Upload
daniela-hoffmann
View
217
Download
4
Embed Size (px)
DESCRIPTION
O trabalho procura pensar as dinâmicas sociais que surgem a partir da implementação de um programa social, bascando compreender os desdobramentos de uma política publica, no caso o Programa Bolsa Família, na vida social. O trabalho tem ainda como objetivo compreender de que modo os beneficiários e potenciais beneficiários percebem o Bolsa Família e quais os possíveis desdobramentos de suas percepções acerca do programa. O estudo resulta de um trabalho de campo realizado a partir do acompanhamento do cadastramento do Programa Bolsa Família, em um bairro do município de Niterói.
Citation preview
Daniela Figueiredo Moreira Hoffmann
Programa Bolsa Família: desdobramentos de uma Política Pública e o
uso da categoria ajuda
Este trabalho é resultado de uma pesquisa realizada pela Universidade Federal Fluminense, com parceria do CNPq, orientada pelo professor Marcos Otávio Bezerra, com duração de um ano e seis meses. Na ocasião em que o trabalho foi publicado, Daniela Figueiredo Moreira Hoffmann terminava o curso de Ciências Sociais. Atualmente, Daniela é formada em Jornalismo e Ciências sociais, tem curso de pós-graduação em Educação a distancia e é mestre em Estudos da Infância.
2
SUMÁRIO
AGRADECIMENTO.................................................................................................. 3
RESUMO..................................................................................................................... 4
INTRODUÇÃO........................................................................................................... 5
CAPÍTULO 1 - Programa Bolsa Família ................................................................. 7
1.1 – O papel dos governos municipais no Programa Bolsa Família...................... 10
1.2 – O Programa Bolsa Família no município de Niterói...................................... 11
1.3 – O NAF (Núcleo de Apoio à Família) do Barreto............................................. 12
CAPÍTULO 2 - Bolsa Família ganha vida concreta............................................... 15
2.1 – O programa social e a vida dos usuários.......................................................... 16
2.2 – A relação entre agentes e usuários.................................................................... 17
2.3 – Conflito: relação entre os usuários................................................................... 19
2.4 – Critérios oficias e a necessidade como justificativa......................................... 20
2.5 – A apropriação do programa para outros fins.................................................. 22
2.6 – Mãe solteira: adaptando-se ao contexto........................................................... 23
CAPÍTULO 3 – O Programa Bolsa Família visto pelos usuários........................... 27
3.1 – A categoria ajuda................................................................................................ 30
3.2 – Mas o que é ajuda?............................................................................................. 36
3.3 – Falta de informação e desapontamento........................................................... 39
3.4 – A quem creditar o benefício?............................................................................ 42
CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................... 43
REFERÊNCIAS.......................................................................................................... 44
3
Dedico esta monografia à minha família, base e fundamento da minha
vida, e ao meu querido irmão, que permanece vivo em doces lembranças
e pensamentos. Agradeço especialmente ao professor Marcos Otávio
Bezerra por ter acreditado e apostado no meu potencial de trabalho e
pela generosidade com que compartilhou seu conhecimento. Agradeço
ainda ao CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico) por ter possibilitado, ao conceder a Bolsa de Iniciação
Científica, meu crescimento pessoal e profissional. E agradeço, por fim,
à ONG AHSAS.
4
Resumo: O trabalho procura pensar as dinâmicas sociais que surgem a partir da
implementação de um programa social, bascando compreender os desdobramentos de uma
política publica, no caso o Programa Bolsa Família, na vida social. O trabalho tem ainda
como objetivo compreender de que modo os beneficiários e potenciais beneficiários
percebem o Bolsa Família e quais os possíveis desdobramentos de suas percepções acerca
do programa. O estudo resulta de um trabalho de campo realizado a partir do
acompanhamento do cadastramento do Programa Bolsa Família, em um bairro do
município de Niterói.
Palavras-chave: Antropologia política, Bolsa Família, assistência, política pública.
Introdução
5
O Programa Bolsa Família é uma política de transferência de renda destinada às famílias
brasileiras em situação de pobreza e implementada ao longo do primeiro governo do
presidente Lula (PT). Atualmente, segundo informações oficiais, o programa atinge mais de
11 milhões de famílias brasileiras.1
O objetivo deste trabalho é observar quais os possíveis desdobramentos desta política
pública na vida dos beneficiários e potenciais beneficiários do programa. Assim, proponho
pensar neste estudo as práticas sociais concretas que se desenrolam a partir da
implementação do Bolsa Família. O estudo intenciona ainda compreender de que modo os
beneficiários e potenciais beneficiários percebem o Bolsa Família e quais os possíveis
desdobramentos de suas percepções acerca do programa.
Para isso, foi realizado um trabalho de campo etnográgico, composto de observação
participante, a qual consiste em uma metodologia de investigação social em que o
observador partilha as atividades e experiências subjetivas de um grupo de pessoas ou de
uma comunidade, interagindo com o grupo social. O método etnográfico permite que o
pesquisador observe e analise, por meio de observação participante, as experiências
compartilhadas pelo grupo estudado, podendo, assim, analisar as interações e relações
sociais que surgem no campo. Além disso, foram realizadas entrevistas informais com os
beneficiários e potenciais beneficiários do Bolsa Família ao longo do trabalho de campo, as
quais permitiram o acesso às representações e às percepções sociais dos participantes, em
outra palavras, ao modo como percebem a vida social. Entrevistas semi-informais com
alguns dos involvidos na implementação do programa também foram realizadas, com a
finalidade de coletar dados sobre o Bolsa Família e sua implementação. O método
etnográfico demonstrou ser o mais eficaz para atingir os objetivos deste estudo, pois
permitiu que fossem observados e analisados os modos de pensar e agir do grupo
pesquisado.
1 http://www.mds.gov.br/bolsafamilia (visitadado em junho de 2007).
6
Acompanhei durante o primeiro semestre de 2006 o cadastramento do Programa Bolsa
Família, no bairro do Barreto, em Niterói. O bairro foi escolhido por já abrigar diversos
estudos de alunos na Universidade Federal Fluminense, o que facilitaria a entrada no
campo. Além disso, por ser um bairro cuja grande parte da população tem uma renda baixa,
poderia-se encontrar no bairro beneficiários e potenciais beneficiários do Programa Bolsa
Família. Estive ainda algumas vezes no Núcleo de Benefício e Renda da Secretaria de
Assistência Social da cidade de Niterói, que se localiza no centro de Niterói, que é
responsável por gerenciar o programa no município. É neste local onde encontra-se a
coordenação do programa e também onde são realizadas as reuniões do Conselho
Municipal de Assistência Social, que é responsável por fiscalizar o Programa Bolsa
Família no município de Niterói. Nestes espaços pude entrar em contato com os usuários e
potenciais usuários do programa e também com os agentes e gestores do Programa Bolsa
Família. Estes foram locais privilegiados que me possibilitaram entrar em contato com as
relações e dinâmicas que surgem a partir do Programa Bolsa Família.
É possível encontrar nos meios de comunicação, nos partidos de oposição e até mesmo nos
meios acadêmicos a idéia de que o recebimento do Bolsa Família, política de transferência
de renda destinada às famílias em situação de pobreza e implementada ao longo do
primeiro governo do presidente Lula (PT), converte-se em votos ou apoio político para o
partido da situação. Grande parte das pessoas, sobretudo no período das eleições
presidenciais ocorridas em 2006, defendeu que o governo estaria se beneficiando do Bolsa
Família para fins eleitoreiros. É comum a atribuição da vitória do Presidente Lula nas
eleições seguintes à implementação do Programa Bolsa Família e ao seu sucesso.
Conceber a política pública como uma política assistencialista talvez seja uma maneira
simplista de ver a questão, que já foi bastante explorada, até mesmo por aquilo que
convencionamos chamar de "senso comum". Não pretendo, portanto, neste trabalho pensar
ou classificar a política pública como uma ação assistencialista, com fins eleitoreiros, cujo
objetivo é angariar votos para políticos e partidos. O objetivo é me afastar da visão corrente
que pensa os programas sociais somente como políticas assistencialistas, ainda calcadas em
uma concepção clientelista do Estado, para, então, poder pensar outras dimensões acerca de
7
um programa social. O que verificamos na maior parte da literatura sobre programas sociais
é um tratamento normativo. A literatura na maioria das vezes não contempla os
desdobramentos de uma política pública e as dinâmicas sociais que se desenvolvem a partir
de sua implementação. Ao contrário, geralmente apenas analisam sua eficiência ou
descrevem e discutem o modo como foram planejadas (Weissheimer, 2006; Simões, 2006;
Pazello e Tavares, 2006; Longo, 2006; Erro e Kassouf, 2004). Neste trabalho, entretanto,
pretendo focar nos desdobramentos da implementação do Bolsa Família e nas percepções
dos beneficiários e potenciais beneficiários acerca do programa.
Outra visão com a qual procurei romper neste estudo é a que trabalha com o conceito de
Estado como se estivesse se referindo a uma entidade abstrata, sem considerar que, na
realidade, o Estado, é uma entidade composta por indivíduos de carne e osso, e como tal se
materializa e ganha corpo por meio desses indivíduos e das relações travadas por eles.
Assim também, penso eu, ocorre com as políticas públicas. Não são apenas teorias e
legislações registradas em papéis. Ao contrário, possuem materialidade. Seus
desdobramentos na vida social e as interações geradas por elas são uma extensão do Estado
que evidenciam ainda mais a concreticidade de sua atuação. De modo que a própria política
pública foi pensada não como apenas uma legislação e uma teoria, mas como algo que
ganha corpo por meio de seus agentes e da interação que travam com os beneficiários e
potenciais beneficiários (Bezerra, 1999, 2004; Borges, 2004).
I. Programa Bolsa Família
O Bolsa Família é um programa do Governo Federal de transferência de renda destinado às
famílias brasileiras em situação de pobreza, com renda per capita de até R$ 120,00
mensais. O programa, criado em outubro de 2003, foi instituído oficialmente pelo Decreto
n° 5.209 de 17 de setembro de 2004 que regulamentou a Lei n° 10.836, de 9 de janeiro de
2004. Segundo a versão oficial, o Programa Bolsa Família associa a transferência do
benefício financeiro ao acesso aos direitos sociais básicos – saúde, alimentação, educação e
assistência social.
8
Ainda segundo a versão oficial, o Bolsa Família foi criado para atender a duas finalidades
básicas: combater a miséria e a exclusão social, com o alívio imediato da pobreza, por meio
da transferência direta de renda à família; promover a emancipação das famílias mais
pobres, reforçando o exercício de direitos sociais básicos nas áreas de Saúde e Educação,
por meio do cumprimento das condicionalidades, o que contribui para que as famílias
consigam romper o ciclo da pobreza entre gerações. Uma outra finalidade do programa
assinala que uma dimensão essencial à superação da fome e da pobreza é a coordenação de
programas complementares, que têm por objetivo fazer com que os beneficiários do Bolsa
Família consigam superar a situação de vulnerabilidade e pobreza. São exemplos de
programas complementares: programas de geração de trabalho e renda, de alfabetização de
adultos, de fornecimento de registro civil e demais documentos.
Para ingressar no Programa Bolsa Família, as famílias devem procurar a Prefeitura de seu
município e se cadastrar no Cadastro Único dos Programas Sociais (CadÚnico). É a partir
das informações do Cadastro Único que o Governo Federal, por meio do Ministério de
Desenvolvimento Social e Combate à Fome, seleciona as famílias que serão contempladas
com o benefício. A seleção considera o orçamento disponível e as metas de expansão do
programa.
Cada município tem um número estimado de famílias pobres – que ganham menos de
R$120,00 - considerado como a meta de atendimento do Programa naquele território. Os
cálculos basearam-se nos dados do Censo de 2000 e da Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (PNAD) de 2004, ambos do IBGE. Ao entrar no Bolsa Família, a família deve
se comprometer a manter suas crianças e adolescentes em idade escolar freqüentando a
escola e a cumprir os cuidados básicos em saúde.
