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PREFEITURA MUNICIPAL DE BELÉM SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
DIRETORIA DE EDUCAÇÃO
DIRETRIZES CURRICULARES DO ENSINO FUNDAMENTAL
CICLOS III E IV
BELÉM-PARÁ 2012
PREFEITO DE BELÉM
Duciomar Gomes da Costa
SECRETÁRIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO Therezinha Moraes Gueiros
DIRETORA DA DIRETORIA DE EDUCAÇÃO - DIED Odozina Farias Braga
COORDENAÇÃO DAS DIRETRIZES CURRICULARES Iris Amaral de Sousa
EQUIPE TÉCNICA DE ENSINO FUNDAMENTAL Ana Vasti Freitas de Paula
Andrea Souza de Albuquerque Benedito Fialho Machado
Bianca Venturieri Dionelpho Machado e Cunha Júnior
Edilson Pereira Palheta Ednéa Maria Martins de Azevedo
Elienae da Costa Nascimento Evaldo Ferreira Rodrigues
Iris Amaral de Sousa Jorgete Maria Portal Lago
Kátia Regina Macedo Tavares Madalena Corrêa Pavão
Maria Adelaide Araujo Monteiro Maria de Fátima Avelar Barbosa Maria de Fátima Cravo de Sousa
Maria de Fátima de Oliveira Teixeira Marilza Pontes dos Santos
Nazaré do Socorro Favacho Cezar Raquel dos Anjos Veiga
Rosivaldo Sacramento Caldas Valéria Maria Marques Fernandes
Wilma Célia Marques Ribeiro Zanete Almeida Gusmão
FICHA TÉCNICA PRODUÇÃO TEXTUAL: Equipe Técnica de Ensino Fundamental - ETEF Centro de Formação de Professores Equipe Técnica de Educação Especial – ETEE Núcleo de Informática Educativa – NIED Conselho Municipal de Educação Educadores das Escolas Municipais de Belém SISTEMATIZAÇÃO DO TEXTO Andrea Souza de Albuquerque, Bianca Venturieri, Dionelpho Machado e Cunha Júnior, Evaldo Ferreira Rodrigues, Ednéa Maria Martins de Azevedo, Elienae da Costa Nascimento, Iris Amaral de Sousa, Jorgete Maria Portal Lago, José Pedro Garcia, Maria Adelaide Monteiro, Maria de Fátima Cravo, Maria de Fátima Teixeira, Madalena Corrêa Pavão, Rosivaldo Sacramento Caldas, Valéria Marques Fernandes, Walter Gomes Rodrigues Junior, Zanete Almeida Gusmão, Ricardo Torres, Miguel Brito Picanço, Carlos Roberto da Silva Ferreira, Liliane Barros Fiúza de Melo Cassiano, José Anchieta de Oliveira Bentes, Elisabeth Pessoa Gomes da Silva, José Maria de Souza Cravo, Luiza Maria Pereira da Silva. FICHA CATALOGRÁFICA CORREÇÃO ORTOGRÁFICA Maria Auxiliadora Brito de Sousa CAPA Dionelpho Machado Junior, Walter Junior, Elienae Nascimento
FOTO Arquivo: ACOM/SEMEC
SUMÁRIO INTRODUÇÃO ...................................................................................................................
1. A CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DOS CICLOS DE FORMAÇÃO .......................
1.1. Antecedentes Históricos ...................................................................................
1.2. Décadas de 80 e 90: as experiências de ciclo no País ....................................
1.3. A Implantação dos Ciclos na Rede Municipal de Educação de Belém ...........
2. PRESSUPOSTOS DOS CICLOS DE FORMAÇÃO ......................................................
2.1. Perspectivas do Desenvolvimento Humano .....................................................
2.2. Desenvolvimento Humano e Ciclos de Formação ............................................
2.3. Inclusão Social ..................................................................................................
2.3.1. Por uma Educação Inclusiva ...............................................................
2.3.2. As Relações Etnicorraciais ................................................................
2.4. Educação Ambiental .........................................................................................
2.4.1. Breve histórico da Educação Ambiental no Brasil ..............................
2.4.2. A Educação Ambiental na Escola .......................................................
2.5. Interdisciplinaridade ..........................................................................................
3. AS ÁREAS DO CONHECIMENTO .................................................................................
3.1. LINGUAGENS ..................................................................................................
3.1.1. Língua Portuguesa ..............................................................................
3.1.2. Ensino de Artes ...................................................................................
3.1.3. Educação Física ..................................................................................
3.1.4. Língua Estrangeira Moderna ...............................................................
3.2. CIÊNCIAS HUMANAS ......................................................................................
3.2.1. História ................................................................................................
3.2.2. Geografia ............................................................................................
3.2.3. Filosofia ...............................................................................................
3.2.4. Sociologia ............................................................................................
3.2.5. Ensino Religioso .................................................................................
3.3. CIÊNCIAS DA NATUREZA ...............................................................................
3.3.1. Ciências Naturais ................................................................................
3.4. MATEMÁTICA ..................................................................................................
3.4.1. O Ensino da Matemática .....................................................................
4. MATRIZ CURRICULAR DO ENSINO FUNDAMENTAL ................................................
5. METODOLOGIA .............................................................................................................
6. AVALIAÇÃO ...................................................................................................................
7. BIBLIOGRAFIA ...............................................................................................................
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INTRODUÇÃO
As Diretrizes Curriculares do Ensino Fundamental da Secretaria Municipal de
Educação (SEMEC) tomam como base o Desenvolvimento Humano, a história social do
conhecimento; a diversificação nas novas formas de ensinar e aprender, bem como as
exigências de um ensino mais democrático, includente e de acesso a todos os cidadãos
da sociedade brasileira e, em particular, da paraense e local.
Ao serem proposta as Diretrizes para o ensino fundamental, no âmbito da
Rede Municipal de Educação de Belém (RMEB), as atenções voltam-se para a
necessidade do aprofundamento ao debate sobre a organização do tempo e do espaço
educativo, do ensino e da própria instituição escolar.
Dentro desse contexto destacamos a organização do ensino em ciclos que,
no Brasil, remonta ao início do século XX ao desencadear discussões e debates sobre
a perspectiva de superar os altos índices de reprovação e fracasso escolar nos anos
iniciais de escolarização do regime seriado. No entanto, é com a implantação do Ciclo
Básico de Alfabetização (CBA), no ano de 1984, na Rede Estadual de Ensino de São
Paulo, que se tem, de fato, o início de uma experiência diferenciada com relação à
organização do ensino, que foi seguida por outras gestões públicas como foi o caso dos
Estados de Minas Gerais, Paraná e Goiás.
Não poderíamos deixar de destacar a questão da flexibilização que também
se encontra inserida nesta discussão, uma vez que no Brasil historicamente a mesma
tem sido usada, ora para justificar a permanência e sucesso dos alunos na escola, ora
para garantir um modelo educacional que se preocupa apenas com a questão
financeira quando propõe a redução de custos ao se aprovar em massa os alunos, sem
que se tenham claros os critérios de progressão, em detrimento ao princípio da
democratização do acesso ao conhecimento e das oportunidades de aprendizagem.
Entendemos que o processo de reorientação curricular deve enveredar-se
por um caminho cuja relação teórico-prática deve ser a mola propulsora nessa
discussão, a fim de contribuir para a superação da fragmentação do conhecimento que
ainda está presente em algumas práticas pedagógicas desenvolvidas no ambiente
escolar. Em função disto, a preocupação com a prática curricular ganha destaque, fruto
que é das contribuições teórico-críticas sobre a educação, da análise do currículo como
objeto social e da prática criada em torno do mesmo.
Este processo, por conseguinte, exige a construção de trabalhos coletivos,
cooperativos, participativos, críticos, criativos e inovadores cujas multidimensões
construídas em torno dele devem convergir em pontos comuns, os quais contribuem
para os avanços significativos em prol da concretização de uma educação de qualidade
e da democratização do saber aos cidadãos, independente de crenças, raça e gênero.
O referido processo deve ser entendido como um movimento dialógico que
garante a autonomia dos educadores e das escolas, a fim de criar possibilidades por
meio de ações técnico-pedagógicas que superem os problemas relacionados à prática
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educacional desenvolvida pelos educadores nas escolas municipais.
Para a construção dessa Diretriz Curricular, além da coordenação e
contribuição dos profissionais da Equipe Técnica do Ensino Fundamental (ETEF),
procurou-se ampliar o nível de participação com a inclusão de outras equipes técnicas
como a ETEE (Equipe Técnica de Educação Especial), Centro de Formação, o NIED
(Núcleo de Informática Educativa), o Conselho Municipal de Educação e de educadores
que fazem parte das escolas municipais de Belém, colaborando nas discussões de
acordo com suas áreas de conhecimento, cuja intenção foi absorver as teorias
educacionais e do conhecimento e relacioná-las às práticas vivenciadas nas escolas
pelos professores, gestores e alunos de forma a legitimar os aspectos da educação, do
ensino e da aprendizagem.
Entretanto, não consideramos que esta proposta esteja com seus contornos
acabados. Sabe-se que qualquer orientação curricular só ganha vida no diálogo
permanente com os educadores que, de fato, exercitam e fazem um currículo em
construção permanente.
Por outro lado, ao procurar organizá-lo a partir de uma perspectiva critica,
tornou-se uma necessidade, uma vez que não há como fazer educação hoje, sem
considerar os aspectos sociais, políticos, econômicos, culturais em que a educação e o
ato pedagógico estão implicados.
Com vistas a atingir esses objetivos apresentamos este documento que está
organizado em 06 (seis) partes, assim distribuídas:
Na primeira, apresentamos a contextualização histórica dos ciclos de
formação, ao desenvolvermos um diálogo sobre a organização do ensino em ciclos,
seus antecedentes históricos e, no Brasil, com destaque para as décadas de 80 e 90 do
século passado, finalizando com o estudo sobre a experiência do ciclo vivenciado no
município de Belém a partir da década de 90 na sua rede de escolas.
Na segunda – pressupostos dos ciclos básicos – discorremos, com base nos
referenciais teóricos sustentados em Piaget, Vygotsky, Wallon, Riegel, Valsiner e
Bronfenbrenner, sobre os pressupostos que norteiam o desenvolvimento humano e sua
conexão com as questões referentes aos ciclos de formação, à inclusão, às relações
étnico-raciais e à educação ambiental.
Na terceira – áreas do conhecimento – serão abordados aspectos teórico-
práticos das áreas de Linguagens, na qual encontram-se as disciplinas Língua
Portuguesa, Ensino da Arte, Educação Física e Língua Estrangeira Moderna; Ciências
Humanas composta das disciplinas História, Geografia, Filosofia, Sociologia e Ensino
Religioso; Ciências da Natureza com a disciplina Ciências e, por último, Matemática.
Na quarta, apresentamos a Matriz Curricular do Ensino Fundamental
desenhada em três quadros. O primeiro refere-se aos Ciclos de Formação I e II, o
segundo aos Ciclos de Formação III e IV como se encontra atualmente, e um terceiro
dos Ciclos III e IV com uma nova organização que suprime o turno intermediário. Todos
representados pelas disciplinas, carga horária e tempo de aula organizado segundo
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legislação educacional em vigência.
Na quinta – Metodologia – descrevemos algumas alternativas metodológicas
para encaminhamento do trabalho com os Ciclos de Formação, quer seja na
perspectiva da pedagogia de projetos, quer seja na perspectiva do tema gerador e/ou
eixos temáticos.
Na última parte – Avaliação - analisaremos as questões avaliativas que se
encontram no cerne dos ciclos de formação, tais como: as instâncias de avaliação da
ação escolar (Conselho Escolar e Conselho de Ciclo), o Projeto Pedagógico de
Intervenção e os instrumentos de registro da avaliação.
Esperamos que estas Diretrizes contribuam para a melhoria da educação
como proposta a ser discutida, refletida, exercitada e aperfeiçoada no cotidiano das
escolas.
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1. A CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DOS CICLOS DE FORMAÇÃO
O percurso histórico sobre a implantação dos Ciclos de Formação, no Brasil,
concretizou-se a partir da década de 80 do século XX e se estende até os dias atuais
sofrendo alterações no decorrer do movimento histórico. Porém, sua origem está ligada,
principalmente, aos países da Europa com a ideia de flexibilização do tempo escolar.
1.1. Antecedentes Históricos
Na França do século XX, a ideia de escola organizada em ciclos esteve
estreitamente ligada ao surgimento do Plano de Reforma Longevin-Wallon nos anos de
1946 e 1947. Nesta perspectiva, Mainardes (2009) afirma que apesar do referido plano
não ter sido aplicado de fato, o mesmo tornou-se referência na área da educação.
Para o referido autor, este plano ao apregoar uma reforma completa do
ensino, partindo do nível maternal ao ensino superior, garantia princípios gerais que
estavam assentados na “justiça, democratização do ensino, valorização das aptidões
individuais, desenvolvimento de uma cultura geral sólida e o aperfeiçoamento contínuo
do cidadão e do trabalhador” (p.52).
Neste plano o ensino estava organizado em ciclos assim distribuídos: 1º
ciclo, chamado de ciclo de orientação, correspondente aos alunos entre as idades de
07 a 11 anos; 2º ciclo, chamado de ciclo de determinação, que incluía alunos de 11 a
15 anos e, finalmente, o 3º ciclo, de 15 a 18 anos, chamado também de ciclo de
determinação.
Com a renovação da escola primária francesa, no ano de 1989, os ciclos
foram retomados e organizados da seguinte forma: ciclo 1, era o ciclo das primeiras
aprendizagens e absorvia alunos entre 3 a 5 anos de idade; ciclo 2, com alunos entre 5
a 8 anos de idade, chamados de ciclos das aprendizagens fundamentais e o ciclo 3,
chamado de ciclo de aprofundamento, com alunos entre as idades de 8 a 11 anos.
Tudo isso para garantir “a continuidade das aprendizagens; evitar a ruptura e
a fragmentação dos percursos escolares e respeitar os ritmos e as especificidades dos
alunos” (MAINARDES, 2009, p. 53).
Com relação à organização do ensino em ciclo no Brasil podemos afirmar
que o termo “ciclo” aparece com a Reforma Francisco Campos na década de 30 do
século XX e com a promulgação das Leis Orgânicas do Ensino da Reforma Capanema
na década de 40 do mesmo século. Em ambas as situações, as organizações do
ensino serviam para se referir a agrupamentos dos anos de estudo.
O ciclo, como forma de designar políticas de não reprovação, surgiu no ano
de 1984 com a implantação do Ciclo Básico de Alfabetização (CBA) na Rede de Ensino
do Estado de São Paulo, o qual serviu de referência para que outros Estados
implantassem o ensino em ciclos.
Muito embora já existisse a sistemática do trabalho seriado juntamente com a
criação dos grupos escolares e o sistema de promoção de alunos de uma série para a
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outra, na década de 30 essa organização trouxe em seu bojo problemas de várias
ordens, tais como: as taxas de evasão, de reprovação e falta de vagas nas escolas que
foram se aprofundando com o decorrer do tempo. A solução dos mesmos ficou por
conta de medidas de promoção de todos os alunos e promoção em massa. É
importante destacar, que tais medidas foram implementadas por autoridades do campo
educacional do Estado de São Paulo sem serem discutidas com os professores,
gestores escolares e demais membros da comunidade escolar.
Como consequência disto, a promoção em massa de todos os alunos
acabou por nivelá-los e, como compreendemos, em condições e níveis de
aprendizagem diferentes, com qualidades e poucas dificuldades para uns e com baixa
qualidade e dificuldades para outros, pois no geral, não avaliavam por critérios
claramente definidos. Adicionado a isso, o fato de não ter havido a participação dos
educadores, na construção dessa diretriz educacional, contribuiu para que tais
propostas fracassassem como ocorreu na maioria dos casos em nosso sistema
educacional brasileiro.
Mais tarde, durante a década de 1950 e 1960, essa discussão foi retomada
por políticos e educadores, desta vez tendo como foco a promoção automática. Neste
sentido, alguns intelectuais e políticos à época chamavam atenção que ao ser adotada
a promoção automática, algumas medidas deviam ser antecipadas como a formação
dos professores e a melhoria da infraestrutura das escolas. E, isso implicaria rever o
conceito de educação e torná-la um serviço obrigatório, sendo que desta forma a
promoção automática seria algo resultante da excelência da escola.
A prerrogativa da promoção automática gerou conflito de posições e de
ideias entre a classe intelectual e a classe política, sendo que os intelectuais entendiam
que tais medidas eram tentativas precárias de se resolver os problemas do ensino,
enquanto que para os políticos eram medidas ideais de superação dos índices de
reprovação e do desperdício de recursos financeiros.
Em meio a esse conflito, muitos políticos e intelectuais defendiam a ideia de
eliminar os exames e o sistema seriado de forma cuidadosa, pois primeiramente
deveriam ser criadas escolas primárias modelos com revisão do currículo, confecção de
materiais pedagógicos alternativos, programas de formação de professores e inovações
nas técnicas pedagógicas, dentre outras.
1.2. Décadas de 80 e 90: as experiências de ciclo no país
Nas décadas de 1980 e 1990, pôde-se verificar um avanço em termos de
concepção por parte dos governos das diversas esferas administrativas na organização
do ensino que, certamente, refletiu/desencadeou todo um processo de luta por uma
educação que atendesse aos interesses da classe popular.
A educação e os sistemas educacionais passaram por um processo de
reforma que se iniciou com a elaboração do Plano Decenal de Educação (1993 a 2003),
tendo como influência organismos de âmbito internacional, interessados em traçar
10
propostas em relação ao sistema educacional do país, culminando com a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei n.9394/96.
Os Estados de São Paulo, Minas Gerais e Paraná começaram a organizar o
tempo escolar através da criação dos Ciclos Básicos de Alfabetização, cuja proposta
pedagógica visava atender adequadamente à clientela diversificada de alunos nos
aspectos sociais, culturais e econômicos.
Essa proposta de organização em Ciclo Básico de Alfabetização (CBA)
trouxe “uma nova visão do papel da escola pública [...]. o Ciclo Básico de Alfabetização
marcou uma ruptura com a ideia da simples promoção automática” (MAINARDES,
2001, p. 44-45).
A ruptura ocorreu no momento em que essa forma de organização ampliou o
processo de alfabetização, ao eliminar a reprovação no final da primeira série, que
tantos prejuízos causara ao sistema, posto que, a grande quantidade de reprovados,
nesta série, impossibilitava a matrícula de novos alunos, mudando a concepção de
avaliação, que por sua vez, deveria centrar-se no processo de aprendizagem e não no
produto.
Essa contribuição do CBA possibilitou a construção e a elaboração de outras
experiências. Diante disso, assegurou-se a flexibilização curricular, o que não
significava a redução de conteúdos trabalhados nos dois primeiros anos; mas, maior
flexibilidade no agrupamento dos alunos, a busca de outras estratégias de
aprendizagem, critérios de avaliação mais compatíveis às classes heterogêneas e com
atendimento paralelo em grupos menores com dificuldades, incentivo à permanência
dos professores experientes nas séries iniciais, utilização de material pedagógico
específico, além da premissa de se levar em consideração o contexto sociocultural dos
alunos.
As cidades de São Paulo e Belo Horizonte assumiram os pressupostos dos
ciclos, caracterizando-os como Ciclos de Formação, formando grupos de alunos da
mesma faixa etária e tendo como eixo de aprendizagem a vivência sociocultural de
cada idade (infância, pré-adolescência e adolescência). Desta forma, a aprendizagem
passa a ser concebida numa perspectiva global ao resgatar uma visão integrada do
aluno nos aspectos cognitivo, afetivo e social, enfatizando a autoestima, com a
construção da identidade nos grupos de socialização, sendo os conteúdos trabalhados
de forma interdisciplinar, utilizando-se a metodologia do Tema Gerador1.
Outra experiência com os ciclos foi vivenciada no estado do Rio de Janeiro,
com a organização do chamado Bloco Único que se dividia em primeiro segmento e
1 O Tema Gerador segundo Paulo Freire envolvem as “situações-limites” que se apresentam aos homens como se
fossem determinantes históricas, esmagadoras, não lhe cabendo outra alternativa a não ser adaptar-se a esta situação.
Contudo, no momento em que este homem a percebe como uma fronteira a ser vencida, se torna mais crítico e sua
ação volta-se para transformar a realidade. A educação precisa ser problematizadora da realidade, colocar em pauta
as situações limites vivenciadas pelos homens, cuja análise crítica lhes possibilite reconhecer a interação entre as
partes, como dimensões da totalidade. FREIRE (1985).
11
segundo segmento. O primeiro segmento abrangia as classes de alfabetização e séries
iniciais: o primeiro momento correspondia aos três anos iniciais (6 a 8 anos) quando a
criança faz a aquisição dos conceitos fundamentais, e o segundo momento, com dois
anos (9 a 10 anos) quando a criança aprofunda os conhecimentos. Já o segundo
segmento (11 a 14 anos) também se dividia em dois momentos, cada um com a
duração de dois anos com aprofundamento dos conteúdos.
A fundamentação dessa organização se baseava na Psicologia com ênfase
nas características do desenvolvimento das crianças. Caso a criança demonstrasse
dificuldades na aprendizagem nos anos iniciais, isso exigiria uma mudança de
abordagem dos conteúdos e reorientação do trabalho dos professores. No quarto e
quinto anos, os alunos com dificuldades teriam atendimento paralelo e recuperação
através de cursos de férias. A avaliação dar-se-ia a partir do desempenho real e em
relação ao progresso manifestado na direção dos objetivos propostos.
Mainardes (2010) afirma que atualmente, no Brasil, a experiência do
processo de implantação dos ciclos demonstra a existência de várias formas de
organização tecidas de acordo com a particularidade de cada localidade, estado e
região, com diferentes nomenclaturas, a saber: Ciclos de Aprendizagem desenvolvidos
nas cidades de Curitiba, Recife e São Luis do Maranhão; Ciclos de Formação ou
Formação Humana vivenciado nas cidades de Porto Alegre, Belo Horizonte e Goiânia;
Regime de Progressão Continuada nas redes estaduais de ensino de São Paulo, Rio
Grande do Sul e rede municipal de ensino de São Paulo; Bloco Inicial de Alfabetização
no Distrito Federal, Florianópolis e Dourado no Mato Grosso do Sul; Ciclo Inicial do
Ensino Fundamental no Rio Branco; Ciclo Inicial de Alfabetização e Ciclo
Complementar de Alfabetização experienciado na rede estadual de ensino de Minas
Gerais e em algumas redes municipais de Minas Gerais; Ciclos de Ensino Fundamental
na cidade de Niterói; Ciclo Básico na Rede estadual de Ensino do Amazonas; Ciclo
Básico de Alfabetização nos anos iniciais na Rede Estadual de Ensino do Paraná e
Organização em ciclos em Ribeirão Preto, no estado de São Paulo.
O referido autor ressalta ainda que entre essas experiências existem
semelhanças e diferenças nos aspectos que vão desde a concepção até a forma de
operacionalizá-las, refletindo influências político-partidárias, condições financeiras,
infraestruturais, alterações nas políticas implementadas e diferença do nível de
conhecimento que as equipes de gestão educacional possuem.
Portanto, a política educacional dos ciclos está sujeita não só às diversas
concepções educacionais, como também às mudanças econômicas, sociais e políticas,
que por sua vez, estão assentadas em um projeto histórico de sociedade.
1.3. A Implantação dos Ciclos na Rede Municipal de Educação de Belém
No Município de Belém, no período de 1989 a 1992, a Rede Municipal de
Educação (RME) era composta por 43 escolas e estava organizada em séries, sendo
ofertado o ensino de 1º grau, o qual abrangia da 1ª a 8ª séries e correspondia ao
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atendimento de crianças de 7 a 14 anos de idade.
A partir de 1992, seguindo a tendência de algumas capitais do Brasil que
organizaram seu currículo em Ciclos Básicos, iniciou-se, na RME de Belém, um
processo de organização curricular de acordo com o que estava estabelecido no artigo
14 da Lei nº. 5.692/71, que deu origem à elaboração de uma proposta preliminar
intitulada: “Uma Alternativa Curricular para as Escolas Municipais” - um projeto piloto de
implantação de Ciclo Básico, cujo objetivo era a flexibilização da seriação, na busca da
redução do problema da repetência e da evasão escolar (BELÉM, 1992).
Essa proposta definiu como primeira fase as seguintes ações diagnósticas:
levantamento de dados nas escolas da rede municipal; pesquisas bibliográficas;
estudos, análise de relatórios de reuniões, de encontros de avaliações institucionais e
de aprendizagem, além das sugestões e opiniões de professores, técnicos e alunos
recolhidas em diferentes unidades escolares. Vale ressaltar que, para a realização
desse diagnóstico preliminar, foram selecionadas seis escolas municipais: E. M. “Ruy
da Silveira Brito”; E. M. “Palmira Gabriel”; E. M .”Silvio Nascimento”; E. M. “João Nelson
Ribeiro”; E. M. “Mª Heloisa de Castro” e E. M. “Josino Viana”, de diferentes áreas da
capital (BELÉM, 1992).
A segunda fase consistiu em uma operacionalização do processo de
reorganização curricular, considerando as seguintes diretrizes:
a) democratizar o ensino e requalificar a escola pública com a finalidade de
reverter o fracasso escolar;
b) resgatar a visão crítica da escola no exercício de sua função social;
c) fundamentar-se na concepção crítica de educação a partir dos teóricos:
Piaget, Emília Ferreiro, Vygotsky, Freire, Freinet e outros;
d) considerar as experiências e expectativas dos professores para a
elaboração da proposta pedagógica.
Esse processo de reorganização curricular culminou com a elaboração e
publicação do documento intitulado: “Ciclo de estudos da nova proposta curricular -
conclusões” (BELÉM , 1992, p. 8), que serviu de referência para a implementação dos
Ciclos Básicos I e II na RME e para os cursos de formação e pós-graducação para
professores, diretores e coordenadores pedagógicos.
Nesse sentido, a Educação Infantil e o ensino de 1° grau foram estruturados
em ciclos e de acordo com a faixa etária, com vistas a flexibilizar o tempo escolar que
deveria ser adequado e ampliado para a aprendizagem da criança.
A organização curricular baseava-se na concepção dos Ciclos Básicos, que
compreenderiam IV níveis. O I nível, chamado de Ciclo Básico I, contemplava o último
ano da Pré-escola e as duas primeiras séries do 1º grau (idade de 6 a 8 anos,
geralmente), prosseguindo-se para as séries subsequentes; nível II – 3ª e 4ª séries;
nível III – 5ª e 6ª séries e nível IV – 7ª e 8ª séries. Caso o aluno não obtivesse domínio
dos conteúdos curriculares ao final do ciclo, permaneceria no mesmo ciclo por mais um
ano, devendo ser acompanhado pelo professor e pela coordenação pedagógica da
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escola (BELÉM, 1992, p. 38).
O Ciclo Básico I passa inicialmente a ser implantado em três escolas da
RME: Escola Municipal Gabriel Lage, Escola Municipal Comandante Klautau e Escola
Municipal Maria Heloisa de Castro, com alunos da 1ª série.
A partir de 1993, deu-se continuidade à proposta de implantação gradativa
dos Ciclos Básicos em todas as escolas da Rede Municipal. Em 1994, o Ciclo Básico I
foi ampliado e implantado nas escolas envolvendo as 1ª e 2ª séries e o Ciclo Básico II
foi efetivado em apenas quatro escolas da rede: E. M. “Gabriel Lage”, E. M.
“Comandante Klautau”, E. M. “Maria Heloisa de Castro” e E. M. “Palmira de Carvalho”.
Em 1995, os Ciclos Básicos I e II passaram a funcionar em todas as escolas
da rede municipal que ofertavam os anos iniciais do ensino fundamental. No entanto,
até o final de 1996, os últimos anos do Ensino Fundamental, permaneceram no regime
seriado.
Segundo a proposta implementada, uma escola organizada em Ciclo Básico
deveria repensar suas funções, seus objetivos e o significado da educação escolar,
tendo o educando como centro do processo.
A reorganização curricular, mais do que uma medida administrativa,
configurou-se em uma diretriz político-pedagógica, que consistia também na revisão da
prática pedagógica, além de mudança de postura dos educadores.
A política educacional da Rede Municipal de Educação definiu como meta a
universalização da Educação Básica, que consistia no desenvolvimento de seis
programas:
O aprimoramento qualitativo da Educação Básica;
A valorização do magistério;
A ampliação e o aparelhamento da rede;
A autonomia da escola;
A instrumentalização eletrônica do setor educacional;
A modernização da gerência do sistema municipal de educação.
Para implementar tais medidas criou-se a Lei nº. 7.722, de 7 de junho de
1994, a qual dispunha sobre o Sistema Municipal de Educação, que deveria ser
operacionalizado através de dois subsistemas:
A Rede de Unidades de Educação Básica, representado pelas 47
unidades escolares;
A Rede de Unidades de Educação para o Desenvolvimento Sustentável: o
Liceu de Artes e Ofícios do Guamá, o Liceu da Escola Mestre Raimundo Cardoso, a
Escola Parque Amazônia, na Terra Firme, o Liceu de Artes e Ofício de Hotelaria da Ilha
de Cotijuba e o Centro de Referência em Educação Ambiental – Escola Bosque
Professor Eidorfe Moreira, que teria como princípio norteador o desenvolvimento
regional e a melhoria da qualidade de vida da população através do desenvolvimento
sustentável (Lei 7.747 de 02 de Janeiro de 1995).
14
Para dar suporte à implementação desta diretriz curricular foi criado o
Instituto de Educadores de Belém – ISEBE, um espaço de formação, onde era ofertado
um curso de 360 horas, cujo objetivo era propiciar aos educadores da RME a
construção de um referencial teórico com foco na pesquisa como princípio educativo, a
fim de subsidiar a prática pedagógica.
A partir de 1997, deu-se continuidade ao processo de implantação dos ciclos
III e IV, com base nos seguintes princípios: democratização do acesso e permanência
com sucesso da criança na escola; gestão democrática; qualidade social da educação e
valorização profissional dos educadores. Buscou-se, com isso, a ressignificação do
ensino em ciclos, assumindo a concepção de Ciclos de Formação.
O trabalho educativo, a partir da concepção de Ciclos de Formação,
concebeu o conhecimento como processo de construção e reconstrução, revestido de
significado, a partir das experiências do educando, sem discriminações que
prejudicassem sua autoestima e sua constituição enquanto sujeito. Nessa perspectiva,
a prática pedagógica deveria favorecer a expressão, o questionamento, a descoberta, a
construção e reconstrução do conhecimento.
Desse modo, o Sistema Municipal de Educação passou a ser organizado em
Ciclos de Formação, obedecendo a seguinte estruturação:
Ciclo de Formação I – 6, 7 e 8 anos (três anos de duração);
Ciclo de Formação II – 9 e 10 anos (dois anos de duração);
Ciclo de Formação III – 11 e 12 anos (dois anos de duração);
Ciclo de Formação IV – 13 e 14 anos (dois anos de duração).
Para a efetivação desse modelo de organização de ensino foram
estabelecidas algumas condições estruturais, a saber: a hora pedagógica2, a formação
continuada dos educadores com base no tema gerador, os conselhos de ciclos, e o
plano pedagógico de apoio.
A partir de 2004, a política educacional do Município de Belém pautou-se
noutra perspectiva, sustentada em três eixos de ação estratégica, a saber: “Expansão
da Educação Infantil”; “Educação para o Desenvolvimento Humano Sustentável” e
“Formação Continuada de Professores”.
A Expansão da Educação Infantil teve como meta a redução do déficit da
educação pré-escolar, com a criação de vagas escolares para crianças de 4 a 5 anos,
mediante a construção de escolas.
A Educação para o Desenvolvimento Humano Sustentável foi efetivada com
a reestruturação da Fundação Escola Bosque e a construção de “ecoescolas”,
2 Hora Pedagógica – HP: passou a garantir aos professores das escolas, quatro horas semanais, destinadas à sua
formação continuada, deixando a cargo da coordenação pedagógica de cada escola a tarefa de coordenar este
processo, cujo espaço deveria ser utilizado pelo professor em conjunto com outros professores e coordenação da
escola para planejar as aulas; discutir metodologias; avaliar o trabalho realizado; estudar; trocar experiências; além
de realizar cursos, oficinas, jornadas pedagógicas, fóruns e encontros promovidos pela Secretaria Municipal com
vistas a socializar as práticas pedagógicas vivenciadas. (I Conferencia Municipal de Educação, Belém, 1999, p. 240).
15
fundamentadas na inserção da dimensão ambiental na prática educativa a partir da
educação infantil, tendo em vista o ser dinâmico, transformador, experimentador e
investigativo que é a criança em desenvolvimento.
Neste sentido, a Prefeitura Municipal de Belém construiu cinco ecoescolas, a
saber: Allana de Souza Barbosa, Professora Alda Eutrópio de Souza, Professora Laís
Fontoura Aderne, Rita Nery e Paraíso. Todas elas adotaram um projeto pedagógico
baseado no conceito de múltiplas inteligências e linguagens. Além disso, fazem parte
de um programa educativo internacional, iniciado na Europa, que propõe uma
pedagogia inovadora, que busca despertar, desde cedo, uma consciência ecológica,
valorizando os recursos naturais existentes.
Os conteúdos da educação infantil são, assim, desenvolvidos através de
salas ambientes, que são espaços pedagógicos organizados com o objetivo de
estimular todas as áreas do conhecimento, de modo a oferecer formação integral à
criança. Utilizam um sistema de rodízio em que elas trocam de sala de aula duas vezes
ao dia, mantendo, no entanto, a divisão por turmas de grupos de crianças, segundo a
idade. O atendimento desses grupos é realizado por um professor de referência. Ao
todo, funcionam nessas escolas, nove salas de aula temáticas: expressão e produção,
jogos, natureza e sociedade, música, brinquedo, artes, multimeios, vivência alimentar e
integração
A Formação Continuada de Professores proposta pelo Programa ECOAR –
Elaborando Conhecimento para Aprender a Reconstruí-lo – da Secretaria Municipal de
Educação de Belém, foi iniciada em 2005, e sustenta-se em três ações a saber:
formação de professores e coordenadores pedagógicos; assessoramento à prática
docente nas escolas e avaliação da aprendizagem dos alunos, mais precisamente
alunos do Ciclo I, (os três primeiros anos) do Ensino Fundamental de 9 (nove) anos,
sendo o foco principal do Programa a aprendizagem do aluno.
Este programa consiste em garantir o direito do professor estudar, como
parte indispensável de seu desempenho durante os 200 dias letivos. De acordo com
Demo (2005), estudar não significa apenas participar de eventos. Significa
substancialmente desconstruir e reconstruir sistematicamente a trajetória formativa e
profissional ao utilizar novas metodologias de aprendizagem: pesquisa, elaboração
própria, relato de experiências, reflexão sobre a própria prática, problematização,
exercício de argumentação e contra-argumentação, debates, leitura sistemática e
verticalizada, dinâmicas, simulação e análise da prática de sala de aula, produção de
material didático próprio, estudo em equipe e individualmente.
A formação dos educadores do Ciclo II acontece através do ALFAMAT
(Alfabetização matemática, leitura e escrita) que configura-se como um programa de
formação continuada desenvolvido e aplicado pelo Núcleo de Informática Educativa
(NIED). Seu objetivo é possibilitar a vivência e discussão de metodologias para o
ensinoaprendizagem de Língua Portuguesa e Matemática. As referidas metodologias
16
são norteadas pelos descritores da Prova Brasil, instrumento de avaliação do Ministério
da Educação (MEC).
A formação de professores do CI e CII acontece em serviço, utilizando as
horas pedagógicas, com encontros mensais de aprendizagem, realizados no espaço da
escola com acompanhamento dos coordenadores pedagógicos, mediante o
desenvolvimento das ações dos Projetos Expertise em Alfabetização, Expertise em
Leitura e Produção de Textos.
Por sua vez a ETEF (Equipe Técnica do Ensino Fundamental) realiza
formações continuadas de professores dos Ciclos III e IV nas diversas áreas do
conhecimento; orientação dos projetos escolares, disciplinares e interdisciplinares, bem
como assessoramento da prática docente e o acompanhamento do desenvolvimento da
aprendizagem dos alunos, em especial, nas disciplinas de Língua Portuguesa e
Matemática.
O acompanhamento da aprendizagem visa melhorar o desempenho dos
alunos na leitura, interpretação, produção escrita e resolução de problemas
matemáticos tendo como fundamentações teóricas os gêneros textuais, resolução de
problemas, temas e descritores da Prova Brasil.
