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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA
LAERCIO SOUZA SANTANA FILHO
A OUTRA FACE DA PRODUÇÃO DO ESPAÇO EM ARACAJU/SE: O DESENVOLVIMENTO DA
AGRICULTURA URBANA, SEUS IMPASSES E CONTRADIÇÕES
São Cristóvão 2010
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA
LAERCIO SOUZA SANTANA FILHO
A OUTRA FACE DA PRODUÇÃO DO ESPAÇO EM ARACAJU/SE: O
DESENVOLVIMENTO DA AGRICULTURA URBANA, SEUS IMPASSE S E
CONTRADIÇÕES
São Cristóvão 2010
iii
LAERCIO SOUZA SANTANA FILHO
A OUTRA FACE DA PRODUÇÃO DO ESPAÇO EM ARACAJU/SE: O
DESENVOLVIMENTO DA AGRICULTURA URBANA, SEUS IMPASSE S E
CONTRADIÇÕES
Dissertação de Mestrado apresentada ao Núcleo de Pós-Graduação em Geografia, da Universidade Federal de Sergipe, como requisito parcial à obtenção do Titulo de Mestre em Geografia.
Orientador: Prof. Dr. Celso Donizete Locatel.
São Cristóvão, Maio de 2010.
iv
LAERCIO SOUZA SANTANA FILHO
A OUTRA FACE DA PRODUÇÃO DO ESPAÇO EM ARACAJU/SE: O
DESENVOLVIMENTO DA AGRICULTURA URBANA, SEUS IMPASSE S E
CONTRADIÇÕES.
Dissertação de mestrado submetida à apreciação da banca examinadora constituída pelos doutores:
__________________________________________ Prof. Dr. Celso Donizete Locatel (Orientador) Universidade Federal do Rio Grande do Norte
__________________________________________ Prof. Dr. José Eloízio da Costa (Examinador Interno)
Universidade Federal de Sergipe
__________________________________________ Profª. Drª. Marleide Maria Santos Sergio (Examinador Externo)
Universidade Federal de Sergipe- Campus de Itabaiana
v
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a minha família, que sempre esteve presente ao meu lado em todos os momentos, seja compartilhando as vitórias ou para segurar minhas mãos nos momentos de tribulações. Quero em especial registrar aqui minha gratidão aos meus pais (Laércio e Margareth) responsáveis pela minha educação e ao meu Amor... (Gleise), que sempre esteve comigo nas caminhadas geográficas e extra-geográficas, e que agora somos uma só carne. “a nossa história não acaba aqui, há tantos sonhos pra realizar”. Obrigado! Amo vocês!!!!!!!!!!
vii
AGRADECIMENTOS
Agradeço à Universidade Federal de Sergipe por oferecer o curso de
graduação e pós-graduação em Geografia.
A toda comunidade escolar das Escolas: Escola Estadual Profª. Lucila Moraes
Chaves, Colégio Estadual Olavo Bilac e Colégio Francisco Rosa pela
oportunidade de compreender melhor o real sentido da educação brasileira.
Ao Núcleo de pós-graduação em Geografia, no auge dos seus 25 anos de
fundação, na pessoa do Prof. Dr. José Eloízio da Costa, que com muita
competência conduz e coordena os ensinamentos geográficos e pela confiança
depositada no meu trabalho de dissertação.
Ao meu orientador Prof. Dr. Celso Donizete Locatel pelos ensinamentos dos
saberes geográficos na ampliação dos conhecimentos acerca da geografia
agrária brasileira, e que mesmo a distância sempre esteve presente nas
contribuições, sugestões e paciência nas correções dessa dissertação.
Ao corpo docente do Mestrado em Geografia, em particular a Profª. Drª
Alexandrina Luz Conceição, que me incluiu nas suas aulas e que contribuiu
para minha formação acadêmica no desvelar dos saberes geográficos e a
Profª. Drª. Vera França sempre prestativa e que contribuiu com excelentes
sugestões nos momentos em que me encontrava sem norte geográfico.
Aos meus amigos da pós-graduação Rodrigo (peça fundamental no trabalho de
campo e na formatação da dissertação), Marcos Pereira, Alysson, Alvanira,
Núbia, Adelli, Venozina, Ana Consuelo e muitos outros que contribuíram
através das discussões, conselhos e exemplos de vida. Vocês são muito
especiais pra mim. Nívia (minha querida madrinha e companheira nos estudos
da ciência jurídica) e Danny Jefferson (meu amigo irmão) pelas contribuições
da língua portuguesa e impressão, respectivamente. Não poderia deixar de
destacar meus amigos do doutorado que representaram Vitórias e Conquistas:
Vilomar (Vila) e Adrecksa (Déa), exemplo de família e seres humanos.
Aos colegas de curso, com as contribuições em sala de aula.
A Everton, secretário do Núcleo, que com muita atenção e respeito me atendeu
nos momentos em que precisava dos seus auxílios administrativos.
vii
Aos funcionários das instituições por nós visitadas INCRA, IBGE, SEPLAN pelo
apoio e importante fonte de pesquisa para o desenvolvimento do nosso
trabalho, e em especial a EMURB na pessoa de Gilberto Nunes da Silveira,
brilhante geógrafo que contribuiu no suporte cartográfico presente na
dissertação.
Aos meus pais Laércio e Margareth, peças fundamentais para minha educação
na construção do meu ser, vocês são meus exemplos de seres humanos. Aos
meus irmãos Alysson, Luciana e Luciene e toda a minha família, que mesmo
estando ausente em boa parte da minha jornada acadêmica, sempre
acreditaram em mim. Vocês são especiais para mim.
Ao meu amor, Gleise..., que nos conhecemos ainda crianças..., estudávamos
na mesma escola..., frequentávamos os mesmos ambientes e tivemos a
oportunidade de nos conhecermos melhor, passamos por várias experiências
juntos, sempre juntos, geográficas e extrageográficas, e muitos sonhos pra
realizar, te amo, meu amor.
Aquele que é autor e consumador da minha fé, Deus vivo, presente e
soberano, que sempre me sustenta e me ensina a passar pelos vales e
desertos, confiando no Seu amor para comigo, pois a força que em mim opera
vem do Senhor. Obrigado Pai.
Enfim, a todos aqueles que direta e indiretamente contribuíram na construção
dessa dissertação de mestrado, meu muito obrigado.
viii
LISTA DE FIGURAS
Figura 01: Localização da área de estudo, Aracaju, 2009 9 Figura 02: Propriedade localizada na zona de expansão de Aracaju 24
Figura 03: Fundo de quintal com frutíferas e plantas medicinais 24
Figura 04: Delimitação da propriedade privada na zona de expansão de Aracaju 31
Figura 05: Propriedade localizada próximo ao DIA 32
Figura 06: Elementos ligados à definição da agricultura urbana 35
Figura 07: Propriedade na zona de expansão de Aracaju 38
Figura 08: Presença de frutífera em residência no Bairro Bugio 38 Figura 09: Plantas medicinais cultivadas nos Jardim de residência do Bairro Bugio 40
Figura 10: Consorciamento de cultivos na zona de expansão de Aracaju 40
Figura 11: Brasil Áreas Metropolitanas 43
Figura 12: Plantas medicinais nas propriedades pesquisadas 47
Figura 13: Cultivo de Pimenta 48
Figura 14: Plantas frutíferas identificadas nas propriedades pesquisadas 49
Figura 15. Coleta de pitanga 50 Figura 16: Comercialização dos produtos agrícolas na Av. Poço do Mero, Bugio 67 Figura 17: Comercialização dos produtos agrícolas na Av. Poço do Mero, Bugio 67
Figura 18: Animais pastando nas ruas da zona de expansão de Aracaju 70 Figura 19: Condomínio residencial fechado na zona de expansão de Aracaju 72
Figura 20: Mesclas de sentidos e usos na zona de expansão de Aracaju 76
Figura 21: Residências presente na Zona de Expansão Urbana de Aracaju 85
Figura 22: Residência presente na Zona de Expansão Urbana de Aracaju 85
Figura 23: Chácaras e sítios na zona de expansão de Aracaju 86
Figura 24: Problemas da macrodrenagem na zona de expansão de Aracaju 88
Figura 25: Mapa da Zona de Expansão de Aracaju 90
Figura 26: Afloramento de lençol freático junto a residência 91
Figura 27: Afloramento de lençol freático próximo a rodovias 91
Figura 28: ZEA: Aspectos naturais, presença da ocupação humana e remanescentes de atividades agrícolas
92
Figura 29: Rio Vaza Barris 93 Figura 30: Agricultura urbana na zona de expansão 95 Figura 31: Jornalista Joel Silveira em construção sobre o rio Vaza Barris 96 Figura 32: Infraestrutura na Orla Por do Sol, Povoado Mosqueiro 97 Figura 33: Comercialização das terras na zona de expansão de Aracaju 97 Figura 34: Zona de Expansão de Aracaju: povoado Areia Branca 101
Figura 35: Zona de Expansão: animais pastando próximo a rodovia 102 Figura 36: Agricultura urbana nos bairros Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont 103 Figura 37: Localização dos Bairros Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont 105
Figura 38: Cultivo de bananeira junto à residência no bairro Jardim Centenário 106 Figura 39: Vista aérea da Av. Hildete Falcão, av. Melício Machado e Zona de Expansão 107 Figura 40: Delimitação da propriedade e dos recursos naturais. 109 Figura 41: Venda de terrenos na zona de expansão de Aracaju 110
iv
LISTA DE QUADROS
Quadro 01: Tipologias possíveis para atividades de Agricultura Urbana e Periurbana 36 Quadro 02: Iniciativas de Governos Central, local e de empresas públicas e privadas na promoção da agricultura urbana no Brasil
42
Quadro 03: Indicações de ervas medicinais 45
Quadro 04: Procedência dos citadinos alvos da pesquisa 100
x
LISTA DE TABELAS
Tabela 01: Aracaju, estabelecimentos agropecuários, 2006 75 Tabela 02: Produção pecuária do município de Aracaju, 2008 76
Tabela 03: Número de imóveis rurais distribuídos por hectare no município de Aracaju, 2008.
111
Tabela 04: Concentração das propriedades por grupo de famílias e construtoras 112 Tabela 05: Número dos imóveis rurais pertencentes as construtora em Aracaju 113
xi
RESUMO
A agricultura urbana é caracterizada pelas múltiplas faces produtivas ligadas ao setor agrícola. Assim abrange o plantar e o colher de cereais, hortículas, plantas medicinais e frutíferas, bem como a criação de animais de pequeno e grande porte que servem tanto para o consumo familiar, para a venda a estabelecimentos comerciais ou diretamente nas residências no sistema chamado “porta em porta”. Através do entendimento das práticas agrícolas é possível relacionar outras categorias analíticas, que estão presentes e fazem parte do conceito da agricultura urbana, o que significa que se faz necessário a discussão sobre o conceito de campo, cidade, rural, urbano e agricultura enquanto ponto de partida para a análise das práticas socioespaciais. Com base neste contexto, o objetivo desse trabalho é analisar a manifestação de elementos característicos do rural no espaço urbano de Aracaju, mais especificamente na zona de expansão e nos bairros Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont, levando-se em consideração a prática da agricultura urbana e a presença de alguns elementos do modo de vida rural, desmistificando a dicotomia campo-cidade. O presente estudo fundamenta-se numa ampla pesquisa bibliográfica, a partir de obras que abordam questões teórico-conceituais para o tratamento dos fenômenos rurais e urbanos; na observação in loco, através de trabalhos de campo para levantamento de dados primários, documentação fotográfica, aplicação de questionários, coleta de dados secundárias oriundos da EMURB, INCRA, IBGE e SEPLAN. A análise da prática da atividade agrícola em Aracaju permite retomar a discussão campo-cidade a partir da perspectiva da totalidade e não da dicotômica rural-urbano, assim como possibilita o entendimento de que a atividade agrícola desenvolvida nessas áreas da cidade tem múltiplas dinâmicas e coexistem com outras formas de produção do espaço. Assim, a agricultura urbana praticada na cidade de Aracaju, pode ser entendida a partir da materialidade da produção do espaço, com suas múltiplas faces e significados.
Palavras-chave: Cidade, Campo, Agricultura urbana
.
xii
ABSTRACT
Urban agriculture is characterized by multiple productive faces related to the agricultural sector. Therefore comprehend planting and picking grains, horticultural, medicinal plants and fruits, as well as the breeding of small and large animals that serve both for household consumption, for sale to retail establishments or directly into homes using so called "door to door. " Through the understanding of agricultural practices is possible to lists other analytical categories, which are present and are part of the concept of urban agriculture, which means that it is necessary to discuss the concept of countryside, city, rural, urban and agriculture as a point of departure for the analysis of socio-spatial practices. Based on this context, the objective of this work is to analyze the expression of rural characteristic elements in the urban space of Aracaju, but specifically in the area of expansion and neighborhoods of Bugio, Jardim Centenario and Santos Dumont, taking into consideration the practice of agriculture urban and the presence of some elements of rural life, demystifying the rural-urban dichotomy. This study is based on a wide literature search, from works that discuss theoretical and conceptual issues for the treatment of rural and urban phenomena; on-site observation, through field work for collecting primary data, photographic documentation, application questionnaires and secondary data collection of EMURB, INCRA, IBGE and SEPLAN. The analysis of the practice of agriculture in Aracaju is allowed to resume the rural-urban discussion from the perspective of the enterity, not of the dichotomous rural-urban, as well as enables the knowing that the activity developed in these areas the city has many dynamic and coexist with other forms of production space. Thus, urban agriculture practiced in the city of Aracaju, can be understood from the materiality of production space, with its multiple faces and meanings.
Keywords: City, countryside, Urban agriculture
xiii
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO...................................................................................... 1
1.1 ESTADO DA ARTE............................. ............................................ 5
1.2 RECORTE ESPACIAL DA PESQUISA............... ........................... 7
1.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS........................................ 10
1.4 ESTRUTURA DO TRABALHO...................... ................................. 15
2. AGRICULTURA URBANA: POSSIBILIDADES E DESAFIOS... ......... 17
2.1 PEQUENA HISTÓRIA DA AGRICULTURA URBANA..... .............. 17
2.2 COMPREENSÃO E DIMENSÃO DA AGRICULTURA URBAN A.. 22
2.3 A AGRICULTURA URBANA: TIPOLOGIAS E DEFINIÇÕ ES....... 34
2.4 AS FRUTIFERAS E AS PLANTAS MEDICINAIS NO
CONTEXTO DA AGRICULTURA URBANA..................... ........................
44
3. RELAÇÃO CAMPO CIDADE EM ARACAJU................. ...................... 52
3.1 DA DICOTOMIA ESPACIAL A NOÇÃO DE CONTINUUM. ........... 52
3.2 A PROBLEMÁTICA DO QUE VEM A SER RURAL E URB ANO
NO BRASIL.......................................... .....................................................
59
3.3 AGRICULTURA E ESPAÇO URBANO ............... .......................... 64
4. A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO EM ARACAJU E A
AGRICULTURA........................................ ................................................
81
4.1 O SÍTIO URBANO............................. .............................................. 81
4.2 ZONA DE EXPANSÃO DE ARACAJU: ASPECTOS
GERAIS.....................................................................................................
84
4.3 AGRICULTURA URBANA E A PRODUÇÃO DO ESPAÇO E M
ARACAJU............................................ .....................................................
98
4.4 A RENDA DA TERRA NA ZONA DE EXPANSÃO DE ARA CAJU 108
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS E SUGESTÕES................ ....................... 115
6. REFERÊNCIAS..................................................................................... 119
7. ANEXO................................................................................................. 125
1 INTRODUÇÃO
No reconhecimento de que a cidade tem sido lugar propício para o
desenvolvimento do capitalismo e lugar privilegiado para localização da
indústria, do comércio e dos serviços, ou seja, da produção e da troca,
percebem-se, no campo teórico, interpretações que afirmam a dominação do
urbano sobre o rural, da cidade sobre o campo, este por sua vez, diluído pelo
tecido urbano, com assimilação do rural pelo processo de industrialização da
sociedade ocidental, como se o mesmo precisasse ser recriado ou reinventado.
É pertinente ressaltar o entendimento do rural e do urbano como
espaços diferenciados, porém complementares, que estabelecem relações de
interdependência e interpenetração, mas que guardam peculiaridades
inerentes a cada um.
Com o deslocamento forçado de milhões de pessoas do campo para as
cidades no Brasil, muitos dos grandes centros urbanos não tiveram a
capacidade (ou não foram preparados) para receber essa população,
deixando-os excluídos de uma infraestrutura básica (como educação, saúde,
saneamento básico) e de oferta de empregos. Um dos resultados desse
processo foi a condição sub-humana de existência nas periferias urbanas,
contradizendo inclusive a falsa lógica de que o êxodo rural “libertaria” as
pessoas do atraso do mundo rural e as conduziria à luz e à liberdade da
cidade.
Com isso, observa-se que essa população marginalizada, desprovida de
renda e de perspectiva, busca múltiplas estratégias de sobrevivência, sendo
um dos exemplos as antigas práticas provenientes do espaço rural, de
autoprodução - que é a agricultura urbana, desenvolvida em meio intra-urbano,
capaz de manter a sobrevivência tanto de famílias urbanas de heranças
culturalmente rurais, como aquelas que por necessidade praticam tais
atividades ligadas ao setor primário.
Numa outra condição, ainda no espaço intra-urbano, encontram-se
áreas que são resquícios de explorações agrícolas, as quais existiam antes da
expansão urbana. Com isso, verifica-se a manutenção de explorações
agrícolas em áreas definidas como urbanas que ou estão sendo mantidas com
2
a finalidade de especulação imobiliária, convertendo as terras em loteamentos
e extraindo a renda da terra1 ou em que seus proprietários desenvolvem a
agricultura como fonte de renda, seja principal ou complementar.
Sendo assim, esta pesquisa nasce da necessidade de se analisar as
manifestações de práticas e elementos do modo de vida tipicamente rurais na
cidade, ressaltando as dificuldades em se definir e delimitar o que é rural e
urbano no Brasil, mais especificamente no município de Aracaju, tendo como
base empírica a chamada Zona de Expansão de Aracaju (ZEA), mais
conhecida como Mosqueiro, localizada na região sul da capital, e alguns
bairros localizados no noroeste da cidade (Bugio, Santos Dumont e Jardim
Centenário), em que famílias persistem com práticas agrícolas comuns à zona
rural, expressas na paisagem urbana, através da denominada agricultura
urbana.
Em função de se analisar esse processo considerado um impasse, no
sentido de que a agricultura urbana na cidade de Aracaju, representa não só a
estratégia ou alternativa que a população busca na obtenção de alimentos mais
saudáveis, seja pela presença de frutíferas e ervas medicinais, ou mesmo na
criação de animais de pequeno e grande porte, mas também na ambivalência
entre o processo de valorização fundiária, decorrente do capital especulativo
imobiliário, e da resistência dessa prática, em sua face demonstrada pela
mercantilização da terra, produto do processo de metropolização de Aracaju.
As contradições do espaço se materializam, principalmente na zona de
expansão, em decorrência dos interesses dos sujeitos que operam nessa área
e que produzem o espaço, mas cujo caráter de segregação sócio-espacial é
uma evidência incontestável como produto em movimento, ou seja, as práticas
agrícolas desenvolvidas em micro-espaços, com criações de animais, frutíferas
residuais, ervas medicinais, são marcas comuns da agricultura urbana.
A abordagem conceitual, isto é, o resgate dos conceitos de rural e
urbano foi o caminho escolhido para se destacar e explorar a presença de
traços e de práticas agrícolas presentes em áreas urbanas, como forma de
1 Segundo Oliveira (2007), a renda da terra é um lucro extraordinário, suplementar, permanente, que ocorre tanto no campo como na cidade. Lucro esse apropriado pelo capitalista acima do lucro médio, sendo a compreensão desse conceito de fundamental importância no entendimento da realidade agrária e mesmo urbana, pois em ambas tem na terra um componente importante.
3
produção do conhecimento geográfico, buscando dar uma contribuição, mesmo
que de forma incipiente, à discussão epistemológica.
A agricultura urbana (AU) é compreendida como a prática agrícola ou
pecuária que se desenvolve, em geral, dentro da cidade ou em seu entorno,
por moradores-produtores que ocupam espaços vazios existentes na área,
dentre os quais estão os fundos de quintais e jardins de suas próprias
residências, terrenos baldios, próprios ou públicos. Tal prática absorve mão-de-
obra local, em sua maioria familiar, normalmente dissociada das relações
típicas capitalistas (assalariadas), gerando dessa forma estratégias rentáveis e
empregatícias, com produção de alimentos para consumo próprio e para o
mercado, contribuindo para a segurança alimentar.
A agricultura urbana é um tema complexo e instigante na perspectiva
geográfica, uma vez que pode proporcionar à sociedade, se praticada de forma
racional, certo equilíbrio ao ecossistema urbano. Contraditoriamente é um tema
pouco estudado na Geografia, visto que a maioria das produções acadêmicas
elenca a temática do desenvolvimento urbano-industrial moderno como último
estágio no processo de amadurecimento do capitalismo, em que a expansão
urbana acabaria dissolvendo todo foco de práticas tradicionais do mundo rural.
Pode-se reconhecer o processo de urbanização como um fenômeno
mundial, visto que a universalização das trocas, sedimentada basicamente no
espaço da cidade, aproxima países e aprofunda a divisão espacial e
internacional do trabalho. Levando-se em consideração que a cidade é o palco
das maiores manifestações do construído, em que o novo e o velho convivem
lado a lado e fazem parte do mesmo tecido urbano (paisagem urbana), não se
pode negligenciar a presença mesmo que camuflada/sufocada pelas ondas do
moderno, de práticas e manifestações, típicas do mundo rural presentes no
espaço urbano.
Em meio aos constantes processos de transformações tanto do campo
quanto da cidade, considera-se que estudos sobre essa problemática partindo
do nível intramunicipal são pertinentes, sobretudo porque surgem, cada vez
mais, novas configurações na organização espacial dos municípios, que devem
ser avaliados paralelamente à elaboração de planos e projetos de
desenvolvimento mais amplos.
4
É notório também, para além da dimensão física e visível (formas), a
manifestação do rural dentro do urbano através de elementos comuns ao
campo (como a própria agricultura e o modo de vida) dentro da cidade -
pensada em sua totalidade, entendendo o campo e a cidade como parte da
mesma trama territorial, não como opostos, mas sim como espaços
complementares, resultantes de um mesmo processo de produção do espaço
geográfico.
Apesar do desconhecimento e descrédito atribuídos às práticas de
agricultura urbana, inclusive na comunidade acadêmica e também órgãos
públicos, é necessário uma maior atenção sobre essa prática. Diante do
exposto e reconhecendo a validade do estudo sobre agricultura urbana no
âmbito da Geografia, pretende-se dar respostas as indagações ainda não
devidamente respondidas que surgem na atualidade, além de contribuir na
construção do conhecimento científico, no exame de práticas presentes no
meio intra-urbano.
Ao abordar essa temática algumas indagações surgem para nortear a pesquisa, a saber: • Há de fato agricultura no espaço urbano de Aracaju? Observada a
presença deste fenômeno, qual sua importância enquanto estratégia na
reprodução das unidades familiares que a praticam?
• Quem são os agricultores urbanos de Aracaju e o que representa essa
prática econômica na composição da renda familiar?
• O Município de Aracaju é totalmente urbano, como define o Plano
Diretor, e a despeito dessa realidade ainda há propriedades e
estabelecimentos rurais, assim como usos e funções não-urbanos no
município?
• Será que a agricultura urbana tem favorecido a manutenção da
especulação imobiliária juntamente com os agentes do setor imobiliário
e da indústria da construção civil, presentes na zona de expansão?
Pretende-se com este trabalho analisar a manifestação de elementos
característicos do rural no espaço urbano de Aracaju, levando-se em
consideração a prática da agricultura urbana e a presença de alguns
elementos do modo de vida rural, desmistificando a dicotomia campo-cidade.
5
Para a operacionalização da pesquisa, o objetivo principal foi
desdobrado em outros específicos, quais sejam:
• Analisar a funcionalidade da agricultura urbana.
• Discutir o conceito de rural e urbano utilizado na Geografia, no Brasil e
as interações campo-cidade presentes em Aracaju.
• Abordar questões referentes ao capital imobiliário e a renda da terra.
• Analisar a existência de elementos característicos do espaço rural que
são conservados e reproduzidos pela população urbana de Aracaju que
estão envolvidos como a atividade agrícola urbana.
• Levantar a produção agrícola do município de Aracaju, destacando as
práticas mais significativas na caracterização da agricultura urbana,
além de identificar a diversidade de plantas e animais criados nos
quintais das residências que praticam a agricultura urbana.
Para melhor dimensionar o objeto dessa pesquisa faz-se necessário
considerar o estado da arte que o envolve, o recorte territorial adotado e os
procedimentos metodológicos utilizados para a operacionalização desse
trabalho.
1.1 ESTADO DA ARTE
Com o intuito de verificar em que estado se encontra o conhecimento
científico acerca da discussão da agricultura urbana, é pertinente conhecer de
que forma essa temática vem sendo discutida, ou seja, é preciso que se
conheça o estado da arte, visto que este serve de suporte na compreensão do
fenômeno, logo dos estudos particulares, neste caso, da agricultura urbana.
Faz-se também necessário salientar como a cidade é compreendida,
pois cidade e urbano muitas vezes são considerados como sinônimos, o que
nos obriga a precisar como esses conceitos são entendidos. As considerações
estão apoiadas na definição proposta por Henri Lefebvre (1969) que
caracteriza cidade como um espaço-tempo, uma realidade presente, imediata,
um dado prático-sensível (material), arquitetônico, mas ao mesmo tempo em
que tem presente uma estrutura social (sensível), é um pedaço do conjunto
social e “incorpora na matéria-sensível, as instituições, as ideologias”. É
6
composta paradoxalmente pelos espaços desabitados e mesmos inabitáveis. E
que “o ‘habitat’ não constitui a cidade e que ela não pode ser definida por essa
função isolada” (Lefebvre, 1969, p. 60). Ela é a ‘mediação entre as mediações’,
contém a ordem próxima e está contida na ordem distante. A cidade como
mediação, é o local onde se manifestam as contradições da sociedade,
principalmente as relacionadas aos grupos diversos e ao poder político. Não
podendo ser concebida enquanto um sistema significante, fechado, isolado.
Contendo a ordem próxima, ela a mantém, sustenta relações de produção e de propriedade; é o local de sua reprodução. Contida na ordem distante, ela a sustenta; encarna-a, projeta-a sobre um terreno (o lugar) e sobre um plano, o plano da vida imediata; a cidade inscreve essa ordem, prescreve-a, escreve-a, texto num contexto mais amplo e inapreensível como tal a não ser para a mediação. (LEFEBVRE, 1969, 47).
Em relação ao conceito de urbano, Lefebvre (1986) apud Silva (2006),
destaca que este não designa puramente a cidade e a vida na cidade, nem
coincide com a polis (cite) e nem com a cidade medieval, mas as substitui,
englobando-as. O urbano pode ser entendido como o espaço onde se
desenvolve a modernidade e a cotidianidade no mundo moderno, a forma atual
da simultaneidade, da unidade, da reunião, da convergência e do encontro.
Embora o urbano não dispense uma base prático-sensível, uma morfologia, ele
não pode definir como apegado a essa, por outro lado ela não é algo que se
pode separar dela.
Além dessa discussão, também serão utilizados os conceitos de cidade
e campo, rural e urbano a partir da obra de autores a exemplo de Ferrão
(2000), Reis (2005), que discutem questões relacionadas a dicotomia espacial
e a noção de continuum, de Carneiro (1998) que aprofunda os debates
referentes ao rural e urbano. A discussão realizada por esses autores está
atrelada às mudanças a partir da segunda metade do século XX, chamando a
atenção para uma nova ruralidade, e de como o ritmo de mudanças nas
relações sociais e de trabalho no campo vão dirimir as noções de rural e
urbano. Alentejano (2000), que faz contraposição à visão do “novo rural” e
Carlos (2004b), que analisa a relação campo-cidade em sua articulação, na
perspectiva da contradição centro/periferia. Maia (2003) e Rezende (2004),
7
dentre outros, conduzem a discussão a partir da manifestação do mundo rural
na cidade.
1.2 RECORTE ESPACIAL DA PESQUISA
Aracaju, ao longo de sua formação, foi e tem sido estudada por
diferentes ramos da ciência, interessados em compreender melhor o seu papel
no conjunto da economia sergipana e, sobretudo sua inserção no sistema
urbano brasileiro: Porto (1991) França (1988,1997), Loureiro (1983), Ribeiro
(1989), Machado (1990), dentre outros, estando esses estudiosos voltados
para a caracterização interna da cidade, sua evolução e estruturação urbana,
bem como questões de organização regional.
Aracaju constitui-se num centro sub-metropolitano ou capital regional
brasileira dentre os municípios sergipanos, desponta enquanto capital sua
primazia urbana consolidada em relação às demais cidades a ela subordinada,
sendo detentora, segundo França (1997, p. 68) das maiores variações relativas
da população urbana (1980-1991), apresentando taxas de crescimento
superiores às do conjunto urbano do estado e bem expressivas do que as do
total da população, conforme destaca França (1997). Para
O rápido crescimento da população dá-se concomitantemente a um processo de esvaziamento do campo sergipano, sobretudo em decorrência da pecuarização, da concentração da terra e, em determinadas áreas, da modernização da agricultura. Aracaju passa a ser o principal centro de atração das populações que migram do campo e das cidades do interior. (FRANÇA, 1997, p. 60).
O município de Aracaju abrange uma área de 181,8 Km2, circunscrito na
mesorregião Leste Sergipano, delimitada pelas coordenadas geográficas de
10º 55’ 56” de latitude sul e 37º 04’ 23” de longitude oeste. Faz fronteira em sua
porção norte, com o município de Nossa Senhora do Socorro, tendo como
divisa o Rio do Sal: na porção sul, limita-se com o município de Itaporanga
D’ajuda, que são separados pelo rio Vaza Barris, com a atual construção da
ponte ligará a capital a praia da Caueira; no sentido oeste, faz fronteira com os
8
municípios de São Cristóvão e Nossa Senhora do Socorro e a leste é banhado
pelo rio Sergipe e pelo oceano Atlântico.
Para a verticalização da pesquisa tomar-se-à como base empírica a
chamada Zona de Expansão de Aracaju (ZEA), mais conhecida como
Mosqueiro, localizada na região sul da capital, e alguns bairros localizados no
noroeste da capital (Bugio, Santos Dumont e Jardim Centenário), locais em que
se verifica a ocorrência da prática agrícola com maior intensidade no município
em questão (Figura 01).
9
Figura 01: Localização da área de estudo, Aracaju, 2009. Fonte: EMURB – Empresa Municipal de Urbanização de Aracaju Digitalização: Gilberto Nunes
10
1.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Para concretização dos objetivos, torna-se necessária a caracterização
geográfica da área de estudo, através da integração dos fatos sociais,
históricos, econômicos, culturais e ambientais, tendo em vista uma melhor
apreensão da realidade material em análise, respeitando as particularidades
dos fatos anteriormente destacados.
Para construção de um referencial teórico consistente e basilar, o
presente estudo fundamenta-se numa ampla pesquisa bibliográfica, com
ênfase nas teorias originárias de diferentes ramos das ciências humanas, em
especial a Geografia, que debatem questões teórico-conceituais para o
tratamento dos fenômenos rurais e urbanos na atualidade, buscando um
melhor entendimento de suas interações, contidas em dissertações de
mestrado, teses de doutorado, artigos científicos, revistas especializadas e
livros.
Cabe ressaltar a escassez de material no âmbito da Geografia que
aborde a temática da agricultura urbana, sendo necessário dialogar com outras
áreas do conhecimento, a exemplo da economia, agronomia, sociologia.
Porém, não se pode deixar de frisar as contribuições dos autores que
serviram de referência e se coadunaram no suporte e elo para a discussão da
produção do espaço, as transformações do espaço urbano de Aracaju, a
relação campo-cidade e o desenvolvimento da prática da agricultura urbana:
Lefebvre (1969), Carlos (1999; 2004), França (1988; 1997), Madaleno (2001;
2002), Maia (2003; 2007), Locatel (2004), dentre outros, que somados
promoveram a efervescência científica na contribuição para a leitura da
realidade, não de forma a aplicar determinados modelos prontos e acabados,
mas fazer de forma coerente as relações entre a teoria geral e a realidade
material-sensível.
A agricultura urbana exercida no espaço intra-urbano de Aracaju, escapa
ao controle estatístico oficial, razão pela qual o nosso projeto de investigação
inclui observação in locus, através de trabalhos de campo para levantamento
de dados primários, documentação fotográfica, entrevista semi-estruturada e
aplicação de questionário.
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Foi utilizado também como procedimento metodológico o uso de
fotografia, com o objetivo de identificar elementos para a caracterização e
compreensão da prática agrícola no espaço urbano de Aracaju. Foram
registradas imagens fotográficas, em especial nas localidades onde se
desenvolveu a análise empírica, para subsidiar, desta forma, o aprofundamento
das discussões acerca da problemática abordada.
As áreas identificadas com agricultura urbana em Aracaju durante a
pesquisa foram classificadas em dois grupos que são: Grupo 01: as áreas
localizadas na porção noroeste da cidade, em que a densidade demográfica é
elevada com alto grau de ocupações dos espaços, representando as áreas
periféricas, cuja prática se dá juntamente às residências, nos chamados fundo
de quintal, com cultivos de frutíferas e plantas medicinais em vasos e canteiros;
Grupo 02: refere-se a zona de expansão urbana de Aracaju, que está
localizada no extremo sul da cidade. Representa atualmente a maior reserva
de solo urbano da cidade, em que se mesclam paisagens típicas do rural e do
urbano. Sendo que, em ambas as áreas a agricultura urbana se reproduz,
mesmo sem apoio institucional.
A escolha dessas áreas no município de Aracaju deve-se a principio, no
tocante a chamada zona de expansão, às visíveis marcas na paisagem que
denotam traços fortes do rural, refletidos pela presença da criação de animais
de pequeno e grande porte, que compartilham esses espaços com as
diferentes formas de ocupação e pela permanência do cultivo de coco,
reacendendo a questão da dicotomia espacial entre rural e urbano. Para as
áreas localizadas no noroeste deve-se à facilidade de coleta de informação,
pelo conhecimento e convívio diário com a geografia dessa localidade.
Acerca da tipologia que abarca o conceito de agricultura urbana e
periurbana (AUP), conforme Santandreu e Lovo (2007) nota-se que ela pode
ser realizada em espaços públicos e privados dentro do perímetro urbano e
ainda no espaço periurbano de um município. Para a exiquibilidade da
pesquisa foi adotada uma tipologia que venha a caracterizar a diversidade de
espaços possíveis de serem utilizados com a prática da AU no espaço intra-
urbano de Aracaju, mais especificamente em sua zona de expansão urbana e
alguns bairros do noroeste da capital.
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O intenso debate sobre a definição dos limites entre o urbano e
periurbano e entre este e o rural abrange uma diversidade de posições teóricas
e está longe de se atingir um consenso para uma definição universal. Este
debate se refletiu na dificuldade em definir a abrangência das práticas agrícolas
no espaço urbano pesquisado, mas se optou pela AU de base intra-urbana, ao
invés de adentrar na complexa, mas não menos importante agricultura
periurbana.
Para tanto, foram aplicados 30 questionários com as famílias que
desenvolvem a agricultura urbana, com o objetivo principal de subsidiar a
análise qualitativa referente às características socioeconômicas e
caracterização do espaço em que são desenvolvidas as práticas de agricultura
urbana. É importante destacar que a aplicação dos questionários foi cessada
em virtude da repetição das respostas nas localidades pesquisadas e de
acreditar ter obtido informações cruciais para o entendimento da agricultura
nessas áreas da cidade. A definição da amostra para a aplicação dos
questionários com os agricultores foi de forma aleatória e não probabilística,
uma vez que o trabalho prima por uma análise qualitativa e não quantitativa.
Vale salientar a dificuldade em aplicar os questionários na zona de
expansão de Aracaju, pois o acesso ao proprietário foi dificultado, primeiro pela
grande dimensão das propriedades e ausência dos proprietários nas mesmas,
nos momentos da investigação. Sendo assim, foi realizado registro fotográfico
tanto das propriedades, bem como da presença dos animais, confinados ou
soltos pelas ruas e avenidas. Foi estabelecida uma relação entre os dados
oriundos do IBGE, no tocante a produção agropecuária municipal, com a
investigação de campo e tais registros.
Os dados de fontes secundárias foram obtidos junto a FIBGE, a partir de
publicações tais como Censo Agropecuário, Produção Agropecuária Municipal,
INCRA, a partir do Cadastro de Imóveis Rurais de Aracaju, EMURB e SEPLAN.
A primeira vista é um tanto paradoxal combinar os labores e paisagens
típicas do mundo rural ao meio urbano; todavia, apesar de ser uma expressão
recente, a agricultura urbana, na acepção da palavra, designa uma atividade
bem antiga, referente às atividades para produção de bens alimentares, sejam
de origem animal ou vegetal, bem como outras espécies úteis ao homem,
através da reutilização de resíduos sólidos e de águas residuais, promovidos
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nos espaços intra-urbanos ou na periferia das manchas construídas, em
cidades das mais variadas dimensões.
As técnicas de coleta de dados utilizadas visam a realização de um
estudo de caso, passível de comparação com outras pesquisas similares
efetuadas em diferentes cidades, por outros pesquisadores. A aplicação de
questionário destina-se ao levantamento da agricultura urbana praticada em
Aracaju, destacando também as práticas preexistentes ao próprio processo de
expansão urbana ocorrido nesses bairros da cidade. Para a Zona de Expansão
foi utilizada na identificação dos locais com presença de agricultura, a carta de
Zoneamento Urbano Ambiental, elaborada pela GEO Consultoria e Serviços,
na escala de 1:30000, no ano de 2000.
A partir daí seguiu-se um roteiro estabelecido, focando as áreas
destacadas na carta de Zoneamento, na qual se visualizou o que se entende
por Zona Residencial pré-urbana com funções comerciais, industriais, turísticas
e de serviços, bem como a Zona de Moradias individuais, sítios e chácaras,
condomínios e loteamentos residenciais licenciados, ocupados e em processo
de ocupação.
Nessa perspectiva, foi iniciada a visitação de caráter exploratório na
investigação sobre a agricultura urbana, bem como no destaque das práticas
agrícolas preexistentes ao próprio processo de urbanização. Foi plausível a
orientação pela rodovia dos Náufragos, mais especificamente sua margem
direita que antes mesmo de adentrar nos Povoados Areia Branca, Matapuã e
Mosqueiro, os quais se conectam a tal rodovia, foi visível uma paisagem que
guarda traços muito fortes com um passado estritamente agrícola, seja pela
presença da cocoicultura, seja pelas casas antigas, isoladas na paisagem,
contrastando com os condomínios horizontais fechados, principalmente na
Aruana e chácaras com alto grau de sofisticação.
Outra fonte importante na busca de informações sobre os problemas
vivenciados pelos moradores da ZEA foi pesquisada nos arquivos disponíveis
em meios digitais do Jornal da Cidade, vinculados ao site do Conselho das
Associações de Moradores da Zona de Expansão de Aracaju (COMBAZE).
Para os bairros Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont, localizados
no noroeste da capital, seguiu-se uma trajetória de exploração focada na busca
de práticas agrícolas desenvolvidas principalmente junto a residências, no
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chamado fundo de quintal, na manutenção das frutíferas e plantas medicinais,
buscando compreender a permanência e a funcionalidade de tais práticas.
Com relação ao método de amostragem espacial, ele é indicado
especialmente para proceder a estudos sobre a forma de uso e ocupação do
solo, sempre que não seja possível recorrer a completos e abrangentes
levantamentos aerofotogramétricos e ao tratamento digital pelo Sistema de
Informação Geográfica (SIG), o que justifica a escolha do método aplicado.
Somam-se à pesquisa, o método de amostragem estratificada, em que
vamos procurar representar as distintas camadas socioeconômicas nas
diversas áreas pesquisadas, merecendo especial atenção os seguintes fatores:
aos tamanhos das respectivas propriedades, a densidade da população e a
relação com o restante da cidade, sempre procurando estabelecer a devida
proporcionalidade relativas às dimensões humana, social e espacial de cada
área pesquisada (Ferreira e Simões, 1987, apud Madaleno, 2002).
Em relação aos questionários, tem-se a possibilidade de analisar melhor
a origem geográfica dos sujeitos pesquisados, o nível de escolaridade, a faixa
etária e distribuição por sexo, a composição familiar, alguns de seus hábitos, e,
sobretudo a produção de alimentos nos espaços intra-urbanos, destacando os
principais produtos, a presença de plantas medicinais e/ou ornamentais, os
animais criados, as técnicas e métodos de cultivos praticados. Esse
procedimento possibilitou uma melhor compreensão acerca da agricultura
praticada em Aracaju, bem como do porquê da permanência dessas atividades
nos espaços em que são praticadas.
Apoiado num modelo interativo da análise dos dados, foram realizadas
coletas tanto nas instituições públicas do Estado como também in locus, de
forma a permitir uma interpretação coerente das variáveis pesquisadas.
Entende-se que a sistematização das respostas dos sujeitos pesquisados, e
posterior tratamento quantitativo, num formato consistente e reflexivo, conduziu
a uma melhor percepção da realidade no tocante à prática e à presença da
agricultura urbana em Aracaju.
As entrevistas semi-estruturadas foram realizadas no próprio local de
moradia dos sujeitos envolvidos com AU, com a finalidade de obter
informações cruciais sobre a vida na relação com o espaço urbano, o trabalho
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desempenhado, as possibilidades e perspectivas acerca da prática agrícola no
contexto do urbano e seu relacionamento com a vizinhança e a cidade.
A combinação entre a observação da realidade, os questionários e as
entrevistas aos diferentes sujeitos, estas complementadas pelas fontes
bibliográficas sobre a temática em tela e do meio estudado possibilitou
compreender a agricultura urbana e as problemáticas relacionadas à dicotomia
espacial entre o rural e o urbano.
1.4 ESTRUTURA DO TRABALHO
O presente trabalho estrutura-se em três capítulos, além dessa
introdução. Inicia-se com a introdução da temática abordada: a agricultura
urbana e a elucidação das questões motivadoras dessa pesquisa, o recorte da
área de estudo e a metodologia adotada para o desenvolvimento do trabalho.
O primeiro capítulo objetiva trazer para o debate o conceito de
agricultura urbana com suas possibilidades e desafios, apresentando sua
importância, funcionalidade, principais produções no Brasil, atuação e papel do
Estado na legitimação da agricultura urbana, aspectos econômicos, sua
relação com a segurança alimentar e da biodiversidade. Para fundamentação
teórica as produções da Revista Agricultura Urbana e, principalmente, as
contribuições de Maria Madaleno e Mougeot, serviram de suporte teórico para
sustentar a defesa da existência da agricultura urbana em Aracaju.
O segundo capítulo visa a discutir os conceitos de campo e cidade, rural
e urbano, a partir dos principais debates proporcionados pela sociologia e
geografia, de forma processual, cujo balizamento inicial é a revolução
industrial. Dentre as leituras proporcionadas por diferentes autores, a que mais
se coaduna com a perspectiva de pensamento aqui proposto é o lefebvriano,
sobre a produção do espaço e o “direto à cidade”.
No terceiro capítulo é apresentado o recorte territorial escolhido, qual
seja a zona de expansão de Aracaju e os bairros Bugio, Jardim Centenário e
Santos Dumont localizados no noroeste da capital; assim, para elucidação da
discussão em torno da relação campo-cidade e da prática da agricultura
urbana, foi feita uma caracterização geral da área, apresentando os diferentes
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aspectos geográficos, bem como o destaque dos atuais e principais problemas
vivenciados pela população de tais localidades.
Ainda no terceiro capítulo, buscou-se destacar empiricamente a
Agricultura urbana em Aracaju, chamando a atenção para a diferenciação das
práticas agrícolas preexistentes, a exemplo da cocoicultura, apresentando os
resultados do trabalho de campo, com resultados de população e da produção
agrícola. É bom frisar que os dados aqui apresentados não se coadunam por
completo e também não fazem parte, muitas vezes, do banco de dados dos
órgãos oficiais na elucidação da prática da agricultura urbana. É importante
salientar a importância de se fazer a ponte entre a teoria geral que dá suporte
ao entendimento do nosso objeto de estudo, com o esforço para não
desconfigurar a realidade material-sensível.
Por último são apresentadas as considerações finais e sugestões, na
continuidade do estudo acerca da prática da agricultura urbana. Assim, é
esperado que a mesma possa servir de subsídio no entendimento da produção
do espaço do município de Aracaju e seja levada em conta na formulação de
políticas públicas ligadas ao planejamento urbano, no tocante a minimizar os
impactos relacionados à segurança alimentar. E que a partir dessa pesquisa
outras surjam e possam dar continuidade para um melhor entendimento da
produção do espaço urbano e a relação deste com a agricultura.
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2 AGRICULTURA URBANA: POSSIBILIDADES E DESAFIOS
O presente capítulo traz uma discussão teórica acerca do conceito de
agricultura urbana, abordando sua evolução, seus elementos determinantes,
tipologias presente no meio intra-urbano, suas dimensões e compreensão da
agricultura urbana, bem como seus desdobramentos no tocante à natureza do
solo urbano, com ênfase no recorte espacial escolhido, a saber: a Zona de
Expansão urbana localizada no extremo sul da capital sergipana e os bairros
Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont.
2.1 PEQUENA HISTÓRIA DA AGRICULTURA URBANA
A agricultura urbana constitui-se como um fenômeno socioeconômico e
espacial crescente nas cidades dos países industrializados centrais, bem como
nos países periféricos. Para os primeiros, constitui um sistema de produção
importante e competitivo; já para os segundos, revela-se como estratégia de
sobrevivência dos mais pobres, na medida em que fornece alimento e emprego a
uma parcela significativa da população (MADALENO, 2002).
Tal fenômeno não obteve crédito junto aos estudiosos antes da década de
1960, por se conceber o urbano e rural como espaços não só totalmente
diferentes, mas, sobretudo, divergentes. Porém, alguns pesquisadores trazem o
entendimento, enfatizando que, apesar de quase ausente das cidades após a
revolução industrial, a agricultura prevaleceu dentro e na orla das mesmas desde
tempos imemoriais (MOUGET, 1994 apud MADALENO, 2002).
Nas cidades africanas, a agricultura urbana constitui-se enquanto
complemento de renda familiar e importante fonte de proteínas e vitaminas, pelo
fato de enriquecer a dieta diária de parcela não desprezível da população, mas
tem sua principal relevância pelo aproveitamento de recursos disponíveis nos
espaços intra-urbanos, em consonância com as recomendações feitas na Cimeira
da Terra, durante a Rio 92, denominada Agenda 21, documento que relata que as
atividades econômicas diversificadas devem ser desenvolvidas em meio urbano a
fim de diminuir a pobreza e de promover o reequilíbrio ecológico dos
assentamentos humanos (MADALENO, 2002).
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Nesse contexto, as instituições internacionais de cooperação e
desenvolvimento vêm creditando e legitimando cada vez mais a produção das
atividades primárias entre os citadinos, sendo o foco principal a população menos
favorecida economicamente e as mulheres. Através de redes de serviços e
infraestrutura, apoio técnico e financeiro, somados ao esforço conjunto das
comunidades, bem como da remoção de barreiras legais às atividades informais,
nota-se o objetivo de melhorar a qualidade de vida urbana.
A agricultura urbana, atividade econômica do setor primário, pode ser
praticada em pequenos espaços vazios existentes dentro do tecido urbano, ou em
espaços situados na orla da cidade, denominação dada aos espaços periurbanos.
Há autores que denominam de periurbana aquela em que a agricultura é
praticada na periferia da cidade e urbana as desenvolvidas nos espaços
interiores, mas não edificados da mesma; entretanto as duas concepções são
aceitas, generalizando-se a expressão urbano a ambos os espaços.
A designação agricultura urbana abarca um sem número de formas de exploração agrícola que vão do cultivo intensivo dos quintais privados, ao plantio de uma associação de diversas espécies vegetais à beira das estradas e caminhos, passando pela ocupação, quantas vezes ilegais, de lotes urbanos vazios, pelo cultivo em vasos e recipientes dos mais diversos feitos nas varandas, terraços, em pátios, nas caves, nas paredes de estruturas construídas, ate à prática da agricultura hidropônica, da agricultura e das mais ricas e variadas formas de criação de quase todos os tipos de gado (MADALENO, 2002, p. 3).
Essa prática contribui para a produção, processamento e a
comercialização de alimentos e energia, com destino a abastecer a demanda dos
consumidores urbanos. Segundo Madaleno (2002) as contribuições sobre
agricultura urbana têm conhecido consideráveis expansões nas últimas duas
décadas, mesmo com as poucas produções, mas é significativo o acesso
dedicado a esta temática, sendo que o continente mais rico em atividades
primárias em meio urbano é o africano. Foi no Congo, na pequena cidade de
Pointe Noire, que no final da década de 50 o geógrafo Pierre Vennetier de forma
sistemática pesquisou 1013 famílias dentre as quais contou 266 dedicadas à
agricultura urbana, totalizando cerca de 1500 praticantes da agricultura,
cultivando mandioca, milho, amendoim, batata e outros gêneros.
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A atenção destinada à agricultura urbana nas publicações científicas e
tecnológicas até o final da década de 1960 foi muito escassa. Mas é a partir da
década de 1970 que a agricultura urbana ganha projeção, através de assistência
técnica e financeira adequada, através das intervenções da FAO, do governo dos
países centrais, da UNICEF, na promoção e patrocínio de programas de apoio e
incentivo as atividades de agricultura urbana em alguns países da África
Ocidental, a exemplo de Gana, Costa do Marfim, Zaire e Zâmbia.
A prática agrícola em meio urbano na década de 1970 era vista como
aberrante, ou pelo menos conjuntural, reflexo do intenso êxodo rural
desaparecendo a longo prazo; mas, conforme destaca Madaleno (2002), isso não
ocorreu, em função de a crise econômica resultante da crise do setor petrolífero,
acentuarem os problemas sociais e econômicos. Assim a agricultura urbana,
antes considerada uma anomalia que a cidade acabaria por rejeitar, configura-se
como possibilitadora de soluções possíveis para a mitigação da pobreza urbana.
A agricultura urbana, nos anos 80 do século XX, conheceu um período de
crescimento e destaque em alguns países em desenvolvimento, crescimento
estimulado por organizações internacionais, por meio da incrementação de
programas de cooperação com países pobres na perspectiva de pesquisarem as
características da agricultura praticada em meio urbano, para a expansão das
áreas cultivadas, somadas ao apoio técnico aos pequenos produtores
(MADALENO, 2002).
No que concerne às entidades financiadoras, o International Development Research Centre do Canadá (IDRC) teve um papel de locomotiva em muitos dos programas de pesquisas citados, pois promoveu, a nível mundial, e a partir de 1983, uma série de projetos sobre o uso de resíduos urbanos como insumo agrícola, estudos sobre sistemas de distribuição de produtos alimentares e sobre segurança alimentar. Ao todo foram 30 programas de investigação desenvolvidos em 24 países, nomeadamente latino-americanos, africanos e asiáticos, ao longo de toda década de 1980 (MADALENO, 2002, p 11).
A consolidação da agricultura urbana ocorre nos anos de 1980, superando
as previsões herdadas dos estudos dos anos setenta, segundo os quais esta não
era apenas recurso dos mais pobres e menos instruídos, e sim promotora de
fonte de renda, inclusive dos mais favorecidos economicamente. Tal afirmação é
constatada em algumas cidades que se revelaram auto-suficientes em
20
determinados produtos alimentícios, a exemplo de Singapura, na criação suína,
ou de Bamako, no Mali, na produção de vegetais frescos (MADALENO, 2002).
Nos anos 90 do século XX, a agricultura urbana conheceu sua
consagração, pois aumentaram as publicações dedicadas a este tema, apoiados
pelo uso da internet na divulgação dos estudos locais, regionais, assim como os
programas de apoio técnico e financeiro, tornando-se a temática visível, fazendo
parte das iniciativas das grandes agências de desenvolvimento internacional.
Em relação à América Latina, Cuba apresenta-se com gravíssimos
problemas econômicos, sendo alvo de incentivos externos para a promoção da
prática da agricultura urbana, em que o próprio governo, através do Ministério da
Agricultura, atua na distribuição de sementes aos potenciais cultivadores, pelas
casas de semillas (sementes), dispersas pelas áreas metropolitanas, bem como
pelo incentivo das hortas populares ou comunitárias na capital, apoiados pelo
conselho de igrejas de Cuba e organizações não governamentais, a exemplo da
Green Team e da Organização Internacional Australiana de Permacultura (AOPI)
(CHAPLOWE, 1998, apud MADALENO, 2002).
Em Cuba, a agricultura urbana tem início com a etapa crítica do processo
revolucionário encetado em 1959. Quando ocorreu a queda do socialismo em
outros países no final dos anos 1989 e 1990, e principalmente com a derrocada
da União Soviética, com o qual mantinha laços intrínsecos, dada a
representatividade comercial de seu parceiro, mesmo diante do forte bloqueio
imposto pelos Estados Unidos. Nota-se, ainda, que Cuba não dispõe de recursos
energéticos apropriados e nem capital suficiente, ocasionando um pós
desmantelamento da URSS: forte carência na alimentação, transporte, ausência
de produtos não duráveis como roupas, calçados, agravamento do setor
habitacional, isto é, todos esses aspectos de decréscimo no nível de vida da
população não se coadunavam com os avanços de décadas anteriores.
Neste mesmo período existiam em Cuba pesquisas com utilização de
substratos orgânicos para a produção agrícola, realizadas pelo Instituto de
Investigaciones Fundamentales en Agricultura Tropical (INIFAT), o qual até então
não tinha grande repercussão no país pela grande oferta de produtos
quimicamente produzidos. Mas no momento de crise, tais pesquisadores são
convocados pelo governo cubano no apoio de produção de alimentos sob uma
21
nova ótica, ocasião em que as produções urbana e periurbana de alimentos em
Cuba tomam grande impulso (AQUINO, 2002).
