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PRESENÇA REVISTA DE EDUCAÇÃO, CULTURA E MEIO AMBIENTE- Mai.-N°26, Vol. VII, 2003.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA – UNIR
REVISTA DE EDUCAÇÃO, CULTURA E MEIO AMBIENTE- Mai.-N°26, Vol. VII, 2003.
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UNIVEUNIVEUNIVEUNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA RSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA RSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA RSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA ———— UNIR UNIR UNIR UNIR
GRUPO DE ESTUDOS E PESQUISAS MODOS DE VIDAS E CULTURAS AMAZÔNICAS-GEPCULTURA
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA HUMANA E PLANEJAMENTO AMBIENTAL
PRESENÇAPRESENÇAPRESENÇAPRESENÇA ---- ISSN 1413ISSN 1413ISSN 1413ISSN 1413----6902690269026902
Revista de Educação, Cultura e Meio Ambiente
Vol. VI - n° 26 - Maio — 2003 — Porto Velho/RO
PROVADO PELO CONSEPE/UFRO RESOLUÇÃO N°0122/1994
E d i t o r : JOSUÉ COSTA
Foto:
Josué da Costa
Leiaute e Diagramação:
Eliaquim T. da Cunha
Sheila Castro dos Santos
CONSELHO EDITORIAL
Arneide Bandeira Cemin – antropóloga/UNIR
Carlos Santos – geógrafo/UNIR
Clodomir Santos De Moraes - sociólogo/UNIR
Liana Sálvia Trindade – antropóloga/USP
Maria Das Graças Silva Nascimento Silva – geógrafa/UNIR Mariluce Paes De Souza –administradora/UNIR
Miguel Nenevé – letras/UNIR Nídia Nacib Pontuschka – geógrafa/USP
Theóphilo Alves De Souza Filho – administrador/UNIR
www.revistapresença.unir.br
PRESENÇAPRESENÇAPRESENÇAPRESENÇA.... Revista de Educação, Cultura e Meio Ambiente. Porto Velho, fundação Universidade Federal de Rondônia.
Trimestral
1. Educação-Periódica 2. Meio Ambiente — Periódico
CDU 37(05)
REVISTA DE EDUCAÇÃO, CULTURA E MEIO AMBIENTE- Mai.-N°26, Vol. VII, 2003.
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SUMÁRIOSUMÁRIOSUMÁRIOSUMÁRIO
EDITORIAL.....................................................................................................04 O SENTIDO DA COLONIZAÇÃO AGRÍCOLA DE NOVAS TERRAS EM RONDÔNIA....................................................................................................05 JOSÉ JANUÁRIO DE OLIVEIRA AMARAL EXCLUSÃO SOCIAL RIBEIRINHA: UM ESTUDO DE CASO NA COMUNIDADE DE NAZARÉ.......................................................................12 NARA ELIANA MILLER SERRA A LINGUAGEM E OS GÊNEROS DO DISCURSO......................................17 MARIA CELESTE SAID SILVA SILVA MARQUES DIAGNÓSTICO DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO BRANCO, COMPREENDENDO O ALTO E MÉDIO CURSO, NA REGIÃO SUDESTE DE RONDÔNIA...........................................................................30 VALTIR PEREIRA DA SILVA CATIA ELIZA ZUFFO CONCEITOS DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL EM JOSUÉ DE CASTRO: UMA LEITURA ATUAL.........................................................43 ADRIANO LOPES SARAIVA EONARDO GUILHERME LUZ ARAGÃO JÚLIO CÉSAR SOUZA CHAGAS
REVISTA DE EDUCAÇÃO, CULTURA E MEIO AMBIENTE- Mai.-N°26, Vol. VII, 2003.
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EDITORIALEDITORIALEDITORIALEDITORIAL
A revista Presença vem marcar mais uma publicação colocando como centro da discussão teór ica aspectos vol tados a comunicação, imaginár io e significação para o homem em suas relações sociais. Neste sentido, as matérias aqui apresentadas vislumbram contribuir de forma significativa para a discussão sobre a pesquisa que utiliza a oralidade como referência em formar interpretações da realidade que têm, no entrevistado uma visão prioritária para essa aproximação, bem como a construção mítica e cultural que os rituais que trazem símbolos e códigos textuais que dizem muito mais do que o ato de realização cultural em si. E m u ma d i n â mi c a q u e é p ec u l ia r a o ca rá t e r e e x is t ênc i a dessa revista, propomos uma expansão da leitura do meio ambiente, sob o ponto de v is ta ético. Pensamos todas as discussões articuladas com o conhec imento da realidade amazônica (compromisso irrefutável, imbricado com o próprio existir da revista), publicando fatos acerca da construção histórica deste lugar, enquanto entidade federativa assim como espaço urbano. Ambos sob a égide da dependência política. Por certo não poderíamos deixar de contribuir com a discussão sobre o ensino superior refletindo sobre a seleção do conhecimento que lhe vem sendo inquirida através das reformas curriculares. Essas reflexões, neste número, enriquecerão e certamente contribuirão para o debate por todos aqueles que são interessados pelo tema. Isto nos estimula a confiar que no próximo número a disputa por um espaço nesta revista continuará acirrado.
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O SENTIDO DA COLONIZAÇÃO AGRÍCOLA O SENTIDO DA COLONIZAÇÃO AGRÍCOLA O SENTIDO DA COLONIZAÇÃO AGRÍCOLA O SENTIDO DA COLONIZAÇÃO AGRÍCOLA DE NOVAS TERRAS EM RONDÔNIADE NOVAS TERRAS EM RONDÔNIADE NOVAS TERRAS EM RONDÔNIADE NOVAS TERRAS EM RONDÔNIA
José Januário de Oliveira AmaralJosé Januário de Oliveira AmaralJosé Januário de Oliveira AmaralJosé Januário de Oliveira Amaral**** RESUMO: Procuramos interpretar as transformações sociais ocorridas em Rondônia, promovidas pelo processo de colonização agrícola empreendido pelo governo brasileiro na década de setenta, na Região Amazônica. Entendemos que o processo de colonização insere-se num contexto mais amplo de redefinição da sociedade brasileira, sendo simultaneamente, resultado e condição do desenvolvimento das relações capitalistas no Brasil contemporâneo. PALAVRAS-CHAVE: Colonização, Capitalismo, Brasil.
ABSTRACT: We tried to interpret the social transformations happened in Rondônia, promoted by the process of agricultural colonization undertaken by the Brazilian government in the decade of seventy, in the Amazon Area. We understood that the colonization process interferes in a wider context of redefinição of the Brazilian society, being simultaneously, result and condition of the development of the capitalist relationships in contemporary Brazil.
KEYWORD: Colonization, Capitalism, Brazil.
Para efeito de nosso estudo utilizamos a noção de processo de colonização agrícola que,
mesmo em sua formulação mais simples, conforme apontou Tavares dos Santos (1989) constitui
um processo social complexo, de dupla dimensão, espacial e temporal, que faz interagir forças
sociais em conflito e, deste modo, produz relações sociais.
A dimensão espacial envolve trajetórias sociais de regiões distintas, seja no sentido rural/rural,
seja no sentido rural/urbano. Estas migrações estão recheadas de conteúdos particulares, porém
existe uma reciprocidade nas relações. O colono passa simultaneamente por dois vieses: o da
dessocialização em sua região de origem, e o da ressocialização nas novas terras.
O colono, ao sair nas condições em que sai, modifica a dinâmica das relações sociais de onde
migrou, altera as relações familiares, de compadrio e de vizinhança. Ao chegar nas novas terras,
vai continuar migrando de cidade em cidade até conseguir a sua “terra de trabalho”, que motivou a
* Professor assistente do Departamento de Geografia da Universidade Federal de Rondônia e doutorando em Geografia Humana pelo Departamento de Geografia da FFLCH/USP.
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sua partida. Ele vive no limiar de duas situações sociais, pois vivência a duplicidade de estruturas
sociais completamente diferentes entre si. Portanto, a dimensão espacial relaciona intimamente as
regiões de origem dos colonos com as novas terras. Esta situação leva o migrante a continuar
sendo objeto, e não o sujeito que deveria ser. Neste sentido Martins (1988:11) é categórico ao
dizer:
“migrar temporariamente é mais que ir e vir, é viver em espaços geográficos diferentes, temporalidades dilaceradas pelas contradições sociais... É sair quando está chegando, voltar quando está vindo. É necessitar quando está saciado. É estar em dois lugares ao mesmo tempo, e não estar em nenhum, partir sempre e não chegar nunca.”
Conforme Oliveira (1990) e Martins (1988 e 1990), a necessidade da busca das novas terras é
resultado de quem, como camponês, vive no limite de sua reprodução. O que é
consubstancialmente agravado pelo cerco imposto pelo capital.
A segunda dimensão do processo de colonização - a temporal - está relacionada ao período
de duração na qual se concretiza: Segundo Tavares dos Santos (1989:114) “tal duração se
estabelece de um ponto, datado social e historicamente, a outro, o que significa também que o
processo de colonização passa por certos ciclos.” Podemos identificar nesse processo três ciclos
importantes de colonização:
1o A colonização de 1940 a 1945 para os trabalhadores nacionais objetivando atender
excedentes populacionais de “trabalhadores nacionais pobres”;
2o A colonização de 1951 a 1960, cujo objetivo era o atendimento de “zonas empobrecidas” e
sem emprego. Período marcado pelas fortes lutas sociais no campo, a exemplo das ligas
camponesas; e
3o A colonização de 1970 contra a reforma agrária.
Compreendemos que o processo de colonização é realizado durante um determinado tempo,
quando são produzidos efeitos sociais significativos: são os efeitos simbólicos e políticos que se
manifestam no espaço social concretizado pela colonização. Ou seja, durante o tempo social da
colonização, produzem-se símbolos que tentam atrair as populações das suas regiões de origem.
Um exemplo de representação produzida nas novas terras foi a utilização do conceito de
“Eldorado”, “Rondônia Canaã da Amazônia”, lugar onde o camponês certamente realizaria o seu
“sonho da terra própria” e encontraria fartura e riqueza. Isto passa a fazer parte do imaginário
social dos migrantes, influenciando na decisão de partir para as áreas de colonização.
Outro aspecto da temporalidade da colonização, segundo Tavares dos santos (1989:114),
consiste nos efeitos políticos que se verificam, pois o que se objetiva é a reprodução da dominação
social, durante um certo tempo, no espaço social da colonização, e a mensagem difundida vai
intervir nas práticas políticas das forças sociais em conflito.
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O cruzamento das dimensões espacial e temporal da colonização agrícola nas novas terras
revela as diferentes classes, grupos e forças sociais atuantes no processo. No período da
“colonização contra a reforma agrária” podemos identificar as seguintes: O Estado, manifestado
através de suas diversas agências a exemplo: do INCRA, da SUDAM, do BASA, e etc.; as
empresas e as cooperativas de colonização; as empresas de mineração; os grupos de garimpeiros;
os grupos dominantes locais; as nações indígenas; os grandes proprietários fundiários; e os
camponeses.
Os diferentes grupos, classes ou forças sociais, originários de regiões diversas, possuem
interesses particulares, isto provoca relações sociais novas, quer na relação homem/natureza, quer
nas relações dos homens entre si.
O papel do Estado é ressaltado como “maestro” dos conflitos sociais e dos processos sociais
emergentes. Ele exerce funções normativas na acumulação e na legitimação e age como ‘fio
condutor” dos processos sociais. Intervém diretamente em várias escalas espaciais, participando
diretamente de sua elaboração e transformações, estimulando diversos fluxos, aliviando tensões
sociais localizadas e combatendo frontalmente outros movimentos.
O Estado atua nos conjuntos espaciais em diferentes escalas, articulando sua ação desde o
nível internacional até o local, participando ativamente nas transformações espaciais, e sua
presença também é relevante junto aos conflitos sociais, sendo que a cada nível sua ação é
permeada e sofre a influência dos agentes e grupos sociais em presença, segundo sua força
relativa.
A ação governamental acentua as contradições internas nas novas terras, incrementando
planos e programas de novas políticas e tecnologias. Apontamos quatro principais:
1o uma crise ecológica que se deu em vários lugares, causando, por exemplo, as queimadas
provocando efeitos irreparáveis ao meio ambiente;
2o uma crise de mercado, grandes estoques e mercado local insuficiente para absorver, e
problemas de armazenamento e escoamento da produção;
3o ineficácia da modernização tecnológica; e,
4o uma crise financeira, endividamento bancário, causando a chamada “expulsão branca” das
unidades de produção camponesa.
