33
 Ciências & Cognição 2007; Vol 12: 115-133 <http://www.cienciasecognicao.org> © Ciências & Cognição  S u b me t i d o e m 1 5 / 1 0 / 2 0 0 7 | A c e i t o e m 2 6 / 1 1 / 2 0 0 7 | I S S N 1 8 0 6 - 5 8 2 1 P u b l i c a d o o n l i n e e m 0 3 d e d e z e mb r o d e 2 0 0 7  Artigo Científico  Psicopedagogia: limites e possibilidades a partir de relatos de  profissionais  Psychopedagogy: limits and possibilities according from the professionals experiences  Maria Regina Peres e Maria Helena Mourão Alves Oliveira  Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campina s), Campinas, SP, Brasil.  Resumo  A psicopedagogia tem sido uma das áreas de conhecimento que tem gerado grande interesse nos pro-  fissionais ligados à educação. Este trabalho tem por objetivo investigar a prática do professor - psico-  pedagogo, seus desafios, suas limitações, suas possibilidade s, frente ao cotidiano da atuação psicope-  dagógica preventiva em instituições regulares de ensino. São sujeitos dez professores psicopedago-  gos de diferentes instituições de ensino. O material utilizado é um questionário de entrevista semi es-  truturada. Os resultados mostram que 100% dos sujeitos são do sexo feminino, entre 26 a 50 anos. As  contribuiçõe s obtidas para melhores resultados na atuação nesta área são diminuição do número de a-  lunos nas classes, necessidade da continuidade de estudos, melhor compreensão sobre as possibilida-  des de realização do diagnóstico psicopedagógico institucional, valorização de uma atuação conjunta  com diversos profissionai s, ampliação de psicopedagogo s em espaços institucionais. © Ciências &  Cognição 2007; Vol. 12: 115-133.  Palavras-chave: psicopedagogia; aprendizagem; prevenção; professor psicopeda-  gogo; atuação psicopedagógi ca.  Abstract  Psychopedagogy has been one of the areas of knowledge that has created great interest in profession-  als attached to education. This work has as its objective to investigate the practice of

Psicopedagogia Limites e Possibilidades

Embed Size (px)

Citation preview

  • Cincias & Cognio 2007; Vol 12: 115-133 Cincias & Cognio S u b me t i d o e m 1 5 / 1 0 / 2 0 0 7 | A c e i t o e m 2 6 / 1 1 / 2 0 0 7 | I S S N 1 8 0 6 - 5 8 2 1 P u b l i c a d o o n l i n e e m 0 3 d e d e z e mb r o d e 2 0 0 7

    Artigo Cientfico

    Psicopedagogia: limites e possibilidades a partir de relatos de profissionais Psychopedagogy: limits and possibilities according from the professionals experiences

    Maria Regina Peres e Maria Helena Mouro Alves Oliveira

    Pontifcia Universidade Catlica de Campinas (PUC-Campinas), Campinas, SP, Brasil.

    Resumo

    A psicopedagogia tem sido uma das reas de conhecimento que tem gerado grande interesse nos pro- fissionais ligados educao. Este trabalho tem por objetivo investigar a prtica do professor - psico- pedagogo, seus desafios, suas limitaes, suas possibilidades, frente ao cotidiano da atuao psicope- daggica preventiva em instituies regulares de ensino. So sujeitos dez professores psicopedago- gos de diferentes instituies de ensino. O material utilizado um questionrio de entrevista semi es- truturada. Os resultados mostram que 100% dos sujeitos so do sexo feminino, entre 26 a 50 anos. As contribuies obtidas para melhores resultados na atuao nesta rea so diminuio do nmero de a- lunos nas classes, necessidade da continuidade de estudos, melhor compreenso sobre as possibilida- des de realizao do diagnstico psicopedaggico institucional, valorizao de uma atuao conjunta com diversos profissionais, ampliao de psicopedagogos em espaos institucionais. Cincias & Cognio 2007; Vol. 12: 115-133.

    Palavras-chave: psicopedagogia; aprendizagem; preveno; professor psicopeda- gogo; atuao psicopedaggica.

    Abstract

    Psychopedagogy has been one of the areas of knowledge that has created great interest in profession- als attached to education. This work has as its objective to investigate the practice of

  • teacher/pscychopedagogue; his challenges, his limitations, his possibilities concerning the day-to-day routine of preventive psychopedagogy in regular educational institutions. The subjects studied are ten teacher/psychopedagogues from different educational institutions. The material used was a ques- tionnaire of semi-structured interviews. The results show that 100% of the subjects are of the feminine sex between the ages of 26 and 50. The contributions obtained for better results in performance in this area are: diminishing the number of students in the classroom, the necessity of continuing studies, better comprehension concerning the possibilities of institutional psychopedagogic diagnosis, valuing the unified performance of several professionals, and elevating the number of psychopedagogues in educational institutions. Cincias & Cognio 2007; Vol. 12: 115-133.

    - M.R. Peres Graduada em Biologia (PUC-Campinas) e Pedagogia (ASMEC), Mestre em Metodologia do Ensi-no (Universidade Estadual de Campinas) e Doutoranda em Psicologia (PUC-Campinas). Atualmente Professora daFaculdade de Educao e Coordenadora de Curso de Especializao em Psicopedagogia (PUC-Campinas). integran-te do Grupo de Pesquisa Aprendizagem, Linguagem e Leitura (PUC-Campinas). E-mail para correspondncia:[email protected]. M.H.M.A. Oliveira Graduada em Fonoaudiologia (PUC-So Paulo), Mestre em Psicolo-gia Escolar (PUC-Campinas) e Doutora em Psicologia Cincia e Profisso (PUC-Campinas). Atualmente ProfessoraTitular (PUC-Campinas) e Lder do Grupo de Pesquisa Aprendizagem, Linguagem e Leitura (PUC-Campinas). E-mailpara correspondncia: [email protected].

    115 Cincias & Cognio 2007; Vol 12: 115-133 Cincias & Cognio

    Key Words: psychopedagogy; learning ability; prevention; teacher/ psychopeda- gogue; psychopedagogic performance.

    Introduo ela tambm considera as valiosas contribui- es, de outras reas de conheci-mento como A busca pela continuidade de estudos, a Antropologia, a Sociologia, a Fonoaudiolo-tem-se constitudo em uma crescente neces- gia, a Medicina, a Neurologia, a Lingstica.sidade quer seja, por questes pessoais e/ou Desta forma se valoriza a construo de umaprofissionais. Esta constatao nos motivou a educao mais ampla que integre as diversasrealizar este trabalho considerando que uma reas de conhecimento, na construo dos sa-

  • das reas de conhecimento que tm apresen- beres do aluno.tado grande demanda para a continuidade de A prtica psicopedaggica prev almestudos, entre os profissionais oriundos de da atuao em clinicas, a atuao em institui-cursos de formao de professores, tem sido a es. De modo geral, o atendimento clnicorea de psicopedagogia. visa intervir em situaes de insuces-sos que Ao se considerar a importncia da j se apresentam instaladas. A atuao insti-formao continuada para profissionais de tucional ocorre, geralmente, em instituiesdiversas reas, destacamos as idias de Batista de ensino, empresas, organizaes assistenci-(2000), ao enfatizar a demanda histrica que ais. Esta forma de atuao apresenta um car-os cursos de especializao, ou seja, que os ter preventivo que visa evitar ou minimizarcursos de ps-graduao lato sensu vm con- possveis situaes de insucessos.seguindo na cultura educacional brasileira. Na prtica institucional preventiva, umEste crescente interesse, dentre outras ques- dos aspectos que merece destaque tem sido ates, estaria relacionado s exigncias do dificuldade dos psicopedagogos em propormercado de trabalho que, juntamente com o procedimentos de avaliao e de interveno.tempo de durao dos cursos de especializa- Esta questo tambm uma das preocupaeso, geralmente um ano letivo, vm atraindo a de Bossa (2000) ao enfatizar que uma das di-muitos. ficuldades prticas com que se deparam os A psicopedagogia, concebida como psicopedagogos brasileiros, reside nos proce-uma rea de conhecimento relativamente atu- dimentos diagnsticos para a interveno. Se-al, historicamente apresenta como objeto de gundo a autora, a indefinio quanto ao ins-estudos, o processo de aprendizagem e suas trumental utilizado no trabalho psicope-interfaces com os vrios campos de conheci- daggico merece ser pensada, de forma quemento. Atualmente, segundo Rubinstein e co- novas perspectivas possam da surgir e aten-laboradores (2004: 227) "o objeto de estudo der as reivindicaes inerentes atividadeda psicopedagogia contem-pornea continua psicopedaggica. Ela tambm acrescenta quesendo a aprendizagem, entretanto passa-se a vrios autores j se debruaram sobre estavalorizar a amplitude do fenmeno educacio- questo, entretanto enfatiza que ainda h mui-nal" e mais intensamente a relao do sujeito to por se fazer.com a aprendizagem. Considera-se assim o Neste mesmo sentido, quanto aos pro-contexto, a situao e as interaes realizadas cedimentos de diagnstico e interveno, a-pelo aprendiz durante o processo de ensino e presentamos as

