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2016 EDUCAÇÃO MUSICAL Prof.ª Débora Costa Pires Prof. Luiz Roberto Lenzi

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2016

Educação Musical

Prof.ª Débora Costa PiresProf. Luiz Roberto Lenzi

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Copyright © UNIASSELVI 2016

Elaboração:

Débora Costa Pires

Luiz Roberto Lenzi

Revisão, Diagramação e Produção:

Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri

UNIASSELVI – Indaial.

780L575e Pires; Débora Costa Pires Educação musical / Débora Costa Pires; Luiz Roberto Lenzi :

UNIASSELVI, 2016.

218 p. : il. ISBN 978-85-515-0021-7 1.Música. I. Centro Universitário Leonardo Da Vinci.

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III

aprEsEntaçãoCaro acadêmico! Este Caderno de Estudos tem como objetivo

apresentar os conteúdos referentes à Educação Musical. Para isso, é importante que você conheça como a música percorreu o seu desenvolvimento histórico.

Na Unidade 1, você irá (re)descobrir a orquestra sinfônica, com os seus mais variados instrumentos musicais e também conhecer um pouco mais sobre a história destes instrumentos. Verá também que a voz humana faz referência como um eficiente instrumento musical e meio para classificar as vozes dos instrumentos. Ainda, nesta unidade, você conhecerá as propriedades do som e os elementos da música, ferramentas com as quais os compositores constroem suas obras, moldadas em um gênero e uma forma musical.

Na Unidade 2, você mergulhará na história da música, desde os primeiros registros arqueológicos, atravessando séculos de desenvolvimento musical, com alguns dos compositores mais significativos de cada período histórico.

Na Unidade 3, você conhecerá um pouco sobre a educação musical, seus objetivos e algumas importantes propostas. A trajetória do ensino musical no Brasil pela história também será mostrada. Além disso, você poderá entender a inserção do ensino musical desde a educação infantil até o ensino médio, passando pelo ensino fundamental. Você poderá também conhecer outros espaços para atuação, como as escolas de música, bandas e fanfarras.

Durante o transcorrer das leituras você encontrará exercícios e dicas para apreciação musical. É importante que, além de estudar os conteúdos deste caderno, você, caro leitor, procure pesquisar na web interpretações e performances das obras aqui sugeridas. Em música é essencial que você exercite uma escuta mais refinada. Da mesma forma que você deve apreciar atentamente uma obra de artes visuais. Na música, você precisa ampliar seu repertório sonoro e exercitar a sua escuta musical para perceber e compreender os detalhes que poderiam passar despercebidos. Este caderno vai ajudá-lo a “ouvir musicalmente”, desenvolvendo uma escuta ativa.

Ao escrever este caderno, procuramos ser objetivos para que você possa compreender os fundamentos que tornam possíveis a organização dos sons em música, a sua inserção na vida cultural e social e, como consequência, a importância do seu ensino. Em outras palavras, se a música é hoje da maneira como a conhecemos, é porque existe uma história e conhecer esta trajetória amplia nossa visão de mundo e transforma a nossa realidade. Como a artista Fayga Ostrower já disse, “a arte é uma forma de crescimento para a liberdade, um caminho para a vida”.

Boa leitura!Os autores

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IV

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos!

NOTA

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UNIDADE 1 - INSTRUMENTOS MUSICAIS E PARTITURAS .................................................... 1

TÓPICO 1 - A ORQUESTRA, SEUS INSTRUMENTOS E VOZES ............................................... 3

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 32 VOZ HUMANA COMO INSTRUMENTO MUSICAL ................................................................. 43 CLASSIFICAÇÃO DOS INSTRUMENTOS ................................................................................... 6

3.1 INSTRUMENTOS DE CORDAS .................................................................................................... 73.2 INSTRUMENTOS DE SOPRO ....................................................................................................... 113.3 INSTRUMENTOS DE PERCUSSÃO ............................................................................................. 17

RESUMO DO TÓPICO 1 ....................................................................................................................... 24AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 25

TÓPICO 2 - A OBJETIVIDADE MUSICAL ....................................................................................... 27

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 272 PROPRIEDADES DO SOM ................................................................................................................ 27

2.1 ALTURA ............................................................................................................................................ 272.2 DURAÇÃO ....................................................................................................................................... 342.3 INTENSIDADE ................................................................................................................................ 362.4 TIMBRE ............................................................................................................................................. 38

3 ELEMENTOS DA MÚSICA................................................................................................................ 393.1 MELODIA ......................................................................................................................................... 393.2 HARMONIA ..................................................................................................................................... 403.3 RITMO ............................................................................................................................................... 43

RESUMO DO TÓPICO 2 ....................................................................................................................... 46AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 47

TÓPICO 3 - AS FORMAS E OS GÊNEROS MUSICAIS ................................................................. 49

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 492 FORMAS MUSICAIS .......................................................................................................................... 49

2.1 FORMA BINÁRIA ........................................................................................................................... 562.2 FORMA TERNÁRIA ....................................................................................................................... 572.3 RONDÓ ............................................................................................................................................. 582.4 TEMA E VARIAÇÕES ..................................................................................................................... 582.5 FORMA SONATA ............................................................................................................................ 60

3 GÊNEROS EM MÚSICA ..................................................................................................................... 613.1 GÊNEROS DA MÚSICA INSTRUMENTAL ............................................................................... 613.2 GÊNEROS DA MÚSICA VOCAL ................................................................................................. 64

LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 66RESUMO DO TÓPICO 3 ....................................................................................................................... 68AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 70

suMário

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VIII

UNIDADE 2 - HISTÓRIA DA MÚSICA ............................................................................................. 71

TÓPICO 1 - MÚSICA ANTIGA E MÚSICA NA IDADE MÉDIA ................................................. 73

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 732 MÚSICA ANTIGA ............................................................................................................................... 733 MÚSICA NA IDADE MÉDIA ............................................................................................................ 79RESUMO DO TÓPICO 1 ....................................................................................................................... 86AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 88

TÓPICO 2 - MÚSICA RENASCENTISTA E BARROCA ................................................................ 89

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 892 MÚSICA RENASCENTISTA ............................................................................................................. 893 MÚSICA BARROCA ............................................................................................................................ 96RESUMO DO TÓPICO 2 .....................................................................................................................102AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................104

TÓPICO 3 - CLASSICISMO E ROMANTISMO .............................................................................1051 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1052 MÚSICA CLÁSSICA ..........................................................................................................................1053 MÚSICA ROMÂNTICA ....................................................................................................................111RESUMO DO TÓPICO 3 .....................................................................................................................119AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................121

TÓPICO 4 - MÚSICA MODERNA.....................................................................................................123

1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1232 UMA NOVA LINGUAGEM MUSICAL .........................................................................................1233 ROMPENDO TRADIÇÕES ..............................................................................................................131LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................135RESUMO DO TÓPICO 4 .....................................................................................................................137AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................139

UNIDADE 3 - MÚSICA E EDUCAÇÃO ...........................................................................................141

TÓPICO 1 - EDUCAÇÃO MUSICAL ................................................................................................143

1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1432 OBJETIVOS DA EDUCAÇÃO MUSICAL ...........................................................................1443 PROPOSTAS EM EDUCAÇÃO MUSICAL ...................................................................................1474 PROPOSTAS EM EDUCAÇÃO MUSICAL DA PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XX ...149

4.1 ÉMILE JAQUES-DALCROZE ......................................................................................................1494.2 EDGAR WILLEMS ........................................................................................................................1514.3 CARL ORFF ....................................................................................................................................1524.4 ZOLTÁN KODÁLY .......................................................................................................................1544.5 HEITOR VILLA-LOBOS ...............................................................................................................155

5 PROPOSTAS EM EDUCAÇÃO MUSICAL DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX ...1575.1 RAYMOND MURRAY SCHAFER ...............................................................................................1575.2 JOHN PAYNTER ............................................................................................................................1595.3 HANS-JOACHIM KOELLREUTER ............................................................................................160

RESUMO DO TÓPICO 1 .....................................................................................................................163

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IX

AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................165

TÓPICO 2 - HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO MUSICAL NO BRASIL ...........................................167

1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1672 PERÍODO JESUÍTICO .......................................................................................................................1693 PERÍODO IMPERIAL ........................................................................................................................1724 REPÚBLICA .........................................................................................................................................173

4.1 CANTO ORFEÔNICO ..................................................................................................................1754.2. CANTO ORFEÔNICO E A REVOLUÇÃO DE 30....................................................................176

5 DITADURA ..........................................................................................................................................1796 EDUCAÇÃO MUSICAL NA CONTEMPORANEIDADE .........................................................181RESUMO DO TÓPICO 2 .....................................................................................................................182AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................184

TÓPICO 3 - MÚSICA NA SALA DE AULA .....................................................................................185

1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1852 EDUCAÇÃO INFANTIL ...................................................................................................................1873 ENSINO FUNDAMENTAL .............................................................................................................1894 ENSINO MÉDIO ................................................................................................................................1915 ESPAÇOS ALTERNATIVOS ............................................................................................................193

5.1 ESCOLAS DE MÚSICA ................................................................................................................1945.2 BANDAS E FANFARRAS .............................................................................................................195

6 REPERTÓRIO MUSICAL .................................................................................................................197LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................199RESUMO DO TÓPICO 3 .....................................................................................................................204AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................206

REFERÊNCIAS ......................................................................................................................................207

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UNIDADE 1

INSTRUMENTOS MUSICAIS E PARTITURAS

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir desta unidade, você será capaz de:

• identificar e classificar os mais variados instrumentos musicais de acordo com a produção de som;

• entender as propriedades do som e seus registros em música;

• compreender como uma obra musical é construída por meio das formas e dos gêneros musicais.

Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer desta unidade você encontrará atividades que irão lhe auxiliar na compreensão dos conceitos em questão.

TÓPICO 1 – A ORQUESTRA, SEUS INSTRUMENTOS E VOZES

TÓPICO 2 – A OBJETIVIDADE MUSICAL

TÓPICO 3 – AS FORMAS E OS GÊNEROS MUSICAIS

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TÓPICO 1UNIDADE 1

A ORQUESTRA, SEUS INSTRUMENTOS E VOZES

1 INTRODUÇÃO

Se você observar qualquer agrupamento musical, irá perceber que normalmente estarão usando instrumentos para expressar sua musicalidade, ou então, apenas a própria voz como instrumento. Nesta unidade você primeiramente estará familiarizado com os mais variados instrumentos musicais e como eles estão organizados de acordo com sua construção e produção sonora.

Desde as mais populares bandas de rock até as grandes orquestras sinfônicas, você irá perceber que é utilizada uma grande diversidade de instrumentos musicais, para produzir aquele som desejado.

FIGURA 1 – INSTRUMENTOS MUSICAIS DIVERSOS PROPORCIONAM UM SOM DIFERENCIADO

FONTE: Disponível em: <http://www.hollywoodreporter.com/review/under-covers-yo-la-tengo-832206>. Acesso em: 5 abr. 2016.

Para melhor compreender este universo, vamos iniciar este percurso falando sobre o equipamento musical mais natural: a voz humana.

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UNIDADE 1 | INSTRUMENTOS MUSICAIS E PARTITURAS

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2 VOZ HUMANA COMO INSTRUMENTO MUSICAL

Como a própria palavra diz, “instrumento” é um meio para uma finalidade. É algo que você utiliza ou manuseia para exercer a atividade que se propôs a fazer. No entanto, musicalmente falando e de acordo com Dourado (2004, p. 167), trata-se de

qualquer artefato, dispositivo, aparelho ou qualquer objeto construído, adaptado pelo homem ou encontrado na natureza, que é utilizado para produzir sons determinados ou indeterminados, os quais, organizados ou não, são passíveis de serem identificados como música sob o ponto de vista de alguma concepção artística ou social [...].

Assim, podemos conceber um violão como um instrumento musical, por exemplo, e da mesma forma um tambor, um violino ou mesmo uma comum caixa de fósforos no batucar de um chorinho. A voz humana está inserida neste contexto, pois além dela própria ser um instrumento musical, é um eficaz meio natural para classificar o registro dos demais instrumentos. Mas de que forma se dá esta classificação?

Podemos organizar a voz humana em vozes femininas (agudas) e vozes masculinas (graves). Nas femininas encontramos vozes que são ainda mais agudas, e a estas denominamos como “soprano”, enquanto que naquelas que não são tão agudas (ou mais graves que a soprano) denominamos de “contralto”. No mesmo raciocínio, as vozes masculinas também são organizadas como “tenor” para mais agudo e “baixo” para mais grave. O quadro a seguir mostra essa classificação e ainda algumas subclassificações, em vista do amplo alcance da voz humana nas mais tênues diferenças.

QUADRO 1 – CLASSIFICAÇÃO DAS VOZES HUMANAS

Vozesfemininas

Soprano

Sopra ligeiroSoprano líricoSoprano dramáticoMezzosoprano

ContraltoAlto ligeiroAltoAlto dramático

Vozes masculinas

Tenor

ContratenorTenor ligeiroTenor líricoTenor dramáticoTenor heroico

Barítono

Barítono "Martin" ou francêsBarítono verdianoBarítono-baixo

Baixo Baixo cantanteBaixo profundo

Maisagudo

Mais grave

FONTE: Massin (1997, p. 40)

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TÓPICO 1 | A ORQUESTRA, SEUS INSTRUMENTOS E VOZES

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Cabe ressaltar que aspectos que diferenciam uma cantora soprano para contralto não é apenas o alcance de notas mais agudas ou mais graves, mas sim toda a complexidade e heterogeneidade do corpo humano no que diz respeito à massa corporal, estrutura muscular e estrutura óssea na emissão do som. Da mesma forma para com os cantores tenores e barítonos, barítonos e baixos.

FIGURA 2 – CANTORA LÍRICA (SOPRANO) RENÉE FLEMING EM SOLO COM ORQUESTRA

FONTE: Disponível em: <http://www.cleveland.com/musicdance/index.ssf/2016/01/cleveland_orchestra_pulls_out.html>. Acesso em: 5 abr. 2016.

Entendendo a voz humana como um meio de expressar a música, e, sobretudo para aqueles que desejam aprimorar sua técnica vocal, faz-se necessário compreender melhor o funcionamento deste complexo instrumento em sua anatomia e sua fisiologia. Esta compreensão permite que o cantor utilize métodos eficazes de projeção de voz, respeitando os limites físicos pessoais. Também os professores de canto, com base nestes conhecimentos, “podem corrigir as falhas de seus alunos e ensinar a eles a técnica vocal que se fundamente na natureza anatômica e fisiológica humana”, (MARTINEZ, 2000, p. 155).

DICAS

Você pode encontrar vários exemplos de cantores da atualidade no portal Youtube. Sugerimos aqui alguns para as principais vozes: Diana Damrau (soprano ligeiro), Renée Fleming (soprano), Jose Carreras (tenor), Bryn Terfel (baixo-barítono) e Robert Lloyd (baixo).

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UNIDADE 1 | INSTRUMENTOS MUSICAIS E PARTITURAS

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3 CLASSIFICAÇÃO DOS INSTRUMENTOS

Ao observarmos uma grande orquestra sinfônica moderna, de 80 até 120 músicos instrumentistas num mesmo palco, perceberemos uma grande variedade de instrumentos, com formatos que nos são familiares e outros, um tanto estranhos.

Os instrumentos musicais da orquestra sinfônica podem ser classificados em grandes famílias e, numa visão geral e simplista, podemos diferenciá-los em três categorias: cordas, sopros e percussão.

FIGURA 3 – DISPOSIÇÃO GERAL DOS INSTRUMENTOS NA ORQUESTRA SINFÔNICA

percussão

maestro

cordas

sopros

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

Existem métodos de classificação de instrumentos que são muito precisos quanto aos critérios de produção sonora. Um dos mais eficientes é o método desenvolvido pelos musicólogos europeus Erich Moritz van Hornbostel (1877-1935) e Curt Sachs (1881-1959), chamado de método “Hornbostel & Sachs”.

NOTA

A Figura 3 mostra a disposição dos instrumentos da orquestra diante do maestro, com a família das cordas logo à frente, família dos sopros logo atrás e por último a família da percussão. Vamos conhecer mais adiante os personagens desta grande família sonora. A palavra orquestra tem origem grega (Orkestra) e

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TÓPICO 1 | A ORQUESTRA, SEUS INSTRUMENTOS E VOZES

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[...] indicava onde o coro deveria dançar e cantar. Em meados do período Barroco francês, orquestra passou a denominar-se o local do palco onde trabalham os músicos. Atualmente, uma orquestra é um conjunto de instrumentos de cordas, ao qual podem ser agregadas madeiras, metais, harpa, percussão, teclados e outros, dependendo da partitura. Costuma-se creditar a Monteverdi a organização de um dos primeiros grupos que poderiam ser definidos como orquestras, da forma como conhecemos hoje. O número de instrumentistas e formações variou enormemente até o final do século XX, quando, após as instrumentações grandiosas de Wagner, Strauss, Berlioz, Mahler e Bruckner, o conjunto terminou por estabilizar-se em uma média de cem instrumentistas. A orquestra sinfônica moderna completa ainda conserva o padrão do final do século XIX: violinos, violas, violoncelos e contrabaixos (em números aproximados: 32, 12, 12 e 8, respectivamente), oboés, flautas, clarinetas e fagotes (em grupos de quatro cada, incluindo músicos que costumam alternar com oboé e corne inglês, flauta e Piccolo, clarineta e clarone, e fagote e contrafagote), 4 trompetes, 3 trombones, 5 a 8 trompas, 1 tuba, tímpanos, percussão miscelânea, harpa e piano. (DOURADO, 2004, p. 238-239).

Outra denominação que acabou se tornando sinônimo de orquestra é o termo “filarmônica”. Em sua origem, significa “amantes da música”, ou ainda representava um grupo de instrumentistas de caráter amador. Na atualidade, tanto orquestra como filarmônica possuem o mesmo sentido.

Como você pode ver, a orquestra sinfônica da atualidade abrange uma imensa variedade de instrumentos, e em algumas obras, compositores utilizam novas e exóticas fontes sonoras, como instrumentos amplificados eletronicamente, instrumentos orientais e até objetos ou máquinas.

3.1 INSTRUMENTOS DE CORDAS

A família dos instrumentos de cordas pode ser subdividida em duas:

• cordas friccionadas e• cordas tangidas (dedilhadas).

Na primeira, o som é produzido pela fricção de outro objeto nas cordas, o que normalmente é feito pelo arco, e na segunda, as cordas são apenas dedilhadas. Vamos nos ater, neste primeiro momento, aos instrumentos de cordas friccionadas, pois são estes os que formam o maior corpo da orquestra.

Ao vermos uma orquestra sinfônica interpretando alguma obra, imediatamente à nossa frente está o regente e a grande família das cordas friccionadas: os violinos, as violas, os violoncelos (ou apenas cello) e os contrabaixos.

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UNIDADE 1 | INSTRUMENTOS MUSICAIS E PARTITURAS

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FIGURA 4 – A FAMÍLIA DO VIOLINO

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

Pode-se dizer que a família do violino é uma família completa, pois seus instrumentos abarcam todas as possibilidades de vozes, desde os sons mais agudos com o violino até os mais graves com o contrabaixo. Assim temos o violino como soprano, a viola como contralto, o violoncelo como tenor e, obviamente, o contrabaixo como baixo. No entanto, não é uma regra arbitrária, pois qualquer destes instrumentos em algum momento pode exercer uma função de voz mais próxima.

Vale ressaltar que, com exceção da voz humana, os instrumentos não são femininos por serem classificados como mais agudos ou masculinos por emitirem sons mais graves. Instrumentos musicais não têm gênero! Na verdade, eles têm um alcance de notas muito maior que a voz humana.

NOTA

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TÓPICO 1 | A ORQUESTRA, SEUS INSTRUMENTOS E VOZES

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Assim como o instrumento, o arco é feito de madeira e fios de crina de cavalo ou mesmo material sintético, que são presos e esticados no arco, a fim de produzir o som por meio de fricção. No entanto, o instrumentista pode dispensar o uso do arco em algum momento específico e fazer uso de “pizzicato”, ou seja, dedilhar as cordas.

DICAS

Pesquise na internet a obra de Johann e Josef Strauss, “Pizzicato-Polka”, para ver e ouvir o som do dedilhado na família do violino. Para o uso do arco, pesquise no mesmo portal “Pequena Serenata Noturna”, do compositor Wolfgang Amadeus Mozart.

O instrumentista movimenta o arco em direções opostas e a isto chamamos de “arcada”. Este termo, segundo Dourado (2009), refere-se ainda a sinais gráficos que orientam o músico acerca do trecho musical de cada arcada, como as ligaduras de arco. As técnicas de manuseio do arco possuem tradições antigas, que culminaram em tendências educativas, mais conhecidas como “escolas de arco” e ensinam sobre os “golpes de arco” que orientam como articular as notas.

Finalmente, nós temos a “articulação”, e para melhor exemplificar este conceito, imagine o som como as vogais do nosso alfabeto: “a, e, i, o, u”. As vogais estão para o som assim como as consoantes do alfabeto estão para a articulação. As consoantes são como “sons mudos” e servem para dar forma ao som. Da mesma maneira como a acentuação das articulações difere em cada idioma, assim também a articulação difere em cada estilo musical. Trata-se de um aspecto comum a todos os instrumentos.

Entre os instrumentos da família do violino, destacam-se os famosos instrumentos construídos pelo luthier italiano Antônio Stradivari (1644-1737). Considerado o melhor artista na construção destes instrumentos em todos os tempos, Stradivari ainda é insuperável em termos de qualidade (SADIE, 1994). Apesar de estes exemplares datarem do início do século XVIII, muitos deles ainda estão em atividade, utilizados por virtuoses, e seu valor é estimado em milhões de dólares.

Um dos instrumentos mais antigos de que se tem notícia, tanto na família das cordas dedilhadas como também nas demais famílias, parece ser o arco musical (MASSIN, 1997), datando do século III a.C. Atualmente encontramos seus derivados, como a harpa e o violão. A história da música através dos séculos nos mostra que a harpa passou por um grande desenvolvimento, tanto no Oriente como no Ocidente, assumindo formatos diferentes. No antigo Egito já havia harpas “com quatro cordas e medindo dois metros de altura” (MASSIN, 1997, p. 16). Houve um período em que o instrumento caiu em desuso e retornou na Idade Média. Mais adiante na História, precisamente na segunda metade do

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UNIDADE 1 | INSTRUMENTOS MUSICAIS E PARTITURAS

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século XVIII, o instrumento foi aperfeiçoado e difundido. Foi na França, por volta de 1800, que a harpa foi aperfeiçoada definitivamente, utilizando sete pedais que permitem ao harpista tocar em todas as tonalidades possíveis. A partir do Romantismo os compositores passaram a utilizar este instrumento em suas composições envolvendo grupos maiores. Normalmente usa-se de uma a duas harpas numa grande orquestra.

Outro parente do arco musical é a lira, usada na Mesopotâmia e no Egito. Na antiga Grécia é que surgiu este instrumento, com uma pequena caixa de ressonância e cordas presas a ela (MASSIN, 1997).

Encontramos outros instrumentos de cordas dedilhadas na música popular, como o violão, a guitarra e o contrabaixo elétrico. O parente mais antigo destes é o alaúde, encontrado já no Egito e Mesopotâmia no século II a.C. Foi, sobretudo, na Europa dos séculos XVI e XVII que o alaúde desempenhou importante papel na música instrumental. Compositores como Monteverdi (1567-1643) e Haendel (1685-1759) utilizaram a tiorba (ou arquialaúde), um sucessor do alaúde usado para acompanhar outros instrumentos. No século XVII foi desenvolvido outro modelo, com um braço de aproximadamente dois metros, usado como instrumento na voz do baixo: o Guitarrone. Também o bandolim é muito comum mesmo nos tempos atuais, em diversos formatos e modelos.

FIGURA 5 – FAMÍLIA DAS CORDAS DEDILHADAS

FONTE: O autor

Cavaquinho

Contrabaixo elétrico

Violão

Banjo

Guitarra elétrica Harpa moderna

Viola caipira

Bandolim

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TÓPICO 1 | A ORQUESTRA, SEUS INSTRUMENTOS E VOZES

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Entre os mais conhecidos popularmente estão a guitarra elétrica e o violão. A guitarra elétrica (assim como o contrabaixo) é amplamente difundida na música popular, especialmente no gênero rock e seus derivados, com as distorções e pedais de efeitos. O violão, especialmente no Brasil, é instrumento essencial para gêneros como samba e seus derivados, como a bossa-nova e o chorinho, assim como a viola caipira em seu particular gênero musical.

3.2 INSTRUMENTOS DE SOPRO

Na grande família dos sopros, o som se dá pela coluna de ar que passa pelo interior do instrumento. No entanto, apenas a emissão do ar não é suficiente para gerar som, é preciso de um corpo que vibre para que o instrumento amplifique este som. Assim como nos violinos o som é produzido pela fricção do arco na corda, no violão o som é gerado quando sua corda é dedilhada. Já os instrumentos de sopro necessitam de um corpo vibrante específico. É justamente esta a questão que faz com que os sopros sejam subdivididos em duas famílias:

• metais e • madeiras.

A subfamília das madeiras possui uma grande variedade de instrumentos e utiliza uma palheta presa na boquilha do instrumento para vibrar conforme o sopro e assim produzir o som. Assim são os instrumentos como clarinetes e saxofones. Nos clarinetes nós encontramos tamanhos diversos, como o clarinete em Eb (mi bemol – mais agudo), o clarinete em Bb (si bemol), o clarinete em A (lá – mais grave), o clarinete baixo em Bb (uma oitava mais grave) e o clarinete alto em Eb (mi bemol), englobando as quatro vozes: soprano, alto, tenor e baixo. O clarinete deriva da charamela, instrumento usado na Idade Média, sobretudo popularmente na França.

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UNIDADE 1 | INSTRUMENTOS MUSICAIS E PARTITURAS

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Já os saxofones possuem uma história bem mais recente. Na década de 1840, o inventor belga Adolphe Sax (1814-1894), entre tantos inventos, desenvolveu uma família de instrumentos que levou seu próprio nome: os saxofones. O saxofone tem o corpo de metal e pertence à família das madeiras, devido ao seu timbre e produção sonora, a palheta (SADIE, 1994). Sax criou uma família completa: sax soprano, sax alto, sax tenor, sax barítono e sax baixo. Atualmente é muito difundido nas big bands, em gêneros como jazz e também no repertório sinfônico.

FIGURA 6 – FAMÍLIA DOS SOPROS: MADEIRAS

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

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FIGURA 7 – FAMÍLIA DOS SOPROS: MADEIRAS. OS INSTRUMENTOS DE ADOLPHE SAX

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

A flauta transversal e o flautim (ou flauta picollo) são instrumentos que diferem dos demais, pois não utilizam palhetas e sim o que chamamos de embocadura livre. Atualmente feita de metal, originalmente era construída em madeira e está entre os instrumentos mais antigos de que se tem notícia. Estudos revelam que este instrumento desapareceu da “arte ocidental após a queda de Roma, ressurgindo nos séculos X e XI” (SADIE, 1994, p. 331). Existe um número muito grande de instrumentos desta espécie, como a flauta de pã, a flauta doce e a flauta vaso (mais conhecida como ocarina).

Existem ainda os instrumentos de palheta dupla, como os da família do oboé, o que inclui o oboé d’amore, o corne-inglês, o fagote e o contrafagote. Assim como a flauta, também possui uma história que nos remete ao antigo Egito. Na Idade Média era comum o uso de instrumentos de formatos diversos, mas com a mesma produção de som: a palheta dupla. Naquela época, estes instrumentos foram denominados como “hautbois” (madeira alta). Somente a partir de 1660, o oboé passou a ter as dimensões atuais, porém, necessitava de aperfeiçoamento. Juntamente com a flauta transversal, é um instrumento amplamente utilizado no repertório de compositores clássicos como Mozart, Haydn e Beethoven, assim como do Romantismo.

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O fagote representa o tenor desta família e o contrafagote o baixo. Estes dois diferem dos oboés por possuírem um tubo metálico e curvo unindo as palhetas ao corpo do instrumento. Seu antecessor provavelmente foi a dulçaína, na Europa do século XVII. Compositor do Barroco, Antonio Vivaldi (1678-1741) escreveu 37 concertos para o fagote como instrumento solista, acompanhado por uma pequena orquestra de cordas. Também foi amplamente utilizado no repertório do Classicismo e Romantismo.

DICAS

Para ver e ouvir as madeiras, pesquise no portal Youtube o “Quinteto Villa-Lobos”, formado por uma flauta transversal, um oboé, um clarinete, um fagote e uma trompa. Perceba a diferença de timbres com os instrumentos mais agudos e graves.

Voltando ao nosso quadro que ilustra a formação da orquestra sinfônica (Figura 3), chegamos agora em uma seção de instrumentos que fica situada atrás dos violinos e das madeiras: trata-se da seção dos metais. Estes instrumentos são os responsáveis pelas partes mais intensas (ou mais fortes) no repertório sinfônico. Assim como nas madeiras, os metais também são numerosos em variedade, com instrumentos que alcançam as notas mais agudas e outros que contrastam em notas muito graves. A produção sonora destes instrumentos se dá pela vibração dos lábios e o instrumento irá amplificar esta vibração. Entre os metais, podemos encontrar os seguintes instrumentos:

• Trompete picollo• Trompete• Flügelhorn• Trompa• Trombone tenor• Trombone baixo• Euphonium (Tenorhorn, baritone, bombardino)• Tuba, souzafone

Entre os instrumentos mais agudos desta família está o trompete e suas origens remetem-nos ao antigo Egito, Assíria e Israel. Seu formato era curto, numa peça de madeira, bronze ou prata (SADIE, 1994). Trata-se de um instrumento que passou por muitas mudanças ao longo da história, tanto no seu formato e acessórios quanto à sua função social. “Em sua forma moderna, tem um tubo que mede 130cm (para o instrumento em Bb) de diâmetro e cilíndrico, até se alargar numa campana cônica” (SADIE, 1994, p. 964), possuindo ainda três válvulas (chamadas de pistos), possibilitando assim que o instrumento toque todas as notas num alcance aproximado à tessitura da voz soprano.

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DICAS

Você pode ver e ouvir divertidos exemplos dos metais em ação, pesquisando no portal Youtube o quinteto de metais “Canadian Brass” (ou mesmo outros grupos). Ali você encontrará formações com dois trompetes, um trombone, uma trompa e uma tuba, contemplando as vozes soprano, alto, tenor e baixo.

O trompete tem suas variantes, com o menor deles, o trompete piccollo (com afinações em Si bemol e Lá). Trompetes um pouco maiores são mais comuns, principalmente nas afinações de Si bemol (Bb), Dó (C) e Mi bemol (Eb). Nas orquestras normalmente são utilizados três trompetes, dependendo da obra.

O trombone (Bb) possui o dobro de comprimento do trompete em Bb e um bocal mais largo, assim como a campana. Não utiliza pistos no seu manuseio e sim uma vara flexível, que faz com que o comprimento do instrumento se alongue, tornando possível a execução de todas as notas, num alcance aproximado à voz do tenor e barítono. O trombone tem suas origens no século XV, mais conhecido como sacabuxa (SADIE, 1994), e no século XVII já estava consolidado na música sacra, acompanhando o coro. Esta função social perdurou até o século XVIII e compositores utilizavam o trombone nas obras em que desejavam um toque mais religioso ou mesmo espiritual. O formato deste instrumento pouco foi alterado, apenas ampliou-se a campana e o tubo, proporcionando um som mais encorpado. Embora com pouquíssimo uso, há ainda o trombone picollo, que com frequência é confundido como um “trompete de vara”, assim como o trombone de válvulas (ou de pistos), que é confundido como “trompete baixo”.

Tanto o trombone como o trompete são amplamente utilizados em outros gêneros musicais, como o jazz, nas grandes big bands americanas e também nas bandas militares.

Já a trompa possui origens mais remotas: segundo Sadie (1994), trompas eram feitas de conchas, chifres de animais etc. É um formato diferente do trompete e do trombone, pois é curvilíneo e vai gradativamente aumentando o diâmetro. Isto permite ao instrumentista a possibilidade de uma gama maior de notas musicais sem o uso de válvulas. Amplamente utilizada nas orquestras do século XVIII e XIX, a trompa ainda tinha a sua forma natural, porém, possuía acessórios para que o instrumentista pudesse tocar outras notas. Pequenos tubos podiam ser colocados entre o bocal, deixando o instrumento mais curto ou mais longo, permitindo maior alcance de notas, mas com o inconveniente de parar de tocar para fazer a troca do tubo.

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FIGURA 8 – FAMÍLIA DOS SOPROS: METAIS

Em 1818, Stölzel e Blühmel resolveram este problema com a invenção das válvulas para as trompas, tornando a trompa um instrumento mais versátil, possibilitando tocar todas as notas dentro de seu alcance. Na orquestra sinfônica moderna é comum observarmos a presença de quatro a seis trompas.

O instrumento mais grave (e consequentemente o maior) da família dos metais é a tuba e é utilizado como o baixo da seção dos metais. A região em que a tuba normalmente toca localiza-se abaixo do trombone. O som é mais aveludado, mais se aproximando da trompa do que do trompete e trombone. Mais jovem dos metais, a tuba foi desenvolvida somente nos anos de 1820, 1830. O instrumento que antecede a tuba é o “oficleide”, que se assemelha com um saxofone baixo, porém, com bocal. Curiosamente, o oficleide acabou em desuso, cedendo lugar à tuba. Compositores como Richard Wagner (1813-1883), Gustav Mahler (1860-1911) e Richard Strauss (1864-1949) utilizaram esses instrumentos (oficleide e tuba) em sinfonias, não só como acompanhamento e reforço sonoro, mas como instrumento com partes solísticas.

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

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O compositor e maestro militar americano John Philip Sousa (1854-1932) desenvolveu uma variante da tuba especialmente para o uso nas bandas militares. A tuba convencional não é um instrumento confortável para ser usado num desfile, por exemplo. Com um formato completamente diferente, de modo que o instrumentista pudesse apoiar o instrumento no ombro, o assim chamado “sousafone” resolveu esta questão com eficiência, sendo muito popular nos Estados Unidos e também no Brasil.

Desta forma, o trompete, a trompa, o trombone e a tuba abarcam as vozes respectivamente como soprano, contralto, tenor e baixo. Além destes, outros instrumentos são usados especificamente em algumas obras para orquestra, como o “euphonium”, que muito se assemelha com a tuba, porém soa na altura do trombone. Da mesma forma, o trompete encontra outro instrumento equivalente com um som mais aveludado, trata-se do “Flügelhorn”.

3.3 INSTRUMENTOS DE PERCUSSÃO

Já vimos uma série de instrumentos de cordas e sopros e quem são os personagens destas grandes famílias. Finalmente, veremos a seção que fica no fundo da orquestra, mas nem por isso é menos numerosa: a seção da percussão.

Até aqui, a nossa compreensão acerca dos instrumentos da orquestra sinfônica já está mais elaborada e o nosso gráfico da orquestra também pode ser aprimorado.

FIGURA 9 – DISPOSIÇÃO APRIMORADA DOS INSTRUMENTOS NA ORQUESTRA SINFÔNICA

percussão

violoncelos

baixos2º violinos

1º violinos

maestro

violas

madeiras

metais

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

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Os instrumentos de percussão sempre foram muito populares, desde a Idade Média até o século XVII, com grande diversidade. Eram utilizados principalmente nas danças. O ritmo sempre foi algo muito intenso nestes períodos. No entanto, no Classicismo musical, a busca pela melodia colocou a percussão num segundo plano. A exceção fica com os tímpanos, mas sempre com um moderado uso. A partir do Romantismo, a percussão começou a ganhar espaço nas orquestras.

O tambor pode ser considerado como um dos mais antigos instrumentos, presente em várias culturas e em várias épocas históricas. Os tambores podem ser percutidos com baquetas ou mãos. Podem ser sacudidos, dedilhados ou friccionados e podem possuir os mais diversos formatos: “semiesféricos, cilíndricos, em forma de barril, de cone duplo, de ampulheta (cintados), cônicos ou caliciformes”. (SADIE, 1994, p. 921). Na verdade, existe uma quantidade gigantesca de instrumentos nesta família. São tantos, que alguns deles podem ter nomes diferentes.

Nos instrumentos de percussão, o som é produzido pelo choque de dois corpos, por exemplo, uma baqueta atingindo a pele de um tambor. Muito simples, não é? Acontece que após esse toque, a pele continua vibrando e a caixa deste tambor funciona como objeto ressonante, faz com que a vibração seja amplificada, justamente pela forma do tambor. Se tirarmos a pele deste tambor e a tocássemos com a baqueta, não teremos o som do tambor, pois não haverá ressonância suficiente.

O princípio é muito simples: imagine um instrumento que você viu anteriormente, um violão. Nele, a corda dedilhada produz uma vibração e a caixa do violão funcionará como um amplificador deste som. Se tirarmos a corda do instrumento e a esticarmos na mesma tensão que estava no violão e dedilhá-la, também não teremos aquele som característico. Assim, sempre precisamos de um corpo vibrante e ao mesmo tempo um objeto ressonante.

Nós já falamos que existem vários critérios para classificar os instrumentos. No caso da percussão, poderíamos classificar desta forma:

• Idiofones percutidos – o instrumento vibra como um todo. Ex.: afuxê, pratos, xilofone.

• Membranofones percutidos – o instrumento utiliza uma membrana, uma pele que é esticada no instrumento. Ex. bumbo, atabaque, tímpanos.

Outra maneira mais simples seria uma classificação também em duas categorias:

• Instrumentos que têm entonação definida.• Instrumentos que não têm entonação definida.

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A entonação (ou entoação) é a maneira pela qual um som é emitido. Se tivermos um som definido, significa que podemos identificá-lo como uma nota específica (um Dó, por exemplo). No caso de um som com entoação indefinida, seria extremamente difícil reconhecer uma nota, é o caso de um prato sendo percutido com baqueta, por exemplo.

Em termos de percussão, um dos instrumentos mais utilizados em todas as orquestras é o tímpano. Tratam-se de tambores semiesféricos com uma membrana, uma pele, normalmente de material sintético ou couro. Esta membrana é esticada no corpo do instrumento e um mecanismo acionado por um pedal faz com que essa membrana seja tensionada sobre o instrumento. Quanto mais tensão, mais agudo se torna o som ao tocar. Dessa forma, o músico pode acionar o pedal para alcançar a nota dó, por exemplo. No entanto, apenas um tímpano não é suficiente para todas as notas, além de que o acionamento do pedal não é rápido.

Faz-se necessário o uso de outros tímpanos de tamanhos diferentes para as demais notas. Normalmente, se usa um par central, mas em obras mais complexas são necessários até cinco tímpanos.

FIGURA 10 – INSTRUMENTOS DE PERCUSSÃO COM ALTURA DE SOM DEFINIDA

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

Os instrumentos de teclado representam uma subclassificação na família da percussão. Ali encontramos o xilofone, que tem as teclas de madeiras e tubos acoplados imediatamente abaixo das teclas, para amplificar o som. O nome vem do grego (xylo = madeira, phone = som) e “sua origem não é clara, podendo ter ancestralidade africana ou asiática” (SADIE, 1994, p. 1037). Nestas culturas ainda são usados instrumentos primitivos, com teclas amarradas. Da mesma família deste instrumento encontramos a Marimba, que tem um som um pouco mais aveludado.

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DICAS

Um exemplo musical interessante para ouvir o som do xilofone está na obra do compositor francês Camile Saint-Saëns (1835-1921), “O Carnaval dos Animais”, no movimento intitulado “Dança Macabra”. O som do xilofone nos dá a impressão de que usam ossos ao invés de teclas...

Outro instrumento de teclas é o Glockenspiel (do alemão, “sinos que tocam”, ou mesmo “carrilhão”). Muito similar ao xilofone, este instrumento tem dimensões reduzidas e suas teclas são de metal. Assim como o xilofone, é necessário o uso de baquetas para tocá-lo. O vibrafone segue na mesma família de teclas percutidas, porém, é utilizado um pequeno motor elétrico capaz de amplificar o som numa espécie de vibrato (MASSIN, 1997).

Ainda nos instrumentos com entoação definida, nós temos o Gongo. Trata-se de “um disco metálico, em geral de bronze, ligeiramente abaulado, com uma saliência arredondada no centro, que pode estar em posição horizontal ou suspensa...” (MASSIN, 1997, p. 32).

Outro importante personagem deste universo instrumental da música é o piano, onde o som é obtido na percussão de suas cordas. Desta maneira, alguns teóricos defendem o piano como instrumento de cordas, enquanto que outros o defendem como instrumento de percussão. Ao tocar nas teclas do piano, o teclado aciona um martelo que percute uma corda, produzindo assim o som correspondente à tecla. O piano, como o conhecemos atualmente, tem uma história que remonta a 1770. No entanto, o mais antigo ancestral é o Dulcimer, utilizado na Idade Média. Evoluindo na sua construção, nos tempos de Johann Sebastian Bach (1685-1750), o clavicórdio, de som mais fraco, porém suave, era muito utilizado. Já o cravo, por exemplo, era muito similar, mas ao acionar as teclas, pinças beliscavam as cordas. Assim, o princípio de produção sonora é diferente (MASSIN, 1997).

Ao final do século XVIII, muitas inovações foram aperfeiçoando o piano: o instrumento podia tocar de maneira forte (do italiano forte) e também fraca (piano). Por isso, o instrumento era chamado de forte-piano, mas logo a denominação seria simplificada em “piano”. No século XIX inventores ingleses criaram o piano de armário, uma versão vertical do piano. Instrumento muito versátil, é utilizado como instrumento solo, ou acompanhamento em diversos gêneros musicais, desde o jazz, o samba, a música de câmara ou como solista com acompanhamento de orquestra.

A celesta é um instrumento da família do piano. No entanto, o teclado aciona um martelo revestido de feltro que percute lâminas metálicas de diferentes formatos ao invés de cordas, como no piano.

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FIGURA 11 – O PIANO E SEUS FAMILIARES

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

DICAS

Ouça a Sonata Nº 21 “Waldstein”, Op. 53 em Dó maior, de Ludwig van Beethoven. Você vai perceber a versatilidade do piano nesta magnífica obra.

Nos instrumentos de entoação indefinida, existe um número gigantesco. Após o período Clássico, a partir do Romantismo, compositores como Ludwig van Beethoven (1770-1827) e Hector Berlioz (1803-1869) introduziram em suas composições para grande orquestra, instrumentos de percussão que até então não eram utilizados, ou mesmo que não faziam parte da tradição musical daquela época. Além do uso comum dos tímpanos, Beethoven introduziu bumbo e pratos na sua 9ª Sinfonia, e Berlioz foi ainda mais audacioso: a percussão passou a marcar presença no repertório da orquestra sinfônica (MASSIN, 1997). Nascido na França, Berlioz foi um dos pioneiros nesse sentido e é autor dos critérios que adotamos aqui para classificar os instrumentos de percussão em entoação definida e indefinida.

Na figura a seguir, mostramos alguns instrumentos de percussão utilizados nas orquestras e também na música popular.

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FIGURA 12 – INSTRUMENTOS DE PERCUSSÃO SEM ENTOAÇÃO DEFINIDA

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

Finalizando este tópico, segundo Philippe Beaussant (MASSIN, 1997), os instrumentos de percussão com entoação indefinida têm uma diversidade que parece sempre aumentar. O autor, parafraseando o próprio Berlioz, diz que

...qualquer corpo sonoro pode tornar-se instrumento de música, desde que haja a intenção de encará-lo como tal. O potencial instrumental nutriu-se, ao longo deste século, mais de objetos incorporados à execução musical do que propriamente de instrumentos inventados. (MASSIN, 1997, p. 33).

Um divertido exemplo de um corpo sonoro sendo utilizado como instrumento musical pode ser visto na obra intitulada “The Typewriter” (a Máquina de Escrever), do compositor americano Leroy Anderson (1908-1975), que utiliza uma máquina de escrever como instrumento solista.

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FIGURA 13 – A MÁQUINA DE ESCREVER, DE LEROY ANDERSON

FONTE: Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=nW8dGwa2zRw>. Acesso em: 5 abr. 2016.

Até aqui, você viu um grande número de instrumentos musicais, divididos nas três grandes famílias. Agora podemos compreender melhor a estrutura de uma grande orquestra sinfônica.

FIGURA 14 – A FILARMÔNICA DE BERLIM

FONTE: Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=j2Hk2SZGrRY>. Acesso em: 6 jun. 2016.

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Neste tópico vimos que:

• A voz humana pode ser considerada um instrumento musical e é um meio natural e eficaz para classificar o registro de altura dos sons dos instrumentos musicais, por exemplo, do mais agudo para o mais grave em: soprano, contralto, tenor, barítono e baixo.

• Os demais instrumentos musicais podem ser classificados em cordas, sopros e percussão.

• Podemos subclassificar as cordas em friccionadas (família do violino) e tangidas (harpa, violão, guitarra...).

• Os sopros se dividem em madeiras (flauta, oboé, clarinete, fagote, saxofone...) e metais (trompete, trombone, trompa, euphonium, tuba...).

• A percussão pode ser subclassificada em instrumentos que não possuem entoação definida, como: afuxê, ganzá, triângulo, pratos, tantã, bateria, congas, pandeiro, castanhola, reco-reco, etc., e instrumentos com entoação definida, como Glockenspiel, tímpanos, xilofone, campanas tubulares, vibrafone etc.

• Segundo o compositor Berlioz, qualquer corpo sonoro pode tornar-se instrumento de música, desde que haja a intenção de encará-lo como tal.

RESUMO DO TÓPICO 1

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1 Um exemplo muito eficiente para você ver e ouvir os mais variados instrumentos da orquestra sinfônica moderna está na obra do compositor francês Maurice Ravel (1875-1937), “Bolero”. Você ouvirá muitos instrumentos fazendo solos e uma grande sonoridade no final. Procure esta obra no Youtube e faça uma escuta atenta, buscando reconhecer, com o auxílio das imagens, os sons emitidos por cada instrumento.

2 Ao ouvir as suas músicas preferidas, faça o exercício de “escutar mais além”, para identificar quais instrumentos musicais estão presentes. Faça uma lista dos instrumentos que você conseguiu identificar em cada música.

3 Na mesma música que você ouviu, quais instrumentos estão em evidência? Você pode descrever?

4 Palavras Cruzadas Musicais.

AUTOATIVIDADE

o maior dos metais

Souancestral

foi osacabuxa

Beethovenusou este

instrumentona sonata

"Waldstein"

L

Inst. dafamília

das madeiras

Renée (?),cantorasoprano

Abreviatura deVioloncello

Da família do violino

Cordas, (?) ePercussão

Usado para friccionar ascordas do violino

Inst. criado porJohn P. Sousa

Voz mais aguda

Invenção de uma belga,Instrumento de metal da família dasmadeiras

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TÓPICO 2

A OBJETIVIDADE MUSICAL

UNIDADE 1

1 INTRODUÇÃO

Neste tópico iremos tratar dos elementos musicais presentes no som e suas maneiras de registrá-los em partituras. Veremos que os aspectos técnicos da arte musical dialogam com outras áreas de estudo, como a física acústica. As quatro propriedades do som, a altura, a duração, a intensidade e o timbre, são os personagens que jogam com os elementos musicais que compreendem a melodia, a harmonia e o ritmo.

Você verá que, apesar da música ser uma arte, existem fundamentos técnicos e científicos que dão objetividade aos sons quando combinados de forma artística, resultando em música.

2 PROPRIEDADES DO SOM

Quando falamos em música, estamos nos referindo a um campo da arte que acontece num plano temporal. A obra de arte musical só existe quando está sendo interpretada, quando músicos estão tocando seus instrumentos ou cantando a composição. Assim, é necessário aprimorar nossa fruição musical para percebermos os sutis detalhes de uma obra musical, para que não passem despercebidos. Neste primeiro momento vamos estudar o som e suas propriedades, ou seja, vamos entender como percebemos os sons musicais.

2.1 ALTURA

Quando falamos em altura em música, num primeiro momento podemos pensar que estamos nos referindo ao volume do som ou sua intensidade. Popularmente, altura tem o significado de “aumentar o som”. No entanto, o termo refere à frequência de um som determinável, uma nota musical. Exemplificando, se começamos uma escala com a nota dó, seguimos com ré, mi, fá, sol e assim por diante, estamos subindo com os sons.

Tudo o que ouvimos se dá graças às ondas sonoras, vibrações que chegam ao nosso ouvido interno e posteriormente codificadas no cérebro. Porém, podemos classificar o que ouvimos em dois aspectos: som e ruído.

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UNIDADE 1 | INSTRUMENTOS MUSICAIS E PARTITURAS

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De maneira geral, tanto som quanto ruído consistem num fenômeno que a física explica. No entanto, caro leitor, estamos tratando da arte da música e, dessa forma, quando falamos em som, estamos nos referindo a algo que é desejável, algo que podemos determinar e identificar como uma nota musical, com uma altura definida.

O físico alemão Heinrich Hertz (1857-1894) estudou este campo da física demonstrando a existência das ondas sonoras. Por meio de seus estudos, Hertz quantificou as ondas sonoras determinando frequências para os sons. As “unidades de medida das ondas sonoras”, a partir de então chamadas de Hertz (abreviatura Hz) são determinadas por ciclos por segundo (DOURADO, 2004). Assim, ficou convencionado que a nota lá (situada no meio do teclado do piano) possui uma frequência de 440 Hz. Ao aumentar este número, ou seja, ao subir a frequência gradativamente, teremos um “lá” um pouco mais agudo, mais alto, até que chegue na nota “si”. Cada nota musical possui sua frequência específica e uma pequena oscilação é normal, nada impede uma orquestra inteira tocando com um lá ajustado para 443 Hz, por exemplo.

Por isso o som é algo que podemos determinar, identificar como frequência e então classificar como uma nota musical.

DICAS

Se você prestar atenção ao cotidiano, vai perceber que existem muitos sons determináveis: um liquidificador, um cortador de grama ou qualquer motor por vezes emitem sons com frequência suficiente para identificarmos como uma nota musical!

Quando falamos em ruído, queremos dizer que se trata de um som (ou mais sons ao mesmo tempo) que possui uma frequência indefinida, dificultando ou tornando quase impossível o reconhecimento da frequência como uma ou mais notas musicais. Musicalmente falando, ruído é um som indesejável!

Na figura a seguir, você pode conferir a frequência de algumas notas musicais.

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TÓPICO 2 | A OBJETIVIDADE MUSICAL

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FIGURA 15 – ALGUMAS NOTAS MUSICAIS E SUAS FREQUÊNCIAS

DÓ261 Hz

MaisGrave Mais

AgudoRé 293 Hz

Mi 329 HzFá 349 Hz

Sol 391 Hz

Si 493 HzLá 440 HzSOL

SILÁ

RÉMI

FONTE: Disponível em: <http://www2.eca.usp.br/prof/iazzetta/tutor/acustica/introducao/tabela1.html>. Acesso em: 26 abr. 2016. Diagramação: Luiz Lenzi.

