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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPRITO SANTO
CENTRO DE CINCIAS DA SADE
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM DOENAS INFECCIOSAS
PRISCILA CAMARGO GRANADEIRO FARIAS
ANLISE DE FATORES GEOGRFICOS E CLIMTICOS RELACIONADOS
DISTRIBUIO DE PHLEBOTOMINAE (DIPTERA: PSYCHODIDAE) EM REA DE
TRANSMISSO DE LEISHMANIOSE TEGUMENTAR AMERICANA NO ESTADO
DO ESPRITO SANTO, BRASIL
VITRIA
2014
PRISCILA CAMARGO GRANADEIRO FARIAS
ANLISE DE FATORES GEOGRFICOS E CLIMTICOS RELACIONADOS
DISTRIBUIO DE PHLEBOTOMINAE (DIPTERA: PSYCHODIDAE) EM REA DE
TRANSMISSO DE LEISHMANIOSE TEGUMENTAR AMERICANA NO ESTADO
DO ESPRITO SANTO, BRASIL
VITRIA
2014
Dissertao apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Doenas Infecciosas do Centro de Cincias da Sade da Universidade Federal do Esprito Santo, para a obteno do Ttulo de Mestre em Doenas Infecciosas.
Orientador: Prof. Dr. Alosio Falqueto
Co-orientador: Profa. Dra. Blima Fux
Dados Internacionais de Catalogao-na-publicao (CIP) (Biblioteca Central da Universidade Federal do Esprito Santo, ES, Brasil)
Farias, Priscila Camargo Granadeiro, 1982- F224a Anlise de fatores geogrficos e climticos relacionados
distribuio de Phlebotominae (Diptera: Psychodidae) em rea de transmisso de leishmaniose tegumentar americana no estado do Esprito Santo, Brasil / Priscila Camargo Granadeiro Farias. 2014.
91 f. : il. Orientador: Alosio Falqueto.
Coorientador: Blima Fux.
Dissertao (Mestrado em Doenas Infecciosas) Universidade Federal do Esprito Santo, Centro de Cincias da Sade.
1. Psychodidae. 2. Leishmaniose Mucocutnea. 3. Vetores
de Doenas. 4. Variaes Sazonais. I. Falqueto, Alosio. II. Fux, Blima. III. Universidade Federal do Esprito Santo. Centro de Cincias da Sade. IV. Ttulo.
CDU: 61
Dedico este trabalho ao meu marido
Thiago, aos meus filhos Bruno e
Bernardo, e minha me, Maria de
Ftima. Amo vocs!
AGRADECIMENTOS
As coisas da vida so interessantes. Agosto j foi tido como o ms do cachorro
louco. Pra mim um ms de grandes conquistas! H quase 13 anos, no dia 13 de
agosto de 2001, eu passava pela primeira vez pelos portais da entrada principal da
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Era um sonho se tornando realidade,
e me lembro de no crer que aquilo estava de fato acontecendo. Ficava conferindo
meu nome nas listas de chamada pra ter certeza de que aquele lugar era meu. E era
exatamente onde eu deveria estar.
Hoje c estou, novamente em agosto, buscando mais uma vitria nessa minha
trajetria. Agora fechando um ciclo. E foi difcil! Estudei como acho que nunca fiz
para a prova de seleo e ainda muito durante o curso de Mestrado em Doenas
Infecciosas. Eu estava adentrando um espao estranho, onde pessoas que eu no
conhecia demonstravam domnio total de assuntos que eu, uma mdica veterinria
num curso da sade humana, ainda precisava aprender. Mas minha formao
acadmica e esforos puderam fazer as diferenas diminurem a cada dia, e percebi
que a troca era muito rica. A Universidade Federal do Esprito Santo ento se tornou
a minha casa. E era exatamente onde eu deveria estar.
Por isso e muito mais, AGRADEO:
Antes de tudo, a Deus, nosso Pai. A vida preciosa, e sei que sou privilegiada por
ter a minha. Sade, amor, uma bela famlia, fora e oportunidades. Com tantos
desafios desde sempre e podendo contabilizar tantas vitrias, s posso ser grata.
Obrigada, amado Pai!
Universidade Federal do Esprito Santo, que abriu suas portas e me permitiu
vivenciar grandes experincias e aprendizados.
Aos professores e colegas do curso de Ps-graduao em Doenas Infecciosas,
pela dedicao, ensinamentos e parceria. Foram dois anos de crescimento pessoal e
intelectual.
CAPES, pela bolsa de estudos.
Ao meu orientador, prof. Alosio Falqueto, esse exemplo de mdico, pesquisador e
ser humano. Seu comprometimento e imerso em sua misso profissional so
inspiradores. Como meta, quero ser ao menos parecida com ele, s que na verso
mdica veterinria!
Mil vezes minha co-orientadora e amiga prof. Blima Fux, pelo apoio desde que
cheguei Parasitologia. Obrigada pelos ensinamentos e pelas oportunidades que
me ofereceu, como te acompanhar nas aulas da graduao. Isso tudo no tem
preo, mas o maior valor de todos o da amizade sincera que construmos!
Ao Claudiney, que acreditou em mim desde o comeo, e foi fundamental em todas
as fases deste trabalho. No h palavras para agradecer por sua ajuda.
Ao Prof. Gustavo Rocha Leite e colega doutoranda Vivianne Meneguzzi, pelo
valioso auxlio nas anlises estatsticas, no esclarecimento da metodologia e na
parte tica do trabalho, sempre com muito boa vontade e disponibilidade.
Ao Jefferson, que participou ativamente das coletas e tabulao dos dados, mas que
infelizmente desencarnou antes de ver este trabalho pronto.
Aos meus colegas do Centro de Controle de Zoonoses de Cariacica, os mdicos
veterinrios Fabrcio, Daniel e Thyara, alm das auxiliares Cristina e Emlia. Vocs
me ajudaram muito nos piores perodos, com meus horrios malucos, e tornaram
meus dias no trabalho mais leves e agradveis. Juntos somamos foras nas nossas
lutas dirias.
Aos meus queridos animais, meus pacientes ou no. Especialmente minha
companheira das horas no computador, Maria Teresa. Com eles sofro, me divirto e
aprendo a cada dia que h muitas outras linguagens alm da fala, as quais o
homem, na construo da sua identidade e evoluo, deixou que adormecessem
dentro de si. Descobrir a linguagem dos animais descobrir a mim mesma. Isso me
move!
Agradeo minha me Maria de Ftima, sempre guerreira. Voc o exemplo e a
mola propulsora das minhas conquistas! Sem voc nada disso seria possvel. Ao
meu irmo Adair, que comigo cresceu e que me faz rir sempre. Ao meu pai, Gilson,
grande entusiasta das minhas vitrias. Ao meu padrasto Gasto, que graas a Deus
est conosco e pode participar de mais essa etapa da minha vida. Espero continuar
sempre dando a vocs alegrias, orgulho e todo meu amor! Obrigada por acreditarem
em mim!
minha sogra Adlia, meu sogro Paulo Cezar e meu cunhado Cezinha, por me
receberem de braos abertos, alm de me socorrerem nas horas mais complicadas.
Vocs so demais! Amo vocs!
Muito obrigada aos meus demais familiares e amigos queridos, por me
impulsionarem e terem pacincia com a minha ausncia. Seria impossvel citar
todos, ento deixo aqui um enorme beijo para minhas amigas-irms Patty Pacheco e
Ana Paula Magalhes. O tempo e a distncia nunca podero apagar nossa amizade!
Ao meu amado marido, Thiago. Como eu disse, sou privilegiada! Tenho ao meu lado
uma pessoa maravilhosa, que me ajudou a dar conta quando faltou tempo, quando o
fardo pesou demais, quando bateu desnimo e desespero. Te amo! Agradeo a
Deus todos os dias por ter voc e nossos meninos!
Aos meus filhos Bruno e Bernardo. Bruno, o mais velho, vivenciou comigo todos os
desafios da graduao, do incio da vida profissional e agora do Mestrado. Um
menino doce e que nunca fez cobranas, apesar de ter sofrido tanto quanto eu com
a distncia e a minha falta de tempo. J Bernardo, meu pequenininho, este sim,
cobra e mostra sua insatisfao quando a mame no pode dar ateno. Um perfil
diferente, mas igualmente adorvel! No h felicidade maior do que olhar pra eles e
v-los saudveis, felizes, ao meu lado! A cada dia me sinto mais honrada por ter
recebido dois seres to especiais na minha vida. Mame ama vocs!
E sim, no poderia deixar de cit-la, j que foi e ainda uma referncia fortssima na
minha vida: minha av Arlete, que hoje j se encontra no plano espiritual. Espero
ansiosamente por outros encontros nossos em sonhos e na vida. Meu amor eterno!
RESUMO
A leishmaniose tegumentar americana (LTA) uma doena que acomete pele e
mucosas causada por parasitos dermotrpicos do gnero Leishmania Ross, 1903.
Os parasitos so transmitidos atravs da picada de pequenos dpteros da famlia
Psychodidae, os flebotomneos. O municpio de Cariacica, Esprito Santo, Brasil,
esteve nos ltimos cinco anos (2009 a 2013) entre os cinco que apresentaram maior
nmero de casos notificados no estado, segundo a Secretaria de Estado de Sade
(SESA-ES, 2014). A localidade de Roda Dgua demonstra grande importncia, por
concentrar elevado nmero de casos, contribuindo com grande parte das
notificaes do municpio. Avaliando os casos da doena na regio, registrados nos
pronturios mdicos do servio de referncia, na Unidade de Medicina Tropical da
Universidade Federal do Esprito Santo, observou-se que estes ocorriam a at 550
m de altitude, numa rea que vai de 20 a 718 m. A hiptese mais provvel seria a de
que o fenmeno fosse relacionado aos vetores, j que o homem e os animais
estariam presentes em todas as altitudes. De fevereiro de 2002 a janeiro de 2004
foram realizadas coletas mensais de flebotomneos em Roda Dgua, que
aconteciam simultaneamente em trs nveis de altitude, sendo: nvel 1 - at 250 m;
nvel 2 - entre 250 e 500m e nvel 3 - acima de 500m. Em cada nvel as coletas
aconteciam em dois ambientes: mata e peridomiclio. As capturas eram feitas em
armadilhas de Shannon modificadas e por busca ativa em repouso, com capturador
de Castro. Avaliou-se o comportamento das espcies quanto pluviosidade
(perodos seco e chuvoso) e s estaes do ano. Analisaram-se estatisticamente as
principais espcies antropoflicas de importncia epidemiolgica (Falqueto, 1995).