  • recentes inquietaes de Ru-aprendizagem. Diante destes referenciais binstein e colaboradores (2004) e Masinique a ao psicope-daggica ser proposta e (2006). Estas estudiosas enfatizam que a di-desenvolvida. versidade de prticas psicopedaggicas em Isto, tambm contribui para que se funo da ampliao do campo de atuao dopossa situar a psicopedagogia como uma rea psicopedagogo impe o desafio da realizaode conhecimento interdisciplinar. Neste senti- de novos estudos. Esses estudos poderiam sedo temos que a psicopedagogia, alm de ter o iniciar junto aos cursos de formao do psico-seu referencial na Psicologia e na Pedagogia, pedagogo se estendendo aos programas for-

    116 Cincias & Cognio 2007; Vol 12: 115-133 Cincias & Cognio

    mais de pesquisa desenvolvidos nas universi- do? o por que?; o para que?; se ensina e sedades, especialmente junto a grupos de ps- aprende. Com isto a viso positivista de edu-graduao. Isto contribuiria para obtermos cao cede espao a uma concepo de ensinouma viso mais aprofundada que expressasse e de aprendizagem decorrente da epistemolo-as atuais tendncias da prtica psicopedaggi- gia gentica. Este novo enfoque, reala aca brasileira. construo do conhecimento por meio do a- Assim diante destas e de outras consi- prender fazendo. Com isto passa-se a conside-deraes, o interesse pelo tema psicopedago- rar as etapas de desenvolvimento cognitivo dogia amplia-se e articula-se experincia de aprendiz.uma das pesquisadoras que atua como profes- Isto segundo Kiguel (1990: 39), vemsora universitria e coordenadora de curso de favorecer a "[...] compreenso do fenmenopsicopedagogia em uma instituio particular da aprendizagem de forma a integrar as vriasde ensino. Merece tambm destaque, o fato de reas do conhecimento, considerando ainda,que este tema se converteu em projeto de pes- os diferentes nveis evolutivos." Este mesmoquisa de doutorado, culminando na elabora- estudioso sugere que ser pela interdisci-o deste artigo entre orientadora e orientan- plinariedade, ou seja, por meio da conjugaoda, junto ao programa de ps-graduao em de esforos das vrias reas do conhecimentopsicologia. e conseqentemente de vrios especialistas,

  • Nesta perspectiva, o presente estudo ao que se poder intervir no complexo fenmenopretender desenvolver uma investigao sobre da aprendizagem humana.a atual prtica do psicopedagogo utilizou co- Assim, ao considerarmos a psicopeda-mo referencial alm de um levanta-mento bi- gogia como uma rea de conhecimentos sen-bliogrfico sobre o tema, uma investigao svel a questes relativas do processo educa-com professores que tambm so psicopeda- cional e a contextualizarmos a partir de seusgogos e que estejam atuando em diferentes referenciais tericos, nos defrontamos especi-instituies de ensino pblicas e particulares. almente com as inegveis contribuies daEntendemos que isto nos auxilia a melhor psicologia e da pedagogia. Segundo Viscacompreender os diversos limites e possibili- (1987), a psicopedagogia foi sendo construdadades da atuao psicopedaggica institucio- como uma rea de conhecimento ao mesmonal preventiva no nosso pas. tempo independente e complementar da peda- gogia, por considerar as questes metodolgi-1. O Objeto de estudo, os fundamentos e as cas e em especial o trabalho docente. E emrelaes da psicopedagogia relao psicologia, por considerar especial- mente, as contribuies das escolas psicanal- Existe consenso entre vrios estu- ticas, piagetiana e da psicologia social, pordiosos da psicopedagogia, dentre eles Fer- meio de Enrique Pichn-Rivire. A partir des-nndez (1994), Kiguel (1990), Macedo tes referenciais, a psicopedagogia enfatiza os(1992), Rubinstains e colaboradores (2004), aspectos cognos-citivos, afetivos, emocionais,Massini (2006) Visca (2002), e outros, de que sociais, alm de outros.a psicopedagogia desde a sua origem tem si- Portanto partimos da premissa de quetuado o seu objeto de estudo junto s qus- a construo de conhecimentos no pode setes diretamente relacionadas aprendi- limitar a contribuies isoladas de qualquerzagem. rea que seja, mas sim da inter-relao entre Respeitando-se os estudos, o contexto, elas em funo de um objetivo maior. Assim,as particularidades, dentre outras questes, a psicopedagogia entendida como uma readestacamos as contribuies de Macedo de conhecimentos, geradora de uma prtica(1992) e Visca (1987), que ao enfatizarem o interdisciplinar, no pode ignorar as contri-objeto de estudo da psicopedagogia consi- buies das vrias reas de conhecimentos.deram especialmente as questes de origem Diante

  • disto, Lima (1990: 19), apre-metodolgica, dentre elas, o como?; o quan- senta a importncia de um "dialogo confronto

    117 Cincias & Cognio 2007; Vol 12: 115-133 Cincias & Cognio

    especialmente entre a psicologia e a pedago- A atuao clinica na psicopedagogiagia de forma que se faa algo mais efetivo em apresenta um carter teraputico, inferindo afuno do sujeito cognoscente". Desta forma, idia de cura, de resgate da sade do apren-no se trata de substituir a psicologia pela psi- der. Neste sentido, ela atende aos portadorescopedagogia, pedagogia, antropologia, filoso- de dificuldades de aprendizagens, que j sefia, lingstica, biologia, fonoaudiologia, me- encontram instaladas. Nada impede, pormdicina, ou por qualquer outra rea de conhe- que ao se diagnosticar e proceder a interven-cimento. Entendemos assim que a busca por o, visando eliminar ou minimizar os pro-melhorias educacionais passa pela articulao blemas, tambm se atue de forma a prevenirdas diversas reas em busca de significados outras, possveis dificuldades. Neste sentido,para a atuao profissional. Neste sentido es- o trabalho psicopedaggico na clinica, podetamos incluindo tambm a atuao psicope- tambm ser considerado um trabalho preven-daggica que, no nosso entender, em muito tivo. Com isto, o psicope-dagogo atua inici-pode contribuir com o sucesso da dinmica almente realizando o diagnstico da situaoeducador-conhe-cimento-educando. problema para, em seguida buscar as formas Dentre os estudiosos que abordam as mais adequadas para a interveno. O diag-contribuies das vrias reas de conhe- nstico visa principalmente investigar oscimento rea da psicopedagogia, destaca- qus? e, por qus?, de determinadas situa-mos as de Bossa (2000), e de Stroili (2001). es. A fase de interveno visa a busca dasAssim, segundo os estudos desenvolvidos, melhores opes de procedimentos para sesobre este tema, temos alguns subsdios que efetivar a ao.se destacam. Dentre eles, os: da pedagogia Na atuao institucional, segundo Fa-que ao estudar as diversas abordagens do pro- gali (1998), a nfase do trabalho psicopeda-cesso de ensino e aprendizagem procura em- ggico reside na construo de conhecimentosbasar a ao docente; da epistemologia e da desenvolvidos em nvel preventivo. Este tra-

  • psicologia gentica que analisa e descreve o balho pode ser realizado em diversas frentesprocesso de construo do conhecimento pelo institucionais visando evitar o desenvolvi-sujeito em interao com outros e com os ob- mento de possveis problemas de aprendiza-jetos; da psicologia social que se preocupa gem ou de outras situaes que possam com-com as relaes familiares, grupais, institu- prometer a educao para a vida social. Den-cionais, com as interferncias socioculturais e tre as possibilidades de atuao institucionaleconmicas que permeiam a aprendizagem; do psicopedagogo temos trabalhos na reada neuropsicologia que possibilita a compre- hospitalar, empresarial, familiar, escolar, eenso dos mecanismos cerebrais que servem outras.de base para o aprimoramento das atividades Em especial, enfocaremos a atuaomentais; da psicanlise que aborda o mundo psicopedaggica institucional e neste sentidodo inconsciente, das representaes, que se podemos constatar que, em grande parte dasexpressa por meio de sintomas e smbolos; da instituies, o f`azer psicopedaggico' ocor-lingstica que traz a compreenso da lngua- re, de modo geral, tendo como referencial trsgem, da lngua enquanto cdigo disponvel vertentes. A primeira, quando o psicopedago-aos membros de uma sociedade. go contratado temporariamente, para uma Com isto, tomando como referencial a assessoria psicopedaggica. Neste trabalho,idia de complementaridade das funes em geralmente as intervenes ocorrem direta-busca de articul-las as diversas reas do co- mente junto ao grupo de docentes que por suanhecimento humano para a compreenso do vez, esto em busca de metodologias diferen-fenmeno educacional, temos que a psicope- ciadas de trabalho, visando um melhor apro-dagogia, segundo Fagali (1998), se caracteriza veitamento escolar por parte do aluno. A as-como uma rea de atuao interdisciplinar sessoria pode se dar tambm junto a pais oudesenvolvida por meio das modalidades, cli- familiares de alunos que apresentam possveisnica e institucional. dificuldades de aprendizagem. Neste caso,

