quadro geral das intenções e implicações do projeto, traçando múltiplos caminhos e
trajetórias entre propostas curatoriais e práticas artísticas inseridas na paisagem e nas
complexas tramas urbanas da América do Sul e Central54. Em 2006, no Cinema
Capacete VI no Rio de Janeiro, foi exibido o vídeo do artista João Modé, que
participou da Versão 1.4, no trajeto, La Paz/Bolívia – Lima/Peru.
Segundo Ranciére, as práticas artísticas são “maneiras de fazer” que intervêm
na distribuição geral das maneiras de fazer e nas relações com maneiras de ser e
formas de visibilidade. La idea de que el arte contemporáneo potencia la vida colectiva
53 Um espaço privado de difusão e exibição de arte contemporânea gestionados por artistas, instalada em um bairro periférico de Santiago de Chile, dirigido por Ana Maria Saavedra e Luis Alarcon. Responde ao propósito de fazer participar, em torno de novas manifestações de arte, a um setor social que tem estado normalmente fora delas. 54 Helmut Batista sobre o Projeto ROAD.
45
al crear um espacio remoto y vacío dedicado a lá meditación individual no es uma
invención extraña que pruebe el agotamiento del arte contemporáneo. Al contrario,
concuerda con toda la lógica de un régimen de identificación del arte y con su
política.(Ranciére, 2006:3).
Neste sentido, o projeto, na atuação de suas próprias atividades (Road, o
jornal capacete, a banca nº2, o cinema capacete, entre outros, etc.), é tido
como um posicionamento político frente aos desdobramentos instalados no
circuito. As condições que se colocam nessas maneiras de fazer, por sua
atuação, é uma resposta ao próprio sistema em que está se operando. As
questões estéticas nos projetos artísticos relacionam, mesmo que não
diretamente, esse envolvimento na produção de subjetividade.
Esses projetos são uma resposta frente à demanda da produção artística
ante a situação política de fomento. Os projetos e iniciativas atuam exatamente
neste limiar da visibilidade, muitas vezes sobrevivendo ou formando novas
estratégias para manter ou produzir colaborações.
O exemplo de
atuação neste limiar é
o Projeto Contramão,
das artistas Adriana
Barreto, Bruna Mansani
e Tamara Willerding,
atua nesse limiar. Ele
acontece como uma
proposta curatorial, só
que em ambientes
domésticos, nas casas
das pessoas. O
convidado (dono da casa) é quem escolhe os artistas e a forma que vai ser
disponibilizado publicamente. A exposição é muitas vezes aberta ao público em
dias específicos ou somente na abertura do evento. Normalmente difere-se uma
mostra da outra pela diferença da própria casa em agregar peças de arte. O
46
projeto, a cada edição, é reformulado, assim como a curadoria e o formato de
exibição55.
No lançamento do projeto, na casa de Tamara Willerding, em setembro de
2005, o trabalho de Bruna Mansani, da série Ditos Populares, consistia em
apresentar panos de louças com frases específicas, uma para cada dia da
semana, dialogando e inserindo-se dentro do próprio contexto da casa e da
exposição. A metáfora - para a arte panos de louça56 - desaparece dentro do
próprio contexto e adquire uma forte conotação política, pois independente das
relações ou sistemas, o trabalho não só acontece, como desperta ligações
subjetivas de atuação e disponibilização de um projeto artístico. E aí suas
relações estéticas na esfera simbólica.
O modo como se realiza o Projeto Contramão, nas casas das pessoas e o
próprio envolvimento cotidiano com uma relação pública de arte, não deixa de
ser uma prática política. A concentração mínima que se dá, em ambos projetos,
por si só, refletem essa possibilidade. Quer seja na viagem de dois artistas pela
América Latina, do Projeto ROAD de Capacete, ou na exposição reservada do
Contramão, eles levantam e refletem questões políticas57, mesmo não sendo
esse o ponto principal que move suas atividades.
Estas iniciativas de artistas geram suas próprias regras e criam
oportunidades de circulação, nas quais o principal motivo do trabalho é a
possibilidade de se discutir novas formas de inserção e atuação no circuito.
