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RACISMO E PRECONCEITO ETNICORRACIAIS NO AMBIENTE ESCOLAR
Autora: Maria Clara Perussolo1
Orientador: Oseias de Oliveira2
Resumo
O presente artigo faz parte do Projeto de Intervenção Pedagógica, sendo um produto final do Programa de Desenvolvimento Educacional da Secretaria de Estado da Educação do Paraná (PDE). O objetivo principal foi provocar reflexões acerca do preconceito etnicorracial na escola, envolvendo pedagogos, professores e funcionários, por meio de leituras, debates, trabalhos em grupo, com o intuito de elaborar, juntamente com os professores que trabalham História no ensino fundamental, material didático que auxilie no ensino sobre as características de cada etnia, para que o preconceito possa ser superado, criando-se um ambiente que evite a discriminação que é fruto do preconceito e do racismo. Para tanto, procurou-se realizar uma sondagem sobre a ocorrência de preconceito entre os alunos na escola, na sala de aula e, juntos, desenvolver um trabalho sobre o respeito e a solidariedade humana, no sentido de promover a conscientização, mostrar que diversidade não implica em inferioridade e que a sensibilidade é muito importante para a aceitação do outro, estimulando as noções de comportamento, convívio social e auto-estima entre os alunos.
Palavras-chave: preconceito etnicorracial; discriminação; sensibilização
Abstract
This article is part of the Educational Intervention Project, being a final product of the Educational Development Program of the Secretariat of Education of Paraná (PDE). The main objective was to instigate thoughts about prejudice racial ethnic at school, involving teachers, faculty and functionaries, through readings, discussions, group work, in order to develop together with the teachers who work History in Elementary School, textbooks to assist in teaching about the characteristics of each ethnic group, and, in this way, the prejudice can be overcome by creating an environment that avoids discrimination that is the result of prejudice and racism. To this end, we tried to conduct a survey on the occurrence of prejudice among students in school, in the classroom, and, together, develop a work on respect and human solidarity, to promote awareness, show that diversity does not imply inferiority and the sensitivity is very important for the acceptance of others, encouraging notions of behavior, social interaction and self-esteem among students.
1 Pós graduada em Geografia e História da Arte, formada em História, Professora da Rede Pública do Estado do Paraná, no Colégio Estadual Parigot de Souza, em Programa de capacitação do PDE, na Universidade Estadual do Centro Oeste – UNICENTRO.
2 Professor Doutor do Departamento de História da UNICENTRO.
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Key-words: prejudice, racial ethnic, discrimination, sensitivity
1 Introdução
A educação é um direito fundamental que deve ser garantido a toda e
qualquer pessoa. É, ao mesmo tempo, um meio para a realização de outros direitos
fundamentais.
Neste sentido, entendemos a educação como um processo que deve
estimular o pleno desenvolvimento da pessoa, de suas potencialidades, de valores
e atitudes em favor de uma sociedade mais justa e menos desigual como a que
ainda vemos atualmente. Sob esse prisma, este artigo tem como objetivo auxiliar o
professor na reflexão e no planejamento de ações voltadas para a diminuição do
preconceito racial e da discriminação a que estão expostos não só os alunos, mas
toda a comunidade escolar.
Sabemos que, na maioria das vezes, o preconceito racial e a discriminação
a determinadas pessoas surgem em função de características consideradas social
e/ou culturalmente negativas em relação a outras. Cor da pele, orientação sexual,
gênero, necessidades educacionais especiais são alguns exemplos de situações
em que a diferença se transforma em discriminação.
Assim, este trabalho traz em seu bojo a semente de uma discussão sobre
um dos papéis da escola: o de ampliar as possibilidades e diminuir as diferenças
para a geração presente. Dessa forma, por meio de leituras e discussões sobre o
tema “preconceito racial” e “discriminação”, se quer ressaltar o papel social dos
educadores em sua função de atuar diretamente na formação moral dos
estudantes.
Na escola encontramos um espaço sociocultural, em que múltiplas
identidades estão em processo de interação. Assim, este espaço é privilegiado
tanto para a disseminação de preconceitos vários como para a sua desconstrução.
De fato, é importante demonstrar que os conceitos que formamos a priori, sem uma
análise prévia do que significam, não são gratuitos, mas construções sociais e
históricas.
Identificar a existência ou não de situações que evidenciem preconceito
dentro da escola, e trabalhar para superá-las, é uma tarefa que passa pelo
conhecimento histórico. É preciso demonstrar qualitativamente que o continente
3
africano e os negros têm história, que a história do Brasil foi, de certa forma,
determinante para a construção de comportamentos preconceituosos que se
arraigaram de geração a geração por meio de atitudes e posturas de desdém
diante das desigualdades de cunho social, cultural e econômico, e que o
preconceito é uma construção ideológica imbricada para justificar a extrema
desigualdade com que as diferenças têm sido tratadas nesse processo.
Sendo assim, procurar-se-á envolver toda a comunidade do Colégio
Estadual Parigot de Souza na identificação e “combate” ao preconceito, ao racismo
e consequente discriminação no ambiente escolar, tarefa que não é, obviamente,
exclusiva do professor de história, cabendo a todos os docentes das demais áreas
de ensino, e aos demais profissionais que fazem parte do cenário escolar:
diretores, coordenadores pedagógicos, funcionários, assim como os pais e alunos.
Essa proposta já se iniciou por meio de um grupo de estudos, composto por
20 cursistas, entre eles 14 professores, 3 funcionários e 3 pedagogos com o intuito
de buscar embasamento teórico e momentos de discussão, reflexão e sugestões
para que o enfrentamento diante desses eventos que são reais na escola, seja
pautado em práticas conscientes e com consistência teórica, uma vez que o tema é
polêmico e não se trata de um mero comportamento passageiro, mas uma prática
imbuída de valores adquiridos e firmados socialmente.
Outra atividade realizada foi por meio do GTR, (Grupo de Trabalho em
Rede), em que foi possível identificar as várias opiniões e experiências dos
educadores, a partir de reflexões sobre o tema, propostas pela professora PDE.
Tanto o GTR, quanto os grupos de estudos realizados na escola, foram de suma
importância para o nosso trabalho, pois evidenciaram a preocupação dos
educadores no que tange ao comportamento dos alunos frente ao diferente, bem
como demonstrou o conhecimento e a capacidade dos profissionais que estão no
chão das escolas dia a dia.