Segundo Aquino (2002), a modalidade de agricultura urbana para a
produção de hortaliças e condimentos frescos foi a primeira atividade realizada
em Cuba, sendo a mais desenvolvida; mas há a presença de outras modalidades
de produção: organopônicos, hortas intensivas, pátios, parcelas, fazendas de
auto-abastecimento e suburbanas. A agricultura urbana pode se estabelecer
também em Unidade Básica de Produção Cooperativa (UBPCs). Nessas UBPCs
há produção de gado, hortas intensivas e minhocultura na mesma unidade. É com
essa realidade que em Cuba
O lugar em que se estabelece este tipo de Agricultura pode ser definido a nível de município ou província, podendo ser um terreno baldio onde antes se jogava lixo, por exemplo, ou ser uma escolha pessoal se tratando de pátios ou quintais. Aquele que recebe a terra paga um pequeno imposto, e quando necessário o governo cubano subsidia a capacidade do mesmo, implantando irrigação e outros meios necessários para se iniciar a atividade [...], o que significa que a agricultura urbana representa uma boa fonte de renda. Em contrapartida, a cobrança para quem detém essa área é muito intensa, se não atender às exigências e não colaborar no atendimento as metas, perde o direito a terra (AQUINO, 2002, p.21).
Diversos centros de pesquisas de alguns países europeus têm incluído em
seus orçamentos a promoção desta atividade econômica em diversos países, a
exemplo da França, por meio da implementação da agricultura urbana em cidades
africanas e asiáticas, do Reino Unido e seus projetos universitários, da Itália na
promoção e apoio do projeto Por-huerta da Argentina, Portugal - através do
programa Práxis XXI financia projetos, como o desenvolvido por Madaleno (2002)
sobre agricultura urbana na cidade de Belém do Pará, e estudo similar em
Presidente Prudente-SP.
A agricultura urbana no Brasil tem muito pouco incentivo por parte do poder
público e, muitas vezes, quando se consegue um apoio político é somente
provisório, pois o interesse partidário (mandatário) varia de acordo com o dirigente
político. Merecem destaque o “Programa de verticalização da pequena produção
agrícola” (PROVE) em Brasília (DF), cujo objetivo é promover a pequena
produção agrícola, seu processamento e comercialização e o “Programa Hortas”
em Teresina (PI), que inicialmente tinha a finalidade de formação e terapia
22
ocupacional de crianças carentes, ampliando-se para toda a família,
principalmente, na zona de expansão do perímetro urbano daquela cidade
(AQUINO, 2007).
2.2 COMPREENSÃO E DIMENSÃO DA AGRICULTURA URBANA
A crescente urbanização pela qual todo o mundo vem passando nas
últimas décadas tem levado a uma necessidade cada vez maior do fornecimento
de alimentos à cidade. Essa necessidade vem sendo (ou tentando ser) suprida,
além do crescente aumento da produção agrícola na zona rural, pela produção de
alimentos na cidade a partir da prática da agricultura urbana ou da agricultura
orgânica.
Enquanto a agricultura orgânica tem por princípio estabelecer um
conjunto de procedimentos que envolve a planta, o solo e as condições
climáticas, produzindo um alimento sadio e com suas características e sabor
originais, a agricultura urbana é definida como sendo a produção de alimentos
dentro do perímetro urbano e periurbano, levando em consideração a inter-
relação homem-cultivo-animal-meio-ambiente e as facilidades da infraestrutura
urbanística que propiciam a estabilidade da força de trabalho e a produção
diversificada durante todo o ano (AQUINO, 2007).
A definição do que vem a ser agricultura urbana, leva em consideração as
múltiplas faces produtivas ligadas ao setor primário, abrangendo dessa forma, o
plantar e o colher de cereais, hortículas, plantas medicinais, frutíferas, bem como
a criação de animais de pequeno e grande porte para a produção alimentícias,
tendo como destino final o consumo familiar ou a venda a estabelecimentos
comerciais ou diretamente nas residências, no chamado comércio 'porta em
porta'.
A agricultura urbana é a equação entre ambientes e sociabilidades urbanas com elementos e sociabilidades do meio rural; revestida de intencionalidades e meios técnicos produtivos peculiares, mas tendo como base os espaços urbanos que nutrem, coíbem e intercalam as práticas agrícolas. As atividades do setor primário nos entremeios da cidade somam e criam, o 'acontecer solidário' entre homens e mulheres, terra e produção
23
e, sobretudo, a materialidade da superfície com a produtividade agrícola nas cidades (MARTINS, 2008, p. 2).
Na agricultura urbana, a produção é bastante limitada quantitativamente,
se comparada com as possibilidades dos setores rurais convencionais, pois o
principal objetivo reside no suprimento, de ao menos parte, das necessidades
alimentares dos agricultores, enquanto o excedente é parte integrante nos
diferentes espaços cultivados e cultiváveis.
É comum, conforme Dinis e Marcelino (2007), nas pequenas unidades,
cujos sistemas produtivos são efetuados nos canteiros e pequenas hortas nos
quintais, o excedente geralmente é vendido para a comunidade da própria
vizinhança, podendo ocorrer que esses alimentos sejam doados aos vizinhos e
conhecidos mais próximos, quando não participar de trocas, o que pode ser visto
como um aspecto cultural dessas localidades.
Nas unidades com maiores dimensões, cujo objetivo é a venda dos
produtos, estes serão comercializados em feiras ou nos comércios regionais, e o
valor de troca do produto é balizado pelas demandas e dinâmicas dos mercados
locais, mas também sofrem influência das especulações presentes na
comercialização da produção oriunda das propriedades convencionais (campo)
(DINIS e MARCELINO, 2007).
Nas áreas pesquisadas, como se pode observar nas Figuras 02 e 03
temos uma variedade de dimensões das propriedades existentes, mesmo estando
inseridas nos limites municipais de Aracaju encontramos grandes reservas de
terrenos com presença da prática agrícola.
24
Figura 02: Propriedade localizada na zona de expans ão de Aracaju. Foto: SANTANA FILHO, L. S, 2009.
Figura 03: Fundo de quintal com frutíferas e planta s medicinais. Foto: SANTANA FILHO, L. S, 2009.
25
Assim como em todo o litoral sergipano durante as décadas de 1970 e
1980, a cocoicultura, segundo França (1991), era muito forte nessa localidade,
mas com a lógica da especulação imobiliária, e posterior conversão das terras de
rural para urbano ocorreu uma retração de sua produção, mas que ainda hoje, na
primeira década do século XXI, somam-se à totalidade da produção do espaço
nessa localidade; percebem-se pequenas propriedades que certamente existiam
e foram inseridas na lógica urbana com o processo de urbanização, mas que
guardam traços de uma vida singular e bucólica, a exemplo das casas muitas
vezes isoladas na paisagem, ou mesmo com o cultivo do caju e criação de
galináceos ao lado da residência.
Nos bairros Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont, percebe-se que a
dimensão das propriedades é justamente o tamanho da residência, que destina
parte dela, seja o fundo do quintal, o jardim na frente da residência ou mesmo a
lateral da casa como local de produção de frutíferas, plantas medicinais ou
criação de animais de pequeno porte.
Para a compreensão da agricultura urbana, além do inter-relacionamento
entre os espaços urbano e rural, outro aspecto relevante faz-se presente, qual
seja a maximização dos usos do ambiente, sobretudo pela reutilização de
resíduos sólidos e de águas residuais, provenientes das atividades urbanas,
utilizados na fertilização de terra e na irrigação dos cultivos, reduzindo os gastos
com a produção. É importante destacar que os elementos que geram benefícios,
quando mal gerenciados, ocasionam problemas ligados à contaminação dos
cultivos, animais e, sobretudo, dos consumidores finais.
Segundo Madaleno (2002), pode apresentar riscos, sobretudo, quando da
utilização de água poluída para irrigação, ou pela ausência de hábitos de limpeza
na boa conservação e utilização dos alimentos, donde surge a preocupação e
fomento na divulgação de tais riscos entre a comunidade mais carente e sua
inclusão no cotidiano escolar.
As variadas limitações observadas na prática da agricultura urbana têm
estimulado a criação de tecnologias para a execução, a exemplo da reciclagem
de resíduos sólidos domésticos e sua utilização na adubação, uso de tanque de
compostagem, reutilização de pequenas superfícies como terraços, varandas,
canteiros etc.
26
Segundo Aquino (2007), para o sucesso da produção agrícola de forma
sustentada nas regiões urbanas ou periurbanas, precisa-se ter a garantia de
fornecimento de insumos orgânicos, o resgate e a preservação de cultivos
adaptados às condições locais, a adequação de novos substratos à produção de
mudas e o uso de defensivos alternativos que não sejam poluentes. Contudo,
para se atingir essas necessidades e evitar ou conter problemas de contaminação
do solo, é urgente, o reconhecimento, pelas autoridades locais, acerca do
problema da agricultura urbana relacionado à contaminação do solo: a resposta
desejada a tal situação não perpassa pela proibição de se produzirem alimentos
nessas áreas e, sim, por criar formas de se buscar ajuda técnica para a produção
segura de alimentos, sem ameaça à saúde, e que possa trazer benefícios
econômicos, dentre outros.
O engajamento dos lares urbanos na agricultura pode ser dividido,
segundo Wilbers et al (2004), em dois cenários. No primeiro, famílias se deslocam
das áreas rurais para as urbanas trazendo seus conhecimentos pertinentes às
práticas rurais, ou simplesmente continuam a cultivar em suas terras de sempre,
sofrendo as influências do urbano que tende a incrementar novas formas a
paisagem urbana; no segundo cenário, famílias urbanas, há muito estabelecidas
na cidade, envolvem-se com a agricultura, seja por escolha/desejo ou por
necessidade.
Os supracitados autores, que abordam também a questão de gênero e
agricultura urbana destacam que apesar de representar o acesso a fontes de
renda na economia familiar, propiciada pela redução das compras de alimentos,
muitas mulheres podem preferir se tornarem ativas em outro setor informal
urbano, a exemplo do comércio, para evitar possíveis riscos com as práticas
agrícolas, somadas às tarefas domésticas pelas quais continuam responsáveis,
mesmo quando assumem tarefas produtivas na agricultura, ou mesmo conciliam
com emprego formal ou informal fora do lar.
Essas atividades devem pautar-se pelo respeito aos saberes e conhecimentos locais, pela promoção da equidade de gênero através do uso de tecnologias apropriadas e processos participativos promovendo a gestão urbana, social e ambiental das cidades, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida da população urbana e para a sustentabilidade das cidades (SANTANDREU, LOVO 2007, p.5).
27
Através do entendimento das práticas agrícolas, é possível relacionar
outras categorias analíticas, as quais estão presentes e fazem parte do conceito
da agricultura urbana, o que revela a necessidade de se discutir sobre os
conceitos de campo, cidade, rural e agricultura enquanto meios analíticos das
práticas sócioespaciais.
Muitos têm sido os significados e atribuições direcionadas às práticas
agrícolas desenvolvidas nas interfaces urbanas. Sendo assim analisada
predominantemente pela questão da segurança alimentar, pela oportunidade de
geração de trabalho e renda, tradições rurais e relacionadas à especulação das
terras. Tal atividade tem ganhado relevância no cenário mundial e nacional,
Resende (2004), Madaleno (2001, 2002), Mougoet (2000). Apesar disso, surgem
questionamentos acerca do papel da agricultura dentro dos espaços intra-
urbanos, bem como sobre a sua importância para o contexto urbano e para seus
praticantes.
Essas indagações conduziram ao desenvolvimento da pesquisa, quando
se buscou compreender as faces que compõem a agricultura urbana na cidade de
Aracaju, relacionando para isso as práticas ligadas à agricultura urbana com a
natureza do solo urbano, na percepção de que tais práticas contribuem para a
criação de novas imagens e conceitos para a cidade, simultaneamente favorece a
relação entre os espaços urbanos e rurais.
Nesta perspectiva, e reconhecendo o antagonismo em que se vive num
planeta dotado de recursos finitos, mas pautada nos desperdícios da sociedade
de consumo, percebe-se que qualquer esforço feito com o objetivo de aumentar a
capacidade dos citadinos produzirem seu próprio alimento é relevante.
Recorrer à agricultura como estratégia posta à disposição do planejamento
urbano pode funcionar no sentido de capacitar melhor os planejadores para
encontrarem soluções possíveis para se resolver ou minimizar os problemas da
fome, pobreza, de melhor rendimentos e de criar, a partir da produção de
alimentos, a possibilidade de suprir as necessidades alimentares ou, pelo menos,
melhorar a qualidade nutricional dos sujeitos ligados com as práticas agrícolas,
mesmo em áreas precárias e carentes de infra-estruturas nos espaços intra-
urbanos.
28
A prática da agricultura urbana provém, dentre outros fatores, da escassez
de oportunidades adequadas e acessíveis à obtenção de renda e da demanda
não satisfatória nas áreas urbanas de produtos agrícolas em quantidades e
qualidades suficientes. Como pontos positivos, a agricultura urbana gera uma
produção voltada para o autoconsumo, aumento de disponibilidade de alimentos,
diversificação da dieta alimentar e fortalecimentos dos laços de vida comunitária.
Ressalte-se que essa leitura, embora atinente à realidade, passa
desapercebida para muitos pesquisadores; quando abordadas, são classificadas
e entendidas por alguns como temporárias, arcaicas, reflexo da precarização do
trabalho e inadequadas ao meio intra-urbano. É claro que dentre as inúmeras
realidades, pode-se utilizar-se dessas leituras para explicar os fenômenos que se
estabelecem no espaço geográfico.
Há, dentre as diferentes leituras, o entendimento de que a prática agrícola
desenvolvida por sujeitos citadinos que, muitas vezes, se encontram
marginalizados e excluídos socialmente do processo produtivo formal da cidade,
produzem o espaço a partir também da afirmação dessas práticas, seja através
de cultivos de vegetais, criação e comercialização dos produtos, ou na sua
reprodução enquanto sujeitos, podendo ser entendidos também como o exército
de reserva para o capital, em que estão aguardando o momento de sua
exploração, no processo de reprodução ampliada do capital, enquanto se
reproduzem com tais estratégias.
Madaleno (2001, 2002), nos oferece subsídio para a compreensão e
importância acerca da agricultura urbana; segundo a referida autora, ela designa
uma série de atividades, que ocorrem nas interfaces da cidade, mas que estão
relacionadas às questões econômicas locais e regionais.
Conforme a mesma autora as atividades de criação e cultivo sempre
foram características presentes na cidade, marcadas pelo intenso processo de
urbanização e o aumento da pobreza, o que contribui para o aumento das
atividades agrícolas no espaço urbano. Nesse contexto a agricultura urbana
ganha relevância no cenário da produção alimentícia, buscando equacionar
condições de reprodução social dos sujeitos citadinos, envolvendo-os com as
práticas agrícolas.
29
O Comitê de Agricultura (COAG), a FAO e as ONGs, têm desenvolvido
pesquisas sobre as questões econômicas e sociais resultantes da agricultura
urbana, ou seja os possíveis benefícios e malefícios causados na vida de seus
praticantes; tais pesquisas objetivam compreender as potencialidades e os
principais problemas da agricultura urbana, desenvolvidos nas interfaces das
cidades. Nesse sentido,
Fuera de la FAO, la AUP es objeto de un reconocimiento creciente entre los encargados de formular políticas y las ONG. En 1996 se creó el Grupo de Apoyo a la Agricultura Urbana y en 1996 se puso en marcha la Iniciativa Mundial sobre la Agricultura Urbana, en la que participan importantes donantes y organismos internacionales (entre ellos el PNUD, el CIID, la FAO, el Banco Mundial, la GTZ, el NRI, etc.). Otras organizaciones de las Naciones Unidas que participan también de diversos modos son las siguientes: la OACNUR, el UNICEF, la OMS y el CNUAH2. AGUILA es una red de 16 países de América Latina que intercambian información sobre la AUP, y se ha establecido o se están estableciendo otras redes en Africa occidental, Asia sudoriental y Europa. En 1993 se creó en los Estados Unidos una organización sin fines de lucro llamada Red sobre la Agricultura Urbana que ha realizado estudios de investigación y actividades de promoción sobre la AUP en todo el mundo. Numerosas organizaciones de la sociedad civil (por ejemplo, CARE, SAVE, Oxfam, Heifer Institute) han participado en proyectos básicos para impulsar la AUP en ciudades de países desarrollados y en desarrollo. Un número creciente de universidades (FAO, 1999).
A agricultura urbana torna-se, muitas vezes, uma produção oculta nos
“entremeios” do tecido urbano, sendo que nos países menos desenvolvidos
consolida-se no setor informal ou circuito inferior das práticas econômicas da
cidade, contribuindo assim para a sua marginalização nos planos de
desenvolvimento urbanos; com isso, aumenta a vulnerabilidade e a perda de
consistência tanto dos agricultores como dos espaços de produção perante o
crescimento da cidade, não favorecendo a criação de políticas de incentivos e
manejo dos espaços urbanos que estão sedimentados por cultivos e criação de
animais.
Segundo Martins (2008), para compreender a agricultura nos entremeios
urbanos é necessário observar desde as raízes históricas das ocupações dos
espaços, além de perceber os vínculos entre as identidades construídas no
pretérito, materializadas com outras dimensões e possibilidades no contexto da
vida urbana, sendo necessário fazer referência ao espaço rural e aos
30
deslocamentos e permanência no/e com os espaços culturais, que re-emergem e
sedimentam nas práticas urbanas via as construções e viveres.
É com esse entendimento que a compreensão da agricultura urbana e os
sujeitos a ela atrelados, significa perceber os processos de construção
sociocultural e interação entre espaços, ambientes, cenários, cenas e sujeitos, e
perceber que os agricultores materializam os seu viveres e arranjos para
desenvolver as atividades enquanto elemento integrante no espaço urbano
(MARTINS, 2008).
O cultivar e produzir, ligados a atividade agrícola urbana é composto de
criação, recriação e sobreposição de tempos, formando uma cadência produtiva
nas unidades agrícolas e, que compõe a textura e o significado de cada espaço
cultivado nos entremeios urbanos, começando a ganhar forma com a
intencionalidade e as técnicas que cada sujeito utiliza no seu espaço produtivo,
seja para o autoconsumo ou direcionamento da produção para o mercado que
gera renda e trabalho (MARTINS, 2008).
Na compreensão da materialidade da agricultura urbana, faz-se
necessário a priori, analisar a apropriação do espaço urbano para a atividade
agrícola. Segundo Correia (1999) e Carlos (2004), a natureza do solo urbano é
diferenciada e representa uma apropriação sistematizada e justaposta,
relacionada às formas de edificação urbana. Nessa perspectiva a agricultura
urbana coexiste com os sistemas urbanos, compartilhados com os espaços de
moradia dos sujeitos que praticam tais atividades.
Para Correia (1999), o espaço urbano na cidade capitalista é constituído,
num primeiro momento da sua apreensão, de espaços que apresentam diferentes
usos da terra, justapostos entre si, e que vão definir, o centro da cidade,
concentração de atividades comerciais, serviços, áreas residenciais, industriais,
de lazer, dentre outras, e também aquelas de reserva para futura expansão.
É na coexistência com o sistema urbano e nas conexões da lógica
capitalista que não se pode dissociar a presença do rural no espaço urbano, onde
a prática agrícola, no caso da zona de expansão, representa um meio justaposto
com diferentes usos do solo, em que para se atingir uma finalidade para além da
31
cerca, o proprietário objetiva ganhar visibilidade através da presença de animais
de pequeno e grande porte, bem como promover a venda do seu terreno.
Na zona de expansão de Aracaju ocorre que muitas vezes as práticas
agrícolas não são a finalidade principal das propriedades, como foi afirmado
anteriormente. Ocorre é que estas propriedades têm na criação dos animais, no
solo ocioso, a possibilidade de gerar aos proprietários da terra a maximização do
lucro via especulação imobiliária, cuja marca simbólica na zona de expansão é a
presença da cerca, enquanto delimitação e materialização do poder e do
monopólio da terra. A Figura 04 expressa claramente essa situação, pois se
percebe o entrelaçamento dos aspectos que devem ser observados para o
entendimento da agricultura urbana nessa localidade: a cerca, o animal, a frutífera
(côco) e com grande destaque o solo “especulado”.
Figura 04: Delimitação da propriedade privada na zo na de expansão de Aracaju. Foto: SANTANA FILHO, L. S, 2009.
Contextualizando esses aspectos com o crescimento geográfico da cidade
de Aracaju, temos a existência de espaços aparentemente “inutilizados”, a
exemplo da sua zona de expansão urbana que, com maior ou menor intensidade,
32
foi sendo ocupada por animais de grande e pequeno porte, somados a presença
marcante na paisagem dos coqueirais e a forte conversão do solo rural em urbano
via especulação, e a própria renda da terra; como também cultivares nos quintais
das residências que, através do cultivo em vasos de plantas medicinais, ou a
presença de frutíferas materializam a existência da prática agrícola na interface
da cidade.
Cabe destacar que a prática da agricultura urbana não se limita as áreas
ou bairros utilizados como recorte empírico nesta pesquisa. Podem-se citar como
exemplo outras áreas como as localizadas próximo ao Distrito Industrial de
Aracaju – DIA (Figura 05), com presença de criações de animais de grande e
pequeno porte, e propriedades localizadas próximo ao Hospital de Urgência de
Sergipe – HUSE, antigo hospital João Alves, onde gados pastam livremente,
dentre outras espalhadas pelos limites municipais da capital.
Figura 05: Propriedade localizada próximo ao DIA. Foto: SANTANA FILHO, L. S, 2009.
Outro aspecto a ser elencado acerca da agricultura urbana está
relacionado a venda dos cultivos aos moradores da cidade, que promove a
manutenção das unidades produtivas, com a renda obtida. No processo de
comercialização devemos atentar para as seguintes categorias de consumidores
33
que estão intimamente atreladas a venda dos produtos, que são: os fregueses,
atravessadores e empresas, que juntos vão representar o ponto de encontro entre
o cultivo agrícola que é metamorfoseado para produto capitalizado (MARTINS,
2008).
A agricultura urbana é uma atividade de múltiplas possibilidades, que
extrapola o engessamento da produção e trabalho ligados ao setor primário,
sendo necessário perceber que a mesma é desenvolvida por homens e mulheres,
não apenas usuários do espaço urbano para produção, mas sujeitos produtores
de tempo e espaço, que materializam e produzem o espaço geográfico, com
atividades, sendo ajustados as suas múltiplas sociabilidades.
Para Dinis e Marcelino (2007) a singularidade da utilização dos espaços
urbanos na produção agro-alimentar, reflete um significado igualmente distinto na
produção, pois os espaços urbanos são aproveitados de acordo com suas
possibilidades, onde se presencia a prática agrícola aliada à ocupação de
intervalos espaciais presentes em comprimidos ambientes: canteiros, vasos,
quintais, jardins comunitários.
Madaleno (2002) quando da sua pesquisa acerca da AU em Belém do
Pará, destaca que:
O quintal funciona geralmente como reserva de vitaminas, de produtos vegetais frescos, de plantas condimentares cultivadas sem recursos a adubos químicos ou a pesticidas e herbicidas. Reproduzem-se ainda ervas medicinais que mitigam as dores e se oferecem como alternativa barata e socialmente bem aceite à farmácia. Os quintais são fontes de proteínas animais, a que se recorre em datas festivas ou em momentos de maior aperto financeiro. (MADALENO, 2002, p. 105).
Muitas cidades têm potencial para arcar com suas responsabilidades no
tocante as suas demandas alimentares, promovendo alterações profundas no
cenário social e ambiental. Torna-se cada vez mais notório a agricultura urbana
como processo capaz de atender parte significativa dessas necessidades das
populações, conduzindo também ao fomento da economia local e a garantia da
segurança alimentar das pessoas envolvidas, que podem também participar da
formação coletiva que permeia os trabalhos comunitários (DINIS e MARCELINO,
2007).
34
Os referidos autores destacam que o envolvimento das pessoas na
produção agrícola nos centros e arredores urbanos, relaciona-se a origem desses
agricultores potenciais. Sendo que quando recebidos pela realidade de uma nova
terra, no contexto da migração, esses indivíduos são participantes e nem sempre
sujeitos, de um processo de integração cultural muito forte, geralmente conduzido
pela perda de conhecimento e saberes populares até mesmo em uma única
geração.
Porém, muitas experiências cotidianas no campo e conquistas frente às
dificuldades são resgatadas perante a possibilidade do retorno às atividades
ligadas ao sistema produtivo agrícola. Além disso, faz-se presente na realidade
urbana, um conjunto de tecnologias e informações bastante próprias bem como a
integração dos espaços geográficos, tendo como resultado dessas relações o
enriquecimento cultural das comunidades.
No resgate da cultura segundo Dinis e Marcelino (2007), é possível
observar que a rede de relacionamentos humanos existentes entre agricultores
são fortalecidos, e remonta a vida campesina, em que as relações interpessoais,
nessa realidade, são pautadas nas pessoas e não nos bens materiais que
possuem, além do que as relações de compadrio, as quais assumem tanta
importância quanto a familiar conjugal.
2.3 A AGRICULTURA URBANA: TIPOLOGIAS E DEFINIÇÕES
O conceito de agricultura urbana é construído por uma complexa rede de
fatores ainda não tão bem explicados, a exemplo da pobreza urbana e da
insegurança alimentar, que ocupam lugar preponderante. Daí porque é necessário
se identificar as diferentes conceituações, como exigência na facilitação das
intervenções de políticas públicas e de assistência tecnológica na promoção e na
gestão da agricultura urbana (MOUGOET, 2000).
Ainda de acordo com esse mesmo autor, os conceitos são ferramentas
mentais que criamos e recriamos para melhor compreender, interagir e modificar
nossas experiências no mundo real. E que devemos questionar se a agricultura
urbana é realmente o que chamamos, ou assim queremos denominar, ou que
percebemos na realidade.
Para Mougoet (2000) as definições mais usuais da agricultura urbana se
35
baseiam em vários elementos determinantes conforme se observa na Figura 06.
FIGURA 06 – Elementos ligados à definição da agricu ltura urbana Fonte: Mougeot, 2000
Em relação às atividades econômicas, em sua grande maioria as
definições se referem à fase produtiva da agricultura, porém mais recentemente
são incorporadas também o processamento e a comercialização, e as interações
entre todas as fases, em que a produção, venda e também o processamento
tendem a estar mais inter-relacionados no tempo e no espaço por conta da
proximidade geográfica e ao fluxo de recursos mais rápidos.
O determinante da localização tem sido causa de um importante conflito
conceitual, visto que muitas das definições do que seja agricultura urbana
destacam o local onde a mesma é praticada, seja na cidade ou em seus
arredores imediatos. Porém poucos estudos apresentam diferenças entre os
locais intra-urbanos e os periurbanos, ou se o fazem, utilizam critérios variados.
Nas definições de agricultura intra-urbana, utiliza-se como critério o
número de habitantes, densidade mínimas, limites oficiais da cidade, limites
municipais da cidade, dentre outros, a agricultura dentro da competência legal e
regulamentar das autoridades urbanas. No tocante as definições da agricultura
periurbana é bem mais problemático, pois estão em contato mais direto com as
36
áreas rurais e estes espaços sofrem no decorrer do tempo, mudanças agrícolas
mais profundas do que as áreas centrais e construídas da cidade.
A AUP é um conceito multidimensional que inclui a produção, transformação e a prestação de serviços, de forma segura, para gerar produtos agrícolas (hortaliças, frutas, plantas medicinais, ornamentais, cultivados ou advindos do agro extrativismo, etc.) e pecuários (animais de pequeno, médio e grande porte) voltados ao autoconsumo, trocas e doações ou comercialização, (re) aproveitando-se, de forma eficiente e sustentável, os recursos e insumos locais (solo, água, resíduos, mão-de-obra, saberes, etc.). Essas atividades podem ser praticadas nos espaços intra-urbanos, urbanos ou das regiões metropolitanas e articuladas com a gestão territorial e ambiental das cidades. (SANTADREU e LOVO, 2007, p.11)
Acerca da tipologia que abarca o conceito de AUP, conforme Santandreu e
Lovo (2007) podem ser realizadas em espaços públicos e privados, dentro do
perímetro urbano e ainda no espaço periurbano de um município. Para nossa
pesquisa adotamos uma tipologia que venha a caracterizar a diversidade de
espaços possíveis de serem utilizados com a prática da AU no espaço intra-
urbano de Aracaju, mais especificamente nas áreas escolhidas para análise.
Tipologia Espaços característicos Espaço Privados Lotes vagos; Terrenos baldios particulares ou com dúvidas
sobre a propriedade; Lajes e tetos; Quintais e Pátios; Áreas periurbanas; Áreas verdes em conjuntos habitacionais
Espaços Públicos Terrenos de propriedade Municipal, Estadual e Federal com espaços possíveis de utilização de acordo com a caracterização feitas nas linhas abaixo:
Verdes Urbanos Praças e Parques. Institucionais Escolas e Creches; Posto de Saúde; Hospitais; Presídios;
Edifícios Públicos e Privados Não Edificáveis Laterais de vias férreas; Laterais de estradas e avenidas;
Margens de cursos d’água; Áreas inundáveis; Faixa sob linhas de alta tensão; Ambientes aquáticos (rios e lagoas)
Unidades de Conservação Áreas de Proteção Ambiental; Reservas Ecológicas; Outras unidades desde que seja permitido o manejo e uso de potencialidades
Áreas de Tratamento Aterro Sanitário; Lagoas de Oxidação. Quadro 01 – Tipologias possíveis para atividades de Agricultura Urbana e Periurbana Fonte: TERRILE, 2006 Apud SANTADREU e LOVO, 2007.
Na zona de expansão de Aracaju a presença das cercas, (Ver Figura 07),
ainda se faz presente, sendo uma constante nas diferentes áreas investigadas,
37
(re) afirmando a presença da propriedade privada e da posse, mesmo que a
atividade agropecuária não seja a finalidade principal em determinadas
propriedades, ela é o meio de demonstrar que a terra tem dono. Em outra
vertente de análise é observado, conforme a Figura 08 a forte presença nas
residências de frutíferas, das quais a mangueira teve um destaque maior. Pode-
se afirmar que a tipologia mais presente é a do espaço privado com utilização dos
seus lotes vagos e terrenos baldios com múltiplas finalidades, mesmo existindo
outras tipologias de menor escala.
38
Figura 07: Propriedade na zona de expansão de Araca ju. Foto: SANTANA FILHO, L. S, 2009.
Figura 08: Presença de frutífera em residência no B airro Bugio. Foto: SANTANA FILHO, L. S, 2009.
Mougeot (2000) acerca da tipificação das áreas afirma que estas variam de
autor para autor, sendo classificadas com relação à residência do produtor, ou
seja, se o mesmo pratica fora do lote ou na sua residência; em relação à
modalidade de uso ou posse da terra (cedida, arrendada, compartilhada, dentre
39
outras formas), e com relação à categoria oficial do uso do solo da zona onde se
pratica a agricultura (residencial, industrial, institucional).
Com relação aos sistemas e escala da produção, grande parte das
pesquisas reúne dados acerca dos diferentes tipos de sistemas encontrados na
área de estudo, em que o esforço investigativo reside numa escala de menor
abrangência, sendo importante destacar a ocorrência de mudanças e
intercâmbios entre os sistemas de produção e dentro de cada unidade produtiva.
Para os tipos de produtos, seja animal ou vegetal, as definições são
enfatizadas diferenciando os tipos de colheita (grão, raízes, hortaliças, ervas
aromáticas e medicinais, plantas ornamentais, árvores frutíferas, entre outros), e
os tipos de animais (galinhas, coelhos, cabras, carneiros, bovinos, suínos, etc.)
produzidos. São consideradas também as hortaliças perecíveis, mas com preços
relativamente valorizados, e os produtos de origem animal, in natura ou
processados.
No contexto da destinação da produção, grande parte das pesquisas
aborda a relação do autoconsumo e do mercado, sendo que ambos os objetivos
são visados pelo produtor ou nos lares onde se pratica a agricultura urbana.
É reconhecido que parte da população faz uso de algum tipo de planta
medicinal cultivadas nos jardins e varandas de suas residências (Figura 09), cuja
produção se destina para o autoconsumo e doações aos vizinhos e parentes, bem
como em propriedades onde a prática do consorciamento de cultivos é utilizada
(Figura 10). Acrescidos da criação de animais de pequeno e grande porte, soltos
ou pastando em terrenos baldios.
40
Figura 09: Plantas medicinais cultivadas no Jardim de residência do Bairro Bugio. Foto: SANTANA FILHO, L. S, 2009.
Figura 10: Consorciamento de cultivos na zona de ex pansão de Aracaju. Foto: SANTANA FILHO, L. S, 2009.
É importante destacar que diante das definições atribuídas a agricultura
urbana, são poucas aquelas que aprofundam os contrastes acerca da agricultura
41
urbana com a rural, e menos ainda analisam as implicações no relacionamento
das mesmas. Sendo assim, conforme Mougeot (2000), dos elementos analisados,
menos a localização, podem ser incorporados a aplicação igualmente a
agricultura rural. A distinção decisiva entre ambas reside na integração da
agricultura urbana ao sistema econômico e ecológico urbano, não sendo apenas
a localização a definidora para tal distinção.
Segundo Mougeot (2000) o principio da integração no relacionamento entre
agricultura no ecossistema urbano permite reconhecer três tipos de relações: a
primeira é que em qualquer cidade e em qualquer momento, seus alimentos são
produzidos por uma agricultura de caráter rural, periurbano e intra-urbano. Fica
comprovado que a agricultura urbana completa a agricultura rural em termos de
autoconsumo, fluxos de comercialização e fluxos de abastecimento de mercado; o
segundo é de que em qualquer momento, em cidades de diferentes tamanhos ou
complexidade, a agricultura nela praticada será mais do tipo urbano (mais
intensiva e produtiva) nos centros maiores do que nos menores; em terceiro, em
qualquer cidade em determinado período de tempo com o processo de
urbanização, a agricultura do tipo urbano e intensivo crescerá como porcentagem
de toda a agricultura praticada.
Poder-se-ia citar na América Latina, conforme Madaleno (2002), relevantes
iniciativas do poder central e local bem como das empresas públicas e privadas
na promoção da agricultura urbana em cidades com altos índices de pobreza e
incentivo ao desenvolvimento de horticultura urbana, sendo que a referida autora
o fez com bastante propriedade, entretanto podem-se destacar os exemplos do
caso brasileiro, na perspectiva de vislumbrar a legitimação das práticas
econômicas ligadas à agricultura urbana.
Como se observa no Quadro 02, o incentivo dado à prática da agricultura
urbana não ocorre somente em cidades de regiões menos desenvolvidas do país
e nem tampouco se restringe a cidades com características semelhantes. Em
várias cidades e áreas metropolitanas brasileiras são encontradas experiências
com agricultura urbana, apoiadas ou não pelas ONGs ou pelo Estado nas
instâncias municipal, estadual e federal. Nessa perspectiva faz-se necessário
questionar acerca da natureza, bem como as formas de usos desses espaços
utilizados e produzidos pela agricultura urbana.
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Organização Localização Plano de Ação
Governo local
Prefeitura de Belém
Belém-PA O programa Cinturão Verde, promove a criação de patos na ilha de Cotijuba e a horticultura e fruticultura na periferia de Belém (ilhas de Mosqueiro e Caratateua)
Governo estadual
Estado do Pará
Belém-PA O governo do Pará também estimula a avicultura urbana, através da Secretaria da Agricultura – SAGRI
Governo local
Prefeitura do Rio Branco
Rio Branco-AC Criou o pólo municipal de produção agro florestal que faz o reassentamento de populações oriundas de favelas em terrenos públicos, dá apoio técnico e distribui sementes entre outros insumos.
Governo local
Prefeitura de São Paulo
São Paulo-SP Recentemente introduziu-se a agricultura urbana no Plano Diretor urbano de SP.
Governo Local
Presidente Prudente
Presidente Prudente-SP
Promove o programa Alimente Prudente: dando apoio técnico e sementes aos agricultores urbanos.
Governo local
Prefeitura de Curitiba
Curitiba-PR Promove a ocupação de lotes não construídos, aos agricultores urbanos, estimulando a utilização de resíduos sólidos urbanos-RSU como insumo, desde os anos 1970.
Governo local Prefeitura de Londrina
Londrina-PR Apóia a unidade de vizinhança DEMOCRACIA E LIBERDADE que pratica a horticultura urbana. Recebe recursos da UNICEF
Companhia de distribuição de eletricidade-CEREJ
Rio de Janeiro-RJ
Empresta terras na promoção da horticultura cuja produção compra para abastecer as suas cantinas
Petrobras Belém-PA Empresta terra de sua propriedade para hortas escolares e comunitárias
COPEC
Petroquímica
Camaçari-BA Projeto PRONATURA distribui terras e águas as famílias dos empregados, usando resíduos das fabricas como input. Estimula cultivos destinados a agroindústria (mandioca e batata-doce)
Quadro 02 – Iniciativas de Governos Central, local e de empresas públicas e privadas na promoção da agricultura urbana no Brasi l Fonte: Madaleno, 2002, p. 20.
Recentemente o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
(MAPA), organizou uma pesquisa, através de uma série de encontros nas 11
43
áreas metropolitanas no país (Figura 11), cuja finalidade era de identificar e
caracterizar os espaços da agricultura urbana e periurbana (AUP), na perspectiva
de fornecer apoio institucional para a promoção de tal atividade.
Segundo esse mesmo relatório, no Brasil as regiões sul e sudeste
concentram de forma mais intensiva as atividades relacionadas com agricultura
urbana. Todavia, isso não significa que tal atividade não possa ser encontrada em
outras regiões. Essa iniciativa vem reforçar também a existência da AUP no
Brasil, demonstrando que a produção vegetal é a de maior relevância, com 46%
das iniciativas, cuja orientação se faz tanto para o autoconsumo como para o
mercado, e que promove a geração de trabalho e renda, como também
complementa a alimentação das famílias praticantes.
Figura 11: Brasil: Áreas Metropolitanas. Fonte: Brasil, MAPA, 2007
Os recursos destinados pelo governo federal conforme tal relatório esteve
mais concentrado nos grandes centros, ou melhor, nas áreas metropolitanas,
sendo importante ressaltar que a pratica da agricultura urbana é percebida em
diversas áreas urbanas espalhadas pelo Brasil, e que não foram incluídas na
construção do relatório.
Mais recentemente, o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à
Fome (MDS) incluiu a Agricultura Urbana como parte do programa Fome Zero do
governo federal. Segundo o MDS, a Agricultura Urbana permite a produção de
44
alimentos de forma comunitária em espaços urbanos e periurbanos da cidade. A
produção é destinada para auto-consumo, abastecimento de restaurantes
populares, cozinhas comunitárias e venda de excedentes no mercado local – o
que resulta numa geração de renda, melhoria da alimentação e inclusão social,
conforme o MDS.
A inclusão da AU em programa social do governo federal se dá devido ao
número cada vez maior de políticas assistencialistas promovidas pelo Estado via
governo e que, estando a Agricultura Urbana tão disseminada e visível nos
espaços das cidades, é oportuno ao poder público incluir a AU em seu programa
de governo. A inclusão é válida, contudo não se deve esquecer que a prática
desse tipo de agricultura não é algo novo e sua existência independe de
programas governamentais.
Ferreira e Castilho (2007), retomando a discussão acerca dos órgãos
públicos e ONGs que visam apoiar a prática da agricultura urbana, destacam que
as ações pensadas são apenas pontuais, em espaços selecionados, muitas vezes
sob os critérios imprecisos no que tange à eficácia e eficiência dos recursos e da
abrangência social. Assim, a agricultura urbana ainda não tem recebido a devida
atenção por parte dos gestores públicos do planejamento urbano.
No caso de Aracaju, pelo menos durante a pesquisa, não foi detectado a
destinação de recursos oriundos do governo federal na promoção da agricultura
urbana. Entretanto, mesmo sem apoio institucional, foram observadas práticas de
agricultura urbana significativas nesta cidade, representando assim, uma
atividade presente no processo de produção do espaço urbano local.
2.4 AS FRUTIFERAS E AS PLANTAS MEDICINAIS NO CONTEX TO DA AGRICULTURA URBANA
As plantas medicinais tem contribuído para a produção de medicamentos,
tornando-as reconhecidas pela medicina convencional. Mas é necessário
esclarecer que existe uma diferença entre os medicamentos fitoterápicos que são
produtos tecnicamente elaborados e que apresentam uma forma final de uso,
neste caso podem ser comprimidos, cápsulas e xaropes. Enquanto as ervas
medicinais de uso caseiro são constituídas, muitas vezes, da planta seca, inteira
ou em pequenos pedaços, no processo de preparação dos populares “chás”.
45
Não é difícil encontrar algum morador que conheça o poder
medicamentoso de algum tipo de planta, folha, casca, raiz ou flor que minimize e
alivie os sintomas de um resfriado ou mal-estar. São muitos os benefícios das
ervas medicinais que passam de geração em geração, independente da
localidade que o sujeito esteja residindo. Diante dessa realidade a Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), objetivando esclarecer quanto ao
poder das ervas medicinais, através da popularização desse conhecimento, sua
forma correta de uso para se atingir os efeitos benéficos, disponibilizou no
endereço eletrônico (www.anvisa.gov.br) algumas das principais ervas e seu
poder medicamentoso (Quadro 03).
O uso das ervas medicinais é de certa forma justificado pelo elevado preço
no acesso ao serviço de assistência médica no Brasil, sem destacar os elevados
preços para a filiação nos chamados planos de saúde privados. Mesmo
possuindo o Sistema Único de Saúde (SUS), que atende a população de forma
gratuita, este não consegue de fato a eficiência no atendimento da demanda da
população. Acrescido nesse contexto os elevados preços dos medicamentos
prescritos aos pacientes.
Nomenclatura botânica
Nomenclatura popular
Alegações
Aloe vera Babosa Fortalece os cabelos, antirreumático, cicatrizante, anticancerígeno.
Anacardium occidentale
Cajueiro Diarreia não Infecciosa, Lesões como antisséptico e cicatrizante.
Bauhinia nitida Pata de vaca Problemas do aparelho urinário, diabetes.
Carica papaya Mamão ou Papaia Digestivo, combate a prisão de ventre, trata as varizes das pernas.
Cymbopogon citratus Capim santo, Capim limão, Capim cidró, Capim cidreira, Cidreira
Cólicas intestinais e uterinas. Quadros leves de ansiedade e insônia, como calmante suave.
Eugenia uniflora Pitangueira Diarreia não infecciosa.
Lippia alba Erva cidreira, Falsa Erva cidreira, Falsamelissa
Quadros leves de ansiedade e insônia, como calmante suave. Cólicas abdominais, distúrbios estomacais, flatulência (gases), como digestivo, e expectorante.
Malva sylvestris Malva Afecções respiratórias, como expectorante, contusões e dos processos inflamatórios da boca e garganta.
46
Mangifera indica Manga Expectorante e antiasmático. Peumus boldus Boldo Dispepsia (distúrbios da digestão),
como colagogo e colerético. Ocimum basilicum Alfavaca Estimulante, antiespasmódico,
antiasmático, antitússico. Psidium guajava Goiabeira Diarreias não infecciosas, pele e
mucosas lesadas, como antisséptico.
Quadro 03: Indicações de ervas medicinais. Fonte: ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária, 2010 e Madaleno, 2002. Org. SANTANA FILHO, L.S. 2010.
O uso e administração das plantas medicinais apresentam uma
diversidade, podendo ser oral ou de uso tópico. Acerca da utilização das ervas
medicinais, Madaleno (2002) apresenta as diferentes formas no processo de
administração interna das ervas, a saber: o chá, que se toma sob a forma de
decocção (mistura da droga em água fria, sendo depois fervida); de infusão
(aplicação de água a ferver sobre a droga que fica em repouso), ou de maceração
(operação que consiste em submeter as ervas a ação de líquido, a temperatura
ambiente, por várias horas).
É importante salientar dentro dos cultivos urbanos, as plantas medicinais,
pois conforme destaca Madaleno (2002), essa prática tem sua presença marcante
nas propriedades ligadas à agricultura urbana. A mesma autora traz uma lista das
ervas medicinais ligadas aos fatores culturais da sociedade brasileira. Para a
realidade pesquisada, nesse caso a cidade de Aracaju, a agricultura urbana e a
intensidade dos cultivos das ervas medicinais a ela atrelada, é bastante
diferenciada. Mesmo não estando presente em todas as propriedades
pesquisadas, a Figura 12 representa a ocorrência das principais plantas
medicinais encontradas.
47
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Figura 12: Plantas medicinais nas propriedades pesq uisadas. Fonte: Pesquisa de campo 2009. Org: SANTANA FILHO, L. S., 2009
Conforme se observa na Figura 12 o capim santo é a planta mais comum,
ou seja, foi encontrada em 09 (nove) propriedades. Em segundo lugar, a malva
presente em 08 (oito) propriedades. A erva cidreira está presente em 05 (cinco)
propriedades. Embora ocorra com menor frequência e intensidade, porém
presente nas propriedades levantadas, a alfavaca, alumã, babosa, samba-caíta,
manjericão e a pata de vaca.
Um dos exemplos que mais chamou a atenção da prática da agricultura
urbana ligada à produção de plantas medicinais nas áreas pesquisadas, foi
quando da aplicação da entrevista ao Senhor José S. S. J., de 62 anos de idade,
natural de Murici-AL, que cultiva em sua propriedade/residência ervas medicinais
há mais de 25 anos, fruto do conhecimento adquirido por seus avós e pais e que
ele busca passar para seus filhos e netos. As principais ervas e seu poder
medicamentoso, por ele cultivadas em seu jardim são o capim santo que é um
calmante natural, a malva (antinflamatório) alfavaca (serve como tempero, dor de
barriga e para verme). É interessante destacar a presença da palma (no combate
a diarréia) e a presença do cultivo de hortículo, que é a pimenta (ver figura 13).
Toda a produção tem como destino final o autoconsumo, porém, caso algum
vizinho esteja necessitando, isto verificado em um “bate papo cotidiano”, alegando
algum sintoma que pudesse ser amenizado pelas ervas, ele tem o maior prazer
em ceder parte de sua produção.
48
Figura 13: Cultivo de Pimenta Foto: SANTANA FILHO, L.S., 2009.
A manutenção de cultivos na cidade, mais que representar a materialidade
da agricultura urbana, está associada a reprodução de elementos da cultura em
que no contexto da migração campo cidade, os migrantes extrapolam a dicotomia
que há entre essas duas dimensões espaciais e os hábitos e costumes transpõem
a barreira territorial do rural para o urbano.
Outro aspecto muito comum é a presença da frutífera, que é marcante nas
propriedades pesquisadas. Segundo Martins (2008) a frutífera é a materialidade
de um sistema, de conexões de mundo exterior presente nos quintais urbanos, e
que antes mesmo de produzir frutos tem o papel de ornamentar e embelezar o
quintal, e secundariamente tem função de proteção para os pequenos animais e
cultivos.
O mesmo autor ainda destaca que ao plantar uma frutífera significa retirar
da natureza os símbolos constantes e afirmar a proximidade de elementos
diversos, dando definições e contornos ao ambiente urbano. Sendo assim, o
plantar uma mangueira ou uma goiabeira em sua residência, conduz a uma
realidade abstrata, subjetiva em estar próximo da natureza, enquanto elemento de
apropriação, e que vai além da produção de frutos.
Na Figura 14 pode-se observar a recorrência das plantas frutíferas nas
propriedades pesquisadas. Com base nas informações contidas na figura é
possível observar a grande diversidade de frutíferas presentes no espaço urbano
49
de Aracaju, mesmo com predomínio de determinada frutífera, a exemplo da
mangueira, é notório a presença de espécies que tem sua produção mais
diretamente ligadas ao espaço rural, mas que foram encontradas, mesmo que de
forma pontual, nas propriedades pesquisadas.
Dentre as frutíferas, a mais comum foi a mangueira, presente em quase
todas as propriedades pesquisadas, seja na frente ou no fundo da residência, cuja
ocorrência se fez em 20 (vinte) propriedades de 30 (trinta) levantadas, seguidas
do coco, presente em 12 (doze), da bananeira, presente em 09 (nove), do mamão
presente em 08 (oito) e da goiabeira, presente em 06 (seis). Estando também
presente, porém com menor intensidade, as seguintes frutíferas: acerola, laranja,
pinha, sapoti, jaca, cajá, manjelão, caju, jenipapo, graviola, jabuticaba, limão e
pitanga.
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Figura 14 – Plantas frutíferas identificadas nas pr opriedades pesquisadas. Fonte: Pesquisa de campo 2009. Org: SANTANA FILHO, L. S., 2009
Outro momento bastante relevante quanto à pesquisa de campo, refere-se
à oportunidade de aplicação de entrevista a uma senhora de 82 anos, antiga
moradora do bairro Santos Dumont, Senhora Arlete, popularmente conhecida no
bairro como professora Maria Marques. A mesma relatou com tamanha satisfação
o processo de urbanização do bairro, que se deu a partir da venda de sítios para
construção de loteamentos.
No primeiro momento, na entrada da própria residência, que está
localizada em uma das vias de maior circulação e adensamento residencial do
bairro, foi impressionante o impacto proporcionado pela quantidade de frutíferas,
de plantas medicinais e muita área verde, ou seja, se levarmos em consideração
50
a visão clássica do que venha a ser rural, certamente seriamos conduzidos a
considerar que tal espaço estaria vinculado ao campo e não a um bairro
consolidado de Aracaju com intensa densidade populacional.
Ao longo da conversa que ocorreu nos diferentes espaços da propriedade,
inclusive embaixo de cada frutífera, no degustar da pitanga (Figura 15), acerola,
no suco de jenipapo, no presenciar da queda da manga pelo vento, foi nítido
como a senhora Arlete tem o prazer de cultivar cada planta, de acompanhar seu
crescimento, de colher, saborear e também fazer doações aos vizinhos. Ainda
durante os finais de semana sua “chácara” (como ela a denomina), é aconchego
para filhos, netos, noras e genros, onde é espaço do descanso, do lazer, isso
quando ainda não levam uma boa quantidade de frutas para casa.
Figura 15: Coleta de pitanga Foto: SANTANA FILHO, L.S., 2009.
Quando foi perguntado a mesma sobre a possibilidade da venda de sua
propriedade, que apresenta cerca de 500 m2, para morar em um apartamento ou
outra casa menor, devido à violência e a falta de segurança, a professora foi
bastante incisiva na colocação: “Deus me livre de morar num apartamento, pra
mim estou presa numa gaiola”.
51
Além das frutíferas, que não são poucas, pois foi contabilizado um total de
19 espécies diferentes, dentre as menos comuns, os pés de jaca, cajarana,
sapoti, jabuticaba e cajá. Ainda há a presença de plantas medicinais, que a
senhora Arlete faz uso, ressaltando que no passado as pessoas faziam muito
mais uso dessas plantas do que os medicamentos laboratoriais de hoje, alegando
que “o povo era mais sadio, não usava tanto remédio, não se andava doente”.
Com isso, pode-se perceber o valor simbólico da prática da agricultura urbana nos
quintais das casas.
Sendo assim, mesmo a agricultura urbana considerada em seus aspectos
multidimensionais, ora ligada a produção para o autoconsumo, ora destinada ao
mercado, através da venda de seus produtos, ficou evidente a partir da pesquisa
realizada, quando do enfoque da agricultura urbana de caráter intra-urbano no
município de Aracaju, o predomínio da produção voltada para o autoconsumo,
ligada diretamente as tradições culturais, no tocante ao relacionamento com
elementos da natureza.
É dentro desse contexto de práticas agrícolas presentes no espaço urbano
da cidade de Aracaju, que é pertinente fazer uma discussão acerca da relação
campo-cidade, na perspectiva de entendê-las enquanto dimensões espaciais
particulares e singulares, porém complementares e interdependentes.
52
3 RELAÇÃO CAMPO CIDADE EM ARACAJU
A relação campo-cidade é um tema bastante discutido nas ciências sociais,
incluindo a Geografia. Tendo em vista que a cidade e o campo são categorias
preponderantes dos espaços rural e urbano, logo do espaço geográfico. Muito do
que é discutido no tocante a essa temática é posto não como uma relação de
complementaridade e interdependência (como se almeja nesse trabalho), mas
como pares antagônicos. Partindo dessa premissa o capítulo que segue propõe
discutir a relação campo cidade primeiramente pautada na dicotomia espacial,
bem como através da noção de continuum rural-urbano. Segue-se com a
discussão da problemática da definição do que vem a ser rural e urbano no Brasil
e os rebatimentos no recorte empírico, na perspectiva de demonstrar que a teoria
geral materializa-se nas áreas pesquisadas.
3.1 DA DICOTOMIA ESPACIAL A NOÇÃO DE CONTINUUM
Profundas alterações na distribuição espacial da população foram
observadas nos países berço do capitalismo, a partir de meados do século XVIII,
período em que o modelo econômico vigente evoluía na eficiência de acumulação
de capitais, e toda sociedade se reestruturava aos moldes industriais,
promovendo o processo de crescimento das aglomerações urbanas contribuindo
para o esvaziamento demográfico das áreas rurais.
Na visão de alguns autores, o mundo rural secular opõe-se nitidamente ao
mundo urbano, sendo este caracterizado por funções, atividades, grupos sociais,
paisagem que os diferencia sobremaneira do mundo rural. Segundo Ferrão
(2000), esta oposição tende a ser destacada como natural, ou seja, encaradas
como relações de natureza simbióticas, em que campo e cidade são
complementares e mantém um relacionamento estável num contexto marcado
pelo equilíbrio e harmonia de conjunto.
A revolução industrial imprimiu novas configurações espaciais e a aparente
consumação da separação entre as áreas rurais e urbanas, esse marco histórico
que vem alterar essa situação acima descrita acarretou consequências para as
áreas urbanas e rurais. No caso das áreas rurais, verificou-se o processo de
perda de centralidade econômica, social e simbiótica (Ferrão, 2000), sendo este
53
espaço identificado com realidades arcaicas, em detrimento da visão de palco do
progresso dos aglomerados urbano-industriais.
Mas segundo Reis (2005, p.79) “os espaços rural e urbano não podem ser
compreendidos separados um do outro, visto que são realidades que não
existiriam isoladamente”, mas no seu relacionamento e interpenetração.