Inicialmente as famílias aptas a receber o benefício do Programa Bolsa Família eram
famílias consideradas pobres (com renda mensal por pessoa de R$ 50,01 a R$ 100,00) e
extremamente pobres (com renda mensal por pessoal de até R$ 50,00). Entretanto, os
valores de referência para as famílias com direito ao benefício foram estendidos por meio
do Decreto n° 5.749/06, publicado no Diário Oficial da União de 11 de abril de 2006.
9
Atualmente, famílias com renda mensal de até R$ 60,00 por pessoa podem ser incluídas no
Programa independentemente de sua composição. Por sua vez, as famílias com renda
mensal entre R$ 60,01 e R$ 120,00, por pessoa, podem ingressar no Programa desde que
possuam gestantes, ou nutrizes, ou crianças e adolescentes entre 0 à 16 anos.
Famílias Valores iniciais Valores atualizados
Extremamente pobres Renda mensal per capita de até R$
50,00
Renda mensal per capita de até R$
60,00
Pobres Renda mensal per capita entre R$
50,01 e R$ 100,00
Renda mensal per capita entre R$
60,01 e R$ 120,00
Os valores pagos pelo Programa Bolsa Família variam de R$15,00 a R$95,00, de acordo
com a renda mensal por pessoa da família e o número de crianças e adolescentes – menores
de 16 anos. Em alguns casos, o valor pago pelo Bolsa Família pode ser um pouco maior,
como acontece com as famílias que migraram de programas remanescentes e recebiam um
benefício maior nesses programas.
O público alvo preferencial para o recebimento do benefício em nome da família é a
mulher, considerando seu papel central na condução do lar. Segundo o Ministério de
Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), essa decisão tem como base estudos
sobre o papel da mulher na manutenção da família e na sua capacidade em usar os recursos
financeiros em proveito de toda a família.
Em âmbito nacional, a CAIXA é responsável pela interlocução com o MDS em relação ao
pagamento do benefício aos usuários. Enquanto Agente Operador, a CAIXA é encarregada
de efetuar o pagamento das parcelas do Programa Bolsa Família e dos programas
remanescentes, na sede de todos os municípios. O responsável legal da família recebe um
cartão, com o qual pode sacar o benefício em agências ou postos de atendimento bancários
e em unidades lotéricas.
10
1.1. O papel dos governos municipais no Programa Bolsa Família
A Gestão de Benefícios do Programa Bolsa Família é o conjunto de processos e atividades,
cujo objetivo é realizar a entrega do benefício financeiro às famílias. Apesar dos benefícios
do Programa serem repassados diretamente às famílias, o Bolsa Família se fundamenta na
participação de todos os entes federados. De modo que cada esfera de governo tem
atribuições e competências diferenciadas em relação ao programa.
Os governos municipais, segundo a versão oficial, são os principais gestores do Programa
junto às famílias. Compete aos gestores municipais verificar periodicamente a
conformidade da situação das famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família, divulgar as
informações relativas aos benefícios do Programa Bolsa Família, manter a Secretaria
Nacional de Renda e Cidadania (Senarc), que é o órgão federal responsável pela
operacionalização do Programa e pela concessão do benefício, informada sobre os casos de
deficiências ou irregularidades, dentre outras coisas.
Na Gestão de Benefícios do Programa, os gestores municipais podem realizar bloqueios,
desbloqueios ou cancelamentos dos benefícios financeiros das famílias por meio do
Sistema de Gestão de Benefícios. A Gestão de Benefícios pode ser realizada de duas
maneiras: Municípios com Termo de Adesão publicado no Diário Oficial da União podem
utilizar o Sistema de Gestão de Benefícios do Programa Bolsa Família via Internet.
Municípios sem Termo de Adesão publicado no Diário Oficial da União realizarão as
atividades de gestão de benefícios enviando ofícios à SENARC, para processamento.
Também possuem acesso ao Sistema gestores estaduais do Programa Bolsa Família;
Instâncias estaduais e municipais de controle social; e Rede Pública de Fiscalização.
Os gestores do Programa Bolsa Família contam com o Sistema de Gestão de Benefícios,
que é um sistema on-line, desenvolvido para viabilizar a descentralização da gestão de
benefícios do Programa. Os Gestores Estaduais do Bolsa Família, os integrantes das
instâncias municipais e estaduais de controle social e os integrantes da rede pública de
fiscalização do programa também podem consultar as informações.
11
1.2. O Programa Bolsa Família no município de Niterói
Ao município de Niterói, são repassados por mês para apoio à gestão do Programa Bolsa
Família R$ 19.064,50. O número de famílias cadastradas no Cadastro Único na cidade é de
16.789. Destas, as famílias cadastradas que se encaixam no perfil de possíveis beneficiários
do Programa Bolsa Família, ou seja, cuja renda per capita familiar é de até R$ 120,00, é de
15.952. E o número de famílias que recebem a bolsa é de 12.389 (dados do primeiro
semestre de 2007).
Compete à Secretaria Municipal de Assistência Social, da cidade de Niterói, administrar o
programa Bolsa Família no município. A Secretaria está passando por um processo de
mudança em sua estrutura interna para se enquadrar no Sistema Único de Assistência
Social, proposto pelo Governo Federal. Hoje, ela está dividida em dois níveis de proteção
social: Proteção Social Básica e Proteção Social Especial.
A Proteção Social Básica tem por objetivo prevenir situações de risco. Sua base de ação são
os Centros de Referência da Assistência Social (CRASs), que realizam o acompanhamento
socioassistencial. O programa Bolsa Família faz parte do programas de Proteção Social
Básica. Já a Proteção Social Especial é voltada a pessoas em situação de grande
vulnerabilidade pessoal e social. Assim, enquanto os programas da Proteção Social Básica
são preventivos, os programas da Proteção Social Especial dirigem-se à população em
risco.
O Núcleo de Benefício e Renda da Secretaria de Assistência Social, onde estive algumas
vezes, está ligado à Proteção Social Básica. O núcleo está localizado no centro da cidade e
ocupa um dos andares de um prédio, que fica em uma das principais avenidas de Niterói. O
núcleo é o responsável por administrar o Programa Bolsa Família no município. É, por
exemplo, o responsável por coordenar o cadastramento e fazer o cancelamento do
benefício. Lá é feito, em alguns momentos, o Cadastro Único e também é para lá que os
beneficiários devem se dirigir quando quiserem tirar dúvidas ou caso tenham algum
problema relativo ao benefício. Além do programa Bolsa Família, o Núcleo de Benefício e
12
Renda é responsável pelo Benefício de Prestação Continuada, que atinge pessoas de mais
de 65 anos e portadores de deficiência.
No caso do Município de Niterói, os NAFs (Núcleo de Apoio à Família) são os
responsáveis por realizar o cadastramento do programa. Eles encontram-se geralmente no
Centro de Referência da Assistência Social (CRAS), que é justamente o espaço físico onde
os NAFs funcionam. Os NAFs estão distribuídos em diferentes pontos da cidade e atendem
a uma região específica. O NAF Centro abrange São Domingos, Bairro de Fátima, São
Lourenço, Ponta da Areia, Centro (Morro do estado), Pé pequeno, Engenhoca; o NAF
Santo Cristo abrange Santo Cristo; o NAF IACAC abrange Várzea das Moças, o CRAS
Cubango abrange, além do Cubango, Viçoso Jardim e as Comuindades Serrão, Jonas
Botelho, Morro do Eucalipto, Viçoso Jardim, Ladeira do Bumba, São José; o CRAS Vila
Ipiranga abrange, além de Vila Ipiranga, Juca Branco, Boa Vista, Coronel Leôncio, São
Lourenço, Olofote; o CRAS Morro do Céu abrange Caramujo, Morro do Céu; o CRAS
CEJOP abrange o bairro de Icaraí; e o NAF MAE (ONG – AHSAS) abrange Barreto e
Tenente Jardim. Cabe aos NAFs realizarem o Cadastro Único e fazerem a divulgação do
programa junto às regiões pela qual são responsáveis, trabalho muitas vezes realizado com
auxílio das associações de moradores, que têm um papel importante na divulgação e no
cadastramento do Bolsa Família. São os NAFs os responsáveis por preencher os
questionários.
O acompanhamento e a fiscalização do Programa Bolsa Família no município de Niterói
são feitos pelo Conselho Municipal de Assistência Social, que se reúne no prédio do
Núcleo de Benefício e Renda para discutir, além de outras pautas, o andamento do
Programa Bolsa Família, seus resultados, suas metas, etc.
1.3. O NAF (Núcleo de Apoio à Família) do Barreto
A pesquisa concentrou-se no bairro do Barreto, em Niterói. O Barreto tem como limites a
Baía de Guanabara a Oeste, o município de São Gonçalo ao Norte, a Engenhoca a Leste e,
ao Sul, o bairro de Santana. Foi um dos principais pólos industriais do município de
13
Niterói, no início do século XX. O Barreto contou até a década de 1960 com uma estação
das Barcas e uma importante estação de trem, cujo prédio, quase totalmente destruído,
voltou recentemente a atender passageiros que percorrem os 33 quilômetros do trecho
Barreto – São Gonçalo – Itaboraí. No bairro, encontravam-se instalados vários
estabelecimentos têxteis, além de muitas fábricas menores. Entretanto, houve um processo
de decadência industrial no local. Hoje, o Barreto é um bairro cujos moradores em sua
maioria são pessoas de baixa renda.
A população do bairro é de 15.953 habitantes, segundo o Censo de 2002, o que equivale a
3,47% do total de moradores do município de Niterói, cuja população estimada, em 2006, é
de 476.669 (Fonte: IBGE). Niterói tem o maior índice de rendimento dos chefes de
domicílios do estado do Rio de Janeiro. Segundo o Censo 2000, o rendimento é de
R$1.741,40, o que equivale a 11,53 salários mínimos. No Barreto, entretanto, o rendimento
dos chefes de domicílios está entre os menores rendimentos do município, e é de R$841,64,
o que equivale a 5,57 salários mínimos.
Além disso, no bairro, estão concentrados aproximadamente 7,2% do total de moradores de
favela do município, que é de 50.020 habitantes. No Barreto, há a comunidade Pátio da
Leopoldina, onde existem 978 moradores, e a comunidade Buraco do Boi, onde há 2.638
habitantes e 790 domicílios. O Buraco do Boi é a segunda favela mais populosa da cidade,
perdendo apenas para o morro do Preventório, em Charitas, com 4.870 moradores.
O NAF que fica localizado no Barreto não funciona em um CRAS, e sim dentro de uma
ONG. Ele é responsável por atender não só o bairro do Barreto, mas também bairros
vizinhos, Engenhoca e Tenente Jardim. Assim, no caso do Barreto e algumas localidades
próximas, o responsável pelo cadastramento é a ONG AHSAS - Ação dos Direitos
Humanos e Sociais, que hoje funciona também como um NAF.
A ONG AHSAS - Ação de Direitos Humanos e Sociais - é uma Organização Não-
Governamental fundada em 1995, na cidade de Niterói, por um grupo de internos do
Instituto Penal Vieira Ferreira Neto, em conjunto com profissionais liberais, igrejas e
14
voluntários. Inicialmente intitulada de MAE – Movimento de Assistência às Famílias dos
Encarcerados – a organização, em princípio, tinha como principais atividades a recuperação
moral e espiritual dos detentos e a distribuição de cestas básicas para suas famílias.
