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PROBLEMAS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA INFÂNCIA Professora Me. Gescielly Barbosa da Silva Tadei Professora Me. Márcia Regina de Sousa Storer GRADUAÇÃO PEDAGOGIA MARINGÁ-PR 2012

PROBLEMAS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA INFÂNCIA

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PROBLEMAS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA

INFÂNCIAProfessora Me. Gescielly Barbosa da Silva Tadei

Professora Me. Márcia Regina de Sousa Storer

GRADUAçãO

PEDAGOGIA

MARINGÁ-PR2012

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Reitor: Wilson de Matos SilvaVice-Reitor: Wilson de Matos Silva FilhoPró-Reitor de Administração: Wilson de Matos Silva FilhoPresidente da Mantenedora: Cláudio Ferdinandi

NEAD - Núcleo de Educação a Distância

Diretoria do NEAD: Willian Victor Kendrick de Matos SilvaCoordenação Pedagógica: Gislene Miotto Catolino RaymundoCoordenação de Marketing: Bruno JorgeCoordenação Comercial: Helder MachadoCoordenação de Tecnologia: Fabrício Ricardo LazilhaCoordenação de Curso: Márcia Maria Previato de SouzaSupervisora do Núcleo de Produção de Materiais: Nalva Aparecida da Rosa MouraCapa e Editoração: Daniel Fuverki Hey, Fernando Henrique Mendes, Jaime de Marchi Junior, José Jhonny Coelho, Luiz Fernando Rokubuiti e Thayla Daiany Guimarães CripaldiSupervisão de Materiais: Nádila de Almeida Toledo Revisão Textual e Normas: Cristiane de Oliveira Alves, Gabriela Fonseca Tofanelo, Janaína Bicudo Kikuchi, Jaquelina Kutsunugi, Karla Regina dos Santos Morelli e Maria Fernanda Canova Vasconcelos.

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Central - CESUMAR

CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ. Núcleo de Educação a distância:

C397 Problemasedificuldadesdeaprendizagemnainfância/ GesciellyBarbosadaSilvaTadei,MárciaReginadeSouza Storer.Maringá-PR,2012. 224p.

“GraduaçãoemPedagogia-EaD”. 1.Pedadogia2.Desenvolvimentocognitivo.3.Distúrbiosde aprendizagem.4.EaD.I.Título.

CDD-22ed.370 CIP-NBR12899-AACR/2

“As imagens utilizadas neste livro foram obtidas a partir dos sites PHOTOS.COM e SHUTTERSTOCK.COM”.

Av. Guedner, 1610 - Jd. Aclimação - (44) 3027-6360 - CEP 87050-390 - Maringá - Paraná - www.cesumar.brNEAD - Núcleo de Educação a Distância - bl. 4 sl. 1 e 2 - (44) 3027-6363 - [email protected] - www.ead.cesumar.br

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PROBLEMAS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA INFÂNCIA

Professora Me. Gescielly Barbosa da Silva Tadei

Professora Me. Márcia Regina de Sousa Storer

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APRESENTAçãO DO REITOR

Viver e trabalhar em uma sociedade global é um grande desafio para todos os cidadãos. A busca por tecnologia, informação, conhecimento de qualidade, novas habilidades para liderança e solução de problemas com eficiência tornou-se uma questão de sobrevivência no mundo do trabalho.

Cada um de nós tem uma grande responsabilidade: as escolhas que fizermos por nós e pelos nossos fará grande diferença no futuro.

Com essa visão, o Cesumar – Centro Universitário de Maringá – assume o compromisso de democratizar o conhecimento por meio de alta tecnologia e contribuir para o futuro dos brasileiros.

No cumprimento de sua missão – “promover a educação de qualidade nas diferentes áreas do conhecimento, formando profissionais cidadãos que contribuam para o desenvolvimento de uma sociedade justa e solidária” –, o Cesumar busca a integração do ensino-pesquisa-ex-tensão com as demandas institucionais e sociais; a realização de uma prática acadêmica que contribua para o desenvolvimento da consciência social e política e, por fim, a democratização do conhecimento acadêmico com a articulação e a integração com a sociedade.

Diante disso, o Cesumar almeja ser reconhecido como uma instituição universitária de referên-cia regional e nacional pela qualidade e compromisso do corpo docente; aquisição de compe-tências institucionais para o desenvolvimento de linhas de pesquisa; consolidação da extensão universitária; qualidade da oferta dos ensinos presencial e a distância; bem-estar e satisfação da comunidade interna; qualidade da gestão acadêmica e administrativa; compromisso social de inclusão; processos de cooperação e parceria com o mundo do trabalho, como também pelo compromisso e relacionamento permanente com os egressos, incentivando a educação continuada.

Professor Wilson de Matos SilvaReitor

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Caro aluno, “ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção” (FREIRE, 1996, p. 25). Tenho a certeza de que no Núcleo de Educação a Distância do Cesumar, você terá à sua disposição todas as condições para se fazer um competente profissional e, assim, colaborar efetivamente para o desenvolvimento da realidade social em que está inserido.

Todas as atividades de estudo presentes neste material foram desenvolvidas para atender o seu processo de formação e contemplam as diretrizes curriculares dos cursos de graduação, determinadas pelo Ministério da Educação (MEC). Desta forma, buscando atender essas necessidades, dispomos de uma equipe de profissionais multidisciplinares para que, independente da distância geográfica que você esteja, possamos interagir e, assim, fazer-se presentes no seu processo de ensino-aprendizagem-conhecimento.

Neste sentido, por meio de um modelo pedagógico interativo, possibilitamos que, efetivamente, você construa e amplie a sua rede de conhecimentos. Essa interatividade será vivenciada especialmente no ambiente virtual de aprendizagem – AVA – no qual disponibilizamos, além do material produzido em linguagem dialógica, aulas sobre os conteúdos abordados, atividades de estudo, enfim, um mundo de linguagens diferenciadas e ricas de possibilidades efetivas para a sua aprendizagem. Assim sendo, todas as atividades de ensino, disponibilizadas para o seu processo de formação, têm por intuito possibilitar o desenvolvimento de novas competências necessárias para que você se aproprie do conhecimento de forma colaborativa.

Portanto, recomendo que durante a realização de seu curso, você procure interagir com os textos, fazer anotações, responder às atividades de autoestudo, participar ativamente dos fóruns, ver as indicações de leitura e realizar novas pesquisas sobre os assuntos tratados, pois tais atividades lhe possibilitarão organizar o seu processo educativo e, assim, superar os desafios na construção de conhecimentos. Para finalizar essa mensagem de boas-vindas, lhe estendo o convite para que caminhe conosco na Comunidade do Conhecimento e vivencie a oportunidade de constituir-se sujeito do seu processo de aprendizagem e membro de uma comunidade mais universal e igualitária.

Um grande abraço e ótimos momentos de construção de aprendizagem!

Professora Gislene Miotto Catolino Raymundo

Coordenadora Pedagógica do NEAD- CESUMAR

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APRESENTAçãO

Livro: PROBLEMAS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA INFÂNCIAProfessora Me. Gescielly Barbosa da Silva Tadei

Professora Me. Márcia Regina de Sousa Storer

Prezados alunos,

Trabalhar com o desenvolvimento humano nos aspectos motor, cognitivo, emocional e neurológico é uma das facetas mais interessantes da nossa área de conhecimento, ou seja, a pedagogia.

Compreender o desenrolar desse processo tendo como ponto de partida a infância, torna nossa fonte de estudos mais intrigante e curiosa, uma vez que nos dedicamos ao estudo do referido período como uma maneira de tornar essa fase o mais coerente possível para a chegada ao mundo adulto.

Um adulto ponderado, em pleno exercício das faculdades mentais, capaz de estudar, trabalhar e conviver em grupo mostra uma passagem pelo desenvolvimento infantil de maneira tranquila, dentro do vai e vem de ondas que compete o desenrolar do mundo humano.

Partindo dessa perspectiva, planejamos, no atual módulo, estudar questões referentes ao desenvolvimento infantil, e dentro desse quesito, nos ateremos, especificamente à seguinte pontuação Problemas e dificuldades na infância.

No que diz respeito a esse eixo norteador em nosso processo de estudos, termos cinco unidades de estudos, as quais são:

I. O desenvolvimento da criança.

II. As principais teorias que se debruçam sobre o desenvolvimento humano – em busca da compreensão das dificuldades de aprendizagem.

III. As dificuldades e os distúrbios de aprendizagem: a dificuldade quanto à apreensão da leitura e da escrita.

IV. Dificuldades de aprendizagem: entendendo terminologias e conceituações.

V. A importância da atenção para a apreensão do conhecimento erudito.

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No que diz respeito à unidade I , o desenvolvimento da criança, realizaremos um levantamento sobre a história da infância a fim de compreendermos melhor o processo de desenvolvimento e aprendizagem.

Mas antes de adentrarmos nesse item, buscaremos um estudo sobre a construção da categoria infância, pois é a partir dessa categoria que temos áreas de estudos como a psicologia do desenvolvimento, a psicologia da aprendizagem e a psicopedagogia, por exemplo.

Quando pontuamos sobre alterações no desenvolvimento, é comum nos depararmos com o questionamento: “a criança apresenta o comportamento de chupar chupeta aos nove anos de idade, isso é normal?”. Por isso, nosso primeiro passo é destacar a diferenciação entre dois conceitos – o normal e o patológico. A fim de aprofundarmos um pouco essa questão, ampliamos a mesma dentro dos padrões de conhecimento de senso comum e conhecimento científico.

A ciência é baseada no conhecimento da realidade cotidiana. Ao nos depararmos com essa realidade, enquanto pesquisadores e estudiosos buscamos um afastamento da mesma a fim de irmos para além das aparências dadas a priori. Essa realidade cotidiana nos dá um tipo de conhecimento denominado de intuitivo, espontâneo, de tentativas e erros, que é entendido como senso comum (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 1999). Sem esse conhecimento, nossa vida seria muito complicada, e teria que ser repensada e reorientada a cada geração que surgisse. É como se tivéssemos que reinventar a roda a cada instante!

Entendemos, pautadas nas referidas autoras, que somente esse conhecimento não seria suficiente para o desenvolvimento da humanidade. Com o tempo, esse tipo de conhecimento foi sendo aperfeiçoado e especializado até atingir um nível de sofisticação maior. Pensemos nos grandes avanços da humanidade na área da saúde, da tecnologia e da pesquisa laboratorial. Chegamos à lua! Inventamos vacinas com vistas à prevenção de doenças outrora incuráveis! Criamos instrumentos cirúrgicos de última geração para o bom andamento de intervenções hospitalares. Somos capazes de, pelas pesquisas e investimentos na área social, organizarmos inferências acerca de problemas referentes à aprendizagem e ao desenvolvimento humano de maneira global. Isso é o conhecimento científico!

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Você sabia que o conhecimento dito “senso comum” é tido como a base para o conhecimento cientí-fico?

Dessa maneira, ciência pode ser denominada como um conjunto de conhecimentos sobre fatos ou aspectos da realidade expressos por uma linguagem precisa e rigorosa (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 1999).

Retomemos, então, nossa discussão sobre o normal e o patológico. Dentro do exposto sobre o conhecimento científico, o que é normal? Segundo Bueno (1996), normal é o que segue a norma, exemplar. Ao trazermos isso para o nosso contexto de estudos, há a necessidade de pontuar que ao lidarmos com seres humanos, essa normalidade necessita estar pautada no contexto social, histórico e cultural da pessoa. Por exemplo, alguns tailandeses possuem o hábito de comer grilos, baratas, enfim, insetos em geral. E fica a questão: isso é normal? Bem, depende do que é considerado normal para aquela cultura. Para eles é normal, para você isso pode ser anormal, estranho ou mesmo inconcebível! Nesse sentido, dependerá do ponto de vista do observador.

Já a patologia, é definida por Bueno (1996) como uma parte da medicina destinada ao estudo das doenças, o patológico refere-se à patologia.

Ao lidarmos com seres humanos e melhor trabalhar a questão da normalidade e da patologia, temos dois referenciais que nos auxiliam quanto a isso, o Código Internacional das Doenças (CID – 10), e o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM IV). Esses materiais dão maior sustentabilidade e coesão aos nossos estudos e à atuação profissional.

O CID-10 e o DSM IV são os referenciais que auxiliam os estudos sobre patologia.

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Nossa preocupação está em não apresentar algo patológico presente no indivíduo como um “rótulo” imposto sobre ele, seja qual for a questão presente no quadro apresentado. Nossa intenção está em auxiliar na identificação do quadro e no prognóstico do mesmo, ou seja, se é possível fazermos algo pelo sujeito, para o seu progresso.

Essa afirmação é justificada ao observarmos que durante a fase do desenvolvimento humano é possível observar alguns conflitos relacionados ao desenrolar desse processo, os quais podem emergir nessa fase. É no período da infância que podem ocorrer alguns momentos de maior desordem, seja ela afetiva ou emocional, pois é uma fase de constantes assimilações e interiorizações do meio externo. Nessa perspectiva, é possível afirmar que esse meio pode auxiliar de maneira positiva ou negativa o processo de desenvolvimento do indivíduo.

É importante estarmos cientes desse conhecimento prévio para que a compreensão acerca dos problemas e das dificuldades de aprendizagem possa ser trabalhada de maneira mais completa, com a possibilidade de entendermos as possíveis lacunas deixadas no processo de alfabetização, e/ou no desenvolvimento cognitivo, e/ou na socialização, e/ou em questões referentes ao desenvolvimento emocional, e/ou ainda em casos mais específicos de origem genética.

Por isso, a necessidade de compreendermos algumas especificidades do Sistema Nervoso Central (SNC) é imprescindível, assim como a junção entre tais especificidades e suas ligações com as reações a atividades do organismo humano, em especial, na integração de sensações às respostas motoras.

Por isso, para nossa unidade I, nos ateremos aos estudos acerca do desenvolvimento cognitivo da criança, das possíveis alterações nesse desenvolvimento e o desenvolvimento neurológico e psicomotor.

Na unidade II , abordaremos as principais teorias que trabalham com a área de desenvolvimento humano e processo de aprendizagem. Para tanto, contaremos com a compreensão do referencial teórico de alguns estudiosos que foram de suma importância para a compreensão do desenvolvimento infantil. São eles: Jean Piaget (1896 – 1980); Henri Paul Hyacinthe Wallon (1879- 1962); Sigmund Freud, (1856-1939) e Lev Seminovich Vigotsky (1896-1934). Esses autores deixaram um legado de estudiosos que se sentiram encarregados pela propagação dos estudos, dos questionamentos e das pesquisas, após a morte dos mesmos.

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Um estudioso que dá relevantes contribuições a nossa unidade de estudos é o biólogo francês JEAN PIAGET (1896 – 1980). Ele encontrou na psicologia do desenvolvimento a maneira de buscar compreender como o ser humano se desenvolve. A teoria piagetiana possui relevante valor, uma vez que abriu caminhos e novas perspectivas para o estudo do pensamento e da linguagem na criança (SORATO, 2009).

Ao falarmos em Piaget, prontamente pensamos na Epistemologia Genética. Do ano de 1920 a 1980, Piaget dedicou-se aos estudos de natureza epistemológica, por isso a denominação Epistemologia Genética. De acordo com Fabril (2008), a definição de conhecimento é o problema central da epistemologia, sendo motivo de prestígio para Jean Piaget tê-lo enfrentado e, proposto, ademais, a reformulação da questão epistemológica clássica para indagar como se processa a mudança de níveis mais simples de conhecimento até os mais complexos, resultante da interação entre o sujeito e o objeto.

Apenas duas obras Piagetianas relacionam-se à educação!

Para Fabril (2008, p. 11)

Em um primeiro momento, as pesquisas piagetianas direcionaram-se à Psicologia Genética para investigar a gênese de conceitos relacionados ao meio físico, natural e social junto a crianças e adolescentes. O conjunto dessas pesquisas, como assinala Piaget (1983b), permitiu-lhe chegar à fase posterior de sua obra, denominada Epistemologia Genética. É como se por meio da investigação e compreensão do sujeito psicológico – particular e situado – tivesse alcançado o sujeito epistêmico - geral e universal. O sujeito epistêmico representa a resposta a que o autor pode chegar até o final de sua vida à questão-chave de sua obra: por meio da teoria da equilibração, o autor reorganiza e sistematiza conceitos essenciais de sua obra [...] Jean Piaget escreveu como autor e em co-autoria, mais de sessenta livros que registram o desenvolvimento de suas pesquisas e o conseqüente aprimoramento de sua teoria. Dentre seus escritos, apenas duas obras tratam de assuntos relacionados à educação: Psicologia e Pedagogia e Para onde vai a Educação? [...].

Mesmo tendo publicado poucas obras na área da educação, esse educador tornou-se referência para muitos pensadores que vieram a posterióri, como Marta Kohl de Oliveira, por exemplo.

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Na teoria piagetiana, de acordo com Sorato (2009), a construção do conhecimento ocorre quando acontecem ações físicas ou mentais sobre objetos que provocando, dessa maneira, o desequilíbrio, resultam em assimilação ou, acomodação e assimilação dessas ações e, assim, a construção de esquemas ou conhecimento. Resumidamente, é possível entender que uma vez que a criança não consegue assimilar o estímulo, ela tenta fazer uma acomodação e após uma assimilação e equilíbrio é então alcançado.

A partir do exposto, compreendemos que para Piaget o conhecimento é cumulativo e de origem sensorial. Esse estudioso dispõe o desenvolvimento humano em períodos, os quais são: 1º período: Sensório-motor (0 a 2 anos); 2º período: Pré-operatório (2 a 7 anos); 3º período: Operações Concretas (7 a 11 ou 12 anos); e 4º período: Operações formais (11 ou 12 anos em diante) (BROTHERHOOD; GALLO, 2009).

No primeiro período, Sensório-motor (0 a 2 anos), ocorre a percepção e movimentos na exploração no meio. É a fase do egocentrismo, o próprio corpo do bebê é a referência única e constante, a imitação é presente.

No segundo período, Pré-operatório (2 a 7 anos) é anterior a representação lógica do pensamento. Há o desenvolvimento de uma linguagem afetiva que só se torna comunicativa após os 2 anos de idade, fase em que a linguagem mostra-se mais desenvolvida e fortalecida.

O terceiro período, Operações Concretas (7 a 11 ou 12 anos), a criança já busca no adulto a objetividade nas respostas, o adulto é considerado a fonte de conhecimento. Nessa fase, o pensamento é lógico e já pode ser percebido, ocorrendo, também, o início da socialização. O que vai diferenciar esse período da adolescência, é que nas operações concretas a criança estabelece todo o seu raciocínio lógico a partir de experiências vividas no mundo concreto.

Já o quarto e último período, Operações Formais (11 ou 12 anos em diante), o raciocínio lógico ultrapassa as experiências vividas, pois o adolescente é capaz de analisar questões propostas sem que essas estejam presas ao real. Sua procura está em uma relação entre os iguais. No aspecto cognitivo há o domínio da abstração e da generalização, favorecendo o adolescente a capacidade de lidar com conceitos, como: liberdade e justiça.

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Na idade adulta não surge nenhuma nova estrutura mental.

Questionamos então: e na idade adulta, não há um período esboçado? Na referida fase não surge nenhuma nova estrutura mental. O indivíduo caminha para então: um aumento do desenvolvimento cognitivo e para maior compreensão dos problemas. Tais pontos influenciam os conteúdos emocionais, assim como a sua forma de estar no mundo.

Piaget reconhece, porém, que apesar de ponderar faixas etárias como formas específicas de pensar e atuar sobre o mundo pode ocorrer atrasos ou avanços individuais em relação à norma de determinado grupo. De acordo com Sorato (2009), essa variação pode ser devida à natureza do ambiente em que as crianças vivem. É possível compreender que, para Piaget, os contextos que colocam desafios às crianças são potencialmente mais estimulantes para o desenvolvimento cognitivo.

É inegável a importância da teoria de Piaget para a educação. A influência de seus estudos sobre o processo educacional foi bastante enfática, mesmo não tendo a pretensão de agir dessa maneira. Na realidade, tudo o que ele queria era compreender como ocorre o processo de desenvolvimento humano, mas estudiosos utilizam-se desses conhecimentos para buscar compreensões acerca da criança e a apreensão do conhecimento realizada pela mesma, em especial, nas dependências da instituição escolar.

Outro autor abordado é HENRI PAUL HYACINTHE WALLON (1879- 1962). De origem francesa, sua postura científica buscava fundamentação no marxismo. Importava-se com a compreensão acerca do desenvolvimento humano. Formou-se em medicina e pôs-se a estudar acerca de questões referentes à Psicologia do Desenvolvimento.

Henri Wallon – médico francês preocupado com o processo de desenvolvimento humano.

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Henri Paul Hyacinthe WallonFonte:<http://educarparacrescer.abril.com.br/aprendizagem/henri-wallon-307886.shtml>.

Henri Wallon elaborou uma teoria sobre o desenvolvimento humano, pois se preocupava muito com a educação, o que o fez escrever sobre as ideias pedagógicas apontando bases para que a psicologia oferecesse à atuação pedagógica um campo teórico, mostrando o uso que a pedagogia pôde fazer dessas bases, enriquecendo a experiência pedagógica (DOURADO; PRANDINI, 2001). Contudo, sua teoria ainda é pouco divulgada e conhecida nos meios educacionais. Também volta-se para a compreensão da psicogenética, nesse sentido, Dourado e Prandini (2001, p. 2) ressaltam que a psicogenética de Wallon é:

[...] essencialmente sociocultural e relativista, com forte lastro orgânico, a teoria de Wallon considera o desenvolvimento da pessoa completa integrada ao meio em que está imersa, com os seus aspectos afetivo, cognitivo e motor também integrados [...] Assim, a ênfase é para a integração – entre organismo e meio e entre as dimensões: cognitiva, afetiva, e motora na constituição da pessoa. A pessoa é vista como o conjunto funcional resultante da integração de suas dimensões, cujo desenvolvimento se dá na integração de seu aparato orgânico com o meio, predominantemente o social.

Percebemos que Wallon consegue propor a interação entre o organismo e o meio social. Segundo Basso (2010), Wallon propõe estágios de desenvolvimento, assim como Piaget, porém, ele não é adepto da ideia de que a criança cresce de maneira linear. O desenvolvimento humano tem momentos de crise, isto é, uma criança ou um adulto não são capazes de se desenvolver sem nenhum tipo de conflito. A criança se desenvolve com seus conflitos internos e, para ele, cada estágio estabelece uma forma específica de interação com o outro, é um desenvolvimento conflituoso. A criança, para Wallon, é essencialmente emocional e gradualmente vai constituindo-se em um ser sociocognitivo. O autor estudou a criança contextualizada, como uma realidade viva e total no conjunto de seus comportamentos e suas

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condições de existência (BASSO, 2010).

O estudioso dividiu a sua teoria afirmando que no início do desenvolvimento existe uma pre-ponderância do aspecto biológico sobre a criança, para Galvão (2000), no primeiro ano de vida, a criança interage com o meio regida pela afetividade, isto é, o estágio impulsivo--emocional. No estágio sensório-motor ao projetivo (1 a 3 anos), predominam as atividades de investigação, exploração e conhecimento do mundo social e físico. Nesse estágio estão presentes as relações cognitivas da criança com o meio. Dos 3 aos 6 anos, no estágio per-sonalístico, aparece a imitação inteligente, a qual constrói os significados diferenciados que a criança dá para a própria ação.

Os estudos de Henri Wallon ainda não alcançaram notoriedade no cenário educacional.

A divisão do desenvolvimento por estágios realmente nos faz perceber semelhanças com a obra piagetiana. O que ressaltamos é ainda a pouca veiculação da teoria de Henri Wallon no meio educacional.

Lev Seminovich Vigotsky psicólogo russo nasceu em 5 de novembro de 1896, em Orsha. Era judeu, na época uma condição difícil para se prosperar nos estudos, mas seus pais lhe proporcionaram um tutor particular como forma de investimento no processo educacional. Vigotsky era um estudioso empenhado em questões relacionadas à psicologia, às artes, à linguística e às ciências sociais.

Formou-se em Direito pela Universidade de Moscou, teve que conviver com a tuberculose por 14 anos. Trabalhou no Instituto de Psicologia de Moscou demonstrando muita preocupação para com a educação. Morreu aos 37 anos, na Rússia (REGO, 1995). Muitos de seus escritos encontram-se, ainda, no idioma russo.

A partir dos estudos realizados por Vigotsky podemos constatar que o ser humano está profundamente ligado ao movimento histórico e social que o permeia. Esse autor buscou na teoria de Karl Marx as bases para a formulação da sua teoria. Isso nos indica uma preocupação para com o ser humano em sua totalidade.

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A formação do psiquismo humano a partir dos pressupostos vigotskyanos tem o historicismo como grande produtor e norteador desta teoria, assim como de seus continuadores, como os soviéticos Luria (que já vimos anteriormente) e Leontiev, ambos conhecidos no meio educacional do Brasil (SILVA; POSSIDÔNIO, 2007).

Na educação, o pensamento de Vigotsky encontrou relativa propagação. Ao defender as zo-nas de desenvolvimento real e proximal, mostrou a importância dos processos educacionais para a estimulação da criança. A zona de desenvolvimento real (ZDR) refere-se àquilo que a criança tem condições de realizar sozinha. A zona de desenvolvimento potencial (ZDP) refere--se àquilo que a criança realiza, porém, somente com o auxílio de alguém mais experiente.

A descoberta da Psicanálise é considerada um marco na história da humanidade.

Nosso último estudioso a ser mencionado nessa fase introdutória é SIGMUND FREUD (1856-1939). Ele foi um médico vienense que modificou a forma de se compreender a vida psíquica, criando e sistematizando o conceito de inconsciente. Especializou-se em psiquiatria e trabalhou em um laboratório de fisiologia, ministrou, também, aulas de neuropatologia. Podemos afirmar que sua teoria é muito extensa e expressiva, a sua contribuição para a ciência equivale às contribuições de Karl Marx na compreensão dos processos históricos e sociais.

Sigmund FreudFonte: <pt.wikipedia.org/wiki/Sigmund_Freud>.

O pensador criou a PSICANÁLISE. O termo psicanálise é utilizado para se referir à teoria, a

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um método de investigação e a uma prática profissional. É um conjunto de conhecimentos sistematizados sobre a vida psíquica (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 1999).

Contudo, para o meio educacional, o maior legado deixado por Freud foi acerca da descoberta do inconsciente e da sexualidade infantil. Nos dedicaremos mais à compreensão da segunda. O pensador defendia que a função sexual existe desde o princípio da vida, logo após o nascimento, ressaltando que o período do desenvolvimento da sexualidade é longo e complexo até chegar à idade adulta, período em que as funções de reprodução e de obtenção do prazer podem estar associadas, tanto no homem quanto na mulher.

O desenvolvimento psicossexual mostra o amadurecimento sexual infantil dividido em fases – oral, anal, fálica e Complexo de Édipo

Segundo Bock, Furtado e Teixeira (1999), Freud destacou o processo de desenvolvimento psicossexual a função sexual ligada à sobrevivência, o prazer é encontrado no próprio corpo.

Para o autor, as fases do desenvolvimento psicossexual são: Fase oral; Fase anal; Fase fálica; Complexo de Édipo. Na Fase oral: a zona de erotização é a boca. Na Fase anal: a zona de erotização é o ânus. Na Fase fálica: a zona de erotização é o órgão sexual. Logo após a manifestação dessas fases, ocorre o período de latência que se prolonga até a puberdade. Há uma diminuição das atividades sexuais, um intervalo. Na puberdade temos a fase genital, quando o objeto de desejo não está mais no próprio corpo, mas sim em um objeto externo ao indivíduo, “o outro”.

Temos, então, a manifestação do Complexo de Édipo – é a fase de estruturação da personalidade. Ocorre entre 3 e 5 anos, durante a fase fálica. Nesse complexo, a mãe é o objeto de desejo do menino, e o pai é o rival que impede seu acesso ao objeto desejado. O menino procura ser o pai para “ter” a mãe, escolhendo-o como modelo de comportamento, passando a internalizar as regras e normas sociais impostas pela autoridade paterna. Pelo medo da perda do pai, desiste da mãe pela riqueza do mundo social e cultural. Suas regras básicas de comportamento foram internalizadas pela identificação com a figura paterna.

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Este processo ocorre também com as meninas, sendo invertidas as figuras de desejo e de identificação (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 1999).

Mas é preciso ressaltar que Freud não tinha a preocupação para com a instituição escolar, inclusive fica clara a ideia de que a sua teoria não possuía o foco na educação e, nem mesmo na Pedagogia. Segundo Oliveira (2008, p. 246):

[...] é possível afirmar que a Psicanálise serve ao professor como indivíduo, e de modo algum à Pedagogia como um todo. Ela ajuda na assimilação de uma ética, de um modo de conduzir a educação. Em cada indivíduo ela pode atuar de uma forma, produzindo saberes. Além disso, pode ser útil à Antropologia e Filosofia, dentre outras disciplinas. Logo, se a Psicanálise trabalha com o inconsciente, do qual não se pode prever nada, é impossível a criação de um método que vincule Pedagogia e Psicanálise, pois isto implica numa imprevisibilidade.

A Psicanálise é para o professor enquanto indivíduo e não para a pedagogia em si.

A relevância dos referidos estudiosos mostram a convergência de algumas posturas frente ao manejo realizado com crianças. É cabível acentuar, em linhas gerais, as seguintes considerações trazidas por Luria, Piaget, Wallon, Vigotsky e Freud:

1) preocupação com o desenvolvimento humano de maneira ampla, ou seja, nos aspectos neurológico; motor; emocional e psicológico;

2) necessidade da contextualização histórica acerca da teoria dos mesmos;

3) observação da criança enquanto sujeito na história, contrariando a visão das mesmas en-quanto adultos em miniaturas, postura essa defendida por Ariès;

4) maior ou menor dedicação teórica aos aspectos educacionais;

5) preocupação manifesta quanto ao processo de desenvolvimento da criança.

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Vocêsabiaquedificuldadedeaprendizagemedistúrbiodeaprendizagemsãotermosdistintos?

A partir da postura desses pensadores, educadores e estudiosos, é possível ampliar o campo e o olhar de atuação nos dias de hoje, fundamentando o desenvolvimento da criança interligado a diversos setores, acentuando, dessa forma, o papel da família, da escola e dos profissionais mediante a realização de todo ou qualquer trabalho com o público infantil, em especial aqueles dedicados ao aspecto neurológico e neuromotor.

Na unidade III planejamos estudar as dificuldades e os distúrbios de aprendizagem especificando a dificuldade quanto à apreensão da leitura e da escrita. Quem escreve essa unidade é a professora especialista Lussuede Luciana Sousa Ferro.

Na unidade IV trabalharemos as dificuldades de aprendizagem tentando entender as terminologias e conceituações acerca da dificuldade e distúrbio/transtorno de aprendizagem. No que diz respeito à dificuldade de aprendizagem as mesmas dizem respeito a qualquer alteração no aprendizado, considerando todas as fases do desenvolvimento escolar. São consequências extrínsecas ao indivíduo, por vezes, transitórias e com devida intervenção são extintas.

Já o distúrbio de aprendizagem se diferencia da dificuldade de aprendizagem por se tratar de um conjunto de sintomas ou comportamentos que comprometem o processo de aprendizagem, ocasionando ao indivíduo muito sofrimento e perturbação. Neste, há dois aspectos, o orgânico e o cognitivo. O aspecto orgânico diz respeito à construção biológica do sujeito, está relacionada ao corpo. O aspecto cognitivo está ligado ao funcionamento das estruturas cognitivas. Nesse caso, o problema de aprendizagem residiria nas estruturas do pensamento do sujeito.

Existem dois distúrbios de aprendizagem muito comentados na mídia, em reuniões educacionais, trabalhos científicos e conversas informais, a hiperatividade e o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH).

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A criança hiperativa é aquela que todos imaginam estar ligada na potência de 220 volts. São os rotulados como “endiabrados”, não param quietos, não permanecem nas carteiras, falam sem parar, são impulsivos! A hiperatividade é um sintoma, que pode, ou não, vir acompanhada de algum transtorno, déficit, síndrome ou deficiência mental.

As crianças e adultos que manifestam o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, o TDAH, possuem um transtorno orgânico, ou seja, possuem uma alteração nos neurotransmissores. O diagnóstico é, geralmente, realizado a partir do DSM-IV.

Na unidade V, buscaremos entender a importância da atenção para a apropriação do conhecimento erudito, para isso, Alexander Luria será o estudioso contemplado para nortear esse início de unidade. A professora Especialista Amanda Mendes Amude Patez escreve essa unidade.

Pretendemos, também, estudar a questão da afetividade e educação. A aprendizagem ligada aos problemas emocionais, assim como a ligação entre a afetividade e o processo de aprendizagem e os distúrbios emocionais terão a nossa preocupação.

As emoções interferem no processo de aprendizagem? De que maneira? Para Bueno (1996) afeto significa afeição, amizade, simpatia. Uma pessoa afetuosa é considerada uma pessoa afável. Então, um professor afetuoso é um professor afável. Acreditamos que afirmar isso significa poder salientar que o olhar do professor sobre a dificuldade de aprendizagem ou sobre o distúrbio de aprendizagem necessita ser diferenciado do olhar das outras pessoas que lidam com a criança. Rotulações e opiniões pautadas no senso comum não são bem acolhidas ou bem-vindas ao meio escolar, pois naquele ambiente poderá ocorrer o favorecimento do desenvolvimento da criança em seu processo de ensino-aprendizagem.

Acreditamos que o ser humano é dotado de racionalidade e também de afeto. Não há como desvincular esses dois pontos, mas é possível entender como ocorrem na rotina diária da criança. A afetividade não modifica o funcionamento da inteligência, mas pode acelerar ou atrasar, podendo interferir no seu funcionamento. Dessa maneira, a função de mediador precisa ser ocupada pelo professor, para que o processo de aprendizagem ocorra.

Nesse sentido, veremos, no decorrer deste livro de estudos, o histórico sobre as dificuldades, a importância da leitura e da escrita para a raça humana, assim como as intervenções escolares quanto às dificuldades e distúrbios de aprendizagem, observando as características específicas

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dos mesmos e a metodologia adequada a ser utilizada pelo docente em sala de aula.

A principal colocação que sentimos necessidade de fazer é quanto à informação que o professor precisa ter a respeito dos distúrbios de aprendizagem. Conhecendo, de forma ampla, os distúrbios e as principais características dos mesmos ocorrerá maior facilidade para o encaminhamento correto aos profissionais que atuam com a área educacional: psicopedagogos, fonoaudiólogos, psicólogos e neuropsicólogos.

Por isso, clareza quanto à metodologia aplicada em sala é fundamental. Ser diagnosticada com determinado tipo de distúrbio de aprendizagem não significa que a criança está fadada a nunca aprender. Pelo contrário, com uma atuação mais incisiva do professor em sala isso é possível sim. Destacamos que não estamos com o objetivo de responsabilizar em excesso o professor. Na verdade, defendemos a sustentabilidade quanto ao referencial teórico para que a atuação fique mais fluida, afinal, não existe prática sem um bom conhecimento acerca da teoria.

As noções terapêuticas quanto a cada caso a ser trabalhado com as crianças serão o destino dos nossos estudos. É um processo terapêutico que envolve o trabalho de profissionais de diversas áreas, mediante fatores específicos da aprendizagem. Ao encaminhar para um psicólogo, ou para um psicopedagogo, por exemplo, compreendemos que a ação deste será na tentativa de sanar as lacunas deixadas no processo de ensino e aprendizagem, independente se está trabalhando com uma criança que apresente dificuldade ou o distúrbio de aprendizagem. A atividade psicoeducacional e psicopedagógica é tanto preventiva quanto terapêutica.

Acesse o site:<www.psicopedagogia.com.br> e fique atento às notícias sobre o desenvolvimentoinfantil.

Mas, como já afirmamos, não é só o psicólogo ou o psicopedagogo que lidam com a dificuldade e o distúrbio de aprendizagem, profissionais da área da saúde como os médicos e os neurologistas, além de psicólogos, psicopedagogos, psicomotricistas, fonoaudiólogos e oftalmologistas, têm, também, relativa contribuição.

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Você sabia que os psicopedagogos estão organizados em uma associação? É a ABPp.

Precisamos da atenção de vocês em todo o processo de estudos! Anote, questione, participe das aulas. Não esqueça, você iniciou um processo de aprendizagem, dedicação é fundamental!

Gescielly e Márcia

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SUMÁRIO

UNIDADE I

O DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA

DO MINIADULTO AO SER CRIANÇA: DISCUSSÕES SOBRE A INFÂNCIA E A CONSTITUIÇÃO DA PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM 30

O DESENVOLVIMENTO HUMANO: O QUE É NORMAL? 38

DESENVOLVIMENTO NEUROLÓGICO E PSICOMOTOR 44

UNIDADE II

AS PRINCIPAIS TEORIAS QUE SE DEBRUÇAM SOBRE O DESENVOLVIMENTO HUMANO – EM BUSCA DA COMPREENSÃO DAS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM

JEAN PIAGET E SUA INFLUÊNCIA PARA A COMPREENSÃO DO DESENVOLVIMENTO INFANTIL E OS PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM 70

HENRI WALLON E SUA INFLUÊNCIA PARA A COMPREENSÃO DO DESENVOLVIMENTO INFANTIL E OS PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM 82

SIGMUND FREUD E SUA INFLUÊNCIA PARA A COMPREENSÃO DO DESENVOLVIMENTO INFANTIL E OS PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM 86

LEV SEMINOVICH VIGOTSKY E SUA INFLUÊNCIA PARA A COMPREENSÃO DO DESENVOLVIMENTO INFANTIL E OS PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM 95

UNIDADE III

AS DIFICULDADES E OS DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM: A DIFICULDADE QUANTO À APREENSÃO DA LEITURA E DA ESCRITA

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ESCRITA: SUA HISTÓRIA NA FILOGÊNESE 107

LINGUAGEM ESCRITA: SEU PAPEL NA HISTÓRIA HUMANA 113

O PROCESSO DE ENSINO DA LINGUAGEM ESCRITA E O PAPEL DO PSICOPEDAGOGO 120

PARTE PRÁTICA: APÓS TANTA TEORIA, COMO APLICAR ISSO NA PRÁTICA? PSICOPEDAGOGIA E A LINGUAGEM ESCRITA: UM ESTUDO DE CASO 122

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS 122

DESCRIÇÃO DOS INSTRUMENTOS 123

APRESENTAÇÃO DO SUJEITO 123

QUEIXA INICIAL 124

RESULTADOS E ANÁLISES 124

INSTRUMENTOS DE AVALIAÇÃO 125

“MEU FILHO NÃO SABE LER E ESCREVER!” COMO SUPERAR AS DIFICULDADES DA LINGUAGEM ESCRITA? 139

UNIDADE IV

DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM – ENTENDENDO TERMINOLOGIAS E CONCEITUAÇÕES

PROBLEMAS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM 155

ENTENDENDO UM POUCO MAIS SOBRE AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM 156

DIFERENCIANDO AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM DOS DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM – O CUIDADO AO LIDAR COM O SER HUMANO 156

O QUE É HIPERATIVIDADE? 171

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DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE (TDAH) 172

AO LIDARMOS COM A POPULAÇÃO ADULTA 177

ALGUMAS PONTUAÇÕES SOBRE O TDAH 179

UNIDADE V

A IMPORTÂNCIA DA ATENÇÃO PARA A APREENSÃO DO CONHECIMENTO ERUDITO

ALEXANDER ROMANOVICH LURIA (1902-1977): PARA A COMPREENSÃO DE DIFICULDADES LIGADAS À ATENÇÃO DA CRIANÇA 185

ATENÇÃO PARA LURIA – PONTUAÇÕES A PARTIR DE AMDE-PATEZ (2010) 192

DISTÚRBIOS EMOCIONAIS 205

CONCLUSãO 209

REFERÊNCIAS 211

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UNIDADE I

O DESENVOLVIMENTO DA CRIANçAProfessora Me. Gescielly Barbosa da Silva TadeiProfessora Me. Márcia Regina Sousa Storer

Objetivos de Aprendizagem

• Compreenderaconstruçãodacategoriainfância.

• Entenderadiferenciaçãoentreodesenvolvimentonormaleopatológico.

• Realizaradiferenciaçãoentredesenvolvimento/maturidadeeimaturidade.

• Identificarcaracterísticasdodesenvolvimentoneurológicoepsicomotor.

• Buscaracompreensãosobreodesenvolvimentocognitivo,segundoLuria.

• Estudarsobreaatenção.

• CompreendersobreasFunçõesExecutivas/MemóriaOperacional.

Plano de Estudo

A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:

• Do miniadulto ao ser criança: discussões sobre a infância e a constituição da psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem

• O normal e o patológico

• Neurologia e psicomotricidade

• A cognição para Luria

• Atenção

• Funções Executivas/ Memória Operacional

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INTRODUçãO

Na Unidade I, temos algumas metas a serem cumpridas. A primeira delas é a busca pela compreensão sobre o processo histórico da construção da infância, afinal, é pela construção da categoria infância que temos a área da psicologia do desenvolvimento e da psicologia da aprendizagem, assim como a psicopedagogia, é por essa construção que temos hoje tantas discussões e cuidados para um público que começa a ter ênfase somente a partir do século XVII.

Entenderemos a diferenciação entre o desenvolvimento humano dito “normal” e o desenvolvimento humano dito “patológico”, a partir de um olhar biológico, psicológico, social e cultural.

Categorias como o desenvolvimento; a maturidade e a imaturidade serão contempladas, assim como estudos acerca do desenvolvimento neurológico e psicomotor do ser humano. Compreenderemos alguns pontos do desenvolvimento cognitivo, nos atendo aos estudos de Luria para a clarificação dessa questão.

Discussões sobre a atenção estarão em pauta, assim como as funções executivas e a memória operacional ou de trabalho da mente do ser humano.

