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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, OS PORTADORES DE DEPENDÊNCIA QUÍMICA E SUAS FAMÍLIAS CECILIA SERAPIÃO DOS SANTOS Itajaí (SC), 28 de abril de 2008

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS

CURSO DE DIREITO

PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, OS PORTADORES DE DEPENDÊNCIA QUÍMICA E SUAS FAMÍLIAS

CECILIA SERAPIÃO DOS SANTOS

Itajaí (SC), 28 de abril de 2008

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS – CEJURPS

CURSO DE DIREITO

PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, OS PORTADORES DE DEPENDÊNCIA QUÍMICA E SUAS FAMÍLIAS

CECILIA SERAPIÃO DOS SANTOS

Monografia submetida à Universidade

do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de

Bacharel em Direito. Orientadora: Professora Maria Inês França Ardigó

Itajaí (SC), 28 de abril de 2008

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AGRADECIMENTO

Ao Deus Soberano, pela vida, por cuidar de mim até aqui.

A minha mãe Benedita pelo amor incondicional, pela formação, pelo exemplo passado. (in memorian)

A minha amada família, Pedro meu marido, Ricardo meu filho, Paula minha filha, Lucca meu neto, os quais contribuíram

diretamente para que eu pudesse vencer esse desafio.

A Comunidade Terapêutica Pró Vida , em especial ao amigo Luís pela compreensão e solidariedade, Ao Rev. Lenio pelo incentivo.�

A Profª Maria Inês França Ardigó pela dedicação, paciência, amor e pelo profissionalismo exemplar que me conduziu

como orientadora.

Aos amigos de turma, em especial a Ana e o Benoni pelo companheirismo.

Aos demais familiares e amigos pela força.

A todos os professores do Curso de Direito.

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DEDICATÓRIA

“O meu Deus é o Deus do impossível” ‘A Ele Honra e Glória ‘

Pois para Deus nada é impossível. (Lucas 1.37).

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o

Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Cecilia Serapião dos Santos Graduanda

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale

do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Cecilia Serapião dos Santos,

sob o título PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, OS

PORTADORES DE DEPENDÊNCIA QUÍMICA E SUAS FAMÍLIAS, foi submetida

em junho de 2008 à banca examinadora composta pelos seguintes professores:

___________________________; ________________________; e aprovada

com a nota _________, (_______________________________).

Itajaí (SC), ______ de _____________ de 2008

Profª. Maria Inês França Ardigó Orientadora e Presidente da Banca

MSc. Antonio Augusto Lapa Coordenação da Monografia

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ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

DQ Dependente Químico

CT Comunidade Terapêutica

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ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA: Sendo a Dignidade garantida por um

Princípio, logo, ela é absoluta, plena, não pode sofrer arranhões nem ser vítima

de argumentos que a coloquem num relativismo1.

FAMÍLIA: É um sistema dinâmico e em constante transformação, que cumpre sua

função social transmitindo os valores e as tradições culturais2.

DEPENDÊNCIA QUÍMICA: É um grupo de características relacionadas ao

conhecimento, comportamento e pensamento que indicam que uma pessoa não é

capaz de controlar-se no uso de alguma droga3.

DEPENDENTE QUÍMICO: Caracteriza-se por não conseguir controlar o consumo

de drogas, agindo de forma impulsiva e repetitiva4.

COMUNIDADE TERAPÊUTICA: Um tratamento comunitário altamente

estruturado que emprega sanções e penalidades, privilégios e prestígios

determinados pela comunidade como parte de um processo de recuperação5.

1 NUNES, Rizzatto. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana: doutrina e jurisprudência, 2007, p.46 2 PAYÁ e FIGLIE Figlie, Neliana Buzi . Aconselhamento em Dependência Química Neliana Buzi Figlie Selma Bordin, Ronaldo Laranjeira – São Paulo, Roca 2004. p 340. 3 ÁVILA, Luis Carlos; ÁVILA, Maria Roseli Rossi. Noções gerais sobre drogas. Blumenau: Cruz Azul no Brasil. Apostila dirigida e limitada, 2005. 4 SILVEIRA, Dartiu Xavier da; SILVEIRA, Evelyn Doering Xavier da. Um guia para a família, 2003. 5 FIGLIE, Neliana Buzi; BORDIN, Selma; LARANJEIRA, Ronaldo. Aconselhamento em dependência química, 2004,p.154.

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SUMÁRIO

RESUMO ............................................................................................................XI INTRODUÇÃO....................................................................................................1 CAPÍTULO 1.......................................................................................................3 DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA .......................................................3 1.1 VISÃO HISTÓRICA DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA.................3 1.2 CONCEITUANDO O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA......................6 1.3 O PRINCÍPIO DA IGUALDADE....................................................................11 CAPÍTULO 2.......................................................................................................15 DA DEPENDÊNCIA QUÍMICA ...........................................................................15 2.1 CONCEITO ...................................................................................................15 2.2 CONCEITUANDO SUBSTÂNCIAS QUE CAUSAM DEPENDÊNCIA QUÍMICA.............................................................................................................22 2.2.1 O Álcool ....................................................................................................23 2.2.2 A Nicotina .................................................................................................26 2.2.3 A Maconha ................................................................................................27 2.2.4 Cocaína .....................................................................................................29 2.2.5 Inalantes....................................................................................................33 2.2.6 Crack .........................................................................................................33 2.2.7 Ecstasy......................................................................................................34 2.2.8 Ópio...........................................................................................................35 2.2.9 Heroína......................................................................................................35 2.2.10 Lsd...........................................................................................................36 2.3 EFEITOS FÍSICOS E PSÍQUICOS DA DEPENDÊNCIA: A REDUÇÃO DE DANOS .........................................................................................................37 2.4 A RECUPERAÇÃO E O TRATAMENTO PARA O DEPENDENTE QUÍMICO ......................................................................................................40 2.5 INSTITUIÇÕES E SERVIÇOS DE ATENDIMENTO AO DEPENDENTE QUÍMICO ......................................................................................................46 2.5.1Comunidade Terapêutica .........................................................................53 CAPÍTULO 3.......................................................................................................60 DA FAMÍLIA, DEPENDENCIA E DIGNIDADE HUMANA ..................................60 3.1 O CONCEITO DE FAMÍLIA..........................................................................60 3.2 A FAMÍLIA DO DEPENDENTE QUÍMICO....................................................66 3.3 A IMPORTÂNCIA DA FAMÍLIA NO TRATAMENTO E INSERÇÃO DO DEPENDENTE QUÍMICO.............................................................................69 3.4 A FAMILIA E O PRINCIPIO DA DIGNIDADE HUMANA..............................74

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3.5 COMUNIDADE TERAPÊUTICA: CENTRO DE TRATAMENTO ALTERNATIVO PRÓ-VIDA ..........................................................................77 3.5.1 Histórico do Centro de Tratamento Alternativo Pró-Vida.....................81 3.5.2 PROGRAMA DE REABILITAÇÃO E TRATAMENTO...............................84 3.5.2.1 INCLUSÃO AO CTA - PRÓ-VIDA ..........................................................85 3.5.2.2 SAÚDE FÍSICA e ODONTOLÓGICA DOS INTERNOS .........................85 3.5.2.3 PSICOLOGIA..........................................................................................86 3.5.2.4 SERVIÇO SOCIAL..................................................................................86 3.5.2.5 NUTRIÇÃO .............................................................................................87 3.5.2.6 LABORTERAPIA....................................................................................87 3.5.2.7 TERAPIA ESPORTIVA...........................................................................88 3.5.2.8 DESPERTAR ESPIRITUAL....................................................................88 3.5.2.9 CAPACITAÇÃO PROFISSIONAL..........................................................89 3.5.2.10 GRUPO DE APOIO ÀS FAMÍLIAS – GRAF.........................................89 3.5.3 Assistência Psicológica: Psicoterapia De Grupo..................................85 3.5.4 Programa Prevenção de Recaídas .........................................................88 3.5.5 Psicoterapia Individual ............................................................................88 3.6 GRUPO DE APOIO ÀS FAMÍLIAS - GRAF .................................................89 3.7 O DESPERTAR ESPIRITUAL ......................................................................91 3.8 DISCIPULADO .............................................................................................91 3.9 PRÁTICAS TERAPÊUTICAS DESPORTIVAS E OCUPACIONAIS ............92 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................95 REFERÊNCIAS ..................................................................................................97

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RESUMO

O presente estudo consiste numa pesquisa de cunho

bibliográfico, intitulada “Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, os Portadores

de Dependência Química e suas Famílias” tema complexo e relevante, visto que a

dependência química afeta milhares de pessoas contribuindo de maneira

assustadora na criminalidade, pelo conseqüente distúrbio de conduta dos

dependentes os quais são capazes de gerar numa família inúmeros sentimentos, tais

como: ansiedade, vergonha, raiva, que por sua vez levam à culpa e negação, o que

acaba por determinar o isolamento social, bem como ambiente familiar de constantes

brigas e ressentimentos. O objetivo geral desta monografia é apresentar, o

tratamento dispensado, bem como a aceitação deste pelos dependentes

químicos, residentes da Comunidade Terapêutica Pro Vida e suas famílias,

enfocando a dignidade da pessoa humana. Sendo que seus objetivos específicos

são: a) Caracterizar o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana; b) Conceituar

Dependência Química; c) Definir as substâncias que causam dependência

química; d) Verificar a participação das famílias dos residentes em tratamento,

com respeito ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Com relação à

metodologia, utilizou-se o método indutivo, na Fase de Tratamento de Dados o

Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente

Monografia é composto na base lógica Indutiva. Nas diversas fases da Pesquisa,

foram acionadas as Técnicas do Referente, da Categoria, do Conceito

Operacional e da Pesquisa Bibliográfica. Ao final, espera-se ter contribuído

levando conhecimento e informação, e despertando a reflexão frente uma causa

tão nobre, que é o combate na luta contra as drogas, uma problemática, que

envolve e requer a participação da família, da sociedade e do estado, pois a

doença Dependência Química e sua conseqüência vêm a ser um desastre vindo a

refletir na família, sociedade e estado.

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INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto os portadores de

Dependência Química e suas famílias com ênfase no Princípio da Dignidade da

Pessoa Humana.

Seus objetivos são: a) institucional: produzir uma

monografia para obtenção do grau de bacharel em Direito pela Universidade do

Vale do Itajaí – UNIVALI; b) geral: apresentar o resultado do tratamento, dos

portadores de Dependência Química, na Comunidade Terapêutica Pró - Vida, e a

participação das famílias respeitando o Princípio da Dignidade da Pessoa

Humana; c) específicos: Caracterizar o Princípio da Dignidade da Pessoa

Humana; Conceituar as substâncias que causam dependência química; Verificar

se as famílias dos residentes em tratamento, estão respeitando o Princípio da

Dignidade da Pessoa Humana; Identificar os resultados do tratamento

dependência química, na Comunidade Terapêutica Pró-Vida.

Optou-se por este tema, por ser complexo, atual e relevante

frente às conseqüências oriundas do desvio de comportamento do portador de

substancias psicoativas, envolver e atingir as mais diversificadas sociedades.

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase

de Investigação foi utilizado o Método Indutivo6, na Fase de Tratamento de Dados

o Método Cartesiano7, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente

Monografia é composto na base lógica Indutiva.

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas

do Referente8, da Categoria9, do Conceito Operacional10 e da Pesquisa Bibliográfica.

6 Segundo Pasold (2002, p.110) o referido método trata de “pesquisar e identificar as partes de um

fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral”. 7 O referido método pode ser resumido em quatro preceitos que são: 1. "nunca aceitar, por verdadeira,

cousa nenhuma que não conhecesse como evidente " ; 2. dividir cada uma das dificuldades que examinasse em tantas parcelas quantas pudessem ser e fossem exigidas para melhor compreendê-Ias"; 3. "conduzir por ordem os meus pensamentos, começando pelos objeto mais simples e mais fáceis de serem conhecidos, para subir, pouco a pouco, como por degraus, até o conhecimento dos mais compostos, e supondo mesmo certa ordem entre os que não se precedem naturalmente uns aos outros"; 4.fazer sempre enumerações tão completas e revisões tão gerais, que ficasse certo de nada omitir" (grifo no original). In: PASOLD, César Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 106-107.

8 "REFERENTE é a explicitação prévia do motivo, objetivo e produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para uma atividade intelectual. especialmente para uma pesquisa." In: PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, p. 62.

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Para melhor discernimento e apresentação, dividiu-se a

presente monografia em três capítulos.

Sendo assim, no primeiro capítulo tratar-se-á o Princípio da

Dignidade Humana, seu histórico, conceitos e, o Princípio da Igualdade.

No segundo capítulo intitulado Da Dependência Química”

será abordada a Dependência Química, conceitos, tipos de drogas, o contexto

brasileiro, o papel das instituições filantrópicas e, trabalhos desenvolvidos no Centro

de Tratamento Alternativo Pró-Vida.

E, no terceiro sob o título “Família, Dependência e Dignidade

Humana”, conceituou-se Família; a Família do Dependente Químico; o papel da

Família no processo de reinserção do Dependente Químico; a reinserção social do

Dependente e, o Princípio da Dignidade Humana e a Família.

Para a presente monografia foram levantadas as seguintes

hipóteses: a) O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana é respeitado por todas as

famílias dos portadores de Dependência Química; b) O tratamento multidisciplinar para

a família é fundamental para o tratamento da dependência química; c) Na Comunidade

Terapêutica Pró-Vida de Itajaí-SC, todos os internos conseguiram ir até o final do

tratamento.

O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as

Considerações Finais, aduzindo-se sobre a confirmação ou não das hipóteses

trabalhadas, seguidas da estimulação à continuidade dos estudos e de reflexões sobre

a Dependência Química, participação da família na recuperação e inserção social do

Dependente Químico e a Dignidade da Pessoa Humana. Devido ao elevado número

de categorias fundamentais à compreensão deste trabalho monográfico, optou-se por

listá-las em rol próprio, contendo seus respectivos conceitos operacionais.

9 “Categoria é a palavra ou expressão estratégica à elaboração elou expressão de uma idéia" In:

PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, p. 31.

10 "Conceito operacional (=cop) é uma definição para uma palavra e expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos" In: PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, p. 56.

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CAPÍTULO 1

DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA

1.1 VISÃO HISTÓRICA DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA

Preliminarmente, aborda-se o Princípio da Dignidade

Humana, pois insere-se nos Direitos Humanos Fundamentais, que para Moraes11,

surgiram como produto de fusão de várias fontes.

A que tudo indica, a lógica que rege o princípio da Dignidade

Humana remonta ao antigo pensamento judaico-cristão.

Para Yancey12, a civilização ocidental está tão solidamente

edificada sobre os fundamentos assentados na época do antigo testamento, que

não teria sentido sem ele. A crença judaica no monoteísmo nos deu um Grande

Todo, um Universo unificado que, como produto de um Criador, o homem como

pessoa sobre a face da Terra tem a dignidade inerente ao ser humano. Assim

sendo, admite-se que a dignidade humana vivenciada no mundo atual, tem

herança no judaísmo, pois como falar de liberdade, espírito, justiça, fé, tempo,

pessoa, peregrinação, revolução, sem admitir que sejam conceitos originários do

velho testamento.

Rizzato13, nessa mesma linha de pensamento, registra que a

dignidade humana, no Ocidente, o fundamento último e primeiro de toda

moralidade é cristão, e que podemos apontar desde Jesus Cristo, o absoluto.

Aistein14, quando tratou da relação entre Ciência e Religião,

disse que “os mais elevados princípios e aspirações das pessoas do mundo

contemporâneo são fornecidos pela tradição judaico-cristã”.

Para Sarlet15, a positivação do principio da Dignidade da

11 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2005. 12 YANCEY, Philip. A Bíblia que Jesus lia. Vida Acadêmica, 2006, p.21. 13 NUNES, Rizzatto. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana: doutrina e jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2007. 14 AISTEIN, (apud NUNES, Rizzatto. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana: doutrina e jurisprudência, 2007). 15 SARLET, Ingo Wolfgang. (org). Dimensões da dignidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado,

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Pessoa Humana é relativamente recente, ressalvada uma ou outra exceção,

como a Constituição Alemã de 1919 (Constituição de Weimar) estabelecendo em

seu art.151, inciso I, “Que o objetivo maior da ordem econômica é o de garantir

uma existência humana digna”.

A partir da Segunda Guerra Mundial, o valor fundamental da

dignidade da pessoa humana passou a ser reconhecido expressamente nas

constituições, de modo especial após ter sido consagrado pela Declaração

Universal da ONU de 1948.

Segundo Moraes16,

os direitos humanos fundamentais colocam-se como uma das previsões absolutamente necessárias a todas as constituições, no sentido de consagrar o respeito à dignidade humana, garantir a limitação de poder e visar ao pleno desenvolvimento da personalidade humana.

Através dos Direitos Humanos Fundamentais, verifica-se o

comprometimento e responsabilidade do Estado referente o principio da dignidade do

ser humano, segundo Moraes, a forte concepção religiosa trazida pelo Cristianismo,

com a mensagem de igualdade de todos os homens, independentemente de origem,

raça, sexo ou credo, influenciou diretamente a consagração dos direitos fundamentais,

enquanto necessários à dignidade da pessoa humana.

Os princípios consagrados pela Declaração dos Direitos do

Homem e do Cidadão de 1789, dentre eles o princípio da dignidade humana, se

irradiaram universalmente, contribuindo de maneira decisiva para o avanço

democrático dos povos.

A Constituição Federal de 1988, ao expressar em seu artigo

1º, inciso III, o princípio da dignidade da pessoa humana, de acordo com Pereira

Júnior17, elevou o ser humano ao grau máximo como verdadeiro fundamento da

República Federativa do Brasil, ou seja, “o Estado brasileiro existe, desde então,

em função das pessoas e não o contrário”.

2005. p.101. 16 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2005, p.4. 17 PEREIRA JÚNIOR, Anthero Mendes. Principio da dignidade humana e a proteção da filiação no instituto da guarda dos filhos. 150fls. Dissertação. (Mestrado). Centro Universitário FIEO, Osasco, (SP), 2006. Disponível em: www.fieo.br/v2/sp_mestrado/dissert_anthero_junior.pdf.

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Reforçando esta idéia, pode-se ressaltar aqui o fato do

legislador constituinte ter colocado o capítulo dos direitos fundamentais antes da

organização do estado.

Cardoso18 em artigo sobre o direito à redesignação do estado

sexual, elucida o valor da dignidade humana, afirmando que o mesmo “impõe-se como

centro basilar de todo o ordenamento jurídico brasileiro, servindo como parâmetro de

valoração a nortear a interpretação e compreensão do sistema jurídico”.

A proteção da dignidade da pessoa humana e dos direitos

da personalidade conquistou importância relevante no final do século XX,

especialmente em função do desenvolvimento científico e tecnológico. A

dignidade da pessoa é, hoje, princípio fundamental, um valor essencial, que

promove unidade ao sistema constitucional, concebido como verdadeiro núcleo

da hermenêutica e da interpretação constitucional19.

No cenário brasileiro atual, embora se saiba que nem

sempre o princípio da dignidade da pessoa humana é devidamente respeitado na

prática, é pacífica sua aceitação e reconhecimento.

Frente ao contexto, Nobre Júnior20, alude que essa adesão

decorre da tendência dos ordenamentos ao reconhecimento do ser humano como

o centro e o fim do direito. De acordo com suas palavras,

[...] essa inclinação, bastante reforçada depois da traumática barbárie nazi-fascista, encontra-se plasmada pela adoção da dignidade da pessoa humana, à guisa de valor básico do Estado Democrático de Direito21.

Nos ensinamentos de Canotilho22, no Estado Democrático

Acesso em: abr. 2008. 18 CARDOSO, Renata. Transexualismo e o direito à redesignação do estado sexual. 07.Jul.2005. Disponível em: <http://www.direitonet.com.br/artigos/x/21/64/2164/>. Acesso em: 14.Ago.2006. p. 1. 19 LEAL, Rogério Gesta. Perspectivas hermenêuticas dos direitos humanos e fundamentais no Brasil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000. p. 37 e 54. 20 NOBRE JÚNIOR, Edilson Pereira. O direito brasileiro e o princípio da dignidade da pessoa humana. Maio. 2000. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=161>. Acesso em: 25. abr. 2008. 21 NOBRE JÚNIOR, Edilson Pereira. O direito brasileiro e o princípio da dignidade da pessoa humana. (op. cit.), p.1. 22 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 3. ed. Coimbra: Livraria Almedina, 1999. p. 1099.

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de Direito todos os princípios que o regem devem se basear no respeito à pessoa

humana, pois esta funciona como princípio estruturante, ou seja, representa o

arcabouço político fundamental constitutivo de um Estado e sobre o qual se deve

assentar todo o ordenamento jurídico de um país. Por isso, é considerado como

princípio maior na interpretação de todos os direitos e garantias da pessoa

humana.

1.2 CONCEITUANDO O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA

Para Tavares23, princípio é derivado do substantivo latino

principium, principii, significando começo, origem, base, ponto de partida.

Na visão de Ciotola24, o termo “princípio” dá a idéia de

fundamento, origem, razão, causa. Em seu significado lógico, princípios são

verdades fundantes de um sistema de conhecimento, como tais admitidas, por

serem evidentes ou terem sido comprovadas.

Para Rizzatto Nunes25, o principio é real, palpável,

substancial e por isso está presente em todas as normas do sistema jurídico, não

podendo por conseqüência, ser desprezado.

Para Bandeira de Mello26, principio é mandamento nuclear

de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia

sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para a

sua exata compreensão e inteligência exatamente por definir a lógica e a

racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido

harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das

diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico

positivo.

Oportuno mencionar também Pereira e Lucas da Silva27, os

23 TAVARES, Alexandre Marcelo. Fundamentos do Direito Tributário. 3. ed. Florianópolis: Momento Atual, 2006. 24 CIOTOLA. (apud PEIXINHO, Manoel Messias; GUERRA, Isabela Franco; FILHO,Firly Nascimento. Os Princípios da Constituição de 1988. Rio de Janeiro: , 2006, p.31. 25 NUNES, Rizzatto. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana: doutrina e jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2007. p.19. 26 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 4. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1997. 27 PEREIRA, Jane R..Gonçalves; DA SILVA, Fernanda D.L.Lucas, p. 10.

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quais afirmam que princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na

melhor medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes.

Sedo assim, os princípios são mandados de otimização, que estão caracterizados

pelo fato que podem ser cumpridos em diferentes graus e que a medida de seu

cumprimento depende não só das possibilidades reais, mas também das

jurídicas.

Percebe-se então que, princípio vem a ser a origem, início,

ponto de partida, base, fundamento, como também pode ser aquilo do qual

alguma coisa procede na ordem de existência ou do conhecimento, de forma a

permitir a sua compreensão e aproveitamento no sistema jurídico.

A distinção apresentada por Robert Alexy28, entre princípios

e regras, auxilia a compreensão e vale a pena ser reproduzida:

Segundo a definição standart da teoria dos princípios, princípios são normas que ordenam que algo seja realizado em uma medida tão ampla quanto possivel que relativamente a possibilidades fáticas ou jurídicas. Princípios são, portanto, mandamentos de otimização. Como tais, eles podem ser preenchidos em graus distintos. Bem diferentes estão as coisas nas regras. Regras são normas que, sempre, ou só podem ser cumpridas ou não cumpridas. Se uma regra vale, é ordenado fazer exatamente aquilo que ela pede, não mais e não menos. Regras contêm, com isso, mandamentos definitivos. A forma de aplicação de regras não é a ponderação, senão a subsunção29.

Desta forma e partindo-se destas premissas, temos que o

principal valor tutelado pela Constituição da República é, sem qualquer dúvida, a

dignidade humana.

A palavra “dignidade” vem do latim dignitas, que significa

honra, consideração, respeito, com base nesta definição literal, pode-se ousar a

definir dignidade da pessoa humana como sendo à base do direito justo e comum

a todos30.

28 ALEXY, Robert. Colisão de direitos fundamentais e realização de direitos fundamentais no estado de direito democrático. Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro, n. 217, 1999. 29 ALEXY, Robert. Colisão de direitos fundamentais e realização de direitos fundamentais no estado de direito democrático, 1999, p. 69. 30 SILVA, De Plácido. Vocabulário jurídico. 25. ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p.

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De acordo com Nunes31, dignidade é um conceito que foi

sendo elaborado no decorrer da história e chega ao início do século XXI repleta

de si mesma como um valor supremo, construído pela razão jurídica. Sendo a

dignidade garantida por um princípio, logo, é absoluta, plena, não pode sofrer

arranhões nem ser vítima de argumentos que a coloquem num relativismo.

A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente, na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos32.

Portanto, a dignidade humana faz-se presente no indivíduo,

desde o ventre materno. Já há vida humana em formação e no nascimento a

dignidade se completa, pelo fato de ser humano, simplesmente humano, dotado

de corpo físico, alma e espírito, um ser racional. A dignidade nasce com a pessoa.

É-lhe inata. Inerente à sua essência.

Já, segundo Sarlet33,

a dignidade da pessoa humana não deve ser considerada exclusivamente como algo inerente à natureza do homem (no sentido de uma qualidade inata), na medida em que a dignidade também possui um sentido cultural, sendo fruto do trabalho de diversas gerações e da humanidade em seu todo, razão pela qual a dimensão natural e a dimensão cultural da dignidade da pessoa humana se complementam e interagem mutuamente34.

Entende-se que além da dignidade natural, o ser humano

passa a ter dignidade através dos atributos materiais, sentido e criado pelo

homem, desenvolvido e estudado, compreendido e percebido, de forma que veio

458. 31 NUNES, Rizzatto. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana: doutrina e jurisprudência, 2007, p.46. 32 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2005, p.48. 33 SARLET, Ingo Wolfgang. (org). Dimensões da dignidade, 2005. 34 SARLET, Ingo Wolfgang. (org). Dimensões da dignidade, 2005, p. 107.

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aprimorar nos últimos séculos os direitos fundamentais do cidadão.

Para Moraes35, o direito à vida é o mais fundamental de

todos os direitos, já que se constitui em pré-requisito à existência e exercício de

todos os demais direitos.

Na Constitucional Federal é proclamado o direito à vida,

cabendo ao Estado assegurá-lo em sua dupla acepção, sendo a primeira

relacionada ao direito de continuar vivo e a segunda de se ter vida digna quanto à

subsistência36.

O Código Civil Brasileiro37 pontua no seu Art. 2º: A

personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida [...]. Entende-se

personalidade como a possibilidade de conferir-se a um ente, humano ou moral, a

aptidão de adquirirem direitos e contrair obrigações.

Considera-se que ao reconhecimento jurídico da dignidade

da pessoa humana decorre a salvaguarda dos direitos da personalidade. Estes,

consoantes à precisão conceitual de Mota Pinto38, configuram “um conteúdo

mínimo e imprescindível da esfera jurídica de cada pessoa”, incidentes sobre a

sua vida, saúde e integridade física, honra, liberdades física e psicológica, nome,

imagem e reserva sobre a intimidade de sua vida privada.