De um modo geral a ação de acompanhamento e o assessoramento
realizado pelos técnicos da Diretoria de Educação – DIED, junto às escolas, suscitou a
necessidade de elaboração de uma proposta de formação continuada aos
coordenadores e assistentes pedagógicos da RME, uma vez que as práticas
desenvolvidas no cotidiano das escolas demonstraram fragilidades na compreensão do
processo de organização do trabalho pedagógico.
Nesse sentido, desde 2010 a DIED se propôs a realizar este processo
formativo de forma articulada junto com os demais setores da SEMEC e o Conselho
Municipal de Educação, tendo como eixos centrais: formação geral, formação em
serviço nos distritos e o assessoramento permanente nas escolas, na tentativa de:
superar as fragilidades na organização do trabalho pedagógico da escola; acompanhar
o desenvolvimento do trabalho realizado; possibilitar estudos acerca das competências
da equipe de coordenadores e assistentes pedagógicos com base na legislação
vigente; instrumentalizar e fortalecer o trabalho da equipe diretiva tendo em vista a
elaboração dos planos escolares; acompanhar o trabalho do docente e da
aprendizagem discente nas escolas por meio de visitas técnicas mensais; organizar a
HP nas escolas e acompanhar o processo avaliativo (registro síntese, conselho de
ciclo); supervisionar os registros escolares; verificar o cumprimento da carga horária
letiva e a execução do PPA; criar um banco de dados para o contínuo assessoramento
e acompanhamento das escolas, tendo como público alvo das ações os diretores,
coordenadores e assistentes pedagógicos lotados na RME.
Os encontros gerais de formação das coordenações pedagógicas têm como
objetivo refletir uma temática proposta pelos próprios coordenadores das escolas da
RME.
17
Os assessoramentos realizados nas escolas da RME pelos técnicos da DIED
são organizados em cronogramas mensais, com foco determinado pela equipe e de
acordo com as necessidades surgidas.
Diante dessas experiências vivenciadas no transcorrer da trajetória
educacional na RME de Belém, as Diretrizes Curriculares se configuram em orientações
e estratégias pelas quais a escola organiza, trabalha, produz as relações do cotidiano, à
medida que traduz valores, ideias, significados, pensamentos e perspectivas de uma
determinada sociedade, constituindo-se, assim, no currículo escolar. Esse currículo
fundamenta-se em conceitos e concepções, o que procuramos esclarecer abaixo,
explicitando sobre quais fundamentos se assenta a proposta dos Ciclos de Formação
da Rede Municipal de Educação de Belém.
18
2. PRESSUPOSTOS DOS CICLOS DE FORMAÇÃO
2.1. Perspectivas do Desenvolvimento Humano3
Neste momento em que se retoma o debate sobre os Ciclos de Formação na
Rede Municipal de Ensino de Belém, é fundamental recolocar algumas questões que
são imprescindíveis para a compreensão dos mesmos. Uma delas diz respeito ao
Desenvolvimento Humano. Não é possível compreender os Ciclos de Formação sem se
ter uma visão do processo de desenvolvimento pelo qual passam todos os seres
humanos. Sem esse entendimento a ideia de ciclos fica prejudicada, uma vez que é na
articulação entre Desenvolvimento Humano e Educação que os Ciclos de Formação
ganham sentido.
Esta talvez seja uma das maiores dificuldades presentes no cotidiano das
práticas educativas, que pouco ou nunca consideram, na organização dos trabalhos e
dos saberes, as temporalidades do desenvolvimento dos educandos. Educa-se como
se todos fossem iguais, estivessem nos mesmos patamares de aprendizagem, ou
ainda, sem considerar essa aprendizagem. Por isso, faz-se necessário reconsiderar o
processo de Desenvolvimento Humano para que se possa compreender com mais
clareza a ideia dos Ciclos de Formação. A intenção aqui é iniciar o debate sobre a
compreensão de Desenvolvimento Humano, trazer à tona suas principais abordagens e
enfatizar a profunda relação que há entre este e a educação.
As teorias do Desenvolvimento Humano, ao longo do século, envidaram
esforços no sentido de tentar explicar esse intrincado processo de interação recíproca
entre o ser humano em desenvolvimento e seus múltiplos contextos. De acordo com
Krebs (s/d), até meados do século XX, os estudos estavam polarizados entre fatores
inatos, herdados geneticamente, e os fatores ambientais, de natureza física e
sociocultural. Não havia articulação entre esses diferentes saberes, resultando em
pesquisas até mesmo antagônicas. No entanto, devido à complexidade e abrangência
do fenômeno, novas abordagens foram cunhadas nos dois últimos decênios deste
século, procurando superar a dicotomia inato/adquirido ou entre os fatores físico-
biológicos e os socioculturais.
Temos, assim, entre as mais importantes abordagens do Desenvolvimento
Humano, a perspectiva psicogenética de Piaget e Henri Wallon, a sociogenética e
histórico-cultural de Vygotsky e, contemporaneamente, a dialética de Klaus Riegel, a
histórico-cultural de Jaan Valsiner e a bioecológica de Urie Bronfenbrenner.
Na teoria de Piaget, tem-se uma explicação do desenvolvimento psicológico
como uma sequência de estágios4 que vão desde a imaturidade inicial do recém-
3 A íntegra deste texto foi originalmente publicado como artigo pelo professor Dr. Iris Amaral de Sousa no livro:
FETZNER, Andréa Rosana (Org.). Ciclos em Revista: Como romper com as maneiras tradicionais de ensinar?
vol. 6. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2012. Direitos autorais cedidos à Secretaria Municipal de Educação de
Belém/PA.
19
nascido até o final da adolescência. Ele demonstrou como evolui o conhecimento desde
a infância até o conhecimento abstrato, altamente organizado, que encontramos no
adulto. O Desenvolvimento Humano, nesse sentido, se realiza em períodos que se
distinguem entre si pelo predomínio de determinadas características e possibilidades.
Wallon também procurou descrever o desenvolvimento como um processo
em estágios, centrando suas pesquisas não mais no psiquismo, mas nos diferentes
aspectos - emocional, intelectual e moral - do ser humano em processo de vir a ser.
Com ele a psicogênese passou a estar articulada à sociogênese, papel atribuído aos
fatores sociais no desenvolvimento humano.
Em Vygotsky não há mais uma descrição em estágios do desenvolvimento
porque para ele, este não segue uma sequência predeterminada e internamente
guiada, mas um percurso sociogeneticamente mediado e dependente dos processos de
aprendizagem que ocorrem no duplo e complementar plano das interações
socioeducativas e culturais organizadas. Isto quer dizer que os processos psicológicos
humanos têm sua gênese no social, ou seja, cada indivíduo se faz na relação e
interação com seu entorno social e com o outro, pela apropriação dos instrumentos de
mediação simbólica construídos pela cultura a que pertence.
Neste sentido, os processos psicológicos sofrem um processo de
transposição do social para o individual, isto é, do plano interpsicológico (das relações
com os demais), para o plano intrapsicológico (do indivíduo). Contudo, esse movimento
de transposição não é algo mecânico, automático, mas se dá através de relações
complexas, dinâmicas e dialéticas (afirmação-negação, continuidade-descontinuidade,
estabilidade-mudança), pois os indivíduos são sujeitos ativos nessas relações e
interações com o outro e com seu meio sociocultural. Essa transposição consiste,
assim, num lento processo que ocorre através das interações educativas e
culturalmente organizadas, nas quais os indivíduos vão ganhando competência e
autonomia progressiva, de maneira que começam sendo apoiados, guiados e
conduzidos, (relação adulto-criança), para pouco a pouco serem capazes de fazer as
coisas de forma autônoma e independente (COLL; MARCHESI; PALACIOS, 2004).
Numa visão sintética podemos dizer que os seres humanos se fazem, se
criam e recriam constantemente por intermédio das interações e relações que
estabelecem uns com os outros e com o ambiente ao longo de toda a vida. Esses
outros são, habitualmente, os pais, irmãos, avós, babás, educadores, amigos etc. No
caso da criança, o outro, além de inseri-la em determinados contextos ou posições
sociais, é intérprete, mediador do mundo para ela e dela para o mundo, influenciando
em sua socialização e desenvolvimento. Nesse processo de fazer-se com os outros, as
ações, interações e relações partilhadas e interdependentes, que são
permanentemente co-construídas e articuladas pelas e entre as pessoas, vão
delineando, assim, papéis e contrapapéis que são apropriados, assumidos, negados
4 Esses estágios são: sensório-motor, pré-operatório, operações concretas e operações formais.
20
e/ou recriados por cada indivíduo ao longo de sua existência. Desse modo, o ser
humano imerso que está no mundo, vai se fazendo em contínua construção de
significados da realidade e de si mesmo enquanto pessoa através do processo de
articulação entre imitação de modelos (fusão, repetição) e o confronto entre eles
(diferenciação, criação), interligados às necessidades, aos sentidos e às
representações sociais.
Nessa complexa rede de significações, o conjunto de elementos orgânicos,
físicos, sociais, históricos, econômicos, políticos e ideológicos em interação dialética
delimitam, estruturam, marcam e transformam as pessoas e a própria rede de
significações em contínua mutação. “Constrói-se, dessa forma, a consciência individual,
formada pela impregnação da pessoa pelo conteúdo semiótico historicamente criado
por grupos sociais organizados, com os quais se relaciona” (ROSSETTI-FERREIRA;
AMORIM; SILVA, 2000, p. 15). Um dos elementos que se destaca nesse complexo
fluxo de interinfluência mútua entre componentes individuais e socioculturais é a
linguagem, que assume papel de mediação cultural e socio-histórica. Assim, em cada
cultura, todos os sujeitos participam ativamente na co-construção uns dos outros.
A partir da década de 1980, novas perspectivas sobre o Desenvolvimento
Humano emergiram, procurando integrar as ideias de Piaget, Wallon e Vygotsky, ou
ainda, aprofundando os pressupostos vygotskianos, articulando-os a outras áreas do
conhecimento.
Essas abordagens abandonaram a compreensão de desenvolvimento como
algo sempre ascendente. Adotou-se a noção epigenética, na qual cada indivíduo tem
seu desenvolvimento delineado por inúmeras possibilidades vinculadas ao tempo, ao
contexto e aos processos que vão se complexificando ao longo da vida, ou seja, à
medida que o indivíduo interage com o ambiente, busca coerência entre suas pré-
disposições genéticas e os padrões socioculturais estabelecidos, ele se constrói e, ao
mesmo tempo, torna-se cada vez mais complexo. Nessa trajetória, cada momento gera
possibilidades e limites para o próximo, num ciclo dinâmico, contínuo, em que a
dialética estabilidade-mudança vai definindo os diferentes estágios de mudança de
acordo com a faixa etária do indivíduo e com a estrutura sociocultural da qual faz parte.
Os estudos de Krebs (s/d) nos permitem compreender algumas dessas
principais teorias contemporâneas do Desenvolvimento Humano. Tendo como suporte
os princípios da dialética de Hegel, Klaus Riegel propõe que os eventos que contribuem
efetivamente para o desenvolvimento da criança possuem quatro dimensões, duas de
natureza interna: a interno-biológica e individual-psicológica, e duas de natureza
externa: cultural-sociológica e externo-física. Essas dimensões se articulam
dialeticamente compondo o modelo conceitual da teoria, onde conflito e contradição são
tratados com a mesma importância que a atenção e estabilização (preconizados por
Piaget) na análise do desenvolvimento. Já Valsiner realiza um esforço para integrar as
ideias de Lewin, Vygotsky e Piaget com algumas noções da biologia evolucionista e
termodinâmica contemporânea. Adotando um interacionismo dinâmico estruturalista,
21
enfatiza que a criança e seu ambiente (ambos estruturalmente organizados) não são
nem estáticos nem imutáveis, mas estão em permanente transformação, tanto
microgeneticamente quanto ontogeneticamente. Desse modo, o desenvolvimento da
criança é definido no contexto de suas relações com o ambiente cultural e fisicamente
estruturado em que suas ações sobre o ambiente são conduzidas pelo outro. Em seu
quadro teórico, Valsiner delimita diferentes áreas de um campo (zona) que canalizam o
desenvolvimento de um organismo. Estabelece, assim, três tipos de zonas. A zona de
movimento livre (ZML), a zona das ações promovidas (ZAP) e a zona de
desenvolvimento proximal (ZDP).
A zona de movimento livre (ZML) caracteriza-se por uma estrutura funcional
que é constantemente criada e recriada na medida em que a criança e seu cuidador
mudam de um ambiente para outro ou de um conjunto de objetivos para alcançar outros
fins, ou seja, dada a mudança de objetivos e condições, a ZML é constantemente
reorganizada. Sendo dinâmica e episódica, a ZML possui quatro propriedades: é
sempre baseada nos relacionamentos da criança com seu ambiente; nos significados
dos diferentes ambientes para o “outro social” (pais irmãos, professores etc.);
organizada com base no entendimento que os outros têm sobre o que a criança pode
ou não fazer; é reconstruída quando o adulto e a criança entram em novo ambiente.
Como um meio e não um fim em si mesmo, quando se torna obsoleta, é substituída por
outra: a zona da ação promovida (ZAP).
A zona de ação promovida (ZAP) é caracterizada pela promoção de
aquisições de novas habilidades, ou seja, envolve um conjunto de atividades, objetos
ou áreas do ambiente onde as ações da criança são promovidas, e que os outros
devem se envolver, direcionando a criança para aqueles objetos ou atividades que
consideram fundamentais para o seu desenvolvimento. Ela é, assim, uma zona
inclusiva, marcada pelo esforço dirigido das pessoas em torno da criança para orientar
suas ações numa direção.
A complexidade das ZML e ZAP depende do contexto cultural em que se
está inserido, isto é, o significado que a cultura atribui a objetos e atividades são
essenciais para a definição da ZML e ZAP, que são interdependentes. Já a zona de
desenvolvimento proximal (ZDP), marcada pela limitação seletiva da variabilidade,
envolve um conjunto de ações que a criança pode desempenhar quando auxiliada pelo
outro. Pode-se afirmar, de modo geral, que a teoria de Valsiner tem as características
de um sistema dinâmico, centrado na compreensão da interação da criança e seus
contextos, sem estruturar o desenvolvimento em estágios.
A perspectiva bioecológica de Bronfenbrenner também fundamentada em
Lewin, Piaget e Vygotsky, destaca que o Desenvolvimento Humano é algo contínuo que
se faz na interface entre aspectos biológicos, psicológicos e sociais, ou seja, um
conjunto de processos através dos quais as propriedades do indivíduo e do ambiente
interagem e produzem continuidades e mudanças nas características da pessoa e no
seu percurso de vida. Desse modo, o desenvolvimento se dá pela acomodação
22
progressiva, mútua entre o ser humano ativo em desenvolvimento e as propriedades
mutantes dos ambientes em que a pessoa vive, sendo esse processo afetado pelos
contextos mais amplos em contínua transformação em que os ambientes estão
inseridos. Todas as características individuais só podem ser compreendidas assim,
nessa relação, interação bioecológica. Propõe, então, um modelo explicativo sistêmico,
composto por cinco subsistemas socialmente organizados que apoiam e orientam o
Desenvolvimento Humano.
O microssistema é a dimensão mais imediata em que a pessoa vive,
participa, interage ativamente, face a face: família, creche, escola. O mesossistema
compreende a relação entre os microssistemas (variedade de ambientes nos quais a
pessoa em desenvolvimento interage): relação família-escola-trabalho. O exossistema é
composto por ambientes ou contextos nos quais a pessoa não participa ou esteja
diretamente relacionada, mas que influenciam, afetam de forma indireta: instituições da
sociedade. O macrossistema diz respeito a um conjunto de valores, crenças, ideologias,
religiões que sustentam as diferentes culturas, subculturas presentes no cotidiano, e
que geram, no indivíduo, o sentimento de pertença a um determinado grupo. Envolve o
contexto mais amplo em que o micro, o meso e o exossistema estão inseridos: sistemas
políticos, sociais e econômicos. Por último, temos o cronossistema que é a dimensão
temporal das mudanças universais, dos acontecimentos históricos.
Esses cinco subsistemas encontram-se dinamicamente inter-relacionados,
uns sustentando e transformando os outros. Esse modelo por ser caracterizado como
processo-pessoa-contexto-tempo, ou seja, integra as características biológicas e sociais
(pessoa), as mudanças que ocorrem ao longo da vida (processo), as características
físicas, políticas, econômicas, culturais etc. dos ambientes (contextos) e os eventos de
ordem biológica e sociocultural que tiveram impacto na vida da pessoa (tempo).
Além dessas perspectivas, temos ainda a teoria das inteligências múltiplas
de Howard Gardner que começou a emergir na psicologia do desenvolvimento. Ela
apresenta a inteligência humana como um construto multidimensional, em que cada
dimensão é constituída de uma modalidade de inteligência. Temos assim, a verbal-
linguística, a lógico-matemática, a espacial, a cinestésico-corporal, a musical, e a
pessoal, dividida entre interpessoal e intrapessoal.
2.2. Desenvolvimento Humano e Ciclos de Formação
Como podemos ver todas essas perspectivas trouxeram novas contribuições
para o entendimento do ser humano como um ser integral em seu processo de
aprendizagem. Não é mais possível, hoje, sustentar que a criança é como uma página
em branco a ser escrita pelos adultos (empirismo); que ela já traz inata conduta, ideias
que serão desenvolvidas em seu processo de maturação pela educação (inatismo);
nem que ela é produto de estímulo-resposta em sua relação com o meio
(behaviorismo). A criança é, pois, um ser humano complexo, ativo que interage com as
23
pessoas e o ambiente e, nessa interação, que é contraditória, conflituosa e dinâmica,
examina, seleciona, recorta, apreende aquilo que atende as suas necessidades, a partir
daquilo que o ambiente cultural e sua biologia permitem que o faça, refazendo-se
permanentemente. Ao reproduzir gestos, posturas e, depois, palavras, toma para si os
recursos mais avançados que o adulto dispõe. Ao internalizar essa relação social,
estabelece nova forma de mediação para o seu próprio comportamento via processos
cognitivo-linguísticos. E esses processos não estão restritos à infância, mas presentes
ao longo de toda a vida, do nascimento à velhice.
O Desenvolvimento Humano se faz, assim, na interface entre um conjunto de
processos, ciclos, estágios através dos quais as propriedades do indivíduo e do
ambiente interagem e produzem continuidades e mudanças nas características da
pessoa e no seu percurso de vida.
Todavia, esse processo não é algo fragmentado, estável, linear, harmonioso
e unidimensional, mas dinâmico, complexo, articulado, contraditório e multidimensional
em que fatores intra e extraorgânicos - biológicos, psicológicos, ambientais, históricos e
sociais em interinfluência mútua e em transformações sucessivas -, marcam a trajetória
de cada pessoa. Podemos afirmar, então, que o Desenvolvimento Humano é um
processo de construção contínua, complexa, multidirecional e multidimensional que
ocorre desde o nascimento até a morte, em que as inúmeras transformações por que
passam os indivíduos são resultantes da dialética entre biologia e cultura.
Compreender, hoje, esse dinâmico processo, exige-nos recorrer a outros
campos do saber, além da Psicologia. É preciso articular um conjunto de estudos,
englobando a Biologia, a Psicologia, a Sociologia, a Antropologia, entre outros, de
modo interdisciplinar, para que se possa ter uma visão ampliada, integrada da trajetória
de vida de cada indivíduo, ou seja, requer uma perspectiva sistêmica, totalizante do
desenvolvimento, capaz de integrar os múltiplos subsistemas (cognitivo, emocional,
fisiológico, morfológico, conceitual etc.) do indivíduo.
Esta compreensão do Desenvolvimento Humano enfatiza que a educação se
faz na articulação de uma multiplicidade de processos formadores dentro e fora da
escola, internos e externos ao indivíduo, através dos quais, nós nos constituímos,
socializamos, aprendemos, tornamo-nos sociais, culturais e humanos.
Nessa perspectiva, os Ciclos de Formação são pensados como uma forma
de organizar os processos educativos, considerando as temporalidades do
Desenvolvimento Humano com suas especificidades e exigências. Seu eixo
estruturante são as idades da vida, a formação humana em seus tempos-ciclos da
infância, da adolescência, da juventude e da idade adulta. Os Ciclos de Formação não
podem, portanto, ser visualizados como “[...] um amontoado de séries, para acabar com
a retenção, acelerar o fluxo, ou acabar com a defasagem idade-série em nome do
respeito à diversidade de ritmos de aprendizagem, com processos mais leves de
avaliação contínua, ao longo do ciclo” (ARROYO, 1999, p. 10).
24
Os Ciclos de Formação são, assim, “[...] uma procura, nada fácil, de
organizar o trabalho, os tempos e espaços, os saberes, as experiências de socialização
da maneira mais respeitosa para com as temporalidades do desenvolvimento humano”
(ARROYO, 1999, p. 11). Sua lógica não pode ser da seletividade e da exclusão, mas da
inclusão, do respeito aos saberes dos educandos, do outro, ou, como nos diz Paulo
Freire, ao “saber de experiência feito”. Aqui, o trabalho educativo deve estar centrado
no educando, no seu desenvolvimento, na sua aprendizagem. É preciso perceber o
educando como um ser interativo que sofre influência do contexto, mas que tem
potencial também para modificá-lo.
Nessa visão de Desenvolvimento Humano, o conhecimento é compreendido
como uma construção, reconstrução permanente, cujos sujeitos participam ativamente
porque é mediação, construto sociocultural dinâmico, do qual se apropriam em
interação. Não é algo meramente transmissivo, transferido, estanque, linear, pronto,
acabado, dado. A aprendizagem, assim, é socialização de aprendizados que fizemos e
fazemos; que a sociedade construiu; que nós construímos como indivíduos e como
coletivos: no convívio com os pais, mães, irmãos, avós, parentes, na escola, com os
amigos, nos movimentos sociais etc. Não pode ser vista como ensino cognitivo, mas um
processo de construção de práticas sociais e culturais envolvendo o corpo, a mente, a
experiência, o sentimento, a emoção, os valores, o ambiente, o contexto, enfim, a
totalidade do ser “aprendente”. A cultura é, pois, constitutiva dos processos de
desenvolvimento e de aprendizagem.
Esta é a concepção que fundamenta os Ciclos de Formação e que se espera
seja resgatada na rede Municipal de Ensino neste processo de reorientação curricular.
Sem ela, os Ciclos se deformam e não superam a velha lógica seriada.
Enquanto a escola tradicional sustenta-se no “conteudismo”, na certeza
científica e na passividade do aprendiz, o trabalho nos Ciclos de Formação proposto
para RME de Belém mobiliza a escola para os princípios de totalidade entre conteúdo e
forma, de incompletude do conhecimento científico, de participação dialógica na
aprendizagem, de transformação e intervenção democrática. A prática pedagógica
deverá avançar para a compreensão dos processos de desenvolvimento humano e em
direção à escola enquanto espaço-tempo sociocultural de formação.
Desse modo, a RME de Belém deve considerar os aspectos formativos como
os mais relevantes e que a informação só é educativa quando processada e analisada
criticamente. Portanto, ao invés de definir conteúdos curriculares fechados, define
rumos, posturas e caminhos metodológicos que passam a dar suporte ao conhecimento
sistematizado que a escola veicula. Assim, os referenciais curriculares devem
comportar a noção de experiência do passado e a intervenção transformadora do
presente.
Porém, não apenas o Desenvolvimento Humano é pressuposto dos Ciclos.
Há, além dele, outros fatores que devem ser considerados no processo de construção
25
curricular dos ciclos de formação, a saber: a inclusão social, a interdisciplinaridade e a
educação ambiental.
2.3. Inclusão Social
Falar de inclusão social é falar das possibilidades que todo ser humano
dever ter para desenvolver-se como tal; é falar da exclusão social que nos afeta direta
ou indiretamente e provoca entre nós segregações, discriminações, preconceitos, uma
vez que a desigualdade social nos atinge não apenas economicamente, mas também
corporalmente. Por outro lado, temos que considerar que somos diferentes uns dos
outros e devemos aprender a conviver com essas diferenças pessoais, sem que
ninguém se envergonhe delas ou se sinta menos gente que outros. Como nos diz
Boaventura de Sousa Santos “[...] temos o direito a ser iguais sempre que a diferença
nos inferioriza; temos o direito a ser diferentes sempre que a igualdade nos
descaracteriza”5.
Inclusão é, pois, um processo que busca transformação das relações sociais,
garantia de direitos e oportunidades iguais para todos, democratização das relações de
poder, participação social, respeito às diferenças e reconhecimento da diversidade
sociocultural do ser humano.
Na educação, a inclusão ganha sentido de luta pela redução de todo e
qualquer tipo de barreira ou exclusão que venha a impedir os educandos de se
desenvolverem plenamente, maximizando sua participação, independente de sua
origem étnica, racial, socioeconômica ou religiosa. E isso não apenas dos alunos ditos
“especiais”, mas de todos. Nesse sentido, ela supõe uma mudança de paradigma,
reformulação de nosso sistema de educação, uma vez que nosso modelo atual de
ensino ainda reproduz a lógica da exclusão em que o caráter seletivo do currículo
escolar disciplinar acaba funcionando como homogeneizador do aluno “padrão”. Nele,
persiste uma concepção de conhecimento academicista e conteudista que classifica e
exclui os educandos, principalmente os mais necessitados pessoal e economicamente.
Esta concepção cartesiana, positivista do currículo acaba por banalizar as
desigualdades sociais, não considerar a diversidade sociocultural nem as diferenças
individuais. Como nos explica Montoan (2003, p. 19)
Os sistemas escolares também estão montados a partir de um pensamento que recorta a realidade, que permite dividir os alunos em normais e deficientes, as modalidades de ensino em regular e especial, os professores em especialistas nesta e naquela manifestação das diferenças. A lógica dessa organização é marcada por uma visão determinista, mecanicista, formalista, reducionista, própria do pensamento científico moderno que ignora o subjetivo, o afetivo, o
5 Palestra proferida no VII Congresso Brasileiro de Sociologia, realizado no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais
da Universidade Federal do Rio de Janeiro, de 4 a 6 de setembro de 1995.
26
criador, sem os quais não conseguimos romper com o velho modelo escolar para produzir a reviravolta que a inclusão impõe.
Uma escola organizada em ciclos de formação que quer ser séria,
competente e inclusiva não pode aceitar essa lógica ou reforçar a desigualdade que
exclui e descaracteriza os sujeitos.
2.3.1 - Por uma Educação Inclusiva
A realidade social, marcada pelas desigualdades no exercício da cidadania,
tem reflexos na educação e faz emergir o debate acerca da educação que queremos. A
partir da ideia da educação inclusiva como um novo modo de pensar a educação,
coloca-se o desafio de repensar a escola, planejá-la para que se torne efetivamente
aberta às diferenças.
O debate sobre as diferenças e a inclusão das pessoas com deficiência
ganhou bastante destaque a partir da década de 1990, particularmente com a resolução
das Nações Unidas intitulada “Declaração de Salamanca”, em 1994, que
institucionalizou princípios e políticas públicas direcionados à educação especial. A
partir dessa resolução, criou-se um movimento mundial de desenvolvimento de
sistemas educacionais inclusivos com a defesa de uma Educação para Todos.
Trata-se de uma mudança histórica de apropriação de um conjunto de
saberes teóricos na constituição de um discurso sobre o corpo da pessoa deficiente e
sobre seus espaços e formas de adquirir conhecimentos. Dentre essas mudanças, está
a adoção da escola construtiva que vê a deficiência como um processo social em
confronto com as designações e estereótipos atribuídos por qualquer diferença física,
sensorial ou cognitiva a uma pessoa ou comunidade.
Em nosso País, a educação inclusiva é pressuposto da política educacional,
inspirada na concepção de direitos humanos que clama por mudanças no sistema
educacional em todos os níveis e orienta para a garantia da equidade no processo
educacional, fazendo avançar a responsabilidade da escola com a promoção da
cidadania.
Em consonância com as diretrizes e resoluções nacionais e internacionais, a
SEMEC, enquanto direcionadora da política pública de educação na Rede Municipal de
Ensino em Belém, defende o acesso de oportunidades de aprendizagens, promovendo
mudanças arquitetônicas, comunicacionais, atitudinais e curriculares que beneficiem
grupos historicamente excluídos do processo educacional. Reconhecendo como prova
inequívoca o respeito pelo tempo, pelo ritmo e pela pluralidade humana, comungando
com o princípio da igualdade de oportunidades e com o tratamento humano igualitário,
reafirma, através de sua organização escolar em ciclos de formação, que é possível
ocorrer aprendizagens de todas as crianças, jovens e adultos na Rede Municipal de
Ensino Público de Belém.
Uma escola inclusiva é uma escola preparada para identificar e eliminar as
barreiras que impedem o acesso dos alunos ao conhecimento, efetivando mudanças
27
que se iniciam na construção do projeto político pedagógico e na gestão participativa.
Trabalha a inclusão como um processo que deve fundamentar-se em fatores como: a
presença do aluno na escola enquanto sujeito de direito, junto aos demais colegas da
sua faixa etária e na sua comunidade; a participação, o relacionamento livre de
preconceito e discriminação, em ambiente acessível para que realmente todos
participem das atividades escolares, com um currículo aberto e flexível; e o respeito às
diferentes formas de aprender, o que significa que as aprendizagens devem estar em
função de que: a) o falar e o escutar, assim como o escrever e o ler, desenvolvem-se de
maneira paralela e em inter-relação, não de forma sequencial e nem a partir da
aquisição prévia de fonemas; b) o desenho, a dança, a dramatização, os gestos, a
língua de sinais e quaisquer outras formas de expressão e recepção carreiam sentidos,
da mesma forma que o oralizar e o escrever no papel: todas essas modalidades são
instrumentos semióticos de interação social; c) os objetos de ensino devem partir de
práticas comunicativas e da funcionalidade dos textos que podem ocorrer não apenas
no papel, mas também no computador ou outras tecnologias assistivas, disponibilizadas
para os alunos em sala de aula.
Desse modo, a escola que se quer inclusiva não pode apagar as diferenças
individuais, ao contrário, trabalha com elas, possibilita a convivência dessas diferenças,
reeduca os educandos para que se reconheçam iguais, apesar de diferentes e nunca
inferiores uns aos outros; valoriza a multiplicidade humana visando materializar o
caráter democrático da educação, acompanhando as diferenças sociais, econômicas,
geográficas, linguísticas, culturais e individuais.
Blanco (2002) nos explica que os diversos grupos sociais, étnicos e culturais
dispõem de normas, valores, crenças e comportamentos distintos que, em geral, não
fazem parte da cultura das escolas. Por isso, é compromisso a reconstrução crítica do
papel da escola, do fazer pedagógico, da participação efetiva das famílias e,
principalmente, das diretrizes curriculares acolhedoras de todos os alunos,
independente de suas condições pessoais, culturais ou sociais.
Nessa perspectiva, a inclusão desafia a cada momento a construção de uma
escola democrática e inclusiva, bem como exige que os sistemas de ensino sejam
fomentadores de políticas públicas inclusivas. Nesse sentido, fruto das necessidades,
desejos, esperanças, vontades, lutas e desafios, foi implantado o Centro de
Atendimento Educacional Especializado Gabriel Lima Mendes – CAEE, em 25 de
janeiro de 2006, como possibilidade concreta de ser uma referência às escolas da Rede
Municipal para viabilizar a inclusão educacional, com a seriedade que os princípios do
Desenvolvimento e dos Direitos Humanos impõem aos sistemas de ensino. Seu
principal objetivo é garantir o acesso à aprendizagem das pessoas deficientes, que a
cada ano se amplia, por meio do atendimento educacional especializado nas Salas de
Recursos Multifuncionais (SRM).
A SRM tem como objetivo prestar atendimento educacional especializado
aos alunos, público alvo da Educação Inclusiva, efetivamente matriculados em classe
28
comum do ensino regular. O trabalho é desenvolvido obedecendo às leis que garantem
o Atendimento Educacional Especializado — AEE à pessoa com deficiência.
Portanto, o CAEE se constitui como ambiente pedagógico articulador de
referências, práticas e princípios, responsável em fomentar nas escolas, para além do
objetivo técnico e instrumental, a inclusão educacional, baseado na perspectiva do
direito e da diversidade humana.
2.3.2 - As Relações Etnicorraciais
Uma escola que busca ser inclusiva não pode deixar de considerar que as
práticas educacionais revelam relações de poder, que na maioria das vezes
desconsideram a diversidade sociocultural, impondo valores da cultura hegemônica em
detrimento de outras. Isto, infelizmente, ainda marca o presente de nosso país, onde as
culturas afroindígenas, que estão na origem de nossa formação social, são banalizadas
ou desrespeitadas no interior das escolas.
Verifica-se, por exemplo, que a desigualdade de oportunidades que a
população negra e indígena brasileiras enfrentam no âmbito da educação é
profundamente percebida no cotidiano escolar, o que interfere no direito de aprender de
crianças, adolescentes, jovens e adultos.
Estudos realizados no campo das relações raciais e educação explicitam que
as populações afrodescendentes e indígenas estão entre aquelas que mais enfrentam
cotidianamente as diferentes facetas do preconceito, do racismo e da discriminação que
marcam, nem sempre silenciosamente, a sociedade brasileira.
Sabemos que a população de nosso país foi formada a partir da
miscigenação de vários grupos humanos: brancos, negros e índios, fundamentalmente,
e que estabeleceram trocas materiais, culturais e genéticas que resultou em um povo
diversificado em seus mais variados aspectos. Apesar da miscigenação e da troca ser
o componente original da formação da população e da cultura brasileira, estas trocas e
contribuições se estabeleceram de forma desigual devido a interesses políticos,
econômicos e religiosos dos colonizadores europeus, que consideravam sua cultura
como referencial daquilo que era civilizado e desenvolvido.
A este tipo de visão sócio-político-econômica e cultural, imposta em nossa
sociedade pelos europeus, chamamos de visão eurocêntrica do mundo. Visão esta que
se tornou parâmetro para as demais culturas, desconstruindo identidades, gerando
atitudes de preconceito e discriminação com os povos indígenas que aqui se
encontravam há centenas de anos e que viram sua população dizimada e sua cultura
desintegrada, provocando a extinção de várias etnias e a marginalização das
sobreviventes, que sofrem até o presente com os conflitos travados com os
interessados em manter seus privilégios econômicos, políticos e religiosos, invadindo
suas terras, destruindo suas culturas e suas vidas com projetos que nunca atendem
suas necessidades e bem-estar.
29
Assim como os povos indígenas, os africanos e seus descendentes também
passaram pela mesma situação de marginalização. O caráter eurocêntrico imposto fez
com que os africanos e consequentemente seus descendentes fossem alijados do
processo de desenvolvimento social e cultural do país, embora tenham dado
significativa contribuição em todas as áreas, principalmente na econômica, motivo pela
qual os africanos foram trazidos para o nosso território. O resultado desta visão
equivocada é, ainda hoje, o preconceito e a discriminação estabelecidos, embora de
maneira velada contra a cultura afro-brasileira, tornando-a desconhecida ou vista como
exótica e sendo permeada de concepções distorcidas.
Embora se configurem como contingente populacional que corresponde a
aproximadamente metade da população brasileira, os afrodescendentes não têm seus
direitos de cidadãos assegurados, sobrevivendo às dificuldades ocasionadas pela
precariedade dos serviços básicos de saúde, segurança, saneamento, educação e
lazer. Sofreram e sofrem a carga do preconceito e discriminação originados no
processo civilizador do Brasil.
Na educação isso se manifesta como desigualdade de oportunidades aos
afro-indígenas ao pleno direito de aprender que possuem. O acesso às séries iniciais
do Ensino Fundamental, praticamente universalizado no país, não se concretiza, para
índios e negros, nas séries finais da educação básica. Há evidências de que processos
discriminatórios operam nos sistemas de ensino, penalizando crianças, adolescentes,
jovens e adultos, levando-os à evasão e ao fracasso, resultando no reduzido número
deles, que chegam ao ensino superior.
Sabe-se, hoje, que há correlação entre pertencimento etnicorracial e sucesso
escolar, indicando, portanto, que é necessária a firme determinação para que a
diversidade cultural brasileira passe a integrar o ideário educacional não como um
problema, mas como um rico acervo de valores, posturas e práticas que devem
conduzir ao melhor acolhimento e maior valorização dessa diversidade no ambiente
escolar.
Neste sentido, o governo brasileiro, no intuito de romper com as exclusões a
que afrodescendentes e indígenas vêm sofrendo, instituiu a Lei 10.639/2003 (alterada
depois pela 11.645/2008), orientando os sistemas de ensino e as instituições dedicadas
à educação, a voltarem cuidadosa atenção à incorporação da diversidade etnicorracial
da sociedade brasileira nas práticas escolares.
Ciente desses desafios, o Conselho Nacional de Educação, já em 2004,
elaborou parecer CNE/CP nº 3 (10/03/2004) e emitiu resolução CNE/CP nº 1
(17/06/2004), homologada pelo Ministro da Educação, estabelecendo as Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Etnicorraciais.
