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QUESTÕES ECONÔMICAS E ACAD˚MICAS · Sisnando Leite. Œ F or taleza: LCR, 2006. 158p. ; 21 cm ISBN 85-86806-33-1 1. Universidade pœblica 2. Universidade F ede-ral do CearÆ I

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PEDRO SISNANDO LEITE

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FORTALEZA � CEARÁ2006

Leite, Pedro SisnandoQuestões econômicas e acadêmicas./Pedro

Sisnando Leite. � Fortaleza: LCR, 2006.158p. ; 21 cm

ISBN 85-86806-33-1

1. Universidade pública 2. Universidade Fede-ral do Ceará I. Tíulo.

CDD 378.1

L533

Questões Econômicas e Acadêmicas© 2006 copyright by Pedro Sisnando LeiteImpresso no Brasil/Printed in BrazilEfetuado depósito legal na Biblioteca Nacional

PROJETO GRÁFICO E CAPA

[email protected]

REVISOR

Floriano Lopes de Jordão

BIBLIOTECÁRIO

Eduardo Freire Barbosa

Administração de Instituições de ensino superior � 378.1

Este livro é dedicado ao estimado Pro-fessor Antônio de Albuquerque SousaFilho, que influenciou muito minha vidaacadêmica e profissional.

�A educação tem como objetivos formarmentes que possam ser críticas, quepossam verificar, ao invés, de aceitartudo que lhes é oferecido.�

Piaget

SUMÁRIOREFÁCIO ..................................................................................... 11

PARTE IQuestões Acadêmicas

A ESPINHA DORSAL DA MODERNIDADE DO CEARÁ ........... 15UFC: SINAL VERDE PARA AGIR ............................................... 19A UFC NA DÉCADA DE 90 ........................................................ 21O PAPEL DA UFC PARA O ANO 2000 ...................................... 23AS UNIVERSIDADES E O DESENVOLVIMENTO REGIONAL ..... 26MODELOS PARA VERBAS DAS UNIVERSIDADES .................. 28O QUE SERIA O CEARÁ SEM A UFC? ....................................... 31AS UNIVERSIDADES DO NORDESTE ACERTAM O PASSO ....... 33INGRESSANDO NO INSTITUTO DO CEARÁ ............................ 36SAUDAÇÃO DE EDUARDO BEZERRA NETO ........................... 49OBRIGADO, JÂNIO QUADROS .................................................. 53

PARTE IIQuestões Econômicas

ARMADILHA IDEOLÓGICA DA ECONOMIA .......................... 57SOCIAL-DEMOCRACIA PODE SER NOVA VIA ........................ 59MODELOS DE DESENVOLVIMENTO ....................................... 63A VEZ DO PLANEJAMENTO .................................................... 66REINVENTANDO O NORDESTE ................................................ 69A NOVA ECONOMIA DA INFORMAÇÃO ................................ 72NOVO PLANO, VELHOS PROBLEMAS .................................... 75PLANO REAL: HORA DE PISAR NO FREIO.............................. 78REVERSO DO REAL .................................................................... 81AS CAUSAS DA INFLAÇÃO ...................................................... 83AS RAÍZES DA INFLAÇÃO SÃO VÁRIAS... MAS QUEM É O VILÃO ....... 86CUBA PODE SOBREVIVER? ....................................................... 89A AGRICULTURA DO NORDESTE E O III PLANODIRETOR DA SUDENE ................................................................ 93

PARTE IIIPlanejamento Estratégico

INTRODUÇÃO .......................................................................... 129MODERNIZAÇÃO ADMINISTRATIVA DA UFC ..................... 131ENSINO DE MELHOR QUALIDADE ........................................ 133PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO ............................................. 135PRIORIDADES PARA A EXTENSÃO ....................................... 138DESENVOLVIMENTO DE RECURSOS HUMANOS ................. 140PROMOÇÃO E ASSISTÊNCIA AO ESTUDANTE .................... 141DESENVOLVIMENTO DA INFORMÁTICA NA UFC .............. 142SÍNTESE DO PLANO INSTITUCIONAL DA UFC: 1984-1987 .... 143ESTRUTURA DA METODOLOGIA DE PLANEJAMENTOESTRATÉGICO DA UFC: 1991-1995 ........................................ 151

1 1

PREFÁCIO

Ingressei na Universidade Federal do Ceará como pro-fessor auxiliar da Faculdade de Ciências Econômicas. Foium concurso muito concorrido, supervisionado pelo prof.Ary de Sá Cavalcante, então diretor da instituição. Recordo-me que dos sete candidatos, três eram colegas do Banco doNordeste e outros do Instituto de Economia do Ceará.

Em anos seguintes, submeti-me a concurso para profes-sor assistente, professor efetivo e, com muito esforço e novascompetições, para professor adjunto. Finalmente, depois de20 anos de experiência e produção acadêmica, ultrapassei amais difícil e aspirada função de professor titular de Desenvol-vimento Econômico, do Departamento de Teoria Econômicada UFC. A tese apresentada para essa finalidade foi sobre�Escandinávia: Democracia, Desenvolvendo o Bem-Estar�.

Nos cursos de graduação lecionei, no âmbito da Uni-versidade, Introdução à Economia, Desenvolvimento Eco-nômico e Desenvolvimento Rural. Nos cursos de mestrado,ministrei cursos sobre Desenvolvimento Econômico, noCAEN, e Desenvolvimento Rural Integrado, no Curso deMestrado em Economia Rural do Centro de CiênciasAgrárias. Neste último curso, colaborei por dez anos comoprofessor titular dessa cadeira. Experiência rica de apren-dizagem, no entanto, foi na administração universitária. Pas-sei oito anos como Pró-Reitor de Planejamento da UFC, nosreitorados dos professores Anchieta Esmeraldo Barreto(1984-1987) e Antônio de Albuquerque Sousa Filho (1992-1995). Nesse período, participei de várias atividades acadê-micas no Conselho de Reitores e no Ministério da Educação.

Afastei-me das minhas atividades acadêmicas paraexercer o honroso cargo de Secretário de Desenvolvi-mento Rural do Ceará no período de 1995-2002, no Go-verno Tasso Jereissati.

12

Vale assinalar que, durante vinte anos, ao mesmo tem-po que ministrava aulas na Universidade Federal do Cearátambém trabalhava no Banco do Nordeste do Brasil, ondeexercia a função técnica de economista no Departamentode Estudos Econômicos (ETENE). Portanto, com direito aacumulação de função científica e de magistério.

Tudo isso para dizer apenas que as notas que cons-tam deste livreto foram preparadas durante o período emque ocupava as funções de Pró-Reitor da UniversidadeFederal do Ceará. Os pensamentos expostos, no entanto,retratam minhas vivências como professor de teoria eco-nômica e profissional que trabalhava no mundo real dodesenvolvimento regional pertinente as minhas funçõesno Banco do Nordeste. Diziam que essa instituição erauma verdadeira universidade. Concordo com isso.

Alguns dos tópicos das partes I e II deste trabalhoforam publicados no jornal �O Povo� ao longo do perío-do de 1984-2001. A Parte III contém um resumo de do-cumento apresentado à comunidade acadêmica comosubsídio para o planejamento das atividades da Univer-sidade Federal do Ceará, no período de 1991-95, quandoocupei a função de pró-reitor de planejamento.

Constam dos Apêndices três documentos: I � AAgricultura do Nordeste e o III Plano Diretor da SUDENE;II � Síntese do Plano Institucional da UFC: 1984-1987e II � Estrutura da Metodologia de Planejamento Estra-tégico da UFC: 1991-1995.

Como membro do Instituto Histórico, Geográfico eAntropológico do Ceará, animei-me em resgatar as idéiasque foram por mim expostas à opinião pública cearensee aos meus alunos naquele período.

Os meus colegas da Academia Cearense deCiências e da Academia de Ciências Sociais do Cearátambém foram de opinião que a divulgação das refle-xões econômicas e experiências de administração uni-versitária de vida acadêmica não deveriam ser perdidas.

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE IQUESTÕES ACADÊMICAS

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A ESPINHA DORSAL DA MODERNIDADE DO CEARÁ

Será que não nos atrevemos porque as coisas sãodifíceis ou será que são difíceis porque não nosatrevemos.

SÊNECA

Como reestruturar a Universidade Federal do Cea-rá de modo a torná-la uma instituição nova, com padrõesdo ano 2000? Essa pergunta foi formulada a professores,alunos e servidores da UFC, empresários cearenses, ban-cários e sindicalistas. Dentre outras respostas dadas aospesquisadores da Fundação Cearense de Pesquisa e Cul-tura, destaca-se a opinião de que é essencial para a mo-dernização da Universidade a informatização da máquinaadministrativa, do ensino e da pesquisa. Segue-se o des-taque da importância do entrosamento da Instituiçãocom os centros de pesquisa do Brasil e do exterior.

Partindo praticamente da estaca zero, poucos anosatrás, a UFC conta hoje com um Sistema de AutomaçãoUniversitária que cobre todas as carências administra-tivas e acadêmicas, com dois computadores gerenciaise mais de 400 terminais localizados em todos os depar-tamentos e órgãos suplementares. Diz-se que é um dosmais modernos das universidades federais. Por outrolado, para atender às necessidades do ensino de gradu-ação, foram instalados nos últimos dois anos cerca de500 microcomputadores de última geração, que serão1.000 em breve, distribuídos em laboratórios comunitá-rios junto a todos os cursos de graduação.

Faltava, para dar um passo à frente do atual séculoem busca do ano 2000, a aquisição de novo sistema decomputadores para a pesquisa científica. A máquina exis-tente há quase vinte anos foi aposentada por não maissatisfazer às mínimas exigências dos pesquisadores.

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS1 6Até o final do corrente ano, entretanto, a Universi-

dade Federal do Ceará tornar-se-á uma das mais equipa-das em computação científica do Norte e Nordeste e aterceira do País. Somente as universidades do Rio Gran-de do Sul e de Campinas, em São Paulo, possuem sistemasimilar ao que será instalado no Ceará. Essas três univer-sidades e, futuramente, a Universidade Federal do Rio deJaneiro, estarão acopladas num sistema denominado deCentro Nacional de Processamento de Alto Desempenho(CENAPAD). Em conjunto, esses pólos formam o maiorcomplexo de computação científica da América Latina.Estarão ligados entre si através de fibra ótica, que trans-portam dados com rapidez e segurança. A velocidade detransmissão das informações vai aumentar 1.000 vezesem relação ao sistema atualmente em uso.

Todos os microcomputadores e estações de trabalhodestinados à pesquisa e ao ensino de pós-graduação daUFC estarão, por sua vez, conectados com a nova fibra, de100 megabits por segundo, aos dois grandes servidorescomputacionais, um dos quais destinado à FUNCEME. Nocaso específico da UFC, esse sistema de computação con-tará adicionalmente com 400 microcomputadores 486, cer-ca de 100 estações de trabalho Risc e, inicialmente, 50terminais, espalhados pelo Câmpus do Pici, Benfica ePorangabussu, e interligados também por fibra ótica.

Na verdade, o salto para o futuro dado atualmentepela Universidade não é apenas da academia, mas de todoo Ceará. O Centro Nacional de Processamento de AltoDesempenho é um programa de todo o Estado, com aparticipação da Secretaria da Ciência e Tecnologia, Fun-dação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos(FUNCEME), universidades estaduais e todos os órgãosdo Estado que possam realizar pesquisa ou desenvolvi-mento tecnológico, afora o Banco do Nordeste do Brasil ea Federação das Indústrias do Ceará. Trata-se de um pro-

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS 1 7jeto de oito milhões de dólares para equipamentos, alémdos investimentos em infra-estrutura que serão financei-ramente de responsabilidade das entidades beneficiadas.

Não é por acaso que esses fatos estão acontecen-do aqui no Ceará. A opção da FINEP e do Ministério deCiência e Tecnologia em fornecer os recursos para essafinalidade tem sua razão de ser. O Ceará, atualmente,tornou-se uma área de referência nacional como mode-lo de desenvolvimento econômico no meio de uma cri-se. O mesmo acontece com a Universidade Federal doCeará que tem ignorado a não-aprovação, até agora, doOrçamento Federal e se lançou na busca de recursos deoutras fontes para o seu projeto de modernização. Alémdisso, a UFC é considerada hoje, ao nível nacional, comouma instituição de peso. Conta com 8 cursos de douto-rado, 6 dos quais são novos, e 28 cursos de mestrado,alguns também recém-criados, ao lado de dezenas decursos de aperfeiçoamento e especialização. O nível deformação dos professores é atualmente o melhor do Nor-te e Nordeste, posicionando-se por esse critério como aoitava das vinte melhores do País. São 340 doutores, 600mestres e 400 especialistas e graduados com treinamen-to e experiência prática em suas profissões, como são osmédicos, advogados, contabilistas, engenheiros e arqui-tetos, muitos deles de notoriedade nacional.

Afora isso, Fortaleza será ligada em breve por fibraótica ao País e ao exterior por meio de três cabos interna-cionais: América I (EUA) e Columbus I (ligando-se a Eu-ropa por Portugal, França e Itália). Essa superestrada ondeirá trafegar bilhões de informações entra no Brasil porFortaleza e prossegue por todas as capitais nordestinas.O cabo atingirá também Belo Horizonte, Brasília, Goiâniae, para o Sul, seguirá até Porto Alegre, depois de passarpelo Rio de Janeiro, São Paulo e outros centros importan-tes. A partir daí, estende-se para os países do Cone Sul,

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS18através do Projeto Unisur. A essa malha de fibra ótica seligará a Rede Cearense de Pesquisa, através da RedeNacional, cujo ponto de presença no Ceará se encontraem funcionamento no Departamento de Computação daUFC. Todo esse sistema já pode ser utilizado com uso com-binado da telefonia onde não foi instalada ainda a fibraótica. Na UFC estão instalados, internamente, 3.500m queserão ampliados para 20.000m.

A rede acadêmica de informática interligará quin-ze milhões de computadores heterogêneos, em mais de80 países, formando o maior banco de dados do planeta,através do acesso à Internet (rede internacional). �Ocontato imediato ao trabalho de colegas e aos milhõesde volumes de livros e artigos dá aos pesquisadores umapossibilidade até então inimaginável de adquirir conhe-cimentos e informações�, dizem os usuários do sistema.Esses progressos extraordinários poderão também seracessados diretamente das residências dos pesquisado-res cadastrados. Hoje, cerca de 700 professores já pode-riam fazer uso da rede de pesquisa através de seusmicrocomputadores instalados em seus lares.

Domenico de Mazi, renomado professor de Sociolo-gia da Universidade de Roma, diz que entre o fim do sécu-lo XIX e o início do século XX ocorreu uma revolução naFísica (Einstein), Psicologia (Freud), Pintura (Picasso),Música (Schoenberg), Literatura (Joyce) e na Arquitetura(Le Corbusier). No início do século XXI, prevê esse cientis-ta que o homem pós-industrial dará um salto com o uso dainformática e da microeletrônica. A computação abriráamplos horizontes para a democratização da informação,do conhecimento para a conquista de um novo desenvol-vimento e bem-estar da sociedade da Terceira Onda.

A Universidade Federal do Ceará também acredi-ta nisso e prepara-se para a modernidade do novo milê-nio, em parceria com o Estado do Ceará.

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UFC: SINAL VERDE PARA AGIR

Não quero explicar o passado nem advinhar ofuturo. O que eu mais quero, mesmo, é entender opresente.

JORGE LUÍS BORGES

Qual deverá ser o destino da Universidade Federaldo Ceará doravante?

Não sabemos precisamente o que ocorrerá em nos-sa instituição com o novo reitorado, mas temos a con-vicção de que a UFC não será mais a mesma...

A força da inteligência, compromisso e determina-ção do novo reitor Antônio de Albuquerque Sousa Filhoe de sua destemida equipe de auxiliares haverão demudar o rumo da nossa Universidade. Para isto, comorecomenda Santo Inácio de Loiola, deveremos �esfor-çar-nos e lutar como se tudo dependesse de nós e orar econfiar como se tudo dependesse de Deus.�

No início do presente século, um estadista norte-americano, William Jennings Bryan, referiu-se a estaquestão do seguinte modo: �O destino não é um assun-to de sorte, é um assunto de escolha e decisão. Não éalgo que há de esperar, senão algo que há de conquis-tar.� Ou, ainda, no dizer de Sêneca: �Não há vento favo-rável para aquele que não sabe para onde ir.�

Os desafios emergentes exigem que a UFC trilhenovas direções, objetivos e estratégias. A Universidadetem o dever de dedicar esforços planificados na busca deuma sociedade nova, sem copiar modelos de outras rea-lidades. A educação superior deve ser o centro da gera-ção de conhecimento futurista, que parta da realidadeatual para apresentar respostas científicas capazes detransformar a sociedade atual, subdesenvolvida, numamodalidade de economia moderna, justa e progressista.

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS20É necessário, contudo, compreender que a Univer-

sidade não é um mero serviço de utilidade estatal quedeva servir unicamente às necessidades dos contribu-intes, nem um instrumento de ação social direta, comoalguns imaginam.

A Universidade deve ser essencialmente uma ins-tituição educativa, científica e cultural, com vistas a for-mar profissionais em diversos ramos do conhecimentopara o desenvolvimento socioeconômico. Estas funçõesse tornam indispensáveis para que a Universidade nãoseja apenas uma instituição de elevado nível acadêmicoou um sindicato para atender segmentos trabalhistas.Ela deve ser, sim, a geradora do conhecimento científi-co a serviço de uma causa social e do desenvolvimentoeconômico autêntico.

Com essa finalidade, a Universidade deve manteruma consciência crítica e conservar em suas bases opluralismo ideológico, em oposição às formas dogmáticasextremistas que ainda subsistem em nossa Universidade.Reduzir a questão da educação superior a posições extre-mas de pequenos grupos ativistas radicais é suicídio.

Eis por que o propósito do novo reitorado é soerguera reputação da Universidade como força de mudança edesenvolvimento. Desse modo, o seu destino interessa atoda a comunidade. Este é um dos motivos por queestamos com o professor Antônio de Albuquerque paraajudá-lo a concretizar este projeto, que necessita tam-bém de sua cooperação.

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A UFC NA DÉCADA DE 90

A capacidade pouco adianta sem a oportunidade. NAPOLEÃO

A década de 1970 foi marcada por transformaçõessignificativas na universidade brasileira.

O acelerado crescimento da economia do país e omodelo político institucional existente então levaram a umareforma universitária de expansão quantitativa das insti-tuições de ensino superior e das matrículas, com reflexossobre a depreciação qualitativa do ensino de graduação.

A crise econômica da década de 80, gerada por pro-blemas energéticos, dívida externa, inflação, redução dastaxas de crescimento da economia e reestruturação dasinstituições motivou o questionamento do papel da Uni-versidade na sociedade e da reforma universitária anteri-ormente implantada.

É claramente previsível que a década de 90 será operíodo decisivo para os ajustes e mudanças estrutu-rais do modelo universitário brasileiro. Enquanto a eco-nomia brasileira passa por reorientações marcantes,forças econômicas, políticas e sociais remodelam a eco-nomia mundial de acordo com novos paradigmas queafetarão profundamente as economias do III Mundo, demodo geral, e do Brasil, em particular.

É chegado o momento, portanto, de reexame do pa-pel da universidade nesse novo panorama. Qual a opção aseguir doravante? A concepção de uma universidade quedeve concentrar-se em pesquisa e cultura, da tradição ale-mã? Ou a idéia de ensino liberal da época renascentista,quando a universidade se destinava aos eruditos e líderes?

Seria melhor adaptar ao nosso país a concepçãoeuropéia de universidade de ensino teórico e abstrato dasciências e artes, deixando ao ensino técnico a prepara-

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS2 2ção dos ofícios e habilitações, ou o modelo oriundo dosEstados Unidos com ênfase na preparação profissionalde qualquer vocação? Deve a universidade, como insti-tuição social e de interesse público, fortalecer a inter-re-lação docência-investigação-produção e o estreitamentodos vínculos com os organismos de produção e serviços?

Finalmente, devemos aceitar os fundamentos dacarta da União das Universidades Latino-Americanasquanto aos princípios de que a educação universitáriadeva ser orientada para o pleno desenvolvimento da per-sonalidade humana, harmonizando técnica com a for-mação humanística e segundo um modelo de autonomiaintelectual e de educação crítica e criadora?

Todas essas questões, e outras, devem ser reexami-nadas no momento em que se pretende reorientar os rumosda nossa universidade. Torna-se necessário, com este propó-sito, promover com urgência uma ampla consulta aos profes-sores, estudantes, funcionários e organismos público e privadocom vistas a orientar o delineamento da nova universidade.

Os diagnósticos já realizados sobre a UFC devem,naturalmente, ser considerados para a definição da es-tratégia de maior vulto no tocante aos problemas institu-cionais, operacionais, financeiros, acadêmicos, de pessoal,de informática, instalações e planejamento e controle.

A ênfase neste momento deve ser a de fazer daUFC uma nova universidade, à frente do seu tempo, comodevem ser as instituições de ensino universitário.

A tradução de tudo isso para a realidade exigirátrabalho, competência acadêmica e compromisso de pro-fessores, funcionários e estudantes.

Não temos dúvidas dos problemas e das dificulda-des internas e externas a superar. Entendemos, no en-tanto, que o tempo está passando e não mais é possívelesperar. Queremos mais compromisso e participação e,por isso, mais democracia e ação política.

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O PAPEL DA UFC PARA O ANO 2000

O necessário é manter-se à frente dos acontecimen-tos, procurando imprimir-lhes rumo e alternativa.

NICOLAU MAQUIAVEL

No momento em que foram definidos os objetivos,políticas e estratégias de ação da Universidade Federaldo Ceará para o período 1992-95, o Reitor Antônio deAlbuquerque Sousa Filho declarou: �A ênfase neste mo-mento deve ser a de fazer da UFC uma nova Universidade,à frente de ser tempo, como devem ser as instituições deensino universitário.� O nosso compromisso político,acrescenta seu Plano de Ação, deve ser �por uma promo-ção do homem e do povo cearense e nordestino; pela açãodo desenvolvimento científico, tecnológico e cultural.�

Para conhecer a percepção da comunidade sobre essasdiretrizes e os rumos futuristas da Universidade Federal doCeará foi realizada, recentemente, uma pesquisa de opiniãopública junto a diversas categorias profissionais de Fortale-za. A Fundação Cearense de Pesquisa e Cultura, através desua Central de Estudos e Opinião Pública, consultou, poramostragem, professores universitários, estudantes e fun-cionários da UFC, empresários, bancários, funcionários pú-blicos e sindicalistas, num total de 420 pessoas.

A pesquisa procurou conhecer, entre outros temas,que objetivos a UFC deve cumprir para ajudar o desenvol-vimento do País? Mais de 70% dos entrevistados, em mé-dia, apontaram, como fundamental, formar profissionaiscapacitados para a sua profissão, com sentido crítico so-bre a realidade nacional. Na mesma percentagem, segue-se a indicação da necessidade de agilizar a estruturaorganizacional da instituição visando a sua modernizaçãoacadêmica e administrativa para a garantia e acompanha-mento do desenvolvimento social, científico e tecnológico.

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS2 4O segundo assunto investigado foi: Como a UFC po-

deria realizar a aproximação entre o que ensina e as neces-sidade profissionais e sociais de interesse da nação? Asopiniões predominantes foram quanto à necessidade depromover a integração entre a teoria e a prática, mediante orelacionamento com a empresa, o governo e a sociedadecivil. Em segundo lugar, com mais de 70% da opinião dosprofessores, consideram que é indispensável adequar o en-sino às exigências do mercado. A troca de conhecimentoscientíficos e tecnológicos com as empresas e associaçõesnão-governamentais também recebeu destacada referência.

Recursos humanos mais capacitados para o desem-penho de uma profissão, melhoria da qualidade do ensi-no e aumento da credibilidade social, técnica e científicaforam os pontos principais e mencionados como respos-ta à indagação de: �Quais fatores poderão advir daintegração da UFC com a sociedade?�

Em contrapartida, a pesquisa procurou saber o quepoderia ser levado das empresas públicas e privadas e daexperiência do mundo real para a universidade. Os profes-sores, alunos, funcionários da UFC, funcionários públicos,bancários e sindicalistas estão de acordo que a referida co-operação poderia ser na forma de recursos econômicos emateriais, bolsas de estudo, fundo para equipamento, pes-quisa e difusão cultural. Outra alternativa apontada foi o in-tercâmbio de profissionais altamente qualificados no uso datecnologia para ministrar cursos na Universidade, assimcomo o oferecimento de cursos explicativos do que são asempresas, suas tecnologias, seus produtos e processos.

Quais as mudanças necessárias para incentivar aparticipação e compromisso dos segmentos da socieda-de na execução dos objetivos da UFC? Muitas sugestõesforam assinaladas sobre o assunto, tais como: 1) ofereci-mento de cursos de capacitação e formação de profis-sionais que tenham a flexibilidade para adaptar-se às

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS 25mudanças tecnológicas e administrativas que enfrentamas empresas; 2) reuniões com empresários e professorespara a troca de experiência, pontos de vista e necessida-des comuns; 3) melhoria no sistema de comunicação dasações realizadas pela instituição para a sociedade.

Finalmente, a pesquisa procurou conhecer dos en-trevistados: �Como reestruturar a UFC para torná-la umauniversidade nova, com padrões do ano 2000?� A princi-pal sugestão apontada foi promover o entrosamento dainstituição com os centros de pesquisa do Brasil e do exte-rior, com destaque particular das respostas dos bancários,professores e alunos da UFC. Segue-se, em ordem de im-portância, a sugestão de participação mais efetiva da UFCna solução dos problemas econômicos, sociais, científicose tecnológicos do País, assim como a informatização doensino, pesquisa, extensão e dos setores administrativos.Por último, mais de 50% dos entrevistados recomendammanter o programa de integração universidade/empresa/comunidade, com predominância desta opinião entre osfuncionários públicos, alunos e funcionários da UFC.

Da análise dos resultados dessa pesquisa, muitomais ampla e sugestiva do que o resumo dessas notasoferece, pode-se concluir que a UFC está procurandoseguir o caminho certo, como a sociedade poderá jul-gar pelo confronto do que pensa a opinião pública sobrea Universidade Federal e o que vem sendo realizado,como é do conhecimento da comunidade. Na verdade,pode-se dizer que o propósito e a determinação da atualadministração da UFC é cumprir, além disso, com o seumaior compromisso político, que é: �Por uma nova Uni-versidade mais participativa com a solução dos proble-mas econômicos, sociais e políticos do final da presentedécada e do início do novo milênio,� segundo a vocaçãode realizar �O Universal pelo Regional�.

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AS UNIVERSIDADES E O DESENVOLVIMENTO REGIONAL

A UFC deve buscar o Universal pelo Regional.PROF. ANTÔNIO MARTINS FILHO

A universidade e as instituições de ensino superi-or, de modo geral, devem ser essencialmente de nature-za educativa, científica e cultural, com vistas a formaremprofissionais em diversos ramos do conhecimento quepossam ajudar na transformação da sociedade.