Interessante pensar nessa relação de um lugar de uma só praça que
também fala Ranciére58. São projetos e obras que no fim abarcam um número
reduzido de pessoas. Não é que a arte seja política na causa das mensagens e
sentimentos que comunica sobre o estado da sociedade. Tão pouco pela maneira em
que representa as estruturas, os conflitos ou as identidades sociais. É político em virtude
da distância mesma que toma respeito dessas funções. É político na medida em que
marca não só obras e monumentos, senão o “sensorium” de um espaço-tempo
específico, sendo que esse “sensorium” define maneiras de estar juntos ou separados,
de estar dentro ou fora, em frente de ou no meio de, etc. É político, no entanto que seus
55 Poderia lembrar-se aqui da curadoria de Hans Ulrich Obrist em sua cozinha (1991/92) “Minha cozinha veio do desejo do artista de expor em um local escondido, em uma cozinha. Tudo deve ter relação com a necessidade e a urgência do artista.” Conversa com Hans Ulrich Obrist de Marcelo Rezende. 56 (Leitura minha sobre o trabalho de Bruna Mansani e o Projeto Contramão). 57 A política aqui é evidenciada e definida pelo posicionamento de cada projeto em relação ao seu próprio circuito. 58 Ranciére. Jacques. La política de la estética, Otra Parte, Revista de letras y artes, nº 9, 2006
47
afazeres moldam formas de visibilidade que remarcam o entretecido de práticas,
maneiras de ser e modos de sentir e dizer em um sentido comum, o que significa um
“sentido comum” encarnado em um “sensorium” comum. Isto é assim, porque a própria
política não é o exercício de poder ou de luta pelo poder. Antes de qualquer coisa, a
política é a configuração de um espaço como espaço político, a delimitação de uma
esfera específica de experiência, a disposição de objetos deixados como “comuns” e de
sujeitos a quem se reconhece na capacidade de designar esses objetos e discutir sobre
eles. (Ranciére 2006:4)
As relações políticas dessas práticas abarcam vários segmentos nesse
campo estético da arte, estético porque relacionam uma produção de
subjetividade independente de uma obra final. Esses projetos e obras discutem
uma permissividade do próprio circuito que geram em torno de si (e das
pessoas que têm relação direta e indireta), um posicionamento frente às
demandas de uma necessidade específica do meio. Não são as instituições que
abarcam essas práticas, nem uma espera de programas específicos que
coordenariam os seus modelos de articulação. Na esfera simbólica da arte, elas
são próprias das inquietações desses produtores59.
Andréa Fraser em seu texto, Como brindar un servicio artístico: una
introdución, ressalta que a autonomia dependente do artista está implicada
numa relação equivocada de valores entre instituições e artistas. A liberdade
adquirida com base nessa autonomia é com freqüência não mais que a base para uma
auto-exploração. Talvez seja pelo privilégio de reconhecermos e de sermos reconhecidos
nos produtos de nossos trabalhos (como a “liberdade” de trabalhar de acordo com
Marx), ao preço do trabalho que excede gerando uma mais-valia, o benefício, que é
apropriado por outro. Em nosso caso, é primeiramente um benefício simbólico que
geramos. E está condicionado precisamente pela liberdade da necessidade econômica
que expressamos em nossa auto-exploração.
Dado que trabalhamos para nossa própria satisfação, se supõe que nossa tarefa
é sua própria compensação. Com freqüência se sente como se todas nossas relações
profissionais estivessem organizadas de maneira que todo o aparato da arte – incluindo
59 Esse é o posicionamento político que busco e quero evidenciar: o surgimento das inquietações dos artistas gerando suas próprias regras e criando oportunidades de circulação onde o principal motivo do trabalho é a possibilidade de se discutir novas formas de inserção e atuação no circuito. Creio que este não seja um ponto utópico dentro do projeto político geral, mas um meio para produzir uma referência da produção artística contemporânea. E aí pode se retomar o conceito de autonomia, abordado no capítulo anterior desta dissertação.
48
instituições culturais e galerias - estivesse estabelecido para proporcionarmos muito
generosamente a oportunidade de cumprir nossos desejos exibicionistas em uma
apresentação pública.
Somos dependentes dessa condição autônoma abordada por Fraser.
Podemos trabalhar para nós mesmos, para nossa própria satisfação, respondendo
somente a demandas internas, seguindo somente uma lógica interna, mas ao fazer isso
perdemos o direito de regular as condições econômicas e sociais de nossa atividade.
(Fraser 2006: 5, 6).
A discussão posta por Andréa Fraser incita uma discussão e fecha o
capítulo com questões pertinentes relacionadas a uma nova postura de artistas
e instituições frente a essa demanda da produção artística. O posicionamento
no campo estético dentro dessas práticas políticas contribui para a reflexão
acerca das possibilidades de reorganização das estruturas do circuito ou, pelo
menos, liberam essa partição do sensível por intermédio da produção de
subjetividade.
49
Proposições deInsistência
Prática
3.
PRÁTICAS ARTÍSTICAS CONTEMPORÂNEAS:articulação entre asd i f e r e n t e sesferas do circuito
50
3.
Proposições de Insistência Prática60
A partir das práticas realizadas como artista quando do ingresso no
mestrado (2005.2), relaciono a produção de Traplev como um heterônimo,
(num memorial descritivo), perante a investigação abordada nesta dissertação:
Iniciativa de Artista e Práticas Políticas, aqui neste capítulo como Proposições de
Insistência Prática.
A questão das práticas artísticas e sua articulação entre as diferentes
esferas do circuito vieram como uma posição para mim frente ao cenário (quase
anti-), artístico da cidade. A idéia de uma atuação e crítica de arte andava como
projeto, testando a permissividade desse circuito.