No decorrer do século XX, a indústria fez a cidade explodir2,intensificando
o processo de urbanização. Segundo Reis (2005), o crescimento da cidade, a
industrialização da agricultura e o transbordamento do urbano nas áreas rurais,
verificadas em várias regiões do mundo, sugerem que a transição entre espaços
rural e urbano deve ser entendida nos moldes teóricos do espaço continuum,
assim, transferindo-se a polarização antagônica/dicotômica por um gradiente de
variações espaciais.
Isso conduz os pesquisadores a abordarem os diferentes níveis de
integração ou distanciamento entre esses espaços. De forma geral, as análises
do relacionamento entre o rural e o urbano são associadas a duas grandes
abordagens: a da dicotômica e a de continuum. A primeira enfatiza as diferenças
que se estabelecem entre esses dois espaços, sendo o campo pensando como
algo que se opõe a cidade, já a segunda dá ênfase a uma aproximação entre o
espaço rural e urbano.
A sociologia norte americana, a partir da década de 1920, influenciada por
enfoques diferenciados, destaca-se na discussão relacionado ao desenvolvimento
de conceitos que objetivam permitir melhor entendimento das questões referentes
aos espaços rurais e urbanos. Sorokin e Zimmermann (1929) foram os primeiros
a introduzir a perspectiva do continuum rural e urbano, uma concepção dual, uma
vez que considera o rural e o urbano com pólos extremos de uma mesma escala
de gradação, e que para não incorrer em características que marcavam a
polarização, bem como suas relações, esses autores identificaram diferenças
marcantes entre os espaços rurais e urbanos. Mas apesar desses autores serem
considerados os primeiros nas formulações do continuum, acabaram
possibilitando um forte alicerce para a conceituação dicotômica, uma vez que
2 Acerca da implosão e explosão da cidade Lefebvre (1969) destaca a efervescência, dinâmica e transformação que ocorreram nas cidades, impulsionadas pela industrialização, acarretou em concentrações urbanas gigantescas e as populações atingiram densidades inquietantes.
54
estabelecem diferenças socioespaciais para o espaço urbano e rural. (REIS,
2005, P. 80).
A obra clássica de Zorokin e Zimmermann (1929) sugere uma série de
traços essenciais na diferenciação do espaço rural e urbano, onde o
entendimento do rural perpassa pela particularidade de sua economia. O rural
então abrigaria, sobremaneira, a produção agropecuária, e todas as outras
características observadas no campo estariam vinculadas a essa atividade, e os
outros tipos de atividade não-agrícola eram considerados acessórios e não se
destacavam como meio de subsistência da população do meio rural.
Essas características destacam a existência de duas realidades que se
opõem; porém durante o século XX, as profundas alterações socioespacial,
promoveram modificações das características primárias que embasam essa
visão, ou seja, o campo passa a abrigar de forma expressiva as atividades não-
agrícolas.
Para Carneiro (1998) é a partir do desenvolvimento do capitalismo na
agricultura concomitante ao processo de interiorização da indústria e a
modernização da sociedade urbana e rural que a teoria da urbanização passa a
ser formulada, promovendo a integração entre as sociedades urbano-industriais e
as sociedades rurais.
Nesse contexto fica mais nítida a percepção dos diferentes níveis de
integração espaciais dos espaços urbanos e rurais. Sendo que a visão dicotômica
vê os espaços rurais e urbanos como opostos sendo uma a negação da outra, a
visão de continuum que representaria a intensidade e não o contraste, não mais
centrado nos sistemas, mas em indivíduos que se ocupariam de atividade de um
ou de outro tipo em uma única civilização.
Outro enfoque que se contrapõe a visão dicotômica e de continuum, está
centrada nas relações sociais, que ao invés de diluir diferenças, ocorre o reforço
de identidades apoiadas no pertencimento a uma localidade, ou seja, os
contornos territoriais estariam balizados sobre a cultura, que conduziria a
interação entre rural e o urbano de um modo determinado, a partir da garantia e
manutenção de uma identidade (Carneiro, 1998).
Diante dos embates teóricos, das crescentes indefinições e também pela crescente urbanização, o rural deixou de ser atrativo como objeto de pesquisa, pois começou a ser aceito que a
55
urbanização do campo era uma questão de tempo (BLUME apud REIS, 2005, p. 82).
São por essas questões que muitos pesquisadores voltam-se para o
estudo da agricultura. Surgem questionamentos acerca de que seria o fim do rural
ou das leituras sobre o rural.
Torna-se necessário um olhar que busque uma outra direção, pois a
permanência desse atual modelo conduzira a discussão da idéia de que o rural foi
ou está sendo suplantado pela expansão do urbano. Para Alentejano (2000, p.
103.), é fundamental demonstrar que:
Apesar das inegáveis transformações sociais, econômicas, culturais e espaciais resultantes do desenvolvimento do fenômeno urbano, o rural não deixou nem deixará de existir, apenas teve e está tendo seu significado alterado.
A partir da Segunda Grande Guerra, tornou-se visível, com a
industrialização da agricultura3, mudanças nas relações rural-urbano e passou-se
a observar novas configurações no interior do próprio mundo rural (FERRÃO,
2000), em que ocorre uma fratura no espaço rural em duas realidades distintas e
articuladas: o mundo rural moderno e o mundo rural tradicional. A oposição rural-
urbano começa a não ser vista como a mais adequada para explicar a realidade,
ao passo de que a modernidade não é exclusiva das áreas urbanas.
A sociedade brasileira em meados do século XX se configurava como
expressivamente rural. Mas o crescimento da população do país entre 1940-1980
promoveu uma inversão da distribuição da população no tocante às áreas rurais e
urbanas, onde ocorreu: um direcionamento da população das áreas rurais com
destino as áreas urbanas, crescimento desordenado das grandes cidades e a
formação de centros metropolitanos.
A partir da década de 1980 emerge um paradigma socioespacial, pois
mudanças significativas são observadas no meio rural brasileiro, a exemplo da
emergência de um espaço rural multifuncional, que passa a apresentar
3 Esta entendida como modernização da agricultura, foi iniciada no Brasil a partir da década de 1960. É nessa modernização que ocorre o processo de monopolização da terra pelo capital, através da vinculação ao mercado. Contudo, ela é conservadora e dolorosa, pois seu caráter é excludente e parcial, tendo em vista a manutenção das estruturas sociais no campo brasileiro. Ver José Graziano da Silva (1999).
56
diversificação econômica em meio a novas formas de produção e subsistência,
em contraposição ao domínio do tradicional, num passado recente.
Os debates referentes ao urbano e ao rural ressurgem com a mesma
voracidade das mudanças técnicas, econômicas, sociais e ambientais que
atingem esses espaços a partir da segunda metade do século XX. No Brasil, na
década de 1980, as mudanças verificadas no meio rural, a partir da urbanização
do campo e o surgimento de novas dinâmicas que direcionam para uma nova
ruralidade, muitas vezes díspares daquelas ligadas às atividades tipicamente
agropecuárias, promoveram uma intensificação dos debates, diante da sua
importância.
O espaço rural brasileiro, nas últimas décadas, distancia-se das visões
clássicas e dicotômicas, ou seja, a urbanização imprimiu um novo significado
onde sua atuação foi mais significativa, sendo mais perceptível nas áreas rurais
que têm contato direto com a grande cidade que compõem o núcleo dinâmico da
economia brasileira.
Para Carneiro (1998) o ritmo de mudanças nas relações sociais e de
trabalho no campo transforma as noções de “rural” e “urbano” em categorias
simbólicas construídas a partir das realidades distintas cultural e socialmente.
Sendo assim, não dá mais para sustentar uma delimitação entre campo e cidade
apenas pelas atividades econômicas ou mesmo em hábitos culturais ou modos de
vida.
É notório que na atualidade o campo brasileiro passa por um considerável
processo de mudanças, reflexo do processo de modernização da agricultura,
mesmo que de forma contraditória. Para Carneiro (1998) esta se efetivou não de
forma uniforme em sua extensão, e que foi moldado nos padrões de produção do
modelo urbano-industrial.
No Brasil, segundo Carneiro (1998), as pesquisas recentes tem
apresentado dois conjuntos de fenômenos para o meio rural brasileiro.
O primeiro se estabelece no entendimento de que o meio rural brasileiro
não é mais definido exclusivamente pelas atividades agropecuárias, mas estando
agora relacionado com o aumento do número de pessoas residentes no campo
exercendo atividades não-agrícolas e ao aparecimento de uma parcela
considerável de pequenos agricultores que combinam a agricultura com outras
formas de rendimento, na chamada pluriatividade.
57
O segundo está relacionado à procura crescente de formas de lazer
alternativos pelos citadinos com destino ao campo. Esse movimento inicia-se no
Brasil na década de 1970, e ganha dimensões na divulgação do pensamento
ecológico da década de 1990 (Carneiro, 1998), estimulando os desejos de
consumo da natureza, transformando-a em mais uma mercadoria, pelas
modalidades de turismo rural, de aventura, ecológico, alterando o ritmo da vida no
espaço rural.
Ocorre segundo Alentejano (2000), um exagero na elucidação da
ocorrência de mudanças radicais no mundo rural brasileiro, conferindo a mesma
uma nova fisionomia. De fato, não se pode negligenciar a verificação de tal
transformação, importantes e significativas no campo brasileiro, mas o que está
ocorrendo são atribuições na perspectiva de uma absoluta inovação nos últimos
anos, não condizente com a realidade em sua totalidade.
A multiplicação de atividades não-agrícolas, o processo de modernização
da agricultura patronal e de parcelas da agricultura familiar, promoveu segundo os
formuladores e adeptos da concepção do “novo rural” uma nova dinâmica no
campo brasileiro, onde cada vez mais os agricultores estão integrados aos
circuitos financeiros e informacionais e a tecnificação não podendo mais ser
classificados como meramente rurais. Assim, estaria ocorrendo dentro dessa
lógica à consumação da urbanização do campo brasileiro, como a consolidação
da agroindústria – expansão da lógica de produção tipicamente urbana para os
setores modernizados da agricultura, com a atividade tipicamente urbana onde a
modernização não se instalou propriamente dita.
Para Alentejano (2000, p. 101.), essas formulações apresentam três
problemas básicos:
Em primeiro lugar, obscurecem as diferenças existentes no próprio processo de modernização, deixando de perceber as especificidades e contradições presentes neste; de outro, não observam as diferentes estratégias que estão por trás da adoção de práticas idênticas, atribuindo-lhes uma racionalidade comum; finalmente, não identificam as continuidades históricas entre processos antigos e atuais, atribuindo a todos o caráter de novidade.
Segundo Carlos (2004) cidade e campo se diferenciam pelo conteúdo das
relações sociais neles contidos e estas, ganham conteúdos em sua articulação
58
com a construção da sociedade urbana. E, que a contradição cidade-campo se
desenvolve propondo uma nova contradição, que é a de centro e periferia.
Na realidade cidade e campo sinalizam o modo como se realiza a inserção do Brasil no quadro da economia mundial, na divisão sócio-espacial do trabalho revelando a racionalidade imposta pela globalização do capital reproduzindo na escala internacional a hierarquização de espaços dominados/dominantes (CARLOS, 2004, p. 135).
Segundo Carlos (2004) a extensão do sistema capitalista permitiu a
generalização da propriedade privada e a submissão da vida cotidiana a sua
lógica capturando os momentos, culturas e tradições da vida tanto na cidade
quanto no campo, aproximando-os cada vez mais. A cidade e o campo agora
estão articulados, deslocando a contradição cidade/campo vinda da história, para
a contradição centro periferia, estabelecendo uma nova hierarquia social entre
espaços dominantes e dominados a partir da construção de novas centralidades.
Contudo, a sociedade urbana continua com maior reprodução, a cidade vai
ganhando cada vez mais importância, pois estimula os setores competitivos da
economia a partir dos centros urbanos, seja financiando a agricultura capitalista,
seja direcionando a localização da indústria.
A reorganização do processo produtivo aponta novas estratégias de
sobrevivência no campo e na cidade bem como, movimentos sociais no campo
como na cidade, respectivamente os “sem terra” e os “sem teto”. Tanto no campo
como na cidade, o processo de reprodução se realiza pelo conflito entre valor de
uso/valor de troca. As lutas dos “sem direitos” revelam o processo de deterioração
e desintegração da vida colocando em cheque o direito da propriedade privada e
as formas de apropriação do espaço enquanto condição de realização da vida,
seja para a produção do alimento, seja enquanto moradia e tudo o que esta
atividade implica para a vida. Neste embate se questiona no campo a
improdutividade da terra e na cidade a ausência de moradia (CARLOS, 2004).
Lefebvre (1969, p. 17) destaca que “a relação urbanidade-ruralidade,
portanto, não desaparece, pelo contrário: intensifica-se, e isto mesmo nos países
mais industrializados”. E que a cidade tomada de assalto pela industrialização,
não de forma natural ou involuntária, mas pela ação/intervenção de classes ou
frações de classes dirigentes, que possuem o capital – os meios de produção,
geradores não apenas dos empregos e investimentos econômicos, mas de toda a
59
sociedade, com emprego das riquezas nas artes, cultura, no conhecimento, na
ideologia.
Lefebvre (2001), ancorado no pensamento de Marx coloca que a
separação das classes é simultaneamente ilusória e real. Ilusória, porque se
estabelece na mesma sociedade e no mesmo todo, além de que só existe uma
fonte de riqueza social. E real pelo fato de existirem socialmente e estarem
separadas, mantidas como tal, e materializadas pelo conflito.
O referido autor ainda coloca que a divisão do trabalho direciona a
separação do trabalho industrial e comercial, bem como a do trabalho agrícola, de
outro. Conduzindo desta forma a distinção entre campo e cidade e a oposição de
seus interesses. Assim, a divisão do trabalho é responsável, de modo geral, pelas
múltiplas divisões e separações particulares das atividades sociais. Assim, ainda
apoiado em Marx, Lefebvre (1969), afirma que a divisão do trabalho entre cidade
e campo corresponde à separação entre o trabalho material e o trabalho
intelectual. Em que a cidade é considerada local de trabalho intelectual, lócus da
administração, da política e da cobrança de impostos, dentre outros. E dela
emana o controle financeiro e ideológico e se conduz tanto a orientação material
como a orientação moral da sociedade.
3.2 A PROBLEMÁTICA DO QUE VEM A SER RURAL E URBANO NO BRASIL
A origem dos municípios brasileiros é inspirada no modelo da república
romana (época do Brasil colônia), onde exercia funções políticas legislativas e
administrativas. De lá pra cá, a formação municipal brasileira reflete esse modelo.
Até 1938, o Brasil não estabelecia diferença legal entre cidade e vila, com isso
tanto cidades quanto vilas podiam ser sedes de municípios. Foi somente no
Estado Novo que surgiram as diretrizes básicas nacionais de divisão territorial,
onde havia, dentre outros, os seguintes requisitos: população mínima de 100 mil
habitantes, eleitorado não inferior a 10% da população, centro urbano já
constituído (TAVARES, 2003).
Após muitos avanços e regressos, finalmente o Decreto-Lei 311/38
conferiu aos Conselhos Nacionais de Geografia e de Estatística - hoje IBGE – a
atribuição de estabelecer os requisitos mínimos para a elaboração dos perímetros
60
urbanos e mapas municipais. Esta lei vigora até os dias de hoje. A área urbana do
município é definida pela Lei do perímetro urbano (de competência municipal). É o
perímetro urbano que indica o limite oficial entre as áreas urbanas e rurais.
Contudo, quase sempre as áreas são tidas como urbanas (até mesmo algumas
rurais) em virtude de expandir a base de arrecadação do IPTU.
Tavares (2006) expõe que os municípios não atualizam os seus perímetros
urbanos, cabendo ao IBGE introduzir outras unidades territoriais (além das
convencionais urbanas, rural e urbana isolada), a saber: aglomerados
subnormais, aglomerados rurais isolados, áreas urbanizadas, áreas não
urbanizadas e aglomerados de extensão urbana.
As inadequações existentes na definição do que venha a ser rural e
urbano, somam-se as dificuldades conceituais e metodológicas impostas aos
formuladores de política pública e das diversas áreas de conhecimento. A
superação dessa empreitada é dificultada pela vigência de uma legislação
anacrônica, e que carece de investimentos teóricos e de esforço empírico para
sua compreensão.
É impossível realizar um recorte espacial perfeito entre rural e urbano,
diante da complexidade que demonstra que esses conceitos se interpenetram, ou
seja, complexidade de uma realidade composta por diferentes níveis de
integração e distanciamento entre esses espaços.
Para fins de planejamento e formulações de políticas de desenvolvimento rural e urbano, torna-se coerente a realização de algumas subdivisões que não buscarão, necessariamente, a total separação entre as insuficiências teóricas e empíricas do que seja rural e urbano no Brasil, constituindo-se em uma alternativa que possui sua viabilidade justificada por razões de ordem prática (REIS, 2005, p. 90).
Veiga (2002) traz polêmicas reflexões a respeito da delimitação do rural e
do urbano no Brasil, e suas implicações sobre as políticas de desenvolvimento
rural. Destaca a precariedade do anômalo, anacrônico e obsoleto modelo de
delimitação do campo e cidade adotado no Brasil, que desde o final da década de
30, sob a égide do Estado Novo, onde através da lei 311, de 1938, delineou-se
como cidade todas as sedes municipais existentes, independente de suas
características estruturais e funcionais.
61
Veiga (2002) lembra que nada disso teria muita relevância se fossem raros
os casos de sedes municipais que exercem ínfimas pressões antrópicas sobre o
ecossistema urbano, pouco artificializado, às vezes quase intocado (no que se
refere às mudanças decorrentes do processo de urbanização).
Segundo Veiga (2002, p. 66) “para que a configuração territorial brasileira
não permaneça tão obscura, é imprescindível construir tipologias alternativas,
capazes de captar a imensa diversidade dos municípios”.
Veiga (2002) conduz seu estudo sobre o cálculo do número de cidades no
Brasil a partir de uma definição político-administrativa, em que a cidade é definida
como sede do município. Assim existiriam no Brasil 5507 sedes de municípios em
2000, todas ancoradas pelo estatuto legal de cidade. Para o referido autor, 455
seriam “inequivocamente urbanas”, restando 5052 classificados, segundo Veiga,
como “pertencem ao Brasil rural” e as que se encontram no “meio campo”, ou
seja, àqueles cujas características trazem em seu conteúdo aspectos de ambos
os espaços.
Veiga fundamenta-se na densidade demográfica, no chamado grau de
pressão antrópica, que seriam o melhor (para o autor) grau de artificialização dos
ecossistemas, e consequentemente da urbanização do território, somando-se a
localização, reflexo das modificações do meio natural pelas atividades antrópicas.
Segundo Carlos (2004), por essa perspectiva ocorre a naturalização da
sociedade, pois se distingui áreas “mais rurais” em função da natureza intocada e
aos ecossistemas mais alterados pela ação humana e manchas de grandes
cidades.
Carlos (2004) faz críticas a Veiga, por não analisar os processos e estar
preso aos dados estatísticos para respaldar e dar substância ao seu
entendimento acerca da urbanização brasileira, ou seja, não se confunde
processo de urbanização com densidade demográfica. A referida autora
considera ingênua a postura de Veiga por acreditar que a simples alteração
estatística, vão conduzir a reorientação das políticas públicas na promoção de
possibilidades do crescimento, mas perceber que estamos diante da produção do
espaço pela sociedade, e sob a égide do Estado regulador, na imposição das
relações de produção enquanto dominação de espaços.
62
O problema é que “urbano” e “rural” longe de serem meras palavras são conceitos que reproduzem uma realidade social concreta. A simples delimitação espacial do que se acredita ser urbano ou rural nos diz muito pouco sobre os conteúdos do processo de urbanização brasileira, no momento atual. (CARLOS, 2004, p. 131).
Segundo Carlos (2004), a contradição cidade-campo ganha contornos e
dimensões da contradição centro-periferia. Em que a reorganização do processo
produtivo direciona novas estratégias de sobrevivências tanto no campo como na
cidade e movimentos sociais em ambos, articulados, pois a presença da
propriedade privada marca e circunscreve as possibilidades de apropriação no
campo e na cidade e estabelecendo lutas conjuntas.
A relação cidade-campo, conforme Lefebvre (1969) mudou profundamente
no decorrer do tempo histórico, ora se apresentando profundamente conflitantes,
ora mais pacifica e perto de uma associação. Porém podendo ser presenciada
numa mesma época manifestações distintas para tal relacionamento.
Para os momentos históricos que se apresentam profundamente conflitante
entre cidade e campo, Lefebvre (1969) chama a atenção acerca dessa relação
nos países industriais, onde a velha exploração do campo circundante pela cidade
cede lugar a formas mais sutis de dominação e de exploração, tornando-se a
cidade um centro de decisão e aparentemente de associação.
Hoje não tem sentido, porém, reforçar, a idéia de que existe uma diferença, uma luta desleal entre cidade e campo. A questão não é esta; as relações de mercado estabelecem o que deve ser modificado, onde os investimentos devem ser concentrados. Por isso a questão não é que a cidade esteja vencendo e o campo esteja perdendo, a questão é que os detentores dos meios de produção decidem onde é melhor investir. É importante registrar que embora os investimentos se deem tanto no campo como na cidade, esta atraí para si a população em busca de melhores condições de vida. (MACHADO, 1990, p.94).
Segundo Lefebvre (1969) a vida urbana pressupõe encontros, confrontos
das diferenças, conhecimento e reconhecimentos recíprocos (inclusive político e
ideológico) dos modos de viver, dos “padrões” que coexistem na cidade.
A cidade se transforma não apenas em razão de “processos globais” relativamente continuo (tais como o crescimento da produção material no decorrer das épocas, com suas consequências nas trocas, ou o desenvolvimento da
63
racionalidade) como também em função de modificações profundas no modo de produção, nas relações “campo-cidade”, nas relações de classe e de propriedade. O trabalho correto consiste aqui em ir dos conhecimentos mais gerais aos conhecimentos que dizem respeito aos processos e às descontinuidades históricas, á sua projeção ou refração na cidade, e inversamente, dos conhecimentos particulares e específicos referentes à realidade urbana para o seu contexto global. (LEFEBVRE, 1969, p. 53).
Machado (2008) fundamentado na obra de Lefebvre (1978) mostra que a
relação entre urbano e rural gera formas criativas e dinâmicas de ocupação e uso
da terra. Mas o próprio Lefebvre (1969) chama a atenção destacando que pode
ser contestada teoricamente interpretação que vislumbra na oposição cidade-
campo a partir da noção de que os países industrializados têm o campo se
perdendo no seio da cidade, com a cidade absorvendo o campo e perdendo-se
nele.
Adentrar na discussão acerca do rural e urbano em relação à produção do
conhecimento pressupõe: esforço, rigor, organização, dedicação intelectual,
ousadia, pretensão e sonhos, pois constituem operações delicadas, com
presenças reais de possíveis fantasmas que costumam assombrar aqueles que
se prestam na busca pelo saber, porém favorecem a constituição de
questionamentos e discussões.
Pensar sobre o rural e o urbano para além (puramente) do que está posto
pela legislação vigente, mas reflexiva na busca do entendimento da realidade a
partir das manifestações/presenças de traços e aspectos inerentes ao espaço
rural, que se encontra cravado, seja na periferia das cidades (áreas periurbanas),
seja de forma pontual no interior da malha ou tecido urbano.
É pela não aceitação da neutralidade cientifica, tão criticada e que precisa
ser extirpada de fato, que em face de observância de elementos do mundo rural
que adentram na fronteira, para muitos, rígida e intransponível do espaço urbano,
que só se move apenas na expansão de seus limites abarcando aquilo que
teoricamente é concebido como seu oposto, o rural, e imprimindo toda a sua
lógica, ritmo, normas e cultura, destruindo assim qualquer aspecto e
características da rusticidade.
A cidade é um modo de viver, pensar, mas também sentir. O modo de vida urbano produz ideias, comportamentos, valores,
64
conhecimentos, formas de lazer e também cultura. (CARLOS, 2005. p. 26).
A referida autora busca compreender a cidade dentro de uma totalidade, a
partir da qual ela é possível de ser apreendida, ou seja, enquanto produto
histórico e social a cidade tem relações com a sociedade em seu conjunto, com
seus elementos constitutivos e com sua história, transformando-se à medida que
a sociedade como um todo se modifica.
A cidade está além do construído, pensá-la para além das formas, é
entendê-la enquanto reflexo das relações sociais que permeiam a sociedade, nos
mais diferentes aspectos e considerações, a exemplos das várias instituições que
regem esta sociedade (família, escola, igreja, Estado).
3.3 AGRICULTURA E ESPAÇO URBANO
A agricultura é uma atividade complexa e multifacetada, cujas
características variam de acordo com as técnicas empregadas, as condições
geoambientais, as disponibilidades de recursos humanos e capitais, além da
localização das áreas e outros. Logo, a sua compreensão e dimensionamento
dependerá dos procedimentos e métodos empregados na análise territorial, não
se restringindo a uma análise setorial, como é frequente em trabalhos das
ciências sociais, em particular da geografia.
O espaço rural brasileiro na atualidade tem seu conteúdo redefinido a partir
tanto da incorporação de tecnologias ao processo produtivo, bem como o
desenvolvimento das atividades não-agrícolas, e as transformações sociais delas
decorrentes, em que se mesclam funções tradicionais com novas funções. Assim,
a concepção tradicional de espaço rural é cada vez menos satisfatória para definir
e caracterizar tal complexidade territorial (LOCATEL, 2008).
Segundo Locatel (2008), a definição da agricultura como definidora do
espaço rural deve ser relativizada, visto que essa atividade não é exclusiva do
espaço rural, mas pode ser encontrada em espaços urbanos e periubanos.
Tradicionalmente na geografia agrária, os enfoques das atividades agropecuárias
eram definidores do espaço agrário, tido como sinônimo de espaço rural,
atribuindo-lhe características de arcaico, atrasado, rústico e inóspito, além de
65
bucólico e puro, sendo o homem do campo adjetivado de igual maneira, definido
como agricultor, com pouca instrução e cultura.
A própria agricultura praticada no meio rural apresenta características
diversas, ora composta de sistemas agrícolas tradicionais, a exemplo de
agricultura de subsistência e itinerante, ora ligados aos sistemas agrícolas
modernos, atrelados ao comércio nacional e internacional, aproximando cada vez
mais essa realidade a dinâmica urbana, do que a rural.
É dentro dessa lógica que o espaço urbano não é visto aqui apenas
atrelado a indústria, comércio e a negação do rural, pelo contrário, não há uma
separação cidade campo mesmo cada um apresentando suas particularidades e
singularidades. A agricultura urbana vem legitimar e reforçar a presença de
práticas agrícolas na cidade, o que refuta a tão cristalizada idéia de que cidade e
campo são pares antagônicos, sendo necessário considerar que mesmo em meio
ao atual processo de urbanização presenciamos traços e elementos do rural
espalhados pelo tecido urbano.
Segundo Correia (1999), a cidade é o lugar privilegiado de ocorrência de
uma série de processos sociais, entre os quais a acumulação de capital e a
reprodução social têm importância básica. E estes mesmos processos criam
funções e formas espaciais, ou seja, criam atividades e suas materializações,
cujas distribuições espacial constitui a própria organização espacial urbana.
O espaço urbano e sua supremacia enquanto centro da acumulação de
capital incorpora uma diversidade de processos produtivos e assim de variadas
formas de trabalho. Nas periferias das cidades, que em um período anterior eram
pautadas predominantemente pelas atividades eminentemente agrícolas,
mesclam-se atividades urbanas e rurais, exercidas pelos excluídos do trabalho
urbano formal, e que como estratégias de sobrevivência permanecem
desenvolvendo atividades tradicionais, de caráter extremamente precário, mas
que se mantém como necessárias na lógica contraditória de acumulação
capitalista (MOURA, 2007).
O espaço urbano vai sendo construído e reconstruído, através de políticas
públicas, gerando descontinuidades e agrupamentos, sem respeitar as relações
econômicas e sociais preexistentes, ou seja, os interesses da população local,
seus anseios e necessidades. É onde podemos encontrar neste espaço urbano
66
fragmentado e articulado, contradições que instigam e redefinem antigas relações
campo-cidade.
O espaço urbano capitalista apresenta descontinuidades e recortes, com
presença de múltiplas territorialidades resultantes das contradições impostas por
um modelo de desenvolvimento excludente cujo principal objetivo é a acumulação
do capital. A relação dialética entre campo e cidade é materializada nos diferentes
usos do solo, onde a apropriação privada da natureza e a precarização do
trabalho constitui-se condição para a reprodução ampliada do modo de produção
atual (MOURA, 2007).
No processo de crescimento urbano as áreas rurais vão sendo invadidas
pela cidade, originando novas configurações espaciais que não destituem por
completo as antigas formas e funções, promovendo uma mescla de sentidos e
usos, conduzindo a múltiplas territorialidades, visto que mesmo inseridas na
lógica capitalista, preserva relações “não capitalistas de produção”.
O processo de urbanização acelerado pelo qual passou as grandes
metrópoles brasileiras promoveu intensas transformações no espaço urbano e
periurbano das cidades, expondo áreas predominantemente agrícolas aos
impactos da urbanização.
Mesmo não sendo objeto principal de nossa pesquisa, vale ressaltar a
importância da agricultura metropolitana, que se restringe ao enfoque de sua
inserção como parte integral de um processo maior de crescimento urbano, não
sendo possível compreender a agricultura em si, mas num contexto de
abordagem no nível do produtor (BICALHO, 1992, apud TUBALDINI e
RODRIGUES, 2000), e que pode responder aos questionamentos mais
específicos do ambiente rural-urbano.
A esse respeito Machado (2008) fundamentado nas contribuições de
Bicalho (1998), destaca que a metropolização do espaço é muito mais complexa
do que um mero avanço urbano sobre o campo, dando origem a espaços
interativos do urbano com o rural nos quais se mantém atividades agrícolas
dinâmicas.
Essa realidade é tão forte que foi observada na área de estudo que os
agricultores urbanos que comercializavam seus produtos agrícolas nos bairros
investigados eram provenientes dos municípios vizinhos, a exemplo de Nossa
Senhora do Socorro e São Cristóvão, que compõe parte da região metropolitana
67
de Aracaju. Aproveitando para comercializar seus produtos nas avenidas
principais dos bairros durante toda semana (Figuras 16 e 17).
Figura 16: Comercialização dos produtos agrícolas n a Av. Poço do Mero, Bugio. Foto: SANTANA FILHO, L. S., 2009.
Figura 17: Comercialização dos produtos agrícolas n a Av. Poço do Mero, Bugio. Foto: SANTANA FILHO, L. S., 2009.
68
Mesmo o presente trabalho está pautado no entendimento da agricultura
de caráter intra-urbano, faz-se necessário compreender estudos com propostas
metodológicas diferenciadas como, por exemplo, a do modelo de Von Thünen;
Sinclair (1967).
O modelo Thuniano tem sido referência para os debates sobre localização
das atividades agrícolas, sejam para confirmá-las ou refutá-las; o mesmo
estabelece um padrão de distribuição espacial das atividades agropecuárias que
é determinado pela presença de um centro consumidor, a partir do qual as
atividades agrícolas estariam distribuídas em intensidades de usos decrescentes
a partir do distanciamento do centro (MACHADO, 2008).
Nesse mesmo modelo, apoiado em condições espaciais homogêneas e
considerando apenas o custo do transporte, que se mostrava diretamente
proporcional a distância das áreas de produção até a cidade, ou seja, aquelas
atividades valorizadas e intensivas, cuja produção tivesse alto grau de
perecibilidade, estariam localizadas junto ao centro consumidor, já as menos
intensas estariam mais afastadas. Vale ressaltar que mesmo com o advento do
avanço tecnológico ligados ao setor de transporte e a própria resistência genética
e preservação dos alimentos, que conduziria a superação da perspectiva
Thuniana, seu postulado segundo Machado (2008) ainda pode ser encontrado em
vários estudos científicos, principalmente na área da economia.
Diferente na análise da distribuição espacial dos cultivos e das criações,
temos as contribuições de Sinclair (1967), que indica a presença de atividades
extensivas e de baixa rentabilidade próximas aos centros urbanos. Destacando
que a periferia urbana estaria à espera de sua provável conversão em áreas
edificadas em função do crescimento das cidades, ocasionando-se assim, uma
especulação imobiliária, rompendo-se desta maneira os padrões Thuniano de
decréscimo da produção agropecuária em função do distanciamento do centro da
cidade (MACHADO, 2008).
Ainda acerca da discussão sobre agricultura metropolitana, Machado
(2008) ancorado em Bryant (1984) e Bicalho (1992) destaca que a mesma se
manifesta de diferentes maneiras, considerando-se suas relações com a cidade e
suas próprias características. As formas de inserção da produção agrícola
desenvolvida em áreas de influência ou domínio urbano sugerem que existam
69
diferentes ambientes agrícolas em processo de transformação: 1) ambiente de
agricultura desenvolvida, onde existem condições para a realização da prática
agrícola, em função da existência do próprio mercado regional; 2) ambiente de
agricultura adaptada, marcado por incertezas e grande variação na atuação das
forças urbanas e não-urbanas; 3) ambiente de degeneração agrícola, quando as
forças urbanas pressionam as demais e a agricultura declina.
Vale (2004), ao estudar e se debruçar sobre a plurifuncionalidade do
espaço periurbano, destaca que através do crescimento urbano, os limites físicos
das cidades vão englobando áreas cada vez mais distantes da sua core,
englobando o espaço rural, sem levar em consideração que esse espaço é
dotado de identidade própria e especificidade no modo de vida e organização
socioeconômica. Esses espaços englobados estão muitas vezes próximos ao
perímetro urbano e, com o tempo, neles estão inseridas atividades agrícolas e
urbanas.
No caso da zona de expansão que está circunscrita nos limites municipais
de Aracaju, não é difícil presenciar essa mescla de atividades agrícolas e urbanas
convivendo lado a lado, e sob uma mesma lógica (que é a do capital), mesmo que
lhe seja creditado o título de maior reserva de solo urbano disponível para futuros
investimentos do setor da construção civil, até o momento quando se adentra de
fato nos povoados Areia Branca, Mosqueiro, Matapuã, percebe-se a materialidade
da produção do espaço, com suas múltiplas faces e significados (Figura 18).
70
Figura 18 : Animais pastando nas ruas da zona de expansão de Ar acaju.
Foto: SANTANA FILHO, L. S., 2009.
O contraste que agrega paisagem rural e urbana e a plurifuncionalidade
caracterizam o denominado espaço periurbano. Pelo fato da não exatidão
terminológica nas análises que venha a denominar o espaço periurbano sobre o
qual recai a expansão urbana das cidades, torna-se difícil estabelecer
comparações entre espaços periurbanos e o crescimento periférico das cidades.
Podendo-se enunciar vários termos utilizados com este intuito: rural-urban frige,
banlieue, franja urbana ou rururbana, sombra urbana e espaço periurbano (VALE,
2004).
O termo usado pela geografia, quando se trata de áreas com crescimento
periférico e onde se mescla usos do solo urbano e agrícola, é o de franja urbana,
que seria a transição entre o campo e a cidade. É sem duvida um espaço social
diferenciado, pois apresenta além do aumento das formas e modos de vida
urbanos, forte mobilidade de sua população, com variedade social. Estratos
sociais diferenciados, de acordo com as distintas áreas residenciais existentes,
relações sociais mais intensas e valorização contemplativa da natureza, mas não
de forma integrada ao campo.
O termo franja rurubana é definido como um espaço onde além do uso
rural (áreas de cultivo, terrenos baldios e áreas de preservação ambiental),
71
também é ocupada por uso residencial, com pequenos agrupamentos de casas,
proliferação das propriedades unifamiliares somadas a outros usos urbanos, a
exemplo de via de transporte e instalações de serviços urbanos de infraestrutura
básica que necessitam de amplas superfícies. (ZARATE, 1984, apud VALE,
2004).
O crescimento periférico da cidade é classificado por muitos autores como
rururbanização ou rurbanização, sendo que não são sinônimos: o primeiro ocorre
nos espaços situados na zona urbana, onde a população está concentrada, com
associação entre o rural e o urbano, predominando a população urbana que
reside num espaço rural com tendências a valorização do solo, reflexo do
crescimento urbano; a segunda é uma situação intermediária entre puramente
rural e exclusivamente urbana com uma mistura entre os valores representativos
do mundo rural e urbano.
Segundo Vale (2004), periurbanização tão utilizada pelos geógrafos
franceses e espanhóis, seja a melhor forma de interpretar e entender o conceito
de espaço periurbano. Entendido como espaços plurifuncionais com presenças e
características tanto urbanas como rurais, somadas às profundas transformações
econômicas, sociais e físicas, com uma dinâmica vinculada a proximidade de
grande núcleo urbano.
O mesmo autor ainda destaca que nas décadas de 1970 e 1980, proliferou-
se no Brasil a construção de conjuntos habitacionais populares. A partir de 1990
constroem-se os condomínios fechados destinados à classe média e alta, muitas
vezes afastados do centro da cidade, deixando vazios urbanos. Estes por sua vez
conduziram a valorização do solo entre os condomínios e o centro, à medida que
a infraestrutura urbana foi implantada (asfaltamento, saneamento básico,
eletrificação e outros serviços), ou seja, a expansão urbana promove a
especulação imobiliária nessas áreas.
Durante a fase de investigação foi observado tal realidade na zona de
expansão, em que a proliferação dos condomínios fechados (Figura 19), nos
últimos anos, tem se tornado frequente, mesmo que alguns condicionantes
ambientais sejam entraves, como é o caso do problema da macrodrenagem da
região, muitos empreendimentos luxuosos são instalados valorizando cada vez
mais o solo urbano e rural.
72
Figura 19: Condomínio residencial fechado na zona d e expansão de Aracaju.
Foto: SANTANA FILHO, L. S., 2009.
As modificações nas formas de uso do solo acabam promovendo uma
competição pela sua ocupação entre indústria, comércio, residências e
infraestrutura de vários tipos, que vai ao mesmo tempo reduzindo o espaço
agrícola e ocupando as melhores terras que, por sua vez, são valorizadas.
O agricultor periurbano diante das dificuldades enfrentadas acaba sendo
classificado como agente especulador. Por isso, ocorre muitas vezes, o abandono
da atividade agrícola ou a busca de emprego em outros setores. Mas, mesmo
enfrentando estas situações desfavoráveis, as restrições impostas pelo mercado
de trabalho, muitos agricultores ainda apostam na agricultura nestes espaços já
bastante modificados pela urbanização.
França (1988) ao estudar as mudanças ocorridas nas áreas cocoicultoras
do litoral sergipano e as transformações espaciais da ocupação do espaço
litorâneo em relação à essa atividade, destaca que em Sergipe a abertura de
estradas na faixa litorânea, como a Rodovia dos Náufragos, José Sarney, as
estradas da Caueira, Abais, Saco da Boa Viagem e a rodovia para Pirambu,
tiveram papéis fundamentais nesse contexto de mudanças. Em contrapartida com
a abertura de estradas e maior acessibilidade, contribuiu para aumentar a renda
da terra da produção de coco-da-baía, mas também como aumenta o valor dos
73
terrenos litorâneos, acaba sendo prejudicial para a produção, tendo em vista o
incremento do seu potencial especulativo.
A depender de elementos externos, tais como expansão urbana, aberturas
de estradas e valorização das terras, vão promover em algumas áreas litorâneas,
mais evidentes e de forma mais acelerada, a transformação na utilização da terra,
em outras, o processo é mais lento e menos agressivo.
Nesse sentido, a autora afirma que
a produção de coco-da-baía vem sendo ameaçada diante da valorização das áreas litorâneas e da abertura de estradas, que, num primeiro momento, são implantadas com a finalidade de escoar a produção. Na realidade, essas estradas contribuem decisivamente para a redução dos coqueirais, já que as facilidades de acesso até a orla marítima conduzem a uma utilização da área, para o turismo e o lazer (FRANÇA, 1988, p. 11).
Na região da Grande Aracaju, com alto potencial de mudanças, face ao
crescimento urbano da capital e ao grande volume de empreendimentos..., “a
curto prazo, se processe a derrubada do coqueiral, em Aracaju, São Cristóvão,
Nossa Senhora do Socorro e Barra dos Coqueiros. Nesse caso, dar-se-á a
destruição, uma vez que a ocupação do solo passa a ser urbano”. (FRANÇA,
1988, p. 110).
A referida autora destaca que com a valorização dos terrenos litorâneos e,
principalmente, com o crescimento urbano de Aracaju, a tendência é o
desaparecimento da produção agrícola dessa área, ocorrendo a transferência do
coqueiral para áreas mais distantes. Porém apesar de concordar com a leitura da
autora, a produção e utilização da porção sul de Aracaju, nos povoados
Mosqueiro, Areia Branca, Matapuã, na ZEU, presenciamos áreas com práticas
agrícolas que não desapareceram por completo, ou seja, ainda persistem,
presentes na paisagem e que guarda a ligação com um passado glorioso na
produção cocoicultora, e que reascende a velha discussão da dicotomia espacial
entre o rural e urbano.
França (1988) também traz a discussão acerca da renda da produção de
coco, ao argumentar que aumenta a renda pelas condições físicas e das
condições de acessibilidade (renda diferencial), porém diminui diante da
especulação imobiliária e da distância do mercado, destacando ainda que diminui
74
a cocoicultura que, pressionada, chega a ser substituída por outros usos,
sobretudo passando do uso rural ao urbano.
O coco-da-baía deve sofrer a pressão da especulação imobiliária exercida pela cidade, direta e indiretamente, tanto pelo crescimento urbano normal sobre a periferia, como pela demanda das classes urbanas mais favorecidas por terras litorâneas de maior valor para o lazer (FRANÇA, 1988, p.14).
A autora ainda destaca um ponto extremamente importante nessa análise,
afirmando que:
O aumento da renda especulativa diminui a renda da produção, daí se espera que a periferia de Aracaju, diante do aumento do valor da terra, esteja extensificando e, até extinguindo a produção, apresentando, assim, o mais alto potencial de mudanças (FRANÇA, 1988, p. 16).
Contudo, é válido ressaltar que mesmo diante de tais mudanças
argumentadas por França (1988) há a possibilidade de uma relativização. É
sabido a presença muito forte ainda hoje do coco da baía nas áreas litorâneas da
cidade de Aracaju, mesmo não correspondendo de igual modo ao período fausto
e glorioso de sua produção, em que o estado de Sergipe já foi um dos maiores
produtores de coco do Brasil.
Segundo o IBGE, 2008 a produção de coco em Aracaju alcançou o número
de 720 mil frutos numa área plantada de 360 hectares com rendimento médio de
2000 frutos/hectares cujo valor da produção totaliza 324 mil reais. Pode-se
reconhecer o aumento da renda especulativa em detrimento da renda oriunda da
produção do coco. Entretanto, não se pode negar na análise da produção do
espaço dessa localidade a existência de traços e/ou características culturalmente
associados ao espaço rural, a exemplo de propriedade com criação de animais e
as cercas (IBGE, Produção Agrícola Municipal, 2008).
O IBGE, que não trabalha com propriedade e sim com estabelecimentos,
fornece informações referentes aos estabelecimentos agropecuários presentes
em Aracaju, conforme a Tabela 01. Por conhecer a realidade da zona de
expansão de Aracaju, bem como toda a cidade, acreditamos que estes dados
sejam oriundos principalmente da zona de expansão, pois é nesta área onde
visualizamos os vazios urbanos, como características peculiares ao espaço rural.
75
Tabela 01: Aracaju, estabelecimentos agropecuários, 2006. Nº de
estabelecimentos agropecuários
Nº de estabelecimentos
com lavouras permanentes
Nº de estabelecimentos
com lavouras temporárias
Nº de estabelecimentos com pastagens
naturais
Nº de estabelecimentos
com matas e florestas
44 23 4 5 1
Fonte: IBGE, Censo Agropecuário, 2006.
Em relação a produção pecuária municipal, percebe-se a partir da Tabela
02 a presença de rebanhos sejam eles bovinos, equinos, dentre outros. O
interessante é entender como esses dados numéricos, em relação a tal produção,
são significativos, no tocante a uma cidade considerada total ou quase que
totalmente urbana. Vale destacar também que durante o trabalho de campo
visualizou-se que do efetivo bovino, encontrado na cidade de Aracaju, grande
parte está localizada em sua zona de expansão urbana. Bem diferente dos bairros
analisados, que prevalece a prática agrícola relacionadas ao cultivo de frutíferas e
plantas medicinais. Fato esse favorável a decisão de enveredar a análise sobre a
agricultura urbana em Aracaju, basicamente a partir de duas áreas diferenciadas:
a zona de expansão e os bairros Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont.
Ainda com relação a pecuária municipal aracajuana, o IBGE apresenta
informações acerca das vacas ordenhadas e a produção de leite de vaca, o que
provavelmente ainda gera renda para seus produtores. Sendo importante
destacar a venda de leite in natura, a exemplo da comercialização, ainda
presente, do leite de porta em porta dos bairros pesquisados, em que por apenas
um real e trinta centavos (R$ 1,30) o “freguês” leva um litro de leite na vasilha.
76
Tabela 02: Produção pecuária do município de Aracaju, 2008
Rebanho Número/cabeças Bovino 880 Equino 426 Asininos 18 Muares 106 Suínos 530 Caprinos 165 Ovinos 630 Galos, Frangas, Frangos e Pintos 33.000 Galinhas 2.700 Codornas 4.800 Vacas Ordenhadas 170 Produção Quantidade Leite de vaca 122 mil litros Ovos de galinha 11 mil dúzias Ovos de codorna 19 mil dúzias Fonte: IBGE, Produção da pecuária municipal, 2008.
Em algumas propriedades da zona de expansão de Aracaju, percebe-se
que a terra que espera pela conversão de rural para urbano, via especulação
imobiliária, é muitas vezes local de práticas agrícolas, enquanto a mesma não é
vendida, sendo utilizada com plantações de cultivos agrícolas, como pode ser
observado na Figura 20.
Figura 20 : Mesclas de sentidos e usos na zona de expansão de A racaju.
Foto: SANTANA FILHO, L. S., 2009
77
Cada fração da cidade deve ser estudada na observância de suas
especificidades, mas não perdendo a dimensão/compreensão da totalidade das
relações sociais, neste caso sócio-espaciais, visto que a cidade é reflexo da
produção histórico-social, ou melhor, constitui-se em trabalho humano
materializado na paisagem.
Ao se expandir sobre o espaço rural, a cidade tende a incorporá-lo e
submetê-lo a novas formas de apropriação, formatando novos usos e funções.
Neste sentido,
quando a cidade se expande sobre o campo não significa que esta área deixe de ser propicia para o cultivo agrícola, mas que é de interesse do capital através da especulação imobiliária, para que se transforme em loteamento, distrito industrial ou shopping center (MAIA (2000), apud MOURA, 2007, p. 98).
Maia (2003) reflete a respeito da manifestação do mundo rural na cidade,
evidenciando a casa enquanto elemento unificador desses espaços. A autora
trabalha com a categoria subespaços para destacar a manifestação da herança
rural expressas em algumas casas luxuosas como também nas mais simples,
desmistificando que mesmo diante do processo de urbanização e industrialização,
a herança rural não foi suplantada, muito embora suas evidências tenham sido
abafadas pela sociedade moderna.
A referida autora destaca que a partir de um olhar mais atento sobre a
paisagem, podemos encontrar encobertos pelos incrementos urbanos, animais
pastando nos lotes vazios, carroças puxadas pelo burro entregando leite in
natura, homens levando capim para alimentar seus animais, como também
cavaleiros que se aventuram pelas ruas da cidade, dividindo espaços com os
automóveis.
Dentro dessa visão, a autora ainda afirma que a prática desses homens,
geralmente de origem rural, manifesta-se na cidade em micro-espaços, com
pequenas criações ou mesmo na manutenção de costumes que se mesclam a
vida urbana, não se resumindo somente às atividades praticadas, mas sendo
incorporadas no seu modo de viver, tendo a sua casa a expressão de uma
herança rural.
Muitas vezes, esse cidadão que mora na cidade e/ou no seu entorno, por
estar marginalizado ou excluído do processo de produção baseado no modelo
capitalista, inclui-se através da relutância de práticas do mundo rural, trazidos
78
muitas vezes, em virtude das numerosas correntes migratórias provenientes do
campo.
Segundo Resende (2004), o mundo rural continua presente nas cidades,
nas ruas e nos quintais, nas atividades dos carroceiros e suas carroças,
prestando serviços à cidade, nas pequenas hortas e criações de animais na
periferia, assim como nas manifestações culturais, como as festas do Divino e de
Santos Reis.
Como bem lembra Lefebvre (2001, p. 12),
entre as malhas do tecido urbano persistem ilhotas e ilhas de ruralidade “pura”, torrões natais frequentemente pobres (nem sempre), povoados por camponeses envelhecidos, mal “adaptados”, despojados daquilo que constitui a nobreza da vida camponesa nos tempos de maior miséria e da pressão.
Essa afirmativa, que respondia a uma realidade há mais de 40 anos, pode
facilmente ser aplicada a realidade, pois podemos observar a mescla do rural,
tanto nas cidades, como em áreas metropolitanas, tanto em países centrais como
nos periféricos (LOCATEL, 2008).
Apesar de haver uma tendência no sentido da urbanização no mundo, esse
fenômeno não se dá de forma homogênea, nem mesmo as ondas de urbanização
conseguem eliminar todos os elementos da vida rural, com a expansão de sua
trama territorial. E o campo, mesmo sendo “urbanizado” não se deixa eliminar por
completo, havendo sempre às resistências, sobrando sempre elementos da vida
rural.
O crescimento da pobreza urbana e metropolitana, do desemprego e da
insegurança alimentar, dentre outros problemas da realidade urbana, coloca lado
a lado, força de trabalho, conhecimento disponível, que podem ser utilizados para
prática da autoprodução, a exemplo da agricultura urbana, como mais uma
estratégia de sobrevivência/permanência no equacionamento (in)sustentável dos
conflitos urbanos e das contradições geradas pelo modo de produção
hegemônico.
Santos (1994), ao se referir ao território da cidade afirma que:
Quanto às cidades, aquelas cujas dimensões são maiores, utilizam parte dos territórios vazios dentro da aglomeração ou em suas proximidades com atividades agrícolas frequentemente
79
modernas e grandemente destinadas ao consumo da respectiva população. (SANTOS, 1994, p. 65).
Madaleno (2001) salienta que essas atividades socioeconômicas não
devem ser vistas isoladamente, mas considerando o contexto das economias
locais e regionais, das formas de ocupação e uso do solo urbano, dos sistemas
de gestão e até de sistemas de produção e de distribuição de alimentos globais.
Pode-se entender a agricultura urbana e periurbana, como uma estratégia
social, voltada à complementação de renda, geração de emprego, redução do
risco de insegurança alimentar, além de melhores condições para um
protagonismo da mulher, do idoso e do jovem.
Ocorre que no Brasil a implementação das atividades de agricultura
urbana, vinculadas à segurança alimentar não se dá pela escassez de alimentos,
porém está relacionado à demanda, ou seja, a possibilidade de acesso da
população aos alimentos através do mercado.
A agricultura urbana tem um caráter social e ambiental, pois incide nas
famílias que a praticam da seguinte forma: complementação de renda;
fornecimento de alimentos básicos que essas mesmas famílias não teriam acesso
no mercado livre para comprar; alimentos frescos e saudáveis com possibilidade
de diversificação da dieta alimentar; reciclagem do lixo através da utilização de
resíduos e rejeitos domésticos para adubação, além da reutilização de
embalagens para formação de mudas; farmácia caseira (plantas medicinais),
dentre outros.
A questão de geração de renda através da atividade de agricultura urbana
é também compreendida como valor monetário obtido através da comercialização
dos produtos agrícolas e como alternativa para poupar os gastos que seriam
feitos na compra de alimentos, que passam a ser produzidos em seus quintais, da
mesma forma evitando a compra de medicamentos utilizando plantas medicinais,
e cultivando plantas para alimentar seus animais, evitando assim a compra de
rações.
A agricultura urbana e seus desdobramentos no espaço urbano, seja pela
discussão da dicotomia espacial, pela problemática do que vem a ser rural e
urbano, bem como pelas mesclas de sentidos e usos da/na cidade, existe
enquanto manifestação materializada na cidade de Aracaju, logo seu estudo é
pertinente e ao mesmo tempo desafiador. Desafiador porque para levar esse
80
estudo adiante é preciso, antes de qualquer coisa, encará-lo como necessário à
realidade de Aracaju, tendo em vista a ausência de estudos referentes a essa
temática. É a partir dessa premissa que o capítulo seguinte propõe uma
discussão mais afunilada da AU em Aracaju, mais especificamente nos bairros
Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont e na sua Zona de Expansão.
81
4. A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO EM ARACAJU E A AGRIC ULTURA
No presente capítulo discute-se de forma mais verticalizada o recorte
territorial, alvo da pesquisa em tela, que a principio é introduzido com um
resgate da evolução do tecido urbano da capital sergipana, para
posteriormente adentrar, de forma mais especifica, na caracterização geral das
áreas consideradas adequadas para a compreensão e dimensionamento da
agricultura urbana no município de Aracaju. E finaliza-se o mesmo buscando
compreender a renda da terra urbana e da monopolização da terra em Aracaju.
4.1 O SÍTIO URBANO
Aracaju foi fundada em 1855 por Inácio Joaquim Barbosa, para subsidiar
as relações político-administrativas e econômicas, sendo considerada o
principal e mais importante centro da rede urbana estadual. Sua localização
embora em terrenos alagados, de pântanos, mangues e dunas, possuía uma
posição estratégica, situado à margem do estuário do rio Sergipe, o que
possibilitava o controle sobre as diversas regiões econômicas da Província,
principalmente sobre a zona açucareira da Contiguiba.
A produção agrícola da Cotinguiba, em meados do século XIX, estava
relacionada à exigência exterior de consumo de produtos tropicais,
proporcionado pela revolução industrial. É nesse contexto que o Estado teria
que viabilizar a criação de um novo centro de comercialização, que mantivesse
contato com o exterior e que fosse centro econômico da Província, neste caso
São Cristóvão, antiga capital da Província, não atendia essas necessidades.
