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1 Aula 04 - A ÉTICA COMO COMPROMISSO TRANSVERSAL DOS ATORES SOCIAIS NAS RELAÇÕES DE PRODUÇÃO E CONSUMO DE BENS DE SERVIÇOS E CIDADANIA AULA 04 A ÉTICA COMO COMPROMISSO TRANSVERSAL DOS ATORES SOCIAIS NAS RELAÇÕES DE PRODUÇÃO E CONSUMO DE BENS DE SERVIÇOS. RELAÇÃO INTERPESSOAL E ÉTICA

Relação Interpessoal e Ética - aula 04

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Relação Interpessoal e Ética - aula 04

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Aula 04 - A ÉTICA COMO COMPROMISSO TRANSVERSAL DOS ATORES SOCIAIS NAS RELAÇÕES DE PRODUÇÃO E CONSUMO DE BENS DE SERVIÇOS E CIDADANIA

AULA 04A ÉTICA COMO COMPROMISSO

TRANSVERSAL DOS ATORES SOCIAIS NAS RELAÇÕES DE PRODUÇÃO E CONSUMO

DE BENS DE SERVIÇOS.

RELAÇÃO INTERPESSOAL

E ÉTICA

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‘ATORES SOCIAIS E SEU PAPEL DENTRO DO CENÁRIO DE PRODUÇÃO E CONSUMO DE BENS E SERVIÇOS

Nos tópicos anteriores, nos deparamos com a ética nos relacionamentos interpessoais de uma forma geral e no convívio dentro do nosso ambiente de trabalho, analisando todos os envolvidos com a instituição, sejam eles agentes internos ou externos. A ética e as ações de cidadania também fizeram parte de nossos discursos.

Percebemos a globalização como um processo que, em boa parte, derivou-se com a evolução da tecnologia e assim como trouxe muitos aspectos positivos para todas as áreas, também acarretou divergências quanto ao seu uso.

Neste tópico, faremos reflexões sobre como esses assuntos estão relacionados entre si e, principalmente, em como os atores sociais têm um papel importante dentro do cenário de produção e consumo de bens e serviços.

CAPITALISMO E REVOLUÇÃO DIGITAL

Para que possamos compreender melhor a nova organização de trabalho na qual estamos inseridos, precisamos rever o resultado da combinação proporcionada pela Revolução Digital com o Capitalismo.

Na era da Revolução Industrial os trabalhadores estavam engessados em linhas de produção, sem uma qualificação adequada e definida. Com o encontro do capitalismo com a era digital, esses empregados se transformaram em “sócios”, participantes ativos no controle da produção, colaborando de maneira incisiva com os gestores que agora não são mais soberanos nesse cenário empresarial.

Muitos fatores tornam evidente essa mudança de comportamento dentro das instituições. Veremos, a seguir, alguns dos principais:

• Os trabalhadores participam dos lucros e resultados obtidos pela empresa.

• Os trabalhadores representam atualmente a maior fatia de investidores dos fundos de pensão criados por eles.

Voltamos então a Revolução Digital como sendo um fator decisivo no que diz respeito à transição de um capitalismo totalmente voltado aos interesses dos proprietários, em geral os detentores do capital da empresa, para uma forma de capitalismo voltada à satisfação dos demais stakeholders da empresa. Não podemos deixar de perguntar como duas forças distintas, como a do lucro e da responsabilidade social, convivem dentro de um cenário único?

A força da responsabilidade social insurge no cenário capitalista de maneira

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histórica, por meio de movimentos realizados por trabalhadores, consumidores, usuários, políticos e contribuintes em prol da cidadania.

Segundo SROUR (2000, p. 188), a força e permanência da responsabilidade social praticada pelas instituições está assentada sobre 3 (três) pilares, são eles:

1. A existência de um mercado concorrencial;

2. A mobilização incessante da sociedade civil;

3. A disponibilidade de instrumentos de pressão, como a mídia plural, as agências de defesa dos consumidores e a Justiça atuante.

Em um mercado concorrido, empresas que tomam atitudes socialmente responsáveis estão, ao menos, adequadas. Essa forma de conduta é, de certa maneira, adquirida pela pressão dos indivíduos que utilizam órgãos competentes para acionar esses gatilhos dentro das instituições.