As transformações espaciais são complexas e influentes por inúmeras forças. O Estado se
nutre e se fortalece desta diversidade, negociando entrepostos, estimulando fluxos e reordenando
subconjuntos espaciais.
As ações governamentais atuam sobre o território conforme os interesses dos grupos
econômicos aliados às políticas de segurança nacional. Segundo Foucault (1988:157) o território é
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uma noção geográfica, mas acima de tudo é um instrumento jurídico-político: aquilo que é
controlado por um certo tipo de poder.
De acordo com Hébette e Acevedo (1979:155) a colonização, com seu aparato legislativo, vai
se tornar, para a classe de proprietários rurais interessada no monopólio da terra, um instrumento
de domínio e de controle da ocupação do espaço - de controle, portanto, dos grupos sociais que
vão ocupá-lo e de atividades produtivas.
Sob a égide da colonização assiste-se a implantação de uma “tecnologia social” para controle
não só das propriedades nos programas de colonização agrícola, mas de todo o território ainda não
apropriado nas novas terras.
O Estado procura controlar o território, e para tal é fundamental que se realize o controle dos
homens, pois o processo de colonização implica na remoção de população de lugares “velhos”
para estabelece-la nas movas terras. Tavares dos Santos (1989:107) entende tal processo como
“uma técnica social que utiliza mecanismos de controle do espaço e dos homens, para reproduzir a
dominação de classes sobre as populações rurais brasileiras.”
É no cotidiano dos projetos de colonização que o controle chega a exacerbação, toda
atividade econômica não prevista provoca desapropriação e, no limite, represálias: seja a interdição
do garimpo, seja às condições de venda dos produtos a outros comerciantes que não as
cooperativas. Em vários programas houve restrições às iniciativas de organização sindical, ou à
instalação de lideranças artificiais, ou ainda, a vigilância policial.
A respeito da valorização das novas terras, Gnaccarini (1980:61) coloca que grandes e
médios capitais - dinheiro imobilizam-se na apropriação da terra, na Amazônia, com objetivos
puramente especulativos, trata-se de práticas especulativas mais ou menos aleatórias ou
sistemáticas, neste caso incluem-se as companhias de colonização agrícola, em que se joga com a
pura valorização do título de propriedade. Por conseguinte, isto representa a obtenção
extraordinária da renda da terra absoluta pelas empresas colonizadoras e grandes proprietários
fundiários.
Na escalada pela apropriação da renda fundiária, as terras públicas são privatizadas pelas
colonizadora e proprietários rurais com apropriações de grandes áreas de terras. Nos projetos de
colonização os lotes não são entregues ou vendidos de uma única vez. Este fato possibilita ao
empreendedor mais um lucro extraordinário, ou seja, a apropriação de uma renda diferencial, pois
a benfeitoria e a produção dos primeiros lotes irá “valorizar” as terras mais próximas a estes.
Ao evidenciar as transformações em nossa sociedade no século passado, propiciadas pela
cafeicultura, com a promulgação da lei de terras em 1850 e a substituição do trabalho escravo pelo
livre, Martins (1979:29) lembra que a “a renda capitalizada no escravo transformou-se em renda
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territorial capitalizada: num regime de terras livres o trabalho tinha que ser cativo; num regime de
trabalho livre a terra tinha que ser cativa.” Logo, o problema da capitalização da renda fundiária
através da realização/incorporação do trabalho alheio às terras tem suas raízes na instituição da
propriedade privada em nosso País desde a segunda metade do século passado. Portanto, no
Brasil contemporâneo, o “cativeiro da terra” exprime o controle das classes e grupos dominantes
sobre as “populações subalternas”.
Um outro fato de importância é que a colonização nas novas terras não se dá somente no
espaço rural, mas também simultaneamente no espaço urbano. Segundo Gnaccarini (1980:66) não
só os loteamentos são localizados de preferência em ligações com cidades de alguma importância
comercial, como ainda as grandes empresas de colonização e o INCRA criam cidades e abrem
uma rede de estradas , mal conservadas, para o serviço das pequenas propriedades.
O Estado surge, então, como acentuador e magnificador das contradições sociais, na verdade
produz um espaço urbano de populações extremamente empobrecidas e efetivamente não
consegue estruturar o espaço rural a serviço de toda a sociedade. De fato, segundo Soler (1978), é
verificada uma “hiper-urbanização populacional” de algumas cidades, a exemplo de Ji-Paraná,
expressando um caráter de agente colonizador das cidades, como resultado da incapacidade do
meio rural de criar as condições necessárias para a fixação efetiva do homem no Campo. Na
verdade trata-se de uma lógica nas áreas de colonização na Amazônia neste período e não uma
chega a ser uma hiper-urbanização.
A ligação que aproxima o colono às áreas urbanas são os serviços encontrados na cidade,
como educação, saúde, lazer e bancário, que segundo Gnaccarini (1980:66) “prendem
inevitavelmente o colono ao mercado, reforçando os vínculos sociais com a sociedade inclusiva,
cujas riquezas são as mercadorias”. O que vem demonstrar a necessidade de manter as pequenas
propriedades nas novas terras, pois estas são constante reservas de mão-de-obra. Com relação
àquela parcela que não consegue terra, ou é expropriado é absorvida como trabalhadores
assalariados nos projetos agropecuários ou nas cidades surgidas ao longo dos projetos de
colonização.
A contradição do processo de colonização é consubstanciada numa “engenharia social” posta
em prática nas novas terras. O Estado, tentando manter o controle do território e dos homens,
promove uma Seleção social dos ocupantes das novas colônia, sendo a exclusão social a outra
face deste processo.
Para Tavares dos Santos (1989) esta escolha foi acompanhada de uma seleção regional dos
colonos: tratava-se de reunir populações de várias regiões do País, não só do Nordeste mas
também do Sul. A seleção regional e social foi consolidada por uma figura simbólica particular.
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Tratava-se da categoria de colono modelo. Este será tecnicamente moderno e politicamente
conformista, e símbolo de um grupo social que o poder desejaria ser portador de uma ordem
moderna nas novas terras. Assim, o “colono modelo” deveria estar aberto às inovações
tecnológicas e de créditos, ser submisso às orientações das agências de colonização, seja o
INCRA ou as agências privadas de colonização.
Contudo, quem não chegou à condição de colono modelo foi deixado de lado, tanto do ponto
de vista material quanto simbólico. Isto é demonstrado pela repetição dos estereótipos em nível
local, de repercussões políticas e mesmo de ordem repressiva, quanto pelas queixas e denúncias
dos colonos, nesse sentido, o seu nomadismo será um testemunho da exclusão socialmente
produzida, (Tavares dos Santos, 1989). Desta maneira, aqueles colonos que, no início do
processo, foram selecionados como “aptos” para os programas de colonização ao perderem os
lotes passaram a ser denominados de “péssimos agricultores” e desta forma, são estigmatizados.
A migração destes grupos, que representa a massa de excluídos, indica uma das contradições do
processo de colonização nas novas terras.
Não somente os “antipioneiros” são excluídos e, no limites, estigmatizados, mas também
fazem parte deste grupo, nas áreas de colonização, os índios, os ribeirinhos e os posseiros. A
exclusão representa mais uma concretude nas áreas de colonização, sejam os excluídos só campo
ou da cidade. Os Núcleos Urbanos de Apoio Rural - NUAR mantém-se como núcleos de excluídos,
núcleos de pobreza, núcleos dos expropriados dos projetos de colonização.
Como resultado da política de colonização agrícola, o INCRA passou a atuar simplesmente na
regularização de situações emergenciais. Uma vez que os colonos tornaram-se sujeitos políticos
nas áreas de colonização, deixando de serem “modelos”, como pretendiam as elites dirigentes,
passando à condição de ator político nas novas terras. Começam a reivindicar e ocupar terras
improdutivas em quase todo o Estado de Rondônia e alhures.
Bibliografia
AMARAL, J. J. de O., Terra virgem terra prostituta: o processo de colonização agrícola em Rondônia. São Paulo, FFLCH/USP. 1994.
FOUCALT, M., Vigiar e punir. Petrópolis, Vozes, 1987.
__________, Microfísica do poder. Rio de Janeiro, Graal, 1988.
GNACCARINI, J. C., Latifúndio e proletariado. São Paulo, Polis, 1980.
GOFFMAN, E., Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. Rio de Janeiro, Zahar, 1975.
HEBETTE, J. & ACEVEDO, R., Colonização para quem?. Belém, UFPa, 1979.
MARTINS, J. de S., Capitalismo e tradicionalismo. São Paulo, Pioneira, 1979.
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11
____________, O cativeiro da terra. São Paulo, Ciências Humanas, 1980.
____________, Caminhada no chão da noite: emancipação política e liberdade nos movimentos sociais do campo. São Paulo, Hucitec, 1990.
OLIVEIRA, A. U. de, Modo capitalista de produção e agricultura. São Paulo, Ática, 1986.
TAVARES dos SANTOS, J. V., O processo de colonização agrícola no Brasil contemporâneo. Brasilia, Ver. Sociedade e Estado. Vol. IV, nº 2 jul-dez, 1989.
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EXCLUSÃO SOEXCLUSÃO SOEXCLUSÃO SOEXCLUSÃO SOCIAL RIBEIRINHA: UM CIAL RIBEIRINHA: UM CIAL RIBEIRINHA: UM CIAL RIBEIRINHA: UM ESTUDO DE CASO NA COESTUDO DE CASO NA COESTUDO DE CASO NA COESTUDO DE CASO NA COMUNIDADE DE MUNIDADE DE MUNIDADE DE MUNIDADE DE
NAZARÉNAZARÉNAZARÉNAZARÉ
Nara Eliana Miller SerraNara Eliana Miller SerraNara Eliana Miller SerraNara Eliana Miller Serra
Introdução
Discorre-se neste texto as manifestações culturais que influenciaram no comportamento das
populações ribeirinhas em apenas cultivar o necessário à sua subsistência. Busca-se as razões
pelas quais são normalmente alcunhados de" preguiçosos", pelo simples fato do caboclo conservar
os vestígios da inteligência inventiva de seus ancestrais, e se manterem as margens dos rios em
luta constante contra as adversidades naturais e as do próprio homem.
Nesse contexto, compreender os aspectos de produção requer um olhar diferenciado, pois os
ribeirinhos são populações tradicionais com características próprias, requerendo portanto,
tratamento, olhares e políticas que contemplem o seu modo de viver , suas peculiaridades e seus
os aspectos culturais.
Formação das Comunidades ribeirinhas
A maioria dos grupos ribeirinhos das margens do Rio Madeira, é formada de povos indígenas
e pelo migrante nordestino que chegou à Amazônia nos tempo áureos da extração da borracha,
integrando o então chamado contingente dos "soldados da borracha". Uma força gigantesca os
impulsionava cada vez mais para o miolo da mata em busca das pélas. A fibra, a resistência do
retirante, a capacidade de vencer o clima , davam ao nordestino a superioridade sobre tudo que se
lhes tentasse impedir a "marcha conquistadora", e o Rio madeira e seus contribuintes e respectivos
tributários eram conquistados finalmente, por uma população disposta a enriquecer (SILVA:1994).
Vieram em busca de realizar seus sonhos, deixando o então "Brasil sertanejo, real, pobre,
analfabeto e inculto(CHAUÍ: 2000) e percorrer os estados do norte, fixando-se em vários pontos,
entre eles, o então Território de Rondônia. Por aqui chegaram trazendo a coragem que lhes é
peculiar, o desejo de iniciar uma nova vida , com fartura, onde a natureza prodigiosa com suas
matas verdejantes, seus rios caudalosos e sua infinidade de peixes, o multicolorido das aves e
seus cantos que encantam, os animais selvagens tudo lhes prometia a realização de mudança e a
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certeza de poderem conviver com o mítico e o real na esperança de que seria o"Brasil das mil
possibilidades".
Este sonho para muitos, tornou-se pesadelo culminando em muitas mortes. Quanto aos
indígenas, habitantes naturais, fugindo da civilização dos brancos, procuraram os rios e igarapés,
ou entre rios para se fixarem, escapando desta forma à perseguição dos exploradores, não se
submetendo a trabalhos forçados. Índios e nordestinos ao tentarem se aproximar travaram muitas
lutas e tiveram muitos conflitos fatores que contribuíram para que o índio fosse perdendo seu lugar
na terra e muitas tribos dizimadas. Apesar de tudo, conseguiram sobreviver através da
miscigenação étnica cultural, estando hoje, constituindo a população ribeirinha que habita ao longo
das margens dos rios e também deram origem a vilas, lugarejos e cidades da região. Segundo
BENCHIMOL (1999) o seu ciclo de vida se adaptava às peculiaridades regionais, dela retirando
seus recursos materiais de subsistência e as fontes de inspiração de seu imaginário de mitos,
lendas e crenças.