    118 Cincias & Cognio 2007; Vol 12: 115-133 Cincias & Cognio

    geralmente ocorre o encaminhamento para um cia do processo integrado de gesto no interi-atendimento psicopedaggico fora do ambien- or da sala de aula

  • visando um melhor aprovei-te escolar. Diante disto, o psicopedagogo difi- tamento educacional.cilmente ir criar vnculos com o grupo, uma Desta forma, ao considerarmos os tra-vez que seu trabalho, na maior parte dos ca- balhos do professor-psicopedagogo, no inte-sos, espordico, ou seja, se restringe a en- rior da sala de aula, temos que ele poder in-contros semanais, quinzenais e at mesmo tervir, dentre outras questes, no sentido demensais. prevenir ou minimizar possveis dificuldades A segunda vertente se d quando a de aprendizagem. Esta tendncia se constituiinstituio escolar contrata o psicopedagogo no aspecto central, portanto de maior interessepara integrar a sua equipe de trabalho. Ao a- neste trabalho, pois se vincula diretamente atuar junto a equipe escolar, geralmente com- nossa inteno de investigar o desenvolvi-posta por diretores, coordenadores, orientado- mento da prtica do professor-psicopedagogo.res educacionais, professores, alunos, pais, Nele estaremos enfatizando os possveis ins-familiares e outros segmentos o psicopedago- trumentos utilizados no processo de avaliaogo tem a oportunidade de interagir diretamen- e interveno, visando a realizao de umate com o cotidiano das aes desenvolvidas na prtica institucional preventiva.instituio. Neste caso, ele passa a realizar umtrabalho em conjunto com outros profissio- 2. Algumas concepes de preveno e pre-nais, contribu-indo assim, dentre outras ques- veno em psicopedagogiates, com: o desenvolvimento de estudos ereflexes sobre os materiais didticos escolhi- As primeiras concepes sobre pre-dos e utilizados; a organizao e seleo dos veno, historicamente aparecem associadas temas de ensino; o processo metodolgico e idia de sade, a idia de bem estar fsico eavaliativo; as situaes de sucessos e insu- emocional. Entretanto, Durlak (1997) concei-cessos escolares; os relacionamentos interpes- tua a preveno como um conhecimento mul-soais e outros temas e questes que sejam de tidisciplinar que envolve as diversas reas deinteresse e necessidade da instituio. O psi- conhecimentos, dentre elas a educao, a psi-copedagogo tambm alm de desenvolver tra- cologia, a medicina, a sociologia, alm de ou-balhos sistemticos junto a equipe escolar po- tras. Isto se justifica em funo da multicausa-de atuar junto a grupos de pais, ou como al- lidade dos fatores e dos objetivos que devemguns estudiosos preferem, junto a `escola de contemplar, os programas de preveno, empais'. Neste caso, dentre outros, o objetivo funo das necessidades pessoais ou dos gru-

  • maior seria a busca de melhorias nas relaes pos. Diante disto, os trabalhos preventivosentre pais e filhos frente aos desafios de um devero considerar objetivos mltiplos, dentremundo em constante mudana. eles os de: evitar o aparecimento de proble- Na terceira vertente temos a presena mas, evitar que os problemas j existentes sedo professor-psicopedagogo, cuja atuao ir agravem, reduzir a gravidade de novos pro-ocorrer diretamente com alunos em sala de blemas ou mesmo, retardar o desenvolvimen-aula. Isto certamente favorecer, um relacio- to do problema.namento de proximidade, de confiana propi- Historicamente temos, segundo Albeeciando um melhor conhecimento das poss- e Gullotta (1997), que as primeiras propostasveis dificuldades de aprendizagem dos alunos. formais de interveno em sentido preventivo,Possibilidade semelhante a esta tem sido alvo consideraram o aspecto mental, emocional edos recentes estudos dos pesquisadores fran- educacional. Essas aes ocorreram no sculoceses Htu e Carbonneuau (2002), que inves- XX e tiveram como referencial a segundatigam as contribuies dos psicopedagogos no guerra mundial e a guerra do Vietn. Assimprocesso de gesto da sala de aula em institui- ao final dos anos setenta, os Estados Unidoses de ensino da Frana. Esses pesquisadores foi o primeiro pas a oficializar a criao daenfatizam, dentre outras questes, a importn- primeira comisso de preveno sade. Esta

    119 Cincias & Cognio 2007; Vol 12: 115-133 Cincias & Cognio

    proposta envolvia a participao de diversos tamente implicar em melhorias sociais. Comprofissionais, dentre eles, os mdicos, os pa- isto, podemos observar que o nvel de maiorramdicos, os psiclogos, os educadores que abrangncia para o desenvolvimento das a-atuavam junto a vitimas de problemas emo- es psicopedaggicas preventivas o que vaicionais. Dentre os problemas mais comuns, atuar junto aos processos educativos no senti-entre as vtimas das guerras, estavam a pobre- do de evitar ou diminuir os problemas de a-za, a depresso, a raiva, a discriminao, o prendizagem.desemprego. Com o tempo as aes preventi-vas se ampliaram e passaram a ser desenvol- 2.1. Interveno psicopedaggica institu-vida junto a famlias e instituies escolares, cional preventivano somente para as vitimas da guerra, massim em sentido preventivo, para toda a comu- Ao tomarmos

  • como referencial os n-nidade. veis de preveno, Bossa (2000) prope trs Desta forma se amplia a importncia e nveis de interveno psicopedaggica. Noa necessidade do desenvolvimento de pro- primeiro nvel, o psicopedagogo atuaria juntogramas de interveno. Os estudos e pesqui- aos processos educativos visando evitar ossas sobre este tema tambm se expandem. possveis problemas de aprendizagem. ParaCom isto, podemos encontrar em Albee e Jof- isto, proposto um trabalho que considere asfe (1977) uma das mais significativas contri- questes didtico-metodolgicas, e tambm abuies, ao proporem diferentes nveis para formao e a orientao de professores, almum trabalho preventivo. Assim segundo estes do aconselhamento aos pais. No segundo n-autores, temos a preveno primria, a secun- vel, a finalidade esta em, ao mesmo tempo,dria e a terciria. A preveno primria se diminuir e tratar os problemas de aprendiza-constitui de aes a serem realizadas visando gem que j se encontram instalados. Para isto,evitar as situaes problemas. Elas ocorrem a proposta reside na elaborao de um diag-especialmente por meio do desenvolvimento nstico da realidade institucional, a partir dade programas educacionais. Esses programas se iniciaria a elaborao dos planos de inter-so destinados todos e no somente a um veno. Esse plano dever considerar tanto odeterminado grupo da populao. A preven- currculo como o trabalho dos professores,o secundria consiste em, aps o diagnsti- visando evitar que os problemas, os transtor-co de um determinado problema, propor uma nos, se repitam. No terceiro nvel, o objetivointerveno focalizada a um determinado gru- consiste na eliminao dos trans-tornos quepo. Com isto ela tem por objetivo proteger j se encontram instaladas. Neste caso, o car-determinadas populaes de risco. A preven- ter preventivo estaria em prevenir o apareci-o terciria mais ampla que as anteriores mento de outros problemas, decorrentes outendo por objetivo a interveno em popula- mesmo diferentes dos j eliminados. Para isto,es ou grupos onde os problemas j esto a proposta de interveno dever ser a de pro-instalados. Desta forma ela visa reduzir os por alternativas para minimizar as decorrn-efeitos, as conseqncias desses problemas. cias dos problemas, alm de atuar para preve- Diante disto, podemos constatar a im- nir o surgimento de outras conseqncias.portncia das aes de preveno, em especial Ao ampliar essas idias, e enfatizarda preveno primria, pela possibilidade de concretamente a elaborao de aes para o

  • se trabalhar de forma ampla, ou seja, com to- desenvolvimento de propostas de intervenoda a populao. Isto contribuiria para evitar o em nvel preventivo, com o objetivo de apri-surgimento de possveis problemas, para im- morar o processo de construo do conheci-pedir a instalao de situaes indesejveis, mento, Fagali e Vale (1994) tambm propeantes mesmo que elas se manifestem concre- algumas alternativas. Essas alternativas con-tamente. Programas como este tambm cola- sideram a importncia da: reviso dos pro-bora para o envolvimento e conseqente gramas curriculares das instituies bem co-comprometimento da coletividade, o que cer- mo a articulao dos mesmos aos aspectos