A partir dessas várias contribuições, concluiu-se que é necessário realizar
uma sondagem sobre a ocorrência de preconceito entre os alunos na escola, na
sala de aula e, juntos, desenvolver um trabalho sobre o respeito e a solidariedade
humana, promovendo a conscientização, mostrando que diversidade não implica
em inferioridade e que a sensibilidade é muito importante para a aceitação do
outro, no sentido de estimular as noções de comportamento, convívio social e auto-
estima entre os alunos.
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2 Desenvolvimento
2.1 O papel da escola
Uma imensa parcela da população brasileira ainda permanece excluída do
acesso aos benefícios sociais e do pleno exercício da cidadania, em razão da
extrema desigualdade presente dentro e fora da escola. O ideário racista ajuda a
sustentar e justificar essa desigualdade.
Embora a Constituição Federal, em seu artigo 5º, parágrafo XLII, já “garanta
o racismo como crime inafiançável” (Brasil, Constituição de 1988), ainda não havia,
até 2003, a obrigação legal de ensinar, nas escolas, que não se deve ser racista e
que as etnias africanas e seus descendentes tiveram uma contribuição
importantíssima na construção do país.
Recentemente, no entanto, ocorreram avanços na legislação que tende a
garantir uma maior equidade de oportunidades e o resgate social de segmentos
historicamente excluídos e discriminados em nosso país. A lei 10639/03 é um
exemplo muito contundente dessa nova perspectiva jurídica. No entanto, os textos
constitucionais ainda carecem de efetividade. Como aponta o professor Luiz Carlos
Paixão da Rocha “apesar de o movimento social negro considerá-la como uma
importante conquista, os estudos mais recentes têm apontado enormes
dificuldades para a efetivação da nova legislação em todo o país.” (Rocha, 2009, p.
47).
O desafio da construção de uma democracia efetiva, passa pela escola e por
sua capacidade de dar vigor ao enfrentamento necessário à histórica desigualdade
com que os contemplados dessa lei têm sido tratados. A aplicação da lei enfrenta
também a dificuldade de acesso a materiais com linguagem clara, capazes de
auxiliar no trabalho com a história e cultura afro-brasileira e africana, bem como na
ausência de conteúdos sobre esse tema na formação inicial dos professores.
A escola, dado a sua múltipla composição social e cultural, é tanto o local
onde se pode iniciar a construção de um olhar diferente sobre o outro e suas
especificidades, como o lugar onde manifestações de preconceito e racismo podem
se mostrar ou se imiscuir, podem estar, explícita ou sorrateiramente, acontecendo.
Desconstruir visões de mundo que justificam atitudes de intolerância e
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discriminação supõe o reconhecimento de que as pessoas são naturalmente
diferentes, mas que a transformação dessa diferença em desigualdade não é
natural. Como aponta Barros:
... sempre existirão homens e mulheres, diversas variações étnicas ou identitárias, indivíduos de variadas faixas etárias, bem como profissões as mais diversas. Mas pode-se sonhar que um dia estas diferenças serão tratadas socialmente com menos desigualdade. Por isto, as lutas sociais não se orientam em geral para eliminar as diferenças, mas sim para abolir ou minimizar as desigualdades. (Barros, 2009, p.22)
O que é natural e biológico, ao contrário do que pregam as ideologias
racistas, é a diferença entre as pessoas. A desigualdade entre elas é um processo
social e historicamente construído que, como tal, deve ser desconstruído e
combatido, processo no qual a escola tem uma enorme responsabilidade.
As políticas de combate à discriminação e à desigualdade social que vêm
sendo progressivamente implantadas no Brasil são fruto, em sua maioria, menos
de um reconhecimento, sempre tardio, de parte de uma elite branca e racista, que
das lutas organizadas do movimento social negro, de seus ativistas e intelectuais.
Não por acaso, esses movimentos perceberam a importância de travar a luta
também no campo da educação formal. Embora os aspectos de múltipla
determinação do saber escolar nem sempre permitam caracterizá-lo apenas como
um espaço de “reprodução” das ideologias dominantes, ou mero aparelho
ideológico do Estado, é inegável que a escola tem, sim, ampla importância na
formação social e nas representações e visões de mundo que se desenvolvem nas
pessoas que passam por ela.
Bourdie, (1996, p.37) pensa a escola como um local onde a regra geral é
preparar os mais competentes socialmente para assumirem os postos de poder.
Embora uma leitura apressada o caracterize por “reprodutivista”, uma leitura atenta
permite perceber as nuances que constroem os “mais capazes”. Ou seja, aqueles
que têm mais condições de continuar fazendo as coisas do mesmo jeito, em suas
palavras, os mais aptos a “... manter as diferenças sociais preexistentes.”
Nesse sentido, é importante inculcar em todos a ideia de que a competência
social dos mais capazes é uma competência “natural”. Impõe-se uma visão de
mundo apta a perpetuar as desigualdades, sempre que não se mostra aos alunos a
origem social e histórica das mesmas. Para os pensadores de origem marxista, e
6
também para os movimentos sociais, esta é uma característica ideológica. A
ideologia se impõe justamente pela sua naturalização, pelo fato de ser assumida
como verdade sem questionamentos. Para Chauí (1980, p.25), a força de uma
ideologia depende “... de sua capacidade para ocultar sua própria gênese, ou seja,
deve aparecer como verdade já feita e já dada desde todo o sempre, como um ‘fato
natural’ ou como algo ‘eterno’.”
Para Luiz Carlos Paixão da Rocha (2009, p.50), professor e ativista do
movimento negro o reconhecimento da força ideológica das práticas racistas,
impõe a necessidade de um amplo trabalho de contra ideologia para que a nova
legislação conquistada pelos movimentos sociais se efetive. No âmbito político,
este trabalho é levado a cabo pelo movimento negro organizado, mas no âmbito
escolar, precisa ser efetivado por educadores comprometidos e com conhecimento
de causa.