No que tange ao papel do Governo Municipal, cabe cumprir os dispositivos
legais, que recomendam entre outras coisas, que as escolas reformulem seu Projeto
Político Pedagógico adequando-o às Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
das Relações Etnicorraciais; implementem ações de combate ao racismo, preconceito e
30
discriminações em suas dependências e busquem construir projetos pedagógicos
interdisciplinares que abordem e valorizem a diversidade etnicorracial brasileira.
Portanto, cabe ao Sistema Municipal de Educação incorporar em seu
currículo a diversidade étnico-racial como elemento essencial de um Ensino
Fundamental inclusivo.
2.4. Educação Ambiental
Uma escola que tenha por fundamento o Desenvolvimento Humano não
pode se compreender fora do debate sobre os problemas ambientais atuais. Ao
contrário, deve entender que os problemas ambientais são também obstáculos ao pleno
Desenvolvimento do ser Humano. Por isso, precisa fazer disso pauta de sua atuação no
seu cotidiano, de modo a criar uma nova cultura, onde a natureza não seja mais vista
unicamente como matéria-prima a serviço do capital, mas que se compreenda como
parte essencial de nossa existência.
As pesquisas recentes nos têm demonstrado cabalmente que o planeta
Terra é nossa casa, e como tal não há outro habitat humano igual. Desse modo, é
urgente a necessidade de transformação da concepção antropocêntrica, racionalista,
reducionista que estabeleceu a natureza meramente como objeto de exploração e
consumo, desconectou-a da existência humana, promovendo, assim, degradação
ambiental, desigualdade social e cegueira existencial.
Hoje, mais do que em outro período da história, a destruição do planeta é
algo visível e preocupante. Inclusive começamos a sofrer suas consequências com o
aquecimento global. Por isso, precisamos enfrentar os problemas ambientais e os
desafios que eles nos impõem, mudando as práticas existentes e possibilitando a
formação de sujeitos sociais mais conscientes, num processo educativo articulado e
comprometido com a sustentabilidade e a participação, baseado numa lógica que
privilegia o diálogo entre as diferentes áreas do conhecimento.
Vale enfatizar que na Educação Ambiental (AE) existem múltiplas e
diferentes ideias, correntes e manifestações. Portanto, não é possível considerá-la no
singular, como um único modelo alternativo de educação que complemente uma
educação convencional. Desse modo, entende-se que a Educação Ambiental (EA) é
uma forma abrangente de educação que se propõe a atingir todos os cidadãos,
inserindo o meio ambiente em suas dimensões física, química, biológica, econômica,
política e cultural em todas as disciplinas e em todos os veículos de transmissão de
conhecimentos. É um processo participativo, onde o educando deve ser o principal
sujeito do processo de ensinoaprendizagem, com participação ativa no diagnóstico dos
problemas ambientais e busca de soluções, tornando-se um agente transformador,
através de uma nova conduta socioambiental, ética e política. Afinal, a EA não é neutra,
mas uma ação baseada em valores para a transformação social.
31
2.4.1 - Breve histórico da Educação Ambiental no Brasil
A preocupação oficial com a necessidade de um trabalho educativo visando
sensibilizar as pessoas para as questões ambientais evidenciou-se em 1972, na
Conferência sobre Meio Ambiente Humano, realizada pela Organização das Nações
Unidas (ONU), em Estocolmo. Esta conferência gerou a Declaração sobre o Meio
Ambiente Humano e teve como objetivo chamar a atenção dos governos para a adoção
de novas políticas ambientais, entre elas um programa de educação ambiental, com o
objetivo de educar o cidadão para a compreensão e o combate à crise ambiental no
mundo.
No ano de 1977, em Tbilisi, na Geórgia (URSS), foi realizada a Primeira
Conferência sobre Educação Ambiental, a qual recomendou que a prática da EA,
considere todos os aspectos que compõem a questão, ou seja, aspectos econômicos,
sociais, científicos, tecnológicos, éticos, culturais e ecológicos, numa perspectiva inter e
multidisciplinar. Essa Conferência indicou que a AE deveria se efetivar pela educação
formal e informal, atingindo todas as faixas etárias, e cada país implementasse sua
política nacional de educação ambiental.
No Brasil, o processo de institucionalização da EA iniciou em 1973 com a
criação da Secretaria Especial do Meio Ambiente (SEMA). Um elemento de grande
importância para a EA brasileira foi a Política Nacional de Meio Ambiente (PNMA, Lei n0
6.938/81) que estabeleceu, no âmbito legislativo, a necessidade de inclusão da EA em
todos os níveis de ensino, incluindo a educação da comunidade, para a participação
ativa na defesa do meio ambiente. Essa recomendação é reforçada pela Constituição
Federal (1988), no artigo 225, inciso VI que estabelece a promoção da “educação
ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação
do meioambiente”.
No ano de 1992, realizou-se, na cidade do Rio de Janeiro, a Conferência de
Cúpula da Terra – Rio 92. Durante esse evento foi produzida a Carta Brasileira para a
Educação Ambiental, reconhecendo ser a EA um dos instrumentos mais importantes
para viabilizar a sustentabilidade como estratégia de sobrevivência do planeta e,
consequentemente, de melhoria da qualidade de vida humana. Devido aos
compromissos assumidos durante a Rio-92, o governo brasileiro criou o Programa
Nacional de Educação Ambiental (PRONEA) e a instituição desse Programa levou à
formulação e promulgação de uma legislação especifica para a EA e uma política
nacional de Educação Ambiental - Lei 9.759/99.
Para orientar a escola na elaboração dos projetos educativos, enfocando
procedimentos, atitudes e valores no convívio escolar, assim como a necessidade de
tratar temas sociais urgentes, de abrangência nacional tais como: meio ambiente, ética,
pluralidade cultural, orientação sexual, trabalho e consumo, foram aprovados pelo
Conselho Nacional de Educação, em 1997, os Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCN). Contudo, vale ressaltar que na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB nº 9.394/1996) a única referência à Educação Ambiental está no artigo 32, inciso
32
II, o qual exige para o Ensino Fundamental a “compreensão ambiental natural e social
do sistema público, da tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a
sociedade”.
Embora a LDB faça pouca referência à EA houve considerável avanço na
efetivação da mesma nas escolas. Contribuiu significativamente para a realização das
ações em EA, a criação, em 2004, da Secretaria de Educação Continuada,
Alfabetização e Diversidade (SECAD), visto que permitiu um maior enraizamento da EA
no MEC e junto às redes estaduais e municipais de ensino, passando a atuar de forma
integrada às áreas de Diversidade, Educação Escolar Indígena e Educação do Campo.
No município de Belém, a proposta de educação ambiental deve ser parte
importante do currículo de todas as escolas da Rede Municipal e não apenas das
ecoescolas, buscando ressignificar o cuidado para com a diversidade da vida como
valor ético-político que contribua com um projeto de sociedade ambientalmente
sustentável. Essa ideia alimenta o desejo de uma relação simétrica entre os interesses
da sociedade e os processos ambientais, fugindo da dicotomia ambiente-natureza. O
propósito é desenvolver o processo educativo contemplando tanto o conhecimento
científico como os aspectos subjetivos da vida, que incluem as representações sociais,
assim como o imaginário acerca da natureza e da relação do ser humano com ela. Isso
significa trabalhar os vínculos de identidade com o entorno socioambiental.
2.4.2 - A Educação Ambiental na Escola
A dimensão ambiental representa a possibilidade de lidar com conexões
entre diferentes dimensões humanas, propiciando entrelaçamentos e múltiplos
trânsitos entre múltiplos saberes. Nessa teia de aprendizagem, a educação adquire
papel estratégico, com a escola participando como instituição capaz de compreender
e articular os processos cognitivos com os contextos da vida (TRISTÃO, 2002).
Segundo Reigota
[...] a educação ambiental na escola ou fora dela continuará a ser uma concepção radical de educação, não porque prefere ser a tendência rebelde do pensamento educacional contemporâneo, mas sim porque nossa época e nossa herança histórica e ecológica exigem alternativas radicais, justas e pacíficas (1998, p. 43)
Tomando Vygotsky como referência, podemos dizer que o processo de
reconstrução interna (dos indivíduos) ocorre a partir da interação com uma ação
externa (natureza, ecossistema, recursos hídricos, desmatamento etc.), na qual os
indivíduos se constituem como sujeitos pela internalização de significados que são
construídos e reelaborados no desenvolvimento de suas relações sociais. A educação
ambiental pode assumir uma parte ativa de um processo intelectual, constantemente a
serviço da comunicação, do entendimento e da solução de problemas (VYGOTSKY,
1991). Trata-se de um aprendizado social, baseado no diálogo e na interação em
constante processo de recriação e reinterpretação de informações, conceitos e
33
significados, que podem se originar do aprendizado em sala de aula ou da experiência
pessoal do aluno. Portanto, a escola pode transformar-se no espaço em que o aluno
terá condições de analisar a natureza em um contexto entrelaçado de práticas sociais,
parte componente de uma realidade mais complexa e multifacetada.
Tendo em vista que a escola é espaço social e local onde o aluno dá
sequência ao seu processo de socialização e aprendizagem e considerando a
importância da questão ambiental e a visão integrada do mundo, no tempo e no
espaço, é preciso que o ambiente escolar ofereça meios efetivos para a compreensão
dos fenômenos naturais, das ações humanas e suas consequências para consigo,
para sua própria espécie, para os outros seres vivos e o ambiente. Assim, é
imprescindível que a temática ambiental esteja presente em todas as disciplinas do
currículo, relacionada com a realidade da comunidade, para que o aluno entenda a
correlação dos fatos com uma visão integral do mundo em que vive.
Entende-se que a Educação Ambiental como componente essencial do
processo de formação e educação permanente dos sujeitos, com uma abordagem
direcionada para a resolução de problemas, torna o processo educativo mais relevante
e mais realista e estabelece uma maior interdependência entre os saberes e o
ambiente natural e social. Nesse sentido, como objetivos da EA na escola estão: a
sensibilização e a conscientização; a busca de uma mudança comportamental; a
formação de um cidadão mais atuante com a criação de condições para que isso seja
um processo contínuo e permanente, através de ações interdisciplinares; a integração
entre escola e comunidade, objetivando a proteção ambiental e a sobrevivência
humana no planeta.
O desenvolvimento de um processo de sensibilização e conscientização da
comunidade escolar pode fomentar iniciativas que transcendam o ambiente
educacional, atingindo tanto o bairro no qual a escola está inserida como
comunidades mais afastadas nas quais residam alunos, professores e funcionários
que são potenciais multiplicadores de informações e atitudes relacionadas à EA
oferecida na escola, o que possibilita um estreitamento das relações intra e
extraescolar bastante útil na conservação do ambiente, principalmente o da escola.
Portando, esta diretriz, ao enfocar a educação ambiental pretende
possibilitar aos educandos uma compreensão fundamental dos problemas existentes,
da presença humana no ambiente, da sua responsabilidade e do seu papel político-
crítico como cidadãos de um país e de um planeta. Tem o propósito também de
contribuir para recuperar e reforçar valores que conduzam os alunos a repensar e
avaliar, de outra maneira, as suas atitudes diárias e as consequências destas para o
meio ambiente em que vivem.
34
2.5. Interdisciplinaridade
O Ensino Fundamental, como um direito fundamental, deve ser relevante,
pertinente e equitativo, cuja essência esteja pautada em um ensino que forme
indivíduos que assumam seus papéis nos diferentes tempos e espaços históricos, nos
grupos sociais a que pertencem, realizando-se a partir de seus interesses e valores;
deve conduzir ao convívio democrático com as diferenças, orientado pelo respeito
mútuo e pelo diálogo, em que o indivíduo adquire espírito crítico e condições de
aprender a assumir responsabilidades em relação a si e aos outros; deve também se
constituir em luta permanente pelo acesso ao conhecimento para todos, em especial
àqueles grupos da população que estão em desvantagem social, cultural e financeira,
dentro de um regime social profundamente injusto.
A instituição escolar tem como tarefa fundamental garantir a distribuição
social do conhecimento e a recriação da cultura. Para tanto, o currículo deve ser
constituído pelas experiências escolares que se desdobram em torno do conhecimento
e que contribuem para construir as identidades dos alunos. Ao conceber desta maneira
seu currículo, a instituição escolar compreende que os conhecimentos veiculados não
se constituem em meras transposições didáticas extraídas dos conhecimentos originais
a que estes se referem, como as disciplinas científicas, as diferentes formas de
expressão e comunicação (os idiomas, as artes e outras linguagens), ou ainda de
conhecimentos produzidos no âmbito do trabalho, das tecnologias, dos movimentos
sociais, no campo da saúde, dos desportos. (MEC/SEB, Indagações sobre o Currículo,
2009).
Torna-se necessário, portanto, compreender os conhecimentos escolares
como o conjunto de conhecimentos que a escola tem de selecionar e transformar, para
dar-lhe sentido e torná-los passíveis de serem ensinados, transformando-os em
elementos para a formação ética, estética e política do aluno. As escolas são
instituições destinadas à formação das crianças, jovens e adultos e trazem embutido
nos conhecimentos escolares das diferentes áreas, além do processo de didatização
que sofrem, também um sentido moral e político.
Os conhecimentos produzidos em diversas áreas ao adentrarem a escola
são recontextualizados, obedecendo a lógica que preside as instituições escolares,
evidenciando, desta forma, que a história escolar está indissoluvelmente ligada ao
exercício da cidadania. Portanto, a ciência que a escola ensina está impregnada de
valores que buscam promover determinadas condutas, atitudes e determinados
interesses, como por exemplo, a valorização e preservação do meio ambiente, o
reconhecimento etnicorracial, a inclusão social, entre outros. Assim, fica evidente que o
acesso ao conhecimento escolar tem dupla função: formar habilidades intelectuais e
criar atitudes e comportamentos desejáveis para a vida em sociedade. Como nos diz
Cortella (2009, p. 104)
35
A escola está grávida de história e sociedade, e, sendo esse processo marcado pelas relações de poder, o conhecimento é também político, isto é, articula-se com as relações de poder. Sua transmissão, produção e reprodução do conhecimento no espaço educativo escolar decorre de uma posição ideológica (consciente ou não), de uma direção deliberada e de um conjunto de técnicas que lhes são adequadas.
Desse modo, ao dominar o conhecimento escolar e o conhecimento da
cultura, a escola possibilitaria um bom desempenho do aluno. Para que isso ocorra, faz-
se necessário que ele não apenas apreenda os conteúdos escolares, mas também
saiba se movimentar nessas instituições, através do conhecimento que adquire, de
seus valores, seus rituais e normas, ou seja, pela familiaridade com a cultura da escola.
Para tal o aluno demonstra dominá-la quando compreende não apenas aquilo que fica
explicitado no cotidiano escolar, como também o que está implícito, ou seja, tudo aquilo
que não é dito, mas que é valorizado ou desvalorizado pela escola em termos de
comportamento, atitudes e valores que fazem parte de seu currículo oculto.
Por isso, a ação do professor requer um incisivo recurso que opere a síntese
entre a teoria e a prática, entre o explícito e o implícito, afirmando-se na relação entre
unidade e multiplicidade. Cabe ressaltar que a substancialidade na convivência humana
impõe-se como prática histórica que suscite o problema desta relação que vai além da
perspectiva puramente epistemológica e curricular, ampliada pela perspectiva
antropológica.
Esta possibilidade se traduz na prática interdisciplinar, que supera o
dogmatismo monocromático da ciência positivista e amplia o olhar por sobre a
realidade, enxergando as numerosas vias de acesso a este real, superando nexos
meramente lógicos entre as áreas de conhecimento e as práticas cotidianas,
penetrando as dimensões de valor que envolvem aspectos éticos e políticos realçando
a potencialidade do saber, intrinsecamente relacionado com o ser, o fazer e o poder.
(SEVERINO, 1995).
Compreender isso pressupõe uma prática educativa consubstanciada em
uma ação determinada historicamente, onde o agir determina o ser e que, portanto,
circunscreve a essência humana. Assim, afirma Severino (1995, p.161)
Sem dúvida, a substância do existir é a prática, enquanto que o conhecimento tende naturalmente para a teoria. Só se é algo mediante um contínuo processo de agir, só se é algo mediante a ação. É o que testemunham todos os entes que se revelam a experiência humana. Mesmo quando se está diante de um objeto puramente material, a sua ‘essência’, enquanto conjunto de características mais ou menos fixas, só tem sentido, enquanto capacidade de uma forma de atividade.
A ação educativa deve, pois, se constituir de conhecimentos cuja matriz
esteja fincada no solo de relações sociais, como afirma Severino, (1995, p. 163), não
apenas como referência circunstancial, mas como matriz, como placenta que nutre todo
seu processamento. Desta forma, a educação ganha efetividade, a partir de uma
36
prática interdisciplinar antropologicamente constituída e objetivada pelas relações
histórico-sociais que devem orientar práticas pedagógicas que superem a fragmentação
do conhecimento através da integração dos componentes curriculares, bem como de
atividades didáticas integradoras.
Somente a prática docente embasada na interdisciplinaridade poderá
deslegitimar e superar o discurso decadente do cientificismo, abrindo horizontes para
que o conhecimento esteja a serviço da solução de problemas sociais que os
estudantes, no seu dia a dia, enfrentam, superando de forma saudável e consciente os
desafios que o cercam. A educação que precisamos exercitar é aquela capaz de formar
indivíduos críticos, de raciocínio rápido, com sentido de risco, curiosos e conscientes de
seu papel social e das exigências que estão postas no mundo em que vivem. Embasa
nossa afirmação o que nos diz Frigotto (1995, p. 31)
O conhecimento não tem como ser produzido de forma neutra tendo em vista que as relações que ele tenta apreender não são neutras. É justamente neste âmbito que percebemos que a interdisciplinaridade na produção do conhecimento nos é uma necessidade imperativa, mas nos é também um problema que está plotado na materialidade das relações capitalistas de produção da existência. Sem penetrarmos na aridez desta materialidade a questão do debate da interdisciplinaridade fica num limbo sem pecado e sem prazer - limbo da discussão lógico-formal, discursiva.
Faz-se necessário compreender que o distanciamento que envolve a ação
pedagógica, no que concerne à interdisciplinaridade, deve-se ao fato de que não há
unidade dialética na história das ciências, como também não há unidade dialética nos
discursos científicos, quando muito, estes se unem por recursos menos significativos,
de ordem operacional, destacando a não comensurabilidade da ordem conceitual,
explicitando, desta forma, a falta de unidade dialética da história das ciências.
Ao constatarmos isto, fica evidente o porquê da dificuldade em exercitar e
aplicar a interdisciplinaridade como campo de análise e reflexão do campo social e
político nas salas de aula, torna-se quase impossível empreender uma prática docente
arrojada e multidisciplinar que supere a decadente ação docente monolítica e
maniqueísta tão frequente nas escolas na atualidade.
Sendo o processo educativo permeado pelas relações sociais, fica claro o
equívoco de se compreender este processo como uma mera questão metodológico-
didática. Esta tem sido uma grande limitação, que compromete sobremaneira a
superação da prática disciplinar desenvolvida nas salas de aula.
No momento em que a escola parte para a organização dos conteúdos, há
necessidade de superar o caráter fragmentário das disciplinas, buscando construir um
currículo que possibilite tornar mais significativos para os estudantes os conhecimentos
abordados e favoreça a participação ativa de alunos com habilidades, experiências de
vida e interesses muito diferentes. Neste momento, tanto a gestão como os docentes
devem assumir uma interdisciplinaridade construtiva, em que todos ganham, pois esta
37
ensina e aprecia a tolerância frente às demais teorias. Para ela, não se trata de apenas
uma ser verdadeira, não se trata de excluir todas as outras teorias – sentido metafísico
– pelo contrário, incita todas a criarem novas teorias, assim, aumentando o construto
da liberdade efetiva dos homens neste mundo.
Ao efetivar tal processo o docente verá os educandos realizarem
transposições que desenvolverão campos de ação antes insuspeitados, colocando em
prática novas formas de dizer e de fazer. Os educandos conseguirão deslocar o saber
para outros contextos, efetivando-os no mundo externo, corporificando a ciência,
superando a memorização, o saber bancário, através dos processos interdisciplinares.
O educador deve, pois, se propor efetivamente a instigar no educando a busca pelo
saber, criando neste o incansável interesse por desvendar novos conhecimentos,
através de novos construtos que aumentem a liberdade efetiva dos homens frente ao
mundo. Como nos diz Gusdorf (1977, p. 22), “a inteligência humana já é, por essência,
interdisciplinar”, cabendo, portanto, rever as práticas pedagógicas cuja racionalidade
científica são desumanizantes, tornando-as mais significativas e se traduzindo na
própria ação humana.
Porém, é mister que a interdisciplinaridade na escola não se constitua em
misturar métodos e conteúdos de diferentes disciplinas. É necessário compreender que
vivenciar a interdisciplinaridade requer uma atitude radical de ruptura com a
hierarquização dos conhecimentos escolares, aliando-os de forma a ressignificá-los,
formando numerosas redes horizontais de conhecimentos, afirmando-se, desta forma, o
movimento de conjunto pelo qual se desenvolve a ideia de totalidade teórica e prática.
Convém ainda compreender que interdisciplinaridade nada tem a ver com
homogeneização de conhecimentos; muito pelo contrário, interdisciplinarizar exige ter
consciência das especificidades das áreas do conhecimento, e, como tal deve-se
entender que a totalidade é uma categoria que não está acima das ciências impondo
sua reunião; não tem a ver com a soma de um discurso único, nem com uma única
realidade. Pensar desta forma seria puro reducionismo. Entenda-se, portanto, que a
interdisciplinaridade não é a soma de disciplinas, mas, como afirmamos anteriormente,
ela é a ressignificação dos conteúdos analisados por múltiplos olhares por sobre um
mesmo objeto.
Assim compreendidas, as propostas pedagógicas devem ser colocadas em
prática no sentido de favorecer o acesso aos bens culturais, às práticas culturais, ao
convívio com a natureza, bem como contribuir para a ampliação de experiências de
aprendizagem, como afirma Kramer (2009), mobilizando elementos cognitivos, afetivos
e sociais. Estes aspectos devem servir de base para que os saberes e os
conhecimentos sejam trabalhados, de forma a desenvolver determinadas
especificidades, próprias dos seres humanos.
Ao agir dentro desta compreensão, o currículo no Ensino Fundamental deve
corresponder às experiências vividas pelos estudantes, levando em consideração a
necessidade de articular os saberes que os estudantes aprendem na vivência e na
38
convivência em suas comunidades com os conhecimentos sistematizados que a escola
deve lhes tornar acessíveis.
Dessa maneira, qualquer discussão sobre o currículo neste nível de ensino,
deverá superar sempre duas dificuldades que se complementam: de um lado, torna-se
fundamental empoderar-se do que é comum ser denominado de "realidade do aluno" e,
de outro, conhecer o que se costuma chamar de "saberes escolares", relativos à
Educação Básica; uma vez que no Ensino Fundamental estes parecem ser mais
complexos.
Para se desenvolver esta nova concepção de educação escolar, faz-se
necessário questionar e abandonar o modelo de currículo padronizado, prescrito e
hierarquizado que atualmente colocamos em prática nas escolas, concebendo-a como
um espaço de múltiplos saberes e múltiplas racionalidades, rompendo desta forma, com
a compreensão de escola uniforme e homogênea. Para garantir tal ruptura a escola
deve reconhecer-se como espaço dialógico, que incentiva esforços de práticas
pedagógicas criativas, críticas e inovadoras, escolhendo objetivos, conhecimentos,
saberes e procedimentos oriundos de grupos subalternizados e de “sujeitos negados”
na sociedade, desta forma, abrindo espaço para o diálogo entre tais sujeitos
marginalizados e a ciência, a tecnologia e a cultura dominantes.
Dentro desse contexto, a interdisciplinaridade assume um papel
determinante – não como salvadora de todos os males da educação escolar – pois se
impõe enquanto um processo fundamental para a superação da desarticulação,
hierarquização e dicotomização das disciplinas escolares que tem sido o nó górdio no
percurso acadêmico de todos aqueles que frequentam as instituições que desenvolvem
a educação formal.
Colocar em prática uma ação pedagógica interdisciplinar numa escola
organizada em Ciclos de Formação – como é o caso das escolas da Rede Municipal de
Ensino de Belém – requer assumir uma perspectiva de totalidade perante o universo
disciplinar, compreendendo que as áreas de conhecimentos não podem prescindir
umas das outras, elas são complementares, necessitando, portanto, de um olhar
ampliado que promova o ir e vir substantivo que ressignificará os conhecimentos, numa
soma de esforços coletivos e participativos dos diversos profissionais envolvidos em tal
processo. Para promover este movimento interdisciplinar, torna-se necessário atuar nas
diversas instâncias do planejamento, em especial do planejamento curricular, em que a
escola deve estabelecer novas práticas pedagógicas que nos aproxime uns dos outros
e do mundo em que estamos inseridos.
Vale ressaltar ainda, o fato de que cada disciplina tem sua especificidade e
como tal não pode ser “diluída” e sim integrada, através da compreensão de que um
conhecimento necessita ser ressignificado em outros, garantindo desta forma, uma
compreensão mais ampliada e qualificada desse conhecimento e da forma como este
se estabelece no mundo à nossa volta.
39
Outro aspecto relevante que não pode deixar de ser bem entendido é que a
ação pedagógica, dentro do movimento interdisciplinar, não pode ignorar a
especificidade e a cientificidade de cada área de conhecimento, estas estão garantidas
por sua própria materialidade. E para dar conta desse processo deve-se romper com as
concepções metafísicas da realidade social. Ao professor cabe reconhecer que
delimitar um objeto de estudo, não significa que deva fragmentá-lo ou arbitrariamente
limitá-lo, ou seja, delimitar um problema não significa abandonar as múltiplas
determinações que o compõem, pois mesmo delimitado, um fato não perde o tecido da
totalidade que lhe é indissociável.
O movimento interdisciplinar precisa, pois, respaldar e garantir a amplitude e
a ressignificação dos conhecimentos escolares, levando em consideração todos os que
permeiam a sociedade, favorecendo uma aprendizagem significativa dos educandos,
concorrendo para uma prática de sujeitos propositores de transformações sociais.
Portanto, na escola, espaço onde a educação formal se dá, cabe aos
profissionais assumirem-se como permanentes “aprendentes”; que na análise dos fatos
empreendam esforços que saturem as categorias abstratas de mediações, de
conteúdos que se apresentam dentro de uma dada especificidade de uma determinada
realidade. Cabe aqui destacar a afirmação de Frigotto (1997, p. 45) que fortalece nosso
entendimento.
E o conhecimento do social tem um caráter unitário porque os homens ao produzirem sua existência mediante as diversas relações e práticas sociais o fazem enquanto uma unidade que engendra dimensões biológicas, psíquicas, intelectuais, culturais, estéticas etc. Se do ponto de vista da investigação podemos delimitar uma destas dimensões não podemos perder de vista que para que sua compreensão seja adequada é preciso analisá-la na sua necessária relação com as demais dimensões.
Desta forma, a escola, ao endossar o movimento interdisciplinar, assume que
o processo de conhecimento exige uma ação ativa, uma elaboração cujo trabalho de
construção por parte dos sujeitos coletivos esteja voltado para aprofundar a
compreensão dos fatos. Processo este marcado pelos mais diferentes limites do sujeito
envolvido. Enxergar estes limites torna-se fundamental para que os profissionais
envolvidos em tal movimento possam entendê-los e superá-los, uma vez que estes são
desafios no plano da realidade que devem ser assumidos na perspectiva de
redimensioná-los, a partir de um trabalho interdisciplinar explicitado na integridade dos
saberes e conhecimentos necessários para uma vida plena de justiça, fraternidade e
felicidade.
40
3. AS ÁREAS DO CONHECIMENTO
O século XVII foi palco de mudanças profundas na forma como o homem
compreendia seu mundo e a si mesmo. Em meio a essas mudanças emerge a forma de
pensar moderna, baseada no conhecimento científico. Antes disso, porém, a Ciência
como conhecemos hoje, não tinha “estatuto” próprio. Por isso, a partir desse período
histórico, ela constrói seu método de investigação do mundo e passa a investigá-lo.
Entretanto, gradativamente, a Ciência vai se tornando uma ciência particular, à medida
que novas ciências nascem e passam a delimitar seu campo de pesquisa e a construir
um método específico. Isto é, a Ciência vai se particularizar em ciências na medida em
que cada uma privilegiará setores distintos da realidade. Cada uma vai se ocupar em
investigar um aspecto da realidade ao definir um objeto de estudo próprio.
No entanto, as conclusões a que os pesquisadores chegarem sobre suas
investigações vão procurar ganhar sentido geral na medida em que forem validadas em
qualquer outra situação. Isso se dará porque as ciências procurarão pelas
regularidades existentes em determinados fatos e fenômenos da realidade. Assim,
poderão generalizá-los, numa linguagem rigorosa, que permitirá que sejam
comunicados e compreendidos por qualquer sujeito.
Neste processo, as ciências foram aperfeiçoando cada vez mais seus
métodos de investigação, seus instrumentos, na busca do rigor, da precisão, o que
permitiu ao cientista uma verificação mais objetiva dos fenômenos.
Assim, as ciências fundamentadas no racionalismo, no antropocentrismo e
na técnica, se especializaram cada vez mais à medida que mais investigavam as
particularidades da realidade, dos fenômenos. O homem moderno passou, então, a
depositar total e exclusiva confiança em si e na razão humana como instrumento capaz
de conhecer a verdade. Para isso, separou a razão da emoção, o objetivo do subjetivo,
o sujeito do objeto, o conceito da vivência, o ser do saber, a religião da ciência. Enfim,
produziu um conhecimento fragmentado da vida, da realidade e da existência humana.
Para melhor estudar, compreender e explicar a complexidade do universo, a
diversidade dos fenômenos, o homem moderno dividiu as ciências em diversos ramos
de estudo, no intuito de categorizá-las, classificá-las, colocar em ordem um conjunto de
conhecimentos nunca antes produzidos. Surgem então as Ciências Humanas e as
Ciências da Natureza. Porém, esta divisão não foi a única a ser estabelecida. Inúmeras
outras foram criadas procurando dar um sentido mais orgânico para as ciências. De
modo geral, no entanto, as ciências foram agrupadas de acordo com a proximidade dos
objetos de estudo. Cria-se, assim, as Áreas do Conhecimento constituídas de várias
ciências que compartilham determinados aspectos de seus objetos de estudo. Dentro
das Áreas, mais recentemente, surgem subáreas ou disciplinas afins. Temos então a
área das Linguagens, das Ciências Humanas, das Ciências da Natureza e da
Matemática (resolução CNE/CEB nº 7/2010).
É importante frisar que esta divisão das ciências em áreas e subáreas, dá-se
41
mais por uma necessidade de organização e sistematização do conhecimento humano
e não porque a complexidade do universo, a diversidade dos fenômenos e a própria
realidade apontem para esta divisão.
Hoje, sabemos que as Áreas do Conhecimento formam uma complexa teia
de conhecimentos que precisam ser rearticulados, recompostos para que o homem
possa compreender melhor sua realidade, seu mundo. As ciências ao se ocuparem em
desvendar os mais íntimos mistérios da natureza, da realidade, se esqueceram, porém,
de rearticular todo esse conhecimento produzido. É preciso então, que restituamos a
razão comunicativa da Ciência. Afinal, a divisão que existe entre elas, deve-se à
necessidade de abordar, de compreender cientificamente a realidade, viabilizar a ação
humana de produção do conhecimento. Mas isso é uma necessidade didática, imposta
por nossas limitações humanas. Portanto, estudamos as especificidades para melhor
compreender o mundo, a nós mesmos e as nossas relações com os outros (outras
especificidades). Mas a realidade exige sempre uma compreensão de totalidade já que
a mesma é indivisível. Por isso, é necessário que busquemos sempre, mesmo que
parcialmente, mesmo que de forma limitada, uma visão de totalidade da construção do
conhecimento humano. É urgente, pois, que dotemos nossas práticas educativas de
novas abordagens e estratégias que tenham por base referenciais como a
interdisciplinaridade, a complexidade, a inclusão, a diversidade e o Desenvolvimento
Humano.
Organizar a educação fundamental por ciclos de formação significa romper
com a fragmentação do saber e alargar os tempos de aprendizagem/desenvolvimento,
possibilitando a convivência com a diversidade.
Neste sentido, é importante destacar alguns princípios que devem nortear a
ação dos educadores no processo de ensinoaprendizagem escolar nos ciclos de
formação:
I. O desenvolvimento é um processo integrado que abrange todos os
aspectos da vida humana (físico, perceptivo-motor, emocional, cognitivo e social). Não
pode, portanto, restringir-se simplesmente à aprendizagem formal, ao domínio da leitura
e da escrita;
II. O processo de desenvolvimento do ser humano está intrinsecamente
ligado à aprendizagem, sendo, inclusive, influenciado, modificado por ela. Como são
dois processos concomitantes, não devemos trabalhar com a ideia de prontidão, de pré-
requisitos, de encadeamento formal e fragmentado do conhecimento;
III. A aprendizagem é um processo múltiplo. A criança/adolescente utiliza
estratégias diversas interdisciplinares para aprender que estão vinculadas à sua
experiência de vida. Portanto, a brincadeira, o jogo simbólico, a imitação e os gestos
são formas da criança/adolescente aprender a dar significados à sua realidade e
desenvolver habilidades;
42
IV. As crianças/adolescentes apresentam ritmos diferentes de
desenvolvimento. É importante, então, que a escola possibilite tempos e ritmos mais
flexíveis no processo de apropriação do conhecimento;
V. O professor deve compreender o processo de
desenvolvimento/aprendizagem da criança/adolescente, para que, a partir disso, possa
definir as metodologias de ensino que utilizará em sua prática pedagógica;
VI. A socialização de vivências, experiências, valores, representações da
cultura e do conhecimento formal privilegia o ser humano em seu complexo processo
de conhecer, vivenciar, construir e reconstruir a realidade, assim como resguarda a
memória coletiva.
3.1. LINGUAGENS
A área das Linguagens constitui-se de um conjunto de disciplinas como a
Língua Portuguesa, a Língua Estrangeira, o Ensino da Arte e a Educação Física que
estudam os vários significados das linguagens: os códigos (sinais, símbolos, signos) e
a linguagem (capacidade de significação e comunicação, nos seus vários sentidos) do
ser humano. É o universo da expressão humana; produto das relações com a natureza
e com os outros homens. Seus objetos são: a língua e suas variedades, as formas de
expressão simbólica (musical, cênica, visual) e o movimento humano.
O que caracteriza esta área, além da questão propriamente didática, são as
atividades das disciplinas específicas, que devem buscar fundamentação nas opções
teóricas e metodológicas da área. Na verdade essa inter-relação da Língua Portuguesa,
Língua Estrangeira, Arte, Educação Física atende ao progresso das ciências nas
últimas décadas e das demandas sociais e culturais.
O conceito de linguagem (capacidade de significação e comunicação)
funciona como elemento unificador do agrupamento. Busca-se uma ação
interdisciplinar, uma integração mútua dos conceitos, da terminologia, da metodologia:
uma postura interacionista das disciplinas; uma intercomunicação através da inter-
relação dos objetos diante dos quais os objetos particulares constituem-se enquanto
subobjetos.
Historicamente a escola se organiza em segmentos variados quer de tempo,
de pessoas, ou de saber, fragmentando-se na sua ação pedagógica. É necessário
superar as particularidades e constituir, através de uma postura e uma prática
interdisciplinar, uma consciência totalizadora na escola.
As ações pedagógicas devem ter uma visão global da linguagem, buscando
transcender as compreensões isoladas de cada componente de área, estabelecendo
um mínimo denominador comum – que constitui-se nas ações, em projetos, pesquisas
e planejamento afins.
43
3.1.1. Língua Portuguesa
“Meu professor de análise sintática era o tipo do sujeito inexistente. Um pleonasmo, o principal predicado da sua vida, regular como um paradigma da primeira conjugação. Entre uma oração subordinada e um adjunto adverbial, ele não tinha dúvidas: sempre achava um jeito assindético, de nos torturar com um aposto. Casou com uma regência. Foi infeliz. Era possessivo como um pronome. E ela era bitransitiva. Tentou ir para os EUA. Não deu. Acharam um artigo indefinido em sua bagagem. A interjeição do bigode declinava partículas Expletivas, conectivos e agentes da passiva, o tempo todo. Um dia, matei-o com um objeto direto na cabeça.”