O interessante é que a transferência atendia também os interesses dos
Senhores-de-engenho, fato comprovado pela fraca oposição dos proprietários
do Vaza-Barris, que logo perceberam as vantagens econômicas.
É importante frisar que de início, Aracaju não exerceu total influência
sobre a rede urbana da época, pois as outras cidades estavam localizadas nos
fundos dos estuários dos rios Japaratuba, Cotinguiba, Sergipe, Vaza-Barris e
Piauí, na Zona da Mata.
Assim, eram prósperas as cidades de Laranjeiras, Maruim e Riachuelo, na Zona da Contiguiba, e Estância, no vale do Piauí, que além de portuária, exerciam importante função
82
comercial e de serviços para as áreas mais próximas. (RIBEIRO. 1989. p.31).
De imediato, logo nos primeiros anos de vida a cidade de Aracaju teve
que enfrentar sérios problemas urbanos. Em 1855, o próprio presidente
Barbosa foi acometido e morto por moléstia (epidemia de cólera). Tal epidemia
perdurou até o inicio do ano de 1856 na nova capital.
As águas estagnadas formavam o habitat dos mosquitos que transmitiam o impaludismo e tantas outras moléstias, constituindo fator de descrença para os possíveis investidores e de expulsão da população (RIBEIRO. 1989. p. 42).
A implementação da estrutura urbana em Aracaju, no tocante ao
melhoramento de sua infraestrutura, deu-se em um momento histórico em que
o país havia adquirido melhoramentos consideráveis, sendo assim, Inácio
Barbosa, atuou no sentido de colocar a nova capital nesse “circuito”. Para
tanto, o presidente da Província, deixou a cargo do então capitão de
engenheiros, Sebastião José Basílio Pirro, o planejamento da cidade.
O Plano Pirro, segundo Porto (1991), não era adequado para a realidade
do sítio urbano de Aracaju, pois, tratava-se de um sítio praiano e pantanoso,
que necessitava de um planejamento que desse melhor aspecto à cidade,
evitando grandes aterros e facilitando os serviços de drenagem.
Ribeiro (1989) destaca que a nova capital era caracterizada pela enorme
quantidade de aterros, devido às condições físicas e geográficas da região. O
Estado desempenhou o papel de incentivador, observado na elaboração do
Plano da Cidade, na concessão de vários aforamentos aos funcionários
públicos e recursos, cuja preocupação era consolidar a transferência da capital.
Com o objetivo de incentivar as edificações na cidade, o plano Pirro
sofreu pequena alteração, pois o presidente da Província, ao ver a necessidade
de curvar a reta da rua da Frente, alterou-o, fazendo-o paralela ao rio Sergipe.
Apesar das diversas sugestões, “a cidade cresceu fria e inflexível dentro das
malhas do reticulado, numa repetição monótona de si mesma” (PORTO, 1991,
p. 34).
Apesar das dificuldades descritas acima, a construção da cidade seguiu
em frente. Foram criadas edificações administrativas, a Igreja de São Salvador,
83
e diversas edificações na rua São Cristóvão e da Aurora (as mais edificadas), e
como também da Barão de Maruim (conhecida como rua do Barão).
Mas, devido ao “livre arbítrio” dos edificadores (aos quais ameaçavam
comprometer o aspecto e a regularidade do plano da cidade) “a câmara
municipal pôs em execução suas primeiras posturas, aprovadas pela
Resolução Provincial nº 458, de 03 de setembro de 1856, regulando a
edificação e os costumes dos seus habitantes” (PORTO, 1991, p. 42).
Com isso, as habitações que não se enquadravam nessa nova diretriz,
devido a questões econômicas e de infraestrutura, estavam obrigadas a se
refugiarem nas áreas marginais, ou seja, fora do perímetro do plano Pirro.
Porto (1991) denomina tal fato como primeiro fenômeno geográfico de
diferenciação social que se operou em Aracaju. Demonstra a natureza
excludente do espaço urbano de Aracaju, o qual é regulado pelas forças
econômicas e políticas, a qual vai se caracterizar ao longo do seu
desenvolvimento.
Segundo Ribeiro (1989) entre 1900 e 1930, vamos presenciar os
acontecimentos como a 1º Guerra Mundial e o marcante declínio das
economias do açúcar e do algodão, porém, é nesse período que Aracaju vai
sofrer grandes transformações, como as grandes construções de escolas
(Atheneu Sergipense e Escola Normal), Hospital, Teatro, Fundação do Banco
de Sergipe, etc.
De 1930 a 1964, é marcado pela diversificação do Centro-Sul do país na
agricultura, afetando drasticamente o Nordeste, e isso inclui Sergipe. Nos anos
40, como efeito da 2º Guerra, verifica-se um aumento na produção de tecidos,
que representava a principal atividade econômica do estado de Sergipe, fora o
setor rural.
Com a crescente implantação das ferrovias e rodovias, Aracaju foi
perdendo sua função portuária e tornando-se centro administrativo e comercial,
e consequente capital regional. O fácil acesso a Aracaju, possibilitada pelas
vias de transporte, aumentou o fluxo de imigrantes, promovendo assim por
parte da prefeitura o processo de expansão da periferia inicialmente através de
ocupação espontânea e depois loteamentos. Foi a partir daí que se presenciou
o espraiamento da cidade e sua segregação sócio-espacial, em que as classes
84
mais abastadas se dirigem para o sul e as classes menos favorecidas em
direção ao norte.
Os recursos e riquezas do estado de Sergipe, nas últimas décadas do
século XX, concentraram-se ainda mais em Aracaju, e esta reflete de certa
forma a riqueza e contraditoriamente as desigualdades do estado, na medida
em que concentra de um lado a indústria, o comércio e serviços, e acima de
tudo o consumo e, por outro, uma parcela significativa da população vivendo
em condições precárias.
Percebe-se também que a população mais carente de Aracaju em sua
grande maioria, se encontra hoje localizadas nos bairros Santa Maria, antiga
Terra Dura, Mosqueiro, Porto Dantas, Coqueiral Sagrada Família e outros, ou
seja, nas áreas mais periféricas e afastadas das áreas centrais.
Para o desenvolvimento desta pesquisa, devido às dimensões do
município, o recorte territorial, no qual se concentrará a análise empírica,
visando o aprofundamento de algumas questões acerca da agricultura urbana
e seus desdobramentos no espaço urbano da capital será a porção sul do
município conhecida como Mosqueiro na chamada zona de expansão de
Aracaju, e alguns bairros do noroeste da capital, que são o Bugio, Jardim
Centenário e Santos Dumont.
4.2 ZONA DE EXPANSÃO DE ARACAJU: ASPECTOS GERAIS
Até 1960 o acesso ao povoado Mosqueiro era restrito, sendo efetuado
pelos comunitários local (muito deles pescadores) através de animais, a pé ou
navegando pelos riachos, que nas épocas de chuvas tem seus volumes
aumentados, para comercializarem seus produtos no mercado de Aracaju. A
partir de 1980, com a construção da rodovia dos Náufragos, ocorre uma
aproximação das relações entre Aracaju e o povoado Mosqueiro, onde muitos
veranistas passam a frequentar a região, adquirindo terrenos e construindo
casas, que posteriormente tornam-se moradia permanente.
Na zona de expansão de Aracaju há uma diversidade em relação às
residências, em que se encontra um grande número de chácaras e sítios
(Figura 21), bem como a presença dos condomínios fechados com alto grau de
sofisticação (Figura 22). Tal realidade reflete a presença de distintas classes
85
sociais e modos de vida diferenciados da população que aí reside, ou seja,
percebe-se na paisagem o contraste na arquitetura das moradias. Ao mesmo
tempo em que se vê condomínios residenciais destinados a população
abastada, chácaras enormes enquanto local de lazer, tem-se a presença
bastante difundida de pequenos sítios e casas de uma população mais carente,
a qual foi pioneira no processo de ocupação dessa localidade.
Figura 21: Residências presente na Zona de Expansão Urbana de Aracaju. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
nn
Figura 22: Residência presente na Zona de Expansão Urbana de Aracaju. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
86
É interessante destacar que alguns proprietários, como pode ser
observado na Figura 23, ainda apresentam na entrada da propriedade o nome
“sítio ou chácara” denominação que vem caracterizar, de certa maneira, um elo
com os conteúdos do espaço rural aí expresso, e que muitos desses nomes
presentes na entrada são os mesmos encontrados no banco de dados a cerca
das informações sobre imóveis rurais disponibilizada pelo INCRA, em 2008,
que contabilizou um total de 383 imóveis cadastrados cujas áreas variam entre
1 a 300 hectares.
Figura 23: Chácaras e sítios na zona de expansão de Aracaju. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
Leite (2007) destaca que atualmente a especulação imobiliária, no
decorrer dos últimos anos, vem contribuindo com a descaracterização
territorial, espacial, sociocultural, econômica e ambiental da zona de expansão
de Aracaju.
A ocupação dessa área vem ocorrendo principalmente nos setores meridionais e nas proximidades das rodovias. A urbanização ou desruralização da região é observada principalmente em razão da localização geográfica da área – próxima a rios e mar, atraindo a especulação imobiliária voltada para a construção de casas e condomínios fechados de veraneios; embora atualmente estejam se transformando
87
gradativamente em moradias permanentes (LEITE. 2007. p. 35).
Segundo França (2005), os condomínios residenciais fechados, na zona
de expansão, apresentam duas tipologias: a primeira é o condomínio
residencial fechado, onde as casas, a infraestrutura e os equipamentos de
lazer são partes integrantes no momento da compra, já a outra refere-se ao
loteamento residencial fechado, em que o promotor de vendas faz o
parcelamento, mas os lotes vendidos e sua posterior construção fica a cargo do
próprio comprador, de sua renda e opção arquitetônica, e que a infraestrutura e
equipamentos internos vão sendo incrementados pela incorporadora, à medida
que os lotes são vendidos.
A zona de expansão de Aracaju (ZEA) é considerada como espaço
privilegiado pela paisagem natural e pelo processo de construção urbana, mais
evidente na sua fachada litorânea. Possui a maior reserva de terrenos para
atender as demandas futuras do setor da construção civil. Entretanto o sistema
de drenagem natural é um condicionante físico de extrema importância e que
pode vir a comprometer seriamente esta zona, no tocante a qualidade
ambiental, caso não se dê as devidas atenções na reformulação do
planejamento urbano dessa área.
Essa problemática foi apresentada por Loureiro (1983), que já anunciava
para a região compreendida entre o Terminal de Carmópolis (TECARMO) e o
povoado Mosqueiro que qualquer parcelamento da terra deveria ser sustado
até que se definisse um plano de uso e ocupação do solo. Segundo a mesma
autora trata-se de uma zona extremamente baixa e alagadiça, de difícil
drenagem. A Figura 24 expressa claramente os problemas vivenciados pela
população local, que são decorrentes da ineficácia da macrodrenagem, em
que, mesmo diante da normalidade dos índices pluviométricos esperados no
período chuvoso para essa região, promovem caos e transtornos, mas
contraditoriamente não inibem a continuidade da proliferação dos condomínios
residenciais.
88
Figura 24: Problemas da macrodrenagem na zona de expansão de Aracaju. Fonte: CAMBEZE – Conselho das Associações de Moradores da Zona de Expansão, 24/05/2009
A zona de expansão de Aracaju vem passando por um rápido processo
de mudanças, em que o meio natural deu lugar a uma área agrícola,
principalmente, com a produção de coco, até o final da década de 1980, que na
atualidade configura-se como o mais importante espaço da expansão da
cidade de Aracaju.
É nesse contexto que se faz necessário um melhor entendimento do
que vem a ser a chamada Zona de Expansão de Aracaju, seu processo de
ocupação e os “meios justapostos” na obtenção de uma finalidade, que é a
apropriação do solo pelo capital, além dos interesses das grandes empresas
ligadas ao setor da construção civil, que são proprietárias de grandes lotes de
terra nessa localidade. Os meios justapostos representam a mescla de
elementos (terra, gado, condomínios residenciais, cultivo, cerca, dentre outros),
que são intrínsecos nesta zona.
Assim percebe-se como é difícil se estabelecer os limites do que vem a
ser rural e urbano no Brasil, mais especificamente em Aracaju, haja vista que
diante das enormes transformações via processo de urbanização, são
verificados remanescentes da atividade agrícola, somando-se às diversas
formas e conteúdos presente nesse espaço.
89
É importante destacar a contribuição de Silva (2004) que foi decisiva na
escolha do nosso recorte territorial para iniciarmos nossa investigação, pois a
referida autora buscou analisar as transformações sociais, econômicas e
ambientais ocorridas no bairro Porto Dantas, na zona norte de Aracaju, em
função da ocupação desordenada, conduzida pelo fluxo de pessoas oriundas
de outros municípios, da presença de espaços legalmente protegidos e da
função, ainda presente, do segmento agrícola remanescente.
Segundo Silva (2004), as transformações desse espaço urbano são
provenientes do entrelaçamento da dinâmica dos segmentos urbano, agrícola e
ambiental. O segmento de uma agricultura familiar que ainda persiste, embora,
pressionada pela expansão urbana, onde uma população de velhos moradores,
pescadores, agricultores e de migrantes de áreas agrícolas do estado e fora
dele, sempre que conseguem, formam uma pequena roça no quintal ou ao lado
do barraco. Sendo assim, é possível afirmar que esses segmentos estão
subordinados à lógica capitalista.
A zona de expansão de Aracaju (Figura 25), também conhecida como
Mosqueiro, enquadrada como zona de adensamento restrito (ZAR), na Lei
Complementar 042/2000, do Plano Diretor de Aracaju, possui, segundo os
pesquisadores da ADEMI/GEO consultoria (2000), 63 Km2 o que representa
35% do limite territorial do município de Aracaju.
É de extrema importância o conhecimento dos atributos físico-naturais
da zona de expansão de Aracaju, para se entender o processo de uso e
ocupação pela qual vem passando está área da cidade nas últimas décadas.
As características topográficas e as características de solo de constituição
arenosa e permeável condicionam uma drenagem marcada pela infiltração das
águas pluviais e pela evaporação direta através de uma série de lagoas e
baixos estacionalmente inundáveis, com afloramento do lençol freático.
90
Figura 25 – Mapa da Zona de Expansão de Aracaju. Fonte: EMURB, 2010.
É frequente, logo depois da estação chuvosa, o acumulo de águas
residuais em lagoas próximos as residências e margeando a rodovia, reflexo da
proximidade do lençol freático da superfície. Conforme pode ser observado nas
Figuras 26 e 27, esse fenômeno foi presenciado na rodovia dos Náufragos,
como também no povoado Mosqueiro.
91
Figura 26: Afloramento de lençol freático junto a r esidência. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
Figura 27: Afloramento de lençol freático próximo a rodovias. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
92
Segundo Araújo (2006), a zona de expansão de Aracaju é um terraço
marinho holocênico arenoso e com elevada permoporosidade, composto de
cordões litorâneos que entre as cristas abrigam faixas alongadas paralelas ao
mar naturalmente descontinua ou interrompida por aterros, com desníveis
topográficos entre 2 a 6 metros, fora as dunas. A imagem de satélite de parte
dessa localidade permite observar o processo de ocupação através das
manchas que representam os loteamentos e arruamentos bem como os
aspectos naturais com presença de vegetação nativa. (Figura 28).
Figura 28 – ZEA: Aspectos naturais, presença da ocu pação humana e remanescentes de atividades agrícolas. Fonte: SEPLAN/SERGIPE, 2003.
93
Assim como o estado de Sergipe, o município de Aracaju apresenta-se,
no tocante a cobertura vegetal nativa, bastante devastado, reflexo do processo
de edificação do seu sitio, iniciado em 1855. Ainda podendo ser encontrado
pequenos vestígios de sua cobertura vegetal, a exemplo de espécie de
formações perenefolias, representadas pela associação de praias e dunas,
vegetação de restinga e mangue, e o único remanescente de Mata Atlântica é
encontrado no Morro do Urubu (norte da cidade), área legalmente protegida de
interesse ambiental e preservação permanente.
Com base no mapa Geoambiental de Aracaju são três as bacias
hidrográficas na zona de expansão: a bacia hidrográfica do Vaza Barris (Figura
29) que drena a parte sul e se encontra bastante degradado, por não se
respeitar as leis de proteção ambiental, a bacia hidrográfica do rio Santa Maria,
que drena através do rio Santa Maria, a parte oeste e a bacia de contribuição
costeira, que drena para o mar, a leste.
Figura 29: Rio Vaza Barris. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
O povoado Mosqueiro localizado na chamada Zona de expansão
apresenta na associação de praias e dunas vegetação herbácea em que a
brisa marinha impede o desenvolvimento dos arbustos e árvores, Esse tipo de
vegetação favorece a fixação de dunas. Outro tipo de vegetação presente
nessa zona é a restinga, uma associação perenifólia, pouco densa, cujas
arvores se diversifica quanto à espécie e altura.
94
O que mais nos instiga na ZEA é justamente o fato de a mesma
representar muito mais que um setor ou área de Aracaju a ser incorporada
definitivamente na malha urbana de forma continua. Esta área está sendo
apropriada pelo capital a partir da acumulação proveniente da renda da terra,
onde a presença da agricultura muitas vezes são os meios que se justapõem
no processo da obtenção do lucro pelos proprietários, pois a agricultura serve
muitas das vezes como suporte, seja no ganho de visibilidade da propriedade,
mostrando que a mesma tem dono e que assim pode ser vendida com fins
especulativos.
Diante desta perspectiva, não se pode desvincular o entendimento da
agricultura urbana da natureza do solo urbano, ao passo que também não
podemos negar que diante do intenso processo de urbanização atrelado aos
ditames do modo capitalista de produção, são verificadas a presença de
elementos e características vinculadas ao espaço rural, conforme podemos
observar na Figura 30.
95
Figura 30: Agricultura urbana na zona de expansão Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009 Organização: Gilberto Nunes, EMURB, 2009.
96
Com a construção da ponte sobre o rio Vaza Barris (Figura 31), que ligará
o extremo sul da capital ao município de Itaporanga D’ajuda, os processos que
são dinâmicos na zona de expansão, com certeza irão se acentuar, e as práticas
agrícolas que estão comprimidas nos entremeios do urbano, encontrarão mais um
elemento a se coadunar no processo de produção do espaço nessa localidade.
Figura 31: Ponte Jornalista Joel Silveira em constr ução sobre o rio Vaza Barris. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
Vale ressaltar que os terrenos localizados no extremo sul da capital terão
seus preços ainda mais valorizados, fruto também da atuação do Estado na
melhoria da infraestrutura, com o melhoramento do sistema viário, através da
ponte, como no tocante as transformações paisagísticas, na construção da orla
pôr do Sol no Mosqueiro (Figura 32). Assim, o mercado de terras nessa
localidade, vem passando, nos últimos anos, por uma elevação em seus preços,
pois terrenos pouco valorizados e de difícil acesso, tiveram reajustes exorbitantes,
isso foi comprovado durante o trabalho de campo, com o grande número de
placas de vendas de terrenos, seja diretamente na propriedade ou através de
propagandas de corretoras de imóveis (Figura 33).
97
Figura 32: Infraestrutura na Orla Por do Sol, Povoa do Mosqueiro. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
Figura 33: Comercialização das terras na zona de ex pansão de Aracaju
Foto: SANTANA FILHO, L. S, 2009.
Dentro dessa lógica o mercado imobiliário avança em Aracaju,
principalmente na sua zona de expansão. Terrenos antes pouco valorizados, seja
pela dificuldade de acesso ao centro comercial e problemas ainda presentes
98
ligados ao macrozoneamento, são hoje cogitados pelas grandes empresas do
setor da construção civil, na execução de mega projetos habitacionais, sejam eles
na esfera privada e, com menor intensidade, mas não menos importante a esfera
pública, a exemplo do Programa de Arrendamento Residencial (PAR).
O bairro de Aruana, localizado na zona de expansão da cidade e cujo M2 valorizou 600% de dez anos para cá, também começa a se destacar por conta dos condomínios horizontais de alto padrão que começam a surgir. Até o momento, há cerca de uma dezena de condomínios construídos. Cada um abriga uma média de 100 casas com 450 metros quadrados de terreno cada, ao valor de US$ 300 mil, em média. O local combina qualidade de vida e praia, a apenas 15 minutos do centro. "Em Aracaju, o conceito de viver à beira-mar é pouco explorado, situação que começa a mudar com a zona de expansão de Aruana", diz Paulo Henrique Vasconcelos Machado, vice-presidente da construtora Laredo (ADEMI, 2010).
Para o entendimento da produção do espaço urbano em Aracaju faz-se
necessário também levar em consideração a existência da agricultura urbana,
sendo a mesma uma prática multidimensional, que se materializa de diferentes
formas na capital.
4.3 AGRICULTURA URBANA E A PRODUÇÃO DO ESPAÇO EM AR ACAJU
Com a expansão da mancha urbana de Aracaju, que ocorreu, em certa
medida, sem um planejamento adequado, houve a intensificação da periferização
da cidade, o que aumenta a possibilidade da prática da agricultura urbana.
É necessário frisar que a manifestação da agricultura urbana em Aracaju
apresenta distintas territorialidades, em que a materialização nas áreas
pesquisadas, permite distinguir realidades diferenciadas ligadas a mesma, quais
sejam: a diversificação alimentar no cultivo de frutíferas e no cultivo de ervas
medicinais, ligados as tradições rurais; criação de gado de pequeno e grande
porte em espaços comprimidos e/ou soltos pelas ruas e avenidas; a especulação
imobiliária.
A expressão agricultura urbana designa o conjunto de atividades
desenvolvidas em pequenas áreas dentro de uma cidade, ou no seu entorno
(periurbano), para produção, processamento e comercialização dos bens
alimentares de origem animal e vegetal úteis ao homem. É considerada uma
99
atividade simples, tecnologicamente acessível e requerente de pouco ou nenhum
recurso financeiro, com utilização de resíduos produzidos nas áreas urbanas,
porém, podendo ser praticada a partir do emprego de técnicas sofisticadas, como
a hidroponia e a plasticultura.
Mougeot (2000) lembra a respeito da agricultura urbana, que muitas das
definições mais usuais do que vem a ser a "agricultura urbana" desprezam uma
característica crítica que a faz ser realmente "urbana". A agricultura urbana é
diferente da agricultura rural (e complementar a ela) justamente por que ela está
integrada no sistema econômico e ecológico urbano. A não ser que essa
dimensão seja melhor compreendida e tornada operacional, o conceito continuará
sendo pouco útil nos "fronts" científico, tecnológico e político.
A agricultura urbana contribui na promoção da interação entre o espaço
urbano e rural, através das paisagens rurais no lócus de vida urbana. Para
explicar as práticas agrícolas dentro das cidades Resende (2004), argumenta ser
necessário levar em consideração uma série de situações, a saber: a migração, a
urbanização, hobbys, entre outros aspectos.
Os fluxos contínuos de migrantes de origem rural, que nas últimas décadas
do século XX se dirigiram para as cidades brasileiras, enfrentaram uma série de
contratempos, dentre os quais podemos destacar o fenômeno do desemprego
acrescido dos desequilíbrios na estrutura orgânica e social das/nas cidades.
Muitos desses migrantes através da tradição no labor com a terra promovem
outros significados a produção do espaço urbano.
O resultado encontrado durante a aplicação dos questionários nas áreas de
estudo, verificou-se a diversidades da procedência, ou origem geográfica dos
sujeitos alvo da pesquisa. Conforme o Quadro 04, percebe-se que 40% dos
inquiridos haviam nascido na capital sergipana, enquanto que uma proporção
elevada, ou seja, os outros 60%, procedia de outras localidades do estado e,
inclusive de outros estados nordestinos (Alagoas e Bahia).
Outro fator está relacionado ao processo de expansão do tecido urbano
sobre áreas de produção agrícola, em que o processo de urbanização, não
aconteceu por completo, podendo-se perceber algumas descontinuidades
espaciais, inclusive dentro das interfaces urbanas.
100
Naturalidade % Aquidabã 3,33 Aracaju 40,0 Arapiraca-AL 3,33 Brejo Grande 3,33 Gararu 3,33 Itabaiana 3,33 Japaratuba 6,66 Lagarto 6,66 Limoeiro-AL 3,33 Murici-AL 3,33 Pacatuba 3,33 Paulo Afonso-BA 3,33 Piacabuçu-AL 3,33 Poço Verde 3,33 Riachuelo 3,33 Rosário do Catete 3,33 Salgado 3,33 Total 100
Quadro 04: Procedência dos citadinos alvos da pesquisa Fonte: Pesquisa de campo, 2009.
É nesse contexto que a produção do espaço em Aracaju, mais
especificamente na sua zona de expansão, reacende a discussão campo-cidade,
rural e urbano, uma vez que ao considerar e aceitar o município 100% urbano
conduz a própria negação da existência, mesmo que camuflada pelos
incrementos urbanos, dos remanescentes de atividades agrícolas aí presentes. É
dentro desse contexto que a Figura 34 exemplifica tal contradição, ou seja, a de
não levar em consideração as descontinuidades e recortes do/no espaço urbano.
Observa-se na foto que a placa de sinalização indica o início do perímetro urbano
do povoado de Areia Branca, que faz parte do município de Aracaju, logo, se
reconhece a existência do perímetro urbano dos povoados, há que se considerar
as áreas rurais.
101
Figura 34: Zona de Expansão de Aracaju: povoado Areia Branca
Foto: SANTANA FILHO, L. S, 2009.
É necessário considerar que com o processo de urbanização de Aracaju,
áreas foram incorporadas à lógica urbana do município, porém com a
coexistência de múltiplas outras formas de produção do espaço, inclusive os
“meios justapostos” argumentado por Correia (1999) acerca do espaço urbano,
pode-se encontrar na zona de expansão, além das grandes transformações
advindas do setor imobiliário e do processo de conversão do solo rural em urbano
via especulação imobiliária, a presença de gado bovino confinado e outros que
pastam pelas ruas e avenidas livremente; como também a prática de moradores,
de áreas edificadas, nos bairros Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont, por
exemplo, que conservam costumes e hábitos convencionalmente relacionados ao
espaço rural, visíveis na paisagem urbana, através da presença de frutíferas,
criações de galinhas e de ervas medicinais.
As práticas agrícolas dentro da cidade também podem ser justificadas,
pelos citadinos que mantêm em suas propriedades traços do espaço rural. São os
chamados hobbys, que objetivam conservar as vivências e características do
espaço rural através do cultivo nos quintais e jardins na manutenção de
proximidade com a terra e dos próprios elementos que compõem a natureza.
102
É de conhecimento que há práticas de agricultura urbana em outras
localidades dispersas pelo município de Aracaju e que não foram alvos da nossa
discussão, seja pelo fato da complexidade dessa atividade em requerer a
visitação in lócus, uma vez que essas áreas com plantios de frutíferas, plantas
medicinais ou com criações de animais de pequeno ou grande porte são áreas
muito pequenas, encontram-se dispersas intra-bairro e pelo fato de se tratarem de
confinamentos onde são criados animais, quando não estão soltos pastando
pelas ruas e rodovias/avenidas, como pode ser observado na Figura 35.
Figura 35: Zona de Expansão: animais pastando próximo a rodovia. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
A agricultura urbana em Aracaju tem promovido à construção de diferentes
territorialidades na capital, como podemos destacar o cultivo de frutíferas e
plantas medicinais junto às residências com aproveitamentos de exíguos
espaços, seja o fundo de quintal, o jardim e canteiros, vasos nas varandas, ou
cultivando na lateral da própria residência (Ver Figura 36). Como também a
utilização de espaços vazios de uma rodovia na zona de expansão, a exemplo da
rodovia dos Náufragos, em que áreas inicialmente ocupadas com atividades
agrícolas, foram abarcadas ao longo do processo de urbanização, e hoje,
visualiza-se a mescla de utilização agrícola com a empreitada da especulação
imobiliária, bastante presente nessa localidade.
103
Figura 3 6: Agricu ltura urbana nos bairros Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009 Organização: Gilberto Nunes, EMURB, 2009
104
Os bairros Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont, localizados no
noroeste da capital (Ver Figura 37) apresentam características condizentes
com as características multidimensionais da agricultura urbana.
O bairro Santos Dumont surge em 1952, era ocupado anteriormente por
sítios e povoados como o Anipum, Saco, Pau Ferro, Telha, Gengibre e, mais
distante Soledade e Lamarão. (SEPLAN, 2009). Conhecido também como
prainha, sua ocupação se deu em virtude das transformações de vários sítios
em loteamentos e ocupação de suas baixadas próximo ao mangue.
Os sítios foram aos poucos se transformando em grandes e pequenos
grupos de casas, que também receberam populações do processo migratório
composto não somente de sergipanos, mas de alagoanos, baianos e
pernambucanos (SEPLAN, 2009). Inicialmente conhecido como Anipum,
depois recebeu o nome de Santos Dumont em homenagem ao pai da aviação,
devido à transferência e instalação do aeroporto de Aracaju e reivindicação dos
moradores.
O bairro Jardim Centenário tem sua ocupação vinculada aos bairros
Santos Dumont e Olaria, sendo o primeiro a continuidade da expansão da
mancha urbana de Aracaju. Antes da ocupação urbana, era constituído por
sítios e hortas que serviam para abastecer a capital. Alguns moradores
trabalhavam nas salinas existentes na proximidade do bairro e cultivavam a
terra em que adquiriam lotes ou pequenos sítios.
As terras loteadas ainda na década de 1950, contribuiu para a ocupação
da área ao longo da Avenida Santa Gleide e margeando a ferrovia. A
população que ocupa essa área é em sua grande maioria de baixa renda, o
que tem contribuído para a ocorrência de ocupações e a formação de
pequenas favelas, cuja infraestrutura é precária ou inexistente.
Foi comum encontrar junto às residências dessa localidade a presença
de frutíferas, que contribuem para a diversificação da dieta alimentar através da
produção para o autoconsumo. A Figura 38 demonstra claramente a existência
de cultivos, a exemplo da plantação de bananeiras na lateral da residência e da
presença do coco no fundo de quintal.
105
Figura 37: Localização dos Bairros Bugio, Jardim Ce ntenário e Santos Dumont. Fonte: Emurb, 2010.
106
Figura 38: Cultivo de bananeira junto à residência no bairro Jardim Centenário. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
O bairro Bugio tem na sua história um diferencial em relação aos bairros
anteriormente citados, sendo uma área de muitos coqueirais, foi escolhido para
o primeiro mega conjunto habitacional a ser construído no estado de Sergipe,.
denominado conjunto Assis Chateaubriand (SEPLAN 2009). A denominação
Bugio se deu em decorrência a um tipo de macaco, bastante comum na Mata
Atlântica, e que existiam anteriormente em Sergipe.
O bairro foi crescendo em torno do conjunto habitacional, e algumas
ocupações efetuadas foram sendo urbanizadas como forma de inibir a
proliferação de mais habitações subnormais, a exemplo da ocupação do
Anchietão, que permanecia com características de favela.
É importante destacar que o Bugio é um dos poucos bairros em que sua
ocupação não se fez através de entidades particulares (agentes imobiliários e
proprietários fundiários), mas pela ação do Estado na produção do espaço
urbano dessa localidade. A agricultura urbana se manifesta principalmente
associada ao espaço da residência com presença de frutíferas das mais
diversas espécies e pela existência de plantas medicinais cultivadas nos
107
jardins, vasos, canteiros, varandas, cujo destino final direciona-se ao
autoconsumo e no fortalecimento dos laços de vizinhança.
A zona de expansão de Aracaju apesar da relativa distância dos bairros
centrais e de não estar ligada de forma continua à malha urbana da parte
consolidada da cidade (Ver figura 39), é o maior espaço com potencialidades
para futuras instalações de equipamentos de vários setores urbanos e que
apresenta em seu processo de transformação, influenciado sobremaneira, pela
dinâmica imobiliária, impulsionada pelo avanço da segunda residência ou
ocupação de veraneio, sem que se subestime o impacto do crescimento da
moradia primária ou domicilio permanente nas comunidades locais tradicionais,
a exemplo dos Povoados Robalo, Mosqueiro, Gameleira, São José e Areia
Branca.
Figura 39: Vista aérea da Av. Hildete Falcão, av. M elício Machado e Zona de Expansão. Fonte: Pedro Leite in: Sarah França, 2004.
108
4.4 A RENDA DA TERRA NA ZONA DE EXPANSÃO DE ARACAJU
A terra na economia moderna, transforma-se em mercadoria, deixa de
ser apenas um elemento de produção, para ter valor de troca, ou seja, passa a
ser regulada pelas leis de mercado, da oferta e procura.
Renda da terra no modo capitalista de produção pode ser renda
diferencial, na medida em que resulta da concorrência e absoluta quando
resulta do monopólio. A renda diferencial nas palavras de Marx apud Oliveira
(2007), tem sua base na heterogeneidade da natureza, em que não existem
duas parcelas de terras com as mesmas condições de fertilidade natural e
localização em relação aos mercados. Essa renda é auferida por todos os
donos de terra cujas condições de fertilidade e localização, são melhores que
os piores solos em exploração. O proprietário que possui esses melhores solos
se apropria também da renda absoluta, resultante da propriedade fundiária, ou
seja, a propriedade da terra é monopólio de uma classe ou fração de classe,
que cobra um tributo da sociedade para colocá-la em produção. Destarte,
aquilo que constitui as diferenças naturais se converte em diferenças sociais
por obra da propriedade privada.
No tocante a zona de expansão urbana de Aracaju, para o entendimento
acerca da agricultura urbana, percebe-se o uso aos interesses da acumulação
de capital, através do processo de urbanização, que vislumbra um dos seus
principais mecanismos de acumulação e subordinação, através da subjugação
das práticas agrícolas de caráter rural pré-existente ao próprio processo de
urbanização.
Nesse cenário, tal atividade passa a se (re)organizar segundo a lógica
de urbanização, gerando contornos e conteúdos de agricultura urbana, onde a
presença da propriedade privada, na delimitação da posse e no restringir do
acesso inclusive aos recursos naturais, evidenciado na Figura 40, é a marca
principal no entendimento da dinâmica e materialização da agricultura urbana
nessa localidade.
109
Figura 40: Delimitação da propriedade e dos recurso s naturais. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
É importante destacar que se um solo não é cultivado não significa que
não tenha preço, pois este será dado pelos solos vizinhos de semelhantes
características de fertilidade, localização e destino econômico, acrescentando-
se também as melhorias em infraestrutura. Dessa maneira uma região onde os
preços dos solos aumentam, os proprietários que não produzem verão
aumentar os preços de suas parcelas de terra. É essa a causa da especulação
com a terra.
No caso da Zona de Expansão de Aracaju, observa-se que quando o
solo é colocado para produzir, o mesmo muitas das vezes está à espera da sua
venda e conversão de uso e função, ou seja, passa de rural a urbano. Dessa
forma encontramos muitos terrenos com presença tanto de cultivos de vegetais
(Figura 41), que aguardam o momento de sua conversão, como de criação de
gado de grande e pequeno porte em espaços comprimidos, quando não estão
pastando em propriedades de outrem e soltos nas ruas e avenidas.
110
Figura 41: Venda de terrenos na zona de expansão de Aracaju Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
Segundo Foladori (2000) a especulação imobiliária constitui uma clara
causa de (in)sustentabilidade. Subutiliza as vias e os meios de comunicação,
pode aumentar os tempos de transporte, impede a produção de bens, etc. Na
cidade isso é ainda mais visível, por exemplo, zonas novas, antes agrícolas,
são loteadas para construção de moradias, com isso os especuladores
imobiliários compram terra ao preço de suas rendas agrícolas e as vendem ao
preço de suas rendas urbanas, ou seja, uma especulação derivada da
mudança na orientação econômica do solo. O resultado é o crescimento
desordenado da cidade, e consequente aumento do preço de translado das
pessoas, congestionamento dos tráfegos, maiores custos na rede de serviços,
etc; em sua contrapartida, o abandono do centro das cidades, onde prevalecem
os cortiços, apesar de contar com uma infraestrutura instalada.
Segundo Oliveira (2007) a renda de terra e suas diferentes formas
(diferencial I, diferencial II, absoluta e de monopólio) aparecem tanto no campo
como na cidade, onde se materializa a propriedade privada de uma classe ou
fração de classe, ou seja, onde o modo de produção capitalista impere.
No estado de Sergipe ainda é possível verificar características
tipicamente ditas provincianas, em que famílias tradicionais que se mantiveram
no poder há décadas, seja na esfera política ou econômica, e até mesmo no
111
domínio e monopólio das terras continuam ainda hoje mantendo o controle de
muitas das terras sergipanas. As Tabelas 03, 04 e 05, buscam explicitar melhor
essa realidade no município de Aracaju, em que famílias monopolizam as
propriedades fundiárias, cadastradas no INCRA como imóveis rurais no
município de Aracaju.
Tabela 03: Número de imóveis rurais distribuídos por hectare no município de Aracaju, 2008.
Total De 1 a - 5 ha
De 5 a -20 ha
De 20 a -50ha
De 50 a -100 ha
De 100 a -300ha
Número 383 233 108 30 7 5 % 100 60,83 28,20 7,83 1,83 1,31
Área (ha) 3.953,6 565,7 980,7 987,4 538,3 881,5 % 100 14,3 24,8 25,0 13,6 22,3
Fonte: INCRA, informações sobre imóveis rurais, 2008.
A Tabela 03 demonstra a existência de imóveis rurais em Aracaju, o que
traz uma relativização do argumento de que este município é 100% urbano.
Percebe-se na estrutura fundiária de tal município que mais de 60% dos
imóveis rurais tem uma área variando entre 1 e -5 hectares, o que aponta um
número expressivo (233) de imóveis de tamanho relativamente pequeno. Mas é
possível encontrar propriedades (nesse caso cinco) entre 100 e 300 hectares,
mesmo representando 1,31% do total de imóveis, corresponde a 22,3% do total
de áreas cadastradas como imóveis rurais no município de Aracaju.
Esse resultado é de certa forma impactante pois ao se fazer a conversão
de áreas de hectare em quilômetro quadrado, foi constatado que Aracaju
apresenta aproximadamente 39 Km2 (de um total de 174 Km2 segundo o IBGE,
2009), ou seja, aquilo que convencionalmente é tido como característica do
campo brasileiro (concentração e monopolização de terras) está presente no
município, na vida urbana. Logo, essa realidade materializada a partir da
existência de imóveis rurais na cidade conduz, ao menos, a uma reflexão
acerca da relação campo cidade, além do olhar puramente dicotomizado que
há nessa relação.
Há ainda o fato de que esses imóveis rurais muitas vezes têm como
proprietário pessoas ligadas à mesma família, ou seja, o que aparentemente
demonstra uma distribuição de terra, na verdade camufla a concentração de
áreas rurais nas mãos de algumas famílias e/ou construtoras imobiliárias, como
112
pode ser verificado nas Tabelas 04 e 05. Diante do trabalho de campo
desenvolvido e das informações abstraídas da tabela, pode-se afirmar que
grande parte desses imóveis rurais está localizado na Zona de Expansão, o
que é percebido via a grande dimensão de terras ociosas nessa localidade.
Além disso, no cadastro disponibilizado pelo INCRA que consta o nome dos
imóveis rurais e dos seus respectivos proprietários (seja pessoa física ou
jurídica, neste caso as construtoras) foi encontrado nomes de algumas
propriedades que, no trabalho de campo foram detectados nas portas ou
cancelas das propriedades (Figura 23). Fato esse que comprova a veracidade
das informações disponibilizadas pelo INCRA.
Tabela 04: Concentração das propriedades por grupo de famílias e construtoras – 2008
Hectare Barreto Sobral Machado Maynard Construtoras 1 a -5 5 4 4 4 14 5 a -20 4 - 10 2 14 20 a -50 4 1 9 - 3 50 a -100 - 2 - - - 100 a -300 1 - - - - Total (ha) 486,4 194,3 451,4 33,9 243,3 Fonte: INCRA, informações sobre imóveis rurais, 2008.
É interessante destacar que os sobrenomes identificados e que foram
alvos da seleção da Tabela 04, são muitas vezes os mesmos que
historicamente correspondem à personagem da vida política/econômica e
donos de grandes latifúndios, seja na capital ou em todo estado de Sergipe.
Existem outros grupos de nomes de influências locais e regionais que não
aparecem em tal análise, porém não são menos importantes, a exemplo das
famílias Brito, Muniz, Paes Mendonça, dentre outros.
Não se pode deixar de mencionar a presença da família Machado, cujo
sobrenome conecta-se a um dos maiores produtores de coco do Brasil,
(Melício Rezende Machado). Diante do parcelamento de suas propriedades,
muitas ainda pertencem a seus familiares que detém aproximadamente 6% das
propriedades num total de 383 imóveis rurais e 11,4% da área total (3.953.6
ha) que corresponde a tais imóveis, cujas dimensões variam entre 1 a -50
hectares.
Vale ressaltar que a concentração da propriedade privada no município
de Aracaju pode ser ainda maior se levarmos em consideração que muitas
113
propriedades cadastradas, o proprietário da terra é representado, ora como
pessoa jurídica, a exemplo do nome da construtora, ora como pessoa física.
Isso vem demonstrar a força do monopólio da terra no município de Aracaju.
Essa realidade é tão evidente que ao considerar o total de propriedades
vinculadas a essas famílias (Barreto, Sobral, Machado, Maynard) acrescidas
das propriedades das construtoras, tem-se um total de 81 propriedades que
equivale a 21,14% do total de imóveis rurais e 35,6% da área total no município
de Aracaju em 2008.
Tabela 05: Número dos imóveis rurais pertencentes a s construtora em Aracaju – 2008
Hectare Celi Cunha Norcon Cosil
1 a -5 09 02 02 -
5 a -20 09 - 01 03
20 a -50 01 - - 01
50 a -100 - - - -
Total (ha) 117,5 6,5 13,3 59,9
Fonte: INCRA, informações sobre imóveis rurais, 2008.
O mercado imobiliário em Aracaju, nos últimos 10 anos, tem vivenciado
um “boom”, atraindo inclusive construtoras oriundas de outros estados que
começam a se interessar em investimentos na capital sergipana, mesmo tendo
o desafio de enfrentar as concorrentes que se apresentam bem estruturadas.
De certa forma tal setor ainda é monopolizado pelas construtoras e
incorporadoras sergipanas que há anos se destacam no ramo da construção
civil desde os empreendimentos mais sofisticados àqueles cujo valor estima-se
na faixa de 50 mil reais, no chamado “segmento econômico”, para atender o
déficit habitacional. Sendo assim, segundo a Associação dos Dirigentes das
Empresas do Mercado Imobiliário de Sergipe (ADEMI-SE) a Celi e Norcon
detêm 60% do mercado imobiliário da região. A Celi atua tanto em obras
públicas quanto imobiliárias, tem 2,5 mil funcionários, faturamento de R$ 120
milhões e previsão de elevar este montante em 20% em 2008. Com presença
em outras capitais, sendo que 70% de seus negócios estão concentrados em
Sergipe.
114
De acordo com os dados da Tabela 05, baseada no cadastro de
imóveis rurais do INCRA, a construtora Celi é a que possui o maior número de
propriedades (dezenove no total), representando 67,8% dentre as construtoras
destacadas. A mesma ainda detém 59,5% das áreas rurais pertencentes às
construtoras de Aracaju, cujas dimensões territoriais variam de propriedades
com 1 hectare até aquelas de maiores dimensões com -50 hectares.
É diante do exposto que se entende o porquê dos interesses no
monopólio da terra em Aracaju, pois é através do controle e apropriação da
terra pela lógica capitalista na busca incessante pelo lucro, e na observância de
que tais estratégias excedem os rigores territoriais dos espaços rural e urbano,
que é possível compreender a manutenção, há décadas, de tais famílias no
poder, seja no campo ou na cidade. E a partir da compreensão da renda da
terra percebe-se as estratégias dos capitalistas na maximização dos seus
lucros, pois mesmo sem investimento direto, obtêm-se lucros extraordinários e
permanentes, que são pagos por toda a sociedade.
115
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS E SUGESTÕES
A construção do conhecimento é cumulativa, histórica, processual. Deste
modo, o presente trabalho que não tem por objetivo responder e preencher as
lacunas acerca da presença das práticas agrícolas em meio intra-urbano, deixa
margem para continuidades de pesquisa nessa temática, pois só assim será
possível uma tentativa de se compreender a dinamicidade das relações
espaciais (sejam elas urbanas ou rurais) que acontecem na cidade.
A cidade de Aracaju tem vivenciado um intenso processo de
urbanização nos moldes do modo capitalista de produção, capturando sob essa
lógica, áreas circunscritas nos limites legais do perímetro urbano. Este fato
torna evidente o crescimento articulado e fragmentado no que concerne a
cidade construída, consolidada, pois é visível tanto nas áreas centrais quanto
nas periféricas o aumento das edificações, trânsito caótico, violência urbana,
problemas de drenagem, etc. Sendo assim, Aracaju se projeta para o futuro de
metrópole levando consigo os mesmos problemas existentes há décadas
(típicos das grandes cidades brasileiras) e, mais ainda, negando aquilo que
está posto legalmente através da presença de imóveis rurais cadastrados pelo
INCRA, bem como ao que está visível na paisagem urbana: elementos
convencionalmente designados da paisagem rural.
A produção do espaço urbano de Aracaju mescla-se com outras formas
e conteúdos presentes nessa localidade. É evidente que as diferentes práticas
sócio-espaciais desenvolvidas em um mesmo espaço, nesse caso, o espaço
urbano desta cidade, ao longo do tempo, promovem a constituição de distintas
territorialidades. Assim, no município de Aracaju, local de “múltiplas
territorialidades”, presencia-se dinâmicas sócio-espaciais correspondentes aos
usos e as práticas do/no espaço pelos sujeitos locais, segundo cada contexto
histórico especifico, com práticas e/ou atividades agrícolas, cuja dinâmica é
multifacetária.
Faz-se necessário entender o processo de urbanização, enquanto
processo real, pois o mesmo ainda está em curso, e a ideia que se tem de uma
passagem abrupta e instantânea no processo de conversão do uso do solo de
rural ao urbano não se realizou completamente. Sendo assim, nesse processo
histórico visualiza-se as mesclas de sentidos e usos do espaço geográfico, com
116
o entrelaçamento das características outrora antagônicas e singulares dos
espaços rural e urbano delimitadas no próprio município de Aracaju.
Um aspecto relevante a ser considerado é que na prática agrícola
urbana da cidade de Aracaju prevalece o cultivo da frutífera, situação diferente
das identificadas por Resende (2004), Madaleno (2002), Martins (2008), em
que prevalece o cultivo de hortaliças. Contudo vale ressaltar que a presença de
plantas medicinais assume um papel importante e as hortaliças com menor
intensidade. Sendo necessário frisar que a quantidade e a intensidade da
produção agrícola tem relação direta com o tamanho da propriedade que está
destinada a produzir determinado cultivo.
Nessa perspectiva, a agricultura urbana significa uma das formas de uso
e prática no espaço urbano, no processo de produção do espaço geográfico, e
sua existência, muitas vezes, está comprimida nos entremeios do espaço
urbano, sendo permitida pela própria lógica capitalista.
Com o processo de loteamento decorrente da expansão urbana, as
áreas com práticas agrícolas começaram a diminuir. No caso da zona de
expansão de Aracaju, esse fato vem ocorrendo devido principalmente à
disseminação dos condomínios residenciais fechados, com atuação
sincronizada dos poderes público e privado no mercado imobiliário, fato esse
que acarreta na compressão dos espaços “rurais” desta localidade.
Para os demais bairros estudados, a prática da agricultura se restringe
aos limites da própria residência, onde nos exíguos espaços do quintal, do
jardim ou mesmo na lateral da residência, materializam as características e
laços do espaço rural, sejam na presença das frutíferas ou no cultivo de ervas
medicinais. Mas vale destacar que tal prática nos limites municipais de Aracaju,
conforme pesquisa de campo, tem como destino principal o autoconsumo das
famílias.
Durante a investigação, além da presença/remanescência de práticas
agrícolas, aqui denominada de agricultura urbana, percebe-se, na zona de
expansão de Aracaju, que grande parte da prática agrícola ali desenvolvida
significa “o meio justaposto” na busca de se atingir uma finalidade, que é a
maximização do lucro pelo proprietário, através da extração da renda da terra,
via especulação imobiliária e monopólio da terra.
117
A prática agrícola urbana permite uma geração e complementação da
renda familiar, produção de alimentos nutritivos e criação de animais de
pequeno e grande porte, nas diferentes propriedades e mesmo junto às
residências, nos chamados fundos de quintal, de acordo com as
intencionalidades do agricultor. A viabilidade, o auxilio técnico, terra disponível
para a produção, não poderiam ser negligenciadas pelos gestores urbanos no
tocante ao planejamento das cidades.
A produção agrícola urbana na cidade de Aracaju, mais especificamente
em sua zona de expansão, do ponto de vista espacial, apresentou-se
distribuída por quase toda zona, sendo mais perceptível ao longo da rodovia
dos Náufragos, na sua margem direita, onde ao adentrar nos povoados
Mosqueiro, Areia Branca, Matapuã, foi altamente perceptível a interpenetração
dos espaços rural e urbano na contraposição da visão clássica da dicotomia
espacial.
Desta forma a produção agrícola urbana é diferente espacialmente,
quando se considera o recorte proposto neste trabalho, sobretudo nas
características dos espaços de produção, sendo que tais diferenças estão
ligadas aos fatores de ordem social, cultural, econômica, produtiva e espacial.
Para os bairros aqui analisados, a agricultura urbana existe enquanto hábito
cultural, fortalecimento da solidariedade entre vizinhos, estratégia de
complementação alimentar. Para a zona de expansão o entendimento da
agricultura urbana deve ser acrescido de fatores mais ligados à natureza do
solo urbano, tais como especulação imobiliária, renda e monopólio da terra.
Assim sendo, em Aracaju, a agricultura urbana apresenta as seguintes
características:
� Plantios de vegetais em espaços ao longo de rodovias, avenidas,
chácaras, bem como quintais de residências;
� Cultivo de plantas medicinais nas residências como fonte
mitigadora de alguns problemas de saúde;
� Criação de animais de pequeno e grande porte (equinos, bovinos,
caprinos e aves) em terrenos baldios, soltos pelas ruas, próximos
às residências, rodovias e avenidas, em sítios, chácaras e
confinados próximo às margens de rios.
� Atividades pesqueiras desenvolvidas pela comunidade do
118
povoado Mosqueiro nas margens do rio.
Por fim, ao longo da pesquisa foi possível compreender que uma cidade
não deve ser considerada urbana somente a partir daquilo que está
aparentemente mais visível. É preciso olhar a cidade além daquilo que está
posto, que está dito, pois sendo a cidade construída segundo os moldes
capitalistas de produção, ela possui uma materialidade contraditória e
combinada, tendo em vista a permanência de traços e elementos do espaço
rural dentro do tecido urbano que coexistem com outros elementos
relacionados à forma e conteúdos deste espaço.
119
6. REFERÊNCIAS
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125
7. ANEXOS
QUESTIONÁRIO 1. DADOS REFERENTES AO PRODUTOR 1.1. Nome: ............................................................................. 1.2. Idade:............... anos. 1.3. Escolaridade: ( ) Analfabeto ( ) Fundamental incompl. ( ) Fundamental compl. ( ) Médio incompl. ( ) Médio compl. ( ) Superior incompl. ( ) Superior compl. 1.4. Município de origem: .................................. 1.5. Estado de origem: ......................... 1.6. Município que morava antes? .......................................1.7. Estado que morava antes? ....................... 1.8. Anteriormente morava: ( ) na cidade ( ) na área rural 1.9. Condição anterior: ( ) Proprietário ( ) Arrendatário/parceiro ( ) Posseiro ( ) Empregado rural ( ) Empregado na cidade ( ) Outro Qual? ................................. 1.10. Local de moradia:.................... 1.11. Número de pessoas da família que residem no imóvel: Total: ................
Número Número Número
Homens Com 14 anos e menos:...... Entre 14 e 65 anos Com mais de 65 anos: ....
Mulheres Com 14 anos e menos:...... Entre 14 e 65 anos Com mais de 65 anos: ....
1.12 Pretende continuar residindo no local, ou vai para outro lugar? Por quê ............................................... 1.13 Qual a renda média da família? ( ) Menos de 1 SM ( ) de 1 a 2 SM ( ) de 2 a 3 SM ( ) de 3 a 4 SM ( ) de 4 a 5 SM ( ) Acima de 5 SM. 2. DADOS REFERENTES A PROPRIEDADE: 2.1 Qual o tamanho da propriedade? ( ) Menor que 50 m2 ( ) de 50 a 100 m2 ( ) de 100 a 200 m2 ( ) de 200 a 300 m2 ( ) Acima de 300 m2 ….................. especificação. 2.2 Qual o tipo de residência? ( ) Próprio ( ) Arrendada/Parceria ( ) Concedida ( ) Outro ................ 3. UTILIZAÇÃO DAS TERRAS 3.1 Qual o tipo de cultivo na propriedade?...................................................................... É para ( ) mercado, ( ) autoconsumo ( ) ou misto? 3.2 Há quanto tempo cultiva na propriedade? …........................ 3.2 Quais as técnicas utilizadas? ( ) Adubação ( ) Rotação ( ) Rega, quem rega? ...................( ) Outras …............... 3.3 Qual o rendimento em média da atividade agrícola? ….............. 3.4 Em anexo a residência há presença de criação de animal ou algum tipo de planta medicinal? ( ) Sim ( ) Não Se a resposta afirmativa, qual …................. 3.5 A renda atende ao sustento da família? ( ) Sim ( ) Não. Se não, por quê? …........................................................................................................................... 3.6 Quantas colheitas faz por ano? …................................................................. 3.7 Tem plano de continuar cultivando a propriedade? ( ) Sim ( ) Não Por quê? ….................................