Veja que, quanto mais alta a frequência, mais alta (mais aguda) fica a nota musical. Quanto mais baixa a frequência, mais baixa (mais grave) a nota. Entre as notas Lá e Si temos uma diferença de apenas 53 Hz, isso significa que estes dois sons estão muito próximos. Quanto maior a diferença entre Hertz em duas notas, mais distantes estes sons estarão um do outro.

Quando uma orquestra sinfônica (ou qualquer grupo musical) vai se apresentar ou mesmo ensaiar, primeiramente os músicos ajustam a afinação de seus instrumentos, para que estejam “afinados” uns com os outros. Os músicos utilizam a nota Lá (440Hz) para afinar os seus instrumentos. Segundo Dourado (2004, p. 25), “em 1960 estabeleceu-se internacionalmente o padrão de 440 Hz, mas apesar disso as sinfônicas atuais costumam afinar entre 440 e 445 Hz. O diapasão mais frequente empregado nas orquestras vibra em 442 Hz”. O termo diapasão é usado para definir a altura da afinação e também se refere ao equipamento para afinar. Existem diapasões eletrônicos dotados com um pequeno microfone embutido e um visor que orienta o músico a fazer esse ajuste. É o que se chama “afinar o instrumento”, para que todos toquem na mesma afinação e não “desafinados”. O diapasão mais simples é em formato de garfo (Figura 16), que “quando percutido contra uma das mãos ou objeto, produz som de altura determinada, estabelecendo um padrão de afinação”. (DOURADO, 2004, p. 107).

FIGURA 16 – MODELOS DE DIAPASÃO

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UNIDADE 1 | INSTRUMENTOS MUSICAIS E PARTITURAS

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Os instrumentos musicais são construídos com uma afinação específica, cada qual dentro de seu contexto histórico. Na família das cordas, o violino, por exemplo, possui quatro cordas que são afinadas por meio de tensão. Quanto mais tensão, mais agudo o som que a corda emitirá. Cada corda é ajustada para emitir as seguintes notas:

FIGURA 17 - A AFINAÇÃO DO VIOLINO

Mi (659 Hz)

Lá (440 Hz)

Ré (293 Hz)Sol (195 Hz)

O múscio usa as cravelhas parachegar na tensão necessária paraajustar a afinação. Micro afinadores em cada corda

permitem um ajuste preciso

FONTE: Luiz Lenzi (29016)

Em instrumentos de outras famílias, como os metais, a afinação é feita por meio de ajuste do comprimento do instrumento. Os metais possuem “voltas de afinação” (ou bomba de afinação) que podem ser ajustadas deixando o instrumento um pouco mais comprido. Dessa forma, o som que o instrumento emite se torna mais grave (mais baixo), pois aumentamos o comprimento dele. Normalmente, os instrumentos de sopro são construídos com uma afinação mais alta. Ao puxar a volta de afinação, teremos um instrumento que entoará as notas musicais com uma afinação mais baixa. Estaremos, assim, alterando a altura de todas as notas que o instrumento poderá fazer.

FIGURA 18 - AFINAÇÃO DO TROMBONE

Bomba de afinação permite abertura e assim,toma o trombone um pouco mais comprido. Osom, como consequência, terá a frequênciamais baixa, no ajuste da afinação desejada.

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

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TÓPICO 2 | A OBJETIVIDADE MUSICAL

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Você pode se perguntar: “Por que o instrumento já não vem com a afinação ajustada de fábrica?” O que acontece é que a frequência do som oscila de acordo com condições ambientais como frio, calor e a umidade relativa do ar. O material de que o instrumento é construído reage nestas diferentes situações ambientais. Numa determinada situação climática, a madeira do violino reage de maneira diferente do metal do trombone e, assim, os ajustes não serão os mesmos. Uma diferença de apenas 1 ou 2 Hz de afinação numa orquestra interfere na qualidade de uma obra musical.

IMPORTANTE

Nos instrumentos como o violino e o trombone e tantos outros não é possível “ver” as notas musicais. Se observarmos um instrumento de teclado (piano, Glockenspiel, xilofone...) você poderá ver as teclas que correspondem a todas as notas e ter uma melhor noção do alcance em relação à altura. O teclado do piano moderno representa um bom exemplo para entendermos melhor a grafia das notas musicais quanto à altura. Estes teclados possuem uma extensão de sete oitavas (uma oitava representa a sequência dó, ré, mi, fá, sol, lá, si e dó) e ¼ (SADIE, 1994), sendo que cada tecla representa uma nota totalizando 88 teclas. A nota mais grave é a primeira da esquerda para a direita, Lá – 27 Hz e a mais aguda, a última, Dó – 4.186 Hz. Basta comparar os números para perceber que a distância entre estes dois sons é enorme, tratam-se de notas extremas.

FIGURA 19 - O TECLADO DO PIANO E AS NOTAS MUSICAIS

DÓ DÓ DÓDÓ1 oitava 1 oitava

DÓ DÓ

DÓCENTRAL

RÉ MI FÁ SOL LÁ SI

DÓCENTRAL

261Hz

293Hz

329Hz

349Hz

391Hz

440Hz

493Hz

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

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Segundo Bohumil Med (1996), até o século XI a altura dos sons era a única propriedade a ser escrita como orientação. As informações então eram muito vagas e pouco se sabia quanto tempo deveria durar tal nota na sua altura. O sistema de notação como conhecemos hoje foi o resultado de um longo desenvolvimento histórico. O uso do pentagrama, ou a pauta de cinco linhas para a notação musical, data do século XIII, mas foi a partir do século XVII que o pentagrama se consolidou como um padrão para a escrita musical (SADIE, 1994).

O pentagrama, no entanto, não suporta toda a gama de notas musicais. Conforme a necessidade de uma maior altura ao se escrever a música na pauta, linhas suplementares são adicionadas acima (mais agudas, altas) e abaixo (mais graves, baixas) do pentagrama.

FIGURA 20 – LOCALIZAÇÃO DAS NOTAS MUSICAIS NO PENTAGRAMA

DÓ RÉ MI FÁ SOL LÁ SI

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

Observe que no pentagrama as notas musicais são colocadas nas linhas e nos espaços. O símbolo que lembra um “S” logo no começo da pauta é chamado de Clave de Sol. Da mesma forma, utiliza-se uma segunda pauta, com um símbolo diferente, chamado de Clave de Fá.

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FIGURA 21 – CLAVE DE SOL E CLAVE DE FÁ

SOL

mais grave mais agudoDÓ

CENTRAL

DÓ RÉ

MI

MI

LÁ SI DÓ RÉ MI FÁ SOL

SOL

SOLLÁ

LÁSI

SI

SIDÓ

CLAVE DE SOLCLAVE DE FÁ

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

A figura seguinte coloca o teclado do piano com suas 88 notas (teclas) e apresenta o alcance em relação à altura de uma série de instrumentos musicais, tanto de sopros, cordas, percussão e também na voz humana. A figura contempla ainda a grafia no pentagrama, possibilitando verificar e comparar as regiões de alcance de altura de cada instrumento e voz.

FIGURA 22 – EXTENSÃO DAS VOZES E DOS INSTRUMENTOS

violino

sopranomezzo-soprano

clarinete baixo

oboécorne inglês

flautimtrombone

trompetetrompa

flauta

clarinete

contrafagotefagote

tuba

contratenor

baritonobaixo

contralto

contrabaixovioloncello

harpa

CORDAS

MADEIRAS

METAIS

DÓ DÓ DÓ DÓCENTRAL

DÓ DÓ DÓ DÓ

VOZES

viola

tenor

FONTE: BENNETT (1998, p. 6). Diagramação: Luiz Lenzi.

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Assim, quando falamos em altura, também nos referimos às notas dó, ré, mi, fá, sol, lá e si, pois cada uma possui uma altura definida.

2.2 DURAÇÃO

Agora que você já viu a primeira propriedade que é a altura, vamos refletir sobre outra das quatro propriedades do som: a duração.

Se você pode tocar notas musicais no seu instrumento, significa que estas notas ocuparão um espaço de tempo. O conceito é muito simples: a duração, como propriedade do som, define que um som pode ser curto ou longo. Citando Bohumil Med (1996, p. 12), duração é a “extensão de um som; é determinada pelo tempo de emissão das vibrações”. Mas como os músicos sabem quanto tempo devem sustentar as notas musicais? Historicamente, a música era tocada ou cantada e posteriormente alguma forma de registro era feita. Estes registros nem sempre eram eficientes, pois a carência de uma simbologia gráfica mais precisa tornava a interpretação difusa entre os intérpretes. Não obstante, a tradição e a cultura se encarregaram de sustentar o desenvolvimento da escrita musical.

ESTUDOS FUTUROS

Você verá na Unidade 2 como foi o desenvolvimento da escrita musical através dos séculos e como este processo ainda é dinâmico!

Usaremos um artifício simples para demonstrar a lógica dos sinais gráficos que irão nos orientar acerca do tempo que as notas devem ser sustentadas: o relógio. Ao adotar os segundos como referência de tempo, você logo perceberá que esta pulsação é estável, são exatas sessenta pulsações por minuto. Imagine a figura em seguida, representando um espaço de tempo equivalente a quatro segundos. Dividindo a figura pela metade e assim sucessivamente, você terá figuras de formatos diferentes fazendo referência à duração de tempos também diferentes.

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TÓPICO 2 | A OBJETIVIDADE MUSICAL

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FIGURA 23 - EXEMPLO DE DURAÇÃO DOS SONS

4 segundos

2 segundos

1 segundos

1/2 segundo

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

Desta maneira, nós temos quatro sinais gráficos diferentes que orientam sobre a duração de um som. Sabemos aqui que as figuras dobram de tamanho, indicando o dobro de tempo (de baixo para cima). A menor figura ocupa metade de uma pulsação do relógio, ou seja, ocupa o espaço de tempo de meio segundo, enquanto que a maior figura possui quatro pulsações ou quatro segundos.

A lógica que queremos demonstrar é de que essas figuras sempre têm o dobro ou a metade de tempo em relação à sua figura vizinha. O critério dos segundos que utilizamos é apenas referência como exemplo.

ESTUDOS FUTUROS

Ainda neste tópico voltaremos a falar sobre a notação gráfica dos sons em forma de partituras!

Na partitura musical você verá que o som, ou melhor, as notas musicais têm seus sinais gráficos distintos que representam a sua duração. No entanto, os sons podem ser grafados de várias maneiras. Um simples exercício demonstra a duração dos sons:

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FIGURA 24 – SONS CURTOS E SONS LONGOS

sons maiscurtos

sonscurtos

sonslongos

sons maislongos

sons curtos elongos, simultâneos

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

Saberemos se um som é curto ou longo ao compararmos com outro som. Se não tiver a mesma duração, será ou mais curto ou mais longo em relação ao outro. O conceito de duração em música se dá pela relação dos sons. A figura a seguir explica esta ideia:

FIGURA 25 – RELAÇÃO DE DURAÇÃO CURTO X LONGO

Estes dois sons têm o mesmo tamanho. Porém, em relação com outro som, pode ser mais curto

ou mas longo.

curto curtolongo longoFONTE: Luiz Lenzi (2016)

2.3 INTENSIDADE

A próxima propriedade do som que veremos é a intensidade. Esta propriedade trata da “amplitude das vibrações; é determinada pela força ou pelo volume do agente que a produz. É o volume sonoro”. (MED, 1996, p. 12).

A ideia de volume nos remete à extensão, ao tamanho, é uma grandeza que tem relação com a amplitude do som. Assim como a frequência define a altura de um som, a amplitude da onda sonora irá determinar a intensidade, se este som será forte ou fraco.

No cotidiano, percebemos que sons mais fortes necessitam de uma fonte sonora que libere muita energia. É o caso de um grito, uma explosão, um avião decolando, um intenso tráfego de veículos e assim por diante. Fontes sonoras que emitem sons fracos necessitam pouca energia: murmúrios, o som da respiração em repouso etc.

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TÓPICO 2 | A OBJETIVIDADE MUSICAL

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FIGURA 26 – A AMPLITUDE DO SOM

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

Segundo a Figura 26, quanto maior a amplitude da onda, mais forte será o som. Vemos claramente três picos de amplitude, os pontos fortes da esquerda para direita. Em seguida, sons ritmados com amplitude menor, porém, mais compactos, densos. Ao final, o som diminui em intensidade.

Quando necessitamos expressar intensidade na música escrita, ou seja, nas partituras, algumas abreviaturas são colocadas logo abaixo do trecho a que se refere. O compositor, ao escrever, assinala se determinado trecho deve ser tocado ou cantado de maneira forte ou fraca. Como já colocamos, o desenvolvimento das partituras é um longo processo histórico e assim também é na questão da grafia da intensidade. A gama de sons que vai do muito fraco ao muito forte é assinalada na partitura com abreviaturas no idioma italiano, convencionadas historicamente. Foi a partir de 1750 que esta prática de notação gráfica começou a ser adotada pelos compositores (MED, 1996).

FIGURA 27 – INDICATIVOS DE INTENSIDADE EM MÚSICA

fff molto fortíssimo, com a máxima força.ff fortíssimo, muito forte.f forte, forte.mf mezzoforte, meio forte.mp mezzopiano, meio fraco.p piano, fraco, suave.pp pianíssimo, muito suave.ppp molto pianíssimo, o mais suave possível.

FONTE: MED (1996, p. 214)

Numa orquestra sinfônica, quando os músicos interpretam um trecho musical em mezzoforte, por exemplo, o regente é quem vai orientar sobre o grau de força utilizado para esta dinâmica. Isto porque a concepção de intensidade é algo muito particular, subjetivo. Assim, o regente irá controlar a dosagem de força, irá equilibrar a emissão das notas pelos músicos para que encontrem o tal “mezzo-forte” comum.

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2.4 TIMBRE

Nossa última propriedade do som, o timbre, refere-se, segundo Dourado (2004, p. 331), ao que “diferencia a qualidade de sons de igual intensidade e frequência devido à presença maior ou menor de determinados harmônicos e sua relação com a fundamental”. Para exemplificar este conceito, se você ouvir um trompete e um acordeão tocando a mesma nota, vai perceber que ainda assim há uma diferença na qualidade dos sons. Você vai perceber que se trata de sons de qualidades diferentes – mas a mesma nota!

O que acontece quando identificamos uma nota musical tocada por um trompete é que estamos ouvindo e identificando o timbre deste instrumento. Como já vimos, as notas musicais possuem suas frequências particulares, mas o que acontece é que outras frequências “soam” junto com a principal. Estas frequências múltiplas presentes num som gerador é o que chamamos de harmônicos. Mais adiante, na Figura 30, estaremos falando novamente sobre os harmônicos.

Se um clarinete tocar o dó central, estaremos ouvindo um determinado número de harmônicos, muito diferente da quantidade de harmônicos de um violoncelo. No primeiro, o som é produzido pela vibração da palheta e, no segundo, pela fricção da corda. Condições diferentes de produção sonora irão determinar a quantidade de harmônicos presentes no som e, desta forma, iremos identificar o timbre destes instrumentos. A combinação de instrumentos (madeiras, metais, cordas e percussão) resulta em variedade de timbres, enriquecendo a proposta musical. Na Figura 28 vemos diferentes instrumentos resultando na variedade de timbres característica do jazz: o contrabaixo, guitarra, saxofone tenor e bateria.

FIGURA 28 – DIFERENTES INSTRUMENTOS NUM GRUPO DE JAZZ

FONTE: Disponível em: <http://www.truman.edu/majors-programs/majors-minors/music-major/music-ensembles/>. Acesso em: 23 maio 2016.

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TÓPICO 2 | A OBJETIVIDADE MUSICAL

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3 ELEMENTOS DA MÚSICA

Agora que você já conhece as propriedades do som, poderá vislumbrar os elementos musicais utilizados pelos compositores ao criarem suas obras: a melodia, a harmonia e o ritmo.

3.1 MELODIA

De acordo com Dourado (2004, p. 200), a melodia é, “de forma genérica, certa sequência de notas organizada sobre uma estrutura rítmica que encerra algum sentido musical”. Encontraremos melodias muito diferentes nas várias culturas do nosso planeta, cada qual com suas tradições que lhes são particulares. De forma popular, ouve-se dizer que o canto dos pássaros também representa uma melodia, o que é discutível. Não há na natureza a melodia, trata-se de uma invenção humana. É correto afirmar que os pássaros emitem sons determináveis, como as notas musicais. No entanto, o canto das aves representa no máximo um “motivo” ou um “inciso”. O “motivo” refere-se à menor parte reconhecível de uma melodia. Uma melodia é formada a partir de motivos.

Podemos fazer uma analogia de melodia com o texto escrito: uma combinação de três ou quatro palavras já começa a fazer algum sentido, o que poderia representar um “motivo”. Outras combinações de palavras podem acrescentar mais sentido e, da mesma forma, uma combinação de motivos irá criar uma frase musical.

Normalmente, você pode até esquecer a letra de uma música, mas vai lembrar-se da melodia, pois é um elemento muito marcante. A melodia normalmente é o elemento mais evidente e pode ter mais de uma voz, como nas duplas sertanejas onde cantam a primeira e a segunda voz. A primeira é a melodia em si, enquanto que a segunda complementa e reforça harmonicamente a melodia.

Você pode ter ainda um contracanto, uma segunda melodia que faz contraste com a primeira. As melodias normalmente possuem pontos de repouso, que equivalem às vírgulas que colocamos nos textos. Servem para dar sentido e também para literalmente respirar, e os pontos finais representam os finais de frases. O final de uma frase musical nos traz uma sensação de que a música acabou ou que terá continuidade. A organização das melodias como frases musicais acontece de forma métrica, como se cada frase de nosso texto escrito possuísse a mesma quantidade de palavras. A organização de frases musicais se dá no tempo, por isso a organização métrica do tamanho das frases musicais nos auxilia em sua compreensão.

Cada nota de uma melodia, quando escrita na partitura, terá o seu devido lugar. Se a melodia sobe e depois desce, também a posição escrita das notas irá subir e descer, e assim por diante.

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FIGURA 29 – EXEMPLO DE MELODIA

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

3.2 HARMONIA

Outro elemento da música é a harmonia. Assim como a melodia, a harmonia é resultado de um desenvolvimento humano, portanto, não encontramos a harmonia musical na natureza. Não encontramos na natureza um acorde de dó maior, ou uma cadência perfeita. Entretanto, a harmonia musical como a conhecemos é fruto de um contínuo desenvolvimento histórico. A palavra harmonia significa um acordo entre partes de um todo, uma organização equilibrada destas partes. Assim, podemos afirmar que um grupo de jazz numa bela performance musical é um grupo harmonioso. No sentido objetivo da música, harmonia é a combinação de sons de acordo com um sistema. A combinação dos sons origina-se da série harmônica, como já falamos neste tópico.

Reforçando este conceito, Med (1996, p. 92) nos ensina que “Um som musical não se constitui de apenas uma nota. Juntamente com o som principal soam sons secundários, bem fracos e quase imperceptíveis. O som principal é chamado som fundamental e os sons que o acompanham são os sons harmônicos”.

Imagine uma corda de um instrumento musical sendo tangida: haverá a vibração da corda inteira e também uma vibração nas metades. Além disso, a vibração também ocorrerá em terços de maneira menos intensa, em quartos e assim sucessivamente. São os sons harmônicos que acompanham o som fundamental.

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TÓPICO 2 | A OBJETIVIDADE MUSICAL

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FIGURA 30 – SONS HARMÔNICOS

ampl

itude

da

vibr

ação

da

cord

a

sons harmônicos, originários do som fundamental

som fundamental = Dó

dó dó sol sol sibmidó dó

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

O exemplo aqui é a nota dó, porém, todas as outras notas geram série harmônica. Assim você começa a perceber a construção do sistema harmônico musical. O sistema harmônico irá tratar de um acompanhamento da melodia, numa sequência de acordes. Um acorde é um “som feito de três ou mais notas, tocadas simultaneamente, separadas por terças, via de regra” (GUEST, 1996, p. 34). Os acordes podem ser formados por três notas (tríade) ou ainda por quatro notas (tétrade). Ao extrairmos os harmônicos ímpares da série harmônica, começamos a construir os acordes.

FIGURA 31 – O ACORDE E A ESCALA DE DÓ

Construção doacorde de dó

Nome da nota:Cifra popular:

Notas da escala de dó e seus respectivos acordes

dóC D Em G Am BmF

ré mi

soldómi

fá sol lá si

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

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Na harmonia popular usam-se cifras, letras que identificam o acorde, conforme a Figura 31. Os acordes podem ser maiores ou menores. Quando são acordes menores, a cifra é complementada com a letra “m” minúscula. A estrutura dos acordes é dada pela distância entre as notas: no acorde de dó, por exemplo, a distância entre dó e ré é maior do que no acorde de ré, entre as notas ré e mi. Assim nós temos o acorde de “dó maior” (C) e ré menor (Dm), resultando em tríades maiores e tríades menores. Entre duas notas vizinhas, a distância entre elas pode ser por um tom, ou um semitom (ou meio tom).

Ao organizar uma escala diatônica a partir da nota ré e obedecendo à estrutura da escala diatônica maior (tom-tom-semitom-tom-tom-tom-semitom), veremos que há necessidade de alterar as notas fá para fá sustenido e a nota dó para dó sustenido. Da mesma forma, ao organizar uma escala a partir da nota fá, deveremos alterar a nota si para si bemol.

As teclas negras do teclado são justamente as notas alteradas, ajustam as notas meio tom acima ou abaixo, de acordo com a estrutura da escala diatônica. Por exemplo, se alterarmos a nota lá em meio tom acima, teremos a nota lá sustenido; ajustando a nota si meio tom abaixo, teremos si bemol. Observe que tanto lá sustenido como si bemol será tocado na mesma tecla negra.

FIGURA 32 – ESTRUTURA DA ESCALA DIATÔNICA MAIOR

FONTE: Luiz Lenzi

DICAS

O estudo da harmonia requer o uso de um teclado para que o estudante ouça as nuances harmônicas dos acordes. Nossa abordagem aqui é breve, mas você pode aprofundar seus conhecimentos em harmonia pesquisando o tema nas obras de Bohumil Med, Teoria da Música; Ian Guest, Harmonia: método prático e de Marise Ramirez, Harmonia – uma abordagem prática.

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TÓPICO 2 | A OBJETIVIDADE MUSICAL

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3.3 RITMO

Até aqui você viu que a melodia e a harmonia são resultados de um desenvolvimento humano e que não estão presentes na natureza, na forma de um sistema musical. Pode-se afirmar que estes dois elementos da música são aspectos racionais, lógicos. Por esta razão, faz-se necessário um elemento orgânico para que estas questões lógicas possam ser sensibilizadas. A questão central da educação musical encontra um de seus maiores fundamentos (senão o principal) no movimento, ou seja, o ritmo.

Podemos compreender o sistema harmônico, reconhecer melodias e contracantos, estudar a sua forma e estudar o processo teórico/histórico da música sem exercer a prática musical em si. Entretanto, só poderemos tocar um instrumento ou cantar, incorporando o ritmo, ou seja, é o nosso movimento que irá sensibilizar nosso conhecimento musical numa prática artística.

O ritmo é a parte sensível do conhecimento musical. Está presente na natureza em toda a sua plenitude, no bater das ondas do mar nas pedras, no balançar dos galhos de uma árvore pelo vento, no galopar dos antílopes e no bater do nosso coração. Numa visão subjetiva, assim como um pintor usa sua habilidade com as tintas e os pincéis na tela para criar sua imagem, da mesma forma o músico utiliza o corpo e o instrumento para criar a beleza do movimento de uma nota para outra. A matéria-prima da interpretação de uma obra musical é o movimento.

De acordo com Med (1996), o ritmo é a relação dos sons de acordo com sua duração. O autor explica ainda que “O ritmo não é, portanto, um som, mas somente um tempo organizado. ‘O ritmo é a ordem do movimento’ (Platão). A palavra ritmo (em grego rhythmos) designa ‘aquilo que flui, aquilo que se move’”. (MED, 1996, p. 20).

O ritmo pode ser expresso em partituras e, para isso, usam-se sinais gráficos como enunciamos anteriormente. Se você rever a Figura 23, vai identificar figuras hipotéticas orientando sobre o número de pulsações que uma determinada nota deverá ser sustentada. Na teoria musical da atualidade utilizam-se símbolos gráficos que possuem relação de duração uns com os outros (MED, 1996, p. 20). Assim como há sinais que representam a duração do som, existem outros correspondentes que sinalizam a duração dos silêncios (pausas).

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FIGURA 33 – FIGURAS DE TEMPO DA ATUALIDADE

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

A organização quanto à duração das notas (ou das pausas) é feita então pelo formato das figuras de tempo. Além disso, os tempos, ou melhor, a pulsação de qualquer música se organiza dentro de uma métrica que se chama compasso (como uma medida de tempos). Ao ouvir qualquer música no rádio você pode perceber a pulsação, aquela batida sempre igual que praticamente não se altera, não acelera e não diminui em termos de velocidade. No entanto, você irá perceber que existem alguns acentos rítmicos, pulsações que nos dão a sensação de apoio dentro de um padrão de duas, três, quatro ou mais pulsações.

Para melhor compreender o conceito do compasso, veja o exemplo em seguida, na música “Parabéns pra você”:

Parabéns pra você, nesta data querida, muitas felicidades, muitos anos de vida!

primeira meia-frase

Pa-ra-béns prá vo - cê, nes-ta da - ta de vi-da, mui-tas fe - li - ci - da -des, mui-tos a - nos de vi - da!

segunda meia-frase

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TÓPICO 2 | A OBJETIVIDADE MUSICAL

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As sílabas sublinhadas representam os pontos de apoio da melodia, o primeiro tempo de cada compasso. Na partitura acima, os números indicam cada compasso, totalizando oito. A primeira meia-frase termina em “...nesta data de vida”, num acorde de dominante (pergunta). A segunda meia-frase termina num acorde de tônica, dando a sensação de final, de resposta. Como você pode perceber, a melodia sobe e desce, conforme as figuras. A fórmula ¾ logo após a clave de sol indica três pulsações para cada compasso.

autoatividade

Procure ouvir no rádio músicas do gênero pop rock. Perceba a pulsação da música, aquela batida sempre igual. Depois, tente perceber um padrão na pulsação. A maioria possui compassos de quatro pulsações. Normalmente existe alguma mudança de algum instrumento na primeira pulsação de cada compasso (o contrabaixo mudando de nota, mudança de acorde pela guitarra, a sílaba tônica da letra...).

A combinação das figuras de tempo é que registra as melodias e os acompanhamentos harmônicos. Assim, é o ritmo que organiza, que sensibiliza a melodia e a harmonia. As propriedades do som estarão especificadas também na partitura, de acordo com as ideias do compositor. Até aqui você viu sobre o universo dos instrumentos musicais e suas particularidades e as propriedades do som com suas características objetivas na arte musical. No próximo tópico você verá o aspecto que complementa a obra de arte musical: os gêneros e as formas musicais.

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RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico vimos que:

• Som é aquilo que podemos identificar com altura definida. É algo desejável e que pode ser classificado como uma nota musical. Ruído é um som indesejável, não possui altura definida e não se pode identificar como uma nota musical.

• O som possui quatro propriedades: a altura, a duração, a intensidade e o timbre.

• Quanto à altura, os sons podem ser agudos ou graves. Quando executamos uma escala (dó, ré, mi, fá, sol...) estamos subindo os sons.

• A altura dos sons é medida em Hertz, que determina a frequência de uma nota musical, a quantidade de ciclos por segundo. Quanto maior a frequência, mais agudo o som. A nota convencionada para afinação de uma orquestra é estabelecida em Lá (440 Hz).

• Os sons podem ser curtos ou longos, na propriedade duração. O som pode ser ainda forte ou fraco, dependendo da amplitude da onda sonora, referindo à intensidade.

• O timbre é outra propriedade do som. Trata-se da quantidade de sons harmônicos presentes num som gerado. A maior ou menor quantidade destes harmônicos é que vai qualificar os instrumentos, o que nos permite reconhecer o som de determinado instrumento.

• A série harmônica é uma sequência de sons que integram ou são gerados a partir de um som gerador. O conhecimento humano organizou a série harmônica para desenvolver o sistema harmônico como conhecemos.

• Para escrever a música utiliza-se o pentagrama (pauta) e utilizam-se sinais gráficos que determinam a nota musical e, dependendo do formato do sinal, o tempo em que deve ser sustentada.

• A melodia é organizada a partir de um motivo em sons sucessivos, organizados em frases. O contracanto é uma segunda melodia que complementa a principal. Harmonia é a combinação de sons sucessivos e é organizada dentro de um sistema.

• O ritmo é o elemento musical que organiza a melodia e a harmonia. É o principal fator para que a música “saia do papel”, para que ela aconteça, por ser um elemento da natureza, ao contrário da melodia e da harmonia.

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1 Os sons possuem propriedades objetivas onde a física acústica explica como o fenômeno sonoro se manifesta. Um som pode ser curto ou longo (duração), forte ou fraco (intensidade), agudo ou grave (altura) e ainda possuir uma qualidade sonora particular (timbre). Ao se tratar dos elementos musicais, os sons são organizados de maneira sucessiva (melodia) e simultânea (harmonia) num plano temporal (ritmo). Quando um compositor cria uma obra musical, ele utiliza os elementos da música combinando as propriedades do som para expor suas ideias musicais. De acordo com esta lógica, assinale a alternativa CORRETA:

( ) A melodia é construída por meio de um ou mais motivos, resultando numa sequência de frases que são complementadas por outros sons. É a harmonia que vai enriquecer e dar sentido às melodias, com seus sons simultâneos. As frases podem ser muito intensas ou suaves, dependendo do caráter da obra proposta pelo compositor.

( ) A intensidade de uma melodia vai depender do motivo que será utilizado. Para enriquecer a melodia, o compositor utiliza o recurso da harmonia, ou seja, acrescenta outros sons, outras melodias à principal, para elevar a intensidade da música. Para deixar a melodia menos intensa, é necessário menos harmonia.

( ) Para que a música efetivamente “saia do papel”, o compositor utiliza o ritmo como fator principal em sua obra. O ritmo, como elemento presente na natureza, organiza a melodia e a harmonia. O compositor utiliza estes elementos combinando as propriedades do som de forma organizada, evitando dessa forma os ruídos indesejáveis.

( ) O compositor inicia sua obra pelos motivos, constituindo as frases musicais. Os motivos é que fornecem a sequência apropriada à melodia, onde a harmonia proporciona coerência nas frases musicais. A intensidade de uma música é definida pela quantidade de melodias simultâneas em ritmos diferenciados e contrastantes.

AUTOATIVIDADE

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TÓPICO 3

AS FORMAS E OS GÊNEROS MUSICAIS

UNIDADE 1

1 INTRODUÇÃO

Neste tópico, você irá compreender um pouco mais sobre como os compositores criam suas obras musicais e como elas são construídas. Com o auxílio de alguns exemplos muito populares, você perceberá que a forma na música é algo que pode ser comparado a uma estrutura de um edifício ou mesmo um esqueleto que sustenta um corpo. Você verá também que mesmo as músicas mais simples carregam em si estas formas e que elas são um resultado de um desenvolvimento histórico.

Por outro lado, os gêneros musicais identificam o estilo de uma composição, vão classificar as obras musicais quanto às formas. Enquanto a forma trata da estrutura interna de uma obra musical, o gênero cuida da estrutura externa de uma obra (MASSIN, 1997).

2 FORMAS MUSICAIS

Nós podemos compreender a música como uma mensagem sonora que chega aos nossos ouvidos e que é transmitida ao cérebro. As mensagens são então codificadas e associadas com informações precedentes, construindo assim o sentido e a compreensão. Assim reconhecemos uma simples palavra quando a ouvimos, pois elas têm suas flexões, são formadas por uma combinação de vogais e consoantes. Quando você lê aqui a palavra praia, pode começar a imaginar a areia, as ondas e todo o horizonte do oceano num dia ensolarado. Talvez você irá lembrar de uma praia que você visitou ou viu em algum filme. Ao ouvir (ou mesmo lendo aqui) nosso cérebro faz associações com informações que você já possui acerca da mensagem recebida.

Quando fazemos associações de palavras, criamos assim as orações, as frases e as palavras vão construindo sentido entre si. Assim funciona a gramática de um idioma, com suas regras, formas e sua semântica. Além disso, podemos organizar várias frases, relacionando umas com as outras, construindo relações de causa e consequência ou, num tom dramático, descrever tensões que afetam nossas emoções.

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UNIDADE 1 | INSTRUMENTOS MUSICAIS E PARTITURAS

Procure lembrar-se de alguma história que já foi contada a você com toda a sua organização: introdução, apresentação, desenvolvimento, clímax e final; ou então lembre-se de alguém descrevendo verbalmente uma determinada situação: você pode imaginar e criar o seu próprio sentido daquele texto, que muitas vezes difere dos outros. Talvez a praia que você imaginou seja diferente daquela que seu amigo tenha imaginado, pois nossa imaginação e nossas lembranças são muito particulares. Assim também é a música, ela possui uma mensagem, que pode ser abstrata, mas é repleta de sentidos que são interpretados de forma muito particular.

A música, caro leitor, é organizada como um texto, porém, a melodia e o ritmo em si evocam sentimentos muito abstratos. Mesmo na música instrumental, quando não há uma letra, ainda assim teremos uma organização formal e poderemos perceber uma estrutura que organiza a melodia, a harmonia e o ritmo.

Mesmo aquela música que você ouve no rádio possui uma forma: a melodia é sempre igual? Na mesma música há outra melodia diferente? Você pode dividir uma música em seções? Veremos mais adiante como isso funciona.

IMPORTANTE

Existe uma morfologia na música, ou seja, um estudo, uma organização das formas sobre as quais uma música pode ser construída. Tal como a morfologia estuda o formato de um idioma, assim também funciona com a música, temos uma morfologia musical que analisa a forma como uma composição foi concebida. Isto nos ajuda a compreender a obra musical, nos revela como o compositor a imaginou.

Segundo Dourado (2004, p. 137), a forma musical é a

Estrutura ou plano musical de uma composição. Princípio de organização de uma obra em seus elementos musicais, como tonalidade, tema, repetições, variações. Designa, de modo específico, a organização dos elementos de construção de sonatas ou rondós, por exemplo.

Quando o compositor constrói uma melodia, ele usa artifícios como a escolha da tonalidade e o tipo de música que imagina. Traçando um paralelo com a gramática textual, o compositor utilizará de combinações de palavras que irão formar um pequeno motivo (ou inciso). Ou seja, um fragmento rítmico que somado a outros fragmentos começa a compor uma frase musical. Alguns autores defendem que uma frase musical é composta por oito compassos e que uma meia frase seria de quatro compassos. Outros dizem que uma frase comporta quatro compassos. As duas opções são aceitáveis.

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TÓPICO 3 | AS FORMAS E OS GÊNEROS MUSICAIS

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O motivo representa o menor elemento que formará a melodia, é a menor unidade reconhecível em uma música, como já vimos no Tópico 2. Podemos encontrar um famoso exemplo na Quinta Sinfonia de Ludwig van Beethoven (1770-1827). Procure ouvir o início do primeiro movimento desta sinfonia, trata-se de algo bem marcante, com a apresentação do motivo principal, que é formado por três notas curtas seguidas por uma mais longa. Em seguida, o motivo é alternado em vários instrumentos de forma sucessiva, formando assim a melodia. O compositor continua o movimento apresentando e desenvolvendo as frases musicais por mais de sete minutos.

FIGURA 34 – EXEMPLO DE MOTIVO, NA 5ª SINFONIA DE BEETHOVEN

FONTE: Dover Publications, 1989. Diagramação: Luiz Lenzi

Partindo da construção pelos motivos, nós teremos as frases musicais (melodia). Estas frases podem ter um caráter de pergunta ou de resposta, de acordo com a progressão dos acordes. A música começa num tom que denominamos TÔNICA. Se a frase terminar num acorde DOMINANTE, significa que é uma frase com caráter de pergunta, pois dá a sensação de que ainda não terminou, nos dá uma sensação de tensão em busca de repouso. Quando a frase termina na TÔNICA, temos a sensação de que a música finaliza, encontra um repouso, nos dá a sensação de resposta. Em música, sempre teremos frases pergunta e resposta. A progressão ou combinação dos acordes é assunto que compete ao estudo da harmonia funcional – o que não é objeto de nosso estudo no momento. Harmonicamente, precisamos perceber que as frases musicais nos dão a sensação de que haverá continuação da música ou que a mesma terminou – pergunta e resposta.

Quando se diz “como vai você?”, espera-se uma resposta, percebe-se que algo será dito ainda. Na hipotética resposta “estou bem, por enquanto...” sentimos um retorno que não é conclusivo, nos dá a sensação de querer saber mais, ouvir mais o que se tem a dizer. No entanto, se a resposta for algo do tipo “estou muito bem, obrigado!”, percebemos que não há nada mais a ser dito, senão

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UNIDADE 1 | INSTRUMENTOS MUSICAIS E PARTITURAS

mudar de assunto. Assim funciona a harmonia quando se trata do encadeamento dos acordes, dando os sentidos de tensão e repouso para as frases melódicas.

Partiremos para um exemplo simples, encontrado nas cantigas de roda brasileiras. Observe a música “Marcha Soldado” e veja que ela é formada por duas frases musicais de igual tamanho.

FIGURA 35 – CANTIGA DE RODA “MARCHA SOLDADO”

FONTE: Disponível em: <http://www.infoescola.com/folclore/cantigas-de-roda/>. Acesso em: 18 abr. 2016. Diagramação: Luiz Lenzi.

Se você cantar a melodia de “Marcha soldado” vai perceber que as duas estrofes possuem exatamente a mesma melodia, com caráter expositivo/conclusivo. O exemplo é simplório, porém, ilustra frases com caráter de pergunta e resposta. Na primeira meia-frase você tem a pergunta, sente que haverá mais música por vir, e a segunda meia-frase responde, dá a sensação de que a música conclui, totalizando oito compassos. As cantigas de roda possuem esta estrutura extremamente básica, normalmente monotemática e sem desenvolvimento, justamente pela popularidade na educação infantil.

Podemos afirmar que “Marcha soldado” possui apenas uma melodia, que representaremos pela letra “A”. Segundo Ian Guest (1996), “mesmo que haja uma ‘respiração’ no meio, a música ainda é ‘indivisível’”. O autor define canções como as cantigas de roda em estruturas em forma simples, justamente por possuírem uma única melodia.

Procure ouvir outras cantigas de roda, como Carneirinho, carneirão, Parabéns pra você, Ciranda cirandinha, Boi da cara preta e identifique as frases musicais. Perceba a construção de frases e meias-frases com caráter de pergunta e de resposta.

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TÓPICO 3 | AS FORMAS E OS GÊNEROS MUSICAIS

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Vamos verificar um exemplo um pouco mais elaborado, com a música “Garota de Ipanema”, dos compositores cariocas Tom Jobim (1927-1994) e Vinícius de Moraes (1913-1980), composta em 1962: analisaremos a forma desta música, de uma maneira bem simples. Procure ouvi-la. Nas gravações que você encontrará poderá ter uma introdução instrumental. De acordo com o quadro a seguir, o texto que compreende a letra A é a primeira parte da música. As duas primeiras estrofes possuem a mesma melodia.

Nos versos que começam com “Ai! Como estou tão sozinho...”, veja que se trata de uma melodia diferente, nova. Por isso vamos chamar esta parte de B. Apesar de ter menos texto, ocupa a mesma quantidade de tempo que A. Em seguida, temos uma frase completa de A novamente, com texto diferente e com um caráter mais conclusivo. Por esse segundo A ter um final um pouco diferente do primeiro, vamos diferenciá-los como A e A’.

FIGURA 36 – ANÁLISE DA MÚSICA “GAROTA DE IPANEMA”

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UNIDADE 1 | INSTRUMENTOS MUSICAIS E PARTITURAS

Temos então de maneira simples um esquema: Introdução – A – B – A’ – Final. A introdução e o final normalmente são feitos com instrumentos apenas, sem voz, mas isto não é uma regra. Em termos de formas musicais, podemos dizer que esta música tem a forma “A-B-A”, pois esta é a estrutura de “Garota de Ipanema”. Você vai encontrar versões dessa música bem mais extensas, com improvisações de instrumentos. Nesses casos o que acontece é a repetição da estrutura: depois que a letra foi toda exposta, repete-se a música com uma improvisação instrumental no A, por exemplo, seguindo o B com outro instrumento e retomando A com voz e letra. Aqui vale a criatividade dos intérpretes.

Na música popular, a forma normalmente é muito simples e se mostra livre das regras da música erudita. As formas e gêneros musicais na música erudita são mais complexas e elaboradas, possuindo um rigor acadêmico, dentro de normas convencionadas historicamente.

IMPORTANTE

Veja que essa música é relativamente curta, mas as melodias A e B mostram algo que é bem importante em música, que é o contraste, um recurso muito utilizado pelos compositores. Segundo Roy Bennett, os compositores criam o contraste de várias maneiras:

A mais óbvia é usar uma melodia completamente nova, diferente das anteriores. Mas há muitas outras formas de criar contrastes musicais, tais como: mudança de tonalidade, mudança de modo (contraste entre o maior e o menor), ritmo, andamento, dinâmica (fortes e fracos), ambiência, textura e timbre (ou colorido instrumental). O compositor poderá utilizar uma dessas possibilidades de cada vez ou várias ao mesmo tempo, dependendo da intensidade do contraste desejado. (BENNETT, 1986, p. 9).

Vamos verificar a seguir a forma da música “Carinhoso”, do compositor brasileiro Alfredo da Rocha Vianna Filho, o Pixinguinha (1897-1973).

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TÓPICO 3 | AS FORMAS E OS GÊNEROS MUSICAIS

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FIGURA 37 – FORMA DA MÚSICA “CARINHOSO”, DE PIXINGUINHA (1916-17)

FONTE: Luiz Lenzi

A estrutura de “Carinhoso” nos revela uma primeira melodia A completa. Em seguida, temos uma nova seção, que por ter uma melodia diferente e contrastante, chamaremos de B. Finalmente uma terceira melodia, que chamaremos de C, pois difere das outras. No entanto, se você ouvir esta música, perceberá que a parte B é mais curta que A e C. Na verdade, a parte B tem a metade do tamanho (em tempo e número de compassos, apenas uma frase) que as outras duas melodias. Assim, compreendemos que B é uma seção de transição, que leva ao clímax da seção C.

Assim, no “Carinhoso” temos a seguinte estrutura: A (expositivo) – B (mais curto e transitório) – C (expositivo e conclusivo). A estrutura desta música se encaixa como forma livre, pois os temas não repetem, fluem com novas ideias. Apesar de “Carinhoso” completar cem anos de composição e “Garota de Ipanema” ter pouco menos de cinquenta anos, a simplicidade estrutural delas remonta às mesmas estruturas musicais do século XVII.

A seguir, vamos verificar o desenvolvimento histórico das formas musicais para compreendermos melhor como a música da nossa atualidade chegou a tal formato.

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2.1 FORMA BINÁRIA

A Forma Binária é a mais simples das formas. Consiste em duas melodias que contrastam entre si, num esquema A e B. Muito comum no período Barroco, que compreende aproximadamente o início do século XVII e uma parte do século XVIII. Na forma binária, as duas melodias podem ter repetição ou não. Normalmente o final da seção A possui um caráter de pergunta. Uma seção B irá complementar a seção A respondendo à pergunta num caráter conclusivo. Na forma binária, a música se estabelece relativamente curta.

FIGURA 38 – FORMA BINÁRIA SIMPLES

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

Os compositores do período Barroco ampliaram esta forma propondo um desenvolvimento maior na segunda parte. Assim, a seção A continua numa função mais expositiva e a seção B passa a iniciar com melodias construídas com temas que remetem ao A ou mesmo com novos temas, caminhando para tonalidades diferentes. Para isto é necessário um número maior de frases melódicas, visto que, após o desenvolvimento, há novas frases na tônica, o que pode até dobrar o tamanho da seção. Apesar de B poder ser maior que A, ainda se conserva a forma binária.

FIGURA 39 – FORMA BINÁRIA BARROCA

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

A Forma Binária também é chamada de forma AB. No período Medieval havia ainda a forma binária redonda, que consistia de “duas seções seguidas da repetição da primeira, como em ABA (DOURADO, 2004).

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TÓPICO 3 | AS FORMAS E OS GÊNEROS MUSICAIS

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No período Barroco, a Forma Binária era monotemática, ou seja, apenas um tema. Apesar de haver duas seções, a seção B na verdade passa a ser um desenvolvimento da seção A. O que temos na forma binária barroca é AA’. No entanto, mesmo monotemática, existe o contraste.

IMPORTANTE

2.2 FORMA TERNÁRIA

A Forma Ternária apresenta três seções independentes. Apresentando uma sequência A-B-A, segue os mesmos princípios da Forma Binária, porém, a última parte “frequentemente apresenta apenas uma repetição ornamentada da primeira...” (DOURADO, 2004, p. 138).

A Forma Ternária é como uma forma “sanduíche” (BENNETT, 1986), onde B representa o recheio, uma seção contrastante entre duas melodias iguais. É o caso do nosso exemplo “Garota de Ipanema”, construída na forma ternária A-B-A. Bennett usa o esquema A1 e A2 para mostrar as sutis diferenças de uma mesma melodia, porém, é o mesmo sentido que usamos em A e A’.

Frequentemente se descobrirá que A1 termina com uma cadência perfeita na tonalidade da tônica, o que faz essa seção soar quase como uma peça curta, completa por si própria. A seção B está em outra tonalidade e A2 está novamente na tonalidade da tônica. Quando a música de A retorna como A2 na terceira seção da peça, pode soar exatamente como da primeira vez, ou o compositor pode ter decidido alterá-la de alguma forma para tornar a peça mais interessante. Mas a seção A2 será sempre reconhecida como um retorno da música da seção A após o contraste da música da seção B. (BENNETT, 1986, p. 24).

Esta forma também é chamada de forma “da capo” (MASSIN, 1997). O termo “da capo” vem do italiano e significa “do início”. Para que haja efetivamente A e B, é necessário que os compositores criem contrastes entre as seções. Os contrastes podem ser definidos pela tonalidade (modo maior ou menor), ritmo (notas longas ou notas curtas), pelo andamento (lento ou rápido), pela dinâmica (forte ou fraco), pela articulação (notas ligadas, notas bem separadas) ou ainda pela combinação de alguns destes fatores. Bennett (1986) cita ainda alguns exemplos de forma ternária, como a Dança Norueguesa Nº 3, do compositor Edward Grieg (1843-1907). Procure ouvir esta obra (mais do que uma vez) e você irá perceber a forma ternária. As seções não são curtas, porém, são contrastantes em relação ao ritmo e articulação.

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Bennett (1986) nos traz outros exemplos de forma ternária. Procure ouvir e identificar as seções das obras de Johannes Brahms (1833-1897), Dança Húngara Nº 5; Serguei Prokofiev (1891-1953), Gavotte da Sinfonia Clássica e de Piotr Tchaikovsky (1840-1893), Chanson Triste.

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2.3 RONDÓ

Na forma Rondó teremos maior variedade em termos de melodias contrastantes, porém, haverá maior repetição da melodia principal, que chamaremos de “A”. Esta seção principal sempre será intercalada com uma seção contrastante num esquema A-B-A-C-A. As seções podem ser longas e assim as chamaremos de “episódios”, onde a parte A terá seu começo e final na tônica, enquanto que as partes B e C estarão em tonalidades diferentes, contrastantes. Bennett (1986) oferece o seguinte esquema para a forma rondó simples:

FIGURA 40 – ESQUEMA DO RONDÓ SIMPLES

FONTE: Bennett (1986, p, 51)

O fato da seção A reaparecer pode tornar a música um tanto monótona, por isso, os compositores por vezes reapresentam a seção A com alguma leve variação. Na música brasileira você irá encontrar a forma rondó em chorinhos e valsas.

2.4 TEMA E VARIAÇÕES

Esta forma musical representa uma estrutura mais antiga, passando a popularizar-se em meados do século XVI (BENNETT, 1986). Característica da música instrumental, na forma tema e variações o compositor adotará um tema como seção principal e irá construir uma série de variações sobre este tema.

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TÓPICO 3 | AS FORMAS E OS GÊNEROS MUSICAIS

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FIGURA 41 – ESQUEMA DA FORMA TEMA E VARIAÇÕES

FONTE: Bennett (1986, p, 63)

Esta forma também foi amplamente utilizada pelos compositores em suas sinfonias, sobretudo nos movimentos intermediários lentos, como Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) em seu Concerto para piano nº 15, K 450 e no Andante da sinfonia nº 94, de Joseph Haydn (1732-1809). Neste último, Haydn usou um tema que praticamente nos remete a uma cantiga de roda, muito simples.

Procure ouvir esta música de Haydn. Depois que o tema (A) é apresentado pelas cordas, começa a primeira variação (A1) com o primeiro violino. A segunda variação está em tom menor (A2), bem forte, demonstrando certo humor, tocando uma cantiga num tom dramático. Uma nova variação (A3) mais complexa, segue ainda em tom menor e com notas muito rápidas nas cordas, com o acréscimo de flautas, oboés e fagotes. A próxima variação (A4) vem mais tranquila, com um solo de oboé e acompanhamento das cordas. A variação seguinte (A5) retoma com força e com todos os instrumentos. Mais duas variações seguem com caráter conclusivo.

Ao todo, são sete variações em torno de um tema simples. As variações sempre nos lembram do tema, pois se trata de uma construção que dali partiu. Assim como no Rondó, o compositor usa elementos contrastantes entre as variações.

Na forma variação, encontramos por vezes o tema sendo tocado pelo baixo, enquanto que as vozes mais agudas realizam as variações. É o que se chama basso ostinato (baixo obstinado), técnica muito utilizada nos períodos que compreendem os séculos XVI e XVII (BENNETT, 1986). Outras derivações da forma tema e variações são a passacaglia e a chaconne, ambas baseadas na ideia do ostinato:

...a passacaglia consiste em variações sobre um tema ostinato, o qual é geralmente encontrado no baixo – ainda que possa ser transferido para a parte superior; a chaconne consiste em variações sobre uma ideia ostinato que é formada por uma cadeia de harmonias, em vez de uma melodia ou canção. (BENNETT, 1986, p. 69).

Tanto a passacaglia quanto a chaconne são danças com andamento moderado e compasso ternário. Surgiram no período Barroco, com influência da música espanhola.