Parece que enquanto essas forças estiverem atuando sobre as empresas, elas estarão mobilizadas em busca de atitudes socialmente responsáveis, mesmo que essas ações não estejam de acordo com suas convicções, pois, nem sempre atos socialmente responsáveis são compatíveis com lucros.

“Em julho de 1999, a GM foi condenada, em primeira instância, por um júri de Los Angeles (Califórnia), a pagar a soma astronômica de US$ 4,9 bilhões a seis pessoas que sofreram queimaduras em 1993. A picape Chevrolet Malibu 1979 que ocupavam pegou fogo, depois de ter sido atingida na traseira por um carro a 80 quilômetros por hora. A motorista saiu relativamente ilesa, mas seus quatro filhos e sua amiga sofreram queimaduras desfiguradoras. Mais tarde, este valor foi reduzido para US$ 1,2 bilhão”.

Os advogados de defesa convenceram os jurados de que a montadora:

a) Sabia que este tipo de carro não era seguro por causa do tanque de combustível;

b) Conhecia os meios para torná-lo menos perigoso;

c) Preferiu poupar entre quatro e doze dólares a mais por veículo a fazer as modificações necessárias.

Para tanto, os advogados valeram-se de documentos internos da própria GM, entre os quais o famoso memorando que estimava que cada vida humana “tem valor de US$ 200 mil”.

Durante anos a GM lutou para manter o memorando fora dos tribunais, alegando que não refletia a política da corporação.

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Depois de 11 semanas de julgamento, o júri concluiu que o tanque de combustíveis do carro, localizado sob o porta-malas perto do pára-choque traseiro, era perigosamente vulnerável em colisões traseiras. E mais, que o tanque havia sido colocado lá pela GM para economizar custos. O juiz responsável pelo caso escreveu: “Este tribunal concluiu que evidências claras e convincentes demonstraram que o tanque de combustível foi colocado pela ré atrás do eixo dos automóveis do modelo e do tipo de carro em questão para maximizar lucros – em prejuízo da segurança das pessoas”1.

Atualmente, as montadoras destroem uma parcela dos carros que produzem em simulações de batidas. No Brasil, a cultura de mover ações contra essas empresas está sendo importada dos países mais desenvolvidos. Com isso, o país se apropriou desse artifício, a fim de evitar processos.

O recall, que consiste no chamado feito pelas montadoras por meio da mídia, para possíveis defeitos de fabricação dos automóveis segundo o número de série dos veículos, acontece raramente mas já é uma demonstração clara da preocupação dos empresários com a reação dos consumidores e da população.

Sob outra perspectiva dentro da visão de lucros, não parece que os acionistas gostam muito de ouvir que terão que abrir mão da venda dos seus produtos por erros de fabricação. O jeito é transformar essa atitude “necessária” em marketing institucional, estratégias com objetivos de vender a imagem e a marca da instituição ao invés de vender seus produtos.

PRINCÍPIOS ÉTICOS APLICÁVEIS NAS RELAÇÕES DE PRODUÇÃO E CONSUMO DE BENS E SERVIÇOS

Vamos começar falando um pouco sobre os principais aspectos da relação entre quem produz um bem ou serviço, a empresa, e quem o consome, os clientes.

O relacionamento entre eles passa por vários processos que vão desde o primeiro contato que o consumidor tem com o produto até possíveis problemas que o ele encontra após o adquirir.

Vamos estabelecer três momentos deste processo, a propaganda e o marketing, a venda e a pós-venda, e analisar a aplicação dos princípios éticos nesses momentos.

A ÉTICA NA PROPAGANDA E NO MARKETING

A propaganda é o meio pelo qual as empresas divulgam a existência de seus

1 Fonte: SROUR, Robert Henry. Ética Empresarial: Posturas responsáveis nos negócios, na políti-ca e nas relações pessoais. Rio de Janeiro: Campus, 2000.

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produtos-serviços, bem como todos os aspectos inerentes a eles que possam levar o consumidor ao ato da compra. A responsabilidade ética pelo anuncio é atribuída à empresa que produz o bem e não a agência que realizou a campanha promocional.

O que é uma propaganda ética?

Segundo MOREIRA (1999, p.54-55), uma propaganda ética atende aos seguintes requisitos:

• Apresenta ao público apenas a verdade a respeito do produto/ serviço;

• Não ofende a moralidade da sociedade a que se destina;

• Respeita a liberdade de escolha do ser humano;

• Não é escandalosa;

• Não usa os defeitos do produto/serviço do concorrente a seu favor;

• Não é enganosa ou abusiva.