Cabe aos professores de História, evidentemente, papel central na
possibilidade de efetivação da legislação. Barros (2009, p.217) aponta que é
preciso
... dar a conhecer que também são construções sociais todas estas coisas – racismo, preconceitos, discriminações, e mesmo a própria identidade negra que reage contra – eis aqui uma tarefa igualmente importante para as ciências humanas, e para a história em particular.
Como a ideologia calcada no mito da democracia racial é muito presente em
nosso país, é comum a negação da existência de práticas discriminatórias, por que
admiti-las remete a um trabalho de desconstrução de uma verdade posta e
assumida, infelizmente, por uma grande maioria das pessoas. É mais fácil dizer
que no Brasil não existe racismo, ou, o que é pior, sugerir que as condições
desiguais a que a população negra é submetida, estão assim por culpa dos
próprios negros. Nesse sentido, o relatório do Conselho Nacional de Educação
(Parecer n.3, 2004), ao tratar das condições para que o reconhecimento se efetue,
aponta que este requer também:
... que se conheça a sua história e cultura apresentadas, explicadas, buscando especificamente desconstruir o mito da democracia racial na sociedade brasileira; mito este que difunde a crença de que, se os negros não atingem os mesmos patamares que os não negros, é por falta de competência ou de interesse, desconsiderando as desigualdades seculares que a estrutura social hierárquica cria com prejuízos para os negros.
7
A desconstrução do mito da democracia racial, certamente, não deve ser
efetivada apenas por que está na lei, mas também por que constitui parte do
intrincado processo de desconstrução para o qual este trabalho pretende contribuir,
porque pode ajudar a desmascarar, para alunos e educadores, situações em que o
racismo se esconde na sua negação. Quando se aponta que as oportunidades são
iguais, mas os negros é que são menos competentes, estamos diante de flagrante
manifestação do racismo como ideologia.
A construção de uma ideologia racista começou praticamente no momento
em que os primeiros escravos africanos foram introduzidos no país. Dominados
pela cultura e pela força, a ideia da inferioridade associada à cor da pele ganhou
campo livre para crescer e se afirmar entre uma população branca que, se não foi
sempre maioria, pelo menos ocupou sempre a maioria dos postos de poder. O
trabalho de combate e desconstrução levado a efeito pelo movimento negro tem
caráter bastante recente, se comparado ao tempo que as ideias racistas tiveram
para se construir e se afirmar.
Entender que o Brasil é um país onde o preconceito e a discriminação
operam com força e que, portanto, não existe democracia racial, é tão importante
quanto demonstrar as contribuições das várias culturas e etnias que compõem o
quadro cultural do país. Este é um trabalho ainda a ser feito pela escola. Para
Ferreira (2000, p.71/72):
Apoiando-se em uma concepção de mundo e perspectiva histórico-cultural eurocêntrica, a escola passa uma visão distorcida da história como, por exemplo, encarando a escravidão como uma simples experiência civilizatória. As noções de beleza que perpassam as relações são derivadas de uma estética “branca”, constituindo um problema pelo fato de o afro-descendente usá-la como “referência correta”, entendendo-a como positiva, racional e bem desenvolvida, levando, em decorrência, a uma desvalorização da estética negra, encarada como exótica, emocional e primitiva... Assim, é criado um processo pedagógico tal que leva o afro-descendente a inibir sua capacidade de advogar seus interesses culturais, políticos e econômicos aos quais tem direito como cidadão.
A adoção de uma perspectiva eurocêntrica para pensar vários aspectos de
nossa sociedade, como ideais de beleza e desenvolvimento, por exemplo, é
também uma herança colonial que precisa ser discutida. Os ideais de
branqueamento e as sociedades de eugenia que proliferaram no país são calcados
nessa perspectiva. A escola precisa demonstrar que é tão importante ser branco
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como ser negro, evitando que a desconstrução do preconceito seja levada a um
viés que o reforce ainda mais. Nas palavras de Ferreira (2000, p.72): “geralmente,
acredita-se em uma saída simplista, isto é, aquela em que o afro-descendente deve
procurar adaptar-se ao “mundo branco” e o branco, simplesmente, não deve ter
atitudes racistas.
Desconstruir mitos fundantes do modo de perceber a sociedade é uma
tarefa que passa por um processo de re-educação, de aprender a aceitar as
diferenças e recusa em apoiar as desigualdades. O professor de história tem papel
fundamental nesse processo, ao apontar a historicidade de construções em que as
diferenças são usadas para justificar a desigualdade. Perceber que a competência
dos “mais capazes” é um processo social, que a democracia racial é uma ideologia
historicamente construída, que não existe “o branco” e nem “o negro”, mas que
ambas as definições são criações de um modo de ver o mundo com fundo
eurocêntrico, demonstrar que a contribuição social e cultural de sujeitos e grupos
sociais de origem africana é tão importante e necessária quanto a de matriz
europeia, e que a “inferioridade” baseada na cor é uma construção ideológica
destinada a sustentar situações de dominação, são tarefas que passam pela escola
e, particularmente, pela disciplina de história.
Sendo assim, é imprescindível que se conheça bem o que é e como se dá o
preconceito, o racismo e a discriminação no âmbito social, uma vez que muitas de
nossas atitudes, embora nem percebamos, são indícios de um comportamento
preconceituoso, racista ou discriminatório, embora afirmemos que não.
2.1 Preconceito
Preconceito é uma postura ou ideia preconcebida, uma atitude de alienação
a tudo aquilo que foge aos padrões de uma sociedade e pode se manifestar por
meio de uma atitude discriminatória. Temos então, o preconceito racial, o sexual,
religioso, político, cultural, intelectual, socioeconômico, linguístico, entre outros.
Sendo o preconceito um juízo pré-concebido, manifestado geralmente na forma de
uma atitude discriminatória perante pessoas, lugares ou tradições considerados
diferentes ou “estranhos”, as formas mais comuns de preconceito se manifestam
9
no âmbito social, racial e sexual.
Os conceitos ou opinião formados antes de se ter os conhecimentos
adequados de determinada pessoa ou situação, geram uma atitude
emocionalmente condicionada, baseada em crença, opinião ou generalização,
determinando simpatia ou antipatia para com indivíduos ou grupos, bem como
atitudes discriminatórias e manifestação hostil ou desprezo contra indivíduos ou
povos de outras raças.
