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Processo Nº 1358323-2 - HC Crime

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Processo Nº 1358323-2 - HC Crime

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    HABEAS CORPUS N 1.358.323-2, DO FORO CENTRAL DA

    COMARCA DA REGIO METROPOLITANA DE CURITIBA - 3

    VARA CRIMINAL

    IMPETRANTE : MARIANA MARTINS NUNES (DEFENSOR

    PBLICO)

    PACIENTES : DAIANY GONALVES NUNES E TALGIA LEME

    INCIO (RS PRESAS)

    RELATOR : DES. JOS LAURINDO DE SOUZA NETTO

    HABEAS CORPUS TRFICO DE DROGAS DENNCIA PELO

    ARTIGO 33, CAPUT DA LEI N 11.343/06 PRISO EM

    FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA AUDINCIA DE

    CUSTDIA PREVISO EM PACTOS E TRATADOS

    INTERNACIONAIS RATIFICADOS PELO BRASIL CONTROLE DE

    CONVENCIONALIDADE EFETIVAO DOS DIREITOS

    HUMANOS PREVISTOS NA ORDEM INTERNACIONAL

    REQUISITOS DA PRISO FUNDAMENTAO COM BASE NA

    QUANTIA CONSIDERVEL DE DROGAS - AUSNCIA DE

    MELHOR TCNICA FALTA DE CONEXO LGICA

    QUANTIDADE CONCRETAMENTE APREENDIDA QUE NO SE

    REVELA EXPRESSIVA AUSNCIA DE PERIGO CONCRETO -

    MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS CIRCUNSTNCIAS

    DO CASO QUE INDICAM A NECESSIDADE E ADEQUAO DE

    SUA APLICAO ARTIGO 282 DO CDIGO DE PROCESSO

    PENAL ORDEM CONHECIDA E CONCEDIDA POR

    UNANIMIDADE.

    1. Dispe o artigo 7, item 5, da Conveno Americana de Direitos

    Humanos que Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida,

    sem demora, presena de um juiz ou outra autoridade autorizada

    pela lei a exercer funes judiciais (...). No mesmo sentido

    assegura o artigo 9, item 3, do Pacto Internacional de Direitos

    Civis e Polticos que Qualquer pessoa presa ou encarcerada em

  • Documento assinado digitalmente, conforme MP n. 2.200-2/2001, Lei n. 11.419/2006 e Resoluo n. 09/2008, do TJPR/OEO documento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.tjpr.jus.br

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    Habeas Corpus Crime n 1.358.323-2 fls. 2

    virtude de infrao penal dever ser conduzida, sem demora,

    presena do juiz ou de outra autoridade habilitada por lei a exercer

    funes judiciais (...).

    2. Isto porque os direitos humanos so extrados dos tratados de

    direitos humanos ratificados pelo Brasil, e, por isso, no se exige

    da jurisdio apenas um controle de constitucionalidade, com

    vistas a efetivar os direitos previstos na Constituio, mas tambm

    um controle de convencionalidade, com o objetivo de efetivar os

    direitos humanos previstos na ordem internacional.

    3. Nesse contexto, o controle de convencionalidade das leis pela

    jurisdio contribui para que os direitos humanos previstos nos

    tratados internacionais sejam incorporados s decises judiciais,

    permitindo a interiorizao deste consenso por meio das decises

    judiciais. Deste modo, a jurisdio constitucional funciona como

    instrumento potencializador da efetividade dos direitos humanos,

    na medida em que, a partir da compreenso crtica da realidade,

    sob o prisma direitos humanos, aplica este consenso no mbito

    interno, operando, assim, como ferramenta de transformao

    social.

    4. A despeito da autoridade coatora fundamentar a necessidade

    da priso preventiva, como base no requisito da garantia da ordem

    pblica, diante da quantia considervel de drogas, gritante a

    falta de conexo lgica entre a quantidade concretamente

    apreendida em posse das Pacientes Talgia e Daiany,

    respectivamente, 0,2 gramas de cocana e 9 gramas de crack (fl.

    33) e 0,1 grama de cocana e 2 gramas de crack (fls. 36/37).

    Portanto, a quantidade de entorpecentes apreendidos no

    representa perigo concreto ordem pblica.

    5. Analisando as circunstncias do caso concreto, em cognio

    sumria at agora, depreende-se que no h indicativo de carter

    associativo, nem habitualidade por parte das pacientes na

    traficncia, fatos que, aliados quantidade das drogas

    apreendidas, revelam que as medidas alternativas mostram-se

    suficientes e adequadas.

    6. Alis, sem entrar propriamente no mrito da causa,

    considerando a relao meio/fim, bem ainda as circunstncias

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    acima apontadas, verifica-se que, em caso de condenao, seria

    possvel a aplicao do 4 do artigo 33, da Lei n 11.343/2006,

    no se tratando tal questo de exerccio de futurologia, mas sim

    de conceder tratamento jurdico dinmica dos fatos

    estabelecidos pelo Estado.

    VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Habeas Corpus

    Crime n 1.358.323-2, da 3 Vara Criminal do Foro Central da Comarca da Regio

    Metropolitana de Curitiba, em que Impetrante MARIANA MARTINS NUNES e so

    Pacientes DAIANY GONALVES NUNES E TALGIA LEME INCIO (RS PRESAS).