Necessário, assim, ter em conta que a observância das

conseqüências jurídicas decorrentes dos direitos de personalidade é

imprescindível ao respeito da dignidade do ser humano, porquanto a sua

idealização, com ênfase para a jurisprudência alemã, formada ao depois da

segunda conflagração mundial, teve em mora evitar que o individuo fosse

submetido a qualquer sorte de menosprezo, quer pelo Estado, ou pelos demais

indivíduos39.

Coube a Constituição da República Federativa Brasileira

nortear de forma a assegurar os direitos e obrigações do individuo com base nos

princípios e normas fundamentais, mencionando no seu Art. 1º e inciso III:

35 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2005. 36 BRASIL. Constituição Federal. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. (RT Códigos). 37 BRASIL. Código Civil. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/>. Acesso em: 05/Abr./2008. 38 MOTA PINTO, Carlos Alberto da. Teoria Geral do Direito Civil, 4. ed. por António Pinto Monteiro e Paulo Mota Pinto, Coimbra: Coimbra, 2005, p. 207. 39 NUNES, Rizzatto. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana: doutrina e Jurisprudência, 2007.

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Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: a dignidade da pessoa humana40.

Claro, portanto, na Constituinte de 1988 que o Estado

Democrático de Direito que instituía tem, como fundamento, a dignidade da

pessoa humana.

Nesse sentido, pontifica Barroso41:

O ponto de partida do intérprete há que ser sempre os princípios constitucionais, que são o conjunto de normas que espelham a ideologia da Constituição, seus postulados básicos e seus fins. Dito de forma sumária, os princípios constitucionais são as normas eleitas pelo constituinte como fundamentos ou qualificações essenciais da ordem jurídica que institui. A atividade de interpretação da Constituição deve começar pela identificação do princípio maior que rege o tema a ser apreciado, descendo do mais genérico ao mais específico, até chegar à formulação da regra concreta que vai reger a espécie42.

Segundo Moraes43, entende-se que o início da mais preciosa

garantia individual deverá ser dado pelo biólogo, cabendo ao jurista, tão somente,

dar-lhe o enquadramento legal, pois do ponto de vista biológico a vida se inicia

com a fecundação do óvulo pelo espermatozóide, resultando um ovo ou zigoto.

Enfim, a expressão “dignidade humana” é concebida, na

atualidade, como o “reconhecimento de um valor”. Trata-se de um “princípio moral

baseado na finalidade do ser humano e não na sua utilização como um meio”.

Significa dizer que a dignidade humana tem como fundamento “a própria natureza

da espécie humana a qual inclui, normalmente, manifestações de racionalidade,

de liberdade e de finalidade em si, que fazem do ser humano um ente em

permanente desenvolvimento na procura da realização de si próprio”44.

40 BRASIL. Constituição Federal. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. 41 BARROSO, Luís Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. 42 BARROSO, Luís Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas, 2006. 43 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, 2005. 44 DIREITO português. Reflexão ética sobre a dignidade humana. In: Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida. 05. Jan.1999. Disponível em: <http://www.cnecv.gov.pt>. Acesso em:

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1.3 O PRINCÍPIO DA IGUALDADE

A dignidade da pessoa, como já comentado, depende da

proteção e da garantia dos direitos fundamentais, sendo que de acordo com

Zisman45, tais direitos não são absolutos. Trata-se de três ordens de direitos, que

tutelam a liberdade, a segurança e a autonomia da pessoa frente ao poder estatal

e aos demais membros do corpo social.

Cada uma dessas ordens de direito tem princípios que lhes

são em maior grau ou em menor grau afetos. Assim, a dignidade da pessoa

humana, que é dependente dos direitos fundamentais, tem uma relação direta

com outros princípios, que tutelam os mesmos direitos dos quais a dignidade da

pessoa humana é dependente. Não há dignidade da pessoa humana sem que os

direitos fundamentais sejam assegurados, informa Zisman46.

São essenciais à dignidade para a mencionada autora: o

direito à vida, à igualdade, à liberdade psíquica (liberdade de expressão do

pensamento e das opiniões, de escolha religiosa, sexual, política, profissional,

entre outra), à liberdade física, à integridade física e à psíquica (que dependem do

direito à segurança), à propriedade, a penas nãodegradantes, à qualidade de vida

(não se tolera a fome, a negligência do Estado em matéria de educação, o

abandono).

De acordo com Benezath47, o substrato material da

dignidade pode então ser desdobrado em quatro postulados básicos: 1) sujeito

moral, que reconhece a existência de outros iguais a ele, 2) sendo estes outros

merecedores do mesmo respeito à integridade psicofísica de que o sujeito moral é

titular; 3) dotado de vontade livre, de autodeterminação; 4) é parte do grupo

social, em relação ao qual tem garantia de não vir a ser marginalizado.

Desses quatro postulados se extraem os princípios jurídicos

da igualdade; da integridade moral e física; da liberdade e da solidariedade.

14. Abr. 2008. p.10. 45 ZISMAN, Célia Rosenthal. O princípio da dignidade da pessoa humana. São Paulo: IOB Thomson, 2005. p. 27. 46 ZISMAN, Célia Rosenthal. O princípio da dignidade da pessoa humana, 2005. 47 BENEZATH, Bruno Ribeiro de Souza. O direito a uma existência digna. 79 fls. Dissertação. (Mestrado em Direito). Faculdade de Direito de Campos, 2006. Disponível em: <http://www.fdc.br/Arquivos/Mestrado/Dissertacoes/Integra/BrunoBenezath.pdf>. Acesso em: 20. Abr. 2008.

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A Constituição Federal de 1988 adotou o Princípio da

Igualdade de Direitos, prevendo a igualdade de aptidão, uma igualdade de

possibilidades virtuais, ou seja, todos os cidadãos têm o direito de tratamento

idêntico pela lei, em consonância com os critérios albergados pelo ordenamento

jurídico. Dessa forma, o que se veda são as diferenciações arbitrárias, as

discriminações absurdas, pois, o tratamento desigual dos casos desiguais, na

medida em que se desigualam, é exigência tradicional do próprio conceito de

Justiça, pois o que realmente protege são certas finalidades, somente se tendo

por lesado o princípio constitucional quando o elemento discriminador não se

encontra a serviço de uma finalidade acolhida pelo direito. Porém, sem que se

esqueça, como ressalvado por Comparato48, que as chamadas liberdades

materiais têm por objetivo a igualdade de condições sociais, meta a ser

alcançada, não só por meio de leis, mas também pela aplicação de políticas ou

programas de ação estatal.

Menciona Martins Neto49, que o itinerário do princípio da

igualdade aporta na afirmação dos direitos humanos. As camadas sociais

relegadas à indigência e a vulnerabilidade - por debilidade econômico-social e por

sofrerem permanente violação de direitos fundamentais – merecem proteção

particularizada de acordo com a Conferência Mundial de Direitos Humanos

(1993). Por essa razão, a tarefa do jurista é "impor a igualdade de todos no

tocante à sua qualidade de seres humanos, à dignidade humana, aos direitos

fundamentais e às restantes garantias legalmente vigentes de proteção". Daí,

decorre a urgência na superação das desigualdades sociais.

Logo, para Canotilho50, este princípio, o da igualdade é um

dos que estruturam o regime geral dos direitos fundamentais. Esse princípio

condensa um grande conteúdo, citando a igualdade na aplicação do direito e na

criação do direito; o princípio da igualdade é igualdade de oportunidades; a

igualdade perante encargos públicos; e a igualdade e os direitos de igualdade.

Complementa o autor aludindo que:

O princípio da igualdade é não apenas um princípio de Estado de 48 CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e teoria da constituição, 1999. 49 MARTINS NETO, João dos Passos. Direitos fundamentais: conceito, função e tipos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 168.

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direito, mas também um princípio de Estado social. Independentemente do problema da distinção entre “igualdade fáctica” e “igualdade jurídica” e dos problemas econômicos e políticos ligados à primeira (ex.: políticas e teorias da distribuição e redistribuição de rendimentos), o princípio da igualdade pode e deve considerar-se um princípio de justiça social.51

Segundo Benezath52, a igualdade, enquanto igualdade de

oportunidades, conexiona-se, por um lado, com uma política de “justiça social” e

com a concretização das imposições constitucionais tendentes a efectivação dos

direitos econômicos, sociais e culturais. Por outro, ela é inerente à própria idéia de

igual dignidade social (e de igual dignidade da pessoa humana).

Na verdade, trata-se de imperativo de justiça social, na

medida em que é necessária a igualdade de oportunidades para que aqueles que

nascem em condição já desigual (nascem miseráveis, por exemplo) possam

competir/ conviver com um mínimo de dignidade com aqueles que nascem em

condições melhores.

A idéia de dignidade da pessoa humana encontra no novo

texto constitucional total aplicabilidade em relação ao planejamento familiar,

considerada a família célula da sociedade, seja derivada de casamento, seja de

união estável entre homem e mulher, pois fundado nos princípios da dignidade da

pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre

decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e

científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por

parte de instituições oficiais ou privadas53.

O postulado da Dignidade Humana, em virtude da forte

carga de abstração que encerra, não tem alcançado, quanto ao campo de sua

atuação objetiva, unanimidade entre os autores, muito embora se deva de logo,

ressaltar que as múltiplas opiniões se apresentam harmônicas e complementares.

A consagração da dignidade da pessoa humana, como visto,

implica em considerar-se o homem, como o centro do universo jurídico. Esse

reconhecimento que não se dirige a determinados indivíduos abrange todos os

50 CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e teoria da constituição, 1999, p. 416. 51 CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e teoria da constituição. 1999, p. 420. 52 BENEZATH, Bruno Ribeiro de Souza. O direito a uma existência digna. 2006, p.33.

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seres humanos e cada um destes individualmente considerados, de sorte que a

projeção dos efeitos irradiados pela ordem jurídica não há de se manifestar, a

princípio, de modo diverso ante a duas pessoas.

Além das facetas apontadas, a consagração constitucional

da dignidade da pessoa humana resulta na obrigação do Estado em garantir à

pessoa humana um patamar mínimo de recursos, capaz de prover-lhe a

subsistência. No mesmo sentido ainda, as ações no campo da saúde, realizadas

mediante políticas sociais e econômicas que colimem a redução dos riscos de

doença e de outros agravos, garantindo-se o acesso universal igualitário às ações

e serviços para sua promoção, proteção e recuperação54.

Por derradeiro, é a aplicação da igualdade em seu sentido

positivo que baliza concretamente a adoção de medidas tendentes a preservar e

promover a dignidade da pessoa humana55.

Feitas essas considerações, realçando o caráter de princípio

fundamental fruído pela dignidade da pessoa humana, oportuno mencionar que a

vida humana nasce em dignidade, é necessário crescer com dignidade e morrer

em dignidade, pois seu valor vem a ser indizível.

Logo, no capítulo 2, será abordada a Dependência Química,

seus conceitos e definições bem como tipos de drogas que causam a

dependência.

53 BRASIL. Constituição Federal. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. Art 226, § 7º. 54 BRASIL. Constituição Federal. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. Art 196. 55 BENEZATH, Bruno Ribeiro de Souza. O direito a uma existência digna. 2006, p.33.

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CAPÍTULO 2

DA DEPENDÊNCIA QUÍMICA

2.1 CONCEITO

Itajaí-SC, município que possui aproximadamente 164.950

habitantes, situado em importante pólo industrial e de turismo, enfrenta a

problemática da dependência química, este mal que assola o Brasil, e o mundo,

nas últimas décadas de maneira mais avassaladora.

Esta temática acompanha a história da humanidade desde a

Antiguidade. A droga vem a provocar diferentes impactos no decorrer dos tempos.

De passos lentos, sem pedir licença, veio a fazer parte do cotidiano da vida

humana vindo a se instalar sorrateiramente.

Em pleno século XXI, observa-se que a dependência

química, resultado de uso e abuso de substâncias psicoativas, ou seja, drogas,

lícitas e ilícitas vêm a ter um aumento progressivo, vindo trazer graves

conseqüências á saúde física, psíquica e social do ser humano com reflexos na

família e na sociedade.

A Organização Mundial da Saúde56 define substâncias

psicoativas como:

Substâncias que ao entrarem em contato com o organismo, sob diversas vias de administração, atuam no sistema nervoso central produzindo alterações de comportamento, humor e cognição, possuindo grande propriedade reforçadora sendo, portanto, passíveis de auto-administração.

Nos dias atuais, está a nos rodear uma geração que faz uso

dessas substâncias psicoativas, sem saber a princípio, que ela pode alterar o

estado de consciência e que pode levar o cérebro humano a tornar-se

dependente.

56 ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 1993, p.35, (apud FERRARI, Edson. Vencedor Não

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Figlie; Bordin e Laranjeiras57, afirma não existir uma fronteira

clara entre uso, abuso e dependência. Definem o “uso” como qualquer consumo

de substâncias, seja para experimentar, seja esporádico ou episódico; já o

“abuso” ou “uso nocivo” como o consumo de substâncias já “associado a algum

tipo de prejuízo (biológico, psicológico ou social); e finalmente a dependência

como o consumo sem controle, geralmente associado a problemas sérios para o

usuário”. Segundo os autores, isso dá uma idéia de continuidade, como uma

evolução progressiva entre esses níveis de consumo, inicialmente o uso, após a

evolução para o abuso e por fim alguns destes últimos tornar-se-iam

dependentes.

Essa dependência de substâncias psicoativas, ou seja,

conhecida popularmente como dependência de droga, é uma doença e com o uso

contínuo dia após dia, é chamada de Dependência Química, assim reconhecida pela

OMS.

Para Ávila58, a dependência é um grupo de características

relacionadas ao conhecimento, comportamento e pensamento que indicam que uma

pessoa não é capaz de controlar-se no uso de alguma droga.

Considerando sinônimo de escravidão, o autor registra que a

dependência química leva a pessoa a perder o amor próprio, o respeito por si mesma

e também a se distanciar de tudo o que poderia lhe fazer bem, afirma que trata-se de

uma doença grave e incurável, mas que pode ser controlada. Como doença, segundo

ele, se trata de um transtorno, em que o portador desse distúrbio perde o controle no

uso da substância, e sua vida psíquica, emocional, espiritual, física vão deteriorando

gravemente. Considera uma doença química, pelo fato que o que provoca a

dependência é uma reação química no metabolismo do corpo; uma doença interna,

sendo a causa básica e única, o uso do produto, existindo fatores internos inerentes

ao organismo que atuam ao mesmo tempo direta e indiretamente que contribuem

para a instalação da doença, provocando uma predisposição física e emocional para

a dependência; é uma doença progressiva; uma doença crônica incurável; é uma

doença controlável; é uma doença que atinge toda família; é uma doença física e

Usa Drogas, 2004. 57 LARANJEIRA, Ronaldo. et al. (coord.). Usuários de substâncias psicoativas: abordagem, diagnóstico e tratamento. 2. ed. São Paulo: Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo/Associação Médica Brasileira, 2004. p. 5. 58 ÁVILA, Luis Carlos; ÁVILA, Maria Roseli Rossi. Noções gerais sobre drogas. Blumenau: Cruz

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psicológica; uma doença espiritual, a iniciativa de buscar refúgio ou prazer em

qualquer tipo de droga já caracteriza uma patologia grave, não só orgânica como

também em relação à própria existência humana59.

De acordo com Silveira60:

A Dependência é o impulso que leva a pessoa a usar uma droga de forma contínua (sempre) ou periódica (frequentemente) para obter prazer. Alguns indivíduos podem também fazer uso constante de uma droga para aliviar tensões, ansiedades, medos, sensações físicas desagradáveis, etc. O dependente caracteriza-se por não conseguir controlar o consumo de drogas, agindo de forma impulsiva e repetitiva61.

Para mais fácil compreensão, embasando-se em Ávila62,

ressalta-se as duas formas principais em que a Dependência se apresenta: a física e

a psicológica. A forma física consiste na necessidade sempre presente, a nível

fisiológico, o que torna impossível a suspensão brusca das drogas. Essa suspensão

acarretaria a chamada crise da "abstinência". A dependência física é o resultado da

adaptação do organismo, independente da vontade do indivíduo. A dependência

física e a tolerância podem manifestar-se isoladamente ou associadas, somando-se

à dependência psicológica. A suspensão da droga provoca múltiplas alterações

somáticas, causando a dramática situação do "delirium tremens". Isto significa que o

corpo não suporta a síndrome da abstinência entrando em estado de pânico. Sob os

efeitos físicos da droga, o organismo não tem um bom desenvolvimento.

Logo, na Dependência psicológica, o indivíduo sente um

impulso irrefreável, tem que fazer uso das drogas a fim de evitar o mal-estar. A

dependência psicológica indica a existência de alterações psíquicas que favorece a

aquisição do hábito. O hábito é um dos aspectos importantes a ser considerado na

toxicomania, pois a dependência psíquica e a tolerância significam que a dose

deverá ser ainda aumentada para se obter os efeitos desejados. A tolerância é o

Azul no Brasil. Apostila dirigida e limitada, 2005. 59 ÁVILA, Luis Carlos; ÁVILA, Maria Roseli Rossi. Noções gerais sobre drogas, 2005. 60 SILVEIRA, Dartiu Xavier da; SILVEIRA, Evelyn Doering Xavier da. Um guia para a família. 4. ed., Brasília: Presidência da República, Gabinete de Segurança Institucional, Secretaria Nacional Antidrogas, 2003. (Série Diálogo; Nº. 1). 61 SILVEIRA, Dartiu Xavier da; SILVEIRA, Evelyn Doering Xavier da. Um guia para a família, 2003. p. 14. 62 ÁVILA, Luis Carlos; ÁVILA, Maria Roseli Rossi. Noções gerais sobre drogas, 2005.

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fenômeno responsável pela necessidade sempre presente que o viciado sente em

aumentar o uso da droga. Em estado de dependência psíquica, o desejo de tomar

outra dose ou de se aplicar, transforma-se em necessidade, que se não satisfeita

leva o indivíduo a um profundo estado de angústia, (estado depressivo). Esse

fenômeno não deverá ser atribuído apenas às drogas que causam dependência

psicológica. O estado de angústia, por falta ou privação da droga é comum em quase

todos os dependentes e viciados63.

Entender e ver como uma doença vem amenizar para o

dependente o fato na esfera moral e social, embora para muitos seja

desconhecido ainda este fator doença. Reconhecer, como doença, aceitar

principalmente na família, seria estar iniciando o processo de resolver a temática

da dependência dentro do próprio lar.

Wilson Kraemer de Paula64 afirma que, atualmente, existe a

tendência de não se fazer distinção entre dependência física e dependência

psicológica, utiliza-se apenas o termo, Dependência Química.

Segundo a Classificação Internacional de Doenças e de

Problemas relacionados à Saúde (CID-10), a síndrome de dependência é a

presença de um grupamento de sintomas indicando que o indivíduo continua

utilizando uma substância apesar dos problemas relacionados ao seu uso.

Goodman e Gilman et. al.65 “a dependência de drogas pode

ser definida como uma síndrome em que o uso de determinada droga recebe

prioridade muito maior do que outros comportamentos que anteriormente tinham

maior valor”. Diz ser uma doença que atinge cerca de 10% da população mundial,

não é seletiva, e, portanto, não distingue, entre outros, raça, cor, credo, cultura,

condição sócio-econômica ou sexo.

Já para Milby66 qualquer substância que, quando consumida,

63 SILVEIRA, Dartiu Xavier da; SILVEIRA, Evelyn Doering Xavier da. Um guia para a família, 2003. 64 DE PAULA, Wilson Kraemer. Drogas e dependência química: noções elementares. Florianópolis: Papa Livro, 2001. 65 GOODMAN e GILMAN et. al. 1991, p. 344. In: LARANJEIRA, Ronaldo. et al. (coord.). Usuários de substâncias psicoativas: abordagem, diagnóstico e tratamento. 2. ed. São Paulo: Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo/Associação Médica Brasileira, 2003. 66 MILBY. In: LARANJEIRA, Ronaldo. et al. (coord.). Usuários de substâncias psicoativas: abordagem, diagnóstico e tratamento. 2. ed. São Paulo: Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo/Associação Médica Brasileira, 2003.

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modifica uma ou mais funções do corpo pode ser considerada como droga. Para

ele, alguns tipos de comidas, chás, café, bebidas de sabor cola contém

estimulantes leves que podem influenciar as funções do corpo, assim sendo pode

ser também consideradas como drogas, se, consumidas regularmente grandes

quantidades é possível tornar-se dependente delas, mas normalmente se

considera a dependência de drogas como algo muito grave, que tanto leva a

danos físicos como a alterações nos padrões normais de vida. Ele define a

dependência de drogas como um estado mental e, muitas vezes, físico, que

resulta da interação entre um organismo vivo e uma droga. Caracteriza-se por

comportamento que sempre inclui uma compulsão de tomar a droga para

experimentar seu efeito psíquico e, às vezes, evitar o desconforto provocado por

sua ausência. Uma pessoa pode ser dependente de mais de uma droga, afirma

ainda o autor, que a dependência múltipla é razoavelmente comum entre os

abusadores crônicos de drogas.

Segundo Contrin67, o sujeito que não consegue viver sem

substâncias psicoativas, apresenta um distúrbio chamado de síndrome de

dependência. Assim sendo, a Organização Mundial de Saúde, (OMS), com base

no Décimo Código Internacional de Doenças, CID 10, trata dessa síndrome como

um conjunto de fenômenos relacionados ao funcionamento do organismo de um

indivíduo, ao seu comportamento e ao seu estado mental, em que a droga

adquire uma importância muito maior do que quase todos os outros aspectos de

sua vida. A principal característica da síndrome de dependência é o desejo

frequentemente forte, algumas vezes incontrolável, de consumir alguma

substância psicoativa.

A Dependência é definida como:

Um conjunto de fenômenos comportamentais, cognitivos e fisiológicos que se desenvolvem após repetido consumo de uma substância psicoativa, tipicamente associado ao desejo poderoso de tomar a droga, à dificuldade de controlar o consumo, à utilização persistente apesar das suas conseqüências nefastas, a uma maior prioridade dada ao uso da droga em detrimento de outras atividades e obrigações, a um aumento da tolerância pela

67 CONTRIN. IN: SANTA CATARINA. Secretaria de Estado da Educação e do Desporto. Viver livre das Drogas: política de Educação Preventiva. Floriánopolis, 2002. p 84.

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droga e por vezes, a um estado de abstinência física. A síndrome de dependência pode dizer respeito a uma substância psicoativa específica (por exemplo, o fumo, o álcool ou o diazepam), a uma categoria de substâncias psicoativas (por exemplo, substâncias opiáceas) ou a um conjunto mais vasto de substâncias farmacologicamente diferentes68.

Para Ferrarini69, a Dependência Química é a fase final do

processo, é a instalação do vício, é a conexão, a ponte forte com a droga

escolhida. O consumo de uma determinada droga, ou de mais drogas, passa a se

constituir parte importante na vida do usuário e, qualquer tentativa para que ele se

separe das drogas, encontrará grande resistência, para ele é a fase indicativa de

que a pessoa não é capaz de controlar-se, sentindo forte desejo de repetir a dose.

Sente falta das drogas no momento em que deveria estar estudando ou

trabalhando. Continua usando drogas, mesmo sabendo que está afetando sua

saúde e seu estado psicológico, sua situação familiar e financeira.

Em síntese, segundo Marques e Ribeiro70, o conceito de

dependência química pode ser entendido como uma condição que varia ao longo de

um continuum de severidade, onde o ponto inicial é abstinência e o uso

experimental. Esse conceito de continuum indica, segundo Figlie71, que não há uma

fronteira clara entre uso, abuso e dependência. O uso pode ser definido como o

consumo de qualquer substância, podendo ser um consumo experimental,

esporádico ou episódico. Já o uso nocivo é um padrão de consumo que está

associado a algum tipo de prejuízo quer em termos biológicos, psicológicos ou

sociais e por fim, a dependência química que é o consumo de substâncias de uma

forma descontrolada e associada a muitos problemas para o usuário.

Considerada uma doença, a Dependência Química, de

acordo com Malbergier72 apresenta os seguintes sintomas:

68 BALLONE, G. J. Dependência Química e Transtornos da Personalidade. In: PsiqWeb Psiquiatria Geral, 2001. Disponível em: < http://sites.uol.com.br/gballone/psicossomatica/drogas4.html >. Acesso em: 20 mar. 2008. p.12. 69 FERRARINI, Edson. Vencedor Não Usa Drogas. São Paulo: Book, 2004, p.81. 70 MARQUES, A.C.P.R.; RIBEIRO, M. Usuário: abordagem geral. In: Laranjeira, R. et al. Usuários de substâncias psicoativas: abordagem, diagnósticos e tratamento. 2. ed. São Paulo: Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo/Associação Médica Brasileira, 2003. 71 FIGLIE, Neliana Buzi; BORDIN, Selma; LARANJEIRA, Ronaldo. Aconselhamento em dependência química. São Paulo: Roca, 2004. 72 MALBERGIER, André. Dependência Química. 2003. CENTRAD. Centro de Tratamento em

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�� Tolerância: necessidade de aumento da dose para se

obter o mesmo efeito.

�� Crises de abstinência: ansiedade, irritabilidade, insônia ou

tremor quando a dosagem é reduzida ou o consumo é

suspenso.

�� Ingestão em maiores quantidades ou por maior período do

que o desejado pelo indivíduo.

�� Desejo persistente ou tentativas fracassadas de diminuir

ou controlar o uso da substância.

�� Perda de boa parte do tempo com atividades para

obtenção e consumo da substância ou recuperação de

seus efeitos.

�� Negligência com relação a atividades sociais, ocupacionais

e recreativas em benefício da droga.

�� Persistência na utilização da substância, apesar de

problemas físicos e/ou psíquicos decorrentes do uso.

Ainda ressalta o autor (op. cit.) que a Dependência Química

é uma das doenças psiquiátricas mais freqüentes da atualidade.

De acordo com a OMS73, caso três ou mais das situações

abaixo descritas tenham ocorrido por algum tempo durante o último ano, serão

fortes os indícios de presença da dependência química:

�� Desejo acentuado ou compulsão para usar uma

substância psicoativa;

�� Dificuldade em controlar o consumo: início, término e

quantidade;

�� Presença da síndrome de abstinência ou uso da

substância para evitar os seus sintomas;

�� Tolerância, evidenciada pela necessidade de aumentar a

quantidade da droga para obter o mesmo efeito;

�� Interesse centrado na droga, em detrimento de todos os

Adicções, Álcool e Drogas. Disponível em: <http://www.centrad.com.br/index.php?option= com_content&task=view&id=3&Itemid=5>. Acesso em mar./2008. 73 OMS. Organização Mundial da Saúde, 2003, IN: FERRARI, Edson. Vencedor Não Usa Drogas, 2004.

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outros;

�� Persistência no uso, apesar de todos os prejuízos.

Outra característica dessa doença é que a família do

dependente químico adoece junto com ele. Portanto, é fundamental que ela

também receba tratamento especializado a fim de que possa melhorar as próprias

condições de vida ou mesmo colaborar para a recuperação do dependente.

Ao percorrer esse breve caminho para estudar o conceito de

Dependência Química, observa-se que a droga vem causar no indivíduo uma

reação química no organismo, vindo alterar seu estado de consciência e que ao

agir no cérebro humano pode levar a tornar-se um dependente químico.