Em escritos de Rodrigues encontramos que:
...o preconceito é basicamente uma “opinião não justificada, de um indivíduo ou grupo, favorável ou desfavorável, e que leva a atuar de acordo com esta definição”. O preconceito gera a discriminação, que é o tratamento desfavorável, e que leva a atuar arbitrariamente a certas categorias de pessoas ou grupos, que pode ser exercido de forma individual ou coletiva, sobre um indivíduo ou grupo de pessoas. Uma das causas do preconceito é o fato de que percebemos o mundo através das grades de nossa cultura.(www.unicamp.br/iel/site/alunos/publicações)
De acordo com o documento Brasil, Gênero e Raça, lançado pelo Ministério
do Trabalho, “preconceito é uma indisposição, um julgamento prévio negativo que
se faz de pessoas estigmatizadas por estereótipos”, ou seja, “atributos dirigidos a
pessoas e grupos, formando um julgamento a priori, um carimbo.”
Para Lopes (2007, p.14), “O estereótipo é uma espécie de fotografia que
nossa imaginação faz. É uma ideia preconceituosa, uma suposição que se cria, de
um grupo de pessoas, a partir do comportamento de um ou mais indivíduos
daquele grupo”. A origem de todo racismo é, então, o preconceito. Segundo o
referido autor, se eu nunca comi quiabo e me enojo só com a aparência desse
vegetal, eu não posso dizer que quiabo é ruim. Se eu disser isso, eu estarei sendo
preconceituoso. (Lopes, 2007, p.13)
As atitudes preconceituosas estão presentes na sociedade desde muito
tempo e perpassam de geração a geração. Comportamentos que não são
considerados preconceituosos estão, na sua essência, imbuídos de uma ideia
preconcebida, que se justifica pela concepção de sociedade, cultura, educação,
adquiridas na própria família e no meio social em que se vive.
O preconceito surge e é alimentado por desconhecimento e por concepções equivocadas que vamos incorporando ao longo de nossa educação e socialização. Se desenvolvermos em nossos espaços de convivência um tipo de socialização pautada no respeito às diferenças
10
conseguiremos superar o preconceito (Gomes, 2006, p.139)
Entre os vários tipos de preconceito há o preconceito racial que leva as
pessoas a acreditarem que uma raça é melhor que a outra por apresentar
características comportamentais e morais que fazem supor a que classe social a
pessoa pertence. Além desse critério, vem o quesito cor, que, “de cara”,
estigmatiza a pessoa pela sua raça e bagagem cultural.
.
2.2 Racismo
Os movimentos sociais negros e ativistas intelectuais perceberam a
importância de se travar uma luta pelo combate à discriminação e à desigualdade
social, também no campo da educação formal, uma vez que a escola tem, sim,
ampla importância na formação social e nas representações e visões de mundo
que se desenvolvem em seus alunos.
No âmbito político, um amplo trabalho de contra ideologia para que a nova
legislação conquistada pelos movimentos sociais se efetive é levado a cabo pelo
movimento negro organizado, mas no âmbito da escola, precisa ser efetivado por
educadores comprometidos e com conhecimento de causa. Cabe, então, aos
professores de História, evidentemente, papel central na possibilidade de
efetivação da legislação, pois, segundo Barros (2009, p. 217): “... dar a conhecer
que também são construções sociais todas estas coisas – racismo, preconceitos,
discriminações, e mesmo a identidade negra que reage contra – eis aqui uma
tarefa igualmente importante para as ciências humanas, e para a história em
particular.”
“A construção de uma ideologia racista começou praticamente no momento
em que os primeiros escravos foram introduzidos no país”, conforme Jaccoud in
Theodoro ( 2008, p.49). Dominados pela cultura e pela força, a ideia da
inferioridade associada à cor da pele ganhou campo livre para crescer e se afirmar
entre uma população branca que, se não foi sempre maioria, pelo menos ocupou
sempre a maioria dos postos de poder. O trabalho de combate e desconstrução
levado a efeito pelo movimento negro tem caráter bastante recente, se comparado
11
ao tempo que as ideias racistas tiveram para se construir e se afirmar.
Entender que o Brasil é um país onde o preconceito racial e a discriminação
operam com força e que, portanto, não existe democracia racial, é tão importante
quanto demonstrar as contribuições das várias culturas e etnias que compõem o
quadro cultural do país. Este é um trabalho ainda a ser feito pela escola.
A convicção de que existe uma relação entre as características físicas
hereditárias, como a cor da pele, a determinados traços de caráter e inteligência ou
manifestações culturais, fazem com que muitos acreditem na existência de
populações “superiores” a outras. Esse comportamento é percebido claramente
em nossa sociedade, através das “brincadeiras” que são feitas nas rodas de amigo,
por exemplo, em que a pessoa de cor sempre é vítima de piadas e considerada
ineficiente para determinados trabalhos, profissões de alto escalão, ou até para
tarefas domésticas .
Conforme Santos (2005, p.11), “O racismo é um sistema que afirma a
superioridade de um grupo racial sobre outros”. Para Lopes, (2007, p.12), “
Racismo é, então, aquele comportamento por meio do qual uma pessoa ou um
grupo de pessoas manifesta uma ideia preconcebida – ou seja, um preconceito
contra um ou vários indivíduos pertencentes a um grupo de origem diferente e em
geral considerada inferior”.
Para Lopes (2007, p.19), “o racismo é uma ilusão de superioridade. O racista
se acha superior àquele a quem se compara: ele nasceu para mandar e o outro,
visto como inferior a ele, para obedecer.” Ele também explica que o termo racismo
“é antes de tudo a expressão de desprezo por uma pessoa. Às vezes não por
causa de suas características, mas por aquela pessoa pertencer a um grupo.
Como, por exemplo, quando se diz: “eu não gosto desse índio porque todos os
índios são preguiçosos!”. (Lopes, 2007, p.20)
São muitos os conceitos interligados ao racismo, mas podemos entendê-lo,
portanto, como sendo uma atitude de inferiorização e marginalização de uma
determinada cultura, religiões, raça; a exaltação de uma cultura em relação a
outras, considerando-a como superior. Advém desta atitude uma espécie de medo,
um receio de outras culturas e misturas, devido a uma pressuposta superioridade
de outra raça, cultura, religião, etc. dada como modelo a seguir pelas suas
características tidas como ideais. A essa atitude chamamos Xenofobia. Outro
12
conceito ligado ao racismo é o Etnocentrismo que se configura como sendo uma
tendência para sobrevalorizar uma dada cultura, considerando os seus valores e os
seus padrões culturais como medida daquilo que é desejável e estimável para
todos.