A posição política no meu trabalho se é assim que posso falar, aparece em
2001 com a produção do
múltiplo A dívida não está
paga! que se transformou, a
partir de uma inscrição do
texto em uma sacola plástica,
em cartazes e depois
adesivos. No decorrer deste
tempo outros trabalhos
ocorreram, mas a partir deste
primeiro, a questão se
colocava presente - a relação entre crítica e política nesse momento surgiu
também em Novos Projetos (Salão de Itajaí), Projeto Tanques (exposições de
Jaraguá do Sul e Curitiba), na exposição individual em Criciúma Projetos e
Orçamentos Traplev e ainda na proposição para a exposição-publicação PF,
“Esta folha é valida para dispersão”, que nas próprias palavras de Paulo R. O.
Reis evidencia o teor do trabalho: O projeto “Papel para dispersão” talvez seja uma
súmula de toda a discussão da dissertação. Ele é quase um papel-moeda, papel que
discute valores e ações em potência. Ele representa o jogo da arte e jogo de trocas. Ele
explicita também o que está implícito no jogo da arte – conhecimento, participação,
60 Este título foi dado à exposição que organizei na Fundação Cultural de Florianópolis Franklin Cascaes em maio de 2006 e creio que abrange todo contexto relacionado a minha produção nos diversos níveis aqui exemplificados.
51
instituição, compra, venda, troca, agenciamento, decisão de entrar ou não no jogo, de
estabelecer suas regras, quebrar regras... De forma similar, mas diferente do zero
cruzeiro, ele coloca em cena o que é a arte e suas relações pessoais/subjetivas,
institucionais, mercadológicas, políticas, enfim “intercambialidade”61.
Quando do ingresso no mestrado e a oportunidade de receber a bolsa por
um ano, dediquei todo o meu tempo à pesquisa, e foi a partir daí que pude
constatar então o fato das práticas artísticas como um conceito que permitia
atuar em diversos campos como um agente aglutinando idéias e possibilitando
a produção do trabalho num campo ampliado do conceito de artista. Essas
práticas, já abordadas nos capítulos anteriores, permitem um discurso para este
texto no qual me coloco como artista realizador de diversas instâncias, mesmo
aquelas anteriores ao artista mesmo.
Meu envolvimento com a Câmara Setorial de Artes Visuais da Funarte (no
mesmo período do ingresso no mestrado), com reuniões regulares no Rio de
Janeiro, indicava um caminho pelo qual teria de passar – a prática política.
Inserir e discutir com os profissionais e instituições da cidade uma reflexão
acerca de políticas culturais específicas para artes visuais. Completando quase
dois anos nessa discussão, assim como dessa pesquisa, nota-se as dificuldades
que há de inserir ou envolver instâncias públicas de cultura (Florianópolis e
Santa Catarina), na implantação ou pelo menos discussão de temas como
sistemas de fomento a produção, editais, fundos, etc.
Desta maneira a atuação como artista incorporou as atividades políticas
que venho realizando, e com isto reflexiono para este campo acadêmico na
intenção de preparar um terreno de maior alcance na atuação profissional, quer
dentro da academia como professor, quer como um articulador em instituições
de cultura, quer em exposições como artista ou gestionando projetos, espaços
de arte, publicações, etc.
A idéia de pensar ou fabular formatos de fomento62 ou mesmo projetos
reais de reavaliação de política cultural (Câmara Setorial Funarte) teriam o
mesmo sentido: incitar publicamente a necessidade de produzir e possibilitar
uma subjetivação do tempo através da produção contemporânea. Isso não
61 Texto elaborado por Paulo Reis quando da apresentação da Qualificação e incorporado ao corpo deste texto. Em sua fala, Paulo definiu o trabalho como uma síntese da pesquisa desta dissertação. 62 Edital de inauguração 01, do trabalho the new lab site art apresentado na exposição individual no MAC de Goiânia em 2005, e Edital FIESC de Artes Visuais.
52
envolveria só minha produção artistica, mas também a de um grupo de artistas
que a partir de 2000, vem se destacando com sua produção por meio de
exposições. Analisando rapidamente o histórico recente da produção
contemporânea de arte na cidade de Florianópolis, do final da década de 199063
aos anos 2000, esse grupo de artistas se deparou com um vazio64.
Pule no barco porque a ilha está afundando...65
63 Em 1992 morria Harry Laus, Crítico de Arte e Diretor do Museu de Arte de Santa Catarina (MASC), grande incentivador da produção de arte no Estado, em 1997 foi criado o Salão Victor Meirelles e logo depois o Edital de Fomento a Produção em Artes Visuais premiando 5 artistas por ano, mas na entrada do novo governo (2002), foi rapidamente destituído e até hoje não há nenhum mecanismo direto de fomento a produção de arte contemporânea no Estado e muito menos no Município (que nunca houve). 64 Carência de práticas de exposição de arte contemporânea, fomento, reflexão, critica, intercâmbio, etc. 65 Citação minha em uma conversa sobre a situação político cultural com Fernando Boppré num encontro por acaso, sentados na Praça XV – Florianópolis, maio de 2007 de uma história a ser escrita: O personagem da ilha invisível.