Contudo, no ano de 1996, ocorreu a ampliação da associação a partir de uma reforma e de
uma mudança na administração, e ela passou a chamar-se AHSAS – Ação de Direitos
Humanos e Sociais. O projeto MAE foi mantido, mas foram incorporadas novas dimensões
sociais como saúde, educação e esporte. Essa expansão dirige-se a populações mais pobres
de Niterói, especialmente àquelas ligadas ao segmento carcerário. A AHSAS, atualmente,
promove aos encarcerados e às suas famílias assistência psico-social, pedagógica e jurídica,
visando à melhoria na qualidade de vida, à promoção e à integração social. Além de visitas
às instituições penais, a associação oferece também às famílias dos presos e egressos o
atendimento por uma equipe profissional, formada por uma assistente social, um auxiliar
administrativo, um advogado e dez voluntários.
Seu Gomes, também conhecido como Pastor Gomes, é o responsável pela ONG. Ele é um
ex-presidiário, que em função de sua história de vida decidiu realizar um trabalho junto às
famílias de encarcerados e egressos. Ele é hoje membro do Conselho Tutelar e é pastor de
uma igreja no Barreto, localizada próxima à ONG AHSAS – Ação de Direitos Humanos e
Sociais. Importante observar que durante as eleições para vereador, Gomes apoiou um
candidato do PT ( partido do atual prefeito da cidade, Godofredo Pinto).
Por ter um trabalho específico junto às famílias de encarcerados e egressos, a ONG tornou-
se um NAF temático, priorizando o atendimento às famílias de presidiários e ex-
presidiários. Carla, administradora do local, disse que a ONG foi escolhida para fazer o
cadastramento por uma questão de troca de favores. Trata-se, segundo ela, de um favor, já
que, enquanto a ONG sede o espaço para a realização do cadastramento do Programa Bolsa
Família no Barreto e bairros vizinhos, recebe em troca um favor da prefeitura. Carla relatou
que a AHSAS, como NAF, passou a receber R$3000 da Secretaria de Assistência Social,
que é justamente o único recurso com o qual a ONG se mantém. Seu Gomes disse que eles
se responsabilizaram pelo cadastramento do Programa porque na região não havia quem o
fizesse. Ele disse, então, assim como Carla que tornaram-se um NAF temático.
15
Quanto ao cadastramento, é aplicado um questionário por um agente do Programa
contratado na época do cadastramento, no caso da ONG é o João, filho do Pastor Gomes.
Os questionários são repassados para a Secretaria de Assistência Social, que por sua vez
repassa os cadastramentos para o Governo Federal. É o Governo Federal o responsável por
realizar - por meio de critérios já mencionados anteriormente - a seleção das famílias que
receberão o benefício em cada município.
2. Implementação do Programa Bolsa Família: o desenrolar de um programa social
Freqüentemente nos referimos ao Estado como uma instituição abstrata. Do mesmo modo
freqüentemente quando pensamos as políticas públicas nos referimos a elas como se fossem
formulações teóricas abstratas e desprovidas de materialidade. Marcos Otávio Bezerra
(2004) estuda uma experiência de participação popular em um bairro do município de
Niterói; no caso a implementação do orçamento participativo. Bezerra afirma que para
compreender essas experiências e seus efeitos, é preciso ter em mente o fato de que estas
políticas públicas não se realizam em um vazio sociológico. “Para se apreender essas
experiências e seus efeitos em termos mais amplos que os estritamente institucionais (seu
funcionamento, composição, natureza consultiva ou deliberativa etc.) é fundamental
considerar o fato de que estas não se realizam num vazio sociológico” (p. 146). O autor
apresenta um exemplo de como um programa do governo ganha concretude e se
desenvolve em um determinado contexto social. No caso estudado, por exemplo, Bezerra
percebe que o programa se defronta com formas historicamente constituídas de
sociabilidade política e de relações de poder que acabam interferindo em seu
desenvolvimento.
Do mesmo modo, no livro “Em nome das bases: política, favor e dependência pessoal”,
Bezerra (1999) pensa o Estado a partir das dinâmicas sociais e relações travadas entre os
atores sociais que o compõe. No caso, o autor analisa as representações, as práticas e as
relações sociais produzidas em torno da atuação dos parlamentares no Congresso Nacional.
De modo que o Estado é pensado a partir das interações e relações que o constituem.
16
Antonádia Monteiro Borges (2004) realizou um trabalho etnográfico no Recanto das Emas
(DF), entre 2000 e 2002, no qual acompanhou a implementação do programa de
assentamento do governo do Distrito Federal, que visava retirar as favelas que se formavam
nas áreas urbanas. Borges chama atenção exatamente para o modo como a política pública
ganha vida concreta e se manifesta no cotidiano das pessoas, por exemplo, na interação que
se estabelece entre agentes e beneficiários. Assim, as interações travadas entre os
beneficiários e os agentes de um programa social apontam justamente para o fato de que
devemos procurar entender o Estado e suas políticas como algo que se manifesta por meio
de relações sociais específicas e que desencadeia dinâmicas sociais importantes.
2.1. O programa social e a vida dos usuários
Como dito anteriormente, a implementação de um programa social em um determinado
contexto suscita transformações diversas na vida social. A implantação do Programa Bolsa
Família também parece demonstrar que a dinâmica da vida das pessoas e até mesmo na
vida social é alterada em função da implementação de uma política pública.
Como demonstra Antonádia Borges (2004), a política pública ganha vida concreta e se
manifesta no cotidiano das pessoas. No caso da pesquisa realizada por Borges (2004, p. 35)
“as madrugadas nas filas, o cadastramento, a atualização periódica do cadastro, o
conhecimento gradual das varáveis que ‘pesam’ na formula que calcula a pontuação do
candidato, a adequação entre os dados de que se dispõe e aqueles que devem ser
apresentados ao governo, a procura de documentos que registrem a veracidade do que é
declarado, a angustiante espera pela contemplação (...)” são alguns exemplos do modo
como a política pública se desdobra na vida social e tem uma implicação na vida dos
indivíduos que estão de algum modo vinculados a ela.
Um caso que revela o quanto o cotidiano das pessoas é alterado a partir da implementação
do Programa Bolsa Família ocorreu em uma das minhas idas ao Núcleo de Benefício e
Renda. Eu estava sentada na sala principal, onde as pessoas aguardavam o atendimento, e
observava as pessoas que ali estavam. Me deparei, então, com duas senhoras que foram até
17
o local com a finalidade de se cadastrar para receber o benefício. O agente do programa
revelou que não poderiam realizar o cadastramento, pois eram idosas e não tinham filhos
pequenos, deste modo, não encaixavam-se nos critérios para o recibimento da bolsa. Uma
das senhoras, demonstrando indignação com a resposta do agente, disse que haviam
descido as muitas escadarias do morro onde moravam, mesmo sendo idosas e tendo uma
delas dificuldades para andar, especialmente para se cadastrar no programa. As senhoras,
com revolta, disseram que aquilo era um absurdo.
Assim, as filas, as incansáveis idas ao local para saber dos prazos de cadastramento, a
expectativa do recebimento do benefício, o cadastramento, as reclamações e insatisfações, o
providenciamento de documentos e a interação com os agentes do programa passam a fazer
parte do dia-a-dia dessas pessoas. De modo que, em função da implementação de políticas
públicas, a dinâmica da vida destas pessoas é modificada.
2.2. A relação entre agentes e usuários
O estudo das relações que se estabelecem entre agentes e usuários parece sugerir que é a
partir da implementação da política pública que de fato seus desdobramentos vão surgindo.
Isso por quê aquilo que foi previsto pelos idealizadores do programa social acaba se
defrontando com um contexto social dinâmico específico e com formas de se relacionar já
previamente constituídas, o que provoca implicações significativas no modo como a
implementação do programa se desencadeia.
O atual estudo demonstra que a relação entre João, agente do Programa Bolsa Família, e os
potenciais usuários é reveladora de como o agente da política pública é, em certo sentido, a
própria corporificação do Estado, tornado-o uma instância que possui materialidade. O
agente em questão me relatou que sempre que possível procura ajudar as pessoas que vão
até lá fazer o cadastramento, de modo a contribuir para que recebam o benefício e se
encaixem nos critérios pré-estabelecidos pelo programa. Ele costuma sugerir, por exemplo,
no caso de um trabalhador informal, que declare uma renda mais baixa, o que aumenta as
chances de recebimento da bolsa.
18
Situação semelhante a esta aparece na pesquisa de Borges (2004). A autora relata que uma
beneficiária revelou que uma agente do programa sugeriu a ela no momento do
cadastramento que retirasse o cônjuge da ficha de cadastro e deixasse somente as crianças,
pois assim seria mais fácil conseguir receber o benefício.
Vemos por meio destes exemplos que a política pública deixa de ser apenas uma legislação
e uma formulação teórica e passa a ganhar corpo por meio de seus agentes. Como afirma
Borges (2004, p. 25) “(...) todos os procedimentos exigidos (para se tornar apto a receber
benefícios do governo) implicam um envolvimento dos indivíduos com outros mais, ou
seja, exigem socialização”.
Assim, se estabelece uma relação entre aquele que requisita o benefício e os agentes do
programa. João, agente do programa Bolsa Família, disse que procura brincar com as
pessoas para aliviar a tensão na hora da entrevista. E de fato presenciei uma mulher dizer,
no momento do cadastramento, que estava nervosa. Ela levantou sua mão para montrar que
estava tremendo. João procurou deixá-la calma, tratando-a de forma amigável. Notei
também nervosismo durante o cadastramento de uma outra moça, mãe de três filhos,
desempregada, cujo companheiro trabalhava sem carteira assinada. O agente João
perguntou a ela se estava nervosa, e ela respondeu afirmativamente. Então, perguntei a ela
o por quê de estar tão nervosa, e ela respondeu: “Será que é porque eu ‘tô’ tentando marcar
há tempos e só agora eu consegui? (risos)”.
Vemos por meio destes exemplos que a política pública sai do âmbito teórico e ganha vida
prática ao interferir na vida dos indivíduos e ao promover socialização, ou seja, interações
entre usuários e agentes. De acordo com Borges (2004), “É preciso notar que, a cada
inflexão nos procedimentos relativos à obtenção de um benefício, faz-se necessário o
contato físico entre quem demanda um lote e os agentes do governo”. Portanto, como no
caso do Programa Bolsa Família, a implementação de um programa social promove
interações em sua decorrência, modificando o cotidiano das pessoas e produzindo
desdobramentos diversos na vida social onde é implementado.
19
2.3. Conflito: a relação entre os usuários
Um aspecto interessante que parece se desenrolar a partir da implementação do Programa
Bolsa Família é o surgimento de uma espécie de competição entre os usuários do programa.
Muitas vezes ao fazer uma reclamação ou tentar entender o por quê do não recebimento da
bolsa, as pessoas comentavam de seus vizinhos ou conhecidos e comparavam-se a eles.
Ouvi, por exemplo, o argumento de uma mulher dizendo que ganhava menos que uma
conhecida que recebia o Bolsa Família. A mulher disse ainda que ela vivia de aluguel,
enquanto a vizinha tinha casa própria.
Em outra ocasião, em que fui no Núcleo de Benefício e Renda, pude observar uma
reclamação, que também estabelecia uma comparação entre vizinhos. Nesse dia, havia
muitas pessoas na sala aguardando o atendimento dos agentes do programa. Um casal
chegou com a filha, e o marido perguntou à funcionária: “Quero saber por quê a gente está
recebendo só R$15,00. Tem uma vizinha lá que recebe R$80,00”. E a esposa completou: “E
ela trabalha também”. O casal, desta forma, por não saber exatamente os critérios do
programa, comparava-se com a vizinha que trabalha, assim como eles, mas recebe um valor
mais alto. Desta forma, parece que se estabelece uma certa comparação, e até mesmo uma
certa competitividade, entre os beneficiários do programa.