Todos podem ter atitudes etnocentristas, xenofóbicas e até racistas, mas
superadas ao longo dos anos e com a maturidade que vamos adquirindo ao longo
da nossa formação pessoal. No entanto, estas atitudes são por vezes levadas ao
extremo devido a um etnocentrismo e xenofobia exagerados, como por exemplo os
genocídios (destruição sistemática de um povo), como é o caso do Holocausto
Judeu.
Importante mencionar o exemplo da escravatura em que raças eram
obrigadas a fazer trabalhos forçados sem condições, levados a obedecer
cegamente a um ou mais amos sendo tratados de uma forma inferior a animais e
trocados por um par de moedas como se fossem seres sem sentimentos.
De acordo com a Filosofia, racismo é um preconceito contra um “grupo
racial”, geralmente diferente daquele a que pertence o sujeito, e, como tal, é uma
atitude subjetiva gerada por uma sequência de mecanismos sociais.
Um grupo social dominante, seja em aspectos econômicos ou numéricos,
sente a necessidade de se distanciar de outro grupo que, por razões históricas,
possui tradições ou comportamentos diferentes. A partir daí, esse grupo dominante
constrói um mito sobre o outro grupo, que pode ser relacionado à crença de
superioridade ou de iniquidade.
Convém ressaltar que o racismo nem sempre ocorre de forma explícita.
Além disso, existem casos em que essa prática é sustentada pelo aval dos objetos
de preconceito na medida em que também se satiriza racialmente e/ou consente a
prática racista, de uma forma geral. Muitas vezes o racismo é consequência de
uma educação familiar racista e discriminatória.
Nos primeiros contatos entre conquistadores portugueses e africanos no
século XV, não houve atritos de origem racial. Os negros e outros povos da África
entraram em acordos comerciais com os europeus, que incluíam o comércio de
escravos que, naquela época, era uma forma de aumentar o número de
trabalhadores numa sociedade e não uma questão racial.
13
No entanto, quando os europeus, no século XIX, começaram a colonizar o
Continente Negro e as Américas, encontraram justificativas para impor aos povos
colonizados as suas leis e formas de viver. Uma delas foi a ideia errônea de que os
negros e os índios eram "raças" inferiores e passaram a aplicar a discriminação
com base racial nas suas colônias, para assegurar determinados "direitos" aos
colonos europeus. Àqueles que não se submetiam a essa “lei”, era aplicado o
genocídio que exacerbava os sentimentos racistas, tanto por parte dos vencedores,
como dos submetidos, como os índios norte-americanos que chamavam os
brancos de "Cara pálidas".
Os casos mais extremos foram a confinação dos indígenas em reservas e a
introdução de leis para instituir a discriminação, como foram os casos das leis de
Jim Crow nos Estados Unidos da América e do apartheid na África do Sul.
2.3 Discriminação
Embora o termo implique apenas por si mesmo a faculdade de fazer
distinções, ganhou em sociologia um sentido crítico. Designa as distinções feitas na
vida social em detrimento de certos grupos, que são julgadas inaceitáveis pela
maioria, porque violam as normas sociais e o princípio da igualdade perante a lei,
ao mesmo tempo que certos subgrupos da população as justificam. É o caso dos
comportamentos em relação à população negra nos Estados Unidos da América
até aos anos 60; assim como das atitudes anti-semitas. Os critérios de
discriminação variam segundo as sociedades e segundo as épocas. Na Índia
moderna, que legalmente suprimiu o sistema das castas, os antigos intocáveis são
discriminados por causa do passado, que continua vivo ao nível dos costumes. Nos
Estados Unidos, a discriminação durante longo tempo exercida contra os negros
tinha a sua origem na sua antiga condição de escravos. A discriminação pode
fundar-se na raça, na religião, na origem nacional ou na cultura. O fato de se ter
podido definir a discriminação social como a maneira de tratar desigualmente
indivíduos iguais mostra até que ponto se trata de um conceito estreitamente ligado
à sociedade moderna, que põe a igualdade no centro dos seus valores: nas
sociedades fundadas nas diferenças de estatuto ou de casta, a discriminação é um
14
conceito neutro, descritivo, desprovido da conotação pejorativa que lhe atribuímos
nas nossas sociedades.
O termo discriminação tem sua origem na palavra latina "discriminatio" e
quer dizer separação ou distinção. A discriminação é um ato de cortar ou de
separar. Diz-se que há discriminação social quando, num grupo ou numa
sociedade, parte da população recebe tratamento diferente e desigual em relação
aos restantes. Em princípio, a parte que sofre o efeito da discriminação tem o
mesmo estatuto legal que os outros. Mas, na prática, é lesada nos seus direitos,
privada de vantagens ou sobrecarregada com obrigações particulares. Em geral, as
causas sociais da discriminação não são conscientemente sentidas. Tem origem
em preconceitos antigos, e afetividades coletivas. Os principais tipos de
discriminação são de caráter étnico, racial, sexual, político, religioso.
A segregação social, do latim, "segregare", significa "por à margem",
"separar", "isolar" do conjunto da sociedade, indivíduos ou categorias. Pode
realizar-se conscientemente com propósitos sociais ou inconscientemente, pelo
exercício de uma ação voltada a opiniões das pessoas. Mas pode ser de uma lei
que a promova, a exemplo do que ocorria na África do Sul com o Apartheid.
A noção de preconceito se refere a uma atitude injusta e negativa em
relação a um grupo ou a uma pessoa que se supõe ser membro do grupo. O
conceito de discriminação, apesar de literalmente significar ‘tratar alguém de uma
forma diferente’, pode ser definido como um comportamento manifesto, geralmente
apresentado por uma pessoa preconceituosa, que se exprime através da adoção
de padrões de preferência em relação aos membros do próprio grupo e/ou de
rejeição em relação aos membros dos grupos externos.
