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MÓDULO II - EVOLUÇÃO HISTÓRICA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS - DA ERA MODERNA AO ENTRE-GUERRA Unidade 1 - As Relações Internacionais na Era Moderna Unidade 2 - A Nova Ordem Internacional do Século XIX Unidade 3 - A Primeira Guerra Mundial e o Entre-Guerras Esta aula apresenta um panorama histórico das Relações Internacionais. Assista com atenção!

Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

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Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

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MÓDULO II - EVOLUÇÃO HISTÓRICA DAS RELAÇÕES

INTERNACIONAIS - DA ERA MODERNA AO ENTRE-GUERRA

Unidade 1 - As Relações Internacionais na Era Moderna

Unidade 2 - A Nova Ordem Internacional do Século XIX

Unidade 3 - A Primeira Guerra Mundial e o Entre-Guerras

Esta aula apresenta um panorama histórico das Relações Internacionais.

Assista com atenção!

Page 2: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Unidade 1 - As Relações Internacionais na Era Moderna

Ao término desta unidade, o aluno deverá ser capaz de identificar os principais

aspectos da evolução histórica da Sociedade Internacional, do início da Idade

Moderna (século XV) ao fim das Guerras Napoleônicas (século XIX). Deverá,

portanto, estar apto a discorrer sobre:

• As grandes navegações;

• As lutas entre católicos e protestantes;

• A Guerra dos Trinta Anos (1618-1648);

• A paz de Westfália(1648) e

• Europa no século XVIII e a ascensão da França como Potência hegemônica.

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Pág. 2 - A Sociedade Europeia da Era Moderna

O período que vai do ano 1000 até 1800 corresponde à transição do feudalismo

para o capitalismo. Nesse período, a sociedade europeia feudal – rural,

fragmentada no nível nacional, unida pela religião e marcada pelos vínculos de

vassalagem – transformou-se em outra completamente distinta, a sociedade

capitalista. Nesta, o importante era a vida urbana, influenciada pelas transações

comerciais e fundada nas relações de trabalho assalariado.

Quatro acontecimentos são especialmente importantes nesse processo: o

Renascimento, as Grandes Navegações, o advento dos Estados nacionais

absolutistas e a Reforma.

O Renascimento

Marvin Perry observa que “o termo Renascimento foi cunhado em referência à

tentativa de artistas e filósofos de recuperar e aplicar a antiga erudição e modelos

da Grécia e de Roma”. O movimento surgiu na Itália, aproximadamente em 1350

e se estendeu até meados do século XVII. Não surgiu na Itália por acidente. No

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século XIV, ela era a região mais dinâmica da Europa: inúmeros centros

comerciais, como Gênova, Veneza, Florença e Milão se desenvolviam com vigor.

Essas cidades italianas dominavam o comércio com o Oriente e, com isso,

destacavam-se no contexto europeu como Potências comerciais e, algumas

vezes, militares.

O período é um ponto de inflexão. Os contemporâneos tinham a percepção de

que davam início a um novo tempo. Tanto é assim que, para se diferenciarem,

criaram o termo “Idade Média” para se referirem aos seus predecessores.

O Renascimento é especialmente marcado pelas mudanças ocorridas nas artes

– destacadamente na pintura, escultura e arquitetura – e nas ciências. Na Idade

Média, as artes tinham o propósito fundamental de servir à religião cristã,

vinculando-se, muitas vezes, às determinações da Igreja. Na Renascença, o

importante era a valorização do ser humano: tinha-se o antropocentrismo

renascentista se contrapondo ao teocentrismo da Igreja de Roma.

Essa percepção antropocêntrica de mundo não significa, todavia, que houvesse

uma rejeição à religião. Sem se afastarem da religião, os renascentistas

admitiam considerar o homem, obra máxima da Criação divina, o centro de suas

atenções.

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Pág. 3 - A Sociedade Europeia da Era Moderna

O Renascimento (cont.)

E o Renascimento não ocorreu apenas nas Artes. A Ciência, da mesma forma,

foi afetada pelas investigações de Copérnico, Kepler e Galileu. Copérnico, por

exemplo, foi o criador da teoria heliocêntrica, que estabelecia o Sol como o

centro do universo. Isso era uma revolução, porque tirava da Terra a primazia

sobre os demais corpos celestes.

O Mapa 1 ilustra o desenvolvimento do Humanismo na Europa e a expansão

renascentista da Itália para todo o continente.

Mapa 1: O Humanismo e a Renascença na Europa

(Séculos XV e XVII)

Fonte :http://perso.numericable.fr/alhouot/alain.houot/Hist/ma/matm30.html

Interessante notar nos círculos vermelhos e verdes os principais pontos de

florescimento do Renascimento na Itália e em toda a Europa, respectivamente.

O quadrado rosa marca o local do surgimento da imprensa, e os principais focos

artísticos estão assinalados pelos pontos negros, de fato, importantes cidades

europeias. Já as setas representam a difusão do renascimento italiano.

Sugerimos pesquisa mais aprofundada a respeito da importância do

Renascimento na formação da sociedade europeia. Uma fonte importante é A

Evolução da Sociedade Internacional, de Adam Watson (Brasília: Editora UnB,

2004).

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Pág. 4 - A Sociedade Europeia da Era Moderna

As Grandes Navegações

As Grandes Navegações, iniciadas no final do século XV, são um marco na

evolução histórica da Sociedade Internacional. Por meio delas, os europeus

aventuram-se além dos limites tradicionais de seu continente e, de maneira

generalizada, lançam-se pelos oceanos e seguem para os “quatro cantos do

mundo”, entrando em contato com as sociedades asiática, africana e americana

como nunca ocorrera antes. Com as Grandes Navegações, tem início um

processo que culminaria na hegemonia europeia no mundo e na supremacia da

chamada “civilização ocidental” sobre outros povos – muitas vezes, com

resultados fatais para as civilizações não europeias.

As Grandes Navegações podem ser consideradas o primeiro processo de

globalização da era moderna. Com elas, o comércio internacional se

desenvolveu e foram estabelecidos vínculos entre as diversas sociedades

internacionais que existiam na época. Ademais, graças ao estabelecimento dos

vínculos mercantilistas com o Novo Mundo – as Américas –, com a África e com

o Extremo Oriente, a Europa se desenvolveu, o modelo capitalista se estruturou,

e os Estados-nações europeus se tornaram Grandes Potências. Chegou-se ao

ponto em que os conflitos entre os Estados europeus repercutiam pelo planeta.

Três fatores levaram às Grandes Navegações do século XV e seguintes. O

primeiro foi o surgimento de um vívido interesse pelas vantagens que poderiam

ser obtidas por meio do comércio. Para alcançarem a Europa, os produtos do

Oriente ou da África subsaariana passavam por uma quantidade significativa de

intermediários. Tal fato encarecia substancialmente os produtos tão desejados

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pelos europeus, como cravo, canela, pimenta, gengibre, noz-moscada, seda ou

porcelana. A Economia, como força profunda, impulsionaria os europeus para as

Grandes Navegações.

Em segundo lugar, havia que se considerar a escassez de metais preciosos na

Europa. Sem eles, era muito mais difícil a compra de bens da Ásia ou da África.

Isso também dificultava o desenvolvimento das relações comerciais e,

consequentemente, das relações sociais e políticas entre as diversas regiões da

Europa.

Em terceiro lugar, o século XV foi um momento de grandes melhorias na

construção de navios, nos conhecimentos geográficos e nas habilidades navais.

Nesse sentido, a tecnologia passou a ser outra força profunda a produzir

mudanças na conduta dos Atores internacionais do período. Vale lembrar que o

conhecimento, tanto de construção de embarcações quanto de técnicas de

navegação, era considerado um bem de extremo valor e cuja proteção era

questão de Estado, fundamental para países como Portugal e Espanha.

Pág. 5 - A Sociedade Europeia da Era Moderna

As Grandes Navegações (cont.)

Foram os portugueses que primeiro se lançaram em busca de novas rotas de

comércio, desafiando não só a realidade do desconhecido oceano, mas também

as ideias e temores do desconhecido gerados pelo imaginário medieval. Apesar

dos custos e dos riscos altíssimos, as viagens compensavam pelos também

altíssimos lucros obtidos. As viagens geravam, muitas vezes, lucros de até

6.000%.

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Os lucros serviam, pois, de motor que levava às incursões no litoral da África e

à posterior circum-navegação desse continente, bem como às viagens até a

Índia e à “descoberta”, pelos europeus, da América. E não tardou para que os

europeus – primeiro, os portugueses e espanhóis e, depois, holandeses,

franceses e ingleses – instalassem feitorias em locais da Ásia, África e América,

que, posteriormente, se transformaram em colônias.

O Mapa 2 ilustra os impérios coloniais português (em vermelho) e espanhol (em

verde) em seu apogeu. Destaque-se a linha divisória do mundo estabelecida por

Portugal e Espanha pelo Tratado de Tordesilhas (1494), por meio do qual, com

o assentimento do Papa, os dois Estados católicos buscavam legitimar seus

direitos sobre as terras “descobertas”. Claro que nem os povos que viviam

nessas terras e nem os demais monarcas europeus foram consultados, de modo

que rapidamente Inglaterra, França e Holanda questionariam essa hegemonia

luso-espanhola, inclusive com a irônica requisição do “testamento de Adão” que

garantira aos ibéricos a herança do mundo.

Mapa 2: Impérios Coloniais do Século XV (Portugal e Espanha)

Fonte: http://perso.numericable.fr/alhouot/alain.houot/Hist/ma/matm36.html

O fato é que logo as principais potências europeias se lançariam em busca de

novas terras e novas rotas, e uma nova era se iniciaria nas relações

internacionais.

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Como observa Perry (1999, p. 280), “num desenvolvimento sem precedentes,

uma pequena parte do globo, a Europa ocidental, tornara-se a senhora das vias

marítimas, dona de muitas terras em todo o mundo e o banqueiro e recebedor

de lucros numa economia mundial que começava a despontar”. O pequeno

continente dava sinais de seu poder e da dominação que exerceria nos séculos

seguintes sobre povos e impérios de todo o globo.

Sugerimos a leitura da obra de Paul Kennedy (1991), Ascensão e Queda das

Grandes

Potências, em que o autor comenta, entre outras coisas, como os povos de

um

continente fragmentado, com sociedades atrasadas em relação a outras

sociedades do planeta, conseguem se lançar nos oceanos e conquistar o

mundo e as sociedades mais prósperas e desenvolvidas.

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Pág. 6 - A Sociedade Europeia da Era Moderna

As Grandes Navegações (cont.)

Os efeitos para as outras regiões do mundo foram profundos: populações inteiras

– especialmente nas Américas – foram dizimadas; outras tantas, particularmente

na África, foram reduzidas à condição de escravas; plantas, animais e doenças

foram espalhadas pelos quatro cantos do mundo, e, principalmente, dava-se

início a um tipo de economia global nunca antes visto. São forças profundas que

merecem atenção: a tecnologia, dado o aprimoramento das capacidades bélicas

dos europeus e a religião, uma vez que, junto com os conquistadores, iam os

catequizadores e a ideia de “obrigação” que tinham os europeus de “difundir o

cristianismo aos povos mais atrasados” (missões).

O Mapa 3 ilustra a época das grandes navegações e da expansão europeia. A

partir das terras conhecidas pelos europeus na Idade Média (trecho em laranja),

há a expansão por terra – com as viagens de Marco Pólo que apresentaram a

Europa ao Império Chinês – e por mar – graças a intrépidos navegadores como

Cristóvão Colombo (que descobriu a América), Vasco da Gama (o qual, ao

dobrar o

Mapa 3: As Grandes Navegações e as “Descobertas” Européias

Fonte: http://perso.numericable.fr/alhouot/alain.houot/Hist/ma/matm34.html

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“Cabo das Tormentas”, passando a chamá-lo de “Cabo da Boa Esperança”,

estabeleceu a rota marítima para as Índias, garantindo a Portugal a hegemonia

no comércio com a Ásia) e Fernando de Magalhães (primeira viagem ao redor

do mundo – apesar de ele mesmo ter morrido no caminho) –, e um Novo Mundo

surge diante do europeu renascentista. Cite-se ainda as viagens do inglês Jean

Cabot, que em 1497 chega à Nova Inglaterra, e do francês Jacques Cartier, que

em 1534 chega à foz do rio São Lourenço e “toma as terras do Canadá para a

Coroa Francesa”. O mapa revela as terras conhecidas pelos europeus no fim do

século XVI (em amarelo).

Para melhor compreender o significado das grandes navegações e seu

impacto nas relações internacionais dos séculos XV e XVI, um filme

interessante é 1492: A Conquista do Paraíso, de Ridley Scott. Para saber mais

sobre o filme, veja o resumo e o contexto histórico na internet.

Leia também o texto As Grandes Navegações .

Pág. 7 - A Sociedade Europeia da Era Moderna

O Advento do Estado Absolutista

A partir do século XIII, ocorreu na Europa o fenômeno do fortalecimento do rei e

da monarquia. Por intermédio de guerras, alianças e casamentos, os reis se

fortaleceram e foram decisivos nos processos de construção dos Estados

nacionais europeus. Os Estados nacionais se formaram, então, como uma cunha

entre o poder local da nobreza e das cidades e o poder universal da Igreja.

Alguns, como Espanha, França e Inglaterra, foram bem-sucedidos. Outros, como

Itália e Alemanha, não conseguiram constituir-se em unidades nacionais até a

última metade do século XIX.

Page 12: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

O Mapa 4 revela a divisão da Europa no século XIII.

Mapa 4: A Europa no Século XIII

Fonte: http://perso.wanadoo.fr/alain.houot/index.html

No processo de fortalecimento da monarquia, foi importante a criação de

algumas instituições. A primeira delas foi a do imposto nacional, que se

diferenciava da cobrança de tributos feita pelos senhores feudais. Enquanto esta

se fundava nas relações pessoais de vassalagem, o imposto moderno baseava-

se na ideia de que a contribuição era feita para a construção de um bem comum.

A segunda importante instituição foi a de exércitos nacionais. Se, antes, os reis

dependiam das relações pessoais com a nobreza, pois precisavam dos senhores

feudais e de seus exércitos particulares, agora tinham uma força militar própria,

mantida com os novos impostos arrecadados.

Pág. 8 - A Sociedade Europeia da Era Moderna

O Advento do Estado Absolutista (cont.)

O terceiro aspecto importante para o desenvolvimento do Estado absolutista foi

a criação de uma administração civil ligada ou ao rei ou ao Estado. Dessa forma,

o soberano se desligava das relações particulares com a nobreza para poder

governar. Ademais, tinha-se aí o embrião do que seria a burocracia estatal,

essencial para o governo dos Estados modernos.

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Uma obra importante sobre o Absolutismo é "Linhagens do Estado

Absolutista", de Perry Anderson.

Os Estados absolutistas eram, pois, Estados em que o poder se encontrava

concentrado, em razão das instituições como o sistema tributário, o exército

nacional e a administração pública, nas mãos do rei. A figura do Estado se fundia

com a do soberano. Daí as palavras atribuídas a Luís XIV, soberano absolutista

francês: “L’Etat c’est moi!” (“o Estado sou eu!”).

Importante considerar, também, a preocupação dos Estados absolutistas com a

economia nacional, especialmente com o comércio. Essa preocupação se dava,

porque visava à arrecadação de fundos, especialmente sob a forma de metais

preciosos e impostos. Nesse sentido, uma nova classe, cada vez mais próxima

do soberano, se estruturou: a burguesia. Era formada pelos comerciantes e

outros profissionais liberais das cidades que ganhavam força frente à nobreza

ao contribuir para o financiamento do Estado moderno.

Por fim, o aparecimento dos estados absolutistas provocou grande mudança no

sistema internacional. Hélio Jaguaribe (2001, p. 481) observa que “o século XVII

se caracterizou na Europa pela emergência de grandes potências, contrastando

com o mundo do Renascimento, quando as cidades-estado da Itália

desempenhavam os principais papéis na arena internacional, cercadas por

países potencialmente poderosos, como a França, a Espanha e a Inglaterra, que,

no entanto, viviam em condições medievais. No princípio do século XVII, esses

países tinham conseguido em grande parte alcançar sua integração nacional, e

começavam a ter um papel internacional importante."

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Pág. 9 - A Sociedade Europeia na Era Moderna

A Reforma (cont.)

No ano de 529, a Academia de Platão, em Atenas, fora fechada. Em um decreto

desse ano, o imperador romano Justiniano manifestou-se contra a filosofia,

iniciando uma acomodação do desenvolvimento cultural em direção à Igreja. No

mesmo ano, é fundada a Ordem dos Beneditinos, a primeira grande ordem

religiosa. Dali em diante, os mosteiros passariam a deter o monopólio da

educação, da reflexão e da meditação. Na Idade Média, teve plena vigência o

clássico ensinamento de Agostinho: “é necessário compreender para crer e crer

para compreender”.

No século XVI, iniciou-se um amplo movimento de reforma religiosa, que marcou

o fim do monopólio religioso da Igreja Católica Romana sobre a Europa

Ocidental. Esse movimento afetaria definitivamente a política, a economia, a

cultura, a sociedade, enfim, as relações de poder no cenário europeu e mundial.

Até a Reforma, além do monopólio sobre a fé da cristandade, a Igreja Católica

tinha um domínio cultural, político, econômico e espiritual único. Cada aspecto

da vida era rigidamente controlado. A força do Papa, o Bispo de Roma, tanto

política quanto religiosa, sobre a Europa Ocidental era tamanha que, no século

XIII, a Igreja podia proclamar que cada pessoa, praticamente em toda a Europa

Ocidental, tinha fé em Deus de acordo com sua doutrina e seus sacramentos.

Esse controle, no entanto, acabou por se voltar contra a própria instituição. Como

observa Perry (1999, p. 231), “obstruído pela riqueza, viciado no poder

internacional e protegendo seus próprios interesses, o clero, do papa abaixo,

tornou-se alvo de um bombardeio de críticas.”. De um lado, criticava-se a

supremacia da Igreja sobre os reis. De outro, a corrupção, o nepotismo, a busca

Page 15: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

de riqueza pessoal por parte dos bispos e do papa, o relaxamento do

cumprimento das obrigações espirituais e a venda de indulgências. Inúmeros

cristãos passaram a criticar abertamente as práticas da Igreja e do clero. O mais

famoso e mais importante crítico da Igreja foi o monge Martinho Lutero.