Nas populações ribeirinhas, os traços indígenas são visíveis, basta se prestar atenção a cor
morena que predomina, nos cabelos pretos e lisos, na postura de conversar de cócoras, na
destreza de manipular o arco e a flecha ou ainda, quando muitas crianças são chamadas de
"curumins ou cunhantãs'. Os traços culturais , também, são praticamente advindos do índio de
quem o ribeirinho herdou o conhecimento dos rios, lagos e igarapés; o aproveitamento das
várzeas, a convivência com o regime de enchentes , a construção das moradias em paxiúba, o uso
da floresta e da terra firme, a prática agrícola do roçado da mandioca e o preparo da farinha,
artesanato de cipó, de barro, a cuia, os enfeites, as redes, o preparo do peixe, a integração e
contemplação da natureza, a prática do acolhimento , a visão mágica do mundo, as danças, os
mitos, os rituais, as ervas medicinais, o ato de benzer, e o hábito de viver o dia-a-dia sem a
preocupação de acumular.
Assim indígenas e sertanejos trocaram experiências, criaram identidade oriunda de um povo
que buscava através de sua coragem um outro mundo, e os então senhores a terra, mesmo
divergindo em costumes, linguagem e modo de viver, conseguiram juntar suas diferenças e dar
origem a uma nova formação para a cultura das sociedades amazônicas. Só não conseguiram foi o
reconhecimento de sua identidade social, sendo ainda chamados de forma preconceituosa de
beradeiros, matuto, caipira, mura, com se neles fossem reconhecido seres inferiores.
Beradeiro/ribeirinho é o indivíduo nativo, caboclo autêntico que se fixou às margens dos rios
da Amazônia, estabeleceram relação diferenciada com as águas, tendo sua produção e
organização influenciada pelo ritmo das águas. O termo beradeiro é utilizado por quem tem a faixa
etária acima dos cinqüenta anos e possui reminiscência do período da Colônia Agrícola do
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Beiradão. A expressão ribeirinho é mais recente, aceita pelos mais jovens, fugindo dos aspectos
pejorativos que atribuem ao beradeiro como matuto e tolo. Para Martins (1990) são expressões de
modo de vida que reflete uma das facetas do campesinato brasileiro.
Essa herança tão rica e singular, não vista ainda como traço cultural de uma gente tão
brasileira, que é o povo amazônida, ainda se reflete pensamentos tais como descreve
Tocatins(1970):
No selvagem de cultura inferior, de alma ingênua e vida rudimentar (...) a razão emitiu vôo
cego da crença polimorfa, sem nenhum sentido estético, ao contrário do que se sucedeu nos povos
de elevação espiritual, dos quais os gregos merecem destacado lugar.
Espalhadas no ambiente Amazônico, formaram populações isoladas e carentes, criando,
reorganizando sua forma de viver onde "as margens simbólicas se equilibram, umas e outras, mais
ou menos sutilmente, mais ou menos globalmente, conforme a coesão das sociedades e também
conforme o grau de integração dos indivíduos no grupo"(DURAM:1998).
O Sistema Produtivo
Não restam dúvidas que, em conseqüência dessa diferenciação, os ribeirinhos passam por
um processo de exclusão, que não se manifesta de forma explícita, mas na forma de tratamento,
na desvalorização de seus produtos, no poder de barganha dos atravessadores que lhes impõe
preços menores colocando-os muitas vezes na condição de submissos: ou aceitam o que lhes é
oferecido ou refugam a colheita ou produção, conforme relato de um morador de Nazaré:
"Quando a gente chega lá, eles querem dar o preço deles e, como a gente não tem outra
saída, o jeito é aceitar o que eles querem pagar. A gente acaba cedendo. Aí então, chega outra
pessoa para comprar deles, eles vendem por um preço duas vezes mais do que pagou, na nossa
frente, e a gente tem de ficar calado, porque o que se há de fazer? ... então é melhor a gente ficar
por aqui mesmo e ir vivendo conforme Deus quer, porque é muito "sacrificoso" o trabalho que a
gente tem.. e o pessoal nunca dá o valor que a gente merece"
A exclusão não se esgota no afastamento do mercado de trabalho, mas ganha significação
tanto mais drásticas no processo de destruição de valores integrativos tradicionais, atingindo os
patamares da precariedade marcada pela não-pertença e impotência(DEMO, 1998).e, ainda
segundo Goffman(1963) a estigmatização de certos membros de raças, religiosas ou étnicos tem
funcionado, aparentemente, como meio de afastar estas minorias de diversas formas de
competição.Dentro dessa realidade, seria o beradeiro, o caboclo, o ribeirinho, preguiçoso?
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Almeida (1987) nos afirma: Preguiçoso o caboclo não é. O que acontece é que
tradicionalmente ele vem sendo enganado em seus negócios pelos "barões" e frustrado pela
injustiça social, da qual até então, tem sido vítima; de modo que ele chega com isso a perder o
estímulo de produzir muito, pois de qualquer forma, produzir muito ou pouco, quase nada vai
influenciar economicamente, no seu modo de viver. Acomodado sim, ele é, porque neste
Amazonas, a mãe-natureza providencia "de graça" o necessário à sua sobrevivência, sem que ele,
o caboclo, tenha que andar correndo. Burro quanto aos conhecimentos das ciências e das letras
isso é verdade, porém, para os que não tiveram a oportunidade de galgar degraus das escolas e
das universidades, ainda inexistentes nestas paragens, mas os privilegiados, esses não se
envergonham, são tão capazes e preciosos tanto quanto o ouro, a prata, o diamante, o ferro e a
madeira que também saem das selvas.
Inegavelmente, o caboclo amazonense é inteligente, inteligentíssimo, capaz de assimilar com
rapidez e particularidade o que lhe ensinam ou vê alguém fazer, chegando a criar e fazer
espontaneamente, sem nenhuma orientação técnica, coisas admiráveis.
Na verdade, o ribeirinho do Distrito de Nazaré, não possui produção propriamente dita, pois
basicamente produz para sua subsistência, considerada de cultura primitiva, sendo seus utensílios
e ferramentas totalmente artesanais, envolve a família no plantio, colheita e produção, ou ainda,
conta com a colaboração dos "compadres" sob troca de serviços, principalmente no cultivo e
produção da farinha atividade de maior concentração que proporciona a comercialização, apenas
do excedente. Para Demo(1998) a carência material é a casca externa da desigualdade social, cujo
cerne está na "pobreza política"; tal reconhecimento seria suficiente para perceber que o combate
a pobreza não passa em primeiro lugar pela assistência, mas pela reinvenção da cidadania do
excluído. O que implica no aspecto produtivo é a situação de abandono que estas populações
estão submetidas. No caso específico de Nazaré, a maioria dos adultos são analfabetos; para as
crianças e jovens, apenas o Ensino Fundamental. Como despertar para uma visão de mundo e
inserção no mercado seja de trabalho, seja de produção de forma competitiva se as mínimas
condições de saúde, habitação, educação e higiene são insatisfatórias?
Segundo Demo, há três caminhos quase sempre combinados, para se ganhar a vida:
mercado formal, mercado informal e assistência social. Por certo o mais frágil é a assistência
social, porque diante das imposições do mercado, tenderá a ser residual, seja em termos de
atendimento, seja em termos de recursos.
Conclusão:
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Para se compreender a dimensão do comportamento das populações ribeirinhas diante do
processo produtivo e a sua exclusão enquanto ser originário de uma nova formação, de uma
cultura tradicional, quase primitiva, embora já possam contar com a energia elétrica, a televisão e o
rádio, há um longo caminho a ser percorrido.O que se percebe é a ausência dos poderes
constituídos, de políticas públicas voltadas à essa realidade, de diretrizes que contemplem as
peculiaridades desta população, a ausência de assistência técnica e de programas que possibilite
o desenvolvimento sócio-econômico-ambiental. Identificá-los como "preguiçosos e improdutivos" é
a mais cômoda das justificativas para quem não tem comprometimento com as comunidades
ribeirinhas, e desconhece as dificuldades, o isolamento e o estado de pobreza em que estas
populações se encontram.
Bibliografia
ALMEIDA, Raimundo Neves. NA BEIRA DO BARRANCO. Estórias - crendices - sentimentos e humor do caboclo do madeira. Genese, Porto Velho, 1987.
BENCHIMOL, Samuel. A AMAZÔNIA. Formação Social e Cultural. Valer, Manaus,1999.
CHAUÍ, Marilena. BRASIL: MITO FUNDADOR E SOCIEDADE AUTORITÁRIA. Fundação Perseu Abramo, São Paulo, 2000.
DEMO, Pedro. CHARME DA EXCLUSÃO SOCIAL. Autores associados, São Paulo, 1998.
DURAND, Gilbert. A IMAGINAÇÃO SIMBÓLICA. Cultrix/Edusp, São Paulo,1988
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A LINGUAGEM E OS GÊNEROS DO DISCURSOA LINGUAGEM E OS GÊNEROS DO DISCURSOA LINGUAGEM E OS GÊNEROS DO DISCURSOA LINGUAGEM E OS GÊNEROS DO DISCURSO
Maria Celeste Said Silva Silva MarquesMaria Celeste Said Silva Silva MarquesMaria Celeste Said Silva Silva MarquesMaria Celeste Said Silva Silva Marques1111
Introdução
Neste artigo, meu objetivo é fazer um resumo reflexivo sobre a linguagem e os gêneros do
discurso e responder se o panfleto é um gênero discursivo. Dar conta dessa tarefa não é tão fácil.
Primeiro, devido à variedade das tipologias e classificações. Segundo, pela escassez de estudos
sobre o panfleto. Então, desenvolverei este artigo, descrevendo as principais correntes de estudos
sobre a questão do gênero e, a partir daí, situarei a linha de pesquisa mais coerente e produtiva.
Percurso da problemática do gênero na história da língua
As produções discursivas são classificadas. Por exemplo, na mídia, os jornalistas e leitores
empregam os termos reportagem, editorial, classificados; na televisão, talk-show; nas empresas, os
relatórios de balanço; na universidade, dissertação, tese, etc. Os locutores, os leitores utilizam
esses termos sem, no entanto, utilizar freqüentemente os termos englobantes como gênero, modo
ou tipo de discurso.
Em geral, falar de gênero foi, durante muito tempo, um tema da retórica e da literatura. De
acordo com Branca-Rosoff (1999), os lingüistas por muito tempo negligenciaram os estudos dos
níveis intermediários do funcionamento do discurso. A partir dos anos da década de 70, quando se
desenvolveram os estudos sobre o discurso, é que as tipologias e as classificações dos gêneros do
discurso comum se multiplicaram.
Para situar o tema do gênero, começarei apresentando um resumo das correntes principais,
as quais são grandes reagrupamentos que funcionam como métodos de questionamento do
corpus. Eles podem orientar em direção à pesquisa das identidades enunciativas impostas pelas
instituições.
1 Professora do Dep. de Educação - UFRO
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As principais correntes são agrupadas, conforme Branca-Rosoff (1999), em dois grandes
conjuntos: as tipologias universalistas e os gêneros sociais empíricos. Os dois grupos são
subdivididos. Então, vejamos.
As tipologias universalistas
O sintagma “gênero de discurso” (genera dicendi) pertence à tradição retórica grego-latina
aristotélica. Os gêneros oratórios estão diretamente relacionados às instituições da cidade e ainda
hoje se apoiam sobre uma tipologia do espaço social.
1. Tipologia dos grandes setores da atividade da sociedade 1.1. Os gêneros oratórios da Antigüidade
Na retórica grega, os lugares públicos, os atos de linguagem, os lugares discursivos e os tipos
de enunciados estão relacionados. Dessa forma, eles se distinguem em função dos lugares sociais:
o gênero judiciário se exerce no tribunal, o gênero deliberativo na assembléia e o demonstrativo
(ou epidíctico), nas festas públicas. A esses lugares de enunciação institucionais, correspondem
atos de linguagem ritualmente codificados a serviço de uma finalidade pragmática.
1.2. O espaço social contemporâneo: o político e o trabalho
As análises do discurso contemporâneas retomam em parte as divisões da sociedade em
grandes setores de atividades como, por exemplo, os discursos estudados pelo laboratório de
Saint-Cloud “Lexicometrie et textes politiques”. De acordo com Branca-Rosoff (1999, p. 9), o
referido laboratório agrupa enunciados que participam de um mesmo domínio da atividade social: a
arte de lutar pela palavra no espaço público com o objetivo de conquistar o poder. O discurso
político representa muito bem os discursos da assembléia, da mesma forma que o funcionamento
da mídia, dos cartazes eleitorais e os panfletos (des tracts).