    I Trata-se de Habeas Corpus, com pedido liminar,

    impetrado por Mariana Martins Nunes em favor de Dayane Gonalves Nunes e

    Talgia Leme Inacio, contra ato do MM Juzo a quo que, nos autos do Inqurito

    Policial n 0005507-57.2015.8.16.0013, converteu o flagrante em priso

    preventiva.

    Alega o impetrante que a priso em flagrante foi ilegal, fato

    que eiva de vcio toda a priso cautelar subsequente, pois no pode acontecer

    pura e simplesmente a comunicao da priso sem apresentao do preso ao

    juiz, o que apesar de constitucional se mostra absolutamente contrrio ao texto

    do Pacto de so Jos da Costa Rica. Assim, entende que a priso merece ser

    relaxada com imediata edio de alvar de soltura.

    Entende que o magistrado, quando da decretao da

    preventiva, no fundamentou devidamente a sua necessidade, pois no se pode

    admitir circunstncias abstratas, comuns a todos os delitos de trfico de drogas,

    e que toda priso fundada sob as hipteses do art. 312 do CPP tem a imperiosa

    necessidade de basear-se sob dados concretos acerca da conduta do ru sob

    pena de afronta ao art. 93, IX da CF.

    Atenta para o fato de que a lei de drogas no probe o

    benefcio da liberdade provisria, porquanto h muito tal vedao foi declarada

    inconstitucional e ainda, os argumentos existentes na deciso no so suficientes

    para a decretao da priso preventiva, que medida excepcional.

    Informa que as pacientes so primrias, possuem bons

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    antecedentes e suas condutas sempre foram de pessoas adaptadas ao meio

    social.

    Destaca, ainda, que pela nova disciplina da priso,

    indispensvel que a autoridade judicial fundamente a insuficincia e ineficcia

    das medidas cautelares diversas da priso, o que, no entanto, restou inobservado

    no caso concreto, implicando novamente em afronta ao artigo 93 da Constituio

    Federal.

    Tece comentrios acerca da aplicao do redutor do art. 33,

    4. da Lei de Drogas e da possibilidade da substituio da pena por restritivas

    de direitos.

    Em vista da desproporcionalidade da manuteno da priso,

    pugna pela aplicao de medidas cautelares diversas da priso, dispostas no art.

    319 do CPP.

    Requer, assim, que seja deferida a liminar, para que as

    pacientes sejam colocadas em liberdade. No mrito, pugna pela concesso

    definitiva da ordem.

    O pedido liminar foi indeferido s fls. 75/77.

    As informaes foram prestadas pela autoridade coatora (fls.

    82,82,v).

    A doutra Procuradoria Geral de Justia manifestou-se pelo

    conhecimento e denegao da ordem (fls. 85/95).

    a breve exposio.

    II - Conforme se depreende das peas que instruem o feito,

    as Pacientes foram presas em flagrante no dia 05/03/2015, por volta das

    06h50min, por Policiais Militares em operao na rea central de Curitiba, pois

    quando foram abordadas, juntamente com mais 3 indivduos, na Praa Santos

    Dumont, situada na rua Saldanha Marinho, os policiais encontraram com TALGIA

    36 buchas de crack em uma sacola plstica, e mais 5 buchas de cocana e ainda

    10 buchas de crack em sua bolsa, alm de 5 celulares e a quantia de R$ 230,00

    (duzentos e trinta reais) em espcie. J com DAIANY foram encontradas 13

    buchas de crack, 3 buchas de cocana e ainda a quantia de R$ 32,00 (trinta e

    dois reais).

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    Em seguida, o juiz responsvel homologou a priso em

    flagrante e converteu a priso em preventiva por entender patente os requisitos

    autorizadores da priso preventiva, j que evidenciado a existncia do crime e

    indcios suficientes de autoria em desfavor das autuadas, fundamentando o

    decreto prisional com base na garantia da ordem pblica.

    Consta da deciso, na parte que interessa:

    A priso preventiva desvela-se necessria para garantir a ordem

    pblica, haja vista que se lhes atribui o cometimento de crime

    grave (trfico de drogas) e cada uma das acusadas dispunha de

    considervel quantidade de drogas variadas.

    Em poder de TALGIA LEME INACIO foram encontradas cinco buchas

    de cocana e quarenta e seis buchas de crack (dez localizadas em

    sua bolsa e trinta e seis por ela dispensadas). Alm disso, em seu

    poder foram encontrados cinco aparelhos de telefone celular e R$

    230,00. Por sua vez, em poder de DAIANY GONALVES NUNES DA

    SILVA foram achadas trs buchas de cocana e treze buchas de

    crack, alm de R$ 35,00.

    A teor do depoimento dos policiais responsveis pela priso, no

    momento da abordagem as autuadas estavam na companhia de

    outros trs indivduos, os quais dispunham cada qual de um

    cachimbo artesanal para consumo de substncia entorpecente.

    Ademais, aparentavam estar sob efeito de drogas.

    Pelas circunstncias em que flagradas, no difcil perceber que,

    ao menos luz dos elementos do auto de priso, realizavam as

    autuadas o comrcio de drogas na regio central de Curitiba.

    Dispunham de razovel quantidade de drogas de espcies

    diferentes (cocana e crack) e achavam-se rodeadas de usurios de

    entorpecentes.

    No se deve ignorar, outrossim, que TALGIA LEME INACIO tinha em

    sua bolsa cinco aparelhos de telefone celular, circunstncia

    indicativa da mercancia, porque, no raro, usurios de drogas

    furtam/roubam telefones celulares para entrega-los ao traficante

    em troca de drogas.