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2.5 FORMA SONATA

A forma sonata tem suas origens na música antiga e, no entanto, seu maior desenvolvimento foi a partir do período Barroco, seguido pelo período Clássico. O termo vem do italiano (suonare = tocar) e refere-se a uma música que não é cantada e sim tocada por instrumentos. A sonata em si era destinada a um ou mais instrumentos, em andamentos (movimentos) distintos. Sobretudo no século XVIII, com os compositores europeus Mozart, Haydn e posteriormente com Beethoven, a forma sonata apresenta três partes distintas:

• Exposição: um tema (ou um grupo de temas) é apresentado no tom principal e outro tema na dominante;

• Desenvolvimento: onde os temas serão desenvolvidos, sofrerão variações para outras tonalidades;

• Reexposição: os temas iniciais da exposição reaparecem, agora todos na tônica;• Coda: seção curta, com um caráter de afirmação da tonalidade e de finalização.

Na Exposição, o compositor apresenta um grupo de temas, similar à apresentação dos personagens de um filme. O primeiro tema pode ser seguido de um segundo ou até um terceiro tema, sempre na tônica. A partir disso, uma transição harmônica é feita para conduzir a um novo tema (ou a um novo grupo de temas) em outra tonalidade, normalmente na dominante ou na relativa. A esta transição harmônica nós chamamos de ponte (uma ponte leva a um lugar diferente, o outro lado do rio, ou seja, uma tonalidade diferente). No final da exposição pode haver uma repetição de todo o trecho.

Em seguida, vem o Desenvolvimento. Nesta seção, o compositor usa toda sua habilidade para explorar tons vizinhos e distantes, usando os motivos (ou partes deles) para construir novas ideias musicais. Como num filme, o desenvolvimento irá mostrar toda sua problemática, sua complexidade e tensão.

Após toda a tensão e movimentação do desenvolvimento, vem a Reexposição. Aqui teremos exatamente a mesma música da Exposição, com o primeiro grupo de temas e uma ponte alterada que leva ao segundo grupo de temas, porém, na tonalidade da tônica. Nesta parte, é como se o nosso filme encontrasse a resolução de seus conflitos, o final da história.

Finalmente, um trecho relativamente curto, a Coda, para reafirmar a tonalidade e o fim do movimento. Uma Coda significa um complemento musical, a certeza de que algo já terminou.

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FIGURA 42 – FORMA SONATA COMPLETA – SÉCULO XVIII

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

A sonata quando ampliada a vários instrumentos, ou melhor, quando o compositor escreve uma sonata para uma orquestra completa, na verdade estará fazendo uma sinfonia. O termo se refere a “sinfônico”. Normalmente, o primeiro movimento é escrito na forma sonata, o segundo movimento é lento, podendo ser na forma ternária, rondó, variações e outras. Por vezes há um terceiro na forma de minueto (ou scherzo) e o último movimento também na forma sonata, ou ainda numa combinação denominada forma sonata-rondó, normalmente mais rápido que o primeiro movimento.

3 GÊNEROS EM MÚSICA

De maneira geral, podemos dizer que o gênero vai tratar do tipo de música, como a bossa-nova, o samba, o jazz, o rock, o sertanejo etc. Tratam-se de estilos diferenciados. Sabemos muito bem que o samba possui várias maneiras de expressão e ali encontramos vários subgêneros, como o chorinho, a bossa-nova, o samba-enredo, o samba-canção, samba-exaltação e tantos outros. Todos se encaixam num conceito maior que é o samba, como gênero. Da mesma forma o jazz, que abarca subgêneros como o dixieland, o be-bop, o boogie-woogie, o freejazz e por aí vai. Muitos gêneros navegam tanto na música popular quanto na erudita, como as marchas e valsas, que atravessam muitas culturas em diferentes países.

3.1 GÊNEROS DA MÚSICA INSTRUMENTAL

O gênero musical trata de estilos consolidados de composição musical (DOURADO, 2004), onde estes estilos mantêm aspectos em comum, como no caso dos subgêneros citados.

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Você viu o famoso motivo da Quinta Sinfonia de Beethoven que apresentamos no início deste tópico, e que ali Beethoven estende suas ideias musicais por mais de sete minutos. Acontece que estamos nos referindo ao primeiro movimento desta obra. Uma sinfonia possui mais “movimentos”, ou seja, é formada por partes, outras músicas que se complementam. Este gênero possui a seguinte estrutura de movimentos, tomando como exemplo a Quinta Sinfonia de Beethoven:

• O 1º Movimento é denominado Allegro com brio. Significa um andamento rápido, normalmente com notas curtas e frases tocadas com vivacidade. Nesta obra, este movimento está escrito em dó menor. A forma está estruturada como forma sonata completa e seu caráter é expositivo.

• O 2º Movimento é denominado Andante com moto. Significa um movimento que não é rápido, é mais lento, calmo, porém, movido e não lento em demasia. Possui um caráter transitório.

• O 3º Movimento é denominado Scherzo Allegro, rápido. A forma se caracteriza como derivada do minueto.

• O 4º Movimento é denominado Allegro-Presto. Movimento final, possui um caráter conclusivo, agora em tom maior. A obra inteira possui aproximadamente 30 minutos.

Assim, o gênero vai tratar de como uma obra se organiza como um todo. O gênero sinfonia é formado de pelo menos três movimentos, cada qual estruturado com uma forma particular. Normalmente, o primeiro na forma sonata, o segundo em tema e variações, o terceiro em minueto e o último é sempre o mais rápido, numa forma sonata. Dependendo da concepção do compositor, sua sinfonia pode ter até cinco movimentos.

A sinfonia é apenas um dos gêneros da música instrumental. Nos tempos que antecederam Beethoven, uma forma muito utilizada pelos compositores era a suíte. Dourado (2004) nos esclarece que a suíte se caracteriza como

Obra instrumental, geralmente uma sequência de danças para instrumento solista, pequenos conjuntos ou orquestra, subsistiu até o final do período Barroco. A suíte barroca era baseada principalmente em danças como a Allemande, a Courante, a Sarabanda e a Giga, movimentos frequentemente acrescidos de Gagliardas, Courantes e outras danças. Outras suítes foram escritas, a partir do Romantismo, para diversas formações, como a Suíte Quebra-Nozes, de Tchaikovsky, para orquestra sinfônica (DOURADO, 2004, p. 318).

No período Barroco, a suíte possuía até outros nomes, como Partita, Ouvertüre e Ordre, porém obedecem à mesma estrutura do gênero suíte. As suítes podem possuir um Prelúdio ou Abertura opcional, mas a característica principal de uma suíte é a combinação de uma sequência de danças. Todas as danças são organizadas na forma binária barroca, como já vimos. As danças mais frequentes são:

Allemande: dança em compasso quaternário, de caráter sério, de origem alemã.

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TÓPICO 3 | AS FORMAS E OS GÊNEROS MUSICAIS

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Courante: de compasso ternário e andamento mais rápido, normalmente seguida da Allemande. Tem origem francesa e consolidou-se na Itália.

Sarabande: dança de caráter mais sensual, tem origem espanhola. Com um compasso ternário, se caracteriza com um acento no segundo tempo dos compassos, “ponto em que os gestos dos bailarinos eram ligeiramente mais largos”. (DOURADO, 2004, p. 293).

Giga: de origem inglesa, escocesa e irlandesa, é uma dança rápida em compasso ternário. É a mais rápida das danças, ocupando a última das danças de uma suíte.

Na suíte ainda encontramos as Galanteries, que são danças de corte francesas, todas de caráter leve e andamento moderado. As principais galanteries são o Minueto, a Gavota, a Bourré, o Passepied e a Forlane. O compositor Johann Sebastian Bach (1865-1750) adotou um esquema básico para suas suítes:

I – PrelúdioII – AllemandeIII – CouranteIV – SarabandeV – GalanteriesVI – Giga

Outro gênero da música instrumental é o Concerto. Consolidou-se no século XVIII e é formado por cerca de três movimentos e com instrumento solista acompanhado por uma orquestra. O termo acabou sendo popularizado e também significa a apresentação pública de uma orquestra ou mesmo de uma banda de rock ou jazz. Apresentações em locais menores normalmente recebem o nome de recital (DOURADO, 2004). Como gênero musical, o concerto obedece às mesmas regras formais, porém, há o acréscimo de partes solísticas.

O Divertimento se constitui um gênero muito utilizado no período Clássico. Era utilizado para pequenos grupos, com até nove movimentos curtos (DOURADO, 2004). Muito semelhante ao divertimento, encontramos a Serenata, gênero muito ligado às comemorações na nobreza da corte, durante o período Barroco, mas como música vocal. No Classicismo a Serenata ganhou importância pela atenção que Mozart dedicou a este gênero, passando a caracterizar-se como música instrumental.

DICAS

Ouça a “Pequena Serenata Noturna”, do compositor Wolfgang Amadeus Mozart. É um belo exemplo de Serenata, em que o primeiro movimento está escrito na forma sonata.

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No período Romântico, outros gêneros musicais surgem, como o Poema sinfônico. Normalmente escrito num único movimento, este gênero tem o compositor húngaro Franz Liszt (1811-1886) como precursor. O compositor alemão Richard Strauss (1864-1949) utilizou este gênero nas obras Uma Vida de Herói, Don Quixote, Don Juan e Assim Falou Zarathustra. Esta última ficou extremamente popularizada na trilha sonora do filme 2001: Uma Odisseia no Espaço (1968), de Stanley Kubrick.

A Fantasia é uma forma antiga, com um caráter livre das exigências formais. Como o próprio nome sugere, a forma cede à imaginação, à fantasia do compositor. É um gênero que atravessou vários períodos da música e encontrou no Romantismo uma grande importância. Foi por meio deste gênero que os compositores do Romantismo extrapolaram as exigências da forma sonata, dando-lhes liberdade. No século XX, compositores como Arnold Schoenberg (1874-1951) utilizaram este gênero em várias obras (DOURADO, 2004).

O Estudo é um gênero para instrumento solo. É uma obra que mais remete ao aprimoramento técnico no instrumento do que propriamente uma obra musical. Outro gênero é o Impromptu, que também possui caráter virtuosístico e estilo improvisado, num só movimento e normalmente escrito para piano, assim como o Noturno.

3.2 GÊNEROS DA MÚSICA VOCAL

Nos gêneros da música vocal encontramos peças breves e complexas. Nas obras breves, encontramos o Madrigal. Este gênero de origem italiana surgiu no século XVI e é escrito para várias vozes, sem acompanhamento instrumental. A Cantilena é também aplicada à música instrumental e designa uma música elaborada a partir de uma melodia, sempre muito “cantábile” (imitando o canto) para uma ou mais vozes (MASSIN, 1997).

A Cavatina precedia a ária e comportava uma única seção, sem repetição, vindo a se tornar um “tipo distinto de peça musical de caráter simples e expressivo”. (MASSIN, 1997, p. 75). Já no Recitativo, a melodia procura adaptar-se ao ritmo, com ênfase na declamação do texto. Não há uma forma estabelecida, visto que a prioridade é a estrutura textual.

O Lied (canção em alemão) tem origem alemã e segundo Massin (1997), é uma peça vocal com acompanhamento do piano. Possui origens na música medieval, porém encontrou grande desenvolvimento na Alemanha do século XVIII. Sobretudo com o compositor austríaco Franz Schubert (1797-1828), o Lied tornou-se um gênero importante no período Romântico.

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TÓPICO 3 | AS FORMAS E OS GÊNEROS MUSICAIS

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Um gênero extremamente popular é a Romanza. Como o nome sugere, é muito sentimental, tornando-se popularesco. No entanto, compositores como Mozart escreveram romanzas complexas, também na música instrumental. Já o Vaudeville (voix-de-ville, vozes da cidade) trata de “uma canção formada de quadras que são todas cantadas com a mesma melodia”. (MASSIN, 1997, p. 78).

A música vocal encontra uma grande diversidade de gêneros. No entanto, o mais representativo no universo da música vocal sem dúvida é a música lírica. Esta designação tem sentido íntimo com a Ópera, “não apenas o fato de estar ligada a um espetáculo cênico, mas o de haver sido composta para um libreto que foi escrito especialmente para ela”. (MASSIN, 1997, p. 78). Com origem que remonta ao século XV, a Ópera pode ser considerada uma das maiores manifestações artísticas, pois combina a música instrumental, música vocal, poesia, artes visuais e o teatro. No século XVIII este gênero ganhou grande popularidade, subdividindo em subgêneros como a Ópera Buffa, Ópera Séria, Ópera Cômica e o Singspiel. No século XIX, compositores como Bellini, Giuseppe Verdi (1813-1901), Gioachino Rossini (1792-1868) e Gaetano Donizetti (1797-1848) encontraram grande destaque em suas óperas, muito populares até a atualidade. Segundo Dourado (2004), foi com Richard Wagner (1813-1883) que a ópera rompeu fronteiras, principalmente em Tristão e Isolda e O Anel do Nibelungo. Nestas obras, o compositor utilizou o que chamava de Leitmotiv (motivo condutor). Além disso, Wagner estabeleceu novas formas estéticas da concepção da ópera.

Já a Ária é normalmente acompanhada por instrumentos para um cantor solista. Encontramos as árias como trechos das óperas, oratórios e cantatas. A ária pode adotar a forma ostinato, binária e também a forma da capo. Encontramos um número grande de árias famosas, como Casta Diva, da ópera Norma de Vincenzo Bellini (1801-1835), Habanera, da Ópera Carmen, de Georges Bizet (1838-1875), e a ária da Rainha da Noite, da ópera A Flauta Mágica, de Mozart.

FIGURA 43 – ÁRIA “RAINHA DA NOITE” DA ÓPERA “A FLAUTA MÁGICA”

FONTE: Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=dpVV9jShEzU>. Acesso em: 6 jun. 2016.

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UNIDADE 1 | INSTRUMENTOS MUSICAIS E PARTITURAS

Como você pôde perceber, existe um grande número de gêneros, tanto na música vocal como instrumental, tornando as possibilidades muito amplas, onde toda obra musical é concebida, pensada de acordo com um gênero específico. Apresentamos até aqui os gêneros e as formas musicais mais conhecidos, onde alguns são bem específicos e outros são muito parecidos. Além do que aqui foi apresentado, existe uma grande variedade no que diz respeito ao assunto. Portanto, não seria possível esgotar esta temática neste tópico.

LEITURA COMPLEMENTAR

MAESTROS, OBRAS-PRIMAS & LOUCURA

Debussy: La Mer/Elgar: Enigma VariationsOrquestra Sinfônica da BBC/Arturo Toscanini

EMI: Londres (Queen’s Hall), 3 e 12 de junho de 1935Lançado em 1987

Dois maestros não confiavam na gravação. Wilhelm Furtwängler deplorava sua rigidez, ao passo que Arturo Toscanini considerava o som gravado antimusical. “Nossas duas últimas experiências com Toscanini serviram para desencorajar futuras tentativas de gravar com ele”, escreveu o produtor da RCA Charles O’Connell em 1933”. Além do mais, tendo gastado quase dez mil dólares nessas tentativas, nós estamos bem curados desta ambição”. Pelo menos nos Estados Unidos, a essa altura, Toscanini estava de fora.

Dois anos mais tarde, durante o Festival de Música de Verão da BBC, Fred Gaisberg, da EMI, escondeu equipamentos de última geração em dois concertos. Toscanini, excepcionalmente, estava num período muito feliz com a orquestra da BBC (fundada por Adrian Boult em 1930), admirava seus músicos principais e raramente levantava a voz durante os ensaios. A Suíte de Debussy, que ele gravou com muitas alterações marcadas com tinta verde, brilhou como o Canal da Mancha em Eastbourne num dia de verão – seria um paraíso para um pintor pontilhista. Não há nada de literal na sugestão do anoitecer ou das ondas, apenas uma luminosa impressão da natureza à vontade, com uma ameaça vagamente velada de tempestade.

O Elgar foi mais contido. Toscanini começa com movimentos rápidos, surpreendendo os críticos britânicos, que estavam acostumados aos andamentos mais lúgubres do falecido compositor. “É uma música adorável e deve ser viva”, disse Toscanini ao líder das violas, Bernard Shore, que fez um solo vagamente satírico na sexta variação. A execução tem uma beleza arrebatadora, dolorosa e insuperável. “Ele cria a sensação de que não há nada entre você e a música”, disse o então jovem regente John Barbiolli.

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TÓPICO 3 | AS FORMAS E OS GÊNEROS MUSICAIS

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Gaisberg considerou as gravações “perfeitas do ponto de vista técnico”, mas Toscanini se recusou a ouvi-las. Ele estava retornando para os Estados Unidos, onde a NBC lhe havia prometido uma superorquestra. As gravações de estúdio com som de caixa que ele viria a fazer em Nova Iorque concretizaram seus maiores temores a respeito dessa mídia e, após o registro, ele jamais ouvia o seu trabalho novamente. As sessões no Queen’s Hall são as únicas gravações de Toscanini no auge da forma e com o melhor som de sua vida, mesmo não estando ciente de que ele estava sendo preservado para a posteridade. As gravações ficaram guardadas em cofres durante meio século, até que a EMI conseguiu a permissão legal para trazê-las em público.

LEBRECHT, Norman. Maestros, obras-primas & loucura. Rio de Janeiro: Record, 2008, p. 188-189.

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RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico vimos que:

• A música, assim como um texto, possui uma estrutura identificável. Da mesma forma que um texto transmite uma mensagem, também a música transmite, mesmo que seja uma mensagem indeterminada, abstrata.

• Os motivos (incisos) representam a menor unidade reconhecível em uma música. As melodias são criadas a partir de motivos (incisos) que formarão membros de frase. Dois ou mais membros de frase formarão uma frase musical.

• As frases podem ter caráter de pergunta (quando terminam na Dominante) ou de resposta (quando terminam na Tônica).

• As cantigas de roda são estruturadas na forma simples, por possuírem uma única melodia.

• Na forma binária simples temos duas melodias que contrastam em si – A começando na Tônica e terminando na Dominante (ou relativa) e B começando na Dominante e terminando na Tônica. Na forma binária Barroca, a seção B possui um desenvolvimento para outras tonalidades e retorna à tonalidade inicial.

• Na forma ternária o esquema é A-B-A. Como se fosse um sanduíche musical, a seção B contrasta com A. Também é conhecida como forma da capo.

• Na forma rondó nós temos uma melodia principal A, seguida por uma melodia contrastante B, retoma-se o A com variação e continua com uma melodia C e assim por diante. Temos então o esquema A-B-A-C-A, como que “rodeando” a melodia com contrastes.

• Na forma tema e variações, temos a melodia A, seguida pelo A1 (mesma melodia, com variações), melodia A2 (aumentando na complexidade em variação), A3 e assim por diante.

• A forma sonata é uma das mais importantes a partir do Barroco, seguindo pelo Clássico e também no período Romântico. Apresenta a seguinte estrutura:

• Exposição: um tema (ou um grupo de temas) é apresentado no tom principal e outro tema na tônica.

• Desenvolvimento: é onde os temas serão desenvolvidos, sofrendo variações para outras tonalidades.

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• Reexposição: os temas iniciais da exposição reaparecem, agora todos na tônica.

• Coda: seção curta, com um caráter de afirmação da tonalidade e de finalização.

• Os gêneros tratam da estrutura externa de uma obra musical enquanto que a forma trata da estrutura interna.

• Uma sinfonia é um gênero musical. Os movimentos que fazem parte de uma sinfonia são organizados em formas: forma sonata, forma tema e variações, forma ternária etc.

• A suíte barroca é organizada também em movimentos, chamados “danças”. As principais danças são: Allemande, Courante, Sarabande e Giga. Estas danças são organizadas em forma binária.

• Um concerto pode ser entendido como a apresentação de um grupo musical. No entanto, significa também um gênero que possui um instrumento solista acompanhado de uma orquestra.

• A Ópera pode ser considerada uma das maiores manifestações artísticas, combinando música, poesia, artes visuais e o teatro.

• A Ária é normalmente acompanhada por instrumentos para um cantor solista. Encontramos as árias como trechos de ópera, normalmente escritos em forma binária ou ternária.

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1 As cantigas de roda infantis são estruturadas na forma simples, de acordo com Guest (1996), por serem constituídas por uma única melodia. Normalmente ocupando um espaço de oito compassos, estas melodias são formadas por duas meias-frases, onde a primeira termina em pergunta (dominante) e a segunda termina em resposta (tônica). Considerando as formas musicais apresentadas neste tópico, numere corretamente a coluna da direita de acordo com as formas musicais da coluna da esquerda:

AUTOATIVIDADE

(1) Forma Binária ( ) Ausência de temas contrastantes, apresenta o esquema A1, A2, A3, A4, A5.

(2) Tema e Variações ( ) Tema sendo tocado pelo baixo, enquanto que as vozes mais agudas realizam as variações.

(3) Forma “da Capo” ( ) Música monotemática e sem desenvolvimento. Normalmente com apenas oito compassos.

(4) Rondó ( )Normalmente, o final da seção A possui um caráter de pergunta. Uma seção B irá complementar a seção A respondendo à pergunta num caráter conclusivo.

(5) Basso Ostinato ( ) É como uma forma “sanduíche”, onde B representa o recheio, uma seção contrastante entre duas melodias iguais.

(6) Forma Simples ( ) Uma seção principal, sempre intercalada por seções contrastantes.

2 A forma sonata constitui uma das mais importantes a partir do Barroco e sobretudo no Classicismo. Compositores como Mozart e Haydn escreveram um grande número de obras nesta forma, e Beethoven intensificou e ampliou as possibilidades da forma sonata. Muito comum nos primeiros movimentos das sinfonias clássicas e românticas, a sonata pode apresentar uma introdução lenta. Assinale a alternativa correta que descreve o esquema da forma sonata clássica:

( ) Após a Introdução vem a Exposição dos grupos temáticos, seguindo o Desenvolvimento que parte da dominante (ou relativa) e retornando à tônica. A Coda explora melodias em novas tonalidades.

( ) Introdução opcional, a Exposição temática parte da tônica à dominante (ou relativa). O Desenvolvimento explora outras tonalidades e há a Reexposição, constituindo a forma ternária A-B-A. Coda opcional.

( ) Após a Introdução, a Exposição temática começa na tônica e termina na dominante. O Desenvolvimento vai para outros tons, retornando na Reexposição na tônica. A Coda encerra o movimento.

( ) Introdução opcional, segue a Exposição com temas na tônica seguidos por uma ponte que leva à tônica. O Desenvolvimento faz muito movimento harmônico e culmina na Reexposição na dominante. A Coda retoma a tônica.

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UNIDADE 2

HISTÓRIA DA MÚSICA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

Nessa unidade vamos:

• conhecer a história da música, seus compositores e situação histórico/social;

• relacionar os diferentes períodos da música, de acordo com o seu desen-volvimento histórico/social;

• identificar as significativas mudanças na forma e estrutura da música que marcam cada período da história da música;

• compreender que a música está inserida num contexto histórico e por vezes exerce as mais variadas funções sociais;

• identificar e analisar obras musicais de acordo com o estilo, situando-as historicamente.

Esta unidade está dividida em quatro tópicos, conforme segue. No decorrer desta unidade você encontrará atividades que irão lhe auxiliar na compreensão dos conceitos em questão.

TÓPICO 1 – MÚSICA ANTIGA E MÚSICA NA IDADE MÉDIA

TÓPICO 2 – MÚSICA RENASCENTISTA E BARROCA

TÓPICO 3 – CLASSICISMO E ROMANTISMO

TÓPICO 4 – MÚSICA MODERNA

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TÓPICO 1

MÚSICA ANTIGA E MÚSICA NA IDADE MÉDIA

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

Você já viu que o ritmo é o elemento presente na natureza e que ele é o elemento sensível que possibilita a música. O movimento, ou o ritmo, existe muito antes do homem. Ele está nas árvores balançando pelo vento, nas ondas do mar batendo nas pedras, nos animais correndo. Estes são exemplos de como a natureza se manifesta em movimento, como o ritmo. Quando o homem começa a organizar esse ritmo numa manifestação musical, surgem as primeiras manifestações musicais.

A História nos mostra uma série de períodos, espaços de tempo em que o homem separou e colocou em “Idades”. A música, como parte deste processo histórico, também é compreendida em períodos históricos diferentes, onde em cada período eventos importantes traçam suas fronteiras históricas. Na imagem a seguir você pode acompanhar uma linha do tempo traçando os períodos históricos em suas “Idades” estabelecidas na História geral juntamente com os períodos da História da Música.

FIGURA 44 – COMPARATIVO HISTÓRICO GERAL E MUSICAL

IDADE ANTIGA

4000 a.C.

Música Antiga

Queda doImpério Romanodo Ocidente

Tomada dacidade deConstantinoplapelos turco-otamos

RevoluçãoFrancesa

Música Medieval MúsicaRenascentista Música

BarrocaMúsica

Clássica MúsicaRomântica

MúsicaModerna

476 d.C. 1453 16001750

17891810

1900 hoje

PRÉ-

HIS

TÓR

IA

IDADE MÉDIA IDADE MODERNA IDADE CONTEMPORÂNEA

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

2 MÚSICA ANTIGA

Já são conhecidos vários exemplos de pinturas rupestres nas cavernas, representando as ações humanas como caçadas, rituais e outros eventos. Vários destes registros podem ser encontrados atualmente e datam de milhares de anos. As artes plásticas de certo modo encontram suas origens em registros como estes. A música, inserida no campo das artes, é carente de registros, não há como saber ou é praticamente impossível determinar em que momento o homem passou a fazer música, visto seu plano temporal de existência. A atividade arqueológica

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

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FIGURA 45 – PINTURAS DE APROXIMADAMENTE 30 MIL ANOS, NA CAVERNA CHAUVET, NA FRANÇA

FONTE: Disponível em: <http://viajeaqui.abril.com.br/materias/primitiva-rupestre-chauvet>. Acesso em: 21 jun. 2016.

Estudos arqueológicos demonstram registros acerca de manifestações musicais na antiga Mesopotâmia, no antigo Egito e também na China. Muito já se sabe sobre estas civilizações, por exemplo, sua complexa organização social onde a música se fazia presente em rituais e festividades (CANDÉ, 2001).

Na Mesopotâmia, datam-se as primeiras manifestações culturais num povo extremamente organizado, principalmente na região do baixo vale do Eufrates, com o povo sumério, cuja origem é ignorada (CANDÉ, 2001). Pouco se sabe a respeito de algum registro sistemático musical. No entanto, descobertas recentes revelam registros musicais que datam do século XVIII a XV a.C., na forma de três tábuas babilônicas.

[...] essas tábuas cuneiformes revelaram seu conteúdo: um método de afinação da lira-cítara de nove cordas, permitindo estabelecer-se uma teoria de escala babilônica! Esta seria uma escala diatônica de sete sons, de aquisição bastante recente; os especialistas acham, com efeito, que as escalas pentafônicas é que eram usuais então (CANDÉ, 2001, p. 55).

Da mesma forma, a música no antigo Egito – cerca de 3.000 a.C. – estava presente nos rituais. Existe um número imenso de gravuras da época do povo do antigo Egito utilizando instrumentos musicais. Um dos mais antigos é uma placa de xisto, uma espécie de rocha, onde está esculpida a figura de dançarinos tocando flautas, cerca de 3,5 mil anos antes de Cristo (CANDÉ, 2001).

descobriu instrumentos sonoros feitos pelo homem primitivo que provavelmente imitam os sons da natureza, como o canto de pássaros e o som da chuva. Porém, isto está longe de ser um “instrumento musical”, podemos considerar apenas como “instrumentos sonoros”.

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TÓPICO 1 | MÚSICA ANTIGA E MÚSICA NA IDADE MÉDIA

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Na época da construção das pirâmides, época simultânea do declínio da civilização suméria, a cultura musical era riquíssima. Por outro lado, os músicos tinham uma função secundária neste contexto. Raramente citados em textos, normalmente aparecem em gravuras numa postura de submissão aos seus superiores. As influências culturais externas eram hostilizadas, onde a educação mantinha uma função importante neste sentido, numa postura rígida quanto à influência externa de outros povos.

FIGURA 46 – MULHERES TOCANDO INSTRUMENTOS MUSICAIS NO ANTIGO EGITO

FONTE: Disponível em: <http://www.utahloy.com/m6egypttech/muu2.htm>. Acesso em: 21 jun. 2016.

Os registros e as gravuras de instrumentos egípcios não são tão precisos e os exemplares encontrados estão em condições precárias. Por exemplo, uma antiga harpa egípcia possuía as cordas, que provavelmente eram feitas com tripas de animais, e nos exemplares encontrados em buscas arqueológicas as cordas estão ausentes, pela deterioração e ação do tempo. Portanto, é quase impossível determinar a qualidade sonora destes instrumentos. Os instrumentos musicais daquela época eram os mais variados: a harpa, a cítara ou lira, o alaúde ou pandora, a flauta, o trompete, o sistro, crótales e tambores.

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

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FIGURA 47 – INSTRUMENTOS MUSICAIS EGÍPCIOS

Da esquerda para a direita: mulheres tocando crotales (6), harpa de ombro (5), mait (espécie de flauta dupla) (4), ancestral do alaúde (3), harpa portátil e harpa de chão.FONTE: Disponível em: <http://www.imagick.org.br/blog/fibonacci-e-a-musica-do-rabudo/>. Acesso em: 23 jun. 2016.

Na China antiga, por volta de 2.900 a.C., os chineses utilizavam instrumentos como o k’in (com sete cordas) e o sê (cinquenta cordas). Ao longo deste grande período já havia um complexo sistema de escalas e gêneros melódicos, assim como outros instrumentos, como o sheng, uma espécie de órgão de boca. Infelizmente, um decreto imperial de 212 a.C. ordena a destruição dos livros contendo grande parte da literatura musical chinesa. (CANDÉ, 2001).

Encontramos registros da história da música também na Bíblia, em várias passagens que citam instrumentos musicais, como em Gênesis 4:21: “o nome de seu irmão era Jubal: este foi o pai de todos que tocam harpa e flauta”; também em outro livro da Bíblia, Juízes, que relata fatos ocorridos entre 1200 a 1020 a.C.: Juízes 5, “Naquele dia cantaram Débora e Baraque, filho de Abinoão...”; 11, “A música dos distribuidores de água, lá entre os canais dos rebanhos, falai dos atos de justiça do Senhor...”, além do livro II Samuel 6, 5: “Davi e toda a casa de Israel alegravam-se perante o Senhor, com toda a sorte de instrumentos e pau de faia, com harpas, com saltérios, com tamborins, com pandeiros e com címbalos”.

Neste mesmo período histórico, na Grécia antiga, encontram-se os primeiros registros da música como arte, independente de função social. Os gregos elevaram a música como uma arte independente, livre de meras funções sociais, como a música militar, a música para rituais e a música para festividades. As artes ocidentais de maneira geral têm suas origens na Grécia antiga. Especificamente na música, essas origens estão na forma de tratados teóricos, concepções filosóficas e contos. Na Grécia do século VIII a.C., Homero escreveu em seus poemas épicos Ilíada e Odisseia passagens com referência à música: “hinos a Apolo, os coros femininos que choraram a morte de Hector e a utilização, pelos poetas-músicos-intérpretes, de instrumentos como a lira, arquétipo da corda e os aulos, representante dos de sopro”. (CANDÉ, 1995, p. 1).

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TÓPICO 1 | MÚSICA ANTIGA E MÚSICA NA IDADE MÉDIA

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É nesta época que surgem as primeiras escolas de música, sobretudo em Esparta. Os músicos possuíam um status de detentores de um conhecimento técnico e científico na habilidade de fazer música, mas também de um gênio inspirado pelas musas. As concepções estéticas da arte caminham ao lado do conhecimento científico também na arte musical.

A poesia lírica constitui um gênero musical amplamente difundido na Grécia antiga. Composta com uma melodia, esta poesia tem o nome de nomos. Segundo Candé (2001), os nomos eram praticados normalmente com um cantor e seu instrumento sozinho (nomos citaródicos), um cantor e um instrumentista (nomos aulódicos) ou mesmo um instrumentista e um coro (nomos coródicos).

Em aproximadamente 500 a.C. o filósofo e educador Pitágoras desenvolveu o pensamento da harmonia das esferas e a crença da importância dos números para a interpretação dos fenômenos. A este filósofo se atribui a divisão numérica entre as notas musicais da escala. Seus seguidores utilizaram esses princípios para elaborar um sistema musical. Sua influência chegou até a Idade Média e ao Renascimento, quando era utilizado o sistema pitagórico, baseado na afinação em 4ªs e 5ªs justas naturais (SADIE, 1994, p. 728). As proporções de intervalo entre as notas colocadas por Pitágoras trazem objetividade ao estudo da música, pois são os primeiros tratados da física acústica.

Para os seguidores de Pitágoras, a música obedece a estas proporções numéricas que estão amplamente presentes na natureza, concebendo a música como um reconhecimento da harmonia existente na natureza e não uma pura diversão leviana.

DICAS

Você pode conferir as proporções numéricas de Pitágoras na Figura 30 da Unidade 1, numa demonstração desta lei acústica.

A importância do sistema pitagórico coloca valores exatos nos intervalos das escalas, constituindo um método eficiente ao estudo da música. Na organização da escala musical, como já vimos na Unidade 1, Tópico 2 (Figura 32), há uma estrutura de tons (T) e semitons (sT), formando assim a escala diatônica maior (ou menor). Mas isto se refere apenas ao primeiro grau (primeira nota da escala), pois podemos construir novas escalas a partir das outras notas da escala. O resultado serão novas estruturas, intervalos diferentes entre as notas.

Partindo da nota dó até sua oitava acima, teremos a seguinte estrutura, formando a escala diatônica de dó maior:

dó – ré – mi – fá – sol – lá – si – dó T – T- sT – T – T – T – sT.

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

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A nota inicial representa o nome da escala e seu campo tonal. Esta escala pode ser considerada como modo grego Jônio. Partindo da nota ré até sua oitava acima, teremos uma nova organização, porém, dentro do campo tonal de dó maior:

ré – mi – fá – sol – lá – si – dó – ré T – sT – T – T – T – sT – T.

Este é o segundo modo grego da escala, denominado de dórico. O mesmo se faz com as outras notas da escala. Os modos gregos, como assim são chamados, são conhecidos pelos nomes: jônio, dórico, frígio, lídio, mixolídio, eólio e lócrio, respectivamente para o I, II, III, IV, V, VI e VII graus da escala. Alguns destes nomes fazem referência às regiões da antiga Grécia.

O pensamento de Pitágoras influenciou filósofos como Platão e Aristóteles, como forma indissociável à educação para a ética. Com Aristóteles surge um novo movimento estético para a música, elevando-a na condição de arte. Este filósofo constata que a música possui liberdade enquanto expressão do espírito humano, destituindo-a de qualquer valor moral e da utilidade. A ideia de que a música seja privada de utilidade (música militar, música ritual...) coloca-a livre de conceitos, e, portanto, encontra sua utilidade nela mesma. No entanto, Aristóteles alerta que a educação deve elevar o gosto, pelo uso da ética.

Nesta maneira de pensar, cada modo da escala possui uma identidade particular, uma ordem natural que reflete a tradição de cada povo. Trata-se do ethos, que nada mais é do que o conjunto de valores e características, algo semelhante à cultura. Cada modo gregoriano possui um ethos diferente, por isso a designação de cada região grega para os modos da escala.

Na Roma antiga, a tradição musical grega foi herdada, sendo amplamente utilizada nas artes cênicas e também no cenário religioso. Mas a música romana já possuía influência externa, dada a expansão do Império Romano. A tragédia e a comédia ganham espaço como gênero musical, onde há atuações de músicos profissionais, atores e cantores líricos (CANDÉ, 2001). O imperador romano Nero (37 d.C.-68 d.C.) admirava estes gêneros, promovendo fatos interessantes:

Pretendendo impor-se como cantor excepcional, Nero submetia-se a um regime e a penosos exercícios para adquirir as qualidades vocais mais raras. Contudo, segundo seu biógrafo, Suetônio, ele tinha uma voz ‘fraca e velada’. Entretanto, o exemplo do imperador levou senadores e patrícios a estudar e a praticar a música, favorecendo o desenvolvimento de uma arte doméstica refinada, que talvez tenha contribuído para o enriquecimento da música cristã (CANDÉ, 2001, p. 81).

Já naquela época a música incorporava sentidos deturpados, favorecendo classes sociais ricas com seus escravos músicos. A música menos elaborada era para o povo simplório e mesmo o surgimento de grandes artistas aclamados pelo povo servia mais para fomentar distanciados valores sociais na música erudita em contraponto à música popular. Segundo Candé (2001), “nunca houve uma música latina, mas uma maneira latina de fazer música grega!” O que se praticava em Roma há dois mil anos, ironicamente, possui laços muito próximos com a produção musical da atualidade.

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TÓPICO 1 | MÚSICA ANTIGA E MÚSICA NA IDADE MÉDIA

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3 MÚSICA NA IDADE MÉDIA

O declínio do Império Romano do Ocidente, por volta do ano de 476 da era cristã, marca o final da Idade Antiga, segundo historiadores. Uma nova era tem início e perduraria quase mil anos: a Idade Média. É neste período histórico que a Igreja emerge como um centro de poder que influenciaria, além da religião, também a política, a vida social, as artes, assim como a música.

Na Idade Média surge uma das principais obras que servirá como referência para o desenvolvimento da música, com o escritor e estadista romano Anicius Boetius (480-524).

Escreveu sobre as disciplinas matemáticas, lógica, teologia e filosofia. Em institutione musica considerou a música como uma força que impregnava todo o universo (musica mundana) e um princípio unificador tanto do corpo e alma do homem quanto das partes de seu corpo (musica humana); a música também seria inerente a certos instrumentos (musica instrumentalis). Boetius concebeu um Sistema Perfeito de teoria grega com sua teoria de tetracordes, a doutrina pitagórica das consonâncias, a matemática para racionalizar as consonâncias musicais e o princípio da divisão monocórdia. Seu tratado tornou-se a obra de teoria musical mais difundida na Idade Média. (SADIE, p.117).

A música, neste período, tem um tratamento íntimo com a filosofia, à glória do divino e ao engrandecer do espírito. Boetius utilizou-se do conceito de que as coisas obedecem a uma harmonia de acordo com os números, proporções numéricas que demonstram uma lógica do Criador. As proporções numéricas possibilitam a organização do universo e a música, segundo Boetius, é uma pura manifestação deste conceito.

Para o escritor, existe uma Música mundana, uma música que é do mundo, a harmonia do cosmo; existe uma Música humana, que está presente no homem, contribui para sua consonância com o cosmo e, finalmente, uma Música instrumentalis, que é a própria manifestação artística do homem, a música como instrumento que evoca a natureza (MASSIN, 1997).

O pensar da música medieval coloca o homem como um ser musical integrado ao divino. Não somente com Boetius, mas também com outros pensadores, a música está presente no saber, nos conhecimentos em várias áreas, fundamentalmente pelo seu estudo de proporções numéricas. Este estudo estabelece um princípio de “unidade” para o número e outro de “igualdade” para a proporção (MASSIN, 1997). Boetius afirma que as coisas mais belas são as que têm as proporções numéricas mais simples, numa relação de música com arquitetura. Senão, vejamos:

Os retângulos mais simples são os que se encontram numa relação 2/1, proportio dupla (proporção dupla), ou de 3/2 (a unidade mais a metade), sesquialtera, e de 4/3 (a unidade mais 1/3), dita sesquitertia.Ora, no que diz respeito à música, as relações mais simples – portanto as que se deve utilizar, por serem as mais belas – são a oitava (de 2/1), a quinta (de 3/2) e a quarta (4/3) (MASSIN, 1997, p. 129).

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

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Assim, com Boetius a música é considerada como algo com justas proporções, de acordo com a Criação. As mesmas proporções são utilizadas em outras artes e também na arquitetura, nas proporções numéricas encontradas na natureza. Dessa forma, a boa música, aquela que possui as proporções matemáticas, torna possível ao homem encontrar-se em harmonia com a criação do universo. A música que fere a organização numérica é considerada de mau gosto, desvia a conduta humana em desacordo com o universo. Isto pode ter contribuído para uma censura por parte da Igreja, de permitir a “boa” música nos domínios do templo, para a elevação do ser.

FIGURA 48 – PENSADOR DA MÚSICA: ANICIUS BOETIUS

Nos grandes centros da Europa Medieval, tradições musicais mais antigas foram desenvolvidas para a música sacra, entre elas o canto romano antigo, o ambrosiano, o galicano, o moçárabe. Tamanha diversidade musical poderia fragmentar a Igreja cristã e assim surge a necessidade de uma unificação, instituída por São Gregório (CANDÉ, 1995), entre os anos 560 e 604.

Um dos primeiros elementos musicais representando registros de partituras estão na forma do cantochão. Trata-se de um “canto monódico da liturgia cristã, cujo ritmo se baseava apenas nos contornos das frases e acentuações” (DOURADO, 2004). Historiadores acreditam que o cantochão tem suas origens nos primeiros rituais cristãos, porém, pouco se sabe acerca desta questão, em virtude da perseguição que os primeiros cristãos sofriam. Ao que se sabe, o cantochão não tinha acompanhamento e o ritmo variava entre as acentuações das palavras. Por vezes os coros cantavam alternadamente ou ainda num estilo de responsório, com um ou mais solistas (BENNETT, 1986). O cantochão é uma tradição que pode ser vista ainda hoje, em muitas igrejas cristãs.

FONTE: CANDÉ, 1995, p. 2

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TÓPICO 1 | MÚSICA ANTIGA E MÚSICA NA IDADE MÉDIA

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FIGURA 49 – PARTITURA DE CANTOCHÃO DA IDADE MÉDIA

FONTE: Disponível em: <http://cursosvirtuales.cfe.edu.uy/semipresencial/file.php/1/03/Primero86/311HMusUniv1/image/neumas.jpg>. Acesso em: 28 jun. 2016.

O elemento que mais representa a unificação proposta por São Gregório está na forma do Canto gregoriano, desenvolvido a partir da expressão pelos neumas utilizados no século IX ao século XII (CANDÉ, 1995). Os neumas são sinais gráficos sobre o texto que orientam melodicamente o cantor. O termo “neuma” tem origem incerta, porém, a teoria mais aceitável é a de “sinal com cabeça”, característica semelhante às figuras de tempo utilizadas na atualidade, como a mínima, a semínima e a colcheia.

O canto gregoriano é baseado nos modos já expostos aqui, pelos quais foram ampliados até o número de 12 modos, denominados dórico, hipodórico, frígio, hipofrígio, lídio, hipolídio, mixolídio, hipomixolídio, jônico, hipojônico, eólico e hipoeólico. Entretanto, a notação neumática necessitava de conhecimento prévio por parte de seus intérpretes, normalmente pela tradição oral.

Foi no século IX que as primeiras manifestações da música polifônica ganharam espaço por via de experiências pelos compositores. Num sentido estético, os compositores acrescentaram uma ou mais linhas melódicas à linha principal, ao que se chamou organum. Neste estilo de composição, a melodia principal (vox principalis) é enriquecida com uma melodia paralela (vox organalis), normalmente abaixo, num intervalo de quarta ou quinta (BENNETT, 1986). O organum paralelo consistia num método de composição que perduraria por quase dois séculos.

A música continua a ser desenvolvida e no século XI o organum é enriquecido com uma variante de composição, o organum livre, onde a voz de acompanhamento poderia variar do movimento paralelo para contrário e elevar-se livremente da voz principal. Isto por si só já traz uma grande mudança, superando as formas rígidas anteriores. No entanto, a parte rítmica ainda permanece a mesma da vox principalis.

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

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Posteriormente, o organum foi desenvolvido até que seu modelo antigo fosse completamente abandonado. Esta nova tradição gregoriana na música cristã traz como seu principal fator o uso de melismas, em que uma mesma sílaba do texto é entoada com diversas notas (DOURADO, 2004). A voz paralela caracteriza-se como melódica, enquanto que a voz principal (que passou a ser chamada de tenor) contrasta com pouco movimento. Por vezes a parte tenor poderia ser feita com um órgão.

Uma das maiores contribuições dos teóricos musicais da Idade Média está com o monge beneditino Guido D’Arezzo (990-1050) e que perdura até hoje: o nome das notas musicais. D’Arezzo havia estabelecido o sistema de pautas e o nome das seis primeiras notas musicais: Ut, Re, Mi, Fa, Sol, La. Ele estabelece ainda o uso de figuras de tempo conhecidas como a “longa” e a “breve”, que permitem uma maior precisão quanto ao ritmo, além da organização métrica dos compassos ternário e binário (CANDÉ, 1995). D’Arezzo foi influenciado pela filosofia de Boetius.

FIGURA 50 – PARTITURA EM NEUMAS COM SISTEMA DE QUATRO LINHAS

FONTE: Disponível em: <http://www.gregoriano.org.br/gregoriano/cursodecantogregoriano.htm>. Acesso em: 28 jun. 2016.

Com a construção da catedral de Notre-Dame (1182), surge uma rica tradição musical em Paris na chamada “Escola de Notre-Dame”, onde encontramos dois expoentes desta escola: Léonin e seu sucessor, Pérotin. Léonin atuava na Catedral e é considerado aquele que “catalisou a crescente inventividade dos cantores” (SADIE, 1994). Da mesma forma seu sucessor, Pérotin, escreveu uma série de organa (plural de organum) para a Igreja, reorganizando grande parte do repertório de organum antigo, acrescentando vozes e dessa forma enriquecendo-os (BENNETT, 1986).

Desta escola o organum foi desenvolvido com uma variante que ficou conhecida como Descante, uma espécie de voz em contraponto. Quando no trecho musical acontecia o melisma, a parte tenor acompanhava a melodia e a isso chamou-se clausula. Como a parte melismática consiste em uma espécie de adorno em torno de uma nota principal, a utilização de notas de passagem foi se tornando frequente, libertando-se da rígida regra de uma melodia paralela. Este tipo de prática instiga a ideia de “imitação”, um recurso que posteriormente seria muito utilizado na composição musical, assim como forneceria as primeiras origens para gêneros como cânone e a fuga (CANDÉ, 1995).

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A ampliação de notas para uma mesma sílaba começa a exigir uma notação mais precisa, pois há, com isso, um aumento na complexidade da interpretação. Candé (1995) nos explica que começa a surgir uma ars mensurabilis, uma arte musical que precisa ser mensurada, medida, elaborada em compassos.

A música sacra inevitavelmente vem a influenciar a música popular, mesmo com a rigorosa censura por parte da Igreja. Assim, um gênero denominado moteto derivou da clausula, ganhando popularidade como música vocal com acompanhamento e executado com notas rápidas. Normalmente com a parte tenor sendo feita com um instrumento, o moteto consiste na parte duplum, ou seja, uma segunda voz sobre o tenor e que pode ser seguida por uma terceira voz (triplum) (BENNETT, 1986). Da mesma forma, outro gênero popular que derivou da música sacra foi o conductus. Originalmente era utilizado como cântico de procissão, organizado em até quatro vozes utilizando o mesmo texto.

Toda a notação gregoriana, assim como a própria concepção de música, destinava-se ao divino. Em paralelo, uma música que não era destinada aos rituais da igreja também era cultivada: a música profana, presente em festividades populares e também no teatro. A música profana medieval era condenada pela Igreja, que via nesta manifestação um desvio de espiritualidade e censurava qualquer iniciativa musical que não fosse destinada à Igreja.

Na música profana medieval (música popular) encontramos os trovadores nos países latinos e os Meistersinger (mestres cantores) nos países germânicos: músicos que cultivavam a poesia em ocasiões festivas.

O compositor alemão Richard Wagner (1813-1883, Período Romântico) faz alusão aos Meistersinger nas óperas “Tannhäuser” e “Os Mestres Cantores de Nüremberg” (CANDÉ, 1995).

NOTA

O uso de instrumentos para acompanhar a voz torna-se algo habitual, e muitas vezes para substituir a voz. Assim, ainda não há indícios de uma música puramente instrumental, pois o tratamento sempre é vocal. Porém, pequenas seções instrumentais começam a aparecer no século XIII, na forma de danças monódicas ou contrapontos a duas ou três vozes que talvez fossem tocadas com vilhuetas (CANDÉ, 1995). No entanto, na música profana, as melodias têm uma função de ser um suporte para a poesia. Os instrumentos feitos pelo homem são considerados inferiores à voz humana, que se caracteriza como um instrumento musical criado pelo Divino.

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

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FIGURA 51 – TROVADORES MEDIEVAIS

FONTE: Disponível em: <http://cultura.culturamix.com/curiosidades/o-que-sao-trovadores>. Acesso em: 26 jun. 2016.

Os cantos dos trovadores falam dos amantes, da paixão, sempre com muita poesia. Também falam sobre a Virgem Maria, refletindo para o sagrado, além de cantar sobre as cruzadas e as pastorelas (canções em estrofes) (MASSIN, 1997). A Figura 51 mostra o trovador do centro tocando a viela, um importante instrumento que será a base para a futura família do violino. Este instrumento, que surge na Europa no século X, é tocado com um arco (de origem árabe). Possuía de uma a cinco cordas e as gravuras sugerem que o músico o segurava de diversas maneiras (CANDÉ, 2001).

FIGURA 52 – INSTRUMENTOS MUSICAIS MEDIEVAIS

Alaúade

Cítolaou

Cistre

Viola de roda

Corneto

Charamela

Galubé eTamboril

Rebeque

Saltério

Viela

FONTE: BENNETT, 1986, p. 19

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No grande espaço temporal que compreende o Período Medieval, significativas mudanças ocorreram no pensamento musical. Os historiadores identificam estas mudanças denominando como Ars Nova o estilo de música que marca o início do século XIV. A produção musical que antecede passou a ser designada como Ars Antiqua. Na Ars Nova, um dos grandes compositores é Guillaume de Machaut (1300-1377), com uma série de motetos e canções, inspiradas no cantochão (BENNETT, 1986).

FIGURA 53 – PARTITURA DE UMA OBRA DE GUILLAUME DE MACHAUT

FONTE: Disponível em: <http://cjhayesphd.com/guillaume-de-machaut-and-messe-de-nostre-dame/>. Acesso em: 1 jul. 2016.

DICAS

Pesquise sobre a obra musical de Guillaume de Machaut no portal Youtube: trata-se de um dos maiores compositores da Ars Nova que pela primeira vez une música sacra e profana na função como arte. A partir da obra de Machaut, a música profana começa a ser aceita pela Igreja.

O longo período que compreende a música medieval mostra-se repleto de inovações, desde os tratados filosóficos e musicais de Boetius até a Ars Nova de Guillaume de Machaut. Na transição para a música renascentista, destacamos a polifonia coral da música sacra, com compositores como Martin Lutero, na Alemanha, e, na música profana, o desenvolvimento da canção em vários países europeus. Porém, é na polifonia que se encontra a principal característica da música no Renascimento, que será o ponto de partida para novos procedimentos técnicos e para a criação de novos gêneros.