Foram calculados os ndices ecolgicos abundncia, riqueza, diversidade,
equitabilidade e dominncia. Coletou-se um total de 13233 flebotomneos, com
identificao de 23 espcies. A espcie predominante foi Nyssomyia intermedia
(61,12%), seguida por Pintomyia fischeri (18,20%) e Migonemyia migonei (8,68%),
todas antropoflicas. Somou-se a estas a espcie Pintomyia monticola, que
representou 1,67% do total de espcimes coletados e tambm altamente
antropoflica. As demais espcies somaram 10,10% do total de flebotomineos. A
altitude influenciou a distribuio das quatro espcies analisadas, tendo Ny.
intermedia e Pi. fischeri sido mais abundantes no nvel 2, Mg. migonei mais
abundante no nvel 1 e Pi. monticola no nvel 3. Em relao ao ambiente, as
espcies Ny. intermedia e Mg. migonei foram estatisticamente mais abundantes no
peridomiclio e Pi. monticola na mata. A distribuio de Pi. fisheri no apresentou
diferena significativa entre os dois ambientes, porm foi a nica afetada pelas
chuvas e estaes do ano, sendo a espcie mais encontrada no perodo seco e no
inverno. Nyssomyia intermedia parece ser a principal espcie vetora da LTA em
Roda Dgua, com Mg. migonei provavelmente tendo papel secundrio. Pi. fisheri
no parece estar envolvido localmente na transmisso da doena para humanos,
apesar de j ter sido incriminado em outras regies. A distribuio de Pi. monticola
em relao altitude e ao ambiente indica ser improvvel sua participao na
transmisso da LTA naquela regio.
Palavras-chave: Psychodidae, Leishmaniose Mucocutnea, Vetores, Variaes
Sazonais.
ABSTRACT
American cutaneous leishmaniasis (ACL) affects the skin and mucous membranes
caused by dermotropic parasites of the genus Leishmania Ross, 1903. The parasites
are transmitted through the bite of small insects of the family Psychodidae, the
sandflies. The municipality of Cariacica, Esprito Santo, Brazil, has been in the last
five years (2009-2013) among the five municipalities which had the largest numbers
of reported cases in the, according to the State Department of Health (SESA-ES,
2014). The locality of Roda Dgua has shown high epidemiological importance, due
to the large concentration of cases contributing to the municipality notifications.
Evaluating the registered cases from the region, from the medical reference service,
Unidade de Medicina Tropical da Universidade Federal do Esprito Santo, it was
observed that they occurred up to 550 m of altitude, in an area between 20-718 m
above sea level. The most likely hypothesis is that the phenomenon is related to the
vector distribution, since humans and animals are be present in all altitudes. From
February 2002 to January 2004 sand flies were simultaneously captured in monthly
collections in Roda Dgua , at three altitude levels: level 1 - up to 250 m, level 2 -
between 250 and 500 m and level 3 - above 500 m. In each level, collection of sand
flies was carried out in two environments: sylvatic and peridomicile. Collections were
made using modified Shannon traps and by active search with Castro pooter. We
evaluated flight activity of the species as the rainfall (rainy and dry seasons) and the
seasonality. Only species known to be anthropophilic and with epidemiological
importance were statistically analyzed. Abundance, richness, diversity, equitability,
and dminance ecological indices were estimated. A total of 13,233 sand flies from 23
species were collected. The most abundant species was Nyssomyia intermedia
(61.12%), followed by Pintomyia fischeri (18.20%) and Migonemyia migonei (8.68%),
all species are anthropophilic. Pintomyia monticola represented 1.67% of the total
specimens collected and is also antropophilic. The other species comprised 10.10%
of the total specimens collected. The altitude affected the distribution of four species,
and Ny. intermedia and Pi. fischeri were more abundant at level 2, Mg. migonei most
abundant at level 1 and Pi. monticola at level 3. Nyssomyia intermedia and Mg.
migonei were statistically more abundant in peridomestic areas and Pi. monticola in
sylvatic environment. Pintomyia fischeri occurrence was not statistically significant
according to environment, but it was the only one affected by the rain and showed
seasonality, most commonly found in dry periods and during the winter. Nyssomyia
intermedia seems to be the most important vector of ACL in Roda Dgua and Mg.
migonei presents probably acting as asecondary vector. Pintomyia fischeri does not
seem to be involved in disease transmission to humans in the locallity, despite having
already been incriminated in others regions. According to its distribuition, probably
Pi. monticola does not play a role in ACL transmission in Roda Dgua.
Keywords: Psychodidae, Mucocutaneous leishmaniasis, Vectors, Seasonal
variations.
LISTA DE ABREVIAES
C Graus Celsius
DNA Desoxyribonucleic Acid (cido Desoxirribonuclico)
ES Esprito Santo
FUNASA Fundao Nacional de Sade
GPS Global Positioning System (Sistema de Posicionamento Global)
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
IJSN Instituto Jones dos Santos Neves
Km Quilmetros
LTA Leishmaniose Tegumentar Americana
LV Leishmaniose Visceral
Lu. Lutzomyia
m Metros
MG Minas Gerais
Mi. Micropygomyia
mm Milmetros
Mg. Migonemyia
NI No Identificados
Ny. Nyssomyia
OMS Organizao Mundial de Sade
Pi. Pintomyia
RJ Rio de Janeiro
SP So Paulo
SESA-ES Secretaria Estadual de Sade do Esprito Santo
SINAN Sistema Nacional de Notificaes do Ministrio da Sade
TO Tocantins
UFES Universidade Federal do Esprito Santo
WHO World Health Organization
LISTA DE ILUSTRAES
Figura 1. Mapa da incidncia de leishmaniose tegumentar americana por 100
mil habitantes no estado do Esprito Santo no ano de 2010 (SESA-ES, 2014).........23
Figura 2. Nmero de casos de LTA notificados por municpio nos anos de 2009
a 2013, na regio Metropolitana do Esprito Santo, segundo dados da Regional
Vitria da Secretaria Estadual de Sade (SESA-ES, 2014).......................................23
Figura 3. Fotografia do acesso localidade de Roda Dgua, Cariacica,
evidenciando o relevo acidentado..............................................................................38
Figura 4. Mapa dos limites administrativos do municpio de Cariacica ES.
Fonte: Instituto Jones dos Santos Neves- Governo do Estado do Esprito Santo
(IJSN-ES, 2014)..........................................................................................................39
Figura 5. Mapa do modelo digital do terreno do municpio de Cariacica ES.
Fonte: Instituto Jones dos Santos Neves- Governo do Estado do Esprito Santo
(IJSN-ES, 2014)..........................................................................................................40
Figura 6. Fotografia do acesso principal para a localidade de Roda Dgua,
Cariacica, de onde podem-se observar os trs nveis de elevao demarcados por
linhas...........................................................................................................................42
Figura 7. Fotografia do ponto de coleta no nvel 1 da MATA..................................42
Figura 8. Fotografia de ponto de coleta no nvel 2 do peridomiclio, mostrando duas
residncias, rvores frutferas e ces vivendo prximos s casas............................43
Figura 9. Fotografia do peridomiclio do nvel 2. Plantaes de banana, muito
comuns na regio, e a mata ao fundo, na parte mais alta deste nvel.......................43
Figura 10. Fotografia da vista do alto do nvel 3, este ponto a aproximadamente 680
m de altitude. Ao fundo possvel ver o mar e os municpios de Vila Velha,
esquerda, e em parte, Guarapari................................................................................44
Figura 11. Fotografia da coleta por busca ativa em repouso num galinheiro
localizado no peridomiclio do nvel 2 (Fonte: arquivo do professor Gustavo R.
Leite)...........................................................................................................................45
Figura 12. Fotografia da coleta por tubo de suco de Castro em armadilha de
Shannon modificada montada na mata do nvel 2......................................................45
Grfico 1. Distribuio das principais espcies de flebotomneos antropoflicas,
capturadas em diferentes faixas de altitude no peridomiclio da localidade de Roda
Dgua, Cariacica, entre abril de 2002 a maro de 2003...........................................50
Grfico 2. Distribuio das principais espcies de flebotomneos antropoflicas,
capturadas em diferentes nveis de altitude na mata da localidade de Roda Dgua,
Cariacica, entre abril de 2002 a maro de 2003........................................................51
Grfico 3. Distribuio proporcional de cada uma das principais espcies de
flebotomneos antropoflicos capturados na MATA, em Roda Dgua, Cariacica, entre
maro de 2002 e fevereiro de 2004............................................................................52
Grfico 4. Distribuio proporcional de cada uma das principais espcies de
flebotomneos antropoflicos capturados no PERIDOMICLIO em Roda Dgua,
Cariacica, entre maro de 2002 e fevereiro de 2004..................................................52
Grfico 5. Distribuio das principais espcies antropoflicas de flebotomneos em
Roda Dgua, Cariacica, de acordo com pluviosidade, capturadas entre abril de 2002
a maro de 2003.........................................................................................................53
Grfico 6. Distribuio das principais espcies antropoflicas de flebotomneos em
Roda Dgua, Cariacica, em relao s estaes do ano, capturadas entre abril de
2002 a maro de 2003................................................................................................54
LISTA DE TABELAS
Tabela 1. Flebotomneos capturados em Roda Dgua, nos ambientes mata e
peridomiclio, no perodo de abril de 2002 a maro de 2004, com destaque para as
principais espcies conhecidamente antropoflicas e de importncia
epidemiolgica(*)........................................................................................................48
Tabela 2. Percentuais das principais espcies de flebotomneos antropoflicas
capturadas em Roda Dgua entre maro de 2002 a fevereiro de 2004....................49
Tabela 3. ndices ecolgicos obtidos para as populaes de flebotomneos
coletados em Roda Dgua, municpio de Cariacica, na mata e no peridomiclio, no
perodo de abril de 2002 a maro de 2004.................................................................54
ANEXOS
Anexo 1. Parecer de autorizao consubstanciado n 494.029 emitido pelo Comit
de tica em Pesquisa (CEP) envolvendo seres humanos, do Centro de Cincias da
Sade da Universidade Federal do Esprito Santo (CCS -UFES).