A Reforma se iniciou em 1517, com as críticas de Lutero à venda de

indulgências. Indulgências eram obras que os cristãos faziam, em vida, para

reduzir o seu tempo, após a morte, no purgatório. A maior parte dessas obras

era constituída de doações à Igreja. Lutero questionava a validade moral da

venda de indulgência e a possibilidade de que elas poderiam redimir o homem

pecador. Lutero defendia que o homem, apesar de ser intrinsecamente

condenado pelo pecado original, poderia obter a redenção por meio da fé, do

arrependimento pessoal, do arrependimento pelos pecados e pela confiança na

piedade de Deus.

Pág. 10 - A Sociedade Europeia na Era Moderna

A Reforma (cont.)

Aspecto importante das teses de Lutero repousa no fato de que o monge

propunha, em última instância, a dispensa da necessidade da própria Igreja para

que o homem tivesse sua religiosidade e seu contato com o Criador. As

consequências da doutrina luterana ultrapassavam a esfera religiosa, pois

ameaçavam a dominação político-ideológica que a Igreja de Roma exercia sobre

os reinos europeus e seus soberanos.

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Lutero, ao contrário de outros que atacaram a Igreja, obteve proteção da

aristocracia europeia. Mais especificamente, foi protegido por Frederico, príncipe

da Saxônia, na Alemanha. Posteriormente, Lutero deixou claro que não desejava

de forma alguma ser uma ameaça à autoridade política dos príncipes alemães.

Além disso, declarou que o bom cristão era aquele que obedecia às leis e à

ordem.

De fato, Martinho Lutero obteve a simpatia de príncipes e de cidades em toda a

Alemanha. As razões foram simples. Ao se desqualificar a Igreja Católica, abria-

se a possibilidade de confisco das terras desta pelos príncipes e nobres e do fim

dos pesados tributos que a ela eram pagos. Além disso, os príncipes alemães

sentiam-se livres para resistir ao Sacro Império Romano, do católico Carlos V.

Este, pressionado por ameaças externas – a França, a oeste, e os turcos, a leste

– acabou por assinar a Paz de Augsburgo, em 1555. Esse acordo basicamente

definiu que cada príncipe poderia determinar a religião de seus súditos.

Filme indicado: Lutero, de Eric Till, conta a história do monge alemão que se

rebelou contra o abuso de poder na Igreja Católica há 500 anos. Trata-se de

filme interessante para auxiliar na compreensão da Reforma e da

Contrarreforma.

As 95 teses de Lutero que abalaram a Europa renascentista estão disponíveis

em um sitio interessante: a Revista Espaço Acadêmico. Veja, também, a

biografia do monge.

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Pág. 11 - A Sociedade Europeia na Era Moderna

Reforma (cont.)

No Mapa 5, temos a Europa no século XVI, dividida entre os diferentes grupos

de protestantes (em verde) – calvinistas, luteranos e anglicanos –, católicos fiéis

a Roma (em rosa) e ortodoxos (em laranja). Cite-se ainda a constante pressão

do Império Otomano, baluarte do mundo islâmico e um Ator muito relevante no

cenário europeu da época. Claro que as disputas da cristandade centravam-se

em católicos x protestantes, mas alianças com Constantinopla muitas vezes

eram consideradas.

Mapa 5: A Europa à Época da Reforma: a Divisão da Cristandade

Fonte: http://perso.numericable.fr/alhouot/alain.houot/Hist/ma/matm32.html

É importante observar que o descontentamento com a Igreja era grande em boa

parte da Europa. O protestantismo, não só da linha luterana, espalhou-se com

muita rapidez por todo o norte do continente. A reação católica, a

Contrarreforma, deu-se sob diversas formas. A primeira delas foi no campo da

atuação religiosa. Como observa Perry (1999, p. 242), “a princípio, a energia

para a reforma veio do clero comum, bem como de leigos como Inácio de

Loyola”. Loyola foi o fundador da famosa Companhia de Jesus. Como fora

treinado como soldado, ele organizou os jesuítas de forma rígida e altamente

disciplinada.

A Contrarreforma também enfatizava a pregação, a reconversão dos que se

afastaram da Igreja, a construção de templos, a censura, a perseguição a

protestantes e a outros hereges. Também é importante ressaltar que a Igreja,

Page 18: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

por intermédio do Concílio de Trento, de 1545 a1563, modificou ou eliminou

muito dos pontos criticados pelos protestantes, como, por exemplo, a venda de

indulgências. Por outro lado, o Concílio não fez nenhuma concessão ao

protestantismo.

A Reforma significou o enfraquecimento da Igreja e o consequente

fortalecimento dos Estados. Além disso, a Europa se viu dividida em duas: uma

protestante, no norte, e outra católica, no sul do continente. Essa tensão

permaneceria e seria especialmente sentida no século seguinte.

De fato, as disputas entre católicos e protestantes teriam um importante reflexo

nas relações internacionais europeias durante mais de dois séculos, em especial

porque estavam associadas também às rivalidades entre as Potências

europeias. Do ponto de vista das relações internacionais, os novos Estados

protestantes aliavam-se para se contrapor à dominação hegemônica da Igreja e

de seu principal defensor político, a dinastia dos Habsburgos, o grandehegemon

europeu, que tinha um império que englobava a Espanha e a Áustria. Essas

rivalidades religiosas e políticas culminariam na Guerra dos Trinta Anos.

Os conflitos entre católicos e protestantes marcaram a Europa por dois séculos,

e seus efeitos alcançam nossos dias. Um filme muito interessante para se

compreender o período é A Rainha Margot, de Patrice Chéreau. Veja o resumo

e o contexto histórico do filme.

Page 19: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 12 - A Guerra dos Trinta Anos (1618-1648)

A Guerra dos Trinta Anos, de 1618 a 1648, primeiro grande conflito armado dos

tempos modernos, envolveu grande parte da Europa. Essa grande confrontação

do século XVII poria termo ao período de um século de disputas entre católicos

e protestantes e daria início a um novo sistema europeu de relações

internacionais cujos fundamentos alcançariam o século XXI.

O sistema internacional no século XVII foi marcado inicialmente pela

preponderância da Espanha. Seus concorrentes, porém, não tardaram a ocupar

o seu lugar de destaque. A França surgiu como um país importante enquanto a

Inglaterra preparou o terreno, especialmente nas últimas décadas do século,

para se tornar hegemônica no século seguinte. A perda da hegemonia espanhola

esteve ligada a vários fatores. Jaguaribe (2001, p. 486) observa que a

decadência espanhola “resultou da combinação de quatro causas principais:

certas debilidades institucionais; estruturas sociais predatórias; compromissos

ideológicos utópicos; e a adoção de políticas equivocadas”

Importante lembrar que a Espanha, católica, era a potência hegemônica no início

do século XVII. O domínio de Felipe III (1598-1621) abrangia toda a Península

Ibérica, as colônias da América, incluindo o Brasil, o sul da Itália, Milão, ilhas no

Mediterrâneo, Filipinas e enclaves na África.

Especialmente equivocada foi a decisão espanhola de ser defensora da fé

católica. Isso não apenas fez ressurgir, em grau muito maior, as guerras

religiosas do século anterior, mas também levou a Espanha a perder a sua

condição de principal potência do continente europeu.

O século XVII, ressalta Jaguaribe (2001, p. 485), "foi marcado pelos conflitos

religiosos mais agudos já ocorrido no ocidente. Herdados do século precedente,

Page 20: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

eles culminaram na Guerra dos Trinta Anos (1618-1648)", que foi, pois a tentativa

militar dos católicos de conter o protestantismo.

O Mapa 6 ilustra a Europa em 1600, dividida entre reinos católicos e

protestantes.

Fonte:

http://perso.numericable.fr/alhouot/alain.houot/Hist/ancien_R/ancienr7.html

Antes de entrarmos diretamente na Guerra dos Trinta Anos, convém um rápido

parêntese. Em 1556, o Imperador Carlos V, após ter assinado a Paz de

Augsburgo, abdicou e dividiu em dois os seus domínios: de um lado, a Espanha,

Países Baixos, colônias americanas e Itália ficaram para seu filho Felipe II (no

mapa, em laranja); de outro, a Áustria, que ficou com seu irmão Fernando (em

amarelo). Com isso, a família Habsburgo ficou dividida em dois ramos, ambos

católicos e, frequentemente, aliados.

Pág. 13 - A Guerra dos Trinta Anos ( 1618-1648)

A Guerra

A chamada Guerra dos Trinta Anos começou em 1618 como conflito religioso

entre católicos e protestantes na Boêmia e adquiriu caráter político em torno das

contradições entre Estados territoriais e principados. Envolveu a Alemanha,

Áustria, Hungria, Espanha, Holanda, Dinamarca, França e Suécia.

Page 21: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Importante para o início da Guerra dos Trinta Anos foi a ascensão de Fernando

II ao trono austríaco, em 1619. Na época, Fernando II, imperador do Sacro

Império Romano-Germânico era também rei da Boêmia. Os rebeldes negaram-

lhe esse título e entronizaram o príncipe eleitor calvinista Frederico do

Palatinado. Segundo Perry (1999, p. 266):

A Guerra dos Trinta Anos começou quando os boêmios (...) tentaram colocar no

seu trono um rei protestante. Os Habsburgos austríacos e espanhóis reagiram,

mandando um exército ao reino da Boêmia; de súbito, todo o império foi forçado

a tomar partido dentro de linhas religiosas. A Boêmia sofreu uma devastação

quase inimaginável: três quartos de suas cidades foram saqueadas e queimadas

e sua aristocracia foi praticamente exterminada.

O resultado foi o envolvimento de outros príncipes protestantes. O mais

importante deles na primeira fase da Guerra, que vai até 1632, foi o rei da Suécia,

Gustavo Adolfo, morto em batalha naquele ano. A possibilidade de paz entre

Fernando II e os príncipes alemães leva à cena um novo Ator, a França,

preocupada com a excessiva força que poderia ter a Áustria.

Sob o comando do cardeal Richelieu, a França, apesar de católica como os

austríacos, posicionou-se contra estes. Primeiramente, de forma encoberta,

depois de maneira ostensiva. Richelieu estava convencido de que a continuidade

da França como grande poder internacional dependia da guerra contra os

Habsburgos. Assim, a França financiava ou apoiava todos os que se opusessem

ao domínio austríaco ou espanhol, ou, quando necessário, guerreavam

diretamente contra eles. A França, aliás, derrotou o até então imbatível exército

espanhol na batalha de Rocroy, em 1643. Para a Espanha, o custo dessa derrota

foi altíssimo, pois significou o fim da invencibilidade de seu poderoso exército e

a vida de 15 mil soldados.

Page 22: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

A maneira como Richelieu se portou politicamente influenciaria o sistema

internacional pelos próximos séculos. Richelieu criou ou ajudou a criar conceitos

como o de “razão de estado” e “equilíbrio de poder”. Henry Kissinger (1999, p.

60) analisa que “de início, ele [Richelieu] queria impedir a dominação dos

Habsburgos sobre a Europa, mas ao final deixou um legado que por dois séculos

provocou seus sucessores a tentarem o primado francês na Europa. Do fracasso

dessas tentativas, brotou o equilíbrio de poder, primeiro como um fato da vida,

depois como forma de organizar relações internacionais (...). Quando a guerra

terminou, em 1648, a Europa Central fora devastada e a Alemanha perdera

quase um terço de sua população. No tumulto desse conflito trágico, o cardeal

Richelieu enxertou o princípio da raison d´état (razão de estado) na política

externa francesa, princípio que os outros estados europeus adotaram nos cem

anos seguintes”.

Convém reproduzir mais algumas das conclusões de Kissinger (1999, p. 63): “o

objetivo de Richelieu era romper o que ele considerava o cerco da França,

exaurir os Habsburgos e impedir a emergência de uma grande potência nas

fronteiras da França – especialmente na fronteira alemã. Seu único critério para

alianças era que elas atendessem aos interesses da França, aplicado

primeiramente aos estados protestantes, mais tarde até ao Império Otomano

muçulmano”.

Assim, a conduta da França reflete a maneira racional e pragmática como as

grandes Potências atuam no cenário internacional. Apesar de católica, a França

não hesitou em aliar-se aos protestantes para se contrapor à hegemonia

espanhola. Essa conduta garantiria o fortalecimento da França nos anos

seguintes, de modo que, com o fim da guerra e o declínio do poder espanhol, o

Estado francês assumiria o papel de nova Potência hegemônica no continente.

Page 23: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

A Guerra dos Trinta Anos chegaria a termo por meio da Paz de Westfália (1648),

e uma Nova Ordem seria estabelecida no cenário europeu e,

consequentemente, nas relações internacionais da Era Moderna.

Leia mais sobre a Guerra dos Trinta Anos acessando o sítio “Vultos e episódios

da Época Moderna”.

Pág. 14 - A Guerra dos Trinta Anos (1618-1648)

A Paz de Westfália (1648)

A paz foi alcançada porque a guerra, após as suas várias fases, se mostrou

impossível de ser vencida de maneira efetiva. Segundo Jaguaribe (2001, p. 483),

“se foi possível chegar finalmente a um acordo negociado, depois de disputas

ferozes, isso se deveu à incapacidade dos Atores em conflito de impor pela força

os seus respectivos dogmas”.

O primeiro dos tratados, assinado em janeiro de 1648, pôs fim à guerra entre

Espanha e Holanda. Em outubro do mesmo ano, pressionada por seus aliados

alemães, a Espanha também selou a paz com os franceses.

Os tratados de Westfália significaram o fim das ambições dos Habsburgos

austríacos e espanhóis e a vitória da política externa francesa, iniciada com

Richelieu. Os franceses, além de acabarem com as pretensões dos seus

adversários, ainda tiveram algumas importantes conquistas territoriais. O

Page 24: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

fantasma de uma Alemanha unificada, ameaça à França pelo leste, manteve-se

afastado por duzentos anos.

Carpentier e Lebrun (1993, p. 229) anotam que a Europa era “politicamente muito

diferente da de 1560 ou 1600. A Casa da Áustria já não era um perigo para a

paz europeia. (...) A Espanha, enfraquecida e amputada, já se não contava entre

as potências de primeira plana. A Inglaterra, saída do isolamento em que havia

ficado a seguir à guerra civil (...), as Províncias Unidas [Holanda], independentes

e aumentadas, a Suécia, dominadora do Báltico, eram já grandes potências (...).

O facto essencial era, todavia, a situação de preponderância adquirida pela

França. O reino (...) não só era mais vasto e mais bem defendido como também

dispunha de uma clientela em que se contavam quase todos os países europeus.

De resto, o prestígio intelectual e artístico da França não cessava de crescer.

Começara a era da preponderância francesa na Europa”.

No Mapa 7, pode-se perceber a nova configuração de poder no continente

europeu, com destaque para as fronteiras nacionais e os limites assegurados

pelo Tratado de Westfália. A maior parte dessas fronteiras acabaria modificada

nos séculos seguintes.

Mapa 7: A Europa em 1648

Fonte:

http://perso.numericable.fr/alhouot/alain.houot/Hist/ancien_R/ancienr9.html

Page 25: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 15 - A Guerra dos Trinta Anos (1618-1648)

O Legado de Westfália

Importante sublinhar que o Tratado de Westfália marca o fim de cento e

cinquenta anos de conflito entre os nascentes Estados europeus e o fim das

ambições dos Habsburgos. Nasce, então, um novo tipo de Sistema

Internacional, cujos Atores eram, essencialmente, os Estados. Além disso, a

história posterior da Europa caracterizar-se-ia pelo princípio da anti-hegemonia,

isto é, os Estados agiriam no sentido de evitar que um se tornasse a potência

hegemônica (balanço de poder). O Tratado de Westfália, assim, foi responsável

por grandes mudanças no sistema internacional europeu. Ao contrário de boa

parte dos acordos e pactos que eram firmados anteriormente, ele não serviu

apenas para pôr fim a um conflito, mas também para tornar o Estado o principal

Ator das relações internacionais. Além disso, os Estados, independentemente

do tamanho, se viram como iguais e participantes de um mesmo Sistema

Internacional.

Trata-se de um momento histórico fundamental para as Relações Internacionais.

O Tratado de Westfália, de 1648, inaugurou uma nova fase na história política

daquele continente, propiciando o triunfo da igualdade jurídica dos Estados, com

o que ficaram estabelecidas sólidas bases para uma regulamentação

internacional mínima. Essa igualdade jurídica elevou os Estados ao patamar de

únicos Atores nas políticas internacionais, eliminando o poder da Igreja nas

relações entre os mesmos e conferindo aos mais diversos Estados o direito de

escolher seu próprio caminho econômico, político ou religioso. Ficou, então,

consagrado o modelo da soberania externa absoluta, tendo início uma ordem

internacional protagonizada por Atores com poder supremo dentro de fronteiras

territoriais estabelecidas. Mais tarde, os contratualistas (Locke, Rousseau) e, em

1789, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, trariam os elementos

Page 26: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

caracterizadores da soberania que seriam adotados por várias Constituições:

unidade, indivisibilidade, inalienabilidade e imprescritibilidade.

Importante também sublinhar que o primeiro ponto em que os diplomatas em

Westfália acordaram foi que as três confissões religiosas dominantes no Sacro

Império (o catolicismo, o luteranismo e o calvinismo) seriam consideradas iguais.

Revogava-se, assim, a disposição anterior nesse assunto, firmada pela Paz de

Augsburgo, em 1555, que dizia que o povo tinha que seguir a religião do seu

príncipe (cuius regios, eius religio). Isso não só abria uma brecha no despotismo

como abria caminho para a concepção de tolerância religiosa, que, no século

seguinte, se tornaria bandeira dos iluministas, como John Locke e Voltaire. Além

disso, a nova doutrina da Razão de Estado, extraída das experiências

provocadas pela Guerra dos Trinta Anos, exposta e defendida pelo Cardeal

Richelieu, defendia que um reino tem interesses permanentes que o colocam

acima das motivações religiosas. O antigo sistema medieval, que depositava a

autoridade suprema no Império e no Papado, dando-lhes direito de intervenção

nos assuntos internos dos reinos e principados, foi substituído pelo conceito de

soberania de Estado, inaugurando-se um novo sistema em que os Estados têm

direitos iguais baseados numa ordem constituída por tratados e pela sujeição à

lei internacional.