Vamos lá, o trabalho começou!

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DO MINIADULTO AO SER CRIANçA: DISCUSSÕES SOBRE A INFÂNCIA E A CONSTITUIçãO DA PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM

FABIO GENARI1

GESCIELLY BARBOSA DA SILVA TADEI

Acreditamos em um ser humano que se constitui histórica e culturalmente. Se acreditamos em um ser humano formado da referida maneira, então, tudo o que diz respeito a esse ser humano volta-se para essa compreensão.

Trabalhamos com questões referentes à infância, com pontuações voltadas para o desenvolvimento e a aprendizagem humanas. E você acredita que, até esses termos são constituídos social e culturalmente? Convidamos você a “dar um passeio” pelos entremeios da história...

Acreditamos que ao pontuarmos a descoberta da infância podemos não ser bem interpretados, além disso, ao pontuarmos a palavra “descoberta” temos a sensação de que o sentimento de infância foi algo que sempre existiu, e que foi apenas “achado”. Por isso usamos o termo “construção da infância”, o qual implica em processo, em uma razão de ser. Para Postman (1999), a infância foi cunhada em um processo histórico, pela mentalidade vigente na sociedade. Veio como consequência na interação dos costumes, da família, da economia. O contexto de uma época é tão importante que a infância outrora construída está agora, em nossa sociedade pós-moderna que traz uma mentalidade que tende a aproximar cada vez mais os mais jovens dos mais velhos.

Sobre historicidade, podemos salientar que Arriès (1978) escreve que até o século XV não havia um sentimento de infância em sua concepção moderna. A criação desse sentimento alcançaria seu ápice durante os séculos XVIII e XIX. Anteriormente, o mundo adulto fundia-se com o mundo das crianças, não existia uma distinção. Os mais novos e os mais velhos com-1 Acadêmico do segundo ano do Curso de Psicologia do Cesumar.

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partilhavam dos mesmos costumes, das mesmas festas, vestiam as mesmas roupas, falavam na mesma linguagem. Esta mentalidade se refletia, também, na arte, que representava as crianças com músculos salientes, com traços e trajes semelhantes aos dos adultos. Nesse sentido, a concepção de criança e infância, em seu sentido moderno, foram ideias cunhadas por um longo processo sócio-histórico e que tem como um dos marcos no Brasil a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Naquela época (datamos aqui a Idade Média como referência), não existia uma distinção entre adultos e crianças - viviam misturados tão logo as crianças apresentassem condições físicas para acompanhar os mais velhos. Segundo Ariès (1978), era uma crença generalizada na Idade Média que a criança era alheia e indiferente a sexualidade. Não existia um pudor em relação às crianças, era comum brincar com o seu sexo, fazê-las piadas maliciosas. Não havia um respeito especial às idades mais novas. Em suma, crianças e adultos eram estrelas de uma mesma constelação e vistos como iguais.

Para Arriès (1978), o despertar para a construção da infância moderna inicia-se no século XV.

Neste sentido, a proteção à criança e ao adolescente era inexistente não porque os adultos não nutriam afetos por esses, mas sim por acreditarem que não havia diferença entre os de maior idade e os pequeninos. De uma perspectiva histórica, nem a criança nem o adulto havia ainda assimilado em seu contexto social a necessidade de uma separação. Além disso, acreditava-se que tais condutas fossem incapazes de provocar qualquer dano na formação do indivíduo.

Outra razão da falta de um olhar mais específico direcionado à criança descansa no fato de

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que na Idade Média a mortalidade infantil atingia números exorbitantes e o apego aos mais novos ficava fragilizado já que a possibilidade de morte estava sempre à espreita. O óbito dessas crianças era visto como algo normal (MATTIOLI, 1998). A criança funcionava na época medieval como uma espécie de bobo da corte, entretendo os adultos quando esses julgavam adequado. As crianças eram paparicadas.

Osjovenstambémpartiamparaotrabalhomuitocedo,sendoumreflexodopai,quetransmitiaseuofícioaofilho.

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A escola era outro ambiente onde a miscigenação das idades ficava nítida: pessoas de todas as faixas etárias participavam da mesma classe e aprendiam os mesmos ensinamentos. Como disse Ariès (1978), na Idade Média a escola misturava diferentes idades dentro de um espírito de liberdade de costumes. Além disso, o modelo de família era outro, o patriarcal. Essa configuração acomodava inúmeras pessoas (até 200 membros) e nela não se fazia distinção de papéis sexuais, não havia distinção entre o que se fazia no ambiente privado e público - as ruas eram uma extensão das casas.

Para Arriès (1978), Gerson, estudioso que se dedicou ao estudo da infância, olhando para esse contexto, pregava que era preciso alterar a maneira de se relacionar com as crianças, de educá-las. Fazia-se necessário despertar nas mentes jovens um sentimento de culpa em relação ao sexo, para evitar a promiscuidade. Gerson advoga, também, no sentido da utilização de uma linguagem específica para se dirigir às crianças. Não deixar que se toquem e que não habitem a cama de outras pessoas, mesmo que do mesmo sexo.

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No século XVI houve uma mudança mais clara. Alguns educadores passaram a não tolerar que as crianças tivessem acesso a livros duvidosos, dando origem à ideia de fornecer aos jovens versões expurgadas dos clássicos literários. Este é para Arriès (1978) o marco do respeito verdadeiro à infância.

Ao ingressarmos no século XVII, a visão social da criança sofre uma mudança mais brusca, porque não falamos mais, segundo Arriès (1978), de pensadores isolados, como foi Gerson, mas sim de toda uma mobilização da sociedade. O futuro da criança passou a ser valorizado e sua educação tida como imperativa. Data dessa época os retratos de crianças mortas, apontando que mesmo com a manutenção do alto índice de mortalidade infantil, a criança se tornou digna de ser lembrada. Esse novo ambiente deu origem a uma dupla consciência moral: uma que pregava a proteção da infância, sua separação do vilanesco mundo adulto, e uma segunda, que visava o fortalecimento da juventude, educá-la para um aprimoramento moral e racional.

No século XVIII a preocupação com a higiene se une aos sentimentos supracitados. Nesse momento nasce uma preocupação não só com o futuro das crianças, mas também com a sua existência, tanto em âmbito físico como intelectual. Os mais novos assumem um papel central na família.

Destacamos, ainda nessa discussão, que no século XIX são criados os jardins de infância, para educar de forma geral as crianças de classe mais abastada. Ao mesmo tempo, tem origem, também, as pré-escolas, que buscavam apagar a má impressão deixada pelas creches, mas acabaram por educar as crianças do proletariado. Essa mentalidade é a que vai reger a direção da educação até o século XX.

Além disso, podemos apontar “[...] as transformações sócio-econômicas ocorridas na sociedade ocidental a partir do século XVIII, caracterizadas pelo sistema capitalista monopolista e depois concorrencial, substituindo o sistema feudal, “[...] tiveram também seus desdobramentos em relação à família” (MATTIOLI, 1998, p 153). A estrutura familiar patriarcal sofreu uma mudança

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de paradigma e passou para um modelo nuclear, constituído de pais, mães e filhos. Essa nova configuração familiar trouxe consigo a característica de se tornar privada e fortalecer os laços familiares, o que surtiu forte influência na visão social da criança e da infância.

Havia agora uma necessidade de preparar os mais novos para ingressar futuramente no mercado de trabalho. Além disso, o movimento higienista se instalava na sociedade. Era crescente a necessidade de proteger as crianças tanto no âmbito físico, promovendo um ataque contra doenças, quanto no âmbito psicológico - aqueles de menor idade precisavam ser instruídos para que se formassem como cidadãos de valores morais, íntegros. Era preciso retirar as crianças da vil influência do mundo externo. Desta forma, deu-se início ao processo de construção das escolas e creches para atendimento abrangente de público.

Este mesmo movimento higienista promoveu alterações na estrutura urbana. Lugares públicos que outrora eram usados como playgrounds pelas crianças passaram a ser evitados devido à crescente violência e a facilidade da propagação de patologias. Neste sentido, as creches e escolas também se fazem presentes, pois se tornaram o palco das brincadeiras infantis.

As primeiras creches, segundo Mattioli (1998), foram construídas no século XVIII, para liberar a mãe camponesa para o trabalho e diminuir a mortalidade infantil.

A mulher é outro ponto fundamental para o entendimento do desenvolvimento da criança e do adolescente. A noção de que a relação mãe-filho é essencial para o desenvolvimento infantil e mesmo a crença de que a mulher é mais equipada de um ponto de vista biológico para exercer tais cuidados foram ideias cultivadas em função de interesses econômicos e políticos (MATTIOLI, 1998).

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No período das grandes guerras mundiais, criou-se novamente uma necessidade da força de trabalho feminina no mercado - a primeira vez que isso ocorreu foi durante a Revolução Industrial. Findado esse período de guerras, os homens retornavam a seus postos originais criando uma superpopulação de trabalhadores, saturando o mercado e levando a uma consequência óbvia: o desemprego. Então, o Estado passa a difundir uma ideologia da necessidade dos cuidados infantis serem quase que exclusivos das mães com o intuito de fazer com que estas retornassem para dentro do lar aliviando o mercado de trabalho.

John BowlbyFonte: <en.wikipedia.org/wiki/John_Bowlby>.

Para atingir seus objetivos, o Estado fez uso, inclusive, da ciência como aparelho ideológico. Encomendou uma pesquisa para o psicanalista John Bowlby com a finalidade de demonstrar os danos irreversíveis da ausência materna no desenvolvimento da criança. E surtiu efeito: as mães que até então confiavam seus filhos às creches passaram a temer o atendimento infantil fora das fronteiras domésticas. A repercussão foi tamanha que até hoje há reflexos desse sentimento em relação ao trabalho feminino e as creches (MATTIOLI, 1998). Essa crença pode ser vista como contraditória, já que quando era de interesse político e econômico ter a mulher como força de trabalho, esses danos não eram trazidos à tona, quem dirá serem irreversíveis.

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Fonte: <pt.wikipedia.org/wiki/Organização_das_Nações_Unidas>.

O Estado passou a assumir a responsabilidade pela preservação dos direitos das crianças. Essa tendência se confirmou com um documento estabelecido pela Organização das Nações Unidas (ONU) visando à proteção infantil. No Brasil, a garantia dos direitos das crianças passou a ser vigiado por lei pela aprovação da Constituição Federal de 1988. E apenas em 1990 é promulgado o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei Federal de no. 8069 de 13/07/1990). Essa lei promove a implementação dos Conselhos Estaduais e Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente e os Conselhos Tutelares (MATTIOLI, 1998).

Ainda, em 1996, o Ministério da Educação (MEC) cria a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). Segundo a LDB, o sistema de educação destinado à faixa etária de zero a seis anos passou a ser denominado educação infantil. Neste sentido, deve ser oferecida em duas frentes: as creches para crianças de até três anos e as pré-escolas para as crianças de quatro a seis anos de idade e ambas têm por finalidade o desenvolvimento integral da criança (MATTIOLI, 1998).

Mas até que ponto os direitos da criança e do adolescente estão de fato assegurados? É evidente que a criação de um estatuto e mecanismos (conselhos estaduais e tutelares etc.) aponta para avanço, mas isso não significa eficiência.

Dados do MEC revelam que a população de zero a seis anos tem uma média de 14,2% de sua totalidade atendida por creches e pré-escolas. Para Mattioli (1998, p. 167, grifos nossos):

O pouco investimento público, neste tipo de instituições, é um fator que se reveste de extrema gravidade, pois, como não há no país uma cultura da educação de crianças

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pequenas fora de casa, esses atendimentos se caracterizam, na maior parte das vezes, como assistencialistas, sem intencionalidade educativa, funcionando em ambientes físicos inadequados e realizados por voluntários, com pouca ou nenhuma qualificação para a atividade que irão exercer. Nesta forma de funcionamento está diretamente oposta aos direitos da criança, à medida que a educação infantil se transforma numa relação de favor que a criança e a família recebem. Enquanto uma relação de favor, as instituições de educação infantil impendem críticas e fiscalização sobre a qualidade dos serviços prestados.

Entendemos que essa discussão faz-se necessária, uma vez que com o nascimento do sentimento de infância, com a preocupação emergida para com essa faixa etária do desenvolvimento humano, precisamos de uma atenção maior da nação para com o processo educacional desde a educação infantil.

Destacamos, ainda, que, nesse bojo histórico, com a construção da infância e as preocupações voltadas para esse período, fez-se necessário também uma área do saber para nortear as instruções a serem transmitidas. O novo paradigma social exigia uma maior compreensão do fenômeno da infância: como educar as crianças? Por que algumas crianças não aprendem? Esse tipo de diagnóstico justifica uma ciência voltada para tal. Parece correto dizer então, que a Psicologia do Desenvolvimento, assim como a Psicologia da Aprendizagem, são uma consequência necessária do sentimento de infância.

Vocês percebem o quanto o processo histórico é importante? Nossa disciplina só se justifica mediante a construção da infância, haja vista que sem essa construção, para que teríamos que nos desdobrar para compreender os conteúdos que serão ministrados aqui, não é mesmo?

Agora que já entendemos o motivo pelo qual a nossa disciplina existe, convidamos você a entender um pouco mais sobre o desenvolvimento infantil, em especial, o aspecto cognitivo.

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38 PROBLEMAS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA INFÂNCIA | Educação a Distância

O DESENVOLVIMENTO HUMANO: O QUE É NORMAL?

Definindo Normal e Patológico...

O que é normal? Você já parou para pensar no conceito de normalidade? De acordo com Chaplin (1981), a palavra normal possui o seguinte significado: “[...] que não se afasta exageradamente do vulgar, da média ou da norma”. Norma significa, ainda, medida, linha ou orientação. Para a psicopatologia ser “normal” remete à saúde integralmente orgânica física, psíquica e social.

Sendo assim, ao conceituarmos a palavra normal, precisamos considerar as questões éticas, sociais, culturais, econômicas e políticas, pois nós somos seres sociais, formados social, cultural e historicamente. Isso significa que a normalidade passa por esse crivo.

Dessa maneira, concordamos plenamente com Dermeval Saviani (1990), autor esse que afirma que nós não nascemos humanos, nós nos tornamos humanos por meio das relações sociais. Então, a potencialidade do outro é trabalhada e valorizada pelo o seu igual, por aquele que é mais experiente em determinadas funções.

Trouxemos esse ponto de vista pela seguinte questão: o quão perigoso é pontuar que uma criança não está dentro do padrão de normalidade. Ao afirmarmos isso, temos que levar em conta todas as condicionantes acima citadas, caso contrário, faremos um trabalho patologizante, impedindo o outro, no caso a criança, de ter acesso pleno ao seu processo de humanização.

E o que é patológico?

Patologia refere-se à doença, é uma área da medicina que se ocupa do estudo das doenças. Sendo assim, patológico refere-se à patologia, à doença.

E o que é psicopatologia?

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39PROBLEMAS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA INFÂNCIA | Educação a Distância

A psicopatologia ocupa-se do estudo de questões referentes à esfera mental do ser humano. É um ramo da medicina que estuda e busca tratamento para os transtornos mentais e manifestações comportamentais.

De acordo com a psicopatologia, é considerado normal e patológico tudo que se refere a questões que destoam no processo de formação da condição humana. A respeito da saúde, de acordo com a Organização Mundial da Saúde, uma pessoa é considerada normal quando participa de um estado de completo bem-estar físico, mental e social, não apresentando quadros infecciosos e enfermidades.

Mas, se estamos na disciplina de Problemas e Dificuldades de Aprendizagem na Infância, por que precisamos dessas discussões sobre normalidade x patologia, ou normalidade e patologia?

Vejamos, precisamos compreender que a infância foi uma categoria construída, e que foi a partir dessa categoria que tivemos a possibilidade de entendermos que disciplinas específicas para o cuidado com a criança tiveram a chance de se sustentar teórica e metodologicamente, como foi o caso da Psicologia do Desenvolvimento e da Psicologia da Aprendizagem. Inclusive, é dentro da área da Psicologia da Aprendizagem que temos a subárea de estudos referentes a Problemas e Dificuldades de Aprendizagem na Infância. Podemos destacar, ainda, que a Psicopedagogia entra em cena a partir dessas condicionantes, área essa que tem como um dos pilares o trato direto de crianças e adolescentes.

Bem, dentro dessa discussão, trouxemos o conceito de normalidade e patológico, devido ao fato que muitas são as avaliações realizadas, na atualidade, que mostram a “dificuldade” apresentada pela criança em determinada área do conhecimento. Caso não tenhamos claros os conceitos discutidos, corremos o risco de “rotular” a criança, de julgar a sua “incapacidade em aprender”. A partir do momento que entendo as determinações sócio-históricas, compreendo que muitas questões que discutiremos ao longo deste livro, necessitam ser trabalhadas à luz do contexto histórico e cultural de dada situação.

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40 PROBLEMAS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA INFÂNCIA | Educação a Distância

É um trabalho um pouco mais árduo, mas que valoriza a criança enquanto um ser capaz de aprender e lidar com questões referentes ao seu aprendizado. É um caminho de profundo respeito ao outro, naquilo que tange a sua totalidade enquanto ser humano no mundo.

O olhar do profissional, psicólogo, psicopedagogo ou neuropediatra, deve, então, partir desse respeito ao outro, à criança, respeito e tratamento esse que é respaldado por lei. Esse cuidado está presente na Lei 10.216 de 6 de abril de 2001, a qual garante que a “[...] criança tem direito ao melhor tratamento de saúde possível, através de métodos não invasivos visando oferecer assistência integral inclusive serviços médicos, sociais e psicológicos”.

A nossa reflexão deve remeter-se ao comprometimento profissional em considerar o que podemos fazer para auxiliar a criança com dificuldade de aprendizagem, estabelecendo os parâmetros para o início do tratamento da mesma.

Definindo Desenvolvimento, Maturidade e Imaturidade

O processo de desenvolvimento humano necessita ser observado a partir de algumas vertentes, sendo elas: a biológica, a psicológica, a histórica, a social e a cultural. Isso significa afirmar que a criança nasce em um mundo humano, e não em um mundo “natural”. De acordo com Fontana e Cruz (1997) a criança “[...] começa a sua vida em meio a objetos e fenômenos criados pelas gerações que a precederam e vai se apropriando deles conforme se relaciona socialmente e participa das atividades e práticas culturais”.

Ainda respaldadas nas ideias expostas pelas referidas autoras, podemos compreender que:

[...] desde o nascimento, a criança está em constante interação com os adultos, que compartilham com ela seus modos de viver, de fazer as coisas, de dizer e de pensar, integrando-a aos significados que foram sendo produzidos e acumulados historicamente. As atividades que ela realiza, interpretadas pelos adultos, adquirem significado no sistema de comportamento social do grupo a que pertence.

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Então, podemos inferir que o processo de desenvolvimento de uma criança depende diretamente de seu contexto social, histórico e cultural. Mas, significa afirmar que o biológico não tem importância alguma?

Não!!!! De forma alguma podemos descartar a esfera biológica!!! O que tentamos mostrar é que a cultura e as demais categorias têm uma força sobremaneira no processo de formação e de desenvolvimento do indivíduo. É um processo interativo entre as reações naturais, as quais são herdadas biologicamente (a percepção, a memória, as ações reflexas, as reações automáticas, e as associações simples) unem-se aos processos organizados pela sociedade e expressos de maneira cultural e transformam-se em modos de ação, de relação e de representação, características essas notadamente humanas (FONTANA; CRUZ, 1997).

Não temos receio para afirmar a seguinte pontuação: o homem não se adapta ao meio, ele o internaliza, o modifica, o estrutura, o homem se desenvolve nessa relação intrínseca entre ele e a cultura, pois desde o seu nascimento a criança tem com o mundo uma relação mediada pelo outro, pela linguagem, pela internalização de um mundo que, a priori, não tem sentido, mas que passa a ter sentido pela ação de alguém mais experiente para com a criança.

Então, o desenvolvimento é observado, segundo Fontana e Cruz (1997, p. 63) como:

[...] um processo de internalização de modos culturais de pensar e agir. Esse processo de internalização inicia-se nas relações sócias, nas quais os adultos ou as crianças mais velhas, por meio da linguagem, do jogo, do “fazer junto” ou do “fazer para”, compartilham com a criança seus sistemas de pensamento e ação.

Entendemos que desenvolver-se é apropriar-se da cultura, de um mundo humano sistematizado a volta da criança. Nesse sentido, nossa concepção é a de que há uma base material em desenvolvimento ao longo da vida do indivíduo e da espécie humana, pensamos, pautadas em Oliveira (1997, p. 24, grifos nossos) que:

[...] o homem transforma-se de biológico em sócio-histórico, num processo em que a cultura é parte essencial da natureza humana. Não podemos pensar o desenvolvimento psicológico como um processo abstrato, descontextualizado, universal: o funcionamento psicológico, particularmente no que se refere às funções

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psicológicas superiores, tipicamente humanas, está baseado fortemente nos modos culturalmente construídos de ordenar o real.

Podemos chamar a sua atenção para o vocabulário utilizado por nós durante o processo de escrita. Estamos ainda engatinhando na concepção de homem e de mundo trazida pela Teoria Histórico-Cultural, cujo principal expoente é Lev Seminovich Vigotsky. Essa visão de um desenvolvimento humano imerso nas condições sócio-histórica é o centro das discussões realizadas por esse estudioso da psicologia. Ao falar em processo de desenvolvimento, Vigotsky destaca a importância do processo de escolarização na vida de uma criança. Voltaremos a essa discussão mais adiante.

E o que é maturidade?

A maturidade é conhecida no meio acadêmico como maturação, ou melhor, processo de maturação. Isso significa afirmar que no rol do desenvolvimento humano existe a necessidade da maturação, que é o esforço para se conseguir atingir algo, impulsionado pelo processo de mudança pelo qual passa o indivíduo.

Queremos deixar claro aqui que maturação não significa “estar pronto para”, mas sim uma condição pela qual passamos durante nosso desenvolvimento, é a busca pela autonomia, pela independência em: “comer sozinho”, “amarrar o sapato sozinho”, “vestir-se sozinho”, “ser capaz de decodificar as letras do alfabeto”, “entrar no mundo da leitura e da escrita”, “conseguir resolver operações matemáticas que exigem um nível de abstração considerável”, “conseguir dirigir um automóvel, quando adulto, claro!”, dentre inúmeros outros exemplos que exprimem a condição humana para o crescimento.

E quando a criança não consegue realizar atividades como essas, ou quando apresenta dificuldades acentuadas na leitura e na escrita?

Nesse caso, a literatura aponta para uma palavrinha chamada imaturidade. Na realidade, o que colocamos aqui é que a criança, quando se encontra em uma situação assim, significa que

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ela não consegue realizar determinada atividade sozinha. Nesse caso, ela precisará do auxílio de um par mais desenvolvido para que ela consiga compreender de tal maneira que realize a atividade sem auxílio a posteriori. Falamos aqui em Zona de Desenvolvimento Proximal.

Mas, o que significa isso?

Vigotsky, ao trabalhar com a área de desenvolvimento humano, denomina duas grandes áreas de desenvolvimento: a Zona de Desenvolvimento Real, e a Zona de Desenvolvimento Proximal. A Zona de Desenvolvimento Real diz respeito a todas as coisas que a criança consegue realizar sozinha, sem a intervenção de um par mais desenvolvido que ela (uma criança mais velha ou um adulto). A Zona de Desenvolvimento Proximal significa que existem atividades que a criança não conseguirá realizar sem a mediação de um par mais experiente ou de um adulto. Essa “imaturidade” que a literatura traz denota as atividades que a criança ainda não desempenha sem o devido auxílio. Por isso, nós, educadores, precisaremos atuar na Zona de Desenvolvimento Proximal para que possamos auxiliar realmente o processo de desenvolvimento humano.

A compreensão parece difícil? Então, vamos a um exemplo.

Ana não consegue decodificar as letras do alfabeto. O que a professora deve fazer então? Examine as alternativas abaixo e antes de continuar a leitura faça uma opção pela letra a ou pela letra b. Não vale deslizar os olhos para o parágrafo seguinte hein! Seja sincero com o seu processo de apreensão do conteúdo sistematizado. Vamos lá?

As alternativas da professora de Ana são as seguintes:

(a) Colocar Ana junto aos alunos que não conseguem realizar essa atividade para que possa darauxíliodemaneiramaisdiretaparaessascriançasafimdequeelasaprendamadeco-dificarasletras.

(b) Montar grupos na sala de aula. Cada grupos a professora colocará crianças que têm muita facilidadequantoadecodificaçãodeletrasecriançascomdificuldade,comoéocasodeAna.

E aí? Qual foi a sua escolha?

Que tal partirmos para uma discussão?

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Caso você tenha optado pela letra b, você compreendeu de maneira satisfatória o que é atuar sobre a Zona de Desenvolvimento Proximal. Se a professora deixasse Ana em um grupo de crianças com dificuldade de aprendizagem como aquelas apresentadas pela aluna, Ana continuaria com a mesma dificuldade, ou avançaria de maneira deveras lenta. Agora, se a professora organizar um grupo misto, como o indicado pela letra b, Ana pode ter a chance de entrar em contato com pares mais desenvolvidos que ela o que, segundo Vigotsky, auxilia no processo de desenvolvimento humano e na apropriação do conhecimento científico sistematizado historicamente pelos seres humanos que nos antecederam.

Lembrem-se!!!

O desenvolvimento é um processo no ser humano, e é na infância que temos o ápice desse desenvolvimento. Mas, atenção! Não afirmamos aqui que o processo de desenvolvimento e aprendizagem ocorre apenas na infância, ok? Caso afirmássemos isso, você jamais poderia tentar aprender um outro idioma, ou aprender a dirigir, ou fazer um prato culinário diferenciado em ocasiões especiais.

Nosso conselho é: muito cuidado com generalizações!!!

DESENVOLVIMENTO NEUROLÓGICO E PSICOMOTOR

Quando mencionamos o termo neurológico, a própria palavra remete ao termo neurônio. Para melhor compreender como acontece o processo neurológico da aprendizagem é de início saber o que são as células nervosas ou neurônios.

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Fonte: <http://www.coladaweb.com/biologia/corpo-humano/neuronio-sistema-nervoso>.

Os neurônios são células estimuladoras que se comunicam entre si e/ou com as células efetuadoras. No corpo celular em que estão o núcleo e as organelas é onde ocorre a permissão do impulso nervoso que responde às sensações no nosso organismo. Os dentritos ampliam a captação das sensações para avaliação no corpo celular, portanto quanto mais dendritos, mais informações. O axônio funciona como um fio condutor para o estímulo elétrico criado pelo corpo celular. Aqui, os NT (neurotransmissores) produzidos pelo corpo celular devem atingir a sinapse, que se localizam nas terminações do axônio. Na sinapse acontece a transformação do estímulo elétrico em estímulo químico (pelos NT: adrenalina, serotonina, dopamina dentre outros).

Os neurônios produzem substâncias denominadas neurotransmissores clássicos, produzidas no terminal pré-sináptico, que em resposta à atividade nervosa são liberados, resultando em alterações em sua ação. Os neurotransmissores são formados a partir de substâncias (glicose, aminoácidos dentre outros) que passam a barreira hematoencefálica.

Os neurônios são extremamente numerosos, aproximadamente 100 bilhões em cada cérebro, capazes de aprender e fazer em torno de 60 mil conexões, podendo receber 100 mil impulsos por segundo em cada sinapse.

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Já na vida intrauterina dá-se início ao desenvolvimento neuropsicomotor – por volta da terceira semana de gravidez – ou seja, as formações de estruturas nervosas começam desenvolver-se no feto. A importância do acompanhamento desde o pré-natal ao nascimento é de extrema necessidade, pois auxilia na identificação de más-formações e possibilita a intervenção necessária. Essas são medidas preventivas que o adulto pode tomar preparando a chegada da criança ao mundo material, ocupado por nós.

Dados trazidos pela Organização Mundial da Saúde apontam para um investimento governamental e também de ONGs para a atuação junto à população mundial acerca da medicina preventiva no período pré-natal. Essa atitude tem reduzido o número de mortes de bebês e de gestantes, e ampliado o número de crianças saudáveis.

Destacamos aqui a atuação da Pastoral da Criança, criada pela saudosa Zilda Arns, que tem atuado junto a populações carentes para a divulgação da necessidade de uma alimentação saudável para crianças, assim como cuidados básicos de higiene, não descuidando do aconselhamento de gestantes carentes. Posturas assim tem trazido um número cada vez mais elevado de crianças saudáveis que tem adentrado à escola para o contato com o sistema de ensino científico formal.

Fonte:<http://entretenimento.r7.com/famosos-e-tv/noticias/cultura-disponibiliza-entrevista-de-zilda-arns-no-roda-viva-20100115.html>.

Erguemos uma crítica aqui contra a Teoria da Carência Cultural, ideia que teve a sua origem

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nos Estados Unidos da América, e que foi tão divulgada em nosso país ainda na década de 1970, a qual pontuava, de maneira ampla, que crianças pobres teriam dificuldades mais elevadas quanto ao processo de ensino e aprendizagem (PATTO, 1998).

Patto (2007, p. 1) auxilia nossa compreensão de maneira mais pormenorizada ao afirmar que:

Paralelamente à influência da vertente sociológica na pesquisa educacional, um conjunto de idéias que tem sua origem nos Estados Unidos da América, passa a se fazer presente enquanto explicação para a realidade educacional brasileira, a chamada “teoria da carência cultural” (Patto, 1998). Fruto dos movimentos reivindicatórios das minorias negras e de imigrantes latinos que apresentavam baixo rendimento escolar, essa teoria procurava responder à pergunta: por que um grande contingente de crianças negras e imigrantes não aprendia na escola pública americana? Para responder essa questão, psicólogos e demais profissionais passaram a pesquisar as causas dos problemas de aprendizagem, buscando-as nos aspectos do desenvolvimento infantil, nas áreas de nutrição, linguagem, estimulação, cognição, inteligência, motricidade etc. Ocorre, porém que os resultados dos experimentos realizados por tais crianças eram comparados com aqueles obtidos com crianças de classes média e alta da sociedade americana, branca e empregada. Tais resultados eram considerados como padrão de normalidade.

Nosso cuidado, nesse trabalho, é auxiliar a sua compreensão de que o respeito ao ser humano é fundamental, quando olho para o meu aluno em sala de aula, verifico o que ele pode conseguir aprender, independente se trabalho na Zona Urbana ou na Zona Rural, ou se trabalho na Escola Pública ou na Rede Privada de Ensino.

Voltando para as nossas discussões sobre a rede neuronal, questionamos em que isso interfere no processo de desenvolvimento e no processo de aprendizagem?

O processo de aprendizagem se dá no sistema nervoso central. Quando uma informação chega ao sistema nervoso central ela pode transformar-se em memória se a informação já for conhecida, mas, quando chega uma informação nova acontece o processo de aprendizagem.

Além de conhecer o sistema nervoso central e sua finalidade, é importante saber as funções de cada área específica de nosso cérebro. Observe as figuras, as mesmas apresentam as divisões cerebrais que serão explicadas posteriormente.

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Fonte: <http://www.grupoescolar.com/materia/o_sistema_nervoso_humano.html>.

Vejamos as definições básicas sobre cada área e o quanto as mesmas interferem no processo de aprendizagem do ser humano.

No Lobo Occipital acontece a integração visual por meio da recepção dos estímulos nervosos. O responsável pelo tato, pela interpretação e pela integração de estímulos visuais provenientes do córtex occipital é o Lobo Parietal. No Lobo Temporal, em sua parte posterior, ocorre a recepção e decodificação de estímulos auditivos, enquanto que sua parte anterior está

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relacionada com o olfato e a gustação e ainda com comportamentos instintivos.

No Lobo Frontal é onde ocorrem as conexões das diversas funções nervosas compactuadas ao comportamento humano. É aqui que, devido a lesões, pode ocorrer perda da concentra-ção, diminuição da habilidade intelectual, déficit de memória e julgamento (na área do córtex pré-frontal), e ainda, paralisia contralateral e falta de sensibilidade (na área do córtex motor e sensitivo).

É no córtex cerebral (região do sistema nervoso central) que acontece a transformação dos estímulos recebidos em aprendizagem. Mas, para que isso aconteça, toda atividade do SNC (Sistema Nervoso Central) deve funcionar de maneira adequada, em favor das funções nervosas superiores.

À medida que os estímulos nervosos atingem o córtex, há uma comparação (ativação da memória) de experiências anteriores, interpretação, decodificação e compreensão. Se não houver nenhuma “memória” do que está recebendo, isso ficará registrado e tão logo por meio de experimentações posteriores se dará o aprendizado. Portanto, só aprenderei se houver uma estimulação adequada ao SNC (Sistema Nervoso Central). E isso acontece no meio social em que atuamos enquanto seres humanos.

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Hemisférios cerebrais

Fonte: <http://www.infoescola.com/anatomia-humana/cerebro/>.

O cérebro possui dois hemisférios: o hemisfério esquerdo e o hemisfério direito. Ambos os hemisférios processam suas informações de modos diferentes e de maneira inversa, ou seja, por meio de ações cruzadas. O processo de informações acontece no lado dominante, mas, a aprendizagem acontece quando ambos os hemisférios funcionam de maneira equilibrada, o que é resultado do fortalecimento do lado não dominante do cérebro. Destacamos aqui a predominância de um ou de outro hemisfério para dada atividade, pois o cérebro atua de maneira plena em cada atividade que realiza, não há compartimentos específicos, mas a pluralidade de ações.

Os movimentos do corpo humano, primeiramente, são gerados na mente: a ação dos braços, das mãos, pernas, músculos, enfim, todos os movimentos. E quando se faz necessário exercitar esses movimentos cerebrais e físicos, uma área chamada psicomotricidade integra

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técnicas que trabalham o corpo e todo seu desenvolvimento funcional. Sendo, a evolução psicomotora normal em uma criança, passar dos movimentos globais aos específicos e do movimento espontâneo ao consciente.

O DESENVOLVIMENTO COGNITIVO

O que significa cognição?

Significa o ato ou o processo de conhecer. A cognição inclui a atenção, a percepção, a memória, o juízo, a imaginação e o pensamento.

Conforme já estudamos, o cognitivo está relacionado ao funcionamento cerebral, mais especificamente ao funcionamento do sistema nervoso central.

Para que a aprendizagem aconteça, não depende apenas da estrutura que acontece em toda complexidade do funcionamento dos hemisférios cerebrais, mas também, do tipo de aprendizado, como a atenção, que acontece na interação entre o tronco encefálico e o córtex frontal e ainda, de acordo com estudos recentes, o cerebelo (responsável pelo equilíbrio, tônus muscular e coordenação motora) também recebe uma fatia participativa na mudança do foco da atenção.

Luria e o desenvolvimento cognitivo

Alexander Romanovich Luria (1902-1977), um neuropsicólogo russo, que teve seus estudos profundamente influenciados por Lev Semionovich Vigotsky (1896-1934). Luria estudou os processos psicológicos humanos em interação com aspectos culturais, históricos e instrumentais, dando destaque para o papel fundamental que a linguagem exerce sobre o desenvolvimento humano. Esse estudioso estudou, ainda, a organização funcional do cérebro e o desenvolvimento humano, mostrando ser possível verificar, em seus estudos, uma organização conceitual intrincada e complexa que serve de referência para a compreensão

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da construção de repertórios de habilidades e de conhecimento, destacando, também, a relevância do papel da aprendizagem nesse processo.

Compreendemos que o processo sócio-histórico tem um papel fundamental na alteração das funções mentais, ou seja, o ambiente interfere na formação da consciência, onde todo o aparato do comportamento do homem maduro, não é apenas o produto da evolução biológica, resultado do desenvolvimento infantil, é, em especial, concretizado pelo seu desenvolvimento histórico, cultural e social.

Baseado nessas colocações e nos pautando nos estudos realizados por Luria e Vigotsky, que se referem à História do Comportamento Humano, percebemos que os autores buscaram compreender o comportamento humano a partir do desenvolvimento ontogenético e filogenético do homem a luz da história, pois assim, podem unir presente com passado, ou seja, as etapas superiores do desenvolvimento com as iniciais.

Partindo disso, passaram a estudar o macaco antropoide e verificaram existir três estágios em seu desenvolvimento: 1º) Estágio das reações hereditárias ou modos inatos (instintivos); 2º) Estágio dos reflexos condicionados (associações de reações inatas com estímulos ambientais): provém do treinamento e da experiência individual do animal para sua adaptação ao ambiente; e 3º) Estágio das reações intelectuais práticas (utilização de instrumentos): se estabelece após um obstáculo a um comportamento já adquirido ou inato gerando um novo comportamento a situações análogas (significado funcional).

Nesse terceiro estágio pode-se perceber o vínculo entre o macaco e o homem que é a utilização rudimentar de instrumentos, que representa o pré-requisito para o desenvolvimento da atividade laboral, uma vez que o macaco somente faz uso dos instrumentos, mas não os elabora como ocorre no homem com o trabalho e a linguagem.

Com base no exposto acima, pode-se afirmar que no comportamento do homem primitivo suas capacidades biológicas ou inatas são imensamente superiores a do homem cultural,

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porém na utilização de mediadores culturais, como os instrumentos e os signos, que ampliam de forma ilimitada as funções psicológicas são inferiores.

A transformação das funções psicológicas (atenção, memória, percepção, sensação, pensamento, linguagem e volição) primitivas em superiores se deu inicialmente a partir do trabalho com a transformação da natureza para suprir as suas necessidades que em um primeiro momento eram biológicas e posteriormente tornaram-se culturais.

De maneira mais específica, Luria trabalha a questão funcional do cérebro da seguinte maneira: 1 – Primeira Unidade Funcional ou de Vigília: Mantém em estado de alerta o córtex cerebral, controlando o ciclo de sono-vigília. A disfunção deste sistema leva à distração. 2 – Segunda Unidade Funcional ou de Recepção, Análise e Armazenamento: está localizada no córtex cerebral, parietal e occipital. 3 – Terceira Unidade Funcional de Programação, Regulação e Verificação da atividade: nos lobos frontais, onde acontece a organização da percepção ao conhecimento (MARCELLI, 1976). Mesmo trazendo essas especificações, Luria prioriza a influência do meio social, da cultura e do trabalho para a formação humana.

Desta forma, é pelo trabalho que o homem se torna humano, pois ao transformar a natureza o homem se transformou aprendendo a fazer uso de suas capacidades naturais com racionalidade e, com efeito, isso provocou mudanças no conteúdo de seu psiquismo e de seus mecanismos (meios) através dos signos ou instrumentos psicológicos.

Assim, o comportamento do homem cultural distancia em grande escala do comportamento do homem primitivo tanto no aspecto biológico quanto no aspecto cultural, uma vez que as alterações ocorridas se devem às transformações históricas que envolvem: a evolução biológica desde os animais até os seres humanos, a evolução histórico-cultural do homem primitivo ao homem moderno e, o desenvolvimento individual (ontogênese), do recém-nascido até o homem adulto moderno.

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Estudos sobre a atenção

- Senhora, por favor, posso ter um minuto da sua atenção?

- Atenção! Atenção! Só hoje, descontos especiais nas lojas XY Ltda!!! Não perca! Atenção! Atenção!

- Hei, Pedro, sente direito na carteira e preste atenção!

Você já reparou o quanto a nossa atenção é requisitada? E você já parou para entender o que significa atenção? Luria (1981, p. 12) define a atenção da seguinte forma: “[...] é o fator responsável pela escolha dos elementos essenciais para a atividade mental, ou o processo que mantém uma severa vigilância sobre o curso preciso e organizado da atividade mental”.

Portanto, podemos pensar, respaldados em Filgueiras (2010, p. 1), que a atenção tem dois papéis: “[...] (a) selecionar e (b) organizar. O lobo parietal, regiões visuais primária e secundária, hipocampo, amígdala e lobo frontal parecem ser as principais estruturas envolvidas na atenção seletiva visual”.

De acordo com Filgueiras (2010, p. 2) e Vigostky (1984), seria o responsável por afirmar que:

[...] a atenção não é tão somente a atração por estímulos dominantes do meio ou biologicamente significativos, para o pesquisador, a atenção chamada voluntária (aquela que a gente usa conscientemente para se focar em uma determinada característica do todo) seria um processo social construído a partir do que é mais importante, ou não, dentro da nossa cultura. O maior exemplo daquilo que o Vigotsky fala são os inuites ou os índios: ambos percebem, respectivamente, branco e verde em maior ou menor grau de complexidade com base nas demandas do meio. Destarte, conseguem orientar a atenção voluntária para um determinado tom de branco ou verde, pois aprenderam dentro de sua comunidade que aquela formação de neve ou de planta circundam sua tribo, ou servem para preparar armas, por exemplo.

Entendemos assim, que a atenção, enquanto processo mental, é de extrema importância para a organização e filtragem das informações do mundo externo, podendo variar entre estímulos biologicamente predisponentes e estímulos culturais que permeiam o indivíduo.

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Luria (1981) teorizou sobre as bases biológicas do mecanismo de atenção, estabelecendo que seriam a formação reticular, a parte superior do tronco encefálico, o córtex límbico e a região frontal. Para ele, as estruturas da parte superior do tronco encefálico e a formação reticular seriam as responsáveis pela manutenção do tono cortical de vigília e manifestação da reação de alerta geral, enquanto o córtex límbico e a região frontal estariam relacionados ao reconhecimento seletivo de um determinado estímulo, inibindo respostas a estímulos irrelevantes. Deve-se considerar que, na ocasião, era considerado como córtex límbico o giro do cíngulo, para-hipocampal e do hipocampo. Nessa época, Luria já fazia referência aos estudos clínicos com áreas cerebrais lesionadas em humanos, sendo que dela provém grande parte do conhecimento que se tem sobre a função cognitiva atenção e sua base biológica (GONÇALVES; MELO, 2009).