Paulo Leminsky
O poema de Leminsky traduz, em linhas gerais, a concepção de língua que,
comumente, tem como principais objetivos definir termos, classificar e reconhecer
classes gramaticais, confundindo, desse modo, o uso de uma metalinguagem reduzida
a uma terminologia gramatical com práticas de linguagem que proporcionam ao aluno o
uso da língua com mais competência em situações concretas e/ou simuladas de uso.
De acordo com Silva (1986. p. 17) “quando interagimos [...] não pensamos
antes: – ‘agora vou falar uma sílaba, depois uma palavra’ – porque é mais fácil ou
porque se deve graduar o que se fala. Interagimos, simplesmente” através das ações
que os homens fazem com a língua/linguagem. Através dela, o falante age sobre seu
interlocutor, sobre o mundo e sobre a própria interlocução. Este agir só é possível
porque “a língua pertence a todos e não é um instrumento puramente linguístico” (idem,
p. 37).
A visão equivocada de que a língua está à disposição para ser dissecada,
classificada, copiada e transformada em algo sem vida é uma das causas do fracasso
do ensino-aprendizagem do português língua materna, pois, apesar da enorme
quantidade de aulas de português, o que constatamos é que o aluno, de modo geral,
tem muita dificuldade para se expressar oralmente e por escrito, principalmente em
situações formais de comunicação.
Essa concepção de ensino – onde a gramática normativa é, ao mesmo
tempo meio e fim do ensinoaprendizagem – leva o aluno a decorar regras, a etiquetar,
mas não o ajuda a desenvolver as quatro habilidades linguísticas: ler, escrever, ouvir e
falar nas diferentes situações de uso; apesar de o aluno passar onze, doze anos na
escola “aprendendo” sua língua.
No contexto de ensinoaprendizagem do português, faz-se necessário, então,
que o professor, antes de qualquer consideração sobre as metodologias aplicadas em
44
sala de aula, saiba qual é a sua concepção de língua/linguagem e suas implicações
para o processo de ensinoaprendizagem da língua materna, pois “o como se concebe a
natureza fundamental da língua (e/ou linguagem) altera em muito o como se estrutura o
trabalho com a língua ou linguagem em termos de ensino”. (TRAVAGLIA, 1996, p. 21).
Por isso, a resposta ao “para que” ensinar língua portuguesa envolve tanto uma
concepção de linguagem quanto de educação, pois o ponto de vista cria o objeto de
ensino.
Segundo Geraldi (1997, p. 41), a linguagem humana tem sido concebida de
maneiras bastante diversas que podem ser sintetizadas em três principais concepções.
A primeira concepção afirma que a linguagem é a representação do mundo e
de seu pensamento: está relacionada aos estudos tradicionais, em que o aluno
representa para si o mundo através da linguagem. Nesta concepção, a linguagem é o
reflexo do pensamento humano; logo, “as pessoas que não conseguem se expressar
não pensam” (Idem, p. 41).
Já a segunda concepção destaca que a linguagem é um instrumento de
comunicação: sua principal função é a transmissão de informações. Aqui, a linguagem
é vista como um código que transmite a um receptor determinadas mensagens. Trata-
se, sobretudo, de compreender a linguagem como decodificação mecânica,
dispensando-se, desse modo, a reflexão feita pelo falante.
A terceira concepção trata a linguagem como uma forma de interação,
resultado das ações entre os homens, em que mais do que refletir pensamento ou
transmitir mensagens, o falante, através dela, age sobre o outro. Desse modo, a
linguagem funciona como um jogo cujas regras podem ser estabelecidas no processo
de interação que acontece entre os falantes de uma sociedade.
A concepção de linguagem assumida nestas Diretrizes corresponde a esta
última, por acreditarmos que ela possui um papel fundamental na interação social dos
falantes que são sujeitos das ações que realizam através dela.
Para Soares (2004, p. 155), “extrair de uma área de conhecimento uma
disciplina curricular é, fundamentalmente, escolarizar esse conhecimento, ou seja, é
instituir um certo saber a ser ensinado e aprendido na escola”.
Historicamente, o uso da língua portuguesa foi gradativamente tornando-se
obrigatória. No começo, coexistiam três línguas: a língua geral13, o latim e a língua
portuguesa. O latim era ensinado pelos jesuítas aos alunos (normalmente, os filhos dos
portugueses) no ensino secundário e superior. A língua portuguesa servia como
instrumento para a alfabetização desses poucos privilegiados que se escolarizavam:
após aprenderem a ler e a escrever em português, aprendiam o latim.
Porém, a partir da metade do século XVII, o Marquês de Pombal tornou
obrigatório o uso da língua portuguesa no Brasil. Com a vinda da família real para o
13
“Recobria as línguas indígenas faladas no território brasileiro (estas, embora várias, provinham, em sua maioria, de
um mesmo tronco, o tupi, o que possibilitou que se condensassem em uma língua comum)” (SOARES 1996, p. 3).
45
Brasil (século XIX) o ensino da gramática portuguesa ganha “ênfase” e, aos poucos, o
ensino da gramática latina vai desaparecendo.
Nesse período, estudava-se a gramática da língua portuguesa e analisavam-
se os textos de autores consagrados. Os manuais didáticos ofereciam apenas os textos
dos autores, sem qualquer tipo de comentário, pois esta tarefa cabia ao professor de
Português; ao contrário dos manuais didáticos que são utilizados a partir dos anos 60 e
70, com exercícios, respostas e comentários, pois no dizer de Britto (1997, p. 4)
o aumento da oferta de vagas criou a necessidade de recrutamento mais
amplo e menos seletivo de professores, promoveu rebaixamento
salarial, condições de trabalho precárias e formação profissional
deficiente, fatores estes que, por sua vez, reduziram a autonomia
intelectual dos professores, obrigando-o a buscar formas de facilitação e
de suporte de sua atividade docente.
A partir dos anos 80, aproximadamente, sob influência das teorias e estudos
ligados à Pragmática, o ensino de língua portuguesa começa timidamente a apresentar
uma concepção interativa de língua/linguagem, ou seja, começa-se a ver a língua como
instrumento que leva o aluno a interagir com o outro e com o mundo, considerando as
condições sociais e históricas de sua utilização.
Assim, a partir do conhecimento do percurso histórico da disciplina Língua
Portuguesa na Educação Brasileira e das dificuldades encontradas pelos alunos no
processo de leitura e compreensão de textos, as Diretrizes Curriculares de Língua
Portuguesa do Município de Belém requerem, neste momento histórico, novos
posicionamentos, levando em consideração a adoção das práticas de linguagem como
ponto central do trabalho pedagógico.
Portanto, ao longo dos nove anos do Ensino Fundamental, espera-se que os
alunos adquiram progressivamente uma competência em relação à linguagem que lhes
possibilite resolver problemas da vida cotidiana, ter acesso aos bens culturais e
alcançar a participação plena no mundo letrado, “daí a importância de promover-se o
desenvolvimento, no aluno, da capacidade de produzir e compreender textos dos mais
diversos gêneros e, em diferentes situações comunicativas, tanto na modalidade escrita
quanto na modalidade oral” (Matrizes de Referência, Temas, Tópicos e Descritores da
Prova Brasil).
A fim de que esses objetivos sejam alcançados, o ensino da Língua
Portuguesa deve articula-se em torno de três eixos básicos: Práticas de Leitura e/ou
escuta de textos orais e escritos; Práticas de Produção de textos orais e escritos e
Práticas de Análise e Reflexão sobre a Língua.
a) Prática de escuta de textos orais e leitura de textos escritos: de
acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), o ensino de Língua
Portuguesa deve estar centrado num processo de contextualização, o qual se
materializa nos diferentes gêneros textuais que circulam socialmente. Tal prática
46
possibilita ao aluno a percepção das situações reais de comunicação, garantindo que
ele elucide as diferentes situações-problema encontradas no seu dia a dia.
Desse modo,
para se falar em leitura no seu sentido mais amplo, é preciso superar
algumas concepções sobre o aprendizado inicial da leitura. A principal
delas é a de que ler é simplesmente decodificar, converter letras em
sons, sendo a compreensão consequência natural dessa ação. Por
conta dessa concepção equivocada, a escola vem produzindo grande
quantidade de “leitores” capazes de decodificar qualquer texto, mas com
enormes dificuldades para compreender o que tentam ler” (PCN: Língua
Portuguesa, 1998, p. 37).
Outro aspecto a ser considerado é a leitura literária, que deve ser vista como
a arte que transforma/humaniza o homem e a sociedade. Logo, podemos dizer que “a
literatura, assim como a língua que ela utiliza, é um instrumento de comunicação e de
interação social e, por isso, cumpre também o papel social de transmitir os
conhecimentos e a cultura de uma comunidade” (CEREJA & MAGALHÃES, 2000, p.
39).
Para Silva (1998, p. 89),
a literatura, enquanto expressão da vida tem a capacidade de
redimensionar as percepções que o sujeito possui de suas experiências
e do seu mundo. Por isso mesmo, a leitura da literatura, pela sua
natureza e pela sua força estética, colabora significativamente para a
formação da pessoa, influindo nas suas formas de pensar e encarar a
vida.
Em se tratando de leitura literária, é importante que o professor apresente
para o aluno os textos de bons autores desde as primeiras leituras, sem, é claro, proibi-
los de fazerem leituras de outros textos, como gibis, folhetos diversos e outras leituras
de preferência dele.
De acordo com Cagliari (1993, p.179),
como alguém pode aprender a escrever se é privado desde cedo da
leitura dos bons leitores? A escola reclama muito de que os alunos
escrevem mal, mas o que eles leem? São alunos subnutridos
literariamente e, é claro, em decorrência disso, não vão saber escrever.
Sob esse enfoque sugere-se, nestas Diretrizes, que o ensino da literatura
seja trabalhado, em sala de aula, a partir de uma metodologia que leve em
consideração o letramento literário, ou seja, que o aluno seja exposto a práticas de
leitura, de maneira sistematizada, obedecendo a uma sequência pedagógica que leve
em consideração o conhecimento de bons textos literários, a motivação para ler
diferentes textos, a leitura e interpretação desses textos em diferentes contextos.
47
Outro aspecto que deve ser mencionado quando se trabalha com práticas
leitoras é a língua oral, que ainda não é ensinada, de maneira sistematizada em sala de
aula, como também continua ausente da prática pedagógica a utilização de
documentos orais. Para Alves (2000, p. 69),
essa negligência em relação à língua falada na prática escolar contrasta
fortemente com as exigências da própria escola. Em quase todas as
disciplinas há seminários a apresentar, debates dos quais participar,
exposições orais a realizar, ocasiões públicas e formais durante as quais
se pode ver claramente o despreparo dos estudantes para a realização
satisfatória dessas atividades.
Por esse motivo, faz-se necessário que o aluno aprenda a interagir com os
textos orais e escritos que circulam no mundo, criar uma expectativa em função daquilo
que vai ler e ouvir e desenvolver diferentes comportamentos diante da diversidade de
gêneros textuais, pois se a escola desconsiderar esse papel, o sujeito ficará à margem
dos novos letramentos, não conseguindo se constituir no âmbito de uma sociedade
letrada.
Destaque-se que o letramento refere-se ao indivíduo que não só sabe ler e
escrever, mas usa socialmente a leitura e a escrita, pratica a leitura e escrita, posiciona-
se e interage com as exigências da sociedade diante das práticas de linguagem,
demarcando a sua voz no contexto social.
Assim, nas Práticas de Leitura de textos orais e escritos, o aluno deve saber
utilizar indicadores para fazer antecipações e inferências em relação aos conteúdos e à
intencionalidade do texto; confirmar ou retificar as hipóteses de sentido do texto a partir
da percepção de elementos discursivos; ler o que não está escrito, identificando
elementos implícitos; estabelecer relações entre o texto que lê e outros textos já lidos a
fim de elaborar o seu próprio discurso; identificar os vários sentidos que podem ser
atribuídos a um texto; escutar e identificar diferentes tipos de textos orais a fim de
reutilizar adequadamente as diferentes possibilidades de expressão que a língua
oferece; comparar diferentes tipos de textos orais e escritos a fim de evidenciar as
especificidades de cada gênero textual; saber como os textos orais e escritos se
estruturam a fim de facilitar a produção; utilizar diferentes textos orais e escritos a fim
de proporcionar uma reflexão linguística, em sala de aula; despertar e cultivar o desejo
de ler textos literários; ler textos literários de forma silenciosa, individualmente ou em
grupo e pela escuta de alguém; identificar as especificidades do texto literário e ler por
prazer.
b) Práticas de Produção de textos orais e escritos: de acordo com
Castilho (1990, p. 120) “A língua é um conjunto de escolhas que o falante procede no
sistema, tendo em vista suas necessidades de interação social”. O falante, ao usar a
língua, não somente a exterioriza, mas também age sobre o interlocutor, pois o objetivo
do locutor é assegurar ao seu interlocutor as condições necessárias para que este seja
48
capaz de reconhecer a intenção daquele a fim de que realmente haja a interação.
Dessa forma, faz-se necessário que os interlocutores conheçam as condições de
produção nas quais o seu texto (oral ou escrito) está inserido (quem fala ou escreve,
para quem, onde, como, quando e para que se fala ou escreve) e tenham um
conhecimento prévio sobre o assunto abordado na interlocução.
Acrescente-se a isso que para se escrever bem, é necessário antes de
qualquer coisa ler. No dizer de Soares (2000, p. 85),
evidentemente, não se deve generalizar com afirmações do tipo todo
aquele que lê muito escreve bem, como se tratasse de uma relação
mecânica, automática. No entanto, ninguém duvida de que há relações
estreitas e positivas entre a experiência em leitura e o bom desempenho
em escrita. Além de fornecer matéria-prima para a escrita, a leitura pode
revelar pistas de como se deve escrever. Ora, para escrever, é
necessário ter o que dizer/escrever e saber como dizer/escrever. Sem
ter muito o que dizer, não se terá o que escrever. Se não se tem opinião
formada, se não se discutem ideias, se não se especula, duvida,
conjectura, compara, escrever torna-se tarefa árdua. E a leitura é uma
forma privilegiada de se adquirir informações, aprofundar
conhecimentos... Mas não é só isso. A leitura leva também a uma
familiarização com as formas da língua. As pessoas que têm o costume
de ler habituam-se ao contato com o texto escrito.
O mesmo acontece com a produção do texto oral. É preciso ter contato com
diferentes textos, de maneira sistematizada, empregar a língua oral em diferentes
situações de uso, saber adequá-la a cada contexto e interlocutor, reconhecer as
intenções implícitas nos discursos do cotidiano e demais esferas discursivas a fim de
propiciar a possibilidade de um posicionamento do falante diante deles. Por isso, nas
Práticas de Produção de Textos orais e escritos, os alunos devem saber produzir
textos, levando em consideração o destinatário, a finalidade do texto e as
características do gênero; articular, no processo de produção textual, as seguintes
operações: planejamento, textualização e revisão, assim como utilizar os mecanismos
linguísticos necessários para a articulação das diferentes partes do texto.
c) Práticas de Análise e Reflexão sobre a Língua: o objetivo das Aulas de
Português é formar alunos capazes de usar adequadamente a língua materna, em suas
modalidades escrita e oral, assim como refletir sobre o que leem e escrevem, a fim de
entenderem as regularidades linguísticas, os funcionamentos discursivos e as intenções
comunicativas.
No dizer de Cunha (2000, p. 40),
afirmar a primazia funcional da linguagem não significa, portanto, que o
ensino da norma gramatical e a manipulação de objetos metalinguísticos
que acompanham este ensino sejam sistematicamente banidos da sala
de aula. O componente linguístico da competência comunicativa engloba
49
todas as dimensões do sistema da língua, e estas não podem ser
ignoradas em nome de uma suposta modernidade.
Neste sentido, nas atividades de análise e reflexão sobre a língua, os alunos
precisam ter um controle consciente do uso que fazem da linguagem. Assim, a
metalinguagem é um processo imprescindível para o ensinoaprendizagem do
português, mas é preciso que não se perca de vista que a sua função deve ser a de
meio e não a de fim.
Nesta perspectiva, nas Práticas de Análise e Reflexão sobre a Língua,
espera-se que os alunos saibam comparar os diferentes registros utilizados em
diferentes situações comunicativas; saibam revisar o próprio texto, relendo cada parte
escrita, verificando a articulação com o já escrito e planejando aquilo que falta escrever;
analisem a regularidade da escrita; saibam explorar os recursos da linguagem a fim de
garantir a coerência e a coesão textuais; saibam organizar seu texto oral, refletindo
sobre o uso adequado das repetições, elipses, redundâncias, autocorreções e
marcadores conversacionais, presentes nos diferentes textos orais; percebam as
propriedades específicas e as marcas linguísticas peculiares dos textos orais e escritos.
Finalmente, essas Diretrizes elencam alguns objetivos desejáveis ao ensino
da língua portuguesa para cada ciclo escolar, a saber:
3.1.1.1 - Objetivos do Ensino de Língua Portuguesa para o Terceiro Ciclo
As práticas educativas devem ser organizadas de maneira a garantir,
progressivamente, que os alunos sejam capazes de:
Desenvolver o domínio da expressão oral e escrita em diferentes
situações de produção, levando em consideração “o quê, para quê, para quem e como”
ler e/ou escrever diferentes tipos de texto;
Considerar os papéis assumidos pelos falantes, ajustando o texto à
variedade linguística adequada;
Considerar possíveis efeitos de sentido produzidos pela utilização de
elementos não-verbais;
Compreender e saber utilizar os diferentes gêneros orais previstos para
este ciclo;
Saber fazer inferências;
Identificar informações pontuais no texto;
Reconhecer as marcas linguísticas específicas de cada texto;
Identificar e utilizar recursos que estabelecem a coesão no texto;
Empregar adequadamente as palavras, segundo o valor semântico que
expressam no texto;
Ler e produzir diferentes gêneros textuais;
Ler textos literários;
Vivenciar, em contexto escolar, práticas de letramento literário.
50
3.1.1.2 - Objetivos do Ensino de Língua Portuguesa para o Quarto Ciclo
As práticas educativas devem ser organizadas de maneira a garantir,
progressivamente, que os alunos sejam capazes de:
Ler e escrever textos mais complexos, com padrões linguísticos mais
distanciados daqueles da oralidade e com sistemas de referência mais distantes do
senso comum e das atividades da vida diária;
Reconhecer e saber utilizar os implícitos, presentes nos textos orais e
escritos;
Utilizar os marcadores dos textos orais de acordo com o grau de
formalidade/informalidade das situações de comunicação;
Redigir diferentes tipos de texto, estruturando-os de maneira a garantir
fidelidade ao tema, continuidade temática, uso adequado dos recursos linguísticos
(retomadas, anáforas e conectivos) e saiba utilizar os padrões da escrita de acordo com
a função do gênero em questão e das condições de produção;
Saber utilizar marcas de segmentação em função do texto, a citar: título,
paragrafação, periodização, pontuação e acentuação;
Utilizar a língua, levando em consideração o processo de variação da
linguagem;
Identificar as características descritivas, narrativas, dissertativas/
argumentativas em textos orais e escritos;
Localizar informações no texto, fazendo uso de inferências;
Identificar, no texto, ideias centrais e periféricas;
Identificar relações lógico-semânticas (causa, condição, concessão,
conclusão, explicação, exclusão, oposição etc.) entre ideias no texto e os recursos
linguísticos usados em função dessas relações;
Reconhecer e saber usar a linguagem denotativa e a linguagem
conotativa, considerando as intenções comunicativas do texto oral e/ou escrito;
Identificar mudanças de sentido ocasionadas pela inversão da ordem das
palavras no enunciado;
Relacionar recursos de escrita (pontuação, aspas, letra maiúscula etc.)
com propósitos do texto;
Comentar ideias do texto (oralmente e/ou por escrito);
Resumir texto oral e/ou escrito;
Empregar adequadamente as palavras, segundo o valor semântico que
expressam no texto oral e/ou escrito;
Grafar corretamente as palavras; saber separar corretamente; acentuar;
assinalar a crase e fazer adequadamente a pontuação;
Ler por prazer diferentes gêneros textuais (crônicas, entrevistas,
memórias, propagandas etc.).
51
Ressalta-se que a expectativa no quarto ciclo é de que os alunos tenham um
desempenho mais autônomo em relação àqueles conteúdos que já vinham sendo
trabalhados sistematicamente no ciclo anterior.
3.1.2. Ensino de Artes
A disciplina Ensino de Arte, anteriormente intitulada Educação Artística, foi
instituída pela Lei 9394/96 - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Esta
disciplina chegou a ser sinalizada na perspectiva de tornar-se Arte-educação. Hoje, é
entendida, por sua própria essência simbolizadora, como parte integrante da área de
conhecimento Ciências da Linguagem, funcionando como mais um elemento
consolidador desta proposta, sendo um processo educativo inclusivo, uma vez que a
Arte configura-se como síntese da capacidade simbolizadora do indivíduo, a partir de
um processo de (re) significação de valores e códigos construídos e partilhados
coletivamente pelo constante diálogo entre subjetividade e intersubjetividade.
O caráter em construção da disciplina Ensino de Arte, na RME, rompe
concepções que vão em direção à primazia da técnica (formação do artista) ou do
espontaneísmo (laisser-faire – fazer por fazer), tendo como foco a organização de um
processo democrático de vivências a partir da configuração de um ambiente estimulante
e desafiador que possibilite aos educandos – para todos e não somente para os mais
talentosos, – a interação com situações de aprendizagem diversas que lhes
proporcionem vivências e posse de saberes artísticos, críticos e estéticos para sua
relação subjetiva com o mundo através de sua expressividade individual ou coletiva.
A criança pensa poeticamente por natureza, partir de seu contexto
sociocultural, tendo seu canal direto e aberto permanentemente com o lúdico e, desta
maneira, torna a fantasia, o imaginário, como o melhor caminho para se chegar à
realidade. Faz-se necessária, então, a ampliação de sua capacidade simbolizadora
singular na perspectiva da integração aos códigos e linguagens construídos e já
vivenciados em sua sociedade, pela sua capacidade de ver, ouvir, apreciar, criticar,
(re)criar. Daí a importância e o desafio da criança desde o seu primeiro ciclo de
formação, ter acesso a conhecimentos artísticos-estéticos que lhe possibilitem um olhar
integrador às manifestações e produções culturais com as quais interage
cotidianamente ou não.
Neste sentido, o professor de Arte configura-se num mediador nesse
processo de construção e significação de saberes artísticos-estéticos, críticos, políticos,
que para além de sua sala de aula, ou, a partir dela, ecoando para toda a escola, na
perspectiva de ensinar, produzir e incentivar arte em seu contexto escolar num viés
interdisciplinar, sem no entanto, reduzir suas funções em “organizador de eventos” ou
em apoio/reforço para outras disciplinas.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais enfatizam o ensino e a aprendizagem
de conteúdos que colaboram para a formação do cidadão, buscando igualdade de
52
participação e compreensão sobre a produção local, regional, nacional e universal de
arte. A seleção e a ordenação de conteúdos gerais do ensino de Artes têm como
pressupostos a clarificação de alguns critérios, que também encaminham a elaboração
dos conteúdos de Artes Visuais, Música, Teatro e Dança e, no conjunto, procuram
promover a formação artística e estética do aprendiz e a sua participação na sociedade.
É desejável que o aluno ao longo da escolaridade tenha oportunidade de
vivenciar experimentos e expressar-se em arte nas diversas modalidades artísticas no
ambiente escolar e fora deste, visitando, conhecendo e identificando o patrimônio
cultural e artístico de seu bairro, de sua cidade, como também, espaços culturais e
museus de artes, apreciando a sua cultura e a cultura do outro, estabelecendo e
ampliando o conhecimento individual e coletivo, adquirindo, assim, a compreensão de
pertencimento dos bens culturais.
Partindo dessas premissas, os conteúdos do ensino de Artes devem estar
relacionados de tal maneira que possam sedimentar a aprendizagem artística e estética
dos alunos do ensino fundamental da RME.
Visando garantir ao educando experiências significativas nas diversas
linguagens artísticas, caberá ao professor do ensino de Artes da RME trabalhar sua
habilitação específica de formação, elencar seus respectivos conteúdos significativos e
métodos de avaliação em todos os ciclos de formação, com vistas a garantir aos
alunos, durante o percurso escolar, projetos e trabalhos que inter-relacionem as demais
linguagens artísticas e seus respectivos conteúdos, sem, contudo, apropriar-se de uma
abordagem polivalente.
Tal aprendizagem diz respeito à possibilidade dos alunos desenvolverem um
processo contínuo e cada vez mais complexo no domínio do conhecimento artístico e
estético, seja no exercício do seu próprio processo criador, por meio das formas
artísticas, seja no contato com obras de arte e com outras formas presentes nas
culturas ou na natureza. O estudo, a análise e a apreciação das formas podem
contribuir tanto para o processo pessoal de criação dos alunos como também para o
conhecimento progressivo e significativo da função que a Arte desempenha nas
culturas humanas.
Assim, um conjunto de conhecimentos devem estar articulados na prática, ao
mesmo tempo em que mantêm seus espaços próprios, dentro do contexto de ensino e
aprendizagem em três eixos norteadores conexos: a produção, a fruição e a reflexão.
a) A produção: refere-se ao fazer artístico e ao conjunto de questões a ele
relacionadas, no âmbito do fazer do aluno e dos produtores sociais de arte.
b) A fruição: refere-se à apreciação significativa de Arte e do universo a ela
relacionado. Tal ação contempla a fruição da produção dos alunos e da produção
histórico-social em sua diversidade.
c) A reflexão: refere-se à construção de conhecimento sobre o trabalho
artístico pessoal, dos colegas e sobre a Arte como produto da história e da
multiplicidade das culturas humanas, com ênfase na formação cultivada do cidadão.
53
Desta maneira, a disciplina ensino de Artes precisa ser/estar
integrada/integradora ao/do Projeto Político Pedagógico e, por conseguinte, ao trabalho
coletivo na escola, na perspectiva de estabelecer diálogos permanentes com as demais
disciplinas do currículo pela ênfase aos seus elementos específicos, para a contribuição
na construção de um sujeito crítico e atuante na sociedade.
3.1.2.1 - Objetivos do Ensino de Arte para o Terceiro Ciclo
Espera-se que, ao final do terceiro ciclo, os alunos sejam capazes de:
Identificar a diversidade e inter-relações de elementos das linguagens
artísticas que se encontram em múltiplas realidades (vitrines, cenário, roupas,
adereços, objetos domésticos, movimentos corporais, meios de comunicação); perceber
e analisá-los criticamente;
Discutir e refletir sobre as preferências artísticas e influências do contexto
sociocultural, conhecendo usos e funções da Arte em épocas e sociedades distintas,
percebendo as participações diferenciadas de gênero, minorias e etnias;
Compreender a organização dos papéis sociais em relação aos gêneros
(masculino e feminino) e contextos específicos como etnias, diferenças culturais, de
costumes e crenças, para o uso propositivo das linguagens artísticas;
Interpretar e apreciar obras de arte (artes visuais, música, teatro e dança)
do próprio meio sociocultural e as nacionais e internacionais que fazem parte do
conhecimento artístico construído pela humanidade no decorrer de sua história e nos
diferentes espaços geográficos, estabelecendo inter-relações com as outras
modalidades e as demais áreas do conhecimento;
Pesquisar, explorar, improvisar, compor e interpretar obras de arte de
diversas naturezas e procedências, desenvolvendo autoconfiança, senso estético
crítico, concentração, capacidade de análise e síntese, trabalho em equipe com diálogo,
respeito e cooperação;
Compreender e saber identificar a arte como fato histórico contextualizado
nas diversas culturas, conhecendo, respeitando e podendo observar as produções
presentes no entorno, assim como as demais do patrimônio cultural e do universo
natural, identificando a existência de diferenças nos padrões artísticos e estéticos;
Frequentar e saber utilizar as fontes de documentação de arte,
valorizando os modos de preservação, conservação e restauração dos acervos
artísticos e objetos presentes em variados meios culturais, físicos e virtuais, museus,
praças, galerias, ateliês de artistas, centros de cultura, oficinas populares, feiras,
mercados.
3.1.2.2 - Objetivos do Ensino de Arte para o Quarto Ciclo
Espera-se que, ao final do quarto ciclo, os alunos sejam capazes de:
Compreender, analisar e observar as relações entre as linguagens
artísticas, entre outras áreas do conhecimento humano (Educação Física, Matemática,
54
Ciências, Filosofia etc.), estabelecendo as conexões entre elas e sabendo utilizar tais
áreas nos trabalhos individuais e coletivos;
Conhecer e situar profissões e os profissionais das Artes, observando o
momento presente, as transformações históricas já ocorridas e pensar sobre o cenário
profissional do futuro;
Conhecer, apreciar e adotar atitudes de respeito diante da variedade de
manifestações artísticas e analisar as interpenetrações que se dão
contemporaneamente entre elas, refletindo sobre suas respectivas estéticas e valores;
Buscar e saber organizar informações sobre a Arte em contato com
artistas, documentos, acervos nos espaços da escola e fora dela (livros, revistas,
jornais, ilustrações, diapositivos, vídeos, discos, cartazes) e acervos públicos (museus,
galerias, centros de cultura, bibliotecas, fonotecas, videotecas, cinematecas),
reconhecendo e compreendendo a variedade dos produtos artísticos e concepções
estéticas presentes na história das diferentes culturas e etnias;
Fazer uso de formas de registro artístico, convencionais ou não, na grafia
e leitura de produções próprias ou de outros, desenvolvendo variadas maneiras de
comunicação;
Refletir e discutir os múltiplos aspectos das relações comunicacionais dos
alunos com a arte produzida pelos meios tecnológicos contemporâneos (que trazem
novos paradigmas perceptivos e novas relações de tempo/espaço), bem como com o
mercado cultural (indústria de produção, distribuição e formas de consumo);
Conhecer e distinguir diferentes momentos da História da Arte, os
aspectos estéticos predominantes, a tradição dos estilos e a presença dessa tradição
na produção artística contemporânea;
Conhecer a documentação existente nos acervos e arquivos públicos
sobre as artes, sua história e seus profissionais;
Conhecer, relacionar, apreciar arte, concepções artísticas e estéticas —
na sua dimensão material e de significação — criadas por produtores de distintos
grupos étnicos em diferentes tempos e espaços físicos e virtuais, observando a
conexão entre essas produções e a experiência artística pessoal e cultural do aluno.
3.1.3. Educação Física
A Educação Física enquanto componente curricular tem assumido diversos
papéis na educação brasileira, porém sua trajetória nos aponta, cada vez mais, na
direção de sua importância como prática educativa que contribui para uma
compreensão mais integrada das múltiplas dimensões do ser humano.
É imprescindível, ao falar da história da Educação Física, mencionar a
concepção dualista de homem que tem suas raízes históricas nas ciências biológicas e
que ainda hoje exerce forte influência na formação e na prática pedagógica dos
professores. Esta concepção apresenta como objetivos principais a manutenção da
55
saúde corporal, a aquisição de aptidão física que preza apenas pelo desenvolvimento
de capacidades físicas e habilidades motoras. No dizer de Gonçalves
Essa tendência dissocia a Educação Física de um conceito de Educação, aproximando-se mais de um conceito do adestramento físico. Aliadas a essa concepção, estão as tendências à militarização e à higienização, que perpassam a Educação Física. (1994, p. 136).
Por suas origens militares e médicas e por seu atrelamento aos mecanismos
de poder, a Educação Física ficou, por muito tempo, restrita aos aspectos fisiológico,
técnico, higiênico e, sobretudo à disciplinarização do corpo. Isso acabou obstruindo, na
prática pedagógica, a reflexão, tanto prática como teórica, sobre os constructos
pertinentes ao corpo e ao movimento humano como fundamentos conceituais que
perpassam os eixos da construção de seu campo de conhecimento.
Ressalta-se, entretanto, que os conhecimentos sobre corpo e movimento
eram unicamente trabalhados na perspectiva biologizante, configurando-se numa
prática específica de lidar com aqueles conceitos, pela influência de paradigmas que
em geral circulavam nas teorias da Educação.
Hoje, a Educação Física deve ser compreendida como disciplina que
contempla os múltiplos conhecimentos produzidos e usufruídos pela sociedade a
respeito do corpo e do movimento. E deve constituir-se num esforço em face à
necessidade de se fundamentar de maneira articulada ao que o homem tem produzido
historicamente, cuja finalidade é alcançar a construção e sistematização do
conhecimento, a forma como este conhecimento se expressa na realidade e como o
homem atua sobre ele (SOARES, et al 1992).
Ao ampliar seu foco principal de ação na busca da formação plena de
homens e mulheres, garantindo uma educação de qualidade para todos, a Educação
Física, conforme a legislação em vigor (LDB/1996), ganhou igual valor aos demais
componentes curriculares, sendo considerada, desde a legislação de 1971, como área
de conhecimento.
Isto favoreceu para que ela assumisse, como um componente curricular, a
tarefa de contribuir para uma educação compreendida como processo de formação
humana que prioriza não só o domínio de conhecimentos, competências e habilidades,
sejam intelectuais ou motoras, mas também a formação estética, política e ética dos
educandos (PCN: Educação Física, 1997). Além disso, seu trabalho pedagógico,
deverá ser permeado pelos princípios da inclusão, da diversidade e da
heterogeneidade.
Nessa perspectiva, a orientação pedagógica da Educação Física na escola,
deverá fundamentar-se na prática da cultura corporal de movimento e visar suprir as
necessidades dos alunos, compreendo suas singularidades, com ênfase na pluralidade
sociocultural dos indivíduos, em busca de democratizar, humanizar e diversificar o
ensino, para que a compreensão dessa cultura corporal de movimento possibilite a
prática de atitudes e hábitos de atividade física como fundamentais em suas vidas.
56
Desse modo, a Educação Física tem como foco as práticas corporais
construídas ao longo dos tempos, mas não qualquer prática ou movimento, e sim
aquelas que se apresentam como resultado da produção humana historicamente
construída, dentre outras atividades, com finalidades de lazer, expressão de
sentimentos, afetos e emoção; todas com características lúdicas, das diversas culturas
humanas (BRASIL, 1997, p. 27). Essas vivências, seus conceitos, sentidos e
significados são conteúdos legítimos a serem problematizados em todos os níveis da
educação básica.
Ao estudar os fenômenos das práticas corporais enquanto produção cultural
da humanidade, entre eles: o jogo, o esporte, a dança, a ginástica, a luta e as
atividades em que estão presentes o lazer, o lúdico, a expressão corporal e formas de
expressão outras que demandam sentimentos, afetos e interações, a Educação Física
colabora para a concretização de um intenso diálogo intercultural e interdisciplinar, que
no espaço educativo escolar, deve refletir na compreensão e na produção do
conhecimento traduzido no fazer pedagógico daqueles que estão envolvidos, para que
possam se movimentar intencionalmente como sujeitos sociais e como cidadãos
apropriando-se dos bens culturais disponíveis na sociedade (PCN: Educação Física,
1997).
É importante frisar ainda que o trabalho educativo do corpo não é exclusivo
da Educação Física. A educação corporal envolve todas as áreas do conhecimento e
está, dentro da escola, articulada com outras práticas, muitas vezes ocultas – por
exemplo, na organização dos espaços e tempos escolares, nos conteúdos e
metodologias de ensino, nos livros didáticos, nos rituais que envolvem entre outros, as
filas, as formas de se assentar, as formas de se movimentar, os regulamentos e
eventos comemorativos (MCLAREN, 1997; MARCELLINO, 1999).
Por essa razão, a Educação Física escolar deve, assim, oportunizar a todos
os educandos o desenvolvimento de suas potencialidades de forma democrática e não
seletiva, visando seu aprimoramento como seres humanos. Como as outras disciplinas
que compõem o currículo, deve também estar articulada com o projeto maior da escola
e primar por uma visão de homem, enquanto unidade, que reflita sobre suas
contradições e conflitos na direção de sua humanização e emancipação.
Como parte constituinte da Educação, a Educação Física escolar está
comprometida com a formação humana e é partícipe na construção de uma escola
compreendida como tempo e espaço de vivência sociocultural, aprendizado de saberes
e desenvolvimento de sujeitos, considerando a pluralidade das potencialidades
humanas, valorizando o conhecimento, a arte, a estética, a identidade, o sentimento e a
emoção. Manifestações estas expressas na cultura corporal que assume formas de
representações simbólicas de realidades vividas pelo homem, historicamente criadas e
culturalmente desenvolvidas, exteriorizadas nas expressões corporais como a dança, o
jogo etc. (COLETIVO DE AUTORES, 1992, p.38).