Essa situação político-jurídica perdura até os nossos dias, apesar de haver hoje,

particularmente da parte dos EUA, um forte movimento supranacional

intervencionista, com o objetivo de suspender as garantias de privacidade de

qualquer Estado frente a uma situação de emergência ou de flagrante violação

dos direitos humanos.

Page 27: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 16 - A Guerra dos Trinta Anos (1618-1648)

A Nova Ordem Internacional a partir de Westfália

A história europeia após o tratado de Westfália é a contínua busca, por parte da

França, de obtenção da hegemonia europeia e a resistência, por parte dos

demais Atores europeus, a esse intento. Na busca desses objetivos, imperam as

relações pragmáticas e as alianças de ocasião. No século que se seguiu à Paz

de Westfália, “a raison d’état [razão de estado] passou a ser o princípio

orientador da diplomacia europeia”, registra Kissinger (1999, p. 66).

O período pode ser divido em três fases:

A primeira vai de 1648 a 1740 e é de preponderância francesa. A Áustria recuou

de suas pretensões na Alemanha e conquistou, gradativamente, vastas regiões

ao longo do rio Danúbio. A Espanha lentamente se retirava do papel de potência

de primeira ordem. A Inglaterra, a partir da Revolução Gloriosa, de 1688, tornou-

se uma monarquia em que o Parlamento tinha papel preponderante. A França,

especialmente sob Luís XIV “esforçou-se (...) por reforçar o absolutismo

monárquico em França e por impor, mais ou menos diretamente, a sua lei à

Europa. Falhou, porém, nesta sua última pretensão perante a coligação dos

Estados europeus – enquanto, na Europa Central e Oriental, a Prússia começava

a salientar-se, e Pedro, o Grande, procurava conseguir que a Rússia saísse do

seu isolamento” (CARPENTIER; LEBRUN, 1993, p. 233).

Essa Europa do início do século XVIII encontra-se no Mapa, veja:

Mapa 8: A Europa no Início do Século XVIII

Fonte:

http://perso.numericable.fr/alhouot/alain.houot/Hist/ancien_R/ancienr11.html

Page 28: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 17 - A Guerra dos Trinta Anos (1618-1648)

A Nova Ordem Internacional a partir de Westfália (cont.)

A segunda fase vai de 1740 a 1792 e se caracteriza pela preponderância

marítima da Inglaterra e pelo equilíbrio das potências continentais. “A luta, no

mar e nas colônias, entre a Inglaterra – onde, a despeito das tendências de poder

pessoal de Jorge III, prosseguia a evolução para o regime parlamentar – e a

França – onde o absolutismo de Luís XV e Luís XVI enfrentava dificuldades cada

vez maiores – veio a dar a vantagem à Inglaterra, que se tornou a primeira

potência mundial graças à sua superioridade marítima e ao avanço resultante

dos começos da revolução industrial. Na Europa Central e Oriental, a Prússia de

Frederico II, a Áustria de Maria Teresa e José II e a Rússia de Isabel e de

Catarina II eram concorrentes entre si, mas equilibravam-se e chegaram a

acordo para crescer à custa do Império Otomano e da Polônia, que foi totalmente

desmembrada” (CARPENTIER; LEBRUN, 1993, p. 247).

O último período vai de 1792 a 1815 e se caracteriza por ser o momento do

apogeu e do fracasso do projeto de uma Europa francesa. “Entre 1789 e 1815,

a Europa respirou ao ritmo da França. A ‘Grande Nação’ impôs-se, primeiro, pela

força das ideias e, depois, pela das armas. De 1792 até 1815, a guerra opôs

permanentemente a França às monarquias europeias. Napoleão Bonaparte,

herdeiro dessa guerra, tentou construir uma Europa Continental francesa. Mas a

obstinação britânica, que inspirava e financiava as diversas coligações das

coroas, acabaria por vencer o Grande Império. A França foi, então, vítima não

só dos reis como também dos povos, cujos sentimentos ajudara a despertar”

(CARPENTIER; LEBRUN, 1993, p. 277).

Page 29: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Sob o prisma das Relações Internacionais, convém observar a importância da

Potência hegemônica em um sistema e o grau de influência sobre os outros

Atores. Na Nova Ordem estabelecida a partir de Westfália, a França ascendeu à

condição de Potência hegemônica, que havia sido da Espanha sob os

Habsburgos. O século que se seguiu à Guerra dos Trinta Anos foi um século

francês, no qual a sociedade internacional era influenciada pela sociedade

francesa. Daí a expansão do Iluminismo pela Europa e Américas, os costumes

e até o idioma francês influenciando outros povos ou gerando reações

nacionalistas, como ocorre hoje com a língua inglesa e o american way of life.

Assim, o sistema passou a gravitar em torno da França. Essa ordem começou a

ruir quando se modificou o equilíbrio de poder no continente, em virtude de

transformações radicais no interior do hegemon. A maior dessas transformações

foi a Revolução Francesa, que abalou a estrutura de poder no interior da

Potência hegemônica e acabou repercutindo em todo o continente – chegando

inclusive ao Novo Mundo – com as guerras napoleônicas.

Mais um livro útil como referência sobre o período a partir de uma perspectiva

de

Relações Internacionais, além do já sugerido anteriormente - “Ascensão e

Queda

das Grandes Potências", de Paul Kennedy -, é "Diplomacia", de Henry

Kissinger.

Leia mais sobre a Guerra dos Trinta Anos acessando o sítio “Vultos e episódios

da Época Moderna”.

Page 30: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Unidade 2 - A Nova Ordem Internacional do Século XIX

Ao concluir o estudo desta Unidade, o aluno deverá ser capaz de discorrer

sobre os

principais aspectos das relações internacionais do século XIX, particularmente

sobre:

• Os antecedentes da Nova Ordem do século XIX: a Revolução Francesa e as

Guerras Napoleônicas;

• O congresso de Viena (1815) e o Concerto Europeu;

• As Revoluções do século XIX;

• os nacionalismos e as unificações da Itália e da Alemanha;

• a ascensão da Alemanha unificada como Grande Potência;

• o neocolonialismo;

• os novos atores entre as Grandes Potências fora da Europa;

• Estado-nação.

Bom estudo! Não se esqueça de fazer anotações, de abordar com

comprometimento os exercícios de fixação oferecidos e de,

sempre que possível, realizar atividades propostas para tornar o curso mais

dinâmico: filmes, livros, links na Internet.

Page 31: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 2 - A Nova Internacional do Século XIX - Antecedentes

A Revolução Francesa

A Revolução Francesa (1789) foi um evento que marcou profundamente a

sociedade europeia. Inspirada pelos ideais iluministas e liderada pela burguesia

com apoio popular, a Revolução tinha por lema "Liberdade, Igualdade,

Fraternidade" e ressonou em todo o mundo, da Europa ao continente americano,

pondo abaixo regimes absolutistas e ascendendo os valores burgueses. Foi

marco e referência para grandes transformações sociais e políticas que

aconteceriam pelo mundo nos séculos seguintes.

O Mapa 9 apresenta a configuração política da Europa à época da Revolução

Francesa. Note-se como a França Revolucionária estava cercada pelas

potências absolutistas defensoras do Antigo Regime. Apesar disso, os ideais

revolucionários se expandiriam para muito além das fronteiras do Reino da

França.

Mapa 9: A Europa à época da Revolução Francesa

Fonte:

http://perso.numericable.fr/alhouot/alain.houot/Hist/ancien_R/ancienr13.html

Page 32: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Registre-se que essa ressonância da Revolução Francesa foi tanto prática

quanto simbólica. A Revolução foi marcante por ter atingido a principal

monarquia europeia e o maior e mais populoso país europeu (se excluída a

Rússia). De fato, as transformações que marcariam a Europa e a civilização

ocidental no século XIX seriam influenciadas diretamente por aquelas mudanças

ocorridas no âmbito doméstico da França, então a Potência hegemônica no

continente. Nesse sentido, podemos perceber como transformações nas

Grandes Potências acabam afetando todo o sistema internacional,

proporcionalmente ao grau de poder dessa Potência.

Exemplo disso são as mudanças ocorridas nos EUA após o 11 de setembro de

2001 e seus efeitos em todo o globo.

Pág. 3 - A Nova Ordem Internacional do Século XIX - Antecedentes

Revolução Francesa (cont.)

Assim, para os defensores da ordem, a Revolução era perigosa, porque retirava

os alicerces do Antigo Regime. A título de exemplo, foi apenas em 1789 que,

pela primeira vez na história da França, uma Assembleia Nacional foi eleita e

aboliu o feudalismo e seus privilégios. Além disso, também naquele ano, a

Bastilha, o símbolo do poder real, foi tomada de assalto, palácios foram

saqueados e revoltas ocorreram no campo, com os camponeses se sublevando

e questionando, de maneira praticamente inédita no país, o modelo de servidão

estabelecido pelo sistema feudal. Como se não bastasse, uma Declaração dos

Direitos do Homem e do Cidadão foi proclamada como preparativo para uma

Constituição, e a Igreja foi subordinada ao Estado. Eram mudanças que

afetavam o cerne de uma ordem doméstica tradicional e que acabariam afetando

Page 33: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

as estruturas da ordem internacional que tinha a França como principal

protagonista.

Denominou-se Antigo Regime à ordem estabelecida na Idade Moderna na qual

a monarquia absolutista conjugou-se com as principais forças políticas da

sociedade: por meio do Mercantilismo, a monarquia aliou-se à burguesia e ao

mesmo tempo manteve-se unida à nobreza e ao alto clero, concedendo

privilégios a esses dois últimos grupos, muitas vezes em detrimento da burguesia

e sempre às custas dos impostos cobrados do povo.

Não tardou, pois, a reação. As Potências Europeias promoveram ataques contra

o território francês na tentativa de restabelecer o trono de Luís XVI e o Antigo

Regime (vide Mapa 10 – em roxo, a ofensiva dos países da coalizão). As

cabeças coroadas da Europa não poderiam arriscar que um de seus membros

mais importantes fosse derrubado por um levante popular.

Nesse contexto, Luís XVI tentou fugir para o exterior. Preso no meio do caminho,

foi levado de volta a Paris e guilhotinado. A República foi proclamada, e a França

se viu, externamente, em um estado quase permanente de guerra. Internamente,

a Revolução mergulhou no Terror – aproximadamente 40 mil pessoas morreram

– e na luta entre as diversas facções. Após um período de contrarrevolução e de

agravamento dos conflitos internos, o poder passou para as mãos dos generais.

Um deles, Napoleão Bonaparte, assumiu o controle do governo em novembro

de 1799.

Mapa 10: A Revolução Ameaçada (1792-1794)

Fonte:

http://perso.numericable.fr/alhouot/alain.houot/Hist/Rev_Emp/revemp3.html

Page 34: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 4 - A nova Ordem Internacional do Século XIX - Antecedentes

Napoleão Bonaparte

Napoleão, “na verdade, pertencia à tradição do despotismo esclarecido do

século XVIII. Da mesma maneira que os déspotas reformadores, admirava a

uniformidade e a eficiência administrativas, era avesso ao feudalismo, à

perseguição religiosa e à desigualdade civil e defendia a regulamentação

governamental na indústria e no comércio” (PERRY, 1999, p. 339).

Apesar de não se identificar com o republicanismo e com a democracia das fases

mais radicais da Revolução, Bonaparte era visto, pelos demais países europeus

como seu continuador. Isso se deu, em grande parte, porque o general corso

estendeu, “com diferentes graus de determinação e sucesso, (...) as reformas da

Revolução a outras terras. Seus funcionários instituíram o Código Napoleônico,

organizaram um serviço civil efetivo, abriram carreiras de talento e nivelaram os

encargos tributários. Além de abolir a servidão, os pagamentos senhoriais e as

cortes da nobreza, eliminaram os tribunais clericais, fomentaram a liberdade

religiosa, autorizaram o casamento civil, exigiram que se concedessem direitos

civis aos judeus e combateram a interferência do clero na autoridade secular.

(...) Napoleão dera início a uma revolução social de amplitude europeia, que

atacou os privilégios da aristocracia e do clero – que se referiam a ele como o

‘jacobino coroado’ – e beneficiou a burguesia” (PERRY, 1999, p. 344).

Vejamos como se deu a influência das ideias e das novas instituições, segundo

Duroselle (1976, p. 8):

Page 35: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

- As zonas “assimiladas”, anexadas ao território do grande Império, ou

efetivamente vassalas (reino da Itália): aí, os direitos feudais foram suprimidos,

a igualdade estabelecida perante a lei, o código napoleônico adotado e a

administração calcada sobre a da França.

- As zonas de “influência”, onde a anexação foi indireta, mas o Antigo Regime foi

eliminado pelas autoridades francesas. É o caso da maior parte da Alemanha

entre o Reno e o Elba, do Grão-Ducado de Varsóvia, do Reino da Sicília e do

Reino de Nápoles.

- As zonas de “resistência positiva”, essencialmente a Prússia, onde os dirigentes

(...) calcularam que o melhor meio de encerrar a luta contra a França era pôr em

prática extensas reformas sociais (abolição da servidão e dos direitos feudais).

- As zonas de “resistência passiva”, essencialmente a Áustria e a Rússia, onde

a luta contra a França não se fez acompanhar de nenhuma reforma profunda: o

sistema senhorial foi mantido na Áustria, a servidão e o Tchin (nobreza ligada à

função pública) na Rússia.

Enfim, a Inglaterra, depois de 1800 chamada de “Reino Unido da Grã-Bretanha

e Irlanda”, que, por um lado, jamais havia sido conquistada e, por outro, já

possuía um regime suficientemente liberal para que tivesse a tentação ardente

de imitar a França.

Page 36: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 5 - A Nova Ordem Internacional do Século XIX - Antecedentes

Napoleão Bonaparte (cont.)

Portanto, a Era Napoleônica foi marcada por uma série de conflitos armados

ocorridos entre 1799 e 1815, quando a França enfrentou várias alianças de

Potências europeias. O principal motivo das campanhas francesas, após 1789,

era defender e difundir os ideais da Revolução Francesa, mas, com a ascensão

de Napoleão, o objetivo passou a ser a expansão da influência e do território

franceses. O império napoleônico chegou a dominar parte significativa

daEuropa. Napoleão sonhava com uma Europa em que, sob a hegemonia

francesa, não houvesse mais espaço para as estruturas absolutistas do Antigo

Regime. Nessas regiões, as sementes dos ideais revolucionários de 1789 foram

plantadas e germinariam nas décadas seguintes. Para a contenção do

expansionismo francês, foram necessárias várias coalizões das Grandes

Potências.

No Mapa, pode-se ter a ideia da dimensão do Império Napoleônico em seu

apogeu (em verde).

Mapa 11: O Império Napoleônico em seu Apogeu (1810-1811):

Page 37: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 6 - A Nova Ordem Internacional do Século XIX - Antecedentes

Napoleão Bonaparte (cont.)

Em 1812, Napoleão conduziu uma campanha vitoriosa contra os russos

chegando até Moscou. Entretanto, a vitória logo se converteu em grande derrota.

Os russos simplesmente abandonaram Moscou, depois de destruir os campos

cultivados e de incendiar a cidade. Sem abrigo ou provisões, o exército francês,

enfrentando o rigoroso inverno, foi obrigado a deixar a Rússia sob o intenso fogo

do exército russo, perdendo aproximadamente 95% dos cerca de 600 mil

homens que participaram da desastrosa campanha.

Aproveitando-se do enfraquecimento de Napoleão, Áustria, Prússia, Rússia,

Inglaterra e Suécia formaram a 6.ª Coalizão e declararam guerra à França.

Napoleão derrotou os exércitos da Rússia e da Prússia, enquanto os exércitos

franceses estavam sendo derrotados na Península Ibérica por forças espanholas

e inglesas. Após a Batalha de Leipzig, a Batalha das Nações, em 1813, os

exércitos de Napoleão abandonaram os principados alemães. A rebelião contra

o império se estendeu à Itália, Bélgica e Holanda.

Em 1814, um grande exército da 6.ª Coalizão invadiu a França e ocupou Paris.

Napoleão, obrigado a renunciar, foi exilado na Ilha de Elba (próxima da Córsega,

sua terra natal), e a monarquia francesa restaurada com Luís XVIII, irmão de

Luís XVI. Os membros da Coalizão reuniram-se, então, no Congresso de Viena

para restaurar as monarquias na Europa.

No entanto, enquanto era traçado o novo mapa europeu, em março de 1815,

Napoleão fugiu de Elba, voltou à França, e iniciou a formação de um novo

exército. O rei enviou uma guarnição de soldados para prendê-lo, mas estes

aderiram a Napoleão. Luís XVIII fugiu para a Bélgica.

Page 38: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Contra Napoleão foi rapidamente formada uma 7.a Coalizão, composta por

Inglaterra, Áustria, Prússia e Rússia. Sem tempo para preparar um exército,

Bonaparte enfrentou novos combates, mas foi derrotado definitivamente

naBatalha de Waterloo (18 de junho de 1815). Napoleão foi então mantido

prisioneiro na Ilha de Santa Helena, no Atlântico Sul, onde morreu em 1821. Luís

XVIII reassumiu o trono francês com o apoio do Congresso de Viena. Chegaram

ao fim as Guerras Napoleônicas.

Apesar da derrota definitiva em 1815, as ações de Napoleão e os ideais

revolucionários atingiram, de forma irreversível, o Antigo Regime em boa parte

da Europa e aceleraram o processo de modernização do continente. Seus efeitos

alcançaram o continente americano, repercutindo nos processos de

independência de toda a América Latina e nos princípios jurídicos e políticos que

regeriam os novos governos na região. O mundo passou, portanto, por grandes

transformações em virtude da Era Napoleônica. As relações internacionais

nunca mais seriam como antes.