Portanto, pode-se afirmar que a Dependência Química é a

dependência de qualquer substância psicoativa, ou seja, qualquer droga que

altere o comportamento e que possa causar dependência (álcool, maconha,

cocaína, crack, medicamentos para emagrecer à base de anfetaminas, calmantes

indutores de dependência ou faixa preta etc.). A dependência se caracteriza

então, pelo indivíduo sentir que a droga é tão necessária em sua vida quanto

alimento, água, repouso, segurança...

Em outras palavras, a Dependência Química é uma

síndrome caracterizada pela perda do controle do uso de determinada substância

psicoativa. Os agentes psicoativos atuam sobre o sistema nervoso central,

provocando sintomas psíquicos e estimulando o consumo repetido dessa

substância. Alguns exemplos são o álcool, as drogas ilícitas e a nicotina.

2.2 CONCEITUANDO SUBSTÂNCIAS QUE CAUSAM DEPENDÊNCIA QUÍMICA

As substâncias psicoativas ou drogas, quanto a sua origem,

podem ser classificadas como naturais, semi-sintéticas e sintéticas. As drogas

naturais são plantas cuja matéria prima é usada diretamente como droga ou

extraída e purificada. As semi-sintéticas são resultados de reações químicas em

laboratórios a partir de drogas naturais. E as sintéticas são produzidas

unicamente por manipulações químicas em laboratórios74.

74 SENAD. Atualização de Conhecimento sobre Redução da Demanda de Drogas. [s.l.]: SENAD, 2002.

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No que se refere à classificação segundo os aspectos legais,

as drogas podem ser lícitas ou ilícitas. Uma droga é lícita quando não é crime

produzir, usar, nem comercializar e ilícita quando a produção, a comercialização e

o consumo são considerados crimes, sendo proibidas por leis específicas75.

No Brasil existem os dois tipos de drogas, as lícitas e as

ilícitas. O álcool e a nicotina são considerados as drogas lícitas mais

popularmente conhecidas e usadas.

Carlos Ávila e Rossi Ávila76, afirmam após pesquisas

realizadas que existem mais de cem tipos de drogas legais e ilegais que circulam

e ameaçam a sociedade humana, mostram seus efeitos e conseqüências. Entre

elas está o absinto, os anabolizantes, os alucinógenos, os aminoácidos, os

analgésicos narcóticos, as anfetaminas, os anorexigênicos, os antiácidos, os

ansioliticos, os antibióticos, os anticolinérgicos, os antideprressivos, os

antioxidantes, os barbitúricos, os benzedrinas, os benzoadizepínicos, os

aperitivos amargos, o artane, as bebidas energéticas, a cafeína, os corticóides, a

cola de sapateiro, os diuréticos, a endorfina, a fenilciclidina, as fórmulas de

emagrecimento, as gotas nasais, o guaraná em pó, os hipnóticos, os hormônios

femininos, os inalantes, o lança-perfume, os laxantes, o lexotan, o metanol, a

morfina, os narcóticos, a noz-moscada, o prozac, os psicotrópicos, os sedativos,

os solventes, os soníferos, os suplementos vitamínicos, os tranqüilizantes, os

voláteis, os xaropes, a zabumba, entre outras.

Assim, embasando-se nestes autores (op. cit), caracterizam-

se algumas drogas a seguir.

2.2.1 O álcool

O álcool etílico, derivado da cana de açúcar, cereais ou

frutas, através de um processo de fermentação ou destilação é a substância

usada pelo alcoolista, segundo os pesquisadores . É conhecida popularmente por

birita, mé, mel, pinga, cerva. O uso excessivo pode provocar náuseas, vômitos,

tremores, suor abundante, dor de cabeça, tontura, liberação da agressividade,

75 SENAD. Atualização de Conhecimento sobre Redução da Demanda de Drogas, 2002. 76 ÁVILA, Luís Carlos; ÁVILA, Maria R. Rossi. ABC das Drogas, 2005.

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diminuição da atenção, da capacidade de concentração, bem como dos reflexos,

o que aumenta os riscos de acidentes77.

Para Kraemer de Paula78 o álcool etílico é um líquido volátil,

sem cor, e com odor e sabor característicos, produzido pela fermentação do caldo

de cana, de cereais ou raízes. Foi descoberto pelo homem quando este ingeriu

produtos naturais fermentados. Afirma que as primeiras bebidas alcoólicas

produzidas intencionalmente pelo homem foram a cerveja e o vinho. Na Idade

Média, segundo ele, ocorreu a disseminação do processo de destilação e as

bebidas alcoólicas começaram a ser utilizadas na forma destilada.

O álcool é a droga mais consumida no Brasil, por diversos

fatores: por ser um derivado da fermentação da cana de açúcar e facilmente

obtido em qualquer região do país; por ser um produto de baixo custo; por ter a

capacidade peculiar de fornecer energia (sete calorias por grama); por produzir

uma ação euforizante. O álcool produz dependência. O alcoolista, termo usado

para definir o dependente de álcool, desenvolve a tolerância, ou seja, a cada dia

ele necessita de uma dose maior para ter o mesmo efeito. Com o passar do

tempo e agravamento da doença, o dependente de álcool chega a um ponto que

precisa de uma menor quantidade da substância para ter o mesmo efeito (efeito

excitatório). Uma vez constada a dependência, a ausência do álcool pode

desencadear a síndrome de abstinência79.

Ferrarini80 considera que, o alcoolismo é uma doença, sem

causa específica, cientificamente conhecida. O fato é que, cerca de 10% dos

bebedores, segundo ele, têm uma relação com o álcool diferente dos 90%

restantes. Estes 10% são chamados alcoólatras que tem compulsão para beber.

Ingerir a primeira dose é despertar aquele leão adormecido e sentir o impulso

incontrolável de não parar de beber, a esses tipos de dependente, ele afirma que

devem evitar o primeiro gole. Para o autor a definição de alcoólatra é a seguinte:

Alcoólatra é aquele que não consegue evitar o primeiro gole, não pára no

segundo e não lembra do último. É aquele que perde o controle diante da garrafa.

77 ÁVILA, Luís Carlos; ÁVILA, Maria R. Rossi. ABC das Drogas, 2005.Ávila 78 DE PAULA, Wilson Kraemer. Drogas e dependência química: noções elementares. 2001. 79 DE PAULA, Wilson Kraemer. Drogas e dependência química: noções elementares, 2001. 80 FERRARINI, Edson. Vencedor Não Usa Drogas, 2004.

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A Organização Mundial da Saúde (OMS)81 considera

Alcoólatra, o bebedor excessivo, cuja dependência ao álcool chegou ao ponto de

lhe criar transtornos em sua saúde física ou mental; nas relações interpessoais e

na sua função social e econômica e que, por isso, necessita de tratamento.

Segundo a Obra de Neliana Buzi Figlie, Selma Bordin e

Ronaldo Laranjeiras82, o uso do álcool é detectado desde os tempos pré-bíblicos,

mas somente na virada do século XVIII para o século XIX, após a Revolução

Industrial, é que aparece, na literatura, o conceito do beber nocivo como uma

condição clínica. Da produção artesanal passou-se a industrialização e

consequentemente a produção em grande escala, diminuindo seu custo, como

também aumentando as concentrações alcoólicas. Todos esses fatores

permitiram que um número maior de pessoas passasse a consumir álcool com

freqüência. Foi a partir daí que alguns médicos começaram a observar uma série

de complicações físicas e mentais, decorrentes desse consumo excessivo.

O uso do álcool na cultura dos tempos modernos tende a ser

reforçado e associado ao prazer, à virilidade e ao sucesso. A primeira experiência

com essa substância costuma ocorrer na adolescência e seu consumo tende a

aumentar entre os 18 e os 25 anos. A procura pelo tratamento ocorre, geralmente,

a partir dos 30 anos. Quando usado em baixas doses, dependendo do ambiente e

do estado psicológico do usuário, o álcool pode diminuir a ansiedade, causar uma

sensação de bem estar e desinibição. Sabe-se que mesmo baixas doses de

álcool afetam e velocidade e a coordenação de respostas motoras, tornando-se a

principal causa de acidentes automobilísticos graves.

Muitas são as alterações comportamentais decorrentes do

uso abusivo de álcool. Dentre elas destaca-se a agressividade, prejuízo de

julgamento, diminuição da atenção, irritabilidade, euforia, depressão, labilidade

emocional, etc. Fisicamente, segundo Luckmann; Castel et al83, observa-se hálito

alcoólico, fala pastosa, ataxia, hiperemia conjuntival, nistagmo e rush facial. Pode

81 OMS. Organização Mundial da Saúde, 2003, (apud FERRARI, Edson. Vencedor Não Usa Drogas, 2004. 82 LARANJEIRA, Ronaldo. et al. (coord.). Usuários de substâncias psicoativas: abordagem, diagnóstico e tratamento, 2004. p.5. 83 LUCKMANN; CASTEL et. al., 1995. In: LARANJEIRA, Ronaldo. et al. (coord.). Usuários de substâncias psicoativas: abordagem, diagnóstico e tratamento. 2. ed. São Paulo: Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo/Associação Médica Brasileira, 2003.

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ocorrer amnésia posterior, em relação aos eventos ocorridos durante a

intoxicação. O prejuízo do desempenho motor e da capacidade de julgamento são

a causa de inúmeros acidentes automobilísticos, quedas, e até mesmo mortes,

pela ingestão de grandes quantidades de álcool (estimada em níveis acima de

400 a 700 mg/dl). O alcoolismo é responsável por uma redução importante da

capacidade laborativa e de relacionamento social, o que se manifesta por queda

da produtividade, perda do emprego, conflitos familiares, isolamento e auto

negligência.

Na síndrome de abstinência aparecem sintomas como:

tremores, náuseas e/ou vômitos, fraqueza, hiperatividade autonômica, ansiedade,

humor depressivo, irritabilidade, alucinações transitórias, cefaléia e insônia.

Podem ocorrer convulsões tônico-clônicas generalizadas. O delirium tremens é

uma forma grave de abstinência do álcool. É caracterizado pela presença de

delírios, tremores e hiperatividade autonômica.

2.2.2 A nicotina

A Nicotina é considerada droga lícita no Brasil. Kraemer de

Paula registra que ela foi primeiramente usada pelos nativos norte-americanos,

através do fumo, mastigação ou ungüentos. A ingestão do tabaco foi introduzida

no Velho Mundo, após as explorações de Colombo por volta de 1490,

espalhando-se em seguida para a Europa, África e Ásia. Apesar de ser

classificada como um psicoestimulante suave causa dependência bastante

intensa em certos fumantes inveterados, dificultando o abandono do hábito. Com

a interrupção do consumo o dependente apresenta um quadro de grande

nervosismo, sensação de desconforto, intenso desejo de fumar, ansiedade,

depressão, inquietude, queda da pressão arterial e da freqüência cardíaca,

perturbações do sono84.

Segundo Lehmkuhl85, na metade do século XVI, o hábito de

fumar cigarro já tomava conta da maior parte do mundo. O cigarro é o maior

84 DE PAULA, Wilson Kraemer. Drogas e Dependência Química: Noções Elementares, 2001. 85 LEHMKUHL, Maria Aparecida. Viver Livres das Drogas. Secretaria de Estado da Educação e do Desporto. Viver livre das Drogas: política de Educação Preventiva. Floriánopolis, 2002. p 84-85.

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causador de problemas de saúde, principalmente nos pulmões e no coração.

Quando fumado produz uma mistura de ar quente e gases, sendo um grande

poluidor atmosférico, por possuir cerca de 4.200 produtos diferentes. Os principais

são: a nicotina, o alcatrão, o monóxido de carbono, o benzopireno e a amônia. A

nicotina é uma das mais potentes substâncias que produzem a dependência.

Para Roeder86, a nicotina é uma substância estimulante do

sistema nervoso, encontrada nas folhas a planta nicotina tabacum, que é

conhecida popularmente como ‘tabaco’, ‘fumo’ ou ‘pitura’. Com as folhas desta

planta prepara-se o tabaco, fumado normalmente através de cigarros-de-palha,

cigarros de papel, cachimbos ou charutos.

A nicotina provoca contração das artérias, aumenta a

pressão arterial e o ritmo das pulsações do coração, além de favorecer o

aparecimento de coágulos que obstruem os vasos sanguíneos. Essa substância

desenvolve no usuário uma certa dependência física, e uma considerável

dependência psíquica. Cerca de 1,2 bilhão de pessoas, ou seja, um terço da

população adulta mundial, é dependente de tabaco. Por causa do tabaco, morrem

3,5 milhões de pessoas por ano ou sete pessoas por minuto. A mortalidade por

tabagismo é maior que a provocada por AIDS, cocaína, heroína, álcool e

acidentes de trânsito somados87.

Passa-se a mencionar alguns tipos de drogas ilícitas,

algumas comumente usadas no Brasil, atraindo crianças, jovens e adultos nas

mais variadas classes sociais.

2.2.3 A maconha

A maconha é classificada como uma droga natural.

Kraemer de Paula88 registra em sua obra, que a maconha

segundo estatísticas epidemiológicas é a droga ilícita e ilegal mais consumida no

Brasil. Gera dependência e o uso constante pode ocasionar: a motivação, que é a

perda do interesse por quase tudo na vida, além da alteração do nível de

86 ROEDER, Maika Arno. Atividade Física, Saúde Mental e Qualidade de Vida. Rio de Janeiro: Shape, 2003. 87 OMS. Organização Mundial da Saúde, 1994 (apud FERRARI, Edson. Vencedor Não Usa Drogas, 2004. (OMS, 1994).

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testosterona circulante (diminuição no número de espermatozóide), prejuízo na

memória e consequentemente interferência na capacidade de aprendizagem,

diminuição da resistência à infecções, alterações do pensamento e sentimentos

de estranheza. Em doses maiores pode provocar alucinações, pode gerar muita

ansiedade e pânico e despersonalização.

Segundo Maria Aparecida Lehmkuhl89, a maconha na

pessoa do dependente age no Sistema Nervoso Central e este apresenta a

diminuição da percepção espaço-tempo, cefaléia, diminuição da memória,

instabilidade mental representada por apatia, angústia, depressão, dificuldade de

concentração, diminuição da capacidade de aprender e de raciocinar, piora nos

quadros de esquizofrenia existentes, aceleração dos processo psicológicos como

pânico ou paranóia e dificuldade de manter pensamento lógico, podendo ocorrer

atrofia cerebral. Atinge ainda outros órgãos como: os olhos, ouvidos, pulmões,

coração, fígado, intestino, boca, hormônios, motrocidade e outros efeitos ainda

que registra como: hipoglicemia, caracterizada por fome intensa, vontade de

comer doce e aumento da sensibilidade gustativa, micção anormalmente

freqüente, náuseas, vômitos e também a síndrome amotivacional caracterizada

por um desestímulo para alcançar os objetivos como estudar, trabalhar e praticar

esportes.

O SENAD90 menciona que o dependente de maconha, a

consome em forma de cigarro, chamado também como baseado, fino, beck, entre

outros. Também é usada em cachimbo, outros ainda misturam segundo ele, a

maconha com a comida ou a utilizam em forma de chá. O dependente sobre o

efeito da maconha apresenta certos sintomas, como: tontura e alguma dificuldade

para caminhar, parece estar rindo exageradamente ou sem nenhuma razão,

apresenta olhos vermelhos e irritados, mostra dificuldade para lembrar como

coisas aconteceram. Afirma ainda que nem todas as pessoas que fumam

maconha podem tornar-se dependentes, considera-se o indivíduo dependente da

substância, quando ele sente que precisa da droga para se sentir normal. Alguns

consumidores crônicos, segundo ele, evidenciaram sua dependência ao

88 DE PAULA, Wilson Kraemer. Drogas e Dependência Química: Noções Elementares, 2001. 89 LEHMKUHL, Maria Aparecida. Viver Livres das Drogas. Secretaria de Estado da Educação e do Desporto. Viver livre das Drogas: política de Educação Preventiva, 2002. 90 SENAD. Atualização de Conhecimento sobre Redução da Demanda de Drogas, 2002.

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apresentar sintomas de abstinência ao deixar de usá-la. Em um estudo, os

sujeitos apresentaram ansiedade, perda de apetite, dificuldade para dormir, perda

de peso e mãos trêmulas.

Para Ávila91, a pessoa dependente de maconha, marijuana,

haxixe, apresenta alguns sintomas e sinais de conduta como: tagarelice,

excitabilidade, risadas ou depressão e sonolência. Aumento de apetite, ingestão

principalmente de doces, olhos vermelhos, congestos, alucinações, distúrbios na

percepção do tempo e do espaço e ainda alguns elementos acessórios: odor de

relva queimada no local, presença de vegetal cinza esverdeado triturado com

pequenas sementes lisas, restos de cigarros feitos à mão, dedos manchados e

odor nas roupas.

O usuário manipula a maconha para ser consumida. O

dependente adquire a erva acondicionada em pacotinho, feito de papel de jornal

ou de revista, de preferência papel couchê ou acetinado, para evitar mofo. O

pacotinho é aberto e a erva é debulhada, o usuário coloca a erva na palma de

uma das mãos e com os dedos polegar e indicador da outra vai debulhando-a até

ficar bem fina como uma poeira. Depois coloca a erva num pedaço de papel de

seda e o enrola, ficando um cigarrinho comprido e fino (fininho), com as

extremidades fechadas em ponta. O usuário fuma a maconha geralmente em

companhia de alguém ou num pequeno grupo.

O uso e abuso da maconha embora proibida no Brasil, é

visto como algo normal para muitos no meio social, prova disso vem a ser os

movimentos até políticos para sua legalização.

2.2.4 Cocaína

Outra substância considerada extremamente nociva para o

ser humano é a cocaína.

Segundo Bucher92, ela foi extraída das folhas da coca

meados do século XVIII; onde o químico alemão Niemann conseguiu isolar, entre

os seus numerosos alcalóides, o alcalóide principal (80%) e o chamou de

91 ÁVILA, Luís Carlos; ÁVILA, Maria R. Rossi. ABC das Drogas, 2005. 92 BUCHER, Richard. Drogas e Drogadição no Brasil. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992. cap. 6.

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“cocaína”. Em 1898 foi descoberta a exata fórmula de sua estrutura química; em

1902, Willstätter (posteriormente prêmio Nobel) produziu cocaína sinteticamente

em laboratório. Sob a forma de cloridrato da cocaína, ela forma um pó branco

cristalino (“neve”), desde então abundantemente fabricado, a começar por firmas

farmacêuticas. Considerado inicialmente como um novo “remédio milagroso”,

médicos americanos começaram a prescrevê-la contra muitas doenças de difícil

tratamento, como catarro crônico, distúrbios digestivos como dispepsias ou

mesmo úlceras, afecções respiratórias indo de asma à tuberculose, malária, sífilis,

consumição e caquexia generalizada, ou ainda em casos de anorexia, de anemia

grave e de febres prolongadas. Freqüentemente ela foi aplicada no tratamento

das dependências do ópio e da morfina, bem como do álcool, sendo, em

particular, considerada como um “antídoto radical da morfina”.

Prosseguindo com Buscher93, após alguns anos, percebeu-

se que a “droga milagrosa” tinha uma série de inconvenientes – a começar pelo

seu potencial de criar dependência, a célebre “cocainomania” que, em muitos

casos, vinha a ser substituir à “morfinomania” ou mesmo a se combinar com ela,

ocorreram muitas críticas levantadas contra a droga e que se estigmatizavam

como “o terceiro flagelo da humanidade”.

Além das aplicações terapêuticas, a cocaína penetrou na

cultura acidental desde o século XIX, deixando rastros na literatura, na arte e em

diversas condutas de moda.

Entre as múltiplas aplicações não (ou semi-) terapêuticas da

cocaína, cabe citar o famoso “Vinho Mariani” e outros produtos da época94. Trata-

se de um “fortificante”, supostamente apto a curar numerosas doenças. Lançado

em 1863 pelo astuto negociante corso Mariani, a bebida conheceu um

extraordinário sucesso social, entrando nos costumes da burguesia da “belle

époque”, como testemunham numerosos cartazes e obras literárias. Conhecida

como a “Coca dos Incas”, Mariani a comercializou sucessivamente sob forma de

vinho, de elixir, de pasta, goma e pastilha, e finalmente sob forma de chá, cuja

p. 114-125 93 BUCHER, Richard. Drogas e Drogadição no Brasil, 1992. 94 Ver HELFAND (1988).

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concentração de alcalóides superava oito vezes aquela do vinho original95.

De todos estes produtos, cujo potencial tônico foi

devidamente explorado pelas respectivas propagandas, um merece destaque

particular, pois existe até hoje: a Coca-Cola. O astucioso nome o indica

suficientemente: a bebida consiste em uma combinação de elementos

estimulantes da planta da coca e da cola; a fruta desta última, uma noz de origem

africana, contém cafeína, estimulante menos tóxico que a cocaína. Foi

Pemberton, um químico de Atlanta nos Estados Unidos, que lançou o produto em

1885, sem esconder a origem de sua idéia: “o vinho francês da coca, ideal para

os nervos, tônico e estimulante”. Em l988, Candler compra os direitos do produto,

retira todas as pretensas aplicações terapêuticas e o apresenta como um “simples

refrigerante euforizante”. Este até 1903 continha realmente cocaína; desde então,

obedecendo a uma fiscalização mais rigorosa, o extrato de coca utilizado para a

preparação da bebida é expurgado dos seus alcalóides96.

Desde os trabalhos de uma equipe de Harvard (DUKE & al.,

1975) o valor alimentar da coca não traz mais dúvida. Segundo estes

pesquisadores, as folhas secas da planta contêm mais calorias do que a maioria

dos alimentos sul-americanos, como milho, mandioca e feijão; elas são ricas em

proteínas, glicídios, cálcio, fósforo e ferro, e contêm numerosos microelementos e

vitaminas, indispensáveis para a alimentação humana97.

Para o autor entre todas as drogas hoje em circulação, seja

lícita, seja clandestina, a cocaína ocupa um lugar de destaque, tanto que já foi

chamada de “droga dos anos 80”, ou ainda, apresentando-se como augúrio

fatídico, dos anos 90. A sua periculosidade é conhecida, mas em nada afeta a sua

fama.

Para Buscher98, a cocaína é a droga da moda, mas traz suas

conseqüências, como a de um agente mistificador, com um grande potencial de

sedução e mobilização, se não das massas populares, ao menos de

determinadas camadas de elite. Assim, ela é apresentada como a “droga da jet-

society”, como o “caviar” ou o “champagne” das drogas, e não faltam apelidos

95 BUCHER, Richard. Drogas e Drogadição no Brasil. 1992. p. 114. 96 BUCHER, Richard. Drogas e Drogadição no Brasil. 1992. p. 116. 97 BUCHER, Richard. Drogas e Drogadição no Brasil. 1992. 98 BUCHER, Richard. Drogas e Drogadição no Brasil, 1992.

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suntuosos (“pó da felicidade”, “pó mágico”, “brilho”) ou mesmo carinhosos (“dama

branca”, “Lady”, “quentinha”) para enaltecer as suas qualidades estimulantes e

euforizantes.

Segundo Costa Leite99, nenhum dependente de cocaína, ao

iniciar o consumo, tinha a intenção de se tornar dependente da substância. No

entanto, não existe um limite nítido entre o início do consumo, o uso continuado e

o desenvolvimento dos transtornos decorrentes do uso da droga. A

experimentação da cocaína se desenvolve sempre em um meio (contexto) social

definido, promovendo efeitos estimulantes e euforia pronunciada. Nenhuma das

conseqüências negativas do consumo está presente (nos primeiros meses de

consumo ocasional), parecendo ao usuário iniciante que os avisos e informações

que tinha sobre a droga antes da primeira experiência foram exagerados ou

simples “propaganda enganosa”.

Assim, a cocaína é um estimulante poderoso que deixa o

sistema nervoso central em estado de alerta, comparável com um estado de alta-

tensão – em oposição ao stress da vida cotidiana, comparável a um estado de

baixa-tensão, desarmando o indivíduo e inibindo uma série de iniciativas das

quais dependem o seu desempenho, o seu sucesso, a sua carreira.

Pode-se a respeito, citar uma pesquisa de Siegel100, sobre

os efeitos da cocaína a médio prazo. No início, os efeitos positivos mencionados

pelos consumidores investigados prevalecem, como euforia, estimulação, redução

da fadiga e do apetite, excitação sexual, aumento das capacidades mentais e da

sociabilidade; com o tempo, porém, o sentimento generalizado de aumento da

energia vital e da sensibilidade, bem como do otimismo, diminuem e cedem cada

vez mais à agitação e irritabilidade, à ansiedade, hiperexcitabilidade, insônia,

lassidão e modificações nas capacidades de atenção, além de problemas

diretamente orgânicos como a ulceração das mucosas nasais. Como se

desenvolve, mesmo entre usuários recreativos da cocaína, uma certa tolerância

ao produto101.

99 LEITE, Marcos da Costa. Conversando sobre cocaína e crack. SENAD-Secret. Nacional Antidroga. 4. ed. Brasília: DF., 2003. 100 SIEGEL, 1977. In: LARANJEIRA, Ronaldo. et al. (coord.). Usuários de substâncias psicoativas: abordagem, diagnóstico e tratamento. 2. ed. São Paulo: Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo/Associação Médica Brasileira, 2003. 101 Ver ASHLEY (1975).

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Segundo Ferrarini102, a cocaína é extraída das folhas da

planta Erythroxylon coca, conhecida como “coca” e na amazônia os índios

brasileiros que a cultivam lhe dão o nome de epadú. É uma planta que nasce na

América do Sul, devido a vários fatores, entre eles: condição climática e acidez do

solo. Basicamente é no Peru e na Bolívia que o cultivo da folha de coca é intenso,

mas o cultivo clandestino invadiu a Colômbia, o Equador, a Venezuela e o Brasil,

na Amazônia.

Conforme Ferrarini103, a cocaína, nas primeiras doses, não

costuma causar situações preocupantes ou danosas. O usuário vai sentir-se

“importante”, vai achar que ganhou mais “status”, geralmente, na roda de amigos. Vai

achar o “barato” legal, imaginando até, que a partir de agora, é o centro das

atenções. Está mais confiante e eufórico, vai se achar “o último copo d’água do

deserto”. É com o passar dos dias, no uso constante, que as coisas se complicam.

2.2.5 Inalantes

Cremer de Paula104 menciona os inalantes, também

denominados solventes, como substâncias orgânicas lipossolúveis que

atravessam a barreira metoencefálica, com facilidade, produzindo depressão

generalizada no Sistema Nervoso Central e sinais de confusão, através de

distúrbios no funcionamento fisiológico intraneuronal.

Os inalantes são componentes de cola – de sapateiro, (de

aeromodelismo e outras); de material de limpeza – removedores e tira-manchas;

de tintas, vernizes e esmaltes – diluentes e tinners; de produtos cosméticos ou de

higiene; de aerossóis ou de produtos básicos – clorofórmio, acetona e gasolina105.

