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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA JLIO DE MESQUITA FILHO
DEPARTAMENTO DE SADE PBLICA
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM SADE COLETIVA
ROBERTA JUSTEL DO PINHO
PREVALNCIA E FATORES ASSOCIADOS AO USO DE LCOOL
ENTRE IDOSOS DO MUNICPIO DE SO PAULO/SP, ESTUDO SABE
Orientador: Prof. Dr. Maria Cristina Pereira Lima
BOTUCATU SP
2012
ROBERTA JUSTEL DO PINHO
PREVALNCIA E FATORES ASSOCIADOS AO USO DE LCOOL ENTRE
IDOSOS DO MUNICPIO DE SO PAULO/SP, ESTUDO SABE
Orientador: Prof. Dr. Maria Cristina Pereira Lima
Dissertao apresentada ao Programa de Ps-
Graduao em Sade Coletiva, da Faculdade de
Medicina de Botucatu, Universidade Estadual
Paulista Jlio de Mesquita Filho, para obteno do
ttulo de Mestre em Sade Coletiva.
BOTUCATU - SP
2012
FICHA CATALOGRFICA ELABORADA PELA SEO TC. AQUIS. TRATAMENTO DA INFORM.
DIVISO DE BIBLIOTECA E DOCUMENTAO - CAMPUS DE BOTUCATU - UNESP
BIBLIOTECRIA RESPONSVEL: ROSEMEIRE APARECIDA VICENTE
Pinho, Roberta Justel do. Prevalncia e fatores associados ao uso de lcool entre idosos do municpio
de So Paulo/SP, Estudo SABE / Roberta Justel do Pinho. Botucatu : [s.n.],
2012
Dissertao (mestrado) Universidade Estadual Paulista, Faculdade de
Medicina de Botucatu
Orientador: Maria Cristina Pereira Lima Capes: 40601005
1. Idosos - Uso do lcool - So Paulo (SP). 2. Alcoolismo Fatores de risco. 3. Envelhecimento.
Palavras-chave: Idosos; Uso de lcool; Uso de risco.
Dedicatria
v Dita (na memria sempre viva!)
O que eu realmente quero que voc saiba que
no importa o tempo que passe,
o que acontea ou o que a vida nos ensine.
No interessa quem somos ou quem vamos nos tornar.
O que vale o que carregamos dentro de ns.
E voc, guarde isso na memria para todo o sempre,
eu te carrego junto comigo todos os dias.
Clarissa Corra.
Agradecimentos
O fato Cada um de ns a soma dos momentos que j tivemos. E de todas as
pessoas que j conhecemos. E so esses momentos que se tornam nossa histria.
(The Vow).
Primeiramente Prof Dr Maria Cristina Pereira Lima, Kika, pela orientao cuidadosa
e paciente; por toda a compreenso e ensinamentos; no haveria algum mais
comprometida, bem-humorada, didtica, apoiadora e afetuosa para me acolher nesse
projeto! No h palavras para agradecer-lhe! ;
Aos meus pais, Antonio e Renata, pelo amor e apoio incondicionais em todas as minhas
escolhas e ao Rafael, por me ensinar aquilo que s os irmos so capazes de faz-lo;
Ao Caio, meu querido namorado e maior amigo, por estar sempre presente, pelo afeto
to verdadeiro e por tentar compreender minhas ausncias, inquietaes e angstias;
Beth e Rui, pelo carinho e por serem presena sempre constante;
Banca examinadora do Exame de Qualificao, Prof Dr Ana Teresa De Abreu
Ramos Cerqueira, Prof Dr Cristiane Lara Mendes-Chiloff e Prof. Dr. Edison
Iglesias de Oliveira Vidal pelas valiosas contribuies para finalizao desse trabalho e
tambm ao Prof. Dr. Jair Lcio Ferreira Santos, por aceitar o convite para compor a
banca de defesa;
Prof Dr Maria Lcia Lebro, por ter concedido o privilgio de trabalhar os dados do
Estudo SABE;
Aos funcionrios e professores do Programa de Ps-Graduao em Sade Coletiva e
tambm aos colegas de turma, pela convivncia e por dividirem comigo suas ideias e ideais,
suas angustias e sonhos; em especial s amigas Andreza, Ju Corvino, Ju Antoniucci e
Paty;
querida Rosemary Cristina da Silva, Meirinha, pela reviso to cuidadosa das
referncias deste trabalho e por ser a pessoa querida que !
Aos amigos de Botucatu (e da vida), em especial querida Luciana Carnier pela amizade
e acolhida em todos os sentidos, Mawusi, por compartilhar comigo seu encantamento
pela vida e me fazer crer na boa sorte; aos queridos conterrneos que a vida permitiu que
eu encontrasse ali (Meirinha, Luciana, Vanessa, Beto), s amigas Terapeutas
Ocupacionais, aos colegas do Aprimoramento Profissional, da Associao Arte e
Convvio e Hospital-Dia de Psiquiatria (FMB/Unesp) pelas tantas alegrias e
ensinamentos que me proporcionaram;
s amigas de Bauru, do curso de Terapia Ocupacional da Universidade do Sagrado
Corao, especialmente querida Maria Amlia Ximenes, pelo exemplo que se tornou
para mim. Tambm aos alunos do curso pela convivncia e aprendizado compartilhados;
s colegas da Prefeitura Municipal de So Carlos, que hoje me acolhem em um novo
projeto de vida profissional;
Meu muito obrigada por dividirem comigo esse pedao de alegria!
Reze e trabalhe, fazendo de conta que esta vida um dia de capina com sol
quente, que s vezes custa a passar, mas sempre passa. E voc ainda pode
ter muito pedao bom de alegria. Cada um tem a sua hora e a sua vez: voc
ainda h de ter a sua.
Sagarana , Joo Guimares Rosa
RESUMO
Pinho, R.J. PREVALNCIA E FATORES ASSOCIADOS AO USO DE LCOOL
ENTRE IDOSOS DO MUNICPIO DE SO PAULO/SP, ESTUDO SABE. Dissertao
(Mestrado) Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade Estadual Paulista Jlio de
Mesquita Filho, 2012.
Apesar do rpido avano no nmero de idosos em todo mundo, diversas questes relacionadas
a esse crescimento ainda apresentam-se pouco exploradas, como o caso do uso de lcool por
essa populao. Objetivo Estimar a prevalncia de uso de lcool e de uso de risco de lcool
bem como identificar os fatores associados a ambos os desfechos em amostra de idosos
residentes no municpio de So Paulo/SP, participantes do ESTUDO SABE (Sade, Bem-
estar e Envelhecimento) em 2006. Mtodo Anlise transversal, com amostra aleatria por
conglomerados de sujeitos com 60 anos ou mais (n=1184). As variveis dependentes foram
uso de lcool e uso de risco de lcool, este, identificado atravs do Short- Michigan
Alcoholism Screening Test Geriatric (SMAST-G). Foram variveis de exposio:
caractersticas sociodemogrficas, suporte familiar, condies de vida e sade, declnio
cognitivo, tabagismo e capacidade funcional. As estimativas de prevalncia e respectivos
intervalos de confiana foram obtidos aplicando-se pesos que corrigiram para o efeito de
amostragem complexa. A significncia estatstica foi avaliada atravs do teste de Rao-Scott,
por tratar-se de amostra complexa. A anlise multivariada foi feita atravs da construo de
modelos de regresso logstica tanto para uso de lcool quanto para uso de risco de lcool,
com clculo de Odds Ratios ajustadas. Foram includas nos modelos as variveis que
mostraram associao com os desfechos com p0,25 na anlise univariada. Permaneceram no
modelo final as variveis independentes que mantiveram associao com desfecho aps ajuste
(p0,05). Resultados a maioria da amostra era composta por mulheres (59,2%), idosos na
faixa dos 60-64 anos (29,7%), brancos (63,7%), com escolaridade mdia de 4-7 anos (40,4%),
aposentados (40,0%) e casados (61,9%). A prevalncia de uso de lcool foi de 21,1% e 47,7%
entre mulheres e homens, respectivamente (p=0,001), com prevalncia ponderada de uso de
lcool na amostra total de 31,9%. O uso de lcool esteve associado a ser do sexo masculino
(ORajustada= 3,71, IC 2,62-5,26); ter menor idade (ORajustada= 0,97, IC 0,95-0,99); ter 8 ou mais
anos de escolaridade (ORajustada= 5,20, IC 2,96-9,15) e ser tabagista (ORajustada=1,89, IC 1,17-
3,05). Dentre os que relataram consumir lcool, identificou-se prevalncia de uso de risco em
7,5% das mulheres e 26,9% dos homens. O uso de risco esteve associado ao sexo masculino
(ORajustada=11,73, IC 4,38-31,38), ser mais jovem (ORajustada=0,93; IC 0,87-0,99); ter
declarado ser da cor negra/parda (ORajustada=6,28, IC: 2,83-13,94); no saber ler e escrever um
recado (ORajustada=4,13, IC 1,21-14,09) e no ter transtorno mental (ORajustada=0,008, IC 0,03-
0,25). Concluso Os resultados encontrados apontam que, embora o uso de lcool seja menos
prevalente na velhice, as prevalncias desse uso e tambm de uso de risco obtidas mostram-se
relevantes, j que mesmo em menor frequncia/quantidade, esse uso pode implicar diversas
consequncias negativas nessa fase da vida. Alm disso, observou-se que o consumo de lcool
na velhice esteve associado ao sexo masculino, a ser mais jovem e a ser tabagista. Melhores
condies socioeconmicas associaram-se a uso de lcool, mas no a uso de risco, sugerindo
que desigualdades sociodemogrficas possam ser determinantes na prevalncia deste ltimo.
Palavras-chave: idosos; uso de lcool; uso de risco.
ABSTRACT
Pinho, R.J. PREVALENCE AND FACTORS ASSOCIATED WITH ALCOHOL USE
OLDER ADULTS LIVING IN SO PAULO/SP, SABE STUDY. Dissertation (Master
Degree). School of Medicine of Botucatu, University of State of So Paulo, Botucatu, 2012.