Pág. 7 - A Nova Ordem Internacional do Século XIX - Antecedentes

O Congresso de Viena (1815) e o Concerto Europeu

O fim das guerras napoleônicas marcou o início de um sistema internacional

baseado no equilíbrio de poder entre as Potências europeias que durou cem

anos, até a Primeira Guerra Mundial. Foi o mais longo período de paz da história

da Europa ou, pelo menos, o período em que não houve nenhuma guerra que

envolvesse, de forma generalizada, as Potências europeias. Durante 40 anos,

isto é, entre o Congresso de Viena e a Guerra da Crimeia (1854), não houve uma

guerra sequer entre as grandes Potências e, nos 60 anos seguintes, exceto pela

Guerra Franco-Prussiana de 1871, nenhum conflito importante ocorreu.

Page 39: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

O Congresso de Viena foi marcado pelo medo e pelas lembranças trazidas pelos

25 anos anteriores. Os homens que reconstruíram o mapa da Europa em 1815

o fizeram preocupados em evitar que a ordem sofresse novos abalos. Apesar de

todos os negociadores serem adversários da Revolução, estavam perfeitamente

conscientes de que a Europa de 1815 não poderia voltar a ser aquela de 1792.

Não obstante, estavam determinados a evitar novas catástrofes. Para isso,

seriam utilizados dois princípios: o da legitimidade e o do equilíbrio europeu. Nas

palavras de Duroselle (1976, p. 4):

Primeiro, restabelecer a ‘legitimidade’ dos soberanos. Mas ‘na ordem das

combinações legítimas, ligar-se de preferência àquelas que podem com maior

eficácia concorrer para o estabelecimento e conservação de um verdadeiro

equilíbrio’. Serão, então, utilizados com flexibilidade e em proveito dos grandes

Estados os dois princípios, um moral e jurídico, o da legitimidade, outro,

puramente prático, o do equilíbrio europeu.

Como resultado dos debates de Viena, o mapa da Europa sofreu alterações

importantes que refletiam a nova configuração de poder estabelecida pelas

Grandes Potências. A Alemanha, por exemplo, passou de 300 Estados para 38

(comparar o Mapa 12 com o Mapa 11).

Um fato, porém, não pode ser deixado de lado. Na conformação do novo sistema

de equilíbrio europeu, a França continuava a grande preocupação. Sua condição

hegemônica tinha sido excessivamente danosa para as outras Potências

europeias. O Congresso de Viena foi realizado sob o signo de se evitar que ela

ameaçasse novamente o resto do continente.

Dois tratados pós-Congresso de Viena merecem destaque. O primeiro é o

Tratado da Santa Aliança, firmado entre o Czar da Rússia, o Imperador da

Áustria e o Rei da Prússia, em 26 de setembro de 1815. O segundo é o tratado

Page 40: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

conhecido como o da Quádrupla Aliança, entre os Quatro Grandes (Inglaterra,

Rússia, Áustria e Prússia) em 20 de novembro de 1815.

Pág. 8 - A Nova Ordem Internacional do Século XIX - Antecedentes

O Congresso de Viena (1815) e o Concerto Europeu

O Tratado da Santa Aliança estabelecia a restauração na Europa da ordem

religiosa e monárquica, fundamento do Antigo Regime que a Revolução

Francesa quis derrubar. Fundando-se no mundo cristão, excluía o sultão

otomano, apesar de o Czar desejar que o sistema abarcasse a França e a

Espanha. Segundo Duroselle (1976, p. 5), “a ‘Santa Aliança’, produto dos sonhos

do Czar tinha pouca consistência, e que a verdadeira realidade era a Quádrupla

Aliança, assinada secretamente a 20 de novembro de 1815 entre a Rússia, a

Inglaterra, a Áustria e a Prússia, contra a França.”

Mapa 12: O Congresso de Viena (1815)

Fonte: http://perso.numericable.fr/alhouot/alain.houot/Hist/xix/xix1.html

Até 1830, o equilíbrio europeu foi assegurado graças aos entendimentos entre

Inglaterra, Rússia, Áustria e Prússia – os “Quatro Grandes” – e à estabilização

política da França. Como resultado de habilidosa diplomacia, já em 1818 os

franceses conseguiram associar-se à política de garantia da ordem na Europa.

Estava estruturado o Concerto Europeu, por meio do qual as Grandes Potências

europeias conduziriam o continente por décadas. O equilíbrio de forças entre

Inglaterra, Rússia, Áustria, Prússia e França garantia a estabilidade, uma vez

que nenhum desses Estados ou qualquer outro país europeu era

suficientemente poderoso para enfrentar sozinho uma coalizão formada pelos

demais. Assim, estabelecia-se um verdadeiro consórcio entre as Grandes

Potências europeias, que lhes permitiu projetar seu poder sobre toda a Europa

Page 41: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

e pelo mundo. O século XIX seria o século da Paz na Europa e da hegemonia

europeia sobre todo o planeta.

A partir de 1815, a ação dos países europeus intensificou-se em escala mundial.

A Inglaterra, por exemplo, divulgava mais e mais o liberalismo político e

econômico, e a expansão desses ideais liberais foi um dos objetivos da política

externa inglesa no século XIX, pela qual os britânicos atuaram, direta ou

indiretamente, na independência das colônias espanholas e portuguesas na

América e na organização dessas novas nações americanas. Da mesma forma,

os russos cada vez mais se preocupavam com a decadência e o fatiamento

territorial do Império Otomano. Isso explica, em grande parte, a concorrência e

a inimizade que iriam marcar as relações entre Inglaterra e Rússia em boa parte

do século XIX.

A Europa que emergiu do Congresso Viena estava ansiosa pela eliminação dos

traços da Revolução Francesa. Era uma Europa legitimista, clerical, desigual,

aristocrática e, principalmente, reacionária.

Importante registrar, no entanto, que o fantasma de 1789 não desapareceu.

Intelectuais, trabalhadores, liberais, democratas, burgueses estavam

descontentes com o restabelecimento do Antigo Regime. Sob diversos matizes

ideológicos, o século XIX testemunhou um longo desenrolar de revoluções.

Pág. 9 - A Nova Ordem Internacional do Século XIX - Antecedentes

O Século das Revoluções

A Europa pós-Congresso de Viena foi marcada pelo equilíbrio de poder entre os

Estados europeus, o que permitia certa estabilidade no cenário internacional.

Apesar desse quadro de tranquilidade, o século XIX foi tempo de revoluções

tanto políticas quanto econômicas.

Page 42: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Politicamente, houve três grandes ondas revolucionárias: 1820, 1830 e 1848. O

período entre 1817 e 1850 foi época de crise econômica e baixa de preços, ou

seja, período de grande tensão. As grandes ondas revolucionárias de 1830 e

1848, bem como as investidas contrarrevolucionárias, estão indicadas nos

Mapas 13 a 15.

A onda revolucionária de 1830 marca a derrota definitiva dos aristocratas pelo

poder burguês na Europa Ocidental e o triunfo do liberalismo moderado.

Propagou-se o sistema parlamentar (com inspiração no modelo britânico) de

qualificação por propriedade (voto censitário) sob monarquias constitucionais.

No Mapa 13, as estrelas em amarelo apontam as insurreições, as setas pretas

a propagação da onda revolucionária, e as setas vermelhas os movimentos de

repressão dessa onda.

Mapa 13: As revoluções de 1830

Fonte: http://perso.numericable.fr/alhouot/alain.houot/Hist/xix/xix4.html

Pág. 10 - A Nova Ordem Internacional do Século XIX - Antecedentes

O Século das Revoluções

A França era o ponto de irradiação, dada a classe média liberal e radical que se

formara com o movimento jacobino na época da Revolução Francesa. Em 1830,

também já era possível notar o aparecimento de uma classe operária como uma

força política autoconsciente e independente, que começava a reunir os

Page 43: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

jacobinos mais extremados. Já em 1848, a agitação popular tornava-se contrária

à classe média liberal (o “perigo vermelho”).

No Mapa 14, as setas vermelhas indicam a difusão da nova onda revolucionária

francesa e, as setas verdes, a difusão da onda austríaca. As estrelas vermelhas

e verdes apontam os centros revolucionários.

Mapa 14: As Revoluções de 1848

Fonte: http://perso.numericable.fr/alhouot/alain.houot/Hist/xix/xix5.html

Os radicais ficaram desapontados com o fracasso dos franceses em

desempenhar o papel de libertadores internacionais. Esse desapontamento,

junto com o crescente nacionalismo da década de 1830 e a nova consciência

das diferenças nos aspectos revolucionários de cada país, despedaçou o

internacionalismo unificado (centrado na França) a que os revolucionários

tinham aspirado durante a Restauração (o pós-1815). Em 1848, as nações de

fato se sublevaram separadamente.

Pág. 11 - A Nova Ordem Internacional do Século XIX - Antecedentes

O Século das Revoluções

Os radicais, os republicanos e os novos movimentos proletários se retiraram da

aliança com os liberais, dado que o liberalismo moderado se tornara hostil em

razão do seu maior medo, a república social e democrática (em oposição à

monarquia constitucional), a qual era, nesse momento, o slogan da esquerda.

No Mapa abaixo, os quadrados indicam os centros de contrarrevolução e as

setas o movimento da contrarrevolução.

Page 44: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Mapa 15: A Contrarrevolução de 1848

Fonte: http://perso.numericable.fr/alhouot/alain.houot/Hist/xix/xix6.html

De uma forma geral, as revoluções de 1848 foram revoluções sociais de

trabalhadores pobres. Quando se viram diante da revolução “vermelha” (ameaça

à propriedade), os moderados liberais e os conservadores se uniram. Os

trabalhadores ficaram isolados diante da união de forças conservadoras e ex-

moderadas aliadas ao velho regime. Com essa aliança, os regimes

conservadores restaurados estavam preparados para fazer concessões ao

liberalismo econômico. A década de 1850 viria a ser, de fato, um período de

liberalização sistemática: fim da legislação de guildas e liberdade para se praticar

qualquer forma de comércio; fim do severo controle estatal sobre a mineração;

realização de uma série de tratados de livre-comércio etc. Nesse momento, a

burguesia deixava de ser uma força revolucionária.

Esses fatos abriram o caminho para a Revolução Industrial a partir da segunda

metade do século XIX (vários autores se referem a ela como “Segunda

Revolução Industrial”, para distingui-la do avanço industrial no século XVIII).

Com a retirada da nobreza e a diversificação das formas de se fazer dinheiro

(início da chamada haute finance – conjugação dos capitais comercial e

financeiro), as décadas de 1850 e 1860 foram prósperas e capazes de incorporar

os cidadãos instruídos ao mercado de trabalho.

Page 45: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 12 - A Nova Ordem Internacional do Século XIX - Antecedentes

O Século das Revoluções

De 1850 até pelo menos 1873, o tempo foi de prosperidade. Como observa

Duroselle (1976, p. 21), a prosperidade, “interrompida por alguns recessos,

rompe o ímpeto revolucionário. Este só voltará a ressurgir na França em 1869

aproximadamente. Com um nível de vida momentaneamente acrescido, as

massas toleram mais facilmente o jugo, se tiverem a impressão de que o poder

favorece a expansão.”

Em termos gerais, em 1850, a ameaça revolucionária estava encerrada. Os

partidários da ordem estabelecida saíram vitoriosos. Em parte, o fracasso

revolucionário de 1848 se deveu ao “perigo vermelho”. Na França, Napoleão III

ascendeu ao poder, criando o II Império.

A outra grande revolução europeia foi de natureza econômica, como já referido,

com a Revolução Industrial. Após 1850, a economia europeia se expandiu com

rapidez. Novas máquinas e novas tecnologias apareceram por toda parte.

Napoleão III (1808-1873) foi o criador do Segundo Império francês na metade do

século XIX. Governou entre 1852 e 1870, até sua derrota na Guerra Franco-

Prussiana. Carlos Luís Napoleão Bonaparte era sobrinho de Napoleão I. Eleito

presidente da nova República Francesa, deu um golpe de estado em 1851, que

lhe permitiu assumir poderes ditatoriais e transformar a Segunda República no

Segundo Império. Entre as ações de política externa de Napoleão III estão a

intervenção na Guerra da Crimeia, o apoio ao Piemonte nas guerras que

enfrentou como consequência da unificação italiana e a promoção e instalação

de um efêmero Império no México, na pessoa de seu sobrinho, Maximiliano da

Áustria. Em 1870, por ocasião da Guerra Franco-Prussiana, a derrota do Exército

Page 46: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

francês na batalha de Sedan provocou o aprisionamento do Imperador, cujo

regime foi derrotado.

Pág. 13 - Antecedentes

O Século das Revoluções (cont.)

A Revolução Industrial modificou toda a sociedade europeia. Se na sociedade

pré-industrial do século XVIII a agricultura ainda era o centro das atividades

humanas, no século XIX a vida se deslocava progressivamente para as cidades

e para as indústrias. Simultaneamente, o poder, a influência e os valores da

aristocracia perderam força. Em seu lugar, ganharam importância o dinheiro e a

capacidade individual. A modernização da sociedade colaborou, também, para

a progressiva universalização do voto e para a secularização da sociedade. Por

fim, a tecnologia ampliou a diferença entre o Ocidente e as demais regiões do

mundo.

O Mapa 16 ilustra a Europa do século XIX sob plena efervescência da revolução

industrial. O mapa destaca as minas de carvão (em marrom), em torno das quais

se desenvolveram centros siderúrgicos (em vermelho) e industriais (em roxo).

Também na base da revolução industrial estava a indústria têxtil, cujos centros

são destacados em azul. O mapa registra, ainda, as principais cidades industriais

e os centros financeiros (quadrados verdes).

Mapa 16: A Europa Industrial no Século XIX

Fonte: http://perso.numericable.fr/alhouot/alain.houot/Hist/xix/xix3.html

Page 47: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Procure se informar mais sobre a Revolução Industrial, processo que alterou

definitivamente os rumos da História e a partir do qual as relações

internacionais seriam redefinidas, com o poder se concentrando cada vez mais

nas nações ditas "industrializadas".

Um livro interessante sobre o século XIX e a Revolução Industrial é Germinal,

de Émile Zola.

Amplamente considerada a obra máxima de Émile Zola, Germinal (1885)

elevou a estética e a descrição naturalistas a um novo patamar de realismo e

crueza. O romance é minucioso ao descrever as condições de vida subumanas

de uma comunidade de trabalhadores de uma mina de carvão na França. Após

ter contato com ideias socialistas que circulavam pela classe operária

europeia, os mineradores retratados na obra revoltam-se contra a opressão e

organizam uma greve geral, exigindo condições de vida e trabalho mais

favoráveis. A manifestação é reprimida e neutralizada, entretanto permanece

viva a esperança de luta e conquista.

Page 48: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 14 - Antecedentes

Divisão da Europa – Nacionalidade X Legitimidade

A Europa de 1815 foi construída sobre o princípio de que era essencial preservar

o continente de uma possível ameaça francesa. Assim, no redesenho do mapa

continental, o princípio da nacionalidade fora deixado em segundo plano. Nem

por isso, no entanto, inexistia a afirmação da nacionalidade.

O nacionalismo foi um dos filhos das ondas revolucionárias da primeira metade

do século XIX. O nacionalismo se propagou a partir da classe média e teve nas

escolas e nas universidades seus grandes defensores. Vários movimentos

nacionalistas jovens começaram a se espalhar a partir das revoluções de 1830:

a Jovem Itália, a Jovem Polônia, a Jovem Suíça, a Jovem Alemanha, a Jovem

França e a Jovem Irlanda.

Parte da onda nacionalista vinha dos escombros do Império Otomano, o qual,

nas palavras do Czar, era o ancião enfermo da Europa.

Progressivamente, o Império Otomano foi perdendo terras para austríacos,

russos e para nações que iam surgindo de suas fraquezas. A primeira delas foi

a Grécia, cuja independência foi tema de preocupação durante toda a década de

1820. Finalmente independente em 1830, serviu como exemplo para muitos

outros: a Sérvia, alguns anos depois, conquistava autonomia, e, em 1856,

Romênia e Bulgária se tornaram independentes.

O Império Otomano existiu aproximadamente de 1300 a 1922 e, no período de

maior extensão territorial, abrangeu três continentes: da Hungria, ao norte, até

Aden, ao sul, e da Argélia, a oeste, até a fronteira iraniana, a leste, embora

centrado na região da atual Turquia. Por meio do Estado vassalo do janato da

Crimeia, o poder otomano também se expandiu na Ucrânia e no sul da Rússia.

Seu nome deriva de seu fundador, o guerreiro muçulmano turco Osman (ou

Utman I Gazi), que fundou a dinastia que governou o império durante sua

história.

Page 49: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

No restante da Europa, no entanto, apenas a Bélgica se tornou independente da

Holanda, em 1830. Para isso, assumiu o caráter de nação neutra, com aval das

Grandes Potências. A neutralidade belga, garantida pela Grã-Bretanha, seria

violada em 1914 pelo avanço alemão contra a França e contribuiria para que

Londres declarasse guerra a Berlim.

Outras tentativas de independência no continente europeu fracassaram. A

Polônia não conseguiu a autonomia diante da Rússia (1830), e a Hungria

alcançou uma semi-independência em relação à Áustria (1867). Dos

movimentos nacionais de afirmação, os mais importantes foram os da Itália e da

Alemanha, países que se unificaram a partir da segunda metade do século. De

fato, a unificação da Itália e, sobretudo, a da Alemanha, seriam acontecimentos

importantes para alterar o equilíbrio de poder na Europa estabelecido pelo

Concerto Europeu, e afetariam diretamente as relações internacionais do

período, culminando nos processos que levaram à I Guerra Mundial.

Os processos de unificação da Itália e da Alemanha podem ser percebidos no

Mapa 17.

Page 50: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 15 - Antecedentes

A Unificação da Itália

A unificação da Itália foi resultado de uma habilidosa política externa e do

aproveitamento das oportunidades quando elas surgiram. O artífice desse

processo foi Cavour, primeiro-ministro do Estado do Piemonte (norte da

península itálica). Ele conseguiu, graças às alianças com Napoleão III, um aliado

contra os austríacos que ocupavam o norte da Itália. A sua primeira vitória se

deu em 1858. Em troca da cessão da cidade de Nice e da região de Saboia,

Cavour obteve a promessa de auxílio da França ao Piemonte em uma eventual

guerra deste contra a Áustria. Por ocasião do conflito, entretanto, a ajuda

francesa seria menor do que o esperado, e Napoleão III, receoso das possíveis

implicações que uma aliança contra a Áustria poderia ter, acabou retirando seu

apoio antes do esperado. Mesmo assim, o Piemonte se viu vencedor e aumentou

seu território com a conquista da Lombardia.