De acordo com Naglieri e Rojahn (2001), a atenção é um dos processos importantes que afetam muitas áreas da vida diária dos indivíduos como, por exemplo, o rendimento escolar.

Para Luria (1981), o homem recebe um imenso número de estímulos, mas seleciona os mais importantes, ignorando os restantes. Potencialmente, ele faria um grande número de movimentos, mas destaca poucos movimentos racionais, que integram suas habilidades, e inibem outros. Entre o grande número de associações possíveis que existe, ele conserva apenas algumas essenciais para a sua atividade, e abstrai-se das outras que dificultam o processo racional de pensamento.

A seleção da informação necessária, o asseguramento dos programas seletivos de ação e a manutenção de um controle permanente sobre ele são convencionalmente chamados de atenção. O caráter seletivo da atividade consciente, que é função da atenção, manifesta-se igualmente na percepção, nos processos motores e no pensamento (LURIA, 1981).

Ainda de acordo com o autor, existem pelo menos dois grupos de fatores que são determinantes da atenção e que asseguram o caráter seletivo dos processos psíquicos que determinam tanto a orientação como o volume e a estabilidade da atividade consciente. O primeiro desses

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grupos é constituído por estímulos exteriores; o segundo grupo é constituído de fatores relacionados “com o próprio sujeito e com a estrutura de sua atividade”. Para o estudo dos mecanismos neurofisiológicos da atenção é fundamental o fato de que o caráter seletivo da ocorrência dos processos psíquicos, característicos da atenção, pode ser assegurado apenas pelo estado de vigília do córtex, do qual é típico um nível ótimo de excitabilidade. Esse nível de vigília (excitabilidade) é assegurado pelos mecanismos de manutenção do tônus cortical.

De acordo com Aston-jones (2002), a atenção pode ser vista de acordo com três aspectos distintos. O primeiro diz respeito à orientação para os eventos sensoriais, que são as diferentes formas de atenção: motora, visomotora, auditiva. O segundo refere-se ao controle executivo que relaciona a atenção à memória semântica e à linguagem. O terceiro é o estado de vigília e alerta sustentado que prepara o sistema nervoso para os aspectos anteriormente mencionados.

Sabemos que o nível de vigília e alerta pode variar desde o coma profundo até um estado de hiperalerta ansioso (WEINTRAUB; MESULAM, 1985). Esse nível pode ser definido, operacionalmente, pela intensidade de estímulo necessário para desencadear uma resposta do indivíduo. A qualidade da resposta em função da intensidade do estímulo permite caracterizar estados como “estupor”, “sonolência”, “alerta” e “hiperalerta” que descrevem, em ordem ascendente, os níveis de vigília e alerta de uma pessoa.

Luria (1981) chama a nossa atenção para o fato de que seria um engano imaginar que a atenção da criança pequena pudesse ser atraída somente por estímulos poderosos e novos ou por estímulos ligados à exigência imediata. Ele ressalta que a criança vive em um ambiente de adultos. Quando a mãe nomeia um objeto e o aponta com o dedo, a atenção da criança é atraída para aquele objeto que, assim, começa a se sobressair dentre os demais, não importando se ele origina um estímulo forte, novo ou importante.

Dessa forma, continua Luria (1981), o processo de atenção pode ser observado não apenas durante o comportamento organizado, seletivo, mas reflete-se também em indicadores

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fisiológicos precisos, que podem ser usados para estudar a estabilidade da atenção.

Além dos trabalhos clássicos referidos por Luria abordando os processos da atenção, outros mais recentes têm demonstrado que o desenvolvimento da atenção passa pelo desenvolvimento de mecanismos cerebrais inibitórios (VAN DER MOLEN, 2000).

Deve-se entender inibição como o processo de supressão (ou redução) das funções de uma estrutura ou um órgão pela ação de um outro. Enquanto, a capacidade de executar as funções da estrutura suprimida é mantida, ela pode se manifestar tão logo a ação supressora seja removida. Tradicionalmente, as teorias do desenvolvimento enfatizam a importância das mudanças na capacidade de armazenar e processar informações durante o desenvolvimento cognitivo (VAN DER MOLEN, 2000).

A ideia, prossegue ainda o pesquisador, de que os processos inibitórios (processo que ocorre no sistema nervoso central que inibi, retrai, quando reagimos a alguns estímulos retraidamente e não interferimos na modificação do meio) no sistema nervoso também podem contribuir para as mudanças do desenvolvimento surgir muito lentamente a partir de investigações recentes sobre o desenvolvimento cognitivo em crianças e sobre outros aspectos do comportamento.

Essa visão de uma participação crucial das funções inibitórias durante o desenvolvimento decorre de achados sobre diferenças etárias na habilidade a partir da aplicação de uma grande variedade de tarefas que exigiam inibição para a execução. Ele exemplifica com o dado de que a criança, à medida que se torna mais adulta, vai se tornando mais apta a suprimir respostas reflexas. A criança torna-se menos sensível aos ruídos, em tarefas que exigem atenção seletiva, e a distratores, em tarefas que envolvem memorização.

Nessa mesma revisão, Van Der Molen (2000) assume que os processos inibitórios se tornam mais eficientes ao longo da infância, possibilitando uma entrada menor de informação irrelevante para a memória de trabalho (antes referida como “memória de curto prazo” e ainda conhecida como “memória operacional” – componente cognitivo ligado à memória

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que retém temporariamente algumas informações necessárias para o cumprimento de funções cotidianas) e aumentando, assim, a capacidade funcional da criança.

Finalmente, ainda segundo o mesmo autor, revisões recentes sobre a relação entre o desenvolvimento cognitivo e a maturação cerebral têm ressaltado que os resultados de vários paradigmas experimentais têm sido consistentes com a noção do crescimento no desenvolvimento cognitivo associado à eficiência dos processos e inibitórios. Essas evidências incluem achados a partir de tarefas de atenção seletiva, tarefas de memória, tarefas que requerem habilidade para inibir respostas motoras.

Segundo Brodeur e Pond (2001), muitos estudos sobre o desenvolvimento da atenção têm consistentemente demonstrado que as crianças melhoram, consideravelmente, sua capacidade de responder seletivamente a diferentes estímulos do meio ambiente aos três e doze anos.

Plude e Brodeur (1994) postulam uma conceitualização multidimensional da atenção. Eles “olham” para a atenção por meio de um grande modelo no espaço tridimensional, no qual as tarefas de atenção podem ser colocadas ao longo de um plano. Segundo os pesquisadores, talvez a dimensão mais fundamental (primeira) da atenção seja a modalidade ou fonte da informação que está sendo processada, a qual poderia ser primariamente visual, auditiva, somato-sensorial ou mesmo de memória, conforme o modelo que segue.

Figura 1 – Modelo de organização da atençãoFonte: Plude et al. (1994).

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A segunda dimensão se refere à distribuição da atenção no espaço e no tempo, sendo que esforços de processamento seriam focados em um objeto específico, ou localização específica, ou, ainda, divididos entre objetos e eventos. A terceira dimensão da atenção enfatizaria as várias tarefas que requerem mecanismos de seleção especializados, como orientação a um estímulo em particular, seleção de um objeto baseado em atributos específicos e outros.

Ainda segundo os autores, essas três dimensões seriam amplamente independentes umas das outras, significando que, em uma dada circunstância, nós estaríamos aptos a definir uma modalidade de informação, um grau de distribuição e uma tarefa a ser executada.

Para Bracy (1995), a atenção é constituída de habilidades executivas. O sistema sensorial atua continuamente enviando quantidade inimaginável de informações para o cérebro. As informações vindas de alguns sistemas e parte da informação vinda de outros sistemas sofrem algum tipo de processamento por centros inferiores do cérebro, de tal forma que o sinal pode ser combinado, separado, ampliado ou diminuído.

As informações, puras ou parcialmente processadas, são posteriormente enviadas aos centros encefálicos superiores, podendo chegar até as áreas corticais. Nesse momento, é necessário um processamento adicional para trazer a informação para o consciente, decodificar, integrar, formar pensamentos e imagens (do estímulo), manipular e utilizar a informação. Todo o conjunto de habilidades envolvidas nessa tarefa é referido como habilidade executiva e representa vários aspectos da atenção.

As funções executivas

De acordo com Ardila e Ostrosky-Solís (1996, apud CAPOVILLA; ASSEF e COZZA, 2007, p. 52, grifos nossos), as funções relacionadas aos componentes cognitivos têm sido nomeadas de funções executivas e estão relacionadas, de forma geral, “[...] à capacidade do sujeito de engajar-se em comportamento orientado a objetivos, ou seja, à realização de ações voluntárias, independentes, autônomas, auto-organizadas e orientadas para metas específicas”.

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Respaldadas em Gazzaniga e colaboradores (2002; LEZAK, 1995, apud CAPOVILLA; ASSEF e COZZA, 2007, p. 52). Entendemos que “[...] as funções executivas estão entre os aspectos mais complexos da cognição e envolvem seleção de informações, integração de informações atuais com informações previamente memorizadas, planejamento, monitoramento e flexibilidade cognitiva”.

Em seu conceito, as funções executivas podem ser consideradas como um conjunto de funções que têm a responsabilidade de iniciar e desenvolver uma atividade que tenha um objetivo final determinado, participando deste caminho os processos cognitivos o estado de alerta, de atenção, de tempo de reação, da desenvoltura e da flexibilidade do pensamento (FUSTER, 1997).

Memória Operacional (ou memória de trabalho)

A memória operacional ou memória de trabalho refere-se

[...] ao armazenamento temporário da informação necessária para o desempenho de diversas tarefas cognitivas, entre cálculo, leitura, conversação e planejamento. A memória operacional é responsável pela manipulação da informação, o que ocorre, por exemplo: em situações em que se solicita que dígitos sejam subtraídos mentalmente de um valor determinado e que palavras sejam colocadas mentalmente em ordem alfabética. Déficits na memória de trabalho caracterizam-se pela dificuldade de realizar tarefas simultâneas e consequentemente, as informações não são decodificadas, armazenadas e processadas de forma eficaz (MEDICINA EM PRÁTICA, 2011, p. 1).

Essa memória operacional é composta por um conjunto de sistemas cognitivos que funcionam entre si (como um espaço de trabalho), registrando as representações mentais das informações sensoriais para execução das tarefas de trabalho.

Na imagem postada por Netto (2006) no seguinte endereço: <fotolog.terra.com.br/memory:9>, podemos ter uma ideia mais organizada sobre a Memória Operacional ou Memória de Trabalho.

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Fonte: Netto (2006).

De acordo com Netto (2006), baseada nas postulações de Lent (2004), a Memória Operacional Memória/ de Trabalho processa dados vindos da memória de curtíssimo prazo e também utiliza informações armazenadas na memória de longa duração. Aliás, uma das características mais importante da memória de trabalho (MT) é sua capacidade de evocar informações da memória de longo prazo (MLP), integrando-as com novas informações que entram no sistema e que são processadas continuamente.

Mesmo que a MT e MLP possam trabalhar independentemente uma da outra, esses dois sistemas estão continuamente interagindo sobre condições normais. Para a autora, a MT tem um papel fundamental na resolução de problemas cognitivos devido a sua função de processar atividades verbais e/ou orientação espaciais que são essenciais para resolver problemas. Apenas a cada minuto, partes de informações são processadas pela MT, a qual tem a capacidade de reter essas informações durante um tempo mínimo necessário para que ocorra a realização das operações do dia a dia, tais como: compreensão de fatos, raciocínio, resolução de problemas, ação comportamental dentre outros aspectos referentes a esse ponto (NETTO, 2006).

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Nossa! Como nossa atenção é detalhada, não é mesmo?

Sugiro que agora, nos atenhamos a uma atividade de autoestudo para a fixação do conteúdo estudado por nós até esse momento, ok? Vamos lá! Mas antes, uma recapitulação da nossa primeira unidade de estudos.

SUGESTãO DE FILME – PARADA OBRIGATÓRIAOsfilmessugeridosservemparaamelhoriaeampliaçãodoconteúdoestudado.Asugestãoparaessaunidadeéofilme:O Pequeno MilagreQuanto a essa sugestão pedimos para que você se atente para o processo de desenvolvimento dos dois adolescentes, para as questões que os aproximam e que os afastam. Discuta, com o seu grupo de estudos, as questões de normal e patológico.

Título original: Simon BirchTítulo no Brasil: Pequeno MilagreLançamento/País: 1998/EUADiretor: Mark Steven JohnsonGênero: dramaEstúdio: Buena VistaEssefilmecontaahistóriadeSimonBirch,omenorbebêanascernohospitaldeGravestownMemo-rial. Com sérios problemas de crescimento, os médicos o declararam um verdadeiro milagre. Conven-cido de que Deus o pôs no mundo para tornar-se um herói, o pequeno Simon divide suas fantasias e

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altasaspiraçõescomomelhoramigo,Joe,filhodeumaadorávelmãesolteiraquesenegaarevelara identidadedopaidogaroto.EnquantoDeusnãootransformanafiguraheróicaegrandiosaqueimagina, Simon discute a fé com a tirânica professora de catecismo e com o reverendo Russell. Em um lance trágico que irá mudar para sempre o destino dos dois, Joe e Simon se unem para encontrar o que falta em suas vidas. Para Joe, a identidade do pai que não conheceu. Para Simon, é descobrir o destino divino para o qual foi criado (WEB CINE, 2011).

CONSIDERAçÕES FINAIS

Na Unidade I, tivemos como intuito compreender o breve histórico sobre a infância, afinal, é pela construção da categoria infância que temos a área da psicologia do desenvolvimento e da psicologia da aprendizagem, assim como a psicopedagogia, áreas essas que se dedicam ao estudo e a compreensão do processo de desenvolvimento e aprendizagem do público infantil.

Entendemos a diferenciação entre o desenvolvimento humano normal e o desenvolvimento humano patológico, dentro de uma esfera biológica, psicológica, social e cultural.

As categorias: desenvolvimento; maturidade e imaturidade foram contempladas, assim como estudos acerca do desenvolvimento neurológico e psicomotor. Compreendemos alguns pontos do desenvolvimento cognitivo, nos atendo aos estudos de Luria para essa questão.

A atenção também foi nosso foco de discussões, assim como as funções executivas e a memória operacional ou de trabalho. Assim, findamos nossa primeira unidade de estudos.

Mas, não esqueçam, nosso trabalho apenas começou!

ATIVIDADE DE AUTOESTUDO

1. Discuta sobre o processo de construção da categoria infância ao longo dos séculos.

2. ApartirdofilmeO pequeno milagre faça um resumo de 20 linhas discutindo a normalidade e a patologia no processo de desenvolvimento do ser humano.

3.DefinaaspostulaçõesdeLuriasobreodesenvolvimentocognitivodoserhumano.

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ARRIÈS, Philippe. História Social da Criança e da Família. Rio de Janeiro: LTC, 1978.

Autor: Philippe ArièsAno: 1981Edição: 2ªEditora: GuanabaraTradutor: Dora Páginas: 279Idioma: Português

Acesse o site <www.estimulando.com.br/desenvolvimento.htm>, e entenda mais sobre o processo de desenvolvimento humano. Conhecer aspectos do desenvolvimento dito “normal” auxilia nosso enten-dimentosobreomotivoquelevaaoaparecimentodedificuldadesetranstornosdeaprendizagemnainfância.

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“O homem é um ser datado historicamente”. Pautado nessa frase, discuta o motivo que tem levado a tantas discussões acerca do tema infância e desenvolvimento,tendocomofocoadificuldadeeostranstornosdeaprendizagem.

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UNIDADE II

AS PRINCIPAIS TEORIAS QUE SE DEBRUçAM SOBRE O DESENVOLVIMENTO HUMANO – EM BUSCA DA COMPREENSãO DAS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEMProfessora Me. Gescielly Barbosa da Silva TadeiProfessora Me. Márcia Regina de Sousa Storer

Objetivos de Aprendizagem

• CompreenderaEpistemologiaGenéticadeJeanPiaget.

• EntenderateoriadeHenriWallon.

• ObservarateoriadapsicossexualidadedeSigmundFreud.

• IdentificarosprincipaispontosdateoriadeLevSeminovichVigotsky.

Plano de Estudo

A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:

• Jean Piaget

• Henri Wallon

• Sigmund Freud

• Lev Seminovich Vigotsky

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INTRODUçãO

Na Unidade II estudaremos a influência de alguns estudiosos e suas teorias sobre o desenvolvimento humano, assim como o processo que levou essas teorias até o cenário educacional.

O primeiro a ser estudado será Jean Piaget, o pai da Epistemologia Genética, autor esse que se preocupa com o processo de construção da inteligência no ser humano.

Henri Wallon e sua visão sobre a importância da afetividade para o desenvolvimento do ser humano será o segundo estudioso a ser contemplado em nossas discussões.

Sigmund Freud, o terceiro estudioso a ser trabalhado, trará as questões básicas a serem compreendidas sobre o desenvolvimento psicossexual humano.

Lev Seminovich Vigotsky, expoente da Teoria Histórico-Cultural, auxiliará a nossa compreensão para o entendimento do ser humano enquanto um homem datado historicamente.

E qual desses estudiosos é o correto?

Convido você a mergulhar nessa unidade, ao final dela, discutiremos a possibilidade de um desses autores estar mais “correto” ou menos “correto”.

Vamos lá...

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JEAN PIAGET E SUA INFLUÊNCIA PARA A COMPREENSãO DO DESENVOLVIMENTO INFANTIL E OS PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM

Jean Piaget (1896-1980) é considerado o criador da Epistemologia Genética. Nasceu em 1896 na Suíça, tendo uma vida considerada longa, falecendo aos 84 anos de idade. Desde menino interessou-se por questões científicas, estudando moluscos, pássaros, conchas marinhas e mecânica.

Piaget e sua linha do tempo

Fonte: Imagens retiradas do site <www.piaget.org>. Postado por Les Smith no artigo: A Brief Biography of Jean Piaget.

Aos 10 anos publicou as observações que fez sobre um pardal parcialmente e, aos 11 anos, começou a trabalhar como assistente do diretor do Museu de História Natural de sua cidade. Interessou-se por filosofia, e buscava uma explicação para a forma pela qual o homem atinge

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o conhecimento lógico-abstrato que o distingue das outras espécies animais. Piaget queria estudar essa questão de maneira científica, então, ao longo do seu trabalho, assumiu o desafio de construir uma teoria do conhecimento baseada na biologia e ancorada na pesquisa empírica (BROTHERHOOD; GALLO, 2009).

O elo que Piaget encontrou entre a filosofia e a biologia foi a psicologia do desenvolvimento. A elaboração da teoria explicativa da gênese do conhecimento no homem levou Piaget a formular propostas teóricas e metodológicas inovadoras quanto à natureza dos processos de desenvolvimento da criança e que contrariavam o inatismo.

De acordo com Fontana e Cruz (1997, p. 44, grifos nossos), no que diz respeito à teoria piagetiana:

O fundamento básico de sua concepção do funcionamento intelectual e do funcionamento cognitivo é de que as relações entre o organismo e o meio são relações de troca, pelas quais o organismo adapta-se ao meio e, ao mesmo tempo, o assimila de acordo com as estruturas, num processo de equilibrações sucessivas.

Piaget buscava compreender “[...] e determinar as contribuições das atividades do indivíduo e das restrições do ambiente na aquisição do conhecimento” (FONTANA; CRUZ, 1997, p. 44). Esse foi, então, o foco do seu trabalho experimental.

Entre os anos de 1921 a 1925, concentrou-se na coleta de dados que permitissem esboçar os princípios e os fundamentos de sua teoria do conhecimento. Abordou temas gerais como: A relação entre o pensamento e a linguagem (1923); O desenvolvimento, na criança, do julgamento e do raciocínio (1924); A representação do mundo (1926); Causalidade física (1927); O julgamento moral (1927).

Segundo as referidas autoras, o período compreendido de 1925 a 1931, fase em que nasceram seus três filhos, dedicou-se à observação meticulosa do desenvolvimento dos bebês, elaborando análises sobre a construção do real e do desenvolvimento da inteligência.

Na década de 1930 concentrou as suas pesquisas na gênese das noções de quantidade,

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número, tempo, espaço, velocidade, movimento, mensuração, lógica e probabilidade. Na década de 1940 abordou o desenvolvimento da percepção.

A partir da década de 1950 voltou-se para a sistematização teórica da epistemologia genética. No ano de 1955 fundou o Centro Internacional de Epistemologia Genética, onde reuniu cientistas de diferentes áreas: matemáticos; biólogos; psicólogos; profissionais interessados em pesquisar problemas epistemológicos (FONTANA; CRUZ, 1997, p. 44).

Na década de 1970 dedicou-se a investigação dos mecanismos de transição que impulsionam e explicam a evolução do desenvolvimento cognitivo. A “[...] sua vasta produção é um marco de enorme importância para a psicologia e para os estudos do homem do século XX” (FONTANA; CRUZ, 1997, p. 45).

Os estudos de Jean Piaget tiveram impacto no campo da Psicologia e da Pedagogia. Seu trabalho pioneiro no estudo do processo de raciocínio infantil por meio da interação com crianças resultou em um progresso no campo do conhecimento da cognição.

“Mamãe, hoje já é amanhã?”

Ouvir perguntas como essa nos desconcerta, ao mesmo tempo ficamos encantados e nos divertimos também… nossa atenção se volta para compreender o modo peculiar que a criança tem de pensar sobre as coisas e de estabelecer relações entre elas.

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Essas peculiaridades chamaram a atenção, também, de Piaget. Ele queria entender como o ser humano elabora os conhecimentos sobre a realidade, chegando a construir um sistema de abstração. Por isso, ele quis estudar o desenvolvimento do pensamento da criança.

Piaget desenvolveu o termo Psicologia Genética. A palavra genética ele mesmo aplicou a sua psicologia, refere-se à busca das origens dos processos de formação do pensamento e do conhecimento (FONTANA; CRUZ, 1997).

Cuidado!!!

Não confunda a teoria piagetiana com uma “psicologia da criança”. O centro do trabalho de Piaget é o desenvolvimento do conhecimento, e para o referido estudioso, conhecer é: organizar; estruturar, enfim, conhecer é explicar a realidade a partir daquilo que se vivencia nas experiências com os objetos do conhecimento. Para o estudioso a experiência é distinta do conhecimento, conhecimento significa a organização da experiência num sistema de relações.

Dois conceitos, definidos por Piaget, fazem parte do processo inicial da aprendizagem: a assimilação (o meio em função do indivíduo) e a acomodação (o indivíduo em função do meio) sendo a adaptação o ponto de equilíbrio entre esses dois momentos. Significa afirmar que ao agir sobre o meio, o indivíduo incorpora a si elementos que pertencem a esse meio, isso é assimilação: as coisas ou os fatos que são do meio são inseridos em um sistema de relações e adquirem um significado para o indivíduo.

É assim, segundo Piaget, que você aprende!

Mas, ao mesmo tempo em que as ideias e os conceitos que você leu (ou ouviu) são incorporados ao sistema de ideias e conceitos que você possui essas ideias e conceitos já existentes são modificados por aquilo que você leu (assimilou). Esse processo de modificação que se opera nas estruturas de pensamento do indivíduo é chamado de acomodação.

Assimilação e acomodação, juntas, constituem um mecanismo adaptativo, comum a todos

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os seres vivos. Sendo assim, a inteligência é assimilação por permitir ao indivíduo incorporar os dados de experiência. A inteligência é, também, acomodação, pois os novos dados incorporados acabam por produzir modificações no funcionamento cognitivo da pessoa (FONTANA; CRUZ, 1997, p. 46).

A noção de esquemas segundo Fontana e Cruz (1997)

Ao nascer a criança é dotada de reflexos que são reações automáticas desencadeadas por estímulos. São eles que possibilitam ao bebê a adaptação ao meio. A assimilação provoca transformações nos reflexos, que vão, gradativamente se diferenciando e tornando-se cada vez mais complexos e flexíveis. Esse processo dá origem a esquemas de ação.

É por meio desses esquemas que a criança começa a reconhecer a realidade assimilando-a, dando-lhe significações. Quando ela pega a mamadeira, ela a relaciona ao seu esquema de “pegar”, atribui-lhe um sentido de “um objeto que se pega”.

Por meio de assimilações e acomodações, o bebê vai conhecendo os objetos de seu mundo imediato. Eles são organizados em objetos: “para olhar”; “para pegar”; “para sugar”; “para empurrar”. A organização do real por meio da ação marca o início do desenvolvimento cognitivo da criança.

Os esquemas de ação ampliam-se; coordenam-se entre si; diferenciam-se e acabam por se

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interiorizar, transformando-se em esquemas mentais e dando origem ao pensamento. E esse desenvolvimento contínuo dos esquemas se dá no sentido de uma adaptação cada vez mais complexa e diferenciada da realidade.

A noção de equilibração

O desenvolvimento depende de: fatores internos, ligados à maturação e de um processo de autorregulação que ele denomina de equilibração, que é uma propriedade intrínseca e constitutiva da vida mental. É por meio da equilibração que se mantém o estado de equilíbrio ou de adaptação em relação ao meio. Quando no meio há uma situação de conflito ou dificuldade, a nossa capacidade de autorregulação ou equilibração entra em cena, na busca de superar a dificuldade.

No momento em que um bebê quer um objeto que está longe, há uma dificuldade em alcançar o objeto, desequilíbrio. Então, ele tenta puxar o objeto. Essa atividade da criança – a acomodação ou coordenação de seus esquemas de ação – é desencadeada graças à sua capacidade de autorregulação, com o objetivo de compensar a resistência oferecida pelo objeto e alcançar um novo estado de equilíbrio.

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Atenção!!!Equilibração não signifi ca uma volta ao estado anterior, mas leva a um estado de superior em relação ao estado inicial.

Definidos os dois conceitos, Piaget divide o processo de aprendizagem em períodos de acordo com a idade e desenvolvimento da criança: período sensório-motor; período pré-operató-rio; período operatório concreto; período operatório formal.

Período Sensório-motor (0 – 2 anos): o foco central desse período é a percepção e movimentos na exploração no meio. É a fase do egocentrismo, o próprio corpo do bebê é a referência única e constante, aos poucos os reflexos são consolidados, coordenados e organizados. Piaget destaca seis estágios os quais também são chamados de fases. E como é organizada a inteligência nesse período?

Segundo Pereira (2006, p. 42), a inteligência pode resolver:

[...] uma série de problemas com base na ação, elaborando um sistema complexo de esquemas de assimilação. Assim, organiza o real a partir de um conjunto de estruturas espaço-temporais e causais. Como não ha ainda possibilidade de representação, tudo tem que ser resolvido pela ação.

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Estágio I do período sensório-motor: os bebês, em seu primeiro mês de vida, estão restritos aos reflexos inatos. Piaget destaca os reflexos de sucção; visão; audição; fonação e preensão. “Mamar é um exemplo da atividade desse estágio. E é pelo seu funcionamento, ou exercício, que o reflexo se consolida e se firma, dando lugar a constituição de esquemas” (PEREIRA, 2006, p. 44).

Estágio II do período sensório-motor: reações circulares primárias – 1 a 4 meses ou 4 meses e meio. Esse evento é chamado primário porque envolve o corpo do bebê. Ele repete o ato até que seja aprendido e torne-se habitual. Foco: coordenação. Veja o exemplo dado por Jean Piaget (1975, p. 122 – obs. 92, apud PEREIRA, 2006, p. 46).

Aos 0; 3 (12), quando lhe ponho uma chave na mão,fora do seu campo visual, Laurent ainda a leva à boca e não aos olhos. Mas ele está com muita fome (acaba de passar cinco horas sem comer). À tarde, a mesma reação com o estojo, que ele conhece, mas quando lhe ponho a minha corrente de relógio na mão, Laurente examina-a antes de tentar chupá-la.

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Estágio III do período sensório-motor: reações circulares secundárias – 4 a 8 meses. Age sobre objetos. À medida que o bebê entra no terceiro estágio, o desenvolvimento progride para além do aprendizado voltado para o próprio corpo - REVOLUçãO COPÉRNICA EM MINIATURA. Já é possível oferecer objetos de fácil manipulação para o bebê.

Estágio IV do período sensório-motor: 8 a 12 meses. O quarto estágio é um período para consolidar e conciliar as realizações do passado e estendê-las de modo a aplicá-las a novas e diferentes situações. A primeira pista concreta de que um bebê entrou no quarto estágio ocorre quando ele demonstra a capacidade de escolher um meio intencionalmente para obter uma meta pré-estabelecida. Esse é o conceito de relação entre meios e fins. É um ataque a barreira para alcançar o objetivo. “Esta e a fase das primeiras condutas propriamente inteligentes, quando o bebe, para atingir um fim que não está diretamente acessível, põe em ação esquemas que até então não haviam sido utilizados para tal” (PEREIRA, 2006, p. 49).

Estágio V do período sensório-motor: reações circulares terciárias – 12 a 18 meses. Crianças em torno de um ano e meio, embora não falem, se expressam por meio de movimentos e ritmos. De acordo com Pereira (2006, p. 51):

As experiências que o bebê faz nesta fase vão estruturando o meio em objetos permanentes e estabelecendo relações espaciais, temporais e de causalidade. A acomodação precede as novas assimilações e modifica os esquemas de onde surgiu. Decorrente da grande mobilidade que os esquemas conquistaram, existe um progresso no sentido da previsão. A generalização das experiências anteriores permite antecipações práticas.

Estágio VI do período sensório-motor: invenção de novos meios por intermédio de combinação mental – 18 a 24 meses. Foco: representação. Pereira (2006, p. 51) afirma que é nessa fase que:

As invenções não são mais fruto apenas da ação prática, mas são elaboradas mentalmente. Os esquemas já constituídos são recombinados, possibilitando a criação de novas estratégias de ação. Nesse estagio, a acomodação supera a assimilação, tornando-se representativa.

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De forma extremamente breve e resumida, esse é o primeiro período do processo de desenvolvimento da inteligência humana segundo as postulações de Jean Piaget. Destacamos que no final dessa fase já se faz presente o conceito de permanência do objeto.

Período Pré-Operatório (2 – 7 anos): é um período anterior a representação lógica do pensamento. Nessa fase há o desenvolvimento de uma linguagem afetiva que só se torna comunicativa mais ou menos aos 2 anos de idade. Há uma preocupação com o real (causas e efeitos), a linguagem mais desenvolvida, e a imitação é diferida ou adiada. Ocorre uma indiferenciação entre o real e o imaginário, e a regra passada é encarada como sagrada (BROTHERHOOD; GALLO, 2009).

Neste período, a criança substitui o objeto por uma representação (substituição – função sim-bólica), sendo ainda conhecido como estágio da inteligência simbólica. A atividade sensório--motora se torna mais refinada e os movimentos e percepções intuitivos mais sofisticados.

As crianças tornam-se mais egocêntricas, pedem explicação de tudo (os por quês), podem agir por simulação (como se fosse...), possuem a percepção global (mas não discrimina detalhes) e não relaciona fatos (é o que parece ser). Na avaliação de quantidade de massa a criança não distingue as situações modificadas de equivalência.

Período de Operações Concretas (7 – 11 anos): segundo Wadsworth (1992), durante o es-

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tágio das operações concretas “7 a 11 anos”, os processos mentais de uma criança tornam-se lógicos. Ela desenvolve aquilo que Piaget chamou de operações lógicas.

Operações lógicas significa uma operação é uma ação que pode ser internalizada ou uma ação sobre a qual se possa pensar e isto é uma atividade mentalmente reversível – ou para ser mais preciso – é uma ação que pode ocorrer em uma direção ou na direção inversa.

É nessa fase que são estabelecidas as bases para o pensamento lógico, próprio do período final do desenvolvimento cognitivo. Uma operação intelectual “lógica” consiste em um sistema internalizado de ações totalmente reversíveis.

A reversibilidade do pensamento possibilita à criança construir noções de conservação de massa, volume etc. O pensamento reversível pode ser definido como a capacidade de levar em consideração uma série de operações que, revertidas, conduzem ao estado inicial.

No operatório-concreto a criança estabelece noções de temporalidade, de espaço e organização. Consegue distinguir aspectos reais e irreais, dependendo do concreto que consegue abstrair. Tem também a capacidade de verificação e ação do sentido inverso, sendo capaz de anular a primeira ação observada.

Período de Operações Formais (11 – 16 anos): durante o estágio das operações formais, que em média começa em torno dos 11 ou 12 anos, uma criança desenvolve o raciocínio e a lógica necessária à solução de todas as classes de problemas.

O pensamento “liberta-se” da experiência direta e a estruturas cognitivas da criança adquirem maturidade, e o equipamento estrutural cognitivo do adolescente está pronto para pensar “tão bem quanto” o adulto, mas não garante que o pensamento seja “tão bom quanto” ao do adulto. Adultos e adolescentes que raciocinam com as operações formais empregam os mesmos processos lógicos.

Resumidamente é um período no qual as estruturas cognitivas da criança alcançam um

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nível mais elevado, chegada da adolescência. Já é possível ao indivíduo atingir um nível de abstração total, pensando logicamente, conseguindo levantar hipóteses buscando soluções para problemas matemáticos sem precisar partir do concreto, compreendendo metáforas e insinuações.

Podemos afirmar que ocorrerão mudanças ao longo da vida apenas de maneira qualitativa, e não mais quantitativa. É o último período segundo a teoria de Piaget.

A teoria piagetiana teve relativo impacto sobre a área educacional, e também, sobre a teoria psicológica. Embora não tenha desenvolvido uma teoria educacional, suas ideias foram apropriadas por estudiosos que se debruçam sobre tais questões. Um nome de referência na atualidade seria Emília Ferrero, uma das mais expressivas estudiosas sobre o referencial piagetiano e o processo de desenvolvimento humano.

Além do mais, sua teoria do desenvolvimento sistematizada em períodos facilita a organização de um processo interventivo com a criança ou o adolescente. Quanto à esfera educacional, para essa linha de trabalho, o professor é um facilitador do processo de ensino-aprendizagem da criança. Ele está a todo o tempo buscando alternativas para ensinar, mas dentro do período evolutivo da criança, haja vista que o processo de desenvolvimento é maturacional.

Esse foi um pequeno passo estudado sobre a teoria piagetiana, se você teve identificações com o referencial teórico, intensifique os seus estudos…

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Sugestão de Filme – parada obrigatória!!!Assista Jean Piaget – Coleção Grandes Educadores

Documentário apresentado por Yves de La Taille sobre a vida e obra de Jean Piaget, biólogo de forma-ção,psicólogoqueestudouodesenvolvimentocognitivo,filósofoporafinidade,Piagetconstruiuumaobra longa, coerente e sistematizada. Os conceitos que cunhou marcaram o campo da Pedagogia a tal ponto que muitos o consideram, erroneamente, um educador. Para guiar o professor que pretende conhecer melhor o tema, este vídeo apresenta de forma clara os principais conceitos piagetianos. Conforme Yves De La Taille, a teoria de Piaget é importante para todos os adultos que lidam com crianças, pois ajudam a entender não apenas o desenvolvimento da inteligência, mas suas decorrên-cias, como a formação do comportamento e da personalidade da criança.

HENRI WALLON E SUA INFLUÊNCIA PARA A COMPREENSãO DO DESENVOLVIMENTO INFANTIL E OS PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM

Filósofo, médico e psicólogo, Wallon (1879-1962) manteve-se próximo à educação, contribuindo de maneira especial por meio de estudos e observações voltadas às crianças portadoras de deficiência mental.

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Wallon nasceu na França em 1879. Viveu toda sua vida em Paris, onde morreu em 1962. Em 1902, aos 23 anos, formou-se em filosofia pela Escola Normal Superior (GALVÃO, 2000).

Henri WallonFonte: <pt.wikipedia.org/wiki/Henri_Paul_Hyacinthe_Wallon>.

Cursou medicina e formou-se no ano de 1908. Até o ano de 1931 atuou como médico em instituições psiquiátricas, dedicando-se ao atendimento de crianças com deficiências neurológicas e distúrbios comportamentais. Em 1914, mobilizado como médico do exército francês permaneceu por vários meses no front de combate. O contato com lesões cerebrais de ex-combatentes o fez rever algumas concepções neurológicas que havia desenvolvido no atendimento de crianças portadoras de deficiências (LE SUEUR, 2011).

Para Wallon, há fases vividas pela criança, correspondentes a estados de transição do equilíbrio entre raízes do passado que avançam no seu futuro. Devido às experiências de contradições vivenciadas, ocorrem crises que possibilitam a reorganização e passagem para uma nova fase.

A esse autor se deve o salto aos conhecimentos sobre a motricidade – eixo do equilíbrio tônico-motor –, um dos eixos de sua referência, sendo também o da afetividade-emotividade.

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De acordo com Almeida e Mahoney (2006, p. 57), Wallon é autor da teoria psicogenética e interacionista do desenvolvimento, ou seja “[...] a integração organismo-meio e a integração dos conjuntos funcionais; emoções, sentimentos e paixão; o papel da afetividade nos diferentes estágios”.

Conforme Galvão (2000), a psicologia genética abordada por Wallon é um estudo focado nas origens, na gênese dos processos psíquicos. Wallon propõe o estudo integrado do desenvolvimento – afetividade, motricidade, inteligência -, como campos funcionais entre os quais se distribui a atividade infantil. O homem é um ser “geneticamente social”. É a psicogênese da pessoa completa.

Wallon propõe uma série de estágios do desenvolvimento cognitivo. Porém, ele não acredita que os estágios de desenvolvimento formem uma sequência linear e fixa, ou que um estágio suprima o outro. Para Wallon, o estágio posterior amplia e reforma os anteriores. A mudança de cada estágio se caracteriza um tipo diferenciado de comportamento, uma atividade predominante que será substituída no estágio seguinte, além de conferir ao ser humano novas formas de pensamento, de interação social e de emoções que irão direcionar-se, ora para a construção do próprio sujeito, ora para a construção da realidade exterior (FARIA, 2010).

Os estágios, segundo Wallon (1975, apud FARIA, 2010, pp. 8-9), são organizados em número de cinco, os quais podem ser descritos da seguinte maneira:

1.Estágio impulso-emocional: Primeiro estágio de desenvolvimento escrito por Wallon, que vai do nascimento até um ano de idade e estão presentes dois momentos: o da impulsividade motora e o emocional. A criança nessa fase está voltada para construção do eu. É uma fase de preponderância afetiva, centrípeta de acúmulo de energia. 2. Estágio sensório-motor e projetivo: O estágio sensório-motor e projetivo inicia-se por volta de um ano e se estende até os três anos de idade, caracterizado pela investigação e exploração da realidade exterior, bem como pela aquisição da aptidão simbólica e pelo início da representação, ou seja, é o momento em que a inteligência humana se dedica à construção relativamente à realidade. 3. Estágio do personalismo: Como o próprio nome sugere, este estágio está voltado para a pessoa, para o enriquecimento do eu e a construção da personalidade, vai de três a seis anos de idade. A afetividade é marcante neste estágio, na verdade, é o fio condutor

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do desenvolvimento. A criança aprende a perceber o que é de si e o que é do outro. 4. Estágio categorial: Esse estágio inicia-se por volta dos seis anos de idade, ele traz importantes avanços no plano da inteligência. Os progressos intelectuais dirigem o interesse da criança para as coisas, para o conhecimento e conquista do mundo exterior, imprimindo as suas relações com o meio, uma maneira preponderância do aspecto cognitivo do ser humano, nesta etapa da vida. 5. Estágio da adolescência: Nesse estágio a crise pubertária rompe a “tranqüilidade” afetiva que caracterizou o estágio categorial e impõe a necessidade de uma definição dos contornos da personalidade desestruturados devido às modificações corporais resultantes da ação hormonal.

Faria (2010) ressalta que para Wallon a afetividade e o meio social são aspectos fundamentais para a compreensão da obra do autor.

Esse foi um pequenino passo para a compressão de Henri Wallon. Caso você tenha se identificado com a teoria, aprofunde seus estudos. Pesquise mais, discuta mais, especifique mais e melhor os seus conhecimentos sobre o referido estudioso.

Sugestão de Filme – parada obrigatória!!!Assista Henri Wallon – Coleção Grandes Educadores

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Uma das originalidades da teoria de Henri Wallon é sua tentativa de ver a criança de um modo mais integral. Com foco na criança, Wallon busca compreender o desenvolvimento de forma integrada, levando em conta os domínios cognitivo, afetivo e motor. Wallon considera que a escola é um lugar onde se educa, mas, principalmente, onde se deve estudar a personalidade da criança. A perspectiva teórica de Wallon traz ainda uma preocupação bastante atual: como construir uma educação para todos, independente de sua condição social, origem ou raça, e, ao mesmo tempo, uma educação para cada um, que contemple a complexidade do indivíduo em todas as suas dimensões humanas. Você não pode perder essa dica!

SIGMUND FREUD E SUA INFLUÊNCIA PARA A COMPREENSãO DO DESENVOLVIMENTO INFANTIL E OS PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM

- “Isso nem Freud explica!”

- “Isso só Freud explica!”

Você com certeza já deve ter ouvido uma dessas expressões. Muitas pessoas as repetem sem ter a ideia de quem foi Sigmund Freud. Expressões como as citadas mostram a amplitude e a divulgação da obra e do pensamento de um autor. Freud foi um homem à frente de seu tempo, sua obra é considerada um clássico na literatura e nos estudos científicos.

Vamos compreender um pouco sobre ele?

Sigmund Freud (1856-1939) formou-se em medicina, mas foram os estudos sobre a mente humana que lhe chamaram a atenção, área essa para a qual dedicou sua carreira de pesquisador e estudioso. Realizou seus trabalhos com pacientes neuróticos e formulou a Psicanálise, por isso, Teoria Psicanalítica de Freud.

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A linha do tempo para Sigmund Freud

Fonte: <http://sites.google.com/site/ifofofof/apsican%C3%A1lise>.

A contribuição de Freud para a área da ciência é tão expressiva que equivale às contribuições deixadas por Karl Marx, o qual buscou a compreensão dos processos históricos e sociais. E por que uma expressividade dessas para esse médico vienense?