Despite the rapid advance in the number of elderly people worldwide, many issues related to
this growth is still scant explored, as it is the case of alcohol use by this population. Objective
To estimate the prevalence of alcohol use and hazardous use and factors associated with them
among older adults living in So Paulo/ SP, who took part in SABE Study (Health, Wellness
and Aging) in 2006. Method This is a cross-sectional analysis with random cluster sample of
subjects aged 60 years or more (n = 1184). The dependent variables were alcohol use and
hazardous alcohol use, the last one it was identified by the Short Michigan Alcoholism
Screening Test-Geriatric (SMAST-G). Exposure variables were: demographic information,
family support, living conditions and health, cognitive decline, smoking and functional
capacity. . Prevalence estimates and confidence intervals were obtained by applying weights
that corrected for the design. Statistical significance was assessed by the Rao-Scott test,
because it is a complex sample. Multivariate analysis was done by building logistic regression
models for both alcohol use and hazardous use of alcohol, with calculation of adjusted odds
ratios. It was included in the models the variables that showed association with outcomes with
p 0.25 in univariate analysis. Remained in the final model the variables that kept associated
with outcome after adjustment (p 0.05). Results The majority of the sample were women
(59.2%), aged between the ages of 60-64 years (29.7%), white (63.7%), and mean schooling
was 4.7 years (40 4%), retired (40.0%) and married (61.9%). The prevalence of alcohol use
was 21.1% and 47.7% among women and men, respectively (p = 0.001), with prevalence of
alcohol use in the total sample of 31.9%. Alcohol use was associated with being male
(ORadjusted = 3.71, CI 2.62 to 5.26), being younger (ORadjusted = 0.97, CI 0.95 to 5.26),
having 8 or more years of schooling (ORadjusted = 5.20, CI 2.96 to 9.15) and being a smoker
(ORadjusted = 1.89, CI 1.17 to 3.05). Among those who reported alcohol consumption, the
prevalence of hazardous use in 7.5% of women and 26.9% of men. The hazardous use was
associated with male gender (ORadjusted = 11.73, CI 4.38 to 31.38), be younger (ORadjusted
= 0.93, CI 0.87 to 0.99), having declared to be of black / brown (ORadjusted = 6.28, CI: 2.83
to 13.94); not read and write a message (ORadjusted = 4.13, CI 1.21 to 14.09) and not having
a mental disorder (ORadjusted=0,008, IC 0,03-0,25). Conclusion The results indicate that
although alcohol use is less prevalent in old age, the prevalence of use and hazardous use is
relevant, since even with a lower frequency / quantity, such use may entail several negative
consequences for elderly. Furthermore, we observed that alcohol consumption in old age was
associated with male gender, being younger and being a smoker. Better socioeconomic
conditions were associated with alcohol use, but not with hazardous use, suggesting that
demographic determinants can be predictive of that prevalence.
Keywords: older adults; alcohol use; hazardous use.
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Caractersticas sociodemogrficas segundo sexo em amostra de idosos, Estudo
SABE, So Paulo (n=1184). ......................................................................................... 56
Tabela 2 - Distribuio de arranjo e situao familiar, segundo sexo em amostra de idosos,
Estudo SABE, So Paulo (n=1184). ............................................................................. 57
Tabela 3 - Distribuio de religio e importncia atribuda mesma segundo sexo em amostra
de idosos, Estudo SABE, So Paulo (n=1184). ............................................................. 58
Tabela 4 - Distribuio da autoavaliao da memria e de sade segundo sexo em amostra de
idosos, Estudo SABE, So Paulo (n=1184) ................................................................... 59
Tabela 5 - Distribuio de morbidade referida e depresso pela GDS de acordo com sexo em
amostra de idosos, Estudo SABE, So Paulo (n=1184). ................................................ 61
Tabela 6 - Distribuio de ocorrncia e nmero de quedas segundo sexo em amostra de
idosos, Estudo SABE, So Paulo (n=1184) ................................................................... 62
Tabela 7 - Distribuio de uso de lcool e tabaco segundo sexo em amostra de idosos, Estudo
SABE, So Paulo (n=1184) .......................................................................................... 63
Tabela 8 - Distribuio de desempenho em Atividades de Vida Diria e Atividades
Instrumentais de Vida Diria segundo sexo em amostra de idosos, Estudo SABE, So
Paulo (n=1184)............................................................................................................. 64
Tabela 9 - Uso de medicamentos de acordo com sexo em amostra de idosos, Estudo SABE,
So Paulo (n=1184) ...................................................................................................... 64
Tabela 10 - Caractersticas sociodemogrficas segundo uso de lcool em amostra de idosos,
Estudo SABE, So Paulo (1184)................................................................................... 66
Tabela 11 - Distribuio do arranjo e situao familiar de acordo com uso de lcool, na
amostra de idosos do ESTUDO SABE (n=1184) .......................................................... 67
Tabela 12 - Distribuio de religio/prticas religiosas de acordo com uso de lcool, na
amostra de idosos do ESTUDO SABE (n=1184). ......................................................... 68
Tabela 13 - Distribuio de autoavaliao do estado cognitivo e de sade de acordo com uso
de lcool na amostra de idosos do ESTUDO SABE (n=1184)....................................... 69
Tabela 14 - Distribuio de morbidade referida de acordo com uso de lcool na amostra de
idosos do ESTUDO SABE (n=1184) ............................................................................ 71
Tabela 15 - Distribuio de ocorrncia e frequncia de quedas segundo uso de lcool em
amostra de idosos do estudo SABE (n=1184). .............................................................. 72
Tabela 16 - Distribuio do uso de tabaco de acordo com uso de lcool em amostra de idosos
do estudo SABE (n=1184) ............................................................................................ 72
Tabela 17 - Distribuio do desempenho em atividades bsicas de vida diria e atividades
instrumentais de vida diria segundo uso de lcool, em amostra de idosos do Estudo
SABE (n=1184) ........................................................................................................... 73
Tabela 18 - Distribuio do uso de medicaes de acordo com uso de lcool, em amostra de
idosos do estudo SABE (n=1184) ................................................................................. 74
Tabela 19 - Distribuio sociodemogrfica de acordo com uso de risco de lcool em amostra
de idosos do Estudo SABE (n=333).............................................................................. 76
Tabela 20 - Distribuio do arranjo familiar de acordo com uso de risco de lcool em amostra
de idosos do Estudo SABE (n=333).............................................................................. 77
Tabela 21 - Distribuio de religio de acordo com uso de risco de lcool em amostra de
idosos do Estudo SABE (n=333) .................................................................................. 78
Tabela 22 - Distribuio da avaliao do estado cognitivo e condies de sade uso de risco
de lcool em amostra de idosos do Estudo SABE (n=333) ............................................ 79
Tabela 23 - Distribuio de morbidade referida de acordo com uso problemtico de lcool em
amostra de idosos do Estudo SABE (n=333). ............................................................... 80
Tabela 24 - Distribuio de ocorrncia/nmero de quedas de acordo com uso de risco de
lcool em amostra de idosos do estudo SABE (n=333) ................................................. 81
Tabela 25 - Distribuio de frequncia de uso de lcool e uso de tabaco e uso de lcool de
risco em amostra de idosos do estudo SABE (n=333). .................................................. 82
Tabela 26 - Distribuio da capacidade Funcional e uso de risco lcool em amostra de idosos
do estudo SABE (n=333) .............................................................................................. 83
Tabela 27 - Distribuio do uso de medicaes de acordo com uso de risco de lcool em
amostra de idosos do estudo SABE (n=333) ................................................................. 83
Tabela 28 - Odds Ratio brutas e ajustadas para variveis que permaneceram no modelo final
de regresso logstica para uso de lcool na amostra de idosos participantes do ESTUDO
SABE, So Paulo/SP (n=333). ...................................................................................... 84
Tabela 29 - Odds Ratio brutas e ajustadas para variveis que permaneceram no modelo final
de regresso logstica para Uso de Risco de lcool na amostra de idosos participantes do
ESTUDO SABE, So Paulo/SP (n=333)....................................................................... 85
LISTA DE FIGURAS E QUADROS
Figura 1 - Coortes do estudo SABE, realizado em So Paulo/SP, a partir do ano 2000..........39
Figura 2 - Composio da amostra do estudo de uso de lcool em idosos participantes do
estudo SABE, no municpio de So Paulo/SP..........................................................................41
Quadro 1 - Padres de uso de lcool, abrangncia pelos sistemas diagnsticos e sua descrio.
.............................................................................................................................................. 5
Quadro 2 - Instrumentos de identificao/rastreio de uso de lcool: vantagens e desvantagens
para uso com idosos: .............................................................................................................. 9
Quadro 3 - Principais estudos de prevalncia de uso de lcool em idosos brasileiros ............ 27
Quadro 4 - Composio do questionrio SABE (2006) ......................................................... 44
Quadro 5 - Variveis selecionadas para o presente estudo, de acordo com o questionrio
SABE (2006). ...................................................................................................................... 51
LISTA DE SIGLAS
ABVDs Atividades Bsicas de Vida Diria
AIVDs Atividades Instrumentais de Vida Diria
APA American Psychiatric Association
ARPS - Alcohol-Related Problems Survey
AUDIT - Alcohol Use Disorders Identification Test
AVE Acidente Vascular Enceflico
CID-10 Classificao Internacional de Doenas 10 edio
DSM Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders
GDS- Geriatric Depression Scale
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Pesquisa
MAST-G - Michigan Alcoholism Screening Test Geriatric Version
MEEM - Mini-Exame do Estado Mental
NIAAA National Institute on Alcohol Abuse and Alcoholism
OMS - Organizao Mundial da Sade
PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domiclios
OPAS - Organizao Panamericana de Sade
SABE - Sade, Bem-estar e Envelhecimento
SAMSHA - Substance Abuse and Mental Health Services Administration
SEADE - Fundao Sistema Estadual de Anlise de Dados
SMAST-G Short Michigam Alcoholism Screening Test
STATA Stata Statistical Software
SUMRIO
RESUMO
ABSTRACT
LISTA DE TABELAS
LISTA DE FIGURAS
LISTA DE SIGLAS
1. INTRODUO ................................................................................................... 1
1.1 O CONTEXTO: SITUANDO O ENVELHECIMENTO POPULACIONAL E
SUAS CARACTERSTICAS ............................................................................................. 1
1.2 USO DE LCOOL PADRES DE USO E CRITRIOS DIAGNSTICOS ....... 4
1.3 INSTRUMENTOS DE DETECO DO USO DE LCOOL NA POPULAO GERAL E EM IDOSOS ..................................................................................................... 7
1.4 CARACTERSTICAS DO USO DE LCOOL POR IDOSOS ............................. 12
1.5 EPIDEMIOLOGIA DO USO DE LCOOL POR IDOSOS ................................. 24
2. JUSTIFICATIVA ............................................................................................... 34
3. HIPTESES ...................................................................................................... 35
4. OBJETIVOS ....................................................................................................... 36
5. METODOLOGIA ............................................................................................. 37
5.1 DESCRIO DO ESTUDO ................................................................................ 37
5.2 O ESTUDO SADE, BEM-ESTAR E ENVELHECIMENTO (SABE) ................ 37
5.3 DELINEAMENTO E LOCAL DO ESTUDO ....................................................... 39
5.4 SUJEITOS ............................................................................................................ 40
5.5 PROCEDIMENTOS DE AMOSTRAGEM .......................................................... 41
5.5.1 Amostra de idosos ............................................................................................ 42 5.5.2 Amostra dos domiclios .................................................................................... 42
5.6 INSTRUMENTOS ............................................................................................... 43 5.6.1 Short Michigan Alcoholism Screening Test Geriatric ........................................ 45
(S MAST-G) ................................................................................................................ 45 5.6.2 Escala de Depresso Geritrica (Geriatric Depression Scale/GDS) .................... 46
5.6.3 Miniexame do estado mental (meem) ................................................................ 46 5.6.4 ndice katz para atividades bsicas de vida diria (abvd) ................................... 47
5.6.5 Escala de Lawton para Atividades Instrumentais de Vida Diria ....................... 47 5.6.6 Apgar de Famlia .............................................................................................. 48
6. ANLISE DOS DADOS ............................................................................. 50
7. CONSIDERAES TICAS.................................................................. 54
8. RESULTADOS ................................................................................................ 55
8.1 CARACTERSTICAS DA AMOSTRA SEGUNDO SEXO. ................................ 55
8.2 CARACTERSTICAS DA AMOSTRA SEGUNDO USO DE LCOOL ............. 65
8.3 CARACTERSTICAS DA AMOSTRA SEGUNDO USO DE RISCO DE LCOOL ......................................................................................................................... 74
8.4 ANLISE MULTIVARIADA .............................................................................. 84
9. DISCUSSO ..................................................................................................... 86
9.1 PREVALNCIA DE USO DE LCOOL E DE USO DE RISCO EM IDOSOS ... 86
9.2 FATORES ASSOCIADOS AO USO E AO USO DE RISCO DE LCOOL ........ 88
9.3 LIMITAES ...................................................................................................... 98
10. CONSIDERAES FINAIS ................................................................... 100
11. REFERNCIAS .............................................................................................. 102
12. ANEXOS............................................................................................................. 125
1
1. INTRODUO
A fim de esclarecer os principais aspectos relacionados ao uso de lcool por idosos, os
tpicos que seguem buscam compreender esse desfecho no contexto do avano dessa
populao em todo mundo e tambm no Brasil. Discutem como esse consumo tem
caractersticas e consequncias peculiares, que devem ser analisadas como tal, tendo em vista
a dificuldade do diagnstico e a escassez de instrumentos adequados para esse fim. Trazem,
ainda, a reviso dos principais trabalhos da literatura acerca do uso de lcool pela populao
idosa, a epidemiologia do consumo e os principais fatores/aspectos associados a esse
desfecho.