53
Traplev
A inserção do nome artístico Traplev surgiu em 2002 no Projeto Schwanke
em Jaraguá do Sul66 como uma possibilidade abstrata de referenciar a autoria
de arte a um nome que se identificasse como um organismo. A princípio e
desde então, comecei a assinar meus trabalhos sobre o codinome TRAPLEV, ás
vezes, dependendo do trabalho, adicionava uma segunda palavra para afirmar o
teor corporativo como: Traplev Agenciamentos, Traplev New Labs Corp.,
Traplev’s Project, Traplev Archivos, Traplev Presupuestos, Orçamentos e
Projetos Traplev, entre outros.
Para o catálogo realizado no Museu de Arte Contemporânea de Goiás,
assim descrevi Traplev:
O uso do termo Traplev e suas derivações, (new labs corp., agenciamentos,
project, program, orçamentos, etc) formam em seu conjunto ações individuais e
coletivas. Desde o início de 2002, Traplev vem assumindo uma série de atividades que
participam de um contexto específico. A produção de arte, seus agenciamentos,
análises críticas, relação de orçamentos, registros de exposições, publicações, eventos
efêmeros, envios de emails, situações instântaneas, são algumas das ações exercidas
em colaboração também com outros artistas.
(Traplev, 2005:3).
A partir disso abordarei minhas práticas, descrevendo os projetos
realizados durante o percurso do mestrado tentando aí contemporalizar as
questões envolvidas na pesquisa, não quero aqui fazer uma defesa dos
trabalhos para entrarem nesse conceito. O parâmetro se faz individualmente na
própria leitura das imagens como obra.
66 Esta Exposição que primeiramente aconteceu dentro dos moldes de um Salão (2002), teve um desdobramento transformando-se em um projeto de exposição sobre o titulo de Projeto Schwanke Perspectiva das Artes Plásticas de Santa Catarina, (homenageando o artista Luis Henrique Schwanke), o projeto aconteceu em duas edições: em 2003 com exposições em Jaraguá do Sul, Florianópolis e São Paulo; e 2005 que ocorreu apenas na cidade de Jaraguá do Sul. Com produção de 3 catálogos. Para a geração de artistas que surgiram pelos anos 2000 foi o único projeto que fomentou a produção artística abrindo oportunidade para produzirem e mostrarem seus trabalhos dentro e fora do Estado. Tendo sua devida importância na carreira dos artistas que dele participaram. Por motivos políticos a continuação do projeto foi cancelado.
54
Novos Projetos – instalação - 10º Salão de Itajaí – 2005.
55
Este projeto surgiu da proposta de enviar um trabalho específico para o referido
Salão, na intenção de refletir sobre os mecanismos de legitimação da obra.
Assim, criei o Laboratório Internacional de Arte Contemporânea Cidade de
Itajaí, que não foi só aceito como recebeu o primeiro prêmio. Fiquei muito
surpreso e contente e pensei que teria algum efeito dentro do circuito, mas logo
percebi pelo próprio Salão que o trabalho não ecoava nem dentro da própria
cidade, quem diria dentro do Estado. A exposição aconteceu no último andar do
Shopping e durou menos de um mês. A proposta evidenciava talvez o próprio
desejo da instituição promotora do evento, mas nunca houve um diálogo além
da exposição (vulto).
56
Projeto Tanques – instalação – 61º Salão Paranaense – 2005 / 2006.
57
O trabalho realizado para o Salão foi um projeto que tinha concebido para
impressão em grande formato. Tinha feito uma primeira versão em Jaraguá do
Sul no Projeto Schwanke, mas não obteve o mesmo resultado alcançado, na
cidade de Curitiba. As ilustrações de um livro de Segunda Guerra Mundial
evidenciam dois tanques bélicos com inscrições de duas palavras de saudação.
A potência estabelecida pela dimensão da imagem provocando
estranhamento na fachada do museu interessava-me. O enfrentamento diante
de uma exposição de arte também me incitava a estimular uma discussão
institucional de poder e imagem pública. Procurei uma ilustração que tivesse
uma relação ou atrito direto com o sentido de arte.
Até o momento não houve um posicionamento discursivo relacionando o
trabalho com algum aspecto político, mas a questão é explicita pelo próprio
silêncio da imagem.
No momento negocio sua doação com instituições interessadas.
58
Projetos e Orçamentos Traplev – exposição individual – Galeria Municipal de
Arte Contemporânea de Criciúma – 2006.
59
Esta exposição foi
planejada durante seis
meses e, na fase final de sua
produção, desempenhei um
papel performativo que
contribuiu definitivamente
para afirmação de seu
conceito67. Desde o início do
ano de 2006 tinha em mente
a idéia de documentação e
projetos como obra, que
depois denominei como
dispositivos administrativos.
Trabalhei com a galeria para
que a instituição arcasse
com a produção do trabalho
e com isso, em diversas
negociações e orçamentos,
tive em mãos uma planta
baixa do projeto de
exposição.