    Assim, as circunstncias nas quais apreendidas em posse de

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    quantia considervel de drogas de suas espcies diferentes, com

    importncia relevante em dinheiro e cercadas de usurios

    sugerem desfrutem de razovel poder de disseminao de

    narcticos, representando a sua liberdade risco concreto de

    retomada da comercializao do produto ilcito na regio,

    ameaando a sade pblica[3].

    Nenhuma das medidas cautelares no privativas de liberdade teria

    o condo, neste momento, de salvaguardar a ordem pblica.

    Inicialmente, convm ressaltar que a implementao da

    audincia de custdia est prevista em pactos e tratados internacionais

    assinados pelo Brasil, como o Pacto Internacional de Direitos Civis e Polticos e a

    Conveno Americana de Direitos Humanos, conhecida como Pacto de San Jose.

    Dispe o artigo 7, item 5, da Conveno Americana de

    Direitos Humanos que Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem

    demora, presena de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer

    funes judiciais (...). No mesmo sentido assegura o artigo 9, item 3, do Pacto

    Internacional de Direitos Civis e Polticos que Qualquer pessoa presa ou

    encarcerada em virtude de infrao penal dever ser conduzida, sem demora,

    presena do juiz ou de outra autoridade habilitada por lei a exercer funes

    judiciais (...).

    Convm ressaltar ainda que, a Constituio da Repblica,

    alm de trazer como princpio fundamental a dignidade da pessoa humana e um

    significativo rol de direitos fundamentais, de forma a espelhar grande parte da

    proteo internacional, prev a possibilidade de integrao com os tratados

    internacionais ratificados pelo Brasil, no seu art. 5, 2.

    Ocorre ento, no ordenamento jurdico brasileiro, uma

    abertura constitucional ao Direito Internacional, seja quando espelha a essncia

    da proteo internacional, seja quando expressamente incorpora as normas ao

    seu quadro normativo, aperfeioando a principiologia interna com a proteo

    internacional. (MAZZUOLLI, 2010, pg.763)

    Ainda nesta linha, a sistemtica internacional, como garantia

    adicional de proteo, institui mecanismos de responsabilizao e controle

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    internacional, acionveis quando o Estado se mostra falho ou omisso na tarefa de

    implementar direitos e liberdades fundamentais, redefinindo, nas palavras de

    Piovesan, o conceito de cidadania no Brasil.

    O conceito de cidadania se v, assim, alargado e ampliado, na

    medida em que passa a incluir no apenas direitos previstos no

    plano nacional, mas tambm direitos internacionalmente

    enunciados. A sistemtica internacional de accountability vem

    ainda integrar este conceito renovado de cidadania, tendo em

    vista que, ao lado das garantias nacionais, so adicionadas

    garantias de natureza internacional. Consequentemente, o

    desconhecimento dos direitos e garantias internacionais importa

    no desconhecimento de parte substancial dos direitos da

    cidadania, por significar a privao do exerccio de direitos

    acionveis e defensveis na arena internacional. (PIOVESAN, 2012,

    pg. 81)

    Imperioso concluir que a Constituio da Repblica funciona,

    de vrias maneiras, como o fator determinante de aproximao da proteo

    internacional de direitos humanos com o ordenamento jurdico brasileiro, de

    modo que integra, formal e materialmente, as duas esferas de proteo.

    Assim, na medida em que a jurisdio hoje compreendida

    na perspectiva da Constituio, e que esta reflete, em grande medida, o esprito

    da proteo internacional, e permite a integrao do ordenamento jurdico

    interno, possvel concluir que a jurisdio se coloca no contexto da proteo

    internacional dos direitos humanos.

    A Constituio da Repblica, nesse contexto, funciona como

    fator determinante de aproximao da jurisdio com os direitos humanos,

    permitindo, de vrias formas, a compreenso da jurisdio na perspectiva

    humanitria.

    A Carta Magna reproduz o quadro axiolgico da proteo

    internacional dos direitos humanos, propiciando harmonia natural entre o

    ordenamento jurdico brasileiro e aquele arcabouo normativo, favorecendo,

    sobretudo ao intrprete, a compreenso conjunta das duas previses jurdicas.

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    Com efeito, a principiologia constitucional se conecta com os

    valores ticos trazidos pela incorporao do ordenamento jurdico brasileiro

    proteo internacional dos direitos humanos, e repercute na transformao

    sofrida pela jurisdio com a virada axiolgica.

    Em outras palavras, amplia-se o espectro j delineado, do

    compromisso da jurisdio com a os valores constitucionais, para que tambm a

    jurisdio se conecte com as perspectiva dos direitos humanos, para configurar-

    se como instrumento de conformao do ordenamento jurdico brasileiro com o

    corpo jurdico humanitrio internacional.

    Assim, como a Constituio Federal desencadeou uma

    revoluo axiolgica, que, por sua vez, se conectou com o contedo dos direitos

    humanos, consignado est que a jurisdio se situa epistemologicamente nesse

    contexto axiolgico, com a misso de efetivar os direitos humanos.

    Contudo, de se ponderar, num contexto de busca pela a

    efetividade dos direitos humanos, no basta a compreenso epistemolgica da

    jurisdio como instrumento de efetividade, sendo tambm necessrios a

    caracterizao dos meios que propiciem aos encarregados da jurisdio os

    juzes efetivarem esta proteo.