Essas funções, na verdade, não são meros concei-tos formais. Trata-se de uma exigência para que as referi-das instituições não sejam apenas academias de alto nível,mas que o saber científico esteja a serviço de uma causasocial. Daí por que as IES, em qualquer de suas modalida-des, devem ter liberdade de ação através de suaautonomia. Só uma instituição crítica pode cumprir au-tenticamente essa função social, que não é exclusiva dauniversidade pública.

Nesse sentido, têm crescido as manifestações decientistas, professores e políticos no sentido de buscar aestruturação de uma nova universidade capaz de contri-buir para o melhoramento social da comunidade, com oaporte da ciência, da tecnologia e de idéias renovadoras.Nas reuniões e documentos do Conselho de Reitores(CRUB) e de outras instituições científicas é comum amanifestação de que �A Universidade atual não deve sermais a tradicional instituição de conservação e transmis-são da cultura.�

Em resumo, tais pronunciamentos ressaltam que osdesafios históricos do século XX e XXI exigem novas di-reções, metas e objetivos a serem perseguidos por essasinstituições. De fato, a sociedade nordestina espera dasuniversidades a resposta a seus problemas, donde se

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS 2 7conclui que é premente que sejam leais a esta sociedadecom a qual devem trabalhar estreitamente comprometi-das. Em outras palavras, as comunidades subdesenvol-vidas economicamente encaram os centros de educaçãosuperior como fonte de mentalidade reformista etransformadora dessas sociedades.

Sobre o assunto, o renomado professor Celso Fur-tado, em seu livro �Cultura e Desenvolvimento em Épo-ca de Crise�, destaca: �Terá a comunidade universitáriaplena consciência desse desafio? E o que ainda é maisimportante; da missão histórica que lhe cabe na lutapara libertar o Nordeste da dependência e da miséria?�O dr. João Gonçalves de Sousa, ex-Superintendente daSUDENE, por sua vez, assinala que: �O problema da Uni-versidade no Nordeste nunca foi colocado numa pers-pectiva realista, consistente, corajosa. Não há definiçãoprática do seu papel no contexto regional.�

Segundo o grande humanista prof. Guimarães Du-que, �o ensino universitário brasileiro é demasiadamenteintelectual e deficiente no conteúdo de sentimento. Prepa-ra-se o estudante para servir a si próprio e não a seu povo.�

Neste contexto, o tipo de educação superior queinteressa à região Nordeste é aquele que favorece o de-senvolvimento econômico e a mudança social, pois a uni-versidade, numa sociedade em desenvolvimento, devedar ênfase aos problemas de interesse da nação e suasmetas humanísticas. No caso específico do Nordeste doBrasil, cabe a estas instituições uma função social estra-tégica de liderança no delineamento dos rumos que asociedade regional deve seguir.

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MODELOS PARA VERBAS DAS UNIVERSIDADES

A base de todo Estado é a educação da sua juventude. DIÓGENES

O estudo e o debate sobre os critérios para o finan-ciamento do ensino superior tornaram-se pauta cons-tante das reuniões dos reitores brasileiros nos últimosanos. Atualmente, as palavras mais usadas nas discus-sões pertinentes são: avaliação, eficácia, gestão acadê-mica, autonomia. Em outros termos, ensinar mais alunoscom menos despesas, mantendo ou melhorando a qua-lidade dos resultados.

Essa questão está ocupando também espaço cres-cente nos países da Europa e nos Estados Unidos. Emreunião recente dos conselhos de reitores das universi-dades portuguesa e brasileira, realizada na cidade doPorto, esta problemática foi analisada cuidadosamente.

A situação nesses países é diferente do caso brasi-leiro, mas nem por isso o assunto deixou de suscitar pre-ocupações das nossas instituições públicas de ensinosuperior. De fato, a maioria das universidades federaisbrasileiras vive uma situação orçamentária difícil, espe-cialmente em face da crise da economia do País, que seencontra praticamente estagnada há bastante tempo. Emvista disso, grande parte dessas instituições não contacom recursos financeiros suficientes para desenvolveradequadamente sua infra-estrutura física e para recupe-ração de salas de aula, laboratórios e o incremento domaterial bibliográfico. De modo geral, mais de 90% dosrecursos se destinam ao pagamento da folha de pessoaldocente e administrativo, enquanto as verbas de manu-tenção e de investimentos são quase sempre deficitárias.As despesas de outros custeios e de capital das 53 insti-

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS 29tuições de ensino superior foram de apenas 204 milhõesde dólares, em 1993.

É oportuno assinalar que as instituições federaisoferecem anualmente 350 mil matrículas para estudan-tes de ensino superior, mantêm 44 hospitais, com 8,2milhões de consultas e 158 mil operações, em grandeparte com os orçamentos das próprias universidades;realizam 90% de todas as pesquisas do País, com a parti-cipação de 9 mil doutores e 16 mil mestres, com forma-ção em praticamente todas as áreas do conhecimentohumano. Os cursos de pós-graduação de mestrado edoutorado produzem anualmente cerca de 3 mil teses.

Durante muitos anos, esse quadro de potenciali-dades versus limitações financeiras abateram o ânimo deadministradores, professores e funcionários, com prejuí-zos para a educação superior e o desenvolvimento do País.

Nos anos recentes, mesmo subsistindo tais proble-mas, muitos dirigentes e a comunidade universitária bra-sileira modificaram a sua atitude diante da crise. Nasreuniões da Associação Nacional dos Dirigentes das Ins-tituições Federais de Ensino Superior (ANDIFES) e noFórum de Pró-Reitores de Planejamento e Administração,as discussões passaram a tratar da melhoria dos níveis eda qualidade do ensino, melhores resultados das pesqui-sas e maior produtividade. Outros temas de particularinteresse, agora, dos dirigentes dessas instituições sãoadaptar as atividades das IFES às necessidades da socie-dade, maior responsabilidade e melhor gestão das insti-tuições. Avaliação passou a ser uma palavra �mágica�,perseguida por todos. Basta mencionar que praticamen-te todas as instituições federais de ensino superior do Paísestão, no momento, com projetos no Ministério de Edu-cação solicitando recursos com essa finalidade.

A questão principal, em decorrência disso, passoua ser: Como aperfeiçoar a distribuição das verbas basea-

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS30da numa política de atendimento das necessidades e com-petência de cada instituição? Tornou-se evidente, nessecontexto, a adoção de um modelo que expressasse eqüi-dade na alocação de recursos e transparência, atravésde fatores quantificáveis. Enfim, proporcionar estabilida-de de financiamento, prevendo as flutuações e facilitan-do o planejamento das atividades universitárias.

Com essa finalidade, uma nova sistemática de distri-buição de verbas às universidades brasileiras acaba de seraprovada pelos reitores com a pronta concordância doMinistro da Educação e do Secretário de Ensino Superior.Cada fatia dos recursos governamentais para o ensino su-perior será alocada com base numa série de indicadoresde necessidade, produtividade e qualidade. O modelo foiconcebido a partir das experiências sobre o assunto naHolanda, Inglaterra, França, Espanha e Portugal.

Essa decisão corresponde a um grande avanço naalocação de recursos federais para a educação superiore certamente será motivo de estímulo para a moderniza-ção das universidades brasileiras. A Universidade Fede-ral do Ceará foi bem contemplada pela nova sistemática,estando posicionada entre as melhores do País.

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O QUE SERIA O CEARÁ SEM A UFC?

A grande vantagem de dizer a verdade é que te-mos mais hipóteses do que ser convincentes.

SUSAN HAWATCH

A maioria dos economistas e planejadores concor-da que os recursos humanos e não os fatores físicos é quedeterminam o caráter e o ritmo do desenvolvimento eco-nômico de um país. Como diz o renomado cientista socialJohn Kenneth Galbraith: �O primeiro requisito do pro-gresso é uma população instruída, competente e motiva-da.� É verdade que o capital e a terra são essenciais, maso seu aproveitamento e uso dependem da capacidade eengenhosidade do fator humano e do trabalho qualificado.

Não é necessário justificar, naturalmente, o papelda educação como ingrediente insubstituível para umavida mais plena, digna de auto-afirmação e para a pros-peridade material... Do mesmo modo, seria difícil imagi-nar como seria o Estado do Ceará sem a sua UniversidadeFederal. Como funcionariam os setores produtivos, oshospitais, os tribunais, os colégios, a vida econômica, so-cial e cultural?

Dentro desse contexto, a Universidade Federal doCeará tem crescido continuamente nas quatro décadasde sua existência. O patrimônio mais valioso que a UFCconta hoje é o seu próprio corpo de professores e funcio-nários técnico-administrativos. Deles tem dependido osucesso das atividades de ensino, a pesquisa, a extensãoe a eficácia da máquina administrativa. Reconhecendotal fato, a Universidade dedicou, nesses quarenta anos,especial atenção à política de desenvolvimento organi-zacional e treinamento, em alto nível, de todo o seu pes-soal docente e administrativo.

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS3 2As medidas para a melhoria da qualidade do ensino

de graduação e pós-graduação, objetivo prioritário da UFC,estiveram sempre direcionadas para a permanente avalia-ção do processo ensino-aprendizagem e adaptação doscurrículos à realidade sociopolítica e econômica do Nor-deste. Daí o seu lema, lançado desde o início de suas ativi-dades pelo professor Martins Filho, fundador da instituição.

O direcionamento da pesquisa e extensão, pararealimentar a função ensino, tem sido outra preocupaçãoconstante dos administradores da UFC. Além da buscapela melhoria da infra-estrutura física, ampliação e reno-vação de novos equipamentos e apoio bibliográfico à ati-vidade didático-científica. As atividades de extensãotiveram, ao longo dos anos, substancial ênfase no sentidode levar à comunidade, por todos os meios, a sua produ-ção científica, tecnológica e cultural. Deve-se destacar,especialmente, a contribuição da extensão no sentido decaptar as necessidades essenciais da sociedade para avida acadêmica.

Neste aniversário especial da UFC, não é possíveldeixar de referenciar os progressos no campo da com-putação. De fato, a área de informática é motivo de or-gulho para toda a comunidade. Pode-se dizer que, nomomento, a UFC é uma das instituições federais de en-sino superior mais bem equipadas do Norte e Nordesteno campo administrativo e de ensino de graduação. Atéjunho do próximo ano, contará com um dos parquescomputacionais para a pesquisa científica e tecnológicade alto desempenho de vanguarda em todo o País.

Assim, nessa data, tiramos o chapéu e damos nos-sos sinceros parabéns à UFC!

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AS UNIVERSIDADES DO NORDESTE ACERTAM O PASSO

A história nada é se não for a atividade dos ho-mens em busca de seus objetivos.

KARL MARX

As instituições federais, estaduais e particularesde ensino superior do Nordeste dão um salto à frente demãos dadas: estão arquivando o isolacionismo em quesempre viveram e passam a trabalhar cooperativamen-te em áreas de interesse acadêmico estratégico.

Encorajadas por este propósito, firmaram um pac-to de cooperação denominado Protocolo de Integraçãodas Instituições de Ensino Superior do Nordeste (PINE).Pode-se dizer que este programa foi idealizado, de fato,em fins de 1991, pelo reitor da Universidade Federal doCeará, professor Antônio Albuquerque de Sousa Filho,seu atual presidente. Com isto, as instituições objetivamorganizar programas de intercâmbio e cooperação deinteresse comum que contribuam para o desenvolvimen-to socioeconômico e cultural do Nordeste. O alvo princi-pal desse trabalho interuniversitário é privilegiar açõesque promovam a melhoria de qualidade do ensino, mai-or parceria da pesquisa, com reforço da base científicae financeira dessa atividade, e o aumento da presençadessas instituições no interior da região Nordeste, atra-vés de programas de extensão.

O que as instituições de ensino superior verdadeira-mente almejam e no que estão sinceramente empenhadasé na maximização dos resultados, evitando desperdíciosde seus parcos recursos orçamentários, a cada ano maisdifíceis de serem atendidos plenamente pelo poder público.

Com esta finalidade, destaca-se no programa deprioridade do PINE a avaliação institucional com vistas

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS3 4a mostrar à comunidade interna e externa os níveis dedesempenho administrativo e acadêmico, para efeito dedefinir metas de melhoramento ou evidência de resulta-dos positivos no uso de recursos públicos. Trata-se deuma preocupação com a melhoria da reputação do en-sino superior do Nordeste. Outro campo programado decooperação é no âmbito das bibliotecas, cujo acervochega a milhões de volumes de livros e periódicos cien-tíficos. Aqui o interesse é não só desenvolver mecanis-mos de intercâmbio e experiências na preservaçãodesses acervos como, principalmente, interligar essasbibliotecas através da rede de computação científica demodo que todos possam usufruir reciprocamente esserepositório bibliográfico inestimável.

Do mesmo modo, destaca-se a automação universi-tária como área de interesse marcante para a moderniza-ção administrativa. A informatização administrativa visadesburocratizar e reduzir a ineficiência operacional, quetem sido um entrave para quantos assumem o comandodesses entes universitários. Torna-se também emergen-cial a junção de esforços no emprego à computação cien-tífica de alto desempenho. O objetivo neste particular énão só ampliar a capacidade de processamento de dadoscomo, principalmente, interligar as IES através da RedeRegional de Pesquisa à Nacional e à Internacional, sem-pre que possível usando fibra ótica, com suas condiçõestécnicas de alta velocidade.

Propõe-se o PINE implantar, também, projetos deestudos e pesquisas interdisciplinares, direcionados aoferecer subsídios para orientar o desenvolvimentosocioeconômico do Nordeste, com especial ênfase nosaspectos de preservação do meio ambiente. No âmbitodos hospitais universitários, a maior preocupação é fo-mentar ações extramuros, que priorizem a saúde públicacom o fim de melhorar a qualidade de vida das popula-

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS 3 5ções mais pobres. Enfim, são amplas e variadas as possi-bilidades de intercâmbio e de cooperação que essa novamentalidade universitária está propiciando.

É oportuno assinalar que essas instituições agoraassociadas representam 10 universidades federais, 8 es-taduais/municipais e 3 do setor privado. Em conjunto,elas contam com 170 mil alunos matriculados nos cur-sos de graduação, com 20 mil professores. São ao tododois mil PhDs e sete mil mestres em praticamente todasas áreas do conhecimento científico e humano. São ofe-recidos cursos de doutorado e de mestrado e centenasde especializações. Poucos países do Terceiro Mundopossuem um patrimônio científico e intelectual seme-lhante ao que hoje desfruta o Nordeste do Brasil. Restaa pergunta: Como utilizar este poder extraordinário doconhecimento para o bem da comunidade e do nossoPaís? De fato, é valiosíssima a estrutura física disponívelnas dezenas de Campi universitários no Nordeste, en-quanto o dispêndio conjunto em pessoal e custeio, so-mente das instituições públicas federais, somam maisou menos 550 milhões de dólares por ano.

Como se observa, portanto, é alvissareira essa novadisposição das universidades do Nordeste em trabalha-rem sintonizadas em torno desse Protocolo de Integração(PINE), pois certamente se encontra na educação e noconhecimento científico a força determinante do desen-volvimento econômico e social de um povo. Assim, a ba-talha do desenvolvimento do Nordeste pode ser ganha.

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INGRESSANDO NO INSTITUTO DO CEARÁ*

Sinto-me honrado e muito feliz em assumir a con-dição de sócio efetivo do Instituto do Ceará. Agradeço atodos os amigos integrantes deste sodalício pelo gestode bondade e sincera amizade, aprovando o meu nomepara membro desta centenária instituição.

Acredito que a homenagem de que sou alvo tam-bém é extensiva às instituições que moldaram minhaformação profissional. Ao Banco do Nordeste, atribuo osmeus princípios de valorização da eficiência e discipli-na no trabalho em equipe; à Universidade Federal doCeará, devo minha formação intelectual e experiênciano magistério e na administração universitária; ao atualGoverno do Estado, devo a prática do primado da éticana política e o respeito aos princípios de honestidade nouso dos recursos do setor público.

Seria injusto deixar de antecipadamente mencio-nar os nomes do nosso presidente cel. Paulo AyrtonAraújo e do dr. Eduardo de Castro Bezerra Neto que selembraram do meu nome para sócio deste Instituto.Convém registrar que o dr. Eduardo Bezerra foi nossocolega de trabalho durante muitos anos no Banco doNordeste. Desse convívio, nasceu um sentimento fra-terno e de respeito mútuo. Coube também a outro co-lega do BNB, dr. Juarez Novaes Pontes, referenciar omeu nome ao cel. Paulo Ayrton como o de um possívelcandidato ao Instituto do Ceará.

O peso da responsabilidade em assumir a condi-ção de sócio efetivo do Instituto do Ceará é multiplicadopela condição em que o faço.

* Pedro Sisnando Leite � Sócio efetivo do Instituto do Ceará � 1997

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS 3 7Trata-se, evidentemente, do contraste intelectual

entre o meu antecessor, prof. Djacir Lima Menezes, e amodesta condição de provinciano professor de Desen-volvimento Econômico. Lembro-me bem de quão peque-no me achava quando ainda estudante da Faculdade deCiências Econômicas, na Praça do Liceu, ansiava pormelhor compreender os fenômenos socioeconômicos efilosóficos magistralmente analisados pelo culto prof.Djacir Menezes em vários livros de sua autoria.

Na verdade, foi a partir de estudos do extraordinárioacervo das obras do insigne mestre que mergulhei, então,na investigação das teorias de Karl Marx e Friedrich Engels.

Foi efêmera a tentativa de tornar-me um marxista.O materialismo dialético contrastava com minhas arrai-gadas convicções religiosas. Nem por isso arrefeceu emmim o interesse pelos estudos filosóficos e econômicosde fundo crítico ao sistema capitalista. Dessa época, vemo meu interesse pelos modelos sociais democráticos, hojebastante popularizados em muitos países.

Para formular um julgamento da personalidade dodr. Djacir Menezes, necessito recorrer ao amparo de con-temporâneos e estudiosos de sua vida e de sua obra.São valiosos a esse respeito os testemunhos de MoacirTeixeira de Aguiar, prof. Martins Filho, Hélio de SouzaMelo e tantos outros intelectuais de nosso Instituto.

Segundo esses renomados cientistas sociais, o prof.Djacir Menezes é um dos vinte maiores intelectuais doCeará, de todos os tempos. Seu nome também se evi-denciou na vida cultural brasileira. Djacir amava o Cea-rá e sua gente, mesmo vivendo na antiga capital daRepública durante muitos anos.

Contou-me Vladir Menezes que presenciou em certaocasião, no Rio de Janeiro, uma reunião na qual estavamalguns intelectuais mais renomados do país, inclusive Afon-so Arinos e Pedro Calmon. Falavam das universidades fran-

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PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS38cesa, alemã e inglesa em que haviam estudado. Pergunta-ram, então, ao prof. Djacir Menezes em qual centro univer-sitário estrangeiro ele tinha estudado. Num gesto desimplicidade e amor à terra em que nasceu, disse: �Tudo oque sei e ensino aos meus meninos, aprendi no Ceará!�

Maranguape foi o berço de nascimento de Djacir LimaMenezes, em 16 de novembro de 1907. Notabilizou-se cedono jornalismo e nos meios intelectuais cearenses, levandoo proeminente historiador Barão de Studart a convidá-lo aingressar como sócio efetivo no Instituto do Ceará. Eleitoem 20 de abril de 1933, permaneceu neste sodalício até oseu falecimento, no dia 8 de junho do ano passado.

Filho de Paulo Elpídio de Menezes e de Dona OdaFreire Lima Menezes teve, com sua esposa, Stela Pon-tes, os filhos Vladir, professor da Faculdade de CiênciasEconômicas e confrade neste Instituto, Vlademir e DjacirFilho, engenheiros e Vleuda, advogada. De seu pai, Djacir,guardava fortes recordações da marcante personalida-de de jurista defensor do fraco ou humilde sem temor dedesagradar às autoridades. Ao assumir a cátedra de Eco-nomia Política na Faculdade Nacional de Filosofia, emmarço de 1947, entre outras palavras dedicadas a PauloElpídio de Menezes, disse: �Coração amável de meu pai,que mais do que nunca sinto pulsar em mim como afonte invisível do que poderia existir de mais digno nomeu pensamento e na minha vida.�

Fez o curso secundário no Liceu do Ceará e foi oorador da turma de 1925. Na Faculdade de Direito, emFortaleza, iniciou seus estudos de Ciências Jurídicas eSociais em 1926. Transferiu-se, em 1929, para a Faculda-de de Direito da Universidade do Brasil onde, em 1930,concluiu seu curso superior. Ao regressar ao Ceará, em1932, fez curso de doutorado da Faculdade de Direito.

No magistério, o dr. Djacir Menezes notabilizou-sepelo seu brilhantismo e cultura. No Ceará, foi catedráti-

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS 39co de Psicologia no atual Instituto de EducaçãoJustiniano de Serpa e ocupou também a cátedra de In-trodução à Ciência de Direito de nossa escola jurídica.Em 1938, fundou e foi o primeiro diretor da Faculdadede Ciências Econômicas do Ceará, encampada pelo Es-tado, e, depois, incorporada à Universidade Federal doCeará. Nessa Faculdade, ensinou na cátedra de Econo-mia Política, mais tarde ocupada pelo prof. Martins Fi-lho, com quem tive o privilégio de dar os primeiros passosem minha formação de economista.

Foi professor titular de inúmeros cursos e faculda-des no País e no exterior. Na condição de diretor e pro-fessor emérito, comandou os destinos da Faculdade deEconomia e Administração da Universidade Federal doRio de Janeiro, de 1960 a 1964, e como reitor dessa uni-versidade em 1969. São inumeráveis as conferências pro-feridas no país e no exterior e rica é a galeria de títuloshonoríficos e homenagens recebidas.

O título que mais o honrava, segundo o prof. HélioMelo, era o de membro efetivo do Instituto do Ceará.Doravante também penso assim.

O que impressiona na vida cultural do prof. DjacirLima Menezes é a quantidade de trabalhos publicados.Somente livros foram cerca de 50, nos ramos da Filoso-fia, Sociologia, Economia, Direito e Literatura. Algunslivros podem ser mencionados: �O Problema da Reali-dade Objetiva�, �Hegel e a Filosofia Soviética� (premia-do pela Academia Brasileira de Letras), �RaízesPresocráticas de Teses Atuais� e �Idéias Contra Ideolo-gias�, todos no campo da filosofia.

No âmbito da Sociologia, merecem destaque: �Pre-paração ao Método Científico�, �Diretrizes da EducaçãoNacional�, �O Brasil no Pensamento Brasileiro�, �As Eli-tes Agressivas�, �Estudos de Sociologia e Economia� e aexcepcional contribuição no estudo do problema do semi-

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PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS40árido nordestino, �O Outro Nordeste�. As obras didáticasmais conhecidas são: �A Economia Política�, �Introduçãoà Ciência do Direito�, �Princípios de Sociologia�, �DireitoAdministrativo�, �Finanças das Empresas�, para citarapenas algumas.

A literatura também foi enriquecida com obras doescritor Djacir Menezes, tais como: �Evolução do Pen-samento Literário no Brasil�, �Diário de Buenos Aires�,�Crítica Social de Eça de Queiroz� e �Vida Social e Cria-ção Literária�, além de outras.

Em resumo, estas são algumas das informações doriquíssimo curriculum do prof. Djacir Menezes. Espero,no futuro próximo, aprofundar melhor o estudo da suacontribuição científica, especialmente no campo da Eco-nomia e Sociologia como áreas de meu maior interesseprofissional e acadêmico.

Não seria prudente tentar analisar agora qualquerdas citadas obras do dr. Djacir. Na própria escolha do queabordar poderia preterir contribuições originais que são acaracterística da produção científica do renomado filósofo.

De qualquer modo, não posso deixar de recomen-dar a todos os presentes a leitura do �O Outro Nordeste�,publicado pela Editora Casa José de Alencar � UFC. Tra-ta-se de um ensaio de atualidade surpreendente sobre aevolução social e política do Nordeste, de suas implica-ções históricas e dos problemas gerais do meio ambiente.

Como o próprio autor evidencia: �Meus livros refle-tem a minha preocupação na tentativa de aplicação demétodo científico na pesquisa objetiva dos fatos sociais.�Ao mesmo tempo, o escritor, de visão global, posiciona aregião nordestina dentro da evolução do Brasil �em co-nexão com os processos do desenvolvimento capitalistano Ocidente.�

Acredito ser oportuno, no entanto, tecer algunspoucos comentários sobre aspectos do desenvolvimen-

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS 4 1to do Nordeste, segundo minha vivência como pesqui-sador do Banco do Nordeste e como professor de Desen-volvimento Econômico da UFC. Nesta oportunidade,preocupa-me assinalar apenas aspectos relativos aosmotivos políticos e econômicos causativos da defasagemdo pouco progresso do Nordeste em relação a outrasregiões mais desenvolvidas do nosso País.

O Nordeste do Brasil é uma das regiões de maisantiga colonização do novo mundo e área pioneira naexploração agroindustrial do País. Com início em 1552,a produção açucareira do Nordeste tornou-se a mais im-portante do mundo. Na primeira metade do século XVII,a Região viveu, em decorrência disso, uma fase de acen-tuada prosperidade pelos padrões de então, com signi-ficativas transações com os mercados europeus.

A economia açucareira do Nordeste, entretanto,sofreu um rude golpe pela concorrência da produçãooriunda das Antilhas. Os preços do produto caíram dras-ticamente nos mercados internacionais, com graves con-seqüências econômicas e sociais para a Região. Aomesmo tempo, surgiram novas fronteiras regionais noBrasil, produtoras de ouro, borracha e café, que se cons-tituíam as maiores atrações econômicas da época.

Por força do acentuado aumento demográfico e dacrise de produção e emprego no litoral úmido açucarei-ro, a população nordestina deslocou-se, com maior in-tensidade, para o interior semi-árido, onde implantou umaagricultura mista de subsistência e pecuária, em combi-nação com a cotonicultura. A interiorização serviu tam-bém para fornecer carne e cereais ao litoral próspero.

Os historiadores estão de acordo em que as dispa-ridades econômicas e sociais entre o Nordeste e o Cen-tro-Sul tiveram início por volta de 1800, com o término dociclo da cana-de-açúcar e do algodão e a ampliação dosmercados para o café. Deram-se, a partir daí, com a abo-

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PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS4 2lição da escravatura, quase dois séculos de declínio rela-tivo do Nordeste. Além dessa crise de produção, outrosfatores estruturais negativos de natureza socioeconômicapara o desenvolvimento e uma política econômica focali-zada sobre o mais dinâmico Centro-Sul, contribuíram parao aumento do hiato entre essa região e o Nordeste.

A estagnação relativa da economia nordestina, naprimeira metade do atual século, está vinculada tam-bém ao comportamento do setor industrial, que prospe-rou substancialmente em São Paulo, em detrimento doNordeste. Assim é que, na primeira metade do século, aeconomia nordestina chegou a experimentar alguma mo-tivação, com o apoio na sua vinculação ao mercado emexpansão no Centro-Sul. Contudo, o ritmo de aumentona renda per capita nessa fase foi ainda bastante lento,de modo que o Nordeste continuou a perder posição noconjunto da economia nacional.