2.2.6 Crack

Sobre o crack registra que é através de alterações na

estrutura da cocaína (retirada de água do cloridrato), que se obtém uma forma

102 FERRARINI, Edson. Vencedor não usa drogas, 2004. p. 92. 103 FERRARINI, Edson. Vencedor não usa drogas, 2004, p.93. 104 DE PAULA, Wilson Kraemer. Drogas e Dependência Química: Noções Elementares, 2001. 105 BRAUN, Ivan Mário. In: Drogas. Revista Época, ed. 518 de 21/04/2008, p. 88-89.

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cristalina de cocaína. Conhecida como “crack” ou “rock” (pedra). O termo crack

deriva do som destas pedras quando queimam.

O crack é uma droga de ação mais rápida e mais poderosa

que a cocaína comum. Provoca dependência em menos de um mês e pode matar

em menos de um ano.

A Revista Época106, registra que o crack, antes considerado

uma droga “de classe baixa”, ganhou muitos adeptos na classe média alta. No

Brasil, cresce o número de dependentes químicos. Os dados mais confiáveis são

os das Nações Unidas, que apontam um aumento de 10% no consumo de todo

tipo de droga. Uma recente pesquisa da ONU afirma que o consumo da cocaína

no Brasil aumentou 30% entre 2002 e 2007. “Nunca se consumiu tanta cocaína

no Brasil. O problema é preocupante porque o consumo não pára de crescer, na

contramão do que ocorre no mundo”, afirmou Giovanni Quaglia, diretor do

Escritório das Nações Unidas contra Drogas e Crimes. Na Espanha, considerada

o maior consumidor per capita do mundo, a média é 3 usuários para 100 pessoas.

No Brasil, esse número chega a 2,6 para cada 100. Em 2001, era apenas um

consumidor para 100.

Conforme Braun107, a dependência química não tem cura e

não existe remédio ou vacina que a elimine. Os médicos costumam comparar o

dependente com um diabético que, uma vez recuperado, nunca mais pode provar

açúcar. A internação pode ser um caminho. Segundo dados da Organização

Mundial de Saúde, apenas 30 de 100 dependentes conseguem chegar a

recuperação. “Ao contrário do abuso, o conceito de dependência está fortemente

ligado à idéia de perda de controle sobre o uso”, afirma o psiquiatra Ivan Mário

Braun, que trabalha há décadas com esse assunto e escreveu o livro Drogas –

Perguntas e Respostas.

2.2.7 Ecstasy

Para Brau108, o ecstasy é uma droga relativamente nova e,

diferentemente de drogas como a cocaína e a maconha, foi sintetizada pela

106 QUAGLIA, Giovanni. CRACK. Revista Época, ed. 518 de 21/04/2008, p. 88-89. 107 BRAUN, Ivan Mário. In: Drogas. Revista Época, 2008, p. 88-89.

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primeira vez em 1912, na Alemanha, tendo sido utilizada como coadjuvante da

psicoterapia e como um inibidor de apetite.

Generalidades: O princípio ativo do ecstasy, a

Metilenodioxidometa-anfetamina (MDMA), é o mesmo do LSD. É consumido por

via oral, através da ingestão de um comprimido. Os usuários normalmente

consomem o ecstasy com bebidas alcoólicas, o que intensifica ainda mais o efeito

e agrava os riscos.

Curiosidade: Por aumentar a concentração de serotonina e, por

isto, provocar impulsos amorosos, o ecstasy é conhecido como a “Pílula do Amor”109.

2.2.8 Ópio

Ferrarini110 registra que o ópio é extraído da planta “Papaver

Somniferum”, é a papoula do oriente. O ópio é um suco resinoso extraído da

cápsula da papoula, onde se faz uma incisão com a planta ainda verde. Quando o

suco seca, se transforma no pó de ópio, onde existem substâncias de largo uso

na medicina, como a morfina e também a heroína (que significa potente,

energético).

2.2.9 Heroína

Segundo Ferrarini111 a heroína é um opiáceo, obtido através

da síntese da morfina. Seu efeito é mais forte que o da morfina, daí seu nome

heroína, do alemão “heroich”, (potente, energético). Vai determinar uma forte

dependência física e psicológica, isto é, com a falta, o corpo vai ter reações

dolorosas. A droga é totalmente clandestina e não tem nenhuma aplicação

médica, alcançando um preço bastante alto no comércio ilegal.

108 BRAUN, Ivan Mário. In: Drogas. Revista Época, 2008, p. 89. 109 BRAUN, Ivan Mário. In: Drogas. Revista Época, 2008, p. 89. 110 FERRARINI, Edson. Vencedor não usa drogas. 2004, p.93. 111 FERRARINI, Edson. Vencedor não usa drogas. 2004, p.95.

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2.2.10 LSD

Quanto ao LSD, menciona ainda Ferrarini112 que “Lysergic

Saure Diethlamide” é um alucinógeno encontrado sob a forma de comprimidos

(micropontos) ou em papel, que são colocados sob a língua ou injetados e vão

provocar efeitos muito potentes.

É um alucinógeno fabricado a partir de um fungo (uma

praga), que nasce no esporão do centeio e, por um processo químico, surge o

LSD 25. Toda a sua produção é clandestina. O número 25 aparece na

nomenclatura por ter sido isolado da Suíça pelo Dr. Alberto Hoffman no dia 02 de

maio de 1938113.

Complementa esclarecendo que sua potencialidade é

medida em micropontos. Não tem cheiro, cor ou gosto, portanto, se colocado num

copo de água, a pessoa que for tomá-la dificilmente perceberá. As alucinações

variam de pessoa para pessoa. Geralmente, o usuário de LSD 25 já experimentou

outras drogas e quer sensações mais fortes114.

“Qualquer doença psíquica consiste acima de tudo na perda

da liberdade de escolha”. Portanto, a dependência não é uma opção. É uma

condição patológica (uma doença) que tira a liberdade do indivíduo de optar!115

Perceber a presença da doença e se responsabilizar pelo

tratamento é o primeiro passo em direção à recuperação. É preciso escolher a

mudança e buscar ajuda para efetivá-la. Não resolve olhar o passado para achar

um culpado. Deve-se pensar no futuro! Não existem culpados pela situação. Mas

pode haver pessoas comprometidas com o processo de cura (o próprio

dependente, sua família, os amigos, os profissionais da saúde). Afinal, se temos

que estar condenados a alguma coisa nesse mundo, que seja apenas à

liberdade!116

112 FERRARINI, Edson. Vencedor não usa drogas. 2004, p.96. 113 BRAUN, Ivan Mário. In: Drogas. Revista Época, 2008, p. 89. 114 BRAUN, Ivan Mário. In: Drogas. Revista Época, 2008, p. 89. 115 Site Álcool e Drogas sem Distorção. Programa Álcool e Drogas (PAD) do Hospital Israelita Albert Einstein. Disponível em: <www.einstein.br/alcooledrogas>. Acesso em: 02/04/2008. 116 Site Álcool e Drogas sem Distorção. Programa Álcool e Drogas (PAD) do Hospital Israelita Albert Einstein. Disponível em: <www.einstein.br/alcooledrogas>. Acesso em: 02/04/2008.

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2.3 EFEITOS FÍSICOS E PSÍQUICOS DA DEPENDÊNCIA: A REDUÇÃO DE

DANOS

Redução de danos é uma política social que tem como

objetivo prioritário minorar os efeitos negativos decorrentes do uso de drogas.

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS)117,

cerca de 10% das populações dos centros urbanos de todo o mundo consomem

abusivamente substâncias psicoativas independentemente de idade, sexo, nível

de instrução e poder aquisitivo. Como se tem conhecimento é grande as

complicações sociais, resultantes deste abuso, visto que abala o funcionamento

familiar, sendo que gera a violência doméstica e o abuso físico e sexual. Causam

problemas no trabalho, acometendo desde a presidência até o chão de fábrica.

Problemas com a habitação como, por exemplo, má manutenção da casa;

problemas com vizinhos; falta de pagamento com aluguéis, luz e mudanças

freqüentes, etc. Dificuldades financeiras; crimes; dirigir, pois, o maior número de

acidentes de trânsito ocorre por pessoas alcoolizadas e/ou drogadas, bem como a

vitimização, pois, a pessoa drogada torna-se alvo fácil de ladrões e criminosos

violentos.

De acordo com O’Hare118, a redução de danos decorrentes

do uso de drogas tem origem no Relatório Rolleston, de 1926, que concluía que a

manutenção de usuários por meio do emprego de opiáceos é o tratamento mais

adequado para determinados usuários. Pacientes aditos a determinadas drogas

opiáceas poderiam receber drogas, sob prescrição do seu clínico geral, de modo

a permitir-lhes levar vida mais estável e mais útil à sociedade. É possível pensar

que seria mais adequado que essas pessoas interrompessem, inteiramente, seu

consumo, mas é necessário reconhecer também que esse consumo é algo

imbricado às suas características de vida, e que essas pessoas podem ser

ajudadas para evitar as conseqüências mais danosas desse consumo.

Neste contexto, a redução de danos, pode ser caracterizada

117 ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE E ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. Relatório Sobre a Saúde no Mundo, Saúde Mental: Nova Concepção. Nova Esperança: Gráfica Brasil, 2001. 118 PAT O'HARE. In: MESQUITA, Fábio; BASTOS, Francisco Inácio. (org.). Drogas e AIDS Estratégias de Redução de Danos. São Paulo: Hucitec, 1994.

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como uma estratégia, porque se entende que, enquanto tal, e para ter a eficácia

que pretende, ela deve ser operada em internações, promovendo o aumento de

superfície de contato, criando pontos de referência, viabilizando o acesso e o

acolhimento, e descrevendo a clientela e qualificando a demanda, multiplicando

as possibilidades de enfrentamento ao problema da dependência no uso de

drogas.

Ou seja, a redução de danos é

[...] um conjunto de estratégias que procuram minimizar as conseqüências adversas do consumo de drogas psicoativas sobre a saúde, a sociedade e a economia. Neste sentido, objetivando as seguintes metas: abstinência ou redução do consumo de drogas; prevenção da infecção pelo HIV e da transmissão de doenças entre usuários de drogas injetáveis e, uso de drogas siubstitutivas119.

De acordo com Bastos120 o conceito de redução de danos

(harm reduction) ganha força no campo das abordagens terapêuticas e

preventivas relativas ao consumo de substâncias psicoativas no início da presente

década (94). Denomina-se psicoativa qualquer substância que tenha ação sobre o

sistema nervoso central, e que altere estados de consciência, sono/vigília ou

humor. Na verdade, coisas outras que não as substâncias têm propriedades

psicoativas - basta que você pense nas variações de seu estado de ânimo e

vigília, quando está na expectativa de receber o resultado de uma nova proposta

de emprego, ou numa festa com música para dançar.

Segundo ainda a autora121, um dos pressupostos básicos da

proposta de redução de danos é diminuir os males causados pelos diversos

psicoativos sem, no entanto, procurar eliminar, a qualquer preço e a curto prazo,

seu uso. Você já pensou numa sociedade em que fosse terminantemente proibido

tomar cafezinho (já que o café contém cafeína, que tem propriedades

psicoativas)?

As soluções penais e policiais muitas vezes são propostas

119 FIGUEIREDO, Nébia Maria Almeida de. (org.). Ensinando a cuidar em saúde pública. São Caetano do Sul: Yendis, 2005. 120 BASTOS, Francisco Inácio. (org.). Drogas e AIDS Estratégias de Redução de Danos. São Paulo: Hucitec, 1994.

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pelos governantes e legisladores como uma forma de tentar resolver a questão. O

que guia tal raciocínio é pensar que bastaria proibir a produção e o consumo de

uma substância, para ela deixar de ser usada. A proposta, apesar de muitas

vezes bem intencionada, tem-se revelado um fracasso em diversos momentos

históricos, declara Bastos122.

Conforme Laranjeira et al123, neste ponto, a abordagem se

afirma como clínico-política, pois, para que não reste apenas como "mudança

comportamental", a redução de danos deve se dar como ação no território,

intervindo na construção de redes de suporte social, com clara pretensão de criar

outros movimentos possíveis na cidade, visando a avançar em graus de

autonomia dos usuários e seus familiares, de modo a lidar com a hetero e a

autoviolência muitas vezes decorrentes do uso abusivo de drogas, usando

recursos que não sejam repressivos, mas comprometidos com a defesa da vida.

Neste sentido, o lócus de ação pode ser tanto os diferentes locais por onde

circulam os usuários de drogas, como equipamentos de saúde flexíveis, abertos,

articulados com outros pontos da rede de saúde, mas também das de educação,

de trabalho, de promoção social etc., equipamentos em que a promoção, a

prevenção, o tratamento e a reabilitação sejam contínuos e se dêem de forma

associada.

Assim, entende-se por Redução de Danos, uma política

social que tem como objetivo prioritário minorar os efeitos negativos decorrentes

do uso de drogas. Telles124, alude ser uma prática que tem como objetivo reduzir

as conseqüências adversas decorrentes do consumo de drogas lícitas e ilícitas,

mas que, recentemente, ganhou maior ressonância pelo seu emprego no que diz

respeito aos usuários de drogas ilícitas.

Para Bastos125, redução do risco ou redução do dano são

termos freqüentemente usados como sinônimos. O risco se relaciona à

121 FIGUEIREDO, Nébia Maria Almeida de. (org.). Ensinando a cuidar em saúde pública, 2005. 122 BASTOS, Francisco Inácio. (org.). Drogas e AIDS Estratégias de Redução de Danos. 1994. 123 LARANJEIRA, Ronaldo. et al. (coord.). Usuários de substâncias psicoativas: abordagem, diagnóstico e tratamento. 2. ed. São Paulo: Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo/Associação Médica Brasileira, 2003. 124 TELLES, P.R. "Estratégias de redução de danos e algumas experiências de Santos e Rio de Janeiro com usuários de drogas injetáveis". In: MESQUITA, F. e BASTOS, F. I. (org.). Drogas e AIDS: estratégias de redução de danos. 1994. 125 BASTOS, Francisco Inácio. (org.). Drogas e AIDS Estratégias de Redução de Danos. 1994.

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possibilidade de que um evento possa ocorrer, o dano deve ser visto como a

ocorrência do próprio evento. Desse enfoque, evitar o dano seria uma atitude

mais pragmática do que evitar o risco (nem sempre ocorre necessariamente um

dano, em uma situação onde há risco).

Informa Pimenta126, coordenadora geral da ABIA, que com a

redução de danos no Brasil, importantes avanços no campo dos direitos humanos

foram conquistados, além da promoção de leis que garantem o direito do usuário

de drogas ao tratamento da dependência química de forma digna e não punitiva,

bem como a garantia ao acesso ao tratamento da AIDS, das hepatites e de outras

doenças mais prevalentes entre usuários de drogas de forma gratuita e

confidencial.

O conceito de Redução de Danos, segundo O’Hare127, no

contexto da prevenção da disseminação do HIV entre usuários de drogas

injetáveis (UDIs), pode ser entendido segundo uma hierarquia de objetivos quer

dizer, evitar o compartilhamento de equipamentos; substituir o uso injetável de

drogas pelo uso não injetável; reduzir o uso de drogas e, se possível, interromper

o uso de drogas.

Em síntese, a redução de danos tenta compreender as

normas culturais e trabalhar no seu âmbito, focalizando a alteração dos fatores

que, de fato, permitirão a mudança dos comportamentos. O comportamento

seguro, precisa transformar-se em comportamento natural.

2.4 A RECUPERAÇO E O TRATAMENTO PARA O DEPENDENTE QUÍMICO

A Recuperação é o sonho de todos os dependentes

químicos que querem se livrar desta doença e das famílias que sofrem com o

comportamento das pessoas queridas, que muitas vezes se alteram, os

desrespeitam, gritam e podem até agredir fisicamente. Recuperação do

dependente é não usar mais drogas ou álcool, livrar-se do vício. Recuperação da

família é amenizar e, muitas vezes, acabar com todo o sofrimento, com a co-

126 PIMENTA. BOLETIM ABIA. Rio de Janeiro: ABIA, n. 23, mar./abr. 1994. Disponível em <http://www.abiaids.org.br/_img/media/bol%20abia%2023.pdf>. ACESSO em: 20. abr. 2008. 127 PAT O'HARE. In: MESQUITA, Fábio; BASTOS, Francisco Inácio. (org.). Drogas e AIDS Estratégias de Redução de Danos, 1994.

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dependência, com a preocupação excessiva com a doença do outro.

Segundo Gelas128, o processo de recuperação tem

resultados incríveis, mas o caminho não é fácil. É necessário mudar o estilo de

vida, mudar conceitos e preconceitos, é admitir o próprio erro e trabalhar para

ficar cada vez melhor.

Concorda-se com a autora (op. cit.) que a recuperação é

difícil e depende da disposição do indivíduo em aceitar a ajuda necessária (ele só

vai entrar num programa de recuperação se assim o quiser).

A recuperação é um trabalho para anos e consiste em

transformar uma vida até então marcada por brigas, egocentrismo, perdas,

pensamentos obsessivos, etc, em uma vida produtiva. O processo de

recuperação consiste, dentre muitas outras coisas, na identificação desses

mecanismos de defesa, e no reconhecimento da verdadeira intenção por detrás

destes. Por exemplo: muda-se de cidade para ver se as coisas melhoram. Assim

há a falsa idéia de que mudando de cidade os problemas ficarão em outro lugar

bem distante. Só que ele não admite a própria maneira doentia de usar drogas, e

que os problemas são conseqüência do uso.

Corrobora Roeder129 ao afirmar que não existe um modelo

universal de tratamento para dependência química que possa ser utilizado de um

modo geral para obter êxito e eficácia no tratamento, mas alguns princípios

comuns devem estar presentes em qualquer abordagem terapêutica. E,

complementando afirma que “A dependência é um distúrbio crônico e seu

tratamento requer um tempo longo, que deve ser voluntário, para que melhores

resultados sejam obtidos”.

Segundo Dr. Ivan Mário Braun, psiquiatra do GREA - Grupo

de Estudos Interdisciplinares de Álcool e Drogas do Instituto de Psiquiatria do

Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, a dependência química

é um comportamento no qual a pessoa usa drogas prejudiciais de modo

compulsivo e perde o controle sobre seu uso. De acordo ainda com o autor, a

dependência é um transtorno crônico. Isto é, uma vez estabelecido o diagnóstico,

o dependente estará propenso a uma recaída. Há casos de recaídas após

128 GELAS, 2002. 129 ROEDER, Maika Arno. Atividade Física, Saúde Mental e Qualidade de Vida. Rio de Janeiro:

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décadas de abstinência. Por outro lado, se a pessoa participar de um tratamento

de modo motivado e ativo, tem grandes chances de conseguir um controle ao

longo do tempo e poderá, muitas vezes, conseguir parar de usar pelo resto da

vida, afirma Braun130.

O tratamento psicoterápico direcionado para ajudar a pessoa

a superar os obstáculos e ter os prazeres da vida sem usar drogas é sempre

importante. Para drogas como o álcool, o tabaco e os opiáceos já existem

tratamentos medicamentosos com utilidade comprovada. Os grupos de ajuda são

úteis. Se o dependente puder participar de várias modalidades, por exemplo, ir ao

psiquiatra e freqüentar um grupo de ajuda, o resultado pode ser ainda melhor,

afirma o especialista131.

É fato, quando o assunto é tratamento, proliferam-se as

opiniões e correntes. Mas, o importante é que o doente conheça as opções e

possa buscar aquela mais adequada para si. Em todas as abordagens, existe a

possibilidade do indivíduo se adaptar ou não.

E, importante se ressaltar ainda a colocação de Roeder132 ao

mencionar que o dependente químico, para tratar a dependência, antes de tudo,

necessita reconhecer que é portador de uma doença crônica, aceitar sua

condição de dependente e que precisa de ajuda para iniciar o tratamento, como

também, vir a aceitar de forma voluntariosa.

Prossegue a autora133 aludindo que observados esses

princípios elementares, o primeiro passo está dado, o dependente quer ingressar

no tratamento. Esse vem a ser o momento certo para a família contribuir. Deve

buscar auxílio na Comunidade Terapêutica, agendar triagem com a psicóloga

dessa instituição, objetivando a internação do ente familiar, como também

participar ativamente de todo o processo do tratamento, conforme afirma Costa

Leite134: “A família necessita participar ativamente do tratamento e do processo de

Shape, 2003, p.250. 130 BRAUN, Ivan Mário. Como toda doença, a dependência química precisa de tratamento. Artigo. Revista Anônimos. [s.l.]: Libélula, 2008. Disponível em: <http://www.revistaanonimos.com.br /default.asp?modulo=noticias&page=noticia&noticia_id=16>. Acesso em: maio. 2008. 131 BRAUN, Ivan Mário. Como toda doença, a dependência química precisa de tratamento. 2008. 132 ROEDER, Maika Arno. Atividade Física, Saúde Mental e Qualidade de Vida, 2003, p.250. 133 ROEDER, Maika Arno. Atividade Física, Saúde Mental e Qualidade de Vida, 2003, p.250. 134 LEITE, Marcos da Costa. Conversando sobre cocaína e crack, 2003. p.132.

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recuperação do dependente, como núcleo de suporte fundamental do indivíduo”.

Porém, sobre a participação da família será tratada mais adiante, em capítulo

próprio.

Não se poderia encerrar este texto sobre a recuperação do

Dependente Químico sem alusão os estudos de George De Leon135, reconhecido

internacionalmente como sendo a maior autoridade na pesquisa sobre

comunidades terapêuticas, objeto do presente estudo.

Decorrente da vasta experiência clínica juntamente com

inúmeros referenciais teóricos, principalmente no campo motivacional, como o

próprio autor relata, o levaram a descrever as etapas de recuperação de um

indivíduo Dependente de Substancia Psicoativa (DSPAs) em dez, assegurando

ser a melhor descrição clínica da atualidade136.

Assim, sintetiza-se cada uma das etapas de George De

Leon, porém, convém ressaltar, que as etapas (em especial as do pós-

tratamento) não se limitam a Comunidades Terapêuticas (CTs), sendo portanto

válidas em todos os campos clínicos que lidam com a DSPAs.

Ainda viável ressaltar que cada etapa varia de acordo com o

indivíduo no que tange a intensidade e duração. Alguns pacientes levam anos

para superar as etapas, enquanto outros, passam por algumas etapas apenas de

relance. No entanto, as marcas de cada etapa são manifestas na trajetória de

sobriedade do indivíduo, calcadas na sua singular intensidade.

Sendo assim, as seis etapas, de De Leon:

��Etapas Pré-Tratamento (1-6)

Etapa 1 - Negação

Etapa 2 - Ambivalência

Etapa 3 - Motivação extrínseca

Etapa 4 - Motivação intrínseca

Etapa 5 - Prontidão para mudanças

Etapa 6 - Prontidão para tratamento do pré-tratamento,

deveria ser superada antes de qualquer intervenção de tratamento, por exemplo,

135 DE LEON, George. A comunidade terapêutica: teoria, modelo e método, 2008. 136 DE LEON, George. A comunidade terapêutica: teoria, modelo e método, 2008.

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numa CT. segundo De Leon, indivíduos que começam tratamento antes de

passar pela etapa 6, correm um risco muito maior de abandonar o tratamento e

conseqüentemente de sofrer recaída.

��Etapas Relacionadas ao Tratamento (7-10)

Estas próximas etapas refletem mudanças que ocorrem

normalmente para experiências particulares do tratamento, mas não

exclusivamente em comunidades terapêuticas. São elas:

Etapa 7: Desintoxicação

Nesta etapa é realizada a detecção do uso ativo de drogas;

desintoxicação farmacológica e comportamental. A etapa da desintoxicação é a

primeira que confronta categoricamente o indivíduo por estímulos a superar por

conta própria uma série de novos desafios, e percebe-se que gradativamente o

residente aprende a mudar. No entanto, cabe destacar, que recaídas são comuns

na etapa da desintoxicação, é salutar entender a recaída como um erro, mas

jamais como um fracasso. Evidentemente procura-se transpor todas as etapas

sem que haja recaídas, mas deve-se saber que a recaída faz parte de um

caminho rumo à mudança do estilo de vida.

Etapa 8: Abstinência

Liberdade do uso estável de drogas por um período

contínuo, normalmente superior ao maior período histórico do indivíduo em

liberdade do uso da droga. Apesar dos indivíduos estarem focados no

autocontrole em relação às sugestões externas, eles iniciam uma auto-

examinação dos contribuintes psicológicos e internos para o seu problema de uso

e uma reorganização do plano de vida diário. Socialmente eles se “conectam” a

uma “rede” que visa viver livre do uso da droga e iniciam rupturas em

relacionamentos137.

Etapa 9: Continuidade

Sobriedade e determinação pessoal de adquirir ou manter o

comportamento, atitudes e valores associados com o estilo de vida livre das

drogas. Nesta etapa a abstinência continua, mas com uma ênfase para a auto-

examinação e gerenciamento da vida. Acontece um reconhecimento mais

137 DE LEON, George. A comunidade terapêutica: teoria, modelo e método, 2008.

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profundo das causas que contribuíram para o uso da droga, para o pensamento e

para os problemas psicológicos e sociais relacionados.

Adicionalmente, nesta etapa indivíduos tomam atitudes

psicológicas importantes e estabelecem objetivos sociais. Eles adicionam planos

para melhorar as circunstâncias da vida, trabalho, relacionamentos, saúde,

obrigações e responsabilidades.

Etapa 10: Mudança de Identidade e Integridade

A inter-relação das influências do tratamento, experiências

das etapas de recuperação, e das vastas experiências de vida resultam numa

mudança interna e auto-influenciada na identidade pessoal e social. Nesta etapa

a sobriedade está internalizada. – o indivíduo não pensa conscientemente sobre

manter a sobriedade, mas aceita o fato como um pré-requisito de viver

corretamente. Afiliações ocorrem em uma tendência envolvente e de “normal

fraternidade” incluindo família, trabalho, profissão, religião, amigos e pessoas em

recuperação. Adequação a vida e atualização são os problemas em vez dos

problemas relacionados à recuperação da dependência química.

Conforme os ensinamentos de De Leon138; Laranjeira139, é

fundamental que ao deixar a CT, o indivíduo se vincule ativamente a um grupo de

auto-ajuda. Portanto, motivar o indivíduo que recebe alta no tratamento para

freqüentar um grupo de apoio é de suma importância. Estatisticamente o maior

percentual de recaídas ocorre nos primeiros meses da alta terapêutica, em

especial no primeiro mês.

Laranjeira140 em entrevista gravada no dia 07 de setembro

de 2003, em São Paulo/SP, no XV Congresso da ABEAD, afirmando que um dos

aspectos mais importantes do tratamento hoje é o que a gente chama do pós-

tratamento, qualquer forma de tratamento, quer seja no ambulatório, nas

internações, nos Centros de Apoio, nas Instituições filantrópicas, ou mesmo nas

CTs deveria existir alguma forma de pós-tratamento. Porque as recaídas são

138 DE LEON, George. A comunidade terapêutica: teoria, modelo e método. 2008. 139 LARANJEIRA, Ronaldo. et al. (coord.). Usuários de substâncias psicoativas: abordagem, diagnóstico e tratamento. 2004. 140 LARANJEIRA, Ronaldo. Entrevista gravada em mini DV (3:45 min) no dia 07 de setembro de 2003, em São Paulo/SP, no XV Congresso da ABEAD. Transcrita por Alexander Fischer. Na Entrevista, Dr. Ronaldo Laranjeira comenta a importância das Comunidades Terapêuticas, assim como do acompanhamento pós-tratamento (aftercare). Disponível em: <http://www.centrad.com.br/index.php?option=com_content&task=view&id=3&Itemid=5>. Acesso em mar./2008.