    Deste modo, alm do conhecimento crtico da realidade

    brasileira e do impacto da axiologia dos direitos humanos tem sobre nosso

    ordenamento jurdico, pressuposto epistemolgico da concretizao dos direitos

    humanos, tambm necessrio o domnio, pelo intrprete, das tcnicas do

    controle de convencionalidade.

    Isto porque os direitos humanos so extrados dos tratados

    de direitos humanos ratificados pelo Brasil, e, por isso, no se exige da jurisdio

    apenas um controle de constitucionalidade, com vistas a efetivar os direitos

    previstos na Constituio, mas tambm um controle de convencionalidade, com

    o objetivo de efetivar os direitos humanos previstos na ordem internacional.

    A abertura constitucional aos direitos humanos, a partir do

    art. 5, 2 e 3 da Constituio Federal, (MAZZUOLLI, 2010, pg.763), traz ao

    operador do direito brasileiro um desafio hermenutico, pois inclui nas etapas

    interpretativas, alm da j conhecida filtragem constitucional, o necessrio

    controle de convencionalidade das leis brasileiras.

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    Com efeito, mesmo com a controvrsia a respeito da posio

    hierrquica dos tratados internacionais de direitos humanos, e

    independentemente da soluo que se tenha dado ao status dos tratados

    supralegal, constitucional ou emenda constitucional no se questiona que eles

    integram o ordenamento jurdico brasileiro em hierarquia privilegiada, remetendo

    o interprete sua anlise obrigatria. (PIOVESAN, 2012, pg. 115 e ss.;

    MAZZUOLI, 2010, pg.762 e ss.)

    Nas palavras de Piovesan:

    O pressuposto bsico para a existncia do controle de

    constitucionalidade a hierarquia diferenciada dos instrumentos

    internacionais de direitos humanos em relao legalidade

    ordinria. A isto se soma o argumento de que, quando um Estado

    ratifica um tratado, todos os rgos do poder estatal a ele se

    vinculam, comprometendo-se a cumpri-lo de boa-f. (PIOVESAN,

    2012, pg. 149)

    Neste sentido, em que pese a Constituio brasileira silencie

    sobre a obrigatoriedade deste controle, (PIOVESAN, 2012, PG. 149), o juiz, que

    se destaca neste contexto, como representante do poder Judicirio, tem a

    obrigao de no s conhecer a proteo internacional, mas aplica-lo mediante

    controle de convencionalidade difuso, no podendo se furtar de realiza-lo.

    Assim destaca a jurista, valendo-se da Lio da Corte

    Interamericana:

    Quando um Estado ratifica um tratado internacional como a

    Conveno Americana, seus juzes, como parte do aparato do

    Estado, tambm esto submetidos a ela, o que lhes obriga a zelar

    para que os efeitos dos dispositivos da Conveno no se vejam

    mitigados pela aplicao das leis contrrias a seu objeto, e que

    desde o incio carecem de efeitos jurdicos. (...) o Poder Judicirio

    deve exercer uma espcie de controle de convencionalidade das

    leis entre as normas jurdicas internas que aplicam nos casos

    concretos e a Conveno Americana sobre Direitos Humanos.

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    Nesta tarefa, o Poder Judicirio deve ter em conta no somente o

    tratado mas tambm a interpretao que do mesmo tem feito a

    Corte Interamericana, intrprete ltima da Conveno Americana.

    (PIOVESAN, 2012, pg. 149/150)

    Deste modo, em que pese a efetividade desta proteo

    internacional esteja calcada igualmente nos mecanismos de proteo

    internacional, os quais permitem a responsabilizao internacional do Estado por

    violaes de direitos humanos, de se ponderar que a efetividade da proteo

    internacional recai sobremaneira no controle de convencionalidade das leis

    brasileiras.

    Alm da ratificao de tratados de direitos humanos, a serem

    recepcionados de forma privilegiada pela ordem jurdica local,

    fundamental transformar a cultura jurdica tradicional, por vezes

    refratria e resistente ao Direito Internacional, a fim de que realize

    o controle de convencionalidade. (PIOVESAN, 2012, pg. 149)

    Com efeito, na exata medida em que a jurisdio

    constitucional depende do controle de constitucionalidade, (MARINONI, 2008,

    pg. 56), os direitos humanos e sua efetividade recaem substancialmente no

    necessrio controle de convencionalidade pela jurisdio, que, compreendida

    epistemologicamente no contexto constitucional e humanitrio, conforma

    constitucionalidade a normativa brasileira aos tratados internacionais de direitos

    humanos.

    Como afirma Flvia Piovesan, o controle de

    constitucionalidade contribuir para que se implemente no mbito domstico os

    standarts, os princpios e a jurisprudncia internacional em matria de direitos

    sociais (PIOVESAN, 2012, PG. 150), permitindo a harmonizao efetiva da

    ordem interna com a ordem internacional.

    Assim, com o controle de constitucionalidade potencializa-se

    a concretizao dos direitos humanos, permitindo insero dos valores dos

    direitos humanos nas decises brasileiras, efetivando a proteo internacional

    por meio da jurisdio.

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    Nesse contexto, o controle de convencionalidade das leis

    pela jurisdio contribui para que os direitos humanos previstos nos tratados

    internacionais sejam incorporados s decises judiciais, permitindo a

    interiorizao deste consenso por meio das decises judiciais.