1.1 O CONTEXTO: SITUANDO O ENVELHECIMENTO POPULACIONAL E SUAS CARACTERSTICAS
O aumento da populao idosa uma realidade vivenciada mundialmente e, no Brasil,
a mudana nos padres etrios da populao vem ocorrendo de forma intensa e acelerada.
Este fenmeno ocorreu inicialmente em pases desenvolvidos, mas, nas ltimas dcadas, nos
pases em desenvolvimento, tais como os da Amrica Latina e Caribe, incluindo o Brasil, que
o envelhecimento da populao tem ocorrido de forma mais acentuada (LIMA-COSTA &
VERAS, 2003). Assim, vivemos um momento de alterao na estrutura etria da populao
cuja origem, em nosso pas, deu-se no rpido e sustentado declnio da fecundidade
(principalmente aps a dcada de 1960) e reduo na mortalidade (CAMARANO, 2002;
CARVALHO & GARCIA, 2003; VERAS, 2009; LEBRO, 2007, 2009).
De forma geral, o envelhecimento populacional decorre de mudanas na estrutura
etria da populao, a partir da diminuio das taxas de fecundidade, o que leva ao aumento
do peso relativo de idosos em relao ao de jovens na populao de um pas (VERAS et al.,
1987; CAMARANO, 2002; CARVALHO & GARCIA, 2003; LEBRO, 2007).
Nesse sentido, a populao brasileira vem sofrendo, nas ltimas cinco dcadas,
transies decorrentes de mudanas dos nveis de mortalidade e fecundidade, de uma forma
bastante rpida e em ritmo muito mais intenso do que o observado em pases desenvolvidos.
Esse processo fez com que a populao passasse de um regime demogrfico de altas taxas de
natalidade e mortalidade, para outro, primeiramente com baixa mortalidade e em seguida,
com baixa fecundidade (CARVALHO & GARCIA, 2003; LEBRO, 2007).
2
Segundo Camarano (2002) esses dois processos que concorrem para o envelhecimento
de uma determinada populao queda na fecundidade e na mortalidade so resultado de
polticas e incentivos promovidos pela sociedade e pelo Estado e do progresso tecnolgico
vivido pelo Brasil nas ltimas dcadas.
Nos pases Europeus, o processo de transio demogrfica ocorreu de forma lenta e
sustentada devido, principalmente, diminuio das taxas de fecundidade no perodo da
Revoluo Industrial antecedendo, inclusive, o surgimento dos medicamentos
anticoncepcionais. Ainda no incio do sculo XX, o Brasil j vivenciava quedas na
mortalidade em geral, mas somente na dcada de 1950, que esse fenmeno se estabelece
com o declnio brutal na fecundidade bastante relacionado ao processo de urbanizao e
outras transformaes sociais (LEBRO, 2007).
Os sujeitos que esto chegando aos 60 anos depois dos anos 2000 em pases da
Amrica Latina e tambm o Brasil foram aqueles beneficiados pelo grande desenvolvimento
tecnolgico ocorrido aps a Segunda Guerra Mundial (PALLONI & PELAZ, 2000). Assim,
nessa regio, o envelhecimento populacional est bastante relacionado s grandes descobertas
no campo da sade, especialmente no que tange diminuio da mortalidade infantil aps a
dcada de 1930 e, no necessariamente, melhoria dos padres gerais de vida. Logo, os
idosos da atualidade foram expostos a situaes de desnutrio e outras morbidades em uma
etapa bastante precoce da vida, o que no foi observado no histrico de envelhecimento dos
pases desenvolvidos realidade que poder ter impacto relevante nas condies de sade,
funcionalidade e de vida desses idosos (PALLONI et al., 2002; LEBRO, 2007).
Alm disso, ao contrrio dos pases desenvolvidos, esse processo foi e vem sendo
acompanhado de pouco desenvolvimento social e reduzido aumento na renda da populao
geral e tambm dos idosos. Por ocorrer de maneira acelerada, exige polticas pblicas que
deem conta do impacto que esse processo acarreta, o que se mostra um grande desafio para a
sociedade brasileira (VERAS, 2009). Ressalta-se, ainda, que o processo de envelhecimento
nos pases desenvolvidos ocorreu muito tempo depois dos mesmos terem adquirido bons
padres de desenvolvimento econmico e social, enquanto os pases da Amrica Latina ainda
permanecem com suas economias frgeis, nveis crescentes de pobreza e grandes
desigualdades sociais (PALLONI et al., 2002).
A velhice brasileira tem caractersticas singulares: marcada pela heterogeneidade,
visto que a populao de longevos (idosos acima dos 80 anos) est aumentando, alterando a
composio etria dentro do prprio grupo, isto , a populao considerada idosa tambm est
envelhecendo (CAMARANO, 2002; LEBRO, 2007). Outra importante caracterstica a sua
3
feminilizao devido maior expectativa de vida das mulheres, s grandes taxas de viuvez
das mesmas bem como, em decorrncia de diferenas biolgicas, de exposio a riscos de
trabalho e nos padres de consumo de lcool e tabaco, assistncia mdico-obsttrica, etc.,
todos fatores que colocam as mulheres em condio mais favorvel em relao aos homens
(VERAS et al., 1987; LEBRO, 2009). Um aspecto peculiar, porm, dessa feminilizao a
solido: devido ao seu maior perodo de vida, h aumento da viuvez, da qual decorrem
problemas como a reduo de renda e isolamento social. Alm disso, apesar de viverem mais,
as mulheres tendem a viver por mais tempo com incapacidades e piores condies de vida que
os homens (VERAS et al., 1987; CAMARANO, 2002; DUARTE, 2003; LEBRO et al.,
2007).
Em artigo que buscou identificar o perfil sociodemogrfico e de sade mental da
velhice brasileira ao final da dcada de 1990, a partir de pesquisas por amostra domiciliar,
Garrido & Menezes (2002) apontaram que a populao de idosos no Brasil era composta por
uma maioria de mulheres, vivas, com baixa escolaridade e com menor renda em relao aos
homens; de modo geral, os idosos entrevistados eram portadores de pelo menos uma doena
crnica e utilizavam medicamentos regularmente; alm disso, um em cada trs idosos
apresentava sintomas psiquitricos.
Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domiclios PNAD realizada
em 2009, o Brasil contava com uma populao de cerca de 21 milhes de pessoas com 60
anos ou mais. As mulheres ainda eram a maioria (55,8%), bem como os brancos (55,4%), e
64,1% da amostra ocupavam a posio de pessoa de referncia no domiclio. A escolaridade
dos idosos brasileiros ainda considerada baixa, j que 30,7% tinham menos de um ano de
escolaridade. Pouco menos de 12% viviam com renda domiciliar per capita de at salrio
mnimo e cerca de 66% j se encontravam aposentados (IBGE, 2010). No que se refere s
condies de sade, um levantamento suplementar da PNAD 2008 apontou que 77,4% das
pessoas de 60 anos e mais declararam possuir doenas crnicas, apontando para um grande
nmero de idosos que vivenciam a ocorrncia e o impacto dessas morbidades nessa fase da
vida (IBGE, 2010a). Vale ressaltar que esse ltimo dado foi obtido a partir da morbidade
autorreferida sugerindo que essa prevalncia pode ser maior do que a constatada na ocasio da
pesquisa.
Assim, nesse contexto que a cada ano 650 mil novos idosos so incorporados
populao brasileira e em menos de 40 anos, o Brasil passou de um cenrio de mortalidade
prprio de uma populao jovem para um quadro de enfermidades complexas e onerosas,
tpica dos pases longevos (VERAS, 2009). Dados do ltimo censo brasileiro (2011) revelam
4
que a populao com mais de 65 anos, que era de 4,8% em 1991, passando a 5,9% em 2000,
chegou a 7,4% em 2010 (BRASIL, 2011; IBGE, 2011). No cenrio mundial, estima-se que,
em 2050, a populao de idosos ser de aproximadamente, dois bilhes de indivduos
(ZANUTO et al., 2011).