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freqüentes, a adaptação ao meio ambiente à sociedade onde a pessoa viveu é

uma coisa muito complexa e que se precisa ter essa forma de pós-tratamento.

Não que seja necessariamente a CT que faça isso, mas alguém, algum sistema

deveria estar fazendo o sistema de pós-tratamento.

A etapa da mudança de identidade e integridade carece de

um acompanhamento. Alguns ex-residentes têm o privilégio de ainda contar com

o apoio da família, esposa, empregador; mas já são muitos os que não contam

mais com ninguém, digamos que os mesmos precisam reconquistar “Deus e o

mundo” – e como é salutar ter alguém disposto a ajudar.141

Para finalizar esta parte referente à recuperação e tratamento recorre-se

a Mendes142 a qual alude que a maior dificuldade nos dependentes químicos é a

expressão de seus sentimentos, que durante a "ativa" foram vivenciados através

das drogas. Foram anestesiados, abafados e socados para dentro de si, e quando

expressos saíam de uma forma inadequada. A partir do momento que entram no

processo de recuperação começam a vivenciá-los de uma forma diferente: sóbria

e pura, mas ainda com algumas dificuldades em expressá-los e principalmente

em lidar com os mesmos de uma forma assertiva e tranqüila. E é exatamente aí

que os grupos de mútua ajuda favorecem esse aprendizado, na medida em que o

respeito pelo outro é algo que impera, como direito fundamental do cidadão e

direito da dignidade humana.

2.5 INSTITUIÇÕES E SERVIÇOS DE ATENDIMENTO AO DEPENDENTE

QUÍMICO

Durante o século XX, o consumo de substâncias psicoativas

foi estudado exaustivamente e suas nuanças foram compreendidas sob a óptica

científica. Deixou de ser visto como um desvio de caráter para ganhar

características de doença143. Essa mudança paulatina de mentalidade também

repercutiu nas estratégias de tratamento:

141 DE LEON, George. A comunidade terapêutica: teoria, modelo e método. 2008. 142 MENDES, Marília Teixeira. Artigo de Marília Teixeira Mendes revela admiração pelos grupos auto-ajuda. Disponível em: <http://br.geocities.com/psi_mtm/marilia.html>. Endereço do Flickr: http://www.flickr.com/photos/dependencia_quimica/>. Acesso em mar./2008. 143 LARANJEIRA, Ronaldo. et al. (coord.). Usuários de substâncias psicoativas: abordagem, diagnóstico e tratamento. 2004.

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Se há uma doença, deve haver um tratamento específico para ela. O surgimento dos Alcoólicos Anônimos (AA), durante os anos 1930 representou a primeira proposta de tratamento ambulatorial para os dependentes!. Outros esforços implementados foram as comunidades terapêuticas, espaços geralmente rurais, que visavam (além da abstinência) à reeducação dos hábitos morais e sociais do indivíduo dependente. As abordagens, no entanto, eram duras e se baseavam no confronto e na humilhação!144

Logo, de acordo com Edwards; Marshall; Cook145, a segunda

metade do século XX viu nascerem os modelos de tratamento contemporâneos.

Para isso, contribui a nova concepção de dependência química: uma doença de

natureza biológica, psicológica e social. Como qualquer entidade nosológica,

possuía sinais e sintomas clínicos universais e específicos. Por outro lado, cada

dependente tinha níveis de gravidade distintos dentro das idiossincrasias de seu

contexto sociocultural. Isso trouxe, mais uma vez, a necessidade de novos

modelos de tratamento.

Assim, serviços de atendimento foram sendo criados ou

adaptados para o tratamento da dependência química: ambulatórios, centros de

convivência, internações breves e longas, hospitais-dia, moradias assistidas,

acompanhamento terapêutico, agentes multiplicadores, entre outros.

Há uma possibilidade ilimitada de modelos de

tratamentos146. No entanto, segundo Edwards; Marshall; Cook147, há ambientes

de tratamento "mais famosos", tradicionais e conhecidos do grande público e,

cada um deles possui vantagens e desvantagens na prestação de auxílio ao

dependente químico.

Campos Dias148, psicoterapeuta especializado no tratamento

144 MILLER; HESTER, 1995. In: LARANJEIRA, Ronaldo. et al. (coord.). Usuários de substâncias psicoativas: abordagem, diagnóstico e tratamento. 2004, p.461. 145 EDWARDS, G.; MARSHALL, E. J.; COOK, C.C.H. O tratamento do alcoolismo. Porto Alegre: Artmed, 1999. 146 ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE E ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. Relatório Sobre a Saúde no Mundo, Saúde Mental: Nova Concepção. Nova Esperança: Gráfica Brasil, 2001. 147 EDWARDS, G.; MARSHALL, E. J.; COOK, C.C.H. O tratamento do alcoolismo. Porto Alegre: Artmed, 1999. 148 DIAS, Paulo Campos. As facetas da dependência química. Artigo. Revista Anônimos. [s.l.]: Libélula, 2008. Disponível em: <http://www.revistaanonimos.com.br/default.asp? modulo= noticias&page=noticia&noticia_id=16>. Acesso em: maio. 2008.

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de dependentes químico e de seus familiares, em entrevista exclusiva ao Portal

da Revista Anônimos, fala sobre Dependência Química e, quando indagado sobre

as formas de tratamento mais indicadas para o controle da doença, responde que

a doença, desencadeada por múltiplos fatores, também tem tratamento

multidisciplinar. Existe consenso de que não há um único modelo de tratamento

que possa ser empregado para todos os portadores dessa doença, e tampouco

algum modelo terapêutico que tenha eficiência de 100%. Porém, todos os

modelos devem tratar a pessoa e não apenas a doença, ou seja, sensibilizar,

conscientizar e reinserir o dependente químico na sociedade com qualidade de

vida com direito a total dignidade da pessoa humana.

Em seu livro O Tratamento do Alcoolismo, Edwards; et al.149,

elencou ambientes de tratamento: Rede primária de atendimento à saúde;

Unidades comunitárias de álcool e drogas; Unidade ambulatorial especializada;

Comunidades terapêuticas; Grupos de auto-ajuda; Hospitais gerais; Hospital-dia;

Moradia assistida; Hospitais psiquiátricos; CAPs; Sistema Judiciário e Empresas.

Embasando-se em Laranjeira et al150, sintetizam-se algumas

características desses ambientes. A rede primária de atendimento à saúde vem

sendo cada vez mais valorizada como uma maneira eficiente de tratar indivíduos

com problemas relacionados ao consumo de álcool e drogas. Alguns fatores

contribuíram para a emergência desse fenômeno. A popularização do consumo

de substâncias psicoativas aumentou a demanda por tratamento, dificilmente

suprida apenas pelos centros especializados. Não existe um usuário típico,

caricaturesco e facilmente detectável.

As Unidades Comunitárias de Álcool e Drogas surgiram

como alternativa ao tratamento hospitalar (estigmatizador) e às clínicas

especializadas (geralmente pouco disponíveis e distantes da maioria dos

pacientes). Tais unidades procuram oferecer mais opções de serviços e estar em

maior contato com a comunidade, cuja proximidade facilita o acesso do paciente

ao tratamento (remoção de barreiras) e permite aos profissionais realizar visitas

domiciliares, aproximando ainda mais o tratamento da realidade do paciente,

proporcionando também um tratamento mais específico e adaptado, englobando

149 EDWARDS, G.; MARSHALL, E. J.; COOK, C.C.H. O tratamento do alcoolismo. Porto Alegre: Artmed, 1999. 150 LARANJEIRA, Ronaldo. et al. (coord.). Usuários de substâncias psicoativas: abordagem,

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recursos terapêuticos que vão desde a intervenção breve (usuários com poucos

problemas) até intervenções mais complexas.

Já A unidade ambulatorial especializada é um centro de

tratamento multidisciplinar composto por médicos, psicólogos, assistentes sociais,

enfermeiros, terapeutas ocupacionais e educadores. Esses serviços funcionam

como referência para as unidades primárias de saúde, hospitais gerais e

psiquiátricos e também podem estar preparados para a promoção de atividades

de pesquisa, ensino, capacitação e prevenção. Desse modo, constituem não

apenas um referencial terapêutico, mas também teórico.

O Brasil possui ambulatórios especializados para o

tratamento da dependência química há quase duas décadas. A maior parte

destes é considerada centros de excelência e desenvolve linhas de pesquisa que

demonstram grande afinidade com as principais tendências ligadas à prevenção e

ao tratamento da dependência química. No entanto, boa parte destes centros

permanece ligada às instituições universitárias, restrita aos grandes centros

urbanos e voltada à pesquisa. Além disso, a crescente demanda impõe a criação

de novas alternativas de tratamento.

Recentemente, o Ministério da Saúde normatizou as

diretrizes para a criação e o funcionamento dos Centros de Atenção

Psicossocial - Álcool e Drogas (CAPS - AD). Segundo esta portaria, o CAPS é

um serviço de atenção ambulatorial diária totalmente voltado ao atendimento de

pacientes com transtornos decorrentes do uso e da dependência de substâncias

psicoativas. Além de ser uma unidade terapêutica especializada, também é

responsável pelo gerenciamento da demanda e da rede de instituições de

atenção a usuários de álcool e drogas de sua região.

Conforme a rede primária de atendimento, o hospital geral

também é um espaço destinado à motivação para o tratamento de indivíduos que

o procuram em virtude de complicações físicas relacionadas ao consumo de

álcool, tabaco e outras drogas. As salas de emergência com freqüência recebem

pacientes acometidos pela síndrome de abstinência do álcool e delirium tremens.

A internação e a permanência são estritamente voluntárias. O tempo de

internação acompanha o período de maior intensidade dos sintomas: duas

diagnóstico e tratamento. 2004.

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semanas, em média. Durante esse período, os pacientes podem receber, além do

tratamento farmacológico, atendimento psicoterapêutico individual e em grupo,

além de terapia ocupacional. A intenção é sensibilizar os pacientes para os

problemas ocasionados pela dependência e motivá-Ios para a manutenção do

tratamento em um ambiente ambulatorial ou em regime de internação prolongada.

A Moradia Assistida e Albergue Comum é uma opção de

ambiente terapêutico bastante utilizada em vários países. A falta de uma

residência representa um sério empecilho à reintegração social de qualquer

indivíduo. A moradia assistida nada ou pouco interfere na circulação diária do

dependente. Ela funciona como um albergue, porém, com uma estrutura de

hotelaria bem mais adequada e individualizada. Há evidências de que o albergue

também pode ser um local viável para intervenções terapêuticas breves. O Brasil

possui uma estrutura precária de albergues. Falta o modelo de moradia assistida,

talvez a melhor opção de tratamento para a população sem-teto.

O Hospital Psiquiátrico, pode ser um espaço para o

tratamento da dependência química por vários motivos. Em primeiro lugar, as

enfermarias especializadas e estruturadas exclusivamente para o tratamento das

dependências químicas são raras, inclusive no Brasil. As poucas existentes, que

têm como base principalmente a internação voluntária, não possuem uma equipe

organizada (especialmente em termos de segurança) para lidar com pacientes

com comorbidades graves, tais como quadros esquizofreniformes, depressão

maior e transtornos bipolares. Nesses casos, complicações como ímpetos

agressivos e tentativas de suicídio requerem um ambiente de cuidados mais

intensivos e seguros, indicação precisa de internação para dependentes químicos

em hospitais psiquiátricos.

Já o hospital-dia é um ambiente tradicionalmente utilizado

para o tratamento da dependência química. Existem incontáveis possibilidades de

abordagem dentro de um hospital-dia. Ela pode ser intensiva (freqüência diária e

integral), intermediária (algumas vezes por semana, integral ou parcial) ou "quase

ambulatorial" (com visitas semanais por meio período). Pode haver, ainda,

adequações para populações especiais, tais como casos agudos (manejo da

abstinência), adolescentes e mulheres, pacientes com comorbidades (depressão

maior, transtorno bipolar, esquizofrenia, etc.). O hospital-dia permite todo tipo de

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abordagem teórica dentro de uma perspectiva de atendimento multidisciplinar.

O Brasil possui esse tipo de ambiente de tratamento há

algum tempo, costumeiramente organizado para o atendimento psiquiátrico em

geral. Pontos importantes para a valorização do hospital-dia no país são a

utilização mais freqüente deste serviço em detrimento da internação fechada; a

integração do hospital-dia a um sistema organizado de atenção primária e

especializada e o desenvolvimento de ambientes de hospital-dia destinados a

populações específicas; entre estas, os dependentes químicos.

Os grupos de auto-ajuda, em especial o AA e o N.A, são

importantes recursos de tratamento, difundidos e de pronto acesso a qualquer

indivíduo. As reuniões de A.A. e N.A. são de importância central para o seu

funcionamento.

Narcóticos Anônimos, NA é um grupo derivado de AA

destinado aos adictos, os dependentes de drogas. Os Doze Passos de AA são

adaptados aos grupos e os membros compartilham suas experiências nas

reuniões fechadas, assim como em Alcoólicos Anônimos.

Entre os grupos de auto ajuda ainda encontram-se:

Amor-Exigente, são grupos que se reúnem semanalmente

em busca de solução para a auto e mútua ajuda. Os familiares são orientados,

por exemplo, a não aceitar os comportamentos agressivos do dependente e a

fixarem metas de convivência. Isso provoca nele o estímulo à mudança.

Trabalham com 12 princípios básicos que são adaptados para a realidade das

famílias brasileiras. As reuniões duram cerca de duas horas. A cada mês, os

grupos devem desenvolver a prática de um princípio de acordo com as metas de

comportamento. (<www.amorexigente.org.br>).

Al-Anon é uma irmandade para pessoas que convivem e

são afetadas pelo alcoolismo de alguém. As reuniões têm a mesma proposta de

recuperação e funcionamento das que ocorrem em AA, porém com o programa

dos Doze Passos adaptados para o grupo de familiares e amigos. Também

congrega o Al-Teen para crianças e adolescentes que convivem com o

alcoolismo. (<www.al-anon.org.br>).

Naranon. No mesmo formato de Al-Anon, o grupo é voltado

para familiares e amigos de adictos. Também congrega o Narateen para crianças

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e adolescentes afetadas pela adicção de familiares. (<www.naranon.org.br>).

Pastoral da Sobriedade, é uma ação concreta da Igreja

Católica do Brasil que, através da pedagogia de Jesus-Libertador, procura

resgatar e reinserir os dependentes, propondo uma mudança de vida através da

conversão. Inclui reuniões dos dependentes com a presença dos familiares. No

momento da partilha há a separação do núcleo familiar, ou seja, dependentes de

uma família com dependentes e co-dependentes de outra para que melhor

possam se espelhar nas diversas situações e nas soluções encontradas.

Referente O Sistema Judiciário, há um grande número de

situações que envolvem o consumo de álcool e drogas identificadas como

contravenções penais e, entre essas situações, estão os atos de beber e dirigir,

os crimes de natureza aquisitiva, isto é, aqueles que visam angariar fundos para o

consumo de drogas, o porte de drogas ilícitas e muitas outras. Em situações

como essas, o juiz pode decidir enviar o condenado para tratamento.

A grande questão da atualidade compreendendo os órgãos

de políticas públicas e o Poder Judiciário de vários países do mundo são as Drug

Courts (Cortes de Drogas), conhecidas no Brasil como Justiça Terapêutica. O

Movimento das Cortes de Drogas (Drug Courts Moviment) se originou nos

Estados Unidos, mais especificamente no Estado da Flórida, na segunda metade

dos anos 1980.

No Brasil, a Justiça Terapêutica é definida como uma

"proposta em que a legislação seja cumprida harmonicamente com medidas

sociais e tratamento para as pessoas que praticam crimes nos quais o

componente drogas, no sentido amplo, esteja presente de alguma maneira. Ela se

justifica por ser uma possibilidade de tratamento caspax de modificar

comportamentos delituosos para comportamentos socialmente adequados e uma

abordagem não-estigmatizante. Ainda não há estudos nacionais acerca do tema.

Por fim as Comunidades Terapêuticas, um ambiente de

tratamento comum um dos ambientes de tratamento mais conhecidos do público

brasileiro, apesar da pouca informação nacional disponível, porém ao qual já

dedidou-se um ítem à parte no presente estudo, pelo fato de ser o objeto do

estudo, merecendo um maior destaque, o que dispensa aqui abordagem.

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2.5.1 Comunidade terapêutica

As Comunidades Terapêuticas existem em números

bastantes pequenos em relação ao público existente que necessitam de

tratamento. As propostas de formas de atendimento a essa população específica

variam de acordo com a visão de mundo e perspectiva política, ideológica e

religiosa dos diferentes grupos.

Com efeito, segundo Oliveira151,

[...] o Brasil não tem uma tradição em atendimento a usuários de drogas e, quando falo em Brasil, me reporto ao serviço público e gratuito. Infelizmente os governos não colocam o problema das drogas como prioridade e elas aqui são vistas na conotação das lícitas e das ilícitas.

Portanto, carece a nação de locais adequados para propiciar

um tratamento decente e com resultados satisfatórios, sendo que segundo ainda

Oliveira152 “a inexistência do recurso terapêutico, tem reflexos diretos no aumento

da demanda, uma vez que, não tendo onde tratar o dependente, ele continua no

vício e arrasta consigo outras pessoas, aumentando a cada dia o índice de

drogados”.

O modelo de tratamento residencial conhecido como

Comunidade Terapêutica foi utilizado durante muito tempo para pacientes com

patologias psiquiátricas crônicas. Seu funcionamento é fundamentado na

premissa de que quando não se é possível promover mudanças no indivíduo

dependente, passa a ser necessário alterar sua condição, seu meio ambiente e

removê-lo da situação onde o consumo ocorre. O processo terapêutico focaliza

intervenções pessoais e sociais, atribuindo funções, direitos e responsabilidades

ao indivíduo dependente em ambiente seguro em relação ao consumo de álcool e

drogas.

151 OLIVEIRA, M. Eficácia da intervenção motivacional em dependentres do álcool. Tese de Doutorado não-publicada, Curso de Psiquiatria e Psicologia Médica, Universidade Federal de São Paulo. São Paulo, SP. 2000, p. 98. Disponível em: http://br.monografias.com/trabalhos/estudo-estagios-motivacionais-dependentes-alcool/estudo-estagios-motivacionais-dependentes-alcool2.shtml>. Acesso em: maio. 2008. 152 OLIVEIRA, M. Eficácia da intervenção motivacional em dependentres do álcool, p. 99.

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De acordo com Soares153, o termo Comunidade Terapêutica

foi utilizado por Maxwell Jones, a partir de 1959, para definir as experiências

desenvolvidas em um hospital psiquiátrico, baseados nos trabalhos de Sullivan,

Meninger, Bion e Reichman. Suas experiências eram baseadas na adoção de

medidas coletivas, democráticas e participativas dos pacientes tendo como

objetivo resgatar o processo terapêutico a partir da transformação da dinâmica

institucional.

A idéia da Comunidade Terapêutica vinculava-se à idéia de tratar os grupos como se fosse um "organismo psicológico". Maxwell Jones criou o termo "aprendizagem ao vivo" para definir a possibilidade do paciente aprender meios de superar as dificuldades com o auxílio dos outros e relacionar positivamente com outros. A Comunidade Terapêutica surge como processo de reforma institucional interno ao asilo. Seu objetivo era resgatar a função terapêutica do hospital, fazendo que todos, e não apenas os técnicos compartilhassem154.

Porém, segundo Fracasso155, a história de Comunidade

Terapêutica teve início anteriormente à idéia de Maxwell. Em 1860 foi fundada

uma organização religiosa chamada Oxford, cujo objetivo era o renascimento

espiritual da humanidade. Este grupo buscava um estilo de vida mais fiel aos

ideais cristãos: se encontravam várias vezes por semana para ler e comentar a

Bíblia e se comprometiam reciprocamente a serem honestos, sendo que após 10

a 15 anos, constataram que 25% dos seus participantes eram alcoolistas em

recuperação.

Nos Estados Unidos, participantes desse grupo se reuniam

para partilhar o empenho e o esforço que faziam para permanecer sóbrios; desta

maneira nasceu o primeiro grupo de Alcoólicos Anônimos (AA), que, com o

passar dos anos se tornou o maior grupo de Auto-Ajuda do mundo.

No dia 18 de setembro de 1958, Chuck Dederich e um

153�SOARES, Jorge Marco Aurelio. Engenho dentro de casa: sobre a construção de um serviço

de atenção diária em saúde mental. [Mestrado] Fundação Oswaldo Cruz, Escola Nacional de Saúde Pública; 1997. 117 p. disponível em: <http://portalteses.cict.fiocruz.br/transf.php?script =thes_chap&id=00006302&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 24. Abr. 2008. 154 SOARES, Jorge Marco Aurelio. Engenho dentro de casa: sobre a construção de um serviço de atenção diária em saúde mental, 1997, p.11.

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pequeno grupo de alcoolistas em recuperação decidiram viver juntos para, além

de ficarem em abstinência, buscarem um estilo alternativo de vida. Fundaram em

Santa Mônica, na Califórnia, a primeira Comunidade Terapêutica (CT) que se

chamou Synanon. Adotaram um sistema de relacionamento direcionado em uma

atmosfera quase carismática, o que para o grupo foi muito terapêutico.

A aplicação do conceito de ajuda às pessoas em

dificuldades, feita pelos próprios pares, é a base das relações vividas na

Synanon, posteriormente em Daytop, onde cada pessoa se interessa e se sente

responsável pelas outras. Desde o início acolheram alguns jovens que estavam

tentando ficar em abstinência de outras drogas e em decorrência disto a

Comunidade Terapêutica que teve seu início com uma CT para alcoolistas, abriu

suas portas para jovens que usavam outras substâncias psicoativas.

Esse tipo de alternativa terapêutica se consolidou e deu

origem a outras CTs que, conservando os conceitos básicos, aperfeiçoaram o

modelo proposto pela Synanon. A Comunidade Terapêutica Daytop Village é o

exemplo mais significativo deste tipo de abordagem. Foi fundada em 1963 pelo

Monsenhor William Bóbrien e David Deitch, tornando-se um programa terapêutico

muito articulado.

Com a multiplicação das iniciativas desse tipo de abordagem

terapêutica na América do Norte, a experiência atravessou o Oceano Atlântico e

deu início a programas terapêuticos no norte da Europa, principalmente na

Inglaterra, Holanda, Bélgica, Suécia e Alemanha.

No início de 1979, a experiência chegou à Itália, onde foi

fundada uma Escola de Formação para educadores de CTs. Os educadores que

passaram por essa formação deram um novo impulso na Espanha, América

Latina, Ásia e África.

No campo psiquiátrico, acontecia uma outra revolução: a

experiência de comunidade terapêutica democrática para distúrbios mentais, aí

então o psiquiatra escocês Maxwell Jones, trabalhando num hospital, transformou

o trabalho tradicional e, como terapia, utilizava a psicoterapia individual e de

grupo, eliminando ao máximo o uso de medicação e envolvendo os pacientes nas

155 FRACASSO, Laura. Características da comunidade terapêutica. In: SERRAT, Saul Monte (Org.). Drogas e álcool: prevenção e tratamento. Campinas: Komedi, 2001. p. 272–289.

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atividades propostas.

A Comunidade Terapêutica proposta diferia em tudo dos

hospitais psiquiátricos então existentes. Estes apresentavam uma estrutura

rigidamente hierarquizada e que atuava de modo autocrático. Havia muito pouca

comunicação entre as pessoas dos diferentes níveis e uma passividade dos

internos, mantidos na ignorância do que se passava ao seu redor e,

principalmente, em relação ao seu tratamento156.

Logo, constatada a capacidade de recuperação através da

abordagem das CTs, surgiram estudos sobre o fenômeno, sua história, os

conteúdos, em que um ex-psicanalista americano, Mowrer, descobriu, pontos em

comum, ou seja, que compartilhar, é um dos valores fundamentais e comuns. A

referência não é somente em relação aos bens, mas de compartilhar com os

membros do grupo o que cada um possui do ponto de vista humano. A

honestidade, outro ponto forte que emerge do fenômeno das CTs: "Participe do

grupo e fale coisas de você, não de política, trabalho ou de outras coisas. Fale do

que provoca medo e dor dentro de você" (Synanon). É uma referência clara à

necessidade do ser humano de comunicar-se, sem máscaras, em relações

humanas autênticas. Essa honestidade diante do grupo é um valor muito antigo;

apareceu nas primeiras comunidades cristãs e era chamada confissão aberta ou

auto-revelação.

Também apareceram nos estudos do Dr. Mowrer o abandono,

nas relações terapêuticas, da posição clássica vertical médico e paciente. As

interações que se estabelecem entre as pessoas rompem as estruturas rígidas da

hierarquia, do cargo e oferecem mais possibilidades de ajuda. As funções, muito

flexíveis, garantem a estrutura e a organização da vida comunitária. A atenção é

colocada sobre o indivíduo no grupo ou na comunidade. Ele é o verdadeiro

protagonista das ações terapêuticas porque sabe do que precisa, porém, sozinho, é

incapaz de buscar, por isso a importância da auto-ajuda. Cada indivíduo é

responsável pelo seu próprio crescimento e pede a ajuda necessária aos outros para

se ajudar. Sendo assim, cada um é "terapeuta" para si mesmo e para os outros

componentes do grupo, da comunidade.

156 FEBRACT - Federação Brasileira de Comunidades Terapêuticas. http://www.febract.org.br/ artigos2006.htm>. Acesso em: maio. 2008.

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Segundo Fracasso157

A vida comunitária não poderá ser terapêutica se não desaparecer a dualidade equipe-residente. Isto significa que, enquanto existir dentro da mesma estrutura o grupo que "faz" o tratamento e o grupo que o "recebe" está muito longe da verdadeira terapia de grupo na CT. O agente terapêutico não é a estrutura da CT, as regras, os instrumentos, mas tudo aquilo que estes instrumentos podem fazer para que cada residente possa viver experimentar uma relação verdadeira e o amor entre as pessoas.

O papel exercido pelas comunidades terapêuticas no

tratamento psicossocial dos dependentes químicos tem sido muito importante,

tanto em nível mundial como no Brasil.

No decorrer dos últimos anos, com o crescente consumo de

drogas, houve uma grande expansão dessas comunidades no país. Os principais

problemas encontrados nessa expansão são: a má qualidade de atendimento

prestado por algumas comunidades e a falta de adequação para abrigar os

dependentes em busca de tratamento. Para solucionar esses problemas, a

Federação Brasileira de Comunidades Terapêuticas (Febract), em conjunto com a

Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a Secretaria Nacional

Antidrogas (Senad) editaram uma resolução capaz de regulamentar o

funcionamento de todas as comunidades terapêuticas existentes no país158.