Quando falamos de uma mensagem verdadeira sobre o produto, estamos também falando sobre a necessidade de não induzir o consumidor a creditar características a mercadoria que não existem.

É exatamente o que faz a propaganda enganosa, induz o consumidor ao erro em qualquer aspecto que possa ser decisivo no momento da aquisição ou consumo de um bem-serviço. Por exemplo, em aspectos relacionados ao tamanho do produto, ao material com o qual ele é confeccionado, a sua utilidade, ao preço, ao prazo de entrega ou ao seu uso ou aplicação.

Não é considerada uma propaganda ética aquela que se atém aos defeitos do produto-serviço concorrente muito mais do que a suas características e benefícios. Nesse caso, a liberdade de escolha do consumidor também está sendo comprometida.

Podemos caracterizar uma propaganda como escandalosa quando, ao mesmo tempo, o consumidor é levado a perceber mais as cenas que envolvem a campanha do que propriamente o produto em questão, seus instintos estão sendo mais estimulados do que a própria razão e a mensagem não possui uma relação direta com o produto-serviço que está sendo divulgado.

O marketing é constituído por um conjunto de ferramentas utilizadas pela empresa para que um produto-serviço seja amplamente aceito e consumido.

Conforme MOREIRA (1999, p.54-55), para ser considerado marketing ético a empresa precisa:

• Respeitar os princípios da livre concorrência, da propriedade intelectual e industrial dos concorrentes e os direitos do consumidor.

• Utilizar a verdade sobre o produto/serviço.

• Não reduzir a oferta do produto para criar falsos níveis de demanda, alterando assim as leis econômicas.

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• Não apelar para os sentimentos de piedade e solidariedade do ser humano.

• Não oferecer vantagens pessoais para quem tem o poder de decidir em nome das organizações.

• Não associar a compra de um produto ou serviço à obtenção de uma vantagem de valor desproporcional.

A VENDA ÉTICA

A venda é a somatória de forças dirigidas a um cliente para que ele adquira um produto-serviço. Entendemos como venda ética quando os argumentos utilizados para convencer o adquirente sejam verdadeiros, nenhum detalhe relevante sobre o produto-serviço seja omitido e não se é usado nenhum tipo de suborno no momento da decisão da compra.

A PÓS-VENDA

O SAC, serviço de atendimento ao consumidor, das empresas tem o seu foco no cliente que adquiriu o produto e não ficou plenamente satisfeito, detectou algum defeito nessa compra ou tem alguma sugestão para melhorar essa mercadoria. Essa preocupação da instituição está relacionada com o código de defesa do consumidor e com a imagem do item que está no mercado.

Posturas éticas frente a essas possíveis reclamações são tão importantes quanto o processo de divulgação e venda dos bens-serviços.

“Os sócios da “Realista Industrial e Comercial” decidiram fazer a empresa adotar e cumprir um Código de Ética. No período de implantação foi feita uma auditoria de revisão das práticas passadas, de forma a identificar claramente o que não poderia ser repetido.

Para facilitar a exposição dos fatos, os sócios da Realista concordaram em não fazer qualquer punição (nem mesmo em termos de avaliação) contra qualquer empregado ou dirigente que reportasse fatos passados durante os primeiros trinta dias de vigência do Código. Os sócios expuseram também que a “imunidade” evidentemente era só da empresa no seu relacionamento com o seu pessoal.

Em caso de crimes, a posição seria aquela que viesse a ser recomendada pelo jurídico. A primeira área que reportou um fato passado foi a de vendas.

Durante alguns meses, anos antes do advento do Código de Ética, o gerente de vendas havia pago comissões a um comprador de uma empresa cliente, do setor

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privado. Tal gesto entendia que no caso não ficava configurado o suborno, porque: (1º) o comprador fez um pacto verbal com os três principais fornecedores, dizendo a todos que somente receberia o mesmo percentual de qualquer um deles e, com isso, a comissão deixou de ser um diferencial da escolha; (2º) esse arranjo evitou que a Realista pagasse comissão ao seu próprio representante comercial, que não precisou atuar, no caso, em face do arranjo descrito; (3º) o pagamento foi feito com documentação hábil, de serviços de assessoria comercial, com fatura emitida por uma empresa pertencente ao primo do comprador”2.

