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RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 232 1.3 CONTRATO DE PARTILHA DE PRODUÇÃO 1.3.1 Conceito O Contrato de Partilha de Produção (“PSA” ou “PSC”, na sigla em inglês) atual foi desenvolvi- do na Indonésia no início da década de 1960, e ainda hoje é utilizado como modelo ou referência por diversos países produtores, dos quais destacamos Angola, China e Egito. No decorrer do estudo contem- plaremos as diferenças entre esses modelos quanto à sua forma e aplicação. Inicialmente, o PSC também foi adotado em resposta ao relativo desequilíbrio entre países produtores do Oriente Médio e Ocs, presente nos primeiros Contratos de Concessão, conforme desen- volvido no item I.2.1 deste trabalho. O PSC inverteu a lógica da propriedade do hidrocarboneto explotado, antes de titularidade da OC, passando-a para o Estado. Assim, o Estado não mais seria remunerado por meio de royalties e tributos pelo direito outorgado às OCs pela explotação exclusiva desta riqueza mineral, 440 mas, ao con- trário, o hidrocarboneto extraído passaria a ser de propriedade do Estado, parte do mesmo sendo entre- gue à OC como remuneração por suas atividades e pelo risco da exploração e produção. Tal definição conceitual do PSC é unânime no entendimento da doutrina e dos marcos regulatórios estudados, uma vez que as variações nesses modelos não atingem o que se refere à propriedade do hidrocarboneto. Hoje em dia, o PSC tem sido amplamente utilizado na África e na Ásia, como modelo na regu- lação das atividades de exploração e produção em seus territórios. Por meio dos PSCs, o Estado hospedeiro contribui primordialmente com a área territorial a ser explorada (accreage), outorgando à OC 441 o direito exclusivo de conduzir atividades de exploração e produção sem, no entanto, acarretar qualquer forma de arrendamento ou transferência de propriedade. A OC, então, explora a área a seu próprio risco e custo e recebe parte dos hidrocarbonetos produzidos como compensação pelo risco. Assim, caso hidrocarbonetos não sejam encontrados ou as reservas não sejam comercializáveis, o contrato termina sem qualquer direito à OC de recuperar seus custos. A contrapartida para a OC ocorre apenas em caso de sucesso das operações, possibilitando a recuperação dos custos incorridos e investimentos realizados nas fases de exploração e desenvolvimento, através do recebimento de uma porcentagem fixa da produção, normalmente denominada “petróleo de custo” (cost oil). O petróleo remanescente, denominado “petróleo de lucro” (profit oil), corresponde à parcela da produção que será partilhada entre o país produtor e a OC, de acordo com os termos previamente estabelecidos no PSC. Esta partilha do resultado (produção) dos trabalhos realizados pela OC é que dá nome ao contrato. Ainda como resposta aos contratos de concessão antigos, que não possuíam quaisquer obri- gações, parâmetros ou prazos para realização das atividades, os PSCs geralmente incluem programas previamente estabelecidos de exploração e de produção que devem ser cumpridos pela OC. No acompanhamento dos mencionados programas de exploração e produção, o Estado parti- cipa da administração do negócio diretamente ou por meio de uma NOC, como é o caso da gestão dos negócios realizada pela BP MIGAS, no modelo da Indonésia. Há casos também em que a NOC participa ativamente nas atividades de E&P, como por exem- plo, na China, onde a OC realiza as operações até que o Estado, por intermédio da NOC, exerça sua 440 Registra-se que em alguns países o pagamento de participação governamental se aplica em PSCs. 441 A parte privada no PSC pode ser uma só pessoa jurídica, ou um grupo de OCs por meio de consórcio.

Regimes Jurídicos Regulatorios e Contratuais de E&P

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Artigo sobre direito do petroleo

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RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL232

1.3 CONTRATO DE PARTILHA DE PRODUÇÃO

1.3.1 Conceito

O Contrato de Partilha de Produção (“PSA” ou “PSC”, na sigla em inglês) atual foi desenvolvi-

do na Indonésia no início da década de 1960, e ainda hoje é utilizado como modelo ou referência por

diversos países produtores, dos quais destacamos Angola, China e Egito. No decorrer do estudo contem-

plaremos as diferenças entre esses modelos quanto à sua forma e aplicação.

Inicialmente, o PSC também foi adotado em resposta ao relativo desequilíbrio entre países

produtores do Oriente Médio e Ocs, presente nos primeiros Contratos de Concessão, conforme desen-

volvido no item I.2.1 deste trabalho.

O PSC inverteu a lógica da propriedade do hidrocarboneto explotado, antes de titularidade

da OC, passando-a para o Estado. Assim, o Estado não mais seria remunerado por meio de royalties e

tributos pelo direito outorgado às OCs pela explotação exclusiva desta riqueza mineral,440 mas, ao con-

trário, o hidrocarboneto extraído passaria a ser de propriedade do Estado, parte do mesmo sendo entre-

gue à OC como remuneração por suas atividades e pelo risco da exploração e produção. Tal definição

conceitual do PSC é unânime no entendimento da doutrina e dos marcos regulatórios estudados, uma

vez que as variações nesses modelos não atingem o que se refere à propriedade do hidrocarboneto.

Hoje em dia, o PSC tem sido amplamente utilizado na África e na Ásia, como modelo na regu-

lação das atividades de exploração e produção em seus territórios.

Por meio dos PSCs, o Estado hospedeiro contribui primordialmente com a área territorial a ser

explorada (accreage), outorgando à OC441 o direito exclusivo de conduzir atividades de exploração e

produção sem, no entanto, acarretar qualquer forma de arrendamento ou transferência de propriedade.

A OC, então, explora a área a seu próprio risco e custo e recebe parte dos hidrocarbonetos produzidos

como compensação pelo risco. Assim, caso hidrocarbonetos não sejam encontrados ou as reservas não

sejam comercializáveis, o contrato termina sem qualquer direito à OC de recuperar seus custos.

A contrapartida para a OC ocorre apenas em caso de sucesso das operações, possibilitando a

recuperação dos custos incorridos e investimentos realizados nas fases de exploração e desenvolvimento,

através do recebimento de uma porcentagem fixa da produção, normalmente denominada “petróleo

de custo” (cost oil). O petróleo remanescente, denominado “petróleo de lucro” (profit oil), corresponde

à parcela da produção que será partilhada entre o país produtor e a OC, de acordo com os termos

previamente estabelecidos no PSC. Esta partilha do resultado (produção) dos trabalhos realizados pela

OC é que dá nome ao contrato.

Ainda como resposta aos contratos de concessão antigos, que não possuíam quaisquer obri-

gações, parâmetros ou prazos para realização das atividades, os PSCs geralmente incluem programas

previamente estabelecidos de exploração e de produção que devem ser cumpridos pela OC.

No acompanhamento dos mencionados programas de exploração e produção, o Estado parti-

cipa da administração do negócio diretamente ou por meio de uma NOC, como é o caso da gestão dos

negócios realizada pela BP MIGAS, no modelo da Indonésia.

Há casos também em que a NOC participa ativamente nas atividades de E&P, como por exem-

plo, na China, onde a OC realiza as operações até que o Estado, por intermédio da NOC, exerça sua

440 Registra-se que em alguns países o pagamento de participação governamental se aplica em PSCs.441 A parte privada no PSC pode ser uma só pessoa jurídica, ou um grupo de OCs por meio de consórcio.

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opção de se tornar o operador em campos que já tenham iniciado a produção ou qualquer descoberta

de reservas. A mencionada opção só pode ser executada após todos os custos incorridos no desenvolvi-

mento do campo serem recuperados pelo “cost oil”.

1.3.2 Principais características

1.3.2.1 Aspectos Gerais

Um dos principais objetivos dos PSCs é atrair empresas multinacionais do setor de óleo e gás

interessadas em arriscar capital e utilizar-se da expertise tecnológica destas para desenvolver as reservas

do Estado hospedeiro. Na maioria dos países que utilizam o regime de PSC, a NOC figura como parcei-

ra nos empreendimentos, compartilhando também a gestão das atividades de E&P, com vistas a adquirir

conhecimento (know-how) da OC, de modo que a explotação destas reservas possa eventualmente ser-

lhe transferida.442 O PSC foi utilizado pela primeira vez na Indonésia na década de 1960, como alternati-

va ao antigo modelo de concessão, e espalhou-se por diversos outros países, sendo utilizado atualmente

em Angola, Egito, Líbia, Filipinas, Malásia, Peru, Guatemala, Trinidad-Tobago, Quênia, Costa do Marfim

e Guiné Equatorial, dentre outros.

A característica marcante dos PSCs se expressa na propriedade dos hidrocarbonetos produzi-

dos. Considerando a posição estratégica e a força econômica das atividades de E&P de hidrocarbonetos

na maioria dos países produtores, ao garantir ao Estado a propriedade do óleo e do gás produzidos

evidenciam-se os aspectos políticos ligados a estas atividades, tais como nacionalismo, maior controle

estatal sobre as atividades econômicas etc. Analisando historicamente, percebe-se que os primeiros

PSCs surgiram exatamente por um anseio político, especialmente nos países em desenvolvimento, de se

contrapor às primeiras concessões, que eram vistas pela população dos países produtores como juridi-

camente permissivas e economicamente desequilibradas em favor das OCs. As implicações econômicas

de cada um destes regimes, no entanto, serão analisadas em outros tópicos do presente trabalho

1.3.2.2 Propriedade dos Hidrocarbonetos Produzidos

Considerando a preocupação dos países produtores em garantir sua soberania sobre os recur-

sos minerais,443 especialmente a partir da Segunda Guerra Mundial todas as nações, com exceção dos

Estados Unidos da América,444 passaram a assegurar expressamente, em suas respectivas legislações,

a propriedade das reservas antes de sua extração. Portanto, independentemente do Regime ou do país

(ressalvada a situação da exploração onshore nos EUA), os hidrocarbonetos, antes de sua extração, são

de propriedade do Estado hospedeiro. Como mencionado nos capítulos acima, no contrato clássico de

442 SMITH, Ernest E. et al; “International Petroleum Transactions”; Ed. Rocky Mountain Mineral Law Foundation, 2ª Edição, 2000; p. 448.443 SILVA, Fernando Fernandes da; “Direito do Petróleo e Gás – Aspectos Ambientais e Internacionais”. Artigo: “As Concessões Internacio-

nais e a Concessão de Exploração de Petróleo no Direito Brasileiro”; 1ª Ed, p. 15.444 MUTTIT, Greg. “CRUDE DESIGNS: The rip-off of Iraq’s oil wealth”; publicado por PLATFORM e disponível em www.carbonweb.com

(acesso em 05/11/2008); p. 10.

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Concessão, primeira forma usual de exploração comercial de hidrocarbonetos, se outorgavam extensos

territórios por longos períodos de tempo, prevendo-se, ainda, a transferência da propriedade do pe-

tróleo produzido às OCs que haviam adquirido a Concessão. Em contrapartida, as OCs deviam pagar

tributos ou outras formas de compensação financeira pelo óleo produzido ao Estado, mas os valores

repassados eram relativamente de pequena monta.

O PSC, por sua vez, conforme observado acima, inverteu a lógica do fluxo petróleo-moeda nos

países que o adotaram, dado que, neste sistema, os países produtores transferem às OCs tão somente

o direito exclusivo de conduzir as atividades de exploração e produção dos minerais do subsolo, sem,

no entanto, transferir às OCs quaisquer direitos de propriedade sobre o subsolo. Os hidrocarbonetos

produzidos permanecem, portanto, de propriedade do Estado hospedeiro (ou da NOC, conforme o

caso) que contrata a OC para efetuar a exploração de hidrocarbonetos sob seu próprio risco.445 No caso

de viabilidade comercial de descoberta feita pela OC, o Estado, como proprietário dos hidrocarbonetos

produzidos pela OC, deverá ressarci-la pelos seus custos na explotação das reservas (“cost oil”) e par-

tilhar entre o próprio Estado (ou a NOC) e a OC o petróleo restante (“profit oil”), conforme proporções

previamente acordadas no instrumento contratual.

Outra característica dos PSCs que compôs esta revolução nas atividades de E&P de hidrocarbo-

netos foi a maior participação e controle do Estado nesse segmento. Diretamente, ou por meio da NOC,

o Estado hospedeiro passou, nos PSCs, a ter voz ativa na administração e na negociação das atividades

petrolíferas, assumindo, assim, maior controle e fiscalização sobre estas atividades.

Portanto, a nova “filosofia” de contratação aplicada ao mercado de E&P com o uso dos PSCs

alinhava-se perfeitamente aos anseios nacionalistas do pós-guerra, ao garantir a manutenção da pro-

priedade dos hidrocarbonetos produzidos pelo Estado, ao passo em que o inseria na esfera de tomada

de decisões sobre exploração e produção, em contraponto à posição totalmente passiva e não-regula-

dora assumida pelos Estados nas concessões clássicas do início do século XX.

Não obstante a questão de a quem pertence o petróleo, a introdução dos PSCs446, em com-

paração com as concessões clássicas, gerou uma grande mudança, garantindo maiores receitas aos

Estados, e maior participação no controle da explotação de hidrocarbonetos. Considerando a enorme

importância estratégica da exploração e produção de óleo e gás para os países produtores, assumir um

papel ativo na condução destas atividades tornou-se uma importante arma política e econômica. Com

esta nova ferramenta, muitos países produtores puderam desenvolver outros setores de suas economias

e novas políticas públicas.

Por outro lado, é fundamental ressaltar o fato de que, apesar de no regime de Partilha de

Produção a propriedade dos hidrocarbonetos não ser transferida às OCs, as OCs têm o direito de con-

tabilizar as reservas em suas demonstrações financeiras, o que é de enorme interesse para elas, pois

o valor de mercado das OCs guarda direta relação com as reservas petrolíferas que controla.447 Dado

que os países produtores competem entre si internacionalmente pelos investimentos das OCs, permitir a

contabilização das reservas em nome das OCs é um importante fator de atração de investimentos

Como exemplo de nação que utiliza em suas atividades de exploração e produção os PSCs,

podemos citar a Constituição da República da Indonésia, que em tradução livre do seu art. 33, determi-

na que: “Todos os recursos naturais no solo e nas águas do país estão sob jurisdição do Estado e devem ser

445 PALIASHVILI, Irina, Presidente do “Comitê Jurídico Rússia-Ucrânia”; “THE CONCEPT OF PRODUCTION SHARING”, transcrição do Seminário sobre Legislação de PSC, em Setembro de 2008. Retirado do site http://www.rulg.com/documents/ The_Concept_of_Produc-tion_Sharing.htm em 05/11/08.

446 MUTTIT, Greg; in “CRUDE DESIGNS: The rip-off of Iraq’s oil wealth”; publicado por PLATFORM e disponível em www.carbonweb.com (acesso em 05/11/2008); p. 10.

447 BINDEMANN, Kirsten; “Production Sharing Agreement: An Economic Analysis”; publicado por “Oxford Institute of Energy Studies”, 1999; p. 10.

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usados em prol do benefício e bem-estar das pessoas”.448 A legislação petrolífera deste país, em especial a

Lei do Petróleo e Gás Natural da Indonésia, tem como base a disposição constitucional acima indicada,

mantendo a propriedade do petróleo nas mãos estatais, por meio dos PSCs, conforme será detalhado

quando da análise deste país no item I.3.3.2.

De forma semelhante, a nova “Lei das Actividades Petrolíferas” de Angola (Lei 10/04 de 12

de novembro de 2004) que veio a substituir a “Lei Geral das Actividades Petrolíferas”, (Lei 13/78 de 26

de agosto de 1978) manteve o princípio fundamental da propriedade do Estado sobre os recursos pe-

trolíferos herdados do ordenamento constitucional, assim como o regime de monopólio nas outorgas e

associação obrigatória das OCs com o Estado.449

Conclui-se, portanto, que uma característica comum dos países produtores que utilizam os

PSCs é a manutenção, em mãos estatais, da propriedade dos hidrocarbonetos, mesmo após a sua extra-

ção. As fórmulas de partilha do óleo produzido entre o Estado hospedeiro e as OCs serão examinadas

mais adiante, em tópico específico.

I.3.2.3 Instrumento Jurídico Firmado entre o País Produtor e a OC

O instrumento jurídico a ser firmado entre o Estado hospedeiro (ou a NOC) e as OCs sob o

Regime de Partilha de Produção é, justamente, o Contrato de Partilha de Produção. Este é o documento

que, formal e primordialmente, vinculará as partes e determinará os direitos e obrigações de cada um.

A grande diferença entre um contrato de Concessão e um PSC é de natureza legal, sobre a pro-

priedade da produção, conforme explicado anteriormente. Sob este ponto de vista, há alguns autores que

consideram o PSC um contrato de prestação de serviços, em que a OC opera com o status de contratada

em face do detentor dos direitos de mineração e proprietário dos hidrocarbonetos, que é o próprio Estado

hospedeiro ou uma NOC para que, em seguida, uma parte da produção seja recebida pela OC sob o PSC

como um pagamento ou compensação pelos serviços prestados. O óleo recebido pela OC nesta partilha

seria, portanto, proveniente de pura avença contratual, dado que a propriedade dos hidrocarbonetos antes

e após a sua extração é do Estado hospedeiro, o que difere substancialmente dos Contratos de Concessão.

Por outro lado, o PSC pode ser visto como um contrato de características puramente associativas,

onde a OC não presta um serviço ao Estado e, sim, se associa a ele com o objetivo comum de produzir e

partilhar o petróleo extraído. Argumentos que corroboram esta segunda tese são: (i) o fato de que, no PSC,

a OC detém a responsabilidade sobre as operações, o que não seria plausível caso ela figurasse como

mera prestadora de serviços; (ii) a propriedade ao óleo (tanto o cost oil como o profit oil) já ser assegurada

de plano, embora apenas se aperfeiçoe com a tradição do hidrocarboneto produzido, após procedimentos

operacionais de separação, tratamento e medição, dentro de uma periodicidade ajustada no instrumento,

e (iii) o fato de as OCs poderem computar as reservas em suas demonstrações financeiras.

Apesar de variações na estrutura dos PSCs com o passar do tempo e com sua dispersão pelo mun-

do, existe uma série de características básicas aplicáveis a todos os PSCs, quais sejam: (i) a OC é apontada

pelo Estado hospedeiro (ou pela NOC) como contratada em determinada região e por determinado tempo;

(ii) a OC operará sob suas expensas e risco, sob supervisão do Estado hospedeiro; (iii) a OC deverá fornecer

todo o material, equipamento e pessoal necessário à condução das operações; (iv) a produção, existindo,

pertencerá ao Estado hospedeiro; (v) a OC terá direito de recuperar seus investimentos a partir da produção

448 República da Indonésia; Constituição Federal de 27 de dezembro de 1949.449 International Business Publications; “ANGOLA Oil & Gas Exploration Laws and Regulations Handbook”, Volume I; 4a Edição, 2008; p. 58.

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da área contratualmente estipulada; (vi) após a recuperação dos custos, o restante da produção será partilha-

do entre a OC e o Estado hospedeiro em proporções previamente estabelecidas no PSC; (vii) as receitas da

OC estão sujeitas a taxação e (viii) a propriedade dos equipamentos e das instalações é transferida ao Estado

hospedeiro ao final do contrato ou progressivamente, de acordo com o cronograma de amortizações.

Em alguns casos, outros instrumentos contratuais podem ser firmados, subsidiariamente ao PSC. O

mais comum é o “Joint Operating Agreement” ou JOA, que tem como objetivo governar as relações, principal-

mente operacionais, entre as partes interessadas, definindo seus direitos e obrigações e descrevendo os proce-

dimentos a serem observados. O JOA tipicamente inclui: (i) o escopo das operações; (ii) designação, direitos e

obrigações do operador; (iii) a criação de um Comitê de Operações (no caso de as decisões sobre as operações

serem compartilhadas entre a OC e a NOC); (iv) a disposição da produção; (v) cláusulas sobre abandono, de-

sistência, retirada ou cessão; (vi) confidencialidade; (vii) força maior e (viii) resolução de disputas e foro.

Abrangência Territorial Típica dos PSCs

A análise de diversos países que adotam o regime de PSC evidencia a dificuldade de se esta-

belecer padrões em termos de duração e abrangência territorial dos PSCs. Conforme já analisado ante-

riormente, desde a época das concessões clássicas, tanto a duração como a abrangência territorial das

áreas exploratórias tenderam a uma sensível redução, independentemente do regime adotado. Em um

extremo, por exemplo, podemos encontrar a Venezuela,450 que tem a abrangência territorial das áreas

exploratórias definida pelo Ministério da Energia e Petróleo sem, no entanto, poder ultrapassar os 100

km² por área devido à existência de disposição legal neste sentido. No outro extremo, porém, temos a

legislação da Indonésia, que determina que a abrangência territorial das áreas exploratórias será defini-

da caso a caso pelo ministério competente após consulta ao Governo Regional (Lei do Petróleo Art. 12).

As áreas concedidas na Indonésia costumam ser de grandes extensões.

Outro país emblemático na utilização de PSC, tanto por utilizar este regime há décadas, quanto

por sua crescente produção de hidrocarbonetos, é Angola. Nesse país, a definição das áreas é determi-

nada no “Decreto de Concessão” (mais precisamente, um decreto de outorga),451 mediante autorização

do Governo, nos termos solicitados e justificados pela Sonangol, conforme estipulado pelo art. 11 da

“Lei das Actividades Petrolíferas”. Não há, portanto, limitação da abrangência territorial na supracitada

norma angolana. O PSC deverá fazer menção ao decreto que aprovou a exploração daquela área es-

pecífica e refletir exatamente a abrangência territorial e os prazos previstos no decreto.

I.3.2.4 Mecanismos Típicos de Remuneração ao Governo e à OC

Independentemente do sistema fiscal utilizado, o ponto principal da questão financeira é como

os custos são recuperados e como o lucro é dividido. A fim de atingir tal objetivo, de maneira a maximi-

zar a participação governamental enquanto mantém o interesse das OCs, o Estado hospedeiro deverá

formular e implementar um sistema tributário que (i) permita um retorno justo ao Estado e à indústria;

(ii) evite especulação indevida; (iii) previna custos administrativos desnecessários; (iv) seja flexível, ao

abranger de modo eficiente grandes variações tanto nos níveis de produção como no preço dos hidro-

450 Nota do autor: Apesar de a Venezuela não adotar o Regime do PSC e sim da Joint Venture, utilizamos esse país como exemplo para ilustrar a comparação histórica relativa à extensão das áreas retidas para E&P.

451 Nota do autor: É comum nas pesquisas realizadas detectar inconsistências terminológicas para os fins deste trabalho que podem gerar dúvida quanto à natureza ou caracterização de um Regime, objeto da pesquisa. Exemplo é a denominação expressa na lei angolana que intitula o Regime por eles adotado como “Decreto de Concessão” quando se trata de outorga de um PSC.

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carbonetos; e (v) crie um ambiente saudável de competição e de eficiência dos mercados. Formular um

sistema tributário eficiente deve levar em consideração, ainda, os riscos políticos e geológicos, assim

como as potenciais recompensas.452

Remuneração Governamental no Regime de PSC

Conforme explanado nos tópicos anteriores, sob o Regime de PSC, o risco integral é da OC,

que tem o direito de dividir a produção do petróleo com o Estado.

No caso de PSCs, o Estado hospedeiro é remunerado com o petróleo extraído, em parcelas

que invariavelmente são superiores à metade da produção. Essa divisão da produção entre as partes é

a principal fonte de remuneração do país produtor no PSC.

A grande diferença deste regime em relação ao da Concessão, no que concerne às participa-

ções governamentais, é que, regra geral, não há o pagamento de royalties. No entanto, os demais tributos

costumam incidir sobre o resultado obtido pela OC. De fato, é possível a incidência de imposto de renda

devido pelos contratantes sobre a parcela de cada um na produção, sendo certo que o valor do imposto

devido pode ser pago por meio do aumento da parcela de participação governamental na produção.453

Pode existir, ainda, pagamento de bônus e taxas nos PSCs, cujo fato gerador varia conforme a

criatividade e a opção do legislador ou negociador de cada país, podendo ser devido: (i) na descoberta;

(ii) na declaração de comercialidade; (iii) na submissão do Plano de Desenvolvimento; (iv) no início da

produção; (v) após determinado volume produzido (i.e. produção acumulada) ou, ainda, (vi) após ser

atingido determinado patamar de produção diária.

Na Indonésia, por exemplo, existe o chamado “First Tranch Petroleum” (FTP), pelo qual os pri-

meiros 20% da produção devem ser divididos entre a OC e a NOC em porcentagens iguais às do “profit

oil”.454 Isto é, ainda que na Indonésia não exista limite da porcentagem de exploração considerada afeta

à recuperação dos custos, ou seja, ainda que o “cost oil” seja considerado ilimitado, esta recuperação só

poderá ser feita sobre 80% do output. Sobre esse volume a distribuição do “profit oil” varia nas propor-

ções possíveis entre 65/35 e 55/45 para a NOC e a empresa contratada, respectivamente. Além disso,

a Indonésia, em geral, exige o pagamento de Bônus de Assinatura e de Produção.

Observe-se ainda, com referência ao pagamento de tributos, que em 1980, o Governo indo-

nésio foi persuadido a mudar seus procedimentos de recolhimento de imposto de renda para aceitar

pagamentos diretos de impostos pela OC, em virtude de dificuldades que as OCs norte-americanas

estavam tendo perante o IRS em ter os pagamentos de tributos feitos pela NOC Petarmina reconhecidos

para fins de crédito tributário. Os termos dos PSCs firmados à época na Indonésia foram interpretados

de acordo com as leis tributárias norte-americanas como se não houvesse pagamento de imposto de

renda. Os contratos foram então revisados de modo que a OC pagasse diretamente ao Governo da-

quele país a tributação aplicável.455

Em Angola, à semelhança da Indonésia, não se pagam royalties; porém, o imposto de renda

(IR) é fixado em 50%. Angola tem, atualmente, tributação específica para as atividades petrolíferas,

regidas pela Lei 13/2004 para a “Tributação das Actividades Petrolíferas”. A referida lei é aplicável a

todas as empresas nacionais ou estrangeiras, que estejam exercendo atividades petrolíferas no território

angolano. O limite de “cost oil” em Angola é fixado em 50%, enquanto em países como a Nigéria esse 452 “Fiscal Terms for Upstream Projects – An Overview” – Artigo publicado pelo “Center for Energy Economics” (CEE) da Universidade do Texas

em Austin. Disponível em www.utexas.edu e acessado em 17/11/2008.453 SUNLEY, E. M., BAUNSGAARD, T. e SIMARD, D.; “Revenue from the Oil and Gas Sector: Issues and Country Experience; Fiscal Policy For-

mulation and Implementation in Oil-Producing Countries”. Ed. Jeffrey M. Davis, Rolando Ossoski e Annalisa Fedelino Washington: Fundo Monetário Internacional. 2003, pp. 153-183.

454 Nota do autor: Os conceitos de profit oil (petróleo de lucro) e cost oil (petróleo de custo) serão explicados adiante.455 TAVERNE, Bernard; “Petroleum, Industry and Governments”; Ed. Wolters Kluver, 2ª Edicão, 2008; pp. 301 e 302.

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limite não existe, e em outros países como o Catar, Gabão e Costa do Marfim ele é bem inferior, repre-

sentando cerca de 30%. Ainda que se tenha de pagar Bônus de Assinatura em Angola, o fato de ser o

único grande produtor africano que utiliza a taxa de retorno como base de cálculo do “profit oil”, faz

com que este país represente um investimento muito atrativo, em contraposição a outros países africanos

onde os royalties chegam aos 20% e a base de cálculo do “profit oil é baseada em volume de produção.

Com base no sistema de taxa de retorno, à medida que a taxa de retorno aumenta, diminui a participa-

ção da OC no “profit oil”, e uma vez apurado este último, o Fisco angolano cobra um Imposto de Renda

Petrolífero no valor de 50%.456

Já no Egito, além da divisão dos hidrocarbonetos produzidos conforme previsão do PSC, as OCs

estão sujeitas a todas as regras nacionais sobre tributação de renda. Esta tributação recai sobre as vendas

pela OC do petróleo produzido, deduzindo-se os custos incorridos pela OC que tenham sido devidamente

autorizados, nos termos do PSC. Cumpre, porém, observar que os rendimentos atribuídos a determinado

contrato se mantêm separados, para fins de tributação de quaisquer outras atividades realizadas pela OC,

ou seja, não pode a OC compensar lucros nas atividades petrolíferas com prejuízos em outras áreas.

Remuneração da OC no Regime de PSC

a) Cost Oil

Considerando que os custos incorridos pelas OCs na exploração de petróleo e gás somente

serão recuperáveis em caso de descoberta economicamente viável, deve o PSC reger a divisão da pro-

dução entre a OC e o Estado hospedeiro (diretamente ou por meio da NOC) quando esta se mostrar

comercialmente viável.

Existem diferentes sistemas de partilha da produção, mas basicamente todos se dividem em

duas categorias principais: (i) o “modelo indonésio” de PSC, em que a OC recebe primeiro uma aloca-

ção da produção destinada a reembolsá-la de seus custos e despesas (às vezes dentro de certos limites

preestabelecidos) e então, após a recuperação dos custos, um percentual do restante da produção e;

(ii) o “modelo peruano” de PSC, também utilizado em países como Bolívia e Trinidad-Tobago, em que

a OC recebe determinado percentual da produção como único pagamento por seus custos, despesas

e lucro.

Este último modelo de PSC, num primeiro momento, foi considerado como um progresso em

direção à simplificação dos PSCs (tradicionalmente reconhecidos como contratos altamente complexos).

Posteriormente, no entanto, tanto os países produtores como as OCs passaram a fazer severas críticas.

Para os países produtores, uma partilha fixa da produção que não leva em conta o preço do petróleo

pode representar uma enorme perda de receita perante à OC, como de fato ocorreu em muitos desses

contratos na década de 1970. Sob o ponto de vista da OC, no entanto, uma parcela fixa e geralmente

alta do Estado hospedeiro na partilha (geralmente entre 50% e 60%) resulta em algo muito semelhante

a altos royalties sob uma concessão, independentemente dos resultados econômicos da exploração. A

imediata consequência seria, então, que campos marginais ou pequenos não seriam postos em produ-

ção, em razão de sua inviabilidade econômica.

Pelas razões acima elencadas, o “modelo indonésio” tem sido mais amplamente utilizado,

apesar de haver exceções, como a Guatemala e a Líbia, que ainda utilizam o “modelo peruano”. A

título de exemplo, um contrato firmado entre a Líbia e a empresa Mobil na década de 1970 previa

expressamente que os investimentos em exploração feitos pela OC não seriam recuperáveis mesmo

456 GUTMAN, José. “Tributação e Outras Obrigações na Indústria do Petróleo”. Ed. Freitas Bastos, 2007, pp. 349-387.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 239

em caso de descoberta comercial significante, o que enfatiza a inexistência do “cost oil”. Durante a

fase de produção, o hidrocarboneto produzido será dividido, ficando o Governo com 85% e a Mobil

com 15% da produção em área “onshore” e 81% para o Governo e 19% para a Mobil em áreas “off-

shore”,457 sendo esse percentual da produção o único pagamento por seus lucros, custos e despesas

na operação.

É crucial definir a questão dos custos incorridos pela OC, assim como sua forma de recupe-

rá-los por meio da partilha dos hidrocarbonetos extraídos a título de custo dedutível ou “cost oil”. A

análise de eventual limite de receita apropriável como custo dedutível pela OC deve iniciar-se, então,

pelas decisões a serem tomadas quanto a: (i) quais custos da multinacional poderão ser reembolsa-

dos; (ii) se juros ou algum bônus será acrescido sobre estes custos; (iii) como tais custos serão reembol-

sados (in natura ou em moeda, por exemplo); (iv) qual parcela caberá ao Estado hospedeiro durante

o período de reembolso; (v) se royalties, bônus e tributos serão descontados de uma ou de ambas as

partes e, finalmente, (vi) o que ocorre após a OC ter sido inteiramente reembolsada por seus custos

exploratórios.458

Dependendo da necessidade do país de atrair investimentos estrangeiros, atratividade essa di-

retamente relacionada ao prévio conhecimento das bacias sedimentares do Estado hospedeiro, os termos

para recuperação dos investimentos podem ser mais vantajosos às OCs, possibilitando, por exemplo, a

recuperação dos investimentos em prazos mais curtos. Alguns PSCs firmados pelas Filipinas, por exemplo,

chegaram a ter provisões de recuperação dos custos em 60% ou até 70% da produção bruta.459

Considerando que, sob a rubrica do “cost oil”, a OC poderá recuperar tanto suas despesas

operacionais, como custos de capital, uma das críticas comumente feitas ao regime de PSC recai

sobre a complexidade contábil dos cálculos feitos para determinar os custos incorridos pelas OCs,

assim como as fórmulas matemáticas para sua recuperação. Algumas vezes, os custos de financia-

mento são excluídos da noção de “cost oil” ou são reembolsados somente em parte. Considerando

que, geralmente, as OCs detêm maior expertise nas atividades contábeis utilizadas nas atividades

de E&P, além de estarem amparadas por empresas multinacionais de contabilidade altamente espe-

cializadas, elas poderiam implementar mecanismos contábeis de altíssima complexidade, de modo

a dificultar a fiscalização, pela NOC ou pelo Estado hospedeiro, dos custos incorridos. O objetivo

último desta estratégia consiste em apropriar, sob o “cost oil”, a maior quantidade de investimentos

possível, visto que 100% destas despesas serão reembolsadas e, geralmente, em curto espaço de

tempo.

b) Profit Oil

Em seguida à dedução do “cost oil” o remanescente da produção será dividido entre a OC e o

Estado hospedeiro. Esta porção da produção é conhecida internacionalmente como “profit oil”. Existem

diversos sistemas de partilha do “profit oil”, sendo as principais: (i) um percentual fixo de partilha, como

na Indonésia (p. ex.: 85% para o Estado e 15% para a OC); (ii) uma partilha progressiva baseada ou na

produção diária ou de forma cumulativa, aumentando-se a participação estatal de acordo com o au-

mento na produção; e (iii) partilha variável de acordo com a lucratividade das operações, distinguindo-

se, por exemplo, produção onshore de produção offshore ou a relação entre a produção de petróleo e a

de gás. Outra possibilidade dentro dos PSCs é a possibilidade de se criar uma espécie de provisão ou

reserva para o caso de o preço do petróleo atingir novos patamares, de modo a maximizar a apropria-

ção dos recursos pelo Estado hospedeiro.

457 HOSSAIN, Kamal; “Law and Policy in Petroleum Development”, Ed. Nichols Publishing Company, 1979, p. 151.458 SMITH, Ernest E. et al; “International Petroleum Transactions”. Ed. Rocky Mountain Mineral Law Foundation, 2ª Edição, 2000, p. 456.459 MIKESELL, Raymond F; “Petroleum Company Operations and Agreements”; Ed. Resources for the Future, 1984, p. 89.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL240

A opção de partilha progressiva, baseada na produção (diária ou cumulativa) é denominada

“sliding scales” e utilizada, dentre outros países, pela Indonésia. Os primeiros PSCs tendiam a ver a

divisão da produção como divisão de lucros; ou seja, a participação governamental nos PSCs era vista

como tributos pagos ao Estado hospedeiro e, portanto, creditáveis ante os governos locais da OC como

tributos pagos a governos estrangeiros (ao Estado hospedeiro). A partir de 1976, no entanto, os EUA

passaram a entender que a referida partilha não poderia ser considerada como pagamento de tributos

ao Estado hospedeiro, visto que o percentual da produção retido pelo proprietário dos recursos minerais

é característico dos royalties e não de tributos, de acordo com a legislação norte-americana.460 Para evi-

tar a tributação norte-americana, diversos países, como a Indonésia, realizaram algumas modificações

em seus PSCs, como: (i) transferir pagamentos antes feitos às NOCs diretamente para os governos; e (ii)

aumentar os níveis de taxação direta e de royalties, para atingir os níveis exigidos pela Receita Federal

Norte-Americana (Internal Revenue Service – IRS).

No tocante à tributação das OCs sob o regime de PSC, estas, geralmente, estão sujeitas à

tributação sobre as receitas oriundas de suas operações. Inicialmente, nos contratos firmados pela In-

donésia não havia previsão de tributação sobre o “profit oil”, e a parcela de óleo recebida pela OC era

considerada receita líquida. No entanto, com a nova interpretação das autoridades tributárias norte-

americanas, conforme já explicitado no item I.3.2.4 supra, a Indonésia e outros países recalcularam as

proporções da partilha e passaram a adotar tributação sobre as receitas das OCs. Conseqüentemente,

na prática, a questão de se a partilha será ou não feita antes da tributação não é de grande significância.

O mecanismo a ser adotado dependerá unicamente de questões políticas e/ou administrativas do Estado

hospedeiro, assim como da necessidade do país de pagamento in natura (óleo) em vez de pagamento

em moeda. A Líbia, por exemplo, não adota qualquer tributação sob o regime de PSC, mas retém uma

parcela de 81% da produção de hidrocarbonetos, repassando à OC apenas 19%. O percentual a ser re-

cebido pelas OCs, portanto, será previamente ajustado, de acordo com a necessidade ou conveniência,

pelo Estado hospedeiro, de tributar as atividades de exploração e produção de petróleo. Atualmente, o

IRS aceita, para fins de crédito tributário, a inclusão das despesas tributárias da OC perante o Estado

hospedeiro.

Uma última questão que influenciará os países produtores na determinação dos percentuais

da partilha é a maior ou menor necessidade de se atrair investimento estrangeiro. Por exemplo, consi-

derando o declínio da produção de hidrocarbonetos na Indonésia e a conseqüente necessidade do país

de atrair maiores investimentos estrangeiros no setor, houve uma recente alteração nos percentuais da

partilha de produção. Nos blocos ofertados a partir de 2005, as OCs têm recebido entre 20% e 35% do

“profit oil” para produção de petróleo e entre 30% e 40% para gás, ou seja, níveis superiores aos 15%

para petróleo e 30% para gás, comuns anteriormente.461

460 ISENBERGH, Joseph; “The Foreign Tax Credit: Royalties, Subsidies and Creditable Taxes”. Ed. Tax L. Rev, 1984; pp. 251-252.461 International Business Publications; “INDONESIA Oil & Gas Exploration Laws and Regulations Handbook”, Volume I; 5a Edição, 2008; p.

125.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 241

I.3.2.5 Papéis e Responsabilidades da OC e do Governo

Analisando-se diversos países que utilizam o regime de PSC nas suas atividades de exploração

e produção de petróleo, percebe-se que o arcabouço institucional depende, acima de tudo, do regime

político-constitucional adotado pelo país. A outorga de poderes de exploração e explotação de petróleo

do Estado hospedeiro às OCs ocorrerá, sobretudo, de acordo com os ditames constitucionais de cada

nação. Existem, no entanto, alguns atores principais presentes em todos os marcos regulatórios analisa-

dos, que exercem, ou fazem exercer, essas atividades de E&P, dentre os quais destacamos: (i) o Governo

do Estado hospedeiro, que pode agir diretamente, por meio de ministérios ou de agências regulatórias;

(ii) a NOC, que pode figurar como outorgante dos direitos de E&P às OCs ou ser a destinatária desses

direitos, explorando-os em conjunto com as OCs; e (iii) as OCs, que assumem o papel de investidoras

e detentoras da expertise necessária, podendo operar diretamente os blocos ou exercer papéis menos

centrais nas atividades de exploração e produção.

A título ilustrativo, a legislação angolana utiliza-se dos atores acima elencados da seguinte

forma: a “Lei das Actividades Petrolíferas”, em seu art. 48 dispõe que o “Decreto de Concessão” é o ins-

trumento formal pelo qual o Governo outorga à Concessionária Nacional (Sonangol) uma determinada

área de exploração. Tal decreto deverá conter, dentre outros: (i) a outorga dos direitos de mineração; (ii)

a definição e descrição da área outorgada; (iii) a duração da outorga, suas diferentes fases e períodos e;

(iv) a definição do operador. No caso de a Concessionária Nacional se associar com quaisquer terceiras

pessoas (OCs) para o propósito de executar atividades petrolíferas, o art. 49 do mesmo diploma legal

determina que o decreto deverá conter, ainda, os seguintes itens: (i) autorização para a Concessionária

Nacional efetivar tal associação; (ii) a identificação dos associados (OCs) e; (iii) aprovação expressa do

contrato (PSC) a ser firmado entre as partes. Frise-se, por fim, que, por força do art. 17 da legislação sob

análise, a participação da Concessionária Nacional em associação com OCs deve, necessariamente,

incluir o direito de participar no gerenciamento das operações petrolíferas.