Salvo alguma exceção, para Branca-Rosoff (1999), os enunciados considerados como
políticos são pronunciados por atores sociais que têm um status reconhecido no campo político:
são os representantes políticos eleitos ou profissionais da mídia. A noção de discurso político é
herdeira de uma longa tradição que remonta ao gênero deliberativo dos retóricos. Entretanto,
atualmente, a eloqüência foi destituída da força da voz e toma forma do modelo de “informação à
distância” da mídia e, se dirige ao cidadão solitário em frente ao seu televisor, que o convida a
participar do poder somente para eleger candidatos a cargos políticos.
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Os “discursos em situação de trabalho” constituem um conjunto múltiplo de produções a partir
de uma relação metonímica ao lugar do trabalho, em oposição à casa ou aos espaços públicos.
Aqui também é um critério não lingüístico que permite agrupar discursos extremamente diferentes:
conforme a quem eles se dirigem, se é à equipe local ou a um exterior mais ou menos longe;
conforme ao suporte material, se eles são manuscritos ou impressos; se são redigidos ou apenas
rascunhos. Contrariamente às produções políticas, esses textos podem ser pouco
institucionalizados. Esta é, sem dúvida, uma das razões que explicam a ausência de denominação
espontânea utilisável entre os termos empregados sobre o lugar de trabalho. De acordo com
Branca-Rosoff (1999, p.10), “ao utilizar ‘discurso em situação de trabalho’, os pesquisadores
defendem uma teoria das práticas sociais que fazem do trabalho um componente maior da
sociedade atual [...]”.
Para Boutet e outros (1995, p.14), as pesquisas no domínio da “linguagem e trabalho” se
caracterizam pelo fato de o
discurso, textos e outros materiais de análise serem, em grande parte, produzidos pelo movimento da própria pesquisa: quando o pesquisador se propõe estudar a cooperação em um atelier ou a comunicação em um escritório, ele não pode esquivar-se da questão da construção dos dados, de colocar um dispositivo de observação e de elicitação a partir do qual se ordenarão as escolhas dos detalhes.”
2. As classificações transversais: procedimentos da linguagem e cognitivos
Essas classificações são desenvolvidas por pesquisadores que descrevem o funcionamento
do discurso de forma transversal em relação às instituições, mas que buscam, ao mesmo tempo,
colocar as categorias empíricas num nível superior.
2.1. As funções da linguagem: o exemplo de Jakbson
É a partir do Ensaio de lingüística geral de R. Jakbson que as classificações de base funcional
foram largamente difundidas.
Jakbson distinguiu na linguagem as funções referencial, conativa, fática, metalingüística,
poética e pensava poder caracterizar cada texto pela dominância de uma função. Para Branca-
Rosoff (1999, p.11), “esta tipologia foi muito criticada porque são raros os casos de boa
correspondência entre função e discurso. A maior parte dos discursos mobilizam várias funções. E
são igualmente raros os casos em que se pode associar uma forma lingüística e uma função”.
2.2. As tipologias cognitivas
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Nesse tipo de tipologia, os pesquisadores reagrupam os textos a partir de grandes operações
de esquematização da realidade. Em geral, classificam os textos em cinco tipos: narrativo,
descritivo, explicativo, argumentativo e dialógico. Trata-se de descrever os componentes
homogêneos, as seqüências. Essa tipologia se situa num nível não lingüístico. Para os defensores
dessa corrente, trata-se de descrever as operações mentais que estão à disposição dos locutores
na conversa, na elaboração de panfletos ou de informações de televisão. As representações
cognitivas do sentido esquematizam as operações mentais e não discursos historicamente
organizados.
2.3. Os modos de enunciação
São representativos dessa classificação W. Labov e Waletzky, que propõem um estudo dos
relatos comuns misturando vários parâmetros: os estruturais como a ordem cronológica dos
elementos na narração e os sintáticos como a escolha de proposições afirmativas. Entretanto, essa
tentativa é um retorno aos relatos de estrutura narrativa muito simples. A ruptura na ordem
cronológica é observada em numerosos relatos quer sejam de ficção, quer sejam de
acontecimentos.
Jenny Simonin, Jean-Paul Bronckart e vários outros pesquisadores inscritos nessa corrente
classificam os discursos com ajuda de parâmetros que definem a situação de enunciação: a
pessoa, o tempo, o lugar, as diversas modalidades. As marcas enunciativas permitem articular o
enunciado à situação, organizando e definindo os lugares dos enunciadores. Além disso, as
marcas enunciativas constituem um sistema gramatical fechado, bem delimitado, objetivando um
descrição sistemática.
Para Branca-Rosoff (1999, p.13), métodos baseados nos modos de enunciação são
“eficazes para abordarem as relações de lugar e posturas enunciativas. No entanto, não fornecem
detalhes sobre as pressões da linguagem ligadas às instituições de fala historicamente definidas”.
3. Tipos de discurso que relacionam instituições e modos discursivos:
3.1. A análise da mídia e a crítica à pretensão de informar
São representativos dessa tipologia os trabalhos de Charaudeau sobre a informação da mídia.
O referido autor destaca os eixos que definem o “contrato de comunicação” entre o locutor e os
receptores. Sobre o eixo dos modos discursivos, ele considera que a finalidade do discurso da
mídia é informar sobre um acontecimento, mostrando os aspectos problemáticos ou mesmo
provocando-o ao organizar debates. Sobre o eixo das instâncias enunciativas, ele opõe os
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discursos dos jornalistas (que são de origem interna) aos discursos que fazem apelo aos
enunciadores exteriores (àqueles dos expertes, por exemplo).
Para Branca-Rosoff (1999, p.14), “da mesma forma que fazem os cognitivistas e os
funcionalistas, a análise da mídia e a crítica à pretensão de informar considera indevidamente os
comportamentos de linguagem e as relações interativas (os contratos de comunicação) colocados
acima das categorias da língua”.
3.2. Os discursos fundadores: a enunciação de uma posição
Essa tipologia tem como seus representantes principais Dominique Maingueneau e Frédéric
Cossuta, que agrupam sob a mesma etiqueta de “discursos constituintes” um conjunto de textos
definidos pela função social de “archeion”. Para Maingueneau e Cossuta (1995, p. 112-3),
“os discursos constituintes colocam, em atividade, uma mesma função na produção simbólica de uma sociedade, uma função que podemos chamar de archéion. [...] O archéion associa intimamente o trabalho de fundação no e pelo discurso, a determinação de um lugar associado à um corpo de enunciadores consagrados e uma elaboração da memória. [...] São discursos constituintes essencialmente os discursos religioso, científico, filosófico, literário, jurídico. O discurso político parece operar sobre um plano diferente, construído a partir de configurações mutáveis de acordo com a confluência dos discursos constituintes sobre os quais ele se apoia, e sobre os múltiplos estratos de topoi de uma coletividade.”
Os discursos constituintes são abordados pela sua posição de enunciação, visto que o
essencial do trabalho de fundação parece repousar sobre a construção reflexiva pela qual o sujeito
enunciador se autoriza a ocupar sua posição. De acordo com Branca-Rosoff (1999, p.15), a
abordagem de Maingueneau e Cossutta recorta as idéias de Foucault sobre os processos de
institucionalização dos papéis. No entanto, a organização dos conceitos que remetem ao domínio
dos saberes e, de forma mais geral, à coerência interna dos textos não aparecem como elementos
centrais.
3.3. A didática e o estudo lingüístico dos sistemas de reformulação
Os autores representantes dessa classificação são Jean-Claude Beacco e Sophie Moirand,
que resumem em uma categoria, a “didática”, as organizações discursivas de uma classe de
língua, um artigo de vulgarização, um curso num colégio da França, uma explicação espontânea a
respeito de uma receita de comida. A didática, ao colocar em destaque as categorias práticas,
possibilita não se ater às descrições monográficas.
3.4. Uma tipologia puramente lingüística?
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Estatísticos e historiadores da língua exploraram grandes corpora sobre uma base de início
puramente lingüística. A abordagem deles se propõe ser sensível à língua e a história. Bibier
(1988) coleciona 67 traços e os reparte em categorias tais como: marcadores de tempo e de
aspecto, advérbios de tempo e de lugar, as formas nominais, os grupos proposicionais, a passiva,
etc. Trata-se de marcar as correlações para que, dessa forma, possam emergir grandes textos
sobre uma base puramente estatística. Entretanto, os resultados conduziram a dividir os grandes
modos de funcionamento cognitivo.
As escolha dos parâmetros é, entretanto, colocada como natural, isto é, ela não é explicitada
pelo analista. Dessa forma, os traços colecionados não têm nada de “objetivo”. Sua seleção resulta
de hipóteses do pesquisador e da tradição, mais precisamente de bases tipológicas que ele julgar
interessantes. Desse ponto de vista, não há análise puramente imanente e percebe-se, de acordo
com Branca-Rosoff (1999, p.16), “por exemplo, em D. Bibier a influência de trabalhos sobre a
sintaxe do escrito ou de análises enunciativas, sem que jamais estas fontes sejam mencionadas e
discutidas.”
Os gêneros sociais empíricos
Pertencem a esse segundo grupo as pesquisas que defendem a impossibilidade de
estabelecer categorizações a priori.
1. A perspectiva escolar clássica
A noção de gênero literário elaborada nos Latinos repousa sobre critérios heterogêneos, às
vezes temáticos, formais e pragmáticos, e que apresentam uma certa imprecisão.
1.1. Uma enumeração em extensão
Nessa classificação, cada gênero coloca em jogo um lugar no nível social: a epopéia fala dos
deuses, a tragédia dos príncipes, a comédia dos simples cidadãos, a écloga dos pastores, o
apólogo dos animais. A temática trata das ações que convém às diferentes categorias sociais
representadas: a epopéia narra as guerras enquanto a écloga trata dos amores dos pastores.
É prática das instituições de ensino que asseguram a sobrevivência do programa das
poéticas. Nas classes dos colégios, estudam-se os gêneros explicando os autores latinos.
2. Os gêneros comuns incontáveis
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Para Branca-Rosoff (1999, p.19), as abordagens deste tópico não visam a uma tipologia. Elas
objetivam a construção de novos domínios de observação.
2.1. As distorções entre registros e gêneros
Objetivando tornar visível a diferença entre o ponto de vista sociológico e o formal, P. Achard
propõe a utilização de dois termos diferentes: ele designa como registros os papéis da linguagem
em vista das diferentes situações sociais e como gêneros os funcionamentos lingüísticos. Por outro
lado, Achard destaca a impossibilidade de propor um tipologia geral. Ele sublinha que não há
“registro” sem uma hipótese prévia do sociólogo, quando este considera que é pertinente isolar um
funcionamento social para analisar como gênero.
O referido autor admite a ausência de critérios estáveis para apreender os gêneros sociais.
Entretanto, alguns critérios são possíveis, tais como, o momento, o lugar, o papel da linguagem, o
suporte, etc.
2.2. Uma semântica dos gêneros ligada à uma filosofia do sujeito ativo - gênero sócio-discursivo
Essa perspectiva de trabalho e de pesquisa foi aberta, no início dos anos cinqüenta pelo
pesquisador soviético Mikail Bakhtin. Este último concebe seu projeto a partir da constatação de
que, em todo os domínios da atividade humana, os homens utilizam a linguagem. Para constituí-lo
em objeto de estudo, não é possível contentar-se com abordagens parciais (gêneros literários,
análises de conversação, retórica, tipologia, etc.) que não podem ser colocadas uma em relação às
outras. O ângulo de ataque escolhido por Bakhtin, para unificar as abordagens e tratar os gêneros,
é o do enunciado. Nesse quadro, os gêneros não se limitam ao estudo, tradicional e
freqüentemente contestado, dos gêneros literários.
Essa abordagem, de acordo com Branca-Rosoff (1999), tem dois grandes expoentes que são
Bakhtin e Wittgenstein. Este comunga com aquele a divisão dos gêneros em primários (os diálogos
da interação cotidiana, felicitações, votos, agradecimentos, etc.) e os gêneros secundários,
elaborados na literatura ou na atividade científica ou sócio-política. Por um lado, para os dois
autores, é impossível, por princípio, estabelecer uma classificação exaustiva das atividades da
linguagem, pois são inumeráveis as utilizações de tudo que denominamos palavras, signos, frases.