Em entrevista à revista Com Ciência, Monte Serrat,

professor da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, justifica o aumento

significativo de comunidades terapêuticas, como sendo uma resposta à evolução

do consumo de drogas ilícitas por parte dos jovens. Alude também que em termos

mundiais, o número de comunidades terapêuticas é muito grande, tanto em

países de primeiro mundo como também em países de terceiro mundo e,

complementa:

Quando os princípios de recuperação, de resgate da cidadania, de reabilitação física e psicológica e de reinserção social são

157 FRACASSO, Laura. Características da comunidade terapêutica. In: SERRAT, Saul Monte (Org.). Drogas e álcool: prevenção e tratamento. Campinas: Komedi, 2001. p. 272–289. 158 SERRAT, Saul Monte (Org.). Drogas e álcool: prevenção e tratamento. Campinas: Komedi, 2001. p. 17 – 27.

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corretamente aplicados, os tratamentos apresentam resultados positivos e importantes. O objetivo é agir nos fatores psicossociais do paciente. A aplicação de medicamentos fica por conta de comunidades próprias para esse fim, como hospitais e clínicas. Sob esse aspecto psicossocial, a participação da família é imprescindível. E o quadro atual é de mudança. Ao mesmo tempo em que o número de pessoas que ingerem drogas ilícitas aumentou, a compreensão e o enfrentamento dos familiares com relação ao problema melhoraram bastante159.

O processo terapêutico focaliza intervenções pessoais e

sociais, atribuindo funções, direitos e responsabilidades ao indivíduo dependente

em ambiente seguro em relação ao consumo de álcool e drogas. Tratamentos

psico-sociais (psicólogo, assistente social, orientação vocacional, etc.) devem ser

sempre incluídos na programação terapêutica das Comunidades.

Também essas CTs devem reproduzir, o melhor possível, a

realidade exterior para facilitar a reinserção; ter modelo de tratamento residencial;

meio altamente estruturado, atuar através de um sistema de pressões artificialmente

provocadas, estimulando a explicitação da patologia do residente, frente a seus

pares.

Considera Goti160 que na abordagem CT, os pares servem de

espelho da conseqüência social de seus atos; há um clima de tensão afetiva e, o

residente é o principal ator de seu tratamento, sendo que a equipe oferece, apenas,

apoio e ajuda.

Segundo ainda Goti161 do ponto de vista cultural, o

fenômeno moderno da CT está inserido na proposta da filosofia existencial que

deu vida a escola da psicologia denominada Humanista.

As CTs. contemporâneas para tratamento de dependentes

químicos existentes na região da Foz do Rio Itajaí-Açú, apresentam um quadro

semelhante as CTs na concepção de De Leon. Apesar de menores, tanto na parte

ocupada quanto construída, como também na oferta de leitos, desenvolvem

programas de atenção e tratamento a dependentes químicos objetivando através

da internação voluntária, a abstinência das substâncias psicoativas. Essas CTs.

159 SERRAT, Saul Monte (Org.). Drogas e álcool: prevenção e tratamento. Campinas: Komedi, 2001. 160 GOTI, M. E. La Comunidad Terapêutica: Um desafio e la droga. [s.l.]: Nueva Vision, 1997.

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são regidas por estatutos próprios, de acordo com as Normas federais, estaduais

e municipais e obrigadas a cumprir as exigências da ANVISA, de acordo com a

RDC nº 101, de 30 de maio de 2001 D.O. de 31/5/2001.

Através de experiência ao longo dos anos, a realidade da

sobrevivência dos CTs. locais acontecem através de subvenção social recebidas

do município de Itajaí, doações de empresas e comunidade, parcerias através de

convênios e ajuda de Igrejas locais. Registra-se que as arrecadações não

correspondem ao desejado e com isso a qualidade do tratamento apresentado,

muitas vezes, não corresponde à expectativa desejada pela equipe. Mesmo

assim, há esmero e dedicação na busca de apresentar um trabalho excelente e

resultados satisfatórios. Como menciona De Leon sobre a equipe de funcionários

“seu investimento de tempo e energia no trabalho na CT vai, tipicamente, bem

além das expectativas convencionais”.

Conforme pesquisa realizada no município de Itajaí-SC,

constata-se a existência de uma CT para tratamento de dependente químico

denominada Centro de Tratamento Alternativo Pró-Vida, totalmente regularizada

nos órgãos competentes e que corresponde ao modelo de CT segundo De Leon.

Esta será apresentada no próximo capítulo e em item próprio

para melhor exposição e discernimento das suas características, imbuída no

compromisso de que se o dependente quer sair da droga, o problema já não

pertence mais só a ele, mas a própria CT.

161 GOTI, M. E. La Comunidad Terapêutica: Um desafio e la droga, 1990.

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CAPÍTULO 3

DA FAMÍLIA, DEPENDENCIA E DIGNIDADE HUMANA

3.1 O CONCEITO DE FAMÍLIA

Historicamente, a família tem sido definida a partir de suas

funções. No Brasil colonial, autores como Freyre162 e Duarte163 permitem-nos

deduzir que a família exerce funções políticas, econômicas e de representação

social, além da reprodução biológica e cultural até hoje a ela associadas.

Gilberto Freyre é talvez o “pai” da conhecida descrição da

família patriarcal colonial brasileira, apresentada como unidade política,

econômica e social que representa uma “força social que se desdobra em

política164” e ocupa o lugar empreendedor e diretor do Estado. Duarte165 é outro

autor que nos mostra a multiplicidade de tarefas da família no Brasil colonial,

incluindo as funções procriadora, econômica e política, o que, a seu ver, a

distingue da família nuclear moderna que se restringirá à primeira função, através

do processo em que o Estado penetra cada vez mais na unidade doméstica,

absorvendo suas antigas funções econômicas e políticas.

A nossa Lei maior nos dá a seguinte definição, no art. 226,

parágrafo 4º: “Entende-se, também, como entidade familiar à comunidade

formada por qualquer dos pais e seus descendentes”166. Onde temos a definição

constitucional de família na atualidade.

A forma de constituição e os relacionamentos envolvendo a

Família é um dos temas mais polêmicos que existem na atualidade, talvez por

envolver questões éticas, morais, religiosas, além de conflitos de interesses de

algumas minorias.

162 FREYRE, Gilberto. Casa Grande & Senzala: formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal. 29. ed. Rio de Janeiro: Record, 1994. 163 DUARTE, Nestor. A ordem privada e a organização política nacional. 2 ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1996. 164 FREYRE, Gilberto. Casa Grande & Senzala: formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal,1994, p.19. 165 DUARTE, Nestor. A ordem privada e a organização política nacional, 1996.

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Instituto de definição mais disputada do que difícil de se

fazer, é o da família, uma vez que cada ciência quer acrescentar seu tempero ao

tema, sendo que a definição de família varia conforme o tempo e a evolução da

própria sociedade; ela já não é formada da mesma forma que era há 20, 30 ou 60

anos, já que ela evoluiu com a sociedade

É consenso afirmar que o desenvolvimento de instituições

modernas do Estado e mercado abarca em parte as antigas funções da família,

restringindo sua esfera de atuação às dimensões da afetividade e da reprodução

da vida, em seus aspectos biológicos e culturais.

Diante disso, propício ressaltar-se Payá e Figlie167, os quais

aludem que o conceito de família pode ser definido levando-se em consideração

as múltiplas funções reguladoras dos papéis familiares, contradições de

comportamento, afetos, tensões, conflitos presentes no meio, que, ao mesmo

tempo, contribuem para que o sistema permaneça vivo, superando uma visão

estática da própria construção familiar. A família é um sistema dinâmico e em

constante transformação, que cumpre sua função social transmitindo os valores e

as tradições culturais.

Passa-se a definir família, a partir do caput do Art.1.511 do

Código Civil “O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na

igualdade de direitos e deveres dos cônjuges”.

De conformidade com a norma, a família inicia-se com a

união de um homem e uma mulher. Essa união dá-se através do casamento ou

matrimônio.

Como também, através da união estável, conforme preceitua

o Art.1.723 do Código Civil: “É reconhecida como entidade familiar a união estável

entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e

duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”.

Conforme está expresso na norma, verifica-se que é a partir

dessa modalidade de união que há a formação da família e seu

substabelecimento. Nessa união deve haver comunhão; entende-se por

comunhão o partilhar em comum no dia a dia, das idéias, dos sentimentos, do que

166 BRASIL. Constituição Federal. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. 167 PAYÁ e FIGLIE Figlie, Neliana Buzi . Aconselhamento em Dependência Química Neliana Buzi Figlie Selma Bordin, Ronaldo Laranjeira – São Paulo, Roca 2004. p 340.

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possa envolver a vida a dois. Afirma ainda que essa comunhão deva vir a ser

plena de vida. Essa vida tem a ver com um relacionamento saudável, respeitoso,

duradouro, harmonioso, equilibrado, e que as virtudes venham somar no cotidiano

para ambos. Oportuno mencionar a profundidade do matrimônio a luz da bíblia

sagrada “deixa o homem pai e mãe e una-se a sua mulher e torne os dois uma só

carne”168. Essa vem a ser a verdadeira comunhão do ponto de vista cristão.

Entre os conceitos existentes, pode ser citado o de Sílvio de

Salvo Venosa:

Considera-se família em conceito amplo, como parentesco, ou seja, o conjunto de natureza familiar. Nesse sentido, compreende os ascendentes, descendentes e colaterais de uma linhagem, incluindo-se os ascendentes colaterais do cônjuge, que se denominam parentes por afinidade ou afins169.

Ou o de Clóvis Beviláqua, que definia família como um

conjunto de pessoas ligadas pelo vínculo de consangüinidade, cuja eficácia se

estende ora mais largas, ora mais restritamente, segundo as várias legislações.

Outras vezes, porém, designam-se, por família, somente os cônjuges e a

respectiva progênie. Sendo assim, Beviláqua e Venosa, definem família apenas

aqueles que têm o mesmo sangue, ou seja, pai, mãe, filhos, tios, avós, primos,

etc., não incluindo os filhos adotados170.

Contrariando Venosa e Beviláqua, Orlando Gomes, alinha-

se com Mazeuad e Mazeaud, para quem “somente o grupo oriundo do casamento

deve ser denominado família, por ser o único que apresenta os caracteres de

moralidade e estabilidade necessários ao preenchimento de sua função social”,

definição esta que demonstra-se totalmente ultrapassada, pois já foi dito que a

família não é apenas oriunda do casamento, mais de uma gama de relações171.

Na Declaração Universal dos Direitos do Homem, em seu

artigo XVI, §3, vem estabelecido que: “A família é o núcleo natural e fundamental

da sociedade e tem direito à proteção da sociedade e do Estado”.

168 ALMEIDA, João Ferreira de. A Bíblia Sagrada. Brasília: Sociedade Bíblica do Brasil,1993. (Gênesis 2.24). 169 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de Família, vol. 4, p.: 14 e ss. 170 BEVILAQUA, Clóvis. (apud PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de Família, p.29. 171 MAZEAUD e MAZEAUD.; GOMES, Orlando. (apud PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de

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Para Aluísio Santiago, a família nasceu antes da lei, com

raízes no impulso biológico que originariamente uniu o homem à mulher.

A palavra veio do sânscrito, para a língua latina, lembrando Sá Pereira que o radical “fam” corresponde aquele outro “dhá, da língua ariana, que dá idéia de fixação, ou de coisa estável, tendo da mudança do “dh” em “f”surgido no dialeto do Lácio, a palavra “faama” depois “famulus” (servo) e finalmente família, está última a definir, inicialmente, o conjunto formado pelo “pater famílias”, esposa, filhos e servos, todos considerados, primitivamente, como integrantes do grupo familiar, daí Ulpiano, no “Digesto”, já advertir que a palavra família tinha inicialmente acepção ampla, abrangendo pessoas, bens e até escravos.172

Nos dias de hoje, existe uma supervalorização do lado

afetivo, sendo este o principal motivo para a união de duas pessoas que

pretendem, possuem o ânimo de juntos formarem uma família, e que passam a

conviver sob o mesmo teto, casados ou em união estável, que atualmente é

reconhecida por lei.

Paulo Dourado de Gusmão conceitua a família atual como:

Um grupo social igualitário, em que não mais existe a supremacia do marido e do pai, em que há direitos e deveres iguais, em que a mulher está igualada ao marido, e em que a autoridade paterna constitui função social, destinada a satisfazer os interesses do filho menor, critério de que se serve o Juiz para apreciar a ação dos pais173.

Conforme Berenice Dias, a legislação vigente regula a

família do início do século passado, constituída unicamente pelo casamento,

verdadeira instituição, matrimonializada, patrimonializada, patriarcal,

hierarquizada e heterossexual. O moderno enfoque dado à família, se volta muito

mais à identificação dos vínculos afetivos que enlaçam e consolidam a sua

Família.p. 30. 172 SANTIAGO JÚNIOR, Aluísio. Direito de família, aspectos didáticos, doutrina e jurisprudência de acordo com as inovações constitucionais. p.2 e ss. 173 GUSMÃO, Paulo Dourado de. (apud SANTIAGO JÚNIOR, Aluísio. Direito de família, aspectos didáticos, doutrina e jurisprudência de acordo com as inovações constitucionais. p.2 e ss.).

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formação174.

Afirma ainda a autora (op. cit.) que a Constituição Federal de

1988 veio a absorver essa transformação e adotou uma nova ordem de valores,

privilegiando a dignidade da pessoa humana, realizando verdadeira revolução.

Afirma que a entidade familiar é plural e não mais singular, tendo várias formas de

constituição, voltando o seu olhar para a realidade dos arranjos que mostram as

várias possibilidades de representação social da família. O segundo eixo

transformador é a alteração do sistema de filiação, proibindo designações

discriminatórias decorrentes do fato de ter a concepção ocorrida dentro ou fora do

casamento em outras palavras, filho é filho, discriminar crianças fora do

casamento é proibido. O terceiro eixo veio consagrar o princípio da igualdade

entre homens e mulheres.

Observa-se que família brasileira no decorrer de sua história

vem passando por transformações significativas fundamentadas nos princípios

constitucionais que vem corroborar para que o vínculo familiar venha a se

fortalecer na sua essência principal, como célula máter da sociedade.

Viável aqui ressaltar Rui Barbosa quando afirmou: “família é

a célula mater da sociedade”. John MacArthur escreveu: “Talvez sejamos

testemunhas da morte da célula básica de toda a civilização, a família”. Quando

Deus instituiu a família visou ao homem e a sua esposa oportunidade de prazer,

convívio mútuo e meio de procriação, uma forma de se multiplicar175.

Na concepção de Dias176, não mais se concebe a família

como estrutura única, engessada pelos sagrados laços do matrimônio. Também

afirmam que ela não mais se caracteriza pela presença de um homem e uma

mulher e sua prole. Nem sequer haver parentesco em linha reta entre seus

integrantes, ou diversidade de sexo entre seus partícipes, para caracterizar uma

entidade familiar. O traço principal que a identifica é o vínculo de afetividade.

Conforme ainda o autor, apenas uma coisa é certa e parece

não mudar jamais: as pessoas não abandonam a preferência pela vida em

174 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. 175 HENRIQUE, Carlos. Família: instituição divina!. Capelania Institucional. 2006. Disponível em: <http://www.mackenzie.com.br/dhtm/capelania/mensagem2.php?codigo=200>. Acesso em Abr. 2008. 176 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias, 2007.

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família, seja de que molde ou tipo se constitua seu núcleo familiar. Na idéia de

família, o que mais importa a cada um de seus membros, e a todos a um só

tempo, é exatamente pertencer ao seu âmago, é estar naquele idealizado lugar

onde é possível integrar sentimentos, esperanças e valores, permitindo, a cada

um, se sentir a caminho da realização de seu projeto pessoal de felicidade.

A família é de fato a primeira sociedade da qual se faz parte.

Ela é a mais importante. A única que tem laços indissolúveis. Nela se vive a maior

parte da existência. Nela se pode desenvolver talentos naturais e dons espirituais.

E, acrescenta afirmando que à família cabe a educação primeira dos filhos, o

ensinar as primeiras letras e o dar os primeiros passos. É ela quem solidifica os

valores éticos e morais e é nela que se aprende sobre o valor das coisas

espirituais177.

Nesta perspectiva Engels afirma que:

A única coisa que se pode responder é que a família deve progredir na medida em que progride a sociedade, que deve modificar-se na medida em que a sociedade se modifique; como sucedeu até agora. A família é produto do sistema social e refletirá o estado de cultura desse sistema178.

Assim sendo, verifica-se que a família vem a ser o produto

do sistema social, onde muitas variáveis fazem-se presentes. Influência e

acontecimentos tanto positivo como também negativos vem a nortear o ambiente

familiar, cujos reflexos a sociedade está a absorver. Como família vem a ser um

sistema aberto e em transformação constante pela troca de informações com os

sistemas extras familiares. As ações de cada um de seus membros são

orientadas pelas características intrínsecas ao próprio sistema familiar, mas

podem mudar diante das necessidades e das preocupações externas, como

abordaremos a seguir a família na qual um dos integrantes vem a ser uma pessoa

portadora de dependência química.

177 HENRIQUE, Carlos. Família: instituição divina!. Capelania Institucional. 2006. Disponível em: <http://www.mackenzie.com.br/dhtm/capelania/mensagem2.php?codigo=200>. Acesso em Abr. 2008. 178 ENGELS, F. A origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado. 15. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000, p.91.

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3.2 A FAMÍLIA DO DEPENDENTE QUÍMICO

A Dependência Química dentro de uma família traz uma

grande dose de estresse, transformando-se rapidamente em uma doença de todo

o grupo familiar. Este estresse é responsável pelo rompimento da estabilidade.

Frente a tais problemas, são freqüentes os isolamentos sociais, as disfunções

sexuais (em ambos), a inversão de papéis, confundindo assim à parte com o todo.

Observa-se em nossos dias o costume de dizer e ouvir, “se

a família vai bem, a sociedade vai bem”. É evidente que se na família existe um

ente familiar dependente químico, essa família não vem a estar efetivamente

bem, em razão de um integrante estar acometido de uma doença reconhecida

pela OMS, como Dependência Química.

Nesse sentido registra Payá e Figlie: “O impacto que a

família sofre com o uso de drogas por um de seus membros é correspondente às

reações que vão ocorrendo com o sujeito que as utiliza”179.

É fator determinante para poder ajudar o ente familiar

dependente que a família reaja ao sofrimento e busque alternativas para ajudar a

vencer a dependência.

Confirma Liddle e Dakof que a família tem um papel

importante na criação de condições relacionadas tanto ao uso abusivo de drogas

quanto aos fatores de proteção, funcionando igualmente como antídoto, quando o

uso de drogas já estiver instalado180.

Ao pensar-se em prevenção, no que diz respeito à família,

destaca-se que o uso de álcool e/ou outras drogas pelos pais, é um fator de risco

importante, assim como a ocorrência de isolamento social entre os membros da

família. Também é negativamente influente um padrão familiar disfuncional, bem

como a falta do elemento paterno. São considerados fatores de proteção a

existência de vinculação familiar, com o desenvolvimento de valores e o

compartilhamento de tarefas no lar, bem como a troca de informações entre os

membros da família sobre as suas rotinas e práticas diárias; o cultivo de valores

familiares, regras e rotinas domésticas também devem ser consideradas, e

179 PAYÁ e FIGLIE Figlie, Neliana Buzi . Aconselhamento em Dependência Química, 2004. p 340.

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viabilizadas por meio da intensificação do contato entre os componentes de cada

núcleo familiar.

Uma vez que a família é um dos elos mais fortes dessa

cadeia multifacetada que forma o uso abusivo de drogas instaurado na

adolescência, muitas abordagens terapêuticas são "baseadas na família" e

abrangem os fatores intrafamiliares, intra-individuais e socioculturais, de forma

sistêmica.

Stanton e Shadish referem-se a pesquisas que reforçam a

idéia de que é preciso atingir as famílias e trabalhar os vínculos entre seus

membros, nos casos dos indivíduos adictos que querem sair dessa situação,

baseando-se que o tratamento do adicto se beneficiará da inclusão do sistema

familiar no trabalho dos vínculos familiares, devido à ligação entre os mesmos181.

Fundamental, portanto, a participação da família no

tratamento. “Todos podem ajudar: o patrão, os amigos, os vizinhos, mas o suporte

maior deve vir da família. As chances de sucesso do tratamento pioram muito

quando a família não está por perto”182.

A família não está por perto, quando ela vem a violar o

princípio da Dignidade Humana, fugindo de sua responsabilidade como família

instituída. Violar um princípio é muito mais grave do que transgredir uma norma

qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico

mandamento obrigatório, mas a todos os sistemas de comandos. É a mais grave

forma de ilegalidade.

Como instituição familiar ela tem o dever de proteger, zelar,

buscar formas e alternativas de tratamentos. Sendo ela a primeira a detectar o

problema, através das mudanças de atitudes, de comportamentos, troca de

amizades, o mau desempenho escolar, entre outras manifestações visíveis, tem

por obrigação imediata também buscar auxílio, socorro e ajudar no processo de

tratamento. Nenhuma pessoa está tão próxima do dependente, como a família e

180 LIDDLE & DAKOF, 1995a. 181 STANTON e SHADISH. (1997). In: LARANJEIRA, Ronaldo. et al. (coord.). Usuários de substâncias psicoativas: abordagem, diagnóstico e tratamento. 2. ed. São Paulo: Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo/Associação Médica Brasileira, 2003. 182 ÁLCOOL E DROGAS SEM DISTORÇÃO. Programa Álcool e Drogas (PAD) do Hospital Israelita Albert Einstein. Disponível em: <www.einstein.br/alcooledrogas>. Acesso em: 02/04/2008.

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se esta vir a negligenciar ajuda e tratamento para a doença, quem mais poderá vir

a fazê-lo? A Dependência Química também mata como outra doença qualquer e

pode ir mais além, sendo que seus reflexos minam toda a sociedade183.

Segundo Dias solidariedade é o que cada um deve ao outro.

Esse princípio que tem origem nos vínculos afetivos, dispõe de conteúdo ético,

pois contém em suas entranhas o próprio significado da expressão solidariedade,

que compreende a fraternidade e a reciprocidade184. (grifo do autor)

O valor do ente familiar como integrante dessa está no que

ele é e não no que ele representa ser. Ele é humano, portanto por ser humano

independe de condição para ter sua dignidade reconhecida. A solidariedade faz

parte deste processo de reconstrução para restaurar os muros derrubados. Como

princípio ela deve estar inserida na família desde o início de sua formação. Ser

solidário é respeitar o principio da Dignidade Humana.

Mioto menciona que é preciso “pensar as famílias sempre

numa perspectiva de mudança, dentro da qual se descarta a idéia dos modelos

cristalizados para se refletir as possibilidades em relação ao futuro”. Nesse

sentido, coloca que as transformações ocorridas no âmbito familiar são históricas

e articuladas com a sociedade, e quando não encontram “soluções adequadas

para os desafios, elas expressam suas dificuldades por meio de inúmeros

problemas (dificuldades de relacionamento, membros-problema, doenças)”185.

Uma das características marcantes e destrutivas na vida de

um dependente químico é a perda da família através do abandono por parte dela.

Por vergonha, discriminação, por falta de conhecimento da doença, a família vem

a desistir do dependente. Há casos que se um dos membros deixarem de

concordar com o abandono e quiser ajudar, é impedido e até proibido pelos

demais familiares, passa a sofrer ameaças também de exclusão do grupo familiar,

ouvindo frases como: “quer ajudar, vai viver com ele”. Dessa forma o caos vem a

se instalar, o vínculo familiar prestes a se romper. É necessário haver mudanças

urgentemente.

Buscar soluções sempre, reconstruir o caminho de volta do

183 ÁLCOOL E DROGAS SEM DISTORÇÃO. Programa Álcool e Drogas (PAD) do Hospital Israelita Albert Einstein. Disponível em: <www.einstein.br/alcooledrogas>. Acesso em: 02/04/2008. 184 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias, 2007. 185 MIOTO, Regina Célia Tamaso. Família e Serviço Social. Contribuições para o debate. In: Serviço Social e Sociedade, São Paulo, nº.55, nov.1997.

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doente apontando, os meios e métodos, o tratamento, o remédio; desistir jamais,

vem a ser inconcebível esse tipo de atitude, retroceder é violar o princípio da

solidariedade quando nos dias atuais, o traço principal que identifica a família vem

a ser o vínculo de afetividade, fundamentado na Carta Magna.

3.3 A IMPORTÂNCIA DA FAMÍLIA NO TRATAMENTO E INSERÇÃO DO

DEPENDENTE QUÍMICO

A importância da família no tratamento e recuperação do

dependente químico é fator essencial.

A família deve ser a primeira a exercitar o princípio da

dignidade humana para com o ser humano. É ali que ele inicia sua caminhada

para o desenrolar da vida e automaticamente de sua história. Vem a conhecer as

primeiras noções de respeito e amor, entre outras. Viver em sociedade, passando

a perceber a convivência em grupo, a ajuda mútua, o repartir do pão, etc. Vem a

crescer e contribuir e continua a ter o apoio da família, a contar com ela em todos

os momentos, de todas as formas, tão quão necessário para sua formação. Até

aí, tudo transcorre normalmente, até que surge a problemática das drogas,

através de um ente familiar; sem avisar ou pedir licença, a dependência, aos

poucos, vem a se infiltrar no seio familiar. Que fazer? Se a família não acolher,

quem o fará?.

A família é fundamental para o sucesso do tratamento da dependência química. Pensar que tudo se resolverá a partir de uma internação ou após algumas consultas médicas é uma armadilha que não poupa a mais sincera tentativa de tratamento186.

Assim sendo, se pensar que simplesmente a Comunidade

Terapêutica ou um outro tipo de intervenção virá a resolver a situação, é mera

imaginação, se a família não estiver junto, dando todo o apoio e importância que o

caso por si só exige.

Antes da doença existir, a atenção, o apoio, a vivência em

186 ÁLCOOL E DROGAS SEM DISTORÇÃO. Programa Álcool e Drogas (PAD) do Hospital Israelita Albert Einstein. Disponível em: <www.einstein.br/alcooledrogas>. Acesso em: 02/04/2008. 186 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias, 2007.

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grupo é característica marcante de que o vínculo familiar está a existir de forma

clara. Com a doença dependência química instalada no ente familiar, esses laços

devem vir a ser estreitar de maneira mais forte, não permitindo que o vínculo

familiar venha a se romper em hipótese alguma, para não prejudicar e aniquilar

todo o processo de tratamento. E, pode-se acrescentar que, “as chances de

sucesso no tratamento pioram muito quando a família não está por perto187”.

De acordo, Figlie explica que a família não está por perto,

quando ela, simplesmente, interna o dependente químico na comunidade

terapêutica e pensa que sua missão está cumprida, que é a comunidade que tem

o dever de fazer o milagre da recuperação por si só. Também não está por perto

quando negligencia todos os convites, abordagens; compromissos que o

tratamento do ente familiar vem a exigir. Não está por perto quando não quer

entender que a drogadição é uma doença crônica e que o dependente é digno de

tratamento adequado, e deve receber atenção e respeito, ao ponto de ter seu

princípio de dignidade humana totalmente resguardado188.

Figlie, esclarece que, por outro lado, a família perto,

participando de todo o processo que o tratamento venha a exigir, faz com que o

dependente químico venha a perceber que ainda há possibilidades, ainda há

diálogo, a família não desistiu e que ainda acredita na eficácia do tratamento.

