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Revista de Súmulas
SUPERIOR
TRIBUNAL
DE JUSTIÇA
VOLUME 6, ANO 4
FEVEREIRO 2010
Revista de Súmulas
SUPERIOR
TRIBUNAL
DE JUSTIÇA
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Gabinete do Ministro Diretor da Revista
Diretor
Ministro Felix Fischer
Chefe de Gabinete
Marcos Perdigão Bernardes
Assessora
Priscila Tentardini Meotti
Assistentes
Gerson Prado da Silva
Maria Angélica Neves Sant’Ana
Max Günther Feitosa Albuquerque Alvim
Técnico em Secretariado
Fagno Monteiro Amorim
Mensageiro
Jardesson Davi de Menezes Pereira
Estagiários
Marina Lobosque de Oliveira Cunha
Samuel da Mota Cardoso Oliveira
Superior Tribunal de Justiça
www.stj.jus.br, [email protected]
Gabinete do Ministro Diretor da Revista
Setor de Administração Federal Sul, Quadra 6, Lote 1,
Bloco C, 2º Andar, Sala C-240, Brasília-DF, 70095-900
Telefone (61) 3319-8003, Fax (61) 3319-8992
Revista de Súmulas do Superior Tribunal de Justiça – n. 6 -
Brasília: STJ, 2010
Sem periodicidade
ISBN 85-7248-086-2
1. Direito - Periódico - Brasil. 2. Jurisprudência -
Periódico - Brasil. 3. Brasil.
Superior Tribunal de Justiça
CDU 340.142(81)(05)
MINISTRO FELIX FISCHER Diretor
Revista de Súmulas
SUPERIOR
TRIBUNAL
DE JUSTIÇA
Resolução n. 19/1995-STJ, art. 3º.
RISTJ, arts. 21, III e VI; 22, § 1º, e 23.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Plenário
Ministro Cesar Asfor Rocha (Presidente)
Ministro Ari Pargendler (Vice-Presidente)
Ministro Nilson Vital Naves
Ministro Fernando Gonçalves
Ministro Felix Fischer (Diretor da Revista)
Ministro Aldir Guimarães Passarinho Junior
Ministro Gilson Langaro Dipp (Corregedor-Nacional de Justiça)
Ministro Hamilton Carvalhido
Ministra Eliana Calmon Alves
Ministro Francisco Cândido de Melo Falcão Neto (Corregedor-Geral da Justiça Federal)
Ministra Fátima Nancy Andrighi
Ministra Laurita Hilário Vaz
Ministro Paulo Geraldo de Oliveira Medina
Ministro Luiz Fux
Ministro João Otávio de Noronha
Ministro Teori Albino Zavascki
Ministro José de Castro Meira
Ministra Denise Martins Arruda
Ministro Arnaldo Esteves Lima
Ministro Massami Uyeda
Ministro Humberto Eustáquio Soares Martins
Ministra Maria Th ereza Rocha de Assis Moura
Ministro Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin
Ministro Napoleão Nunes Maia Filho
Ministro Sidnei Agostinho Beneti
Ministro Jorge Mussi
Ministro Geraldo Og Nicéas Marques Fernandes
Ministro Luis Felipe Salomão
Ministro Mauro Luiz Campbell Marques
Ministro Benedito Gonçalves
SUMÁRIO
Súmulas
84 .................................................................................................................................11
85 ...............................................................................................................................103
86 ...............................................................................................................................133
87 ...............................................................................................................................213
88 ...............................................................................................................................245
89 ...............................................................................................................................279
90 ...............................................................................................................................309
91 (Cancelada) ...........................................................................................................333
92 ...............................................................................................................................355
93 ...............................................................................................................................379
94 ...............................................................................................................................417
ÍNDICE ANALÍTICO ........................................................................................................................................... 433
ÍNDICE SISTEMÁTICO ...................................................................................................................................... 441
SIGLAS E ABREVIATURAS ............................................................................................................................. 447
REPOSITÓRIOS AUTORIZADOS E CREDENCIADOS PELO
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA ............................................................................................................ 453
Súmula n. 84
SÚMULA N. 84
É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação
de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que
desprovido do registro.
Referência:
CPC, art. 1.046, § 1º.
Precedentes:
REsp 188-PR (4ª T, 08.08.1989 — DJ 31.10.1989)
REsp 226-SP (3ª T, 19.09.1989 — DJ 30.10.1989)
REsp 573-SP (4ª T, 08.05.1990 — DJ 06.08.1990)
REsp 662-RS (3ª T, 17.10.1989 — DJ 20.11.1989)
REsp 696-RS (4ª T, 17.10.1989 — DJ 20.11.1989)
REsp 866-RS (3ª T, 10.10.1989 — DJ 30.10.1989)
REsp 1.172-SP (4ª T, 13.02.1990 — DJ 16.04.1990)
REsp 2.286-SP (3ª T, 17.04.1990 — DJ 07.05.1990)
REsp 8.598-SP (3ª T, 08.04.1991 — DJ 06.05.1991)
REsp 9.448-SP (2ª T, 31.03.1993 — DJ 26.04.1993)
Corte Especial, em 18.06.1993
DJ 02.07.1993, p. 13.283
RECURSO ESPECIAL N. 188-PR (89.0008421-6)
Relator: Ministro Sálvio de Figueiredo
Relator para o acórdão: Ministro Bueno de Souza
Recorrente: Dall’Oglio Scanagatta e Cia. Ltda
Recorridos: Vilson Fabris e cônjuge
Advogados: Antonio Alves do Prado Filho e outros e Joaquim Munhoz de
Mello
EMENTA
Processual Civil. Embargos de terceiro.
Recurso especial. Divergência com a Súmula n. 621 do STF.
1. É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em
alegação de posse advinda de contrato de compromisso de compra e
venda desprovido de registro imobiliário.
2. Inocorrência in casu de fraude à execução.
3. Recurso especial a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer
do recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator; por maioria, negar-lhe
provimento, vencidos os Srs. Ministros Relator e Barros Monteiro, na forma do
relatório e notas taquigráfi cas constantes dos autos e que fi cam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 08 de agosto de 1989 (data do julgamento).
Ministro Bueno de Souza, Presidente e Relator para o acórdão
DJ 31.10.1989
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
16
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo: Cuida-se de embargos de terceiros
opostos pelos recorridos ao fundamento de que o imóvel penhorado pela
empresa exeqüente fora objeto de contrato de compra e venda anterior, com
posse imediata pelos embargantes.
O MM. Juiz sentenciante julgou improcedentes os embargos, com fulcro
na súmula do Supremo Tribunal Federal (Enunciado n. 21), decisão contra a
qual foi manejada, com êxito, apelação, cujo provimento não unânime pelo v.
acórdão (fl s. 159-168) ensejou embargos infringentes, nos quais os eminentes
Juízes do Grupo de Câmaras Cíveis do Tribunal de Alçada do Paraná, por
maioria de votos (6 a 4), mantiveram o provimento da apelação, concluindo no
sentido de que os promitentes compradores “têm posse própria, como de dono, e
podem deduzir embargos de terceiro à penhora, que, como defesa possessória, é
uma defesa específi ca e provisória” (fl s. 234-247).
Irresignada, a embargada interpôs Recurso Extraordinário (fl s. 249-270),
com suporte nas alíneas a e d do art. 119 da Constituição anterior, argüindo,
ainda, relevância da questão federal.
O RE foi admitido pela decisão de fl. 277, em face da divergência
jurisprudencial com a Súmula.
Os autos, antes de virem a esta Corte, foram remetidos ao colendo
Supremo Tribunal Federal, quando a Subprocuradoria Geral da República
opinou no sentido do não-conhecimento do RE por não vislumbrar, in casu, a
alegada divergência sumular.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo (Relator): Conheço do recurso e lhe
dou provimento.
Ressalvo, de início, que não se nega a via dos embargos de terceiro ao
possuidor, uma vez que há expressa disposição legal autorizativa (art. 1.046,
§ 1º, CPC). Pertinente, a todas as luzes, no entanto, a objeção levantada pelo
Ministro Moreira Alves no sentido de que nem sempre é possível essa via, como
nos casos de comodatário, locatário, depositário etc. (ERE n. 87.958-RJ, RTJ
89/285).
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 17
Há um sistema legal concernente à propriedade imobiliária e a sua
observância preserva a confi abilidade dos registros públicos: o assentamento no
álbum imobiliário (e somente ele) permite a oponibilidade erga omnes do direito.
Destarte, a inscrição no Registro Público do contrato preliminar de compra
e venda de imóvel imprime ao direito do adquirente o efeito que decorre do
próprio domínio: oposição a todos. Enquanto não efetuada a inscrição, existe
apenas o direito obrigacional do comprador, cujo inadimplemento, como é
curial, se resolve em perdas e danos entre as partes. Em outras palavras, somente
gera efeitos inter partes.
Por outro lado, é de atentar-se para outro direito que não pode ser
postergado: o de terceiro de boa-fé, que contrata com o alienante e tem no
patrimônio deste a garantia do cumprimento das obrigações por ele assumidas.
Ao buscar a satisfação de seu crédito pela via executiva, o credor se posiciona,
até prova em contrário, como terceiro de boa-fé, com direito à constrição
jurisdicional do patrimônio do devedor inadimplente, pela penhora de bens que
o integrem.
Com a inobservância pelos embargantes do sistema legal para transmissão
de propriedade, no momento em que o credor recorreu ao Poder Judiciário, para
satisfazer seu crédito, encontrou o imóvel inserido no patrimônio do devedor,
posto que somente o registro opera a transferência do domínio (art. 530, I,
CCB).
De outra parte, cumpre salientar que o mesmo sistema legal põe à disposição
dos embargantes os mecanismos jurídicos de proteção ao seu direito, quer seja
através da inscrição da promessa de compra e venda no registro imobiliário
para valer contra terceiros, quer seja pela adjudicação compulsória do bem, ao
fi nal do pagamento, quando a decisão judicial supre a vontade do alienante que
se recusa outorgar escritura defi nitiva. Compete, pois, ao interessado, provocar
o Judiciário em busca da defesa de seus interesses, porquanto é sabido que
dormientibus non sucurrit jus.
O rompimento do sistema legal de transmissão da propriedade para
atender a certas condições e casos, ensejaria casuísmos que poderiam conduzir
à instauração de precedentes, pondo em risco a estabilidade, confi abilidade e
segurança de todo o sistema.
Merece, fi nalmente, destaque o fato de que a doutrina tem, atentamente,
acompanhado a orientação jurisprudencial dominante, conforme se verifi ca em
Humberto Th eodoro Júnior que, cambiando da posição adotada na 1ª edição
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
18
do volume IV dos “Comentários ao Código de Processo Civil” (Forense, 1979,
p. 204), assevera em recente edição de sua obra, com farta remissão a julgados,
verbis:
Se, todavia, o compromisso não foi levado a registro, o que há entre os
contratantes é apenas um vínculo obrigacional, cuja vigência não ultrapassa
a esfera dos sujeitos do negócio jurídico, em face do princípio da relatividade
dos contratos. Nem mesmo a posse do promissário tem sido considerada pela
jurisprudência do STF como sufi ciente para legitimar sua pretensão à tutela dos
embargos de terceiro. É que, não confi gurado o direito real, a posse precária do
promissário é exercida ainda em nome do promitente o que não exclui nem o
domínio, nem a posse indireta do legítimo dono (“Curso de Direito Processual
Civil”, vol. III, 2ª edição, Forense, 1989, n. 1.436, p. 1.819).
À luz do exposto, o enunciado da Súmula n. 621, do Supremo Tribunal
Federal, merece ser prestigiado nesta Corte, razão pela qual conheço e provejo o
recurso para restabelecer a decisão de primeiro grau.
VOTO
O Sr. Ministro Barros Monteiro: Sr. Presidente, está em causa na espécie,
a Súmula n. 621 do colendo Supremo Tribunal Federal. O compromissário-
comprador, desde que não inscrita a Promessa de Compra e Venda no Registro
Público, é mero titular de direito pessoal em relação à coisa penhorada. Nessas
condições apenas o registro é que dá ao compromisso efi cácia erga omnes.
O Pretório Excelso, depois de muita discussão sobre a matéria, acabou
consolidando a sua jurisprudência no enunciado da Súmula n. 621, em condição
tal que a penhora subsiste válida, uma vez que se trate de imóvel simplesmente
compromissado, mas não registrado.
Acompanho o Sr. Ministro-Relator, conhecendo do recurso e dando-lhe
provimento.
VOTO
O Sr. Ministro Bueno de Souza: Senhores Ministros, o verbete n. 621 da
Súmula da Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem o seguinte teor:
Não enseja embargos de terceiro à penhora a promessa de compra e venda
não inscrita no Registro de Imóveis.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 19
2. O enunciado, como se vê, se reveste de acentuadíssimo rigor, a ponto
de exemplifi car hipótese de extinção do processo de embargos de terceiro, sem
decisão de mérito, mediante sentença terminativa, in limine, nos termos dos arts.
267, I, e 295, parágrafo único, III, do Código de Processo Civil.
Em outras palavras, a súmula autoriza os juízes em geral, quaisquer que
sejam as circunstâncias do caso, a repelir, sem mais, embargos de terceiro opostos
à penhora de imóvel, se não estiver inscrito o instrumento de compromisso de
compra e venda em que o terceiro embargante fundamenta sua demanda. As
apelações interpostas contra sentenças liminarmente terminativas, em casos tais,
sequer mereceriam processadas, à luz dessa vinculativa orientação jurisprudencial,
no Tribunal Federal de Recursos; hoje, deveriam ser prontamente repelidas
pelos Tribunais Regionais Federais (Lei Complementar n. 35, de 14.03.1979,
art. 90, § 2º; Constituição de 05.10.1988, art. 108).
3. No entanto, certo é que nem sempre assim se orientou a jurisprudência
do Supremo Tribunal, como passo a demonstrar.
4. Com efeito, logo após sua transferência para a nova Capital Federal,
no julgamento do Agravo de Instrumento n. 28.756-SP, em 20 de setembro
de 1963, sendo Relator o Ministro Ribeiro da Costa, a Suprema Corte, por sua
Segunda Turma, à unanimidade (RTJ 30/401), prestigiou a tese contrária à da
precitada súmula, em v. acórdão assim ementado:
Embargos de terceiros opostos por promitente comprador a fi m de evitar
que o imóvel compromissado seja penhorado e praceado para pagamento de
dívida de promitente vendedor. - Procedência dos embargos quando embora não
registrado o compromisso de compra e venda sendo irretratável, se acha quitado.
- Agravo improvido.
O saudoso Ministro Amaral Santos, com sua autoridade de consagrado
processualista, também deixou clara sua posição, no relatório do RE n. 71.162-
GB, em 12 de outubro de 1971 (RTJ 60/494). Na ementa do aresto da Primeira
Turma, unânime, consta este resumo:
Ação executiva. Penhora de bem vendido por um dos executados a terceiro,
que, embora na posse da escritura defi nitiva de compra e venda, não fi zera a sua
transcrição.
I - Os embargos de terceiro são admitidos não apenas para a proteção
simultânea do domínio e da posse, como no direito anterior, mas também para a
defesa da simples posse.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
20
II - Não ocorrendo quaisquer das hipóteses de fraude à execução, a alienação
há de ser considerada plenamente efi caz, enquanto não for anulada pelo meio
próprio, que é a chamada ação pauliana.
III - Inocorrência de negativa de vigência dos arts. 530 e 928 do Código Civil, e
do art. 178 do Decreto n. 4.857, de 09.11.1939.
Recurso extraordinário não conhecido.
O saudoso Ministro Rodrigues Alckmin, por sua vez, no erudito voto-vista
proferido no RE n. 76.769-GB (Primeira Turma, unânime, em 19.11.1973,
Ementário n. 934/4), manteve-se fiel ao entendimento constante de seus
julgados de Juiz do Tribunal de Alçada de São Paulo.
Eis a síntese de seu pensamento sobre o assunto:
O eminente Relator, Ministro Luiz Gallotti, não conheceu do recurso porque
considerou não ter, o acórdão recorrido, afi rmado que, para interposição dos
embargos de terceiro, se exija a condição simultânea de senhor e possuidor
ao embargante. O acórdão teria reclamado o registro do contrato, para sua
oponibilidade a terceiros, o que não enfrentaria a jurisprudência predominante
do Supremo Tribunal Federal.
Tenho - e examinarei a final, a questão do conhecimento - que a solução
adotada no aresto recorrido é juridicamente inexata.
No acórdão proferido no Agravo de Instrumento n. 28.756 (que o recorrente
invoca para a comprovação do dissídio), o eminente Ministro Ribeiro da Costa fez-
me a honra de transcrever despacho meu, em caso idêntico, em que afi rmei:
Inegável é o cabimento de embargos de terceiro por parte do promitente
comprador, para evitar que o imóvel prometido à venda sem cláusula de
arrependimento possa ser penhorado e levado à praça para pagamento de
dívida do promitente vendedor. Inegável, porque os embargos de terceiro
protegem não apenas o domínio, mas também a posse e mesmo direitos
obrigacionais (v. Lopes da Costa, “Direito Processual Civil Brasileiro”, 4,
254; Pontes de Miranda, “Comentários ao Código de Processo Civil”, ed.
1949, IV/206). Conseqüentemente, bastava a prova do direito obrigacional
anterior à penhora para que os embargos de terceiro pudessem ser
acolhidos.
A doutrina confi rma o assêrto. Pontes de Miranda: “O direito, que se supõe
no art. 707, turbado ou esbulhado (“prejudicado”, melhor fora dito), não é o
direito a que se referia a Ordenação do Livro III, Título 81, ao falar do direito
de apelar, que tem o terceiro, porque alí se tratava da intervenção na relação
jurídica processual, na discussão da pretensão à sentença, e não da execução,
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 21
ou, em geral, da constrição: é o direito do terceiro, que foi objeto de constrição
judicial. Ora, os bens arrestáveis, seqüestráveis, depositáveis, penhoráveis etc.,
não são só os que são objeto de propriedade (senso estrito), de direito das coisas.
São também direitos, pretensões, ações. Portanto, sempre que a constrição
judicial apanhou “direito” (títulos de crédito, direitos, pretensões, ações, art. 930,
II e V) está autorizado o emprego de embargos de terceiro prejudicado - terceira
espécie do art. 707, sendo que o legislador preferiu considerá-la compreensiva
dos embargos de terceiro senhor. Quando a efi cácia do ato judicial fere a órbita
do direito, pretensão, ou ação do terceiro, constringe-o.”
No mesmo sentido, José Frederico Marques, “Instituições de Direito Processual
Civil” V/454, e Carneiro de Lacerda, “Código de Processo Civil”, IV/179.
A alegação a que se prendeu o acórdão, de não achar-se registrada, no Registro
de Imóveis, a promessa de cessão, equivale, sem dúvida, a negar que os embargos
de terceiro possam proteger direitos obrigacionais, ou proteger a posse que,
com apoio neles, se legitime. Reclamou o acórdão, para a proteção do direito do
terceiro embargante, que esse direito seja “real”, pois, se referente a imóvel, que
haja transcrição, inscrição ou averbação.
Além de afastar-se da doutrina e da jurisprudência (que, como visto, não
restringe embargos de terceiro à proteção da propriedade e de direitos reais), o
julgado não teve em conta que o problema devia ser encarado sob o aspecto de
fraude à execução. E provada a constituição de direito, de natureza obrigacional,
embora, a favor do terceiro embargante, sem fraude à execução, nada justifi cava
fosse desconhecido tal direito pelo exequente.
Do mérito da controvérsia se vê que, na verdade, ao repelir os embargos, o
acórdão recorrido afi rmou a tese de que - ainda que se não cogite de fraude à
execução - os embargos de terceiro não protegem direitos - salvo se reais - ou a
posse que neles se baseie.
Dado o valor atribuído à causa, é de ter-se tal entendimento como contrário
à jurisprudência predominante do STF, para que o recurso possa lograr
conhecimento?
Peço vênia ao eminente Ministro Luiz Gallotti para, responder pela afi rmativa.
Como jurisprudência dominante se tem, não somente a cristalizada em Súmulas,
mas a orientação adotada pelo Pleno, ou por ambas as Turmas, sobre a questão
Federal.
Ora, o recorrente indicou julgado dissidente da Segunda Turma (Agravo de
Instrumento n. 28.756) e da Primeira (RE n. 19.642), indicando, ainda, julgado que
teve como protegível a posse amparada em título não registrado (RE n. 71.162
da GB, Relator Ministro Amaral Santos). Outrossim, no RE n. 62.198 de SP (RTJ
41/298) admitiu-se a possibilidade de embargos de terceiro para a proteção de
direito obrigacional (embargos oferecidos pelo locatário em execução de ação
de despejo), frisando o Ministro Adalício Nogueira quanto a extensão deles:
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
22
“a jurisprudência busca insuflar-lhe um sentido novo, uma amplitude mais
compatível com o dinamismo da atividade jurídica contemporânea.”
E não encontrei, na jurisprudência deste Supremo Tribunal, julgado algum que
restrinja os embargos à proteção de direitos reais.
Estes precedentes levam-me a ter como contrária à jurisprudência
predominante a orientação adotada no acórdão recorrido. E assim, conhecendo
do recurso extraordinário, dou-lhe provimento, para restabelecer o acórdão da
apelação.
Esta mesma orientação foi mantida pela egrégia Segunda Turma, unânime,
no v. acórdão do RE n. 82.632-RJ, em 02.04.1976, sendo Relator o Ministro
Th ompson Flores (RTJ 81/852). Eis os dizeres da ementa:
Embargos de terceiro. Promessa de cessão não inscrita no Registro Imobiliário.
Penhor averbado do mesmo imóvel não obsta o êxito dos embargos.
II - Se a promessa de cessão é anterior ao ingresso da execução, e tida como
válida, porque ausente a sua fraude, não se faz mister suas inscrições para
embasar os embargos de terceiro, segundo a melhor doutrina aceita no Supremo
Tribunal Federal.
III - Recurso não conhecido, porque limitado à letra a da permissão
constitucional, incorrendo negativa de vigência das duas normas de lei federal
indicadas.
Naquela assentada, no particular, asseverou o eminente Relator:
Limita-se o excepcional à negativa de vigência do art. 485 do Código Civil,
porque o embargante não teria a posse; e art. 69 da Lei n. 4.380/1964, dado que
inexistiria direito real oponível, eis que a promessa de cessão não estaria inscrita
no Registro Imobiliário.
O exame dos autos, em sua integralidade, convenceu-me, contudo, que não
merece conhecida a irresignação, como já concluíra o despacho presidencial.
De fato.
Os embargos resultaram acolhidos porque desprezou o acórdão a ocorrência
de fraude à execução, invocando, em princípio, o art. 593, II, do Código de
Processo Civil, e após a existência de qualquer prova que a indiciasse.
Atribuiu, pois, validade à promessa de cessão, por escritura pública, anterior ao
ingresso da ação executiva, título no qual se esteou o embargante, ainda que não
inscrito no Registro Imobiliário, diversamente do que sucedera com a penhora.
Assim procedendo, não vejo tenha negado vigência ao art. 485 do Diploma
Civil, do qual não cuidou o acórdão, ao menos expressamente; ou do já referido
art. 69 da Lei n. 4.380/1964.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 23
É que os embargos não assentam em direito real, oponível a terceiros, e
dependente da inscrição do título.
Antes, embasaram-se na escritura de promessa de cessão, e nessa, reconhecida
válida, além de cláusulas outras, assegurava a posse imediata, verbis, fl . 6:
O outorgado fi ca desde já na completa posse e livre administração do
imóvel objeto da presente, inclusive de sua renda, respondendo, porém,
também, desta data em diante, pelos pagamentos de todos os impostos,
taxas e demais tributos fi scais que gravam ou venham a gravar o mesmo
imóvel.
E seria o bastante para justifi car a procedência dos embargos, sem ofensa ao
citado art. 485.
De resto, dispensando a inscrição do contrato promissório de cessão para
nele ver título legítimo a oposição de embargos de terceiro, orientou-se pela
melhor doutrina, afi nando, ademais, com a jurisprudência desta Corte, como
em exaustivo voto acentuou o eminente Ministro Rodrigues Alckmin, após pedir
vista do RE n. 76.769, Primeira Turma, em 19 de novembro de 1973 (Ementário n.
934/4).
E a egrégia Primeira Turma, no RE n. 87.958-RS (RTJ 91/257), sendo
Relator o Ministro Cunha Peixoto, em 24 de novembro de 1977, assim decidiu,
à unanimidade:
Embargos de terceiro senhor e possuidor. Sua procedência nos termos do art.
1.046 do Código de Processo Civil.
A falta de registro da promessa de compra e venda não obsta a procedência
dos embargos, eis que, para se opor ao ato de penhora, basta a qualidade de
mero possuidor.
E ainda reiterou esse entendimento, no RE n. 89.685-SP, em 14.03.1978,
unânime ( Jur. Bras., Embargos de Terceiro, p. 62), em cuja ementa se lê:
Embargos de terceiro. Compromisso de compra e venda não registrado. Falta
de registro. Penhora. Possuidor.
Embargos de terceiro. Compromisso de compra e venda não registrado.
“A falta de registro da promessa de compra e venda não obsta à procedência
dos embargos, eis que para se opor ao ato de penhora, basta a qualidade de
possuidor” (RE n. 87.958).
Dissídio jurisprudencial não comprovado.
Recurso extradordinário não conhecido.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
24
5. Esta pacífi ca jurisprudência guardava, de resto, coerência com a tradição
brasileira, infensa a uma sistemática correlação entre a natureza da decisão e a
correspondente forma de impugnação, como autorizadamente expõe Buzaid
(Agravo de Petição, Saraiva, SP, 1956, pp. 69 e ss.); a qual, por um lado, não
encorajava a imediata rejeição de embargos de terceiro (nem, na verdade, de
qualquer tipo de demanda), bem como refl etia a escassa importância conferida
às fi guras então ainda incipientes de pré-contrato, notadamente o compromisso
de compra e venda (que somente nas décadas de 1930/1940 começou a assumir
feições próprias, em razão do relevo que o mundo dos negócios veio a lhe
atribuir), como se lê, entre outros, em Souza Campos Batalha (Loteamentos,
ed. Limonad, 1953, pp. 340 e ss.) e Orlando Gomes (Direitos Reais, 2ª ed., For.,
1962, pp. 486 e ss.).
Até então, a jurisprudência admitia, sem discrepância, os embargos de
terceiro para tutela da propriedade ou da posse atingida por ato judicial, sem
qualquer alusão a compromisso de compra e venda.
6. Foi somente em 16.03.1971, no julgamento do RE n. 73.527-PE, que
a egrégia Primeira Turma do Supremo Tribunal, unânime, sendo Relator o
eminente Ministro Djaci Falcão (RTJ 63/222), decidiu em sentido diverso, tal
como consta da ementa:
Promessa de compra e venda do imóvel. Sem a formalidade essencial da
inscrição no registro público, não se torna oponível a terceiros. O registro é
que lhe atribui efi cácia erga omnes. Recurso extraordinário conhecido, mas não
provido.
Anote-se que este primeiro precedente da discutida Súmula n. 621 é
extremamente frágil em razões que aconselhassem a modifi cação do rumo
jurisprudencial até então observado, quando é certo que o Supremo Tribunal,
em harmonia com o que vinham decidindo os Tribunais Estaduais, jamais
autorizara a pura e simples rejeição liminar de embargos de terceiro somente
por falta de registro do instrumento de compromisso de compra e venda (em
verdade, sequer jamais cogitou dessa drástica alternativa).
Limita-se o aresto inovador a acenar para o art. 22 do Decreto-Lei n. 58,
de 10.12.1937, com a redação que lhe conferiu a Lei n. 649, de 11.03.1949,
diplomas legais estes, aliás (convém acentuar), cujo declarado escopo
precisamente consiste em robustecer a posição do compromissário comprador,
quer em face do promitente vendedor, quer perante terceiro; não, ao contrário,
em enfraquecê-la.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 25
É bem verdade que o entendimento adotado pelo precedente comportou
certas vacilações. Tanto assim é que, em 13.11.1973, o Ministro Djaci Falcão,
revendo sua posição, aderiu ao voto-vista proferido pelo Ministro Rodrigues
Alckmin no RE n. 76.769-GB, há pouco referido e, que em parte, acabo de
transcrever, para enriquecimento deste voto.
7. A estas considerações, o eminente Ministro Moreira Alves acrescentou,
em seu douto voto-mérito nos embargos em RE n. 87.958-RJ (RTJ 89/291):
Com efeito, ninguém nega que os embargos de terceiro possam ser opostos
pelo mero possuidor. O que não me parece certo, no entanto, é admiti-los em
favor do simples possuidor para efeito de desconstituir a penhora de imóvel de
propriedade do executado, a qual não acarreta turbação ou esbulho de posse. A
ser isso possível, e se o imóvel penhorado tivesse sido entregue em comodato a
alguém, o comodatário poderia excluí-lo da penhora por meio de embargos de
terceiro.
Em se tratando de promitente comprador, os embargos de terceiro só podem
ser utilizados por ele, para opor-se à penhora do imóvel de propriedade ainda
do promitente vendedor executado, se estiver inscrita a promessa de compra e
venda irretratável e irrevogável, pois, nesse caso, a penhora não atinge a posse,
mas sim o direito real à aquisição de que aquele é titular. Se não estiver inscrita a
promessa, o promitente comprador é simples titular de direito pessoal, e embora
na posse do imóvel, não pode atacar o ato de constrição judicial que é a penhora,
como não o poderiam o comodatário, o locatário, o depositário, também
possuidores e titulares de mero direito pessoal com relação à coisa penhorada.
Este segundo precedente da Súmula n. 621, é oportuno recordar, prevaleceu
por pequena maioria, ficando vencidos os Ministros Soares Muñoz, Cunha
Peixoto, Rodrigues Alckmin e Xavier de Albuquerque.
Assim também ocorreu, aliás, com o terceiro precedente (embargos no RE
n. 89.696-RJ, 08.08.1979, Rel. Min. Moreira Alves, RTJ 95/282), quando fi caram
vencidos os Ministros Soares Muñoz, Cunha Peixoto, Xavier de Albuquerque e
Th ompson Flores.
8. Diversamente, portanto, do que se observa relativamente aos julgados
representativos da primeira tendência jurisprudencial, verifica-se que os
precedentes da Súmula n. 621 traduzem orientação predominante, aferida, salvo
uma única exceção, por simples maioria de votos, fundada em razões atinentes,
apenas, ao tema da efi cácia erga omnes do reclamado registro do compromisso de
compra e venda, nos termos do art. 22 do Decreto-Lei n. 58, de 1937 e Lei n.
649, de 1949.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
26
9. No mais, cumpre ter em vista a severa restrição imposta pela Súmula n.
621 à proteção judicial da posse legítima de imóvel, ou seja, de posse fundada
em contrato (Código Civil, art. 493, III), tal o compromisso de compra e venda,
só por desprovido de registro imobiliário: constituindo-se, embora, em posse ad
interdicta, pois imune aos vícios que poderiam contaminá-la (vi, clam, precario),
fi caria, não obstante, cerceado o seu acesso à ação possessória, gênero ao qual
pertencem os embargos de terceiro opostos a esbulho judicial, a reclamar, por
isso mesmo, tutela mais pronta e efi caz (Pontes de Miranda, Comentários ao
Código de Processo Civil, 1ª ed., For., Rio, 1977, XV, 59).
A inovação por este modo propugnada antagoniza, igualmente, a
tendência de jurisprudência da Suprema Corte, no sentido de acentuar a tutela
jurisdicional, até mesmo, da posse ad usucapionem (dispensado, portanto, o
requisito do título), ao admitir a declaração do domínio em obséquio à alegação
da prescrição aquisitiva pelo réu, em defesa (RE n. 23.491-SP, Primeira Turma,
unânime, 11.10.1954, Relator Ministro Abner Vasconcellos, RT 234/484).
10. Em época mais recente, a explosão populacional, cada vez mais
acentuada nas áreas urbanas, vem determinando a inevitável expansão das
cidades maiores, com o incessante e irreversível aparecimento de loteamentos
ou meros fracionamentos de antigas chácaras dos arredores, cujos proprietários,
muitas vezes pessoas rústicas, são impelidos a esse improvisado empreendimento,
da mesma forma que os adventícios, por sua vez, tangidos a adquirir pequenos
lotes residenciais em áreas desprovidas de serviços públicos, onde constroem
suas modestas habitações, fundados em contratos desprovidos de registro, pois o
próprio loteamento é quase sempre irregular. Sobrevindo execução fi scal contra
o improvisado loteador, os lotes já edifi cados são, obviamente, os preferidos
pelos ofi ciais de justiça, para garantia do juízo.
A não se admitir, sequer, a oposição de embargos de terceiro, fica a
jurisdição impedida de tomar conhecimento das bases empíricas da demanda
(Rosenberg).
Daí o que se me afi gura o excessivo rigor do verbete n. 621, a que aludi, de
início.
11. Penso, por conseguinte, que não se aconselha a peremptória recusa
liminar da ação de embargos de terceiro, fundada em compromisso de compra
e venda destituído, embora, de registro imobiliário, como recomenda a Súmula
n. 621: ao cerceamento do direito de ação, somar-se-ia, no caso, o drástico
enfraquecimento da própria posse, que, em casos tais, transcende a mera
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 27
realidade de fato para invocar a qualifi cação de posse legítima, ad interdicta
(fundada em contrato), oponível ao esbulho perpetrado por sujeitos da ordem
privada e, portanto, a fortiori, ao esbulho judicial que porventura seja praticado
através da penhora ou de outro ato de apreensão.
O que se recomenda, assim, é, data venia, que os embargados de terceiro,
em casos tais, não sejam só por isso liminarmente recusados, mas devidamente
processados, decididos como de direito, às instâncias locais incumbindo conhecer
e apreciar as alegações e provas deduzidas em juízo.
Eis porque não posso emprestar minha adesão, ainda que desvaliosa, aos
dizeres da jurisprudência sumulada, a qual, tudo indica, não se concilia com os
imperativos da ordem social do nosso tempo.
12. A decisão recorrida admitiu e, afi nal, acolheu os embargos de terceiro,
que se insurgiram contra a penhora, fundando-se em contrato de compromisso
de compra e venda desprovido de registro imobiliário, bem como na posse
imediata do imóvel, afastada a ocorrência de fraude à execução.
Cumpre, pois, conhecer do recurso, por manifesta a divergência do julgado
com a Súmula n. 621 do Supremo Tribunal.
Nego-lhe, porém, provimento, pelas razões já expostas.
VOTO
O Sr. Ministro Athos Carneiro: Sr. Presidente, ao apreciar este tema
impressiono-me, sobremodo, com as conseqüências, no plano social, dos nossos
julgamentos.
Sabemos que no nosso país, principalmente nas camadas pobres da
população, um grande número de negócios, e até direi, a maior parte dos
negócios, é efetuada de maneira menos formal, e até absolutamente informal.
Compram-se e vendem-se pequenos terrenos e casas apenas mediante a
emissão de recibos, sinais de arras e mesmo de promessas de compra-e-venda
ou “transferências de posse” redigidos de forma a mais singela. E é muitíssimo
comum que esses documentos não venham a ser registrados no Registro de
Imóveis, inclusive porque os termos em que estão vazados não permitiriam
o registro. Para o registro imobiliário é necessário que o contrato revista
determinados requisitos, o que exige, freqüentemente, a presença do tabelião ou
do profi ssional do Direito.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
28
Então, com extrema freqüência, ocorre na vida judiciária termos alguém
que é possuidor do seu terreno ou da sua casa há muitos anos, em inteira
boa-fé, que já pagou a totalidade do preço há muitos anos, e de repente é
surpreendido por uma penhora, em execução promovida contra aquele que lhe
havia “alienado” o imóvel; nos termos da aludida Súmula, irá perder seus direitos
à posse e à aquisição da propriedade.
Então vemos aqui os dois pratos da balança: de um lado, temos o direito
do credor, direito pessoal; do outro lado o direito, também pessoal, do possuidor
e promitente comprador. Geralmente, como no caso dos autos, o possuidor já
mantinha o seu direito de posse e os direitos à aquisição decorrentes de sua
promessa de compra-e-venda desde antes do surgimento do crédito que origina
a penhora.
Então se pergunta: entre as duas pretensões, a do credor, direito pessoal,
e a do promitente comprador com justa posse, direito também pessoal, qual é
aquela que merece maior tutela, maior proteção da ordem jurídica?
Tenho a impressão de que levar nosso raciocínio para o terreno do direito
registral importará na aplicação das normas jurídicas dentro de um, digamos
assim, tecnicismo exagerado. É certo que, num plano puramente registral,
o imóvel penhorado ainda é, tecnicamente, integrante do patrimônio do
promitente vendedor. Mas, inclusive, com freqüência é difícil que o credor
ignore que sobre aquele imóvel, cuja penhora postula, se exerce direito de outra
pessoa, do promitente comprador e possuidor de boa-fé.
O promitente vendedor ainda é dono do imóvel, mas o é sob aquele minus
derivado das obrigações que assumiu, de outorga da escritura defi nitiva, em
virtude do contrato quitado de promessa de compra e venda. O patrimônio do
cidadão não é constituído só dos seus direitos, mas também das suas obrigações.
E o prominente vendedor tem a obrigação de garantir a posse transferida
contratualmente ao promitente comprador, que a exerce em nome próprio.
Então, se dirá: mas o credor não sabia disso; o credor considerava que
o imóvel era do promitente vendedor; emprestou-lhe dinheiro, ou com
ele negociou, confi ante de que aquele imóvel fazia parte, sem ônus, do seu
patrimônio. Será que essa assertiva corresponde às realidades práticas da vida?
Será que o credor foi realmente averiguar no Registro Imobiliário e não atentou
para a circunstância de que naquele imóvel estaria morando alguém, às vezes há
muitíssimos anos, comportando-se como dono? E a penhora, por sua vez, terá
sido objeto de registro, de molde a ter efi cácia perante terceiros?
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 29
Creio mais conforme com as necessidades atuais do comércio jurídico a
interpretação pela qual, no choque de interesses de dois direitos eminentemente
pessoais (a própria penhora não é direito real, mas ato processual executivo),
tanto um quanto outro, deve prevalecer o direito daquele que está na justa posse
do imóvel, como seu legítimo pretendente à aquisição, e com o preço quitado,
face ao direito do credor do promitente vendedor, dês que ausente, por certo,
qualquer modalidade de fraude à credores ou à execução, como no caso dos
autos.
Esta orientação melhor se coaduna às realidades jurídico-sociais do nosso
país, e impede sejamos sensíveis a estas realidades.
De maneira que, rogando vênia ao eminente relator, e reconhecendo às
difi culdades da matéria e o peso dos argumentos em contrário, ouso divergir da
Súmula n. 621, retornando à antiga orientação do Pretório Excelso, revelada,
v.g., nos RREE in RTJ, 91/257; RTJ, 92/818; destarte, mantenho o aresto
proferido pelo egrégio Tribunal de Alçada do Estado do Paraná.
Conheço, mas nego provimento.
VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro Fontes de Alencar: Sr. Presidente, tenho como ajustada
à boa realização da justiça a posição do eminente Ministro Athos Carneiro.
Afi nal, não estamos a julgar pedras, mas a apreciar fatos que envolvem a conduta
humana, envolvem o homem com todas as suas circunstâncias.
Assim, dispensando-me de outras considerações, acolhendo as expostas
pelo Ministro Athos Carneiro, acompanho-lhe o pensamento.
RECURSO ESPECIAL N. 226-SP (8900085093)
Relator: Ministro Gueiros Leite
Recorrente: Banco Brasileiro de Descontos S/A
Recorrido: Vivaldo Curi
Advogados: Matilde Gonçalves de Oliveira e outros e José Luiz Mendes
de Moraes
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
30
EMENTA
Posse imobiliária. Constrição executória. Embargos de terceiro.
Pode manifestar embargos de terceiro o possuidor, qualquer que
seja o direito em virtude do qual tenha a posse do bem penhorado ou
por outro modo constrito.
O titular de promessa de compra e venda, irrevogável e quitada,
estando na posse do imóvel, pode-se opor à penhora deste mediante
embargos de terceiro, em execução intentada contra o promitente
vendedor, ainda que a promessa não esteja inscrita.
Recurso especial de que se conhece pelos dois fundamentos (CF,
art. 105, III, a e c), mas a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, prosseguindo no julgamento,
após o voto-vista do Sr. Ministro Eduardo Ribeiro, por maioria, conhecer do
recurso especial e negar-lhe provimento, vencido o Sr. Ministro Cláudio Santos
que dele conhecia e dava provimento, tudo nos termos do voto do Sr. Ministro-
Relator, na forma do relatório e notas taquigráfi cas constantes dos autos, que
fi cam fazendo parte integrante do presente julgado.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 19 de setembro de 1989 (data do julgamento).
Ministro Gueiros Leite, Presidente e Relator
DJ 30.10.1989
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Gueiros Leite: Trata-se de embargos de terceiro opostos
por Vivaldo Curi, objetivando a liberação de bem penhorado em execução
cambial, promovida pelo Banco Brasileiro de Descontos S/A, os quais foram
julgados improcedentes (fl s. 213-217).
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 31
O embargante apelou e a Oitava Câmara do Primeiro Tribunal de Alçada
Cível de São Paulo, à unanimidade, deu provimento ao recurso (fl s. 247-249),
sob o fundamento de que:
(Omissis)
Portanto, evidente a posse do apelante sobre o imóvel, não vislumbrada
qualquer fraude no compromisso de compra e venda, muito anterior à
constituição da dívida, como ainda não se pode dizer que esse compromisso
era ineficaz por ser o segundo, se o primeiro não estava registrado e ainda
concordando com o novo compromisso a anterior compromissária, dá-se
provimento ao recurso (fl . 249).
Apresentados embargos declaratórios pelo Banco, estes foram rejeitados
(fl s. 255-256).
Irresignado, o Banco Brasileiro de Descontos S/A interpôs recurso
extraordinário, com fundamento no art. 119, III, a e d, da CF/1967, argüindo,
ainda, a relevância da questão federal.
O recorrente alega ofensa aos arts. 530, I, 531, 532, II e III, 533, 856 e
860, parágrafo único, do Código Civil, além do art. 252, da Lei n. 6.015/1973;
divergência com a Súmula n. 621, do STF, e acórdãos que indica.
Sustenta, em suma, que o recorrido não tem a propriedade do imóvel
penhorado, porque ausente o registro do compromisso de compra e venda (fl s.
258-267).
Não houve impugnação (fl . 268). E, pelo despacho de fl s. 269-271, o
recurso foi admitido.
Com as razões (fl s. 280-287) e contra-razões (fl s. 276-278), subiram os
autos ao Supremo Tribunal Federal, que determinou a remessa dos mesmos
a esta Corte, convertido o RE em recurso especial, por causa da instalação do
Superior Tribunal de Justiça (fl . 294).
Com dois volumes e três apensos.
É o relatório do essencial.
VOTO
O Sr. Ministro Gueiros Leite (Relator): Os fatos, tais como narrados
e documentados, envolvem questão de posse imobiliária que se pretende
resguardar de constrição executória, pela via dos embargos de terceiro.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
32
Senão, vejamos.
Miguel Carlos Castro, José Roberto Castro e Luiz Antonio Castro prometeram
vender ao embargante Vivaldo Curi o apartamento descrito no instrumento
particular de promessa de compra e venda, lavrado em 25 de fevereiro de 1982, e
que não foi inscrito no registro de imóveis.
Esse imóvel foi objeto parcial de penhora, em execução promovida pelo
Banco Brasileiro de Descontos S/A contra a empresa Castela Comercial e
Construtora Ltda., dos promitentes vendedores, de modo que o embargante
Vivaldo Curi, dizendo-se seu possuidor, manifestou, nessa qualidade, os
embargos de terceiro do art. 1.046, do CPC, pelos motivos que alega, verbis:
Tomando conhecimento da tramitação do processo de execução n. 1.440/1984,
no qual consta o auto de penhora de 20.11.1984, sobre 50% da referida unidade
autônoma, da qual é compromissário, vem embargar essa penhora, pois, tendo
efetiva as quitações das amortizações, nos termos convencionados, como
comprovam os diversos pagamentos efetivados com cheques de sua conta-
corrente, da conta-corrente de sua esposa, da conta corrente de uma fi rma da
qual é sócio (Doc. 07), todas por coincidência abertas em agências do próprio
Bradesco, cujos numerários foram depositados pela cessionária Antonia Moreto
Castro, em sua conta corrente n. 022.791, no Bradesco (Doc. 08), e em estando
na posse do imóvel há muito tempo (Docs. 09/13), mesmo que fosse só pelo
deferimento do art. 1.046, § 1º, do Código de Processo Civil, estaria habilitado a
pedir que seja a mesma anulada, ante a válida comprovação de sua posse desde o
compromisso (fl . 4, item V).
A sentença lhe foi contrária, por aplicar à hipótese a Súmula n. 621, do
STF, invocada pelo Banco-embargado e que dá conta de ser inviável afastar-se a
penhora com lastro em compromisso não registrado, tanto mais porque a posse
derivaria de aquisição inefi caz (fl . 217).
Mas, o egrégio Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, por sua
Oitava Câmara, reformou a respeitável sentença, porque fi cara provado nos
autos o fato indiscutível da posse do embargante, que lhe fora transmitida e por
ele exercida desde logo, mansa e pacifi camente, assegurando, ainda, que posse
não se registra (fl . 248).
O acórdão decidiu mais que a Súmula n. 621, destinada à proteção dos
credores contra eventual fraude à execução, não se aplicava à hipótese dos autos,
pois havia um compromisso de compra e venda muito anterior à constituição
da dívida, aliás da sociedade comercial e da qual os promitentes vendedores são
meros avalistas (fl . 248).
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 33
Essa decisão foi reafi rmada nos declaratórios do Banco, onde os julgadores
arredaram suposta omissão para fi ns de prequestionamento, deixando claro o
seguinte: nada se decidiu a respeito de poder ou não o compromisso de compra e
venda não registrado embasar embargos de terceiro contra constrição judicial. O
fato é que o Banco pretendia se declarasse que a posse, sem o domínio, não gera
efeito erga omnes, isso porque o acórdão teria deixado de aplicar os dispositivos
que enumera do Código Civil e da Lei n. 6.015/1973 (fl . 255).
Ora, o Banco alega, para ensejar o cabimento do RE que interpôs junto
ao STF, a divergência do acórdão com a Súmula n. 621 e com outras decisões
daquela colenda Corte sobre o mesmo tema (RE n. 87.958, RTJ 89/285; RE n.
94.132, RTJ 107/686; RE n. 97.257; RE n. 103.121; RTJ 112/890, etc. — fl s.
260-264).
Alega, também, afronta às disposições do Código Civil e da Lei dos
Registros Públicos, que apenas enumera, a saber (fl . 264):
a) Código Civil — arts. 530, I; 531 e 532, II e III; 533; 856 e 860,
parágrafo único;
b) Lei n. 6.015/1973 — art. 252.
São, pois, alegações superadas, em face da fundamentação do acórdão sobre
os efeitos derivados da posse e não do domínio, que este se adquire, sim, através
do caráter publicitário do registro, da sua legalidade e força probante.
É certo que as decisões alinhadas pelo recorrente recusam a equiparação do
promissário comprador sem registro ao possuidor, para os efeitos do art. 1.046,
§ 1º, do CPC. Mas isto decorre da mesma confusão de origem, qual a de que a
penhora somente atingiria o direito real e não a posse.
Para alguns, menos avisados, também porque a promessa de compra e
venda sem a efi cácia do registro seria mero direito pessoal.
Pelo que sei, podem manifestar embargos de terceiro o senhor ou possuidor,
qualquer que seja o direito em virtude do qual tem a posse do bem, seja
direito real, obrigacional ou pessoal e até mesmo de crédito, neste último caso
quando o contrato não opera a transferência do domínio (cf. Moraes e Barros.
Comentários ao CPC, vol. IX, Forense, p. 296, Caio Mário da Silva Pereira,
Instituições, vol. IV, 1ª ed., 1970, p. 99).
Assim também Pontes de Miranda, ao defi nir os embargos de terceiro como
a ação do que pretende ter direito ao domínio ou outro direito, inclusive a posse,
sobre os bens penhorados ou por outro modo constritos (Comentários, vol. IX, 2ª
ed., 1959, p. 6).
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
34
Afi nal de contas, se formos colocar nos pratos da balança o que sobre esse
assunto já foi decidido pelos tribunais, verifi caremos não ser possível ter como
pacífi ca a jurisprudência, mas grandemente diversifi cada.