Na Indonésia, por outro lado, conforme já explicitado, o setor de óleo e gás passou por re-

formas legislativas com a publicação da Lei de Óleo e Gás no 22/2001. A Estatal Petarmina foi forçada

a abrir mão do monopólio nas atividades de upstream de óleo e gás. A recém-criada “Badan Pelaksana

Minyak dan Gas Bumi (BP Migas)” passou a assumir primariamente a função de autoridade regulatória

do setor. A Petarmina, por sua vez, (agora denominada PT Petarmina) doravante uma sociedade de

responsabilidade limitada, permanece como um importante ator operacional das atividades de E&P

da Indonésia. A PT Petarmina, juntamente com outras seis importantes OCs multinacionais dominam a

indústria do óleo e gás na Indonésia.462 A BP Migas, juntamente com o Governo indonésio, introduziu

recentemente novas políticas objetivando aumentar os investimentos no país no setor de E&P. A BP Migas

criou vários programas de incentivo para desenvolver bacias marginais de óleo através do país que,

caso contrário, não seriam atrativas para as OCs. Em outubro de 2006 o Governo local suspendeu im-

postos de importação em bens de capital para a indústria de óleo e gás. A BP Migas também organizou

licitações de novos projetos exploratórios pela Indonésia. Por outro lado, no tocante à fiscalização das

atividades, o Governo assume papel central. O art. 40 da Lei de Óleo e Gás no 22/2001 prevê expres-

samente a fiscalização do Estado para implementação de políticas públicas em relação a (i) segurança,

(ii) preservação do meio ambiente, (iii) qualidade dos produtos e serviços, (iv) priorização na utilização

de mão-de-obra, serviços e bens locais e (v) desenvolvimento das comunidades locais.

De uma forma geral, sob esse tipo de estrutura contratual, a responsabilidade última sobre o

controle e gestão das operações fica, em princípio, a cargo da NOC, enquanto as condutas gerenciais

462 International Business Publications; “INDONESIA Oil & Gas Exploration Laws and Regulations Handbook”, Volume I; 5a Edição, 2008, p. 54.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL242

cotidianas ficam a cargo da OC, incluindo o “work program”. Os PSCs costumam, então, determinar

expressamente a divisão de poderes e deveres de cada uma das partes, apesar desta divisão ser, na

prática, de difícil implementação, em especial levando-se em conta que o risco financeiro das operações

é suportado por apenas uma das partes, a OC. As decisões, portanto, costumam, sob o regime de PSC,

ser tomadas em conjunto, sendo muitas vezes criado um comitê com a participação de ambas as partes.

Os PSCs firmados na Malásia entre sua NOC (Petronas) e as OCs prevêem a criação de um Comitê

Consultivo Conjunto, que deve se reunir com determinada periodicidade para aprovação de orçamento,

“work program”, estabelecimento de metas etc.

I.3.2.6 Etapas e Fases Contratuais

Como no Regime de Concessão, no PSC existem duas fases contratuais distintas, que possuem

especificidades tanto sob o aspecto temporal, quanto sob o aspecto obrigacional: a fase de exploração

e a de produção.

Como exemplo, podemos citar a Indonésia cujo PSC tem a validade de, no máximo, 30 anos,

prorrogáveis por mais 20 anos (Lei do Petróleo, Art. 14). O período de exploração (computado dentro do

período total de 30 anos acima) é de, no máximo, seis anos, prorrogáveis por mais quatro anos (idem,

art. 15). Assim como a Indonésia, os países que adotam o PSC, de uma forma geral, tendem a deixar

estas questões em aberto, analisando-as caso a caso.

I.3.2.7 Mecanismos de Escolha e Contratação das OCs

Como verificado na Concessão, basicamente, o Estado hospedeiro (ou a NOC) possui duas

opções para escolha e contratação das OCs: (i) negociação direta ou (ii) licitação competitiva.

Em verdade, atualmente poucos países se utilizam de qualquer um dos dois sistemas de forma

exclusiva. Angola, por exemplo, em sua “Lei das Actividades Petrolíferas”, prevê a utilização de ambos os

procedimentos, isto é, a possibilidade de procedimentos licitatórios (“Concurso público” art. 46) ou, em

casos excepcionais, negociação direta (vide arts. 44 § 4 e 47).463

Negociação Direta

Podemos citar, a título de exemplo de previsão de negociação direta, a Lei do Petróleo e Gás

Natural da Indonésia464 (a ser detalhadamente examinada no item I.3.3.2). Os parágrafos 1, 2 e 3 do

art. 12 do referido diploma legal estabelecem que caberá ao Ministério de Energia e Recursos Minerais,

após consulta ao Governo Regional, estabelecer as áreas e as entidades autorizadas a exercer ativida-

des de exploração e produção. Neste sistema, após uma OC oferecer-se para adquirir um novo bloco

exploratório, o Governo convida outras OCs para apresentarem propostas para aquele bloco. Não apa-

recendo nenhuma outra proposta em um determinado período de tempo, o Governo concede o bloco

para a OC que fez a proposta inicial, assinando um PSC.465

463 República de Angola: “Lei das Actividades Petrolíferas” no 10/2004, de 12 de novembro de 2004.464 República da Indonésia; “Lei no. 22/2001” de 23 de novembro de 2001.465 International Business Publications; “INDONESIA Oil & Gas Exploration Laws and Regulations Handbook”, Volume I; 5a Edição, 2008, p.

125.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 243

Licitação

Nos países que adotam procedimentos licitatórios, geralmente se requer dos licitantes que

cumpram determinados requisitos mínimos para participar das licitações. Posteriormente, o contrato de-

verá ser assinado com o licitante devidamente qualificado que apresentou a melhor proposta, que pode

ser baseado em critérios financeiros ou técnicos, ou uma combinação dos dois.

Geralmente, antes de cada rodada de licitações, o Estado hospedeiro publica os modelos de

contrato que serão futuramente firmados com os licitantes vencedores para cada um dos blocos explo-

ratórios ofertados, contendo todas as obrigações que serão assumidas pelas partes e seus respectivos

direitos. Este procedimento tem como objetivo possibilitar que as propostas de diferentes licitantes sejam

devidamente equacionadas. Nestes casos, não costuma haver espaço para negociação entre a OC e

o Estado hospedeiro em questões-chave, como, por exemplo, limites ao “cost oil”, percentuais de divi-

são do “profit oil” entre a OC e o Estado hospedeiro (ou a NOC) ou percentuais mínimos de royalties.

Deve-se, nesse caso, respeitar os parâmetros mínimos contidos no edital e nos modelos de contrato,

podendo, no entanto, a OC oferecer ao Estado hospedeiro condições ainda mais vantajosas do que as

originalmente oferecidas.

I.3.2.8 Propriedade das Instalações Utilizadas na Exploração e Produção

Uma característica comum dos PSCs é a previsão de que, após o término do contrato, a pro-

priedade de toda a infraestrutura seja transferida ao Estado hospedeiro, sem custos adicionais. Neste

sentido, o caso angolano serve como um exemplo bastante ilustrativo de disposições comuns aos PSCs:

o art. 57 da “Lei de Actividades Petrolíferas” (Lei 10/2004, de 12 de novembro de 2004) prevê expres-

samente que, ao fim do contrato, todos os equipamentos, instrumentos, materiais e quaisquer outros

bens adquiridos para as operações sobre o PSC, assim como todas as informações de natureza técnica

e econômica deverão reverter para a concessionária nacional (Sonangol), sem a aplicação de quaisquer

cobranças.466 A legislação da Indonésia, por sua vez, também dispõe, no art. 20 de sua Lei do Petróleo

e Gás Natural,467 que todos os dados adquiridos por meio de licenças ou por atividades de E&P serão

de propriedade do Estado, sendo permitido às OCs utilizar-se destes dados durante a validade de seus

contratos.

I.3.2.9 Dispositivos de Revisão Contratual e Disputa

Uma das características bastante comuns aos PSCs é sua capacidade, mediante expressa pre-

visão contratual, de “proteger” as avenças contratuais entre o Estado e a OC de eventuais modificações

legislativas que comprometam os termos do contrato, especialmente a lucratividade da OC. Essa carac-

terística, própria do PSC, é denominada self-contained agreement, o que significa que ele é um contrato

regulado por seus próprios termos e condições e pela legislação específica que o rege, não sujeito, pois,

a variações ou mudanças de outras legislações genéricas do Estado hospedeiro.

466 República de Angola; “Lei das Actividades Petrolíferas” no 10/2004, de 12 de novembro de 2004.467 República da Indonésia; “Lei no 22/2001”, de 23 de novembro de 2001.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL244

Isto significa, na prática, uma limitação do poder governamental de interferir nas atividades.

Afinal, além da eficiência do mecanismo de recuperação de custos previstos, a posição econômica da

OC em um PSC será determinada pelo percentual e modalidades de tributação e taxação de imposto de

renda, percentual aplicável aos royalties, e a participação do Estado hospedeiro no “profit oil”. A questão

que se levanta, portanto, reside sobre quais garantias serão dadas à OC no que tange à estabilidade

dessas condições.

No contexto dos PSCs existem, basicamente, dois métodos de se atingir a desejada estabilida-

de da participação governamental, salvaguardando a posição econômica da OC: (i) congelar os per-

centuais dos impostos aplicáveis durante a vigência do contrato e (ii) ajustar os pagamentos contratuais,

tais como a divisão do “profit oil” de modo a contra-balançar quaisquer efeitos negativos sobre a posição

econômica da OC, causados por futuras modificações sobre a tributação das atividades petrolíferas.468

Considerando que um contrato bilateral não pode, em tese, se sobrepor a uma lei, a garantia

de que a legislação tributária não será alterada só poderá ser aplicável nos casos em que o contrato

firmado entre as partes (PSC) é, em si, uma lei ou um contrato firmado diretamente com o Estado. A

Síria e o Egito são casos exemplares desse sistema. Um exemplo de aplicação da segunda possibilidade

(ajuste das condições contratuais) é o modelo de PSC adotado na Malásia.

Trata-se das chamadas “Cláusulas de Estabilização” que objetivam imunizar as operações sob

o PSC de toda e qualquer lei, norma ou regulamento futuro. Ademais, esta “estabilização” não atinge

apenas questões comerciais, mas sim um escopo muito mais amplo, incluindo questões de segurança no

trabalho, meio ambiente, saúde, responsabilidade social etc.469 Diminuir o risco das OCs nas atividades

de E&P costuma ser uma eficiente estratégia dos países produtores para atrair investimento estrangeiro

e este é justamente o objetivo das “cláusulas de estabilização” dos contratos.

Como forma de ilustrar o conceito de “cláusula de estabilização”, o art. 23.2 do modelo de PSC

do Azerbaijão expõe que, no caso de o Governo local ou qualquer outra autoridade do Azerbaijão invocar

lei, tratado intergovernamental, decreto ou ordenamento administrativo, futuro ou presente, que afete, po-

sitiva ou negativamente, os direitos e interesses da OC, incluindo, mas não se limitando a mudanças (i) na

legislação tributária; (ii) nas normas e práticas administrativas ou (iii) jurisdicionais relativas à abrangência

do contrato, os termos do PSC deverão ser reajustados de forma a restabelecer o equilíbrio original. O

referido contrato asiático vai ainda mais longe ao determinar que caso a OC tenha sido adversamente

atingida, o Estado hospedeiro deverá indenizar a OC por quaisquer deteriorações nas circunstâncias eco-

nômicas, perdas ou danos que derivem de tais mudanças. Resumindo, trata-se de um caso de contrato de

PSC que prevê não só “cláusula de estabilização” para questões legais, mas também, expressamente, para

questões econômicas, visando justamente ao equilíbrio econômico-financeiro do PSC.

Impondo certa relativização ao conceito acima exposto, a minuta de PSC angolana disponível

na publicação “ANGOLA Oil & Gas Exploration Laws and Regulations Handbook”470 prevê, em seu artigo 37

que, sem prejuízo de quaisquer outros direitos ou obrigações, no caso de quaisquer mudanças legislativas

ou regulamentares implementadas pelo Governo de Angola ocorrerem após a assinatura do PSC que afe-

tem de maneira adversa suas obrigações, direitos ou benefícios, as partes deverão mutuamente acordar

modificações a serem incluídas no contrato, sujeitas à aprovação das autoridades competentes, de modo

a restaurar os direitos, obrigações e benefícios originalmente previstos. A legislação angolana não prevê,

portanto, uma aplicação imediata e automática do mecanismo de “estabilização” dos contratos.

468 TAVERNE, Bernard; “Petroleum, Industry and Governments”; Ed. Wolters Kluver, 2ª Edição, 2008; p. 150.469 MUTTIT, Greg; “CRUDE DESIGNS: The rip-off of Iraq’s oil wealth”; publicado por PLATFORM e disponível em www.carboweb.com (acesso

em 05/11/2008); p. 24.470 International Business Publications; “ANGOLA Oil & Gas Exploration Laws and Regulations Handbook”, Volume I; 4a Edição, 2008; pp.

214-274.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 245

I.3.3 Países Analisados

I.3.3.1 República de Angola

I.3.3.1.1 Introdução

De acordo com CIA (2009), Angola começou a experimentar um período de maior estabili-

dade política apenas após 2002, quando foi encerrado um longo período de guerra civil, iniciada em

1975, logo após sua independência de Portugal.

A Tabela I.23 resume os principais indicadores macroeconômicos de Angola após o fim da

guerra civil.

Tabela I.23: principais indicadores macroeconômicos de Angola

Angola 2002 2003 2004 2005 2006 2007

PIB (US$ mi) 11.432 13.956 19.775 30.632 45.163 61.424Crescimento real PIB 14,5% 3,3% 11,2% 20,6% 18,6% 21,1%

PIB per capita (US$) 776 919 1.265 1.903 2.728 3.608Exportações (US$ mi) 7.516 9.508 13.475 24.109 31.084 39.249Importações (US$ mi) 2.849 4.184 6.612 7.738 10.544 13.194Inflação 95,6% 98,2% 43,5% 24,8% 11,7% 12,2%População (hab.) 14.737.100 15.180.100 15.635.500 16.095.200 16.557.100 17.024.100

Fonte: Euromonitor, 2008

A economia angolana é fortemente dependente do petróleo, que contribui com mais de

50% do PIB, 75% das receitas governamentais e 90% do valor exportado (FCO, 2008). O forte

crescimento do PIB angolano nos últimos anos justifica-se pelo aumento da produção de petróleo

aliada ao aumento de preços da commodity. Além do petróleo, a indústria de diamantes também se

destaca em Angola, gerando 95% das exportações do país e cerca de 10% do PIB ( excetuando-se

o petróleo).

Problemas de gestão, corrupção e a guerra civil desestabilizaram a economia angolana

durante décadas. Reformas econômicas e forte suporte governamental à moeda local, Kwanza, trou-

xeram progresso e estabilização econômica, além da redução dos índices de inflação do país nesta

década.

A reconstrução da infra-estrutura do país, após o impacto da guerra, também representa

uma meta para Angola. O governo conta fortemente com a receita do petróleo para viabilizar a

execução das obras de reconstrução, seja através do superávit fiscal alcançado, seja através de finan-

ciamentos lastreados em volumes futuros de petróleo. Desde 2004, Angola já obteve cerca de US$ 7

bilhões em empréstimos desta natureza junto à China (CIA, 2008).

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL246

Apesar dos recentes progressos, Angola ainda enfrenta inúmeros desafios, tais como:

• A excessiva burocracia, que faz com que Angola seja um destino difícil para investido-

res471;

• O alto índice de pobreza e as inúmeras dificuldades sociais que o país enfrenta, pois um

PIB per capita de US$3600 esconde o fato de que 95% da população vive em estado de

pobreza (menos de US$1 por dia) ou pobreza absoluta (menos de US$0,76 por dia), cerca

de 60% da população é analfabeta e 60% não possue acesso a água potável (op.cit.);

• O forte déficit de produção de alimentos no país, que importa cerca de 50% de suas ne-

cessidades (CIA, 2008).

I.3.3.1.1.1 Contexto do petróleo e gás natural no país

As primeiras reservas comerciais de Angola foram descobertas não só em terra como também

em águas rasas, na região de Cabinda, na década de 1950. A primeira empresa a receber concessões

de E&P na região foi a CABGOC (Cabinda Gulf Oil Company), atualmente subsidiária da Chevron, que

desde 1955 opera o “Bloco 0”, região com reservas recuperáveis estimadas em 5 bilhões de barris (EIA,

2008).

Em 1976 o governo de Angola criou a empresa estatal de petróleo, Sociedade Nacional de

Combustíveis de Angola, Sonangol, que é responsável pela estruturação e gestão das participações

governamentais no setor de E&P de petróleo em território angolano, além de atuar em outros elos da

cadeia de petróleo e gás no país (DEUTSCHE BANK, 2008, P. 281).

Cabe ao Ministério do Petróleo (para fins deste capítulo sobre a República de Angola, doravan-

te denominado simplesmente como “MINPET”) a responsabilidade pela regulação, implantação da polí-

tica nacional de petróleo, coordenação e controle da auditoria de todo o setor (MENDES, 2008, P. 7).

Com a exploração onshore inibida pelas hostilidades da guerra civil, a Sonangol foi forçada a

incentivar oportunidades offshore de E&P na costa do Atlântico. Dessa forma encorajou interesse de OC

internacionais através do licenciamento de áreas significativas, primeiramente em águas rasas no sul da

Cabinda, na década de 80, e na década seguinte em águas mais profundas, em torno de 100 km da

costa.

O acordo da Sonangol com a CABGOC, para a região de Cabinda, é o único relevante e que

segue o modelo de concessão. Todos os outros relacionamentos da Sonangol com as OC nos blocos

offshore são baseados em acordos de joint ventures e modelos de partilha de produção (EIA, 2008). As

OC exercem o papel de operadores dos campos concedidos.

O grande sucesso exploratório offshore, ao longo da década de 90, foi determinante para o

aumento da representatividade de Angola entre os países produtores de petróleo. De acordo com BP

(2008), Angola foi o quarto maior produtor de petróleo na África (atrás de Nigéria, Argélia e Líbia) e o

décimo sétimo produtor mundial em 2007.

Em janeiro de 2007, foi aprovada a solicitação de Angola para entrada na OPEP, e em janeiro

de 2008, o país tornou-se membro efetivo, sendo-lhe atribuída uma cota de produção de 1,9 milhões

471 Nota do autor: de fato, Angola é considerado um dos países com maiores dificuldades, sob a ótica burocrática, para a consecução de investimentos externos. De acordo com a publicação “Doing Business in 2007” do World Bank, que analisa esses aspectos, Angola ranqueia em 156º lugar dentre os 175 países avaliados pelo estudo (FCO, 2008).

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 247

de barris diários. Este fato traz certa incerteza quanto ao futuro do potencial de aumento da produção

do país, pois a OPEP irá delimitar cotas de produção para Angola de acordo com os interesses da orga-

nização (DEUTSCHE BANK, 2008, P. 281).

Petróleo e gás natural dominam a matriz energética de Angola. A Figura I.83 mostra a distri-

buição em 2005, de acordo com EIA (2008).

Figura I.83: consumo total de energia em Angola, por insumo energético (2005)

Fonte: EIA, 2008

I.3.3.1.1.2 Evolução das reservas de petróleo e gás

A Figura I.84 e a Figura I.85, abaixo, ilustram a evolução histórica das reservas de petróleo e

gás natural de Angola (barras azuis), e a relação reservas/produção do país (linha preta).

Figura I.84: evolução do volume de reservas comprovadas de petróleo e relação reserva/produção em Angola

Fonte: BP, 2008

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL248

Figura I.85: evolução do volume de reservas comprovadas de gás natural e relação reserva/produção em Angola

Fonte: EIA, 2008

A atividade exploratória nas áreas offshore, em Angola, tem sido bem sucedida. As reservas de petróleo aumentaram em torno de 5 vezes em relação ao início da década de 90, enquanto as reservas de gás natural quintuplicaram após a recente adição de cerca de 200 bilhões de metros cúbicos de vo-lumes associados (EIA. 2008). Das reservas de hidrocarbonetos, 85% estão associadas aos campos de águas profundas e ultra-profundas situados nos blocos472 14 (operado por CABGOC), 15 (ExxonMobil), 17 (Total), 18 (BP), 31 (BP) e 32 (Total) (DEUTSCHE BANK, P. 282-4).

A perspectiva futura é de que se mantenha esta tendência ao aumento das reservas comprovadas de petróleo e gás, dada a intensa atividade exploratória na região (op.cit.), somada a licenciamentos futuros de 10 novos blocos exploratórios, que foram anunciados pela Sonangol em agosto de 2007 (EIA, 2008).

I.3.3.1.1.3 Evolução da produção e consumo de petróleo e gás natural

A Figura I.86 e a Figura I.87 resumem a evolução histórica da produção e do consumo domés-

tico de petróleo e gás natural em Angola.

Figura I.86: evolução histórica do consumo doméstico e da produção de petróleo em Angola

Fonte: EIA, 2008

472 Nota do autor: os blocos mencionados são áreas offshore localizadas ao longo da costa Angolana, e foram numerados de acordo com a ordem temporal de licitação pelo Governo local.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 249

Figura I.87: evolução histórica do volume de consumo doméstico e produção de gás natural em Angola

Fonte: EIA, 2008

O país tem aumentado constantemente sua produção de petróleo nos últimos anos, especial-

mente no período 2002-07 em que a taxa de crescimento da produção atingiu 14%. O consumo domés-

tico, ainda que tenha crescido no mesmo período em torno de 6% ao ano, representou apenas 3,5% da

produção no ano de 2007 (EIA, 2008).

Angola produziu em torno de 1,8 milhão de barris diários de petróleo e condensados em

2007. Os aumentos da produção em campos já explorados e o aparecimento de novos campos produ-

tores podem elevar a produção a 2,4 milhões de barris/dia em 2012, embora isto dependa de possíveis

restrições de cotas de produção pela OPEP (DEUTSCHE BANK, 2008, P. 281).

Os principais campos produtores de petróleo de Angola são de natureza offshore:

I Bloco “Zero”: operado pela CABGOC, responsável pela produção de aproximadamente

370 mil barris diários em 2007 (EIA, 2008);

II Bloco 15: operado pela Exxon e com produção estimada em 500 mil barris diários em

2007. Espera-se que novos desenvolvimentos (Kizomba-C e Kizomba-D) elevem a produção

a patamares superiores a 800 mil barris diários a partir de 2011 (DEUTSCHE BANK, 2008,

P. 283; EIA, 2008);

III Bloco 17: operado pela Total, com produção aproximada de 500 mil barris diários em 2007

e com planos de crescimento em novos campos (Pazflor, Clov) que poderão elevar a produ-

ção para o patamar de 850 mil barris por dia em 2012 (EIA, 2008).

Diversos tipos de petróleo são produzidos em Angola, refletindo a tendência de utilização de

FPSOs, que carregam petroleiros diretamente para exportação. O petróleo angolano é tipicamente leve

(densidade em torno de 30º API) e de baixo teor de enxofre (abaixo de 1%), com exceção dos campos

de Dalia do bloco 17 (23,7º API) e Kuito do bloco 14 (20º API).

Em relação ao gás natural, a falta de infra-estrutura de transporte, que faça o percurso entre

os campos associados offshore até a costa, limita o grande potencial de produção para mercado. De

fato, de acordo com EIA (2008), em 2005, 75% do volume bruto de gás produzido em Angola (apro-

ximadamente 8,5 bilhões de metros cúbicos) foi queimado e perdido, 14% foi reinjetado nos poços e

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL250

apenas 11% (0,9 bilhão de metros cúbicos) foi efetivamente destinado ao mercado, sendo 0,1 bilhões

sob a forma de gás natural liquefeito e 0,8 bilhões para consumo doméstico.

Cientes do fato, o governo angolano e a Sonangol vêm, junto aos produtores, agindo segundo

duas estratégias, a saber, a redução do volume de gás queimado (obrigando os produtores a reinje-

tarem ou armazenarem todo o recurso até 2010) e a implantação de uma rede de transporte de gás

natural que estabeleça a ligação entre diversos poços offshore a um terminal de LNG, a ser construído

em Soyo e operado pela Chevron, que terá 36,4% do projeto (outros acionistas seriam Sonangol, Total,

Eni e BP) (op.cit.).

I.3.3.1.1.4 Principais companhias que operam no país

Até o final da década de 90, o mercado angolano tinha forte presença de duas empresas, a

Sonangol e a Chevron, com participações menores da Total e Eni. Nos últimos anos, com o aumento da

produção de alguns blocos e a operação mais recente de outros (especialmente os de águas profundas

e ultra-profundas), outras OC se tornaram mais presentes. Atualmente, além da Sonangol, Chevron,

Total e Eni, empresas como BP, ExxonMobil e StatoilHydro (DEUTSCHE BANK, 2008, P. 283) são também

produtores relevantes no país.

Vale destacar que diversas companhias possuem participações em vários dos campos offshore

angolanos, sendo que uma delas se torna responsável pela operação de cada campo (EIA, 2008). Por

exemplo:

• O Bloco 15 é operado pela ExxonMobil; mas inclui outros acionistas como Sonangol, BP,

Eni e StatoilHydro;

• O Bloco 17 é operado pela Total e Sonangol, ExxonMobil, BP e StatoilHydro possuem

participações;

• A concessão de Cabinda é operada pela CABGOC (subsidiária da Chevron) embora Total,

Eni e Sonangol também detenham participações.

I.3.3.1.1.1 Refino e downstream

O consumo doméstico de derivados de petróleo foi de aproximadamente 60 mil barris diá-

rios em 2007. Atualmente, há apenas uma refinaria em território angolano, situada em Luanda e com

capacidade de processamento de 40 mil barris diários: a Fina Petroleos de Angola – uma joint venture

entre Sonangol e outros investidores privados. A demanda complementar é atendida por importações

de gasolina, querosene de aviação, óleo combustível, gás liquefeito e outros produtos derivados (op.cit.).

A Sonangol está desenvolvendo um projeto de implementação de uma nova refinaria no país,

a SonaRef, com capacidade de refino de 200 mil barris diários e localizada em Lobito, no Sul de Angola.

A refinaria terá capacidade de processamento de tipos de petróleo mais pesados, como a dos campos

Kuito e Dalia. Espera-se que a refinaria, de custo estimado em US$ 3,75 bilhões, inicie suas operações

de refino em 2012 (op.cit.; DEUTSCHE BANK, 2008, P. 285).

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 251

I.3.3.1.2 Marco Legal – Evolução e Atualidade

HISTÓRICO

A exploração e produção de petróleo em Angola tiveram início em 1910, quando a Compa-

nhia Canha & Formigal recebeu a outorga de um lease de petróleo em uma área de 114.000 km2 (cento

e quatorze mil quilômetros quadrados) no offshore do Congo e na Bacia de Kwanza, mas a perfuração

do primeiro poço foi realizada apenas em 1915.473

A Companhia de Pesquisas Minerais de Angola – PEMA e a OC americana Sinclair estiveram

envolvidas nas atividades de exploração e produção de petróleo em Angola desde o começo das ativi-

dades petrolíferas nesse país474.

Em 1955, foi realizada a descoberta de petróleo em áreas onshore da Bacia de Kwanza pela

Petrofina que, em conjunto com o governo colonial português, constituiu uma sociedade denominada

Fina Petroleos de Angola (“Petrangol”) e construiu, posteriormente, uma refinaria em Luanda.475

Em 1973, o petróleo se tornou o principal produto de exportação em Angola, e em 1976, a

produção girava em torno de 100.000 (cem mil) barris de petróleo por dia, provenientes do offshore da

Bacia de Cabinda e do onshore das Bacias do Kwanza e do Congo.476

Desde 1990, mais de 200 poços petrolíferos foram perfurados em Angola. No início de 2000,

havia 29 (vinte e nove) blocos offshore e onshore sob exploração com a presença de 30 (trinta) empresas

petrolíferas diferentes no setor.

De acordo com a Energy Information Administration, agência oficial de estatísticas do governo dos

Estados Unidos da América, a produção de Angola cresceu consideravelmente ao longo da última década.

No ano de 1997, a produção média de petróleo era de setecentos e dez mil barris diários. Já

em 2007, a produção média estava na faixa de um milhão e setecentos mil barris diários, sendo que as

previsões indicam um potencial de dois milhões de barris diários em 2008, com a entrada em produção

das novas áreas em águas profundas.

ANÁLISE DA EVOLUÇÃO DO MARCO LEGAL

No ano da independência de Angola, ocorrida em 1975, foi promulgada a Lei Constitucional que

sofreu algumas alterações ao longo do tempo, sendo a última delas datada de 1992. A Constituição, em seu

artigo décimo segundo, determina que a propriedade sobre os hidrocarbonetos pertence ao Estado, in verbis:

“1. Todos os recursos naturais existentes no solo e no subsolo, nas águas interiores, no mar ter-

ritorial, na plataforma continental e na zona econômica exclusiva, são propriedade do Estado

que determina as condições do seu aproveitamento, utilização e exploração.”

Com relação à regulação específica do setor petrolífero, o governo angolano foi influenciado

pelo modelo da Malásia477. Em 1976, a NOC foi constituída, através do Decreto nº 57, sendo denominada

Sociedade Nacional de Combustíveis de Angola, Unidade Empresarial Estatal – SONANGOL U.E.E478. 473 Oil & Gas Regulation Laws and Exploration Handbook: Strategic Information and Basic Regulations. International Business Publications – IBP,

Washington - DC, Estados Unidos da América. Pág. 32.474 Idem.475 Idem.476 Idem.477 TAVERNE, Bernard. Petroleum, Industry and Governments. Wolter Kluwers Law & Business, 2008. Pág. 269.478 Em 1999 a Sonangol U.E.E. muda o seu estatuto e passa a ter a sua atual denominação social: Sociedade Nacional de Combustíveis

de Angola, Empresa Pública – Sonangol E.P.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL252

Dois anos depois, uma nova lei de petróleo foi promulgada, a Lei nº 13, de 26 de Agosto de

1978, que foi conhecida como “Lei Geral das Atividades Petrolíferas”. A referida Lei nº 13 representou

um grande marco na legislação petrolífera angolana, estabelecendo os princípios fundamentais que

passaram a reger a exploração do potencial petrolífero do país no período pós-independência.

Nos termos desta lei, a totalidade dos reservatórios petrolíferos, localizados em áreas onshore e

offshore, era de propriedade do povo de Angola. Ademais, todos os direitos de exploração e produção de

petróleo foram transferidos para a Sonangol. Esta, por sua vez, não estava autorizada a alienar tais direitos.

Além disso, a lei estabelecia que todos os direitos existentes com relação à exploração petro-

lífera em Angola seriam cancelados e transferidos para a Sonangol. Com isso, qualquer OC que dese-

jasse explorar petróleo nesse país teria que possuir as qualificações técnicas e financeiras necessárias e

associar-se à Sonangol.

Tal associação poderia ser realizada nas áreas onshore por meio de uma Joint Venture, que

deveria contar com a participação majoritária da Sonangol, ou através de um Contrato de Partilha da

Produção, que poderia ser aplicável tanto às áreas onshore como offshore.

Apesar de considerar a lei atualizada nos seus mais importantes aspectos, como nos princípios

atribuíveis à atividade, o governo de Angola decidiu proceder à revisão da mesma de modo a torná-

la mais rica e melhor adaptada às mudanças que o setor apresentava479, visando, com isso, atingir de

maneira mais eficaz os interesses nacionais.

Desta forma, foi promulgada a Lei nº 10, de 12 de novembro de 2004 (para fins deste capítulo

sobre a República de Angola, doravante denominada simplesmente como “Lei”), que ratificou o princípio

fundamental da propriedade estatal sobre os recursos petrolíferos, já consagrado na Constituição ango-

lana480 e na anterior Lei Geral das Atividades Petrolíferas, bem como a obrigatoriedade associativa com

a Sonangol no âmbito de suas concessões petrolíferas, reproduzindo, ainda, alguns outros princípios

constantes da Lei Geral das Atividades Petrolíferas.

Neste contexto, a Lei visa salvaguardar, entre outros, os seguintes princípios de política econô-

mica e social aplicáveis ao setor petrolífero: (i) proteção do interesse nacional; (ii) desenvolvimento do

mercado de trabalho e valorização dos recursos petrolíferos; (iii) proteção do meio ambiente e raciona-

lização da utilização dos recursos petrolíferos; e (iv) viabilização da competitividade do país no mercado

internacional.

Além disso, a Lei contém previsões, condições e regras operacionais de caráter geral que se

aplicam a quaisquer tipos de associação com a Sonangol. Segundo Bernard Taverne, alguns termos pre-

vistos na Lei são, na verdade, tipicamente encontrados nos contratos petrolíferos celebrados com a NOC

ou com órgãos competentes em países em desenvolvimento, e não na lei do petróleo em si, conforme

indicado abaixo:

“The Law further contains provisions, conditions and operational rules of a general nature which are

applicable to all types of association contracts which Sonangol is authorized to enter into, includ-

ing production sharing agreements. Among these conditions there are those which are typical for

petroleum contracts concluded with a state entity established in a developing country and which are

usually found in the contract itself and not in the governing Petroleum Law as is here the case.”481

Dentre as previsões excessivas que o autor cita, é importante destacar as seguintes: (i) previsões

479 Nota do Autor: fatores como o natural desenvolvimento do setor petrolífero angolano, aliado à experiência nacional obtida ao longo dos anos, e considerando, ainda, o reflexo destes quanto à implementação de novos conceitos e práticas no âmbito das atividades petrolíferas.

480 Nota do Autor: Há um novo projeto de Lei Constitucional tramitando no Parlamento angolano. Porém, ao que tudo indica, o regime de propriedade do Estado sobre os hidrocarbonetos não será alterado.

481 TAVERNE, Bernard. Petroleum, Industry and Governments. Wolter Kluwers Law & Business, 2008. Pág. 270.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 253

acerca de conteúdo local; (ii) o direito de requisição do governo em casos de emergência nacional; (iii) o

direito da OC de dispor livremente da sua parcela de produção; e (iv) a obrigação da OC de empregar

apenas cidadãos angolanos em todas as categorias e funções, exceto nos casos em que não haja pro-

fissionais angolanos no mercado com as qualificações e experiência necessárias.

REGIME JURÍDICO REGULATÓRIO ATUAL

O artigo 6 da Lei estabelece que “as operações petrolíferas só podem ser exercidas através de

uma licença de prospecção ou de uma concessão petrolífera nos termos da lei.”

Ainda que pareça, através da leitura do dispositivo legal acima, que o regime jurídico-regula-

tório concernente às atividades de exploração e produção de petróleo seja uma Concessão, conforme

definido no item I.2.1 deste trabalho, fica claro que as concessões de áreas a serem exploradas são

feitas exclusivamente à Sonangol que, nos termos da Lei, é referida como Concessionária Nacional.

As concessões são outorgadas à NOC angolana por meio de Decreto de Concessão pelo Conselho de

Ministros482, podendo ela decidir por explorar as áreas individualmente, ou optar por associar-se a OC,

conforme estabelecido pelos artigos 7º e 44º da Lei.

No entanto, somente quando analisamos a questão da associação com a Sonangol verifica-

mos, sob a ótica das OC, que os modelos existentes em Angola são os da Joint Venture (societária e con-

tratual), PSC e Risk Production Agreement, pois é através destes instrumentos que as relações entre as OC

e o Estado hospedeiro angolano são materializadas. A seguir transcrevemos o artigo aplicável da Lei:

“Artigo 14

1. A Concessionária Nacional pode associar-se com entidades nacionais ou estrangeiras de com-

provada idoneidade e capacidade técnica e financeira, mediante prévia autorização do Governo.

2. A associação pode revestir as seguintes formas:

a) Sociedade comercial;

b) Contrato de consórcio;

c) Contrato de partilha de produção.

3. É permitido também à Concessionária Nacional o exercício das operações petrolíferas através de

contratos de serviços com risco.”

Apesar da Lei prever a existência dos três regimes, o fato é que, desde a promulgação da Lei,

a Sonangol somente utilizou-se do Contrato de Partilha de Produção para associar-se às OC483. Desse

modo, ainda que previstos a Joint Venture e o Contrato de Serviço com Risco, consideraremos, para fins

desse trabalho, que Angola adota o regime-jurídico regulatório do PSC para regular e governar suas

relações com as OC, uma vez que os outros não foram colocados em prática.

Dentre as OC que possuem os PSC firmados com a Sonangol, podemos citar a Braspetro e

a Chevron, que possuem 27,5% e 20% respectivamente do PSC referente ao Bloco 2/85 localizado na

Bacia do Baixo Congo, e (ii) Maersk e Ocidental Petroleum, que possuem 50% e 30% respectivamente do

PSC referente ao Bloco 8 localizado no offshore da Bacia do Kwanza.

Por fim, dentre as outras leis relevantes para o setor de E&P podemos citar: (i) Decreto nº 48

de 2006, que regulamentou a Lei, (ii) a Lei no 19 de 2004 que dispõe sobre a tributação das atividades

482 As atribuições do Conselho de Ministros são explicadas no item I.2.3.1.2 deste trabalho.483 É importante notar que para o Bloco 0 em offshore Cabinda, outorgado em 1955, e que continua sendo o mais produtivo de Angola,

existe um Contrato de Associação (Joint Venture Contratual) firmado entre CABGOC (subsidiária da Chevron) como operadora, Total, Eni e Sonangol E.P.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL254

petrolíferas, a ser melhor analisada no item I.3.3.1.4.1, (iii) a Lei no 11 de 2004, que estabelece o regi-

me aduaneiro pelo qual se regem as operações petrolíferas, e (iv) a Lei no 13 de 2004 de Fomento ao

Empresariado Nacional.

I.3.3.1.3 Agentes Envolvidos

Em Angola, as principais entidades governamentais que desempenham papel fundamental nas

atividades de petróleo e gás natural são: o Conselho de Ministros (para fins deste capítulo sobre a Re-

pública de Angola, doravante denominada simplesmente como “Conselho”), o MINPET, o Ministério das

Finanças e a Sociedade Nacional de Combustíveis de Angola, ou seja, a Empresa Pública “Sonangol”.

CONSELHO DE MINISTROS

Segundo o Artigo 113 da Lei Constitucional Angolana, o Governo Angolano exerce sua com-

petência reunido em Conselho de Ministros, que edita decretos-lei, decretos e resoluções sobre as políti-

cas setoriais, inclusive de hidrocarbonetos. O Conselho é presidido pelo Presidente da República e cons-

tituído pelo Primeiro-Ministro, Ministros e Secretários de Estado, conforme Artigo 108 da Constituição.

No que tange à competência relativa às atividades petrolíferas, cabe ao Conselho editar os Decre-

tos de Concessão (para fins deste capítulo sobre a República de Angola, doravante denominado simplesmen-

te como “Decretos”) que outorgam áreas de concessão para exploração pela Sonangol, que pode fazê-lo em

associação ou contratação de risco com as OC, também mediante autorização constante do Decreto.

Segundo o artigo 48 da Lei, do Decreto deve constar (i) a atribuição dos direitos minerários à

Sonangol, (ii) a área de concessão, (iii) duração da concessão e das diferentes fases e períodos e (iv) a iden-

tificação do operador. Caso a Sonangol se associe à OC, o Decreto deve estabelecer ainda a identificação

das OC associadas e a aprovação do contrato respectivo, que deve ser assinado no prazo de 30 dias,

contados a partir da data da publicação do Decreto no Diário da República. Registre-se que qualquer alte-

ração ao contrato firmado entre as partes depende de autorização do Conselho através de novo decreto.

MINISTÉRIO DO PETRÓLEO

O MINPET é o órgão da Administração Central do Estado que atua como principal regulador484

e tutor do setor petrolífero, sendo ele o responsável pela execução da política nacional e pela coordena-

ção, supervisão e controle de toda a atividade petrolífera.

Desse modo, o MINPET possui as seguintes atribuições gerais concernentes às atividades pe-

trolíferas: (i) faz parte do Conselho que edita os Decretos de Concessão para a Sonangol; (ii) fiscaliza as

atividades petrolíferas; (iii) outorga licenças de prospecção485; (iv) analisa e aprova questões de saúde,

segurança e meio-ambiente; e (v) monitora dados e estatísticas de contas, planos, medições da produ-

ção e fornecimento de petróleo cru às refinarias.