Por outro lado, para Wittgenstein, pode-se partir dos jogos da linguagem (indissociavelmente
formas e sentido) para fundar uma semântica articulando conteúdos da linguagem com conteúdos
de ação. As jogos da linguagem, as maneiras de dizer, são ao mesmo tempo maneiras de produzir
funcionamentos sociais.
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Opção por um gênero
Após essa reflexão sobre os grandes agrupamentos dos métodos de questionamento de
corpus, por coerência, a opção tomada para orientar esta pesquisa se apóia sobre o arcabouço
teórico do sujeito ativo de Bakhtin. Opto pela perspectiva do gênero sócio-discursivo bakhtiniano
por ser ela o reencontro dos homens em situações de trocas verbais, de textos concretos de
comunicação e não em tipos de textos abstratos.
Bakhtin e o gênero
Bakhtin é o lingüista que caracteriza mais nitidamente a linguagem pela presença de
diferentes gêneros e, sem dúvida, é um empreendimento que é muito bem desenvolvido por ele na
Estética da criação verbal (Bakhtin, 1992).
Para Bakhtin, a linguagem acompanha todas as atividades humanas e “cada esfera de
utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, sendo isso que
denominamos gêneros do discurso” (1992, p.279). E como cada esfera se desenvolve e se torna
mais complexa, o repertório de gêneros de discurso da esfera vai diferenciando-se e ampliando-se.
Haverá tantos gêneros de discurso quanto as atividades humanas. Dessa forma, são infinitas a
riqueza e a variedade dos gêneros do discurso. Desse ponto de vista, os gêneros nitidamente se
caracterizam pelo que se faz com a linguagem como: mostrar, descreve, explicar.
Gêneros primários e secundários
Em seu trabalho de definição de enunciado, Bakhtin (1992) introduz uma noção essencial. Os
enunciados constituem, num dado momento da história de uma cultura, um conjunto
impressionante de grande diversidade. Quanto mais uma cultura é rica em espaços de atividades
humanas, mais numerosas são as relações entre esses espaços e multiplicam-se mais as
situações de trocas orais e escritas. A conversação entre parceiros, a entrevista com um
empregador, uma carta de um amigo, a novela, o talk-show, o discurso político, a receita de
comida, vários são os exemplos de gêneros sócio-discur sivos em um dado momento histórico de
uma dada sociedade.
Bakhtin diferencia os gêneros do discurso em primários e secundários. Os gêneros primários
(simples) estão presentes nas situações da vida cotidiana e correspondem a um espectro
diversificado da atividade lingüística humana relacionada com os discursos da oralidade em seu
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variados níveis: do diálogo cotidiano ao discurso didático, filosófico ou sociopolítico. A comunicação
verbal na vida cotidiana dispõe de gêneros, ou seja, para falarmos segundo Bakhtin (1992, p.301),
“utilizamos sempre dos gêneros do discurso [...], todos os nossos enunciados dispõem de uma
forma padrão e relativamente estável de estruturação de um todo. [...] Falamos em vários gêneros
sem suspeitar de sua existência.”
Os gêneros secundários (complexos) são característicos de circunstâncias de uma
comunicação cultural mais complexa e relativamente mais evoluída, principalmente escrita. No
entanto, correspondem a uma interface dos gêneros primários. De acordo com Bakhtin, a
característica essencial dos gêneros secundários é a absorção dos gêneros primeiros e sua
transmutação em gênero secundário. Abrangem o romance, o teatro, o discurso filosófico, o
discurso político, o discurso científico, o discurso ideológico, etc. A divisão em conjunto não
significa que se trata de classes isoladas, mas sim de formas correlativas: um gênero como o
discurso filosófico está representado nas duas esferas. O que significa que o processo
combinatório que constitui um gênero (acabamento) provoca a evolução (inacabamento).
É na vida cotidiana, nas comunicações interativas, que se manifesta o processo combinatório
dos gêneros discursivos. O contato entre vida e enunciado é, então, o potencializador dos gêneros
discursivos que modulam as enunciações e determinam as formas dos gêneros dos enunciados
pronunciados pelos falantes.
A palavra que entra na enunciação é uma unidade do discurso vivo, dinâmico; como tal, é
uma unidade cultural dotada de tudo que é próprio da cultura, principalmente as significações
cognitivas, éticas e estéticas. As produções da linguagem são construídas em situação concreta.
As pessoas falam e escrevem em direção a interlocutores que têm uma identidade social bem
definida e que se interessam sobre um domínio preciso de atividades. Essas produções são então
funcionais: fala-se para participar de uma.
O quadro abaixo resume as diferenças entre as duas grandes categorias de gêneros.
GÊNEROS PRIMÁRIOS GÊNEROS SECUNDÁRIOS Simples Complexos
Presentes nas trocas verbais cotidianas Presentes nos domínios: - culturalmente evoluídos - complexos (artes, ciências, política, etc.)
Freqüentemente orais Freqüentemente escritos Tornam-se componentes dos gêneros Secundários
Formados por absorção e transmutação dos gêneros primários
- estão em relação com o real; - estão em relação com os enunciados do outro:
- estão em relação com o real; - estão em relação diferente com os enunciados do outro; - os gêneros primários integrados perderam sua autonomia por estar submisso aos gêneros secundários;
Quadro (1): Os gêneros
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Para Bakhtin (1992b), utilizamos os gêneros do discurso para falar, ou seja, “todos os nossos
enunciados dispõem de uma forma padrão e relativamente estável de estruturação de um todo”
(p.301). É muito rico nosso repertório dos gêneros do discurso orais e escritos. Podemos até
ignorar a sua existência teórica, mas “falamos em vários gêneros sem suspeitar de sua existência”.
As formas típicas da língua, isto é, os gêneros do discurso, organizam nossa fala da mesma
maneira que fazem as formas gramaticais (sintáticas). Falamos por enunciados e não por orações
isoladas. O locutor recebe além das formas prescritivas da língua comum - ele não as cria
livremente -, os gêneros do discurso, que são “formas não menos prescritivas do enunciado.
(Bakhtin, 1992, p.304)
Com efeito,
“o enunciado, em sua singularidade, apesar de sua individualidade e de sua criatividade, não pode ser considerado como uma combinação absolutamente livre das formas da língua” (p.304). No entanto, é de acordo com o domínio que temos dos gêneros e sua utilização com desenvoltura que “descobrimos mais depressa e melhor nossa individualidade [...], que realizamos com um máximo de perfeição o intuito discursivo que livremente concebemos” (p.304).
A partir das colocações acima, pode-se dizer que as normas, as restrições que regem as
formas de enunciados, constituem o quadro com e no qual se materializam a variedade de trocas
constitutivas de atividade. Os locutores dispõem de gêneros de discurso presentes na comunidade
a que pertencem e sua utilização se dá por meio da concretude das relações sociais. No entanto,
as nuanças sociais, psicológicas, afetivas dependem das filiações dos sujeitos singulares. Trata-se
de dizer que as combinações do enunciado são a expressão da dimensão normatizadora,
enquanto a individualidade é resultado da livre concepção do projeto discursivo do locutor.
As normas dos gêneros funcionam como referência à vinculação social e como meios de
reflexão. Assim sendo, os gêneros do discurso apresentam-se como recursos para pensar e dizer.
Daí que o domínio dos gêneros permite a subversão possível desses mesmos gêneros, num
determinado momento da história, contribuindo para novas variedades entre a infinita possibilidade
de gêneros. No caso específico deste artigo, o gênero panfleto é um exemplo da história dialética
que percorre um gênero, assim como o tipo panfleto político.
Panfleto: um gênero discursivo
O panfleto, enquanto enunciado, reflete, de acordo com a teoria de Bakhtin (1992, p.279), “as
condições específicas e as finalidades [...], não só por seu conteúdo (temático) e por seu estilo
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verbal, ou seja, pela seleção operada nos recursos da língua - recursos lexicais, fraseológicos e
gramaticais -, mas também, e sobretudo, por sua construção composicional”.
O panfleto, enquanto texto e ação com sentido, constitui um gênero secundário e uma
forma de relação dialógica. É uma unidade significativa de comunicações discursivas articuladas
que envolve idéias, valores, etc.
O conceito de panfleto que é utilizado neste trabalho designa uma forma histórica
específica e que é utilizada atualmente. Ma que, sem dúvida, é uma extensão, uma progressão do
modelo antigo. As características que marcam a especificidade do panfleto estão no fato de que,
ele é escrito em folhas de papel de variados tamanhos. Abrange, em sua maioria, uma folha de
papel, mas há panfletos com muitas folhas. São distribuídos gratuitamente à população:
pessoalmente na rua, pelos correios. Alguns são apócrifos. A maioria não tem data, nem local. E
todos são destinados à propaganda em geral: da política, da venda de produtos, da venda de
serviços, etc. Utilizam a polêmica, a sátira, a caricatura, o slogan, uma pequena biografia, etc. O
panfleto, neste artigo, é tratado como um tipo de gênero historicamente circunscrito, pertinente a
uma certa sociedade e portador de características formais e ideológicas representativas. A sua
descrição e análise estão relacionadas à sua emergência histórica.
Como afirma Maingueneau
os gêneros de discurso provêm de diversos tipos de discursos associados a vastos setores da atividade social.” Assim, o gênero panfleto constitui um gênero no interior do tipo de discurso de propaganda. “Divide-se, assim, a sociedade em diferentes setores: produção de propaganda, administração, lazeres, saúde, ensino, pesquisa científica, etc. que corresponde, ao mesmo tempo, a grandes tipos de discursos. (Maingueneau, 1998, p.47).
É operante a construção da seguinte representação:
Setores da Atividade Social
↓↓↓↓
discurso de propaganda ideológica
↓↓↓↓
panfletos
� � � �
político religioso publicitário cultural
O que diferencia o panfleto é o tipo de discurso dominante que o constitui, que Maingueneau
(1998) chama de cena englobante. Quando alguém recebe um panfleto, na rua, ela deve ser
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capaz de determinar se ele implica em um discurso político, religioso, de propaganda, etc., ou seja,
sob qual cena englobante ele está localizado para que possa ser interpretado, em função de qual
finalidade ele é organizado. A imensa variedade de panfletos constitui subgêneros (tipos).
Panfleto político
O panfleto mudou o seu estilo. Aliás, os estilos são diversificados e sofisticados. E, no Brasil,
há um fato muito interessante: a proliferação de uma imensa variedade de panfletos políticos.
Entretanto, podemos resumir as características do panfleto político a partir dos critérios
relacionados por Maingueneau (1998):
PANFLETO POLÍTICO
CRITÉRIOS CARACTERÍSTICAS 1. Finalidade Reconhecida publicidade de um candidato político ou
desqualificação do adversário 2. Status dos Parceiros Legítimos imagem de um candidato e do eleitor 3. Lugar e Momento Legítimos distribuição nas ruas e às vezes pelos
correios 4. Suporte Material texto escrito em papel de uma até quinze
folhas 5. Discurso persuasivo (utiliza a asátira, a polêmica,
a caricatura, etc.) 6. Tipos de Textos verbal e não-verbal
Quadro (2): Características do panfleto político
Os panfletos políticos são escritos heterogêneos, mas como se pode ver, no quadro acima,
eles possuem um certo conjunto de traços que se organizam em um conjunto inteligível portador de
uma significação ideológica em relação às pessoas e conjunto inteligível portador de uma
significação ideológica em relação às pessoas e instituições. As condições de sua gênese é um
determinado momento político, como, por exemplo, o eleitoral. Caracterizam-se por serem
persuasivos. Podem ser publicações nas quais os candidatos apresentam seu programa de
eleição, ensinam os eleitores a votar, textos polêmicos, textos satíricos ou que compreendam tanto
a sátira e a polêmica, mas que possui a dominância de uma das duas características.
Gourevitch (1981) e (1986) diz que o panfleto tem uma tipologia variada: fotografias,
ilustrações, histórias em quadrinhos. E que progressivamente esta forma militante de comunicação
política se fragmentou, podendo ter um formato de folheto de propaganda como de um jornal
apresentando a entrevista de um líder nacional ou a análise de uma situação local típica.
Conclusão
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O panfleto político é um tipo de instrumento para a propaganda em massa. Por isso, impresso
em grandes tiragens. Sua distribuição é feita no espaço público e privado. O panfleto político
permite ao candidato intervir, reagir, se dirigir aos eleitores, sobretudo em função da campanha do
adversário, de forma rápida e mais barata. O panfleto político é um dos textos de propaganda
política muito próprios à explicação, à argumentação.
Referências bibliográficas
BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1992.
BOUTET, Josiane e outros. Discours en situation de travail. In: Langages. Paris: Larousse, (117): 12-31, 1995.