O STF, mesmo, tem várias decisões, sendo que uma delas com a seguinte
ementa:
Cabem embargos de terceiro, por parte do promitente comprador, com
contrato de compromisso de compra e venda quitada, irretratável e não
registrado, a fim de evitar que o imóvel compromissado seja penhorado e
praceado, para pagamento de dívida do promitente vendedor (STF, apelação DJ
de 21.09.1963/118a, apud Alexandre de Paula, CPC Anotado, vol. IV, RT-SP-1977, p.
326; idem RT 294/716; RF 142/151).
Dos Tribunais de São Paulo, Distrito Federal e Bahia as decisões não
discrepam (RT 337/351, RT 369/160, Adcoas 1971/4.890, RTBA 37/437, DJ
21.851, p. 2.335, RDI n. 12/1979 — todos encontrados em Alexandre de Paula,
obra e lugares citados).
Destaco dentre esses um do Tasp, a saber:
... Entretanto, quando não se vislumbra fraude de execução, o titular de
promessa de compra e venda, irrevogável e quitada, estando na posse do imóvel,
pode opor à penhora deste, mediante embargos de terceiro, em ação executiva
intentada contra o promitente vendedor, ainda que a promessa não esteja
inscrita. (Omissis)
(Tasp, ac. 22.06.1971, Apelação n. 161.208, apud Alexandre de Paula, idem,
ibidem).
Não me guio, nestas circunstâncias, pela Súmula STF n. 400, porque a acho
em confl ito com as razões que inspiram a adoção do recurso por divergência
jurisprudencial, mas não posso deixar de considerar que a divergência
reforçada em bons argumentos é salutar, mas difi cilmente poderá convencer da
contrariedade à lei ou à negativa de sua vigência, fundamento que repousa por
base dessa mesma divergência.
Ante o exposto, conheço do recurso pelos dois fundamentos (CF, art. 105,
III, a e c), mas lhe nego provimento, para manter o acórdão recorrido.
É como voto.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 35
ESCLARECIMENTOS
O Sr. Ministro Gueiros Leite (Relator): O conhecimento, quanto à letra
a, foi mais por coerência desde que estavam em jogo todos aqueles textos
do Código Civil e da Lei de Registros Públicos, devidamente questionados
na jurisprudência colacionada. Mas, na verdade, disse eu que foi defi ciente,
nessa parte, a fundamentação do recurso especial, porque o recorrente apenas
enumerou. Há, contudo, entrelaçamento entre a quaestio juris destes textos
legais e os acórdãos referidos. Então, acho que, embricada na parte do dissídio, o
fundamento pela letra a, não devia ser relegado.
Eram estes os esclarecimentos que tinha a prestar, regimentalmente, sendo
que a nossa divergência é apenas no tocante à letra a.
Queria ainda esclarecer que, conforme salientou o Ministro Nilson Naves
ao proferir o seu brilhante voto, o que temos aí é o seguinte: uma promessa de
compra e venda anterior à execução, irretratável, irrevogável e quitada. Além
de irretratável, irrevogável e quitada, não se constituiu em fraude à execução,
tanto mais porque foi penhorada apenas a metade do imóvel do recorrido,
correspondente ao aval de um dos devedores sócio de uma fi rma devedora.
Ainda conforme está na matéria de fato e no histórico que fi z no voto, além
desse imóvel, do qual foi penhorado apenas 50%, a empresa devedora, da qual
fazia parte o avalista, um dos promitentes vendedores, tinha muitos outros bens
passíveis ou possíveis de penhora, que não foram constrictados.
ESCLARECIMENTOS
O Sr. Ministro Gueiros Leite (Relator): Permito-me passar uma vista de
olhos na parte relativa à letra a: (Lê)
Alega, também, afronta às disposições do Código Civil (...) e Lei n. 6.015, art.
252.
Digo eu: (Lê)
São, pois, alegações superadas (...) Conheço do recurso pelos dois fundamentos,
mas lhe nego provimento.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
36
VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Nilson Naves: Em execução cambial, promovida pelo
ora recorrente contra Castella Comercial e Construtora Ltda e outros, o ora
recorrido entrou com embargos de terceiro, buscando liberar o bem penhorado,
objeto de promessa de compra e venda. Pela sentença, não teve êxito, seja porque
o imóvel fora antes transferido — “o imóvel foi transferido à Antonia Moreto
Castro, casada em comunhão de bens com Antonio Castro” —, seja porque o
compromisso de que ora se cuida não foi registrado (Súmula n. 621-STF). Pelo
acórdão, teve êxito, e dele recolho dois trechos:
Tem razão o apelante e seu recurso é provido. A Súmula n. 621 do Pretório
Excelso destina-se à proteção dos credores contra a eventual fraude à execução
de que possam se valer os executados.
No caso presente impossível falar-se em fraude à execução, pois o compromisso
de compra e venda é muito anterior à própria constituição da dívida, que é de
sociedade comercial e onde os promitentes vendedores são meros avalistas. E a
dívida é de 26 de março de 1984, enquanto o compromisso é de 1982.
(...)
Portanto, evidente a posse do apelante sobre o imóvel, não vislumbrada
qualquer fraude no compromisso de compra e venda, muito anterior à
constituição da dívida, como ainda não se pode dizer que esse compromisso
era ineficaz por ser o segundo, se o primeiro não estava registrado e ainda
concordando com o novo compromisso a anterior compromissária, dá-se
provimento ao recurso. Fica a ação julgada procedente, afastada a penhora sobre
o imóvel do apelante, invertidos os ônus da sucumbência.
Malgrado todo esforço do Tribunal a quo, inclusive rejeitando, no acórdão
de fl s. 255-256, os embargos de declaração, a questão aqui versada, tal como
alegou o Banco-recorrente, envolve o assunto da Súmula n. 621-STF, que reza:
“Não enseja embargos de terceiro à penhora a promessa de compra e venda não
inscrita no registro de imóveis”. Correto, pois, o despacho de admissão, pela
anterior alínea d, ao consignar:
No caso em exame o v. acórdão entendeu ser suficiente, para levantar a
constrição, a posse do embargante sobre o imóvel, uma vez que não se
vislumbrou nenhuma espécie de fraude no compromisso de compra e venda, já
inteiramente quitado quando a dívida foi constituída.
Por outro lado, cristalizou-se no Supremo Tribunal Federal o entendimento de
o terceiro somente poder opor embargos para descontituir a penhora, quando
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 37
inscrita a promessa de compra e venda irretratável e irrevogável anteriormente
à constrição, pois nesse caso, a apreensão judicial não atinge a posse, mas sim o
direito real à aquisição de que aquele é titular. Esse o teor da Súmula n. 621.
Daí que conheço do recurso pelo dissídio com a Súmula n. 621-
STF. Esclareço que, no tocante à negativa de vigência, afora a deficiente
fundamentação do apelo último (Súmula n. 284-STF), os textos de lei invocados
não vêm a propósito, pelo que se depreende da decisão recorrida.
Porém, ao recurso nego provimento.
Na rápida pesquisa a que me dediquei sobre o tema, verifi quei que a
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal era pela admissão de embargos
desse porte. No RE n. 76.769, de 1973, com audiência de publicação de 19.12, o
Sr. Ministro Rodrigues Alckmin, em voto de vista, lembrou trecho de despacho
seu, que o Sr. Ministro Ribeiro da Costa transcrevera no Ag n. 28.756, nesses
termos:
Inegável é o cabimento de embargos de terceiro por parte do promitente
comprador, para evitar que o imóvel prometido à venda sem cláusula de
arrependimento possa ser penhorado e levado à praça para pagamento de dívida
do promitente vendedor. Inegável, porque os embargos de terceiro protegem
não apenas o domínio, mas também a posse e mesmo direitos obrigacionais (v.
Lopes da Costa, “Direito Processual Civil Brasileiro”, 4, 254; Pontes de Miranda,
“Comentários ao Código de Processo Civil”, ed. 1949, IV/206). Conseqüentemente,
bastava a prova do direito obrigacional anterior à penhora para que os embargos
de terceiro pudessem ser acolhidos.
Aduziu ainda em seu voto, em três tópicos que destaco:
A alegação a que se prendeu o acórdão, de não achar-se registrada, no Registro
de Imóveis, a promessa de cessão, equivale, sem dúvida, a negar que os embargos
de terceiro possam proteger direitos obrigacionais, ou proteger a posse que,
com apoio neles, se legitime. Reclamou o acórdão, para a proteção do direito do
terceiro embargante, que esse direito seja ‘real’, pois, se referente a imóvel, que
haja transcrição, inscrição ou averbação.
Além de afastar-se da doutrina e da jurisprudência (que, como visto, não
restringe embargos de terceiro à proteção da propriedade e de direitos reais), o
julgado não teve em conta que o problema devia ser encarado sob o aspecto de
fraude à execução. E provada a constituição de direito, de natureza obrigacional,
embora a favor do terceiro embargante, sem fraude à execução, nada justifi cava
fosse desconhecido tal direito pelo exeqüente.
(...)
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
38
E não encontrei, na jurisprudência deste Supremo Tribunal, julgado algum que
restrinja os embargos à proteção de direitos reais.
Estes precedentes levam-me a ter como contrária à jurisprudência
predominante a orientação adotada no acórdão recorrido. E assim, conhecendo
do recurso extraordinário, dou-lhe provimento, para restabelecer o acórdão da
apelação.
Foi o RE n. 76.769 julgado pela Primeira Turma, composta dos Srs.
Ministros Luiz Gallotti, Oswaldo Trigueiro, Aliomar Baleeiro, Djaci Falcão e
Rodrigues Alckmin.
A RTJ 81/852 estampa um julgado de 1976, relatado pelo Sr. Ministro
Th ompson Flores (presentes à Sessão os Srs. Ministros Xavier de Albuquerque,
Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra e Moreira Alves), com essa ementa: “Se
a promessa de cessão é anterior ao ingresso da execução, e tida como válida,
porque ausente a sua fraude, não se faz mister suas inscrições para embasar os
embargos de terceiro, segundo a melhor doutrina aceita no Supremo Tribunal
Federal”. No mesmo caminho, ver RTJ 91/257, julgado de 1977, e RTJ 92/818,
julgado de 1978, ambos relatados pelo Sr. Ministro Cunha Peixoto (neste,
presentes à Sessão os Srs. Ministros Antonio Neder, Xavier de Albuquerque,
Rodrigues Alckmin e Soares Muñoz).
O acórdão da RTJ 91/257, tomado no ano de 1977, teve contra si
embargos de divergência, que o Supremo Tribunal, no fi nal do ano de 1978,
conheceu e recebeu, abrindo, assim, espaço para a futura Súmula n. 621. Foram
os embargos recebidos contra os votos dos Srs. Ministros Soares Muñoz, Cunha
Peixoto, Rodrigues Alckmin e Xavier de Albuquerque (in RTJ 89/285). Para
o recebimento, prevaleceu o voto do Sr. Ministro Moreira Alves, com essa
fundamentação:
Com efeito, ninguém nega que os embargos de terceiro possam ser opostos
pelo mero possuidor. O que não me parece certo, no entanto, é admiti-los em
favor do simples possuidor para o efeito de desconstituir a penhora de imóvel de
propriedade do executado, a qual não acarreta turbação ou esbulho de posse. A
ser isso possível, e se o imóvel penhorado tivesse sido entregue em comodato a
alguém, o comodatário poderia excluí-lo da penhora por meio de embargos de
terceiro.
Em se tratando de promitente comprador, os embargos de terceiro só podem
ser utilizados por ele, para opor-se à penhora do imóvel de propriedade ainda
do promitente vendedor executado, se estiver inscrita a promessa de compra e
venda irretratável e irrevogável, pois, nesse caso, a penhora não atinge a posse,
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 39
mas sim o direito real à aquisição de que aquele é titular. Se não estiver inscrita a
promessa, o promitente comprador é simples titular de direito pessoal, e embora
esteja na posse do imóvel, não pode atacar o ato de constrição judicial que é
a penhora, como não o poderiam o comodatário, o locatário, o depositário,
também possuidores e titulares de mero direito pessoal com relação à coisa
penhorada (in RTJ 89/291-2).
Eis o voto-vencido do Sr. Ministro Soares Muñoz:
Sr. Presidente, não há dúvida de que o voto do eminente Ministro Moreira
Alves é de evidente relevância.
Mas insisto, data venia, no meu ponto de vista, entendendo que a posse do
promitente comprador não é em nome de outrem; é em nome próprio, desde que
o proprietário lha tenha transmitido em razão do contrato. A posse, nos termos do
art. 493, III, do Código Civil, se transmite por qualquer dos meios da aquisição em
geral. O promitente vendedor pode acrescer à obrigação de outorgar a escritura
defi nitiva a de imitir, desde logo, o promitente comprador na posse do imóvel.
Foi o que ocorreu na espécie sub judice. Celebrado o contrato de promessa de
compra e venda através de escritura pública, o promitente comprador passou
a residir no apartamento, como se proprietário fosse. Não necessitava inscrever
no Registro de Imóveis a avença para obter a imissão na posse, porque já se acha
nela, há muitos anos.
De outro lado, a situação de visibilidade da propriedade resultante dessa posse
confere ao compromissário legitimidade ad causam para propor embargos de
terceiro possuidor (Agravo de Instrumento n. 28.756, RREE ns. 19.642, 62.198,
71.162). A pretensão a embargar, por parte do possuidor, salienta Pontes de
Miranda, dá a quem quer que tenha posse indireta, ou direta, a legitimação ativa
(Comentários ao Código de Processo Civil de 1939, tomo IX, p. 52).
Mantenho o voto, rejeitando os embargos. (in RTJ 89/292).
Afora os ERE n. 87.958, da RTJ 89/295, servem, ainda, de referência à
Súmula n. 621, o RE n. 73.527, de 1972, in RTJ 63/222, Relator o Sr. Ministro
Djaci Falcão, unânime, os ERE n. 89.696, de 1979, in RTJ 95/282, Relator o
Sr. Ministro Moreira Alves, vencidos os Srs. Ministros Soares Muñoz, Cunha
Peixoto, Xavier de Albuquerque e Th ompson Flores, o RE n. 93.443, de 1981,
in RTJ 100/835, unânime, Relator o Sr. Ministro Néri da Silveira, mas, aqui,
tratou-se de contrato já inscrito no registro, e, por último, o RE n. 94.132, de
1983, in RTJ 107/686, unânime, Relator o Sr. Ministro Décio Miranda.
Como se vê, mesmo no Supremo Tribunal, com quem é apontado, pelo
recorrente, o dissídio, a questão ora em debate, isto é, saber se enseja, ou não,
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
40
embargos de terceiro à penhora a promessa de compra e venda não inscrita no
registro de imóveis, assumiu as duas admissíveis posições. Tal circunstância não
passou em branco ao Relator deste caso, Sr. Ministro Gueiros Leite, conforme
fl s. 5 e 6 do seu voto. Note-se, ainda, que dois dos julgados de referência à
Súmula n. 621 foram tomados por maioria de votos.
Entre as duas orientações, inclino-me a favor da primitiva orientação
da Alta Corte, como, aliás, já se inclinou, por maioria, a Quarta Turma deste
Superior Tribunal de Justiça, nos REsps ns.188 e 247, na sessão do dia 08. Tive
em mãos o voto do Sr. Ministro Athos Carneiro, que, com repleta felicidade,
resumiu o assunto dessa forma:
Então se pergunta: entre as duas pretensões, a do credor, direito pessoal, e a
do promitente comprador com justa posse, direito também pessoal, qual é aquela
que merece maior tutela, maior proteção da ordem jurídica?
Tenho a impressão de que levar nosso raciocínio para o terreno do direito
registral importará na aplicação das normas jurídicas dentro de um, digamos
assim, tecnicismo exagerado. É certo que, num plano puramente registral, o
imóvel penhorado ainda é, tecnicamente, integrante do patrimônio do
promitente vendedor. Mas, inclusive, com freqüência é difícil que o credor ignore
que sobre aquele imóvel, cuja penhora postula, se exerce direito de outra pessoa,
do promitente comprador e possuidor de boa-fé.
O promitente vendedor ainda é dono do imóvel, mas o é sob aquele minus
derivado das obrigações que assumiu, de outorga da escritura defi nitiva, em
virtude do contrato quitado de promessa de compra e venda. O patrimônio do
cidadão não é constituído só dos seus direitos, mas também das suas obrigações.
E o promitente vendedor tem a obrigação de garantir a posse transferida
contratualmente ao promitente comprador, que a exerce em nome próprio.
Então, se dirá: mas o credor não sabia disso; o credor considerava que o imóvel
era do promitente vendedor; emprestou-lhe dinheiro, ou com ele negociou,
confi ante de que aquele imóvel fazia parte, sem ônus, do seu patrimônio. Será
que essa assertiva corresponde às realidades práticas da vida? Será que o credor
foi realmente averiguar no Registro Imobiliário e não atentou para a circunstância
de que naquele imóvel estaria morando alguém, às vezes há muitíssimos anos,
comportando-se como dono? E a penhora, por sua vez, terá sido objeto de
registro, de molde a ter efi cácia perante terceiros?
Creio mais conforme com as necessidades atuais do comércio jurídico a
interpretação pela qual, no choque de interesses de dois direitos eminentemente
pessoais (a própria penhora não é direito real, mas ato processual executivo),
tanto um quanto outro, deve prevalecer o direito daquele que está na justa posse
do imóvel, como seu legítimo pretendente à aquisição, e com o preço quitado,
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 41
face ao direito do credor do promitente vendedor, dês que ausente, por certo
qualquer modalidade de fraude à credores ou à execução, como no caso dos
autos.
Esta orientação melhor se coaduna às realidades jurídico-sociais do nosso país,
e impende sejamos sensíveis a estas realidades.
De fato, cuidando-se, como se cuida, de direitos de idêntica natureza,
melhor proteção merece o do promitente comprador com justa posse, ausente,
em conseqüência, qualquer espécie de fraude. A solução preconizada possui
cunho bem social, até pragmática, para reproduzir expressão de bom uso nesta
Corte. No mundo dos negócios, o credor, ora o credor!, este sempre tem como
proteger o seu crédito. Demais, como salientado alhures, a doutrina, e ampla,
entende que se a constrição judicial alcançou direitos, está, aí, justifi cado o
emprego dos embargos de terceiro. Em seu voto, no RE n. 76.769, de 1973,
o saudoso Ministro Rodrigues Alckmin lembrou lições de Lopes da Costa,
Pontes de Miranda, José Frederico Marques e Carneiro de Lacerda. “São
também direitos” — diz Pontes — “pretensões, ações. Portanto, sempre que a
constrição judicial apanhou direito (títulos de crédito, direitos, pretensões, ações,
art. 930, II e V)...”
Por fi m, lembro que esta Terceira Turma, no REsp n. 30, acatando o voto
do Sr. Ministro Eduardo Ribeiro, reputou dispensável o registro da promessa de
compra e venda, no caso de execução compulsória, decidindo, dessa forma, em
sentido outro ao estatuído nas Súmulas n. 167-STF e 413-STF. Se não estou
em erro, um assunto arrasta o outro. Tanto é que as Súmulas n. 413 e 621, entre
outras referências, têm por referência o art. 22 do Decreto-Lei n. 58/1937. Ora,
se o promitente comprador pode, sem o registro, exigir do promitente vendedor
a escritura, para tanto valendo a sentença de procedência da ação intentada,
pode, por igual, defender a sua posse, desde que justa, por intermédio dos
embargos de terceiro. Ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositivo.
No caso concreto, o acórdão, na parte que transcrevi, diz tudo, sem
contestação. A promessa é de 1982, enquanto a dívida, de 1984. Inexiste fraude
à execução. Releio-o nas fl s. 248-249: (relê).
Concluindo, como disse Sr. Presidente, conheço do recurso, mas tão-
somente pelo dissídio e dissídio com a Súmula n. 621-STF, e nego-lhe
provimento.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
42
VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro: Já se salientou nos autos a divergência que
a propósito do tema tem lavrado, e que se verifi ca não apenas na jurisprudência
como na doutrina. A questão, em verdade, apresenta difi culdades técnicas,
ao lado de problemática não desprezível, pertinente à realidade da vida dos
negócios, a que o julgador não pode estar desatento.
Como de entendimento corrente, e tem sido salientado no trato da matéria,
a transmissão da posse não constitui cláusula natural da promessa de venda
de tal modo que, para ter-se como presente, independesse de ser explicitada.
Nada impede, entretanto, que os contratantes acordem em que desde logo se
adiante a posse a quem haveria de ter esse direito com a conclusão do contrato
a que o preliminar se refere. A posse, por conseguinte, é alguma coisa mais
que se acrescenta ao negócio, ensejando, de logo, o resultado econômico que a
fi nal seria alcançado. A propósito observou o Ministro Soares Muñoz que, nas
circunstâncias, o promitente comprador tem a posse em nome próprio, como se
proprietário fosse (RTJ 89/929 — v. Francisco Muniz — RT v. 613, p. 08-09).
Não se pode duvidar, por outro lado, de que os embargos de terceiros
prestam-se à defesa de posse. No direito atual, aliás, a dúvida é se passível de
utilização por quem tenha o domínio mas não seja possuidor.
Dentro desse quadro, tenho para mim que se há de aceitar seja facultado ao
promitente comprador valer-se dos embargos. Transmitida que lhe foi a posse,
não há como qualifi cá-la de precária, uma vez efetuado o pagamento do preço e
inexistindo cláusula de arrependimento. Não mais a poderá exigir o promitente
vendedor, embora conserve o domínio. Ficou este esvaziado, não sendo lícito ao
proprietário, no que diz com o imóvel, se não cumprir o prometido e concretizar
a venda.
Considero que a hipótese não é assemelhável à locação, comodato ou
depósito. Aqui se trata, como observado, de posse que se torna definitiva
com o cumprimento do contrato. A relação do promitente comprador com
o promitente vendedor, uma vez pago o preço, restringir-se-á à faculdade de
exigir-lhe a escritura.
Aderindo à observação do Ministro Nilson Naves, quanto à divergência
com a Súmula n. 621, conheço do recurso em virtude do dissídio e nego-lhe
provimento.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 43
VOTO
O Sr. Ministro Cláudio Santos: Sr. Presidente, peço vênia para discordar
desta doutíssima Turma. Não preparei voto escrito como alguns integrantes
desta Turma que pediram vista, mas, de qualquer forma, alinho no momento
alguns fundamentos aligeirados. Penso que, da leitura do Art. 859 do Código
Civil que, taxativamente, estabelece, presume-se pertencer o direito real à pessoa
em cujo nome se o inscreveu ou transcreveu à margem do registro do imóvel,
não fi ca dispensado o registro da promessa para a sua validade erga omnes. Por
outro lado, datíssima vênia, entendo que a turbação ao livre exercício da posse
não ocorre em face da penhora, como aliás, em várias oportunidades, decidiu
o colendo Supremo Tribunal Federal. Tenho em mãos algumas decisões em
recursos extraordinários, decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal,
que, exatamente, embasam o entendimento cristalizado na Súmula n. 621 do
STF, mas deixo de lê-las, porque sei que essas decisões são do conhecimento dos
eminentes Ministros. Todos estudaram muito bem a questão e é desnecessária
a leitura dos arestos. Portanto abstendo-me de outras considerações, e, mais
uma vez, pedindo vênia, discordo da maioria. No caso, meu voto é no sentido de
conhecer do recurso pelo dissídio, para dar-lhe provimento.
RECURSO ESPECIAL N. 573-SP (89.0009764-4)
Relator: Ministro Bueno de Souza
Recorrente: Banco Real S/A
Recorrido: Carlos Roberto Olivi
Advogados: Márcio do Carmo Freitas, Rui Ferreira Pires Sobrinho e
outros.
EMENTA
Processual Civil. Embargos de terceiro.
1. A jurisprudência de ambas as Turmas componentes da
Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, afastando a restrição
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
44
imposta pelo enunciado da Súmula n. 621 do STF, norteou-se no
sentido de admitir o processamento de ação de embargos de terceiro
fundados em compromisso de compra e venda desprovido de registro
imobiliário (REsp n. 662, Relator Ministro Waldemar Zveiter; REsp n.
866, Relator Ministro Eduardo Ribeiro; REsp n. 633, Relator Ministro
Sálvio de Figueiredo; REsp n. 696, Relator Ministro Fontes de Alencar,
REsps n. 188 e 247, de que fui Relator).
2. Recurso especial conhecido, mas improvido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do
recurso, mas negar-lhe provimento, na forma do relatório e notas taquigráfi cas
constantes dos autos, que fi cam fazendo parte integrante do presente julgado.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 08 de maio de 1990 (data do julgamento).
Ministro Bueno de Souza, Presidente e Relator
DJ 06.08.1990
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Bueno de Souza: Banco Real S/A interpôs recurso
extraordinário com fundamento no art. 119, III, alíneas a e d, da Constituição
revogada, sob alegação de violação dos arts. 505, 530, 531, 533, 755, 759 e
860, parágrafo único, do Código Civil; dos arts. 566, I, 585, III, do Código
de Processo Civil e aos arts. 167, item I, n. 9 e 18 e 169, da Lei n. 6.015/1973
(Lei de Registros Públicos); e divergência com a Súmula n. 621 do Supremo
Tribunal Federal.
O recurso foi interposto contra acórdão da Terceira Câmara do Primeiro
Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo, o qual transcrevo, em razão
das peculiaridades da espécie (fl s. 138-141):
Embargos de terceiro ajuizados em execução hipotecária para que seja
decretada a nulidade da penhora e da própria hipoteca executada.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 45
A r. sentença de fl s. 103-107, cujo relatório fi ca adotado, julgou o embargante
carecedor da ação na parte em que pretende a desconstituição da hipoteca e
julgou improcedentes os embargos quanto à pretendida declaração de nulidade
da penhora.
Apelou o vencido pleiteando o integral acolhimento dos embargos (fl s. 109-
116).
Recurso bem processado, com resposta a fl s. 127-129 e preparo a fl . 121.
É o relatório.
Está demonstrado nos autos que, mediante instrumento de contrato particular
de promessa de venda e compra de fração ideal de terreno e de construção, por
preço de custo, de edifício em condomínio, datado de 27 de outubro de 1978, o
apelante contratou com a Meg Consultoria e Empreendimentos Imobiliários S/C
Ltda, a aquisição de um apartamento no Edifício Sizenando de Paula Pinheiro (fl s.
9-13). Está igualmente comprovado que terminada a obra e pago inteiramente o
preço avençado, o apelante entrou na posse do referido apartamento, tanto que
o deu em locação a terceiro, conforme contrato cuja vigência teve início em 10 de
agosto de 1984 (fl s 78-79 v.).
Isto, não obstante, foi aquele apartamento penhorado na execução hipotecária
promovida pelo apelado contra a Meg Consultoria e Empreendimentos
Imobiliários S/C Ltda, com base na hipoteca do terreno em que foi construído o
Edifício Sizenando de Paula Pinheiro, instituída pelo “instrumento particular de
contrato de concessão de fi nanciamento sob as condições de sub-programa do
refi nanciamento ao consumidor de material de construção do Banco Nacional
da Habitação — Recon”, datado de 29 de maio de 1980 (fl s. 93-94 v.), levado a
registro no Primeiro Registro de Imóveis de Campinas (fl . 95).
Contra a penhora e a hipoteca em que se fundamentou, insurgiu-se o apelante
através de embargos de terceiro, alegando sua posse sobre o bem. Para a
pretendida anulação da hipoteca, efetivamente, não é idônea a via processual
escolhida, pois os embargos de terceiro, como salientado pela r. sentença
recorrida, se destinam, exclusivamente, a obter proteção contra constrição
judicial. Assim, quanto a esse pedido fi ca mantida a decretação da carência.
No tocante à penhora, no entanto, tem razão o apelante. Este demonstrou
ter a posse do apartamento em questão e que tal posse é justa e de boa-fé
(Código Civil, arts. 489 e 490, parágrafo único). Por outro lado, está afastada
qualquer possibilidade de fraude, uma vez que os contratos em que se apóiam
os contendores têm suas respectivas datas inquestionadas, inclusive por
reconhecimento das respectivas fi rmas, e a aquisição do apelante é anterior à
instituição da hipoteca. Observe-se, ainda, que a incorporadora não poderia,
sem o assentimento do adquirente, dar em hipoteca o imóvel que prometera à
venda, notando-se, na operação fi nanceira realizada a confi guração objetiva de
delito descrito no inciso II do art. 171 do Código Penal, com possível incidência
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
46
do disposto no inciso II do art. 145 do Código Civil. E acrescente-se que, em vista
do registro da incorporação, nos termos do art. 32 da Lei n. 4.591/1964, com a
conseqüente possibilidade do incorporador negociar sobre unidades autônomas,
negligenciou o apelado a verifi cação da existência ou não de contratos de compra
e venda de unidades autônomas, como o do apelante, por ocasião da concessão
do fi nanciamento. Tais circunstâncias ocorrentes na espécie, afastam a incidência
da Súmula n. 621 do egrégio Supremo Tribunal Federal cuja aplicação não é
automática, “havendo que se indagar das particularidades de cada caso, para se
concluir da validade e efi cácia ou não do compromisso de venda e compra sem
registro e seus efeitos com relação ao terceiro” (RT 602/129).
Por essas razões, dá-se parcial provimento ao recurso.
Na origem, o recurso foi admitido pela divergência com a Súmula n. 621
do STF.
Com a instalação do Superior Tribunal de Justiça, o eminente Ministro
Célio Borja, considerando a conversão automática do recurso extraordinário em
recurso especial, determinou a remessa dos autos a esta Corte.
VOTO
O Sr. Ministro Bueno de Souza (Relator): Srs. Ministros, o r. acórdão
recorrido foi proferido em 23.10.1987 (fl . 137) e o douto Juiz Presidente do
Primeiro Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo acentuou, em seu r.
despacho de fl . 177, verbis:
Mostra-se admissível a abertura da via extraordinária.
A douta Turma Julgadora entendeu que a circunstância de inexistir registro do
instrumento do compromisso de compra e venda do imóvel, por si só, não afasta
o acolhimento dos embargos de terceiro, inocorrendo, no caso em exame, posse
injusta e de má-fé, fraude à execução, estando legitimado o embargante, porque
o bem fora realmente prometido à venda, em época anterior à instituição da
hipoteca.
Entretanto, o colendo Supremo Tribunal Federal tem, reiteradamente, decidido
no sentido de não ensejar embargos de terceiro à penhora, a promessa de
compra e venda não inscrita no Registro de Imóveis, culminando com a edição da
Súmula n. 621.
Em que pesem as ponderáveis razões expendidas no v. acórdão recorrido,
o teor do verbete não faz referência a eventual existência ou inexistência de
fraude, bem como, não alude ao fato de a posse ser justa e de boa-fé e a hipoteca,
posterior à promessa de compra e venda. Impede, isto sim, seja reconhecido o
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 47
direito de fi car livre da execução o bem simplesmente transferido, sem que os
adquirentes regularizem o instrumento no cartório competente.
Daí o confronto, a merecer a análise da Corte Suprema.
De resto, ausentes os permissivos estatuídos nos incisos I e III a X do art. 325
do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, na redação da Emenda n.
02/1985.
Isto posto, cabe encaminhar o recurso, deferindo seu processamento pelo
pressuposto da alínea d, observando-se, quanto à argüição de relevância, o
disposto no art. 328, § 1º, do mencionado Regimento.
2. A ilustre Subprocuradora-Geral da República, Yedda de Lourdes Pereira,
ofi ciando perante o Supremo Tribunal, anotou (fl s. 220-221):
Com argüição de relevância da questão federal e fundamentado nas letras a e
d do inciso III do art. 119 da CF anterior, o recurso sustenta negativa de vigência
de artigos do Código Civil, Código de Processo Civil e Lei de Registros Públicos,
além de divergência com a Súmula n. 621 do STF, porque o Tribunal, provendo
parcialmente apelação, declarou a nulidade de penhora sobre apartamento
que se encontrava na posse de terceiro em virtude de promessa de compra e
venda não registrada, anterior à hipoteca que abrangeu esse imóvel e feita para
conclusão das obras do edifício no qual se integrava.
Recebido apenas pela letra d, o recurso subiu a essa egrégia Corte, onde a
argüição de relevância foi rejeitada.
Trata-se de discussão de matéria infraconstitucional. Essa colenda Corte,
em hipótese semelhante (RE n. 119.204-6-SP) decidiu que a competência para
julgamento de recurso extraordinário fundado em ofensa a dispositivo de
lei bem como dissídio de jurisprudência restrito ao âmbito legal (que subiu
independentemente de acolhimento de argüição de relevância) é do STJ porque
— ipso iure — se converte em recurso especial, com fundamento nas letras a e c
do inciso III do art. 105 da atual Constituição.
Em conclusão, o parecer é pela conversão do recurso em especial e, por
conseqüência, pela negativa de seguimento nesta Corte e remessa ao Superior
Tribunal de Justiça, a fi m de que seja julgado.
3. No sentido da automática conversão do recurso extraordinário em
especial se fi xou, no Supremo Tribunal, o eminente Ministro Célio Borja,
Relator (fl . 224).
4. É, de fato, manifesta a discrepância dos critérios postos em confronto, a
saber, do constante da Súmula n. 621 da Jurisprudência do Supremo Tribunal
(“não enseja embargos de terceiro à penhora a promessa de compra e venda
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
48
não inscrita no Registro de Imóveis”) e do adotado pela r. decisão recorrida,
ao prover, em parte, a apelação a fi m de, recebendo em parte os embargos de
terceiro, excluir da penhora a unidade autônoma abrangida pela hipoteca e pela
constrição judicial.
Não se trata, tão somente, de reconhecer circunstâncias que afastem a
incidência do referido verbete, pois, ao “se indagar das particularidades de cada
caso para se concluir da efi cácia ou não do compromisso de compra e venda
sem registro e seus efeitos com relação ao terceiro”, como se vê no acórdão
hostilizado, no ponto em que se reporta a outro precedente (RT 602/129), em
verdade se exclui sua observância, fazendo-se distinção que o enunciado não
comporta.
5. Conheço, portanto, do recurso, consoante o art. 105, III, c, da
Constituição de 05.10.1988.
6. Não obstante, nego-lhe provimento, reportando-me, relativamente
à admissão dos embargos de terceiro, a despeito da falta de registro do
compromisso de compra e venda de fração ideal do terreno e do contrato de
construção referente à unidade autônoma em condomínio por andares, ao
decidido por esta Quarta Turma no REsp n. 188-PR, de que fui Relator para
o acórdão tomado por maioria em 08.08.1989 (DJ de 31.10.1989), em cuja
ementa se lê:
Processual Civil. Embargos de terceiro.
Recurso especial. Divergência com a Súmula n. 621 do STF.
1. É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de
posse advinda de contrato de compromisso de compra e venda desprovido de
registro imobiliário.
2. Inocorrência in casu de fraude à execução.
3. Recurso especial a que se nega provimento.
Para mais amplo esclarecimento do assunto, faço apensar ao presente cópia
do inteiro teor da mencionada decisão, da qual, no entanto, colho desde logo,
para transcrição, o tópico mais diretamente condizente ao ponto em que, por
ora, me detenho. Eis o que, então, anotei:
Penso, por conseguinte, que não se aconselha a peremptória recusa liminar
da ação de embargos de terceiro, fundada em compromisso de compra e venda
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 49
destituído, embora, de registro imobiliário, como recomenda a Súmula n. 621: ao
cerceamento do direito de ação, somar-se-ia, no caso, o drástico enfraquecimento
da própria posse, que, em casos tais, transcende a mera realidade de fato para
invocar a qualifi cação de posse legítima, ad interdicta (fundada em contrato),
oponível ao esbulho perpetrado por sujeitos da ordem privada e, portanto, a
fortiori, ao esbulho judicial que porventura seja praticado através da penhora ou
de outro ato de apreensão.
O que se recomenda, assim é, data venia, que os embargos de terceiro, em
casos tais, não sejam só por isso liminarmente recusados, mas devidamente
processados, decididos como de direito, às instâncias locais incumbido conhecer
e apreciar as alegações e provas deduzidas em juízo.
Eis por que não posso emprestar minha adesão, ainda que desvaliosa, aos
dizeres da jurisprudência sumulada, a qual, tudo indica, não se concilia com os
imperativos da ordem social do nosso tempo.
7. Acertadamente andou também o colendo Tribunal a quo, quando,
ferindo o mérito, acolheu a pretensão principal dos embargos de terceiro, para
livrar da penhora a unidade autônoma demandada.
Mostram os autos que, em 27.10.1978, o embargante (agora recorrido)
formalizou contrato com a incorporadora, também proprietária do terreno, para
aquisição da fração ideal correspondente à unidade cuja construção no mesmo
ato contratou, a preço de custo; e, mui especialmente, que na matrícula do
imóvel foi efetuado o registro da incorporação, anteriormente ao da hipoteca em
que se funda a execução que redundou na malsinada penhora.
8. Acentuou, ademais, o r. acórdão recorrido, com toda procedência,
a manifesta incompatibilidade do contrato de construção a preço de custo,
corroborado pela emissão da série de notas promissórias destinadas ao custeio
da obra, com o mútuo celebrado com o recorrente, para idêntica fi nalidade, sem
a anuência dos compromissários compradores, contratantes da construção das
unidades autônomas integrantes do condomínio. Daí aludir o acórdão recorrido
ao art. 171, II, do Código Penal, sendo oportuno frisar, a este propósito, que,
ciente do registro da incorporação (como necessariamente deverá estar) o
recorrente, impunha-se-lhe acautelar-se, reclamando do incorporador os
esclarecimentos condizentes à preceituação contida nos arts. 58 e seguintes da
Lei n. 4.591, de 16.12.1964.
É como voto.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
50
ANEXO
RECURSO ESPECIAL N. 188-PR (89.0008421-6)
Relator: Ministro Sálvio de Figueiredo
Relator para o acórdão: Ministro Bueno de Souza
Recorrente: Dall’Oglio Scanagatta e Cia/Ltda
Recorridos: Vilson Fabris e cônjuge
Advogados: Antonio Alves do Prado Filho e outros e Joaquim Munhoz de
Mello
EMENTA
Processual Civil. Embargos de terceiro.
Recurso especial. Divergência com a Súmula n. 621 do STF.
1. É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em
alegação de posse advinda de contrato de compromisso de compra e
venda desprovido de registro imobiliário.
2. Inocorrência in casu de fraude à execução.
3. Recurso especial a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer
do recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator; por maioria, negar-lhe
provimento, vencidos os Srs. Ministros Relator e Barros Monteiro, na forma do
relatório e notas taquigráfi cas constantes dos autos e que fi cam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 08 de agosto de 1989 (data do julgamento).
Ministro Bueno de Souza, Presidente e Relator para o acórdão
DJ 31.10.1989
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 51
EXPOSIÇÃO
O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo: Cuida-se de embargos de terceiro
opostos pelos recorridos ao fundamento de que o imóvel penhorado pela
empresa exeqüente fora objeto de contrato de compra e venda anterior, com
posse imediata pelos embargantes.
O MM. Juiz sentenciante julgou improcedentes os embargos, com fulcro
na súmula do Supremo Tribunal Federal (Enunciado n. 21), decisão contra a
qual foi manejada, com êxito, apelação, cujo provimento não unânime pelo v.
acórdão (fl s. 159-168) ensejou embargos infringentes, nos quais os eminente
Juízes do Grupo de Câmaras Cíveis do Tribunal de Alçada do Paraná, por
maioria de votos (6 a 4), mantiveram o provimento da apelação, concluindo no
sentido de que os promitentes compradores “têm posse própria, como de dono e
podem deduzir embargos de terceiro à penhora, que, como defesa possessória, é
uma defesa específi ca e provisória” (fl s. 234-247).
Irresignada, a embargada interpôs Recurso Extraordinário (fl s. 249-270),
com suporte nas alíneas a e d do art. 119 da Constituição anterior, argüindo,
ainda, relevância da questão federal.
O RE foi admitido pela decisão de fl. 277, em face da divergência
jurisprudencial com a Súmula.
Os autos, antes de virem a esta Corte, foram remetidos ao colendo
Supremo Tribunal Federal, quando a Subprocuradoria Geral da República
opinou no sentido do não conhecimento do RE, por não vislumbrar, in casu, a
alegada divergência sumular.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo (Relator): Conheço do recurso e lhe
dou provimento.
Ressalvo, de início, que não se nega a via dos embargos de terceiro o
possuidor, uma vez que há expressa disposição legal autorizativa (art. 1.046,
§ 1º, CPC). Pertinente, a todas as luzes, no entanto, a objeção levantada pelo
Ministro Moreira Alves no sentido de que nem sempre é possível essa via, como
nos casos de comodatário, locatário, depositário etc. (ERE n. 87.958-RJ, RTJ
89/285).
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
52
Há um sistema legal concernente à propriedade imobiliária e a sua
observância preserva a confi abilidade dos registros públicos: o assentamento no
álbum imobiliário (e somente ele) permite a oponibilidade erga omnes do direito.
Destarte, a inscrição no Registro Público do contrato preliminar de compra
e venda de imóvel imprime ao direito do adquirente o efeito que decorre do
próprio domínio: oposição a todos. Enquanto não efetuada a inscrição, existe
apenas o direito obrigacional do comprador, cujo inadimplemento, como é
curial, se resolve em perdas e danos entre partes. Em outras palavras, somente
gera efeitos inter partes.
Por outro lado, é de atentar-se para outro direito que não pode ser
postergado: o de terceiro de boa-fé, que contrata com o alienante e tem no
patrimônio deste a garantia do cumprimento das obrigações por ele assumidas.
Ao buscar a satisfação de seu crédito pela via executiva, o credor se posiciona,
até prova em contrário, como terceiro de boa-fé, com direito à constrição
jurisdicional do patrimônio do devedor inadimplente, pela penhora de bens que
o integrem.
Com a inobservância pelos embargantes do sistema legal para transmissão
de propriedade, no momento em que o credor recorreu ao Poder Judiciário, para
satisfazer seu crédito, encontrou o imóvel inserido no patrimônio do devedor,
posto que somente o registro opera a transferência do domínio (art. 530, I,
CCB).
De outra parte, cumpre salientar que o mesmo sistema legal põe à disposição
dos embargantes os mecanismos jurídicos de proteção ao seu direito, quer seja
através da inscrição da promessa de compra e venda no registro imobiliário
para valer contra terceiros, quer seja pela adjudicação compulsória do bem, ao
fi nal do pagamento, quando a decisão judicial supre a vontade do alienante que
se recusa outorgar escritura defi nitiva. Compete, pois, ao interessado, provocar
o Judiciário em busca da defesa de seus interesses, porquanto é sabido que
dormientibus non sucurrit jus.
O rompimento do sistema legal de transmissão da propriedade para
atender a certas condições e casos, ensejaria casuísmos que poderiam conduzir
à instauração de precedentes, pondo em risco a estabilidade, confi abilidade e
segurança de todo o sistema.
Merece, fi nalmente, destaque o fato de que a doutrina tem, atentamente,
acompanhado a orientação jurisprudencial dominante, conforme se verifi ca em
Humberto Th eodoro Junior que, cambiando da posição adotada na 1ª edição do
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 53
vol. IV dos “Comentários ao Código de Processo Civil” (Forense, 1979, p. 204),
assevera em recente edição de sua obra, com farta remissão a julgados, verbis:
Se, todavia, o compromisso não foi levado a registro, o que há entre os
contratantes é apenas um vínculo obrigacional, cuja vigência não ultrapassa
a esfera dos sujeitos do negócio jurídico, em face do princípio da relatividade
dos contratos. Nem mesmo a posse do promissário tem sido considerada pela
jurisprudência do STF como sufi ciente para legitimar sua pretensão à tutela dos
embargos de terceiro. É que, não confi gurado o direito real, a posse precária do
promissário é exercida ainda em nome do promitente o que não exclui nem o
domínio, nem a posse indireta do legítimo dono (“Curso de Direito Processual
Civil”, vol. III, 2ª edição, Forense, 1989, n. 1.436, p. 1.819).
À luz do exposto, o enunciado da Súmula n. 621 do Supremo Tribunal
Federal, merece ser prestigiado nesta Corte, razão pela qual conheço e provejo o
recurso para restabelecer a decisão de primeiro grau.
VOTO
O Sr. Ministro Barros Monteiro: Sr. Presidente, está em causa, na espécie,
a Súmula n. 621 do colendo Supremo Tribunal Federal. O compromissário-
comprador, desde que não inscrita a Promessa de Compra e Venda no Registro
Público, é mero titular de direito pessoal em relação à coisa penhorada. Nessas
condições apenas o registro é que dá ao compromisso efi cácia erga omnes.
O Pretório Excelso, depois de muita discussão sobre a matéria, acabou
consolidando a sua jurisprudência no enunciado da Súmula n. 621, em condição
tal que a penhora subsiste válida, uma vez que se trate de imóvel simplesmente
compromissado, mas não registrado.
Acompanho o Sr. Ministro-Relator, conhecendo do recurso e dando-lhe
provimento.
VOTO
O Sr. Ministro Bueno de Souza: Senhores Ministros, o Verbete n. 621 da
Súmula da Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem o seguinte teor:
Não enseja embargos de terceiro à penhora a promessa de compra e venda
não inscrita no Registro de Imóveis.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
54
2. O enunciado, como se vê, se reveste de acentuadíssimo rigor, a ponto
de exemplifi car hipótese de extinção do processo de embargos de terceiro, sem
decisão de mérito, mediante sentença terminativa, in limine, nos termos dos arts.
267, I, e 295, parágrafo único, III, do Código de Processo Civil.
Em outras palavras, a súmula autoriza os juízes em geral, quaisquer que
sejam as circunstâncias do caso, a repelir, sem mais, embargos de terceiro opostos
à penhora de imóvel, se não estiver inscrito o instrumento de compromisso de
compra e venda em que o terceiro embargante fundamenta sua demanda. As
apelações interpostas contra sentenças liminarmente terminativas, em casos tais,
sequer mereceriam processadas, à luz dessa vinculativa orientação jurisprudencial,
no Tribunal Federal de Recursos; hoje, deveriam ser prontamente repelidas
pelos Tribunais Regionais Federais (Lei Complementar n. 35, de 14.03.1979,
art. 90, § 2º; Constituição de 05.10.1988, art. 108).
3. No entanto, certo é que nem sempre assim se orientou a jurisprudência
do Supremo Tribunal, como passo a demonstrar.
4. Com efeito, logo após sua transferência para a nova Capital Federal,
no julgamento do Agravo de Instrumento n. 28.756-SP, em 20 de setembro
de 1963, sendo Relator o Ministro Ribeiro da Costa, a Suprema Corte, por sua
Segunda Turma, à unanimidade (RTJ 30/401) prestigiou a tese contrária à da
precitada súmula, em v. acórdão assim ementado:
Embargos de terceiro opostos por promitente comprador a fi m de evitar que
o imóvel compromissado seja penhorado e praceado para pagamento de dívida
de promitente vendedor. — Procedência dos embargos quando embora não
registrado o compromisso de compra e venda sendo irretratável, se acha quitado
— Agravo improvido.
O saudoso Ministro Amaral Santos, com sua autoridade de consagrado
processualista, também deixou clara sua posição, no relatório do RE n. 71.162-
GB, em 12 de outubro de 1971 (RTJ 60/494). Na ementa do aresto da Primeira
Turma, unânime, consta este resumo:
Ação executiva. Penhora de bem vendido por um dos executados a terceiro,
que, embora na posse da escritura defi nitiva de compra e venda, não fi zera a sua
transcrição.
I - Os embargos de terceiro são admitidos não apenas para a proteção
simultânea do domínio e da posse, como no direito anterior, mas também para a
defesa da simples posse.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 55
II - Não ocorrendo quaisquer das hipóteses de fraude à execução, a alienação
há de ser considerada plenamente efi caz, enquanto não for anulada pelo meio
próprio, que é a chamada ação pauliana.
III - Inocorrência de negativa de vigência dos arts. 530 e 928 do Código Civil, e
do art. 178 do Decreto n. 4.857, de 09.11.1939.
Recurso extraordinário não conhecido.
O saudoso Ministro Rodrigues Alckmin, por sua vez, no erudito voto-vista
proferido no RE n. 76.769-GB (Primeira Turma, unânime, em 19.11.1973,
Ementário n. 934/4), manteve-se fiel ao entendimento constante de seus
julgados de Juiz do Tribunal de Alçada de São Paulo.
Eis a síntese de seu pensamento sobre o assunto:
O eminente Relator, Ministro Luiz Gallotti, não conheceu do recurso porque
considerou não ter, o acórdão recorrido, afi rmando que, para interposição dos
embargos de terceiro, se exija a condição simultânea de senhor e possuidor
ao embargante. O acórdão teria reclamado o registro do contrato, para sua
oponibilidade a terceiros, o que não enfrentaria a jurisprudência predominante
do Supremo Tribunal Federal.
Tenho — e examinarei afi nal, a questão do conhecimento — que a solução
adotada no aresto recorrido é juridicamente inexata.