Estamos, portanto, diante de um contingente da populao brasileira que cresce e
exige mudanas nos paradigmas sociais e de sade, bem como nas formas de assistncia e
cuidado. A relevncia de estudos e pesquisas que descrevam o perfil dessa camada da
populao e apontem solues, questionamentos e reflexes acerca desse processo
inquestionvel. Seguindo essa tendncia, diversos estudos populacionais tm sido conduzidos
com foco nos problemas de sade e condies de vida dos idosos, porm, h temas ainda
insuficientemente explorados, como o caso do uso de lcool por esta populao.
1.2 USO DE LCOOL PADRES DE USO E CRITRIOS DIAGNSTICOS
O consumo de bebidas alcolicas um dos hbitos sociais mais antigos e
disseminados entre as populaes, tendo se tornado um comportamento adaptado maioria
das culturas. O uso de lcool e outras substncias capazes de modificar o estado mental ocorre
h milhares de anos e est associado a celebraes, situaes de negcios, reunies sociais,
cerimnias religiosas e eventos culturais (LARANJEIRA et al., 2007).
Embora esse uso seja milenar, foi somente a partir do incio do sculo XX que se
passou a investigar os problemas que o consumo de lcool pode ocasionar (CARDIN et al.,
1986). Nessa poca, nos Estados Unidos, E.M Jellinek foi um dos pioneiros no estudo e na
divulgao do alcoolismo, exercendo grande influncia na compreenso e no tratamento dos
transtornos advindos do uso de lcool (BRASIL, 2007). Na dcada de 1960, o programa de
Sade Mental da OMS passou a dedicar-se intensamente melhoria do diagnstico e
classificao dos transtornos mentais, dentre eles a dependncia de lcool e outras substncias
psicoativas. Desde ento, os principais sistemas classificatrios de doenas vigentes - a
Classificao Internacional de Doenas, hoje em sua verso nmero 10 (CID-10) (OMS,
1993) e o Manual Diagnstico e Estatstico de Transtornos Mentais, atualmente na quarta
verso (DSM-IV) (APA, 1995) propem categorizaes e critrios diagnsticos acerca do uso
de lcool e outras drogas (BRASIL, 2007).
5
Quadro 1 - Padres de uso de lcool, abrangncia pelos sistemas diagnsticos e sua
descrio.
Padro Critrio para
CID-10
Critrio para
DSM-IV
Descrio e diferenas entre os sistemas
classificatrios
Uso nocivo
(harmful use)
X X
Padro de consumo de qualquer substncia
psicoativa que causa dano para a sade (fsico
ou mental). Pode, mas nem sempre, ter
consequncias sociais associadas. A CID-10
enfoca mais os danos fsicos e mentais,
enquanto o DSM-IV destaca a permanncia do
uso apesar dos problemas sociais,
ocupacionais, psicolgicos ou fsicos,
persistentes ou recorrentes, causados ou
exacerbados pelo uso recorrente;
Uso de risco
(hazardous
use)
No
critrio
diagnstico
No
critrio
diagnstico
Padro que aumenta o risco de consequncias
prejudiciais para o usurio, seja na sade fsica
ou mental, ou consequncias sociais. No
critrio diagnstico, mas um conceito
proposto pela OMS
Uso
problemtico
No
critrio
diagnstico
No
critrio
diagnstico
Consumo de lcool que causa prejuzos fsicos,
mentais ou sociais e que pode se estender em
um processo contnuo, desde um padro de
beber excessivo at a dependncia bebida.
Binge No
critrio
diagnstico
No
critrio
diagnstico
Padro de ingesto intensa durante um perodo
prolongado, escolhido de maneira propositada
(definido tambm como porre e pileque).
Os bebedores deste padro em geral intercalam
esses perodos com perodos de abstinncia.
Dependncia X X De forma geral, refere-se necessidade de
repetidas doses de uma droga para sentir-se
bem ou para evitar sensaes ruins.
6
Atualmente, vrios conceitos so adotados a fim de definir os diferentes padres de
consumo de lcool (quadro 1). Um deles o de uso nocivo (harmful use), que se trata de um
padro de consumo de qualquer substncia psicoativa que causa dano para a sade, esse
podendo ser tanto fsico quanto mental. Comumente, mas no invariavelmente, o uso nocivo
tem consequncias sociais adversas; no entanto, apenas consequncias sociais no so
suficientes para justificar o diagnstico de uso nocivo (BRASIL, 2010, p.127). Todavia, h
diferenas em sua conceituao por cada um dos manuais classificatrios: enquanto a
definio da CID-10 utiliza-se do termo uso nocivo referindo-se geralmente apenas aos
efeitos fsicos e no s consequncias sociais, a definio da DMS-IV para a mesma
problemtica usa o termo abuso referindo-se a um padro desajustado de uso devido no
interrupo do mesmo apesar do reconhecimento de problemas sociais, ocupacionais,
psicolgicos ou fsicos, persistentes ou recorrentes, causados ou exacerbados pelo uso
recorrente em situaes nas quais ele fisicamente arriscado (BRASIL, 2010, pp. 11-12).
O uso de risco por sua vez, (hazardous use) trata-se de um padro de uso de substncia
psicoativa que aumenta o risco de consequncias prejudiciais para o usurio. Ao contrrio do
uso nocivo, o uso arriscado refere-se a padres de uso significativos para a sade pblica,
apesar da ausncia de qualquer transtorno concomitante no usurio (BRASIL, 2010, p.125).
No que se refere dependncia, ambos os sistemas classificatrios abrangem seu
diagnstico, que para a CID-10 compe a Sndrome de Dependncia do lcool (SDA). Os
principais sintomas estabelecidos pela CID-10 so: estreitamento do repertrio de beber;
salincia do comportamento de busca pelo lcool; sensao subjetiva da necessidade de beber;
desenvolvimento da tolerncia ao lcool; sintomas repetidos de abstinncia; alvio ou evitao
dos sintomas de abstinncia ao aumentar o consumo e reinstalao da sndrome de
dependncia (BRASIL, 2010, p. 49).
J o binge (consumo compulsivo peridico de bebida ou beber se embriagando)
um padro de ingesto intensa durante um perodo prolongado, escolhido de maneira
propositada. Em inquritos populacionais, o perodo usualmente definido como mais que
um dia em cada ocasio. As expresses porre e pileque so tambm utilizadas para
descrever esta atividade. Os bebedores deste padro, em geral, intercalam esses perodos com
perodos de abstinncia. (BRASIL, 2010; p.45)
Por fim, o conceito de uso problemtico de lcool refere-se ao consumo de lcool que
causa prejuzos fsicos, mentais ou sociais e que pode se estender em um processo contnuo,
desde um padro de beber excessivo at a dependncia bebida. Assim, segundo Babor &
Higgins-Bidle, citados por MINTO et al. (2007), o conceito de uso problemtico de lcool no
7
se aplica apenas ao dependente ou ao paciente que chega ao servio de sade com hlito
alcolico, intoxicado ou em sndrome de abstinncia - existem outros padres de uso de lcool
que causam riscos substanciais ou nocivos para o indivduo, como beber excessivamente
todos os dias ou repetidos episdios de intoxicao pelo lcool.
Vale ressaltar que tais critrios diagnsticos so importantes pois colaboram na
identificao e a caracterizao dos padres de consumo, permitindo a abordagem mais
adequada no que se refere ao tratamento e estratgias de cuidado direcionadas aos indivduos
que vivenciam transtornos ocasionados pelo consumo inadequado de lcool.
Em relao aos idosos, porm, tais critrios, da forma como esto estabelecidos,
podem ter sua eficcia reduzida na identificao do consumo de lcool j que muitos se
baseiam em alteraes psicossociais que muitas vezes no se encontram no repertrio de
vivncias dos idosos, como por exemplo, fracasso em cumprir obrigaes importantes
relativas a seu papel no trabalho, na escola ou em casa. Esse aspecto, dentre outros que sero
discutidos frente, torna-se um dificultador no que se refere ao diagnstico apropriado do uso
de lcool por idosos. De forma semelhante, os instrumentos diagnsticos, bastante utilizados
na prtica clnica com sujeitos mais jovens, nem sempre se aplicam aos idosos. A seguir,
sero discutidos os principais instrumentos de deteco/rastreamento do uso de lcool, suas
caractersticas e sua adequao no uso com idosos.
1.3 INSTRUMENTOS DE DETECO DO USO DE LCOOL NA POPULAO GERAL E EM IDOSOS
Por suas singularidades, a identificao do uso de lcool por idosos torna-se fator
indispensvel no cuidado com essa populao, j que rastrear/avaliar esse consumo pode
colaborar para a adoo de medidas adequadas para diminuio ou preveno dos efeitos
negativos advindos do uso de lcool. Nesta faixa etria, as mltiplas caractersticas do
envelhecimento (alteraes fisiolgicas que desfavorecem a metabolizao do lcool,
interao com medicaes comumente usadas nessa fase da vida, comorbidades, tolerncia ao
uso, impactos sociais, etc.) (SAMSHA, 1998), tm potencial interao com o lcool, o que
implica que idosos tendam a ter mais problemas do que pessoas mais jovens, mesmo diante
do consumo de pequenas quantidades de lcool (SAMSHA, 1998).
Desse modo, o rastreio do uso de lcool pode trazer benefcios tanto no nvel
individual, por fornecer subsdios aos profissionais de sade no planejamento de aes
especficas com determinado sujeito, bem como no nvel populacional, j que essas
8
informaes, por elaborarem um panorama geral acerca das condies de vida e sade de
idosos no que se refere a essa temtica, podem direcionar aes em sade pblica para o seu
controle, preveno e cuidado. Atualmente, dentre os instrumentos disponveis para essa
finalidade, poucos so direcionados especificamente para uso com idosos (OLIVEIRA et al.,
2011). Isso representa um entrave na identificao do uso de lcool, j que seu padro de
consumo, bem como suas repercusses mostram-se diferentes em relao aos mais jovens.
O quadro 2 traz os principais instrumentos de rastreio e identificao de uso de lcool,
elencando as vantagens e as desvantagens para o uso de cada um deles com populao idosa.