Na verdade, o Nordeste foi considerado, duranteséculos, uma região problemática devido ao seu clima.As primeiras informações sobre secas no Nordeste da-tam de 1583, além de relatos sobre as conseqüências esofrimentos das populações motivadas pelas secas notempo da Colônia, do Império e da República, como re-gistra o dr. Guimarães Duque. A literatura sobre essesfenômenos, de maneira sistemática, data de 1614. Estu-do do dr. Rui Simões de Menezes anota mais de 1.000publicações sobre o assunto.

Foi com as desastrosas ocorrências da seca de1877-79, com mais de um milhão de afetados pela fome,sede e doenças, principalmente no Ceará, que o Gover-no Federal reconheceu ser o Nordeste uma região comproblemas de interesse nacional. Em decorrência disso,o Imperador Pedro II criou uma Comissão Imperial parasugerir medidas que evitassem, no futuro, a repetiçãodas desastrosas conseqüências de crises climáticas se-

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS 4 3melhantes. O fulcro do programa proposto era de natu-reza hidráulica, principalmente no que diz respeito aconstrução de obras de engenharia, açudes públicos eestradas. O açude Cedro, no município de Quixadá (CE),iniciado em 1884 e concluído em 1906, é um exemplodas iniciativas nesse tocante.

Na República, tiveram continuidade as medidas demelhoria das condições do meio físico e, depois da Re-volução de 30, houve aceleração nos trabalhos de enge-nharia e, em menor escala, atenção para com a irrigação,piscicultura, plantas forrageiras e estudos de solos.

Dessa época até a Segunda Guerra Mundial (1942),o Governo Federal procurou realizar a integração políti-ca nacional, quando foram iniciados alguns estudos quevisavam à ação governamental, então bastante centrali-zada. É dessa fase (1943), a criação da Missão TécnicaAmericana de Alto Nível (mais conhecida por MissãoCook) para auxiliar o Brasil no planejamento de auto-suficiência econômica, especialmente tendo em contaos problemas criados com a Segunda Guerra Mundial.

Durante o período de 1948-51 � Governo Dutra �as idéias de planejamento econômico frutificaram vigoro-samente. Um plano qüinqüenal de desenvolvimento na-cional (SALTE) foi elaborado e submetido ao CongressoNacional, em 1948. Neste mesmo ano, a Comissão Téc-nica Mista Brasil � Estados Unidos (conduzida pelos eco-nomistas John Albbink e Octávio Gouveia de Bulhões)elaborou circunstanciados estudos sobre a economia bra-sileira. O Programa, denominado Ponto IV (1951-53), foiresultante de acordo firmado com os Estados Unidos porsugestão dos referidos estudos.

Getúlio Vargas foi eleito presidente em 1950. Logodepois, em 1951, abateu-se sobre o Nordeste uma secade grandes repercussões econômicas e sociais, chaman-do a atenção da Nação para a necessidade da modifica-

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PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS44ção da política para a Região. Após visitar o Nor-destenessa ocasião, o Ministro da Fazenda de Vargas, HorácioLáfer, propôs a criação do Banco do Nordeste do Brasil.

Inicialmente, o BNB tinha por finalidade o financi-amento da agricultura, obras de irrigação, aquisição demáquinas agrícolas, construção de silos e exploração decultivos econômicos adaptados ao semi-árido. Por influ-ência dos três assessores nordestinos de Vargas �Rômulo de Almeida, Jesus Soares Pereira e Cleantho dePaiva Leite � o BNB teve suas funções ampliadas paratornar-se um grande órgão de desenvolvimento econô-mico regional. Em junho de 1952, o BNB foi instituídopor lei e, sob a presidência do dr. Rômulo de Almeida,iniciava suas operações em 1954.

A mensagem presidencial que propunha a criaçãodo BNB continha críticas ao approach de obras contraas secas e apontava a necessidade da realização de es-tudos e da elaboração de um plano global para a Re-gião, de modo a atacar as causas e os efeitos econômicose sociais dos problemas regionais.

O memorando apresentado às Nações Unidas peloeconomista Stefan H. Robock, em dezembro de 1955, naqualidade de assessor do Banco do Nordeste do Brasil,registrava que, não obstante os esforços e a existênciade razoáveis recursos naturais, o Nordeste tinha perma-necido, de modo geral, na retaguarda econômica do País.Naquela ocasião, a região que abrangia os estados doPiauí à Bahia, contava com uma população de 18 mi-lhões de habitantes e com uma renda per capita de ape-nas 43% da média brasileira.

Com base nos estudos iniciais elaborados pela equi-pe em formação no Escritório Técnico de Estudos Econô-micos do Nordeste (ETENE), foi identificado que o poucoêxito dos programas de desenvolvimento do Nordeste po-dia, em grande parte, ser atribuído à ausência de planeja-

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS 45mento e à pequena quantidade de pessoal técnico habili-tado para elaborar os estudos necessários a um programade de-senvolvimento econômico adequado. Outra limita-ção se referia à falta de utilização de critérios científicos naidentificação dos problemas regionais. As compreensõesemocionais dos problemas do Nordeste resultavam empolíticas cujos méritos ficavam muito a desejar.

Disso resultava que os programas regionais eramdefensivos e relativos aos efeitos, e não às causas dire-tamente determinantes do desenvolvimento econômico.Faltava uma visão global da economia regional, aliada àausência de coordenação entre os programas e as insti-tuições responsáveis.

Com base nesse diagnóstico preliminar, o ETENEiniciou um trabalho de análise econômica como subsí-dio à elaboração de um programa regional e de umapolítica de crédito e assistência técnica. Na ocasião, ali-ás, o novo presidente eleito, Juscelino Kubitschek deOliveira (1955), reconhecia a necessidade de �planeja-mento regional e coordenação do Nordeste.�

A 14 de dezembro de 1956, foi assinado o Decreto n.º40.554, constituindo, no Conselho Nacional de Desenvolvi-mento, o Grupo de Trabalho Para o Nordeste (GTDN), cujadireção executiva foi confiada a um representante do BNB.

Os estudos realizados pelo GTDN, depois CODENO �Conselho de Desenvolvimento do Nordeste � resultaramna criação, em dezembro de 1959, por iniciativa do Po-der Executivo, da Superintendência do Desenvolvimen-to do Nordeste (SUDENE), autarquia federal cujo objetivoera a implantação da nova política governamental dedesenvolvimento do Nordeste.

Ao longo dos anos, o Departamento de EstudosEconômicos do Banco do Nordeste do Brasil deu conti-nuidade aos estudos macroeconômicos e setoriais, des-tinados à formulação de políticas econômicas.

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PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS4 6Uma das conclusões relevantes desses exaustivos

estudos foi de que �não é verdade que o Nordeste sejaum sorvedouro de recursos públicos, nem que a econo-mia da região esteja estagnada, nem que a política dedesenvolvimento regional esteja sendo um fracasso.�

Em contrapartida, tais estudos propõem que o Nor-deste não precisa usar o argumento da miséria para con-seguir favores. A Região carece é de desenvolver seupotencial de recursos para atrair novos investimentos.

Na verdade, à proporção que nos aproximamos dofim do segundo milênio desde o nascimento de Cristo,há muitas razões para fazer uma reflexão sobre o futurodo Nordeste e do Ceará, em particular.

Na emergência de uma civilização globalizada, asesperanças no futuro nunca foram antes tão significativase desafiadoras. De fato, novas especializações e tecnologiasestão expandindo nossa capacidade para ver desde o in-terior do átomo até as distantes galáxias do universo. Ascomunicações e meios de transporte nos capacitam a rom-per as barreiras das distâncias. A Medicina avança pro-metendo curas miraculosas e novos tratamentos a doençasantes incuráveis. A engenharia genética promete a que-bra de antigas barreiras no aumento da produtividade ena eliminação de pragas e doenças.

As sementes de um futuro diferente precisam serurgentemente plantadas, com vistas à moldagem de umasociedade e um modelo de desenvolvimento econômicomais justo, igualitário e mais cristão.

Ao Instituto do Ceará cabe um papel especial nes-se momento histórico. O conhecimento, a experiência eo discernimento dos sócios desta Casa podem ser a fon-te de águas limpas para ajudar no crescimento e na fruti-ficação dessa nova vida de prosperidade e bem-estar dapopulação do nosso Estado.

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS 4 7Não se pode obscurecer que a tarefa a realizar ca-

rece de determinação e vontade política obsessiva. O Prê-mio Nobel de Economia, Simon Kuznets, por exemplo,adverte que as mudanças necessárias ao desenvolvimen-to não são apenas de caráter econômico e tecnológico,mas encerram muitas invenções através das quais os in-divíduos cooperem e participem da atividade econômicae social. Outro Prêmio Nobel de Economia, Gunar Myrdal,diz ser necessária para a realização do desenvolvimentoeconômico autêntico, a modernização dos métodos depensamento da sociedade. Acha Myrdal que é preciso aadoção rigorosa dos ideais de eficiência, zelo, pontuali-dade, frugalidade, honestidade, orientação para a mudan-ça, autoconfiança, cooperação e disposição para organizara vida pessoal e comunitária.

Em outras palavras, como adverte em resumo o prof.Stefan Robock: �O desafio que se apresenta no Nordeste éo de melhorar a eficiência de operação de toda sociedade� dos indivíduos, das instituições privadas e das organiza-ções governamentais de maneira continuada.�

Finalmente, gostaria, sinceramente, de agradecermais uma vez a todos os que deram apoio ao meu in-gresso nesta casa de cultura e tradição do Ceará.

A todos os presentes, autoridades, familiares, emespecial minha mulher Mirna � companheira de todos osmomentos � colegas da Academia Cearense de Ciências,Academia de Ciências Sociais do Ceará, do Banco do Nor-deste, das universidades, colegas do Governo do Estado,meus irmãos e irmãs da Comunidade Face de Cristo, en-fim, a todos os meus amigos, agradeço a alegria que meproporcionaram em testemunhar esta solenidade.

Ao Eduardo Bezerra, mais uma vez, o meu reconhe-cimento de todo o coração pelas bondosas palavras a meurespeito. Sempre considerei o Eduardo muito mais do queum intelectual de peso, um companheiro leal e amigo.

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS48Agradeço a Deus por participar, a partir de agora,

dessa grande família do Instituto do Ceará, aproveitan-do os dons que Ele me concedeu.

(Discurso proferido na sessão solene de 23-10-97)

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SAUDAÇÃO DE EDUARDO DE CASTRO BEZERRA NETO*

Os grandes místicos de todas as correntes religio-sas e de todas as épocas legaram à humanidade o teste-munho de que, em Deus, passado, presente e futuro, nãose apresentam diferenciações. Tudo é presente. A Físi-ca de Einstein não contradiz os místicos. Muito ao con-trário, oferece-lhes o respaldo da ciência. Com efeito, aoconceber a teoria da relatividade, Einstein nela incluiua relatividade do tempo. Não será, pois, destituído desentido afirmar que, dentre as múltiplas facetas da cul-tura humana, a História coloca os que a ela se dedicambem próximos do tempo de Deus.

O historiador não é o homem que dirige seu olharpara o passado, tomando como referencial uma escalade grandeza, de modo a situar mais distantes ou maispróximos os acontecimentos que observa. É, sim, o ho-mem de cultura que faz presente o passado. E ao son-dar o futuro, também o faz presente.

É nessa perspectiva atemporal que vejo a pessoado Professor Pedro Sisnando Leite, ao tomar posse naqualidade de sócio efetivo do Instituto do Ceará � Histó-rico, Geográfico e Antropológico.

Vejo-o como historiador do cotidiano do homemnordestino, sondando suas raízes, analisando suas lutaspela sobrevivência, concebendo a realidade nova queconstrói para si e para as gerações futuras. Na vasta obraque nos lega, enriquecendo o patrimônio do Instituto,tudo converge para o presente, ainda que revele víncu-los com os demais estágios do tempo.

* Eduardo de Castro Bezerra Neto é Sócio efetivo do Instituto do Ceará� 1997.

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS50Vejo-o igualmente como geógrafo, porquanto as

pessoas para as quais se volta o seu saber ocupam umespaço territorial bem definido: o Nordeste do Brasil. Asinterações entre o meio ambiente e os seres humanosencontram-se claramente visualizadas nas contribuiçõesque oferece à Ciência, cientista que é. Ultrapassando asfronteiras regionais, tem-se dedicado ao estudo de pes-soas de outros continentes. O centro do seu interesse,porém, é o Nordeste, onde o Ceará tem relevo.

Vejo-o, ainda, como antropólogo. Não é o ambientenatural, não são as relações anônimas o ponto central desua atenção. O foco é o homem, sujeito e objeto das interaçõescom o meio ambiente e com as demais pessoas. Quanto aeste aspecto, quem conhece a vasta bibliografia do sócioefetivo, que nesta solenidade toma posse, pode testemunharque ele é dotado de uma qualidade muito peculiar, qual seja,a de perceber e projetar a visão de pessoas vivas que seinter-relacionam, e não o quadro frio de inter-relações queem plano secundário envolvem pessoas.

Ao saudá-lo, professor Pedro Sisnando Leite, emnome de todos os que o precederam no Instituto do Ce-ará, afirmo com convicção que seu ingresso nesteSodalício não se faz apenas por uma das portas de aces-so a novos sócios: a da História, a da Geografia, ou a daAntropologia. Abrem-se as três numa só, em razão dapolivalência do seu saber. É tríplice, portanto, o nossocontentamento ao tê-lo como consócio.

Descer aos detalhes do seu curriculum vitae parafazê-lo conhecido dos presentes, tomaria tempo muitoalém do que me foi dado para saudá-lo. Destaco sua ori-gem, em Santana do Cariri, e sua dupla graduação: pri-meiro como técnico de contabilidade, depois comobacharel em Ciências Econômicas. Faço referência es-pecial às carreiras que exerceu com brilhantismo noBanco do Nordeste do Brasil e na Universidade Federal

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS 5 1do Ceará. Sua condução ao cargo atual, de Secretáriode Estado do Desenvolvimento Rural do Ceará, decorredo crédito que conquistou pelo trabalho.

Os cursos de especialização e de pós-graduação,a experiência didática e universitária, os cargos e fun-ções ocupados, os trabalhos realizados e publicados, oslivros editados, as conferências proferidas, as participa-ções em reuniões, seminários e simpósios, as filiações aassociações de classe, as aulas, conferências e partici-pação em bancas examinadoras além de inúmeras ou-tras atividades, dão corpo a um alentado documento quecomprova uma vida utilmente ocupada.

Falo em nome dos sócios, mas peço permissão parafalar em meu nome. Permanece diante de nós a figurailustre do professor Pedro Sisnando Leite. Diante de mim,porém, está a pessoa querida do Sisnando, meu chefena Divisão de Agricultura do ETENE. Companheiro ex-periente, que muito contribuiu para consolidar minhacarreira como técnico do Banco do Nordeste. Aproxi-ma-nos a dupla coincidência profissional: ambos forma-dos pela Faculdade de Ciências Econômicas da entãoUniversidade do Ceará e ambos professores de EnsinoSuperior, na UFC e na UECE. Vejo-o como marido dedi-cado da Mirna, figura excepcional como esposa e mãe,além de pai exemplar do Francisco José e da Ana Maria.A linhagem continua, porquanto os netos já dão seqüên-cia à bela cadeia da vida de família. Sinto-me honradopor ter subscrito a proposta que encaminhou sua candi-datura a sócio efetivo do Instituto e, agora, por ter sidodistinguido pelo presidente Paulo Ayrton Araújo parasaudá-lo neste ato solene de posse.

Não lembrarei que a vida guarda semelhanças coma Contabilidade: o que consta no �Haver� tem uma cor-respondência no �Deve�. Apenas afirmo que, sendo asua pessoa dotada de elevada capacidade de trabalho,

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS52essa incomum capacidade certamente refluirá em be-nefício do Instituto, elevando o crédito que ele detémcomo instituição de cultura, reconhecida no Ceará, noBrasil e em outros países do mundo.

Lembro, outrossim, a responsabilidade particularque recai sobre seus ombros ao tornar-se sucessor doilustre professor Djacir Menezes, personalidade que bri-lhou aqui no Ceará, como no Rio de Janeiro, sua segun-da terra por adoção. Estou seguro de que também nesteparticular os sócios do Instituto foram felizes na escolhaque fizeram. E ouso afirmar que, se aqui estivesse pre-sente em pessoa, o professor Djacir Menezes certamen-te diria: �Bem-vindo, Professor Sisnando, chegou a suavez, tome o meu lugar e o honre como eu o honrei.�

Em nome, pois, do professor Djacir Menezes, dopresidente Paulo Ayrton Araújo, de todos os sócios doInstituto e em meu próprio, reafirmo a alegria pelo seuingresso nesta casa: seja muito bem-vindo!

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OBRIGADO, JÂNIO QUADROS

Nunca é tarde para agradecer. Há vinte anos recebium bilhetinho do próprio punho de Jânio Quadros. �Pedro,amigo.� Esta foi a saudação dele que muito me agradou.Começava dizendo: �Seu livro é uma longa e sólida liçãode economia democrática. Inevitável, é a extrapolaçãopara a América Latina. Quando aprenderemos?� O ex-presidente estava se referindo ao recém-editado livro deminha autoria denominado �Escandinávia � Modelo deDesenvolvimento, Democracia e Bem-Estar�. Como é sa-bido, durante o seu exílio voluntário esteve algum tempovivendo na Suécia. Nesse período, teve oportunidade deconhecer de perto a experiência de desenvolvimento eco-nômico dos países nórdicos. De minha parte, dediquei-me ao estudo do que ocorrera nesses países ao longo demeio século que fizera da Escandinávia uma das regiõesmais desenvolvidas do mundo, não só no plano econômi-co, mas no modo de vida, na organização social e na esta-bilidade institucional. Nessa obra publicada pela Editorade Humanismo, Ciência e Tecnologia, de São Paulo, pro-curei oferecer uma visão ampla das razões do elevadopadrão de vida dessa região norte-européia. A revoluçãoindustrial, as influências do comércio externo, o papel daagricultura e sua organização, as doutrinas do desenvol-vimento político, os mecanismos de distribuição de ren-da, de segurança social e da social-democracia.

Essas questões são hoje tratadas com naturalidade,mas foram recebidas com pouco agrado por setores go-vernamentais do início da década de 80. A publicação des-se livro somente foi possível com o apoio da Câmara deComércio da Suécia, do Secretário da Fazenda de São Pau-lo e ex-presidente do Banco do Nordeste, Rubens Vaz da

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE I � QUESTÕES ACADÊMICAS54Costa, e do diretor do Banco Itaú de São Paulo que se inte-ressou em ajudar-me na divulgação das referidas idéias.

Na ocasião, exercia a função de professor-adjuntode Desenvolvimento Econômico da Universidade Fede-ral do Ceará e pretendia concorrer ao título de professortitular e livre docência da UFC. De minha parte, tinhadespendido muitos esforços intelectuais e financeirospara a realização de compilação de informações nospaíses escandinavos para a elaboração da tese que setransformou no livro em referência.

O bilhete do Dr. Jânio Quadros, neste contexto, foimuito importante. Ele era uma autoridade no assunto euma personalidade exigente sobre o julgamento do quelia, como todos sabem. Vejam o que ele disse, continu-ando a sua mensagem:

�O capítulo 9, por exemplo, é modelar. Nunca linada com essa clareza e segurança pedagógicas.

O modelo de desenvolvimento, democracia e bem-estar vai ajudar-me em São Paulo...� Finalmente, con-clui: �Feliz o Ceará com um professor com essaautoridade e limpidez!�

Guardei esta generosa mensagem de simpatia edesinteressado afeto, o que é raro nas grandes persona-lidades. Recordando o seu falecimento há dez anos erelendo esse bilhete sinto-me no dever de, mesmo tardi-amente, agradecer-lhe esse gesto de apoio. Muito obri-gado, Jânio!

Que Deus seja compassivo e bom para sua alma...

PARTE IIQUESTÕES ECONÔMICAS

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ARMADILHA IDEOLÓGICA DA ECONOMIA

Minha função é dizer a verdade; não fazer comque se acredite nela.

JEAN JACQUES ROUSSEAU

O marxismo não morreu, como muitos pensam.Nem o liberalismo concorrencial de Adam Smith deixa-rá de continuar influenciando os sistemas econômicos epolíticos em muitas décadas à frente. Ambas as ideolo-gias, concebidas por esses dois gênios das ciências po-líticas, estão em julgamento agora mais do que ocorreuquando da divulgação inicial das suas obras �O Capi-tal� e a �Riqueza das Nações�.

As desigualdades econômicas e sociais acumula-das pela prática do sistema capitalista, desde cedo, co-locaram em xeque a fragilidade da harmonia deinteresses em benefício de todos, vislumbrada por Smithem sua Teoria da Concorrência Perfeita. Até à sua mor-te, achava esse economista que �nenhuma sociedadepode certamente estar florescente e feliz se a grandemaioria dos seus habitantes é pobre e miserável�.

Em verdade, muitos países avançaram materialmen-te desde então, quando teve lugar o surgimento da revoluçãoindustrial que se alastrou pela Europa e, posteriormente,pelos Estados Unidos da América e outras nações. O gran-de debate que ora atormenta os intelectuais e políticos domundo inteiro, no entanto, é outro. A questão é saber se omarxismo fracassou na sua versão do socialismo prático daex-URSS e da Europa do Leste, ou se apenas ocorreu umatransitória turbulência, provocada por distorções introdu-zidas nas referidas experiências marxistas-leninistas. Seriatal fenômeno apenas uma etapa natural da evolução dassociedades em busca de uma terceira via ou, de fato, o fim

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS58de uma era e o alvorecer de um novo modelo de desenvolvi-mento econômico da sociedade do futuro?

Observando os acontecimentos históricos do atualséculo, podem-se identificar três eventos significativosque marcaram a vida política e econômica da Europa edo mundo inteiro.

A I Guerra Mundial provocou a queda das monarqui-as da Europa Central e da Rússia czarista e a reestruturaçãodo continente com base nos Estados Nacionais. Essa reor-ganização política manifestou-se em pouco tempo inade-quada para manter uma nova ordem de paz.

Após a II Guerra Mundial ocorreu a divisão da Eu-ropa, e de certo modo, do mundo, nos blocos marxista eliberal-capitalista. O primeiro prometia uma sociedadematerialista perfeita e ao outro atribui-se uma ideologiamoderna, que tudo sacrifica ao progresso técnico e aobem-estar econômico.

Agora, no final do século, estamos na terceira fase,com a ruína interna da ideologia marxista-leninista e daorganização de poder criada por ela. Esta terceira revo-lução ocorreu pacificamente, sem derramamento de san-gue. E resultado da decomposição dos pressupostos deum sistema baseado exatamente nos dogmas da dita-dura do proletariado e da revolução violenta como úni-co caminho para o poder...

�A queda do marxismo não fez, só por si, nascerum Estado livre e uma sociedade sã�, diz JosephRortinger. De fato, a Guerra Fria e o socialismo podemestar no fim. Mas um novo modelo econômico para subs-tituí-lo não se delineará voluntariamente.

Neste quadro, não é mais possível ficar entre a es-colha de positivismo e marxismo, pois nenhuma dessasfilosofias oferece a base necessária para construir umasociedade em que a liberdade e o direito se abracem demaneira racional, ética e duradoura.

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SOCIAL-DEMOCRACIA PODE SER NOVA VIA

Com fé, apenas, não se realiza muito. Mas, semfé, não se realiza nada.

SAMUEL BUTLER

Os países do Terceiro Mundo, e o Brasil em parti-cular, estão interessados em encontrar um novo cami-nho para o seu desenvolvimento econômico, que deveriaser mais equilibrado e justo.

Fala-se amplamente em social-democracia comoum possível rumo a seguir doravante.

De modo geral, o modelo da social-democracia éconsiderado sinônimo de progresso e bem-estar. Frutodas soluções harmônicas estão as classes trabalhado-ras no todo sociopolítico. Esse sistema funciona com basena compreensão mútua do trabalho e capital, demons-trando que é possível realizar transformações sociais pro-fundas sem revolução violenta e sem abolição dapropriedade privada.

Na atualidade, as idéias da social-democracia sãoaplicadas pelo menos nas quinze nações mais desen-volvidas do mundo, segundo o Índice de Desenvolvimen-to Humano das Nações Unidas. As experiências práticasmais antigas e conhecidas internacionalmente são as doReino Unido, da Alemanha Ocidental e dos paísesescandinavos. Estes últimos serão referenciados aquicomo exemplificação.

Nos países da Escandinávia, a democracia socialteve simultaneamente várias origens ideológicas, alémdas ligações com o marxismo. As concepções das reli-giões cristãs, por exemplo, substituíram os dogmasateístas de Marx. O capitalismo supriu as idéias demo-cráticas e a aceitação da iniciativa privada. Há, porém,uma drástica oposição aos males provocados pelo capi-

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS60talismo na sua forma conceitual e nos resultadosdesigualitários.

Até a Segunda Guerra Mundial, essas concepçõeseram de natureza apenas teórica. Foi somente após areconstrução da Europa que estas idéias tomaram novaimportância, passando ao longo do tempo por modifica-ções ideológicas e pragmáticas. A adoção da legislaçãodo bem-estar e o aumento do poder de barganha dasforças trabalhistas em muitos países eliminaram ou di-minuíram consideravelmente as diferenças entre ricose pobres. Isto tornou-se possível também através de im-postos recolhidos dos ricos, destinados a financiar os ser-viços sociais, assim como pela própria elevação da rendareal da classe operária.

Assim, os programas extensos de reforma social e deplanejamento dos países que adotam o modelo da social-democracia contribuíram para sepultar os argumentos deexploração de classe e as doutrinas socialistas marxistas.

A democracia econômica e a política de desenvol-vimento da Escandinávia não foram impostas de cimapara baixo, mas emergiram das massas trabalhadoras eda classe média, sendo desenvolvidas gradativamentepelos canais hierárquicos da estrutura política e admi-nistrativa desses países.

Décadas de governo social-democrático, com umsistema de taxas que tem evitado as grandes diferençasde renda e um amplo programa de serviços públicosproporcionaram um alto nível de vida à população des-sa parte da Europa. Atualmente os países daEscandinávia contam com mais de US$ 20 mil de rendaper capita segundo o Banco Mundial.

É importante notar que a palavra desenvolvimentoé um vocábulo sério para esses países e se converteunuma obsessão desse povo, herança do nacional-socia-

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 61lismo europeu ou demanda das aspirações autênticas dassuas massas trabalhadoras e de seus líderes políticos.

A harmonia do indivíduo e a segurança do Estado sefazem pelo debate e diálogo, ou seja, o exercício da liberda-de é estabelecido com base no respeito e na ordem social.

Para o adequado funcionamento da democraciaescandinava, existem diversos instrumentos de salva-guarda dos interesses dos cidadãos. Uma das institui-ções notáveis com esta proposta é o Ombudsman. Afunção dessa organização, instituída pelo parlamento, éoferecer a proteção do regime legal que assegura direi-tos e interesses aos cidadãos diante da burocracia civil,do Governo, das empresas e da sociedade. Essassalvaguardas são aceitas como garantias das liberda-des individuais, criando uma atmosfera de harmoniasocial indispensável a uma autêntica democracia.