SUMRIO
1 INTRODUO.................................................................................................15
1.1. Definio.....................................................................................................15
1.2. Etiologia......................................................................................................15
1.3. Ciclo biolgico da leishmaniose tegumentar americana.............................17
1.4. Aspectos epidemiolgicos da LTA..............................................................18
1.5. Reservatrios..............................................................................................23
1.6. Os vetores..................................................................................................26
2 JUSTIFICATIVA..............................................................................................34
3 OBJETIVOS.....................................................................................................36
3.1. Objetivo Geral.............................................................................................36
3.2. Objetivos especficos..................................................................................36
4 MATERIAIS E MTODOS...............................................................................37
4.1. Descrio da rea de estudo......................................................................37
4.2. Dados epidemiolgicos...............................................................................41
4.3. As coletas...................................................................................................41
4.4. As capturas.................................................................................................44
4.5. Identificao dos insetos............................................................................46
4.6. Avaliao da sazonalidade.........................................................................46
4.7. Anlises estatsticas...................................................................................46
4.8. Aspectos ticos...........................................................................................47
5 RESULTADOS................................................................................................48
6 DISCUSSO....................................................................................................55
6.1 Altitude X Ambiente........................................................................................55
6.2 Sazonalidade.................................................................................................62
6.3 ndices Ecolgicos.........................................................................................63
7 CONCLUSES................................................................................................66
8 PERSPECTIVAS.............................................................................................67
9 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS...............................................................68
15
1 INTRODUO
1.1 Definio
As leishmanioses so zoonoses causadas por protozorios parasitos do gnero
Leishmania Ross, 1903, que ocorrem em 88 pases de quatro continentes(1). Este
gnero compreende aproximadamente 30 espcies, das quais cerca de 20 so
patognicas para a espcie humana (2, 3). A transmisso entre os hospedeiros
vertebrados feita pela picada de pequenos insetos pertencentes ordem Diptera,
famlia Psychodidae, subfamlia Phlebotominae (4).
H duas formas clnicas bsicas, causadas por espcies distintas do parasito: a
leishmaniose tegumentar (LT) e a leishmaniose visceral (LV). Ambas so
consideradas doenas associadas a baixas condies socioeconmicas (1).
A leishmaniose tegumentar americana (LTA) acomete pele e mucosas.
considerada pela Organizao Mundial de Sade como uma das seis enfermidades
parasitrias mais importantes do mundo, tendo sido notificados cerca de 1 milho de
novos casos de LTA nos ltimos cinco anos em todo o globo. Estima-se que a
ocorrncia anual seja ainda maior, entre 0,7 e 1,3 milhes de novos casos,
principalmente nas Amricas, base do Mediterrneo e Oriente Mdio e sia Central.
Os seis pases onde h maior incidncia so Afeganisto, Arglia, Brasil, Colmbia,
Ir e Sria(1). No Brasil a doena representa um dos grandes problemas de sade
pblica, estando presente nos 26 estados da Federao.
1.2 Etiologia
Os parasitos do gnero Leishmania possuem a seguinte posio sistemtica
segundo Levine et al (1980)(5):
Reino PROTISTA Haeckel, 1866;
Sub-reino PROTOZOA Goldfuss,1817;
Filo SARCOMASTIGOPHORA Honigberg & Balamuth, 1963;
Sub-filo MASTIGOPHORA Desing, 1866;
Classe: ZOOMASTIGOPHOREA Calkins, 1909;
16
Ordem KINETOPLASTIDA Honigberg, 1963, emend. Vickerman,1976;
Sub-ordem TRYPANOSOMATINA Kent, 1880;
Famlia TRYPANOSOMATIDAE Doflein,1901; emend. Grobben,
1905;
Gnero: Leishmania Ross,1903.
De acordo com o classificao taxonmica mais aceita atualmente, o gnero
Leishmania compreende dois subgneros: Viannia e Leishmania (6).
Nas Amricas, so reconhecidas atualmente 14 espcies dermotrpicas,
responsveis pela LTA em humanos. No Brasil, ocorrem sete espcies, sendo as
trs principais Leishmania (Viannia) braziliensis, Leishmania (Viannia) guyanensis e
Leishmania (Leishmania) amazonensis, tendo ainda as espcies Leishmania
(Viannia) lainsoni, Leishmania (Viannia) naiffi, Leishmania (Viannia) lindenbergi e
Leishmania (Viannia) shawi, identificadas nas regies Norte e Nordeste do pas (7).
At o momento, L.(V.) braziliensis a nica espcie de Leishmania registrada para
o estado de Esprito Santo, com caracterizao de apenas um nico zimodema
(Z27), ou seja, um nico conjunto de cepas de um microrganismo que compartilham
o mesmo perfil isoenzimtico. Os isolados foram provenientes de amostras humanas
e caninas (8).
L.(V.) braziliensis a espcie com mais ampla distribuio geogrfica no Brasil,
ocorrendo do sul do Par ao Nordeste, atingindo tambm o centro-sul do pas e
algumas reas da Amaznia Oriental (9, 10). tambm a espcie mais prevalente
no homem, podendo causar leses cutneas e mucosas. encontrada em todas as
zonas endmicas do pas, desde o norte at o sul, principalmente em reas de
colonizao recente, como tambm em reas antigas, nestas ltimas, geralmente
associada presena de animais domsticos infectados (11).
17
1.3 Ciclo biolgico da LTA
O ciclo da LTA do tipo heteroxnico, e completa-se necessariamente envolvendo
hospedeiros intermedirios e definitivos, que so flebotomneos e mamferos,
respectivamente(12).
Existem duas formas evolutivas principais: a forma amastigota, observada em
tecidos de hospedeiros vertebrados, que podem ser humanos e outros animais
susceptveis infeco; e a forma promastigota, que se encontra no tubo digestivo
do flebotomneo (13, 14).
As fmeas do flebotomneo ao se alimentarem de sangue de um hospedeiro
vertebrado infectado ingerem as formas amastigotas. Estas se alojam no tubo
digestivo do inseto, transformando-se em promastigotas, que se multiplicam por
diviso binria e depois migram para a probscide, podendo, a partir da, ser
inoculadas no hospedeiro vertebrado (14, 15).
A infeco por Leishmania sp. em mamferos, para ser bem sucedida, depende das
habilidades dos parasitos em evadir da resposta imune do hospedeiro, multiplicarem-
se e serem fagocitados pelas clulas do hospedeiro, e de sobreviver dentro do
fagolisossoma de macrfagos. O parasitismo de Leishmania sp. ocorre no interior de
macrfagos por e pode estimular diferentes tipos de reaes inflamatrias, deste
modo dando origem a vrias formas clnicas e padres patolgicos da doena (16).
Acredita-se que as formas promastigotas de Leishmania sejam parasitos primitivos
dos flebotomneos ou de seus ancestrais. O parasito provavelmente adaptou-se
sobrevivncia em mamferos aps a inoculao do organismo durante a evoluo
dos hbitos hematofgicos dos flebotomneos ancestrais. Os hospedeiros mamferos
agem agora no somente como um suporte para fornecer sangue para estes insetos,
mas tambm como fonte de amastigotas localizadas na pele ou no sangue desses
animais (14).
18
1.4 Aspectos epidemiolgicos da LTA A distribuio da LTA influenciada por fatores climticos e geogrficos ainda pouco
conhecidos, e que determinam a distribuio de diferentes vetores flebotomneos,
parasitos e reservatrios (17).
A LTA ocorre nas Amricas desde o Sul dos Estados Unidos at o norte da
Argentina. O foco mais importante o sul-americano, que compreende todos os
pases, com exceo do Uruguai e do Chile (11).
A doena humana apresenta, pelo menos, dois cenrios epidemiolgicos (18):
O primeiro associa-se entrada do homem na floresta primria para
atividades profissionais, o que, em certas ocasies, resulta em um
nmero expressivo de casos, sugerindo uma epidemia. Nesta, o grupo
mais afetado o de jovens e adultos do sexo masculino, que saem
para trabalhar na mata e contraem a infeco aps serem picados
pelos flebotomneos;
O segundo cenrio associa-se a ambientes ps-devastados, com
presena de mata remanescente ou residual, nos quais a populao
humana se instala. Nesta conformao, indivduos de ambos os sexos
e todas as faixas etrias podem ser infectados.
A devastao das florestas tem alterado as caractersticas epidemiolgicas da LTA
nas Amricas do Sul e Central (19, 20). No Brasil a incidncia de LTA tem
aumentado nos ltimos anos em praticamente todos os estados (11). Surtos
epidmicos tm ocorrido nas regies Sudeste, Centro-Oeste, Nordeste e, mais
recentemente, na regio Amaznica, relacionados ao processo predatrio de
colonizao (19-21).
Onde a colonizao ocorreu h mais tempo, houve ampla destruio da floresta
primria, que foi substituda por plantaes de diversos tipos de culturas, e intensa
atividade humana (17, 22-25). A chegada do homem e o aporte de animais
domsticos tambm representam a introduo de fontes importantes de alimento
para os flebotomneos que atuam como vetores do parasita.
19
Pesquisas apontam que a simples deteco de uma das espcies de flebotomneos
que apresentam importncia epidemiolgica j configura fator de risco para a LTA,
no sendo este risco potencializado pela deteco de mais de uma espcie com
essa caracterstica (26).
Outros trabalhos indicam que o risco de transmisso da Leishmania se deve
existncia de um grande nmero de espcies vetoras, somada ao surgimento de
espcies que costumavam ser restritas vida selvagem. Com a modificao do
ambiente, algumas delas so beneficiadas, e podem ser capazes de manter o ciclo
periurbano da doena (27).
A identificao e caracterizao da transmisso domiciliar, peridomiciliar
(predominantemente rural) e extradomiciliar (silvestre) so fundamentais para o
controle da LTA (28).
No Esprito Santo, em 2010, foram notificados 138 casos em 29 municpios.
Somando-se s condies ambientaisaspropcias para o desenvolvimento do vetor,
a presena da doena pode estar relacionada ao processo migratrio, ocupao de
encostas e aglomerados em centros urbanos associados a matas secundrias ou
residuais (29). A doena considerada endmica na maioria dos municpios
capixabas (25).
Estudos realizados no estado demonstram que h predomnio do carter de
transmisso domiciliar e peridomiciliar da LTA, ocorrendo em pessoas de ambos os
sexos e diferentes faixas etrias (9, 17, 25, 30-32).
Entre os anos de 1980 e 2000 houve uma intensa expanso populacional para a
rea urbana, no Esprito Santo, com taxa de variao populacional geral do estado
entre 1960 e 1970, segundo o IBGE, de apenas 13%. No entanto, nos municpios de
Cariacica, Serra, Viana, Vila Velha e Vitria, o acrscimo tendo sido de 156%, 88%,
60%, 123% e 60%, respectivamente (33).