• Analise as três razões apresentadas pelo gerente e avalie:

• A primeira razão desqualifica suborno?

• Sob o ponto de vista ético, as outras duas razões justificam?

CÓDIGO DE ÉTICA

Da mesma maneira que em uma sala de aula os alunos trazem consigo valores, crenças e formações morais distintas, em uma empresa os funcionários também possuem opiniões, formações e experiências diferentes.

O Código de Ética nada mais é do que a formatação de um padrão pela empresa sobre as condutas a serem seguidas por todos os seus componentes em seus relacionamentos e operações. Para que esse novo conceito seja cumprido integralmente pelos funcionários, as organizações modernas e competitivas administram constantes treinamentos e reciclagens, bem como a real punição dos que infringem essas normas.

POR QUE SER UMA EMPRESA ÉTICA?

O principal motivo é que esse é o comportamento exigido pela sociedade moderna. Segundo MOREIRA (1999, p. 21), “O único lucro moralmente aceitável é aquele obtido com ética”. A obtenção do respeito da população e da concorrência, assim como dos seus funcionários, também são motivos para que uma empresa atue de maneira ética dentro de uma comunidade.

2 http://1eadnusjt.blogspot.com/

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RESPONSABILIDADE SOCIAL

• Concorrência de mercado

• Sociedade civil mobilizada

• Instrumentos de pressão, como mídia e agências de defesa do consumidor

Tivemos o exemplo claro da GM de como o lucro para os empresários ainda é um fator preponderante sobre a responsabilidade social.

O QUE É RESPONSABILIDADE SOCIAL?

Podemos conceituar como sendo uma nova forma que as empresas estabeleceram de conduzir seus negócios, desenvolvendo projetos nas áreas mais distintas e com os mais diversos públicos. Firma uma parceria e uma co-responsabilidade no desenvolvimento social, apresentando uma preocupação com o público que o cerca, que já denominamos de stakeholders.

Segundo SROUR (2000), a responsabilidade social empresarial diz respeito à tomada de decisão orientada eticamente, condicionada pela preocupação com o bem estar da coletividade.

Vamos pensar um pouco. A organização está inserida na sociedade, portanto faz parte dela. No momento em que ela toma consciência disso e se engaja na busca constante da melhoria dessa comunidade todos ganham. As pessoas não estão mais aceitando comprar produtos ou serviços de empresas que tratam mal seus funcionários, que desrespeitam o meio ambiente ou que não tomam o devido cuidado com sua mercadoria.

BALANÇO SOCIAL

O Balanço Social é um documento publicado pela empresa que contém informações sobre investimentos e ações realizadas por ela no cumprimento de sua função social. O objetivo dessa publicação é deixar transparente esse conteúdo que pode ter algum impacto sobre a sociedade, não somente para seus sócios-acionistas, mas também para todos os stakeholders.

A revista EXAME apresenta em uma das suas edições um ranking das melhores empresas brasileiras para se trabalhar. Ele é feito por meio de um questionário enviado aos funcionários das organizações participantes. Esses empregados são sorteados, tomando-se o cuidado de atingir tanto os contratados mais recentemente como os mais antigos de firma. Essa pesquisa é enviada e após ser respondida é encaminhado para uma instituição terceirizada que irá formatar os dados.

Se olharmos a descrição dessas empresas com um pouco de atenção veremos uma característica bem peculiar em quase todas, sua preocupação com seus funcionários, com

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o meio ambiente e com a sociedade em geral.

A maioria delas oferece benefícios diferenciados a seus empregados, como plano de saúde e odontológico extensivo aos familiares, instalação de creches, academias, restaurantes dentro da firma, ticket alimentação entre muitos outros. Essas vantagens têm o objetivo de melhorar a qualidade de vida do funcionário e equilibrar sua vida profissional com a família, para que ele se torne mais produtivo nas suas funções.

Possuem também programas de apoio a entidades carentes, códigos de conduta e uma preocupação com o meio ambiente. Uma fórmula simples que dá muito resultado. Quem não gostaria de trabalhar em uma instituição considerada pelos seus funcionários como uma das melhores para se trabalhar no país?