126
3.8 Os filhos têm interesse em manter a prática agrícola na propriedade?..................................................................................................................... 4. CONDIÇÕES DA MORADIA DO AGRICULTOR 4.1 Material de construção da casa ( ) madeira ( ) alvenaria ( ) mista ( ) pau a pique ( ) outros.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA
LAERCIO SOUZA SANTANA FILHO
A OUTRA FACE DA PRODUÇÃO DO ESPAÇO EM ARACAJU/SE: O DESENVOLVIMENTO DA
AGRICULTURA URBANA, SEUS IMPASSES E CONTRADIÇÕES
São Cristóvão 2010
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA
LAERCIO SOUZA SANTANA FILHO
A OUTRA FACE DA PRODUÇÃO DO ESPAÇO EM ARACAJU/SE: O
DESENVOLVIMENTO DA AGRICULTURA URBANA, SEUS IMPASSE S E
CONTRADIÇÕES
São Cristóvão 2010
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LAERCIO SOUZA SANTANA FILHO
A OUTRA FACE DA PRODUÇÃO DO ESPAÇO EM ARACAJU/SE: O
DESENVOLVIMENTO DA AGRICULTURA URBANA, SEUS IMPASSE S E
CONTRADIÇÕES
Dissertação de Mestrado apresentada ao Núcleo de Pós-Graduação em Geografia, da Universidade Federal de Sergipe, como requisito parcial à obtenção do Titulo de Mestre em Geografia.
Orientador: Prof. Dr. Celso Donizete Locatel.
São Cristóvão, Maio de 2010.
iv
LAERCIO SOUZA SANTANA FILHO
A OUTRA FACE DA PRODUÇÃO DO ESPAÇO EM ARACAJU/SE: O
DESENVOLVIMENTO DA AGRICULTURA URBANA, SEUS IMPASSE S E
CONTRADIÇÕES.
Dissertação de mestrado submetida à apreciação da banca examinadora constituída pelos doutores:
__________________________________________ Prof. Dr. Celso Donizete Locatel (Orientador) Universidade Federal do Rio Grande do Norte
__________________________________________ Prof. Dr. José Eloízio da Costa (Examinador Interno)
Universidade Federal de Sergipe
__________________________________________ Profª. Drª. Marleide Maria Santos Sergio (Examinador Externo)
Universidade Federal de Sergipe- Campus de Itabaiana
v
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a minha família, que sempre esteve presente ao meu lado em todos os momentos, seja compartilhando as vitórias ou para segurar minhas mãos nos momentos de tribulações. Quero em especial registrar aqui minha gratidão aos meus pais (Laércio e Margareth) responsáveis pela minha educação e ao meu Amor... (Gleise), que sempre esteve comigo nas caminhadas geográficas e extra-geográficas, e que agora somos uma só carne. “a nossa história não acaba aqui, há tantos sonhos pra realizar”. Obrigado! Amo vocês!!!!!!!!!!
vii
AGRADECIMENTOS
Agradeço à Universidade Federal de Sergipe por oferecer o curso de
graduação e pós-graduação em Geografia.
A toda comunidade escolar das Escolas: Escola Estadual Profª. Lucila Moraes
Chaves, Colégio Estadual Olavo Bilac e Colégio Francisco Rosa pela
oportunidade de compreender melhor o real sentido da educação brasileira.
Ao Núcleo de pós-graduação em Geografia, no auge dos seus 25 anos de
fundação, na pessoa do Prof. Dr. José Eloízio da Costa, que com muita
competência conduz e coordena os ensinamentos geográficos e pela confiança
depositada no meu trabalho de dissertação.
Ao meu orientador Prof. Dr. Celso Donizete Locatel pelos ensinamentos dos
saberes geográficos na ampliação dos conhecimentos acerca da geografia
agrária brasileira, e que mesmo a distância sempre esteve presente nas
contribuições, sugestões e paciência nas correções dessa dissertação.
Ao corpo docente do Mestrado em Geografia, em particular a Profª. Drª
Alexandrina Luz Conceição, que me incluiu nas suas aulas e que contribuiu
para minha formação acadêmica no desvelar dos saberes geográficos e a
Profª. Drª. Vera França sempre prestativa e que contribuiu com excelentes
sugestões nos momentos em que me encontrava sem norte geográfico.
Aos meus amigos da pós-graduação Rodrigo (peça fundamental no trabalho de
campo e na formatação da dissertação), Marcos Pereira, Alysson, Alvanira,
Núbia, Adelli, Venozina, Ana Consuelo e muitos outros que contribuíram
através das discussões, conselhos e exemplos de vida. Vocês são muito
especiais pra mim. Nívia (minha querida madrinha e companheira nos estudos
da ciência jurídica) e Danny Jefferson (meu amigo irmão) pelas contribuições
da língua portuguesa e impressão, respectivamente. Não poderia deixar de
destacar meus amigos do doutorado que representaram Vitórias e Conquistas:
Vilomar (Vila) e Adrecksa (Déa), exemplo de família e seres humanos.
Aos colegas de curso, com as contribuições em sala de aula.
A Everton, secretário do Núcleo, que com muita atenção e respeito me atendeu
nos momentos em que precisava dos seus auxílios administrativos.
vii
Aos funcionários das instituições por nós visitadas INCRA, IBGE, SEPLAN pelo
apoio e importante fonte de pesquisa para o desenvolvimento do nosso
trabalho, e em especial a EMURB na pessoa de Gilberto Nunes da Silveira,
brilhante geógrafo que contribuiu no suporte cartográfico presente na
dissertação.
Aos meus pais Laércio e Margareth, peças fundamentais para minha educação
na construção do meu ser, vocês são meus exemplos de seres humanos. Aos
meus irmãos Alysson, Luciana e Luciene e toda a minha família, que mesmo
estando ausente em boa parte da minha jornada acadêmica, sempre
acreditaram em mim. Vocês são especiais para mim.
Ao meu amor, Gleise..., que nos conhecemos ainda crianças..., estudávamos
na mesma escola..., frequentávamos os mesmos ambientes e tivemos a
oportunidade de nos conhecermos melhor, passamos por várias experiências
juntos, sempre juntos, geográficas e extrageográficas, e muitos sonhos pra
realizar, te amo, meu amor.
Aquele que é autor e consumador da minha fé, Deus vivo, presente e
soberano, que sempre me sustenta e me ensina a passar pelos vales e
desertos, confiando no Seu amor para comigo, pois a força que em mim opera
vem do Senhor. Obrigado Pai.
Enfim, a todos aqueles que direta e indiretamente contribuíram na construção
dessa dissertação de mestrado, meu muito obrigado.
viii
LISTA DE FIGURAS
Figura 01: Localização da área de estudo, Aracaju, 2009 9 Figura 02: Propriedade localizada na zona de expansão de Aracaju 24
Figura 03: Fundo de quintal com frutíferas e plantas medicinais 24
Figura 04: Delimitação da propriedade privada na zona de expansão de Aracaju 31
Figura 05: Propriedade localizada próximo ao DIA 32
Figura 06: Elementos ligados à definição da agricultura urbana 35
Figura 07: Propriedade na zona de expansão de Aracaju 38
Figura 08: Presença de frutífera em residência no Bairro Bugio 38 Figura 09: Plantas medicinais cultivadas nos Jardim de residência do Bairro Bugio 40
Figura 10: Consorciamento de cultivos na zona de expansão de Aracaju 40
Figura 11: Brasil Áreas Metropolitanas 43
Figura 12: Plantas medicinais nas propriedades pesquisadas 47
Figura 13: Cultivo de Pimenta 48
Figura 14: Plantas frutíferas identificadas nas propriedades pesquisadas 49
Figura 15. Coleta de pitanga 50 Figura 16: Comercialização dos produtos agrícolas na Av. Poço do Mero, Bugio 67 Figura 17: Comercialização dos produtos agrícolas na Av. Poço do Mero, Bugio 67
Figura 18: Animais pastando nas ruas da zona de expansão de Aracaju 70 Figura 19: Condomínio residencial fechado na zona de expansão de Aracaju 72
Figura 20: Mesclas de sentidos e usos na zona de expansão de Aracaju 76
Figura 21: Residências presente na Zona de Expansão Urbana de Aracaju 85
Figura 22: Residência presente na Zona de Expansão Urbana de Aracaju 85
Figura 23: Chácaras e sítios na zona de expansão de Aracaju 86
Figura 24: Problemas da macrodrenagem na zona de expansão de Aracaju 88
Figura 25: Mapa da Zona de Expansão de Aracaju 90
Figura 26: Afloramento de lençol freático junto a residência 91
Figura 27: Afloramento de lençol freático próximo a rodovias 91
Figura 28: ZEA: Aspectos naturais, presença da ocupação humana e remanescentes de atividades agrícolas
92
Figura 29: Rio Vaza Barris 93 Figura 30: Agricultura urbana na zona de expansão 95 Figura 31: Jornalista Joel Silveira em construção sobre o rio Vaza Barris 96 Figura 32: Infraestrutura na Orla Por do Sol, Povoado Mosqueiro 97 Figura 33: Comercialização das terras na zona de expansão de Aracaju 97 Figura 34: Zona de Expansão de Aracaju: povoado Areia Branca 101
Figura 35: Zona de Expansão: animais pastando próximo a rodovia 102 Figura 36: Agricultura urbana nos bairros Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont 103 Figura 37: Localização dos Bairros Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont 105
Figura 38: Cultivo de bananeira junto à residência no bairro Jardim Centenário 106 Figura 39: Vista aérea da Av. Hildete Falcão, av. Melício Machado e Zona de Expansão 107 Figura 40: Delimitação da propriedade e dos recursos naturais. 109 Figura 41: Venda de terrenos na zona de expansão de Aracaju 110
iv
LISTA DE QUADROS
Quadro 01: Tipologias possíveis para atividades de Agricultura Urbana e Periurbana 36 Quadro 02: Iniciativas de Governos Central, local e de empresas públicas e privadas na promoção da agricultura urbana no Brasil
42
Quadro 03: Indicações de ervas medicinais 45
Quadro 04: Procedência dos citadinos alvos da pesquisa 100
x
LISTA DE TABELAS
Tabela 01: Aracaju, estabelecimentos agropecuários, 2006 75 Tabela 02: Produção pecuária do município de Aracaju, 2008 76
Tabela 03: Número de imóveis rurais distribuídos por hectare no município de Aracaju, 2008.
111
Tabela 04: Concentração das propriedades por grupo de famílias e construtoras 112 Tabela 05: Número dos imóveis rurais pertencentes as construtora em Aracaju 113
xi
RESUMO
A agricultura urbana é caracterizada pelas múltiplas faces produtivas ligadas ao setor agrícola. Assim abrange o plantar e o colher de cereais, hortículas, plantas medicinais e frutíferas, bem como a criação de animais de pequeno e grande porte que servem tanto para o consumo familiar, para a venda a estabelecimentos comerciais ou diretamente nas residências no sistema chamado “porta em porta”. Através do entendimento das práticas agrícolas é possível relacionar outras categorias analíticas, que estão presentes e fazem parte do conceito da agricultura urbana, o que significa que se faz necessário a discussão sobre o conceito de campo, cidade, rural, urbano e agricultura enquanto ponto de partida para a análise das práticas socioespaciais. Com base neste contexto, o objetivo desse trabalho é analisar a manifestação de elementos característicos do rural no espaço urbano de Aracaju, mais especificamente na zona de expansão e nos bairros Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont, levando-se em consideração a prática da agricultura urbana e a presença de alguns elementos do modo de vida rural, desmistificando a dicotomia campo-cidade. O presente estudo fundamenta-se numa ampla pesquisa bibliográfica, a partir de obras que abordam questões teórico-conceituais para o tratamento dos fenômenos rurais e urbanos; na observação in loco, através de trabalhos de campo para levantamento de dados primários, documentação fotográfica, aplicação de questionários, coleta de dados secundárias oriundos da EMURB, INCRA, IBGE e SEPLAN. A análise da prática da atividade agrícola em Aracaju permite retomar a discussão campo-cidade a partir da perspectiva da totalidade e não da dicotômica rural-urbano, assim como possibilita o entendimento de que a atividade agrícola desenvolvida nessas áreas da cidade tem múltiplas dinâmicas e coexistem com outras formas de produção do espaço. Assim, a agricultura urbana praticada na cidade de Aracaju, pode ser entendida a partir da materialidade da produção do espaço, com suas múltiplas faces e significados.
Palavras-chave: Cidade, Campo, Agricultura urbana
.
xii
ABSTRACT
Urban agriculture is characterized by multiple productive faces related to the agricultural sector. Therefore comprehend planting and picking grains, horticultural, medicinal plants and fruits, as well as the breeding of small and large animals that serve both for household consumption, for sale to retail establishments or directly into homes using so called "door to door. " Through the understanding of agricultural practices is possible to lists other analytical categories, which are present and are part of the concept of urban agriculture, which means that it is necessary to discuss the concept of countryside, city, rural, urban and agriculture as a point of departure for the analysis of socio-spatial practices. Based on this context, the objective of this work is to analyze the expression of rural characteristic elements in the urban space of Aracaju, but specifically in the area of expansion and neighborhoods of Bugio, Jardim Centenario and Santos Dumont, taking into consideration the practice of agriculture urban and the presence of some elements of rural life, demystifying the rural-urban dichotomy. This study is based on a wide literature search, from works that discuss theoretical and conceptual issues for the treatment of rural and urban phenomena; on-site observation, through field work for collecting primary data, photographic documentation, application questionnaires and secondary data collection of EMURB, INCRA, IBGE and SEPLAN. The analysis of the practice of agriculture in Aracaju is allowed to resume the rural-urban discussion from the perspective of the enterity, not of the dichotomous rural-urban, as well as enables the knowing that the activity developed in these areas the city has many dynamic and coexist with other forms of production space. Thus, urban agriculture practiced in the city of Aracaju, can be understood from the materiality of production space, with its multiple faces and meanings.
Keywords: City, countryside, Urban agriculture
xiii
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO...................................................................................... 1
1.1 ESTADO DA ARTE............................. ............................................ 5
1.2 RECORTE ESPACIAL DA PESQUISA............... ........................... 7
1.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS........................................ 10
1.4 ESTRUTURA DO TRABALHO...................... ................................. 15
2. AGRICULTURA URBANA: POSSIBILIDADES E DESAFIOS... ......... 17
2.1 PEQUENA HISTÓRIA DA AGRICULTURA URBANA..... .............. 17
2.2 COMPREENSÃO E DIMENSÃO DA AGRICULTURA URBAN A.. 22
2.3 A AGRICULTURA URBANA: TIPOLOGIAS E DEFINIÇÕ ES....... 34
2.4 AS FRUTIFERAS E AS PLANTAS MEDICINAIS NO
CONTEXTO DA AGRICULTURA URBANA..................... ........................
44
3. RELAÇÃO CAMPO CIDADE EM ARACAJU................. ...................... 52
3.1 DA DICOTOMIA ESPACIAL A NOÇÃO DE CONTINUUM. ........... 52
3.2 A PROBLEMÁTICA DO QUE VEM A SER RURAL E URB ANO
NO BRASIL.......................................... .....................................................
59
3.3 AGRICULTURA E ESPAÇO URBANO ............... .......................... 64
4. A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO EM ARACAJU E A
AGRICULTURA........................................ ................................................
81
4.1 O SÍTIO URBANO............................. .............................................. 81
4.2 ZONA DE EXPANSÃO DE ARACAJU: ASPECTOS
GERAIS.....................................................................................................
84
4.3 AGRICULTURA URBANA E A PRODUÇÃO DO ESPAÇO E M
ARACAJU............................................ .....................................................
98
4.4 A RENDA DA TERRA NA ZONA DE EXPANSÃO DE ARA CAJU 108
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS E SUGESTÕES................ ....................... 115
6. REFERÊNCIAS..................................................................................... 119
7. ANEXO................................................................................................. 125
1 INTRODUÇÃO
No reconhecimento de que a cidade tem sido lugar propício para o
desenvolvimento do capitalismo e lugar privilegiado para localização da
indústria, do comércio e dos serviços, ou seja, da produção e da troca,
percebem-se, no campo teórico, interpretações que afirmam a dominação do
urbano sobre o rural, da cidade sobre o campo, este por sua vez, diluído pelo
tecido urbano, com assimilação do rural pelo processo de industrialização da
sociedade ocidental, como se o mesmo precisasse ser recriado ou reinventado.
É pertinente ressaltar o entendimento do rural e do urbano como
espaços diferenciados, porém complementares, que estabelecem relações de
interdependência e interpenetração, mas que guardam peculiaridades
inerentes a cada um.
Com o deslocamento forçado de milhões de pessoas do campo para as
cidades no Brasil, muitos dos grandes centros urbanos não tiveram a
capacidade (ou não foram preparados) para receber essa população,
deixando-os excluídos de uma infraestrutura básica (como educação, saúde,
saneamento básico) e de oferta de empregos. Um dos resultados desse
processo foi a condição sub-humana de existência nas periferias urbanas,
contradizendo inclusive a falsa lógica de que o êxodo rural “libertaria” as
pessoas do atraso do mundo rural e as conduziria à luz e à liberdade da
cidade.
Com isso, observa-se que essa população marginalizada, desprovida de
renda e de perspectiva, busca múltiplas estratégias de sobrevivência, sendo
um dos exemplos as antigas práticas provenientes do espaço rural, de
autoprodução - que é a agricultura urbana, desenvolvida em meio intra-urbano,
capaz de manter a sobrevivência tanto de famílias urbanas de heranças
culturalmente rurais, como aquelas que por necessidade praticam tais
atividades ligadas ao setor primário.
Numa outra condição, ainda no espaço intra-urbano, encontram-se
áreas que são resquícios de explorações agrícolas, as quais existiam antes da
expansão urbana. Com isso, verifica-se a manutenção de explorações
agrícolas em áreas definidas como urbanas que ou estão sendo mantidas com
2
a finalidade de especulação imobiliária, convertendo as terras em loteamentos
e extraindo a renda da terra1 ou em que seus proprietários desenvolvem a
agricultura como fonte de renda, seja principal ou complementar.
Sendo assim, esta pesquisa nasce da necessidade de se analisar as
manifestações de práticas e elementos do modo de vida tipicamente rurais na
cidade, ressaltando as dificuldades em se definir e delimitar o que é rural e
urbano no Brasil, mais especificamente no município de Aracaju, tendo como
base empírica a chamada Zona de Expansão de Aracaju (ZEA), mais
conhecida como Mosqueiro, localizada na região sul da capital, e alguns
bairros localizados no noroeste da cidade (Bugio, Santos Dumont e Jardim
Centenário), em que famílias persistem com práticas agrícolas comuns à zona
rural, expressas na paisagem urbana, através da denominada agricultura
urbana.
Em função de se analisar esse processo considerado um impasse, no
sentido de que a agricultura urbana na cidade de Aracaju, representa não só a
estratégia ou alternativa que a população busca na obtenção de alimentos mais
saudáveis, seja pela presença de frutíferas e ervas medicinais, ou mesmo na
criação de animais de pequeno e grande porte, mas também na ambivalência
entre o processo de valorização fundiária, decorrente do capital especulativo
imobiliário, e da resistência dessa prática, em sua face demonstrada pela
mercantilização da terra, produto do processo de metropolização de Aracaju.
As contradições do espaço se materializam, principalmente na zona de
expansão, em decorrência dos interesses dos sujeitos que operam nessa área
e que produzem o espaço, mas cujo caráter de segregação sócio-espacial é
uma evidência incontestável como produto em movimento, ou seja, as práticas
agrícolas desenvolvidas em micro-espaços, com criações de animais, frutíferas
residuais, ervas medicinais, são marcas comuns da agricultura urbana.
A abordagem conceitual, isto é, o resgate dos conceitos de rural e
urbano foi o caminho escolhido para se destacar e explorar a presença de
traços e de práticas agrícolas presentes em áreas urbanas, como forma de
1 Segundo Oliveira (2007), a renda da terra é um lucro extraordinário, suplementar, permanente, que ocorre tanto no campo como na cidade. Lucro esse apropriado pelo capitalista acima do lucro médio, sendo a compreensão desse conceito de fundamental importância no entendimento da realidade agrária e mesmo urbana, pois em ambas tem na terra um componente importante.
3
produção do conhecimento geográfico, buscando dar uma contribuição, mesmo
que de forma incipiente, à discussão epistemológica.
A agricultura urbana (AU) é compreendida como a prática agrícola ou
pecuária que se desenvolve, em geral, dentro da cidade ou em seu entorno,
por moradores-produtores que ocupam espaços vazios existentes na área,
dentre os quais estão os fundos de quintais e jardins de suas próprias
residências, terrenos baldios, próprios ou públicos. Tal prática absorve mão-de-
obra local, em sua maioria familiar, normalmente dissociada das relações
típicas capitalistas (assalariadas), gerando dessa forma estratégias rentáveis e
empregatícias, com produção de alimentos para consumo próprio e para o
mercado, contribuindo para a segurança alimentar.
A agricultura urbana é um tema complexo e instigante na perspectiva
geográfica, uma vez que pode proporcionar à sociedade, se praticada de forma
racional, certo equilíbrio ao ecossistema urbano. Contraditoriamente é um tema
pouco estudado na Geografia, visto que a maioria das produções acadêmicas
elenca a temática do desenvolvimento urbano-industrial moderno como último
estágio no processo de amadurecimento do capitalismo, em que a expansão
urbana acabaria dissolvendo todo foco de práticas tradicionais do mundo rural.
Pode-se reconhecer o processo de urbanização como um fenômeno
mundial, visto que a universalização das trocas, sedimentada basicamente no
espaço da cidade, aproxima países e aprofunda a divisão espacial e
internacional do trabalho. Levando-se em consideração que a cidade é o palco
das maiores manifestações do construído, em que o novo e o velho convivem
lado a lado e fazem parte do mesmo tecido urbano (paisagem urbana), não se
pode negligenciar a presença mesmo que camuflada/sufocada pelas ondas do
moderno, de práticas e manifestações, típicas do mundo rural presentes no
espaço urbano.
Em meio aos constantes processos de transformações tanto do campo
quanto da cidade, considera-se que estudos sobre essa problemática partindo
do nível intramunicipal são pertinentes, sobretudo porque surgem, cada vez
mais, novas configurações na organização espacial dos municípios, que devem
ser avaliados paralelamente à elaboração de planos e projetos de
desenvolvimento mais amplos.
4
É notório também, para além da dimensão física e visível (formas), a
manifestação do rural dentro do urbano através de elementos comuns ao
campo (como a própria agricultura e o modo de vida) dentro da cidade -
pensada em sua totalidade, entendendo o campo e a cidade como parte da
mesma trama territorial, não como opostos, mas sim como espaços
complementares, resultantes de um mesmo processo de produção do espaço
geográfico.
Apesar do desconhecimento e descrédito atribuídos às práticas de
agricultura urbana, inclusive na comunidade acadêmica e também órgãos
públicos, é necessário uma maior atenção sobre essa prática. Diante do
exposto e reconhecendo a validade do estudo sobre agricultura urbana no
âmbito da Geografia, pretende-se dar respostas as indagações ainda não
devidamente respondidas que surgem na atualidade, além de contribuir na
construção do conhecimento científico, no exame de práticas presentes no
meio intra-urbano.
Ao abordar essa temática algumas indagações surgem para nortear a pesquisa, a saber: • Há de fato agricultura no espaço urbano de Aracaju? Observada a
presença deste fenômeno, qual sua importância enquanto estratégia na
reprodução das unidades familiares que a praticam?
• Quem são os agricultores urbanos de Aracaju e o que representa essa
prática econômica na composição da renda familiar?
• O Município de Aracaju é totalmente urbano, como define o Plano
Diretor, e a despeito dessa realidade ainda há propriedades e
estabelecimentos rurais, assim como usos e funções não-urbanos no
município?
• Será que a agricultura urbana tem favorecido a manutenção da
especulação imobiliária juntamente com os agentes do setor imobiliário
e da indústria da construção civil, presentes na zona de expansão?
Pretende-se com este trabalho analisar a manifestação de elementos
característicos do rural no espaço urbano de Aracaju, levando-se em
consideração a prática da agricultura urbana e a presença de alguns
elementos do modo de vida rural, desmistificando a dicotomia campo-cidade.
5
Para a operacionalização da pesquisa, o objetivo principal foi
desdobrado em outros específicos, quais sejam:
• Analisar a funcionalidade da agricultura urbana.
• Discutir o conceito de rural e urbano utilizado na Geografia, no Brasil e
as interações campo-cidade presentes em Aracaju.
• Abordar questões referentes ao capital imobiliário e a renda da terra.
• Analisar a existência de elementos característicos do espaço rural que
são conservados e reproduzidos pela população urbana de Aracaju que
estão envolvidos como a atividade agrícola urbana.
• Levantar a produção agrícola do município de Aracaju, destacando as
práticas mais significativas na caracterização da agricultura urbana,
além de identificar a diversidade de plantas e animais criados nos
quintais das residências que praticam a agricultura urbana.
Para melhor dimensionar o objeto dessa pesquisa faz-se necessário
considerar o estado da arte que o envolve, o recorte territorial adotado e os
procedimentos metodológicos utilizados para a operacionalização desse
trabalho.
1.1 ESTADO DA ARTE
Com o intuito de verificar em que estado se encontra o conhecimento
científico acerca da discussão da agricultura urbana, é pertinente conhecer de
que forma essa temática vem sendo discutida, ou seja, é preciso que se
conheça o estado da arte, visto que este serve de suporte na compreensão do
fenômeno, logo dos estudos particulares, neste caso, da agricultura urbana.
Faz-se também necessário salientar como a cidade é compreendida,
pois cidade e urbano muitas vezes são considerados como sinônimos, o que
nos obriga a precisar como esses conceitos são entendidos. As considerações
estão apoiadas na definição proposta por Henri Lefebvre (1969) que
caracteriza cidade como um espaço-tempo, uma realidade presente, imediata,
um dado prático-sensível (material), arquitetônico, mas ao mesmo tempo em
que tem presente uma estrutura social (sensível), é um pedaço do conjunto
social e “incorpora na matéria-sensível, as instituições, as ideologias”. É
6
composta paradoxalmente pelos espaços desabitados e mesmos inabitáveis. E
que “o ‘habitat’ não constitui a cidade e que ela não pode ser definida por essa
função isolada” (Lefebvre, 1969, p. 60). Ela é a ‘mediação entre as mediações’,
contém a ordem próxima e está contida na ordem distante. A cidade como
mediação, é o local onde se manifestam as contradições da sociedade,
principalmente as relacionadas aos grupos diversos e ao poder político. Não
podendo ser concebida enquanto um sistema significante, fechado, isolado.
Contendo a ordem próxima, ela a mantém, sustenta relações de produção e de propriedade; é o local de sua reprodução. Contida na ordem distante, ela a sustenta; encarna-a, projeta-a sobre um terreno (o lugar) e sobre um plano, o plano da vida imediata; a cidade inscreve essa ordem, prescreve-a, escreve-a, texto num contexto mais amplo e inapreensível como tal a não ser para a mediação. (LEFEBVRE, 1969, 47).
Em relação ao conceito de urbano, Lefebvre (1986) apud Silva (2006),
destaca que este não designa puramente a cidade e a vida na cidade, nem
coincide com a polis (cite) e nem com a cidade medieval, mas as substitui,
englobando-as. O urbano pode ser entendido como o espaço onde se
desenvolve a modernidade e a cotidianidade no mundo moderno, a forma atual
da simultaneidade, da unidade, da reunião, da convergência e do encontro.
Embora o urbano não dispense uma base prático-sensível, uma morfologia, ele
não pode definir como apegado a essa, por outro lado ela não é algo que se
pode separar dela.
Além dessa discussão, também serão utilizados os conceitos de cidade
e campo, rural e urbano a partir da obra de autores a exemplo de Ferrão
(2000), Reis (2005), que discutem questões relacionadas a dicotomia espacial
e a noção de continuum, de Carneiro (1998) que aprofunda os debates
referentes ao rural e urbano. A discussão realizada por esses autores está
atrelada às mudanças a partir da segunda metade do século XX, chamando a
atenção para uma nova ruralidade, e de como o ritmo de mudanças nas
relações sociais e de trabalho no campo vão dirimir as noções de rural e
urbano. Alentejano (2000), que faz contraposição à visão do “novo rural” e
Carlos (2004b), que analisa a relação campo-cidade em sua articulação, na
perspectiva da contradição centro/periferia. Maia (2003) e Rezende (2004),
7
dentre outros, conduzem a discussão a partir da manifestação do mundo rural
na cidade.
1.2 RECORTE ESPACIAL DA PESQUISA
Aracaju, ao longo de sua formação, foi e tem sido estudada por
diferentes ramos da ciência, interessados em compreender melhor o seu papel
no conjunto da economia sergipana e, sobretudo sua inserção no sistema
urbano brasileiro: Porto (1991) França (1988,1997), Loureiro (1983), Ribeiro
(1989), Machado (1990), dentre outros, estando esses estudiosos voltados
para a caracterização interna da cidade, sua evolução e estruturação urbana,
bem como questões de organização regional.
Aracaju constitui-se num centro sub-metropolitano ou capital regional
brasileira dentre os municípios sergipanos, desponta enquanto capital sua
primazia urbana consolidada em relação às demais cidades a ela subordinada,
sendo detentora, segundo França (1997, p. 68) das maiores variações relativas
da população urbana (1980-1991), apresentando taxas de crescimento
superiores às do conjunto urbano do estado e bem expressivas do que as do
total da população, conforme destaca França (1997). Para
O rápido crescimento da população dá-se concomitantemente a um processo de esvaziamento do campo sergipano, sobretudo em decorrência da pecuarização, da concentração da terra e, em determinadas áreas, da modernização da agricultura. Aracaju passa a ser o principal centro de atração das populações que migram do campo e das cidades do interior. (FRANÇA, 1997, p. 60).
O município de Aracaju abrange uma área de 181,8 Km2, circunscrito na
mesorregião Leste Sergipano, delimitada pelas coordenadas geográficas de
10º 55’ 56” de latitude sul e 37º 04’ 23” de longitude oeste. Faz fronteira em sua
porção norte, com o município de Nossa Senhora do Socorro, tendo como
divisa o Rio do Sal: na porção sul, limita-se com o município de Itaporanga
D’ajuda, que são separados pelo rio Vaza Barris, com a atual construção da
ponte ligará a capital a praia da Caueira; no sentido oeste, faz fronteira com os
8
municípios de São Cristóvão e Nossa Senhora do Socorro e a leste é banhado
pelo rio Sergipe e pelo oceano Atlântico.
Para a verticalização da pesquisa tomar-se-à como base empírica a
chamada Zona de Expansão de Aracaju (ZEA), mais conhecida como
Mosqueiro, localizada na região sul da capital, e alguns bairros localizados no
noroeste da capital (Bugio, Santos Dumont e Jardim Centenário), locais em que
se verifica a ocorrência da prática agrícola com maior intensidade no município
em questão (Figura 01).
9
Figura 01: Localização da área de estudo, Aracaju, 2009. Fonte: EMURB – Empresa Municipal de Urbanização de Aracaju Digitalização: Gilberto Nunes
10
1.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Para concretização dos objetivos, torna-se necessária a caracterização
geográfica da área de estudo, através da integração dos fatos sociais,
históricos, econômicos, culturais e ambientais, tendo em vista uma melhor
apreensão da realidade material em análise, respeitando as particularidades
dos fatos anteriormente destacados.
Para construção de um referencial teórico consistente e basilar, o
presente estudo fundamenta-se numa ampla pesquisa bibliográfica, com
ênfase nas teorias originárias de diferentes ramos das ciências humanas, em
especial a Geografia, que debatem questões teórico-conceituais para o
tratamento dos fenômenos rurais e urbanos na atualidade, buscando um
melhor entendimento de suas interações, contidas em dissertações de
mestrado, teses de doutorado, artigos científicos, revistas especializadas e
livros.
Cabe ressaltar a escassez de material no âmbito da Geografia que
aborde a temática da agricultura urbana, sendo necessário dialogar com outras
áreas do conhecimento, a exemplo da economia, agronomia, sociologia.
Porém, não se pode deixar de frisar as contribuições dos autores que
serviram de referência e se coadunaram no suporte e elo para a discussão da
produção do espaço, as transformações do espaço urbano de Aracaju, a
relação campo-cidade e o desenvolvimento da prática da agricultura urbana:
Lefebvre (1969), Carlos (1999; 2004), França (1988; 1997), Madaleno (2001;
2002), Maia (2003; 2007), Locatel (2004), dentre outros, que somados
promoveram a efervescência científica na contribuição para a leitura da
realidade, não de forma a aplicar determinados modelos prontos e acabados,
mas fazer de forma coerente as relações entre a teoria geral e a realidade
material-sensível.
A agricultura urbana exercida no espaço intra-urbano de Aracaju, escapa
ao controle estatístico oficial, razão pela qual o nosso projeto de investigação
inclui observação in locus, através de trabalhos de campo para levantamento
de dados primários, documentação fotográfica, entrevista semi-estruturada e
aplicação de questionário.
11
Foi utilizado também como procedimento metodológico o uso de
fotografia, com o objetivo de identificar elementos para a caracterização e
compreensão da prática agrícola no espaço urbano de Aracaju. Foram
registradas imagens fotográficas, em especial nas localidades onde se
desenvolveu a análise empírica, para subsidiar, desta forma, o aprofundamento
das discussões acerca da problemática abordada.
As áreas identificadas com agricultura urbana em Aracaju durante a
pesquisa foram classificadas em dois grupos que são: Grupo 01: as áreas
localizadas na porção noroeste da cidade, em que a densidade demográfica é
elevada com alto grau de ocupações dos espaços, representando as áreas
periféricas, cuja prática se dá juntamente às residências, nos chamados fundo
de quintal, com cultivos de frutíferas e plantas medicinais em vasos e canteiros;
Grupo 02: refere-se a zona de expansão urbana de Aracaju, que está
localizada no extremo sul da cidade. Representa atualmente a maior reserva
de solo urbano da cidade, em que se mesclam paisagens típicas do rural e do
urbano. Sendo que, em ambas as áreas a agricultura urbana se reproduz,
mesmo sem apoio institucional.
A escolha dessas áreas no município de Aracaju deve-se a principio, no
tocante a chamada zona de expansão, às visíveis marcas na paisagem que
denotam traços fortes do rural, refletidos pela presença da criação de animais
de pequeno e grande porte, que compartilham esses espaços com as
diferentes formas de ocupação e pela permanência do cultivo de coco,
reacendendo a questão da dicotomia espacial entre rural e urbano. Para as
áreas localizadas no noroeste deve-se à facilidade de coleta de informação,
pelo conhecimento e convívio diário com a geografia dessa localidade.
Acerca da tipologia que abarca o conceito de agricultura urbana e
periurbana (AUP), conforme Santandreu e Lovo (2007) nota-se que ela pode
ser realizada em espaços públicos e privados dentro do perímetro urbano e
ainda no espaço periurbano de um município. Para a exiquibilidade da
pesquisa foi adotada uma tipologia que venha a caracterizar a diversidade de
espaços possíveis de serem utilizados com a prática da AU no espaço intra-
urbano de Aracaju, mais especificamente em sua zona de expansão urbana e
alguns bairros do noroeste da capital.
12
O intenso debate sobre a definição dos limites entre o urbano e
periurbano e entre este e o rural abrange uma diversidade de posições teóricas
e está longe de se atingir um consenso para uma definição universal. Este
debate se refletiu na dificuldade em definir a abrangência das práticas agrícolas
no espaço urbano pesquisado, mas se optou pela AU de base intra-urbana, ao
invés de adentrar na complexa, mas não menos importante agricultura
periurbana.
Para tanto, foram aplicados 30 questionários com as famílias que
desenvolvem a agricultura urbana, com o objetivo principal de subsidiar a
análise qualitativa referente às características socioeconômicas e
caracterização do espaço em que são desenvolvidas as práticas de agricultura
urbana. É importante destacar que a aplicação dos questionários foi cessada
em virtude da repetição das respostas nas localidades pesquisadas e de
acreditar ter obtido informações cruciais para o entendimento da agricultura
nessas áreas da cidade. A definição da amostra para a aplicação dos
questionários com os agricultores foi de forma aleatória e não probabilística,
uma vez que o trabalho prima por uma análise qualitativa e não quantitativa.
Vale salientar a dificuldade em aplicar os questionários na zona de
expansão de Aracaju, pois o acesso ao proprietário foi dificultado, primeiro pela
grande dimensão das propriedades e ausência dos proprietários nas mesmas,
nos momentos da investigação. Sendo assim, foi realizado registro fotográfico
tanto das propriedades, bem como da presença dos animais, confinados ou
soltos pelas ruas e avenidas. Foi estabelecida uma relação entre os dados
oriundos do IBGE, no tocante a produção agropecuária municipal, com a
investigação de campo e tais registros.
Os dados de fontes secundárias foram obtidos junto a FIBGE, a partir de
publicações tais como Censo Agropecuário, Produção Agropecuária Municipal,
INCRA, a partir do Cadastro de Imóveis Rurais de Aracaju, EMURB e SEPLAN.
A primeira vista é um tanto paradoxal combinar os labores e paisagens
típicas do mundo rural ao meio urbano; todavia, apesar de ser uma expressão
recente, a agricultura urbana, na acepção da palavra, designa uma atividade
bem antiga, referente às atividades para produção de bens alimentares, sejam
de origem animal ou vegetal, bem como outras espécies úteis ao homem,
através da reutilização de resíduos sólidos e de águas residuais, promovidos
13
nos espaços intra-urbanos ou na periferia das manchas construídas, em
cidades das mais variadas dimensões.
As técnicas de coleta de dados utilizadas visam a realização de um
estudo de caso, passível de comparação com outras pesquisas similares
efetuadas em diferentes cidades, por outros pesquisadores. A aplicação de
questionário destina-se ao levantamento da agricultura urbana praticada em
Aracaju, destacando também as práticas preexistentes ao próprio processo de
expansão urbana ocorrido nesses bairros da cidade. Para a Zona de Expansão
foi utilizada na identificação dos locais com presença de agricultura, a carta de
Zoneamento Urbano Ambiental, elaborada pela GEO Consultoria e Serviços,
na escala de 1:30000, no ano de 2000.
A partir daí seguiu-se um roteiro estabelecido, focando as áreas
destacadas na carta de Zoneamento, na qual se visualizou o que se entende
por Zona Residencial pré-urbana com funções comerciais, industriais, turísticas
e de serviços, bem como a Zona de Moradias individuais, sítios e chácaras,
condomínios e loteamentos residenciais licenciados, ocupados e em processo
de ocupação.
Nessa perspectiva, foi iniciada a visitação de caráter exploratório na
investigação sobre a agricultura urbana, bem como no destaque das práticas
agrícolas preexistentes ao próprio processo de urbanização. Foi plausível a
orientação pela rodovia dos Náufragos, mais especificamente sua margem
direita que antes mesmo de adentrar nos Povoados Areia Branca, Matapuã e
Mosqueiro, os quais se conectam a tal rodovia, foi visível uma paisagem que
guarda traços muito fortes com um passado estritamente agrícola, seja pela
presença da cocoicultura, seja pelas casas antigas, isoladas na paisagem,
contrastando com os condomínios horizontais fechados, principalmente na
Aruana e chácaras com alto grau de sofisticação.
Outra fonte importante na busca de informações sobre os problemas
vivenciados pelos moradores da ZEA foi pesquisada nos arquivos disponíveis
em meios digitais do Jornal da Cidade, vinculados ao site do Conselho das
Associações de Moradores da Zona de Expansão de Aracaju (COMBAZE).
Para os bairros Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont, localizados
no noroeste da capital, seguiu-se uma trajetória de exploração focada na busca
de práticas agrícolas desenvolvidas principalmente junto a residências, no
14
chamado fundo de quintal, na manutenção das frutíferas e plantas medicinais,
buscando compreender a permanência e a funcionalidade de tais práticas.
Com relação ao método de amostragem espacial, ele é indicado
especialmente para proceder a estudos sobre a forma de uso e ocupação do
solo, sempre que não seja possível recorrer a completos e abrangentes
levantamentos aerofotogramétricos e ao tratamento digital pelo Sistema de
Informação Geográfica (SIG), o que justifica a escolha do método aplicado.
Somam-se à pesquisa, o método de amostragem estratificada, em que
vamos procurar representar as distintas camadas socioeconômicas nas
diversas áreas pesquisadas, merecendo especial atenção os seguintes fatores:
aos tamanhos das respectivas propriedades, a densidade da população e a
relação com o restante da cidade, sempre procurando estabelecer a devida
proporcionalidade relativas às dimensões humana, social e espacial de cada
área pesquisada (Ferreira e Simões, 1987, apud Madaleno, 2002).
Em relação aos questionários, tem-se a possibilidade de analisar melhor
a origem geográfica dos sujeitos pesquisados, o nível de escolaridade, a faixa
etária e distribuição por sexo, a composição familiar, alguns de seus hábitos, e,
sobretudo a produção de alimentos nos espaços intra-urbanos, destacando os
principais produtos, a presença de plantas medicinais e/ou ornamentais, os
animais criados, as técnicas e métodos de cultivos praticados. Esse
procedimento possibilitou uma melhor compreensão acerca da agricultura
praticada em Aracaju, bem como do porquê da permanência dessas atividades
nos espaços em que são praticadas.
Apoiado num modelo interativo da análise dos dados, foram realizadas
coletas tanto nas instituições públicas do Estado como também in locus, de
forma a permitir uma interpretação coerente das variáveis pesquisadas.
Entende-se que a sistematização das respostas dos sujeitos pesquisados, e
posterior tratamento quantitativo, num formato consistente e reflexivo, conduziu
a uma melhor percepção da realidade no tocante à prática e à presença da
agricultura urbana em Aracaju.
As entrevistas semi-estruturadas foram realizadas no próprio local de
moradia dos sujeitos envolvidos com AU, com a finalidade de obter
informações cruciais sobre a vida na relação com o espaço urbano, o trabalho
15
desempenhado, as possibilidades e perspectivas acerca da prática agrícola no
contexto do urbano e seu relacionamento com a vizinhança e a cidade.
A combinação entre a observação da realidade, os questionários e as
entrevistas aos diferentes sujeitos, estas complementadas pelas fontes
bibliográficas sobre a temática em tela e do meio estudado possibilitou
compreender a agricultura urbana e as problemáticas relacionadas à dicotomia
espacial entre o rural e o urbano.
1.4 ESTRUTURA DO TRABALHO
O presente trabalho estrutura-se em três capítulos, além dessa
introdução. Inicia-se com a introdução da temática abordada: a agricultura
urbana e a elucidação das questões motivadoras dessa pesquisa, o recorte da
área de estudo e a metodologia adotada para o desenvolvimento do trabalho.
O primeiro capítulo objetiva trazer para o debate o conceito de
agricultura urbana com suas possibilidades e desafios, apresentando sua
importância, funcionalidade, principais produções no Brasil, atuação e papel do
Estado na legitimação da agricultura urbana, aspectos econômicos, sua
relação com a segurança alimentar e da biodiversidade. Para fundamentação
teórica as produções da Revista Agricultura Urbana e, principalmente, as
contribuições de Maria Madaleno e Mougeot, serviram de suporte teórico para
sustentar a defesa da existência da agricultura urbana em Aracaju.
O segundo capítulo visa a discutir os conceitos de campo e cidade, rural
e urbano, a partir dos principais debates proporcionados pela sociologia e
geografia, de forma processual, cujo balizamento inicial é a revolução
industrial. Dentre as leituras proporcionadas por diferentes autores, a que mais
se coaduna com a perspectiva de pensamento aqui proposto é o lefebvriano,
sobre a produção do espaço e o “direto à cidade”.
No terceiro capítulo é apresentado o recorte territorial escolhido, qual
seja a zona de expansão de Aracaju e os bairros Bugio, Jardim Centenário e
Santos Dumont localizados no noroeste da capital; assim, para elucidação da
discussão em torno da relação campo-cidade e da prática da agricultura
urbana, foi feita uma caracterização geral da área, apresentando os diferentes
16
aspectos geográficos, bem como o destaque dos atuais e principais problemas
vivenciados pela população de tais localidades.
Ainda no terceiro capítulo, buscou-se destacar empiricamente a
Agricultura urbana em Aracaju, chamando a atenção para a diferenciação das
práticas agrícolas preexistentes, a exemplo da cocoicultura, apresentando os
resultados do trabalho de campo, com resultados de população e da produção
agrícola. É bom frisar que os dados aqui apresentados não se coadunam por
completo e também não fazem parte, muitas vezes, do banco de dados dos
órgãos oficiais na elucidação da prática da agricultura urbana. É importante
salientar a importância de se fazer a ponte entre a teoria geral que dá suporte
ao entendimento do nosso objeto de estudo, com o esforço para não
desconfigurar a realidade material-sensível.
Por último são apresentadas as considerações finais e sugestões, na
continuidade do estudo acerca da prática da agricultura urbana. Assim, é
esperado que a mesma possa servir de subsídio no entendimento da produção
do espaço do município de Aracaju e seja levada em conta na formulação de
políticas públicas ligadas ao planejamento urbano, no tocante a minimizar os
impactos relacionados à segurança alimentar. E que a partir dessa pesquisa
outras surjam e possam dar continuidade para um melhor entendimento da
produção do espaço urbano e a relação deste com a agricultura.
17
2 AGRICULTURA URBANA: POSSIBILIDADES E DESAFIOS
O presente capítulo traz uma discussão teórica acerca do conceito de
agricultura urbana, abordando sua evolução, seus elementos determinantes,
tipologias presente no meio intra-urbano, suas dimensões e compreensão da
agricultura urbana, bem como seus desdobramentos no tocante à natureza do
solo urbano, com ênfase no recorte espacial escolhido, a saber: a Zona de
Expansão urbana localizada no extremo sul da capital sergipana e os bairros
Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont.
2.1 PEQUENA HISTÓRIA DA AGRICULTURA URBANA
A agricultura urbana constitui-se como um fenômeno socioeconômico e
espacial crescente nas cidades dos países industrializados centrais, bem como
nos países periféricos. Para os primeiros, constitui um sistema de produção
importante e competitivo; já para os segundos, revela-se como estratégia de
sobrevivência dos mais pobres, na medida em que fornece alimento e emprego a
uma parcela significativa da população (MADALENO, 2002).
Tal fenômeno não obteve crédito junto aos estudiosos antes da década de
1960, por se conceber o urbano e rural como espaços não só totalmente
diferentes, mas, sobretudo, divergentes. Porém, alguns pesquisadores trazem o
entendimento, enfatizando que, apesar de quase ausente das cidades após a
revolução industrial, a agricultura prevaleceu dentro e na orla das mesmas desde
tempos imemoriais (MOUGET, 1994 apud MADALENO, 2002).
Nas cidades africanas, a agricultura urbana constitui-se enquanto
complemento de renda familiar e importante fonte de proteínas e vitaminas, pelo
fato de enriquecer a dieta diária de parcela não desprezível da população, mas
tem sua principal relevância pelo aproveitamento de recursos disponíveis nos
espaços intra-urbanos, em consonância com as recomendações feitas na Cimeira
da Terra, durante a Rio 92, denominada Agenda 21, documento que relata que as
atividades econômicas diversificadas devem ser desenvolvidas em meio urbano a
fim de diminuir a pobreza e de promover o reequilíbrio ecológico dos
assentamentos humanos (MADALENO, 2002).
18
Nesse contexto, as instituições internacionais de cooperação e
desenvolvimento vêm creditando e legitimando cada vez mais a produção das
atividades primárias entre os citadinos, sendo o foco principal a população menos
favorecida economicamente e as mulheres. Através de redes de serviços e
infraestrutura, apoio técnico e financeiro, somados ao esforço conjunto das
comunidades, bem como da remoção de barreiras legais às atividades informais,
nota-se o objetivo de melhorar a qualidade de vida urbana.
A agricultura urbana, atividade econômica do setor primário, pode ser
praticada em pequenos espaços vazios existentes dentro do tecido urbano, ou em
espaços situados na orla da cidade, denominação dada aos espaços periurbanos.
Há autores que denominam de periurbana aquela em que a agricultura é
praticada na periferia da cidade e urbana as desenvolvidas nos espaços
interiores, mas não edificados da mesma; entretanto as duas concepções são
aceitas, generalizando-se a expressão urbano a ambos os espaços.
A designação agricultura urbana abarca um sem número de formas de exploração agrícola que vão do cultivo intensivo dos quintais privados, ao plantio de uma associação de diversas espécies vegetais à beira das estradas e caminhos, passando pela ocupação, quantas vezes ilegais, de lotes urbanos vazios, pelo cultivo em vasos e recipientes dos mais diversos feitos nas varandas, terraços, em pátios, nas caves, nas paredes de estruturas construídas, ate à prática da agricultura hidropônica, da agricultura e das mais ricas e variadas formas de criação de quase todos os tipos de gado (MADALENO, 2002, p. 3).
Essa prática contribui para a produção, processamento e a
comercialização de alimentos e energia, com destino a abastecer a demanda dos
consumidores urbanos. Segundo Madaleno (2002) as contribuições sobre
agricultura urbana têm conhecido consideráveis expansões nas últimas duas
décadas, mesmo com as poucas produções, mas é significativo o acesso
dedicado a esta temática, sendo que o continente mais rico em atividades
primárias em meio urbano é o africano. Foi no Congo, na pequena cidade de
Pointe Noire, que no final da década de 50 o geógrafo Pierre Vennetier de forma
sistemática pesquisou 1013 famílias dentre as quais contou 266 dedicadas à
agricultura urbana, totalizando cerca de 1500 praticantes da agricultura,
cultivando mandioca, milho, amendoim, batata e outros gêneros.
19
A atenção destinada à agricultura urbana nas publicações científicas e
tecnológicas até o final da década de 1960 foi muito escassa. Mas é a partir da
década de 1970 que a agricultura urbana ganha projeção, através de assistência
técnica e financeira adequada, através das intervenções da FAO, do governo dos
países centrais, da UNICEF, na promoção e patrocínio de programas de apoio e
incentivo as atividades de agricultura urbana em alguns países da África
Ocidental, a exemplo de Gana, Costa do Marfim, Zaire e Zâmbia.
A prática agrícola em meio urbano na década de 1970 era vista como
aberrante, ou pelo menos conjuntural, reflexo do intenso êxodo rural
desaparecendo a longo prazo; mas, conforme destaca Madaleno (2002), isso não
ocorreu, em função de a crise econômica resultante da crise do setor petrolífero,
acentuarem os problemas sociais e econômicos. Assim a agricultura urbana,
antes considerada uma anomalia que a cidade acabaria por rejeitar, configura-se
como possibilitadora de soluções possíveis para a mitigação da pobreza urbana.
A agricultura urbana, nos anos 80 do século XX, conheceu um período de
crescimento e destaque em alguns países em desenvolvimento, crescimento
estimulado por organizações internacionais, por meio da incrementação de
programas de cooperação com países pobres na perspectiva de pesquisarem as
características da agricultura praticada em meio urbano, para a expansão das
áreas cultivadas, somadas ao apoio técnico aos pequenos produtores
(MADALENO, 2002).
No que concerne às entidades financiadoras, o International Development Research Centre do Canadá (IDRC) teve um papel de locomotiva em muitos dos programas de pesquisas citados, pois promoveu, a nível mundial, e a partir de 1983, uma série de projetos sobre o uso de resíduos urbanos como insumo agrícola, estudos sobre sistemas de distribuição de produtos alimentares e sobre segurança alimentar. Ao todo foram 30 programas de investigação desenvolvidos em 24 países, nomeadamente latino-americanos, africanos e asiáticos, ao longo de toda década de 1980 (MADALENO, 2002, p 11).
A consolidação da agricultura urbana ocorre nos anos de 1980, superando
as previsões herdadas dos estudos dos anos setenta, segundo os quais esta não
era apenas recurso dos mais pobres e menos instruídos, e sim promotora de
fonte de renda, inclusive dos mais favorecidos economicamente. Tal afirmação é
constatada em algumas cidades que se revelaram auto-suficientes em
20
determinados produtos alimentícios, a exemplo de Singapura, na criação suína,
ou de Bamako, no Mali, na produção de vegetais frescos (MADALENO, 2002).
Nos anos 90 do século XX, a agricultura urbana conheceu sua
consagração, pois aumentaram as publicações dedicadas a este tema, apoiados
pelo uso da internet na divulgação dos estudos locais, regionais, assim como os
programas de apoio técnico e financeiro, tornando-se a temática visível, fazendo
parte das iniciativas das grandes agências de desenvolvimento internacional.
Em relação à América Latina, Cuba apresenta-se com gravíssimos
problemas econômicos, sendo alvo de incentivos externos para a promoção da
prática da agricultura urbana, em que o próprio governo, através do Ministério da
Agricultura, atua na distribuição de sementes aos potenciais cultivadores, pelas
casas de semillas (sementes), dispersas pelas áreas metropolitanas, bem como
pelo incentivo das hortas populares ou comunitárias na capital, apoiados pelo
conselho de igrejas de Cuba e organizações não governamentais, a exemplo da
Green Team e da Organização Internacional Australiana de Permacultura (AOPI)
(CHAPLOWE, 1998, apud MADALENO, 2002).
Em Cuba, a agricultura urbana tem início com a etapa crítica do processo
revolucionário encetado em 1959. Quando ocorreu a queda do socialismo em
outros países no final dos anos 1989 e 1990, e principalmente com a derrocada
da União Soviética, com o qual mantinha laços intrínsecos, dada a
representatividade comercial de seu parceiro, mesmo diante do forte bloqueio
imposto pelos Estados Unidos. Nota-se, ainda, que Cuba não dispõe de recursos
energéticos apropriados e nem capital suficiente, ocasionando um pós
desmantelamento da URSS: forte carência na alimentação, transporte, ausência
de produtos não duráveis como roupas, calçados, agravamento do setor
habitacional, isto é, todos esses aspectos de decréscimo no nível de vida da
população não se coadunavam com os avanços de décadas anteriores.
Neste mesmo período existiam em Cuba pesquisas com utilização de
substratos orgânicos para a produção agrícola, realizadas pelo Instituto de
Investigaciones Fundamentales en Agricultura Tropical (INIFAT), o qual até então
não tinha grande repercussão no país pela grande oferta de produtos
quimicamente produzidos. Mas no momento de crise, tais pesquisadores são
convocados pelo governo cubano no apoio de produção de alimentos sob uma
21
nova ótica, ocasião em que as produções urbana e periurbana de alimentos em
Cuba tomam grande impulso (AQUINO, 2002).