A Lei, em diversos artigos, faz referência à competência do MINPET, sendo importante destacar

484 Nota do autor: a Sonangol também desempenha algumas atividades de cunho regulatório como se verá adiante.485 Nota do autor: a licença de prospecção corresponde, no Brasil, à autorização outorgada pela ANP para Empresas de Aquisição de

Dado (EADs) para realização de atividades sísmicas.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 255

as seguintes atribuições: (i) análise, aprovação e outorga das licenças de prospecção (art. 33 da Lei); (ii)

definição, após autorização do Conselho, das áreas de concessão (art. 11 da Lei); (iii) prorrogação dos

prazos da licença de prospecção ou dos períodos da concessão (art. 12 da Lei); (iv) aprovação das ces-

sões das posições contratuais pelas OC, inclusive mudança de operador (art. 16 e 19 da Lei); (v) análise

dos planos exigidos pela legislação vigente para a prevenção de danos ambientais, incluindo estudos

de avaliação e auditorias de impacto ambiental, planos de recuperação paisagística e estruturas, ou

mecanismos contratuais e permanentes, de gestão e auditoria ambiental (art. 24 da Lei); (vi) fiscalização

do cumprimento das obrigações de conteúdo local (art. 27); autorização à Sonangol para abertura de

licitação para escolha das OC que a ela se associarão (art. 44 da Lei), ou para a realização de negocia-

ção direta nos casos permitidos pela Lei; (vii) aprovação dos planos anuais de trabalhos de prospecção,

pesquisa e avaliação (art. 58 da Lei), além do plano geral de desenvolvimento e produção (art. 63); (viii)

determinação de unitizações e aprovação dos planos respectivos (art 63 da Lei); (ix) aprovação para iní-

cio da produção comercial, uma vez cumpridas as tarefas constantes do plano geral de desenvolvimento

e produção (art. 69 da Lei); e (x) aprovação dos planos anuais de produção, que deverão ser apresen-

tados até outubro do ano anterior.

MINISTÉRIO DAS FINANÇAS

O Ministério das Finanças, por intermédio da Direção Nacional de Impostos, é o órgão respon-

sável pelas cobranças de tributos.

No que se refere à sua relação com as OC, o Ministério das Finanças deve ser informado so-

bre as subcontratações realizadas e anualmente realizar uma auditoria em todos os livros e documentos

contábeis das OC.

SONANGOL

Pouco antes da independência de Angola, foi criado um grupo de trabalho para apoiar a

indústria petrolífera e para mobilizar os angolanos que nela trabalhavam. O grupo de trabalho tinha

como objetivo estabelecer uma estratégia que permitisse a continuação das atividades de exploração da

produção de petróleo após a proclamação da independência. Posteriormente, o grupo de trabalho deu

lugar à Comissão Nacional de Reestruturação da Indústria Petrolífera.

Em 1976, a nacionalização da ANGOL deu origem à Sonangol U.E.E. e à Direção Nacional

de Petróleos, que dependia do Ministério da Indústria. A ANGOL, Sociedade de Lubrificantes e Combus-

tíveis, tinha sido constituída em 1953, como subsidiária da SACOR (companhia Portuguesa), para atuar

na área da comercialização e distribuição de combustíveis, lubrificantes e gases liquefeitos em Angola.

O Decreto-lei nº 52/76 criou a Sociedade Nacional de Combustíveis de Angola, Unidade Empre-

sarial Estatal – Sonangol U.E.E.486 que estabeleceu a Sonangol como uma empresa estatal voltada para gerir

a exploração dos recursos de hidrocarbonetos em Angola, tendo como único acionista o Estado Angolano.

Logo após a fundação da Sonangol, para a criação das infra-estruturas que assegurassem o bom

funcionamento desta, foi constituída uma Comissão de Gestão a que se seguiu o Núcleo Central da Sonangol.

Após a independência, várias companhias que lá operavam abandonaram o país, deixando

para trás a sua infra-estrutura e seus funcionários. Por esta razão, a Sonangol comprou as instalações

486 Em 1999 a Sonangol U.E.E. muda o seu estatuto social e passa a ter a denominação de Sociedade Nacional de Combustíveis de Angola, Empresa Pública – Sonangol E.P.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL256

da Texaco, Fina e da Shell e, por meio de um acordo, ficou com as da Mobil. No processo, a Sonangol

absorveu ainda os antigos trabalhadores de empresas petrolíferas

Atenta a novas oportunidades de negócios, a Sonangol desenvolveu e criou parcerias para a

implantação de unidades empresariais que contribuíssem para o desenvolvimento de Angola e para a

sua própria expansão. Privilegiando os aspectos de gestão de recursos de hidrocarbonetos, preservação

do meio ambiente e a segurança industrial, a Sonangol elaborou um sistema empresarial em volta do

petróleo, do qual fazem parte mais de 30 empresas subsidiárias e filiadas.

Segundo o Artigo 4 da Lei, a Sonangol é detentora exclusiva de direitos minerários em Angola

e, assim, designada Concessionária Nacional, como explicado anteriormente.

Ainda que Concessionária Nacional, a Sonangol desempenha funções que, em outras jurisdi-

ções, não seriam de atribuição da NOC ou de qualquer concessionária de E&P. Segundo relatório do Ban-

co Mundial elaborado em 2007487, a Sonangol é, ao mesmo tempo, contribuinte e responsável tributária,

desempenha funções de políticas públicas, investidora de recursos públicos e reguladora do setor.

Dentre as políticas públicas desempenhadas pela Sonangol destacam-se (i) o fornecimento de

subprodutos de petróleo para o mercado doméstico a preços subsidiados, (ii) fornecimento de diversos

produtos básicos aos serviços públicos (aos militares, hospitais, etc) e a áreas remotas, (iii) gerenciamen-

to da dívida pública, (iv) performance de vários papéis de regulador, e (iv) comercialização da parcela

do governo do hidrocarboneto, sob os PSC488.

No que diz respeito às funções regulatórias, podemos destacar: (i) os instrumentos contratuais

de cessão devem ser submetidos à sua prévia aprovação (art. 16 da Lei); (ii) o risco de aplicação dos

investimentos no período de pesquisa corre por conta das entidades que se associarem à ela (art. 18

da Lei); (iii) o operador de uma área de concessão é indicado ao MINPET pela Sonangol e esta pode

remover o operador em caso de culpa grave na execução das operações, e em outros casos relevantes

expressos no PSC; (iv) a emissão de parecer ao MINPET sobre pedido de licença de prospecção por parte

interessada, podendo pedir esclarecimentos (art. 38 da Lei); e (v) mediante autorização do MINPET, a

Sonangol promove rodadas de licitação para escolha das OC a que se associará por meio, geralmente,

de PSC, além de recomendar as zonas que devem ser abertas à prospecção.

No entanto, em sua condição de Concessionária Nacional, a Sonangol possui diversas obrigações

para com o governo angolano, dentre as quais destacamos: (i) cumprir com as deliberações do governo relati-

vamente à política comercial de importações e exportações; (ii) executar os programas de trabalho obrigatórios,

nos prazos estabelecidos, assim como os relatórios mensais, trimestrais e anuais das operações petrolíferas; (iii)

realizar sondagem e ensaios apropriados de descobertas de hidrocarbonetos, de acordo com os programas apro-

vados, comunicando sem demora os seus resultados ao MINPET, para que se possa fazer a análise do valor das

descobertas e a viabilidade da sua exploração; (iv) submeter-se à quaisquer fiscalização, inspeção ou verificação

que o governo pretenda realizar; (v) conservar em Angola todos os livros e registros que firmem, nos termos da lei

comercial em vigor, os documentos contábeis originais, justificativos das despesas realizadas, bem como o registro

completo e atualizado de todas as operações técnicas efetuadas ao abrigo do respectivo Decreto de Concessão.

Por último, é importante registrar que, ainda que a Sonangol E.P. seja a Concessionária Na-

cional, ela, via de regra, indica a Sonangol Pesquisa e Produção Sarl, uma de suas subsidiárias e mais

conhecida como a Sonangol P&P, para firmar os PSC e atuar nas atividades E&P em blocos marítimos

e terrestres com as OC parceiras, não deixando, contudo, de ser a parte primariamente responsável,

perante o Governo, pelas obrigações e deveres como Concessionária Nacional.

487 THE WORLD BANK. A World Bank Country Study – Angola – Oil, Broad-based Growth, and Equity. Washington, DC, May 2007.488 Idem. Pág. 49.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 257

I.3.3.1.4 Características Peculiares de Angola

I.3.3.1.4.1 Remuneração do Estado (Contrato de Partilha de Produção)

Angola tem, atualmente, uma tributação específica para as atividades petrolíferas, regidas

pela Lei 13/2004 sobre “Tributação das Actividades Petrolíferas”. A referida lei é aplicável a todas as

empresas, nacionais ou estrangeiras, que estejam exercendo atividades petrolíferas no território ango-

lano489 e tem por objetivo estabelecer o regime tributário incidente sobre as atividades de pesquisa, de-

senvolvimento, produção, armazenagem, venda, exportação, tratamento e transporte de petróleo bruto

e gás natural490.

De acordo com dados do Banco Mundial, as receitas do petróleo e do gás natural são funda-

mentais ao desempenho econômico, social e político de Angola491. As receitas de petróleo já represen-

tam 40% do PIB, 80% das receitas do governo e 95% dos ganhos em divisas estrangeiras492. Os princi-

pais organismos envolvidos na gestão das receitas petrolíferas são:

1. Ministério das Finanças (MINFIN): responsável pela política econômica e financeira global,

gestão orçamentária, cobrança de impostos, auditoria, verificação, e fiscalização da Sonan-

gol (Concessionária Nacional).

2. Banco Nacional de Angola (BNA): banco depositário dos pagamentos de tributos e outros

pagamentos relacionados ao petróleo, à câmara de compensação dos fluxos financeiros, à

gestão da dívida externa493 e à moeda estrangeira.

3. Ministério dos Petróleos (MINPET): responsável pela política setorial e sua fiscalização.

4. Concessionária Nacional - Sonangol - Representante do Estado no setor, como conces-

sionária responsável pelas auditorias de custos, cobrança de um número determinado de

pagamentos devidos ao Estado e participante comercial no setor.

No sistema fiscal angolano existem regimes distintos para contratos de associação em áreas

de Concessão e PSC. Em cada um destes regimes, existe um nível complementar de complexidade, com

diferentes variantes contratuais, aplicáveis aos diferentes tipos de regimes. No caso do Bloco 0, por

exemplo, os abatimentos permitidos para o cálculo do Imposto sobre Transações Petrolíferas, relativos à

Área A, são diferentes daqueles permitidos nas Áreas B e C.

Em relação à Partilha da Produção, os acordos evoluíram contratos anteriores, que eram baseados

na produção acumulada, para contratos mais recentes, de águas profundas, que hoje são baseados na taxa

de retorno, sendo Angola o único país entre os grandes produtores africanos a utilizar este critério.

A maioria dos elementos do PSC são negociáveis, além de serem parâmetros específicos. Em

outras palavras, diferem de acordo com cada contrato, como por exemplo percentuais e alíquotas, re-

cuperação de custos e “liftings”.

489 Síntese do Sistema Tributário da República de Angola, preparada pela Direcção Nacional de Impostos do Ministério das Finanças – Documento atualizado em maio de 2007 http://www.minfin.gv.ao/fsys/Sintese_Sistema_Tributario_Angolano_Maio07.pdf.

490 A Lei nº 13/2004 é também aplicável a outras substâncias, tais como nafta, ozoterite, enxofre, hélio, dióxido de carbono e substâncias salinas, quando provenientes das operações petrolíferas (art. 1º).

491 Revisão da Gestão das Despesas Públicas e Responsabilização Financeira. Banco Mundial. 16 de Fevereiro de 2005 http://siteresour-ces.worldbank.org/INTANGOLA/Resources/pemfar_portuguese.pdf.

492 KPMG (2002 - 2003). Avaliação do Sector Petrolífero Angolano. Relatório Inicial (versão). Luanda.493 Nota do autor: O processo de gestão da dívida em Angola está, na prática, espalhado entre três organismos: O recém-criado Gabinete

da Dívida do BNA que tem a seu cargo reunir e gerir estatísticas da dívida externa. Esta função está contemplada no Artigo 17 da Lei Orgânica do Banco Central.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL258

De acordo com estudo do Banco Mundial, o custo de administração deste regime pode ser

particularmente penoso e dispendioso, em razão da diversidade contratual.

São consideradas como remunerações governamentais todas as receitas advindas da atividade

petrolífera, ou seja, todos os tributos e outros pagamentos ao Estado, exigidos por lei ou cláusulas contratuais.

Nestas circunstâncias, os principais componentes da tributação petrolífera em Angola são os seguintes:

Bônus: pagamentos únicos em dinheiro, realizados por ocasião da adjudicação de um contrato

para explorar e produzir. Podem ser também cobrados pagamentos de bônus por ocasião da declaração

de uma descoberta comercial ou do começo da produção. Outros bônus, recentemente introduzidos,

são aqueles destinados a fundos sociais. Os bônus são licitados por investidores estrangeiros potenciais

e pagos à Concessionária Nacional.

Imposto sobre a Produção do Petróleo (TP ou royalties): No caso de Angola, os royalties são

chamados impostos sobre a produção e calculados como uma percentagem da produção bruta de cada

uma das áreas de concessão ou de contrato. São aplicáveis apenas aos contratos de associação e as

alíquotas vigentes são da ordem de 16,67% a 20%. Tanto este imposto quanto os arrolados abaixo são

recolhidos ao MINFIN.

Imposto sobre o Rendimento do Petróleo: O Imposto sobre o Rendimento do Petróleo (IRP) é

calculado aplicando-se uma alíquota de 65,75% sobre os lucros provenientes das áreas de concessão

mais antigas, e uma alíquota de 50% sobre o lucro do petróleo oriundo das mais recentes áreas (PSC).

Imposto sobre Transações Petrolíferas: O Imposto sobre Transações Petrolíferas (TP) só se aplica

à Área de Concessão de Cabinda.

De acordo com a Lei nº 13/2004, para efeitos de cálculo do rendimento tributável, à exceção

da taxa de superfície, o petróleo bruto produzido em Angola deve ser valorizado ao preço de mercado

calculado nas bases dos preços reais FOB, obtidos nas vendas de boa-fé a terceiros. A referida lei es-

tabelece uma série de critérios específicos para este cálculo494. De todo modo, após a determinação do

preço de mercado para uma área de concessão ou de desenvolvimento específica, este preço deve ser

utilizado para todo o petróleo ali produzido durante o trimestre de referência.

IMPOSTO SOBRE A PRODUÇÃO DO PETRÓLEO (TP)

Este imposto incide sobre a quantidade de petróleo bruto e gás natural, medida à boca do poço.

Este imposto incide apenas nos casos de contratos de associação, ou seja, o petróleo e as outras substâncias

produzidas nas operações petrolíferas, produzidas com base em PSC, não estão sujeitos a este imposto495.

A alíquota do TP é, regra geral, de 20%, sendo certo que em determinadas condições de pro-

fundidade de água e zonas terrestres de difícil acesso a alíquota pode ser reduzida a até 10%496.

O valor devido pode ser recolhido pelo contribuinte em dinheiro ou in natura, a depender da

opção do Estado.

Ao teor do art. 16º da Lei nº 13/2004, se a opção do Estado recair sobre o recebimento em

dinheiro, a alíquota deve incidir sobre o valor das quantidades de petróleo produzidas e medidas à boca

do poço, ou das quantidades de petróleo que poderiam ter sido produzidas, no caso de acidente ou

deficiência de operação ocasionada por negligência ou falta grave do operador.

494 Lei nº 13/2004, art. 6º.495 Lei nº 13/2004, art. 12º, item 4.496 Lei nº 13/2004, art. 14º.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 259

No caso de recebimento do valor in natura, cabe à Concessionária Nacional receber, dar quita-

ção e administrar as substâncias dadas em pagamento pelo contribuinte. No caso de venda do petróleo,

a Concessionária Nacional deve entregar a receita aos cofres públicos, sujeitando-se, ainda, a inspeções

do MINFIN e obrigando-se a apresentar uma prestação anual de contas pelo recebimento do produto

ao Tribunal de Contas497.

IMPOSTO SOBRE O RENDIMENTO DO PETRÓLEO (IRP)

O IRP, cobrado tanto nos Contratos de Associação como nos PSC, é calculado a partir de

diferentes alíquotas, a saber: 65,75% para os Contratos de Associação e 50% para os PSC, conforme

previsto no art. 41º da Lei nº 13/2004.

O rendimento tributável tem como parâmetro o lucro apurado ao final de cada exercício, e

depende do tipo de contrato, de acordo com o art. 19º da Lei nº 13/2004.

No caso dos contratos de associação ou de serviços com risco, a base de cálculo é o resultado da

diferença entre os proveitos ou ganhos realizados e os custos ou perdas imputáveis ao mesmo exercício.

No caso de PSC, o profit oil é apurado deduzindo-se da totalidade do petróleo produzido, em

cada área de desenvolvimento, o petróleo necessário à recuperação de custos dessa área (cost oil).

Despesas dedutíveis e não dedutíveis

A legislação tributária angolana considera como custos e perdas dedutíveis os valores despen-

didos e indispensáveis à obtenção dos ganhos tributáveis, bem como aqueles necessários à manutenção

da fonte produtora, entre eles498:

• Encargos com a atividade básica, acessória ou complementar (despesa de pessoal, custo

de material, encargos de serviços, despesas com transporte de material);

• Encargos de natureza administrativa referentes às despesas gerais e administrativas incor-

ridas, relativos a operadores ligados à manutenção de escritórios, instalações de apoio às

atividades petrolíferas e às residências afeitas às mesmas;

• Reintegrações e amortizações de custos;

• Rendas pagas a terceiros pela ocupação dos imóveis necessários à execução das opera-

ções petrolíferas;

• Custos dos serviços de gestão de risco das operações petrolíferas, contratados nos termos

da legislação angolana aplicável;

• Despesas decorrentes de litígios, serviços jurídicos e outros serviços afins, necessários ou

apropriados à obtenção, conservação e proteção da área de concessão, bem como aque-

les necessários à instauração ou defesa de ações judiciais ou reclamações relativas às

operações petrolíferas.

Por outro lado, os custos e perdas considerados não dedutíveis pela legislação angolana tam-

bém são diversos, entre eles:

497 Art. 17º da Lei nº 13/2004.498 Os arts. 21º e 22º da Lei nº 13/2004 arrolam toda a lista de custos dedutíveis e indedutíveis.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL260

I Despesas decorridas de falta grave, negligência grave ou dolo por parte do contribuinte ou

de quem atue por conta deste;

II Comissões pagas aos intermediários;

III Despesas de comercialização ou transporte de petróleo para além do ponto de entrega;

IV Despesas com qualquer garantia prestada nos termos do contrato celebrado com a Conces-

sionária Nacional;

V Indenizações, multas ou penalidades por descumprimento de obrigações legais ou contra-

tuais;

VI Contrapartidas oferecidas ao Estado ou à Concessionária Nacional pela atribuição da qua-

lidade de associada da Concessionária Nacional.

Apuração dos custos fiscais499

Nos contratos de associação ou de serviços com risco, alguns custos são amortizados com

base em percentual de 16,666% a partir do início do ano em que forem realizados ou do ano em que se

verificar a primeira produção comercial de petróleo, o que ocorrer mais tarde. Os encargos suportados

no período anterior ao do início da produção devem ser acumulados e capitalizados no referido ano,

sendo o valor anual de amortização calculado com base no percentual de 25% ao longo de um período

de quatro anos.

Na hipótese do valor das deduções exceder o rendimento bruto anual em um determinado

exercício, o excesso deve ser transportado para os anos seguintes, com prazo máximo de cinco anos

para tal aproveitamento.

No que se refere aos PSC, existem as seguintes regras para a apuração dos custos fiscais:

• O levantamento e a livre disposição do petróleo para recuperação dos custos limitam-se,

em cada exercício, a uma porcentagem máxima do total do petróleo produzido em cada

área de desenvolvimento, conforme estabelecido em cada PSC;

• as despesas de pesquisa são recuperáveis a partir do saldo não utilizado do petróleo para

a recuperação dos custos existentes em cada área de desenvolvimento, após a recupe-

ração das despesas de produção, das despesas de desenvolvimento e das despesas de

administração e serviços, sempre limitado ao montante máximo de petróleo para a recu-

peração de custos prevista no PSC. As despesas de pesquisa não são registradas no ativo

da OC e, portanto, não sofrem amortização;

• As despesas de produção, de desenvolvimento e de administração e serviços possuem

regras específicas de apuração500.

Como antes mencionado, Angola é o único grande produtor africano cuja base de cálculo do

profit oil é feita por meio da taxa de retorno, enquanto que os demais países calculam o profit oil tomando

por base o volume de produção. Por outro lado, como visto, a alíquota do Imposto de Renda Petrolífero,

incidente sobre o profit oil é de 50% nas áreas de concessão mais recentes e 65,75% nas mais antigas501.

Desse modo, após a recuperação dos custos, a receita de produção remanescente é partilhada

499 Art. 23º da Lei nº 13/2004.500 Para maior detalhamento das regras, cf. art. 23º da Lei nº 13/2004.501 GUTMAN, José. “Tributação e Outras Obrigações na Indústria do Petróleo”. Ed. Freitas Bastos, 2007, pp.349-387.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 261

com a OC levando-se em conta, no split, a taxa de retorno do projeto, sendo que os termos deste split

são objeto de negociação entre a NOC e a OC. A Tabela I.24 mostra um exemplo deste split.

Tabela I.24: exemplo de divisão do profit oil em Angola

Profit sharing

Taxa de retorno (%) Parcela da OC (%)0-15 8015-25 6025-30 40>30 20

Fonte: GUTMAN, José. “Tributação e Outras Obrigações na Indústria do Petróleo”. Ed. Freitas Bastos, 2007.

Vale mencionar que, segundo o art. 28º da Lei nº 13/2004, a determinação da base de cálcu-

lo tributável pelo IRP é realizada por uma comissão específica, que consideraas informações prestadas

pelo contribuinte, cabendo ao contribuinte pedido de revisão e de reclamação.

IMPOSTO DE TRANSAÇÕES SOBRE O PETRÓLEO (TTP)502

Imposto que incide sobre o lucro decorrente unicamente da produção na província de Cabin-

da, em regime de exploração conjunta com a Sonangol, cuja alíquota está fixada em 70%. Assim sendo,

o petróleo produzido ao abrigo de PSC não está sujeito a este imposto.

Além dos custos e perdas dedutíveis autorizados por lei na apuração do IRP, é permitido deduzir

(i) um prêmio de produção, sobre os volumes de petróleo bruto e gás líquido considerados no cálculo

do rendimento bruto e (ii) um prêmio de investimento que corresponde a uma porcentagem das impor-

tâncias investidas e capitalizadas em cada ano fiscal, a partir do ano de início da produção, sendo certo

que ambos os prêmios são definidos nos diplomas de concessão.

A sua vez, do rendimento tributável por este imposto não é permitido deduzir nenhum dos

impostos, taxas e contribuições legalmente previstos, bem como os custos de financiamento, incluindo

juros e outros encargos, ex vi do art. 46º da Lei nº 13/2004.

TAXA DE SUPERFÍCIE

Esta taxa incide sobre a área de concessão ou sobre a área de desenvolvimento, caso prevista

no contrato, cobrada em valor equivalente a USD 300,00 por Km2, sendo devida pelas associadas da

Concessionária Nacional.

RECEBIMENTOS DA CONCESSIONÁRIA NACIONAL

A Concessionária Nacional, segundo a legislação atual, está autorizada a deduzir até 10% do

montante total de profit oil devido nas operações petrolíferas sob a forma de comissão, para suprir seus

custos operacionais. Caso os custos operacionais faturados sejam inferiores ao máximo de 10% permi-

502 Art. 45º da Lei nº 13/2004.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL262

tidos por lei, o saldo remanescente deve ser transferido ao MINFIN.

Os bônus e os excessos sobre o preço limite previstos em alguns PSC, auferidos pela Conces-

sionária Nacional, não são tributados e devem ser entregues integralmente ao Estado. Por sua vez, todas

as demais receitas da Concessionária Nacional estão sujeitas à tributação.

CONTRIBUIÇÃO PARA FORMAÇÃO DOS QUADROS ANGOLANOS

Contribuições feitas à previdência social, destinadas a garantir a subsistência física dos cida-

dãos, total ou parcialmente incapacitados para trabalhar, bem como a dos seus familiares sobreviventes,

caso aqueles venham a falecer. De acordo com a regulamentação, a alíquota atual é de 8% do salário,

a cargo do empregador, e 3% do salário, a cargo do trabalhador.

Assim, o Regime Tributário especial da indústria petrolífera503 é resumido na tabela abaixo.

Tabela I.25: resumo do regime tributário especial da indústria petrolífera em Angola

Impostos Natureza dos Impostos Alíquota

1. Imposto sobre a produção do petróleo (TP – espécie de Royalty)

Lei 13/04 (Título III, Capítulo I)

Imposto sobre o valor do petróleo produzido, pago pelas empresas

petrolíferas que atuam no regime de operação conjunta com a Sonangol

a). Cabinda: 20%b). FS e FST: 16,67%

c). Em determinadas condições de profundidade de água e zonas terrestres

de difícil acesso a alíquota pode ser reduzida até 10%

2. Imposto sobre o rendimento do petróleo (IRP)

Lei 13/04 (Título III, Capítulo II)

Imposto sobre os lucros das empresas petrolíferas

Associação: 65,75%

PSC: 50%

3. Imposto de transações sobre o petróleo (TTP)

Lei 13/04 (Título III, Capítulo III)

Imposto sobre o lucro, decorrente unicamente da produção na província de Cabinda em regime exploração conjunta

com a Sonangol

70%

4. Taxa de superfícieLei 13/04 (Título III, Capítulo IV)

Taxa que incide sobre a área de concessão ou sobre a área de

desenvolvimento caso prevista no contratoUSD 300,00 por Km2

5. Regime da Concessionária NacionalLei 13/04 (Título IV, Capítulo I)

Receitas provenientes dos recebimentos da Concessionária Nacional, incluindo o

bônus e o preço limite contratual

90% (a Concessionária Nacional pode reter até 10%)

6. Contribuições à Previdência SocialLei 18/90

Decreto 27/91Decreto 7/99

Contribuições à previdência social, destinada a garantir a subsistência física

dos cidadãos total ou parcialmente incapacitados para trabalhar bem como, com a sua morte, a dos seus familiares

sobreviventes

8% do salário, a cargo do empregador

3% do salário, a cargo do trabalhador

Fonte: elaboração TozziniFreire Advogados

Durante o ano de 2007504, de acordo com dados obtidos, as companhias petrolíferas que

operaram na costa angolana pagaram impostos e taxas no valor de 1.693.382,8 Milhões de Kwanzas,

dos quais 893.861,2 Milhões de Kwanzas foram pagos pela Sonangol como Concessionária Nacional.

A tributação ficou distribuída conforme a Figura I.88.

503 Síntese do Sistema Tributário da República de Angola, preparada pela Direcção Nacional de Impostos do Ministério das Finanças – Documento atualizado em maio de 2007 (http://www.minfin.gv.ao/fsys/Sintese_Sistema_Tributario_Angolano_Maio07.pdf).

504 Todos os dados aqui relacionados foram obtidos no “Relatório de Actividades de 2007’, documento preparado pelo Ministérios dos Petróleos, do Governo de Angola, em 06/11/2008.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 263

Figura I.88: distribuição das receitas fiscais da indústria petrolífera em Angola em 2007

Fonte: “Relatório de Actividades de 2007’, Ministérios dos Petróleos de Angola, 06/11/2008.

Importante notar que o IRP é pago por todas as companhias dos blocos e associações que se

encontram em produção, enquanto a taxa de produção é cobrada apenas do Bloco 0 e do contrato de

associação relacionado com a produção de um bloco onshore datado de antes da promulgação da Lei.

Quanto à distribuição de receitas fiscais por companhia em Angola, essa encontra-se ilustrada

na Figura I.89.

Figura I.89: receitas fiscais por companhia em Angola (2007)

Fonte: “Relatório de Actividades de 2007’, Ministérios dos Petróleos de Angola, 06/11/2008.

Por companhias, a ChevronTexaco constituiu a empresa que mais contribuiu durante o exer-

cício fiscal em análise, com cerca de 12,50% do total tributado, seguida da Sonangol com 10,25%, da

Total com 7,27%, da Esso com 4,73%, da Eni Angola com 4,13%, da BP Exploration Angola com 4,07%,

da Statoil com 2,43%, da Norsk Hydro com 1,12%, de outras companhias estrangeiras com 0,45%, das

companhias nacionais privadas (Sonangol Sinopec Internacional, China Sonangol e Somoil) com 0,26%

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL264

e por último da Fina com 0,25%. Esta diferença tributária deve-se ao potencial dos blocos em que as

companhias estão envolvidas.

A Sonangol, na qualidade de detentora dos direitos mineiros e com o status de Concessionária

Nacional, teve uma participação de 52,79% do total de impostos e taxas. Este fato resulta das prerroga-

tivas e direitos que lhe são concedidos e garantidos nos contratos de partilha de produção (PSC).

No entanto, a Norsk Hydro com 123,88%, a Svenska com 122,61%, a ChevronTexaco com

122,06%, a Braspetro com 120,52%, a Ajex/Ajoco com 119,09%, a BP Exploration com 112,46%, a

Statoil com 109,55%, a Esso com 106,75%, a Total (ELF) com 103,38%, a Fina com 102,43%, a Galp

Energia com 101,74%, a Somoil com 101,19% constituem o grupo de empresas que suplantaram as

previsões iniciais dos respectivos impostos, segundo os preços de referência fiscal fixados para 2007.

Enquanto as empresas restantes, por imperativos próprios do mercado petrolífero, ficaram aquém das

previsões. A Tabela I.26 atesta os fatos supramencionados.

Tabela I.26: balanço fiscal por companhia em Angola (2007)

Fonte: “Relatório de Actividades de 2007’, Ministérios dos Petróleos de Angola, 06/11/2008.

A Concessionária Nacional, nos termos dos contratos de partilha de produção do petróleo

(PSC), atingiu a meta dos 106,86%, implicando um desvio positivo de cerca de 6,86% das suas contri-

buições reais em relação ao plano inicial. Isto se deve ao volume da produção dos blocos nela afetados,

para além da influência do preço do petróleo no mercado internacional.

No qüinqüênio 2003/2007, as receitas petrolíferas arrecadas através do Imposto sobre o

Rendimento de Petróleo (IRP), Imposto sobre a Produção de Petróleo (TP), Imposto sobre a Transação de

Petróleo (TTP) e da Partilha de Produção, tiveram um crescimento médio anual de 37,13% em função do

crescimento progressivo da produção do petróleo bruto e dos respectivos preços de venda no mercado

internacional. A Figura I.90 mostra a evolução das receitas fiscais petrolíferas em Angola no período

2003/2007.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 265

Figura I.90: evolução das receitas fiscais petrolíferas em Angola entre 2003 e 2007

Fonte: “Relatório de Actividades de 2007’, Ministérios dos Petróleos de Angola, 06/11/2008.

I.3.3.1.4.2 Processo de Escolha e Remuneração da OC

Processo de Escolha da OC:

Considerando as explicações constantes do item I.3.2.7 quanto aos Processos de Escolha e

Remuneração da OC, sabe-se que há, de uma forma geral, duas opções dentre as quais o Estado hos-

pedeiro pode optar: (i) licitação competitiva ou (ii) negociação bilateral direta.

O caso de Angola, ao prever as duas possibilidades, dependendo de determinadas carac-

terísticas, é equiparável à maioria dos países. Sua Lei prevê, expressamente, tanto a possibilidade de

procedimentos licitatórios (“Concurso público” art. 46) como, em casos excepcionais, negociação direta

(vide arts. 44, §4 e 47).

O art. 46 prevê que: “Os procedimentos do concurso público para atribuição da qualidade de asso-

ciada da Concessionária Nacional devem constar dum regulamento a ser aprovado pelo Governo, no prazo de

60 dias contados a partir da data da entrada em vigor da presente lei”. A escolha das OC ocorre, portanto,

via de regra, por meio de licitações públicas. Nesse sentido, a regulamentação acima indicada ocorreu por

meio do Decreto 48/06 de 1 de setembro de 2006, que regula o processo e os procedimentos licitatórios

para contração de OC ou grupos de OC com a Sonangol. Este decreto refletiu a grande preocupação do

Governo Angolano em assegurar a transparência dos processos licitatórios, de modo a assegurar a atrati-

vidade do setor de petróleo e gás natural angolano face as OC multinacionais.

O supracitado Decreto 48/06, aprovado pelo Conselho de Ministros e publicado no Diário da

República, órgão oficial da República de Angola, em 1 de setembro de 2006, prevê uma série de regras

dentro dos padrões internacionais para realização de procedimentos licitatórios, tais como: (i) enumera-

ção de requisitos para pré-qualificação das OC interessadas; (ii) obrigatoriedade de ampla divulgação

nos meios de comunicação dos procedimentos licitatórios futuros; (iii) instituição de uma comissão para

análise e julgamento das propostas, denominada no Decreto como “Júri”, composta por um repre-

sentante da Concessionária Nacional, um representante designado pelo MINPET e um representante

designado pelo MINFIN; (iv) determinação de critérios objetivos para o julgamento das propostas e (v)

previsão de ritos mais simplificados para aquisições de bens ou serviços de pequena monta.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL266

No entanto, o Decreto sob análise apresenta, também, algumas características peculiares,

não comumente encontradas em normas semelhantes em outros países, dentre as quais se destacam:

(i) a possibilidade de realização de uma licitação específica para a escolha do operador, realizando-se,

posteriormente, uma segunda licitação para seleção das demais OC a se associarem; (ii) realização de

licitações envolvendo apenas empresas de pequeno ou médio porte, ou apenas empresas que sejam

controladas por cidadãos angolanos; e (iii) a elaboração, pelo MINPET, de uma lista de entidades ango-

lanas prestadoras de serviços e fornecedoras de bens às operações petrolíferas que deverão, obrigato-

riamente, ser consultadas pelos operadores quando da realização de licitações.

Por outro lado, a Lei prevê a possibilidade de haver negociações diretas, conforme previsto no

parágrafo 4 do Art. 44, abaixo transcrito:

“Artigo 44º

(Atribuição da concessão e da qualidade de associada da Concessionária Nacional)

4. Pode ser atribuída a qualidade de associada da Concessionária Nacional por negociação directa

com empresas interessadas, mas apenas nos seguintes casos:

a) Imediatamente a seguir a um concurso público de que não tenha resultado a atribuição da quali-

dade de associada da Concessionária Nacional por motivo de falta de propostas;

b) Imediatamente a seguir a um concurso público de que não tenha resultado a atribuição da quali-

dade de associada da Concessionária Nacional, em virtude de o Ministério de tutela, após ouvir

a Concessionária Nacional, ter considerado que as propostas apresentadas são insatisfatórias

em função dos critérios de adjudicação adoptados”

Após a análise do dispositivo angolano acima, podemos observar que a contratação direta é

uma exceção à regra geral de licitar. Este mesmo princípio observa equivalência com a legislação brasi-

leira no que diz respeito às contratações públicas.

No que se refere aos mecanismos de escolha das OC temos, ainda, o art. 47 que trata es-

pecificamente dos procedimentos aplicáveis aos casos de negociação direta, previstos no supracitado

parágrafo 4 do art. 44. Cabe transcrever o art. 47 que, conforme veremos, é auto-explicativo:

“Artigo 47º

(Regime da negociação directa)

1. Nos casos referidos no nº 4 do artigo 44º qualquer entidade de comprovada idoneidade e capa-

cidade técnica e financeira pode requerer à Concessionária Nacional a atribuição da qualidade

de sua associada mediante negociação directa.

2. O requerimento a que se refere o número anterior deve ser instruído nos termos do disposto na

parte final do nº 3 do artigo 44º e ser submetido pela Concessionária Nacional, que emite um

parecer ao Ministério de tutela, para efeitos de decisão se deve ou não dar-se início ao respectivo

processo negocial.

3. No caso de o Ministério de tutela, após cumprimento do disposto no nº 5 do artigo 44º verificar

que continua apenas a existir uma entidade interessada em adquirir a qualidade de associada da

Concessionária Nacional, pode decidir pelo início do processo de negociação directa.”

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 267

Depreende-se do trecho acima transcrito que a iniciativa do processo de negociação direta ca-

berá à OC interessada, que deverá solicitar à Sonangol o início das tratativas neste sentido. Esta, por sua

vez, analisará a solicitação e emitirá um parecer ao “Ministério de tutela” (MINPET) que, então, emitirá

decisão final sobre a possibilidade ou não, de se realizar uma negociação direta.

Considerando a crescente produção de hidrocarbonetos angolana, o país tem sido alvo de

interesse da maioria das grandes OC multinacionais. A última rodada de licitações angolana ocorreu

em março de 2008, visando a contratação, via PSC, de OC para um grande número de blocos. Algumas

características interessantes desta última rodada de licitações são: (i) blocos licitados sob o regime de

Partilha de Produção, com o modelo do PSC previamente disponibilizado pela Sonangol na internet; (ii)

limitação do “cost-oil” a 50% da produção; (iii) partilha do petróleo baseada em alguns contratos feitos

por meio de escalas de volume de produção e outros por meio de aplicação do “rate of return (ROR)”

também conhecido como “R-factor”; (iv) fase de exploração variando entre 3 e 5 anos, com possibilidade

de extensão por mais 2 a 3 anos; (v) fase de produção de 20 a 25 anos; (vi) exigência, em alguns blocos

offshore, de perfuração de no mínimo 1 poço na área do “pré-sal” na fase de exploração.505

Remuneração da OC:

A remuneração da OC, sob o PSC angolano, subdivide-se em “cost oil” e “profit oil”. Como já ob-

servado, considerando a tendência cada vez mais evidente de assinatura de PSC com alguma forma de “escala

variável” na partilha do “profit oil”, Angola é o único país africano e o único grande produtor mundial a usar, em

alguns de seus PSC, o sistema de escala variável pautado na “taxa de retorno”, também conhecida como “rate

of return”, “ROR” ou “R-Factor”. Países com produções menos expressivas, como a Índia e o Azerbaijão também

têm utilizado o ROR em seus respectivos PSC, como forma de atrair investidores estrangeiros.

O grande diferencial do sistema de ROR é que ele se baseia na relação entre receitas e despe-

sas da OC, o que significa que as receitas acumuladas no contrato, recebidas pela OC tanto a título de

recuperação de custos (“cost oil”) quanto partilha do excedente (“profit oil”), serão divididas pelas despe-

sas acumuladas durante aquele determinado período Já nos PSC com sistema de escala cumulativa, os

percentuais da partilha entre a OC e o Estado hospedeiro variam de forma a aumentar a participação

do Estado no “profit oil” à medida em que são atingidos patamares de produção pré-determinados,

independentemente da lucratividade resultante.

Considerando que a rentabilidade da atividade petrolífera varia em função (i) dos preços do

petróleo; (ii) da dimensão da descoberta e (iii) dos custos de exploração e desenvolvimento, relacionar

a partilha do “profit oil” com a taxa de retorno alcançada permite que todos estes fatores sejam devida-

mente incorporados ao cálculo. Este é, portanto, o grande diferencial da utilização do ROR em relação

aos demais mecanismos de cálculo para a partilha da produção.

Nesse sentido, costuma-se criticar tanto o sistema de escala cumulativa quanto o sistema de

escala por produção diária por considerarem, tão somente, níveis de produção (diários ou cumulativos,

conforme o caso) sem levar em conta o impacto na lucratividade das OC, derivado das oscilações do

preço do petróleo. Resumindo, estes sistemas são incapazes de se adaptar a grandes variações no preço

do petróleo. Em casos de grande alta dos preços do petróleo, o país produtor não será eficiente em

se apropriar ao máximo desta valorização do commodity, ao passo que, no caso de grande baixa das

cotações, estas escalas podem se tornar extremamente perversas às OC, dificultando, ou até impossibi-

litando, o investimento. O ROR, por outro lado, tende a ser mais eficiente neste sentido, dado que fun-

damenta as variações na participação da OC diretamente no retorno financeiro obtido pela própria OC.