Freud ousou colocar os processos misteriosos do psiquismo, suas regiões obscuras, ou seja, as fantasias, os sonhos, os esquecimentos, e a interioridade do homem como problemas científicos (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 1999).

Para Bock; Furtado e Teixeira (1999) Psicanálise é um termo, uma teoria e uma forma de intervenção.

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A linha de estudos da Psicanálise atém-se tanto ao conhecimento individual quanto ao conhecimento coletivo, esse conhecimento coletivo pode ser destacado por orientações; por trabalhos grupais e por trabalhos institucionais.

A forma de intervenção pauta-se na análise, que busca o autoconhecimento e a cura que ocorre por meio desse autoconhecimento.

Freud criou os conceitos de inconsciente (Id); pré-consciente (Superego) e consciente (Ego). Esses conceitos são, também, muito divulgados no dia a dia das pessoas. Vale a pena, mesmo que de maneira rápida, observarmos o que significa o termo. É importante sabermos que trabalhamos, no momento, com a estrutura da personalidade.

Fonte: <notapositiva.com>.

O inconsciente exprime o “conjunto de conteúdos não presentes no campo visual da consciência”. É constituído pelos conteúdos reprimidos, que não têm acesso aos sistemas pré-consciente/consciente, pela ação de censuras internas. Esses conteúdos podem ter sido conscientes em algum momento, e ter sido reprimidos, isto é, “foram para o inconsciente”. É atemporal, sendo regido por leis próprias de funcionamento (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 1999).

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O pré-consciente, de acordo com os referidos autores, refere-se ao sistema onde permanecem aqueles conteúdos acessíveis à consciência. É aquilo que não está na consciência naquele momento, mas no momento seguinte pode estar.

E o consciente, para Bock, Furtado e Teixeira (1999), é o sistema do aparelho psíquico que recebe ao mesmo tempo, as informações do mundo exterior e do mundo interior. Na consciência, destaca-se o fenômeno da percepção, principalmente a percepção do mundo exterior, a atenção, o raciocínio.

Fonte:<http://www.coisasdavida.com.br/produto-252/camisa-baby-look/baby-look-freud-id-ego-superego>.

Partindo das ideias expostas por Guanaes e Japur (2003, apud BROTHERHOOD; GALLO, 2010, p. 49, grifos nossos), podemos compreender, quanto às definições de Id, Ego e Superego, que:

[...] “o Id é o reservatório das pulsões (impulsos básicos) desordenadas”, o Ego é o órgão executivo, responsável pelo controle da percepção e contato com a realidade, bem como pelo adiamento e modulação na expressão dos impulsos. O Superego é o responsável por estabelecer e manter a consciência moral da pessoa a partir de ideais e valores internalizados através das relações interpessoais.

Segundo Brotherhood e Gallo, Freud acreditava que o Id todo e partes do Ego e do Superego são inconscientes.

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Sigmund Freud verifica o desenvolvimento, também, em estágios, dividindo o desenvolvimento a partir de um esquema de zona erógena. Nesse ponto, a teoria psicanalítica chamou muito a atenção para a sua época, visto que trazia o desenvolvimento psicossexual do ser humano, o qual tem a função sexual ligada à sobrevivência (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 1999).

De acordo com as autoras, entendemos que Freud afirmava que a função sexual existe desde o princípio da vida, logo após o nascimento, sendo o período do desenvolvimento da sexualidade longo e complexo até chegar a idade adulta, onde as funções de reprodução e de obtenção do prazer podem estar associadas, tanto no homem quanto na mulher.

Pautadas em Brotherhood e Gallo (2010, p. 50) podemos compreender, ao mencionarmos o desenvolvimento infantil, que: “as crianças passam por uma sequência de zonas erógenas, quando a libido (energia sexual) se concentra em diferentes regiões do corpo, à medida que prossegue o desenvolvimento psicológico, caracterizando as fases do desenvolvimento [...]”.

Esse aspecto de sexualidade, ao qual se referia Freud, é a relação da criança com seu próprio corpo, é a busca da satisfação, é a motivação para o comportamento do indivíduo, tendo modificações de acordo com a fase na qual a criança se encontra. Essas fases são:

Fase Oral (de 0 a 1 ano): a zona de erotização é a boca. É um período em que a criança está experimentando o mundo. Tudo o que chama a sua atenção é “experimentado”, a boca, região do corpo que, nessa fase, ocasiona maior satisfação.

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Fase Anal (de 2 a 4 anos): a relação de dar e reter é estabelecida nessa fase. “As crianças são solicitadas a controlar os impulsos naturais, face às restrições da sociedade” (BROTHERHOOD; GALLO, 2010, p. 50). A criança passa a adquirir o controle dos esfíncteres. Nesta etapa, a criança começa a ter noção de higiene e posse de objetos, estabelecendo limite do que está fora de seu corpo.

Fase Fálica (de 4 a 6 anos): nessa fase, a criança tem a curiosidade quanto às “diferenças” entre meninos e meninas, voltando a sua atenção para a região genital do seu corpo, identificando-o como uma área de prazer. Apresenta uma manifestação forte e grandiosa de si mesma, surgindo aqui o complexo de Édipo, em que o menino apresenta intensa referência pela figura materna e a menina pela figura paterna.

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Fonte: <http://www.hm9.com.brblogv2wp-contentuploads200903foto-do-dia-240309-400x600.jpg>.

Fase de Latência (de 6 a 11 anos): a característica principal, nessa fase, é um deslocamento da libido para atividades sociais. O interesse por si desloca-se para a satisfação gerada nas relações externas. A criança gasta sua energia em atividades escolares e sociais, investindo no que recebe do meio externo.

Fase Genital (a partir de 11 anos): tendo início a adolescência, tornam-se nítidas as características de impulsos sexuais. O adolescente busca “algo para amar” que não seja de seu grupo familiar. Sua referência são os amigos e pode receber influências nesse meio, pois “tem” que adquirir uma “identidade adulta”, não tão depende dos pais como na infância. Ao mesmo tempo em que quer se inserir em um grupo, busca um diferencial que determine seu jeito e estilo próprio.

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A Teoria de Freud teve ampla aceitação na sociedade e, também, no meio acadêmico-científico. Mas, precisamos ressaltar que Freud não publicou nada relacionado ao tema da aprendizagem.

O que aconteceu foi uma apropriação de suas ideias por estudiosos que se identificaram com o referencial psicanalítico e deram continuidade a essa teoria no contexto escolar, por exemplo. A relevância de Freud para o meio educacional é a sua investigação quanto ao surgimento das preocupações que a criança possui. Para ele, há um momento de determinação na vida dos homens: é o momento da descoberta da diferença sexual anatômica (OLIVEIRA, 2008).

Oliveira (2008) afirma que para o estudioso, as primeiras investigações são sexuais e servem para situar a criança no mundo. A teoria psicanalítica, para a autora, pauta o desenvolvimento intelectual na sexualidade, sendo assim, compreendemos que o que impulsiona a inteligência pesquisadora é algo sexual, é como se o desenvolver biológico comandasse o desenvolvimento psicológico.

Kupfer (1998) pontua que ainda que haja determinantes que levem a criança a desejar aprender, ela precisa de alguém que intermedeie seu aprendizado; e este alguém é o professor. “Então, a pergunta: ‘O que é aprender ?’ supõe, para a psicanálise, a presença de um professor, colocado numa determinada posição, que pode ou não propiciar aprendizagem”.

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A Psicanálise serve ao professor como indivíduo, e de modo algum à Pedagogia como um todo.

Esse aprendizado supõe um relacionamento de mestre e aluno. O professor só consegue transmitir conhecimento se é autorizado e acreditado pelo aluno, não importa se está dizendo a verdade ou não. Na fase da latência, por exemplo, a criança dirige ao educador um afeto antes transmitido aos pais (OLIVEIRA, 2008).

A linha da psicanálise dá importância à relação entre docente e discente e às condições que esta fornece à aprendizagem, quanto ao conteúdo, o mesmo não tem importância, o que deve ser trabalhado, para Oliveira (2008) é a curiosidade infantil, o professor deve adquirir a confiança da criança, e com isso despertar um anseio pelo conhecimento.

Mesmo com essa explanação, a autora pontua que a aproximação da Psicanálise com a Educação constitui-se como um grande desafio. Freud notou ser impossível ensinar como um pedagogo clássico, ou seja, dar uma aula e pedir para que os alunos reproduzam o que entenderam. Com isso, é possível afirmar que a Psicanálise serve ao professor como indivíduo, e de modo algum à Pedagogia como um todo.

“A inteligência é o único meio que possuímos para dominar os nossos instintos” (Sigmund Freud).

Fonte: <www.culturabrasil.org/freud.htm>.

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LEV SEMINOVICH VIGOTSKY E SUA INFLUÊNCIA PARA A COMPREENSãO DO DESENVOLVIMENTO INFANTIL E OS PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM

Professora Me. Gescielly Barbosa da Silva TadeiProfessora Esp. Lussuede Luciana Sousa Ferro

Ao longo da primeira unidade já pontuamos algumas concepções de Vigotsky sobre o desenvolvimento humano. Nosso intuito, no presente item, é contextualizar brevemente a vida e a obra do autor.

Lev Semenovitch VygotskyFonte: <pt.wikipedia.org/wiki/Lev_Vygotsky>.

Ao nos pautarmos no processo histórico, compreendemos que entre o final do século XIX e as primeiras décadas do século XX, a Rússia passou por constantes conflitos econômicos, sociais e políticos. Até 1917 a Rússia foi governada por imperadores, os chamados czares, sendo substituídos pelos revolucionários socialistas. Após a tomada do governo pelos socialistas este país sofreu um longo período de guerra civil até se constituir na potência econômica que se tornou após os meados do século XX.

Foi nesse contexto que viveu Vigotsky (1896-1934), um jovem que faleceu prematuramente aos 38 anos, mas que neste curto período de vida produziu uma obra riquíssima de pesquisas sobre o desenvolvimento do psiquismo humano. “[...] Neste sentido, Vigotsky não se adiantou à sua época, apenas lançou olhar perscrutador sobre as necessidades da Rússia, buscando

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respostas aos problemas com que se deparavam os homens daquele período” (TULESKI, 2002, p. 45).

Para discutir as questões da psicologia cognitiva, primeiramente, Vigotsky desenvolveu suas análises sobre a crise da Psicologia, apontando, naquele momento, sua situação paradoxal, de um lado havia a psicologia como ciência natural que explicava os processos elementares sensoriais e reflexos, tomando o homem basicamente como corpo, e por outro lado, a psicologia como ciência mental que descrevia os processos psicológicos e superiores como mente, consciência e espírito. Foi na tentativa de superar essa crise da psicologia que Vigotsky e sua equipe buscaram uma teoria que sintetizasse essas duas abordagens que dominavam a psicologia naquele momento.

Para Vigotsky, não bastava apenas justapor esses dois elementos da psicologia vivida naquele momento, mas propor uma nova psicologia, conforme Tuleski, 2002, p. 23 “[...] determinada por ele de psicologia geral, teria uma base explicativa única para os fenômenos humanos [...]”, partindo da transformação dos já existentes, construindo, assim, um caminho que eliminaria a separação entre a matéria e o espírito, baseando-se no método proposto por Marx e Engels denominado de materialismo histórico-dialético. Luria, Leontiev e Vigotsky (2006, p. 25) dizem que Vigotsky foi influenciado por esses pensadores concluindo:

[...] que as origens das formas superiores de comportamento consciente deveriam ser achadas nas relações sociais que o indivíduo mantém com o mundo exterior. Mas o homem não é apenas um produto de seu ambiente, é também um agente ativo no processo de criação deste meio [...].

Partindo desse pressuposto a psicologia vigotskyana compreende que todo comportamento humano se desenvolve primeiro externamente no âmbito intrapessoal por meio da coletividade e depois se interpessoaliza, ou seja, há um mediador, não acontece diretamente.

Vigotsky (1930, p. 3) foi um estudioso das causas sociais e entende que o desenvolvimento do psiquismo humano está atrelado ao desenvolvimento histórico da humanidade, ao afirmar que:

[...] as várias contradições internas, as quais se encontram nos diferentes sistemas

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sociais, encontram sua expressão acabada tanto no tipo de personalidade, quanto na estrutura do psiquismo humano de um período histórico determinado.

De acordo com essa citação de Vigotsky, entendemos que, assim como o homem transforma a natureza e por meio dela se transforma, ele utiliza-se de instrumentos psicológicos ou símbolos para ampliar suas capacidades superiores e se modificar internamente. O homem se transforma e se humaniza apropriando-se dos conhecimentos historicamente desenvolvidos pela humanidade, a partir do momento que isto faz parte do meio em que vive.

Tomando como base para as suas pesquisas a realidade histórico-cultural daquele momento, Vigotsky não deixou de considerar todo o desenvolvimento histórico da humanidade, tendo como centro os estudos da psicologia cognitiva, investigou com seus colaboradores, Luria e Leontiev, “[...] os processos neurofisiológicos isto é, a relação entre o funcionamento intelectual e a cultura da qual os indivíduos fazem parte [...]” (VILLALOBOS, 2006, p.15).

Esses estudos tiveram um enorme valor científico resultando, entre outros conceitos, as chamadas FPS- Funções Psicológicas Superiores (a memória, atenção, percepção, solução de problemas), relacionando desenvolvimento e aprendizado, ou seja, ao longo do desenvolvimento humano as FPS devem ser construídas e mediadas pelos instrumentos e símbolos que são desenvolvidos no interior da vida social e funcionam como um objeto social e mediador da relação entre o indivíduo e o mundo.

Para desenvolver-se plenamente como ser humano, o homem necessita participar do trabalho coletivo apropriando-se do conhecimento que a humanidade foi desenvolvendo ao longo de sua história. Diferente dos animais, os homens se desenvolvem durante as operações de trabalho sobre a natureza e por intermédio das relações com outros homens. Com o desenvolvimento social, o conhecimento foi adquirindo autonomia e a linguagem e os instrumentos transformaram-se em objetos de comunicação humana.

Ao contrário das reflexões apresentadas até este momento a atual sociedade capitalista tem dificultado a apropriação do conhecimento para todas as classes sociais, caminhando

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na direção de uma nova perspectiva que valoriza o fragmentário, a prática cotidiana, a competitividade e a adaptação do indivíduo às constantes mudanças sociais.

É no entendimento dessa realidade social que devemos buscar o entendimento da educação como responsável pela superação dos comportamentos instintivos e primitivos, desenvolvendo os culturais, eliminando as características burguesas como o individualismo e o imediatismo.

Contrapondo essa realidade, a ação escolar deve ser a do enfrentamento por uma escola pública que garanta aos trabalhadores um ensino da melhor qualidade formando homens conscientes, não alienados, capazes de dominar seu próprio comportamento, de fazer análises críticas e de provocar transformações sociais. Em uma visão vigotskyana, defendemos que cabe, portanto, à escola, a responsabilidade pelo máximo de desenvolvimento das capacidades cognitivas, do pensamento lógico, linguístico ou abstrato.

Dica de Filme: Parada Obrigatória!Documentário: Vigotsky – Coleção Grandes Educadores

Lev Vigotsky se preocupa em entender o funcionamento psicológico do ser humano, integrando as-pectos biológicos e culturais. Com relação à educação, a teoria de Vigotsky enfatiza o papel da apren-

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dizagem no desenvolvimento humano, valorizando a escola, o professor e a intervenção pedagógica. Talvez por isso, suas idéias têm tido tanta repercussão entre os educadores do ocidente, apesar de sua distância no tempo e espaço (viveu na antiga União Soviética e morreu há mais de 60 anos).AproduçãodeVigotskyfoivasta:escreveucercade200trabalhoscientíficosqueforampontosdepartida para inúmeros projetos de pesquisa posteriores, desenvolvidos por seus colaboradores e se-guidores, e ainda centrais na agenda de psicologia da educação contemporânea.

CONSIDERAçÕES FINAIS

Na Unidade II pudemos estudar sobre a influência de alguns estudiosos e suas teorias sobre o desenvolvimento humano, assim como essas teorias chegam ao cenário educacional.

O primeiro a ser estudado foi Jean Piaget, o pai da Epistemologia Genética. Verificamos que Piaget tem uma teoria completa sobre o desenvolvimento da criança, visto que ele buscava compreender como se dá a construção da inteligência no ser humano.

Wallon, um autor não tão conhecido e veiculado como Piaget, traz a sua visão sobre a importância da afetividade para o desenvolvimento do ser humano. É também respeitado no cenário acadêmico-científico, tendo um número expressivo de seguidores de suas ideias.

Freud, terceiro estudioso a ser trabalhado, contribui com os nossos estudos ao trazer exemplificações e explicações sobre o desenvolvimento psicossexual infantil. Precisamos ressaltar que Freud não desenvolveu estudos dentro do cenário educacional, sendo assim, sua teoria vale-se para o professor enquanto estudioso e pesquisador, mas não como um método a ser seguido e trabalhado na escola.

Vigotsky, expoente da Teoria Histórico-Cultural, traz a sua visão sócio-histórica sobre a constituição do indivíduo em uma intrínseca relação entre homem-meio-cultura-história.

E qual desses estudiosos é o correto?

Não há como respondermos a essa pergunta. Hoje, trabalhamos com a identificação pessoal de cada estudante com a teoria para futuros aprofundamentos acerca da temática. Precisamos

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de avanços na área da neurociência para podermos afirmar se Freud é mais consistente ou menos que Vigotsky, ou se Wallon é mais coerente que Piaget em seus estudos e pesquisas.

ATIVIDADE DE AUTOESTUDO

1. A partir da leitura e das discussões sobre a obra de Jean Piaget, faça um resumo das principais ideias desse autor naquilo que diz respeito ao processo de desenvolvimento da inteligência humana.

2. DefinaarelevânciadeSigmundFreudparaaeducação.

3. Vigotskydesenvolveusuateoriaemummomentohistóricoespecífico.Façaumbreveresu-mo sobre a vida e obra desse estudioso que é referência para a educação nos dias atuais.

VIGOTSKY, Lev Seminovich. Obras Escogidas. Moscú: Pedagóguika, 1982.Livro: Obras EscogidasAutor: Lev Semenovich VygotskyGênero: Psicologia

Acesse o site <www.culturainfancia.com.br>, para buscar conhecimentos na área do desenvolvimento da criança. O site traz diversos eixos de pesquisa, como: arte, desenvolvimento, educação e roteiros culturais.

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101PROBLEMAS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA INFÂNCIA | Educação a Distância

“Não existe uma linha teórica na psicologia que responda a todas as questões referentes ao desenvolvimento infantil”. Sendo assim, como devemos estudar as teorias apresentadas pelos di-versos autores?

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UNIDADE III

AS DIFICULDADES E OS DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM: A DIFICULDADE QUANTO À APREENSãO DA LEITURA E DA ESCRITAProfessora Esp. Lussuede Luciana Sousa Ferro

Objetivos de Aprendizagem

• EntenderaFilogênesedaEscrita.

• CompreenderopapeldaLinguagemEscritanaHistóriaHumana.

• ObservaroProcessodeEnsinodaLinguagemEscritaeoPapeldoPsicopedagogo.

• VerificaraPráticadoPsicopedagogoquantoàDificuldadedeAprendizagemapartirde um Estudo de Caso.

Plano de Estudo

A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:

• Filogênese da Escrita

• Linguagem Escrita e História

• Dificuldade de Aprendizagem quanto à Leitura e à Escrita

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INTRODUçãO

No processo de apropriação da escrita a Psicopedagogia pode contribuir não só para o indivíduo que apresenta dificuldade de aprendizagem, mas à sociedade como um todo. Enquanto área do conhecimento, a Psicopedagogia integra outras ciências afins como a Psicologia, a Fonoaudiologia, a Neurologia, a Sociologia, a Linguística, a Psicanálise entre outras, oportunizando compreender como ocorre a aprendizagem na criança, considerando todos os fatores intervenientes no desenvolvimento infantil e deixando de remeter a dificuldade apresentada como exclusiva do aluno (YAEGASHI, 1998).

Quando falamos em desenvolvimento infantil o leque se abre para muitos fatores intervenientes nesse processo, porém, neste trabalho, objetivamos apontar aspectos que interferem no processo de aquisição da linguagem escrita nos indivíduos, para que esses se tornem capazes de se apropriarem dos conteúdos científicos. Dessa forma, precisamos compreender a aquisição da linguagem escrita como algo amplo que todos os alunos devem ter acesso, evitando assim casos de fracasso escolar.

Muitas vezes, no ambiente clínico, os pais procuram o psicopedagogo com queixas, como: “Por que meu filho não consegue ler e escrever?”, “Ele não entende o que lê!”, “Ele escreve tudo errado!”, “Ele tá na escola, mas parece que não aprende nada do que ensinam pra ele!”, dentre tantas outras queixas referentes à aquisição da linguagem escrita.

As atividades realizadas diariamente no espaço escolar e o contato com crianças com dificuldade de aprendizagem, permitiu-nos conviver com o processo de aquisição de escrita dos alunos, principalmente nas séries iniciais, exigindo reflexão contínua sobre essa temática. Compreendendo que a aquisição da escrita assume um papel fundamental como forma de apropriação do conhecimento científico, internalizando os meios cognitivos de compreender o mundo e poder transformá-lo, é importante pensarmos nos fatores que promovem essa aprendizagem, em especial nas crianças que apresentam dificuldade para aprender.

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Também são preocupantes os índices acerca das bibliografias produzidas, nos últimos anos, sobre os problemas de leitura e escrita, a qual denuncia de maneira contundente a baixa qualidade educacional oferecida pelos sistemas escolares, desde a educação básica até o ensino superior. Antes de discutir essa questão é preciso conhecer os dados mais recentes apresentados no último dia 19 de janeiro de 2010, pelo IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Segundo as pesquisas do IPEA, somente 48% dos jovens de 15 a 17 anos estão cursando o ensino médio, apenas 13% dos jovens de 18 a 24 anos frequentaram o ensino superior em 2007; e o dado mais agravante é que o Brasil apresenta um índice de 14,2 milhões de analfabetos com 15 anos ou mais (CASTRO; AQUINO; ANDRADE, 2010).

Concomitantes a esses dados que denunciam a precariedade educacional brasileira, ainda temos que enfrentar os resultados abaixo do mínimo esperado dos programas oficiais de avaliações externas nacionais como a Prova Brasil, Exame Nacional de Ensino Médio (ENEM), Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE) e as internacionais como o PISA (Programa Internacional de Avaliação de Estudante). Nessa última, o nível de proficiência mínimo indicado para que o aluno seja considerado apto a viver na sociedade “letrada” é 2, e o Brasil apresentou nos resultados de 2006, que 69% dos seus alunos ficaram abaixo desse nível. Infelizmente, esses resultados têm demonstrado altos índices da baixa qualidade de ensino e aprendizagem que vem caracterizando o ensino nas escolas públicas brasileiras até os dias atuais.

Na busca por caminhos que superem essa falácia da Educação, precisamos compreender a linguagem como porta de entrada para os saberes eruditos mais elaborados, pois, segundo Luria (1979), a linguagem surgiu da necessidade de comunicação, transformando-se em instrumento decisivo do conhecimento humano. Baseada nos aportes teóricos de Vigotsky, Souza (2008) aponta que a linguagem é o mais elaborado sistema de signos presente na cultura humana e, por meio dela é possível organizar o pensamento e ter acesso ao conhecimento científico. De acordo com essa premissa e organizados nas bases da Teoria Histórico-Cultural, entendemos que a apropriação da linguagem escrita pelas crianças deve ocorrer de forma

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consciente, por meio de motivos e necessidades que as estimulem a escrever com significado e função social, pois para Vigotsky (1935 apud ROJO, 1997, p. 39):

[...] a escrita ocupou um lugar muito estreito na prática escolar, em relação ao papel fundamental que ela desempenha no desenvolvimento cultural da criança. Ensina-se às crianças desenhar letras e construir palavras com elas, mas não se ensina a linguagem escrita. Enfatiza-se de tal forma a mecânica de ler o que está escrito que se acaba obscurecendo a linguagem escrita como tal. [...] E o resultado é uma fala morta [...] (VIGOTSKY, 1935 apud ROJO, 1997, p. 39).

Ainda apoiados na Teoria Histórico-Cultural, entendemos que a escola deve ser o espaço que proporcionará uma educação voltada para a formação integral do aluno. Afirmarmos, também, a importância do papel do professor nesse período de escolarização, o qual será aquele que estabelecerá, conforme Oliveira, Almeida e Arnoni (2007, p. 118) “[...] a diferença entre o conhecimento a ser apresentado aos alunos e as experiências cotidianas dos estudantes [...]”, pois esse conhecimento transforma suas vidas, na medida em que ela é “[...] pensada e articulada às experiências que a humanidade vem sistematizando no decorrer da história [...]” (OLIVEIRA; ALMEIDA; ARNONI, 2007, p. 119).

Partindo do pressuposto de que a realidade social é produzida historicamente, as dificuldades escolares deverão ser analisadas, contextualizadas, historicizadas e compreendidas como um fenômeno, pois as taxas de baixa qualidade no ensino estão presentes na sociedade há, pelo menos, seis décadas. Inclui-se, nesse contexto, a aprovação com baixo índice de aprendizagem dos conteúdos escolares e de indivíduos privados de uma escrita carregada de sentido e significados.

ESCRITA: SUA HISTÓRIA NA FILOGÊNESE

“A escrita dá acesso direto ao mundo das idéias e permite apreender o pensamento e fazê-lo atravessar o espaço e o tempo; é o fato social que está na base de nossa civilização”1 (HIGOUNET, 2003).1 Citação retirada da capa do livro de Higounet.

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A escrita é um bem cultural socialmente constituído e historicamente produzido. Para se compreender a escrita, como produção humana, é importante verificar como ocorreu a sua evolução, desde os primeiros sinais gráficos até a escrita alfabética. Desse resgate o mais importante é entender as funções para as quais a escrita foi criada, bem como as fases pelas quais passou, pois assim como a história do desenvolvimento das sociedades, a escrita percorreu diferentes caminhos até chegar aos dias atuais. A humanidade construiu ao longo dos anos diversos sistemas de escrita, a alfabética é um dos sistemas possíveis que utilizamos hoje e, o seu desenvolvimento, tem demonstrado que o longo caminho percorrido até nossos dias foi resultado das transformações ocorridas na humanidade.

De acordo com Février (1959 apud HIGOUNET, 2003, p. 11), os sinais gráficos devem fazer parte do cotidiano da sociedade, reproduzindo a fala utilizada: “é preciso inicialmente um conjunto de sinais que possua um sentido estabelecido de antemão por uma comunidade social e que seja por ela utilizado e em seguida é preciso que esses sinais permitam gravar e reproduzir uma frase falada”.

Para o autor, atualmente a escrita é o procedimento utilizado pela humanidade para constituir a linguagem articulada. Desde os tempos mais remotos e diante da necessidade de um meio de expressão permanente, “[...] o homem primitivo recorreu a engenhosos arranjos de objetos simbólicos ou a sinais materiais, nós, entalhes, desenhos [...]” para se comunicar (FÉVRIER 1959, apud HIGOUNET, 2003, p.9). Porém, a escrita é mais que um instrumento de comunicação, ela movimenta o pensamento de forma organizada quando esse é transcrito, fazendo-o atravessar o espaço e o tempo.

A primeira forma de comunicação ocorreu por meio da emissão de grunhidos e gestos, evoluindo para registros em forma de desenhos, mais tarde, por meio da fala, e, posteriormente, pela sistematização da fala em forma de símbolos gráficos, criando a escrita convencional.

[...] no decorrer da História, as necessidades humanas fizeram com que a escrita chegasse à forma como a conhecemos atualmente. O ser humano soube aprimorar os seus sentidos para fazer face às necessidades e perigos da vida cotidiana, foi

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aprendendo, assim, a ler os indícios e a interpretá-los. Indícios que foram, muitas vezes, reproduzidos pelo homem primitivo para se comunicar, como as pinturas nas cavernas, feitas com intenções ainda não totalmente compreendidas pelo homem moderno. Foram estas as primeiras manifestações do ser humano na tentativa de fixar aspectos do mundo em que vivia em um suporte situado fora do seu próprio cérebro, a pedra (ELIAS; NASCIMBENI, 2001, p. 3).

Figura 2- Registro na cavernaFonte: Disponível em: <http://www.quartaseriemargarida pardelhas.blogspot.com.blogspot.com>.

Além dos desenhos, outras formas de comunicação fizeram parte da história humana, como os nós em cordinhas e bastões para entalhar o cálculo e a cronologia, no objetivo de marcar o tempo de acordo com os ciclos da natureza, o dia e a noite.

Por volta de 4000 a.C., os sumérios desenvolveram a escrita cuneiforme, um tipo de escrita feita com auxílio de objetos em formato de cunha que apresentava um conjunto de sinais silábicos e fonéticos, mas sem derivar em alfabeto. Nesse mesmo período, os egípcios desenvolveram um sistema de escrita denominado hiroglífica formado por pictogramas (desenhos que representam coisas), fonogramas (desenhos que representam sons) e outros signos determinantes (FRANCIOLI; SFORNI).

Fonte: <http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/127-2.pdf>.

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Figura 3- Escrita cuneiformeFonte: Disponível em: <http://www.abcdesign.com.br>.

Figura 4- Escrita egípcia em papiroFonte: Disponível em: <http://www.phisalia.blogspot.com>.

De acordo com Elias e Nacimbeni (2001), uma nova maneira de se escrever surgiu quando a escrita começou a representar não mais os seres, ações ou objetos, mas sim o som da fala, sendo necessário um novo tipo de sinal que pudesse indicar as ideias. O som passaria a representar ele próprio, quebrando a relação entre sinal e objeto, e a escrita não estaria reservada somente para comemorar eventos importantes do dia a dia, poderia ser usada para informar e instruir.

Na Roma Antiga, o alfabeto possuía somente letras maiúsculas. Ao ser utilizada em pergaminho, ocorreram modificações originando o estilo inicial, uma forma de letra arredondada e mais rápida para escrever, cujo traçado era elegante e legível. Essa nova forma de escrita surgiu por volta do ano 500 d.C., no norte da Europa, Inglaterra e Irlanda. O estilo permaneceu até o século VIII, sendo utilizado para escrever as escrituras bíblicas. Nesse mesmo século, por exigência do imperador Carlos Magno, foi elaborado um estilo de escrita com letras maiúsculas e minúsculas, permanecendo até

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o século XV, quando eruditos italianos criaram outro estilo de escrita.

Figura 5- Escrita Uncial – inscrição grega de 146 a.C.

Fonte: Disponível em: <http://www.anasofia.net/pdf/tipografia>.

E a escrita que utilizamos hoje, qual sua origem? Nossa escrita é alfabética e originou--se no alfabeto dos fenícios, constituído por 22 consoantes maiúsculas e cada conso-ante representava um som (Figura 5). É também fonética porque utiliza símbolos que representam sons. Por volta do século VIII, a.C., os gregos transformaram algumas das consoantes fenícias em vogais, acrescentaram novos caracteres, ampliando o alfabeto para 24 letras e, ao contrário dos fenícios que escreviam da direita para a esquerda, os gregos passaram a escrever da esquerda para a direita. Posteriormente, por volta de 753 a.C, os romanos, baseando-se no alfabeto grego, criaram o alfabeto latino, que foi disseminado pelo mundo juntamente com a expansão do Império Romano, do cristianismo e com o domínio do mundo ocidental, chegando à forma que conhecemos e utilizamos na língua portuguesa.

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Evolução da escrita alfabética

Figura 6 - A escrita alfabéticaFonte: Disponível em: <http://www.anakabum.wordpress.com>.

Essa história revela como a escrita se constitui em um instrumento cultural determina-do pela realidade social concreta. Podemos perceber a relação entre poder político--econômico e a escrita na própria história da colonização brasileira. Adotamos a língua portuguesa de origem latina e escrevemos utilizando a escrita alfabética, porque fomos colonizados por uma nação que fazia uso desse tipo de escrita. No período da coloni-zação, os indígenas do litoral brasileiro falavam a língua tupi e influenciaram a língua portuguesa deixando um acervo de novas palavras que constituem nosso vocabulário, mas, mesmo assim, as palavras de origem indígena são grafadas com letras do alfa-beto latino e pronunciadas com seus sons fonéticos e não com os sons indígenas. Isso demonstra que a dominação oral e escrita dos colonizadores conteve a influência da

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língua indígena (FRANCIOLI; SFORNI).

Fonte: <http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/127-2.pdf>.

O surgimento da escrita alfabética é resultado das relações do trabalho humano que os homens experimentaram diante das necessidades de comunicação e não apenas como instrumento de comunicação, pois ela não é neutra, inocente e natural. Segundo, Polido e Francioli (2009, p. 4) “[...] a comunicação verbal é uma produção social, campo de conflitos e de confrontos ideológicos próprios das relações de poder que estão presentes nas relações sociais [...]”.

De acordo com essa premissa, o ensino da linguagem precisa ocupar um lugar de excelência no período de escolarização, pois se a compreendermos como bem histórico cultural, não é possível separá-la do contexto social, ou seja, o ensino da linguagem deve ater-se à sua função social, o professor deve produzir sentido e promover motivos para que sua aprendizagem seja efetuada de forma calcada nas raízes do saber erudito. Para que isso seja possível, a prática pedagógica necessita ser organizada, sistematizada e planejada intencionalmente.

Com a retomada dessas questões, abrem-se caminhos para possíveis meios de superação das dificuldades de aprendizagem, provenientes de uma alfabetização deficitária e vazia de sentidos. Abordar a linguagem escrita, no contexto histórico produzido ao longo dos anos, é o que será discutido no próximo tópico.

LINGUAGEM ESCRITA: SEU PAPEL NA HISTÓRIA HUMANA

A capacidade que o homem desenvolveu de transmitir conhecimento, permitiu sua sobrevivência como espécie, dando-lhe supremacia na escala evolutiva. Como vimos no item anterior, nos primórdios da civilização, esse conhecimento foi transmitido de geração em geração por uma linguagem que misturava sons e gestos, de forma que cada povo codificou os sons da sua língua para reproduzi-los, e gradativamente, foram progredindo para a escrita atual. Outras mudanças também ocorreram, como o ambiente que sofreu alterações radicais, obrigando o ser humano a encontrar outras fontes de alimentação, já que a caça ficara escassa. Desse

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processo surge a agricultura e, com ela, a sedentarização, a organização social em cidades e o acúmulo de riquezas2.

No princípio a escrita era utilizada apenas para se informar algo, mas logo o homem passou a propagar suas ideias, crenças e costumes para além do tempo e do espaço, construindo informações que se manteriam inalteradas por séculos, sendo pronunciadas a grandes distâncias. Com a evolução cultural dada pelos gregos no período clássico, a escrita tornou-se o principal instrumento na transmissão do saber e instrumento de poder político.

O papel social da escrita sofreu alterações no mesmo decurso que aconteceu a evolução de uma civilização sempre mais organizada. Como visto na história da escrita, os primeiros registros escritos relatavam os acontecimentos do cotidiano e seu emprego estava também limitado pelo fato de poucos povos terem acesso à escrita. Eram geralmente trabalhadores intelectuais a serviço de personagens do poder. Com o tempo a escrita começou a substituir cada vez mais a memória, e as genealogias e os textos religiosos passaram a ser escritos.

No decorrer da história da humanidade, outros motivos criaram no homem a necessidade de produzir outras formas de registro para se comunicarem e se organizarem, como a construção progressiva de sistemas de representação, visto anteriormente. Em suas pesquisas, Luria (1986, p. 22) destaca que a necessidade de comunicação mais precisa entre as pessoas, em função do trabalho, ocasionou a aparição da linguagem como resultado da história social:

[...] a linguagem transformou-se em elemento decisivo do conhecimento humano, graças ao qual o homem pode superar os limites da experiência sensorial, individualizar as características dos fenômenos, formular determinadas generalizações ou categorias. Pode-se dizer que sem o trabalho e a linguagem, no homem não se teria formado o pensamento abstrato “categorial” [...].

A escrita percorreu diferentes caminhos até chegar aos nossos dias, porém, foi sendo desenvolvida como método de registrar a memória cultural, política, artística, religiosa e social

2 Os dados apresentados tomaram como base as discussões de ELIAS e NASCIMBENI produzidas no documentário “Construção da Escrita” - TV Escola – Curso de Formação de Professores Alfabetizadores, 2001. Os dois parágrafos seguintes a esse, também se referiram à mesma fonte citada.

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de um povo, instrumentalizando a reflexão, a expressão e a transmissão de informações. A principal finalidade da escrita é estabelecer um sistema convencional e que, por meio dele, os membros de um grupo possam comunicar-se entre si e com seus sucessores de forma precisa e duradoura. Essa discussão revela quais foram os motivos que levaram os homens a criarem essa forma de linguagem e quais as funções historicamente construídas pela humanidade que permanecem em nosso meio, ou seja, a utilização da linguagem escrita para organização, comunicação, registro e lazer.

Ao buscarmos elementos para a compreensão da função social da escrita, a teoria histórico--cultural, especificamente os estudos de Vigotsky, Leontiev e Luria (2005), constituem a base fundamental que explica a linguagem escrita como processo histórico. Vigotsky considera a linguagem como instrumento do pensamento e Leontiev, como instrumento simbólico no qual estão consubstanciadas complexas ações mentais do pensamento. A aquisição da linguagem promove o desenvolvimento das funções psicológicas superiores exigindo do indivíduo, nesse processo, o movimento de seu pensamento. O desenvolvimento dessas ações, por parte de cada sujeito, ocorre mediante a apropriação da linguagem que foi produzida pelos homens ao longo da História. Nesse mesmo sentido, Luria (1986) distingue a linguagem como um sistema de códigos, elaborados no processo da história social, que transmite qualquer informação, mesmo aquelas que estão fora do contexto da ação que está sendo praticada.

Para compreendermos esse processo será desenvolvido, neste primeiro momento, a análise do significado epistemológico da linguagem como forma de comunicação objetivada que só existe nas relações humanas.

Marx e Engels (2002, pp.33-34) consideram que:

[...] A linguagem é tão velha como a consciência – a linguagem é a consciência real prática que existe também para outros homens e que, portanto, só assim existe também para mim, e a linguagem só nasce como a consciência, da necessidade, da carência física do intercâmbio com outros homens [...] (grifo do autor).

Da mesma forma, Leontiev (1967, p. 86) analisa essas considerações de Marx, acrescentando:

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[...] O nascimento da linguagem só pode ser compreendido em relação com a necessidade, nascida do trabalho, que os homens sentem de dizer alguma coisa. Como se formaram a palavra e a linguagem? No trabalho os homens entram forçosamente em relação, em comunicação uns com os outros. Originariamente, as suas acções, o trabalho propriamente, e a sua comunicação formam um processo único. Agindo sobre a natureza, os movimentos de trabalho dos homens agem igualmente sobre os outros participantes na produção. Isto significa que as acções do homem, têm nestas condições uma dupla função: uma função imediatamente produtiva, e uma função de acção sobre os outros homens, uma função de comunicação [...].

Vigotsky (2001), também pesquisou sobre a linguagem ao buscar compreender a história da espécie humana e, em suas pesquisas, não a separa do pensamento. Para o autor, a associação entre pensamento e linguagem é atribuída à necessidade das relações humanas durante o trabalho no momento que ocorre o intercâmbio social. Essa relação entre pensamento e linguagem se modifica, evolui ao longo das experiências do sujeito, considerando os fatores sócio-históricos. Apesar de estarem associados, Vigotsky (2001, p. 111) considera que ambos possuem raízes diferentes.

[...] A relação entre pensamento e linguagem modifica-se no processo de desenvol-vimento tanto no sentido quantitativo quanto qualitativo. Noutros termos, o desenvol-vimento da linguagem e do pensamento realiza-se de forma não paralela e desigual. As curvas desse desenvolvimento convergem e divergem constantemente, cruzam-se, nivelam-se em determinados períodos e seguem paralelamente, chegam a confluir em algumas de suas partes para depois tornar a bifurcar-se.

No instante em que pensamento e linguagem se cruzam, Vigotsky (2001, p. 133) define “[...] que o pensamento se torna verbal e a fala se torna intelectual” (grifo do autor). Para o autor, essa é a principal base que traçou em sua pesquisa para compreender o desenvolvimento ontogenético do pensamento e da linguagem que parte do biológico para o histórico-social, ou seja, a relação entre o pensamento e a fala se faz a partir da passagem da fala exterior para a fala interior.

Ao compreendermos a concepção de linguagem a partir de Vigostsky, Leontiev e Luria, que a consideram de natureza sócio-histórica, resultado da interação social, estamos admitindo que ela ocorre somente no contexto em que os indivíduos realizam constantemente os dois

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tipos de linguagem: oral e escrita. Compreendemos que a linguagem escrita é diferente da linguagem falada, ocorrendo também diferentes evoluções entre ambas, pois enquanto a fala atinge estágios elevados de desenvolvimento, a escrita não pode repetir essas mesmas etapas de evolução pelo “[...] fato de que esta linguagem é apenas pensada e não pronunciada [o] que constitui uma das maiores dificuldades com que se defronta a criança no processo de apreensão da escrita [...]” (VIGOTSKY, 2001, p. 313), ou, ainda, que a escrita:

[...] é uma fala sem interlocutor, dirigida a uma pessoa ausente ou imaginária, ou a ninguém em especial – uma situação nova e estranha para a criança. [...] Na escrita, somos obrigados a criar a situação, ou a representá-la para nós mesmos. Isto exige um distanciamento da situação real [...].