Segundo Aquino (2002), a modalidade de agricultura urbana para a
produção de hortaliças e condimentos frescos foi a primeira atividade realizada
em Cuba, sendo a mais desenvolvida; mas há a presença de outras modalidades
de produção: organopônicos, hortas intensivas, pátios, parcelas, fazendas de
auto-abastecimento e suburbanas. A agricultura urbana pode se estabelecer
também em Unidade Básica de Produção Cooperativa (UBPCs). Nessas UBPCs
há produção de gado, hortas intensivas e minhocultura na mesma unidade. É com
essa realidade que em Cuba
O lugar em que se estabelece este tipo de Agricultura pode ser definido a nível de município ou província, podendo ser um terreno baldio onde antes se jogava lixo, por exemplo, ou ser uma escolha pessoal se tratando de pátios ou quintais. Aquele que recebe a terra paga um pequeno imposto, e quando necessário o governo cubano subsidia a capacidade do mesmo, implantando irrigação e outros meios necessários para se iniciar a atividade [...], o que significa que a agricultura urbana representa uma boa fonte de renda. Em contrapartida, a cobrança para quem detém essa área é muito intensa, se não atender às exigências e não colaborar no atendimento as metas, perde o direito a terra (AQUINO, 2002, p.21).
Diversos centros de pesquisas de alguns países europeus têm incluído em
seus orçamentos a promoção desta atividade econômica em diversos países, a
exemplo da França, por meio da implementação da agricultura urbana em cidades
africanas e asiáticas, do Reino Unido e seus projetos universitários, da Itália na
promoção e apoio do projeto Por-huerta da Argentina, Portugal - através do
programa Práxis XXI financia projetos, como o desenvolvido por Madaleno (2002)
sobre agricultura urbana na cidade de Belém do Pará, e estudo similar em
Presidente Prudente-SP.
A agricultura urbana no Brasil tem muito pouco incentivo por parte do poder
público e, muitas vezes, quando se consegue um apoio político é somente
provisório, pois o interesse partidário (mandatário) varia de acordo com o dirigente
político. Merecem destaque o “Programa de verticalização da pequena produção
agrícola” (PROVE) em Brasília (DF), cujo objetivo é promover a pequena
produção agrícola, seu processamento e comercialização e o “Programa Hortas”
em Teresina (PI), que inicialmente tinha a finalidade de formação e terapia
22
ocupacional de crianças carentes, ampliando-se para toda a família,
principalmente, na zona de expansão do perímetro urbano daquela cidade
(AQUINO, 2007).
2.2 COMPREENSÃO E DIMENSÃO DA AGRICULTURA URBANA
A crescente urbanização pela qual todo o mundo vem passando nas
últimas décadas tem levado a uma necessidade cada vez maior do fornecimento
de alimentos à cidade. Essa necessidade vem sendo (ou tentando ser) suprida,
além do crescente aumento da produção agrícola na zona rural, pela produção de
alimentos na cidade a partir da prática da agricultura urbana ou da agricultura
orgânica.
Enquanto a agricultura orgânica tem por princípio estabelecer um
conjunto de procedimentos que envolve a planta, o solo e as condições
climáticas, produzindo um alimento sadio e com suas características e sabor
originais, a agricultura urbana é definida como sendo a produção de alimentos
dentro do perímetro urbano e periurbano, levando em consideração a inter-
relação homem-cultivo-animal-meio-ambiente e as facilidades da infraestrutura
urbanística que propiciam a estabilidade da força de trabalho e a produção
diversificada durante todo o ano (AQUINO, 2007).
A definição do que vem a ser agricultura urbana, leva em consideração as
múltiplas faces produtivas ligadas ao setor primário, abrangendo dessa forma, o
plantar e o colher de cereais, hortículas, plantas medicinais, frutíferas, bem como
a criação de animais de pequeno e grande porte para a produção alimentícias,
tendo como destino final o consumo familiar ou a venda a estabelecimentos
comerciais ou diretamente nas residências, no chamado comércio 'porta em
porta'.
A agricultura urbana é a equação entre ambientes e sociabilidades urbanas com elementos e sociabilidades do meio rural; revestida de intencionalidades e meios técnicos produtivos peculiares, mas tendo como base os espaços urbanos que nutrem, coíbem e intercalam as práticas agrícolas. As atividades do setor primário nos entremeios da cidade somam e criam, o 'acontecer solidário' entre homens e mulheres, terra e produção
23
e, sobretudo, a materialidade da superfície com a produtividade agrícola nas cidades (MARTINS, 2008, p. 2).
Na agricultura urbana, a produção é bastante limitada quantitativamente,
se comparada com as possibilidades dos setores rurais convencionais, pois o
principal objetivo reside no suprimento, de ao menos parte, das necessidades
alimentares dos agricultores, enquanto o excedente é parte integrante nos
diferentes espaços cultivados e cultiváveis.
É comum, conforme Dinis e Marcelino (2007), nas pequenas unidades,
cujos sistemas produtivos são efetuados nos canteiros e pequenas hortas nos
quintais, o excedente geralmente é vendido para a comunidade da própria
vizinhança, podendo ocorrer que esses alimentos sejam doados aos vizinhos e
conhecidos mais próximos, quando não participar de trocas, o que pode ser visto
como um aspecto cultural dessas localidades.
Nas unidades com maiores dimensões, cujo objetivo é a venda dos
produtos, estes serão comercializados em feiras ou nos comércios regionais, e o
valor de troca do produto é balizado pelas demandas e dinâmicas dos mercados
locais, mas também sofrem influência das especulações presentes na
comercialização da produção oriunda das propriedades convencionais (campo)
(DINIS e MARCELINO, 2007).
Nas áreas pesquisadas, como se pode observar nas Figuras 02 e 03
temos uma variedade de dimensões das propriedades existentes, mesmo estando
inseridas nos limites municipais de Aracaju encontramos grandes reservas de
terrenos com presença da prática agrícola.
24
Figura 02: Propriedade localizada na zona de expans ão de Aracaju. Foto: SANTANA FILHO, L. S, 2009.
Figura 03: Fundo de quintal com frutíferas e planta s medicinais. Foto: SANTANA FILHO, L. S, 2009.
25
Assim como em todo o litoral sergipano durante as décadas de 1970 e
1980, a cocoicultura, segundo França (1991), era muito forte nessa localidade,
mas com a lógica da especulação imobiliária, e posterior conversão das terras de
rural para urbano ocorreu uma retração de sua produção, mas que ainda hoje, na
primeira década do século XXI, somam-se à totalidade da produção do espaço
nessa localidade; percebem-se pequenas propriedades que certamente existiam
e foram inseridas na lógica urbana com o processo de urbanização, mas que
guardam traços de uma vida singular e bucólica, a exemplo das casas muitas
vezes isoladas na paisagem, ou mesmo com o cultivo do caju e criação de
galináceos ao lado da residência.
Nos bairros Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont, percebe-se que a
dimensão das propriedades é justamente o tamanho da residência, que destina
parte dela, seja o fundo do quintal, o jardim na frente da residência ou mesmo a
lateral da casa como local de produção de frutíferas, plantas medicinais ou
criação de animais de pequeno porte.
Para a compreensão da agricultura urbana, além do inter-relacionamento
entre os espaços urbano e rural, outro aspecto relevante faz-se presente, qual
seja a maximização dos usos do ambiente, sobretudo pela reutilização de
resíduos sólidos e de águas residuais, provenientes das atividades urbanas,
utilizados na fertilização de terra e na irrigação dos cultivos, reduzindo os gastos
com a produção. É importante destacar que os elementos que geram benefícios,
quando mal gerenciados, ocasionam problemas ligados à contaminação dos
cultivos, animais e, sobretudo, dos consumidores finais.
Segundo Madaleno (2002), pode apresentar riscos, sobretudo, quando da
utilização de água poluída para irrigação, ou pela ausência de hábitos de limpeza
na boa conservação e utilização dos alimentos, donde surge a preocupação e
fomento na divulgação de tais riscos entre a comunidade mais carente e sua
inclusão no cotidiano escolar.
As variadas limitações observadas na prática da agricultura urbana têm
estimulado a criação de tecnologias para a execução, a exemplo da reciclagem
de resíduos sólidos domésticos e sua utilização na adubação, uso de tanque de
compostagem, reutilização de pequenas superfícies como terraços, varandas,
canteiros etc.
26
Segundo Aquino (2007), para o sucesso da produção agrícola de forma
sustentada nas regiões urbanas ou periurbanas, precisa-se ter a garantia de
fornecimento de insumos orgânicos, o resgate e a preservação de cultivos
adaptados às condições locais, a adequação de novos substratos à produção de
mudas e o uso de defensivos alternativos que não sejam poluentes. Contudo,
para se atingir essas necessidades e evitar ou conter problemas de contaminação
do solo, é urgente, o reconhecimento, pelas autoridades locais, acerca do
problema da agricultura urbana relacionado à contaminação do solo: a resposta
desejada a tal situação não perpassa pela proibição de se produzirem alimentos
nessas áreas e, sim, por criar formas de se buscar ajuda técnica para a produção
segura de alimentos, sem ameaça à saúde, e que possa trazer benefícios
econômicos, dentre outros.
O engajamento dos lares urbanos na agricultura pode ser dividido,
segundo Wilbers et al (2004), em dois cenários. No primeiro, famílias se deslocam
das áreas rurais para as urbanas trazendo seus conhecimentos pertinentes às
práticas rurais, ou simplesmente continuam a cultivar em suas terras de sempre,
sofrendo as influências do urbano que tende a incrementar novas formas a
paisagem urbana; no segundo cenário, famílias urbanas, há muito estabelecidas
na cidade, envolvem-se com a agricultura, seja por escolha/desejo ou por
necessidade.
Os supracitados autores, que abordam também a questão de gênero e
agricultura urbana destacam que apesar de representar o acesso a fontes de
renda na economia familiar, propiciada pela redução das compras de alimentos,
muitas mulheres podem preferir se tornarem ativas em outro setor informal
urbano, a exemplo do comércio, para evitar possíveis riscos com as práticas
agrícolas, somadas às tarefas domésticas pelas quais continuam responsáveis,
mesmo quando assumem tarefas produtivas na agricultura, ou mesmo conciliam
com emprego formal ou informal fora do lar.
Essas atividades devem pautar-se pelo respeito aos saberes e conhecimentos locais, pela promoção da equidade de gênero através do uso de tecnologias apropriadas e processos participativos promovendo a gestão urbana, social e ambiental das cidades, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida da população urbana e para a sustentabilidade das cidades (SANTANDREU, LOVO 2007, p.5).
27
Através do entendimento das práticas agrícolas, é possível relacionar
outras categorias analíticas, as quais estão presentes e fazem parte do conceito
da agricultura urbana, o que revela a necessidade de se discutir sobre os
conceitos de campo, cidade, rural e agricultura enquanto meios analíticos das
práticas sócioespaciais.
Muitos têm sido os significados e atribuições direcionadas às práticas
agrícolas desenvolvidas nas interfaces urbanas. Sendo assim analisada
predominantemente pela questão da segurança alimentar, pela oportunidade de
geração de trabalho e renda, tradições rurais e relacionadas à especulação das
terras. Tal atividade tem ganhado relevância no cenário mundial e nacional,
Resende (2004), Madaleno (2001, 2002), Mougoet (2000). Apesar disso, surgem
questionamentos acerca do papel da agricultura dentro dos espaços intra-
urbanos, bem como sobre a sua importância para o contexto urbano e para seus
praticantes.
Essas indagações conduziram ao desenvolvimento da pesquisa, quando
se buscou compreender as faces que compõem a agricultura urbana na cidade de
Aracaju, relacionando para isso as práticas ligadas à agricultura urbana com a
natureza do solo urbano, na percepção de que tais práticas contribuem para a
criação de novas imagens e conceitos para a cidade, simultaneamente favorece a
relação entre os espaços urbanos e rurais.
Nesta perspectiva, e reconhecendo o antagonismo em que se vive num
planeta dotado de recursos finitos, mas pautada nos desperdícios da sociedade
de consumo, percebe-se que qualquer esforço feito com o objetivo de aumentar a
capacidade dos citadinos produzirem seu próprio alimento é relevante.
Recorrer à agricultura como estratégia posta à disposição do planejamento
urbano pode funcionar no sentido de capacitar melhor os planejadores para
encontrarem soluções possíveis para se resolver ou minimizar os problemas da
fome, pobreza, de melhor rendimentos e de criar, a partir da produção de
alimentos, a possibilidade de suprir as necessidades alimentares ou, pelo menos,
melhorar a qualidade nutricional dos sujeitos ligados com as práticas agrícolas,
mesmo em áreas precárias e carentes de infra-estruturas nos espaços intra-
urbanos.
28
A prática da agricultura urbana provém, dentre outros fatores, da escassez
de oportunidades adequadas e acessíveis à obtenção de renda e da demanda
não satisfatória nas áreas urbanas de produtos agrícolas em quantidades e
qualidades suficientes. Como pontos positivos, a agricultura urbana gera uma
produção voltada para o autoconsumo, aumento de disponibilidade de alimentos,
diversificação da dieta alimentar e fortalecimentos dos laços de vida comunitária.
Ressalte-se que essa leitura, embora atinente à realidade, passa
desapercebida para muitos pesquisadores; quando abordadas, são classificadas
e entendidas por alguns como temporárias, arcaicas, reflexo da precarização do
trabalho e inadequadas ao meio intra-urbano. É claro que dentre as inúmeras
realidades, pode-se utilizar-se dessas leituras para explicar os fenômenos que se
estabelecem no espaço geográfico.
Há, dentre as diferentes leituras, o entendimento de que a prática agrícola
desenvolvida por sujeitos citadinos que, muitas vezes, se encontram
marginalizados e excluídos socialmente do processo produtivo formal da cidade,
produzem o espaço a partir também da afirmação dessas práticas, seja através
de cultivos de vegetais, criação e comercialização dos produtos, ou na sua
reprodução enquanto sujeitos, podendo ser entendidos também como o exército
de reserva para o capital, em que estão aguardando o momento de sua
exploração, no processo de reprodução ampliada do capital, enquanto se
reproduzem com tais estratégias.
Madaleno (2001, 2002), nos oferece subsídio para a compreensão e
importância acerca da agricultura urbana; segundo a referida autora, ela designa
uma série de atividades, que ocorrem nas interfaces da cidade, mas que estão
relacionadas às questões econômicas locais e regionais.
Conforme a mesma autora as atividades de criação e cultivo sempre
foram características presentes na cidade, marcadas pelo intenso processo de
urbanização e o aumento da pobreza, o que contribui para o aumento das
atividades agrícolas no espaço urbano. Nesse contexto a agricultura urbana
ganha relevância no cenário da produção alimentícia, buscando equacionar
condições de reprodução social dos sujeitos citadinos, envolvendo-os com as
práticas agrícolas.
29
O Comitê de Agricultura (COAG), a FAO e as ONGs, têm desenvolvido
pesquisas sobre as questões econômicas e sociais resultantes da agricultura
urbana, ou seja os possíveis benefícios e malefícios causados na vida de seus
praticantes; tais pesquisas objetivam compreender as potencialidades e os
principais problemas da agricultura urbana, desenvolvidos nas interfaces das
cidades. Nesse sentido,
Fuera de la FAO, la AUP es objeto de un reconocimiento creciente entre los encargados de formular políticas y las ONG. En 1996 se creó el Grupo de Apoyo a la Agricultura Urbana y en 1996 se puso en marcha la Iniciativa Mundial sobre la Agricultura Urbana, en la que participan importantes donantes y organismos internacionales (entre ellos el PNUD, el CIID, la FAO, el Banco Mundial, la GTZ, el NRI, etc.). Otras organizaciones de las Naciones Unidas que participan también de diversos modos son las siguientes: la OACNUR, el UNICEF, la OMS y el CNUAH2. AGUILA es una red de 16 países de América Latina que intercambian información sobre la AUP, y se ha establecido o se están estableciendo otras redes en Africa occidental, Asia sudoriental y Europa. En 1993 se creó en los Estados Unidos una organización sin fines de lucro llamada Red sobre la Agricultura Urbana que ha realizado estudios de investigación y actividades de promoción sobre la AUP en todo el mundo. Numerosas organizaciones de la sociedad civil (por ejemplo, CARE, SAVE, Oxfam, Heifer Institute) han participado en proyectos básicos para impulsar la AUP en ciudades de países desarrollados y en desarrollo. Un número creciente de universidades (FAO, 1999).
A agricultura urbana torna-se, muitas vezes, uma produção oculta nos
“entremeios” do tecido urbano, sendo que nos países menos desenvolvidos
consolida-se no setor informal ou circuito inferior das práticas econômicas da
cidade, contribuindo assim para a sua marginalização nos planos de
desenvolvimento urbanos; com isso, aumenta a vulnerabilidade e a perda de
consistência tanto dos agricultores como dos espaços de produção perante o
crescimento da cidade, não favorecendo a criação de políticas de incentivos e
manejo dos espaços urbanos que estão sedimentados por cultivos e criação de
animais.
Segundo Martins (2008), para compreender a agricultura nos entremeios
urbanos é necessário observar desde as raízes históricas das ocupações dos
espaços, além de perceber os vínculos entre as identidades construídas no
pretérito, materializadas com outras dimensões e possibilidades no contexto da
vida urbana, sendo necessário fazer referência ao espaço rural e aos
30
deslocamentos e permanência no/e com os espaços culturais, que re-emergem e
sedimentam nas práticas urbanas via as construções e viveres.
É com esse entendimento que a compreensão da agricultura urbana e os
sujeitos a ela atrelados, significa perceber os processos de construção
sociocultural e interação entre espaços, ambientes, cenários, cenas e sujeitos, e
perceber que os agricultores materializam os seu viveres e arranjos para
desenvolver as atividades enquanto elemento integrante no espaço urbano
(MARTINS, 2008).
O cultivar e produzir, ligados a atividade agrícola urbana é composto de
criação, recriação e sobreposição de tempos, formando uma cadência produtiva
nas unidades agrícolas e, que compõe a textura e o significado de cada espaço
cultivado nos entremeios urbanos, começando a ganhar forma com a
intencionalidade e as técnicas que cada sujeito utiliza no seu espaço produtivo,
seja para o autoconsumo ou direcionamento da produção para o mercado que
gera renda e trabalho (MARTINS, 2008).
Na compreensão da materialidade da agricultura urbana, faz-se
necessário a priori, analisar a apropriação do espaço urbano para a atividade
agrícola. Segundo Correia (1999) e Carlos (2004), a natureza do solo urbano é
diferenciada e representa uma apropriação sistematizada e justaposta,
relacionada às formas de edificação urbana. Nessa perspectiva a agricultura
urbana coexiste com os sistemas urbanos, compartilhados com os espaços de
moradia dos sujeitos que praticam tais atividades.
Para Correia (1999), o espaço urbano na cidade capitalista é constituído,
num primeiro momento da sua apreensão, de espaços que apresentam diferentes
usos da terra, justapostos entre si, e que vão definir, o centro da cidade,
concentração de atividades comerciais, serviços, áreas residenciais, industriais,
de lazer, dentre outras, e também aquelas de reserva para futura expansão.
É na coexistência com o sistema urbano e nas conexões da lógica
capitalista que não se pode dissociar a presença do rural no espaço urbano, onde
a prática agrícola, no caso da zona de expansão, representa um meio justaposto
com diferentes usos do solo, em que para se atingir uma finalidade para além da
31
cerca, o proprietário objetiva ganhar visibilidade através da presença de animais
de pequeno e grande porte, bem como promover a venda do seu terreno.
Na zona de expansão de Aracaju ocorre que muitas vezes as práticas
agrícolas não são a finalidade principal das propriedades, como foi afirmado
anteriormente. Ocorre é que estas propriedades têm na criação dos animais, no
solo ocioso, a possibilidade de gerar aos proprietários da terra a maximização do
lucro via especulação imobiliária, cuja marca simbólica na zona de expansão é a
presença da cerca, enquanto delimitação e materialização do poder e do
monopólio da terra. A Figura 04 expressa claramente essa situação, pois se
percebe o entrelaçamento dos aspectos que devem ser observados para o
entendimento da agricultura urbana nessa localidade: a cerca, o animal, a frutífera
(côco) e com grande destaque o solo “especulado”.
Figura 04: Delimitação da propriedade privada na zo na de expansão de Aracaju. Foto: SANTANA FILHO, L. S, 2009.
Contextualizando esses aspectos com o crescimento geográfico da cidade
de Aracaju, temos a existência de espaços aparentemente “inutilizados”, a
exemplo da sua zona de expansão urbana que, com maior ou menor intensidade,
32
foi sendo ocupada por animais de grande e pequeno porte, somados a presença
marcante na paisagem dos coqueirais e a forte conversão do solo rural em urbano
via especulação, e a própria renda da terra; como também cultivares nos quintais
das residências que, através do cultivo em vasos de plantas medicinais, ou a
presença de frutíferas materializam a existência da prática agrícola na interface
da cidade.
Cabe destacar que a prática da agricultura urbana não se limita as áreas
ou bairros utilizados como recorte empírico nesta pesquisa. Podem-se citar como
exemplo outras áreas como as localizadas próximo ao Distrito Industrial de
Aracaju – DIA (Figura 05), com presença de criações de animais de grande e
pequeno porte, e propriedades localizadas próximo ao Hospital de Urgência de
Sergipe – HUSE, antigo hospital João Alves, onde gados pastam livremente,
dentre outras espalhadas pelos limites municipais da capital.
Figura 05: Propriedade localizada próximo ao DIA. Foto: SANTANA FILHO, L. S, 2009.
Outro aspecto a ser elencado acerca da agricultura urbana está
relacionado a venda dos cultivos aos moradores da cidade, que promove a
manutenção das unidades produtivas, com a renda obtida. No processo de
comercialização devemos atentar para as seguintes categorias de consumidores
33
que estão intimamente atreladas a venda dos produtos, que são: os fregueses,
atravessadores e empresas, que juntos vão representar o ponto de encontro entre
o cultivo agrícola que é metamorfoseado para produto capitalizado (MARTINS,
2008).
A agricultura urbana é uma atividade de múltiplas possibilidades, que
extrapola o engessamento da produção e trabalho ligados ao setor primário,
sendo necessário perceber que a mesma é desenvolvida por homens e mulheres,
não apenas usuários do espaço urbano para produção, mas sujeitos produtores
de tempo e espaço, que materializam e produzem o espaço geográfico, com
atividades, sendo ajustados as suas múltiplas sociabilidades.
Para Dinis e Marcelino (2007) a singularidade da utilização dos espaços
urbanos na produção agro-alimentar, reflete um significado igualmente distinto na
produção, pois os espaços urbanos são aproveitados de acordo com suas
possibilidades, onde se presencia a prática agrícola aliada à ocupação de
intervalos espaciais presentes em comprimidos ambientes: canteiros, vasos,
quintais, jardins comunitários.
Madaleno (2002) quando da sua pesquisa acerca da AU em Belém do
Pará, destaca que:
O quintal funciona geralmente como reserva de vitaminas, de produtos vegetais frescos, de plantas condimentares cultivadas sem recursos a adubos químicos ou a pesticidas e herbicidas. Reproduzem-se ainda ervas medicinais que mitigam as dores e se oferecem como alternativa barata e socialmente bem aceite à farmácia. Os quintais são fontes de proteínas animais, a que se recorre em datas festivas ou em momentos de maior aperto financeiro. (MADALENO, 2002, p. 105).
Muitas cidades têm potencial para arcar com suas responsabilidades no
tocante as suas demandas alimentares, promovendo alterações profundas no
cenário social e ambiental. Torna-se cada vez mais notório a agricultura urbana
como processo capaz de atender parte significativa dessas necessidades das
populações, conduzindo também ao fomento da economia local e a garantia da
segurança alimentar das pessoas envolvidas, que podem também participar da
formação coletiva que permeia os trabalhos comunitários (DINIS e MARCELINO,
2007).
34
Os referidos autores destacam que o envolvimento das pessoas na
produção agrícola nos centros e arredores urbanos, relaciona-se a origem desses
agricultores potenciais. Sendo que quando recebidos pela realidade de uma nova
terra, no contexto da migração, esses indivíduos são participantes e nem sempre
sujeitos, de um processo de integração cultural muito forte, geralmente conduzido
pela perda de conhecimento e saberes populares até mesmo em uma única
geração.
Porém, muitas experiências cotidianas no campo e conquistas frente às
dificuldades são resgatadas perante a possibilidade do retorno às atividades
ligadas ao sistema produtivo agrícola. Além disso, faz-se presente na realidade
urbana, um conjunto de tecnologias e informações bastante próprias bem como a
integração dos espaços geográficos, tendo como resultado dessas relações o
enriquecimento cultural das comunidades.
No resgate da cultura segundo Dinis e Marcelino (2007), é possível
observar que a rede de relacionamentos humanos existentes entre agricultores
são fortalecidos, e remonta a vida campesina, em que as relações interpessoais,
nessa realidade, são pautadas nas pessoas e não nos bens materiais que
possuem, além do que as relações de compadrio, as quais assumem tanta
importância quanto a familiar conjugal.
2.3 A AGRICULTURA URBANA: TIPOLOGIAS E DEFINIÇÕES
O conceito de agricultura urbana é construído por uma complexa rede de
fatores ainda não tão bem explicados, a exemplo da pobreza urbana e da
insegurança alimentar, que ocupam lugar preponderante. Daí porque é necessário
se identificar as diferentes conceituações, como exigência na facilitação das
intervenções de políticas públicas e de assistência tecnológica na promoção e na
gestão da agricultura urbana (MOUGOET, 2000).
Ainda de acordo com esse mesmo autor, os conceitos são ferramentas
mentais que criamos e recriamos para melhor compreender, interagir e modificar
nossas experiências no mundo real. E que devemos questionar se a agricultura
urbana é realmente o que chamamos, ou assim queremos denominar, ou que
percebemos na realidade.
Para Mougoet (2000) as definições mais usuais da agricultura urbana se
35
baseiam em vários elementos determinantes conforme se observa na Figura 06.
FIGURA 06 – Elementos ligados à definição da agricu ltura urbana Fonte: Mougeot, 2000
Em relação às atividades econômicas, em sua grande maioria as
definições se referem à fase produtiva da agricultura, porém mais recentemente
são incorporadas também o processamento e a comercialização, e as interações
entre todas as fases, em que a produção, venda e também o processamento
tendem a estar mais inter-relacionados no tempo e no espaço por conta da
proximidade geográfica e ao fluxo de recursos mais rápidos.
O determinante da localização tem sido causa de um importante conflito
conceitual, visto que muitas das definições do que seja agricultura urbana
destacam o local onde a mesma é praticada, seja na cidade ou em seus
arredores imediatos. Porém poucos estudos apresentam diferenças entre os
locais intra-urbanos e os periurbanos, ou se o fazem, utilizam critérios variados.
Nas definições de agricultura intra-urbana, utiliza-se como critério o
número de habitantes, densidade mínimas, limites oficiais da cidade, limites
municipais da cidade, dentre outros, a agricultura dentro da competência legal e
regulamentar das autoridades urbanas. No tocante as definições da agricultura
periurbana é bem mais problemático, pois estão em contato mais direto com as
36
áreas rurais e estes espaços sofrem no decorrer do tempo, mudanças agrícolas
mais profundas do que as áreas centrais e construídas da cidade.
A AUP é um conceito multidimensional que inclui a produção, transformação e a prestação de serviços, de forma segura, para gerar produtos agrícolas (hortaliças, frutas, plantas medicinais, ornamentais, cultivados ou advindos do agro extrativismo, etc.) e pecuários (animais de pequeno, médio e grande porte) voltados ao autoconsumo, trocas e doações ou comercialização, (re) aproveitando-se, de forma eficiente e sustentável, os recursos e insumos locais (solo, água, resíduos, mão-de-obra, saberes, etc.). Essas atividades podem ser praticadas nos espaços intra-urbanos, urbanos ou das regiões metropolitanas e articuladas com a gestão territorial e ambiental das cidades. (SANTADREU e LOVO, 2007, p.11)
Acerca da tipologia que abarca o conceito de AUP, conforme Santandreu e
Lovo (2007) podem ser realizadas em espaços públicos e privados, dentro do
perímetro urbano e ainda no espaço periurbano de um município. Para nossa
pesquisa adotamos uma tipologia que venha a caracterizar a diversidade de
espaços possíveis de serem utilizados com a prática da AU no espaço intra-
urbano de Aracaju, mais especificamente nas áreas escolhidas para análise.
Tipologia Espaços característicos Espaço Privados Lotes vagos; Terrenos baldios particulares ou com dúvidas
sobre a propriedade; Lajes e tetos; Quintais e Pátios; Áreas periurbanas; Áreas verdes em conjuntos habitacionais
Espaços Públicos Terrenos de propriedade Municipal, Estadual e Federal com espaços possíveis de utilização de acordo com a caracterização feitas nas linhas abaixo:
Verdes Urbanos Praças e Parques. Institucionais Escolas e Creches; Posto de Saúde; Hospitais; Presídios;
Edifícios Públicos e Privados Não Edificáveis Laterais de vias férreas; Laterais de estradas e avenidas;
Margens de cursos d’água; Áreas inundáveis; Faixa sob linhas de alta tensão; Ambientes aquáticos (rios e lagoas)
Unidades de Conservação Áreas de Proteção Ambiental; Reservas Ecológicas; Outras unidades desde que seja permitido o manejo e uso de potencialidades
Áreas de Tratamento Aterro Sanitário; Lagoas de Oxidação. Quadro 01 – Tipologias possíveis para atividades de Agricultura Urbana e Periurbana Fonte: TERRILE, 2006 Apud SANTADREU e LOVO, 2007.
Na zona de expansão de Aracaju a presença das cercas, (Ver Figura 07),
ainda se faz presente, sendo uma constante nas diferentes áreas investigadas,
37
(re) afirmando a presença da propriedade privada e da posse, mesmo que a
atividade agropecuária não seja a finalidade principal em determinadas
propriedades, ela é o meio de demonstrar que a terra tem dono. Em outra
vertente de análise é observado, conforme a Figura 08 a forte presença nas
residências de frutíferas, das quais a mangueira teve um destaque maior. Pode-
se afirmar que a tipologia mais presente é a do espaço privado com utilização dos
seus lotes vagos e terrenos baldios com múltiplas finalidades, mesmo existindo
outras tipologias de menor escala.
38
Figura 07: Propriedade na zona de expansão de Araca ju. Foto: SANTANA FILHO, L. S, 2009.
Figura 08: Presença de frutífera em residência no B airro Bugio. Foto: SANTANA FILHO, L. S, 2009.
Mougeot (2000) acerca da tipificação das áreas afirma que estas variam de
autor para autor, sendo classificadas com relação à residência do produtor, ou
seja, se o mesmo pratica fora do lote ou na sua residência; em relação à
modalidade de uso ou posse da terra (cedida, arrendada, compartilhada, dentre
39
outras formas), e com relação à categoria oficial do uso do solo da zona onde se
pratica a agricultura (residencial, industrial, institucional).
Com relação aos sistemas e escala da produção, grande parte das
pesquisas reúne dados acerca dos diferentes tipos de sistemas encontrados na
área de estudo, em que o esforço investigativo reside numa escala de menor
abrangência, sendo importante destacar a ocorrência de mudanças e
intercâmbios entre os sistemas de produção e dentro de cada unidade produtiva.
Para os tipos de produtos, seja animal ou vegetal, as definições são
enfatizadas diferenciando os tipos de colheita (grão, raízes, hortaliças, ervas
aromáticas e medicinais, plantas ornamentais, árvores frutíferas, entre outros), e
os tipos de animais (galinhas, coelhos, cabras, carneiros, bovinos, suínos, etc.)
produzidos. São consideradas também as hortaliças perecíveis, mas com preços
relativamente valorizados, e os produtos de origem animal, in natura ou
processados.
No contexto da destinação da produção, grande parte das pesquisas
aborda a relação do autoconsumo e do mercado, sendo que ambos os objetivos
são visados pelo produtor ou nos lares onde se pratica a agricultura urbana.
É reconhecido que parte da população faz uso de algum tipo de planta
medicinal cultivadas nos jardins e varandas de suas residências (Figura 09), cuja
produção se destina para o autoconsumo e doações aos vizinhos e parentes, bem
como em propriedades onde a prática do consorciamento de cultivos é utilizada
(Figura 10). Acrescidos da criação de animais de pequeno e grande porte, soltos
ou pastando em terrenos baldios.
40
Figura 09: Plantas medicinais cultivadas no Jardim de residência do Bairro Bugio. Foto: SANTANA FILHO, L. S, 2009.
Figura 10: Consorciamento de cultivos na zona de ex pansão de Aracaju. Foto: SANTANA FILHO, L. S, 2009.
É importante destacar que diante das definições atribuídas a agricultura
urbana, são poucas aquelas que aprofundam os contrastes acerca da agricultura
41
urbana com a rural, e menos ainda analisam as implicações no relacionamento
das mesmas. Sendo assim, conforme Mougeot (2000), dos elementos analisados,
menos a localização, podem ser incorporados a aplicação igualmente a
agricultura rural. A distinção decisiva entre ambas reside na integração da
agricultura urbana ao sistema econômico e ecológico urbano, não sendo apenas
a localização a definidora para tal distinção.
Segundo Mougeot (2000) o principio da integração no relacionamento entre
agricultura no ecossistema urbano permite reconhecer três tipos de relações: a
primeira é que em qualquer cidade e em qualquer momento, seus alimentos são
produzidos por uma agricultura de caráter rural, periurbano e intra-urbano. Fica
comprovado que a agricultura urbana completa a agricultura rural em termos de
autoconsumo, fluxos de comercialização e fluxos de abastecimento de mercado; o
segundo é de que em qualquer momento, em cidades de diferentes tamanhos ou
complexidade, a agricultura nela praticada será mais do tipo urbano (mais
intensiva e produtiva) nos centros maiores do que nos menores; em terceiro, em
qualquer cidade em determinado período de tempo com o processo de
urbanização, a agricultura do tipo urbano e intensivo crescerá como porcentagem
de toda a agricultura praticada.
Poder-se-ia citar na América Latina, conforme Madaleno (2002), relevantes
iniciativas do poder central e local bem como das empresas públicas e privadas
na promoção da agricultura urbana em cidades com altos índices de pobreza e
incentivo ao desenvolvimento de horticultura urbana, sendo que a referida autora
o fez com bastante propriedade, entretanto podem-se destacar os exemplos do
caso brasileiro, na perspectiva de vislumbrar a legitimação das práticas
econômicas ligadas à agricultura urbana.
Como se observa no Quadro 02, o incentivo dado à prática da agricultura
urbana não ocorre somente em cidades de regiões menos desenvolvidas do país
e nem tampouco se restringe a cidades com características semelhantes. Em
várias cidades e áreas metropolitanas brasileiras são encontradas experiências
com agricultura urbana, apoiadas ou não pelas ONGs ou pelo Estado nas
instâncias municipal, estadual e federal. Nessa perspectiva faz-se necessário
questionar acerca da natureza, bem como as formas de usos desses espaços
utilizados e produzidos pela agricultura urbana.
42
Organização Localização Plano de Ação
Governo local
Prefeitura de Belém
Belém-PA O programa Cinturão Verde, promove a criação de patos na ilha de Cotijuba e a horticultura e fruticultura na periferia de Belém (ilhas de Mosqueiro e Caratateua)
Governo estadual
Estado do Pará
Belém-PA O governo do Pará também estimula a avicultura urbana, através da Secretaria da Agricultura – SAGRI
Governo local
Prefeitura do Rio Branco
Rio Branco-AC Criou o pólo municipal de produção agro florestal que faz o reassentamento de populações oriundas de favelas em terrenos públicos, dá apoio técnico e distribui sementes entre outros insumos.
Governo local
Prefeitura de São Paulo
São Paulo-SP Recentemente introduziu-se a agricultura urbana no Plano Diretor urbano de SP.
Governo Local
Presidente Prudente
Presidente Prudente-SP
Promove o programa Alimente Prudente: dando apoio técnico e sementes aos agricultores urbanos.
Governo local
Prefeitura de Curitiba
Curitiba-PR Promove a ocupação de lotes não construídos, aos agricultores urbanos, estimulando a utilização de resíduos sólidos urbanos-RSU como insumo, desde os anos 1970.
Governo local Prefeitura de Londrina
Londrina-PR Apóia a unidade de vizinhança DEMOCRACIA E LIBERDADE que pratica a horticultura urbana. Recebe recursos da UNICEF
Companhia de distribuição de eletricidade-CEREJ
Rio de Janeiro-RJ
Empresta terras na promoção da horticultura cuja produção compra para abastecer as suas cantinas
Petrobras Belém-PA Empresta terra de sua propriedade para hortas escolares e comunitárias
COPEC
Petroquímica
Camaçari-BA Projeto PRONATURA distribui terras e águas as famílias dos empregados, usando resíduos das fabricas como input. Estimula cultivos destinados a agroindústria (mandioca e batata-doce)
Quadro 02 – Iniciativas de Governos Central, local e de empresas públicas e privadas na promoção da agricultura urbana no Brasi l Fonte: Madaleno, 2002, p. 20.
Recentemente o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
(MAPA), organizou uma pesquisa, através de uma série de encontros nas 11
43
áreas metropolitanas no país (Figura 11), cuja finalidade era de identificar e
caracterizar os espaços da agricultura urbana e periurbana (AUP), na perspectiva
de fornecer apoio institucional para a promoção de tal atividade.
Segundo esse mesmo relatório, no Brasil as regiões sul e sudeste
concentram de forma mais intensiva as atividades relacionadas com agricultura
urbana. Todavia, isso não significa que tal atividade não possa ser encontrada em
outras regiões. Essa iniciativa vem reforçar também a existência da AUP no
Brasil, demonstrando que a produção vegetal é a de maior relevância, com 46%
das iniciativas, cuja orientação se faz tanto para o autoconsumo como para o
mercado, e que promove a geração de trabalho e renda, como também
complementa a alimentação das famílias praticantes.
Figura 11: Brasil: Áreas Metropolitanas. Fonte: Brasil, MAPA, 2007
Os recursos destinados pelo governo federal conforme tal relatório esteve
mais concentrado nos grandes centros, ou melhor, nas áreas metropolitanas,
sendo importante ressaltar que a pratica da agricultura urbana é percebida em
diversas áreas urbanas espalhadas pelo Brasil, e que não foram incluídas na
construção do relatório.
Mais recentemente, o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à
Fome (MDS) incluiu a Agricultura Urbana como parte do programa Fome Zero do
governo federal. Segundo o MDS, a Agricultura Urbana permite a produção de
44
alimentos de forma comunitária em espaços urbanos e periurbanos da cidade. A
produção é destinada para auto-consumo, abastecimento de restaurantes
populares, cozinhas comunitárias e venda de excedentes no mercado local – o
que resulta numa geração de renda, melhoria da alimentação e inclusão social,
conforme o MDS.
A inclusão da AU em programa social do governo federal se dá devido ao
número cada vez maior de políticas assistencialistas promovidas pelo Estado via
governo e que, estando a Agricultura Urbana tão disseminada e visível nos
espaços das cidades, é oportuno ao poder público incluir a AU em seu programa
de governo. A inclusão é válida, contudo não se deve esquecer que a prática
desse tipo de agricultura não é algo novo e sua existência independe de
programas governamentais.
Ferreira e Castilho (2007), retomando a discussão acerca dos órgãos
públicos e ONGs que visam apoiar a prática da agricultura urbana, destacam que
as ações pensadas são apenas pontuais, em espaços selecionados, muitas vezes
sob os critérios imprecisos no que tange à eficácia e eficiência dos recursos e da
abrangência social. Assim, a agricultura urbana ainda não tem recebido a devida
atenção por parte dos gestores públicos do planejamento urbano.
No caso de Aracaju, pelo menos durante a pesquisa, não foi detectado a
destinação de recursos oriundos do governo federal na promoção da agricultura
urbana. Entretanto, mesmo sem apoio institucional, foram observadas práticas de
agricultura urbana significativas nesta cidade, representando assim, uma
atividade presente no processo de produção do espaço urbano local.
2.4 AS FRUTIFERAS E AS PLANTAS MEDICINAIS NO CONTEX TO DA AGRICULTURA URBANA
As plantas medicinais tem contribuído para a produção de medicamentos,
tornando-as reconhecidas pela medicina convencional. Mas é necessário
esclarecer que existe uma diferença entre os medicamentos fitoterápicos que são
produtos tecnicamente elaborados e que apresentam uma forma final de uso,
neste caso podem ser comprimidos, cápsulas e xaropes. Enquanto as ervas
medicinais de uso caseiro são constituídas, muitas vezes, da planta seca, inteira
ou em pequenos pedaços, no processo de preparação dos populares “chás”.
45
Não é difícil encontrar algum morador que conheça o poder
medicamentoso de algum tipo de planta, folha, casca, raiz ou flor que minimize e
alivie os sintomas de um resfriado ou mal-estar. São muitos os benefícios das
ervas medicinais que passam de geração em geração, independente da
localidade que o sujeito esteja residindo. Diante dessa realidade a Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), objetivando esclarecer quanto ao
poder das ervas medicinais, através da popularização desse conhecimento, sua
forma correta de uso para se atingir os efeitos benéficos, disponibilizou no
endereço eletrônico (www.anvisa.gov.br) algumas das principais ervas e seu
poder medicamentoso (Quadro 03).
O uso das ervas medicinais é de certa forma justificado pelo elevado preço
no acesso ao serviço de assistência médica no Brasil, sem destacar os elevados
preços para a filiação nos chamados planos de saúde privados. Mesmo
possuindo o Sistema Único de Saúde (SUS), que atende a população de forma
gratuita, este não consegue de fato a eficiência no atendimento da demanda da
população. Acrescido nesse contexto os elevados preços dos medicamentos
prescritos aos pacientes.
Nomenclatura botânica
Nomenclatura popular
Alegações
Aloe vera Babosa Fortalece os cabelos, antirreumático, cicatrizante, anticancerígeno.
Anacardium occidentale
Cajueiro Diarreia não Infecciosa, Lesões como antisséptico e cicatrizante.
Bauhinia nitida Pata de vaca Problemas do aparelho urinário, diabetes.
Carica papaya Mamão ou Papaia Digestivo, combate a prisão de ventre, trata as varizes das pernas.
Cymbopogon citratus Capim santo, Capim limão, Capim cidró, Capim cidreira, Cidreira
Cólicas intestinais e uterinas. Quadros leves de ansiedade e insônia, como calmante suave.
Eugenia uniflora Pitangueira Diarreia não infecciosa.
Lippia alba Erva cidreira, Falsa Erva cidreira, Falsamelissa
Quadros leves de ansiedade e insônia, como calmante suave. Cólicas abdominais, distúrbios estomacais, flatulência (gases), como digestivo, e expectorante.
Malva sylvestris Malva Afecções respiratórias, como expectorante, contusões e dos processos inflamatórios da boca e garganta.
46
Mangifera indica Manga Expectorante e antiasmático. Peumus boldus Boldo Dispepsia (distúrbios da digestão),
como colagogo e colerético. Ocimum basilicum Alfavaca Estimulante, antiespasmódico,
antiasmático, antitússico. Psidium guajava Goiabeira Diarreias não infecciosas, pele e
mucosas lesadas, como antisséptico.
Quadro 03: Indicações de ervas medicinais. Fonte: ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária, 2010 e Madaleno, 2002. Org. SANTANA FILHO, L.S. 2010.
O uso e administração das plantas medicinais apresentam uma
diversidade, podendo ser oral ou de uso tópico. Acerca da utilização das ervas
medicinais, Madaleno (2002) apresenta as diferentes formas no processo de
administração interna das ervas, a saber: o chá, que se toma sob a forma de
decocção (mistura da droga em água fria, sendo depois fervida); de infusão
(aplicação de água a ferver sobre a droga que fica em repouso), ou de maceração
(operação que consiste em submeter as ervas a ação de líquido, a temperatura
ambiente, por várias horas).
É importante salientar dentro dos cultivos urbanos, as plantas medicinais,
pois conforme destaca Madaleno (2002), essa prática tem sua presença marcante
nas propriedades ligadas à agricultura urbana. A mesma autora traz uma lista das
ervas medicinais ligadas aos fatores culturais da sociedade brasileira. Para a
realidade pesquisada, nesse caso a cidade de Aracaju, a agricultura urbana e a
intensidade dos cultivos das ervas medicinais a ela atrelada, é bastante
diferenciada. Mesmo não estando presente em todas as propriedades
pesquisadas, a Figura 12 representa a ocorrência das principais plantas
medicinais encontradas.
47
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Figura 12: Plantas medicinais nas propriedades pesq uisadas. Fonte: Pesquisa de campo 2009. Org: SANTANA FILHO, L. S., 2009
Conforme se observa na Figura 12 o capim santo é a planta mais comum,
ou seja, foi encontrada em 09 (nove) propriedades. Em segundo lugar, a malva
presente em 08 (oito) propriedades. A erva cidreira está presente em 05 (cinco)
propriedades. Embora ocorra com menor frequência e intensidade, porém
presente nas propriedades levantadas, a alfavaca, alumã, babosa, samba-caíta,
manjericão e a pata de vaca.
Um dos exemplos que mais chamou a atenção da prática da agricultura
urbana ligada à produção de plantas medicinais nas áreas pesquisadas, foi
quando da aplicação da entrevista ao Senhor José S. S. J., de 62 anos de idade,
natural de Murici-AL, que cultiva em sua propriedade/residência ervas medicinais
há mais de 25 anos, fruto do conhecimento adquirido por seus avós e pais e que
ele busca passar para seus filhos e netos. As principais ervas e seu poder
medicamentoso, por ele cultivadas em seu jardim são o capim santo que é um
calmante natural, a malva (antinflamatório) alfavaca (serve como tempero, dor de
barriga e para verme). É interessante destacar a presença da palma (no combate
a diarréia) e a presença do cultivo de hortículo, que é a pimenta (ver figura 13).
Toda a produção tem como destino final o autoconsumo, porém, caso algum
vizinho esteja necessitando, isto verificado em um “bate papo cotidiano”, alegando
algum sintoma que pudesse ser amenizado pelas ervas, ele tem o maior prazer
em ceder parte de sua produção.
48
Figura 13: Cultivo de Pimenta Foto: SANTANA FILHO, L.S., 2009.
A manutenção de cultivos na cidade, mais que representar a materialidade
da agricultura urbana, está associada a reprodução de elementos da cultura em
que no contexto da migração campo cidade, os migrantes extrapolam a dicotomia
que há entre essas duas dimensões espaciais e os hábitos e costumes transpõem
a barreira territorial do rural para o urbano.
Outro aspecto muito comum é a presença da frutífera, que é marcante nas
propriedades pesquisadas. Segundo Martins (2008) a frutífera é a materialidade
de um sistema, de conexões de mundo exterior presente nos quintais urbanos, e
que antes mesmo de produzir frutos tem o papel de ornamentar e embelezar o
quintal, e secundariamente tem função de proteção para os pequenos animais e
cultivos.
O mesmo autor ainda destaca que ao plantar uma frutífera significa retirar
da natureza os símbolos constantes e afirmar a proximidade de elementos
diversos, dando definições e contornos ao ambiente urbano. Sendo assim, o
plantar uma mangueira ou uma goiabeira em sua residência, conduz a uma
realidade abstrata, subjetiva em estar próximo da natureza, enquanto elemento de
apropriação, e que vai além da produção de frutos.
Na Figura 14 pode-se observar a recorrência das plantas frutíferas nas
propriedades pesquisadas. Com base nas informações contidas na figura é
possível observar a grande diversidade de frutíferas presentes no espaço urbano
49
de Aracaju, mesmo com predomínio de determinada frutífera, a exemplo da
mangueira, é notório a presença de espécies que tem sua produção mais
diretamente ligadas ao espaço rural, mas que foram encontradas, mesmo que de
forma pontual, nas propriedades pesquisadas.
Dentre as frutíferas, a mais comum foi a mangueira, presente em quase
todas as propriedades pesquisadas, seja na frente ou no fundo da residência, cuja
ocorrência se fez em 20 (vinte) propriedades de 30 (trinta) levantadas, seguidas
do coco, presente em 12 (doze), da bananeira, presente em 09 (nove), do mamão
presente em 08 (oito) e da goiabeira, presente em 06 (seis). Estando também
presente, porém com menor intensidade, as seguintes frutíferas: acerola, laranja,
pinha, sapoti, jaca, cajá, manjelão, caju, jenipapo, graviola, jabuticaba, limão e
pitanga.
0
5
10
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Figura 14 – Plantas frutíferas identificadas nas pr opriedades pesquisadas. Fonte: Pesquisa de campo 2009. Org: SANTANA FILHO, L. S., 2009
Outro momento bastante relevante quanto à pesquisa de campo, refere-se
à oportunidade de aplicação de entrevista a uma senhora de 82 anos, antiga
moradora do bairro Santos Dumont, Senhora Arlete, popularmente conhecida no
bairro como professora Maria Marques. A mesma relatou com tamanha satisfação
o processo de urbanização do bairro, que se deu a partir da venda de sítios para
construção de loteamentos.
No primeiro momento, na entrada da própria residência, que está
localizada em uma das vias de maior circulação e adensamento residencial do
bairro, foi impressionante o impacto proporcionado pela quantidade de frutíferas,
de plantas medicinais e muita área verde, ou seja, se levarmos em consideração
50
a visão clássica do que venha a ser rural, certamente seriamos conduzidos a
considerar que tal espaço estaria vinculado ao campo e não a um bairro
consolidado de Aracaju com intensa densidade populacional.
Ao longo da conversa que ocorreu nos diferentes espaços da propriedade,
inclusive embaixo de cada frutífera, no degustar da pitanga (Figura 15), acerola,
no suco de jenipapo, no presenciar da queda da manga pelo vento, foi nítido
como a senhora Arlete tem o prazer de cultivar cada planta, de acompanhar seu
crescimento, de colher, saborear e também fazer doações aos vizinhos. Ainda
durante os finais de semana sua “chácara” (como ela a denomina), é aconchego
para filhos, netos, noras e genros, onde é espaço do descanso, do lazer, isso
quando ainda não levam uma boa quantidade de frutas para casa.
Figura 15: Coleta de pitanga Foto: SANTANA FILHO, L.S., 2009.
Quando foi perguntado a mesma sobre a possibilidade da venda de sua
propriedade, que apresenta cerca de 500 m2, para morar em um apartamento ou
outra casa menor, devido à violência e a falta de segurança, a professora foi
bastante incisiva na colocação: “Deus me livre de morar num apartamento, pra
mim estou presa numa gaiola”.
51
Além das frutíferas, que não são poucas, pois foi contabilizado um total de
19 espécies diferentes, dentre as menos comuns, os pés de jaca, cajarana,
sapoti, jabuticaba e cajá. Ainda há a presença de plantas medicinais, que a
senhora Arlete faz uso, ressaltando que no passado as pessoas faziam muito
mais uso dessas plantas do que os medicamentos laboratoriais de hoje, alegando
que “o povo era mais sadio, não usava tanto remédio, não se andava doente”.
Com isso, pode-se perceber o valor simbólico da prática da agricultura urbana nos
quintais das casas.
Sendo assim, mesmo a agricultura urbana considerada em seus aspectos
multidimensionais, ora ligada a produção para o autoconsumo, ora destinada ao
mercado, através da venda de seus produtos, ficou evidente a partir da pesquisa
realizada, quando do enfoque da agricultura urbana de caráter intra-urbano no
município de Aracaju, o predomínio da produção voltada para o autoconsumo,
ligada diretamente as tradições culturais, no tocante ao relacionamento com
elementos da natureza.
É dentro desse contexto de práticas agrícolas presentes no espaço urbano
da cidade de Aracaju, que é pertinente fazer uma discussão acerca da relação
campo-cidade, na perspectiva de entendê-las enquanto dimensões espaciais
particulares e singulares, porém complementares e interdependentes.
52
3 RELAÇÃO CAMPO CIDADE EM ARACAJU
A relação campo-cidade é um tema bastante discutido nas ciências sociais,
incluindo a Geografia. Tendo em vista que a cidade e o campo são categorias
preponderantes dos espaços rural e urbano, logo do espaço geográfico. Muito do
que é discutido no tocante a essa temática é posto não como uma relação de
complementaridade e interdependência (como se almeja nesse trabalho), mas
como pares antagônicos. Partindo dessa premissa o capítulo que segue propõe
discutir a relação campo cidade primeiramente pautada na dicotomia espacial,
bem como através da noção de continuum rural-urbano. Segue-se com a
discussão da problemática da definição do que vem a ser rural e urbano no Brasil
e os rebatimentos no recorte empírico, na perspectiva de demonstrar que a teoria
geral materializa-se nas áreas pesquisadas.
3.1 DA DICOTOMIA ESPACIAL A NOÇÃO DE CONTINUUM
Profundas alterações na distribuição espacial da população foram
observadas nos países berço do capitalismo, a partir de meados do século XVIII,
período em que o modelo econômico vigente evoluía na eficiência de acumulação
de capitais, e toda sociedade se reestruturava aos moldes industriais,
promovendo o processo de crescimento das aglomerações urbanas contribuindo
para o esvaziamento demográfico das áreas rurais.
Na visão de alguns autores, o mundo rural secular opõe-se nitidamente ao
mundo urbano, sendo este caracterizado por funções, atividades, grupos sociais,
paisagem que os diferencia sobremaneira do mundo rural. Segundo Ferrão
(2000), esta oposição tende a ser destacada como natural, ou seja, encaradas
como relações de natureza simbióticas, em que campo e cidade são
complementares e mantém um relacionamento estável num contexto marcado
pelo equilíbrio e harmonia de conjunto.
A revolução industrial imprimiu novas configurações espaciais e a aparente
consumação da separação entre as áreas rurais e urbanas, esse marco histórico
que vem alterar essa situação acima descrita acarretou consequências para as
áreas urbanas e rurais. No caso das áreas rurais, verificou-se o processo de
perda de centralidade econômica, social e simbiótica (Ferrão, 2000), sendo este
53
espaço identificado com realidades arcaicas, em detrimento da visão de palco do
progresso dos aglomerados urbano-industriais.
Mas segundo Reis (2005, p.79) “os espaços rural e urbano não podem ser
compreendidos separados um do outro, visto que são realidades que não
existiriam isoladamente”, mas no seu relacionamento e interpenetração.