No acórdão proferido no Agravo de Instrumento n. 28.756 (que o recorrente
invoca para a comprovação do dissídio), o eminente Ministro Ribeiro da Costa fez-
me a honra de transcrever despacho meu, em caso idêntico, em que afi rmei:
Inegável é o cabimento de embargos de terceiro por parte do promitente
comprador, para evitar que o imóvel prometido à venda sem cláusula de
arrependimento possa ser penhorado e levado à praça para pagamento de
dívida do promitente vendedor. Inegável, porque os embargos de terceiro
protegem não apenas o domínio, mas também a posse e mesmo direitos
obrigacionais (v. Lopes da Costa, “Direito Processual Civil Brasileiro”, 4,
254; Pontes de Miranda, “Comentários ao Código de Processo Civil”, ed.
1949, IV/206). Conseqüentemente, bastava a prova do direito obrigacional
anterior à penhora para que os embargos de terceiro pudessem ser
acolhidos.
A doutrina confi rma o assêrto. Pontes de Miranda: “O direito, que se supõe
no art. 707, turbado ou esbulhado (“prejudicado”, melhor fora dito), não é o
direito a que se referia a Ordenação do Livro III, Título 81, ao falar do direito de
apelar, que tem o terceiro, porque ali se tratava da intervenção na relação jurídica
processual, na discussão da pretensão à sentença, e não da execução, ou, em
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
56
geral, da constrição: é o direito do terceiro, que foi objeto de constrição judicial.
Ora, os bens arrestáveis, seqüestráveis, depositáveis, penhoráveis etc, não são
só os que são objeto de propriedade (senso estrito), de direito das coisas. São
também direitos, pretensões, ações. Portanto, sempre que a constrição judicial
apanhou “direito” (títulos de crédito, direitos, pretensões, ações, art. 930, II e V)
está autorizado o emprego de embargos de terceiro prejudicado — terceira
espécie do art. 707, sendo que o legislador preferiu considerá-la compreensiva
dos embargos de terceiro senhor. Quando a efi cácia do ato judicial fere a órbita
do direito, pretensão, ou ação do terceiro, constringe-o.”
No mesmo sentido, José Frederico Marques, ‘Instituições de Direito Processual
Civil’, V/454 e Carneiro de Lacerda, “Código de Processo Civil”, IV/179.
A alegação a que se prendeu o acórdão, de não achar-se registrada, no Registro
de Imóveis, a promessa de cessão, equivale, sem dúvida, a negar que os embargos
de terceiro possam proteger direitos obrigacionais, ou proteger a posse que,
com apoio neles, se legitime. Reclamou o acórdão, para a proteção do direito do
terceiro embargante, que esse direito seja “real”, pois, se referente a imóvel, que
haja transcrição, inscrição ou averbação.
Além de afastar-se da doutrina e da jurisprudência (que, como visto, não
restringe embargos de terceiro à proteção da propriedade e de direitos reais), o
julgado não teve em conta que o problema devia ser encarado sob o aspecto de
fraude à execução. E provada a constituição de direito, de natureza obrigacional,
embora, a favor do terceiro embargante, sem fraude à execução, nada justifi cava
fosse desconhecido tal direito pelo exequente.
Do mérito da controvérsia se vê que, na verdade, ao repelir os embargos, o
acórdão recorrido afi rmou a tese de que — ainda que se não cogite de fraude à
execução — os embargos de terceiro não protegem direitos — salvo se reais —
ou a posse que neles se baseie.
Dado o valor atribuído à causa, é de ter-se tal entendimento como contrário
à jurisprudência predominante do STF, para que o recurso possa lograr
conhecimento?
Peço vênia ao eminente Ministro Luiz Gallotti para responder, pela afi rmativa.
Como jurisprudência dominante se tem, não somente a cristalizada em Súmulas,
mas a orientação adotada pelo Pleno, ou por ambas as Turmas, sobre a questão
Federal.
Ora, o recorrente indicou julgado dissidente da Segunda Turma (Agravo de
Instrumento n. 28.756) e da Primeira (RE n. 19.642), indicando, ainda, julgado
que teve como protegível a posse amparada em título não registrado (RE n.
71162 da GB, Relator Ministro Amaral Santos). Outrossim, no RE n. 62.198 de SP
(RTJ 41/298) admitiu-se possibilidade de embargos de terceiro para a proteção
de direito obrigacional (embargos oferecidos pelo locatário em execução de
ação de despejo), frisando o Ministro Adalício Nogueira quanto a extensão deles:
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 57
“a jurisprudência busca insuflar-lhe um sentido novo, uma amplitude mais
compatível com o dinamismo da atividade jurídica contemporânea”.
E não encontrei, na jurisprudência deste Supremo Tribunal, julgado algum que
restrinja os embargos à proteção de direitos reais.
Estes precedentes levam-me a ter como contrária à jurisprudência
predominante a orientação adotada no acórdão recorrido. E assim, conhecendo
do recurso extraordinário, dou-lhe provimento, para restabelecer o acórdão da
apelação.
Esta mesma orientação foi mantida pela egrégia Segunda Turma, unânime,
no v. acórdão do RE n. 82.632-RJ, em 02.04.1976, sendo Relator o Ministro
Th ompson Flores (RTJ 81/852). Eis os dizeres da ementa:
Embargos de terceiro. Promessa de cessão não inscrita no Registro Imobiliário.
Penhor averbado do mesmo imóvel não obsta o êxito dos embargos.
II - Se a promessa de cessão é anterior ao ingresso da execução, e tida como
válida, porque ausente a sua fraude, não se faz mister suas inscrições para
embasar os embargos de terceiro, segundo a melhor doutrina aceita no Supremo
Tribunal Federal.
III - Recurso não conhecido, porque limitado à letra a da permissão
constitucional, incorrendo negativa de vigência das duas normas de lei federal
indicadas.
Naquela assentada, no particular, asseverou o eminente Relator:
Limita-se o excepcional à negativa de vigência do art. 485 do Código Civil,
porque o embargante não teria a posse; e art. 69 da Lei n. 4.380/1964, dado que
inexistiria direito real oponível, eis que a promessa de cessão não estaria inscrita
no Registro Imobiliário.
O exame dos autos, em sua integralidade, convenceu-me, contudo, que não
merece conhecida a irresignação, como já concluira o despacho presidencial.
De fato.
Os embargos resultaram acolhidos porque desprezou o acórdão a ocorrência
de fraude à execução, invocando, em princípio, o art. 593, II, do Código de
Processo Civil, e após a existência de qualquer prova que a indiciasse.
Atribuiu, pois, validade à promessa de cessão por escritura pública, anterior
ao ingresso ação executiva, título no qual se esteou o embargante, ainda que não
inscrito no Registro Imobiliário, diversamente do que sucedera com a penhora.
Assim procedendo, não vejo tenha negado vigência ao art. 485 do Diploma
Civil, do qual não cuidou o acórdão, ao menos expressamente; ou do já referido
art. 69 da Lei n. 4.380/1964.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
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É que os embargos não assentam em direito real, oponível a terceiros, e
dependente da inscrição do título.
Antes, embasaram-se na escritura de promessa de cessão, e nessa, reconhecida
válida, além de cláusulas outras, assegurava a posse imediata, verbis, fl . 6:
O outorgado fi ca desde já na completa posse e livre administração do
imóvel objeto da presente, inclusive de sua renda, respondendo, porém,
também, desta data em diante, pelos pagamentos de todos os impostos,
taxas e demais tributos fi scais que gravam ou venham a gravar o mesmo
imóvel.
E seria o bastante para justifi car a procedência dos embargos, sem ofensa ao
citado art. 485.
De resto, dispensando a inscrição do contrato promissório de cessão para
nele ver título legítimo a oposição de embargos de terceiro, orientou-se pela
melhor doutrina, afi nando, ademais, com a jurisprudência desta Corte, como
em exaustivo voto acentuou o eminente Ministro Rodrigues Alckmin, após pedir
vistas do RE n. 76.769, Primeira Turma, em 19 de novembro de 1973 (Ementário n.
934/4).
E a egrégia Primeira Turma, no RE n. 87.958-RS (RTJ 91/257), sendo
Relator o Ministro Cunha Peixoto, em 24 de novembro de 1977, assim decidiu,
à unanimidade:
Embargos de terceiro senhor e possuidor. Sua procedência nos termos do art.
1.046 do Código de Processo Civil.
A falta de registro da promessa de compra e venda não obsta a procedência
dos embargos, eis que, para se opor ao ato de penhora, basta a qualidade de
mero possuidor.
E ainda reiterou esse entendimento, no RE n. 89.685-SP, em 14.03.1978,
unânime ( Jur. Bras., Embargos de Terceiro, p. 62), em cuja ementa se lê:
Embargos de terceiro. Compromisso de compra e venda não registrado. Falta
de registro. Penhora. Possuidor.
Embargos de terceiro. Compromisso de compra e venda não registrado.
“A falta de registro da promessa de compra e venda não obsta à procedência
dos embargos, eis que para se opor ao ato de penhora, basta a qualidade de
possuidor” (RE n. 87.958).
Dissídio jurisprudencial não comprovado.
Recurso extraordinário não conhecido.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 59
5. Esta pacífi ca jurisprudência guardava, de resto, coerência com a tradição
brasileira, infensa a uma sistemática correlação entre a natureza da decisão e a
correspondente forma de impugnação, como autorizadamente expõe Buzaid
(Agravo de Petição, Saraiva, SP, 1956, pp. 69 e ss); a qual, por um lado, não
encorajava a imediata rejeição de embargos de terceiro (nem, na verdade, de
qualquer tipo de demanda), bem como refl etia a escassa importância conferida
às fi guras então ainda incipientes de pré-contrato, notadamente o compromisso
de compra e venda (que somente nas décadas de 1930/1940 começou a assumir
feições próprias, em razão do relevo que o mundo dos negócios veio a lhe
atribuir), como se lê, entre outros, em Souza Campos Batalha (Loteamentos, ed.
Limonad, 1953, pp. 340 e ss) e Orlando Gomes (Direitos Reais, 2ª ed., Forense,
1962, pp. 486 e ss.).
Até então, a jurisprudência admitia, sem discrepância, os embargos de
terceiro para tutela da propriedade ou da posse atingida por ato judicial, sem
qualquer alusão a compromisso de compra e venda.
6. Foi somente em 16.03.1971, no julgamento do RE n. 73.527-PE, que
a egrégia Primeira Turma do Supremo Tribunal, unânime, sendo Relator o
eminente Ministro Djaci Falcão (RTJ 63/222), decidiu em sentido diverso, tal
como consta da ementa:
Promessa de compra e venda do imóvel. Sem a formalidade essencial da
inscrição no registro público, não se torna oponível a terceiros. O registro é
que lhe atribui efi cácia erga omnes. Recurso extraordinário conhecido, mas não
provido.
Anote-se que este primeiro precedente da discutida Súmula n. 621 é
extremamente frágil em razões que aconselhassem a modifi cação do rumo
jurisprudencial até então observado, quando é certo que o Supremo Tribunal,
em harmonia com o que vinham decidindo os Tribunais Estaduais, jamais
autorizara a pura e simples rejeição liminar de embargos de terceiro somente
por falta de registro do instrumento de compromisso de compra e venda (em
verdade, sequer jamais cogitou dessa drástica alternativa).
Limita-se o aresto inovador a acenar para o art. 22 do Decreto-Lei n. 58,
de 10.12.1937, com a redação que lhe conferiu a Lei n. 649, de 11.03.1949,
diplomas legais estes, aliás (convém acentuar), cujo declarado escopo
precisamente consiste em robustecer a posição do compromissário comprador,
quer em face do promitente vendedor, quer perante terceiro; não, ao contrário,
em enfraquecê-la.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
60
É bem verdade que o entendimento adotado pelo precedente comportou
certas vacilações. Tanto assim é que, em 13.11.1973, o Ministro Djaci Falcão,
revendo sua posição, aderiu ao voto-vista proferido pelo Ministro Rodrigues
Alckmin no RE n. 76.769-GB, há pouco referido e, que em parte, acabo de
transcrever, para enriquecimento deste voto.
7. A estas considerações, o eminente Ministro Moreira Alves acrescentou,
em seu douto voto-mérito nos embargos em RE n. 87.958-RJ (RTJ 89/291):
Com efeito, ninguém nega que os embargos de terceiro possam ser opostos
pelo mero possuidor. O que não me parece certo, no entanto, é admiti-los em
favor do simples possuidor para efeito de deconstituir a penhora de imóvel de
propriedade do executado, a qual não acarreta turbação ou esbulho de posse. A
ser isso possível, e se o imóvel penhorado tivesse sido entregue em comodato a
alguém, o comodatário poderia excluí-lo da penhora por meio de embargos de
terceiro.
Em se tratando de promitente comprador, os embargos de terceiro só podem
ser utilizados por ele, para opor-se à penhora do imóvel de propriedade ainda
do promitente vendedor executado, se estiver inscrita a promessa de compra e
venda irretratável e irrevogável, pois, nesse caso, a penhora não atinge a posse,
mas sim o direito real à aquisição de que aquele é titular. Se não estiver inscrita a
promessa, o promitente comprador é simples titular de direito pessoal, e embora
na posse do imóvel, não pode atacar o ato de constrição judicial que é a penhora,
como não o poderiam o comodatário, o locatário, o depositário, também
possuidores e titulares de mero direito pessoal com relação à coisa penhorada.
Este segundo precedente da Súmula n. 621, é oportuno recordar, prevaleceu
por pequena maioria, ficando vencidos os Ministros Soares Muñoz, Cunha
Peixoto, Rodrigues Alckmin e Xavier de Albuquerque.
Assim também ocorreu, aliás, com o terceiro precedente (embargos no
RE n. 89.696-RJ, 08.08.1979, Relator Ministro Moreira Alves, RTJ 95/282),
quando fi caram vencidos os Ministros Soares Munõz, Cunha Peixoto, Xavier de
Albuquerque e Th ompson Flores.
8. Diversamente, portanto, do que se observa relativamente aos julgados
representativos da primeira tendência jurisprudencial, verifica-se que os
precedentes da Súmula n. 621 traduzem orientação predominante, aferida, salvo
uma única exceção, por simples maioria de votos, fundada em razões atinentes,
apenas, ao tema da efi cácia erga omnes do reclamado registro do compromisso de
compra e venda, nos termos do art. 22 do Decreto-Lei n. 58, de 1937 e Lei n.
649, de 1949.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 61
9. No mais, cumpre ter em vista a severa restrição imposta pela Súmula n.
621 à proteção judicial da posse legítima de imóvel, ou seja, de posse fundada
em contrato (Código Civil, art. 493, III), tal o compromisso de compra e venda,
só por desprovido de registro imobiliário: constituindo-se, embora, em posse ad
interdicta, pois imune aos vícios que poderiam contaminá-la (vi, clam, precario),
fi caria, não obstante , cerceado o seu acesso à ação possessória, gênero ao qual
pertencem os embargos de terceiro opostos a esbulho judicial, a reclamar, por
isso mesmo, tutela mais pronta e efi caz (Pontes de Miranda, Comentários ao
Código de Processo Civil, 1ª ed., Forense, Rio, 1977, XV, 59).
A inovação por este modo propugnada antagoniza, igualmente, a
tendência de jurisprudência da Suprema Corte, no sentido de acentuar a tutela
jurisdicional, até mesmo, da posse ad usucapionem (dispensado, portanto, o
requisito do título), ao admitir a declaração do domínio em obséquio à alegação
da prescrição aquisitiva pelo réu, em defesa (RE n. 23.491-SP, Primeira Turma,
unânime, 11.X.1954, Relator Ministro Abner Vasconcellos, RT 234/484).
10. Em época mais recente, a explosão populacional, cada vez mais
acentuada nas áreas urbanas, vem determinando a inevitável expansão das
cidades maiores, com o incessante e irreversível aparecimento de loteamentos
ou meros fracionamentos de antigas chácaras dos arredores, cujos proprietários,
muitas vezes pessoas rústicas, são impelidos a esse improvisado empreendimento,
da mesma forma que os adventícios, por sua vez, tangidos a adquirir pequenos
lotes residenciais em áreas desprovidas de serviços públicos, onde constroem
suas modestas habitações, fundados em contratos desprovidos de registro, pois o
próprio loteamento é quase sempre irregular. Sobrevindo execução fi scal contra
o improvisado loteador, os lotes já edifi cados são, obviamente, os preferidos
pelos ofi ciais de justiça, para garantia do juízo.
A não se admitir, sequer, a oposição de embargos de terceiro, fica a
jurisdição impedida de tomar conhecimento das bases empíricas da demanda
(Rosenberg).
Daí o que se me afi gura o excessivo rigor do verbete n. 621, e que aludi, de
início.
11. Penso, por conseguinte, que não se aconselha a peremptória recusa
liminar da ação de embargos de terceiro, fundada em compromisso de compra
e venda destituído, embora de registro imobiliário, como recomenda a Súmula
n. 621: ao cerceamento do direito de ação, somar-se-ia, no caso, o drástico
enfraquecimento da própria posse, que, em casos tais, transcende a mera
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
62
realidade de fato para invocar a qualifi cação de posse legítima, ad interdicta
(fundada em contrato), oponível ao esbulho perpetrado por sujeitos da ordem
privada e, portanto, a fortiori, ao esbulho judicial que porventura seja praticado
através da penhora ou de outro ato de apreensão.
O que se recomenda, assim, é, data venia, que os embargos de terceiro,
em casos tais, não sejam só por isso liminarmente recusados, mas devidamente
processados, decididos como de direito, às instâncias locais incumbindo conhecer
e apreciar as alegações e provas deduzidas em juízo.
Eis porque não posso emprestar minha adesão, ainda que desvaliosa, aos
dizeres da jurisprudência sumulada, a qual, tudo indica, não se concilia com os
imperativos da ordem social do nosso tempo.
12. A decisão recorrida admitiu e, afi nal, acolheu os embargos de terceiro,
que se insurgiram contra a penhora, fundando-se em contrato de compromisso
de compra e venda desprovido de registro imobiliário, bem como na posse
imediata do imóvel, afastada a ocorrência de fraude à execução.
Cumpre, pois, conhecer do recurso, por manifesta a divergência do julgado
com a Súmula n. 621 do Supremo Tribunal.
Nego-lhe, porém, provimento, pelas razões já expostas.
VOTO
O Sr. Ministro Athos Carneiro: Sr. Presidente, ao apreciar este tema
impressiono-me, sobremodo, com as conseqüências, no plano social, dos nossos
julgamentos.
Sabemos que no nosso país, principalmente nas camadas pobres da
população, um grande número de negócios, e até direi, a maior parte dos
negócios, é efetuada de maneira menos formal, e até absolutamente informal.
Compram-se e vendem-se pequenos terrenos e casas apenas mediante a
emissão de recibos, sinais de arras e mesmo de promessas de compra-e-venda
ou “transferências de posse” redigidos de forma a mais singela. E é muitíssimo
comum que esses documentos não venham a ser registrados no Registro de
Imóveis, inclusive porque os termos em que estão vazados não permitiriam
o registro. Para o registro imobiliário é necessário que o contrato revista
determinados requisitos, o que exige, freqüentemente, a presença do tabelião ou
do profi ssional do Direito.
Então, com extrema freqüência, ocorre na vida judiciária termos alguém
que é possuidor do seu terreno ou da sua casa há muitos anos, em inteira
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 63
boa-fé, que já pagou a totalidade do preço há muitos anos, e de repente é
supreendido por uma penhora, em execução promovida contra aquele que lhe
havia “alienado” o imóvel; nos termos da aludida Súmula, irá perder seus direitos
à posse e à aquisição da propriedade.
Então vemos aqui os dois pratos da balança: de um lado, temos o direito
do credor, direito pessoal; do outro lado o direito, também pessoal, do possuidor
e promitente comprador. Geralmente, como no caso dos autos, o possuidor já
mantinha o seu direito de posse e os direitos à aquisição decorrentes de sua
promessa de compra-e-venda desde antes do surgimento do crédito que origina
a penhora.
Então se pergunta: entre as duas pretensões, a do credor, direito pessoal,
e a do promitente comprador com justa posse, direito também pessoal, qual é
aquela que merece maior tutela, maior proteção da ordem jurídica?
Tenho a impressão de que levar nosso raciocíonio para o terreno do
direito registral importará na aplicação das normas jurídicas dentro de um,
digamos assim, tecnicismo exagerado. É certo que, num plano puramente
registral, o imóvel penhorado ainda é, tecnicamente, integrante do patrimônio
do promitente vendedor. Mas, inclusive, com freqüência é difícil que o credor
ignore que sobre aquele imóvel, cuja penhora postula, se exerce direito de outra
pessoa, do promitente comprador e possuidor de boa-fé.
O promitente vendedor ainda é dono do imóvel, mas o é sob aquele minus
derivado das obrigações que assumiu, de outorga da escritura defi nitiva, em
virtude do contrato quitado de promessa de compra e venda. O patrimônio do
cidadão não é constituído só dos seus direitos, mas também das suas obrigações.
E o promitente vendedor tem a obrigação de garantir a posse transferida
contratualmente ao promitente comprador, que a exerce em nome próprio.
Então, se dirá: mas o credor não sabia disso; o credor considerava que
o imóvel era do promitente vendedor; emprestou-lhe dinheiro, ou com
ele negociou, confi ante de que aquele imóvel fazia parte, sem ônus, do seu
patrimônio. Será que essa assertiva corresponde às realidades práticas da vida?
Será que o credor foi realmente averiguar no Registro Imobiliário e não atentou
para a circunstância de que naquele imóvel estaria morando alguém, às vezes há
muitíssimos anos, comportando-se como dono? E a penhora, por sua vez, terá
sido objeto de registro, de molde a ter efi cácia perante terceiros?
Creio mais conforme com as necessidades atuais do comércio jurídico a
interpretação pela qual, no choque de interesses de dois direitos eminentemente
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
64
pessoais (a própria penhora não é direito real, mas ato processual executivo),
tanto um quanto outro, deve prevalecer o direito daquele que está na justa posse
do imóvel, como seu legítimo pretendente à aquisição, e com o preço quitado,
face ao direito do credor do promitente vendedor, dês que ausente, por certo,
qualquer modalidade de fraude à credores ou à execução, como no caso dos
autos.
Esta orientação melhor se coaduna às realidades jurídico-sociais do nosso
país, e impede sejamos sensíveis a estas realidades.
De maneira que, rogando vênia ao eminente relator, e reconhecendo às
difi culdades da matéria e o peso dos argumentos em contrário, ouso divergir da
Súmula n. 621, retornando à antiga orientação do Pretório Excelso, revelada,
v.g., nos RREE in RTJ, 91/257; RTJ, 92/818; destarte, mantendo o aresto
proferido pelo egrégio Tribunal de Alçada do Estado do Paraná.
Conheço, mas nego provimento.
VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro Fontes de Alencar: Senhor Presidente, tenho como ajustada
à boa realização da justiça a posição do eminente Ministro Athos Carneiro.
Afi nal, não estamos a julgar pedras, mas a apreciar fatos que envolvem a conduta
humana, envolvem o homem com todas as suas circunstâncias.
Assim, dispensando-me de outras considerações, acolhendo as expostas
pelo Ministro Athos Carneiro, acompanho-lhe o pensamento.
RECURSO ESPECIAL N. 662-RS (89.0009939-6)
Relator: Ministro Waldemar Zveiter
Recorrente: Normélio Knaak
Recorridos: Almirante Guiomar de Vargas e cônjuge
Advogados: José Adelmo de Oliveira e outro e Gisela R. Reich e outro
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 65
EMENTA
Processual Civil. Embargos de terceiros. Contrato de promessa
de compra e venda e de cessão de direitos não inscrito no Registro de
Imóvel. Posse. Penhora. Execução. Art. 1.046, do CPC.
I - Inexistente fraude, encontrando-se os recorridos na posse
mansa e pacífi ca do imóvel desde 1983, estão legitimados, na qualidade
de possuidores a opor embargos de terceiros, com base em contrato
de compra e venda e de cessão de direito não inscrito no Registro
de Imóvel, para pleitear a exclusão do bem, objeto da penhora no
processo de execução, onde não eram parte, a teor do art. 1.046, § 1º,
do CPC.
II - Recurso conhecido pela letra d, da Constituição Federal
anterior, a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, conhecer do
recurso pela divergência e negar-lhe provimento, na forma do relatório e notas
taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 17 de outubro de 1989 (data do julgamento).
Ministro Evandro Gueiros Leite, Presidente
Ministro Waldemar Zveiter, Relator
DJ 20.11.1989
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Waldemar Zveiter: O eminente Presidente do colendo
Tribunal de Alçada do Estado do Rio Grande do Sul sumariou e decidiu a
controvérsia nos seguintes termos (fl s. 130-132):
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
66
Vistos estes autos.
Embargos de terceiro interpostos por Almirante Guiomar de Vargas e sua
mulher Odila Maria dos Santos Vargas à execução que Normélio Knaak promove
a Empreendimentos Imobiliários Sete Ltda., pois penhorado um imóvel seu,
localizado no Município de Dois Irmãos, tramitando, dita execução na Comarca
de Campo Bom.
Aduzem que adquiriram de José Saulo de Oliveira através de contrato particular
de cessão de direitos, com anuência de Empreendimentos Imobiliários Sete
Ltda., o lote n. 1 da Quadra 11, do Loteamento Parque São João, anteriormente
adquirido pelos alienantes da imobiliária citada, sem no entanto, ter procedido
ao registro imobiliário, por desconhecerem sua necessidade, mas ainda detêm a
posse do imóvel, desde a assinatura do contrato. A posse é justa, por isso é que
requerem a procedência dos embargos, invocando jurisprudência pertinente
à espécie e juntam notas promissórias que dizem comprovar o pagamento do
imóvel.
O embargado, alega, em impugnado os embargos, a posse precária dos
embargantes, de vez que figuram como meros cessionários dos promitentes
compradores e não proprietários. Menciona a Súmula n. 621, citando doutrina
e jurisprudência. Além do mais, os embargantes não registraram o contrato em
cartório, não surtindo, destarte, efeitos contra terceiro, a aquisição.
Julgando antecipadamente o feito, a MM. Juíza de Direito a quo sentenciou
favoravelmente aos embargantes determinando o levantamento da penhora
efetuada no imóvel descrito na inicial.
A Primeira Câmara Cível confi rmou a sentença.
Consigna a ementa:
Embargos de terceiro. Contrato de promessa de compra e venda e de
cessão não registrados. Posse. Penhora.
Embora não inscrito no Registro de Imóveis o contrato de promessa de
compra e venda, e de cessão de imóvel loteado, comprovação documental
dos negócios jurídicos e demonstrada a posse do promitente comprador e
do cessionário, legitimado está esse a lançar mão dos embargos de terceiro
para defendê-la, em caso de constrição judicial decorrente de penhora por
execução aforada contra o promitente vendedor.
Exegese do art. 1.046 do CPC.
Ao estabelecer a proteção da posse, a norma contida no art. 1.046 do
CPC refere-se à posse em si, como fato jurídico que produz efeitos próprios,
independentemente de alicerçar-se sobre o domínio da coisa.
Ao intérprete não cabe restringir o verdadeiro alcance da norma legal ou
limitar sua verdadeira extensão.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 67
Procedentes os embargos de terceiro, por legítima a posse do
cessionário, desconstitui-se a penhora decorrente de execução proposta
contra o promitente vendedor.
Sentença confi rmada. Apelo improvido.
Normélio Knaak recorre extraordinariamente, amparado no art. 119, inciso III,
letra d, da Constituição Federal.
Alega divergência com a Súmula n. 621, do Supremo Tribunal Federal e dissídio
pretoriano.
O recorrente sustenta que a decisão recorrida divergiu da Súmula ao entender
que: “os embargos de terceiro objetivam tutelar e defender não apenas a posse
decorrente do domínio, ou de contrato de promessa de compra e venda registrado,
mas também a posse isoladamente, como tal considerada e de forma exclusiva.”
A divergência com a súmula enseja a admissibilidade do recurso extraordinário.
Isto posto, admito o recurso pela letra d do permissivo constitucional, face à
divergência com a Súmula n. 621. O preparo será efetuado no prazo, art. 545 do
CPC. Vistas às partes para razões.
Intimadas as partes, o recorrente apresentou suas razões (fl s. 136-153) e os
recorridos as contra-arrazoaram (fl s. 155-158).
Subiram os autos ao egrégio Supremo Tribunal Federal, onde o eminente
Ministro Sydney Sanches, por despacho, em virtude da instalação deste Tribunal,
converteu o recurso ipso jure, em especial, por ser a matéria infraconstitucional, e
não o conhecendo, determinou a remessa do processo a esta Corte (fl . 167).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Waldemar Zveiter (Relator): A Primeira Câmara Cível
do colendo Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul decidiu a controvérsia
sumariada na seguinte ementa (fl . 108):
Embargos de terceiro. Contrato de promessa de compra e venda e de cessão
não registrados. Posse. Penhora.
Embora não inscrito no Registro de Imóveis o contrato de promessa de compra
e venda, e de cessão, de imóvel loteado, a comprovação documental dos negócios
jurídicos e demonstrada a posse do promitente comprador e do cessionário,
legitimado está esse a lançar mão dos embargos de terceiro para defendê-la, em
caso de constrição judicial decorrente de penhora por execução aforada contra
promitente vendedor.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
68
Exegese do art. 1.046 do CPC.
Ao estabelecer a proteção da posse, a norma contida no art. 1.046 do
CPC refere-se à posse em si, como fato jurídico que produz efeitos próprios,
independentemente de alicerçar-se sobre o domínio da coisa.
Ao intérprete não cabe restringir o verdadeiro alcance da norma legal ou
limitar sua verdadeira extensão.
Procedentes os embargos de terceiro, por legítima a posse do cessionário,
desconstitui-se a penhora decorrente de execução proposta contra o promitente-
vendedor.
Sentença confi rmada. Apelo improvido.
Inconformado, interpôs o embargado, Normélio Knaak, extraordinário,
com fulcro no art. 119, III, letra d, da Constituição Federal (anterior), no qual
alega, em síntese, que o acórdão recorrido teria divergido com a Súmula n. 621-
STF.
É de ver, correto o despacho que admitiu o RE pela alínea d do permissivo
constitucional ao aduzir (fl . 132):
O recorrente sustenta que a decisão recorrida divergiu da Súmula ao entender
que: “os embargos de terceiro objetivam tutelar e defender não apenas a
posse decorrente de domínio, ou de contrato de promessa de compra e venda
registrado, mas também a posse isoladamente, como tal considerada e de forma
exclusiva.”
A divergência com a súmula enseja a admissibilidade do recurso extraordinário.
Conheço, pois, do recurso pelo dissídio com a Súmula e, assim o examino:
A questão ora em debate, se resume em saber se é cabível, ou não, embargos
de terceiro à penhora, com base em contrato de promessa de compra e venda e
de cessão de direito não inscrito no registro de imóveis.
Revelam os autos a inexistência de fraude à execução e que os recorridos
encontram-se imitidos na posse mansa e pacífi ca do imóvel penhorado desde
1983, por justo título.
O insigne Pontes de Miranda leciona:
Os embargos de terceiro são a ação do terceiro que pretende ter o direito ao
domínio ou outro direito, inclusive a posse, sobre bens penhorados ou por outro
modo constritos. O usufrutuário, por exemplo, é o senhor; o locatório é possuidor.
Se a penhora não lhes respeita o direito, um ou outro pode embargar como
terceiro (in Tratado de Ações, ed. Revista dos Tribunais, 1976, pp. 180-181).
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 69
Continua:
O direito expectativo, como o oriundo de promessas de contrato, desde que a
medida constritiva o atinge, pode ser protegido por embargos de terceiro... (Obra
citada, p. 247).
Ainda sobre a mesma matéria, o ilustre Hamilton de Morais e Barros
ensina:
Não se quer nos embargos de terceiro que o autor seja o proprietário do bem.
Não se faz essa exigência. Basta que tenha a posse, por direito real ou pessoal. São
exemplos disso o locatário, o credor com garantia real, o credor que tenha direito
de retenção (Comentários ao Código de Processo Civil — vol. IX, 2ª ed., Forense,
1986, p. 371).
Sobre o mesmo tema, aliás, esta egrégia Turma, em sessão do dia
19.09.1989, proferiu decisão, ao julgar o RE n. 226-SP, relator o eminente
Ministro Gueiros Leite.
De igual forma também já se manifestou a egrégia Quarta Turma deste
Tribunal ao decidir o RE n. 188-PR, relator o não menos eminente Ministro
Athos Carneiro, em 08.08.1989.
Como se vê, correto, portanto, o acórdão recorrido ao divergir do
entendimento expresso na Súmula n. 621-STF, eis que, inexistente fraude à
execução, encontrando-se os recorridos na posse mansa e pacífi ca do imóvel
desde 1983, estão legitimados, na qualidade de possuidores, a opor embargos
de terceiro, para pleitear a exclusão do bem, objeto da penhora no processo de
execução, onde não eram parte, nos termos do art. 1.046, § 1º, do Código de
Processo Civil.
Tais os fundamentos pelos quais conheço do recurso pela letra d do
permissivo constitucional, mas nego-lhe provimento.
VOTO VENCIDO
O Sr. Ministro Cláudio Santos: Sr. Presidente, data venia, discordo do Sr.
Ministro-Relator, que conhece do recurso, em face da divergência, e nega-lhe
provimento.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
70
RECURSO ESPECIAL N. 696-RS (89.0009976-0)
Relator: Ministro Fontes de Alencar
Recorrente: Normélio Knaak
Recorridos: Aparício Trindade e outros
Advogados: José Adelmo de Oliveira e outro e Gisela R. Reich e outro
EMENTA
Embargos de terceiro. Contrato de promessa de compra e venda
e cessão, não inscrito no Registro de Imóveis. Preço quitado. Posse.
Penhora. Súmula n. 621 do Supremo Tribunal Federal.
I - Havendo justa posse e quitação do preço, o promitente
comprador, embora não tenha registrado o contrato de compromisso
de compra e venda, pode opor embargos de terceiro a fi m de livrar de
constrição judicial o bem penhorado.
II - Precedentes do Superior Tribunal de Justiça, REsps n. 188
e 225.
III - Recurso especial conhecido, porém improvido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do
recurso, mas, negar-lhe provimento, na forma do relatório e notas taquigráfi cas
constantes dos autos, que fi cam fazendo parte integrante do presente julgado.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 17 de outubro de 1989 (data do julgamento).
Ministro Bueno de Souza, Presidente
Ministro Fontes de Alencar, Relator
DJ 20.11.1989
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 71
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Fontes de Alencar: O despacho que admitiu o apleo
extremo guarda o seguinte teor:
Vistos estes autos.
Embargos de terceiro, com pedido liminar, interpostos por Aparício Trindade,
Milton Eninger e sua mulher Lia Ellwanger Eninger, José da Silva Silveira, Sueli
da Rosa Concencia, Adão Lima da Silva e sua mulher e Leni Pereira da Silva,
todos residentes no Loteamento São João, em Dois Irmãos, contra Normélio
Knaak, que move processo de execução, junto à Comarca de Campo Bom, a
Empreendimentos Imobiliários Sete Ltda.
Objetivam, fundamentando seu pedido no art. 1.046, § 1º, do CPC, a
desconstituição da penhora efetuada sobre os lotes de terra localizados na quadra
11 do Loteamento São João, em Dois Irmãos, em sua propriedade, adquiridos da
executada, através de contrato de promessa de compra e venda.
Porém, a promitente vendedora até a presente data não levou o contrato a
registro imobiliário, sendo que os embargantes não tomaram tal providência
porque era tarefa que cabia à promissária vendedora e também porque não se
aperceberam da falha por serem pessoas simples.
Contudo, os requerentes já quitaram o total do preço dos imóveis, conforme
notas promissórias que juntam. Daí, porque requerem seja levantada a penhora
que recaiu em tais lotes, onde já estão residindo, posto que construíram casas no
local.
Deferida a liminar de manutenção de posse, o embargado foi citado,
apresentando impugnação, onde alega que ocorre, na espécie, posse precária
de vez que os autores são meros promitentes compradores e não proprietários,
não sendo cabíveis embargos, a teor da Súmula n. 621 do STF, doutrina e
jurisprudência.
A MM. Dra. Juíza de Direito deu pela procedência dos embargos, determinando
o levantamento da penhora realizada sobre os lotes descritos na inicial, tornando
defi nitivo o mandado de manutenção de posse antes deferido.
A Primeira Câmara Cível confi rmou a sentença.
Consigna a ementa:
Embargos de terceiro. Contrato de promessa de compra e venda, e de
cessão, não inscritos no Registro de Imóveis. Posse. Penhora.
Embora não inscrito no registro de imóveis o contrato de promessa
de compra e venda, ou de cessão, de imóvel loteado, a comprovação
documental do negócio jurídico e demonstrada a imissão do promitente
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
72
comprador ou cessionário na posse do terreno, legitimado está o
compromissário ou cessionário a defender sua posse, no caso de constrição
judicial decorrente de penhora por execução contra o promitente vendedor,
via processual dos embargos de terceiro.
Exegesse do art. 1.046 do CPC.
Ao estabelecer a proteção possessória, a norma contida no art. 1.046 do
CPC refere-se à posse em si, como tal considerada, instituto jurídico não
vinculado ao domínio ou propriedade do bem.
Ao intérprete não cabe restringir o verdadeiro alcance da norma legal ou
limitar sua verdadeira extensão.
Procedentes os embargos de terceiro, por legítima, a posse dos
promitentes compradores e cessionários, eis que não viciada por violência,
clandestinidade ou precariedade, desconstitui-se a penhora decorrente de
execução proposta contra o promitente vendedor.
Sentença confi rmada. Apelo improvido.
Normélio Knaak recorre extraordinariamente, amparado no art. 119, inciso III,
letra d, da Constituição Federal.
Alega divergência com a Súmula n. 621, do Supremo Tribunal Federal e dissídio
pretoriano.
Divergência com a Súmula n. 621.
O recorrente sustenta que a decisão recorrida divergiu da Súmula ao entender
que: “os embargos de terceiro objetivam titular e defender não apenas a posse
decorrente do domínio, ou de contrato de promessa de compra e venda
registrado, mas também a posse isoladamente, como tal considerada e de forma
exclusiva.”
A divergência com a Súmula enseja a admissibilidade do recurso extraordinário.
Isto posto, admito o recurso pela letra d, do permissivo constitucional, face a
divergência com a Súmula n. 621. O preparo será efetuado no prazo do art. 545,
do CPC. Vistas às partes para razões (fl s. 293-296).
Com as razões de fl s. 300 a 317 e contra razões de fl s. 319 a 322, subiram
os autos ao egrégio Supremo Tribunal Federal, tendo o eminente Relator
Ministro Sydney Sanches, transformado ipso iure o recurso extraordinário em
recurso especial, determinado a remessa do processo a esta Corte.
É o relatório.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 73
VOTO
O Sr. Ministro Fontes de Alencar (Relator): O objeto do recurso diz
respeito a questão pertinente à possibilidade dos embargos de terceiro em caso
de promessa de compra e venda de imóvel não registrado (Súmula n. 621 do
STF).
Consoante vimos do relatório,
a promitente vendedora até a presente data não levou o contrato a registro
imobiliário, sendo que os embargantes não tomaram tal providência porque era
tarefa que cabia à promissária vendedora e também porque não se aperceberam
da falha por serem pessoas simples.
Contudo, os requerentes já quitaram o total do preço dos imóveis, conforme
notas promissórias que juntam. Daí por que requerem seja levantada a penhora
que recaiu em tais lotes, onde já estão residindo, posto que construíram casas no
local (fl . 294).
O caso guarda semelhança com o REsp n. 188 onde se deu um
abrandamento a Súmula n. 621, consoante se lê no voto do eminente Ministros
Athos Carneiro, ao votar no REsp n. 188:
Creio mais conforme com as necessidades atuais do comércio jurídico a
interpretação pela qual, no choque de interesses de dois direitos eminentemente
pessoais (a própria penhora não é direito real, mas ato processual executivo),
tanto um quanto outro, deve prevalecer o direito daquele que está na justa posse
do imóvel, como seu legítimo pretendente à aquisição, e com o preço quitado,
face ao direito do credor do promitente vendedor, dês que ausente, por certo,
qualquer modalidade de fraude à credores ou à execução, como no caso dos
autos.
Esta orientação melhor se coaduna às realidades jurídico-sociais do nosso país,
e impede sejamos sensíveis a estas realidades.
Também com meu voto abonei tal tese.
Também nessa mesma diretriz é o Recurso Especial n. 225, relatado
pelo eminente Ministro Gueiros Leite, perante a Terceira Turma, ao assim se
pronunciar:
Pelo que sei, podem manifestar embargos de terceiro o senhor ou possuidor,
qualquer que seja o direito em virtude do qual tem a posse do bem, seja direito
real, obrigacional ou pessoal e até mesmo de crédito, neste último caso quando o
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
74
contrato não opera a transferência do domínio (cf. Moraes e Barros. Comentários
ao CPC, vol. IX, Forense, p. 296, Caio Mário da Silva Pereira, Instituições, vol. IV, 1ª
ed., 1970, p. 99).
Assim também Pontes de Miranda, ao defi nir os embargos de terceiro como a
ação do que pretende ter direito ao domínio ou outro direito, inclusive a posse,
sobre os bens penhorados ou por outro modo constritos (Comentários, vol. IX, 2ª
ed., 1959, p. 6).
Afi nal de contas, se formos colocar nos pratos da balança o que sobre esse
assunto já foi decidido pelos tribunais, verifi caremos não ser possível ter como
pacífi ca a jurisprudência, mas grandemente diversifi cada.
O STF, mesmo, tem várias decisões, sendo que uma delas com a seguinte
ementa:
Cabem embargos de terceiro, por parte do promitente comprador, com
contrato de compromisso de compra e venda quitada, irretratável e não
registrado, a fi m de evitar que o imóvel compromissado seja penhorado e
praceado, para pagamento de dívida do promitente vendedor.
(STF, apelação DJ de 21.09.1963/118a, apud Alexandre de Paula, CPC
Anotado, vol. IV, RT-SP-1977, p. 326; idem RT 294/716; RF 142/151).
Dos Tribunais de São Paulo, Distrito Federal e Bahia as decisões não discrepam
(RT 337/351, RT 369/160, Adcoas 1971/ 4.890, RTBA 37/437, DJ n. 21.851, p. 2.335,
RDI n. 12/1979 — todos encontrados em Alexandre de Paula, obra e lugares
citados).
Destaco dentre esse um do TASP, a saber:
... Entretanto, quando não se vislumbra fraude de execução, o titular
de promessa de compra e venda, irrevogável e quitada, estando na posse
do imóvel, pode opor à penhora deste, mediante embargos de terceiro,
em ação executiva intentada contra o promitente vendedor, ainda que a
promessa não esteja inscrita. (Omissis)
(TASP, ac. 22.06.1971, Apelação n. 161.208, apud Alexandre de Paula,
idem, ibidem).
Na linha dos precedentes, conheço do presente recurso, mas lhe nego
provimento.
É o meu voto.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 75
VOTO
O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo: Já tive oportunidade de manifestar-
me na matéria mais de uma vez, inclusive como Relator. Naquela oportunidade,
manifestei-me no sentido de prestigiar a súmula do Supremo Tribunal Federal,
não obstante inclinações pessoais pelo entendimento em contrário.
Reexaminei a matéria e cheguei à conclusão diversa daquela que havia
abraçado anteriormente, razão pela qual acompanho o eminente Ministro-
Relator.
VOTO
O Sr. Ministro Barros Monteiro: Sr. Presidente, esta questão atinente
à Súmula n. 621 já foi objeto de apreciação pelas duas Turmas integrantes
da Segunda Seção desta Corte, conforme acabou, por sinal, de mencionar o
eminente Sr. Ministro-Relator.
Na Terceira Turma, a votação — se não estou em equívoco — foi por
quatro votos a um, prevalecendo esta mesma diretriz.
Assim, Sr. Presidente, penso que a matéria já está sufi cientemente discutida
e delineada e, nesses termos, também de acordo com o que teve ocasião de
acentuar o Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo, reformulo a orientação, para
adimitir os embargos de terceiro, mesmo nessas hipóteses em que a promessa de
venda e compra não está inscrita no registro imobiliário.
VOTO
O Sr. Ministro Bueno de Souza (Presidente): Srs. Ministros, acompanho
o Sr. Ministro Relator. De fato, verifi co que a hipótese em tudo se assemelha
àquela que fez objeto do Recurso Especial n. 188-PR e 247-SP, dos quais fui
Relator para acórdão, julgados em 08.08.1989, decisões ainda pendentes de
publicação. Como esclarece o Sr. Ministro Relator, a r. decisão recorrida indica
as circunstâncias de fato e de direito que aconselham afastar a observância do
enunciado da Súmula n. 621 do Supremo Tribunal Federal, na consonância dos
nossos referidos precedentes, aos quais me reporto, fazendo juntar cópia do voto
que então proferi, para mais amplo esclarecimento do aresto.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
76
ANEXO
RECURSO ESPECIAL N. 188-PR
VOTO
O Sr. Ministro Bueno de Souza: Senhores Ministros, o verbete n. 621 da
Súmula da Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem o seguinte teor:
Não enseja embargos de terceiro à penhora a promessa de compra e venda
não inscrita no Registro de Imóveis.
2. O enunciado, como se vê, se reveste de acentuadíssimo rigor, a ponto
de exemplifi car hipótese de extinção do processo de embargos de terceiro, sem
decisão de mérito, mediante sentença terminativa, in limine, nos termos dos arts.
267, I e 295, parágrafo único, III do Código de Processo Civil.
Em outras palavras, a súmula autoriza os juízes em geral, quaisquer que
sejam as circunstâncias do caso, a repelir, sem mais, embargos de terceiro opostos
à penhora de imóvel, se não estiver inscrito o instrumento de compromisso de
compra e venda em que o terceiro embargante fundamenta sua demanda. As
apelações interpostas contra sentenças liminarmente terminativas, em casos tais,
sequer mereceriam processadas, à luz dessa vinculativa orientação jurisprudencial,
no Tribunal Federal de Recursos; hoje, deveriam ser prontamente repelidas
pelos Tribunais Regionais Federais (Lei Complementar n. 35, de 14.03.1979,
art. 90, § 2º; Constituição de 05.10.1988, art. 108).
3. No entanto, certo é que nem sempre assim se orientou a jurisprudência
do Supremo Tribunal, como passo a demonstrar.
4. Com efeito, logo após sua transferência para a nova Capital Federal,
no julgamento do Agravo de Instrumento n. 28.756-SP, em 20 de setembro
de 1963, sendo Relator o Ministro Ribeiro da Costa, a Suprema Corte, por sua
Segunda Turma, à unanimidade (RTJ 30/401), prestigou a tese contrária à da
precitada súmula, em v. acórdão assim ementado:
Embargos de terceiro opostos por promitente comprador a fi m de evitar que
o imóvel compromissado seja penhorado e praceado para pagamento de dívida
de promitente vendedor. — Procedência dos embargos quando embora não
registrado o compromisso de compra e venda sendo irretratável, se acha quitado
— Agravo improvido.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 77
O saudoso Ministro Amaral Santos, com sua autoridade de consagrado
processualista, também deixou clara sua posição, no relatório do RE n. 71.162-
GB, em 12 de outubro de 1971 (RTJ 60/494). Na ementa do aresto da Primeira
Turma, unânime, consta este resumo:
Ação executiva. Penhora de bem vendido por um dos executados a terceiro,
que, embora na posse da escritura defi nitiva de compra e venda, não fi zera a sua
transcrição.
I - Os embargos de terceiro são admitidos não apenas para a proteção
simultânea do domínio e da posse, como no direito anterior, mas também para a
defesa da simples posse.
II - Não ocorrendo quaisquer das hipóteses de fraude à execução, a alienação
há de ser considerada plenamente efi caz, enquanto não for anulada pelo meio
próprio, que é a chamada ação pauliana.
III - Inocorrência de negativa de vigência dos arts. 530 e 928, do Código Civil, e
do art. 178 do Decreto n. 4.857, de 09.11.1939.
Recurso extraordinário não conhecido.
O saudoso Ministro Rodrigues Alckmin, por sua vez, no erudito voto-vista
proferido no RE n. 76.769-GB (Primeira Turma, unânime, em 19.11.1973,
Ementário n. 934/4), manteve-se fiel ao entendimento constante de seus
julgados de Juiz do Tribunal de Alçada de São Paulo.
Eis a síntese de seu pensamento sobre o assunto:
O eminente Relator, Ministro Luiz Gallotti, não conheceu do recurso porque
considerou não ter, o acórdão recorrido, afi rmando que, para interposição dos
embargos de terceiro, se exija a condição simultânea de senhor e possuidor
ao embargante. O acórdão teria reclamado o registro do contrato, para sua
oponibilidade e a terceiros, o que não enfrentaria a jurisprudência predominante
do Supremo Tribunal Federal.