    120 Cincias & Cognio 2007; Vol 12: 115-133 Cincias & Cognio

    afetivo-cognitivos; ateno para a utilizao mesmos. Desta forma, o professor-de diferentes formas de trabalhar o contedo psicopedagogo tambm estaria trabalhando noprogramtico; elaborao de diversos materi- sentido de fortalecer as relaes do grupo, noais para uso do prprio aluno de forma a inte- deixando de considerar a influncia da escola,grar o raciocnio, a afetividade, a cognio, o da famlia e da sociedade.conhecimento. Ao abordarmos a importncia da pre- Assim, a interveno psicopedaggica veno e da interveno psicopedaggica, nopreventiva proposta, toma como referencial a podemos ignorar a fase que precede a essasao curricular e os aspectos afetivo-cogni- aes. A etapa de avaliar, ou seja, a avaliaotivos dos aprendizes. No que se refere a ques- psicopedaggica, que dever anteceder a todato curricular, se torna evidente a necessidade e qualquer proposta de interveno, seja elado desenvolvimento de prticas que sensibili- clinica ou institucional.zem os docentes sobre a importncia da refle- A avaliao psicopedaggica, de mo-xo critica e possvel reviso de: concepes do geral, aparece associada a uma queixa.de educao; orga-nizao e seleo dos con- Segundo Barbosa (2001), os sintomas regis-tedos de ensino; metodologia e avaliao. trados em uma queixa, so em princpio, ori-Aliado a isto se destaca a importncia de se ginrios das observaes desencadeadas naconsiderar a existncia de vnculos afetivo- instituio. Essas observaes devero, por

  • emocionais, como possveis elementos facili- um lado, considerar as atitudes da criana outadores do processo de ensino e aprendiza- adolescente ao assistirem as aulas, durante osgem. intervalos e recreios, nas atividades extra Entretanto, se torna oportuna a consta- classe, nos relacionamentos com os colegas etao de que as propostas apresentadas, apesar professores. Por outro lado, na avaliao psi-de serem muito adequadas e pertinentes, nas copedaggica a instituio de ensino tambmaes que so sugeridas, para a interveno dever ser considerada. Desta forma, a anlisepsicopedaggica institucional, no se conside- da adequao dos materiais did-ticos, dara a possibilidade, do professor ser um psico- proposta pedaggica, da mtodo-logia, da a-pedagogo. Neste sentido partimos do pressu- valiao, associadas a entrevistas com profes-posto de que, em tese, o professor- sores, tem se constitudo em importante ins-psicopedagogo, sendo um profissional especi- trumento de avaliao.alizado e estando diria-mente inserido no Assim diante das diversas possibi-ambiente da sala de aula, poderia tambm in- lidades de interveno psicopedaggica, po-tervir preventivamente. demos constatar, que no Brasil os recursos Esta nova configurao, em principio, mais utilizados para a avaliao na instituio,oportunizaria a reflexo e a possibilidade de tm sido as entrevistas, as observaes, osreviso da prtica do professor-psicopeda- inventrios, as pesquisas, as dinmicas gru-gogo e talvez, at mesmo da proposta pedag- pais e em especial os jogos pedaggicos.gica da instituio. Diante disto, consi- Comtudo a importncia da ao psico-deramos que, este profissional estaria mais pedaggica preventiva, dever sempre consi-sensvel a buscar propostas de trabalho que, derar a subjetividade do aluno, bem como asao mesmo tempo em que, atendessem aos in- particularidades de cada situao, alm dateresses e necessidades pessoais e sociais de complexidade dos fatores que a permeiam.seus alunos, propicias-sem possveis melhori- Uma realidade diferente da brasileira,as nos relacionamentos e no prprio ato de no que se refere a avaliao e interveno psi-ensinar e de aprender. No que se refere ao a- copedaggica, pode ser encontrada na Ar-luno, esse professor especializado em psico- gentina. Neste pas, prtica comum, o psico-pedagogia por meio do convvio dirio, pode- pedagogo utilizar, tanto na clinica como naria, dentre outras questes, estar atento para instituio, diversos testes como instru-mentomelhor auxiliar no desenvolvimento cogniti- para a avaliao do

  • aluno. Entretanto o refe-vo, afetivo, emocio-nal, psicomotor, dos mes-

    121 Cincias & Cognio 2007; Vol 12: 115-133 Cincias & Cognio

    rencial para o atendimento tanto clinico como gente deve considerar as contribuies dasinstitucional est na famlia e na escola. escolas de Genebra, da Psicanaltica e da Psi- Desta forma, as propostas de interven- cologia Social. Dentre outros fatores, os tra-o, de modo geral, se iniciam a partir de en- balhos da escola de Genebra subsidiariam ostrevistas estruturadas ou semi-estrutu-radas fundamentos sobre a construo do conheci-com pais ou familiares, com os docentes ou mento, os da escola psicanaltica auxiliariamcoordenadores das escolas e com o aluno. Es- na explicao de questes relaci-onadas a afe-sas entrevistas se constituem em uma anam- tividade e os trabalhos da psicologia socialnese que, com os pais ou familiares, tem por enfocariam as questes culturais, os processosobjetivo principal conhecer o histrico de vi- grupais e suas relaes com o individuo.da do aluno e as relaes que permearam es- Assim, ao abordarmos a diversidadesas histrias. As entrevistas com os docentes, de recursos da avaliao psicopedagogia insti-coordenadores ou orientadores, visam obter tucional na Argentina e confront-la com ainformaes sobre o processo de ensino e a- realidade da avaliao psicopedaggica noprendizagem, conhecer a proposta da institui- Brasil, podemos constatar a existncia de umo, a metodologia, a avaliao, o material enorme distanciamento entre elas. Talvez adidtico, e especialmente as relaes profes- mais significativa diferena relacionada ava-sor e aluno e entre os alunos. A entrevista ini- liao e interveno psicopedaggica residacial com o aluno, dentre outros, tem por obje- na prpria questo da formao do psicope-tivo o levantamento de hipteses sobre os dagogo. Na Argentina os cursos que formamcomportamentos, os relaciona-mentos, os in- o psicopedagogo apresentam disci-plinas co-teresses, e at mesmo os pos-sveis silncios muns nos dois primeiros anos formao dodo aluno diante de algumas questes. psiclogo e do psicopedagogo. Alm disso, Juntamente com a entrevista, o psico- os currculos dos cursos de psicopedagogiapedagogo argentino, tambm utiliza com as apresentam uma significativa carga horria

  • crianas, alguns instrumentos especficos de para disciplinas de tcnicas de diagnsticoavaliao. Dentre os instrumentos que iro psicopedaggico, diagnstico psicopedaggi-nortear as propostas de interveno psicope- co institucional, interveno psicopedaggicadaggicas esto os testes de inteligncia, as em instituies escolares, alm de outras dis-provas de nvel do pensamento ou tambm ciplinas. Isto, dentre outros fatores, favorece achamadas de piagetianas, a avaliao do nvel possibilidade da liberao do o uso de testespedaggico, a avaliao perceptomotora, os tanto para os psiclogos como para os psico-testes projetivos, os testes psicomotores e ou- pedagogos argentinos, alm de propiciar umatros. melhor possibilidade de preparao para o exerccio profissional.Tambm merece destaque como forma de ins- No Brasil a avaliao por meio do usotrumento mais amplo e subjetivo de avaliao de testes psicolgicos, de inteligncia, proje-o que Fernndez (1990: 44) denomina de "o tivos e outros, so de uso exclusivo dos psic-olhar e a escuta psicopedaggica". Segundo a logos. No nosso entender isto muito coeren-autora, essa postura revelada por meio da te, especialmente com os pressupostos quedisponibilidade do psicopedagogo ouvir aten- norteiam a formao do psicopedagogo notamente a famlia, a instituio escolar e o a- Brasil que muito diferente dos valorizadosluno visando formular hipteses sobre deter- em alguns outros paises. Assim temos queminados fatos, situaes, contextos. dentre outros paises, na Argentina, a forma- Temos ainda que o referencial terico o bsica do psicopedagogo ocorre aps qua-mais utilizado na avaliao psicopedaggica tro anos de estudos, em nvel de graduao.argentina, o da "Epistemologia Conver- Em continuidade a formao inicial, so pro-gente em Psicopedagogia" . Nesta proposta o postos cursos de especia-lizao, mestrado oupsiclogo argentino Visca (2002) parte da doutorado.concepo de que a psicopedagogia conver-

    122 Cincias & Cognio 2007; Vol 12: 115-133 Cincias & Cognio

    Na Frana, a formao inicial ocorre fisso regulamentada no nosso pas, ela en-por meio dos programas de cincias da educa- contra-se legitimada.