Coincidindo com este aporte de pessoas para as regies mais urbanizadas do
estado, observou-se um aumento expressivo do nmero de casos de LTA
registrados pela FUNASA. De 62 casos registrados em 1980, o nmero de registros
20
elevou-se para 548 em 2000, com perodos intermedirios apresentando nmeros
ainda mais expressivos. Ressalta-se o trinio de 1991 a 1993, em que foram
notificados, respectivamente, 728, 722 e 893 casos(8) . Estes dados reforam a
hiptese da transmisso domiciliar da doena no Esprito Santo, visto que a molstia
ocorre em reas de colonizao antiga, s vezes sem florestas nas proximidades
das casas.
Leishmania (V.) braziliensis tem sido a espcie de parasito identificada, por meio de
eletroforese de isoenzimas (MLEE), como o nico agente etiolgico responsvel por
casos humanos e caninos em todo o estado (8).
O ciclo de transmisso de L. (V.) braziliensis no estado normalmente ocorre em
reas situadas em altitudes baixas e mdias, compreendendo a faixa entre 50 e 750
metros acima do nvel do mar. Os focos endmicos so comuns nas encostas das
montanhas, em reas intensamente desmatadas, mas mostrando alguns
remanescentes de vegetao original. A molstia ocorre em comunidades rurais,
com casas dispersas e o espao entre estas ocupado por plantaes de caf e de
banana. Nas ltimas dcadas, focos de LTA surgiram em comunidades j
estabelecidas h mais de um sculo, prximas s cidades que compem a regio
metropolitana da grande Vitria, na costa Atlntica. Essas reas ainda conservam
caractersticas rurais, porm, a diviso sucessiva de pequenas propriedades deu
origem a verdadeiros povoados, praticamente sem florestas nas proximidades das
casas (30). Extensos bananais e rvores frutferas recobrem o espao no entorno
das casas, mantendo o solo sombreado, com abundante matria orgnica, onde
procriam os vetores de Leishmania sp (32). Tais caractersticas, associadas
presena de animais domsticos infectados, sustentam a hiptese da transmisso
domiciliar da LTA na regio.
Hoje os municpios com maior coeficiente de incidncia (acima de 50 casos para
cada 100 mil habitantes) esto localizados no interior, com destaque para os das
Regies do Capara e Serrana, como Brejetuba e Afonso Cludio, locais com
grande rea de vegetao, populao rural e baixos indicadores sociais. Muqui, na
regio sul, um dos municpios com maior incidncia. Ressaltam-se ainda aqueles
da regio do Vale do Rio Doce, como So Domingos do Norte (8, 29, 34) (Figura 1).
21
A disseminao da LTA na faixa litornea do Esprito Santo parece ter ocorrido h
poucas dcadas, a julgar pelo relato de Barro et al. (1985) (23), que descrevem o
primeiro surto da doena nos municpios de Viana e Cariacica. Sobre a distribuio
geogrfica da LTA no estado, no perodo de 1978 a 1982, constatou-se que os
municpios de Viana e Cariacica eram os que apresentavam maior prevalncia da
doena. Os dois municpios juntos concentraram 60,5% das notificaes no estado,
seguidos por Guarapari, Domingos Martins, Colatina e Linhares. Nessa ocasio, a
localidade de Roda Dgua, no municpio de Cariacica, j aparecia como principal
foco da doena na regio (25).
Cariacica um dos municpios capixabas mais populosos, com 348.738 habitantes
contabilizados no censo de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica, e a
maioria dessa populao vive em reas urbanizadas (35). Sendo assim, os elevados
nmeros de notificaes, que concentram-se nas reas rurais e periurbanas como
Roda Dgua, diluem-se no total de indivduos e o municpio encontra-se na faixa de
incidncia de 0 a 5 casos por 100 mil habitantes (Figura 1). Porm basta analisar os
nmeros absolutos para compreender sua importncia no cenrio capixaba da LTA.
O municpio esteve entre os 10 com maior nmero de casos notificados no Esprito
Santo entre os anos de 1989 a 1998 (34). Nos ltimos cinco anos (2009 a 2013),
esteve entre os cinco municpios com mais casos notificados na regio metropolitana
do estado, segundo a Secretaria de Estado da Sade (29)(Figura 2).
22
Figura 1. Mapa da incidncia de leishmaniose tegumentar americana por 100 mil
habitantes no estado do Esprito Santo no ano de 2010 (29).
23
Figura 2. Nmero de casos de LTA notificados por municpio nos anos de 2009 a
2013, na rgio Metropolitana do Esprito Santo, segundo dados da Regional Vitria
da Secretaria de Estado da Sade (29).
Nota-se no grfico acima que Cariacica tem contribudo com boa parte das
notificaes do estado, inclusive ficando frente de municpios como Afonso Cludio
e Brejetuba, no ano de 2013, por exemplo. Estes nmeros tem origem no SINAN,
mas tambm nas planilhas paralelas, enviadas SESA diretamente pelos municpios
(29).
1.5 Reservatrios:
Cerca de 20 espcies de Leishmania infectam o homem, sendo que todas elas so
zoonticas ou tm origens zoonticas recentes (2).
Nmeros da LTA nos anos de 2009 a 2013 - Regio
Metropolitana do ES (SESA/ES)
56
14
10
19
0
5
10
15
20
25
30
2009 2010 2011 2012 2013
N
me
ro d
e C
as
os
Afonso Cludio
Alfredo Chaves
Anchieta
Brejetuba
Cariacica
Conceio do Castelo
Domingos Martins
Fundo
Guarapari
Ibatiba
Itagua
Itarana
Laranja da Terra
Marechal Floriano
Pima
Santa Leopoldina
Santa Maria de Jetib
Santa Teresa
Serra
Venda Nova do Imigrante
Viana
Vila Velha
Vitria
24
Para uma espcie animal ser incriminada como hospedeiro reservatrio, sua
populao deve ser numerosa, possuir hbitos gregrios freqentes, vida longa,
intenso contato com o inseto vetor, infeco leve de curso longo e o agente
infectante deve ser indistinguvel do parasito encontrado no homem (36).
Pouco se conhece sobre os reservatrios naturais de L.(V.) braziliensis, entretanto
tm sido identificadas vrias espcies de roedores naturalmente infectados por este
parasito: Oryzomys concolor, Oryzomys capito, Oryzomys nigripes, Akodon
arviculoides, Proechimys spp, Rhipidomys leucodactylus, e Bolomys lasiurus, alm
do marsupial Didelphis marsupialis (37-39).
Pesquisas vem apontando a presena de ces (8, 30, 31, 40, 41), equdeos (31, 42,
43) e roedores domsticos (44) infectados por leishmania em inmeros focos de
LTA, sugerindo a participao dos mesmos na domiciliao da doena.
No ES, presume-se que o tatu (Euphractus sexcinctus) e a paca (Agouti paca) sejam
hospedeiros no ciclo silvestre de L. (V.) braziliensis (24), enquanto que os ces e,
possivelmente, eqinos (30, 31) atuem como hospedeiros domsticos de infeco
para seres humanos em muitos focos da doena (17, 30).
De fato ainda controversa a caracterizao de animais domsticos como
reservatrios da LTA, sendo estes comumente considerados hospedeiros acidentais,
tal como o homem (40). Entretanto, merece destaque a participao do co no ciclo
de transmisso domiciliar e peridomiciliar da doena, tendo em vista a frequncia
com que o animal aparece infectado em reas de colonizao antiga, especialmente
no Sudeste do Brasil, em geral pela mesma espcie de Leishmania sp isolada em
casos huamanos. (8, 30, 31, 46). A importncia do reservatrio canino vem da
freqente e intensa proximidade entre ces e humanos (47), alm de sua
capacidade de transitar entre a mata e o domiclio.
Mesmo com a ampla investigao sobre a infeco natural de ces por Leishmania
sp., em reas endmicas de LTA, o papel desse animal como possvel reservatrio
domstico ainda no est totalmente esclarecido. Sabe-se hoje, que o ciclo de
transmisso da LTA apresenta caractersticas peculiares em cada regio endmica,
25
e nem sempre possvel extrapolar dados de uma localidade para outra. As
condies fitogeogrficas de cada regio tendem a ser distintas, podendo no haver
similaridades entre os fatores biticos como a presena da mesma espcie de
parasito, reservatrios silvestres e flebotomneos (48).
O parasitismo por Leishmania em lcera cutnea de co naturalmente infectado foi
diagnosticado pela primeira vez por Pedroso, em 1913 (49). No entanto, somente a
partir de 1980 foram intensificados os estudos sobre a participao de caninos
domsticos em ciclos de transmisso da LTA, no Brasil (50).
Em rea endmica no estado da Bahia, L. (V.) braziliensis foi identificada em seis
amostras isoladas de ces, e essas, por sua vez, eram similares s isoladas de
leses cutneas do homem, na mesma regio (41).
Em foco de transmisso de LTA no estado do Rio de Janeiro, isolou-se L. (V.)
braziliensis de 26 casos humanos, de dois ces e uma mula. Nesse foco constatou-
se que 32% dos ces e aproximadamente 30% dos eqinos apresentavam leses
cutneas de leishmaniose, sugerindo sua participao na transmisso da molstia ao
homem (51).
Ainda no RJ, no municpio de Paracambi, realizou-se inqurito epidemiolgico
canino para LTA e constatou-se a infeco canina nas formas clnica/subclnica, A
associao da prevalncia em ces com a infeco humana sugere que o co possa
atuar como fonte de infeco, assim como favorecer a disseminao da doena.
(46).
No ES, em um estudo prospectivo no municpio de Viana, observou-se que 17,2%
dos ces estavam naturalmente infectados. Dentre os 732 habitantes da rea, foram
registrados 11 casos novos da doena, sendo que 10 deles ocorreram na coorte de
indivduos que conviviam com ces doentes (24, 30).
Em Itarana, tambm no ES, durante um surto epidmico, constatou-se que as
pessoas que conviviam com ces doentes apresentavam-se infectadas em
proporo significativamente maior do que as do grupo controle. No referido estudo,
26
verificaram que 45,24% dos indivduos que conviviam com ces doentes
apresentaram intradermorreao de Montenegro positiva. J, entre os que no
conviviam com animais infectados, apenas 19,53% apresentaram positividade. Na
ocasio, L. (V.) braziliensis foi isolada tanto no homem quanto no co, sugerindo que
o animal tenha papel importante no ciclo de transmisso da LTA (31).
Em pesquisa sobre a especificidade alimentar de flebotomneos nos municpios
capixabas de Viana e Afonso Cludio, observou-se que as mesmas espcies que
apresentavam antropofilia tambm eram intensamente cinoflicas, tanto nos
ambientes domiciliar quanto peridomiciliar e mata. O autor infere que a transmisso
ocorre predominantemente no ambiente domiciliar, tendo como fonte de infeco o
co e talvez o prprio homem (24).