Tenho — e examinarei afi nal, a questão do conhecimento — que a solução
adotada no aresto recorrido é juridicamente inexata.
No acórdão proferido no Agravo de Instrumento n. 28.756 (que o recorrente
invoca para a comprovação do dissídio), o eminente Ministro Ribeiro da Costa fez-
me a honra de transcrever despacho meu, em caso idêntico, em que afi rmei:
Inegável é o cabimento de embargos de terceiro por parte do promitente
comprador, para evitar que o imóvel prometido à venda sem cláusula de
arrependimento possa ser penhorado e levado à praça para pagamento de
dívida do promitente vendedor. Inegável, porque os embargos de terceiro
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
78
protegem não apenas o domínio, mas também a posse e mesmo direitos
obrigacionais (v. Lopes da Costa, “Direito Processual Civil Brasileiro”, 4,
254; Pontes de Miranda, “Comentários ao Código de Processo Civil”, ed.
1949, IV/206). Conseqüentemente, bastava a prova do direito obrigacional
anterior à penhora para que os embargos de terceiro pudessem ser
acolhidos.
A doutrina confi rma o assêrto. Pontes de Miranda: “O direito, que se supõe
no art. 707, turbado ou esbulhado (“prejudicado”, melhor fora dito), não é o
direito a que se referia a Ordenação do Livro III, Título 81, ao falar do direito de
apelar, que tem o terceiro, porque alí se tratava da intervenção na relação jurídica
processual, na discussão da pretensão à sentença, e não da execução, ou, em
geral, da constrição: é o direito do terceiro, que foi objeto de constrição judicial.
Ora, os bens arrestáveis, sequestráveis, depositáveis, penhoráveis etc., não são
só os que são objeto de propriedade (senso estrito), de direito das coisas. São
também direitos, pretensões, ações. Portanto, sempre que a constrição judicial
apanhou “direito” (títulos de crédito, direitos, pretensões, ações, art. 930, II e V)
está autorizado o emprego de embargos de terceiro prejudicado — terceira
espécie do art. 707, sendo que o legislador preferiu considerá-la compreensiva
dos embargos de terceiro senhor. Quando a efi cácia do ato judicial fere a órbita
do direito, pretensão, ou ação do terceiro, constringe-o.”
No mesmo sentido, José Frederico Marques, “Instituições de Direito Processual
Civil”, V/454 e Carneiro de Lacerda, “Código de Processo Civil”, IV/179.
A alegação a que se prendeu o acórdão, de não achar-se registrada, no Registro
de Imóveis, a promessa de cessão, equivale, sem dúvida, a negar que os embargos
de terceiro possam proteger direitos obrigacionais, ou proteger a posse que,
com apoio neles, se legitime. Reclamou o acórdão, para a proteção do direito do
terceiro embargante, que esse direito seja “real”, pois, se referente a imóvel, que
haja transcrição, inscrição ou averbação.
Além de afastar-se da doutrina e da jurisprudência (que, como visto, não
restringe embargos de terceiro à proteção da propriedade e de direitos reais), o
julgado não teve em conta que o problema devia ser encarado sob o aspecto de
fraude à execução. E provada a constituição de direito, de natureza obrigacional,
embora, a favor do terceiro embargante, sem fraude à execução, nada justifi cava
fosse desconhecido tal direito pelo exequente.
Do mérito da controvérsia se vê que, na verdade, ao repelir os embargos, o
acórdão recorrido afi rmou a tese de que — ainda que se não cogite de fraude à
execução — os embargos de terceiro não protegem direitos — salvo se reais —
ou a posse que neles se baseie.
Dado o valor atribuído à causa, é de ter-se tal entendimento como contrário
à jurisprudência predominante do STF, para que o recurso possa lograr
conhecimento?
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 79
Peço vênia ao eminente Ministro Luiz Gallotti para, responder pela afi rmativa.
Como jurisprudência dominante se tem, não somente a cristalizada em, Súmulas,
mas a orientação adotada pelo Pleno, ou por ambas as Turmas, sobre a questão
Federal.
Ora, o recorrente indicou julgado dissidente da Segunda Turma (Agrvo de
Instrumento n. 28.756) e da Primeira (RE n. 19.642), indicando, ainda, julgado
que teve como protegível a posse amparada em título não registrado (RE n.
71.162 da GB, Relator Ministro Amaral Santos). Outrossim, no RE n. 62.198-SP
(RTJ 41/298) admitiu-se a possibilidade de embargos de terceiro para a proteção
de direito obrigacional (embargos oferecidos pelo locatário em execução de
ação de despejo), frisando o Ministro Adalício Nogueira quanto a extensão deles:
“a jurisprudência busca insuflar-lhe um sentido novo, uma amplitude mais
compatível com o dinamismo da atividade jurídica contemporânea.”
E não encontrei, na jurisprudência deste Supremo Tribunal, julgado algum que
restrinja os embargos à proteção de direitos reais.
Estes precedentes levam-me a ter como contrária à jurisprudência
predominante a orientação adotada no acórdão recorrido. E assim, conhecendo
do recurso extraordinário, dou-lhe provimento, para restabelecer o acórdão da
apelação.
Esta mesma orientação foi mantida pela egrégia Segunda Turma, unânime,
no v. acórdão do RE n. 82.632-RJ, em 02.04.1976, sendo Relator o Ministro
Th ompson Flores (RTJ 81/852). Eis os dizeres da ementa:
Embargos de terceiro. Promessa de cessão não inscrita no Registro Imobiliário.
Penhor averbado do mesmo imóvel não obsta o êxito dos embargos.
II - Se a promessa de cessão é anterior ao ingresso da execução, e tida como
válida, porque ausente a sua fraude, não se faz mister suas inscrições para
embasar os embargos de terceiro, segundo a melhor doutrina aceita no Supremo
Tribunal Federal.
III - Recurso não conhecido, porque limitado à letra a da permissão
constitucional, incorrendo negativa de vigência das duas normas de lei federal
indicadas.
Naquela assentada, no particular, asseverou o eminente Relator:
Limita-se o excepcional à negativa de vigência do art. 485 do Código Civil,
porque o embargante não teria a posse; e art. 69 da Lei n. 4.380/1964, dado que
inexistiria direito real oponível, eis que a promessa de cessão não estaria inscrita
no Registro Imobiliário.
O exame dos autos, em sua integralidade, convenceu-me, contudo, que não
merece conhecida a irresignação, como já concluíra o despacho presidencial.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
80
De fato.
Os embargantes resultaram acolhidos porque desprezou o acórdão a
ocorrência de fraude à execução, invocando, em princípio, o art. 593, II, do Código
do Processo Civil, e após a existência de qualquer prova que a indiciasse.
Atribuiu, pois, validade à promessa de cessão, por escritura pública, anterior ao
ingresso da ação executiva, título no qual se esteou o embargante, ainda que não
inscrito no Registro Imobiliário, diversamente do que sucedera com a penhora.
Assim procedendo, não vejo tenha negado vigência ao art. 485 do Diploma
Civil, do qual não cuidou o acórdão, ao menos expressamente; ou do já referido
art. 69 da Lei n. 4.380/1964.
É que os embargos não assentam em direito real, oponível a terceiros, e
dependente da inscrição do título.
Antes, embasaram-se na escritura de promessa de cessão, e nessa, reconhecida
válida, além de cláusulas outras, assegurava a posse imediata, verbis, fl . 6:
O outorgado fi ca desde já na completa posse e livre administração do
imóvel objeto da presente, inclusive de sua renda, respondendo, porém,
também, desta data em diante, pelos pagamentos de todos os impostos,
taxas e demais tributos fi scais que gravam ou venham a gravar o mesmo
imóvel.
E seria o bastante para justifi car a procedência dos embargos, sem ofensa ao
citado art. 485.
De resto, dispensando a inscrição do contrato promissório de cessão para
nele ver título legítimo a oposição de embargos de terceiro, orientou-se pela
melhor doutrina, afi nando, ademais, com a jurisprudência desta Corte, como
em exaustivo voto acentuou o eminente Ministro Rodrigues Alckmin, após pedir
vista do RE n. 76.769, Primeira Turma, em 19 de novembro de 1973 (Ementário n.
934/4).
E a egrégia Primeira Turma, no REsp n. 87.958-RS (RTJ 91/257), sendo
Relator o Ministro Cunha Peixoto, em 24 de novembro de 1977, assim decidiu,
à unanimidade:
Embargos de terceiro senhor e possuidor. Sua procedência nos termos do art.
1.046 do Código de Processo Civil.
A falta de registro da promessa de compra e venda não obsta a procedência
dos embargos, eis que, para se opor ao ato de penhora, basta a qualidade de
mero possuidor.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 81
E ainda reiterou esse entendimento, no RE n. 89.685-SP, em 14.03.1978,
unânime ( Jur. Bras., Embargos de Terceiro, p. 62), em cuja ementa se lê:
Embargos de terceiro. Compromisso de compra e venda não registrado. Falta
de registro. Penhora. Possuidor.
Embargos de terceiro. Compromisso de compra e venda não registrado.
A falta de registro da promessa de compra e venda não obsta à procedência
dos embargos, eis que para se opor ao ato de penhora, basta a qualidade de
possuidor (RE n. 87.958).
Dissídio jurisprudencial não comprovado.
Recurso extraordinário não conhecido.
5. Esta pacífi ca jurisprudência guardava, de resto, coerência com a tradição
brasileira, infensa a uma sistemática correlação entre a natureza da decisão e a
correspondente forma de impugnação, como autorizadamente expõe Buzaid
(Agravo de Petição, Saraiva, SP, 1956, pp. 69 e ss.); a qual, por um lado, não
encorajava a imediata rejeição de embargos de terceiro (nem, na verdade, de
qualquer tipo de demanda), bem como refl etida a escassa importância conferida
às fi guras então ainda incipientes de pré-contrato, notadamente o compromisso
de compra e venda (que somente nas décadas de 1930/1940 começou a assumir
feições próprias, em razão do relevo que o mundo dos negócios veio a lhe
atribuir), como se lê, entre outros, em Souza Campos Batalha (Loteamentos,
ed. Limonad, 1953, pp. 340 e ss.) e Orlando Gomes (Direitos Reais, 2ª ed., For.,
1962, pp. 486 e ss.).
Até então, a jurisprudência admitia, sem discrepância, os embargos de
terceiro para tutela da propriedade ou da posse atingida por ato judicial, sem
qualquer alusão a compromisso de compra e venda.
6. Foi somente em 16.03.1971, no julgamento do RE n. 73.527-PE, que
a egrégia Primeira Turma do Supremo Tribunal, unânime, sendo Relator o
eminente Ministro Djaci Falcão (RTJ 63/222), decidiu em sentido diverso, tal
como consta da ementa:
Promessa de compra e venda do imóvel. Sem a formalidade essencial da
inscrição no registro público, não se torna oponível a terceiros. O registro é
que lhe atribui efi cácia erga omnes. Recurso extraordinário conhecido, mas não
provido.
Anote-se que este primeiro precedente da discutida Súmula n. 621 é
extremamente frágil em razões que aconselhassem a modifi cação do rumo
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
82
jurisprudencial até então observado, quando é certo que o Supremo Tribunal,
em harmonia com o que vinham decidindo os Tribunais Estaduais, jamais
autorizara a pura e simples rejeição liminar de embargos de terceiro somente
por falta de registro do instrumento de compromisso de compra e venda (em
verdade, sequer jamais cogitou dessa drástica alternativa).
Limita-se o aresto inovador a acenar para o art. 22 do Decreto-Lei n. 58,
de 10.12.1937, com a redação que lhe conferiu a Lei n. 649, de 11.03.1949,
diplomas legais estes, aliás (convém acentuar), cujo declarado escopo
precisamente consiste em robustecer a posição do compromissário comprador,
quer em face do promitente vendedor, quer perante terceiro; não, ao contrário,
em enfraquecê-la.
É bem verdade que o entendimento adotado pelo precedente comportou
certas vacilações. Tanto assim é que, em 13.11.1973, o Ministro Djaci Falcão,
revendo sua posição, aderiu ao voto-vista proferido pelo Ministro Rodrigues
Alckmin no RE n. 76.769-GB, há pouco referido e, que em parte, acabo de
transcrever, para enriquecimento deste voto.
7. A estas considerações, o eminente Ministro Moreira Alves acrescentou,
em seu douto voto-mérito nos embargos em RE n. 87.958-RJ (RTJ 89/291):
Com efeito, ninguém nega que os embargos de terceiro possam ser opostos
pelo mero possuidor. O que não me parece certo, no entanto, é admiti-los em
favor do simples possuidor para efeito de desconstituir a penhora de imóvel de
propriedade do executado, a qual não acarreta turbação ou esbulho de posse. A
ser isso possível, e se o imóvel penhorado tivesse sido entregue em comodato a
alguém, o comodatário poderia excluí-lo da penhora por meio de embargos de
terceiro.
Em se tratando de promitente comprador, os embargos de terceiro só podem
ser utilizados por ele, para opor-se à penhora do imóvel de propriedade ainda
do promitente vendedor executado, se estiver inscrita a promessa de compra e
venda irretratável e irrevogável, pois, nesse caso, a penhora não atinge a posse,
mas sim o direito real à aquisição de que aquele é titular. Se não estiver inscrita a
promessa, o promitente comprador é simples titular de direito pessoal, e embora
na posse do imóvel, não pode atacar o ato de constrição judicial que é a penhora,
como não o poderiam o comodatário, o locatário, o depositário, também
possuidores e titulares de mero direito pessoal com relação à coisa penhorada.
Este segundo precedente da Súmula n. 621, é oportuno recordar, prevaleceu
por pequena maioria, ficando vencidos os Ministros Soares Muñoz, Cunha
Peixoto, Rodrigues Alckmin e Xavier de Albuquerque.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 83
Assim também ocorreu, aliás, com o terceiro precedente (embargos no
RE n. 89.696-RJ, 08.08.1979, Relator Ministro Moreira Alves, RTJ 95/282),
quando fi caram vencidos os Ministros Soares Muñoz, Cunha Peixoto, Xavier de
Albuquerque e Th ompson Flores.
8. Diversamente, portanto, do que se observa relativamente aos julgados
representativos da primeira tendência jurisprudencial, verifica-se que os
precedentes da Súmula n. 621 traduzem orientação predominante, aferida, salvo
uma única exceção, por simples maioria de votos, fundada em razões atinentes,
apenas, ao tema da efi cácia erga omnes do reclamado registro do compromisso de
compra e venda, nos termos do art. 22 do Decreto-Lei n. 58, de 1937 e Lei n.
649, de 1949.
9. No mais, cumpre ter em vista a severa restrição imposta pela Súmula n.
621 à proteção judicial da posse legítima de imóvel, ou seja, de posse fundada
em contrato (Código Civil, art. 493, III), tal o compromisso de compra e venda,
só por desprovido de registro imobiliário: constituindo-se, embora, em posse ad
interdicta, pois imune aos vícios que poderiam contaminá-la (vi, clam, precario),
fi caria, não obstante, cerceado o seu acesso à ação possessória, gênero ao qual
pertencem os embargos de terceiro opostos a esbulho judicial, a reclamar, por
isso mesmo, tutela mais pronta e efi caz (Pontes de Miranda, Comentários ao
Código de Processo Civil, 1ª ed., For., Rio, 1977, XV, 59).
A inovação por este modo propugnada antagoniza, igualmente, a
tendência de jurisprudência da Suprema Corte, no sentido de acentuar a tutela
jurisdicional, até mesmo, da posse ad usacapionem (dispensado, portanto, o
requisito do título), ao admitir a declaração do domínio em obséquio à alegação
da prescrição aquisitiva pelo réu, em defesa (RE n. 23.491-SP, Primeira Turma,
unânime, 11.X.1954, Relator Ministro Abner Vasconcellos, RT 234/484).
10. Em época mais recente, a explosão populacional, cada vez mais
acentuada nas áreas urbanas, vem determinando a inevitável expansão das
cidades maiores, com o incessante e irreversível aparecimento de loteamentos
ou meros fracionamentos de antigas chácaras dos arredores, cujos proprietários,
muitas vezes pessoas rústicas, são impelidos a esse improvisado empreendimento,
da mesma forma que os adventícios, por sua vez, tangidos a adquirir pequenos
lotes residenciais em áreas desprovidas de serviços públicos, onde constroem
suas modestas habitações, fundados em contratos desprovidos de registro, pois o
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
84
próprio loteamento é quase sempre irregular. Sobrevindo execução fi scal contra
o improvisado loteador, os lotes já edifi cados são, obviamente, os preferidos
pelos ofi ciais de justiça, para garantia do juízo.
A não se admitir, sequer, a oposição de embargos de terceiro, fica a
jurisdição impedida de tomar conhecimento das bases empíricas da demanda
(Rosenberg).
Daí o que se me afi gura o excessivo rigor do verbete n. 621, a que aludi, de
início.
11. Penso, por conseguinte, que não se aconselha a peremptória recusa
liminar da ação de embargos de terceiro, fundada em compromisso de compra
e venda destituído, embora, de registro imobiliário, como recomenda a Súmula
n. 621: ao cerceamento do direito de ação, somar-se-ia, no caso, o drástico
enfraquecimento da própria posse, que, em casos tais, transcende a mera
realidade de fato para invocar a qualifi cação de posse legítima, ad interdicta
(fundada em contrato), oponível ao esbulho perpetrado por sujeitos da ordem
privada e, portanto, a fortiori, ao esbulho judicial que porventura seja praticado
através da penhora ou de outro ato de apreensão.
O que se recomenda, assim, é, data venia, que os embargos de terceiro,
em casos tais, não sejam só por isso liminarmente recusados, mas devidamente
processados, decididos como de direito, às instâncias locais incumbindo conhecer
e apreciar as alegações e provas deduzidas em juízo.
Eis porque não posso emprestar minha adesão, ainda que desvaliosa, aos
dizeres da jurisprudência sumulada, a qual, tudo indica, não se concilia com os
imperativos da ordem social do nosso tempo.
12. A decisão recorrida admitiu e, afi nal, acolheu os embargos de terceiro,
que se insurgiram contra a penhora, fundando-se em contrato de compromisso
de compra e venda desprovido de registro imobiliário, bem como na posse
imediata do imóvel, afastada a ocorrência de fraude à execução.
Cumpre, pois, conhecer do recurso, por manifesta a divergência do julgado
com a Súmula n. 621 do Supremo Tribunal.
Nego-lhe, porém, provimento, pelas razões já expostas.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 85
RECURSO ESPECIAL N. 866-RS (89.0010378-4)
Relator: Ministro Eduardo Ribeiro
Recorrente: Normélio Knaak
Recorridos: Jairo Schumann e outros
Advogados: Jorge Sidmar Dienstmann e outro e Gisela R. Reich
EMENTA
Embargos de terceiro. Promessa de compra e venda não registrada.
O promitente comprador, imitido na posse, poderá defendê-la
pela via dos embargos de terceiro.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, em preliminar, por unanimidade
de votos, conhecer do recurso pelo dissídio, e no mérito, por maioria, negar-lhe
provimento, na forma do relatório e notas taquigráfi cas constantes dos autos,
que fi cam fazendo parte integrante do presente julgado.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 10 de outubro de 1989 (data do julgamento).
Ministro Nilson Naves, Presidente
Ministro Eduardo Ribeiro, Relator
DJ 30.10.1989
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro: Jairo Schumann e sua mulher e Décio
Nicolau Klock e sua mulher ajuizaram embargos de terceiro tendo em vista a
penhora de imóveis, de que se afi rmam promitentes compradores, em execução
movimentada por Normélio Knaak contra Empreendimentos Imobiliários Sete
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
86
Ltda. Esclarecem que a executada prometeu-lhes vender os lotes de terreno,
objeto da constrição judicial, sendo-lhes de logo transferida a posse e já tendo
sido efetuado o pagamento do preço integralmente.
Os embargos foram julgados procedentes, confirmada a setença pelo
egrégio Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul.
Recorreu extraordinariamente o vencido, alegando divergência manifesta
com a Súmula n. 621 do Supremo Tribunal Federal, uma vez que a promessa
de compra e venda não se achava registrada. Admitido o recurso, o eminente
Ministro Relator teve-o como convolada em especial, vindo os autos a esta
Corte.
É o relatório
VOTO
O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro: Conheço do recurso, posto que
induvidoso o dissídio com a Súmula do egrégio Supremo Tribunal Federal.
A matéria em debate foi examinada por esta Turma no julgamento do
REsp n. 226 de que foi relator o Ministro Gueiros Leite. Com o voto vencido
do Ministro Cláudio Santos, fi rmou-se o entendimento a serem admissíveis
embargos de terceiro, por parte de promitente comprador, imitido na posse,
mesmo não se achando registrado o instrumento em que se consubstanciou o
compromisso. Proferi, na oportunidade, o seguinte voto:
Já se salientou nos autos a divergência que a propósito do tema tem lavrado,
e que se verifi ca não apenas na jurisprudência como na doutrina. A questão,
em verdade, apresenta dificuldades técnicas, ao lado de problemática não
desprezível, pertinente à realidade da vida dos negócios, a que o julgador não
pode estar desatento.
Como de entendimento corrente, e tem sido salientado no trato da matéria,
a transmissão da posse não constitui cláusula natural da promessa de venda
de tal modo que, para ter-se como presente, independesse de ser explicitada.
Nada impede, entretanto, que os contratantes acordem em que desde logo se
adiante a posse a quem haveria de ter esse direito com a conclusão do contrato
a que a preliminar ser refere. A posse, por conseguinte, é alguma coisa mais
que se acrescenta ao negócio, ensejando, de logo, o resultado econômico que
afi nal seria alcançado. A próposito observou o Ministro Soares Muñoz que, nas
circunstâncias, o promitente comprador tem a posse em nome próprio, como se
proprietário fosse (RTJ 89/292-v. Francisco Muniz - RT v. 613 pp. 8-9).
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 87
Não se pode duvidar, por outro lado, de que os embargos de terceiro prestam-
se à defesa de posse. No direito atual, aliás, a dúvida é se passível de utilização por
quem tenha o domínio mas não seja possuidor.
Tenho para mim que se há de aceitar seja lícito valer-se o promitente
comprador dos embargos, nas circunstâncias. Transmitida que lhe foi a posse,
não há como qualifi cá-la de precária uma vez efetuado o pagamento do preço e
inexistindo cláusula de arrependimento. Não mais a poderá exigir o promitente
comprador, embora conserve o domínio. Ficou este esvaziado, legitimamente não
podendo o proprietário, no que diz com o imóvel, se não cumprir o prometido e
concretizar a venda.
Considero que a hipótese não é assemelhável à locação, comodato ou
depósito. Aqui se trata, como observado, de posse que se torna defi nitiva com o
cumprimento do contrato. A relação do promitente comprador com o promitente
vendedor, uma vez pago o preço, restringir-se-á à faculdade de exigir-lhe a
escritura.
Em vista do exposto nego provimento.
VOTO VENCIDO
O Sr. Ministro Cláudio Santos: Sr. Presidente, fui voto vencido na decisão
da Turma no caso líder, de modo que, por ora, mantendo aquele ponto de vista.
Aguardarei que as posições se sedimentem, para, no futuro, admitir rever minha
posição. No momento, ainda confi rmo meu ponto de vista, idêntico ao adotado
na Súmula n. 621, do STF.
Assim, com a devida vênia, conheço do recurso e dou-lhe provimento.
RECURSO ESPECIAL N. 1.172-SP (89.0011126-4)
Relator: Ministro Athos Carneiro
Recorrente: Antonio Bernardes de Oliveira Filho
Recorridos: Augusto Auricchio e cônjuge
Advogados: Denise Lohn Bernardes de Oliveira e Salim Arida e outro
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
88
EMENTA
Embargos de terceiro possuidor, opostos por promitente
comprador ante penhora do imóvel prometido comprar.
O promitente comprador, por contrato irrevogável, devidamente
imitido na posse plena do imóvel, pode opor embargos de terceiro
possuidor — CPC, art. 1.046, § 1º — para impedir penhora promovida
por credor do promitente vendedor. A ação do promitente comprador
não é obstada pela circunstância de não se encontrar o pré-contrato
registrado no ofício imobiliário. Inocorrência de fraude à execução.
O registro imobiliário somente é imprescindível para a
oponibilidade face aqueles terceiros que pretendam sobre o imóvel
direito juridicamente incompatível com a pretensão aquisitiva do
promitente comprador. Não é o caso do credor do promitente vendedor.
Orientação de ambas as Turmas da Segunda Seção do Superior
Tribunal de Justiça.
Recurso especial conhecido pela letra c (Súmula n. 621), mas não
provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do
recurso, mas negar-lhe provimento, na forma do relatório e notas taquigráfi cas
precedentes que integram o presente julgado.
Custas, como de lei.
Brasilia, 13 de fevereiro de 1990 (data do julgamento).
Ministro Bueno de Souza, Presidente
Ministro Athos Carneiro, Relator
DJ 16.04.1990
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 89
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Athos Carneiro: Apreciando, em grau de apelação,
embargos de terceiro opostos pelo casal de Augusto Auricchio face penhora em
bens imóveis efetuada em favor do embargado Antônio Bernardes de Oliveira
Filho, a egrégia Primeira Câmara do 1º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo
reformou o decisum que dera pela improcedência dos embargos; assim, acolheu o
colegiado as alegações dos apelantes, de que haviam adquirido os lotes mediante
compromisso de compra-e-venda quitado embora não registrado, deles tendo
posse plena com construção de benfeitorias valiosas, já antes do ajuizamento das
execuções promovidas pelo apelado (fl s. 221-222).
O aresto alude à orientação adotada no VII Encontro Nacional de
Tribunais de Alçada, realizado em São Paulo em 1985, considerando injusta
a aplicação da Súmula n. 621, “quando, manifestamente ausente a fraude
de execução ou contra credores, pugna o promitente comprador, através de
embargos de terceiro, pela defesa de sua posse, por não possuir compromisso de
compra e venda registrado” (fl . 221).
Interpôs Antônio Bernardes de Oliveira Filho recurso extraordinário, com
argüição de relevância, invocando o art. 119, inciso III, alínea d da Constituição
pretérita, e alegando que o v. acórdão dissentiu da orientação do STF fi xada na
Súmula n. 621, bem como de julgados publicados nas RTJs 63/222, 95/282,
100/835, 107/686, 11/449 e 89/285 (fl s. 224-232), dando assim à lei federal
— art. 346 do CPC de 1939; art. 1.046 do CPC de 1973; art. 22 do Decreto-
Lei n. 58/1937 com a redação dada pela Lei n. 649/1949 — exegese diversa da
atribuída pelo Sumo Pretório.
Admitido o apelo pela letra d (fl s. 237-238), os autos subiram ao Pretório
Excelso, sendo remetidos a esta Corte em despacho de fl . 299.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Athos Carneiro (Relator): 1. Este tema, como já afi rmei no
REsp n. 1.310, ac. unânime de 28 de novembro p. p., foi apreciado no Superior
Tribunal de Justiça, pela vez primeira, no REsp n. 188, aos 08.08.1989, por esta
Quarta Turma, relator para o acórdão o eminente Ministro Bueno de Souza, sob
a ementa:
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
90
Processual Civil. Embargos de terceiro.
Recurso especial. Divergência com a Súmula n. 621 do STF.
1. É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de
posse advinda de contrato de compromisso de compra e venda desprovido de
registro imobiliário.
2. Inocorrência in casu de fraude à execução.
3. Recurso especial a que se nega provimento. (DJU de 31.10.1989, p. 16.557)
Na oportunidade, como vogal, proferi o seguinte voto:
Sr. Presidente, ao apreciar este tema impressiono-me, sobremodo, com as
conseqüências, no plano social, dos nossos julgamentos.
Sabemos que no nosso país, principalmente nas camadas pobres da
população, um grande número de negócios, e até direi, a maior parte dos
negócios, é efetuada de maneira menos formal, e até absolutamente informal.
Compram-se e vendem-se pequenos terrenos, apartamentos e casas apenas
mediante a emissão de recibos, sinais de arras e mesmo de promessas de compra-
e-venda ou “transferências de posse” redigidos de forma singela. E é muitíssimo
comum que esses documentos não venham a ser registrados no Registro de
Imóveis, inclusive porque com freqüência os termos em que estão vazados não
permitiriam o registro. Para o registro imobiliário é necessário que o contrato
revista determinados requisitos, o que exige, freqüentemente, a presença do
tabelião ou do profi ssional do Direito.
Então, com extrema freqüência, ocorre na via judiciária termos alguém que é
possuidor do seu terreno ou da sua casa há muitos anos, em inteira boa-fé, que
já pagou a totalidade do preço há muitos anos, e de repente é surpreendido por
uma penhora, em execução promovida contra aquele que lhe havia ‘alienado’
o imóvel; nos termos da aludida súmula, irá perder seus direitos à posse e à
aquisição da propriedade.
Então vemos aqui os dois pratos da balança: de um lado, temos o direito do
credor, direito pessoal; do outro lado o direito, também pessoal do possuidor
e promitente comprador. Geralmente, como no caso dos autos, o possuidor já
mantinha o seu direito de posse e os direitos à aquisição decorrentes de sua
promessa de compra-e-venda desde antes do surgimento do crédito que origina
a penhora.
Então se pergunta: entre as duas pretensões, a do credor, direito pessoal, e a
do promitente comprador com justa posse, direito também pessoal, qual é aquela
que merece maior tutela, maior proteção da ordem jurídica?
Tenho a impressão de que levar nosso raciocínio para o terreno do direito
registral importará inclusive na aplicação das normas jurídicas dentro de um,
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 91
digamos assim, tecnicismo exagerado. É certo que, num plano puramente
registral, o domínio do imóvel penhorado ainda, tecnicamente, integra o
patrimônio do promitente vendedor.
O promitente vendedor ainda é dono do imóvel, mas o é sob aquele minus
derivado das obrigações que assumiu, de outorga da escritura definitiva,
em virtude do contrato, quitado ou não, de promessa de compra e venda. O
patrimônio do cidadão não é constituído só dos seus direitos, mas também das
suas obrigações. E o promitente vendedor tem a obrigação de garantir a posse
transferida contratualmente ao promitente comprador, que a exerce em nome
próprio.
Então, dir-se-á: mas o credor não sabia disso; o credor considerava que o imóvel
era do promitente vendedor; emprestou-lhe dinheiro, ou com ele negociou,
confi ante de que aquele imóvel fazia parte, sem ônus, do seu patrimônio. Será
que essa assertiva corresponde às realidades da vida? Será que o credor foi
realmente averiguar no Registro Imobiliário? Não atentou para a circunstância
de que naquele imóvel estaria morando alguém, às vezes há muitíssimos anos,
comportando-se como dono? E a penhora, por sua vez, terá ela sido objeto de
registro, de molde a ter efi cácia perante terceiros?
Creio mais conforme com as necessidades atuais do comércio jurídico a
interpretação pela qual, no choque de interesses de dois direitos eminentemente
pessoais (a própria penhora não é direito real, mas ato processual executivo),
direito pessoal tanto um quanto outro, deve prevalescer na via dos embargos
de terceiro, o direito daquele que está na justa e plena posse do imóvel, como
seu legítimo pretendente à aquisição, face ao direito do credor do promitente
vendedor, dês que no caso ausente, por certo, qualquer modalidade de fraude à
credores ou à execução.
Esta orientação melhor se coaduna às realidades jurídico-sociais do nosso país,
e impende sejamos sensíveis a estas realidades.
De maneira que, rogando vênia ao eminente relator, e reconhecendo às
difi culdades da matéria e o peso dos argumentos em contrário, ouso divergir da
Súmula n. 621, retornando à antiga orientação do Pretório Excelso, revelada, v.g.,
nos RREE in RTJ, 91/257; RTJ, 92/818; destarte, mantenho o aresto proferido pelo
egrégio Tribunal de Alçada do Estado do Paraná.
Votaram então vencidos os eminentes Ministros Sálvio de Figueiredo,
relator originário, e Barros Monteiro. Em posteriores julgamentos, entretanto,
a respeito do tema, tal orientação da Quarta Turma passou a ser adotada à
unanimidade.
2. Não discrepou a egrégia Terceira Turma, que decidiu sobre a matéria no
REsp n. 116, aos 19.09.1989, relator o eminente Ministro Gueiros Leite, com a
ementa que segue:
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
92
Posse imobiliária. Constrição executória. Embargos de terceiro.
Pode manifestar embargos de terceiro o possuidor, qualquer que seja o
direito em virtude do qual tenha a posse do bem penhorado ou por outro modo
constrito.
O titular de promessa de compra e venda, irrevogável e quitada, estando na
posse do imóvel, pode-se opor à penhora desta mediante embargos de terceiro,
em execução intentada contra o promitente vendedor, ainda que a promessa não
esteja inscrita.
Recurso especial de que se conhece pelos dois fundamentos (CF, art. 105, III a e
c), mas a que se nega provimento. (DJ de 30.10.1989)
Com o Relator estiveram os eminentes Ministros Nilson Naves, Eduardo
Ribeiro e Waldemar Zveiter, vencido o eminente Ministro Cláudio Santos.
3. Temos, destarte, que a Segunda Seção do Superior Tribunal de
Justiça, onde julgada a matéria de diretiro privado, já fi rmou posição sobre a
controvertida questão, com o retorno ao posicionamento que foi do eminente
Ministro, e jurista insígne, Pedro Soares Muñoz, quando em voto-vencido no
Sumo Pretório assim se expressava:
Sr. Presidente, não há dúvida de que o voto do eminente Ministro Moreira
Alves é de evidente relevância.
Mas insisto, data venia, no meu ponto de vista, entendo que a posse do
promitente comprador não é em nome de outrem; é em nome próprio, desde que
o proprietário lha tenha transmitido em razão do contrato. A posse, nos termos do
art. 493, III, do Código Civil, se transmite por qualquer dos meios da aquisição em
geral. O promitente vendedor pode acrescer à obrigação de outorgar a escritura
defi nitiva a de imitir, desde logo, o promitente comprador na posse do imóvel.
Foi o que ocorreu na espécie sub-judice. Celebrado o contrato de promessa
de compra e venda através de escritura pública, o promitente comprador passou
a residir no apartamento, como se proprietário fosse. Não necessitava inscrever
no Registro de Imóveis a avença para obter a imissão na posse, porque já se acha
nela, há muitos anos.
De outro lado, a situação de visibilidade da propriedade resultante dessa posse
confere ao compromissário legitimidade ad causam para propor embargos de
terceiro possuidor (Agravo de Instrumento n. 28.756, RREE ns. 19.642, 62.198,
71.162). A pretensão a embargar, por parte do possuidor, salienta Pontes de
Miranda, dá a quem quer que tenha posse indireta ou direta, a legitimação ativa
(Comentários ao Código de Processo Civil de 1939, Tomo IX, p. 52).
Mantenho o voto, rejeitando os embargos. (in RTJ-89/292).
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 93
Aliás, do voto do eminente Ministro Nilson Naves no RE n. 226, vale a
referência que trascrevo:
Demais, como salientado alhures, a doutrina, é ampla, entende que se a
constrição judicial alcançou direitos, está, aí, justifi cado o emprego dos embargos
de terceiro. Em seu voto, no RE n. 76.769, de 1973, o saudoso Ministro Rodrigues
Alckmin lembrou lições de Lopes da Costa, Pontes de Miranda, José Frederico
Marques e Carneiro Lacerda. “São também direitos” — diz Pontes — “pretensões,
ações. Portanto, sempre que a constrição judicial apanhou direito (títulos de
crédito, direitos, pretensões, ações, art. 930, II, e V)...”.
Por fi m, lembro que esta Terceira Turma, no REsp n. 30, acatando o voto do
Sr. Ministro Eduardo Ribeiro, reputou dispensável o registro da promessa de
compra e venda, no caso de execução compulsória, decidindo, dessa forma, em
sentido outro ao estatuído nas Súmulas ns. 167 e 413-STF. Se não estou em erro,
um assunto arrasta o outro. Tanto é que as Súmulas ns. 413 e 621, entre outras
referências, têm por referência o art. 22 do Decreto-Lei n. 58/1937. Ora, se o
promitente comprador pode, sem o registro, exigir do promitente vendedor a
escritura, para tanto valendo a sentença de procedência da ação intentada, pode,
por igual, defender a sua posse, desde que justa, por intermédio dos embargos de
terceiro. Ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio.
4. Não será demasia aditar que a expressão fi nal do art. 135 do CC: “...
Mas os seus efeitos, bem como os da cessão, não operam, a respeito de terceiros
(art. 1.067), antes de transcrito no registro público”, não se reveste ao alcance
propugnado pelo recorrente.
Esta condição de efi cácia, a transcrição, refere-se àqueles terceiros que
invoquem direito incompatível com o direito adquirido por via do instrumento
particular. Assim, v.g., a promessa de venda não registrada não pode ser
exitosamente oposta a quem posteriormente venha a comprar do proprietário, e
a registrar, o mesmo imóvel objeto da promessa. O direito pessoal cederá, então,
ante o direito real sobre o imóvel.
Não há, entretanto, incompatibilidade entre um direito de crédito de A
contra B, e a justa posse, com embasamento em contrato aquisitivo, exercida por
C em imóvel pertencente a B. Os direitos pessoais, podem ambos substituir;
apenas não poderá o credor exercer sua pretensão executória (CPC, art. 591)
sobre aquele bem na posse plena de C, em virtude de direito igualmente pessoal,
e constituído em situação que não denota fraude a credores ou à execução.
5. O v. acórdão recorrido, de que foi relator o eminente Juiz de Alçada
Guimarães e Souza, excelentemente fundamentado, merece destarte
confi rmação.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
94
Nestes termos, mantido o posicionamento ja remansoso desta Turma
e da Segunda Seção, conheço do recurso pela letra c, mas ao mesmo nego
provimento.
É o voto.
RECURSO ESPECIAL N. 2.286-SP (90.1757-2)
Relator: Ministro Cláudio Santos
Recorrente: Banco do Brasil S/A
Recorrida: Diva Garcia Artacho Jurado
Advogados: Yocio Saito e outros e Hebrahim Hallak
EMENTA
Embargos de terceiro. Promessa de compra e venda não registrada.
Direito do promitente comprador, imitido na posse, à defesa
desta, através de embargos de terceiro.
Especial conhecido, mas improvido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer
do recurso mas negar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro
Relator, na forma do relatório e notas taquigráfi cas constantes dos autos, que
fi cam fazendo parte integrante do presente julgado.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 17 de abril de 1990 (data do julgamento).
Ministro Gueiros Leite, Presidente
Ministro Cláudio Santos, Relator
DJ 07.05.1990
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 95
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Cláudio Santos: Cuida-se de extraordinário com argüição
de relevância, recebido como especial, e admitido pela Presidência do egrégio
Primeiro Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo.
Alega o recorrente a negativa de vigência aos arts. 530, I, 531 e 533 do
Código Civil, 22 do Decreto-Lei n. 58/1937, com a redação dada pela Lei n.
6.014/1973 e 172 da Lei n. 6.015/1973, e aponta divergência com os julgados
publicados in RTJs 89/285, 95/282, 101/1.305, 104/239, 107/686 e 111/354 e
RT 600/256 e com a Súmula n. 621.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Cláudio Santos (Relator): O recurso tem por tema a
conhecida questão dos embargos de terceiro exercitados por promitente
comprador que instruiu a inicial com título particular não levado a registro.
Assevera o banco recorrente ser a posse em que se funda a recorrida de
natureza provisória, derivada de direito pessoal, não podendo surtir efeito
quanto a terceiros. Acrescenta que a falta de registro do compromisso da compra
e venda impossibilita a descontituição da penhora.
Os fundamentos do acórdão recorrido foram os seguintes:
II. Tem entendido este relator em inúmeros precedentes que a lei (art. 1.046, §
1º, do CPC) confere proteção à posse de bens constritos, mediante embargos de
terceiro.
Reconhece-se, também, com base na doutrina de Pontes de Miranda (Tratado
de Direito Privado, tomo X, p. 172, § 1.084) que o compromisso de compra e
venda de imóvel é meio adequado e efi ciente para transmissão da posse, com
animus domini.
Finalmente, admite-se que a penhora afeta a posse de imóvel, até porque
é indissociável da penhora a idéia de alienação do bem penhorado e sua
transmissão ao arrematante.
Nestas condições, não poderia o julgamento antecipado da lide obstar que
a embargante produzisse as provas requeridas no sentido de demonstrar essa
relevante matéria fática. (fl s. 187-188)
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
96
As premissas postas em destaque não desafi nam dos motivos que têm
feito este Tribunal Superior afastar a Súmula n. 621 do STF, no desate de tais
questões.
Efetivamente, no REsp n. 1.190-SP, Quarta Turma, relator o eminente
Ministro Fontes de Alencar (DJ de 18.12.1989), fi cou decidido: “... Firme é a
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de um abrandamento
da Súmula n. 621 do Supremo Tribunal Federal, a fi m de que o promitente
comprador possa opor embargos de terceiro, objetivando livrar da constrição
judicial o imóvel penhorado em execução contra o promitente vendedor, embora
não tenha a promessa sido registrada. Precedentes do Superior Tribunal de
Justiça (REsps ns. 188, 226, 696 e 698)”. Em outro julgamento, no REsp n.
1.310-SP, Relator o eminente Ministro Athos Carneiro (DJ de 18.12.1989),
foi pronunciado: “O registro imobiliário somente é imprescindível para a
oponibilidade face àqueles terceiros que pretendam sobre o imóvel direito
juridicamente incompatível com a pretensão aquisitiva do promitente comprador.
Não é o caso do credor do promitente vendedor. Orientação de ambas as Turmas
da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça”. Finalmente, em decisão
da Terceira Turma, REsp n. 866-RS, DJ de 30.10.1989, Relator o eminente
Ministro Eduardo Ribeiro, foi proclamado: “O promitente comprador, imitido
na posse, poderá defendê-la pela via dos embargos de terceiro.”
Diante de tais precedentes, outras considerações são dispensáveis, razão
por que conheço do recurso com base na letra c, mas para desprovê-lo.
É como voto.
RECURSO ESPECIAL N. 8.598-SP (9134010)
Relator: Ministro Dias Trindade
Recorrentes: Antônio Francisco Macena e outros
Recorrida: Jormag Empreendimentos Imobiliários Ltda
Interessada: Itatins Empreendimentos e Participações Ltda
Advogados: João Antonio Reina e Jamil Jorge
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 97
EMENTA
Processual. Embargos de terceiro. Promessa de venda quitada.
O promissário comprador de imóvel, com obrigação quitada,
tem ação de embargos de terceiro, para defesa da posse, que seu título
induz, de constrição judicial, ainda que não se encontre o mesmo
inscrito no registro imobiliário.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do
recurso especial e lhe dar provimento, na forma do relatório e notas taquigráfi cas
constantes dos autos, que fi cam fazendo parte integrante do presente julgado.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 08 de abril de 1991 (data do julgamento).
Ministro Nilson Naves, Presidente
Ministro Dias Trindade, Relator
DJ 06.05.1991
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Dias Trindade: Antônio Francisco Macena e outros interpõem
recurso especial, com fundamento no art. 105, III, a e c da Constituição Federal,
de acórdão proferido pela Sétima Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São
Paulo, que deu provimento a apelação interposta por Jormag — Empreendimentos
Imobiliários Ltda, em autos de embargos de terceiro opostos pelos recorrentes,
visando excluir a penhora que recaiu sobre imóveis dos quais são adquirentes,
em face de ação de rescisão de contrato cumulada com perdas e danos movida
pela recorrida contra Itatins Empreendimentos e Participações Ltda.
Sustenta o recorrente negativa de vigência ao art. 1.046 do Código de
Processo Civil, bemo como a inaplicabilidade in casu da Súmula n. 621 do
Supremo Tribunal Federal, por tratar-se de imóvel loteado. Sustenta ainda
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
98
dissídio jurisprudencial com julgados do Tribunal de Alçada Civil de São Paulo
e do Paraná.
Processado o recurso, vieram os autos a este Tribunal.
É como relato.
VOTO
O Sr. Ministro Dias Trindade (Relator): Nesta ação de embargos de
terceiros, propostos por promissários compradores de lotes-chácaras, com
contratos não inscritos no registro imobiliário, o acórdão reformou sentença
que dera pela procedência da ação, somente por aplicação da Súmula n. 621 do
Supremo Tribunal Federal.
É certo que a apelação devolvera ao órgão julgador de segundo grau apenas
as teses da existência de fraude de credores, na efetivação dos contratos de
promessa de compra e venda dos autores e aplicação da referida Súmula n. 621-
STF, matérias a que, também, se resume a contestação.
Sobre a possibilidade de exercer o promissário comprador, quitado de sua
obrigação e, pois, com caráter de irrevogabilidade da avença, estando na posse
do bem imóvel, por força desse contrato, a ação de embargos de terceiro, para
a garantia de sua posse, já se apresenta farta a jurisprudência das duas Turmas
deste Tribunal especializadas em direito privado.
Com efeito, a ação de embargos de terceiro pode ser aviada pelo só
possuidor, sem importar a existência ou não de título que não a posse, daí
apresentar-se uma demasia exigir-se para aquele com posse titulada, a inscrição
do título, para ser oposto contra todos, como condição para o exercíco da
proteção possessória, pela via dos embargos de terceiro.
Cito, sem necessidade de reproduzir os enunciados dos resumos os
acórdãos proferidos no REsp n. 188-PR — Relator Ministro Bueno de Souza;
REsp n. 226-SP — Relator Ministro Gueiros Leite; REsp n. 247-SP — Relator
Ministro Athos Carneiro; REsp n. 866-RS — Relator Ministro Eduardo Ribeiro;
REsp n. 481-SP — Relator Ministro Fontes de Alencar; REsp n. 556 — Relator
Ministro Waldemar Zveiter, que adotam orientação em sentido contrário ao que
induz a Súmula n. 621 do Supremo Tribunal Federal, a indicar que, em ambas
as Turmas se vai formando se não total, mas uma quase unanimidade, posto que
no mesmo sentido já decidiu o Sr. Ministro Sálvio Figueiredo, que fi cara vencido
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 99
em outras oportunidades, no REsp n. 633-SP, não apenas em mera adesão, mas
com substanciais argumentos para embasar o seu convencimento (cf. Revista do
Superior Tribunal de Justiça n. 6/395).
Assim, sobre o tema, tenho que o acórdão violou a regra do art. 1.046 e §
1º do Código de Processo Civil, além de entrar em divergência com os acórdãos
dos Tribunal de Justiça de São Paulo e Tribunal de Alçada do Paraná, trazidos
com a petição de recurso.
Como acentuei no início deste voto, o órgão julgador se ateve, dentre os
temas devolvidos com a apelação, em examinar a aplicação da Súmula n. 621,
para acolhê-la, de maneira prejudicial, de sorte que não exauriu a apelação, a
indicar que não pode esta Turma, sem suprimir uma instância, decidir a causa.
Isto posto, voto no sentido de conhecer do recurso, por ambos os
fundamentos, dando-lhe provimento, para cassar o acórdão, de modo que o
órgão julgador examine a apelação, afastado o óbice da Súmula n. 621-STF.
RECURSO ESPECIAL N. 9.448-SP (91.0005605-7)
Relator: Ministo Antônio de Pádua Ribeiro
Recorrente: Fazenda do Estado de São Paulo
Advogados: José Ramos Nogueira Neto e outros
Recorrida: Maria de Lourdes Barbarini
Advogado: Pedro Paulino Alves
EMENTA
Embargos de terceiro. Escritura pública de compra e venda não
registrada.
I - O comprador por escritura pública não registrada, devidamente
imitido na posse do imóvel, pode opor embargos de terceiro para
impedir penhora promovida por credor do vendedor. Precedentes do
STJ.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
100
II - Ofensa aos preceitos legais colacionados não caracterizada.
Dissídio pretoriano não confi gurado.
III - Recurso especial não conhecido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima
indicadas, decide a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, na
conformidade dos votos e das notas taquigráfi cas anexas, por unanimidade,
não conhecer do recurso. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Hélio
Mosimann, Peçanha Martins e Américo Luz. Ausente, ocasionalmente, o Sr.
Ministro José de Jesus.
Brasília (DF), 31 de março de 1993 (data do julgamento).
Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, Presidente e Relator
DJ 26.04.1993
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro: Trata-se de recurso especial,
interposto com fundamento nas letras a e c do permissivo constitucional, pela
Fazenda do Estado de São Paulo contra o acórdão que, em grau de apelação,
julgou procedentes embargos de terceiro opostos por Maria de Lourdes
Barbarini, e declarou insubsistente a penhora de parte ideal de imóvel por ela
adquirido por escritura pública de venda e compra; a escritura pública fora
lavrada anteriormente à penhora realizada na execução fi scal aforada contra
anterior proprietário, não estando, porém registrada quando se deu a constrição
judicial (fl s. 86-93).