    Deste modo, a jurisdio constitucional funciona como

    instrumento potencializador da efetividade dos direitos humanos, na medida em

    que, a partir da compreenso crtica da realidade, sob o prisma direitos

    humanos, aplica este consenso no mbito interno, operando, assim, como

    ferramenta de transformao social.

    Pois bem.

    Aps, essa necessria introduo acerca do controle de

    convencionalidade, a fim de demonstrar a necessidade de efetivao dos direitos

    humanos previstos na ordem internacional, volta-se ao tema principal, qual seja,

    a denominada audincia de custdia, que consiste, basicamente, na

    apresentao, sem demora, do preso autoridade judiciria, para que este

    decida pela manuteno ou no da priso, com base nos princpios da legalidade

    e necessidade.

    E uma das principais vantagens da implementao da

    audincia de custdia no Brasil, importa na misso de reduzir o encarceramento

    em massa no pas, porquanto atravs dela se promove um encontro do juiz com

    o preso.

    Desta feita, a audincia de custdia servir para que o juiz

    analise a necessidade da priso, momento em que o juiz, de acordo com o

    princpio da legalidade, poder: i) relaxar a priso em flagrante ilegal; ii) decretar

    a priso preventiva ou outra medida cautelar alternativa priso; iii) manter

    solta a pessoa suspeita da prtica de determinado delito, se verificar ausentes os

    pressupostos da cautelaridade previstos no artigo 312 do CPP.

    Outrossim, nem se argumente que resta suficiente a

    comunicao imediata da priso ao juiz de qualquer pessoa, com a remessa, no

    prazo de vinte e quatro horas, do auto de priso em flagrante, nos termos do

    artigo 306, caput e 1 do Cdigo de Processo Penal.

    A esse propsito a Corte Internacional de Direitos Humanos

    tem decidido reiteradamente que o simples conhecimento por parte de um juiz

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    Habeas Corpus Crime n 1.358.323-2 fls. 12

    de que uma pessoa est detida no satisfaz essa garantia, j que o detido deve

    comparecer pessoalmente e render sua declarao ante ao juiz ou autoridade

    competente (Corte IDH. Caso Acosta Caldern Vs. Equador. Sentena de

    24/06/2005).

    E, ainda, que o juiz deve ouvir pessoalmente o detido e

    valorar todas as explicaes que este lhe proporcione, para decidir se procede a

    liberao ou a manuteno da privao da liberdade, concluindo que o

    contrrio equivaleria a despojar de toda efetividade o controle judicial disposto

    no artigo 7.5 da Conveno (Corte IDH. Caso Bayarri Vs. Argentina. Sentena de

    30/10/2008. No mesmo sentido, cf. Caso Chaparro lvarez e Lapo iguez Vs.

    Equador. Sentena de 21/11/2007; Caso Garcia Asto e Ramrez Rojas Vs. Per.

    Sentena de 25/11/2005; Caso Palamara Iribarne Vs. Chile. Sentena de

    22/11/2005.

    No entanto, a despeito de trata-se de um princpio

    fundamental e de longa data do direito internacional, a audincia de custdia no

    vinha sendo respeitada no Brasil.

    Contudo, tal situao vem sofrendo alterao, pois uma srie

    de medidas esto sendo tomadas, no mbito nacional, a fim de concretizar, cada

    vez mais, o respeito ao direito de audincia de custdia no momento da priso

    em flagrante, apontando para a inevitvel implantao dessa audincia no Brasil.

    A primeira delas, consiste no Projeto Audincia de Custdia,

    desenvolvido pelo CNJ em parceria com o TJSP e o Ministrio da Justia, e

    consiste na criao de estrutura multidisciplinar nos Tribunais de Justia para

    receber presos em flagrante, visando a uma primeira anlise sobre o cabimento

    e a necessidade de manuteno dessa priso ou a imposio de medidas

    alternativas ao crcere.

    Alis, em 10 de abril de 2015, em notcia vinculada no site

    do Supremo Tribunal Federal, consta que o Presidente do STF e do Conselho

    Nacional de Justia, ministro Ricardo Lewandowski, o ministro da Justia, Jos

    Eduardo Cardozo, e o presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa

    (IDDD), Augusto Arruda Botelho, assinaram na quinta-feira (9), trs acordos de

    cooperao tcnica para facilitar a implementao do projeto Audincia de

    Custdia em todo o Brasil e para viabilizar a aplicao de medidas alternativas

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    Habeas Corpus Crime n 1.358.323-2 fls. 13

    cautelares, como o uso de tornozeleiras eletrnicas

    (http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=289056&cai

    xaBusca=N)

    Assim, no se pode ignorar a inevitvel alterao do

    comportamento do Judicirio Brasileiro em relao necessidade de realizao

    das audincias de custdia, previstas em normas de direito internacional, que j

    integram o ordenamento jurdico nacional.

    Contudo, a ausncia da referida audincia de custdia, no

    conduz, necessariamente, a anulao da deciso, eis que vivel a aplicao de

    medida cautelar diversa da priso, diante da adequao e necessidade, em razo

    das circunstncias do caso concreto.