Vale lembrar que a inexistncia de ces com leses suspeitas em reas endmicas
de LTA humana no significa que a doena canina no esteja ativa (52). comum
encontrar animais que no desenvolvem leses, mas albergam os parasitos, e
tambm aqueles que j apresentaram leses, mas evoluram naturalmente para a
cura clnica.
Ainda no se conhece o papel epidemiolgico dos animais com infeco subclnica,
no ciclo de transmisso da LTA, mas sabida a grande dificuldade em caracterizar
doena ou cura parasitolgica na espcie canina. No municpio de Viana, ES, foram
examinados 186 ces, dos quais 46 apresentavam leses suspeitas, sendo
encontrados parasitos em 31 deles. Os pesquisadores no puderam demonstrar
parasitos em material obtido por bipsia das cicatrizes das leses curadas, seja por
meio do exame direto ou inoculao em hamster, reforando a dificuldade de
diagnstico preciso em ces(30).
1.6 Os Vetores:
Os flebotomneos so os vetores de Leishmania sp. So insetos hematfagos
pertencentes ordem Diptera, famlia Psychodidae, subfamlia Phlebotominae. Estes
insetos so popularmente conhecidos como mosquito-palha, asinha-de-palha,
27
birigui, cangalha, tatuqura. So pequenos, muito pilosos, castanhos claros ou
cor-de-palha, e reconhecidos por permanecerem com as asas, lanceoladas,
entreabertas e ligeiramente levantadas no repouso. Segundo (53) apresentam curto
raio de ao, que fica em torno de 200 m.
O grupo de insetos ao qual pertencem os flebotomneos surgiu no perodo Cretceo
Inferior (h entre 145 e 65 milhes de anos) Estes dpteros ento ocuparam a
maioria das regies compostas por Savanas, Mata Atlntica, Caatinga, Cerrado,
Floresta Amaznica e Chaco, com exceo das regies frias e ilhas ocenicas (54).
Atualmente so encontrados flebotomneos principalmente nos trpicos e
subtrpicos, com algumas poucas espcies penetrando as regies temperadas tanto
do Norte (a at 50 de latitude Norte) quanto do Sul (a at cerca de 40 de latitude
Sul), no sendo encontrados na Nova Zelndia nem nas Ilhas do Pacfico. Ocorrem
em uma gama muito ampla de habitats, desde o nvel do mar a altitudes de at 2800
m (55).
Quanto alimentao de adultos, machos e fmeas sugam seivas vegetais, nctar
de flores, frutos e solues aucaradas, utilizando carboidratos como fonte de
energia(56-60). Os carboidratos influenciam o desenvolvimento e a infectividade de
Leishmania em flebotomneos. Somente as fmeas so hematfagas, necessitando
de sangue de vertebrados para a maturao de seus ovos. Algumas espcies se
alimentam apenas uma vez entre as posturas, enquanto outras precisam de vrios
repastos para um nico ciclo de oviposio, o que pode fazer destas importantes
vetoras (61-63).
No ciclo biolgico desses dpteros, as fases imaturas ocorrem em ambiente terrestre.
Os ovos, as larvas, com quatro estdios evolutivos, e as pupas necessitam de locais
midos sombreados, ricos em matria orgnica, para se desenvolverem at a fase
adulta, alada. De modo geral, para seu desenvolvimento, requerem temperaturas
entre 20C e 30C, umidade superior a 80% e matria orgnica (53).
Fatores como o clima, temperatura, umidade relativa do ar, precipitao, a fonte de
alimentos, a declividade e outros parmetros ecolgicos podem influenciar na
28
densidade populacional destes insetos e, por conseguinte, na distribuio das
leishmanioses (64, 65).
Em condies de laboratrio, a temperatura tima para o desenvolvimento da
maioria das espcies neotropicais de 25C a 27C, sendo que condies trmicas
ligeiramente acima desta faixa implicam em ciclos mais rpidos (62). A maioria das
espcies de flebotomneos da regio Neotropical habita reas de floresta com ndice
pluviomtrico em torno de 2000 mm por ano, mas estes insetos tambm podem ser
encontrados em reas semi-ridas, com cobertura vegetal arbustiva (53, 66).
Sobre seu comportamento hematofgico, os flebotomneos iniciam sua atividade no
crepsculo vespertino, avanando especialmente nas horas da primeira metade da
noite (67). Durante o dia podem ser encontrados em ectopos naturais como troncos
de rvores, tocas de animais, sob folhas cadas no solo, frestas em rochas e em
cavernas, que utilizam para repouso aps a cpula e a hematofagia (68-71).
At o momento, pelo menos 927 espcies ou subespcies de flebotomneos atuais e
22 fsseis j foram descritas no planeta, sendo que aproximadamente 500 atuais e
16 fsseis ocorrem no Novo Mundo (72). O Brasil o pas que concentra o maior
nmero de espcies (73).
Esses dpteros esto amplamente distribudos por todo o territrio brasileiro,
ocorrendo em nichos ecolgicos variados, inseridos em diferentes biomas, o que
caracteriza sua estreita relao adaptativa com o meio ambiente. A distribuio
geogrfica das espcies de flebotomneos pode ser influenciada por barreiras fsicas,
precipitao pluviomtrica, vegetao, luminosidade e abundncia de hospedeiros
vertebrados(74). As mudanas ambientais, seja por fenmeno natural ou interveno
humana, como destruio das matas nativas, alteram os habitats naturais de
flebotomneos e modificam as relaes ecolgicas entre vetores e parasitos.
Forattini, em 1960 (75), j enfatizava a chance de flebotomneos silvestres se
adaptarem ao ambiente domstico e peridomstico. Segundo o autor, a capacidade
adaptativa destes insetos depende da similaridade do ambiente alterado pelo
homem com o nicho ecolgico por eles originalmente ocupado.
29
Como os habitats naturais so alterados ou destrudos pela atividade humana,
algumas espcies desaparecem e outras se beneficiam. As espcies com maior
probabilidade de se adaptarem so aquelas que predominam no estrato terrestre e
prosperam em bordas florestais ou clareiras. Os flebotomneos pr-adaptados que
levaram vantagens com a atividade antrpica, atualmente so encontrados tanto em
ambientes rurais quanto urbanos, com afinidade por abrigos de animais domsticos
e habitaes humanas (76).
A densidade populacional desses insetos no ambiente peridomiciliar diretamente
relacionada sua atratividade pelos animais domsticos e s condies ambientais
encontradas nos abrigos. Tais condies podem ser: ambiente rico em matria
orgnica, favorvel ao desenvolvimento das formas imaturas; grande quantidade de
animais para a alimentao sangunea dos adultos e uma gama de micro-habitats
que os protegem das situaes adversas como ventos e chuvas excessivos (77-79).
Alguns estudos tm mostrado que a agregao de flebotomneos em ambiente
peridomiciliar est relacionada com a liberao de feromnios pelos insetos e
cairomnios pelos hospedeiros (80, 81). O carter oportunista destes psicoddeos,
no que diz respeito alimentao sangunea, revela que uma grande variedade de
vertebrados pode funcionar como fonte alimentar, entre eles animais domsticos,
silvestres e o homem (82).
Uma pesquisa sobre o comportamento de flebotomneos em rea endmica de LTA
no norte do estado do Paran, encontrou alta prevalncia de insetos antropoflicos
em abrigos de galinhas e sunos, deixando evidente que os animais domsticos
exercem forte atrao sobre esses dpteros, independentemente de serem ou no
caracterizados como reservatrios de Leishmania sp (83).
De acordo com essas observaes, possvel compreender por que a LTA
representa to importante problema de sade pblica e por que est presente em
todos os estados do Brasil. Abrigos de animais domsticos construdos prximos das
habitaes humanas, a falta de limpeza no peridomiclio e a localizao das casas
ao lado de pequenos capes de mata so freqentemente observados nas reas
30
rurais em diversas regies do pas (84-87). Assim, surgem condies propcias para
a procriao dos flebotomneos, favorecendo o aparecimento e a disseminao da
doena.
O potencial vetorial dos flebotomneos determinado por sua capacidade de
sobrevivncia, multiplicao e diferenciao das promastigotas no trato digestivo, e
probabilidade de transmitir os parasitos aos vertebrados (88).
Para a espcie ser considerada transmissora da Leishmania ao homem, devem ser
considerados os seguintes critrios(89):
Apresentar certo grau de antropofilia;
Ter a capacidade de infectar-se quando se alimentar no reservatrio e
transmitir a Leishmania para um novo hospedeiro;
A Leishmania encontrada no flebotomneo naturalmente infectado deve
ser a mesma isolada no ser humano, em determinada rea geogrfica;
Em reas onde a doena ocorre, a distribuio espacial do vetor deve
coincidir com a da espcie de Leishmania encontrada no homem, e em
densidade suficiente para manter a transmisso do parasito na
natureza;
A espcie de flebotomneo deve apresentar capacidade de se infectar
experimentalmente e ser capaz de transmitir a Leishmania para um
hospedeiro, pela picada.
Em relao sistemtica de flebotomneos nas Amricas, Young e Duncan (1994)
(61) agrupam as espcies em um nico gnero Lutzomyia, enquanto que Galati
(2003) (71) as distribui em 24 gneros.
No estado do Esprito Santo, adotando a classificao filogentica proposta por (71),
existem registros de ocorrncia de 57 espcies de flebotomneos pertencentes aos
gneros Bichromomyia, Brumptomyia, Evandromyia, Expapillata, Lutzomyia,
Micropygomyia, Migonemyia, Nyssomyia, Pintomyia, Pressatia, Psathyromyia,
Psychodopygus, Sciopemyia e Trichopygomyia. (4, 17, 61, 71, 90-93).
31
Pesquisas realizadas no estado do ES demonstraram a existncia de quatro
espcies com potencial para transmisso de LTA, sendo elas Nyssomyia intermedia
(Lutz & Neiva, 1912), Nyssomyia whitmani (Antunes & Coutinho, 1939), Migonemyia
migonei (Frana, 1920) e Pintomyia fisheri (Pinto, 1926). Admite-se que essas
espcies tenham importncia epidemiolgica por serem antropoflicas e j terem sido
encontradas parasitadas pela L. (V.) braziliensis em outros estados brasileiros. No
ES, leva-se em considerao o fato de aparecerem em alta densidade nas principais
reas endmicas de LTA, sugerindo que tenham importncia como vetoras do
parasito (17, 30).