Carla, administradora da ONG AHSAS, onde é feito o cadastramento do Bolsa Família no
Barreto, me revelou que é muito recorrente a existência de “rivalidades” entre aqueles que
recebem e também os que não recebem o benefício. Ela disse que sempre escuta
reclamações de pessoas dizendo que precisam mais do que outra pessoa que já recebe a
bolsa, ou que ganham salários menores do que os que recebem o benefício. Carla disse que
junto com as reclamações são feitas comparações com as situações dos vizinhos e
conhecidos. Os argumentos utilizados são bastante variados: pode ser, por exemplo, que o
outro tem casa própria, enquanto que a pessoa vive de aluguel, ou que o outro trabalha,
enquanto a pessoa está desempregada. Muitos questionam, de acordo com Carla, o por quê
de receberem menos que os outros, quando alegam precisar mais.
20
Assim, podemos verificar que a falta de informação em relação aos critérios do programa
acaba gerando comparações entre vizinhos e conhecidos, que querem entender o por quê de
receberem menos. Interessante observar que geralmente aparece um motivo que deveria
faze-los receber mais do que os demais.
2.4. Critérios oficias e a necessidade como justificativa
O caso das senhoras que haviam descido as escadarias da comunidade onde moravam para
se cadastrar, e se indignaram ao saber que não se encaixavam no perfil de possíveis
beneficiários do Bolsa Família, aponta para um possível descompasso entre os critérios
oficiais de seleção e os critérios morais que as próprias pessoas acreditam que devem ser
considerados no momento da escolha dos beneficiários.
No caso do Bolsa Família, cada município tem um número estimado de famílias pobres
considerado como a meta de atendimento do programa naquele território específico. No
município de Niterói, por exemplo, a estimativa de famílias pobres, que se encaixam no
perfil de beneficiários do Programa Bolsa Família (cuja renda per capita familiar é de até
R$120,00), segundo fontes do IBGE de 2004, era de 10.694. Como dito, o cadastramento
não implica a entrada imediata dessas famílias no Programa e, conseqüentemente, o
recebimento do benefício. Em todo o Brasil, segundo fontes oficiais, o total de famílias
cadastradas é de 15.571.190, entretanto, o número de famílias cadastradas que têm o perfil
de possível beneficiário do Programa Bolsa Família é de 14.169.794. E o total de famílias
que de fato recebem o benefício é de 11.071.446. No município de Niterói, por exemplo, o
número de famílias cadastradas é de 16.789. Destas, as famílias cadastradas que se
encaixam no perfil de possíveis beneficiários do Programa Bolsa Família é de 15.952.
Os critérios oficiais para se cadastrar no programa, já especificados anteriormente, são
levados em conta na hora da seleção das famílias que irão receber o benefício. São exigidos
ainda dos membros da família diversos documentos de todos os moradores da casa, como
comprovante de residência, Identidade, CPF; Titulo de Eleitor; Certidão de Nascimento e
Carteira de Trabalho (mesmo que não esteja assinada).
21
No momento em que é feito o Cadastro Único, é preenchido um formulário pelos agentes
do programa com informações sobre o potencial usuário. No item “Identificação do
domicílio e da família” são requeridas informações como endereço, características do
domicílio e lista de pessoas residentes no domicílio. Em relação às características do
domicílio é perguntado o tipo de tratamento de água da residência, bem como de
abastecimento da água; o tipo de iluminação; a situação da casa, ou seja, se é alugada,
própria, cedida, etc; o tipo de casa, ou seja, se é apartamento, casa, etc; o tipo de
construção; o modo como é feito o escoamento sanitário e o destino do lixo no domicílio;
etc. O item “Identificação da pessoa” diz respeito às informações básicas, como nome,
sexo, nacionalidade, estado civil, tipo de deficiência, raça/cor, de todos os membros da
família. O questionário contempla ainda perguntas a respeito do tipo de escola freqüentada
e da série escolar que o requerente cursou e perguntas relativas à ocupação do potencial
beneficiário, à situação no mercado de trabalho - ou seja, se é assalariado, se é empregador,
entre outros - e à remuneração. É ainda perguntado, por exemplo, o tempo de moradia da
família na residência. E também é requisitado que sejam informados os valores gastos com
alimentação, água, gás, medicamentos, transportes, aluguel, o número de pessoas que
vivem da renda da família, entre outros.
Como visto, o questionário contempla itens que procuram considerar a situação de moradia,
como o tipo de tratamento da água, a situação da casa, ou seja, se é alugada, própria,
cedida, etc e o modo como é feito o escoamento sanitário. Contempla ainda itens que
consideram a qualificação profissional, como qual é a ocupação, qual é a situação no
mercado de trabalho, ou seja, se é assalariado, se é empregador. Entretanto, de acordo com
informações oficiais, o principal critério para selecionar os beneficiários do programa é a
renda per capita, ou seja, a soma do salário dos membros da família que trabalham de
carteira assinada divido pelo número de pessoas da família.
Ao confrontar os critérios oficiais do Programa Bolsa Família e os critérios morais dos
próprios beneficiários e potenciais beneficiários, é possível observar que há um certo
desencontro entre o perfil exigido para ingressar no programa e o perfil que os próprios
usuários identificam como sendo o ideal. Termos como dificuldade e necessidade aparecem
22
com freqüência para justificar o por quê de se ter direito ou não a receber o benefício.
Precisar mais do que outro, passar por maiores necessidades, deveriam, segundo os
beneficiários, garantir o direito ao benefício. O fato de ganhar salários menores do que
aqueles que recebem o benefício, por exemplo, pode ser apontado como justificativa para
ter direito a receber benefício. Do mesmo modo, o fato de ter ou não emprego com certeira
assinada é também apontado como uma justificativa para se ter acesso ao recebimento da
bolsa.
Certa vez fui no Núcleo de Benefício e Renda e observei um homem, que estava junto com
sua esposa, perguntar à funcionária do Programa Bolsa Família que atendia aos
beneficiários: “Quero saber por quê a gente está recebendo só R$15,00. Tem uma vizinha lá
que recebe R$80,00. E a esposa completou: “E ela trabalha também”. Outra vez, uma
mulher que aguardava o atendimento disse falando de sua filha “Não é possível. Então era
pra minha filha ter recebido. Ela está com a casa caindo aos pedaços, tem seis filhos pra
criar e até agora não recebeu”. As necessidades que justificam o recebimento do benefício
são, neste exemplo, a casa em péssimas condições e a quantidade de filhos.
Assim, enquanto os critérios oficias do Bolsa Família valorizam a renda como elemento
central, os beneficiários parecem ver na maior necessidade e dificuldade - que podem ser
expressas em diferentes características, como o emprego e as condições de moradia -,
aspectos que deveriam ser considerados no momento da seleção das famílias beneficiárias.
Há, portanto, uma divergência entre os critérios oficiais e os critérios que os beneficiários e
potenciais beneficiários consideram de fato pertinentes e justos.
2.5. A apropriação do programa para outros fins
A utilização do cadastro para outros fins também é um exemplo interessante de como o
programa social acaba sendo apropriado de diferentes maneiras, dependendo do contexto ao
qual é aplicado. Borges (2004, p. 38) relata que um cabo eleitoral utilizou o cadastro como
banco de dados para contatar eleitores e relembrá-los de que o então candidato havia lhe
concedido o benefício. “Além do sentido mais referencial de um cadastro, que é agrupar e
23
classificar um conjunto de pessoas, gradualmente percebi que havia no Recanto das Emas
outros usos possíveis para esse tipo de registro”.
O então secretário-geral da FAMNIT (Federação das Associações de Moradores de Niterói)
e representante dos usuários no Conselho Municipal de Assistência Social de Niterói,
relatou que utilizou o Programa Bolsa Família, antes da pesquisa ser realizada, para
acompanhar a vacinação de crianças e de pessoas que estavam com doenças, como
hanseniase, tuberculose, e também para acompanhar portadores de HIV.
Segundo ele, o cadastro foi utilizado para conhecer a população. “Através do cadastro a
gente foi conhecendo a população (...). Nós começamos a trabalhar esse morador (...)
Pegamos o nome e endereço de todo mundo que nós cadastramos e fomos atrás dessa
pessoa. E aí nós fomos descobrindo a sua deficiência, as suas frustrações”. Assim,
percebemos em sua fala que o Cadastro Único, que inicialmente seria usado pelo governo
federal para selecionar as famílias, acaba ganhando outro tipo de função em determinados
contextos.
Assim, é que um programa social, com uma finalidade específica, pode se desdobrar de tal
forma a ser utilizado com outras finalidades que surgem a partir de sua implementação,
servindo a outra interesses e fins, que a princípio não encontravam-se previstos por aqueles
que o formularam.
2.6. Mãe solteira: adaptando-se ao contexto
Um fato que chama a atenção é a grande recorrência de mulheres solteiras que iam até a
ONG AHSAS – Ação de Direitos Humanos e Sociais, no Barreto, com intuito de receber o
benefício. Na sala de espera do Núcleo de Benefício e Renda era notável também a maior
presença do público feminino para resolver questões relativas ao benefício. Além disso, a
grande maioria dos que iam fazer o cadastramento no bairro era de mulheres, muitas das
vezes mães solteiras.
24
No próprio bairro estudado, o Barreto, com características de bairro popular, pareceu
bastante recorrente a presença de mães solteiras, que criavam seus filhos com a ausência
paterna. Na ONG AHSAS, certa vez, conheci o professor de Jiu Jistu, Lê. Professor de Jiu
Jitsu em academias, Lê foi até a ONG AHSAS porque pretendia utilizar o espaço da ONG
para treinar para uma competição os alunos que ensina gratuitamente. Lê é morador da
comunidade de Nova Brasília, que fica no Barreto, e é um desses meninos que foi criado
sem a presença do pai. Sua mãe o criou sozinha. Segundo ele, ela foi seu pai e sua mãe, e,
por isso, é uma grande “guerreira”. Ele disse que o pai nunca deu nada para ele e nem
pagou pensão. Era sua mãe quem tinha cuidado dele, trabalhando fora. Lê relatou que seu
pai é morador da “parte branca”, lugar que ele também denominou de “asfalto” e de
“pista”. Disse que a família do seu pai tem boas condições, mas nunca o ajudou. Lê disse
que não tem muito contato com seu pai, mas que de vez em quando vai até a casa do seu
pai de “motinha”. E, segundo ele, o faz para mostrar para seu pai o quanto sua mãe o criou
bem e o quanto ele conseguiu vencer na vida, mesmo sem a ajuda dele.
Assim como Lê, João, agende do programa e morador do mesmo bairro, disse que também
foi criado durante muitos anos com a ausência do pai. Seu Gomes era da Policia Militar e
ganhava muito dinheiro por fora, com o tráfico. Então, foi preso no dia em que João
completava cinco anos. João foi, então, criado pela mãe.
Não só na ONG AHSAS, mas também no Núcleo de Benefício e Renda da Secretaria de
Assistência Social de Niterói, conheci muitas mulheres e meninas que tinham algo em
comum: a ausência de um homem em casa que fosse o provedor da família. Grande parte
delas não recebia pensão, ou porque o marido não dava, ou até mesmo porque elas não
queriam mais receber nada do antigo companheiro. Geralmente elas chamam o homem de
esposo, mas grande parte das vezes não chegaram a casar, apenas “moraram juntos” com
seus “esposos”.
Muitas das mulheres que tinham interesse em se cadastrar no programa eram o que se
poderia chamar de mães solteiras, ou seja, eram mulheres que criavam seus filhos sem a
presença de um parceiro. Interessante notar que grande parte delas também era filha de
25
“mãe solteira”, o que é um dado interessante. Portanto, fazia parte do universo dessas
pessoas a ausência de um homem em casa servindo de provedor para a família. Carla,
administradora da ONG AHSAS, ao falar das dificuldades das famílias do bairro, relatou a
situação das mães solteiras. Segundo ela, são mulheres que muitas vezes foram
abandonadas ou têm seus maridos presos em presídios. Carla disse que passam dificuldades
aquelas que não recebem pensão e criam seus filhos sozinhas. Ela falou ainda que muitas
mulheres optam por não receber pensão para não manter relações com o pai da criança.