Esse comportamento, vem gerar no dependente químico a motivação para

prosseguir no objetivo proposto. Caso contrário, para que tratar, se não há nem

mais a credibilidade dos entes mais chegados, daqueles que, conhecendo sua

essência deviam ser agentes restauradores no processo de tratamento e

recuperação, reavendo sua dignidade189.

A família é a fonte que pode jorrar vitalidade na vida do

dependente químico. Ele necessita reestruturar sua vida em todos os aspectos:

moral, familiar, social e emocional entre outros; valores esses que foram

desgastados pela dependência. É através da família engajada no processo do

187 ÁLCOOL E DROGAS SEM DISTORÇÃO. Programa Álcool e Drogas (PAD) do Hospital Israelita Albert Einstein. Disponível em: <www.einstein.br/alcooledrogas>. Acesso em: 02/04/2008. 188 FIGLIE, Neliana Buzi; BORDIN, Selma; LARANJEIRA, Ronaldo. Aconselhamento em dependência química, 2004. 189 FIGLIE, Neliana Buzi; BORDIN, Selma; LARANJEIRA, Ronaldo. Aconselhamento em dependência química, 2004. 189 FIGLIE, Neliana Buzi; BORDIN, Selma; LARANJEIRA, Ronaldo. Aconselhamento em dependência química, 2004

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tratamento e recuperação que o cliente vem a reabastecer, reaver os valores

outrora perdidos190.

Para Figlie “O apoio familiar é vital para a reestruturação do

dependente químico191”. Vitalizar, segundo o Prof. Celso Pedro Luft, significa “dar

vida a, restaurar as energias, revigorar, infundir novo alento, novo ânimo”.

Assim sendo, pode-se também afirmar, que a família vem a

ser parte vital para a recuperação do dependente químico.

Porém, por outro lado, a família, desconhecendo a

problemática da dependência, por falta de informação e de orientação, vem a

estar despreparada para enfrentar a situação. E na perspectiva de que qualquer

tipo de ajuda venha a apresentar resultados eficazes, desenvolve

comportamentos muitas vezes de maneira errônea192.

As reações familiares à dependência na família abrangem

um enorme leque que vai desde a expulsão de casa até a aceitação do consumo

dentro do ambiente familiar, a (facilitação), que sempre acarreta conseqüências

desastrosas, complementa.

A facilitação, segundo ele, “é o favorecimento de

comportamento e atitudes relativas ao consumo de drogas”. Agindo assim, a

família não está em nada contribuindo para o tratamento e recuperação do

dependente, há um fechar de olhos para os problemas e as conseqüências que o

dependente passa a enfrentar e longe dele desejar e aderir a um tratamento193.

Nesse sentido o autor afirma que “paralelamente ao

tratamento individual do dependente, uma intervenção terapêutica familiar é

sempre aconselhável”194.

Terapêutica ou terapia segundo o Prof. Celso Pedro Luft, diz

respeito ao estudo dos métodos de tratamento das doenças.

Entende-se, portanto, que a família, muitas vezes, necessita

receber orientações e aconselhamentos, seguindo um método de tratamento

adequado, para poder agir de maneira que venha a contribuir através do seu

190 LEITE, Marcos da Costa. Conversando sobre cocaína e crack, 2003. 191 FIGLIE, Neliana Buzi; BORDIN, Selma; LARANJEIRA, Ronaldo. Aconselhamento em dependência química, 2004, p.353. 192 LEITE, Marcos da Costa. Conversando sobre cocaína e crack, 2003. 193 LEITE, Marcos da Costa. Conversando sobre cocaína e crack, 2003. 194LEITE, Marcos da Costa. Conversando sobre cocaína e crack, 2003.

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apoio a eficácia do tratamento da doença. Seria este o entendimento relativo à

intervenção terapêutica familiar, como sendo uma das alternativas para contribuir

com eficácia no tratamento, recuperação e, reinserção.

Marcos da Costa Leite, em outra obra, afirma: “A terapia

familiar é um aspecto sumamente importante na recuperação do dependente em

tratamento”195.

Nesta, um dos aspectos importantes, muitas vezes

abordado, vem a ser o próprio desconhecimento sobre drogas, seus aspectos,

sinais de uso e abuso, implicações.

Na terapia familiar, tais assuntos passam a ser abordados,

objetivando esclarecer, orientar, para que a família possa aprender e passar a

compreender melhor as atitudes e comportamentos do dependente, de maneira

que possa conviver de forma que venha a contribuir no processo de tratamento e

recuperação. Assim sendo, pode vir a auxiliá-lo com firmeza, transmitindo

segurança e certeza de que vem a estar junto nesta caminhada, por conhecer um

pouco da problemática da dependência existente, e assim, poder contribuir

sabiamente no processo de tratamento e recuperação. Afirma o autor “a família

necessita discutir seus (pré)-conceitos, melhorar a qualidade das relações

interpessoais para criar uma real estrutura de suporte ao paciente, que auxilie em

sua reabilitação”196.

É necessário que a família venha a se esvaziar de qualquer

tipo e regras de comportamentos leigos, que até o momento não ajudaram a

enfrentar com êxito o problema da dependência e dar abertura a um novo

aprendizado, objetivando mudanças de hábitos, rotinas, criando um ambiente

próprio, para que o dependente possa crescer no seu objetivo e ganhar firmeza a

cada novo dia.

Afirma ainda que se “faz necessário que a família aprenda a

não ‘sabotar’ o processo de recuperação do paciente, como também sua

abstinência”.

Sabotar, aqui mencionado, recorrendo-se ao Professor

Celso Pedro Luft, significa dificultar, opor resistência o que foi trabalhado.

195 LEITE, Marcos da Costa. Conversando sobre cocaína e crack, 2003, p.19. 196 LEITE, Marcos da Costa. Conversando sobre cocaína e crack, 2003, p.19.

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Nesse caso seria opor-se a todo o processo de recuperação

e a abstinência, a tudo que foi construído como fruto do tratamento eficaz. Mudar

atitudes, hábitos na rotina da família, em favor do dependente, é construir um

novo projeto de vida, é um gesto de amor ao próximo, é não sabotar.

Faz-se necessário ser prudente, principalmente no lazer,

festas e reuniões de família, organizar de maneira que os elementos, acessórios

diretos e indiretos usados, não causar fissuras (desejo de usar a droga) ao

dependente. Isso é zelar, respeitar, ajudar no processo de tratamento e

recuperação do ente familiar. Vem a ser atitudes valorosas que o dependente

deve perceber e passa a se sentir amado, vendo que não está mais só nesse

processo, mas que ainda está a existir um elo muito forte, talvez o mais forte

nessa caminhada, o vínculo familiar.

Sintetiza-se assim esta parte relatando que o tratamento na

Comunidade Terapêutica, cujo período de internação atende o regimento de cada

Instituição, varia de seis a doze meses de internação. Observa-se que após este

período, no mês que antecede a saída, é trabalhado a reinserção sócio familiar do

interno. Ele passa a sair nos finais de semana para casa da família ou um ente

que tenha acompanhado seu tratamento. Passa a ter seu comportamento

monitorado e observado nestes períodos, como também leva tarefas para ser

cumpridas por escrito, deve ser feita por ele juntamente com um ente familiar,

vem a ser tipos de questionário para descrever o final de semana em família, o

qual deverá após ser analisado pela psicóloga responsável pelo tratamento na

Instituição. Após a alta do tratamento sugere-se que o dependente químico

participe de grupos de apoio, como Alcoólicos Anônimos, Amor Exigente, CAPS

AD locais, Grupos de Apoio de Igrejas locais e ter a família sempre por perto, não

no sentido de fiscalizar, mas no sentido de proteger, zelar. A família como parte

fundamental neste processo, vem a servir como rede de apoio social e deve vir a

ser inserida como um participante a mais, ativo e com potencial a ser

desenvolvida, para assim criar condições efetivas de enfrentamento da

situação.197

197 Relato feito pela autora do trabalho com base na pesquisa realizada no Pró-Vida.

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3.4 A FAMILIA E O PRINCIPIO DA DIGNIDADE HUMANA

Ao caminhar pelas ruas da nossa Itajaí, mais próximo dos

acessos às rodovias, é comum nos deparar com alguns seres humanos largados

a mercê do caminho. Ociosos, sem rumo, mal cheirosos, famintos, um cartão

postal para quem está para chegar á cidade bastante deprimente e assim o

quadro também vem a ser o mesmo por esse Brasil a fora. A maioria desses

seres humanos já experimentaram viver em família, alguns são pessoas

portadoras de dependência química que à família um dia veio a desistir deles,

veio a cansar e hoje vive a margem da sociedade e esta os vem reconhecer como

uma ameaça. Lá no inicio de sua trajetória veio a lhes faltar o respeito ao princípio

da Dignidade Humana, não só por parte da família, mas do Estado também.

Pergunto eu, alguém veio a lhes acolher? De forma alguma não. O breve relato é

prova disso. Entende-se então, que se a família não acolher o doente, outros

também não o acolhem e o caos na vida desses está imposto.

Segundo Dias

O direito das famílias é o mais humano de todos os direitos. Acolhe o ser humano desde antes do nascimento, por ele zela durante a vida e cuida de suas coisas até depois de sua morte. Procura dar-lhe proteção e segurança, rege sua pessoa, insere-o em uma família e assume o compromisso de garantir a sua dignidade. [...} Essa série de atividades nada mais significa do que o compromisso do Estado de dar afeto a todos de forma igualitária, sem preconceitos e discriminações198.

Desistir do dependente químico é desrespeitar a vida, é

insensibilidade, é não dar chance a si mesmo de exercitar o amor fraternal, este

sentimento tão nobre que tem o poder de transformar, moldar a vida do ser

humano, tão necessário na convivência familiar. O dependente químico é um ser

humano como outro qualquer. Veio a nascer de mulher, dotado de físico, alma e

espírito, portador de Dignidade Humana, já desde o ventre materno. Não veio ao

mundo sozinho, foi concebido no seio familiar, possui laços consangüíneos, como

também não nasceu dependente, pelo contrário, a dependência química veio a

ser adquirida e treinada ao curso da vida, uns mais cedo, outros mais tarde,

198 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias, 2007, p 78.

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levados pelas circunstâncias e fatores peculiares de cada pessoa e o meio em

que ela vive.

Diante dos fatos, como entender a instituição família, no

auge de sua consagração, quando se observa que o Princípio da Dignidade

Humana não está sendo respeitado na pessoa do dependente químico.

Segundo Dias a Dignidade da Pessoa humana, colocada no

ápice do ordenamento jurídico, encontra na família o solo apropriado para o seu

enraizamento de desenvolvimento; daí a ordem constitucional dirigida ao Estado

no sentido de dar especial e efetiva proteção à família, independentemente da

sua espécie. Propõe-se, por intermédio da repersonalização das entidades

familiares, preservar e desenvolver as qualidades mais relevantes entre os

familiares: o afeto, a solidariedade, a união, o respeito, a confiança, o amor, o

projeto de vida comum, permitindo o pleno desenvolvimento pessoal e social de

cada partícipe, com base em ideais pluralistas, solidaristas, democráticos e

humanistas.199

Viável destacar-se a colocação do sociólogo Giddens, ao

afirmar que as duas principais funções da família são a socialização primária e a

estabilização da personalidade. Segundo esse autor a socialização primária é um

processo pelo qual as crianças aprendem as normas culturais da sociedade em

que nasceram [...] ocorre durante os primeiros anos da infância, a família é o mais

importante núcleo para o desenvolvimento da personalidade humana. Diz o autor

que a estabilização da personalidade [...] é o papel desempenhado pela família ao

assistir emocionalmente seus membros adultos200.

Logo, na concepção de Dias, é a família, a primeira célula da

sociedade a desenvolver o princípio da Dignidade Humana para com seus

integrantes. A pessoa não recebe dignidade humana, ela já é digna a partir de

seu nascimento, é algo inerente a todo ser humano, pelo simples fato de ser

humano, simplesmente, humano. A dignidade por si só é estabelecida no ser

humano, portanto ela deve ser respeitada de todas as formas e maneiras a iniciar

no meio familiar, refletindo-se ao meio social. É na família que o dependente

químico vem mostrar os primeiros sinais da doença e verifica-se que na maioria

199 DIAS, Maria Berenice. Direito de Família e o novo Código Civil. 3. ed, Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 105-106.

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das vezes a família não vem a perceber. A luta pela sobrevivência principalmente

na área financeira está acima de outros valores e vem roubar sutilmente, os

momentos de diálogo, percepção, sensibilidade, tão necessário ao convívio

familiar, fugindo do ideal de ninho, abrigo, porto seguro. A doença está instalada,

o dependente passa a apresentar conseqüências até graves no aspecto físico,

moral e social. Surge a crise familiar. É cobrado, acusado, desrespeitado,

ameaçado e até excluído do próprio ambiente. Trata-se de um doente, portador

da doença denominada Dependência Química, como também poderia ser

portador de um Câncer, de Aids, de Tuberculose, de Cirrose quando não teria sua

dignidade arranhada.

A família no tratamento mostra que o diálogo ainda existe. A

rotina da dependência química traz ressentimentos para todos.

Muita roupa suja vai ser lavada. No entanto, é preciso entender

que se trata de uma doença. Em um primeiro momento a

motivação do dependente para a mudança e do apoio da

família para mantê-lo motivado são importantíssimos. Isso

demonstra que a família ainda é capaz de se unir, conversar e

resolver seus problemas201.

Segundo Oliveira, o que não pode ser esquecido é que o

sistema jurídico não cria afetividade entre pais e filhos. Apenas confere campo

propício para que essas relações se desenvolvam. Os vínculos de sangue unem

pais e filhos para o resto de suas vidas. Todavia, respeito, carinho, afetividade e

responsabilidade dos pais para com seus filhos são algo que não pode ser

compulsoriamente imposto202.

Afirma ainda ele que vem a ser uma questão de maturidade

e de evolução, e neste ponto chega-se aos limites de atuação do elemento

normativo para ter ingresso aos altos valores que devem existir em cada

brasileiro. O filho desprezado de hoje, segundo ele, “pode ser a única pessoa com

quem possa o imaturo pai contar amanhã; quadro que se repete como lição de

200 GIDDENS, Anthony. Sociologia. p.152. 201 ÁLCOOL E DROGAS SEM DISTORÇÃO. Programa Álcool e Drogas (PAD) do Hospital Israelita Albert Einstein. Disponível em: <www.einstein.br/alcooledrogas>. Acesso em: 02/04/2008. 202 OLIVEIRA, José Sebastião de. Fundamentos Constitucionais do Direito de Família. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

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vida, diariamente”203.

A família exerce e respeita o princípio da Dignidade

Humana, quando ela muitas vezes com dificuldades para enfrentar a doença do

dependente químico, vem a buscar ajuda, auxílio, orientação, apoio e tratamento

nas Instituições de caráter filantrópico e social.

Quando os dependentes químicos chegam a uma dessas

instituições, geralmente já se conscientizaram que necessitam de ajuda para

vencer a dependência, bem como explicitaram o desejo de se submeterem ao

tratamento. Não raramente estão com suas relações sócio-familiares

prejudicadas, quando não destruídas, e com seus projetos educativo e

profissional interrompidos.

Nesse sentido, o processo de reinserção familiar e social do

interno do Centro de Tratamento Alternativo Pró-Vida, tornou-se nosso objeto de

estudo, buscando conhecer a dinâmica do processo de acompanhamento no

tratamento através da presença participativa, nas visitações semanais ao interno,

presença ativa nas reuniões do GRAF – Grupo de Apoio a Familiares, presentes

quando solicitados e abertos à visitação pela Equipe de profissionais, tratados a

seguir.

3.5 COMUNIDADE TERAPÊUTICA: CENTRO DE TRATAMENTO

ALTERNATIVO PRÓ-VIDA

A Família e a Comunidade Terapêutica (CT) são fatores

primordiais na vida de um dependente químico, se ele almeja o tratamento, o

problema não é mais só dele, a Comunidade Terapêutica abraça e convida a

família não só a abraçar o problema, mas ir além, entender que a vida do ente

familiar está acima de qualquer problema. Dependente e família recebem ajuda

especificas para vencer a temática da drogadição.

Figlie afirma que, apesar da CT ser um dos ambientes de

tratamento mais conhecidos do público brasileiro, há pouca informação nacional

disponível a respeito. Segundo ela, as CTs surgiram das observações clínicas de

203 OLIVEIRA, José Sebastião de. Fundamentos Constitucionais do Direito de Família. 2002, p. 255.

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Maxwell Jones em 1953. Psiquiatra do exército inglês, Jones começou a

desenvolver esse modelo para soldados com traumas da II Guerra Mundial.

Durante os anos 1950 as CTs ganharam grande notoriedade como uma

alternativa para o tratamento psiquiátrico manicomial. Para ela, foi durante os

anos de 1960 em diante que começaram a surgir as CTs exclusivamente

desenhadas para o tratamento da dependência de álcool e drogas204.

Dois modelos de tratamento influenciaram ativamente essas

primeiras comunidades: o modelo de Minnesota, nome dado ao tratamento

proposto para o AA em 1935 e o modelo Synanon, já mencionado na obra de

George De Leon205.

Segundo Figlie, desprestigiadas desde o final dos anos

1970, as CTs voltaram a chamar atenção nos anos 1980, vindo a apresentar

perfis diferentes de suas predecessoras. Sem ter pessoal especializado,

passaram para abordagens com base na psicanálise e nas terapias existencial e

cognitiva comportamental. Houve, segundo ela, maior investigação científica

acerca de sua eficácia, dos pacientes mais indicados para esse ambiente de

tratamento, do papel dos profissionais envolvidos, entre outras coisas206.

A autora registra como conceito atual de CT, segundo a

Associação Nacional de Comunidades Terapêuticas dos Estados Unidos como

“Um tratamento comunitário altamente estruturado que emprega sanções e

penalidades, privilégios e prestígios determinados pela comunidade como parte

de um processo de recuperação”207.

Registra ainda, que no ano de 1990 foi fundada a Federação

Brasileira de CTs (FEBRACT) que possui cerca de uma centena de filiadas. Há

ainda, segundo ela, um número equivalente de outras CTs não filiadas à

FEBRACT, mas que possuem registro junto aos Conselhos Estaduais de

Entorpecentes. Muitas CTs brasileiras têm alto grau de organização e

complexidade e, por outro lado, afirma que existem outras funcionado

204 FIGLIE, Neliana Buzi; BORDIN, Selma; LARANJEIRA, Ronaldo. Aconselhamento em dependência química, 2004, p. 142. 205 DE LEON, George. A Comunidade Terapêutica : Teoria, modelo e método, 2003. 206 FIGLIE, Neliana Buzi; BORDIN, Selma; LARANJEIRA, Ronaldo. Aconselhamento em dependência química, 2004, p. 142. 207 FIGLIE, Neliana Buzi; BORDIN, Selma; LARANJEIRA, Ronaldo. Aconselhamento em dependência química, 2004, p. 154.

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precariamente, sem infra-estrutura e equipe pouco capacitada e que não há

estudos ou um indicador público acerca da quantidade e da qualidade das

comunidades208.

Na concepção de George De Leon, a CT considera o abuso

de substâncias um transtorno complexo da pessoa inteira. Padrões de

comportamento e de pensamento derrotistas ou auto-destrutivos revelam

perturbações tanto no estilo de vida como no modo individual de agir dos

dependentes químicos e este, segundo ele, é responsável por seu transtorno e

sua recuperação; afirma que da perspectiva da CT, a dependência química é um

sintoma, não a essência do transtorno, o problema é a pessoa e não a droga209.

Afirme o autor, através da experiência de recuperação dos

residentes em CT, que embora difiram em termos demográficos, sociais e

psicológicos, todos os indivíduos em CT. partilham essas características da

pessoa portadora de transtornos, sendo que tal afirmação é compatível com

pesquisas sobre as características psicológicas e de personalidade dos usuários

abusivos de substâncias em geral, já realizados.

No Brasil, segundo a autora, as CTs são conhecidas por

“fazendas” ou “sítios” e são ambientes terapêuticos bastante recorrentes no meio

brasileiro. Afirma que os estudos acerca do tema são praticamente nulos na

literatura científica nacional, restrito a relatos da experiência de profissionais

envolvidos em tais ambientes. Para ela, os modelos terapêuticos utilizados

nessas comunidades habitualmente se baseiam no Modelo de Minnesota, em

preceitos religiosos ou em combinação de ambos. Muitas dessas comunidades

são administradas por equipes de dependentes que concluíram, com sucesso, o

programa terapêutico. Registra ela que, as CTs de orientação católica e

evangélica são bastante comuns e participam ativamente do tratamento dos

dependentes de álcool e drogas e da capacitação de indivíduos interessados em

participar desse tipo de tratamento comunitário.210

Na cidade de Itajaí, além da Comunidade Terapêutica CT

PRÓ-VIDA existem mais quatro Instituições que atende também como

208 FIGLIE, Neliana Buzi; BORDIN, Selma; LARANJEIRA, Ronaldo. Aconselhamento em dependência química, 2004, p. 477. 209 DE LEON, George. A Comunidade Terapêutica: Teoria, modelo e método, 2003, p.51. 210 FIGLIE, Neliana Buzi; BORDIN, Selma; LARANJEIRA, Ronaldo. Aconselhamento em

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Comunidade Terapêutica voltada a esse público, ou seja, portadores da doença

denominada como Dependência Química. Oportuno mencioná-las para

conhecimento, sendo: o Desafio Jovem Nova Vida, localizado no Bairro

Canhanduba, a Casa de Recuperação Vale Ebenezer no Bairro da Paciência, o

CREDEC localizado no Bairro de São Roque e o Resgate Dominante localizado

no Bairro da Ressacada e que entres as cinco Comunidades vem ser a única que

atende pessoas do século feminino. Dentre essas, o Pró-Vida é a Comunidade

Terapêutica que oferece a melhor estrutura e serviço em Itajaí. Ao longo destes

dezesseis anos tem prestado relevantes serviços à comunidade itajaíense e

redondezas como também clareza e transparência na aplicação dos recursos

recebidos através dos relatórios e prestações de contas apresentados na esfera

municipal, estadual e federal.

Atendendo o objetivo inicialmente proposto, nesta parte do

trabaho se abordará a Comunidade Terapêutica PRÓ-VIDA de Itajaí, embasando-

se em pesquisa realizada pela equipe profissional da própria instituição, na qual

se está inserida.

A partir de então os registros aqui realizados foram

coletados e elaborados com levantamento de dados na própria Instituição através

de seus respectivos registros, nas pesquisas ali realizadas.

Muitas são as instituições junto à sociedade civil,

pertencentes ao grupo do 3º Setor, (instituições sem fins lucrativo), que têm se

proposto a desenvolver um trabalho de assistência e tratamento a dependentes

químicos, através de Comunidades Terapêuticas. O número delas cresce, à

medida em que a demanda aumenta, levando grupos, comunidades, associações,

clubes de serviços e igrejas a organizarem trabalhos de atendimento a esse

segmento. Porém, as Comunidades Terapêuticas existem em números bastantes

pequenos em relação ao público existente que necessitam de tratamento. As

propostas de formas de atendimento a essa população específica variam de

acordo com a visão de mundo e perspectiva política, ideológica e religiosa dos

diferentes grupos.

dependência química, 2004, p.477.

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3.5.1 Histórico do Centro de Tratamento Alternativo Pró-Vida

O Centro de Tratamento Alternativo Pró-Vida é uma

Comunidade Terapêutica com sede à Rua Álvaro Beraldi, 104, Bairro Carvalho

localizado aproximadamente a 5 km do centro da cidade de Itajaí, SC,

Propunha-se inicialmente ao tratamento de dependentes

químicos. No ano de 1992 funcionava na cidade de Itapema em casa cedida por

Domênico San Giovani, com 10 internos e 3 funcionários que administravam

todas as atividades durante o dia, incluindo espiritualidade, atividade física, horta

e criação de pequenos animais.

A constatação no transcurso do trabalho, que a maioria da

clientela potencial estava contaminada pelo vírus HIV e que, via de regra, as

Instituições Civis da micro-região dedicadas a este trabalho evitavam a atenção a

indivíduos soropositivos para o vírus HIV decidiu-se atender prioritariamente aos

UDIs (usuários de drogas injetáveis) independentemente do resultado da

sorologia.

No ano de 1993 em razão da distância, sendo todos os

internos de Itajaí, a Casa de Recuperação Pró-Vida mudou-se para uma chácara,

nesta cidade, cedida pelo funcionário público Celso Félix, na localidade de Rio do

Meio permanecendo por um ano neste local. A Casa teve condições de internar

15 pessoas e já contava com 6 funcionários e incluía a criação de peixes nas

atividades terapêuticas.

Em 1994 a Casa de Recuperação Pró-Vida mudou-se para

uma casa cedida pelo representante comercial Nilton Santos no Bairro Fazenda,

também em Itajaí.

Até este período a Entidade enfrentou diversas dificuldades

financeiras, físicas, políticas, preconceitos, etc.

Em 1995 a Casa de Recuperação Pró-Vida firmou convênio

com o Ministério da Saúde, Projeto denominado "Centro de Tratamento

Alternativo Pró-Vida", válido até outubro de 1998, com o objetivo de prevenir a

infecção do HIV e o abuso de drogas endovenosas na população em geral dando

ênfase aos UDIs. Para atingir este objetivo pretendeu-se ampliar as atividades já

desenvolvidas na ONG Pró-Vida, nas áreas de prevenção, atendimento imediato,

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tratamento, reabilitação, pesquisa, reintegração dos UDIs à sociedade, enfocando

a questão das DST (Doenças Sexualmente Transmissíveis) e do HIV/AIDS, da

seguinte forma:

a) Ampliando a capacidade ambulatorial de atendimento

(interno e externo) para UDIs;

b) Ampliando as atividades de prevenção ao uso abusivo de

drogas e disseminação pelo HIV/AIDS;

c) Ampliando o serviço de aconselhamento Pré e Pós-Teste,

já existente;

d) Ampliando a capacidade de atendimento do serviço de

saúde mental: terapia de grupo, grupos de apoio e

psicoterapia aos internados;

e) Implantando um serviço de Terapia Ocupacional para

UDIs;

f) Implementando o serviço de atendimento em regime de

internato;

g) Implantando um serviço de informática.

O CENTRO DE TRATAMENTO ALTERNATIVO PRÓ-VIDA,

é uma Instituição Filantrópica, declarada de utilidade pública, pela Lei Municipal

2728 de 11 de Junho de 1992, da Lei Estadual 8959, de Janeiro de 1993 e da Lei

Federal nº 5558/2001 de 24 de Julho de 2001, tem registro no Conselho Nacional

de Assistência Social, SENAD, CONEN E NOS Conselhos Municipais: COMUSA,

CONDICA, Assistência Social, COMAD, estabelecida em Itajaí - SC, filiada a

CRUZ AZUL do Brasil e tem por finalidade principal o tratamento do usuário de

drogas e álcool, portador ou não do Vírus HIV.

O Centro de Tratamento Alternativo Pró-Vida é administrado

pela diretoria eleita por Assembléia Geral de seus membros efetivos e Conselho

Fiscal.