    Sobre a questo, oportuna a transcrio dos ensinamento de

    Antonio Magalhes Gomes Filho:

    Resta ainda observar que, mesmo quando verificado um defeito

    de motivao que possa levar ao reconhecimento da nulidade em

    favor da defesa, o juiz ou o tribunal no devem necessariamente

    anular a deciso contaminada pelo vcio. possvel tambm, e

    desde que seja o caso, decidir no mrito em benefcio do ru,

    reformando o provimento, in melius, a teor do que determina de

    modo expresso o art. 249, 2, do Cdigo de Processo Civil,

    aplicvel por analogia ao processo penal: Quando puder decidir no

    mrito, em favor da parte da parte a quem aproveite a declarao

    de nulidade, o juiz no a pronunciar nem mandar repetir o ato,

    ou suprir-lhe a falta. (in A motivao das decises penais. So

    Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, p. 204).

    Em relao aos requisitos ensejadores da priso preventiva,

    oportuno considerar que a deciso de primeiro grau no se revestiu da melhor

    tcnica.

    Em primeiro lugar, porque, com relao apontada ordem

    pblica, insta salientar que o argumento concernente suposta gravidade do

    delito no constitui elementar adequada para o decreto ou a manuteno de

    prises cautelares, as quais possuem, por escopo constitucional, possibilitar o

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    Habeas Corpus Crime n 1.358.323-2 fls. 14

    regular desenvolver processual e, portanto, carter meramente instrumental.

    Assim, quando empregada a ttulo de pr-julgamento do

    caso penal, confundem-se as finalidades do instituto processual com as

    finalidades da pena de priso, gerando-se clara antecipao da punio

    institucionalizada, esta vedada expressamente pelo ordenamento jurdico ptrio.

    Em segundo lugar, a despeito da autoridade coatora

    fundamentar a necessidade da priso preventiva, como base no requisito da

    garantia da ordem pblica, diante da quantia considervel de drogas,

    gritante a falta de conexo lgica entre a quantidade concretamente apreendida

    em posse das Pacientes Talgia e Daiany, respectivamente, 0,2 gramas de

    cocana e 9 gramas de crack (fl. 33) e 0,1 grama de cocana e 2 gramas de crack

    (fls. 36/37).

    Portanto, a quantidade de entorpecentes apreendidos no

    representa perigo concreto ordem pblica.

    Por outro vrtice, a incitada preveno delitiva (retomada da

    comercializao do produto ilcito), tambm presente na deciso de decreto da

    priso preventiva, finalidade da pena, e no escopo de priso cautelar (Teoria

    da Pena artigo 59, in fine, do Cdigo Penal).

    Sobre a possibilidade de as pacientes voltarem a traficar

    substncias entorpecentes, efetivamente constitui uma possibilidade, mas nica

    e exclusivamente possibilidade. A possibilidade, todavia, um juzo valorativo

    altamente subjetivo e abstrato por sua prpria natureza, justamente por

    demandar um contexto imaginrio extremo acerca de uma condio no real.

    Assim, diante da quantidade de entorpecentes apreendidos

    no representar perigo concreto ordem pblica, bem ainda diante das

    consideraes tecidas a respeito da audincia de custdia, mostra-se adequado e

    suficiente a decretao das medidas cautelares, como expressamente previsto

    no 2, artigo 282, do Cdigo de Processo Penal.

    Com o advento da Lei 12.403/2011, foi alterada a dinmica

    das prises no Cdigo de Processo Penal, pondo fim chamada bipolaridade

    cautelar do sistema brasileiro, ou seja, o acusado respondia ao processo preso

    cautelarmente ou lhe era deferido o direito liberdade provisria.

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    Com a edio do aludido diploma legal, ampliou-se o leque

    de medidas cautelares de natureza processual diversas da priso. De acordo com

    a nova redao do artigo 310 do Cdigo de Processo Penal, o juiz, ao receber o

    auto de priso em flagrante, poder: I) relaxar a priso, quando ilegal; ou II)

    converter a priso em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos

    constantes do art. 312 do CPP se revelarem inadequadas ou insuficientes as

    medidas cautelares diversas da priso; ou, c) conceder liberdade provisria, com

    ou sem fiana.

    Da interpretao literal do artigo 282, 6, artigo 312,

    pargrafo nico, artigo 313 e artigo 319, todos do Cdigo de Processo Penal,

    conclui-se que, agora, a priso preventiva medida cautelar duplamente

    excepcional, aplicvel apenas se as demais forem insuficientes ou inadequadas.

    Portanto, no acervo de providncias cautelares previstas nos

    artigos 319, 320 e 321, todos do Cdigo de Processo Penal, a decretao da

    priso preventiva ser, como densificao do princpio da proibio de excesso

    (ou da subsidiariedade), a medida extrema a ser adotada, somente para aquelas

    situaes em que as alternativas legais priso no se mostrarem aptas e

    suficientes a proteger o bem ameaado pela irrestrita e plena liberdade do

    indiciado ou acusado.

    essa, precisamente, a ideia da subsidiariedade processual

    penal, que permeia o princpio da proporcionalidade, em sua mxima parcial (ou

    subprincpio) da necessidade (proibio do excesso): o juiz somente poder

    decretar a medida mais radical a priso preventiva quando no existirem

    outras medidas menos gravosas ao direito de liberdade do acusado por meio das

    quais seja possvel alcanar os mesmos fins colimados pela priso cautelar.

    Trata-se de uma escolha comparativa, entre duas ou mais

    medidas disponveis in casu, a priso preventiva e alguma(s) das outras

    arroladas no art. 319 do CPP igualmente adequadas e suficientes para atingir o

    objetivo a que se prope a providncia cautelar.