Comecei a notar a recorrência de mães solteiras fazendo o cadastramento quando entrou
uma senhora na sala da ONG AHSAS querendo atendimento. Ela relatou que ganhava o
Bolsa Família e que cortaram o beneficio fazia pouco tempo. Ela disse que sua renda era de
R$100,00. A mulher fazia trabalhos como faxineira, sem carteira assinada, mas ficou
doente e não mais pôde trabalhar. Ela relatou que sua situação é muito difícil, pois não tem
marido e o pai de seus dois filhos não paga pensão.
Percebi, então, que é muito recorrente o cadastramento de mães solteiras, já que não era a
primeira, nem a segunda vez, que eu via uma delas se cadastrar. Comentei com João,
responsável por fazer o cadastramento do Bolsa Família na ONG, o fato, ele confirmou que
de fato é muitoo cadastramento de mulheres que criam seus filhos sozinhas. Como
exemplo, ele comentou a respeito da moça que havia acabado de ir à ONGse cadastrar no
programa. A moça havia nos relatado que a sua situação com o pai de sua filha é delicada.
Falou que está na justiça para receber a pensão. No entanto, o pai não assume a menina
como filha. O pai dela, portanto, não foi declarado na ficha de cadastramento.
Na sala de espera do Núcleo de Benefício e Renda também pude presenciar exemplos de
uma mãe solteiras que recebiam o benefício. Certa vez, puxei papo com uma menina que
estava sentada ao meu lado, ela tinha acabado de chegar. Ela tinha, na ocasião, uma filha de
quatro anos e recebia o Bolsa Família há mais de um ano. Ela me relatou que morava
sozinha com sua filha, pois não morava mais junto de seu esposo. O ex-marido paga
pensão, mas ela disse que tem que ficar em cima dele para ele pagar direito. Comentando
sobre pais que não pagam pensão, ela disse que sua filha é a cara do pai e que nem
26
precisaria fazer DNA. Ela vive, hoje, com o dinheiro do Bolsa Família e do dinheiro que
recebe do pai da criança.
O interessante é que o próprio Programa Bolsa Família privilegia a mulher no recebimento
do benefício, considerando seu papel central na condução do lar. Segundo o Ministério de
Desenvolvimento Social, responsável pelo gerenciamento do Programa Bolsa Família, essa
decisão tem como base estudos sobre o papel da mulher na manutenção da família e na sua
capacidade em usar os recursos financeiros em proveito de toda a família.
“Para o MDS, o público alvo preferencial para o recebimento do benefício em nome da família é a
mulher. Essa decisão tem como base estudos sobre o papel da mulher na manutenção da família e na
sua capacidade em usar os recursos financeiros em proveito de toda a família”.2
Percebemos, neste caso, que na própria formulação do Programa Bolsa Família houve
preocupação em adaptar o programa social ao contexto no qual ele seria inserido. O
Ministério de Desenvolvimento Social afirma que a mulher é quem deve ser priorizada na
hora de receber a bolsa. Assim, o caso do Programa Bolsa Família revela que não só a vida
social se adapta à implementação de um programa social, mas a legislação e o projeto de
um programa social também leva em consideração o contexto social em que o programa
social será implementado. Como demonstrado previamente, no contexto estudado, grande
parte das famílias parecia conviver com a ausência paterna em casa, e a maior parte dos que
iam se cadastrar ou fazer reclamações eram mulheres. Assim, parece haver uma
convergência entre a legislação do Programa Bolsa Família, que prioriza as mulheres no
recebimento da bolsa, e o contexto social no qual o programa foi implantado. De fato
pensar um programa social parece exigir que se conheça o contexto no qual o programa vai
ser inserido, bem como pensar as implicações que o programa terá na dinâmica social.
3. O Programa Bolsa Família visto pelos usuários e potenciais usuários
2 Site: http://www.mds.gov.br/programas/transferencia-de-renda/programa-bolsa-familia/programa-bolsa-familia/criterios-de-elegibilidade/ (visitado em maio de 2007)
27
Pensar o Bolsa Família como um programa cujo objetivo principal é angariar votos para o
partido da situação tem sido bastante comum. Esta visão ganhou grande evidencia no
período que precedeu as eleições de 2006. O então Senador Cristovam Buarque (PDT/DF) -
que depois concorreu às eleições presidenciais de 2006 -, em artigo publicado no jornal O
Globo, no dia 29 de outubro de 2005, falando sobre o Bolsa Família, disse que a bolsa torna
a família beneficiária devedora do governo.
“A Bolsa Família, vista como simples transferência de renda, sem a contrapartida do estudo nem o
investimento na qualidade da educação, e administrada pela assistência social, transforma a família
em submissa devedora do governo, recebedora de favores, passível de riscos eleitoreiros. Além de
não educar as crianças, deseduca politicamente as famílias. Prova disso é a análise de que o resultado
eleitoral de 2006 pode ser determinado pela lealdade dessas famílias da bolsa à candidatura do
Presidente Lula.”
Essa idéia também pode ser encontrada entre os potenciais eleitores, alguns dos quais
recebem o Bolsa Família. Certo dia, estávamos eu, André, Will e Omar, conversando na
mesa, próximo da cozinha, na ONG AHSAS. André trabalha na ONG, já Will e Omar são
membros da Cooperativa Comunitária de Construção Civil do Barreto (CCOCB), iniciativa
apoiada pela Incubadora de Cooperativas Populares, que é um projeto de extensão da
Universidade Federal Fluminense. As reuniões da cooperativa são realizadas na ONG, por
isso entrei em contato com os membros durante o trabalho de campo. Conversávamos sobre
muitos assuntos, dentre eles a minha pesquisa e o Bolsa Família. Até que André me
perguntou se eu gostaria de saber sua opinião sobre o programa. Eu respondi
afirmativamente e, então, ele disse: “As pessoas vão acabar votando no Lula com medo de
acabar o Bolsa Família”.
Os meios de comunicação também publicam reportagens que apontam para o fato de que o
Bolsa Família é usado por alguns com fins eleitoreiros. Um argumento que poderia
demonstrar o poder do Bolsa Família para angariar votos é o fato de que, como afirma a
reportagem do jornal Estado de S. Paulo, de 30 de Abril de 2006, o candidato do PSDB
Geraldo Alckimin afirma que o programa continuará a existir em seu governo. Na
reportagem do dia 02 de maio de 2006, no mesmo jornal, o jornalista afirma:
28
“Embora reconheçam ser uma política assistencialista, o PSDB não quer perder votos nas camadas
mais pobres. Por isso, a alternativa é sustentar que a origem do bolsa Família está no governo
Fernando Henrique Cardoso, que vai ampliá-lo e não acabar com o programa como os adversários
estão espalhando entre os eleitores.”
No dia 08 de maio de 2006, o mesmo jornal publica que Fernando Henrique disse que as
políticas sociais do atual governo são apenas uma continuidade do seu próprio governo.
“As políticas atuais que estão sendo feitas pelo Lula foram começadas por mim”, disse.
Outra reportagem no jornal Estado de S. Paulo publicou que o então ministro do
Desenvolvimento Indústria e Comércio Exterior, Luiz Fernando Furlan, disse que as
políticas sociais do governo Lula, por exemplo, garantem ao presidente uma parcela
significativa de votos. “Será que alguém que ganhou um emprego vai votar contra o
governo?”, disse. Segundo Furlan, esta mesmo idéia poderia ser aplicada no caso de
beneficiários de programas sociais como o Bolsa Família.
A reportagem do jornal Folha de S. Paulo, de 31 de maio de 2006, diz que a última
pesquisa Datafolha mostra que o principal motivo que induz o eleitor a votar no presidente
Luiz Inácio Lula da Silva é a percepção das ações do governo na área social, associado à
visão de que ele está fazendo um "governo voltado para os pobres" e conduzindo bem sua
política econômica. Segundo o levantamento, 25% dos entrevistados citaram os programas
sociais como razão do voto em Lula. Das ações na área, a que mais se destaca é o Bolsa-
Família, citado por 14%.
Além disso, um levantamento do Data Folha publicado pelo jornal Folha de S. Paulo, no
dia 30 de outubro de 2005, revela que Lula consegue percentuais mais elevados de eleitores
entre aqueles beneficiados por programas como o Bolsa Família. Segundo a pesquisa, "nos
cenários traçados para o primeiro turno, Lula bateria todos os adversários, se votassem
apenas os brasileiros que participam ou têm alguém da família beneficiado por programas
sociais federais. A intenção de votos para Lula varia de 37% (numa disputa contra José
29
Serra, do PSDB, que ficaria com 26%) a 40% (em um embate com o também tucano
Geraldo Alckmin, que não passaria de 11%), entre os beneficiários destes projetos”.
Outra pesquisa divulgada pelo jornal O Estado de S. Paulo, no dia 5 de junho de 2006, e
realizada pelo o Instituto Ipsos Public Affairs informa que 56% dos cidadãos que avaliam o
governo como ótimo ou bom já recebeu benefícios do programa Bolsa Família ou conhece
alguém que o fez. O estudo ouviu mil eleitores em 70 cidades brasileiras.
Durante uma reunião do Conselho Municipal de Assistência Social do município de
Niterói, que ocorreu no Núcleo de Benefício e Renda da Secretaria Municipal de
Assistência Social, Osvaldo, membro do Partido dos Trabalhadores, representante dos
usuários do Bolsa Família e um dos conselheiros da comissão, chamou os participantes que
lá estavam de “clientela do Bolsa Família”. E interveio durante a fala da coordenadora do
Núcleo de benefício e Renda, que nessa ocasião falava sobre os resultados do Programa
Bolsa Família no município, e perguntou ironicamente: “Nós sabemos que vamos ter
críticas, que vão dizer que o Bolsa Família tem fins eleitoreiros. Eu acho que não é o caso.
Ou será que tem fins eleitoreiros mesmo?”.
Alguns textos bastante importantes para o estudo do Estado fazem parte de uma tradição
que vem pensando a relação entre Estado e população segundo uma visão clientelista. Um
texto que permite a familiarização com o modo como a política brasileira vem sendo
pensada é “Mandonismo, Coronelismo, Clientelismo: Uma Discussão Conceitual”. No
livro, José Murilo de Carvalho (1997) retoma conceitos básicos como mandonismo,
coronelismo, clientelismo, patrimonialismo, feudalismo. Para isso, percorre a obra de
diferentes autores que abordaram estes assuntos. Fala, por exemplo, das visões de Vitor
Nunes Leal e Raymundo Faoro. José Murilo de Caravalho defende que qualquer que seja a
noção de clientelismo implica troca entre atores de poder desigual. No caso do clientelismo
político, o Estado é a parte mais poderosa. É ele quem distribui benefícios públicos em
troca de votos ou de qualquer outro tipo de apoio que necessite.
Pensar as política públicas como políticas de cunho assistencialista, que visam arrecadar
votos para o governo, parece ser bastante recorrente. Como vimos, esta visão não é
30
encontrada apenas no meio acadêmico, mas também nos meios de comunicação, entre
políticos e ainda em idéias que chamamos de “senso-comum”.
3.1. A categoria ajuda
No jornal O Globo, de 16 de julho de 2006 na reportagem “Social, mas com apelos
econômicos e eleitorais”, há a fala de uma senhora, Maria de Lurdes dos Santos, que tem
cinco filhos menores e cuja única renda são os R$80 que recebe do programa Bolsa
Família. Ela afirma: “Esse dinheiro é uma ajuda do governo (...) Só sei que recebo e vou
fazer compras”.
No jornal Estado de São Paulo, na reportagem publicada no dia 31 de janeiro de 2006,
Maria da Conceição Souza, 29 anos, mãe de três filhos com menos de 10 anos – duas
meninas e um menino -, todos de pais diferentes-, revela: “Eu ganhava a vida lavando
roupa e nem sempre o que eu ganhava dava para comprar comida todo dias para as
crianças. Quando entre para o programa passei a conseguir comprar arroz e feijão para o
mês todo. Foi uma grande ajuda”.