A partir desta compreensão, propomos que o exercício teórico-prático da
57
disciplina na escola, leve em consideração os seguintes eixos norteadores:
a) Conhecimento sobre o corpo: conjunto de conhecimentos que
subsidiam as práticas corporais. Entre eles, encontram-se os anatômicos, fisiológicos,
biomecânicos e bioquímicos que possibilitam o estabelecimento de critérios para
julgamento, escolha e realização de atividades corporais saudáveis.
b) Esportes, jogos, lutas e ginásticas: conjuntos de práticas corporais que
subsidiam a compreensão de regras, posturas, técnicas, valores e atitudes
colaborativas, competitivas e recreativas.
c) Atividades rítmicas e expressivas: são códigos simbólicos, através dos
quais o ser humano, em interação sociocultural, produz a possibilidade de comunicação
por gestos e posturas. “Têm como característica comum a intenção explícita de
expressão e comunicação por meio dos gestos na presença de ritmos, sons e da
música na construção da expressão corporal.” (PCN: Educação Física, 1998, p. 71).
3.1.3.1 - Objetivos do Ensino de Educação Física para Terceiro Ciclo
Espera-se que, ao final do terceiro ciclo, os alunos sejam capazes de:
Participar de atividades de natureza relacional, reconhecendo e
respeitando suas características físicas e de desempenho motor, bem como as de seus
colegas, sem discriminá-los por suas características pessoais, físicas, sexuais ou
socioculturais;
Apropriar-se de processos de aperfeiçoamento das capacidades físicas,
das habilidades motoras próprias das situações relacionais, aplicando-os com
discernimento em situações-problema que surjam no cotidiano;
Adotar atitudes de respeito mútuo, dignidade e solidariedade na prática
dos jogos, lutas e dos esportes, buscando encaminhar os conflitos de forma não-
violenta, através do diálogo;
Diferenciar os contextos amador, recreativo, escolar e profissional do
esporte, reconhecendo e evitando o caráter excessivamente competitivo em quaisquer
desses contextos;
Conhecer, valorizar, apreciar e desfrutar das diferentes manifestações da
cultura corporal, adotando uma postura despojada de preconceitos ou discriminações;
Aprofundar-se no conhecimento dos limites e das possibilidades do
próprio corpo, de forma a poder controlar algumas de suas posturas e atividades
corporais com autonomia e a valorizá-las como recurso para melhoria de suas aptidões
físicas;
Aprofundar as noções conceituais de esforço, intensidade e frequência por
meio do planejamento e sistematização de suas práticas corporais, e buscar
informações para seu aprofundamento teórico de forma a construir e qualificar sua
própria aptidão física;
Organizar e praticar atividades corporais, valorizando-as como recurso
para usufruto do tempo disponível, bem como ter a capacidade de alterar ou interferir
58
nas regras convencionais, com o intuito de torná-las mais adequadas ao momento do
grupo, favorecendo a inclusão dos praticantes;
Analisar, compreender e manipular os elementos que compõem as regras
como instrumentos de criação e transformação.
3.1.3.2 - Objetivos do Ensino de Educação Física para Quarto Ciclo
Espera-se que, ao final do quarto ciclo, os alunos sejam capazes de:
Valorizar a cultura corporal de movimento como parte do patrimônio
cultural da comunidade;
Relacionar a diversidade de manifestações da cultura corporal de seu
ambiente e de outros, com o contexto em que são produzidas e valorizadas;
Conhecer, organizar e interferir no espaço de forma autônoma, bem como
reivindicar locais adequados para a promoção de atividades corporais e de lazer,
reconhecendo-as como uma necessidade do ser humano e um direito do cidadão, em
busca de uma melhor qualidade de vida;
Cuidar e responsabilizar-se pelo desenvolvimento e manutenção de suas
capacidades físicas (resistência aeróbica, força, velocidade, flexibilidade);
Reconhecer e valorizar os efeitos que as práticas corporais e hábitos
saudáveis exercem sobre a aptidão física e a qualidade de vida;
Compreender que o competir com outros não significa rivalidade,
entendendo a oposição como uma estratégia do jogo e não como uma atitude frente
aos demais;
Reconhecer e valorizar as diferenças de desempenho, linguagem e
expressividade decorrentes, inclusive, das diferenças físicas, sexuais e socioculturais;
Respeitar a integridade física, limite pessoal e moral do outro e de si
próprio;
Analisar alguns dos padrões de beleza, saúde e desempenho difundidos
pela mídia, e compreender sua inserção no contexto sociocultural em que são
produzidos, despertando para o senso crítico e relacionando-os com as práticas da
cultura corporal de movimento.
3.1.4. Língua Estrangeira Moderna
O ensino da língua estrangeira deve representar uma postura e uma prática
construtiva em relação à educação, que oportunizam a inclusão e igualdade na
aquisição de saberes sob a ótica da multipluralidade cultural, também para aqueles de
classes sociais menos favorecidas. Deve, portanto, respaldar-se numa prática de
inclusão pedagógica de saberes e identidade cultural e, ainda, conhecer outros
saberes, outras identidades para que se possa ter uma visão ampla não somente do
espaço em que se vive, mas do mundo a que pertence.
59
Neste contexto, o ensino da Língua Estrangeira é uma forma de aumentar a
auto-percepção do aprendente e, por esse motivo, ela deve centrar-se no engajamento
discursivo, a fim de envolver os aprendentes no discurso, e agir no mundo social, pois a
língua não é somente um fenômeno lingüístico; é também um fenômeno
sociolinguístico.
Nesse sentido é primordial restaurar o papel da língua estrangeira na
formação educacional, pois a sua aprendizagem juntamente com a aprendizagem da
língua materna é um direito de todo cidadão, conforme expresso na Lei de Diretrizes e
Bases e na Declaração Universal dos Direitos Linguísticos, publicadas pelo Centro
Internacional Escarré para Minorias Étnicas e Nações (Ciemen) e pelo PEN-Club
Internacional. Sendo assim, a escola não pode mais se omitir em relação a essa
aprendizagem.
Assim, é necessário refletir sobre uma ação pedagógica que possibilite a
aproximação metodológica entre a língua portuguesa e a língua estrangeira para o
desenvolvimento das competências de leitura e escrita, e, a partir daí, ir-se construindo
objetivos comunicacionais, pois língua é fundamentalmente um fenômeno oral.
Portanto, é indispensável desenvolver uma certa familiaridade com o idioma falado, e
mais especificamente, com a sua pronúncia, antes de se procurar dominar o idioma
escrito. Todavia, não é possível considerar o desenvolvimento de habilidades orais
como objetivo central do ensino de língua estrangeira nas escolas.
Dessa maneira, com exceção de algumas situações específicas de
comunicação, o uso de uma língua estrangeira parece estar, em geral, mais vinculado à
leitura e ainda se observa que os únicos exames formais em língua estrangeira
(vestibular e admissão em concursos e cursos de pós-graduação) requerem o domínio
de uma competência leitora. Portanto, a leitura atende, por um lado, às necessidades
da educação formal, e, por outro, é a habilidade que o aprendente pode usar em seu
contexto social imediato.
Logo, as competências de leitura devem iniciar a partir de textos com
vocabulário reduzido, de preferência com uso moderado de expressões idiomáticas,
regionalismos, e em seguida, palavras "difíceis" (de rara ocorrência), pois a proximidade
do conteúdo do texto ao nível de conhecimento do aluno é uma condição importante.
Outro aspecto, também importante, é o grau de atratividade do texto, em que o assunto,
se possível, deve ser de alto interesse para o leitor e a atenção deve concentrar-se na
ideia central, mesmo que detalhes se percam. Assim, o leitor deve habituar-se a buscar
identificar sempre em primeiro lugar os elementos essenciais da oração, ou seja,
sujeito, verbo e complemento porque a maior dificuldade nem sempre é entender o
significado das palavras, mas sua função gramatical e, consequentemente, a estrutura
da frase. Então, o grau de dificuldade dos textos deve avançar gradativamente, e o
aluno deve procurar fazer da leitura um hábito frequente e permanente.
Desse modo, para facilitar a aquisição das competências de leitura,
propomos uma ação pedagógica que tenha como princípio experimentar uma
60
abordagem integrada do ensino/aprendizagem das línguas materna e estrangeira com
a intenção de efetivar uma prática pedagógica sistematizada que abranja ambas as
disciplinas, a fim de que sejam essencialmente desenvolvidas as capacidades de
produzir condutas de linguagem as mais atuantes possíveis. De acordo com os estudos
de MOSQUERA (1984), a compreensão de outras culturas, ações humanas, produtos
de experiências sociais são enormemente enriquecedoras quando nos servem como
conhecimento da nossa cultura.
Assim, a Didática Integrada das Línguas propõe desenvolver as habilidades
básicas de expressão discursiva dos aprendentes, tendo em vista que a proficiência em
línguas estrangeiras tem efeito positivo sobre a língua materna, em virtude de, com
isso, poder-se entender a riqueza, nuances e nível de comunicação que contém e pode
expressar o nosso idioma, o que certamente será, por sua vez, de acordo com CHISS
(apud PRADO; CUNHA, 2003, p. 13), “fonte de experiências e a ocasião para novas
interrogações teóricas”.
Portanto, ao longo dos ciclos III e IV do Ensino Fundamental, espera-se que
os aprendentes adquiram, progressivamente, as competências em relação ao
desenvolvimento da comunicação e da habilidade de leitura. Para isso, propõe-se o
ensino integrado da Língua Materna e da Língua Estrangeira que possibilite ao
aprendente resolver problemas da vida cotidiana, ter acesso aos bens culturais e
alcançar a participação plena no mundo letrado. Espera-se, ainda, que através da
pesquisa, discussão e produção de textos, estimule-se a compreensão dos mais
diversos gêneros, em diferentes situações comunicativas, tanto na modalidade escrita
quanto na oral (Matrizes de Referência, Temas, Tópicos e Descritores da Prova Brasil).
Por esse motivo, propomos que o ensino da Língua Estrangeira tenha os
seguintes eixos conceituais norteadores:
a) Discurso/interdiscurso: percurso dinâmico, movimento realizado pela
prática da língua (enunciados orais, escritos) em variados contextos sociais, espaço-
tempo diferenciados, que permeiam as relações sociais e de poder e que permitem aos
sujeitos significar e intervir no real.
b) Variedade e análise linguística: são os diferentes modos de expressar a
língua, compreendida e analisada em sua complexidade, variedade e riqueza.
c) Gênero: é a forma codificada em que a língua se manifesta em diferentes
formas de textualização e em diferentes contextos sócio-históricos e culturais.
3.1.4.1 - Objetivos do Ensino da Língua Estrangeira para o Terceiro Ciclo
As práticas educativas devem ser organizadas de maneira a garantir,
progressivamente, que os alunos sejam capazes de:
Entender a mensagem do texto, reconhecendo as palavras cognatas e os
falsos cognatos;
61
Ler texto na língua estrangeira fazendo inferências contextuais sobre o
mesmo, recorrendo a materiais escritos na língua portuguesa para buscar informações
sobre o conteúdo do qual está lendo;
Utilizar a linguagem oral com eficácia, adequando-a às intenções e
situações comunicativas e estratégias dentro de contextos específicos;
Ler e interpretar textos, sabendo reconhecê-los de acordo com os gêneros
previstos para o ciclo;
Possibilitar a ampliação da competência de leitura do aprendente, ou seja,
uma prática de leitura a partir da leitura de textos cuidadosamente selecionados para
que os mesmos sejam de interesse do leitor;
Utilizar o dicionário em momentos apropriados e quando necessário;
Desenvolver no aluno comportamentos de leitores e escritores,
considerando as especificidades do gênero textual, do suporte e das condições de
produção;
Ler textos, na língua estrangeira, utilizando estratégias de leituras para
melhor compreendê-los, tais como a inferência contextual que possibilita a mediação de
sentidos entre o sujeito e o mundo, entre a imagem e o objeto;
Identificar no universo que o cerca as línguas estrangeiras que cooperam
nos sistemas de comunicação, percebendo-se como parte integrante de um mundo
plurilíngue e compreendendo o papel hegemônico que algumas línguas desempenham
em determinado momento histórico;
Reconhecer que o aprendizado de uma ou mais línguas lhe possibilita o
acesso a bens culturais da humanidade construídos em outras partes do mundo;
Ler e valorizar a leitura como fonte de informação e prazer, utilizando-a
como meio de acesso ao mundo do trabalho e dos estudos avançados.
3.1.4.2 - Objetivos do Ensino da Língua Estrangeira para o Quarto Ciclo
As práticas educativas devem ser organizadas de maneira a garantir,
progressivamente, que os alunos sejam capazes de:
Vivenciar uma experiência de comunicação humana, pelo uso de uma
língua estrangeira, no que se refere a novas maneiras de se expressar e de ver o
mundo, refletindo sobre os costumes ou maneiras de agir e interagir e as visões de seu
próprio mundo, possibilitando maior entendimento de um mundo plural e de seu próprio
papel como cidadão de seu país e do mundo;
Construir conhecimento sistemático, sobre a organização textual e sobre
como e quando utilizar a linguagem nas situações de comunicação, tendo como base
os conhecimentos da língua materna;
Desenvolver consciência linguística e consciência crítica dos usos que se
fazem da língua estrangeira que está aprendendo;
Ler não somente os textos de situações diárias como também textos
literários apresentando os autores da literatura estrangeira;
62
Identificar as características descritivas, narrativas, dissertativas,
argumentativas em textos;
Identificar, no texto, ideias centrais e periféricas, localizando informações e
fazendo uso de inferências;
Promover debates e seminários sobre temas contemporâneos dos textos
lidos que necessitem reflexão detalhada para desenvolvimento da consciência do
aprendente;
Ler diferentes gêneros textuais, interagindo com os diferentes tipos de
textos, a fim de estabelecer relações entre as ideias do texto;
Saber reconhecer a que nomes os pronomes se referem;
Saber inferir o significado de palavras e expressões desconhecidas.
3.2. CIÊNCIAS HUMANAS
A área das Ciências Humanas se constitui de um conjunto de várias ciências
– Sociologia, Filosofia, Antropologia, História, Geografia, Política e outras – que têm
como objeto de estudo a vida do homem em sociedade e sua relação com o meio
ambiente. Estas ciências devem permitir a compreensão crítica e global da vida em
sociedade, seu funcionamento e sua historicidade; compreender a organização social
através de suas múltiplas facetas: o político, o social, o econômico, o religioso e o
cultural. Elas produziram e produzem conhecimentos que devem se articular entre si
para dar ao homem uma compreensão coerente, abrangente de sua realidade, do
mundo em que vive.
E essa compreensão deve ter por base o vivido e o conceitual, isto é, deve-
se partir das vivências e experiências concretas dos educandos, a fim de se ter uma
leitura da sociedade como totalidade. É necessário, pois, que tomemos a realidade
como ponto de partida para a construção do conhecimento, estabelecendo relações
entre os saberes que os educandos trazem e o conhecimento sistematizado e
acumulado historicamente, articulando o particular e o universal, o próximo e o distante,
o concreto e o abstrato, em diferentes níveis de abrangência, dando assim, significado
à existência dos sujeitos e ao seu mundo.
A Geografia, a História, a Sociologia, a Filosofia e o Ensino Religioso são as
disciplinas que representam, no Ensino Fundamental, esta área de conhecimento, e
pela proximidade dos objetos, devem caminhar articuladamente para dar sentido à
formação global dos educandos. Apesar de saberem-se diferentes, são
complementares, pois todas trabalham no sentido de dar um significado ético-histórico-
cultural para a vida humana.
3.2.1 História
A constituição da disciplina História como um componente curricular no
âmbito escolar brasileiro teve inicio no século XIX, ao definir seus pressupostos teórico-
63
metodológicos baseados no pensamento positivista, exercendo, neste contexto, a
função político-educacional de formar uma identidade comum. O objetivo era conceber
o cidadão nacional, o qual, segundo a ideologia dominante da época, era o responsável
em continuar a construção da nação brasileira. Desse modo, o currículo escolar
privilegiava conteúdos e atividades que exalassem as realizações das elites; o culto à
pátria, através das comemorações cívicas e reverência aos Símbolos Nacionais como a
Bandeira, o Hino e as Armas.
Na perspectiva positivista, à disciplina História cabia implementar os
princípios curriculares estabelecidos pelas elites, a fim de garantir o projeto de
dominação burguesa por meio de um discurso de homogeneidade e unidade das ações
humanas para a construção de uma cultura nacional, buscando negar a exclusão social
e as discriminações de gênero e etnicorraciais. Na metodologia de ensino predominava
a narrativa de fatos do passado e de feitos heróicos com base em uma abordagem
linear, mecânica, pré-determinada e fragmentada do processo histórico, o que
impossibilitava ao aluno desenvolver a percepção de que a História é um fazer
dinâmico, construído por meio da interferência do ser humano.
O ensino escolar de História passou a sofrer alterações de concepções a
partir da década de 1970, com as reflexões sobre as estruturas educacionais
tradicionais, influenciadas por um processo político e social iniciado pelos movimentos
sociais de contestação à dominação econômica, social e étnico-cultural, à exploração
do trabalhador e à expansão do lucro liderado pela sociedade capitalista excludente na
Europa, nos anos 60, que se estendeu a outros continentes.
Nesse período foram formuladas, por historiadores adeptos da corrente
marxista, teorias críticas da educação provocando reflexões acerca do ensino da
disciplina História na escola, com ênfase na necessidade do ensino centrar-se na
análise critica dos fatos sociais, no desvelar dos conflitos de interesse, no
questionamento da História Universal e incluir a história das classes sociais
economicamente menos favorecidas. A orientação foi uma revisão dos conhecimentos
e metodologias a serem adotados pelos professores de História de forma a dar
significado reflexivo ao processo pedagógico.
Assim, os programas de ensino deslocaram o eixo de visão da história: da
narrativa dos feitos heróicos, para o estudo das lutas de classe e da determinação do
movimento da história a partir das estruturas econômicas e sociais, determinando o
desenvolvimento das forças produtivas como motor da história. Contudo, esta
abordagem não rompeu com a concepção determinista e etapista da história, uma vez
que a mesma pautava o ensino na segmentação dos períodos históricos (SOUSA,
2008).
Historiadores como Le Goff (1993), Lucien Febvre e Marc Bloch defenderam
os aportes metodológicos da Nova História, a qual colocava em foco a história das
pessoas, costumes, valores, lugares, mentalidades, crenças, manifestações artístico-
64
culturais diversas, práticas religiosas que por muito tempo foram silenciadas pela
opressão da cultura das elites.
Ainda na década de 80-90, os estudos realizados por Clifford Geertz, Mikhail
Bakhtin, Norbert Elias, Michel Foucault e Pierre Bourdieu, influenciaram um conjunto de
historiadores que abriram perspectivas para novas reflexões, possibilitando a
elaboração de novos conceitos e distintos aportes, fazendo emergir uma nova
tendência na historiografia denominada de Nova História Cultural que valoriza as ações
e concepções de mundo dos sujeitos das classes populares em seu contexto espaço-
temporal. Tal abordagem enfatiza a necessidade da microanálise, ou seja, a micro-
história, fundamentada numa racionalidade não-linear, que reavalia a macro-história,
com recortes que valorizam os sujeitos como indivíduos que sofrem e enfrentam os
condicionantes do processo histórico mais amplo. Isso permite estabelecer relações
interdisciplinares, capazes de analisar relações múltiplas de temporalidades e construir
uma consciência histórica que considera as diversas práticas culturais dos sujeitos.
Nesse sentido, para a implementação de uma perspectiva reflexiva ao ensino
de História é fundamental considerar-se o cotidiano e a história de vida dos sujeitos que
até o momento não foram priorizados na historiografia oficial. A história local se
apresenta como uma alternativa metodológica de organização do conhecimento
histórico escolar e da condução didática, tendo em vista que a mesma possibilita ao
educando estabelecer uma relação de sua realidade local com o saber sistematizado,
facilitando a construção de novos saberes acerca de seu contexto histórico-social.
Desse modo, o ensino de História deve privilegiar os processos históricos
relativos às ações e às relações humanas praticadas no tempo, bem como o significado
atribuído pelos sujeitos, ou melhor, desenvolver linguagens e princípios que permitam
aos educandos ler e interpretar os fatos em diferentes sociedades, tempos e espaços.
Por este motivo, estamos propondo que a abordagem histórica leve em consideração
os seguintes eixos conceituais norteadores:
a) Sociedade: o homem é um ser de grupo que carrega consigo as marcas
de um legado cultural. Suas necessidades são muitas e se preenchem ou são
aperfeiçoadas na interação com os outros ao longo da vida. Nesse sentido, sociedade
aqui é entendida como uma rede de relacionamentos entre pessoas; um tipo de
organização social formada pelo conjunto interdependente de sujeitos que
compartilham interesses, preocupação, intenções, valores, gostos e costumes, e que
interagem entre si e com a natureza, constituindo um sistema semiaberto ou uma
comunidade. O significado mais geral de sociedade refere-se simplesmente a um grupo
de pessoas vivendo juntas numa comunidade organizada. Como tal, o termo sociedade
é muitas vezes usado como sinônimo para o coletivo de cidadãos de um país,
governados por instituições nacionais que lidam com o bem-estar cívico.
A vida social, no entanto, é marcada por conflitos ou visões de mundo
alternativas, competidoras e conflitantes. É neste contexto que a História busca
compreender e explicar os fenômenos sociais, as contradições existentes, contribuindo,
65
assim, para a construção de um aluno crítico e questionador.
b) Cultura: o termo é compreendido aqui como a maneira de viver de um
povo, isto é, tudo o que um povo aprende, produz e adota como hábitos de vida, sua
língua, sua história, suas obras de arte, seus costumes e suas tradições religiosas.
Cultura é, assim, o aspecto da vida social que se relaciona com a produção do saber,
arte, folclore, mitologia, bem como com a sua perpetuação pela transmissão de uma
geração a outra. É, portanto, um sistema de símbolos compartilhados com os quais se
interpreta a realidade e se confere sentido à vida dos seres humanos. Muitas culturas
diferentes podem existir num mesmo país. Tudo o que é aprendido e partilhado pelos
indivíduos de uma determinada comunidade e que confere uma identidade dentro do
seu grupo de pertença é considerado cultura. Por isso, a cultura é o resultado dos
modos como os diversos grupos humanos buscaram resolver os seus problemas ao
longo da história. O homem tanto recebe a cultura dos seus antepassados como cria
elementos que a renova. Desse modo, o homem se fez homem social porque vive num
meio cultural. Cultura é, pois, o conjunto de manifestações humanas que contrastam
com a natureza ou comportamento natural; é criação; é fator de humanização.
c) Espaço: é abordado nas diversas áreas do conhecimento sob os aspectos
históricos, sociológicos, etnológicos e outros. No entanto, procura-se analisá-lo tendo
como referencial sua construção e organização pelos mais diferentes grupos sociais.
À escola cabe oportunizar aos educandos a percepção das relações que são
estabelecidas pelas mais distintas sociedades num dado momento histórico. Porém, é
necessário ensinar aos educandos a não observarem apenas de forma superficial, mas
a terem um olhar mais aprofundado e crítico acerca do espaço. Dessa forma, o espaço
será compreendido não como mera reunião de casas e prédios, mas enquanto uma
construção humana para atender as necessidades materiais e culturais retratando seus
contrastes, conflitos e lutas de classes.
A organização espacial, na verdade, está alicerçada de acordo com a
estrutura da sociedade, ou seja, de acordo com os interesses das classes sociais aí
existentes. Não é sem fundamento que algumas áreas da cidade, por exemplo, sejam
melhores equipadas em termos infraestruturais do que outras, que convivem sem os
serviços básicos essenciais como energia elétrica, água encanada, rede de esgoto. Isto
é fruto das contradições existentes na sociedade.
d) Tempo: é na cultura que o tempo se produz, ou seja, o ser humano vive e
se faz no tempo e com o tempo. Construindo cultura, modos de vida social e de
existência, o homem se historiciza, se contextualiza no tempo. Por isso, o tempo se
configura como uma categoria fundamental para o ensino de história escolar uma vez
que a história é a história das sociedades e/ou algum grupo social que sofre mudanças
a partir das relações de trabalho, de poder e produção cultural, estabelecidas entre os
sujeitos e destes com o espaço em que vivem.
Bittencourt (2004) estabelece algumas especificidades do tempo histórico. O
tempo vivido pode ser concebido como o psicológico – o tempo da experiência
66
individual; o biológico - as etapas da vida do ser humano. O tempo concebido varia de
acordo com a cultura e as relações vividas. O tempo intuitivo definido pelas relações de
sucessão e de duração fornecidas pela percepção imediata externa e interna. O tempo
operatório pode ser métrico-cronológico e periodizações ou qualitativo – relações de
simultaneidade, sucessão e duração.
Neste sentido, o conceito de tempo histórico não pode ficar limitado ao
tempo cronológico. Os alunos precisam compreender a sequência dos acontecimentos,
mas superando as uniformidades, as regularidades, o sentido de sucessão crescente e
cumulativa, para que possam perceber com mais clareza as mudanças e as
permanências nas vivências humanas.
3.2.1.1 - Objetivos do Ensino de História para o Terceiro Ciclo
Conhecer realidades históricas singulares, distinguindo diferentes modos
de convivência nelas existentes;
Caracterizar e distinguir relações sociais da cultura com a natureza em
diferentes realidades históricas;
Caracterizar e distinguir relações sociais de trabalho, de poder em
diferentes realidades históricas;
Refletir sobre as transformações tecnológicas e as modificações que elas
geram no modo de vida das populações e nas relações de trabalho nos vários
contextos;
Localizar acontecimentos no tempo, dominando padrões de medida e
noções para distingui-los por critérios de anterioridade, posterioridade e simultaneidade;
Utilizar diferentes fontes históricas em suas pesquisas escolares;
Ter iniciativa e autonomia na realização de trabalhos individuais e
coletivos.
3.2.1.2 - Objetivos do Ensino de História para o Quarto Ciclo
Utilizar conceitos para explicar relações sociais, econômicas e políticas de
realidades históricas singulares, com destaque para a questão da cidadania;
Reconhecer as diferentes formas de relações de poder inter e intragrupos
sociais;
Identificar e analisar lutas sociais, guerras e revoluções na História do
Brasil e do mundo;
Conhecer as principais características do processo de formação e das
dinâmicas dos Estados Nacionais;
Refletir sobre as grandes transformações tecnológicas e os impactos que
elas produzem na vida das sociedades;
Localizar acontecimentos no tempo, dominando padrões de medida e
noções para compará-los por critérios de anterioridade, posterioridade e
simultaneidade;
67
Debater ideias sobre as diferentes concepções da história e expressá-las
por escrito e por outras formas de comunicação;
Utilizar diferentes fontes históricas em suas pesquisas escolares.
3.2.2 Geografia
Quando se pensa em uma Geografia para o século XXI, devemos considerar
que essa disciplina, assim como as outras, resulta da influência direta promovida pelas
alterações impostas pelo meio técnico-científico-informacional.
A partir do final do século XX, as mudanças resultantes das novas formas de
comunicação, responsáveis, inclusive, por criar uma nova perspectiva de espaço — o
virtual —, transformaram a maneira como a sociedade lida com o conhecimento,
impondo também ao ensino da disciplina uma nova perspectiva. Essa nova concepção
de Geografia incorpora um segundo momento, quando os desafios impostos pelas
transformações do meio técnico-científico-informacional inseridos em sala de aula e fora
dela promovem uma conexão on-line e passam a influir e a modificar o local, o regional
e o global ao mesmo tempo.
O encurtamento das distâncias associado à expansão dos meios de
transporte tanto de pessoas e mercadorias como de informações, assim como as
alterações promovidas no mundo do trabalho, permitem a cada momento vislumbrar um
leque de aproximações capazes de romper com as barreiras culturais, aproximando
mundos diferentes. Essa nova concepção de espaço influencia os modos de agir e de
pensar da humanidade em sua totalidade.
O ensino de Geografia ganha, portanto, uma nova dimensão de espaço — o
espaço virtual e se materializa numa concepção de ensino diferenciada, em que os
conteúdos específicos de Geografia, ao interagirem com os de outras ciências,
possibilitam ao educando, por intermédio da mediação realizada pela escola, a
ampliação de um conhecimento autônomo e abrangente.
Também é fundamental desenvolver uma atitude de respeito aos saberes
que o estudante traz à escola, adquiridos em seu meio cultural, pois é certo que
envolvem uma variada gama de discussões com temas da atualidade, como a urgência
ambiental, os diferentes níveis de bem-estar das populações, as questões de saúde
pública, as políticas assistenciais, as greves, o desemprego, a globalização, as relações
internacionais, os conflitos de diferentes ordens, as crises econômicas, entre outros.
O objeto central da investigação geográfica reside, portanto, no estudo do
espaço geográfico, abrangendo o conjunto de relações que se estabelece entre os
objetos naturais e os construídos pela atividade humana, ou seja, os artefatos sociais.
Nesse sentido, enquanto o “tempo da natureza” é regulado por processos bioquímicos
e físicos responsáveis pela produção e pela interação dos objetos naturais, o “tempo
histórico” responsabiliza-se por perpetuar as marcas acumuladas pela atividade
humana como produtora de artefatos sociais. Ao considerar tais premissas, o ensino de
68
Geografia deve priorizar o estudo do território, da paisagem e do lugar em suas
diferentes escalas. Assim, rompe-se com uma visão estática na qual a natureza segue
o seu curso imutável e irreal, enquanto a humanidade é vista como uma entidade a ser
estudada à parte, como se não interagisse com o meio.
O conceito de escala geográfica expressa as diferentes dimensões que
podem ser escolhidas para o estudo do espaço geográfico, passível de ser abordado a
partir de recortes tais como o lugar, a região, o território nacional ou o mundo.
Entretanto, as diferentes escalas geográficas estão sempre inter-relacionadas: é
preciso, por exemplo, considerar o mundo, a região e o território nacional na análise
dos fenômenos que ocorrem no lugar. Desse modo, assim como os demais
componentes curriculares da educação básica, cabe ao ensino de Geografia privilegiar
a alfabetização geográfica, ou seja, desenvolver linguagens e princípios que permitam
ao aluno ler e compreender o espaço geográfico. Em virtude disso propomos uma
abordagem que leve em consideração os seguintes eixos conceituais norteadores:
a) Território: o termo foi originalmente formulado pela Biologia,
compreendendo a área delimitada por uma espécie na qual são desempenhadas as
suas funções vitais. Incorporado posteriormente pela Geografia, o conceito ganhou
contornos geopolíticos ao configurar-se como o espaço físico no qual o Estado se
concretiza. Porém, ao se compreender o Estado nacional como a nação politicamente
organizada, estruturada sobre uma base física, não é possível considerar apenas sua
função política, mas também o espaço construído pela sociedade. Portanto, o território
deve ser considerado a extensão apropriada e usada pela sociedade. Ao compreender
o que é o território, deve-se levar em conta toda a diversidade e a complexidade de
relações sociais, de convivências e diferenças culturais que se estabelecem em um
mesmo espaço.
b) Paisagem: distinto do senso comum, esse conceito tem um caráter
específico para a Geografia. A paisagem geográfica é a unidade visível do real e que
incorpora todos os fatores resultantes da construção natural e social. A paisagem
acumula tempos e deve ser considerada como tudo aquilo que vemos; o que nossa
visão alcança (SANTOS, 2001). Dessa forma, uma paisagem nunca pode ser destruída,
ela está sempre se modificando. As paisagens devem ser consideradas como a forma
de um processo em contínua construção, pois representam a aparência dos elementos
construídos socialmente e, portanto, representam a essência da própria sociedade que
as constrói.
c) Lugar: o conceito de paisagem vincula-se fortemente ao conceito de lugar,
e este também se distingue do senso comum. Para a Geografia, o lugar traduz os
espaços nos quais as pessoas constroem os seus laços afetivos e subjetivos, pois
pertencer a um território e fazer parte de sua paisagem significa estabelecer laços de
identidade com cada um deles. É no lugar que cada pessoa busca suas referências
pessoais e constrói o seu sistema de valores. São esses valores que fundamentam a
vida em sociedade, permitindo, a cada lugar, construir uma identidade própria.
69
d) Educação cartográfica: a alfabetização cartográfica deve ser entendida
como um dos instrumentos indispensáveis para a cidadania. Como diria Lacoste,
cartas, para quem não aprendeu a lê-las e a utilizá-las, sem dúvida não têm qualquer
sentido, como não teria uma página escrita para quem não aprendeu a ler. Portanto,
uma educação que objetiva a formação do cidadão consciente e autônomo deve
incorporar no currículo os fundamentos para o desenvolvimento da alfabetização
cartográfica, da leitura e da interpretação de gráficos e tabelas, além de leitura,
interpretação e confecção de mapas.
3.2.2.1 - Objetivos do Ensino de Geografia para o Terceiro Ciclo
Reconhecer que a sociedade e a natureza possuem princípios e leis
próprios e que o espaço geográfico resulta das interações entre elas, historicamente
definidas;
Compreender a escala de importância, no tempo e no espaço, do local e
do global e da multiplicidade de vivências com os lugares;
Reconhecer a importância da cartografia como uma forma de linguagem
para trabalhar em diferentes escalas espaciais as representações locais e globais do
espaço geográfico;
Distinguir as grandes unidades de paisagens em seus diferentes graus de
humanização da natureza, inclusive a dinâmica de suas fronteiras, sejam elas naturais
ou históricas, a exemplo das grandes paisagens naturais, e das sociopolíticas como dos
Estados nacionais e cidade-campo;
Compreender que os conhecimentos geográficos que adquiriram ao longo
da escolaridade são parte da construção da sua cidadania, pois os homens constroem,
se apropriam e interagem com o espaço geográfico nem sempre de forma igual;
Perceber na paisagem local e no lugar em que vivem as diferentes
manifestações da natureza, sua apropriação e transformação pela ação da coletividade,
de seu grupo social;
Reconhecer e comparar a presença da natureza, expressa na paisagem
local, com as manifestações da natureza presentes em outras paisagens;
Reconhecer semelhanças e diferenças nos modos que diferentes grupos
sociais se apropriam da natureza e a transformam, identificando suas determinações
nas relações de trabalho, nos hábitos cotidianos, nas formas de se expressar e no
lazer;
Conhecer e utilizar fontes de informação escritas e imagéticas, utilizando
para tanto alguns procedimentos básicos;
Criar uma linguagem comunicativa, apropriando-se de elementos da
linguagem gráfica utilizada nas representações cartográficas;
Saber utilizar a observação e a descrição na leitura direta ou indireta da
paisagem, sobretudo mediante ilustrações e linguagem oral;
70
Reconhecer, no seu cotidiano, os referenciais espaciais de localização,
orientação e distância, de modo que se desloquem com autonomia e representem os
lugares onde vivem e se relacionam;
Reconhecer a importância de uma atitude responsável de cuidado com o
meio em que vivem, evitando o desperdício e percebendo os cuidados que se devem
ter na preservação e na conservação da natureza.
3.2.2.2 - Objetivos do Ensino de Geografia para o Quarto Ciclo
Neste ciclo, pretende-se que os educandos construam um conjunto de
conhecimentos, referentes a conceitos, procedimentos e atitudes relacionados à
Geografia, que lhes permitam ser capazes de:
Compreender as múltiplas interações entre sociedade e natureza nos
conceitos de território, lugar e região, explicitando que de sua interação resulta a
identidade das paisagens e lugares;
Identificar e avaliar as ações dos homens em sociedade e suas
consequências em diferentes espaços e tempos, de modo que construam referenciais
que possibilitem uma participação propositiva e reativa nas questões sociais, culturais e
ambientais;
Compreender a espacialidade e a temporalidade dos fenômenos
geográficos estudados em suas dinâmicas e interações;
Compreender que as melhorias nas condições de vida, os direitos
políticos, os avanços técnicos e tecnológicos e as transformações socioculturais são
conquistas decorrentes de conflitos e acordos que ainda não são usufruídas por todos
os seres humanos e, dentro de suas possibilidades, empenhar-se em democratizá-las;
Utilizar corretamente procedimentos de pesquisa da Geografia para
compreender o espaço, a paisagem, o território e o lugar, seus processos de
construção, identificando suas relações, problemas e contradições;
Fazer leituras de imagens, de dados e de documentos de diferentes fontes
de informação, de modo que interprete, analise e relacione informações sobre o
território, os lugares e as diferentes paisagens;
Utilizar a linguagem gráfica para obter informações e representar a
espacialidade dos fenômenos geográficos;
Valorizar o patrimônio sociocultural e respeitar a sociodiversidade,
reconhecendo-os como direitos dos povos e indivíduos e elementos de fortalecimento
da democracia;
Perceber que a sociedade e a natureza possuem princípios e leis próprias,
e que o espaço resulta das interações entre elas, historicamente definidas;
Relativizar a escala de importância, no tempo e no espaço, do local e do
global e da multiplicidade de vivências com os lugares;
Conseguir distinguir as grandes unidades de paisagens em seus
diferentes graus de humanização da natureza, inclusive a dinâmica de suas fronteiras,
71
sejam elas naturais ou históricas, a exemplo das grandes paisagens naturais e das
sociopolíticas, como dos Estados nacionais e cidade-campo;
Explicar que a natureza do espaço como território e lugar é dotada de uma
historicidade em que o trabalho social tem uma grande importância para a
compreensão da dinâmica de suas interações e transformações;
Desenvolver no aluno o espírito de pesquisa, fundamentado na ideia de
que para compreender a natureza do território, paisagens e lugares, é importante valer-
se do recurso das imagens e de vários documentos que possam oferecer informações,
ajudando-o a fazer sua leitura para desvendar essa natureza;
Fortalecer o significado da cartografia como uma forma de linguagem que
dá identidade à Geografia, mostrando que ela se apresenta como uma forma de leitura
e de registro da espacialidade dos fatos do seu cotidiano e do mundo;
Criar condições para que o aluno possa começar, a partir de sua
localidade e do cotidiano do lugar, a construir sua ideia do mundo, valorizando,
inclusive, o imaginário que tem dele.