    Desse modo, sob a influncia do princpio da

    proporcionalidade e das novas opes fornecidas pelo legislador, imperiosa a

    imposio de medidas cautelares diversas da priso.

    Destaque-se, para tanto, que as Pacientes Daiany e Talgia

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    so primrias, possuem endereo fixo, bem ainda tm desenvolvem profisses

    lcitas, sendo a primeira autnoma como designer de sombrancelhas e a segunda

    Garota de Programa, conforme documentos de fls. 53/54 e 58/59. Alis, a CBO

    (CLASSIFICAO BRASILEIRA DE OCUPAO) N 5198 05 trata especificamente

    dos Profissionais do Sexo.

    Analisando as circunstncias do caso concreto, em cognio

    sumria at agora, depreende-se que no h indicativo de carter associativo,

    nem habitualidade por parte das pacientes na traficncia, fatos que, aliados

    quantidade das drogas apreendidas, revelam que as medidas alternativas

    mostram-se suficientes e adequadas.

    Alis, sem entrar propriamente no mrito da causa,

    considerando a relao meio/fim, bem ainda as circunstncias acima apontadas,

    verifica-se que, em caso de condenao, seria possvel a aplicao do 4 do

    artigo 33, da Lei n 11.343/2006, no se tratando tal questo de exerccio de

    futurologia, mas sim de conceder tratamento jurdico dinmica dos fatos

    estabelecidos pelo Estado.

    Destarte, em consulta aos autos da Ao Penal n 0008482-

    52.2015.8.16.0013 (via PROJUDI), depreende-se que as Pacientes foram

    denunciadas no tipo expresso do artigo 33, caput, da Lei n 11.343/2006, o que

    somente vem a reforar essa tese.

    Sobre a questo, confiram-se os seguintes julgados do STJ:

    HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRPRIO.

    DESCABIMENTO. HOMICDIO E LESO CORPORAL. DELITO DE

    TRNSITO. EMBRIAGUEZ. PRISO PREVENTIVA.

    DESPROPORCIONAL. MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISO.

    SUFICINCIA PARA MANUTENO DA ORDEM PBLICA.ORDEM NO

    CONHECIDA, MAS CONCEDIDA DE OFCIO PARA SUBSTITUIR A

    CONSTRIO PREVENTIVA POR MEDIDAS CAUTELARES.

    - Tanto a deciso que determinou a segregao provisria quanto

    a que indeferiu a liberdade provisria valeram-se da gravidade

    abstrata do delito para justificar a custdia cautelar para garantia

    de ordem pblica, o que, segundo a pacfica jurisprudncia desta

    Corte Superior, no fundamento idneo para imposio da

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    medida extrema, notadamente se cabvel a sua substituio por

    medidas alternativa.

    - Na prpria deciso que indeferiu o pedido de liberdade provisria,

    o magistrado aponta que no h receio de que o acusado v se

    furtar ao penal ou influenciar a colheita de provas, todavia

    mantm a priso cautelar como resposta genrica gravidade do

    delito, o que evidencia o constrangimento a que o acusado est

    submetido.

    - A medida odiosa deve ser aplicada apenas em ultima ratio, em

    consonncia com o disposto no art. 282, 6 do Cdigo de

    Processo Penal e consagrando a mnima interveno do Estado na

    liberdade individual. Em se tratando de paciente primrio, sem

    antecedentes, de condies pessoais favorveis, que permaneceu

    no local do acidente e solicitou socorro s vtimas, tenho por

    suficiente e adequada a decretao de medidas cautelares.

    Ordem no conhecida, mas concedida, de ofcio, para substituir a

    priso preventiva por medidas cautelares a serem impostas pelo

    juiz de primeiro grau, conforme entender necessrias e adequadas

    ao caso.

    (HC 284.897/PB, Rel. Ministra MARILZA MAYNARD

    (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/SE), SEXTA TURMA,

    julgado em 04/09/2014, DJe 23/09/2014)

    RECURSO ORDINRIO EM HABEAS CORPUS. PEQUENA

    QUANTIDADE DA DROGA. CONDIES PESSOAIS DO AGENTE.

    DESPROPORCIONALIDADE DA PRISO CAUTELAR. IMPOSIO DE

    MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS.

    1. A pequena quantidade de droga apreendida e as condies

    pessoais do agente, primrio e endereo certo, fazem ver como

    suficientes medidas cautelares menos gravosas do que a priso.

    2. Recurso ordinrio parcialmente provido para cassar a priso

    preventiva, aplicando, em substituio, as seguintes medidas

    cautelares: (a) apresentao a cada 2 (dois) meses, para verificar a

    manuteno da inexistncia de riscos ao processo e sociedade;

    (b) ocupao lcita, de forma a garantir que a renda pessoal no

    provenha de crimes; (c) proibio de mudana de domiclio sem

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    prvia autorizao judicial, evitando-se riscos aplicao da lei

    penal; e (d) proibio de contato pessoal com os agentes

    nominados na denncia e quaisquer outros envolvidos em

    atividades criminosas, como proteo contra a reiterao

    criminosa.

    (RHC 51.106/BA, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA,

    julgado em 16/12/2014, DJe 03/02/2015) (grifo nosso)

    RECURSO ORDINRIO EM HABEAS CORPUS - HOMICDIO -

    EMBRIAGUEZ - PRISO CAUTELAR - REQUISITOS DO ART. 312 DO

    CPP - EXCEPCIONALIDADE. CONJUGAO COM O ART. 282 DO CPP.