Nyssomyia intermedia tem sido considerada principal vetora de L.(V.) braziliensis no
Sudeste do Brasil (22), embora Ny. whitmani (Antunes & Coutinho, 1939) e Mg.
migonei (Frana, 1920) tambm sejam freqentemente encontradas fazendo repasto
em humanos no peridomiclio, em reas com transmisso ativa de leishmaniose (24,
71).
Alm de j terem sido incriminadas como vetoras em diversas regies do pas, Ny.
intermedia, Ny. whitmani e Mg. migonei tambm tm afinidade pelo co (24),
considerado reservatrio de L. (V.) braziliensis no ambiente domiciliar (8, 17, 23, 30).
Estudos sobre flebotomneos vm sendo realizados no Esprito Santo, tanto nas
reas rurais quanto periurbanas, onde a LTA apresenta alta incidncia. No entanto, a
captura de flebotomneos nessas regies, vem se restringindo aos ambientes
domsticos e pequenos fragmentos de Mata Atlntica prximos s casas (22). O
nico estudo em reserva primria de Mata Atlntica no estado foi realizado em rea
com baixa incidncia de LTA (94).
Pesquisas realizadas no Brasil e em outros paises da Amrica do Sul evidenciam
que o clima tropical e as altitudes de at 800 metros acima do nvel do mar so
favorveis transmisso da LTA (37, 85, 95-99).
Pesquisadores estudaram as condies de sobrevivncia de Ny. intermedia, espcie
incriminada como transmissora da LTA em diversas regies do Brasil. Segundo os
autores, esta no habita altitudes mais elevadas (85). Um outro trabalho, em Itapira,
32
SP, encontrou-se que mais de 70% das reas de ocorrncia da LTA em altitudes
menores que 750 m (100).
Alm da declividade, o clima, influenciado por esta, as fontes de alimentos e outros
parmetros ecolgicos determinam a distribuio dos flebotomneos. Assim, acabam
por influenciar a ocorrncia das doenas transmitidas por eles (64). Fatores
climticos como temperatura, umidade e pluviometria, tm influenciado de modo
varivel a populao de flebotomneos, dependendo da rea analisada (101).
A riqueza e diversidade de espcies pertencentes a diferentes grupos apresentam
padres distintos de distribuio. Algumas so restritas ao ambiente silvestre e
outras registradas em reas profundamente alteradas pela ao do homem. (102).
O aumento da densidade ou abundncia das populaes de flebotomneos em torno
das casas demonstra o grau de afinidade de algumas espcies a ambientes com
elevada atividade antrpica (103, 104). Essas variaes populacionais podem estar
associadas com o aumento na incidncia de leishmaniose, pois algumas delas
podem atuar como vetores da doena (105, 106).
Em Afonso Cludio, ES, foi desenvolvido um estudo altitudinal, no qual Ny.
intermedia foi incriminada como principal espcie vetora da LTA naquele ambiente,
tendo como possveis vetores secundrios Ny. whitmani e Mg. migonei. Neste estudo
a transmisso peridomiciliar foi confirmada como a mais importante(17).
Em Cariacica, ES, estudos anteriores apontam indcios de transmisso intra e
peridomiciliar, com a participao de Ny. intermedia, Pi. fisheri e Mg. migonei como
possveis vetores (22).
Nos municpios de Viana e Afonso Cludio, ES, analisando-se fmeas de
flebotomneos capturadas em focos de LTA, verificou-se que 0,77% delas continham
DNA de Leishmania sp, dentre as quais algumas das principais espcies
incriminadas como vetoras, tais como Ny. intermedia e Ny. whitmani. Ficou assim
demonstrando que havia circulao dos parasitos entre a populao de vetores
(107).
Tambm no municpio de Viana, que faz limite com Cariacica, pesquisadores
identificaram criadouros peridomiciliares de flebotomneos. Ao capturar formas
33
adultas que emergiam do solo em diferentes distncias das habitaes humanas e
abrigos de animais, observaram que a espcie encontrada em maior nmero foi Ny.
intermedia, que, assim como Mg. migonei deu preferncia a criadouros mais
prximos das casas (32). Considerando que o raio de vo mdio dos flebotomneos
curto, em geral at 200 metros (53), estes achados indicam que os insetos que
circulam em determinado ambiente nascem de criadouros no prprio local.
Observando-se os hbitos antropoflicos e potencial vetorial das duas espcies mais
capturadas, refora-se a hiptese da transmisso domiciliar da LTA na regio.
Analisando os aspectos epidemiolgicos da LTA em reas intensamente modificadas
pela ao antrpica, como no Sudeste do Brasil, percebe-se a complexidade de que
se reveste o ciclo de transmisso da doena na regio. A devastao das florestas
reduzindo o quantitativo de animais silvestres, ao invs de facilitar o entendimento
dos mecanismos de transmisso da LTA, parece ter desafiado a compreenso dos
pesquisadores, que ainda no conseguiram explicar o ressurgimento da doena em
reas onde havia desaparecido h dcadas (108). Mais que isto, o aparecimento da
doena humana em reas colonizadas h mais de um sculo, onde nunca fora antes
registrada, evidencia a necessidade de novos estudos para elucidar seu mecanismo
de transmisso.
34
2 JUSTIFICATIVA
Considerando os postulados de Killick-Kendrick e Ward (1981) (89), sobre os elos da
cadeia de transmisso da leishmaniose em determinada regio, existem, na
literatura, poucos trabalhos abrangentes, integrando informaes consistentes sobre
a doena humana, animais reservatrios e espcies vetoras de Leishmania, em uma
mesma rea endmica. A maioria das publicaes traz informaes fragmentadas,
ora abordando exclusivamente aspectos relacionados doena humana, outras
vezes focalizando um nico elo da cadeia de transmisso, como animais
reservatrios ou insetos vetores. Soma-se a isto o fato de que diferentes grupos de
pesquisadores trabalham de forma independente, utilizando metodologias
diferenciadas, em reas com caractersticas ecolgicas diversas. Em funo disto,
existe enorme dificuldade em se comparar os resultados de trabalhos realizados em
diferentes reas endmicas, inviabilizando qualquer estudo de meta-anlise sobre os
mecanismos de transmisso da LTA. Da a necessidade de realizar estudos mais
abrangentes, com novas abordagens metodolgicas e resgatando informaes
acumuladas a partir de pesquisas anteriores realizadas em uma mesma rea
endmica. Com esta viso se prope a realizao do presente trabalho, na tentativa
de elucidar os mecanismos de transmisso da LTA em rea de colonizao antiga,
com caractersticas ecolgicas intensamente modificadas pela ao antrpica e onde
a doena assume perfil epidemiolgico diverso daquele observado em regies com
transmisso silvestre.
O conhecimento sobre a composio da fauna flebotomnica de determinada regio
e o comportamento das espcies que ali ocorrem imprescindvel para o
esclarecimento de aspectos envolvidos na transmisso da LTA, possibilitando fazer
inferncias a respeito de grupos mais ou menos expostos ao risco de infeco. Alm
disso, a busca constante de informaes sobre o aumento do nmero de casos de
LTA e a adaptao dos vetores a esses ambientes necessria para a
compreenso da epidemiologia desse agravo e a sustentao de aes de
preveno e controle.
A observao de que os casos de LTA na rea desapareciam em altitudes acima de
550 metros, a partir de um deslocamento de cerca de cinco quilmetros da base do
vale at o topo da montanha, mostrou-se epidemiologicamente interessante para a
35
realizao do presente trabalho. Pelas caractersticas descritas, supe-se que os
provveis reservatrios de Leishmania, sejam eles humanos, animais domsticos ou
silvestres, estariam igualmente representados em qualquer nvel de altitude, na rea
delimitada para o estudo. Como hiptese de trabalho, supe-se que a ausncia da
doena na parte superior do vale ocorra em funo de mudanas nas populaes de
flebotomneos, em diferentes nveis de altitude. Assim, um estudo ecolgico sobre os
insetos nessa rea poder trazer importantes subsdios para a elucidao do ciclo
de transmisso da LTA na regio costeira do estado do ES.
36
3 OBJETIVOS
3.1 Objetivo geral
Estudar as populaes de flebotomneos e alguns fatores que podem influenciar sua
distribuio rea endmica para leishmaniose tegumentar americana, a localidade de
Roda Dgua, municpio de Cariacica, Esprito Santo, Brasil.
3.2 Objetivos Especficos
I) Identificar as espcies de flebotomneos que ocorrem no ambiente silvestre e
peridomiciliar na localidade de Roda Dgua;
II) Avaliar a influncia da altitude sobre as populaes de flebotomneos da rea;
III) Caracterizar a distribuio as espcies antropoflicas em relao ao ambiente
peridomiciliar ou silvestre.
IV) Inferir sobre as provveis espcies vetoras de Leishmania na rea estudada.
37
4 MATERIAIS E MTODOS
4.1 Descrio da rea de estudo
O estudo foi realizado na localidade de Roda Dgua, Cariacica, situada a 20 16
21 de latitude Sul e 40 25 05 de longitude Oeste (Figura 3). O municpio faz parte
da regio metropolitana de Vitria, capital do estado, da qual localiza-se a 15 Km de
distncia. O relevo acidentado (Figura 4), com altitude variando entre 20 e 718 m
acima do nvel do mar (109). O clima tropical mido, com ndice de precipitao
anual entre 1200 e 1300 mm, com destaque para os meses de novembro a maro,
com precipitao mensal que alcana mais de 150 mm. As menores precipitaes
ocorrem nos meses de inverno com valores inferiores a 100 mm. A temperatura
mdia do municpio da ordem de 24 C, apresentando os meses mais quentes no
vero, em que as temperaturas chegam a ultrapassar 33 C (110).
A localidade de Roda Dgua (Figura 5), uma rea endmica para LTA. Pertence
zona rural do municpio e tem como caractersticas a localizao muito prxima de
rea urbanizada (Figura 4), conservando, no entanto, caractersticas rurais, com
remanescentes de floresta Atlntica. Tratam-se de vales, cujas encostas foram
quase que totalmente ocupadas com extensas plantaes de banana e caf,
entremeadas por pequenas glebas florestais de formao secundria, restritas aos
cumes dos montes ou trechos com afloramentos rochosos, imprprios para
agricultura. O tipo de relevo bastante acidentado da regio determina a localizao
aleatria das residncias em diferentes nveis de altitude, com cenrio repetitivo no
entorno das casas, representado pela presena dos abrigos de animais domsticos
em contigidade com as plantaes de banana. Por sua vez, as lavouras delineiam
uma faixa de isolamento entre o ambiente domstico e os remanescentes florestais.