3. Considerações dos cursistas do grupo de estudos e GTR
Os participantes do grupo de estudos, bem como do GTR, receberam vários
materiais para leitura e reflexão acerca do tema “Racismo e preconceito étnico
racial”, tendo, assim, a oportunidade de entrar em contato com as várias
ponderações sobre o preconceito, o racismo e a discriminação abordados pelos
autores que foram referência para esse trabalho.
15
Participaram do GTR muitos professores, pedagogos e funcionários de
escola, sendo 25 participantes no total. Do grupo de estudos, realizado no Colégio
Estadual Parigot de Souza, que fora organizado de forma interdisciplinar, ou seja,
uma pedagoga e duas professoras de Ciências, participaram 20 profissionais dos
vários segmentos da escola: professores (14), pedagogos (3) e funcionários (3),
somando-se 36h à distância e 24h presenciais.
Tanto no GTR, quanto no grupo de estudos, inicialmente apresentamos o
assunto proposto através de um pequeno questionário que levou às seguintes
reflexões: Qual a diferença entre preconceito, racismo e discriminação; por que há
preconceito racial em nossa sociedade; você se considera uma pessoa
preconceituosa; podemos verificar indícios de preconceito, racismo e discriminação
na escola; qual o papel dos educadores na prevenção e/ou diminuição do
preconceito e da discriminação na escola.
No que tange às questões de cunho pessoal, todos os participantes das
duas modalidades supracitadas comentaram que mesmo que pensemos o
contrário, temos em alguns momentos de nossa vida atitudes de preconceito
principalmente e consequente discriminação, mesmo que de forma camuflada, pois
estamos inseridos em uma sociedade de diversas raças, culturas, pensamentos.
Para a professora A, “Em nossa sociedade o preconceito geralmente é
negado pelo discurso social por manifestar-se muitas vezes de forma camuflada,
porém esta negação é um equívoco, pois é fácil identificá-lo em muitas atitudes
rotineiras.” Para a cursita B, “A formação de valores educacionais se desenvolve na
vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas escolas, nas manifestações
culturais, nos movimentos e organizações locais”. Ponderamos que nosso
comportamento perante o “outro” é marcado, muitas vezes, pelas experiências que
tivemos nas várias situações vivenciadas.
Nesse sentido, Praxedes, em seu escrito intitulado “Educação para o
respeito à diversidade e à diferença”, (2010, p.2), produzido para o Grupo de
estudos sobre “Diversidade na Escola”, promovido pelo Governo Estadual de
Educação, comenta que:
Os preconceitos são construídos no pensamento humano com base em esquemas inconscientes de percepção, avaliação e apreciação. Incorporamos e construímos esses esquemas inconscientes de entendimento por meio do aprendizado da língua e dos valores e ideias expressos pelas culturas que nos acompanham desde o nascimento, ou seja, as manifestações culturais populares, nas religiões, etc. No nosso
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pensamento atuam categorias mentais de entendimento, de percepção do mundo a nossa volta, que permitem a classificação dos seres humanos, objetos, fatos e relações que mantemos com os outros, tornando cada um de nós predisposto a pensar de uma determinada maneira, construir juízos sobre tudo que percebemos, formar pré-juízos ou preconceitos que orientam as nossas ações.
O que diz respeito a diferenciação de racismo, preconceito e discriminação,
as contribuições se deram da seguinte forma: “Racismo é definido como crença na
inferioridade nata dos membros de determinados grupos étnicos e raciais; desse
modo, o racismo leva ao pensamento de pertencer ou não a um determinado
grupo.” Outra cursita, trazendo a contribuição do dicionário, comentou que
“Podemos definir o preconceito como um juízo preconcebido, manifestado
geralmente na forma de uma atitude discriminatória perante pessoas, lugares ou
tradições considerados diferentes ou estranhos”.
Na continuidade dessa reflexão, ponderou-se “que a discriminação pode ser
provocada e motivada por preconceito”.
Foram também pertinentes as reflexões de que a sociedade brasileira se
caracteriza por uma pluralidade étnica, desencadeando, assim, muitos
desencontros, em que as diferenças se acentuam, levando à formação de
hierarquias sociais. Na escola, percebemos que o preconceito e o racismo não
acontecem somente por causa da cor, da classe social, da religião, da orientação
sexual, de alguma deficiência. Essas diferenças se dão também por conta do
gênero, da religião e até da aparência física, uma vez que a estética física é
deveras valorizada em nossa sociedade. “Infelizmente, o preconceito e as atitudes
discriminatórias ainda estão presentes em nosso cotidiano, na sociedade em geral
e também nas escolas, onde demonstrações coletivas de intolerância, desrespeito,
discriminação e violência acontecem e geram conflitos inúmeros entre seus
membros”.
Segundo opiniões dos cursistas, é na escola que se estabelece as bases
para a formação do educando, buscando-se respeito aos valores culturais como
princípios constitucionais da educação, tanto quanto da dignidade humana,
garantindo-se promoção do bem de todos sem preconceito. Então, se o racismo e
toda forma de preconceito não nascem na escola, é nela que devemos discutir sua
existência, educar de maneira que nossos jovens percebam que somos iguais
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apesar das diferenças que apresentamos e, portanto, educar para a cidadania
exige que professores e alunos trabalhem com a diversidade sabendo que todos
devem ser respeitados independentes da raça, cor, nível social, religião.
A meta da escola deve ser, de acordo com os apontamentos feitos, alcançar
e promover a educação de cidadãos atuantes e conscientes no seio da sociedade
multicultural e pluritécnica, buscando relações étnicas e sociais positivas, rumo à
construção de uma Nação verdadeiramente democrática.
Para o cursista D, “A escola, evidentemente, é o local mais propício para o
diálogo a cerca das desigualdades sociais, uma vez que, na sua formação existem
indivíduos oriundos de todas as camadas sociais. Infelizmente o mesmo motivo
que ajuda no desenvolvimento de saberes, que é essa múltipla composição social
e cultural, provoque tantas manifestações de preconceito e racismo”.