A três semanas da
inauguração, estava em uma
tentativa burocrática, de
diversas formas legais,
solicitando subsídio para
minha residência na
Argentina, onde meu projeto
tinha sido selecionado entre
mais de 40 propostas. Nesta
experiência, entre Assembléia
Legislativa, deputados e Secretário do Lazer (Secretaria de Cultura, Esporte e 67 Neste momento também desenvolvi um trabalho de discussão com Teresa Riccardi que desenvolveu um texto para a exposição e uma espécie de desdobramento da fala que fizemos. O texto estará mais adiante e esse desdobramento estará como anexo junto as publicações realizadas.
60
Turismo), preparei um projeto completo para solicitar ajuda de custo para a
proposta selecionada. No meio disso tudo, houve uma possibilidade (depois
falida) de preparar um formulário específico para tentar obter o valor solicitado.
Considerei a experiência burocrática e administrativa vivenciadas, como
processo para a exposição. O convite, Plano de Aplicação, foi um dos resultados
dessa “performance”. A Mostra resume muito dos assuntos abordados nessa
dissertação, pois considero um bom desencadeamento da minha produção no
sentido político/burocrático/administrativo, que envolveu o trabalho nessa
época.
As questões envolvidas por meio dos
textos disponibilizados e outros múltiplos
distribuídos são muito pertinentes a uma
discussão de posicionamento frente às
situações específicas na produção e
fomentação de arte hoje.
61
62
Endoce una Crítica – texto/proposição de Teresa Riccardi para Traplev
Orçamentos.
63
(Pre)supuestos para una práctica artística: Endose una critica
Teresa Riccardi
En Argentina desde siempre y no especialmente desde el 2001, algunos cheques que no se eligen cobrar, pueden ser endosados a otras personas. Estos incluyen no una transacción de a dos sino de a tres sujetos. Si una persona tiene una deuda o desea pagarle a otra puede emitir un cheque que sea o no nominativo. Si elige no poner el nombre del destinatario beneficiario, el que lo recibe puede endosarlo y hacer que le pague el primero, solamente firmando atrás el nombre de un tercero. El cheque (una forma de pago) endosado/mediado, puede ser un cheque volador, difícil de atrapar, lapso o intermitencia entre legalidad e ilegalidad en los sistemas de fiabilidad de circulación financiera. Se trata de un modo de cancelar un pago que realmente depende más que nada no sólo de la garantía bancaria de las partes, sino de la credibilidad y cooperación voluntaria libre entre los que pactan la transacción. Así como refiere a la economía, refiere también a los modos en que los sujetos actúan ante los presupuestos y la credibilidad en los modos de circulación del valor y la mercancía. Cuando el arte es pensado en tanto practica artística, (pre)supone no solo una critica al obra como objeto deificado sino a un sujeto que articula o pone en contacto a otros sujetos junto a un pensamiento creativo y afirmativo. La mediación y la condición de posibilidad de crear otros modos de producción, no son solamente aquellos que implican al mercado del arte, sino a los que responden los artistas en tanto sujetos afectados por otros. Las transacciones que llevan a cabo en su vida cotidiana permean la definición de las practicas que ejercen, sin preestablecer el contorno de aquello que lo clasifica en tanto sujeto, artista, autor o individuo. ¿Como delimitar cuando soy sujeto responsable fiscal y cuando sujeto artístico, como componer y descomponer esa manera de pensar? El (pre)supuesto de la cooperación libre entre sujetos y la creatividad que atraviesan tanto la afectividad y la confianza humana son vectores que activan las estrategias estético-políticas, así como la critica a los sistemas de circulación imperantes que se vuelven inflexibles a la hora de pensar una subjetividad subalterna como lo es hoy el artista. El pensamiento creativo, la critica, son valores devaluados que solo pueden resignificarse en tanto se introduzcan en circuitos cuyos sujetos prioricen redes de lazos afectivos y nuevas percepciones de la temporalidad que se practiquen mas allá dispositivo de exhibición. En otras palabras que puedan producir relaciones subvertidas con otros sujetos, relaciones que antes no existían mas allá de la muestra68. Como plantea Traplev poner en disponibilidad, hacer posible una intromisión, pensar en el acontecimiento y crear una articulación. Crear una expectativa sobre la temporalidad y la apariencia, no solo partiendo de la obra sino a través de experiencias donde el cuerpo de la obra se plantea como proceso de distribución misma. Agenciamiento colectivo de participación y subversión de sentidos!!! La circulación y disponibilización que envió a Traplev Orçamentos propone en esta práctica actual, una colaboración-creativa de Endose de critica. Mediante una factura (primera de cinco, con original y copia) se ofrece un servicio -una práctica critica (escritura, pensamiento, asesoramiento, seguimiento por mail, etc.) no remunerable, resultante de un diálogo entre el artista y yo. Esta practica, que se inicia a través de la factura pero que existe como “transacción inmanente”, donde el elegido me “debe” un diálogo para que exista nuestra practica (la existencia de la obra depende de lo que las personas construyen con ella); quedará plasmada en principio en una factura original y copia, que le será enviada por correo. El mismo artista sugerirá, mediante firma en la parte posterior de la factura, el endose de critica a un tercer sujeto artista. Al generar este pedido de endose la relación se vuelve tripartita como en el cheque “volador”, la simulación de pago interesa más que el pago, las relaciones de vinculación hacen a la obra más que al medio de la misma como tal. Este es el primer endose de critica enviado a Traplev, luego de reflexiones y (pre)supuestos a distancia entre Roberto y Yo. Ro, endosálo a alguien !!! 68 Duplus, “La práctica artística más allá del dispositivo de exhibición”, Fundación Proa, Buenos Aires 2005.