9
Quadro 2 - Instrumentos de identificao/rastreio de uso de lcool: vantagens e desvantagens
para uso com idosos:1
Vantagens Desvantagens
CAGE Instrumento de triagem de uso de
lcool mais utilizado na prtica clnica
Rpido e com escore facilmente
calculado
Validado para identificar abuso
de lcool e dependncia em adultos
No consegue diferenciar beber atual de
pregresso;
Falho na identificao de bebedores que
bebem se embriagando e uso nocivo
Validade inconsistente para uso em idosos
AUDIT 2
Fornece informaes sobre
frequncia e quantidade atual de
consumo;
Pode identificar consumo de
risco;
nico instrumento validado
transculturalmente
Relativamente longo (10 questes)
Demonstrou desempenho ruim na deteco
de uso de lcool em idosos;
A ausncia de respostas binrias (tipo
sim/no) dificulta a formulao do escore;
SMAST-
G 3
Derivado de instrumento j
validado (MAST-G);
Elaborado com questes
especficas para idosos;
Respostas binrias (sim/no)
facilitando o escore;
Excelente sensibilidade e
especificidade em estudos com idosos;
Relativamente longo (10 questes)
Pouco eficaz na associao de consumo
passado e pregresso;
Faltam questes acerca de quantidade e
frequncia de consumo perigosos;
ARPS
Permite associar a relao entre
uso de lcool e declnio de sade;
Identificao de potenciais
intervenes, tais como manejo de
medicamentos
Muito extenso para uso na rotina de
cuidados de servios de sade, especialmente os de
ateno primria;
Escore bastante complicado de ser
calculado;
1 Adaptado de Culberson (2006); 2Alcohol Use Disorders Identification Test; 3 Short Michigan Alcoholism
Screening Test Geriatric Version ; 4 Alcohol-Related Problems Survey.
10
Dentre os instrumentos diagnsticos e de rastreio para uso de lcool em idosos h o
Michigan Alcoholism Screening Test Geriatric Version (MAST-G), desenvolvido em 1992
por Blow e colaboradores a partir de uma verso original para adultos. Contm 24 questes
dicotmicas e foi criado para deteco de abuso e provvel dependncia de lcool em idosos,
tendo sido validado recentemente no Brasil por Kano (2011). Sua criao adquiriu grande
importncia, j que possibilitou a primeira abordagem especfica do uso de lcool em idosos.
Alm de identificar o uso e provvel dependncia ao lcool, apresenta uma ampla
configurao e percepo dos prejuzos advindos desse consumo nos mais diferentes
contextos de vida dos idosos, como nas relaes sociais, condies de sade, de sono, solido
e perdas (KANO, 2011).
A verso resumida do MAST-G, o Short Michigan Screening Test - Geriatric Version
(SMAST-G), instrumento utilizado neste trabalho, ser discutida na metodologia.
Considerado uma alternativa de aplicao do MAST em mulheres, o TWEAK (do
acrnimo T tolerance; W worried; E eye-opener; A amnesia; K k/cut down) foi
desenvolvido por Russell & Bigler (1979) buscando um instrumento adequado para
identificao de abuso de lcool em gestantes. Em sua formulao, a partir da MAST, foram
eliminadas as questes mais associadas ao comportamento masculino do que ao feminino em
relao ao uso de lcool (RUSSELL, 1994). Contm cinco questes que pontuam sete pontos;
sendo que a partir de dois pontos afirmativas considera-se consumo de risco de lcool
(RUSSELL, 1994; OLIVEIRA et al., 2011). No Brasil, esse instrumento foi utilizado para
identificao do uso de lcool em mulheres idosas em um estudo acerca da violncia
domstica contra idosos realizado por Apratto Jr. (2010) . Em publicao recente de Oliveira
et al (2011), comparando a eficcia do AUDIT (padro-ouro) com o CAGE, TWEAK e T-
ACE (instrumento de rastreio de uso de lcool em gestantes) na identificao do uso de
lcool em uma amostra de idosos homens, o TWEAK foi identificado como instrumento de
melhor desempenho, embora essa diferena no tenha sido estatisticamente significativa.
Alguns instrumentos foram desenvolvidos para uso na populao geral, mas foram
amplamente utilizados em populaes geritricas. Os mais utilizados neste grupo, foram o
CAGE e o AUDIT. O Alcohol-Related Problems Survey (ARPS), por sua vez, foi
desenvolvido por Fink et al. (2002) especificamente para a avaliao de uso de lcool em
idosos, buscando associar a avaliao do consumo de lcool s condies consideradas de
risco advindos desse uso na velhice (declnio de sade, comorbidades psiquitricas, doenas
crnicas, uso de medicaes, incapacidade funcional, etc). Assim, seria o nico instrumento a
identificar no somente uso/no uso de lcool, mas tambm os idosos cujo uso de lcool,
11
combinado a outras condies de risco na velhice, estariam sujeitos a um risco ainda maior
advindo dessa ingesto (FINK et al., 2002). Estudo realizado pelos mesmos criadores do
instrumento verificou que o ARPS identificou grande parte dos bebedores rastreados
positivamente pelo CAGE, SMAST e AUDIT, alm de ter detectado bebedores de risco no
identificados por esses instrumentos (FINK et al., 2002a). No h, porm, relatos da
utilizao desse instrumento no contexto brasileiro.
O AUDIT (Alcohol Use Disorders Identification Test) foi desenvolvido por um grupo
de pesquisadores colaboradores da Organizao Mundial da Sade na dcada de 1980
(SAUNDERS et al., 1993), com a finalidade de deteco de beber problemtico em
populaes jovens nos servios de ateno primria em sade, podendo ser administrado em
uma breve entrevista com o paciente (RUSSELL, 1994; OLIVEIRA et al., 2011). Contm 10
questes relativas quantidade e frequncia de consumo, dependncia de lcool, etc.
Pontuaes acima de oito indicam casos de beber problemtico. Leva em conta as quantidades
de lcool para estabelecer o parmetro de risco advindo do consumo; todavia, em idosos, nem
sempre somente a quantidade o que define o risco, mas tambm a associao do uso com
medicaes, condies clnicas e a prpria condio de envelhecimento (FINK et al., 2002).
Em estudo de Morton et al. (1996) com idosos do sexo masculino, comparando a eficcia dos
principais instrumentos de rastreio de uso de lcool em idosos identificou que o CAGE e o
MAST-G apresentaram propriedades psicomtricas superiores s do AUDIT na deteco do
abuso e dependncia de lcool na amostra estudada. No h relatos de sua confiabilidade e
validao com sujeitos idosos (OLIVEIRA et al., 2011).
O questionrio CAGE, por sua vez, (da sigla em ingls: Cut-down, Annoyed,
Guilty e Eye-opener), desenvolvido por Mayfield et al. (1974), composto de quatro
itens, sendo que pontuar duas ou mais questes indica provvel abuso ou dependncia de
lcool. Avalia o impacto do uso dessa substncia na vida (sentir-se irritado quando criticam
seu consumo de lcool, por exemplo) (CULBERSON, 2006) embora no faa relao com
status de sade ou funcional, medicaes utilizadas e principalmente, quantidade e frequncia,
sendo, portanto, ruim na deteco de bebedores pesados ou binge (NGUYEN et al., 2001;
CULBERSON, 2006), e de certa forma de idosos, j que tais aspectos so importantes na
avaliao do consumo de lcool por essa populao. Seu desempenho foi considerado
comparvel ao do MAST-G, tendo como vantagem em relao a esse instrumento o fato de
ser curto (apenas quatro questes), enquanto aquele composto de 24 perguntas (MORTON
et al., 1996). Em estudo de Adams et al. (1996), porm, o CAGE mostrou-se insuficiente para
detectar o consumo excessivo de lcool em idosos. Para esses autores, incluir perguntas sobre
12
a quantidade e a frequncia do consumo, alm de administrar o CAGE, poderia aumentar o
nmero de bebedores-problema detectados nessa faixa da populao.
A fim de comparar o desempenho do CAGE e do SMAST-G na identificao do
consumo de lcool em idosos, Moore et al. (2002a) identificaram uma concordncia entre
ambos instrumentos de 85%. Dentre a amostra de idosos rastreados, 26% de todos que
responderam aos dois instrumentos, foram rastreados positivamente para um ou outro; 20%
pontuaram somente para o CAGE; 16% somente para o SMAST-G e 11% para ambos. Foi
observado que aqueles que pontuaram apenas para o CAGE bebem mais que os que
pontuaram apenas para o SMAST-G, e que os que pontuaram em ambos, bebem mais que
aqueles que pontuaram apenas no CAGE. Tais resultados permitiram aos autores concluir que
aqueles que foram rastreados somente pelo SMAST-G bebem em menor
quantidade/frequncia do que os que pontuaram em um ou outro instrumento ou em ambos,
sugerindo assim, que o SMAST-G detecta idosos que bebem menos do que os que j
apresentam problemas com lcool. E como os idosos esto expostos a um maior risco mesmo
bebendo em pequenas quantidades, podem estar em risco para o uso de lcool, concluindo que
o SMAST-G pode ser um bom instrumento para uso com idosos. O mesmo instrumento
tambm mostrou ser melhor na identificao de uso de lcool em mulheres idosas.
1.4 CARACTERSTICAS DO USO DE LCOOL POR IDOSOS
Entre idosos, o uso de lcool parece ser uma ocorrncia comum e geralmente
associada a uma gama extensa de problemas de sade (OCONNEL et al., 2003). Sabe-se
que, embora o uso de lcool tenda a diminuir com a maturidade e sua maior prevalncia esteja
situada entre os jovens/adultos, o nmero de idosos usurios de substncias psicoativas poder
aumentar simultaneamente com o crescimento dessa populao, exigindo dos servios e
programas de sade novas abordagens e olhares voltados problemtica, com adoo de
tcnicas de identificao e tratamento apropriadas a essa populao (OCONNEL et al., 2003;
McGRATH et al., 2005; LIEB et a.l, 2008; PILLON et al., 2010; WALLACE, 2010).
No final da dcada de 90, a publicao do Treatment Improvement Protocol (TIP 26),
documento norte-americano que discutiu as relaes entre o envelhecimento e o abuso de
substncias a fim de fornecer recomendaes para a prtica dos profissionais, j afirmava o
quo tardia a preocupao, seja da comunidade cientfica seja pela literatura gerontolgica,
do uso e abuso de drogas (lcitas ou ilcitas) por idosos (SAMSHA, 1998), constatando-se
13
tambm, que o rpido crescimento desse segmento da populao no tem sido acompanhado
de pesquisas que avaliem o real consumo de lcool por esses indivduos (SOROCCO &
FERREL, 2006). Ross (2005) afirma que, apesar do nmero de estudos que tem se dedicado
compreenso dessa problemtica ser crescente, essa camada da populao tem sido
historicamente ignorada no que diz respeito a esse assunto. Para o autor, os idosos
representam um grupo vulnervel no qual qualquer quantidade de uso de lcool,
especialmente o uso excessivo, pode representar problemas do ponto de vista biopsicossocial.
Um aspecto que parece ter papel fundamental na discusso dessa temtica a pouca
identificao dos idosos que bebem e os fatores que esto associados a esse padro de
comportamento na velhice. As razes para a pouca identificao e, por consequncia, a
escassez de diagnsticos clnicos e tratamentos adequados so variadas. Primeiramente,
acredita-se que difcil constatar o uso de lcool nessa fase da vida pelo fato desse consumo,
muitas vezes, no representar/demonstrar riscos, j que muitos dos idosos j esto afastados
do mundo do trabalho e de vrias atividades sociais nas quais as consequncias do abuso de
lcool poderiam transparecer (SCHMALL et al., 2009).