Uma reportagem do Globo Online, publicada em 18 de Maio de 2006, cujo título é “Ajuda
do governo não chega a quem passa fome”, Jaíde, que tenta receber o benefício do governo
diz: “Já fiz de tudo para ver se recebo alguma ajuda. (...) Eu corro atrás, mas nunca chegou
nada para mim. O que me deixa mais indignada é saber que muita gente não precisa receber
a ajuda do governo (...)”.
O que chama atenção em relação ao Programa Bolsa Família é o fato de que comumente a
categoria utilizada para designar o programa é ajuda. É possível observar esse fato até
mesmo por meio de depoimentos de beneficiários em algumas reportagens de jornais.
Podemos observar por meio destas reportagens que o Programa Família usualmente é
pensado como uma ajuda do governo ou de quem que seja apontado como o gestor do
programa. Uma literatura importante aponta para o fato de que o uso de certas categorias
pode ser importante para percebermos alguns fenômenos sociais. Certamente não é por
acaso que o Bolsa Família é designado como ajuda. O fato da categoria utilizada para se
31
referir ao benefício ser ajuda pode ser revelador do modo como os usuários e dos
potenciais beneficiários se relacionam com o programa e o percebem.
Beatriz Heredia (1979) faz uma análise da organização interna de unidades de produção
camponesa, na Zona da Mata de Pernambuco. Heredia destaca a oposição casa/roçado
como central na definição da esfera do trabalho. O roçado aparece como o lugar da
produção e um lugar predominantemente masculino, ao passo que a casa aparece como o
lugar do consumo e um lugar predominantemente feminino. Ela demonstra como a
categoria ajuda, naquele contexto, revela algumas dinâmicas sociais importantes. Enquanto
as atividades do roçado são consideradas trabalho, as atividades da casa são definidas pela
categoria ajuda.
No estudo de Renata de Castro Menezes (2004), a categoria ajuda freqüentemente aparece
para definir a doação e as graças recebidas do santo. E a ajuda, segundo a autora, gera um
sentimento de gratidão e agradecimento, que pode resultar em devoção. “(...) a medida em
que um devoto se torna mais e mais fervoroso, ele se doa a um santo – ‘seu’ santo,
enquanto persistir a gratidão e o reconhecimento pelas graças alcançadas em toda a sua
vida”.
Moacir Palmeira e Beatriz Heredia (2005) utilizam parte da pesquisa que desenvolveram
sobre concepções de política e ação sindical entre populações rurais em alguns municípios
de Pernambuco e do Rio Grande do Sul. No contexto estudado pelos autores, a ligação
estabelecida por um chefe de família com um determinado político compromete todo o
grupo doméstico. O voto tem um caráter de adesão, ou seja, situa os eleitores em um lado
da sociedade.
Heredia e Palmeira (2005) observaram que a concessão de ajuda é parte da relação que se
estabelece entre eleitores e políticos. Os candidatos fazem-se valer de ajudas, favores,
capazes de fazer com que o eleitor se sinta comprometido com eles, já que a concessão de
um favor pode fazer com que o eleitor sinta-se endividado com o candidato doador. A
32
eleição, nesse contexto, pode aparecer como um momento de amortizar a dívida para com
um político.
Marcos Otávio Bezerra (1999) analisa as representações, práticas e relações sociais
produzidas em torno da atuação dos parlamentares no Congresso Nacional. A atuação dos
parlamentares aparece num sistema de relações de interdependências entre representantes
dos poderes locais (estados e municípios), nacional e agentes privados, em que categorias,
como favor, dívida são fundamentais para se compreender as relações entre essas diferentes
instâncias da vida pública.
Assim, é que categorias como favor, dívida, ajuda são significativas para se pensar certas
dinâmicas e representações sociais. Interessante também ressaltar que essas categorias
ganham sentido quando pensadas em contextos específicos, pois elas revelam justamente
relações e concepções que emergem contextualmente.
Ao longo da pesquisa de campo que realizei, também percebi que a categoria mais utilizada
para definir o Programa Bolsa Família é a categoria ajuda. As pessoas freqüentemente
utilizavam o termo ajuda ao se referir ao benefício. Portanto, não é somente na imprensa
que os beneficiários utilizam a categoria ajuda para definir o programa. Em campo,
constantemente, a categoria ajuda apareceu para designar o Bolsa Família.
No Núcleo de Benefício e Renda, responsável pelo gerenciamento do Programa no
município de Niterói, há pessoas das mais diversas regiões da cidade, que se dirigem até lá
para fazer o cadastramento, saber informações, fazer reclamações. Certa vez, uma moça
estava no local e identificou-se como moradora de Charitas. Ela disse que fez o
cadastramento em 2004, quando ainda estava grávida de cinco meses de seu filho caçula. O
motivo de sua ida ao local foi tentar entender o porquê de não ter recebido o benefício
desde a ocasião de seu cadastramento. Perguntei a ela por que achava que o governo
oferecia esse programa, e ela me revelou: “Ele quer ajudar as crianças. Porque as mães não
podem trabalhar. Aí ele dá essa ajuda”. Por meio desse exemplo podemos observar a
categoria ajuda aparecendo para explicar o porquê da implementação do programa.
33
Nesse mesmo dia conversei ainda com uma mulher, moradora do Cubango, que estava na
sala de espera relatou que não recebia a bolsa desde janeiro, motivo de sua estada no local.
Todos, então, começaram a conversar sobre política e o governo atual (governo Lula). A
fala de uma das mulheres tentava explicar o por quê da existência do Programa Bolsa
Família. Ela disse: “Lula enviou esses serviços para retribuir os votos. O povo votou nele e
agora ele quer pagar para retribuir”. E acrescentou: “O governo diz: ‘vamos dar uma
ajudinha’”.
Por meio da fala desta mulher é possível observar que há a idéia de que Lula possuía uma
dívida para com o povo, já que recebeu votos da população. E, por isso, teve que pagar a
sua dívida. Estão em jogo as noções de reciprocidade e troca. Uma vez que Lula recebeu
os votos, ficou em dívida com a população e, por isso, teve que retribuir com uma ajuda,
no caso o Programa Bolsa Família.
Outro dia fui novamente até o Núcleo de Benefício e Renda, os funcionários do Programa
estavam realizando o cadastramento em uma salinha e em outra sala estavam atendendo
pessoas que já recebem o benefício. Quando cheguei na sala de espera só havia mulheres. E
algumas delas estavam com seus filhos. Havia também duas moças sentadas em frente a
mim. Uma era loira, branca, de olhos castanhos, com aproximadamente 30 anos, vestia-se
com uma calça de ginástica e uma roupa simples e disse que tinha um filho de um ano. A
outra era morena clara, com aproximadamente 30 anos de idade, vestia-se de maneira
simples e disse que tinha um filho de três anos. Elas, então, começaram a falar sobre o
Programa e a loira disse: “Já é uma ajuda. Não é muita coisa, mas já ajuda”. Mais uma vez
a categoria ajuda aparece para definir o programa.
A fala de um beneficiário do programa também utiliza a categoria para definir o Programa
Bolsa Família. Rogério recebe o benefício há mais ou menos um ano. Na ocasião, ele
recebia R$45 do programa. Ele é casado e é pai de três filhos, um menino de 16 anos e duas
meninas, uma de 12 e outra de sete anos. O filho mais velho não mais interfere no
recebimento do dinheiro. Naquela ocasião, Rogério tinha pegado uma criança para criar e
pretendia cadastrá-la no programa. Ele disse a respeito do benefício: “Dá para ajudar a
34
comprar material do colégio. O dinheiro tem que ser usado para isso: alimento, comprar
material”. E acrescentou: “não fumo, não bebo”.
Além da noção de ajuda aparecer novamente por meio da fala de Rogério, é interessante
observar que ele logo tratou de demonstrar que utiliza o dinheiro para comprar coisas úteis
e necessárias. E fez questão de frisar que não fuma e não bebe, ou seja, que não utiliza o
dinheiro para tais finalidades. Na fala de Rogério, além do fato relevante de que aparece o
termo ajuda para classificar o programa, podemos observar a necessidade dele frisar que
não é fumante e não faz uso de bebidas alcoólicas, o que provavelmente tem como objetivo
me mostrar que ele faz uso da bolsa de forma correta, ou seja, para comprar comida e
material para seus filhos. Rogério me disse ainda: “Já pensei em abrir mão do benefício
para ajudar outras pessoas que precisam mais”. Explicação, inclusive, que ouvi com
alguma freqüência. Em discussões, por exemplo, de pessoas falando que muitas pessoas
ganham e não precisam. Importante notar que mesmo nesses casos o termo ajuda aparece.
Certo dia, em uma de minhas idas até a ONG AHSAS, havia duas mulheres com um bebê,
que aguardavam para fazer o cadastramento do programa. Na realidade, uma delas foi até lá
fazer o agendamento para se cadastrar, enquanto a outra foi fazer o cadastramento. Uma
delas era mãe de uma menina de três anos. Antes da moça entrar em uma salinha para se
cadastrar, ela me disse que resolveu fazer o programa porque moram apenas ela e a filha e
ela não tem emprego. Ela disse: “Só moro eu e minha filha. Eu não trabalho, vivo de
biscates. E é uma ajudinha”. E ela acrescentou: “Meu marido não ajuda”.
O interessante neste caso é notar que a mesma categoria utilizada para definir o Programa
Bolsa Família, é utilizada também para definir o ato do marido dar alguma coisa para ela e
sua filha. Ou seja, a atuação do governo é uma ajuda, tanto quanto o seria a ação de seu
marido. João, então, perguntou pra ela do que ela vive. Ela disse que vive de ajuda. Ele
perguntou de quem, e ela respondeu: “Minha família. Meu pai ajuda”. Curioso que aqui
também, além dela definir a bolsa como uma “ajudinha”, ela define do mesmo modo a
atitude do pai de dar uma quantia de dinheiro para ela e sua filha de ajuda.
35
Outras situações ainda são bastante interessantes para pensar a utilização da categoria ajuda
para designar o Bolsa Família. Fui até a Secretaria de Assistência Social do município de
Niterói. Falei com a assessora de comunicação da secretaria. Sobre o Bolsa Família, ela me
disse que há muitos casos de usuários que quando passam a receber um salário ou
conseguem um emprego vão até a secretaria e devolvem o cartão que usavam para receber
o benefício do programa. A assessora me relatou que houve uma senhora que devolveu o
cartão, porque achava que outros precisavam mais do que ela naquele momento. Ela
acredita que esse tipo de atitude se deve ao trabalho de conscientização que vem sendo feito
pelos agentes do programas. As reuniões, segundo ela, acabam conscientizando as pessoas
de que o benefício é para os que precisam naquele momento.
Em outro momento, fui também até à Secretaria de Assistência Social do município de
Niterói. Falei com o psicólogo da Secretaria, do programa Plantão Social. Ele também me
relatou, em relação ao Programa Bolsa Família, que houve casos de pessoas que, por terem
conseguido um emprego, foram até à Secretaria de Assistência Social cancelar o benefício
do programa. Ele disse que teve uma mulher, no ano de 2005, que foi até lá e quis inclusive
devolver todo dinheiro que ela havia ganhado no Programa Bolsa Família.
Entretanto, interessante aqui é a gente pensar como algumas pessoas só querem receber o
benefício por acharem que passam por um momento de necessidade, em que precisam de
ajuda. Quando se estabilizam ou ganham um novo emprego podem querer devolver o
cartão que utilizam para sacar o benefício.
É interessante notar, por meio destes exemplos, que a categoria ajuda aparece
freqüentemente como a categoria definidora do Programa Bolsa Família. Além disso, ela
aparece não só para designar o benefício, mas também para designar outros tipos de ações
que familiares desempenham. E é importante notar que a noção de reciprocidade, de dívida
também aparece em alguns momentos.