3.2.3 Filosofia
Historicamente as professoras e os professores de Filosofia sempre tiveram
sua presença posta em xeque na estrutura educacional brasileira, pois a maioria do
público não via utilidade no ensino ou aprendizado dos chamados temas filosóficos,
soando como coisa vaga e puramente abstrata. Atualmente, apesar de muitos falarem
da importância da Filosofia na escola, isto é justificado, por vezes, de maneira
moralista.
O Estado do Pará foi um dos primeiros a promover o regresso da disciplina
ao Ensino Básico, após o período de exceção vivido durante os anos de “chumbo” no
Brasil, período político em que os governos militares retiraram o ensino de Filosofia e
Sociologia das escolas, pois, – segundo um discurso bastante utilizado – os
governantes temiam que se questionasse o status quo, que tal ensino pudesse
esclarecer as massas e fazer com que as crianças e os jovens aprendessem a
contestar a ordem vigente do poder e da autoridade.
Na Secretaria Municipal de Educação de Belém, seu retorno tem caminhado
para o amadurecimento, pois começou com a inclusão da Filosofia e da Sociologia
como disciplinas obrigatórias na estrutura curricular do ensino fundamental (Ciclos III e
IV), a partir da Lei Municipal nº 8.338, de 8 de julho de 2004. Sua implantação se deu
através do que se denominou de “Projeto Piloto”, de caráter experimental, em dez
escolas da Rede Municipal. Em 2005, numa parceria com o Departamento de Filosofia
da Universidade Federal do Pará (UFPA), realizou-se um curso de Ensino de Filosofia
no Ensino Fundamental que culminou por selecionar alguns professores de Filosofia
para ingressarem na rede municipal de ensino. Desta parceria, surgiu também um
72
primeiro programa para o ensino fundamental da disciplina, organizado pelo citado
Departamento de Filosofia da UFPA.
Esse retorno ganhou respaldo com a aprovação da LDB (Lei nº 9394/1996)
que reconheceu a Filosofia e a Sociologia como conhecimentos necessários ao
exercício da cidadania (art. 36, Inciso IV). Porém, há que se esclarecer que até mesmo
o sentido de cidadania precisa ser visto como algo a se discutir, afinal vivemos num
estado democrático de direito, onde não se deve impor currículos, mas discuti-los. Se
cada um tiver de admitir-se e agir como cidadão, com determinadas atitudes de justiça
e demais valores, isso cabe ao indivíduo decidir. O compromisso deve ser, pois, com o
permitir, possibilitar a livre escolha do educando, colocando-o em contato com os
modos filosóficos de pensar, para que possam pensar melhor, cobrando-lhe somente
o que é de praxe nas disciplinas, a compreensão da realidade dos fatos relacionando-
os com as teorias. Não se pode é cobrar concordância com tudo, nem que cada
educando passe a assumir uma postura filosófica diante do mundo, tampouco que
aceite como verdade as ideologias de poder vigentes.
Filosofar subverte essa ordem, não é proibido, mas antifilosófico praticar o
pensamento filosófico como educação moral a serviço de uma civilidade e uma
ordenação social estabelecidas.
No ensino de Filosofia o importante é apresentar as várias possíveis atitudes
e sentidos filosóficos e avaliar nos educandos a compreensão disso. O que se pretende
neste nível não é o engajamento filosófico dos alunos nem a sua tutela para adequá-lo
ao sistema, mas oportunizar contato com os modos de pensar dos filósofos, estimular e
orientar a análise do processo de pensamento e a aplicação dos mesmos como se faz
com qualquer componente curricular, até o limite de complexidade que os educandos o
conseguirem. Daí, então, cada um escolhe o que julgar melhor pensar, numa atitude
livre.
Isso não significa memorização de teorias, mas aprender a pensar mais
atentamente e pensar por si mesmo, tendo a Filosofia enquanto prática do pensamento,
ou seja, desenvolver a capacidade de pensar analítica e criticamente a realidade
humana; permitir que os alunos tenham contato com releituras de suas convicções,
críticas às suas ideias e tradições, percebam aos poucos que as questões filosóficas
podem ser compreendidas por dentro e por fora de suas vivências e saberes, mas
sempre em alguma relação com elas, desafiando-os.
Quanto mais próximas as temáticas tratadas nas aulas de Filosofia da
realidade dos educandos, mais produtivas as reflexões, uma vez que pensar junto com
eles suas experiências e vivências, não é propriamente ensinar, mas polemizar,
desestruturar, desconstruir, fruir, valorizar a problematização, a dúvida filosófica – tarefa
da Filosofia como mobilizadora do pensamento.
Desse modo, temos um primeiro pressuposto sugerido: a investigação
filosófica como provocação, como propõe o pensador Gilles Deleuze em seu
73
Abecedário (exemplo moderno de como relacionar o cotidiano com a teoria), que passa
a ser suporte imprescindível no ensino de Filosofia.
O educador faz-se provocador e possível orientador do pensar, mas não um
condutor ou tutor que vá impedir a liberdade criativa do educando. Mais do que
aperfeiçoar o pensamento na produção de explicações, o ensino do filosofar permite a
elaboração de questionamentos que libertam o pensar do indivíduo de suas amarras,
como aponta a tão citada e incompreendida proposição de Kant sobre o ensino
filosófico: “Só é possível aprender a filosofar”6.
Consoante essas intenções anunciadas, é que podem ser respondidas as
graves questões colocadas pela prática educativa: Quais são os sentidos necessários à
formação dos jovens? O que se deve ensinar como valor às crianças? Sejam quais
forem as respostas dadas a essas perguntas, cabe ao professor de Filosofia, além de
examinar a coerência de tais significados, fazer a crítica dos fundamentos em que
assentam esses valores, pois deles dependem a regulação de nosso agir cotidiano e a
garantia do pensamento em geral, num processo que se faz e refaz continuamente.
Realizando essa proposta provocativa, o que se tem é o início de uma cultura reflexiva
e dialógica que não permite ou exige, mas reconhece e gera nos jovens e adolescentes
autonomia e percepção ética, por meio do convívio e da compreensão do pensar e do
agir diferentes, do incentivo à sua capacidade de argumentação, colaborando
inevitavelmente para o que se propõem como competências básicas de aprendizado
nos Ciclos de Formação III e IV.
Um segundo pressuposto sugerido do ensino de Filosofia no Ensino
Fundamental é o processo de discussão da postura diante do mundo, auxiliando as
crianças e os jovens a refletirem sobre as atitudes e problemas da existência humana
de modo autônomo. Como prevê a Declaração de Paris (de 1995, que reuniu
Professoras e Professores Filósofos de diversos continentes)
Reafirmamos que a educação filosófica, formando espíritos livres e reflexivos, capazes de resistir às diversas formas de propaganda, de fanatismo, de exclusão e de intolerância, contribui para a paz e prepara cada um a assumir suas responsabilidades face às grandes
interrogações contemporâneas7.
O diálogo de ensinoaprendizagem filosófico mobiliza todo o arcabouço de
valores, conceitos e preconceitos que educandos e educadores utilizam em sua vida,
contrapondo-os no exercício de polemização que possibilita um amadurecimento
progressivo do pensar, numa elaboração contínua e necessária à vida humana. Isso dá
pertinência ao filosofar nos Ciclos III e IV, tendo em vista que vai além da exigência de
6 KANT, Immanuel. Crítica da Razão Pura. 1983, p.407-408.
7 A Declaração de Paris é produto de um encontro internacional que pautou a relevância do ensino de Filosofia para a
humanidade no ano de 1995. Pode ser encontrada no endereço eletrônico
edsongil.files.wordpress.com/.../declaracaodeparisparaafilosofia.doc, em tradução feita por componentes do Centro
Acadêmico de Filosofia da UFPA.
74
direitos e cumprimento de deveres da cidadania, abrindo espaço para a atividade
básica de construção da política, a discordância crítica, universalizante e livre,
possibilitando uma prática cidadã que não é uniformizante e sim dialética. A
responsabilidade, o respeito e outros valores acabam por advir, do modo como for
decidido livremente, de uma compreensão necessária e não de uma necessidade
compreendida, pensando e constituindo suas ideias na prática. A forma de conduzir ou
permitir a fluência do processo de ensinoaprendizagem é fundamental, mas isso
depende, no entanto, de uma teoria filosófica ou várias que constituam um conjunto
norteador do trabalho do (a) professor (a) de Filosofia. Neste sentido, alguns conceitos
norteadores podem fundamentar o trabalho a ser desenvolvido na escola e fora dela,
nos momentos de pensar filosófico:
a) O Ser: mediante as teorias existentes acerca do que é o ser de um modo
geral e o Ser Humano, a partir do pensamento de filósofos Pré-Socráticos e de
Aristóteles, é possível iniciar a compreensão das mais básicas investigações,
apresentando não propriamente toda a teoria desses pensadores em sua
complexidade, mas começando por mostrar como é possível construir as questões
trabalhadas por eles: O que sustenta o todo do que existe? É possível explicá-lo? Como
ele se encontra atualmente? O que é o Ser Humano? O que é o Pensar? É possível e
necessário defini-los?
b) A Linguagem: demonstrando nas teorias e com exemplos da vivência
humana sobre as mais diversas formas de dizer, exprimir, afirmar, negar, debater,
argumentar etc., pode-se iniciar a percepção dos diferentes níveis das linguagens,
levando a pensar seu papel: se instrumento, inventora de sentidos, belezas; se espaço
de transformação; enfim, provocar a análise de toda a capacidade simbólica humana.
c) O Fazer: buscar a apresentação espontânea e estimular a contraposição
das visões e posturas de mundo, num movimento dialético de enfrentamento do que se
pensa e propõe como verdade ou certeza, investigando de modo conjunto os meandros
dos discursos, produções e atitudes estéticas, morais, políticas. As teorias filosóficas
juntam-se num coletivo de construção e desconstrução de juízos.
3.2.3.1 - Objetivos do Ensino de Filosofia para o Terceiro Ciclo
A especificidade do ensino filosófico é justamente ensinar a interpretação
filosófica das ideias e coisas em geral. No Ciclo III, isso significa estimular, orientar e
avaliar a partir dos seguintes objetivos:
Compreender as ideias e atitudes filosóficas iniciais;
Utilizar de recursos lógicos e linguísticos próprios da Filosofia;
Compreender a problematização filosófica de realidades, linguagens e
ideias, fazendo-se uso de conceitos filosóficos básicos;
Compreender o questionamento filosófico de ideias de outras áreas de
estudo; tipos de pensamento e da própria Filosofia em trabalhos interdisciplinares;
75
Compreender o questionamento do próprio pensamento, do ser, do agir e
do fazer humano e da realidade em geral;
Leitura filosófica inicial dos mais diversos tipos de textos e obras
humanas, inclusive os filosóficos, e realidades próximas aos educandos;
Produção de discurso escrito, falado ou outras expressões que
demonstrem compreensão inicial de como é realizado o modo de pensar filosófico e
suas articulações.
3.2.4 Sociologia
O homem se diferencia dos animais por sua capacidade de se relacionar e
produzir; isso graças, dentre outros fatores, à linguagem que lhe possibilita comunicar-
se com outros homens e tornar-se um ser social. Neste sentido, é imprescindível
compreender como o homem biológico torna-se um ser social e produtor de cultura. Tal
processo envolve todos os sujeitos sociais, modelando comportamentos e
personalidades, internalizando regras sociais, maneiras de ser, de pensar e de agir
transmitidas por meio da socialização. O homem, portanto, precisa compreender-se e
compreender os outros e, para isso, busca respostas.
A Sociologia é uma ciência que tem como objetivo responder aos
questionamentos a respeito da existência humana, enquanto sujeito social, explicando
os fenômenos sociais, observando os homens e suas relações de interdependência, em
interação e os produtos dessa interação, compreendendo-os como ser sociocultural.
Enquanto ciência social tem como foco o estudo do homem em sociedade, o homo
socius, portanto, o homem e seu universo sociocultural como um todo, analisando as
inter-relações entre os diversos fenômenos sociais.
A Sociologia como um conhecimento que procura demonstrar a “verdade”
sobre a natureza dos fenômenos sociais ganha importância no Ensino Fundamental,
uma vez que é uma ciência que possibilita aos alunos compreenderem-se enquanto
sujeitos sociais e também compreender o outro que faz parte desse universo social,
percebendo também a relação existente entre homem e sociedade.
Por outro lado, são várias as concepções sobre Sociologia. Para alguns ela
está a serviço dos interesses dominantes; para outros, ela representa, teoricamente,
uma intimidade com os movimentos revolucionários. Segundo Martins (2006) a
Sociologia é “este conjunto de conceitos, de técnicas e de métodos de investigação
produzidos para explicar a vida social” (p. 8). Ele afirma também que a Sociologia [...] “é
o resultado de uma tentativa de compreensão de situações sociais radicalmente novas,
criadas pela então nascente sociedade capitalista” (p. 8). Desde seus primórdios esteve
para além da tentativa de refletir sobre a sociedade moderna; na verdade, esta ciência
ao explicar os fenômenos sociais, teve e tem intenções e interesses de interferir na
realidade social. Os conflitos e contradições existentes na sociedade capitalista entre as
76
classes sociais, em especial entre burguesia e proletariado, influenciaram e continuam
influenciando significativamente a construção e sistematização da Sociologia.
A Sociologia surgiu num contexto histórico que culminou com a decadência
da sociedade feudal e consolidação da sociedade capitalista, e “sua criação não é obra
de um único filósofo ou cientista, mas representa o resultado da elaboração de um
conjunto de pensadores que se empenharam em compreender as novas situações de
existência que estavam em curso” (MARTINS, 2006, p. 10-11). No século XVIII,
profundas transformações de cunho socioeconômico, político e culturais ocorreram no
mundo ocidental, trazendo situações até então inexistentes para os homens. Essas
transformações foram provocadas tanto pela Revolução Industrial, quanto pela
Revolução Francesa. Tais movimentos foram decisivos para a perpetuação do
capitalismo e também para o surgimento de uma nova ciência, a Sociologia, que
procurou compreender e explicar as permanências e as transformações que ocorriam
na sociedade e, em alguns casos, até a se arriscar a propor encaminhamentos para
dadas situações sociais. Por isso é que a Sociologia busca responder algumas
questões referentes à vida dos homens em sociedade, estudar e explicar as relações
sociais e também sistematizar conhecimento científico sobre os fenômenos sociais.
Porém, é no século XIX que a Sociologia se firma enquanto ciência social,
por meio de estudos científicos realizados por autores como Augusto Comte, Émile
Durkheim, Karl Marx, Max Weber, entre outros que procuraram analisar e explicar a
dinâmica da nova realidade social: o capitalismo. Cada um a seu modo procurou
fundamentar suas explicações, chegando a conclusões que se diferenciam uns dos
outros sobre os problemas que emergiam ou eram provocados pela consolidação da
sociedade capitalista. Alguns consideravam que ela produzia solidariedade (Durkheim),
outros que era uma sociedade extremamente desigual.
Karl Marx, por exemplo, considerou-a como um modo de produção que
provocava uma divisão do trabalho entre os proprietários e os não proprietários dos
meios de produção. Esta divisão, segundo ele, é responsável pela luta de classe entre
trabalhadores (proletariado) e capitalista (burguesia) e pela exploração através do maior
valor produzido pelo trabalho (mais-valia). É esse movimento contraditório entre
trabalho e capital que permitiria a superação da atual sociedade e a construção de
outra.
Outro sociólogo que muito contribuiu para a compreensão da sociedade
capitalista foi Max Weber que parte da análise desenvolvida por Marx, mas a modifica,
remetendo-a a outros encaminhamentos. Weber, assim como Marx, acreditava que a
noção de classe tem um determinante econômico fundamental. Porém, aponta outros
elementos que não têm vínculo direto com a riqueza, mas que são importantes para a
definição do conceito de classe social, tais como: o prestigio hereditário, a participação,
a autoidentificação, o reconhecimento dos outros, os estilos de vida, a educação, as
atitudes e os valores que os indivíduos possuem. Para Weber, as desigualdades não
77
resultam somente da divisão da sociedade em classes; elas são modeladas
principalmente pelo status e pelo partido.
Podemos perceber que tanto Marx quanto Weber divergem em suas análises
sobre a sociedade capitalista. No entanto, ambos têm pontos em comum:
compreenderam que a sociedade capitalista é uma sociedade desigual e que as
classes sociais são fundamentalmente determinadas pelo fator econômico.
É, portanto, pelos estudos pioneiros desses autores que a Sociologia
penetrou nas Universidades, já no século XX, e ganhou o reconhecimento de Ciência
Social.
Como uma disciplina que tem por objetivo possibilitar aos alunos uma
reflexão acerca da realidade sociocultural em que estão imersos, e nela se
compreenderem enquanto sujeitos, é que propomos uma abordagem que leve em
consideração os seguintes eixos conceituais norteadores:
a) Socialização: processo pelo qual nós nos fazemos uns com os outros e a
própria sociedade, através da complexa teia de relações sociais que estabelecemos
desde criança. Para Berger e Luckmann (2002, p. 175) é “a ampla e consistente
introdução de um indivíduo no mundo objetivo de uma sociedade ou de um setor dela”.
A socialização se constitui de socialização primária, aquela que acontece na infância e
a socialização secundária, que diz respeito a outros processos que introduzem o
indivíduo já socializado em novos setores do mundo objetivo de uma sociedade.
b) Classe Social: para a visão weberiana, classe social corresponde à
posição de um dado grupo no sistema predominante de estratificação social da
sociedade industrial, considerando-se para isso os rendimentos, o prestígio e o poder.
Para Marx, no entanto, classe social representa o lugar que grupos humanos ocupam
no interior das relações sociais de produção, como se relacionam e desempenham
seus papéis na organização social do trabalho.
Embora, hoje, surjam determinadas interpretações que buscam esvaziar o
conceito de classe social, ele é ainda uma ferramenta de análise importante para se
compreender nossa sociedade capitalista.
c) Diversidade Cultural: do ponto de vista antropológico, a cultura é
entendida como um processo histórico, dinâmico e pode representar também um
processo de dominação, político e ideológico. Desse modo, o povo brasileiro é,
enquanto cultura brasileira, fruto de um processo sócio-histórico, em que os
fundamentos culturais encontram-se arraigados nas questões de âmbito econômico,
social, político e ideológico. Os problemas vivenciados no decorrer do processo sócio-
histórico brasileiro influenciaram e influenciam decisivamente na formação da cultura e
identidade do povo brasileiro. Assim, no decorrer da história foi se criando uma
identidade nacional brasileira. Tal identidade se firmou e se consolidou a partir da
diversidade cultural criada e exteriorizada por milhões de brasileiros.
Nos dias atuais, não há como falarmos de identidade nacional sem
considerar seus símbolos identitários que representam o “jeitinho” peculiar de ser de
78
cada brasileiro. Esses símbolos são configurados através do carnaval, do samba, das
festas religiosas das regiões Sul, Sudeste, Nordeste e Norte; no futebol etc.
d) Instituições Sociais: as instituições sociais são organizações sociais e
como tal formam sistemas sociais. Para Fichter, (apud LAKATOS 1995, p.166), a
instituição possui “uma estrutura relativamente permanente de padrões, papéis e
relações que os indivíduos realizam segundo determinadas formas sancionadas e
unificadas, com o objetivo de satisfazer necessidades sociais básicas”. Em todas as
sociedades as instituições sociais se fizeram e se fazem presentes e são de
fundamental importância para o funcionamento da sociedade e para o processo de
socialização.
Nas sociedades contemporâneas as instituições sociais mais importantes
são: a família, considerada o fundamento básico e universal das sociedades; a religião,
que também faz parte de toda e qualquer sociedade; o Estado, organização que exerce
autoridade sobre o povo, por meio de um governo consentido, dentro de um território
delimitado, com direito exclusivo ao uso da força; a escola, indispensável para a
sobrevivência de uma sociedade e que tem como função produzir, transmitir, socializar
e perpetuar o acervo de conhecimentos, normas, valores, ideias, ideologias, tradições
etc. que são inerentes ao grupo. É através da diversidade de instituições que a
sociedade se organiza e funciona.
3.2.4.1 - Objetivos do Ensino da Sociologia para o Quarto Ciclo
Compreender a Sociologia enquanto Ciência contemporânea capaz de
contribuir para a formação de mentalidades crítico-transformadoras;
Perceber e analisar as características do sistema capitalista de produção,
sua origem e perpetuação; as relações sociais e seus conflitos; a divisão social do
trabalho e a luta de classes;
Perceber o processo global como uma prática que ratifica os princípios
capitalistas e analisar as consequências desse fenômeno para a sociedade;
Perceber o homem como ser cultural, compreendendo a cultura humana
como um fazer constante, refletindo os vários sistemas simbólicos que compõem a
cultura de uma sociedade;
Compreender a diversidade cultural e o processo de formação da
identidade nacional e regional da sociedade brasileira;
Identificar e compreender as instituições básicas de uma sociedade e suas
principais funções sociais, econômicas, culturais e políticas.
3.2.5 Ensino Religioso
Por séculos o Ensino Religioso foi tratado como ensino da religião ou mais
precisamente ensino do Catolicismo. Assumiu, assim, o caráter de catequese,
evangelização, excluindo-se qualquer referência a outras manifestações religiosas.
79
Porém, ao longo das décadas de 70, 80 e 90 começou a sofrer mudanças profundas.
Foi aos poucos transitando de uma perspectiva catequética para uma visão mais
ecumênica, interconfessional, até definir-se, hoje, como inter-religioso. Essas mudanças
aconteceram em virtude do amadurecimento da compreensão de sua natureza e seu
papel na escola pública, do avanço do conhecimento antropo-socio-teológico sobre o
fenômeno religioso; do pluralismo religioso da sociedade; das lutas sociais por
cidadania e democratização da sociedade brasileira e, sobretudo, pelo empenho de
educadores em resgatar e tornar possível aos educandos o acesso a uma parcela do
conhecimento historicamente acumulado pela humanidade: o conhecimento religioso.
O Ensino Religioso tem como núcleo central de sua ação-reflexão-ação o
estudo da religiosidade humana. Religiosidade essa expressa, manifestada ao longo de
toda a história da humanidade, desde as sociedades pré-históricas, até hoje, pois não
há civilização – seja no oriente, seja no ocidente – que não tenha deixado marcas
profundas de sua vivência religiosa.
Essa religiosidade é a dimensão mais profunda da totalidade do Ser, exprime
a aposta humana de que o universo todo faça sentido; é esforço humano para pensar a
realidade toda a partir da experiência de que a vida tenha sentido. O homem tendo
tomado consciência de sua finitude, limite, inconclusão e fragilidade deparou-se com a
necessidade de sua vida ter sentido. Esse sentimento é, então, externalizado das mais
diversas formas, na tentativa de dominar os mistérios da vida. Este esforço para que a
vida faça sentido e, consequentemente, mereça ser vivida, fez o Homo sapiens sapiens
tornar-se Homo regiliosus.
Esse é o fundamento do fenômeno religioso – objeto de estudo do Ensino
Religioso – que é intrinsecamente humano, universal e está inscrito na radicalidade da
existência humana, porque é abertura ao Transcendente, àquilo ou àquele que
ultrapassa a superfície da vida, que pode lhe dar um sentido último a sua existência.
Ainda que possa ter sido vivenciado em cada época histórica, culturas ou grupos
sociais de modo diferente, expressa a recusa humana de encarar o desconhecido como
barreira definitiva, de não se render ao caos e de se opor às ameaças do não-ser.
Enquanto disciplina que trata do conhecimento religioso, uma das dimensões
do conhecimento humano, o Ensino Religioso possibilita uma reflexão crítica sobre a
práxis sociocultural que estabelece significados, oportunizando novas relações do ser
humano com a natureza, com o mundo e com o outro. Possibilita ao educando reflexão
sobre sua religiosidade, permitindo-lhe encontrar respostas ao seus questionamentos
existenciais mais profundos, indo além da aparência das coisas, acontecimentos, ritos,
símbolos, formulações para interpretar toda a realidade em profundidade crescente, de
modo crítico e transformador.
Nesse percurso, é preciso ter cuidado com a banalização do religioso, com
as verdades absolutas, com o fanatismo, a intolerância e o proselitismo. O Ensino
Religioso não pode ser confundido com o ensino de religião, que é de competência de
cada denominação religiosa e não da escola pública. Como área do conhecimento,
80
deve buscar uma visão interdisciplinar do conhecimento religioso, articulando os vários
aspectos: sociológico, antropológico, filosófico, teológico e psicológico que permitam
um entendimento mais abrangente e consistente do fenômeno religioso. Por isso, não
pode ser mera informação de conteúdos religiosos, um saber pelo saber, sem sabor.
Portanto, o Ensino Religioso como disciplina escolar deve valorizar o
pluralismo religioso, a diversidade cultural e religiosa presentes na sociedade brasileira
e paraense, tendo como finalidade: facilitar a compreensão do educando, de si próprio,
do outro que o diferencia, do mundo com e no qual se inter-relaciona, do
Transcendente que se manifesta plural e diverso no processo de construção da
Humanidade.
Deve garantir e afirmar o direito à diferença e apresentar uma prática
docente própria, alicerçada no exercício e no aprendizado da cidadania, no respeito, no
compromisso com uma sociedade democrática, plural, menos desigual, solidária e
fraterna. Sua práxis não deve descurar de considerar sempre, o convívio social dos
educandos, sua tradição religiosa e de sua família, a liberdade de expressão religiosa,
sem comparações, confrontos ou preconceitos de qualquer espécie, isto é, deve ter
como eixos conceituais norteadores do conhecimento: as culturas e tradições
religiosas, as escrituras sagradas (escritas e orais), as teologias, os ritos e os ethos que
sustentam a pluralidade cultural e religiosa das mais diversas raízes: européia, oriental,
africana e indígena, desencadeando, assim, o diálogo e a reverência8.
a) Culturas e Tradições Religiosas: reúne um conjunto de conhecimentos
ligados ao fenômeno religioso que lhe servem de fundamento e que discutem a “função
e valores da tradição religiosa, relação entre tradição religiosa e ética, teodicéia,
tradição religiosa natural e revelada, existência e destino do ser humano nas diferentes
culturas” (PCN: Ensino Religioso, p. 33). Falar de cultura e tradições religiosas é falar
da profunda relação que há entre elas, dos elementos que a conectam, pois é
impossível entender a religião fora do universo cultural. É estabelecer diálogo entre o
núcleo “ético-mitico” da cultura, com a aquilo que fomos (passado), somos (presente) e
que seremos (futuro).
b) Escrituras Sagradas (orais e escritas): estudo dos textos, narrativas que
transmitem, de acordo com a crença de seus fiés, uma mensagem do Transcendente,
isto é, através dessas escrituras o Transcendente revela, faz conhecer aos seres
humanos seus mistérios, sua vontade, seus preceitos e suas orientações para a vida
neste mundo em um tempo histórico e contexto cultural determinado (PCN: Ensino
Religioso).
c) Teologias: é o conjunto de afirmações e conhecimentos elaborados,
organizados e sistematizados por cada tradição religiosa sobre o Transcendente e
repassado ao fieis.
8 Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso. Parâmetros Curriculares Nacionais: ensino religioso, 1997.
81
d) Ritos: é o conjunto de práticas religiosas das diferentes religiões. É o
estudo do complexo universo simbólico dessas religiões.
e) Ethos: “É a forma interior da moral humana em que se realiza o próprio
sentido do ser” (PCN: Ensino Religioso, p. 37). São as orientações, as normas, os
valores de cada tradição religiosa apresentados aos fiéis no contexto sociocultural para
o relacionamento com o outro. São os fundamentos éticos propostos pelas religiões.
3.2.5.1 - Objetivos do Ensino Religioso para o Terceiro Ciclo
Conhecer a evolução das estruturas religiosas nas organizações humanas
no decorrer do tempo;
Compreender a formação histórica da ideia do Transcendente;
Analisar, nas diferentes mudanças culturais, como as ideologias religiosas
chegaram a determinar as verdades de que se nutrem;
Perceber que os textos sagrados e as narrativas religiosas são marcados
pelo contexto sociopolítico e religioso e que a verdade contida neles é fruto da
experiência mística de um povo;
Propiciar aos educandos conhecimento do significado dos símbolos
sagrados dos diversos grupos religiosos presentes no mundo;
Valorizar a vida como criação transcendente, desenvolvendo atitudes de
respeito, responsabilidade e preservação para consigo mesmo, com o outro, com a
natureza e com o Transcendente;
Conhecer a sua própria cultura, respeitando os valores das diversas
tradições religiosas, possibilitando a convivência, o respeito, a tolerância e a
solidariedade com o diferente;
Reconhecer que as manifestações de fé: acontecimentos, ritos, símbolos,
formulações e até interpretações do sagrado podem ser utilizadas pelo mercado de
bens simbólicos capitalista, tornando-as instrumento de alienação, exploração e
dominação sociocultural;
Contribuir para o desenvolvimento da capacidade de pensar e agir
criticamente diante de um sistema social injusto que alimenta o preconceito, a
discriminação e as desigualdades;
Possibilitar a reconstrução da relação entre ciência, cultura e fé como
formas de compreensão do humano que não são mutuamente excludentes.
3.2.5.2 - Objetivos do Ensino Religioso para o Quarto Ciclo
Proporcionar ao educando o conhecimento do sentido da vida/morte
sustentado pelas tradições religiosas através das crenças, doutrinas, normas e métodos
de relacionamento com o transcendente, com os outros, com o mundo e consigo
mesmo;
Perceber que as determinações religiosas influenciam na construção
mental do inconsciente coletivo;
82
Compreender que as tradições religiosas edificam e estabelecem
concepções, métodos e exercícios de autoconhecimento, do conhecimento do
Transcendente e do mundo que influenciam e regulam práticas sociais;
Compreender o conhecimento do sagrado como parte fundamental do
conhecimento humano que deve ser integrado, interligado as suas outras dimensões,
na busca de superação de uma visão estreita da vida e do universo;
Perceber que as representações do Transcendente de cada Tradição
Religiosa constituem-se como valor significativo de uma cultura;
Entender a espiritualidade como o cultivo da vivência com o mistério,
elemento vital na relação do fiel com o sagrado;
Promover através da vivência de valores morais, éticos, hábitos e atitudes,
o diálogo inter-religioso de modo a superar preconceitos e proselitismos;
Desenvolver uma postura crítica diante das situações desumanas que se
opõem à vida digna do ser humano (injustiça social, ausência de postura ética,
degradação moral, dominação, exploração, autoritarismo etc.), cultivando a alteridade,
valores e atitudes de solidariedade, cooperação, respeito e repúdio à negação da vida;
Despertar a consciência ecológica como chave para compreensão da vida
como complexidade cósmica integrada.
3.3. CIÊNCIAS DA NATUREZA
A área de conhecimento das Ciências da Natureza reúne um conjunto de
conceitos das Ciências Físicas e Biológicas. As Ciências Físicas compreendem a
Física, a Química, a Geologia e a Astronomia; as Ciências Biológicas abrangem a
Biologia Geral, Botânica, Zoologia e outras (ALMEIDA; OLIVEIRA, 1971; BRASIL,
1998a). Seu objeto de estudo são os fenômenos naturais e os processos de
abstração e generalização. Num trabalho de leitura e interpretação dos fenômenos
naturais, procuram compreender o mundo onde o homem está inserido, constituindo-se
numa via de acesso ao pensamento científico e tecnológico, em que se tratam os
processos de pensamento, os modos de explicar, de entender e atuar na realidade
social e cultural.
Historicamente, até o século XVII, a relação homem-natureza pautou-se na
mutualidade, quando o homem retirava da mãe terra (Gaia) o suficiente para o seu
sustento, o qual podemos ainda verificar na prática de muitos povos indígenas que
mantêm finos laços com a natureza.
A partir do século XVII, surge uma nova concepção da relação homem-
natureza, quando este deixa de ser pertencente ao meio para se tornar o proprietário
dos recursos naturais. Surge, assim, uma nova concepção de Ciências, onde o rigor
proposto por uma estrutura matemática de fragmentação gera inúmeros campos de
estudo, com o propósito de produzir conhecimentos específicos e, consequentemente,
83
isolados entre si e das demais áreas do conhecimento. No entanto, todo o saber
fragmentado construído não perdeu seu caráter eminentemente humano.
Essa estrutura de Ciências que conhecemos como “paradigma da
fragmentação ou cartesiano”, porque foi proposta pelo matemático, filósofo, René
Descartes, passou a ser contestado na primeira metade do século XX, com o fim da
Segunda Guerra Mundial. Então, uma nova abordagem de estruturação do
conhecimento científico passou a ter como base a conexão entre os saberes buscando
a “totalidade” do conhecimento.
Com essa proposta de mudança das estruturas de organização do
conhecimento humano, surgiram novas formas de produção científica, que passaram a
exigir também alteração nas concepções trabalhadas nas escolas e universidades,
apesar de existir ainda forte enraizamento da concepção cartesiana, onde prevalecem a
ênfase nos conteúdos e nos pré-requisitos.
As produções científicas geradas nesse período objetivaram a valorização do
homem a partir da melhoria de sua qualidade de vida. A construção desse novo
parâmetro de leitura da realidade procurou resgatar a complexidade do homem e suas
relações com o meio e com o outro.
Nesse contexto de reconstrução das estruturas do conhecimento humano,
surgiram as chamadas “novas Ciências” das quais podemos identificar a “Física
Quântica” e a “Psicologia”, dentre outras. Essa nova concepção científica procurou
identificar o homem não mais como simples ser biológico, mas agora como ser
sociocultural, produtor e produto das relações que constrói no contexto ao qual
pertence.
Assim, é notório que já não há mais espaço para uma escola que não pensa
os fenômenos sociais e o próprio homem na sua totalidade e complexidade. Portanto,
as propostas de formação de um homem crítico que busque exercitar a sua cidadania e
tenha condições de (re) construir a realidade, objetivando a melhoria da qualidade de
vida, necessita de uma Ciência que não lhe proponha recortes da natureza, mas que
traga propostas de (re) integração desta com os recursos de que dispõe sem perder de
vista as limitações existentes nas relações homem-meio-homem.
Na reconstrução deste conhecimento “totalizante”, a área das Ciências da
Natureza busca a integração de diferentes conjuntos de fenômenos naturais e sociais,
gerando representações da realidade, buscando compreender o universo, a vida e seus
processos de transformação, sem desconsiderar a sabedoria popular. A produção
tecnológica é outro contexto no qual as Ciências Naturais estão relacionadas
operacionalizando o aproveitamento desses recursos tendo em vista a melhoria da
qualidade de vida no planeta.
Hoje, discutir Ciências Naturais na Rede Municipal de Ensino de Belém é
buscar a reconstrução das nossas estruturas cognitivas com o propósito de construir
uma abordagem mais holística, mais complexa do universo que o homem habita com
84
suas múltiplas dimensões, não se deixando vencer apenas pelo cientificismo que ainda
é muito presente nas aulas de Ciências.
A tomada de consciência quanto às necessidades de melhoria das relações
com o outro e com o meio ambiente perpassa, antes de tudo, pela valorização do “eu”
(autoestima) e da incorporação de que as ações individuais devem estar integradas ao
contexto coletivo na construção de uma nova realidade.
3.3.1 Ciências Naturais
O mundo contemporâneo não poderia ser compreendido sem os
conhecimentos científicos e tecnológicos que estão presentes em praticamente todos
os setores e esferas da nossa sociedade. Conhecimentos esses que envolvem
aspectos práticos, históricos e filosóficos, éticos e sociais, que nos permitem
compreender fenômenos presentes em nosso cotidiano, enfrentar problemas na vida
doméstica ou social, participar de forma crítica de debates públicos relevantes no
mundo atual acerca dos usos da Ciência e da Tecnologia, de seus benefícios e riscos.