64
Traplev Archivos – instalação – Residência El Basilisco – Buenos Aires - 2006.
65
A possibilidade de estar em um período
de residência para artistas é um momento ideal
para desenvolver e se deparar com novas
realidades no trabalho. Minha experiência dos
exatos 45 dias, na cidade de Buenos Aires para
produção e experimentação de obra foi muito
rica. Avellaneda (onde fica a residência El
Basilisco), é um município que fica ao lado do
rio Riachuelo, a 30 minutos da avenida de
Mayo, principal de Buenos Aires. A cidade é
muito polítizada notando-se em seus muros,
nos edifícios públicos e também em algumas
conversas. A vivência em outro lugar, os costumes e novos desafios enfrentados
livremente para desenvolver idéias é o campo propício para o olhar encontrar
outras subjetividades. Todo processo de chegada à cidade permeou uma situação
política. Inicialmente, quando selecionado para residência, não havia nada acertado
sobre como chegar. No Brasil, e mesmo no Estado, há uma carência de projetos
que permitam participar de residências para artistas69. No fim, um mês antes de
embarcar, os dois artistas coordenadores da residência comunicaram que a
Embaixada do Brasil em Buenos Aires iria subsidiar minha ida ao país para
participar do intercâmbio.
Recebi do Ministério das Relações Exteriores as passagens e da Embaixada
mil dólares, a título de sobrevivência e produção. Convertido para pesos deu cerca
de três mil pesos. Metade pagou a própria residência (aluguel do espaço) e a outra
parte foi para necessidades básicas e produção. No princípio, me permiti
experimentar a cidade, para aos poucos ir me aproximando e reunir as idéias para
um possível trabalho. Andando pelas ruas da cidade me interessei por uma espécie
de propagandas que utilizavam a impressão serigráfica sobre uma sacola plástica,
espalhada por todos os postes da cidade. Fiz algumas pesquisas de preços nos tais
serviços, mas no fim não consegui financiar o projeto. No fim, apresentei duas
instalações e uma publicação (recibo///) que reunia alguns dos trabalhos realizados
durante o período no país.
69 Salvo a Fundação Iberê Camargo e Itaú Cultural quando da edição do Rumos de Artes Visuais.
66
Traplev Orçamentos - exposição 1 triz – Museu Hassis – 2006.
67
Este trabalho foi apresentado na inauguração da sala de exposições Vento
Sul para arte contemporânea do Museu Hassis. A obra consistia nesta carta
distribuída aos visitantes e estava num suporte com os adesivos das duas
logos: Traplev Orçamentos e Programa Fiesc de Artes. Tratava-se de uma
correspondência fictícia com dados verídicos de seu faturamento anual. Era uma
provocação à própria estrutura da exposição. O museu pretendia inaugurar a
sala de arte contemporânea e numa reunião com os artistas e curadores
colocamos a questão profissional de subvencionar no mínimo os trabalhos
realizados. A partir dessa conversa, os dirigentes do museu refletiram e
determinaram uma ajuda de custo e um catálogo da mostra. No entanto a
discussão do trabalho abarcava outra esfera, que dialogou com a estrutura da
própria instituição que abrigou a mostra. No seu decorrer, eu elaborei um
projeto70 de propostas de políticas culturais, conforme as discussões da Câmara
Setorial de Artes Visuais da Funarte e apresentei pessoalmente a Federação das
Indústrias do Estado de Santa Catarina.
70 Mais à frente apresentarei o projeto elaborado.
68
Traplev Agenciamentos
Atuando dentro do que chamo de Práticas
Artísticas71 realizo uma série de trabalhos que
complementa a articulação da produção artística
realizada ao meu redor. Nela estão inseridas
curadorias de exposições, projeto de publicação e
agenciamentos com instituições. Em 2005 e 2006
organizei três72 exposições reunindo vários artistas
que hoje são referência quando se fala da recente
produção de arte contemporânea na cidade.
Durante seis meses, entre julho e dezembro de
2005, assinei uma coluna sobre artes visuais no
caderno Anexo, na época editada por Néri Pedroso, do
Jornal A Notícia.
Atualmente produzo o Ciclo de Discussões sobre
Práticas Artísticas, iniciado no mês de janeiro no
Museu Hassis. O segundo encontro ocorreu sobre o
tema Práticas Políticas no Campo Estético. Projeto
Contramão, das artistas Adriana Barreto, Bruna
Mansani e Tamara Willerding, e o coordenador do
Espaço Arco de Arte Contemporânea, o artista
Roberto Freitas, foram os convidados na discussão
sobre projetos e iniciativas de artistas em
Florianópolis. Como no primeiro encontro, neste
também será produzido uma edição especial de
recibo sobre os dois espaços.