São inúmeros os exemplos que podemos citar. Uma vez estabelecida uma comunicação entre a sociedade e a instituição cabe a cada uma desempenhar o seu papel.

QUANDO A INSTITUIÇÃO TOMA A INICIATIVA: MINERAÇÃO

3Um engenheiro da Samarco Mineração, uma das maiores exportadoras brasileiras de minério de ferro, foi despachado, em meados de 1999, para uma pequena cidade no oeste da Índia. Ali fica a mina de um dos fornecedores de bentonita, uma matéria-prima usada no processo de fabricação do aço. Sua missão era preparar o embarque de 11.000 toneladas do insumo comprado pela Samarco. Sucede que o negócio gorou já na primeira visita do brasileiro à mina.

Ele teve uma visão assustadora do local: mineiros manuseavam ácidos perigosos sem nenhuma proteção. A pele de seus antebraços estava despigmentada, como se acometidos de vitiligo. “As condições de trabalho eram inaceitáveis”, diz Luciano Penido, presidente da Samarco. Desde então, a companhia nunca mais negociou com a empresa indiana. Essa decisão teve um efeito positivo: recentemente, a Mitsubishi, trading da empresa indiana, procurou a Samarco para mostrar que normas de segurança haviam sido tomadas.

3 Fonte: Curso Abril de Jornalismo em Revista, revista PLUG 2000, v. 17, p. 36-41, [ julho] 2000.

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QUANDO A INSTITUIÇÃO TOMA A INICIATIVA: DESASTRE AMBIENTAL

4Um duto que leva óleo da refinaria de Duque de Caxias para a Ilha d’Água se rompeu, deixando vazar 1290 toneladas. A mancha de óleo atingiu praias e mangues da baía de Guanabara.

A Petrobrás assumiu o erro e se comprometeu a reparar os estragos. A demonstração de transparência e humildade surpreendeu muitos analistas de investimentos e fez com que mantivessem suas recomendações para a compra das ações da companhia.

O presidente da empresa, Henri Philippe Reichstul desdobrou-se para explicar ao Congresso Nacional, à opinião pública, aos ambientalistas e aos pescadores prejudicados pelo vazamento o que aconteceu e o que estava sendo feito para reparar os danos. A empresa colocou informações diárias sobre o assunto na Internet, escalou mais de duas mil pessoas para trabalhar na limpeza das áreas atingidas, trouxe mangueiras para reter o óleo e técnicos estrangeiros como consultores, pagou a multa de 51 milhões de reais antecipadamente e, com isso, obteve um desconto de 30% - o saldo foi depositado em um fundo para a recuperação da baía – iniciou o pagamento de indenizações e veiculou comunicados à população na mídia.

É possível que os custos totais para a Petrobrás cheguem a 100 milhões de reais. Suas ações, no entanto, continuaram em ascensão, o que indica que o mercado reagiu positivamente e que, do episódio, a empresa deva sair com maior credibilidade.

QUANDO A INSTITUIÇÃO É OBRIGADA A TOMAR A INICIATIVA

5A Nike viu suas ações despencarem em 50% na bolsa de valores quando sofreu uma denúncia de que seus fornecedores paquistaneses exploravam o trabalho infantil. Tomou a atitude de submeter seus cinco mil fornecedores a auditorias anuais, bem como a inspeção a cada três meses, vetando trabalhadores com menos de 18 anos. A sua recuperação aconteceu em 18 meses. O exemplo da Nike deixa claro como as pessoas podem mudar o comportamento de uma empresa por meio do boicote aos seus produtos.

As posturas adotadas pelas empresas dos exemplos anteriores são características de organizações que se preocupam com a responsabilidade social. Analise as semelhanças na conduta dessas instituições. Procure um exemplo de firma que pratica a responsabilidade social.

4 http://inspecaoequipto.blogspot.com/2013/05/caso-007-o-maior-acidente-da-reduc-1972.html#5 http://pedrothiagogeografia.blogspot.com/2013/04/exploracao-do-trabalho-escravo-infantil.html#

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Responsabilidade social: uma nova forma estabelecida pelas empresas para conduzir seus negócios junto à estruturação de parcerias e de uma co-responsabilidade no desenvolvimento social.

Balanço Social: documento publicado pela organização que contém informações sobre investimentos e ações realizadas por ela no cumprimento de sua função social.