Alm disso, os profissionais que lidam diretamente com os idosos ainda discutem
pouco a temtica do lcool junto a essa populao. Duru et al. (2010) identificaram que
quanto mais velhos os idosos que procuram/frequentam atendimentos mdicos, menor a
probabilidade de discutirem sobre uso/abuso de lcool. Em outro estudo, Nguyen et al. (2001)
identificaram que 78% dos idosos de um servio de ateno primria nunca tinham discutido
uso de bebida com um mdico. Outras possveis causas das dificuldades de identificao do
consumo de lcool por idosos podem ser atribudas: a) ao fato de que muitas vezes os
sintomas do abuso podem imitar sintomas de doenas clnicas comuns nessa fase da vida,
como hipertenso arterial, transtornos cognitivos, depresso, atribuindo-se, inclusive, os
sintomas do uso de lcool ao envelhecimento; b) descrena de que o tratamento de lcool
seja eficiente entre os idosos; c) ao fato de que a prpria sub-identificao e a prevalncia
subestimada levariam os clnicos e profissionais de sade a acreditar que este um problema
infrequente acima dos 60 anos; d) muitos dos idosos e suas famlias tm preconceito em
relao aos transtornos mentais, tendendo a neg-los ou a no encarar o abuso de lcool como
um problema de sade mental; e) os critrios dos manuais diagnsticos em sade mental para
abuso e dependncia, muitas vezes, no so adequados para aplicao em idosos, j que
contemplam em suas questes aspectos como obrigaes de trabalho ou realizao de tarefas
que diminuem naturalmente ou so pouco comuns nessa fase da vida; f) os idosos seriam mais
propensos a esconder o seu uso/abuso de substncias, principalmente em decorrncia de que
14
muitos vivem sozinhos e tendem a terem menos problemas em pblico por conta de seu
abuso; g) escassez de instrumentos adequados/especficos para uso triagem e identificao
do uso de lcool em idosos; h) encarar o uso de lcool como algo aceitvel e normal nessa
fase da vida, na qual os prazeres esto reduzidos; i) por fim, os servios de sade parecem
estar pouco preparados para lidar com essa questo no cotidiano de sua prtica: o tempo e o
nmero das consultas mdicas bastante reduzido, restando pouco tempo hbil para uma
investigao completa das demandas e necessidades dos idosos, negligenciando muitas vezes
assuntos como o uso e abuso de substncias alm da escassez de profissionais especializados
para atender essa demanda. (RAO & CROME, s/d; SAMSHA, 1998; THOBABEN, 2006;
SUWALA & GERSTENKORN, 2007; ZANUTO et al., 2011)
De forma geral, as principais substncias de uso abusivo pelos idosos so o lcool, a
nicotina e as drogas prescritas (medicaes de uso controlado), revelando uma tendncia
diferente da populao adolescente e de adultos jovens, cujo maior uso compreende, alem do
lcool, as drogas ilcitas (maconha, cocana, crack, etc.) (ZANUTO et al., 2011). H mais de
duas dcadas j se afirmava que o abuso de lcool e de medicaes prescritas entre indivduos
acima dos 60 anos um dos problemas de sade que mais cresce nos Estados Unidos
(SAMSHA, 1998), sobretudo porque, de acordo com a Sociedade Americana de Geriatria
(2006) 15% dos sujeitos com mais de 65 anos vivem riscos advindos do consumo excessivo
de lcool (THOBABEN, 2006).
Estudo de Lin et al. (2011), com idosos norte-americanos acima dos 65 anos, afirma
que a prevalncia do uso de drogas lcitas por idosos (medicamentos sem prescrio, lcool e
tabaco) foi de 21,1% durante a vida e 5,4% nos ltimos 12 meses, sendo o uso de lcool de
16,1% durante a vida e de 1,5%, no ano anterior pesquisa; em relao ao tabaco, foram de
8,7% e 4,0%, e medicamentos sem prescrio, foram 0,6% e 0,2%, respectivamente.
Segundo Pillon et al. (2010) 83,8% dos idosos frequentadores de um Centro de
Ateno Psicossocial lcool e Drogas (CAPS AD) no interior do estado de So Paulo
buscaram o mesmo por problemas relacionados ao abuso/dependncia de lcool, sendo essa
clientela predominantemente do sexo masculino, aposentados e com baixo nvel de
escolaridade.
A idade na qual os idosos comeam a fazer uso de lcool parece ter papel importante
na forma como este uso evolui, sendo identificados dois diferentes grupos em idosos que
apresentam problemas com lcool (ZANUTO et al., 2011). Relatos apontam que 30 a 50%
dos idosos dependentes de lcool inicia o uso de lcool tardiamente, isto , j na velhice; por
outro lado 50 a 70% dos idosos que bebe iniciaram o uso de lcool ainda na idade adulta,
http://apps.isiknowledge.com/OneClickSearch.do?product=UA&search_mode=OneClickSearch&db_id=&SID=1AN76nFGm88cPkeG9Ni&field=AU&value=Suwala%20M&ut=000258576400010&pos=1http://apps.isiknowledge.com/OneClickSearch.do?product=UA&search_mode=OneClickSearch&db_id=&SID=1AN76nFGm88cPkeG9Ni&field=AU&value=Gerstenkorn%20A&ut=000258576400010&pos=2
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envelhecendo, muitas vezes, com sequelas biopsicossociais decorrentes de um incio precoce
de uso de lcool (DUNNE, 1994; DAR, 2006, THOBABEN, 2006).
De modo geral, aqueles que comearam a beber na juventude/vida adulta e estenderam
o uso de lcool para a velhice, geralmente convivem com consequncias fsicas, sociais e
psicolgicas de longa durao, apresentam maior tendncia a apresentar comportamento
antissocial, histria familiar de alcoolismo, alm de caractersticas clssicas de desnutrio,
doenas psiquitricas, cirrose e sndromes cerebrais orgnicas (THOBABEN, 2006;
GROVER et al., 2008; ZANUTO et al., 2011).
Os idosos que comeam a beber tardiamente (geralmente aps a quinta dcada de
vida) tendem a apresentar maior nvel educacional e ter suporte familiar e, ao contrrio
daqueles que iniciaram o uso precocemente, tendem a apresentar menor nmero de problemas
fsicos e mentais; geralmente so mais receptivos ao tratamento e mais propensos a se
reabilitarem espontaneamente, tendo, portanto, um melhor prognstico (BRENNAN &
MOOS, 1996). Eventos estressantes do/no final da vida como a aposentadoria ou a perda de
um ente querido podem ser fatores desencadeantes da dependncia de lcool tardia em alguns
indivduos idosos, que passam a beber para aliviar a solido ou a falta de sentido/significado
na vida (LIBERTO & OSLIN, 1995; MIRAND & WELTE, 1996; THOBABEN, 2006).
Todavia, em relao a esse ltimo aspecto, questiona-se se eventos estressantes na velhice
seriam a causa de incio do uso abusivo de lcool ou se j haveria um abuso no percebido
que piora com a precipitao de situaes de trauma, perdas e afastamento social nessa etapa
da vida (ZANUTO et al., 2011)
Estudo comparando jovens e idosos dependentes de lcool (SHAHPESANDY et al.,
2006) observou que os jovens tendem a ter uma frequncia significativamente superior de
influncia positiva da histria familiar, bebem quantidades significativamente maiores de
lcool, tm mais problemas com a lei e maior prevalncia de transtornos de personalidade em
comparao com os idosos. Por outro lado, idosos bebedores tendem a ter mais complicaes
somticas devido ao abuso de lcool - embora bebam em menor quantidade - alm de
tenderem a abster-se mais.
Os limites do consumo seguro de lcool pela populao geral e entre os idosos
tambm tm sido discutidos. Enquanto o Substance Abuse and Mental Health Services
Administration (SAMSHA, 1998) define o limite de uma dose diria para homens e mulheres,
o National Institute on Alcohol Abuse and Alcoholism (NIAAA) dos Estados Unidos define o
consumo de lcool que ultrapassa mais de quatro doses dirias (ou mais de 14/dose/semana)
para homens e mais de trs doses/dirias (ou mais de sete/semana) para mulheres como sendo
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de risco para o desenvolvimento de problemas relacionados ao lcool. Esses limites so
menores para as mulheres devido ao fato das mesmas terem proporcionalmente menor
quantidade de gua corporal se comparadas aos homens, desse modo, conseguindo maiores
concentraes de lcool no sangue bebendo a mesma quantidade de lcool. Homens e
mulheres idosos tambm tm menor massa corporal magra e maior sensibilidade aos efeitos
do lcool. Alm disso, geralmente esto expostos a muitas situaes clnicas que oferecem um
maior risco se associados ao consumo de lcool (interao de mltiplas medicaes, por
exemplo) (NIAAA, 2005).
A Sociedade Americana de Geriatria, por sua vez, define como consumo de alto risco
o uso de trs ou mais doses em uma nica ocasio ou sete doses por semana para pessoas a
partir dos 65 anos, no fazendo referncia para a diferena entre os sexos (MOOS et al.,
2009).
Acerca do uso de lcool por mulheres idosas, sabe-se que as mesmas tm riscos e
vulnerabilidades especficas relacionadas ao consumo quando comparadas com os homens de
mesma idade, como a progresso mais rpida para dependncia, sensibilidade aumentada para
o lcool, maior consumo de drogas psicoativas e maior estigmatizao social. Nelas, mesmo
baixos nveis de consumo podem aumentar o risco de problemas de sade. Alm disso,
mulheres mais velhas so mais propensas a desenvolver problemas de lcool pela primeira
vez mais tarde na vida (BLOW, 2000).
Lopes et al. (2010) tambm ressaltam que nas mulheres h uma forte influncia
sociocultural em relao ao uso problemtico de lcool. Em seu estudo identificaram que as
mulheres alfabetizadas foram proporcionalmente mais expostas ao lcool, enquanto mulheres
sem escolarizao apresentaram maior frequncia de problemas com lcool; isto , as
mulheres com baixa escolaridade tendem a beber proporcionalmente menos, mas mais
pesadamente.
Por outro lado, Byles et al. (2006) em estudo longitudinal com mulheres de 70-75 anos
identificou que mulheres que no faziam consumo de bebida alcolica mostraram maior
propenso a morrer e ter pior qualidade de vida do que as que bebem moderadamente,
concluindo que o consumo moderado pode proporcionar benefcios.