Camillo Benso, conde de Cavour (1810-1861), político italiano, foi Presidente do

Conselho em 1852. Aliou-se a Napoleão III contra a Áustria, porém este firmou

a paz em 1859 sem consultá-lo. Cavour demitiu-se quando Victor Emanuel II,

Rei da Sardenha, aceitou as condições do Imperador francês. No início de 1860,

ajudou Giuseppe Garibaldi na conquista do Reino das Duas Sicílias. Conseguiu

a proclamação do Reino da Itália em17 de março de 1861 e de Vítor Emanuel II

como seu primeiro soberano.

Mapa 17: Unificação da Itália e da Alemanha no Século XIX

Fonte: http://perso.numericable.fr/alhouot/alain.houot/Hist/xix/xix7.html

Page 51: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Posteriormente, pequenos Estados italianos – Parma, Módena, Toscana e

Romanha – votaram pela união com o Piemonte. Com as conquistas do sul da

península, foi proclamado o reino da Itália, em 1861. Faltavam, porém, a cidade

de Roma e o Vêneto. Só em 1866 La Vénétie foi incorporada, como recompensa

pelo apoio dos italianos aos prussianos durante a guerra contra a Áustria. Roma,

por fim, foi ocupada em 1870, quando os franceses retiraram os seus soldados

da cidade em razão da Guerra Franco-Prussiana. Com a anexação de Roma e

dos Estados Papais, estava consolidada a unificação da Península Itálica sob

uma única autoridade: o Reino da Itália.

Pág. 16 - Antecedentes

A Unificação da Alemanha

Não seria temerário afirmar que a unificação da Alemanha, ocorrida em 1871,

foi, após o Congresso de Viena, o evento mais importante da política

internacional do século XIX. A unificação alemã provocou o desmoronamento

dos fundamentos do equilíbrio internacional surgidos em 1815 e levou a política

internacional ao retorno às lutas irrestritas do século XVIII. Ademais, seus efeitos

estariam diretamente relacionados com eventos marcantes do século seguinte,

como a I e a II Guerras Mundiais, a Guerra Fria e a integração europeia.

O principal temor dos franceses do século XVII era a unificação alemã. Richelieu,

por exemplo, via na Alemanha unificada uma ameaça potencialmente mais

perigosa para a França. A unificação, entretanto, somente foi possível porque a

Prússia conseguiu, ao longo de 150 anos, construir um Estado forte o bastante

para que pudesse, no fim do século XIX, almejar a preponderância entre os

Estados alemães.

Page 52: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Também não se pode esquecer a ação deBismarck, primeiro-ministro prussiano

que soube, por meio de uma política interna autoritária e uma política externa

cuidadosa e pragmática, unificar a Alemanha. A maneira racional, pragmática e

calculada como Bismarck conduziu a política alemã ficou conhecida como

Realpolitik.

Assim, externamente, o Chanceler prussiano foi bem-sucedido em três guerras.

Junto com a Áustria, atacou e conquistou territórios da Dinamarca, em 1864.

Dois anos depois, a luta pelos espólios dessa conquista fez com que os

austríacos declarassem guerra à Prússia. Vencedores, os prussianos

conseguiram afastar a Áustria dos assuntos alemães. Continuando com a sua

Realpolitik e derrotada a Áustria, Bismarck conquistou territórios e forçou os

Estados alemães menores a se aliarem a ele.

Em 1871, sabedor de sua vantagem militar, Bismarck provocou os franceses.

Estes declararam guerra e foram rapidamente derrotados. Como vitória,

Bismarck conseguiu o apoio suficiente de que necessitava para que os outros

Estados alemães aceitassem integrar-se à Prússia, formando o Império Alemão,

ou Segundo Reich

Otto von Bismarck (1815-1898), o “Chanceler de Ferro”, foi o grande artífice e

primeiro chanceler do segundo império alemão. Seu pai era um latifundiário de

origem nobre, e sua mãe pertencia à burguesia. Em sua personalidade, fundiam-

se a sutileza intelectual e o provincianismo da aristocracia conservadora. Entrou

na política em 1847. Como delegado da primeira Dieta prussiana, destacou-se

como um dos mais férreos conservadores. Quando eclodiu a Revolução de 1848,

foi para Berlim e pediu que o rei Frederico Guilherme IV reprimisse a sublevação.

Seu conselho não foi levado em consideração, mas sua lealdade foi

recompensada ao ser nomeado representante prussiano na Confederação

Germânica, a liga dos 39 estados alemães, em 1851. Passou a ser embaixador

na Rússia em 1859 e foi designado para a França em 1862. Designado

Page 53: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Chanceler prussiano no mesmo ano, procedeu com uma série de reformas

internas e deu início à suaRealpolitik, que garantiria a vitória sobre Grandes

Potências europeias, como a Áustria e a França, e conduziria à unificação alemã.

Em 1890, desentendeu-se com o Kaiser (ou Imperador) em virtude do

direcionamento da Política Externa do Reich, sendo demitido e deixando a vida

pública.

Depois da unificação, a Alemanha desenvolveu-se de maneira significativa,

sobretudo nas áreas industrial e militar. Em três décadas, o país já se mostrava

a principal Potência do continente em desenvolvimento industrial e tecnológico,

superando a França. Ademais, com uma intensa política de construção naval,

logo as marinhas mercante e de guerra alemãs ameaçavam a hegemonia

britânica no mundo.

Na virada do século, os alemães já deixavam claro que desejavam ocupar seu

lugar de destaque entre as Grandes Potências, sendo fundamental para isso o

estabelecimento de um império colonial e a conquista de novos mercados pelo

planeta. Entretanto, as pretensões do Reich acabariam chocando-se com os

interesses das Grandes Potências tradicionais – em especial, Grã-Bretanha e

França –, o que levaria a Europa à Primeira Guerra Mundial, em agosto de 1914.

Pág. 17 - Antecedentes

Expansão colonial

Outro aspecto importante da Sociedade Internacional do século XIX é a nova

expansão colonial. Durante todo o século, mas sobretudo em sua segunda

metade, desenvolveu-se um processo de conquistas europeias sobre a África e

Ásia, denominado Neocolonialismo. Na virada do século, praticamente todo o

Page 54: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

continente africano, à exceção da Etiópia e da Libéria, estava sob jugo das

Potências europeias como parte de seus impérios coloniais.

O Neocolonialismo foi a principal expressão do Nacionalismo e do Imperialismo,

este último a forma assumida pelo capitalismo a partir da Segunda Revolução

Industrial, segundo os globalistas.

Os defensores do Estado-nação entendiam o Estado como progressista (capaz

de desenvolver uma economia, tecnologia, organização burocrática e força

militar viáveis), ou seja, precisava ser pelo menos territorialmente grande. Para

a sociedade burguesa moderna, liberal e progressista, a unidade estatal natural

deveria ser extensa, daí o decorrente expansionismo colonial. O padrão de

programa nacional do século XX seria diferente: Estado totalmente

independente, homogêneo territorial e linguisticamente, laico e provavelmente

republicano/parlamentar.

O sionismo, que refundaria o Estado de Israel, seguiria esse padrão: tomar o

território, inventar uma língua e laicizar as estruturas de um povo cuja unidade

histórica havia sido apenas a prática de uma religião comum.

A concepção nacionalista de Estado do século XIX se casou perfeitamente com

os objetivos capitalistas. O domínio das Potências europeias sobre povos dos

outros continentes não foi apenas econômico, mas também militar, político e

social, impondo à força um novo modelo de organização do trabalho que

pudesse garantir, principalmente, a obtenção de matéria-prima para as indústrias

Page 55: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

europeias. À violência militar e à exploração do trabalho somam-se as

imposições sociais, incluindo a disseminação do cristianismo entre os povos

nativos, num processo de aculturação, sob a justificativa de que se estaria

levando os valores ocidentais da “civilização” aos povos primitivos. Era o “ideal

civilizador do homem branco”.

Nesse processo mercantil-civilizador, a África foi conquistada e dividida, o

mesmo acontecendo com parte da Ásia. Impérios tradicionais como a China

sucumbiram à hegemonia europeia. O mundo nunca se mostrara tão

eurocêntrico, e as nações europeias efetivamente eram as protagonistas das

relações internacionais. O planeta como um todo tornou-se o tabuleiro do jogo

de poder entre as Potências europeias.

Pág. 18 - Antecedentes

Expansão Colonial (cont.)

Paralelamente ao fornecimento de matéria-prima pelas colônias, os europeus

buscavam mercados consumidores para seus produtos em outras partes do

mundo, por exemplo, no continente americano. E esses mercados eram

disputados pelas Grandes Potências.

A partir da segunda metade do século XIX, portanto, as preocupações europeias

se tornaram mundiais. As rivalidades se projetavam nos outros continentes. “O

século XIX é extraordinariamente dinâmico: vai assistir-se à expansão da Europa

pelo mundo, tanto pela ação política dos seus Estados, pelos fluxos migratórios,

pelo escoamento das suas economias, como pela sua influência civilizadora.”

(PELLISTRANDI, 2000, p. 115). As Grandes Potências europeias cuidavam de

estabelecer seus impérios coloniais subjugando os povos dos outros

continentes, particularmente da Ásia e da África. O quadro de 1914, conforme

Page 56: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

ilustra o Mapa 18, seria de um mundo partilhado entre as Potências Europeias,

com a Grã-Bretanha e França detentoras dos maiores impérios coloniais.

Mapa 18: Impérios Coloniais em 1914

Fonte: http://perso.numericable.fr/alhouot/alain.houot/Hist/xix/xix8.html

Especialmente importante é o Congresso de Berlim, em 1885. As razões

políticas do imperialismo de final do século XIX eram tão importantes quanto as

razões econômicas. Para as nações recém-unificadas – Itália e Alemanha – a

obtenção de territórios na África e na Ásia significava prestígio e

autorreconhecimento. Para a França, profundamente traumatizada após a

derrota de 1871 (na Guerra Franco-Prussiana), as conquistas coloniais eram um

meio de readquirir respeito.

Pág. 19 - Antecedentes

As novas Potências – Estados Unidos da América e Japão

A segunda metade do século XIX vê também o aparecimento de dois Atores

importantes no jogo político internacional: Estados Unidos da América (EUA) e

Japão.

Os EUA começaram a se projetar como Potência após a violenta Guerra Civil,

travada para impedir a separação dos estados do sul do país. Pouco antes, os

norte-americanos haviam consolidado o seu processo de expansão colonial às

expensas do México. Além disso, em 1867, compraram da Rússia o Alasca e,

Page 57: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

após derrotarem a Espanha, em 1898, adquiriram Porto Rico, Filipinas e um

virtual controle sobre Cuba. Da mesma forma, o Oceano Pacífico tornava-se uma

área de projeção de poder dos EUA.

Internamente, os EUA iniciaram um vigoroso processo de industrialização graças

a um mercado interno crescente, a uma estrutura tarifária protecionista para

afastar a concorrência estrangeira, a uma estrutura estável de comércio e ao

grande número de inovações tecnológicas. Em 1914, às vésperas da I Guerra

Mundial, o país já era, de longe, a principal Potência industrial do planeta.

Sobre a situação dos EUA frente a outras potências na virada do século, vide

Paul Kennedy, op.cit.

O Japão é outro exemplo de rápido crescimento econômico. Até 1854,

mantivera-se fechado ao exterior. Nesse ano, uma esquadra norte-americana

forçou o país a abrir-se e aceitar o comércio com o exterior. “Decidido a preservar

a independência do país, um grupo de samurais (...) tomou o governo. A

Restauração Meiji de 1867, como ficou conhecido esse episódio, devolveu o

poder ao imperador” (PERRY, 1999, p. 473).

Inspirado por uma forte ideologia nacionalista, o governo Meiji iniciou um

importante conjunto de reformas: os privilégios sociais foram eliminados, o

serviço militar obrigatório foi implantado, uma Constituição foi elaborada, e

passou a existir parlamento. Além disso, a economia foi rapidamente

modernizada. Fábricas foram instaladas, tecnologia europeia foi comprada,

ferrovias, portos, estradas e telégrafos instalados. Em menos de 20 anos, o novo

Page 58: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

poder japonês dava sinais de existência: em 1894, derrotava a China, e, em

1905, a Rússia.

Na Guerra Russo-Japonesa (1904-1905), pela primeira vez na era moderna

uma Potência do Oriente derrotava um poderoso Estado europeu.

Pág. 20 - Antecedentes

O Estado-nação

O Estado-nação é o resultado moderno da experiência de formação e construção

do Estado desde Westfália e pressupõe a formação propriamente dita de uma

burocracia (no sentido de separação dos meios administrativos dos patrimônios

particulares dos agentes da administração). Testemunhou-se um processo de

racionalização da atividade estatal. A relação entre poder político e território

sofreu uma revolução, com uma completa transformação das relações do poder

político central com as múltiplas tradições locais – o estabelecimento de uma

única lei, uma única língua, uma única política fiscal e preceitos políticos

uniformes para todo um território.

Havia razões políticas e econômicas por trás desse processo. De um lado, a

necessidade de um contrato social voltado para a “coisa pública”, em que os

“objetivos públicos” deixariam de ter nos corpos estamentais de privilégios os

intermediários da ação político-administrativa estatal; e, de outro, a necessidade

de facilitar a circulação dos bens num território, através da redução, simplificação

e uniformização do sistema tributário (com a superação da fragmentação

legislativa e do patrimonialismo fiscal), e de estimular o equilíbrio entre as regiões

de um Estado e o aumento das trocas inter-regionais.

Page 59: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Uma das consequências desse processo foi a anulação sistemática das

tradições locais de vários povos; ou seja, a partir das várias identidades dever-

se-ia inventar uma identidade nacional que integrasse a população em novos

referenciais de pertencimento, de associação. Assim, os vários Estados

buscaram constituir internamente suas nações. A mesma demanda conjuntural

ocorria nas grandes massas territoriais e étnicas do centro-leste europeu

(Império Prussiano, Império Austro-Húngaro e Império Russo). Todos passaram

a buscar pelo caráter de sua nação e a igualmente se perguntar se de várias

nações era possível formar um espírito comum. Enfim, construir um Estado-

nação significou, do século XIX ao XX, não apenas desenvolver uma economia

e uma organização econômico-político-militar viável, mas também agrupar vários

grupos sociais localmente circunscritos com suas línguas, tradições, costumes e

leis próprias num grande agrupamento social politicamente representado e

juridicamente nivelado por um Estado laico regido por um conjunto geral de leis

soberanas – a Constituição.

Estados constitucionais e não constitucionais aprenderam a avaliar a força

política que era a capacidade de apelar para seus súditos na base da

nacionalidade (o Czar da Rússia não apenas baseava seu governo nos

princípios da autocracia e da ortodoxia como passou a apelar aos russos como

russos na década de 1880). A escola primária passou a ser o meio de se ensinar

às crianças a serem bons súditos e cidadãos. Os Estados criaram nações, ou

seja, o patriotismo nacional, e cidadãos linguística e administrativamente

homogeneizados (a Itália usou a escola e o serviço militar para fazer italianos,

os EUA tornaram o conhecimento da língua inglesa condição para a cidadania

americana, a Rússia tentou dar à língua russa o monopólio da educação, com o

fim de “russificar” as nacionalidades menores). Esse processo auxiliava a definir

as nacionalidades excluídas da nacionalidade oficial, que, caso contrário,

poderiam vir a oferecer resistência e a se refugiar em algum partido socialista.

Page 60: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Esse era o pano de fundo para um século “de extremos”, o século XX, em que

os principais Atores internacionais se confrontariam numa intensidade nunca

antes vista na história da Sociedade Internacional.

Pág. 21 - Conclusão

O período de 1815 a 1914, quando comparado aos séculos anteriores e ao

século XX, foi de relativa paz para a Europa. Excetuando-se a Guerra da

Crimeia (1854), não existiram grandes conflitos entre as principais potências.

O sistema de equilíbrio de poder estabelecido no Congresso de Viena

mostrou-se bastante bem-sucedido e só foi desarticulado a partir do momento

em que Bismarck conseguiu unificar a Alemanha.

Após 1871 e especialmente após 1890, a Europa viveu tempos de incerteza.

A guerra voltou a ser considerada alternativa cada vez mais provável. França

e Alemanha não poderiam se reconciliar por causa da Alsácia-Lorena, território

que a primeira perdera para a segunda na Guerra Franco-Prussiana de 1870-

1871. França e Inglaterra estavam envolvidas em um grande processo de

divisão colonial na África. A Inglaterra e a Rússia, por causa da Índia e da Ásia

Central, encontravam-se em permanente estado de tensão. Na Ásia, uma nova

Potência surgia: o Japão. Além disso, a mais complexa das áreas de conflito

não pode ser esquecida: os Bálcãs. Ali, os interesses contraditórios de Áustria-

Hungria, Rússia, Sérvia e Império Otomano fomentavam uma rivalidade

crescente. Uma disputa de poder daria início à I Guerra Mundial (1914-1918),

que, por sua vez, poria fim à “Era dos

Impérios”.

Page 61: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

A Era dos Impérios, de Eric Hobsbawm (Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988), é

obra fundamental para a compreensão do período que antecede a I Guerra

Mundial e no qual se consolida a hegemonia europeia no mundo.

Page 62: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Unidade 3 - A I Guerra Mundial e os Entre-Guerras

Ao final desta unidade, o aluno deverá ser capaz de:

• identificar os principais fatos que levaram à deflagração da I Guerra Mundial;

• descrever a dinâmica de desenvolvimento da I Guerra Mundial;

• explicar a relação entre o Congresso de Versalhes e o estabelecimento de

uma

nova ordem internacional;

• deliminar o estabelecimento da Crise de 1929.

Esperamos que você tenha um excelente aproveitamento em seus estudos!