Ao lado de outras áreas do conhecimento, as Ciências Naturais propiciam
condições para ampliar o conhecimento de mundo, promovem valores humanos e
fornecem instrumentos para a percepção, a interpretação crítica e a intervenção
fundamentada para a transformação da realidade. Assim como as outras disciplinas -
Língua Portuguesa, Matemática, Geografia, História –, os conhecimentos científicos e
tecnológicos também devem fazer parte da cultura e da vida de todo cidadão.
O estudo de Ciências Naturais tem, hoje, como um de seus principais
desafios a formação dos estudantes para uma sociedade que cada vez mais acredita
que o conhecimento científico possa representar um elemento básico para que as
crianças e os jovens tanto compreendam os fenômenos observáveis em seu corpo, na
natureza e no universo, como se posicionem diante das mudanças contínuas do mundo
em que vivem.
Para tanto, a escola deve proporcionar aos estudantes o desenvolvimento de
habilidades que lhes permitam elaborar critérios para orientá-los em suas decisões
pessoais; para que saibam analisar fenômenos naturais e processos tecnológicos de
seu cotidiano; e a fim de que se utilizem, em novas situações, de informações,
conceitos e procedimentos construídos na aprendizagem escolar. Para que esses
objetivos sejam alcançados, é preciso que os “temas científicos” sejam vivenciados de
modo a permitir também o desenvolvimento de valores éticos, articuladamente à
alfabetização científica que se deseja.
O ensino de Ciências estimula a curiosidade natural dos estudantes pela
natureza; a inquietação pelas explicações; valoriza a construção social do
conhecimento e a necessidade da criação de soluções para a sobrevivência humana no
planeta, diante dos impasses colocados pela realidade do nosso tempo.
85
A educação em Ciências deve proporcionar aos estudantes a oportunidade
de desenvolver capacidades que neles despertem a inquietação diante do
desconhecido, buscando explicações lógicas e razoáveis, levando os alunos a
desenvolverem posturas críticas, realizarem julgamentos e tomarem decisões
fundamentadas em critérios objetivos, baseados em conhecimentos compartilhados por
uma comunidade escolarizada (BIZZO, 1998).
Além desses aspectos relevantes, Miguens e Garret (1991) destacam outros
como: ajudam os alunos a obterem um conhecimento sobre fenômenos naturais
através de novas experiências; facilitam uma primeira experiência, um contato com a
natureza e com o fenômeno que eles estudam; desenvolvem algumas habilidades
científicas práticas como observar e manipular; oportunizam a exploração, a extensão e
o limite de determinados modelos e teorias; permitem comprovar ideias alternativas
experimentalmente; possibilitam aumentar a confiança ao aplicá-las na prática e
explorar e comprovar a teoria através da experimentação.
A importância do trabalho prático é inquestionável na Ciência e deveria
ocupar lugar central no seu ensino (SMITH, 1975). No entanto, o aspecto formativo das
atividades práticas experimentais tem sido negligenciado, muitas vezes, ao caráter
superficial, mecânico e repetitivo em detrimento aos aprendizados teórico-práticos que
se mostram dinâmicos, processuais e significativos (SILVA & ZANON, 2000).
Borges (1997, p. 22) ressalta que “precisamos encontrar novas maneiras de
usar as atividades prático-experimentais mais eficientemente e com propósitos bem
definidos”, mesmo sabendo que isso não é a única solução para os problemas
relacionados com a aprendizagem de Ciências. Em outras palavras, devem-se ensinar
Ciências para ampliar as possibilidades de compreensão do mundo e de suas
transformações e especialmente para o reconhecimento do homem como parte do
universo e como indivíduo. Por isso, consideramos como eixos fundamentais:
a) Os seres vivos e o ambiente: neste eixo, deve-se possibilitar ao
estudante visão crítica sobre as relações entre o ser humano e a natureza,
contrapondo-se à visão de um homem que se exclui do meio ambiente, para que
compreenda as questões ambientais para além de suas fronteiras biológicas,
abrangendo tanto aspectos físicos e químicos, bem como dimensões históricas, sociais,
econômicas, políticas, culturais e éticas; e para que valorize a preservação dos
ambientes e do planeta, sendo capaz de compreender e propor soluções para as
degradações e recuperações ambientais.
b) Ser humano e saúde: neste eixo, devem ser integrados conhecimentos
do ser humano nos seus aspectos biológicos, físicos, químicos e afetivos, além das
relações do ser humano com sua cultura e com a sociedade. Esses conhecimentos
devem ter como base o ser humano enquanto um todo integrado e dinâmico,
relacionando as condições necessárias para a saúde individual e coletiva.
c) Transformações da matéria e energia: neste eixo, os temas e conteúdos
relacionados com essa área de conhecimento devem contribuir para uma melhor
86
compreensão das questões relativas aos usos de recursos materiais e energéticos.
Aqui estão colocadas questões sociopolíticas e éticas, para as quais devem ser
discutidos e desenvolvidos argumentos relativos aos modos de consumo, valorizando-
se as atitudes individuais e coletivas adequadas ao uso de materiais e recursos
naturais, no consumo de alimentos, do vestuário, da água, da energia elétrica, nos
meios de transporte, na habitação, assim como nos descartes e destinações dos
resíduos sólidos (lixo) e líquidos (esgoto).
d) Dinâmica e evolução da Terra e do Universo: este eixo tem como
objetivo oportunizar a construção de uma visão de mundo mais abrangente, nele
situando-se histórica e espacialmente. Os conhecimentos aqui relacionados devem
possibilitar uma concepção da ciência enquanto construção humana em constante
mudança, cujos modelos explicativos estão fundamentados para além da mera
observação, mas que são permeados por valores culturais e sociopolíticos.
Possibilitam, ao mesmo tempo, a elaboração de hipóteses e o debate sobre indagações
acerca da origem da vida, do planeta e do Universo.
3.3.1.1 - Objetivos do Ensino de Ciências Naturais para o Terceiro Ciclo
Para o terceiro ciclo, os temas de estudo e as atividades de Ciências
Naturais devem ser organizados para que os alunos ganhem progressivamente as
seguintes capacidades:
Reconhecer que a humanidade sempre se envolveu com o conhecimento
da natureza e que a Ciência, uma forma de desenvolver este conhecimento, relaciona-
se com outras atividades humanas;
Valorizar a disseminação de informações científicas socialmente
relevantes aos membros da sua comunidade;
Construir relatos orais e outras formas de registros acerca do tema em
estudo relacionado às informações das Ciências Naturais, considerando informações
obtidas por meio de observação, experimentação, textos ou outras fontes;
Reconhecer descrições de galáxias, estrelas, planetas e satélites
relacionando informações sobre as características da Terra com o surgimento e
evolução da vida;
Identificar e caracterizar as principais regiões formadoras da estrutura do
planeta Terra, enfatizando sua importância dinâmica e equilíbrio na vida do planeta;
Reconhecer, em textos, representações figurativas e nos ambientes
vivenciados a natureza cíclica das transformações da água na natureza, inclusive em
sistemas experimentais;
Associar a variação de pressão atmosférica às variações de altitude,
identificando as características dos gases que entram na composição do ar atmosférico;
Caracterizar as condições e a diversidade de vida no planeta Terra em
diferentes espaços, particularmente nos ecossistemas brasileiros;
87
Conhecer e caracterizar os diferentes biomas brasileiros, enfatizando a
fauna e flora da Amazônia;
Interpretar situações de equilíbrio e desequilíbrio ambiental relacionando
informações sobre a interferência do ser humano e a dinâmica das cadeias alimentares;
Reconhecer as doenças transmitidas pela água, pelo solo e pelo ar e as
maneiras de evitá-las relacionando-as aos hábitos de higiene;
Identificar diferentes tecnologias que permitem as transformações de
materiais e de energia necessárias às atividades humanas essenciais hoje e no
passado;
Identificar padrões de semelhança e características comuns entre
variedade de plantas, de animais e de outros seres vivos e analisar hipóteses sobre a
diversidade e as adaptações dos seres vivos.
3.3.1.2 - Objetivos do Ensino de Ciências Naturais para o Quarto Ciclo
As atividades e os temas de estudo de Ciências Naturais devem ser
organizados para que os estudantes ganhem progressivamente as seguintes
capacidades:
Compreender e exemplificar como as necessidades humanas, de caráter
social, prático ou cultural, contribuem para o desenvolvimento do conhecimento
científico ou, no sentido inverso, beneficiam-se desse conhecimento;
Compreender as relações existentes entre o processo social e a evolução
das tecnologias, associadas à compreensão dos processos de transformação de
energia, dos materiais e da vida;
Confrontar as diferentes explicações individuais e coletivas, reconhecendo
a existência de diferentes modelos explicativos na Ciência, inclusive de caráter
histórico, respeitando as opiniões, para reelaborar suas ideias e interpretações;
Compreender o corpo humano e sua saúde como um todo integrado por
dimensões biológicas, afetivas e sociais, relacionando à prevenção de doenças e
promoção de saúde das comunidades a políticas públicas adequadas;
Compreender as diferentes dimensões da reprodução humana e os
métodos anticoncepcionais, valorizando o sexo seguro e a gravidez planejada;
Conhecer a estrutura da matéria, suas transformações físicas e químicas
e suas aplicações nas atividades cotidianas;
Relacionar as ideias de espaço e tempo, considerando unidades de
medida, compreendendo conceitos de velocidade e aceleração e suas relações com o
conceito de energia e sua variação;
Avaliar implicações sociais, econômicas e ambientais nos processos de
geração e transformações de energia.
88
3.4. MATEMÁTICA
A compreensão da Matemática como área de conhecimento deve-se ao seu
entendimento como saber dinâmico, prático e relativo, estruturado numa linguagem que
possibilita ao ser humano investigar, compreender, explicar e atuar no mundo, ou seja,
atribuir sentido e construir significados para sua existência, em interação constante com
os avanços do contexto sócio-histórico e cultural.
Etimologicamente, a palavra Matemática é a composição dos termos
máthema (matema = ensinar, conhecer, entender, explicar) e techné (tica = técnicas e
artes) e assim, originalmente, Matemática é a técnica de conhecer, entender e explicar
o mundo visível.
Historicamente, a Matemática sofreu influência de saberes culturais de
diversos povos do mundo, em especial, das sociedades egípcias, babilônicas, hindus e
arábicas. Sistematizados ao longo da história da humanidade, geraram no ser humano
um pensamento matemático, que foram aos poucos sendo organizados, sistematizados
e ganhando o caráter de conhecimento rigoroso, formal e dedutivo, produto da atividade
humana tanto dentro como fora da academia.
Sabe-se hoje que o desenvolvimento do pensamento matemático promove
no sujeito uma melhor compreensão dos fenômenos naturais, sociais, econômicos e
tecnológicos e, consequentemente, pode influenciar na melhoria e na evolução de
produtos, bens e serviços ao bem-estar de sua sociedade.
Como perspectiva para o século XXI, a Matemática busca a valorização dos
diversos saberes matemáticos (etnomatemáticos) de povos e grupos étnicos que
produziram matemáticas diferenciadas da matemática escolar e acadêmica, bem como
de novas possibilidades (tendências da educação matemática) como a modelagem
matemática, informática na educação matemática, história da matemática, psicologia na
educação matemática, educação matemática crítica e etc., com a intenção de tornar a
matemática mais compreensível a todos.
3.4.1 O Ensino da Matemática
No Brasil, durante meados da década de 1920, ocorreram movimentos
direcionados à reorganização curricular da Matemática que se caracterizava por ser um
ensino baseado na aritmética e na geometria euclidiana. Influenciados pelo movimento
escolanovista, procurou-se mudar o caráter elitista presente no ensino da Matemática
neste período, bem como, ampliar seu acesso a um maior número de pessoas,
democratizando-a.
Entretanto, somente nas décadas de 60/70, após o 1º Colóquio Brasileiro de
Matemática, ocorreu uma mudança na abordagem do conhecimento matemático, que
foi influenciado pelo Movimento da Matemática Moderna. A partir de então, o ensino da
89
Matemática passou a considerar a teoria dos conjuntos como base para o
desenvolvimento de todo o seu conhecimento científico.
Tal mudança contribuiu para uma política de modernização econômica que
se apresentava como uma via privilegiada para o pensamento científico e tecnológico, e
assim, buscava relacionar a matemática escolar com a matemática formal, rigorosa,
dedutiva e tecnicista existente nos ambientes acadêmico-científicos.
Este novo cenário tinha o formal e o simbólico prevalecendo ao prático. Isto
acabou promovendo, nas décadas seguintes, um elevado índice de reprovação devido
ao grau de complexidade e pouco significado para os alunos, em especial aos alunos
do ensino de 1º grau.
No final da década de 1980, ocorreram novos debates a respeito da
apresentação do ensino de Matemática, com o propósito de mudar o crítico cenário
existente, dentre eles: ensino focado para o desenvolvimento das competências
básicas do estudante; melhorar a autonomia do aluno para a construção do seu
conhecimento; ressignificar o conhecimento matemático por meio da resolução de
problemas de situações do cotidiano; o uso das novas tecnologias como importante
instrumento neste processo de aprendizagem em Matemática etc.
Os estudos sobre Educação Matemática, que se sucederam os anos 80,
mostraram que muitos aspectos do processo de ensino, aprendizagem e avaliação do
conhecimento matemático na Educação Básica, necessitavam ser revistos, pois havia
de se valorizar a aprendizagem tanto quanto aos conteúdos.
Como consequência desses estudos, em 1995, são apresentados os PCN –
Parâmetros Curriculares Nacionais, para promover um novo olhar sobre a educação,
com a intenção de valorizar as diversidades regionais, culturais e políticas, e de
melhorar o acesso à educação, principalmente aos brasileiros menos favorecidos, e
assim, o ensino de Matemática sofreu uma importante reformulação, tendo agora o
sujeito “aprendente” de Matemática como foco principal da organização curricular da
escola.
Desta forma, compartilhamos dos mesmos preceitos propostos pelos PCN:
Matemática (1997, 1998) e definimos o ensino e aprendizagem em Matemática nos
seguintes eixos conceituais:
a) Números e Operações/Álgebra: eixo referente aos distintos significados
de número, algoritmos operatórios e aplicações em diferentes contextos. Além da
utilização de representações algébricas na resolução de problemas que requerem as
funções numéricas.
b) Espaço e Forma: eixo caracterizado pelo estudo do espaço e das formas
geométricas planas e espaciais e suas características e propriedades.
c) Grandezas e Medidas: eixo caracterizado pelo estudo das grandezas
oficiais e não oficiais utilizadas nas atividades cotidianas para determinar medidas de
comprimento, área, volume e tempo entre outras e seus respectivos múltiplos e
submúltiplos.
90
d) Tratamento da Informação: corresponde ao eixo caracterizado pelo
estudo das técnicas analíticas e críticas de fluxogramas, tabelas e gráficos, bem como
do significado de média aritmética, frequência, valores absoluto e relativo, incluindo
estudos preliminares de análise combinatória e probabilidade.
É importante ressaltar que estes eixos não sejam realizados isoladamente. E
que todos os quatro eixos aconteçam de forma clara e com significado ao estudante,
por meio de problemas de contexto real que favoreçam a compreensão e o
desenvolvimento do pensamento matemático.
3.4.1.1 - Objetivos do Ensino de Matemática para o Terceiro Ciclo
Neste ciclo, o ensino de Matemática tem como objetivos:
Ampliar e construir novos significados para os números naturais, inteiros e
racionais a partir de sua utilização no contexto;
Resolver situações-problema envolvendo números naturais, inteiros,
racionais e a partir delas ampliar e construir novos significados da adição, subtração,
multiplicação, divisão, potenciação e radiciação;
Identificar, interpretar e utilizar diferentes representações dos números
naturais, racionais e inteiros, indicadas por diferentes notações, vinculando-as aos
contextos matemáticos e não-matemáticos;
Identificar a localização de números inteiros na reta numérica;
Selecionar e utilizar procedimentos de cálculo (exato ou aproximado,
mental ou escrito) em função da situação-problema proposta;
Reconhecer que representações algébricas permitem expressar
generalizações sobre propriedades das operações aritméticas;
Traduzir informações contidas em tabelas e gráficos em linguagem
algébrica e vice-versa, generalizando regularidades e identificar os significados das
letras;
Utilizar conhecimentos sobre as operações numéricas e suas
propriedades para construir estratégias de cálculo algébrico;
Identificar e resolver equações e inequações do 1.º grau que expressem
um problema;
Resolver situações-problema de localização e deslocamento de pontos no
espaço, reconhecendo nas noções de direção e sentido, de ângulo, de paralelismo e de
perpendicularismo, elementos fundamentais para a constituição de sistemas de
coordenadas cartesianas;
Estabelecer relações entre figuras espaciais e suas representações
planas, envolvendo a observação das figuras sob diferentes pontos de vista,
construindo e interpretando suas representações;
Resolver situações-problema que envolvam figuras geométricas planas,
utilizando procedimentos de decomposição e composição, transformação, ampliação e
redução;
91
Ampliar e construir noções de medida, pelo estudo de diferentes
grandezas, a partir de sua utilização no contexto social e da análise de alguns dos
problemas históricos que motivaram sua construção;
Resolver problemas que envolvam diferentes grandezas, selecionando
unidades de medida e instrumentos adequados à precisão requerida;
Resolver situações-problema por meio de equações e inequações do
primeiro grau, compreendendo os procedimentos envolvidos;
Observar a variação entre grandezas, estabelecendo relação entre elas e
construindo estratégias de solução para resolver situações diretas ou inversamente
proporcionais;
Compreender e calcular problemas envolvendo porcentagem;
Coletar, organizar e analisar informações, construir e interpretar tabelas e
gráficos, formular argumentos convincentes, tendo por base a análise de dados
organizados em representações matemáticas diversas;
Utilizar a capacidade de investigação com perseverança na busca de
resultados, valorizando o uso de estratégias de verificação e controle de resultados;
Demonstrar predisposição para alterar a estratégia prevista para resolver
uma situação-problema quando o resultado não for satisfatório;
Demonstrar reconhecimento do fato de que pode haver diversas formas
de resolução para uma mesma situação-problema e conhecê-las;
Valorizar e usar a linguagem matemática para expressar-se com clareza,
precisão e concisão;
Interpretar situações-problema para a elaboração de estratégias de
resolução e na sua validação;
Demonstrar interesse pelo uso dos recursos tecnológicos, como
instrumentos que podem auxiliar na realização de alguns trabalhos, sem anular o
esforço da atividade compreensiva;
Resolver situações-problema que envolvam o raciocínio combinatório e a
determinação da probabilidade de sucesso de um determinado evento por meio de uma
razão;
Resolver problema utilizando propriedades dos polígonos (soma de seus
ângulos internos, número de diagonais, cálculo da medida de cada ângulo interno nos
polígonos regulares);
Resolver problema envolvendo o cálculo de perímetro e área de figuras
planas.
3.4.1.2 - Objetivos do Ensino de Matemática para o Quarto Ciclo
Neste ciclo, o ensino de Matemática visa aos seguintes objetivos:
Resolver situações-problemas envolvendo números naturais, inteiros,
racionais e irracionais, ampliando e consolidando os significados da adição, subtração,
multiplicação, divisão, potenciação e radiciação;
92
Ampliar e consolidar os significados dos números reais e suas operações
por meio de situações-problemas e de diferentes usos em contextos sociais e
específicos da Matemática;
Produzir e interpretar diferentes escritas algébricas, expressões,
igualdades e desigualdades, identificando as equações, inequações e sistemas;
Selecionar e utilizar diferentes procedimentos de cálculo com números
reais;
Calcular o valor numérico de expressões algébricas;
Compreender e calcular equações do 2º grau por meio de várias
estratégias coerentes;
Resolver problema que envolva equação do 2.º grau;
Interpretar e representar a localização e o deslocamento de uma figura no
plano cartesiano;
Produzir e analisar transformações e ampliações/reduções de figuras
geométricas planas, identificando seus elementos variantes e invariantes,
desenvolvendo o conceito de congruência e semelhança;
Ampliar e aprofundar noções geométricas como incidência, paralelismo,
perpendicularismo e ângulo para estabelecer relações, inclusive as métricas, em figuras
bidimensionais e tridimensionais;
Ampliar e construir noções de medida, pelo estudo de diferentes
grandezas, utilizando dígitos significativos para representar as medidas, efetuar
cálculos e aproximar resultados de acordo com o grau de precisão desejável;
Obter e utilizar possibilidades para cálculo da área de superfícies planas e
para o cálculo de volumes de sólidos geométricos (prismas retos e composições desses
prismas) por meio de problemas;
Identificar e calcular um sistema de equações do 1.º grau que expressa
um problema;
Representar graficamente um sistema de equações do 1.º grau em um
plano cartesiano;
Representar em um sistema de coordenadas cartesianas a variação de
grandezas, analisando e caracterizando o comportamento dessa variação em
diretamente proporcional, inversamente proporcional ou não proporcional;
Construir tabelas de frequência e representar graficamente dados
estatísticos, utilizando diferentes recursos, bem como elaborar conclusões a partir da
leitura, análise, interpretação de informações apresentadas em tabelas e gráficos;
Construir um espaço amostral de eventos equiprováveis, utilizando o
princípio multiplicativo ou simulações, para estimar a probabilidade de sucesso de um
dos eventos;
Resolver problema envolvendo informações apresentadas em tabelas e/ou
gráficos;
93
Associar informações apresentadas em listas e/ou tabelas simples aos
gráficos que as representam e vice-versa;
Demonstrar compreensão da importância da estatística na atividade
humana e de que ela pode induzir a erros de julgamento, pela manipulação de dados e
pela apresentação incorreta das informações (ausência da frequência relativa, gráficos
com escalas inadequadas).
94
4. MATRIZ CURRICULAR DO ENSINO FUNDAMENTAL
Considerando os objetivos previstos pelas Áreas do Conhecimento acima
descritas, a matriz curricular se constitui no elemento que traduz em disciplinas e
cargas horárias os fundamentos legais previstos nas Diretrizes Curriculares para o
Ensino Fundamental, organizado em Ciclos de Formação na Rede Municipal de
Educação (RME) de Belém, conforme desenho abaixo:
QUADRO I: MATRIZ CURRICULAR DO ENSINO FUNDAMENTAL CIII e CIV
AMPARO LEGAL
Base
Nacional
Comum
Disciplinas Estudos
Obrigatórios
Semanal Mensal
CIII (1º ano)
CIII (2º ano)
CIV (1º ano)
CIV (2º ano)
CIII CIV
Lei d
e D
iretr
ize
s e
Bas
es d
a E
du
cação
Nacio
na
l – L
DB
EN
– 9
394/9
6
(Art
. 26)
Língua Portuguesa
5 aulas 5 aulas 5 aulas 5 aulas 25 aulas 25 aulas
Matemática 5 aulas 5 aulas 5 aulas 5 aulas 25 aulas 25 aulas
Ciências 3 aulas 3 aulas 3 aulas 3 aulas 15 aulas 15 aulas
História 4 aulas 4 aulas 3 aulas 3 aulas 20 aulas 15 aulas
Geografia 3 aulas 3 aulas 4 aulas 4 aulas 15 aulas 20 aulas
Ensino da Arte 2 aulas 2 aulas 2 aulas 2 aulas 10 aulas 10 aulas
Educação Física (Lei 10.793/03)
2 aulas 2 aulas 2 aulas 2 aulas 10 aulas 10 aulas
Art
. 33
da L
ei
9394
/96
Ensino Religioso 1 aula 1 aula 1 aula 1 aula 5 aulas 5 aulas
Part
e
Div
ers
ific
ad
a
Língua Est. Moderna
2 aulas 2 aulas 2 aulas 2 aulas 10 aulas 10 aulas
OBSERVAÇÕES:
I - Carga Horária anual mínima de 800 horas e 200 dias letivos, em atendimento ao disposto no artigo 34 da
Lei nº 9394/96.
II - Projetos da Rede Municipal de Educação de Belém: Sala de Leitura e Laboratório de Informática cujas
cargas horárias estão inclusas na carga horária semanal.
95
III - Os conteúdos de História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena serão ministrados no âmbito de todo
currículo escolar, em especial nas disciplinas Arte e História, conforme a Lei Nº 11.465/2008 e são obrigatórios
para todas as escolas.
IV - O conteúdo de Música, conforme determina a Lei nº 11.769/2008, será trabalhado na disciplina Arte e é
obrigatório para todas as escolas.
V - O Ensino Religioso será oferecido aos alunos dos III e IV Ciclos, assegurando o que diz a LDBEN Nº
9.394/96, em seu artigo 33.
VI – As escolas oferecem 5 (cinco) tempos de aula, sendo computada a Hora-aula ao tempo de 45 minutos.
VII – Os componentes: Filosofia e Sociologia funcionam como disciplinas nas 30 escolas que não possuem o
turno intermediário, no anexo I.
VIII – Esta matriz está sendo utilizada nas escolas de Ciclo de Formação III e IV que possuem o turno do
intermediário.
QUADRO II: MATRIZ CURRICULAR DO ENSINO FUNDAMENTAL CIII e CIV
AMPARO LEGAL
Base
Nacional
Comum
Disciplinas Estudos
Obrigatórios
Semanal Mensal
CIII (1º ano)
CIII (2º ano)
CIV (1º ano)
CIV (2º ano)
CIII CIV
Lei d
e D
iretr
ize
s e
Bas
es d
a E
du
ca
ção
Nacio
na
l – L
DB
EN
– 9
394/9
6
(Art
. 26)
Língua Portuguesa
5 aulas 5 aulas 5 aulas 5 aulas 25 aulas 25 aulas
Matemática 5 aulas 5 aulas 5 aulas 5 aulas 25 aulas 25 aulas
Ciências 4 aulas 4 aulas 4 aulas 4 aulas 20 aulas 20 aulas
História 4 aulas 4 aulas 4 aulas 4 aulas 20 aulas 20 aulas
Geografia 4 aulas 4 aulas 4 aulas 4 aulas 20 aulas 20 aulas
Ensino da Arte 3 aulas 3 aulas 3 aulas 3 aulas 15 aulas 15 aulas
Educação Física (Lei 10.793/03)
3 aulas 3 aulas 3 aulas 3 aulas 15 aulas 15 aulas
Art
. 33
da L
ei
9394
/96
Ensino Religioso 1 aula 1 aula 1 aula 1 aula 5 aulas 5 aulas
Part
e
Div
ers
ific
ad
a Língua. Est.
Moderna 2 aulas 2 aulas 2 aulas 2 aulas 10 aulas 10 aulas
Filosofia 2 aulas 2 aulas ------ ----- 10 aulas ------
Sociologia ----- ----- 2 aulas 2 aulas ------ 10 aulas
96
OBSERVAÇÕES:
I - Carga Horária anual mínima de 800 horas e 200 dias letivos, em atendimento ao disposto no artigo 34 da
Lei nº 9394/96.
II - Projetos da Rede Municipal de Educação de Belém: Sala de Leitura e Laboratório de Informática cujas
cargas horárias estão inclusas na carga horária semanal.
III - Os conteúdos de História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena serão ministrados no âmbito de todo
currículo escolar, em especial nas disciplinas Arte e História, conforme a Lei Nº 11.465/2008 e são
obrigatórios para todas as escolas.
IV - O conteúdo de Música, conforme determina a Lei nº 11.769/2008, será trabalhado na disciplina Arte e é
obrigatório para todas as escolas.
V - O Ensino Religioso será oferecido aos alunos dos III e IV Ciclos, assegurando o que diz a LDBEN Nº
9.394/96, em seu artigo 33.
VI – As escolas oferecem 6 (seis) tempos de aula, sendo computada a Hora-aula ao tempo de 45 minutos.
VII – Os componentes: Filosofia e Sociologia funcionam como disciplinas nas 30 escolas que não possuem o
turno intermediário, no anexo I.
VIII – As 11 escolas que possuem turmas de CIII e CIV funcionando no turno intermediário até o ano de 2012
deverão deixar de ofertá-lo para se enquadrar a esta matriz, ver anexo II.
IX – A disciplina Educação Física será ministrada no contraturno.
97
5. METODOLOGIA
O desenvolvimento dos Ciclos de Formação perpassa necessariamente pelo
uso de alternativas metodológicas que possibilitem a melhoria da aprendizagem
escolar, sucesso e permanência do aluno na escola, a reflexão crítica e o cumprimento
da função social da Escola Pública Municipal de Belém.
A análise da prática pedagógica tem demonstrado que só serão possíveis
mudanças significativas na educação, à medida que os educadores tiverem uma
compreensão profunda da razão de ser da sua prática e uma clara opção política
acerca do seu ato pedagógico.
Nas condições objetivas do trabalho docente, é necessário ao professor e à
coordenação pedagógica da escola organizarem o tempo e o espaço para a reflexão
coletiva dos educadores sobre as experiências pedagógicas e o estudo de um
instrumental teórico sistematizado que auxilie na compreensão da razão de ser dos
problemas enfrentados.
Segundo Vasconcellos (2006, p. 147), de acordo com a teoria do
conhecimento que fundamenta o trabalho do professor, é necessário tomar como
referência a concepção dialética de conhecimento, destacando a problematização como
elemento nuclear na metodologia de trabalho em sala de aula. Se forem
adequadamente trabalhadas, as perguntas deverão provocar e direcionar de forma
significativa e participativa o processo de construção do conhecimento por parte do
aluno, sendo também um elemento mobilizador para esta construção, tendo em vista a
formação integral do educando.
Os conhecimentos das disciplinas devem se interligar para desenvolver o
espírito crítico e os valores que se constroem socialmente. Assim, educandos e
educadores poderão interagir em sala de aula num processo coletivo direcionado para
um saber mais elaborado.
Neste sentido, a aprendizagem é produto da interação entre o conhecimento
que o educando possui e as novas informações que lhe serão proporcionadas. “O
aprendizado pressupõe uma natureza social específica e um processo através do qual
as crianças penetram na vida intelectual daqueles que as cercam” (VYGOTSKY, 1987,
p.99).
No planejamento e na execução das atividades, deverão ser levados em
conta o nível de conhecimento dos alunos e seu ritmo de aprendizagem. Esse
procedimento visa respeitar as diferenças individuais e as características dos alunos.
Nesta perspectiva, a escola, enquanto espaço autônomo de produção do
Projeto Político Pedagógico, o qual reflete a realidade e necessidades dos educandos,
precisa refletir a opção metodológica de organização do currículo sem perder de vista
os pressupostos descritos nesta diretriz como processo de construção do
conhecimento, com vistas ao pleno desenvolvimento do educando.
A organização do ensino em Ciclos de Formação na RME de Belém
98
caracteriza-se pela renovação das experiências educacionais em que a inversão dos
fundamentos curriculares são pautados na reconstrução social, uma vez que volta-se
para o aluno e para os conteúdos de aprendizagem e orienta para a sua autonomia e
desenvolvimento pessoal. Portanto, há preocupação com a autorrealização dos alunos
como sujeitos do processo educativo, pois os conteúdos são formas de ajudar a pensar
e organizar a aprendizagem.
Para tanto, a escola, dotada de autonomia para a construção de seu Projeto
Político Pedagógico, poderá optar por uma metodologia que melhor se identifique com
a proposta pedagógica que a escola já trabalha. Nesta perspectiva, conceituamos
abaixo algumas linhas metodológicas que poderão ser analisadas pelas escolas.
A Pedagogia de Projetos é uma alternativa metodológica que surge na
primeira metade do século passado, nos Estados Unidos, imbuída da ideia de que a
educação é um processo de vida e que a escola deve representar a vida presente real
para o (a) aluno (a) como ele vive socialmente (DEWEY, 1987), pois é somente com o
uso do projeto, com atitude didática que se alcança os propósitos educacionais. A
expansão dessa ideia ocorre com maior ênfase a partir da década de 90 com Coll
(1994), Hernandez (1998), Jolibert (1994), Bomtempo (1997) e Nogueira (2005),
Valente e Almeida (1999), Almeida e Júnior (2000), Leite (1994), Abrantes (1995),
dentre outros, quando esses pensadores encaminham proposições de análises e
reflexões sobre a importância, função e significado das experiências escolares trazidas
pelos alunos para a escola.
No trabalho por projetos as mudanças na concepção de ensino,
aprendizagem e na própria postura do professor são fatores imprescindíveis para
viabilizar as questões relacionadas à educação; é uma maneira de repensar a função
social da escola e da sala de aula em suas complexidades.
A metodologia de projetos consiste em organizar os estudantes em torno de
diretrizes, objetivos, ações, metas, atividades e tarefas definidas coletivamente pelos
professores, alunos, técnicos em educação e outros profissionais para intervir didática e
pedagogicamente no aprender, dando-lhes novo sentido às vivências e experiências
positivas; essa atitude metodológica ajuda na organização, no estabelecimento de
normas de convivência e de funcionamento da sala de aula para o alcance da
autonomia e autodisciplina, considerando que são dimensões pensadas para favorecer
a tomada de decisões, as escolhas, o levantamento de hipóteses, o significado das
experiências pedagógicas e a manifestação política de cada estudante.
Desse modo, o trabalho pedagógico a partir do uso de projetos favorece o
acesso, a permanência, o sucesso da aprendizagem, a participação ativa, significativa,
atrativa, real e mobilizadora dos alunos, bem como a apresentação dos conteúdos
como momentos de revitalização, de mobilização, de orientações, de fixação de
diretrizes, subsídios, tratamento, interpretação e meios para contribuir no
desenvolvimento de habilidades e o gosto pelo processo de análise, de crítica e de
aprender.
99
Para Valente e Almeida (1999), é uma proposta de intervenção pedagógica,
onde as necessidades de aprendizagem aparecem nas tentativas de resolver situações
problemáticas, o que exige uma reorganização nos espaços e tempos escolares. A
aprendizagem tem que ser significativa para o aluno em que o conteúdo curricular e as
demais estratégias educativas permeiem por uma intencionalidade pedagógica que
contribua para a construção do conhecimento.
Nessa nova visão de conceber o currículo, os professores necessitam
planejar suas atividades conjuntamente com novas estratégias de ensino de forma que
suas disciplinas possam interagir e proporcionar ao aluno o acesso integral ao
conhecimento.
Decorrente deste processo surge o conceito de interdisciplinaridade que
perpassa pela superação da fragmentação do trabalho disciplinar e estabelecimento de
parcerias de forma que as disciplinas possam estar articuladas entre si e cheguem ao
aluno de forma totalizante. Para tanto, o trabalho em conjunto e em cooperação das
diferentes áreas do saber é importante para se construir essa prática no interior da
escola.
Ao se pensar na estrutura de desenvolvimento de trabalho com projetos,
Waldhelm (2000, p. 2) propõe a seguinte estrutura: problematização de contextos
significativos para o aluno; pesquisa e seleção de fontes de informação; relação da
problemática levantada com outras; a vivência de atividades que favoreçam a
cooperação, o trabalho em equipe; o registro do percurso feito; a avaliação processual;
propostas de intervenção e o levantamento de novas questões a partir do conhecimento
construído.
Portanto, a Pedagogia de Projetos como atitude metodológica estimula o
desenvolvimento do pensamento por meio de um diálogo constante entre os
estudantes, mediado pela atuação do professor competente e comprometido, além de
incentivar a interação dos estudantes com o meio físico, social e cultural.
Outra metodologia de trabalho é o Tema Gerador que toma por base as
ideias defendidas pelo educador Paulo Freire que busca problematizar as questões
sociais. Nessa metodologia predomina o diálogo entre educador e educandos
envolvidos num processo que deve propiciar a construção de um diálogo inteligente
com o mundo, problematizando o conteúdo que os mediatiza.
O Tema Gerador é uma proposta de trabalho pedagógico fundada em uma
concepção crítica do processo educacional, baseada na pesquisa socioantropológica,
na interdisciplinaridade, e tem como princípio metodológico a promoção de uma
aprendizagem global, não fragmentada, que promova a integração do conhecimento e a
transformação social.
A investigação no processo educacional é o ponto de partida da proposta e
permite aos educadores conhecer a realidade de vida de seus alunos, tomar
consciência das situações que estes vivenciam e, a partir destas, propor atividades
contextualizadas relacionadas a este cotidiano, para que os conteúdos se tornem
100
significativos para os educandos, rompendo com o ensino tradicional que prioriza a
fragmentação dos conteúdos abordados e a memorização.
Através da seleção do tema gerador, é realizada a codificação e
decodificação do tema, buscando-se o seu significado social; assim, é possível avançar
para além do limite de conhecimento que os educandos têm da realidade e melhor
compreendê-la, a fim de poder intervir criticamente. Do tema gerador deverão sair as
palavras geradoras e o recorte para cada uma das áreas do conhecimento. Cada
palavra geradora deverá ter a sua ilustração que, por sua vez, suscitará novos debates.