Alega a recorrente ofensa aos arts. 530, inciso I, 531 e 533, do Código
Civil, 172 da Lei n. 6.015/1973 e 185 do CTN, além de dissídio jurisprudencial
sobre o tema controvertido.
Inadmitido (fl . 114), o recurso subiu a esta Corte em razão do provimento
do agravo em apenso.
É o relatório.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 11-102, fevereiro 2010 101
VOTO
O Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro (Relator): Ao inadmitir o
processamento do recurso especial, argumentou o ilustre 4º Vice-Presidente do
egrégrio Tribunal a quo (fl s. 112-113):
Primeiramente porque os arts. 530, I, 531 e 533, do Código Civil e 172 da
Lei n. 6.015/1973, não foram ventilados no acórdão hostilizado, inocorrendo
interposição de embargos declaratórios para suprir-se eventual omissão, razão
pela qual não houve o necessário e indispensável prequestionamento, incidindo
na espécie o teor das Súmulas ns. 282 e 356 do colendo Supremo Tribunal Federal
e que impede o acesso do recurso especial, pois, conforme orientação fi rmada
pelo Superior Tribunal de Justiça, ao apelo especial aplicam-se também as
Súmulas mencionadas.
Ademais, o acórdão recorrido decorreu da convicção inspirada à Turma
Julgadora pelas provas existentes no processo, especialmente a posse da
embargante sobre o bem penhorado, e as razões justifi cativas do recurso atêm-
se a uma perspectiva de reexame dessas provas. A esse objetivo, todavia, não
se presta o recurso especial, de acordo com a doutrina e com a Súmula n. 279
do Pretório Excelso, aplicável ao novo recurso, como vem decidindo o Superior
Tribunal de Justiça. Confi ra-se: “Não se admite reexame de provas no âmbito
do recurso especial” (AI n. 405-MA, Relator Ministro Waldemar Zveiter, DJU de
21.09.1989, p. 14.817).
Além disso, a interpretação dada ao tema em debate, segue orientação
jurisprudencial perfilhada por esta Corte de Justiça, pelo que, evidente sua
razoabilidade, incidindo na hipótese o enunciado da Súmula n. 400, que também
obsta ao acesso à via especial.
Relativamente ao dissídio jurisprudencial, constata-se que o apelante não fez,
como lhe competia, a demonstração analítica da divergência, pois os paradigmas
apresentados versam casos relacionados com compromisso de venda e compra,
que não se identifi cam com a espécie dos autos, que se refere a escritura pública
de compra e venda não registrada, mas lavrada muito tempo antes da inscrição
da dívida e do ajuizamento da execução fi scal, razão pela qual, não observado do
art. 255, parágrafo único, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça,
inadmissível o seguimento do recurso pelo permissivo da alínea c.
Correto o transcrito despacho. Mesmo se pudesse, no caso, admitir o
dissídio pretoriano (e o douto despacho supratranscrito já alertou: os paradigmas
colacionados referem-se a compromisso de compra e venda e o caso a escritura
pública de compra e venda não registrada), ainda assim não caberia conhecer-
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
102
se do recurso, porquanto os precedentes desta Corte fi rmaram-se no mesmo
sentido do acórdão recorrido:
Embargos de terceiro. Promessa de compra e venda não registrada.
O promitente comprador, imitido na posse, poderá defendê-la pela via dos
embargos de terceiro (REsp n. 866-RS (1989/0010378-4) — Relator Sr. Ministro
Eduardo Ribeiro — Julgado em 10.10.1989 — Publicado em 30.10.1989).
Embargos de terceiro possuidor, opostos por comprador ante penhora do
imóvel prometido comprar.
O comprador, devidamente imitido na posse do imóvel, pode opor embargos
de terceiro possuidor — CPC, art. 1.046, § 1º — para impedir penhora promovida
por credor do vendedor. A ação do comprador não é obstada pela circunstância
de não se encontrar o contrato registrado no ofício imobiliário. Inocorrência de
fraude.
O registro imobiliário somente é imprescindível para a oponibilidade
face aqueles terceiros que pretendam sobre o imóvel direito juridicamente
incompatível com a pretensão aquisitiva do comprador. Não é o caso do credor
do comprador.
Orientação de ambas as Turmas da Segunda Seção do Superior Tribunal de
Justiça.
Recurso especial conhecido pela letra c (Súmula n. 621), mas não provido
(REsp n. 6.128-PR (90.0011679-1) — Relator Sr. Ministro Athos Carneiro — Julgado
em 05.03.1991 — Publicado em 1º.04.1991).
Acrescento que, no recurso supracitado de que foi Relator, o ilustre
Ministro Athos Carneiro cita, ainda, os seguintes precedentes: REsps ns. 188-
PR, 212-SP, 226-SP, 713-SP, 1.310-SP, 2.238-PR e 4.618-SP.
Isto posto, em conclusão, não conheço do recurso.
Súmula n. 85
SÚMULA N. 85
Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública fi gure
como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a
prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do qüinqüênio anterior à
propositura da ação.
Referência:
Decreto n. 20.910/1932, art. 3º.
Precedentes:
REsp 2.140-SP (1ª T, 07.05.1990 — DJ 28.05.1990)
REsp 6.408-SP (1ª T, 27.11.1991 — DJ 16.12.1991)
REsp 10.110-SP (2ª T, 10.02.1993 — DJ 22.03.1993)
REsp 11.873-SP (2ª T, 07.10.1991 — DJ 28.10.1991)
REsp 12.217-SP (1ª T, 29.06.1992 — DJ 24.08.1992)
REsp 29.448-SP (6ª T, 24.11.1992 — DJ 10.05.1993)
REsp 31.661-SP (5ª T, 17.02.1993 — DJ 15.03.1993)
Corte Especial, em 18.06.1993
DJ 02.07.1993, p. 13.283
RECURSO ESPECIAL N. 2.140-SP (90.0001161-2)
Relator: Ministro Garcia Vieira
Recorrente: Fazenda do Estado de São Paulo
Recorrido: José de Paulo Spallini
Advogados: Adriana Motta
Maria Elena Miranda e outros
EMENTA
Administrativo. Funcionário. Revisão de proventos. Prescrição.
Cálculo de gratifi cação.
O litígio não envolve a própria gratifi cação, sim a aplicação
de critério para fixação do quantum devido. O venerando aresto
hostilizado, afastando a prescrição e determinando ao julgador de
primeiro grau o exame de mérito, não merece censura. Não houve a
prescrição do fundo do direito.
Recurso conhecido unanimemente e negado provimento por
maioria.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide
a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer
do recurso e por maioria, negar-lhe provimento, na forma do relatório e notas
taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 07 de maio de 1990 (data do julgamento).
Ministro Armando Rollemberg, Presidente
Ministro Garcia Vieira, Relator
DJ 28.05.1990
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
108
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Garcia Vieira: A Fazenda do Estado de São Paulo, interpõe
Recurso Especial, fundado na Constituição, art. 105, III, a e c combinado com
o ADCT, art. 29, § 1º, argüindo relevância da questão federal, arrazoando que
José Paulo Spallini ajuizou ação, “visando ao recebimento de seus proventos de
acordo com o enquadramento na Tabela I da Escala de Vencimentos 5; que em
1ª instância foi acolhida preliminar de prescrição e o processo julgado extinto,
porém o segundo grau rejeitou-a.
O acórdão atacado está às fl s. 137-140, é da Quinta Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, dando provimento parcial para
cassar o decreto de prescrição e devolver a lide para exame e decisão do mérito.
O processo não recebeu contra-razões, fl . 194 v.
A douta Subprocuradoria Geral da República oferece parecer de fl s. 197-
202, concluindo pela incidência da prescrição no próprio fundo de direito
pretendido e, logo, pelo provimento do recurso.
Na ação o Autor informa que se aposentou no cargo de Técnico de
Educação, hoje Supervisor de Ensino, e que seus proventos estavam abaixo do
padrão de seus colegas aposentados há menos tempo.
A decisão de primeiro grau (fl s. 103-108) acolheu o tema de que foi a
Lei Complementar n. 108/1978 que criou e instituiu as tabelas e que a Lei
Complementar n. 247/1981 a repetiu e, em conseqüência, o enquadramento
ocorreu em 1978, concluindo pela prescrição.
Nos fundamentos do acórdão, consta:
A presente ação foi intentada em 12 de janeiro de 1987, portanto, antes do
decurso do prazo de cinco anos, a contar da data da defi nição administrativa
impugnada, razão pela qual não se justifi ca o reconhecimento da prescrição...
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Garcia Vieira (Relator): Sr. Presidente, o Recurso Especial
foi interposto no dia 08 de março de 1989, antes da instalação desta egrégia
Corte, ocorrida no dia 07.04.1989 e com argüição de relevância. Ora, até esta
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 103-132, fevereiro 2010 109
data o colendo Supremo Tribunal Federal exerceu “as atribuições e competências
defi nidas na ordem constitucional precedente” (art. 27, § 1º do ADCT). O
Recurso a ser interposto, para nossa Corte Maior era o Recurso Extraordinário
e não o Especial e neste não existe a argüição de relevância. Embora continue
imperando entre nós o princípio da fungibilidade, no caso, por tratar de erro
grosseiro, ele é inaplicável, não podendo ser aproveitado o Especial como
Extraordinário, mesmo porque foi ele fundamentado no art. 105, item III, letras
a e c, da vigente Constituição Federal e não na anterior.
Ainda que não tivesse ocorrido o erro grosseiro e pudesse ser aproveitado
o recurso, não seria caso de provimento. Como a presente ação não se enquadra
em nenhum dos incisos I a X do art. 325 do Regimento do Pretório Excelso,
e a argüição de relevância não existe no Recurso Especial, houve preclusão da
matéria infraconstitucional.
O autor, pela primeira vez, em requerimento administrativo de 21 de
janeiro de 1987 (doc. de fl s. 16-17) pediu sua inclusão na tabela I da Lei
Complementar n. 247/1981 (art. 2º) e seu pedido foi indeferido no dia
15.10.1987 (doc. de fl s. 18-22). Como a presente ação foi ajuizada no dia 08 de
janeiro de 1988, não transcorreu o lapso prescricional de 5 (cinco) anos previsto
pelo art. 1º do Decreto n. 20.910/1932. Antes disso não foi o autor intimado
de nenhuma decisão administrativa negando o direito pleiteado por ele em seu
requerimento administrativo e nesta ação.
Na realidade se insurge o autor contra a forma de cálculo de seus
vencimentos que, segundo ele, deve ser de acordo com a tabela I da escala de
vencimentos 5 e não II da referida Lei Complementar n. 247/1981, como vem
sendo feito pela Administração Estadual e pede o pagamento das diferenças
vencidas e vincendas.
A questão é bem conhecida desta egrégia Seção e do colendo Supremo
Tribunal Federal que, na decisão plenária no RE n. 110.419, sessão de
08.03.1989, fi rmou o entendimento de que, quando se trata de redução do
cálculo da gratifi cação, a prescrição não atinge o fundo do direito e só alcança
as parcelas vencidas antes do qüinqüênio anterior à propositura da ação. Por
ocasião deste julgamento, o eminente Ministro Relator, Moreira Alves, em seu
voto apreciou, detidamente a jurisprudência de nossa Corte Maior, sobre a
hipótese. Deu ele o exato sentido da Súmula n. 443 da excelsa Corte. Para ele,
o que a referida súmula afi rma é que: “a prescrição das prestações anteriores ao
período previsto em lei ocorre, quando tiver sido negado, antes daquele prazo, o
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
110
próprio direito reclamado, ou a situação jurídica de que ele resulta”. Ora, no caso
em exame, não houve qualquer requerimento administrativo e a administração
não negou a pretensão dos autores. Mas, para o eminente Ministro Moreira
Alves a Súmula n. 443 é incorreta e não está de acordo com os acórdãos em
que se apóia. Segundo ele, “... dos seis acórdãos em que se apóia a súmula em
causa, cinco deles dizem respeito à prescrição na Justiça do Trabalho e um à
prescrição contra a Fazenda Pública. Deles todos, os dois últimos se referem
inequivocamente à hipóteses de prescrição do denominado fundo do direito: o RE
n. 46.814, em que, para se saber se o salário deveria ser acrescido pelo pagamento
dos dias de repouso, ter-se-ia de verifi car se o empregado seria mensalista (caso
em que não faria jus ao acréscimo) como sustentava o empregador, ou não,
como pretendia o empregado e lhe proporcionaria o aumento salarial; e os
ERE n. 5.813, em que os embargantes se insurgiam contra a transferência ex
offi cio para outra carreira. Já os quatro primeiros são concernentes à prescrição
apenas das prestações vencidas, e não do fundo do direito. O primeiro deles
— os ERE n. 20.508 — versava sobre empregado que exerceu interinamente
uma outra função e nada reclamou contra o salário que lhe foi pago durante
ano e meio; voltou, então, à sua função primitiva e só veio a reclamar sobre
o quantum recebido durante a interinidade depois de decorridos dois anos; a
minoria entendeu que o direito de pleitear a diferença salarial estava prescrito;
já a maioria sustentou a tese de que “no caso de remuneração de serviço a
prescrição ocorre à proporção que as prestações foram incorrendo no respectivo
prazo”. O segundo — os ERE n. 56.342 — dizia respeito à reclamação sobre
duas gratifi cações: uma de meio de ano (que havia sido suprimida em 1951,
vários anos antes da propositura da ação) e outra natalina (que, em 1951, teve
seu percentual diminuído para 1/2 do salário ao passo que até então era de 2/3
e, só em 1957, extinta); a Justiça do Trabalho deu pela prescrição da própria
pretensão ao restabelecimento da primeira gratifi cação (por já estar extinta havia
mais de dois anos antes da reclamação) e pela prescrição apenas das prestações
vencidas antes dos dois anos anteriores à propositura da reclamação, no tocante
à natalina (que, evidentemente, quanto à sua extinção estava dentro do prazo
dos dois anos), estabelecendo que os empregados fariam jus a ela por ter sido
ilegalmente extinta, e o percentual a ser pago seria o de 2/3 do salário e não o de
1/2, tudo isso com base no fundamento da habitualidade; esta Corte, manteve a
prescrição à própria pretensão do estabelecimento da primeira gratifi cação, sob
o argumento de que “negado o próprio direito, há mais de dois anos, a prescrição
não se limita a prestações anteriores”; e quanto à natalina não foi ela chamada
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 103-132, fevereiro 2010 111
a manifestar-se sobre a prescrição, mas quanto à habitualidade para o efeito do
restabelecimento da gratifi cação, decidiu que a Justiça do Trabalho havia julgado
acertadamente. O terceiro aresto — RE n. 36.735 — dizia respeito a benefício
coletivo, e a prescrição se limitou às prestações vencidas, sob este fundamento:
“Não dou pela prescrição, eis que não se trata de alteração contratual e sim
de benefício coletivo, caso em que a prescrição abrange apenas as prestações
anteriores a dois anos, quando do ajuizamento da reclamação”. Finalmente, o
quarto acórdão — RE n. 37.743 — decidiu a questão concernente à diferença
de salário com base em aumento concedido em dissídio coletivo, e se manifestou
no sentido de que, vigente o dissídio coletivo, a prescrição relativa à diferença
salarial alcançava apenas as prestações vencidas.
Portanto, embora nenhum desses seis acórdãos tenha tratado de hipótese
rigorosamente análoga à sob julgamento, o que é certo é que eles, quando se
tratou de pedido de pagamento de diferença de salário (e, nesse caso, o mérito
do pedido é sempre saber se o requerente tem ou não, direito a essa diferença,
em virtude de desvio temporário de funções, de benefício coletivo ou de dissídio
coletivo), sempre decidiram por se tratar de quantum devido, no sentido da
prescrição apenas das parcelas vencidas. Só se deu pela prescrição do fundo de
direito, no tocante à extinção do direito à gratifi cação mesma. Ou à questão de
saber qual a exata situação jurídica do empregado (se mensalista, ou não), ou à
controvérsia sobre a legalidade de transferência ex offi cio de carreira.
Assim sendo, o enunciado da súmula já por si só não trata da questão em
causa — como se demonstrou no início — nem qualquer dos acórdãos que
lhe serviram de base decidiu em sentido contrário ao aresto ora recorrido, é
manifesto que não há divergência com a Súmula n. 443.
Para ele o que dizem estes acórdãos é que “negado o próprio direito, a
prescrição não se limita à prestações anteriores, mas alcança a própria pretensão
àquele”. Na espécie não se pretende a própria gratifi cação e sim a aplicação de
critério correto para a fi xação do quantum devido aos autores. Direito de ter
referida gratifi cação não é a mesma coisa que direito a um determinado critério
para o cálculo do quantum. Esta distinção é muito bem feita pelo eminente
Ministro Moreira Alves em seu citado voto. Esclareceu ele que os acórdãos nos
quais se apóia a Súmula n. 443, distinguem “o direito de ter uma vantagem do
direito ao critério para o estabelecimento do quantum dessa vantagem, para
considerar que, no último caso, só ocorre a prescrição das prestações vencidas”.
Acentua ele que, nestes acórdãos, “quando se tratou de pedido de pagamento
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
112
de diferença de salário (e, nesse caso, o mérito do pedido é sempre saber se o
requerente tem, ou não direito a essa diferença em virtude de desvio temporário
de funções, de benefício coletivo ou de dissídio coletivo), sempre decidiram,
por se tratar de quantum devido, no sentido da prescrição apenas das parcelas
vencidas. Só se deu pela prescrição do fundo de direito, no tocante à extinção do
direito à gratifi cação mesma, ou à questão de saber qual a exata situação jurídica
do empregado. Se mensalista, ou não, ou à controvérsia sobre a legalidade de
transferência ex offi cio de carreira”. Citou ele o precedente no RE n. 93.875
sobre a prescrição referente à pretensão sobre critério de cálculo do quantum de
gratifi cação incontroversa da Segunda Turma, com a seguinte ementa:
Prescrição qüinqüenal. Controvérsia sobre qual de duas leis (se a anterior ou se
a posterior) é que se aplica para o cálculo de uma das vantagens incorporadas a
proventos.
Inexistência, no caso, de negativa de vigência do art. 1º do Decreto n.
20.910/1932, uma vez que, em última análise o acórdão recorrido entendeu que,
no caso, o direito à vantagem, que decorre de relação jurídica incontroversa e
sobre o qual não houve decisão administrativa contrária a requerimento dos
interessados, renasce mensalmente, razão por que a prescrição diz respeito,
apenas, às parcelas mensais. Interpretação que, no mínimo, é razoável (Súmula n.
400).
Recurso extraordinário não conhecido (RTJ 101/816).
Após citar e examinar vários outros precedentes da Excelsa Corte, concluiu
que:
Fundo do direito é expressão utilizada para significar o direito de ser
funcionário (situação jurídica fundamental) ou os direitos a modifi cações que se
admitem com relação a essa situação jurídica fundamental, como reclassifi cações,
reenquadramentos, direito a adicionais por tempo de serviço, direito a gratifi cação
por prestação de serviços de natureza especial, etc.). A pretensão do fundo do
direito prescreve, em direito administrativo, em cinco anos a partir da data da
violação dele, pelo seu não reconhecimento inequívoco. Já o direito a perceber
as vantagens pecuniárias de correntes dessa situação jurídica fundamental ou de
suas modifi cações ulteriores é mera conseqüência daquele, e sua pretensão, que
diz respeito a quantum, renasce cada vez em que este é devido (dia a dia, mês a
mês, ano a ano, conforme a periodicidade em que é devido seu pagamento), e,
por isso, se restringe às prestações vencidas há mais de cinco anos, nos termos
exatos do art. 3º do Decreto n. 20.910/1932 que reza:
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 103-132, fevereiro 2010 113
Art. 3º: Quando o pagamento se dividir por dias, meses ou anos, a
prescrição atingirá progressivamente as prestações, à medida que
completarem os prazos estabelecidos pelo presente decreto.
Se - como está expresso nesse dispositivo legal - a pretensão à prestação
legalmente devida (que é simplesmente um quantum) renasce, para efeito de
prescrição, periodicamente por ocasião do momento em que deve ser feito seu
pagamento tudo o que a esse quantum, que é a prestação, está indissoluvelmente
ligado (assim, portanto, inclusive o critério de sua fi xação, decorra ele de ato
normativo inconstitucional ou ilegal, ou de má interpretação da Administração
Pública) só rege pelo mesmo princípio. Se o Estado paga, reconhece, portanto,
a existência incontroversa do fundo do direito, mas paga menos do que é
constitucional ou legalmente devido, o direito ao pagamento certo renasce
periodicamente.
Note-se, por fi m, que esse renascimento periódico só deixa de ocorrer — e
isso foi construção jurisprudencial, para impedir que ele se desse apesar de
indeferimentos sucessivos da Administração Pública a reclamação expressa do
funcionário — se o servidor público requer ao Estado a correção da prestação que
lhe está sendo indevidamente paga, e seu requerimento é indeferido. A partir de
então, tem o servidor de ajuizar a ação para obter o resultado querido, sob pena
de prescrever defi nitivamente essa pretensão.
Dessa orientação não se afasta o decidido no RE n. 112.649 (e o mesmo ocorre
com as decisões idênticas aí citadas), ao contrário do que sustenta o eminente
Relator, no voto proferido no presente recurso extraordinário.
Este entendimento foi reiterado na recente decisão proferida no dia 17
de março de 1989, no RE n. 114.597-8, Relator eminente Ministro Octavio
Gallotti, publicado no DJ de 14.04.1989, que trata de ação proposta por ofi ciais
da Polícia Militar do Estado de São Paulo, visando retifi cação de cálculo da
gratifi cação de nível universitário e tem a seguinte ementa:
Prescrição de vantagem funcional.
Dissídio superado, ante o decidido pelo Tribunal Pleno, no RE n. 110.419
(sessão de 08.03.1989), onde fi cou assentado que quando o ato administrativo
impugnado apenas reduz o cálculo da gratifi cação (sem aboli-la) não concerne,
então, ao fundo do direito, mas à sua conseqüência. Por isso, a prescrição só
atinge as parcelas.
Recurso de que não se conhece, de acordo com a Súmula n. 356.
Na realidade o venerando aresto hostilizado, ao afastar a prescrição
e determinar ao julgador de primeiro grau o exame de mérito, não merece
qualquer censura porque, de fato, não houve a prescrição do fundo do direito.
Conheço do recurso apenas pela divergência e lhe nego provimento.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
114
VOTO VENCIDO
O Sr. Ministro Armando Rollemberg (Presidente): Data venia do
eminente Ministro-Relator, considero que argüição de relevância feita em
recurso extraordinário ou especial, quando já em vigor a Constituição de 1988,
porém antes da instalação deste Tribunal, não caracteriza erro grosseiro capaz de
afastar o conhecimento do recurso.
Por isso, conheço do recurso e, com a vênia do Sr. Ministro-Relator, dou-
lhe provimento, por entender que, no caso, ocorreu a prescrição.
VOTO
O Sr. Ministro Pedro Acioli: Senhor Presidente, acho que, nesta primeira
parte do conhecimento, estou de pleno acordo com o eminente Ministro
Armando Rollemberg, pois também considero erro grosseiro. O Sr. Ministro-
Relator entendeu que houve esse erro, porque foi admitido recurso especial
e não extraordinário, já na vigência da nova Constituição. A fi nalidade desta
Corte é apreciar o recurso, sempre que possível, a não ser que seja um erro
grosseiro.
Também conheço do recurso e nego-lhe provimento, de acordo com o Sr.
Ministro-Relator.
É como voto.
RECURSO ESPECIAL N. 6.408-SP (90122651)
Relator: Ministro Pedro Acioli
Recorrentes: Oswaldo Magalhães e outros
Recorrida: Fazenda do Estado de São Paulo
Advogados: Zélia F. de Souza de Figueiredo Lyra e outros e Suzana M.
Pimenta C. Preta Federighi e outro
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 103-132, fevereiro 2010 115
EMENTA
Administrativo. Benefícios funcionais. Prescrição.
I - Em se tratando de vantagens funcionais, de cunho pecuniário,
a lesão do direito renova-se mês a mês. A prescrição não alcança o
fundo de direito, mas tão-somente as parcelas contidas no qüinqüênio.
Precedentes.
II - Provimento do recurso.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide
a egrégia Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar
provimento ao recurso, na forma do relatório e notas taquigráfi cas constantes
destes autos e que fi cam fazendo parte integrante do presente julgado.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 27 de novembro de 1991 (data do julgamento).
Ministro Pedro Acioli, Presidente e Relator
DJ 16.12.1991
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Pedro Acioli: Oswaldo Magalhães e outro interpuseram
o presente recurso especial com esteio no art. 105, III, alíneas a e c, da Carta
Política, em razão de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo,
que entendeu estar prescrito o fundo de direito em feito onde se discute
vantagens funcionais, oriundas de relação trabalhista entre o recorrente e o
Estado de São Paulo.
Alega o recorrente que o v. acórdão vulnerou o art. 3º do Decreto n.
20.910/1932, o art. 39, §§ 1º e 2º da Constituição Federal, bem como a Súmula
n. 443 do STF.
Colaciona acórdãos do egrégio Supremo Tribunal Federal, para demonstrar
a divergência jurisprudencial.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
116
Nesta instância a douta Subprocuradoria da República, em extenso parecer,
defende a prescrição adotada pelo acórdão vergastado, fundando sua tese no art.
1º do Decreto n. 20.910/1932, e opina, ao fi nal, pelo improvimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Pedro Acioli (Relator): A divergência jurisprudencial
está bem demonstrada, merecendo que se conheça do recurso pela alínea c do
dispositivo constitucional autorizador do recurso.
Na realidade, este Tribunal e particularmente esta turma, vem
reiteradamente decidindo de forma contrária ao que decidiu o acórdão recorrido.
De outra parte, ao enfrentar a questão posta o v. acórdão fundou-se tão-
somente no art. 1º do Decreto n. 20.910/1932, que assim dispõe:
Art. 1º — As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem
assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Federal, Estadual ou
Municipal, seja qual for a natureza, prescrevem em cinco anos contados da data
do ato ou fato do qual se originarem.
Todavia, logo em seguida vem o art. 3º do mesmo diploma legal que assim
dispõe:
Art. 3º — Quando o pagamento se dividir por dias, meses ou anos, a prescrição
atingirá progressivamente as prestações, à medida que completarem os prazos
estabelecidos pelo presente decreto.
Ora, a boa técnica de interpretação aconselha ao intérprete não fazer uso
de dispositivo isolado porquanto a fi nalidade da lei pode estar diluída entre
os seus diversos dispositivos. Assim, cumpre aceitar o argumento exposto nas
razões do recurso de que restou violado o art. 3º do Decreto n. 20.910/1932.
Faço uso, ainda, dos dizeres do Sr. Ministro Rodrigues Alckmin, quando
afi rma:
É certo que a relação funcional não prescreve porque o que prescreve
são pretensões, fundadas ou infundadas. Assim se a lei outorga determinada
vantagem pecuniária a uma classe funcional, quem se encontra em tal classe
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 103-132, fevereiro 2010 117
terá direito à vantagem pecuniária. Se a Administração não efetua o pagamento
devido, prescrevem as parcelas (Decreto n. 20.910/1932, art. 3º). A pretensão
deduzida, aí, é a de perceber a vantagem — não a de ser considerado integrante
de determinada classe ou categoria funcional. (fl . 189)
Nesta linha de raciocínio, o que é alcançado pela prescrição são as parcelas,
permanecendo o fundo de direito intacto e renovado a cada mês, vista tratar-se
de prestações periódicas e sucessivas. Esta a inteligência do art. 3º do Decreto n.
20.910/1932.
Diante do exposto, dou provimento ao recurso para, afastada a prescrição,
seja apreciado o mérito da questão como o Tribunal a quo entender de direito.
É como voto.
RECURSO ESPECIAL N. 10.110-SP
Relator: Ministro Peçanha Martins
Recorrentes: Ondina Camponez Nogueira e outros
Recorrida: Fazenda do Estado de São Paulo
Advogados: Antônio Roberto Sandoval Filho e Adriana Motta
EMENTA
Administrativo. Vantagem funcional. Adicionais de sexta parte.
Prescrição do fundo de direito. Dissídio jurisprudencial comprovado.
Súmulas ns. 443-STF e 163-TFR.
Em se tratando de relação continuada e inexistindo recusa
formal da Administração ao reconhecimento do direito pleiteado, a
prescrição não atinge o fundo de direito, alcançando, tão só, as parcelas
vencidas, anteriores ao qüinqüênio da propositura da ação.
Recurso provido.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
118
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, dar provimento ao recurso. Votaram
com o Relator os Ministros Américo Luz, Pádua Ribeiro, José de Jesus e Hélio
Mosimann.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 10 de fevereiro de 1993 (data do julgamento).
Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, Presidente
Ministro Peçanha Martins, Relator
DJ 22.03.1993
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Peçanha Martins: Ondina Camponez Nogueira e outros
manifestaram recurso especial com apoio no art. 105, III, c da Constituição
Federal, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que,
unanimemente, negou provimento à apelação interposta nos autos da ação
ordinária proposta contra a Fazenda Estadual, reconhecendo a prescrição do
fundo de direito e não apenas as prestações que do direito defendido poderiam
ocorrer.
Alegam divergência jurisprudencial com as Súmulas ns. 443 do STF e
163 do TFR. Invoca, ainda, julgados deste STJ que diz divergirem do acórdão
recorrido.
Contra-razões às fl s. 503-508.
Admitido na origem, por despacho de fl s. 510-511.
Em parecer de fls. 518-520, a Subprocuradoria-Geral da República,
através de manifestação da Dra. Odília Ferreira da Luz Oliveira, opinou pelo
conhecimento parcial e pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 103-132, fevereiro 2010 119
VOTO
O Sr. Ministro Peçanha Martins (Relator): O acórdão recorrido reconheceu
a prescrição do direito, enquanto o recorrente esposa a tese de que a prescrição
alcança “apenas as parcelas qüinqüenais, pois trata-se de prestação de trato
sucessivo, o fato da inexistência de ato formal da recorrida, negando o direito
pleiteado”.
Conheço do recurso. Discordo do parecer de douta Subprocuradoria-
Geral da República que reconheceu a prescrição decretada pelo v. acórdão ora
recorrido, por isso mesmo que divergente do entendimento deste STJ e do STF,
inclusive da Súmula n. 443 do Pretório Excelso.
Quando do julgamento do REsp n. 8.057-0-SP (DJ de 05.10.1992), assim
manifestei meu entendimento sobre a matéria:
A relação jurídica travada entre as partes é do trato sucessivo e inexistiu recusa
formal da Administração ao reconhecimento do direito dos Recorridos, razão por
que a prescrição somente poderia atingir as prestações, como já assentou o STF
no RE n. 110.637-9, sendo Relator o eminente Ministro Néri da Silveira.
Neste STJ, inúmeros os julgados em inteira consonância com a jurisprudência
do STF, valendo transcrita a seguinte ementa:
Administrativo. Vantagem funcional. Recálculo de vencimentos
adicionais. Sexta-parte. Prescrição do fundo de direito. Inocorrência.
I - se inexistir ato administrativo indeferindo, expressamente, a pretensão
ou o direito reclamado, não se há falar em prescrição do fundo de direito
mas, tão-só, das parcelas vencidas, anteriores aos cinco anos da propositura
da ação. Precedentes.
II - Recurso desprovido (REsp n. 992-SP, Relator, o saudoso Ministro
Geraldo Sobral, in DJ de 1º.07.1991, p. 9.161).
No mesmo sentido, os julgadores nos REsps ns. 5.559, Relator Ministro Américo
Luz; 6.408, Relator Ministro Pedro Acioli; 16.802, Relator Ministro Garcia Vieira,
todos em conformidade com a Súmula n. 443 do STF.
Por tais razões, conheço do recurso e lhe dou provimento, para afastar a
prescrição do fundo de direito.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
120
RECURSO ESPECIAL N. 11.873-SP (91.00119415)
Relator: Ministro Antônio de Pádua Ribeiro
Recorrente: Fazenda do Estado de São Paulo
Recorridos: Leonor Frungillo e outro
Advogados: Ana Shirley Macedo Falcão (Recorrente), e Maria Elena
Miranda Vedovato e outros (Recorridos)
EMENTA
Administrativo. Funcionário. Adicionais de magistério.
Prescrição da ação. Inocorrência.
Processual Civil. Duplo grau de jurisdição. Supressão. Ofensa ao
art. 475 do CPC. Caracterização.
I - No caso, não se acha caracterizada a prescrição do fundo do
direito. Inocorrência de ofensa ao art. 1º do Decreto n. 20.910, de
1932.
II - Afastada a prescrição declarada pelo Juízo de primeiro grau,
não pode o Tribunal, entendendo não prescrita a ação, adentrar no
exame dos demais aspectos da causa não apreciados e decididos por
aquele Juízo. Se assim fez, excedeu os limites da devolução, negando
vigência ao art. 475 do CPC.
III - Recurso especial parcialmente provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima
indicadas, decide a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, por
unanimidade, dar parcial provimento ao recurso, na forma do relatório e notas
taquigráfi cas anexas, que fi cam fazendo parte integrante do presente julgado.
Custas, como de lei,
Brasília (DF), 07 de outubro de 1991 (data de julgamento).
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 103-132, fevereiro 2010 121
Ministro Américo Luz, Presidente
Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, Relator
DJ 28.10.1991
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro: Leonor Frungillo e Aurora
Frungillo Guerra propuseram ação sumaríssima contra a Fazenda do Estado de
São Paulo, em que pediram fosse a ré condenada a retifi car o seu enquadramento
no regime da Lei Complementar n. 444, de 1985, de modo que os pontos obtidos
antes do advento da Lei Complementar n. 180, de 1978, fossem consignados
nos seus prontuários a título de adicionais de magistério e, ainda, a pagar-lhes as
diferenças de vencimentos, vencidas e vincendas, com os acréscimos legais.
A sentença julgou a ação prescrita (fl s. 122-124) e o acórdão da Segunda
Câmara de Férias da Primeira Seção Civil do Tribunal de Justiça deu provimento
à apelação para julgar a ação procedente, considerando prescritas apenas as
parcelas pleiteadas anteriores ao qüinqüênio (fl . 148):
A ação, portanto, é julgada procedente, devendo a Fazenda proceder ao
reequadramento das autoras, como pedido na inicial, pagando os atrasados,
observada a prescrição qüinqüenal das parcelas, com correção desde o
ajuizamento e juros de mora a contar da citação, devendo as autoras ser
reembolsadas das custas, corrigidas de cada desembolso, computando-se sobre o
total apurado em liquidação a verba honorária que fi ca arbitrada em 10%.
Daí o presente recurso especial, pelas letras a e c, manifestado pela Fazenda
do Estado de São Paulo, sob a alegação de que o acórdão impugnado, ao afastar
a prescrição, contrariou o art. 1º do Decreto n. 20.910, de 1932, e deu-lhe
interpretação divergente da que lhe tem atribuído o Supremo Tribunal Federal;
e, ao julgar procedente a ação, decidindo o seu mérito, negou vigência aos arts.
475 e 515 do CPC, suprimindo um grau de jurisdição.
Contra-arrazoado (fl s. 173-178), o recurso foi admitido (fl . 180), subindo
os autos a esta Corte, onde me vieram distribuídos.
É o relatório.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
122
VOTO
O Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro (Relator): Quanto à prescrição
da ação, bem decidiu o aresto impugnado, ao afastá-la. No sentido de que a
prescrição, no caso, é apenas das parcelas vencidas, anteriores ao qüinqüênio
contado da propositura da ação, não atingindo o próprio fundo do direito, o
acórdão da Primeira Turma, proferido no Recurso Especial n. 2.140-SP, Relator
Ministro Garcia Vieira, assim ementado:
Administrativo. Funcionário. Revisão de proventos. Prescrição. Cálculo de
gratifi cação.
O litígio não envolve a própria gratificação, sim a aplicação de critério
para fi xação do quantum devido. O venerando aresto hostilizado, afastando a
prescrição e determinando ao julgador de primeiro grau o exame de mérito, não
merece censura. Não houve a prescrição do fundo do direito.
Recurso conhecido unanimemente e negado provimento por maioria.
Todavia, o aresto recorrido, ao afastar a prescrição e desde logo julgar
procedente a ação, suprimiu o duplo grau de jurisdição, violando os arts. 475
e 515 do CPC. A propósito, o decidido por esta Turma no REsp n. 292-SP,
Relator Ministro Carlos M. Velloso, onde se lê na ementa do respectivo acórdão
o seguinte tópico:
Se o Juízo a quo deu pela ocorrência da prescrição, não pode o Tribunal ad
quem, entendendo não prescrita a ação, apreciar os restantes aspectos da causa
não apreciados e decididos pelo Juízo de 1º grau, pois estaria a suprimir o exame
obrigatório deste último, assim excedendo os limites da devolução.
Isto posto, conheço do recurso e dou-lhe provimento, em parte, a fi m de
que os autos voltem ao Juízo de 1º grau, para o exame das questões de mérito
propriamente dito.
RECURSO ESPECIAL N. 12.217-SP (91.00131879-2)
Relator: Ministro Humberto Gomes de Barros
Recorrente: Fazenda do Estado de São Paulo
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 103-132, fevereiro 2010 123
Recorridos: Elenir Vasconcelos e outros
Advogados: Luiza Yukiko Kinoshita e outros e Antônio Roberto Sandoval
Filho
EMENTA
Prescrição. Obrigação de trato sucessivo e continuado. Decreto n.
20.910/1932. Fundo do direito. Ausência de denegação.
A prescrição, a teor do Decreto n. 20.910/1932 (art. 3º), incide
apenas sobre o direito de ação relativo às prestações de trato sucessivo
não reclamadas no qüinqüênio que antecedeu a propositura da ação.
Afastada a prescrição, se o processo carece, ainda, de instrução,
os autos devem retornar ao juízo de primeiro grau, para que examine
a pretensão.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao recurso. Votaram
com o Relator os Srs. Ministros Milton Pereira, Cesar Rocha e Garcia Vieira.
Ausente, justifi cadamente o Sr. Ministro Demócrito Reinaldo.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 29 de junho de 1992 (data do julgamento).
Ministro Garcia Vieira, Presidente
Ministro Humberto Gomes de Barros, Relator
DJ 24.08.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros: O Tribunal de Justiça de
São Paulo decidiu apelação interposta pelos ora decorridos, em acórdão assim
expresso:
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
124
Os autores pleiteiam o recálculo de seus vencimentos, mediante restituição
dos denominados pontos da evolução funcional, com a conseqüente revisão do
enquadramento de cada um e do pagamento das diferenças salariais.
A matéria é regida pelo princípio da prescrição qüinqüenal das parcelas
vencidas, nos termos do entendimento jurisprudencial compendiado na Súmula
n. 443 do Pretório Excelso, segundo a melhor interpretação do Decreto Federal n.
20.010, de 06 de janeiro de 1932.
Não se cuida, propriamente, de extinção de benefício funcional, nem se
cogita de hipótese em que a pretensão houvesse passado pelo crivo, de anterior
apreciação administrativa, mediante resolução formal e explícita, de sorte que é
incabível a invocação da regra da actio nata, que pressupõe a violação do direito.
O fundo do direito agora reclamado não chegou a ser examinado na esfera
administrativa, de modo que, na pendência da relação funcional, o que prescreve,
no capítulo da remuneração dos servidores, é o direito às parcelas vencidas mês a
mês, respeitado o qüinqüênio, mediante contagem retrospectiva desde a data do
ajuizamento da causa.
Se assim não fosse, estar-se-ia afrontando o disposto no art. 3º do Decreto
Federal, n. 20.910/1932, com violação do preceito constitucional que assegura
a tutela do direito adquirido, existente ao tempo do ajuizamento da causa,
atualmente previsto no art. 5º, inciso XXXVI, da Constituição da República.
A propósito, cabe lembrar que a orientação fi rmada pela colenda Primeira
Turma Especial deste egrégio Tribunal, no julgamento do Incidente de
Uniformização de Jurisprudência, na Apelação Cível n. 39.416-1-SP, é no sentido
de que a prescrição não fl ui da data da vigência da lei, mas do vencimento de
cada parcela mensal (RJTJESP 104/387).
A tese jurisprudencial a que se apega a sentença veio a ser superada, no seio
do colendo Supremo Tribunal Federal (RE n. 114.597-8-SP, 17.03.1989, Primeira
Turma, Relator o eminente Ministro Octavio Gallotti) e repudiada pelo colendo
Superior Tribunal de Justiça (RE n. 26-SP, Relator o ilustre Ministro Garcia Vieira, in
DJ de 23.10.1989, p. 16.191).
Além disso, no caso concreto, milita circunstância de relevo, no que se refere
ao posterior reconhecimento administrativo, em caráter normativo, do direito
pleiteado pelos servidores, pelo Despacho Normativo do Sr. Governador do
Estado, datado de 25 de abril de 1984, expressamente invocado na inicial.
Ora, a ação foi proposta em 21 de dezembro de 1987. Logo, não há falar em
prescrição do direito respectivo, senão em relação às prestações pecuniárias
mensalmente vencidas.
De resto, os inúmeros precedentes jurisprudenciais deste egrégio Tribunal,
invocados pelos autores, fortalecem esse convencimento, nada justifi cando a
restrição suscitada a esse título pela Fazenda do Estado.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 103-132, fevereiro 2010 125
Por conseguinte, é de rigor o afastamento do decreto extintivo do processo.
Todavia, o acolhimento da pretensão recursal não é integral, porquanto os
apelantes pleiteiam, desde logo, a decretação da procedência da demanda, o que
não é cabível, no presente estágio processual, sob pena de supressão de um grau
na jurisdição.
Em conseqüência, devem os autos voltar ao r. Juízo de primeira instância, para
apreciação da questão de mérito propriamente dito (fl s. 504-506).
O Estado de São Paulo opôs recurso especial contra este acórdão.
Invocou os permissivos constitucionais das letras a e c. Alegou violação ao
art. 1º do Decreto n. 20.910/1932 e dissídio pretoriano.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros (Relator): A controvérsia
relaciona-se com a incidência da prescrição. Indaga-se:
este fenômeno, extintivo da ação, atingiu o direito de pedir reenquadramento?
ou terá incidido apenas sobre as prestações vencidas há mais de cinco anos?
A resposta encontra-se no art. 3º do Decreto n. 20.910, assim expresso:
Quando o pagamento se dividir por dias, meses ou anos, a prescrição
atingirá progressivamente as prestações, à medida que completarem os prazos
estabelecidos pelo presente decreto.
O Tribunal Federal de Recursos e o Supremo Tribunal Federal reduziram,
nas Súmulas ns. 163 e 443, respectivamente, a correta interpretação deste
dispositivo:
Súmula n. 163 — Nas relações jurídicas de trato sucessivo, em que a Fazenda
Pública fi gure como devedora, somente prescrevem as prestações vencidas antes
do qüinqüênio anterior à propositura da ação.
Súmula n. 443 — A prescrição das prestações anteriores ao período previsto
em lei não ocorre quando não tiver sido negado, antes daquele prazo, o próprio
direito reclamado ou a situação jurídica de que ele resulta.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça também já se assentou
neste sentido.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
126
No REsp n. 13.441 a Primeira Turma decidiu:
A prescrição, a teor do art. 3º do Decreto n. 20.910/1932, incide apenas sobre
o direito de ação relativo às prestações de trato sucessivo não reivindicadas no
qüinqüênio que antecedeu o pedido.
A Segunda Turma também homenageou o art. 3º do Decreto n. 20.910,
proclamando:
Não há falar em prescrição do fundo do direito, se não foi indeferida,
expressamente, pela Administração, a pretensão, ou o direito reclamado. Neste
caso, prescrevem as prestações anteriores ao qüinqüênio que preceda a citação
para a ação. (REsp n. 215)
O acórdão recorrido, inclusive no que se refere à determinação para que os
autos retornem ao Juízo de primeiro grau para complementação do julgamento,
confere com a jurisprudência assentada nesta Corte.
Nego provimento ao recurso especial.
Peço vênia para, nos termos do art. 126 do nosso Regimento Interno,
propor a remessa destes autos à Primeira Seção, para que se assente em súmula
esta orientação.
RECURSO ESPECIAL N. 29.448-SP (92.0029612-2)
Relator: Ministro Vicente Cernicchiaro
Recorrente: Fazenda do Estado de São Paulo
Recorridos: Plínio de Albuquerque Furtado e outros
Advogados: Antônia Marilda Ribeiro Alborgueti e outro e Antônio
Roberto Sandoval Filho
EMENTA
REsp. Embargos de divergência. Direito Administrativo. Prescrição.
Obrigação de trato sucessivo. O direito se constitui, conserva-se,
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 103-132, fevereiro 2010 127
modifi ca-se ou se extingue com base em acontecimento histórico,
denominado suposto fático. Em se tratando de vencimento de
funcionário, porque se repete mês a mês, sempre que não for efetuado,
ou pago a menor, começa novo prazo, evidentemente, relativo ao
respecitivo mês. O direito incorporara-se ao patrimônio. A inação
alcança somente os efeitos desse direito, vale dizer, as parcelas mensais.
Pouco importa que administrativamente haja negativa da pretensão.
O direito decorre da lei. Ato administrativo, porque hierarquicamente
inferior, não pode contrastá-la. A coercibilidade mantém-se íntegra
quanto ao qüinqüênio anterior ao início da ação.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráfi cas constantes dos autos, por unanimidade, não conhecer do recurso
especial, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Votaram os Srs. Ministros
Pedro Acioli e Adhemar Maciel. Ausente, por motivo justifi cado, o Sr. Ministro
José Cândido.
Brasília (DF), 24 de novembro de 1992 (data do julgamento).
Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, Presidente e Relator
DJ 10.05.1993
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro: Recurso especial interposto pelo
Estado de São Paulo nos autos dos Embargos Infrigentes em que contende
com Plínio de Albuquerque Furtado e outros, objetivando a reforma do v.
acórdão da Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo,
afastando a prescrição da ação visando à incidência de adicionais por tempo de
serviço de forma recíproca e enquadramento nos arts. 3º e 4º das Disposições
Transitórias da LC n. 180/1978, objetivando, também, percepção de atrasados,
sob o entendimento de que apenas as parcelas anteriores ao qüinqüênio são
atingidas.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
128
O Recorrente argúi:
De fato, com a edição da LC n. 180/1978, que introduziu modifi cações na
sistemática de cálculo dos adicionais e da sexta-parte, é que teria ocorrido a
violação do direito material perseguido pelos recorridos, ou seja, a partir da
primeira prestação periódica, sem a inclusão do benefício pleiteado, houve
negativa implícita, por parte da Administração Pública e, a partir dessa data,
nasceu o direito à propositura da ação.
No entanto, os recorridos se quedaram inertes apenas deduzindo pretensão
ao direito perseguido após o decurso do prazo previsto no art. 1º do Decreto n.
20.910/1932 e, portanto, o direito de ação está irremediavelmente prescrito (fl .
365).
Sustenta, outrossim, ocorrência de divergência jurisprudencial, trazendo à
colação decisões desta Corte e do Supremo Tribunal Federal.
Contra-razões às fl s. 379-403.
Admissão do recurso especial às fl s. 405-406.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro (Relator): A matéria deste recurso foi
enfrentada, anteriormente, neste Tribunal, mais de uma vez.
No REsp n. 1.430-SP, por maioria, vencido o ilustre Ministro Ilmar
Galvão, como Relator e integrante da egrégia Segunda Turma, deduzi:
Sr. Presidente, a matéria fática é a seguinte: a Constituição Paulista estabeleceu:
O adicional por tempo de serviço, sempre concedido por qüinqüênios,
bem como a sexta-parte dos vencimentos integrais, concedidos após vinte e
cinco anos de efetivo exercício, incorporar-se-ão aos vencimentos para todos
os efeitos.
A Lei Complementar n. 180/1978, todavia, disciplinou diferentemente o cálculo
desses adicionais, impedindo “incidir um adicional sobre o outro sucessivamente”.
O recurso apóia-se nas alíneas a e c do art. 105 da Constituição da República.
O primeiro aspecto refere-se ao disposto no art. 1º do Decreto n. 20.910/1932,
verbis:
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 103-132, fevereiro 2010 129
As dívidas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e
qualquer direito ou ação contra a Fazenda Federal, Estadual ou Municipal,
prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou do fato do qual se
originarem.