Outras considerações importantes, tecidas por participantes do GTR é que o
ser humano se completa a partir das relações que estabelece com seu semelhante,
por isso a escola é esse espaço privilegiado que proporciona a interação
necessária para seu desenvolvimento intelectual e social. Percebe-se atualmente
que o maior desafio dos educandos é manter essas relações em um patamar
seguro e de respeito às diferenças. Nossos jovens estão mais preparados para
atacar, agredir verbalmente do que para ouvir, refletir. A escola é uma das
responsáveis pelo processo de socialização e são as crianças em processo de
formação emocional, cognitiva e social que podem incorporar com mais facilidade
as mensagens com conteúdos discriminatórios que permeiam as relações sociais
O terreno das discussões é delicado, mas não deve ser ignorado por quem
está lutando pela melhoria da qualidade de ensino. Devemos insistir em elaborar
práticas pedagógicas que priorizem a sensibilidade e promovam a reflexão.
Para outra participante, “eliminar o preconceito e a discriminação seria o
ideal, mas é obvio que é uma missão quase que impossível. Querer despojar
definitivamente aquilo que foi incorporado durante toda a história de uma família
em um indivíduo (nosso aluno) é no mínimo tendencioso”. “Agora, como
educadores, não podemos ignorar que precisamos fazer alguma coisa. Mas, nosso
objetivo é prevenir conflitos através da sensibilização e da reflexão”.
Outra ponderação feita é que percebemos frequentemente em nossas salas
de aula e no dia a dia em geral, a persistência de uma mentalidade enraizada no
sistema escravista/colonial. Por mais que se tente mudar essa realidade há, ainda,
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quem não consiga ver o negro no mesmo patamar que os de cor branca. “Acredito
que se falar em “superação” desta mentalidade ainda é utopia, mas, um dos
caminhos para a conscientização da não-discriminação e da prática contra o
racismo é através do conhecimento histórico, dentro das nossas salas de aula e
significativamente na relação direta professor/aluno”.
Segundo Praxedes, em seu texto “Educação para o respeito, à diversidade e
à diferença, (2010, p.1):
O contato entre humanos que se consideram diferentes tornou o debate sobre as diferenças humanas muito mais politizado e com consequências práticas na vida do dia a dia, tornando imprescindível o respeito e o reconhecimento recíprocos dos indivíduos e grupos que convivem nos mesmos espaços. Entretanto, percebe-se que é muito mais fácil chegarmos a um consenso sobre a necessidade do respeito às diferenças entre os humanos, do que termos, de fato, uma prática cotidiana de respeito aos seres humanos que consideramos diferentes.
Sendo assim, é conveniente abordar a reflexão colocada de que muitos dos
professores sentem a necessidade de maiores oportunidades de formação e
discussão sobre a questão abordada, pois são muitas as indagações e os desafios
enfrentados. Por isso, momentos de parada para leituras e ampliação de
conhecimentos sobre a temática em foco, nesse trabalho, ajudará a se fazer um
resgate histórico e a desconstruir socialmente o preconceito e a discriminação
racial que sofre a população negra, especialmente. Para tanto, fazer um resgate
histórico de imagens positivas do negro, a fim de propiciar a construção de um
campo menos favorável ao desenvolvimento do preconceito racial na educação e
na sociedade brasileira, é um dos meios de se diminuir o preconceito na escola e
na sociedade como um todo.
É consenso entre os participantes de que a caminhada é longa, mas
possível. É necessário levar até os alunos a história das lutas étnicas, o quanto os
conflitos raciais fizeram vítimas ao longo dos anos, para os alunos terem
conhecimentos dos dissabores e das conquistas. Porém, cabe aqui ressaltar os
questionamentos feitos no GTR, que servem para os professores pensarem na
forma que devem abordar o tema em sala de aula: “A voga atual do
multiculturalismo não poderá transformar o Brasil em uma nação multiétnica, onde
só teremos a figura do branco e do negro e este com direitos acima do branco?”
Outra ponderação pertinente foi a seguinte: “A lei 10639/03 que torna obrigatório o
ensino da História e Cultura Afro Brasileira nos estabelecimentos de ensino
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públicos e privados, não pode ser um instrumento de desagregação entre brancos
e negros?”.
Outras questões levantadas e passíveis de reflexão é que somente através
de estudo sério e profundo poderemos amenizar o preconceito ainda existente em
nossas escolas. Ele se apresenta em várias situações como o tão falado Bullying
que se manifesta, muitas vezes, por atitudes discriminatórias como apelidos,
insultos, situações vexatórias em que a vítima passa vergonha na frente dos
colegas. Essas situações, quando abordadas, são, na maioria das vezes, tratadas
com discursos inertes que na prática apenas informam sobre o problema, sem
proporcionar uma ação combativa a esta situação que aflige muitos de nossos
educandos e educandas.
Por isso, os educadores precisam de formação continuada sobre o assunto,
bem como reunir a escola para debates frequentes e busca de soluções em
conjunto. Caso contrário, continuaremos a flagrar atitudes de preconceito, racismo
e discriminação em nosso meio.
Para Luft, num artigo para a revista Veja, usado como fonte de leitura no
grupo de estudos:
Por que não tentamos ser simplesmente naturais? Por que achar que somos melhores que os outros, que nossas ideias, posturas ou tendências são as que todos devem seguir? Por que não aceitamos o outro como ele é, quem sabe gago, tímido, gordo, baixo, alto demais, magro demais, talvez lento de raciocínio, possivelmente de outra raça ou credo, ou pobre, ou amando lá do seu jeito? Sem o tratar como coitadinho, que é o que em geral algumas campanhas fazem – algumas bem intencionadas. (Revista Veja, 2011, p.24)
Para tanto, de acordo com as contribuições dadas pelos participantes do
GTR e do grupo de estudos, “É necessário que além da abordagem do tema,
evidencie-se o real cumprimento da lei e a prática de ações combativas às várias
formas de preconceito, racismo e discriminação, visando à promoção do respeito e
da igualdade em todos os ambientes sociais, inclusive nas escolas brasileiras.
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Conclusão
Considerando o que fora apresentado nesse artigo, pode-se concluir que a
atitude de solidariedade, respeito e aceitação do próximo, diante das diferentes
características étnicas raciais, é um tanto complexa, uma vez que depende em
muito de um vasto conhecimento da pessoa humana e de uma postura de
empenho e força de vontade por parte do indivíduo, seja ele adulto, jovem, criança,
idoso, em promover a mudança de sua concepção de mundo e, por consequência,
de sua prática social.