505 Informações disponíveis no site da Sonangol (www.sonangol.co.ao). Acessado em 21 de novembro de 2008.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL268

A adoção da ROR costuma ser considerada como uma evolução dos primeiros sistemas de

escalas variáveis para divisão do “profit oil”, pautadas ou em taxas de produção diária, ou na produção

acumulada. A Indonésia, país onde se desenvolveu o regime de PSC, como já visto anteriormente, é um

clássico exemplo de país que utiliza basicamente o sistema de produção acumulada. O sistema de ROR,

por sua vez, tem sido particularmente usado em blocos de águas profundas em Angola, além dos já

mencionados casos do Azerbaijão e da Índia.

Dado que a remuneração da OC é diretamente afetada pela tributação aplicável às suas ativi-

dades, deve-se ressaltar que, em Angola, não se paga TP nos contratos de Partilha de Produção. Porém,

o imposto de renda (IR) é fixado em 50%, conforme disposto na Lei 13/2004 para a “Tributação das

Actividades Petrolíferas”, que é aplicável a todas as empresas, nacionais ou estrangeiras, que exerçam

atividades petrolíferas no território angolano.

Os contratos-modelo de Partilha de Produção angolanos disponibilizados pela Sonangol em

seu sítio na Internet prevêem, em seu art. 12, que o óleo produzido em um trimestre de uma determinada

área produtora, subtraído o petróleo de recuperação de custos (“cost oil”) daquela mesma área, será

considerado “profit oil” e deverá ser dividido entre a Sonangol e a OC ou grupo de OC, de acordo com

a taxa de retorno obtida ao fim do trimestre anterior, após a contabilização de impostos. A quantidade

de petróleo a ser considerada como recuperação de custos “cost oil” será calculada de acordo com o

preço de mercado para aquela determinada qualidade do petróleo produzido.

Dado que a maioria dos elementos chave dos PSC são negociáveis, além do fato de que deter-

minados parâmetros como bônus, recuperação de custos, depreciação e escalas de partilha de produção

podem variar de contrato para contrato, a remuneração das OC, em Angola, pode variar enormemente,

sendo difícil estabelecer padrões neste sentido. Uma análise mais profunda neste sentido deveria ocorrer

em cada PSC específico firmado entre a Concessionária Nacional e uma OC ou grupo de OC.

1.3.3.1.4.3 Etapas e Fases Contratuais

Entre 1952 e 1976, mais de 30.500km de pesquisas sísmicas foram realizadas no território

angolano, resultando na perfuração de 368 poços de prospecção e 302 poços de produção de óleo. Du-

rante este período, um total de 23 áreas foi descoberta, três das quais em áreas “offshore”. A exploração

em águas profundas começou em 1991, no Bloco 16, sendo seguida pelos blocos 14, 15, 17, 18 e 20.

Mais recentemente, no início do ano 2000, havia 29 blocos “onshore” ou “offshore” sendo explorados

por 30 diferentes OC, 14 destas operadoras. A primeira unidade FPSO (Floating, Production, Storage

& Offloading) em operação em Angola iniciou suas atividades em dezembro de 1999 e, desde 2003, a

maior FPSO do mundo está em operação no “Projeto Kizomba”, no bloco 15506.

Fases de Exploração e Produção sob o PSC angolano:

Considerando as pesquisas sísmicas realizadas, que determinam as áreas que detêm poten-

cial petrolífero, a Sonangol irá solicitar ao MINPET a outorga das áreas e autorização para a respectiva

licitação para escolha das OC. Isso posto, as fases contratuais deverão ser subdivididas, assim como na

grande maioria dos países, em Fase de Exploração e Fase de Produção.

506 International Business Publications; “ANGOLA Oil & Gas Exploration Laws and Regulations Handbook”, Volume I; 4a Edição, 2008; págs. 31 e 32.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 269

Assim, conforme determinado pelo art. 11 da Lei, em um primeiro momento ocorre a definição

das áreas e sua respectiva outorga no “Decreto de Concessão”, mediante autorização do Governo nos

termos solicitados e devidamente justificados pela Sonangol. Da mesma forma, a duração da outorga

estará determinada no mencionado decreto, que já especificará, inclusive, os prazos para atividades de

exploração e de produção. Será, então, firmado o PSC, que terá previsões expressas quanto aos prazos

das fases de exploração e de produção, assim como as obrigações assumidas pela OC em cada uma

das fases. Os termos das fases de exploração e de produção do PSC deverão, assim, estar espelhados

nas determinações constantes do Decreto de Concessão. Neste mesmo sentido temos o art. 48, da su-

pracitada lei, que prevê, dentre outras disposições, que o “Decreto de Concessão” deverá determinar a

duração da outorga, suas diferentes fases e períodos.

Quanto à divisão em fases de exploração e produção, o art. 10 da Lei prevê a referida divisão

com uma nomenclatura específica, em “períodos”, e uma subdivisão em “fases”:

“Artigo 10º

(Períodos e fases da concessão)

1. A duração da concessão abrange em regra dois períodos repartidos em fases:

a) O período de pesquisa, que compreende as fases de pesquisa e avaliação;

b) O período de produção, que compreende as fases de desenvolvimento e produção.

2. A concessão pode abranger apenas o período de produção.”

O modelo de PSC angolano507 prevê, em sua cláusula 15, as obrigações mínimas que a OC as-

sume no PSC durante a fase de exploração, sendo essas: (i) realizar programa de estudos sísmicos cobrin-

do determinada área; (ii) traçar horizontes geológicos; (iii) realizar perfuração de poços de exploração em

profundidades predeterminadas, conforme definido no “Work Program” e no orçamento; e (iv) caso a OC

requeira extensão do prazo de exploração, deverá ela realizar a perfuração de mais poços, em número e

profundidades estabelecidos no próprio PSC. Ainda, de acordo com o supracitado modelo, caso a OC não

cumpra suas obrigações exploratórias dentro dos prazos determinados, ela automaticamente abre mão de

todas as áreas do contrato ainda não transformadas em Áreas de Desenvolvimento.

Por fim, o Art. 12 da Lei,transcrito abaixo, sumariza os prazos e procedimentos para requeri-

mento de prorrogação de prazos, tanto das licenças de prospecção, como das concessões (outorgas):

Artigo 12º

(Definição e prorrogação dos prazos da licença de prospecção e da concessão)

1. Os prazos da licença de prospecção, bem como os de cada um dos períodos da concessão são

definidos na respectiva licença e no decreto de concessão.

2. O prazo máximo de uma licença de prospecção é de três anos.

3. A duração dos prazos de licença de prospecção e de cada um dos períodos da concessão pode

ser excepcionalmente prorrogada a requerimento da licenciada ou da Concessionária Nacional.

4. A prorrogação é da competência do Ministro de tutela que a concede ou denega em função das

507 International Business Publications; “ANGOLA Oil & Gas Exploration Laws and Regulations Handbook”, Volume I; 4a Edição, 2008; págs. 214 a 274.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL270

razões invocadas e após se ter certificado de que foram cumpridas por parte da licenciada ou da

Concessionária Nacional as obrigações existentes.

5. O requerimento a que se refere o nº 3 deve fazer a exposição dos factos que

deram origem à necessidade da prorrogação do prazo.

6. A licença de prospecção considera-se atribuída a partir da data da entrada em vigor do respec-

tivo diploma de atribuição. A concessão considera-se atribuída a partirdos momentos a seguir

indicados:

a) Caso a Concessionária Nacional se associe a outras entidades nos termos do

artigo 14.° a partir do momento da assinatura do respectivo contrato;

b) Caso a Concessionária Nacional não se associe a outras entidades, a partir do momento da

entrada em vigor do decreto de concessão.

Verificada a existência de um poço comercial, a Concessionária Nacional deve, imediatamen-

te, proceder à avaliação do reservatório e enviar relatório detalhado ao MINPET, na forma do art. 60 da

Lei. Esta é a chamada fase de avaliação, que precede o período de produção.

O período de produção, por sua vez, será determinado de acordo com os resultados das

avaliações enviadas ao MINPET. Uma vez declarada a comercialidade de determinado poço, na forma

do art. 63 da Lei, deverá ser demarcado o reservatório e, em seguida, elaborado um plano de desen-

volvimento de modo a dar início a sua exploração comercial. A comunicação formal ao MINPET da

descoberta comercial inicia o período de produção.

O “Plano Geral de Desenvolvimento da Produção” deverá ser elaborado em conjunto entre a

OC e a Sonangol, e ser aprovado pelo MINPET, nos termos do art. 63 da Lei. Este plano deverá elencar

e detalhar todas as atividades relacionadas à produção daquele determinado reservatório. Anualmente,

porém, deverão ser elaborados os “Planos Anuais de Desenvolvimento e de Produção”, que também

deverão ser objeto de análise e aprovação do MINPET, conforme disposto no art. 65 da Lei.

Durante o período de produção, por força do art. 71 da Lei, a Concessionária Nacional deve

proceder à medição diária da produção, registrando todo o petróleo produzido e recuperado, utilizando,

para tal, métodos e instrumentos devidamente certificados, com respeito absoluto pelas regras da boa

técnica e da prática da indústria petrolífera e informar, semanalmente, ao MINPET sobre os volumes

produzidos por cada área de desenvolvimento. Ou seja, além de demonstrar o controle que o Estado

Angolano deseja deter sobre a produção de seu território, o referido artigo indica também os anseios

da legislação angolana em se manter alinhada com as técnicas e políticas internacionais de produção

de hidrocarbonetos. Este alinhamento visa manter as atividades de exploração e produção de hidro-

carbonetos angolana em dia com os parâmetros internacionais, de modo a manter Angola no rol das

grandes OC multinacionais.

No decorrer do prazo de exploração, determinado pelo Decreto de Concessão, caso ainda

haja poços em operação e comercialmente viáveis, pode a Sonangol, juntamente com a OC, solicitar ao

MINPET a prorrogação do período de produção por determinado período de tempo.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 271

I.3.3.1.4.4 Instrumentos de Controle sobre a Produção

Os dispositivos previstos na legislação angolana para controle da produção de petróleo, de forma geral, são bastante similares aos existentes no Brasil, analisados em capítulo anterior.

A Lei, abordada especialmente nos Capítulos VI – Operações Petrolíferas e VII – Fiscalização das Operações Petrolíferas, dispõe sobre as formas utilizadas para o controle sobre a produção, esta-belecendo no primeiro parágrafo do artigo 58 que os trabalhos de prospecção, pesquisa e avaliação devem constar de um plano anual, a ser elaborado pela Sonangol e pelas associadas, o qual deve ser submetido pela Sonangol ao MINPET.

Quando da descoberta comercial e início do período de produção, referida norma dispõe, no artigo 63, que a Concessionária Nacional e suas associadas devem elaborar um plano geral de desen-volvimento e produção (para fins deste capítulo sobre a República de Angola, doravante denominada simplesmente como “Plano Geral”) a ser submetido pela Sonangol ao MINPET para apreciação e deci-são dentro de prazos já estabelecidos no referido artigo.

Dentro do prazo de 90 dias, após o recebimento do referido Plano Geral, deverá o MINPET se pronunciar sobre a aprovação ou não do plano, podendo solicitar revisão parcial ou total do mesmo, dentro do referido prazo, no caso de constatar que este não observa disposições impostas por lei ou pelo decreto de concessão.

O Plano Geral pode, a qualquer momento, ser alterado mediante pedido expresso e funda-mentado da Sonangol ao MINPET.

Isto feito, e tendo o mesmo sido aprovado pelo MINPET, com base no artigo 65 da Lei em comento, os trabalhos de desenvolvimento e de produção previstos para cada ano devem constar de planos anuais (para fins deste capítulo sobre a República de Angola, doravante denominada simplesmente como “Planos Anuais”), devidamente pormenorizados e orçados, a serem apresentados pela Sonangol ao MINPET, dentro de um prazo a ser definido pelo mesmo, sendo que o mesmo somente pode determinar a não execução do referido plano no caso de descumprimento do disposto nas normas aplicáveis ou do decreto de concessão.

De qualquer forma, pode o MINPET recusar total ou parcialmente o Plano Anual. Em tal caso, deverá o próprio Ministério comunicar à Sonangol o ocorrido dentro de um prazo de 15 dias, após o recebimento, fundamentando o seu motivo. Dessa forma, o dito Plano Anual poderá ser alterado, desde que tecnicamente justificado.

Não obstante, tanto o Plano Anual como a Sonangol e associadas, conforme o caso, devem ainda elaborar planos anuais de produção relativa a cada jazida petrolífera (para fins deste capítulo so-bre a República de Angola, doravante denominada simplesmente como “Plano de Jazida”), que devem ser apresentados para apreciação e decisão do MINPET até o final de Outubro de cada ano.

Nos termos do 2º e 3º parágrafos do Artigo 70 da Lei, a Sonangol, quando for o caso, e desde que previamente consultada suas associadas, pode apresentar para apreciação e decisão do MINPET planos alternativos de produção ao Plano de Jazida, incluindo os métodos de injeção possíveis e os res-pectivos fatores de recuperação, assim como planos de recuperação secundária e terciária.

Qualquer alteração ao Plano de Jazida deve ser previamente aprovado pelo MINPET, o qual, a seu exclusivo critério, e desde que fundamentado por interesse nacional para garantir a eficiente utilização dos reservatórios, instalações e/ou sistemas de transporte, pode determinar o aumento, a di-minuição ou a manutenção dos volumes de produção programados, devendo, em tais casos, atribuir à Sonangol um prazo razoável para apresentação dos planos adicionais de produção.

Por fim, cumpre ainda mencionar que compete à Sonangol, nos termos da letra (g) do 1º pará-

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL272

grafo do artigo 30 da Lei, preparar e submeter ao MINPET relatórios mensais das operações petrolíferas com inclusão de todos os elementos técnicos e econômicos relacionados com a atividade desenvolvida no mês a que cada relatório corresponde, bem como relatórios trimestrais e anuais, incluindo os resul-tados obtidos e uma análise comparativa com as previsões feitas para os períodos a que tais relatórios se referem.

I.3.3.1.4.5 Controles e Limites para Comercialização

O artigo 81 da Lei dispõe que as OC, associadas à Sonangol, podem dispor livremente da sua quotaparte do petróleo produzido, sujeito aos termos Lei e demais legislação aplicável. Portanto, via de regra, não há controle ou limites impostos a comercialização da parcela dos hidrocarbonetos a que as OC têm direito, sob o os PSC firmados com a Sonangol.

Além disso, o artigo 13 do Modelo de Contrato de Partilha de Produção508, referente à Rodada de Licenciamento de 2007/2008, estabelece que cada uma das Partes terá o direito de, separadamente, comercializar e exportar a sua quota-parte do óleo cru produzido sob o contrato.

No entanto, é importante notar que as partes exercem seu direito sujeito ao lifting schedule e aos procedimentos e regulamentações que são elaborados pela Sonangol e submetidos à análise das OC associadas. Tais procedimentos e regulamentações devem ser consistentes com os termos do PSC aplicável e, de acordo com a Lei, deverão rezar sobre questões necessárias para garantir a efici-ência e equidade das operações, como por exemplo, os direitos das Partes, prazos para notificações, quantidades mínimas e máximas, duração de armazenamentos, prazos, conservação, derramamento, responsabilidades das partes, taxas e penalidades por over e underlifting e procedimentos de segurança e emergência.

Regra mais importante sobre limites à comercialização é a estipulada no artigo 78º da Lei, que trata sobre a “satisfação das necessidades de consumo interno”. Segundo esta regra, o Governo, mediante notificação feita com uma antecedência mínima de 90 dias, pode exigir à Sonangol e às suas OC associadas, sempre que entender necessário, que seja fornecido no ponto de entrega509, uma quantidade de petróleo, a partir da respectiva quota-parte da produção, destinada à satisfação das ne-cessidades de consumo interno daquele Estado hospedeiro. O artigo também prevê que a participação da Sonangol e das OC associadas, na satisfação das necessidades de consumo interno de Angola, não poderá exceder a proporção entre a produção anual proveniente da área da concessão respectiva e a produção anual global de petróleo do País, nem ser superior a 40% da produção total da respectiva área concessão.

É importante notar que Angola paga pela produção requisitada, um valor calculado de acordo com as disposições relativas à avaliação do petróleo para efeitos fiscais, valor este que deve ser pago em moeda interna-cionalmente convertível, no prazo de 30 dias contados a partir do fim do mês em que ocorra o levantamento.

508 Aplicável aos Blocos offshore 9, 19, 20, 21, 46, 47, 48.509 Ponto de Entrega é ponto FOB da instalação angolana de carregamento, no qual o petróleo atinge a falange de entrada da tubagem de

carregamento do meio de transporte de levantamento ou qualquer outro ponto que possa ser acordado entre o Ministério do Petróleo, a Sonangol e suas associadas.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 273

I.3.3.1.4.6 Conteúdo Local e Outras Formas de Incentivo à

Cadeia Produtiva Local

Normas versando sobre percentual mínimo de utilização da indústria nacional sempre foram uti-

lizadas por países sub-desenvolvidos, ou em desenvolvimento, para fomentar o crescimento do seu parque

industrial, aproveitando a existência de suas reservas para atrair possíveis OC para atuar no território.

No caso de Angola, que sofreu durante anos com conflitos armados, que resultaram na devas-

tação do já precário parque industrial, a necessidade de ampliação dos pontos de trabalho e de toda

a indústria nacional faz com que tais normas de conteúdo local garantam um mínimo de investimento

para o desenvolvimento sustentável da indústria nacional.

Neste sentido, na exposição de motivos da Lei já é mencionado que um dos objetivos de tal

norma é a promoção do desenvolvimento do mercado de trabalho e o aumento da competitividade do

País no mercado internacional.

Da mesma forma, no Capítulo II, que versa sobre os Princípios de Organização e de Exercício

das Operações Petrolíferas, encontramos o Artigo 26, que versa sobre o fomento do empresariado an-

golano e promoção de desenvolvimento.

Ao longo dos seus três parágrafos, dispõe, o referido Artigo 26, que o Governo Angolano

deve adotar medidas tencionem garantir, promover e incentivar a participação no setor petrolífero de

empresas tituladas por cidadãos angolanos e estabelecer as condições necessárias para tanto. Ademais,

também dispõe que a Sonangol e suas associadas devem cooperar com as autoridades governamentais

nas ações públicas de promoção do desenvolvimento econômico-social do País.

Com fulcro em tais conceitos, na mesma Lei, no artigo 27, é normatizada a utilização de bens e

serviços nacionais, estabelecendo que as licenciadas, a Sonangol e associadas, assim como quaisquer outras

entidades que com elas colaborem para execução das operações petrolíferas devem observar o seguinte:

• Adquirir materiais, equipamentos, maquinaria e bens de consumo e de produção ango-

lana, da mesma qualidade, ou sensivelmente da mesma qualidade, e que estejam dis-

poníveis para venda e entrega em devido tempo a preços não superiores a mais de 10%

do custo dos artigos importados, incluindo os custos de transporte, seguro e encargos

aduaneiros devidos;

• Contratar prestadores de serviços locais, a medida em que os serviços que prestem sejam

idênticos aos que estejam disponíveis no mercado internacional, bem como os seus preços,

quando sujeitos aos mesmos encargos fiscais, não ultrapassem em mais de 10% os preços

praticados por empreiteiros estrangeiros para idênticos serviços.

Estabelece, ainda, a obrigatoriedade da consulta às empresas angolanas nas mesmas condi-

ções da consulta ao mercado internacional, incumbindo o MINPET da fiscalização do cumprimento de

tais previsões, tornando nulo quaisquer contratos que violem tal regulamento.

I.3.3.1.4.7 Regras Sobre Unitização

Conforme já exposto nos itens anteriores, Angola procedeu a uma recente atualização de

sua legislação petrolífera, o que culminou com a promulgação da Lei. Ao atualizar sua legislação

petrolífera, o Governo Angolano objetivou manter suas normas internas em consonância com os

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL274

recentes e constantes desenvolvimentos da indústria petrolífera mundial, mantendo a atratividade do

país, neste setor, da economia perante as OC. Nesse sentido, tema sensível e relativamente recente,

que tem despertado discussões em âmbito internacional, é a questão da unitização, em especial de

áreas offshore. As questões envolvendo unitização de áreas adquire contornos ainda mais sensíveis

quando estas áreas desafiam fronteiras nacionais, requerendo, então, envolvimento direto de dois ou

mais governos soberanos.

Conforme já discutido no item I.2.3.1.4.7 neste trabalho, o Brasil não tem, ao menos atual-

mente, quaisquer questões de unitização envolvendo países vizinhos, havendo apenas questões envol-

vendo diferentes OC, com a possibilidade de participação da ANP vir a se tornar necessária em alguns

casos. Em Angola, porém, a questão é bastante diferente, pois sua região petrolífera mais desenvolvida

encontra-se justamente na região de Cabinda, uma área fronteiriça com a República Democrática do

Congo, ao norte do país. Casos como este extrapolam a legislação vigente no país e requerem a assi-

natura de tratados internacionais para sua regulação.

Em virtude do acima exposto, de modo a facilitar a compreensão de um tema que, por si só,

já demonstra alta complexidade, serão avaliadas, separadamente, as questões envolvendo (i) uniti-

zação de áreas exploradas por OC distintas dentro do território angolano, regidas pela “Lei de Ativi-

dades Petrolíferas” e pelas disposições constantes do modelo de PSC disponibilizado pela Sonangol e

(ii) a unitização em áreas fronteiriças, em especial na região da Bacia Inferior do Congo, regida por

um Memorando de Entendimentos firmado entre o Governo Angolano e o da República Democrática

do Congo.

Unitização de Áreas dentro do Território Angolano

Conforme já exposto nos parágrafos anteriores, no caso de uma determinada reserva pe-

trolífera se estender além dos limites específicos determinados no Decreto de Concessão daquela

respectiva área, aplicar-se-ão as disposições pertinentes da Lei 10/04. A referida Lei detém artigo

específico sobre unitização510, tratando, por exemplo, da obrigatoriedade da Concessionária Nacional

de informar, imediatamente, ao Ministério do Petróleo a descoberta de que uma determinada reserva

petrolífera se estende para além da área concedida ou de uma reserva que apenas seja economica-

510 Lei 10/04 - “Lei das Actividades Petrolíferas”; “Artigo 64 (Unitização e Desenvolvimento Conjunto): 1. A Concessionária Nacional deve informar de imediato o Ministério de tutela logo que: 1.1. descubra na área da concessão um jazigo de petróleo capaz de um desenvolvimento comercialmente viável e que se estenda para

além da área da referida concessão; 1.2. descubra na área da concessão um jazigo de petróleo que apenas pode ser desenvolvido comercialmente em conjunto com um jazigo

de petróleo existente numa área adjacente à área da referida concessão; 1.3. considere que uma descoberta comercial na concessão deve, por razões técnico-económicas, ser desenvolvida conjuntamente com

uma descoberta comercial existente numa área adjacente à referida concessão. 2. No caso de as duas áreas se encontrarem sob o regime de concessão petrolífera, o Ministério de tutela pode, através de notificação

escrita dirigida à Concessionária Nacional e suas associadas, determinar que o petróleo descoberto seja desenvolvido e produzido em conjunto.

3. No caso de o Ministério de tutela fazer uso dos direitos referidos no número anterior, as entidades envolvidas devem cooperar com vista à elaboração de um plano geral de desenvolvimento e produção conjunto para o petróleo em questão.

4. O plano referido no número anterior deve ser apresentado ao Ministério de tutela, para apreciação e decisão, no prazo de 180 dias contados a partir da data em que a Concessionária Nacional tenha recebido a notificação referida no número anterior ou num prazo mais longo se tal for concedido pelo Ministério de tutela.

5. No caso de o plano geral de desenvolvimento e produção não ser apresentado no prazo estabelecido no número anterior, o Ministério de tutela pode contratar um consultor independente para que, de acordo com a prática geralmente aceite na indústria petrolífera inter nacional e a expensas da Concessionária Nacional e/ou das suas associadas, elabore o citado plano.

6. O consultor referido no número anterior deve realizar consultas e manter todas as partes permanentemente informadas sobre o seu trabalho.

7. A Concessionária Nacional e suas associadas devem executar o plano geral de desenvolvimento e produção elaborado nos termos do número anterior, sob pena de o jazigo ou jazigos em questão voltarem para a titularidade do Estado.

8. No caso das situações de unitização previstas no nº 1 se verificarem relativamente a uma área que não se encontre sob o regime de concessão petrolífera ou a um país limítrofe, o Ministério de tutela, mediante proposta da Concessionária Nacional deve submeter à aprovação do Governo, a estratégia a ser adoptada com vista a possibilitar a produção do petróleo em questão.”

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 275

mente viável em conjunto com outra reserva em área adjacente à área da referida concessão.

Percebe-se, assim, que a legislação angolana prevê a aplicação de mecanismos de uniti-

zação dentro de seu território em 2 casos distintos, quais sejam: (i) se uma determinada reserva pe-

trolífera se estende a outra área, objeto de outra concessão do estado à Sonangol e seus eventuais

parceiros ou (ii) se determinado poço somente seja economicamente viável se explorado em conjunto

com outro poço de outra concessão adjacente. Enquanto a primeira possibilidade trata da questão

geológica comum, envolvendo acordos de unitização, a segunda opção permite a unitização de área

com o objetivo de possibilitar que a infra-estrutura necessária à exploração e produção seja comparti-

lhada pelos operadores, aumentando a eficiência econômica da atividade por meio de ganhos de es-

cala.511 Trata-se, portanto, de um caso de unitização de áreas, não para evitar exploração predatória

ou competitiva entre as OC, mas sim para possibilitar a estas explorar reservas petrolíferas que não

seriam comercialmente viáveis se exploradas isoladamente.

O referido dispositivo legal, ao determinar que cabe ao Ministério do Petróleo definir se ha-

verá unitização de áreas exploradas pela Sonangol com diferentes OC, obriga, por outro lado, que

as OC associadas à Sonangol, por meio de diferentes PSC, busquem um “Plano Geral de Desenvolvi-

mento e Produção Conjunto”, que substituirá os planos de desenvolvimento elaborados em cada PSC

isoladamente.

Considerando os diversos e complexos fatores a serem negociados para se chegar a um

acordo, especialmente em razão dos interesses conflitantes entre as OC das áreas unitizadas, eviden-

cia-se que, dificilmente, as partes seriam capazes de chegar a um acordo por si só. Antevendo esta

fragilidade sistemática, a legislação angolana, buscando demonstrar transparência e isenção nas de-

cisões, introduziu dispositivo que prevê a resolução de conflitos sobre unitização por meio da contrata-

ção de um consultor independente, a fim de definir os termos do “Plano Geral de Desenvolvimento e

Produção Conjunto”, adotando os princípios geralmente aceitos na indústria petrolífera internacional.

Trata-se, portanto, da aplicação do instituto da mediação, contratada pelo Ministério do Petróleo, às

expensas das partes, caso estas não sejam capazes de chegar a um acordo sozinhas. A punição para

o caso da Sonangol e suas associadas (OC) não cumprirem com o determinado pelo consultor inde-

pendente é a perda das áreas unitizadas, voltando estas ao controle do Governo.

O modelo de PSC fornecido pela Sonangol que vem sendo utilizado recentemente também

detém previsões expressas sobre Unitização e Desenvolvimento Conjunto. Basicamente, estas cláusu-

las contratuais se reportam ao disposto no art. 64 da Lei e determinam que as demais cláusulas do

PSC deverão permanecer aplicáveis em caso de unitização.

Unitização Envolvendo a República de Angola e seus países limítrofes:

Angola é geologicamente formada pelas bacias sedimentares de Kwanza, Congo e Namíbia.

No entanto, apenas as bacias de Congo e Kwanza têm apresentado quantidades comerciais de petró-

leo. A região da costa sul de Angola tem sido pouco explorada após o fracasso dos blocos 9, 21, 22 e

25, localizados ao sul da capital, em Luanda. Considerando que as atividades exploratórias na costa

do vizinho meridional de Angola, Namíbia, também não têm obtido qualquer sucesso, atividades pe-

trolíferas ao sul de Angola estão, atualmente, desencorajadas. Alguns engenheiros do departamento

de geologia da Sonangol, no entanto, desejam realizar estudos mais profundos da Bacia da Namíbia,

pois acreditam que a região pode trazer boas surpresas512. Entretanto, por hora não há atividades

511 Asmus, David, et al; “Unitizing Oil and Gas Fields Around the World: A Comparative Analysis of National Laws and Private Contracts”, Uni-versity of Houston Law Center, 2006, pág 29.

512 International Business Publications; “ANGOLA Oil & Gas Exploration Laws and Regulations Handbook”, Volume I; 4a Edição, 2008;

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL276

exploratórias de expressão na região e, assim, não há perspectiva de haver, em um futuro próximo,

quaisquer questões envolvendo unitização Angola e Namíbia.

O panorama na costa norte de Angola, por outro lado, é completamente diverso. Além da

grande quantidade de hidrocarboneto presente na região da foz do Rio Congo (Bacia Sedimentar do

Congo), responsável por expressiva parcela da produção angolana de petróleo, esta região é alvo, até

hoje, de disputas territoriais entre os dois países. Traçada originalmente em fins do século XIX, entre as

autoridades coloniais portuguesa e belga, a fronteira terrestre entre Angola e a República Democrática

do Congo (RDC) continua objeto de disputa entre essas nações. A grande quantidade de diamantes

no subsolo da região já gerou, no passado, conflitos armados, tanto entre forças oficiais como pa-

ramilitares. A exploração ilegal de diamantes na região por milícias rivais angolanas e congolesas é

considerada um grande problema por ambos os países.

Atualmente, a situação diplomática entre os dois países é pacífica e ambos vêm buscando

uma solução conjunta na questão dos blocos offshore nas regiões de fronteira marítima, especialmente

enquanto não se chega a um acordo definitivo, na marcação das fronteiras terrestres, entre as duas

nações.

O primeiro resultado prático dos esforços diplomáticos entre as duas nações tomou forma

com a assinatura, em 18 de junho de 2003, do Memorando de Entendimento sobre Exploração Co-

mum da Bacia Inferior do Congo. Este Memorando foi aprovado internamente em Angola pela Reso-

lução 19/04, do Ministério do Petróleo, objetivando “proceder à exploração racional, equilibrada e no

interesse comum da Bacia Inferior do Congo, enquanto não forem delimitados os limites fronteiriços nesta

região pelos dois países”513.

O referido Memorando revela a vontade política dos chefes de Estado da RDC e de Angola

em reunir, em um curto espaço de tempo, todas as condições que permitam a exploração comum dos

recursos petrolíferos da região determinada pelo Memorando, região esta denominada “Corredor

Marítimo de Exploração Comum Petrolífera”, a partir do referido memorando deverão ser definidas as

zonas de interesse comum.

As principais características do referido memorando podem ser resumidas nos seguintes

pontos: (i) em respeito ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito, o referido Corredor não integra

as áreas já descobertas pelas empresas operadoras das concessões petrolíferas angolanas; (ii) a re-

partição dos interesses entre as partes, no Corredor, será de 50% para cada nação; (iii) a participação

associativa do Operador será dividida paritariamente entre as duas partes e; (iv) A repartição dos

interesses da RDC e Angola, no Corredor, entre as sociedades nacionais (Cohydro e Sonangol) e os

entes privados (OC) será definida respectivamente pelas duas partes.

Os estudos e entendimentos entre ambas as partes permanecem até a presente data, in-

cluindo encontros freqüentes dos Ministros do Petróleo das duas nações e de suas respectivas equipes.

A RDC está, inclusive, realizando, atualmente, estudos internos com o objetivo de substituir o antigo

regime de concessões do país pelo regime de partilha de produção.

Por fim, a Sonangol estima que a produção comercial no “Corredor Marítimo de Exploração

Comum Petrolífera” deve se iniciar em 2010, gerando receita para ambas as nações.

pág. 33.513 Ministério do Petróleo de Angola; Resolução 19/04 de 30 de junho de 2004; parte introdutória.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 277

I.3.3.1.5 Análise Financeira do Regime

Nos anos de 2007/2008, o Governo Angolano colocou sob licitação vários blocos explo-

ratórios, delegando a responsabilidade do processo para a Sonangol. A licitação outorgou os blocos

a grupos empreiteiros que podiam ser formados por uma ou varias companhias e, em alguns casos,

contavam a priori com participação da companhia estatal Sonangol Pesquisa e Produção. Os contratos

também contemplavam a figura de um operador encarregado por executar, em nome do grupo emprei-

teiro, as operações petrolíferas na área sob contrato. Em alguns blocos, a Sonangol Pesquisa e Produção

já era pré-estabelecida como sendo o operador.

Os blocos que formaram parte da licitação foram os seguintes:

• Bloco centro (Cabinda onshore)

• Blocos KON 11 e KON 12 (Kwanza onshore)

• Bloco 9 (águas rasas)

• Blocos 19, 20 e 21 (águas profundas)

• Blocos 46, 47 e 48 (águas ultra-profundas)

Para cada um dos blocos, o Governo Angolano estabeleceu condições específicas. Definimos,

para efetuar as análises financeiras do regime angolano apresentadas nesta seção, as condições con-

tratuais estabelecidas para o bloco 46 de águas ultra-profundas, por apresentar maior similaridade com

o caso brasileiro.

Vale mencionar que o roteiro enfatizado para esta seção segue roteiro metodológico descrito

no Anexo I.1 desse relatório.

Termos principais do contrato de partilha de produção do Bloco 46:

O Governo Angolano estabeleceu os seguintes termos principais no contrato de partilha de

produção para o Bloco 46514:

Término Detalhes

Período de pesquisa 5 anos, prorrogável por 3 anos

Período de produção

25 anosAté 12 meses antes do fim do período de produção, o grupo empreiteiro pode solicitar à Sonangol a prorrogação do período de produção. Se a Sonangol não se opuser a tal solicitação, deve discutir com o grupo empreiteiro os termos e as condições da prorrogação

Participação da Sonangol no grupo empreiteiro

20% de participação da Sonangol Pesquisa e Produção no grupo empreiteiro (para os efeitos das análises executadas, assumiu-se que os 80% de participação restantes são assumidos pela OC)

Financiamento dos custos de exploração

A proporção de custos de exploração da Sonangol Pesquisa e Produção (20%) é financiada pelo grupo empreiteiro (isto é, a Sonangol Pesquisa e Produção não participa dos custos de exploração e, portanto, não assume risco exploratório)

Bônus de assinatura

A ser definido como parte da licitação (para os efeitos das análises executadas, assumiu-se US$ 25.000.000)O bônus de assinatura não é amortizável nem recuperável e deve ser pago por todos os membros do grupo empreiteiro com exceção da Sonangol Pesquisa e Produção

Uplift de custos de capital (não inclui custos de exploração)

20% (isto é, por cada US$1M de custos de capital investidos, US$1.2M são recuperados através do Petróleo Bruto)

514 www.sonangol.co.ao

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL278

(continuação)

Término Detalhes

Limite de Petróleo Bruto para a recuperação de custos (cost oil limit)

Máximo recuperável de 50% das receitas do período. O excedente de custos não recuperados é transferido para o próximo período

Depreciação de custos de capital 4 anos, segundo metodologia linear

Divisão do Petróleo-Lucro (profit oil split)

Baseado na TIR (Taxa Interna de Retorno) do grupo empreiteiro segundo as regras abaixo:TIR <= 10% 70% grupo empreiteiro / 30% Governo10% < TIR < 12,5% 55% grupo empreiteiro / 45% Governo12,5% < TIR < 17,5% 45% grupo empreiteiro / 55% Governo17,5% < TIR < 20% 30% grupo empreiteiro / 70% Governo20% <= TIR 20% grupo empreiteiro / 80% Governo

Fluxo de caixa para cálculo da TIR

O fluxo de caixa utilizado para calcular a TIR do grupo empreiteiro deve ser computado, a cada 4 meses, da seguinte maneira:(i) os custos recuperados;(ii) (+) Petróleo-Lucro do grupo empreiteiro;(iii) (-) Imposto de petróleo (imposto de renda);(iv) (-) Despesas de desenvolvimento e produção.Não é permitida a dedução das despesas de exploração no calculo da TIR

Gás Natural Se na área do contrato for descoberto gás natural não associado com petróleo bruto, a Sonangol terá o direito exclusivo de avaliá-lo, desenvolvê-lo e produzi-lo por sua conta e risco

Fonte: Petrocash

I.3.3.1.5.1 Análise dos objetivos do Governo

Maximizar receitas governamentais (Government Take):

No caso do regime fiscal em questão, são quatro as fontes de arrecadação do governo: (i)

bônus de assinatura; (ii) porcentagem do Petróleo-Lucro; (iii) imposto de petróleo; e (iv) participação de

20% da Sonangol no grupo empreiteiro. É de notar que enquanto os três primeiros itens são sempre

maiores ou iguais a zero, o quarto pode ser positivo ou negativo dependendo do fluxo de caixa do grupo

empreiteiro em cada período.

Para um “campo pequeno de águas profundas”515, a aplicação deste regime fiscal resulta

em um government take de 75,1% para um preço de US$50/bbl. A Figura I.91 ilustra o government

take (linha vermelha) e os fluxos de caixa acumulados (gráfico de barras) para diferentes patama-

res de preços e permite observar que o government take sofre grandes mudanças para preços me-

nores de US$55/bbl, mas se estabiliza em torno de 85% - 88% para preços acima de US$55/bbl.

515 O “campo pequeno de águas profundas”, utilizado como exemplo para avaliação financeira do regime, é descrito em detalhes no Anexo I.1

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 279

Figura I.91: Government Take e fluxos de caixa acumulados não descontados para um campo pequeno de águas profundas

Fonte: Elaboração Bain & Company

Analisando o lado esquerdo da curva, quando os preços são menores que US$40/bbl, o grupo em-

preiteiro possui fluxo de caixa acumulado negativo. Entretanto, o Governo aufere arrecadação positiva (através

do bônus de assinatura, da sua participação no Petróleo-Lucro e do imposto de petróleo), e a sua arrecadação

é maior que o fluxo de caixa negativo proveniente da participação da Sonangol no campo. O resultado deste

efeito é um government take maior que 100%, e deriva em um ponto importante: mesmo sob cenários ácidos

de preços e incluindo a participação da Sonangol no grupo empreiteiro, o Governo Angolano consegue auferir

arrecadação positiva.

Aprofundando o que ocorre tecnicamente, o government take maior que 100% deve-se ao fato de que

o modelo estabelece um teto de 50% das receitas para recuperação de custos que, apesar de não ser sempre

suficiente para cobrir os custos do grupo empreiteiro, sempre gera Petróleo-Lucro e imposto de petróleo para o

Governo. O resultado é que, para preços baixos, o grupo empreiteiro obtém um fluxo de caixa acumulado ne-

gativo e o Governo um fluxo de caixa acumulado positivo. Isso significa que, via suas diferentes fontes de caixa,

o Governo acaba recebendo mais recursos dos que são necessários para cobrir os custos totais de campo e,

portanto, seu fluxo de caixa acumulado torna-se maior que o lucro total disponível na operação. O efeito final

termina sendo um government take maior que 100%.

Em cenários de preços baixos, este efeito é tanto maior quanto menor for a porcentagem limite do pe-

tróleo bruto para a recuperação de custos. Portanto, valores baixos desta porcentagem favorecem ao Governo,

mas podem prejudicar significativamente à OC e desestimular a atratividade para investimentos no campo.

Sob o ponto de vista de incentivo marginal, porém, a análise é diferente. Economicamente, a OC

seguirá investindo no projeto sempre e quando sua receita marginal for maior do que o seu custo marginal. Isto

é, se a OC já tiver realizado os investimentos de capital necessários, a decisão de produzir ou não a preços de

US$25/bbl será baseada no lucro ou prejuízo que, marginalmente, será auferido pela extração de um barril

adicional de petróleo. Sob esta ótica, a OC aufere lucros quando produz a preços de US$25/bbl.