Vigotsky (2001, p. 313) explica que esse fato ocorre porque a escrita torna-se uma linguagem isolada, em que a criança “[...] conversa com a folha de papel em branco, com um interlocutor imaginário ou apenas representado [...]” e isso exige maior nível de abstração por parte da criança, pois antes de registrar ou grafar o sistema simbólico, ela precisa representá-lo no pensamento. Outra questão apontada pelo autor como sendo o motivo central da linguagem escrita é o fato de a criança, durante esse processo, agir voluntariamente, ou seja, agir de acordo com suas estruturas psíquicas organizadas pelo ambiente histórico-social, neste caso, organizado pelo ensino escolar sistematizado. No entanto, a criança necessita ter consciência das estruturas sonoras das palavras que irá escrever, separando os códigos linguísticos em partes-sílabas e depois juntá-los novamente para registrar o que deseja, tornando a escrita clara para o seu interlocutor. Esse processo é destacado por Vigotsky (1934 apud ROJO, 1997, pp. 122-123) ao explicitar que:

[...] a comunicação por escrito dirige-se a um interlocutor ausente, que muito poucas vezes tem em mente o mesmo assunto que o escritor. Portanto, deve ser muito mais desenvolvida: a diferenciação sintática deve chegar a seu ponto máximo e devem-se usar expressões que soariam artificiais na conversação. [...] Na escrita, como o tom da voz e o conhecimento do assunto são excluídos, somos obrigados a utilizar muito mais palavras, e com maior exatidão. A escrita é a forma de fala mais elaborada [...].

Nesse processo de compreensão, Vigotsky (1998) tem como premissa que o aprendizado e o desenvolvimento fazem parte da vida da criança desde seu nascimento, pois os considera

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inter-relacionados. Assim, o aprendizado escolar é aquele que depende diretamente do desenvolvimento das funções psíquicas como a memória, a atenção voluntária, a abstração, a imaginação que, de acordo com Vigotsky (1998, p. 76), são os processos psicológicos superiores de origem sociocultural, enquanto os processos elementares são de origem biológica, os quais, por meio dos signos, transformam-se em funções superiores. Para o autor,

[...] as principais fases formais que percorre a personalidade da criança em sua formação estão diretamente ligadas ao grau de desenvolvimento de seu pensamento, já que, do sistema de cognição em que se realize toda a experiência interna e externa da criança, dependerá o aparelho psíquico que a divida, analise, conecte e elabore [...].

Com base nesse pressuposto teórico, entendemos que, com o desenvolvimento das funções psíquicas superiores, a criança avança concomitantemente em seu desenvolvimento por meio das interações sociais, da relação com o outro e da apropriação da matéria (conceitos, signos, elementos mediadores...), desenvolvem-se as funções complexas do pensamento. Dessa forma, podemos dizer que “[...] o processo de construção da escrita é mediado por estes signos transmitidos culturalmente, considerando que, por vivermos numa sociedade letrada, a criança tem contato com esse sistema desde muito cedo [...]” (SOUZA, 2008, p. 2).

Rojo (1997, p. 50) discute essas questões tomando como base o pensamento de Vigotsky, o qual afirma que o aprendizado em cooperação com os pares mais desenvolvidos (adultos ou colegas) é determinante da construção de um novo domínio de conhecimento e de novas funções. Nesse mesmo sentido, as reflexões de Vigotsky (1935 apud ROJO, 1997, pp. 50-51) continuam quando este diz que:

[...] O ensino tem de ser organizado de forma que a leitura e escrita se tornem necessárias às crianças. Se forem usadas apenas para escrever congratulações oficiais para os membros da diretoria da escola ou para qualquer pessoa que o professor julgar interessante (e sugerir claramente para as crianças) então o exercício da escrita passará a ser puramente mecânico e logo poderá entediar as crianças; suas atividades não se expressarão em sua escrita e suas personalidades não desabrocharão. A leitura e a escrita devem ser algo que a criança necessite [...] uma atividade cultural complexa.

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Vimos então que para a criança se apropriar da escrita, é necessário que ela seja ensinada, e esse processo de aquisição implica uma necessidade, um motivo, um desejo de apropriação da mesma. Segundo Rojo (1997, p. 51),

[...] as crianças têm uma motivação mágica, imaginária, um grande prazer na leitura e na construção e reprodução de histórias de fadas e de contos, além da necessidade de registrar uma linguagem de ordem prática como, bilhetes, receitas, registros ou experiências escolares, organização de listas ou agendas [...].

A autora completa dizendo que, em qualquer dos casos, a conclusão de Vigotsky (1935 apud ROJO, 1997, p. 51) é a de que:

[...] a escrita deve ser “relevante à vida” [...], deve ter significado para as crianças, uma necessidade intrínseca deve ser despertada nelas e a escrita deve ser incorporada a uma tarefa necessária e relevante para a vida. Só então poderemos estar certos de que ela se desenvolverá não como um hábito de mão e dedos, mas como uma forma nova e complexa de linguagem [...].

Dessa forma, o indivíduo estabelece diferentes maneiras de comunicação com o outro, tendo diferentes motivos para escrever; logo, seu discurso escrito é estruturado de acordo com seu destino, ou seja, para quem é escrito. Nesse caso, as diferentes relações estabelecidas com o interlocutor:

[...] vão determinar o que podemos ou não dizer, o que devemos ou não dizer e como e quando. Teremos também diferentes motivos ou intenções de efeito: comunicar e fazer contato; guiar a ação do interlocutor, informar e registrar, solicitar e obter algo; reivindicar ou protestar; registrar nossa vivência e nossas sensações; envolver; fazer imaginar; dar prazer; etc [...] (ROJO, 1997, p. 53).

Pensando na escola como o espaço sistematizado de ensino e no professor como mediador nesse processo de apropriação da escrita pela criança, a elaboração de intervenção pedagógica, segundo Rojo (1997, p. 52), deve compreender e organizar o processo de ensino da leitura e da escrita em interação com a criança, de forma que ela seja motivada, desejada pela criança, relevante para sua vida e necessária para a atividade em curso. A escrita deve ser uma prática significativa que vai além de um ensino ou uma técnica e, como tal, deve constituir-se como um discurso significativo, inserido, também, numa situação com significado

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e não apenas na manipulação de letras, sons e palavras. “[...] Ao pensar na linguagem enquanto capacidade de organizar e generalizar o pensamento, pode se refletir sobre o que representa ao sujeito o domínio da linguagem escrita, como instrumento de inserção na cultura do grupo ao qual pertence [...]” (SOUZA, 2008, p.3).

Nessa perspectiva, os instrumentos e signos são mutuamente ligados e fundamentais no desenvolvimento cultural do indivíduo. Enquanto os instrumentos influenciam externamente a ação do homem sobre os objetos, os signos orientam internamente o controle do próprio indivíduo. Tanto os instrumentos quanto os signos ampliam a capacidade humana de interagir com a natureza e, ao interagir, o homem modifica a natureza ao mesmo tempo em que modifica a si mesmo. E é nessa interação que se desenvolve a linguagem como um signo que permite às pessoas agirem umas sobre as outras, num processo permanente de autotransformação.

O PROCESSO DE ENSINO DA LINGUAGEM ESCRITA E O PAPEL DO PSICOPEDAGOGO

Compreendendo a função social da escrita, o lugar que ocupa na sociedade e os fatores que a permeia, fica clara a necessidade de um profissional, como o psicopedagogo, que busca identificar e intervir nos fatores que influenciam no processo dessa aprendizagem nas relações sociais e culturais. Nesse sentido, a atuação psicopedagógica precisa resgatar, no processo de aprendizagem da criança, o desenvolvimento das funções psicológicas superiores, por meio da aquisição dos signos: linguagem escrita e falada. Dessa forma, cabe ao psicopedagogo entender como ocorre esse processo, para possibilitar ao indivíduo o reconhecimento da própria função desses signos em sua vida.

Ao pensarmos em uma criança com dificuldade de escrita outros aspectos do seu desenvolvimento ficam prejudicados, pois a linguagem é a via de acesso ao conhecimento científico e esse conhecimento sistematizado só é possível na escola. Ao ser privado de um ensino organizado e sistematizado da linguagem escrita, no período de alfabetização, o

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indivíduo estará privado, também, de se apropriar e generalizar os conceitos específicos e socialmente necessários.

Dessa forma, pensar em uma escola que não transmite informações esvaziadas de conteúdos, mas que ensine saberes indica a necessidade de resgatar, na história da educação, os caminhos que nortearam a ação pedagógica no decorrer dos anos, a fim de compreender porque esse espaço do “aprender” ainda reproduz saberes fragmentados e isolados de seu contexto social e cultural, os quais culminam em diagnósticos de dificuldades de aprendizagem, conduzindo crianças aos consultórios psicopedagógicos, muitas vezes, com resultados clínicos equivocados.

Quando pensamos em uma ação intencional e promotora do saber, direcionamos nosso olhar para o trabalho psicopedagógico atrelado ao pensamento de resgate da totalidade do aluno,

[...] fragmentada não porque considera partes de ou elementos simples dessa realidade, mas porque os toma (partes ou elementos) em si mesmos. Fragmentada porque pretende apreender o aluno a partir de sua comunidade, mas faz dessa comunidade uma ilha, isolada de todo o corpo de relações em que se organiza a existência humana, Assim, ilhada do todo, não apenas deixa de apreender a realidade da comunidade, como também, não apreende a realidade do aluno, dado que ambos só adquirem realidade num contexto muito mais universal [...] (KLEIN, 2008, p. 56).

De acordo com Klein (2008, p. 56), é preciso “[...] apreender o aluno concreto, o aluno historicamente situado [...]” em uma “[...] realidade humana que esteja fundada, radicalmente, no movimento de homens reais [...]” (KLEIN,2008, p. 132).

Essa discussão traz ao trabalho psicopedagógico contribuições relevantes, pois tanto no trabalho preventivo quanto no educativo, o psicopedagogo recorre a outras áreas do conhecimento para intervir e promover a aprendizagem. Busca-se não separar a teoria da prática, ou seja, não é possível compreender o indivíduo que apresenta dificuldade longe de seu contexto escolar e social. Tampouco é possível compreendê-lo no imediatismo de suas funções escolares, ignorando o percurso de cada momento constituído na história da humanidade.

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Pensando sobre as questões atreladas ao ensino escolar como meio de apropriação do saber erudito, e ao trabalho do psicopedagogo como instrumento de investigação e superação da dificuldade pelo indivíduo, o trabalho psicopedagógico deve integrar-se aos que almejam alcançar o conhecimento científico. Para continuar a discussão, o próximo capítulo apresenta a avaliação psicopedagógica realizada com uma criança que tem dificuldade com a apropriação da escrita, o percurso que ela faz para aprender e as possíveis causas da dificuldade.

Em seguida, a análise do trabalho mostra algumas hipóteses diagnósticas que culminaram em possíveis encaminhamentos de discussão para a superação da queixa inicial: “Ele escreve errando muito as palavras” e “as histórias são curtinhas sem imaginação”.

PARTE PRÁTICA: APÓS TANTA TEORIA, COMO APLICAR ISSO NA PRÁTICA? PSICOPEDAGOGIA E A LINGUAGEM ESCRITA: UM ESTUDO DE CASO

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Durante o processo de avaliação psicopedagógica, foram aplicados testes e provas psicopedagógicas e pedagógicas com o intuito de entender a queixa inicial da família. As provas aplicadas foram analisadas por meio de uma abordagem quantitativa e serviram como instrumentos que ajudaram a compreender o processo de aprendizagem percorrido pela criança e seus conhecimentos prévios, entendidos como base para aquisição do conhecimento científico.

No decorrer do processo avaliativo, o nosso objetivo foi o de investigar os problemas da dificuldade escolar do sujeito e apontar os possíveis caminhos de reversão da situação atual que estava sendo apresentada e, nesse caso, o problema com a linguagem escrita. Nesse sentido, precisamos fazer um levantamento dos aspectos intervenientes no desenvolvimento e aprendizagem e detectarmos as possíveis causas da dificuldade, a fim de superá-las.

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Foram realizadas oito sessões de avaliação para concluirmos o diagnóstico psicopedagógico. A princípio investigamos junto à família, em anamnese (entrevista com a mãe), como ocorreu seu desenvolvimento desde o biológico ao pedagógico, como forma de coletarmos dados que somaram as possíveis hipóteses diagnósticas e auxiliaram na compreensão do sujeito em processo de ensino e aprendizagem.

DESCRIçãO DOS INSTRUMENTOS

Aplicamos a E.O.C.A. (Entrevista Operativa Centrada na Aprendizagem), desenvolvida por Jorge Visca, com o intuito de investigarmos as causas das dificuldades de aprendizagem no indivíduo e centralizarmos a avaliação em uma entrevista voltada para a aprendizagem.

Para complementarmos a investigação realizamos alguns testes e provas psicopedagógicas que colaboraram no diagnóstico. Porém, nessa análise apresentaremos somente aquelas que apontaram as dificuldades de escrita.

No final da avaliação analisamos os dados coletados tomando como base teórica a abordagem Histórico-Cultural, a fim de compreendermos os processos da aquisição da linguagem escrita como sendo um dos meios de apropriação dos conceitos científicos.

Dessa forma, foi possível traçarmos os caminhos para a promoção de uma boa aprendizagem: “aquela que se adianta ao desenvolvimento” aquela que vem acompanhada de quem ensina, do que ensina e como ensina (VIGOTSKY, 1998).

APRESENTAçãO DO SUJEITO

L. F.3 é uma criança de 9 anos que estuda na 2ª série em uma escola pública em município do Noroeste Paranaense. Foi indicada pela Casa da Criança4 , uma instituição filantrópica que 3 L. F. serão as siglas utilizadas para nos referirmos à criança.4 Casa da Criança é uma instituição filantrópica situada na cidade de Maringá que acolhe crianças que não têm

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atende crianças carentes após o período de aula regular. Essa criança foi encaminhada para avaliação psicopedagógica por apresentar dificuldade de aprendizagem em algumas áreas do conhecimento, em especial a linguagem escrita.

QUEIXA INICIAL

Segundo relato da mãe, L. F. tem dificuldade para ler e produzir texto sozinho, escreve “errando muito as palavras” e “as histórias são curtinhas, sem imaginação”. Sua autoestima está baixa e constantemente fala que “é burro”, não quer ler na frente de outras pessoas e, quando tenta ler, “fica olhando as figuras do livro enquanto passa as páginas”. Segundo ela, a professora reclama que ele “não presta atenção na aula e fica conversando com os outros, parece que está no mundo da lua”. A mãe reclamou da escola anterior dizendo “se meu filho está assim, um pouco é culpa da escola que ficou trocando de professora”. Para ela, as dificuldades começaram a partir desse momento de trocas.

RESULTADOS E ANÁLISES

História de Vida do Sujeito

L. F. ingressou na escola com 7 anos, não fez Educação Infantil, iniciando na 1ª série em 2007 em escola pública do município de Maringá. Já no seu primeiro contato com a escola ocorreram três trocas de professoras, as quais foram remanejadas pela escola. Em 2008, na 2ª série, enfrentou outras duas mudanças de professoras, também por determinação da escola. Mesmo com essa situação, L. F. parecia estar indiferente ao que acontecia, reclamando apenas de alguns colegas da sala, dizendo que eles é que o “provocavam” e começavam “a brigar do nada”. Segundo a mãe, L. F. terminou a 2ª série sem se alfabetizar e sem aprender os conteúdos básicos da série. A família decidiu mudá-lo de escola e deixá-lo repetir o “ano

onde ficar enquanto os pais trabalham. O trabalho é voluntário e oferece atividade lúdica, apoio pedagógico e atendimento psicológico e psicopedagógico.

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perdido” (2ª série), na tentativa de recuperar “as coisas que não tinha aprendido”. Além da dificuldade apresentada, outra preocupação que a família tinha era com o comportamento, pois L. F. se tornou agressivo com os colegas, envolvendo-se em brigas sempre na “saída da escola e na hora do recreio”. A escola frequentemente comunicava aos pais dos fatos ocorridos. Dessa forma, os pais decidiram matriculá-lo em aulas de judô, na tentativa de superação dos problemas comportamentais.

Diante das dificuldades apresentadas pela escola referentes ao comportamento agressivo, a falta de atenção nas aulas, o “não” saber ler e interpretar, o “não” saber escrever sem erros ortográficos, os pais decidiram levá-lo ao neurologista que, em exame clínico, diagnosticou em L. F. Transtorno de Déficit de Atenção (TDA), orientando tratamento medicamentoso com o uso de Metilfenidato (ritalina). Durante 3 meses tomou o medicamento, mas ao participar de um evento, o qual tratava sobre distúrbios, a mãe teve conhecimento sobre os efeitos colaterais do remédio e suspendeu o uso do medicamento, sem comunicação prévia à médica, substituindo-o por um medicamento manipulado pela mãe de “placebo”, que segunda ela, “funciona para deixar a criança mais atenta”. A mudança de medicamento não alterou o comportamento de L. F. e nem os relatos da escola, mencionados pela mãe, quando ela procurou saber do comportamento do filho. Diante disso, o medicamento foi suspenso pela mãe.

Em função da dificuldade que apresenta com a leitura e com a escrita L. F. está matriculado na 3ª série, mas frequenta a 2ª série, correndo o risco de ser reprovado por notas baixas e cursar em 2010 a 3ª série, o que representa em sua vida outra reprovação.

INSTRUMENTOS DE AVALIAçãO

As provas que utilizamos na avaliação psicopedagógicas focaram a investigação de todas as áreas do desenvolvimento infantil, porém, para análise diagnóstica, ateremos nossa atenção àquelas que foram instrumentos indicativos do comprometimento da linguagem escrita. O

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processo de avaliação psicopedagógica ocorreu no final do mês de novembro até meados do mês de dezembro.

Iniciamos o processo de avaliação psicopedagógica com a E.O.C.A (Entrevista Operativa Centrada na Aprendizagem). A E.O.C.A. avalia, por meio de materiais que estimulem a realização de atividades, os conhecimentos prévios da criança e as causas das dificuldades de aprendizagem no indivíduo, centralizando a avaliação em uma entrevista voltada para a aprendizagem. Por meio da E.O.C.A levantamos algumas hipóteses diagnósticas que se firmaram juntamente com a coletânea de outros dados obtidos.

Utilizamos como provas: Projetivas Psicopedagógicas (Par educativo, eu com meus companheiros, o plano da sala de aula, família educativa, o plano da minha casa e o desenho livre); Pedagógicas (TDE – Teste de Desempenho Escolar, listagem de palavras conhecidas, pseudopalavras, e produção textual), com as quais investigamos especificamente as dificuldades com a linguagem escrita.

Análise da E.O.C.A (Entrevista Operativa Centrada na Aprendizagem)

As hipóteses diagnósticas que levantamos no processo de avaliação, por meio da E.O.C.A, apontaram que L. F. não apresentava características de Déficit de Atenção, pois manteve a concentração durante as atividades e não perdeu o foco, mesmo quando conversou sobre outros assuntos de sua vida cotidiana, concomitante ao que estava fazendo. Antes de executar alguma tarefa, antecipou as ideias, para depois registrar o pensamento. Apresentou vocabulário deficitário quando usou expressões como: “troço” (atividade), “pauzinho” (palito de sorvete) e dificuldade na apropriação de conceitos e significação de palavras, pois demonstrou insegurança para ler o que escreveu e os rótulos que encontrou, ora soletrou as letras ora as sílabas, de forma que leu o que não estava escrito como, por exemplo, quando leu “morder” ao invés de “modelar.” Muitas vezes, conseguiu realizar a atividade somente depois que a aplicadora explicou o significado de cada consigna antes das provas, ou antes, de algum termo utilizado na mesma. Ficou ansioso quando imaginou que a avaliadora poderia pedir para que

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escrevesse texto dizendo: “Você não vai falar pra mim escrever texto não, né?” O que não aconteceu, pois esta disse que isso ele faria, naquele momento, apenas se o desejasse, que ele mostraria utilizando os materiais propostos o que sabia fazer.

Percebemos, também, a dificuldade que encontrou para conceituar e generalizar conceitos, pois a cada breve explicação do que significava um termo ou expressão, realizava a atividade corretamente. Não se interessou por materiais de leitura e escrita que estavam na caixa e quando tentou ler algo (rótulos, enunciados...) que lhe chamou a atenção, leu em voz baixa ou com os olhos de maneira quase imperceptível. Essa atitude representou sua insegurança, medo ou vergonha de expor algo que ainda não sabia fazer sozinho, em especial ler e escrever, ficando evidente em cada tentativa suas dificuldades.

Durante a escrita dos enunciados e títulos das atividades realizadas, não apresentou antecipação de ideia quanto ao que ia escrever, e tudo o que escreveu perguntou se era “junto ou separado” (segmentação). Essa atitude levantou a suspeita de que ele escreveu a partir do que viu na imagem e não de forma contextualizada ou objetivada com seu pensamento. Isso demonstrou que não tinha ampliação de ideias e mediação dos conteúdos escolares no que tange ao ensino da linguagem escrita, pois todas as hipóteses levantadas na E.O.C.A caminharam para a possível falta de um ensino sistematizado, distanciando assim, a ideia de um diagnóstico que envolveu a dificuldade proveniente de algum distúrbio ou transtorno. A discussão apresentou algumas questões da leitura, mas nesse momento leitura e escrita estão interligadas, pois quando escreveu não conseguiu decodificar suas próprias produções, bem como interpretá-las.

Nos exemplos abaixo foi possível observarmos, na forma como organizou as atividades, que ainda mantém características de crianças que estudam na Educação Infantil. As produções chamaram a atenção pelo colorido e pelos materiais que utilizou: cola colorida, tinta guache, recorte, colagem e massinha. Há dois indicativos prováveis que precisam ser confirmados ao longo do diagnóstico: de que está tentando suprir o período em que não frequentou a Educação Infantil, consumindo todo o material oferecido na avaliação ou, não tem contato com

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esses materiais no seu dia a dia escolar.

Nesse sentido, o seu interesse ainda estava focado somente nas atividades lúdicas porque lhe trouxe prazer e exigiu menos o contato com a leitura e a escrita.

Figura 7- Recorte e colagem - Título: “Os carros”Fonte: Acervo da autora.

Figura 8- Colagem - Título: “Artes”Fonte: Acervo da autora.

Figura 9- Pintura -Título: “Nada a ver”

Fonte: Acervo da autora.

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Para finalizarmos a aplicação da entrevista foram necessárias duas sessões.

Na última, pegou a caixa de massinha e tentou ler o rótulo: “massa de... Ah! Pensei que era de morder, mas é de modelar”. Ao perguntarmos se sabia o que queria dizer aquilo que leu, respondeu que já tinha visto na escola, mas não sabia o que era modelar. Depois do pré--conceito sobre “modelar” que ouviu da avaliadora, L. F. utilizou a massa de modelar e criou várias figuras como aranha, cobra e as letras5 do seu nome, com todos os detalhes. Como fez com os outros materiais, também, consumiu toda a massinha.

Teia da aranha

Figura 10 - Modelagem com massinha - Título: “Os animais e Obra de artes”Fonte: Acervo da autora.

Nessa atividade, deparou-se com uma palavra que não soube o significado. Quando a avaliadora disse que precisava “fixar” a teia para ela parar em pé, ele perguntou: “O que é isso?”. Mais uma vez percebemos a dificuldade de apropriação de vocabulário e acesso a conceitos de termos frequentemente utilizados na sociedade letrada.

Análise das Provas Projetivas Psicopedagógicas

Segundo Paín (1986), o objetivo das Provas Projetivas Psicopedagógicas (PPP) é investigar a relação (vínculos) do sujeito com a aprendizagem e em quais circunstâncias que isso se

5 As letras do nome não foram registradas para preservar a identidade da criança.

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dá, considerando a estrutura básica da personalidade e as relações sociais e culturais que o sujeito está inserido.

Ao verificarmos os vínculos que L. F. estabeleceu com a aprendizagem, no domínio escolar, percebemos que ele não se colocou em situação de aprendizagem formal (em sala de aula). Isso pode ser um indicativo de pouca interação entre professor e aluno ou forma de revelar sua carência de atenção ao que consegue realizar sem ajuda, como se estivesse tentando mostrar, nas atividades realizadas nas sessões com a avaliadora, o que tem de melhor em si, ou seja, “alguém está olhando para mim, para aquilo que eu já sei fazer sem ajuda”, ou ainda, “não sei ler e escrever direito, mas sei fazer outras coisas”. Dessa forma, podemos dizer que L. F. estabelece vínculo melhor com a aprendizagem assistemática. Nesse caso, como irá se apropriar da escrita, sem receber aprendizagem sistematizada e organizada? Será que sua presença na escola está provida de sentido? O tempo todo demonstrou medo em errar o que fazia (apagou e desenhou, perguntando, constantemente se estava bonito). Não soube responder, imediatamente, o que aprendeu e o que ensinou. Isso pode ser indicativo de que está sendo cobrado de L. F. aquilo que ele ainda não sabe fazer, mas também não está sendo ensinado de forma organizada, promovendo sua aprendizagem. Com a possível falta de sistematização, pouco utilizou de instrumentos e signos para representar seu pensamento no desenho, assim como na fala e na escrita, pois quando falou sobre os amigos, disse apenas que eram legais.

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Figura 11- Par educativoTítulo: “O aprendizado”Fonte: Acervo da autora.

Figura 12- Eu com meus companheirosTítulo: “Os meu amigo”Fonte: Acervo da autora.

Relatou que preferia sentar no fundo da sala, sozinho, que era “pra ninguém encher o saco”. Essa atitude indicou vínculo negativo com a aprendizagem e/ou com a professora ou ainda pode significar sentimento de rejeição. Representou a figura humana sem os olhos, a boca, o nariz, a orelha, as mãos, os pés, os dedos, o cabelo e o pescoço, demonstrando a dificuldade de expressão de afeto. Todos estavam sentados de perfil, olhando para baixo e com as mãos sobre a mesa. A mesa da professora estava vazia e ela não apareceu na cena podendo indicar

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a falta de motivo para apreender os conteúdos específicos, inclusive ler e escrever, pois não encontrou motivos que o despertasse para aprender.

O vazio de objetos e recursos que apareceu na sala de aula pode representar o vazio de conteúdo, de expectativas, de significado que a escrita tem para que ele se apropriasse do mundo letrado. Com tantos indicativos que demonstraram a falta de vínculo com a aprendizagem, podemos compreender melhor o percurso realizado por L. F. no processo de ensino e aprendizagem.

Figura 13- O plano da sala de aula - Título: “Minha sala”Fonte: Acervo da autora.

Foi nesse momento que, também, falou sobre sua paixão por cavalos e, quando a avaliadora perguntou se na escola pensava em cavalos, ele respondeu “o tempo todo...sabia que eu daria um olho por um cavalo?” A falta de vínculo com a aprendizagem também pôde ser presenciada nessa fala, uma vez que o foco dele em situação de aprendizagem estava voltado para pensamentos externos ao do ensino. A apropriação da linguagem escrita nesses momentos, ou de qualquer outro conhecimento, seria algo secundário.

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Ao analisarmos o domínio familiar, demonstrou que os vínculos afetivos estavam preservados, porém não tinha acompanhamento da família em suas tarefas de casa, pois disse “minha mãe trabalha muito, de manhã e de tarde e a noite ainda estuda” e “meu pai fica fazendo a janta ou vendo TV”. Por isso, desenhou a mãe em seu trabalho, separada dele e do pai. O que chamou a atenção foi a semelhança do desenho da sala de aula em que a mãe estuda e de sua sala de aula, representada em prova anterior. Essa semelhança pode ser um indicativo de que refletiu na professora (vínculo negativo) a falta que sente da mãe.

Figura 14- Família EducativaTítulo: “A minha família”Fonte: Acervo da autora.

Segundo L. F., as pessoas ficaram na sala porque é nesse lugar que todos ficam juntos (vendo TV), dizendo que “é na sala que eu faço minha tarefa, em cima do braço do sofá e vendo TV, às vezes meu pai me ajuda”. Percebemos, nessa prova, que em casa não há uma organização para a realização das tarefas. A organização externa, tanto na escola quanto em casa, colabora para que a criança se organize internamente, mas isso a criança não adquire naturalmente, é preciso que seja ensinado a ela. Nesse sentido, como L. F. irá organizar seu pensamento no ato de escrever, o qual exige constante movimento do pensar, se não está inserido em um contexto que propicie o seu desenvolvimento?

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Avaliação da Leitura e da Escrita e Análise das Provas Pedagógicas

Não foi possível, no primeiro momento, aplicarmos provas e testes sistematizados referentes à escrita porque quando solicitamos para ler um texto lúdico, demonstrou que o ato de ler exigiu--lhe um grande esforço, ocasionando tensão muscular. Sua primeira reação foi de recusa e “vergonha”. Na primeira sessão entrou na sala e perguntou diretamente: “Você vai pedir pra mim ler e escrever texto?” Foi visível em seu corpo o relaxamento muscular quando ouviu a resposta “Hoje nós faremos outras atividades”. Aos poucos introduzimos situações de leitura e escrita como ler os enunciados, os rótulos, panfletos e as páginas das revistas que lhe cha-mavam a atenção (material utilizado em outras provas).

Posteriormente a essas observações, pedimos que lesse um texto curto sobre a história de dois cavalos. Apresentou dificuldade com a leitura, leu palavra por palavra (sílaba por sílaba) sem inflexões e ignorou as pontuações do texto. Acompanhou a leitura com os olhos, omitiu palavras e inverteu sílabas, cometeu erros em palavras comuns e perdeu-se no texto (pulou linhas ou palavras), sendo necessário retomar várias vezes a leitura da mesma palavra ou frase. Reconheceu várias tipologias textuais associadas ao tema em questão. Exemplo: “Onde podemos ler uma notícia? Como descobrir onde fica a capital do Paraná?” (avaliação de leitura). Não respondeu adequadamente às questões relacionadas à compreensão do texto lido (Interpretação textual), emitindo respostas incoerentes ao que foi pedido.

Recusou-se, em um primeiro momento, a escrever texto, mas foi possível verificar, durante uma brincadeira de listagem de palavras, a escrita delas com erros ortográficos e trocas de letras como S/Z, S/C, S/SS, ~/N e palavras sem acentos como PASSARO e TELEFONICA.

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Figura 16 - Listagem de palavrasFonte: Acervo da autora.

Na aplicação do teste TDE (Teste de Desempenho Escolar), instrumento psicométrico de avaliação, desenvolvido por Lilian M. Stein, o qual analisa o desempenho escolar da escrita, aritmética e leitura, indicando quais áreas da aprendizagem estão preservadas ou prejudicadas.

Das 34 palavras que escreveu, apresentou 14 acertos e 19 erros. Os erros mais frequentes foram: início de palavras com SS, RR, trocas como L/U e Z/S. Na avaliação da leitura leu 10 palavras corretamente de maneira lenta e soletrada. Na análise dos resultados, a classificação referente à leitura e à escrita foi inferior com previsão de escore bruto abaixo de 7 anos de idade. L. F. tem 9 anos, então apresentou um nível de aprendizagem escolar esperado para uma criança com idade inferior a 7 anos.

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Figura 17 - TDE: área escritaFonte: Acervo da autora.

Para confirmarmos as hipóteses levantadas sobre a dificuldade com a escrita, foi proposto a L. F. que produzisse um texto a partir de uma história que ele contou sobre um menino que se perdeu dos pais. Na produção textual percebermos dificuldades de escrita voltadas ao domínio da ortografia, coesão, expansão de ideias, além da falta de pontuação.

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O menino perdido

Era uma vez um menino chamado Romeu a mãe dela falou Romeu vai levar redebou para vóvo ele foi corendo para casa da vóvo ele levou e chogou o lobomal estava mordeno a vovo a vovo ficou quenem o popai em jeu (encheu) o lobo mal de bulacha eles vivero feliz para sempre mas o lobo não. FIN

Transcrição do texto.

Figura 18- Produção textual IFonte: Acervo da autora.

Observação e Análise do Material Escolar

O material escolar apresentou-se sem zelo: capas coladas com fita adesiva, bordas e cantos corroídos, “orelhas” e rasgos em todas as páginas e desenhos sem conclusão. Esse “desleixo” pode ser uma expressão da dificuldade de leitura e escrita, uma forma de expressar o distanciamento que apresenta com essa área do conhecimento.

As tarefas de casa e atividades foram concluídas, porém a correção das atividades, realizada pela professora, apareceram somente no caderno de língua portuguesa. As correções restringiram-se apenas à ortografia e foram feitas acima da palavra “errada”, não trabalhando, em seguida, a reescrita do texto, o qual apresentou, também, outros itens importantes (já mencionados) a serem avaliados e trabalhados com L. F. como coesão, expansão de ideias e discurso coerente ao que foi proposto. Observou-se com isso que não houve mediação sistematizada e organizada da ação pedagógica voltada para o processo de alfabetização.

No texto abaixo, por exemplo, produzido na escola, podemos detectar a falta dos requisitos mencionados acima, para a produção de uma escrita contextualizada e provida de sentido.

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Partindo da iniciação “O gato que mudava de casa”, escreva um texto para a avaliação de Português.

Era uma vez uma gata chamada Mimi ela gostava de dormir na casa.

Tinha um cachorro chamado Ispoti e a gata pulou do sofá efoi para a cozinha.

Deu um olé e conseguiu vencer ele e o dono deles dois não brigou mas nesa corrida agata que-brou a pata e ele foi para o veterinario”.

Transcrição do texto

Figura 19- Produção textual IIFonte: Acervo da autora.

Analisando esse material percebemos um contato ainda rudimentar, ou seja, em suas produções apareceram situações vividas em seu cotidiano que indicaram a falta do conhecimento de outras áreas, mediação e organização com os estudos realizados em casa e na escola. Indicaram, também, que não foram promovidos os motivos que o fizessem sentir necessidade em aprender de forma sistemática. O conhecimento que levou de casa não foi reconhecido, no espaço escolar, como aquele que apontaria os caminhos para o processo da apropriação da escrita e dessa, a aquisição de outros conhecimentos. Ou ainda podemos dizer que, o conhecimento que trouxe do senso comum não foi trabalhado de forma que promovesse a apropriação do conhecimento científico, pois como poderá apropriar-se dos

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saberes já constituídos pela humanidade se a via de acesso ao mundo letrado, a escrita, está prejudicada? Como promover a aprendizagem da linguagem escrita de forma que ele se desenvolva integralmente? A quem essa tarefa é direcionada?

Diante dessas inquietações, buscamos, na abordagem Histórico-Cultural, subsídios para responder a essas questões, discutindo as contribuições que essa perspectiva pode oferecer ao ensino da linguagem escrita, ao ensino escolar e a sociedade como um todo, pois estamos buscando uma escola de qualidade.

“MEU FILHO NÃO SABE LER E ESCREVER!” COMO SUPERAR AS DIFICULDADES DA LINGUAGEM ESCRITA?

Inicialmente, vimos o surgimento da escrita na História enquanto ferramenta e com uma função social explícita. Pensando na apropriação desse conhecimento, enquanto via de acesso aos saberes eruditos, questionamos: é possível superar as dificuldades de aprendizagem da linguagem escrita? O que significa dominar um conhecimento, no caso, a escrita?

No capítulo anterior, nos deparamos com um de tantos outros resultados de um ensino fragmentado e sem sentido do “ler e escrever”. Então, quando pensamos em L. F. e no percurso que ele fez para aprender, percebemos que a escrita ocupou um espaço restrito no caminho percorrido para se alfabetizar, ou seja, a alfabetização não se consolidou e consequentemente, os vínculos com a aprendizagem sistemática foram prejudicados. Diante disso, tomemos as análises realizadas nas provas e testes aplicados, como instrumentos para o levantamento de algumas hipóteses de diagnóstico e, em seguida, discutir possibilidades de superação dessa problemática, pautados nas contribuições da Teoria Histórico-Cultural.

No processo avaliativo, L. F. demonstrou atitudes de timidez, sentimentos de rejeição e impotência. Percebemos sua autoestima baixa e desmotivação com o ambiente escolar e aprendizagem sistemática, revelando que seus vínculos com a aprendizagem estavam

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afetados em relação aos conteúdos do processo de alfabetização (conceitos – caracterização e generalização; organização do pensamento;) e aos específicos da série. Nesse sentido, ficou prejudicada a apropriação da leitura e da escrita, a qual se apresentou “morta”, ou seja, esvaziada de conteúdo. Além disso, o material escolar e a as atividades aplicadas confrontam o diagnóstico de Déficit de Atenção (DA) direcionado à L. F. em 2008, pois apesar de não ser acompanhado de forma sistemática, suas atividades são terminadas e os alguns conteúdos absorvidos, mesmo que superficialmente.

Para compreendermos os motivos que impedem os avanços desse sujeito em se desenvolver, tomaremos como base os estudos de Vigotsky que parte do pressuposto de que o indivíduo aprende quando se apropria cientificamente daquilo que é elaborado ao longo da história da humanidade, internalizando os meios cognitivos de compreender o mundo e poder transformá-lo. Buscaremos na abordagem histórico-cultural, princípios que permitem compreender a relação entre o ensino e a aprendizagem, de modo que possamos pensar nos elementos fundamentais para que ocorra a apropriação de conhecimentos por parte dos alunos, diminuindo, assim, histórias de insucesso escolar que têm sido tão frequentes na contemporaneidade.

Segundo Vigotsky, o “bom ensino” é aquele que promove o desenvolvimento psíquico, que se adianta ao desenvolvimento, ou seja, “[...] uma correta organização de aprendizagem da criança conduz ao desenvolvimento mental [...]” (VIGOTSKY, 2006, p. 115). Desta forma, entendemos que, se o ensino escolar for desenvolvido e organizado com atividades sistematizadas e de qualidade, esse promove o desenvolvimento das capacidades intelectuais da criança, bem como, “[...] a escola, possibilitando o contato sistemático e intenso dos indivíduos com os sistemas organizados de conhecimento e fornecendo a eles instrumentos para elaborá-los, mediatiza seu processo de desenvolvimento [...]”. (FONTANA; CRUZ, 1997, p. 66).”

Também é essa a compreensão de Saviani (2005), para ele o trabalho educativo é o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens. E completa dizendo que a escola deve ser “[...] um espaço organizado de forma sistemática com o objetivo de possibilitar o acesso à

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cultura erudita [...]” (SAVIANI, 1995, pp. 27-28). Para Saviani, a transmissão do conhecimento erudito é o ponto primordial do ensino escolar, ou seja, a escola é o espaço que oportuniza a transmissão do conhecimento científico convertido em “saber escolar”, em processo de transmissão-assimilação. O acesso a esse saber ocorre na medida em que dominamos a linguagem na qual grande parte dele está sistematizada: a escrita.

Partindo dessa premissa, entendemos que a promoção do desenvolvimento depende “do que se adquire e de como se adquire” (KOSTIUK, 2005, p. 48). Ou seja, depende do conteúdo adquirido e como ele é adquirido. Segundo o autor, o domínio de um objeto de estudo “perfeitamente determinado” não garante a promoção do desenvolvimento real. É pelo desenvolvimento do pensamento da criança que isso ocorre, ou seja, da capacidade de ela “analisar e generalizar os fenômenos da realidade, de raciocinar corretamente”. Resumindo, é necessário:

[...] desenvolver “no todo” as faculdades mentais. Se se pretende alcançar esta meta, tem de se encontrar uma solução satisfatória para os problemas do ensino. O desenvolvimento do pensamento lógico é um dos fatores mais importantes do sucesso escolar. Todavia, isto não significa que qualquer ensino contribua para garantir esse desenvolvimento [...] (KOSTIUK, 2005, p. 50).

De acordo com essa perspectiva, o ensino não pode restringir-se apenas à transmissão dos conhecimentos, mas organizar-se de forma a favorecer o desenvolvimento de todas as características psíquicas. Quando falamos em apropriação do conhecimento, referimo-nos àqueles produzidos pela humanidade ao longo dos anos e adquiridos cientificamente na escola, porém os resultados do ensino escolar ainda são insatisfatórios como demonstramos em discussão no início da pesquisa.

Para Leontiev (1967, p. 266), a criança encontra-se em um mundo criado e transformado pela atividade humana “das gerações precedentes”, ou seja, ela não “está” apenas neste mundo, mas vive e atua sobre ele, utilizando “[...] instrumentos, idioma e lógica já elaborados pela sociedade. Para Eidt (2009, p. 2), a criança não possui ‘aptidões preparadas de antemão’ para realizar essas tarefas [...]” e a formação dessas aptidões acontece de acordo com o

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processo de domínio, pelo indivíduo, do patrimônio cultural produzido pela humanidade ao longo do processo histórico. Então, “[...] não basta que os indivíduos sobrevivam, é preciso que realizem atividades que reproduzam a realidade reproduzida historicamente pelos homens [...]”, de acordo com Duarte (1996, p. 32) ou, ainda, que:

[...] O indivíduo humano se faz humano apropriando-se da humanidade produzida historicamente. O indivíduo se humaniza reproduzindo as características historicamente produzidas do gênero humano. Nesse sentido, reconhecer a historicidade do ser humano significa, em se tratando do trabalho educativo, valorizando a transmissão da experiência histórico-social, valorizar a transmissão do conhecimento socialmente existente [...] (DUARTE, 1996, p. 93).

De acordo com o pensamento de Duarte (1996), a função da escola é transmitir o conhecimento científico, mas não qualquer conhecimento, e sim aquele produzido pela humanidade através dos tempos e em suas formas mais elevadas. Para o autor, o papel da educação é o de ampliar as aquisições culturais do indivíduo, mediante a apropriação dos conhecimentos científicos, produzindo novas necessidades, novos saberes e tendo como meta o desenvolvimento da sua individualidade como um todo. Evidencia-se que as necessidades humanas não são dadas a priori, mas são histórico-sociais, desenvolvidas pela sociedade nas crianças e adquiridas a partir das condições de vida e educação.