O trabalho com o Tema Gerador rompe com a compreensão de que o
currículo baseia-se em uma ordem sequencial e as disciplinas estão hierarquicamente
estruturadas, o que leva o aluno a fragmentar sua compreensão da realidade. Os
conteúdos curriculares passam a ser trabalhados de forma interdisciplinar e são
definidos de acordo com a necessidade de desvelamento do Tema Gerador pelo
coletivo dos educadores da escola. A educação escolar, neste sentido, vai além da
mera transmissão de conteúdos dispostos nos livros didáticos; as contribuições do
conhecimento científico vão sendo incorporados à realidade de vida dos alunos e esta
ganha significado. A escola, nesta perspectiva, é um espaço democrático de
socialização de saberes.
A organização didática nas salas de aula é realizada por meio de três
momentos pedagógicos: o estudo da realidade/pesquisa sócio-antropológica; a
organização do conhecimento/análise das falas significativas com redução temática,
seleção de conteúdos significativos; e a aplicação do conhecimento/programação das
aulas.
Uma terceira possibilidade metodológica está em se trabalhar com os Eixos
Temáticos. Isso significa que o trabalho pedagógico do educador deve enveredar para
a flexibilização dos conteúdos fixos e libertá-los das amarras que as sequências de
unidades curriculares exigem em uma ordem temporal e linear. Desta forma, os eixos
temáticos podem ser negociados em sala de aula entre professores e alunos a partir de
seleção, junção de temas, respeitando às particularidades do ensino, da aprendizagem
e da realidade em que os sujeitos estão inseridos. Sendo também necessário relacioná-
los com os conteúdos universalmente fornecidos pelas áreas do conhecimento humano
e absorvidos nas disciplinas escolares.
Para Neves (1998), o trabalho com eixos temáticos possibilita a articulação
de saberes adquiridos por alunos e professores em diferentes contextos, pois organiza
os conteúdos de forma ampla e abrangente por meio da problematização, do
encadeamento lógico dos conteúdos, da abordagem e da análise dos temas propostos.
Dentro dessa perspectiva, a fonte global de resumos e críticas (2011),
extraída do site shvoong (www.shvoong.com), define eixo temático como
[...] a espinha dorsal de um determinado assunto, abrangendo apenas sua parte principal e sem divagar por sub caminhos ou links relativos a ele. [...] é um recorte, conquanto ainda um tanto amplo, na área de
101
conhecimento. Nos eixos temáticos, o programa aglutina investigações e estudos de diferentes enfoques. O eixo temático organiza a estrutura, limita a dispersão temática e fornece o cenário no qual são construídos os objetos de pesquisa.
Diante disso, percebemos que o eixo temático tem foco centrado em
assuntos mais gerais, sustentado nas questões investigativas para uma melhor
organização e consequentemente operacionalização do planejamento de ensino.
Muitos professores e alunos ao se depararem com o trabalho pedagógico por
eixos temáticos têm a possibilidade de escolherem temas e assuntos que desejam
estudar, os quais não exigem necessariamente pré-requisitos e tampouco o
conhecimento programado de todos os conteúdos inseridos nas áreas do
conhecimento.
Acreditamos, assim, que é possível trabalhar com os eixos temáticos os
conteúdos escolares partindo das partes para o todo e do todo para as partes, com
possibilidade de desvelamento das múltiplas faces de um determinado assunto, sem
que necessariamente ocorra de forma linear, temporal e evolutiva. A partir das questões
investigadas os professores podem oferecer condições aos alunos de tecerem seus
conhecimentos em uma rede de saberes onde é possível construir e reconstruir seu
universo conceitual e situacional sobre os assuntos inerentes às diversas áreas do
conhecimento.
Em outras palavras, podemos afirmar que os eixos temáticos são
agrupamentos de temas que dão suporte ao planejamento do trabalho no campo
educacional e, que ao serem levantadas questões, as quais abarcam determinado
assunto, necessitam ser articuladas com outros assuntos, de forma que os mesmos
possam estabelecer conexões entre si e constantemente serem avaliados e
repensados em um processo dialético e dialógico.
A resolução nº 04/2010-CNE/CEB, de 13 de julho de 2010, ao definir as
Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica, enfatiza a
necessidade de se trabalhar com essa linha metodológica, uma vez que os
[...] eixos temáticos são uma forma de organizar o trabalho pedagógico, limitando a dispersão do conhecimento, fornecendo o cenário no qual se constroem objetos de estudo, propiciando a concretização da proposta pedagógica centrada na visão interdisciplinar, superando o isolamento das pessoas e a compartimentalização de conteúdos rígidos”; (Art. 13, § 3º, VI).
A respeito disso, Ribeiro (2006, p. 2), se referindo a uma experiência no
ensino de história, afirma que
Um ensino da história por eixos temáticos pressupõe a quebra dos conteúdos fixos, da linearidade temporal e da cronologia política. Possibilita o trabalho com recortes diferentes, partindo do presente para o passado, num constante ir e vir. Teoricamente, a prática desse ensino proporciona maior liberdade na escolha dos temas.
102
Se há na escola, noutro exemplo, a necessidade de se discutir a questão do
Meio Ambiente, como pode, então, ser garantido no planejamento dos professores esse
tema? Não se trata de entender que tal discussão esteja somente inserida na disciplina
Ciências, mas como os desdobramentos deste tema podem ser assegurados em outras
disciplinas, como é o caso da relação estabelecida entre o homem-natureza e homem-
homem no meio em que ele vive. Assim, acreditamos que os eixos temáticos permitem
que as disciplinas estabeleçam interfaces de diálogo entre si, a partir de seu próprio
objeto de estudo, e quebrem com o a linearidade com que, quase sempre, abordam
seus conteúdos.
Por outro lado, não podemos esquecer que os eixos temáticos estão
estreitamente condicionados aos planejamentos educacionais e de ensino das
disciplinas escolares, e podem ser propostos durante o período letivo de forma
bimestral, trimestral, semestral em consonância com a organização do trabalho da
escola e orientado pelas diretrizes gerais traduzidas em seu projeto pedagógico.
A despeito desta proposta metodológica na organização do currículo, é
importante mencionarmos alguns dispositivos legais como a Lei 9394/96 que
estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional (especificamente os artigos 26,
27 e 28, da seção I, e capítulo II, que tratam, dentre outras coisas, da obrigatoriedade
de uma base curricular comum obrigatória em todo o território nacional e uma parte
diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura,
da economia, escola e da sua clientela.
Consideramos que tais componentes curriculares podem ser organizados em
eixos temáticos integralizados às disciplinas e às áreas de conhecimento clássicas e,
dependendo da política educacional implementada nos sistemas de ensino, adotada
como metodologia oficial.
Ainda com base na Resolução nº 04/2010-CNE/CEB-2010, a parte
diversificada do currículo é entendida como a complementação da base nacional e que
ao situá-la, prevê o “estudo das características regionais e locais da sociedade, da
cultura, da economia e da comunidade escolar (Art.15), e que também “pode ser
organizada em temas gerais, na forma de eixos temáticos, selecionados
colegiadamente pelos sistemas educativos ou pela unidade escolar” (art.15, § 1º).
Outra prerrogativa legal da resolução nº 04/2010-CNE/CEB-2010 são as
referentes aos art. 13 (§ 3º - III, V e VI; § 4º), art. 15 (§ 1º) e art.17 (§ 2º), onde exige-se,
dentre outras coisas, que o currículo escolar tenha como referência a construção de
valores, práticas, identidades e significados socioculturais dos alunos em sintonia com
as peculiaridades do meio em que vivem e suas próprias necessidades conforme
apregoado na parte diversificada do currículo.
Tudo isso precisa estar assegurado no projeto pedagógico de cada unidade
escolar, cujos procedimentos didático-pedagógicos abranjam aspectos disciplinares,
interdisciplinares e transdisciplinares aprovados por todos os segmentos e instâncias
103
colegiadas da escola, o que devem nortear como princípio “a organização da matriz
curricular, a definição de eixos temáticos e a constituição de redes de aprendizagem”
(Art. 13, § 3º, III), com interfaces nas diversas áreas de conhecimento.
104
6. AVALIAÇÃO
A avaliação é um dos aspectos fundamentais da prática educativa, uma vez
que está intrinsecamente relacionada à concepção da proposta político-pedagógica que
se adota na escola. Isso significa dizer que ela não é neutra, pois ao avaliarmos
acabamos por exercer um ato político, quer seja quando reforçamos a manutenção das
desigualdades sociais com atos e posturas acríticas ao não nos posicionamos diante
das discussões e práticas; quer seja quando combatemos certos fazeres educativos e
colocamos em pauta as discussões no sentido de buscar caminhos e respostas por
meio da consciência crítica diante de posturas que são inerentes aos paradigmas tidos
como verdades absolutas, com o objetivo de problematizar as questões inerentes à
realidade em suas múltiplas dimensões.
Ao repensar o processo avaliativo na RME de Belém, levamos em
consideração a postura crítica que envereda para a transformação do contexto
socioeducacional, pois compactuamos com práticas reflexivas que são salutares ao
serem trabalhalhadas por meio dos conhecimentos disciplinares na escola, bem como a
sua socialização e seus significados práticos na vida dos alunos. Essa dinâmica de
avaliação exige dar novos significados à cultura escolar.
A avaliação do ponto de vista da aprendizagem e como componente do
processo educacional define a vida escolar do aluno no que concerne à sua
permanência, continuidade e desenvolvimento no ciclo de aprendizagem. Por meio da
avaliação é possível que o aluno compreenda que a aprendizagem é construída e
reconstruída dentro do seu ciclo de vida, antes e depois de ingressar nas instituições
educacionais. Tal processo contribui para a sua formação, ajuda a construir consciência
crítica diante do seu próprio desenvolvimento intelectual, social e afetivo, como também
contribui com a do grupo social o qual é parte integrante.
Nos ciclos de formação, a avaliação exerce papel fundamental, pois subsidia
os educadores em seu fazer pedagógico ao garantir uma análise reflexiva dos avanços
e dificuldades vivenciados na prática educacional, revendo e redefinindo novas
intervenções, proposições de atividades, estratégias e metodologias mais adequadas
às fases de desenvolvimento dos alunos.
Visualizada neste enfoque, a avaliação fundamenta-se na perspectiva
dialética, cuja finalidade principal é fornecer informações sobre o processo pedagógico,
de forma que permita aos agentes escolares decidir sobre intervenções e
redirecionamentos necessários em face ao projeto pedagógico definido coletivamente e
comprometido com a garantia da aprendizagem. Então, a avaliação deixa de ser um ato
de cobrança para se transformar em mais um momento de aprendizagem, assumindo
um caráter diagnóstico e de respeito ao nível de desenvolvimento do aluno.
Segundo Saul (2000), avaliação
[...] é dimensão intrínseca do ato de conhecer e, portanto, fundamentalmente compromissada com o diagnóstico do avanço do
105
conhecimento quer na perspectiva de sistematização, quer na produção do novo conhecimento de modo a se construir em estímulo para o avanço da produção do conhecimento. (p. 129)
As ideias de Saul (2000) partem do pressuposto de que a avaliação é
concebida como processual, contínua, participativa, diagnóstica e investigativa; cujas
informações nela expressas propiciam o redimensionamento da ação pedagógica e
educativa, reorganizando as próximas ações do aluno, da turma, do educador, do
coletivo no ciclo de formação e mesmo na escola quando se propõe a avançar no
entendimento e desenvolvimento do processo de aprendizagem.
O esquema a seguir demonstra a concepção defendida por Saul
Nessa abordagem, a avaliação tem as seguintes funções:
a) Contínua: permanente no processo de aprendizagem do educando, pois
estimula e alavanca seu desenvolvimento por meio de avanços, dificuldades e
possibilidades;
b) Dinâmica: utiliza diferentes instrumentos e na reflexão dos seus
resultados inclui a diversidade de intervenções que desencadeiam todo o processo
educativo;
c) Investigativa: levanta e mapeia dados para a compreensão do processo
de aprendizagem do educando ao oferecer subsídios para os profissionais refletirem
sobre a prática pedagógica que realizam;
d) Diagnóstica: levanta dados que descrevem como está se dando e em
que processo se encontra a aprendizagem, para subsidiar ações futuras e, com isso,
retroalimentar a prática pedagógica do educador;
INV
ES
TI
GA
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A
PROCES
SUAL
DIAGNÓS
TICA
PROCESSO
AVALIATIVO
ENSINO
APRENDIZAGEM
COGNITIVO
SOCIAL
CULTURAL
EMOTIVO
AFETIVO
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Í
NU
A
PARTICI
PATIVA
106
e) Participativa: é fundamental para que os diversos sujeitos (alunos, pais e
outros profissionais da escola) envolvidos no processo de ensinoaprendizagem possam
conjuntamente contribuir e avaliar cotidianamente as ações educativas desenvolvidas
na escola e em sala de aula.
Desta forma, entende-se que uma proposta de avaliação não se limita
meramente ao aspecto cognitivo, mas aos conhecimentos elaborados e reelaborados
advindos de múltiplos saberes e ao desenvolvimento dos estágios da criança
anunciados na teoria piagetiana; aos aspectos emocionais, intelectual e moral
defendidos por Wallon e também aos aspectos socioculturais encontrados nas ideias de
Vygotsky.
Ao centralizar a avaliação no aspecto cognitivo o educador corre o risco de
restringir sua prática pedagógica na quantidade de erros e de acertos dos alunos sobre
determinados conteúdos, deixando de ampliar seu campo de análises em outras
dimensões. A despeito disso, Luckesi (1995), ao propor a substituição do erro como
fonte de castigo pelo erro como fonte de virtude, aponta algumas questões que
merecem destaque.
Nos tempos atuais, sabe-se que o castigo se manifesta de outras maneiras
que afetam não somente o físico e sim a personalidade dos alunos. No entanto, essa
outra modalidade de castigo surte o mesmo efeito que aquele ao criar um clima de
medo, tensão e ansiedade nos alunos a ponto de não conseguirem se “adaptar” ao
sistema e, ao fracassarem, se sentirem incapacitados e inúteis por não terem
conseguido atingir o objetivo proposto pela escola e pelo professor.
Diante de tais circunstâncias, os alunos vão perdendo o interesse por tudo
que é oferecido na escola, evidência detectada na fala de Luckesi (1995, p. 51) quando
expressa: “o clima de culpa, castigo e medo, que tem sido um dos elementos da
configuração da prática docente, é um dos fatores que impedem a escola e a sala de
aula de serem um ambiente de alegria, satisfação e vida feliz”.
Por outro lado, o ato amoroso anunciado pelo referido autor está relacionado
com o não julgamento que integra, inclui, acolhe atos, ações, alegrias, pois é
compreendido como o ato que diferencia o certo do errado. Ao acolher uma situação se
preocupa, posteriormente, em ajuizar a sua qualidade e, caso necessário, realiza as
mudanças. Por essa razão, esta ideia de avaliação se distingue da avaliação do
julgamento, da medida e da punição.
Portanto, a avaliação da aprendizagem como categoria constitutiva do
trabalho pedagógico, precisa promover avanços na vida escolar dos alunos ao qualificar
o trabalho do conjunto da escola, pois as situações de aprendizagem e produção de
conhecimentos não são responsabilidades apenas do professor regente, mas são
partilhadas por outros profissionais que atuam nos diversos ambientes de
aprendizagem da escola.
Neste sentido, a avaliação da aprendizagem precisa estar em sintonia com o
que se propõe no projeto político pedagógico da escola, pois para Sordi e Ludke (2009,
107
p. 4) “a autonomia do docente não pode ser confundida com autonomização. Não tem
ele a prerrogativa de decidir, por si só, algo que afeta o bem comum e marca o projeto
pedagógico da escola”.
Por essa razão, é importante incluir as questões com quem e para quem se
avalia e introduzir indagações que fazemos quando discutimos e praticamos a
avaliação, ou seja: o quê, quando, como, com que e para quê avaliamos.
O objetivo de construir uma escola na perspectiva democrática precisa
favorecer não só o acesso, mas a permanência dos alunos na escola, de forma efetiva,
sistemática e com desempenho satisfatório diante da trajetória de sua vida escolar. É o
que assegura Jacomini (2008, p. 93-94) quando expressa que
A democratização do acesso à escola questionou e, em certa medida, flexibilizou algumas características da avaliação tradicional; porém somente a democratização do ensino pode efetivamente pôr um fim na avaliação classificatória e seletiva, tendo em vista que o direito à educação não pode ser realizado em uma escola que preserve esse tipo de avaliação. Isso porque, se se propõe garantir a aprendizagem a todos, a avaliação deverá servir a esse objetivo, deixando, então, de ser instrumento de classificação e seleção.
A RME de Belém, ao assumir o Ciclo de Formação como forma de organizar
o ensino, procura romper com a lógica seletiva, punitiva, classificatória e excludente da
avaliação. E, ao fazer isto, aponta caminhos que contribuem para a reconstrução da
prática pedagógica, visto que concebe a ação educativa como um exercício constante
do pensar e do fazer escolar.
Desse modo, compreende que a avaliação deve ter como preocupação:
a) Identificar as dificuldades, sucessos e fracassos no contexto da escola,
com vistas a tomar decisões diante das ações pedagógicas, administrativas ou
estruturais garantidas no projeto político-pedagógico da escola e apontar novos
caminhos a serem trilhados;
b) Incluir todos os segmentos escolares na avaliação do trabalho escolar
assumindo uma postura cooperativa e colaborativa entre os sujeitos da ação educativa;
c) Incorporar as dimensões formativas e diagnósticas da avaliação da
aprendizagem e estimular a aquisição de conhecimento;
d) Superar a dicotomia entre ensino e avaliação e entender que os
resultados obtidos contribuem para orientar a aprendizagem e os objetivos
educacionais assumidos pela escola;
e) Sustentar o trabalho escolar em novas bases conceituais, coletivas,
consensuais, crítica e cidadã;
f) Entender que os sujeitos do processo educacional são seres inacabados e
construtores de significados com base nas relações que estabelecem com o mundo e
outros seres humanos;
108
g) Compreender que o conhecimento é dinâmico, relativo, plural,
investigativo e reflexivo;
h) Assumir as diferenças individuais e socioculturais dos educandos e incluir
todos no contexto escolar;
i) Garantir o acesso, permanência e progressão dos educandos de forma
responsável;
j) Estimular a prática de uma cultura totalizante, mas entendendo que as
partes estão interligadas e interdependentes entre si e integram uma mesma
engrenagem que abrange multidimensões, tais como: psicológicas, sociais, culturais,
políticas, econômicas, tecnológicas, artísticas e científicas.
Com vistas a sistematizar o processo avaliativo do regime de ensino
organizado em ciclos, faz-se necessário a institucionalização de instâncias e criação de
estratégias no interior da escola que sejam responsáveis pelo planejamento das ações
e avaliação das formas de aprendizagem e da organização do trabalho escolar. Desta
forma, os registros, instrumentos e relatórios são elementos indispensáveis para
subsidiar as dinâmicas de avaliação na escola.
Neste sentido, vários instrumentos são considerados para analisar os
resultados quanto à apreensão dos conteúdos trabalhados pelos alunos e ao trabalho
escolar dos profissionais da educação. Portanto, ao se propor uma abordagem dialética
e processual de avaliação é imprescindível a construção de instrumentos e registros
que alcancem os objetivos educacionais vividos na escola pelos seus segmentos.
Em primeiro lugar, pelo fato de perceber a avaliação enquanto elemento
inserido na dinâmica de trabalho da escola em seus processos de planejamento e
organização curricular.
Posteriormente, por demonstrar ou aliar dimensões da organização do
trabalho pedagógico e do processo de formação do aluno; ou seja, que deixem às
claras a proposta pedagógica da escola, do professor e a forma como cada aluno se
envolve e reage com esse trabalho com vistas a construir seu próprio processo de
aprendizagem e formação.
E, finalmente, por envolver diferentes sujeitos do processo educativo (pais,
responsáveis, gestores, técnicos, professores), pois são agentes que contribuem com a
formação dos alunos nas dimensões afetiva, social, cultural e política, os quais indicam
continuadamente novos rumos ao redimensionar a prática pedagógica.
Apontamos, abaixo, algumas instâncias, procedimentos e instrumentos de
registros da avaliação escolar, os quais são vivenciados nas escolas municipais.
Procedimentos esses que por si só não responderão a uma prática avaliativa inclusiva,
mas que se revestem de significados na medida em que são trabalhados no cotidiano
escolar ao buscarem a construção de um novo paradigma para a prática de avaliação
escolar e da aprendizagem.
Isso implica na organização consciente desse cotidiano, com princípios
claros de aprendizagem construídos e apropriados em cada ciclo e na escola, pois é
109
necessário constituir elementos para que a prática pedagógica possa ser discutida e
aprofundada, captando o que ocorre e do que se deseja na escola. É o momento da
crítica, da reflexão e da consciência da trajetória que se percorre, sem desvinculá-la do
contexto social mais amplo, para que todos saibam para onde estão caminhando e em
que circunstâncias.
Assim, eliminar-se-á o caráter meramente subjetivo da avaliação realizada,
na maioria das vezes, solitariamente pelo educador, abrindo-se espaço para que todos
os segmentos sejam coparticipantes, coautores e corresponsáveis na práxis durante o
processo ensinoaprendizagem.
6.1. Instâncias de Avaliação da Ação Escolar
6.1.1. Conselho Escolar
O conselho escolar, enquanto instância consultiva, deliberativa, fiscalizadora
e mobilizadora da gestão escolar, possui as representações de todos o segmentos da
comunidade intra e extraescolar e, por se caracterizar como espaço colegiado e de
tomadas de decisões coletivas, contribui para a construção, execução e avaliação de
projetos e planos de interesse da comunidade escolar, democratiza e intervém também
nos aspectos pedagógicos, com vistas a superar os problemas e responder pelas
necessidades da escola e dos sujeitos que nela atuam.
Dentre as competências do conselho escolar está a de discutir, definir e
avaliar, em conjunto com o coletivo da escola, a organização do currículo escolar, o
projeto pedagógico e também as formas de avaliação da aprendizagem por serem
consideradas um desdobramento do aspecto pedagógico da escola.
A avaliação escolar não deve ser entendida como um instrumento de
recompensa e de controle, pois não se resume somente em verificar o desempenho
dos alunos em determinadas disciplinas, áreas do conhecimento ou do comportamento
humano, mas reside, principalmente, na revisão do trabalho docente, da coordenação
pedagógica e da própria instituição escolar, neste caso, representada pela equipe
diretiva e pelas demais categorias representadas do Conselho Escolar.
A avaliação do trabalho dos docentes e da coordenação pedagógica da
escola deve ser realizada com o objetivo de melhorar o desempenho profissional e dar
excelência à qualidade do ensino e da educação como atividade fim. Deve propor
analisar as condições e necessidades dos docentes, coordenadores pedagógicos e
equipe gestora da escola de forma que possam realizar seus trabalhos com êxito para a
promoção de suas realizações profissionais.
A respeito da escola certamente se faz necessário avaliar o desempenho da
equipe gestora sobre os aspectos administrativos, pedagógicos do trabalho escolar,
diagnosticar se as pretensões estão sendo alcançadas, replanejar o que for necessário
para mudar ou melhorar a instituição escolar. Isso possibilita detectar as necessidades
da escola para melhorar seus resultados como um todo.
110
Neste sentido, o Projeto Político Pedagógico, enquanto elemento subsidiador
do trabalho escolar, qualifica as ações da escola que é construída pelos vários olhares
de forma colaborativa. Por isso, requer parcerias e a constituição de espaços de
trabalho verdadeiramente coletivos que reflitam os diferentes níveis de atuação de
todos os segmentos da escola. Nessas condições os conselhos escolares
São, primordialmente, o sustentáculo de projetos político-pedagógicos que permitem a definição dos rumos e das prioridades das escolas numa perspectiva emancipadora, que realmente considera os interesses e as necessidades da maioria da sociedade. (Conselhos Escolares: MEC/SEB, p. 33)
Entende-se, assim, que o Conselho Escolar é um desses espaços
privilegiado para a efetivação deste trabalho coletivo na sua forma mais ampla e
representativa.
6.1.2. Conselhos de Ciclo
São instâncias avaliativas que analisam as dificuldades e os avanços dos
alunos, o desempenho dos professores e possibilitam a superação de práticas
fragmentadas, em especial nos Ciclos III e IV, onde o trabalho curricular tem como
desafio a efetivação de uma prática interdisciplinar, pois para se alcançar tal desejo,
Hoffmann (1995, p. 112) assegura que é preciso:
[...] uma ação coletiva e cooperativa entre os educadores no levantamento e discussão de questões avaliativas, uma aproximação necessária entre professores de diferentes disciplinas, no sentido de trocar idéias, levantar problemas, construir em conjunto um ressignificado para a sua prática.
Para tanto é preciso agregar os diversos saberes dos profissionais da escola
(experienciais, epistemológicos, disciplinares etc.) que segundo Tardiff (2002) e
Pimenta (1999) são aqueles acumulados historicamente pelos sujeitos nos grupos
sociais os quais frequentou e frequenta e aqueles adquiridos nos diversos campos de
conhecimento. Esses conhecimentos também podem ser elaborados e reelaborados
por via do trabalho interdisciplinar.
Os conselhos de ciclo constituem-se em um espaço de troca e reflexão entre
professores, coordenadores pedagógicos, pais e alunos com o objetivo de construir
alternativas pedagógicas que auxiliem alunos e professores na superação das
dificuldades apresentadas (individuais ou coletivas) no desenvolvimento de suas ações
e reflexões educativas.
Nessas instâncias os alunos têm condições de tomarem ciência do seu
desempenho escolar e lhes são dadas as oportunidades de manifestarem suas
opiniões. Aos professores e coordenadores pedagógicos é o momento propício de se
reunirem para conversar, trocar ideias, sugerir alternativas de “intervenção” para
solucionar as dificuldades.
111
A implementação desta experiência ajuda a romper com práticas avaliativas
centradas no aluno, sob a ótica de um único professor, de forma unilateral, e busca
entender a totalidade dos processos vivenciados nas escolas.
Nesse momento de avaliação, os diários de classe, cadernos de campo,
registros de reuniões, anotações do professor e outros registros da aprendizagem
devem ser levados ao conselho para apreciação e análise do desempenho dos alunos.
O que requer que esses registros sejam permanentemente utilizados, explicitando,
neles, os avanços e recuos do desenvolvimento dos educandos.
Ao serem diagnosticados em seus desempenhos escolares, chamamos
atenção para aqueles alunos que encontram dificuldades em seus processos de
aprendizagem, pois é preciso que o coletivo de profissionais da educação, coloque em
prática diversas estratégias pedagógicas para que eles possam construir seus próprios
processos de aquisição de conhecimento, superar gradativamente tais dificuldades e
terem condições de continuar progredindo juntamente com os demais alunos que se
encontram em um nível mais avançado de aprendizagem.
Para tanto, citamos algumas dessas estratégias como:
Plano Pedagógico de Apoio (PPA);
Plantão Pedagógico pré e pós-conselhos de ciclos;
Projetos de qualificação de estudos (oficinas, palestras, gincanas etc.).
6.2. Plano Pedagógica de Apoio (PPA)
O Plano Pedagógica de Apoio (PPA) é estratégico para se alcançar os
objetivos de uma avaliação mais humana, transformadora e emancipadora conforme
apregoa Saul (2000, p. 61) ao afirmar que
A avaliação emancipatória caracteriza-se como um processo de descrição, análise e crítica de uma dada realidade, visando transformá-la [...] está situada numa vertente político-pedagógica cujo interesse primordial é emancipador [...], de fazer com que as pessoas direta ou indiretamente envolvidas em uma ação educacional escrevam a sua “própria história” e gerem as suas próprias alternativas de ação.
Neste sentido e na perspectiva de garantir o sucesso escolar dos alunos, o
Projeto Político-Pedagógico deverá incluir como uma de suas ações o PPA, como mais
uma ferramenta de caráter obrigatório destinado aos alunos que necessitarem de
melhor aproveitamento em seu processo de formação plena e garantia do processo
continuado de formação dos sujeitos, através de um acompanhamento pedagógico
realmente priorizado e diferenciado.
O PPA deve ser compreendido e trabalhado na perspectiva da progressão
continuada. Ele se realiza nas ações que os professores desenvolvem no processo
educativo, com aqueles alunos que, mesmo com todas as atividades realizadas,
apresentam dificuldades no domínio de determinados conhecimentos. Entendendo
112
dificuldade de aprendizagem como dificuldades específicas que persistem e prejudicam
o processo de desenvolvimento dos educandos.
Necessitar de um PPA é reconhecer que alguns alunos necessitam de um
acompanhamento pedagógico específico, que respeite seu ritmo de aprendizagem. E
tal projeto, não deve ser entendido como mera repetição das informações, em que
predomina a lógica do “mais do mesmo”. De fato, apesar de retomar às informações
que o aluno não revelou domínio, deve conter um conjunto de novas situações que
consigam alterar as suas dificuldades e que lhes permitam desenvolver “competências”
para que tais dificuldades sejam superadas. Neste sentido, o PPA não se qualifica
como aula de reforço, nem como recuperação paralela.
O PPA se configura assim, como mais uma estratégia que os professores
poderão lançar mão na busca do sucesso da aprendizagem dos educandos. Para que
um trabalho dessa natureza se efetive, é fundamental que os profissionais da escola
busquem um trabalho mais articulado, onde a individualidade professor/turma, não seja
preponderante, mas que o conjunto de profissionais da escola possa ser responsável
pelo conjunto de alunos que nela estudam, planejando coletivamente as atividades
necessárias à aprendizagem com sucesso dos mesmos.
Com base nesses pressupostos, não é possível pensar num modelo único de
PPA que dê conta das diferentes necessidades, especificidades que poderão ser
percebidas em relação a um aluno ou grupo de alunos. É a reflexão coletiva dos
profissionais concretos, em uma escola concreta, discutindo sobre alunos concretos
que irá delinear a essência do trabalho a ser efetivado, no sentido de apoiar aqueles
que estão com maiores dificuldades de aprendizagem.
Podemos, portanto, apresentar alguns elementos que norteiem o trabalho
das escolas na elaboração do PPA e que poderão e deverão ser redimensionados em
função das diferentes realidades das escolas da Rede Municipal de Educação.
6.2.1. Elementos Norteadores de um Plano Pedagógico de Apoio
a) O Plano Pedagógico de Apoio enquanto ação pedagógica insere-se no
procedimento de avaliação contínua e diagnóstica. Desta forma, considera-se que os
princípios da avaliação educacional previstos no Projeto Político-Pedagógico da escola,
assim como os eixos que são apontados no Registro Síntese do Desenvolvimento do
Aluno, são elementos básicos para a observação, interpretação e indicativos de
estratégias que necessitam ser encaminhadas junto aos alunos com maiores
dificuldades na aprendizagem.
b) As especificidades/necessidades dos alunos a serem trabalhadas a
partir de indicativos apresentados nos registros sínteses.
Apontar as dimensões do desenvolvimento e de aprendizagem,
especificando os objetivos a serem atingidos, as relações e conceitos, o tempo previsto
para superação das dificuldades percebidas, os envolvidos no processo, os
aspectos/interações psico-sócio-afetivas dos educandos.
113
c) A necessidade de construção de estratégias que, ao mesmo tempo,
trabalhem as dificuldades destacadas no Registro Síntese do aluno e os avanços
necessários no ciclo do qual o aluno participa.
Como a organização do espaço/tempo de vivência escolar ocorre através de
ciclos, é importante que o Projeto aponte elementos pedagógicos como os objetivos,
princípios de convivência, conteúdos e habilidades curriculares etc., que expressem
situações de aprendizagem e desenvolvimento que precisam ser trabalhadas nos
Ciclos de Formação.
d) Definição das ações pelo conjunto de profissionais que atuam nos
Ciclos.
Para que o PPA cumpra seus objetivos, é fundamental que ele seja
amplamente discutido e elaborado pelo conjunto de profissionais que atuam nos ciclos.
Tal postura visa à superação de atitudes de trabalho fragmentados, que se centralizam
em determinados elementos do processo em desenvolvimento pelo aluno, como por
exemplo, a predominância por procedimentos de reforço aos conteúdos disciplinares
em detrimento de situações concretas de aprendizagem, que abrangem as várias
dimensões do conhecimento e da ação escolar.
6.3. Instrumentos de Registro da Avaliação
Registrar os vários níveis e fases da produção do conhecimento vivenciados
pelos alunos, pela turma e trabalho docente é uma atitude fundamental.
A sistematização destas informações subsidia de forma “visível” a trajetória
do grupo, construindo parte da memória coletiva, além de permitir aos professores,
coordenadores pedagógicos e responsáveis a percepção de como o aluno se
desenvolve através das várias produções que ele apresenta e representa no cotidiano
de sala de aula e de outros espaços educativos na escola.
As possibilidades de acompanhamento e registros deste processo são inúmeras
e podem ser materializadas nos seguintes recursos de apoio:
6.3.1. Arquivo de Atividades dos Alunos
A organização de uma coletânea das produções significativas realizadas pelo
aluno e pela turma (exercícios, trabalhos e pesquisas individuais e em grupos, os
textos, a participação nas programações da escola, relatos orais e escritos,
observações) que recebem tratamento específico pelo professor, o qual faz suas
observações, registrando suas análises, será instrumento importante para historicizar
os diferentes momentos do processo de ensinoaprendizagem, podendo ser observados
aspectos referentes ao trabalho docente e dos coordenadores pedagógicos, ao
desenvolvimento da turma e às reuniões pedagógicas.
A utilização deste material dá elementos para a realização da avaliação ao
permitir aos profissionais da escola e à comunidade em geral pesquisar, analisar e
114
ressignificar a proposta de trabalho que vem sendo encaminhada em sala de aula com
os alunos e na escola pelos professores e equipe diretiva.
6.3.2. Diário de Classe
O Diário de Classe utilizado nas escolas da RME de Belém possui
características de documento síntese das anotações, referentes ao desenvolvimento da
turma e de cada aluno, através de elementos descritivos e analíticos que permitem
acompanhar aspectos significativos do trabalho pedagógico efetivado, tornando-se uma
fonte subsidiadora nas reuniões de pais, de professores, do Conselho de Ciclo e da
equipe diretiva. Algumas escolas também já experimentam outras formas de registro
das atividades diárias que lhes fornecem informações relativas às várias dimensões
inerentes ao processo de desenvolvimento de aprendizagem dos alunos.
6.3.3. Registro Síntese de Acompanhamento Individual do Aluno
O acompanhamento sistemático do processo de desenvolvimento e
aprendizagem dos alunos é elemento fundamental para o trabalho pedagógico, que
busca superar a prática avaliativa centrada em instrumentos de medida. Esse é um
desafio a mais enfrentado de forma coletiva nas escolas da RME de Belém.
Experienciar um instrumento que sintetize aspectos globais do
desenvolvimento e aprendizagem dos alunos, durante o Ciclo de Formação,
considerando seus avanços e dificuldades, apontando elementos do processo de
formação que redimensionem a ação educativa, é uma das bases do trabalho proposto.
O Registro Síntese de Avaliação descreve de forma clara e sintética a
interação socioeducativa vivenciada pelo aluno; construção de conhecimento nas
diversas áreas de conhecimento humano com base nas produções realizadas pelos
alunos e, ao final, quando é definida a progressão do aluno.
Todas essas situações devem retratar as conquistas e as dificuldades
apresentadas pelo aluno ao longo do ano letivo no Ciclo de Formação de modo
individual e no grupo; as proposições de ações interventivas e de solução dos
problemas. Nesse movimento a avaliação reflete a imagem da ação desenvolvida pelo
professor. Tende a ficar falsa quando os códigos a serem utilizados não permitem uma
representação clara e significativa do que se observou no trabalho realizado junto com
os alunos. Esse registro só pode se constituir ao longo do processo educacional e de
trajeto de aprendizagem do aluno, sendo inútil tentar descrever o que não se viu, o que
não foi trabalhado e o que não foi vivenciado.
Entretanto, é importante ressaltar que o que faz a avaliação ser formativa
não é a utilização ou não de determinado instrumento. Segundo Villas Boas (2006), o
que faz a avaliação ser formativa é a prática do professor.
Não podemos esquecer que neste processo avaliativo a instituição escolar
precisa também ser avaliada com a finalidade de diagnosticar a sua dinâmica de
funcionamento, se as metas e os objetivos pretendidos estão sendo alcançados e
115
replanejar o que for necessário, para mudar ou melhorar a instituição. É uma forma de
indicar as necessidades da escola para melhorar seus resultados pedagógicos e de
rendimento dos alunos. Desta forma, o processo avaliativo será geral, participativo e
atuante em todos os setores da escola e do trabalho docente.
116
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