Conclui-se que, se os preços fossem de US$35/bbl antes da realização dos investimentos de capital no

campo, a OC poderia potencialmente optar por não investir e suspender sua participação no projeto. Por outro

lado, se os preços diminuíssem para US$35/bbl ou até US$25/bbl depois de feitos os investimentos de capital,

a OC escolheria continuar produzindo a interromper a operação.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL280

Para preços maiores que US$55/bbl, pode-se observar na Figura I.91 que o government take vai au-mentando e atinge 87,9% para preços de US$125/bbl. O aumento é conseqüência direta de que, sob preços

maiores, a TIR do grupo empreiteiro aumenta e, portanto, o Governo fica cada vez com uma maior porcenta-

gem do Petróleo-Lucro. Quanto maiores são os preços, mais rapidamente o grupo empreiteiro atinge os dis-

tintos patamares de TIR (que são calculados ano a ano). Este mecanismo assegura ao governo o aumento de

sua participação no lucro disponível do campo para cenários de preços altos, porém, para valores de TIR do

grupo empreiteiro maiores que 20%, a porcentagem do Petróleo-Lucro que o Governo recebe é inalterada.

Para um “campo grande de águas profundas”516, a aplicação deste regime fiscal resulta em

um government take de 82,8% para um preço de US$50/bbl. A Figura I.92 analisa o government take

(linha vermelha) e os fluxos de caixa (gráfico de barras) para diferentes preços e permite observar que o

government take diminui entre os preços de 25 a US$30/bbl, para logo aumentar rapidamente entre 30

e US$50/bbl até estabilizar na faixa entre 82% até 89%.

Figura I.92: Government Take e fluxos de caixa acumulados não descontados para um campo grande de águas profundas

Fonte: Elaboração Bain & Company

A queda inicial da curva deve-se ao fato de que, para preços menores que US$31/bbl, o teto de 50% de petróleo bruto para recuperação de custos não é suficiente para que a OC recupere a totali-dade de seus custos com uplift, embora a OC tenha, devido a seus lucros provenientes do Petróleo-Lucro, fluxos de caixa acumulados positivos. Entre os preços de 25 e US$30/bbl a OC recupera cada vez mais seus custos com uplift e, portanto, fica com uma maior parte do lucro disponível do campo até atingir a totalidade dos mesmos para US$31/bbl.

A partir de US$31/bbl, o government take aumenta pois o empreiteiro começa a atingir pata-mares de TIR cada vez maiores, permitindo ao Governo capturar uma parcela do Petróleo-Lucro cada vez maior. Já para preços superiores a US$95/bbl, o grupo empreiteiro atinge uma TIR de 20% nos primeiros anos de produção, o que faz que o Governo fique desde o início da operação com 80% do Petróleo-Lucro. Como mencionado anteriormente, a porcentagem do Petróleo-Lucro que o Governo recebe quando o grupo empreiteiro atinge qualquer valor de TIR maior que 20% é inalterada, e conse-qüentemente subidas adicionais de preços tem impacto mínimo no government take.

Sob este regime e considerando um “campo grande de águas profundas” a preços de US$50/bbl,

a receita principal do Governo provém de sua participação no Petróleo-Lucro, seguido pela arrecadação do

516 O “campo grande de águas profundas”, utilizado como exemplo para avaliação financeira do regime, é descrito em detalhes no Anexo I.1

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 281

imposto de petróleo, o fluxo de caixa da Sonangol e o bônus de assinatura. A Figura I.93 mostra em forma de

área a evolução de cada um desses componentes ao longo do tempo. É de notar que nos anos antes do começo

da produção (anos 5, 6 e 7) o Governo tem saídas de caixa, dado que o fluxo de caixa da Sonangol é negativo

como conseqüência da sua participação no grupo empreiteiro. Se o objetivo do Governo for evitar qualquer tipo

de investimentos próprios durante a vida do campo, este sistema com participação estatal não será o adequado.

Figura I.93: Arrecadação do Governo por tipo de receita para um campo grande de águas profundas em um cenário de preço a US$50/bbl

Fonte: Elaboração Bain & Company

Incentivar a melhoria do desempenho operacional:

No modelo utilizado pela Angola para o Bloco 46, a OC tem, na grande maioria das situações,

incentivos para melhorar seu desempenho operacional. A Figura I.94 ilustra a variação do VPL da OC

mediante variações dos custos operacionais variáveis. Como pode se observar nas linhas azul, vermelha e

cinza da Figura I.94, à medida que os custos operacionais variáveis diminuem (lado esquerdo do gráfico),

o VPL da OC aumenta levemente, e a medida que os custos operacionais variáveis aumentam (lado direito

do gráfico), o VPL da OC diminui. Isto é refletido com a inclinação negativa das curvas do gráfico.

Figura I.94: Variação sobre o VPL da OC para variações dos custos operacionais vari-áveis para um campo grande de águas profundas

Fonte: Elaboração Bain & Company

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL282

Existem, não obstante, algumas situações em que a lógica oposta à descrita anteriormente acon-

tece. Por exemplo, para um preço de US$50/bbl e aumento de custos operacionais variáveis entre 10 e

15%, e para um preço de US$75/bbl e aumentos de custos operacionais variáveis entre 15 e 20%, as cur-

vas dão um pequeno salto e a OC se vê beneficiada por aumento de custos. Isto é, existem pontos onde a

OC atinge um maior VPL se os custos do grupo empreiteiro aumentam. Apesar de parecer contra-intuitivo,

nessas situações o grupo empreiteiro atinge um menor nível de TIR, o que aumenta sua porcentagem do

Petróleo-Lucro e termina resultando em um ganho marginal maior que a perda de valor por incorrer em

maiores custos. Para evitar este tipo de comportamentos e capturar eficientemente as melhorias econômi-

cas do projeto, o regime deveria contemplar um maior número de faixas de TIR e distribuição do Petróleo-

Lucro mais estreitas (ou mesmo um modelo linear de cálculo da distribuição do Petróleo-Lucro em função

da TIR), ainda que isto possa, na prática, aumentar a complexidade do modelo.

Observa-se na Figura I.94 que o incentivo da OC para melhorar custos é muito maior para preços de

petróleo de US$25/bbl do que para preços de petróleo mais altos. De fato, para preços de US$25/bbl, os custos

a recuperar do grupo empreiteiro são sempre maiores do que o limite de 50% de petróleo bruto disponível para

a recuperação de custos e, conseqüentemente, o Petróleo-Lucro fica inalterado em 50% das receitas todos os

anos. Portanto, toda a melhoria nos custos do grupo empreiteiro é capturada pelo próprio grupo (em que a OC

tem 80%). Já para patamares de preços de petróleo maiores, o teto de 50% do petróleo bruto disponível para

a recuperação de custos do grupo empreiteiro não é sempre atingido e, portanto, o Petróleo-Lucro resulta às

vezes maior a 50% das receitas. Nessa última situação parte das melhorias operacionais do grupo empreiteiro

acabam aumentando o Petróleo-Lucro, o que termina também beneficiando ao Governo.

Sob a ótica do VPL do Governo, pode-se observar na Figura I.95 que há incentivo de melhoria

operacional para o Governo, pois o VPL do mesmo aumenta quando há redução de custos e vice-versa

para todas as situações de preço (neste caso, a influência do Governo para incentivar a melhoria ope-

racional poderia ser exercida através da sua participação de 20% da Sonangol no grupo empreiteiro ou

através da sua participação no comitê de operações, como será aprofundado na seção seguinte). Para

preço de US$25/bbl, a melhora no VPL do Governo é conseqüência única de menores custos na So-

nangol através de sua participação de 20% no grupo empreiteiro, já que, como explicado no parágrafo

anterior, as outras fontes de arrecadação do Governo permanecem inalteradas nessa situação.

Figura I.95: Variação sobre o VPL do Governo para variações dos custos operacionais variáveis para um campo grande de águas profundas

Fonte: Elaboração Bain & Company

VLP Governo para campo grandede águas profundas

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 283

Controlar a produção:

O contrato de partilha de produção do bloco 46 contempla que o plano de produção, enten-

dido como o perfil planejado de produção de barris de petróleo cru por dia ao longo do tempo, deve

ser aprovado por uma comissão de operações. Estabelece-se que a comissão de operações é constituída

por 4 membros, 2 dos quais designados pela Sonangol e 2 pelo grupo empreiteiro, e é dirigida por um

presidente que é designado pela Sonangol dentre os seus representantes. Cada membro da comissão de

operações tem direito a um voto, possuindo o presidente também o voto de desempate.

Estabelece-se que, após a descoberta e comprovação comercial das reservas, o alcance da

área e os depósitos a serem utilizados para produção deverão ser concordados pela Sonangol e pelo

grupo empreiteiro. Mais precisamente, no prazo de 30 dias contados a partir da data de uma desco-

berta comercial, o grupo empreiteiro deve preparar e apresentar à Sonangol um projeto de plano geral

de desenvolvimento e produção, o qual deve ser analisado e discutido entre as partes com vista a ser

acordado e submetido ao Ministério dos Petróleos pela Sonangol no prazo de 3 meses contados a partir

da data da descoberta comercial ou em outro prazo mais longo se tal for concedido pelo Ministério dos

Petróleos. A partir da data da aprovação do plano, o grupo empreiteiro deve elaborar anualmente, de

acordo com as regras profissionais e os padrões aceitos pela indústria petrolífera internacional, um pro-

jeto de plano de produção anual para o ano seguinte.

O plano de produção deve ser aprovado por escrito pela comissão de operações e deve ser

submetido pela Sonangol ao Ministério dos Petróleos para aprovação, nos termos da Lei das Atividades

Petrolíferas. Após aprovação do mesmo, o grupo empreiteiro está autorizado e obrigado a executar, sob

a supervisão e controle da comissão de operações e dentro dos limites das despesas orçadas, o plano

de produção aprovado. Logo, o grupo empreiteiro deve gerenciar suas operações com o objetivo de

produzir, em cada trimestre, a quantidade de Petróleo prevista no plano de produção.

Para gerenciar e otimizar a produção, o contrato de partilha da produção do bloco 46 também

estabelece se seguintes condições:

1. O grupo empreiteiro deve tomar todas as medidas necessárias e apropriadas, em con-

formidade com tecnologia adequada utilizada na indústria petrolífera internacional, para

evitar a perda ou desperdício de petróleo à superfície ou no subsolo, sob qualquer forma,

durante as operações de pesquisa, desenvolvimento, produção, recolhimento e distribui-

ção, armazenagem ou transporte de petróleo;

2. Concluída a perfuração de um poço de desenvolvimento produtivo, o grupo empreiteiro

deve informar a Sonangol da data de realização do ensaio do poço, devendo comunicar-

lhe, no prazo de 15 dias após a conclusão do ensaio, os resultados obtidos sobre o nível

de produção estimado;

3. O grupo empreiteiro deve, em tempo oportuno, colocar à disposição de representantes

autorizados da Sonangol, para seu exame, estatísticas e relatórios diários ou semanais,

relativos à produção da área do contrato;

4. O grupo empreiteiro através do operador deve, com restrita observância das disposições legais

e contratuais e sujeito às deliberações da comissão de operações, agir no interesse comum

das partes e tomar a seu cargo a execução do trabalho inerente às operações petrolíferas de

acordo com as regras profissionais e os padrões aceitos na indústria petrolífera internacional;

5. O grupo empreiteiro, através do operador, deve conduzir os trabalhos inerentes às ope-

rações petrolíferas de forma eficiente, diligente e conscienciosa, e executar os planos de

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL284

trabalho e orçamentos nas melhores condições econômicas e técnicas e de acordo com as

regras profissionais e os padrões aceitos na indústria petrolífera internacional;

6. Nas operações petrolíferas, o grupo empreiteiro, através do operador, deve aplicar tecno-

logia e experiência de gestão mais apropriadas, incluindo a sua própria tecnologia, tais

como patentes, “know-how” ou outra tecnologia secreta, contanto que tal seja permitido

pelas leis e pelos acordos aplicáveis.

Finalmente, e como proteção para o Governo, estabelece-se que a Sonangol pode proceder

à rescisão do contrato se o grupo empreiteiro interromper a produção por um período superior a 90

dias sem causa ou justificativa aceitável em termos da prática normal da indústria petrolífera interna-

cional.

Minimizar investimento próprio:

Sob o modelo do bloco 46, o Governo investe no projeto através da participação de

20% da Sonangol Pesquisa e Produção no grupo empreiteiro. Estabelece-se que só na fase de

exploração a Sonangol Pesquisa e Produção está isenta de investir. Desta maneira, o modelo gera

para o Governo necessidades de caixa entre os anos 5 e 7, conforme foi ilustrado na Figura I.93

pela área azul. O tamanho da área seria maior quanto maior fosse a participação da Sonangol

Pesquisa e Produção no grupo empreiteiro, portanto, se o objetivo do Governo for evitar inves-

timentos próprios, deveria reduzir ao máximo sua participação no grupo empreiteiro. Por outro

lado, reduzir a participação da Sonangol geraria um maior fluxo de caixa para a OC em cenários

de preços rentáveis.

Preservação ambiental:

São poucas as referências que o contrato estabelece neste sentido. Especifica-se que, no caso

de uma situação de emergência no decurso das operações petrolíferas que requeira uma ação imedia-

ta, o grupo empreiteiro, através do operador, está autorizado a desencadear todas as ações que julgue

necessárias para proteger vidas humanas, os interesses das Partes e o meio ambiente, devendo informar

prontamente todas as ações desencadeadas à Sonangol.

Geração de empregos locais:

Os contratos fazem ênfase na geração de empregos locais, e embora não estabeleçam um mínimo de pessoal ou serviços angolanos a serem contratados, exigem que, para cumprir determinadas condições, deve-se dar preferência a contratações locais. Mais precisamente, o Governo Angolano exige que o grupo empreiteiro, através do operador e dos outros participantes do grupo, deva:

• Contratar fornecedores locais, se a qualidade e a disponibilidade dos serviços que prestam forem semelhantes aos disponíveis no mercado internacional e os seus preços, quando sujeitos aos mesmos encargos fiscais, não sejam superiores em mais de 10% aos preços praticados por fornecedores estrangeiros para serviços idênticos;

• Adquirir materiais, equipamentos, maquinaria e bens de consumo de fabricação nacional, se sua quantidade, qualidade e prazo de entrega forem semelhantes aos de materiais, equipamentos, maquinarias e bens de consumo alternativos à disposição no mercado

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 285

internacional, quando o preço local desses artigos não for superior em mais de 10% ao preço dos artigos importados, antes da aplicação dos direitos aduaneiros, mas após a inclusão dos respectivos custos de transporte e de seguro;

• Elaborar os estudos geológicos e geofísicos, bem como quaisquer outros estudos

relacionados com a execução do presente Contrato, preferencialmente em Angola,

exceto se for apropriado, para efeitos de um processamento econômico e eficiente

de dados e exames laboratoriais, o recurso a centros especializados fora de território

angolano.

Em uma primeira análise, o impacto dessas políticas pode ser prejudicial tanto para a OC

como para o Governo já que, como analisado na seção “Incentivar a melhoria do desempenho opera-

cional”, o VPL para ambas as partes é reduzido se os custos operacionais forem maiores. Porém, uma

análise exaustiva dessa política deve considerar um maior nível de complexidade, pois o Governo obtém

benefícios indiretos quando há contratação de pessoal local e de serviços de empresas angolanas. Por

exemplo, a contratação de empresas locais irá reter maior lucro operacional no país, e portanto, aumen-

tará a arrecadação de imposto de renda nos outros elos da cadeia, conseqüentemente incrementando

a arrecadação do Governo. Portanto, para poder chegar a uma conclusão exaustiva a respeito desta

política é necessário analisar se os benefícios indiretos –tangíveis e intangíveis– capturados pelo Gover-

no através desta política compensam a perda de VPL do projeto específico gerada por maiores custos

operacionais.

Para a OC, esta política pode se tornar muito prejudicial em cenários de preços pertos ao

ponto de equilibro do projeto, pois a obrigação de contratar localmente ao maior preço pode ser deter-

minante na rentabilidade do projeto e, portanto, afetar à OC em sua decisão de investir ou continuar

produzindo.

Desenvolvimento e aporte tecnológico local:

Nos contratos de partilha de produção de Angola, exige-se que o grupo empreiteiro

treine, de um modo diversificado, sistemático e planificado, todo o pessoal angolano direta ou

indiretamente envolvido nas operações petrolíferas com o objetivo de aumentar os seus conhe-

cimentos e qualificação profissional e a fim de que o pessoal angolano, gradualmente, atinja o

nível de conhecimento e qualificação profissional idêntico ao dos trabalhadores estrangeiros do

grupo empreiteiro. Exige-se que tal formação inclua, também, a transferência de conhecimento

da tecnologia petrolífera e a necessária experiência de gestão, permitindo ao pessoal angolano a

utilização da mais avançada e adequada tecnologia utilizada nas operações petrolíferas, incluindo

tecnologias de sua propriedade e utilizada sob patente, “know-how” e outras tecnologias confiden-

ciais, dentro dos limites permitidos pelas leis e acordos aplicáveis, sujeito a acordos apropriados

de confidencialidade.

Os custos decorrentes da formação do pessoal angolano ao serviço do grupo empreiteiro

devem ser suportados por este, mas o contrato permite que sejam recuperados como despesas de

produção. Os programas devem ser estabelecidos em um acordo entre a Sonangol e o grupo emprei-

teiro.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL286

I.3.3.1.5.2 Análise dos objetivos da OC

Maximizar o VPL do investimento:

Em cenários de aumento de preços a tendência da OC é incrementar seu VPL. Como se obser-

va na Figura I.96, que ilustra o VPL da OC para diferentes campos e cenários de preço de petróleo, a OC

se beneficia dos incrementos de preço do petróleo e seu VPL cresce constantemente para todos os tipos

de campos considerados, salvo algumas pequenas irregularidades. O motivo destas irregularidades é

que para certos patamares de preço as faixas de TIR atingidas reduzem a porcentagem do Petróleo-Lucro

para o grupo empreiteiro, e, em alguns casos, repercutem em um menor VPL absoluto para a OC.

Sob o modelo avaliado para Angola, o Governo se beneficia do aumento de preço a uma ve-

locidade muito maior que a da OC. Como se observa na Figura I.97, que ilustra o VPL do Governo e da

OC para o “campo grande de águas profundas” para diferentes patamares de preço de petróleo, o VPL

do Governo cresce a um ritmo mais rápido que o da OC, especialmente a partir de preços de US$50/

bbl. Observa-se que, para um preço de US$25/bbl, a OC tem VPLs negativos, ainda que o campo con-

tinue sendo rentável para o Governo.

Figura I.96: VPL da OC para distintos cenários de preços e campos

Figura I.97: VPL para um campo grande de águas profundas para distintos cenários de preços

Fonte: Elaboração Bain & Company

Recuperar o investimento o quanto antes possível:

Sob o modelo fiscal do bloco 46 simulado no “campo grande de águas profundas”, a OC re-

cupera os investimentos nos anos 16 e 11 para preços de 25 e US$50/bbl respectivamente. A Figura I.98

e a Figura I.99 mostram o fluxo de caixa acumulado da OC (linha preta) e os fluxos de caixa anuais da

OC e o Governo (barras). Neste caso, o incentivo do uplift do investimento e depreciação acelerada tem

como objetivo dar preferência à recuperação de custos da OC, mas o limite de 50% do petróleo bruto

do período para recuperação de custos produz o efeito contrário e acaba prejudicando a OC, que deve

esperar vários anos para recuperar seus custos. Por outro lado, o benefício para o Governo é realizado

já desde o primeiro ano de produção.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 287

Figura I.98: Fluxo de caixa para preços de US$25/bbl (campo grande águas profundas)

Figura I.99: Fluxos de caixa para preços de US$50/bbl (campo grande águas profundas)

Fonte: Elaboração Bain & Company

Assegurar TIR mínima:

A Figura I.100 mostra a evolução da TIR da OC para os quatro tipo de campos sob diferentes cenários de preços. Pode-se ver que a lógica de atratividade dos campos se mantém: campos maiores oferecem retornos maiores. A OC ganha constantemente com os aumentos do preço do petróleo sem que o mecanismo fiscal contemple um “teto” na taxa. A viabilidade de poços menores, no entanto, pode ser questionável, pois são atingidos níveis limites para preços de petróleo entre 40 e US$50/bbl. O regi-me deveria ser, então, flexibilizado para atender a condições mais desfavoráveis (campos menores) atra-vés de, por exemplo, mudanças nas faixas do Petróleo-Lucro para assegurar uma maior porcentagem do mesmo para a OC quando consideradas TIR baixas. Com as mudanças adequadas os campos menores poderiam se tornar comercialmente viáveis, o que beneficiaria tanto à OC (atraindo a mesma para exe-cutar o investimento) como ao Governo (que aumentaria sua arrecadação por viabilizar o campo).

Figura I.100: TIR OC para para distintos cenários de preços e campos produtivos

Fonte: Elaboração Bain & Company

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL288

Deve-se notar que a TIR da OC utilizada no contrato para determinar a divisão do Petróleo-Lucro

não inclui despesas de exploração. A TIR “contratual” resulta, portanto, maior que a TIR real da OC, e logica-

mente a prejudica. Essa metodologia contratual de cálculo da TIR pode gerar um desincentivo ao investimento

da OC na fase de exploração, já que quanto maior forem as despesas de exploração, maior será a diferença

entre a TIR real e a TIR “contratual”, apesar de ser essa última a utilizada para a divisão do Petróleo-Lucro.

Possuir flexibilidade em situações distintas de risco exploratório/operacional/produtivo:

Como mencionado no inicio desta seção, Angola tem utilizado diferentes condições de contratos

para os distintos blocos licitados. A flexibilidade do regime de partilha de produção lhe permitiu ao país

definir condições contratuais específicas caso a caso segundo, entre outros pontos, o risco exploratório e

a dificuldade de operação. A Tabela I.27 resume algumas das condições que variaram para os diferentes

blocos na licitação 2007/2008.

Tabela I.27: Resumo das condições contratuais principais para o Bloco centro, Bloco 9 e Bloco 48. Licitação 2007/2008

Bloco centro (Cabinda onshore) Bloco 9 (águas rasas) Bloco 48 (águas ultra

profundas)

Período de pesquisa

4 anos, prorrogável por mais 3 anos

4 anos, prorrogável por mais 3 anos

5 anos, prorrogável por mais 3 anos

Período de produção 20 anos 25 anos 25 anos

Participação da Sonangol no grupo empreiteiro

50% de participação da Sonangol Pesquisa e Produção no grupo empreiteiro, quem também é o Operador do bloco

65% de participação da Sonangol Pesquisa e Produção no grupo empreiteiro, quem também é o Operador do bloco

20% de participação da Sonangol Pesquisa e Produção no grupo empreiteiro

Uplift de custos de capital

10% 10% 20%

Limite do Petróleo Bruto para a recuperação de custos

50% 50% 50%

Porcentagem do Petróleo-Lucro (profit oil split) para o Governo

Baseado na produção acumulada (PA) em milhões de barris, segundo as regras abaixo:PA <= 25 40% Governo25<PA<50 60% Governo50<PA<100 70% Governo100<PA<250 80% Governo250=< PA 90% Governo

Baseado na TIR do grupo empreiteiro, segundo as regras abaixo:TIR <= 15% 30% Governo15%<TIR<20% 40% Governo20%<TIR<30% 75% Governo30%<TIR<40% 85% Governo40% =< TIR 90% Governo

Baseado na TIR do grupo empreiteiro, segundo as regras abaixo:TIR <= 10% 30% Governo10%<TIR<12,5% 40% Governo12,5%<TIR<17,5% 55% Governo17,5%<TIR<20% 70% Governo20% =< TIR 80% Governo

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 289

1.3.3.2 República da Indonésia

1.3.3.2.1 Introdução

A Indonésia, país com a quarta maior população do mundo (apenas atrás de China, Índia e

Estados Unidos), apresentou em 2007 um PIB de US$ 433 bilhões, sendo assim o país com a 20ª maior

economia do globo. A Tabela I.28 resume os principais indicadores macroeconômicos do país no perí-

odo 2002 a 2007 (Euromonitor, 2008).

Tabela I.28: principais indicadores macroeconômicos da Indonésia

Indonésia 2002 2003 2004 2005 2006 2007

PIB (US$ mi) 195.660 234.772 256.837 285.869 364.599 432.929

Crescimento real PIB 4,5% 4,8% 5,0% 5,7% 5,5% 6,3%

PIB per capita (US$) 900 1.065 1.151 1.265 1.593 1.869

Exportações (US$ mi) 59.164 64.107 70.767 86.996 103.486 118.728

Importações (US$ mi) 38.340 42.244 54.877 75.533 80.333 93.088

Inflação 11,9% 6,6% 6,2% 10,5% 13,1% 6,4%

População (mil hab.) 217.465 220.354 223.225 226.063 228.865 231.627

Fonte: Euromonitor, 2008

Após um período de crescimento de 7% ao ano entre 1987 e 1997, estimulado por ações

desenvolvimentistas do governo local que buscavam crescimento na oferta de emprego e aumento das

exportações em setores não associados a petróleo e gás natural, no ano de 1998 o PIB do país chegou

a retrair mais de 13%, em função da crise asiática de 1997. Neste momento, diversos investidores es-

trangeiros “abandonaram” o país. O governo então assumiu a custódia de empresas em diversos setores

da economia através de operações de reestruturação de dívidas existentes e revendeu, posteriormente,

a maior parte dos ativos à iniciativa privada. (USDS, 2008).

Recuperada, a economia da Indonésia atingiu um período de estabilidade que perdura até os

dias hoje, graças a esforços de recapitalização do setor bancário e ações de estímulo ao crescimento e

emprego, especialmente em infraestrutura (op.cit.).

Sob o aspecto político, o World Bank (2008) reconhece que, após a posse do atual Presiden-

te Susilo Bambang Yudhoyono, em outubro de 2004, a Indonésia está passando por um período de

transição para um modelo de governo mais democrático e descentralizado. Destaca-se o anúncio, no

início do governo, da “100-day agenda”, aludindo a ações políticas de curto prazo para energizar a

burocracia, a um plano anti-corrupção em dezembro de 2004 e ao lançamento do “Medium Term Plan”

no início de 2005, focado em “criar uma Indonésia mais pacífica, segura, democrática, justa, próspera

e estabelecer estabilidade macroeconômica para o desenvolvimento” (USDS, 2008).

Reformas na economia e em alguns setores-chave (como o setor financeiro), além do estabelecimen-

to da nova Lei de Investimentos em março de 2007, também vêm ajudando a criar fundamentos mais sólidos

para crescimento e condições de atratividade para investidores domésticos e estrangeiros (CIA, 2008).

Não obstante a evolução das condições do país nos últimos 10 anos, a Indonésia ainda enfrenta

inúmeros desafios, como altos índices de pobreza e desemprego, carência de infra-estrutura, corrupção, um

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL290

ambiente regulatório complexo, distribuição inadequada de recursos entre as regiões do país, além do forte

envolvimento do Estado em diversos setores da economia (op.cit.; FCO, 2008). De fato, o governo atualmente

controla cerca de 150 empresas, muitas delas com monopólios em setores-chave, por exemplo, refino de petró-

leo, e administra preços em diversos setores, como eletricidade, arroz e combustíveis (CIA, 2008; USDS, 2008).

A economia da Indonésia é puxada pelo consumo doméstico, com 63% do PIB, seguido de inves-

timentos (25%), consumo do governo (8%) e exportações líquidas (4%). O setor de hidrocarbonetos continua

sendo uma parcela importante da economia e representou 19 % (US$ 23 bilhões) das exportações do país

em 2007, mas a representatividade do setor já foi muito maior nas décadas de 70 e 80, quando a Indonésia

possuiu uma posição de exportador líquido de aproximadamente 1 milhão de barris diários (BP, 2008).

Outros setores exportadores relevantes são: commodities minerais (19% das exportações), ele-

trodomésticos (13%), borracha (7%) e produtos têxteis (4%) (USDS, 2008).

I.3.3.2.1.1 Contexto do petróleo e gás natural no país

As primeiras reservas com volumes comerciais de petróleo foram descobertas na Indonésia em

1883, ao norte da ilha de Sumatra. A história do início da exploração de petróleo no país confunde-se

com a da Royal Dutch que viria a se tornar uma das maiores empresas globais do setor, após a fusão

com a Shell Transport and Trading Company em 1907, tornando-se a Royal Dutch Shell (Shell, 2008).

Sendo a Indonésia uma colônia holandesa à época, a Royal Dutch Shell dominou as atividades de E&P

na região por mais de 30 anos, operando concessões em Sumatra, Java e Kalimantan (USLC, 2008).

Os campos mais importantes da Indonésia, Duri e Minas, localizados na província de Riau, fo-

ram descobertos pouco antes do início da Segunda Guerra Mundial pela Caltex, uma joint venture entre

Chevron e Texaco na época, atualmente Chevron (op.cit.).

Em 27 de dezembro de 1949 a Indonésia obteve sua independência, após três séculos de

colonização holandesa e ocupação japonesa durante a Segunda Guerra Mundial. Refletindo sua de-

pendência política, o setor de petróleo e gás natural do país foi controlado por estrangeiros até a sua

independência (Steele, 2008, P. 98).

A partir de então, o recém-estabelecido governo da Indonésia buscou intensificar o controle

sobre as atividades do setor de petróleo e gás natural do país através do aumento das operações de di-

versas empresas estatais e do endurecimento das negociações e termos dos contratos com as OC sobre

as atividades de E&P de petróleo e gás natural. Em 1963, a Caltex, a Royal Dutch Shell e a Standard

Vacuum entregaram as suas concessões ao governo e passaram a atuar como contractors. Nascia o mo-

delo de PSC (Production Sharing Contracts) na Indonésia, país pioneiro na adoção deste regime, replicado

posteriormente em outros países (op.cit.).

Em 1968, as estatais do setor de E&P, atuantes à época, tais como a Indonesian Oil Mining

Company – Pertamin, a National Oil Mining Company – Permina, e a National Oil and Gas Company

– Permigan, foram consolidadas em uma única companhia, a Pertamina (National Oil and Natural Gas

Company). Ao mesmo tempo, uma nova legislação garantia à Pertamina o poder de negociar contratos

de PSC com outras OC na Indonésia (USLC, 2008).

A Pertamina iniciou forte movimento de estímulo à E&P no país, assinando cerca de 30 PSC

em 1969 e outros nos anos subseqüentes. Os acordos eram tidos como bastante exigentes para as OC,

com o governo chegando a capturar 85% do petróleo produzido após a recuperação dos custos (op.cit.).

Apesar dessas condições, houve interesse das OC em investir e a produção saltou de um patamar médio

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 291

de 542 mil barris diários, entre 1965 e 69, para 1,35 milhões de barris / dia na década de 70 e 1,45

milhões na década de 80 (BP, 2008).

O sucesso produtivo da Indonésia perdurou até o começo da década de 90, quando as reser-

vas com maior facilidade de exploração começaram a amadurecer e a reposição com novas reservas

exigiam investimentos de maior porte, tais como as fronteiras produtivas offshore. O contexto de merca-

do da época era particularmente desfavorável devido a um ciclo de baixa de preços, porém condições

específicas do país na época influenciaram a queda nos investimentos exploratórios das OC; de fato,

de acordo com Steele (2008), uma série de eventos políticos e econômicos impactou negativamente o

clima para investimentos no setor, como transições políticas, movimentos separatistas, a crise financeira

asiática e a ocorrência de ataques terroristas. A partir da segunda metade da década de 90, a produção

de petróleo começou a declinar.

Em outubro de 2001 o setor petrolífero da Indonésia passou por profundas reformas com a apro-

vação da lei de óleo e gás natural nº 22/2001 (EIA, 2008). Esta lei estabeleceu o fim do monopólio da

Pertamina e a transferência de suas atividades de regulação e administração do setor petrolífero para um

novo órgão regulatório independente, chamado de BP MIGAS (Badan Perlaksanaan Minyak Gas). Através

de decreto presidencial em 2003, a Pertamina teve seu status legal alterado para companhia limitada PT

Pertamina (Persero). Há expectativas quanto à sua privatização em relação a momentos futuros (EIA, 2008).

Maior transparência dos processos de licitação, maior disposição do governo para negociar

com as OC, incentivos para poços marginais e uma vasta área de águas profundas ao leste do país vêm

contribuindo para atrair novamente as empresas para a atividade de E&P na Indonésia. De fato, todas

as cinco maiores OC de capital aberto, como a ExxonMobil, BP, Total, Chevron e a Shell, dentre outras

empresas relevantes do setor como a norueguesa StatoilHydro, vem demonstrando interesse em investir

no país. Entretanto, há ainda preocupações das OC relacionadas à falta de consistência e clareza em

alguns aspectos regulatórios, alto nível de tributação do governo, lentidão na tramitação dos processos

por parte da BP MIGAS, e dificuldades de criação de relacionamentos colaborativos entre as OC e o

órgão regulador (Steele, 2008, P. 94-7).

A Indonésia foi um dos primeiros membros da OPEP, juntando-se ao cartel em 1962 (um ano após a

fundação da organização). Entretanto, ao assumir posição de importador líquido de petróleo a partir de 2004,

a Indonésia perdeu relevância no grupo de produtores e deixou de ser membro em 2008 (op.cit., P. 91).

Petróleo e gás natural dominam a matriz energética da Indonésia. A Figura I.101 mostra a

distribuição em 2005, de acordo com EIA (2008).

Figura I.101: consumo total de energia na Indonésia, por insumo energético (2007)

Fonte: BP, 2008

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL292

I.3.3.2.1.2 Evolução das reservas de petróleo e gás natural

A Figura I.102 e a Figura I.103 ilustram a evolução histórica das reservas de petróleo e gás

natural da Indonésia (gráfico de barras) e a relação reservas/produção do país (gráfico de linhas).

Figura I.102: evolução do volume de reservas comprovadas de petróleo e relação reserva/produção na Indonésia

Fonte: EIA, 2008

Figura I.103: evolução do volume de reservas comprovadas de gás natural e relação reserva/produção na Indonésia

Fonte: EIA, 2008

As reservas de petróleo da Indonésia vêm declinando ano a ano, representando, em 2007,

apenas 0,35% das reservas globais (BP, 2008). Muitos dos grandes campos atualmente em produção,

descobertos em meados do século XX, vêm apresentando sinais de esgotamento. A atividade explora-

tória e de desenvolvimento no país tem sido insuficiente para manter o patamar histórico do volume de

reservas. Como já abordado na seção anterior, esforços estão sendo empreendidos pelo governo da

Indonésia no sentido de incentivar a exploração, com o objetivo de reverter a tendência de exaustão dos

recursos comprovados no país (EIA, 2008).

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 293

Segundo a EIA (2008), a Indonésia é detentora da 10ª posição em reservas comprovadas de gás natural no mundo, com um volume de 2,8 trilhões de metros cúbicos. Mais de 70% das reservas de gás natural estão localizadas em campos offshore. As maiores reservas estão localizadas na ilha de Natuna, em East Kalimantan, em South Sumatra e em West Papua (op.cit.). Ao contrário do petróleo, o sucesso exploratório em gás natural tem sido traduzido em aumento de reservas provadas nos últimos anos. De fato, entre 1997 e 2007 as reservas cresceram a um ritmo médio de 3,1% ao ano.

I.3.3.2.1.3 Evolução da produção e consumo de petróleo e gás natural

A Figura I.104 e a Figura I.105 resumem a evolução histórica da produção e consumo domés-tico de petróleo e gás natural na Indonésia.

Figura I.104: evolução histórica do volume de consumo doméstico e produção de petróleo na Indonésia

Fonte: EIA, 2008

Figura I.105: evolução histórica do volume de consumo doméstico e produção de gás natural na Indonésia

Fonte: EIA, 2008

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL294

A produção de petróleo na Indonésia, que hoje representa 1,2% da produção global, vem

declinando em ritmo acelerado. Em 2007, a produção de óleo cru e condensados atingiu 960 mil

barris diários, volume equivalente a 63% do que foi produzido 10 anos antes (1,52 milhões de barris

por dia). Em 2004, o consumo doméstico superou a produção local, fato até então inédito na história

do país.

O blend mais importante da Indonésia é o do campo de Minas, um petróleo leve com den-

sidade 35º API e baixo teor de enxofre. O campo de Duri já possui composição mais pesada, sendo

inclusive extraído com auxílio de injeção de vapor no poço.

A perspectiva futura, ao menos nos próximos 5 anos, é de continuidade do declínio da

produção de petróleo, amenizado pela entrada em operação do campo de Cepu, um JOA (Joint

Operation Agreement) entre ExxonMobil e PT Pertamina. A produção esperada do campo, de 600

milhões de barris recuperáveis, é de 180 mil barris diários (EIA, 2008).

Quanto ao gás natural, a Indonésia é o décimo primeiro produtor mundial, responsável

por 2,3% do volume em 2007. O aumento histórico de produção observado foi destinado, em

grande parte, para exportação, seja através de gasodutos, conectando a Indonésia com Cingapura

e Malásia, seja através da produção de LNG nos terminais de Bontang (o maior do mundo, com

capacidade de 31 bilhões de metros cúbicos ao ano) e Arun (capacidade de 13,6 bilhões de metros

cúbicos por ano) e posterior envio aos mercados do Japão, Coréia do Sul e Taiwan (op.cit.). Em

2007, a Indonésia foi o 3º. maior exportador mundial de LNG, com 27,7 bilhões de metros cúbi-

cos, apenas atrás do Catar (38,5 bilhões de metros cúbicos) e da Malásia (29,8 bilhões de metros

cúbicos) (BP, 2008).

Nos últimos anos, esforços estão sendo feitos para aumento do consumo interno de gás na-

tural, como fonte de substituição ao petróleo. A redução de subsídios para compra de combustíveis e

a expansão da capacidade de geração de energia elétrica através de termelétricas a gás contribuem

para aumentar a demanda doméstica (USEJ, 2006, P. 34). Limitações da rede de distribuição de gás

natural (em termos de alcance e interconectividade) deverão ser reduzidas com a construção do IGTS

(Integrated Gas Transportation System), sistema de gasodutos de 2.600 milhas, interconectando as

ilhas de Sumatra, Java e Kalimantan (EIA, 2008). A infra-estrutura de transmissão e distribuição de

gás natural da Indonésia é conduzida pela estatal Perusahaan Gas Negara (PGN).

Iniciativas de expansão da capacidade de exportação de gás natural também estão em curso

(op.cit.):

• A Indonésia vem liderando discussões para implantação do TAGP (“Trans-ASEAN Gas

Pipeline”), uma rede de gasodutos transnacional que objetiva conectar os países do

Sudeste Asiático;

• A implantação de um terminal de LNG, que viabilizará a exploração do campo de

Tangguh, localizado na província de Papua e com reservas provadas de 400 bilhões de

metros cúbicos. Liderado pela BP, em consórcio com CNOOC, Mitsubishi, Nippon Oil,

KG e LNG Japan, o terminal de Tangguh terá capacidade de 11,5 bilhões de metros

cúbicos por ano, prevista para 2009.

Além dos aspectos de infraestrutura, o aumento da produção de gás natural enfrenta

desafios relacionados a incertezas e barreiras regulatórias: por exemplo, diversos produtores (sob

PSC) requerem garantias de venda doméstica de gás natural por parte da PT Pertamina, enquanto

o governo demonstra relutância. Outra requisição dos produtores é a ausência de um sistema com-

petitivo de precificação de gás (o sistema histórico é baseado em negociação campo a campo entre

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 295

a PT Pertamina e o produtor, e definição de um preço fixo ao longo do contrato de fornecimento).

Finalmente, a falta de políticas claras de obrigações de volumes domésticos, extensões contratuais e

taxação inibem o ânimo de investimento em expansões (USEJ, 2006, P. 35-6).

I.3.3.2.1.4 Principais companhias que operam no país

Em E&P de petróleo, a maior das companhias internacionais operando na Indonésia é a

Chevron, proprietária de 100% da Caltex (anteriormente uma joint-venture entre a Texaco e a Che-

vron). Além da Chevron, diversas outras OC também estão presentes, tais como BP, ConocoPhillips,

ExxonMobil e Total. Além da PT Pertamina, as estatais chinesas Petrochina e CNOOC (China Natio-

nal Offshore Oil Company) também possuem operações de E&P de petróleo (op.cit., P. 12).

No setor de E&P de gás natural, as principais OC presentes na Indonésia são: Total, Exxon-

Mobil, Vico (uma joint venture entre BP e Eni), BP, Chevron e ConocoPhillips (op.cit., P. 32).

I.3.3.2.1.5 Refino e downstream

De acordo com EIA (2008), em 2007 a Indonésia possuía cerca de 1 milhão de barris di-

ários de capacidade de refino, distribuída em 8 refinarias, todas de propriedade da PT Pertamina.