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RESUMO DO TÓPICO 1

• Na pré-história, o homem produziu instrumentos sonoros que provavelmente imitavam os sons da natureza.

• Pesquisas arqueológicas revelam os primeiros registros musicais, datando do século XVIII a XV a.C.

• Na China, em 2,5 mil a.C., já havia instrumentos de cordas, assim como sistema de escalas. No antigo Egito, cerca de 3 mil a.C., a música era uma constante.

• Na Grécia antiga, em VIII a.C., a música passa a figurar como arte independente de função.

• A poesia lírica foi um gênero da Grécia antiga, constituída pelo nomos.

• Pitágoras (500 a.C.) desenvolveu o sistema de números que explicam os fenômenos observáveis. A ele se atribui a divisão numérica entre as notas musicais da escala.

• Os modos gregos são conhecidos pelos nomes: jônio, dórico, frígio, lídio, mixolídio, eólio e lócrio.

• Na Idade Média, Anicius Boetius (480-524) elaborou um importante sistema de ideias baseado no pensamento grego, por meio de um sistema de proporções numéricas encontrado na natureza.

• O cantochão (canto monódico da liturgia cristã) representa um dos primeiros elementos musicais como partituras.

• O canto gregoriano (proposto por São Gregório) foi um elemento unificador numa Europa dividida em tradições musicais durante a Idade Média.

• A notação gráfica musical da Idade Média utilizava os neumas – sinais gráficos sobre o texto que orientam melodicamente o cantor.

• No século IX a música polifônica ganha espaço quando os compositores começaram a acrescentar uma ou mais linhas melódicas à principal. É o que se chama organum.

• No século XI surge o uso de melismas: quando uma mesma sílaba do texto é entoada com diversas notas.

• Guido D’Arezzo (990-1050) estabelece um sistema de pautas e o nome das seis primeiras notas musicais: Ut, Re, Mi, Fa, Sol, La.

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• Em aproximadamente 1200, o organum foi desenvolvido com o Descante (voz em contraponto). Quando no trecho musical acontecia o melisma, a parte tenor acompanhava a melodia e a isso chamou-se clausula.

• Na música profana medieval encontramos os trovadores e os Meistersinger, que cultivavam a poesia em ocasiões festivas, em que os instrumentos passam a ganhar destaque.

• Na Ars Nova, o estilo de música do início do século XIV traz Guillaume de Machaut como um dos grandes compositores.

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AUTOATIVIDADE

Os historiadores estabeleceram espaços temporais que definem as “Idades” da história ocidental. O objeto de estudo da História se caracteriza nas ações que homens e mulheres vêm desenvolvendo e que de alguma forma representam significativas mudanças no seu tempo. Estas ações significativas provocam mudanças em curto, médio ou longo prazo, nas sociedades, e se manifestam na maneira de pensar na política, na religião, na sociedade como um todo. Assim, os historiadores estabeleceram a Idade Antiga, a Idade Média, a Idade Moderna e a Idade Contemporânea, de acordo com acontecimentos históricos sociais. As artes estão inseridas neste contexto, assim como a maneira de fazer música. Assinale a alternativa CORRETA que corresponde à relação da história geral com a história da música.

( ) As Idades estabelecidas pelos historiadores refletem, da mesma forma, os períodos de desenvolvimento musical, estabelecendo a Música da Idade Média, Música da Idade Moderna e Música da Idade Contemporânea.

( ) A partir da descoberta de registros musicais da antiguidade, os compositores da Idade Média definiram que a música seria adotada principalmente nos rituais da Igreja, pelo poder que a música poderia exercer sobre o povo.

( ) As fronteiras entre as Idades estabelecidas pelos historiadores são marcadas por eventos importantes, com grande impacto nas sociedades. No entanto, essas Idades correspondem até certo ponto com os períodos da História da Música.

( ) Anicius Boetius (480-524) estabeleceu a transição entre a música antiga e a música medieval, estabelecendo um sistema musical filosófico que estabelece a harmonia e a lógica dos números como fator da perfeição e equilíbrio da natureza.

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TÓPICO 2

MÚSICA RENASCENTISTA E BARROCA

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

A Idade Medieval corresponde a aproximadamente mil anos e a música dentro deste espaço temporal mostra o aperfeiçoamento da escrita, da harmonia e da própria construção de instrumentos. Já a Renascença e o Barroco correspondem a apenas 300 anos e o desenvolvimento musical, por outro lado, irá consolidar a música como a conhecemos hoje.

Acontecimentos históricos importantes estão registrados como transição da Idade Média para a Idade Moderna, como a Reforma Luterana, o descobrimento das Américas e o final da Guerra dos Cem Anos. As estruturas feudais típicas da Idade Média já não comportavam sua independência e a experiência toma lugar do temor da superstição. O comércio passa a ganhar força e nas artes plásticas os pintores descobrem a perspectiva.

2 MÚSICA RENASCENTISTA

O período histórico que compreende a Renascença caracteriza-se pelo retorno dos ideais gregos, o culto pelo saber e a cultura. Se com Guillaume de Machaut a música profana começa a possuir um reconhecimento por parte da Igreja, na Renascença haverá o desenvolvimento dos gêneros musicais, quando instrumentos começam a ganhar mais e mais destaque.

Na música sacra, as principais formas de música ainda se consolidam nos motetos e missas, porém, ampliando a altura polifônica utilizando quatro vozes. Os modos ainda constituem a base da música sacra. Não obstante, a liberdade na composição proporcionou certas mudanças, com o acréscimo de notas estranhas ao modo em notas de passagem (o que os historiadores chamam de “música ficta”), assim como a extensão das obras.

Grande parte da produção musical, pelo menos a de melhor qualidade, foi dedicada à Igreja, sobretudo na forma a capella – sem acompanhamento de instrumentos, apenas cantada (BENNETT, 1986). Nesta forma também há o uso da polifonia: além do tenor, uma voz mais grave foi adicionada, consolidando as primeiras partes para o que chamamos de voz “baixo”. Esta foi escrita em quatro vozes e requer equilíbrio, pois além do antigo descante, tenor e o baixo, outra voz intermediária irá enriquecer a melodia:

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

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• Cantus (ex-discantus) – mais tarde soprano (voz feminina mais aguda)• Altus (contratenor altus) – mais tarde alto ou contralto (voz feminina mais grave)• Tenor – manteve-se a denominação (voz masculina mais aguda)• Bassus – (contratenor bassus) – mais tarde baixo (voz masculina mais grave)

Conforme já vimos no início da Unidade 1, esta estrutura torna-se autossuficiente em termos musicais, pois é composta por um amplo alcance, do grave ao agudo (CANDÉ, 2001).

A polifonia que começa na música medieval assume grande importância e se torna uma forma de escrita extremamente desenvolvida pelos compositores. A maneira de escrever começa a se modificar, assim como os gêneros musicais. O próprio sistema de notação foi aprimorado, porém, as barras de compasso definindo a métrica da música é algo que somente aparecerá por volta de 1550.

FIGURA 54 – NOTAÇÃO RENASCENTISTA

breve

Século XIV

*O valor real dos sinais não corresponde às similitudes gráficas.Praticamente, nossa semínima tem uma duração equivalente à da semibreve do século XV.

Século XV

ou

Século XVII em diante*

semibreve

mínima

semínima

colcheia

semicolcheia

FONTE: CANDÉ (2001, p. 313).

A evolução musical perpassa também nos seus meios de divulgação, em que os editores têm um papel fundamental. Em meados de 1473, os editores recorrem à técnica tipográfica de Guttenberg para impressão de partituras na Alemanha. Em Veneza, no ano de 1498, o editor Ottaviano Petrucci obtém uma bem-sucedida impressão de uma série de canções de compositores europeus. Petrucci figura como um dos primeiros editores de música e suas edições contribuíram na constituição de um público alfabetizado musicalmente (CANDÉ, 2001). No entanto, o material impresso torna-se acessível somente às classes sociais mais favorecidas, em virtude do alto custo de impressão e do próprio papel. Importantes editores emergem nos demais países europeus.

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TÓPICO 2 | MÚSICA RENASCENTISTA E BARROCA

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Nas partituras, uma prática comum chama a atenção na disposição das quatro partes polifônicas, impressas de modo que cada músico pudesse sentar-se em volta de uma mesma mesa para ler e tocar simultaneamente, o que claramente define como um tipo de música para ser interpretada em eventos particulares, pelo prazer de fazer música (MASSIN, 1997).

FIGURA 55 – PARTITURA DE JOHN DOWLAND (1597)

FONTE: Disponível em: <http://musiciansinordinary.blogspot.com.br/2013_11_01_archive.html>. Acesso em: 4 jul. 2016.

Uma das características da música renascentista e que a difere da música medieval é o uso da imitação. Trata-se de um recurso em que os compositores apresentam a melodia e imediatamente sua repetição em outra voz, normalmente numa altura diferente (SADIE, 1994). No recurso da imitação, o cânone representa como o gênero mais expressivo.

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

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Um gênero que floresce neste período é o madrigal, desenvolvido na canção polifônica e a monodia acompanhada, que futuramente servirá como base para o desenvolvimento da ópera. O madrigal foi um gênero com íntima relação com a música italiana e perdurou até 1620. Caracteriza-se como uma música triste, escrita em até cinco vozes e possui uma estrutura livre (CANDÉ, 1995). Diferente da canção, o madrigal não utiliza repetições e segue conforme o texto, fazendo uso de passagens cromáticas (semitons). Assim como nas outras artes, o madrigal possui influência do retorno das ideias da antiga Grécia e seus efeitos morais.

Apresentamos aqui alguns importantes compositores renascentistas, sobretudo no gênero madrigal: Philippe Verdelot, Luca Marenzio, Carlo Gesualdo e Cláudio Monteverdi. Logo o gênero estaria popularizado também na Inglaterra, com compositores como John Dowland e William Byrd, os quais desenvolveram variantes com o madrigal tradicional, o balé e o ayre. Tamanha diversidade começa a frutificar com os primeiros pensamentos para uma estrutura vertical da música, numa sucessão de acordes. Em toda a Europa, novas variações musicais surgem, como novas modalidades, além do madrigal italiano, também a frótola, o Lied na Alemanha, a canção na França e o villancico na Espanha (BENNETT, 1986).

Outras formas são exploradas pelos compositores italianos, como a pavana (dança séria, normalmente em compasso binário) e o saltarello – termo genérico para danças italianas moderadamente rápidas (SADIE, 1994). Na Alemanha, Krieger e Pachelbel contribuíram para o desenvolvimento do gênero ricercare. A tocata representa um gênero instrumental, especialmente para órgão ou cravo. O termo deriva do verbo “tocar” e se configura como uma música escrita de acordo com as possibilidades técnicas dos instrumentos de teclado. Começam a surgir, assim, gêneros musicais que são direcionados, pelo menos de forma técnica, a certos instrumentos.

Segundo Bennett (1986), havia ainda as variações e baixo ostinato: nas primeiras, havia melodias populares seguidas de variações, enquanto que no baixo ostinato a melodia era mantida numa voz mais grave enquanto as vozes superiores executavam variações.

A sociedade renascentista fazia uso da música, além da Igreja, nas cerimônias oficiais, nas festividades públicas e privadas. Eram comuns instrumentos como pífaros, tamborins e sacabuxas acompanhando canções, onde o teatro também se fazia presente. Fato interessante era a “entrada” dos monarcas nas cidades: um evento de esplendor musical e teatral em que um grande número de clarins, instrumentos dos mais diversos, além de pequenos coros e cantores traziam motetos (MASSIN, 1997).

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TÓPICO 2 | MÚSICA RENASCENTISTA E BARROCA

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Entre os instrumentos musicais já citados, temos ainda uma série de instrumentos que datam do período medieval, mas que por muito tempo se mantiveram populares. Outros instrumentos foram inventados. É o caso do cervelato: um “instrumento de palheta dupla e sons graves; tinha um tubo comprido, enroscado dentro de um cilindro medindo aproximadamente 30 centímetros” (BENNETT, 1986, p. 30). Da mesma maneira, o cromorne, um instrumento de madeira e com palheta dupla para produzir o som.

FIGURA 56 – INSTRUMENTOS MUSICAIS RENASCENTISTAS

Cromorne

Trompete

Sacabuxa

Cervelato

Viola

FONTE: BENNETT, 1986, p. 30

Apesar dos termos serem em inglês, a denominação consort deriva do italiano e significa concerto. A palavra inglesa whole significa inteiro, então trata-se de um grupo completo, por exemplo, um sacabuxa alto, dois tenores e um baixo. Por outro lado, broken significa quebrado, referindo-se a um grupo que não possuía uniformidade no timbre, por serem de instrumentos diferentes, por exemplo: uma flauta, uma viola da gamba, um alaúde e um cistre.

NOTA

A música instrumental começa a se propagar na França, sobretudo na área da Corte, mas também nos demais países da Europa. Nesta questão, um sistema de notação específico para instrumento surge como invenção. Segundo Candé (1997, p. 20), na música instrumental renascentista,

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

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Um prolongado processo que parte da expressão vocal que caracteriza a Idade Média e que conta, para a sua imposição e difusão, com um meio equivalente à imprensa na música em geral: a tablatura, ou seja, a invenção de uma notação específica da música, que mostra os dedos no lugar e situação das notas, o que permite que todos possam tocar o alaúde, sem conhecimentos musicais, e a consequente difusão da música instrumental.

Aproximadamente nas primeiras décadas do século XVI, a música divide-se em instrumental e vocal, de forma bem diferenciada. Tanto o surgimento de escolas com ênfase na música instrumental como a atenção por parte dos compositores nesta nova proposta resultam em novos gêneros instrumentais, como o ricercare. Muito popular, este gênero inicialmente era exclusivo para alaúde ou teclado e tinha um caráter de prelúdio. Vários ricercari do compositor italiano Antonio Gabrieli possuem características que mais tarde irão constituir a fuga.

Acerca dos instrumentos mais populares neste período, podemos colocar no topo da lista o alaúde. Sua importância pode ser comparada com a importância do piano no século XIX (CANDÉ, 2001). Trata-se de um instrumento de origem muito antiga, que remonta ao Egito e Mesopotâmia antigos, em vários formatos. Entre esta variação predominou na Europa o alaúde originário da Península Ibérica do século XII. O alaúde renascentista possuía cinco cordas duplas e uma simples, que podia variar na afinação. Outros instrumentos fazem parte da família do alaúde, como a tiorba, também chamada de arquiláude ou chitarrone, que possui um cravelhame extra para as cordas mais graves. Na Espanha havia uma variação do alaúde, conhecido como vihuela. Outra variação era utilizada na Índia e Paquistão, com o nome de sitar, possuindo origem persa (SADIE, 1994).

FIGURA 57 – A FAMÍLIA DO ALAÚDE

Samisenou Shamisen Alaúde

Chitarrone

Sitar

Cistre

FONTE: SADIE, 1994, p. 15

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TÓPICO 2 | MÚSICA RENASCENTISTA E BARROCA

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Entre os grandes compositores do Renascimento figura o nome de Josquin des Prés (1440-1521). Trata-se de um compositor de exímia capacidade de articular melodia com o texto na expressão lírica, principalmente nos motetos, em que equilibra a poesia com a música (CANDÉ, 2001). Compôs 19 missas a quatro vozes, 129 motetos para quatro, cinco e até seis vozes, além de quase uma centena de canções para voz ou instrumentos.

Giovanni Pierluigi da Palestrina (1525-1594) foi um compositor que explorou a música polifônica coral combinando a técnica com a estética. Organista e maestro di capella, compôs 103 missas, aproximadamente 600 motetos, salmos e hinos e mais de 100 madrigais sacros e profanos. Uma história curiosa é atribuída a ele, quando o Papa Marcelo II ordenou a proibição da música na igreja. O Papa Marcelo II morreu com apenas 22 dias de pontificado, quando sucedeu a Paulo IV. Conta a lenda que Palestrina soube habilmente argumentar em favor da música, persuadindo os dois pontífices. Uma de suas obras mais conhecidas é justamente a “Missa Papae Marcelli”, em homenagem a Marcelo II (CANDÉ, 2001).

Guillaume Dufay (1400-1474) representa um dos maiores gênios do primeiro período da Renascença – assim como será Josquin des Prés na segunda. Dufay compôs motetos isorrítmicos (repetição do padrão rítmico) complexos onde as linhas melódicas fluem livremente, demonstrando uma habilidade ímpar entre os compositores de seu tempo, colocando em prática toda a tradição científica da polifonia. Dufay foi um dos pioneiros em utilizar inversão de acordes de terças e sextas. Compôs nove missas e cerca de 40 missas inacabadas, aproximadamente 90 motetos e hinos sacros e profanos.

John Dowland (1563-1626), além de compositor, foi alaudista e cantor. Suas composições possuem originalidade como obras visionárias de um mundo trágico e profundo, numa temática que remete à morte e ao pecado. Foi o principal responsável pela elevação da música inglesa neste período, utilizando dissonâncias para enaltecer as tensões de acordo com o texto de suas canções (SADIE, 1994). Escreveu mais de 70 obras para alaúde e canto, fantasias polifônicas, danças como pavanes, galhardas e conjuntos de variações, além de uma extensa obra na música vocal.

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

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FIGURA 58 – COMPOSITORES RENASCENTISTAS

Da esquerda para a direita: Josquin des Prés, Guillaume Dufay, Giovanni Pierluigi da Palestrina John Dowland.

FONTES: Disponível em:<http://www.thefamouspeople.com/profiles/josquin-desprez-432.php>. <http://assets6.classicfm.com/2012/17/giovanni-palestrina-1335366793-view-1.jpg><https://www.oneonta.edu/faculty/farberas/arth/Images/ARTH_214images/van_eyck/thymotheos.jpg>.<http://www.tudor4u.com/john_dowland.html>.Acesso em: 5 jul. 2016.

O grande processo evolutivo da música que acontece no período renascentista não possui margens precisas historicamente. Os estilos musicais do período medieval se fundem no Renascimento, assim como será na transição para o período Barroco. Trata-se de algo inerente dos processos históricos. Dessa forma, a melodia acompanhada flui para o surgimento da música instrumental e a notação gráfica torna-se cada vez mais precisa. As possibilidades técnicas fazem emergir novos gêneros, numa música chamada “pura”, liberta do texto e que abre novos significados, por exemplo, a música como arte e não somente funcional.

Segundo Candé (1995), esta é uma das maiores contribuições do Renascimento: o surgimento da música instrumental e as novas possibilidades de cena com o madrigal. Das formas renascentistas os compositores do Barroco irão desenvolver sólidas propostas de gênero.

3 MÚSICA BARROCA

O termo “barroco” tem relação com o estilo arquitetônico e da arte do século XVII, quando o uso excessivo de ornamentos seria a principal característica. Na música, esta característica estaria também presente. Posteriormente, os musicólogos e historiadores adotariam o termo “Barroco” para designar o período aproximado entre 1600 e 1750.

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TÓPICO 2 | MÚSICA RENASCENTISTA E BARROCA

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Neste período de 150 anos, uma série de mudanças no gosto e no estilo marca um desenvolvimento musical intenso, consolidando em formas e gêneros que atravessariam os séculos. O papel da voz superior (que até então era secundária) começa a ter maior valor em detrimento da principal e o interesse pela melodia cresce, numa necessidade de um acompanhamento. O contraponto, em sua técnica de combinar duas linhas melódicas simultaneamente, muito em voga no Renascimento, começa a perder sua força, favorecendo a melodia. Porém, a técnica contrapontística seria desenvolvida em suas variantes no período Barroco, principalmente por Johann Sebastian Bach (1685-1750), o que servirá como uma das referências de técnicas de composição até os tempos atuais.

A música modal cede às novas concepções harmônicas: ainda no Renascimento, os compositores já começaram a utilizar alterações nas notas (sustenido e bemol) em busca de novas sonoridades, e o Barroco culmina na utilização de apenas dois modos: o jônio e o eólio (BENNETT, 1986). São os indícios da música tonal, bipartindo-se no modo maior e menor.

Os compositores barrocos sentiam certo “incômodo” na tradição do contraponto, que consideravam tornar a compreensão do texto um tanto camuflada no movimento de vozes independentes. Uma nova concepção passa a ser adotada, onde a melodia possui maior ênfase, sendo acompanhada por instrumentos harmônicos, em progressão dos acordes.

As partes da música que faziam o acompanhamento eram confiadas a um único instrumento, que poderia ser um alaúde, um cravo ou órgão. Tornou-se rotineiro escrever a sucessão de sons do baixo, para fundamentar a harmonia da música (BENNETT, 1986). Para evitar acordes indesejáveis durante a execução, os compositores desenvolveram um sistema de notação com números sobre a nota do baixo, orientando assim quais acordes deveriam ser tocados, o que se chamou de cifras. Assim, um cello poderia tocar a voz do baixo, mas era necessário um instrumento capaz de tocar pelo menos mais três notas simultâneas para gerar um acorde, o que poderia ser com um alaúde ou um cravo para completar os acordes. Esta técnica será chamada de baixo contínuo.

FIGURA 59 – COMPARATIVO ENTRE CIFRA BARROCA E CIFRA POPULAR ATUAL

FONTE: Luiz Lenzi (2016)

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

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DICAS

Procure ouvir o oratório de Händel “O Messias” (Messiah, 1742), do compositor alemão Georg Friedrich Händel (1685-1759). Trata-se de um dos mais famosos oratórios do período Barroco, com texto bíblico e duração de aproximadamente duas horas e 30 minutos. Uma das partes mais famosas consiste no coral “Aleluia” (Hallelujah), amplamente popularizada nos dias de hoje.

Uma prática muito comum refere-se à música de câmara, que se destina a um pequeno grupo de instrumentistas, como um quarteto ou quinteto de cordas, um trio com instrumento harmônico como o cravo ou, ainda, quartetos ou quintetos com acompanhamento de cravo. Estas formações destinam-se a tocar em espaços fechados, por isso sua denominação de “música de câmara”. Não obstante, o canto era prática comum, numa variação destas formações. Assim, na música de câmara vocal, a cantata desempenha um importante papel como gênero musical. As cantatas, segundo Bennett (1986, p. 39), “são obras para solistas e coro, acompanhados por orquestra e contínuo, lembrando um oratório em miniatura”.

A suíte constitui uma das principais características da música instrumental do período Barroco. Esta forma de composição fornece os alicerces para o desenvolvimento da música instrumental que transcende para os períodos Clássico e Romântico da história da música. Uma suíte constitui-se de uma obra com uma sequência de pequenas músicas (danças).

Neste ponto do nosso texto, caro leitor, você deve ter criado algumas conexões com o Tópico 3 da Unidade 1: as formas e os gêneros musicais se consolidam de acordo com o gosto e o estilo de cada época. As mudanças que ocorrem no meio musical derivam também de fatores sociais de cada período histórico. Apesar de mudanças estilísticas, o que ocorre historicamente é uma expansão das formas e gêneros, assim como as técnicas de composição, como o contraponto e o baixo contínuo.

NOTA

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TÓPICO 2 | MÚSICA RENASCENTISTA E BARROCA

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FIGURA 60 – COMPOSITORES DO PERÍODO BARROCO

Da esquerda para a direita: Antonio Vivaldi (1678-1741), Georg Philipp Telemann (1681-1767), Johann Sebastian Bach (1685-1750) e Georg Friedrich Händel (1685-1759).

FONTES: Disponível em: <http://www.bach-cantatas.com/Lib/Vivaldi.htm>.<https://www.carus-verlag.com/personen/Georg-Philipp-Telemann/>.<http://www.mfiles.co.uk/composers/Johann-Sebastian-Bach.htm>.<https://www.carus-verlag.com/en/persons/georg-friedrich-haendel/>.Acesso em: 19 jul. 2016.

A música instrumental no Barroco passa a ter uma importância tão grande quanto a música vocal. As formas musicais mais antigas ainda permanecem, mas o novo valor que se dá aos instrumentos traz importantes inovações no que diz respeito aos gêneros e às formas musicais. Surgem novas concepções, como “a fuga, o prelúdio coral, a suíte, a sonata e o concerto” (BENNETT, 1986, p. 39).

Na fuga um tema é apresentado numa voz (que pode ser um instrumento) e alguns compassos adiante o mesmo tema é apresentado em outra voz, e assim sucessivamente em outras vozes. Trata-se de uma técnica de contraponto imitativo (SADIE, 1994). O que mais define uma fuga é sua apresentação do tema na seção chamada de “exposição” (assim como será na forma sonata).

FIGURA 61 – FUGA I EM 4 VOZES, DE BACH

FONTE: Das Wohltemperierte Klavier, Teil I, p. 4

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

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Outra forma característica do Barroco é o concerto grosso, consistindo em música instrumental. Neste tipo de estrutura musical são utilizados dois grupos instrumentais fazendo contraste entre si, em que o grupo menor é denominado de “concertino” e o grupo maior é denominado “ripieno” ou mesmo “concerto grosso”. O concertino tem um tratamento solístico e normalmente é constituído por dois violinos e um violoncelo. Por outro lado, o ripieno consiste no restante da orquestra, o que também é chamado de tutti, que significa todos, em italiano. Contribuindo na tradição, o baixo contínuo é figura sempre presente também nesta forma.

Do concerto grosso surge o concerto para instrumento solo (um instrumento principal com acompanhamento de um grupo instrumental). No concerto há novamente a ideia de contraste entre o solista e a pequena orquestra. O concerto barroco normalmente é formado por três movimentos (rápido – lento – rápido) e encontramos neste gênero compositores que exploraram intensamente as possibilidades técnicas e virtuosísticas para um instrumento solo.

Um dos compositores mais significativos do barroco é Antonio Vivaldi. Nascido em Veneza, o jovem Vivaldi ingressou no sacerdócio (1703), mas por pouco tempo. Por problemas de saúde, possivelmente asma, ficou impossibilitado de realizar as celebrações e passou a exercer o cargo de maestro di violino do Ospedale dela Pietà, um orfanato para meninas, em Veneza (SADIE, 1994). Vivaldi acabou exercendo outras funções nos anos seguintes, mas sempre continuou a escrever música para aquela entidade, enviando novas obras mensalmente pelo correio.

A obra de Vivaldi rapidamente popularizou-se pela Europa. Uma das razões deste sucesso se dá pelo fato de muitas obras possuírem cunho didático – as obras dedicadas ao orfanato. Hábil compositor, suas obras são utilizadas até hoje como repertório obrigatório na literatura das cordas friccionadas. Em seus concertos, adotou formas que se consolidaram, como as obras em três movimentos (rápido-lento-rápido), como se fossem três músicas diferentes: um primeiro movimento mais elaborado e extenso, um segundo mais lento, criando contraste, e um terceiro também rápido, porém mais curto que o primeiro, com final bem conclusivo. Quando se ouve um concerto em todos os movimentos, percebemos uma identidade que permeia a obra inteira.

DICAS

Uma das obras mais famosas de Vivaldi é a série de concertos intitulada “As Quatro Estações”, publicados em 1723. Entre os concertos mais populares desta coletânea estão os intitulados “Primavera” e “Verão”, escritos em tonalidades maiores, e ainda “Outono” e “Inverno”, em tonalidades menores. Procure ouvir alguns destes concertos.

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TÓPICO 2 | MÚSICA RENASCENTISTA E BARROCA

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Vivaldi escreveu mais de 500 concertos, fazendo combinações de instrumentos em formações incomuns à época. Escreveu também muita música sacra vocal, cerca de 50 óperas e outras obras. A originalidade de Vivaldi está também na rica contribuição ao formato do concerto. O gosto da época, no entanto, mostrava-se instável: sua obra que outrora fazia sucesso perdeu o prestígio e talvez por esta razão Vivaldi tenha se mudado para Viena, na Áustria, onde morreu em 1741, em meio à pobreza.

Outro ícone da música barroca é Johann Sebastian Bach. Nascido em Eisenbach, foi filho de músico e aprendeu logo na infância com o próprio pai a tocar violino e teoria musical. Após a morte do pai, o jovem Bach foi viver com o irmão, com quem teve aulas de cravo. Em 1708, já casado, ingressa como músico de câmara do duque de Saxe-Weimar, sendo muito reconhecido. Anos mais tarde passa a viver em outras cidades da Alemanha, na função de Kapellmeister (mestre de capela). Deste período, aproximadamente 1717, datam os famosos Concertos de Brandenburgo (SADIE, 1994), além de várias sonatas e concertos. Em 1722 passa a trabalhar em Leipzig (Alemanha), até o fim de sua vida.

FIGURA 62 – MANUSCRITO DE BACH, ORGELBÜCHLEIN. BWV 599-644

FONTE: Disponível em: <http://www.omifacsimiles.com/brochures/bach_obb.html>. Acesso em: 5 jul. 2016.

A obra de Bach continua a impressionar os musicólogos. Sabe-se que o formato da produção musical dos compositores daquela época se deve a exigências de seus empregadores e por obrigações sociais, como a música sacra. No entanto, em especial na música de Bach, a complexidade é uma característica marcante, assim como aspectos religiosos intrínsecos na maneira de compor, com significados numerológicos. Os historiadores colocam na morte de Bach, 1750, o final do período Barroco. As últimas décadas de Bach, assim como de Vivaldi e de Händel, como os anos seguintes, representariam uma transição para um novo estilo de música, alicerçado no Iluminismo, que culminaria no que seria chamado de “estilo clássico”.

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RESUMO DO TÓPICO 2

• Na Renascença, as principais formas de música ainda se consolidam nos motetos e missas. Os instrumentos começam a ter algum destaque.

• Na música sacra renascentista houve o acréscimo de outras vozes, culminando nas quatro principais: Cantus, Altus, Tenor e Bassus.

• Em 1473 surgem os primeiros editores de música.

• Surgem no Renascimento gêneros como cânone, o madrigal, a monodia acompanhada, o ricercare e as canções por toda a Europa.

• Instrumentos comuns da Renascença: cervelato, cromorne, sacabuxa e trompete.

• Na Inglaterra surge o consort, um grupo de instrumentos que podem ser de famílias diferentes, mas que mantêm as quatro ou mais vozes.

• Josquin des Prés, Guillaume Dufay, Giovanni Pierluigi da Palestrina e John Dowland figuram entre os mais importantes compositores renascentistas.

• No período Barroco, a melodia passa por uma valorização, na medida da ampla utilização dos ornamentos musicais.

• O baixo escrito culmina na técnica do baixo contínuo, normalmente feito por um violoncelo ou cravo.

• O melodrama surge como gênero de obras dramáticas cantadas, combinando teatro, música e poesia.

• A música instrumental no Barroco passa a ter uma importância tão grande quanto a música vocal.

• As óperas e oratórios eram constituídos por uma série de árias e recitativos, normalmente compostos em forma ternária ABB e ABA.

• O recitativo é utilizado na ópera e no oratório como recurso intermediário, criando conexões entre as árias. O texto é mais declamado que cantado.

• O oratório assemelha-se com a ópera, porém possui caráter sacro, e o artefato cênico nem sempre é utilizado.

• A música de câmara é muito popular no Barroco, utilizando cantatas e suítes de danças.

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• Surgem novas concepções de música instrumental, como a fuga, o prelúdio, a suíte, a sonata e o concerto.

• O concerto grosso surge no Barroco, onde dois grupos instrumentais fazem contraste entre si - “concertino” e “ripieno”.

• Compositores como Antonio Vivaldi, Johann Sebastian Bach, Georg Friedrich Händel e Georg Philipp Telemann são alguns dos mais importantes compositores do período Barroco.

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AUTOATIVIDADE

A música barroca tem relação com o estilo arquitetônico e da arte do século XVII, quando o uso excessivo de ornamentos foi a principal característica. Os compositores barrocos sentiam certo “incômodo” na tradição do contraponto, que consideravam tornar a compreensão do texto um tanto camuflada no movimento de vozes independentes. Os modos gregos começam a cair em desuso, com predominância apenas do modo maior e menor. Agrega-se a estas mudanças a escrita do baixo contínuo.

A respeito do parágrafo acima, avalie as afirmações a seguir:

I – Os ornamentos são elementos que valorizam a melodia e o baixo contínuo resolve o problema de os intérpretes tocarem acordes indesejados à obra.

II – Com o desuso do contraponto, gêneros como o concerto grosso e a suíte barroca farão amplo uso de ornamentos na aplicação do baixo contínuo.

III – A melodia passa a ter maior valor e o baixo contínuo será o responsável pela harmonia, definindo quais acordes o intérprete deve tocar.

Está correto o que se afirma em:

A) I e II, apenas.B) I e III, apenas.C) II e III, apenas.D) I, II e III.E) III apenas.

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TÓPICO 3

CLASSICISMO E ROMANTISMO

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

Foi durante a eclosão da Revolução Francesa que o período musical a que chamamos de “período Clássico” toma espaço. O grande impacto deste movimento atinge não somente a França, mas também toda a Europa, onde os princípios de “liberdade, igualdade e fraternidade” tomam lugar da antiga tradição feudal, aristocrática e religiosa, num movimento popular revolucionário. As consequências foram conflitos intensos e a revolução transformou-se em terror em meados de 1789, culminando no período de transição que os historiadores denominaram como o início da Idade Contemporânea. No Classicismo temos a chamada Primeira Escola de Viena, com Mozart, Haydn e o jovem Beethoven. É uma época em que a melodia ganha força num estilo refinado e posteriormente uma nova geração romântica ampliará as formas musicais, principalmente com Beethoven, que faz a ponte entre o Classicismo e o Romantismo.

2 MÚSICA CLÁSSICA

O termo “clássico” adquire na atualidade uma série de sentidos. Pode-se dizer que o compositor Tom Jobim representa um clássico da música popular brasileira, assim como Led Zeppelin representa um clássico do rock. Trata-se de uma perspectiva popular e nesta mesma ótica está a música erudita, também entendida como “música clássica”. Segundo Dourado (2004, p. 215), música clássica pode se referir à “música chamada ‘séria’, erudita, culta, executada fora do contexto popular ou folclórico”, como um sinônimo de música erudita. No entanto, o termo “clássico” se refere ao período estabelecido entre 1750 a 1810.

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

Alguns autores estabelecem o final do período clássico da música no ano de 1830. O fato é que a transição de um período a outro não é algo claro. As fronteiras entre períodos da música se caracterizam em mudanças no estilo e inovações nas composições de acordo com os costumes de sua época.

NOTA

No classicismo musical prevalece a música instrumental sobre a vocal. É o período em que a forma sonata se consolida como a mais importante forma musical, enaltecendo a sinfonia e o quarteto de cordas. O início do classicismo musical traz o estilo galante, uma maneira mais leve e graciosa de fazer música, ao contrário do contraponto barroco. Porém, este estilo mostra-se, muitas vezes, superficial, por ter a intenção de agradar de forma simplória os ouvintes. Pode-se constatar que o início do período Clássico mostra uma produção musical não tão intensa ao compararmos com outros períodos.

Por outro lado, compositores como Carl Philip Emanuel e Johann Christian Bach (filhos de Johann S. Bach) tratam o estilo galante com um alto refinamento. Compositores como os austríacos Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) e Joseph Haydn (1732-1809) tratariam de amadurecer o estilo clássico, desenvolvendo a melodia como nunca antes: leve e graciosa, repleta de complexidade harmônica e rítmica.

Nas formações instrumentais, desde as primeiras organizadas por Monteverdi, no Classicismo o número de instrumentistas aumentou: uma seção de cordas de 20 a 30 músicos, uma seção de sopros (em duplas) formada principalmente por flautas, oboés, clarinetes, fagotes, trompas, trompetes e tímpanos. Nas cordas, o tratamento orquestral é quase sempre como tutti, ou seja, os primeiros violinos (de quatro a oito músicos, aproximadamente) tocam a mesma partitura, assim como os segundos violinos, as violas, cellos e baixos, cada seção com sua parte. Nos sopros, cada voz é tocada por um instrumento, com as madeiras realizando contracantos e normalmente as trompas em partes com função mais harmônica, substituindo o baixo contínuo ou o cravo.

Surge também um instrumento desenvolvido a partir do cravo, o piano-forte. Segundo Bennett (1986), este instrumento surgiu na Itália, por volta de 1700, pelo construtor Bartolomeu Cristofori e que chamou de gravicembalo col piano e forte, que significa um cravo que pode tocar forte e fraco. No cravo as cordas são pinçadas, tangidas. No instrumento de Cristofori as cordas são percutidas por um pequeno martelo num mecanismo acionado pelas teclas. Dessa forma, o instrumento poderia responder ao grau de força na digitação do teclado pelo músico. “Forte” para maior grau de força e “piano” para tocar fraco.

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TÓPICO 3 | CLASSICISMO E ROMANTISMO

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O desenvolvimento do piano-forte passou por muitos melhoramentos, com experimentos que permitiram ao intérprete tocar trechos musicais de forma mais suave e também de forma mais incisiva, ampliando as possibilidades de articulação. Foi com o compositor Carl Phillip Emanuel Bach (um dos filhos de Johann Sebastian Bach) que este instrumento recebeu um grande número de composições, explorando as possibilidades técnicas. Assim, o piano-forte começa a substituir o cravo e posteriormente seria chamado apenas de “piano”.

Em oposição ao Barroco, onde há um tratamento mais polifônico das melodias, o estilo clássico de composição musical compreende algo mais leve, não tão complexo. Isso não quer dizer que a simplicidade não tenha seu grau de exigência técnica por parte dos instrumentistas: a leveza da melodia requer uma interpretação com alto grau de técnica instrumental. No entanto, a polifonia ainda estaria presente no período Clássico.

No século XVIII, Viena (Áustria) caracterizava-se como o centro musical da Europa. Nesta cidade cosmopolita, os compositores encontravam oportunidades para a realização de suas obras, visto que

[...] a música sempre ocupou o primeiro lugar dentre seus prazeres e, tanto isso é verdade que as próprias refeições não lhes proporcionavam uma satisfação completa se não fossem alegradas com a presença de um flautista, de um violinista, de um tocador de cítara, de um trio ou de um quarteto improvisado, que se instalavam até mesmo nos gramados do Prater, para serem ouvidos pelos comensais, encantando-os com árias, frequentemente extraídas das óperas de Mozart ou Haydn, ou do repertório de Lanner ou de Strauss [...] (BRION, 1959, p. 70-71).

A Viena do século XVIII conservava um refinamento musical onde se destacava a orquestra da Corte (Hofmusikkapelle) reunindo uma orquestra sinfônica, coros e elementos do teatro lírico. Todavia, a tradição educacional musical era uma preocupação constante e sempre se estava à caça de crianças e adolescentes talentosos para a formação e desenvolvimento musical, estético e artístico.

Especificamente na segunda metade do século XVIII, quando da ascensão da burguesia, um novo público emerge para um consumo musical nunca visto. A música passa a ser executada nos mais variados lugares e em diferentes ocasiões, como em concertos privados, mesmo com músicos amadores. O grande público agora poderia pagar para ouvir concertos.

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

Em meados de 1764, o compositor austríaco Joseph Haydn teve sua primeira sinfonia publicada por uma editora de Paris (no total foram 104 sinfonias), juntamente com obras de outros compositores. Na capa da encadernação, o título dizia “nomes desconhecidos que merecem ser conhecidos!” Rapidamente as sinfonias de Haydn tornaram-se muito populares: a melhor maneira de adquiri-las era comprar diretamente com os copistas profissionais de Viena, Veneza e Leipzig, vendidas por um preço razoável. Curiosamente, Haydn não tinha conhecimento de que suas obras estavam sendo comercializadas. Os editores parisienses chegavam a atribuir a Haydn uma série de obras de compositores desconhecidos pelo público, pois, sem dúvida, o nome de Haydn por si próprio já garantiria uma boa venda (MASSIN, 1997).

FIGURA 63 – COMPOSITORES DO PERÍODO CLÁSSICO

Da esquerda para direita: Joseph Haydn, Wolfgang Amadeus Mozart, Johann Christian Bach e Pe. José Maurício.

FONTE: Disponível em: <http://coinz.eu/aut/2_ats/g/z_18_schilling_20_1982_1993_haydn_joseph_austrian_coins.jpg>.<http://kidsmusiccorner.co.uk/wp-content/uploads/2010/01/Mozart.jpg>.<http://www.art-prints-on-demand.com/a/gainsborough-thomas/portrait-of-johann-christ.html>.http://albertoviana.net/classicos/compositores/jmaurici.htm. Acesso em: 26 jul. 2016.

A produção de sinfonias foi algo de grandioso na segunda metade do século XVIII: cerca de 15 mil sinfonias foram escritas, numa época em que direitos autorais não eram uma prática das editoras. Assim, muitas obras foram atribuídas a Haydn e Mozart, com objetivo de lucrar com vendas. Neste sentido, Wolfgang Amadeus Mozart, a partir de 1784, teve o cuidado de catalogar suas próprias obras, acrescentando as datas de finalização. Haydn agiu da mesma maneira. Por outro lado, os compositores por vezes agiam da mesma maneira que os editores. Haydn chegou a vender uma mesma sinfonia para editores diferentes, oferecendo exclusividade da obra.

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TÓPICO 3 | CLASSICISMO E ROMANTISMO

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DICAS

Procure ouvir o segundo movimento da Sinfonia nº 94, de Joseph Haydn. Está escrito na forma tema e variações. Observe o humor de Haydn colocando uma melodia de certa forma infantil, numa dinâmica em pianíssimo (muito fraco) e subitamente uma nota com todos os instrumentos da orquestra de maneira muito forte! Nos padrões da época, é algo totalmente novo, causando um verdadeiro susto na plateia. Por esta razão, esta sinfonia também é conhecida como “Sinfonia Surpresa!”

Os compositores somente chegariam a uma independência financeira e social no final do século XVIII. Até lá, seriam empregados como músicos da Corte, compositores designados a escrever obras para seus senhores para ocasiões mais diversas. Foi o caso do jovem Mozart, empregado do arcebispo Colloredo, príncipe de Salsburgo. Mozart sabia que seu futuro como compositor deveria ser em Viena e não em Salsburgo, no regime quase de escravidão em que vivia. A ruptura deu-se de forma agressiva por ambos os lados, com direito aos piores insultos.

Assim, Mozart estabelece moradia em Viena, obtendo sucesso com sua música, sendo muito requisitado como professor e suas obras admiradas pela sociedade vienense. Os infortúnios, porém, logo bateriam à sua porta. A independência financeira dos compositores era um fato muito recente e, de certa forma, instável. Mozart sentiu-se à vontade para escrever o que desejava, com inovações harmônicas, o que gerou desconforto por parte dos editores e também do público: uma série de quartetos de cordas de Mozart não foi aceita para publicação, pois o editor considerou que havia “muitos erros de impressão”. Os tais “erros” nada mais eram do que acordes dissonantes que Mozart começava a empregar em algumas obras.

Mas as inovações não foram bem-vindas numa sociedade tradicional como Viena da segunda metade do século XVIII. Soma-se a estes fatos a incapacidade de Mozart de administrar seu dinheiro, com gastos em festas, roupas e, por vezes, gastando mais do que recebia.

Mozart escreveu mais de 650 obras, dentre elas 41 sinfonias. Suas últimas obras revelam um compositor maduro e muitos já o consideravam um “traidor do estilo clássico”, abrindo as portas para um novo estilo de composição. Muitos de seus contemporâneos afirmavam que tanto Mozart quanto Haydn consolidam-se como os primeiros românticos. O que podemos afirmar é que a contribuição destes dois compositores austríacos para com a música clássica consolidou o estilo musical daquela época.

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

Mozart nasceu em Salzburg, em 1756 e morreu em Viena, em 5 de dezembro de 1791. A causa de sua morte é improvável, muito se fantasiou com conspirações e assassinato, mas o mais provável é que sua saúde (que sempre foi frágil) foi se deteriorando aos poucos, durante muitos anos.

DICAS

Assista à produção cinematográfica “Amadeus”, do cineasta americano Milos Forman. A produção é de 1984 e recebeu oito Oscars, inclusive de melhor filme. O enredo fala da vida de Mozart e também do compositor da Corte Antonio Salieri, assim como a sociedade vienense da época. No entanto, ao contrário do que diz o filme, o Réquiem foi encomendado por um conde, que preferiu anonimato, para homenagear sua esposa falecida, e não por Salieri.

FIGURA 64 – FRAGMENTO DO RONDÓ EM LÁ MENOR (KV 511), DE W. A. MOZART, ESCRITO EM 11 DE MARÇO DE 1787

FONTE: MOZART. Rondo a-Moll KV 511. Urtext Edition + Faksimile. Wiener Urtext Edition: 1973.

No Brasil, o padre José Maurício (1767-1830) figura entre um dos mais importantes compositores não só do Brasil, mas da América Latina. Filho de uma escrava com Apolinário Garcia, sempre revelou talento para a música, tornando-se mestre de capela no Rio de Janeiro. Nesta função, o padre José Maurício compôs obras para os rituais da Igreja Católica, também atuando como organista. A partir de 1808, com a chegada da família real de Portugal ao Rio de Janeiro, o padre foi nomeado mestre de capela real, nos moldes da tradição europeia. Apesar de cair na admiração de D. João VI, sofreu preconceito pela sua cor de pele. Em 1811, o padre brasileiro foi substituído por outro compositor, o português Marcos Portugal. No entanto, a Corte manteve José Maurício nos serviços de composição de novas obras e o mesmo realizou as primeiras audições do “Réquiem” de Mozart e “A Criação”, de Joseph Haydn. Compôs 30 missas, responsórios e várias obras para a Igreja, além de obras profanas.

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TÓPICO 3 | CLASSICISMO E ROMANTISMO

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3 MÚSICA ROMÂNTICA

A música romântica compreende o período entre 1811 a 1900. O termo romântico tem “conotação de mistério, fantasia, elementos que passaram a assumir papel de maior importância em contraposição às características clássicas” (DOURADO, 2004). Porém, as ideias românticas já começavam com Mozart em suas obras tardias. Na obra de Goethe, “Fausto”, poema trágico em forma de peça teatral, os compositores românticos Ludwig van Beethoven (1770-1827), Robert Schumann (1810-1856) e Franz Schubert (1797-1828) seriam profundamente influenciados pelas ideias de sensualidade, fantasia e escuridão.

O público já se mostra diferente das épocas anteriores: o fator mais importante é que o público agora é numeroso e caracteriza-se além da Corte e dos palácios, pois é formado em sua maioria pela burguesia. Patronos e mecenas dão lugar a outra figura do meio musical, que seria o empresário, agenciando músicos profissionais e amadores, nas casas de ópera pela Europa. A geração de compositores românticos busca ideias nacionalistas, voltadas à tradição e aos valores de sua pátria.

Os historiadores musicais do período romântico buscam na música renascentista e barroca um estudo mais aprofundado das obras dos grandes mestres e, dessa maneira, passam a catalogar o repertório, organizando eventos onde também se promovia a música antiga.

Os compositores encontram um cenário propício como autores independentes – a tão sonhada situação social que Mozart tanto procurou sem sucesso. A burguesia sedenta das artes encontrou na música o seu refúgio, muito mais do que nas artes plásticas e no teatro. Os concertos públicos enalteciam eventos sociais, mas também enalteciam os virtuosos. Formações instrumentais amadoras também faziam parte do cenário, promovendo concertos nas cidades menores. Estes movimentos organizados em sociedades culminaram na formação de grandes orquestras, inicialmente como filarmônicas, ou seja, de caráter amador – e que, no entanto, atualmente possuem caráter também profissional, assim como as grandes orquestras sinfônicas.

Por um lado, havia uma crescente corrente a favor de uma música mais acessível ao grande público, numa linguagem de fácil compreensão e, por outro, os compositores buscaram uma maior complexidade e aprimoramento harmônico, assim como na estrutura das formas e dos gêneros musicais. De um lado a “música ligeira” e, de outro, a “música séria e erudita” (MASSIN, 1997). A música ligeira, apesar de na época haver uma certa oposição a uma música que se destinava ao divertimento apenas, mostra-se repleta de qualidade. Neste ínterim destacam-se as valsas de Johann Strauss Filho (1825-1899), como a valsa Danúbio Azul (1867), Vida de Artista (1867), Beber, Amar e Cantar (1869) e a Valsa do Imperador (1889). Também se destaca aqui a música de Jacques Offenbach (1819-1880). É importante salientar que ainda não havia “música comercial” como nos dias de hoje. Candé (1995, p. 242) nos revela que,

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

[...] quando se sabe que as Danças Húngaras de Brahms eram tocadas nas cervejarias, tem-se uma ideia elevada do que era a música ligeira antes de sua exploração industrial. Ainda só se trata de uma música burguesa. A qualidade estragar-se-á quando uma indústria burguesa se lembrar de produzir uma música de grande consumo visando ao popular, de acordo com critérios que traem a pior demagogia comercial e o desprezo pelo consumidor.

Na música erudita, Beethoven trabalhou ampliando a forma sonata de uma maneira que nenhum outro compositor havia feito até então. Ampliou os episódios da forma sonata, criando estruturas melódicas que só podem ser compreendidas quando a orquestra inteira está interpretando a obra. É o caso da melodia da sua quinta sinfonia, no primeiro movimento. Procure voltar até a Figura 34 e veja como Beethoven estrutura a melodia, passando de instrumento por instrumento, costurando melodicamente a orquestra. Ao ouvir este movimento, você poderá perceber a fluência da orquestra, neste novo conceito de escrita.

Beethoven escreveu apenas nove sinfonias. Haydn escreveu 104 e Mozart, apesar da morte prematura, escreveu 41 sinfonias. Mas Beethoven já previa que sua obra ficaria para a história. A sua primeira sinfonia foi composta em 1800 e possui todos os moldes de uma sinfonia clássica. A partir da segunda, os indícios de expansão formal já se caracterizam, o tradicional minueto é substituído pelo scherzo. Na terceira sinfonia, o primeiro movimento é tão extenso que tem quase a mesma duração da primeira sinfonia completa. O auge está na Nona Sinfonia, a chamada “Sinfonia Coral”. Os originais da Nona Sinfonia utilizados em sua primeira audição, em 1824, foram leiloados em 2003 em Londres, pelo valor aproximado de R$ 8 milhões.

A parte final do movimento, chamado de Coda, que historicamente caracteriza-se como uma afirmação de um final, com ênfase na tônica, passa agora a ter um novo desenvolvimento, com novos elementos, quase como uma seção independente.

No romantismo, a emancipação dos músicos e compositores faz com que as obras musicais perdessem a sua antiga função social para elevar-se a uma independência artística. A obra de arte musical passa a ter o valor em si própria, cada vez mais valorizada pelo grande público e, da mesma maneira, cada vez mais institucionalizada. Uma nova geração de compositores emerge com esta nova perspectiva, com instrumentistas virtuosos como Nicolò Paganini (1782-1840), Franz Liszt (1811-1886), Frédéric Chopin (1810-1849), e compositores como Carl Maria von Weber (1786-1826), Felix Mendelssohn (1809-1847), Richard Wagner (1813-1883) e Johanes Brahms (1833-1897).