Conforme John Marurice Clark, �para que a ordemexista, importa que cada qual aceite sacrifícios, pelo me-nos em parte do direito de agir como entenda.�

O fenômeno notável do modelo escandinavo foi apassagem de uma economia subdesenvolvida para umadesenvolvida em um prazo relativamente curto, compa-rativamente com a experiência das demais nações hojericas. As lições que podem ser aprendidas dessa expe-riência contêm ensinamentos valiosos para os países atu-almente em desenvolvimento.

Sabe-se, no entanto, que o período de preparaçãopara o desenvolvimento foi longo, pontilhado de obstá-culos e dificuldades, mas superadas por um trabalho per-tinaz e constante do Governo e da população.

Por conseguinte, é fácil observar que a social-demo-cracia como modelo político e econômico contém muitodos elementos hoje desejados pelos brasileiros. O cami-nho para uma nova ordem econômica, contudo, dificilmente

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS62pode ser copiado de outras nações, sem as necessárias eindispensáveis adaptações às atividades nacionais.

Vale ressaltar, finalmente, a advertência do econo-mista Alvin Toffler: �Na era da mudança do Poder à fren-te, a principal luta ideológica não mais será entre ademocracia capitalista e o totalitarismo comunista...� Naverdade, a grande esperança dos povos do TerceiroMundo e do Brasil é mudar o caráter do desenvolvimen-to, atualmente adotado, de mero crescimento da rendapara um novo estilo que resulte em benefício de toda asociedade, especialmente dos pobres e marginalizados.

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MODELOS DE DESENVOLVIMENTO

Não se ajudam os pobres arruinando os ricos.ABRAHAM LINCOLN

A palavra desenvolvimento tem sido usada com di-versos significados.

A noção de desenvolvimento econômico que con-tou com maior número de adeptos, nos anos de pós-guer-ra, era fundamentada no crescimento do produto ourenda por habitante. Dizia-se que um país ou região sedesenvolvia quando apresentava, ao longo de um perío-do, incremento do produto ou renda real per capita.

A partir do início da década de setenta, um núme-ro crescente de economistas passou a considerar o cres-cimento do produto ou da renda como um indicadorinadequado do desenvolvimento econômico. Dentro des-te contexto, o crescimento da capacidade produtiva devecompletar-se com outros elementos que possam dar re-levo mais apropriadamente às demais dimensões do de-senvolvimento econômico.

Na verdade, as mudanças atinentes a este assuntonão foram simplesmente de como avaliar os progressosalcançados nos países em desenvolvimento, mas esta-belecer novos conceitos, objetivos e revisão de todo oenfoque do desenvolvimento no contexto dos países sub-desenvolvidos.

Sobre o assunto, Hollis Chenery explica: �Desenvol-vimento econômico pode ser visto como um conjunto demudanças inter-relacionadas na estrutura da economiaque são requeridas para o crescimento continuado. Elasenvolvem a composição de demanda, produção e empre-go, bem como a estrutura externa do comércio e do fluxode capital.� Desse modo, desenvolvimento é um proces-

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS64so multidimensional, abrangendo a reorientação e reor-ganização completas dos sistemas econômico e social.Seja qual for o processo de desenvolvimento, ele devemotivar mudanças fundamentais nas atividades popula-res e até mesmo nas crenças e costumes. Com essasmodificações no âmbito nacional do sistema econômico,é necessário também, de modo geral, ajustamentos nocontexto internacional da economia.

Do ponto de vista das Nações Unidas, �O desen-volvimento econômico destina-se a oferecer aos povosmelhores oportunidades para uma vida mais condigna.�A eliminação das acentuadas desigualdades na distribui-ção de renda e da riqueza é uma necessidade imperiosadas nações subdesenvolvidas. Torna-se excepcionalmen-te importante a redução da pobreza e das injustiças so-ciais, muito difundidas nesses países, tanto nos grupossociais como entre regiões. Há necessidade de propor-cionar emprego às populações crescentes, especialmen-te as das comunidades mais pobres, muito necessitadasde alimentos, serviços sanitários, educação e habitação.Estes elementos são considerados, ao mesmo tempo, pro-duto final e instrumento para as mudanças socioeco-nômicas dos países subdesenvolvidos. É necessário umaumento persistente do produto com vistas a viabilizaros objetivos mencionados e, paralelamente, o estabele-cimento de políticas deliberadas e adaptadas ao alcan-ce das melhorias sociais.

Enfim, a interpretação do conceito de desenvolvi-mento é de que a sua finalidade última deve consistir namelhoria do bem-estar social. Por sua vez, o progressosocial está estreitamente relacionado com a plena utili-zação do potencial humano e depende principalmentede mudanças sociais politicamente viáveis. Essas muta-ções consistem em uma nova integração social e numamodificação das instituições e das relações sociais de

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 65modo que se procure a justiça social e a base institucionalótima para o avanço tecnológico e econômico.

Como propõe Alfred Sauvy: �A questão não é sa-ber se convém favorecer ou deter o desenvolvimento,mas em que condições se produzirá, e esforçar-se porobter a melhor evolução possível.� O desenvolvimentonão pode ser mais definido como simplesmente um au-mento de consumo e de produção de bens materiais eserviços. Há de defini-lo como um processo que permiteaos indivíduos, às comunidades e aos governos recupe-rarem seus direitos e capacidades sobre o seu própriofuturo. É essencial contar com a liberdade para elegerum estilo pessoal de vida de acordo com os valores cul-turais, tradicionais e as necessidades sociais.

Desenvolvimento econômico deve significarmelhoria nas condições de vida, para as quais o cresci-mento econômico e a industrialização são essenciais.Mas se não há preocupação com a qualidade do cresci-mento e das mudanças sociais, não se estará falando dedesenvolvimento econômico.

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A VEZ DO PLANEJAMENTO

Os planos não passam de boas intenções, a menosque se transformem de imediato em trabalho árduo.

PETER DRUCKER

O planejamento tem sido utilizado como uma es-tratégia valiosa no enfrentamento de muitos desafios aolongo da história da humanidade. Em certas circuns-tâncias, foi adotado para organizar um país para a guer-ra, como explica Sun Tsu no seu extraordinariamentemoderno livro �A Arte da Guerra�, escrito há 2.500 anos.Noutras, destinou-se a acelerar ao máximo a reconstru-ção de pós-guerra, cujo exemplo mais notável foi o �Pla-no Marshall�, adotado após a Segunda Guerra Mundial,que recolocou a Europa Ocidental na senda da estabili-dade e do desenvolvimento. Nos países socialistas, tevecomo propósito acelerar o desenvolvimento industrial eajudar a transformação do sistema político e institucional.Na América Latina, de modo geral, o planejamento foiaceito como uma metodologia indispensável para ten-tar superar as condições do subdesenvolvimento e ob-ter mudanças estruturais e institucionais inerentes àsnecessidades do progresso econômico. Mesmo os paí-ses já industrializados do Primeiro Mundo continuamutilizando o planejamento econômico de naturezaindicativo destinado a orientar as inversões políticas eprivadas e a coordenar o sistema econômico.

O verdadeiro papel do planejamento econômico,na atualidade, é servir de instrumento para superar ascondições de atraso e como um processo social com adupla função de otimizar as relações meios e fins e comoauxiliar para aumentar a racionalidade material e hu-mana do desenvolvimento econômico.

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 67No caso do Brasil, entretanto, o planejamento não

tem cumprido essa função vital. Especialmente nos últi-mos anos, ele tem sido produto apenas do esforço técni-co-intelectual dos economistas. Estes especialistas dãodemasiada ênfase aos aspectos tecnocráticos dos pla-nos, geralmente colocando como ação planejadora osefeitos e não as causas do processo socioeconômico.Como explica o prof. Louis J. Wallinsky: �O planejamen-to é um método de finalidade reformadora das estrutu-ras de propriedade, de rendas e dos mecanismos depoder das sociedades subdesenvolvidas.�

Os objetivos e alternativas de desenvolvimento,consequentemente, só em parte são responsabilidadedos técnicos encarregados da elaboração dos planos.São os ministros de Estado, em nome do Governo, quetomam as decisões e determinam as políticas de ação.Somente eles podem delinear as metas e as estratégias,criar as instituições necessárias e estimular as energiasnacionais de apoio à execução. �Os planos, enfim, nãose realizam automaticamente; precisam ser postos emprática pelas autoridades governamentais com o apoioda sociedade�, adverte o Prêmio Nobel de Economia,Jean Tinberger.

Planejar uma política de desenvolvimento, aliás,tem se tornado uma necessidade premente para supe-rar a crise atual da economia brasileira. Neste sentido, onovo ministro do planejamento, Senador Beni Veras, afir-mou em sua recente posse: �A SEPLAN, com todos osseus membros, tem uma dívida com o País. Temos queser capazes de ajudar a nação brasileira a encontrar seucaminho. Podemos ser o traço de união na construçãode um governo justo, eficiente e democrático.�

Outros propósitos oportunos formulados pelo novoministro são de adotar o planejamento participativo e des-centralizado e de recuperar a prática de planejamento

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS68de longo prazo no País. �Buscando a sustentabilidade doprocesso de desenvolvimento em todas as suas dimen-sões econômicas, sociais, ambientais e políticas.� Aquestão regional também está contemplada entre as pri-oridades e preocupações do ministro Beni Veras. Afirmaele que há necessidade de �redefinir o viciado modelo dedesenvolvimento regional que adotamos durante váriasdécadas.� Segundo o ministro, o novo modelo de desenvol-vimento regional �está a exigir novas soluções � mais dinâ-micas, mais descentralizadas, mais criativas.� Acredita eleque com uma gestão eficiente e parcimoniosa, os recursospúblicos são suficientes para a superação da pobreza e,conseqüentemente, para o desenvolvimento econômico doPaís. O novo lema será: �É proibido gastar mal.�

O programa de ação do novo ministro prevê o aperfei-çoamento da gestão pública, adequação das obrigaçõesdo Estado às necessidades do País, o estabelecimento deum pacto federativo e a mobilização do potencial realiza-dor da sociedade e do setor privado. Tais metas, eviden-temente, não poderão ser plenamente alcançadas, comoé desejo do ministro, sem um correto planejamento. Comodiz ele: �Temos de ter consciência de estarmos criandoas pré-condições para um longo surto de desenvolvimen-to que está ao alcance de nossas mãos, se tivermos cora-gem para concluir o programa traçado.� Isto é, executaro que for planejado, segundo essas novas diretrizes.

Sem dúvida, essa é a vez do planejamento dar suaverdadeira contribuição ao desenvolvimento do Brasil,como o fez em tantas outras partes do mundo, onde oassunto foi levado a sério e com determinação.

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REINVENTANDO O NORDESTE

Não é triste mudar de idéias; o triste é não teridéias para mudar.

BARÃO DE ITARARÉ

O Nordeste hoje seria diferente e bem mais pobre,não fora a ação dos órgãos regionais, tais como o BNB, aSUDENE e o DNOCS, comenta o economista João Gon-çalves de Souza, no seu livro sobre o Nordeste Brasilei-ro. O ex-superintendente da SUDENE e diretor da OEAafirma, ainda: �O esforço de cada um deles, examinan-do friamente, revela marcos positivos.�

Os resultados das ações desses organismos regio-nais muito tem a ver com o Decreto 40.554, de dezem-bro de 1956, assinado pelo então presidente JuscelinoKubitschek, criando o Grupo Para o Desenvolvimento doNordeste (GTDN), espelhado no que vinha acontecen-do, ao nível internacional, com a Aliança Para o Progres-so. O GTDN, que funcionou sob a coordenação do Bancodo Nordeste, teve como objetivo principal realizar pes-quisas e apresentar ao governo um plano global para odesenvolvimento do Nordeste. Com base nos estudos doETENE/BNB e em novas pesquisas, o economista CelsoFurtado fez um conciso diagnóstico dos problemas doNordeste e prescreveu as novas diretrizes de ação, nobem conhecido documento �Uma Política Para o Desen-volvimento do Nordeste�. Daí surgiu o Conselho de De-senvolvimento do Nordeste (CODENO) e logo mais a cri-ação da SUDENE, em dezembro de 1959.

Trinta e cinco anos depois, ou, mais precisamente,em maio de 1994, a Secretaria de Planejamento da Presi-dência da República, os órgãos de desenvolvimento regi-onal e o BNDES, Caixa Econômica Federal e a Financiadorade Estudos e Projetos (FINEP) assinaram protocolo de alta

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS70significação para o Nordeste, certamente inspirado naexperiência do GTDN. Trata-se agora da criação do Co-mitê Regional do Nordeste das Instituições Federais deFinanciamento e De-senvolvimento (CORIF). Objetiva esteprotocolo a realização de estudos, coordenação de pro-gramas e projetos e a racionalização do uso dos recursospúblicos, enfim, o desenvolvimento do Nordeste.

Seria oportuno perguntar: O que ocorreu verdadei-ramente na economia do Nordeste entre estes dois mo-mentos da história econômica regional? Há necessidadede um novo paradigma de desenvolvimento? Ou basta aper-feiçoar o que está sendo feito? Os resultados falam por si.

O crescimento da renda do Nordeste nos últimostrinta anos, foi excepcional pelos padrões internacionais.O setor industrial, a geração de divisas e outros indica-dores globais da economia se mostraram ascendentes.Estes avanços quantitativos não foram, todavia, os mes-mos no tocante à melhoria da qualidade de vida de mi-lhões de habitantes dessa Região, especialmente osdependentes de atividades agrícolas e marginalizadosdos centros metropolitanos.

Na verdade, o que tem ocorrido no Nordeste é asubsistência ainda dos principais problemas de desigual-dades e pobreza absoluta que marcam as economias sub-desenvolvidas do Terceiro Mundo. Efetivamente, overdadeiro significado de desenvolvimento não corres-ponde apenas a um aumento quantitativo da produçãodos bens e serviços, mas, principalmente, a sua melhordistribuição. A finalidade do desenvolvimento é melho-rar prioritariamente as condições de vida da sociedadeem todos os seus aspectos econômicos, sociais, culturais,institucionais e ambientais. De fato, a mera �acumulaçãode bens e serviços, mesmo em benefício da maioria, nãobasta para realizar a felicidade humana�, lembra JoãoPaulo II, na Encíclica �Sollicitudo Rei Socialis.�

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 71Torna-se necessário, por isso, redefinirem-se, cla-

ramente, os objetivos e os rumos de um novo estilo dede- senvolvimento econômico mais qualitativo do que oatualmente em curso no Nordeste.

Ao novo Comitê Regional do Nordeste (CORIF)cabe, neste momento histórico, a responsabilidade dereinventar o desenvolvimento do Nordeste e estabele-cer uma nova ordem regional, fundamentada no verda-deiro progresso econômico e nos princípios da promoçãohumana. Por sua vez, os órgãos de desenvolvimento re-gional contam agora com uma excelente oportunidadepara se renovarem e progredirem com a Região.

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A NOVA ECONOMIA DA INFORMAÇÃO

O meu interesse é pelo futuro desde que é neleque vou passar o resto da minha vida.

C. KITTERING

O renomado professor de Sociologia do Trabalho,Domênico Di la Masi, da Universidade de Roma, afirmaque, atualmente, está-se travando uma luta entre os queprocuram preservar o industrialismo e os que propõemque a informação seja a força dinâmica de uma novaera, de uma verdadeira �Renascença�. Segundo o refe-rido cientista social, está surgindo uma sociedade pós-industrial, onde a agricultura e a indústria serãoultrapassadas ou substituídas economicamente pelainformática e pelos serviços. Este fenômeno afetará ospaíses ricos e as economias mais atrasadas. Ou seja, aseconomias do Terceiro Mundo deveriam queimar eta-pas, saltando da era fundamentada nos recursos natu-rais para a etapa da informatização e da eletrônica.

Tal enfoque dos problemas do desenvolvimento eco-nômico vem crescendo de importância na literatura aca-dêmica e nos pronunciamentos políticos nos últimos anos.

André Danzin, do Comitê Europeu de Pesquisa eDesenvolvimento, vê na sociedade de informação a opor-tunidade para o ressurgimento econômico da Europa.�O potencial da eletrônica e da informação será o pri-meiro setor do crescimento�, diz ele. Outros cientistas eeconomistas falam de uma �Idade Espacial�, �IdadeTecnoetrônica� e de uma �Idade da Informação.� Estasexpressões buscam, naturalmente, descrever as etapasfuturas das sociedades ricas, onde os problemas da po-breza, desigualdades sociais e atraso econômico são ape-nas recordações históricas.

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 73Segundo o economista e escritor Alvin Toffler, a hu-

manidade enfrentou, até o momento, duas ondas de mu-danças, cada uma provocando a ruptura de culturas ecivilizações e substituindo-as por novos modos de vida,jamais imaginados pelos que viveram antes. A primeiraonda foi a da revolução agrícola, que prevaleceu duran-te milhões de anos. A nova etapa foi a onda da civiliza-ção industrial, que perdurou um pouco mais de 200 anose está chegando ao fim. A terceira onda já teve inícioem algumas partes do mundo e poderá completar-se empoucas décadas vindouras. Esta civilização nova, pós-industrial, exigirá governos mais eficazes, mais democrá-ticos. Haverá uma ruptura entre o produtor e oconsumidor, gerando uma nova economia do �prossumi-dor�. Será a primeira sociedade verdadeiramente hu-mana da história.

Na verdade, muitos países já entraram nessa novaetapa do de-senvolvimento econômico, como os Esta-dos Unidos, Grã-Bretanha, França, Alemanha e Japão;enquanto outros estão vivendo o impacto simultâneo devárias ondas.

O economista Jean-Jacques Servan-Schreiber, au-tor do �Desafio Mundial�, também acha que a industria-lização clássica não é verdadeiramente um caminhoseguro para a independência dos povos subdesenvolvi-dos. Até que ponto essa industrialização não serve, an-tes, aos interesses expansionistas das multinacionais, deforma que torna os países pobres mais pobres e maisendividados?

Estas e outras questões estão sendo ressaltadasnos estudos sobre as alternativas que viabilizam umanova ordem político-econômica mundial.

Observando esta problemática da perspectiva doBrasil, de modo geral, não devemos esquecer que noplaneta existem dois mundos. O mundo dos ricos e o

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS74mundo dos pobres. O primeiro é industrializado e avan-çado tecnologicamente, com alta produtividade na agri-cultura, e que já resolveu todos os seus problemasestruturais de educação, saúde e pobreza absoluta. Onumeroso mundo dos subdesenvolvidos, onde se encon-tra ainda o nosso País, é marcado por extrema pobrezade segmento importante da população, baixa produtivi-dade, grande proporção de desempregados e abjeta de-sigualdade econômica e social.

A questão política mais premente das áreas sub-desenvolvidas, portanto, é pertinente à superação dosgraves problemas estruturais, da modernizaçãotecnológica e melhoria da produtividade generalizada.Sem solução desses entraves jamais os países subde-senvolvidos alcançarão sequer a almejada fase da revo-lução industrial. A luta principal, a ser empreendida naspróximas décadas, deverá ser o combate à pobreza e adefesa da justiça econômica como estratégia para obteruma reversão da tendência do aumento do hiato de ren-da e bem-estar entre as nações e dentro de cada estadodo Terceiro Mundo.

Neste contexto, a revolução da informação poderáser um elemento fundamental de modernização e trans-formação da economia dos países subdesenvolvidos atu-ais. De forma alguma, entretanto, deve-se esquecer aadvertência do dr. Herman Kahn, do Hudson Institute,no seu livro sobre os próximos 200 anos: �Somente ospaíses que tiverem vencido, antecipadamente, a revo-lução da educação e da tecnologia serão beneficiadospela nova onda da informação e da eletrônica.�

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NOVO PLANO, VELHOS PROBLEMAS

A história, depois de feita, é inalterável. JOHN KENNETH GALBRAIT

O novo Plano Econômico lançado recentemente pre-tende, em seus fundamentos, conter ou reduzir a atualsuperinflação no País. A proposição do ministro FernandoHenrique Cardoso é que o seu plano consubstancia umaproposta de estabilização econômica de natureza mone-tária e fiscal.

O objetivo final da nova política é criar as condiçõesnecessárias à retomada do crescimento econômico con-tinuado, segundo a concepção de que não é possível oalcance da referida meta sem antes reduzir drasticamen-te a inflação. Este aspecto do novo Plano Econômico sus-cita um velho problema, isto é, inflação versus crescimentoeconômico. É necessário reduzir a inflação para obter aretomada do crescimento econômico?

Há uma crença acadêmica na América Latina de queo desenvolvimento econômico não pode verificar-se semrecorrer à inflação. Esta tese, aliás, conta com respeitáveisseguidores do Brasil, enquanto outros são de opinião que�não há correlação entre inflação e desenvolvimento�.

Na verdade, a história econômica da humanidademostra que a inflação não é necessária ou benéfica aodesenvolvimento econômico, conforme ensina dr.Octávio Gouveia de Bulhões, presidente do Instituto Bra-sileiro de Economia da FGV. Do mesmo modo, o prof.Hans Singer diz: �De meu conhecimento nunca houveum caso de desenvolvimento econômico bem sucedidocombinado com inflação acelerada.�

De fato, não houve inflação durante a fase impor-tante do desenvolvimento econômico na Inglaterra, en-

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS76tre 1784-1814, assim como não houve nos Estados Uni-dos, no Japão e na União Soviética em períodos de maisrápido crescimento econômico. Mesmo no Brasil e naArgentina não ocorreu inflação durante os melhores mo-mentos da economia desses países.

A literatura econômica é farta em análises compro-batórias de que, para o desenvolvimento econômico e oprogresso, é preferível uma situação financeira estávela uma inflação acelerada.

Não há dúvida, portanto, de que o desenvolvimen-to é possível com moderada inflação; mas é falsa a idéiade que a inflação é inevitável no curso do desenvolvi-mento econômico. O equívoco decorre da confusão quegeralmente se faz em economia quanto à causa e ao efeitodos fenômenos.

Na prática, quando um país procura aumentar ataxa de crescimento de seu desenvolvimento ocorremais pressão sobre os recursos disponíveis. Verifica-se,em conseqüência, um aumento da procura desses bense uma elevação dos preços correspondentes. Conclui-se, daí, que o desenvolvimento provoca a inflação. Isto éuma falácia porque a pressão sobre os recursos físicos,nesse caso do crescimento econômico, afeta os preçosrelativos de alguns bens e não o nível geral de preçosque caracteriza os processos inflacionários. Em outraspalavras, no processo de crescimento a variação dospreços são de alguns artigos em comparação com ou-tros e nada mais. Do mesmo modo, não haverá pressãosobre os preços, no processo de crescimento, quandoos recursos obtidos pelo governo para investimentos fo-rem através de impostos ou empréstimos ao público eas empresas particulares utilizarem suas próprias pou-panças em seus investimentos.

Se a inflação não é necessária para o crescimentoeconômico do País, então quem é que a quer? São gru-

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 77pos politicamente poderosos do País que se beneficiamcom a inflação, sendo que alguns têm de tê-la para so-breviver. Mas, quem perde ou paga pela inflação brasi-leira? A hiperinflação reduz rapidamente a renda ouremuneração real dos assalariados, impede o aumentoda produtividade, destrói o mercado de crédito produti-vo e controla o balanço das empresas. No entanto, umdos efeitos mais danosos da inflação é quanto à distorçãodos investimentos, com fuga para a moeda estrangeira,aplicações na compra de imóveis e terrenos, além dedesincentivar a aplicação de recursos no setor de bensde capital e de infra-estrutura.

Em suma, a inflação desvia o curso dos investimen-tos do setor produtivo para as aplicações especulativas,em prejuízo do desenvolvimento econômico do País.

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PLANO REAL: HORA DE PISAR NO FREIO

Dai-me boa política e eu vos darei boas finanças. BARON LOUIS

A inflação selvagem do Brasil pode ser domada?Teremos estabilidade dos preços, doravante? Este Pla-no vai dar certo mesmo?

São perguntas que estão, no momento, na boca e nopensamento de todos os que se preocupam com o futurodo País ou com o seu bolso... É verdade que alguns achamque se temos vivido com elevada inflação nos últimos anos,por que não poderemos viver outros dez ou vinte anos?

A primeira reflexão que se deve fazer sobre taisquestões é: Por que o Brasil detém atualmente a maiorinflação do mundo, afora a dividida e caótica economiada Iugoslávia? Como se explica que todos os países de-senvolvidos do mundo tenham inflações de apenas doisa cinco por cento ao ano? Além disso, a quase totalida-de das nações do Terceiro Mundo, quer grandes, médi-as e republiquetas da América Latina, África, OrienteMédio e Sudeste Asiático estão com inflações que, rara-mente, ultrapassam vinte por cento anualmente. O re-corde mundial do Brasil, de maior concentração de rendanas mãos de poucos e uma pobreza generalizada emtodo o território nacional, não estaria correlacionado como crônico processo inflacionário que estamos vivendohá anos? Basta de perguntas, vamos aos fatos...

Durante a maior parte da história econômica recen-te do nosso País, o governo gastou desmedidamente maisdo que havia arrecadado. Este modo de agir enfraque-ceu o crédito público, reduziu a eficiência econômica, se-pultou a credibilidade e a reputação governamentais. Ainflação, segundo explica o economista W. L. White, as-

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 79semelha-se a um navio que, devido a um furo em seu cas-co, está afundando lentamente e parece haver tempo su-ficiente para corrigir o defeito. Mas, finalmente, chega omomento em que a proa afunda e sua popa, erguendo-seno ar, mergulha para o fundo, irremediavelmente...

A hiperinflação é, fundamentalmente, um fenôme-no monetário no qual as classes assalariadas e de rendafixa perdem poder aquisitivo. Enquanto isso, o governoe os capitalistas ganham. Estes, pela especulação, e ogoverno, pela cobrança de um imposto inflacionário su-til, representado pela emissão de moeda para gastos decusteio ou de investimentos de duvidosa prioridade,como é do conhecimento da sociedade brasileira.

Este é um complexo mecanismo que poucos conhe-cem. Seus resultados são públicos e notórios, como expli-ca um modesto engraxate da Praça do Ferreira, aoindagar-lhe o que ele achava que era a inflação: �Infla-ção é uma maracutaia que o governo inventou para tirardinheiro dos pobres e dar aos ricos.� Nem MiltonFriedman, Prêmio Nobel de Economia, com seus estudosdos fenômenos monetários, seria tão preciso e correto.

Quem não sabe que a situação da economia brasilei-ra hoje é ótima para uma minoria e desastrosa para a mas-sa populacional mais expressiva? Parece que os governose os detentores do poder econômico nunca refletiram comoeles seriam também beneficiados com uma economia es-tável, isenta desse câncer destrutivo do processo produti-vo. Basta ver o que ocorre nos países do Primeiro Mundoque eliminaram totalmente esse fator de intranqüilidadesocial e de pouca justiça econômica. De fato, os países de-senvolvidos tremem de medo e pavor com qualquer ame-aça do recrudescimento da inflação, por menor que seja.Tal como passar de 3 para 4% ou 5% ao ano.