BRANCA-ROSOFF, Sonia. Entre langue et discours. In: Langage & societé. Paris: Maison des sciences de l’homme, (87): 5-24, 1999.
GOUREVITCH, Jean-Pierre. La propagande dans tous ses états. Paris: Edilig, 1981.
______ La politique et ses images. Paris: Edilig, 1986.
MAINGUENEAU, Dominique. Analyser les textes de communication. Paris: Dunod, 1998.
MAINGUENEAU, Dominique e COSSUTTA, Frédéric. L’analyse des discours constituants. In: Langages. Paris: Larousse, (117): 112-125, 1995.
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DIAGNÓSTICO DA BACIA HIDROGRÁFICA DIAGNÓSTICO DA BACIA HIDROGRÁFICA DIAGNÓSTICO DA BACIA HIDROGRÁFICA DIAGNÓSTICO DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO BRANCO, COMPREENDENDO O DO RIO BRANCO, COMPREENDENDO O DO RIO BRANCO, COMPREENDENDO O DO RIO BRANCO, COMPREENDENDO O ALTO ALTO ALTO ALTO E MÉDIO CURSO, NA REGIÃO E MÉDIO CURSO, NA REGIÃO E MÉDIO CURSO, NA REGIÃO E MÉDIO CURSO, NA REGIÃO
SUDESTE DE RONDÔNIASUDESTE DE RONDÔNIASUDESTE DE RONDÔNIASUDESTE DE RONDÔNIA
Valtir Pereira da SilvaValtir Pereira da SilvaValtir Pereira da SilvaValtir Pereira da Silva2222 Catia Eliza ZuffoCatia Eliza ZuffoCatia Eliza ZuffoCatia Eliza Zuffo3333
RESUMO: A bacia do Rio Branco é o manancial onde está inserido parte dos municípios de Alta Floresta do Oeste e Alto Alegre dos Parecis, abrangendo na totalidade ambas as áreas urbanas. A bacia apresenta um amplo sistema agropecuário, bem como, um considerável potencial hidroelétrico, ambos relevantes à expansão da região. Para verificar estas afirmações, realizou-se uma análise ambiental, visando caracterizar especialmente os seus aspectos físicos. Identificou-se os problemas de mau uso da terra, tais como: desmatamento da mata ciliar para ampliação das áreas agropecuárias; assoreamento de canais no alto curso, onde os solos são arenosos e locais com potencial disponíveis para os aproveitamentos com PCH’s. Com base nestes dados são apresentados aos órgãos ligados a estas atividades e a comunidade em geral, medidas para minimizar o impacto sobre as áreas ocupadas e de recuperação das áreas degradadas, visando o uso racional do ambiente, o que resultará em melhor qualidade de vida à comunidade. PALAVRAS-CHAVE: Bacia hidrográfica do Rio Branco – Diagnóstico, Região Sudeste de Rondônia.
Introdução
O presente trabalho tem como objetivo geral o diagnóstico do meio ambiente da bacia do Rio
Branco até o Salto Catolino (RO), compreendendo o seu alto e médio curso, onde estão inseridos
partes dos municípios de Alta Floresta do Oeste e Alto Alegre dos Parecis, na região sudeste do
Estado de Rondônia (Figura 01), dando ênfase aos aspectos físicos.
O acesso à área, a partir de Porto Velho é feito pela rodovia federal BR-364, sentido Porto
Velho – Cuiabá, até o entroncamento com a rodovia estadual RO-479, a qual dá acesso a cidade
de Rolim de Moura. Seguindo através da RO-383 até a cidade de Santa Luzia do Oeste. A partir
2 Bacharel em Geografia; Rua Joaquim da Rocha, 5081, Conj. Rio Mamoré, Porto Velho, RO; (069) 210-3293;
[email protected] 3 Profª. Assistente do Deptº. de Geografia/ Fundação Universidade Federal de Rondônia/ UNIR; Cx. Postal 1647, Porto
Velho, RO; (069) 227-3588; [email protected]
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desta a RO-491 dá acesso à Alta Floresta do Oeste, e a RO-490 para Alto Alegre dos Parecis, que
está localizado a 524 km de Porto Velho.
FIGURA 01: Mapa de localização da área de estudo. Fonte: SEDAM, Complementado por Valtir Pereira da Silva.
Os deslocamentos no interior da bacia são realizados através de estradas vicinais paralelas
(linhas de colonização ou estradas municipais) de direção NS e secundariamente EW, espaçadas
de 4 em 4 km, trafegáveis sem restrição no período seco (denominado de verão na região
Amazônica).
O médio curso do Rio Branco é encachoeirado, o que o torna propício à construção de PCH’s
(Pequenas Centrais Hidrelétricas), que são de suma importância para o desenvolvimento da região
e consecutivamente do Estado de Rondônia.
A escolha e delimitação da área de estudo ocorreu devido a bacia possuir vocação
agropecuária, bem como, um grande potencial hidroelétrico, que requer um diagnóstico visando
analisar o ambiente e que possa servir de orientação aos técnicos de órgãos que atuam junto aos
produtores agropecuários, bem como, aos empresários que estão investindo na produção de
energia elétrica, para que uma atividade não venha a prejudicar a outra, já que estas podem ser
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consideradas atividades contraditórias, ou seja, enquanto os agropecuaristas tendem a desmatar
indiscriminadamente para ampliar a sua área de produção, os reservatórios das hidrelétricas
devem manter suas áreas florestadas, no entorno, assim como ao longo das matas ciliares da
bacia de captação. Desse modo a análise realizada apresenta sugestões para evitar desperdícios
econômicos e principalmente as ações poluidoras e de agressão ao meio ambiente.
Dentre os objetivos específicos, destaca-se: investigar possíveis degradações ao ambiente;
oferecer sugestões para o uso adequado da terra; indicar, através de pesquisa em bibliografia
especializada, quais os pontos inventariados e o potencial para construção de PCH’s.
A hipótese a ser verificada engloba as seguintes indagações: a produção agropecuária
existente na área da bacia do Rio Branco está de acordo com as normas ambientais? Os recursos
hídricos estão sendo assoreados? As áreas em que os empresários irão investir na construção de
PCH’s, que necessariamente devem ser florestadas, para a manutenção dos reservatórios, estão
e/ou serão protegidas?
Ao ocupar o espaço, o homem causa nele algum dano, e em função disso é necessário fazer
uma análise no ambiente, para mensurar a magnitude do dano, como também estabelecer normas
para uma melhor ocupação do espaço e explorar de forma racional a potencialidade do ambiente
em que o homem está atuando.
Metodologia
Para a estruturação e confecção do presente trabalho, fez-se necessário recorrer a literatura
especializada de órgãos tais como: IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística);
EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária); SEDAM (Secretaria Estadual de
Desenvolvimento Ambiental); INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária);
ITERON (Instituto de Terras e Colonização de Rondônia); Prefeitura Municipal e Posto de Saúde
de Alto Alegre dos Parecis; e PLANAFLORO (Plano Agropecuário e Florestal de Rondônia).
Mapas, Cartas e Imagem de Satélite Utilizados:
• Cartas Colorado, Arara, Paulo Saldanha e Rio Pardo, da Diretoria de Serviços Geográficos
do Exército - DSG, folhas SD-20-X-A-II, SD-20-X-A-III, SC-20-Z-C-V e SC-20-Z-D-IV, na escala
1:100.000, ano de 1976;
• Imagem de Satélite LANDSAT 5, escala 1:100.000, ano de 1997, do Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais INPE;
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• Mapa de Solos Zona SE, da Segunda Aproximação do Zoneamento Sócio-Econômico-
Ecológico do Estado de Rondônia, elaborado pelo Consórcio TECNOSOLO/DHV/EPTISA, escala
1: 500.000, ano 1997.
Os dados fisiográficos da bacia hidrográfica do Rio Branco até o Salto Catolino, objeto deste
estudo, foram copilados a partir das cartas supra citadas, da DSG.
A área da bacia foi calculada, através do programa Área-Pol do SGI/INPE (Sistema de
Informações Geográficas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
A hierarquização fluvial foi feita de acordo com a metodologia, introduzida por Arthur N.
STRAHLER em 1952, Apud CHRISTOFOLETTI (1980: 106-107).
Dados como densidade de rios, de drenagem, coeficiente de manutenção, dentre outros que
são apresentados neste trabalho, foram calculados a partir da metodologia de CHRISTOFOLETTI
(1980: 102-124), utilizando um curvímetro e outros materiais de expediente.
As análises de uso da terra baseiam-se nos dados apresentados pelo Censo Agropecuário do
IBGE (1996), Imagem de Satélite LANDSAT 5 (1997), Levantamento Sistemático de Produção
Agrícola (LSPA, 1999), Pesquisas de Campo, além de outras bibliografias que serão apresentadas
no desenvolvimento do texto.
Na fase de coleta de informações e verificação “in loco”, visitou-se os dois municípios
pertencentes à bacia, tanto na área urbana quanto na rural, onde foi observada a situação
ambiental, bem como fotografados pontos críticos ou relevantes ao trabalho.
Resultados e discussões
Área da Bacia Hidrográfica (A ou S)
A bacia compreende uma área de 204.913,780 hectares.
A área abrange duas bacias de 5ª ordem, definidas através do sistema introduzido por
STRAHLER,1952 apud CHRISTOFOLETTI (1980: 106).
As duas bacias foram delimitadas e apresentaram os seguintes áreas:
• Rio Branco: 147.387,3152 hectares; e
• Igarapé Saldanha: 57.526,4128 hectares.
Para ARGENTO (1996: 269),
“uma bacia hidrográfica é o ‘conjunto de terras drenadas por um rio principal e seus afluentes’ (GUERRA,1993), cuja delimitação é dada pelas linhas divisoras de água que demarcam seu contorno. Estas linhas são definidas pela conformação das curvas de nível existentes na carta topográfica, e ligam os pontos mais elevados da região em torno da drenagem considerada”.
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Perímetro da Bacia (P)
O perímetro da bacia foi medido com o uso de um curvímetro, onde se obteve o valor de
316,7 km, sendo:
• Rio Branco: 276,4 km; e
• Igarapé Saldanha: 132,3 km
Cabe salientar que a linha divisória entre estas bacias mede 46 km.
Os dados fisiográficos pertinentes a bacia do Rio Branco estão agrupados na tabela 01, e
seus cálculos dispostos junto a cada item, a medida que aparecem no texto.
TABELA 01 DADOS FISIOGRÁFICOS DA BACIA DO RIO BRANCO
Item Parâmetros Rio
Branco
Igarapé
Saldanha
Total
1 Área da Bacia (Km²) 1.473,9 575,3 2049,2
2 Perímetro da bacia (Km) 276,4 132,3 316,7
2.1 Linha Divisória (Km) 46 46 92
3 Comprimento total dos canais (Km) 872,9 537,1 1.410
4 Densidade de Drenagem 0,592 0,933 0,688
5 Declividade do Rio Principal (m) 271 271 271
5.1 Altitude na Nascente (m) 450 450 450
5.2 Altitude na C. Salto Catolino (m) 179 179 179
5.3 Comprimento do Rio Principal (m) 110 50,2 -----
6 Declividade Média (m/km) 2,46 5,39 -----
7 Densidade de Segmentos da bacia / Km² 0,14 0,42 0,22
7.1 Número total de Segmentos 215 243 458
8 Densidade de Rios / Km² 0,11 0,34 0,18
8.1 Rios de 1ª Ordem 164 197 361
9 Extensão do percurso Superficial (km) 0,844 0,536 0,726
Elaboração: Valtir Pereira da Silva.
Forma da Bacia
A forma da bacia pode ser definida através de dois índices:
Conforme, RONDÔNIA.PLANAFLORO/ZSEE. Hidrologia (1998. V.1, Texto, p. 20),
IC = 0,28 P , (1)
√s
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onde: IC é o índice de compacidade, ou de Gravelius, que informa a geometria da bacia, tendo como relação o perímetro da bacia e de um circulo da mesma superfície.
P = perímetro da bacia; e S = área da bacia.
IC = 0,28 316,7 IC = 1,9
45.267
Outra forma é através do índice entre o comprimento e a área da bacia (Ico):
Ico = Dh , (2)
√A
Segundo CHRISTOFOLETTI (1980: 115), este índice, além da forma, indica a ocorrência de
alargamento ou alongamento da bacia. Se o valor for próximo a 1,0 a forma será quadrada, se for <
1,0 será alargada e será mais alongada quanto maior for acima desta unidade.
Sendo, Dh = o diâmetro da bacia, e A = área da bacia, obtém-se:
Ico = 73 Ico = 1,61
√ 2.049,1
Sendo de 73 km a maior largura da bacia, pode-se afirmar que a sua forma é alongada.