A seguir apresento documentação relacionada a
exposições organizadas e outros agenciamentos.
71 Como um conceito que me permite atuar em diversos campos como um agente aglutinando idéias e possibilitando a produção do meu trabalho num campo ampliado do conceito de artista. 72 Entregravuras curada com Nara Milioli no Museu de Arte de Santa Catarina, Novos Laboratórios na ACAP e Proposições de Insistência Prática na Fundação Franklin Cascaes.
69
Projeto Novos Laboratórios – ACAP – Florianópolis – 200573
73 Esta exposição esta registrada com fotos e detalhes dos trabalhos no site www.terreno.baldio.nom.br na parte de exposições.
70
A mostra surgiu a partir da necessidade de expor ao público a produção recente
de arte contemporânea produzida hoje na cidade. Com isso foi proposto a ACAP
(associação catarinense de artistas plásticos) realizar uma mostra diferente do
que se costuma apresentar nesta sala de exposição (prédio da alfândega). Com
o intuito de refletir sobre as várias possibilidades de exposição, foi proposto aos
artistas que apresentassem projetos de trabalhos que de algum modo
estivessem ligados a idéia de uma exposição em processo, sendo construída
durante todo o período da mostra. Refletindo sobre a necessidade de estar em
constante movimento, a mostra teve o caráter de possibilitar o debate, criando
um espaço aberto às discussões e às diversas ações propostas e que agenciava
a prática da arte contemporânea. A exposição consistiu em uma programação
de três semanas, onde a cada dia ocorrerão ações, aglutinando a participação
das pessoas e a realização dos trabalhos. Performances, instalações, imagens,
música, palestras, encontros com artistas, intervenções e filmes forão algumas
das atividades propostas. A exposição esteve aberta ao público para visitação e
interação, inclusive com ações a serem realizadas e divulgadas na hora74.
74 Para esta exposição foi realizado um folder contendo todas informações sobre os artistas e ações decorrentes.
71
Exposição Proposições de Insistência Prática – Forte Santa Bárbara – 2006.
Segue texto de apresentação da exposição:
72
proposições de insistÊncia prática75 Ilha de SC 18 de maio a 23 de junho de 2006
Sede da Fundação Franklin Cascaes – Forte Santa Bárbara Traplev Agenciamentos
Nos dias de abril depois de iniciado o processo de contato com os artistas para
conversar sobre suas práticas e trabalhos e olhando algumas propostas, me identifiquei com uma imagem de cor quase magenta com a frase inscrita: PORQUE EU SEMPRE MESMO ESTIVE AQUI76 de Priscila Zaccaron. O sentido sugerido pela frase da artista, de uma forma contemplava um desejo e ao mesmo tempo deflagra uma falta no contexto de arte da cidade que está se formando, criando um diálogo de acesso. Realizar uma exposição num espaço institucional é o desafio que se coloca na possibilidade de estar “dentro”, re-ativando um espaço com possibilidade crítica, sendo evidente uma reforma de política cultural e fomento para as artes visuais.
A condensação dos 20 artistas reunidos é um deflagrador da idéia de princípio, do porquê apresentar um conjunto de trabalhos em dada situação, e qual motivo para este deslocamento. Iniciar uma busca com referências estabelecidas me perturbava, ao mesmo tempo em que procurar algo para deixar clara minha intenção me confortava. Era um alívio pensar nesse vácuo entre possibilitar e realizar. Reunir artistas e obras para uma “exposição de arte” em espaço específico77, primeiramente com o propósito de evidenciar o processo histórico da montagem de situações, são possibilitar olhares e reintegrar o diálogo.
Em processo de desenvolvimento das idéias no campo relacional78 ao espaço de performação79, pra mim ficou cada vez mais intenso, produzir algo contextualizando todas as insistências que dizem respeito a uma cadeia produtiva específica e seu fluxo. Sendo isto um subtítulo ou sobre-texto, quase subliminar, parti para abster-me de vícios de linguagens e abarcar no que cada artista em potência tinha a contribuir para a construção deste texto. A relação com o espaço, o registro de situações dadas, o desenvolvimento de um processo, o estudo da imagem, o local como experiência, a sensibilidade praticada em proposições sonoras e intervenções a deriva80 na cidade refletem já uma boa parte das insistências de proposições práticas apresentadas aqui nesta ocasião, que prefiro deixar ao silêncio dos visitantes e/ou ao barulho de uma banda as prerrogativas de uma emergência. Artistas: Raquel Stolf, Julia Amaral, Teresa Siewert, Ricardo Basbaum, Giórgia Mesquita, Gustavo Meneguini, Armando Athaíde, Nara Milioli, Priscila Zaccaron, Amanda Cifuente, Cláudia Zimmer, Tiago Franco, Bruna Mansani, Erro Grupo, Fê Luz, Thaís Gil, Edmilson Vasconcelos, Daniel Acosta, Flávia Fernandes, Traplev (projeto curatorial).