As principais refinarias são as de Cilicap, da Java Central (348 mil barris diários), Balikpapan, em

Kalimantan (241 mil barris diários) e Balongan, em West Java (125 mil barris diários).

O governo da Indonésia está buscando atrair investimentos em capacidade de refino lo-

cal, através de incentivos fiscais, com o objetivo de garantir a oferta local de derivados de petróleo.

Atualmente, 30% da demanda doméstica de derivados são atendidas por importações (Reuters,

2008).

Diversos projetos de novas refinarias foram registrados nos últimos 15 anos, no entanto

nenhum deles foi efetivamente iniciado. Os projetos mais prováveis parecem ser em joint ventures

entre a PT Pentamina e outras OC, como a iraniana NIORDC (National Iranian Oil Refining & Dis-

tribution Company) e a chinesa Sinopec.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL296

I.3.3.2.2 Marco Legal – Evolução e Atualidade

a) Breve Histórico da Indonésia Colonial

Existem indícios de populações nativas nas Ilhas de Sumatra e Java há mais de quinhentos mil anos. Aproximadamente em 2.500 a.C., já existiam sociedades semi nômades que criavam animais domés-ticos e utilizavam utensílios de cerâmica e rocha. A interação com outras regiões da Ásia começou em torno do ano 500 a.C., quando foram introduzidos os metais. Nos primeiros séculos da Era Cristã, o Budismo e o Hinduísmo passaram a exercer forte influência na população local, culminando, no séc. VII, com o Império Srivijaya. A constante passagem de mercadores islâmicos pelo arquipélago nos séculos seguintes exerceu enorme influência na população local que, hoje, tem 85% de sua população sob a fé muçulmana.517

No século XVII, a Companhia Holandesa das Índias Orientais (VOC na sigla holandesa) passou a dominar os principais portos do arquipélago, exercendo enorme influência não somente na esfera eco-nômica, mas também política. Nos séculos XVII e XVIII, esta influência incluía apoio a alguns governantes locais em detrimento de outros, muitas vezes alimentando disputas internas. Porém, a situação na Europa sofreu enormes mudanças no final do séc. XVIII, o que teve reflexos nos territórios ultramarinos sob controle holandês, especialmente com a falência da VOC em 1799 e a anexação da Holanda, pelo Império Fran-cês, em 1811. Aproveitando-se da fragilidade da situação do arquipélago, o Império Britânico apressou-se em invadi-lo em 1811, rendendo rapidamente as forças francesas e governando-o de 1811 a 1816, quando, o Governo Britânico devolveu o controle do território diretamente ao Governo Holandês.

As ilhas de Java e Sumatra, assim como toda a porção leste do arquipélago, assumiram, então, pela primeira vez, o status de sociedade colonial. O moderno Estado da Indonésia foi, portanto, criado no século XIX, sob controle holandês, pois foi nesta época que a maioria de suas fronteiras foi delimitada, juntamente com um processo de integração política, econômica e militar.

A abertura do Canal de Suez, em 1869, incentivou o aumento da produção agrícola em Sumatra para exportação à Europa, especialmente grãos, cana de açúcar, chá, cacau e tabaco. Após esta fase de extensa exploração da agricultura pelos holandeses, começou um processo de diversificação da economia da Indonésia, voltando-se, sobretudo, para a produção de borracha, visando a nascente indústria auto-motiva, e para a produção de petróleo que, inicialmente, era usado como combustível para lâmpadas.

A indústria do petróleo iniciou seu desenvolvimento com a criação da “Koninklijke Nederlandsche Maatschappij tot Exploitatie van Petroleum-bronnen in Nederlandsch Indië” (Companhia Real Holandesa para Exploração de Petróleo nas Índias Holandesas), em 1890, esta foi incorporada em 1907 à Shell Trans-port and Trading Company, que já explorava petróleo na região de Kalimantan desde 1891, formando a Royal Dutch Shell. A Royal Dutch Shell dominou o mercado colonial de exploração petrolífera na Indonésia por mais de 30 anos. Em 1911, a Royal Dutch Shell já operava concessões em Sumatra, Java, Kalimantan (parte indonésia da Ilha de Bornéu), representando aproximadamente 4% da produção mundial à época518.

A exploração petrolífera na Indonésia era, à época, regida pela Lei de Mineração das Índias Holandesas de 1899, modificada em 1919, que, a partir disso, passou a ser considerada a origem do conceito de PSC. De acordo com o art. 5º dessa lei, o Ministro competente poderia ser autorizado por lei especial a formalizar contratos com OC, conferindo a esta direitos exclusivos de explorar e produzir petróleo em determinado território por determinado número de anos. A OC era obrigada a pagar royal-

ties e uma parte proporcional do lucro. O Governo Colonial tinha o direito de requerer que os royalties

e sua parte nos lucros fossem pagos em óleo ou derivados, desde que tais produtos fossem utilizados

517 Informação retirada de Country Studies (http://countrystudies.us/indonesia/), sítio da internet patrocinado pelo Departamento de Pes-quisa da Biblioteca do Congresso Norte-Americano. Acessado em 26/11/2008.

518 Informação retirada de Country Studies (http://countrystudies.us/indonesia/), sítio da internet patrocinado pelo Departamento de Pes-quisa da Biblioteca do Congresso Norte-Americano. Acessado em 26/11/2008.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 297

para as próprias necessidades do governo. Certamente, tratava-se de apenas um pequeno passo em

direção aos PSC atuais, mas já demonstra claramente a idéia de partilha da produção entre a OC e o

País Produtor.519

b) Segunda Guerra Mundial, Independência e Controle Nacional da Produção

A exploração e produção de hidrocarbonetos continuou sob controle holandês até a ocupação

do arquipélago pelos japoneses na segunda guerra mundial. Esta ocupação durou três anos e somente

três dias após a rendição incondicional do Japão na guerra, quando um pequeno grupo de indonésios,

liderados por Sukarno520 e Mohammad Hatta, proclamaram a independência e criaram a República da

Indonésia. Os holandeses imediatamente tentaram restabelecer seu controle sobre a região, mas encon-

traram forte resistência. Após quatro anos de disputas, em 1949, os holandeses transferiram formalmen-

te a soberania ao Governo Federal da Indonésia. Finalmente, após décadas de exploração comercial, o

controle sobre a produção de petróleo finalmente passou para mãos nacionais521.

A então recém criada Estatal Permina, predecessora da Pertamina, começou suas operações

no fim dos anos 1950, tendo como foco central os campos abandonados pela Royal Dutch Shell no nor-

te de Sumatra, assim como outras áreas brevemente controladas pelos japoneses. A assistência técnica

fornecida pelo Japão foi fundamental para a reconstrução do setor na Indonésia.

Em 1960, por meio do Decreto Governamental 44/1960, primeira legislação específica sobre

petróleo da era pós-colonial, os hidrocarbonetos foram considerados parte das riquezas nacionais sob

controle do Estado e as atividades de exploração e produção passaram a ser consideradas responsabi-

lidades do Estado, podendo este delegar a responsabilidade a empresas públicas (NOC). Isto significa

dizer que as licenças exclusivas, até então vigentes, foram nacionalizadas, sendo que os antigos licencia-

dos (denominados concessionários) somente puderam continuar exercendo seus direitos por um período

breve , determinado por regulamento específico. Às concessionárias afetadas por este Decreto foi con-

cedido um direito preferencial na obtenção de contratos de serviço a serem firmados com a nova NOC,

responsável pela área de suas antigas concessões522. Neste contexto, em 1963, as OC Caltex, Standard

Vacuum e Royal Dutch Shell devolveram suas concessões ao Governo, mas continuaram a operar nos

mesmos campos, figurando, respectivamente, como contratadas das recém criadas estatais PN Permina,

PN Petarmin e PN Permigan523.

Considerando o acima exposto, faz-se importante salientar que os objetivos do processo de

nacionalização da indústria petrolífera na Indonésia eram diferentes em relação à maioria dos países em

desenvolvimento em meados do séc XX. Enquanto nestes países, como, por exemplo, o México e o Irã, o

objetivo da nacionalização era garantir exclusividade das atividades de E&P pelo Estado, na Indonésia,

o verdadeiro objetivo era reestruturar o regime de exploração e produção de hidrocarbonetos, alterando

a forma de contratação entre o Estado e as OC, mas permitindo a continuidade das operações pelas

OC. O primeiro passo neste sentido foi o cancelamento das licenças então vigentes que, combinado

com a criação de empresas públicas, culminou na mudança do regime de exploração para o regime de

partilha de produção com as OC.524

519 TAVERNE, Bernard; “Petroleum Industry and Governments”, 2a edição; Wolters Klower, Holanda, 2008, pág 256.520 Nota do Autor: Como muitos javaneses, Sukarno não tinha sobrenome.521 International Business Publications; “INDONESIA Oil & Gas Exploration Laws and Regulations Handbook”, Volume I; 5a Edição, 2008;

pág 25.522 TAVERNE, Bernard; “Petroleum Industry and Governments”, 2a edição; Wolters Klower, Holanda, 2008, pág 255.523 MULJADI, Kartini; MACHMUD, Dr. T.N; “Regulation of Indonesia’s Oil and Gas Industry at the Crossroads”, 2001, artigo publicado em

www.ifrl.com, acessado em 28/11/2008.524 TAVERNE, Bernard; “Petroleum Industry and Governments”, 2a edição; Wolters Klower, Holanda, 2008, pág 256.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL298

Por outro lado, como o gás natural era pouco explorado neste País Produtor, pequenas quan-

tidades eram usadas como combustível pela própria indústria do petróleo desde os anos vinte , sendo a

maior parte, porém, re-injetada nos poços de produção de petróleo. Em 1963 o gás natural foi utilizado

pela primeira vez como matéria prima em uma fábrica de fertilizantes no país. Mesmo assim, até 1973,

cerca de 60% de sua produção era queimada ou desperdiçada. O Governo local, no entanto, estava

cada vez mais consciente do potencial de uso doméstico do gás natural e, principalmente, de seu forte

potencial de exportação. O desenvolvimento da regulação das atividades petrolíferas nesta época, que

será analisado adiante, viabilizou projetos de exploração e produção de gás natural525.

Após esta fase de transição, ao final da década de sessenta, começaram a ser firmados os primei-

ros PSC entre o Governo da Indonésia e as OC, contratos estes que exerceram enorme influência no desen-

volvimento e na evolução nos regimes internacionais de exploração e produção de hidrocarbonetos.

Algumas características destes primeiros PSC eram: (i) duração do contrato de 30 anos, incluindo

10 anos de fase de exploração; (ii) contrato automaticamente rescindido caso, após os 10 anos de fase

exploratória, não houvesse descobertas comerciais; (iii) NOC era a responsável pelo gerenciamento das

operações; (iv) cronogramas e orçamentos eram elaborados pelas OC e submetidos à aprovação da

NOC; (v) OC era obrigada a executar os cronogramas de uma maneira eficiente, utilizando-se dos méto-

dos científicos apropriados; (vi) limite máximo do “cost oil” de 40%; (vii) divisão do “profit oil” em 65% para

o Estado e 35% para a OC; (viii) obrigação de fornecimento de até 25% da produção para suprimento do

mercado local; (ix) opção da NOC de receber todo o seu “profit oil” in natura, caso contrario, a OC fica

obrigada a comercializar a porção pertencente à NOC da melhor maneira possível, resguardada a opção

da NOC comercializar o óleo por si mesma; (x) OC estava sujeita ao imposto de renda e quaisquer outros

tributos incidentes sobre a distribuição ou remessa de capital (no entanto, todos estes tributos deveriam

ser assumidos e pagos pela NOC, por meio de sua porção do “profit oil”. A OC receberia então, recibos

das autoridades fiscais do país. evidenciando que todos os tributos haviam sido recolhidos; e (xi) a NOC

detinha o direito de requerer que a OC transferisse 5% de sua participação a uma empresa indonésia,

mediante o pagamento de 5% das despesas incorridas até então por esta nova empresa à OC.

c) Lei 8/1971 e Criação da Pertamina

Em 1971 foi promulgada a Lei Federal 8 (“Lei 8/1971”), permanecendo em vigor por 30 anos.

A Lei 8/1971, juntamente com a Lei 44/1960, estabeleceram o arcabouço legal que regeu as atividades

petrolíferas até 2001. A Lei 8/1971 reservava todos os direitos de mineração de petróleo e gás natural

a uma única empresa, a Perusahaan Pertambangan Minyak das Gas Bumi Negara (Pertamina), criada pela

mesma legislação. Tal lei extinguia as 3 NOC anteriores (PN Permina, PN Petarmin e PN Permigan) e

dava poderes à recém criada Pertamina, para cooperar com terceiros sob “regulamentação” estatal.

Desta forma, todas as atividades de upstream e downstream no país passaram ao controle da nova NOC.

A Pertamina passou, então, a reger as políticas de produção, distribuição, comercialização e preços dos

hidrocarbonetos no mercado doméstico. Objetivando ampliar ainda mais o poder estatal sobre a ati-

vidade petrolífera, a Pertamina passou também a supervisionar todas as atividades do setor, tais como

estabelecimento de normas para licitações e decisão final sobre grandes compras. Por fim, a Pertamina

foi legalmente responsabilizada por garantir o adequado suprimento de hidrocarbonetos à nação, o que

fazia através dos PSC526.

Resumindo, a partir de 1970, o quadro legal básico da legislação petrolífera da Indonésia

525 MEHDEN, Fred von der; LEWIS, Steven W; “Liquefied Natural Gas from Indonesia: The Arun Projects”, Stanford University, 2004, pag. 526 NORDS, Hildegun Kyvik et al; “SNF REPORT 08/2003 – The Upstream Petroleum Industry and Local Industrial Development. A Compa-

rative Study”; Institute for Research in Economics and Business Administration; Noruega, 2003, págs 26 e 27.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 299

passou a ser o Art. 33 da Constituição Federal de 1945, a Lei 44/1960 de Petróleo e Gás Natural e a Lei

8/1971, que criou a Pertamina. O art. 33 da Constituição Federal dispõe que as atividades produtivas

consideradas estratégicas e importantes pelo Estado devem ser controladas por este e que as riquezas do

solo e das águas, dentro do território nacional, devem ser utilizadas para o máximo benefício do povo

indonésio. Mais especificamente, o art. 2 da Lei 44/1960 declarava que “todos os minerais, óleo e gás

natural existentes dentro do território indonésio constituem recursos naturais do país controlados pelo

Estado”. Além do maior controle Estatal exercido sobre as atividades petrolíferas através da Pertamina,

outra novidade da lei 8/1971 foi a remoção da exigência constante da Lei 44/1960 referente à aprova-

ção parlamentar para ratificação dos PSC. Sob a nova legislação, os PSC passaram a ser efetivos após

aprovação presidencial, um procedimento mais simples e célere.

A primeira década de partilha de produção após a Lei 8/1971 foi um período que pode ser

descrito como de grande euforia por parte das OC. O sistema funcionava e os investidores estavam

satisfeitos, o que levou o sistema indonésio a ser copiado em diversos outros países como, por exemplo,

sua vizinha Malásia. No entanto, o entusiasmo inicial com o regime de PSC gradualmente passou a

erodir à medida que o gerenciamento pela Pertamina tornou-se extremamente burocrático, com a cria-

ção de novas aprovações e procedimentos pela NOC. Neste sentido, o crescente controle exercido pela

Estatal nas operações diárias passou a ser considerado pelas OC desnecessário e contra-produtivo.527

Durante a década de oitenta, os modelos de PSC indonésios sofreram diversas modificações

que, de uma forma geral, serviram para simplificá-lo. A produção total passou a ficar disponível para

recuperação de custos e a obrigação de fornecimento doméstico a USD 0,20 (vinte centavos de dólar

norte americano) o barril passou a ser aplicável apenas após o quinto ano de produção, limitado a

um máximo de 25% da produção, dividido entre as partes. A partilha do “profit oil” foi estabelecida em

65,91% para a Pertamina e 34,09% para as OC.

Posteriormente, já durante a década de noventa, ante a insatisfação das OC e o declínio da pro-

dução de hidrocarbonetos na Indonésia, iniciou-se um movimento com o intuito de alterar a Lei 8/1971. A

diminuição no interesse das OC na Indonésia causou uma queda no ritmo de descoberta e desenvolvimen-

to de novos poços e, com o declínio da produção dos antigos poços, a produção de hidrocarbonetos come-

çou a cair acentuadamente. A explosão do consumo interno de hidrocarbonetos, por outro lado, afetava

ainda mais o equilíbrio entre produção e consumo, fazendo a exportação de hidrocarbonetos despencar

na Indonésia que viria a se tornar, na década seguinte, importadora de hidrocarbonetos.

Desta forma, em 1998, ficou pronto um primeiro projeto da nova lei de hidrocarbonetos para

o país, que foi submetido ao Parlamento da República da Indonésia em fevereiro de 1999. Tal proposta

continha uma série de radicais mudanças ao sistema então vigente, tais como: (a) extinção do envolvi-

mento da Pertamina nos PCS528, reestruturando-a como uma empresa pública, nos moldes da Petronas

na Malásia; (ii) criação de um ambiente competitivo, em que investidores estrangeiros (OC) competis-

sem com a Pertamina, tanto em atividades de upstream como de downstream; (iii) maior flexibilidade na

negociação dos contratos entre o Governo e os investidores; e (iv) a criação de duas novas agências,

uma responsável exclusivamente por atividades de upstream e outra por atividades de downstream, am-

bas se reportando diretamente ao Presidente.

Submetido ao Parlamento em fevereiro 1999, o projeto não foi aprovado, sobretudo por

não ter levado em consideração a opinião da Pertamina, que havia, inclusive, preparado sua própria

minuta do projeto de lei. Diante disso, ocorreram uma série de estudos e discussões para sua revisão e

nova submissão ao Parlamento, o que aconteceu no final do mesmo ano de 1999, logo após a eleição

527 MULJADI, Kartini; MACHMUD, Dr. T.N; “Regulation of Indonesia’s Oil and Gas Industry at the Crossroads”, 2001, artigo publicado em www.ifrl.com, acessado em 28/11/2008.

528 Nota do autor: como será explicado adiante a parte contratante nos PSCs passou a ser a BP MIGAS.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL300

do presidente Abdurrahman Wahid529. Esta nova versão, no entanto, manteve praticamente intactas as

principais características do projeto de lei original e sua aprovação demorou dois anos, pois o supraci-

tado Presidente, preocupando-se apenas com a sua manutenção no poder, não demonstrou qualquer

vontade política para a aprovação do referido diploma legal. Desta forma, a nova legislação apenas

conseguiu aprovação após a posse da Presidente Megawati530.

d) A Lei 22/2001 – Lei do Petróleo e Gás Natural

Assim, a Lei do Petróleo e Gás Natural da República da Indonésia, (“Lei 22/2001”, doravante,

para efeito deste documento, “Lei”) foi aprovada pelo Parlamento em 23 de novembro de 2001. O texto

da referida Lei, em suas justificativas, expõe claramente as causas que fizeram com que o Parlamento

optasse por mudar a legislação que rege o setor. Dentre as razões explicitadas no citado diploma legal,

destacamos que: (i) a Lei do Petróleo, Gás Natural e Mineração de 44/1960, a Lei 15/1962 sobre a obri-

gação das OC em atenderem ao mercado doméstico e a Lei 8/1971 sobre as empresas estatais de óleo

e gás natural, não eram mais adequadas ao desenvolvimento da indústria do petróleo; (ii) a observação

do desenvolvimento, em âmbito nacional e internacional, da indústria do petróleo indica a necessidade

de se modificar a legislação pátria sobre esta atividade de modo a se criar um ambiente independente,

confiável, transparente, competitivo, eficiente e ambientalmente responsável, com vistas a incentivar o

incremento do potencial pátrio e do papel nacional no setor; e (iii) considerando as necessidades acima

indicadas, de modo a fornecer uma base legal que possibilite a renovação e rearranjo do setor petrolí-

fero no país, faz-se necessário promulgar uma nova lei sobre petróleo e gás natural.

Antes da análise de aspectos específicos da Lei 22/2001, em especial em relação às ativida-

des de exploração e produção, faz-se necessário observar que, assim como a legislação indonésia em

geral, esta Lei trata dos conceitos básicos, traçando um quadro regulatório do setor petrolífero, que em

muitos de seus detalhes, requereria regulamentação posterior pelo Governo. A própria Lei antecipa esta

regulamentação em diversos trechos.531

No tocante ao contexto hierárquico em que essa Lei se insere na legislação indonésia, assim como

suas subseqüentes regulamentações, convém aqui explicitar a hierarquia da legislação do país, em ordem

decrescente de importância: (i) Constituição da República da Indonésia de 1945; (ii) Lei ou Regulamentação

Governamental Substitutiva de Lei; (iii) Regulamentação Governamental; e (iv) Regulamentação Regional532.

Partindo finalmente para a análise da Lei, o seu art. 1 traz uma série de definições utilizadas do

decorrer do texto legal (assim como no presente estudo), sendo as principais: (i) “Atividades de Upstream”,

atividades comerciais baseadas nas atividades de exploração e explotação; (ii) “Exploração”, atividades que

objetivam adquirir informações sobre as condições geológicas, com objetivo de localizar e a obter esti-

mativas das reservas de petróleo e gás natural nas áreas operacionais; (iii) “Explotação” define a série de

atividades direcionadas à produção de petróleo e gás natural nas áreas operacionais, incluindo, mas não se

limitando, a operações de perfuração de poços e construção de instalações para transporte, armazenamento

e processamento para separar e purificar petróleo e gás natural nas áreas operacionais; (iv) “Atividades de

Downstream” são as atividades comerciais voltadas para o processamento, transporte e/ou atividades de comercialização; (v) “Área Operacional” significa uma determinada região, dentro do território jurisdicional indonésio, utilizado para exploração e explotação; (vi) “Contratos de Cooperação Conjunta” devem ser os

529 Abdurrahman WAHID, também conhecido como Gus Dur, (nascido em 7 de setembro de 1940) é um líder político e religioso na Indonésia que exerceu o cargo de Presidente da República entre 1999 e 2001.

530 Diah Permata MEGAWATI Setiawati Soekarnoputri, (nascida em 23 de Janeiro de 1947) filha do primeiro Presidente da Indonésia, Sukarno, exerceu o cargo de Presidente da Indonésia de Julho de 2001 a Outubro de 2004.

531 NEWBERY, Mark; “Indonesia: The New Indonesian Oil & Gas Law”, 2002, artigo disponível em www.mondag.com;acessado em 28/11/08;532 Nota do Autor: Essa noção de hierarquia, já amplamente aceita desde a Constituição de 1945, foi reafirmada expressamente no art.

7 da Lei 10/2004.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 301

Contratos de Partilha, de Produção, ou outros modelos de contratos de cooperação conjunta para atividades de exploração e explotação, que sejam mais benéficos ao Estado e cujo resultado maximize o bem estar do povo; (vii) “Governo Central” ou “Governo” representam o elemento do Estado Unitário da República da Indonésia, consistindo no Presidente e seus Ministros; (viii) “Governo Regional” deve significar o represen-tante de cada província, assim como outros elementos da administração local; (ix) “Agência Executora” será a agência criada para controlar as atividades de upstream no setor de petróleo e gás natural; (x) “Agência Reguladora” será a agência criada para regular e supervisionar o fornecimento e distribuição de óleo com-bustível e gás natural, assim como o transporte de gás natural por gasodutos nas atividades de downstream; e (xi) Ministro deve ser o Ministro encarregado das atividades de petróleo e gás natural.

Algumas considerações se fazem necessárias em virtude das definições acima descritas. A Agência Executora para as atividades de upstream prevista no art. 1 da Lei foi posteriormente criada por Regulamentação Governamental e denominada BP MIGAS. Logo após a criação da BP MIGAS, outra Regulamentação Governamental de 2004 criou a Agência Reguladora das atividades de downstream, denominando-a BPH MIGAS. Ambas serão oportunamente analisadas em detalhe. Já o Ministro encarre-gado das atividades de petróleo e gás natural na Indonésia, de acordo com a organização atual do Poder Executivo daquele país, é o Ministro de Energia e Recursos Minerais. Por fim, cabe, ainda, observar que a definição de “Contratos de Cooperação Conjunta” (termo que é utilizado no decorrer do texto legal) abre a possibilidade de utilização de outra forma contratual além dos PSC, como seriam os casos do Contrato de Assistência Técnica (TAC, na sigla em inglês) e da Recuperação de Petróleo Aprimorada (EOR, na sigla em inglês) que embora possam ser entendidos como contratos de serviço, dado a sua natureza, são muito similares em forma e conteúdo aos PSC. Estes dois contratos serão analisados oportunamente.

Após as definições constantes do art. 1, o art. 2 traça os objetivos da referida norma, que são basicamente: (i) o benefício econômico do povo; (ii) integração, segurança, prosperidade e bem estar da nação; (iii) segurança jurídica; e (iv) preocupação com o meio ambiente. Não há na legislação, po-rém, indicação de hierarquia sobre estes objetivos que podem, muitas vezes, ser conflitantes. A Lei ainda dispõe que o objetivo final da nova legislação é assegurar controle e execução efetivos das várias ativi-dades no setor de óleo e gás natural assim como a utilização eficiente, produtiva, altamente competitiva e sustentável dos recursos petrolíferos por meio de um mecanismo aberto e transparente533.

Em seguida, considerando que os recursos minerais são de propriedade do Estado, a Lei reconhece que as diversas regiões do país devem compartilhar dos benefícios financeiros e ter alguma autonomia na condução das operações de óleo e gás. O grau de controle, anteriormente centralizado no Governo Federal, tem sido um fator histórico de conflito entre as administrações regionais e a administração federal no país.

No tocante ao controle sobre as operações, a Lei determina que deverá ser criando um Ente Governamental especialmente para controlar e supervisionar as atividades de upstream, definidas como as atividades de exploração e produção. Tais atividades devem ser conduzidas por meio de contratos de cooperação, que podem ser PSC ou outras formas de cooperação conforme já exposto. O parágrafo segundo do art. 6 da Lei dispõe que os contratos de cooperação conjunta em questão deverão conter, ao menos, as seguintes disposições: (i) garantia de manutenção da propriedade dos recursos naturais pelo Governo até o ponto de entrega; (ii) controle sobre gerência operacional exercidos por Agência Governamental; e (iii) responsabilidade integral das OC pelo capital e pelos riscos.

O Governo deve, ainda, dar prioridade às necessidades domésticas na utilização de gás na-tural e garantir uma reserva estratégica de óleo, assim como garantir tanto a disponibilidade, quanto a distribuição de óleo combustível.

A Lei em questão institui uma proibição de que uma mesma entidade se envolva simultaneamente nas atividades de upstream e downstream. A Lei estipula ainda que, no caso de uma entidade deter mais de uma

533 Lei 22/2001, art. 3º.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL302

área operacional, deve haver uma entidade estatutária diferente para cada área, de modo a garantir contabili-dades separadas e prevenir que haja transferência de risco entre diferentes projetos.

O artigo 11 da Lei, por sua vez, trata objetivamente das questões relativas às atividades de upstream. Este artigo, em seu parágrafo segundo, determina que todos os contratos de cooperação conjunta que já te-nham sido assinados (PSC, portanto) devem conter, no mínimo, principais provisões sobre: (i) receitas do Esta-do; (ii) área operacional e reversão da mesma; (iii) obrigações de desembolso; (iv) transferência de propriedade dos resultados da produção de óleo e gás natural; (v) termo e condições de extensão do prazo do contrato; (vi) resolução de disputas; (vii) obrigações sobre suprimento de petróleo e/ou gás natural para o mercado domés-tico (limitados a, no máximo, 25% da produção, vide art. 25); (viii) validade do contrato; (ix) obrigações após a fase de produção; (x) segurança do trabalho; (xi) gerenciamento ambiental; (xii) transferência de direitos e obrigações; (xiii) comunicação de ocorrências; (xiv) plano de desenvolvimento do campo; (xv) priorização de uso de bens e serviços domésticos; (xvi) desenvolvimento das comunidades vizinhas e garantia de direitos à comu-nidade local; e (xvii) priorização de contratação de trabalhadores indonésios.

No tocante ao prazo dos PSC, o parágrafo primeiro do art. 14 determina que os contratos não de-verão ultrapassar o prazo de 30 anos, enquanto o parágrafo segundo possibilita às companhias devidamente registradas e domiciliadas na Indonésia requerer uma extensão de prazo de, no máximo, 20 anos. Em seguida, o Art. 15 da Lei dispõe que os prazos do artigo 14 englobam as atividades de exploração e explotação, sendo que o período de exploração deve ser de 6 anos, extensível por mais quatro.

Quanto à aquisição de dados, os arts. 19 e 20 explicitam que: (i) pesquisas devem ser realizadas sob licença do Governo de modo a dar suporte à preparação das áreas operacionais; (ii) os dados obtidos pelas pesquisas geológicas, assim como pelas atividades de exploração e produção são de propriedade e controle do Governo; (iii) os dados obtidos pelas OC, em suas respectivas áreas, podem ser utilizados em suas ativida-des durante a validade de seus contratos, devendo, ao final destes, devolver todos os dados; (iv) estes dados e informações geológicas são confidenciais; (vi) cabe ao Governo regular, gerenciar e utilizar os dados de modo a planejar a abertura de novas áreas operacionais; e (vii) demais procedimentos e requerimentos para a imple-mentação de serviços de aquisição de dados sísmicos deverão ser regulamentados pelo Governo.

Importante, ainda, salientar a estipulação do art. 21 no sentido de que o primeiro plano para desen-volvimento de produção de uma nova área operacional deverá ter prévia aprovação do Ministro que, por sua vez, deve fundamentar-se nas considerações a este respeito emitidas pela Agência Executora, após consulta ao governo da respectiva província.

Ressalte-se ainda que todos os contratos devem ser notificados por escrito ao Parlamento, de modo a garantir transparência e publicidade dos mesmos. No entanto, a Lei não deixa claro se o Parlamento teria poderes para desaprovar ou interferir nos contratos534.

No tocante às receitas governamentais, que serão detalhadamente analisadas em item específico, cabe aqui apenas salientar que cabe às OC remunerar o Estado na forma de impostos e receitas não tributárias. Exemplos de impostos aplicáveis são os impostos de importação e de contribuições regionais, que são novida-des trazidas pela nova Lei, dado que até então as OC estavam sujeitas apenas ao imposto de renda. Receitas não tributárias podem ser exemplificadas pelo profit oil assim como por pagamentos pelas OC de bônus. As OC regidas pelos PSC anteriores à nova Lei tiveram a possibilidade de manter o sistema original de tributação de seus contratos ou aderir ao novo regime. Questões relativas à partilha entre o Governo Central e as províncias serão igualmente tratadas em item específico, mais adiante.

Quanto à Pertamina que, conforme já visto, teve sua atuação e seus objetivos bastante modificados, o art. 63 prevê que: (i) com a criação da Agência Executora (posteriormente denominada BP MIGAS), todos os direitos, obrigações e conseqüências resultantes dos PSC entre a Pertamina e as OC deverão ser transferidas à Agência Executora; (ii) da mesma forma, quaisquer outros contratos relacionados aos PSC devem ser transfe-534 NEWBERY, Mark; “Indonesia: The New Indonesian Oil & Gas Law”, 2002, artigo disponível em www.mondaq.com;acessado em 28/11/08.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 303

ridos à Agência Executora; (iii) todos os contratos acima mencionados permanecerão em vigor por toda a sua vigência original; (iv) a implementação de acordos ou negociações entre a Pertamina e outras partes (OC), no âmbito das atividades de exploração e produção, deverão ser transferidas ao Ministério competente (Ministério Energia e Recursos Minerais).

Por fim, cabe ainda salientar que, sob a égide da Lei 22/2001, o desenvolvimento das atividades de petróleo e gás é uma responsabilidade do Governo Central, tanto na questão do estabelecimento de políticas como de implementação das atividades. A referida Lei, apesar de ter expressamente retirado da Pertamina suas funções regulatórias e ter determinado a criação de dois novos Entes Governamentais para a execução de atividades de upstream e supervisão de atividades de downstream respectivamente, deixou pendente a criação de tais entidades.

Assim, apenas em 16 de julho de 2002 Megawati, então presidente da Indonésia, assinou a Resolu-ção Governamental 42 (GR 42/2002), criando a Badan Perlaksanaan Minyak Gás - BP MIGAS, Corpo Executivo para Atividades de Upstream, que assumiu as antigas atividades de upstream da Pertamina no gerenciamento dos contratos, conforme requerido pela Lei 22/2001. No entanto, ficaram pendentes as regulamentações para implementação da BP MIGAS, o que somente veio a ocorrer por meio da GR 35/2004535.

Da mesma forma, em 30 de dezembro de 2002 foi assinada pela Presidente Megawati a GR 67/2002, para a criação de um Corpo Regulatório para as Atividades de Downstream (Badan Pengatur Hilir Minyak dan Gás Buni - BPH MIGAS) que assumiu as responsabilidades, anteriormente a cargo da Pertamina, na supervisão todas as operações de downstream. A regulamentação para implementação da BPH MIGAS, por sua vez, ficou a cargo da GR 36/2004.536

Podemos, então, dizer que as principais características da GR 35/2004, que regulamentam as ativi-dades de upstream por meio da BP MIGAS, são: (i) tentativa de trazer maior segurança jurídica às atividades de upstream, determinando as funções da BP MIGAS e diminuindo incertezas; (ii) na questão de importação e re-exportação, a GR 35/2004 reafirmou as previsões da Lei 22/2001; (iii) OC devem ter grande cuidado com a proi-bição de distribuição, disseminação e transferência de dados geológicos, devido às fortes penalidades contidas na Resolução; (iv) regulamentação mais precisa de questões relativas a desmobilização e desativação de instalações, apesar de não prever uma solução final para a grave questão das plataformas abandonadas; e (v) alguns artigos da GR 35/2004 requerem posterior regulamentação, o que deve ocorrer por meio de decisões ministeriais.

Diante do acima exposto, conclui-se que, além de bastante recente, o novo marco regulatório do petróleo e gás natural na Indonésia ainda carece de regulamentação e, sobretudo, de maturação, pois muitos dispositivos legais ainda têm sua aplicação prática questionada. Podemos, no entanto, resumir o atual quadro regulatório da indústria petrolífera na Indonésia, após a edição da Lei 22/2001, da seguinte forma: (i) a nova legislação alterou a forma de participação e controle do estado sobre o setor de hidrocarbonetos e permitiu competição no setor de downstream; (ii) a nova Lei autorizou a criação de duas novas entidades, BP MIGAS e BPH MIGAS, para que estas assumissem as funções regulatórias e de supervisão do setor, anteriormente sob responsabilidade da Pertamina; (iii) a primeira (BP MIGAS) substituiu a Pertamina como parte contratante das OC nos PSC (chamados pela Lei de Contratos de Cooperação), eliminando o conflito de interesses derivado da atuação da Pertamina simultaneamente como produtora e como reguladora de suas con-correntes; (iv) a nova Lei também extinguiu o monopólio da Pertamina na área de downstream, com a Agência Reguladora (BPH MIGAS) assumindo a responsabilidade pelo gerenciamento da distribuição do

gás natural e do suprimento de óleo combustível; e por fim, (v) a Lei 22/2001 determinou um prazo

de dois anos para que a Pertamina se tornasse uma sociedade de responsabilidade limitada (Persero).

535 International Business Publications; “INDONESIA Oil & Gas Exploration Laws and Regulations Handbook”, Volume I; 5a Edição, 2008; págs 118 e 119.

536 International Business Publications; “INDONESIA Oil & Gas Exploration Laws and Regulations Handbook”, Volume I; 5a Edição, 2008; pág 119.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL304

I.3.3.2.3 Agentes Envolvidos

PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Como em qualquer regime presidencialista, o Presidente da República, figura máxima do Poder

Executivo, exerce grande influência em todos os setores da economia. O setor de exploração e produção de

óleo e gás natural, por ser, historicamente, de extrema importância para a Indonésia, é objeto de especial

atenção da Presidência da República. Tal importância pode ser evidenciada, por exemplo, por meio dos

arts. 45 e 47 da Lei 22/2001, que determinam que os presidentes da BP MIGAS e BPH MIGAS, respectiva-

mente, serão nomeados diretamente pelo Presidente da República, após consulta ao Parlamento.

A referida Lei, em sua exposição de motivos, dispõe que a nomeação dos representantes

máximos das Agências Executora (BP MIGAS) e Reguladora (BPH MIGAS) são de responsabilidade do

Presidente da República devido a: (i) as tarefas e funções das referidas Agências estarem ligadas a com-

modities de grande necessidade da população e altamente influentes na economia nacional, com grande

potencial de impacto na vulnerabilidade da sociedade e; (ii) necessitarem de regulação inter-setorial,

envolvendo mais de um Ministério537.

Neste sentido, o Presidente da República é responsável por editar, via Regulamentação Gover-

namental (GR, na sigla em inglês) todas as normas complementares à Lei 22/2001, tais como: (i) GR

42/2002, que criou a BP MIGAS; GR 35/2004, que regulamentou as funções e atividades da BP MIGAS

e GR 36/2004, que regulamentou as funções e atividades da BPH MIGAS.

O Presidente deve, ainda, ser periodicamente informado das atividades das referidas Agên-

cias, através do Ministério de Energia e Recursos Minerais, cujo Ministro também é nomeado pelo Presi-

dente da República.

MINISTRO DE ENERGIA E RECURSOS MINERAIS

O Ministro de Energia e Recursos Minerais tem suas funções principais estabelecidas na Lei, em

especial nos arts. 12, 16, 17 e 21.

O art. 12 da Lei estabelece que as áreas operacionais a serem ofertadas para atividades de

exploração e produção de hidrocarbonetos às OC devem ser estipuladas pelo Ministro que, após con-

sulta ao Governo Local538, ofertará tais áreas.

O art. 16, por sua vez, determina a obrigação das OC de reverterem gradualmente parte ou

a integridade das áreas ao Ministro. Trata-se, assim, de estipulação comum à maioria dos países que

possuem atividades de exploração de óleo e gás natural, no sentido de que as partes onde não houve

descobertas comercialmente viáveis devem ser devolvidas ao Governo. Neste mesmo sentido temos o

art. 17, que dispõe que campos já aprovados para desenvolvimento, mas que não tenham entrado em

operação após o prazo máximo de 5 anos, a partir do término do período de exploração devem igual-

mente ser devolvidos ao ministro.

Por fim, o Art. 21 determina que o primeiro plano de desenvolvimento de um campo, visando

537 Exposição de Motivos à Lei 22/2001, art. 47, parágrafo quarto.538 Nota do Autor: Por “Governo Local” deve-se entender cada uma das 23 Províncias indonésias e seus respectivos governos, que estão

submetidos ao Governo Central da República.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 305

à produção, deve ter prévia aprovação do Ministro, que, por sua vez, deve levar em conta as considera-

ções da Agencia Executora (BP MIGAS) assim como do Governo Local.

MINISTRO DA FAZENDA

Apesar de todas as atividades relacionadas à exploração e produção de hidrocarbonetos es-

tarem, a princípio, sob responsabilidade do Ministro de Energia e Recursos Minerais, o Ministro da Fa-

zenda, também exerce função de extrema importância, dado que sua atuação será determinante tanto

na participação do Estado como nas receitas da OC.

Decretos do Ministro da Fazenda reduzindo impostos de importação, como, por exemplo, o

Decreto 187/2000, que reduziu os tributos de importação de 708 itens, incluindo produtos petroquími-

cos para atividades de upstream e downstream, podem ser uma eficiente ferramenta de equilíbrio entre

as receitas do Estado e da OC.

Por meio do controle de tributos aplicáveis às OC, conforme o exemplo acima, a lucratividade

destas pode ser diretamente afetada. Logicamente, alterações drásticas e reiteradas neste sentido podem

gerar um ambiente de incerteza em relação ao país, o que pode afastar as OC.

Como outros exemplos de atuação do Ministro da Fazenda, temos: (i) a Carta do Ministério de

Fazenda no. S-443ª/1982, que dispõe sobre o tratamento da receita e das despesas para fins de cost

oil e dedução fiscal e (ii) os decretos do Ministério da Fazenda 267/78 e o 458/84, que regulamentam

a questão da aplicação da alíquota de imposto de renda de 45%, a qual foi reduzida em 1984 pra 35%

e em 1995 para 30%.