Nesse sentido “[...] a Psicologia Histórico-Cultural considera os processos de aprendizagem conscientemente dirigidos pelo educador como qualitativamente superiores aos processos espontâneos de aprendizagem [...]” (DUARTE, 1996, p. 91). O mesmo processo ocorre no desenvolvimento do psiquismo no indivíduo, no qual o papel da apropriação de experiências historicamente constituídas está presente. É o que afirma Luria (1979, p. 73):

[...] a grande maioria dos conhecimentos e habilidades do homem se forma por meio da assimilação da experiência de toda a humanidade, acumulada no processo da história social e transmissível no processo de aprendizagem. [...] A grande maioria de conhecimentos, habilidades e procedimentos do comportamento de que dispõe o homem não são o resultado de sua experiência própria, mas adquiridos pela assimilação da experiência histórico-social de gerações.

A atividade da consciência humana terá significado quando os conhecimentos forem

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adquiridos pela transmissão de outras pessoas, considerando que o indivíduo, assim como o conhecimento, são produtos sociais, ou seja, “[...] o indivíduo não pode elaborar seu conhecimento individual a não ser apropriando-se do conhecimento historicamente produzido e socialmente existente [...]” (DUARTE, 1996, p. 92).

Ao discutirmos a transmissão do conhecimento científico e a forma de como se dá a apropriação desse, devemos abordar, também, o desenvolvimento intelectual da criança em idade escolar, pois é nessa área que o educador irá atuar como transmissor do conhecimento. Essa questão pode tomar como base as pesquisas de Vigotsky (1993), as quais discutem os conceitos de “zona de desenvolvimento próximo” e “nível de desenvolvimento atual”. O referido autor inicia suas pesquisas mostrando que, para se analisar o desenvolvimento de uma criança, é preciso deter-se naquilo que ainda está em processo de formação e não naquilo que já está maduro.

[...] o desenvolvimento atual de uma criança é aquele que pode ser verificado através de testes nos quais a criança resolve problemas de forma independente, autônoma. Já a zona de desenvolvimento próximo abarca tudo aquilo que a criança não faz sozinha, mas consegue fazer imitando o adulto [...] (VIGOTSKY, 1993, p. 238).

Analisando o conceito elaborado por Vigotsky (1993), podemos observar que o nível de desenvolvimento de uma criança é definido por aquilo que ela sabe fazer com autonomia e por aquilo que ela faz com ajuda de outras pessoas. Para melhor compreendermos essa questão relevante ao processo do desenvolvimento, devemos discutir, também, o processo de imitação que, segundo Vigotsky (1993, p. 246), “[...] se a interpretarmos no sentido amplo, é a forma principal da instrução sobre o desenvolvimento [...]”, ou seja, a criança só poderá imitar aquilo que está presente na zona de desenvolvimento próximo, passando do que sabe para o que não sabe. A imitação é considerada o centro do conceito de “zona de desenvolvimento próximo e zona de desenvolvimento atual”, porém, aquilo que é imitação precisa possibilitar ao indivíduo a reprodução daquilo que é essencial ao conhecimento, ou seja, “a criança não pode imitar qualquer coisa” (DUARTE, 1996, p. 96).

Desta forma, compreendemos que não podemos ultrapassar a zona de desenvolvimento próximo, evadir aos limites do desenvolvimento da criança, pois ela não conseguirá

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resolver a situação proposta, mesmo com a ajuda do outro, não avançando em seu nível de desenvolvimento que, segundo Vigotsky (1993, pp. 244-245), “[...] ensinar a uma criança aquilo que é incapaz de aprender é tão inútil como ensinar-lhe a fazer o que é capaz de realizar por si mesma [...]”.

Essa fala de Vigotsky (1993, pp.244-245) nos remete ao ensino escolar e suas implicações, fazendo-nos refletir sobre os conteúdos escolares e a forma como estão sendo ensinados.

[...] quando observamos o curso de desenvolvimento da criança durante a idade escolar e no curso de sua instrução, vemos que na realidade qualquer matéria exige da criança mais do que esta pode dar nesse momento, isto é, que esta realiza na escola uma atividade que lhe obriga a superar-se. Isto se refere sempre à instrução escolar sadia. Começa-se a ensinar a criança a escrever quando, todavia não possui todas as funções que asseguram a linguagem escrita. Precisamente por isso, o ensino da linguagem escrita provoca e implica o desenvolvimento dessas funções [...].

O que podemos observar nessa afirmação é que o ensino escolar sistematizado, planejado e organizado desempenha papel fundamental na aquisição dos conhecimentos e desenvolvimento da criança. Esse ensino é o mediador entre o sujeito e os conhecimentos elaborados historicamente pela humanidade.

Nesse sentido, Vigotsky (1993, pp. 241-242) chama a atenção para um fato importante e relevante à prática pedagógica, o de não esperar que as capacidades da criança, necessárias para apreender um conteúdo, sejam amadurecidas para lhe transmitir o novo conhecimento, ou seja,

[...] o que a criança é capaz de fazer hoje em colaboração será capaz de fazê-lo por si mesma amanhã. Por isso, parece verossímil que a instrução e o desenvolvimento na escola guardem a mesma relação que a zona de desenvolvimento próximo e o nível de desenvolvimento atual. Na idade infantil, somente é boa a instrução que vá avante do desenvolvimento e arrasta a este último. Porém, à criança unicamente se pode ensinar o que é capaz de aprender. A instrução é possível onde cabe a imitação [...].

Portanto, a educação escolar assume o importante papel de transmitir os conteúdos que foram elaborados historicamente pela humanidade e necessários socialmente. Dessa forma, a educação não “espera” pelo amadurecimento das funções psíquicas do sujeito, mas estimula

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e condiciona seu desenvolvimento, “[...] é mediadora entre o cotidiano e o não-cotidiano na formação do indivíduo [...]”, conforme assevera Duarte (1996, p. 3), transformando a “[...] prática social global não de forma imediata, mas sim pela mediação da transformação dos sujeitos da prática social [...]” (SAVIANI, 1989, p. 82). Ou, ainda, como afirma Leontiev (1978), para a criança se humanizar, necessita apropriar-se dos resultados que foram produzidos e elaborados pela humanidade, isto é, apropriar-se, por meio da educação, da cultura produzida socialmente, dando continuidade ao processo histórico. Para esse autor, “[...] o movimento da história só é possível com a transmissão, às novas gerações, das aquisições da cultura humana, isto é, com a educação [...]” (LEONTIEV,1978,p. 273).

Com essa discussão entendemos que o professor tem a tarefa de ensinar à criança aquilo que ela ainda não é capaz de aprender sozinha porque:

[...] a mediação realizada pelo professor entre o aluno e a cultura apresenta especificidades, ou seja, a educação formal é qualitativamente diferente por ter como finalidade específica propiciar a apropriação de instrumentos culturais básicos que permitam elaboração de entendimento da realidade social e promoção do desenvolvimento individual. Assim, a atividade do professor é um conjunto de ações intencionais, conscientes, dirigidas para um fim específico [...] (BASSO, 1998, p.3).

O professor mediador atua na zona de desenvolvimento próximo, promovendo o desenvolvimento das capacidades que se encontram nesse nível e a apropriação dos bens produzidos historicamente pela humanidade. Em se tratando disso, Sforni (2004, p. 39) afirma que:

[...] na interação social não são transmitidos apenas conteúdos, mas também elementos que propiciam o desenvolvimento das capacidades de memória, atenção, abstração, generalização, dentre outras; ou seja, a forma de pensamento também é construída na atividade mediada [...].

Para efetivação dessa prática, faz-se necessário que o professor seja um profissional também cientificamente instruído, ou seja, que ele domine seu objeto de estudo, o qual deve estar enraizado na ciência. Somente nessa perspectiva é que ocorrerá a apropriação do conhecimento científico por parte do aluno de maneira sistemática, dando continuidade ao processo histórico de produção e transmissão cultural.

Ao tratarmos da natureza da apropriação do conhecimento escolar, estamos discutindo que o conhecimento científico não equivale a apenas classificar e conceituar as várias ciências. Pelo contrário, equivale a produzir uma síntese da atividade material e intelectual produzida pelas

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gerações anteriores, causando, desta forma, ampliação de generalizações conceituais que a aprendizagem reporta ao pensamento. Em outras palavras,

[...] a aquisição de conceitos científicos não significa apenas a assimilação de novas informações, mas a possibilidade de produção de um sistema de pensamento organizado, já que este dirige o pensamento para a própria atividade mental [...] (SFORNI, 2004, p. 84).

Diante dessa discussão, podemos considerar que o ensino formal e sistematizado desempenha um papel importante na conscientização da criança a respeito de seus próprios processos mentais, porque o ensino escolar promove a apropriação dos conceitos científicos e, por meio deles, se desenvolve o domínio e a consciência, além de transferir a outros conceitos e a outros níveis de pensamento, essa sistematização consciente, ou seja, “[...] a consciência reflexiva chega à criança através dos portais científicos [...]” (VIGOTSKY, 1987, p. 79).

Portanto, segundo Sforni (2004, p. 85),

[...] Pensar o conteúdo escolar e os próprios conceitos científicos na condição de produtos e instrumentos da atividade humana redimensiona o nosso olhar sobre os meios e prioridades de ensino. É possível, assim, entender por que aprender conceitos não é acumular conhecimentos, mas tomar posse do nível de consciência neles potencializados ao longo de sua formação. Nesse sentido, o domínio conceitual vai além da compreensão do significado presente na palavra, e impõe como condição para sua apropriação a atividade psíquica que internaliza a atividade material e externa determinantes do conceito [...].

Com base nessa compreensão, não é a quantidade de conceitos que determina a maior possibilidade de influenciar no desenvolvimento dos alunos, mas a qualidade que se destina à aprendizagem de generalizações desses conceitos, a qual, Sforni chama de movimento, pois:

[...] permite ao sujeito estar sob um processo de formação permanente, que o capacita a combinar diferentes conceitos, construir modelos e mobilizá-los para compreender, organizar, e produzir novos conhecimentos. Em outras palavras, adquire-se também metodologia para apreender conteúdos. A generalização conceitual é, ao mesmo tempo, conteúdo e instrumento de conhecimento [...] (SFORNI, 2004, p. 43).

Mas, como ensinar de maneira que o aluno não perca de vista a função social do objeto de estudo e, nesse caso, a escrita? Diante dessas questões podemos entender que, o ensino

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sistematizado desenvolve as capacidades intelectuais das crianças, porém, a busca do bom ensino deve pautar-se em seu sistema, o qual deve assegurar a apropriação pelas crianças “[...] de determinadas capacidades necessárias à realização de ações e operações já possibilitadas pelo nível de desenvolvimento científico alcançado, representado nos signos disponíveis na cultura [...]” (SFORNI, 2004, p. 46).

Não podemos olhar para essas questões apenas por um viés, pois sabemos que a organização do ensino não é determinada por um único aspecto, mas por uma “encruzilhada de culturas” (SFORNI, 2004). Portanto, nessa perspectiva, é primordial selecionar os conteúdos curriculares de maneira que seja abordado aquilo que é socialmente considerado relevante ao conhecimento.

Essa postura propõe um ensino que “[...] não se atenha ao imediatismo das exigências cotidianas e tenha como objetivo o desenvolvimento dos alunos através da formação do pensamento teórico [...]” (SFORNI, 2004, pp. 76-77), promovendo “[...] as capacidades psíquicas que permitam ao homem colocar-se como interlocutor consciente no âmbito social [...]” (SFORNI, 2004, p. 77).

Podemos considerar que tão importante quanto o domínio da escrita é a compreensão da finalidade social desse código numa sociedade letrada. Nesse sentido, pensar em uma alfabetização que permita “ao homem colocar-se como interlocutor consciente no âmbito social” significa trazer para o contexto da alfabetização os textos que circulam no âmbito social. Ou seja, é fundamental que as atividades de codificação e decodificação façam sentido para o aluno e, para isso, é necessário que elas estejam inseridas em situações de letramento.

Quando nos reportamos ao caso de L. F., podemos dizer que se ele tivesse se apropriado da linguagem escrita de forma organizada, planejada e direcionada à aquisição dos conceitos científicos, não faria parte do grupo de alunos que, mesmo sendo escolarizados, apresentam dificuldades com a língua materna. Um dos possíveis caminhos para a realização do trabalho interventivo é resgatar os conceitos que se perderam no percurso de sua escolarização, ou

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seja, é preciso que a escola ensine a L. F. os conteúdos escolares mais elementares, que não foram adquiridos nas séries anteriores. Porém, esse trajeto precisa ser percorrido em curto espaço de tempo, tendo em vista que está cursando a 3ª série e, nesse ponto da discussão, cabe ressaltar a importância do trabalho psicopedagógico atuando na recuperação dos mecanismos da aprendizagem a fim de promover a apropriação da linguagem escrita, fonte de outros conhecimentos.

E qual o papel dos profissionais envolvidos na educação e no processo de superação das dificuldades de aprendizagem, em especial a escrita, como o psicopedagogo? Como esse profissional pode colaborar na superação desses desafios? O psicopedagogo está diretamente ligado a esses fatores quando os casos lhe chegam à clínica. A esse, cabe a tarefa de compreender como ocorre, na escola, o processo de apropriação do código linguístico e qual sua função na sociedade em que estamos inseridos. Dessa forma, terá subsídios para compreender o indivíduo enquanto ser social e cultural, a fim de realizar uma avaliação pautada no contexto histórico, e direcionar a intervenção para a formação dos processos psicológicos superiores, dirigindo o desenvolvimento psíquico do indivíduo. Assim, será possível pensar em um trabalho coletivo e consubstanciado de sentidos, na busca por uma educação de qualidade.

CONSIDERAçÕES FINAIS

As discussões levantadas nesta unidade estão voltadas para uma educação escolar que forme homens que consigam interagir de forma consciente com o mundo, para isso ele deve apro-priar-se dos conhecimentos sistematizados “[...] incorporando-os como instrumento irreversí-vel, a partir do qual será possível conferir uma nova qualidade às lutas no seio da sociedade [...]” (SAVIANI, 1995, pp. 27-28). Ao refletirmos sobre os caminhos percorridos pela educação até aqui, vimos que ainda são muitas as perguntas, muitas as respostas em cada período vivi-do pela sociedade. A busca pela superação de uma educação fragmentada e que tem pouco impacto sobre o desenvolvimento dos sujeitos é ainda um desafio.

Se compreendermos a educação como prática social e como promotora do desenvolvimento dos sujeitos, percebemos que há vários espaços de formação humana, porém somente o espaço escolar é o local de acesso ao saber erudito porque, na escola, o conhecimento produzido pelos homens está consolidado nas ciências e nas artes, que se constituem em conteúdos escolares e é transmitido aos estudantes. Para que isso seja efetivado, é preciso

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compreender que a educação é:

[...] a influência e a intervenção planejadas, adequadas ao objetivo, premeditadas, conscientes, nos processos de crescimento natural do organismo. Por isso, só terá caráter educativo o estabelecimento de novas reações que, em alguma medida, intervenham nos processos de crescimento e os oriente [...] (VIGOTSKY, 2003, p. 82).

Nesse sentido, o papel do professor é imprescindível, pois ele é aquele que se apropriou do saber erudito, desenvolvendo condições de transmiti-lo ao aluno de forma planejada e sistematizada. Estendendo esse compromisso do “ensinar e do aprender” ao papel do psicopedagogo, podemos afirmar que esse profissional tem muito a contribuir ao ensino escolar e na superação das dificuldades de aprendizagem. Por ser especialista nessa área, entendemos que ele é o profissional que pode apontar, por meio de avaliação psicopedagógica, as possíveis causas da dificuldade do sujeito, bem como intervir nos processos de aprendizagem. Além disso, pode colaborar com a escola, orientando e sugerindo alguns caminhos interventivos, e com a família para que compreendam esse processo e atuem, como mediadores e não apenas como espectadores.

Concluímos esse trabalho, reforçando a necessidade de pensarmos em caminhos que promovam a aprendizagem da linguagem escrita, pois essa abre as portas para os conhecimentos das demais disciplinas escolares. Percebemos que o ensino deve ser organizado de maneira que torne o objeto de estudo uma necessidade ao aluno, e o motivo de aprender lhe seja despertado e isso se faz quando os conteúdos são relevantes a sua vida. Desta forma, a criança torna-se consciente do que está fazendo e aprende a usar suas habilidades conscientemente (VIGOTSKY, 1993).

É necessário ensinar a escrita como forma de se comunicar com o mundo exterior, porém, na escola “pouca importância se dá à escrita, ficando essa relegada à vida prática, produzindo formadores de um país não-leitor e não-escritor” (SÉRKEZ; MARTINS, 1996, p. 32). Logo, é no âmbito escolar que esse quadro deve ser revertido e, de acordo com Sérkez e Martins (1996, p. 33), é preciso explorar as paredes das salas de aula e os muros da escola para mostrar o importante papel da escrita num mundo cada vez mais complexo.

[...] é necessário, num primeiro momento, que o professor chame a atenção do aluno para a importância da escrita e onde ela é utilizada na sociedade, para então, através das práticas da leitura e produção, inserir o aluno no seu universo, trabalhando a escrita em suas diferentes funções [...] (SÉRKEZ; MARTINS, 1996, p. 33).

Nessa perspectiva, trabalhar o processo de ensino da escrita é uma necessidade e um desafio que devem ser enfrentados para que possamos formar sujeitos não apenas escolarizados, mas

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leitores e escritores que dominam os instrumentos simbólicos, ampliando a sua capacidade de interação com o mundo.

ATIVIDADE DE AUTOESTUDO

1. Agora que você compreende a importância da leitura e da escrita para o nosso processo de humanização, discuta com o seu grupo de estudos o caso de um aluno, ou um caso da própria literatura,queapresenteadificuldadedeaprendizagemnessaárea,e façaumasíntese de aproximadamente 20 linhas, apontando os caminhos para a superação do mes-mo, de acordo com as postulações apresentadas pela autora da nossa unidade.

2. ExpliciteaposturadeVigotskyacercadadificuldadedeaprendizagemquantoàleituraeàescrita.

3. Faça uma síntese sobre a importância da escrita para a humanidade, dentro de um contex-to histórico e cultural.

GARCÍA, Jesus Nicasio. Manual de difi culdades de aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.Livro:ManualdeDificuldadesdeAprendizagem:LINGUAGEM,LEITURA,ESCRITAEMATEMÁTICAAutor: Jesus Nicasio Garcia Editora: Artmed Número de Páginas: 274

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151PROBLEMAS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA INFÂNCIA | Educação a Distância

Acesseosite<www.brasilescola.com>,fiquepordentrodasdiscussõessobredificuldades,problemase transtornos de aprendizagem.

“Acriançanãoéadificuldadeouoproblemadeaprendizagem,elaestácomoadificuldadeouoproblema de aprendizagem”.

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UNIDADE IV

DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM – ENTENDENDO TERMINOLOGIAS E CONCEITUAçÕESProfessora Me. Gescielly Barbosa da Silva TadeiProfessora Me. Márcia Regina de Sousa Storer

Objetivos de Aprendizagem

• Entenderadiferençaentredistúrbioetranstornodeaprendizagem.

• Compreenderofocosocial,históricoeculturalaolidarmoscomacriançacomdifi-culdade ou transtorno.

• Observarasdificuldadesquantoàlinguagem/leitura/escrita/matemática/relaçõese movimentos.

• Verificaraatuaçãodocentejuntoàcriançacomdificuldadeemsaladeaula.

Plano de Estudo

A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:

• Dificuldade e Transtorno de Aprendizagem

• Nomenclaturas quanto às dificuldades e transtornos de aprendizagem

• Intervenção docente

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INTRODUçãO

Será nosso intuito estudar na presente unidade os problemas e dificuldades de aprendizagem. Para tanto, a diferenciação entre dificuldade e distúrbio será contemplada.

Para exemplificação acerca da postura profissional a ser desempenhada ao acompanharmos uma criança com dificuldade de aprendizagem, traremos o caso fictício de uma criança chamada Sara.

Quantos às especificidades das dificuldades e distúrbios trabalharemos as dificuldades quanto à linguagem; escrita; matemática; relações e movimentos; hiperatividade; Transtorno de Atenção - TDA; Transtorno de Atenção e Hiperatividade TDAH.

Além disso, será abordado uma possibilidade de intervenção com crianças com dificuldade de aprendizagem pelo professor em sala de aula.

PROBLEMAS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM

Observamos, na Unidade III, que para levantarmos os aspectos pertinentes ao quadro de dificuldade de aprendizagem de uma criança, precisamos ter, em primeiro lugar, fundamentação teórica, afinal, é necessário entender sobre o que estou trabalhando.

Em segundo lugar, preciso conhecer bem a minha criança, realizar uma boa anamnese com os pais, e sair do “eu acho” para o “eu penso que”. Não julgar e não “enquadrar os sintomas da criança é uma atitude fundamental”.

Iniciar o trabalho com a criança partindo do pressuposto de que ela consegue, sem pré-jul-gamentos e nem colocações sobre possíveis incapacidades. Nossa crença no processo de crescimento do indivíduo é de extrema importância para o crescimento dele.

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Durante o trabalho, observamos que é necessária a proposta de atividades que beneficiarão e estimularão a área em necessidade de crescimento.

Com esses passos podemos afirmar que realmente o respeito para com o processo de desenvolvimento da criança estará em pleno progresso.

ENTENDENDO UM POUCO MAIS SOBRE AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM

Para compreender os fatores que ocasionam problemas na aprendizagem, segundo a neuropsicologia, é importante voltar-se ao estudo sistêmico (sistema organizado por meio de métodos pré-definidos) da condição humana por intermédio de três dimensões: a causa, o processo e o sintoma.

No estudo da causa, os fatores geradores do possível “problema”, o estudo do processo ocorre por meio da investigação das funções mentais superiores (as estruturas sensoriais, cognitivas, motoras, perceptuais) que articulam este indivíduo e no resultante de todas essas dimensões encontramos o sintoma, efeito da problemática do sujeito, a qual é manifesta dentro do ambiente escolar.

DIFERENCIANDO AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM DOS DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM – O CUIDADO AO LIDAR COM O SER HUMANO

Dificuldade significa qualquer tipo de alteração no processo de aprendizagem da criança, considerando, para isso, o ensino escolar como um todo, ou seja, o aspecto relacional, a aprendizagem formal dentre outros. As dificuldades são consequências de causas extrínsecas ao indivíduo, por vezes, transitórias e com a devida intervenção são extintas. Podemos considerar inúmeros fatores (socioculturais, emocionais, físicos e metodológicos).

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Para Moojen (2009, p. 1, grifos nossos), em geral a primeira pessoa a identificar dificuldades na aprendizagem é o professor. Muitas crianças não apresentam maiores dificuldades em casa; ao entrarem na escola evidenciam dificuldades para acompanhar os colegas ou entender as propostas pedagógicas. É importante destacar uma classificação:

Dificuldades naturais: corresponde às dificuldades que todos os indivíduos possuem em alguma disciplina e em algum momento acadêmico. As causas podem estar relacionadas a aspectos evolutivos decorrentes de metodologia inadequada, conflitos familiares e faltas freqüentes na escola. Dificuldades secundárias: corresponde a dificuldades dentro de um quadro diagnóstico na área neurológica ou psicológica. Incluindo casos de portadores de deficiência mental, sensorial e transtornos emocionais.

As causas das dificuldades de aprendizagem são reveladas a partir de um levantamento de hipóteses realizado por um especialista da área (psicólogo escolar/educacional; psicopedagogo; neuropediatra), no qual estão relacionados fatores biológicos, emocionais, familiares e sociais.

Alterações bruscas de comportamento como, por exemplo, uma criança que, comumente, comporta-se de maneira tranquila, amorosa e de maneira “repentina” passa a manifestar um tom mais agressivo, revoltado ou indisciplinado, merece a nossa atenção enquanto educadores.

Crianças que não permanecem sentadas nas carteiras são irrequietas, falantes ou quietas demais, não gostam de perder ou receber um “não” como resposta, choram, fazem birra, batem nos colegas ou em si próprias, expressam, também, que não estão bem, essa é uma maneira de externalizar o que incomoda. Pais, familiares, amigos e professores precisam estar atentos para não agirem somente por meio da punição, mas também por meio da observação e da escuta.

Desajustes familiares, irresponsabilidade para com o cuidado da criança, desafeto entre o casal dentre outros agravantes, resultam em problemas emocionais que futuramente podem evoluir para um quadro de instabilidade emocional.

É na escola que encontramos o ambiente propício para a manifestação de algumas questões relativas ao comportamento, haja vista que é um ambiente no qual convivem seres humanos

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em relação, e onde há relação há a eclosão de conflitos, de manifestações comportamentais e de dificuldades, ou seja, há a reprodução de problemas sociais, familiares que podem acentuar alguns tipos de problemas de aprendizagem.

Sendo assim, não podemos tratar da questão da dificuldade se não observarmos as questões referentes ao contexto social, histórico e cultural, sem observarmos o processo de ensino. Afinal, a “culpada” pela dificuldade de aprendizagem não é a criança. Fazer uma redução a culpado e inocente não favorece o encaminhamento de todo o processo de superação da referida questão.

A dificuldade de aprendizagem nos remete ao ato de aprender, que é uma ação dificultosa. Quando nos pomos a aprender, buscamos significado para aquilo que não sabemos que nos é difícil de compreender.

Chamamos a sua atenção para a seguinte colocação, imaginem que chegue até você o caso de uma aluna chamada Sara de 11 anos de idade, mas que ainda frequenta o segundo ano do ensino fundamental I. A queixa é a de que Sara é uma menina com dificuldades de aprendizagem, não conseguiu apreender o processo de leitura e de escrita e que ainda tenta compreender os processos matemáticos. Suponha que quem lhe passou o caso foi a supervisora educacional e que esta pediu o acompanhamento da psicóloga da escola.

O primeiro ponto a destacarmos é a tendência, ainda na época atual, de o psicólogo atender ao aluno de forma individual, chamando-o reservadamente à sala do colégio e aplicando alguns testes psicológicos que avaliam e classificam o aluno de acordo com o seu desempenho. Segundo Patto (1987), isso ocorre devido ao fato de a Psicologia ter surgido no Brasil no Período da Primeira República desenvolvendo-se em laboratórios anexos às escolas ou instituições paraescolares voltada à experimentação. Anos mais tarde, a Psicologia atuou como uma espécie de “oráculo” destinando e selecionando os mais “aptos” na educação ou em atividades profissionais, utilizando-se basicamente de testes psicológicos.

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Facci (2004) compartilha dessa opinião ao afirmar que a Psicologia enquanto ciência surgiu a partir de condições históricas determinadas, partindo de uma visão clínica no sentido de diagnóstico e de tratamento dos problemas de aprendizagem e de uma visão psicomotricista.

Analisando esse contexto, percebe-se que a Psicologia desenvolvia seu trabalho dentro de um contexto histórico, e que atendia a demanda cogitada na época. Entretanto, atualmente esse tipo de postura ainda é utilizado. Bem, pode-se cogitar que a psicóloga pode ter se sentido tentada a chamar a criança em sua sala e fazer uma análise do caso, seria mais rápido, economizaria tempo e a professora teria um “resultado” comprovado cientificamente em suas mãos.

Depois de ouvir a queixa da professora, Luiza dirigiu-se até a sala da supervisora da escola, e perguntou à mesma sobre a aluna Sara. A supervisora pôs-se então a comentar que o caso remete-se a uma desestrutura familiar, e que a criança sofreu um acidente aos cinco anos e que bateu a cabeça. Embora, o neuropediatra diga que está tudo bem com Sara, parece que a escola não está tão confiante assim no diagnóstico.

Veja, a preocupação não está pautada no conteúdo escolar, visto que especulações quanto à família de Sara e seu acidente sofrido há muito tempo ocupam o primeiro plano da discussão.

Ao recorrermos a Bock (2000) encontramos que a tarefa da escola é pautada na transmissão do conhecimento adquirido historicamente. Nessa perspectiva, especula-se que essa não tem sido a fundamental preocupação no caso da aluna Sara. Parece que há a necessidade de que Luiza comprove que Sara não é capaz de aprender em uma sala de crianças ditas “normais”. Cogita-se uma culpabilização da criança e da família sobre a suposta incapacidade da criança, afinal, a família é carente, Sara não tem mãe, tem vários irmãos... essa é justamente a visão liberal acerca do homem, onde segundo Bock (op.cit.), esse é visto como um ser cheio de capacidades e potencialidades que podem ser manifestadas no decorrer da vida. É a ideia de natureza humana, a qual traz a questão da essência, da semente de homem que desabrocha conforme é estimulada e adequada ao meio social. Nesse sentido, se Sara não aprende é

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porque alguma coisa está errada, e cabe à psicóloga desvendar esse mistério, afinal a menina está comprometendo o bom andamento da turma!

A psicóloga para e se põe a pensar no que poderia fazer enquanto psicóloga, visto que a demanda cobrava de forma encoberta o alvará quanto a um possível “problema” que impedia o aprendizado de Sara. Será que estava ocultado aí o desejo de que a aluna repetisse a incrível façanha do Barão de MÜNCHHAUSEN?1 Nesse momento a psicóloga percebeu a onipotência com que sua profissão estava sendo encarada, ela podia “decidir”, colaborar para o possível trajeto a ser traçado na vida escolar de Sara.

Ao ler a ficha escolar da criança, a psicóloga viu que a menina participava de um grupo de apoio psicopedagógico em uma clínica escola de Psicopedagogia. Decidiu então, procurar a psicopedagoga responsável por Sara.

Esta colocou que a menina realmente não estava alfabetizada, mas que desde que começou a frequentar o grupo de apoio psicopedagógico ela havia progredido muito. “Agora Sara constrói frases inteiras, seu raciocínio matemático melhorou muito, e atualmente quando comete algum erro já consegue corrigi-lo”. De modo geral, Sara está acompanhando o conteúdo da segunda série escolar, embora haja uma defasagem quanto a sua idade para com a mesma.

O que estava acontecendo então? Nesse grupo de apoio psicopedagógico Sara estava mostrando um bom desempenho, será que na sala de aula ela não estava conseguindo expressar o que estava aprendendo?

A psicóloga decidiu procurar a professora do primeiro ano do ensino fundamental para obter mais informações. Esta lhe disse que a menina realmente tinha muita dificuldade, mas que no final do ano ela já havia progredido muito e que acompanhava a turma. Mais um dado a somar no levantamento realizado, a menina apresentou progressos sim... mas, por que esse progresso não estava sendo percebido?1 História do Barão que ao cair em um brejo e afundar até o pescoço consegue, pela força de seu próprio braço, puxar-se pelos cabelos não somente a si, mas também a seu cavalo, o qual segurava fortemente entre os joelhos.

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A fim de conseguir mais informações a respeito do caso, a psicóloga resolveu observar algumas aulas da professora de Sara, ao total foram 4 observações. Resolveu fazê-las com um intervalo de 2 dias para que a professora e também os alunos se acostumassem com a sua presença.

Percebeu que Sara se comportava de acordo com o contexto da sala de aula que era composta por crianças com idade entre 7 e 8 anos. A menina conversava com os colegas, no entanto era nítido perceber que algumas crianças a deixavam isolada, principalmente aquelas popularmente nomeadas de “preferidas da professora”. Sara demonstrava a necessidade de que a professora lhe escolhesse ou elogiasse sua atuação em algo que havia feito. A psicóloga não percebeu desatenção, a aluna acompanhava o ritmo da sala de aula e tinha a matéria em dia. Cometia erros tal qual os demais alunos. O que estava acontecendo então? Será que era a personificação da personagem JACK?2

A psicóloga percebeu que tinha um extenso material em mãos. Profissionais apontavam para a melhora da aluna: a professora do primeiro ano, a psicopedagoga do grupo de apoio psicopedagógico, e agora havia sua própria opinião, pois havia constatado que a menina estava aprendendo e progredindo, então, decidiu ter uma conversa com a professora, no entanto, não queria que essa conversa acontecesse na hora do intervalo, então pediu para que a professora fosse até a sua sala no horário de sua “hora atividade”.

Antes, porém do encontro com a professora, a psicóloga decidiu conversar com Sara e também aplicar um teste (TDE) na criança. Mas decidiu fazer isso apenas para que seus dados tivessem crédito perante a docente. Assim o fez. Na conversa com Sara, ficou explícita a importância da figura da professora na vida da menina e a necessidade dessa em agradar a professora. Mencionou informações como: “[...] de vez em quando ela implica com as minhas pulseiras, aí

2 História de um menino que tem uma rara doença que o faz crescer e envelhecer em uma velocidade acima do normal. Os pais têm dificuldades em lidar com o problema, Jack aos 10 anos tem vontade de ir para a escola, mas ao adentrar esse ambiente começa ser alvo de piadas e chacotas dos colegas que o consideram diferente e muito mais velho que eles. É um filme que mostra a ansiedade frente ao novo e o conflito entre a exigência pela postura adulta de uma criança de 10 anos que possui comportamento infantil. Autor: Robin Williams, ano: 1996.

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eu tiro, mas quando eu quero usar eu coloco na hora do recreio [...]” “[...] não sei por que ela não deixa eu sentar na primeira carteira, todo mundo senta só eu não”. Sara mostrou-se uma menina desinibida e aceitou fazer o teste. O resultado desse teste apenas confirmou aquilo que já era conhecido, Sara está na faixa exigida para a segunda série primária e comete erros assim como todos os alunos. Com esses dados “comprovados” a conversa com a professora poderia partir de um nível mais concreto.

No dia da reunião, a professora chegou com um atraso de 10 minutos, a psicóloga percebeu que esta estava um pouco mais agitada que o normal, e que havia trazido uma atividade realizada meses antes pela aluna. Antes que a psicóloga começasse a falar, a professora disse que considera Sara uma menina normal, um pouco dispersa, mas normal.

Durante a conversa, a psicóloga foi apontando os resultados do teste, e suavemente foi colocando a opinião dos demais profissionais a respeito da aluna, e comentou que se está havendo mesmo esse progresso, é porque a professora está sendo um fator fundamental nesse processo. A professora corou suas bochechas, mas logo em seguida mostrou a atividade da menina e apontou frases onde essa havia escrito “nóis montemo as barraca”. A psicóloga pontuou que esse tipo de frase estava indicando o meio social vivenciado pela criança, mas que era possível mostrar para a menina que há outra forma de se escrever a língua portuguesa, forma essa diferente daquela falada.

Ao final da conversa a professora comentou que ainda havia muita coisa em que Sara poderia melhorar, principalmente nesses detalhes. Colocou ainda que sofre com uma menina grande demais em sua sala, pois ela já é “sensual” e as demais meninas não. A psicóloga pontuou pontos como a estatura de Sara não ser tão alta, e que a preocupação da escola necessita se pautar em priorizar a transmissão do saber sistematizado. A conversa ocorreu de forma tranquila, esses dados foram passados também para a Equipe Pedagógica do colégio por meio de um breve relatório.

Quando a psicóloga observa Sara brincando no pátio da escola se sente feliz por não tê-la

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designado para uma classe especial simplesmente pelo fato de ela não aprender tão rápido quanto seus colegas de sala. Ela não precisou ser enquadrada como uma portadora de distúrbio de aprendizagem, nem de deficiência mental ou de doença mental. Ainda existem algumas reclamações quanto ao desempenho da aluna, mas já que o “Teste TDE” mostrou os resultados... teste é teste... e não se discute!

A postura da psicóloga foi a de não culpabilizar Sara pela sua dificuldade, mas sim a de tentar compreender o contexto social de onde estava surgindo a queixa em relação à aluna. À primeira vista essa atitude parece simples, mas ao iniciá-la pôde-se acompanhar o caminho sinuoso percorrido pela psicóloga, visto que as “autoridades escolares” já haviam dado o veredicto de que Sara não conseguiria acompanhar a turma da segunda série. Analisar criticamente uma situação onde pode estar envolvido um ser humano demanda um grande esforço, visto que esse contém informações do todo social, é por isso que a análise pode ser mais extensa.

É por esse motivo que o psicólogo necessita de uma teoria que garanta uma consistente base teórico-filosófica, pois independente do local onde for trabalhar (escola, empresa, clínica ou hospital) as bases teórico-filosóficas serão as mesmas, e consequentemente a visão de homem será a mesma.

Você deve se perguntar nesse momento: por que tive que ler esse caso?

Porque queremos, precisamos e devemos ressaltar que as informações que mostraremos aqui sobre as dificuldades e transtornos de aprendizagem necessitam de respaldo social e histórico, pois cada item que será discutido precisa de uma contextualização. Não queremos e não pretendemos mostrar nomenclaturas para a classificação de crianças de acordo com a dificuldade apresentada. O que pretendemos é clarificar que essas nomenclaturas existem, a característica central das mesmas e, em especial, a força que a crença que nós profissionais da educação apresentamos para o processo de desenvolvimento e aprendizagem da criança faz toda e qualquer diferença no diagnóstico e do prognóstico da mesma.

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Vamos lá então!

Ouvimos muitos pais e professores se referirem às crianças da seguinte maneira: “meu filho não sabe ler e nem escrever” (como no caso tratado na Unidade anterior); “meu filho é um disléxico!”; “essa criança tem distúrbio de atenção”; “minha filha é distraída”.

Ora, os sujeitos possuem dificuldades, mas eles não são as dificuldades! A incapacidade vivaz surge à tona diante de comentários do gênero, o que pode ser o início de uma complicação diante do ato de aprender.

O ato de aprender está dentro de cada um de nós, mas acontece mediante a interação com o ambiente, o contato com os símbolos e com quem media a aprendizagem. O “não saber” faz que cada indivíduo tenha dificuldades menores e maiores, dependendo do que está internalizado em cada um, de conhecer e saber trabalhar as limitações individuais. Às dificuldades dos que não sabem como trabalhar com os próprios limites, sentindo-se incapazes é que se atribui o termo dificuldade de aprendizagem.

E o que são distúrbios ou transtornos de aprendizagem?

Os transtornos de aprendizagem, segundo Moojen (2009), são descritos nos Manuais Internacionais de Transtornos Mentais o DSM-IV. Respaldadas no DSM-IV (1995, p. 46).

Os Transtornos de Aprendizagem são diagnosticados quando os resultados do indivíduo em testes padronizados e individualmente administrados de leitura, matemática ou expressão escrita estão substancialmente abaixo do esperado para sua idade, escolarização ou nível de inteligência. Os problemas na aprendizagem interferem significativamente no rendimento escolar ou nas atividades da vida diária que exigem habilidades de leitura, matemática ou escrita. Em presença de um déficit sensorial, as dificuldades de aprendizagem podem exceder aquelas habitualmente associadas com o déficit. Os Transtornos de Aprendizagem podem persistir até a idade adulta.

O termo Distúrbio de Aprendizagem se diferencia de Dificuldade de Aprendizagem por se tratar de um conjunto de sintomas ou comportamentos que comprometem a aprendizagem, ocasionando no indivíduo muito sofrimento e perturbação (MOOJEN, 2009).

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A mais recente definição de Distúrbios de Aprendizagem foi publicada em 1998 pelo National Joint Commitee on Learning Disabilities (NJCLD), que afirma:

Distúrbio de Aprendizagem é uma expressão geral que se refere a um grupo heterogêneo de distúrbios, manifestado por dificuldades significativas na aquisição e no uso de capacidades de atenção, fala, leitura, escrita, raciocínio ou habilidades matemáticas. Estes distúrbios são intrínsecos ao indivíduo, supostamente devido a uma disfunção do sistema nervoso central e podem ocorrer ao longo da duração de vida. Problemas de comportamentos auto-reguladores, percepção social e interação social podem coexistir com distúrbios de aprendizagem, mas não consistem, por si só, em distúrbios de aprendizagem. Embora distúrbios de aprendizagem possam ocorrer concomitantemente com outras condições incapacitantes (ex: prejuízo sensorial, retardo mental, distúrbio emocional grave), ou com influências extrínsecas (como diferenças culturais, instrução insuficiente ou inadequada), eles não são decorrentes destas condições ou influências.

Assim, os distúrbios de aprendizagem são disfunções psiconeurológicas, em que a causa é neurológica e o comportamento é a manifestação de que algo não está bem.

Portanto, os Distúrbios Específicos do Desenvolvimento das Habilidades Escolares são compostos por grupos com comprometimentos específicos na aprendizagem, não sendo resultados de outros transtornos, como deficiência mental ou problemas visuais. Vejamos alguns:

Dificuldades de Aprendizagem da Linguagem (DAL): o DSM-IV classifica entre os transtornos do desenvolvimento os transtornos da linguagem. García (1998, p. 145, grifos do autor) afirma que:

Podem ser distinguidos dois tipos de transtornos da linguagem e fala: os transtornos do desenvolvimento na articulação e os transtornos do desenvolvimento da linguagem, tipo expressivo e tipo receptivo, que, a grosso modo, corresponderiam à terminologia mais habitual na Espanha, respectivamente, de dislalias, sejam específicas ou generalizadas (hotentonismo), de disfasias expressivas e disfasias receptivas, as quais se costuma acrescentar o qualitativo de evolutivas ou de desenvolvimento (o que seria uma redundância, pois o prefixo dis- já faz referência a esse conceito ou marco evolutivo e de desenvolvimento).

Dificuldades de Aprendizagem da Leitura: de acordo com a exposição de García (1998, p.

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173, grifos nossos), a conceituação quanto a esse quadro

Define-se pela presença de um déficit no desenvolvimento do reconhecimento e compreensão dos textos escritos. Este transtorno não é devido nem à deficiência mental, e nem a uma inadequada ou escassa escolarização, nem a um déficit visual ou auditivo, nem a um problema neurológico. Somente se classifica como tal se é produzida uma alteração relevante do rendimento acadêmico ou da vida cotidiana.

O autor continua a esclarecer que:

Esse transtorno é denominado como “dislexia” ou como transtorno do desenvolvimento da leitura (STANOVICH, 1992, apud García, 1998, p. 173). Manifesta-se uma leitura oral lenta, como omissões, distorções e substituições de palavras, com interrupções, correções e bloqueios. Produz-se uma afetação, também, da compreensão leitora.