No decorrer do século XX, a indústria fez a cidade explodir2,intensificando
o processo de urbanização. Segundo Reis (2005), o crescimento da cidade, a
industrialização da agricultura e o transbordamento do urbano nas áreas rurais,
verificadas em várias regiões do mundo, sugerem que a transição entre espaços
rural e urbano deve ser entendida nos moldes teóricos do espaço continuum,
assim, transferindo-se a polarização antagônica/dicotômica por um gradiente de
variações espaciais.
Isso conduz os pesquisadores a abordarem os diferentes níveis de
integração ou distanciamento entre esses espaços. De forma geral, as análises
do relacionamento entre o rural e o urbano são associadas a duas grandes
abordagens: a da dicotômica e a de continuum. A primeira enfatiza as diferenças
que se estabelecem entre esses dois espaços, sendo o campo pensando como
algo que se opõe a cidade, já a segunda dá ênfase a uma aproximação entre o
espaço rural e urbano.
A sociologia norte americana, a partir da década de 1920, influenciada por
enfoques diferenciados, destaca-se na discussão relacionado ao desenvolvimento
de conceitos que objetivam permitir melhor entendimento das questões referentes
aos espaços rurais e urbanos. Sorokin e Zimmermann (1929) foram os primeiros
a introduzir a perspectiva do continuum rural e urbano, uma concepção dual, uma
vez que considera o rural e o urbano com pólos extremos de uma mesma escala
de gradação, e que para não incorrer em características que marcavam a
polarização, bem como suas relações, esses autores identificaram diferenças
marcantes entre os espaços rurais e urbanos. Mas apesar desses autores serem
considerados os primeiros nas formulações do continuum, acabaram
possibilitando um forte alicerce para a conceituação dicotômica, uma vez que
2 Acerca da implosão e explosão da cidade Lefebvre (1969) destaca a efervescência, dinâmica e transformação que ocorreram nas cidades, impulsionadas pela industrialização, acarretou em concentrações urbanas gigantescas e as populações atingiram densidades inquietantes.
54
estabelecem diferenças socioespaciais para o espaço urbano e rural. (REIS,
2005, P. 80).
A obra clássica de Zorokin e Zimmermann (1929) sugere uma série de
traços essenciais na diferenciação do espaço rural e urbano, onde o
entendimento do rural perpassa pela particularidade de sua economia. O rural
então abrigaria, sobremaneira, a produção agropecuária, e todas as outras
características observadas no campo estariam vinculadas a essa atividade, e os
outros tipos de atividade não-agrícola eram considerados acessórios e não se
destacavam como meio de subsistência da população do meio rural.
Essas características destacam a existência de duas realidades que se
opõem; porém durante o século XX, as profundas alterações socioespacial,
promoveram modificações das características primárias que embasam essa
visão, ou seja, o campo passa a abrigar de forma expressiva as atividades não-
agrícolas.
Para Carneiro (1998) é a partir do desenvolvimento do capitalismo na
agricultura concomitante ao processo de interiorização da indústria e a
modernização da sociedade urbana e rural que a teoria da urbanização passa a
ser formulada, promovendo a integração entre as sociedades urbano-industriais e
as sociedades rurais.
Nesse contexto fica mais nítida a percepção dos diferentes níveis de
integração espaciais dos espaços urbanos e rurais. Sendo que a visão dicotômica
vê os espaços rurais e urbanos como opostos sendo uma a negação da outra, a
visão de continuum que representaria a intensidade e não o contraste, não mais
centrado nos sistemas, mas em indivíduos que se ocupariam de atividade de um
ou de outro tipo em uma única civilização.
Outro enfoque que se contrapõe a visão dicotômica e de continuum, está
centrada nas relações sociais, que ao invés de diluir diferenças, ocorre o reforço
de identidades apoiadas no pertencimento a uma localidade, ou seja, os
contornos territoriais estariam balizados sobre a cultura, que conduziria a
interação entre rural e o urbano de um modo determinado, a partir da garantia e
manutenção de uma identidade (Carneiro, 1998).
Diante dos embates teóricos, das crescentes indefinições e também pela crescente urbanização, o rural deixou de ser atrativo como objeto de pesquisa, pois começou a ser aceito que a
55
urbanização do campo era uma questão de tempo (BLUME apud REIS, 2005, p. 82).
São por essas questões que muitos pesquisadores voltam-se para o
estudo da agricultura. Surgem questionamentos acerca de que seria o fim do rural
ou das leituras sobre o rural.
Torna-se necessário um olhar que busque uma outra direção, pois a
permanência desse atual modelo conduzira a discussão da idéia de que o rural foi
ou está sendo suplantado pela expansão do urbano. Para Alentejano (2000, p.
103.), é fundamental demonstrar que:
Apesar das inegáveis transformações sociais, econômicas, culturais e espaciais resultantes do desenvolvimento do fenômeno urbano, o rural não deixou nem deixará de existir, apenas teve e está tendo seu significado alterado.
A partir da Segunda Grande Guerra, tornou-se visível, com a
industrialização da agricultura3, mudanças nas relações rural-urbano e passou-se
a observar novas configurações no interior do próprio mundo rural (FERRÃO,
2000), em que ocorre uma fratura no espaço rural em duas realidades distintas e
articuladas: o mundo rural moderno e o mundo rural tradicional. A oposição rural-
urbano começa a não ser vista como a mais adequada para explicar a realidade,
ao passo de que a modernidade não é exclusiva das áreas urbanas.
A sociedade brasileira em meados do século XX se configurava como
expressivamente rural. Mas o crescimento da população do país entre 1940-1980
promoveu uma inversão da distribuição da população no tocante às áreas rurais e
urbanas, onde ocorreu: um direcionamento da população das áreas rurais com
destino as áreas urbanas, crescimento desordenado das grandes cidades e a
formação de centros metropolitanos.
A partir da década de 1980 emerge um paradigma socioespacial, pois
mudanças significativas são observadas no meio rural brasileiro, a exemplo da
emergência de um espaço rural multifuncional, que passa a apresentar
3 Esta entendida como modernização da agricultura, foi iniciada no Brasil a partir da década de 1960. É nessa modernização que ocorre o processo de monopolização da terra pelo capital, através da vinculação ao mercado. Contudo, ela é conservadora e dolorosa, pois seu caráter é excludente e parcial, tendo em vista a manutenção das estruturas sociais no campo brasileiro. Ver José Graziano da Silva (1999).
56
diversificação econômica em meio a novas formas de produção e subsistência,
em contraposição ao domínio do tradicional, num passado recente.
Os debates referentes ao urbano e ao rural ressurgem com a mesma
voracidade das mudanças técnicas, econômicas, sociais e ambientais que
atingem esses espaços a partir da segunda metade do século XX. No Brasil, na
década de 1980, as mudanças verificadas no meio rural, a partir da urbanização
do campo e o surgimento de novas dinâmicas que direcionam para uma nova
ruralidade, muitas vezes díspares daquelas ligadas às atividades tipicamente
agropecuárias, promoveram uma intensificação dos debates, diante da sua
importância.
O espaço rural brasileiro, nas últimas décadas, distancia-se das visões
clássicas e dicotômicas, ou seja, a urbanização imprimiu um novo significado
onde sua atuação foi mais significativa, sendo mais perceptível nas áreas rurais
que têm contato direto com a grande cidade que compõem o núcleo dinâmico da
economia brasileira.
Para Carneiro (1998) o ritmo de mudanças nas relações sociais e de
trabalho no campo transforma as noções de “rural” e “urbano” em categorias
simbólicas construídas a partir das realidades distintas cultural e socialmente.
Sendo assim, não dá mais para sustentar uma delimitação entre campo e cidade
apenas pelas atividades econômicas ou mesmo em hábitos culturais ou modos de
vida.
É notório que na atualidade o campo brasileiro passa por um considerável
processo de mudanças, reflexo do processo de modernização da agricultura,
mesmo que de forma contraditória. Para Carneiro (1998) esta se efetivou não de
forma uniforme em sua extensão, e que foi moldado nos padrões de produção do
modelo urbano-industrial.
No Brasil, segundo Carneiro (1998), as pesquisas recentes tem
apresentado dois conjuntos de fenômenos para o meio rural brasileiro.
O primeiro se estabelece no entendimento de que o meio rural brasileiro
não é mais definido exclusivamente pelas atividades agropecuárias, mas estando
agora relacionado com o aumento do número de pessoas residentes no campo
exercendo atividades não-agrícolas e ao aparecimento de uma parcela
considerável de pequenos agricultores que combinam a agricultura com outras
formas de rendimento, na chamada pluriatividade.
57
O segundo está relacionado à procura crescente de formas de lazer
alternativos pelos citadinos com destino ao campo. Esse movimento inicia-se no
Brasil na década de 1970, e ganha dimensões na divulgação do pensamento
ecológico da década de 1990 (Carneiro, 1998), estimulando os desejos de
consumo da natureza, transformando-a em mais uma mercadoria, pelas
modalidades de turismo rural, de aventura, ecológico, alterando o ritmo da vida no
espaço rural.
Ocorre segundo Alentejano (2000), um exagero na elucidação da
ocorrência de mudanças radicais no mundo rural brasileiro, conferindo a mesma
uma nova fisionomia. De fato, não se pode negligenciar a verificação de tal
transformação, importantes e significativas no campo brasileiro, mas o que está
ocorrendo são atribuições na perspectiva de uma absoluta inovação nos últimos
anos, não condizente com a realidade em sua totalidade.
A multiplicação de atividades não-agrícolas, o processo de modernização
da agricultura patronal e de parcelas da agricultura familiar, promoveu segundo os
formuladores e adeptos da concepção do “novo rural” uma nova dinâmica no
campo brasileiro, onde cada vez mais os agricultores estão integrados aos
circuitos financeiros e informacionais e a tecnificação não podendo mais ser
classificados como meramente rurais. Assim, estaria ocorrendo dentro dessa
lógica à consumação da urbanização do campo brasileiro, como a consolidação
da agroindústria – expansão da lógica de produção tipicamente urbana para os
setores modernizados da agricultura, com a atividade tipicamente urbana onde a
modernização não se instalou propriamente dita.
Para Alentejano (2000, p. 101.), essas formulações apresentam três
problemas básicos:
Em primeiro lugar, obscurecem as diferenças existentes no próprio processo de modernização, deixando de perceber as especificidades e contradições presentes neste; de outro, não observam as diferentes estratégias que estão por trás da adoção de práticas idênticas, atribuindo-lhes uma racionalidade comum; finalmente, não identificam as continuidades históricas entre processos antigos e atuais, atribuindo a todos o caráter de novidade.
Segundo Carlos (2004) cidade e campo se diferenciam pelo conteúdo das
relações sociais neles contidos e estas, ganham conteúdos em sua articulação
58
com a construção da sociedade urbana. E, que a contradição cidade-campo se
desenvolve propondo uma nova contradição, que é a de centro e periferia.
Na realidade cidade e campo sinalizam o modo como se realiza a inserção do Brasil no quadro da economia mundial, na divisão sócio-espacial do trabalho revelando a racionalidade imposta pela globalização do capital reproduzindo na escala internacional a hierarquização de espaços dominados/dominantes (CARLOS, 2004, p. 135).
Segundo Carlos (2004) a extensão do sistema capitalista permitiu a
generalização da propriedade privada e a submissão da vida cotidiana a sua
lógica capturando os momentos, culturas e tradições da vida tanto na cidade
quanto no campo, aproximando-os cada vez mais. A cidade e o campo agora
estão articulados, deslocando a contradição cidade/campo vinda da história, para
a contradição centro periferia, estabelecendo uma nova hierarquia social entre
espaços dominantes e dominados a partir da construção de novas centralidades.
Contudo, a sociedade urbana continua com maior reprodução, a cidade vai
ganhando cada vez mais importância, pois estimula os setores competitivos da
economia a partir dos centros urbanos, seja financiando a agricultura capitalista,
seja direcionando a localização da indústria.
A reorganização do processo produtivo aponta novas estratégias de
sobrevivência no campo e na cidade bem como, movimentos sociais no campo
como na cidade, respectivamente os “sem terra” e os “sem teto”. Tanto no campo
como na cidade, o processo de reprodução se realiza pelo conflito entre valor de
uso/valor de troca. As lutas dos “sem direitos” revelam o processo de deterioração
e desintegração da vida colocando em cheque o direito da propriedade privada e
as formas de apropriação do espaço enquanto condição de realização da vida,
seja para a produção do alimento, seja enquanto moradia e tudo o que esta
atividade implica para a vida. Neste embate se questiona no campo a
improdutividade da terra e na cidade a ausência de moradia (CARLOS, 2004).
Lefebvre (1969, p. 17) destaca que “a relação urbanidade-ruralidade,
portanto, não desaparece, pelo contrário: intensifica-se, e isto mesmo nos países
mais industrializados”. E que a cidade tomada de assalto pela industrialização,
não de forma natural ou involuntária, mas pela ação/intervenção de classes ou
frações de classes dirigentes, que possuem o capital – os meios de produção,
geradores não apenas dos empregos e investimentos econômicos, mas de toda a
59
sociedade, com emprego das riquezas nas artes, cultura, no conhecimento, na
ideologia.
Lefebvre (2001), ancorado no pensamento de Marx coloca que a
separação das classes é simultaneamente ilusória e real. Ilusória, porque se
estabelece na mesma sociedade e no mesmo todo, além de que só existe uma
fonte de riqueza social. E real pelo fato de existirem socialmente e estarem
separadas, mantidas como tal, e materializadas pelo conflito.
O referido autor ainda coloca que a divisão do trabalho direciona a
separação do trabalho industrial e comercial, bem como a do trabalho agrícola, de
outro. Conduzindo desta forma a distinção entre campo e cidade e a oposição de
seus interesses. Assim, a divisão do trabalho é responsável, de modo geral, pelas
múltiplas divisões e separações particulares das atividades sociais. Assim, ainda
apoiado em Marx, Lefebvre (1969), afirma que a divisão do trabalho entre cidade
e campo corresponde à separação entre o trabalho material e o trabalho
intelectual. Em que a cidade é considerada local de trabalho intelectual, lócus da
administração, da política e da cobrança de impostos, dentre outros. E dela
emana o controle financeiro e ideológico e se conduz tanto a orientação material
como a orientação moral da sociedade.
3.2 A PROBLEMÁTICA DO QUE VEM A SER RURAL E URBANO NO BRASIL
A origem dos municípios brasileiros é inspirada no modelo da república
romana (época do Brasil colônia), onde exercia funções políticas legislativas e
administrativas. De lá pra cá, a formação municipal brasileira reflete esse modelo.
Até 1938, o Brasil não estabelecia diferença legal entre cidade e vila, com isso
tanto cidades quanto vilas podiam ser sedes de municípios. Foi somente no
Estado Novo que surgiram as diretrizes básicas nacionais de divisão territorial,
onde havia, dentre outros, os seguintes requisitos: população mínima de 100 mil
habitantes, eleitorado não inferior a 10% da população, centro urbano já
constituído (TAVARES, 2003).
Após muitos avanços e regressos, finalmente o Decreto-Lei 311/38
conferiu aos Conselhos Nacionais de Geografia e de Estatística - hoje IBGE – a
atribuição de estabelecer os requisitos mínimos para a elaboração dos perímetros
60
urbanos e mapas municipais. Esta lei vigora até os dias de hoje. A área urbana do
município é definida pela Lei do perímetro urbano (de competência municipal). É o
perímetro urbano que indica o limite oficial entre as áreas urbanas e rurais.
Contudo, quase sempre as áreas são tidas como urbanas (até mesmo algumas
rurais) em virtude de expandir a base de arrecadação do IPTU.
Tavares (2006) expõe que os municípios não atualizam os seus perímetros
urbanos, cabendo ao IBGE introduzir outras unidades territoriais (além das
convencionais urbanas, rural e urbana isolada), a saber: aglomerados
subnormais, aglomerados rurais isolados, áreas urbanizadas, áreas não
urbanizadas e aglomerados de extensão urbana.
As inadequações existentes na definição do que venha a ser rural e
urbano, somam-se as dificuldades conceituais e metodológicas impostas aos
formuladores de política pública e das diversas áreas de conhecimento. A
superação dessa empreitada é dificultada pela vigência de uma legislação
anacrônica, e que carece de investimentos teóricos e de esforço empírico para
sua compreensão.
É impossível realizar um recorte espacial perfeito entre rural e urbano,
diante da complexidade que demonstra que esses conceitos se interpenetram, ou
seja, complexidade de uma realidade composta por diferentes níveis de
integração e distanciamento entre esses espaços.
Para fins de planejamento e formulações de políticas de desenvolvimento rural e urbano, torna-se coerente a realização de algumas subdivisões que não buscarão, necessariamente, a total separação entre as insuficiências teóricas e empíricas do que seja rural e urbano no Brasil, constituindo-se em uma alternativa que possui sua viabilidade justificada por razões de ordem prática (REIS, 2005, p. 90).
Veiga (2002) traz polêmicas reflexões a respeito da delimitação do rural e
do urbano no Brasil, e suas implicações sobre as políticas de desenvolvimento
rural. Destaca a precariedade do anômalo, anacrônico e obsoleto modelo de
delimitação do campo e cidade adotado no Brasil, que desde o final da década de
30, sob a égide do Estado Novo, onde através da lei 311, de 1938, delineou-se
como cidade todas as sedes municipais existentes, independente de suas
características estruturais e funcionais.
61
Veiga (2002) lembra que nada disso teria muita relevância se fossem raros
os casos de sedes municipais que exercem ínfimas pressões antrópicas sobre o
ecossistema urbano, pouco artificializado, às vezes quase intocado (no que se
refere às mudanças decorrentes do processo de urbanização).
Segundo Veiga (2002, p. 66) “para que a configuração territorial brasileira
não permaneça tão obscura, é imprescindível construir tipologias alternativas,
capazes de captar a imensa diversidade dos municípios”.
Veiga (2002) conduz seu estudo sobre o cálculo do número de cidades no
Brasil a partir de uma definição político-administrativa, em que a cidade é definida
como sede do município. Assim existiriam no Brasil 5507 sedes de municípios em
2000, todas ancoradas pelo estatuto legal de cidade. Para o referido autor, 455
seriam “inequivocamente urbanas”, restando 5052 classificados, segundo Veiga,
como “pertencem ao Brasil rural” e as que se encontram no “meio campo”, ou
seja, àqueles cujas características trazem em seu conteúdo aspectos de ambos
os espaços.
Veiga fundamenta-se na densidade demográfica, no chamado grau de
pressão antrópica, que seriam o melhor (para o autor) grau de artificialização dos
ecossistemas, e consequentemente da urbanização do território, somando-se a
localização, reflexo das modificações do meio natural pelas atividades antrópicas.
Segundo Carlos (2004), por essa perspectiva ocorre a naturalização da
sociedade, pois se distingui áreas “mais rurais” em função da natureza intocada e
aos ecossistemas mais alterados pela ação humana e manchas de grandes
cidades.
Carlos (2004) faz críticas a Veiga, por não analisar os processos e estar
preso aos dados estatísticos para respaldar e dar substância ao seu
entendimento acerca da urbanização brasileira, ou seja, não se confunde
processo de urbanização com densidade demográfica. A referida autora
considera ingênua a postura de Veiga por acreditar que a simples alteração
estatística, vão conduzir a reorientação das políticas públicas na promoção de
possibilidades do crescimento, mas perceber que estamos diante da produção do
espaço pela sociedade, e sob a égide do Estado regulador, na imposição das
relações de produção enquanto dominação de espaços.
62
O problema é que “urbano” e “rural” longe de serem meras palavras são conceitos que reproduzem uma realidade social concreta. A simples delimitação espacial do que se acredita ser urbano ou rural nos diz muito pouco sobre os conteúdos do processo de urbanização brasileira, no momento atual. (CARLOS, 2004, p. 131).
Segundo Carlos (2004), a contradição cidade-campo ganha contornos e
dimensões da contradição centro-periferia. Em que a reorganização do processo
produtivo direciona novas estratégias de sobrevivências tanto no campo como na
cidade e movimentos sociais em ambos, articulados, pois a presença da
propriedade privada marca e circunscreve as possibilidades de apropriação no
campo e na cidade e estabelecendo lutas conjuntas.
A relação cidade-campo, conforme Lefebvre (1969) mudou profundamente
no decorrer do tempo histórico, ora se apresentando profundamente conflitantes,
ora mais pacifica e perto de uma associação. Porém podendo ser presenciada
numa mesma época manifestações distintas para tal relacionamento.
Para os momentos históricos que se apresentam profundamente conflitante
entre cidade e campo, Lefebvre (1969) chama a atenção acerca dessa relação
nos países industriais, onde a velha exploração do campo circundante pela cidade
cede lugar a formas mais sutis de dominação e de exploração, tornando-se a
cidade um centro de decisão e aparentemente de associação.
Hoje não tem sentido, porém, reforçar, a idéia de que existe uma diferença, uma luta desleal entre cidade e campo. A questão não é esta; as relações de mercado estabelecem o que deve ser modificado, onde os investimentos devem ser concentrados. Por isso a questão não é que a cidade esteja vencendo e o campo esteja perdendo, a questão é que os detentores dos meios de produção decidem onde é melhor investir. É importante registrar que embora os investimentos se deem tanto no campo como na cidade, esta atraí para si a população em busca de melhores condições de vida. (MACHADO, 1990, p.94).
Segundo Lefebvre (1969) a vida urbana pressupõe encontros, confrontos
das diferenças, conhecimento e reconhecimentos recíprocos (inclusive político e
ideológico) dos modos de viver, dos “padrões” que coexistem na cidade.
A cidade se transforma não apenas em razão de “processos globais” relativamente continuo (tais como o crescimento da produção material no decorrer das épocas, com suas consequências nas trocas, ou o desenvolvimento da
63
racionalidade) como também em função de modificações profundas no modo de produção, nas relações “campo-cidade”, nas relações de classe e de propriedade. O trabalho correto consiste aqui em ir dos conhecimentos mais gerais aos conhecimentos que dizem respeito aos processos e às descontinuidades históricas, á sua projeção ou refração na cidade, e inversamente, dos conhecimentos particulares e específicos referentes à realidade urbana para o seu contexto global. (LEFEBVRE, 1969, p. 53).
Machado (2008) fundamentado na obra de Lefebvre (1978) mostra que a
relação entre urbano e rural gera formas criativas e dinâmicas de ocupação e uso
da terra. Mas o próprio Lefebvre (1969) chama a atenção destacando que pode
ser contestada teoricamente interpretação que vislumbra na oposição cidade-
campo a partir da noção de que os países industrializados têm o campo se
perdendo no seio da cidade, com a cidade absorvendo o campo e perdendo-se
nele.
Adentrar na discussão acerca do rural e urbano em relação à produção do
conhecimento pressupõe: esforço, rigor, organização, dedicação intelectual,
ousadia, pretensão e sonhos, pois constituem operações delicadas, com
presenças reais de possíveis fantasmas que costumam assombrar aqueles que
se prestam na busca pelo saber, porém favorecem a constituição de
questionamentos e discussões.
Pensar sobre o rural e o urbano para além (puramente) do que está posto
pela legislação vigente, mas reflexiva na busca do entendimento da realidade a
partir das manifestações/presenças de traços e aspectos inerentes ao espaço
rural, que se encontra cravado, seja na periferia das cidades (áreas periurbanas),
seja de forma pontual no interior da malha ou tecido urbano.
É pela não aceitação da neutralidade cientifica, tão criticada e que precisa
ser extirpada de fato, que em face de observância de elementos do mundo rural
que adentram na fronteira, para muitos, rígida e intransponível do espaço urbano,
que só se move apenas na expansão de seus limites abarcando aquilo que
teoricamente é concebido como seu oposto, o rural, e imprimindo toda a sua
lógica, ritmo, normas e cultura, destruindo assim qualquer aspecto e
características da rusticidade.
A cidade é um modo de viver, pensar, mas também sentir. O modo de vida urbano produz ideias, comportamentos, valores,
64
conhecimentos, formas de lazer e também cultura. (CARLOS, 2005. p. 26).
A referida autora busca compreender a cidade dentro de uma totalidade, a
partir da qual ela é possível de ser apreendida, ou seja, enquanto produto
histórico e social a cidade tem relações com a sociedade em seu conjunto, com
seus elementos constitutivos e com sua história, transformando-se à medida que
a sociedade como um todo se modifica.
A cidade está além do construído, pensá-la para além das formas, é
entendê-la enquanto reflexo das relações sociais que permeiam a sociedade, nos
mais diferentes aspectos e considerações, a exemplos das várias instituições que
regem esta sociedade (família, escola, igreja, Estado).
3.3 AGRICULTURA E ESPAÇO URBANO
A agricultura é uma atividade complexa e multifacetada, cujas
características variam de acordo com as técnicas empregadas, as condições
geoambientais, as disponibilidades de recursos humanos e capitais, além da
localização das áreas e outros. Logo, a sua compreensão e dimensionamento
dependerá dos procedimentos e métodos empregados na análise territorial, não
se restringindo a uma análise setorial, como é frequente em trabalhos das
ciências sociais, em particular da geografia.
O espaço rural brasileiro na atualidade tem seu conteúdo redefinido a partir
tanto da incorporação de tecnologias ao processo produtivo, bem como o
desenvolvimento das atividades não-agrícolas, e as transformações sociais delas
decorrentes, em que se mesclam funções tradicionais com novas funções. Assim,
a concepção tradicional de espaço rural é cada vez menos satisfatória para definir
e caracterizar tal complexidade territorial (LOCATEL, 2008).
Segundo Locatel (2008), a definição da agricultura como definidora do
espaço rural deve ser relativizada, visto que essa atividade não é exclusiva do
espaço rural, mas pode ser encontrada em espaços urbanos e periubanos.
Tradicionalmente na geografia agrária, os enfoques das atividades agropecuárias
eram definidores do espaço agrário, tido como sinônimo de espaço rural,
atribuindo-lhe características de arcaico, atrasado, rústico e inóspito, além de
65
bucólico e puro, sendo o homem do campo adjetivado de igual maneira, definido
como agricultor, com pouca instrução e cultura.
A própria agricultura praticada no meio rural apresenta características
diversas, ora composta de sistemas agrícolas tradicionais, a exemplo de
agricultura de subsistência e itinerante, ora ligados aos sistemas agrícolas
modernos, atrelados ao comércio nacional e internacional, aproximando cada vez
mais essa realidade a dinâmica urbana, do que a rural.
É dentro dessa lógica que o espaço urbano não é visto aqui apenas
atrelado a indústria, comércio e a negação do rural, pelo contrário, não há uma
separação cidade campo mesmo cada um apresentando suas particularidades e
singularidades. A agricultura urbana vem legitimar e reforçar a presença de
práticas agrícolas na cidade, o que refuta a tão cristalizada idéia de que cidade e
campo são pares antagônicos, sendo necessário considerar que mesmo em meio
ao atual processo de urbanização presenciamos traços e elementos do rural
espalhados pelo tecido urbano.
Segundo Correia (1999), a cidade é o lugar privilegiado de ocorrência de
uma série de processos sociais, entre os quais a acumulação de capital e a
reprodução social têm importância básica. E estes mesmos processos criam
funções e formas espaciais, ou seja, criam atividades e suas materializações,
cujas distribuições espacial constitui a própria organização espacial urbana.
O espaço urbano e sua supremacia enquanto centro da acumulação de
capital incorpora uma diversidade de processos produtivos e assim de variadas
formas de trabalho. Nas periferias das cidades, que em um período anterior eram
pautadas predominantemente pelas atividades eminentemente agrícolas,
mesclam-se atividades urbanas e rurais, exercidas pelos excluídos do trabalho
urbano formal, e que como estratégias de sobrevivência permanecem
desenvolvendo atividades tradicionais, de caráter extremamente precário, mas
que se mantém como necessárias na lógica contraditória de acumulação
capitalista (MOURA, 2007).
O espaço urbano vai sendo construído e reconstruído, através de políticas
públicas, gerando descontinuidades e agrupamentos, sem respeitar as relações
econômicas e sociais preexistentes, ou seja, os interesses da população local,
seus anseios e necessidades. É onde podemos encontrar neste espaço urbano
66
fragmentado e articulado, contradições que instigam e redefinem antigas relações
campo-cidade.
O espaço urbano capitalista apresenta descontinuidades e recortes, com
presença de múltiplas territorialidades resultantes das contradições impostas por
um modelo de desenvolvimento excludente cujo principal objetivo é a acumulação
do capital. A relação dialética entre campo e cidade é materializada nos diferentes
usos do solo, onde a apropriação privada da natureza e a precarização do
trabalho constitui-se condição para a reprodução ampliada do modo de produção
atual (MOURA, 2007).
No processo de crescimento urbano as áreas rurais vão sendo invadidas
pela cidade, originando novas configurações espaciais que não destituem por
completo as antigas formas e funções, promovendo uma mescla de sentidos e
usos, conduzindo a múltiplas territorialidades, visto que mesmo inseridas na
lógica capitalista, preserva relações “não capitalistas de produção”.
O processo de urbanização acelerado pelo qual passou as grandes
metrópoles brasileiras promoveu intensas transformações no espaço urbano e
periurbano das cidades, expondo áreas predominantemente agrícolas aos
impactos da urbanização.
Mesmo não sendo objeto principal de nossa pesquisa, vale ressaltar a
importância da agricultura metropolitana, que se restringe ao enfoque de sua
inserção como parte integral de um processo maior de crescimento urbano, não
sendo possível compreender a agricultura em si, mas num contexto de
abordagem no nível do produtor (BICALHO, 1992, apud TUBALDINI e
RODRIGUES, 2000), e que pode responder aos questionamentos mais
específicos do ambiente rural-urbano.
A esse respeito Machado (2008) fundamentado nas contribuições de
Bicalho (1998), destaca que a metropolização do espaço é muito mais complexa
do que um mero avanço urbano sobre o campo, dando origem a espaços
interativos do urbano com o rural nos quais se mantém atividades agrícolas
dinâmicas.
Essa realidade é tão forte que foi observada na área de estudo que os
agricultores urbanos que comercializavam seus produtos agrícolas nos bairros
investigados eram provenientes dos municípios vizinhos, a exemplo de Nossa
Senhora do Socorro e São Cristóvão, que compõe parte da região metropolitana
67
de Aracaju. Aproveitando para comercializar seus produtos nas avenidas
principais dos bairros durante toda semana (Figuras 16 e 17).
Figura 16: Comercialização dos produtos agrícolas n a Av. Poço do Mero, Bugio. Foto: SANTANA FILHO, L. S., 2009.
Figura 17: Comercialização dos produtos agrícolas n a Av. Poço do Mero, Bugio. Foto: SANTANA FILHO, L. S., 2009.
68
Mesmo o presente trabalho está pautado no entendimento da agricultura
de caráter intra-urbano, faz-se necessário compreender estudos com propostas
metodológicas diferenciadas como, por exemplo, a do modelo de Von Thünen;
Sinclair (1967).
O modelo Thuniano tem sido referência para os debates sobre localização
das atividades agrícolas, sejam para confirmá-las ou refutá-las; o mesmo
estabelece um padrão de distribuição espacial das atividades agropecuárias que
é determinado pela presença de um centro consumidor, a partir do qual as
atividades agrícolas estariam distribuídas em intensidades de usos decrescentes
a partir do distanciamento do centro (MACHADO, 2008).
Nesse mesmo modelo, apoiado em condições espaciais homogêneas e
considerando apenas o custo do transporte, que se mostrava diretamente
proporcional a distância das áreas de produção até a cidade, ou seja, aquelas
atividades valorizadas e intensivas, cuja produção tivesse alto grau de
perecibilidade, estariam localizadas junto ao centro consumidor, já as menos
intensas estariam mais afastadas. Vale ressaltar que mesmo com o advento do
avanço tecnológico ligados ao setor de transporte e a própria resistência genética
e preservação dos alimentos, que conduziria a superação da perspectiva
Thuniana, seu postulado segundo Machado (2008) ainda pode ser encontrado em
vários estudos científicos, principalmente na área da economia.
Diferente na análise da distribuição espacial dos cultivos e das criações,
temos as contribuições de Sinclair (1967), que indica a presença de atividades
extensivas e de baixa rentabilidade próximas aos centros urbanos. Destacando
que a periferia urbana estaria à espera de sua provável conversão em áreas
edificadas em função do crescimento das cidades, ocasionando-se assim, uma
especulação imobiliária, rompendo-se desta maneira os padrões Thuniano de
decréscimo da produção agropecuária em função do distanciamento do centro da
cidade (MACHADO, 2008).
Ainda acerca da discussão sobre agricultura metropolitana, Machado
(2008) ancorado em Bryant (1984) e Bicalho (1992) destaca que a mesma se
manifesta de diferentes maneiras, considerando-se suas relações com a cidade e
suas próprias características. As formas de inserção da produção agrícola
desenvolvida em áreas de influência ou domínio urbano sugerem que existam
69
diferentes ambientes agrícolas em processo de transformação: 1) ambiente de
agricultura desenvolvida, onde existem condições para a realização da prática
agrícola, em função da existência do próprio mercado regional; 2) ambiente de
agricultura adaptada, marcado por incertezas e grande variação na atuação das
forças urbanas e não-urbanas; 3) ambiente de degeneração agrícola, quando as
forças urbanas pressionam as demais e a agricultura declina.
Vale (2004), ao estudar e se debruçar sobre a plurifuncionalidade do
espaço periurbano, destaca que através do crescimento urbano, os limites físicos
das cidades vão englobando áreas cada vez mais distantes da sua core,
englobando o espaço rural, sem levar em consideração que esse espaço é
dotado de identidade própria e especificidade no modo de vida e organização
socioeconômica. Esses espaços englobados estão muitas vezes próximos ao
perímetro urbano e, com o tempo, neles estão inseridas atividades agrícolas e
urbanas.
No caso da zona de expansão que está circunscrita nos limites municipais
de Aracaju, não é difícil presenciar essa mescla de atividades agrícolas e urbanas
convivendo lado a lado, e sob uma mesma lógica (que é a do capital), mesmo que
lhe seja creditado o título de maior reserva de solo urbano disponível para futuros
investimentos do setor da construção civil, até o momento quando se adentra de
fato nos povoados Areia Branca, Mosqueiro, Matapuã, percebe-se a materialidade
da produção do espaço, com suas múltiplas faces e significados (Figura 18).
70
Figura 18 : Animais pastando nas ruas da zona de expansão de Ar acaju.
Foto: SANTANA FILHO, L. S., 2009.
O contraste que agrega paisagem rural e urbana e a plurifuncionalidade
caracterizam o denominado espaço periurbano. Pelo fato da não exatidão
terminológica nas análises que venha a denominar o espaço periurbano sobre o
qual recai a expansão urbana das cidades, torna-se difícil estabelecer
comparações entre espaços periurbanos e o crescimento periférico das cidades.
Podendo-se enunciar vários termos utilizados com este intuito: rural-urban frige,
banlieue, franja urbana ou rururbana, sombra urbana e espaço periurbano (VALE,
2004).
O termo usado pela geografia, quando se trata de áreas com crescimento
periférico e onde se mescla usos do solo urbano e agrícola, é o de franja urbana,
que seria a transição entre o campo e a cidade. É sem duvida um espaço social
diferenciado, pois apresenta além do aumento das formas e modos de vida
urbanos, forte mobilidade de sua população, com variedade social. Estratos
sociais diferenciados, de acordo com as distintas áreas residenciais existentes,
relações sociais mais intensas e valorização contemplativa da natureza, mas não
de forma integrada ao campo.
O termo franja rurubana é definido como um espaço onde além do uso
rural (áreas de cultivo, terrenos baldios e áreas de preservação ambiental),
71
também é ocupada por uso residencial, com pequenos agrupamentos de casas,
proliferação das propriedades unifamiliares somadas a outros usos urbanos, a
exemplo de via de transporte e instalações de serviços urbanos de infraestrutura
básica que necessitam de amplas superfícies. (ZARATE, 1984, apud VALE,
2004).
O crescimento periférico da cidade é classificado por muitos autores como
rururbanização ou rurbanização, sendo que não são sinônimos: o primeiro ocorre
nos espaços situados na zona urbana, onde a população está concentrada, com
associação entre o rural e o urbano, predominando a população urbana que
reside num espaço rural com tendências a valorização do solo, reflexo do
crescimento urbano; a segunda é uma situação intermediária entre puramente
rural e exclusivamente urbana com uma mistura entre os valores representativos
do mundo rural e urbano.
Segundo Vale (2004), periurbanização tão utilizada pelos geógrafos
franceses e espanhóis, seja a melhor forma de interpretar e entender o conceito
de espaço periurbano. Entendido como espaços plurifuncionais com presenças e
características tanto urbanas como rurais, somadas às profundas transformações
econômicas, sociais e físicas, com uma dinâmica vinculada a proximidade de
grande núcleo urbano.
O mesmo autor ainda destaca que nas décadas de 1970 e 1980, proliferou-
se no Brasil a construção de conjuntos habitacionais populares. A partir de 1990
constroem-se os condomínios fechados destinados à classe média e alta, muitas
vezes afastados do centro da cidade, deixando vazios urbanos. Estes por sua vez
conduziram a valorização do solo entre os condomínios e o centro, à medida que
a infraestrutura urbana foi implantada (asfaltamento, saneamento básico,
eletrificação e outros serviços), ou seja, a expansão urbana promove a
especulação imobiliária nessas áreas.
Durante a fase de investigação foi observado tal realidade na zona de
expansão, em que a proliferação dos condomínios fechados (Figura 19), nos
últimos anos, tem se tornado frequente, mesmo que alguns condicionantes
ambientais sejam entraves, como é o caso do problema da macrodrenagem da
região, muitos empreendimentos luxuosos são instalados valorizando cada vez
mais o solo urbano e rural.
72
Figura 19: Condomínio residencial fechado na zona d e expansão de Aracaju.
Foto: SANTANA FILHO, L. S., 2009.
As modificações nas formas de uso do solo acabam promovendo uma
competição pela sua ocupação entre indústria, comércio, residências e
infraestrutura de vários tipos, que vai ao mesmo tempo reduzindo o espaço
agrícola e ocupando as melhores terras que, por sua vez, são valorizadas.
O agricultor periurbano diante das dificuldades enfrentadas acaba sendo
classificado como agente especulador. Por isso, ocorre muitas vezes, o abandono
da atividade agrícola ou a busca de emprego em outros setores. Mas, mesmo
enfrentando estas situações desfavoráveis, as restrições impostas pelo mercado
de trabalho, muitos agricultores ainda apostam na agricultura nestes espaços já
bastante modificados pela urbanização.
França (1988) ao estudar as mudanças ocorridas nas áreas cocoicultoras
do litoral sergipano e as transformações espaciais da ocupação do espaço
litorâneo em relação à essa atividade, destaca que em Sergipe a abertura de
estradas na faixa litorânea, como a Rodovia dos Náufragos, José Sarney, as
estradas da Caueira, Abais, Saco da Boa Viagem e a rodovia para Pirambu,
tiveram papéis fundamentais nesse contexto de mudanças. Em contrapartida com
a abertura de estradas e maior acessibilidade, contribuiu para aumentar a renda
da terra da produção de coco-da-baía, mas também como aumenta o valor dos
73
terrenos litorâneos, acaba sendo prejudicial para a produção, tendo em vista o
incremento do seu potencial especulativo.
A depender de elementos externos, tais como expansão urbana, aberturas
de estradas e valorização das terras, vão promover em algumas áreas litorâneas,
mais evidentes e de forma mais acelerada, a transformação na utilização da terra,
em outras, o processo é mais lento e menos agressivo.
Nesse sentido, a autora afirma que
a produção de coco-da-baía vem sendo ameaçada diante da valorização das áreas litorâneas e da abertura de estradas, que, num primeiro momento, são implantadas com a finalidade de escoar a produção. Na realidade, essas estradas contribuem decisivamente para a redução dos coqueirais, já que as facilidades de acesso até a orla marítima conduzem a uma utilização da área, para o turismo e o lazer (FRANÇA, 1988, p. 11).
Na região da Grande Aracaju, com alto potencial de mudanças, face ao
crescimento urbano da capital e ao grande volume de empreendimentos..., “a
curto prazo, se processe a derrubada do coqueiral, em Aracaju, São Cristóvão,
Nossa Senhora do Socorro e Barra dos Coqueiros. Nesse caso, dar-se-á a
destruição, uma vez que a ocupação do solo passa a ser urbano”. (FRANÇA,
1988, p. 110).
A referida autora destaca que com a valorização dos terrenos litorâneos e,
principalmente, com o crescimento urbano de Aracaju, a tendência é o
desaparecimento da produção agrícola dessa área, ocorrendo a transferência do
coqueiral para áreas mais distantes. Porém apesar de concordar com a leitura da
autora, a produção e utilização da porção sul de Aracaju, nos povoados
Mosqueiro, Areia Branca, Matapuã, na ZEU, presenciamos áreas com práticas
agrícolas que não desapareceram por completo, ou seja, ainda persistem,
presentes na paisagem e que guarda a ligação com um passado glorioso na
produção cocoicultora, e que reascende a velha discussão da dicotomia espacial
entre o rural e urbano.
França (1988) também traz a discussão acerca da renda da produção de
coco, ao argumentar que aumenta a renda pelas condições físicas e das
condições de acessibilidade (renda diferencial), porém diminui diante da
especulação imobiliária e da distância do mercado, destacando ainda que diminui
74
a cocoicultura que, pressionada, chega a ser substituída por outros usos,
sobretudo passando do uso rural ao urbano.
O coco-da-baía deve sofrer a pressão da especulação imobiliária exercida pela cidade, direta e indiretamente, tanto pelo crescimento urbano normal sobre a periferia, como pela demanda das classes urbanas mais favorecidas por terras litorâneas de maior valor para o lazer (FRANÇA, 1988, p.14).
A autora ainda destaca um ponto extremamente importante nessa análise,
afirmando que:
O aumento da renda especulativa diminui a renda da produção, daí se espera que a periferia de Aracaju, diante do aumento do valor da terra, esteja extensificando e, até extinguindo a produção, apresentando, assim, o mais alto potencial de mudanças (FRANÇA, 1988, p. 16).
Contudo, é válido ressaltar que mesmo diante de tais mudanças
argumentadas por França (1988) há a possibilidade de uma relativização. É
sabido a presença muito forte ainda hoje do coco da baía nas áreas litorâneas da
cidade de Aracaju, mesmo não correspondendo de igual modo ao período fausto
e glorioso de sua produção, em que o estado de Sergipe já foi um dos maiores
produtores de coco do Brasil.
Segundo o IBGE, 2008 a produção de coco em Aracaju alcançou o número
de 720 mil frutos numa área plantada de 360 hectares com rendimento médio de
2000 frutos/hectares cujo valor da produção totaliza 324 mil reais. Pode-se
reconhecer o aumento da renda especulativa em detrimento da renda oriunda da
produção do coco. Entretanto, não se pode negar na análise da produção do
espaço dessa localidade a existência de traços e/ou características culturalmente
associados ao espaço rural, a exemplo de propriedade com criação de animais e
as cercas (IBGE, Produção Agrícola Municipal, 2008).
O IBGE, que não trabalha com propriedade e sim com estabelecimentos,
fornece informações referentes aos estabelecimentos agropecuários presentes
em Aracaju, conforme a Tabela 01. Por conhecer a realidade da zona de
expansão de Aracaju, bem como toda a cidade, acreditamos que estes dados
sejam oriundos principalmente da zona de expansão, pois é nesta área onde
visualizamos os vazios urbanos, como características peculiares ao espaço rural.
75
Tabela 01: Aracaju, estabelecimentos agropecuários, 2006. Nº de
estabelecimentos agropecuários
Nº de estabelecimentos
com lavouras permanentes
Nº de estabelecimentos
com lavouras temporárias
Nº de estabelecimentos com pastagens
naturais
Nº de estabelecimentos
com matas e florestas
44 23 4 5 1
Fonte: IBGE, Censo Agropecuário, 2006.
Em relação a produção pecuária municipal, percebe-se a partir da Tabela
02 a presença de rebanhos sejam eles bovinos, equinos, dentre outros. O
interessante é entender como esses dados numéricos, em relação a tal produção,
são significativos, no tocante a uma cidade considerada total ou quase que
totalmente urbana. Vale destacar também que durante o trabalho de campo
visualizou-se que do efetivo bovino, encontrado na cidade de Aracaju, grande
parte está localizada em sua zona de expansão urbana. Bem diferente dos bairros
analisados, que prevalece a prática agrícola relacionadas ao cultivo de frutíferas e
plantas medicinais. Fato esse favorável a decisão de enveredar a análise sobre a
agricultura urbana em Aracaju, basicamente a partir de duas áreas diferenciadas:
a zona de expansão e os bairros Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont.
Ainda com relação a pecuária municipal aracajuana, o IBGE apresenta
informações acerca das vacas ordenhadas e a produção de leite de vaca, o que
provavelmente ainda gera renda para seus produtores. Sendo importante
destacar a venda de leite in natura, a exemplo da comercialização, ainda
presente, do leite de porta em porta dos bairros pesquisados, em que por apenas
um real e trinta centavos (R$ 1,30) o “freguês” leva um litro de leite na vasilha.
76
Tabela 02: Produção pecuária do município de Aracaju, 2008
Rebanho Número/cabeças Bovino 880 Equino 426 Asininos 18 Muares 106 Suínos 530 Caprinos 165 Ovinos 630 Galos, Frangas, Frangos e Pintos 33.000 Galinhas 2.700 Codornas 4.800 Vacas Ordenhadas 170 Produção Quantidade Leite de vaca 122 mil litros Ovos de galinha 11 mil dúzias Ovos de codorna 19 mil dúzias Fonte: IBGE, Produção da pecuária municipal, 2008.
Em algumas propriedades da zona de expansão de Aracaju, percebe-se
que a terra que espera pela conversão de rural para urbano, via especulação
imobiliária, é muitas vezes local de práticas agrícolas, enquanto a mesma não é
vendida, sendo utilizada com plantações de cultivos agrícolas, como pode ser
observado na Figura 20.
Figura 20 : Mesclas de sentidos e usos na zona de expansão de A racaju.
Foto: SANTANA FILHO, L. S., 2009
77
Cada fração da cidade deve ser estudada na observância de suas
especificidades, mas não perdendo a dimensão/compreensão da totalidade das
relações sociais, neste caso sócio-espaciais, visto que a cidade é reflexo da
produção histórico-social, ou melhor, constitui-se em trabalho humano
materializado na paisagem.
Ao se expandir sobre o espaço rural, a cidade tende a incorporá-lo e
submetê-lo a novas formas de apropriação, formatando novos usos e funções.
Neste sentido,
quando a cidade se expande sobre o campo não significa que esta área deixe de ser propicia para o cultivo agrícola, mas que é de interesse do capital através da especulação imobiliária, para que se transforme em loteamento, distrito industrial ou shopping center (MAIA (2000), apud MOURA, 2007, p. 98).
Maia (2003) reflete a respeito da manifestação do mundo rural na cidade,
evidenciando a casa enquanto elemento unificador desses espaços. A autora
trabalha com a categoria subespaços para destacar a manifestação da herança
rural expressas em algumas casas luxuosas como também nas mais simples,
desmistificando que mesmo diante do processo de urbanização e industrialização,
a herança rural não foi suplantada, muito embora suas evidências tenham sido
abafadas pela sociedade moderna.
A referida autora destaca que a partir de um olhar mais atento sobre a
paisagem, podemos encontrar encobertos pelos incrementos urbanos, animais
pastando nos lotes vazios, carroças puxadas pelo burro entregando leite in
natura, homens levando capim para alimentar seus animais, como também
cavaleiros que se aventuram pelas ruas da cidade, dividindo espaços com os
automóveis.
Dentro dessa visão, a autora ainda afirma que a prática desses homens,
geralmente de origem rural, manifesta-se na cidade em micro-espaços, com
pequenas criações ou mesmo na manutenção de costumes que se mesclam a
vida urbana, não se resumindo somente às atividades praticadas, mas sendo
incorporadas no seu modo de viver, tendo a sua casa a expressão de uma
herança rural.
Muitas vezes, esse cidadão que mora na cidade e/ou no seu entorno, por
estar marginalizado ou excluído do processo de produção baseado no modelo
capitalista, inclui-se através da relutância de práticas do mundo rural, trazidos
78
muitas vezes, em virtude das numerosas correntes migratórias provenientes do
campo.
Segundo Resende (2004), o mundo rural continua presente nas cidades,
nas ruas e nos quintais, nas atividades dos carroceiros e suas carroças,
prestando serviços à cidade, nas pequenas hortas e criações de animais na
periferia, assim como nas manifestações culturais, como as festas do Divino e de
Santos Reis.
Como bem lembra Lefebvre (2001, p. 12),
entre as malhas do tecido urbano persistem ilhotas e ilhas de ruralidade “pura”, torrões natais frequentemente pobres (nem sempre), povoados por camponeses envelhecidos, mal “adaptados”, despojados daquilo que constitui a nobreza da vida camponesa nos tempos de maior miséria e da pressão.
Essa afirmativa, que respondia a uma realidade há mais de 40 anos, pode
facilmente ser aplicada a realidade, pois podemos observar a mescla do rural,
tanto nas cidades, como em áreas metropolitanas, tanto em países centrais como
nos periféricos (LOCATEL, 2008).
Apesar de haver uma tendência no sentido da urbanização no mundo, esse
fenômeno não se dá de forma homogênea, nem mesmo as ondas de urbanização
conseguem eliminar todos os elementos da vida rural, com a expansão de sua
trama territorial. E o campo, mesmo sendo “urbanizado” não se deixa eliminar por
completo, havendo sempre às resistências, sobrando sempre elementos da vida
rural.
O crescimento da pobreza urbana e metropolitana, do desemprego e da
insegurança alimentar, dentre outros problemas da realidade urbana, coloca lado
a lado, força de trabalho, conhecimento disponível, que podem ser utilizados para
prática da autoprodução, a exemplo da agricultura urbana, como mais uma
estratégia de sobrevivência/permanência no equacionamento (in)sustentável dos
conflitos urbanos e das contradições geradas pelo modo de produção
hegemônico.
Santos (1994), ao se referir ao território da cidade afirma que:
Quanto às cidades, aquelas cujas dimensões são maiores, utilizam parte dos territórios vazios dentro da aglomeração ou em suas proximidades com atividades agrícolas frequentemente
79
modernas e grandemente destinadas ao consumo da respectiva população. (SANTOS, 1994, p. 65).
Madaleno (2001) salienta que essas atividades socioeconômicas não
devem ser vistas isoladamente, mas considerando o contexto das economias
locais e regionais, das formas de ocupação e uso do solo urbano, dos sistemas
de gestão e até de sistemas de produção e de distribuição de alimentos globais.
Pode-se entender a agricultura urbana e periurbana, como uma estratégia
social, voltada à complementação de renda, geração de emprego, redução do
risco de insegurança alimentar, além de melhores condições para um
protagonismo da mulher, do idoso e do jovem.
Ocorre que no Brasil a implementação das atividades de agricultura
urbana, vinculadas à segurança alimentar não se dá pela escassez de alimentos,
porém está relacionado à demanda, ou seja, a possibilidade de acesso da
população aos alimentos através do mercado.
A agricultura urbana tem um caráter social e ambiental, pois incide nas
famílias que a praticam da seguinte forma: complementação de renda;
fornecimento de alimentos básicos que essas mesmas famílias não teriam acesso
no mercado livre para comprar; alimentos frescos e saudáveis com possibilidade
de diversificação da dieta alimentar; reciclagem do lixo através da utilização de
resíduos e rejeitos domésticos para adubação, além da reutilização de
embalagens para formação de mudas; farmácia caseira (plantas medicinais),
dentre outros.
A questão de geração de renda através da atividade de agricultura urbana
é também compreendida como valor monetário obtido através da comercialização
dos produtos agrícolas e como alternativa para poupar os gastos que seriam
feitos na compra de alimentos, que passam a ser produzidos em seus quintais, da
mesma forma evitando a compra de medicamentos utilizando plantas medicinais,
e cultivando plantas para alimentar seus animais, evitando assim a compra de
rações.
A agricultura urbana e seus desdobramentos no espaço urbano, seja pela
discussão da dicotomia espacial, pela problemática do que vem a ser rural e
urbano, bem como pelas mesclas de sentidos e usos da/na cidade, existe
enquanto manifestação materializada na cidade de Aracaju, logo seu estudo é
pertinente e ao mesmo tempo desafiador. Desafiador porque para levar esse
80
estudo adiante é preciso, antes de qualquer coisa, encará-lo como necessário à
realidade de Aracaju, tendo em vista a ausência de estudos referentes a essa
temática. É a partir dessa premissa que o capítulo seguinte propõe uma
discussão mais afunilada da AU em Aracaju, mais especificamente nos bairros
Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont e na sua Zona de Expansão.
81
4. A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO EM ARACAJU E A AGRIC ULTURA
No presente capítulo discute-se de forma mais verticalizada o recorte
territorial, alvo da pesquisa em tela, que a principio é introduzido com um
resgate da evolução do tecido urbano da capital sergipana, para
posteriormente adentrar, de forma mais especifica, na caracterização geral das
áreas consideradas adequadas para a compreensão e dimensionamento da
agricultura urbana no município de Aracaju. E finaliza-se o mesmo buscando
compreender a renda da terra urbana e da monopolização da terra em Aracaju.
4.1 O SÍTIO URBANO
Aracaju foi fundada em 1855 por Inácio Joaquim Barbosa, para subsidiar
as relações político-administrativas e econômicas, sendo considerada o
principal e mais importante centro da rede urbana estadual. Sua localização
embora em terrenos alagados, de pântanos, mangues e dunas, possuía uma
posição estratégica, situado à margem do estuário do rio Sergipe, o que
possibilitava o controle sobre as diversas regiões econômicas da Província,
principalmente sobre a zona açucareira da Contiguiba.
A produção agrícola da Cotinguiba, em meados do século XIX, estava
relacionada à exigência exterior de consumo de produtos tropicais,
proporcionado pela revolução industrial. É nesse contexto que o Estado teria
que viabilizar a criação de um novo centro de comercialização, que mantivesse
contato com o exterior e que fosse centro econômico da Província, neste caso
São Cristóvão, antiga capital da Província, não atendia essas necessidades.
O interessante é que a transferência atendia também os interesses dos
Senhores-de-engenho, fato comprovado pela fraca oposição dos proprietários
do Vaza-Barris, que logo perceberam as vantagens econômicas.