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TÓPICO 3 | CLASSICISMO E ROMANTISMO

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FIGURA 65 – COMPOSITORES ROMÂNTICOS

Da esquerda para a direita: Ludwig van Beethoven, Richard Wagner, Franz Schubert e Piotr Ilych Tchaikovsky.

FONTES: Disponível em: <https://mirnacavalcanti.wordpress.com/2012/12/18/beethoven/>.<http://www.monsalvat.no/wagnerfaq_files/wagner2a.jpg>.<https://www.seren.bangor.ac.uk/wp-content/uploads/2015/02/Franz-Peter-Schubert.jpg>.<http://thediplomatinspain.com/wp-content/uploads/2016/03/Tchaikowsky-OK.jpg>. Acesso em: 16 ago. 2016.

Foi a partir dos compositores do romantismo musical que o colorido orquestral, ou seja, a combinação e a variação de timbres de diversos instrumentos, foi se desenvolvendo. No Classicismo as vozes de trompas preenchiam harmonias substituindo o baixo contínuo, assim como as madeiras variavam funções como contracantos ou dobramento das vozes (tocando a mesma coisa que os violinos, por exemplo). No período Romântico, os instrumentos de sopro adquirem novas funções, adquirem certa independência dentro da orquestra. De certa forma, isto também se deve aos avanços tecnológicos dos construtores de instrumentos: novas invenções mecânicas substituem os antigos trompetes barrocos, com o auxílio de válvulas que proporcionam aos instrumentos possibilidades de tocar em várias tonalidades.

No Romantismo, os instrumentos de sopro alcançam um nível técnico de construção que permite melhor afinação e calibração, tornando-os mais fáceis de manusear, com sistemas de afinação padronizados nas regiões da Europa. As novas possibilidades de timbre e de altura dos sopros, aliadas à eficiente tradição na construção dos instrumentos de cordas, enriquecem a sonoridade da orquestra sinfônica com nuances e dinâmicas que até então não eram possíveis. Em paralelo à evolução e aperfeiçoamento na construção dos instrumentos musicais, o virtuosismo e a técnica de interpretação também são cultivados e surgem nomes brilhantes, como Nicolò Paganini (violinista).

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

A maneira de fazer música estreita seus laços com a produção artística no campo das artes plásticas, onde os compositores demonstram afinidade na pintura, assim como no teatro e na literatura. Descrever um quadro, musicalizar uma peça de teatro ou mesmo descrever um conto torna-se uma prática de composição. Dessa forma, uma obra musical que descreve algo passa a ser designada como música programática, ou mesmo música de programa. Do contrário, uma obra não descritiva, que não conta nenhuma história, é denominada como música absoluta. Nesta intenção de composição, vários gêneros se encaixam, como a abertura, a sinfonia e outros.

A liberdade de composição faz eclodir novos gêneros musicais. Assim é com o poema sinfônico, uma estrutura de composição criada pelo compositor e pianista húngaro Franz Liszt. Este gênero se assemelha com a abertura de concerto, composição de apenas um movimento, de caráter descritivo, normalmente escrita em forma de sonata (BENETT, 1986).

Após toda a expansão das formas musicais determinadas por Beethoven, outro compositor alemão surge, exercendo influência sobre os demais: Richard Wagner. Nascido em Leipzig, compôs várias óperas inspiradas nas tradições germânicas, evocando assim um espírito nacionalista. Wagner instituiu mudanças na ópera, mesclando de forma eficiente e equilibrada as artes cênicas com a música. Em suas óperas (algumas com até quatro ou cinco horas de duração), os cenários e os figurinos são cuidadosamente elaborados, assim como a iluminação e a representação. Contudo, a composição orquestral sobressai pela qualidade técnica impressa por Wagner, ampliando a massa sonora das cordas e utilizando uma grande seção de sopros, madeiras e principalmente os metais, com até “oito trompas, quatro trompetes, quatro trombones e pelo menos cinco tubas. A percussão também desempenhava um papel importante” (BENETT, 1986, p. 63).

Em 1876 foi inaugurado o Bayreuth Festspielhaus (Teatro do Festival de Bayreuth), na Alemanha, um teatro especialmente construído para as óperas de Wagner. Entre o palco e a plateia, um espaço foi projetado para que a orquestra se posicionasse, deixando o palco completamente livre para os cantores e toda parte cênica. Este espaço chama-se “fosso”.

Mas as ideias revolucionárias de Wagner também se aplicavam à sua vida social e ao meio político. Frequentemente perseguido, Wagner constantemente viajava. Mas foi com o rei da Baviera, Ludwig II, que encontrou seu maior apoio. Ludwig era ávido admirador das artes e principalmente pelas óperas de Wagner. Ofereceu ao compositor uma abastada pensão e assumiu suas dívidas. O próprio castelo de Ludwig foi construído com o formato de um cisne, inspirado na ópera de Wagner “Lohengrin”, onde o personagem mítico aparece com cisne gigante.

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TÓPICO 3 | CLASSICISMO E ROMANTISMO

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FIGURA 66 – CASTELO DE NEUSCHWANSTEIN, BAVIERA, ALEMANHA, INSPIRADO NA ÓPERA DE WAGNER

FONTE: Disponível em: <http://www.amazingplacesonearth.com/wp-content/uploads/2012/11/NeuschwansteinCastle.jpg>. Acesso em: 29 jul. 2016.

Na Áustria, o compositor Franz Schubert imprime sua marca na história da música com a composição dos Lieder (plural de Lied, do alemão: canção). Trata-se de uma música cantada, com versos e poemas que podem estar dispostos em duas formas: o Lied estrófico, onde a melodia se repete em cada estrofe do poema, e o Lied inteiro, com uma melodia diferente para cada verso. Normalmente para piano e voz, pela sua popularidade, muitas adaptações para orquestra e canto são utilizadas. Schubert compôs mais de 600 Lieder.

DICAS

Procure ouvir uma das mais famosas canções de Schubert, “Serenata”. Existem várias adaptações para instrumentos e orquestra.

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

No século XIX, aproximadamente na segunda metade, compositores de outros países começam a tecer sua independência musical, libertando-se da forte tradição alemã inspirada em Beethoven e Wagner. Compositores da Rússia, Noruega, da Boêmia (futura Tchecoslováquia) preocupam-se em escrever uma música que refletisse suas pátrias, inspirada nas tradições e cultura de sua nação, é o que culmina no movimento chamado nacionalismo. Os elementos musicais que estão presentes na música nacionalista são justamente as canções folclóricas, a música descritiva de fatos, lendas e contos de uma comunidade, enfim, aspectos característicos que identificam uma nação, servindo de base para obras como óperas, aberturas e poemas sinfônicos (BENNETT, 1986).

Neste movimento surge, na Rússia, o “grupo dos cinco”, formado pelos compositores Modest Mussorgsky (1839-1881), Aleksandr Borodin (1883-1887), César Cuy (1835-1918), Nicolai Rimsky Korsakov (1844-1908) e Mily Barakirev (1837-1910). A musicalidade mostra-se moderna, como na obra de Mussorgsky intitulada “Quadros em uma Exposição” (1874), escrita originalmente para piano. A obra é uma suíte com 16 movimentos e é uma homenagem ao seu amigo, o pintor Viktor Hartmann. Este pintor havia falecido em 1873 e uma exposição póstuma de seus quadros foi promovida, inclusive com a presença do amigo Mussorgsky. A obra começa com o “Promenade”, simbolizando o espectador caminhando pela exposição, seguida pelas obras plásticas em si. Posteriormente, em 1922, o compositor francês Maurice Ravel (1875-1937) escreveria uma grandiosa versão para orquestra sinfônica do original, o que contribuiu enormemente para a popularidade da obra de Mussorgsky.

Procure ouvir esta obra na versão original para piano e também a versão orquestral de Ravel. Você poderá ouvir (e sentir) o significado de cada movimento descrevendo a exposição com seus quadros. “Quadros em uma Exposição” está escrito da seguinte maneira:

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TÓPICO 3 | CLASSICISMO E ROMANTISMO

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I – Promenade (Passeio): Allegro giusto, nel modo russico, senza allegrezza, ma poco sostenuto.

II – Gnomus (Gnomo): Sempre vivo.III – Promenade: Moderato comodo assai e con delicatezza.IV – Il Vecchio Castello (O castelo antigo): Andante molto cantabile e con dolore.V – Promenade: Moderato non tanto, pensante.VI – Tuileries: Allegretto non troppo, cappricioso.VII – Bydlo (Carro de Bois): Sempre moderato, pensante.VIII – Promenade: Tranquillo.IX – Ballet des Petits Poussins dans leurs Coques (Balé dos pintinhos em suas

cascas de ovos): Schernizo.X – Samuel Goldenberg et Schmuyle: Andante grave, enérgico.XI – Promenade: Allegro giusto, nel modo russico, poco sostenuto.XII – Limoges, Le Marché (O Mercado em Limoges): Allegretto vivo, sempre

scherzando.XIII – Catacombae, Sepulcrum Romanum: Largo.XIV – Cum Mortuis in Língua Mortua (Com os mortos em língua morta): andante

non troppo, com lamento.XV – La Cabane de Baba-Yaga sur de Pattes de Poule (A cabana da bruxa sobre

patas de galinha): allegro com brio, feroce. Andante mosso. Allegro molto.XVI – La Grande Porte de Kiev (A grande portão de Kiev): Allegro alla breve.

Maestoso. Con grandezza.

Outro compositor russo de grandiosa importância é Piotr Ilitch Tchaikosvky (1840-1893). Embora não se configure um nacionalista como os do “Grupo dos Cinco”, Tchaikovsky promoveu a música russa numa linguagem mais “ocidental”. Compôs dez óperas, balés, entre os quais estão os mais populares O Lago dos Cisnes, A Bela Adormecida e O Quebra Nozes. Compôs ainda seis sinfonias, várias aberturas sinfônicas, quatro concertos, quartetos e trios, uma série de músicas para piano e mais de 100 melodias. Atualmente, a música de Tchaikovsky é considerada mais nacionalista que o próprio grupo dos cinco.

Outro nome importante do movimento nacionalista é o do compositor norueguês Edward Grieg (1843-1907). Suas obras mais famosas estão entre a suíte Holberg e as suítes Peer Gynt 1 e 2. Na primeira suíte, quatro movimentos a compõem: I – Amanhecer, II – A morte de Aese, III – A dança de Anitra e IV – Na Casa do Rei da Montanha (este último, uma das mais conhecidas melodias de Grieg).

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

FIGURA 67 – COMPOSITORES ROMÂNTICOS DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XIX

Da esquerda para a direita: Modest Mussorgsky, Edward Grieg, Nicolai Rimsky Korsakov, Gustav Mahler e Richard Strauss.

FONTES: Disponível em:<http://cps-static.rovicorp.com/3/JPG_500/MI0002/869/MI0002869578.jpg?partner=allrovi.com>.<http://www.mfiles.co.uk/composers/edvard-hagerup-grieg-portrait.jpg>.<http://2.bp.blogspot.com/-hhs-UEhHNYU/VhPlcMKbKVI/AAAAAAAAFFg/KlfUAZ8vpas/s1600/Nikolai%2BRimsky-Korsakov.jpg>.<http://gustavmahler.com/site/pictures/picture-section/Gustav-Mahler/Gustav-Mahler20.jpg>.<http://www.bfz.hu/wp-content/uploads/2013/04/Richard-Strauss-270x362.jpg>. Acesso em: 15 ago. 2016.

No romantismo tardio, os maiores representantes figuram em Gustav Mahler (1860-1911) e Richard Strauss (1864-1949). Nascidos na Alemanha, escreveram obras para formações orquestrais nunca antes vistas. Nas sinfonias de Mahler, algumas com até uma hora e meia de duração, como sua 2ª sinfonia (escrita entre 1888 e 1894), necessita cerca de 60 instrumentistas de sopros e percussão, além do maior número possível de cordas. Utiliza ainda um coro e solistas soprano e contralto. Não obstante, há uma seção de metais e percussão que toca atrás do palco. A obra fala de heroísmo, morte e ressurreição.

Richard Strauss é um dos últimos representantes do Romantismo musical. Sua obra mais famosa é o poema sinfônico Also Spracht Zarathustra, popularizada no filme “2001: Uma Odisseia no Espaço” (1968), de Stanley Kubrick.

No final do romantismo musical muitos compositores já começam a inovar as estruturas musicais com novas experiências. Acredita-se que a expansão da forma atingiu o seu ápice, razão pela qual os compositores do início do século XX sentiram a necessidade de um novo estilo, de novas formas de composição, compatíveis com tantos avanços culturais, científicos e tecnológicos do século XX.

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RESUMO DO TÓPICO 3

• Música clássica pode ser entendida como sinônimo de música erudita. Porém, o termo “clássico” se refere ao período musical estabelecido entre 1750 a 1810.

• No Classicismo, a música instrumental passa a ter maior valor que a música vocal. Inicia com o estilo galante, uma maneira mais leve e graciosa.

• Os sopros passam a substituir o baixo contínuo.

• Por volta de 1700, o construtor Bartolomeu Cristofori cria o gravicembalo col piano e forte.

• No século XVIII, Viena caracterizava-se como o centro musical da Europa. Com a ascensão da burguesia, um novo público emerge.

• Joseph Haydn, Wolfgang Amadeus Mozart e o jovem Ludwig van Beethoven figuram como os principais nomes do classicismo musical.

• Somente no final do século XVIII os compositores teriam as condições sociais de se tornarem independentes. Até então, eram serviçais da Corte.

• No Brasil, o padre José Maurício (1767-1830) figura entre um dos mais importantes compositores não só do Brasil, mas da América Latina.

• Beethoven expande ao máximo a forma musical, sobretudo nos concertos e nas sinfonias.

• No Romantismo, os instrumentos musicais passam por avanços técnicos. Os sopros adquirem funções importantes na orquestra.

• Surge uma música que conta uma história ou fato: a música programática. Já a música absoluta é destituída de argumento.

• Franz Liszt cria um novo gênero: o poema sinfônico – obra programática de apenas um movimento.

• Richard Wagner enalteceu a ópera, combinando com teatro e poesia.

• Franz Schubert cria o Lied, uma música cantada, com versos e poemas.

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• Na segunda metade do século XIX surge o movimento nacionalista. O Grupo dos Cinco é um dos grandes representantes, formado por Mussorgsky, Borodin, Cuy, Korsakov e Barakirev.

• Gustav Mahler e Richard Strauss figuram como os mais importantes do Romantismo tardio.

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A música clássica compreende um espaço temporal de aproximadamente 60 anos, enquanto que a música romântica compreende cerca de 90 anos. Alguns teóricos julgam que o período clássico da música configura um espaço de transição entre o Barroco e o Romantismo, onde figuram os principais mestres: Haydn, Mozart e Beethoven. Sabe-se que cada período da música é marcado pelas mudanças na maneira de escrever e de fazer a música, em que os elementos utilizados pelos compositores por vezes são característicos de sua época. Com base nesta exposição, numere a coluna da direita de acordo com os elementos musicais expostos na coluna da esquerda:

AUTOATIVIDADE

(01) Grupo dos Cinco ( ) Gênero criado por Franz Liszt.(02) Estilo galante ( ) Invenção de Bartolomeu Cristofori.(03) Poema sinfônico ( ) Substitui o baixo contínuo.(04) Scherzo ( ) Característico do início do Classicismo.(05) Seção de sopros ( ) Em Beethoven, substitui o Minueto.(06) Gravicembalo col piano e forte ( ) Movimento Nacionalista.

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TÓPICO 4

MÚSICA MODERNA

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

No romantismo tardio, os compositores já não se encontravam satisfeitos com a tradição musical, no que diz respeito às formas musicais e aos elementos da música, como a harmonia, o ritmo e a melodia. Tanto Beethoven e Wagner, assim como Liszt, haviam expandido as formas musicais e também exploraram e praticamente esgotaram as possibilidades harmônicas das progressões dentro da tradição musical.

Os compositores necessitam de algo novo. Surge então uma série de tendências que exploram possibilidades musicais nunca vistas, opondo-se ao Romantismo. De certa forma, Liszt havia resolvido grande parte do problema com a criação de um gênero novo, o poema sinfônico, o que permitiu um novo estilo de composição, sem criar atritos com as tradições de composição. Da mesma fonte ou tendência, segue Richard Strauss e, posteriormente, Gustav Mahler.

A música do século XX passará por intensas mudanças, que acompanham os avanços tecnológicos de seu tempo. Por outro lado, há a valorização da música antiga, também em releituras contemporâneas. A música moderna inicia com os prenúncios do atonalismo e segue até os dias de hoje.

2 UMA NOVA LINGUAGEM MUSICAL

Se Beethoven, em suas grandiosas sinfonias, sugeria um número de aproximadamente 60 instrumentistas, em Mahler e Strauss o número seria triplicado. Tamanha quantidade permitiria a utilização de pequenos grupos solistas, para criar atmosferas completamente novas e acentuar contrastes (GRIFFITHS, 1998).

O austríaco Arnold Schoenberg (1874-1951) também foi autor de poemas sinfônicos e se destaca neste gênero a obra inspirada na poesia de Richard Dehmel, “Noite Transfigurada” (Verklärte Nacht), escrita não para orquestra, mas para dois violinos, duas violas e dois violoncelos. A característica harmônica destas obras se dá por efeitos de cromatismo, sem espaço para o lírico (não sentimental).

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

A técnica do contraponto, tão utilizada na música antiga, retorna como técnica de composição, porém as combinações harmônicas são extremamente dissonantes, criando um movimento constante de dissonâncias. Compositores como Max Reger (1873-1916) e Ferruccio Busoni (1866-1924) utilizaram esta técnica em ousadas composições, que de certa forma desafiam o gosto popular. Tanto Mahler, Strauss, Schoenberg, Reger e Busoni tiveram a tarefa de “criar música na ausência das velhas certezas harmônicas” (GRIFFITHS, 1998).

O francês Claude Debussy (1862-1918) é citado por historiadores como um dos principais compositores que estabelecem as tendências para a música moderna. Esta transição – ou um novo começo de uma nova música, caracteriza-se no prelúdio L’Après-midi d’n faune (A tarde de um fauno), considerada o marco da música moderna. Nesta obra pode-se perceber

[...] a liberdade da estrutura, de que participam a um só tempo a forma sonata, a forma Lied e o procedimento da variação alia-se a uma maravilhosa flexibilidade orquestral: deslocamento contínuo das figuras temáticas pela orquestra em movimentos; utilização sutil das cordas, não mais tratadas tradicionalmente como material de base da orquestra, mas encarregadas de conformar diferentes luminosidades, tudo isso dentro de uma profunda unidade de linguagem (MASSIN, 1997, p. 910).

Nos padrões da velha tradição musical, as tonalidades maior e menor constituem a base da música ocidental. No entanto, o Prelúdio de Debussy rompe com estas tradições. Ao ouvi-lo, em alguns momentos pode-se perceber dúvidas em relação à tonalidade. O recurso cromático, que utiliza sequências de semitons, não permite que se identifique uma cadência ou progressão harmônica – o que já pode ser percebido logo nos dois primeiros compassos desta obra. O cromatismo aliado ao contraponto constituiria uma das bases para a música moderna.

Parte da obra de Debussy é considerada impressionista, apesar dele próprio não a considerar nesta linha de pensamento artístico, preferia um pensamento mais independente. O termo impressionismo é utilizado para as artes plásticas, sobretudo com os pintores Monet e Pissarro e posteriormente o termo foi associado à música, justamente ao Prelúdio de Debussy. No impressionismo a pintura sugere as formas de maneira sutil, utilizando sombras e contornos que não são tão óbvios. A música impressionista caracteriza-se como “um conceito útil particularmente para a música que dissolve os contornos da progressão tonal tradicional como aspectos modais ou cromáticos e transmite estados de espírito e emoções em torno de um tema, em vez de apresentar uma imagem musical detalhada” (SADIE, 1994, p. 450).

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TÓPICO 4 | MÚSICA MODERNA

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FIGURA 68 – PINTURA IMPRESSIONISTA DE PISSARRO “PAISAGEM EM CHAPONVAL”, E DE MONET, “POURVILLE”

FONTE: Disponível em: <http://noticias.universia.com.br/tempo-livre/noticia/2012/09/19/967470/conheca-paisagem-em-chaponval-camille-pissarro.html#><http://www.fineart-china.com/htmlimg/image-95087.html>. Acesso em: 16 ago. 2016.

Entre os contemporâneos franceses de Debussy estão Camille Saint Säens (1835-1921), que considerava o poema sinfônico a sua forma predileta de composição. Suas obras mais famosas são o poema sinfônico La Danse Macabre (“Dança Macabra”, uma homenagem a Franz Liszt) e a suíte Le Carnaval des animaux (O Carnaval dos Animais). Nesta suíte, originalmente para piano, os movimentos são relativamente curtos, com cerca de 20 a 30 compassos, e estão assim descritos:

I – Introduction and Royal March of the Lion “Introdução e a marcha real do leão”: pode-se sentir o efeito do leão rugindo.

II – Poules et Coqs “Galinhas e galos”: notas contínuas e rápidas sugerem um cacarejar das aves.

III – Hémiones (Animax véloces) “mulas”: escalas rápidas.IV – Tortues (tartarugas): movimento lento, como a própria tartaruga.V – L’Éléphant: com a melodia em notas graves, sugere os passos do elefante.VI – Kangourous: muitas mudanças de andamento, sugerindo a mobilidade

do animal.VII – Aquarium: uma grande quantidade de notas muito rápidas lembra o

movimento de vários peixes.VIII – Personnages a Longues Oreilles: com senso de humor, Saint Saëns se refere

ao asno.IX – Le Coucou au fond des bois: o “cuco” aparece aqui, em meio às frases.X – Volière (aviário): movimento com notas extremamente rápidas, lembrando

o bater de asas de um beija-flor.XI – Pianistes: Aqui Saint Saëns faz uma caricatura sobre pianistas que

exageram na interpretação, mais preocupados em aparecer a si mesmos do que a obra musical.

XII – Fossiles: notas agudas em sequência lembram um xilofone, que, por sua vez, representa ossos batendo.

XIII – Le Cygne (O Cisne): graciosidade neste movimento.XIV – Final: Um resumo de todos os movimentos.

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

Outros contemporâneos franceses de Debussy são Gabriel Fauré (1845-1924), Paul Dukas (1865-1935) e Albert Roussel (1869-1937). Contudo, um dos mais famosos seria Maurice Ravel (1875-1930). Ravel foi inspirado por Weber, Schumann, Chopin e Liszt, e aos 20 anos já publicava suas obras para piano. Em 1928, Ravel compôs o Bolero, obra que se tornaria famosa até os dias atuais. Trata-se de um balé que apresenta um ritmo estático que perdura por toda a obra e praticamente sempre com a mesma melodia. No entanto, o jogo de timbres, com os mais variados instrumentos, enriquece a obra, numa progressão sempre crescente. Você já ouviu esta obra, na autoatividade do Tópico 1 da Unidade 1 deste caderno de estudos.

FIGURA 69 – COMPOSITORES DO SÉCULO XX

Da esquerda para a direita: Claude Debussy, Arnold Schoenberg, Camille Saint-Saëns, Maurice Ravel e Igor Stravinsky.

FONTES: Disponível em:<http://1.bp.blogspot.com/-l2t2N6rkizE/UhUw3ZgowaI/AAAAAAAAEb8/DbS0y6JsQrQ/s1600/Claude-Debussy-Pictures11.jpg>.<http://www.leweschambermusicfestival.com/afternoon-concert-2nd-half/>.<http://www.biography.com/people/camille-saint-sa%C3%ABns-40398>. <http://rateyourmusic.com/artist/maurice_ravel; http://www.bach-cantatas.com/Lib/Stravinsky-Igor.htm>. Acesso em: 17 ago. 2016.

Uma das obras mais polêmicas do início do século XX é a “Sagração da primavera”, do compositor russo Igor Stravinsky (1882-1971). Aluno de Korsakov, foi também influenciado pela música de Debussy e Ravel. Stravinsky recebeu, em 1910, uma encomenda para escrever música de balé (um gênero musical), “O pássaro de fogo”, baseado no folclore russo. Em 1913, a estreia do balé “A Sagração da Primavera” acontece em meio a protestos e intensas vaias! O palco foi o Théâtre des Champs-Élysées em Paris, em 29 de maio.

A Sagração trata de uma cerimônia pagã antiga e funde dados etnográficos de várias regiões da Rússia. Stravinsky obteve auxílio neste sentido com Nicolas Roerich, pintor e arqueólogo. Entretanto, a obra segue o mesmo estilo de outra obra antecessora, “O pássaro de fogo”, mas a Sagração foi um verdadeiro choque para o público. O motivo principal está nos figurinos e na coreografia do balé, dirigidos por Vaslav Nijiinsky, bailarino russo. O público acostumado com um balé tradicional ficou extremamente irritado com os passos grotescos, figurinos exóticos combinados com uma música não tradicional. O resultado foi um verdadeiro tumulto, com intercessão da polícia para acalmar os ânimos.

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TÓPICO 4 | MÚSICA MODERNA

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Na segunda metade do século XX surge o movimento nacionalista, onde os compositores passam a utilizar temas folclóricos em suas novas obras. Exemplo disso são os americanos Charles Ives e Aaron Copland. No Velho Mundo, o compositor e pesquisador Bela Bartók (1881-1945) realizou uma série de pesquisas na Hungria e na Romênia, registrando canções populares e folclóricas, analisando padrões rítmicos alternados. Juntamente com seu amigo, o compositor Zoltán Kodály, objetivaram a música folclórica em partituras, além de criarem novas composições com os elementos folclóricos pesquisados. Porém, com a eclosão da Segunda Guerra Mundial, Bartók passa a viver nos Estados Unidos, onde passaria por várias dificuldades.

Nos Estados Unidos, o blues, que surgiu com os escravos nas plantações de algodão, evolui para diversas ramificações do jazz, com um ritmo muito intenso, melodias com ou sem acentuações rítmicas. Os jazzistas desenvolvem novas escalas, numa mescla de tom maior e menor e diminuição de alguns graus da escala, culminando na chamada escala de blues. Nos instrumentos de metal, como trompete e trombone, o uso de surdinas (objetos metálicos encaixados na campana do instrumento) distorce completamente o timbre, enriquecendo a música.

Alguns compositores – como Ravel, Milhaud, Gershwin, Kurt Weill, Stravinsky, Walton e Copland – enfatizaram deliberadamente muitos desses elementos jazzísticos em alguns de seus trabalhos. Por exemplo: Milhaud em seu balé La Création du Monde; Stravinsky em seu Ragtime para 11 instrumentos e na Histoire du Soldat; e Gershwin em Concerto para Piano, Um Americano em Paris e Rhapsody in Blue (que ele mesmo descreveu como ‘peça de concerto de inspiração jazzística’). (BENNETT, 1986, p. 71).

A música do século XX passa a utilizar o recurso do atonalismo, que significa ausência de tonalidade. Neste tipo de composição, torna-se muito difícil ou praticamente impossível definir qual é a tonalidade em que certo trecho musical está escrito. Você pode imaginar, caro leitor, uma música escrita na tonalidade de dó maior, tocada ao piano. Neste tom de dó, as teclas negras do piano não serão utilizadas, pois são notas “estranhas” a esta tonalidade. As teclas negras são as notas que podem ser ‘sustenido’ ou ‘bemol’. Não obstante, pode ocorrer alguma alteração de alguma nota, para produzir um efeito diferente na música, o que é um recurso comum. Pode ainda, depois do primeiro período, a música desenvolver-se em outra tonalidade, com um sustenido ou bemol para um novo tom.

Na música atonal, a utilização de teclas negras e brancas do piano seria uma constante. Sequências de teclas brancas e negras (tons e semitons) são comuns e, desta maneira, não é possível distinguir a tonalidade, pelo excesso de “notas estranhas” à tonalidade. Esta nova tendência de composição culmina no expressionismo musical.

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

Assim como o termo ‘impressionista’ é emprestado das artes plásticas, da mesma forma o termo expressionista define um estilo de composição, seja nas artes plásticas ou na música. Entre os pintores expressionistas mais conhecidos estão Edvar Munch (1863-1944) e Ernst Kirchner (1880-1938). Nesta maneira de expressão vale a intenção do artista, sua visão pessoal da obra de arte e não a “impressão” da realidade. Trata-se de algo muito íntimo, como meio de distorcer a realidade. Veja as obras destes dois pintores expressionistas logo a seguir: você pode imaginar como seria uma música expressionista?

FIGURA 70 – “O GRITO”, DE MUNCH E “MENINA COM GATO”, DE KIRCHNER

FONTES: Disponível em: <https://micaelarossetti.wordpress.com/sobre-arte/o-grito-de-munch/> e<http://pt.wahooart.com/@/ErnstLudwigKirchner>. Acesso em: 5 set. 2016.

Como na pintura, a música expressionista também é carregada de distorção da realidade. Nesta linha de pensamento está o austríaco Arnold Schoenberg e seus discípulos Alban Berg e Anton Webern, os quais formaram a chamada Segunda Escola de Viena. O uso de acordes em sequências cromáticas traz a definição de atonalismo e a este critério outros elementos são adicionados, como o uso de melodias que denotam ausência de padrões rítmicos e um uso de contrastes. Nos instrumentos musicais, que na música tonal normalmente tocam no seu registro médio – o que seria o mais comum –, no expressionismo utilizam registros extremos, como muito agudo ou muito grave. O expressionismo utiliza como principal ferramenta o atonalismo. Procure ouvir a obra de Schoenberg chamada “Noite transfigurada” para sexteto de cordas, pois trata-se de um belo exemplo de música expressionista.

Já o neoclassicismo se configura como um movimento intelectual/musical que surgiu após a Primeira Guerra Mundial, buscando uma nova linguagem, ou, pelos menos, aspirava-se a uma nova linguagem. O Romantismo já era considerado como algo incompatível com a sociedade pós-guerra. Assim, os compositores buscaram estilos de composição característicos do século XVIII, o Barroco e o Clássico.

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TÓPICO 4 | MÚSICA MODERNA

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Stravinsky afirmou, em suas Chroniques de ma vie (1935), que a música seria, “por sua própria natureza, essencialmente incapaz de expressar o que quer que seja, sentimentos, atitudes mentais, estados psicológicos [...] (GRIFFITHS, 1998, p. 62). Este e outros compositores buscariam na música de Bach a objetividade necessária para expressar uma nova arte da música. Nesta nova perspectiva, Stravinsky compõe o balé Pulcinella (1920), obtendo auxílio na montagem dos figurinos e dos cenários de seu grande amigo, o pintor Pablo Picasso. Stravinsky escreveu obras escolhendo formações instrumentais que fugissem da velha tradição cordas/sopros/percussão, como em Mavra e les Noces, para piano e percussão.

FIGURA 71 – COMPOSITORES MODERNOS

Da esquerda para a direita: Erick Satie, Paul Hindemith, Bela Bartók, o brasileiro Heitor Villa-Lobos e o americano John Cage.

FONTES: Disponível em: <http://www.cheltenhamfestivals.com/music/festival-plus/keyboard-inventions/>.<http://www.thefamouspeople.com/profiles/paul-hindemith-326.php>.<http://www.babelmatrix.org/works/hu/Bart%C3%B3k_B%C3%A9la-1881/Cantata_profana/en/39014-Cantata_profana>.<http://www.biography.com/people/heitor-villa-lobos-9518768>.<http://multiplicidade.com/blog/quem-foi-john-cage/>. Acesso em: 20 ago. 2016.

No mesmo movimento, o compositor francês Erik Satie (1866-1925) era carregado de senso de humor, compondo obras e intitulando como “Choses Vues à Droite et à Gauche (sans lunettes)” – Coisas vistas à direita e à esquerda (sem óculos) e também a “Música de mobiliário”. Mas Satie (e seus restritos seguidores) consiste num caso à parte. O neoclassicismo, como nova proposta artística, tem como base uma música já consolidada no Barroco e Classicismo e, por isso, se consagra como um sério retorno aos grandes mestres.

O compositor Paul Hindemith (1895-1963) foi um notável na orquestração de sopros, bebendo da mesma fonte de Stravinsky, no uso da harmonia tonal. Inspirado no Barroco, o estilo de Hindemith se distancia do de Satie, por utilizar um ritmo marcante e uso de harmonias tradicionais, mas que permanecem mais em tensão do que repouso. Tanto na Alemanha como na França, o neoclassicismo tem o seu auge justamente no período de transição entre a Primeira e a Segunda Guerra Mundial.

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

FIGURA 72 – DESENHO DE PICASSO PARA “RAGTIME” (1919), DE STRAVINSKY, E BARTÓK GRAVANDO CANÇÕES FOLCLÓRICAS NA ALDEIA DARÁZS (1908), TCHECOSLOVÁQUIA

FONTE: Disponível em: <http://www.ralphmag.org/HT/jazz.html> e<http://www.esm.rochester.edu/blog/2016/03/eastman-school-symphony-orchestra-program-notes-for-bartok-and-shostakovich/>. Acesso em: 20 ago. 2016.

Outros compositores figuram no neoclassicismo: Sergei Prokofiev (1891-1953) e Dimitri Shostakovich (1906-1975). Enquanto Shostakovich escrevia uma música que em muito agradava ao Estado soviético, Prokofiev vivia se exilando em Paris, devido ao seu mordaz sarcasmo. Por outro lado, foi com o compositor Bela Bartók que o neoclassicismo encontrou sua pura essência. Bartók absorveu “métodos e materiais do passado sem o recurso esterilizante da ironia” (GRIFFITHS, 1998, p. 78). Bartók fez uso com extrema eficiência dos elementos do Barroco para a concepção do neoclassicismo.

No Brasil, o compositor Heitor Villa-Lobos (1887-1959) considerava, em suas próprias palavras, que a música deveria ser “uma arte que se deve venerar como uma religião”. Villa-Lobos admirava Beethoven, por ir além de seus antecessores, e considerava a música de Brahms e Schumann “entediante”, por eles continuarem os mesmos métodos de seus mestres. Ainda jovem, Villa-Lobos ingressou num grupo de seresteiros no Rio de Janeiro. Com 18 anos, passou a viajar pelo Brasil, para conhecer mais do folclore musical nacional. Estudou em Paris e se encantou por uma donzela inglesa, com quem viajou para os Estados Unidos. Influenciado pela música de Wagner e Puccini, estudou as técnicas tradicionais de orquestração, mas logo partia para outros compositores.

Na década de 1920, Villa-Lobos já dispunha de fama internacional. Partiu para a Europa para divulgar seu trabalho, apresentando os “Choros nº 3, 4, 8 e 10, o Rudepoema, a segunda série de A prole do bebê, cinco serestas, três poemas indígenas (canto e orquestra), Na Bahia tem (canto a capela) e o admirável Noneto” (PUENTE, 1984, p. 167). Daí em diante, passou por longas excursões, também pelos Estados Unidos, onde recebeu, em 1957, uma homenagem de Robert Wagner, da municipalidade de New York. No Rio de Janeiro, Villa-Lobos promoveu o canto orfeônico e, em certas ocasiões, chegou a reunir, no Estádio do Clube Vasco da Gama, milhares de crianças num único coro.

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TÓPICO 4 | MÚSICA MODERNA

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3 ROMPENDO TRADIÇÕES

Em 1921, Arnold Schoenberg apresenta os fundamentos de uma nova música, denominada serialismo. Trata-se de uma fuga das tradições de composição, excluindo as regras e as formas tradicionais de composição, em favor da composição atonal – desprovida de tonalidade. Este tipo de composição caracteriza-se de forma intuitiva, que não é previamente determinada. Mas logo Schoenberg e seus seguidores trataram de utilizar aspectos que remetem à forma, com a intenção de que seja possível identificar uma forma.

O princípio do serialismo é simples. As 12 notas da escala cromática são dispostas em uma ordem fixa, a série, que pode ser utilizada na geração de melodias e harmonias, e permanece obrigatória em toda a obra. A série é assim uma espécie de tema oculto: não precisa ser apresentada como tema (embora, naturalmente, seja possível fazê-lo), mas é um reservatório de ideias e uma referência básica (GRIFFITHS, 1998, p. 81).

O compositor tem então uma ampla possibilidade de combinações das notas, melodias e harmonias rítmicas, utilizando, no entanto, aspectos que possam identificar uma forma musical. É possível identificar princípios semelhantes nos cânones e fugas de Bach, pela complexidade métrica utilizada. Muitos contemporâneos de Schoenberg fizeram críticas ao método, como mecânico e extremamente matemático.

As evoluções em música continuam a surpreender da mesma maneira que os avanços tecnológicos estão em ascensão. No campo das artes, uma visão futurista começa a florescer. Se antes compositores evocavam sons que partiam da natureza, agora os novos compositores almejavam criar música também com os sons mecânicos das invenções tecnológicas. George Antheil (1900-1959) criou o “Balé Mecânico” em 1926, utilizando oito pianos, uma pianola, oito xilofones, uma hélice de avião e duas campainhas elétricas. Você pode, caro leitor, imaginar uma música utilizando tais instrumentos?

Um dos grandes precursores de uma música de características futuristas foi Edgard Varèse (1883-1965). Estudou em Paris e Berlim e imigrou para os Estados Unidos em 1915. No Novo Mundo, Varèse compôs a obra Amériques para um grande conjunto de 140 músicos, utilizando uma grande complexidade rítmica na percussão. Varèse tinha uma predileção por instrumentos de madeira em registro agudo, metais e sobretudo na percussão. Em sua obra intitulada Hyperprism, com frequência se percebe os sons da cidade, como sirenes anunciando o automóvel (GRIFFITHS, 1998). A estreia desta obra foi em 1923 e causou um escândalo.

Desde que chegou aos Estados Unidos, Varèse insistiu na construção de aparelhos sonoros eletrônicos a fim de criar novos timbres e combinações sonoras. É desta época a invenção do russo (que vivia nos EUA) Leon Thérémin (1896-1993), que levou seu próprio nome. O thérémin é um instrumento eletrônico controlado apenas pela aproximação das mãos do instrumentista, sem contato físico.

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

FIGURA 73 – SOLISTA KATICA ILLÉNY COM O INSTRUMENTO TEREMIN

FONTE: Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=lY7sXKGZl2w> Acesso em: 21 ago. 2016.

DICAS

Ouça o instrumento teremin em várias obras musicais. Você pode ver este instrumento inclusive como solista em orquestras pelo portal YouTube.

Outro polêmico inovador foi o americano John Cage (1912-1992). Ao final da década de 30, Cage incorporou objetos às cordas de um piano, acrescentando assim sons estranhos aos habituais do piano. Os experimentos de Cage foram muito além: entre inovações sonoras com aparelhos eletrônicos e outros instrumentos, ele cria o máximo do acaso musical em 1952, com a obra intitulada 4’33” (4 minutos e 33 segundos), com três movimentos. Originalmente para piano solo, a obra foi adaptada para outros instrumentos (embora isto seja discutível...). Na partitura não há nada anotado e os músicos mantêm-se em completo silêncio. Apenas o regente, ou o músico intérprete, faz uso de um cronômetro para delimitar o espaço de tempo. A obra consiste dos sons oriundos da sala de concerto, pelo próprio público e do ambiente.

Embora as experiências musicais com equipamentos eletrônicos datam de 1890, foi durante os anos de 1920 e 1930 que uma série de instrumentos foram inventados – entre eles o teremin. Cage fez experiências manipulando gravações fonográficas e o resultado é a obra Imaginary Landscape, de 1934. A experiência, contudo, não foi bem recebida pela comunidade artística, pois os avanços tecnológicos cresciam rapidamente, resultando em novas experiências, especialmente após a Segunda Guerra Mundial.

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TÓPICO 4 | MÚSICA MODERNA

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Pierre Schaeffer (1910-1995) foi um francês que também realizou experiências neste campo. Foi em 1948 quando ele modificava sons gravados a partir de ruídos. Esta técnica de composição ficou conhecida como música concreta e outros músicos na Europa e Estados Unidos seguiram por este novo caminho (SADIE, 1994).

Aluno de Schoenberg, o compositor alemão Karlheinz Stockhausen (1928-2007) seguiria por experiências exóticas no final dos anos 1960. Trabalhando no Japão, adaptou-se à cultura local com fins de absorver a musicalidade daquele país. Realizou músicas contendo trechos folclóricos de diversas nacionalidades interagindo com sons eletrônicos, além da utilização de instrumentos orientais. A busca por novas sonoridades não parou com Stockhausen: nos Estados Unidos, compositores como Cage e Steve Reich utilizaram em suas composições ritmos provenientes do Japão, Índia, Bali e da África.

FIGURA 74 – SCHAFFER E STOCKHAUSEN TRABALHANDO EM SEUS ESTÚDIOS

FONTES: Disponível em: <http://www.allmusic.com/artist/pierre-schaeffer-mn0000679092> e<http://www.karlheinzstockhausen.org/complete_list_of_works_german.htm>. Acesso em: 21 ago. 2016.

Na década de 1950, o serialismo ganha força na Europa, por meio de Cage. Compositores como Pierre Boulez (1925-2016), Earle Brown (1926-2002) e Christian Wolf (1934) já haviam aderido às experiências seriais. Este tipo de música necessita uma notação completamente diferenciada da convencional. Em muitas obras, a notação não é específica, o que permite ao intérprete, segundo o próprio Wolff, “a liberdade e a dignidade dos executantes. Ela deve ser capaz de surpreender (inclusive os próprios executantes e o compositor)” (GRIFFITHS, 1998, p. 161). Nas obras de Wolff não há um rigor sobre o produto final e o acaso por vezes está presente nas performances, promovendo liberdade de interpretação.

A música serial rompe completamente com os conceitos de melodia, harmonia e ritmo, solidificados na extensa literatura histórica da música. Assim também a notação gráfica toma vários formatos dependendo da criatividade do compositor. Apresentamos na figura a seguir a partitura de “Fontana Mix”, de John Cage. Procure ouvir algumas versões desta obra no portal YouTube. Você pode formular uma opinião sobre este tipo de música?

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

FIGURA 75 – PARTITURA DE “FONTANA MIX” (1958), DE JOHN CAGE

FONTE: Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=Z-r6LyTUiYg> Acesso em: 22 ago. 2016.

A partir da segunda metade do século XX, o cenário musical erudito retorna ao romantismo tardio, com compositores como Samuel Barber e William Walton, e também ao neoclassicismo com Michael Tippett e Eliott Carter (GRIFFITHS, 1998). Ao que os fatos indicam, a música passou por um desenvolvimento extremo no período que compreende os anos de 1900 a 1970, quando os próprios conceitos musicais foram postos em dúvida. Não se sabe ainda até que ponto o serialismo vai perdurar, mas é certo que os mestres barrocos, clássicos e românticos continuarão no repertório obrigatório dos conservatórios de música em todos os continentes.

No âmbito popular, o rock é um gênero presente em quase todo o mundo. Desde o sucesso Rock Around the Clock, de Bill Halley e seus Cometas, nos Estados Unidos dos anos 1950, rapidamente o novo gênero caiu no gosto das grandes massas. O jazz dos negros americanos estava em vasta ascensão, desde as grandes big bands, com seus habilidosos instrumentistas e cantores de sucesso. Não foi à toa que um jovem símbolo sexual chamado Elvis Presley encantasse toda uma geração. Cantor talentoso, parece ser uma resposta à comunidade musical negra. Fenômeno semelhante aconteceu nos anos 80 no Brasil, quando as duplas sertanejas cresceram nas paradas de sucesso com suas canções superficiais sobre amores traídos e incompreendidos, impulsionadas pela mídia, destronando as bandas de rock que entoavam textos críticos ao governo e questionavam a sociedade.

Voltando aos Estados Unidos, berço do rock’n’roll, a música de Ray Charles encantava e Chuck Berry, com sua guitarra distorcida, fez história. Os anos 70 trouxeram os Beatles e também o estilo folk-song com nomes como Paul Simon e Art Garfunkel. Mestres da guitarra consolidaram seus nomes na história do rock: Eric Clapton, Jeff Beck e Jimmy Paige, além dos Rolling Stones, que desde 1962 mantêm a energia no palco. Pink Floyd foi uma banda que realizou vários experimentos em vários LPs, destacando-se os álbuns “Atom Heart Mother” (1970), integrando uma orquestra e coro em sua música. Continuou a surpreender com os álbuns “The Dark Side of the Moon” (1973) e “The Wall” (1979), este último considerado uma ópera-rock. Sem dúvida, o rock tornou-se um gênero amplo, com amplas ramificações que vão do rock tradicional, passando pelo Heavy Metal, Hard Metal até o Death Metal com seus vocais guturais.

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TÓPICO 4 | MÚSICA MODERNA

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Aqui estamos nós, caro leitor, nesta linha do tempo em que a música parece ter alcançado os seus limites estruturais, formais e filosóficos. O que podemos esperar para o futuro da música? Numa era em que a tecnologia digital avança de uma forma assustadoramente veloz, podemos ter a certeza de que muita coisa nova e surpreendente ainda há de surgir.

LEITURA COMPLEMENTAR

CARTA DE WOLFGANG AMADEUS MOZART PARA SEU PAI, LEOPOLD

Vienne ce 22 de Janvier 1783

Mon três cher Pére!

Não receie pelo preço dos três concertos! Acho que mereço um ducado por cada um e queria ver quem seria capaz de obter a cópia dos três juntos pela soma de um ducado! Ninguém poderá copiá-los [antes], porque eu não os entrego a ninguém enquanto não tiver um número razoável de assinantes. O anúncio já saiu três vezes no Wiener Diarium, cupons pelas assinaturas podem ser comprados comigo desde o dia 20 pela importância de 4 ducados à vista, e durante o mês de abril os concertos poderão ser retirados também comigo, contra a devolução do recibo.

As cadências e introduções mandarei na próxima carta à minha querida irmã. Ainda não modifiquei a introdução para o rondó: quando executo este concerto, o toco como me vem à cabeça na hora. Tenha a bondade de mandar o quanto antes as sinfonias pedidas, pois realmente preciso delas – E agora mais um pedido, pois minha esposa não me deixa em paz. Sem dúvida, o senhor também sabe que é época de carnaval, e da mesma maneira como em Salzburgo ou em Munique, aqui também as pessoas dançam. Bem, gostaria (sem, contudo, que alguém soubesse de antemão) de me apresentar fantasiado de Arlequim (pois aqui muitos frequentam os bailes de máscaras, um montão de burros). Portanto, gostaria de lhe pedir que me emprestasse a sua fantasia de Arlequim, mas isso também deveria ocorrer o quanto antes – até lá não iríamos aos bailes, apesar de eles já funcionarem a todo vapor. Gostamos mais dos bailes domésticos. Na semana passada eu também organizei um em casa! Cada chapeau, é claro, teve que pagar 2 florins. Começamos às 6 horas e terminamos às 7. – O quê? – Durou apenas uma hora? – Que nada! Às 7 da manhã! De certo não consegue imaginar como arrumei espaço para isso? É claro, agora que eu me lembro, sempre esqueço de lhe contar nas cartas, que há um mês e meio mudei de moradia. Esta também fica na Hohe Brücke, apenas a alguns prédios da outra. Portanto, agora estamos morando no pequeno edifício Herberstein, número 412, 3º andar, no senhor von Wetzlar, um judeu rico. Minha sala tem 1000 passos de comprimento e 1 de largura [humor mozarteano], e depois teremos ainda um quarto e uma bonita e grande cozinha. Ao lado existem duas grandes salas que estão vazias no momento,

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UNIDADE 2 | HISTÓRIA DA MÚSICA

portanto essas é que foram usadas para o baile doméstico. Estavam presentes o barão Wetzlar e sua esposa, a baronesa Waldstädten, v. Edelbach, o malandro do Gilowsky, o jovem Stephanie et Uxor (e esposa), Adamberger e a mulher, Lange e a senhora, Lange etc. Não posso enumerar todos. – Agora vou terminar, porque ainda quero escrever aos Wendling em Manhein por causa dos concertos. Por gentileza, insista com o compositor de ópera Gatti, o capaz de tudo, por causa dos libretos, como seria bom se eles já estivessem aqui. Bom, adieu! Baijamos-lhe as mãos 1000 vezes, abraços de coração à nossa querida irmã, seus filhos obedientes

W. Et Co. Mozart

FONTE: MOZART, Wolfgang Amadeus. Cartas vienenses. Tradutor de Gabor Aranyi. São Paulo: Editora Veredas, 2004, pp. 146 e 147.

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RESUMO DO TÓPICO 4

• O prelúdio L’Après-midi d’n faune, de Claude Debussy, é considerado o marco da música moderna.

• Grande parte da música de Debussy caracteriza-se como impressionista.

• Stravinsky compõe em 1913 o balé “A sagração da primavera”. A obra estreia em meio a vaias e protestos.

• Na segunda metade do século XX surge o movimento nacionalista.

• Na Europa, Bela Bartók realizou uma série de pesquisas na Hungria e na Romênia, registrando canções populares e folclóricas, juntamente com Zoltán Kodály.

• O jazz americano influencia compositores como Ravel, Milhaud, Gerswhin, Weill, Stravinsky e Copland.

• Surge o atonalismo, que é uma composição cromática, repleta de notas estranhas à tonalidade, camuflando completamente indícios de uma possível tonalidade.

• A música atonal é a base para o expressionismo, onde os compositores buscam a distorção da realidade.

• A música expressionista tem como principais expoentes Arnold Schoenberg e seus discípulos Alban Berg e Anton Webern, os quais formaram a chamada “segunda escola de Viena”.

• O neoclassicismo se configura como um movimento intelectual/musical que surgiu após a Primeira Guerra Mundial, buscando estilos de composição característicos do Barroco e do Clássico.

• Erik Satie segue na linha do neoclassicismo, porém, com humorístico senso crítico. Por outro lado, Paul Hindemith compõe música séria aos princípios neoclássicos, com ênfase nos sopros e percussão.

• Heitor Villa-Lobos colocou sua música erudita brasileira para ser apreciada nos grandes palcos da Europa e Estados Unidos.

• Em 1921, Schoenberg apresenta os fundamentos de uma nova música, denominada serialismo. Desprovido de tonalidade, o novo estilo caracteriza-se de forma intuitiva.

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• O início do século XX também é marcado por uma série de inventos eletrônicos com fins musicais, entre eles o instrumento chamado teremin.

• O americano John Cage inovou com a obra 4’33”, consistindo exclusivamente pelos sons perceptíveis do ambiente.

• Pierre Schaeffer e Karlheinz Stockhausen realizaram experiências no campo da música concreta, modificando sons gravados a partir de ruídos.

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Na música moderna, a principal característica num primeiro momento é o rompimento de tradições estilísticas na composição musical, o que pode ser constatado na obra de Claude Debussy, Prélude à l’Après-midi d’um faune. Trata-se do marco da música moderna e, a partir deste momento, uma série de movimentos traça a história musical do século XX.