As instituições estão mais conscientes quanto ao seu papel na sociedade. Hoje as pessoas são mais criteriosas quando escolhem bens e serviços de empresas que, por exemplo, não respeitam o meio ambiente. Essa nova conduta está rendendo bons frutos para as empresas.

No tópico anterior abordamos a importância da mídia nas relações entre consumidores e empresas. No exemplo da Petrobrás podemos observar que essa veiculação foi fundamental para manter a imagem da instituição frente à sociedade. Já no da Samarco, percebe-se que a atitude da empresa brasileira, partindo de um dos seus funcionários frente ao seu fornecedor de matéria-prima, gerou modificações significativas para os empregados da firma indiana.

Da mesma maneira que a Samarco, a Nike também precisou tomar uma atitude frente aos seus fornecedores, mas neste caso a iniciativa partiu de uma pressão da sociedade.

“Filantropia e responsabilidade social”

Por Oded Grajew

O povo brasileiro é solidário. São inúmeros os registros de atitudes de apoio desprendido, em momentos de catástrofe pública ou dificuldades coletivas. Essa solidariedade está enraizada na cultura popular, animada pelos valores da tradição religiosa e por uma realidade de exclusão social que leva um grande contingente a uma situação de extrema carência. É o que se vê, por exemplo, na promoção de campanhas de arrecadação, de bingos beneficentes e venda de rifas para sustentar os chamados “trabalhos de caridade”.

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É uma prática louvável e salutar, sem dúvida alguma, e deve ser enaltecida. No entanto, após tantos anos de filantropia - até programas de televisão a incentivam, o País ainda não foi capaz de deixar de condenar milhões de cidadãos à miséria absoluta. Apesar do desenvolvimento econômico e de toda a colaboração que a sociedade proporciona a seus excluídos na forma de donativos, o Brasil continua sendo o segundo maior país do mundo em termos de desigualdade social.

É bem verdade que a prática da filantropia é importante e sempre traz algum tipo de conforto para os desvalidos, sobretudo num país de população tão carente como o Brasil. Mas ela não é suficiente para substituir políticas públicas. Nos moldes em que é realizada acaba se tornando um paliativo para o grave quadro social, porque, em muitos casos, não busca a continuidade das ações e se concentra, geralmente, em promoções episódicas, como campanhas de agasalho no inverno e arrecadações de brinquedos no período natalino.

No Brasil, apesar do esforço de mídia que se faz em torno de campanhas para obtenção dos mais variados fundos sociais, a capacidade de doação da sociedade é muito baixa, se comparada a outros países. Estima-se que a média é de apenas R$ 23 reais per capita por ano. Esse número é extremamente inferior ao dos norte-americanos, por exemplo, cujas contribuições per capita são estimadas em algo equivalente a R$ 780 anuais. Isso não ocorre somente porque a sociedade americana é mais rica. Ela possui uma prática filantrópica composta por contribuição contínua, participação do cidadão nas entidades apoiadas e uma rigorosa fiscalização e acompanhamento dos repasses efetuados pelas entidades sociais beneficiadas. Já em nosso País, parte dos recursos advindos de doações nem ao menos chega a seus destinatários finais.

A priori, para evitar ocorrências deste tipo é necessário que a empresa tenha compromisso com o processo de doação, envolvendo-se com a entidade social e ajudando-a a desenvolver ferramentas de avaliação que permitam medir os impactos efetivos das ações nos públicos beneficiados. Assim é possível acompanhar o caminho percorrido por esses recursos e mensurar os resultados sociais obtidos.

Assegurar que os investimentos transformem efetivamente a condição de vida das pessoas é uma questão fundamental, ao alcance das empresas e que pode servir de exemplo para seus parceiros e para os governos. E o exemplo sempre é pedagógico para estabelecer modelos, prioridades e referências.

É importante analisar que, quando se pretende uma parceria entre empresários, governos e entidades assistenciais para o desenvolvimento de programas sociais, os recursos destinados diretamente à filantropia também devem ser alvo de fiscalização, assim como a sociedade deve fazer com o dinheiro público.

Mas as doações efetuadas pelas empresas brasileiras precisam fazer parte de um projeto mais amplo, que esteja referenciado em princípios e valores éticos e que contribua para a constituição de um cenário econômico sustentável. Simultaneamente, é necessário

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implementar uma política que promova distribuição de renda, que traga para o País uma condição de justiça social e de garantia dos direitos básicos de cidadania.