A divergência jurisprudencial está ilustrada com o RE n. 99.336-3-SP:
Ementa: Prescrição. Decreto n. 20.910/1932, art. 2º. Gratificação pro
labore. Extinção da ação para obter o benefício. Precedentes. Prescrição
referente ao próprio direito ou vantagem reclamado, a cuja postulação
se deixou fi car inerte e interessado, no decurso de prazo extintivo, e não
prescrição referente às prestações de trato sucessivo decorrentes de um direito
reconhecido ou de uma situação permanente. Espécies distintas. Recurso
extraordinário conhecido e provido (fl s.151-152).
Entendo, a prescrição afeta diretamente o direito de ação. Indiretamente
repercute no direito material. Considero a coercibilidade elemento essencial
da norma jurídica, isto é, a possibilidade, mediante a prestação jurisdicional,
o devedor, coativamente, ser compelido a cumpri-la ou o Estado atuar
substitutivamente. Não é o momento próprio, todavia, observe-se, a perda do
fundo de direito é condicional visto a prescrição depender de alegação. De outro
lado, apesar da fl uência do prazo, se a obrigação for voluntariamente honrada,
não caberá o direito de repetir.
Há a perda do direito substancial quando a prescrição atinge o direito público
subjetivo de pedir a intervenção do Estado, tendo-se a lide como objeto.
Há a perda ao direito das prestações quando o direito material permanece
intacto. Afetada será apenas a percepção dos efeitos que têm como causa aquele
direito.
Assim, o funcionário deixa de postular a defi nição de um direito seu, no prazo
consignado no Decreto n. 20.910/1932. Esse direito restou desprotegido do
direito de ação. Perdeu a coercibilidade. Todavia, persistindo o direito que gera
prestações periódicas e sucessivas, remanesce também o direito de ação. Embora
ultrapassado o lustro, as posteriores aos cinco anos poderão ser reclamadas.
No caso dos autos, Lei Complementar contrariou a Constituição de São Paulo.
Esse pormenor não foi reaviventado neste Recurso Especial. Restrito, insisto, à
ocorrência da prescrição.
Na chamada hierarquia das leis, a Constituição ocupa posição de proeminência
relativamente à Lei Complementar. Esta, como se sabe, não afeta a primeira.
Disciplina situação jurídica nos limites consentidos pela Carta Política. No dizer
do Kelsen, em sua Teoria Pura do Direito, entre tais normas forma-se relação de
subordinação. A inferior tem fundamento na superior.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
130
Dessa forma, a modifi cação introduzida pela Lei Complementar é carente de
efi cácia. Não produziu efeito algum.
Em outras palavras, apesar do tempo transcorrido, o direito material
permaneceu intacto. A omissão dos respectivos titulares não o afetou. O direito
substantivo enseja o direito de ação, entretanto, enquanto não se operar a
prescrição, não é necessário ser exercido.
O direito reclamado pelos Recorridos permaneceu, embora, formalmente,
parecesse extinto.
Enfim, os Recorridos perderam somente o direito de exigir as prestações
mensais, alcançadas pela inação correspondente há mais de cinco anos anteriores
à propositura da ação.
Reeditando tais considerações, não conheço do recurso.
RECURSO ESPECIAL N. 31.661-SP
Relator: Ministro Costa Lima
Recorrente: Municipalidade de São Paulo
Advogados: Valdeci dos Santos e outros
Recorridos: Alberto Lian e outros
Advogada: Célia Mollica Villar
EMENTA
Administrativo. Funcionário. Vantagens. Prescrição.
Tratando-se de vantagem devida a fucionário público, referente
a pagamento efetuado parceladamente, a prescrição não atinge o
próprio fundo do direito.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 103-132, fevereiro 2010 131
taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, em não conhecer do recurso. Votaram
com o Relator os Srs. Ministros Assis Toledo, Edson Vidigal, Flaquer Scartezzini
e José Dantas.
Brasília (DF), 17 de fevereiro de 1993 (data do julgamento).
Ministro Flaquer Scartezzini, Presidente
Ministro Costa Lima, Relator
DJ 15.03.1993
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Costa Lima: A Municipalidade de São Paulo interpõe
recurso especial com fulcro nas alíneas a e c do permissivo constitucional, em
razão de não se conformar com o v. aresto de fl s. 927-927 v., que não reconheceu
a prescrição do próprio fundo de direito, mas apenas de parcelas referentes a
gratifi cações devidas a ocupantes de cargos de nível universitário e ligados às
atividades médicas, previstas nas Leis Municipais ns. 9.708/1984, 9.740/1989 e
9.904/1985.
Diz a recorrente que assim decidindo contrariou o art. 178, § 10, do
Código Civil e o art. 1º do Decreto n. 20.910/1932, pertinentes à prescrição e
divergiu de julgado do colendo Supremo Tribunal Federal (fl s. 930-937).
Os recorridos contra-arrazoaram (fl s. 939-945), e o especial foi admitido
(fl s. 947-948).
Relatei.
VOTO
O Sr. Ministro Costa Lima (Relator): Acolheria a prescrição, caso os
autores pedissem enquadramento ou reclassifi cação; ou extinção de alguma
gratifi cação. O que eles pretendem é o recebimento de gratifi cações previstas em
leis municipais e que não foram pagas.
Ao caso dos autos tem pertinência o julgado do colendo Supremo Tribunal
Federal, RE n. 80.913-RS (RTJ vol. 84, pp. 193-197).
Disse, com grande autoridade, o Ministro Rodrigues Alckmin:
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
132
É certo que a relação funcional não prescreve mesmo porque o que prescreve
são pretensões, fundadas ou infundadas. Assim, se a lei outorga determinada
vantagem pecuniária a uma classe funcional, quem se encontre em tal classe
terá direito à vantagem pecuniária. Se a Administração não efetua o pagamento
devido, prescrevem as parcelas (Decreto n. 20.910, art. 3º). A pretensão deduzida,
aí, é a de perceber a vantagem — não, a de ser considerado integrante de
determinada classe ou categoria funcional.
Mas se a lei concede reestruturação, ou reenquadramento e a Administração
não dá nova situação funcional ao servidor (situação cujos ganhos seriam
melhores), a pretensão a ser deduzida é a de obter esse re enquadramento. Essa
pretensão prescreve.
O termo inicial da prescrição corresponde ao da actio nata. Se a Administração
deve praticar, de ofício, ato e reenquadramento, e o pratica, excluindo o
interessado, desse ato nasce a ofensa a direito e a conseqüente pretensão a
obter judicialmente a satisfação dele. Se a Administração, que deve agir de
ofício, se omite e não há prazo para que pratique o ato, pelo que a omissão não
corresponde à recusa, ainda não corre a prescrição (RTJ, vol. 84, p. 194).
E o não menos acatado Ministro Cunha Peixoto afi rmou que o tema é
dominado pelo interesse público:
A relação entre o funcionário e o Estado, como é pacífi co na doutrina e na
jurisprudência, é estatutária; e isto leva a admitir, em tese, a imprescritibilidade
de seu direito, já que este direito está preso a modificações necessárias ao
interesse do Estado. O que comanda é o interesse público, se este leva a conceder
determinada situação ao funcionário, este direito não precisa ser pleiteado, nem
mesmo invocado. A Administração deve enquadrá-lo na nova situação.
Daí não se pode dizer que o direito do funcionário à nova condição atribuída
por lei prescreve, se a Administração não o coloca nesta posição e ele não reclama
dentro de cinco anos (ob. cit. p. 196).
Ora, no caso dos autos, cumpria à Administração agir de ofício
compatibilizando a situação de cada funcionário de acordo com a lei posta em
vigor, se fi cou inerte, isso não corresponde a uma negativa.
Desse modo, inexistente a violação de Lei Federal aventada, deixo de
conhecer do recurso.
Súmula n. 86
SÚMULA N. 86
Cabe recurso especial contra acórdão proferido no julgamento de agravo
de instrumento.
Referência:
CF/1988, art. 105, III.
Precedentes:
EREsp 11.919-AM (CE, 25.03.1993 — DJ 26.04.1993)
EREsp 12.270-SP (CE, 25.03.1993 — DJ 24.05.1993)
EREsp 16.118-SP (CE, 24.09.1992 — DJ 09.11.1992)
EREsp 19.481-SP (CE, 24.09.1992 — DJ 16.11.1992)
Corte Especial, em 18.06.1993
DJ 02.07.1993, 13.283
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL N. 11.919-AM
(92.0008023-5)
Relator: Ministro José Dantas
Embargante: Ministério Público Federal
Embargado: Rádio TV do Amazonas S/A
Advogados: Daniel Isidoro de Mello e outro
EMENTA
Constitucional e Processual. Decisão interlocutória. Recurso
especial.
Cabimento. Na linha da tradicional construção jurisprudencial
do Supremo Tribunal Federal, tocante ao cabimento de recurso
extraordinário contra decisão interlocutória, quando defi nitivamente
encerrada a questão federal nas instâncias locais, igual assertiva
recomenda-se no concernente ao recurso especial.
Divergência que se pacifi ca, em sede de embargos, pela prevalência
do acórdão paradigma.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Corte
Especial do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráfi cas a seguir, por maioria, receber os embargos. Votaram vencidos os
Srs. Ministros Pedro Acioli e Demócrito Reinaldo. Os Srs. Ministros William
Patterson, José Cândido, Américo Luz, Pádua Ribeiro, Flaquer Scartezzini, Nilson
Naves, Eduardo Ribeiro, Dias Trindade, José de Jesus, Fontes de Alencar, Cláudio
Santos, Sálvio de Figueiredo e Barros Monteiro votaram com o Sr. Ministro-
Relator. Os Srs. Ministros Bueno de Souza, Costa Lima, Costa Leite, Edson Vidigal
e Peçanha Martins não participaram do julgamento (art. 162, § 2º, do RISTJ).
Os Srs. Ministros Pedro Acioli, Assis Toledo e Hélio Mosimann não compareceram
à sessão por motivo justifi cado. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Antônio
Torreão Braz.
Brasília (DF), 25 de março de 1993 (data do julgamento).
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
138
Ministro Torreão Braz, Presidente
Ministro José Dantas, Relator
DJ 26.04.1993
RELATÓRIO
O Sr. Ministro José Dantas: Apreciando agravo de instrumento
interposto pelo Ministério Público a fi m de obter reabertura do prazo de
vista no processo de mandado de segurança julgado em primeiro grau, negou-
lhe provimento a Quarta Turma do egrégio Tribunal Regional Federal da 1ª
Região, ao entendimento de que, na forma do art. 10 da Lei n. 1.533/1951, o
discutido prazo tem início com abertura de vista dos autos para opinar, desde ali
improrrogável (fl . 60).
Do recurso especial que se seguiu, sob invocação do art. 105, III, a, da CF,
relatado pelo Sr. Ministro Demócrito Reinaldo, e com adesão dos Srs. Ministros
Pedro Acioli e Garcia Vieira, não conheceu a egrégia Primeira Turma deste
Tribunal, por maioria de votos, vencido o Sr. Ministro Gomes de Barros; isso, a
fundamento de que, verbis:
Ementa
Constitucional e Processual. Recurso especial contra acórdão proferido em
agravo de instrumento interposto desafiando despacho intercalado do juiz
monocrático. Impossibilidade. Não conhecimento.
Recurso especial, como vem defi nido na Constituição Federal (art. 105, III), é
instrumento hábil a desafi ar os julgados provenientes de causas decididas, em
única ou última instância, pelos tribunais.
As causas decididas (pelos tribunais), segundo preconiza a Constituição, não
têm a compreensão dilargante, a ponto de abranger, na sua confi guração, para
justifi car o recurso especial, meros decisórios decorrentes de julgamentos de
agravos instrumentados interpostos contra despachos de juiz de primeiro grau,
que são apenas impulsionadores do processo.
O cabimento de recurso especial em agravo de instrumento exige, pelo menos,
que este tenha vinculação com uma decisão terminativa do processo, com ou
sem julgamento do mérito.
Recurso não conhecido, com voto-vencido (fl . 90).
Insistente, o Ministério Público manifestou, então, os presentes embargos
de divergência, forte na indicação e defesa do ponto de vista contrário,
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 139
consubstanciado em acórdão da egrégia Terceira Turma, Relator o Sr. Ministro
Cláudio Santos, de fundamentos assim ementados:
Causa decidida em última instância. Intimação. Omissão do nome do
advogado. Nulidade. Recurso provido.
Compreende-se por causa decidida em última instância não apenas a questão
do mérito, mas qualquer uma ainda que incidental.
A omissão do nome do advogado na intimação para indicar peças que devem
compor o instrumento de agravo, acarreta nulidade.
Recurso provido. (fl . 100)
Admiti os embargos a fl . 108, os quais, devidamente processados, não
foram, porém, impugnados — fl . 115 v.
Relatei.
VOTO
O Sr. Ministro José Dantas (Relator): Sr. Presidente, a divergência
suscitada nos presentes embargos oferece-se palmar, conforme se sabe que, no
tema conceitual das decisões interlocutórias, põem-se num plano de absoluta
similaridade as matérias cotejadas — a reabertura de prazo de vista ao
Ministério Público, caso dos autos, e a renovação da intimação para formação
de instrumento, por omissão do nome do advogado na respectiva publicação,
acórdão paradigma.
E a conhecê-los, os embargos não parecem oferecer maior difi culdade
quanto à pacifi cação da divergência a que se prestam.
Na verdade, se bem que ainda carente de maturidade, o novo recurso especial
tem lastro de experiência nas antiqüíssimas práticas do recurso extraordinário,
seu irmão colaço. Daí que as arestas formais de maior repetência encontram-
se aplainadas do modo como, no curso de um longo tempo, foram aos poucos
estabelecidas as defi nições temáticas, mormente em matéria de cabimento do
derradeiro e excepcional apelo interpretativo da Lei Federal.
Então, no que interessa ao caso dos autos, cabe acentuar que, desde os
primeiros tempos, o alcance da expressão causas decididas em última ou derradeira
instância fi ndou esclarecido pelo sentido fi nalístico da norma constitucional
instituidora do recurso extraordinário; isto é, por uma abrangência maior do
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
140
que a concepção formalística da técnica processual, signifi cativa do litígio
meritoriamente considerado.
Da evolução dessa temática jurisprudencial, conclusiva de uma mais ampla
compreensão terminológica, fez excelente apanhado o Professor Roberto Rosas,
intitulado “O Conceito de causa para a Competência do STF”, à cuja publicação
vale remeter o pesquisador — RT 532/289.
Donde a intermitência de julgados conceituadores do termo “causa”,
proferidos a propósito do recurso extraordinário cabível contra decisão
interlocutória, sem exigência de maior adequação ao permissivo constitucional
do que a irrecorribilidade do julgamento nas instâncias inferiores, segundo a
expressão do saudoso Ministro Victor Nunes, ao votar no RE n. 57.682-GB, in
RTJ 34/161. Consulte-se, a exemplo, o seguinte rol de ementas:
Recurso extraordinário. Cabimento contra decisão interlocutória ou proferida
em agravo, desde que defi nitiva (RE n. 53.124-PR, Relator Ministro Evandro Lins e
Silva, RTJ v. 31, p. 323, 1965).
Cabe recurso contra decisão proferida em agravo ou contra decisão
interlocutória, desde que defi nitiva (AI n. 24.434-GO, Relator Ministro Victor Nunes
Leal, RTJ 17, p. 114, 1961).
O recurso extraordinário é admissível de decisão de caráter interlocutório,
quando ela configura uma questão federal, encerrada definitivamente nas
instâncias locais (RE n. 57.728-SP, Relator Ministro Hermes Lima, RTJ 41, p. 153,
1967) fl s. 98-99.
Complete-se essa colação, tomada de empréstimo do sobrestado recurso
extraordinário do Ministério Público embargante, com um precedente, de
data bem mais recente, pertinente à legitimidade passiva do Banco Central em
determinada ação de anulação e substituição de ORTN, matéria de deslinde
evidentemente interlocutório, e por isso ocorrido em sede de agravo de
instrumento que o Tribunal Regional Federal da 2ª Região havia desprovido —
RE n. 114.210-RJ, in RTJ 128/383.
Igual exemplifi cação de matéria agravável poderia forrar-se em acórdão
antigo, relativo à exceção de competência do foro do desquite — RE n. 58.699,
Relator Ministro Hermes Lima, in RTJ 35/706.
Finalmente, en passant, lembrem-se tantos ou quantos verbetes da Súmula
do Supremo Tribunal Federal, constituídos à base do reexame de decisões
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 141
interlocutórias, consoante a natureza eminentemente incidental dos temas
averbados; vejam-se:
Súmula n. 231 — produção de provas pelo revel comparecente;
Súmula n. 240 — depósito preparatório do recurso em ação de acidente do
trabalho;
Súmula n. 310 — contagem do prazo recursal, no caso de intimação na sexta-
feira;
Súmula n. 425 — tempestividade do agravo tardiamente despachado;
Súmula n. 619 — prisão do depositário judicial, independentemente de ação
de depósito.
Em suma, Sr. Presidente, sem desmerecer a pródiga ilustração do voto
condutor do v. acórdão embargado, fi co em que maior acerto há em admitir-se
cabível o recurso especial contra decisões interlocutórias, do modo como o v.
acórdão paradigma fi liou-se à tradicional jurisprudência-suprema, tocante ao
similar cabimento do recurso extraordinário.
Daí que, fi liando-me também a tão antiga construção exegética, aplico-a ao
caso sub judice; pelo que devolvo os autos à Turma de origem, para que, afastada
a prejudicial de que se trata, julgue o recurso especial como achar de direito.
Para tanto é que recebo os embargos, nos limites da divergência que lhes
deu causa.
É como voto.
VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro William Patterson: Sr. Presidente, tenho processo idêntico
ao que acaba de julgar o Ministro José Dantas. Já o examinei e pedi dia para
julgamento.
Estou concluindo na mesma linha do entendimento de S. Exa. Devo
realçar que o Ministério Público — como acabou de acentuar o Sr. Ministro
José Dantas — enumera uma série de decisões do Supremo Tribunal Federal
a respeito do assunto, em relação a recurso extraordinário, que, a meu juízo,
aplica-se no caso do recurso especial.
Acompanho o Sr. Ministro-Relator.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
142
VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Pedro Acioli: O recurso especial de que tratam os presentes
embargos de divergência teve o julgamento na Primeira Turma resumido na
seguinte ementa — fl . 90:
Constitucional e Processual. Recurso especial contra acórdão proferido em
agravo de instrumento interposto desafiando despacho intercalado do juiz
monocrático. Impossibilidade. Não conhecimento.
Recurso especial, como vem defi nido na Constituição Federal (art. 105, III), é
instrumento hábil a desafi ar os julgados provenientes de causas decididas, em
única ou última instância, pelos tribunais.
As causas decididas (pelos tribunais), segundo preconiza a Constituição, não
têm a compreensão dilargante, a ponto de abranger, na sua confi guração, para
justifi car o recurso especial, meros decisórios interpostos contra despachos do
juiz de primeiro grau, que são apenas impulsionadores do processo.
O cabimento de recurso especial em agravo de instrumento exige, pelo menos,
que este tenha vinculação com uma decisão terminativa do processo, com ou
sem julgamento do mérito.
Recurso não conhecido, com voto-vencido (fl . 90).
Quando integrante daquela Turma eu proferi voto-vista nesse mesmo
sentido onde destaquei:
O agravo de instrumento não é causa, mas tão-somente um incidente
processual, que a lei adjetiva coloca à disposição das partes para assegurar o
reexame de determinados atos desenvolvidos dentro do feito e que não puseram
fi m ao processo.
Resulta então que a ter-se a decisão posta em agravo de instrumento com
todos os pressupostos exigidos pela norma maior estar-se-ia, via oblíqua, criando
nova legislação processual, o que ao Judiciário é defeso.
Hoje, depois de ouvir o voto do Relator, Ministro José Dantas, e muita
refl exão sobre o tema em termos comparativos dos preceitos da Constituição
anterior e da atual, não me convenci de que devo me reconsiderar.
A atual Constituição — art. 105, inciso III — coloca como competência
do Superior Tribunal de Justiça julgar, em recurso especial, as causas decididas
em única ou última instância.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 143
O verbete “causas” utilizado pelo constituinte, sem dúvida se refere à ação
no seu todo e não das decisões incidentais ou prejudiciais proferidas pelos juízes
monocráticos.
Segundo De Plácido e Silva, causa:
Na técnica processual, causa se confunde com a demanda. Empregam-se
como vocábulos equivalentes.
E esta acepção vem, de que a causa é o fundamento legal do direito que se
quer fazer valer perante a autoridade judiciária. Causa, a razão, extensivamente
passou a designar o processo judicial que, por ela, a causa, a razão, o motivo é
intentado, sendo, pois, equivalente a litígio.
Neste sentido também se consagrou.
“Causas decididas” quer dizer, “processo fi ndo”, prestação jurisdicional
encerrada.
As questões incidentes resolvidas nas causas pelos juízes de primeira
instância, delas cabe apenas os recursos para o Tribunal ad quem e não para o
Superior Tribunal de Justiça, em razão do Texto Constitucional não aludir à
incidentes ou decisões interlocutórias.
Analiso restritivamente o Texto Constitucional, pois, o agravo de
instrumento não é a causa em si mesma, traz apenas uma questão resolvida na
causa.
Faço os meus elogios ao constituinte, que pretendeu evitar as delongas
judiciais, a eternização dos recursos, a mandar para o Superior Tribunal de
Justiça somente as causas já decididas em única ou última instância e não os
incidentes nela resolvidos pelos juízes monocráticos, que serão decididas no
Superior Tribunal de Justiça com a chegada da causa no seu todo.
É sabido e consabido que o agravo de instrumento não é interposto da
decisão fi nal da causa, mas das questões incidentais resolvidas ou decididas pelo
juízo singular, que não guarda a conceituação de “decisão de única e nem de
última instância”.
Tenho certeza que o constituinte pretendeu minimizar, reduzir e acelerar
o andamento das causas ajuizadas no Poder Judiciário, que ao usar a expressão
“causas decididas em única ou última instância”, procurou evitar a proliferação
de recursos retardatórios das questões resolvidas na causa pelo juiz singular.
Assim, rendo os meus respeitos ao Relator para dele divergir e acompanhar
o voto predominante do Ministro Demócrito Reinaldo.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
144
Rejeito os embargos.
É como voto.
VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Américo Luz: Creio que a matéria objeto dos presentes
embargos já se encontra decidida pela Corte quando do julgamento dos
Embargos de Divergência no REsp n. 16.118-0-SP, Relator o eminente
Ministro William Patterson, acórdão publicado no DJ de 09.11.1992.
Eis o voto de S. Exa. na parte que destaquei, verbis:
Razão assiste ao embargante. Na verdade, a competência conferida a este
Superior Tribunal de Justiça pela Constituição Federal (art. 105, III), para julgar, em
recurso especial, as causas decididas em única ou última instância, pelos Tribunais
Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados e do Distrito Federal, não se
restringe aos feitos que envolvam decisão de mérito. A expressão ‘causas’, ali
inserta engloba todas as questões julgadas pelos citados Órgãos, nas condições
estipuladas, mesmo que elas digam respeito a incidentes, como ocorre na espécie.
O voto-vencido, do Ministro Gomes de Barros, analisa o problema sob a ótica
correta, a meu juízo, valendo, pois, pô-lo em destaque:
O termo “causa” é empregado na acepção de questão que envolve até
o próprio processo. E tanto isto é verdade que, no art. 109 ao se referir aos
juízes federais, a Constituição diz que lhes “compete processar e julgar as
causas em que a União, Entidades,..., mais adiante: ‘as causas em que o
Estado estrangeiro’, às causas fundadas em tratado”.
Em várias oportunidades a Constituição faz referência à causa. Ora,
evidentemente, no art. 109, não se quer dizer que a Justiça Federal deve
conhecer somente do mérito, ou somente das decisões terminativas do
processo. Por outro lado, quando se julga qualquer incidente está-se
julgando a causa; uma parcela da causa, é verdade, mas se está julgando a
causa, muitas vezes, sob uma faceta extremamente importante é o valor da
pretensão jurídica envolvida na causa.
No dizer de Moacyr Amaral Santos, “causa é qualquer questão sujeita a
decisão judicial, tanto em processos de jurisdição contenciosa, como em
processos de jurisdição voluntária” (‘Primeiras Linhas’, vol. 3º, p. 161, 11ª ed.).
Aliás, a Terceira Turma do STJ, no julgamento do Recurso Especial n. 9.173,
conduzido pelo eminente Ministro Cláudio Santos, apreciou a questão,
decidindo: “Compreende-se por causa decidida em última instância, não
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 145
apenas a questão de mérito, mas qualquer uma, ainda que incidental”. Este
julgado é recente, pois foi publicado no dia 20 de outubro último.
Advirta-se, por oportuno, que idêntica é a posição do Supremo Tribunal
Federal no trato do assunto, em relação ao recurso extraordinário, e que, pela
similitude do recurso especial com aquele, pode-se, perfeitamente, invocar a
orientação do Pretório Excelso, lembrada na petição do recurso. É ler-se:
Recurso extraordinário. Cabimento contra decisão interlocutória ou
proferida em agravo desde que defi nitiva (RE n. 53.124-PR, Relator Ministro
Evandro Lins e Silva, RTJ 31, p. 323, 1965).
Cabe recurso contra decisão proferida em agravo, ou contra decisão
interlocutória, desde que defi nitiva (AI n. 24.434-GO, Relator Ministro Victor
Nunes Leal, RTJ 17, p. 114, 1961).
O recurso extraordinário é admissível de decisão de caráter interlocutório,
quando ela confi gura uma questão federal, encerrada defi nitivamente nas
instâncias locais (RE n. 57.728-SP, Relator Ministro Hermes Lima, RTJ 41, p.
153, 1967).
Nos presentes autos a temática é a mesma, e o voto do Relator, Ministro
José Dantas, não dissente do entendimento agora esposado na Corte Especial.
Com essas considerações, recebo os embargos, nos termos do voto do
eminente Relator.
É como voto.
VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Demócrito Reinaldo: Depois de exame mais acurado do
processo, verifi quei que a matéria discutida no presente recurso é inteiramente
idêntica àquela contida nos Embargos de Divergência no Recurso Especial n.
19.352-1-SP, em que proferi voto, com as conclusões a seguir:
A expressão constitucional causas decididas não pode ter compreensão
dilargante a ponto de abranger, para justifi car o conhecimento do apelo especial,
arestos decorrentes de agravos instrumentados contra decisões de juízes de 1º
grau.
O conhecimento de recurso especial, em agravo de instrumento, exige que
este se origine de uma decisão (em 1º grau de jurisdição), que extinga o processo,
com ou sem julgamento de mérito.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
146
Adoto, como razão de decidir, os argumentos expendidos no voto proferido
nos Embargos de Divergência n. 19.352-1, citado, cuja cópia em anexo, fi ca
fazendo parte integrante deste.
É como voto.
ANEXO
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL N. 19.352-SP
(92.0011205-6)
VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Demócrito Reinaldo: Senhores Ministros,
1. Vencido, mas não convencido, pedi vista do processo, não só para uma
análise mais profunda da matéria, mas, sobretudo, para deixar claro o meu
ponto de vista ao sustentar o incabimento do recurso especial contra acórdão
decorrente de agravo instrumentado, desafi ando decisões de juiz monocrático.
É que a vexata quaestio a que, agora, se tenta colocar um ponto fi nal, com
uma defi nição irrefragável desta colenda Corte, é oriunda de tese, por mim
defendida — e que chegou, até, a prevalecer — na egrégia Primeira Turma, em
março de 1992, quando apenas acabava de transpor os umbrais do Superior
Tribunal de Justiça, como um de seus Ministros.
Conveio-me, ainda, a necessidade de esclarecer outros aspectos da
controvérsia de sobrada relevância, porquanto, diante da própria evolução do
sistema jurídico-constitucional brasileiro — com a promulgação da Constituição
de 1988, a criação do STJ e a vigência do Código de Processo Civil —, o
entendimento que preconizo, com a devida vênia da douta maioria, me pareceu
o mais razoável, ou, em outras palavras: é a solução mais satisfatória (para o
momento), entendendo-se esta em função do que a ordem jurídica vigorante
considera como sentido de justiça.
Transcrevamos, para momento, a sinopse do decisório embargado:
Constitucional e Processual. Recurso especial contra acórdão em agravo de
instrumento que desafi a decisão interlocutória. Não conhecimento.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 147
O recurso especial, como vem defi nido na Constituição Federal (art. 105, III), é
instrumento hábil a enfrentar os julgados provenientes de causas decididas, em
única ou última instância, pelos Tribunais.
A expressão constitucional “causas decididas” não pode ter compreensão
dilargante a ponto de abranger, para justificar o apelo especial, arestos
decorrentes de agravos instrumentados contra decisões do juiz singular.
O cabimento de recurso especial em agravo de instrumento exige que este
se origine de uma decisão que extinga o processo, com ou sem julgamento de
mérito.
Alinhei, como premissas dessa conclusão, alguns argumentos, cuja
transcrição é da maior valia, para a análise subseqüente:
A competência do STJ é a de “julgar as causas decididas em única ou última
instância”. Causas decididas, segundo me parece, são aquelas que foram julgadas,
a fi nal, que tiveram uma decisão terminativa, encerrando o processo, com ou
sem julgamento de mérito. Não se decide uma causa através de mero despacho
interlocutório. É preciso que ele seja, pelo menos, terminativo, que fine o
processo, que julgue a causa, na expressão constitucional... Julgar a causa não é
impulsionar a causa, despachar a causa; é concluir o julgamento, sentenciando-a,
pondo-lhe fi m (com ou sem alcance do mérito)... O não conhecimento de recurso
especial, quando interposto contra acórdão proferido em agravo de instrumento,
não acarreta qualquer prejuízo às partes. É que, matérias importantes como
as condições da ação, a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e sua
representação, o interesse processual, podem ser julgadas, de ofício, em qualquer
tempo ou grau de jurisdição (CPC, art. 267, § 3º), e, dos demais despachos no
curso do processo, cabe agravo retido, do qual as partes podem valer-se para
evitar que a sentença proferida na causa (abrangente ou não do mérito) transite
em julgado ou torne, a matéria ventilada (no agravo retido), preclusa. O ataque
do ato decisório intercalado, por via do agravo retido, tem a força de fazer com
que a sentença proferida na causa (sentença terminativa do processo) fi que com
a sua efi cácia condicionada ao desprovimento desse agravo, no que pertine às
questões nele discutidas (Revista do Superior Tribunal de Justiça, vol. 34, pp. 441 e
442 — sem grifo no original).
O embargante, na fundamentação de seus embargos, indica como correta
a orientação adotada pela egrégia Terceira Turma, no julgamento do Recurso
Especial n. 9.173-0-SP, de que resultou o acórdão assim ementado:
Quando a Constituição defi ne os contornos do especial, a causa decidida não
é apenas a de mérito, mas, qualquer uma, incidental ou não, apreciada em última
instância. Esse é o entendimento pacífi co daquela expressão nos tribunais (fl .
124).
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
148
Assegura, fi nalmente, ser este o escólio predominante na Suprema Corte
de Justiça consoante arestos proferidos no Agravo de Instrumento n. 24.439, de
1961, no Recurso Extraordinário n. 53.124, de 1965, e Recurso Extraordinário
n. 57.728, de 1967.
2. Antes, todavia, de tentar verberar, com menos méritos, os judiciosos
argumentos arvorados nos embargos, rogo aos meus eminentes pares que me
escusem, se lhes parecer rebarbativo o meu intento de perscrutar, ainda, o
sentido e a compreensão da expressão constitucional em viso, já agora alinhando
outros argumentos em sintonia com a legislação processual vigente (Código de
Processo Civil e Lei n. 8.038, de 28 de maio de 1990).
A Constituição da República, ao estabelecer a competência — originária
e recursal — dos órgãos da Justiça Federal (de primeiro e segundo graus) e
das Instâncias Especiais (Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal
Federal), nos arts. 102 a 109, menciona o termo “causa” nove vezes (“causa em
que fi gura como parte Estado estrangeiro”; “causa entre a União e os Estados
ou Municípios”; “causas fundadas em tratado”; “causa em que forem partes
instituições previdenciárias”; “causas decididas por juízes e tribunais”).
Entretanto, salvo nos casos de usar um termo jurídico consagrado e
específi co (como, por exemplo, mandado de segurança, habeas corpus, extradição,
reclamação, revisão, confl ito de competência, mandado de injunção, habeas data
etc.), os vocábulos empregados pela Lei Magna são: “causa”, “litígio”, “ação” (art.
102, I, a, e, n, e III; art. 105, II, c, e III; art. 108, II; art. 109, I, II e III, e §§ 1º,
2º e 3º).
Isso signifi ca que o legislador constituinte, ao disciplinar, em capítulo
próprio, matéria de enorme relevância, qual seja, a de estipular a competência
de Instâncias Especiais, utilizou-se de termos essencialmente técnicos, assim
entendidos — nos meios judiciais como na terminologia técnico-jurídica.
Causa, segundo os dicionaristas, em linguagem forense, “é processo em que se
debate e julga, ação, demanda, causa civil, causa criminal” (CALDAS AULETE,
“Dicionário Contemporâneo da Língua Portuguesa”, vol. 1, p. 741 — sem
grifo no original). “Na técnica processual, causa se confunde com demanda.
Empregam-se como vocábulos equivalentes. E esta acepção vem de que a causa
é o fundamento legal do direito que se quer fazer valer perante a autoridade
judiciária: causa, a razão, extensivamente passou a designar processo judicial,
sendo, pois, equivalente, a litígio” (DE PLÁCIDO E SILVA, “Vocabulário
Jurídico”, vol. I, p. 321 — sem grifo no original).
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 149
“As expressões — preleciona o constitucionalista Pinto Ferreira — devem
ser usadas pelo legislador em seu sentido vulgar, salvo se se tratar de assunto
técnico, quando então será preferida a nomenclatura técnica peculiar ao setor de
atividade sobre o qual se pretende legislar” (“Revista de Informação Legislativa
do Senado Federal”, vol. 89, p. 183).
Como já se observou, alhures, no conferimento de competências aos
diversos órgãos judiciários, o Constituinte não se desbordou, uma única vez —
malgrado abusar da palavra “causa” — para o emprego do termo ou expressão
de signifi cação vulgar, como, in exemplis: “feito”, “autos”, “incidente”, “questão”,
ou mesmo “processo”, que tem conteúdo científi co próprio (e sentido diverso
do de causa). Deixou, o legislador, meridianamente clara a sua intenção de usar
(ao disciplinar matéria de competência de Tribunais Maiores) exclusivamente
da terminologia jurídica, com a preocupação mediata de ser compreendido
e quiçá inspirado na lição de que “a essência e conteúdo da lei não estão nas
palavras, mas nas idéias, no espírito, nos superiores conceitos informadores da
lei. O conteúdo espiritual dela é sempre muito mais rico do que o expressado
literalmente” (ALÍPIO SILVEIRA, “Hermenêutica no Direito Brasileiro”, vol.
1, p. 5 — sem grifo no original).
O juiz atribui aos vocábulos sentido resultante da linguagem vulgar; “porém,
quando empregados termos jurídicos — ensina CARLOS MAXIMILIANO
—, deve crer-se ter havido preferência pela linguagem técnica. No direito
público usam mais dos vocábulos no sentido técnico; em direito privado, na
acepção vulgar. Em qualquer caso, entretanto, quando haja antinomia entre
os dois signifi cados, prefi ra-se o adotado geralmente pelo mesmo legislador,
conforme as inferências deduzíveis ao contexto” (“Hermenêutica e Aplicação do
Direito”, p. 143 — sem grifo no original).
“Como observa BIERLING (“Juristische Prinzipienlehre”, 1911, vol. IV,
pp. 214-215), em geral se emprega de preferência a linguagem técnico-jurídica
no direito público, de modo que, caso surja diversidade de signifi cações num
mesmo vocábulo, o hermeneuta, entre a expressão científi ca e a vulgar, deverá
preferir a primeira” (ALÍPIO SILVEIRA, obra citada, p. 11).
No texto constitucional — como no dispositivo sob investigação — não
há nenhum indício, por mais leve que seja (como por exemplo, a conexão com
outras palavras do artigo ou do capítulo, o uso de palavras, no mesmo capítulo,
com signifi cações diversas etc.) de que se possa inferir que o termo causa tenha
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
150
sido empregado, pelo legislador, em sentido equivalente ao de questão (“questão”
é usada signifi cando causa, demanda, litígio, pelo vulgo).
Se o Constituinte pretendesse conferir, ao preceito, um conteúdo mais
amplo, seria bastante escrever: “julgar, em recurso especial, as questões decididas,
em única ou última instância, pelos Tribunais”, sem nenhuma dificuldade
semântica e sem prejuízo algum à clareza e perfeição do texto. A presunção,
portanto, em tema de redação constitucional, “é a de que o legislador se exprima
em termos técnicos, evitando os vulgares”, adotando a denominação jurídico-
científ ica de “causa”, quando, no contexto, cuidou de matéria de natureza,
também, técnica, qual seja, a criação e as hipóteses de cabimento do recurso
especial e a fi xação de competência de um Tribunal de instância derradeira.
3. Antes de tentarmos, a seguir, uma interpretação integrada mediante a
demonstração da correlação entre a “expressão constitucional” e o sistema de
recursos, no Código de Processo Civil em vigor, quero dizer algumas palavras
sobre a jurisprudência que se formou, no Supremo Tribunal Federal, acerca do
tema.
Tenhamos presente, desde logo, que os arestos do Excelso Pretório
atribuindo um elastério maior ao vocábulo causa, no texto constitucional e que
constituem o fundamento proeminente da divergência, foram proferidos nos
anos de 1961, 1965 e 1967 (Recursos Extraordinários ns. 53.124 e 57.728 e
Agravo de Instrumento n. 24.434). Esses acórdãos são também citados, como
argumento basilar, nos embargos de divergência ns. 11.919 (Relator Ministro
Américo Luz), 13.079-1 (Relator Ministro Costa Leite), 15.650-0 e 19.412-
4 (Relator Ministro Waldemar Zveiter) e 17.157-4 (Relator Ministro Edson
Vidigal), para julgamento em mesma assentada.
Não tenho, é evidente, nem o pejo, nem a ousadia de discordar do
entendimento fi rmado, na egrégia Suprema Corte, na década de 1960. Naquela
época, ele se justifi cava, tanto é que prevaleceu, com o aval de conspícuos juízes e
juristas. Era outro o Código de Processo Civil (o de 1939), com uma sistemática
recursal diversa da que prevaleceu no Código de Processo Civil de 1974. Sobre o
procedimento do recurso extraordinário vigia o art. 863 do Código de Processo
Civil de 1939, alterado pela Lei n. 3.396, de 2 de junho de 1958, substituída, em
1974, pelo art. 541 do Código de Processo Civil, com vigência até o advento da
Lei n. 8.038, de 28 de maio de 1990, cujo art. 44 os revogou.
Com efeito, o art. 863 do Código de Processo Civil de 1939 tinha a
seguinte dicção:
SÚMULAS - PRECEDENTES
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Art. 863. Nas decisões proferidas em única e última instância, caberá recurso
para o Supremo Tribunal Federal, nos casos previstos no art. 101, III, letras a e d, da
Constituição (sem grifo no original).
Com a promulgação da Lei n. 3.396/1958, citada, o art. 863 da antiga Lei
do Processo passou a ter a redação a seguir:
Art. 863. Caberá recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal das
decisões proferidas, em única ou última instância, pelos Tribunais da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Territórios, nos casos previstos na Constituição
Federal (sem grifo no original).
Já o art. 541, do atual Código de Processo Civil, estabeleceu:
Art. 541. Caberá recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal das
decisões proferidas por outros Tribunais, nos casos previstos na Constituição da
República (sem grifo no original).
Como se observa, ao tempo da formação jurisprudencial da Suprema
Corte, segundo a legislação vigente “cabia recurso extraordinário das decisões
proferidas por outros Tribunais”. O substantivo decisões tinha, no Código de
1939, abrangência maior, acepção muito mais dilargante, compreendendo, até
qualquer julgamento: acórdão, sentença, despacho. Até mesmo as decisões, em
sentido lato, de juiz de primeiro grau (sentenças ou despachos) poderiam ser
objeto do extraordinário (art. 863).
O Código de Processo Civil de 1973 usou de igual expressão: “das decisões
proferidas por outros Tribunais” (art. 541), em antinomia, aliás, com os arts. 162 e
163, que fazem nítida distinção entre acórdão, sentença, decisão (interlocutória) e
despacho. Não restava, pois, ao Supremo Pretório, na prevalência dessa legislação,
senão admitir o extraordinário manifestado contra decisão, entendida esta com
amplitude e largueza.
A Lei n. 8.038, de 1990, não incidiu na erronia, revogando, desde logo,
expressamente, no art. 44, a Lei n. 3.396/1958 e o art. 541 do Código de Processo
Civil, limitando o cabimento dos recursos extraordinário e especial “aos casos
previstos na Constituição Federal” (art. 26). A alteração da legislação processual,
sobretudo na parte dos recursos, impende ser considerada, por ter indiscutível
repercussão na fi xação do verdadeiro sentido da expressão constitucional —
“julgar causas decididas” (art. 105, III).
4. A Constituição de 1988, a par de instituir um Tribunal de Instância
Excepcional, conferindo-lhe competências originária e recursal — criou um
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
152
novo recurso — o especial, com feição de extraordinário, erigindo o Superior
Tribunal de Justiça em intérprete máximo da Lei Federal, com função de
unifi car a jurisprudência dos Tribunais que lhe estão vinculados, em hierarquia,
deixando a regulamentação dos procedimentos à legislação ordinária (Código
de Processo Civil e Lei n. 8.038/1990).
Destarte, há um entrelaçamento de tal ordem entre as normas
constitucionais e o Código de Processo Civil — na parte pertinente ao sistema
de recursos — que se não pode pretender uma interpretação isolada, de umas
ou de outras, sem cotejá-las, numa integração recíproca. Os juristas, aliás,
identifi cam um paralelo entre a disciplina do processo e o regime constitucional
em que ele se desenvolve. “Todo o Direito Processual, como ramo do Direito
Público, tem suas linhas fundamentais traçadas pelo Direito Constitucional, que
fi xa a estrutura dos órgãos jurisdicionais, que garante a distribuição da justiça
e a declaração do direito objetivo e estabelece alguns princípios processuais; e
o Direito Processual Penal chega a ser apontado como Direito Constitucional
aplicado às relações entre autoridade e liberdade. O Direito Processual é
fundamentalmente determinado pela Constituição em muitos dos seus aspectos
e institutos característicos. Alguns princípios que o informam são, ao menos
inicialmente, princípios constitucionais, ou seus corolários” (ANTÔNIO
CARLOS ARAÚJO CINTRA, “Direito Processual Constitucional”, in “Teoria
Geral do Processo”, p. 75).
Constitui regra básica de hermenêutica a de que se não pode interpretar
uma norma, seja de lei ou de Constituição, de forma isolada, desarticulando-a
do sistema jurídico a que está jungida. Consiste o processo sistemático, afi ança
Carlos Maximiliano, “em comparar o dispositivo sujeito a exegese com outros
do mesmo repositório ou de leis diversas, mas referentes ao mesmo objeto.
Por umas normas se conhece o espírito das outras... O direito objeto não é um
conglomerado caótico de preceitos; constitui vasta unidade, organismo regular,
sistema, conjunto harmônico das normas coordenadas, em interdependência
metódica, embora fi xada cada uma no seu lugar próprio. De princípios jurídicos
mais ou menos gerais deduzem corolários; uns e outros se condicionam e
restringem reciprocamente, embora se desenvolvam de modo que constituam
elementos autônomos em campos diversos” (obra citada, pp. 165 e 166).
Na estria de uma interpretação sistemática, decorrente do confronto
entre a expressão constitucional — julgar causas decididas — e a disciplina da
interposição, do processamento e dos efeitos do agravo instrumentado, como
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 153
preconizada no atual Código de Processo Civil (art. 522 e § 1º), a conclusão
que me parece mais correta — entendendo-se esta em função do que a ordem
jurídica considera como sentido de justiça — é a de que não tem cabida
o conhecimento, pelo STJ, de recurso especial manifestado contra acórdão
proferido em agravo de instrumento desafi ando decisão interlocutória de juiz do
primeiro grau.
O Código de Processo Civil, ao indicar, no art. 522, as hipóteses de
cabimento do agravo de instrumento, dispôs:
§ 1º. Na petição, o agravante poderá requerer que o agravo fi que retido nos
autos, a fi m de que dele conheça o Tribunal, preliminarmente, por ocasião do
julgamento da apelação; reputar-se-á renunciado o agravo se a parte não pedir
expressamente, nas razões ou nas contra-razões da apelação, sua apreciação pelo
Tribunal (sem grifo no original).
Nesta fase, façamos um esclarecimento rememorativo.
No Código de Processo Civil de 1939, embora persistam alguns aspectos
da convergência, o recurso de agravo tinha diferente formulação. O agravo
de instrumento era o recurso adequado para afrontar decisões proferidas em
incidentes processuais, mas com o elenco delimitado no art. 842. O agravo no
auto do processo circunscrevia-se aos casos específi cos, elencados em numerus
clausus (art. 851). Esses recursos não poderiam ter uso indiferente, pelas partes,
já que os casos de cabimento de cada espécie (agravo de instrumento ou agravo
no auto do processo) eram defi nidos em relação exaustiva. J. C. Barbosa Moreira
confi gurou, em síntese de inigualável clareza, a índole do agravo no auto do
processo (que se distancia do atual agravo retido): “O cabimento do agravo no
auto do processo cingia-se a determinados casos expressamente prescritos na lei
(Código de 1939, art. 851), e nesses não havia alternativa para a parte, a não
ser a de omitir-se: não lhe era dado optar entre a retenção nos autos e a subida
imediata por meio de instrumento” (“Comentários ao Código de Processo
Civil”, vol. V, p. 464).
Não se admitia, portanto, o recurso indiferente, mesmo consagrado pelo
Código revogado o princípio da fungibilidade (art. 810), porque, no caso, o uso
do agravo de instrumento ao invés do agravo no auto do processo (ou a recíproca)
confi gurava erro grosseiro cuja “inescusabilidade derivava da circunstância de se
haver deduzido recurso impertinente, em substituição daquele expressamente
previsto na lei” ( Revista Forense, 91/123). “Os Tribunais recusaram sempre
(na vigência do Código de 1939) o conhecimento de um recurso ao invés de
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
154
outra espécie recursal cabível e adequada” (RF, 163/215, Revista dos Tribunais,
489/105; RP, 4/393) (STF).
Em suma: na vigência do Código de Processo de 1939, sendo outra a
disciplina dos recursos, era, em ordem de princípio, impraticável a interpretação
sistemática, conjugando-se normas da Lei do Processo e da Constituição
Federal, visando ao desiderato que, agora, vigendo outra legislação, se tenta
alcançar.
Na petição, repito, diz o atual Código (§ 1º do art. 522), que “o agravante
poderá requerer que o agravo fi que retido nos autos, a fi m de que dele conheça
o Tribunal, preliminarmente, por ocasião do julgamento da apelação”. A
interposição do agravo, com a manifestação da parte para que fi que retido evita
que a sentença a ser proferida na causa (abrangente ou não do mérito) transite
em julgado, ou torne a matéria ventilada no agravo (retido), preclusa. O ataque
das decisões interlocutórias, pela via do agravo retido, tem a força de fazer
com que a sentença (terminativa da causa, em primeira instância) fi que com a
sua efi cácia condicionada ao desprovimento desse agravo, no dizente às questões
nele articuladas. O agravo retido tem o efeito diferido — sem perda de sua
natureza de agravo —, preservando as questões, nele suscitadas, do risco da
preclusão, transferindo sua apreciação ao tribunal ad quem, como preliminar do
julgamento da apelação. Pode ser manejado no processo de conhecimento, no de
execução, no cautelar e nos procedimentos especiais. “Ocioso é acrescentar que,
se agravante o vencedor, de modo nenhum se exige, para facultar-lhe o pedido
de julgamento do agravo nas contra-razões, que a apelação venha da parte
contrária. O apelante pode ser o Ministério Público, até aí na função de custos
legis, ou terceiro prejudicado.” ( J. C. BARBOSA MOREIRA, “Comentários ao
Código de Processo Civil”, vol. V, pp. 468 e 469).
O conhecimento do agravo retido, preleciona o processualista Athos Gusmão
Carneiro — hoje, conspícuo Ministro desta Corte — não sofre óbice algum pela
ausência de apelação voluntária, quando a sentença sobe ao reexame do Tribunal
apenas por força do disposto no art. 475 do Código de Processo Civil. Exegese
diversa não só poderia causar grave prejuízo à parte contrária à Fazenda, como
infringiria o princípio fundamental da igualdade das partes, pois o reexame
necessário abrange também as questões incidentais resolvidas em desfavor ao
Poder Público (RF, 254/314).