Enumere corretamente a coluna da direita de acordo com os conceitos e compositores e obras apresentados na coluna da esquerda.

AUTOATIVIDADE

(01) Schoenberg, Berg e Webern ( ) Composição cromática, repleta de notas estranhas.

(02) Música nacionalista ( ) Composições modernas que têm como base a música do século XVIII.

(03) Expressionismo ( ) Imaginary Landscape, de 1934.(04) Neoclassicismo ( ) Retorno ao Romantismo tardio.

(05) Igor Stravinsky ( ) As 12 notas da escala cromática são dispostas em uma ordem fixa.

(06) Samuel Barber ( ) Tem como base a música atonal, distorção da realidade.(07) John Cage ( ) Compositor de humor crítico.(08) Música concreta ( ) Instrumento eletrônico do início do século XX.(09) Serialismo ( ) Segunda Escola de Viena.(10) Teremin ( ) Temas folclóricos aparecem nas obras.(11) Erick Satie ( ) A Sagração da Primavera (1913).(12) Atonalismo ( ) Manipulação de sons gravados a partir de ruídos.

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UNIDADE 3

MÚSICA E EDUCAÇÃO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir desta unidade você será capaz de:

• conhecer os objetivos da educação musical;

• compreender algumas das mais destacadas propostas em educação musical;

• contextualizar os diversos momentos históricos e práticas musicais relacio-nadas dentro da história da educação musical no Brasil;

• compreender a inserção da educação musical no contexto escolar, nos ní-veis da educação infantil, do Ensino Fundamental e Médio; além da músi-ca em contextos alternativos, como escolas de música e fanfarras.

Esta unidade está dividida em três tópicos, conforme segue. No de-correr desta unidade, você encontrará atividades que lhe auxiliarão na com-preensão dos conceitos em questão.

TÓPICO 1 – EDUCAÇÃO MUSICAL

TÓPICO 2 – HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO MUSICAL NO BRASIL

TÓPICO 3 – MÚSICA NA SALA DE AULA

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TÓPICO 1

EDUCAÇÃO MUSICAL

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

A busca do conhecimento é uma das mais importantes características dos seres humanos, provavelmente a mais importante. Em todas as civilizações, em todas as sociedades, em diferentes épocas ou períodos – não importa quão simples ou sofisticadas as sociedades – sempre existe alguém que pensa, observa e questiona fenômenos, eventos e ideias fazendo as perguntas clássicas: o que? como? e por que? O conhecimento é tão importante que os seres humanos desenvolveram, através dos tempos e da sua própria evolução, sistemas simbólicos e sistemas de notação para expressá-Io, mas, principalmente, para preservá-Io (MARTINS, 2014, p. 6).

A música faz parte do processo histórico de desenvolvimento do conhecimento e da expressão humana, mas a educação musical e a preocupação com os processos de uma pedagogia musical (aprendizagem adequada a diferentes necessidades e características humanas com respeito aos níveis de desenvolvimento biológico, cognitivo e cultural) tiveram uma trajetória lenta e permeada de preconceitos e crendices (MARTINS, 2014).

O potencial da música no processo de desenvolvimento, aprendizagem intelectual e social é amplamente aceito e reconhecido cientificamente. Porém, quando se fala sobre o contexto do currículo e da história da educação brasileira, a música já ganhou e perdeu espaço por diferentes questões políticas e ideológicas (MONTI, 2011).

É importante conhecer o passado do ensino de música nas escolas regulares

e a situação em que este se encontra atualmente, permitindo assim a reflexão e o debate sobre novas propostas da educação musical na Educação Básica, já que, a partir da música, podem-se desenvolver as habilidades artísticas de todos os que têm acesso a essa linguagem na escola, disseminando-as para a comunidade (FUCCI AMATO, 2006).

O ensino da música vive um momento de retomada como componente curricular com a aprovação unânime da Lei nº 11.769/2008, que dispõe sobre a obrigatoriedade da música na Educação Básica como conteúdo e que altera a Lei nº 9.394, de 1996, conhecida como Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), conforme publicação no Diário Oficial da União (Seção 1, 19/8/2008, p. 1):

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Lei 11.769 determina a obrigatoriedade da música na escola. O presidente Lula sancionou no dia 18 de agosto de 2008 a Lei nº 11.769, que estabelece a obrigatoriedade do ensino de música nas escolas de educação básica. A aprovação da lei foi sem dúvida uma grande conquista para a área de educação musical no país. Todavia, há também grandes desafios que precisam ser enfrentados para que possamos, de fato, ter propostas consistentes de ensino de música nas escolas de educação básica [...].

No século XX, em um movimento de oposição à tradição secular, dominante no ensino da música, os trabalhos de Orff, Dalcroze, Kodály, Willems, Gainza, Martenot e Schafer propõem uma nova metodologia para o ensino de música, em que o fazer musical, a exploração sonora, a expressão corporal, o escutar e perceber consciente, o ato de improvisar e criar, a troca de sentimentos, a vivência pessoal e a experiência social oportunizariam a experiência concreta antes da formação de conceitos abstratos (LOUREIRO, 2011, p. 43). Segundo Loureiro (2011, p. 43), essa nova proposta para o ensino da música ressalta a importância da prática livre experimental, em oposição à transmissão de conhecimentos do professor para o aluno, emergindo a valorização do processo natural de desenvolvimento artístico-musical:

Objetivando trazer modernização na maneira de musicalizar crianças, preocupando-se com as diferenças individuais dos alunos, tais propostas foram encontrar espaço, no Brasil, nos centros alternativos para o ensino da iniciação musical, criados sob os auspícios de Liddy Chiaffarelli e Antônio Sá Pereira, em final da década de 30.

É preciso pensar em uma educação musical consciente de seu tempo e espaço; contemporânea, capaz de aliar as características do passado e do presente, acolher e respeitar as particularidades culturais dos envolvidos. É preciso promover nos alunos um conhecimento amplo, o desenvolvimento criativo e participativo. A música não pode estar restrita a apresentações, à música das aparências, das comemorações visíveis e exteriores. É preciso oferecer alternativas para que as crianças e jovens tenham um contato prazeroso com a própria musicalidade, desenvolvendo-a e vivenciando-a através de experiências criativas (KATER, 2012).

2 OBJETIVOS DA EDUCAÇÃO MUSICAL

A música é um fato da vida cultural universal e não é exclusiva de uma especialidade profissional. O aprendizado musical deve contribuir para a formação integral do ser humano. Desde a Grécia antiga, com Platão, o poder do ensino da música sobre a formação do cidadão é conhecido. Numerosas são as pesquisas que abordam os benefícios do aprendizado musical no desenvolvimento de habilidades cognitivas (PETRAGLIA, 2012). A educação musical não pode ser somente um meio de se gerar o conhecimento em arte ou apenas a sensibilização para a obra de arte, mas também deve: “[...] criar nos indivíduos não tanto aptidões artísticas específicas, mas sobretudo um desenvolvimento global da personalidade, através de formas as mais diversificadas e complementares possíveis de atividades expressivas, criativas e sensibilizadoras” (PORCHER, 1982, p. 25).

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Aspectos como o cultivo da sensibilidade, criatividade, escuta, percepção, atenção, imaginação, liberdade de experimentação, coragem do risco, respeito pelo novo e pelo diferente, pelo que é próprio a cada um, a construção do conhecimento com autonomia, responsabilidade individual e integração no coletivo, entre outros, estão envolvidos na formação dos alunos através da música. De acordo com a educadora musical Gainza (1988, p. 101), “O objetivo específico da educação musical é musicalizar, ou seja, tornar o indivíduo sensível e receptivo ao fenômeno sonoro, promovendo nele, ao mesmo tempo, respostas de índole musical”. Para Penna (2008, p. 31), musicalizar é:

[...] desenvolver os instrumentos de percepção necessários para que o indivíduo possa ser sensível à música, apreendê-la, recebendo o material sonoro/musical como significativo. Pois nada é significativo no vazio, mas apenas quando relacionado e articulado ao quadro das experiências acumuladas, quando compatível com os esquemas de percepção desenvolvidos.

A educação musical deve oferecer estímulos significativos aos alunos, despertar a curiosidade e a disponibilidade para a aprendizagem. Acolher o “brincar”, o ato de “criar vínculos”, o lúdico como forma de manter a atenção ao que se realiza: a vivência musical participativa. Para Kater (2012, p. 43), a educação musical tem um caráter inclusivo e deve integrar teoria e prática, tradição e inovação:

Uma educação musical, enfim, que estimule o prazer (vínculo), para instaurar a presença (inteiridade), possibilitar a participação efetiva (relação, implicação) e assim, então, estimular a produção de conhecimentos gratificantes em nível geral e, especialmente, pessoal (formação ampla do aluno e não simples transferência de informações por parte do professor). Pois quando, num processo educativo, o professor se transforma em educador, inverte-se a preponderância de uma formação para a música por uma formação pela música, tornando possível aos alunos inscreverem-se num espaço de construção do sujeito, no qual estratégias dinâmicas de aprendizado (as lúdicas, por exemplo) permitem um “desaprisionamento” individual que favorece a apreensão da questão da identidade e da alteridade (fundamento do desenvolvimento humano). Espaço dentro do qual os saberes pessoais dialogam com os saberes consagrados, onde os “saberes induzidos” fazem contraponto com os “saberes construídos”.

Assim como é importante que o aluno conheça as estruturas fundamentais da linguagem musical, desenvolva o gosto pelas grandes manifestações musicais da história, da cultura do seu povo e do mundo, é fundamental que ele utilize esse saber como base para sua expressão individual, que deverá crescer ao longo dos anos escolares até a um amplo desenvolvimento do potencial criativo do jovem (PETRAGLIA, 2012). A educação musical pode permitir a construção e exercício da autonomia pessoal e a participação ativa em sociedade.

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É uma oportunidade para as novas percepções de si e do “outro” através da música, intensificando a dimensão formadora e a dinâmica social das escolas (KATER, 2012). Porém, apesar da necessidade destas visões e objetivos da educação musical, a realidade nem sempre acompanha. Ainda o ensino da música encontra-se esquecido em muitas instituições de ensino em nosso país, sendo utilizado muitas vezes com objetivos extramusicais:

A utilização da música sem finalidades educativas, em momentos ou circunstâncias do cotidiano escolar, não é restrita ao espaço da sala de aula, por exemplo: cantar na fila que se forma depois do recreio no retorno para a classe, cantar para chamar a atenção dos alunos, cantar em formaturas ou nas festividades das datas comemorativas do calendário escolar, cantar para o apoio na aprendizagem de conteúdos de outras disciplinas. Além dessas ocasiões, ocorrem, de maneira esporádica, práticas que objetivam a aprendizagem da música com finalidades educativo-musicais, ou seja, para a aquisição de conhecimentos musicais e com a utilização de procedimentos específicos da área, por exemplo: canções [exercícios ou jogos] para a aprendizagem de conceitos musicais como pulsação e apoio (BEAUMONT, ROSA, 2004, p. 794).

Para Swanwick (2003), é necessário seguir três princípios simples de ação

em educação musical:

• Considerar a música como discurso.• Considerar o discurso musical uns dos outros.• Prezar pela fluência do início ao final das práticas musicais.

O autor defende uma educação musical comprometida com a qualidade e desenvolvida por meio de atividades de envolvimento: composição, apreciação e performance musical, e apoiadas e reforçadas pela literatura e pelo desenvolvimento teórico e técnico. Além disso, o respeito ao discurso musical dos sujeitos, com experiências significativas de interações humanas e a fluência musical em todas as etapas do desenvolvimento.

A música nasce em contextos sociais; no entanto, por sua natureza metafórica, ela não é apenas um reflexo da cultura, mas pode ser criativamente interpretada ou produzida. Uma vez que a música é uma forma de discurso e, portanto, depende de negociações dentro de sistemas de significados compartilhados, a interação humana, a cooperação e o encontro do prazer em experiências compartilhadas são considerados objetivos da educação musical (BUENO; COSTA; BUENO, 2013, p. 495).

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É preciso que a música na escola não se confunda com o fazer musical descompromissado, de lazer e passatempo. Deve-se ter claro que as escolas são espaços de formação, de produção de conhecimentos. Para Kater (2012), os alunos são representantes sensíveis e inteligentes de estados musicais, que merecem ser conhecidos e desenvolvidos com consciência desde o ponto onde se encontram, para cumprir seu papel na sociedade. Para este autor, não é válida a repetição de experiências passadas sem analisar as realidades presentes. Todo modelo, método ou proposta educacional deve ser analisado quanto à realidade de desenvolvimento e aplicação. É necessário o exercício da colaboração, da integração de ideias, métodos e modos de fazer, através de critérios e criatividade.

3 PROPOSTAS EM EDUCAÇÃO MUSICAL

A música é uma linguagem, dessa forma, necessita métodos, progressivos e controlados, para a produção de uma alfabetização estética para que a expressão não permaneça impotente e criação ilusória (PORCHER, 1973). Dito isso, é preciso ressaltar que os métodos não precisam e não devem ser seguidos passo a passo, já que eles foram concebidos em épocas e lugares diferentes. A metodologia deve ser escolhida conforme a filosofia de ensino do professor e que permita sustentar a prática pedagógica dentro dos seus objetivos e conteúdos. O professor deve se reapropriar de um método, readaptando ao grupo social e aos objetivos que possui (ALCURE, 2000). É preciso a escolha de uma metodologia que "supere os limites do conservatorial" (PENNA, 1995, p. 81). Através da procura por soluções para a fama elitista que a música e as artes em geral preservam por causa do modelo conservatorial. Libâneo (1990) afirma que: “Conteúdos culturais não têm condições de serem assimilados, em termos de efeitos duradouros, sem sua apropriação ativa pelo aluno, o que requer o uso de métodos e técnicas adequados” (apud PENNA, 1995, p. 81).

Modelo conservatorial: Modelo construído a partir do Conservatório de Música francês, no final do século XVIII, em sintonia com os ideais democráticos da Revolução Francesa (SANTOS, 2001).

NOTA

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Assim como a própria música, a história da educação musical acompanha a história do desenvolvimento humano. Os mais antigos registros de educação musical foram encontrados em pinturas egípcias de 2500 a.C. (BEYER, 1993). A educação musical assumiu, de acordo com cada povo e época, diversas formas e objetivos éticos, religiosos, políticos, artísticos ou científicos. Também os responsáveis pela educação musical e o público-alvo alteraram-se ao longo do tempo:

Os responsáveis pela educação musical e o público-alvo dessa educação também vão sendo alterados ao longo do tempo. Houve épocas em que a educação musical esteve restrita aos religiosos e às pessoas que pagassem por ela. Em outros momentos o gênero foi determinante para ser educado musicalmente, assim como a classe social, e também houve períodos em que se buscou a democratização da educação musical com diversos propósitos, sendo praticada associada à educação formal e em escolas específicas de educação musical, que passaram a surgir somente a partir do século XIX (VALIENGO, 2005, p. 75).

Com a publicação do primeiro Tratado de Educação de Comenius (1592-1670), a educação de forma geral sofreu transformações, alterando o enfoque da educação musical, que passou a incentivar as sensações e ações. Também pesquisas filosóficas e educacionais colaboraram e ofereceram novas visões sobre o desenvolvimento humano. As primeiras sistematizações em educação musical apareceram a partir do século XVIII e anteciparam os chamados “métodos ativos” surgidos no século XX. Esses métodos ativos são sistematizações, elaboradas por músicos, em sua maioria, europeus, que dão prioridade à experimentação antes do aprendizado da teoria. São inspirados em educadores do século anterior, como Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), Pestalozzi (1746-1827), Herbart (1776-1841) e Froebel (1782-1852) (VALIENGO, 2005, p. 75).

A característica marcante destes métodos é a experiência direta com a música. O aluno participa de forma ativa dos processos musicais desenvolvidos em sala de aula que permitem o contato com várias dimensões do fazer musical, evitando-se a ênfase na teoria musical e nos exercícios descontextualizados que, na maioria das vezes, desestimulam a aprendizagem musical (FIGUEIREDO, 2012). Esses métodos foram desenvolvidos em seus países e aplicados em outros contextos. No Brasil, esses métodos chegaram a partir da década de 1950 e foram aplicados em contextos restritos, como o ensino particular de música. Neste sentido, é preciso deixar claro que a adaptação dos métodos precisa levar em conta os diversos contextos sociais. Eles não são “receitas prontas” que podem ser aplicados em qualquer contexto educativo musical, sem a análise de sua função no processo de formação musical dos indivíduos (FIGUEIREDO, 2012). Como aponta Maura Penna (PENNA, 1995, p. 82), “não é a assinatura de um mestre ‘consagrado’ que irá garantir nossa prática cotidiana em sala de aula”.

As propostas musicais que serão abordadas a seguir caracterizam-se por terem conquistado espaços no mundo todo e por terem se adequado a diferentes perspectivas do ensino de música, possuindo lugar de destaque em nossa sociedade. O estudo desses métodos pode promover novas abordagens para o ensino de música na contemporaneidade.

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Essas propostas têm como elementos o trabalho com o corpo, o uso da voz, a criação e experiência musical, a escuta consciente e criativa a partir de diferentes vivências. Podem ser uma importante ferramenta para educadores musicais neste momento de reinserção da música como conteúdo curricular na escola brasileira e poderão contribuir para que a educação musical esteja acessível a todos os brasileiros que passam pela escola. Como aponta Figueiredo (2012, p. 86): “É um processo de reinvenção, de revisão permanente dos elementos metodológicos que façam sentido para a educação musical brasileira nos dias de hoje”.

4 PROPOSTAS EM EDUCAÇÃO MUSICAL DA PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XX

4.1 ÉMILE JAQUES-DALCROZE

Émile Jaques-Dalcroze (1865-1950), músico suíço e compositor fluente, sua obra inclui algumas óperas, dois concertos para violino, três quartetos de cordas, peças para piano e muitas canções. Escreveu também livros pedagógicos. Realizou seus estudos em Paris e no Conservatório de Genebra. No período em que lecionou Harmonia no Conservatório de Genebra (1892-1910), percebeu que os estudantes não conseguiam ouvir, pela escuta interna ou mental, a música escrita na partitura, e, ao executar, o faziam de forma mecânica e pouco musical. Em suas observações, o que falta aos estudantes era coordenação entre olhos, ouvidos, mente e corpo para aprender o repertório e tocar bem. Diante disso, ele desenvolveu o sistema que ficou conhecido como Euritmia Dalcroze (Dalcroze Eurhythmics) de treinamento musical. Este método tinha como objetivo criar, através do ritmo, uma corrente de comunicação rápida, regular e constante entre o cérebro e o corpo para que o sentido rítmico possa se tornar uma experiência corporal. Essas ideias, mais tarde, no século XX, se confirmaram em pesquisas sobre kinestesia (kines = movimento, thesia = consciência) (GOULART, 2000). Durante a infância, todos os sentidos são alimentados pela kinestesia, por isso as crianças estão sempre se movimentando, explorando o mundo.

Euritmia (eu = bom, rhythm = fluxo, rio ou movimento) de Dalcroze estuda todos os elementos da música através do movimento, partindo de três pressupostos básicos, conforme Goulart (2000):

• Todos os elementos da música podem ser vivenciados através do movimento. • Todo som musical começa com um movimento. Portanto, o corpo, que faz os

sons, é o primeiro instrumento musical a ser treinado. • Há um gesto para cada som, e um som para cada gesto. Cada um dos elementos

musicais: acentuação, fraseado, dinâmica, pulso, andamento, métrica – pode ser estudado através do movimento.

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Este método é multidisciplinar, relacionando música e movimento corporal. O solfejo musical no espaço possibilita visualizar as diferentes noções musicais. O aprendizado ocorre em grupo, desenvolvendo as capacidades de adaptação, imitação, reação, integração e socialização (DEL BIANCO, 2007). Este método possibilita adquirir uma educação auditiva ativa com a ajuda do movimento, tomando consciência do corpo e aprendendo a improvisar corporal e musicalmente. Utiliza-se também como material auxiliar bolas, aros, fitas, instrumentos de percussão como pandeiros, claves, castanholas, entre outros.

Há o pensamento errado de que a euritmia é uma espécie de dança, ou de ensino de movimentos bonitos. Mas, na verdade, os movimentos usados na euritmia são improvisados pelos próprios alunos, e não propostos pelo professor. A dança é uma arte própria; a euritmia é um meio para se atingir a plena musicalidade. O professor que usa a metodologia de Dalcroze costuma pedir aos alunos: “Mostrem-me o que vocês estão ouvindo”, em vez de “Digam-me o que vocês estão ouvindo”. A música é uma arte não verbal e é este universo sem palavras que deve ser explorado durante as aulas. Há nas aulas que seguem o método Dalcroze muita atividade física e movimentos enquanto se ouve a música tocada pelo professor, em geral, improvisando ao piano. Nos jogos e brincadeiras rítmicas desenvolvidas nas aulas, os alunos se envolvem e aprendem a aplicar, também em suas performances, os conceitos vivenciados. Sempre que possível, usam a demonstração ao invés da narrativa oral.

A euritmia é baseada na mobilização da mente e do corpo. Por esse método, interessa-se pela pessoa como ela é, sem levar em conta a idade, habilidades e dificuldades. Para Dalcroze, a música não é somente o que se ouve, mas o que se sente através do corpo (BACHMANN, 1998). Para Dalcroze, uma música precisa de acuidade auditiva, sensibilidade, senso rítmico e capacidade de exteriorizar espontaneamente sensações emocionais. Para ele, a educação musical deve fomentar essas qualidades (BACHMANN, 1998).

Inicialmente, o método foi preconizado para crianças a partir de seis anos, mas logo se percebeu que crianças menores e adultos poderiam beneficiar-se deste método, podendo ele ser utilizado na educação de cegos, pessoas com transtornos mentais e deficientes. Outros músicos, como Kodály e Orff, tiveram contato com esses estudos e foram influenciados diretamente pelas ideias de Dalcroze. Estas e mais ideias sobre o Método Dalcroze podem ser lidas nos trabalhos dos autores Shehan (1997) e Landis e Carder (1972).

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DICAS

Para você ter uma ideia melhor do Método Dalcroze, há um vídeo de uma oficina realizada com professores sobre o método. Nele você pode observar a relação de movimento com a aprendizagem de quadratura musical. Veja em: <https://youtu.be/63Q_6skqJBE>.

4.2 EDGAR WILLEMS

Edgar Willems (1890-1978) nasceu na Suíça e foi aluno de Dalcroze. Desenvolveu uma proposta de ensino de música para todas as crianças a partir de três anos de idade. Para Willems, existe uma conexão entre a natureza humana, a música e a audição. Ele relaciona campos humanos (o sensorial, o afetivo e o mental) a elementos musicais (ritmo, melodia e harmonia). Além disso, ele vincula três verbos em francês a esses aspectos, são eles: Ouir, écouter e entendre (ouvir, escutar e “ouvir” com o sentido de compreender; respectivamente) (BOMFIM, 2012, p. 82).

Esta abordagem propõe que toda criança pode ser preparada auditivamente para aprender a ouvir os materiais sonoros básicos que compõem a música e organizá-los com a experiência musical. Para o pedagogo musical, o preparo auditivo deve vir antes do ensino de um instrumento musical específico, a escuta deve ser a base da musicalidade (KEBACH, 2011).

Como você pode perceber, o estudo da audição é um dos pontos fundamentais abordados em sua proposta. Willems propõe exercícios especiais para a distinção auditiva dos parâmetros do som, especialmente o parâmetro altura, com o objetivo de desenvolver não somente a capacidade de diferenciação dos tons e semitons, mas também o espaço entre eles, chamado de intratonal. Para ele, há uma estreita relação entre a arte e a psicologia. Dessa forma, a música deveria ser olhada sob o ângulo psicológico, no estudo das ligações que unem a música e seus elementos essenciais à natureza humana. O ritmo, a melodia, a harmonia, a composição e a inspiração são elementos que receberiam seus impulsos de certos aspectos correspondentes à natureza do homem. Com isso, o ser humano no seu todo, sensorial, afetivo e mental, vivenciaria a prática musical e para ela contribuiria (KEBACH, 2011).

Na teoria de Willems, a educação do ouvido é um ponto-chave. Para ele é

preciso haver um despertar musical precoce. Dentro dessa teoria, já no período pré-escolar, de três a seis anos, a criança se encontraria num amplo amadurecimento cerebral. Dessa forma, como aponta Fonterrada (2015, p. 125), “sua proposta compreende dois aspectos: um teórico, que se refere a elementos fundamentais da audição e da natureza humana; outro prático, que diz respeito à organização do material didático necessário à aplicação de suas ideias de educação musical”.

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Sua proposta de aprendizado está interligada com as etapas do desenvolvimento humano. Dessa forma, Willems estabeleceu um método progressivo de aprendizado, em que se recomenda a iniciação da educação musical pelo aspecto sensorial (BOMFIM, 2012). Como Jaques-Dalcroze, Willems reforça a importância dos movimentos para o desenvolvimento rítmico e das ligações entre o som e o ritmo. Dentro desta necessidade, Willems compôs uma série de músicas específicas para trabalhar padrões rítmicos variados, em que as crianças deveriam marchar, correr, galopar, saltar conforme a música tocada. Para ele, são de grande importância as relações que existem entre o ritmo musical e o movimento, e sugere que a movimentação através da música conduza a criança a uma escuta geradora de aprendizagem e a uma resposta criativa. O movimento é um modo de expressão criativa da música (KEBACH, 2011, p. 73-74).

Sobre melodia e movimento, Willems (1981, p. 29) ressalta que “o elemento principal da melodia é o intervalo melódico, o qual representa um movimento de um som ao outro. Este movimento, que acontece no tempo, pode sentir-se como realizado no espaço”.

Para estimular na criança o interesse e o amor pela música, a proposta recomenda que a prática deva acontecer antes da teoria. Sendo necessário, portanto, ouvir música, cantar, estimular os movimentos corporais naturais, entre outros. A improvisação é um aspecto central desse pensamento. A teoria é introduzida aos poucos, porém a relação da criança com a música já está estabelecida naturalmente (BOMFIM, 2012).

4.3 CARL ORFF

Carl Orff (1895-1982), alemão, nascido em Munich, onde realizou seus estudos de música e regência. Muito ligado ao teatro, à literatura e à educação, fundou em 1924, junto com a dançarina Dorothea Günther, a Günther School. Ali se ensinava música, dança e ginástica para crianças. Aí nós podemos ver as raízes da filosofia educacional de Orff. A proposta de Orff combina música e dança, trabalhando com o ritmo da fala, atividades vocais e instrumentais em grupo, com ênfase na improvisação e na criação musical na busca de um método capaz de sensibilizar musicalmente as crianças, desde muito cedo (KEBACH, 2011).

Carl Orff desenvolveu um material adequado para o desenvolvimento de sua proposta. Criou instrumentos de percussão e trabalhou com a expressividade vocal: palavras faladas, rimas, cantos e um repertório baseado em escalas pentatônicas (KEBACH, 2011). O instrumental Orff, um conjunto de instrumentos musicais idealizados por ele mesmo, inclui xilofones, metalofones, tambores e diversos instrumentos de percussão, além de violas da gamba e flautas doces (FIGUEIREDO, 2012).

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Pentatônica é um termo aplicado a qualquer música, modo ou sistema baseado em cinco sons diferentes dentro de uma oitava. Muitas melodias tradicionais europeias são sem semitons. (THE NEW GROVE DICTION Y OF MUSIC AND MUSICIANS, 1980, p. 353).

NOTA

FIGURA 76 – INSTRUMENTAL ORFF

FONTE: Disponível em: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/f/f8/Intrumentarium_Orff-Schulwerkde_la_société_Studio_49.jpg>. Acesso em: 29 ago. 2016.

Orff acreditava que não existem adultos ou crianças que não possam aprender música. Uma formação adequada é capaz de desenvolver a capacidade de se perceber ritmos, alturas e formas musicais, além de promover a participação de todos em atividades criativas coletivas. A experiência de tocar em grupo permite que as crianças entrem em contato direto com o fazer musical. Segundo Valiengo (2005, p. 76):

Orff tinha como intenção possibilitar uma vivência musical e não a formação de músicos profissionais. Para isso utilizava repetições (eco) e estímulos (pergunta/resposta), resultando em improvisos, além de jogos e uma música de base que envolvesse fala, dança e movimento, partindo do ritmo, o que chamou de ‘música elemental’.

Como aponta Kebach (2011), o conceito de educação musical de Orff nasce da necessidade de expressividade, há nele a união entre gesto, música e palavra. A palavra é considerada em seus significados literais, como substância rítmica e de articulação de frases e sílabas. Esse processo é chamado, como já foi dito, música elemental. Assim, as ideias de Orff conectam-se, da mesma forma que as de Jaques-Dalcroze e Willems, possibilitando aos alunos a plena atividade, criatividade, motivação, autonomia.

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Orff deu prioridade à produção de peças e materiais orientados a estimular execução em grupo (instrumental, vocal, corporal). Ele produziu uma obra didática em cinco volumes (Orff Schulwerk) que integra jogos linguísticos e o movimento corporal ao conjunto vocal-instrumental. São vários os grupos de percussão no mundo que têm como base o instrumental Orff e executam e difundem as peças para crianças e jovens do Orff Schulwerk. Entre os trabalhos mais conhecidos de Orff como compositor estão Carmina Burana (1937), a ópera Die Kluge (The clever woman, 1943) e a peça musicada Antigonae (1949).

DICAS

A Carmina Burana, de Carl Orff, é uma das peças mais populares do repertório da música clássica. Ela é uma cantata cênica composta por Carl Orff em 1935 e 1936, baseada em 24 dos poemas encontrados na coleção medieval Carmina Burana. Seu título completo em latim é Carmina Burana: Cantiones profanæ cantoribus et Choris cantandæ comitantibus instrumentis atque magicis imaginibus (Canções de Beuern: Canções seculares para os cantores e coros para ser cantado em conjunto com instrumentos e imagens mágicas). Carmina Burana é parte de Trionfi, o tríptico musical que também inclui a cantata Carmina Catulli e Trionfo di Afrodite. O movimento mais conhecido é "Fortuna Imperatrix Mundi" (O Fortuna), que abre e fecha a peça. A Davis Symphony Orchestra da Universidade da Califórnia, o Coro e Graduados Coro da Universidade, e a Boychoir Pacific realizaram Carmina Burana no Centro Mondavi na Universidade Davis. Veja em: <https://youtu.be/GRjyxr1ysKw>.

4.4 ZOLTÁN KODÁLY

Zoltán Kodály (1882-1967), nascido em Kecskemét (Hungria), realizou seus estudos em Budapeste. Orientou e coordenou os esforços de seus alunos de composição e etnomusicologia, levando, em poucos anos, a educação musical para toda a população escolar da Hungria. Seu trabalho de pesquisa, iniciado em 1905 juntamente com o compositor e pesquisador Béla Bartók, reuniu e popularizou a música folclórica da Hungria, que tinha sido esquecida durante muitos séculos pelas camadas mais cultas da população. Sua produção como compositor objetivou aspectos didáticos, como obras corais e exercícios para alunos espalhados por toda a Hungria. Nos últimos anos de sua vida, visitou regularmente essas escolas e supervisionou a produção de material didático, com ênfase na utilização do canto e destinado a húngaros (CRUZ, 1998).

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Como compositor, Kodály faz citações ou imita as formas, harmonias, ritmos e melodias da música folclórica húngara. Entre suas composições mais apreciadas estão os Psalmus Hungaricus (1923), para tenor, coro e orquestra; a ópera Háry János (1926); Dances of Galánta (1933), para orquestra; e a Missa Brevis (1945). Kodály possuía licenciatura em Linguística, doutor em Filosofia, possuía diplomas de composição e de violoncelo. Com uma vasta cultura geral, deixou suas obras mais importantes no campo da Pedagogia Musical e da Etnomusicologia (CRUZ, 1998). O compositor foi membro do Musical Directory (1919), diretor da Academia Liszt, membro da Academia das Ciências Húngaras e seu presidente em 1945, presidiu diferentes conferências do ICTM International Council for Traditional Music, presidente honorário do Conselho da Música do Ministério da Cultura Húngaro, membro honorário da Belgian Royal Academy of the Arts, Honoris causa pela Oxford University, Toronto University e Accademia de Santa Cecília, entre outros (CRUZ, 1998).

Kodály enfatizava a utilização de repertório adequado a cada país, música nacional tradicional ou composta a partir dela, no ensino pré-escolar e início do ensino básico. Para ele, cada país deveria compilar e trabalhar o repertório próprio, assim como a música erudita tem que estar presente como fonte para uma sólida educação musical (CRUZ, 1998). A música folclórica, como afirma Szonyi (1990), é a herança de todas as pessoas e um princípio fundamental do método Kodály que pode ser aplicado a diferentes experiências culturais em educação musical. Muitos pesquisadores defendem que não há um Método Kodály, mas sim uma filosofia de educação. Este posicionamento defende a não cristalização das ideias de Kodály, que foram revolucionárias e devem ser contextualizadas no tempo e espaço (CRUZ, 1998).

O que se destaca na proposta de educação musical de Kodály é que ela é dirigida para todas as pessoas, onde a prática vocal em grupo, o treinamento auditivo e o solfejo ocupam um papel central nesta metodologia. Dentro dessa perspectiva, a experiência musical vem antes da teoria. Também são elementos dessa proposta a criatividade, os movimentos corporais e o desenvolvimento intelectual e emocional (FIGUEIREDO, 2012).

4.5 HEITOR VILLA-LOBOS

Heitor Villa-Lobos nasceu no Rio de Janeiro, no dia 5 de março de 1887, e morreu em 17 de novembro de 1959 na mesma cidade. Era filho de um funcionário público que tocava violoncelo nas horas de folga, daí sua influência para a música. Reconhecido como uma das grandes figuras da música brasileira, influenciador de compositores nacionais, tem a sua produção musical ecoando em grandes salas de concerto de todo o mundo. Como educador musical, foi o idealizador do canto orfeônico no Brasil, tanto em suas mega-apresentações como em seu denso trabalho de sistematização da educação musical e vocal (FUCCI AMATO, 2008).

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Em 1922, a Semana de Arte Moderna denunciou a situação das artes no Brasil, influenciada pelo conservadorismo europeu e segmentando em planos opostos a música do presente e a música do passado. A proposta da Semana de Arte Moderna trouxe novas maneiras de se entender o fazer artístico, redefinindo o ensino de arte, contestando todo aquele que não considerasse a expressão espontânea da criança. Nesse contexto surge a figura de Heitor Villa-Lobos, cuja música tem raízes na tradição folclórica (MARTINOFF, 2013).

Na década de 1930, o movimento orfeônico tornou-se mais visível em São Paulo e o projeto espalhou-se por todo o país. A instalação do canto orfeônico toma grande força com o apoio de Villa-Lobos (MONTI, 2008). Sendo muito bem-sucedido em seus primeiros empreendimentos nas concentrações orfeônicas paulistanas, em 1931, Heitor Villa-Lobos apresentou ao governo uma nova proposta para o ensino artístico/musical de crianças.

Chernavsky (2003) faz uma reflexão sobre o papel de Villa-Lobos no ensino de música no Brasil. Segundo esta autora, seu projeto não visava a uma reforma no sistema tradicional do ensino musical, como vinha sendo ministrado nas instituições especializadas do país. Tratava-se de uma proposta totalmente inovadora: transmitir conhecimentos musicais através de aulas de canto orfeônico, transformado em disciplina obrigatória em todas as escolas públicas, primárias e secundárias, do Distrito Federal. Atuando em todos os setores do ensino municipal, o canto orfeônico seria capaz de atingir um número muito maior de crianças e de famílias. E foi exatamente essa função prática assumida pelo canto orfeônico, servindo como meio propagador de mensagens de motivação nacional/ufanista, um dos principais motivos que levaram o governo, empenhado na construção de uma nova nação brasileira, a patrocinar esse projeto, transformando-o no maior investimento pelo qual o Brasil já passara em termos de educação musical e artística. Em 1932, o presidente Vargas assinou um decreto que tornava obrigatório o ensino de canto orfeônico nas escolas. Também neste ano foi criado o Curso de Pedagogia de Música e Canto Orfeônico e o Orfeão de Professores do Distrito Federal, ambos projetos de Heitor Villa-Lobos (CHERNAVSKY, 2003).

DICAS

Para conhecer um pouco mais a trajetória de Heitor Villa-Lobos, vale a pena assistir ao vídeo Lá vem História... Villa-Lobos. O endereço eletrônico é este: <https://youtu.be/98WNH2G_pCE>.

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TÓPICO 1 | EDUCAÇÃO MUSICAL

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5 PROPOSTAS EM EDUCAÇÃO MUSICAL DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX

5.1 RAYMOND MURRAY SCHAFER

Raymond Murray Schafer (1933-), nascido em Sárnia, Ontário (Canadá), é um importante compositor, escritor, educador musical e ambientalista. Seu trabalho é baseado na importância da educação auditiva de qualidade para o ensino básico. Schafer foi quem cunhou os termos “paisagem sonora” (soundscape) e clariaudiência (audição clara), para compreender o problema da poluição sonora em nossa paisagem mundial. Sua obra caracteriza-se por não ser linear e por ter uma grande preocupação com a criatividade e com a qualidade de vida no planeta, propondo uma ecologia acústica. Suas ideias foram a base para a criação do The World Forum for Acoustic Ecology (Fórum Mundial de Ecologia Acústica), que atualmente publica um noticiário chamado “Soundscape Newsletter” (notícias da paisagem sonora) e um Anuário com pesquisas a respeito desse tema (SCHAFER, 2001). Os pilares de sua teoria são a relação entre som e meio ambiente, a confluência das artes e a relação da arte com o sagrado.

Três eixos caracterizam o pensamento de Schafer e podem ser encontrados em sua produção: a relação som/ambiente, a confluência das artes e a relação da arte com o sagrado (FONTERRADA, 2011). O primeiro eixo, a relação entre som e meio ambiente, concentra o foco de atenção de Schafer e que para caracterizá-la criou a palavra soundscape, já citada anteriormente. Neste eixo é preciso destacar a mudança na relação entre homem e meio ambiente a partir da Revolução Industrial, da consequente maquinaria pesada, que provocaram e ainda provocam o aquecimento global, envenenamento dos rios, o desmatamento e tantos outros fenômenos. Em suas pesquisas, Schafer detectou esse desequilíbrio na paisagem sonora e tem desenvolvido trabalhos no campo da ecologia acústica. Ele critica a sociedade contemporânea por seu descuido com esse fenômeno (FONTERRADA, 2011).

O grande objetivo do trabalho de Schafer é aperfeiçoar os modos de apreensão do som pelo homem e fazer um trabalho de conscientização de seu impacto no ambiente. Neste processo, indivíduos e comunidades tornam-se cúmplices do processo de construção de campos sonoros adequados a cada um e à sociedade em que vivem. Em suas composições, Schafer inspira-se nos sons da natureza: de animais ou dos elementos (água, neve, fogo), como pode ser ouvido nas obras corais Miniwanka (1973), Snowforms (1985), Sun (1982) e Fire (1986), entre outras. Ele também se inspira em sons imaginados como em A garden of bells (1983), em que flores são substituídas por sinos, e vozes míticas das personagens Princesa das estrelas, Lobo e Inimigo dos três chifres em The Princess of the stars (1981), que foi escrita para ser realizada à beira de um lago, no meio da floresta (FONTERRADA, 2011).

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DICAS

Acadêmico! Para ter uma ideia das composições de Schafer, escute a obra Miniwanka (1973), descrita por Schafer como: “Ondas chicoteado em ressaca, atirando-se às pedras como os primeiros anfíbios vindos do mar. E embora ele possa ocasionalmente virar as costas para as ondas, ele nunca escapará de seu charme atávico. ‘O homem sábio se deleita na água’, diz Lao-tzu. Todas as estradas do homem levam à água. É a chave da paisagem sonora original e o som acima de todos os outros que nos dá o maior prazer em sua miríade de transformações”. O endereço eletrônico é este: <https://youtu.be/ViBbRM3gFnI>.

O segundo eixo, a confluência das artes, é um ideal cultivado por Schafer no novo gênero criado por ele, o Teatro de Confluência. Gênero em que várias linguagens artísticas interagem, sem que nenhuma delas tenha prioridade sobre as outras. Além dessa relação entre si, elas também se relacionam com o meio. O ambiente é parte essencial da obra, pois suas características incidem diretamente na qualidade sonora (FONTERRADA, 2011). O conceito de confluência das artes de Schafer aponta para a superação da fragmentação e desagregação através da arte, superando o excesso de especialização característico da sociedade ocidental desde o século XIX (SCHAFER, 2002).

O terceiro eixo da obra schaferiana é a relação entre a arte e o sagrado. Como aprofunda Fonterrada (2011, p. 280):

A compreensão da produção schaferiana só pode ser alcançada pela transcendência da apreensão intelectual do saber, pois o sentido do sagrado não é de caráter racional, mas holístico, e envolve todos os canais com os quais o homem conta para se apropriar do existente, construir, relacionar-se com o mundo e ser capaz de interpretá-lo, ao outro e a si mesmo. Refiro-me aos aspectos sensível, perceptivo, motor, afetivo, mental, social, espiritual, além do intelectual propriamente dito. O ser humano só terá acesso a essas dimensões por imersão, quando, então, o sentido do sagrado aflorará, pela experiência do vivido, num processo de reencantamento do mundo.

Para Schafer, a perda de valor do sagrado é responsável por muitos problemas vividos pelo homem contemporâneo que, por isso, perde a motivação para viver e se relacionar com o próximo e com o meio de maneira saudável. A arte tem o papel de recuperar esses valores perdidos, detém o poder de transformação (FONTERRADA, 2011).

Para Schafer, a educação auditiva contempla temas referentes ao estudo das paisagens sonoras, percepção auditiva, conscientização sonora, além da criação e apreciação de temas, históricos ou não, e ainda a classificação e manutenção dessas paisagens sonoras. Para ele, os estudos da paisagem estão interligados com as ciências, a sociedade e as artes. Dessa forma, com a acústica e a psicoacústica aprendemos as propriedades físicas do som e do modo pelo qual ele é interpretado pelo cérebro humano. Com a sociedade aprendemos como o homem se comporta

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com os sons e de que maneira estes afetam e modificam o seu comportamento. Com as artes e particularmente com a música, aprendemos de que modo o homem cria paisagens sonoras ideais para aquela outra vida que é a da imaginação e da reflexão psíquica. Com base nesses estudos, começamos a construir os fundamentos de uma nova interdisciplina – o projeto acústico (SCHAFER, 2001, p. 18).

Schafer afirma que a poluição sonora é resultado da desatenção para com a paisagem sonora mundial. No seu livro O ouvido pensante (1991), ele critica o método tradicional de ensino de música por não possibilitar uma educação total, consciente da paisagem sonora. O indivíduo precisa ter uma consciência ecológica do ambiente que o cerca, há uma surdez mundial relacionada à poluição sonora, aos níveis de ruídos elevados que prejudicam a audição e a atenção. Neste ponto, Schafer reforça que a alienação influencia a percepção de mundo e cria cidadãos passivos. Portanto, como você pode perceber, Schafer combate o modelo de sociedade em que vivemos após as revoluções industriais, que induz ao individualismo, à alienação e à repressão dos sentidos. Este é um dos grandes legados de Schafer para o ensino de música atualmente: a capacitação de indivíduos perceptivos e críticos da sociedade.

Schafer não propõe um método, mas uma formação musical que busca descobrir o potencial criativo das crianças e que alunos de qualquer idade estejam atentos aos sons do ambiente, que compreendam a paisagem sonora mundial como uma composição, em que o homem é seu principal compositor. Schafer preocupa-se com a melhoria da qualidade sonora do planeta e acredita que deve haver um ponto de confluência de todas as manifestações artísticas.

5.2 JOHN PAYNTER

John Paynter (1931-2010) nasceu em Londres (Inglaterra), é compositor e professor, dedicou-se ao ensino de música em escolas e colégios ingleses, propondo e defendendo um fazer musical criativo nas aulas de música, antes de ir para a Universidade de York. Seu pensamento fundamenta-se nas ideias educativas características do início do século XX, tendo como alicerce pedagógico os princípios de liberdade, descoberta e individualidade e, por outro, acompanha a revolução musical dos compositores de sua época (MATEIRO, 2011).

A proposta pedagógica de John Paynter está descrita, principalmente, em três livros: Sound and Silence (1970), Hear and Now (1972) e Sound and Structure (1999 [1992]). Nesses livros, Paynter esclarece que os exemplos de atividades musicais que ele apresenta não são um método a seguir, mas formas de pensar como fazer música. Sobre o ensino de música, Paynter ressalta que essa é uma área em que se deve evitar métodos, porque eles bloqueiam a criatividade. Paynter tinha como objetivo que suas propostas inspirassem o planejamento dos professores de música e outras áreas, para criar novas possibilidades e adaptação das atividades. Ele organizou essas experiências em projetos que podem ser utilizados sem sequência, com duração variando dependendo do grupo de estudantes e da complexidade das atividades, podendo ser realizados em três ou quatro semanas (MATEIRO, 2011).

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No livro Sound and Silence há 36 projetos relacionados às tendências da música do século XX. Os primeiros 24 projetos são para instrumentos, com temas como música e mistério, música e palavras, imagens na música, silêncio, música e drama, movimento e música, explorando instrumentos de corda, espaço e tempo, sons curtos e longos, explorando o piano, sons de palavras, notas, modos e sequências, música e números. Os outros projetos, direcionados a estudantes de 11 a 15 anos de idade, são propostas voltadas para a música vocal e para a criação melódica e harmônica, de forma progressiva. Essas atividades são consideradas como experimentos criativos de exploração dos vários aspectos da técnica harmônica. Neste livro, a criança é compreendida como um ser criativo nato e, por isso, estimulam a criatividade propondo atividades.

Hear and Now é um livro sobre a música contemporânea nas escolas, propõe aos professores fazer música durante as aulas, ultrapassando os limites da interpretação vocal e instrumental. Paynter (1972) mostra as possibilidades que a música contemporânea oferece para a educação musical de crianças e jovens. Destaca-se a imaginação, a ênfase no indivíduo e o material disponível como aspectos fundamentais no processo educacional em desenvolvimento durante o século XX.

O livro Sound and Structure apresenta 16 projetos organizados em quatro partes. A primeira explora os sons da música e compreende como funcionam. Depois vem a organização desses sons em ideias musicais. A terceira parte é dedicada à técnica, uma vez que as ideias exigem o desenvolvimento de meios de controle artístico. E, por fim, somando todas as etapas é possível produzir peças musicais completas, estruturando assim o tempo. O principal objetivo é a exploração de processos. Neste livro Paynter reforça a criatividade como a base para o currículo de música e sustenta que a música é uma arte criativa em todas as suas formas: composição (inventar), execução (interpretar) e audição (refazer a música dentro de nós mesmos).

Como já foi dito, Paynter não faz uma hierarquização de sua proposta pedagógica. Ele parte da técnica de composição e no desenvolvimento da capacidade criativa do indivíduo, educando os sentimentos e despertando a imaginação, para depois desenvolver técnicas e habilidades. Além disso, para ele também a escuta criativa (desprovida dos referenciais tradicionais), a integração da música com outras áreas artísticas e a composição e a introdução da música contemporânea nas escolas são essenciais à educação musical (MATEIRO, 2011).

5.3 HANS-JOACHIM KOELLREUTER

Hans-Joachim Koellreutter (1915-2005) nasceu em Freiburg, na Alemanha, no dia 2 de setembro de 1915, naturalizado brasileiro desde o início do século XX. Para ele, a música era um meio de comunicação, um veículo para a transmissão de ideias e pensamentos daquilo que foi pesquisado, descoberto ou inventado. Ele acreditava que a música transportaria para o novo, e esse deveria ser um importante objetivo da educação musical, da iniciação à profissionalização (TECA, 2015).

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O movimento Música Viva foi criado no Brasil em 1938, por H. J. Koellreuter, com suas primeiras realizações e atividades concretas acontecendo no ano seguinte. Assim, de 1939 até o fim da década de 40, aconteceu um movimento de renovação, que tinha como meta instaurar um novo meio musical, inicialmente no Rio de Janeiro e depois em São Paulo. É um movimento caracterizado pelo ineditismo de suas propostas na área cultural, atualidade no pensamento musical, a convergência com tendências estéticas, filosóficas e políticas de vanguarda internacional, dinamizando o ambiente da época. Os jovens compositores Cláudio Santoro, César Guerra-Peixe, Eunice Katunda e Edino Krieger, liderados por Koellreuter, são responsáveis pela primeira fase da composição atonal e dodecafônica da música brasileira, coube a eles a criação de uma nova perspectiva da produção musical ligada na concepção contemporânea da função social do artista. O movimento Música Viva gerou uma intensa dinâmica cultural, agregando um amplo conjunto de atividades promovidas: concertos, audições experimentais, conferências, cursos, programas de rádio, publicação de boletins e de partituras etc.; temas contemporâneos para reflexão e oportunidades instigadoras de debates. Essas iniciativas provocaram uma maior compreensão da arte, do músico e de seu papel na sociedade de sua época. Esse movimento foi concebido sob três enfoques: Educação (formação); Criação (composição) e Divulgação (interpretação, apresentações públicas, publicações, transmissões radiofônicas).

NOTA

Pode ser considerado um dos mais importantes professores de música do país. Foi criador do movimento musical “Música Viva”, e influenciou praticamente todos os músicos brasileiros de sua geração. Teve grande atuação em São Paulo e no Rio de Janeiro, e dinamizou as discussões sobre música no país através de debates, recitais, palestras, cursos, criações de escolas, publicações etc.

No campo da educação musical, Koellreutter mostrou-se um grande

pensador. Seu trabalho enfatiza aspectos sociais para descrever hábitos de audição e produção musical, se preocupa diretamente com o desenvolvimento de um tipo de audição de músicas baseadas no contexto social em que o aluno está envolvido.

Por ser um compositor contemporâneo, sua proposta de educação musical valoriza outros sistemas musicais, outros instrumentos não tradicionais e notações diferentes da tradição europeia dos últimos séculos. Para Koellreutter, o desenvolvimento da audição é uma possibilidade da ampliação de padrões sonoros, há o desenvolvimento de hábitos de audição que se formam especificamente antes dos hábitos de audição musical, estes últimos com características da presença de algum tipo de julgamento estético. O autor chega a apresentar uma série de atividades visando a tal desenvolvimento de hábitos de audição gerais.

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As atividades denominadas como jogos dialogais são possibilidades de audição direcionada a diversos aspectos e características sonoras em geral, bem como possibilidade de operar em um mundo especificamente através da operação de padrões sonoros. Dentro desse contexto é possível dizer que, no primeiro momento de sua abordagem metodológica, o objetivo está na audição, independentemente de serem elementos musicais ou não musicais.