  • o. A formao continuada ocorre nos cursos Desta forma, a questo da formaode ps-graduao na rea de psicopedagogia. interfere diretamente na avaliao psicopeda-Isto caracteriza uma enorme diferena em re- ggica perpassando pela possibilidade delao a atual formao do psicopedagogo no construo e sedimentao de um referencialBrasil. Podemos afirmar que, exceto rarssi- terico que ir servir de parmetros para amas excees, so os cursos de especializa- organizao de instrumentos avaliativos e,o, geralmente com durao de aproxima- sobretudo para analises dos resultados obti-damente 360 horas distribudas em um ano dos.letivo, que teoricamente formam o psicopeda-gogo brasileiro. No podemos nos esquecer 3. Objetivostambm que estes cursos de especializaorecebem profissionais de diversas formaes Diante do exposto so objetivos desteiniciais, porm de `reas afins'. Isto certamen- estudo descrever e analisar a prtica de pro-te se constitui em um diferencial altamente fessores que tambm so psicopedagogos,significativo, para o exerccio desta atividade, investigar seus possveis limites e possibili-que j se inicia na formao, perpassa pela dades. So objetivos especficos:atuao e reflete diretamente na identidade ena questo da regulamentao da profisso. caracterizar o professor psicopedagogo, a No Brasil a psicopedagogia no pos- partir de alguns dados pessoais e profis-suem o status de profisso regulamentada, ela sionais;esta oficialmente catalogadas, junto ao Cdi- identificar a instituio em que estes pro-go Brasileiro de Ocupao CBO, como uma fissionais esto atuando;ocupao. Este fato no desmerece o trabalho descrever a prtica cotidiana do professor -do psicopedagogo. Ao contrrio, partimos do psicopedagogo;pressuposto de que este posicionamento alm verificar a opinio dos entrevistados so-de mais coerente em sentido educacional con- bre as influncias da formao inicial natribui para se evitar dificuldades que esbar- prtica psicopedaggica;ram, sobretudo, na construo da identidade e verificar os trabalhos de interveno psi-da legalidade para o exerccio profissional. copedaggica preventiva e os procedi- mentos de diagnsticos mais utilizados;Se por um lado o exerccio da psicopedagogia descrever as propostas de interveno psi-esbarra na questo da legalidade, por outro copedaggica considerada como bem su-lado, temos tambm a realidade de que vrios cedida;municpios, especialmente nos estados do Sul identificar, segundo os participantes, as

  • e de So Paulo, ignoram o reconhecimento da contribuies da psicopedagogia institu-profisso e realizam concursos pblicos para cional preventiva, os seus desafios e suaspsicopedagogos. No estado de So Paulo, sugestes, para a obteno de melhoriastambm temos a aprovao do projeto lei n. na prtica psicopedaggica.128/2000, que estabelece a assistncia psico-lgica e psicopedaggica em todas as institui- 4. Metodologiaes de ensino bsico, abrindo a possibilidadedo psicopedagogo se integrar profissional- Assim, visando atingir os objetivosmente na rea educacional. Acreditamos que, propostos buscamos, por meio da trajetriafatos como estes contri-buem com idias po- metodolgica, dos relatos e das aes, des-pularmente dissemi-nadas entre os psicopeda- crever os limites e as possibilidades da prticagogos de que, apesar da psicopedagogia ainda cotidiana do professor psicopedagogo. Parano ter conquistado o status de ser uma pro- isto utilizamos como referencial os dados ob- tidos por meio de questionrio semi estrutura-

    123 Cincias & Cognio 2007; Vol 12: 115-133 Cincias & Cognio

    do alm da anlise qualitativa para os dados apresentou trs partes, sendo que na primeiraobtidos. buscamos informaes referentes a dados pes- Para isto, utilizamos inicialmente um soais dos entrevistados. Na segunda parte,pr-teste com dois psicopedagogos, tivemos buscamos situar o professor psicopedagogocom isto, o objetivo de verificar validade do quanto a sua formao inicial e continuada einstrumento. Diante dos resultados obtidos, o seu tempo de atuao. Na terceira parte, enfo-instrumento sofreu pequenas adequaes vi- camos os relatos sobre a atuao profissionalsando atender ao novo universo da pesquisa e a possvel existncia de intervenes psico-que passou a considerar o grupo de professo- pedaggicas preventivas.res psicopedagogos que deveriam estar atu-ando em sala de aula, junto ao Ensino Fun- Procedimentodamental, em instituies publicas ou particu-lares do estado de So Paulo. No contato inicial com os partici- pantes apresentamos o Termo de Consen-Participantes timento Livre e

  • Esclarecido. Este termo foi aprovado pelo Comit de tica e Pesquisa, Os dez professores psicopedagogos por meio do protocolo 362/06, tendo tambmparticipantes desta pesquisa, foram convida- sido registrado junto a Comisso Nacional dedos pela pesquisadora, para que pudssemos tica em Pesquisa CONEP, por meio da fo-obter um universo variado em termos de tem- lha de rosto FR 97120. Ao apresentarmos opo de experincia profissional e de realidades termo aos participantes da pesquisa, ressalta-de instituies de ensino. mos a importncia do registro de aceite, bem Os entrevistados foram escolhidos in- como explicitamos os objetivos da mesmatencionalmente em funo de pertencerem a alm da forma de participao dos envolvi-diferentes realidades educacionais e atende- dos, e do carter sigiloso das informaes arem aos objetivos da pesquisa. Isto segundo serem obtidas. Enfatizamos assim que todo oThiollent (1986), se apresenta como um prin- desenvolvimento da ps-quisa considerou acpio perfeitamente adequado ao contexto de preservao da integridade fsica, cognitiva,uma pesquisa que enfatiza aspectos qualitati- afetiva e moral dos partici-pantes. Atendendovos. Apesar do convite, a participao na pes- assim as normas ticas implcitas nas pesqui-quisa, se deu de forma voluntria, sendo pos- sas com seres humanos.svel que o participante se retirasse em qual- Os procedimentos utilizados na ps-quer momento sem que houvesse nenhuma quisa foram desdobrados nas seguintes etapas:espcie de penalidade ou nus. Tambm foidestacado o nosso compromisso em respeitar Elaborao de pr-teste. O pr-teste foia privacidade e o sigilo em relao aos dados realizado de forma voluntria com doisou informaes obtidos, bem como o nosso psicopedagogos;objetivo de retornar aos participantes os resul- Contato inicial com os professores psi-tados obtidos com este trabalho. copedagogos. Neste encontro, foram apre- sentados os objetivos do trabalho de pes-Material quisa, sendo questionado o interesse ou no em participar da mesma. Em caso a- O material utilizado consistiu de um firmativo, o termo de consentimento livrequestionrio semi-estruturado. Os participan- e esclarecido foi entregue, formalizandotes da pesquisa tiveram acesso a este instru- assim a concordncia na participao;mento de diferentes formas, conforme a mani- Encaminhamento dos questionrios. Essa

  • festao explicitada. Assim o questionrio etapa ocorreu para os pesquisados que nochegou aos participantes, nos meses de maro contato inicial manifestaram o desejo dee abril de 2007, via correio eletrnico ou pes- colaborarem com a pesquisa. Conforme asoalmente, isto em mos. O questionrio opo de cada participante, o questionrio

    124 Cincias & Cognio 2007; Vol 12: 115-133 Cincias & Cognio

    j foi entregue ao final do contato inicial Em relao a instituio de Ensino para que depois de respondido, fosse de- Fundamental em que os participantes atuam volvida por meio de correio, via carta se- como professores psicopedagogos, temos lada. Para outros participantes que dese- que 50% delas so instituies de origem jaram responder por correio eletrnico, foi pblica, 40% de origem particular. Temos solicitado o e-mail pessoal, sendo o ques- tambm 10% do total de participantes que a- tionrio encaminhado posteriormente; tuam ao mesmo tempo em instituio publica Sistematizao e anlise dos dados obti- e particular. dos. Ao relatarem como desenvolvem os seus trabalhos os entrevistados indicaram co-5. Resultados e discusso mo principais procedimentos metodol-gicos: aula terica, aula prtica (jogos variados, mu- Os entrevistados so todos professores sica, alfabeto mvel), exerccios de compre- psicopedagogo pertencentes ao sexo femi- enso e aplicao, leitura e releitura de textos,nino com idades entre 26 a 50 anos. Do total produo de textos. Os recursos didticos re-de entrevistados, 60% so formados exclusi- latados foram: livro didtico, livro paradidti-vamente em pedagogia, 20% fizeram cursos co, materiais concretos, televiso e vdeo.de licenciatura, sendo, portugus e ingls e Os dados obtidos revelam a predomi-matemtica, 10% possui dupla formao, pu- nncia de duas reas de conheci-mentos, a deblicidade e propaganda e pedagogia e 10% lngua portuguesa e a de matemtica. Isso o-apresenta a formao em psicologia. correu apesar de contarmos somente com um Neste ltimo caso, podemos constatar entrevistado formado em lngua portuguesa ea existncia do psiclogo, atuando como pro- um formado em

  • matemtica que atuam espe-fessor em sala de aula. Isto no nos causou cificamente nestas reas de conhecimento. Osgrande surpresa, pois de conhecimento p- demais esto atuando preferencialmente nes-blico, a existncia de vrios outros profissio- tas reas, no ensino de 1. a 4.srie. Podemosnais que embora no apresentem a formao considerar que isto j era esperado em funodesejada para a atuao, desenvolvem seus das orientaes da atual LDB 9394/96, que notrabalhos como coordenadores, como orienta- artigo 32, enfatiza que o Ensino Fundamental,dores educacio-nais e at mesmo como gesto- dentre outros, dever ter por objetivos o de-res, especial-mente junto a instituies parti- senvolvimento da capacidade de aprender,culares de ensino. Para isto, partimos do pres- tendo como meios bsicos o pleno domnio dasuposto de que, neste caso, embora no se jus- leitura, da escrita e do clculo. Desta forma setifique, o curso de psicopedagogia deve ter ressalta o desenvolvimento das habilidadescontribudo para auxiliar na preparao deste diretamente ligadas essas reas. Justamenteprofissional para o desempenho da funo de as duas reas de conhecimento mais enfatiza-professor - psicopedagogo. das pelos entrevistados. Temos tambm que 70% dos entre- Entretanto, se por um lado a atualvistados realizaram seus cursos de formao LDB ressalta a importncia de um trabalhoinicial em instituies particulares e 30% so nas reas de lngua portuguesa e matemtica,provenientes de instituies pblicas de ensi- por outro lado, no mesmo artigo 32, da LDB,no. O tempo de formao inicial dos entrevis- outros objetivos so propostos. Dentre elestados varia entre dois anos a vinte e dois anos. destacamos os relacionados compreenso doDos participantes, 90% atuam na formao de ambiente natural e social do sistema poltico,origem e somente 10% no atua na formao da tecnologia, das artes e dos valores em quede origem. Tambm temos uma variao que se fundamenta a sociedade. Neste sentidocompreende a faixa de um a nove anos, para o tambm se valoriza o trabalho com outras -tempo de formao como especialista em psi- reas de conhecimentos, como as de cinciascopedagogia. naturais, histria, geografia, artes. Enten- demos como altamente significativa essa falta