Page 63: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 2 - A I Guerra Mundial

Para muitos estudiosos das relações internacionais, o século XX não se inicia

em 1901, mas em 1914, com a deflagração do maior de todos os conflitos que o

mundo presenciara até então: a I Guerra Mundial. Durante muito tempo chamado

de a Grande Guerra, esse conflito, que durou de 1914 a 1918, iniciou-se na

Europa e acabou envolvendo outras nações do globo, inclusive novas Potências

emergentes que não pertenciam ao continente europeu, com destaque para os

EUA e o Japão.

Nunca se havia tido um conflito tão destrutivo e arrasador como a I Guerra

Mundial. Trata-se do primeiro grande confronto internacional da era industrial.

Foi maciço o uso das ferrovias, e “os caminhões se tornaram tão importantes

quanto os cavalos no abastecimento de soldados no campo” (ROBERTS, 2002,

p. 681). Pela primeira vez, foram empregados de maneira efetiva novos

equipamentos de combate, como o avião e o tanque de guerra. Também foram

utilizados, por ambos os lados em luta, gases letais, responsáveis por milhares

de baixas.

http://www.brasilescola.com/

Ao final do conflito, o sistema internacional mudaria definitivamente. A Europa

sofreria intensa destruição, os impérios coloniais começariam a ruir, e a

hegemonia europeia no mundo daria seus últimos suspiros. A Sociedade

Internacional se apresentaria ainda mais complexa e com novos Atores não

europeus a ditar suas regras. A Belle Époque seria apenas nostalgia.

Page 64: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 3 - A I Guerra Mundial

Causas da Grande Guerra

Crise e incerteza. Esses eram os sentimentos que dominavam a Europa após

1890. Essa data não é aleatória. É o ano em que Bismarck deixa de ser o

Chanceler alemão. Bismarck sabia muito bem o que queria: manter a França

permanentemente enfraquecida e sem chances de revanche, além de afastada

das preocupações territoriais. Seus sucessores, especialmente o

KaiserGuilherme II, não tinham planos nesse sentido, ou, se os tinham, eram

confusos, erráticos e provocativos. A isso se somava o fato de que cada país

europeu tinha a sua lista de reivindicações.

A França não esquecia a perda da Alsácia-Lorena para a Alemanha. Tal fato era

o motor do nacionalismo francês. Além disso, preocupada em recuperar

prestígio, a França lançou-se, com todas as suas forças, na corrida colonial.

A Rússia buscava expandir-se na Ásia Central, no Extremo Oriente e nos Bálcãs.

Como resultado dessa política, atritou-se com os ingleses na disputa pelo

Afeganistão, com o Japão (guerra em 1905), e permanecia em constante estado

de tensão com os austríacos e com os otomanos pela hegemonia da península

balcânica.

Convém lembrar que a França havia sido derrotada na Guerra Franco-

Prussiana, duas décadas antes.

Entre outras consequências, havia perdido o território da Alsácia-Lorena para

os alemães. As décadas que se seguiram à derrota francesa foram marcadas

por um profundo sentimento revanchista, pela baixa estima francesa e pelo

desejo de ver a Alemanha subjugada a qualquer custo.

Page 65: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 4 - A I Guerra Mundial

Causas da Grande Guerra

Os britânicos, por sua vez, temiam as ambições russas na Ásia Central e as

pretensões coloniais francesas na África. Passaram, também, a temer cada vez

mais os alemães, principalmente depois que estes ensejaram uma política de

construção naval em 1897. Além disso, a Alemanha unificada revelou-se

formidável concorrente econômica, superando os ingleses em áreas como

química, siderurgia e energia, mostrando-se, por fim, a partir da queda de

Bismarck, mais e mais interessada em estabelecer um império colonial e disputar

espaço com outros países europeus na África e Ásia.

A Áustria-Hungria era percebida, assim como a Rússia e o Império Otomano,

como a Potência decadente da Sociedade Europeia. Cercados por todos os

lados, os austríacos tinham interesses conflitantes com os russos e com os

eslavos da península balcânica. Além disso, sendo um país multiétnico, o

Império Austro-Húngaro defrontava-se com crescentes pressões domésticas das

minorias internas que desejavam maior autonomia. Cada vez mais, a Áustria-

Hungria sustentava sua segurança no apoio da Alemanha. Tratados de não

agressão e assistência recíproca foram celebrados entre os dois Estados

germânicos nos anos anteriores à I Guerra Mundial.

O temor de Bismarck de ver a Alemanha ameaçada nos fronts oriental e

ocidental tornou-se realidade, em grande parte, em virtude da política externa de

Guilherme II. Preocupado em mostrar-se forte e influente, mas sem a habilidade

política de Bismarck, o Kaiser acabou atraindo para si muitos inimigos. Grã-

Bretanha, França e Rússia se aliaram, principalmente, para fazer frente ao

poderio alemão.

Page 66: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Para agravar a situação, as políticas governamentais nas Potências europeias

eram ditadas por ânimos nacionalistas e não havia nenhuma instituição

internacional que pudesse mediar conflitos. O Congresso de Viena há muito

deixara de ter importância e nada de significativo surgira em seu lugar. É verdade

que existia, desde 1899, a Corte Internacional de Justiça de Haia. Infelizmente,

no entanto, ela se mostrou ineficaz. A paz anterior a 1914 era obtida pelas

ameaças mútuas, e não pelas decisões da Corte de Haia. A guerra, por sua vez,

era articulada por meio de alianças secretas entre as Potências: era a diplomacia

secreta que marcava as relações internacionais da Europa até a I Guerra

Mundial.

Acrescente-se a isso o recrudescimento dos discursos nacionalistas, como o

pan-germanismo e o pan-eslavismo, que pregavam a reunião dos povos de etnia

germânica e eslava, respectivamente, em uma só nação, ou a coalizão dos

Estados de uma mesma etnia contra ameaças de Estados de outras. Esses

movimentos também questionavam a existência de impérios multiétnicos como

o Otomano, o Austro-Húngaro e mesmo o Russo, e defendiam a independência

dos povos sob o jugo de Viena, Constantinopla e São Petersburgo. Outra forma

de nacionalismo era o francês, com forte viés revanchista contra a Alemanha e

desejoso de recuperar a “grandeza da França”. As minorias nacionais como se

encontravam na Europa de 1914 podem ser vistas no Mapa 19.

Mapa 19: A Europa de 1914 – Minorias Étnicas

Ainda sobre a Grande Guerra, indica-se Coronel Redl, de István Szabó, que

mostra o funcionamento do exército austro-húngaro às vésperas da Primeira

Guerra.

Preste atenção no modo como a organização militar se fundava em valores

como tradição e separação em classes.

Page 67: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 5 - A I Guerra Mundial

Causas da Grande Guerra

Assim, as relações internacionais às vésperas da I Guerra Mundial eram

marcadas pela disputa entre as Grandes Potências por mercados e pelo

interesse das novas Potências, em especial a Alemanha e a Itália, de possuírem

impérios coloniais e de se equipararem às principais Potências coloniais

europeias. Também caracterizava as relações internacionais anteriores à

Grande Guerra uma significativa corrida armamentista entre os principais Atores

europeus, com rivalidades que afloravam entre eles e refletiam-se em um

sistema de alianças estabelecidas, na maior parte das vezes, por meio da

diplomacia secreta.

As diferenças entre as Potências eram, ademais, significativas. Na arena

europeia havia novas Potências, como a Alemanha e a Itália, que desejavam

ampliar seu poder e tinham interesses conflitantes com as Grandes Potências

tradicionais e ainda poderosas Grã-Bretanha e França, que buscavam manter-

se na liderança da Sociedade Internacional a qualquer custo. Havia, ainda, os

grandes impérios em decadência – o Império Russo, o Império Austro-Húngaro

e o Império Otomano – que, em virtude das dificuldades domésticas, em especial

dos movimentos nacionalistas separatistas em seu interior, viam-se

enfraquecidos demais para permanecerem, ainda durante muito tempo, em

condição de igualdade com a Grã-Bretanha, a França e a Alemanha.

No início do século XX, a estrutura do Concerto Europeu fora definitivamente

substituída pela política de alianças. De um lado, ainda sob a articulação de

Bismarck, as chamadas Potências Centrais – Alemanha e Áustria – assinaram

com a Itália, em 1882, o Tratado da Tríplice Aliança, que dava a cada parte

garantia de assistência das demais em caso de ataque por uma Potência

externa. Como resposta à Tríplice Aliança, franceses, britânicos e russos

Page 68: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

constituíram a Tríplice Entente, a qual reuniria as Potências aliadas na Grande

Guerra.

A Europa, antes de 1914, viu-se, pois, em uma série de crises. Após sobreviver

a duas ou três realmente graves, o assassinato do Arquiduque Francisco

Ferdinando, herdeiro do trono austro-húngaro, foi o estopim que deu início ao

conflito.

A Áustria considerou o assassinato a oportunidade ideal para resolver, de forma

definitiva, os problemas com a Sérvia. Sob a alegação de que o governo sérvio

era responsável pelo assassinato, fez uma série de exigências. Em suas

exigências, os austríacos contavam com o apoio irrestrito do Kaiser alemão.

Sobre o conflito... Em 28 de junho de 1914, o arquiduque Francisco Ferdinando

e sua esposa foram assassinados por um nacionalista sérvio quando visitavam

a cidade de Sarajevo, que se encontrava em uma região conturbada do

Império Austro-Húngaro.

Pág. 6 - A I Guerra Mundial

Causas da Grande Guerra

A Sérvia, por sua vez, como país eslavo, acreditava que contaria com o apoio da

Rússia. Como em um dominó, o sistema de alianças fez com que a guerra entre

austríacos e sérvios atingisse, também, alemães e russos. Estes últimos, graças

Page 69: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

a outra aliança, atraíram para o conflito os franceses. Os ingleses entraram na

guerra para defender a Bélgica, país que fora invadido pelos alemães. Assim,

um sistema de alianças rígido e um sistema de mobilização militar conduziram

os europeus para a Guerra. De um lado, estavam Inglaterra, França, Rússia e

Sérvia. De outro, Alemanha e Áustria-Hungria. Durante o desenrolar do conflito,

muitos outros países se envolveriam. O Mapa 20 retrata essas alianças às

vésperas da I Guerra Mundial

Mapa 20 : A Europa de 1914 – As Alianças

Fonte: http://www.geografiaparatodos.com.br/index.php?pag=mapastematicos

Sobre a Guerra: As hostilidades se iniciaram quando, diante da ineficácia das

gestões diplomáticas, a Áustria declarou guerra à Sérvia, em 28 de julho de

1914. A Rússia, aliada dos sérvios, mobilizou-se contra a Áustria, e a

Alemanha, aliada do Império Austro-Húngaro, declarou guerra à Rússia em 1.º

de agosto. As tropas alemãs cruzaram a fronteira de Luxemburgo, em 2 de

agosto, e, no dia seguinte, 3 de agosto, a Alemanha declarou guerra à França,

a qual era aliada da Rússia. O governo britânico declarou guerra à Alemanha

no dia 4 de agosto, em virtude de os alemães terem violado a neutralidade

belga, da qual os ingleses eram garantes. A Itália permaneceria neutra até 23

de maio de 1915, quando, então, declarou guerra à Áustria-Hungria. O Japão

declarou guerra à Alemanha em 23 de agosto de 1914 e, em 6 de abril de

1917, os Estados Unidos fizeram o mesmo.

Page 70: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 7 - A I Guerra Mundial

A Guerra

Inicialmente, os que iam para o front acreditavam que a guerra terminaria em

poucas semanas. Não é falso dizer que os soldados, de ambos os lados, iam

para a guerra entusiasmados pelo fervor nacionalista, acreditando que

alcançariam vitória fácil e rápida. Infelizmente, no entanto, o conflito acabou por

ser longo e penoso.

As operações militares na Europa se desenvolveram em três frentes: a ocidental

ou franco-belga, a oriental ou russa e a meridional ou sérvia. Posteriormente,

surgiriam novas zonas de combate, com a intervenção do Império Otomano, da

Itália e da Bulgária.

Durante décadas, cada um dos países fez planos detalhados. Os alemães, por

exemplo, tinham o famoso Plano Schlieffen. Elaborado pelo general Schlieffen,

previa o pior cenário possível: uma guerra em dois fronts – um contra a França,

outro contra a Rússia. Para o sucesso do plano, era necessária uma rápida

vitória contra os franceses, para, depois, vencer a Rússia. Temerário, arriscado

e de difícil execução, o plano acabou por fracassar. A almejada rápida vitória

contra os franceses acabou transformando-se na estática guerra de trincheiras,

que durou a maior parte dos quatro anos de conflito.

Os russos assumiram a ofensiva, na frente oriental, no início da guerra, mas

foram detidos pelos exércitos austríacos e alemães. Em 1915, as Potências

Centrais haviam conseguido expulsar os russos da Polônia e da Lituânia e

tinham tomado todas as fortalezas limítrofes da Rússia, que ficou sem condições

de empreender ações importantes por falta de homens e de suprimentos. O

fracasso na guerra contribuiria para o aumento da crise político-institucional

Page 71: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

interna da Rússia, que culminaria na deposição do czar, no estabelecimento de

um governo republicano e na revolução bolchevique de outubro de 1917.

O Império Otomano entrou na guerra em 29 de outubro de 1914, ao lado dos

alemães e austríacos. Os turcos iniciaram a invasão da zona russa da cordilheira

do Cáucaso em dezembro. O governo russo pediu auxílio aos britânicos, que

tentaram tomar o Estreito de Dardanelos. Porém, a Campanha de Gallípoli, como

ficou conhecida a ação, resultou em fracasso total para as tropas aliadas, que

foram tenazmente derrotadas pelos turcos.

Pág. 8 - A I Guerra Mundial

A Guerra

Nos Bálcãs, em 1915, os austríacos, com apoio dos búlgaros, conseguiram

derrotar e ocupar a Sérvia. Eclodiram duas lutas na região em 1916: o ataque

conjunto de sérvios e italianos às forças búlgaras e alemãs e uma ofensiva aliada

sobre a Macedônia.

O triunfo obtido pelos alemães contra os russos e sérvios, em 1915, deu-lhes

condições de concentrarem suas operações na frente ocidental.

Desencadearam a batalha de Verdun em 21 de fevereiro, mas não conseguiram

conquistar esta cidade devido à contraofensiva do general francês Henri Philippe

Pétain. Os aliados contra-atacaram, por sua vez, na batalha do Somme, iniciada

em 1º de julho e na qual os britânicos usaram pela primeira vez carros de

combate modernos. Os franceses empreenderam nova ofensiva em outubro,

restabelecendo a situação que existia antes de fevereiro. Todos esses

movimentos podem ser vistos no Mapa 21.

Page 72: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Mapa 21: A Guerra em Agosto de 1914

Fonte:

http://perso.numericable.fr/alhouot/alain.houot/Hist/guerre14_18/gun7.html

Essas batalhas de 1916 já revelavam quão assustadoramente mortífera seria a

Grande Guerra: nos cinco meses da batalha de Verdun, “os exércitos franceses

e alemães sofreram mais de seiscentas mil baixas (mortos, feridos e

desaparecidos) e, no primeiro dia da batalha do Somme (...), o exército britânico

(...) teve vinte mil mortos e quase quarenta mil feridos. No monumento em

Thiepval, dedicado aos soldados britânicos mortos em pouco mais de um ano

em Somme, há mais de setenta mil nomes, exclusivamente daqueles cujos

corpos nunca foram encontrados” (ROBERTS, 2002, p. 682).

Pág. 9 - A I Guerra Mundial

A Guerra

A guerra continuaria estática. Os exércitos dos dois lados acabaram fincando

posições que se manteriam por meses. A guerra de trincheiras, com homens

com lama até o pescoço, enfiados em valas imundas e sujeitos a doenças, como

cólera e tifo, e a ataques da artilharia inimiga, alguns empregando gases letais,

seria uma traumática realidade quotidiana pela qual a Grande Guerra seria

lembrada. Nesse sentido, a I Guerra Mundial seria distinta de todas as que a

precederam e, de fato, também dos conflitos seguintes, nos quais a guerra

dinâmica, de velocidade, seria a regra. Em resumo, nos primeiros três anos que

se seguiram a 1914, poucas conquistas houve por parte de ambos os lados além

daquelas obtidas nos primeiros meses da guerra.

Page 73: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

1917: Grandes Mudanças

Em 1917, os aliados tiveram um revés: a Rússia saiu da guerra. Em março

daquele ano, uma revolução culminou na implantação de um governo provisório

e na abdicação do Czar Nicolau II. Em novembro (outubro no calendário russo),

uma nova revolução, liderada pelos bolcheviques, derrubou o governo provisório

e tomou o poder. As autoridades russas propuseram à Alemanha a cessação

das hostilidades. Representantes da Rússia, Áustria e Alemanha assinaram o

armistício em 15 de dezembro, cessando, assim, a luta na frente oriental. Os

alemães puderam redirecionar suas forças para o front ocidental.

Se saíra vitoriosa contra a Rússia, a Alemanha fracassara em seu intento de

provocar a rendição da Grã-Bretanha por meio da destruição da frota aliada. Em

janeiro de 1917, a Alemanha declarava guerra submarina generalizada e

anunciava que afundaria qualquer embarcação que encontrasse em uma vasta

área do Atlântico Norte, considerada zona de guerra, não importando se fosse

navio de guerra, mercante ou de passageiros. Com isso, muitas embarcações

foram torpedeadas, causando milhares de baixas, inclusive entre civis de países

neutros, como os EUA e o Brasil.

A política de neutralidade norte-americana mudou com a guerra submarina

promovida pelos alemães. Em 3 de fevereiro de 1917, os EUA romperam

relações diplomáticas com a Alemanha, declarando-lhe guerra em 6 de abril.

Uma força expedicionária foi enviada para a Europa. A sorte mudara novamente

na direção dos aliados.

Page 74: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Outro filme muito interessante é O Batalhão Perdido, de Russell Mulcahy (EUA,

2001, 92 min), que conta a história real de um batalhão norte-americano que se

perde no meio das linhas alemãs durante a I Guerra Mundial.