Tal fato poderia passar como um fato despercebido. Entretanto, é interessante questionar o
por quê da categoria utilizada para definir o benefício ser ajuda. Por que a categoria
36
utilizada pelos beneficiários e potenciais beneficiários do programa para designar o Bolsa
Família é ajuda? Outros termos, como direito, benefício e obrigação, poderiam ser
utilizados para definir o programa, mas não o são. Um caminho possível para esclarecer a
questão é tentar pensar em que outras situações a categoria ajuda apareceu em campo, a fim
de pensar o que a categoria ajuda significa para o grupo estudado ao longo do trabalho de
campo.
3.2. Mas o que é ajuda?
Para tentar entender o significado da categoria ajuda no contexto em que a pesquisa foi
realizada, tentou-se pensar em que outras situações esta mesma categoria aparecia em
campo. Não foram raros os momentos em que o termo ajuda foi utilizado.
Certo dia, eu me dirigi à Praça do Barreto. Lá, vi dois homens mais velhos sentados. Eram
dois aposentados. Perguntei para eles se já tinha ouvido falar no Programa Bolsa Família e
o que achavam do programa. Um dos homens disse que achava que o Programa Bolsa
Família era uma boa ajuda para aqueles que precisam. Depois de algum tempo de conversa
falamos sobre outros assuntos. O homem, então, me relatou que recentemente teve um
problema cardíaco e precisou fazer uma cirurgia que custava R$3000,00. Ele disse que não
tinha condições de pagar pela cirurgia. Então, um amigo seu recomendou a ele que
procurasse uma determinada pessoa em um hospital. Assim, o aposentado não precisou
pagar a cirurgia. Perguntei, então, como ele se sentia em relação a esse amigo. Ele me disse
que se o amigo precisasse, sem dúvidas, ele o ajudaria também. E disse que seu amigo é
muito bom e que no que ele precisar ele vai ajudá-lo.
Podemos observar que a mesma categoria utilizada para definir o Programa Bolsa Família
foi utilizada para definir a atitude de seu amigo de colocá-lo em contato com alguém, o que
possibilitou que ele se submetesse gratuitamente a uma cirurgia. Outro aspecto interesse
que aparece em sua fala é o fato de que o aposentado estaria disposto a retribuir a ajuda que
recebeu de seu amigo.
37
Fui até à comunidade Buraco do Boi, que fica no bairro do Barreto. Cheguei até a
comunidade por meio de moradores que conheci na ONG AHSAS. Eles trabalham na
cooperativa de construção civil, cujas reuniões realizam-se na ONG. Assim, acabei
entrando em contato com alguns dos cooperados e suas famílias, alguns deles beneficiários
do Programa Bolsa Família. Seu Otávio e Almir, membros da cooperativa, Luciana, esposa
de Aílton, e seus dois filhos fizeram questão de nos acompanhar quando estávamos já indo
embora da comunidade. No caminho conversamos sobre muitos assuntos e estávamos
brincando uns com os outros. Almir, então, relatou que um dos membros da cooperativa,
Waldemar, deu a ele o terreno onde mora, na comunidade Buraco do Boi: “Foi o Waldemar
que arrumou esse terreno para a gente morar lá na comunidade. Se não fosse ele... Ele
ajudou muito a gente. Nossa! Eu sou muito grato a ele. Ele foi muito legal com a gente”. E
Luciana concordou com o marido.
A conversa surgiu num momento em que falávamos de algumas características negativas a
respeito de Waldemar. Aílton, então, disse que não poderia falar nada dele e nos relatou a
situação. Vemos aí que a categoria ajuda aparece para designar a atitude de Wanderlei de
ter dado algo ao casal. Nesse caso, fica evidente a gratidão de Almir por ter recebido o
terreno de Waldemar. A gratidão aparece como uma espécie de reconhecimento do que foi
feito.
Neste dia, a chapa de Almir havia ganhado as eleições para ocupar a presidência da
associação de moradores da comunidade. Foi feita uma festa de despedida para os
moradores que ocuparam a presidência da associação até aquele momento. Durante a festa,
me chamou atenção um comentário de uma senhora que havia trabalhado na antiga
associação. Perguntei a uma menina se ela era da antiga associação. Ela me disse que sim, e
a senhora falou: “Ela vai continuar. Eu liguei pra eles (os membros da diretoria) e pedi pra
ela continuar”. E acrescentou: “Seu Paulo (antigo Presidente da Associação da comunidade
Buraco do Boi) ajudou muito minhas filhas. Ele é um homem muito bom. Minhas filhas
todas trabalham aqui”. Assim, a atitude do antigo presidente de ter dado um cargo na
associação para suas filhas foi considerada pela senhora como uma ajuda. E em seguida a
esse comentário, segue-se um elogio ao antigo presidente.
38
É bastante interessante o fato de que a categoria ajuda aparece, nesse contexto, não só para
designar o Programa Bolsa Família, mas também para definir outras atitudes, em que é
recebido uma doação de alguém. Interessante também, que constantemente segue-se ao
relato do recebimento da ajuda um comentário elogioso ao doador ou uma fala que
demonstra gratidão pelo recebimento da doação.
Tais usos da categoria ajuda podem nos ajudar a pensar o significado deste termo em outras
situações e contextos, a fim de tentarmos entender o por quê do uso da categoria ajuda para
designar o Programa Bolsa Família. No contexto estudado, como vimos, a categoria ajuda
foi utilizada para assinalar situações em que alguém recebia algo de outra pessoa e, por
isso, sentia-se de algum modo grato.
Como vimos anteriormente, o Bolsa Família é geralmente visto como uma ação de cunho
assistencialista, que visa obter votos para o partido da situação. O uso da categoria ajuda,
desta forma, pode indicar e confirmar que, de algum modo, políticas públicas, como o
Bolsa Família, ainda são percebidas pela população como políticas de conheco assistencial,
que visam ajudar à população. Portanto, a definição e entendimento deste tipo de política
como tendo um cunho assistencialista parece se fazer presente no imaginário social.
O uso da categoria ajuda parece indicar ainda, se pensarmos no modo como o termo é
usado em outras situações no mesmo contexto social, que muitos dos que recebem a bolsa e
sentem-se ajudados pelo governo e, consequentemente, sentem-se gratos por receberem o
benefício.
A pergunta que se segue é: A gratidão pelo recimento do Bolsa Família converte-se
necessariamente em votos? Seria, então, o Bolsa Família eficiente para angariar votos para
os partidos políticos e seus representantes? Esta pergunta não pode ser respondida com
precisão, pois gratidão não necessariamente converte-se em votos. No entanto, não é
possível descartar a possibilidade. Provavelmente, em alguns casos, o Bolsa Família pode,
39
sim, angariar votos para os partidos. Entretanto, é preciso levar em conta outros aspectos
importantes que serão discutidos no próximo subcapítulo.
3.3. Falta de informação e desapontamento
Um dos desdobramentos do Programa Bolsa Família parece ser um certo descontentamento
dos beneficiários e potenciais beneficiários com o programa, que muitas das vezes
relaciona-se com a falta de conhecimento acerca de informações básicas sobre o benefício.
Em minhas idas ao Núcleo de Benefício e Renda da Secretaria de Assistência Social de
Niterói pude presenciar diversas reclamações sendo feitas por usuários e até mesmo por
aqueles que tinham interesse em receber o benefício. Algumas das reclamações se dirigiam
à dificuldade de realizar o cadastramento, já que há prazos, datas, etc.
Notei que grande parte das pessoas não sabia, por exemplo, os critérios de seleção para
conseguir receber a bolsa. As pessoas pareciam não ter informação sobre quem selecionava
as famílias, quais eram os critérios de seleção e que o cadastro não necessariamente
significa que iriam receber a Bolsa. No Núcleo de Benefício e Renda, certa vez, havia duas
mulheres falando sobre o cadastramento e a dificuldade para receber o benefício. Uma
delas disse: “Poxa. É época de eleição, eles deveriam adiantar isso”. E perguntou para a
outra quanto o Programa dava para as famílias e quais eram os critérios. A mulher
respondeu: “Não sei se é por filhos, se é quem trabalha... A senhora já recebe?”.
Assim, muitas vezes as pessoas não sabiam quais são os critérios necessários para
conseguir o benefício. Duas senhoras idosas, por exemplo, foram até a sede do Bolsa
Família em Niterói querendo se cadastrar no programa. No entanto, o funcionário disse que
elas não se encaixavam nos critérios para receber a bolsa, pois não tinham filhos pequenos
e eram idosas. Uma das senhoras depois de relatar ao homem as dificuldades pelas quais
tinha passado para chegar até ali, como ter desccido as escadarias do morro com a mulher
que a acompanhava, lamentou não poder receber o benefício e deixou o local reclamando
40
da situação em que se encontrava, do descaso do governo e do baixo salário que recebia, já
que tinha mais de setenta anos e havia trabalhado a vida toda.
Como no exemplo acima, por diversas vezes observei que as pessoas não estavam
esclarecidas sobre os critérios de seleção para o programa. E em muitos casos foi possível
perceber que não sabiam nem ao menos que o fato de terem se cadastrado não significava
que necessariamente receberiam benefícios. Por muitas vezes presenciei reclamações de
potenciais usuários que queriam entender o porquê de ainda não terem recebido o benefício,
já que haviam se cadastrado. Eles se surpreendiam ao saber dos agentes que a seleção era
feita pelo governo federal e que havia uma série de critérios que pautava a escolha.
Grande parte das pessoas que estiveram na sede do programa pretendia se cadastrar para
receber os recursos do Bolsa Família. No entanto, foram informadas de que o
cadastramento não estava ocorrendo naquele momento, pois ainda haveria uma reunião
com o prefeito de Niterói, Godofredo Pinto (PT), para decidir se seriam abertas novas
vagas. Muitos dos que pretendiam tornar-se usuários, então, reclamavam, alegando que já
haviam tentado se cadastrar em alguns momentos e frustraram-se. Uma pessoa chegou a
dizer que achava melhor não receber o benefício, pois a espera e o trabalho para consegui-
lo não compensavam. Ela disse que foi por insistência de sua mãe, que disse que seria bom
para os filhos pequenos, que ainda tentava se cadastrar. Ainda em outra ocasião, uma moça,
mãe de dois filhos, que sentava-se na sala de espera, me relatou que se cadastrado há quase
três anos no morro do Preventório, em Niterói. O motivo de sua ida ao Núcleo de Benefício
e Renda foi justamente o fato de não ter recebido o benefício desde a ocasião de seu
cadastramento.
Com os exemplos dessas pessoas que haviam se cadastrado e procuraram a coordenação do
programa para entender o porquê de ainda não receberem a bolsa, pude constatar que não
há, na grande maioria das vezes, o entendimento de que o cadastro não necessariamente
resultará no ganho do benefício e, mais ainda, que não há o entedimento de quais são os
critérios necessários para se receber o benefício.
41
Além disso, o fato das pessoas se encaixarem nos critérios para o recebimento do Bolsa
Família, não significa que automaticamente receberiam o benefício, pois o número de
recursos disponíveis pelo programa destinado a cada município é restrito. Grande parte dos
que vão se cadastrar desconhece esta informação, e ao saber que o cadastro não
necessariamente representa o recebimento do benefício, ficavam surpresas e algumas vezes
sentiam-se frustradas e até mesmo indignadas.
Em um dos dias em que fui acompanhar o cadastramento no Núcleo de Benefício e Renda
ouvi de uma mulher dizer: “Eu já me cadastrei há cinco anos. Fui receber só mês passado e
mesmo assim deu problema”. Nesse mesmo dia uma outra mulher que acompanhava a filha
jovem com sua neta disse, falando de outra filha sua: “E minha filha que tem seis filhos e
não ganha nem um real? Só Deus sabe da necessidade dela: casa caindo, seis filhos. Ela já
fez a inscrição, mas até agora nada”.