Tais caractersticas propiciam a formao de diferentes nichos ecolgicos para os
insetos vetores, variando no sentido horizontal, do peridomiclio para a floresta e, no
sentido vertical, em funo dos diferentes nveis de altitude.
As casas distam pelo menos 100m dos remanescentes florestais. Na diviso
sucessiva das propriedades rurais, as habitaes humanas passaram a ser
construdas cada vez mais prximas entre si, formando verdadeiros povoados. Tal
configurao do ambiente facilita o deslocamento das pessoas e dos animais
38
domsticos, principalmente os ces, de uma casa para outra. Muitos moradores
criam tambm aves, porcos, gatos, cabras, entre outros animais.
Figura 3. Acesso localidade de Roda Dgua, Cariacica, evidenciando o relevo
acidentado.
39
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41
4.2 Dados epidemiolgicos
O presente estudo utilizou dados epidemiolgicos contidos nos pronturios mdicos
dos pacientes diagnosticados com LTA provenientes de Roda Dgua atendidos na
no Servio de Infectologia Unidade de Medicina Tropical da Universidade Federal do
Esprito Santo (UFES), que referncia estadual para o agravo. As informaes
colhidas e registradas nestes pronturios com fins didticos e de pesquisa, por tratar-
se de um hospital-escola, vo muito alm daquelas existentes nas fichas de
notificao do Sistema Nacional de Notificaes do Ministrio da Sade (SINAN),
incluindo a localizao exata e georreferenciamento das residncias dos pacientes
com diagnstico positivo para LTA.
4.3 As coletas
Para realizao das coletas foram definidos, com auxlio de um aparelho GPS, seis
pontos fixos, distribudos em trs nveis de altitude, sendo que o nvel 1
correspondeu faixa de altitude de at 250 m; o nvel 2 abrangeu a faixa entre 250 e
500 m e o nvel 3 representou a faixa acima de 500 m. Em cada nvel de altitude
foram definidos arbitrariamente dois pontos fixos para realizao das coletas de
flebotomneos, um situado na mata e outro no peridomiclio, respectivamente.
Programou-se uma coleta por ms, no perodo de maro de 2002 a fevereiro de
2004. As coletas eram realizadas simultaneamente nos seis pontos fixos
previamente definidos, sendo os insetos coletados no decorrer das trs primeiras
horas noturnas. Em cada incurso ao campo participavam nove coletores, sendo que
seis eram alocados aleatoriamente, um para cada ponto fixo, onde coletavam
durante as trs horas programadas. Em cada nvel de altitude, um terceiro coletor
dividia seu tempo de trabalho entre o peridomiclio e a mata, coletando durante uma
hora e meia em cada ponto. Este protocolo teve como objetivo corrigir possvel vis
de amostragem, decorrente da habilidade individual de cada coletor.
Durante as coletas as temperaturas eram aferidas em dois momentos, uma vez no
incio da coleta e outra no trmino. Ento era calculada a mdia da temperatura de
cada nvel, em cada ponto, a cada coleta. Evitavam-se as coletas nos dias mais
chuvosos, para que estas no interferissem nos resultados.
42
Figura 6. Acesso principal para a localidade de Roda Dgua, Cariacica, de onde
podem-se observar os trs nveis de elevao demarcados por linhas.
Figura 7. Ponto de coleta na mata do nvel 1, apontado pela seta vermelha.
NVEL 3
NVEL 2
NVEL 1
43
Figura 8. Peridomiclio do nvel 2, mostrando duas residncias, rvores frutferas e
ces (Fonte: arquivo pessoal).
Figura 9. Peridomiclio do nvel 2. Plantaes de banana, muito comuns na regio, e
a mata ao fundo, na parte mais alta deste nvel (Fonte: arquivo pessoal).
44
Figura 10. Vista do alto do nvel 3, a aproximadamente 680 m neste ponto. Ao fundo
possvel ver o mar e os municpios de Vila Velha, esquerda, e em parte,
Guarapari (Fonte: arquivo pessoal).
4.4 As capturas
Os flebotomneos foram capturados por busca ativa com capturador manual de
Castro (figura 2), em superfcies de pouso, representadas por paredes externas das
casas, abrigos de animais domsticos, troncos de rvores e nas armadilhas de
Shannon modificadas (17). A armadilha de Shannon modificada representada por
um retngulo de tecido branco de 2,00 m x 1,20 m, coberto por um teto tambm de
tecido branco medindo 1,20 m X 1,50 m. Duas armadilhas foram instaladas
simultaneamente em cada nvel de altitude, e sempre em cada uma delas havia um
pesquisador fixo durante as trs horas e mais um mvel, durante a metade deste
perodo. No peridomiclio os insetos foram capturados nas armadilhas, paredes das
residncias, rvores e anexos. Na mata foram coletados nas armadilhas e nos
troncos de rvores.
45
Figura 11. Coleta por busca ativa em repouso num galinheiro localizado no
peridomiclio do nvel 2 (Fonte: arquivo do prof. Gustavo R. Leite).
Figura 12. Coleta por tubo de suco de Castro em armadilha de Shannon
modificada montada na mata do nvel 2 (Fonte: arquivo do prof. Gustavo R. Leite)
46
4.5 Identificao dos insetos
Os flebotomneos capturados foram levados ao laboratrio onde passaram por
processo de triagem e montagem em lminas, segundo a tcnica de Barretto &
Coutinho (1940) (111). A identificao dos espcimes baseou-se nos critrios
taxonmicos propostos por Galati (2003) (71), enquanto a abreviao dos gneros
segue a proposta de Marcondes (2007) (112).
Aqueles flebotomneos que no puderam ser identificados em nvel de espcie
formaram o grupo NI. Estes foram depositados em um arquivo entomolgico do
laboratrio e posteriormente sero reavaliados. Algumas espcies s podem ser
identificadas pela observao de caracteres especficos da fmea ou do macho, e
nem sempre um exemplar de cada sexo era coletado.
4.6 Avaliao da sazonalidade
A distribuio sazonal das espcies de flebotomneos que ocorrem em Roda Dgua
foi avaliada com base em variaes observadas nos regimes de chuva e
temperatura, ao longo do perodo estudado, com a finalidade de identificar possvel
influncia dos parmetros climticos, sobre as populaes dos insetos. A avaliao
foi conduzida de duas formas: a primeira dividindo o perodo em chuvoso e seco,
com base nos ndices pluviomtricos estimados para a regio e a segunda, pelas
estaes do ano, primavera, vero, outono e inverno.
4.7 Anlises Estatsticas
As anlises estatsticas foram realizadas em duas etapas, sendo a primeira foi
executada no programa IBM SPSS Statistics 20 (45), em que somente as espcies
reconhecidamente antropoflicas (24) foram avaliadas quanto s variveis nvel de
altitude, ambiente, perodo do ano (chuvoso e seco) e estaes do ano.
Alm da estatstica descritiva, aplicou-se o teste de Kolmogorov-Smirnov para saber
se os dados apresentavam distribuio de Gauss. Como estes no seguiam a
distribuio Gaussiana foi necessrio aplicar testes no-paramtricos. Para variveis
como o nvel de altitude e estaes do ano aplicou-se o teste de Kruskall-Wallis e
para ambiente de coleta e poca, o teste U de Mann-Whitney-Wilcoxon. Em relao
47
altitude tambm foi calculada a correlao de Spearman para dados no
paramtricos (113).
A segunda etapa referente anlise ecolgica das espcies de flebotomneos
capturadas em Roda Dgua, obtendo-se os ndices abundncia, riqueza,
diversidade de Shannon_H, equitabilidade_J e dominncia de Berger-Parker. Para
esta fase de anlises foi utilizado o programa Past 3.x .
Os dados foram tabulados e os grficos elaborados no programa Microsoft Excel
Starter 2010.
4.8 Aspectos ticos
O projeto foi encaminhado ao Comit de tica em Pesquisa envolvendo seres
humanos do Centro de Cincias da Sade da Universidade Federal do Esprito
Santo, obtendo-se parecer de autorizao consubstanciado n 494.029 (Anexo 1).
48
5 RESULTADOS
No perodo de abril de 2002 a maro de 2004 foram capturados 13.233 exemplares
de flebotomneos, identificados em 23 espcies. Deste total, 114 exemplares
estavam danificados e no puderam ser identificados em nvel de espcie com base
nos caracteres taxonmicos analisados. Estes espcimes foram registrados no grupo
NI, e contabilizados somente no total. A tabela 1 apresenta todas as espcies
encontradas em Roda Dgua e sua distribuio de acordo com o nvel de elevao
e o tipo de ambiente.
Tabela 1. Flebotomneos capturados em Roda Dgua, nos ambientes mata e
peridomiclio, no perodo de abril de 2002 a maro de 2004, com destaque para as
principais espcies conhecidamente antropoflicas e de importncia
epidemiolgica(*).
Ambiente
Espcie Peridomiclio Mata Total (%)
Brumptomyia nitzulescui 1 8 9 0,068
Evandromyia callipyga 1 18 19 0,143
Evandromyia edwardsi 0 9 9 0,068
Evandromyia sallesi 0 1 1 0,007
Evandromyia tupynambai 0 2 2 0,015
Martinsmyia gasparviannai 0 27 27 0,204
Micropygomyia schreiberi 32 218 250 1,889
Micropygomyia ferreirana 53 224 277 2,093
Migonemyia migonei* 1021 127 1148 8,675
Migonemyia quinquefer 136 407 543 4,103
Nyssomyia intermedia* 7826 262 8088 61,120
Nyssomyia yuilli yuilli 0 2 2 0,015
Pintomyia fischeri* 1738 671 2409 18,20
Pintomyia misionensis 0 2 2 0,015
Pintomyia monticola* 20 202 222 1,677
Pintomyia pessoai 0 1 1 0,007
Psathyromyia pascalei 2 24 26 0,196
Psathyromyia limai 1 9 10 0,076
Psathyromyia lutziana 0 1 1 0,007
Psychodopygus hirsutus 2 25 27 0,204
Psychodopygus matosi 4 34 38 0,287
Sciopemyia microps 2 4 6 0,045
Trichopygomyia longispina 1 1 2 0,015
NI 5 109 114 0,861
TOTAL 10845 2388 13233 100%
49
Dentre todas as espcies capturadas e identificadas em Roda Dgua, a mais
abundante foi Ny. intermedia (61,12%), seguida por Pi. fischeri (18,20%) e Mg.
migonei (8,68%) (Tabela 2). As trs espcies demonstram comportamento
antropoflico e cinoflico (Falqueto, 1995). Soma-se a estas uma quarta espcie que
tambm tem o hbito de fazer repasto sanguneo em seres humanos e ces, que
Pi. monticola. Entretanto, a mesma foi pouco encontrada neste estudo (1,67%).