O novo Plano Econômico de Estabilização, ou PlanoReal, contém praticamente todos os elementos técnicos

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS80indispensáveis para frear e derrubar a hiperinflação doBrasil a níveis muito baixos, semelhantes aos que vigoramhoje na maioria dos países subdesenvolvidos, isto é, de doisa cinco por cento ao mês. Trata-se da mais abrangente,realística e criativa de todas as tentativas de combate àinflação no Brasil. Por sua vez, a situação das contas públi-cas estão em níveis toleráveis, em parte devido ao grandeatraso na aprovação do orçamento de 1994. A dívida ex-terna que era um poderoso foco de inflação foi renegociadade acordo com termos compatíveis com a capacidade depagamento. O preço do petróleo, que já foi uma fonte deelevação generalizada dos preços, regrediu. O País contacom uma reserva cambial em moedas fortes entre 25 a 30bilhões de dólares, proporcionalmente idêntica, em termosde renda nacional, ao que a Argentina conta para susten-tar seu programa de inflação zero.

Este tesouro de poder aquisitivo internacional serásuficiente para lastrear os 3,6 bilhões de novas unida-des de real a serem emitidas, bem como uma garantiapara a moeda escritural que é movimentada pelo siste-ma financeiro. Ao lado do congelamento ou controle dasemissões do real aos níveis do crescimento da econo-mia ou do estoque de divisas fortes, é possível obter umajuste fiscal compatível com o novo patamar de estabili-dade econômica programado.

Em resumo, o combate ao selvagem processo in-flacionário brasileiro, que atualmente asfixia a economia,impõe-se por motivos econômicos, sociais e éticos. O Pla-no Real é factível e se ajusta perfeitamente às metas deestabilidade financeira e ao estímulo à retomada do de-senvolvimento econômico nacional. É um plano madu-ro, e não medidas precipitadas. Vai funcionar e dará certosem dúvida. Acreditem!

Como diz Joelmin Beting: �A ordem é salvar o pla-no. E, através dele, o BRASIL.�

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REVERSO DO REAL

Não procure erros, encontre soluções. HENRY FORD

A hiperinflação é uma doença perigosa que podedestruir uma sociedade. Mas a inflação tem cura. Paraprovar isso basta examinar a história econômica dos úl-timos dois séculos. Desde o início da revolução industri-al, praticamente em todos os países do mundo ocorreram,em certos momentos, inflações elevadas, conforme ospadrões de cada época. Do mesmo modo, todos conse-guiram dominá-las.

Atualmente são poucos os países do Terceiro Mun-do e nenhum dos desenvolvidos que sofrem desse mal.Tem sido determinante para isso a compreensão de quea inflação galopante é uma doença destruidora do teci-do social e um dos maiores obstáculos ao desenvolvi-mento econômico e à estabilidade política.

No momento em que são adotadas medidas desti-nadas a reverter o processo inflacionário brasileiro, tor-na-se oportuno lembrar, entretanto, que a derrota dainflação é um pré-requisito fundamental, mas não sufi-ciente, para o desenvolvimento econômico e a prosperi-dade geral. O País necessita urgentemente da adoçãode uma estratégia de desenvolvimento que leve em contao quadro de estabilidade interna e a nova ordem econô-mica internacional. A grande tarefa do momento não éapenas �tirar o carro do atoleiro�, como dizia Pompidou.Neste momento histórico, a questão é saber se os brasi-leiros saberão encontrar o caminho de um desenvolvi-mento econômico equilibrado e socialmente mais justo.

Por outro lado, é oportuno advertir que nem tudosão flores no processo de cura da inflação. Há efeitos

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS82colaterais dolorosos, especialmente aqueles que vinhamsendo beneficiados pelo descontrole monetário. Para ex-plicar melhor, Milton Friedman, Prêmio Nobel de Eco-nomia, estabelece um paralelo entre o alcoolismo e ainflação. Diz ele: Quando o alcoólatra se inicia no vício,os efeitos primeiros são bons. É o mesmo que ocorre noinício do aumento da quantidade de moeda em circula-ção, quando todos elevam os gastos, especialmente ogoverno, sem necessidade de poupança anterior ou em-préstimo. Depois aparecem os efeitos negativos: elevaçãodos preços, perda do poder aquisitivo dos trabalhado-res, estagnação econômica e, finalmente, como todossabem, o caos social.

Felizmente, a cura do alcoolismo é fácil: deixar de be-ber. A receita para a cura da inflação também é conhecida:equilíbrio orçamentário, controle das emissões, política decrédito rigorosa e determinação política para eliminá-la.

O alcoólatra que se interna, explica o professorFriedman, sofre tremendamente com a ausência da be-bida antes de superar a compulsão de beber. Os efeitoscolaterais do combate à inflação são dolorosos para osque eram beneficiados pela orgia do vício, ou seja, o pró-prio governo e os detentores do poder econômicoespeculativo que tiram vantagens desse fenômeno. Es-ses efeitos colaterais, naturalmente, não afetam os assa-lariados, os detentores de renda fixa, os segmentos maispobres da população e as regiões subdesenvolvidas.

Para a sociedade como um todo, os benefícios surgema médio prazo com possibilidade de mais crescimento, au-mento do emprego, economia mais sadia e próspera. O realjá mostrou a cara, agora é esperar o reverso da moeda.

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AS CAUSAS DA INFLAÇÃO

Aqueles que esquecem o passado são condena-dos a revivê-lo.

PROVÉRBIO SÂNSCRITO

Existem diversas teorias para explicar as causasmotivadoras da inflação no Brasil. As hipóteses mais co-nhecidas são defendidas pelos economistas das escolasdenominadas �monetaristas� e �estruturalistas�.

Segundo o mais importante defensor da concep-ção monetarista, Milton Friedman, da Universidade deChicago, a inflação ocorre quando a quantidade de mo-eda cresce muito mais rapidamente do que a produção.Desse modo, se a quantidade de bens e serviços se ele-vasse na mesma velocidade da quantidade de moeda,os preços se manteriam estáveis.

Para o renomado economista Gottfried Haberler,muitos fatores e políticas podem ser responsáveis pelainflação: 1. A procura agregada crescendo mais do quea oferta agregada, puxando para cima os preços e salá-rios; 2. A elevação da procura devido a um déficit go-vernamental; 3. Expansão do crédito, das exportaçõesou dos salários. Esclarece Haberler, contudo, que emtoda inflação a moeda é um elemento causal e nenhumoutro fator poderá provocá-la sem que esteja associadaa um aumento da quantidade de moeda.

Rose Friedman confirma o argumento de Haberlerde que não há nenhum exemplo de aumento da quanti-dade de moeda sem aumento de preços. Explica ela quea produção é limitada pelos recursos físicos (capital, ter-ra, insumos) e humanos disponíveis e pela capacidadede usá-los. A produção de papel-moeda e depósitos ban-cários não estão sujeitos a limites físicos. Desse modo, épossível ver o crescimento da base monetária em mais

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS84de 1.000 por cento, como aconteceu no Brasil em 1992,por exemplo, enquanto a produção de bens e serviçosdificilmente alcança mais de 10% ao ano.

Foi por isso que o grande economista JohnMaynard Keynes, após a Primeira Guerra Mundial, ad-vertia que �não há meio mais seguro de derrubar a baseda sociedade do que corroer a moeda�.

É evidente que o aumento das despesas públicasnão provoca o agravamento da inflação se os gastos adi-cionais fossem realizados por empréstimos tomados aopúblico ou oriundo de mais impostos. Neste caso, o go-verno teria mais moeda; o público, todavia, disporia demenos dinheiro.

Proclamam, ainda, os monetaristas que a inflaçãodeve ser detida antes que se transforme em tensões ex-plosivas. O método eficiente para combater a inflaçãoproposta por esta escola é o controle da demanda ex-cessiva através de medidas monetárias, fiscais e de as-sistência financeira internacional.

As medidas recomendadas pelo Fundo MonetárioInternacional são desta categoria e incluem limitaçõesde crédito, reduções de gastos públicos, congelamen-tos de salários e eliminação de subsídios e de controledireto dos preços.

A concepção estruturalista foi proposta por um gru-po de economistas da Comissão de Estudos Para a Amé-rica Latina, conhecida como CEPAL. Em resumo, a tesedessa outra teoria é a de que a inflação é uma contin-gência do próprio processo de crescimento econômico.Os aumentos de preços, assim, são motivados por pres-sões geradas no interior do próprio sistema econômicoem conseqüência da limitada capacidade de os paísessubdesenvolvidos aumentarem a produção de setoresestratégicos, a exemplo dos alimentos, dos produtos ex-portáveis e das matérias-primas.

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 85Neste contexto, o crescimento da renda e da urba-

nização geram tensões de procura sobre a rigidez daoferta desses produtos, elevando os preços e as taxasdo mercado cambial.

A conclusão desses economistas, identificados coma esquerda, é de que os países da América Latina estãocondenados à inflação crônica. A única saída seria a re-alização de mudanças estruturais básicas, como a refor-ma agrária e o estabelecimento de uma nova ordemeconômica internacional.

Acreditam os defensores da visão estruturalista daCEPAL que um programa de combate à inflação de ca-ráter apenas monetarista não tem possibilidade de de-ter a elevação dos preços e provocaria uma estagnaçãoeconômica, aumentando o desemprego.

Sobre esta teoria, que teve o seu apogeu na déca-da de 50, diz o professor Mário Henrique Simonsen:�Nunca tanta teoria explicou tão pouco.�

Em resumo, todos os tipos de causas das pressõesinflacionárias não se materializariam num processo deelevação de preços se não fosse por meio de um meca-nismo de propagação de tais pressões, isto é: esse pro-cesso vem a ser a capacidade dos diferentes agentes,setores ou grupos econômicos e sociais para reajusta-rem sua renda ou despesa real relativas: 1) aos assalari-ados, através de reajustes; 2) aos empresários, atravésde altas de preços; e 3) ao setor público, por intermédiode aumentos das despesas fiscais nominais.

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AS RAÍZES DA INFLAÇÃO SÃO VÁRIAS... MAS QUEM É O VILÃO?

A inflação é como o pecado; todo governo a de-nuncia e a pratica.

LEITH ROSS

A inflação tem uma longa história no Brasil e já setornou parte do modo de vida do povo e o problema maisdiscutido da economia do País.

Este fenômeno, caracterizado por uma elevaçãogeneralizada dos preços, assume diversas modalidadesao longo do tempo e das circunstâncias. Os economis-tas utilizam, assim, diversas designações para identifi-carem os diferentes tipos de inflação e suas causas.

Quando os preços se elevam tendo como origemas altas nos preços dos fatores de produção e salários échamada de INFLAÇÃO DE CUSTOS. Quando esse fe-nômeno ocorre a partir de modificações rápidas na pro-cura ou oferta em relação a outros fatores, diz-se que aINFLAÇÃO É SETORIAL. A ESTAGFLAÇÃO se dá noscasos em que as elevações dos preços ocorrem com ta-xas baixas ou negativas de crescimento da economia. AHIPERINFLAÇÃO OU SUPERINFLAÇÃO se verifica noscasos em que a moeda está doente, em estado terminal,como é o caso atual do Brasil.

Além desses, ainda existe a INFLAÇÃO PSICOLÓ-GICA, também chamada de inflação de expectativas ouinercial. Segundo os adeptos desse tipo, a inflação éprovocada pelas pessoas que acreditam na teoria român-tica de que um dia os salários vão alcançar os preços.

Muitos são os fatores e políticas que têm sido res-ponsáveis pela inflação, qualquer que seja a sua deno-minação. Mas, para o governo, é mais fácil atribuir istoaos aproveitadores, à falta de compreensão dos agricul-

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 87tores, à pressão salarial dos empregados, à busca dasempresas por mais lucros ou à rigidez no aumento daprodução de alimentos.

A experiência prática, no entanto, comprova que fa-tores não-monetários, como os mencionados, podem ser acausa original dos aumentos de preços. Contudo, sem au-mentar a base monetária e o estoque de moeda, não have-rá inflação. A espiral contínua de preços e salários tem umacausa principal: o déficit público, criado quando o gover-no gasta mais dinheiro do que consegue arrecadar. Dessemodo, não adianta o governo alertar os empresários e osassalariados para os males das subidas de preços. Isto épura demagogia e perda de tempo, pois aquele excedentede consumo � déficit do próprio governo e do crédito pes-soal � é que determina a elevação dos preços.

Como esse conflito vem sendo tratado no casobrasileiro? Da seguinte maneira: É o governo que tem omonopólio da emissão de moeda, mas os bancos parti-culares criam também dinheiro através da multiplica-ção de depósitos bancários. Dessa maneira, o rombo dasfinanças do governo tem sido resolvido com a emissãode papel-moeda e letras sem lastro, o que significa ape-nas a elevação da inflação, pela qual paga toda a socie-dade. De fato, a inflação tende a redistribuir renda eriqueza, isto é, retirando das classes assalariadas emproveito das categorias que vivem dos lucros. A infla-ção acelerada desorganiza também o mercado de cré-dito, distorce os componentes de rentabilidade e domercado cambial, desestimulando os investimentos so-ciais e de utilidade pública. É um prêmio à especulação.

De uma maneira ou de outra, todos os economis-tas estão de acordo em que as pressões inflacionárias,de modo geral, são motivadas: a) quando o governo ten-ta absorver mais recursos dos que são liberados pelosetor privado; b) quando várias pessoas tentam melho-

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS88rar a sua participação da renda, tais como os assalaria-dos e os empresários; c) quando as expectativas de com-pra são superiores à capacidade da economia.

O renomado prof. Milton Friedman assevera que ainflação pode ocorrer de modo continuado, aberta (semcontrole do governo) ou reprimida (indexada).

Ele afirma, no entanto, que a inflação mais desas-trosa é a inflação reprimida, pois o sistema de preços é aúnica técnica até agora conhecida para uma eficientealocação de recursos na economia.

De acordo com a literatura existente e a experiên-cia prática sobre esse problema, a melhor estratégia paraarrefecer ou estancar uma calamitosa inflação, como abrasileira, é por meio de um orçamento verdadeiramenteequilibrado e uma política de crédito sóbria e firme.

Para finalizar, cabe a pergunta:Como a unidade real de valor do novo Plano Eco-

nômico vai contribuir para a resolução de toda essa pro-blemática inflacionária? De minha parte, a resposta ésimples: Não sei... Mas não tenho dúvidas de que elaserá eficaz para controlar salários, que, no caso atual doBrasil, não é o fator determinante da inflação, como aprática vem demonstrando há muito tempo.

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CUBA PODE SOBREVIVER?

Há uma solução simples para cada problema –nítida, plausível e errada.

OGAEN NASH

A crise cubana está adquirindo dimensões de tra-gédia. É possível mesmo dizer que o futuro de Cuba jáestá selado.

O desgaste da experiência socialista, entretanto,não é um fenômeno exclusivo desse país. O esboroa-mento dos regimes não-democráticos teve início quasesimultaneamente na União Soviética e nos países do lesteEuropeu, com a simbólica queda do muro de Berlim. Naverdade, Samuel P. Huntington, nos seus estudos sobreas transformações do final do século XX, demonstra que,entre 1974 e 1990, cerca de trinta países passaram doautoritarismo à democracia. Como diz ele: �O tempo estádo lado da democracia.�

E, então, o que poderá ocorrer com Cuba? Sobrevi-verá dessa tormenta? O destino do povo cubano começoua ser delineado a partir da implantação da nova políticaeconômica e social da Perestroika, de Mikhail Gorbachev,em 1986. Desde então ocorreu uma radical mudança nasrelações de cooperação da União Soviética com Cuba.Sérias dificuldades iniciais transformaram-se em gravese complexos problemas políticos, econômicos e sociais.

Na verdade, Cuba sempre viveu, desde a revolu-ção, duas realidades distintas. Enquanto a maciça aju-da externa financiava os programas de natureza social,o processo produtivo enfrentava muitas dificuldades epouco progresso. Assim é que, entre 1960-1980, mesmocom um incremento demográfico discreto, pouco aumen-tou a renda per capita, segundo dados das Nações Uni-

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS90das. Nesse período, a taxa de evolução do referido indi-cador foi de apenas 0,6% ao ano, estabilizando-se daíem diante até 1986, e declinando nos anos seguintes atéo presente. As pesadas despesas de custeio reduzirama capacidade de poupança interna a limites insuficien-tes para as reposições do estoque de capital e para ali-mentar o crescimento da economia. Por outro lado, ocomércio exterior de Cuba entrou em colapso com a fa-lência da Comunidade Econômica dos países socialis-tas. O resultado era inevitável: a economia passou adesandar para a situação deplorável em que se encon-tra atualmente.

Outros fatores contribuíram para influenciar a cri-se do socialismo cubano. Destaque-se o envelhecimen-to da liderança revolucionária do comandante-chefeFidel Castro. Atualmente, o povo cubano tem mais infor-mações sobre o mundo exterior e acha que somente asatisfação das necessidades sociais básicas não é sufi-ciente para torná-lo realizado e feliz. As restrições àsliberdades individuais e religiosas estão ferindo mortal-mente o espírito revolucionário da coletividade e mes-mo o afeto ao carismático líder nacional. As excessivasdespesas militares estão também exaurindo os parcosrecursos do país. Cerca de 12% do produto interno bru-to são destinados a essa finalidade, com uma força ar-mada correspondente a 17 militares por 1.000 habitantes.No Brasil, tal relação é de 2 por mil. Enquanto isso, asdespesas com educação atingem 6,6% e com saúde, 3,4%do PIB.

No campo econômico, apesar de muitos esforçosdo governo cubano, a produção agrícola e agroindustrialcontinuam concentradas na cultura canavieira. Além dis-so, apenas 23% do território nacional (110 mil km) éagricultável. A contribuição desse setor mal chega a 10%da produção nacional total e a 14% do emprego. A base

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 91agrária isoladamente não tem, assim, condições de ge-rar recursos para financiar o crescimento econômico deCuba, como ocorreu nos estágios iniciais da economiasocialista soviética ou chinesa. O setor industrial, demodo geral, é atrasado e pouco diversificado. Não temcompetitividade para concorrer no mercado externo, anão ser no tocante às atividades fumageira e de bebi-das. Finalmente, o setor terciário funciona mal, engessadopor uma burocracia lenta e desmotivada.

É, portanto, evidente que Fidel Castro está diantede um grave dilema, com poucas alternativas de ação.A decisão não está mas nos Estados Unidos, com a sus-pensão do bloqueio, ou na Rússia, com nova ajuda eco-nômica. A sobrevivência de Cuba encontra-se nas mãosde Fidel Castro. Terá de renunciar ao seu objetivo inicialde �socialismo ou morte� a favor da adoção de uma de-mocracia genuína, com a escolha de um novo presiden-te pelo voto secreto e livre.

Acreditamos que a ajuda mais eficaz que podemosdar a esse povo, neste momento difícil, é orar.

A AGRICULA AGRICULA AGRICULA AGRICULA AGRICULTURA DO NORDESTETURA DO NORDESTETURA DO NORDESTETURA DO NORDESTETURA DO NORDESTEE O III PLANO DIRETOR DA SUDENEE O III PLANO DIRETOR DA SUDENEE O III PLANO DIRETOR DA SUDENEE O III PLANO DIRETOR DA SUDENEE O III PLANO DIRETOR DA SUDENE

SEMINÁRIO SOBRE O III PLANO DIRETOR DA SUDENE

Notas para debate preparadas por PedroSisnando Leite, Professor Assistente daFaculdade de Ciências Econômicas daUniversidade Federal do Ceará e Técnico deDesenvolvimento Econômico do BNB.

Promoção da Faculdade de Ciências Econômicas daUniversidade Federal do Ceará e Superintendência do

Desenvolvimento Econômico e Cultural do Ceará (SUDEC)

Fortaleza, fevereiro de 1966

SUMÁRIO

Introdução .................................................................................. 95

PRIMEIRA PARTE: SÍNTESE SOBRE A AGRICULTURA NO NOR-DESTE

I. Estrutura da renda agrícola ................................................... 96II. Tendências do �quantum� .................................................... 98

SEGUNDA PARTE: O TERCEIRO PLANO DIRETOR DA SUDENEE A AGRICULTURA

III. A estratégia de ação da SUDENE e o problema agrário ........ 100IV. Diretrizes da política de desenvolvimento agrícola ........ 102V. Principais programas setoriais ........................................... 1031. Promoção agropecuária e organização agrária ................. 1032. Racionalização do abastecimento alimentar ..................... 1043. O desenvolvimento da cultura algodoeira ........................ 1064. Melhoramento da pecuária do Nordeste ............................ 1075. Reflorestamento e fruticultura ............................................ 1076. Pesquisas e experimentação agronômicas ........................ 1087. Irrigação do Submédio São Francisco ................................. 1098. Projeto de povoamento do Maranhão ................................. 1119. Desenvolvimento integrado do Vale do Jaguaribe ........... 11210. Outros programas de interesse para a agricultura ......... 1131) Recursos naturais ................................................................. 1132) Ensino agrícola ..................................................................... 114VI. A política de incentivos à agropecuária nordestina ....... 114VII. Esquema dos recursos do III Plano Diretor ...................... 1161. Resumo da distribuição setorial dos recursos da SUDENE ..... 1172. Investimentos na agricultura e setores correlatos ............ 118

TERCEIRA PARTE: CONSIDERAÇÕES À MARGEM DO III PLA-NO DIRETOR DA SUDENE

1. Diagnóstico da economia agrícola do Nordeste ................ 1202. Planejamento e execução .................................................... 1213. Agricultura versus indústria ............................................... 1224. Aperfeiçoamento tecnológico da agricultura ................... 124

95

INTRODUÇÃO

A agricultura ocupa um lugar de destaque na economia doNordeste com, aproximadamente, 48% da renda interna regional.

O contingente demográfico radicado no quadro rural re-presenta dois terços de toda a população do Nordeste, apesardo êxodo contínuo que se verifica para as cidades e outras áreasdo País. Outro elemento extremamente importante com relaçãoa esse setor é a sua participação no emprego da mão-de-obra,que se eleva a cerca de 70% de toda a população economica-mente ativa do Nordeste(*).

Além disso, prevalece uma expansão populacional bas-tante elevada, classificável mesmo como de �explosãodemográfica�. Para as regiões que almejam desenvolvimentoeconômico, isto significa necessidade de mais inversões bási-cas, a fim de que sejam propiciadas aos novos habitantes, ascondições mínimas que dignificam a própria existência: alimen-tação, educação, vestuário, habitação e assistência médica.

Em outras palavras, se não desejarmos que retrocedam ascondições de vida já conquistadas no Nordeste, devemos cana-lizar parte considerável de inversões para atender a essa triplanecessidade: manter o �status� atual, atender a expansãodemográfica e possibilitar o crescimento da economia.

Apesar de haver uma estreita relação entre os fatores queconstituem a base do desenvolvimento econômico, cabe à agri-cultura grande parte das responsabilidades nesse particular.Assim, para que o desenvolvimento do setor agrícola seja leva-do a cabo, sem pressões internas e de- sajustamentos, torna-senecessária sua planificação completa e detalhada, a fim de queela seja normativa e realista.

O presente documento, preparado para servir de apoio àsdiscussões no Seminário sobre o III Plano Diretor da SUDENE,reúne alguns despretensiosos comentários relativos à agricul-tura e ao referido Plano.

(*) O Nordeste aqui mencionado compreende os estados: Maranhão,Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas,Sergipe e Bahia.

96

PRIMEIRA PARTE:SÍNTESE SOBRE A AGRICULTURA DO NORDESTE

I. Estrutura da Renda Agrícola

O produto bruto da agricultura nordestina foi estimadoem Cr$ 1.208 bilhão, a preços correntes, em 1964.

Dada, porém, a acentuada desvalorização da moeda, du-rante os últimos anos, torna-se evidente que os cotejos entreanos diferentes não apresentam muita validade. Assim, fez-se ocálculo, no período 1960/1964, a preços constantes, tomandocomo base 1960, ano em que a SUDENE começou suas ativida-des no Nordeste.

Segundo os dados assim ajustados, o produto agrícoladeflacionado alcançou, em 1964, a cifra de Cr$ 174 bilhões,correspondendo a um incremento real de 26% em relação aoprimeiro ano em análise, quando o produto foi da ordem de Cr$137 bilhões.

A lavoura regional, que compreende cerca de 36 produ-tos, contribuiu, em 1964, com 68% para a formação do produtobruto da agricultura. Os oito produtos agrícolas mais importan-tes, em termos de valor da produção, são: algodão, mandioca,cana-de-açúcar, feijão, cacau, milho, banana e sisal. O algodãoparticipa geralmente com 15% do produto bruto e os sete res-tantes com 40%.

Os outros componentes são: a pecuária e a avicultura,com 16,8% do produto bruto regional; os derivados da pro-dução animal, com 6,6%; a produção extrativa vegetal, com6,9%; e a pesca, com apenas 1,6%, todos tomando por base oano de 1964.

No período 1960-1964, como evidenciam os dados do Ta-bela 1, não ocorreram mudanças estruturais na formação do pro-duto bruto da agricultura nordestina. Na realidade, o prazoconsiderado é muito curto para que ocorram modificações des-sa natureza.

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 97Tabela 1 � Nordeste1

Produto Bruto da Agricultura � 1960/1964

1. Valor a preços de 19602 � Cr$ 1.000.000

Discriminação 1960 1961 1962 1963 1964Lavouras 92.770 96.430 101.090 110.770 118.500Pecuária e avicultura 23.860 19.568 23.760 21.748 29.284Derivados da produção animal 9.088 9.290 9.742 10.330 11.489Extrativa vegetal 9.358 9.880 10.714 11.080 12.035Pesca 2.457 2.758 4.076 2.812 2.732Total 137.532 137.931 149.384 156.740 174.044

2. Números índices (1960 = 100)

Lavouras 100 103 108 119 127Pecuária e avicultura 100 82 99 91 122Derivados da produção animal 100 102 107 113 126Extrativa vegetal 100 105 114 118 128Pesca 100 112 165 114 111Total 100 100 108 113 126Fonte dos dados básicos: Serviço de Estatística da Produção � M.A.

Tabela 2Evolução Física dos Principais Produtos Agrícolas 1960/1964

1. Números Absolutos (mil t)

Discriminação 1960 1961 1962 1963 1964Algodão 717 750 726 832 747Cana-de-açúcar 20.234 21.302 23.124 24.810 23.897Mandioca 7.631 7.709 8.270 9.122 9.319Feijão 494 497 546 608 558Arroz 496 755 834 905 889Milho 1.028 1.067 1.146 1.273 1.222Cacau 155 147 132 136 145Banana 1.540 1.743 2.072 2.275 2.423Agave 163 170 174 199 228Fumo 54 53 65 64 68

(1) Abrange os Estados do Maranhão à Bahia.(2) O produto bruto foi calculado a preços de 1960 tendo em vista a falta deum deflator recomendável, pois os dados nominais, dada a inflação, pou-ca significação tem quando analisados em série temporal.

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS982. Números índices (1960 = 100)

Algodão 100 105 101 116 104Cana-de-açúcar 100 105 114 123 118Mandioca 100 101 108 120 122Feijão 100 101 110 123 113Arroz 100 152 168 182 179Milho 100 104 111 124 119Cacau 100 95 85 88 94Banana 100 113 135 148 157Agave 100 104 106 122 139Fumo 100 98 120 119 125Fonte dos dados básicos: Serviço de Estatística da Produção � M.A.