Várias nações latino-americanas, entre elas o Peru, o Brasil e a Bolívia,

apoiariam a ação dos EUA. O afundamento de alguns navios levou o Brasil, em

26 de outubro de 1917, a participar da guerra, enviando uma divisão naval em

apoio aos aliados. Aviadores brasileiros participaram do patrulhamento do

Atlântico, navios do Lóide Brasileiro transportaram tropas norte-americanas para

a Europa, e uma missão médica foi enviada para a França.

Pág. 10 - A I Guerra Mundial

1918: o fim da carnificina

Apesar da entrada dos EUA no conflito, os primeiros meses de 1918 não foram

favoráveis às Potências aliadas. O Mapa 22 ilustra a disposição das forças no

início de 1918 (comparar com o Mapa 21). Em 3 de março, a Rússia assinou o

Tratado de Brest-Litovsk, com o qual punha oficialmente um fim à guerra com os

Impérios Centrais. Em 7 de maio, a Romênia, derrotada, assinou o Tratado de

Bucareste com a Áustria-Hungria e a Alemanha, às quais cedia diversos

territórios.

Mapa 21: A Guerra em Agosto de 1914 Mapa 22 - A Grande Guerra em 1918

Fonte:

http://perso.numericable.fr/alhouot/alain.houot/Hist/guerre14_18/gun8.html

Page 75: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 11 - A I Guerra Mundial

1918: o fim da carnificina (cont.)

Em 1918, no entanto, a luta nos Bálcãs foi catastrófica para os Impérios Centrais.

Uma força de cerca de 700.000 soldados aliados iniciou uma grande ofensiva

contra as tropas alemãs, austríacas e búlgaras na Sérvia. Os búlgaros,

derrotados, assinaram um armistício. Além disso, os aliados obteriam a vitória

definitiva na frente italiana entre outubro e novembro. A comoção da derrota

provocou rebeliões revolucionárias no Império Austro-Húngaro, que se viu

obrigado a assinar um armistício em 3 de novembro. O Imperador Carlos I

abdicou oito dias depois, e, em 12 de novembro, foi proclamada a República da

Áustria.

A frente turca também caiu. As forças britânicas tomaram o Líbano e a Síria,

ocupando Damasco e outros pontos estratégicos. A Marinha francesa, por sua

vez, ocupou Beirute, e o governo otomano solicitou um armistício.

Depois da paz em separado com a Rússia, a Alemanha tentou uma ofensiva final

contra a França. Nesse momento derradeiro, porém, os alemães tiveram que

enfrentar as recém-chegadas tropas americanas. Cansados e com parcos

recursos materiais, os germânicos fracassaram em seus ataques finais. Depois

de quatro anos, a exaustão atingiu todos os países combatentes, enquanto os

EUA acabavam de entrar no conflito. Em fins de 1918, os principais aliados da

Alemanha – Áustria-Hungria, Turquia e Bulgária – pararam definitivamente de

lutar. Áustria-Hungria e Turquia simplesmente se desmancharam depois de

quatro anos de combate.

A Alemanha, sob pressões internas e externas, pediu a paz. O Kaiser Guilherme

II abdicou, e o país se transformou em república. A Alemanha, ao contrário de

Page 76: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

seus aliados, não se desintegrou, e o armistício foi feito antes que o seu território

fosse invadido. Isso teria grandes implicações simbólicas posteriormente.

Pág. 12 - A I Guerra Mundial

O saldo da Grande Guerra

O saldo da guerra foi a morte de mais de 8 milhões de pessoas. Outras 10

milhões de pessoas ficaram inválidas. Economicamente, o trauma foi profundo.

A França gastou 30% da riqueza nacional, e a Inglaterra, 22%. A produção

industrial caiu entre 30% e 40%. Além disso, enormes dívidas foram contraídas

para pagar a guerra. Nunca o mundo assistira a uma hecatombe de tamanhas

proporções, com tantas baixas, tantos mutilados e tanta destruição.

Sob a ótica das relações internacionais, a Grande Guerra provocou mudanças

profundas no equilíbrio de poder no mundo. Os velhos impérios, que foram

protagonistas da política entre as nações nos quatro séculos anteriores,

desaparecem. O II Reich chega a termo, e uma frágil democracia é estabelecida

na Alemanha, que continuava como Ator de destaque no cenário europeu e cuja

recuperação influenciaria definitivamente os destinos da Europa e o sistema

internacional. Grã-Bretanha e França, apesar de vencedoras da Grande Guerra,

foram obrigadas a admitir que uma nova configuração de poder seria

estabelecida, com dois Atores não europeus tremendamente importantes, o

Japão e a nova Potência que se afirmava, os EUA.

Terminado o conflito, que deveria ter sido rápido e fácil, a Europa estava em

situação lamentável e não mais teria forças para estar à frente da Sociedade

Internacional. Os EUA já deveriam ser consultados sobre os destinos do sistema

internacional, e, no Oriente, o Japão avocava sua parcela de influência. E essas

Page 77: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

transformações estavam apenas começando... O mundo já dava sinais de deixar

de ser eurocêntrico. A Primeira Guerra Mundial foi a grande tragédia europeia.

A Grande Guerra foi um evento marcante na história da humanidade e deu

início ao século XX. Há muitas obras a respeito. Sugere-se, para leitura inicial,

o livro de John Keegan, História Ilustrada da I Guerra Mundial (Ediouro). Os

livros de John Keegan são indicados para os que se interessam por história

militar. Também sobre a realidade da Grande Guerra, sugere-se a leitura de

Nada de Novo no Front, de Erich Maria Remarque (Porto Alegre, L&PM, 2004).

Trata-se de um romance histórico, contado por alguém que viveu a dura

realidade da guerra e foi considerado, no pós-guerra, uma obra-prima da

literatura pacifista mundial. Baseado no livro, foi feito o filme de mesmo nome

(All Quiet on the Western Front,

Lewis Milestone, 1930), também um clássico do gênero.

Page 78: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 13 - O Entre-Guerras e a Nova Ordem Internacional

A Conferência de Paris, O Tratado de Versalhes e o Advento de uma Nova

Ordem Internacional

Em janeiro de 1919, 25 países se reuniram em Paris para as conversações de

paz. Os derrotados e a Rússia, entretanto, não participaram dos debates.

Os norte-americanos, guiados pelo idealismo do Presidente Woodrow Wilson,

desejavam a criação da Sociedade de Nações, entidade que pudesse resolver

amigavelmente as questões internacionais. Também conhecida como Liga das

Nações, essa organização internacional deveria servir de foro onde os Estados

poderiam resolver suas animosidades sem recorrer à guerra, que deveria ser

definitivamente banida das relações internacionais. A paz seria assegurada por

meio de um mecanismo de segurança coletiva, e o direito internacional, a

autodeterminação e a democracia deveriam prevalecer nas relações entre os

povos. Esses valores, que constituiriam o norte moral para a conduta dos

Estados, seriam fomentados pelas instituições então criadas, como a Liga das

Nações e a Corte Internacional de Justiça (denominada à época Corte

Permanente de Justiça Internacional).

Grã-Bretanha e França, todavia, buscavam defender seus interesses de forma

mais incisiva e pragmática. Os franceses desejavam a reintegração da Alsácia-

Lorena a seu território, o desarmamento alemão e o pagamento de indenizações

de guerra. Os ingleses, por sua vez, queriam o controle sobre a frota e sobre as

colônias alemãs. Eram posições antagônicas aos anseios estadunidenses e

refletiam o realismo da política internacional europeia do século XIX.

O Tratado de Versalhes, principal convenção de paz da Grande Guerra, continha

termos bastante duros para os vencidos. A Alemanha perdeu vários territórios e

Page 79: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

todas as suas possessões coloniais. Além da Alsácia-Lorena, devolvida para a

França, perdeu territórios para a Lituânia e, principalmente, para a Polônia.

Como resultado das perdas territoriais para esta última, a Alemanha foi

fisicamente dividida, com a Polônia separando a Prússia Oriental do restante do

país. Tinha-se aí um dos motivos que fomentaram o nacionalismo e o

revanchismo alemães no Entre-Guerras (1919-1939).

Pág. 14 - O Entre-Guerras e a Nova Ordem Internacional

A Conferência de Paris, O Tratado de Versalhes e o Advento de uma Nova

Ordem Internacional (cont.)

Militarmente, a Alemanha foi desarmada. O exército foi reduzido para 100 mil

homens e 4 mil oficiais. Não mais teria marinha, aviação, tanques ou artilharia

pesada. Também não poderia fabricar material bélico. Por fim, o país se viu

obrigado a pagar uma grande indenização financeira para os vencedores. Para

se ter ideia da indenização que a Alemanha se viu obrigada a pagar, o valor

acordado era tão expressivo que seria pago em parcelas que só acabariam no

início da década de 1980. Claro que esse pagamento não se daria como

previsto...

Outros tratados de paz foram firmados entre 1919 e 1923. Como resultado,

inúmeros países surgiram da desintegração do Império Austro-Húngaro, do

Império Otomano e do Império Russo: Finlândia, Letônia, Estônia, Lituânia,

Polônia, Tchecoslováquia, Hungria e Iugoslávia. Um novo mapa político da

Page 80: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Europa era desenhado, com novas nações constituídas do esfacelamento das

colchas de retalho étnicas, que eram os citados velhos impérios.

O Mapa 23 ilustra a nova configuração política europeia do pós-I Guerra (em

amarelo, os novos Estados).

Fonte:

http://perso.numericable.fr/alhouot/alain.houot/Hist/guerre14_18/gun12.html

Pág. 15 - O Entre-Guerras e a Nova Ordem Internacional

Uma Nova Ordem Internacional

A Europa que saía da guerra era bastante diferente daquela que a iniciara. De

certo modo, o impacto da I Guerra para algumas nações europeias foi ainda

maior do que o da II Guerra Mundial. Sangrada e traumatizada, a Europa não

conseguiu se recuperar por meio dos Tratados de Paz. Ao contrário de uma paz

duradoura, conseguiu-se, apenas, por intermédio de tratados impiedosos, deixar

os alemães desejosos de uma revanche. Diferentemente do Congresso de Viena

(1815), que fora um exemplo de como se obter a paz, Versalhes foi a expressão

de raiva dos vencedores. O resultado é que, vinte anos depois, eclodiria outra

guerra mundial.

Page 81: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Novas Potências não europeias: EUA e Japão

Quais foram os verdadeiros vencedores da I Guerra Mundial? França e Grã-

Bretanha saíram em frangalhos do conflito. Perderam milhões de vidas e tiveram

uma geração inteira traumatizada. Perderam recursos industriais, econômicos e

financeiros. Para ganhar a guerra, tiveram que se aliar e se endividar junto aos

EUA. Estes, se já eram um país importante antes de 1914, tornaram-se, após o

fim da guerra, a principal Potência mundial. Inegável que a vitória das Potências

ocidentais só foi possível porque os norte-americanos enviaram um contingente

significativo para a França a partir de 1917. Os EUA foram o fiel da balança na

Grande Guerra: não apenas impediram que as ofensivas alemãs fossem bem-

sucedidas como também mostraram para os alemães que a continuidade da

guerra era inútil.

O Japão, mesmo com papel secundário na I Guerra Mundial, soube tirar proveito

do enfraquecimento das Potências europeias. Conseguiu ocupar as possessões

alemãs na China e na Oceania. Além disso, como se envolvera apenas

marginalmente no conflito, encontrava-se pronto para as suas aventuras

militares nas décadas de 1920 e 1930 e, posteriormente, na II Guerra Mundial.

Pág. 16 - O Entre-Guerras e a Nova Ordem Internacional

Idealismo na política internacional e a Liga das Nações

A Grande Guerra havia sido demasiadamente traumática. Nunca o mundo

presenciara tanta carnificina e destruição em um conflito entre “nações

civilizadas”. Os europeus, que haviam comemorado o início do ansiado conflito,

concluíram-no exaustos e dispostos a fazer daquela a derradeira guerra.

Page 82: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

O sentimento mundial e, sobretudo, europeu, ao fim da Grande Guerra, era de

que não se poderia mais tolerar que os povos se dizimassem em um conflito

armado, e que a Sociedade Internacional deveria empreender todos os esforços

no intento de garantir um mundo pacífico e regido pelo Direito, e não pela força.

O presidente estadunidense Woodrow Wilson foi o idealizador do programa de

construção de uma nova ordem internacional chamado Quatorze Pontos. Esse

programa, apresentado para a Conferência de Paris, previa um acordo de paz

sem anexações territoriais ou indenizações de guerra e baseava-se no princípio

da autodeterminação dos povos, isto é, cada nacionalidade teria direito de ter a

própria independência, caso, por exemplo, da Hungria, Polônia e Sérvia. Além

disso, o programa wilsoniano previa a criação de uma Sociedade das Nações,

para assegurar que o mundo não entrasse novamente em guerra.

A Sociedade das Nações, ou Liga das Nações, foi fundada em 28 de abril de

1919. Apesar das pretensões de Wilson, ela acabou sendo bastante limitada.

Um Conselho Permanente, formado por Estados Unidos, Grã-Bretanha, França,

Japão e Itália, serviria como árbitro nas questões internacionais. Caso não fosse

bem-sucedido, a Assembleia Geral, composta por todos os membros, poderia

votar sanções morais, econômicas ou militares.

Para fins práticos, os efeitos trazidos pelo advento da Sociedade das Nações

foram desprezíveis. Como exercia, na realidade, pouco poder, quando votava

algum tipo de sanção ou de agravo, o país atingido simplesmente se retirava da

Liga. Ademais, a organização já começara enfraquecida, pois a principal

Potência mundial e pátria do seu idealizador, os EUA, acabaram não aderindo à

Liga, por decisão do Congresso norte-americano.

Page 83: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 17 - O Entre-Guerras e a Nova Ordem Internacional

A Revolução Russa

A Revolução Russa foi um dos eventos mais importantes do século XX, tal como

fora a Revolução Francesa no século XVIII. Surgiu da derrota para o Japão em

1905 (em que disputou o território da Manchúria), dos escombros da I Guerra

Mundial, da disseminação das ideias socialistas e revolucionárias geradas no

século XIX e da incapacidade do governo czarista de ouvir os anseios populares.

A entrada russa na Grande Guerra, tal como ocorrera em outros países, fora

celebrada pelo povo. O governo de São Petersburgo imaginava que a

superioridade numérica da Rússia em homens seria suficiente para derrotar os

alemães. Isso não se mostrou verdadeiro. Apesar de estar em inferioridade

numérica, a Alemanha soube lidar com a incompetência militar e com os

problemas logísticos russos. As derrotas militares não tardaram a surgir e,

rapidamente, transformaram-se em desastres. Além disso, a guerra pressionou,

de modo exagerado, a economia russa: os camponeses foram retirados de suas

terras para lutar no front, empresas e indústrias faliram, a inflação corroía o poder

de compra e não havia comida suficiente para abastecer as principais cidades.

Em fins de 1916, a Rússia czarista estava à beira do colapso.

Apesar disso, o Czar Nicolau II, preso aos compromissos de guerra com a

França e com a Grã-Bretanha, não dava sinais de que desistiria do conflito.

Pressionado, abdicou em março de 1917. O governo passou às mãos de um

governo moderado sob o comando de Alexander Kerenski. Entretanto, o novo

governo não eliminou o principal problema do país: a guerra. Em outubro do

mesmo ano, Lênin, líder bolchevista que retornara do exílio, preparou a tomada

do poder. Kerenski, abandonado pelo exército, fugiu. Lênin assumiu então o

governo

Page 84: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Lênin conseguiu retornar do exílio e chegar à Rússia para promover a

Revolução graças ao auxílio dos alemães, particularmente dos serviços de

inteligência do Kaiser, com os quais o líder bolchevista comprometeu-se a pôr

fim à participação de seu país na guerra assim que tomasse o poder.

A Revolução Russa e o Stalinismo são o pano de fundo dos filmes Dr. Jivago e

Reds, de Warren Beatty. Confira!

Pág. 18 - O Entre-Guerras e a Nova Ordem Internacional

A Revolução Russa (cont.)

Os bolchevistas eram guiados pelas ideias de Karl Marx e Friedrich Engels,

pensadores comunistas do século XIX. Assim, tinham o objetivo de, uma vez

tomado o poder, realizar profundas mudanças na sociedade. De acordo com

Marx, a história se funda na luta de classes, e essa seria superada pela classe

mais revolucionária e vanguardista, o proletariado. A contribuição de Lênin para

a política do século XX foi a seguinte: a revolução seria feita através da condução

e organização do disciplinado partido de vanguarda de revolucionários

profissionais. A revolução de 1905 mostrara uma burguesia russa politicamente

fraca; a Constituição liberal-burguesa formulada era muito restrita, e o czarismo

tornara a se implantar. Para uma revolução sem burguesia, o partido conduziria

a classe operária com o apoio do campesinato, ansioso por terras.

Page 85: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

As repercussões de uma revolução russa seriam mais amplas que as de 1789.

A simples extensão física e a plurinacionalidade de um império que ia do Pacífico

à fronteira alemã significava que sua queda afetaria um número muito maior de

países, em dois continentes, que a de um Estado marginal ou isolado na Europa

ou na Ásia.

Uma das primeiras medidas de Lênin foi a retirada da Rússia da guerra. Por meio

do armistício de Brest-Litovsk, entregou parte importante do território e dos

recursos industriais e econômicos russos na Europa para os alemães em troca

da paz. Mesmo arriscado, foi um lance bem-sucedido. Junto com isso, implantou

um regime de partido único apoiado em uma poderosa polícia política, a Tcheka,

e no Exército. Depois de três anos de sangrenta guerra civil, inclusive com a

invasão do território russo por forças estrangeiras, a vitória e o controle do país

foram definitivamente alcançados.