Sampaio (2011, p. 2) destaca que há alguns comportamentos que chamam a nossa atenção ao lidarmos com uma criança com dislexia como, por exemplo: “[...] demora em aprender a segurar a colher para comer sozinho, a fazer laço no cadarço do sapato, pegar e chutar bola; atraso na locomoção; atraso na aquisição da linguagem; dificuldade na aprendizagem das letras”. A dificuldade da criança com dislexia está em identificar símbolos gráficos (letras e números) o que traz como consequência a dificuldade na leitura e na escrita.

Confusão de letras, sílabas ou palavras que se parecem graficamente: a-o, e-c, f-t, m-n, v-u. Inversão de letras com grafia similar: b/p, d/p, d/q, b/q, b/d, n/u, a/e. Inversões de sílabas: em/me, sol/los, las/sal, par/pra. Adições ou omissões de sons: casa Lê casaco, prato lê pato. Ao ler pula linha ou volta para a anterior. Soletração defeituosa: lê palavra por palavra, sílaba por sílaba, ou reconhece letras isoladamente sem poder ler. Leitura lenta para a idade. Ao ler, movem os lábios murmurando. Freqüentemente não conseguem orientar-se no espaço sendo incapazes de distinguir direita de esquerda. Isso traz dificuldades para se orientarem com mapas, globos e o próprio ambiente. Usa dedos para contar. Possui dificuldades em lembrar se seqüências: letras do alfabeto, dias da semana, meses do ano, lê as horas. Não consegue lembrar-se de fatos passados como horários, datas, diário escolar. Alguns possuem dificuldades de lembrar objetos, nomes, sons, palavras ou mesmo letras. Muitos conseguem copiar, mas na escrita espontânea como ditado e ou redações mostra severas complicações. Afeta mais meninos que meninas.

A alexia é uma disfunção, também, quanto à capacidade de leitura, geralmente, acompanhada por dificuldades na habilidade escrita, na qual a criança apresenta dificuldades em estabelecer

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o significado da palavra.

Dificuldades de Aprendizagem da Escrita: ainda de acordo com as definições de García (1998, p. 191), podemos compreender que a dificuldade de aprendizagem escrita trata-se de:

Uma dificuldade significativa no desenvolvimento das habilidades relacionadas com a escrita. Esse transtorno não se explica nem pela presença de uma deficiência mental, nem por escolarização insuficiente, nem por um déficit visual ou auditivo, nem por alteração neurológica. Classifica-se como tal apenas se produzem alterações relevantes no rendimento acadêmico ou nas atividades da vida cotidiana. A gravidade do problema pode ir desde erros na soletração até erros na sintaxe, estruturação ou pontuação das frases, ou na organização de parágrafos (GREGG, 1992 apud GARCÍA, 1998, p. 173).

Escrita em espelho e intercâmbio de letras fazem parte dessa dificuldade de aprendizagem da escrita.

Disgrafia: desordem na integração visomotora. Apresenta apropriação na linguagem oral e leitura, mas não consegue escrever. Sampaio (2011, p. 3) destaca que a disgrafia é também denominada de “letra feia”, essa denominação ocorre:

[...] devido a uma incapacidade de recordar a grafia da letra. Ao tentar recordar este grafismo escreve muito lentamente o que acaba unindo inadequadamente as letras, tornando a letra ilegível. Algumas crianças com disgrafia possui também uma disortografia amontoando letras para esconder os erros ortográficos. Mas não são todos disgráficos que possuem disortografia. A disgrafia, porém, não está associada a nenhum tipo de comprometimento intelectual.

Para a autora, lentidão na escrita, letra ilegível, escrita desorganizada, traços irregulares, desorganização do texto e desorganização geral na folha são algumas das características da disgrafia, a qual, segundo Sampaio (2011, p. 3, grifos nossos), possui dois tipos:

A Disgrafia motora (discaligrafia): a criança consegue falar e ler, mas encontra dificuldades na coordenação motora fina para escrever as letras, palavras e números, ou seja, vê a figura gráfica, mas não consegue fazer os movimentos para escrever; Disgrafia perceptiva: não consegue fazer relação entre o sistema simbólico e as grafias que representam os sons, as palavras e frases. Possui as características da dislexia sendo que esta está associada à leitura e a disgrafia está associada à escrita.

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Transtornos Específicos da Habilidade Matemática: trata-se de dificuldades significativas no desenvolvimento das habilidades relacionadas com a matemática (SEMRUD-CLIKEMANN; HYND, 1992 apud GARCÍA, 1998, p. 211).

Essas dificuldades não são ocasionadas pela deficiência mental, nem por escolarização escassa ou inadequada, nem por déficits visuais ou auditivos (SMITH; RIVERA, 1991, apud GARCÍA, 1998, p. 211). Apenas se classificam como tais se acontece uma alteração ou deterioração relevante dos rendimentos escolares ou da vida cotidiana (KELLER; SUTTON, 1991 apud GARCÍA, 1998, p. 211).

As dificuldades dos transtornos específicos da área da matemática incidirão em diversas atividades. García (1998, p. 211, grifos do autor) destaca que, quanto às dificuldades:

Estas incluem habilidades ‘linguistiscas’ (como a compreensão e o emprego da nomenclatura matemática, a compreensão ou denominação de operações matemáticas e a codificação de problemas representados por símbolos matemáticos), habilidades ‘perceptivas’ (como o reconhecimento ou a leitura de símbolos numéricos ou sinais aritméticos, e o agrupamento de objetos em conjuntos), habilidades de ‘atenção’ (como copiar figuras corretamente nas operações matemáticas básicas, recordar o número que ‘transportamos’ e que devemos acrescentar a cada passo, e observar os sinais das operações) e as habilidades ‘matemáticas’ (como o seguimento das sequências de cada passo nas operações matemáticas, contar objetos e aprender as tabuadas de multiplicar).

Sampaio (2011, p. 1) destaca que os processos envolvidos na discalculia são:

1. Dificuldade na memória de trabalho; 2. Dificuldade de memória em tarefas não--verbais; 3. Dificuldade na soletração de não-palavras (tarefas de escrita); 4. Não há problemas fonológicos; 5. Dificuldade na memória de trabalho que implica contagem; 6. Dificuldade nas habilidades viso-espaciais; 7. Dificuldade nas habilidades psicomotoras e perceptivo-táteis.

A autora complementa as informações dadas até o momento e nos convida a recorrermos ao DSM-IV, para entendermos que o Transtorno da Matemática caracteriza-se da seguinte forma:

A capacidade matemática para a realização de operações aritméticas, cálculo e raciocínio matemático, encontra-se substancialmente inferior à média esperada para a idade cronológica, capacidade intelectual e nível de escolaridade do indivíduo. As dificuldades da capacidade matemática apresentadas pelo indivíduo trazem prejuízos

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significativos em tarefas da vida diária que exigem tal habilidade.

Em caso de presença de algum déficit sensorial, as dificuldades matemáticas excedem aquelas geralmente a este associadas. Diversas habilidades podem estar prejudicadas nesse Transtorno, como as habilidades linguísticas (compreensão e nomeação de termos, operações ou conceitos matemáticos, e transposição de problemas escritos em símbolos matemáticos), perceptuais (reconhecimento de símbolos numéricos ou aritméticos, ou agrupamento de objetos em conjuntos), de atenção (copiar números ou cifras, observar sinais de operação), e matemáticas (dar seqüência a etapas matemáticas, contar objetos e aprender tabuadas de multiplicação) (SAMPAIO, 2011).

A Discalculia e a Acalculia são terminologias mais conhecidas na atualidade e que situam-se na área dos transtornos da matemática.

Discalculia: Sampaio (2011) afirma que o portador de discalculia comete erros diversos na solução de problemas verbais, nas habilidades de contagem, nas habilidades computacionais, na compreensão dos números. Kocs, citada por Keller e Sutton (1991 apud GARCÍA, 1998, p. 213) diferencia a discalculia em seis subtipos, os quais são:

1. Discalculia Verbal -Dificuldadeparanomearasquantidadesmatemáticas,osnúmeros,os termos, os símbolos e as relações.

2. Discalculia Practognóstica -Dificuldadeparaenumerar,compararemanipularobjetosreais ou em imagens matematicamente.

3. Discalculia Léxica-Dificuldadesnaleituradesímbolosmatemáticos.

4. Discalculia Gráfica -Dificuldadesnaescritadesímbolosmatemáticos.

5. Discalculia Ideognóstica–Dificuldadesemfazeroperaçõesmentaisenacompreensãode conceitos matemáticos.

6. Discalculia Operacional-Dificuldadesnaexecuçãodeoperaçõesecálculosnuméricos.

Acalculia: ocorre quando o indivíduo, após sofrer lesão cerebral, como um acidente vascular cerebral ou um traumatismo crânio-encefálico, perde as habilidades matemáticas já adquiridas. A perda ocorre em níveis variados para realização de cálculos matemáticos (SAMPAIO, 2011).

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Distúrbios na ordem das relações dos movimentos e objetos: afeta a aérea motora, responsável pela ordem dos movimentos – praxia. Sendo: Apraxias e Dispraxias.

Praxia: ou planejamento motor é um movimento intencional, organizado, tendo em vista a obtenção de um fim determinado, ou seja, é a capacidade motora que o indivíduo tem de aprender movimentos (FRANCO, 2010, p. 1). Divide-se em duas etapas, a ideação (o que fazer?) e a execução (o como fazer?).

A criança com dificuldade na ideação dá preferência a brinquedos que já têm um papel definido. Por exemplo, gostam muito de bonequinhos personagem, com os quais reproduzem cenas de filmes ou do cotidiano. Também gostam de brinquedos como Legos, que têm um modelo a ser seguido. Dificilmente montam uma brincadeira em que existe substituição de função para os objetos, tal como fazer com que uma latinha seja o telefone ou a boneca seja a mamãe. Outras crianças são capazes de inventar um “script” para a brincadeira, mas são rígidas em relação a execução,fazendo com que seja difícil a interação com os amigos, que podem querer mudar a forma que a estória foi idealizada, trazendo muitos conflitos e fazendo com que a criança tenha poucos amigos. Essas crianças podem preferir ser o “diretor de cena” a ser um participante real da brincadeira, porque vão ter dificuldade na execução do plano. Tendem a ficar muito bravas se alguém sugere uma modificação no enredo porque fica difícil dar continuidade. Outras ainda, preferem ser coadjuvantes na brincadeira e são capazes de seguir o enredo sugerido por um amigo mas não sabem como iniciar a brincadeira independentemente ou como dar continuidade a uma idéia que alguém apresente (FRANCO, 2010, p. 1).

Apraxias: ocorre por meio de desordens no hemisfério cerebral responsável pela coordenação, corresponde à desordem nos movimentos do corpo.

Dispraxias: a perda da habilidade do movimento do corpo devido à alguma lesão. Para Franco (2010, p. 1):

Algumas crianças com dificuldade de integração sensorial, no grupo que apresenta dificuldade de planejamento motor ou dispraxia. A criança dispráxica tem dificuldade em planejar o que fazer com um objeto que não tem um papel pré- determinado, tal como uma caixa de papelão ou rolo de barbante. Assim, embora tenham vontade de brincar, essas crianças são incapazes de fazê-lo por um tempo prolongado, de participar em brincadeiras com outros ou ainda de participar de uma variedade de atividades lúdicas. Essas dificuldades vão se refletir nas atividades acadêmicas ou sociais, fazendo com que seja difícil, por exemplo, idealizar uma estória para escrever uma composição ou

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participar com amigos de situações em que seja necessário ter uma certa flexibilidade. São incapazes de suspender a realidade ou de realmente se divertir em uma atividade lúdica. Embora a motivação para brincar seja inerente à criança, a habilidade de fazê-lo pressupõe uma série de pré-requisitos que nem sempre estão presentes no desenvolvimento da criança.

Distúrbio da Memória: comprometimento da atenção, sendo, geralmente, acompanhado por hiperatividade, impulsividade e distratibilidade. Podemos mencionar aqui o TDA com ou sem Hiperatividade.

TDA: Transtorno de Déficit de Atenção. Disfunção que compromete a concentração e atenção.

TDAH: denominado Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade. Além do comprometimento da concentração e atenção vem acompanhado de hiperatividade.

O QUE É HIPERATIVIDADE?

Partindo da apropriação da concepção de que o aprendizado caminha de acordo com um conjunto de fatores internos – atenção, concentração, interesse, maturidade neurológica e funcionabilidade das estruturas cerebrais – fica mais fácil perceber que algumas dificuldades na aprendizagem estão ligadas a fatores que não dependem somente de uma boa educação.

Os hiperativos, geralmente, são aqueles rotulados como “endiabrados”. Não param quietos em qualquer ambiente. Na escola são impossíveis de permanecer na carteira. Mexem as pernas, os pés, as mãos ou os dedos constantemente, falam sem parar, terminam frases de outras pessoas, são impacientes, impulsivos, curiosos e irritam pessoas próximas com facilidade. Mantêm esse comportamento não apenas em um ambiente de convívio, mas em todos os lugares. Um exemplo clássico: “Denis, o pimentinha”, o menino do desenho animado que não deixa seus pais, seus amigos e especialmente o Sr. Wilson em paz.

Para a intervenção com a criança, o auxílio profissional é de suma importância. É essencial, também, a contribuição familiar para ajudar a criança na compreensão de limites e regras.

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Dica de fi lme – Parada Obrigatória!Dênis, o pimentinha!

Título no Brasil: Dênis, o pimentinhaTítulo original: Dennis the menaceLançamento/país: 1993/ EUADiretor: Nick CastleGênero: ComédiaDênis é um garoto que inferniza a vizinhança e George Wilson, um vizinho aposentado, parece ser o alvo preferido do menino. Alice Mitchell, a mãe de Dênis, começou em um novo emprego e logo se vê obrigada a viajar com Henry, seu marido. Como a famadeDênisénotórianenhumababáquerficartomandocontadogaroto,masMarthaWilson,aesposadeGeorge,seprontificaem cuidar de Dênis. Isto deixa seu marido desesperado, mas o

pior ainda está por vir quando Dênis “colabora” na reunião que os Wilson fazem para comemorar um prêmio de jardinagem, ganho por George.

DÉFICIT DE ATENçãO E HIPERATIVIDADE (TDAH)

Como estudamos anteriormente um aspecto necessário para a aprendizagem é a atenção (função de uma estrutura localizada no tronco encefálico – Formação Reticular – e da atividade dos neurotransmissores até o lobo frontal e demais partes do cérebro).

Quando uma criança nasce, a falta de atenção é uma característica relativa até,

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aproximadamente, seu primeiro ano de vida. Isso ocorre, pois a FR ainda está imatura. Mas, partindo do primeiro até o segundo aninho de vida, sua atenção irá melhorar progressivamente. A maturidade da FR se completa até o quarto ano de vida da criança.

De acordo com estudos, as crianças, ou adultos com TDAH possuem uma alteração nos neurotransmissores, responsáveis pela transmissão das informações nas células nervosas por meio de substâncias, com o controle de liberação da dopamina e da noradrenalina alterados. Assim, as informações necessárias se alteram ou não chegam ao lobo frontal, sendo esta parte do cérebro responsável por manter a atenção até o tempo necessário, planejamento, organização, controlar impulsos, emoções e a memória, o que não acontece de maneira adequada com o TDAH (TAMANINI, 2011).

Quando a criança completa a idade escolar, logo surgem os primeiros comentários como, por exemplo:

- “Nossa, essa criança não para, hein?!”

- “Ele é assim em casa também?”

- “Parece que não tem limite!”

- “Onde ela desliga?”

-“Mãe, você dá leite ou ela se alimenta com o dedinho na tomada?”

- “Vive no mundo da lua!”

- “Nossa! Como é desligada!”.

Na verdade, não é tão simples diagnosticar uma criança com TDAH. Seu comportamento e atitudes, transtornos e desconfortos devem ser uma constante em sua vida, não apenas ser hiperativa e desatenta na escola, só desatenta em casa e hiperativa em meio à família e amigos. De acordo com Assencio-Ferreira (2003), “[...] não existe exame laboratorial, radiológico ou de neuroimagem que permita o estabelecimento do diagnóstico de certeza”. O que se utiliza com

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frequência é o Manual de Diagnóstico e Estatística – IV edição (DSM-IV) da Associação Psiquiátrica Americana que veremos a seguir.

Este guia só poderá ser utilizado para obtenção de diagnóstico clínico por profissionais especializados em TDAH, sendo o objetivo deste em apenas conhecer para possuir uma base de como acontece o processo de realmente diagnosticar se alguém possui ou não o TDAH (extraído do livro: Neurologia e Fonoaudiologia de Vicente José Assencio-Ferreira).

Salientamos que esse pode ser considerado um instrumento a mais para o diagnóstico e prognóstico, mas que a utilização apenas desse questionário é insuficiente para lidarmos com a criança ou adulto com TDAH.

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175PROBLEMAS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA INFÂNCIA | Educação a Distância

CRITÉRIO A: Assinale com um “x” a coluna correta.

Nunca ou raramente

Pouco Bastante Quase sempre

Ele presta pouca atenção em detalhes e faz erros por falta de atenção nos deveres?

Ele mexe com as mãos e pés quando está sentado ou se mexe muito na cadeira?

Ele tem dificuldade de manter-se concentrado nos deveres e também nos jogos?

Ele sai do lugar na sala de aula ou em outras situações (ex: mesa de jantar). Quando deveria ficar sentado?

Ele parece estar prestando atenção em outras coisas quando se está falando com ele?

Ele corre ou trepa nas coisas quando deveria ficar tranqüilo?

Ele tem dificuldade em seguir instruções até o fim ou deixa os deveres sem terminar?

Ele tem dificuldade de ficar em silêncio enquanto brinca?

Ele é desorganizado com os deveres e outras atividades do dia-a-dia?

Ele é “elétrico” e fica a “mil por hora”?

Ele evita ou antipatiza com deveres ou atividades que exijam concentração?

Ele fala demais?

Ele perde material da escola ou coisas do dia-a-dia?

Ele responde às perguntas antes dos outros terminarem de falar?

Ele se distrai com facilidade com coisas fora daquilo que está fazendo?

Ele tem dificuldade de esperar a vez?

Ele se esquece de coisas que deveria fazer no dia-a-dia?

Ele interrompe os outros ou se mete na conversa dos outros?

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176 PROBLEMAS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA INFÂNCIA | Educação a Distância

Como avaliar?

1) Se existem pelo menos 6 itens marcados como “BASTANTE” ou “DEMAIS” de 1 a 9 = existem mais sintomas de desatenção que o esperado em uma criança ou adolescente.

2) Se existem pelo menos 6 itens marcados como “BASTANTE” ou “DEMAIS” de 10 a 18 = existem mais sintomas de hiperatividade e impulsividade que o esperado em uma criança ou adolescente.

O questionário SNAP-IV é útil para avaliar apenas o primeiro dos critérios (critério A) para se fazer o diagnóstico. Existem outros critérios que também são necessários.

IMPORTANTE: Não se pode fazer o diagnóstico de TDAH apenas com o critério A! Veja abaixo os demais critérios.

CRITÉRIO A: Sintomas (vistos acima)

CRITÉRIO B: Alguns desses sintomas devem estar presentes antes dos 7 anos de idade.

CRITÉRIO C: Existem problemas causados pelos sintomas acima em pelo menos 2 contextos diferentes (por ex., na escola, no trabalho, na vida social e em casa).

CRITÉRIO D: Há problemas evidentes na vida escolar, social ou familiar por conta dos sintomas.

CRITÉRIO E: Se existe um outro problema (tal como depressão, deficiência mental, psicose etc.), os sintomas não podem ser atribuídos exclusivamente a ele.

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AO LIDARMOS COM A POPULAçãO ADULTA:

1) É OBRIGATÓRIO ter tido TDAH na infância. Isso pode exigir consultar os pais, parentes mais velhos ou mesmo professores. O TDAH no adulto é meramente a continuação do TDAH da infância e adolescência.

Avaliação de Adultos segundo a Associação Brasileira de Déficit de Atenção - ABDA

O questionário abaixo é denominado ASRS-18 e foi desenvolvido por pesquisadores em colaboração com a Organização Mundial de Saúde. Esta é a versão validada no Brasil.

Adultos Nunca raramente Algumas vezes Muito frequentemente

1. Com que freqüência você comete erros por falta de atenção quando tem de trabalhar num projeto chato ou difícil?

2. Com que freqüência você tem dificuldade para manter a atenção quando está fazendo um trabalho chato ou repetitivo?

3. Com que freqüência você tem dificuldade para se concentrar no que as pessoas dizem, mesmo quando elas estão falando diretamente com você?

4. Com que freqüência você deixa um projeto pela metade depois de já ter feito as partes mais difíceis?

5. Com que freqüência você tem dificuldade para fazer um

trabalho que exige organização?

6. Quando você precisa fazer algo que exige muita concentração, com que freqüência você evita ou adia o início?

7. Com que freqüência você coloca as coisas fora do lugar ou tem de dificuldade de encontrar as coisas em casa ou no trabalho?

8. Com que freqüência você se distrai com atividades ou barulho a sua volta?

9. Com que freqüência você tem dificuldade para lembrar de compromissos ou obrigações?

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Parte A

Adultos Nunca raramente Algumas vezes Muito frequentemente

1. Com que freqüência você fica se mexendo na cadeira ou balançando as mãos ou os pés quando precisa ficar sentado (a) por muito tempo?

2. Com que freqüência você se levanta da cadeira em reuniões ou em outras situações onde deveria ficar sentado (a)?

3. Com que freqüência você se sente inquieto (a) ou agitado (a)?

4. Com que freqüência você tem dificuldade para sossegar e relaxar quando tem tempo livre para você?

5. Com que freqüência você se sente ativo (a) demais e necessitando fazer coisas, como se estivesse “com um motor ligado”?

6. Com que freqüência você se pega falando demais em situações sociais?

7. Quando você está conversando, com que freqüência você se pega terminando as frases das pessoas antes delas?

8. Com que freqüência você tem dificuldade para esperar nas situações onde cada um tem a sua vez?

9. Com que freqüência você interrompe os outros quando eles estão ocupados?

Fonte: Mattos P, Segenreich D, Saboya E, Louzã M, Dias G, Romano M. Adaptação Transcultural para o Português da Escala Adult Self-Report Scale (ASRS-18, versão1.1) para avaliação de sintomas do Transtorno de Déficit de Atenção / Hiperatividade (TDAH) em adultos. Revista Brasileira de Psiquiatria (in press).

Parte B

Como avaliar:

Se os itens de desatenção da parte A (1 a 9) E/OU os itens de hiperatividade-impulsividade da parte B (1 a 9) têm várias respostas marcadas como FREQUENTEMENTE ou MUITO FREQUENTEMENTE existe chances de ser portador de TDAH (pelo menos 4 em cada uma das partes).

O questionário ASRS-18 é útil para avaliar apenas o primeiro dos critérios (critério A) para se fazer o diagnóstico. Existem outros critérios que também são necessários.

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IMPORTANTE: Não se pode fazer o diagnóstico de TDAH apenas com os sintomas descritos na tabela! Veja abaixo os demais critérios.

CRITÉRIO A: Sintomas (vistos na tabela acima).

CRITÉRIO B: Alguns desses sintomas devem estar presentes desde precocemente (antes dos 7 ou 12 anos).

CRITÉRIO C: Existem problemas causados pelos sintomas acima em pelo menos 2 contextos diferentes (por ex., no trabalho, na vida social, na faculdade e no relacionamento conjugal ou familiar).

CRITÉRIO D: Há problemas evidentes por conta dos sintomas.

CRITÉRIO E: Se existe um outro problema (tal como depressão, deficiência mental, psicose etc.), os sintomas não podem ser atribuídos exclusivamente a ele.

Não esqueça que qualquer inferência sobre o TDAH na população adulta, deve estar pautada em muitas investigações sobre a história de vida da pessoa!

ALGUMAS PONTUAçÕES SOBRE O TDAH

Verificamos, assim, que para o diagnóstico do TDAH não é de única causa, portanto, a indisciplina ou falta de controle parental, como muitos confundem devido ao comportamento e falta de limites de algumas crianças. O TDAH é resultado do mau funcionamento dos neurotransmissores e demais órgãos responsáveis pela atenção e controle da impulsividade (FR) e apenas especialistas qualificados na área poderão investigar com precisão até o resultado diagnóstico e encaminhamentos necessários e adequados a cada caso.

Somente em último caso considera-se o uso de medicamentos em crianças com TDAH. O importante é estabelecer a partir do diagnóstico os encaminhamentos necessários à terapia

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e reabilitação da criança com terapeutas, fonoaudiólogos, psicólogos e psicopedagogos, de acordo com necessidades específicas do indivíduo.

Trabalhando com as Crianças com Dificuldades de Aprendizagem

O trabalho com a criança envolve o profissional (psicólogo, psicopedagogo, neuropediatra), a escola (em especial a atuação do professor regente em sala de aula) e a família.

É importante que o professor observe alguns critérios ao lidar com a criança com dificuldade de aprendizagem como, por exemplo: a clareza das expectativas do educador diante de cada atividade proposta; estabelecimento de rotina com períodos de descanso em sala de aula; reforçar o estabelecimento de rotina, através de meios visuais e auditivos (cartazes, calendários); as instruções e orientações devem ser transmitidas de maneira clara, direta e curta; observar se o aluno tem todos os materiais necessários para realização das atividades propostas, se não, auxiliar o aluno a consegui-los; não solicitar atividades extensas de uma só vez, mas dividi-las em etapas, como, por exemplo, pedir que resolva cinco, de quinze questões, e depois que o aluno terminar pedir mais cinco, até que ele cumpra toda a atividade; iniciar a aula com as atividades que requerem maior atenção e deixar as mais “agradáveis” para o final da aula; supervisionar, constantemente, o tempo para cada atividade.

Quanto às modificações que tem apresentado relativo êxito durante as avaliações dos alunos:

• Propiciarumambientetranquilo.

• Darmaistempoparaosalunoscomdificuldade.

• Elaborarumnúmeromenordeatividadesporpágina.

• Pedirqueacriançavolteobservandosuasrespostas,emespecialaquelasquepossuemtipo impulsivo/hiperativo.

O importante é ter em mente que quando estudamos sobre as dificuldades de aprendizagem precisamos compreender e avaliar o momento correto de encaminhamento para profissionais

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especializados para as intervenções.

Acrescentamos aqui, o não subestimar a capacidade da criança, acreditar que ela pode dar um resultado sempre maior que aquele que esperamos. Essa confiança na criança é transmitida nas gestualizações e falas que estabelecemos na rotina de aula ou de atendimento clínico.

CONSIDERAçÕES FINAIS

Estudamos na unidade IV os problemas e dificuldades de aprendizagem, diferenciando dificuldades e distúrbios para uma melhor compreensão sobre o processo de aprendizagem da criança em sala de aula.

Observamos uma postura profissional adequada ao acompanharmos o caso fictício de uma criança com dificuldade de aprendizagem, o caso Sara. Quantos as especificidades das dificuldades e distúrbios compreendemos as dificuldades quanto à: linguagem; à escrita; à matemática; as relações e movimentos; à hiperatividade; ao Transtorno de Atenção - TDA; ao Transtorno de Atenção e Hiperatividade TDAH.

O trabalho do professor em sala de aula, assim como a sua importância para o processo de desenvolvimento e aprendizagem da criança, foram também, contemplados.

ATIVIDADE DE AUTOESTUDO

1. ReleiaocasoSarae,tomando-ocomobase,definaumaformadeintervençãoadequadapara uma criança que frequenta o quarto ano do Ensino Fundamental I, e que ainda não consegue ler e nem mesmo escrever.

Acesseosite<www.vigotski.net/ditebras/barroco.pdf>,eentendaaposturavigotskyanasobreadifi-culdade e o transtorno de aprendizagem.

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182 PROBLEMAS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA INFÂNCIA | Educação a Distância

Acesseosite<www.profala.com>ecompreendaopapeldaescolafrenteàsdificuldadesdeapren-dizagem.

“Quem vem ao mundo, constrói uma casa nova, se vai e a deixa a outro, este a arrumará a sua ma-neira. E ninguém acaba nunca de construí-la” (GOETHE).

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UNIDADE V

A IMPORTÂNCIA DA ATENçãO PARA A APREENSãO DO CONHECIMENTO ERUDITOProfessora Me. Amanda Mendes Amude PatezProfessora Me. Gescielly Barbosa da Silva TadeiProfessora Me. Márcia Regina de Sousa Storer

Objetivos de Aprendizagem

• EntenderarelevânciadeLuriaparaacompreensãodaatenção.

• Compreenderaimportânciadaatençãoparaapreensãodoconteúdocientífico.

• Observararelaçãoentreafetividadeeeducação.

• Verificarosdistúrbiosemocionaisemvoga:DDOeDistúrbiodeConduta.

Plano de Estudo

A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:

• Atenção para Luria

• Atenção e conteúdo científico

• Afetividade e Educação

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INTRODUçãO

Na presente unidade estudaremos a relevância da atenção para o processo de apreensão do conhecimento erudito, ou seja, do conhecimento científico.

Um dos maiores estudiosos nessa área é Alexander Luria, um dos pensadores que compunham a Teoria Histórico-Cultural, lembra-se? Luria desenvolveu estudos específicos na área da atenção, por isso hoje é muito estudado na área da neurologia.

Além do mais, após termos visto tantas informações na unidade anterior sobre TDA e TDAH, pontos esses que incidem diretamente sobre a atenção da criança, nada melhor que estudarmos esse fator com um dos mais proeminentes autores na área.

Será de intuito, ainda, entendermos a correlação de afetividade e educação, ressaltando, aqui que a afetividade defendida nada se respalda no ideário romantizado, mas sim àquilo que tange uma aprendizagem repleta de sentido para o aluno, em uma correlação entre conteúdo científico e prática cotidiana.

ALEXANDER ROMANOVICH LURIA (1902-1977): PARA A COMPREENSãO DE DIFICULDADES LIGADAS À ATENçãO DA CRIANçA

Fonte: <pt.wikipedia.org/wiki/Alexander_Luria>.

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Nesta unidade pretendemos falar sobre Alexander Romanovich Luria. Não é nossa pretensão esgotar o assunto, portanto, faremos apenas uma exposição de natureza conceitual, utilizando como referencial teórico metodológico o materialismo-histórico. Nosso objetivo é apresentar suas obras de maior repercussão no Brasil e descrever um dos processos mentais estudados por ele em sua relação com a cultura, a atenção, por serem funções psicológicas superiores imprescindíveis à educação.

Com base no materialismo-histórico compreendemos que o rumo das suas pesquisas está intrinsecamente vinculado ao contexto histórico ao qual fazia parte, por isso, antes de citar as obras desse pesquisador vamos entender Luria dentro de seu contexto histórico e social, levando em conta, então, a Rússia pós-revolucionária como marco inicial de seus estudos e pesquisas e, posteriormente, a União Soviética sob o regime stalinista (TULESKI, 2007).

Luria nasceu em 16 de julho de 1902 em Kazan, uma região central a leste de Moscou. Filho de um médico conceituado e também professor da escola de Kazan, Luria teve oportunidade de ampliar sua cultura, ter acesso ao mundo intelectualizado, ao idioma alemão e às grandes produções na psicologia (COLE, 1992 apud REGO e OLIVEIRA, 2010).

Sua infância foi sob a influência tirânica do czarismo. Aos 15 anos vivenciou as mudanças advindas da Revolução de 1917, que transformou não apenas a paisagem natural, como também os interesses da população, cujos interesses pessoais cederam espaço para metas amplas em favor de uma sociedade coletiva. Entre as profundas transformações, destaca-se a redução de 8 para 6 anos no curso de formação ginasial (REGO; OLIVEIRA, 2010).

Posteriormente, ingressou no curso de Ciências Sociais da Universidade de Kazan, nos anos que se seguiram à Revolução, graduando-se com 19 anos em 1921. Entrementes, a conturbação política daquele momento revelou-se não apenas no âmbito social, mas no espaço acadêmico, tanto nos temas explanados em sala de aula. Os professores encontravam-se desnorteados, sem referenciais, não sabendo o que ensinar e nem como ensinar os alunos. E foi nesse contexto que Luria envolveu-se ativamente nas discussões políticas sobre a nova sociedade

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em formação, bem como nas associações científicas, sendo esse o período no qual começou a se interessar pelas ideias do socialismo utópico, pela psicologia e começou a esboçar seu projeto de uma nova psicologia (REGO; OLIVEIRA, 2010).

Ao formar-se em Ciências Sociais, Luria iniciou simultaneamente um curso de Medicina no Hospital Psiquiátrico de Kazan e uma formação em um Instituto Pedagógico. O curso de Medicina foi interrompido, retomado apenas em 1936 e finalizado no ano seguinte enquanto doutorava-se em Psicologia pelo Instituto de Tbilisi (REGO; OLIVEIRA, 2010).

De acordo com Tuleski (2007), podemos organizar os estudos de Luria em três grandes fases que abrangem em si períodos distintos da sua produção. A primeira fase corresponde ao período precedente da sua associação a Vigotsky. Nessa etapa sua produção teórica sofreu grande influência da Psicologia Ocidental, como a noção de inconsciente apresentada por Freud, a adoção de métodos como a associação livre e a hipnose utilizadas tanto por Freud quanto por Jung, o ato de fazer referência à terapia psicanalítica entre outros.

A segunda fase corresponde ao período em que Luria, Leontiev e Vigotsky unem-se, constituem a Troika em 1924 e por meio das pesquisas do desenvolvimento genético (filogênese e ontogênese) tentam criar uma nova abordagem dos processos psicológicos humanos, tendo como pilar o método materialista histórico e dialético, sob os quais seriam erguidos os pilares da nova psicologia, a Psicologia Histórico-Cultural. A terceira fase corresponde ao período que sucede a morte de Vigotsky e, conforme a autora, aparentemente parece haver um redirecionamento dos seus interesses e de suas pesquisas, que o faz concentrar-se mais na área da neuropsicologia.

Esse redirecionamento aparente da produção luriana ocorreu em função de fatores políticos e econômicos pelos quais a sociedade passava. Para explicar essa questão a autora subdivide essa terceira fase em outras subdivisões. A primeira subdivisão abarca os anos entre 1930 a 1950 sendo marcada pela adoção de terminologias pavlovianas com muito mais intensidade do que apareciam os pressupostos Vigotskyanos. Essa foi a forma que Luria encontrou para

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driblar a censura e a perseguição política decorrente da política autocrática de Stalin para ocultar os fundamentos marxistas, que são o alicerce de toda produção teórica. Já a segunda subdivisão abrange os anos de 1960 e 1070, nos quais houve uma maior abertura política na União Soviética a partir da morte de Stalin e, com isso, as obras de Vigotsky passaram a ser liberadas pela censura, o que tornou possível embasar suas pesquisas sem ter que maquiar os pressupostos marxistas, como ocorreu por trinta anos.

Seu trabalho foi amplamente difundido no ocidente e embora todas as suas obras não sejam traduzidas para o português, contamos com nove livros, e alguns artigos, com os quais é possível entrar em contato com sua trajetória acadêmica e profissional, seus pressupostos filosóficos e epistemológicos e suas teses. A partir de Tuleski (2007) e Rego e Oliveira (2010) destacaremos esses livros e faremos uma breve exposição de suas temáticas, para que o leitor que não o conheça possa entrar em contato com o riquíssimo trabalho desse pesquisador do século passado que tem grandes implicações para a Educação Escolar e para a compreensão dos problemas de escolarização.

Curso de Psicologia Geral foi publicado no Brasil pela primeira vez em 1979 e foi traduzido diretamente do Russo. Trata-se de quatro volumes, nos quais o autor trata dos seguintes temas: o cérebro, a evolução do psiquismo e a atividade consciente; as sensações e a percepção; a atenção e a memória; o comportamento intelectual, a linguagem e o pensamento, a solução de tarefas, mostrando a organização cerebral, o desenvolvimento de cada função nos indivíduos normais, o prejuízo por causa de lesões cerebrais e destaca o conceito de plasticidade cerebral. Luria explicita a adoção do método materialista-histórico, delineando a unidade dialética mente-corpo, indivíduo-sociedade na constituição da atividade consciente.

Fundamentos de Neuropsicologia foi traduzido para o português em 1981 da publicação norte-americana e é uma das maiores referências de Luria no Brasil. Explica conceitos como plasticidade cerebral, sistema funcional e esclarece objetivamente a formação e organização das funções psicológicas superiores.

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Na avaliação da interação entre o cérebro e os processos mentais humanos Luria identificou 3 unidades básicas, ou sistemas funcionais cuja participação torna-se necessária para qualquer tipo de atividade mental:

I Unidade: regular tônus cortical ou vigília (estado de consciência). Unidade da atenção, ou de regulação do tônus otimal e vigília que envolve camadas do córtex e o sistema reticular ativador.

II Unidade: obter, processar e armazenar informações. Unidade de codificação e processamento, um sistema funcional para obter, processar e armazenar as informações que chegam do mundo exterior (e dos aparelhos de seu próprio corpo) localizada nos lobos occipital, temporal e parietal.

III Unidade: programar, regular e verificar a atividade cerebral. Unidade de planificação ou destinada a programar, regular e verificar a atividade mental. Esse terceiro bloco localizado basicamente no lobo frontal, elabora programas de comportamento, assegura e regula sua realização e participa do controle do seu cumprimento.

Desenvolvimento Cognitivo: seus fundamentos culturais e sociais

Publicado no Brasil em 1990 foi traduzido a partir da edição norte-americana. Livro e grande valia para compreensão do papel da cultura no desenvolvimento psicológico. Luria faz uma pesquisa na Ásia Central (Uzbequistão e Quirguistão) nos anos de 1931 e 1932 com o intuito de verificar como os processos psicológicos superiores são constituídos em diferentes contextos culturais. A região até então isolada e estagnada economicamente passava por processo de transformação social, o que proporcionaria uma grande oportunidade de promover experimentos empíricos que avaliassem a percepção, abstração, generalização, dedução e inferência, solução de problemas matemáticos, imaginação e autoanálise que comprovassem sua tese de que esses processos eram histórico-culturais. Com esse experimento, Luria comprovou que:

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os sujeitos mais escolarizados e envolvidos em situações de trabalho coletivizado e modernizado tenderam a lidar melhor com os atributos genéricos e abstratos dos objetos, enquanto que aqueles analfabetos ou pouco escolarizados e vinculados aos modos de trabalho tradicional reportavam-se a contextos concretos e a experiências particulares para balizar seu processo de raciocínio (REGO e OLIVEIRAB, 2007, p. 113).

Estudos sobre a história do comportamento: símios, homem primitivo e criança foi escrito em colaboração com Vigotsky e traduzido para o português apenas em 1996 a partir da edição norte-americana. Conta como as Funções Psicológicas Superiores (processos psicológicos) se desenvolvem resultando da atividade simbólica e instrumental, pelo macaco, homem primitivo e criança, ou seja, passando do homem primitivo ao homem cultural e da criança ao adulto, afastando a concepção naturalizante de desenvolvimento.

Pensamento e Linguagem: as últimas conferências de Luria foram publicadas no Brasil em 1985. Nada mais é do que uma coletânea de conferências reunidas em um livro que menciona o desenvolvimento da linguagem, levando em consideração a base fisiológica e psicológica e sua função reguladora e reorganizadora em todos os demais processos mentais, sempre reconsiderando os pressupostos da Psicologia Histórico-Cultural.

Linguagem e desenvolvimento intelectual na criança foi escrito em parceria com Yudovich e traduzido para o português direto do original em russo em 1985. Como esse livro foi escrito no período de crítica stalinista à Teoria Histórico-Cultural e eleição gradativa da reflexologia pavloviana como única possibilidade explicativa para o comportamento humano, é possível encontrar nesta obra inúmeras citações de Pavlov, como também a utilização do jargão pavloviano que não é encontrado em sua obra autobiográfica, A Construção da Mente (1992), ao relatar os mesmos estudos.

A mente e a memória, publicado no Brasil em 1999, apresenta o caso de Shereshevskii, jornalista russo com uma memória aparentemente ilimitada em função de uma acentuada sinestesia, por meio da qual transformava suas impressões e as palavras ouvidas em imagens vistas, sons ou sensações tácteis. Foi acompanhado por Luria durante décadas.

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191PROBLEMAS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA INFÂNCIA | Educação a Distância

Sua personalidade e comportamento ficaram comprometidos em função da dificuldade em esquecer-se e pelo excesso de informações sensórias produzidas a cada estímulo.

O homem com um mundo estilhaçado, publicado no Brasil em 2008 relata o caso de Zasetsky, um homem que sofreu uma lesão cerebral traumática por fragmentos de um projétil durante a Segunda Guerra Mundial, que teve perda de funções cerebrais e mentais, entre elas a memória. O livro mostra o trabalho de Luria:

unindo a descrição científica rigorosa das patologias com a análise dos modos de reabilitação dos sujeitos. Luria se esforçava em compreender os caminhos alternativos do desenvolvimento. Convencido da importância das interações, do peso da cultura na constituição do processo psíquico e do papel ativo do sujeito na apropriação da experiência histórico-cultural, ele parte do pressuposto de que o processo de desenvolvimento de cada pessoa segue uma trajetória singular (REGO; OLIVEIRA, 2007, p. 116).

A construção da mente, traduzido da publicação norte-americana para o português em 1992 e organizado por M &S Cole após a morte de Luria. Livro autobiográfico no qual Luria expõe sua trajetória de pesquisa e suas descobertas do funcionamento cerebral, juntamente com Vigotski. Ele deixa claro que:

[...] uma teoria da organização cerebral das funções superiores tem que levar em conta determinados processos (como aqueles envolvidos no ato de escrever) que dependem parcialmente de mediadores externos, historicamente condicionados (LURIA, 1992 apud TULESKI, 2007, p. 7).

Em todos os seus trabalhos, tendo Vigotsky como líder, Luria busca compreender a complexidade da formação dos processos mentais superiores. Opondo-se aos behavioristas, para os quais esses processos resultavam da combinação do condicionamento de hábitos, e aos idealistas, segundo os quais esses processos são inatos ao homem desenvolvendo-se concomitante ao seu processo de maturação, Luria durante suas seis décadas de atividade buscou a relação entre esses processos mentais e a cultura.