É importante observar também que essa postura frente ao desenvolvimento de hábitos de audição oferece possibilidade de uma ação diretamente ligada à música contemporânea. Com isso, a proposta de Koellreutter escapa da crítica da alienação, mais que isso, o autor se constituiu, durante toda a segunda metade do século passado, em um dos principais críticos dessa alienação entre educação musical e música contemporânea, ou, em última instância, da música e sociedade contemporânea.

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Neste tópico vimos que:

• A educação musical, assim como a música, está inserida em seu tempo e espaço. Faz parte do processo histórico de desenvolvimento do conhecimento e deve ser vivenciada através de experiências enriquecedoras e criativas.

• O ensino de música tem como objetivos contribuir para a formação integral do ser humano, da construção do conhecimento com autonomia, responsabilidade individual e integração no coletivo.

• A educação musical deve também estimular a curiosidade, o ato de criar vínculos, o desenvolvimento do gosto pelas grandes manifestações musicais da história, da cultura do seu povo e do mundo, o conhecimento das estruturas fundamentais da linguagem musical.

• Há diversas propostas de aprendizagem musical que abordam diversas realidades, experiências e objetivos. Nenhuma proposta pode ser considerada como uma “receita pronta”, aplicável a qualquer contexto educativo musical. É preciso analisar a sua função no processo de formação musical dos indivíduos e o contexto deles.

• Os métodos ativos surgidos no século XX são sistematizações, elaboradas por músicos, que priorizam a experimentação antes do aprendizado da teoria.

• As propostas de ensino musical têm como características o trabalho com o corpo, o uso da voz, da criação e experiência musical, a escuta consciente e criativa a partir de diversas vivências.

• Dalcroze desenvolveu o Sistema Euritmia de treinamento musical. Este método tinha como objetivo criar, através do ritmo, uma corrente de comunicação rápida, regular e constante entre o cérebro e corpo para que o sentido rítmico se torne uma experiência corporal.

• Willems faz uma conexão entre a natureza humana, a música e a audição. Ele relaciona campos humanos (o sensorial, o afetivo e o mental) a elementos musicais (ritmo, melodia e harmonia). Na sua abordagem, propõe que toda criança pode ser preparada auditivamente para aprender a ouvir os materiais sonoros básicos que compõem a música e organizá-los com a experiência musical.

• A proposta de Orff combina música e dança, trabalhando com o ritmo da fala, atividades vocais e instrumentais em grupo, com ênfase na improvisação e na criação musical. Desenvolveu um instrumental próprio para a sua proposta.

RESUMO DO TÓPICO 1

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• A proposta de Kodály utiliza a música tradicional ou composta a partir dela e a ênfase está na prática vocal em grupo.

• Villa-Lobos propunha a transmissão de conhecimentos musicais através de aulas de canto orfeônico, transformado em disciplina obrigatória em todas as escolas públicas, primárias e secundárias.

• Schafer preocupa-se com a qualidade do ambiente sonoro. Sua proposta está baseada em três eixos: a relação som/ambiente, a confluência das artes e a relação da arte com o sagrado. Criou os termos “paisagem sonora” e “clariaudiência”.

• A proposta de Paynter está baseada nos princípios de liberdade, descoberta e individualidade. Suas propostas de ensino musical estimulam a criatividade e a adaptação.

• O trabalho de Koellreuter enfatiza aspectos sociais para descrever hábitos de audição e produção musical, se preocupa diretamente com o desenvolvimento de um tipo de audição de músicas baseadas no contexto social em que o aluno está envolvido.

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Mas será que é possível ensinar sem saber o que se está ensinando? Será que é possível ensinar sem saber como ensinar? Certamente que não. É indispensável articular o que e como para ensinar efetivamente, quer dizer, para desenvolver um verdadeiro processo educativo, compreendido não apenas como transmissão de conteúdos, mas como um processo de desenvolvimento das capacidades (habilidades, competências) do aluno, de modo que ele se torne capaz de apropriar-se significativamente de diferentes saberes e fazer uso pessoal destes em sua vida. Assim, longe de uma função menor, que pode caber a quem não sabe, o ensinar (no sentido verdadeiramente educativo acima colocado) constitui-se numa atividade bastante complexa, em que é preciso dar ao conteúdo que se ensina (o que) uma forma (como, o modo de ensinar) que viabilize um processo de ensino e aprendizagem significativo.

FONTE: PENNA, Maura. A função dos métodos e o papel do professor: em questão, “como” ensinar música. In.: Gisele Jordão; Renata R. Allucci, Sérgio Molina, Adriana Miritello Terahata. (Org.). A música na escola. 1ª ed., São Paulo: Allucci & Associados Comunicações, 2012, v. 1, p.13.

Com base nesta exposição e nas propostas de educação apresentadas neste tópico, numere a coluna da direita relacionando as propostas de educação e suas características apresentadas na coluna da esquerda:

AUTOATIVIDADE

(1) KOELLREUTER ( ) Há uma profunda conexão entre a natureza humana, a música e a audição.

(2) PAYNTER ( ) Utiliza de jogos que promovem o diálogo e a audição direcionada, de elementos musicais ou não musicais.

(3) VILLA-LOBOS ( ) Todo som começa com um movimento. O aprendizado ocorre em grupo e utiliza-se de materiais como bolas e arcos.

(4) SCHAFER ( ) Transmissão de conhecimentos musicais através do canto coletivo nas escolas.

(5) DALCROZE ( ) Adaptação do repertório de acordo com a realidade do país. Ênfase no canto coral.

(6) ORFF ( ) A proposta baseia-se na relação som/ambiente, na confluência das artes e na relação da arte com o sagrado.

(7) WILLEMS ( ) Não acredita na utilização de métodos da educação musical, a criatividade é a marca do processo de ensino.

(8) KODÁLY ( ) Utiliza um instrumental adequado à sua proposta e a palavra é substância rítmica e de articulação de frases e sílabas.

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TÓPICO 2

HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO MUSICAL NO BRASIL

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

O desenvolvimento da educação musical brasileira está ligado à história da própria cultura. Desde a descoberta do Brasil, em 1500, portugueses e espanhóis, ameríndios e africanos contribuíram para a formação da nossa cultura (OLIVEIRA, 1992). Nos três primeiros séculos, eles “trouxeram suas línguas e culturas, suas canções e suas danças” (AZEVEDO, 1950, p. 285). Há registros no Brasil de que, nos tempos da colonização, os jesuítas ensinavam música às crianças e jovens. Além de catequizar, o ensino de música se dava também como ferramenta de auxílio ao ensino da leitura e da matemática. Eles também ensinavam a utilização de instrumentos de corda e sopro. Desde o início a música foi considerada um instrumento de educação em diferentes situações no país (CÁRICOL, 2012).

No período colonial, a música esteve principalmente associada à conversão dos índios, com os jesuítas, nas escolas de ler, escrever e cantar, nas casas da Companhia e nos seminários, a partir de fins do século XVII (BINDER; CASTAGNA, 1996). O ensino institucionalizado de música no Brasil iniciou-se somente no período imperial, com o Conservatório do Rio de Janeiro, que, criado em 1841, somente entrou em funcionamento a partir de 1848 (BINDER; CASTAGNA, 1996).

O ensino de música foi inserido no currículo escolar brasileiro em instituições educacionais públicas com o Decreto Federal nº 331A, de 17 de novembro de 1854, que determinava o aprendizado básico de noções de música e exercícios de canto (CÁRICOL, 2012). Desse período em diante, o ensino de música sofreu avanços, desafios e retrocessos com a implantação de novos decretos, principalmente nas províncias de São Paulo e Rio de Janeiro, no século XIX.

Em São Paulo, o canto coral se tornou uma atividade obrigatória nas escolas públicas com a Reforma Rangel Pestana, pela Lei nº 81, de 6 de abril de 1887. O Decreto nº 981, de 8 de novembro de 1890, durante a Reforma Benjamin Constant, regulamentou a instituição primária e secundária e instituiu o ensino de elementos de música, que deveriam ser ministrados por professores especiais para a música admitidos em concurso (CÁRICOL, 2012).

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UNIDADE 3 | MÚSICA E EDUCAÇÃO

No Rio de Janeiro houve a reforma Fernando de Azevedo, promulgada pela Lei nº 3.281, de 23 de janeiro de 1928, que previa o ensino de música em todos os cursos seguindo o 1º Programa de Música Vocal e Instrumental, elaborado por músicos como Eulina de Nazareth, Sylvio Salina Garção Ribeiro e o maestro Francisco Braga. Porém, foi durante a Segunda República, nas décadas de 1910 e 1920, que houve as primeiras manifestações de um ensino mais organizado, caracterizado como canto orfeônico (CÁRICOL, 2012).

Um dos grandes incentivadores do ensino de música foi o compositor e maestro Heitor Villa-Lobos, que propôs a ideia de inserir aulas de canto e de instrumento para crianças e jovens nas escolas básicas da rede pública. Seu maior desafio foi a falta de profissionais no setor educacional de música, já precário naquele tempo, em razão da falta de instituições que os capacitassem a um ensino adequado de música (SILVA, 2014).

Em 1961, a Lei de Diretrizes e Bases (LDB), Lei nº 4.024/1961, instituiu que o ensino de música teria por objetivo um ensino democrático e acessível a toda a população. Nessa nova proposta foram utilizados vários métodos de grandes educadores musicais estrangeiros, como: Zoltán Kodály (da Hungria); Carl Orff (da Alemanha) e Edgar Willems (da Bélgica). E, em território nacional, foram referenciados os nomes de Antônio de Sá Pereira, Liddy Chiaffarelli, Gazzy de Sá e H. J. Koellreutter (alemão naturalizado brasileiro) (CÁRICOL, 2012). Já em 1971, o então presidente Médici promulgou a Lei nº 5.692/1971, que extinguiu a Educação Musical da grade curricular nacional, dando lugar à matéria de Educação Artística, que englobava os conteúdos de artes cênicas, artes plásticas, música e desenho, sem privilegiar qualquer um desses conteúdos (CÁRICOL, 2012). Porém, o que aconteceu é que os conteúdos de artes plásticas prevaleceram sobre os outros na sala de aula. Além disso, o ensino não obrigatório das artes tornou-a secundário.

Durante o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, em 1996, resgatou-se o status do ensino da arte como componente curricular obrigatório da Educação Básica, através da Lei nº 9.394/1996. Em 2008, um novo avanço veio com o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que decretou, em Lei nº 11.769/2008, o ensino de música como conteúdo obrigatório na grade curricular da educação brasileira. Neste ponto, o desafio volta a ser a qualificação do professor de Arte, capaz de trabalhar a música com conhecimento em sala de aula, de maneira proveitosa, visando aos desenvolvimentos: cognitivo, afetivo, motor e artístico-cultural dos alunos a partir da Educação Infantil (SILVA, 2014).

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TÓPICO 2 | HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO MUSICAL NO BRASIL

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2 PERÍODO JESUÍTICO

O principal objetivo da Companhia de Jesus, fundada por Ignácio de Loyola em 1540, era o de levar a palavra de Cristo aos pagãos das terras recém-descobertas, e em 1549, nove anos após sua criação oficial, o padre jesuíta Manuel da Nóbrega chegou às terras brasileiras, na Bahia, com a armada de Tomé de Souza, dando início à atuação dos jesuítas nas Américas (HOLLER, 2005). Os jesuítas trouxeram sua política de instrução – uma escola, uma igreja – e edificaram templos e colégios em diversas regiões da colônia, constituíram um sistema de educação e expandiram sua pedagogia através do uso do teatro, da música e das danças, com o objetivo de “atingir a inteligência das crianças e encontrar-lhes o caminho do coração” (AZEVEDO, 1943, p. 290).

Após a chegada ao Brasil em 1549, os jesuítas abriram as primeiras escolas e foram os primeiros professores de música do Brasil, sendo detentores do sistema educacional vigente na colônia (LOUREIRO, 2001, p. 43). Os jesuítas trouxeram práticas europeias musicais para a colônia. Usavam música para ensinar os índios o catecismo católico, traduzindo para o tupi as canções e hinos religiosos, ou através dos autos, monólogos musicados do século XVI (ALMEIDA, 1942, p. 286). Os nativos eram músicos natos que cantavam e dançavam em louvor aos deuses, durante a caça, a pesca e em comemorações: o nascimento, casamento, morte, vitórias alcançadas. A gravura aquarelada de Keller Leuzinger, de meados do século XIX, a seguir, mostra o interior de uma igreja no atual Estado do Amazonas e a importância da música na integração cultural.

FIGURA 77 – GRAVURA AQUARELADA DE KELLER LEUZINGER

FONTE: Fundação Biblioteca Nacional. Disponível em: <http://www.rhbn.com.br/uploads/ docs/images/images/DSH_2309%20RH%2044.jpg>. Acesso em: 6 ago. 2016.

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UNIDADE 3 | MÚSICA E EDUCAÇÃO

Efetivas técnicas de musicalização foram usadas pelos jesuítas para adaptar a prática da fé cristã ao contexto cultural dos índios e negros, formalizando o ensino de música para escravos (OLIVEIRA, 1992). Segundo Loureiro (2001, p. 45):

Ligada a ritual de magia, à religião, a música revelava-se através da expansão instintiva do som, da cadência rítmica, porém mostrava a simplicidade na melodia e nos instrumentos musicais. Sua aprendizagem ocorria através de suas práticas nos rituais e na comunicação com as divindades veneradas. Os padres jesuítas dela também se apropriaram. Trabalhando na catequese e aculturação dos indígenas, eles usaram a música para comunicar sua mensagem de fé, ao mesmo tempo em que buscavam uma aproximação com o habitante nativo.

Até a expulsão dos padres jesuítas, em 1759, a atuação da Companhia de Jesus foi intensa. Apesar de o principal motivo da vinda da Companhia de Jesus ter sido a catequese, os jesuítas também se dedicaram à educação da população dos centros urbanos que começavam a surgir (HOLLER, 2005). Os jesuítas na América portuguesa estabeleceram-se acompanhando a ocupação portuguesa: próximo ao litoral e a centros urbanos. No século XVI, alguns estabelecimentos surgiram em regiões isoladas, e mais tarde deram origem a centros urbanos, como os Colégios de São Paulo e do Rio de Janeiro. Nos séculos XVII e XVIII, os estabelecimentos maiores fixaram-se em centros já formados ou em formação, como os Colégios do Pará e de Maranhão, e os seminários (HOLLER, 2005). Segundo o mesmo autor, as aldeias também se formavam vinculadas a um colégio, e não eram muito distantes destes, e do contato com o homem branco.

Com o tempo, os colégios passaram a oferecer formação superior, além dos ensinamentos básicos de ler e escrever. Através dos colégios e seminários, com as suas bibliotecas, praticamente as únicas naquele tempo, os jesuítas estabeleceram no Brasil uma rede de ensino em uma época em que não existia imprensa, circulação de livros ou universidades. Além disso, ocupavam e defendiam áreas disputadas com a Espanha, e até o momento de sua expulsão os jesuítas haviam ocupado toda a costa do Brasil, desde Belém do Pará até Laguna, em Santa Catarina, e haviam também estabelecido aldeias no interior da Amazônia (HOLLER, 2005).

A importância atribuída à música na catequese fez com que ela integrasse o currículo das escolas de ler e escrever. No Seminário dos Órfãos, criado em 1759, os jesuítas ensinavam, além da gramática e do latim, música e cantochão, criando uma cartilha musical, denominada Artinha, usada pelos mestres nas aulas de iniciação musical, ao mesmo tempo em que se processava a alfabetização, datando dessa época o tratado do solfejo intitulado “Escola de Canto de Órgão”, do baiano Caetano de Melo de Jesus (LOUREIRO, 2011, p. 45).

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DICAS

Vale a pena assistir ao filme “A Missão” (1986), dirigido por Rolland Joffé, com roteiro de Robert Bolt. Baseado em fatos reais, este filme trata sobre os conflitos que envolveram os jesuítas, as Coroas ibéricas e com o papa, culminando na expulsão dos primeiros em meados do século XVIII. A trilha sonora é de Ennio Morricone.

A música foi amplamente utilizada na atuação dos jesuítas na América portuguesa. Eles perceberam que o uso do canto e de instrumentos era uma ferramenta eficiente na conversão de indígenas. A música exercia uma grande atração sobre os índios, como expressam diversos documentos dos cronistas da Companhia de Jesus (HOLLER, 2005).

A música que os jesuítas trouxeram era simples e singela, as linhas puras do cantochão, cujos acentos comoviam os indígenas. [...] Havia uma influência indefinível e instintiva que atuava sobre a sensibilidade grosseira dos índios, naqueles cantos e naqueles hinos que lhes pareciam vozes celestiais, alguma coisa de extático e sobrenatural (ALMEIDA, 1942, p. 285).

Embora a Companhia de Jesus tivesse surgido em meio ao espírito austero da Contrarreforma, e seus regulamentos fossem pouco propensos à prática musical, há referências à música em cerimônias religiosas e eventos profanos, realizada, sobretudo, por indígenas, em relatos logo depois da chegada dos jesuítas no Brasil até sua expulsão em 1759 (HOLLER, 2005).

Os jesuítas trabalhavam por uma formação integral do aluno, não concebendo a educação como uma simples transmissão de conhecimentos. Acreditavam que a educação deveria desenvolver aptidões e habilidades que capacitassem o homem para a vida do homem “branco”. Para tanto, o trabalho educacional era permeado pelo canto, tendo grande importância pedagógica para a missão educacional da organização, apesar do desafeto por esta arte (MONTI, 2011, p. 408).

Segundo Beyer (1994, p. 102), os jesuítas “trouxeram ao elemento indígena um repertório vigente naquela época na Europa. Ou seja, os jesuítas educaram os indígenas musicalmente para o desempenho musical destes nas missas”.

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UNIDADE 3 | MÚSICA E EDUCAÇÃO

Depois de 200 anos de atuação dos jesuítas na educação brasileira, as reformas implantadas pelo Marquês de Pombal, primeiro-ministro de Portugal de 1750 a 1777, os expulsou do Brasil, em 1759. Os padres da Companhia de Jesus tiveram praticamente todos os colégios fechados e os bens confiscados. Houve pouco enfoque ao ensino da música na educação escolar do modelo da reforma pombalina. A música passa a ser considerada um conhecimento específico, ministrado em conservatórios, em escolas confessionais especializadas e em aulas particulares ministradas nos lares (MONTI, 2008). “Essas formas de ensino de música preservam as marcas da tradição jesuítica, dessa forma, a música preserva a forte conotação religiosa, ligada às características e formas europeias, marcantes em toda a produção musical do período colonial” (LOUREIRO, 2011, p. 45-46). Neste contexto os músicos organizaram-se nas denominadas ‘irmandades’, já que não era grande o número de padres-músicos. Com isso, as irmandades assumiram a responsabilidade de difusão da música durante a segunda metade do século XVIII. Apenas com a vinda da família real portuguesa para o Brasil a música vai retomar um lugar na educação escolar, contando com o apoio de D. João VI (MONTI, 2008).

3 PERÍODO IMPERIAL

O ensino de música no século XIX está inserido em um período em que ocorrem diversos acontecimentos significativos que atingem nossos dias, como a criação do Imperial Conservatório de Música, que hoje deu origem à Escola de Música da UFRJ e muitos dos modelos de educação vigentes no país (FREIRE, 1996). Os primeiros teatros foram construídos e o processo de secularização das artes foi acelerado.

Neste período, o piano era moda e o ensino particular substituía a falta dos conservatórios (ALMEIDA, 1942, p. 336). Esta também foi a época das bandas e orquestras, quando surgiram as primeiras instituições e sociedades de música, como o Conservatório de Música, já citado anteriormente. Francisco Manuel da Silva, autor do Hino Nacional, colocou a responsabilidade da educação do músico brasileiro no governo ao organizar o Conservatório, que inicialmente foi financiado pelo fundo de loterias, pelo Decreto nº 238, de 27 de novembro de 1841, tornando-se subordinado à fiscalização do Ministro do Império em 1841 (OLIVEIRA, 1992, p. 36). De acordo com Oliveira (1992, p. 36), Carlos Gomes foi produto deste Conservatório, onde o Iirismo italiano predominava.

O ensino formal, no Rio de Janeiro oitocentista, tem sua ocorrência registrável, ao longo do século XIX, em estabelecimentos diversos – colégios de instrução geral, onde o ensino de música era também ministrado, como o Colégio Pedro II, criado em 1838; e estabelecimentos vocacionais, como o próprio Imperial Conservatório de Música, criado em 1841, e efetivamente instalado em 1848. O ensino informal, por sua vez, se processa, no mesmo período, através de aulas particulares, ministradas por pessoas nem sempre devidamente capacitadas, mas responsáveis por considerável “fatia” do ensino de música no século passado, e por músicos de reconhecida competência musical, como o padre José Maurício Nunes Garcia (FREIRE, 1996).

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Depois da Independência do Brasil, a vida musical diminuiu e, com o advento da República, o declínio se tornou ainda mais acentuado. O Conservatório tornou-se Instituto Nacional de Música: nomes como Henrique Oswald, Francisco Braga, Barroso Neto, Leopoldo Miguez foram projetados como compositores de estética internacionalista, e Alberto Nepomuceno e Alexandre Levy como uns dos primeiros nacionalistas (ANDRADE, 1965). Neste período, a educação musical acontecia nos conservatórios e era para poucos, porque o Conservatório não atendia à demanda da sociedade que crescia enormemente.

4 REPÚBLICA

Durante o período republicano, o Brasil passa por mudanças estruturais importantes na política e na administração pública. A partir da Proclamação da República (1889) é implantado um projeto de modernização da sociedade brasileira seguindo ideias liberais. Neste período, há a instalação de fábricas, construção de prédios públicos, modernização de avenidas, construção de estradas e muitas outras melhorias.

Também é nesse período que a sociedade brasileira percebe que, por meio da educação, os objetivos de modernização do país poderiam ser alcançados e consolidados (LIMA JÚNIOR, 2011). A escola passa a ter uma função específica, “é quando de fato o poder público assume a tarefa de organizar e manter integralmente as escolas”. (SAVIANI, 2004, p. 18).

Borges (2007) divide a República em dois momentos. O primeiro, antes de 1925, conhecido como “entusiasmo pela educação”, e o segundo, após este período, chamado “otimismo pedagógico”. Para este autor, no primeiro encontramos a base de cunho positivista advinda da Proclamação da República, onde a educação assume grande importância enquanto solução para todos os problemas nacionais. Ocorre um entusiasmo pela instrução das massas que, ignorantes, constituíam verdadeiro freio ao progresso nacional (CARVALHO, 1989). Há as primeiras tentativas de organizar-se um Orfeão no Brasil e onde acontece a separação entre educação pública e Igreja (FUCKS, 1991). É na primeira República que acontece o marco inicial da formação e construção da estrutura escolar no Brasil, sedimentando conceitos, práticas educacionais, ideologias, simbologias, programas e políticas educacionais (JARDIM, 2003, p.20). No ensino de música, neste período ocorre a sua determinação como disciplina, com carga horária, organização dos conteúdos, formas de avaliação, entre outras definições (JARDIM, 2003).

No segundo período, de 1925 em diante, ocorre o surgimento dos ideais escolanovistas, onde a transformação nacional dava lugar à tentativa de formar um novo homem (BORGES, 2007).

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UNIDADE 3 | MÚSICA E EDUCAÇÃO

A Escola Nova contrapôs o que era considerado “tradicional”. Pretendia a incorporação de toda a população infantil. Nesta proposta, o aluno assumia o centro dos processos de aquisição do conhecimento escolar, sendo a escrita imprescindível nas capacidades fundamentais para o indivíduo. O conhecimento era adquirido através da experiência, os alunos eram levados a observar fatos e objetos com o intuito de conhecê-los. As preocupações educacionais da década de 20 culminaram na elaboração do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, em 1932, assinado pelos principais expoentes do meio educacional brasileiro: Fernando de Azevedo, Anísio Teixeira, Roquette Pinto, Mario Casassanta, Cecília Meireles e vários outros. A educação nova deveria deixar de ser um privilégio determinado pela condição econômica e social do indivíduo, para assumir um “caráter biológico”. A educação deveria então reconhecer que todo o indivíduo teria o direito de ser educado até onde permitiam as suas aptidões naturais, independentemente de razões de ordem econômica e social. Pregavam ainda que a educação era uma função essencialmente pública, gratuita e necessitava da coeducação para tornar mais econômica a organização da obra escolar. Esse manifesto trabalhava com a perspectiva de que todos são iguais, diferenciando somente em suas capacidades cognitivas. Tudo isto dentro de uma realidade em que o governo populista de Getúlio Vargas pregava a necessidade de aumentar o número de escolas e de alunos matriculados.

NOTA

No governo de Getúlio Vargas (1930 a 1945 e 1951 a 1954), o Brasil passa por um período de consolidação dos ideais liberais e redefinição da educação. São realizadas duas reformas: Reforma Francisco Campos (1931) e Reforma Capanema (1942), que consolidam a estrutura educacional brasileira (LIMA JÚNIOR, 2009). Nesse período, o canto orfeônico ganhou o status de disciplina, inclusive no ensino secundário, e instrumento da política cultural e da construção da nacionalidade (LIMA JÚNIOR, 2009).

DICAS

Para se ter uma ideia melhor da produção de Villa-Lobos, é possível assistir às Meninas Cantoras de Petrópolis e Orquestra Sinfônica Brasileira apresentarem duas peças deste compositor: Canto do Pajé e Estela é Lua Nova, com arranjos de Jotinha de Moraes, no endereço: <https://youtu.be/tSVCmMA1AoQ>. Esta apresentação faz parte do Projeto Aquarius, dedicado a Villa-Lobos.

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Durante a Segunda República, inicia-se a discussão da primeira LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), que tramitou a partir de 1948 e foi promulgada em 1961 (Lei 4.024/61). Nesta mesma época surgem o Movimento de Cultura Popular em Pernambuco e o método Paulo Freire de alfabetização de adultos (BORGES, 2007). O país busca por mudanças, apoiadas na cultura popular e nos movimentos sociais. O grupo Música Viva, formado em 1938, lança um manifesto em 1946, em que defende um ensino ideologicamente engajado, não só musical:

MÚSICA VIVA, compreendendo que o artista é produto do meio e que a arte só pode florescer quando as forças produtivas tiverem atingido um certo nível de desenvolvimento, apoiará qualquer iniciativa em prol de uma educação não somente artística, como também ideológica, pois não há arte sem ideologia (MARIZ, 1999, p. 298).

Dessa maneira, o grupo coloca-se neste manifesto na vanguarda da produção musical brasileira, extrapolando o pensamento escolanovista. Porém, este ideal jamais se difundiria no regime autoritário imposto ao país após 1968 (BORGES, 2007).

4.1 CANTO ORFEÔNICO

O termo “orfeão” (orpheón) foi utilizado pela primeira vez em 1833 por Bouquillon-Wilhem, orientador do ensino de canto nas escolas de Paris. Este termo refere-se a Orfeu, poeta e músico, filho da musa Calíope e de Apolo. Segundo a mitologia grega, o deus Orfeu era o músico mais talentoso que já viveu. Quando tocava sua lira, os pássaros paravam de voar para escutá-lo e os animais selvagens perdiam o medo. As árvores se curvavam para pegar os sons no vento. O canto orfeônico tem suas origens na França, no início do século XIX, quando era uma atividade obrigatória nas escolas municipais de Paris. É um canto coletivo, em que se organizam conjuntos heterogêneos de vozes. A prática do canto orfeônico não exige conhecimento musical ou treinamento vocal prévio (CÁRICOL, 2012, p. 20).

No Brasil, o Canto Orfeônico está associado ao nome de Villa-Lobos, mas seu projeto educacional foi antecedido por outras atividades orfeônicas. O movimento orfeônico surgiu nos âmbitos da educação brasileira com tal nomenclatura desde o início do século XX, mais precisamente no ano de 1910 (GOLDEMBERG, 1995). Foram os educadores João Gomes Júnior e Carlos Alberto Gomes Cardim, que atuaram na Escola Caetano de Campos, na capital paulista, e os irmãos Lázaro e Fabiano Lozano, com atividades junto à Escola Complementar (posteriormente, Escola Normal) em Piracicaba, os primeiros a estabelecerem o canto orfeônico no ensino (CÁRICOL, 2012). “Mesmo que o ensino de Canto Orfeônico não tenha se expandido nas escolas brasileiras nas décadas de 1910 e 1920, o ensino de música nessa modalidade esteve presente nas três primeiras décadas do século XX”. (LEMOS, 2005, p. 2).

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UNIDADE 3 | MÚSICA E EDUCAÇÃO

O método de canto orfeônico tinha como objetivos a renovação da educação musical oferecida pelos conservatórios e popularização do saber musical por meio da inserção da música no sistema público de ensino. Essas iniciativas introduziram o canto orfeônico na sociedade e fortaleceram o projeto de Villa-Lobos que aconteceria nos anos seguintes (CÁRICOL, 2012).

Depois da década de 1920, o governo de São Paulo foi a favor do ensino de música, na modalidade orfeônica, nas escolas das redes públicas, com ênfase nas escolas primárias e normais. Já o ensino secundário só teve a música presente nos currículos escolares nos primeiros anos da década de 30 (MONTI, 2008).

Nesta época, o Brasil estava imerso no ideal nacionalista. O movimento modernista era uma corrente estética consolidada, que predominou no país até meados da década de 1940. Esse movimento, entre outras ideias, pregou a busca por uma identidade musical nacional, ao mesmo tempo em que as iniciativas de canto orfeônico de Villa-Lobos começavam a ser conhecidas em São Paulo, cidade onde o compositor se instalou após a chegada de uma temporada na Europa (CÁRICOL, 2012).

4.2. CANTO ORFEÔNICO E A REVOLUÇÃO DE 30

A Revolução de 1930 aconteceu em um contexto social e econômico de grande apreensão. Nessa época, o mundo passava por uma grande crise econômica que afetou o Brasil e suas exportações de café. O cenário político no país também era instável. Neste momento inicia-se a revolta militar, partindo do sul do Brasil, e Getúlio Vargas assume o poder em 3 de novembro de 1930. É nesse contexto da revolução de 1930 que a educação musical ganha importância política, segundo Loureiro (2003, p. 55):

O clima de nacionalismo dominante no país, a partir da revolução de 30, fez com que o ensino de música, em virtude de seu potencial formador, dentro de um processo de controle e persuasão social, crescesse em importância nas escolas, passando a ser considerado um dos principais veículos de exaltação da nacionalidade, o que veio a determinar sua difusão em todo o país.

Villa-Lobos realizou cerca de 50 apresentações em cidades do interior paulista. Nessas ocasiões aconteciam palestras, concertos instrumentais e corais com a participação da população local. Essas apresentações reuniram até 12 mil pessoas em uma única apresentação. Tais seções tinham a execução da música brasileira e repertório de cunho cívico-patriótico, seguindo os princípios de Villa-Lobos em usar o canto orfeônico como instrumento de educação cívica. Em 1932, essas apresentações foram repetidas na Capital Federal, congregando, como afirma Monti (2008), cerca de 40 mil vozes infantojuvenis escolares e mil instrumentistas das bandas de música. Com isso o movimento de Villa-Lobos passou a ser conhecido por Anísio Teixeira, então Secretário de Educação da cidade do Rio de Janeiro (CÁRICOL, 2012).

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Nesse período também teve início um plano de desenvolvimento da educação musical no Brasil com a criação, em 1932, da SEMA (Superintendência de Educação Musical e Artística), dirigida pelo músico e maestro Villa-Lobos de 1932 a 1941 (LIMA JUNIOR, 2011).

O canto orfeônico foi o maior movimento pedagógico musical da educação brasileira. O projeto orfeônico desenvolvido por Heitor Villa-Lobos foi adotado oficialmente no ensino público brasileiro, inicialmente no Distrito Federal, a partir do ano de 1932, e depois em todo o país. A implantação desse projeto aconteceu com o Decreto nº 19.890, assinado pelo presidente Getúlio Vargas, em 18 de abril de 1932, que tornou o canto orfeônico disciplina obrigatória nos currículos escolares nacionais por mais de três décadas (MONTI, 2011, p. 79).

É durante o período getulista que a educação musical ganha maior importância. O ensino de música na escola pública adquire uma importância política e social quando o regime getulista se utiliza do potencial que a música exerce sobre as pessoas, principalmente sobre as crianças, para justificar a grandeza e as mudanças realizadas pelo governo, mudanças essas que direcionam a economia brasileira de acordo com as pretensões do capital internacional (LIMA JUNIOR, 2011).

A partir de 1936, a SEMA passou a se chamar Serviço de Educação Musical e Artística do Departamento de Educação Complementar do Distrito Federal. Através dele, Villa-Lobos criou o Curso de Orientação e Aperfeiçoamento do Ensino de Música e Canto Orfeônico, com o objetivo principal de formar educadores para que fossem multiplicadores de suas práticas, e oferecia curso, aos professores das escolas primárias, de Declamação Rítmica e de Preparação ao ensino do Canto Orfeônico, e de Especializado de Música e Canto Orfeônico e de Prática de Canto Orfeônico, aos professores especializados (CÁRICOL, 2012).

O sucesso do projeto de Villa-Lobos dependia da profissionalização de professores capazes de disseminar seus métodos e sua ideia de música como fator de formação de caráter da juventude. Inicialmente essa tarefa ficou a cargo do SEMA, mas a necessidade de formação de professores especializados e também de uma coordenação para as atividades orfeônicas que foram crescendo pelo país deu origem ao Conservatório Nacional de Canto Orfeônico (CNCO), em 1942, entidade que Villa-Lobos dirigiu até a sua morte, em 1959 (CÁRICOL, 2012, p. 21). Na tabela abaixo é possível apreender algumas linhas gerais do movimento do Canto Orfeônico:

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UNIDADE 3 | MÚSICA E EDUCAÇÃO

FONTE: Besen (1991)

Com o fim do Estado Novo, em 1945, este movimento, que tinha um caráter nacionalista e cívico, gradualmente vai perdendo força. Há a diminuição da prática do canto nas escolas públicas e, por consequência, a educação musical passa a ser questionada (LIMA JÚNIOR, 2011).

O declínio do canto orfeônico nas escolas tem raízes mais profundas. A queda de Vargas e o fim do Estado Novo põem termo às manifestações de mobilização de massas típicas das ditaduras nazifascistas. [...] A presença de escolares em cerimônias públicas, cantando hinos e músicas que celebravam a grandeza do país, ajudava a criar a imagem de um povo saudável e disciplinado, de um povo unido em torno do projeto de reconstrução nacional conduzido pelo Estado Novo. O país se democratizava e para isso era necessário eliminar tudo aquilo que pudesse ser associado ao regime autoritário. Nesse processo, embora o canto orfeônico continuasse presente como disciplina, no currículo das escolas ele já não possuía a mesma importância (LOUREIRO, 2003, p. 63).

QUADRO 2 - IMPLANTAÇÃO DO CANTO ORFEÔNICO

Implantação do Canto Orfeônico

Villa-Lobos éoficialmente

convidado porAnísio Teixeira,

em 1932

- em cinco meses realiza 1ª apresentação pública;- divide os cursos de orientação e aperfeiçoamento do Ensino de Música e

Canto Orfeônico em quatro etapas:1) Curso de declamação rítmica2) Curso de preparação ao ensino do Canto Orfeônico3) Curso especializado de Música e Canto Orfeônico4) Curso de Prática de Canto Orfeônico;- cursos 1 e 2: professores de escola primária;- curso 3: professor especializado;- curso 4: caráter eminentemente prático - reuniões e estudos voltados aos

métodos de ensino, programas, análises.

Preocupações- preocupação com o texto;- fornecer subsídios para executar corretamente os hinos oficiais;- unificação nacional.

Outras iniciativas

- curso de Especialização de Música Instrumental: músicos de banda;- fichas individuais de avaliação: participação das famílias na avaliação da

influência do Canto Orfeônico nas atitudes dos alunos;- organiza cordão carnavalesco "Sôdade do Cordão".- faz apelo aos interventores nos estados mostrando vantagens do Canto

Orfeônico;- organiza Guia Prático em seis volumes;- divulgação no exterior do Canto Orfeônico;- 1941: afastamento para criação do Conservatório Nacional de Canto

Orfeônico, em 1942, hoje Instituto Villa-Lobos.

Atividadespráticas

a) Centro de Coordenação: reuniões semanaisb) Sabatinas Musicais: audição, participação de virtuoses etc.c) Centro de Pesquisas Musicais: pesquisar, reavivar obras etc.

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TÓPICO 2 | HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO MUSICAL NO BRASIL

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Villa-Lobos entendia que a música, através do trabalho com o canto orfeônico, era um elemento imprescindível à educação, pois reunia todos os elementos essenciais para a formação musical. O canto coletivo apresentava grande poder de socialização e integração da comunidade, além do aspecto educativo na formação moral e cívica da infância brasileira (CÁRICOL, 2012). Conforme afirma Cáricol (2012, p. 23):

O projeto de Villa-Lobos foi adotado oficialmente no ensino público brasileiro, em todo o território nacional, durante as décadas de 1930, 1940 e 1950 e foi posteriormente substituído pela disciplina Educação Musical, por meio da Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº 4.024, de 1961.

A movimentação do início dos anos 1960 foi interrompida pelo golpe militar de 1964, que, junto com um pacote de medidas políticas e econômicas, promove no campo da educação uma nova reforma educacional. A Lei nº 5.692/71 causou um grande impacto na organização didático-pedagógica e no funcionamento das escolas brasileiras. O canto orfeônico foi integrado à disciplina de Educação Artística e eliminou as poucas aulas de música que ainda havia na escola pública (LIMA JUNIOR, 2011).

5 DITADURA

A ditadura militar no Brasil teve início com o golpe militar de 31 de março de 1964, que afastou o Presidente da República, João Goulart, e em seu lugar tomou o poder o Marechal Castelo Branco. Durou até a eleição de Tancredo Neves, em 1985. O golpe foi justificado pelos militares na época com a alegação de que havia uma ameaça comunista no país. Após a tomada de poder pelos militares, foi estabelecido o AI-1 (Ato Institucional nº 1). Constituído por 11 artigos, permitia ao governo militar modificar a Constituição, anular mandatos legislativos, interromper direitos políticos por 10 anos e demitir, colocar em disponibilidade ou aposentar compulsoriamente qualquer pessoa que fosse contra a segurança do país, o regime democrático e a probidade da administração pública, além de determinar eleições indiretas para a Presidência da República.

Nesta época, a liberdade de expressão e de organização era quase inexistente. Dessa forma, partidos políticos, sindicatos, agremiações estudantis e outras organizações foram suprimidos ou tiveram interferência do governo. A censura reprimiu os meios de comunicação e as manifestações artísticas. A década de 1960 também foi um período de grandes transformações na economia do Brasil, de modernização da indústria e dos serviços, de concentração de renda, de abertura ao capital estrangeiro e do endividamento externo.

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UNIDADE 3 | MÚSICA E EDUCAÇÃO

Desde o período colonial até o início dos anos 1970, o ensino de música esteve presente na escola, tanto na escola pública quanto na escola privada. Em 1971, a Lei nº 5.692/71, promulgada pelo governo militar, retirou o ensino sistemático de música e das artes específicas do currículo da escola regular, com o sentido de garantir o processo de formação de mão de obra para a grande indústria que seria implantada no país nos anos seguintes (LIMA JÚNIOR, 2009). Esta lei reformou o ensino de 1º e 2º graus, a estrutura e organização do ensino, mas sem alterar os objetivos gerais da educação da Lei nº 4.024/61. A Lei nº 5.692/71 alterou os fins da lei anterior em termos de 1º e 2º graus, definindo como objetivo geral:

Art. 1º O ensino de 1º e 2º graus tem por objetivo geral proporcionar ao educando a formação necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de autorrealização, qualificação para o trabalho e preparo para o exercício consciente da cidadania (BRASIL, 1971, p. 59).

Essa continuidade nos objetivos é coerente com a continuidade da ordem socioeconômica, que exigiu rever os rumos de organizar e operar os serviços educacionais (SAVIANI, 1996). A Lei nº 5.692/71 estabeleceu uma educação tecnologicamente orientada, que buscava a profissionalização da criança na 7ª série, sendo a escola secundária completamente profissionalizante (BARBOSA, 1989). Para a autora Ana Mae Barbosa, “esta foi uma maneira de profissionalizar mão de obra barata para as companhias multinacionais que adquiriram grande poder econômico no país sob o regime da ditadura militar de 1964 a 1983” (BARBOSA, 1989, s/p.)

O ensino polivalente das artes afasta a prática musical das escolas, especialmente das escolas públicas (BORGES, 2007). Há o processo de sucateamento dos serviços prestados pelo Estado, incluindo a educação, em função do investimento em infraestrutura feito neste período com o objetivo de promover o “milagre econômico” (BORGES, 2007).

Os cursos de “Licenciatura Curta”, muito comuns na década de 1970, têm impacto na formação superior precária do educador musical, e com o direcionamento tecnicista da educação no período da ditadura militar, percebe-se a predominância do ensino das Artes Visuais, com foco acentuado no desenho industrial, e o afastamento das outras linguagens artísticas, como o teatro, a dança e a música, do currículo (MONTI, 2008). “Nesse período, a educação musical tornou-se privilégio de poucos, pois a maioria das escolas brasileiras aboliu o ensino de música dos currículos escolares devido à não obrigatoriedade da aula de música na grade curricular e à falta de profissionais da área” (MATEIRO, 2000, p. 2).

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6 EDUCAÇÃO MUSICAL NA CONTEMPORANEIDADE

Há um consenso entre educadores e outras pessoas envolvidas indiretamente com educação, em diversas áreas do conhecimento, de que o ensino de música “é um importante componente de conhecimento nos processos que potencializam o desenvolvimento do ser humano” (BELLOCHIO, 2000, p. 71), sendo assim um campo de conhecimento a ser trabalhado na escola, nas atividades docentes e nas estruturações do ensino.

Com a promulgação da nova Constituição, em 1988, houve a necessidade de uma nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que foi promulgada em 1996. A partir desta lei, a Lei 9.394/96, é que vemos o ressurgimento da atividade musical nas escolas enquanto componente curricular (BORGES, 2007). Sobre essa lei, Penna (2004, p. 23) comenta:

A atual LDB, estabelecendo que “o ensino da arte constituirá componente curricular obrigatório, nos diversos níveis da educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos” (Lei 9.394/96 – art. 26, parágrafo 2º), garante um espaço para a(s) arte(s) na escola, como já estabelecido em 1971, com a inclusão da Educação Artística no currículo pleno. E continuam a persistir a indefinição e ambiguidade que permitem a multiplicidade, uma vez que a expressão “ensino de arte” pode ter diferentes interpretações, sendo necessário defini-la com maior precisão.

Também os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), elaborados pelo Ministério da Educação como propostas pedagógicas, não contribuem para uma definição concreta sobre como a música deve ser trabalhada em sala de aula, e não definem se o professor de arte deve ter uma formação geral, com o conhecimento das várias linguagens artísticas, ou se deve ser especializado em uma só modalidade (teatro, dança, música ou artes visuais), conforme comentam Penna (2004) e Arroyo (2004).

Há, nos primeiros anos do século XXI, a ampliação do Ensino Fundamental para nove anos; a criação do FUNDEB (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica), que amplia o investimento federal na educação, e o processo de municipalização do Ensino Fundamental no Brasil. Determinando, desse modo, a necessidade de conquistar espaço para a Educação Musical nas redes municipais de ensino, além da inclusão da Educação Musical enquanto componente curricular obrigatório em todos os sistemas de ensino em nível nacional (BORGES, 2007).

Em um momento de retomada do ensino da música no currículo, o trabalho realizado pelo Canto Orfeônico, através do SEMA e do Conservatório Nacional de Canto Orfeônico, em termos de política pública para a Educação Musical, ainda se mostra uma referência, por ser o único modelo de política pública de ensino musical voltada para as massas. É possível perceber a importância da sustentação política a qualquer ação educacional para o êxito e continuidade das ações (BORGES, 2007).

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Neste tópico vimos que:

• No período colonial, o ensino de música era realizado pelos padres jesuítas em suas escolas, movido por objetivos ideológicos.

• Após a chegada ao Brasil dos jesuítas em 1549, foram abertas as primeiras escolas e os jesuítas foram os primeiros professores de música do Brasil, sendo detentores do sistema educacional vigente na Colônia.

• Com a expulsão dos jesuítas do Brasil, em 1759, as irmandades assumiram a responsabilidade de difusão da música durante a segunda metade do século XVIII. Apenas com a vinda da família real portuguesa para o Brasil a música vai retomar um lugar na educação escolar.

• O ensino de música no século XIX está inserido em um período em que ocorrem diversos acontecimentos significativos que atingem nossos dias, como a criação do Imperial Conservatório de Música (hoje Escola de Música da UFRJ) e modelos de educação vigentes.

• No século XIX, o ensino particular, nem sempre ministrado por pessoas devidamente capacitadas, substituiu a falta de conservatórios.

• Mesmo estando presente desde os jesuítas, é com o advento da República que o ensino de música na escola pública se torna uma ferramenta para a formação cívica do novo cidadão brasileiro.

• É na República que a sociedade brasileira percebe que, por meio da educação, os objetivos de modernização do país poderiam ser alcançados e consolidados. É neste período que ocorre a formação e construção da estrutura escolar no Brasil.

• No período da República, o canto orfeônico tinha como objetivos a renovação da educação musical oferecida pelos conservatórios e popularização do saber musical por meio da inserção da música no sistema público de ensino através de um forte caráter nacionalista.

• A partir da Lei 4.024/61, o canto orfeônico foi questionado quanto à sua importância para a formação do cidadão. Foi transformada em disciplina optativa para o ensino secundário e normal, ficando as aulas sujeitas à escola e aos estabelecimentos de ensino.

RESUMO DO TÓPICO 2

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• A ditadura militar teve grande impacto no campo da educação. A Lei nº 5.692/71 causou um grande impacto na organização didático-pedagógica e no funcionamento das escolas brasileiras. Entre as muitas mudanças ocorridas, o canto orfeônico foi integrado à disciplina de educação artística, indicando o objetivo de maior eficácia com economia de recursos.

• A Lei n° 9.394/96 permite o ressurgimento da atividade musical nas escolas enquanto componente curricular obrigatório.

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AUTOATIVIDADE

No Brasil, a educação musical passou por uma trajetória lenta e reformista, observando-se as mais diversas concepções referentes ao ensino da música. Por exemplo, com a queda do sistema republicano em 1930, instalou-se uma política educacional nacionalista e autoritária, que utilizou a música para desenvolver a “coletividade”, a “disciplina” e o “patriotismo”. É durante esse período que se dá a obrigatoriedade do ensino de música nas escolas primárias e secundárias (Decreto nº 19.891, de 11 de abril de 1931), refletindo um momento de transformação liderado por Villa-Lobos.

MATEIRO, Teresa. Educação Musical nas escolas brasileiras: retrospectiva histórica e tendências atuais. In: Revista Nupeart, v. 4, n. 4, set. 2006, p. 115.

A respeito do período da República e a educação musical, avalie as afirmações a seguir:

I – O canto orfeônico é um projeto educacional que surgiu na educação brasileira já no início do século XX, através de nomes como João Gomes Júnior e Carlos Alberto Gomes Cardim.

II – A importância da música, a partir da Revolução de 1930, teve um crescimento na sua importância devido ao seu caráter formador.

III – As movimentações ocorridas na educação musical durante o período da República permaneceram mesmo após o golpe militar de 1964.

Está correto o que se afirma em:

A) I e II, apenas.B) I e III, apenas.C) II e III, apenas.D) I, II e III.E) III apenas.

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TÓPICO 3

MÚSICA NA SALA DE AULA

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

A música possui uma forte relação com a cultura e ocupa um importante espaço no universo social, carregando significados, valores, usos e funções particulares que variam de acordo com o contexto de produção e assimilação (BLACKING, 1995; HOOD, 1971; MERRIAM, 1964; MYERS, 1992; NETTL, 1983; NETTL et al., 1997; QUEIROZ, 2004). Dessa forma, a música é um elemento importante e significativo da vida humana:

capaz de expressar características diversificadas da relação do homem consigo mesmo, com a natureza, com a sociedade e com a cultura. Nesse sentido, a música é um importante sistema de expressão cultural e artística com valor educativo particular, que a insere no processo de transmissão de conhecimento como linguagem diferenciada de outras formas de estruturação e (des) organização dos saberes (QUEIROZ; MARINHO, 2007, p. 70).

O ensino musical na escola não tem a intenção de formar um músico

profissional, assim como o ensino das ciências não visa à formação de cientistas. Para as educadoras musicais Hentschke e Del Ben (2003, p. 181), as funções da música no contexto escolar são:

[...] auxiliar crianças, adolescentes e jovens no processo de apropriação, transmissão e criação de práticas músico-culturais como parte da construção de sua cidadania. O objetivo primeiro da educação musical é facilitar o acesso à multiplicidade de manifestações musicais da nossa cultura, bem como possibilitar a compreensão de manifestações musicais de culturas mais distantes. Além disso, o trabalho com música envolve a construção de identidades culturais de nossas crianças, adolescentes e jovens e o desenvolvimento de habilidades interpessoais.Nesse sentido, é importante que a educação musical escolar, seja ela ministrada pelo professor unidocente ou pelo professor de artes e/ou música, tenha como propósito expandir o universo musical do aluno, isto é, proporcionar-lhe a vivência de manifestações musicais de diversos grupos sociais e culturais e de diferentes gêneros musicais dentro da nossa própria cultura.

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UNIDADE 3 | MÚSICA E EDUCAÇÃO

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Um dos mais importantes desafios neste início de século XXI é o de repensar os modelos vigentes em educação para preparar os estudantes para uma realidade totalmente diferente do que há 20 anos. Como aliar tecnologia, desenvolvimento sustentável, comprometimento solidário nas relações e os fundamentos imprescindíveis para o desenvolvimento humano amplo? A transformação da realidade global passa pela formação de cada indivíduo e, portanto, pelo fortalecimento da educação. Dessa forma, a educação musical, reincorporada ao ensino básico brasileiro, é uma ferramenta para alcançar esse objetivo. Permite o exercício de qualidades transversais a toda educação: cooperação, paciência, gentileza, relativização da competição, a escuta de si e do outro, entre outras. Essas qualidades são pertinentes a todas as disciplinas, porém, na música, elas são essenciais. A prática musical estimula a criatividade e exercita a liberdade com responsabilidade (MOLINA, 2012).

A educação musical, formal ou informal, pode possibilitar às crianças, aos jovens e adultos, requisitos importantes para a vida. Ela transcende os limites dos muros da escola e se insere no próprio contexto cultural onde está e pode contribuir para o desenvolvimento do indivíduo, estimular o estudo e a valorização de culturas regionais e globais. A música é uma linguagem que, através do significado e da relação com o contexto social em que está inserida, possibilita aos sujeitos a construção de múltiplos sentidos singulares e coletivos (MAHEIRIE, 2003).