Dos escombros do império dos czares surgiu um novo país, a União das

Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), primeira nação do mundo sob um

regime marxista e que se tornaria a única Potência do planeta capaz de rivalizar

com os EUA. O governo revolucionário enfrentaria ainda grandes crises políticas

e econômicas, mas conseguiria superar esses obstáculos e retomar o processo

de industrialização e de crescimento iniciado pela Rússia czarista. Entretanto,

essas transformações acarretariam a morte de milhões de pessoas, não só em

virtude da insuficiência de alimentos, mas também por causa de decisões

desastrosas da política econômica – tomadas por burocratas do Partido

Comunista – e, ainda, como resultado de perseguições e expurgos contra toda

e qualquer pessoa suspeita de ser contrária ao regime. Nesse contexto, a figura

de Josef Stalin, que assumiu o poder após a morte de Lênin, em 1924, e

governou ditatorialmente a URSS até a sua própria morte, em 1953, teve um

papel central.

Page 86: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 19 - O Entre-Guerras e a Nova Ordem Internacional

A Crise de 1929

Com o fim da Primeira Guerra Mundial, os EUA se tornaram a principal Potência

econômica do mundo. A década de 1920 foi um tempo de grande crescimento

econômico. Empolgados com a possibilidade de lucro rápido, milhares de

pessoas se puseram a investir na Bolsa de Valores, inclusive comprando ações

a crédito. Esse movimento de especulação fez com que os preços das ações

fossem muito maiores do que elas realmente valiam.

Em outubro de 1929, a “bolha” da Bolsa explodiu. Em poucas semanas, bilhões

de dólares evaporaram. Empresas reduziram a produção, milhões de

trabalhadores ficaram desempregados, agricultores tiveram que entregar as

suas terras para os bancos, e centenas de bancos fecharam as portas. O índice

de produção estadunidense, que era de 100 em 1929, caiu, em pouco tempo,

para 60.

Externamente, os efeitos da crise também foram devastadores. Como sempre

ocorre, problemas na principal Potência repercutem rapidamente no restante do

sistema internacional. Desemprego, inflação e quebra de empresas atingiram

praticamente todos os outros países do mundo, à exceção da União Soviética,

que não dependia do sistema econômico internacional por ter sido isolada pelas

Potências, em virtude da Revolução de 1917 e do estabelecimento do regime

comunista.

Saiba mais sobre a crise de 1929.

Page 87: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 20 - O Entre-Guerras e a Nova Ordem Internacional

Fascismo e Nazismo

Após a I Guerra Mundial, a Europa foi tomada por uma onda de radicalização

política. Regimes totalitários, à esquerda e à direita, apareceram por todo o

continente. Os antigos regimes liberais foram, pouco a pouco, substituídos por

regimes onde imperava a força. E isso ocorreu com o apoio popular, que, em

diversos países, manifestou descrédito na democracia.

Após 1916, o constitucionalismo liberal e a democracia representativa batem em

retirada, embora restaurados após 1945. Em 1939, os únicos dentre os 27

Estados europeus que podiam ser descritos como democracias parlamentares

eram: Reino Unido, Estado Livre da Irlanda, França, Bélgica, Suíça, Holanda e

os quatro escandinavos. Todos eles, salvo o Reino Unido, a Irlanda, a Suécia e

a Suíça, logo desapareceriam temporariamente em virtude de ocupação ou de

aliança com a Alemanha nazista.

O Tratado de Versalhes comprometeu as chances de recuperar a estabilidade

capitalista da Alemanha e, portanto, da Europa, em bases liberais.

O comunismo, que já havia alcançado o poder na Rússia por ocasião da

Revolução de 1917, apresentava-se, para muitos europeus, como a saída da

esquerda. À direita, foi o fascismo que surgiu como o grande adversário dos

regimes democráticos.

A Itália é o primeiro país em que um regime fascista estabeleceu-se e adquiriu

importância. Benito Mussolini, antigo militante socialista, catalisou em torno de

si toda a insatisfação do povo italiano com o resultado da I Guerra Mundial. Os

italianos pouco poderiam comemorar dos resultados da Grande Guerra. Apesar

Page 88: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

de oficialmente vitoriosos, as baixas em vidas foram altíssimas. Além disso, a

Itália não conseguiu obter o prestígio que há tanto tempo desejava. Para as

outras potências europeias, a Itália ainda era uma nação de segunda categoria.

Também não se pode esquecer que a Itália chegou à década de 1920 em grave

crise econômica: o desemprego grassava, empresas quebravam, a inflação era

alta e os trabalhadores perdiam renda. Tratava-se de cenário bastante propício

a soluções autoritárias. Mussolini aproveitou-se da oportunidade. Em 1921,

fundou o Partido Fascista e, em 1922, realizou a Marcha sobre Roma, dizendo-

se defensor da ordem contra o caos e a anarquia. Inicialmente, o discurso

fascista manteve um aspecto de normalidade, mas, em 1925, os fascistas

tomaram, definitivamente, o poder.

Sobre as questões relacionadas ao totalitarismo e ao autoritarismo da Europa,

vide Mark Mazower, O continente sombrio: a Europa do século XX (São

Paulo:Companhia das Letras, 2001). Obra teórica fundamental a respeito é

Origens do Totalitarismo, de Hannah Arendt (São Paulo: Companhia das Letras,

1989).

Page 89: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 21 - O Entre-Guerras e a Nova Ordem Internacional

Fascismo e Nazismo (cont.)

O Fascismo italiano, copiado depois por muitos outros países, tinha entre seus

princípios:

a existência do Estado autoritário, baseado na figura do chefe (ou líder)

e no partido único

a preponderância do coletivo – ou das massas – sobre o indivíduo;

o Estado como o árbitro nas relações entre patrões e empregados;

a exaltação da guerra e da grandeza nacional.

Muitos outros países adotaram regimes similares ao italiano ou inspirados nele:

Espanha, Portugal, Polônia, Hungria, Iugoslávia, Grécia, Bulgária, Lituânia,

Estônia, Letônia e Áustria, para citar os Estados europeus. Até no Brasil, em

1937, com o Estado Novo de Getúlio Vargas, foi estabelecido um regime

fortemente influenciado pelas ideias fascistas.

Não obstante, o fascismo não seria a opção mais autoritária de direita no Entre-

Guerras. Em 1933, chegava ao poder na Alemanha o principal discípulo das

ideias de Mussolini: Adolf Hitler. O novo líder alemão conseguiu não apenas

superá-lo como radicalizar mais ainda a ideologia fascista: estabelecia-se o

nacional-socialismo na Alemanha.

Page 90: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 22 - O Entre-Guerras e a Nova Ordem Internacional

As origens do nazismo

O nacional-socialismo, ou nazismo, como é também chamado, surgiu em meio

à crise da década de 1920 e encontrou nos problemas da Alemanha e do mundo

no pós-I Guerra Mundial as razões de seu fortalecimento. A primeira dessas

razões é o perene revanchismo alemão oriundo da derrota e das imposições dos

vencedores da I Guerra Mundial.

Simbolicamente, os alemães não se sentiam derrotados, porque o território

alemão não fora invadido em 1918. Ademais, quando os combates foram

suspensos por meio de um armistício – e não de uma capitulação –, parecia

haver um equilíbrio entre os lados combatentes, pois ambos estavam exauridos.

A culpa para o armistício era jogada sobre as costas do poder civil, os

“entreguistas”, particularmente os socialistas que negociaram o armistício,

supostos responsáveis pelo fracasso.

Em segundo lugar, as condições do Tratado de Versalhes para a Alemanha

foram muito mais duras do que o Presidente Wilson sugerira. Os alemães foram

declarados culpados pela guerra, obrigados a pagar uma reparação gigantesca

e impedidos de ter um exército de tamanho compatível com a realidade de uma

Potência.

Por fim, as crises econômicas da década de 20 – primeiro, em 1923, quando o

país passou pela hiperinflação, depois, em 1929, resultado da quebra da Bolsa

de Nova York – se mostraram fundamentais para criar um caldo simbólico de

ódio e rancor. Razões econômicas que repercutiram em movimentos sociais

questionaram a frágil democracia da República de Weimar, como foi

Page 91: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

denominado o regime alemão em sua breve experiência democrática (1919-

1933).

Pág. 23 - O Entre-Guerras e a Nova Ordem Internacional

As origens do nazismo (cont.)

Aos ingredientes do fascismo, os nazistas juntaram o racismo – especialmente

contra judeus, eslavos e ciganos. Também aprofundaram o autoritarismo

fascista, ao resumirem o Estado a um chefe único, o Führer: alicerçava-se um

Estado totalitário, que só encontraria congênere na URSS stalinista.

Os nazistas eram, simultaneamente, antimarxistas e anticapitalistas: o

marxismo, para os nazistas, seria obra dos judeus, e o capitalismo, por sua vez,

era desigual e individualista. Ademais, defendiam um sistema de partido único,

hierarquizado e presente em todas as etapas da vida do indivíduo – o indivíduo

não existia fora do partido –, e pregavam um nacionalismo levado às últimas

consequências.

No pós-I Guerra Mundial, o nacionalismo foi definitivamente incorporado pela

direita política. Desde o final do século XIX que as organizações de massa do

nacionalismo alemão desviaram-se do liberalismo herdado de 1848 para uma

postura militarista, agressiva e antissemita. No Entre-Guerras, ganhava ainda

mais força um novo movimento político baseado no chauvinismo, na xenofobia

e na idealização da expansão nacional, na conquista e no próprio ato da guerra.

Tal nacionalismo passou a atrair as classes médias frustradas, os antiliberais e

os antissocialistas.

Uma vez no poder, alcançado por meio de eleições democráticas, os nazistas

iniciaram profundas reformas: instituíram um modelo de partido único,

dominaram o Judiciário, estabeleceram a censura, promoveram expurgos no

serviço público e nas universidades e criaram os campos de concentração, para

onde eram enviados os elementos indesejados. Também conseguiram o rápido

Page 92: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

rearmamento do Exército. Ao lado dessas ações práticas, os nazistas agiram

com muita força no campo simbólico. Uma palavra resume esse processo:

propaganda.

Pág. 24 - O Entre-Guerras e a Nova Ordem Internacional

A Guerra Civil Espanhola (1936-1939)

Episódio marcante do Entre-Guerras foi a Guerra Civil Espanhola (1936-1939).

O conflito foi caracterizado pelo confronto entre as grandes correntes

ideológicas da época e nele lutaram voluntários de diversas partes do mundo,

inclusive do Brasil.

Após a queda da ditadura de Primo de Rivera, em 1930, o rei da Espanha Afonso

XII tentou restabelecer um governo constitucional. Entretanto, as eleições de

1931 acabaram com as pretensões monarquistas: o rei foi exilado e a República

proclamada. Apesar das resistências, a República espanhola mostrou-se

democrática e, em 1936, ganhou as eleições a Frente Popular, composta por

anarquistas, comunistas, socialistas e radicais. O novo governo apoiou as

reivindicações dos movimentos operários e camponeses, e os trabalhadores

começaram a ocupar as fábricas e a invadir terras.

O assassinato do líder monarquista Calvo Sotelo por forças anarquistas, em 13

de julho de 1936, serviu de justificativa para o levante militar liderado pelo

Page 93: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

general Francisco Franco, a partir do Marrocos espanhol. Para fazer frente à

revolta do Exército, o governo republicano recorreu a milícias, armando os

populares. Em dois meses, as tropas de Franco já dominavam metade do

território espanhol. Entretanto, a guerra se prolongaria por três anos,

constituindo-se em um confronto sangrento e generalizado.

Enquanto os nacionalistas, liderados por Franco, tinham apoio de setores

conservadores, como o Exército e parte do clero católico, e das províncias

ocidentais do país, os republicanos contavam com a Força Aérea e a Marinha,

com os trabalhadores, a pequena burguesia radical e parte do campesinato.

Contavam os republicanos também com as regiões industriais que ocupavam o

triângulo Madri-Valência-Barcelona. Bascos e catalães apoiavam a República.

Em 1938, os franquistas conseguiram isolar a Catalunha de Madri. Barcelona

capitulou em janeiro de 1939 e Madri em março do mesmo ano. Em 1º de abril

de 1939, acabou a sangrenta guerra que dividira a Espanha, deixara cerca de

500.000 mortos e 450.000 exilados. Estabeleceu-se um governo de índole

fascista, liderado por Franco, e que perduraria por quase quatro décadas.

Pág. 25 - O Entre-Guerras e a Nova Ordem Internacional

A Guerra Civil Espanhola (1936-1939)

Economicamente, a guerra civil deixou a Espanha em uma situação catastrófica.

A renda per capita só recuperaria os níveis de 1936 em meados da década de

1950. A malha industrial espanhola foi destruída, e o país voltou à condição de

economia eminentemente agrária. A infraestrutura foi muito danificada, a

Espanha gastou todas as suas reservas e a dívida externa cresceu.

Page 94: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Com o fim da guerra, o governo de Franco instaurou uma ditadura de direita,

simpática aos países do Eixo (Alemanha, Itália e Japão). Esse regime se

manteria até a morte de Franco, em 1975, quando então a monarquia seria

restabelecida, e o país iniciaria um processo de redemocratização.

No que concerne às relações internacionais, a Guerra Civil Espanhola foi um

conflito que repercutiu muito além da Península Ibérica: com a participação

das Potências – Alemanha e Itália apoiando Franco e URSS auxiliando os

republicanos – e dos grupos de voluntários de diversas nacionalidades, o

conflito adquiriu um caráter internacional e extremamente ideológico.

Também sobre o Entre-Guerras, assista ao filme Tempos Modernos, de Charles

Chaplin, um clássico que ilustra o impacto da Segunda Revolução Industrial

sobre a vida humana. Trata-se do último filme mudo de Chaplin, que focaliza a

vida urbana nos Estados Unidos nos anos 30, imediatamente após a crise de

1929, quando a depressão econômica atingiu toda a sociedade norte-americana,

levando grande parte da população ao desemprego e à fome. Leia a sinopse do

filme!

Page 95: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 26 - O Entre-Guerras e a Nova Ordem Internacional

A Guerra Civil Espanhola (1936-1939) (cont.)

A guerra na Espanha foi o prelúdio da nuvem negra que se abateria sobre a

Europa e o mundo a partir de 1939. Nela as ideologias se confrontaram, os

regimes autoritários puderam mostrar seu poder e testar sua máquina de guerra,

e as democracias deixaram claro o misto de desinteresse e impotência para lidar

com temas que envolviam o risco de abalo da “segurança coletiva”.

Toda a extensão da tragédia causada pela Guerra Civil Espanhola pode ser

constatada pela reportagem do The Times, de 28 de abril de 1937, da qual

extraímos o seguinte trecho:

“Guernica, a mais antiga cidade dos bascos, centro de suas tradições culturais,

foi completamente destruída ontem à tarde por um reide aéreo dos revoltosos.

O bombardeio dessa cidade aberta, muito atrás das linhas de combate, durou

três horas e quinze minutos, durante as quais uma poderosa esquadra aérea

alemã, composta de bombardeiros Junker e Heinkel, e caças Heinkel, não

parava de despejar sobre a cidade bombas de1000 libras e, calcula-se, mais

de 3000 projéteis incendiários de 2 libras, de lumínio. Ao mesmo tempo, os

caças mergulhavam sobre a cidade para metralhar a parte da população civil

refugiada nos campos(...).”

A Guerra Civil Espanhola é o pano de fundo do filme Por Quem os Sinos Dobram,

de Sam Wood (EUA, 1943, 159 min), estrelado por Ingrid Bergman e Gary

Cooper.

Page 96: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Pág. 27 - O Entre-Guerras e a Nova Ordem Internacional

O III Reich e os antecedentes da II Guerra Mundial

Nos três anos que se seguiram à nomeação de Adolf Hitler Chanceler da

Alemanha, em 30 de janeiro de 1933, o governo nacional-socialista promoveu

transformações que rapidamente reconduziram o país ao seleto clube das

Grandes Potências. Em 1936, o III Reich, como ficou conhecida a Alemanha

nazista, já era uma das maiores economias do mundo: havia reduzido o

desemprego em 40% já em 1934; inúmeras obras públicas estavam sendo feitas,

e a indústria retomara sua força, de modo que o país já se mostrava

internacionalmente competitivo. Como aconteceu na União Soviética, é inegável

que a opção totalitária reergueu o país.

Recuperada do ponto de vista doméstico, a Alemanha se lançaria em uma nova

empreitada de política externa. Como sempre prometera, Hitler desejava

conduzir os alemães à retomada do orgulho nacional, por meio do repúdio às

imposições estabelecidas pelo Tratado de Versalhes e da busca do “espaço vital”

a leste, indispensável para a sobrevivência do III Reich. Com ações calculadas

que jogavam com a capacidade de reação das Grandes Potências, a Alemanha

foi, aos poucos, derrubando cada imposição do acordo de paz de 1919 e

anexando novos territórios ao Reich.

Grã-Bretanha e França, ainda traumatizadas pelos efeitos da Primeira Guerra,

evitaram agir para impedir o avanço da política externa nazista. Era a política do

apaziguamento, da paz a qualquer preço, que se fez ao custo da entrega da

Áustria e da Tchecoslováquia para a Alemanha. Havia também a expectativa,

por parte das democracias europeias, de que, em seu avanço para o leste, logo

o III Reich se chocaria com a URSS. Assim, Grã-Bretanha e França contavam

com o conflito entre os dois grandes Estados totalitários, o que seria para elas

demasiadamente interessante.

Page 97: Relações Internacionais - Teoria e História - Módulo II

Vide “A Política Exterior do III Reich: Algumas Reflexões”, de Joanisval Brito

Gonçalves. In: Albene Menezes e Mercedes Kothe (orgs.). Brasil e Alemanha,

1827-1997, Perspectivas Históricas, 170 anos da assinatura do 1º Tratado de

Comércio e Navegação. Brasília: Thesaurus, 1997.

Entretanto, Londres e Paris não consideraram o improvável: em agosto de 1939,

Alemanha e URSS assinaram um tratado de não agressão. Para desespero das

democracias ocidentais, os dois inimigos figadais aliavam-se. Estava pronto o

quadro que levaria à Segunda Guerra Mundial.

Parabéns! Você chegou ao final do Módulo II de estudo do curso Relações

Internacionais - Teoria e História.

Como parte do processo de aprendizagem, sugerimos que você faça uma

releitura do mesmo e resolva os Exercícios de Fixação. O resultado não

influenciará na sua nota final, mas servirá como oportunidade de avaliar o seu

domínio do conteúdo. Lembramos ainda que a plataforma de ensino faz a

correção imediata das suas respostas!