Para tanto, o professor de História, bem como os de outras disciplinas que
atuam na escola, precisam, antes de qualquer coisa, conhecer as teorias que
embasam os estudos voltados para a diversidade étnica racial. Como afirma
Antunes (2003, p.108), “o professor precisa ser visto como alguém que pesquisa,
observa, levanta hipóteses, analisa, reflete, descobre, aprende, reaprende”.
Seguindo essas recomendações, o docente deixará seu comportamento inerte
diante de situações claras de preconceito racial na escola, alertando seu educando
a adotar uma postura mais crítica diante do diferente.
Para uma melhor convivência é fundamental conseguirmos realmente
enxergar o outro em todo seu potencial humano e criativo. Quando isso ocorre,
propicia-se ao outro sentir-se pertencente e aceito pelo grupo. A pessoa, quando
se percebe pertencente ao grupo, sente-se capaz para expor seus pensamentos e
sentimentos e empenha-se em se desenvolver, o que pode promover a convivência
harmônica entre todos, bem como o respeito.
O Brasil é um país com uma grande diversidade cultural e racial composta
por descendentes de povos africanos e de índios brasileiros, de imigrantes
europeus, asiáticos e latino-americanos. Por conta disso, podemos afirmar que o
Brasil é um país dotado de uma “pluralidade cultural”, ou seja, diferentes culturas
foram e são produzidas pelos grupos sociais que fazem parte da nossa história.
Essa pluralidade pode ser percebida nas diferentes formas com que os
habitantes deste grande país organizaram sua vida social e política, nas suas
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relações com o meio e com outros grupos, na produção de conhecimentos, etc. A
diferença entre culturas é fruto da singularidade desses processos em cada grupo
social.
No entanto, apesar de toda essa riqueza cultural e da diversidade existente,
uma série de desigualdades socioeconômicas assolam essas populações.
Segundo dados do IBGE, a população afrodescendente tem uma renda inferior à
da população branca, de descendentes de europeus e também da população
asiática. Mesmo constando como crime na Constituição Federal do Brasil de 1988,
a sociedade brasileira continua, em seu cotidiano, marcada por ações racistas e
discriminatórias.
Cabe à escola reconhecer essa realidade que também compõe o cenário
escolar, para que os alunos tenham esses conhecimentos do contexto sócio
histórico e econômico que levam ao preconceito e à discriminação. Por parte de
muitos jovens há atitudes de desprezo por aqueles que não têm o mesmo nível
social, econômico e cultural, de modo que trabalhar com eles um embasamento
teórico sobre essa questão pode ser uma forma de enfrentar a situação de
exclusão e insucesso escolar nas crianças e adolescentes que sofrem preconceitos
e discriminações. É preciso valorizar e respeitar as diferentes raças e etnias,
desenvolvendo propostas alternativas e utilizando materiais didáticos e
paradidáticos que contemplem a pluralidade racial e étnica de nosso país.
O grande desafio da escola é investir na superação da discriminação e dar a
conhecer a riqueza representada por essa diversidade étnica cultural que compõe
o patrimônio sociocultural brasileiro, valorizando a trajetória particular dos grupos
que compõem a sociedade, respeitando e valorizando as diferenças.
Vivemos em um mundo globalizado e tecnológico capaz de reduzir
distâncias, aproximar ou distanciar pessoas, aumentar o acesso a informações e
ao conhecimento, mas que também pode acentuar diferenças culturais, sociais e
econômicas. Mas, a partir do currículo do ensino fundamental e médio, cujos
princípios orientadores apontam para uma escola capaz de promover as
competências indispensáveis ao enfrentamento dos desafios sociais, culturais e
profissionais do mundo atual, faz-se importante promover momentos de discussão
numa perspectiva de ampliação do trabalho do professor, bem como do
crescimento do aluno.
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Atualmente, quando se fala em educação preventiva, mais do que
considerar a prevenção das doenças e suas consequências, analisam-se os fatores
que influenciam as condições de vida e de saúde das pessoas (individual e
coletivamente), entre eles as relações desiguais de gênero, classe, raça, cor da
pele e etnia, a privação da liberdade, bem como questões relacionadas à violência,
ao estigma, à discriminação e outras violações de direitos humanos.
Um trabalho com educação preventiva na escola, portanto, não se esgota na
transmissão de informações técnicas porque, isoladamente, elas não mudam
atitudes e comportamentos cultural e socialmente construídos. Por esta razão, o
ideal é que as ações sejam desenvolvidas de forma permanente e perpassassem
todas as disciplinas (interdisciplinaridade), envolvendo, também, todos os
segmentos da escola.
Nesses termos, ponderamos que o resultado no que tange à participação
dos professores, pedagogos e funcionários nos grupos de estudo realizados no
Colégio Estadual Parigot de Souza foi de suma importância, uma vez que nos
levaram a refletir sobre o preconceito, o racismo e consequentemente a
discriminação que ainda imperam, apesar das grandes mudanças tecnológicas, da
transformação social, cultural e até econômica pela qual a sociedade passou.
Como assinalado no corpo desse artigo, houve uma significativa participação
do grupo do GTR nas discussões sobre o assunto em questão, de modo que as
opiniões pessoais e os debates a partir das várias leituras propostas apontadas
pela professora tutora configuraram-se como uma forma preciosa de se reconhecer
as várias opiniões sobre o preconceito, o racismo e a discriminação, bem como
mostrou que a escola tem um grande trabalho pela frente, pois esses eventos são
herança cultural, de cunho familiar e mais que uma conscientização sobre o tema,
precisamos de sensibilização.
Todavia, acreditamos que a teoria e mais o conjunto de propostas práticas
contempladas nos grupos de estudos e no GTR possibilitaram uma ampla reflexão sobre as
mudanças necessárias no que se refere ao modo de pensar, sentir e agir sobre o “diferente”.
É necessário, de acordo com as diversas opiniões obtidas nesses trabalhos que a escola
pública seja um espaço de confiança, um lugar para a liberdade, para a alegria e para o
prazer da produção de conhecimento científico e reconhecimento do “outro” enquanto
pessoa, desprovida de todas as atribuições de cunho econômico, das heranças culturais e
sociais, no sentido de celebrar a pessoa naquilo que ela é e traz de sua história familiar e
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sociocultural.
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