II. Tendência do �Quantum�

O ritmo de crescimento real da economia agrícola do Nor-deste, no período de 1955/1962, foi da ordem de 4,7% ao ano,segundo o índice de �quantum�, calculado de acordo com ocritério do Laspayres pelo grupo de programação do Departa-mento de Agricultura e Abastecimento da SUDENE.

Segundo, ainda, a mesma fonte, o incremento das lavou-ras, isoladamente, foi de 5,2% no mesmo período, enquanto apecuária apresentou uma taxa de crescimento de apenas 2,9%.

O grupo representado pelos produtos classificadoscomo alimentícios (arroz, batata doce, batata inglesa, fava,feijão, mandioca, milho e soja) registrou um crescimento decerca de 52% entre os anos extremos do período 1955/1962. Ocomportamento do grupo referente a matérias-primas, cons-tituído, por algodão, amendoim, cacau, café, cana-de-açúcar,côco, fumo, mamona e sal, embora registrando progresso,mostra resultados muito aquém dos verificados para o pri-meiro grupo.

Examinando, porém, mais detidamente as variações ocor-ridas isoladamente, para cada um dos produtos de ambos osgrupos, verifica-se que intensidades diversas se manifestam emcada caso, sendo óbvio que os resultados comentados anterior-mente dizem respeito apenas à tendência geral.

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 99Não obstante o quadro otimista acima esboçado, não se

deve fugir a um exame mais profundo sobre o real significado detais acontecimentos.

Preliminarmente, convém ressaltar que tais resultadoscorrespondem a dados absolutos. Não foi levado em conta, na pre-sente análise, o crescimento da população que, no Nordeste, é deaproximadamente 2,4% ao ano, havendo Estados, como o Maranhão,que apresenta incremento demográfico da ordem de 5,8%.

Durante o período em análise, não se verificaram progres-sos relevantes na produtividade do setor, devendo-se o aumen-to da produção agrícola, preponderantemente, à expansão dasáreas cultivadas. Em outras palavras, o crescimento da econo-mia agrícola tem sido de natureza extensiva.

Cumpre, ainda, assinalar que, estudando a situação daagricultura do Nordeste, nos últimos 10 ou 15 anos, não se iden-tificam tendências perceptíveis quanto a mudança nos siste-mas de trabalho e posse da terra. As condições atuais decomercialização dos produtos agrícolas continuam tão precári-as como antes. Afora alguns produtos de exportação, pratica-mente não há para os demais produtos condições mínimas dearmazenagem, padronização, transporte a granel, serviços deinformações de preços, Bolsa de Mercadorias e armazéns geraisque possibilitem a emissão de �warrants�.

Muitas são as dificuldades e os obstáculos a transpor, a fimde que a agricultura se torne eficiente, próspera e capaz de supor-tar as responsabilidades que lhe foram cometidas em prol do de-senvolvimento econômico do Nordeste. Este é o grande desafio daatualidade para a SUDENE e os habitantes do Nordeste.

100

SEGUNDA PARTE:O III PLANO DIRETOR DA SUDENE E A AGRICULTURA

III. A Estratégia de Ação da Sudene e o Problema Agrário

O III Plano Diretor da SUDENE mantém a mesma orienta-ção dos dois planos anteriores1, com algumas variantes apenasno que se refere à composição dos investimentos programados.De fato, especialmente no que tange ao setor agrícola, seria di-fícil compreender-se, em toda a sua magnitude, o III Plano Dire-tor sem um prévio conhecimento dos seus antecedentes. Naverdade, pode-se dizer que a SUDENE tem uma estratégia comrelação ao problema agrário do Nordeste, ao invés de planosparciais descontínuos. Não há, neste documento, a preocupa-ção de tratamento exclusivo do III Plano Diretor da SUDENE,mas, sobretudo, de examinar o problema dentro das diretrizesque os diversos planos da SUDENE vêm tradicionalmente apre-sentando.

O diagnóstico preliminar da economia agropecuária doNordeste, realizado quando da elaboração do I Plano, identifi-cou que o de-senvolvimento desse setor somente poderia seratingido através da adoção de uma política econômica queabrangesse as seguintes linhas de ação:1. Reestruturação da economia rural, visando um aproveitamen-

to mais racional dos recursos da terra, na zona úmida, o apro-veitamento da possibilidade de irrigação e a criação, nacaatinga, de uma economia mais resistente à seca.

2. Necessidade de reorientar e intensificar, amplamente, a pes-quisa agronômica.

3. Orientar os movimentos de população, colonizando ou povo-ando terras subutilizadas, na zona úmida, particularmenteMaranhão e sul da Bahia.

1 De acordo com as suas atribuições, a SUDENE já elaborou e pôs emexecução o I e o II Planos para os períodos de 1960/62 e 1963/65, respec-tivamente. O III Plano abrange os anos de 1966/68.

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 1014. Necessidade da adoção de um conjunto de medidas visando

melhorar as condições de abastecimento, atalhar a tendên-cia estrutural à elevação relativa dos preços dos alimentosna região e criar uma reserva estratégica de alimentos para ocaso de uma seca.

5. Conhecer melhor as reações das populações rurais às medidasde reestruturação da economia agrícola, assisti-las na identifica-ção dos seus problemas, na assimilação de técnicas simples decaráter sanitário ou econômico e, enfim, induzi-los a abrir, porconta própria, o caminho de acesso ao desenvolvimento.

6. Aproveitamento racional dos recursos de água, levando emconsideração os aspectos sobre as precipitações pluvio-métricas, águas subterrâneas, transporte e deposição de se-dimentos e outras questões pertinentes.

Particularmente, no que toca à estratégia de ação para otriênio 1966/68, estabelece o III Plano que a orientação geral aser seguida deve ser a de complementação de programas e pro-jetos já iniciados e a manutenção de políticas preestabelecidas,mas que sejam compatíveis com os objetivos de desenvolvimen-to regional.

Outra diretiva preconizada é a que diz respeito à superaçãode obstáculo de ordem operacional que influíram negativamentena execução dos planos anteriores. Ressalta-se, com efeito, a defici-ente atuação de alguns órgãos públicos encarregados de executarcertas tarefas, delegadas ou contratadas em forma de convênio coma SUDENE. Constitui, também, uma preocupação constante a adap-tação funcional dos órgãos públicos e privados no que se refere àsubordinação dessas entidades aos métodos e objetivos do planeja-mento, com o qual, inevitavelmente, haveria de ocorrer certa frus-tração, como demonstram experiências passadas.

A inovação introduzida no atual plano, todavia, relacio-nada com a abertura de novas linhas de atuação, a adoção denovos estímulos e a identificação de forças dinâmicas até entãonão aproveitadas convenientemente. Os novos enfoques intro-duzidos dão relevo preponderante à utilização de fontes de finan-ciamento internacional e ao emprego de medidas promocionais,

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS102tendentes a interessar mais significativamente o setor privado,para aplicação de recursos em atividades de interesse para odesenvolvimento regional.

O aumento da produtividade dos fatores será tentado atra-vés de novos meios e cujas funções de produção dêem melhoraproveitamento ao fator mão-de-obra, particularmente a nãoespecializada, que é abundante na região. A ampliação depesquisas tecnológicas constitui um dos itens de sustentaçãodos programas nesse particular, havendo mesmo recomenda-ções no sentido de ser estabelecida uma unidade de pesquisapertinente ao assunto de âmbito regional.

IV. Diretrizes da Política de Desenvolvimento AgrícolaAs diretrizes fundamentais do III Plano da SUDENE visam

elevar a taxa de crescimento da produção primária, com vista aaumentar a oferta de alimentos per capita, ampliar no setor agríco-la a capacidade de consumo de produtos industriais e expandir aoferta de matérias-primas. De modo mais específico, os objetivosambicionados podem-se distribuir da seguinte maneira:a) reorganizar a economia agrícola e apoiar o programa nacio-

nal de reformulação da reforma agrária;b) melhorar a comercialização da produção agrícola;c) ampliar a oferta de terras, pelo deslocamento da fronteira agrí-

cola e mais adequada utilização das terras não aproveitadas;d) aumentar a produtividade agrícola pela introdução de ino-

vações tecnológicas adequadas as condições regionais;e) intensificar a produção de alimentos para o consumo interno

de matérias-primas destinadas à indústria regional e de pro-dutos agrícolas para a exportação.

Como podem ser observadas, as diretrizes especificadaspara esse Plano guardam estreita fidelidade aos planos anterio-res. Com efeito, atribui-se ao III Plano diferenciação apenas quan-to à ênfase que se pretende dar ao problema da comercializaçãodos produtos agrícolas e quanto à tática de execução descen-tralizada, assuntos que pouca atenção mereceram no I e II Pla-nos Diretores.

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 103O principal fundamento para a manutenção das diretri-

zes comentadas baseia-se na convicção de que o processo deindustrialização do Nordeste pode ser comprometido seriamen-te caso não se consiga aumentar a oferta de matérias-primaspara esse setor e abastecer oportunamente de alimentos as po-pulações dos centros urbanos em expansão. Desse modo duaslinhas de ação se revelam necessárias: medidas de efeito a curtoe médio prazos, isto é, normalização do suprimento de alimentoe matérias-primas e medidas de efeito a prazo mais dilatado,que dizem respeito ao aumento da produtividade e diversifica-ção da produção agrícola.

V. Principais Programas SetoriaisO esquema operacional para a consecução das diversas

diretrizes enunciadas no item anterior está distribuído por umasérie de programas e projetos. São os mais importantes os seguin-tes: organização agrária, cujo objetivo é o fortalecimento docooperativismo e o estímulo a novas formas de organização agrá-ria; abastecimento alimentar, que visa a melhoria do sistema decomercialização, financiamento da produção e estabelecimentoda política de preços mínimos; promoção agropecuária, a qualtem em vista o aumento de oferta de alimentos e de matérias-primas para o mercado regional e para exportação, além desubprogramas atinentes à pecuária, ao algodão, às oleaginosas eàs culturas alimentares, como cereais, leguminosas e frutícolas.

Tendo em vista o especial significado de tais programas, far-se-á uma pequena descrição dos referidos projetos e daqueles deinteresse direto da agricultura, classificados no plano da SUDENEsob o título de programas especiais e recursos naturais.

1. Promoção Agropecuária e Organização AgráriaO programa de promoção agropecuária e organização

agrária foi concebido tendo em vista a elevação da produtivida-de agrícola e uma distribuição mais conveniente da renda gera-da no setor agrícola.

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS104Referidos objetivos devem ser alcançados através da

dinamização do sistema cooperativo. Previu também o Plano apossibilidade de as cooperativas contribuírem para a racionali-zação do abastecimento alimentar, usando para isso a compra, obeneficiamento e a venda da produção dos associados, os quaisdeverão contar com ajuda creditícia e técnica do programa.

O programa pertinente a esse problema compreende as-pectos referentes à extensão rural, crédito e cooperativismo,elaboração, execução e controle de projetos de organização agrá-ria, cuja execução caberia às cooperativas rurais mistas. Atra-vés das organizações cooperativas, seria prestada assistênciatécnica aos agricultores, especialmente quanto à mecanizaçãoe conservação de solos. A produção de semente de milho híbri-do, para fornecimento às cooperativas de produtores, igualmen-te, foi completada nesse programa.

2. Racionalização do Abastecimento AlimentarO abastecimento alimentar no Nordeste tem sido motivo

de considerável preocupação da SUDENE. No seu diagnósticopreliminar ficou evidenciada a existência de dois aspectos fun-damentais para a abordagem do problema: as questõesatinentes à produção agrícola propriamente dita e as deficiên-cias do processo de comercialização. O primeiro aspecto já foidevidamente focalizado em comentários anteriores.

Quanto ao problema da racionalização do abastecimento,que corresponde ao segundo item, referido para fins opera-cionais, foi equacionado levando em consideração sobretudo ospontos a seguir indicados:1. Investimentos de infra-estrutura em armazéns, silos e cen-

trais de abastecimento.2. Constituição de estoques alimentares de emergência, para

regularizar o mercado desses produtos quando da ocorrên-cia de crises na sua oferta.

Poucas modificações têm sido introduzidas quanto à formade considerar este problema nos três planos diretores da SUDENE.Tal procedimento, aliás, deve ser considerado como positivo, pois

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 105indica uma concordância de opinião dos diversos técnicos quetêm examinado o assunto em época e sob condições diferentes.

Não obstante, vêm sendo realizadas coletas de informa-ções e pesquisas tendentes a formar uma base de informaçõescomplementares, capazes de permitir uma revisão do diagnósti-co inicial. Merecem destaque especial os trabalhos sobre abaste-cimento alimentar das principais cidades do Nordeste: oslevantamentos de custos de produção de algumas lavouras, a fimde possibilitarem a formulação de uma política de preços míni-mos mais compatíveis com a realidade regional e as pesquisassobre conservação de alimentos, com o objetivo de determinar omelhor tipo de ensilagem para os mesmos; a organização de umsistema de informações de mercado, preços, etc.

Em resumo, o aspecto fundamental da linha de atuaçãoda SUDENE nesse campo é o que diz respeito às iniciativas per-tinentes ao estabelecimento de uma infra-estrutura para o abas-tecimento. Grande parte das dificuldades atualmente existentesno campo da oferta de alimento são decorrentes, de fato, de umainadequada utilização ou inexistência de armazéns, silos, mer-cados, etc., através dos quais se possa processar um fluxo decomercialização normal. É verdade que, paralelamente à implan-tação de novos serviços, deve ser dada atenção ao problema dosequipamentos de estocagem já existentes e que se encontramsem utilização, na maioria das vezes devido à falta de algunsserviços de engenharia ou complementação de instalações dealguns poucos equipamentos.

Mais recentemente, a Secretaria Executiva da SUDENE ela-borou um plano, aprovado pelo Conselho Executivo, queobjetivava o financiamento de armazéns e silos às cooperativasde produção, para repasse ao pequeno e médio produtor. Outrafrente é a racionalização do abastecimento ao nível do consumi-dor, construindo centrais de abastecimento nos grandes centrosurbanos e mercados nas principais cidades da Região.

A execução de um programa de desenvolvimento em umaregião do tipo da nordestina deve levar em conta seriamente osproblemas de comercialização.

O êxito de medidas adotadas com o objetivo de modificar ascondições tecnológicas da produção poderão não alcançar os resul-

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS106tados esperados se não forem providenciadas medidas que possibi-litem uma organização eficaz da sua distribuição para os centros deconsumo. Ademais, é indispensável que haja um conhecimento ade-quado do mercado, a fim de precisar que produtos e variedadesdevem ser cultivadas. Os custos de comercialização podem anular orendimento conquistado no tocante à produção.

Não conta o Nordeste com uma estrutura capaz de mani-pular eficazmente a produção agrícola. São muito elevados osdesperdícios e os prejuízos correspondentes. Assim, seria con-veniente a adoção de programas que objetivassem atacar esteproblema, não só no que diz respeito às instalações físicas, mastambém aos métodos e estrutura desta.

3. O Desenvolvimento da Cultura AlgodoeiraA importância da cultura algodoeira na economia nordesti-

na não decorre unicamente de sua participação na formação doproduto bruto da agricultura regional, assim como, dos contingen-tes populacionais que emprega em sua lavoura, mas, sobretudo,da capacidade multiplicadora que exerce através das usinas debeneficiamento, de industrialização da semente, destinada à pro-dução de óleos e da torta para o gado, da indústria de fiação, têxtile uma infindável cadeia de atividades dependentes tanto no Nor-deste, como em outras áreas do país e do exterior.

Apesar de se tratar de uma cultura tradicional, pouco pro-gresso tem surgido quanto à sua produtividade que, aliás, é dasmais baixas do país. Dos conhecimentos existentes e das pes-quisas realizadas na Região, concluiu-se que a produção de al-godão poderia ser melhorada, quantitativa e qualitativamente,através da adoção dos seguintes programas:1. Instalação de campos de multiplicação, a fim de tornar auto-

suficiente o Nordeste em sementes selecionadas de algodãoarbóreo e herbáceo.

2. Realizar melhoramentos genéticos que visem a elevação dosrendimentos agrícolas e industriais do algodão mocó.

3. Introdução de sementes selecionadas e métodos culturais.4. Organização, coordenação e supervisão dos órgãos públicos e

cooperativas vinculadas à cultura algodoeira do Nordeste.

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 107Algumas das providências acima sugeridas, como sejam,

a multiplicação de sementes, o combate às pragas, as campa-nhas de espaçamento, etc., poderiam ser postas em prática acurto prazo, enquanto medidas que visem ao melhoramento doalgodoeiro arbóreo, dada a própria natureza da cultura, somen-te seriam satisfeitas a médio e longo prazo.

4. Melhoramento da Pecuária Do NordesteA justificativa preparada pela SUDENE, atinente ao pro-

grama de melhoramento da pecuária, ressalta que a expansãodesse setor é essencial ao desenvolvimento do Nordeste, não sódevido à sua natural importância dentre as atividades econômi-cas da área, e como, principalmente, tendo em vista que a carneé a fonte principal de suprimento de proteínas na dieta alimen-tar da população regional.

O programa sobre esse setor tem por objetivo básico a redu-ção da dependência existente em relação a outros mercados e/ouà consecução da auto-suficiência da Região no abastecimento decarnes. A concretização desse intento será atingida não só atravésdo aumento do número de cabeças, mas, principalmente, pelo au-mento médio de peso médio das carcaças. Como medida de longoprazo, foi previsto o melhoramento genético do rebanho bovino notocante também à sua precocidade e aptidão leiteira.

Reconheceu o referido programa que o fator limitante paraa expansão da pecuária regional tem sido a escassez de alimen-tação adequada, cuja oferta às vezes não é suficiente para man-ter o rebanho, mesmo nas condições atuais. Por isso, o Planocontempla, de modo relevante, os aspectos referentes ao me-lhor aproveitamento dos recursos naturais das áreas onde a pe-cuária é atividade predominante, ou as que possam serexploradas com esse objetivo.

5. Reflorestamento e FruticulturaA primeira fase do programa de reflorestamento do Nor-

deste será realizada nas margens das estradas federais. Os tra-balhos previstos incluem a formação de uma equipe adestrada

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS108em reflorestante (e fruticultura), a formação educativa da popu-lação, o aumento da oferta de mudas, a identificação das causasdo desaparecimento das reservas florestais, etc.

Quanto à fruticultura, foram selecionadas como áreas deatuação as faixas úmidas e semi-úmidas do Nordeste, onde se-rão plantados principalmente cajueiros, umbuzeiros, cajazeiros,jaqueiras e outras espécies.

Nas zonas serranas, onde a cultura do café se encontraem decadência econômica, pretende-se difundir a cultura dabananeira e de frutas cítricas. Nas regiões mais baixas, de for-mação arenosa, será efetuado o plantio de culturas tropicais,isto é, cajá, manga, abacate, jenipapo, maracujá, etc.

Inicialmente, serão instalados viveiros para produzir semen-tes e mudas nas estações experimentais federais e estaduais.

6. Pesquisas E Experimentação AgronômicasO emprego de modernas técnicas agropecuárias depen-

de fundamentalmente de um suporte de pesquisas e experi-mentação agronômicas capaz de orientar os técnicos eagricultores na sua adequada adoção.

De fato, muitos programas de melhoria da agriculturanordestina tem sido protelados ou apenas conseguiram resulta-dos desprezíveis devido a esse fator. Evidentemente, apesar dosresultados já alcançados pelas estações experimentais da re-gião, praticamente tudo ainda está para ser feito, caso se obser-ve o problema no seu contexto mais amplo.

As limitações existentes quanto à expansão de áreas agri-cultáveis no Nordeste, porém, poderão desaparecer se os recursospotenciais da Região forem explorados de modo rentável. O progra-ma da SUDENE, pertinente ao assunto, por exemplo, relaciona asseguintes áreas carentes de pesquisas para o seu aproveitamento.

1.000 haPlanícies costeiras 6.000Sedimentais do cretáceo 27.000Siluriano e devoniano 14.700

Além das áreas acima mencionadas, merecem referênciaespecial os 3 milhões de hectares de tabuleiros, situados nas

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 109zonas úmidas de uma faixa que vai do Ceará até o Estado deAlagoas, cuja proximidade dos centros urbanos mais importan-tes os tornam altamente promissores.

O programa organizado pela SUDENE, quanto a esse as-sunto, foi esquematizado de acordo com a seguinte distribuição:1. Aproveitamento dos tabuleiros, planícies costeiras, áreas do

devoniano, siluriano e sedimentares do cretáceo e restaura-ção de silos das regiões úmidas e subúmidas do Nordeste.

2. Inventário agronômico e expansão da pesquisa e experimen-tação do dimensionamento dos modernos métodos agro-pecuários do Nordeste.

3. Inventário das principais pragas e doenças e estudo dos res-pectivos meios de controle.

4. Estudo consultivo da água na cultura da cana-de-açúcar einvestigação dos distintos sistemas de irrigação e possibili-dade de drenagem e de diversificação da produção agro-pecuária da zona úmida do Nordeste, com ênfase nas culturasalimentícias de engorda de gado leiteiro.

5. Desenvolvimento da cultura do coqueiro no Nordeste.

7. Irrigação no Submédio São Francisco

A instabilidade das ofertas de alimentos e de matérias-pri-mas para a indústria tem sido historicamente a característica do-minante da agricultura nordestina. Em decorrência, é comumentepreconizada como solução para o problema a utilização da irriga-ção, que vem apresentando resultados indiscutivelmente surpre-endentes em outras regiões do mundo que sofrem irregularidadespluviométricas semelhantes às do Nordeste.

O programa de reestruturação da economia agropecuária,da SUDENE, contempla com prioridade a implantação de umaagricultura irrigada, onde as condições de solo e oferta dáguasejam adequadas. Tendo em vista, porém, a falta de experiênciano Nordeste, neste campo, sugeriu-se que, inicialmente, fossemlevantados dados básicos, realizados estudos e precedidos ex-perimentos cujos resultados permitissem a implantação de pro-gramas factíveis e de sucesso garantido.

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS110A região do Submédio São Francisco foi escolhida para

início das referidas experiências e, posteriormente, para desen-volvimento da imigração em larga escala. Este programa, queteve início em 1961, conta com a cooperação do Fundo Especialdas Nações Unidas, através da FAO (Organização de Alimenta-ção e Agricultura).

Dentre os trabalhos e estudos já realizados, destaca-se olevantamento das características de solo em 2.500 mil ha. Inicial-mente foram identificados, em decorrência de tais estudos, que160 mil ha citados detêm potencialidades de irrigação boas e 350mil ha com potencialidade sofrível. Foram efetivados estudoshidrológicos e meteorológicos no curso do rio e dos seus princi-pais tributários, objetivando caracterizar as disponibilidades deágua e condições climáticas das zonas a serem beneficiadas comprogramas de irrigação. As pesquisas agronômicas, tanto as rea-lizadas em canteiros, na �caatinga�, como nas estações experi-mentais, também visam a determinação da capacidade produtivada terra, sua reação quando submetida à irrigação e as necessi-dades de água das plantas a serem cultivadas. Os aspectos eco-nômicos do problema não foram descurados. Está sendo realizada,paralelamente aos demais estudos, análise econômica dos fato-res que influem no custo operacional, em confronto com os bene-fícios decorrentes.

Dos estudos realizados e da experiência obtida, tornou-serecomendável a implantação de um projeto-piloto de irrigaçãoque funcionasse como modelo experimental numa área de 4.000mil ha. O Conselho Deliberativo da SUDENE aprovou o estabele-cimento do referido projeto em sua reunião de 04.10.1961.

Dentre as providências programadas no tocante a esseprojeto, consta a continuação dos estudos já iniciados, a conclu-são de duas estações experimentais no município de Petrolina(solos latosólicos) e Juazeiro (solos grumusólicos) e anteproje-tos de engenharia de distribuição de água nas áreas a serembeneficiadas com irrigação.

No que diz respeito ao laboratório vivo de irrigação, estãosendo feitos levantamentos topográficos detalhados, além deinstalações de bombeamento, desmatamentos e preparo de so-los a serem cultivados, construção de escolas, etc.

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 1118. Projeto de Povoamento do Maranhão

Ainda com vista à expansão do setor agrícola do Nordes-te, a SUDENE elaborou os Projetos Integrados de Povoamento doMaranhão. Referidos projetos almejam deslocar a fronteira agrí-cola da Região, integrando em sua economia uma vasta áreadesocupada daquele Estado, ou cujo aproveitamento vinha sen-do realizado de forma predatória.

Desde o primeiro plano diretor que se atribui a esse projetode colonização um papel relevante, pois há, por parte dos técni-cos da SUDENE, a convicção de que o aproveitamento, em formaracional, dos recursos de solos, acoplado com assistência técni-ca, financeira, médica, sanitária e educacional à populaçãoradicada ou a ser estabelecida nessa região, apresentará comoresultante o surgimento de uma economia agropecuária produti-va e estável, capaz de suprir adequadamente uma larga faixa dasnecessidades de alimentos e matérias-primas do Nordeste.

A Secretaria Executiva da SUDENE, através do seu GrupoInterdepartamental de Povoamento do Maranhão (GIPM), vemrealizando, a partir de 1962, um apreciável trabalho de implanta-ção das medidas tentantes a oferecer as condições necessáriasao funcionamento do projeto. Assim, tem sido feitos estudos deagrologia, hidrologia, prospecções florestais, serviços assisten-ciais às populações já existentes, etc. Consideráveis somas derecursos já foram aplicadas no estabelecimento dos serviços deapoio ao projeto, isto é, serviço rádio, campos de pouso, de multi-plicação de sementes, alojamentos, oficinas mecânicas, comprade aviões, instalação de geradores, etc.

A delimitação da área escolhida para o projeto em refe-rência tem a forma de um polígono irregular, com 30.000km, si-tuada na região noroeste do Maranhão.

Os aspectos locacionais dominantes para a seleção dessaárea foram as disponibilidades de terras do domínio público e aseconomias externas representadas pela estrada BR-222 e os riosPindaré e Turiaçu. O sistema pluviométrico da área é normal, com2.000mm, em cerca de 180 a 200 dias por ano. A região constitui-senos limites da atual fronteira agrícola, com possibilidades de alar-

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS112gamento desta. Conta, na época da escolha, com uma populaçãode 40.000 habitantes, inteiramente entregues à própria sorte, emvias de se transformarem em sério problema social.

A construção da BR-222 tem-se constituído um excelente fa-tor de atração para as correntes migratórias providas das zonas semi-áridas do Nordeste, onde as oportunidades de emprego sãoinsuficientes para absorver uma expansão demográfica acelerada.

A população que se traslada para essa área e a que já seencontra aí radicada espelham condições de extrema pobreza.O estado de subnutrição prevalece em largas camadas da popu-lação e de condições econômicas. A malária, tracoma, verminose,tuberculose, lepra e outras doenças típicas de áreas paupérri-mas grassam em caráter endêmico.

9. Desenvolvimento Integrado do Vale do Jaguaribe

A bacia do rio Jaguaribe abrange mais da metade do ter-ritório cearense. Existe nesta região um potencial de solos agrí-colas subexplorados, o qual, segundo documentos da SUDENE,através de um sistema racional de irrigação dos seus 250 milhectares de aluviões mais favoráveis, poderá produzir mais doque os 900 mil hectares de terras não aluviais atualmente culti-vados no Nordeste.