Independentemente do sexo, porm, o uso de lcool entre idosos traz preocupaes
relacionadas ao fato do consumo nesta fase da vida, que marcada por inmeras alteraes e
transformaes biopsicossociais. Tanto devido s inmeras alteraes fisiolgicas decorrentes
do processo natural de envelhecimento, como pela alta prevalncia de doenas crnicas nessa
fase da vida, o impacto que o lcool exerce nos idosos difere sensivelmente do que ocorre
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com indivduos mais jovens. Uma das mudanas que mais colaboram para essa diferenciao
deve-se ao fato do aumento da quantidade de clulas gordurosas nos tecidos bem como a
diminuio da gua corporal. Por ser o lcool solvel em gua, e a quantidade desta estar
diminuda no organismo do idoso, as quantidades de lcool ingeridas tendem a se concentrar
mais nesses sujeitos comparativamente aos indivduos mais jovens, considerando-se as
mesmas dosagens (SMITH, 1995, SAMSHA, 1998). Alm disso, constata-se aumento na
sensibilidade e diminuio da tolerncia ao lcool, bem como diminuio do metabolismo do
lcool no trato gastrointestinal (SAMSHA, 1998).
Assim, aspectos como o alto nvel de concentrao de lcool no sangue de idosos,
mesmo diante de consumo no elevado, o aumento da sensibilidade do crebro ao lcool,
alm da alta prevalncia de doenas crnicas e consumo de medicaes associadas ao
envelhecimento, tornam os idosos mais suscetveis aos efeitos do lcool, mesmo diante do
consumo de pequenas quantidades (MOORE et al., 2001).
Outra preocupao relacionada ao uso de lcool por idosos a que se refere
interao dessa substncia com as mltiplas medicaes comumente utilizadas na velhice, j
que sabido que o aumento no nmero de doenas crnicas nessa etapa da vida leva
necessidade de administrao de vrios frmacos a fim de control-las. Os efeitos do lcool,
aliados s mudanas fisiolgicas advindas do envelhecimento, podem alterar os efeitos dos
medicamentos normalmente usados para controle de condies clnicas crnicas altamente
prevalentes nessa fase da vida (hipertenso arterial, diabetes, dentre outras) tendendo a
agravar a evoluo natural de tais doenas. A interao com os medicamentos pode, ainda,
elevar as chances de ocorrncias como quedas, acidentes automobilsticos e at mesmo a
morte (RIGLER, 2000; LIMA et al., 2009).
Estudo de Pringle et al. (2005) identificou prevalncia de 20,3% de uso de lcool em
idosos que faziam parte de um programa de distribuio de medicamentos nos Estados
Unidos. Constatou que dos idosos que bebiam, 44,9% usavam ao menos um medicamento,
28,6% dois, 14,1% trs, 6,9% quatro e 5,5% cinco ou mais. Aira et al. (2005) observaram que
86,9% dos idosos identificados como consumidores de lcool em seu estudo faziam uso
regular de medicaes, constatando consumo moderado de lcool associado hipertenso
arterial (43%), diabetes (46%) e depresso (39%), assim como ao uso de sedativos e
analgsicos. Em todos estes casos, o risco associado ao beber est mais relacionado ao
consumo de medicamentos que interagem com o lcool do que o consumo da bebida em si.
Em algumas culturas, porm, o uso de lcool considerado como recurso de
automedicao entre idosos. Em um estudo realizado na Finlndia com idosos acima dos 75
18
anos constatou que, embora 19,7% da amostra tenham negado uso de lcool pelo instrumento
AUDIT, afirmaram fazer uso de lcool como forma de automedicao, o que foi mais comum
entre mulheres e grupos mais velhos. Deste modo, o uso de lcool como automedicao foi
comum entre os idosos do contexto estudado, principalmente entre os mais velhos.
Comumente estes idosos usavam a substncia para tratar doenas cardiovasculares, alteraes
do sono e do humor e, embora bebessem em quantidades pequenas, estas ainda assim
poderiam oferecer riscos na medida em que tambm se associavam ao uso de medicaes
prescritas (AIRA et al., 2008).
Embora tenham papel fundamental na compreenso do uso de lcool por idosos, os
fatores de risco associados a essa ocorrncia, ainda no esto totalmente esclarecidos e
carecem de maiores informaes para serem elucidados.
Estado de sade, renda e histrico de beber na vida adulta parecem direcionar muito
mais a trajetria de beber entre idosos do que aspectos como aposentadoria, que outrora foi
considerada como importante evento traumtico em idosos e que predisporia o uso/abuso de
lcool. Ter renda mais baixa, por exemplo, poderia representar menos dinheiro para compra
alm de restringir a participao em atividades sociais que envolvam uso de lcool, fazendo
com que indivduos com nveis de renda mais elevados tenham condies mais favorveis
para beber (BRENNAN et al., 2010).
Muitas vezes, a presena de doenas crnicas e distrbios do sono podem colocar em
risco os idosos a automedicar-se com lcool para controlar a dor ou induzir o sono
(AMOAKO, RICHARDSON-CAMPBELL & KENNEDY-MALONE, 2003 apud BOYLE &
DAVIS, 2006).
H, ainda, evidncias de que as mulheres na velhice esto mais vulnerveis ao
alcoolismo de incio tardio que os homens (BLOW et al., 2000; BOYLE & DAVIS, 2006).
Alm disso, os idosos que vivenciam situaes de isolamento social e que tenham menor
tempo de lazer so mais propensos a beber em excesso para evitar o tdio e a solido. Viuvez
tambm estaria associada a esse mesmo desfecho (BOYLE e DAVIS, 2006).
Alguns aspectos tambm devem ser considerados na identificao de comportamentos
de risco para o consumo de lcool por idosos. Em estudo de Moore et al. (2001) bebedores de
risco entre idosos foram identificados como tal, por exemplo, pelo relato de dirigir aps
beber ou andar acompanhado por algum que bebeu e est dirigindo; nesse mesmo estudo uso
prejudicial e de risco de lcool tambm foram considerados dessa forma por estarem
associado ao uso de cigarro. Wilson et al. (2007), apontaram como fatores individuais
potencialmente associados ao uso de risco em idosos: presso arterial elevada, uso de tabaco,
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nmero total de medicaes utilizadas bem como quantidade e frequncia de uso de lcool .
Alm disso, quedas recorrentes, mudanas no apetite, sintomas gstricos parecem ser aspectos
importantes a serem investigados na prtica clnica, a fim de verificar sua associao com o
uso de lcool (BOYLE & DAVIS, 2006).
Outro aspecto importante em relao ao uso de lcool por idosos que, muitas vezes,
esse comportamento vem acompanhado de poucos cuidados com a prpria sade ou mesmo
comportamentos de negligncia em relao mesma. Merrick et al. (2008) identificaram que
o beber pesado parece estar associado com menor probabilidade de recebimento/acesso de
servios de preveno em sade em relao queles indivduos cujo consumo de lcool
encontra-se dentro dos limites esperados para a idade, levando a crer que o beber de risco
possa tambm estar associado a vrios outros comportamentos negativos como pouco cuidado
com a sade e autonegligncia, por exemplo.
Satre et al. (2003), por sua vez, identificaram que embora o consumo de lcool seja
menos comum em idosos mais velhos, os longevos que fazem abuso de lcool seriam menos
interessados/motivados para tratamento que os mais jovens. Os mesmos autores apontam que
ser solteiro nessa fase da vida tambm pode estar associado positivamente com maiores
problemas associados ao lcool, o que para eles talvez explique porque ser casado esteja
associado a maior procura por tratamento.
Outro aspecto discutido dentro dessa temtica das condies de morbimortalidade
associadas ao uso de lcool na velhice. Um estudo realizado com veteranos nos Estados
Unidos concluiu que pacientes idosos que relataram uso de lcool, mas que no se enquadram
em critrios que apontam para problemas com a substncia (bebem em quantidade/frequncia
que no representam problemas) apresentaram melhor status/condies de sade em
comparao queles que no bebem ou queles que bebem problematicamente
(PEYTREMANN-BRIDEVAUX et al., 2004).
Sun et al. (2009), identificaram em um estudo com idosos chineses que o uso
ocasional e moderado de lcool esteve associado a menores taxas de mortalidade por todas as
causas, tanto em homens quanto mulheres com piores condies de sade. Beber moderado
associado menor mortalidade tambm foi constatado por Lang et al. (2007). Estudo de Lin
et al. (2005), realizado com idosos japoneses, constatou que o risco de mortalidade por todas
as causas foi de 12% a 20% menor entre os bebedores com consumo entre 0,1 a 22,9 g/dia.
Por outro lado, o uso pesado de lcool (>69g/dia) foi associado excessiva mortalidade,
principalmente devido neoplasias e doenas cardiovasculares, dados que tambm foram
20
achados por Moore et al. (2006). Consumo moderado associado a menor mortalidade tambm
foi achado por McCaul et al. (2010).
A ocorrncia de quedas na velhice um tema bastante recorrente e sua associao com
uso de lcool tambm tem sido investigada. Reviso de Rigo et al. (2005) aponta que a
incidncia anual de quedas em idosos com mais de 65 anos varia de 35 a 40%, taxas que se
elevam a partir dos 75 anos. Para os autores, porm, frequente na literatura estudos que
trazem associao negativa do uso moderado de lcool com maior ocorrncia de quedas, ou
seja, beber em pequenas quantidades teria efeito protetor sobre a ocorrncia de quedas em
idosos. Lima et al., (2009) em um estudo transversal de base populacional realizado com
idosos a partir dos 60 anos, observou que 24,5% relataram quedas, e que estas se associaram
ao uso de risco de lcool e a ser mais velho. Mukamal et al. (2004), em estudo transversal e
tambm com abordagem longitudinal, identificaram uma aparente inverso entre o uso de
lcool e risco de quedas frequentes, porm, a anlise do estudo longitudinal demonstrou taxas
similares de risco para quedas em abstmios e bebedores de leve a moderados, porm uma
porcentagem de 25% maior de risco entre aqueles que bebem mais de 14 doses de lcool na
semana. Estudo de Suelves et al. (2010), com objetivo de encontrar os fatores associados a
ocorrncia de quedas em uma populao de idosos a partir dos 65 anos no encontrou
associao entre uso de lcool e maior nmero de quedas na amostra.