É importante frisar que de início, Aracaju não exerceu total influência
sobre a rede urbana da época, pois as outras cidades estavam localizadas nos
fundos dos estuários dos rios Japaratuba, Cotinguiba, Sergipe, Vaza-Barris e
Piauí, na Zona da Mata.
Assim, eram prósperas as cidades de Laranjeiras, Maruim e Riachuelo, na Zona da Contiguiba, e Estância, no vale do Piauí, que além de portuária, exerciam importante função
82
comercial e de serviços para as áreas mais próximas. (RIBEIRO. 1989. p.31).
De imediato, logo nos primeiros anos de vida a cidade de Aracaju teve
que enfrentar sérios problemas urbanos. Em 1855, o próprio presidente
Barbosa foi acometido e morto por moléstia (epidemia de cólera). Tal epidemia
perdurou até o inicio do ano de 1856 na nova capital.
As águas estagnadas formavam o habitat dos mosquitos que transmitiam o impaludismo e tantas outras moléstias, constituindo fator de descrença para os possíveis investidores e de expulsão da população (RIBEIRO. 1989. p. 42).
A implementação da estrutura urbana em Aracaju, no tocante ao
melhoramento de sua infraestrutura, deu-se em um momento histórico em que
o país havia adquirido melhoramentos consideráveis, sendo assim, Inácio
Barbosa, atuou no sentido de colocar a nova capital nesse “circuito”. Para
tanto, o presidente da Província, deixou a cargo do então capitão de
engenheiros, Sebastião José Basílio Pirro, o planejamento da cidade.
O Plano Pirro, segundo Porto (1991), não era adequado para a realidade
do sítio urbano de Aracaju, pois, tratava-se de um sítio praiano e pantanoso,
que necessitava de um planejamento que desse melhor aspecto à cidade,
evitando grandes aterros e facilitando os serviços de drenagem.
Ribeiro (1989) destaca que a nova capital era caracterizada pela enorme
quantidade de aterros, devido às condições físicas e geográficas da região. O
Estado desempenhou o papel de incentivador, observado na elaboração do
Plano da Cidade, na concessão de vários aforamentos aos funcionários
públicos e recursos, cuja preocupação era consolidar a transferência da capital.
Com o objetivo de incentivar as edificações na cidade, o plano Pirro
sofreu pequena alteração, pois o presidente da Província, ao ver a necessidade
de curvar a reta da rua da Frente, alterou-o, fazendo-o paralela ao rio Sergipe.
Apesar das diversas sugestões, “a cidade cresceu fria e inflexível dentro das
malhas do reticulado, numa repetição monótona de si mesma” (PORTO, 1991,
p. 34).
Apesar das dificuldades descritas acima, a construção da cidade seguiu
em frente. Foram criadas edificações administrativas, a Igreja de São Salvador,
83
e diversas edificações na rua São Cristóvão e da Aurora (as mais edificadas), e
como também da Barão de Maruim (conhecida como rua do Barão).
Mas, devido ao “livre arbítrio” dos edificadores (aos quais ameaçavam
comprometer o aspecto e a regularidade do plano da cidade) “a câmara
municipal pôs em execução suas primeiras posturas, aprovadas pela
Resolução Provincial nº 458, de 03 de setembro de 1856, regulando a
edificação e os costumes dos seus habitantes” (PORTO, 1991, p. 42).
Com isso, as habitações que não se enquadravam nessa nova diretriz,
devido a questões econômicas e de infraestrutura, estavam obrigadas a se
refugiarem nas áreas marginais, ou seja, fora do perímetro do plano Pirro.
Porto (1991) denomina tal fato como primeiro fenômeno geográfico de
diferenciação social que se operou em Aracaju. Demonstra a natureza
excludente do espaço urbano de Aracaju, o qual é regulado pelas forças
econômicas e políticas, a qual vai se caracterizar ao longo do seu
desenvolvimento.
Segundo Ribeiro (1989) entre 1900 e 1930, vamos presenciar os
acontecimentos como a 1º Guerra Mundial e o marcante declínio das
economias do açúcar e do algodão, porém, é nesse período que Aracaju vai
sofrer grandes transformações, como as grandes construções de escolas
(Atheneu Sergipense e Escola Normal), Hospital, Teatro, Fundação do Banco
de Sergipe, etc.
De 1930 a 1964, é marcado pela diversificação do Centro-Sul do país na
agricultura, afetando drasticamente o Nordeste, e isso inclui Sergipe. Nos anos
40, como efeito da 2º Guerra, verifica-se um aumento na produção de tecidos,
que representava a principal atividade econômica do estado de Sergipe, fora o
setor rural.
Com a crescente implantação das ferrovias e rodovias, Aracaju foi
perdendo sua função portuária e tornando-se centro administrativo e comercial,
e consequente capital regional. O fácil acesso a Aracaju, possibilitada pelas
vias de transporte, aumentou o fluxo de imigrantes, promovendo assim por
parte da prefeitura o processo de expansão da periferia inicialmente através de
ocupação espontânea e depois loteamentos. Foi a partir daí que se presenciou
o espraiamento da cidade e sua segregação sócio-espacial, em que as classes
84
mais abastadas se dirigem para o sul e as classes menos favorecidas em
direção ao norte.
Os recursos e riquezas do estado de Sergipe, nas últimas décadas do
século XX, concentraram-se ainda mais em Aracaju, e esta reflete de certa
forma a riqueza e contraditoriamente as desigualdades do estado, na medida
em que concentra de um lado a indústria, o comércio e serviços, e acima de
tudo o consumo e, por outro, uma parcela significativa da população vivendo
em condições precárias.
Percebe-se também que a população mais carente de Aracaju em sua
grande maioria, se encontra hoje localizadas nos bairros Santa Maria, antiga
Terra Dura, Mosqueiro, Porto Dantas, Coqueiral Sagrada Família e outros, ou
seja, nas áreas mais periféricas e afastadas das áreas centrais.
Para o desenvolvimento desta pesquisa, devido às dimensões do
município, o recorte territorial, no qual se concentrará a análise empírica,
visando o aprofundamento de algumas questões acerca da agricultura urbana
e seus desdobramentos no espaço urbano da capital será a porção sul do
município conhecida como Mosqueiro na chamada zona de expansão de
Aracaju, e alguns bairros do noroeste da capital, que são o Bugio, Jardim
Centenário e Santos Dumont.
4.2 ZONA DE EXPANSÃO DE ARACAJU: ASPECTOS GERAIS
Até 1960 o acesso ao povoado Mosqueiro era restrito, sendo efetuado
pelos comunitários local (muito deles pescadores) através de animais, a pé ou
navegando pelos riachos, que nas épocas de chuvas tem seus volumes
aumentados, para comercializarem seus produtos no mercado de Aracaju. A
partir de 1980, com a construção da rodovia dos Náufragos, ocorre uma
aproximação das relações entre Aracaju e o povoado Mosqueiro, onde muitos
veranistas passam a frequentar a região, adquirindo terrenos e construindo
casas, que posteriormente tornam-se moradia permanente.
Na zona de expansão de Aracaju há uma diversidade em relação às
residências, em que se encontra um grande número de chácaras e sítios
(Figura 21), bem como a presença dos condomínios fechados com alto grau de
sofisticação (Figura 22). Tal realidade reflete a presença de distintas classes
85
sociais e modos de vida diferenciados da população que aí reside, ou seja,
percebe-se na paisagem o contraste na arquitetura das moradias. Ao mesmo
tempo em que se vê condomínios residenciais destinados a população
abastada, chácaras enormes enquanto local de lazer, tem-se a presença
bastante difundida de pequenos sítios e casas de uma população mais carente,
a qual foi pioneira no processo de ocupação dessa localidade.
Figura 21: Residências presente na Zona de Expansão Urbana de Aracaju. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
nn
Figura 22: Residência presente na Zona de Expansão Urbana de Aracaju. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
86
É interessante destacar que alguns proprietários, como pode ser
observado na Figura 23, ainda apresentam na entrada da propriedade o nome
“sítio ou chácara” denominação que vem caracterizar, de certa maneira, um elo
com os conteúdos do espaço rural aí expresso, e que muitos desses nomes
presentes na entrada são os mesmos encontrados no banco de dados a cerca
das informações sobre imóveis rurais disponibilizada pelo INCRA, em 2008,
que contabilizou um total de 383 imóveis cadastrados cujas áreas variam entre
1 a 300 hectares.
Figura 23: Chácaras e sítios na zona de expansão de Aracaju. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
Leite (2007) destaca que atualmente a especulação imobiliária, no
decorrer dos últimos anos, vem contribuindo com a descaracterização
territorial, espacial, sociocultural, econômica e ambiental da zona de expansão
de Aracaju.
A ocupação dessa área vem ocorrendo principalmente nos setores meridionais e nas proximidades das rodovias. A urbanização ou desruralização da região é observada principalmente em razão da localização geográfica da área – próxima a rios e mar, atraindo a especulação imobiliária voltada para a construção de casas e condomínios fechados de veraneios; embora atualmente estejam se transformando
87
gradativamente em moradias permanentes (LEITE. 2007. p. 35).
Segundo França (2005), os condomínios residenciais fechados, na zona
de expansão, apresentam duas tipologias: a primeira é o condomínio
residencial fechado, onde as casas, a infraestrutura e os equipamentos de
lazer são partes integrantes no momento da compra, já a outra refere-se ao
loteamento residencial fechado, em que o promotor de vendas faz o
parcelamento, mas os lotes vendidos e sua posterior construção fica a cargo do
próprio comprador, de sua renda e opção arquitetônica, e que a infraestrutura e
equipamentos internos vão sendo incrementados pela incorporadora, à medida
que os lotes são vendidos.
A zona de expansão de Aracaju (ZEA) é considerada como espaço
privilegiado pela paisagem natural e pelo processo de construção urbana, mais
evidente na sua fachada litorânea. Possui a maior reserva de terrenos para
atender as demandas futuras do setor da construção civil. Entretanto o sistema
de drenagem natural é um condicionante físico de extrema importância e que
pode vir a comprometer seriamente esta zona, no tocante a qualidade
ambiental, caso não se dê as devidas atenções na reformulação do
planejamento urbano dessa área.
Essa problemática foi apresentada por Loureiro (1983), que já anunciava
para a região compreendida entre o Terminal de Carmópolis (TECARMO) e o
povoado Mosqueiro que qualquer parcelamento da terra deveria ser sustado
até que se definisse um plano de uso e ocupação do solo. Segundo a mesma
autora trata-se de uma zona extremamente baixa e alagadiça, de difícil
drenagem. A Figura 24 expressa claramente os problemas vivenciados pela
população local, que são decorrentes da ineficácia da macrodrenagem, em
que, mesmo diante da normalidade dos índices pluviométricos esperados no
período chuvoso para essa região, promovem caos e transtornos, mas
contraditoriamente não inibem a continuidade da proliferação dos condomínios
residenciais.
88
Figura 24: Problemas da macrodrenagem na zona de expansão de Aracaju. Fonte: CAMBEZE – Conselho das Associações de Moradores da Zona de Expansão, 24/05/2009
A zona de expansão de Aracaju vem passando por um rápido processo
de mudanças, em que o meio natural deu lugar a uma área agrícola,
principalmente, com a produção de coco, até o final da década de 1980, que na
atualidade configura-se como o mais importante espaço da expansão da
cidade de Aracaju.
É nesse contexto que se faz necessário um melhor entendimento do
que vem a ser a chamada Zona de Expansão de Aracaju, seu processo de
ocupação e os “meios justapostos” na obtenção de uma finalidade, que é a
apropriação do solo pelo capital, além dos interesses das grandes empresas
ligadas ao setor da construção civil, que são proprietárias de grandes lotes de
terra nessa localidade. Os meios justapostos representam a mescla de
elementos (terra, gado, condomínios residenciais, cultivo, cerca, dentre outros),
que são intrínsecos nesta zona.
Assim percebe-se como é difícil se estabelecer os limites do que vem a
ser rural e urbano no Brasil, mais especificamente em Aracaju, haja vista que
diante das enormes transformações via processo de urbanização, são
verificados remanescentes da atividade agrícola, somando-se às diversas
formas e conteúdos presente nesse espaço.
89
É importante destacar a contribuição de Silva (2004) que foi decisiva na
escolha do nosso recorte territorial para iniciarmos nossa investigação, pois a
referida autora buscou analisar as transformações sociais, econômicas e
ambientais ocorridas no bairro Porto Dantas, na zona norte de Aracaju, em
função da ocupação desordenada, conduzida pelo fluxo de pessoas oriundas
de outros municípios, da presença de espaços legalmente protegidos e da
função, ainda presente, do segmento agrícola remanescente.
Segundo Silva (2004), as transformações desse espaço urbano são
provenientes do entrelaçamento da dinâmica dos segmentos urbano, agrícola e
ambiental. O segmento de uma agricultura familiar que ainda persiste, embora,
pressionada pela expansão urbana, onde uma população de velhos moradores,
pescadores, agricultores e de migrantes de áreas agrícolas do estado e fora
dele, sempre que conseguem, formam uma pequena roça no quintal ou ao lado
do barraco. Sendo assim, é possível afirmar que esses segmentos estão
subordinados à lógica capitalista.
A zona de expansão de Aracaju (Figura 25), também conhecida como
Mosqueiro, enquadrada como zona de adensamento restrito (ZAR), na Lei
Complementar 042/2000, do Plano Diretor de Aracaju, possui, segundo os
pesquisadores da ADEMI/GEO consultoria (2000), 63 Km2 o que representa
35% do limite territorial do município de Aracaju.
É de extrema importância o conhecimento dos atributos físico-naturais
da zona de expansão de Aracaju, para se entender o processo de uso e
ocupação pela qual vem passando está área da cidade nas últimas décadas.
As características topográficas e as características de solo de constituição
arenosa e permeável condicionam uma drenagem marcada pela infiltração das
águas pluviais e pela evaporação direta através de uma série de lagoas e
baixos estacionalmente inundáveis, com afloramento do lençol freático.
90
Figura 25 – Mapa da Zona de Expansão de Aracaju. Fonte: EMURB, 2010.
É frequente, logo depois da estação chuvosa, o acumulo de águas
residuais em lagoas próximos as residências e margeando a rodovia, reflexo da
proximidade do lençol freático da superfície. Conforme pode ser observado nas
Figuras 26 e 27, esse fenômeno foi presenciado na rodovia dos Náufragos,
como também no povoado Mosqueiro.
91
Figura 26: Afloramento de lençol freático junto a r esidência. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
Figura 27: Afloramento de lençol freático próximo a rodovias. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
92
Segundo Araújo (2006), a zona de expansão de Aracaju é um terraço
marinho holocênico arenoso e com elevada permoporosidade, composto de
cordões litorâneos que entre as cristas abrigam faixas alongadas paralelas ao
mar naturalmente descontinua ou interrompida por aterros, com desníveis
topográficos entre 2 a 6 metros, fora as dunas. A imagem de satélite de parte
dessa localidade permite observar o processo de ocupação através das
manchas que representam os loteamentos e arruamentos bem como os
aspectos naturais com presença de vegetação nativa. (Figura 28).
Figura 28 – ZEA: Aspectos naturais, presença da ocu pação humana e remanescentes de atividades agrícolas. Fonte: SEPLAN/SERGIPE, 2003.
93
Assim como o estado de Sergipe, o município de Aracaju apresenta-se,
no tocante a cobertura vegetal nativa, bastante devastado, reflexo do processo
de edificação do seu sitio, iniciado em 1855. Ainda podendo ser encontrado
pequenos vestígios de sua cobertura vegetal, a exemplo de espécie de
formações perenefolias, representadas pela associação de praias e dunas,
vegetação de restinga e mangue, e o único remanescente de Mata Atlântica é
encontrado no Morro do Urubu (norte da cidade), área legalmente protegida de
interesse ambiental e preservação permanente.
Com base no mapa Geoambiental de Aracaju são três as bacias
hidrográficas na zona de expansão: a bacia hidrográfica do Vaza Barris (Figura
29) que drena a parte sul e se encontra bastante degradado, por não se
respeitar as leis de proteção ambiental, a bacia hidrográfica do rio Santa Maria,
que drena através do rio Santa Maria, a parte oeste e a bacia de contribuição
costeira, que drena para o mar, a leste.
Figura 29: Rio Vaza Barris. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
O povoado Mosqueiro localizado na chamada Zona de expansão
apresenta na associação de praias e dunas vegetação herbácea em que a
brisa marinha impede o desenvolvimento dos arbustos e árvores, Esse tipo de
vegetação favorece a fixação de dunas. Outro tipo de vegetação presente
nessa zona é a restinga, uma associação perenifólia, pouco densa, cujas
arvores se diversifica quanto à espécie e altura.
94
O que mais nos instiga na ZEA é justamente o fato de a mesma
representar muito mais que um setor ou área de Aracaju a ser incorporada
definitivamente na malha urbana de forma continua. Esta área está sendo
apropriada pelo capital a partir da acumulação proveniente da renda da terra,
onde a presença da agricultura muitas vezes são os meios que se justapõem
no processo da obtenção do lucro pelos proprietários, pois a agricultura serve
muitas das vezes como suporte, seja no ganho de visibilidade da propriedade,
mostrando que a mesma tem dono e que assim pode ser vendida com fins
especulativos.
Diante desta perspectiva, não se pode desvincular o entendimento da
agricultura urbana da natureza do solo urbano, ao passo que também não
podemos negar que diante do intenso processo de urbanização atrelado aos
ditames do modo capitalista de produção, são verificadas a presença de
elementos e características vinculadas ao espaço rural, conforme podemos
observar na Figura 30.
95
Figura 30: Agricultura urbana na zona de expansão Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009 Organização: Gilberto Nunes, EMURB, 2009.
96
Com a construção da ponte sobre o rio Vaza Barris (Figura 31), que ligará
o extremo sul da capital ao município de Itaporanga D’ajuda, os processos que
são dinâmicos na zona de expansão, com certeza irão se acentuar, e as práticas
agrícolas que estão comprimidas nos entremeios do urbano, encontrarão mais um
elemento a se coadunar no processo de produção do espaço nessa localidade.
Figura 31: Ponte Jornalista Joel Silveira em constr ução sobre o rio Vaza Barris. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
Vale ressaltar que os terrenos localizados no extremo sul da capital terão
seus preços ainda mais valorizados, fruto também da atuação do Estado na
melhoria da infraestrutura, com o melhoramento do sistema viário, através da
ponte, como no tocante as transformações paisagísticas, na construção da orla
pôr do Sol no Mosqueiro (Figura 32). Assim, o mercado de terras nessa
localidade, vem passando, nos últimos anos, por uma elevação em seus preços,
pois terrenos pouco valorizados e de difícil acesso, tiveram reajustes exorbitantes,
isso foi comprovado durante o trabalho de campo, com o grande número de
placas de vendas de terrenos, seja diretamente na propriedade ou através de
propagandas de corretoras de imóveis (Figura 33).
97
Figura 32: Infraestrutura na Orla Por do Sol, Povoa do Mosqueiro. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
Figura 33: Comercialização das terras na zona de ex pansão de Aracaju
Foto: SANTANA FILHO, L. S, 2009.
Dentro dessa lógica o mercado imobiliário avança em Aracaju,
principalmente na sua zona de expansão. Terrenos antes pouco valorizados, seja
pela dificuldade de acesso ao centro comercial e problemas ainda presentes
98
ligados ao macrozoneamento, são hoje cogitados pelas grandes empresas do
setor da construção civil, na execução de mega projetos habitacionais, sejam eles
na esfera privada e, com menor intensidade, mas não menos importante a esfera
pública, a exemplo do Programa de Arrendamento Residencial (PAR).
O bairro de Aruana, localizado na zona de expansão da cidade e cujo M2 valorizou 600% de dez anos para cá, também começa a se destacar por conta dos condomínios horizontais de alto padrão que começam a surgir. Até o momento, há cerca de uma dezena de condomínios construídos. Cada um abriga uma média de 100 casas com 450 metros quadrados de terreno cada, ao valor de US$ 300 mil, em média. O local combina qualidade de vida e praia, a apenas 15 minutos do centro. "Em Aracaju, o conceito de viver à beira-mar é pouco explorado, situação que começa a mudar com a zona de expansão de Aruana", diz Paulo Henrique Vasconcelos Machado, vice-presidente da construtora Laredo (ADEMI, 2010).
Para o entendimento da produção do espaço urbano em Aracaju faz-se
necessário também levar em consideração a existência da agricultura urbana,
sendo a mesma uma prática multidimensional, que se materializa de diferentes
formas na capital.
4.3 AGRICULTURA URBANA E A PRODUÇÃO DO ESPAÇO EM AR ACAJU
Com a expansão da mancha urbana de Aracaju, que ocorreu, em certa
medida, sem um planejamento adequado, houve a intensificação da periferização
da cidade, o que aumenta a possibilidade da prática da agricultura urbana.
É necessário frisar que a manifestação da agricultura urbana em Aracaju
apresenta distintas territorialidades, em que a materialização nas áreas
pesquisadas, permite distinguir realidades diferenciadas ligadas a mesma, quais
sejam: a diversificação alimentar no cultivo de frutíferas e no cultivo de ervas
medicinais, ligados as tradições rurais; criação de gado de pequeno e grande
porte em espaços comprimidos e/ou soltos pelas ruas e avenidas; a especulação
imobiliária.
A expressão agricultura urbana designa o conjunto de atividades
desenvolvidas em pequenas áreas dentro de uma cidade, ou no seu entorno
(periurbano), para produção, processamento e comercialização dos bens
alimentares de origem animal e vegetal úteis ao homem. É considerada uma
99
atividade simples, tecnologicamente acessível e requerente de pouco ou nenhum
recurso financeiro, com utilização de resíduos produzidos nas áreas urbanas,
porém, podendo ser praticada a partir do emprego de técnicas sofisticadas, como
a hidroponia e a plasticultura.
Mougeot (2000) lembra a respeito da agricultura urbana, que muitas das
definições mais usuais do que vem a ser a "agricultura urbana" desprezam uma
característica crítica que a faz ser realmente "urbana". A agricultura urbana é
diferente da agricultura rural (e complementar a ela) justamente por que ela está
integrada no sistema econômico e ecológico urbano. A não ser que essa
dimensão seja melhor compreendida e tornada operacional, o conceito continuará
sendo pouco útil nos "fronts" científico, tecnológico e político.
A agricultura urbana contribui na promoção da interação entre o espaço
urbano e rural, através das paisagens rurais no lócus de vida urbana. Para
explicar as práticas agrícolas dentro das cidades Resende (2004), argumenta ser
necessário levar em consideração uma série de situações, a saber: a migração, a
urbanização, hobbys, entre outros aspectos.
Os fluxos contínuos de migrantes de origem rural, que nas últimas décadas
do século XX se dirigiram para as cidades brasileiras, enfrentaram uma série de
contratempos, dentre os quais podemos destacar o fenômeno do desemprego
acrescido dos desequilíbrios na estrutura orgânica e social das/nas cidades.
Muitos desses migrantes através da tradição no labor com a terra promovem
outros significados a produção do espaço urbano.
O resultado encontrado durante a aplicação dos questionários nas áreas de
estudo, verificou-se a diversidades da procedência, ou origem geográfica dos
sujeitos alvo da pesquisa. Conforme o Quadro 04, percebe-se que 40% dos
inquiridos haviam nascido na capital sergipana, enquanto que uma proporção
elevada, ou seja, os outros 60%, procedia de outras localidades do estado e,
inclusive de outros estados nordestinos (Alagoas e Bahia).
Outro fator está relacionado ao processo de expansão do tecido urbano
sobre áreas de produção agrícola, em que o processo de urbanização, não
aconteceu por completo, podendo-se perceber algumas descontinuidades
espaciais, inclusive dentro das interfaces urbanas.
100
Naturalidade % Aquidabã 3,33 Aracaju 40,0 Arapiraca-AL 3,33 Brejo Grande 3,33 Gararu 3,33 Itabaiana 3,33 Japaratuba 6,66 Lagarto 6,66 Limoeiro-AL 3,33 Murici-AL 3,33 Pacatuba 3,33 Paulo Afonso-BA 3,33 Piacabuçu-AL 3,33 Poço Verde 3,33 Riachuelo 3,33 Rosário do Catete 3,33 Salgado 3,33 Total 100
Quadro 04: Procedência dos citadinos alvos da pesquisa Fonte: Pesquisa de campo, 2009.
É nesse contexto que a produção do espaço em Aracaju, mais
especificamente na sua zona de expansão, reacende a discussão campo-cidade,
rural e urbano, uma vez que ao considerar e aceitar o município 100% urbano
conduz a própria negação da existência, mesmo que camuflada pelos
incrementos urbanos, dos remanescentes de atividades agrícolas aí presentes. É
dentro desse contexto que a Figura 34 exemplifica tal contradição, ou seja, a de
não levar em consideração as descontinuidades e recortes do/no espaço urbano.
Observa-se na foto que a placa de sinalização indica o início do perímetro urbano
do povoado de Areia Branca, que faz parte do município de Aracaju, logo, se
reconhece a existência do perímetro urbano dos povoados, há que se considerar
as áreas rurais.
101
Figura 34: Zona de Expansão de Aracaju: povoado Areia Branca
Foto: SANTANA FILHO, L. S, 2009.
É necessário considerar que com o processo de urbanização de Aracaju,
áreas foram incorporadas à lógica urbana do município, porém com a
coexistência de múltiplas outras formas de produção do espaço, inclusive os
“meios justapostos” argumentado por Correia (1999) acerca do espaço urbano,
pode-se encontrar na zona de expansão, além das grandes transformações
advindas do setor imobiliário e do processo de conversão do solo rural em urbano
via especulação imobiliária, a presença de gado bovino confinado e outros que
pastam pelas ruas e avenidas livremente; como também a prática de moradores,
de áreas edificadas, nos bairros Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont, por
exemplo, que conservam costumes e hábitos convencionalmente relacionados ao
espaço rural, visíveis na paisagem urbana, através da presença de frutíferas,
criações de galinhas e de ervas medicinais.
As práticas agrícolas dentro da cidade também podem ser justificadas,
pelos citadinos que mantêm em suas propriedades traços do espaço rural. São os
chamados hobbys, que objetivam conservar as vivências e características do
espaço rural através do cultivo nos quintais e jardins na manutenção de
proximidade com a terra e dos próprios elementos que compõem a natureza.
102
É de conhecimento que há práticas de agricultura urbana em outras
localidades dispersas pelo município de Aracaju e que não foram alvos da nossa
discussão, seja pelo fato da complexidade dessa atividade em requerer a
visitação in lócus, uma vez que essas áreas com plantios de frutíferas, plantas
medicinais ou com criações de animais de pequeno ou grande porte são áreas
muito pequenas, encontram-se dispersas intra-bairro e pelo fato de se tratarem de
confinamentos onde são criados animais, quando não estão soltos pastando
pelas ruas e rodovias/avenidas, como pode ser observado na Figura 35.
Figura 35: Zona de Expansão: animais pastando próximo a rodovia. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
A agricultura urbana em Aracaju tem promovido à construção de diferentes
territorialidades na capital, como podemos destacar o cultivo de frutíferas e
plantas medicinais junto às residências com aproveitamentos de exíguos
espaços, seja o fundo de quintal, o jardim e canteiros, vasos nas varandas, ou
cultivando na lateral da própria residência (Ver Figura 36). Como também a
utilização de espaços vazios de uma rodovia na zona de expansão, a exemplo da
rodovia dos Náufragos, em que áreas inicialmente ocupadas com atividades
agrícolas, foram abarcadas ao longo do processo de urbanização, e hoje,
visualiza-se a mescla de utilização agrícola com a empreitada da especulação
imobiliária, bastante presente nessa localidade.
103
Figura 3 6: Agricu ltura urbana nos bairros Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009 Organização: Gilberto Nunes, EMURB, 2009
104
Os bairros Bugio, Jardim Centenário e Santos Dumont, localizados no
noroeste da capital (Ver Figura 37) apresentam características condizentes
com as características multidimensionais da agricultura urbana.
O bairro Santos Dumont surge em 1952, era ocupado anteriormente por
sítios e povoados como o Anipum, Saco, Pau Ferro, Telha, Gengibre e, mais
distante Soledade e Lamarão. (SEPLAN, 2009). Conhecido também como
prainha, sua ocupação se deu em virtude das transformações de vários sítios
em loteamentos e ocupação de suas baixadas próximo ao mangue.
Os sítios foram aos poucos se transformando em grandes e pequenos
grupos de casas, que também receberam populações do processo migratório
composto não somente de sergipanos, mas de alagoanos, baianos e
pernambucanos (SEPLAN, 2009). Inicialmente conhecido como Anipum,
depois recebeu o nome de Santos Dumont em homenagem ao pai da aviação,
devido à transferência e instalação do aeroporto de Aracaju e reivindicação dos
moradores.
O bairro Jardim Centenário tem sua ocupação vinculada aos bairros
Santos Dumont e Olaria, sendo o primeiro a continuidade da expansão da
mancha urbana de Aracaju. Antes da ocupação urbana, era constituído por
sítios e hortas que serviam para abastecer a capital. Alguns moradores
trabalhavam nas salinas existentes na proximidade do bairro e cultivavam a
terra em que adquiriam lotes ou pequenos sítios.
As terras loteadas ainda na década de 1950, contribuiu para a ocupação
da área ao longo da Avenida Santa Gleide e margeando a ferrovia. A
população que ocupa essa área é em sua grande maioria de baixa renda, o
que tem contribuído para a ocorrência de ocupações e a formação de
pequenas favelas, cuja infraestrutura é precária ou inexistente.
Foi comum encontrar junto às residências dessa localidade a presença
de frutíferas, que contribuem para a diversificação da dieta alimentar através da
produção para o autoconsumo. A Figura 38 demonstra claramente a existência
de cultivos, a exemplo da plantação de bananeiras na lateral da residência e da
presença do coco no fundo de quintal.
105
Figura 37: Localização dos Bairros Bugio, Jardim Ce ntenário e Santos Dumont. Fonte: Emurb, 2010.
106
Figura 38: Cultivo de bananeira junto à residência no bairro Jardim Centenário. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
O bairro Bugio tem na sua história um diferencial em relação aos bairros
anteriormente citados, sendo uma área de muitos coqueirais, foi escolhido para
o primeiro mega conjunto habitacional a ser construído no estado de Sergipe,.
denominado conjunto Assis Chateaubriand (SEPLAN 2009). A denominação
Bugio se deu em decorrência a um tipo de macaco, bastante comum na Mata
Atlântica, e que existiam anteriormente em Sergipe.
O bairro foi crescendo em torno do conjunto habitacional, e algumas
ocupações efetuadas foram sendo urbanizadas como forma de inibir a
proliferação de mais habitações subnormais, a exemplo da ocupação do
Anchietão, que permanecia com características de favela.
É importante destacar que o Bugio é um dos poucos bairros em que sua
ocupação não se fez através de entidades particulares (agentes imobiliários e
proprietários fundiários), mas pela ação do Estado na produção do espaço
urbano dessa localidade. A agricultura urbana se manifesta principalmente
associada ao espaço da residência com presença de frutíferas das mais
diversas espécies e pela existência de plantas medicinais cultivadas nos
107
jardins, vasos, canteiros, varandas, cujo destino final direciona-se ao
autoconsumo e no fortalecimento dos laços de vizinhança.
A zona de expansão de Aracaju apesar da relativa distância dos bairros
centrais e de não estar ligada de forma continua à malha urbana da parte
consolidada da cidade (Ver figura 39), é o maior espaço com potencialidades
para futuras instalações de equipamentos de vários setores urbanos e que
apresenta em seu processo de transformação, influenciado sobremaneira, pela
dinâmica imobiliária, impulsionada pelo avanço da segunda residência ou
ocupação de veraneio, sem que se subestime o impacto do crescimento da
moradia primária ou domicilio permanente nas comunidades locais tradicionais,
a exemplo dos Povoados Robalo, Mosqueiro, Gameleira, São José e Areia
Branca.
Figura 39: Vista aérea da Av. Hildete Falcão, av. M elício Machado e Zona de Expansão. Fonte: Pedro Leite in: Sarah França, 2004.
108
4.4 A RENDA DA TERRA NA ZONA DE EXPANSÃO DE ARACAJU
A terra na economia moderna, transforma-se em mercadoria, deixa de
ser apenas um elemento de produção, para ter valor de troca, ou seja, passa a
ser regulada pelas leis de mercado, da oferta e procura.
Renda da terra no modo capitalista de produção pode ser renda
diferencial, na medida em que resulta da concorrência e absoluta quando
resulta do monopólio. A renda diferencial nas palavras de Marx apud Oliveira
(2007), tem sua base na heterogeneidade da natureza, em que não existem
duas parcelas de terras com as mesmas condições de fertilidade natural e
localização em relação aos mercados. Essa renda é auferida por todos os
donos de terra cujas condições de fertilidade e localização, são melhores que
os piores solos em exploração. O proprietário que possui esses melhores solos
se apropria também da renda absoluta, resultante da propriedade fundiária, ou
seja, a propriedade da terra é monopólio de uma classe ou fração de classe,
que cobra um tributo da sociedade para colocá-la em produção. Destarte,
aquilo que constitui as diferenças naturais se converte em diferenças sociais
por obra da propriedade privada.
No tocante a zona de expansão urbana de Aracaju, para o entendimento
acerca da agricultura urbana, percebe-se o uso aos interesses da acumulação
de capital, através do processo de urbanização, que vislumbra um dos seus
principais mecanismos de acumulação e subordinação, através da subjugação
das práticas agrícolas de caráter rural pré-existente ao próprio processo de
urbanização.
Nesse cenário, tal atividade passa a se (re)organizar segundo a lógica
de urbanização, gerando contornos e conteúdos de agricultura urbana, onde a
presença da propriedade privada, na delimitação da posse e no restringir do
acesso inclusive aos recursos naturais, evidenciado na Figura 40, é a marca
principal no entendimento da dinâmica e materialização da agricultura urbana
nessa localidade.
109
Figura 40: Delimitação da propriedade e dos recurso s naturais. Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
É importante destacar que se um solo não é cultivado não significa que
não tenha preço, pois este será dado pelos solos vizinhos de semelhantes
características de fertilidade, localização e destino econômico, acrescentando-
se também as melhorias em infraestrutura. Dessa maneira uma região onde os
preços dos solos aumentam, os proprietários que não produzem verão
aumentar os preços de suas parcelas de terra. É essa a causa da especulação
com a terra.
No caso da Zona de Expansão de Aracaju, observa-se que quando o
solo é colocado para produzir, o mesmo muitas das vezes está à espera da sua
venda e conversão de uso e função, ou seja, passa de rural a urbano. Dessa
forma encontramos muitos terrenos com presença tanto de cultivos de vegetais
(Figura 41), que aguardam o momento de sua conversão, como de criação de
gado de grande e pequeno porte em espaços comprimidos, quando não estão
pastando em propriedades de outrem e soltos nas ruas e avenidas.
110
Figura 41: Venda de terrenos na zona de expansão de Aracaju Foto: SANTANA FILHO, L S, 2009.
Segundo Foladori (2000) a especulação imobiliária constitui uma clara
causa de (in)sustentabilidade. Subutiliza as vias e os meios de comunicação,
pode aumentar os tempos de transporte, impede a produção de bens, etc. Na
cidade isso é ainda mais visível, por exemplo, zonas novas, antes agrícolas,
são loteadas para construção de moradias, com isso os especuladores
imobiliários compram terra ao preço de suas rendas agrícolas e as vendem ao
preço de suas rendas urbanas, ou seja, uma especulação derivada da
mudança na orientação econômica do solo. O resultado é o crescimento
desordenado da cidade, e consequente aumento do preço de translado das
pessoas, congestionamento dos tráfegos, maiores custos na rede de serviços,
etc; em sua contrapartida, o abandono do centro das cidades, onde prevalecem
os cortiços, apesar de contar com uma infraestrutura instalada.
Segundo Oliveira (2007) a renda de terra e suas diferentes formas
(diferencial I, diferencial II, absoluta e de monopólio) aparecem tanto no campo
como na cidade, onde se materializa a propriedade privada de uma classe ou
fração de classe, ou seja, onde o modo de produção capitalista impere.
No estado de Sergipe ainda é possível verificar características
tipicamente ditas provincianas, em que famílias tradicionais que se mantiveram
no poder há décadas, seja na esfera política ou econômica, e até mesmo no
111
domínio e monopólio das terras continuam ainda hoje mantendo o controle de
muitas das terras sergipanas. As Tabelas 03, 04 e 05, buscam explicitar melhor
essa realidade no município de Aracaju, em que famílias monopolizam as
propriedades fundiárias, cadastradas no INCRA como imóveis rurais no
município de Aracaju.
Tabela 03: Número de imóveis rurais distribuídos por hectare no município de Aracaju, 2008.
Total De 1 a - 5 ha
De 5 a -20 ha
De 20 a -50ha
De 50 a -100 ha
De 100 a -300ha
Número 383 233 108 30 7 5 % 100 60,83 28,20 7,83 1,83 1,31
Área (ha) 3.953,6 565,7 980,7 987,4 538,3 881,5 % 100 14,3 24,8 25,0 13,6 22,3
Fonte: INCRA, informações sobre imóveis rurais, 2008.
A Tabela 03 demonstra a existência de imóveis rurais em Aracaju, o que
traz uma relativização do argumento de que este município é 100% urbano.
Percebe-se na estrutura fundiária de tal município que mais de 60% dos
imóveis rurais tem uma área variando entre 1 e -5 hectares, o que aponta um
número expressivo (233) de imóveis de tamanho relativamente pequeno. Mas é
possível encontrar propriedades (nesse caso cinco) entre 100 e 300 hectares,
mesmo representando 1,31% do total de imóveis, corresponde a 22,3% do total
de áreas cadastradas como imóveis rurais no município de Aracaju.
Esse resultado é de certa forma impactante pois ao se fazer a conversão
de áreas de hectare em quilômetro quadrado, foi constatado que Aracaju
apresenta aproximadamente 39 Km2 (de um total de 174 Km2 segundo o IBGE,
2009), ou seja, aquilo que convencionalmente é tido como característica do
campo brasileiro (concentração e monopolização de terras) está presente no
município, na vida urbana. Logo, essa realidade materializada a partir da
existência de imóveis rurais na cidade conduz, ao menos, a uma reflexão
acerca da relação campo cidade, além do olhar puramente dicotomizado que
há nessa relação.
Há ainda o fato de que esses imóveis rurais muitas vezes têm como
proprietário pessoas ligadas à mesma família, ou seja, o que aparentemente
demonstra uma distribuição de terra, na verdade camufla a concentração de
áreas rurais nas mãos de algumas famílias e/ou construtoras imobiliárias, como
112
pode ser verificado nas Tabelas 04 e 05. Diante do trabalho de campo
desenvolvido e das informações abstraídas da tabela, pode-se afirmar que
grande parte desses imóveis rurais está localizado na Zona de Expansão, o
que é percebido via a grande dimensão de terras ociosas nessa localidade.
Além disso, no cadastro disponibilizado pelo INCRA que consta o nome dos
imóveis rurais e dos seus respectivos proprietários (seja pessoa física ou
jurídica, neste caso as construtoras) foi encontrado nomes de algumas
propriedades que, no trabalho de campo foram detectados nas portas ou
cancelas das propriedades (Figura 23). Fato esse que comprova a veracidade
das informações disponibilizadas pelo INCRA.
Tabela 04: Concentração das propriedades por grupo de famílias e construtoras – 2008
Hectare Barreto Sobral Machado Maynard Construtoras 1 a -5 5 4 4 4 14 5 a -20 4 - 10 2 14 20 a -50 4 1 9 - 3 50 a -100 - 2 - - - 100 a -300 1 - - - - Total (ha) 486,4 194,3 451,4 33,9 243,3 Fonte: INCRA, informações sobre imóveis rurais, 2008.
É interessante destacar que os sobrenomes identificados e que foram
alvos da seleção da Tabela 04, são muitas vezes os mesmos que
historicamente correspondem à personagem da vida política/econômica e
donos de grandes latifúndios, seja na capital ou em todo estado de Sergipe.
Existem outros grupos de nomes de influências locais e regionais que não
aparecem em tal análise, porém não são menos importantes, a exemplo das
famílias Brito, Muniz, Paes Mendonça, dentre outros.
Não se pode deixar de mencionar a presença da família Machado, cujo
sobrenome conecta-se a um dos maiores produtores de coco do Brasil,
(Melício Rezende Machado). Diante do parcelamento de suas propriedades,
muitas ainda pertencem a seus familiares que detém aproximadamente 6% das
propriedades num total de 383 imóveis rurais e 11,4% da área total (3.953.6
ha) que corresponde a tais imóveis, cujas dimensões variam entre 1 a -50
hectares.
Vale ressaltar que a concentração da propriedade privada no município
de Aracaju pode ser ainda maior se levarmos em consideração que muitas
113
propriedades cadastradas, o proprietário da terra é representado, ora como
pessoa jurídica, a exemplo do nome da construtora, ora como pessoa física.
Isso vem demonstrar a força do monopólio da terra no município de Aracaju.
Essa realidade é tão evidente que ao considerar o total de propriedades
vinculadas a essas famílias (Barreto, Sobral, Machado, Maynard) acrescidas
das propriedades das construtoras, tem-se um total de 81 propriedades que
equivale a 21,14% do total de imóveis rurais e 35,6% da área total no município
de Aracaju em 2008.
Tabela 05: Número dos imóveis rurais pertencentes a s construtora em Aracaju – 2008
Hectare Celi Cunha Norcon Cosil
1 a -5 09 02 02 -
5 a -20 09 - 01 03
20 a -50 01 - - 01
50 a -100 - - - -
Total (ha) 117,5 6,5 13,3 59,9
Fonte: INCRA, informações sobre imóveis rurais, 2008.
O mercado imobiliário em Aracaju, nos últimos 10 anos, tem vivenciado
um “boom”, atraindo inclusive construtoras oriundas de outros estados que
começam a se interessar em investimentos na capital sergipana, mesmo tendo
o desafio de enfrentar as concorrentes que se apresentam bem estruturadas.
De certa forma tal setor ainda é monopolizado pelas construtoras e
incorporadoras sergipanas que há anos se destacam no ramo da construção
civil desde os empreendimentos mais sofisticados àqueles cujo valor estima-se
na faixa de 50 mil reais, no chamado “segmento econômico”, para atender o
déficit habitacional. Sendo assim, segundo a Associação dos Dirigentes das
Empresas do Mercado Imobiliário de Sergipe (ADEMI-SE) a Celi e Norcon
detêm 60% do mercado imobiliário da região. A Celi atua tanto em obras
públicas quanto imobiliárias, tem 2,5 mil funcionários, faturamento de R$ 120
milhões e previsão de elevar este montante em 20% em 2008. Com presença
em outras capitais, sendo que 70% de seus negócios estão concentrados em
Sergipe.
114
De acordo com os dados da Tabela 05, baseada no cadastro de
imóveis rurais do INCRA, a construtora Celi é a que possui o maior número de
propriedades (dezenove no total), representando 67,8% dentre as construtoras
destacadas. A mesma ainda detém 59,5% das áreas rurais pertencentes às
construtoras de Aracaju, cujas dimensões territoriais variam de propriedades
com 1 hectare até aquelas de maiores dimensões com -50 hectares.
É diante do exposto que se entende o porquê dos interesses no
monopólio da terra em Aracaju, pois é através do controle e apropriação da
terra pela lógica capitalista na busca incessante pelo lucro, e na observância de
que tais estratégias excedem os rigores territoriais dos espaços rural e urbano,
que é possível compreender a manutenção, há décadas, de tais famílias no
poder, seja no campo ou na cidade. E a partir da compreensão da renda da
terra percebe-se as estratégias dos capitalistas na maximização dos seus
lucros, pois mesmo sem investimento direto, obtêm-se lucros extraordinários e
permanentes, que são pagos por toda a sociedade.
115
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS E SUGESTÕES
A construção do conhecimento é cumulativa, histórica, processual. Deste
modo, o presente trabalho que não tem por objetivo responder e preencher as
lacunas acerca da presença das práticas agrícolas em meio intra-urbano, deixa
margem para continuidades de pesquisa nessa temática, pois só assim será
possível uma tentativa de se compreender a dinamicidade das relações
espaciais (sejam elas urbanas ou rurais) que acontecem na cidade.
A cidade de Aracaju tem vivenciado um intenso processo de
urbanização nos moldes do modo capitalista de produção, capturando sob essa
lógica, áreas circunscritas nos limites legais do perímetro urbano. Este fato
torna evidente o crescimento articulado e fragmentado no que concerne a
cidade construída, consolidada, pois é visível tanto nas áreas centrais quanto
nas periféricas o aumento das edificações, trânsito caótico, violência urbana,
problemas de drenagem, etc. Sendo assim, Aracaju se projeta para o futuro de
metrópole levando consigo os mesmos problemas existentes há décadas
(típicos das grandes cidades brasileiras) e, mais ainda, negando aquilo que
está posto legalmente através da presença de imóveis rurais cadastrados pelo
INCRA, bem como ao que está visível na paisagem urbana: elementos
convencionalmente designados da paisagem rural.
A produção do espaço urbano de Aracaju mescla-se com outras formas
e conteúdos presentes nessa localidade. É evidente que as diferentes práticas
sócio-espaciais desenvolvidas em um mesmo espaço, nesse caso, o espaço
urbano desta cidade, ao longo do tempo, promovem a constituição de distintas
territorialidades. Assim, no município de Aracaju, local de “múltiplas
territorialidades”, presencia-se dinâmicas sócio-espaciais correspondentes aos
usos e as práticas do/no espaço pelos sujeitos locais, segundo cada contexto
histórico especifico, com práticas e/ou atividades agrícolas, cuja dinâmica é
multifacetária.
Faz-se necessário entender o processo de urbanização, enquanto
processo real, pois o mesmo ainda está em curso, e a ideia que se tem de uma
passagem abrupta e instantânea no processo de conversão do uso do solo de
rural ao urbano não se realizou completamente. Sendo assim, nesse processo
histórico visualiza-se as mesclas de sentidos e usos do espaço geográfico, com
116
o entrelaçamento das características outrora antagônicas e singulares dos
espaços rural e urbano delimitadas no próprio município de Aracaju.
Um aspecto relevante a ser considerado é que na prática agrícola
urbana da cidade de Aracaju prevalece o cultivo da frutífera, situação diferente
das identificadas por Resende (2004), Madaleno (2002), Martins (2008), em
que prevalece o cultivo de hortaliças. Contudo vale ressaltar que a presença de
plantas medicinais assume um papel importante e as hortaliças com menor
intensidade. Sendo necessário frisar que a quantidade e a intensidade da
produção agrícola tem relação direta com o tamanho da propriedade que está
destinada a produzir determinado cultivo.
Nessa perspectiva, a agricultura urbana significa uma das formas de uso
e prática no espaço urbano, no processo de produção do espaço geográfico, e
sua existência, muitas vezes, está comprimida nos entremeios do espaço
urbano, sendo permitida pela própria lógica capitalista.
Com o processo de loteamento decorrente da expansão urbana, as
áreas com práticas agrícolas começaram a diminuir. No caso da zona de
expansão de Aracaju, esse fato vem ocorrendo devido principalmente à
disseminação dos condomínios residenciais fechados, com atuação
sincronizada dos poderes público e privado no mercado imobiliário, fato esse
que acarreta na compressão dos espaços “rurais” desta localidade.
Para os demais bairros estudados, a prática da agricultura se restringe
aos limites da própria residência, onde nos exíguos espaços do quintal, do
jardim ou mesmo na lateral da residência, materializam as características e
laços do espaço rural, sejam na presença das frutíferas ou no cultivo de ervas
medicinais. Mas vale destacar que tal prática nos limites municipais de Aracaju,
conforme pesquisa de campo, tem como destino principal o autoconsumo das
famílias.
Durante a investigação, além da presença/remanescência de práticas
agrícolas, aqui denominada de agricultura urbana, percebe-se, na zona de
expansão de Aracaju, que grande parte da prática agrícola ali desenvolvida
significa “o meio justaposto” na busca de se atingir uma finalidade, que é a
maximização do lucro pelo proprietário, através da extração da renda da terra,
via especulação imobiliária e monopólio da terra.
117
A prática agrícola urbana permite uma geração e complementação da
renda familiar, produção de alimentos nutritivos e criação de animais de
pequeno e grande porte, nas diferentes propriedades e mesmo junto às
residências, nos chamados fundos de quintal, de acordo com as
intencionalidades do agricultor. A viabilidade, o auxilio técnico, terra disponível
para a produção, não poderiam ser negligenciadas pelos gestores urbanos no
tocante ao planejamento das cidades.
A produção agrícola urbana na cidade de Aracaju, mais especificamente
em sua zona de expansão, do ponto de vista espacial, apresentou-se
distribuída por quase toda zona, sendo mais perceptível ao longo da rodovia
dos Náufragos, na sua margem direita, onde ao adentrar nos povoados
Mosqueiro, Areia Branca, Matapuã, foi altamente perceptível a interpenetração
dos espaços rural e urbano na contraposição da visão clássica da dicotomia
espacial.
Desta forma a produção agrícola urbana é diferente espacialmente,
quando se considera o recorte proposto neste trabalho, sobretudo nas
características dos espaços de produção, sendo que tais diferenças estão
ligadas aos fatores de ordem social, cultural, econômica, produtiva e espacial.
Para os bairros aqui analisados, a agricultura urbana existe enquanto hábito
cultural, fortalecimento da solidariedade entre vizinhos, estratégia de
complementação alimentar. Para a zona de expansão o entendimento da
agricultura urbana deve ser acrescido de fatores mais ligados à natureza do
solo urbano, tais como especulação imobiliária, renda e monopólio da terra.
Assim sendo, em Aracaju, a agricultura urbana apresenta as seguintes
características:
� Plantios de vegetais em espaços ao longo de rodovias, avenidas,
chácaras, bem como quintais de residências;
� Cultivo de plantas medicinais nas residências como fonte
mitigadora de alguns problemas de saúde;
� Criação de animais de pequeno e grande porte (equinos, bovinos,
caprinos e aves) em terrenos baldios, soltos pelas ruas, próximos
às residências, rodovias e avenidas, em sítios, chácaras e
confinados próximo às margens de rios.
� Atividades pesqueiras desenvolvidas pela comunidade do
118
povoado Mosqueiro nas margens do rio.
Por fim, ao longo da pesquisa foi possível compreender que uma cidade
não deve ser considerada urbana somente a partir daquilo que está
aparentemente mais visível. É preciso olhar a cidade além daquilo que está
posto, que está dito, pois sendo a cidade construída segundo os moldes
capitalistas de produção, ela possui uma materialidade contraditória e
combinada, tendo em vista a permanência de traços e elementos do espaço
rural dentro do tecido urbano que coexistem com outros elementos
relacionados à forma e conteúdos deste espaço.
119
6. REFERÊNCIAS
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WILBERS, J. HOVORKA, A. VEENHUIZEN, R. V. Gênero e Agricultura Urbana. Revista de Agricultura Urbana. Vol. 12, Maio de 2004. Disponível em: <http://www.agriculturaurbana.org.br/>. Acesso em: 03 de novembro de 2008.
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7. ANEXOS
QUESTIONÁRIO 1. DADOS REFERENTES AO PRODUTOR 1.1. Nome: ............................................................................. 1.2. Idade:............... anos. 1.3. Escolaridade: ( ) Analfabeto ( ) Fundamental incompl. ( ) Fundamental compl. ( ) Médio incompl. ( ) Médio compl. ( ) Superior incompl. ( ) Superior compl. 1.4. Município de origem: .................................. 1.5. Estado de origem: ......................... 1.6. Município que morava antes? .......................................1.7. Estado que morava antes? ....................... 1.8. Anteriormente morava: ( ) na cidade ( ) na área rural 1.9. Condição anterior: ( ) Proprietário ( ) Arrendatário/parceiro ( ) Posseiro ( ) Empregado rural ( ) Empregado na cidade ( ) Outro Qual? ................................. 1.10. Local de moradia:.................... 1.11. Número de pessoas da família que residem no imóvel: Total: ................
Número Número Número
Homens Com 14 anos e menos:...... Entre 14 e 65 anos Com mais de 65 anos: ....
Mulheres Com 14 anos e menos:...... Entre 14 e 65 anos Com mais de 65 anos: ....
1.12 Pretende continuar residindo no local, ou vai para outro lugar? Por quê ............................................... 1.13 Qual a renda média da família? ( ) Menos de 1 SM ( ) de 1 a 2 SM ( ) de 2 a 3 SM ( ) de 3 a 4 SM ( ) de 4 a 5 SM ( ) Acima de 5 SM. 2. DADOS REFERENTES A PROPRIEDADE: 2.1 Qual o tamanho da propriedade? ( ) Menor que 50 m2 ( ) de 50 a 100 m2 ( ) de 100 a 200 m2 ( ) de 200 a 300 m2 ( ) Acima de 300 m2 ….................. especificação. 2.2 Qual o tipo de residência? ( ) Próprio ( ) Arrendada/Parceria ( ) Concedida ( ) Outro ................ 3. UTILIZAÇÃO DAS TERRAS 3.1 Qual o tipo de cultivo na propriedade?...................................................................... É para ( ) mercado, ( ) autoconsumo ( ) ou misto? 3.2 Há quanto tempo cultiva na propriedade? …........................ 3.2 Quais as técnicas utilizadas? ( ) Adubação ( ) Rotação ( ) Rega, quem rega? ...................( ) Outras …............... 3.3 Qual o rendimento em média da atividade agrícola? ….............. 3.4 Em anexo a residência há presença de criação de animal ou algum tipo de planta medicinal? ( ) Sim ( ) Não Se a resposta afirmativa, qual …................. 3.5 A renda atende ao sustento da família? ( ) Sim ( ) Não. Se não, por quê? …........................................................................................................................... 3.6 Quantas colheitas faz por ano? …................................................................. 3.7 Tem plano de continuar cultivando a propriedade? ( ) Sim ( ) Não Por quê? ….................................
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3.8 Os filhos têm interesse em manter a prática agrícola na propriedade?..................................................................................................................... 4. CONDIÇÕES DA MORADIA DO AGRICULTOR 4.1 Material de construção da casa ( ) madeira ( ) alvenaria ( ) mista ( ) pau a pique ( ) outros.