    125 Cincias & Cognio 2007; Vol 12: 115-133 Cincias & Cognio

  • de referncias a outros componentes curricu- Outro diferencial a ser considerado na prticalares. Esperamos que isto no signifique a au- do professor - psicopedagogo, se refere a op-sncia de um trabalho com as reas de cin- o de escolha do material didtico a ser utili-cias, histria, geografia, dentre outras, pelos zado. Assim, mesmo que a instituio escolarprofessores psicopedagogos, em detrimento imponha determinados materiais e recursosda exclusividade para a realizao de um tra- didticos, em especial, o livro didtico, que obalho isolado somente com as reas de lngua professor - psicopedagogo no se detenha aportuguesa e de matemtica. este nico material. Que ele tenha a sensibili- Os procedimentos metodolgicos dade de possibilitar aos seus alunos a experi-mais utilizados pelos entrevistados so a aula ncia de trabalhar com diferentes materiais,terica, a aula prtica, exerccios de compre- por meio de diversos procedimentos metodo-enso e aplicao, leitura e releitura de textos, lgicos. Tambm seria fundamental que oproduo de texto. No nosso entender so professor psicopedagogo considerasse aprocedimentos viveis que devem ser utiliza- possibilidade da efetivao da avaliao diag-dos de forma variada. Entretanto, independen- nstica. Ela poderia se consti-tuir em um pro-temente do procedimento que se utilize, enfa- jeto, visando inicialmente, dentre outras ques-tizamos a importncia de que o professor - tes, a prpria organizao do como e dopsicopedagogo incentive os alunos para que quando seria mais oportuno realiz-la. Nesteregistrem as atividades desenvol-vidas. Esta sentido esta proposta possibilitaria melhorestratgia se constitui em um referencial sig- situar o aluno, frente as diferentes reas denificativo, pois auxilia na melhor compreen- conhecimentos, alm de se transformar emso dos temas estudados, possibilitando a or- um recurso de trabalho do professor - psico-ganizao de idias e estimulando a aprendi- pedagogo, que se somaria a outros visandozagem dos alunos. Ela tambm pode se cons- uma aprendizagem mais real e significativa.tituir em parte do processo avaliativo. No nosso entender, isso tambm atuar pre- Partindo do referencial de que os pro- ventivamente na sala de aula.fessores - psicopedagogos utilizam nas aulas Obtivemos tambm como resultadoprticas, materiais concretos, recorre-mos a que 90% dos entrevistados percebem as influ-Lorenzato (2006), que se refere aos materiais ncias da formao inicial na atual prtica.

  • concretos como recursos didticos que agem Eles afirmam que, de modo geral, isto se re-diretamente no processo de ensino e aprendi- vela por meio do desenvolvimento de ativida-zagem, dependendo dos objetivos a serem a- des na escola. Isto vem de encontro s idiastingidos. Assim de fundamental importncia de Castanho (2001) ao explicitar que na atua-que ao utilizar esses materiais em sala de aula, lidade se valoriza a formao inicial bem co-o professor planeje muito bem o seu trabalho, mo a formao continuada com base na reali-selecione e organize os contedos a serem dade da prtica e na constituio da profissodesenvolvidos bem como a possibilidade de docente. Deste grupo que consegue perceberutilizao dos mesmos. Diante disto, se torna as influncias da formao inicial na atualinteressante ressaltar a importncia de um tra- prtica, se destacam 60% de professores balho com uma grande variedade de materiais psicopedagogos que se referem s dificulda-concretos bem como, com a explorao de des de aprendizagem. Essas dificuldades apa-atividades diversas com um mesmo tipo de recem compreendendo vrios fatores, dentrematerial, atendendo assim as diferentes, mas eles, os de origem cognitiva, emocional, dis-complementares reas de conhecimentos. ciplinar. Relacionamos situa-es como estas Assim, diante dos dados obtidos junto s idias de Visca (2002) ao se referir a psi-aos entrevistados, seria altamente relevante copedagogia como uma rea de conhecimentoque o professor - psicopedagogo construsse que favorece inter-relaes com outras reas,uma prtica apoiada em slidos referenciais no dever se prender somente a busca detericos e que ao exerc-la, no se limitasse respostas que envolvam a questo cognitivaao ensino de lngua portuguesa e matemtica. de forma isolada. Ao contrrio, na interao

    126 Cincias & Cognio 2007; Vol 12: 115-133 Cincias & Cognio

    dos vrios fatores, dentre eles os de origem Esta realidade altamente preocu-cognitiva, afetiva, emocional, social, familiar, pante, uma vez que a psicopedagogia institu-neurolgica, que esto as respostas mais pre- cional se caracteriza especialmente pelo de-cisas e coerentes s questes de aprendiza- senvolvimento de um trabalho em nvel pre-gem. ventivo. Desta forma, segundo Bossa (2000),

  • Juntamente a isto, temos que 70% dos o trabalho psicopedaggico preven-tivo naentrevistados afirmam realizarem um trabalho instituio, est diretamente relacio-nado aopsicopedaggico preventivo. Constatamos processo de ensino e aprendizagem de formauma tendncia, em indicar os jogos como um individual ou grupal. Neste sentido caber aodos recursos mais utilizados para o diagnsti- psicopedagogo, dentre outras aes, identifi-co visando um trabalho preventivo. Alm dos car as possveis perturbaes no processo e-jogos, os entrevistados indicaram os brinque- ducacional, atuar conjuntamente com demaisdos, as brincadeiras, os desenhos, as produ- profissionais da instituio, contribuir na ori-es escolares, os questionrios para entrevis- entao do trabalho didtico metodolgicotas com a famlia, a observao, o olhar e a junto aos docentes, buscar melhorias educa-escuta psicopedaggica, o inventrio com os cionais. Como, estamos aqui com um gruporegistros dos dados. de professores psicope-dagogos, entende- A importncia dos jogos como instrumento mos que aes como estas, alm de outras,avaliativo, para a realizao de um trabalho que considerassem especial-mente a questopreventivo inegvel, entretanto, Lorenzato metodolgica, afetiva, o envolvimento dos(2006), lembra que por melhor que seja um pais e familiares bem como dos demais pro-material didtico, ele no garantia sucesso fissionais da escola, deveriam ser uma cons-na aprendizagem. Isto vai depender muito de tante na rotina de possibilidades de trabalhocomo o material ser utilizado. Isto obvia- dos entrevistados.mente tambm vai depender dos referen-ciais Ao serem questionados sobre o(s)tericos do psicopedagogo. Tambm ressal- procedimento(s) diagnstico(s) utilizados paratamos que os jogos, os brinquedos, as produ- a interveno psicopedaggica, os professoreses do aluno, por exemplo, podem ser utili- psicopedagogos mais uma vez indicaram oszados inicialmente como instrumento de di- jogos e em seguida as atividades de leitura eagnstico e posteriormente como junto s pr- escrita. Outros procedimentos tambm foramticas de interveno, como um recurso meto- citados como: atividades matemticas, ativi-dolgico, visando superao de possveis dades ldicas, representaes, dramatiza-o,dificuldades de aprendizagem. desenho, brincadeiras, entrevistas com pais, Os dados obtidos revelam a existncia de entrevistas com alunos, observaes e a avali-professores - psicopedagogos que apresentam ao dinmica do potencial da aprendizagemmaior clareza sobre que a atuao preventiva, LPAD. Este ultimo proce-dimento pro-

  • chegando a apresentar algumas aes concre- posto por Reuven Feuerstein, se refere Pro-tas. Outros se referem a importncia do traba- grama de Enriquecimento Curricu-lar P.E.I.lho preventivo, mas no chegam a apresentar que dentre outras questes, compreende umaes para a sua realizao, eles apresentam a trabalho de avaliao do potencial cognitivo.inteno, mas explicitam como seria o desen- Os resultados tambm revelam a difi-volvimento do trabalho preven-tivo institu- culdade de muitos dos entrevistados em rela-cional. tarem ou at mesmo de situarem e se posicio- Temos tambm um significativo grupo narem sobre a utilizao de procedi-mentosrepresentado por 30% dos entrevistados, que para um diagnstico institucional. Isto podeapesar de estarem atuando como professores - ser constatado quando os professores psico-psicopedagogos em instituies de ensino a- pedagogos confundem procedimentos comfirmaram no realizarem um trabalho psico- materiais utilizados. Assim, temos entrevis-pedaggico preventivo. tados que diante da solicitao de registrarem os procedimentos mais utilizados indicaram