75 Texto em desenvolvimento parte 01 - Traplev. 76Sem-título - imagem impressa dimensões variáveis - 2005. 77 Sede física da Fundação Municipal de Cultura de Florianópolis, Fundação Franklin Cascaes – Forte Santa Bárbara, e histórico político de mais de 8 anos de “atuação local”. 78 Deflagrados nas aulas do Prof. Dr. Zé Kinceler no Programa de Pós-graduação Mestrado de Artes Visuais (ceart-udesc), com textos de Nicolas Borriaud, entre outros. 79 Termo de Regina Melin e projeto de pesquisa do Centro de Artes-UDESC, decorrente da tese de Doutorado: Incorporações – agenciamentos do corpo no espaço relacional, PUC, SP, 2003. 80 Conceito de Gui Debord desenvolvido a partir da Internacional Situacionista na década de 50. A idéia contida neste trecho corresponde a uma relação histórica, não se restringindo a uma abordagem de similariedade.
73
Publicação Esporádica e Limitada recibo (desde 2002).
Este projeto teve início em 2002, proposto por mim para conjunto de artistas, na época
da universidade, que se reuniram para editar a publicação. No inicio a idéia era realizar mais de
um número, mas naquele momento financiamos apenas uma edição de 2000 exemplares. Em
2005 retomei o projeto e após a exposição Projeto Novos Laboratórios na ACAP, realizei um
“boneco” do que seria o segundo número chamado recibo05 que registrava a exposição com
fotos e textos. Produzi uma edição de 10 números (assinadas e numeradas), para apresentar na
tentativa de conseguir financiá-la em número mínimo, com impressão frente e verso, tamanho
A4, preto e branco em folhas de cor. Na época não consegui apoio e o projeto ficou apenas nos
10 números impressos inicialmente.
Em 2006, quando da Residência El Basilisco que
participei na Argentina, produzi um número especial de
recibo/// no qual evidenciei o processo de trabalho do
período na cidade. No Brasil fiz uma edição limitada de
10 números e distribui em São Paulo e Florianópolis
para amigos. Na exposição da Residência no El
Basilisco foi produzido uma série de 50 e distribuído na
abertura.
Em janeiro de 2007 a partir do Ciclo de
Discussão sobre Práticas Artísticas está em produção
outra edição especial chamada recibo//// - welcome to
Montgomery in Florianópolis, que registra a passagem
e o diálogo sobre práticas artísticas com a artista
alemã Roseline Rannoch coordenadora junto com Julia
Pfeiffer do espaço de arte Montgomery em Berlim, esta
edição será bilíngüe e será distribuída nos dois países,
no segundo semestre de 2007.
Como projeto editorial específico pensado para
a dissertação, será lançado como projeto mais um
número especial chamado recibo 87, no qual reuni
uma série de trabalhos sobre o tema A Noção de
Despesa. Além deste número será lançada a edição
especial: recibo 10 em parceria com Nara Milioli para a
mostra Contramão em sua casa, refletindo sobre o
tema proposto: observatório móvel. Este terá uma
edição de 1000 exemplares, sendo este número uma
retomada do projeto para distribuição. A publicação
recibo está em aberto e ainda é possível haver outros números a partir de outras propostas, a
idéia é reeditar os já existentes e imprimir os inéditos que serão lançados, tornando disponível
para circulação em ocasião da defesa desta dissertação.
74
Ciclo de Discussões sobre Práticas Artísticas – Museu Hassis – 2007.
A partir da investigação realizada sobre a prática do artista e a articulação entre
as diferentes esferas do circuito, abordo uma série de espaços e projetos geridos por
artistas que modificam e complementam a cena local com estratégias de parcerias e
difusão da produção artística visando o intercâmbio.
O projeto busca através de encontros com
artistas e teóricos desenvolver e aprofundar a idéia
de autonomia e prática política no sistema de arte
relacionando vários fatores e pensamentos para
potencializar as práticas desenvolvidas
transbordando esses limites.
O Ciclo, iniciado no mês de janeiro com a
artista convidada Roseline Rannoch de Berlim que
apresentou, no Museu Hassis o espaço coordenado
junto com a também artista, Julia Pffeifer da
Alemanha, teve um desdobramento que foi a
confecção do modelo de Montgomery em Berlim
numa escala de maquete apresentada também
durante a sua fala no Museu. Esta fala foi à partida
do projeto no qual os artistas: Traplev e Roseline iniciaram uma expedição pela cidade
registrando o modelo nas diversas paisagens. O resultado deste trabalho esta sendo
produzido para a edição de uma publicação onde estarão às fotos desses percursos e
uma entrevista entre Traplev, (artista coordenador do Ciclo), Julia e Roseline (artistas
coordenadoras de Montgomery) sobre práticas artísticas e outros aspectos, que será
lançada em breve.
75
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