Por fim, GR 35/2004 que, conforme já analisado, regulamentou a atuação da BP MIGAS, dis-

põe, em seu art. 78, que caberá ao Ministro da Fazenda, juntamente com o Ministro de Energia e Recur-

sos Minerais atuar nos procedimentos relativos à importação de materiais e equipamentos da indústria

de óleo e gás natural. Em seguida, o art. 78, da referida Regulamentação Governamental, dispõe que

a BP MIGAS deve, periodicamente, encaminhar ao Ministério da Fazenda relatórios sobre materiais e

equipamentos que tenham sido transferidos entre OC signatárias de diferentes PSC.

Por fim, com o objetivo de esclarecer o percentual de receitas que será regionalmente partilha-

do entre as diversas Províncias do país, o Ministro da Fazenda começou em 2005 a publicar um relatório

anual estimando a alocação das receitas de óleo e gás natural para os Governos Locais. Estes decretos

anuais objetivam diminuir os constantes atritos entre o Governo Central e os Governos Locais no tocante

à distribuição das receitas das atividades petrolíferas.539

PERTAMINA

Conforme previsto na Lei 22/2001, em especial nas disposições transitórias constantes do art.

60, em 18 de junho de 2003 a Presidente Megawati assinou a GR 31/2003 para transformar a empresa

pública Pertamina em uma sociedade de responsabilidade limitada (Persero ou PT Pertamina). O objeti-

vo desta nova regulamentação é estabelecer uma entidade competitiva e eficiente, aumentando, assim,

atividade econômica do país e o bem estar do povo. De acordo com a supracitada norma, todos os

ativos pertencentes à Pertamina deveriam servir como capital à nova entidade. O Ministro das Finanças,

539 International Business Publications; “INDONESIA Oil & Gas Exploration Laws and Regulations Handbook”, Volume I; 5a Edição, 2008; pág 51.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL306

baseado em uma avaliação conjunta com o Ministro de Energia e Recursos Minerais determinou o valor

do capital alocado à nova entidade. A nova Pertamina tem autorização governamental para fornecer,

durante dois anos, óleo combustível para o mercado doméstico, sendo devidamente compensada pelo

Governo. Após o referido prazo, licitações deveriam ser feitas para substituição dos serviços prestados

pela Pertamina.

Apesar das grandes modificações que sofreu, a Pertamina ainda contribui significativamente

na produção de hidrocarbonetos, sendo a sexta maior produtora de petróleo na Indonésia e a terceira

maior produtora de gás natural. A Pertamina tem, ainda, algumas atividades no exterior, como um

contrato de exploração e produção no Iraque (atualmente suspenso pelas condições em que o país se

encontra) e dois contratos para exploração e produção na Líbia, assinados em 2005.

BP MIGAS

Os artigos 44 e 45 da Lei 22/2001 traçaram os objetivos principais da “Agencia Executora”

das atividades de upstream, que, por estipulação da referida Lei, deveria ser criada mediante Regu-

lamentação Governamental. Esta lacuna foi parcialmente suprida em 2004, com a GR 35/2004 (

analisada anteriormente) que criou a BP MIGAS , no entanto, não foi exaustiva quanto aos deveres

da nova entidade, requerendo posteriores regulamentações, muitas das quais pendentes até a pre-

sente data.

Pode-se, porém considerar as principais responsabilidades da BP MIGAS como sendo: (i) for-

necer recomendações ao Ministro na preparação e oferta de áreas operacionais e Contratos de Coope-

ração (PSC); (ii) assinar Contratos de Cooperação; (iii) controlar as atividades e operações de upstream;

e (iv) determinar os vendedores da parcela do profit oil pertencente ao Governo.

Ao mesmo tempo em que controla as operações de exploração e produção de petróleo no

país, a BP MIGAS, uma entidade governamental sem fins lucrativos, age em nome do Governo como

parte nos PSC assinados com as OCs, conforme previsão do art. 44 da Lei.

Administrativamente, a BP MIGAS, vinculada ao Ministério de Energia e Recursos Minerais,

é dirigida por um presidente e um vice-presidente, assistidos por 5 conselheiros e quatro principais

divisões operacionais: (i) planejamento; (ii) finanças e marketing; (iii) operações; e (iv) assuntos gerais.

O presidente da BP MIGAS é nomeado pelo Presidente da República, baseado em recomendação do

Ministro de Energia e Recursos Minerais, após aprovação do referido nome pelo Parlamento, conforme

disposto no art. 45 da Lei. A Agência deve se reportar periodicamente ao Presidente da República por

meio do Ministro de Energia e Recursos Minerais, assim como encaminhar ao Parlamento cópias dos

PSC assinados.

BPH MIGAS

A criação de uma Agência Reguladora das atividades de downstream encontra expressa previ-

são no art. 46 da Lei 22/2001, tendo, ainda, sua estrutura delineada no art. 47. Conforme já anterior-

mente demonstrado, sua criação efetivou-se por meio do GR 36/2004 que, assim como a GR 35/2004

que criou a BP MIGAS, não foi exaustiva na determinação de todos os direitos e obrigações da nova

Agência Reguladora, deixando muitos pontos a serem regulamentados futuramente.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 307

Analisando-se as disposições dos arts. 46 e 47 da Lei em conjunto com as determinações

da GR 36/2004, pode-se apontar as principais responsabilidades da BPH MIGAS como sendo: (i)

regular e determinar o suprimento e a distribuição de óleo combustível; (ii) regular a transmissão e

distribuição de gás natural; (iii) armazenar óleo combustível de modo a atingir as metas de reservas

estratégicas; (iv) planejar a utilização de instalações de transporte e armazenamento de óleo e gás

natural; (v) determinar as tarifas de utilização de oleodutos e gasodutos; (vi) determinar os preços de

gás natural para uso doméstico e pequenos consumidores; e (vii) recomendar a construção de novos

oleodutos ou gasodutos.

A BPH MIGAS tem, ainda, responsabilidade de regulamentar e desenvolver as seguintes

atividades: (i) outorga de licenças de operação de atividades de downstream; (ii) determinar tipos e

padrões dos combustíveis a serem comercializados; (iii) formular políticas de reservas estratégicas;

(iv) determinar fórmulas para precificar o combustível subsidiado; (v) garantir proteção ao meio

ambiente; (vi) garantir a segurança e saúde ocupacional; (vii) promover o desenvolvimento das

comunidades.

Administrativamente, a BPH MIGAS consiste de um Comitê de nove membros, sendo um deles

nomeado presidente. Todos os membros são nomeados pelo Presidente da República, baseado na reco-

mendação do Ministro após aprovação do Parlamento. A BPH MIGAS deve se reportar, periodicamente,

ao Presidente da República através do Ministro.

I.3.3.2.4 Características Peculiares da Indonésia

I.3.3.2.4.1 Remuneração do Estado (Contrato de Partilha de Produção)

O artigo 33 da Constituição da República da Indonésia, promulgada em 1945, determina

que “todos os recursos naturais no solo e nas águas do país estão sob jurisdição do Estado e devem ser usa-

dos em prol do benefício e bem-estar das pessoas540”. Esta é a base constitucional do modelo regulatório

adotado por este País, no qual as OC participam da exploração de petróleo através dos contratos de

partilha de produção. Tais empresas contratadas incorrem no risco da operação, financiando todos os

custos relacionados à exploração, produção e desenvolvimentos do petróleo produzido.

Devido às reformas legislativas ocorridas na Indonésia, com base na disposição constitucional aci-

ma indicada, foi promulgada em 2001 a nova Lei de Petróleo e Gás Natural do país – Lei no. 22/01. O artigo

31 desta Lei estabelece expressamente as formas nas quais se darão a remuneração do Estado, in verbis:

“Artigo 31

(1) As entidades jurídicas ou estabelecimentos permanentes que desenvolvem atividades de upstre-

am, como determinado no artigo 11 parágrafo 1, deverão pagar a receita do Estado na forma de

tributos e não-tributos.

(2) a receita do estado na forma de tributos mencionada no parágrafo (1) deverá consistir de:

a. impostos;

540 República da Indonésia; Constituição Federal de 27 de dezembro de 1949.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL308

b. encargos devidos na importação;

c. encargos e impostos regionais.

(3) receita do estado na forma de não-tributos mencionada no parágrafo (1) deverá consistir de:

a. porção do estado

b. encargos na forma de contribuições permanentes e contribuições sobre a exploração;

c. bônus.

(4) Os contratos de cooperação conjunta devem mencionar que a obrigação de pagar os impostos

previstos no parágrafo (2) é executada de acordo com:

a. as provisões das leis tributárias aplicáveis a partir da assinatura do contrato de cooperação con-

junta;

b. as provisões das leis tributárias em vigor.

(5) As provisões relacionadas à estipulação de valores da porção estadual, encargos estaduais e

bônus, conforme mencionado no parágrafo (3), bem como os procedimentos para remessa dos

mesmos, devem ser estipulados através de regulamentação do governo.

(6) As receitas auferidas para o Estado que não sejam provenientes de tributos, como mencionado

no parágrafo (3) devem ser destinadas ao governo central e regionais, os quais deverão dividi-lo de

acordo com o que está estabelecido na legislação em vigor.”

Sendo assim, de acordo com o disposto acima, as OC remuneram o Estado hospedeiro na

forma de tributos ou taxas/encargos diversos, os quais incidirão sobre seus resultados, não havendo

previsão de pagamento de royalties.

Tais tributos consistem em impostos estaduais, encargos e tarifas devidas sobre as importações

e impostos regionais. Já as outras formas de remuneração, que não os tributos, são os bônus de assina-

tura, dados e de produção, encargos fixos sobre a exploração e demais encargos, os quais serão melhor

explicitados nos itens abaixo.

• Descentralização Fiscal

A distribuição das receitas oriundas da exploração do petróleo é um ponto de intersecção entre

os interesses políticos do Governo Central em Jakarta e os Governos Regionais, onde se localizam as

áreas de produção de petróleo.

Contudo, com o advento da Lei, segundo o seu parágrafo 6 do artigo 31, parte das receitas

provenientes do petróleo serão agora também destinadas ao Governo Regional.

Tal dispositivo foi posteriormente regulamentado através da edição do Decreto no. 237, de 03

de junho de 2003, o qual estipulou as estimativas das porções financeiras das regiões em relação às

receitas oriundas da exploração de petróleo.

A fórmula de partilha, com percentual fixo, da receita entre o governo central e o regional

alterou o antigo mecanismo no sentido em que agora 15% das receitas líquidas de petróleo do Estado

hospedeiro (e.g. receita bruta menos o cost oil) são direcionadas para os governos regionais e 85% para

o governo central.

Dos 15% referentes às receitas de petróleo, 6% são destinados para a região onde está locali-

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 309

zada a produção, 6% são divididos entre as demais regiões localizadas dentro desta província e 3% são

destinados para a região da província central541.

• Bônus de Assinatura

Segundo o Artigo 31, §§ 3 e 5 da Lei, o Estado hospedeiro pode exigir o pagamento de Bônus

de Assinatura, Dados e de Produção. A OC deverá pagar o Bônus de Assinatura no momento em que o

contrato é assinado e o Bônus de Produção durante o prazo de vigência do contrato firmado com a BP

MIGAS. Tais bônus não poderão fazer parte do cost oil. Entretanto, os bônus pagos poderão ser deduzi-

dos da base de cálculo do imposto de renda da pessoa jurídica542.

De acordo com o anexo elucidativo da Lei, o Bônus de Assinatura, Dados e Produção são de-

terminados conforme o cumprimento de certo nível de produção cumulativo (i.e. produção acumulada)

e conforme foi estipulado em cada PSC.

• First Tranch Petroleum (“FTP”)

Apesar de não existir expressa previsão de pagamento de royalties na nova Lei de Petróleo e

Gás Natural da Indonésia, o First Tranch Petroleum (“FTP”) pode ser entendido como um tipo de royalty

pago ao Estado543.

O FTP consiste em incentivos para desenvolver bacias em áreas fronteiriças (províncias orien-

tais), marginais e de águas profundas. Originalmente, o FTP representava os primeiros 15%, no caso das

províncias orientais, e 20% nos demais campos da produção de cada ano, a ser dividida em percenta-

gens iguais de “profit oil” entre a OC e o Estado hospedeiro.

Ainda que em alguns PSC na Indonésia não exista limite da porcentagem de exploração, con-

siderada afeta à recuperação dos custos, ainda que o “cost oil” seja considerado ilimitado, esta recupe-

ração só poderia ser feita sobre 80% do output.

No entanto, em relação aos contratos firmados após da edição da Lei, não há mais a previ-

são de divisão do FTP entre a OC e o Estado hospedeiro. Atualmente, todo o FTP é conferido ao Estado

hospedeiro, no percentual de 10%.

541 PriceWaterhouseCoopers; “Oil & Gas INDONESIA Investment and Taxation Guide”, 2005.542 PriceWaterhouseCoopers; op. cit.543 International Business Publications; “INDONESIA Oil & Gas Exploration Laws and Regulations Handbook”, pg. 177, Volume I; 5a Edição,

2008.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL310

I.3.3.2.4.2 Processo de Escolha e Remuneração da OC

Processo de Escolha da OC

Conforme descrito anteriormente, podemos constatar a existência de duas formas primor-

diais de escolha e contratação de uma OC pelo Estado hospedeiro, quais sejam: a licitação compe-

titiva e a negociação direta.

Quando tratamos da República da Indonésia, podemos observar a existência destas duas

possibilidades. A licitação competitiva é promovida pela BP MIGAS, dado que a Regulamentação

Governamental Nº 42/2002, determinava que a Agência Executora fosse a responsável pela super-

visão e gerenciamento dos PSC544.

Em 2006, foi editada a Regulação 40/2006, relativa aos procedimentos de alocação e

oferta de blocos de petróleo e gás natural. O objetivo desta norma é aumentar a transparência e

clareza dos processos de licitação, inclusive os critérios de seleção para os vencedores de cada ro-

dada. Atualmente os licitantes devem oferecer uma garantia bancária de, ao menos, 20% do valor

do bônus de assinatura, quando participarem de um processo de licitação competitiva ou de um

processo de negociação direta com o valor superior a US$ 500.000 (quinhentos mil dólares).545

O processo de licitação competitiva começa com a preparação e definição da área a ser

licitada: os dados geológicos são avaliados e é feito um levantamento especulativo dos dados do

bloco a ser licitado. Essas informações são fornecidas pela BP MIGAS em seu Pacote de Dados,

quando da divulgação da licitação.

Assim, como exigido em outros países, para a habilitação de uma OC no processo lici-

tatório, faz-se necessário o cumprimento de requisitos técnicos, legais e administrativos, os quais

são comprovados através de dados e certificados exigidos pelo Documento de Licitação. Este docu-

mento deverá ser preenchido pelos licitantes, contendo todas as informações, incluindo a proposta

comercial.

Após a submissão dos documentos acima mencionados pelas OC à BP MIGAS, um comitê

fará a avaliação dos documentos enviados e determinará o licitante vencedor para cada um dos

blocos.

Segue, na Figura I.106, um quadro esquemático fornecido pelo Departamento de Energia

e Recursos Minerais da República da Indonésia para a Rodada de Licitações de 2008546.

544 Disponível em http://www.bpmigas.com/English/Default.asp. Acesso em 29/11/2008.545 International Business Publications; “INDONESIA Oil & Gas Exploration Laws and Regulations Handbook”, Volume I; 5a Edição, 2008;

pág 157546 Nota do Autor: Não foram localizadas informações sobre quais critérios objetivos são utilizados para indicar a proposta vencedora.

Depreende-se da Legislação vigente e do quadro em questão que as condições técnicas, financeiras (idoneidade), e comerciais são os critérios levados em consideração.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 311

Figura I.106: processo de escolha na Indonésia para a Rodada de Licitações de 2008

Fonte: Departamento de Energia e Recursos Minerais da República da Indonésia

Outra forma de contratação com a OC, a qual tem sido prática muito comum na Indonésia, é

a negociação direta, que tem previsão expressa na Lei547, nos parágrafos 1º, 2º e 3º do artigo 12.

Nesta prática, a OC pode fazer uma proposta direta ao governo relativa a uma determinada

área de fronteira exploratória. Esta proposta será avaliada por um comitê designado pela BP MIGAS e,

em seguida, um estudo técnico geológico será feito pelo mesmo em conjunto com a OC, para avaliação

do real potencial da área em negociação. Após a avaliação do resultado deste estudo, é feita a avalia-

ção da qualificação técnica e econômica da área de fronteira exploratória e são estabelecidos os limites

da mesma.

Subseqüentemente, a BP MIGAS convida outras OC para a elaboração de propostas acerca do

bloco em estudo. Se, no tempo determinado para apresentação de propostas, nenhuma outra empresa

convidada demonstrar interesse e apresentar uma proposta, o Governo concede o bloco para a OC que

fez a proposta inicial, assinando então o PSC nos mesmos termos ofertados. Caso outras OC manifes-

tem interesse, um comitê avaliará as propostas e decidirá o vencedor da disputa.

Remuneração da OC

Considerando que a Indonésia utiliza o regime de PSC, a OC recebe primeiro uma alocação

do total da produção destinada a reembolsá-la de seus custos e despesas (“cost oil”) e, após a recupe-

ração dos custos, obtém um percentual determinado da produção, a título de lucro, denominado “profit

oil” (“Petróleo-Lucro”).

A partilha do profit oil na Indonésia é feita em alguns casos progressivamente, ou seja, é ba-

547 [1] República d

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL312

seada na produção da OC. Desta forma, quanto maior a produção de óleo (em barris por dia), maior

fica a participação do Estado na produção, e menor da OC. Neste sentido, apresentamos um exemplo

na Tabela I.29.

Tabela I.29: exemplo de partilha do profit oil na Indonésia

Produção (em barris por dia)Participação

governamental no profit oil

De 0 a 15.000 bpd 55%

De 15.001 a 30.000 bpd 60%

De 30.001 a 50.000 bdp 65%

De 50.001 a 100.000 bdp 70%

De 100.000 bpd em diante 75%

Fonte: SMITH, Ernest E. e outros; “International Petroleum Transactions”; Ed. Rocky Mountaind Mineral Law Foundation, 2ª. Edição, 2000, pág. 450.

Ademais, o artigo 22 da Lei dispõe que as OC devem garantir, no máximo, 25% de sua parte

na produção de petróleo para o fornecimento doméstico. Esta obrigação é atualmente regulamentada

na Resolução 2/2008.

Este tipo de obrigação tem grande impacto quando abordamos a lucratividade das OC, na

medida que o barril fornecido a título de “fornecimento doméstico” pode ter seu valor determinado pela

Estado hospedeiro, o que diminui sensivelmente os lucros obtidos, como ocorria na década de 70 na

Indonésia, quando as OC eram obrigadas a vender petróleo para consumo doméstico a US$ 0,20 (vinte

centavos de dólar) o barril.

Questões Tributárias Atinentes à Remuneração da OC

No tocante à tributação das OC sob o regime de PSC, estas, geralmente, estão sujeitas a tribu-

tação sobre as receitas oriundas de suas operações. Inicialmente não havia previsão de tributação sobre

o “profit oil” e a parcela de petróleo recebida pela OC era considerada receita líquida. No entanto, com

a nova interpretação das autoridades tributárias norte-americanas, conforme explicitado no item abaixo,

a Indonésia recalculou as proporções da partilha e passou a adotar tributação sobre as receitas das OC.

• Perspectiva Histórica

Entre os anos de 1960 e 1980, as OC tinham o direito de ter sua porção do profit oil em bases

líquidas de imposto (i.e. com o pagamento do imposto de renda da Indonésia feito pela NOC em nome

das OC).

Entretanto, em 1980, o governo da Indonésia foi persuadido a mudar seus procedimentos de

pagamento de imposto de renda para aceitar pagamentos diretos de impostos pela OC, em virtude de

dificuldades que as OC norte americanas estavam tendo perante a Receita Federal Norte-Americana

(Internal Revenue Service – IRS) em ter os pagamentos de tributos feitos pela NOC Pertamina reconhecidos

para fins de crédito tributário. Os termos dos PSC firmados à época, na Indonésia, foram interpretados

de acordo com as leis tributárias norte-americanas, nas quais a referida partilha não poderia ser consi-

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 313

derada como pagamento de tributos ao estado hospedeiro, visto que o percentual da produção retido

pelo proprietário dos recursos minerais é característico dos royalties e não de tributos.548

Para evitar a tributação norte-americana, os contratos foram então revisados de modo que a

OC pagasse diretamente ao Estado hospedeiro a tributação aplicável549. Sendo assim, a partir de tal

alteração, as OC são tributadas na Indonésia da mesma forma que as demais empresas constituídas

neste país, contudo, com bases de cálculo diferentes.

Sob os termos dos contratos novos ou revisados, as OC pagarão imposto de renda à alíquota

de 30% sobre a sua parte da produção. As OC também devem pagar imposto de renda retido na fonte

à alíquota de 20% sobre os dividendos, resultando em uma alíquota combinada de 44% em relação aos

seus lucros.

Além disso, em relação aos contratos alterados, realizou-se uma revisão relativa ao percentual

do “profit oil” em favor das OC. Conseqüentemente, esta mudança fez com que as regras de “cost oil”

estivessem de acordo com o esquema de deduções de despesas, conforme disposto na legislação de

imposto de renda aplicável às empresas ocidentais.

• Princípio da Uniformidade

Em razão da alteração mencionada no item acima, tornou-se necessário o ajuste do chaman-

do Princípio da Uniformidade em relação à base de cálculo tributável. Tal princípio, conforme discrimi-

nado na Carta do Ministério de Fazenda no. S-443A de 6 de maio de 1982, dispõe que o tratamento da

receita e das despesas, para fins de cost oil e dedução fiscal, deverá ser idêntico.

Portanto, com o intuito de atender tanto às alterações na legislação fiscal quanto tal princípio,

as autoridades fiscais da Indonésia têm de considerar a base de cálculo para fins de imposto de renda

das OC, diferentemente daquela aplicada a outros contribuintes na Indonésia. Sendo assim, seguem

alguns exemplos de ajustes abaixo:

a) o valor tributável do petróleo produzido será baseado em uma fórmula específica em opo-

sição ao valor real de venda;

b) a classificação dos intangíveis e dos custos de capital não serão necessariamente consisten-

tes com as regras gerais de imposto de renda em relação a essas despesas.

c) as taxas de depreciação/amortização aplicáveis a tais intangíveis e custos de capital não

serão consistentes com as regras gerais de imposto de renda em relação a essas taxas.

d) somente ocorrerá dedução fiscal das despesas a partir da declaração de comercialidade do

poço, em oposição à regra prevista no regulamento do imposto de renda, que dispõe que

as despesas deverão ser deduzidas na data de sua ocorrência.

• Regime Fiscal

Os lucros são computados e tributados tendo em vista os princípios normais de contabilidade

e modificados por certos ajustes fiscais.

Regra geral, a dedução é permitida para as despesas incorridas relacionadas às atividades das

548 ISENBERGH, Joseph; “The Foreign Tax Credit: Royalties, Subsidies and Creditable Taxes” Ed Tax L. Rev, 1984; págs. 251-252549 TAVERNE, Bernard; “Petroleum, Industry and Governments”; Ed. Wolters Kluver, 2a Edicão, 2008; pp. 301 e 302.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL314

empresas. Entretanto, em relação às OC existem limitações, como demonstrado no item anterior, em

razão do principio da Uniformidade.

Nesse sentido, seguem as principais características do regime fiscal aplicado à indústria de

petróleo na Indonésia, as quais serão desenvolvidas nos itens abaixo550:

Tabela I.30: principais características do regime fiscal da indústria de petróleo da Indonésia

Royalties Partilha de Produção1

Imposto de Renda

Imposto retido na fonte de Dividendos2

Incentivos a Investimentos3

Indonésia N/A 70-90% (V) 30% 20% Sim (I,D,Ct)

1 Partilha de produção vinculada ao volume físico da produção(V).2 Aplicável a não residentes.3 Isenção na importação de equipamentos e bens de capital (I), depreciação acelerada (A) e Crédito para investimento (CI).

• Alíquotas de Imposto de Renda

De acordo com o Princípio da Uniformidade, as alíquotas de imposto de renda devem ser

aplicadas de acordo com o período em que o PSC foi firmado, em razão da determinação do profit oil

líquido, calculado a partir da alíquota do imposto de renda da época em que o contrato foi firmado.

Sendo assim, tais alíquotas serão aplicadas durante toda a vigência do PSC, independentemente de

alteração das mesmas ao longo dos anos.

Os decretos do Ministério da Fazenda 267/78 e o 458/84 regulamentaram tal questão no

sentido de que aos contratos assinados antes de 1984 seria aplicada a alíquota de imposto de renda de

45%, a qual foi reduzida, em 1984, pra 35% e, em 1995, para 30%.

Além do imposto acima, após o profit oil ter sido tributado pela OC, os mesmos ficam sujeitos a

mais uma tributação no momento da remessa de dividendos. Como exemplo, os contratos firmados antes

de 1984 estão sujeitos a seguinte tributação: alíquota de 20%, levando a uma carga tributária total de 56%

(i.e. 45% mais (55% x 20%)), tal cálculo representa um profit oil bruto de 0,3409 (i.e. 15%/1-.56%).

Para que fosse mantida uma constante após a aplicação do imposto, os percentuais de profit oil

foram alterados ao longo dos anos, enquanto a alíquota genérica de imposto de renda era reduzida.

Nesse sentido, segue tabela com o resumo das alíquotas de imposto de renda ao longo do tempo.

Tabela I.31: alíquotas históricas de imposto de renda aplicados na Indonésia

Eras do PSC Alíquota genérica

Alíquota sobre os Dividendos

Alíquota Combinada Profit Oil Líquido do

Imposto

Pré-1984 45% 20% 56% 0,3409 15%

1984-1994 35% 20% 48% 0,2884 15%

Após 1994 30% 20% 44% 0,2678 15%

Atual 30% 20% 44% 0,4464 25%

Fonte: PriceWaterhouseCoopers, “Oil & Gas INDONESIA Investment and Taxation Guide”, 2005.

Importante mencionar que o imposto de renda retido na fonte, quando da remessa de dividendos

550 International Business Publications; “INDONESIA Oil & Gas Exploration Laws and Regulations Handbook”, Volume I; 5a Edição, 2008.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 315

em relação aos PSC, não poderá ser compensando via tratado para evitar a bitributação no país de origem

do OC. Segundo instrução editada pelo Ministério da Fazenda em 1999, o profit share do Estado hospedeiro

seria aumentado para compensar qualquer utilização de redução de imposto, via tratado pelas OC.

Tal fato foi, inclusive, inserido como cláusula nos recentes PSC, evidenciando que o Estado hospe-

deiro e a OC concordam que todas as percentagens do “profit oil” previstas no contrato foram determinadas,

baseadas na suposição de que a OC está sujeita ao pagamento de imposto de renda sobre a distribuição de

dividendos após a tributação de seus lucros, conforme dispõe o § 4 do artigo 2, da lei do imposto de renda

da Indonésia, e que o mesmo não será abatido ou reduzido via tratado para evitar a bitributação551.

• Princípio“Ring-Fencing”

O princípio da delimitação (“ring-fencing principle”) está expresso na instrução do Ministério da

Fazenda no. SE-75/1990, a qual dispõe que os custos incorridos pela OC em relação a um PSC especí-

fico não poderão ser utilizados para exonerar as obrigações tributárias de outro projeto.

• Escrituração Contábil e Fiscal

Conforme dispõe o próprio PSC e demais regulamentações exaradas pelo Ministério da Fazen-

da, as OC estão obrigadas a manter sua escrituração contábil e fiscal e a calcular o imposto de renda da

pessoa jurídica em dólares americanos. O imposto sobre o valor agregado e o imposto de renda retido

na fonte são calculados em moeda corrente do Estado hospedeiro.

• Pagamento de Impostos

Como já mencionado no item sobre remuneração do Estado, o pagamento do imposto de

renda pelas OC são considerados como uma receita de petróleo pelo Estado hospedeiro.

Os pagamentos do imposto de renda ocorrem a cada mês em que o petróleo é produzido. No final

do ano, a produção real é determinada e um pagamento final é realizado com os devidos ajustes. As variações

positivas ou negativas da produção são consideradas, para fins fiscais, como compra ou venda de petróleo.

Caso o pagamento adiantando do imposto exceda o total devido no final do ano, o pagamen-

to a maior será compensado ou restituído no ano fiscal seguinte.

• Impostos Retidos na Fonte

As OC estão obrigadas a preencher e apresentar mensalmente às autoridades fiscais as infor-

mações relativas aos impostos retidos.

Os fatos geradores mais comuns dos impostos retidos pelas OC são (i) aluguéis de terra ou

empreendimento (imposto direto) e (ii) as alíquotas presumidas de imposto de renda, i.e., navegação

internacional à alíquota de 1,2% e 2,64%.

• Imposto sobre o valor agregado (“VAT”) – regra geral

Como regra geral, o VAT incide, à alíquota de 10%, sobre bens e mercadorias importadas ou

produzidas internamente, serviços e na transferência de bens e mercadorias da matriz e suas filiais, ou

551 PriceWaterhouseCoopers, op.cit.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL316

para terceiros, com algumas exceções.

Em princípio, os créditos de VAT, obtidos na entrada de bens, podem ser compensados com os

débitos na saída, entretanto, existem exceções.

A venda do óleo extraído é isento de VAT. Sendo assim, as OC nunca terão direito a crédito

deste imposto nessa situação. Por outro lado, dependendo do fato gerador, o VAT poderá ser diferido,

isento (no caso de importação) ou reembolsado (somente no caso da BP MIGAS)

• Diferimento do VAT

De acordo com Decreto Presidencial no. 22/99, todos os pagamentos de VAT relacionados à explora-

ção de petróleo e gás natural e aos serviços de perfuração eram diferidos até o momento do profit oil da NOC.

Posteriormente, o mencionado Decreto foi alterado e tal dispositivo revogado. Dessa forma, as

OC estão obrigadas a pagar o VAT sobre bens e serviços adquiridos no Estado hospedeiro, que somente

serão restituídos quando do início da produção.

• Impostos sobre a Importação

A isenção dos impostos devidos sobre a importação, que inclui o imposto de importação, o

VAT- importação e o pré-pagamento do imposto de renda, costumava ser direcionada a certos bens e

equipamentos, importados temporariamente ou não.

Entretanto, a Lei alterou tal cenário ao dispor, em seu artigo 31, que as OC devem pagar os

impostos sobre a importação.

O Ministério da Fazenda publicou, em janeiro de 2005, uma instrução isentando o imposto de

importação devido em importações permanentes, ou seja, aqueles que terão a propriedade transferida

posteriormente para o Estado hospedeiro. No entanto, esteve em vigor somente até julho de 2006.

Além disso, as autoridades tributárias vêm entendendo que as importações temporárias devem

seguir o tratamento dado às importações permanentes.

• Impostos Regionais

Existem vários impostos e taxas regionais, cobrados das OC, que podem variar de acordo com

a região e fato gerador da operação.

• Cost Oil

As OC podem se recuperar de certos custos de produção, tais como:

a) custos operacionais de cada ano, incluindo custos de exploração em outros sítios dentro da

área do PSC; custos de perfuração intangíveis em poços em fase de exploração ou desen-

volvimento; e custos com aquisição de inventário no Estado hospedeiro. A OC pode também

recuperar uma proporção dos custos incorridos pela matriz, geralmente limitados a 2% do

total de custos, desde que os custos sejam consistentemente aplicados, demonstrados em

relatório trimestrais e aprovados pela BP MIGAS;

b) depreciação dos custos de capital às taxas de 50%, 25%, 12,5% e 10%;

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 317

c) custos operacionais e de depreciação não aproveitados no ano anterior. Se não existe produção su-

ficiente para recuperar tais custos, os mesmos poderão ser acumulados sem prazo decadencial.

Os principais custos não recuperáveis são os bônus pagos ao governo e os custos financeiros.

Entretanto, os mesmos podem ser deduzidos do imposto de renda das OC.

• Crédito para Investimento

Em reconhecimento ao longo processo entre o momento da fase exploração e da produção

de um poço, pelo Estado hospedeiro, é oferecido um crédito entre 17% a 55% do custo, com imple-

mentação das instalações das OC e transporte de equipamentos relacionados à atividade, desde que

negociado e aprovado pela BP MIGAS.

• Demais Disposições Fiscais

Considerando que, pelo conceito de PSC, a OC deverá incorrer em todos os riscos e custos re-

lacionados à exploração até a declaração de comercialidade, caso a produção não proceda, tais custos

não poderão ser recuperados.

Apesar de o GAAP adotado pela Indonésia ter princípios contábeis específicos para a indústria

de Petróleo e Gás Natural (“PSAK” No. 29), o qual é similar ao modelo norte-americano - US Statement

of Financial Accounting Standard (“SFAS”) 19-, no momento de preparar suas demonstrações financeiras,

as OC preferem não utilizar o modelo da Indonésia e optam por realizar demonstrações do PSC para

que os mesmos sejam ajustados na contabilidade de suas respectivas matrizes no exterior552.

1.3.3.2.4.3 Etapas e Fases Contratuais

Conforme já analisado anteriormente, as atividades de upstream são praticadas mediante a as-

sinatura de um “Contrato de Cooperação” entre a BP MIGAS e a OC. Dessa forma, a Lei 22/2001 deter-

mina algumas previsões que devem constar destes contratos, como por exemplo: (i) termos acerca da par-

ticipação governamental; (ii) investimentos (despesas) obrigatórios na fase de exploração; (iii) condições de

prazo e prorrogação do contrato; (iv) obrigações de fornecimento ao mercado doméstico; (v) obrigações

pós fase de produção; e (vi) obrigações acerca de saúde, segurança e gerenciamento do meio ambiente.

Apesar de a Lei abrir a possibilidade de os Contratos de Cooperação não serem exatamente

PSC, até a presente data todos os Contratos de Cooperação firmados são extremamente similares em

forma e conteúdo ao formato histórico dos PSC. Assim como na maioria dos países existem, basicamen-

te, duas categorias de contratos firmados pelas OC na Indonésia, quais sejam: os Contratos de Coo-

peração e os Acordos de Operação Conjunta (JOA). Estes são acordos sobre como serão conduzidas

as operações de exploração e produção e, aqueles, referem-se aos direitos e deveres assumidos pelos

investidores (OC), ante a BP MIGAS, para atividades de exploração e produção.553

Os Contratos de Cooperação são basicamente o PSC strictu sensu, o Contrato de Assistência

Técnica (TAC, na sigla em inglês) e a Recuperação de Petróleo Aprimorada (EOR, na sigla em inglês).

Serão analisadas abaixo, as principais características de cada uma dessas modalidades contratuais:

552 PriceWaterhouseCoopers; “Oil & Gas INDONESIA Investment and Taxation Guide”, 2005.553 PriceWaterhouseCoopers; “Oil & Gas INDONESIA Investment and Taxation Guide”, 2005, pág 26.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL318

PSC strictu sensu:

• Um Contrato de Cooperação para a exploração e produção de óleo e gás natural entre a

OC (que podem ser companhias estrangeiras ou a PT Petarmina) e a BP MIGAS;

• BP MIGAS figura como supervisora e gerente do PSC;

• OC são os investidores e contratados;

• A participação governamental se dará de acordo com a partilha da produção, na qual o

Governo e a OC ficam com uma parcela da produção, que é medida de acordo com os

percentuais previamente acordados;

• A OC tem o direito de receber e dispor livremente de sua parcela na produção;

• Custos de operação da OC são recuperáveis pela produção de acordo com as fórmulas

de recuperação via “cost oil” pré estabelecidas no PSC;

• A propriedade sobre a parcela da OC nos hidrocarbonetos produzidos somente é transfe-

rida no ponto de entrega;

• Delimitação das áreas de trabalho e prazos para devolução parcelada ou integral das

mesmas;

• Mecanismos de resolução de disputas;

• Determinações sobre segurança ocupacional, saúde e meio ambiente;

• Prioridade no uso de mão de obra e bens locais;

TAC:

• Tipicamente usada em áreas produtoras já estabelecidas cobrindo, portanto, apenas a

fase de produção;

• PT Pertamina é a supervisora e gerente do TAC;

• Custos de operação são recuperáveis pela produção;

• Um TAC pode cobrir exploração e produção caso seja firmado para uma área onde o

Governo deseje incentivar a exploração;

• OC não tem o direito de partilha sobre a integralidade da produção;

• De acordo com a Lei 22/2001, os TAC existentes não poderão ser prorrogados.

EOR:

• Utilizado em campos já maduros com o objetivo de aplicação de tecnologia avançada de

modo estender a vida útil destes campos, aumentando o percentual de recuperação dos

mesmos;

• PT Pertamina geralmente participa juntamente com as OC;

• PT Pertamina é a supervisora e gerente do EOR;

• Custos de operação são recuperados pela produção e geralmente limitados a determina-

do percentual. Em alguns casos, acréscimo incremental da produção pode ser dividido na

base da partilha de produção.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 319

• O EOR pode incluir provisões específicas sobre como as partes devem conduzir as opera-

ções petrolíferas.

Evidencia-se, portanto, que tanto no TAC quanto no EOR quem participa dos contratos é a PT

Pertamina e não a BP MIGAS, como ocorre nos PSC. Os participantes dos PSC strictu sensu, TAC ou EOR ge-

ralmente firmam, ainda, acordos separados sobre como deverão ser conduzidas as operações. Estes acordos

geralmente têm a forma de Acordos de Operação Conjunta (JOA) , cujas principais características são:

• O JOA é um acordo em separado, adicional ao Contrato de Cooperação;

• Seu objetivo é governar as relações entre as partes que detêm participação no PSC, defi-

nindo direitos e obrigações mútuas e descrevendo os procedimentos sob a responsabilida-

de de cada participante;

• O JOA geralmente inclui: (i) o escopo das operações; (ii) designação de direitos e obriga-

ções do operador; (iii) o estabelecimento de um Comitê de Operações; (iv) disposição da

produção; (v) disposições sobre renúncia, desistência ou transferência da participação; (vi)

cláusulas de confidencialidade; (vii) disposições sobre força maior; (viii) cláusulas sobre

resolução de disputa e lei aplicável.

Consoante art. 14, da Lei 22/2001, o termo total dos Contratos de Cooperação é de 30 anos

e a OC deve iniciar as operações no prazo máximo de 6 meses, contados de sua assinatura. A Fase

de Exploração, por expressa disposição do art. 15 da Lei, tem previsão inicial de 6 anos, podendo ser

prorrogada por mais 4, totalizando um máximo de 10 anos, prazo este que está contabilizado no prazo

total de 30 anos do Contrato. Não havendo descobertas comerciais viáveis no prazo de Exploração, o

Contrato será rescindido e as despesas incorridas pela OC não serão reembolsadas.

O prazo original de 30 anos, por expressa autorização do art. 14 da Lei, também pode ser

prorrogado por adicionais 20 anos, sendo, para tal, necessária prévia e expressa autorização do Mi-

nistério de Energia e Recursos Minerais. Tal autorização deve ser requerida entre 10 e 2 anos antes do

término originalmente previsto para o Contrato.

Durante a Fase de Exploração, a OC deve executar todos os serviços previstos no Programa Ex-

ploratório Mínimo (“Work Program”), cuja estimativa total de custos consta do Contrato de Cooperação. O

Ministério de Energia e Recursos Minerais deve aprovar quaisquer serviços em desacordo com o “Work Pro-

gram”, em especial quando se tratar de execução de serviços em patamar ou valores inferiores ao previsto

contratualmente. Caso a OC não execute os serviços previstos para a fase de exploração, tais como aquisição

de dados sísmicos e perfuração de poços exploratórios, o Contrato poderá ser rescindido. Concluída a Fase

de Exploração, caso a OC não tenha cumprido integralmente os investimentos previstos, a diferença deverá

ser restituída ao Governo, exceção feita às alterações com prévia e expressa autorização do Ministério.

Em caso de Descoberta Comercialmente Viável, deve a OC imediatamente informar a Agência

Executora, para que esta, por sua vez, solicite ao Ministério autorização para iniciar o desenvolvimento

da produção. De acordo com o atual modelo de Contrato de Cooperação da Indonésia, decorridos 5

anos da referida aprovação ou do término da Fase de Exploração sem que tenham sido produzidas

quantidades comerciais de Petróleo, a OC deve devolver a área operacional ao Governo.