Sendo assim, a soma das quatro principais espcies antropoflicas em Roda Dgua
representou 89,67% do total de espcimes identificados, contra os 10,1% resultantes
da soma das demais. Estas ltimas sero analisadas parte, apenas do ponto de
vista ecolgico.
Tabela 2. Percentuais das principais espcies de flebotomneos antropoflicas
capturadas em Roda Dgua entre maro de 2002 a fevereiro de 2004.
Espcies
antropoflicas
Percentuais sobre
o total Valores absolutos
Ny. intermedia 61,12% 8088
Pi. fischeri 18,20% 2409
Mg. migonei 8,68% 1148
Pi. monticola 1,67% 222
Total 89,67% 11867
As quatro principais espcies de flebotomneos que tm afinidade pelo homem
apresentaram diferenas significativas quanto sua distribuio nos trs nveis de
elevao estudados, utilizando-se o teste de Kruskal-Wallis. Ny. intermedia foi mais
abundante no nvel 2, tendncia esta acompanhada por Pi. fisheri, porm de forma
mais sutil. Mg. migonei esteve em maior quantidade no nvel 1, decrescendo no 2 e
sendo quase inexistente no nvel 3. J Pi. monticola apresentou distribuio inversa:
mais abundante no nvel 3, escassa no 2 e quase inexistente no 1 (figuras 1 e 2).
50
Em relao ao ambiente de coleta, das quatro espcies analisadas, apenas Pi.
fischeri apresentou semelhana estatstica entre o nmero de espcimes coletados
na mata e no peridomiclio segundo o teste U de Mann-Whitney (=0,05). Nas outras
trs espcies nota-se tendncia fortemente significativa para um dos dois ambientes,
sendo Mg. migonei e Ny. intermedia mais abundantes no peridomiclio, enquanto que
Pi. monticola foi mais abundante na mata (figuras 1 e 2).
Proporcionalmente, no entanto, observou-se que Pi. fischeri foi a espcie mais
abundante na mata dentre as 23 coletadas, contribuindo com 28,10% do total de
flebotomneos capturados neste ambiente, seguida por Mi. quinquefer (17,04%), que
no tem importncia epidemiolgica. Ny. intermedia contabilizou apenas 10,97% do
total da mata, Mg. migonei 5,32% e Pi. monticola 8,45%.
J no peridomiclio Ny. intermedia foi a espcie que demonstrou-se fortemente
dominante e abundante, contribuindo com 72,16% do total de espcimes coletados,
seguida por Pi. fischeri com 16,02% e Mg. migonei com 9,41%. Pi. monticola
contabilizou apenas em 0,18% do total dos insetos capturados neste ambiente.
Grfico 1. Distribuio das principais espcies de flebotomneos antropoflicas,
capturadas em diferentes faixas de altitude no peridomiclio da localidade de Roda
Dgua, Cariacica, entre abril de 2002 a maro de 2003.
0
1000
2000
3000
4000
5000
6000
N
me
ro d
e e
sp
c
ime
s
at 250m 250 a 500m acima de 500m
Nveis de altitude
PERIDOMICLIO
Ny. intermedia
Mg. migonei
Pi. fischeri
Pi. monticola
51
Grfico 2. Distribuio das principais espcies de flebotomneos antropoflica,
capturadas em diferentes nveis de altitude na mata da localidade de Roda Dgua,
Cariacica, entre abril de 2002 a maro de 2003.
Observando as propores das espcies antropoflicas em relao ao total de
espcimes coletados em cada nvel de cada amkbiente, tem-se que na mata Ny.
intermedia apareceu em 15,2% dos flebotomneos capturados no nvel 1. Neste
ambiente, no nvel 2, em 10,37% do total de capturados. J no nvel 3, no foi mais
capturada. A populao de Migonemyia migonei e partiu de 8,5% do total coletado
no nvel 1 da mata, passando para 0,74% no nvel 2 e 0,18% no nvel 3. Pi. fischeri
contribuiu com 22,94% de flebotomneos capturados no nvel mais baixo. No
segundo nvel caiu para 9,87% e no mais elevado, rea sem doena, 55.75%. Pi.
monticola distribuiu-se de forma diferente dos demais. Esta espcie apareceu em
0,48% do total do nvel 1 na mata, subiu para 6,17% no nvel 2 e aumentou ainda
mais no nvel 3, contribuindo com 31,71% do total de espcimes capturados neste
ambiente (grfico 3).
No peridomiclio, Ny.intermedia foi a espcie identificada em 57,57% daquelas
coletadas no nvel 1. No segundo nvel, em 78,76%. J no nvel 3, cai para 0,33% do
0
50
100
150
200
250
300
350N
m
ero
de e
sp
cim
es
at 250m 250 a 500m acima de 500m
Nvel de altitude
MATA
Ny. intermedia
Mg. migonei
Pi. fischeri
Pi. monticola
52
total. Migonemyia migonei contribuiu com 17,68%, caiu pra 5,98% no segundo nvel
e no terceiro no apareceu. Pi. monticola comea com 0,03%, sobe para 0,19% 3 no
nvel 3, o mais elevado, 1,49%. Pi. fischeri contribuiu com 22,94% de flebotomneos
capturados no nvel mais baixo. No segundo nvel, caiu para 9,87%, e no nvel mais
elevado, rea sem doena, 55.75%. Pi. monticola distribuiu-se de forma diferente
dos demais. Esta espcie apareceu em 0,48% do total, subiu para 6,17% (grfico 4) .
Grfico 3. Distribuio proporcional de cada uma das principais espcies de
flebotomneos antropoflicos capturados na MATA, em Roda Dgua, Cariacica, entre
maro de 2002 e fevereiro de 2004.
Grfico 4. Distribuio proporcional de cada uma das principais espcies de
flebotomneos antropoflicos capturados no PERIDOMICLIO em Roda Dgua,
Cariacica, entre maro de 2002 e fevereiro de 2004.
Mata
0.00% 10.00% 20.00% 30.00% 40.00% 50.00% 60.00%
P. fischeri
N. intermedia
M. migonei
P. monticola
Esp
cie
s
Percentuais sobre o total capturado em cada nvel
Nvel 3
Nvel 2
Nvel 1
Peridomiclio
0.00% 10.00% 20.00% 30.00% 40.00% 50.00% 60.00% 70.00% 80.00% 90.00%
P. fischeri
N. intermedia
M. migonei
P. monticola
Esp
cie
s
Percentuais sobre o total capturado em cada nvel
Nvel 3
Nvel 2
Nvel 1
53
Utilizou-se o teste de Kruskal-Wallis para comparar a distribuio destes
flebotomneos em relao s estaes do ano. Assim, foi possvel observar que
apenas Pi. fischeri teve sua populao afetada pelas mesmas, sendo o inverno a
estao em que foi mais capturado, e outono aquela em que foi mais escasso. As
outras trs espcies de interesse distriburam-se uniformemente nas quatro
estaes, no apresentando diferena estatstica para este parmetro (grfico 5).
Quanto poca do ano, a anlise pelo teste U de Mann-Witney revela que apenas a
distribuio de Pi. fischeri foi significativamente influenciada pela pluviosidade
(p=0,07, NS=0,05), sendo maior na poca seca do que na chuvosa. As chuvas no
influenciaram de maneira significativa a distribuio de Ny. intermedia, Mg. migonei e
Pi. monticola (grfico 6).
Grfico 5. Distribuio das principais espcies antropoflicas de flebotomneos em
Roda Dgua, Cariacica, de acordo com pluviosidade, capturadas entre abril de 2002
a maro de 2003.
0
1000
2000
3000
4000
5000
N
mero
de E
sp
cim
es
SECO CHUVOSO
Perodo
PLUVIOSIDADE
Ny. intermedia
Mg. migonei
Pi. fischeri
Pi. monticola
54
Grfico 6. Distribuio das principais espcies antropoflicas de flebotomneos em
Roda Dgua, Cariacica, em relao s estaes do ano, capturadas entre abril de
2002 a maro de 2003.
Dentre os ndices ecolgicos calculados neste trabalho, os mais importantes so a
riqueza e a abundncia, mas para um melhor entendimento e possibilidade de
discusso dos dados, tambm foram includos os ndices de Diversidade de
Shannon, Equitabilidade de Pielou e a Dominncia de Berger-Parker (tabela 3).
Tabela 3. ndices ecolgicos obtidos para as populaes de flebotomneos
coletados em Roda Dgua, municpio de Cariacica, na mata e no peridomiclio, no
perodo de abril de 2002 a maro de 2004.
.
0
500
1000
1500
2000
2500
3000
3500
N
mero
de e
sp
cim
es
OUTONO INVERNO PRIMAVERA VERO
ESTAES DO ANO
Ny. intermedia
Mg. migonei
Pi. fischeri
Pi. monticola
NDICE ECOLGICO MATA PERIDOMICLIO
Riqueza 23 16
Abundncia 2388 10845
Diversidade de Shannon (H) 2.102 0.8721
Equitabilidade de Pielou (J) 0.6705 0.3220
Dominncia de Berger-Parker 0.2944 0.7220
55
6 DISCUSSO
6.1 Altitude X Ambiente
Nyssomyia intermedia foi espcie mais capturada em Roda D'gua (61,12%).
Predominou no ambiente peridomiciliar do nvel 2 (78,76% do total para este nvel),
onde provavelmente encontra melhores condies ecolgicas para seu
desenvolvimento, alm de dispor grande densidade de hospedeiros. importante
destacar que justamente neste nvel que se concentra o maior nmero de casos de
LTA na rea (Unidade de Medicina Tropical/UFES dados no publicados). Trata-se
de um txon predominante e abundante no peridomiclio de muitos focos de LTA,
tanto no Esprito Santo, como em outros estados da regio Sudeste do Brasil (17, 24,
28, 44, 114).
Em Roda Dgua foi possvel observar notvel tendncia de Ny. intermedia ser mais
abundante no ambiente peridomiciliar, com 7.826 espcimes capturados no
peridomiclio contra apenas 262 na mata, tendncia acompanhada por Pi. fischeri
(1738 exemplares no peridomiclio e 671 na mata) e Mg migonei. (1021 no
peridomiclio e 127 na mata).
Nyssomyia intermedia s.l. na verdade um complexo, e contempla duas espcies
distintas: Ny. intermedia e Ny. neivai (Pinto, 1926), que foram consideradas
sinnimos at meados dos anos 90 (115). So espcies com muitas caractersticas
comuns