Densidade de Drenagem (Dd)
Dd = Lt , (3)
A
Esta fórmula apresentada por (Horton, 1945) apud CHRISTOFOLETTI ibidem indica a correlação entre o comprimento total dos canais (Lt) com a área da bacia (A), tabela 01 – item 4.
Rio Branco: Dd = 872,9 , Dd = 0,592
1.473,9
Igarapé Saldanha: Dd = 537,1 , Dd = 0,933
575,3
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Os dados dessa tabela demostram que apesar do Igarapé Saldanha ocupar apenas 28% da
área total da bacia, a sua densidade de drenagem é 67,8% maior do que a densidade do Rio
Branco.
Declividade do Rio Principal
A declividade do Rio Branco, bem como a do Igarapé Saldanha, possuem o mesmo valor, já
que suas nascentes coincidentemente estão na mesma altimetria, com cotas de 450m. tabela 01 –
item 5.
A delimitação da foz do Saldanha, exigiu uma pesquisa mais detalhada, uma vez que ela
ocorre na meio da corredeira do Salto Catolino, o que dificulta sua precisão. Na análise das curvas
de níveis plotadas na carta, verificou-se que a foz está sob a cota de 200m. Como estas cartas
datam de 1976 e os canais estão sempre sendo trabalhados pelas águas, optou-se por aceitar
como mais exato os valores apresentados pela ELETRONORTE (Centrais Elétricas do Norte do
Brasil S.A.), ano 1999, que mediu em campo e obteve o valor de 179m, que além de ser os mais
atualizados, foi aceito pela ANEEL.
Como ambos os canais possuem a mesma declividade e o Saldanha possui apenas 45,6% do
comprimento do Rio Branco, denota que consequentemente o Saldanha possui uma maior
declividade, maior gradiente e menor tempo de concentração (Tabela 01 – item 6).
O médio curso do Rio Branco, que compreende da PCH Alta Floresta até o Salto Catolino,
possui um desnível de 118 m em um percurso de 27 km, o que fornece uma declividade média de
4,37 m/km, valor inferior a todo o percurso do Saldanha, que está inserido em relevo acidentado,
do qual faz parte o médio curso do Rio Branco.
O alto curso do Rio Branco por conseguinte possui uma declividade de apenas 1,84 m/km,
está inserido em relevo mais plano e consequentemente com menor densidade de canais. O seu
tempo de concentração é mais lento, porque possui menor declividade, maior percurso superficial e
maior infiltração, que resulta em um atraso do volume precipitado que chegará ao canal,
principalmente na extensão do alto curso que está sobre solos arenosos, que depende do
escoamento gravitacional das águas infiltradas para o subsolo.
Densidade de Segmentos (Fs)
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Fs = ∑ ni (4)
A
Esta fórmula apresentada por CHRISTOFOLETTI (1980: 16), refere-se a quantidade de
canais por unidade de área. Onde ni é o número total de segmentos. Tabela 01 – item 7.1.
Fs (rb) = 215 Fs (rb) = 0,14 Fs (is) = 243 Fs (is) = 0,42
1473,9 575,3
Observa-se que toda a bacia analisada possui 0,22 canais por km², mas, a bacia do Saldanha
apresenta uma densidade de segmentos, 200% maior do que a do Rio Branco. Tabela 01 – item 7.
Densidade de Rios (Dr)
Dr = N , (5)
A
CHRISTOFOLETTI (1980: 115). define a quantidade de canais de 1ª ordem, por quilometro
quadrado, a partir da ordenação de STRAHLER, (Tabela 01 – item 8).
Dr = 361 , Dr = 0,18
2.049.2
Este item mostra o comportamento hidrográfico da bacia como um todo, bem como, de forma
individualizada a capacidade que cada uma possui em gerar novos cursos de água.
Extensão do Percurso Superficial (Eps)
Eps = 1 (6)
2 Dd
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Este índice representa em média a distância que o volume precipitado, através do
escoamento superficial percorre do interflúvio até o canal permanente (Tabela 01 – item 9),
conforme CHRISTOFOLETTI (1980: 111).
Eps = 1 , = 0,726
1,376
No geral, as águas percorrem em média 726m entre o interflúvio e o canal.
Considerando que é neste deslocamento que surge a erosão em lençol, e que de acordo com
o grau de inclinação das vertentes, comprimento e erodibilidade dos solos, podem surgir ravinas e
até voçorocas, recomenda-se cautela na exposição dos solos da bacia do Rio Branco,
principalmente próximo as suas nascentes, onde os solos são arenosos e possuem em média
844m de escoamento superficial, que com o aumento da energia cinética ocorrerá perdas de solos
e consequentemente assoreamento dos canais (Figuras 02 e 03).
Para CUNHA (1996: 356),“Chuvas concentradas, associadas aos fortes declives aos
espessos mantos de intemperismo e ao desmatamento podem criar áreas potenciais de erosão e
de movimentos de massa, fornecedoras de sedimentos para os leitos fluviais”.
RONDÔNIA. PLANAFLORO/ZSEE. Hidrologia (1998. V.1, Texto, p. 84-88), calculou o
deflúvio da bacia do Rio Branco, usando dados do período 1970/71 – 1994/95, através do
programa MOSS-IV, onde obteve o valor do deflúvio médio anual de 816,11(hm³/ano).
Padrão de Drenagem
O padrão de drenagem da bacia, de acordo com as definições de CHRISTOFOLETTI (1980:
102-105), são as seguintes:
• O Escoamento Global, é do tipo exorreica, já que seu escoamento é contínuo até o Oceano
Atlântico;
• O Arranjamento Espacial dos cursos fluviais possuem drenagem do tipo dendrítica, a qual se
assemelha a uma árvore, com tronco, raminhos e folhas;
• Os Subsidiários, possuem padrão pinado, com tributários paralelos que se unem ao rio principal
em ângulos agudos.
Dados Fisiográficos da Bacia do Rio Branco até o Desvio da PCH Cassol
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O alto Rio Branco possui um desvio, que através de um canal capta parte das águas de um
reservatório construído no seu leito no ponto Utm 638.527 e 8633.778, que após utilizadas são
devolvidas ao Rio Colorado, deixando de fazer parte do volume total da bacia.
O comprimento do Rio Branco, da nascente até o desvio são 15,7 km, compreendendo uma
bacia de 3ª ordem, mais 11,1 km do “Igarapé da Estiva”, que é uma bacia de 2ª ordem, com sua
foz natural no Rio Branco, a 1,5 km a jusante do reservatório, mas que também recebeu um
reservatório e tem sua água desviada por um canal construído para o reservatório do Rio Branco,
onde existe uma MU (usina de potência inferior a 1.000 KW), que serve para o abastecimento
elétrico da Fazenda Cassol, e que ajuda no abastecimento do reservatório do Rio Branco.
- Área do trecho desviado: 74,9 km²;
- Perímetro: 55,2 km;
- Quantidade de Canais: de 1ª ordem = 9, de 2ª = 3 e de 3ª = 1;
- Comprimento total dos canais: 48,7 km
- Comprimento do canal principal: 15,7 km
- Densidade de drenagem (Dd): 0,65;
- Densidade de segmentos (Fs): 0,17;
- Densidade de rios (Dr) 0,12;
- Extensão do percurso superficial: 0,769.
• Entrevistou-se o Sr. Everton Dienstmann, que por ocasião do trabalho de campo, foi quem
acompanhou toda a pesquisa no interior de suas propriedades. Ele informou que os desvios foram
feitos para desviar apenas 50% do volume de água.
Considerações finais
O diagnóstico ambiental de uma bacia hidrográfica, visando analisar os seus diversos usos,
necessariamente passa pela identificação de seus aspectos fisiográficos e antrópicos.
A ocupação da área se deu de forma espontânea e coincide com os grandes ciclos que
incentivaram a migração para Rondônia, destacando o ciclo agrícola e o extrativismo mineral e
florestal, as políticas públicas de colonização, através de assentamentos realizados pelo INCRA, os
quais ocorreram nestas áreas somente dez anos após a emancipação política do município de Alta
Floresta do Oeste.
O levantamento sócio-econômico aponta uma economia basicamente agropecuarista, mas
com uma área urbana em expansão, apresentando 53 indústrias de economia formal e informal
nos dois municípios. A principal deficiência observada é a falta de abastecimento de água no
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município de Alto Alegre dos Parecis, onde foi denunciado que os poços tubulares estão
contaminados por fossas sépticas.
O platô da Chapada dos Parecis, onde está inserido a bacia do Rio Branco, serve de divisor
entre as bacias do Rio Guaporé e Ji-Paraná, o relevo é dissecado, podendo ser divido em duas
áreas diferentes, uma com relevo suave ondulado, usado pela agropecuária e outra com relevo
acidentado, indicado para a construção de PCH’s.
Os solos da maior parte da bacia são o latossolo vermelho-escuro eutrófico, associado com
latossolo vermelho-amarelo eutrófico, bem drenado argiloso, o solo mais crítico da bacia e que por
ironia é onde estão situadas as nascentes do Rio Branco, são as areias quartzosas.
Os solos Latossolos vermelho-escuro eutróficos apresentam uma boa fertilidade, que
associado ao clima com curto período seco, com precipitações médias de 1.788mm e
evapotranspiração de 1.392mm, mantém sempre a probabilidade de novas chuvas, fazendo com
que a bacia e a região comece a se destacar pelos números apresentados em sua produção.
Os solos Latossolos vermelho-amarelo distróficos e areias quartzosas, requerem maiores
cuidados para evitar a erosão, devendo estas áreas muito arenosas serem usadas para
preservação ou cultivos permanentes, evitando o uso de máquinas e o super pastoreio.
A hidrografia compreende duas bacias de 5ª ordem, sendo a do Rio Branco com 147,4 mil
hectares e a do Igarapé Saldanha com 57,5 mil hectares, juntas possuem um perímetro de 316,7
km. A 15,7 km da nascente, o Rio Branco possui um desvio que ajuda na geração da PCH Cassol,
bem como uma Mini Usina com 10 KV instalados e que abastece de energia a fazenda Cassol. O
perfil do médio Rio Branco apresenta condições para o aproveitamento com cinco PCH’s, sendo
que uma já está construída e em funcionamento, duas possuem o projeto básico aprovado pela
ANEEL, restando aos interessados o encaminhamento de projetos para que todo o potencial
energético seja utilizado, com o devido cuidado em relação ao meio ambiente.
A vegetação original possui predomínio de Floresta Ombrófila Submontana com Dossel
Emergente, constituídas por florestas tropicais úmidas, pluviais sempre verdes, com dossel bem
distinto e emergente, e sub-bosque estratificado principalmente sobre latossolos. Ocorre em menor
quantidade a Floresta Aberta Submontana, que cresce sobre solos antigos, rasos, fortemente
intemperizados, com afloramento de rochas e seixos superficiais, onde a topografia é declivosa
dominada por vales e ravinas, possui palmeiras e cipós emergentes, destacando a Palmeira
Babaçu, o Coco Cabeçudo e as Higrófilas, Açaí, Sororoca e Paxiúba, as espécies arbóreas de
porte elevado, como Jatobá, Cedro e outras ocorrem na Floresta Ombrófila Densa Submontana.
Analisando através de imagens de satélite, o uso da terra com agropecuária na bacia é da
ordem de 53,2%, e um total de 44,1% permanecendo sob mata. As principais degradações
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observadas foram o desmatamento da mata ciliar e das nascentes para uso agropecuário. O trecho
do médio curso do Rio Branco que apresenta características propícias a instalação de PCH’s,
também está na dependência do uso adequado da terra por parte dos agropecuaristas, uma vez
que o assoreamento dos canais podem causar prejuízos enormes aos produtores de energia, e a
falta de energia também pode causar prejuízos aos agropecuaristas. Fica evidente que um
depende da atividade do outro, e que juntos podem acelerar o desenvolvimento da região,
favorecendo a economia do Estado de Rondônia.
Para que a bacia continue sendo um atrativo agropecuário e para melhorar a qualidade de
vida local, faz-se as seguintes recomendações:
• aos agricultores que adotem medidas conservadoras, evitando o assoreamento dos canais;
• empenho dos órgãos ambientais para que façam fiscalização local, combatendo o
desmatamento da áreas de preservação, bem como incentivando o reflorestamento das matas
ciliares;
• as autoridades constituídas e a sociedade civil organizada para que tomem conhecimento da
situação ora apresentada, levando em consideração que esse tipo de problema não está restrito
apenas à região objeto deste estudo, mas extrapola os limites da bacia do Rio Branco, podendo
atingir proporções alarmantes.