    127 Cincias & Cognio 2007; Vol 12: 115-133 Cincias & Cognio

    materiais como: noticias de jornais e revistas; intervenes para a realizao de um trabalhoatividades que envolvem o uso da viso, da integrado.audio, de coordenao motora grossa e fi- A importncia do trabalho integrado,na; histrias clssicas e em quadrinhos. j foi apontada por Barbosa (2001), Visca Diante disto, seria fundamental que os (2002), Saravali (2004) dentre outros, comoprofessores psicopedagogos no tomassem um dos diferenciais da prtica do psicopeda-um nico instrumento como fonte exclusiva gogo. Neste momento, entretanto, retomamospara a avaliao, mas sim considerassem a e ampliamos estas idias destacando a rele-possibilidade de utilizao de vrios proce- vncia de que o professor psicopedagogodimentos bem como das vrias frentes de realize um trabalho diagnstico e de interven-investigao, dentre elas a escola, a famlia, o, articulado com as equipes interna e ex-as relaes sociais, os interesses pessoais e terna da escola.outros. Tambm deve ser analisada a possibi- Diante dos relatos de intervenes

  • lidade de se recorrer a avaliao de outros bem sucedidas, podemos perceber que muitasprofissionais em funo das necessidades a- das questes relacionadas a aprendizagem sepresentadas. misturam as relacionadas a afetividade. Neste Assim temos segundo Rubinstains e caso o professor psicopedagogo parece as-colaboradores (2004), que as prticas avalia- sumir a posio de um mediador entre conhe-tivas e de interveno psicopedaggica so cimentos formalmente exigidos pela escola, oextremamente variadas no Brasil uma vez que interesse dos alunos, o nvel de desenvolvi-os psicopedagogos ancorados em suas forma- mento cognitivo dos mesmos, as expectativases, em seus referenciais tericos desenvol- da famlia, as relaes afetivas, dentre outras,vem um estilo prprio de avaliao e inter- que permeiam o processo educacional.veno psicopedaggica. Elas ainda explici- Ao considerar a indicao das contri-tam que apesar das particularidades, podemos buies essenciais da psicopedagogia obtive-encontrar pontos comuns na prtica psicope- mos junto aos entrevistados resultados que sedaggica brasileira. Isso se revela especial- referem a: busca de melhorias na aprendiza-mente na opo em atuar utilizando recursos gem; melhor compreenso do processo decomo os jogos, a observao, o P.E.I., os pro- construo do conhecimento; reviso da pr-jetos de trabalho. pria prtica docente; preveno a problemas Ao serem convidados a relatarem uma de aprendizagem; diagnostico das dificulda-interveno psicopedaggica considerada bem des de aprendizagem; considerao do con-sucedida muitos professores psicopedago- texto emocional e cognitivo do aprendiz; pos-gos a fizeram em vrias instan-cias. Desta sibilidade de realizao um trabalho conjunto;forma eles destacaram interven-es realiza- avaliao do aluno como um todo; aprendiza-das diretamente com os alunos, com os pais e gem para a ouvir o aluno e sua famlia; com-com outros profissionais da instituio. Os preenso da complexidade dos diversos fato-entrevistados tambm utilizaram ou mencio- res envolvidos no processo educacional; de-naram a importncia da utilizao de vrios senvolvimento de um olhar diferenciado pararecursos para isto. Com os alunos os recursos a aprendizagem e para as dificuldades de a-cognitivos mais utilizados foram: histrias, prendizagem; analise do processo de ensino ecaderno, lousa, leituras, figuras, representa- aprendizagem a partir do sujeito que aprendees grficas, materiais concretos para alfabe- e da instituio que ensina; busca de metodo-tizao, atividades pedaggicas. Com os alu- logias diferenciadas

  • de trabalho.nos tambm foram destacadas situaes que Como pode ser constatado, a grandeenvolvem a afetividade, a estimulao, a ob- parte dos entrevistados, atribuem como con-servao, a auto-avaliao. Com os pais fo- tribuies da psicopedagogia, os fatores queram destacadas as conversas informais e as se articulam diretamente ou indiretamente aentrevistas. Com os demais profissionais as obteno de melhorias relacionadas ao pro- cesso de ensino e aprendizagem. Entre-tanto

    128 Cincias & Cognio 2007; Vol 12: 115-133 Cincias & Cognio

    entendemos que a psicopedagogia vai alm aprendizagem, promovendo a aprendizagem;disto pois, segundo Kolyniak Filho (2001) a realizao de um trabalho integrado; o reco-tambm seria importante que os psicopedago- nhecimento profissional e cientifico.gos que atuam em escolas, no se limitassem Ao retomarmos a idia do excessivoa considerar somente a superao de possveis nmero de alunos em sala e da dificuldade dedificuldades de aprendizagem. Eles poderiam se fazer um bom trabalho ou um trabalho psi-e deveriam, criar mecanismos pelos quais os copedaggico por causa disto, os entrevista-alunos pudessem interagir com mais seguran- dos reforaram as idias de Angelini (2006)a, apreo, solidariedade, respeito, dentre ou- que destaca a existncia de condies que im-tros valores. Enfim, que a psicopedagogia pedem ou comprometem a qualidade da edu-tambm pudesse contribuir para a formao cao no Brasil. Dentre elas, esta pesquisa-tica e cidad do aluno. dora destaca as classes numerosas; o que se Ampliando os dados obtidos junto aos entende por progresso continuada; a ausnciaentrevistados, temos tambm os estudos e de condies mnimas para o trabalho; a de-pesquisas dos educadores franceses Htu e sestruturao das famlias; a inadequada for-Carbonneuau (2002), que dentre outras ques- mao de muitos professores; a m remu-tes, apontam que uma das atuais contribui- nerao dos professores.es da psicopedagogia institucional reside Essas questes, com exceo da que seem auxiliar na reflexo individual e do grupo refere a m remunerao, j haviam sido a-sobre a prtica dos docentes e sobre a adequa- pontadas em outros

  • momentos tambm peloso e diversidade dos projetos da instituio. entrevistados. Assim entendemos que seriaEssa diversidade se refere, aos projetos insti- importante que, de um lado, as instituies detucionais, objetivos esperados, interesses e ensino, sejam elas pblicas ou particularesnecessidades dos alunos, seus possveis limi- revissem as questes de carter estruturais etes e suas possibilidades, seus vnculos afeti- pedaggicas que possam estar comprometen-vos, emocionais, familiares e mais recente- do a qualidade da aprendizagem. Por outromente as situaes de violncia por eles en- lado, tambm se torna fundamental que o pro-frentados. fessor, se prepare para o trabalho educacional, A seguir registramos os resultados ob- que aps a sua formao inicial, dentre outrastidos diante da solicitao de tomar como re- questes, ele invista na continuidade de seusferencial a relao teoria e prtica e indicar os estudos.principais desafios na rea psicopedaggica. Neste sentido, a expectativa de traba-Mais uma vez se destaca a preocupao com lho com o professor psicopedagogo, se tor-elevado nmero de alunos em sala de aula. E na uma alternativa, se considerarmos que essenovamente esta situao apontada como e- profissional j apresenta um diferencial quelemento que dificulta o bom desenvolvimento reside na formao continuada. A isto acres-do processo educacional. Juntamente a isto, centamos a expectativa de que ele tambmos entrevistados agora, evocam esta realidade apresente uma sensibilidade maior para o de-tambm como elemento desafiador para um senvolvimento de uma prtica diferenciada,trabalho psicopedaggico institucional. Ou- que no ignora as possveis dificuldades dostros fatores tambm foram apontados como seus alunos, mas que diante dela, trabalha desafiadores da rea de psicopedagogia como: partir das possibilidades do mesmo.a ausncia de superviso que acompanhe o A coerncia entre a relao teoria etrabalho psicopedaggico; a existncia de tra- prtica, o elemento essencial que ir funda-balho psicopedaggico na escola; a existncia mentar as aes psicopedaggicas. Isto talvezda psicopedagogia na rede pblica de ensino; se constitua em um dos maiores desafios daa ampliao do nmero de professores psi- psicopedagogia, resgatar a concepo de edu-copedagogos; a ampliao dos atendimentos cao do professor - psicopedagogo e sensibi-psicopedaggicos nas escolas; a possibilidade liz-lo para a sua importncia no trabalho dede auxiliar na superao das dificuldades de diagnstico e interveno junto a seus alunos.