    PROIBIO DE EXCESSO. APLICAO DE MEDIDA CAUTELAR

    DIVERSA DA PRISO. ART. 319 DO CPP C/C ART. 294 DO CTB.

    RECURSO NO PROVIDO. CONCESSO, DE OFCIO, DO WRIT.

    1. (...)

    3. A despeito da notria gravidade e da reprovabilidade social do

    comportamento do recorrente - a ensejar, se demonstrada a

    imputao, correspondente e proporcional sancionamento penal -

    haveria de ser analisada a existncia ou no de meios outros, que

    no a priso preventiva, que pudessem, com igual idoneidade e

    eficcia, satisfazer as exigncias cautelares do caso analisado,

    com carga coativa menor.

    4. A ideia subjacente subsidiariedade processual penal, que

    permeia o princpio da proporcionalidade, em sua mxima parcial

    (ou subprincpio) da necessidade (proibio de excesso), conduz a

    que o juiz somente deve decretar a medida mais radical - a priso

    preventiva - quando no existirem outras medidas menos gravosas

    ao direito de liberdade do indiciado ou acusado, por meio das quais

    seja possvel alcanar, com igual eficcia, os mesmos fins

    colimados pela priso cautelar.

    5. Recurso no provido. Concesso, ex officio, da ordem de habeas

    corpus, para substituir a priso provisria pelas seguintes

    providncias, de igual idoneidade e suficincia cautelar: a)

    proibio de frequentar bares, boates e casas de shows (art. 319,

    inciso II. CPP); b) recolhimento domiciliar noturno e nos dias de

    folga (art. 319, V, CPP) e c) suspenso da habilitao para conduzir

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    veculo automotor (art. 294 do CTB, L. 9.503/97), sem prejuzo de

    outras medidas que o prudente arbtrio do juiz natural da causa

    indicar cabveis e adequadas.

    (RHC 46.099/RJ, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA

    TURMA, julgado em 06/05/2014, DJe 02/06/2014)

    Ressalte-se, por fim, que a Paciente Talgia Leme Incio,

    quando interrogada perante a autoridade policial declarou que viciada em

    crack. Alis, segundo as informaes processuais em seu nome, constata-se a

    existncia de alguns Termos Circunstanciados, pelo artigo 28 da Lei n

    11.343/2006 (consumo pessoal de substncia entorpecente), conforme

    documentos de fls. 65/68.

    Portanto, as circunstncias concretas fazem supor que se

    trata de viciada/traficante, que acabou praticando a suposta conduta ilcita para

    manuteno do seu vcio.

    Ante o exposto, com fulcro no artigo 282, 2 do CPP,

    considero necessrio e suficiente a imposio das seguintes medidas cautelares

    a Paciente TALGIA LEME INCIO:

    a) comparecer a programa/curso educativo, destinado a

    usurios e dependentes de drogas, a ser designado pelo d. Juzo de primeiro grau

    (como medida educativa prevista no art. 28, III da Lei 11.343/2006);

    b) proibio de frequentar a Praa Santos Dumont (centro

    da cidade de Curitiba), como proteo contra a reiterao criminosa (art. 319, II,

    CPP);

    c) proibio de manter contato com a pessoa de Tharles

    Silva (art. 319, III, CPP);

    d) proibio de ausentar-se da Comarca que reside, diante

    da convenincia e necessidade de sua permanncia at a completa finalizao

    da ao penal instaurada (art. 319, IV);

    Em relao a Paciente DAIANY GONALVES NUNES DA SILVA,

    considero necessrio e suficiente a imposio das seguintes medidas cautelares:

    a) proibio de frequentar a Praa Santos Dumont (centro

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    da cidade de Curitiba), como proteo contra a reiterao criminosa (art. 319, II,

    CPP);

    b) proibio de manter contato com a pessoa de Tharles

    Silva (art. 319, III, CPP);

    c) proibio de ausentar-se da Comarca que reside, diante

    da convenincia e necessidade de sua permanncia at a completa finalizao

    da ao penal instaurada (art. 319, IV);

    Tais medidas devem ser cumpridas, sem prejuzo de

    eventual reviso ou revogao pelo magistrado singular, nos termos legais, art.

    282, 4 do Cdigo de Processo Penal.

    Diante do exposto, voto no sentido de conhecer o writ e

    conceder a ordem de habeas corpus, para o fim de aplicar s Pacientes TALGIA

    LEME INCIO e DAIANY GONALVES NUNES DA SILVA as medidas cautelares

    respectivamente elencadas, determinando-se a autoridade coatora a lavratura

    dos respectivos termos e expedio de alvars de soltura em seu favor, se por

    al no estiverem presas e se aceitarem as condies referidas.

    Ante ao exposto,

    ACORDAM os Senhores integrantes da Quinta Cmara

    Criminal do Tribunal de Justia do Estado do Paran, por unanimidade de votos,

    em conceder a ordem, nos termos do voto do Relator.

    Acompanharam o voto do eminente Desembargador Relator,

    os Exmos. Des. Marcus Vinicius de Lacerda Costa e o Juiz Substituto em 2 Grau

    Ruy Alves Henriques Filho.

    Curitiba, 23 de abril de 2015.

    Des. JOS LAURINDO DE SOUZA NETTO

    Relator

    2015-04-28T15:44:55-0300Paran - BrasilValidade Legal