Esse horizonte deve nortear as ações das empresas socialmente responsáveis. É preciso envolver fornecedores, parceiros, funcionários e todos os agentes da cadeia produtiva num processo de transformação efetiva da sociedade. Faz parte desse processo exigir políticas públicas coerentes e evitar a prática assistencialista de somente angariar alimentos, agasalhos ou doação em dinheiro.

Por outro lado, é fundamental que a filantropia passe a fazer parte de uma estratégia global da empresa com consistência, que ajude na montagem de uma imagem corporativa com responsabilidade social, o que contribui para impulsionar os negócios. Empresas que trabalham com a perspectiva socialmente responsável, que atuam no sentido de estabelecer uma agenda inclusiva que preveja benefícios para a comunidade, levam vantagem na disputa de mercado.

Em levantamento realizado pelo Instituto Ethos em 2000, na pesquisa “Responsabilidade Social das Empresas - Percepção do Consumidor Brasileiro”, o comportamento social empresarial é bastante prestigiado. Para 43% dos entrevistados, colaborar com escolas, postos e entidades sociais da comunidade é uma atitude que estimula a compra de produtos da empresa, e faz com que ela seja recomendada aos amigos. Em 2001 a mesma pesquisa mostrou que essa é uma tendência, já que praticamente o mesmo percentual de consumidores respondentes (42%) considera que esse tipo de colaboração só aumenta o prestígio e as vendas das empresas que a pratica.

É inegável que as práticas filantrópicas vêm amadurecendo. Cresce a consciência de que esse tipo de ação deve ser constante, persistente e com compromisso, envolvendo todos os atores sociais. Cresce também entre as empresas a visão de que uma prática de intervenção socialmente responsável traz ganhos para o seu negócio, sua imagem e, principalmente, para a sociedade.

CONCLUSÃO

Analisamos a ética nas relações entre produção e consumo de bens-serviços, considerando a propaganda e o marketing aplicado a eles e o processo de venda e de pós-venda. Apresentamos os motivos para que uma empresa atue de maneira ética, tendo como principal foco a expectativa que a sociedade tem dessa conduta aplicada por ela. E, levantamos as principais características de um Código de Ética e sua definição.

Durante esse tópico conhecemos diversos exemplos de empresas que estão inseridas no contexto da responsabilidade social, que é definida aqui como sendo a maneira que as organizações conduzem seus negócios por meio de uma conduta ética e focada nas responsabilidades com o meio ambiente e com ações que gerem resultados positivos para a sociedade.

Como vimos, o balanço social é a documentação que essas instituições apresentam

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para demonstrar clareza e transparência nas suas ações e, também, que podemos citar inúmeras empresas que cumprem o seu papel social de maneira espontânea. Outras são condicionadas pelo clamor popular ou mesmo pelo boicote a seus produtos ou serviços, sendo obrigadas a tomar uma atitude.

Porém, a boa noticia é que os empresários estão deixando de olhar somente a si e estão aumentando seu campo de visão. É considerável o aumento no número de empresas que se conscientizam sobre a responsabilidade social ser uma atitude com ganhos para ambos os lados. Essa conscientização só foi possível porque a sociedade se mobilizou, já que existem concorrentes e instrumentos de pressão, como a mídia, que cobraram essa mudança.

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ASHLEY, Patrícia Almeida (coordenação). Ética e Responsabilidade Social nos Negócios. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2005.

MOREIRA, Joaquim Manhães. A Ética Empresarial no Brasil. São Paulo: Pioneira. 1999.

SROUR, Robert Henry. Ética Empresarial: Posturas responsáveis nos negócios, na política e nas relações pessoais. Rio de Janeiro: Campus, 2000.

SROUR, Robert Henry. Poder, Cultura e Ética nas Organizações. São Paulo: Campus. 6ª edição. 1998.

http://www.filantropia.org/artigos/oded_grajew.htm ACESSADO EM 24/04/2002

http://pedrothiagogeografia.blogspot.com/2013/04/exploracao-do-trabalho-escravo-infantil.html# - ACESSADO EM 27/04/2002

Curso Abril de Jornalismo em Revista, revista PLUG 2000, v. 17, p. 36-41, [ julho] 2000.