A situação de terem feito o cadastro e não receberem a bolsa gera nessas pessoas um
descontentamento com a situação. Do mesmo modo atrasos no pagamento, diminuição do
valor da Bolsa recebida após o recadastramento, constatação de que um vizinho recebe
mais do que a própria pessoa, dentre outros fatos, podem gerar insatisfação por parte dos
que o recebem. Observei que o fato de não receberem, justamente por não estarem
informados sobre os critérios de seleção e por acharem que iriam receber caso se
cadastrassem, gerava reclamações e descontentamento por parte das pessoas. Muitos
chegavam a reclamar com os agentes e a comentar com os que esperavam na sala para ser
atendidos a seu desapontamento.
Assim, o recebimento da Bolsa pode gerar descontentamento por parte dos que o recebem,
caso haja, por exemplo, atrasos no pagamento ou caso haja depois do recadastramento
diminuição do valor da Bolsa. E, além disso, a falta de informação sobre os critérios de
seleção e sobre o fato de que o cadastramento não necessariamente significa que o que a
pessoa receberá o benefício pode também gerar descontentamento.
42
Voltando a pergunta do subcapítulo anterior, acerca do eficácia do Bolsa Família como
gerador de votos para os partidos políticos e seus representantes, poderíamos nos
questionar: Poderia o Bolsa Família, ao promover descontentamento por parte de alguns
dos beneficiários e potenciais beneficiários, fazer com que muitos deixem de votar nos
responsáveis pela implementação do programa? Novamente, a resposta parece um pouco
vaga, pois descontentamento não necessariamente fará com que as pessoas deixem de votar
nos partidos e seus representantes. No entanto, não é possível descartar a possibilidade.
Provavelmente, em alguns casos, o descontentamente como o Bolsa Família pode, sim,
deixar de angariar votos para os partidos. Assim como, os milhões de beneficiários, ainda
que reclamem em certas ocasiões, podem, sim, acabar votando em partidos e em função do
recebimento do benefício.
3.4. A quem creditar o benefício?
No caso da implementação do Programa Bolsa Família, um aspecto que parece passível de
observação é o fato de que muitos beneficiários e potenciais beneficiários não sabiam a
quem creditar o benefício. Ou seja, não sabiam ao certo quem eram os gestores e
responsáveis pelo Programa Bolsa Família. Uma senhora, por exemplo, quando perguntei a
ela a quem ela se referia quando falava de quem a tinha concedido o benefício, ela disse:
“Acho que é o Lula. Não sei se foi a Rosinha... o Lula. Acho que foi o Lula mesmo, 'né'?”.
Em sua fala fica claro que há situações em que os próprios usuários não sabem muito bem
definir quem é o gestor do Programa. Não foram raros em que presenciei, ao longo do
trabalho de campo, pessoas atribuírem o recebimento do benefício a políticos locais e
pessoas ligadas a eles que tinham os informado sobre a possibilidade de se cadastrar para o
programa e os ajudado a conseguir o benefício.
A reportagem do jornal O Globo, de 16 de julho de 2006, divulgou que a pesquisa do
DataUFF, realizada com quatro mil beneficiários do Bolsa Família em 53 municípios,
revela que 60% das pessoas creditam o Programa Bolsa Família ao governo federal e
17,6% ao presidente Lula. Mas 9,5% acham que é o Estado o responsável por distribuir a
bolsa. E 6,4% acreditam que o responsável pela distribuição do benefício é a prefeitura
43
municipal e 6,3 acham que sejam políticos locais os responsáveis pela distribuição dos
recursos do programa.
Assim, é possível perceber que, embora a maioria saiba que o governo federal é o
responsável pelo programa, há aqueles que creditam a outras instância da vida pública o
recebimento da bolsa. Além disso, podemos perceber que freqüentemente ocorre uma
espécie de “personificação” do responsável por distribuir os recursos. Um número
significativo de pessoas (17,6%) acredita que o responsável pela melhoria de renda é o
presidente Lula, o que pode ser um fator bastante significativo. Poderíamos nos questionar
se estas pessoas, ao creditarem diretamente ao Lula o recebimento do benefício, ou seja, a
ajuda mensal dada a eles pelo presidente, não acabariam, uma vez gratos por receber a
bolsa, retribuindo a ajuda com votos. Novamente, é bem possível, ainda que não seja um
comportamento compulsório.
Considerações finais
A pesquisa parece apontar para o fato de que pensar um programa social parece demandar
que se conheça o contexto no qual o programa vai ser inserido, bem como pensar as
implicações que o programa terá na dinâmica social. É interessante pensarmos como, a
partir da implantação de uma política pública, aspectos não antes concebidos formalmente
no momento da formulação do programa, acabam se desenrolando. Aspectos estes, como
por exemplo a relação entre agentes e usuários, que parecem fundamentais para se pensar o
modo como as pessoas percebem o programa e se relacionam com ele.
O trabalho de campo realizado a partir do Programa Bolsa Família permitiu pensar alguns
desdobramentos do Programa no município de Niterói, mais especificamente no bairro do
Barreto. No caso da implementação do Bolsa Família, um dos desdobramento do programa
é o fato de que muitos usuários e potenciais usuários não sabiam a quem creditar o
benefício. Ainda um outro desdobramento que surge a partir da implementação do Bolsa
Família é um certo descontentamento dos usuários e potenciais usuários com o programa,
44
que muitas das vezes relaciona-se com a falta de conhecimento acerca de informações
básicas sobre o benefício.
A utilização do cadastro para outros fins é um exemplo interessante de como o programa
social acaba sendo apropriado de diferentes maneiras, dependendo do contexto ao qual é
aplicado. E as relações que se estabelecem entre aquele que requisita o benefício e os
agentes do programa parecem demonstrar que o Estado atua por meio daqueles que o
representam.
A implantação do Programa Bolsa Família parece demonstrar ainda que a dinâmica da vida
das pessoas é alterada em função da implementação de uma política pública. Como vimos,
no caso do Bolsa Família, parece surgir uma espécie de competição entre os usuários do
programa também parece reveladora do modo como a vida social é alterada a partir da
implementação de um programa social.
O uso da categoria ajuda aparece ainda como um aspecto bastante relevante no atual
estudo. O fato dos beneficiários e potenciais beneficiários utilizarem o termo ajuda, e não
termos como direito, obrigação, benefício para defnir o Programa Bolsa Família parece
demonstrar que ainda impera no imaginário social uma visão do Estado como uma
instituição assistencialista, e que, portanto, muitos sentem-se gratos por receber o benefício.
Se a gratidão converte-se em votos ou não, é uma questão em aberto. Provavelmente, as
futuras eleições e os rumos que o país vão tomar falarão por si.
Referências
• BECKER, Howard. “Introdução”. In: Métodos de Pesquisa em Ciências Sociais. São
Paulo, Hucitec, 1993.
• BEZERRA, Marcos Otávio. Em nome das bases: política, favor e dependência pessoal.
Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1999.
45
• BEZERRA, Marcos Otávio. “Participação popular e conflitos de representação política:
notas a partir de um caso de orçamento participativo”. In: CHAVES, Carla Costa e
TEIXEIRA, Christine de Alencar. Espaços e tempos da política. Rio de Janeiro:
Relume Dumará, 2004.
• BORGES, Antonádia M. “A fórmula do tempo: notas etnográficas sobre o ‘tempo de
Brasília’”. In: TEIXEIRA, Carla C. e CHAVES, C. de Alencar (orgs). Espaços e
Tempos da Política. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 2004.
• CARVALHO, José Murilo de. In: Mandonismo, coronelismo, clientelismo: uma
discussão conceitual. Rio de Janeiro: DADOS v. 40, n. 2,1997.
• DA MATTA, Roberto. “O ofício de etnólogo, ou como ter anthropological blues”. In:
NUNES, Edson de oliveira (org.). A aventura sociológica. Rio de janeiro, Jorge Zahar
Editor, 1978.
• DINIZ, Eli. “A máquina chaguista: estrutura e estilo de ação”. In: Voto e máquina
política. Patronagem e clientelismo no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1982.
• EVANS-PRITCHARD, Edward. “Apêndice IV: Algumas Reminiscências e Reflexões
sobre o Trabalho de Campo”. In: Bruxaria, Oráculos e Magia entre os Azande. Rio de
Janeiro: Zahar, 1978.
• EVANS-PRITCHARD, Edward. E. Trabalho de Campo e Tradição Empírica. In:
Antropologia social. Lisboa: Edições 70, 1985.
• FERRO, Andrea Rodrigues e KASSOUF, Ana Lúcia. Avaliação do Impacto dos
Programas de Bolsa Escola sobre o Trabalho Infantil no Brasil. Trabalho apresentado
no I Congresso da Associação Latino-Americana de População, ALAP, realizado em
Caxambu, MG, setembro de 2004.
46
• HEREDIA, Beatriz. “Capítulo III: Casa – Roçado”. In: A morada da vida: trabalho
familiar de pequenos produtores do Nordeste do Brasil. Rio de Janeiro, Brasil, Ed. Paz
e Terra, 1979.
• LEAL, Victor Nunes. “Indicações sobre a estrutura e o processo do ‘coronelismo’”. In:
Coronelismo, enxada e voto. São Paulo: Alfa-Omega, 1975.
• LONGO, Luciene Aparecida Ferreira de Barros. Bolsa-Escola: um estudo da eficácia
para brancos e negros. Trabalho apresentado no XV Encontro Nacional de Estudos
Populacionais, ABEP, realizado em Caxambu, MG, setembro de 2006.
• MALINOWSKI, Bronislaw. “Introdução: tema método e objetivo desta pesquisa”. In:
Argonautas do Pacífico Ocidental – Um relato do empreendimento e da aventura dos
nativos nos arquipélagos da Nova Guiné Melanésia. São Paulo: Victor Civita, 1984.
• WEISSHEIMER, Marco Aurélio. Bolsa Família: Avanços, limites e possibilidades do
programa que está transformando a vida de milhões de famílias no Brasil. São Paulo:
Editora Fundação Perseu Abramo, 2006.
• MENEZES, Renata de Castro. “A relação de devoção”. In: A Dinâmica do Sagrado.
Rituais, Sociabilidade e Santidade num Convento do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro:
Relume-Dumará, 2004.
• PALMEIRA, Moacir e HEREDIA, Beatriz. “O voto como adesão”. In: CANEDO,
Letícia. (Org.). O Sufrágio Universal. Rio de Janeiro: Estação Liberdade, 2005.
• PAZELLO, Elaine Toldo e TAVARES, Priscilla Albuquerque. Uma avaliação do
Programa Bolsa Escola Federal: focalização e impacto na distribuição de renda e
pobreza. Trabalho apresentado no XV Encontro Nacional de Estudos Populacionais,
ABEP, realizado em Caxambu, MG, setembro de 2006.
47
• QUEIROZ, Maria Isaura Pereira de. “O coronelismo numa interpretação sociológica”.
In: FAUSTO, Boris. O Brasil Republicano, 1º vol. São Paulo: DIFEL, 1975.
• SIMÕES, Claudia Pestana. “Quem pariu Mateus, que o balance” – Contribuições para
uma avaliação do Programa Bolsa Família no município de Recife. Dissertação
apresentada à COPPE/UFRJ como parte dos requisitos necessários para a obtenção do
grau de Mestre em Ciências. Orientador: Francisco José de Castro Moura Duarte. Rio
de Janeiro: UFRJ, set 2006.
• VELHO, Gilberto. “Observando o familiar”. In: Individualismo e Cultura – Notas para
uma Antropologia da Sociedade Contemporânea. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2ª
edição.
• WHITE, William Foote. “Anexo A – Sobre a evolução de Sociedade de esquina”. In:
Sociedade de Esquina. Rio de janeiro: Jorge Zahar Editor, 2005.
• WRIGTH-MILLS, C. “Do artesanato intelectual”. In: A Imaginação Sociológica. Rio
de Janeiro: Zahar, 1980.
• www.mds.gov.br (acessado em agosto de 2006 e maio de 2007)