O rebanho bovino do Vale, que representa 68% do rebanhodo Estado, poderá ser duplicado com uma assistência adequada.A produção de artefatos de palha de carnaúba, de redes e debordados pode ser incrementada substancialmente comocomplementação às atividades agrícolas. Desse modo, a SUDENEdefiniu como objetivos para o desenvolvimento desse Vale �im-plantar um programa integrado de valorização da Bacia doJaguaribe que visa ao aproveitamento dos recursos naturais desuperfície e subsolo, de desenvolvimento da agropecuária, esta-belecimento de pequenas e médias indústrias, aperfeiçoamentodo fator humano e reforço das instituições sociais�.

A primeira etapa desse programa, que consiste no estudodetalhado dos aspectos econômicos e sociais, já se encontraconcluído (1) enquanto as pesquisas de caráter físico estão sen-

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 113do realizadas por técnicos franceses e nacionais. A exploraçãodessa região, quando da implantação dos programas, será efe-tuada através de um convênio entre a SUDENE, o Estado doCeará e o governo francês, cuja cooperação se encontra fixadapara o período que vai até abril de 1969.

10. Outros Programas de Interesse para a AgriculturaO problema agropecuário não pode ser visto isoladamen-

te, desde que guarda estreitas vinculações com muitos setoresde atividades. Um dos principais problemas no estabelecimen-to de metas de desenvolvimento agrícola repousa sobre as dis-ponibilidades dos recursos naturais ou, no caso específico doNordeste, nas disponibilidades da oferta de água e terrasagricultáveis. Na formulação de programas agrícolas, é comumo dispêndio de volumosas somas em outros setores da economiaa fim de proporcionar as bases sobre as quais haverá de se esta-belecerem os programas agrícolas propriamente.

Por conseguinte, convém examinar outros programas con-templados no Plano Diretor, com vista a assegurar o cumpri-mento dos objetivos especificados para agricultura.

1. Recursos naturaisO III Plano Diretor acentua a importância do estudo dos recur-

sos naturais, aspecto, aliás, já previsto nos demais planos diretores.O planejamento de uma região depende, evidentemente, do poten-cial de desenvolvimento, de seus recursos naturais, etc.

A abordagem inicial para o tratamento desse problema re-pousa na efetivação de pré-investimentos ligados aos recursosnaturais, como sejam: cobertura cartográfica do Nordeste, a fim defacilitar a efetivação de estudos no que se relaciona à localizaçãoagrícola, industrial, urbana e de estradas; levantamentofotointerpretativo básico da região das pesquisas tendentes aoaproveitamento de recursos minerais e vegetais, destinados às in-dústrias e à exportação; pesquisas hidrogeológicas que visam odimensionamento dos recursos de água subterrânea da Região;estudo dos solos a fim de organizar uma carta dos solos e permitir oestabelecimento de prioridades para o aproveitamento de áreas

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS114destinadas à agricultura; estudos das bacias de irrigação, com vis-tas ao seu potencial energético e agrícola além de pesquisashidrológicas sistemáticas básicas.

2. Ensino agrícolaA orientação da SUDENE, quanto ao aspecto educacio-

nal, abrange inúmeras facetas, dentre as quais o ensino agríco-la profissional, de interesse para o presente documento.

No Nordeste é notória a escassez de pessoal de nível mé-dio para o setor agrícola, motivo pelo qual, no III Plano Diretor,foram previstas medidas capazes de atenuar tal déficit. Assim éque se estabeleceu como meta a ampliação e o reequipamentode 10 colégios agrícolas, efetivar a construção e equipamentode 20 unidades, além de reequipamento de outros 20, assegu-rando a todos esses estabelecimentos condições para integralfuncionamento. Foi idealizada também a construção e equipa-mento de um Instituto de Educação Técnica, que formará e trei-nará professores destinados ao magistério das escolas agrícolas.

VI. A Política de Incentivos a Agropecuária Nordestina

O Conselho Deliberativo da SUDENE, reunido em Salva-dor no dia 1º de setembro de 1965, aprovou uma resolução es-tendendo as vantagens da legislação de incentivos fiscais efinanceiros ao setor agropecuário, até então apenas facultado àindústria, segundo os artigos 34/18, constantes do I e II PlanosDiretores da SUDENE.

Os objetivos gerais estabelecidos na citada Resolução sãoos seguintes:1. Obter a plena incorporação do setor agrícola regional ao pro-

cesso de desenvolvimento nacional.2. Atender à demanda crescente de produtos alimentícios de

primeira necessidade e de matérias-primas básicas conside-radas essenciais para o desenvolvimento do Nordeste.

3. Contribuir para a eliminação dos aspectos negativos da es-trutura agrária da Região.

Os referidos incentivos tanto poderão ser proporciona-

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 115dos às empresas agropecuárias já estabelecidas, como àquelasque venham a se estabelecer na Região. Os critérios de priorida-de que orientarão a escolha dos projetos que devam receber taisfavores são os seguintes:1. Projetos que se proponham substituir importações do exteri-

or ou de outras regiões do país.2. Projetos de colonização ou recolonização, que envolvam for-

mas de exploração da terra e de organização agrária, social eeconomicamente mais adequadas às diversas áreas, segun-do os critérios estabelecidos pela SUDENE.

3. Projetos que se proponham diversificar a produção em zonasmonocultoras, de produto considerado gravoso para a eco-nomia nacional.

4. Projetos cuja combinação de fatores se caracterize pela maioroferta relativa de empregos permanentes à mão-de-obra agrí-cola.

5. Projetos que se proponham produzir alimentos consideradosessenciais e de demanda insatisfeita para o abastecimentodos centros urbanos regionais.

6. Projetos que impliquem defesa do solo, reflorestamento ou outrasformas de renovação ou conservação dos recursos naturais.

7. Projetos que impliquem melhor aproveitamento dágua parafins agrícolas, especialmente por meio de construção de bar-ragens, poços e sistemas de irrigação e drenagem.

8. Projetos de exploração agropecuária em áreas onde a Uniãoou os Estados hajam realizado trabalhos de pesquisa, levan-tamento e quantificação de recursos naturais, ou obras deaçudagem, irrigação e drenagem que se enquadrem nos pro-gramas porventura existentes para as referidas áreas.

9. Projetos agropecuários que visem um melhor aproveitamen-to de áreas subutilizadas pela introdução de espécies ani-mais ou vegetais técnicas e economicamente adequadas àsreferidas áreas.

Além dos requisitos enumerados acima, para que os proje-tos agropecuários possam contar com as vantagens pertinentesà Resolução 1.829 da SUDENE torna-se necessário que sejam, emúltima instância, compatíveis com as políticas estabelecidas nos

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS116programas de desenvolvimento regional e com o setor agrícola,de modo particular. Desse modo, aqueles projetos que resultamem aumento de produção de bens considerados gravosos para aeconomia nacional não receberão incentivos.

De igual modo, não se enquadrarão na referida Resoluçãoos projetos que resultem em pressão inadequada do balanço depagamentos do país, especialmente quanto à importação deequipamentos que a indústria nacional tenha capacidade deproduzir convenientemente, ou outras modalidades de instru-mentos cuja recombinação de fatores existentes no país tornamdispensáveis tais aquisições. Mesmo nos casos em que seja ne-cessário efetuar importações de equipamentos, somente aque-les projetos que não excedam em pagamentos anuais aimportância de US$ 30.000, quer se trate de modalidades à vistaou parcelada.

Em resumo, merecerão acolhida, por parte da SUDENE,todos os projetos agropecuários que sejam considerados essen-ciais para o desenvolvimento econômico do Nordeste, excluí-dos aqueles cujos investimentos resultem num custo socialelevado em relação aos benefícios que poderiam oferecer.

VII. Esquema dos Recursos do III Plano DiretorOs recursos previstos no III Plano Diretor para serem apli-

cados no Nordeste (1), durante o triênio de 1966/1968, montam aCr$ 3.864 bilhões, a preços de 1966, dos quais 85% correspondemao esforço interno de poupanças. A parcela restante será provi-da por recursos de origem externa.

Dos Cr$ 3.315 bilhões de origem nacional, cerca de 60%correspondem à participação do setor público, isto é, da União,estados e municípios, correspondendo à percentagem restanteao setor privado, o qual empregará, dos Cr$ 1.380 bilhões, apro-ximadamente 70% em atividades industriais e 30% nos setoresserviços e agricultura.

É importante distinguir que apenas Cr$ 744.920 milhões,ou seja, 19% dos recursos totais referidos acima caberão àSUDENE e por ela serão administrados. Os demais recursos ape-nas receberão influência direta por parte da SUDENE.

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 117Comentando sobre o assunto o III Plano Diretor afirma: �...

o que se pretendeu assegurar foi seu caráter de órgão de plane-jamento e de coordenação, descentralizando ao máximo, em fa-vor de estruturas técnicas e administrativas regionais eestaduais, as tarefas executivas e de aplicação dos recursos�.

1. Resumo da Distribuição Setorial dos Recursos da SudeneA alocação de recursos constantes do III Plano canalizou

para o setor agricultura e abastecimento a importância de Cr$ 96bilhões para o triênio, correspondendo tal cifra a 12,9% do volumetotal a ser aplicado em todos os setores. A distribuição anual pro-gramada consigna para o ano de 1966 a aplicação de Cr$ 18 bi-lhões, para 1967, o montante de Cr$ 32 bilhões e para o último anodo período, isto é, 1968, a importância de Cr$ 46 bilhões.Percentualmente, a posição do setor agrícola não sofre substancialmodificação, como pode aparentar o exame da evolução das im-portâncias absolutas. De fato, as aplicações na agricultura e abas-tecimento corresponderão em 1966, a 12,5 do total geral, passandono ano seguinte, para 12,8 e, em 1968, atingirão somente a 13,2.Comparativamente, porém, com o II Plano Diretor, foi um dos seto-res que sofreram maior incremento na sua posição relativa.

Além dos recursos enumerados acima, a serem aplicadosdiretamente na agricultura e abastecimento, devem ser acres-cidos outros investimentos que, apesar de haverem sido classi-ficados nos itens de recursos naturais e programas especiais,estão intimamente relacionados com a agricultura, como já foicomentado em outra parte deste documento, e que pode serobservado através da discriminação dos recursos por ativida-des, constante das tabelas seguintes.

O total de investimentos especificados para recursos na-turais, no triênio, foi da ordem de Cr$ 55 bilhões e, para programasespeciais, Cr$ 45 bilhões, isto é, 7,4% e 5,8%, respectivamente,dos recursos totais do Plano.

Este raciocínio nos leva à conclusão de que a agriculturaserá favorecida direta e indiretamente no III Plano Diretor com Cr$194 bilhões, representando em termos relativos, 26% de todos osrecursos constantes do programa de investimento da SUDENE.

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS1182. Investimentos na Agricultura e Setores Correlatos

Consoante foi discutido no item anterior, consideraram-se como parte integrante do programa de investimentos do se-tor agrícola tanto os recursos subordinados à classificação deagricultura e abastecimento, como aqueles pertinentes aos re-cursos naturais e programas especiais. Por esse motivo, encon-tram-se, a seguir indicados, os referidos recursos, além dosdestinados exclusivamente à agricultura.

I � Agricultura e abastecimento

II � Programas Especiais

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QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 119III � Recursos Naturais

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120

TERCEIRA PARTE:CONSIDERAÇÕES À MARGEM DO III PLANO DIRETOR DA SUDENE

Os presentes comentários não devem ser consideradoscomo opiniões definitivas do autor. Seria estranho pretender fi-xar pontos de vista sobre um assunto como o do desenvolvimentoagrícola do Nor-deste, referente ao qual ainda não foram realiza-dos estudos abrangendo toda a dimensão do problema.

O que se pretende, com as idéias expostas a seguir, é le-vantar alguns pontos que comumente são negligenciados quan-do do exame das questões pertinentes ao planejamento daeconomia regional, especialmente, no que se relaciona com aagricultura.

1. Diagnóstico da Economia Agrícola do Nordeste

O esforço da SUDENE para cobrir as múltiplas frentes detrabalho, estabelecidas no III Plano Diretor, será bastante preju-dicado em vista da falta de critérios de prioridade que identifi-quem com certo rigor a ênfase a ser atribuída na execução decada atividade. Poder-se-ia, além disso, levantar dúvidas sobrea exclusão de certos programas que forem preteridos por forçada inexistência de um instrumento seletivo que os identificassecomo importantes.

Procedimento dessa natureza, quando da elaboração do IPlano Diretor, seria perfeitamente compreensível, mas suainstitucionalização nos demais planos corresponderia a umademonstração da falta de progresso nos métodos e técnicas deplanejamento.

Uma medida cônscia e inteligente foi inegavelmente ainclusão no III Plano Diretor de um projeto de pesquisa denomi-nado de Análise da Estrutura e Funcionamento do Setor Primá-rio, cuja justificativa afirma a certa altura: �as pesquisas atéagora realizadas, no âmbito da SUDENE, têm fornecido informa-ções esparsas e assistemáticas, das quais resultam em diagnós-ticos carentes de rigor específico�.

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 121O enfoque de programação setorial, preconizado no III Pla-

no Diretor da SUDENE para a agricultura, carece também de ummelhor exame. Segundo os métodos mais modernos de planeja-mento, o fomento agrícola não se pode fazer independentementeda programação geral. O processo de planejamento é irrealizável,em termos de resultados, a menos que se tenham em conta todosos aspectos de desenvolvimento, é o que afirmam os técnicos detodas as partes do mundo onde a planificação apresenta êxito. Aprogramação agrícola somente poderia ser considerada isolada-mente como uma primeira fase do planejamento, o que não é o casoda SUDENE, já executando o seu terceiro Plano Diretor.

Resta ainda considerar que o papel da programação agrí-cola, neste caso, é fazer com que o fomento da agricultura sejasuficientemente reconhecido no plano geral e que se preveja epermita um adequado equilíbrio dinâmico com todos os demaissetores. Para tanto, torna-se necessário estudar:a) As prováveis reações perante alterações previstas em outros

setores da economia e do exterior.b) A demanda, presente e futura, de produtos alimentícios e

matérias-primas agrícolas.c) Os hábitos de consumo e a influência na demanda de produ-

tos agrícolas, em decorrência de uma mudança na renda ounos níveis nutricionais.

d) As medidas que poderiam ser adotadas para acelerar o cres-cimento da produção per capita do setor, quanto à oferta enecessidade de recursos e organização.

Enfim, a programação agrícola dificilmente resultará embenefícios adequados sem a consideração deste e de outros pro-blemas conexos, cuja solução implica necessariamente um pla-nejamento global.

2. Planejamento e Execução

A idéia de planejamento não deve ser considerada como algoseparado da ação. Planejar e executar é um processo único, ambosconstituindo partes integrantes de uma só responsabilidade.

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS122A finalidade da SUDENE, conforme foi idealizada, deveria

ser desenvolver o Nordeste e não apenas fazer planos, os quaispodem existir sem que ocorra o desenvolvimento almejado. ASUDENE deve ser responsável não apenas pelos planos, mas pe-los RESULTADOS. Fazer planos pode tornar-se apenas uma erudi-ção estéril, caso não venha a se tornar realidade, como geralmenteocorre nas regiões subdesenvolvidas onde prevalece a inoperânciae a falta de organização das entidades executivas.

O que se tem verificado no Nordeste e em outras regiõesdo mundo, onde se pretende fazer desenvolvimento econômico,é tentar transferir responsabilidades no que se relaciona com omais difícil dos problemas, isto é, a execução. Por seu turno, asentidades executivas, sem estrutura e capacidade necessáriaspara a implementação de complexos projetos, em reverso, atri-buem a falta de cumprimento das tarefas à inadequabilidade doplanejamento.

Neste particular, aliás, vem-se atribuindo ultimamente umpapel apenas limitado à SUDENE, qual seja, o de órgão deplanejamento e coordenação, objetivando com tal orientaçãodescentralizar ao máximo, em favor de estruturas técnicas e ad-ministrativas regionais e estaduais, as tarefas executivas e deaplicação de recursos.

Não obstante, a Lei 3.692, de 15 de novembro de 1959, quecriou a SUDENE, destacou como uma das suas finalidades �exe-cutar diretamente ou mediante convênio, acordo ou contrato,os projetos relativos ao desenvolvimento do Nordeste que lheforem atribuídos, nos termos da legislação em vigor�.

A combinação adequada dessas responsabilidades é quedeve ser a orientação mais recomendável, pois certos progra-mas estarão destinados a um irreparável fracasso, caso sua exe-cução seja delegada aos órgãos que possuem responsabilidadelegal para implementá-lo.

3. Agricultura versus IndústriaDentre as diversas maneiras de conceituar o desenvolvi-

mento econômico seria possível considerá-lo como sendo umprocesso de constante aperfeiçoamento do sistema de aproveita-

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 123mento dos recursos escassos para satisfazer, em maior escala, ascrescentes e sempre renovadas necessidades humanas. Tal pro-cesso é identificado comumente através da elevação da rendaper capita, a qual traz implícita referidas transformações.

A história econômica nos mostra que, para atingir esse re-sultado, é necessário acumular uma crescente quantidade de benspara fins produtivos. Para sua consecução se torna indispensávela realização de um trabalho cujo produto não seja consumidoimediatamente, senão destinado a reduzir o esforço futuro na pro-dução de bens, isto é, a formação de capital exige a obtenção deum �excedente� da produção sobre o consumo.

O problema vital para a conquista do desenvolvimento, por-tanto, é saber de qual setor se retirará esse �excedente�. No Nordes-te, e em muitas outras regiões do mundo, tem sido o setor agrícola ofornecedor interno dos recursos para o desenvolvimento das demaisatividades econômicas. Evidentemente, nas fases iniciais do desen-volvimento, quase toda a formação de capital procede da agricultu-ra. É necessário, por isso, dedicar-lhe especial atenção e nãosacrificá-la inutilmente, promovendo indústrias de todas as classes,algumas sem futuro nem base econômica alguma.

Não se sugere, de modo algum, o fomento agrícola àsexpensas da indústria. Na verdade, a industrialização possui rele-vante importância no desenvolvimento econômico geral e tam-bém como fator essencial para o próprio desenvolvimento agrícola.

A diretriz mais consentânea é a de um desenvolvimentoequilibrado dos setores agrícola e industrial. A agricultura deveproporcionar alimentos e matérias-primas para os outros seto-res da economia, enquanto é a demanda dos demais setores queconstitui o principal estímulo para o desenvolvimento agrícola.Naturalmente que o processo de industrialização exige não sóum complexo de matérias-primas e fábricas mutuamente relaci-onadas, senão também um extenso sistema de fornecimento deenergia elétrica, de transporte, de serviços comerciais, etc. Poroutro lado, para estimular a vida rural tradicional do Nordeste,nenhum instrumento é mais poderoso que a extensão dessainfra-estrutura ao campo. Assim, os investimentos que se con-sagram a indústria e outros campos relacionados podem signifi-car benefícios indiretos para a agricultura.

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS124Outra missão preponderante da agricultura é fornecer mão-

de-obra e matérias-primas à indústria e alimentos para a popula-ção, além de ser uma fonte de formação de capital e contribuirpara a criação de divisas essenciais às importações de equipa-mentos e insumos para a indústria. Ademais, é necessário criarfontes de trabalho fora da agricultura, para que se aumente ademanda por produtos desse setor. Existe, também, outra pode-rosa razão para isso. Os demógrafos estão de acordo em que ataxa de natalidade e, portanto, o aumento da população, estãoem proporção direta ao número de habitantes no quadro rural.Entre outros fatores, à medida que aumenta a renda da popula-ção e os níveis educacionais e de saúde, torna-se menor a taxa denatalidade, a qual tem sido a determinante da taxa de crescimen-to da população. Por conseguinte, a solução do problema deno-minado �explosão demográfica� tem suas raízes ligadasintimamente à solução do problema agrário.

Por fim, o desenvolvimento econômico é um processo noqual incidem inumeráveis fatores. Como entre estes são prepon-derantes, no Nordeste, a agricultura e a indústria, pode assegu-rar-se que o progresso de um setor depende do outro, razão porque não será adequado tentar resolver os problemas desses doissetores através de planejamento e medidas independentes.

4. Aperfeiçoamento Tecnológico da Agricultura

Estudos realizados evidenciam que os principais centrosurbanos da região sofrem uma relativa escassez de gêneros ali-mentícios para consumo de suas populações.

Tal fato teria feito com que os preços dos produtos bási-cos da alimentação humana se comportassem em crescente ele-vação, mesmo deduzindo os efeitos do processo inflacionárioque se manifestou no período.

Resultados de pesquisas do BNB e SUDENE, ademais, re-velam que mesmo nos centros urbanos mais importantes daRegião (Fortaleza, São Luís, Campina Grande, Salvador e Reci-fe), a população despende uma média de 45 a 70% de sua rendatotal com a aquisição de gêneros alimentícios, em que predomi-

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE II � QUESTÕES ECONÔMICAS 125nam a farinha, o arroz e o feijão, figurando a carne na dieta ali-mentar em pequena proporção, assim como outros produtosprotéicos denominados de nobre.

Incrementos da produção agrícola do Nordeste, portanto,são necessários para aumentar os níveis de renda e de consumoda população rural e dos demais setores. Duas modalidades sãosugeridas nos planos diretores da SUDENE para a concretizaçãodesse objetivo: aumentar a produção agrícola através do cultivode terras adicionais, as quais, evidentemente são escassas noNordeste e somente por meio de pesados investimentos podemtornar-se disponíveis, ou aumentar a produção por meio do acrés-cimo da produtividade por hectare das colheitas.

Quanto a este último aspecto, há um background muitodesfavorável para a sua concretização, pois muito pouco seconhece sobre as formas exatas pelas quais a defeituosa agri-cultura do Nordeste. Em muitas regiões, nem sequer os cien-tistas estudaram ou descobriram o que os agricultores devemfazer para o aumento da produtividade, comparativamente comos recursos existentes. Noutros casos, métodos teóricos exis-tem, porém pouquíssimos experimentos têm sido executadoslevando-se em conta as possibilidades dos pequenos agricul-tores em aplicar tais processos ou vantagens econômicas. Defato, poucos são os resultados científicos práticos, mesmo as-sim apenas existentes nas estações experimentais, capazes deserem utilizados com possibilidades de êxito pelo tipo de agri-cultor da região.

Consequentemente, devido à inexistência do referido su-porte de trabalhos experimentais e práticos, um bom trabalhode extensão ainda não pode passar de uma fase muito tímida.Parte das responsabilidades por essa situação e a formação uni-lateral dos agrônomos em cuja formação os aspectos econômi-cos dos problemas agrícolas são muito negligenciados. Ademais,mesmo que recomendações alimentares fossem utilizadas paraa promoção de um serviço de extensão, subsistiria ainda o pro-blema de escassez de agrônomos para realizá-lo.

PARTE IIIPLANEJAMENTO ESTRATÉGICO

129

INTRODUÇÃO

Administrar é prever, é planejar; é organizar, co-mandar, coordenar e controlar.

HENRI FAYOL

Esta parte contém subsídios que orientavam asações prioritárias e estratégicas da Universidade Fede-ral do Ceará referentes ao período de 1991-95.

Convém ressaltar que a tarefa da Universidade deplanejar e controlar o seu destino depende muito de comoharmonizar os interesses dos três elementos da matrizinstitucional � professores, alunos e funcionários. De fato,é fundamental obter a conscientização e o engajamentoda comunidade e dos dirigentes, pois os planos não se re-alizam sem tal cooperação. A formulação e execução deum plano estratégico oferecem, também, uma excelenteoportunidade para a abertura de um fórum para o debatesobre as necessidades dos centros, departamentos e ou-tras unidades do quadro organizacional da instituição.

As proposições gerais de objetivos, políticas e estra-tégias de ações para 1991-95 já foram definidas prelimi-narmente pela superior administração atual da UFC. Hánecessidade, contudo, de mais discussão quanto à defini-ção da missão da Universidade, bem como da conveniên-cia de adaptar, reorientar ou fortalecer programas emexecução. Nesse sentido, deve-se buscar descobrir e apro-veitar oportunidades novas e, principalmente, resolver osproblemas atuais existentes nas áreas acadêmicas e ad-ministrativas, e prevenir a eclosão de dificuldades futuras.

O termo �estratégico�, usado no presente traba-lho, refere-se a uma metodologia de tomada de decisõese de administração utilizada para definir a direção quea Universidade deve seguir, diante dos recursos dispo-

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE III � PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO130níveis e da necessidade de adaptação da Instituição aomeio ambiente interno e externo.

Como explica Peter Druck: �O planejamento estra-tégico não pretende tomar decisões futuras, mas afuturidade das decisões.� Sua principal finalidade é ser-vir de guia aos administradores para fazer acontecer semperder de vista o conjunto.

O planejamento da ação da UFC, enfim, tem comoobjetivo melhorar o processo de decisão, cuidar das pri-oridades, coordenar e garantir os resultados esperados.

131

MODERNIZAÇÃO ADMINISTRATIVA DA UFC

A gerência estratégica é a gestão do futuro, tor-na-se crucial no mundo de hoje, em que o futu-ro se aproxima velozmente do presente.

PAULO ROBERTO MOTTA

A administração universitária deve ser considera-da um instrumento para canalizar a diversidade cultu-ral com vistas ao cumprimento da missão e objetivos dainstituição. Para isso, os administradores precisam mo-bilizar as sinergias para fazer funcionar produtivamenteo patrimônio cultural existente e assegurar o desenvol-vimento institucional.

A nova concepção de administração universitáriadeve-se preocupar mais com a manifestação das aspira-ções, crenças e valores da cultura institucional. Deve-se buscar a qualidade do trabalho realizado e não,apenas resultados mensuráveis da força de trabalho, quetem sido o critério exclusivo no sistema administrativoburocrático convencional. De fato, a produtividade doprofessor, do pesquisador e do estudante é fundamen-talmente uma questão de qualidade e não de quantidade.

O melhoramento da administração da UFC poderáser obtido pela adoção do sistema de gestão estratégicaem substituição à modalidade burocrática. Para tanto,há necessidade de promover a modernização organiza-cional da Instituição com o fito de obter uma administra-ção descentralizada e mais democrática. Objetivamente,torna-se essencial o fortalecimento da autonomia doscentros, faculdades, departamentos e coordenações decursos, com destinação de verbas de material de consu-mo específicas, serviços pessoais e serviços contratuaisde terceiros, conforme critérios técnicos e planosoperativos desses centros de custo.

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE III � PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO132Dentre outras ações complementares, seria vital a

organização de mecanismos adequados de comunicaçõesinternas � convencionais e informatizadas � de modo afazer com que as atividades da superior administraçãosejam conhecidas pela comunidade. Como parte dessesistema (SAU), deveria ser estabelecido um mecanismode proteção contra o abuso da burocracia subsistente,de modo que professores, funcionários, estudantes e ad-ministradores da Universidade tenham a quem direcionarsuas reclamações e obter solução para elas.