A Diretoria é composta de: Presidente, Vice-Presidente,

Secretário, Tesoureiro, Diretor de Relações Públicas, Diretor de Coordenação e

Diretor Executivo.

A Equipe de Profissionais da CTA Pró-Vida é composta por:

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��Um Coordenador Geral

��Quatro Coordenadores;

��Dois Monitores;

��Uma Psicóloga;

��Uma Secretária;

��Uma Relações Pública

��Um Terapeuta pastoral

��Um Professor de Educação Física;

��Duas Cozinheiras;

��Dois Estagiários;

��Aproximadamente 10 voluntários.

O CENTRO DE TRATAMENTO ALTERNATIVO PRÓ-VIDA

mantém parceria/ convênio com a Prefeitura Municipal de Itajaí e mensalmente

recebe recursos financeiros. A contrapartida é tratar de pessoas do sexo masculino,

dependentes de álcool e outras drogas, portadores ou não de HIV e Aids.

A CELESC – Centrais Elétricas de Santa Catarina também

apoia o trabalho através do Convênio firmado com a Instituição, onde as pessoas

contribuem espontaneamente através da Fatura de Luz.

Em Janeiro de 2008, foi aprovado o Projeto Horta e Esporte

junto a Fundação Mackenzie, parceria prevista para três anos, com possibilidades

de renovação do Projeto.

Apesar de contar com a parceria da 1ª Igreja Presbiteriana

de Itajaí, Prefeitura Municipal, CELESC, Projeto Mackenzie, a Instituição ainda

possui dificuldades financeiras para continuar oferecendo o melhor padrão no

tratamento.

Seu público alvo abrange a faixa etária a partir dos 14 anos

do sexo masculino com 30 alunos/dia, trabalhando em sistema de internamento,

sob abstinência total.

Com o objetivo de manter um espaço alternativo que deverá

ser usado como Terapia Ocupacional e como fonte de lazer, visando à

abstinência do uso de álcool e outras drogas e garantir as pessoas que vivem

com HIV/AIDS, o acesso ao tratamento com qualidade e promover a adesão ao

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mesmo, tem como missão “Melhoria de vidas por meio de um tratamento de

recuperação e reeducação de pessoas com transtornos decorrentes do uso e

abuso de substâncias psicoativas portadoras ou não do vírus HIV e /ou doentes

de Aids, proporcionando aos mesmos um resgate de valores e auto-estima,

contribuindo para sua inclusão social”.

Visualiza “Ser reconhecida pela sociedade, pelos serviços

prestados a comunidade, na excelência do tratamento a dependentes químicos

portadores ou não do vírus HIV e/ou doentes de Aids e por ser auto-sustentável”.

Para tal, tem como valores:

�� Amor a Deus e ao próximo.

�� Respeito mútuo.

�� Pluralidade de idéias.

�� Confiança.

�� Ética.

�� Solidariedade.

A Comunidade Terapêutica deve desenvolver métodos no

tratamento que venham a envolver o interno, equipe de profissionais e familiares

para que essas relações possam ser trabalhadas, enfrentadas e assumidas por

todos os envolvidos nesse processo e assim o resgate da relação egresso e

família, objetivando a reinserção familiar e social.

Nesse sentido, o processo de reinserção familiar e social do

interno do Centro de Tratamento Alternativo Pró-Vida, tornou-se nosso objeto de

estudo, buscando conhecer a dinâmica do processo de acompanhamento no

tratamento através da presença participativa, nas visitações semanais ao interno,

presença ativa nas reuniões do GRAF – Grupo de Apoio a Familiares, presentes

quando solicitados e abertos à visitação pela Equipe de profissionais.

3.5.2 PROGRAMA DE REABILITAÇÃO E TRATAMENTO

O CTA - PRÓ-VIDA desenvolve seu programa de tratamento

através das seguintes atividades:

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3.5.2.1 INCLUSÃO AO CTA - PRÓ-VIDA

É uma atividade desenvolvida para informar e integrar os

novos internos beneficiários ao ambiente de tratamento. Essa atividade dá-se o

nome de “Bem vindo a nossa Casa”. É realizada uma vez por mês pelo

Coordenador Geral e a Psicóloga da Instituição. É apresentado ao interno o

Programa de Tratamento da Entidade, o Vídeo Institucional, o Regimento Interno

e é feito o levantamento de expectativas quanto ao tratamento através de

anotações do próprio participante.

3.5.2.2 SAÚDE FÍSICA e ODONTOLÓGICA DOS INTERNOS

É desenvolvido a partir da assistência e acompanhamento

das recomendações médicas e/ou utilização de medicamentos”; Como também a

educação em hábitos de higiene; cuidados com o bem-estar físico e saúde bucal

faz parte deste objetivo e também vem a ser trabalhada a prevenção às DSts, HIV

e Aids, destacando-se a seguir:

�� Acompanhamento médico regular para pessoas

portadoras do vírus HIV e /ou doente de Aids no

Serviço Municipal de Saúde.

�� Acompanhamento dos Exames Laboratoriais regulares

para pessoas portadoras do vírus HIV e/ ou doentes de

Aids, solicitados pelo Serviço Municipal de Saúde.

�� Avaliação e acompanhamento psiquiátrico (quando

necessário).

�� Acompanhamento Odontológico regular para pessoas

portadoras do vírus HIV e /ou doentes de Aids.

�� Incentivo à adesão ao tratamento anti-retroviral e

complicações oportunistas.

�� Armazenamento, controle e ministração da medicação

anti-retroviral para pessoas portadoras do vírus HIV e

/ou doentes de Aids, ou demais medicamentos, para

garantir o uso responsável de medicações.

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�� Disponibilização de acompanhamento médico e

odontológico para demais internos quando

estritamente necessário.

�� Educação em hábitos de higiene física e bucal.

�� Informações sobre Drogas, HIV / DST / AIDS.

�� Disponibilização de Acervo em Drogas e HIV / DST /

AIDS.

3.5.2.3 PSICOLOGIA

Trata-se da busca do desenvolvimento emocional e afetivo,

resgate da auto-estima, modificação do estilo de vida, consciência das situações

de risco e como enfrentá-la. Esse processo consta de:

�� Triagem (entrevista inicial com a psicóloga da

Entidade).

�� Avaliação do comprometimento na adesão e

manutenção do tratamento

�� Avaliação do comprometimento biológico, psíquico,

social, familiar e legal pelo uso e abuso de substâncias

psicoativas.

�� Avaliação Familiar

�� Psicoterapia Individual

�� Psicoterapia de Grupo

�� Programa Prevenção de Recaídas

�� Grupo de Apoio às Famílias Quinzenal – GRAF,

3.5.2.4 SERVIÇO SOCIAL

O Serviço Social no CTA Pró-Vida pretende assegurar aos

internos beneficiários e a família o direito à educação, saúde, trabalho, lazer,

segurança, previdência, a proteção à maternidade e a infância, assistência aos

desamparados, desenvolvendo as seguintes atividades:

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�� Promoção da Cidadania – acesso à documentação

�� Viabilização dos Direitos Previdenciários de pessoas

portadoras do vírus HIV e/ou doentes de Aids e

demais internos ( quando necessário ):

�� FGTS

�� Auxílio – Doença

�� PIS / PASEP

�� Aposentadoria por Invalidez

�� Encaminhamentos mediante intimação à Delegacia de

Polícia e Fórum Municipal.

3.5.2.5 NUTRIÇÃO

Busca-se desenvolver no interno a valorização da

alimentação nutritiva, destaca-se:

�� Alimentação saudável e balanceada com cardápio

diário pré-elaborado.

�� Seleção, conservação e preparação de frutas e

verduras.

3.5.2.6 LABORTERAPIA

A participação diária, efetiva e rotativa de limpeza,

organização, cozinha, horta, pomar, etc, vem a fazer parte desta atividade como

imprescindível para o tratamento. Passa-se a relacionar individualmente para

melhor entendimento:

HORTA

�� Conhecimentos gerais sobre alimentação e a escolha

adequada dos alimentos;

�� Incentivo ao cultivo e consumo de produtos orgânicos;

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�� Incentivo ao trabalho comunitário.

POMAR

�� Conhecimento das técnicas de adubação, cultivo e

consumo;

�� Formas de Consumo

LIMPEZA E MANUTENÇÃO DAS INSTALAÇÕES FÍSICAS, INTERNA E

EXTERNA

�� Ambiente interno;

�� Conservação das instalações;

�� Capinação.

3.5.2.7 TERAPIA ESPORTIVA

A Entidade prima pela manutenção de um espaço alternativo

utilizado através das diversas opções da prática esportiva, entre ela destaca-se:

�� Exercícios físicos localizados;

�� Caminhadas semanais;

�� Prática do Fartlek;

�� Futebol;

�� Basquetebol

�� Futebol de salão.

3.5.2.8 DESPERTAR ESPIRITUAL

Entende-se a garantia de atividades que visem estimular o

desenvolvimento interior no interno, conforme abaixo:

�� Devocionais Diárias;

�� Meditação Dirigida diária;

�� Programa de Discipulado;

�� Aconselhamento Pastoral;

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3.5.2.9 CAPACITAÇÃO PROFISSIONAL

Estímulo ao aperfeiçoamento profissional, resgatando a

bagagem cultural e experiência de vida, por meio da valorização do processo

ensino - aprendizagem, destaca-se:

VOLTA ÀS AULAS:

�� EJA – ENSINO JOVENS E ADULTOS I e II Grau.

3.5.2.10 GRUPO DE APOIO ÀS FAMÍLIAS - GRAF

Iniciou-se este trabalho em 18 de fevereiro de 1997, depois

de se perceber a importância da participação da família na recuperação do

dependente químico e posteriormente como fator de prevenção de recaídas. O

grupo desempenha funções educativas e terapêuticas.

O fato de um membro da família estar usando drogas, pode

mostrar que este comportamento é um sintoma ou indício de que algo mais grave

está acontecendo no indivíduo, na família, na comunidade em geral. Então, torna-

se importante compreender a função das drogas na vida das pessoas e

principalmente nos membros da família.

Assim, é um desafio para estas famílias reconquistarem a

confiança no ente querido em tratamento, pois ela acaba adoecendo também. Os

relacionamentos até então, tornaram-se difíceis e tensos, levando na maioria dos

casos à desarticulação de toda estrutura familiar.

Muitos sentimentos afloram no meio da família: depressão,

estado de choque, descrença, choro incontrolável, revolta, sensação de traição,

de perda e culpa.

É no GRAF que estas famílias são orientadas em como

proceder para ajudar e dar o suporte necessário ao membro em recuperação. E o

próprio Grupo assume a função de sustentação uns para com os outros e também

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de encorajamento, para enfrentar todos os sentimentos envolvidos.

O GRAF tem ainda como objetivo informar às famílias sobre

os aspectos físicos e psicológicos que envolvem o usuário de drogas; fortalecer a

comunicação entre a família e o interno; diminuir a ansiedade das famílias; reduzir

conflitos e tensões; aprender novos meios de superar as dificuldades; preparar a

família para a reintegração da pessoa à comunidade; oportunizar a troca de

experiências; superar os preconceitos existentes em relação à questão das

drogas; estimular a família ao resgate de valores perdidos e a amá-los e acolhe-

los.

Comprovando a importância do apoio das familias, conforme

o gráfico a seguir constata-se que os internos cujas famílias participaram das

atividades do GRAF alcançaram a última etapa do tratamento.

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Inte

rna

çõ

es

2002 2003 2004 2005 2006 2007

Ano

GRAF - Grupo de Apoio à Família

Número Total de Internações

Número de Internos queconcluíram o tratamento, cujasfamílias participaram do GRAF

Número de Internos que nãoconcluíram o tratamento, cujasfamílias participaram do GRAF

Número de Internos que nãoconcluíram o tratamento, semparticipação da família

GRÁFICO 1: Resultado do tratamento dispensado aos Internos: 2002-2007

Fonte: elaborado pela acadêmica

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O CTA PRÓ-VIDA é uma Comunidade Terapêutica com

solidificada estrutura ao longo de dezesseis anos tem prestados serviços

relevantes no município de Itajaí e redondezas.

Promove palestras de prevenção ao uso e abuso de drogas

na comunidade e arredores. Distribui panfletos de conscientização e prevenção

as drogas, DSTs, HIV / AIDS e está diretamente envolvida com os portadores de

HIV / AIDS dependentes, priorizando o tratamento através da internação.

Participam dos Conselhos Municipais, Fóruns, Seminários, buscando

conhecimento e atualidades para primar sempre o melhor serviço por excelência.

Vem a ser uma gotinha da gotinha num oceano, mas está

engajada no combate de luta contra as drogas, colocando o ser humano em 1º

lugar, tratando-o em dignidade, porque ele já é um ser digno e jamais pode ter

ela violada.

Antes de se finalizar, acredito conveniente registrar que a

viabilidade, interesse e amplitude dos dados relacionados sobre a CTA Pró-Vida

foram favorecidas devido ao envolvimento da acadêmica que a partir de 1º de

Fevereiro de 2001 trabalha na Instituição.

Sendo assim, como integrante de uma equipe de

funcionários de Comunidade Terapêutica, nossa função vai mais além do que

essa mencionada exerce-se a atividade como um ministério, vive-se como em

família, ouvindo os internos, passando experiências de vida, exercendo a

afetividade através de um princípio bíblico “amar o próximo como a si mesmo”.

3.5.3 Assistência psicológica: psicoterapia de grupo

A Psicoterapia de Grupo é um momento importante no

conhecimento de crenças individuais e coletivas, no aprendizado social para a

aquisição de novos valores e resgate de outros por hora perdidos.

Todos os alunos, como se costuma chamá-los, passam pelo

momento de grupo e iniciam as atividades a partir do 2º mês de internação.

O formato grupal oferece certas vantagens: proporciona

oportunidades para verificar as interações dos alunos e assim ter condições de

administrá-las; proporciona oportunidades de experimentar os sentimentos

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negativos, para aprender a lidar com a adversidade de maneira produtiva, as

ligações pessoais tornam-se mais fortalecidas. Novas habilidades sociais e de

liderança são aprendidas. Reforço mútuo de várias práticas de comportamentos

mais adequados.

Mostra a universalidade dos problemas humanos, ou seja,

todos têm suas dificuldades. Proporciona o contato com qualidades de cada um,

por hora esquecida. Formar e manter relacionamentos sadios, pois a

incapacidade de se estabelecer estes relacionamentos é um grande fator

precipitante para as recaídas e o retorno a agentes químicos.

3.5.4 Programa prevenção de recaídas

É utilizado um modelo de prevenção desenvolvido pelo

médico psiquiatra Paulo Knapp e colaboradores a partir do livro Prevenção da

Recaída do eminente psicanalista G. Alan Marlatt da Universidade de

Washington, EUA. Tem auxiliado os residentes a tomarem consciência da

situação de dependência, bem como das situações de risco e,

conseqüentemente, a criação de estratégias e habilidades para lidarem com estas

situações, buscando a modificação do seu estilo de vida.

Estas atividades iniciam-se após três meses da data de

internação e prolonga-se por três meses aproximadamente.

Este Grupo de Prevenção dá abertura ao Aluno em

tratamento de perceber com maior ênfase o espaço que a droga ocupava em sua

vida, as perdas ocorridas e a necessidade de mudança em todas as áreas da

vida, sejam elas, física, mental, espiritual, social, familiar e profissional.

3.5.5 Psicoterapia Individual

É realizada semanalmente durante a internação do aluno,

dependendo do caso apresentado na entrevista inicial ou nos trabalhos de grupo.

Tem o objetivo de aumentar o autoconhecimento, mudar os comportamentos

inadequados e aquisição de novos comportamentos, bem como melhorar a

estruturação dos processos cognitivos. Nesses momentos procura-se resgatar do

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aluno ou inserir nele à vontade para o tratamento, ou seja, deve existir motivação

interna e pessoal para o processo de recuperação, tratamento e reintegração

familiar e social, caso contrário todo o esforço da Instituição não será bem

assimilado.

Acredita-se que a dependência por substâncias psicoativas

é uma doença que desestrutura a pessoa em diferentes áreas do contexto

humano. Para tanto, o acompanhamento individual é importante para maior

orientação quanto a esta realidade e da necessidade de autoconhecimento, e

aumento de sua auto-estima.

3.6 GRUPO DE APOIO ÀS FAMÍLIAS - GRAF

Iniciou-se este trabalho em 18 de fevereiro de 1997, depois

de se perceber a importância da participação da família na recuperação do

dependente químico e posteriormente como fator de prevenção de recaídas. O

grupo desempenha funções educativas e terapêuticas.

O fato de um membro da família estar usando drogas, pode

mostrar que este comportamento é um sintoma ou indício de que algo mais grave

está acontecendo no indivíduo, na família, na comunidade em geral. Então, torna-

se importante compreender a função das drogas na vida das pessoas e

principalmente nos membros da família.

Assim, é um desafio para estas famílias reconquistarem a

confiança no ente querido em tratamento, pois ela acaba adoecendo também. Os

relacionamentos até então, tornaram-se difíceis e tensos, levando na maioria dos

casos à desarticulação de toda estrutura familiar.

Muitos sentimentos afloram no meio da família: depressão,

estado de choque, descrença, choro incontrolável, revolta, sensação de traição,

de perda e culpa.

É no GRAF que estas famílias são orientadas em como

proceder para ajudar e dar o suporte necessário ao membro em recuperação. E o

próprio Grupo assume a função de sustentação uns para com os outros e também

de encorajamento, para enfrentar todos os sentimentos envolvidos.

O GRAF tem ainda como objetivo informar às famílias sobre

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os aspectos físicos e psicológicos que envolvem o usuário de drogas; fortalecer a

comunicação entre a família e o interno; diminuir a ansiedade das famílias; reduzir

conflitos e tensões; aprender novos meios de superar as dificuldades; preparar a

família para a reintegração da pessoa à comunidade; oportunizar a troca de

experiências; superar os preconceitos existentes em relação à questão das

drogas; estimular a família ao resgate de valores perdidos e a amá-los e acolhe-

los.

Comprovando a importância do apoio das familias, conforme

o gráfico a seguir constata-se que os internos cujas famílias participaram das

atividades do GRAF alcançaram a última etapa do tratamento.

3.7 O DESPERTAR ESPIRITUAL

Acreditando que todo ser humano necessita crer em um Ser

Superior, e este Ser Superior sendo o próprio Deus; e acreditando que Ele pode

mudar a situação degradante de uma pessoa, proporciona-se nesta Entidade

período de estudos bíblico para que haja um conhecimento espiritual e amplo de

Deus.

Os estudos da Palavra de Deus são realizados duas vezes

por dia, no período da manhã e a noite. Dentro destes estudos bíblicos é dada

uma base do que a Bíblia ensina a respeito da vida. Os estudos são dirigidos por

pastores voluntários, como também outras pessoas voluntárias (professoras) que

dão do seu tempo para ministrar estudos aos alunos.

Juntamente com os cultos, existem períodos de cânticos

espirituais denominados de LOUVOR. O louvor é um ato onde as pessoas

podem engrandecer e glorificar o nome Santo de Deus. Estes louvores tem

proporcionado aos alunos residentes alegria em seus corações e a paz que a

adoração à Deus traz ao ser humano.

Ao final do dia acontece o Momento de Meditação Individual,

onde cada aluno tem a oportunidade de experimentar e conhecer a verdade da

Palavra de Deus através da leitura individual.

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3.8 DISCIPULADO

É um momento durante o dia que os alunos residentes

acima de 3 meses participam de uma série de estudos baseados na Bíblia, pois

ela vem a ser a fonte de revelação sobre Jesus. Ao mesmo tempo em que se

conhece a Jesus e o que ele faz, confronta-se a vida de cada um com estas

realidades. Este grupo é teórico e essencialmente prático.

Alguns assuntos deste discipulado são:

��Quem é Jesus.

• O que Jesus exige de mim pessoalmente.

��A missão de Jesus;

��Promessas de Deus para quem recebe Jesus.

• O que devemos fazer para tornar-nos discípulos de

Cristo?

• O que é vida eterna?

��A vida da pessoa sem Cristo.

��A vida da pessoa com Cristo.

��Diferentes tipos de pessoas.

��Aplicações pessoais.

Vivemos em épocas difíceis e conturbadas onde a maioria

das pessoas tem dificuldades de resolver seus próprios problemas. Não tem

objetivos e nem metas. Através desses momentos, os internos podem optar por

conhecer a verdade de Deus, e que esta verdade pode mudar um caráter que o

tempo deturpou.

3.9 PRÁTICAS TERAPÊUTICAS DESPORTIVAS E OCUPACIONAIS

Entre as atividades terapêuticas desenvolvidas encontram-

se as práticas desportivas, que tem como objetivo propiciar “lazer”, bem estar

físico e mental, contribuindo sobremaneira com a desintoxicação orgânica dos

alunos.

Os exercícios físicos localizados são praticados duas vezes

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por semana, permitindo ao organismo desintoxicação com maior facilidade

através da eliminação das toxinas pelo suor, além de corrigir a postura muscular.

A prática do “FARTLEK”, esporte que combina caminhada

com breves percursos de corrida, permite ao organismo um maior

desenvolvimento aeróbico, e conseqüentemente um aumento da capacidade

respiratória e pulmonar.

Com a prática do futebol, futebol de salão, permite-se

observar o desenvolvimento orgânico, aeróbico, anaeróbio, e a capacidade da

resistência orgânica atual.

Mas o objetivo central é observar o comportamento do grupo

nas diversas circunstâncias propiciadas pelo desporto coletivo, que geram

reações emocionais e de comportamento (alegria, tristeza, raiva, ódio,

companheirismo, individualismo, etc).

Todas as atividades são orientadas por um professor de

educação física com especialização em treinamento e desenvolvimento físico,

visando maior segurança e tranqüilidade aos alunos e na confiabilidade dos

objetivos propostos.

Quanto às atividades ocupacionais, períodos do dia

determinados para limpeza interna e externa da casa, capinação do campo e

pátio, trabalho de horta e jardinagem.

No ano de 2000 foi aprovado pelo Ministério da Saúde, outro

Projeto denominado Horta e Terapia. Iniciou em Junho de 2000 e terminou em

Agosto de 2001. O desenvolvimento de Horticultura, (horta orgânica)

proporcionou aos internos da Instituição conhecimentos técnicos e práticos,

incentivando-os inclusive a prática de uma alimentação mais saudável. A horta

orgânica subsiste até hoje proporcionando aos internos fonte de terapia e

ocupação.

No inicio do ano de 2008 foi firmado uma parceria com a

Fundação Mackenzie, através do Projeto para continuidade da Horta e Terapia

Esportiva para três anos, com possibilidades de renovação.

Enfim, o CTA PRÓ-VIDA é uma Comunidade Terapêutica

com solidificada estrutura ao longo de dezesseis anos tem prestados serviços

relevantes no município de Itajaí e redondezas.

Promove palestras de prevenção ao uso e abuso de drogas

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na comunidade e arredores. Distribui panfletos de conscientização e prevenção

as drogas, DSTs, HIV / AIDS e está diretamente envolvida com os portadores de

HIV / AIDS dependentes, priorizando o tratamento através da internação.

Participam dos Conselhos Municipais, Fóruns, Seminários, buscando

conhecimento e atualidades para primar sempre o melhor serviço por excelência.

Vem a ser uma gotinha da gotinha num oceano, mas está

engajada no combate de luta contra as drogas, colocando o ser humano em 1º

lugar, tratando-o em dignidade, porque ele já é um ser digno e jamais pode ter

ela violada.

Antes de se finalizar, acredito conveniente registrar que a

viabilidade, interesse e amplitude dos dados relacionados sobre a CT A Pró-Vida

foram favorecidas devido ao envolvimento da acadêmica que a partir de 1º de

Fevereiro de 2001 trabalha na Instituição.

Sendo assim, como integrante de uma equipe de

funcionários de Comunidade Terapêutica, nossa função vai mais além do que

essa mencionada exerce-se a atividade como um ministério, vive-se como em

família, ouvindo os internos, passando experiências de vida, exercendo a

afetividade através de um princípio bíblico “amar o próximo como a ti mesmo”.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Fica um sentimento de gratificação e satisfação por ter sido

possível chegar ao final deste trabalho cujo objetivo visa concluir o Curso de

Direito, que por si só já valeu a pena todo esmero e dedicação, porém devo

registrar que vai mais além. O sentimento maior é poder contribuir de maneira

simples e singela a esta causa tão nobre, que é o combate na luta contra as

drogas. Se fechar os olhos para essa problemática, vem a perder a pessoa do

dependente, a família, a sociedade e o estado, pois a doença Dependência

Química uma vez instalada ela corrói como um câncer, e sua conseqüência vêm a

ser um desastre vindo a refletir na família, sociedade e estado.

É um assunto que vem exigir por parte da família, do estado,

da sociedade um olhar de preocupação em busca de mudanças, medidas que

venha contribuir positivamente para a mudança desse quadro social.

A tentativa foi um alerta, de trazer a reflexão, a importância

do respeito ao Princípio da Dignidade Humana frente aos portadores de uma

doença, denominada de Dependência Química. Primeiramente na família, que é

onde tudo inicia se estendo no tratamento em Comunidade Terapêutica e na

reinserção sócio familiar. Com relação as hipóteses levantadas constatou-se que

não foi confirmada a primeira hipótese de pesquisa:

a) O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana não é

respeitado por todas as famílias dos portadores de Dependência Química;

A segunda hipótese de pesquisa foi confirmada:

b) O tratamento multidisciplinar para a família é fundamental

para o tratamento da dependência química;

A terceira hipótese da pesquisa também não está

confirmada:

c) Na Comunidade Terapêutica Pró-Vida de Itajaí-SC, as

maiorias dos internos não conseguiram ir até o final do tratamento. Na pesquisa para elaborar este trabalho, um índice que

chamou a atenção foi o auto grau de abandono do dependente químico pela

família e através disso observou-se que estes que sofrem o abandono não

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perseveraram no tratamento em Comunidade Terapêutica, e vem a desistir,

voltando ao círculo vicioso.

Esse registro é colocado aqui para ressaltar a importância

da família no processo de tratamento e recuperação. Vale a pena respeitar o ser

humano na sua dignidade, investir, dar oportunidade, caminhar juntos neste

processo e lá na frente olhar para trás como família unida e dizer: a droga não

nos venceu, nós é que a vencemos, porque o dialogo nunca deixou de existir.

Esse trabalho não termina aqui, essa temática vem a ser

inesgotável nos seus mais variados aspectos, portanto deseja-se que esse tema

levantado sirva de estímulo ao prosseguimento de outros que venha a contribuir

para que o princípio da Dignidade Humana aos Portadores de Dependência

Química a iniciar pela família, jamais venha a ser violado e assim a problemática

da droga se não totalmente excluída do meio, completamente abominada.

Nunca é demais, portanto, insistir que é a rede de

profissionais, de familiares, de organizações governamentais e não-

governamentais em interação constante, cada um com seu núcleo específico de

ação, mas apoiando-se mutuamente, alimentando-se enquanto rede – que cria

acessos variados, acolhe, encaminha, previne, trata, reconstrói existências, cria

efetivas alternativas de combate ao que, no uso das drogas, destrói a vida.

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