Cabe alertar que a busca pelo desenvolvimento não deve ter prioridade sobre a qualidade
ambiental e principalmente sobre as condições de vida da sociedade.
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CONCEITOS DE DESENVOLVIMENTO CONCEITOS DE DESENVOLVIMENTO CONCEITOS DE DESENVOLVIMENTO CONCEITOS DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL EM JOSUÉ DE CASTRO: SUSTENTÁVEL EM JOSUÉ DE CASTRO: SUSTENTÁVEL EM JOSUÉ DE CASTRO: SUSTENTÁVEL EM JOSUÉ DE CASTRO:
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Adriano Lopes Saraiva*Adriano Lopes Saraiva*Adriano Lopes Saraiva*Adriano Lopes Saraiva* Leonardo Guilherme Luz Aragão*Leonardo Guilherme Luz Aragão*Leonardo Guilherme Luz Aragão*Leonardo Guilherme Luz Aragão*
Júlio César Souza Chagas*Júlio César Souza Chagas*Júlio César Souza Chagas*Júlio César Souza Chagas*
RESUMO: Pensar em desenvolvimento sustentável é preocupar-se com as necessidades do presente sem comprometer a satisfação das necessidades das gerações futuras. A partir da leitura da obra de Josué de Castro, este artigo discute o conceito de desenvolvimento sustentável em suas diversas concepções, buscando subsídios para promover discussões teóricas sobre o tema. PALAVRAS-CHAVE: Desenvolvimento sustentável; Josué de Castro; Sociedade; Natureza; Geografia Social.
Apresentando a obra de Josué de Castro
Falar da obra de Josué de Castro torna-se um grato prazer quando percebemos que sua
preocupação sempre esteve ligado ao humano. O homem esteve sempre no centro de suas
análises e de suas obras. Na atualidade, a leitura da obras de Castro nos mostra que o discurso ali
contido, ainda é atual. Perdura ainda no início do século XXI os mesmos quadros de pobreza e
miséria descritos e combatidos nas obras de Castro.
Josué de Castro procurou desenvolver uma ciência, a partir do fenômeno do
subdesenvolvimento, que é a fome. Tentou criar uma teoria explicativa para a triste realidade do
subdesenvolvimento, da pobreza e da miséria. O que foi iniciado com a publicação em 1946 da
primeira edição de Geografia da Fome. O que significou nas palavras de Homero Homem “livro que
vai ficar pelo seu milagre de clareza e rigor científico, pelo seu duplo significado de mensagem ao
nosso povo e aos homens que governam” (Jornal do Brasil – Rio de Janeiro, s/d).
4 Artigo Apresentado como conclusão da Disciplina Geografia Social, ministrada pelo prof. Dr. Josué da Costa Silva – Dep. de
Geografia da Universidade Federal de Rondônia – UNIR.
*Acadêmicos do 8º período de geografia da Universidade Federal de Rondônia – UNIR.
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A obra de Josué de Castro é profundamente humana e universal, elaborada acima de
posições partidárias e das intolerâncias políticas. A preocupação com a situação da população
pobre, expulsa das áreas agrícolas do interior e mal localizadas no Recife, aguçou o interesse do
jovem médico pelo problema social, levando-o a dedicar parte do seu tempo na análise do
problema da população de baixa renda.
Ampliando sua atenção como médico, político e professor universitário passou a pensar em
escala nacional. Com isso, o crescimento da produção científica de Castro foi considerável,
começando com ensaios detalhista como “Geografia da Fome”, passando para obras em que
analisou a fome em escala mundial. Como exemplos desta fase temos “Geopolítica da fome” e
“Livro Negro da Fome”.
Sendo um cientista com sensibilidade social, Castro trabalhou com visão aberta a
interdisciplinaridade. Partiu de uma análise biológica e médica do problema alimentar para uma
visão geográfica, sociológica e política. Rompeu as falsas fronteiras que o positivismo havia criado
entre as várias áreas do conhecimento científico e tornou-se um grande geógrafo, um dos maiores
da geografia brasileira.
Na atualidade em que vivemos, onde temos dificuldades de distinguir o nacional do
internacional, onde o processo em marcha da chamada “globalização”, reorienta de forma mais
intensa a ação do capital, o pensamento de Castro ganha importância, já que desde os anos 50 ele
já dizia que não se podia separar o problema do Brasil da problemática mundial e que se deveria
procurar uma solução tanto em escala nacional, como mundial.
O tema mais recorrente das obras de Castro é a fome, que para ele é a expressão biológica
de males sociológicos. É um fenômeno de caráter mundial que não assola apenas regiões como o
nordeste ou a Amazônia brasileira, está presente em todos os continentes em todos os países. Há
várias causas para que se ocorra fome, o mais claro e evidente é a má distribuição de renda, que
faz com que grande parte da população não tenha as mínimas condições de comprar seus
alimentos.
Castro caracteriza duas maneiras de morrer de fome: não comer nada e definhar de maneira
vertiginosa até o fim, ou comer de maneira inadequada e entrar em um regime de carências ou
deficiências específicas, capaz de provocar um estado que pode também conduzir a morte. Mais
grave ainda que a fome aguda e total, devido as suas repercussões sociais e econômicas, é o
fenômeno da fome crônica ou parcial que corrói silenciosamente inúmeras populações do mundo.
As principais obras de Josué de Castro são: Geografia da Fome, Geopolítica da Fome,
Ensaios de Geografia Humana, Sete Palmos de terra e um caixão, Ensayos sobre el Sub-
desarrolo, Siglo Veinte, adonde va la América Latina?, Homens e Caranguejos, A explosão
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demográfica e a fome no mundo, Fome um tema proibido, Documentários do Nordeste, entre
outros.
Concepções de desenvolvimento e o desenvolvimento sustentável
Ao lermos a obra de Castro e suas críticas construídas desde a década de 40, podemos
enfatizar que o desenvolvimento só ocorrerá se, houver grandes mudanças na estrutura da
sociedade, em especial na distribuição justa de renda. A concentração abusiva de riqueza é fator
determinante para a expansão desequilibrada. Assim, esta tremenda desigualdade social entre os
povos divide economicamente o mundo em duas faces distintas: o mundo dos ricos e o mundos
dos pobres, o mundo dos países desenvolvidos e industrializados, e o mundo dos países
proletários e subdesenvolvidos. Tais concepções são de uma atualidade impressionante, pois a
estrutura social que Castro criticava desde a década de 40 não mudou, por isso ela é ainda atual.
Este fosso econômico divide ainda hoje a humanidade em dois grupos que se entendem com
dificuldade, o grupo dos que não comem. Constituído por dois terços da humanidade, e que
habitam as áreas subdesenvolvidas do mundo, e o grupo dos que não dormem, que é o terço
restante dos países ricos. E que não dormem com receio da revolta dos que não comem.
Igualmente é falso considera Castro, o conceito de desenvolvimento avaliado unicamente a
base da expansão da riqueza material, do crescimento econômico. O desenvolvimento implica
mudanças sociais sucessivas e profundas que acompanham inevitavelmente as transformações
tecnológicas do contorno natural. O conceito de desenvolvimento não é meramente quantitativo,
mas compreende os aspectos qualitativos dos grupos humanos a que concerne. Crescer é uma
coisa, desenvolver é outra. Crescer é em linhas gerais é fácil. O difícil é equilibrar as duas coisas,
crescer com justiça social desenvolvendo todos os setores econômicos e sociais.
MENDES assim define desenvolvimento:
“como a criação de condições tendentes à produção do ser humano em sua integridade. É, portanto, um processo e o sucesso resultante. Incorpora objetivos, destina-se a certos fins. E o desenvolvimento econômico e material é vista como um elemento importante, mas em si insuficiente, para a promoção do desenvolvimento humano” (1998, p. 54)
Com base nessa perspectiva, as discussões atuais colocam para o desenvolvimento humano
o respeito à natureza e dos elementos que dela fazem parte. Assim, recai-se no conceito de um
desenvolvimento que respeite o meio ambiente e o homem. Um desenvolvimento que busque o
equilíbrio entre os diversos elementos da natureza e da sociedade, estamos falando de um
conceito que vem sendo adotado e denomina-se desenvolvimento sustentável.
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Para a CMMAD (Comissão Mundial para o Meio Ambiente e Desenvolvimento) o
desenvolvimento sustentável é o “desenvolvimento que satisfaz às necessidades da geração
presente sem comprometer as possibilidades das futuras gerações em satisfazer suas
necessidades” (1991).
Tal definição contém dois conceitos-chave:
I. O conceito de “necessidades”, sobretudo as necessidades essenciais dos pobres do mundo
que devem receber a máxima prioridade;
II. A noção das limitações que o estágio da tecnologia e da organização social impõe ao
meio ambiente, impedindo-o de atender as necessidades presentes e futuras.
Em seu sentido mais amplo, a estratégia do desenvolvimento sustentável visa promover a
harmonia entre os seres humanos e entre a humanidade e a natureza. No contexto específico das
crises do desenvolvimento e do meio ambiente surgidas nos anos 80, que as atuais instituições
políticas e econômicas nacionais e internacionais ainda não conseguiram e talvez não conseguirão
superar, a busca do desenvolvimento sustentável requer, segundo o Relatório Budtland de 1998:
• Um sistema político que assegure a efetiva participação dos cidadãos no processo
decisório;
• Um sistema econômico capaz de gerar excedentes técnicos em bases confiáveis e
constantes;
• Um sistema social que possa resolver as tensões causadas por um desenvolvimento não
equilibrado;
• Um sistema de produção que respeite a obrigação de preservar a base ecológica do
desenvolvimento;
• Um sistema tecnológico que busque constantemente novas soluções;
• Um sistema internacional que estimule padrões sustentáveis de comércio e financiamento;
• Um sistema administrativo flexível e capaz de autocorrigir-se.
Assim, o desenvolvimento sustentável:
“... seria então, o desenvolvimento que, ao contrário das concepções tradicionais,
pressupõe uma forma de viver e agir, em que a finalidade da produção e do consumo é
proporcionar o bem-estar da maioria da população, provocar um impacto maior no meio
ambiente, através de novas formas de conhecimento sobre a relação homem/natureza.”
(FIGUEIREDO, 1999, p. 39)
Tal conceito mostra-se como uma alternativa as teorias e aos modelos tradicionais de
desenvolvimento, buscando uma harmonia entre os elementos constituintes da natureza e da
sociedade. A proposta constrói-se sobre uma crítica ao processo de desenvolvimento tradicional
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que provocou intensos impactos, seja na migração, na instalação de grandes projetos econômicos
e de infra-estrutura, queimadas, etc.
Em se tratando de Amazônia, o modelo que combina modernização econômica com pobreza
e desigualdade social e com destruição do meio ambiente, exige uma definição por parte de alguns
segmentos da sociedade e do poder público caminhos e alternativas que busquem amenizar e
resolver essas situações.
A estratégia seria então, implementar um modelo racional de aproveitamento econômico,
conservação e reprodução auto-sustentada, que aliasse alternativas tecnológicas e de organização
dos atores sociais. Um modelo capaz de reorientar as de investimento para a região e para o
restante do país.
Considerações finais
O que se pode concluir é que Castro foi um exemplo de homem público e de cientista, que
não se negou aos combates pela modernização do país, pelas campanhas de diminuição das
diferenças sociais entre as pessoas e as classes, assim, como pela apresentação de soluções para
uma visão e uma preocupação com os problemas regionais, nacionais e internacionais.
Ele era um cidadão brasileiro com uma visão e uma preocupação com o problemas mundiais
e um cidadão do mundo que lutava e se arriscava em defesa das transformações da sociedade
brasileira dentro de critérios racionais e populares.
Suas análises permanecem atuais, na medida que ainda retrata uma realidade comum em
noticiários e jornais. A miséria e fome ainda hoje estão entre os males do subdesenvolvimento. Sua
contribuição é decisiva tanto, para os estudiosos dos problemas brasileiros como para planejadores
e administradores que necessitam equacionar e resolver problemas que afligem não apenas o
país, mas também o restante do mundo. É conveniente um toque de otimismo, lembrando que as
crises podem ser processos de um “parto” de uma sociedade melhor.
E para não esquecer, só há um tipo de verdadeiro desenvolvimento: o desenvolvimento
humano. O ser humano como fator de desenvolvimento, o ser humano beneficiário do
desenvolvimento. E o cérebro humano a fábrica de desenvolvimento. É a vida humana que deve
desabrochar pela utilização dos produtos postos à sua disposição pelo desenvolvimento.
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