Impende considerar que, de todas as decisões interlocutórias desafi áveis
por agravo de instrumento, pode o recorrente pedir que ele fi que retido. O
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 155
dispositivo do art. 522, § 1º, do Código de Processo Civil é peremptório e
inadmite restrições. Não importa que se trate de incidentes processados em
apartado, como, ad exemplum — a impugnação do valor da causa ou as exceções
de impedimento ou supeição. Sendo a hipótese de agravo de instrumento,
poderá haver retenção, salvante as pouquíssimas exceções que decorrem da
própria sistematização dos recursos, na legislação processual (verbi gratia, o
agravo de instrumento contra decisão indeferitória do processamento dos
recursos em geral, inclusive do especial e do extraordinário), mas que não se
inserem no objetivo dos presentes embargos.
O insigne Th eotônio Negrão, espiolhando todo o Código de Processo, com
vistas à identifi cação de decisões em que, embora comportassem o agravo de
instrumento, fosse inviável, todavia, a forma retida, escreveu: “No processo de
execução, nem sempre cabe apelação e, neste caso, o agravo retido não teria como
chegar à superior instância.” (“Código de Processo Civil e legislação processual
em vigor”, 23ª edição, nota n. 11 ao art. 522, p. 353). Tenho, entretanto, a ousadia
de discordar do eminente jurista. Em primeiro lugar, apesar de o agravo retido
diferir o julgamento da matéria ao Tribunal, não perde a sua natureza de agravo,
possibilitando o juízo de retratação. Ao depois, o processo de execução, ainda
quando não forem opostos os embargos (se não ultimado sem o julgamento do
mérito), só se extingue por uma das motivações previstas no art. 794 do CPC,
e a extinção só produz efeito quando declarada por sentença, sendo esta apelável
(art. 795 do Código de Processo Civil).
J. C. Barbosa Moreira, em seus “Comentários ao Código de Processo Civil”,
alinhou, casuisticamente, a quase totalidade das decisões que, no processo de
execução, estão sujeitas ao agravo (obra citada, p. 462).
Até mesmo na hipótese do art. 558 e seu parágrafo único, do CPC —
quando, ao agravo, poder-se-á conferir efeito de suspender a execução de certas
medidas judiciais — nada impede que a parte faça a opção pelo agravo retido.
Em casos expressamente defi nidos em lei, o juiz perante o qual se interpôs o
agravo, ou o Relator, pode, a requerimento da parte, “suspender a execução da
decisão agravada”, até o julgamento do recurso, pelo Tribunal. A competência,
esclarece Barbosa Moreira, “para decretar a suspensão antes da subida, remanesce
no órgão a quo, ainda que o agravo fi que retido nos autos e só venha a subir
com a apelação porventura interposta contra a sentença; neste caso, pois, o
agravante pode requerer a suspensão em qualquer momento anterior à execução
da medida, ou mesmo em se tratando de providência que se protraia (como a
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
156
prisão do depositário infi el) enquanto ela perdure. É intuitivo, contudo, que
normalmente optará o agravante, em hipóteses tais, pela subida imediata” (obra
e volume citados, p. 472).
Pois bem: fi cando, o agravo, inserido nos autos, a requerimento da parte,
e uma vez encerrado o procedimento, no primeiro grau de jurisdição (com ou
sem conhecimento do mérito), se da sentença se interpuser apelação (ou ela
estiver submetida ao obrigatório duplo grau de jurisdição), ao Tribunal ad quem
competirá, ao ensejo do respectivo julgamento, apreciar as questões objeto do
agravo retido. É, portanto, este último decisório (proferido em última instância),
aí, já abrangente das matérias discutidas nas decisões monocráticas de primeiro
grau e daqueloutras que motivaram a apelação, que se deve atacar pela via do
recurso especial.
Esta é a conclusão que me parece mais racional, venia concessa, com base
em interpretação sistemática, e que poderá induzir esta Corte à adoção de
uma jurisprudência construtiva e, até, a uma providência de política judiciária.
Se prevalecente, reduzirá, em média, vinte e cinco por cento dos recursos especiais,
na área de Direito Público (e quiçá, percentual muito mais elevado, na Seção
de Direito Privado, em que são numerosas as questões processuais embutidas
em agravos), sem nenhum prejuízo para as partes, porque delas não se retira a
possibilidade do reexame de matérias — desde que contidas em agravo retido —
pela instância superior, nem cria óbice intransponível que impeça esse reexame,
nem confi gura, por isso mesmo, restrição ilegal ao direito de recorrer.
Ao revés: em prevalecendo esse entendimento, direcionar-se-á a atividade
das partes para o uso das formas recursais adequadas e cônsones com a
economia processual, impedindo o manejo de recursos inúteis, que postergam,
indefi nidamente, a prestação jurisdicional e afogam os Tribunais Superiores
com incidentes protelatórios (e numeroso acervo de processos), difi cultando
ou impedindo-os, até, de cumprir a sua destinação constitucional, que é a de
proferir juízo, em defi nição derradeira e irrefragável, sobre questões jurídicas de
proeminente relevância, na interpretação da legislação federal.
A interpretação que defendo não incorre na censura impetuosa, mas
serena, do Ministro Pádua Ribeiro, assim concebida:
Não podemos de forma alguma sufragar interpretações que cerceiem a
competência deste Tribunal quanto à salvaguarda da inteireza do Direito Público
Federal. As decisões dos Tribunais de apelação, mesmo proferidas em agravo,
desde que apliquem Lei Federal, não podem nunca fi car sem a possibilidade de
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 157
reexame deste Tribunal. Caso contrário, passaríamos a ter Tribunais de última
instância espalhados por todo o território nacional, cada um dando a última
palavra, em termos de interpretação e aplicação de Lei Federal (Embargos de
Divergência n. 19.481-1).
O equívoco em que incorre o nobre Ministro, sobre vislumbrar a
possibilidade de “cerceio à competência do STJ e da transformação de Tribunais
ordinários em estâncias especiais” é consectário da estreiteza do voto que
proferi, na Primeira Turma, evidentemente sucinto e do qual não despontavam
argumentos para a exata compreensão da tese e nem propiciava discussão mais
profunda sobre o alcance do tema.
Todavia, o entendimento que preconizo não me veio ao acaso, sem a devida
meditação e sem que me debruçasse, ao longo do tempo, no estudo comparativo
da Constituição e da legislação processual.
A apreensão do eminente Ministro, como se ouviu da exposição, não tem
razão de ser. Não há restrição de competência do STJ. Não se quis, em momento
algum, afastar as decisões interlocutórias do crivo do Superior Tribunal de
Justiça. O que se pretende é racionalizar o uso do agravo.
Não é demais repetir, com apoio nas lições dos juristas, que o agravo
de instrumento, hoje, considerado, recurso anacrônico e superado, não surte,
na grande maioria das vezes, outro efeito prático, senão o da procrastinação
(Th eotônio Negrão, ob. citada, p. 354). Tanto que, alguns juristas sugerem,
ainda que de lege lata, que se reconheça ao juiz o poder de indeferir, por falta
de interesse, a formação do instrumento, impondo ao agravante o caminho da
retenção (Moniz Aragão, “Considerações Práticas Sobre o Agravo”, Revista
Forense, 246/265).
Adverte Barbosa Moreira, que negar a viabilidade da retenção é atitude que
contravém de frente a uma aspiração generalizada e justa. A tendência que vai
predominando é exatamente a oposta: prestigiar mais o agravo retido, cerceando
o emprego da outra modalidade para evitar delongas a que costuma dar ensejo
(Rev. de Processo 31/269).
Interposto o agravo na sua forma retida contra decisão interlocutória, as
questões nela suscitadas não precluem, mas fi cam no aguardo do julgamento pelo
Tribunal ordinário, conjuntamente com as demais matérias que objetivaram a
demanda. Esse último julgamento fi ca sob a censura do Superior Tribunal de
Justiça, acaso manifestado o especial. Não haverá, pois, nenhuma questiúncula,
decidida no curso do processo, imune ao reexame da instância derradeira.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
158
Do exposto, conclui-se:
a) o legislador constituinte, ao atribuir ao STJ competência para julgar, em
recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais
(art. 105, III), conferiu à palavra causa o sentido científi co, técnico-jurídico,
inscrevendo-a na acepção de “ação”, “demanda”, “litígio”, tanto quanto o fez com
outros vocábulos, ao fi xar o elenco de competências de juízos e Tribunais de
Instância Especial (arts. 102, 105 e 109), por cuidar de assunto essencialmente
técnico;
b) se o constituinte pretendesse imprimir, ao dispositivo (art. 105, III),
um conteúdo mais amplo, tê-lo-ia feito, escrevendo, em seu contexto: “julgar,
em recurso especial, as questões decididas, em única ou última instância, pelos
Tribunais”, sem difi culdade semântica e sem prejuízo à clareza e precisão do
texto — quod lex non distinguit, non distinguere possumus;
c) ao conferir competência aos órgãos judiciários (em todo o Capítulo
III do Título IV da Constituição), o constituinte não se desbordou, uma
única vez — apesar de abusar da palavra “causa” — para o emprego de termos
ou expressões de signifi cação vulgar, usando exclusivamente de terminologia
jurídica, com o espírito preconcebido de evitar a confusão de conceitos ou
dúvidas na aplicação de seus dispositivos;
d) de uma interpretação sistemática resultante do confronto entre a expressão
constitucional — julgar causas decididas — e a disciplina da interposição do
processamento e dos efeitos do agravo de instrumento (“Código de Processo
Civil”, art. 522 e § 1º), a conclusão que me parece mais correta — entendendo-
se esta em função do que a ordem jurídica considera como sentido de justiça —
é a de que o STJ não deve conhecer de recurso especial manifestado em agravo
de instrumento que desafi a decisão interlocutória de juiz de primeiro grau, por
ser a única condizente, a meu sentir, com os interesses da justiça e o princípio da
economia processual;
e) essa conclusão — a mais racional, data venia — não acarreta prejuízo às
partes, porque destas não retira a possibilidade do reexame de matérias — desde
que contidas em agravo retido — pelo Superior Tribunal de Justiça, nem cria
óbice intransponível que impeça esse reexame e não confi gura, por isso mesmo,
restrição ilegal (ou inconstitucional) ao direito de recorrer; essa interpretação, ao
revés, direcionará a atividade das partes para o uso racional das formas recursais
adequadas (preferindo sempre o manuseio do agravo retido) e congruentes
com a economia processual, impedindo o manejo de recursos inúteis, que
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 159
postergam, injustifi cadamente, a prestação jurisdicional e afogam as instâncias
especiais com incidentes protelatórios, difi cultando ou impedindo, até, o STJ de
cumprir sua destinação constitucional, que é a de proferir juízo, em defi nição
derradeira, sobre questões jurídicas de proeminente relevância, na interpretação
da legislação infraconstitucional;
f ) essa orientação não restringe o uso do agravo de instrumento, ao ponto
de fazer letra morta do dispositivo do Código, que o instituiu (mesmo porque
poderá ser manejado livremente na esfera das instâncias ordinárias); a parte
continua com o direito de opção entre o agravo de instrumento e a sua forma
retida; mas, não lhe é dado usar de mero capricho, como se a Lei do Processo lhe
atribuísse poderes absolutos na escolha do recurso — ou instrumentado ou retido;
o limite do direito à opção da parte está em que deve obedecer ao princípio
da economia processual, que é o que consulta, prevalentemente, os interesses da
justiça e da coletividade.
Há de incidir, aqui, a vetusta parêmia: o Direito não dá todo direito, nem o
seu uso confere arbitrariedade. Levado a suas últimas conseqüências, já não se
teria o uso regular, mas o abuso do direito, a que já os romanos profl igavam com
veemência com argumentos sintetizados no conhecido apotegma: summum jus,
summa injuria.
No preâmbulo da Constituição, ao se constituir um Estado Democrático
destinado a assegurar o exercício dos direitos individuais e sociais, se elegeu a
Justiça como um dos valores supremos da sociedade. Torna-se curial que, ao
exercer o seu direito, o titular terá que se amoldar aos interesses maiores do
ideário da Justiça — em seu sentido mais abrangente — e que condiz com a
realização do bem coletivo.
O processo, que é um meio, não pode exigir um dispêndio superior ao valor
dos bens — ou da relevância da matéria — que estão em debate, que são o seu
fi m; uma necessária proporção entre o fi m e os meios deve orientar a economia
do processo e, conseqüentemente, a atividade das partes, no âmbito do processo
(conf. EDUARDO COUTURE, “Fundamentos de Direito Processual Civil”,
p. 188).
g) excepcionalmente, para os casos (aliás, ainda não identifi cados pelos
processualistas) em que a jurisprudência vier a entender que não cabe, das
decisões monocráticas de primeiro grau, o agravo em sua forma retida, aí então
nada impede que o STJ conheça do recurso especial em agravo de instrumento
(Código de Processo Civil, art. 558);
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
160
h) o entendimento do Supremo Tribunal Federal, ao conferir ao termo
causa (na vigência de Constituições revogadas), o sentido amplo de questão,
resultou de jurisprudência, em princípio com profundas divergências — entre
Ministros e Turmas — construída em décadas anteriores a 1970, quando a
composição do excelso Pretório era inteiramente outra e a legislação processual
(Código de 1939) — na parte pertinente aos recursos — tinha disciplina
diferente; promulgada a Constituição de 1988, revogado o Código de Processo
Civil de 1939 e tendo em vista as alterações previstas na Lei n. 8.038/1990,
art. 44, a egrégia Suprema Corte de Justiça ainda não enfrentou a controvérsia,
analisando o Texto Constitucional sob o pálio de uma interpretação sistemática,
com as regras do Código de Processo Civil em vigor;
i) embora nas causas em que forem parte Estado estrangeiro ou organismo
internacional, de um lado, e, de outro, Município, julgadas, em primeiro grau de
jurisdição, pelos juízes federais, o recurso seja o ordinário para o STJ, o sistema
de recursos é o do CPC (arts. 36 e 37 da Lei n. 8.038/1990); pelo princípio
da economia processual, a parte deve usar do agravo, na sua forma retida, para
desafi ar as decisões do juiz de primeiro grau (Lei n. 8.038/1990, art. 36, II); o
Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o recurso ordinário (CF, art. 105, II,
c) decidirá, em conjunto, todas as questões fragmentárias inseridas nos agravos
retidos e as demais motivadoras do litígio; desse decisório do STJ, proferido em
última instância, é que poderá caber, nas hipóteses previstas na Constituição,
recurso extraordinário; optando, a parte, pelo manejo do agravo de instrumento
contra as decisões interlocutórias dos juízes federais de primeira instância, se
apreciados pelo STJ, poderão surgir tantos recursos extraordinários quantos
forem os agravos instrumentados; entretanto, se deve ou não conhecer desses
recursos, é tarefa privativa do colendo Supremo Tribunal Federal.
Com estas considerações e a vênia da doutíssima maioria, mantenho o
entendimento que perfi lhei quando do julgamento, na egrégia Primeira Turma,
do Recurso Especial n. 19.352-0:
A expressão constitucional causas decididas não pode ter compreensão
dilargante a ponto de abranger, para justifi car o conhecimento do apelo especial,
arestos decorrentes de agravos instrumentados contra decisões do juiz de
primeiro grau.
O conhecimento do recurso especial, em agravo de instrumento, exige que
este se origine de uma decisão (em primeiro grau de jurisdição), que extinga o
processo, com ou sem julgamento de mérito.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 161
Rejeito os embargos.
É como voto.
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL N. 12.270-SP
(92111599)
Relator: Ministro Nilson Naves
Embargantes: Ministério Público Federal e Estado de São Paulo
Embargados: Julio Agostinho Luize e outros
Advogados: Paula Nelly Dionigi e outro e Ediangeli Rossi Migliano e
outros
EMENTA
Recurso especial contra acórdão proferido no julgamento de
agravo de instrumento. Cabimento do recurso, a teor de precedente da
Corte Especial: EREsps ns. 13.473-5, 16.118-0 e 19.481-1. Embargos
de divergência conhecidos e recebidos.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Corte
Especial do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das
notas taquigráfi cas a seguir, por maioria, receber os embargos. Votou vencido
o Sr. Ministro Demócrito Reinaldo. Os Srs. Ministros Eduardo Ribeiro, Dias
Trindade, José de Jesus, Assis Toledo, Vicente Cernicchiaro, Waldemar Zveiter,
Fontes de Alencar, Cláudio Santos, Sálvio de Figueiredo, Barros Monteiro,
José Dantas, William Patterson, Bueno de Souza, José Cândido, Pádua Ribeiro,
Flaquer Scartezzini e Costa Lima votaram com o Sr. Ministro-Relator. Os
Srs. Ministros Pedro Acioli e Hélio Mosimann não compareceram à sessão
por motivo justifi cado. O Sr. Ministro Assis Toledo não compareceu à sessão
por motivo justifi cado (art. 162, § 1º, RISTJ). Os Srs. Ministros Américo Luz,
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
162
Costa Leite, Edson Vidigal e Peçanha Martins não participaram do julgamento
(art. 162, § 2º, RISTJ).
Brasília (DF), 25 de março de 1993 (data do julgamento).
Ministro Antônio Torreão Braz, Presidente
Ministro Nilson Naves, Relator
DJ 24.05.1993
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Nilson Naves: Decidiu a Primeira Turma conforme esta
ementa:
Constitucional e Processual. Recurso especial contra acórdão proferido em
agravo de instrumento interposto desafiando despacho intercalado do juiz
monocrático. Impossibilidade. Não conhecimento.
O recurso especial, como vem defi nido na Constituição Federal (art. 105, III),
é instrumento hábil a desafi ar os julgados provenientes de causas decididas, em
única ou última instância, pelos tribunais.
As causas decididas (pelos tribunais), segundo preconiza a Constituição, não
têm a compreensão dilargante, a ponto de abranger, na sua confi guração, para
justifi car o recurso especial, meros decisórios decorrentes de julgamentos de
agravos instrumentados interpostos contra despachos do juiz de primeiro grau,
que são apenas impulsionadores do processo.
O cabimento do recurso especial em agravo de instrumento exige, pelo menos,
que este tenha vinculação com uma decisão terminativa do processo, com ou
sem julgamento de mérito.
Recurso não conhecido (voto vencido).
O Ministério Público Federal e o Estado de São Paulo entraram com
embargos de divergência, com base no REsp n. 9.173, da Terceira Turma, com
essa ementa:
Causa decidida em última instância. Intimação. Omissão do nome do
advogado. Nulidade. Recurso provido.
Compreende-se por causa decidida em última instância não apenas a questão
de mérito, mas qualquer uma ainda que incidental.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 163
A omissão do nome do advogado na intimação para indicar peças que devem
compor o instrumento de agravo, acarreta nulidade.
Recurso provido.
Admitidos os embargos, a parte contrária não os impugnou.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Nilson Naves (Relator): Na sessão do dia 24.09, esta Corte
julgou os EREsps ns. 13.473, 16.118 e 19.481, recebendo-os para que prevaleça
a posição do acórdão divergente, conforme essas ementas:
— Embargos de divergência. Conhecimento. Recurso especial. Admissibilidade.
Causa em sentido lato. Agravo de Instrumento.
I. Causa para efeito de admissibilidade do recurso especial há de ser
compreendida lato sensu. É qualquer questão sujeita a uma decisão judiciária, em
última ou única instância, ainda que incidentalmente.
II. Embargos recebidos para admitir a interposição de recurso especial, mesmo
quando a decisão recorrida tiver sido proferida em agravo de instrumento.
III. Baixa dos autos à Turma para, afastado o óbice, siga com o julgamento
(EREsp 13.473-5-AM, Relator Sr. Ministro Costa Lima).
— Processual Civil. Recurso especial. Cabimento. Matéria incidental.
A competência atribuída ao STJ, pelo art. 105, III, da CF, não exclui o cabimento
do Recurso Especial, quando a decisão recorrida aborda, apenas, aspecto
incidental.
Embargos de divergência conhecidos e providos (EREsp 16.118-0-SP, Relator Sr.
Ministro William Patterson).
— EREsp. Constitucional. Processual Civil. Recurso Especial. Causa decidida em
última instância — “Causas decididas, em única ou última instância” (Constituição,
art. 105, III) compreendem as questões, ainda que diversas do mérito, dado o
interesse, no sentido processual do termo, da parte à prestação jurisdicional
exaustiva, materialmente considerada. Impõe-se uma condição: haver sido —
decidida — no Tribunal originário. Decidida, aqui, é igual a exaurida naquela
Corte. Não se compreenderia alguma matéria restar imune à exigência de
harmonia à legislação federal (EREsp n. 19.481-1-SP, Relator Sr. Ministro Vicente
Cernicchiaro).
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
164
Dos presentes embargos conheço, porque comprovada a divergência, e
os recebo, à vista dos precedentes da Corte, devolvendo os autos à Turma de
origem, para que, afastada a preliminar, prossiga no julgamento do recurso
especial.
VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Demócrito Reinaldo: Depois de exame mais acurado do
processo, verifi quei que a matéria discutida no presente recurso é inteiramente
idêntica àquela contida nos Embargos de Divergência no Recurso Especial n.
19.352-1-SP, em que proferi voto, com as conclusões a seguir:
A expressão constitucional causas decididas não pode ter compreensão
dilargante a ponto de abranger, para justifi car o conhecimento do apelo especial,
arestos decorrentes de agravos instrumentados contra decisões de juízes de 1º
grau.
O conhecimento de recurso especial, em agravo de instrumento, exige que
este se origine de uma decisão (em 1º grau de jurisdição), que extinga o processo,
com ou sem julgamento de mérito.
Adoto, como razão de decidir, os argumentos expendidos no voto proferido
nos Embargos de Divergência n. 19.352-1, citado, cuja cópia em anexo, fi ca
fazendo parte integrante deste.
É como voto.
ANEXO
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL N. 19.352-SP
(92.0011205-6)
VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Demócrito Reinaldo: Srs. Ministros,
1. Vencido, mas não convencido, pedi vista do processo, não só para uma
análise mais profunda da matéria, mas, sobretudo, para deixar claro o meu
ponto de vista ao sustentar o incabimento do recurso especial contra acórdão
decorrente de agravo instrumentado, desafi ando decisões de juiz monocrático.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 165
É que a vexata quaestio a que, agora, se tenta colocar um ponto fi nal, com
uma defi nição irrefragável desta colenda Corte, é oriunda de tese, por mim
defendida — e que chegou, até, a prevalecer — na egrégia Primeira Turma, em
março de 1992, quando apenas acabava de transpor os umbrais do Superior
Tribunal de Justiça, como um de seus Ministros.
Conveio-me, ainda, a necessidade de esclarecer outros aspectos da
controvérsia de sobrada relevância, porquanto, diante da própria evolução do
sistema jurídico-constitucional brasileiro — com a promulgação da Constituição
de 1988, a criação do STJ e a vigência do Código de Processo Civil —, o
entendimento que preconizo, com a devida vênia da douta maioria, me pareceu
o mais razoável, ou, em outras palavras: é a solução mais satisfatória (para o
momento), entendendo-se esta em função do que a ordem jurídica vigorante
considera como sentido de justiça.
Transcrevamos, para memento, a sinopse do decisório embargado:
Constitucional e Processual. Recurso especial contra acórdão em agravo de
instrumento que desafi a decisão interlocutória. Não conhecimento.
O recurso especial, como vem defi nido na Constituição Federal (art. 105, III), é
instrumento hábil a enfrentar os julgados provenientes de causas decididas, em
única ou última instância, pelos Tribunais.
A expressão constitucional “causas decididas” não pode ter compreensão
dilargante a ponto de abranger, para justificar o apelo especial, arestos
decorrentes de agravos instrumentados contra decisões do juiz singular.
O cabimento do recurso especial em agravo de instrumento exige que este
se origine de uma decisão que extinga o processo, com ou sem julgamento de
mérito.
Alinhei, como premissas dessa conclusão, alguns argumentos, cuja
transcrição é da maior valia, para a análise subseqüente:
A competência do STJ é a de “julgar as causas decididas em única ou última
instância.” Causas decididas, segundo me parece, são aquelas que foram julgadas,
a fi nal, que tiveram uma decisão terminativa, encerrando o processo, com ou
sem julgamento de mérito. Não se decide uma causa através de mero despacho
interlocutório. É preciso que ele seja, pelo menos, terminativo, que fine o
processo, que julgue a causa, na expressão constitucional... Julgar a causa não é
impulsionar a causa, despachar a causa; é concluir o julgamento, sentenciando-a,
pondo-lhe fi m (com ou sem alcance do mérito)... O não-conhecimento de recurso
especial, quando interposto contra acórdão proferido em agravo de instrumento,
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
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não acarreta qualquer prejuízo às partes. É que, matérias importantes como
as condições da ação, a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e sua
representação, o interesse processual, podem ser julgadas, de ofício, em qualquer
tempo ou grau de jurisdição (CPC, art. 267, § 3º), e, dos demais despachos no
curso do processo, cabe agravo retido, do qual as partes podem valer-se para
evitar que a sentença proferida na causa (abrangente ou não do mérito) transite
em julgado ou torne, a matéria ventilada (no agravo retido), preclusa. O ataque
do ato decisório intercalado, por via do agravo retido, tem a força de fazer com
que a sentença proferida na causa (sentença terminativa do processo) fi que com
a sua efi cácia condicionada ao desprovimento desse agravo, no que pertine às
questões nele discutidas (Revista do Superior Tribunal de Justiça, vol. 34, pp. 441 e
442 — sem grifo no original).
O embargante, na fundamentação de seus embargos, indica como correta
a orientação adotada pela egrégia Terceira Turma, no julgamento do Recurso
Especial n. 9.173-0-SP, de que resultou o acórdão assim ementado:
Quando a Constituição defi ne os contornos do especial, a causa decidida não
é apenas a de mérito, mas, qualquer uma, incidental ou não, apreciada em última
instância. Esse é o entendimento pacífi co daquela expressão nos tribunais (fl .
124).
Assegura, fi nalmente, ser este o escólio predominante na Suprema Corte
de Justiça consoante arestos proferidos no Agravo de Instrumento n. 24.439, de
1961, do Recurso Extraordinário n. 53.124, de 1965, e Recurso Extraordinário
n. 57.728, de 1967.
2. Antes, todavia, de tentar verberar, com menos méritos, os judiciosos
argumentos arvorados nos embargos, rogo aos meus eminentes pares que me
escusem, se lhes parecer rebarbativo o meu intento de perscrutar, ainda, o
sentido e a compreensão da expressão constitucional em viso, já agora alinhando
outros argumentos em sintonia com a legislação processual vigente (Código de
Processo Civil e Lei n. 8.038, de 28 de maio de 1990).
A Constituição da República, ao estabelecer a competência — originária
e recursal — dos órgãos da Justiça Federal (de primeiro e segundo graus) e
das Instâncias Especiais (Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal
Federal), nos arts. 102 a 109, menciona o termo “causa” nove vezes (“causa em
que fi gura como parte Estado estrangeiro”; “causa entre a União e os Estados
ou Municípios”; “causas fundadas em tratado”; “causa em que forem partes
instituições previdenciárias”; “causas decididas por juízes e tribunais”).
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 167
Entretanto, salvo nos casos de usar um termo jurídico consagrado e
específi co (como, por exemplo, mandado de segurança, habeas corpus, extradição,
reclamação, revisão, confl ito de competência, mandado de injunção, habeas data
etc.), os vocábulos empregados pela Lei Magna são: “causa”, “litígio”, “ação” (art.
102, I, a, e, n, e III; art. 105, II, c, e III; art. 108, II; art. 109, I, II e III, e §§ 1º,
2º e 3º).
Isso signifi ca que o legislador constituinte, ao disciplinar, em capítulo
próprio, matéria de enorme relevância, qual seja, a de estipular a competência
de Instâncias Especiais, utilizou-se de termos essencialmente técnicos, assim
entendidos — nos meios judiciais como na terminologia técnico-jurídica.
Causa, segundo os dicionaristas, em linguagem forense, “é processo em que se
debate e julga, ação, demanda, causa civil, causa criminal” (CALDAS AULETE,
“Dicionário Contemporâneo da Língua Portuguesa”, vol. 1, p. 741 — sem
grifo no original). “Na técnica processual, causa se confunde com demanda.
Empregam-se como vocábulos equivalentes. E esta acepção vem de que a causa
é o fundamento legal do direito que se quer fazer valer perante a autoridade
judiciária: causa, a razão, extensivamente passou a designar processo judicial,
sendo, pois, equivalente, a litígio” (DE PLÁCIDO E SILVA, “Vocabulário
Jurídico”, vol. 1, p. 321 — sem grifo no original).
“As expressões — preleciona o constitucionalista Pinto Ferreira — devem
ser usadas pelo legislador em seu sentido vulgar, salvo se se tratar de assunto
técnico, quando então será preferida a nomenclatura técnica peculiar ao setor de
atividade sobre o qual se pretende legislar” (Revista de Informação Legislativa
do Senado Federal, vol. 89, p. 183).
Como já se observou, alhures, no conferimento de competências aos
diversos órgãos judiciários, o Constituinte não se desbordou, uma única vez —
malgrado abusar da palavra “causa” — para o emprego de termo ou expressão
de signifi cação vulgar, como, in exemplis: “feito”, “autos”, “incidente”, “questão”,
ou mesmo “processo”, que tem conteúdo científi co próprio (e sentido diverso
do de causa). Deixou, o legislador, meridianamente clara a sua intenção de usar
(ao disciplinar matéria de competência de Tribunais maiores) exclusivamente
da terminologia jurídica, com a preocupação mediata de ser compreendido
e quiçá inspirado na lição de que “a essência e conteúdo da lei não estão nas
palavras, mas nas idéias, no espírito, nos superiores conceitos informadores da
lei. O conteúdo espiritual dela é sempre muito mais rico do que o expressado
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
168
literalmente” (ALÍPIO SILVEIRA, “Hermenêutica no Direito Brasileiro”, vol.
1, p. 5 — sem grifo no original).
O juiz atribui aos vocábulos sentido resultante da linguagem vulgar;
“porém, quando empregados termos jurídicos — ensina Carlos Maximiliano —,
deve crer-se ter havido preferência pela linguagem técnica. No Direito Público
usam mais dos vocábulos no sentido técnico; em Direito privado, na acepção
vulgar. Em qualquer caso, entretanto, quando haja antinomia entre os dois
signifi cados, prefi ra-se o adotado geralmente pelo mesmo legislador, conforme
as inferências deduzíveis ao contexto” (“Hermenêutica e Aplicação do Direito”,
p. 143 — sem grifo no original).
“Como observa Bierling (“Juristische Prinzipienlehre”, 1911, vol. IV, pp.
214/215), em geral se emprega de preferência a linguagem técnico-jurídica
no Direito Público, de modo que, caso surja diversidade de signifi cações num
mesmo vocábulo, o hermeneuta, entre a expressão científi ca e a vulgar, deverá
preferir a primeira” (ALÍPIO SILVEIRA, obra citada, p. 11).
No Texto Constitucional — como no dispositivo sob investigação — não
há nenhum indício, por mais leve que seja (como por exemplo, a conexão com
outras palavras do artigo ou do capítulo, o uso de palavras, no mesmo capítulo,
com signifi cações diversas etc.) de que se possa inferir que o termo causa tenha
sido empregado, pelo legislador, em sentido equivalente ao de questão (“questão”
é usada signifi cando causa, demanda, litígio, pelo vulgo).
Se o Constituinte pretendesse conferir, ao preceito, um conteúdo mais
amplo, seria bastante escrever: “julgar, em recurso especial, as questões decididas,
em única ou última instância, pelos Tribunais”, sem nenhuma dificuldade
semântica e sem prejuízo algum à clareza e perfeição do texto. A presunção,
portanto, em tema de redação constitucional, “é a de que o legislador se exprima
em termos técnicos, evitando os vulgares”, adotando a denominação jurídico-
científ ica de “causa”, quando, no contexto, cuidou de matéria de natureza,
também, técnica, qual seja, a criação e as hipóteses de cabimento do recurso
especial e a fi xação de competência de um Tribunal de instância derradeira.
3. Antes de tentarmos, a seguir, uma interpretação integrada mediante a
demonstração da correlação entre a “expressão constitucional” e o sistema de
recursos, no Código de Processo Civil em vigor, quero dizer algumas palavras
sobre a jurisprudência que se formou, no Supremo Tribunal Federal, acerca do
tema.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 169
Tenhamos presente, desde logo, que os arestos do Excelso Pretório
atribuindo um elastério maior ao vocábulo causa, no texto constitucional e que
constituem o fundamento proeminente da divergência, foram proferidos nos
anos de 1961, 1965 e 1967 (Recursos Extraordinários ns. 53.124 e 57.728 e
Agravo de Instrumento n. 24.434). Esses acórdãos são também citados, como
argumento basilar, nos Embargos de Divergência ns. 11.919 (Ministro-Relator
Américo Luz), 13.079-1 (Relator Ministro Costa Leite), 15.650-0 e 19.412-
4 (Relator Ministro Waldemar Zveiter) e 17.157-4 (Relator Ministro Edson
Vidigal), para julgamento em mesma assentada.
Não tenho, é evidente, nem o pejo, nem a ousadia de discordar do
entendimento fi rmado, na egrégia Suprema Corte, na década de 1960. Naquela
época, ele se justifi cava, tanto é que prevaleceu, com o aval de conspícuos juízes e
juristas. Era outro o Código de Processo Civil (o de 1939), com uma sistemática
recursal diversa da que prevaleceu no Código de Processo Civil de 1974. Sobre o
procedimento do recurso extraordinário vigia o art. 863 do Código de Processo
Civil de 1939, alterado pela Lei n. 3.396, de 02 de junho de 1958, substituída,
em 1974, pelo art. 541 do Código de Processo Civil, com vigência até o advento
da Lei n. 8.038, de 28 de maio de 1990, cujo art. 44 os revogou.
Com efeito, o art. 863 do Código de Processo Civil de 1939 tinha a
seguinte dicção:
Art. 863. Nas decisões proferidas em única ou última instância, caberá recurso
para o Supremo Tribunal Federal, nos casos previstos no art. 101, III, letras a e d, da
Constituição (sem grifo no original).
Com a promulgação da Lei n. 3.396/1958, citada, o art. 863 da antiga Lei
do Processo passou a ter a redação a seguir:
Art. 863. Caberá recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal das
decisões proferidas, em única ou última instância, pelos Tribunais da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Territórios, nos casos previstos na Constituição
Federal (sem grifo no original).
Já o art. 541, do atual Código de Processo Civil, estabeleceu:
Art. 541. Caberá recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal das
decisões proferidas por outros Tribunais, nos casos previstos na Constituição da
República (sem grifo no original).
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
170
Como se observa, ao tempo da formação jurisprudencial da Suprema
Corte, segundo a legislação vigente “cabia recurso extraordinário das decisões
proferidas por outros Tribunais”. O substantivo decisões tinha, no Código de
1939, abrangência maior, acepção muito mais dilargante, compreendendo, até
qualquer julgamento: acórdão, sentença, despacho. Até mesmo as decisões, em
sentido lato, de juiz de primeiro grau (sentenças ou despachos) poderiam ser
objeto do extraordinário (art. 863).
O Código de Processo Civil de 1973 usou de igual expressão: “das decisões
proferidas por outros Tribunais” (art. 541), em antinomia, aliás, com os arts. 162 e
163, que fazem nítida distinção entre acórdão, sentença, decisão (interlocutória) e
despacho. Não restava, pois, ao Supremo Pretório, na prevalência dessa legislação,
senão admitir o extraordinário manifestado contra decisão, entendida esta com
amplitude e largueza.
A Lei n. 8.038, de 1990, não incidiu na erronia, revogando, desde logo,
expressamente, no art. 44, a Lei n. 3.396/1958 e o art. 541 do Código de Processo
Civil, limitando o cabimento dos recursos extraordinário e especial “aos casos
previstos na Constituição Federal” (art. 26). A alteração da legislação processual,
sobretudo na parte dos recursos, impende ser considerada, por ter indiscutível
repercussão na fi xação do verdadeiro sentido da expressão constitucional —
“julgar causas decididas” (art. 105, III).
4. A Constituição de 1988, a par de instituir um Tribunal de Instância
Excepcional, conferindo-lhe competências originária e recursal — criou um
novo recurso — o especial, com feição de extraordinário, erigindo o Superior
Tribunal de Justiça em intérprete máximo da Lei Federal, com função de
unifi car a jurisprudência dos Tribunais que lhe estão vinculados, em hierarquia,
deixando a regulamentação dos procedimentos à legislação ordinária (Código
de Processo Civil e Lei n. 8.038/1990).
Destarte, há um entrelaçamento de tal ordem entre as normas
constitucionais e o Código de Processo Civil — na parte pertinente ao sistema
de recursos — que se não pode pretender uma interpretação isolada, de umas
ou de outras, sem cotejá-las, numa integração recíproca. Os juristas, aliás,
identifi cam um paralelo entre a disciplina do processo e o regime constitucional
em que ele se desenvolve. “Todo o Direito Processual, como ramo do Direito
Público, tem suas linhas fundamentais traçadas pelo Direito Constitucional, que
fi xa a estrutura dos órgãos jurisdicionais, que garante a distribuição da justiça
e a declaração do direito objetivo e estabelece alguns princípios processuais; e
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 171
o Direito Processual Penal chega a ser apontado como Direito Constitucional
aplicado às relações entre autoridade e liberdade. O Direito Processual é
fundamentalmente determinado pela Constituição em muitos dos seus aspectos
e institutos característicos. Alguns princípios que o informam são, ao menos
inicialmente, princípios constitucionais, ou seus corolários” (ANTÔNIO
CARLOS ARAÚJO CINTRA, “Direito Processual Constitucional”, in Teoria
Geral do Processo, p. 75).
Constitui regra básica de hermenêutica a de que se não pode interpretar
uma norma, seja de lei ou de Constituição, de forma isolada, desarticulando-a
do sistema jurídico a que está jungida. Consiste o processo sistemático, afi ança
Carlos Maximiliano, “em comparar o dispositivo sujeito a exegese com outros
do mesmo repositório ou de leis diversas, mas referentes ao mesmo objeto. Por
umas normas se conhece o espírito das outras... O direito objetivo não é um
conglomerado caótico de preceitos; constitui vasta unidade, organismo regular,
sistema, conjunto harmônico de normas coordenadas, em interdependência
metódica, embora fi xada cada uma no seu lugar próprio. De princípios jurídicos
mais ou menos gerais deduzem corolários; uns e outros se condicionam e
restringem reciprocamente, embora se desenvolvam de modo que constituam
elementos autônomos em campos diversos” (obra citada, pp. 165 e 166).
Na estria de uma interpretação sistemática, decorrente do confronto
entre a expressão constitucional — julgar causas decididas — e a disciplina da
interposição, do processamento e dos efeitos do agravo instrumentado, como
preconizada no atual Código de Processo Civil (art. 522 e § 1º), a conclusão
que me parece mais correta — entendendo-se esta em função do que a ordem
jurídica considera como sentido de justiça — é a de que não tem cabida
o conhecimento, pelo STJ, de recurso especial manifestado contra acórdão
proferido em agravo de instrumento desafi ando decisão interlocutória de juiz do
primeiro grau.
O Código de Processo Civil, ao indicar, no art. 522, as hipóteses de
cabimento do agravo de instrumento, dispôs:
§ 1º. Na petição, o agravante poderá requerer que o agravo fi que retido nos
autos, a fi m de que dele conheça o Tribunal, preliminarmente, por ocasião do
julgamento da apelação; reputar-se-á renunciado o agravo se a parte não pedir
expressamente, nas razões ou nas contra-razões da apelação, sua apreciação pelo
Tribunal (sem grifo no original).
Nesta fase, façamos um esclarecimento rememorativo.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
172
No Código de Processo Civil de 1939, embora persistam alguns aspectos
de convergência, o recurso de agravo tinha diferente formulação. O agravo
de instrumento era o recurso adequado para afrontar decisões proferidas em
incidentes processuais, mas com o elenco delimitado no art. 842. O agravo no
auto do processo circunscrevia-se aos casos específi cos, elencados em numerus
clausus (art. 851). Esses recursos não poderiam ter uso indiferente, pelas partes,
já que os casos de cabimento de cada espécie (agravo de instrumento ou agravo
no auto do processo) eram defi nidos em relação exaustiva. J. C. Barbosa Moreira
confi gurou, em síntese de inigualável clareza, a índole do agravo no auto do
processo (que se distancia do atual agravo retido): “O cabimento do agravo no
auto do processo cingia-se a determinados casos expressamente prescritos na lei
(Código de 1939, art. 851), e nesses não havia alternativa para a parte, a não
ser a de omitir-se: não lhe era dado optar entre a retenção nos autos e a subida
imediata, por meio de instrumento” (“Comentários ao Código de Processo
Civil”, vol. V, p. 464).
Não se admitia, portanto, o recurso indiferente, mesmo consagrado pelo
Código revogado o princípio da fungibilidade (art. 810), porque, no caso, o uso
do agravo de instrumento ao invés do agravo no auto do processo (ou a recíproca)
confi gurava erro grosseiro cuja “inescusabilidade derivava da circunstância de se
haver deduzido recurso impertinente, em substituição daquele expressamente
previsto na lei” (“Revista Forense,” 91/123). “Os Tribunais recusaram sempre
(na vigência do Código de 1939) o conhecimento de um recurso ao invés de
outra espécie recursal cabível e adequada” (RF, 163/215, “Revista dos Tribunais”,
489/105; RP, 4/393) (STF).
Em suma: na vigência do Código de Processo de 1939, sendo outra a
disciplina dos recursos, era, em ordem de princípio, impraticável a interpretação
sistemática, conjugando-se normas da Lei do Processo e da Constituição
Federal, visando ao desiderato que, agora, vigendo outra legislação, se tenta
alcançar.
Na petição, repito, diz o atual Código (§ 1º do art. 522), que “o agravante
poderá requerer que o agravo fi que retido nos autos, a fi m de que dele conheça
o Tribunal, preliminarmente, por ocasião do julgamento da apelação”. A
interposição do agravo, com a manifestação da parte para que fi que retido evita
que a sentença a ser proferida na causa (abrangente ou não do mérito) transite
em julgado, ou torne a matéria ventilada no agravo (retido), preclusa. O ataque
das decisões interlocutórias, pela via do agravo retido, tem a força de fazer
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 173
com que a sentença (terminativa da causa, em primeira instância) fi que com a
sua efi cácia condicionada ao desprovimento desse agravo, no dizente às questões
nele articuladas. O agravo retido tem o efeito diferido — sem perda de sua
natureza de agravo —, preservando as questões, nele suscitadas, do risco da
preclusão, transferindo sua apreciação ao tribunal ad quem, como preliminar do
julgamento da apelação. Pode ser manejado no processo de conhecimento, no de
execução, no cautelar e nos procedimentos especiais. “Ocioso é acrescentar que,
se agravante o vencedor, de modo nenhum se exige, para facultar-lhe o pedido
de julgamento do agravo nas contra-razões, que a apelação venha da parte
contrária. O apelante pode ser o Ministério Público, até aí na função de custos
legis, ou terceiro prejudicado” ( J. C. BARBOSA MOREIRA, “Comentários ao
Código de Processo Civil”, vol. V, pp. 468 e 469).
O conhecimento do agravo retido, preleciona o processualista Athos Gusmão
Carneiro — hoje, conspícuo Ministro desta Corte — não sofre óbice algum pela
ausência de apelação voluntária, quando a sentença sobe ao reexame do Tribunal
apenas por força do disposto no art. 475 do Código de Processo Civil. Exegese
diversa não só poderia causar grave prejuízo à parte contrária à Fazenda, como
infringiria o princípio fundamental da igualdade das partes, pois o reexame
necessário abrange também as questões incidentais resolvidas em desfavor ao
Poder Público (RF, 254/314).
Impende considerar que, de todas as decisões interlocutórias desafi áveis
por agravo de instrumento, pode o recorrente pedir que ele fi que retido. O
dispositivo do art. 522, § 1º, do Código de Processo Civil é peremptório e
inadmite restrições. Não importa que se trate de incidentes processados em
apartado, como, ad exemplum — a impugnação do valor da causa ou as exceções
de impedimento ou suspeição. Sendo a hipótese de agravo de instrumento,
poderá haver retenção, salvante as pouquíssimas exceções que decorrem da
própria sistematização dos recursos, na legislação processual (verbi gratia, o
agravo de instrumento contra decisão indeferitória do processamento dos
recursos em geral, inclusive do especial e do extraordinário), mas que não se
inserem no objetivo dos presentes embargos.
O insigne Th eotônio Negrão, espiolhando todo o Código de Processo, com
vistas à identifi cação de decisões em que, embora comportassem o agravo de
instrumento, fosse inviável, todavia, a forma retida, escreveu: “No processo de
execução, nem sempre cabe apelação e, neste caso, o agravo retido não teria como
chegar à superior instância” (Código de Processo Civil e legislação processual
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
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em vigor, 23ª edição, nota 11 ao art. 522, p. 353). Tenho, entretanto, a ousadia
de discordar do eminente jurista. Em primeiro lugar, apesar de o agravo retido
diferir o julgamento da matéria ao Tribunal, não perde a sua natureza de agravo,
possibilitando o juízo de retratação. Ao depois, o processo de execução, ainda
quando não forem opostos os embargos (se não ultimado sem o julgamento do
mérito), só se extingue por uma das motivações previstas no art. 794 do CPC,
e a extinção só produz efeito quando declarada por sentença, sendo esta apelável
(art. 795 do Código de Processo Civil).
J. C. Barbosa Moreira, em seus “Comentários ao Código de Processo Civil”,
alinhou, casuisticamente, a quase totalidade das decisões que, no processo de
execução, estão sujeitas ao agravo (obra citada, p. 462).
Até mesmo na hipótese do art. 558 e seu parágrafo único do CPC —
quando, ao agravo, poder-se-á conferir efeito de suspender a execução de certas
medidas judiciais — nada impede que a parte faça a opção pelo agravo retido.
Em casos expressamente defi nidos em lei, o juiz perante o qual se interpôs o
agravo, ou o Relator, pode, a requerimento da parte, “suspender a execução da
decisão agravada”, até o julgamento do recurso, pelo Tribunal. A competência,
esclarece Barbosa Moreira, “para decretar a suspensão antes da subida, remanesce
no órgão a quo, ainda que o agravo fi que retido nos autos e só venha a subir
com a apelação porventura interposta contra a sentença; neste caso, pois, o
agravante pode requerer a suspensão em qualquer momento anterior à execução
da medida, ou mesmo em se tratando de providência que se protraia (como a
prisão do depositário infi el) enquanto ela perdure. É intuitivo, contudo, que
normalmente optará o agravante, em hipóteses tais, pela subida imediata” (obra
e volume citados, p. 472).
Pois bem: fi cando, o agravo, inserido nos autos, a requerimento da parte,
e uma vez encerrado o procedimento, no primeiro grau de jurisdição (com ou
sem conhecimento do mérito), se da sentença se interpuser apelação (ou ela
estiver submetida ao obrigatório duplo grau de jurisdição), ao Tribunal ad quem
competirá, ao ensejo do respectivo julgamento, apreciar as questões objeto do
agravo retido. É, portanto, este último decisório (proferido em última instância),
aí, já abrangente das matérias discutidas nas decisões monocráticas de primeiro
grau de daqueloutras que motivaram a apelação, que se deve atacar pela via do
recurso especial.
Esta é a conclusão que me parece mais racional, venia concessa, com base
em interpretação sistemática, e que poderá induzir esta Corte à adoção de
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 175
uma jurisprudência construtiva e, até, a uma providência de política judiciária.
Se prevalecente, reduzirá, em média, vinte e cinco por cento dos recursos especiais,
na área de Direito Público (e quiçá, percentual muito mais elevado, na Seção
de Direito Privado, em que são numerosas as questões processuais embutidas
em agravos), sem nenhum prejuízo para as partes, porque delas não se retira a
possibilidade do reexame de matérias — desde que contidas em agravo retido —
pela instância superior, nem cria óbice intransponível que impeça esse reexame,
nem confi gura, por isso mesmo, restrição ilegal ao direito de recorrer.
Ao revés: em prevalecendo esse entendimento, direcionar-se-á a atividade
das partes para o uso das formas recursais adequadas e cônsones com a
economia processual, impedindo o manejo de recursos inúteis, que postergam,
indefi nidamente, a prestação jurisdicional e afogam os Tribunais Superiores
com incidentes protelatórios (e numeroso acervo de processos), difi cultando
ou impedindo-os, até, de cumprir a sua destinação constitucional, que é a de
proferir juízo, em defi nição derradeira e irrefragável, sobre questões jurídicas de
proeminente relevância, na interpretação da legislação federal.