Há diversos estudos nas áreas de educação musical, etnomusicologia, antropologia e educação em geral que enfatizam a importância da música para a sociedade, cultura e para o ensino (QUEIROZ; MARINHO, 2007). Para esses autores é preciso pensar em propostas de formação musical inseridas no universo cultural de cada sociedade e em espaços múltiplos de produção e transmissão de conhecimento. E é nas escolas de educação básica, o único espaço educacional verdadeiramente democrático, que se torna possível proporcionar a uma importante parcela da sociedade o ato de vivenciar, experimentar e compreender música (QUEIROZ; MARINHO, 2007).

“A música deve ser utilizada em várias etapas do processo de ensino e aprendizagem e organizada sempre de maneira lúdica, criativa, emotiva e cognitiva” (CORREIA, 2010, p. 139). De acordo com o Referencial Curricular (BRASIL, 1998, p. 48), “aprender música significa integrar experiências que envolvem a vivência, a percepção e a reflexão, encaminhando-as para níveis cada vez mais elaborados”. E ainda:

Deve ser considerado o aspecto da integração do trabalho musical às outras áreas, já que, por um lado, a música mantém contato estreito e direto com as demais linguagens expressivas (movimento, expressão cênica, artes visuais etc.), e, por outro, torna possível a realização de projetos integrados. (BRASIL, 1998, p. 49).

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As crianças não podem ser deixadas com seus próprios recursos, é preciso ensinar o maior número de recursos para que as crianças e jovens possam lidar com o maior número de possibilidades (ARENDT, 2001). É preciso possibilitar a experimentação de diversas situações no âmbito da escola para o desenvolvimento desses recursos e disponibilizar saberes acumulados pela humanidade. Dessa forma, a música, como conhecimento humano, deve ser disponibilizada, tanto como apreciação quanto pelo fazer musical, para crianças que chegam a um mundo musical, sonoro.

2 EDUCAÇÃO INFANTIL

A música na educação infantil tem seguido concepções pedagógicas que vigoraram no país por muito tempo. Ainda há resquícios de um ensino que utilizou a música, especialmente a canção, como suporte para a formação de hábitos e atitudes, disciplina, rotina, comemoração de datas diversas, entre outras funções. Os cantos eram, em sua maioria, acompanhados de gestos e movimentos mecânicos e estereotipados. A música aparecia nesse contexto como um meio para atingir objetivos extramusicais (BRITO, 2003).

De acordo com os documentos do Referencial Curricular para a Educação Infantil (RCNEI):

A música é a linguagem que se traduz em formas sonoras capazes de expressar e comunicar sensações, sentimentos e pensamentos, por meio da organização e relacionamento expressivo entre o som e o silêncio. A música está presente em todas as culturas, nas mais diversas situações: festas e comemorações, rituais religiosos, manifestações cívicas, políticas etc. (BRASIL, 1998, p. 45).

Através da brincadeira, as crianças interagem com os universos sonoros e têm a oportunidade de descobrir formas de fazer música. A partir da curiosidade a criança pesquisa materiais sonoros, inventa melodias e ouve com prazer a música de diferentes povos e lugares (JOLY, 2003). Nessa brincadeira, a criança começa a categorizar e a dar significado aos sons, agrupando-os para dar sentido a ela. Esse processo é o que a fará compreender os sons de sua cultura, começar a desenvolver uma identidade com a música à sua volta (MAFFIOLETTI, 2007). Essa é a razão pela qual a música assume significados diferentes em cada cultura:

[...] consideramos familiar aquele tipo de música que faz parte de nossa vivência, justamente porque o fazer parte de nossa vivência permite que nós nos familiarizemos com os seus princípios de organização sonora, o que torna uma música significativa para nós (PENNA, 2008, p. 21).

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Ao nos acostumarmos com esses padrões de organização, estabelecemos vínculos com as pessoas, costumes e tradições do local onde vivemos. O ensino de música nas escolas pode contribuir para esse processo de organização. É importante a criança se relacionar com a música também no ambiente escolar, em uma fase em que ela constrói saberes que serão utilizados por toda a vida.

Através da música, as crianças aprendem a se conhecer, conhecer os outros e a desenvolver a imaginação e criatividade. Como todos os dias as crianças, de alguma forma, entram em contato ou interagem com música, é preciso que a compreendam para criar vínculos com gêneros e estilos que tenham significado para elas. Mas aí surgem questões importantes: Como podemos trabalhar o ensino musical com crianças pequenas? Como aproximá-las desse universo, sensibilizando-as para que possam se apropriar desse conhecimento?

Segundo o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI) (1998), a vivência musical da criança deve acontecer através da prática e da percepção, em propostas como aprender, ouvir e cantar uma canção, participar de jogos de mão e brincadeiras de roda. Também o movimento corporal é importante:

O gesto e o movimento corporal estão ligados e conectados ao trabalho musical. Implica tanto em gesto como em movimento, porque o som é, também, gesto e movimento vibratório, e o corpo traduz em movimento os diferentes sons que percebe. Os movimentos de flexão, balanceio, torção, estiramento etc., e os de locomoção como andar, saltar, correr, saltitar, galopar etc., estabelecem relações diretas com os diferentes gestos sonoros. (BRASIL, 1998, p. 61).

O corpo em movimento colabora para o processo de ensino e aprendizagem musical. Atividades que envolvam a percepção e interiorização do ritmo, intensidade e altura, a forma musical e a expressividade das crianças são ótimas possibilidades. Dentro dessa perspectiva, vimos no Tópico 1 a proposta do educador musical Dalcroze. Sua prática musical conecta a escuta, a música e o movimento corporal.

O sistema Dalcroze parte do ser humano e do movimento corporal estático, ou em deslocamento, para chegar à compreensão, fruição, conscientização e expressão musicais. A música não é um objeto externo, mas pertence, ao mesmo tempo, ao [sic] fora e ao [sic] dentro do corpo. (FONTERRADA, 2005, p. 120).

O RCNEI também traz outra maneira de trabalhar o ensino musical com as crianças, através da apreciação musical. De acordo com Brasil (1998), a apreciação musical pode proporcionar a ampliação e o enriquecimento de conhecimentos musicais, além de ampliar o repertório das crianças. A escuta musical permite a discussão sobre a diversidade de instrumentos musicais existentes, suas maneiras de produção de som, formas de combinação em diversas formações instrumentais. Também se pode falar sobre as diferentes formas de trabalhar a voz, possibilidades, classificação, entre outros aspectos. De acordo com o RCNEI:

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TÓPICO 3 | MÚSICA NA SALA DE AULA

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A integração entre os aspectos sensíveis, afetivos, estéticos e cognitivos, assim como a promoção de integração e comunicação social, conferem caráter significativo à linguagem musical. É uma das formas importantes de expressão humana, o que por si só justifica sua presença no contexto da educação, de um modo geral, e na educação infantil, particularmente. (BRASIL, 1998, p. 45).

Todas essas características que a linguagem musical pode proporcionar através da aula de música justificam a sua presença na educação infantil. Para Guilherme (2006, p. 158), a música é um dos estímulos mais potentes para ativar os circuitos do cérebro na infância. Os estudos atuais apontam que a janela de oportunidade musical, ou a inteligência musical, abre-se aos três anos e começa a se fechar aos dez anos. Assim, essa faixa etária é o momento ideal para que ocorram os primeiros estudos musicais por meio do processo de musicalização com as crianças.

3 ENSINO FUNDAMENTAL

A atual Lei de Diretrizes e Bases estabelece que “o ensino da arte constituirá componente curricular obrigatório, nos diversos níveis da educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos” (Lei nº 9.394/96 – art. 26, parágrafo 2º). Ela garante um espaço para a arte (ou artes) na escola, como já estabelecido em 1971, com a inclusão da Educação Artística no currículo pleno. Mas há uma indefinição quando na lei é utilizada a expressão “ensino da arte”, que permite várias interpretações e necessita uma maior precisão. Na tentativa de diminuir as imprecisões foi aprovada a Lei nº 11.769, de agosto de 2008, que altera a LDB e determina o ensino de música como componente curricular obrigatório do ensino de arte (BRASIL, 2008).

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) para o Ensino Fundamental e Médio (BRASIL, 1999), elaborados pelo Ministério da Educação (MEC), orientam oficialmente a prática pedagógica e têm sido utilizados pelo Ministério da Educação como referência para a avaliação das escolas. Os PCN do Ensino Fundamental são subdivididos em dois conjuntos de documentos: um para 1º e 2º ciclos (1º ao 5º ano), outro para o 3º e 4º ciclos (6º ao 9º ano). Para a área de Arte são propostas quatro modalidades artísticas: artes visuais, música, teatro e dança. Segundo os PCN (Arte, Introdução, 1998: 19):

[...] as oportunidades de aprendizagem de arte, dentro e fora da escola, mobilizam a expressão e a comunicação pessoal e ampliam a formação do estudante como cidadão, principalmente por intensificar as relações dos indivíduos tanto com seu mundo interior como com o exterior.

Mas não há indicações claras de como realizar essas modalidades, ficando a cargo da escola quais linguagens artísticas trabalhar, quando e de que forma (PENNA, 2001). Apesar de não apresentarem o detalhamento necessário, os parâmetros têm uma concepção aberta de música, contemplando a diversidade de manifestações musicais em todos os campos de produção: erudito, popular,

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da mídia. Incentivando a integração da vivência musical do aluno no processo pedagógico, ampliando (PENNA, 2004).

Dessa forma, os Parâmetros Curriculares Nacionais especificam o que é “desejável para o ensino de música, mas nem eles nem a LDB garantem a sua presença na escola” (PENNA, 2004, p. 26). A autora reforça a importância desses documentos normativos como orientação oficial para a ação pedagógica na educação básica.

Nos dias atuais, poucas escolas incluem a disciplina Música no seu currículo, e as práticas realizadas, muitas vezes, não levam em consideração a realidade do aluno, distanciando-o do prazer do fazer musical (LOUREIRO, 2003). Para Loureiro (2003), é necessário ter uma ideia clara e concreta do ensino de música como um veículo de conhecimento e contribuir com uma visão intercultural frente à homogeneização da cultura global. Para ela (LOUREIRO, 2003, p. 104):

O ensino da música como disciplina inserida no currículo da escola fundamental apresenta-se hoje como uma área de conhecimento onde a diversidade de funções e a variedade de abordagens impedem a construção de uma prática educativa democrática, abrangente e formativa. Diante da realidade brasileira, a educação musical em nível de ensino fundamental não apresenta uma característica própria, um direcionamento que lhe dê a identidade de saber escolar, com possibilidades de acesso irrestrito à prática musical, onde se articulam experiências adquiridas tanto fora quanto dentro do sistema escolar de ensino.

Esses são problemas peculiares do momento atual. Propõem-se diferentes práticas musicais com o objetivo de amenizar as necessidades pedagógicas musicais em um campo com diversas concepções de conhecimento e de mundo. Falta uma sistematização do ensino de música nas escolas de ensino fundamental. A música é uma prática social, uma linguagem artística. Nela estão contidos valores e significados atribuídos às pessoas e à sociedade. Koellreutter (1998, p. 41) acredita que:

No tocante à música na sociedade moderna – ou melhor, no tocante à educação pela música, a mais importante implicação desta tese é a tarefa de despertar, na mente dos jovens, a consciência da interdependência de sentimento e racionalidade, de tecnologia e estética. No fundo, isto significa desenvolver a capacidade do ser humano para um raciocínio globalizante e integrador.

A educação musical no ensino regular deve ser ampla e contemplar as diversas possibilidades dentro do fazer musical. Deve-se ter objetivos ligados à sensibilização do estudante para o mundo à sua volta, para capacitar para a percepção, criação e desenvolver suas potencialidades (LOURO; ALONSO; ANDRADE, 2006). Para Del-Ben e Hentschke (2003), a música no contexto dos anos iniciais deveria ser a base de toda a educação, pois é fonte de estímulos, equilíbrio e felicidade para a criança. Sobre a música no contexto escolar, Ongaro e Silva (2006, p. 2) afirmam:

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A expressão musical desempenha importante papel na vida recreativa de toda criança, ao mesmo tempo em que desenvolve sua criatividade, promove autodisciplina e desperta a consciência rítmica e estética. A música também cria um terreno favorável para a imaginação quando desperta as faculdades criadoras de cada um. A educação pela música proporciona uma educação profunda e total.

O ensino de música deve envolver atividades variadas e explorar diversas possibilidades. A aprendizagem será mais significativa se envolver tarefas de apreciação, a execução e a criação. A escola pode realizar um ensino de música que esteja ao alcance de todos, democratizar o acesso à arte, realizar a tarefa de renovação, reconstrução em práticas pedagógicas musicais de qualidade e significativas. O verdadeiro objetivo do ensino musical nas escolas de ensino fundamental é levar o aluno a gostar, ouvir, apreciar e compreender a música.

4 ENSINO MÉDIO

O currículo do Ensino Médio tem uma base nacional comum e uma parte diversificada. A música está incluída na área “Linguagens, Códigos e suas Tecnologias”, que integra a base comum. A proposta para Arte dos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio é bem mais resumida e geral que a dos PCN para o Ensino Fundamental, englobando artes visuais, música, teatro, dança e artes audiovisuais. Dessa forma, os Parâmetros para o Ensino Médio estabelecem potencialmente um espaço para música dentro do conteúdo curricular “Arte”, e sua efetivação depende da decisão pedagógica de cada escola (PENNA, 2002). Os Parâmetros pretendem uma “continuidade aos conhecimentos de arte desenvolvidos na educação infantil e fundamental em música, artes visuais, dança e teatro, ampliando saberes para outras manifestações, como as artes audiovisuais” (BRASIL, 1999, p. 169). Como analisa Penna (2004, p. 24), “a proposta do Ensino Médio mantém a multiplicidade interna da área”, mas sem maiores definições e encaminhamentos.

Dentro dessa perspectiva, o professor de Arte tem bastante liberdade para o planejamento de suas aulas, já que poucas redes de ensino têm propostas curriculares ou conteúdos programáticos para a área de arte ou para as linguagens específicas (PENNA, 2002). Segundo a autora, quando essas propostas existem, são aplicadas irregularmente ou vigoram por pouco tempo.

Como Del-Ben (2012) reflete, tratar de educação musical no Ensino Médio nos exige, de um lado pensar sobre os jovens e suas relações tanto com a música quanto com a escola e, de outro, sobre a escola que queremos e que podemos construir para esses jovens. Há na vida dos jovens a grande presença da música. Essa presença se realiza através de diferentes práticas musicais e diferentes modos de se relacionar com a música em um contexto das culturas juvenis, da multiplicidade de dimensões que transcendem os aspectos sonoros musicais, como relações de gênero, classe, etnia e religião. Essa complexidade não é exclusiva dos jovens, mas é neles que se torna mais visível e onde a escola parece

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perder mais o sentido. Como observa Arroyo (2007, p. 33): “Aquele adolescente e jovem totalmente submisso aos adultos e à escola deu lugar a uma juventude que tem imposto seus modos de ser, suas necessidades e desejos. Para dar conta dessa nova maneira de ser da juventude, a escola deve mudar”.

Por causa desta necessidade de mudança, houve a reforma do Ensino Médio na década de 1990. Para Dagmar Zibas (2005), o contexto da época e o atual justificam uma reforma, tendo em vista o grande aumento de matrículas e, assim, maior diversidade dos alunos; o novo contexto produtivo torna necessária a formação com base em novos conhecimentos e competências; a exigência de conhecimentos e valores para a construção de uma cidadania democrática, o que exige da escola a “leitura desse mundo” e também a exigência de aproximação entre currículo e cultura juvenil. Porém, essa reforma não foi alcançada, ficando no papel (KUENZER, 2010). Essa constatação também é feita por Dayrell (2007, p.1116-1117):

Apesar de várias iniciativas do poder público, não houve ainda uma adequação da estrutura escolar a esta nova realidade. Salvo algumas exceções, principalmente no âmbito das redes de ensino municipais de algumas cidades brasileiras, a estrutura da escola pública, incluindo a própria infraestrutura oferecida, e os projetos político-pedagógicos ainda dominantes em grande parte das escolas, não respondem aos desafios que estão postos para a educação dessa parcela da juventude. Se a escola se abriu para receber um novo público, ela ainda não se redefiniu internamente, não se reestruturou a ponto de criar pontos de diálogo com os sujeitos e sua realidade.

Essas críticas à escola são, muitas vezes, transpostas para o ensino de música e as experiências de aprendizagem em música que a escola organiza para os jovens estudantes. Isso ajuda a entender e refletir os sentidos da própria escola e do aprender/ensinar música na escola. Para Basabe e Colls (2010), ensinar envolve um processo de comunicação, dedicação e cuidado em relação ao aluno, pelo o que ele pode chegar a ser. Nesse sentido, o parecer do Conselho Nacional de Educação sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica, aprovado em 7 de abril de 2010, sustenta que:

O professor da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental é, ou deveria ser, um especialista em infância; os professores dos anos finais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, conforme vem defendendo Miguel Arroyo (2000), devem ser especialistas em adolescência e juventude, isto é, condutores e educadores responsáveis, em sentido mais amplo, por esses sujeitos e pela qualidade de sua relação com o mundo. (BRASIL, CNE/CEB, 2010, p. 54-55).

Isso sem deixar de lado os conhecimentos que caracterizam os componentes curriculares, como a música. É preciso construir uma escola jovem, para jovens e com a participação deles. Uma escola que atenda aos anseios, necessidades e interesses da juventude (DEL-BEN, 2012).

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TÓPICO 3 | MÚSICA NA SALA DE AULA

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5 ESPAÇOS ALTERNATIVOSA escola é considerada responsável pelo processo educativo, está

encarregada da tarefa de educar (SOUZA, 2001). Porém, na educação musical percebe-se que este processo não está mais restrito à sala de aula. Dentro desta perspectiva, Souza (2001, p. 85) reflete que:

Crianças e jovens talvez “aprendam” música, hoje, mais em seus ambientes extraescolares do que na escola propriamente dita, pois não há dúvida de que é possível aprender e ensinar música sem os procedimentos tradicionais a que todos nós provavelmente fomos submetidos.

Em qualquer prática musical estão implícitos o ensino e a aprendizagem, nenhuma prática é melhor que a outra, mas deve ser considerado o seu contexto de construção e ação. O campo da educação musical vai além dos cenários escolares e acadêmicos (ARROYO, 2002). Michel Bozon (2000), um sociólogo francês, ao estudar instituições musicais (escola de música, fanfarra, orquestra), destacou seu caráter social: a sociabilidade trazida pelas relações entre as pessoas que tocam juntas e o processo de diferenciação entre grupos de músicos. As práticas musicais

constituem um dos domínios onde as diferenças sociais ordenam-se da maneira mais clássica e marcante, mesmo se os agentes, mais seguido e constantemente que em outros campos, se recusem a admitir que a hierarquia interna da prática é uma hierarquia social (ORTIZ, 1994, p. 147).

A prática musical envolve mais que executar, improvisar, compor, arranjar, ouvir, dançar, entre outras ações. Deve-se considerar que a prática musical envolve vários aspectos, como: produtores das ações, o que é produzido, como e por que, e todo o contexto social e cultural. Segundo Blacking (1992, p. 305):

O fazer musical e um senso de musicalidade das pessoas são resultado da interação interpessoal com ao menos três conjuntos de variáveis: sons ordenados simbolicamente, instituições sociais e uma seleção de capacidades cognitivas e sensório-motoras disponíveis do corpo humano.

A música aparece no espaço escolar de várias formas. Em determinados contextos, os grupos vocais e instrumentais assumem o papel da socialização, disciplina e ampliação de experiências musicais. Assim, “as bandas e fanfarras constituem elementos importantes na forma escolar e podem ser analisadas como derivações do ensino de música na escola” (CAMPOS, 2008, p. 103). É preciso considerar, neste ponto, o processo de escolarização: conjunto de normas e relação com o conhecimento.

Para Vincent, Lahire e Thin (1994), a forma escolar é marcada por relações impessoais: aquele que ensina, aquele que aprende, aquele que administra, aquele que executa – e pela determinação de tempo e espaço específicos: um espaço fechado e ordenado. Para Campos (2008, p. 104), as atividades ligadas à música podem contribuir para o reforço dos limites entre o “mundo da escola” e o “mundo fora da escola”.

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UNIDADE 3 | MÚSICA E EDUCAÇÃO

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5.1 ESCOLAS DE MÚSICA

Somente no século XIX, em 1841, pela iniciativa de Francisco Manuel da Silva, foi criado o primeiro Conservatório no país – o Imperial Conservatório, como já vimos no Tópico 2. Segundo Freire (1992), mesmo com as modificações que foram introduzidas no seu currículo até a sua transformação na atual Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro, as inovações mantiveram-se fundamentadas em um paradigma tradicional, priorizando-se o repertório europeu dos séculos XVIII e XIX (ESPERIDIÃO, 2002).

No século XX, a educação musical em foco na sociedade ocidental era a acadêmica/escolar, isto é, a educação musical que acontecia nos conservatórios e nas escolas. A compreensão do ensino e da aprendizagem musical baseava-se em uma lógica cartesiana e positivista, e o que deveria ser ensinado e aprendido permaneceu, assim como em séculos anteriores, na música da tradição europeia dos XVIII e XIX (ARROYO, 2003).

Hoje, como sabemos, o processo educativo em música não acontece

somente nas instituições escolares. As tarefas de ensinar e aprender música não são exclusividade da escola regular. Crianças e jovens têm a possibilidade de aprender música em ambientes como as escolas de música, com muito mais frequência, inclusive. Conforme Penna (2002, p. 17), as escolas especializadas, de qualquer tipo, são:

Um espaço de atuação que mantém o valor da prática musical em si, tendo correntemente como referência a música erudita e práticas pedagógicas de caráter técnico profissionalizante. Assim, as escolas especializadas “confirmam” uma concepção de música e de prática pedagógica que não é compatível com as exigências desafiadoras das escolas públicas de Ensino Fundamental e Médio, sendo certamente mais “atraentes e protetoras” do que o espaço de trabalho da escola regular, com seus inúmeros desafios.

O ambiente da escola de música é um espaço que atende a uma demanda

considerável de alunos, e as várias opções de aula de instrumento que podem ser encontradas nessas escolas possibilitam a convivência entre guitarristas, violonistas, cantores, percussionistas, disc-jóqueis (DJs) e violinistas, entre outros, gerando também atividades organizadas de integração, tais como apresentações, cursos, concursos e formação de bandas com alunos e professores de diversos níveis, do iniciante até os que atuam profissionalmente.

São abordados nas aulas variados estilos de música, como vocal, instrumental, eletrônica, rock, erudita, MPB, samba, música tradicionalista gaúcha, entre outros (LEME; BELLOCHIO, 2014). Nas escolas de música os professores são legitimados por sua atuação como músicos. As escolas de música, segundo Requião (2000, p. 98):

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Não precisam atender a regimentos externos e instrumentos oficiais, como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) e os documentos dela decorrentes, assim como não são controladas por nenhuma agência estatal ou religiosa. Já as instituições oficiais de ensino, como as Instituições de Ensino Superior (IES), estão submetidas às determinações do Ministério da Educação (MEC) e têm o reconhecimento legal dos diplomas e certificados por elas conferidos, uma vez atendidas as determinações daquele órgão.

A educação musical realizada em conservatórios ainda hoje é predominantemente tecnicista: compete ao estudante adquirir as habilidades necessárias para a execução instrumental, sem grandes preocupações com uma educação musical que contemple o indivíduo como um ser atuante, reflexivo, sensível e criativo. O professor deve transmitir saberes e a prática instrumental é priorizada (ESPERIDIÃO, 2002).

5.2 BANDAS E FANFARRAS

Muitas instituições de ensino musical seguem o modelo conservatorial de ensino: com professor e aluno como principal meio para o aprendizado. Em contraposição, o ensino coletivo de instrumentos musicais utiliza a metodologia de interação social entre os indivíduos. Esta metodologia de ensino musical ainda é recente no Brasil. Consiste em ministrar aulas para vários alunos ao mesmo tempo, de maneira multidisciplinar. Como multidisciplinar queremos dizer que, além do conhecimento instrumental, há saberes como teoria musical, percepção musical, história da música, improvisação e composição (NASCIMENTO, 2006).

Cabe aqui, antes de tudo, definir e distinguir os universos de bandas e fanfarras. As fanfarras são vistas como um tipo de banda, mais simples, composta apenas por instrumentos de metal simples (cornetas) e de percussão (o ponto de destaque da fanfarra):

Dois são os instrumentos básicos para a composição instrumental de uma fanfarra. A corneta e o tambor. Com o decorrer dos tempos, foram aperfeiçoados, a corneta em forma, tonalidade e material de fabricação, o tambor em forma, dimensão e material de fabricação (SACCO, 1982, p. 6).

A tradição das bandas de música remonta à época do Brasil Colônia. No século XIX, as bandas estavam presentes em praticamente todos os eventos sociais, sacros e profanos, militares e civis, e no século XX transformaram-se em uma das mais populares manifestações da cultura nacional. Atualmente, são um centro gerador de vasto repertório de diversos gêneros, como chorinhos, marchas e dobrados, no qual se formam diversos músicos profissionais e amadores (PIRES, 2008).

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Segundo Binder (2006), a banda é um conjunto musical formado por instrumentos de sopro e percussão, e sua instrumentação moderna começou a estruturar-se quando as charamelas e dulcianas (instrumentos medievais de sopro) foram substituídas por oboés e fagotes, durante o reinado de Luís XIV (1638-1715), por Jean-Baptiste Lully (1632-1687). As bandas atuavam nas cortes e nas igrejas e não tinham a conotação de conjunto popular, como têm atualmente (BINDER, 2006).

No século XVIII surgiu no Brasil o primeiro grupo musical que se aproximava de uma banda: segundo Diniz (2007), era uma “banda primitiva”, formada por escravos obrigados por seus senhores a aprender novos ofícios. Essa banda recebia a denominação de “barbeiros”, porque a profissão de barbeiro era a única a permitir tempo vago para aprendizagem de outros trabalhos, e tocavam fandangos, dobrados e quadrilhas em festas religiosas e profanas (DINIZ, 2007).

Para Campos (2008, p. 107), as experiências proporcionadas por uma banda de música vão além do aprendizado musical: “vínculos são formados a partir da relação que os participantes estabelecem uns com os outros e com a música”. Segundo Pereira (2003), a banda de música no Brasil é onde, em muitos casos, se concretiza a convivência sociocultural mais efetiva, além das atividades musicais. Nessa perspectiva:

[...] há um movimento mundial de crescimento e de reavaliação e revalorização da importância da educação musical, da aprendizagem do instrumento musical e da prática instrumental coletiva, onde a banda de música é inserida como uma das principais práticas alternativas.[…] No Brasil, elas se tornaram, em muitos locais, o único espaço da cidade em que o ensino musical e instrumental é desenvolvido, a única possibilidade de acesso e conhecimento para a maioria da população à música instrumental; somando-se a isso, as apresentações e performances ao vivo, processo bastante raro nos dias de hoje. (PEREIRA, 2003, p. 68- 69).

Mas, sobre o ensino musical, o que acontece em muitos casos é que ele fica diluído na urgência das apresentações e do repertório. Pereira (2003), ao abordar as bandas brasileiras, aponta que os ensaios nem sempre são utilizados de forma pedagógica, limitando-se à repetição da leitura/execução das músicas, sem correção ou apresentação de objetivos, apenas para preparação de repertório. Campos (2008) assinala que:

[...] é fundamental ressaltar que o trabalho desenvolvido pelos regentes ou mestres de bandas contribui muito para o enriquecimento de experiências e conhecimentos musicais, mesmo que estes estejam diretamente ligados à prática instrumental e à execução de um repertório voltado para apresentações públicas. Nesse aspecto, não é raro o regente estabelecer suas próprias representações para favorecer a compreensão do que deva ser executado (CAMPOS, 2008, p. 6).

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Tourinho (2007) ressalta que no ensino coletivo há o compartilhamento de conhecimento, espaço, e a interação e a diferença são partes importantes do aprendizado. Para a autora, o ensino coletivo é a transposição inata de comportamento humano de observação e imitação para o aprendizado musical. A autora ainda apresenta princípios da metodologia de ensino coletivo, fazendo uma comparação com a metodologia individual:

Acreditar que todos podem aprender a tocar um instrumento; acreditar que todos aprendem com todos; o ritmo da aula, que deve ser planejada, direcionada para o grupo, exigindo do estudante disciplina, assiduidade e concentração; o planejamento é feito para o grupo, levando-se em conta as habilidades individuais de cada um; autonomia e decisão; o ensino coletivo elimina os horários vagos (TOURINHO, 2007, p. 2-3).

Segundo Ortins, Cruvinel e Leão (2004, p. 51), o ensino coletivo, além de oferecer habilidades físicas, mentais, intelectuais e emocionais, “também pode favorecer os sentidos de socialização, responsabilidade e solidariedade, volta-se para questões que colaboram para a boa formação do ser humano, que é a vivência em grupo”.

Nascimento (2006, p. 3) reforça a importância da metodologia do ensino coletivo de instrumentos musicais, diferenciando essa metodologia do modelo conservatorial. No ensino coletivo prevalece a interação social entre os participantes. As bandas de música e fanfarras cumprem importante papel na inserção de crianças, jovens e adultos no conhecimento musical. São espaços privilegiados da prática da metodologia do ensino coletivo, a fim de contribuírem com uma aprendizagem mais autônoma e para a democratização do ensino musical (BRITO, 2014).

6 REPERTÓRIO MUSICAL

A diversidade musical está presente nas escolas. Diferentes expressões musicais fazem parte do cotidiano do universo escolar. Elas vêm na bagagem cultural do aluno e através das suas experiências sociais. A música está presente no dia a dia: na televisão, rádio, internet, na brincadeira com os amigos, entre outras formas. Dessa maneira, todos formam uma relação com essa expressão cultural. Dentro deste contexto, o professor precisa lidar com suas vertentes da diversidade cultural: a primeira está relacionada ao universo musical trazido pelos alunos e a segunda com a inserção, na prática escolar, de músicas de diferentes contextos culturais (QUEIROZ, 2011). Para Sekeff (2007, p. 20):

O fazer musical não é o mesmo nos diversos momentos da história da humanidade ou nos diferentes povos, pois são diferenciados os princípios de organização dos sons. E esse aspecto dinâmico da música é essencial para que possamos compreendê-la em toda a sua riqueza e complexidade.

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Para Queiroz (2011), a música que os alunos ouvem em casa e compartilham em suas relações sociais deve ter lugar garantido na prática docente, já que permite a exploração de aspectos como sonoridade, timbre dos instrumentos, formas de cantar, padrões rítmicos, entre outros. Assim como é imprescindível a inserção de músicas de outros contextos culturais que ampliam e/ou transformam o universo musical do aluno, ao permitirem a incorporação de estéticas e experiências musicais variadas. Nessa categoria podem ser incluídas, inclusive, as músicas locais que não são veiculadas na mídia e que, às vezes, são desconhecidas pelos estudantes (QUEIROZ, 2011).

O contato com diferentes músicas do mundo e contextos podem abrir portas e possibilitar uma visão de mundo mais aberta, flexível e de respeito com o outro, desvencilhando-se de atitudes e impressões preconcebidas. Almeida e Pucci (2015, p. 21) sinalizam que:

A busca por vivenciar a pluralidade musical implica em procurar entender a multiplicidade de expressões que une povos, mas que também pode provocar conflitos. Ainda hoje se percebe uma relutância em se aproximar do desconhecido e de expressões culturais de outros povos. As diferentes manifestações culturais nas quais a música está inserida não podem ser consideradas isoladamente, pois dizem respeito aos processos sociais que nem sempre são fáceis de ser compreendidos em um primeiro momento.

É preciso possibilitar aos alunos conhecer outras músicas para que, a

seu critério, o aluno (re)signifique, amplie e transforme a sua própria música. Mas é importante destacar que considerar a diversidade é reconhecer que todas as músicas são legítimas, sem hierarquia de valor. As diversas músicas devem conviver democraticamente na sala de aula, promovendo o diálogo, trabalhando as diferenças, os valores e significados que fazem parte de cada expressão musical (QUEIROZ, 2011).

Ao lidar com diversas expressões culturais, a educação musical cumpre os objetivos previstos nos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997; 1998): desenvolver práticas integradas com os temas transversais, contemplar a “pluralidade cultural” de múltiplos contextos sociais; compreender diferentes expressões culturais (do bairro, da cidade, do estado, da região, do país e do mundo), além de contemplar também a pesquisa e descoberta de diversificados aspectos musicais de distintas culturas (instrumentos, ritmos, melodias, estéticas vocais) e conhecer e vivenciar a diversidade do patrimônio cultural imaterial do mundo, caracterizado pela música de diferentes etnias (QUEIROZ; MARINHO, 2009). Para Merriam (1967), todas as pessoas, não importando em que cultura estão inseridas, devem ser capazes de localizar a música no contexto de suas crenças, experiências e atividades, pois sem isso a música não pode existir. Mas como equilibrar o conhecimento dos diversos gêneros musicais dentro da escola com a demanda com a mídia de massa e as preferências dos estudantes? Eco (2004) analisa a situação:

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De fato, o rádio pôs à disposição de milhões de ouvintes um repertório musical ao qual, até bem pouco tempo, só se podia ter acesso em determinadas ocasiões. Daí a expansão da cultura musical nas classes médias e populares, [...] por outro lado, o rádio – nisso ajudado pelo disco –, pondo à disposição de todos uma enorme quantidade de música já “confeccionada” e pronta para o consumo imediato [...] inflacionou a audição musical, habituando o público a aceitar a música como complemento sonoro das suas atividades caseiras, com total prejuízo de uma audição atenta e criticamente sensível, levando, enfim, a um hábito da música como coluna sonora da jornada, material de uso, que atua mais sobre os reflexos, sobre o sistema nervoso, do que sobre a imaginação e a inteligência (ECO, 2004, p. 317).

A exposição a esse repertório domestica a escuta, convertendo em uma audição musical passiva, sem atenção, homogeneizando o gosto e ampliação do consumo (PENNA, 2008). “Há um paradoxo sem precedentes, desde o século XX: ouvimos muito mais música que antes, mas esta apresenta apenas a função decorativa” (HARNONCOURT, 1998, p. 13). Porém, essa música de consumo, de massa, pode ser um caminho para estreitar as relações dos estudantes com outros gêneros musicais.

Queiroz (2011) faz um alerta sobre o ato de reproduzir músicas “exóticas”, desprovidas de valor simbólico para os alunos. O conhecimento musical passa pelo interesse da música de sua cultura e de culturas alheias (LUNSQUIST; SZEGO, 1998). Para contemplar a diversidade musical é preciso planejar, elaborar e realizar atividades de interpretação, apreciação e criação musical. É preciso expandir os conhecimentos dos estudantes, reconhecendo suas vivências, anseios e as suas (inter) relações com a música. Reconhecer a diferença e perceber que não existe uma única música ou sistema musical.

LEITURA COMPLEMENTAR

MÚSICA NA ESCOLA: UMA EXPERIÊNCIA DE (COM) FIAR

Adriana Miritello Terahata

Quando o ensino de música voltou a ser obrigatório no Brasil e sua efetiva realização definida para agosto de 2011, nos deparamos com uma inquietante pergunta: qual o sentido da música na escola?

Lançamo-nos ao desafio de tentar respondê-la reunindo profissionais da

área de música e da educação que também se sentiram desafiados e, em uma atitude generosa, decidiram compartilhar seus pensamentos e fazeres.

A experiência de ouvir estes diferentes educadores, músicos, educadores musicais; de perguntar, pensar juntos sobre a obrigatoriedade do ensino de música nas escolas brasileiras, remeteu-me ao trabalho das fiandeiras. Ao fiar e desfiar fios constituindo um tecido... Nossa vivência também foi de fiar, de (com) fiar!

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O tecido é produto de uma tensão – a urdidura e a trama – na educação, a referência e o movimento, respectivamente. Tecemos a educação nesta tensão de uma relação assimétrica entre adulto-jovem. Tecer os fios da educação requer paciência, assim como Penélope que tecia o manto à espera de Ulisses, trabalho interminável. A educação como um tecido, uma trama feita por múltiplos fios que vão, a cada segundo, conferindo uma nova textura, um novo desenho.

A educação passa pela questão de ser, de se tornar humano. Educar, portanto, não se restringe a determinados assuntos, muito menos em abordar temas específicos ou em ser estabelecido como um processo realizado de modo fixo, tampouco a ser realizado, apenas, por instituições específicas.

É nesta perspectiva que revisitei o que foi dito e escrito sobre a música na escola ao longo deste projeto, apontando, de alguma forma, as possibilidades e desafios que foram apresentados.

Se, como afirma Carvalho (2007, p. 21), em conformidade com o pensamento de Hannah Arendt, o papel do professor é ensinar: iniciação deliberada e sistemática nas linguagens, procedimentos e valores referentes tanto à sua área de conhecimento quanto à cultura e aos valores da escola, qual o papel do educador de música? Quem é ele? Qual sua formação?

Outro aspecto a ser considerado é que também existem, como lembra o autor (2007, p. 20), várias instituições formativas e maneiras de acolher os novos, no entanto, em cada caso variam-se os procedimentos e os objetivos.

Nesse sentido, ensinar na “escola de música” é diferente de se ensinar na “escola convencional”, onde a matéria música irá conviver com todas as outras que já fazem parte do currículo educacional. Como será esta convivência? Defendemos uma inter-relação profunda e significativa, isto é, que todos os fazeres educacionais dialoguem entre si para um conhecer melhor o mundo, para melhor estar no mundo.

Vou me valer de uma afirmação de Hannah Arendt em seu texto Sobre a

Educação para fomentar tais reflexões:

A educação é o ponto em que decidimos se amamos o mundo o bastante para assumirmos a responsabilidade por ele, e, com tal gesto, salvá-lo da ruína que seria inevitável não fosse a renovação e a vinda dos novos e dos jovens. A educação é, também, onde decidimos se amamos nossas crianças o bastante para não expulsá-las de nosso mundo e abandoná-las aos seus próprios recursos e tampouco arrancar de suas mãos a oportunidade de empreender alguma coisa nova e imprevista para nós, preparando-as em vez disso com antecedência para a tarefa de renovar o mundo comum (2001, p. 247).

Acredito que nesse inquietante pensamento de Hannah Arendt residem alguns aspectos fundamentais de serem pensados ao se propor o ensino de música nas escolas.

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Ao nos indagarmos se amamos o mundo o bastante..., pergunto: a que mundo estamos nos referindo? E, no mesmo sentido: de que criança estamos falando?

Pensar a educação é nos debruçarmos amorosamente sobre essas questões e, por se tratar de uma relação de se ensinar e se aprender, respondermos, de alguma forma, a elas: que mundo queremos apresentar para as crianças e que crianças queremos educar?

Hannah Arendt (2001) afirma que não podemos deixar as crianças entregues aos seus próprios recursos, isto é, temos responsabilidade em ensinar o maior número possível de recursos para que as crianças tenham condições de lidar com o maior número de possibilidades. Isto não significa dizer que “doutrinaremos” os pequenos prevendo situações e simulando reações, mas implica dizer que as crianças, ao experimentarem uma diversidade de situações no âmbito protegido da escola, poderão desenvolver tais recursos.

Isto também significa pôr à disposição das crianças os saberes acumulados pela humanidade, fazê-las circular dentro do discurso corrente e, talvez o mais importante, ouvir atenciosamente os sentidos atribuídos a tais experiências.

No mesmo sentido, nesse projeto, um discurso comum a todos os colaboradores foi a defesa de um mundo mais solidário, ético e a educação de crianças autônomas e que consigam, ao longo de sua trajetória educacional, construir e constituir uma rica variedade de recursos para lidar com a diversidade do mundo.

A partir do exposto, considero que a música como conhecimento humano tem que ser disponibilizada, tanto como apreciação quanto pelo fazer musical, para os pequenos que chegam ao mundo, aliás, eles chegam a um mundo musical, sonoro.

Considerando que conhecer o mundo também é saber da necessidade que ele tem do novo, o fazer do educador não poderá ser construído sem respeito ao jovem, que o traz consigo. Daí se reconhecer a necessidade de diálogo, de escuta mútua. Todos devem falar e ouvir, com a liberdade e o espaço que seus papéis demandam e permitem, daí a necessidade de uma educação aberta ao diálogo.

Este texto também tem essa perspectiva de abertura, por se completar na maneira de ler, de ser acolhido pelo leitor que se sentir desafiado a pensar o ensino de música a partir desse ponto de vista: ele só será possível se percebido como direito fundamental de todas as crianças e jovens. Ele só será possível em um ensino sem preconceito e discriminação.

Para tanto, acredito que as ações coletivas devam ser priorizadas e norteadas por princípios como tolerância, respeito e, principalmente, pelo diálogo em vez de ações que mantenham a lógica vigente do consumo e do isolamento.

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No entanto, essas ações coletivas não devem ser confundidas com homogeneização dos envolvidos. É importante respeitar a individualidade de cada pessoa e cada ação ser estudada, analisada e efetivada considerando a pluralidade presente.

Nas relações ensino-aprendizagem, o que percebemos é que concepções preestabelecidas determinam o melhor jeito de ser e agir do outro, as melhores intervenções. Não necessariamente elas estão equivocadas, porém temos que atentar à necessidade de abertura ao diálogo, relação que não pressupõe superioridade por nenhuma das partes, uma vez que se torna possível rever posições já que o outro é considerado.

Como defendo a implantação de uma rotina para crianças e jovens, tanto no que se refere aos combinados organizacionais quanto aos combinados éticos, também defendo para os adultos – educadores – um tempo-espaço para reflexão sobre a ação com crianças e jovens.

Um passo importante é construir, junto com os diferentes parceiros, na perspectiva de uma rede de proteção à criança e ao adolescente, um projeto educacional que rompa com a ‘aplicação’ dos guias para educadores. Esse projeto requer objetivos comuns que possam servir como indicadores para uma avaliação constante da própria prática.

Um grande desafio a ser superado diz respeito ao espaço que a música ganhará na escola: qual música ensinar? Como ensinar? E a qualificação do educador que assumirá esta responsabilidade?

Acredito que a educação é, antes de qualquer coisa, uma atitude ética, generosa de uns com outros. É necessário compartilhar, lançar-se aos desafios cotidianos do fazer, não sob a arrogância acadêmica, cientificamente correta, com a postura do saber mais, de ter encontrado verdades, mas com o compromisso do pensar sobre, uma ciência engajada, comprometida. É preciso permanecer e continuar se debruçando atenciosamente sobre estas questões (ou algumas delas).

Termino a costura do texto, porque essa se faz necessária, mas a prática reflexiva sobre o trabalho com música para e com crianças e jovens, a partir dessas experiências, deve continuar...

Optei por trazer, de forma sintética, um pouco do pensamento das pessoas que (com) fiaram e, dessa forma, abriram a possibilidade de compartilhar experiências, tendo em vista que compartilho e vivencio muitas das angústias vividas por aqueles que por aqui passaram...

Reconheço que os fios que teceram essa trama estão fundamentados na admiração e respeito pelas pessoas que acolheram esta proposta e com quem convivi ao longo do último ano. É pautada nesses valores, bem como na defesa de uma educação significativa, que me pus à disposição.

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A palavra respeito permeou todas as possibilidades de ensino de música: pela diversidade de repertório, de métodos, de tempo e espaço para acontecerem. Dessa forma, a responsabilidade ética deste projeto foi de se assentar em uma relação de respeito, como deveria se dar toda e qualquer proposta educativa. Respeito traduzido em uma escuta atenta, honestidade nas opiniões, em resumo, em uma abertura ao outro.

Uma grande amiga me ensinou que uma sociedade de confiança é uma comunidade de solidariedade, de projeto comum, de intercâmbio, de uma liberdade criativa que conhece seus deveres e limites, em suma, sua responsabilidade.

Assumir minha responsabilidade pelo mundo se traduz agora em compartilhar este trabalho com todos aqueles que também queiram tecer o bem comum, que se disponham a (com) fiar. Ao vislumbrar a trama que se formou, espero ter encontrado alguns fios que possam guiar aqueles que pretendem enfrentar o desafio de amar o mundo educando crianças e jovens a partir das reflexões que esse texto suscitou e, de forma respeitosa, usando as palavras de Mia Couto (2003, p. 16), peço licença.

É que em todo lado, mesmo no invisível, há uma porta.Longe ou perto, não somos donos mas simples convidados.

A vida, por respeito, requer constante licença.

REFERÊNCIAS

ARENDT, H. Entre o passado e o futuro. Trad. Mauro W. Barbosa de Almeida. 5ª ed. São Paulo: Perspectiva, 2001. CARVALHO, J. S. F. A Crise na educação como crise da modernidade. In: Educação especial: biblioteca do professor – Hannah Arendt pensa a educação. Nº 4, Ed. Segmento, 2007.

COUTO, M. Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.

FONTE: TERAHATA, Adriana Miritello. Música na escola: uma experiência de (com) fiar. In: Gisele Jordão; Renata R. Allucci, Sérgio Molina, Adriana Miritello Terahata. (Org.). A música na escola. 1ª ed., São Paulo: Allucci & Associados Comunicações, 2012, v. 1, p. 42-45.

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Neste tópico vimos que:

• A música está intimamente ligada com a cultura e ocupa um importante espaço no universo social. Possui valores, significados, usos e funções, que variam conforme o contexto de produção e assimilação.

• O objetivo do ensino musical não é formar um músico profissional e, sim, permitir a apropriação, transmissão e criação de práticas musicais no processo de construção da cidadania. Promover a construção de identidades culturais e desenvolver habilidades interpessoais.

• A música deve ser utilizada em várias etapas do processo de ensino e precisa ser organizada de forma lúdica, criativa, emotiva e cognitiva. Deve integrar experiências de vivência, percepção e reflexão.

• Na educação infantil é através da brincadeira que as crianças interagem com os universos sonoros e descobrem formas de fazer música. Através da brincadeira, a criança compreende os sons de sua cultura e desenvolve uma identidade com a música à sua volta.

• A vivência musical da criança deve acontecer através da prática, da percepção, dos jogos e do movimento. A apreciação musical também é uma forma de trabalhar música com as crianças, já que permite a ampliação e o enriquecimento de conhecimentos musicais.

• O ensino de música na educação básica ainda está em processo de consolidação. E ele, na escola fundamental, é uma área de conhecimento com uma diversidade de funções e variedade de abordagens.

• A educação musical no ensino regular deve sensibilizar o estudante para o mundo à sua volta, capacitar para a percepção, criação e desenvolver seu potencial. Deve envolver atividades variadas e explorar diversas possibilidades.

• O ensino de arte e música tem bastante liberdade nas aulas do Ensino Médio. A música está muito presente na vida dos jovens e envolve diferentes práticas musicais, modos de se relacionar, relações de gênero, classe, etnia e religião. O ensino de música deve contemplar essa diversidade e se aproximar dos anseios dos jovens.

• Escola não é a única responsável pelo ensino musical. Qualquer prática musical possui o processo de ensino e aprendizagem, que varia conforme o contexto e finalidade.

RESUMO DO TÓPICO 3

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• A prática musical envolve: executar, improvisar, compor, arranjar, ouvir, dançar, entre outros aspectos. Deve-se levar em consideração também quem produz música, o que produz, como, por que e em que contexto social e cultural isso ocorre.

• A educação em conservatórios e escolas de música enfatiza a execução instrumental em uma visão tecnicista, que remonta aos estabelecimentos de educação musical do século XIX.

• O ensino coletivo em música permite a interação social, a inserção de crianças, jovens e adultos no conhecimento musical. Possibilita a autonomia e a democratização do ensino musical.

• A diversidade cultural deve ser contemplada nas aulas. Ela permite contemplar as diferentes bagagens e contextos culturais dos estudantes, assim como é essencial para a ampliação de repertórios e ideias, através do respeito e do diálogo.

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AUTOATIVIDADE

O termo “Educação Musical” abrange muito mais do que a iniciação musical formal, isto é, é educação musical aquela introdução ao estudo formal da música e todo o processo acadêmico que o segue, incluindo a graduação e pós-graduação; é educação musical o ensino e aprendizagem instrumental e outros focos; é educação musical o ensino e aprendizagem informal de música. Desse modo, o termo abrange todas as situações que envolvam ensino e/ou aprendizagem de música, seja no âmbito dos sistemas escolares e acadêmicos, seja fora deles.

FONTE: ARROYO, Margarete. Educação musical na contemporaneidade. In: II Seminário Nacional de Pesquisa em Música da UFG, 2002, Goiânia. Anais do II Seminário Nacional de Pesquisa em Música da UFG, 2002. p. 18-29.

Levando em consideração todas as instâncias da educação musical estudadas neste tópico, assinale a alternativa CORRETA:

a ( ) A aprendizagem em música está ligada exclusivamente ao ambiente escolar. Nele há sistematização de conteúdos e saberes de uma forma que nenhum outro contexto realiza.

b( ) O ensino coletivo pode dificultar a socialização, o desenvolvimento de responsabilidades e a solidariedade. Estimula o individualismo e a competição.

c ( ) A educação musical está completamente inserida no ambiente escolar e, atualmente, sua presença como componente curricular é indiscutível.

d( ) O ensino musical, entre outras possibilidades, é capaz também de abordar a pluralidade cultural e vivenciar a diversidade do patrimônio cultural imaterial do mundo.

e ( ) Deve-se sempre utilizar o repertório trazido pelos estudantes. A utilização dele, de forma única, nas aulas de música, permite o envolvimento dos alunos e expansão cultural.

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REFERÊNCIAS

ALCURE, Roberta Schneider. Uma proposta de aplicação da abordagem metodológica de Carl Orff para um grupo de crianças carentes. Trabalho de Conclusão de Curso; (Graduação em Licenciatura Plena em Educação Artística Música) – Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, 2000.

ALMEIDA, Berenice de; PUCCI, Magda Dourado. Outras terras, outros sons. São Paulo: Callis Ed., 2015.

ALMEIDA, Renato. História da música brasileira. Rio de Janeiro: F. Briguet & Com., 1942.

ARENDT H. Entre o passado e o futuro. Trad. Mauro W. Barbosa de Almeida. 5ª ed. São Paulo: Perspectiva, 2001.

ARROYO, Margarete. Escola, juventude e música: tensões, possibilidades e paradoxos. In: Em Pauta, v. 18, n. 30, p. 5-39, jun. 2007.

ARROYO, Margarete. Música na educação básica: situações e reações nesta fase pós-LDBEN/ 96. In: Revista da ABEM, Porto Alegre, v. 10, 29-34, mar. 2004.

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ARROYO, Margarete. Mundos musicais locais e educação musical. In: Em pauta, Porto Alegre, v. 13, n. 20, p. 95-121, 2002.

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