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ATENçãO PARA LURIA – PONTUAçÕES A PARTIR DE AMDE-PATEZ (2010)

Em Curso de Psicologia Geral (1991) e Fundamentos da Neuropsicologia (1981), Luria evidencia os processos psicológicos (Funções Psicológicas Superiores-FPS). Nesses estudos, define a atenção como a capacidade humana de selecionar os mais importantes estímulos existentes no meio externo. Mesmo que surjam inúmeros estímulos externos no campo perceptivo, o ser humano seleciona os dominantes, ignorando aqueles que dificultam o processo racional do pensamento. Os estímulos ignorados permanecem como “pano de fundo” na consciência, sendo ativados em caso de necessidade.

O caráter seletivo da atenção, que se volta para um estímulo em detrimento de outro, é necessário, também, para o desenvolvimento da percepção, dos processos motores e do pensamento (LURIA, 1991). Sem esse caráter seletivo, uma quantidade de informação desorganizada emergiria no campo do pensamento, resultando em associações descontroladas. Assim, seria impossível o acesso ao pensamento organizado e, consequentemente, a realização de qualquer atividade humana.

A atenção é uma atividade orientada para o objeto e possui uma direção, o que significa dizer que o motivo que a estimula pode estar tanto no sujeito que tem a atenção, quanto no objeto de atenção. A relação entre o sujeito e o objeto é bilateral: tanto a atenção se dirige para o objeto por algum interesse imediato ou necessidade do sujeito, quanto o objeto pode atraí-la em razão de suas características e qualidades.

Com base em suas ideias podemos explicar essa relação bilateral da seguinte forma: a atenção possui fatores que delimitam sua manifestação, definem suas propriedades e a seleção dos processos psíquicos. Tais fatores podem ser tanto de ordem externa quanto de ordem interna.

Os fatores externos, extrínsecos ao indivíduo, chegam-lhe pelo campo da percepção e determinam o sentido e o volume da atenção. Dentre eles, Luria destaca a intensidade e a novidade do estímulo, os contrastes, as mudanças bruscas e o movimento.

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A intensidade do estímulo está relacionada a sua força. Estímulos fortes, como uma luz intensa, cores brilhantes, sons e cheiros fortes, facilmente chamam a atenção do sujeito. Quanto mais forte a intensidade do estímulo, mais ele se destacará. Assim, se houver dois estímulos ou mais, de intensidades diferentes, a atenção do sujeito voltar-se-á para aquele que tem maior força. Por exemplo, quando se entra em um recinto com baixa iluminação, a atenção se dirige imediatamente para a lâmpada que tem maior voltagem e que, por isso, ilumina mais. Isso quer dizer que, embora as demais lâmpadas também iluminem o local, é a que tem maior intensidade que desperta a atenção do sujeito. No entanto, se, no campo perceptivo, os estímulos tiverem a mesma intensidade, nenhum deles se destaca e a atenção do sujeito sofre oscilações, voltando-se ora para um ora para outro.

Já a novidade do estímulo está relacionada a sua singularidade e originalidade. Se, dentre vários estímulos conhecidos, surgir um incomum, é este que atrairá a atenção do sujeito. A novidade, porém, apenas servirá de estímulo se for compreendida, ou seja, se tiver relação com alguma experiência passada ou, então, se despertar a curiosidade do sujeito.

Se um estímulo sonoro ou visual mudar bruscamente, também chamará a atenção do sujeito. Essa mudança brusca pode ser tanto a interrupção de uma luz ou de um som, quanto seu começo. O mesmo acontece com o movimento dos objetos.

Por fim, o contraste entre os estímulos está relacionado as suas propriedades. A atenção é dirigida involuntariamente para as diferenças perceptíveis, sejam elas de forma, cor ou tamanho.

Quanto aos fatores internos, estão situados no próprio sujeito e na estrutura de sua atividade. No sujeito, encontram-se a personalidade, o caráter, o temperamento, o estado de ânimo, a atitude emocional, o cansaço e os processos mentais. Na estrutura da atividade, os interesses e as necessidades influenciam a dinâmica da atenção.

Segundo a visão clássica de estruturação psíquica, as propriedades do indivíduo são forças

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internas, inerentes ao homem. Para evitar o erro de relacionar esses fatores internos a fatores de ordem hereditária ou a funções psíquicas abstratas, é necessário distinguir os conceitos de personalidade, caráter, temperamento, emoções, interesses e necessidades.

Para a Teoria Histórico-Cultural, a personalidade do sujeito é parte constituinte da consciência e, como tal, sua formação também sofre influência externa: “[...] a personalidade constitui uma formação integral de um tipo especial. Não é uma integridade condicionada de modo genotípico: a personalidade não nasce, a personalidade se faz1” (LEONTIEV, 1978, p. 137, tradução nossa).

A personalidade desenvolve-se ao longo da vida, “formando-se na atividade concreta” (RUBINSTEIN, 1972, p. 21). Seu desenvolvimento depende do aparato anatômico fisiológico sadio; este, embora seja condição, não é determinante desse desenvolvimento. Dessa forma, a personalidade resulta da relação dialética entre os fatores internos e externos ao homem.

O temperamento é um “aspecto dinâmico da personalidade, que caracteriza a dinâmica da sua atividade psíquica [...] está alternadamente ligado a todos os restantes aspectos da vida da personalidade e condicionado por todo o conteúdo concreto da sua vida e da sua atividade” (RUBINSTEIN, 1972, pp. 89-90). Ele se manifesta na força, na velocidade e no ritmo das manifestações psicomotoras humanas, ou seja, aparece na lentidão, na rapidez, na calma ou na agitação das ações práticas, dos movimentos expressivos e da forma da linguagem.

O caráter está relacionado à orientabilidade do temperamento: “[...] o temperamento é a premissa presente e o caráter o resultado final do processo educativo” (VIGOTSKY, 2004, p. 398). Ou seja, o caráter não é estático, é dinâmico; resulta da luta das forças inatas contra as adquiridas. Assim, o processo educativo é de grande valia na formação do caráter do educando, embora tal intervenção não se dê de forma direta. É como o jardineiro que, ao adubar e regar o solo, tornando o meio propício para o desenvolvimento da planta, influencia de forma indireta seu crescimento.1 “la personalidad constituye uma formación integral de um tipo especial. No es uma integridad condicionada de modo genotípico: la personalidade no nace, la personalidad se hace”.

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Os estados de ânimo relacionam-se à postura diante da vida, podendo ser eufóricos ou depressivos e também aprendidos (RUBINSTEIN, 1972).

Quanto aos interesses, Vigotsky (2004) os define como a disposição psíquica de se voltar para um ou outro objeto, em razão das necessidades socialmente constituídas. Desse modo, “tudo o que fazemos [...] fazemo-lo movidos por um interesse, ainda que seja por um interesse negativo como temer complicações” (2004, p. 112).

Conforme Vigotsky (2004, p. 112), o interesse é:

uma disposição de preparar o organismo para certa atividade, disposição essa acompanhada de uma elevação geral da atividade vital e do sentimento de satisfação. Quem escuta algo com interesse prende a respiração, aguça o ouvido na direção do falante, não desvia deste a vista, suspende qualquer outro trabalho e movimento e, como se diz, ‘se torna todo ouvidos’. Isso é a expressão mais completa da total concentração do organismo em um ponto, da sua plena transformação em um tipo de atividade.

Necessidade e interesse andam juntos. As necessidades “[...] manifestam as suas relações práticas (do homem) com o mundo e a sua dependência deste” (RUBINSTEIN, 1972, p. 29). As necessidades, o impulso primário da atividade, são historicamente determinadas e dão lugar ao interesse.

Com base na análise dos fatores externos e internos do desenvolvimento da atenção arbitrária, é possível afirmar que a estruturação da atenção racional depende das propriedades do meio e também de como esse meio é internalizado pelo sujeito. Os traços individuais resultam da atividade e do lugar que o sujeito ocupa em suas relações sociais, o que configura uma unidade dialética. Como o sujeito e a estrutura da sua atividade estão em confluência com a realidade objetiva, forma-se essa unidade, na qual um fator interno, ao mesmo tempo em que é resultado, influi no movimento do meio. Assim, quando os autores evidenciam a influência do estado de ânimo do sujeito, da sua atitude emocional, do seu cansaço e de seus processos mentais (sobretudo, o volume e a constância da atenção) e do seu interesse sobre a formação da atenção, eles estão se referindo a esse movimento dialético no qual a consciência está embasada. Por meio dele, de forma concomitante, os processos citados são influenciados

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pelas situações externas e influenciam na aquisição da atenção voluntária. Por isso, um mesmo estímulo pode ser percebido de diferentes maneiras pelas pessoas, já que cada uma ocupa um lugar diferenciado nas relações sociais, exercendo um tipo específico de trabalho na sociedade capitalista.

Fatores

externos

Estímulos

Contrastes

Mudanças

Movimentos

Sentido

Volume

Atenção

Fatores internos

Sujeito (personalidade, caráter, temperamento, estados de ânimo, processos mentais)

Estrutura da atividade

(interesses, necessidades)

Estabilidade

Volume

Fonte: Quadro organizado por AMUDE-PATEZ (2011).

Segundo estudos de Luria (1991), os fatores externos e internos, além de determinar a manifestação da atenção, influenciam na constituição das propriedades da atenção que são: o volume e a estabilidade. O volume corresponde à quantidade de estímulos externos que assumem caráter dominante, ou seja, que podem ser captados de uma só vez pelo campo perceptivo. A estabilidade da atenção é a duração com a qual esses processos discriminados pela atenção podem manter seu caráter dominante. A estabilidade da atenção está sujeita a oscilações periódicas. Como a atenção é um processo dinâmico e está relacionada à experiência sensorial, em alguns momentos, o estímulo perde seu caráter dominante, mas, em outros, o recupera. Assim, a oscilação da atenção pode ser influenciada pela oscilação da precisão sensorial, do cansaço, da falta de adaptação dos órgãos sensoriais, ou, ainda, da

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observação de figuras ambíguas.

Podemos distinguir dois níveis ou tipos de atenção: a atenção involuntária e a atenção voluntária (ou atenção arbitrária, racional).

Quadro 1- Quadro sintético de comparação entre a atenção involuntária e a atenção voluntária

ATENÇÃO INVOLUNTÁRIA ATENÇÃO VOLUNTÁRIA

- Determinada pelas trocas e oscilações do meio externo, ou seja, pelo aparecimento dos estímulos novos, por mudanças bruscas, por contrastes e força dos estímulos; além disso, depende dos interesses imediatos, das necessidades e do estado de ânimo do sujeito. É um tipo de atenção que se produz e se mantém independentemente da intenção do indivíduo.

- Determinada pelos fins da atividade consciente a que se dirige. - Exigida sempre que não existe um interesse imediato, mas que é preciso orientar a atenção para um objeto por meio de um esforço consciente.

- Forma primitiva de atenção. - Forma desenvolvida de atenção.

- Deve-se a comportamentos reflexos. - Desenvolve-se da atenção involuntária.

- Caráter instável. - Caráter estável.

- É passiva, por ser governada por fatores independentes do sujeito, por exemplo, um ruído repentino, uma sensação de fome.- Não intencional, na medida em que é guiada por estímulos externos ao indivíduo.

- Caráter ativo, por ser orientada pelo próprio sujeito.

- Espontânea. - Atenção orientada por esforço consciente.

- Tem caráter mediato, em razão de o objeto que é foco da atenção não a atrair diretamente sobre si.

Fonte: Fundamentado em Rubinstein (1973b), Gonobolin (1969) e Luria (1991; 1981).

Feito isso, iremos analisar de que forma a atenção voluntária se forma e se desenvolve nos indivíduos, considerando, especialmente, as interações sociais e o uso da linguagem: “na criança em desenvolvimento, as primeiras relações sociais e as primeiras exposições a um

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sistema linguístico (de significado especial) determinam as formas de sua atividade mental” (LURIA, 1991, p. 23).

Nos primeiros meses de desenvolvimento, logo após o nascimento, a criança apresenta um tipo de atenção rudimentar, não intencional e involuntário, que não é capaz de orientar seu comportamento. A atenção, nesses primeiros meses de vida, é involuntária, com caráter de reflexo orientado (LURIA, 1991).

O reflexo orientado pode surgir em virtude de uma mudança de situação ou pela expectativa de um estímulo novo, que, em razão da originalidade, torna-se o estímulo principal. Em resposta a esse estímulo, de um lado, surge um sistema seletivo de respostas e, de outro, concomitantemente, ocorre a inibição de reações aos estímulos secundários. O autor destaca como manifestação reflexa aos estímulos biologicamente significativos um conjunto de reações eletrofisiológicas, vasculares e motoras, dentre as quais podemos mencionar a virada de olho e de cabeça no sentido do novo objeto e a reação de precaução (reações vasculares, mudanças da respiração, reações galvânicas da pele) ou escuta. Assim, a criança em idade tenra tende a interromper a sucção, direcionar o olhar e depois a cabeça rumo ao estímulo sonoro ou luminoso abrupto, mesmo que esteja sendo amamentada. Isso ocorre porque o estímulo sonoro ou luminoso, por ser um estímulo novo, adquire status principal e o ato de sugar torna-se uma atividade secundária, que é interrompida quando a atenção é desviada para o estímulo principal, desorganizando a ação.

Com o passar do tempo, a atenção involuntária se desenvolve e adquire forma mais complexa:

[...] a criança vive num ambiente de adultos e se desenvolve num processo vivo de comunicação com eles. Essa comunicação, que se realiza através da fala, de atos e gestos do adulto influencia essencialmente a organização dos processos psíquicos da criança (LURIA, 1991, p. 25).

Nesse processo de interação social, mesmo que seja no princípio, quando o infante ainda não domina a linguagem, essa forma de atenção se faz presente em virtude do convívio com os adultos. Por meio da linguagem, ideias, sentimentos e modos de comportamento, os adultos

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concretizam sua função inicial de comunicação, expressão e compreensão e tornam possível a organização do pensamento da criança, na medida em que a função comunicativa está estreitamente combinada com o pensamento.

Quando um adulto utiliza a linguagem para interagir com a criança, seu campo perceptivo, que é amplo, é direcionado para um foco, em razão de a instrução verbal provocar uma influência seletiva forte e rigorosa. Então, quando a mãe nomeia um objeto do ambiente e o aponta com o dedo, a atenção da criança é atraída para este objeto, que se torna o objeto principal, deixando de lado os demais por um período temporário por se tornarem irrelevantes.

Nas fases iniciais do desenvolvimento da criança, para que sua atenção seja desenvolvida, é necessário tanto sua atuação quanto a do adulto. O adulto, por meio da linguagem, sinaliza um objeto destacando-o do campo perceptivo amplo do infante que o explora tanto com o olhar, quanto com as mãos. Percebemos que a organização da atenção nessa fase, que se configura como uma função interpsíquica, está dividida entre o adulto, que guia a atenção da criança, e a própria criança, que se submete à indicação verbal e gesticular do adulto – geralmente, a mãe.

Essa interação é necessária, pois crianças muito pequenas não diferenciam e nem distinguem os objetos que as circundam: é a instrução verbal da mãe que cumpre esta função. Entretanto, Luria (1991, p. 25) ressalta:

a atenção da criança continua a ter caráter involuntário e exteriormente determinado, com a única diferença de que aos fatores naturais do meio exterior incorporam-se os fatores da organização social do seu comportamento e o controle da atenção da criança por meio de um gesto indicador e da palavra.

Posteriormente, o indivíduo aprende a falar e, ao dominar a linguagem, é capaz de indicar e nomear objetos, distinguindo-os dos demais. Com o domínio da linguagem, desenvolvem-se capacidades intelectuais, como o pensamento e a dedução, por meio dos quais as crianças analisam, generalizam e codificam suas experiências, o que torna possível que, por meio de um esforço consciente que se mantém estável por um período maior, a atenção se transfira de um objeto para outro.

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A linguagem é assimilada por meio das relações sociais, promovendo um salto do sensorial ao racional. Assim, a atenção começa a ser guiada não apenas por percepções e impressões, mas pela orientação do pensamento (que passa por uma reorganização radical), tornando-se organizada e arbitrária, o que nos permite dizer que ela se tornou uma função intrapsíquica.

A função intrapsíquica demarca a passagem da forma de atenção elementar para a atenção superior, tipicamente humana, que é produto do desenvolvimento histórico-social e que leva anos para se configurar: “a formação da atenção voluntária tem uma história longa e dramática, e a criança só adquire uma atenção eficiente e estável, socialmente organizada, pouco tempo antes da hora em que deverá começar a frequentar a escola” (LURIA, 1981, p. 229).

O autor relaciona a linguagem ao desenvolvimento da atenção, considerando que o comando verbal e o gestual tem uma influência orientadora e reguladora, que direciona a atenção da criança. Contudo, esclarece que essa capacidade de responder a uma instrução verbal não ocorre de imediato, depende tanto da faixa etária do sujeito2 , quanto das condições distrativas próximas a ele. Por volta dos dois anos de idade, quando a mãe pergunta: - cadê o ursinho de pelúcia, a criança direcionará seu olhar para o brinquedo e tentará pegá-lo com as mãos. No entanto, caso haja objetos desconhecidos em seu campo perceptivo, ela poderá se distrair, tendo dificuldade para focar sua atenção no objeto nomeado. Sobre essa fase, o autor menciona dois fatos: o primeiro é que a instrução verbal não consegue competir com os fatores que norteiam a atenção involuntária; o segundo, que a instrução verbal pode acionar um comportamento, mas não reprimi-lo. Assim, as reações motoras continuam se repetindo independentemente de o comando cessar. Por exemplo, quando se direciona a atenção da criança para uma bolinha, por meio do comando verbal, depois que ela a pega, é difícil fazê-la soltar por meio de outro comando verbal.

Aos três anos, quando estão se formando os primeiros conceitos e valores da criança, a mediação do adulto é decisiva na orientação da atenção. Cabe ao adulto direcionar a atenção

2 A faixa etária não está relacionada à maturação biológica, mas, ao contrário, está relacionada ao desenvolvimento das capacidades psicológicas necessárias para que a instrução verbal realize sua função de regular o pensamento.

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da criança para o quê, como e quando dirigir a atenção, embora se saiba que a instrução verbal do adulto só vai se efetivar quando coincidir com a percepção imediata da criança.

Na fase dos quatro e cinco anos, quando está na idade pré-escolar, segundo os autores, a capacidade de a criança atender a uma instrução verbal torna-se forte e, em decorrência disso, a fala pode se sobrepor aos fatores que norteiam a atenção involuntária.

Já as crianças em idade escolar, com seis anos de idade aproximadamente, apresentam atenção de caráter um pouco mais estável do que na fase anterior. Outro dado importante fornecido pelos autores é que o infante se torna capaz de guiar sua atenção por meio da fala interna. O desenvolvimento da atenção e o da percepção são intrínsecos: para desenvolver a atenção voluntária é necessário estimular a percepção, de forma que um desenvolvimento insuficiente da atenção corresponde a uma percepção superficial. Isso pode ser constatado nas aulas de leitura, quando o aluno não percebe a palavra como um todo, mas apenas uma de suas partes. Nesse caso, o resultado é a leitura incorreta da palavra.

Nos primeiros anos da escola formal, por volta dos sete anos, a seletividade da atenção, em razão da fala interna da criança, está desenvolvida a tal ponto que, além de organizar seu comportamento, é capaz de organizar, também, seus processos sensoriais.

Em resumo, conforme Luria em suas duas obras mencionadas, a atenção é uma função psicológica imprescindível ao ser humano, porque, além de ser importante para o desenvolvimento das demais FPS, é indispensável para a realização da atividade humana. Na medida em que proporciona ao homem a capacidade de selecionar os estímulos provenientes do meio, ela torna possíveis o pensamento e a atividade social.

Por isso a importância em nós, educadores e responsáveis pela formação da criança, compreendermos esse aspecto de forte relevância (a atenção humana) na obra de Luria. A partir dessas informações, nossas aulas poderão ser organizadas de maneira a trabalharmos

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melhor a atenção da criança para que a mesma possa apreender os conteúdos científicos sistematizados ao longo da história da humanidade.

Dica de fi lme – Parada Obrigatória!Como Estrelas na Terra – toda a criança é especial

Título original: Taare Zamen Par – every child is specialLançamento/país: 2007/ EUADiretor: Aamir KhanGênero: DramaTaare Zameen Par conta a história de uma criança que sofre com dislexia e custa a ser compreendida. Ishaan Awasthi, de 9 anos, já repetiu uma vez o terceiro período (no sistema educacional indiano) e corre o risco de repetir de novo. As letras dançam em sua frente, como diz, e não consegue acom-panhar as aulas nem focar sua atenção. Seu pai acredita apenas na hipótese de falta de disciplina e trata Ishaan com muita rudez e falta de sensibilidade. Após serem chamados na escola para falar com a diretora, o pai do garoto decide levá-lo a um internato, sem que a mãe possa dar opinião alguma. Tal atitude só faz regredir em Ishaan a vontade de aprender e de ser uma criança. Visivelmente deprimido, sentindofaltadamãe,doirmãomaisvelho,davida…Afilosofiadointernatoéadedisciplinarcavalosselvagens. Mas, um professor substituto de artes entra em cena e logo percebe que algo de errado estavapairandosobre Ishaan.Nãodemorouparaqueodiagnósticodedislexiaficasseclaroparaele, o que o leva a por em prática um ambicioso plano de resgatar aquele garoto que havia perdido a vontade de viver.

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AFETIVIDADE E EDUCAçãO, EXISTE ESSA CORRELAçãO?

A relação pais e filhos independem de apenas possuir sensibilidade materna ou paterna, mas implica na sensibilidade padrão de conduta que contextualiza esta relação. Sendo esta sensibilidade uma disposição em prestar atenção aos sinais da criança e entendê-los de maneira rápida, quando preciso for.

Na escola, a atenção do educador tem como figura central e constante a criança. A esta deve ser dada, de maneira adequada e bem dirigida, respostas e direcionamentos de maneira sempre mediativa. O professor não está na escola para resolver os problemas afetivos das crianças, mas para acompanhar e mediar situações de conflitos nas relações e na aprendizagem.

Entendemos que o meio social é o fator proeminente do processo de aprendizagem, podemos observar os estímulos que o meio propicia por meio das condições afetivas, sociais, econômicas nas quais a criança está inserida. Nesse sentido, no ambiente escolar o professor é o mediador para uma aprendizagem significativa, para isso, a afetividade durante todo processo de apropriação do conhecimento é fundamental.

Não queremos trazer aqui a figura da afetividade em um tom romântico. Em absoluto! Afetividade não é isso! Afetividade é crer na possibilidade de avanço da criança, dentro do processo acadêmico-científico, mostrando-lhe o sentido de tudo o que é aprendido em sala de aula. É o dar sentido, é o mostrar a referência que entendemos ser o papel fundamental da afetividade.

Vigotsky (1930) já pontuava essa necessidade de referência do mediador para a estimulação da Zona de Desenvolvimento Proximal da criança. Vejam a importância do outro para a relação e a formação humana! Vejam a importância da afetividade nessa relação.

Nesse sentido, há a interferência sobre o indivíduo, em um contexto familiar e escolar, enquanto meio, a afetividade influencia na construção da individualidade da criança e no

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desenvolvimento de sua personalidade.

Na escola, as relações com os amigos e professores, estabelecem um amplo espaço para desenvolver a individualidade, dentro de um contexto sócio-histórico, por meio dos conflitos cotidianos em sala de aula, no pátio, nas brincadeiras, tornando a escola um dos centros de relações mais importantes na vida das crianças.

É nesse contexto que a criança aprende a ser gente, a ser humano, a constituir-se como um ser humano.

Por meio da afetividade, revela-se o desejo e sendo esse desejo revelado surge o querer que busca algo a ser alcançado: o aprender. Ou seja, a afetividade rompe com “barreiras” que bloqueiam a aprendizagem, tornando-a satisfatória e não “enfadonha” em todos os momentos. Entre essas barreiras encontra-se o medo do fracasso, de perder o controle, medo da reação do meio. Bloqueios estes vão sendo enraizados no decorrer das experiências de sucesso e fracasso na vida da criança.

O medo revela expressões de insegurança, fuga, autoproteção e busca por atenção. Ele paralisa, e o estímulo à coragem pode mediar o processo de superação, podendo ser apenas o desejo de tentar um triunfo. Crianças que apresentam dificuldades e/ou distúrbios de aprendizagem tendem a manifestar constantes alterações de sentimentos, oscilações entre a tristeza e a alegria.

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Nessa perspectiva, observar os sinais emocionais é de suma importância. Alguns sinais emocionais podem ser indicativos de que algo não está bem e, ainda, podem interferir e/ou prejudicar a aprendizagem.

Os sinais mais comuns são a raiva, a agressividade, o medo, a timidez em excesso, a ansiedade e a insegurança. Crianças com fortes experiências de frustração e falta de afeto e amor, que vivem em ambientes de opressão e agressão podem adotar a agressividade como uma forma de proteção.

Verificamos que a escola é o ambiente no qual essas condutas “explodem”. Mesmo exercendo essa figura de empatia com as crianças, essa humanidade que necessita ser inerente a nossa classe profissional, o professor precisa ter em mente que sua função, na escola, é a transmissão do conteúdo científico historicamente acumulado pela sociedade.

DISTÚRBIOS EMOCIONAIS

Parece que quando tratamos da área educacional, em particular naquilo que tange o processo de desenvolvimento e aprendizagem do ser humano, sempre há alguns distúrbios que atingem o ápice da “moda”.

Virou mania falarmos em TDAH.

Agora “virou mania” falarmos em Distúrbio Desafiador e de Oposição - DDO. Não afirmamos aqui que esse distúrbio não existe, o que pedimos é a atenção para diagnósticos desenfreados, os quais não têm levado em consideração a observação da criança em sua totalidade. Por isso, pedimos cuidado!

Segundo o DSM IV, o Transtorno Desafiador de Oposição tem como característica essencial:

um padrão recorrente de comportamento negativista, desafiador, desobediente e hostil para com figuras de autoridade, que persiste por pelo menos 6 meses (Critério A) e se caracteriza pela ocorrência freqüente de pelo menos quatro dos seguintes compor-

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tamentos: perder a paciência (Critério A1), discutir com adultos (Critério A2), desafiar ativamente ou recusar-se a obedecer a solicitações ou regras dos adultos (Critério A3), deliberadamente fazer coisas que aborrecem outras pessoas (Critério A4), responsabi-lizar outras pessoas por seus próprios erros ou mau comportamento (Critério A5), ser suscetível ou facilmente aborrecido pelos outros (Critério A6), mostrar-se enraivecido e ressentido (Critério A7), ou ser rancoroso ou vingativo (Critério A8). A fim de se qua-lificarem para o Transtorno Desafiador Opositivo, os comportamentos devem ocorrer com mais freqüência do que se observa tipicamente em indivíduos de idade e nível de desenvolvimento comparáveis e deve acarretar prejuízo significativo no funcionamento social, acadêmico ou ocupacional (Critério B).

Quanto aos comportamentos, o DSM IV pontua que os mesmos tendem a ser:

[...] negativistas ou desafiadores, são expressados por teimosia persistente, resistência a ordens e relutância em comprometer-se, ceder ou negociar com adultos ou seus pares. O desafio também pode incluir testagem deliberada ou persistente dos limites, geralmente ignorando ordens, discutindo e deixando de aceitar a responsabilidade pelas más ações. A hostilidade pode ser dirigida a adultos ou a seus pares, sendo demonstrada ao incomodar deliberadamente ou agredir verbalmente outras pessoas (em geral sem a agressão física mais séria vista no Transtorno da Conduta). As manifestações do transtorno estão quase que invariavelmente presentes no contexto doméstico, mas podem não ser evidentes na escola ou na comunidade. Os sintomas do transtorno tipicamente se evidenciam mais nas interações com adultos ou companheiros a quem o indivíduo conhece bem, podendo assim não serem perceptíveis durante o exame clínico. Em geral, os indivíduos com este transtorno não se consideram oposicionais ou desafiadores, mas justificam seu comportamento como uma resposta a exigências ou circunstâncias irracionais.

O DDO em crianças sem tratamento adequado pode transformar-se em um Distúrbio de Conduta e com tratamento ainda pode evoluir para um quadro de Transtorno de humor ou ansiedade, podendo persistir alguns sintomas de agressividade.

O Distúrbio de Conduta é considerado o mais grave distúrbio psiquiátrico da infância, sendo um padrão repetitivo e persistente de violação de regras, constantemente, violadas. Dos sintomas abaixo mencionados ao menos três devem estar presentes nos últimos doze meses e pelo menos um critério presente nos últimos seis meses, como a agressividade com pessoas e animais, costuma tiranizar, ameaçar ou intimidar os outros; costuma iniciar lutas físicas; usou alguma arma que possa causar danos físicos a outros; crueldade física com animais e/ou

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pessoas; roubou durante confronto (assalto, furto de bolsa etc.).

Destruição de propriedade, envolveu-se em incêndios com intenção de prejudicar; destrói propriedade alheia; violações graves das regras, costuma “matar aula” antes dos 13 anos de idade; já fugiu de casa à noite pelo menos duas vezes; fica fora durante a noite apesar das proibições dos pais; fraudes ou roubo, furtou artigos de valor; costuma mentir para adquirir favores ou bens para evitar trabalhar; já invadiu domicílios, edifícios ou carros.

Destacamos, porém, que essas nomenclaturas existem apenas para a clarificação do quadro que temos que lidar. Nossa perspectiva é a de que todo o ser humano evolui, desde que haja a crença no mesmo e as condições necessárias para o seu processo de desenvolvimento e aprendizagem.

CONSIDERAçÕES FINAIS

Na unidade V vimos a relevância da atenção para o processo de apreensão do conhecimento científico, dando destaque para a obra de Alexander Luria, um dos pensadores que compunham a Teoria Histórico-Cultural, e que hoje é muito estudado por pesquisadores da área da neurologia.

Foi de intuito, ainda, entendermos a correlação de afetividade e educação, ressaltando, aqui que a afetividade defendida nada se respalda no ideário romantizado, mas sim àquilo que tange uma aprendizagem repleta de sentido para o aluno, em uma correlação entre conteúdo científico e prática cotidiana.

ATIVIDADE DE AUTOESTUDO

1. Sugerimos que você, juntamente com o seu grupo de estudos, faça uma síntese sobre o seguinte tema: “o que é a atenção para Luria?”. No mínimo 20 linhas.

2. Explique, após as discussões realizadas, se há uma correlação entre afetividade e educa-ção.

3. Façaumasíntesedofilme“comoestrelasnaTerra-todacriançaéespecial”,discutindooponto de vista vigotskyano sobre a aprendizagem humana.

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VIGOTSKY, L. S. O desenvolvimento psicológico na infância. São Paulo: Martins fontes, 2003.

Acesse o site <www.aprendercrianca.com.br>, discuta com o seu grupo de estudos as diferentes formasdeaprendizagemeasespecificidadeshumanasparaqueaaprendizagemformalaconteça.

“O caminho do objeto até a criança e desta até o objeto passa por outra pessoa” - Vigotsky.

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CONCLUSãO

PROBLEMAS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA INFÂNCIA

Buscamos, no decorrer da escrita deste livro, mostrar a nossa preocupação com a formação humana, e não apenas em esmiuçar os problemas e as dificuldades de aprendizagem.

Acreditamos que o ser humano desenvolve-se a partir da interação com outros seres humanos. Nossa postura é a de que o homem se torna homem por meio das relações sociais que são datadas historicamente.

Optamos por começar a nossa escrita dessa maneira por um simples motivo, “não queríamos que você imaginasse que teria que encontrar problemas em crianças”, ou que você imaginasse que teria que lidar em sua rotina profissional com “crianças-problema”. O que buscamos foi mostrar que o ser humano precisa ser visto como um todo, e que a queixa quanto à criança precisa ser contextualizada. Quisemos mostrar o profundo respeito que temos por toda e qualquer criança que porventura temos contato.

Foi de nosso intuito mostrar, também, que testes e instrumentos existem apenas para um complemento para o nosso trabalho, e não como determinantes de todo o processo a ser realizado com a criança.

Gostaríamos, professora Márcia e eu, de agradecermos aos profissionais que partilharam de seu conteúdo científico conosco. São eles Fábio Genari, que trabalhou um resgate da construção da categoria infância; Lussuede Luciana Sousa Ferro, que nos auxiliou na compreensão sobre dificuldades de aprendizagem ligadas a área da leitura e da escrita; Amanda Mendes Amude Patez, que clarificou dados sobre a atenção em Luria, um dos maiores pensadores dos últimos tempos, com uma vasta obra que, mesmo após sua morte, tem sido muito divulgada na área da neurociência e também na área educacional.

Tivemos uma intenção durante nosso processo de escrita, quisemos, conscientemente, deixar marcada a nossa postura de que o respeito para com a criança é fundamental, assim como a crença em seu processo de crescimento, desenvolvimento e aprendizagem. Enquanto educadores precisamos acreditar na melhora do outro, na chance de mudança, no desabrochar de novas experiências...

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Afinal, como afirma a professora mestre Cláudia Lopes da Silva, “as crianças não nascem em vasos, elas nascem em famílias, nascem em determinada cultura, em dado contexto social, histórico e cultural”, acreditamos ser sempre esse o nosso ponto de partida ao sermos convocados a realização de trabalhos com crianças.

Até breve!

Um abraço,

Gescielly Tadei e Márcia Storer

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REFERÊNCIAS

ABREU, Berenice Ferreira Leonhardt de. Vocabulário de psicomotricidade, psicopedagogia e psicologia infantil. 2010. Disponível em: <http://www.leoabreu.psc.br>. Acesso em: 08 ago. 2010.

ASSENCIO-FERREIRA, Vicente José. Neurologia e Fonoaudiologia. São Paulo: Pulso, 2003.

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GLOSSÁRIO

Prezado aluno, nosso intuito, nesse breve glossário, foi clarificar algumas terminologias e colocações que apareceram durante a escrita do livro.

Abstração: consiste de focalizar nos aspectos essenciais inerentes a uma entidade e ignorar as propriedades “acidentais”. Em termos de desenvolvimento significa concentrar-se no que um objeto é e o que ele faz. O uso de abstração preserva a liberdade para tomar decisões de desenvolvimento ou de implementação apenas quando há um melhor entendimento do problema ou questão a serem resolvidos (RICARTE, 2001).

Afasias: é por si só a perda da capacidade e das habilidades de linguagem falada e escrita (ASPESI, 2010).

Assimilação: na fonética a assimilação é a transmissão de um ou vários movimentos articulatórios de um fonema vizinho, ou próximo, o que pode determinar até o igualamento deles. Tomando essa colocação para o contexto estudado, é a capacidade de articular conceitos e informações a pontuações já concebidas (DICIONÁRIO ON LINE DE PORTUGUÊS, 2010).

Ariès: estudioso francês dedicado ao estudo da história da criança e da família (ARIÈS, 1978).

Cognição: a aquisição de um conhecimento por meio da percepção. É o conjunto dos processos mentais usados no pensamento e na percepção, também na classificação, reconhecimento e compreensão para o julgamento por intermédio do raciocínio para o aprendizado de determinados sistemas e soluções de problemas. De uma maneira mais simples, podemos dizer que cognição é a forma como o cérebro percebe, aprende, recorda e pensa sobre toda informação captada por meio dos cinco sentidos (CIÊNCIA E COGNIÇÃO, 2010).

Dedução: consequência tirada de um raciocínio; conclusão (DICIONÁRIO ON LINE DE PORTUGUÊS, 2010).

Defectologia: campo de estudo que se estudam as pessoas que apresentam algum tipo de “defeito” – aqueles que não se enquadram nos parâmetros da normalidade. Seja sob uma condição física, seja sob uma condição psicológica (MARTINS, 2010).

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222 PROBLEMAS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA INFÂNCIA | Educação a Distância

Epistemologia: a epistemologia é o ramo da filosofia que estuda a origem, a estrutura, os métodos e a validade do conhecimento (ESTUDOS SOBRE INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL, 2010).

Funções Psicológicas Superiores: as funções psicológicas superiores (FPS), tais como a atenção, memória, imaginação, pensamento e linguagem são organizados em sistemas funcionais, cuja finalidade é organizar adequadamente a vida mental de um indivíduo em seu meio (VERONEZ; DAMACENO; FERNANDES, 2005).

Generalização: ação de generalizar; resultado dessa ação.

Operação do espírito que consiste em comparar as qualidades comuns a uma classe de indivíduos, desprezando as suas diferenças e reunindo essas qualidades comuns numa só ideia, que as fixa e define (DICIONÁRIO ON LINE DE PORTUGUÊS, 2010).

Historicismo: o historicismo é a ideia de que a história obedece a certas leis, que há uma forma racional de compreendê-la e prevê-la. O marxismo, por exemplo, é historicista, pois faz da história uma história da luta das classes; e prevê sua dissolução, isto é, acha a única síntese possível (MARTUCHELLI, 2007).

Inferência: dedução, conclusão (BUENO, 1996).

Inconsciente: para a psicanálise, o inconsciente é um “lugar” desconhecido pela consciência: uma “outra cena”. Trata-se de uma instância ou sistema constituído por conteúdos recalcados que escapam às outras instâncias, o pré- consciente e o consciente (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 1999).

Karl Marx: economista, filósofo e socialista alemão, Karl Marx nasceu em Trier em 5 de Maio de 1818 e morreu em Londres a 14 de Março de 1883. Estudou na universidade de Berlim, principalmente a filosofia hegeliana, e formou-se em Iena, em 1841, com a tese Sobre as diferenças da filosofia da natureza de Demócrito e de Epicuro. Em 1842 assumiu a chefia da redação do Jornal Renano em Colônia, onde seus artigos radical-democratas irritaram as autoridades. Em 1843, mudou-se para Paris, editando em 1844 o primeiro volume dos Anais Germânico-Franceses, órgão principal dos hegelianos da esquerda.

Em 1844, conheceu em Paris Friedrich Engels, começo de uma amizade íntima durante a

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223PROBLEMAS E DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA INFÂNCIA | Educação a Distância

vida toda. Foi, no ano seguinte, expulso da França, radicando-se em Bruxelas e participando de organizações clandestinas de operários e exilados. Ao mesmo tempo em que na França estourou a revolução, em 24 de fevereiro de 1848, Marx e Engels publicaram o folheto O Manifesto Comunista, primeiro esboço da teoria revolucionária que, mais tarde, seria chamada marxista.

Voltou para Paris, mas assumiu logo a chefia do Novo Jornal Renano em colônia, primeiro jornal diário francamente socialista. Depois da derrota de todos os movimentos revolucionários na Europa e o fechamento do jornal, cujos redatores foram denunciados e processados, Marx foi para Paris e daí expulso, para Londres, onde fixou residência. Em Londres, dedicou-se a vastos estudos econômicos e históricos, sendo frequentador assíduo da sala de leituras do British Museum.

Escrevia artigos para jornais norte-americanos, sobre política exterior, mas sua situação material esteve sempre muito precária. Foi generosamente ajudado por Engels, que vivia em Manchester em boas condições financeiras. Em 1864, Marx foi cofundador da Associação Internacional dos Operários, depois chamada I Internacional, desempenhando dominante papel de direção. Em 1867 publicou o primeiro volume da sua obra principal, O Capital. Dentro da I Internacional encontrou Marx a oposição tenaz dos anarquistas, liderados por Bakunin, e em 1872, no Congresso de Haia, a associação foi praticamente dissolvida. Em compensação, Marx podia patrocinar a fundação, em 1875, do Partido Social-Democrático alemão, que foi, porém, logo depois, proibido. Não viveu bastante para assistir às vitórias eleitorais deste partido e de outros agrupamentos socialistas da Europa. Disponível em: <www.culturabrasil.org/marx.htm>. Acesso em: 20 jul. 2011 (CULTURA BRASIL, 2010).

Neuropsicologia: é um ramo da ciência que estuda as relações entre o cérebro e o comportamento humano, dedicando-se, prioritariamente, a investigar como diferentes lesões causam déficits em diversas áreas da cognição humana (SOCIEDADE BRASILEIRA DE NEUROPSICOLOGIA, 2010).

Praxias: movimento intencional, organizado, tendo em vista a obtenção de um fim ou de um resultado determinado. Não é um movimento reflexo, nem automático; é um movimento voluntário, consciente, intencional, organizado, inibido, isto é, humanizado, sujeito, portanto a um planejamento cortical e a um sistema de autorregulação (ABREU, 2010).

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Prognóstico: previsão, suposição sobre o que deve acontecer. Sinal, indício de acontecimento futuro. Medicina Parecer do médico a respeito da evolução provável de uma doença (DICIONÁRIO ON LINE DE PORTUGUÊS, 2010).

Socialismo: o Socialismo é um sistema político-econômico ou uma linha de pensamento criado no século XIX para confrontar o liberalismo e o capitalismo. A idéia foi desenvolvida a partir da realidade na qual o trabalhador era subordinado naquele momento, como baixos salários, enorme jornada de trabalho entre outras.

Nesse sentido, o socialismo propõe a extinção da propriedade privada dos meios de produção e a tomada do poder por parte do proletariado e controle do Estado e divisão igualitária da renda. Os precursores dessa corrente de pensamento foram Saint-Simon (1760-1825), Charles Fourier (1772-1837), Louis Blanc (1811-1882) e Robert Owen (1771-1858), conhecidos como criadores do socialismo utópico. Outros pensadores importantes que se enquadram no socialismo científico são os conhecidos Karl Marx e Friedrich Engels. Disponível em: <mundoeducacao.uol.com.br/geografia/o-socialismo.htm>. Acesso em: 20 jul. 2011 (MUNDO EDUCAÇÃO, 2010).