Alm de seus impactos biolgicos/fsicos, o uso de qualquer substncia psicoativa
pode afetar profundamente o cotidiano e as relaes afetivas/sociais nele estabelecidas; assim,
importante discutir o uso de lcool em idosos e o impacto social que esse consumo exerce,
especialmente nos familiares dessa populao . Estudo de Nadkarnni et al. (2011) identificou
que 16,3% dos familiares de idosos que consumem lcool tinham alguma morbidade
psicolgica. Moos et al. (2010) compararam cnjuges de idosos com uso problemtico de
lcool com cnjuges de indivduos que fazem uso sem problemas constatando que o primeiro
grupo relatou sade mais precria, maior quantidade de sintomas depressivos e menor
envolvimento em tarefas domsticas e atividades sociais e religiosas.
A relao entre uso de lcool na velhice e a sua associao com o tabagismo tambm
tem sido relatada na literatura. Inmeros estudos apontam que associaes positivas entre o
uso de lcool e tabaco so bastante comuns (RAO & CROME, s/d; MIRAND & WELT,
1996; LIN et al., 2005; FALK et al., 2006; KIM et al., 2007; BLAY et al., 2009; BREITLING
et al., 2010)
Kirchner et al. (2007) identificaram que, no geral, o uso de tabaco mais comum em
idosos que apresentam padres de consumo pesado ou excessivo de lcool (19,1% e 27,9%,
21
respectivamente, p
22
que defendem essa associao ressalta que esse efeito positivo restringe-se ao uso moderado
de lcool, o que no se repetiria com padres excessivos de uso.
Dessa forma, estudos apontam a associao positiva entre beber moderado e
diminuio do risco de doena cardiovascular (ASNTEY et al., 2006; MUKAMAL et al.,
2006), menor prevalncia de sintomas depressivos em idosos homens (ZIMMERMAN et al.,
2004, McDOUGALL Jr. et al., 2006) melhor estado geral de sade (ZIMMERMAN et al.,
2004; McDOUGALL Jr. et al., 2006), menor risco de acidente vascular cerebral
(MUKAMAL et al., 2001); maior densidade mineral ssea (CAWTHON et al., 2006); menor
prevalncia de anormalidades da substncia branca cerebral (MUKAMAL et al., 2001);
aumento da substncia cinzenta (ANSTEY et al., 2006), menor mortalidade
(PEYTREMANN-BRIDEVAUX et al., 2004, LEE et al., 2009), melhor desempenho
funcional (CAWTHON et al., 2007; LEE et al., 2009), menor prevalncia de limitao fsica
(CAWTHON et al., 2007; MARALDI et al., 2009); melhor qualidade de vida tanto em
homens quanto em mulheres (CHAN et al., 2009). Em outro estudo (KIRCHNER et al., 2007)
foi constatado que abstmios, bebedores pesados e em binge tendem a relatar mais sintomas
de depresso/ansiedade, pior estado geral de sade, e menor apoio social que os bebedores
considerados moderados. Desse modo, os resultados apontam que o beber moderado pode ser
protetor para a sade e seus aspectos biopsicossociais.
Embora alguns estudos apontem tambm melhor desempenho cognitivo entre sujeitos
que fazem uso moderado do lcool (ZIMMERMAN et al., 2004; LUCHSINGER et al., 2004;
McDOUGALL Jr. et al., 2006; STOTT et al., 2008; PETERS et al., 2008; NEAFSY e
COLLINS, 2011) alguns autores encontraram associao com dficit cognitivo em mulheres
(LOPES et al., 2010) e outros discutem a discrepncia entre estudos que apontam que
diferentes tipos de bebidas exercem efeitos diferenciados sobre a cognio (LETENNEUR,
2007).
No que se refere capacidade funcional, Moore et al. (2003) identificaram que 42% da
amostra de idosos com 60 anos ou mais demonstrou padro de uso de lcool tipo binge; 15%
tinha algum prejuzo em suas atividades instrumentais de vida diria (AIVDs) e 16% em suas
Atividades Bsicas de Vida Diria (ABVDs). Na amostra, 44% dos sujeitos tinham prejuzos
tanto nas ABVDs quanto nas AIVDs). Entre aqueles que bebiam at sete doses na semana,
aqueles com prejuzos funcionais bebiam menos que os que no tinham nenhum prejuzo em
suas ABVDs e AIVDs. Em oposio, os que excederam os limites de consumo, aqueles com
prejuzos em suas ABVDs e AIVDs bebiam mais que os que no tinham nenhum prejuzo. Os
autores, concluram, assim que, neste grupo, beber mais de sete doses/semana foi associado
23
com alteraes nas AIVDs e, em menor grau ABVDs. Beber mais de trs/doses por ocasio
foi associado com alteraes nas AIVDs.
Porm, muitos autores reforam que esses achados no devem representar um estmulo
e incentivo para que idosos permaneam ou iniciem o consumo de lcool j que muitas das
associaes entre o beber na velhice e seus aspectos protetores ainda no esto bem
elucidadas. Alm do fato de bebedores moderados diferirem em muitos aspectos dos
abstmios e bebedores pesados, algo que pode confundir essa associao a relao entre o
beber moderado e o estilo de vida, o que favoreceria os achados positivos que se tem
observado. (ZIMMERMAN et al., 2004; LEE et al., 2009; MARALDI et al., 2009; MENON
et al., 2010).
De forma geral, consenso na literatura que os problemas relacionados ao lcool
diminuem com a idade, j que se observa que entre os longevos, esse uso mostra-se reduzido
(MOOS et al., 2009, BLAY et al., 2009;). Essa associao tem sido observada tanto em
estudos transversais quanto longitudinais. Estudo longitudinal de Moos et al. (2009) com
sujeitos de idade entre 55 e 65 anos em 20 anos de seguimento verificou que, tanto para
homens quanto mulheres, houve diminuio no percentual de bebedores e na frequncia do
beber ao longo do estudo. Alm disso, constatou-se que os homens bebem mais que as
mulheres em todos os subgrupos de idosos (jovens ou longevos), bem como so mais
propensos a apresentar problemas relacionados ao lcool. Acredita-se que essa diminuio no
uso de lcool com o passar da idade esteja diretamente associada ao aumento dos problemas
relacionados ao lcool por esses indivduos (MOOS et al., 2009). Outras causas atribudas
diminuio, segundo Mirand & Welt (1996), citando outros autores, podem estar relacionadas
com a preocupao com as condies de sade, mudanas no padro social, a partir da
filiao a redes sociais que consomem menos lcool, ou melhor estilo de vida para as
mulheres, j que nos homens essa tendncia no se repete.
Diante do que foi colocado, o uso de lcool na velhice possui inmeras
particularidades seja no que se refere aos fatores de risco a ele associados, ao perfil dos idosos
que consomem lcool e ao impacto que esse uso pode ter nas condies de vida e sade nessa
fase da vida. A seguir, sero abordados os aspectos epidemiolgicos desse consumo e os
principais estudos destinados a essa compreenso.
24
1.5 EPIDEMIOLOGIA DO USO DE LCOOL POR IDOSOS
No que se refere investigao do uso de lcool por idosos, os estudos mais comuns
tm sido os de carter transversal, que descrevem o padro de consumo da substncia e
mostram diferenas entre o comportamento de beber de diferentes grupos etrios. Os estudos
longitudinais, por sua vez, tambm so necessrios para identificar se estes padres so
devidos a efeitos de coorte ou de envelhecimento (KEMM, 2003) j que os hbitos de beber
dos sujeitos de uma determinada poca podem receber influncias da cultura, condies de
vida e sade, etc, que podem se modificar com o passar dos anos, interferindo no padro e nos
hbitos em relao bebida de um mesmo sujeito ao longo da vida (OCONNEL et al., 2003).
Nos estudos transversais, as taxas de prevalncia podem variar de acordo com a
adoo de diferentes critrios diagnsticos utilizados nos estudos realizados (uso de risco, uso
problemtico, binge, dependncia), j que quando os critrios so mais rgidos (uso
nocivo/dependncia, por exemplo), refletem menor prevalncia do que quando os critrios so
mais amplos (uso de risco, problemtico) (OCONNEL et al., 2003). A prevalncia pode
variar, ainda, de acordo com o instrumento utilizado e as classificaes adotadas acerca de
quantidade e frequncia. Alm disso, os estudos que detectam uso de lcool atravs de
autorrelato tm uma limitao j que muitos indivduos podem omitir informaes por
vergonha, medo, culpa ou simplesmente, por no atriburem importncia s mesmas.
Estudos transversais tm demonstrado que o nvel de consumo de lcool diminui com
o avanar da idade, em todos as classificaes de consumo (binge, pesado e moderado)
(KIRCHNER et al., 2007) e est mais associado a ser do sexo masculino (PEYTREMANN-
BRIDEVAUX ET al., 2004; LIN et al 2005; CASTRO e COSTA et al., 2008; CASTILLO et
al., 2008; MERRICK et al, 2008; BLAY et al., 2009; HIRATA et al., 2009; BLAZER & WU,
2009; WEYERER et al., 2009; HALME et al., 2010; LIN et al., 2011; NADKANNI et al.,
2011).
Alm disso, esses estudos apontam que, de um modo geral, o uso de lcool se associa
a ter melhor renda (PEYTREMANN-BRIDEVAUX et al., 2004; MERRICK et al., 2008) mas
h alguma controvrsia em relao escolaridade. Assim, enquanto h estudo que apontam
associao com melhor nvel de escolaridade (PEYTREMANN-BRIDEVAUX et al., 2004;
LIN et al., 2005; MERRICK et al., 2008; BLAZER & WU, 2009; NADKANNI et al., 2011),
h outros que apontam a menor escolaridade como risco para uso de lcool (BLAY et al.,
2009; HIRATA et al., 2009, LOPES et al., 2010).
25
Melhores condies de sade tambm so apontados como fatores associados a uso de
lcool (CASTRO e COSTA et al., 2008; MERRICK et al., 2008; BLAZER & WU, 2009;
WEYERER et al., 2009), mas tambm h estudos que apontam associao com problemas de
sade como danos funcionais e cognitivos (HIRATA et al., 2009), doena heptica
(WEYERER et al., 2009) e comportamentos de risco sade como o uso de fumo
(MERRICK et al., 2008; BLAY et al., 2009; HIRATA et al., 2009; KIM et al., 2009;
WEYERER et al., 2009).
Por fim, no h consenso sobre o estado civil e sua possvel associao com lcool, na
medida em que h estudos que apontam maior risco para divorciados/separados/solteiros
(MERRICK et al., 2008; LIN et al., 2011) e outro que apontam maior chance entre os casados
(BLAZER & WU, 2009).
O Connel et al. (2003) afirmam que embora o uso de lcool na velhice seja pouco
diagnosticado, atinge prevalncia de 10% na comunidade, 14% nas urgncias hospitalares,
18% nas internaes em enfermarias e de 23 a 44% em unidades psiquitricas.
No que se refere prevalncia de uso de lcool entre idosos no Brasil, Laranjeira et al.
(2007), no I Levantame