Enfim, deve-se reconhecer que muito foi realizadonos últimos anos, mas é necessário melhorar ainda mais aadministração e gestão da UFC. Para isso, é preciso afastartodos os impedimentos burocráticos e realizar mudançasde conteúdo, de metodologia e de estilo de administração.Na verdade, uma universidade jovem que avança no seucrescimento e complexidade enfrenta inevitavelmentedistorções que vão aparecendo ao longo da vida da insti-tuição. Entretanto, nenhuma organização pode suportar,para sempre, a existência de tais problemas.

Essa problemática não exige necessariamente quemudanças só possam ser realizadas de modo radical.Reformas bem concebidas e adotadas gradativamentepodem colocar a Universidade no seu caminho certo semquebra da disciplina e de acordo com os propósitos fun-damentais da instituição.

133

ENSINO DE MELHOR QUALIDADE

O ensino brasileiro é demasiado intelectual e de-ficiente no conteúdo de sentimento; as escolasestão saturadas de ciência e quase vazias dehumanismo.

J. G. DUQUE

As medidas para a melhoria da qualidade do ensi-no de graduação, certamente objetivo prioritário da UFC,devem estar direcionadas para a contínua avaliação doprocesso ensino-aprendizagem e adaptação dos currí-culos à realidade sociopolítica e econômica do Nordeste.

Um ponto de partida nesse processo deve ser aadoção de estímulos ao uso de novas metodologias paraa melhoria do ensino, oferecendo ao professor meios paraque ele possa aperfeiçoar seus instrumentos educacio-nais. A pulverização das matérias ou a multiplicidadede disciplinas precisam ser revistas. As coordenaçõesde cursos deveriam ser grandemente fortalecidas atra-vés de maior poder decisório sobre os objetivos dos cur-sos e dos currículos. Além disso, é essencial aorganização de estágios curriculares para os cursos ondetal prática é complemento pedagógico para a formaçãosocial do jovem. É urgente também a organização deum Centro de Comunicação e Produção de Audiovisual.

Outra medida que não pode deixar de ser exami-nada é a criação de cursos noturnos. A recente adoçãode nova metodologia para o vestibular foi um passo im-portante para a melhoria da qualidade de ensino na UFC.Impõe-se também estudar a adoção do sistema seriadoe a organização de novos cursos ou extinção de outros,bem como o estabelecimento de programas de �Univer-sidade Aberta�, utilizando o rádio, a TV e o ensino direto.

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE III � PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO134No plano do ajustamento da educação superior à

educação básica, convém ser criado um �Colégio Uni-versitário� como laboratório para a Faculdade de Edu-cação e oferta de oportunidade de boa educação paraos filhos de funcionários carentes e estudantes oriundosde segmentos populacionais menos favorecidos da so-ciedade. Acreditamos que será viável obter apoio doMEC para esse projeto. No tocante ao estudo de experi-ências pedagógicas seria também conveniente a cria-ção de uma �creche- modelo�.

Além das ações citadas, devem ser levadas em con-sideração pela UFC as prioridades indicadas pelo MECpara o ensino superior quanto ao melhor aproveitamen-to do contingente de professores dos cursos de pós-gra-duação na melhoria do ensino de graduação. Odirecionamento da pesquisa e da extensão pararealimentar a função ensino é outro desafio, além da bus-ca pela melhoria das condições da infra-estrutura física,renovação e aquisição de novos equipamentos e apoiobibliográfico à atividade didático-científica.

Enfim, como lembra o prof. J.G. Duque, no seu livrosobre Perspectivas Nordestinas: �Tem-se um longo ca-minho a percorrer no aperfeiçoamento do homem na Uni-versidade. A região tem progredido com o esforço delee da cúpula dirigente; entretanto, o ritmo de desenvol-vimento está bem distante do necessário para conten-tar as carências gerais da população.�

135

PESQUISA E PÓS-GRADUACÃO

Na pesquisa e na investigação não há lugar paraa mesquinharia. As descobertas e os inventos pa-garão sobejamente as despesas.

J.G. DUQUE

Há duas categorias de pesquisa geralmente reali-zadas nas universidades.

A pesquisa básica, ou fundamental, que consisteno trabalho teórico ou experimental, sem ter como pro-pósito uma aplicação específica. É a matéria-prima dasdemais fases.

Denomina-se prática a pesquisa que tem em vistadeterminar usos para a pesquisa básica em função dedefinir novos métodos, processos ou produtos específicos.

Convém registrar que tem sido propósito da UFCdispensar atenção à pesquisa fundamental como baseao esforço subseqüente em ciência e tecnologia. É tam-bém preocupação especial da Pró-Reitoria de Pesquisae Pós-Graduação orientar as pesquisas da UFC no sen-tido de compatibilizar essas linhas de investigações comas necessidades do Nordeste e do Ceará. Nesse sentido,devem ser desenvolvidos esforços para mobilizar o cor-po docente, apoiar grupos emergentes, oferecer bolsasde estudo de iniciação científica, auxiliar a participaçãode professores/pesquisadores em congressos, assimcomo oferecer prêmio anual do mérito científico.

Estudos realizados apontam várias distorções nosprogramas de pesquisas desenvolvidos nas universida-des do País. São levantadas dúvidas sobre o postuladoda integração pesquisa-ensino, bem como sobre a qua-lidade da maioria das investigações conduzidas por pro-fessores sem as qualificações para essas atividades. As

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE III � PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO136verdadeiras pesquisas, segundo tais estudos, estão sen-do realizadas somente pelos docentes com nível de dou-torado, principalmente ligados aos programas depós-graduação. O professor Cláudio de Moura Castro,da USP, estima que 82% das pesquisas das universida-des brasileiras estão sendo efetuadas por 15% dos pro-fessores com dedicação exclusiva. Outro aspecto para oqual o referido economista chama a atenção é o do altocusto da pesquisa nas universidades, especialmentenaquelas de menor competência nesse setor.

Na verdade, o programa de pesquisas desenvolvi-do nas universidades tem sido motivo de muitas discus-sões nos últimos anos, especialmente no tocante ao dilemade como combinar treinamento profissional com pesqui-sa e a realidade econômico-social do País. Outras limita-ções ao desenvolvimento da pesquisa nas universidadesapontadas são: a falta de incentivos funcionais ou finan-ceiros para os que realizam pesquisas, múltiplas fontesde financiamento e difícil integração entre pesquisa, en-sino de pós-graduação e ensino de graduação.

Com o novo projeto da UFC ANO 2000, este pro-blema deverá ser analisado amplamente, oferecendouma oportunidade para a Universidade Federal do Cea-rá posicionar-se quanto às suas atividades de pesquisa.Há necessidade, especialmente, do estabelecimento deum plano global de pesquisa para a UFC levando emconta a definição de programas integrados de trabalhoem equipe e interdisciplinar, com destaque de priorida-des no tocante a alguns problemas regionais.

A questão mais séria e urgente neste particular édefinir claramente as tarefas e responsabilidades especí-ficas da UFC no desenvolvimento, adaptação e aplicaçãode nova tecnologia em benefício da sociedade nordestina.

A criação dos institutos de pesquisa de assuntosespeciais pode ser uma estratégia de grande sucesso

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE III � PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO 137para reorientar e vitalizar os trabalhos dos pesquisado-res da UFC e a formação de novos cientistas.

Para se obter êxito nesse sentido, impõe-se a orga-nização de uma sistemática de acompanhamento des-sas atividades por parte da UFC. Sem restringir aliberdade dos pesquisadores, torna-se também indispen-sável estabelecer um sistema de divulgação permanen-te junto à comunidade sobre o andamento e os resultadosdas pesquisas realizadas na UFC. É preciso quebrar oisolacionismo da UFC, estabelecendo um sistema deintercomunicação com outras universidades e institu-tos de pesquisas no País e no exterior.

Por outro lado, a pós-graduação deve receber espe-cial atenção quanto à consolidação dos cursos existen-tes, criação de novos cursos de mestrado, especializaçãoe, especialmente, de incentivos para a organização decursos de doutorado em áreas de excelência da UFC.Quanto aos atuais cursos, deve-se procurar ampliar onúmero de teses defendidas e o engajamento do alunonas pesquisas existentes.

Deve merecer particular atenção a pesquisainstitucional, voltada à produção de conhecimentos ne-cessários à melhoria dos processos de planejamento ede decisão da UFC. É necessário que os referidos estu-dos sejam realizados nos centros, departamentos e naPró-Reitoria de Planejamento e podem ser tanto de ca-ráter acadêmico como administrativo.

138

PRIORIDADES PARA A EXTENSÃO

A maior finalidade do saber é, quando o temos,transmiti-lo.

CONFÚCIO

As atividades de extensão da UFC merecem rece-ber substancial ênfase no sentido de levar à comunida-de, por todos os meios, a sua produção científica,tecnológica e cultural. Deve-se reforçar, igualmente, acontribuição da extensão no sentido de captar as ne-cessidades essenciais da sociedade. Atenção especialconvém ser atribuída às ações junto às populações debaixa renda nos meios urbano e rural, objetivando amelhoria das condições socioeducativa e cultural dascomunidades assistidas. Outra área de extrema relevân-cia é a preservação e dinamização da cultura, em suasvárias modalidades. Todas essas atividades devem serassumidas mais ativamente pelos centros, faculdades edepartamentos acadêmicos.

A programação e as novas políticas de extensãoda UFC, contudo, devem ser submetidas à ampla dis-cussão com a comunidade universitária e junto às asso-ciações culturais do Estado.

De qualquer modo, a definição dessas atividadesdeve contemplar a vocação regional da UFC e os objeti-vos fundamentais da cultura.

A título de sugestão para estudo, poderiam ser espe-cificamente indicados os seguintes assuntos: a) elaborarprograma de cursos, debates e reuniões com vistas a de-mocratizar o acesso aos conhecimentos técnicos, científicose culturais; b) realizar uma reestruturação administrativana Imprensa Universitária e na Editora, bem como insti-tuir um programa amplo de publicação de livros didáticos

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE III � PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO 139de autores da UFC; c) adotar um programa de apoio à pro-dução cultural da comunidade universitária � concursosliterários, de artes plásticas, etc; d) sem comprometer aqualidade acadêmica e pedagógica, a UFC deve partici-par, como entidade crítica e orientadora, dos programasde de- senvolvimento socioeconômico do Nordeste.

Os programas de extensão podem contribuir sig-nificativamente para que a Universidade cumpra o seupapel de formadora cultural e intelectual dos cidadãos eagente crítico da produção e difusão de conhecimentos.No caso de uma região subdesenvolvida como o Nor-deste, especialmente, cabe à Universidade uma funçãosocial estratégica de liderança no delineamento dos ru-mos que a sociedade deve seguir.

Na verdade, as políticas e planos econômicos do Nor-deste não têm sido verdadeiramente orientados para solu-cionar as necessidades da maior parte da população. Arealização do progresso tem servido apenas para concen-trar mais a riqueza entre poucos e marginalizar a maioria dapopulação do bem-estar material, desenvolvimento cultu-ral e uso pleno dos seus direitos humanos fundamentais.

140

DESENVOLVIMENTO DE RECURSOS HUMANOS

Quando a Universidade tem êxito, seus proble-mas aumentam em vez de diminuírem.

JAMES A. PEARKIN

O patrimônio mais valioso de que a UniversidadeFederal do Ceará dispõe é o seu próprio quadro de profes-sores e funcionários técnico-administrativos. Deles depen-dem o êxito ou fracasso das atividades de ensino, pesquisae extensão e a eficiência da máquina administrativa. Oscustos dos serviços prestados pela Universidade estão tam-bém dependentes desse fator. Cerca de 85 a 90% dos re-cursos do Tesouro Nacional transferidos para a UFC sãodestinados ao pagamento do seu quadro de pessoal.

Reconhecendo tal fato, a UFC vem dedicando es-pecial atenção ao estudo e delineamento de políticas dedesenvolvimento organizacional e de pessoal. Com esteintuito, deve ser preparado, com ampla participação dacomunidade universitária, um Plano de Desenvolvimentode Recursos Humanos para o período de 1991-95. Osobjetivos e metas principais constantes desse progra-ma devem merecer todo o apoio da nova administraçãoda UFC para sua efetiva execução.

Concretamente, o referido plano poderia abrangerprioritariamente três programas: a) formação e desenvol-vimento de pessoal; b) administração de pessoal, com ên-fase nos benefícios, adaptação e valorização funcional; c)programa de apoio técnico-administrativo, compreenden-do apoio pedagógico ao ensino de graduação; d) progra-ma de formação de mestres e doutores no país e no exterior.

Em síntese, deve-se buscar, por todos os meios, ofe-recer condições de incentivo e adaptação funcionais paraa elevação dos níveis de motivação e compatibilizaçãodos servidores às suas respectivas funções.

141

PROMOÇÃO E ASSISTÊNCIA AO ESTUDANTE

Não se pode favorecer a fraternidade humanaalentando a luta de classes.

ABRAHAM LINCOLN

Numa região subdesenvolvida, há necessidade deapoio aos estudantes carentes quanto à alimentação, as-sistência à saúde, bolsas de estudo e outras modalidadesde ajuda que sejam identificadas como condição para ofe-recer a tranqüilidade indispensável para o estudo e seudesenvolvimento pessoal. As ações, neste particular, de-penderão, naturalmente, das disponibilidades de recur-sos financeiros consignados no orçamento da UFC.

Certamente que o passo essencial para garantirtal política é assegurar maior participação responsáveldos estudantes nas discussões dos problemas da vidada Universidade. Para isso, precisam ser de-senvolvidasações com a finalidade de afirmação da Universidadecomo comunidade não somente de professores, mas tam-bém de estudantes, de modo a justificar a alocação, demodo prioritário, de recursos para esse segmento.

Deve ser também ampliado o apoio ao desportouniversitário. Para tanto, é indispensável a recuperaçãototal do ginásio esportivo, quadras e parque aquáticodo Pici, bem como a melhoria da quadra de esportes doBenfica. Do mesmo modo, ampliar e apoiar as equipesesportivas da Universidade na realização de eventos epromoções esportivas na Universidade e em intercâmbiocom a comunidade.

Por fim, parece oportuno estimular a criação da as-sociação de ex-alunos para manter-se um vínculo comos egressos e receber deles colaboração no sentido deaperfeiçoar a qualidade do ensino pelo aproveitamentodas experiências desses profissionais.

142

DESENVOLVIMENTO DA INFORMÁTICA NA UFC

Dêem-me uma alavanca, e moverei o mundo. ARQUIMEDES

A área informática da Universidade Federal do Ce-ará tem-se desenvolvido rapidamente nos últimos anos,tanto quantitativamente como qualitativamente.

O novo Plano da UFC ANO 2000 deve atribuir gran-de prioridade à informática, tanto para uso acadêmico(ensino, pesquisa e extensão), como administrativo, co-leta e armazenamento de informações indispensáveispara subsidiar o planejamento, a execução e a avaliaçãodas áreas acadêmicas e administrativas.

Há necessidade de melhoramento da qualidade depessoal técnico de processamento de dados, adminis-trativo, e docentes em computação e usuário do siste-ma, bem como o desenvolvimento de cursos de iniciaçãocientífica em computação e metodologia educacional nes-se campo.

Pode-se dizer que, no momento, a capacidade deprocessamento de dados do NPD, para fins científicos, en-contra-se esgotada. Assim, é urgente e indispensável paraa modernidade da UFC a aquisição de um novo computa-dor de porte adequado e a instalação de uma nova rede de�estações de trabalho� para atender a tais necessidades.

O grande desafio para a atual administração da UFCserá, entretanto, a introdução do uso do microcompu-tador nas áreas de ensino de graduação. Estima-se queuma adequada automação dos principais cursos ondeeste instrumento é essencial para um ensino moderno,compatível com as exigências do novo século, exigirárecursos no montante de aproximadamente US$ 700 mil.O sistema de computação científico tem custo estimadode 1,5 milhão de dólares.

SÍNTESE DO PLANO INSTITUCIONALDA UFC : 1984-1987

145

O CONTEXTO SOCIOECONÔMICO DO CEARÁ

Planejamento é a definição de um futuro dese-jado e de meios eficazes de alcançá-lo.

RUSSEL C. ACKOFF

O Ceará contava, em 1980, com 5,3 milhões de habi-tantes, dos quais 52% no grupo de idades de menos de 20anos. Dos 1,7 milhões de pessoas ocupadas, 48% eram anal-fabetas ou contavam com menos de um ano de estudo, ape-nas 1,8% possuíam o 2º grau completo e 7% o 1º grau, e 2,9%o nível superior. A população economicamente ativa depen-dia na proporção de 45% das atividades agrícolas, 18% deempregos industriais e 37% dos serviços. Existiam no Estado38% de pessoas desocupadas e subempregadas nas ativida-des agrícolas.

A renda �per capita� do Ceará era de US$ 540, represen-tando 27% da brasileira e 74% do Nordeste. Entre 1971-81 o pro-duto interno bruto do Ceará cresceu 5,5% ao ano, a despeito dasdificuldades econômicas do País. Este desempenho, todavia, foimarcado por acentuadas oscilações decorrentes de fatores cli-máticos.

A produção agrícola do Ceará é realizada em 2,5 milhõesde ha e a geração de divisas oriundas desse setor montou a US$200 milhões, em 1981. Esse setor é caracterizado por condiçõesde atraso, baixo nível tecnológico, estrutura fundiária defeituo-sa e grande vulnerabilidade às secas periódicas. A economia desubsistência compreende 45% do valor da produção dos princi-pais gêneros alimentícios.

O setor industrial contribuía com 25% da formação do pro-duto total do Estado e empregava 18% da população economi-camente ativa, cerca de 300 mil pessoas.

A economia do Ceará, em suma. É subdesenvolvida, ca-racterizada por baixos padrões educacionais, de saúde, forteconcentração da renda, nível tecnológico da agricultura tradi-cional e expressivo contingente de pobreza absoluta, com ten-sões sociais nos centros urbanos e zonas rurais.

146

PROGRAMA DE AÇÕES PRIORITÁRIAS DO REITOR ANCHIETAESMERALDO BARRETO � 1984-87

Uma política de educação universitária abrange muitosaspectos da ciência e do ensino que é difícil de resumir em pou-cas palavras. De qualquer modo, pode-se ter uma idéia das prin-cipais ações que estão sendo executadas pela UFC no períodode 1984-87, conforme discriminado a seguir.

Atividades Meios:a) modernização administrativa da UFC, com vistas a ra-

cionalização dos procedimentos administrativos,melhoria do desempenho e diminuição dos custosoperacionais;

b) implementação do sistema de planejamento global epermanente;

c) reestruturação organizacional da universidade nasáreas administrativas e acadêmicas.

Atividades Fins:a) melhorar os padrões de qualidade do ensino de gradu-

ação e pós-graduação;b) contribuir para a superação de alguns problemas regio-

nais, através da preparação de professores para o ensinodo 1º e 2º graus e de nível universitário;

c) oferecer ao mercado de trabalho profissionais com for-mação adequada às necessidades dos vários setoreseconômicos;

d) realizar pesquisas que possibilitem resposta aos proble-mas mais presentes da região (habitação, saúde,agropecuária, alimentação, indústrias alternativas, etc.),além de trabalhos de natureza acadêmica fundamentaispara a geração de conhecimentos para superar as neces-sidades do ensino;

e) promover, através da extensão, ações comunitárias in-tegradas, cursos, serviço de assistência às populações,ação cultural universitária;

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE III � PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO 147f) prestar assistência médico-hospitalar à população in-

digente residente na periferia de Fortaleza.

Instrumentos para Cumprimento das Metas:a) construção de 27.729m² de prédios, laboratórios, salas

de aulas, salas de professores, clínicas e oficinas, espa-ços para apoio a serviços gerais, reforma e adaptação de17.040m² dos edifícios existentes e ampliação de 200m²,que serão financiados com recursos do convênio MEC/BID-III;

b) construção do novo prédio do Hospital das Clínicas,com financiamento do F.A.S..

c) complementação das obras de infra-estrutura física,aquisição e instalação de equipamentos para laborató-rios e centros de experimentação; equipamentos para aBiblioteca Central e outras unidades acadêmicas e ad-ministrativas; financiadas com recursos do convênioMEC/BID-III, FAZ e orçamento próprio da UFC;

d) desenvolvimento de 9 projetos da área de ciências dasaúde, administração de recursos humanos e suporteinstitucional e administração geral, que receberão as-sistência técnica de consultores nacionais, através doconvênio MEC/BID-III;

e) ampliação do número de docentes para 1.800 e dosdiscentes para 18 mil; integração de todos os projetosde extensão da área rural e maior desenvolvimento daação na periferia urbana, também financiadas com re-cursos do convênio UFC/BID-PR/EXT;

f) treinamento de 20 docentes em doutorado; 40 emmestrado (no país e no exterior) e realização de 20 cur-sos de especialização e 45 treinamentos para o pessoaltécnico administrativo, a serem financiados com re-cursos dos Convênios MEC-BID-III, UFC/CAPES-PICDe recursos do orçamento próprio da UFC;

g) essas metas serão consolidadas anualmente no planooperativo, instrumento final de planejamento integra-do que está se desenvolvendo na UFC, através da Pró-Reitoria de Planejamento.

148

ALGUMAS ATIVIDADES DA UFC

Criada pela Lei n.º 2.373, de 16 de dezembro de 1954, aUniversidade Federal do Ceará é constituída na forma deautarquia educacional de regime especial é vinculada ao Mi-nistério de Educação. Tem por objetivo preservar, elaborar,desenvolver e transmitir o saber em suas várias formas de co-nhecimento puro e aplicado, cumprindo-lhe, basicamente, pro-mover atividades de ensino, pesquisa e extensão.

A UFC contava, em 1982, com 1.454 docentes, dos quais42% com qualificação de doutorado e mestrado e 9% em nívelde especialização. O quadro de pessoal técnico-administrati-vo era constituído de 2.482 servidores, 13% dos quais com nívelsuperior, 47% com o 2º grau e o restante com o 1º grau. O ensinode graduação é ministrado em 34 cursos nas modalidades ba-charelado, licenciatura plena e curta e formação de tecnólogos.Existem na UFC 17 cursos de mestrado, com 558 alunos matri-culados no 2º semestre. Em 1982, funcionaram 13 cursos deespecialização, além de 43 cursos eventuais. Funcionam, ain-da, na UFC, 6 núcleos de pesquisas e a Fundação Cearense dePesquisa e Cultura, entidade de direito privado, com objetivode promover e subsidiar, com recursos obtidos junto a agênci-as financiadoras, programas de pesquisa e prestação de servi-ços técnicos.

Foram graduados pela UFC, no período de 1979-82, 6.301profissionais em 34 áreas, dos quais 70% desses egressos per-maneceram na região Nordeste. Em 1982, efetivaram matrícu-las no 2º semestre 15.130 alunos, dos quais 1.870 colaram grau.Os cursos de especialização e mestrado (17 cursos) têm sidooferecidos em respostas às solicitações da comunidade, comparticipação de professores e técnicos dos Estados do Norte eNordeste.

Os cursos de línguas receberam 14.788 alunos no período1979-1983, provenientes das escolas de 1º e 2º graus. Os 43 cur-sos de extensão são oferecidos pela UFC, em 1982, beneficiaram1.992 alunos.

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE III � PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO 149A UFC desenvolvia, em 1982, 272 projetos de pesquisa,

das quais 209 com financiamento próprio e 63 em convênio comoutras instituições, com o envolvimento de 533 docentes pes-quisadores. Das pesquisas em realização, 37% eram na área deciências, 16% estudos sociais aplicados, 14% em ciências agrári-as, 14% em ciências da saúde e o restante em humanidades,tecnologia e no laboratório de ciências do mar. No campo daextensão, foram realizadas 131 cursos no período 1979-82, com aparticipação de 6.316 alunos. O CRUTAC-CE beneficiou anual-mente 30.000 pessoas diretamente e 150.000 indiretamente. Asatividades de extensão também se concretizaram através dosprojetos Pacatuba, Campus Avançado do Xapurí, Pro-DocenteRural, Programa Universitário de Ação nas Periferias Urbanas,além do teatro universitário, o cinema de arte, o coral, o fórumuniversitário, a rádio universitária e outras modalidades de ex-tensão. O programa de atenção primária à saúde, tendo por basea maternidade Escola Assis Chateaubriand, atende aproxima-damente 400.000 pessoas em áreas rurais e urbanas. O centro deCiências da Saúde desenvolve dois programas de atuação juntoà comunidade: Ambulatório Integrado (assistência à infância) eserviços de odontologia preventiva e social.

A UFC complementa suas atividades de ensino, pesquisae extensão, com apoio a administração direta e indireta do go-verno estadual e de instituições regionais, através do suprimen-to de conhecimentos; participação dos docentes comoadministradores e assessores, valendo destacar que, em 1982,estavam nessas funções, no Ceará, 20 docentes da UFC.

ESTRUTURA DA METODOLOGIADE PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO DA UFC:

1992-1995

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE III � PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO 153FUNDAMENTOS DA ADMINISTRAÇÃO E DO PLANEJAMENTO

A questão indicada agora não é como fazer as coisasde modo certo, mas como encontrar as coisas certasque devem ser feitas e nelas concentrar os recursos eesforços.

PETER DRUCKER

1. A mais fundamental das funções da administração éo planejamento, pois ele é a arte de administrar e go-vernar.

2. Planejar é decidir antecipadamente o que fazer, comofazer, quando fazer e quem irá fazer. É eliminar o hiatoentre onde estamos e onde queremos ir. É determinarconscientemente os cursos de ação.

3. O processo de planejamento compreende a seleção dosobjetivos da organização e dos meios de atingi-los.

4. Não é possível analisar e controlar resultados sem pla-nos, pois não se saberia determinar a direção que de-veria ser seguida.

Sistema de planejamento para realizar um objetivo potencial

Vinculação entre plano e orçamento

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE III � PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO154

FONTE: Stanford Research Institute Harvard Business School

Níveis de detalhamento do planejamento estratégico

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE III � PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO 155Matriz de planejamento por cenário

FUTUROS CENÁRIOS

Planejamento Estratégico

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE III � PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO156Planejamento Estratégico

Sistema de direção estratégica

Fonte: Management Analysis Centeraspectos que devem ser conside-rados na programação do plano estratégico.

QUESTÕES ECONÔMICAS E ACADÊMICAS

PARTE III � PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO 157ASPECTOS QUE DEVEM SER CONSIDERADOSNA PROGRAMAÇÃO DO PLANO ESTRATÉGICO

1. Definição da missão da instituição. Todas as organiza-ções são construídas sobre valores e pressupostos.

2. Bom planejamento necessita de sincero comprometi-mento por parte da superior administração.

3. Ampla participação de todas as partes da comunida-de para que na fase de execução todos possam colabo-rar com mais entusiasmo.

4. O planejamento bem sucedido necessita de pessoalbem treinado. �O plano tem pouco valor se a organiza-ção a que se destina não é capaz de executá-lo.�

5. O planejamento necessita de informações verdadeiras.

6. O planejamento é um processo contínuo: planejamen-to, acompanhamento, avaliação e atualização.

7. �É melhor produzir um plano viável que não é ótimo doque um plano ótimo que não é viável.�

PEDRO SISNANDO LEITE

PARTE III � PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO158Estrutura da administração estratégica