Os atuais PSC indonésios contêm, ainda, previsão de devolução periódica de parcelas da área

originalmente estipulada no Contrato. Ao término do terceiro ano de vigência do Contrato, a OC deve

retornar ao Estado 20% da área e, caso o programa exploratório mínimo, estipulado para os primeiros

3 anos, não tenha sido cumprido, a OC deve devolver adicionais 15% da área original. Ao término da

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL320

Fase de Exploração, a OC deve devolver uma porção adicional de modo que a área retida para produ-

ção não ultrapasse 20% da área originalmente estabelecida no PSC.

Em caso de descoberta durante a fase de exploração que, na opinião conjunta da BP MIGAS e

da OC seja comercialmente viável, será iniciado o desenvolvimento daquela porção da área explorató-

ria, referente à reserva descoberta.

Iniciada a Fase de Produção, a OC começará a recuperar os investimentos por meio do “cost oil”.

O PSC pode, ainda, estabelecer que ficará a cargo da OC comercializar todo o óleo produzido (tanto a

parte da OC quanto a parte da BP MIGAS), como, de fato, tem ocorrido em diversos Contratos. A OC, por

sua vez, poderá livremente dispor de seu óleo, ressalvadas as disposições específicas sobre fornecimento

ao mercado doméstico. Caso a parcela do “cost oil” não seja recuperada em determinado ano, o restante

poderá ser recuperado nos anos subseqüentes. O PSC detém, ainda, a fórmula para avaliação do petróleo

produzido, que será utilizada na recuperação dos custos da OC. Geralmente esta fórmula está associada

ao preço de mercado de uma cesta de variedades do petróleo equivalentes ao petróleo da região.

Definida a recuperação dos custos por meio do “cost oil”, o modelo de PSC indonésio passa

à análise da partilha do “profit oil”, que nada mais é do que o restante da produção, após a dedução

dos custos. Estes percentuais de partilha podem tanto ser fixos como em forma de “escala variável”,

aumentando a participação do Estado na partilha à medida em que aumenta a produção. Em seguida,

determina-se o ponto de entrega do petróleo, sendo este o ponto a partir do qual ambas as partes po-

dem livremente dispor de sua partilha dos hidrocarbonetos produzidos.

Por fim, os PSC assinados após 1995, passaram a incluir um orçamento específico para limpeza

e restauração das áreas após o término das operações. Durante a Fase de Produção será criado um fundo

para despesas relativas a abandono e restauração das áreas, que será dedutível a título de “cost oil” e isento

de tributação. Caso a integralidade deste fundo não seja utilizada na recuperação das áreas, o valor restante

será transferido à BP MIGAS. Deve-se ressaltar que as despesas das OC em PSC que não atinjam a Fase de

Produção, não serão recuperáveis, mesmo aquelas relativas ao abandono e restauração das áreas.

I.3.3.2.4.4 Instrumentos de Controle sobre a Produção

A preocupação com o controle, pelo Estado, sobre a produção de hidrocarbonetos é tema

recorrente na legislação indonésia e pode ser encontrada tanto na Constituição Federal, como na Lei

do Petróleo e suas regulamentações. Na qualidade de exportadora de petróleo e país membro da OPEP

por mais de 40 anos, deter controle sobre a produção era fundamental ao Governo. Nos últimos anos,

porém, com o declínio da produção e a explosão do consumo de hidrocarbonetos no país, a Indonésia

tornou-se importadora de petróleo, motivo pelo qual, atualmente, todas as medidas referentes a controle

de produção visam seu melhor desenvolvimento.

O Art. 33 da Constituição de 1945 afirma que o Estado deve deter o controle da produção

de setores que sejam estratégicos e que exerçam forte influência sobre a vida do povo. Em seguida, o

mesmo artigo constitucional determina que os recursos naturais e minerais pertencem ao Estado e de-

vem ser utilizados de forma a maximizar a prosperidade e o bem-estar do povo indonésio. Interpretando

este parágrafo evidencia-se que, por disposição constitucional, é dever do Estado exercer considerável

controle sobre a produção nacional de hidrocarbonetos.

Neste sentido, a exposição de motivos da Lei 22/2001 determina que, ante a disposição cons-

titucional acima indicada e, considerando, ainda, que o petróleo e o gás natural são recursos naturais

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 321

não renováveis e estratégicos, posto que exercem papel vital na economia do país, tais recursos devem

ser gerenciados pelo Estado de forma a maximizar a prosperidade e o bem-estar do povo.

Assim, o art. 1o da Lei, que define os principais termos utilizados nos artigos seguintes, em seu

item 1.23, dispõe que a Agência Executora será o órgão responsável pelo controle das atividades de

upstream. Mais adiante, o art. 3 (a), do referido diploma legal, determina que um dos objetivos da Lei é

garantir a efetiva implementação e controle das atividades petrolíferas, dado que “os hidrocarbonetos

são um recurso natural não-renovável e estratégico, de propriedade do Estado”. Em seguida, o art. 4

dispõe que será criada uma Agência Executora (BP MIGAS) que executará o controle estatal sobre tais

atividades dentro da “jurisdição minerária indonésia”.

Prosseguindo com a análise da Lei 22/2001, seu art. 6, caput, determina que as atividades de

upstream serão executadas e controladas por meio dos Contratos de Cooperação (PSC). Desta forma, o item

6(b)2 define que o controle sobre o gerenciamento operacional deverá ser garantido no PSC à Agência Exe-

cutora. Este dispositivo legal foi reproduzido no art. 24 da GR 35/2004 que estabelece que tal controle ope-

racional deve constar dos termos do PSC. Isto significa dizer que, por força das disposições do PSC, o controle

geral sobre as operações deverá ficar a cargo do Governo, por meio da BP MIGAS, independentemente da

OC ser apontada como operadora. Caberá, portanto, à OC tomar as decisões do dia a dia das operações,

devendo, no entanto, consultar a BP MIGAS acerca de quaisquer decisões estratégicas.

No tocante à aquisição de dados sísmicos, atividade esta que antecede a fase de produção e,

muitas vezes antecede até mesmo a assinatura dos PSC, a Indonésia passou a dar importância muito

maior a tais dados a partir da edição da Lei 22/2001. O art. 20 da Lei garante a propriedade de todos

os dados sísmicos do território indonésio ao Estado, garantindo, ainda, que tais dados deverão ser por

ele controlados. Por sua vez, o art. 15 da GR 35/2004 reflete o disposto na Lei, acrescentando, ainda,

que a utilização de tais dados será controlada pelo Ministério de Energia e Recursos Minerais. Em segui-

da, o art. 18 da GR 35 garante à OC exploradora de determinada área, o uso dos dados sísmicos de

sua área operacional, durante a validade de seu contrato. Cabe aqui salientar que o controle sobre as

informações sísmicas e geofísicas é um passo estratégico importante para deter maior controle sobre a

produção futura, dado que tais dados são fundamentais para determinar a exploração do território.

Por fim, temos, ainda, as disposições do art. 78 da GR 35/2004 que, além de reforçar que o

controle geral das operações de upstream deve estar a cargo da BP MIGAS nos PSC, confere a esta Agên-

cia poderes para assinar outros contratos que sejam subordinados ao Contrato de Cooperação. Como

exemplo de contrato subordinado ao Contrato de Cooperação podemos citar o JOA, já devidamente

analisado em tópicos anteriores.

Incentivos a Campos Marginais e Outros Programas de Incentivo à Produção

O Ministério de Energia e Recursos Minerais emitiu, em 25 de abril de 2005, a Regulamenta-

ção 008/2005 sobre o Programa de Incentivos a Campos Marginais. Tal regulamentação oferece às OC

o incentivo de recuperação adicional de 20% dos custos. A este incentivo é dado tratamento equivalente

a um crédito de investimento recuperável, porém tributável. Para a aplicação do incentivo, os campos

devem estar localizados em uma área de produção ativa e devem ter uma taxa de retorno de menos

de 15%, baseada nos termos e condições do PSC. Para usufruir do incentivo, as OC devem submeter

requerimento à BP MIGAS, apresentando os documentos necessários à comprovação de que aquele

determinado campo atende aos requisitos especificados da Regulamentação 008/2005.554

554 PRICEWATERHOUSECOOPERS – PWC; “Oil & Gas in Indonesia, Investment and Taxation Guide”, 2005, pág 39. Disponível em http://www.pwc.com; Acesso em 01/12/2008.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL322

A Regulamentação acima representa uma tentativa do Governo de, por meio de incentivos,

desenvolver a produção local, que se encontra atualmente em declínio. Os Contratos de Cooperação

denominados TAC e EOR, já devidamente analisados em tópico anterior, são outros exemplos de atua-

ção do Governo no sentido de aumentar a produção de hidrocarbonetos.

I.3.3.2.4.5 Controles e Limites para a Comercialização

Desde os primeiros modelos de PSC na Indonésia, podemos constatar a existência de mecanis-

mos para controle e limite da comercialização do petróleo extraído, tanto na legislação nacional, quanto

no próprio modelo de PSC.

DMO

Nesta linha de raciocínio, o § 1º, do artigo 22 da Lei, institui um mecanismo denominado de

DMO (Domestic Market Obligation) que estabelece o compromisso das OC de vender até 25% (vinte e

cinco por cento) de sua participação (profit oil mais cost oil), para satisfazer a demanda doméstica.

O petróleo a ser vendido ao mercado nacional deve ser calculado, a cada ano, com base no

menor dos seguintes critérios:

• 25% da parte pertencente à OC antes da incidência de impostos ou de sua participação

da quantidade total de petróleo produzido na área outorgada; ou

• Os resultados da multiplicação da participação padrão da OC no petróleo produzido na

área outorgada previamente estabelecida por uma fração pela qual o numerador é a

quantidade total de petróleo a ser entregue ao Mercado Nacional e o denominador é a

produção total de petróleo da Indonésia de todas as OC com as quais a BP MIGAS esta-

beleceu contrato de PSC, multiplicados pela participação da OC.

Em virtude do exposto, é possível que o petróleo a ser vendido pela aplicação do DMO constitui

inteiramente a parte da OC referente ao “profit oil”. Porém, no caso de não haver produção suficiente

para satisfação da quota do DMO, não haverá compensação deste montante nos anos seguintes.

Cumpre mencionar que o conceito do DMO também é contemplado nos atuais PSC, estando

previsto que, nos primeiros 5 (cinco) anos após o início da produção comercial da área outorgada, a

OC deverá vender o seu “profit oil” destinado à DMO a preço de mercado. Após tal período, o petróleo

deverá ser vendido com um determinado desconto aplicado ao referido preço de mercado.

Apesar de ser contemplado, tanto na Lei como nos PSC, as OC afirmam existir certa obscuri-

dade com relação ao DMO, sendo que as questões usualmente levantadas são: (i) a quantidade exata

da produção que deve ser destinada ao mercado nacional a título de DMO, (ii) se o Governo honrará

o disposto nos PSC já assinados, (iii) dúvidas relativa às sanções contratuais, e (iv) correta incidência de

impostos.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 323

Preço-base para venda

Ao longo da década de 80, o preço-base utilizado para a venda do barril durante os primeiros

5 anos de produção era de, obrigatoriamente, US$ 0,20 por barril, o que prejudicava a rentabilidade

das OC durante os primeiros anos produtivos.

Atualmente, o preço-base utilizado ao longo de todo o período do PSC é o Preço Médio Pon-

derado (Weighted Average Price).

Não obstante o Preço Médio Ponderado, já sabemos que, pelo regime de PSC, a OC é re-

munerada na forma de cost oil e profit oil, o que torna necessário determinar um preço para conversão

do barril de petróleo em dólares, para fins de recuperação dos custos pelo cost oil. Este preço é obtido

pelos “Preços do Petróleo Indonésio” – Indonesian Crude Prices (IPC), publicado pela Asian Petroleum Price

Índex. O IPC é divulgado mensalmente pela BP MIGAS, com base na variação média do preço da cesta

contendo tipos de petróleo comercializados internacionalmente.

Para fins de divisão da produção e cálculo dos impostos, utiliza-se uma cesta média do IPC,

sendo que esta forma de cálculo nem sempre acompanha corretamente as flutuações significativas nos

preços do petróleo e, portanto, é considerada deficiente pelas OC555.

Existe, ainda, outro mecanismo de Controle da Comercialização na Indonésia, que é a limita-

ção na venda do petróleo da BP MIGAS pela OC.

Neste âmbito, os acordos de PSC, atualmente utilizados na Indonésia, prevêem que a OC

poderá receber e exportar livremente sua participação no petróleo, com ressalvas apenas em relação à

questão da DMO anteriormente analisada.

Ademais, quando autorizada pela BP MIGAS, a OC poderá vender parte ou a integralidade

da produção destinada à Agência Executora para terceiros. Se, no procedimento de venda, a BP MIGAS

encontrar comprador disposto a pagar valor maior do aquele obtido pela OC pelos barris de petróleo

produzidos, a BP MIGAS poderá, com 90 (noventa) dias de antecedência, notificar a OC de que pretende

vender seu petróleo ao comprador que ofereceu a maior quantia.

Recebida a notificação pela OC, caso esta possua interesse em igualar a oferta feita pelo com-

prador, deverá então notificar a BP MIGAS com 45 (quarenta e cinco) dias de antecedência da venda.

Desta forma, a OC poderá continuar a vender todo o montante de petróleo produzido, incluindo a parte

da BP MIGAS, ao comprador de sua escolha.

I.3.3.2.4.6 Conteúdo Local e Outras Formas de Incentivo à

Cadeia Produtiva Local

Embora a Lei nº 44/1960 não possua nenhuma previsão expressa quanto à necessidade de

preferência na contração de mão-de-obra, bens e serviços nacionais, desde o primeiro modelo de PSC,

na década de 1960, existe o conceito de proteção e incentivo da indústria nacional.

Podemos citar como exemplo o dispositivo existente no modelo original de PSC, que previa a

possibilidade da NOC solicitar que a OC ofereça 5% de sua participação em um bloco a uma empresa

da indonésia, a ser designada pela própria NOC.

555 PriceWaterhouseCoopers; “Oil & Gas INDONESIA Investment and Taxation Guide”, 2005, pág 35

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL324

Cumpre aqui esclarecer que o referido dispositivo estabelece, que tal solicitação devia ser feita

em até três meses após a primeira declaração de Descoberta Comercialmente Viável feita pela OC, deven-

do a empresa da indonésia ressarcir à OC 5% dos custos arcados pela mesma até aquele momento556.

Essa cláusula visa garantir à uma empresa local a possibilidade de ganho de expertise, incen-

tivando o crescimento da pesquisa e desenvolvimento industrial nesta área, ao invés de concentrar todo

o conhecimento em mãos estrangeiras.

Não houve maiores novidades na Indonésia a respeito de conteúdo local ou incentivo à cadeia pro-

dutiva local até a edição da Lei, que em seu artigo 3º prevê que a implementação de atividades relacionadas

à esfera petrolífera deve ter como parte de seus objetivos o crescimento da renda estatal e a máxima contri-

buição à economia nacional e ao desenvolvimento e fortalecimento da indústria e dos negócios indonésios.

Neste sentido, o mesmo diploma legal dispõe que as OC devem priorizar o uso da mão-de-

obra, bens e serviços locais, desde que estes sejam transparentes e competitivos.

Conforme se percebe, tais dispositivos são bastante vagos, não determinando percentuais ou

mesmo indicando órgãos de fiscalização, como ocorre em outras nações.

Devido a esta ausência de precisão, a GR 35/2004 buscou aprofundar e detalhar, dentre ou-

tras, as questões relativas à contração de serviços e compra de materiais pelas OC. Assim, seu art. 78

determina que seja dada prioridade ao uso de tecnologia, bens e serviços, incluindo aqueles relativos

a design e engenharia, sempre que os mencionados itens possuírem preço, prazo e qualidade iguais

àqueles providos pelos fornecedores estrangeiros.

Conforme já demonstrado anteriormente, é característica comum aos países que adotam o re-

gime de PSC, relegar ao próprio instrumento contratual muitas das disposições que, em outros regimes,

constam de texto legal.

Dessa forma, faz-se importante mencionar que o próprio PSC também prevê, em item especí-

fico, tanto a necessidade da preferência, por parte da OC, de contratação da mão de obra, serviços e

bens locais, quanto a obrigação de treinar os trabalhadores, inclusive para cargos de gerência e chefia,

sendo que os gastos com treinamento podem ser incluídos como custos operacionais.

Ademais, a competência para supervisão do cumprimento do disposto em lei, incluindo o uso dos

bens, serviços e tecnologia domésticos passou a ser diretamente do Ministro de Energia e Recursos Minerais.557

Não obstante, outra forma de incentivo à cadeia produtiva se dá através do controle de im-

portação de produtos, uma vez que qualquer importação de bens e equipamentos exige aprovação do

Ministério de Energia e Recursos Minerais, do Ministério das Finanças e de quaisquer outros ministérios,

cuja área de atuação inclua comércio exterior.

Além disso, bens e equipamentos, serviços, tecnologia, engenharia e design só podem ser

importados se não estiverem disponíveis similares no país.

A administração de bens e serviços é de competência da BP MIGAS e quaisquer excessos de bens e

equipamentos devem ser transferidos a outras OC atuantes na Indonésia, com a devida aprovação da men-

cionada Agência Executora, do Ministério de Energia e Recursos Minerais e do Ministério das Finanças.

Cabe lembrar que todos os bens e equipamentos usados nas atividades de exploração devem

ser entregues ao Governo quando do término do PSC, uma vez que todos os bens e equipamentos ad-

quiridos pela OC tornam-se de propriedade do Estado ao final do PSC.

556 TAVERNE, Bernard; “Petroleum Industry and Governments”, 2a edição; Wolters Klower, Holanda, 2008, pág 259.557 PriceWaterhouseCoopers; “Oil & Gas INDONESIA Investment and Taxation Guide”, 2005, pág 35

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 325

I.3.3.2.4.7 Regras sobre Unitização

O primeiro diploma legal a versar sobre o tema Unitização na Indonésia foi o Decreto 402 de

1967, cujo art. 2º dava ao Diretor Geral558 poderes para determinar a distribuição de custos de produ-

ção entre áreas operacionais, no caso de as partes não chegarem a um acordo mútuo.

Baseando-se no art. 7 da Lei 44/1960, que dispõe que as OC são proibidas de realizar ativi-

dades de exploração e produção fora de suas respectivas áreas operacionais, o referido decreto dispõe

que, no caso de uma mesma reserva abranger mais de uma área operacional, as operações devem ser

desenvolvidas de forma unificada.

No entanto, na medida em que a proibição existia apenas para impedir que as OC atuassem fora

de suas respectivas áreas, sendo a regulamentação vaga em diversos outros aspectos, ficava subentendido que

cada OC poderia produzir na porção daquela reserva que estivesse dentro de sua área de trabalho, drenan-

do-a, por conseqüência, até que uma decisão final fosse tomada pelo Governo através do Diretor Geral559.

Recentemente, com a promulgação da Lei e a consequente revogação da Lei 40/1961 e do

Decreto 402/1967, o tema Unitização ficou novamente pendente de regulamentação. Considerando

que a Lei não tem qualquer estipulação a respeito do tema, esta lacuna foi suprida com a GR 35/2004,

que abordou a questão da Unitização de áreas em seus arts. 40 a 43.

O art. 40 da GR 35/2004 dispõe que a OC deve notificar o Ministério de Energia e Recursos

Minerais através da BP MIGAS, quando se evidenciar que determinada reserva se estende além da

área operacional, adentrando a área de outra OC ou o território de outro país. Em seguida, o art. 41

determina que: (i) quando se evidenciar que uma reserva invade a área operacional regida por outro

PSC, as OC devem iniciar o processo de unitização; (ii) quando a reserva se estender para além da área

de operação de um PSC, atingindo uma área livre, não operacional, a unitização deve apenas ocorrer

quando esta área livre se tornar uma área operacional; (iii) no caso de, após 5 anos a área livre não ter

se tornado uma área operacional, a OC pode requerer à BP MIGAS a extensão proporcional de sua área

operacional; e (iv) todos os processos de unitização requererem aprovação do Ministro.

Cabe aqui ressaltar que a problemática existente no Decreto 402/1967, e discutida anteriormen-

te, de certa forma permaneceu válida em virtude da redação do art. 41, que permite à OC operar uma

reserva que se estenda a uma área livre, enquanto esta não se tornar uma área operacional. Em outras

palavras, na prática, a extensão da área operacional da OC, que pode ser requerida após cinco anos, so-

mente servirá para formalizar a produção de determinada reserva que, de qualquer forma, já vinha ocor-

rendo por meio de poços dentro da área operacional original. Por outro lado, caso a área livre que contém

porção da reserva venha a ser explorada por outra OC, não há qualquer estipulação de como ocorrerá

esta unitização entre uma OC que já está produzindo, e outra OC que passou a deter a área contígua.

Voltando à GR 35/2004, o art. 42, por sua vez, determina que cabe ao Ministro indicar qual

operador deverá conduzir as operações unificadas, baseando-se no acordo entre os contratados apro-

vado pela BP MIGAS. O dispositivo legal em questão não indica quais os critérios que devam ser utiliza-

dos para seleção do operador, no caso de as partes não chegarem a um acordo.

No caso da reserva se estender através do território de outro país, consoante o art. 43, o acor-

do entre as OC será determinado pelo Ministro de Energia e Recursos Minerais que, por sua vez, deverá

se basear nos termos do acordo firmado entre o Governo da República da Indonésia e o Governo do

outro país em questão, considerando, ainda, o máximo benefício ao Estado.

558 Nota do Autor: “Diretor Geral” é uma nomenclatura utilizada na Lei 40/1961 para designar a autoridade responsável pela supervisão e controle das atividades de upstream, função que atualmente está a cargo da Entidade Executora (BP MIGAS).

559 ASMUS, David & WEAVER, Jacqueline; “Unitizing Oil and Gas Fields Around the World: A Comparative Analysis of National Laws and Private Contracts”, University of Houston Law Center, 2006, pág. 51.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL326

I.3.3.2.5 Análise Financeira do Regime Fiscal

Ao longo dos anos, a Indonésia adotou distintas “gerações” de contratos de partilha de pro-

dução, com condições que foram mudando, conforme descrito anteriormente e aprofundado na seção

“Possuir flexibilidade em situações distintas de risco exploratório/operacional/produtivo”. Considerando-se

as análises econômico-financeiras apresentadas nesta seção, escolheu-se um contrato da última gera-

ção em uma área offshore, por ter maior similaridade com o caso brasileiro.

Principais termos do contrato de partilha de produção offshore na área indonésia de Tarakan560:561

Termo Detalhes

Duração do contrato 30 anos (inclui 10 anos para pesquisa)

Bônus de assinatura US$ 675.000O bônus de assinatura não é amortizável nem recuperável

Bônus de produção

Estabelece que a OC deve pagar os seguintes bônus de produção: (i) US$1.000.000 no momento em que atingir uma produção acumulada de 25 milhões de barris de petróleo equivalentes (boe)(ii) US$2.000.000 no momento em que atingir uma produção acumulada de 50 milhões de barris de petróleo equivalentes (boe)(iii) US$3.000.000 no momento em que atingir uma produção acumulada de 100 milhões de barris de petróleo equivalentes (boe)Os bônus de produção não são amortizáveis nem recuperáveis

Participação da BP MIGAS no contrato

Estabelece que o Governo tem o direito de requerer 10% de participação da BP MIGAS no contrato depois do ocorrido o primeiro descobrimento comercial. Nesse caso, a BP MIGAS deve repagar à OC o 10% de todos os investimentos e custos feitos até o momento (incluindo o bônus de assinatura) e investir conjuntamente com a OC de acordo com sua porcentagem no campo (para os efeitos da modelagem, assumiu-se 0%)

Royalties (“First Tranche Petroleum”) A BP MIGAS tem o direito de receber 10% do Petróleo Bruto e Gás Bruto (“First Tranche Petroleum”) antes que se faça qualquer uso dos mesmos

Depreciação de custos de capital tangíveis 4 anos, segundo metodologia linear (existem, porém, algumas exceções de custos que são depreciadas em 2 anos, também segundo metodologia linear)

Depreciação de custos de capital intangíveis 1 ano

Utilização de Petróleo Bruto e cálculo do Petróleo-Lucro

O Petróleo Bruto tem as seguintes destinações, em ordem de prioridade:(a) Royalties (FTP)(b) Recuperação de custos de petróleoApós feita essa alocação, o remanescente é considerado Petróleo-Lucro

Utilização de Gás Bruto e cálculo do Gás-Lucro

O Gás Bruto tem as seguintes destinações, em ordem de prioridade:(a) Royalties (FTP)(b) Recuperação de custos de gásApós feita essa alocação, o remanescente é considerado Gás-Lucro

Limite de Petróleo Bruto e Gás Bruto para a recuperação de custos (cost oil limit)

Sem limite depois de aplicados os royalties (FTP). O excesso de custo não recuperado é transferido, sem limites, para o próximo período

Obrigação de vender petróleo ao mercado local (Domestic Market Obligation - Oil)

Sempre que houver Petróleo-Lucro, a OC deve vender, para abastecimento do mercado doméstico, 25% da sua participação no mesmo ao Governo de Indonésia. O preço de venda será: (i) 100% do preço de mercado durante os primeiros cinco anos depois de iniciada a produção, e (ii) 25% do preço de mercado a partir do sexto ano depois de iniciada a produção

Obrigação de vender gás ao mercado local (Domestic Market Obligation – Natural gas)

Sempre que houver Gás-Lucro, a OC deve vender, para abastecimento do mercado doméstico, 25% da sua participação ao Governo de Indonésia. O preço de venda deverá ser igual ao preço médio de um contrato de gás no mercado.

Divisão do Petróleo-Lucro (profit oil split) 44,7% OC / 55,3% BP MIGAS (Governo)

Divisão do Gás-Lucro (profit natural gas split) 71,5% OC / 28,5% BP MIGAS (Governo)

Imposto de renda (Alíquota Combinada) 44%

Fonte: Petrocash

560 www.petrocash.com561 Esta obrigação de vender ao Governo petróleo a preço descontato é, indiretamente, uma forma de taxação.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 327

I.3.3.2.5.1 Análise dos objetivos do Governo

Maximizar receitas governamentais (Government Take):

No modelo analisado, a arrecadação do Governo através do Petróleo-Lucro é alta, com a BP

MIGAS ficando sempre com mais da metade do mesmo. A Figura I.107 mostra a arrecadação por tipo

de receita para um “campo grande em águas profundas”562 a preços de US$50/bbl e permite observar

a predominância do Petróleo-Lucro do Governo.

Figura I.107: Arrecadação do Governo por tipo de receita para um campo grande de águas profundas em um cenário de preço a US$50/bbl

Fonte: Elaboração Bain & Company

Um ponto positivo para o Governo é que o modelo “diversifica” as fontes de receitas, permitin-

do-lhe arrecadar também em cenários de preços desfavoráveis. Conta-se, por um lado, com fontes ou

impostos que dependem do lucro do campo (Petróleo-Lucro, Imposto de renda, Lucro por venda prefe-

rencial da OC ao mercado interno) e, por outro lado, com fontes ou impostos que são independentes do

lucro do campo (First Tranche Petroleum e os bônus). A utilização destes últimos permite que o Governo

comece a compartilhar indiretamente parte da produção antes que a OC tenha recuperado a totalidade

de seus custos.

A Figura I.108 mostra a evolução do government take (linha vermelha) e os fluxos de caixa

acumulados não descontados para a OC e o Governo (barras). Pode-se observar que o government take

parte de 86,5% para um preço de US$25/bbl e começa a cair muito lentamente até atingir 80,6% para

um preço de US$125/bbl.

562 O “campo grande de águas profundas”, utilizado como exemplo para avaliação financeira do regime, é descrito em detalhes no Anexo I.1.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL328

Figura I.108: Government Take e fluxos de caixa acumulados não descontados para um campo grande de águas profundas

Fonte: Elaboração Bain & Company

O government take, apesar de mostrar leve queda, mantém-se em níveis sempre altos e outor-ga ao Governo uma participação praticamente constante ao longo do tempo. Dessa forma, observa-se um comportamento contrário ao objetivo de destinar fluxos de caixa maiores à OC quando o lucro do campo é baixo e fluxos de caixa menores quando o lucro do campo é alto.

A falta de flexibilidade é conseqüência da forma como o modelo é desenhado; a fonte princi-pal de arrecadação do Governo (o Petróleo-Lucro do Governo) é estabelecida como uma porcentagem fixa (55,3%) do Petróleo-Lucro, independente de qualquer outra variável. Na prática, a porcentagem real do Petróleo-Lucro para o Governo é ainda maior, pois a OC tem a obrigação de vender ao mercado doméstico (Domestic Market Obligation) parte de seu Petróleo-Lucro a um preço diferencial.

Ao analisar o government take para um “campo pequeno em águas profundas”563 se obtém conclusões similares. Na Figura I.109 pode-se observar a tendência de leve queda, com estabilização na faixa de 80- 81% para preços altos do petróleo.

Figura I.109: Government Take e fluxos de caixa acumulados não descontados para um campo pequeno de águas profundas

Fonte: Elaboração Bain & Company

563 O “campo pequeno de águas profundas”, utilizado como exemplo para avaliação financeira do regime, é descrito em detalhes no Anexo I.1.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 329

Mais uma vez são verificados valores altos do government take para todo o intervalo de preços. Neste caso, porém, a OC obtém fluxos de caixa acumulados negativos para preços menores que US$33/bbl e, por conseguinte, o government take fica superior a 100%. A OC não começaria um projeto nesse cenário de preços, mas continuaria marginalmente produzindo se esses níveis fossem atingidos uma vez que os investimentos de capital principais já teriam sido feitos.

Incentivar a melhoria do desempenho operacional:

Melhorias nos custos operacionais geram impacto positivo no VPL da OC, conforme mostra a sen-sibilidade feita para um campo grande de águas profundas na Figura I.110. Existem incentivos para que as operações sejam mais eficientes e eles são tanto maiores quanto menor for o preço de petróleo, dado que para preços mais baixos o impacto dos custos operacionais no lucro é proporcionalmente maior.

Figura I.110: Variação do VPL da OC para variações nos custos operacionais variáveis em um campo grande de águas profundas

Fonte: Elaboração Bain & Company

O Governo também se vê beneficiado por tais ações, já que menores custos geram maior Petróleo-

Lucro. A Figura I.111 mostra a variação do VPL do Governo para alterações nos custos operacionais variáveis.

Figura I.111: Variação do VPL do Governo em relação à variação de custos operacionais variáveis sob diferentes cenários de preço no “campo grande em águas profundas”

Fonte: Elaboração Bain & Company

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL330

Controlar a produção:

Complementando o já elaborado na seção I.3.3.2.4.4, estabelece-se contratualmente que a OC

é responsável pela execução das operações petrolíferas e a BP MIGAS pelo gerenciamento das mesmas. A

OC deve, três meses antes do começo de cada ano, preparar e entregar um plano de trabalho para apro-

vação da BP MIGAS. Este plano deve incluir, entre outras coisas, a produção orçada e os custos estimados

para o próximo ano. Durante os 30 dias após o recebimento do plano de trabalho, a BP MIGAS tem o

direito de propor revisões de pontos específicos sempre que forem justificadas. Estabelece-se que ambas as

partes devem se reunir o quanto antes para discutir as revisões propostas pela BP MIGAS e, após aprovado

o plano de trabalho, a OC deve segui-lo da melhor maneira possível.

Além da obrigação anual explicada no parágrafo anterior, estabelece-se que a OC e a BP MI-

GAS devem se encontrar periodicamente para discutir a condução das operações petrolíferas e, se existi-

rem problemas derivados das mesmas, as partes deverão resolvê-los de forma amigável. Porém, se isso

porventura não acontecer, deverá submeter a disputa à arbitragem.

Com estas cláusulas, o Governo se assegura do controle da produção, mas deixa a possibilidade

de ter que chegar até arbitragem, caso haja diferenças entre suas decisões e as da OC.

Minimizar investimento próprio:

Para a modelagem do contrato em questão, assumiu-se que todos os investimentos são feitos

pela OC. Porém, o Governo tem o direito de demandar 10% de participação da BP MIGAS no contrato e,

se esse for o caso, a BP MIGAS deve investir conjuntamente com a OC desde o início da exploração do

campo. Desta maneira, o contrato dá flexibilidade ao Governo e lhe permite minimizar investimentos pró-

prios (0% de participação da BP MIGAS) ou investir proporcionalmente (10% de participação da BP MIGAS)

se decidir tomar o risco do projeto.

Preservação ambiental:

No contrato há três claras referências às obrigações da OC com relação ao meio ambiente.

Especificamente, a OC deve:

• Realizar um estudo do meio ambiente antes do início das atividades;

• Tomar todas as precauções necessárias para proteger os sistemas ecológicos, a navegação e

a pesca, e prevenir a poluição extensiva na área, mar ou rios como conseqüência direta do

resultado das operações petrolíferas;

• Remover todos os equipamentos e instalações quando da finalização do contrato, abandono

da área ou término do projeto antes do previsto. As atividades de restauração devem ser

realizadas conforme a regulação do país de maneira tal que previna danos e perigos à vida

humana e ao meio ambiente, seguindo um processo que deverá ser aceitável para a BP

MIGAS e o Governo da Indonésia.

Geração de empregos locais e desenvolvimento e aporte tecnológico local:

Complementando as informações já descritas na seção I.3.3.2.4.6, como medida de favore-

cimento local o contrato estabelece que a OC concorde em empregar profissionais locais qualificados.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 331

Após o início da produção, a OC deve treinar todos os profissionais indonésios de posições operacionais

e administrativas (incluindo executivos), responsabilizando-se por preparar e conduzir tais programas.

Todos os custos e despesas decorrentes do recrutamento e formação de profissionais indonésios podem

ser recuperados como despesas de produção.

Adicionalmente, estabelece-se que a OC deve considerar conjuntamente com a BP MIGAS um

programa de treinamento para o pessoal do Governo da Indonésia ou da própria BP MIGAS. Neste caso,

estabelece-se que a forma de pagamento dos custos e despesas decorrentes do programa será acordada

entre o Governo da Indonésia, a BP MIGAS e a OC.

Finalmente, a OC deve dar preferência à compra de materiais e serviços produzidos na Indoné-

sia ou administrados por indonésios, sempre que os mesmos sejam oferecidos em condições de qualidade,

preço e disponibilidade igualmente vantajosas aos oferecidos em outros mercados. Não há, neste sentido,

nenhum prejuízo para a OC.

I.3.3.2.5.2 Análise dos objetivos da OC

Maximizar o VPL do investimento:

Para a OC obter VPL positivo são necessários preços do barril de petróleo maiores que US$35/

bbl em campos grandes, e maiores que US$60/bbl em campos pequenos, conforme mostra a Figura

I.112. Isso representa um ponto fraco do modelo, pois a viabilidade dos campos menores é questionável.

Em um cenário de preços mais altos, os VPL são maiores e a OC se beneficia indefinidamente

e a uma mesma “velocidade”, como pode-se observar pela inclinação das linhas na Figura I.112. Essa

“velocidade”, ou inclinação das linhas, é maior para os campos pequenos que para os grandes.

Para o Governo, o beneficio do VPL também é constante e maior que para a OC, conforme

mostrado na Figura I.113.

Figura I.112: VPL da OC para distintos cenários de preços em distintos tipos de campos

Figura I.113: VPL para distintos cenários de preços em “campo grande em águas profundas”

Fonte: Elaboração Bain & Company

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL332

Recuperar o investimento o quanto antes possível:

O contrato em questão não contempla mecanismos especiais que acelerem a recuperação do investi-mento por parte da OC, demorando-se 14 e 12 anos para preços de 25 e US$50/bbl respectivamente (Figura I.114 e Figura I.115) quando se consideram campos grandes em águas profundas. Poder-se-iam diminuir esses prazos se o contrato contemplasse mecanismos como uplift de custos ou aumento da distribuição do Petróleo-Lucro para a OC durante os primeiros anos de produção, como vistos em outros regimes avaliados neste relatório.

Figura I.114: Fluxos de caixa para preços de US$25/bbl em “campo grande em águas profundas”

Figura I.115: Fluxos de caixa para preços de US$50/bbl em “campo grande em águas profundas”

Fonte: Elaboração Bain & Company

Assegurar TIR mínima:

Como se viu anteriormente, a inflexibilidade do modelo gera complicações para os campos pequenos tornando-os rentáveis só para preços superiores a US$/60bbl. A Figura I.116 mostra a TIR da OC e permite observar que a faixa limite564 dos campos pequenos só é ultrapassada a partir desse patamar. O regime tem a fraqueza de não assegurar uma taxa mínima de retorno para a OC, e tampouco lhe limitar o ganho em cenário de preços maiores.

Figura I.116: Simulação da sensibilidade do preço do petróleo sobre a TIR para os diferentes cenários avaliados

Fonte: Elaboração Bain & Company

564 A faixa limite é explicada no Anexo I.1.

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL 333

Possuir flexibilidade em situações distintas de risco exploratório/operacional/produtivo:

Ao longo dos anos, o Governo da Indonésia foi se adaptando aos distintos contextos mundiais e às

condições particulares de sua indústria petrolífera, oferecendo às OC diferentes tipos de contratos de partilha

de produção, conforme a época. Desde o ano 1965 existiram basicamente quatro gerações de contratos:

Primeira geração (1965-1975). Foram contratos que continham, entre outras, as seguintes

condições econômicas:

• 40% de limite de Petróleo Bruto e Gás Bruto para a recuperação de custos

• Divisão do Petróleo-Lucro e Gás-Lucro de 35% para a OC e 65% para PERTAMINA (Go-

verno)

• Obrigação da OC de entregar ao mercado local (Domestic Market Obligation) 25% da sua

porção de petróleo a um preço de US$0,20/bbl

Segunda geração (1976-1988). Foram contratos que continham principalmente as seguintes

condições econômicas:

• Sem limite de Petróleo Bruto e Gás Bruto para a recuperação de custos

• 20% de uplift para custos de capital tangíveis

• Custos de capital depreciados em 7 anos

• Divisão do Petróleo-Lucro de 34.09% para a OC e 65.91% para PERTAMINA (Governo) e

do Gás-Lucro de 68.19% para a OC e 31.82% para PERTAMINA (Governo)

• Domestic Market Obligation da OC de 25% sobre sua porção do Petróleo-Lucro e a um

preço de US$0,20/bbl, exceto durante os primeiros 5 anos de produção em que o preço

definido era equivalente ao de exportação

Terceira geração (1988-2001). Foram contratos que continham, entre outras, as seguintes

condições econômicas:

• Inclusão do First Tranche Petroleum de 20% ou 15% da produção, compartilhada entre a

OC e a PERTAMINA na mesma proporção que a divisão do Petróleo-Lucro e Gás-Lucro

• Alteração do preço do Domestic Market Obligation para 10% do preço do mercado inter-

nacional

• Melhorias nas condições contratuais para as áreas denominadas “de fronteira” pela PER-

TAMINA, outorgando à OC uma maior porcentagem do Petróleo-Lucro com o objetivo de

incentivar o desenvolvimento de regiões marginais. O método para repartir o Petróleo-

Lucro nessas áreas foi em função da produção diária de barris de petróleo (bopd) e se es-

tabeleceu uma porcentagem final depois de impostos para as partes da seguinte maneira:

75% Governo/25% OC para 0 < bopd < 50.000; 80% Governo/20% OC para 50.000 <

bopd < 150.000; 85% Governo/15% OC para 150.000 < bopd

RELATÓRIO I - REGIMES JURÍDICO-REGULATÓRIOS E CONTRATUAIS DE E&P DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL334

Quarta geração (2001-Atual). Foram contratos que continham, entre outras, as seguintes

condições econômicas:

• Diminuição do First Tranche Petroleum até 10%, que é conferido a BP MIGAS em sua tota-

lidade

• Melhora do preço do Domestic Market Obligation para 25% do preço do mercado interna-

cional

• Possibilidade de negociar, caso a caso, a divisão do Petróleo-Lucro entre a OC e a BP

MIGAS

Um exemplo desta quarta geração é o contrato descrito e utilizado ao longo desta seção.

Conclui-se que, mediante a estipulação de diferentes condições segundo o período e a área, as OC

puderam atingir mais flexibilidade em situações distintas de risco e contexto internacional. Entretanto,

a flexibilização do regime restringiu-se a mudanças de parâmetros ao longo do tempo realizadas pelo

Governo indonésio, não havendo grande flexibilidade para alterações dos mesmos para as diferentes

licitações realizadas no período de aplicação em cada geração.