  • 129 Cincias & Cognio 2007; Vol 12: 115-133 Cincias & Cognio

    Neste sentido temos as contribuies de Moo- mos". Esses estudos foram realizados pelojen (2004), que resgata a importncia de um Instituto PNBE (Pensamento Nacional dastrabalho de diagnstico e de interveno coe- Bases Empresariais) que tem a sua principalrentes, subsidiados por teorias atuais que, atividade centrada na educao e contou comdentre outras questes, considerem os avan- a participao de renomados educadores. Osos do mundo cultural. resultados obtidos foram divulgados no ano Ao serem questionados sobre as con- de 2003 visando a obteno de melhorias paratribuies visando melhorias na atuao psi- o pas em diversos setores. No que se refere acopedaggica, 90% dos professores psico- educao e ao estado de So Paulo, temos porpedagogos se manifestaram indicando a ne- meio do relatrio apresentado em 27.04.06, acessidade de: diminuio do nmero de alu- nfase dada a necessidade do desenvolvimen-nos nas classes; investir na continuidade de to de estudos, para que se possa diminuir oestudos, melhorias no diagnstico psicopeda- nmero de alunos em sala de aula. Segundoggico, atuar de maneira conjunta conside- esse mesmo estudo, o estado de So Paulorando o envolvimento da famlia e dos diver- conta hoje com a mdia de quarenta estudan-sos profissionais, ampliar o nmero de psico- tes em sala de aula, o que tende a comprome-pedagogos nas instituies. Muitas das indi- ter a qualidade do ensino.caes j haviam sido apresentadas em mo- Diante disto, torna-se evidente a ne-mentos anteriores, o caso do elevado nme- cessidade da reduo do nmero de alunos emro de alunos em sala de aula, da importncia a sala de aula. Entretanto, entendemos que istocontinuidade de estudos, do diagnstico psi- no poder se constituir como condio isola-copedaggico e da atuao conjunta com os da para a obteno de melhorias educacionaisdiversos profissionais. e muito menos para a realizao de um traba- Ao considerarmos as contribuies a- lho psicopedaggico preventivo. Outros fato-presentadas pelos professores - psicopedago- res merecem considerao dentre eles, a pr-gos, partimos do pressuposto que elas se ca- pria formao do professor e do psicopedago-racterizam como elementos complementares. go; as condies

  • fsicas, estruturais da insti-Os elementos ou atitudes isoladas, dificilmen- tuio escolar; a questo curricular; o projetote se caracterizam como melhorias. Se to- pedaggico da escola; a avaliao e interven-marmos como referencial, por exemplo, a im- o psicopedaggica em nvel preventivo; aportncia da continuidade de estudos, isto cer- formao de uma equipe para o desenvolvi-tamente influir na realizao de um melhor mento de um trabalho integrado.diagnstico, na sensibilidade para a formaode uma equipe de trabalho, no desenvolvi- 6. Consideraes finaismento de aes conjuntas, dentre outras ques-tes. Os resultados indicam por um lado, a A queixa sobre a dificuldade de se fa- existncia de vrios elementos limitantes, ouzer um trabalho de melhor qualidade, por cau- dificultadores do trabalho psicopedaggicosa do alto nmero de alunos em sala de aula e institucional. Estas questes perpassam, ema proposta de se diminuir a quantidade consi- muitos casos, pela prpria dificuldade de con-derada como excessiva, no se caracteriza ceber em que se constitui um trabalho institu-como uma dificuldade exclusiva do professor cional preventivo. Juntamente ao desafio de- psicopedagogo. Temos vrios estudos que, se elaborar e realizar diagnsticos e interven-dentre outras questes, apresentam a necessi- es na instituio. Estas dificuldades, nodade de se rever o excesso de alunos em salas nosso entender, dentre outras, se relacionamde aula, especialmente em algumas regies do diretamente a ausncia deste tipo de experin-nosso pas. Dentre esses estudos e propostas, cia que deveria ter sido propiciada, especial-destacamos as do "Projeto Brasil 2022 Do mente pelos cursos de especializao em psi-pas que temos para o pas que queremos" copedagogia e tambm pelas prprias institui-que enfoca o tema "A educao que quere- es onde estes profissionais atuam.

    130 Cincias & Cognio 2007; Vol 12: 115-133 Cincias & Cognio

    Por outro lado, os resultados tambm ta voltada para o trabalho do professor -apontam para a enorme possibilidade que se psicopedagogo, investindo na preparaoconstitui o trabalho do professor - psicopeda- de seus alunos tambm para este tipo degogo realizado de maneira preventiva na insti- atuao;

  • tuio. Como este trabalho estaria sendo rea- os professores psicopedagogos sejamlizado diretamente pelo professor - psicope- incentivados a construir instrumentos pr-dagogo, portanto, de maneira natural, mas in- prios para uma melhor investigao dastencional, ele excluiria a necessidade de no- situaes apontadas como dificuldades novos espaos, bem como a de novos profissio- processo de ensino e aprendizagem. Essesnais da psicopedagogia que fariam o contato instrumentos deveriam considerar a pro-com o professor, visando obter informaes posta pedaggica da escola, o material di-para trabalhar com o aluno. No estamos com dtico, o prprio trabalho do professor isso, excluindo a necessidade de um trabalho psicopedagogo, as expectativas do aluno,extra-instituio, mas estamos atentando para da famlia, os relacionamentos familiaresa possibilidade de que este trabalho tambm a estabilidade afetivo emocional, dentreseja realizado pelo professor psicopedago- outras;go, de forma rotineira e preventiva em sala de a auto avaliao da prpria atuao dosaula. professores psicopedagogos seja uma Assim, os resultados obtidos revelam prtica constante, assim como a realizaouma tendncia na direo da importncia de de atividades que desenvolvam a constru-se ampliar os trabalhos institucionais preven- o e a formao da autonomia e de umtivos em funo de minimizar o surgimento autoconceito positivo por parte do aluno;de possveis dificuldades de aprendizagem, ao a atuao do professor psicopedagogomesmo tempo em que contribui com a auto- seja registrada, discutida e apresentada emnomia, com a cidadania, com o preparo do fruns especiais, produzindo material ci-aluno para o enfrentamento de novos e cons- entificamente qualificado, com conse-tantes desafios. qente aumento nas publicaes da rea. Neste sentido temos segundo Tonet(2004), que as mudanas sociais esto alte- Essas contribuies, no nosso enten-rando as caractersticas da sociedade e conse- der, so viveis, apesar de ainda convivermosqentemente de seus grupamentos humanos. com questionamentos sobre a validade do tra-Isto implica diretamente em alteraes na es- balho psicopedaggico. Questionamentoscola e no perfil desejado pela mesma, para estes veementemente contestados por vriosseus professores. Desta forma o professor - estudiosos, dentre eles, Bossa (2002), Fernn-psicopedagogo se constitui como um profis- dez (2001), Htu e Carbonneau (2002), Viscasional qualificado que dentre outras questes, (2002), ao

  • enfatizarem que a psicopedagogiapromove condies para que seus alunos te- busca respostas onde as outras reas de co-nham de forma continua e independente, o nhecimento parecem ter deixado lacunas.acesso a cultura. Isto contribui para a melhor Desta forma, o valor da psicopedago-preparao do aluno para o desenvolvimento gia preventiva, j se encontra comprovado,de suas potencialidades e, conseqentemente em uma dimenso institucional, ao ser aceitapara a vida. e considerada como um diferencial para a a- Diante disto, apresentamos algumas quisio de melhorias educacionais. A psico-contribuies que consideramos essenciais pedagogia tambm j adquiriu o status de serpara a ampliao do trabalho a ser realizado reconhecida como objeto de pesquisa nos cur-pelo professor psicopedagogo em sala de sos de graduao e ps-graduao, ampliandoaula. Assim sugerimos que: assim a possibilidade de se estender cada vez mais aos educadores e reas afins. Mais re- os cursos de especializao em psicope- centemente estamos constatando a exigncia dagogia passem a considerar uma propos- desta especializao ou mesmo a indicao de

    131 Cincias & Cognio 2007; Vol 12: 115-133 Cincias & Cognio

    literatura referente a esta rea de conhecimen- prevention programs for children and adoles-to, em concursos pblicos para professores. cents. (pp.01-25). New York: JohnPodemos tambm acrescentar a estas situa- Winley&Sons.es, os resultados obtidos neste trabalho, on- Fagali, E.Q. (1998). Por que e como a psico-de os professores psicopedagogos entrevis- pedagogia institucional?. Rev. da Assoc. Bras.tados legitimam, por meio de suas aes, a Psicopedagogia, 17(46), 37-41.possibilidade da atuao psicopedaggica ins- Fagali, E.Q. e Vale, Z.R.(1994). Psicopeda-titucional preventiva. gogia institucional aplicada: a aprendizagem escolar dinmica e construo na sala de au-7. Referncias bibliogrficas la. Petrpolis. Rio de Janeiro: Vozes. Fernndez, A. (1990). A inteligncia aprisio-Albee, G.W. e Gullotta, T.P.(1997). Primary nada. Porto Alegre: Artes Mdicas.

  • prevention's evolution. Em: Albee, G.W. e Fernndez, A. (1994). A mulher escondida naGullotta, T.P Primary prevention works. (pp professora: uma leitura psicopedaggica do03-21). New Delhi: Sage Publications. ser mulher, da corporalidade e da aprendiza-A