A interpretação que defendo não incorre na censura impetuosa, mas
serena, do Ministro Pádua Ribeiro, assim concebida:
Não podemos, de forma alguma sufragar interpretações que cerceiem a
competência deste Tribunal quanto à salvaguarda da inteireza do Direito Público
Federal. As decisões dos Tribunais de apelação, mesmo proferidas em agravo,
desde que apliquem Lei Federal, não podem nunca fi car sem a possibilidade de
reexame deste Tribunal. Caso contrário, passaríamos a ter Tribunais de última
instância espalhados por todo o território nacional, cada um dando a última
palavra, em termos de interpretação e aplicação de Lei Federal (Embargos de
Divergência n. 19.481-1).
O equívoco em que incorre o nobre Ministro, sobre vislumbrar a
possibilidade de “cerceio à competência do STJ e da transformação de Tribunais
ordinários em estâncias especiais” é consectário da estreiteza do voto que
proferi, na Primeira Turma, evidentemente sucinto e do qual não despontavam
argumentos para a exata compreensão da tese e nem propiciava discussão mais
profunda sobre o alcance do tema.
Todavia, o entendimento que preconizo não me veio ao acaso, sem a devida
meditação e sem que me debruçasse, ao longo do tempo, no estudo comparativo
da Constituição e da legislação processual.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
176
A apreensão do eminente Ministro, como se ouviu da exposição, não tem
razão de ser. Não há restrição de competência do STJ. Não se quis, em momento
algum, afastar as decisões interlocutórias do crivo do Superior Tribunal de
Justiça. O que se pretende é racionalizar o uso do agravo.
Não é demais repetir, com apoio nas lições dos juristas, que o agravo
de instrumento, hoje, considerado, recurso anacrônico e superado, não surte,
na grande maioria das vezes, outro efeito prático, senão o da procrastinação
(Th eotônio Negrão, ob. citada, p. 354). Tanto que, alguns juristas sugerem,
ainda que de lege lata, que se reconheça ao juiz o poder de indeferir, por falta
de interesse, a formação do instrumento, impondo ao agravante o caminho da
retenção (Moniz Aragão, “Considerações Práticas Sobre o Agravo”, Revista
Forense, 246/65).
Adverte Barbosa Moreira, que negar a viabilidade da retenção é atitude que
contravém de frente a uma aspiração generalizada e justa. A tendência que vai
predominando é exatamente a oposta: prestigiar mais o agravo retido, cerceando
o emprego da outra modalidade para evitar delongas a que costuma dar ensejo
(Rev. de Processo, 31/269).
Interposto o agravo na sua forma retida contra decisão interlocutória, as
questões nela suscitadas, não precluem, mas fi cam no aguardo do julgamento
pelo Tribunal ordinário, conjuntamente com as demais matérias que objetivaram
a demanda. Esse último julgamento fi ca sob a censura do Superior Tribunal de
Justiça, acaso manifestado o especial. Não haverá, pois, nenhuma questiúncula,
decidida no curso do processo, imune ao reexame da instância derradeira.
Do exposto, conclui-se:
a) o legislador constituinte, ao atribuir ao STJ competência para julgar, em
recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais
(art. 105, III), conferiu à palavra causa o sentido científ ico, técnico-jurídico,
inscrevendo-a na acepção de “ação”, “demanda”, “litígio”, tanto quanto o fez com
outros vocábulos, ao fi xar o elenco de competências de juízos e Tribunais de
Instância Especial (arts. 102, 105 e 109), por cuidar de assunto essencialmente
técnico;
b) se o constituinte pretendesse imprimir, ao dispositivo (art. 105, III),
um conteúdo mais amplo, tê-lo-ia feito, escrevendo em seu contexto: “julgar,
em recurso especial, as questões decididas, em única ou última instância, pelos
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 177
Tribunais”, sem difi culdade semântica e sem prejuízo à clareza e precisão do
texto — quod lex non distinguit, non distinguere possumus;
c) ao conferir competência aos órgãos judiciários (em todo o Capítulo
III do Título IV da Constituição), o constituinte não se desbordou, uma
única vez — apesar de abusar da palavra “causa” — para o emprego de termos
ou expressões de signifi cação vulgar, usando exclusivamente de terminologia
jurídica, com o espírito preconcebido de evitar a confusão de conceitos ou
dúvidas na aplicação de seus dispositivos;
d) de uma interpretação sistemática resultante do confronto entre a expressão
constitucional — julgar causas decididas — e a disciplina da interposição, do
processamento e dos efeitos do agravo de instrumento (Código de Processo
Civil, art. 522 e § 1º), a conclusão que me parece mais correta — entendendo-se
esta em função do que a ordem jurídica considera como sentido de justiça — é
a de que o STJ não deve conhecer de recurso especial manifestado em agravo
de instrumento que desafi a decisão interlocutória de juiz de primeiro grau, por
ser a única condizente, a meu sentir, com os interesses da justiça e o princípio da
economia processual;
e) essa conclusão — a mais racional, data venia — não acarreta prejuízo às
partes, porque destas não retira a possibilidade do reexame de matérias — desde
que contidas em agravo retido — pelo Superior Tribunal de Justiça, nem cria
óbice intransponível que impeça esse reexame e não confi gura, por isso mesmo,
restrição ilegal (ou inconstitucional) ao direito de recorrer; essa interpretação, ao
revés, direcionará a atividade das partes para o uso racional das formas recursais
adequadas (preferindo sempre o manuseio do agravo retido) e congruentes
com a economia processual, impedindo o manejo de recursos inúteis, que
postergam, injustifi cadamente, a prestação jurisdicional e afogam as instâncias
especiais com incidentes protelatórios, difi cultando ou impedindo, até, o STJ de
cumprir sua destinação constitucional, que é a de proferir juízo, em defi nição
derradeira, sobre questões jurídicas de proeminente relevância, na interpretação
da legislação infraconstitucional;
f ) essa orientação não restringe o uso do agravo de instrumento, ao ponto
de fazer letra morta do dispositivo do Código, que o instituiu (mesmo porque
poderá ser manejado livremente na esfera das instâncias ordinárias); a parte
continua com o direito de opção entre o agravo de instrumento e a sua forma
retida; mas, não lhe é dado usar de mero capricho, como se a Lei do Processo lhe
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
178
atribuísse poderes absolutos na escolha do recurso — ou instrumentado ou retido;
o limite do direito à opção da parte está em que deve obedecer ao princípio
da economia processual, que é o que consulta, prevalentemente, os interesses da
justiça e da coletividade.
Há, de incidir, aqui, a vetusta parêmia: o Direito não dá todo direito, nem
o seu uso confere arbitrariedade. Levado a suas últimas conseqüências, já não se
teria o uso regular, mas o abuso do direito, a que já os romanos profl igavam com
veemência com argumentos sintetizados no conhecido apotegma: summum jus,
summa injuria.
No preâmbulo da Constituição, ao se constituir um Estado Democrático
destinado a assegurar o exercício dos direitos individuais e sociais, se elegeu a
Justiça como um dos valores supremos da sociedade. Torna-se curial que, ao
exercer o seu direito, o titular terá que se amoldar aos interesses maiores do
ideário da Justiça — em seu sentido mais abrangente — e que condiz com a
realização do bem coletivo.
O processo, que é um meio, não pode exigir um dispêndio superior ao valor
dos bens — ou da relevância da matéria — que estão em debate, que são o seu
fi m; uma necessária proporção entre o fi m e os meios deve orientar a economia
do processo e, conseqüentemente, a atividade das partes, no âmbito do processo
(conf. EDUARDO COUTURE, “Fundamentos de Direito Processual Civil”,
p. 188);
g) excepcionalmente, para os casos (aliás, ainda não identifi cados pelos
processualistas) em que a jurisprudência vier a entender que não cabe, das
decisões monocráticas de primeiro grau, o agravo em sua forma retida, aí então
nada impede que o STJ conheça o recurso especial em agravo de instrumento
(“Código de Processo Civil”, art. 558);
h) o entendimento do Supremo Tribunal Federal, ao conferir ao termo
causa (na vigência de Constituições revogadas), o sentido amplo de questão,
resultou de jurisprudência, em princípio com profundas divergências — entre
Ministros e Turmas — construída em décadas anteriores a 1970, quando a
composição do Excelso Pretório era inteiramente outra e a legislação processual
(Código de 1939) — na parte pertinente aos recursos — tinha disciplina
diferente; promulgada a Constituição de 1988, revogado o Código de Processo
Civil de 1939 e tendo em vista as alterações previstas na Lei n. 8.038/1990,
art. 44, a egrégia Suprema Corte de Justiça ainda não enfrentou a controvérsia,
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 179
analisando o Texto Constitucional sob o pálio de uma interpretação sistemática,
com as regras do Código de Processo Civil em vigor;
i) embora nas causas em que forem parte Estado estrangeiro ou organismo
internacional, de um lado, e, de outro, Município, julgadas, em primeiro grau de
jurisdição, pelos juízes federais, o recurso seja o ordinário para o STJ, o sistema
de recursos é o do CPC (arts. 36 e 37 da Lei n. 8.038/1990); pelo princípio
da economia processual, a parte deve usar do agravo, na sua forma retida, para
desafi ar as decisões do juiz de primeiro grau (Lei n. 8.038/1990, art. 36, II); o
Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o recurso ordinário (CF, art. 105, II,
c) decidirá, em conjunto, todas as questões fragmentárias inseridas nos agravos
retidos e as demais motivadoras do litígio; desse decisório do STJ, proferido em
última instância, é que poderá caber, nas hipóteses previstas na Constituição,
recurso extraordinário; optando, a parte, pelo manejo do agravo de instrumento
contra as decisões interlocutórias dos juízes federais de primeira instância, se
apreciados pelo STJ, poderão surgir tantos recursos extraordinários quantos
forem os agravos instrumentados; entretanto, se deve ou não conhecer desses
recursos, é tarefa privativa do colendo Supremo Tribunal Federal.
Com estas considerações e a vênia da doutíssima maioria, mantenho o
entendimento que perfi lhei quando do julgamento, na egrégia Primeira Turma,
do Recurso Especial n. 19.352-0:
A expressão constitucional causas decididas não pode ter compreensão
dilargante a ponto de abranger, para justifi car o conhecimento do apelo especial,
arestos decorrentes de agravos instrumentados contra decisões do juiz de
primeiro grau.
O conhecimento do recurso especial, em agravo de instrumento, exige que
este se origine de uma decisão (em primeiro grau de jurisdição), que extinga o
processo, com ou sem julgamento de mérito.
Rejeito os embargos.
É como voto.
VOTO
O Sr. Ministro José Dantas: Senhor Presidente, meu voto está de acordo
com aquele proferido nos Embargos de Divergência no Recurso Especial n.
11.919-9-AM, do qual farei oportuna juntada por xerocópia.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
180
ANEXO
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL N. 11.919-AM
VOTO
O Sr. Ministro José Dantas (Relator): Sr. Presidente, a divergência
suscitada nos presentes embargos oferece-se palmar, conforme se sabe que,
no tema conceitual das decisões interlocutórias, põem-se num plano de absoluta
similaridade as matérias cotejadas — a reabertura de prazo de vista ao
Ministério Público, caso dos autos, e a renovação da intimação para formação
de instrumento, por omissão do nome do advogado na respectiva publicação,
acórdão paradigma.
E a conhecê-los, os embargos não parecem oferecer maior difi culdade
quanto à pacifi cação da divergência a que se prestam.
Na verdade, se bem que ainda carente de maturidade, o novo recurso especial
tem lastro de experiência nas antiquíssimas práticas do recurso extraordinário,
seu irmão colaço. Daí que as arestas formais de maior repetência encontram-
se aplainadas do modo como, no curso de um longo tempo, foram aos poucos
estabelecidas as defi nições temáticas, mormente em matéria de cabimento do
derradeiro e excepcional apelo interpretativo da Lei Federal.
Então, no que interessa ao caso dos autos, cabe acentuar que, desde os
primeiros tempos, o alcance da expressão causas decididas em última ou derradeira
instância fi ndou esclarecido pelo sentido fi nalístico da norma constitucional
instituidora do recurso extraordinário; isto é, por uma abrangência maior do
que a concepção formalística da técnica processual, signifi cativa do litígio
meritoriamente considerado.
Da evolução dessa temática jurisprudencial, conclusiva de uma mais ampla
compreensão terminológica, fez excelente apanhado o Professor Roberto Rosas,
intitulado “O Conceito de causa para a Competência do STF”, a cuja publicação
vale remeter o pesquisador — RT 532/289.
Donde a intermitência de julgados conceituadores do termo “causa”,
proferidos a propósito do recurso extraordinário cabível contra decisão
interlocutória, sem exigência de maior adequação ao permissivo constitucional
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 181
do que a irrecorribilidade do julgamento nas instâncias inferiores, segundo a
expressão do saudoso Ministro Victor Nunes, ao votar no RE n. 57.682-GB, in
RTJ 34/161. Consulte-se, a exemplo, o seguinte rol de ementas:
Recurso extraordinário. Cabimento contra decisão interlocutória ou proferida
em agravo, desde que defi nitiva (RE n. 53.124-PR, Relator Ministro Evandro Lins e
Silva, RTJ v. 31, p. 323, 1965)
Cabe recurso contra decisão proferida em agravo ou contra decisão
interlocutória, desde que defi nitiva (AI n. 24.434-GO, Relator Ministro Victor Nunes
Leal, RTJ 17, p. 114, 1961)
O recurso extraordinário é admissível de decisão de caráter interlocutório,
quando ela configura uma questão federal, encerrada definitivamente nas
instâncias locais (RE n. 57.728-SP, Relator Ministro Hermes Lima, RTJ 41, p. 153,
1967) fl s. 98-99.
Complete-se essa colação, tomada de empréstimo do sobrestado recurso
extraordinário do Ministério Público embargante, com um precedente, de
data bem mais recente, pertinente à legitimidade passiva do Banco Central em
determinada ação de anulação e substituição de ORTN, matéria de deslinde
evidentemente interlocutório, e por isso ocorrido em sede do agravo de
instrumento que o Tribunal Regional Federal da 2ª Região havia desprovido —
RE n. 114.210-RJ, in RTJ 128/383.
Igual exemplifi cação de matéria agravável poderia forrar-se em acórdão
antigo, relativo à exceção de competência do foro do desquite — RE n. 58.699,
Relator Ministro Hermes Lima, in RTJ 35/706.
Finalmente, en passant, lembrem-se tantos ou quantos verbetes da Súmula
do Supremo Tribunal Federal, constituídos à base do reexame de decisões
interlocutórias, consoante a natureza eminentemente incidental dos temas
averbados; vejam-se:
Súmula n. 231 — produção de provas pelo revel comparecente;
Súmula n. 240 — depósito preparatório do recurso em ação de acidente do
trabalho;
Súmula n. 310 — contagem do prazo recursal, no caso de intimação na sexta-
feira;
Súmula n. 425 — tempestividade do agravo tardiamente despachado;
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
182
Súmula n. 619 — prisão do depositário judicial, independentemente de ação
de depósito.
Em suma, Sr. Presidente, sem desmerecer a pródiga ilustração do voto
condutor do v. acórdão embargado, fi co em que maior acerto há em admitir-se
cabível o recurso especial contra decisões interlocutórias, do modo como o v.
acórdão paradigma fi liou-se à tradicional jurisprudência suprema, tocante ao
similar cabimento do recurso extraordinário.
Daí que, fi liando-me também a tão antiga construção exegética, aplico-a ao
caso sub judice; pelo que devolvo os autos à Turma de origem, para que, afastada
a prejudicial de que se trata, julgue o recurso especial como achar de direito.
Para tanto é que recebo os embargos, nos limites da divergência que lhes
deu causa.
É como voto.
VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro William Patterson: Sr. Presidente, com a devida vênia
do Sr. Ministro Demócrito Reinaldo, e na linha dos precedentes desta Corte
Especial, acompanho o Sr. Ministro-Relator.
VOTO
O Sr. Ministro Bueno de Souza: Senhor Presidente, meu voto é no sentido
daquele proferido nos Embargos de Divergência em Recurso Especial n.
19.352-1-SP.
ANEXO
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL N. 19.352-SP
VOTO
O Sr. Ministro Bueno de Souza: Sr. Presidente, também louvo o diligente
esforço do eminente Ministro Demócrito Reinaldo, em buscar a compatibilização
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 183
dos textos apropriados para o discernimento da questão. Assim também,
muito me sensibiliza a superior preocupação de S. Exa. com a desordenada
multiplicação de feitos na competência desta Corte, a ponto de acarretar o seu
congestionamento. A busca, portanto, de critérios interpretativos que pudessem
aliviar essa situação, sem dúvida, se recomenda, porém, não me parece, data venia,
que o critério propugnado, baseado principalmente em expressões textuais da
própria Constituição, possa sustentar, de modo satisfatório, o que S. Exa. propõe.
Basta ver, por acréscimo ao que foi ponderado pelo Sr. Ministro José Dantas, o
que consta também na Constituição, art. 105, II, quanto à competência desta
Corte, em que se prevê julgamento, em recurso ordinário, das “causas em que
forem partes Estado estrangeiro ou organismo internacional, de um lado, e, do
outro, Município ou pessoa residente ou domiciliada no País”.
Tive mesmo ensejo de relatar agravo de instrumento, perante a Quarta
Turma, interposto por Estado estrangeiro em causa contida nesta previsão
constitucional. Não me parece que o Tribunal pudesse escusar-se a esta
competência. Penso que por outro caminho se há de buscar a solução que todos
almejamos, principalmente sem desguarnecer a tutela da interpretação uniforme
do Direito Federal. Não é demais também ponderar que a tendência para
simplifi cação do processo, se por um lado proporciona alguns dos benefícios que
todos buscamos, por outra parte dá motivos à prática de lesões graves a direitos,
por ocasião das decisões interlocutórias, quando, por exemplo, o Juiz nega a
produção de meios de prova, o que pode equivaler à denegação do direito que
dessa prova depende.
Penso que a recusa dessa competência, a título de realizarmos um
programa de adequação do Tribunal ao desempenho das suas funções,
seria arriscada simplificação de problema de magnitude talvez maior. Por
isso, persisto naquele entendimento tradicional, sobre o qual penso devamos
evoluir por outros métodos, isto é, causa é qualquer feito em que se possa
apontar lesão, contrariedade ao direito federal, sem prejuízo das construções
que estão aguardando nossa criatividade. Certamente que, em um breve tempo,
encontraremos algum caminho. Por enquanto, mantenho meu entendimento,
data venia.
VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro: O meu voto é no sentido do
que proferi nos Embargos de Divergência no Recurso Especial n. 19.352-1-SP.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
184
ANEXO
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL N. 19.352-SP
VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro: Sr. Presidente, a meu ver,
nenhuma interpretação da palavra “causa” que implique restringir a competência
constitucional deste Tribunal de zelar pela autoridade e uniformidade
interpretativa da legislação federal pode ser aceita. Todavia, cabe-me, no ensejo,
manifestar a minha sincera homenagem ao brilhante trabalho produzido pelo
eminente Ministro Demócrito Reinaldo, no voto que acaba de proferir, que
contém subsídios sólidos que devem ser considerados — e que se espera no
tempo mais breve — pelo legislador, a fi m de procurar melhorar a situação
em que se encontra, não apenas esta Corte, mas os demais Tribunais do País,
que, na verdade, são vítimas de legislação processual repleta de recursos, que se
multiplicam diariamente e que cada vez mais estão a comprometer a própria
aplicação do Direito substancial.
O processo, sem dúvida alguma, tem caráter instrumental, mas essa
instrumentalidade não deve ser exagerada a ponto de se transformar em
formalismo comprometedor do sentido maior de se aplicar a lei no mais curto
período de tempo.
Com essas breves considerações, prestando mais uma vez as minhas
homenagens ao estimado Ministro Demócrito Reinaldo, peço vênia para
manifestar meu ponto de vista já tradicional, no sentido de considerar que
a palavra “causa” há de ser entendida num sentido amplo, à vista do Texto
Constitucional em vigor, atinente à interposição do recurso especial.
Acompanho o Sr. Ministro-Relator, recebendo os embargos.
VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro Costa Lima: Senhor Presidente, cumprimento o eminente
Ministro Demócrito Reinaldo pelo brilhante voto que acaba de proferir.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 185
Todavia, na linha do precedente de minha relatoria, EDiv no REsp n.
13.473-5-AM, julgado em 24.09.1992, peço vênia para acompanhar o voto do
eminente Ministro-Relator.
ANEXO
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL N. 13.473-AM
(920008022-7)
Embargante: Ministério Público Federal
Embargado: J. Miranda Auriero
EMENTA
Embargos de divergência. Conhecimento. Recurso especial.
Admissibilidade. Causa em sentido lato. Agravo de instrumento.
I. Causa para efeito de admissibilidade do recurso especial há de
ser compreendida lato sensu. É qualquer questão sujeita a uma decisão
judiciária, em última ou única instância, ainda que incidentalmente.
II. Embargos recebidos para admitir a interposição de recurso
especial, mesmo quando a decisão recorrida tiver sido proferida em
agravo de instrumento.
III. Baixa dos autos à Turma para, afastado o óbice, siga com o
julgamento.
VOTO
O Sr. Ministro Costa Lima (Relator): É competente o Superior Tribunal
de Justiça para processar e julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única
ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos
Estados, do Distrito Federal e Territórios (art. 105, III, da CF).
À sua vez, compete aos Tribunais Regionais Federais processar e julgar as
causas decididas pelos Juízes Federais.
A mesma discussão havida quanto o que se devia entender por causa para
efeito de admissão do recurso extraordinário, foi revivida no que pertine ao
recurso especial. O que se disse ali tem aplicação aqui.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
186
Estudo histórico feito pelo Professor Roberto Rosas (“Recursos no Superior
Tribunal de Justiça”, Ed. Saraiva, 1991, pp. 171-176) mostra a evolução da
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Para o Ministro Hahnemann
Guimarães, “a causa é a questão decidida na sentença que, em única ou última
instância, encerra o processo judicial (RE n. 12.815). Em outra oportunidade
afi rmou que causa é qualquer processo que se decide em juízo, encerre ou não
litígio, porque pode haver processo com ou sem litígio (RE n. 22.141)”.
Nessa linha de entendimento, deixou de considerar o simples processo
administrativo, a reclamação ou a correição parcial, quando a decisão tem cunho
meramente administrativo, deixando de envolver questão federal (RE n. 73.297,
RTJ 63/297; RE n. 79.323, RTJ 73/936). Conclui Roberto Rosas com Castro
Nunes “que a expressão causa deve ser entendida com ampla compreensão” (ob.
cit., p. 213).
José Frederico Marques diz que “o vocábulo causa é empregado em sentido
amplo, e também como sinônimo de questão. Portanto, cabe, igualmente, recurso
extraordinário contra acórdãos referentes a causas de jurisdição voluntária e
contra acórdãos que contenham decisão interlocutória simples, ou sentença
terminativa” (“Manual de Direito Processual Civil”, 3º vol., 2ª parte, p. 179).
Para Moacyr Amaral Santos o primeiro pressuposto é que deve ter havido
decisão de uma causa. “É da decisão que se recorre. Causa é qualquer questão
sujeita à decisão judicial, tanto em processos de jurisdição contenciosa como
em processos de jurisdição voluntária” (“Primeiras Linhas de Direito Processual
Civil”, 3º vol., p. 153, Ed. Saraiva, 1981). Neste mesmo sentido a manifestação
de Rogério Lauria Tucci e José Rogério Cruz e Tucci, em “Constituição de 1988
e Processo. Regramentos e Garantias Constitucionais do Processo”, Ed.
Saraiva, pp. 114-115) e Maria Stella V. S. Lopes Rodrigues (“Recursos da Nova
Constituição”, 2ª ed., RT, n. 7.3)
Penso, assim, que incensurável o voto do eminente Ministro Cláudio Santos
ao concluir:
Quando a Constituição defi ne os contornos do especial, a causa decidida não
é apenas a de mérito, mas qualquer uma, incidental ou não, apreciada em última
instância. Esse é o entendimento pacífi co daquela expressão nos tribunais (fl . 90
— REsp n. 9.173-SP).
Concluo, Senhor Presidente e Senhores Ministros dizendo que, data
venia do douto entendimento do acórdão embargado, inclino-me por adotar a
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 187
construção que admite maior abrangência da expressão causa, daí porque recebo
os embargos e devolvo o processo à Turma de origem, a fi m de que, afastado
o óbice apontado, siga com o julgamento do recurso especial como achar de
direito.
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL N. 16.118-SP
(92.0009101-6)
Relator: Ministro William Patterson
Embargante: Ministério Público Federal
Embargados: Manoel Martins e outros
Interessada: Fazenda do Estado de São Paulo
Advogados: Celso Lourenção Vasconcellos de Oliveira e Wilson Luís de
Sousa Foz
EMENTA
Processual Civil. Recurso especial. Cabimento. Matéria
incidental.
A competência atribuída ao STJ, pelo art. 105, III, da CF, não
exclui o cabimento do Recurso Especial, quando a decisão recorrida
aborda, apenas, aspecto incidental.
Embargos de divergência conhecidos e providos.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Corte
Especial do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das
notas taquigráfi cas a seguir, por maioria, receber os embargos e determinar que
o processo retorne à Turma, de sorte a ser julgado o mérito, nos termos do voto
do Sr. Ministro-Relator; vencido o Sr. Ministro Pedro Acioli, que os rejeitava.
Votaram com o Relator os Srs. Ministros Bueno de Souza, Pádua Ribeiro,
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
188
Costa Lima, Nilson Naves, Eduardo Ribeiro, Dias Trindade, José de Jesus,
Assis Toledo, Edson Vidigal, Vicente Cernicchiaro, Waldemar Zveiter, Fontes
de Alencar, Cláudio Santos, Sálvio de Figueiredo, Barros Monteiro e Hélio
Mosimann. Ausentes, justifi cadamente, os Srs. Ministros Antônio Torreão Braz
(Presidente), José Cândido, Américo Luz, Flaquer Scartezzini, Costa Leite e
Demócrito Reinaldo. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro José Dantas.
Brasília (DF), 24 de setembro de 1992 (data do julgamento).
Ministro José Dantas, Presidente
Ministro William Patterson, Relator.
DJ 09.11.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro William Patterson: A egrégia Primeira Turma, por maioria,
vencido o Ministro Gomes de Barros, decidiu a questão nos termos refl etidos
na seguinte ementa, do respectivo acórdão (fl . 92), da lavra do Ministro Garcia
Vieira, verbis:
Processual. Recurso especial. Agravo de instrumento. Liquidação de sentença.
Infl ação de janeiro de 1989, de 70,28%.
Só cabe a este egrégio Tribunal, julgar, em recurso especial, as causas decididas,
em última ou única instância e não meras decisões em questões incidentes de
execução.
Recurso não conhecido.
Inconformado, o Ministério Público Federal oferece embargos de
divergência, alegando que a colenda Terceira Turma tem entendimento
diferente, consoante ressai do paradigma que traz à colação (REsp n. 9.173-SP),
da relatoria do Ministro Cláudio Santos, segundo o qual:
Quando a Constituição defi ne os contornos do especial, a causa decidida não é
apenas a de mérito, mas de qualquer uma, incidental ou não, apreciada em última
instância. Esse o entendimento pacífi co daquela expressão nos Tribunais.
Os embargos foram admitidos pelo despacho de fl . 107, ao entendimento
de sufi cientemente comprovada a divergência. Não houve impugnação.
É o relatório.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 189
VOTO
O Sr. Ministro William Patterson (Relator): Razão assiste ao embargante.
Na verdade, a competência conferida a este Superior Tribunal de Justiça pela
Constituição Federal (art. 105, III), para julgar, em recurso especial, as causas
decididas em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou
pelos Tribunais dos Estados e do Distrito Federal, não se restringe aos feitos que
envolvam decisão de mérito. A expressão “causas” ali inserta engloba todas as
questões julgadas pelos citados Órgãos, nas condições estipuladas, mesmo que
elas digam respeito a incidentes, como ocorre na espécie.
O voto vencido, do Ministro Gomes de Barros, analisa o problema sob a
ótica correta, a meu juízo, valendo, pois, pô-lo em destaque:
O termo “causa” é empregado na acepção de questão que envolve até o
próprio processo. E tanto isto é verdade que, no art. 109 ao se referir aos juízes
federais, a Constituição diz que lhes “compete processar e julgar as causas em
que a União, Entidades,..., mais adiante: ‘as causas em que o Estado estrangeiro’, às
causas fundadas em tratado”.
Em várias oportunidades, a Constituição faz referência a causa. Ora,
evidentemente, no art. 109, não se quer dizer que a Justiça Federal deve conhecer
somente do mérito, ou somente das decisões terminativas do processo. Por outro
lado, quando se julga qualquer incidente está-se julgando a causa; uma parcela
da causa, é verdade, mas se está julgando a causa, muitas vezes, sob uma faceta
extremamente importante é o valor da pretensão jurídica envolvida na causa.
No dizer de Moacyr Amaral Santos, “causa é qualquer questão sujeita a decisão
judicial, tanto em processos de jurisdição contenciosa, como processos de
jurisdição voluntária” (“Primeiras linhas”, vol. 3º, p. 161, 11ª ed.).
Aliás, a Terceira Turma do STJ, no julgamento do Recurso Especial n. 9.173,
conduzido pelo eminente Ministro Cláudio Santos, apreciou a questão, decidindo:
“Compreende-se por causa decidida em última instância, não apenas a questão
de mérito, mas qualquer uma, ainda que incidental”. Este julgado é recente, pois
foi publicado no dia 20 de outubro último.
Advirta-se, por oportuno, que idêntica é a posição do Supremo Tribunal
Federal no trato do assunto, em relação ao recurso extraordinário, e que, pela
similitude do recurso especial com aquele, pode-se, perfeitamente, invocar a
orientação do Pretório Excelso, lembrada na petição do recurso. É ler-se:
Recurso extraordinário. Cabimento contra decisão interlocutória ou proferida
em agravo desde que defi nitiva (RE n. 53.124-PR, Relator Ministro Evandro Lins e
Silva, RTJ 31, p. 323, 1965).
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
190
Cabe recurso contra decisão proferida em agravo, ou contra decisão
interlocutória, desde que defi nitiva (AI n. 24.434-GO, Relator Ministro Victor Nunes
Leal, RTJ 17, p. 114, 1961).
O recurso extraordinário é admissível de decisão de caráter interlocutório,
quando ela configura uma questão federal, encerrada definitivamente nas
instâncias locais (RE n. 57.728-SP, Relator Ministro Hermes Lima, RTJ 41, p. 153,
1967).
Por último, cabe-me registrar que esta Corte Especial, em recente
julgamento, acolheu a tese sustentada pelo Embargante (cfr. ED no REsp n.
11.919-9-AM, Relator o Sr. Ministro José Dantas).
Ante o exposto, recebo os embargos, para determinar que o processo
retorne à Primeira Turma, de sorte a ser julgado o mérito.
VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro Bueno de Souza: Sr. Presidente, o meu voto é idêntico ao
proferido nos Embargos de Divergência no Recurso Especial n. 19.481-1-SP,
cujo Relator foi o Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro.
ANEXO
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL N. 19.481-SP
VOTO
O Sr. Ministro Bueno de Souza: Sr. Presidente, não tive ainda
oportunidade de votar no caso símile, do qual é Relator o eminente Ministro
José Dantas, referente aos Embargos de Divergência no Recurso Especial n.
11.919, pendentes de pedido de vista, agora, do eminente Ministro Américo Luz.
Entretanto, estou pronto a resumir meu pensamento, sem mais delongas.
Limitar-me-ei, reportando-me a pronunciamentos anteriores no mesmo
sentido, a lembrar que este entendimento amplo (de que a conceituação de
causa para efeito de admissão de recurso especial, tanto quanto de recurso
extraordinário, corresponde à conspícua tradição de nossa jurisprudência) é
coetânea com a existência do próprio Supremo Tribunal Federal, devendo por
isso mesmo, pairar acima das vacilações quanto à amplitude de sua pertinência.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 191
Não penso se justifique (digo-o com todas as vênias) a propugnada
modifi cação desse critério, porquanto a ofensa ou contrariedade à Lei Federal e
a discrepância jurisprudencial podem perfeitamente confi gurar-se e determinar
graves danos à tutela de direitos, mesmo em recursos em procedimentos
versantes somente com questão de natureza processual. Seria extremamente
preconceituoso, em relação aos temas de natureza processual, sufragar o
entendimento de que, quando disso se tratasse, direitos subjetivos não estariam
necessariamente em jogo na causa.
Demais disso, se é verdade que a justiça brasileira enfrenta difi culdades em
virtude de multiplicação do número de causas, o meio de conjurar este problema
há de consistir em outras medidas de abrangência geral e não em diligências
casuísticas, como seria o caso da súbita restrição do acesso ao recurso especial,
em tais causas.
Com estas breves considerações, subscrevo o douto voto do eminente
Ministro José Dantas, que profi cuamente compendiou a história jurisprudencial
do tema no direito brasileiro.
VOTO VENCIDO
O Sr. Ministro Pedro Acioli: Senhor Presidente, o meu voto é idêntico ao
proferido nos Embargos de Divergência no Recurso Especial n. 19.481-1-SP,
cujo Relator foi o Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro.
Assim, faço juntar cópia do EREsp n. 11.919-9-AM, no qual votei neste
sentido.
ANEXO
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL N. 11.919-AM
(92.0008023-5)
VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Pedro Acioli: O recurso especial de que tratam os presentes
embargos de divergência teve o julgamento na Primeira Turma resumido na
seguinte ementa — fl . 90:
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
192
Constitucional e Processual. Recurso especial contra acórdão proferido em
agravo de instrumento interposto desafiando despacho intercalado do juiz
monocrático. Impossibilidade. Não conhecimento.
Recurso especial, como vem defi nido na Constituição Federal (art. 105, III), é
o instrumento hábil a desafi ar os julgados provenientes de causas decididas em
única ou última instância, pelos tribunais.
As causas decididas (pelos Tribunais), segundo preconiza a Constituição, não
têm a compreensão dilargante, a ponte de abranger, na sua confi guração, para
justifi car o recurso especial, meros decisórios interpostos contra despachos do
juiz de primeiro grau, que são apenas impulsionadores do processo.
O cabimento do recurso especial em agravo de instrumento exige, pelo menos,
que este tenha vinculação com uma decisão terminativa do processo, com ou
sem julgamento do mérito.
Recurso não conhecido, com voto-vencido (fl . 90).
Quando integrante daquela Turma eu proferi voto-vista nesse mesmo
sentido, onde destaquei:
O agravo de instrumento não é causa, mas tão-somente um incidente
processual, que a lei adjetiva coloca à disposição das partes para assegurar o
reexame de determinados atos desenvolvidos dentro do feito e que não puseram
fi m ao processo.
Resulta então que a ter-se a decisão posta em agravo de instrumento com
todos os pressupostos exigidos pela norma maior estar-se-ia, via oblíqua, criando
nova legislação processual, o que ao Judiciário é defeso.
Hoje, depois de ouvir o voto do Relator, Ministro José Dantas, e muita
refl exão sobre o tema em termos comparativos dos preceitos da Constituição
anterior e da atual, não me convenci de que devo me reconsiderar.
A atual Constituição — art. 105, inciso III — coloca como competência
do Superior Tribunal de Justiça julgar em recurso especial as causas decididas
em única ou última instância.
O verbete “causas” utilizado pelo constituinte, sem dúvida, se refere à ação
no seu todo e não das decisões incidentais ou prejudiciais proferidas pelos juízes
monocráticos.
Segundo De Plácido e Silva, causa:
Na técnica processual, causa se confunde com a demanda. Empregam-se
como vocábulos equivalentes.
E esta acepção vem, de que a causa é o fundamento legal do direito que se
deve fazer valer perante a autoridade judiciária. Causa, a razão, extensivamente
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 193
passou a designar o processo judicial que, por ela, a causa, a razão, o motivo, é
intentado, sendo, pois equivalente a litígio.
Neste sentido também se consagrou.
“Causas decididas” quer dizer, “processo fi ndo”, prestação jurisdicional
encerrada.
As questões incidentes resolvidas nas causas pelos juízes de primeira
instância, delas cabem apenas os recursos para o Tribunal ad quem e não para
o Superior Tribunal de Justiça, em razão do texto constitucional não aludir a
incidentes ou decisões interlocutórias.
Analiso restritivamente o Texto Constitucional, pois o agravo de
instrumento não é a causa em si mesma, traz apenas uma questão resolvida na
causa.
Faço os meus elogios ao constituinte, que pretendeu evitar as delongas
judiciais, a eternização dos recursos, a mandar para o Superior Tribunal de
Justiça somente as causas já decididas em única ou última instância e não os
incidentes nela resolvidos pelos juízes monocráticos, que serão decididas no
Superior Tribunal de Justiça com a chegada da causa no seu todo.
É sabido e consabido que o agravo de instrumento não é interposto da
decisão fi nal da causa, mas das questões incidentais resolvidas ou decididas
pelo juízo singular, que não guarda a conceituação de “decisão e nem de última
instância”.
Tenho certeza que o constituinte pretendeu minimizar, reduzir e acelerar
o andamento das causas ajuizadas no Poder Judiciário, que ao usar a expressão
“causas decididas em única ou última instância”, procurou evitar a proliferação
de recursos retardatórios das questões resolvidas na causa pelo juiz singular.
Assim, rendo os meus respeitos ao Relator para dele divergir e acompanhar
o voto predominante do Ministro Demócrito Reinaldo.
Rejeito os embargos.
É como voto.
VOTO
O Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro: Sr. Presidente, inclino-me a
sustentar a tese já tradicional no nosso Direito, e que foi muito bem expressa no
voto anteriormente proferido nesta Corte pelo Ministro José Dantas.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
194
Na verdade, não podemos, de forma alguma, sufragar interpretações que
cerceiam a competência deste Tribunal quanto à salvaguarda da inteireza do
Direito positivo federal. Nesse sentido é que as decisões dos Tribunais de
apelação, mesmo proferidas em agravo, desde que apliquem Lei Federal ou
divirjam quanto a sua interpretação, não podem nunca fi car sem a possibilidade
de um reexame por parte deste Tribunal. Caso contrário passaríamos a ter
Tribunais de última instância espalhados por todo o território nacional, cada um
dando a palavra última em termos de aplicação e interpretação da Lei Federal.
O sistema federativo fi caria, evidentemente, comprometido.
Esta é uma matéria que já foi objeto de profundas meditações e acha-se
consubstanciada em numerosos precedentes jurisprudenciais, no sentido do
cabimento do recurso especial.
Com essas sumárias palavras, desalinhavadas, acompanho o voto do ilustre
Ministro-Relator.
VOTO
O Sr. Ministro Costa Lima: Sr. Presidente, o meu voto é idêntico ao
proferido nos Embargos de Divergência no Recurso Especial n. 13.473-5-AM,
do qual faço juntar cópia.
ANEXO
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL N. 13.473-AM
(920008022-7)
Embargante: Ministério Público Federal
Embargado: I. Miranda Auriero
EMENTA
Embargos de divergência. Conhecimento. Recurso especial.
Admissibilidade. Causa em sentido lato. Agravo de instrumento.
I. Causa para efeito de admissibilidade do recurso especial há de
ser compreendida lato sensu. É qualquer questão sujeita a uma decisão
judiciária, em última ou única instância, ainda que incidentalmente.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 195
II. Embargos recebidos para admitir a interposição de recurso
especial, mesmo quando a decisão recorrida tiver sido proferida em
agravo de instrumento.
III. Baixa dos autos à Turma para, afastado o óbice, siga com o
julgamento.
VOTO
O Sr. Ministro Costa Lima (Relator): É competente o Superior Tribunal
de Justiça para processar e julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única
ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos
Estados, do Distrito Federal e Territórios (art. 105, III, da CF).
À sua vez, compete aos Tribunais Regionais Federais processar e julgar as
causas decididas pelos Juízes Federais.
A mesma discussão havida quanto o que se devia entender por causa para
efeito de admissão do recurso extraordinário, foi revivida no que pertine ao
recurso especial. O que se disse ali tem aplicação aqui.
Estudo histórico feito pelo Professor Roberto Rosas (“Recursos no Superior
Tribunal de Justiça”, Ed. Saraiva, 1991, pp. 171-176) mostra a evolução da
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Para o Ministro Hahnemann
Guimarães, “a causa é a questão decidida na sentença que, em única ou última
instância, encerra o processo judicial (RE n. 12.815). Em outra oportunidade
afi rmou que causa é qualquer processo que se decide em juízo, encerre ou não
litígio, porque pode haver processo com ou sem litígio (RE n. 22.141)”.
Nessa linha de entendimento, deixou de considerar o simples processo
administrativo, a reclamação ou a correição parcial, quando a decisão tem cunho
meramente administrativo, deixando de envolver questão federal (RE n. 73.297,
RTJ 63/297; RE n. 79.323, RTJ 73/936). Conclui Roberto Rosas com Castro
Nunes “que a expressão causa deve ser entendida com ampla compreensão” (ob.
cit., p. 213).
José Frederico Marques diz que “o vocábulo causa é empregado em sentido
amplo, e também como sinônimo de questão. Portanto, cabe, igualmente, recurso
extraordinário contra acórdãos referentes a causas de jurisdição voluntária e
contra acórdãos que contenham decisão interlocutória simples, ou sentença
terminativa” (“Manual de Direito Processual Civil”, 3º vol., 2ª parte, p. 179).
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
196
Para Moacyr Amaral Santos o primeiro pressuposto é que deve ter havido
decisão de uma causa. “É da decisão que se recorre. Causa é qualquer questão
sujeita à decisão judicial, tanto em processos de jurisdição contenciosa como
em processos de jurisdição voluntária” (“Primeiras Linhas de Direito Processual
Civil”, 3º vol., p. 153, Ed. Saraiva, 1981). Neste mesmo sentido a manifestação
de Rogério Lauria Tucci e José Rogério Cruz e Tucci, em “Constituição de 1988
e Processo. Regramentos e Garantias Constitucionais do Processo”, Ed.
Saraiva, pp. 114-115) e Maria Stella V. S. Lopes Rodrigues (“Recursos da Nova
Constituição”, 2ª ed., RT, n. 7.3)
Penso, assim, que incensurável o voto do eminente Ministro Cláudio Santos
ao concluir:
Quando a Constituição defi ne os contornos do especial, a causa decidida não
é apenas a de mérito, mas qualquer uma, incidental ou não, apreciada em última
instância. Esse é o entendimento pacífi co daquela expressão nos tribunais (fl . 90
— REsp n. 9.173-SP).
Concluo, Senhor Presidente e Senhores Ministros dizendo que, data
venia do douto entendimento do acórdão embargado, inclino-me por adotar a
construção que admite maior abrangência da expressão causa, daí porque recebo
os embargos e devolvo o processo à Turma de origem, a fi m de que, afastado
o óbice apontado, siga com o julgamento do recurso especial como achar de
direito”.
VOTO
O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro: Sr. Presidente, o meu voto é idêntico ao
proferido nos Embargos de Divergência no Recurso Especial n. 19.481-1-SP,
cujo teor é o seguinte:
O Texto Constitucional, a meu ver, não permite dúvida de que a palavra “causa”
quando se cogita de competência recursal para o STJ, abrange também questões
que não se refi ram ao julgamento fi nal do feito.
O art. 105, III, cogitando o recurso especial, prevê competência para “julgar
em recurso especial as causas decididas...”. E, no item II, lê-se, “julgar em recurso
ordinário as causas em que foram partes o Estado estrangeiro”.
Em ambas as hipóteses menciona-se o julgamento de causas. A admitir-se a
interpretação dada pelo acórdão, seriam irrecorríveis as decisões interlocutórias
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 197
proferidas em tais processos. O mesmo se diga das causas submetidas aos Juízes
Federais, apreciadas, em segundo grau, pelos Tribunais Regionais Federais.
Aí também — (CF, art. 108, II) — consigna o texto que aquelas Cortes são
competentes para “julgar, em grau de recurso, as causas decididas pelos Juízes
federais”. Quem seria o competente para julgar os agravos?
Acompanho o eminente Ministro-Relator, data venia do douto Ministro Pedro
Acioli.
VOTO
O Sr. Ministro José de Jesus Filho: Sr. Presidente. Meu voto é idêntico ao
proferido nos Embargos de Divergência no Recurso Especial n. 19.481-1-SP,
cujo Relator foi o Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro, cuja cópia farei anexar.
ANEXO
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL N. 19.481-SP
VOTO
O Sr. Ministro José de Jesus Filho: Sr. Presidente, na egrégia Segunda
Turma, sobre essa matéria, na linha do pensamento dos eminentes Ministros
Relator e Romildo Bueno de Souza, bem como o do Sr. Ministro Eduardo
Ribeiro, que o detalhou a nível constitucional, temos julgado essa matéria
semanalmente, ora em recurso especial, ora em agravo de instrumento, sendo
perfeitamente viável.
Peço vênia ao Sr. Ministro Pedro Acioli para acompanhar o eminente
Ministro-Relator.
VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro Hélio Mosimann: Senhor Presidente, o meu voto é idêntico
ao proferido nos Embargos de Divergência no Recurso Especial n. 19.481-1-
SP, cujo Relator foi o Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro, e que foi julgado nesta
mesma sessão.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
198
ANEXO
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL N. 19.481-SP
VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro Hélio Mosimann: Senhor Presidente, evitando entravar os
trabalhos da Corte, vou acompanhar o eminente Ministro-Relator, reservando-
me, porém, para um melhor estudo em ocasião oportuna, uma vez que ainda não
me manifestei diretamente sobre a matéria.
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL N. 19.481-SP
(92.0013398-3)
Relator: Ministro Vicente Cernicchiaro
Embargante: Estado de São Paulo
Embargado: Marini e Daminelli S/A
Advogados: João Saraiva Lima e outro e Rodolfo Cavalcanti Bezerra
EMENTA
EREsp. Constitucional. Processual Civil. Recurso especial. Causa
decidida em última instância. “Causas decididas, em única ou última
instância” (Constituição, art. 105, III) compreendem as questões,
ainda que diversas do mérito, dado o interesse, no sentido processual
do termo, da parte à prestação jurisdicional exaustiva, materialmente
considerada. Impõe-se uma condição: haver sido — decidida — no
Tribunal originário. Decidida, aqui, é igual a exaurida naquela Corte.
Não se compreenderia alguma matéria restar imune à exigência de
harmonia à legislação federal.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 199
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Corte
Especial do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das
notas taquigráfi cas constantes dos autos, por maioria, receber os embargos e
determinar que o processo retorne à Turma, de sorte a ser julgado o mérito,
nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator; vencido o Sr. Ministro Pedro
Acioli, que os rejeitava. Os Srs. Ministros Waldemar Zveiter, Fontes de Alencar,
Cláudio Santos, Sálvio de Figueiredo, Barros Monteiro, Hélio Mosimann,
José Dantas, Bueno de Souza, Pádua Ribeiro, Jesus Costa Lima, Nilson Naves,
Eduardo Ribeiro, Dias Trindade, José de Jesus, Assis Toledo e Edson Vidigal
votaram com o Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros Antônio Torreão Braz
(Presidente), José Cândido, Américo Luz, Flaquer Scartezzini, Costa Leite
e Demócrito Reinaldo não compareceram à sessão por motivo justifi cado.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro William Patterson.
Brasília (DF), 24 de setembro de 1992 (data do julgamento).
Ministro William Patterson, Presidente
Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, Relator
DJ 16.11.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro: O Estado de São Paulo, por seu
Procurador, nos autos do Recurso Especial n. 19.481-1, opõe os presentes
Embargos de Divergência, fulcrado o art. 266 e seguintes do RISTJ.
Diz o Embargante que a colenda Primeira Turma desta Corte não
conheceu do recurso, sob fundamento de que “só cabe a este egrégio Tribunal
julgar, em recurso especial, as causas decididas, em última ou única instância, e
não de meras decisões em questões incidentes de execução” (fl . 56).
O paradigma apontado como divergente repousa no acórdão proferido
no julgamento do Recurso Especial n. 9.173, relatado pelo eminente Ministro
Cláudio Santos, e que pontifi cou entendimento contrário àquele embargado,
verbis:
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
200
Compreende-se por causa decidida em última instância, não apenas a questão
de mérito, mas qualquer uma, ainda que incidental (fl . 65).
O Embargante transcreve, ainda, opiniões de renomados juristas brasileiros,
a corroborar a tese do amplo cabimento dos recursos de cunho extraordinário em
nosso ondenamento jurídico. Por fi m, requer seja uniformizado o entendimento
desta Corte, fazendo-se subsistir os termos do v. acórdão-paradigma.
Não houve manifestações da parte contrária (fl . 72).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro (Relator): O v. acórdão recorrido,
Relator o eminente Ministro Garcia Vieira ostenta a seguinte ementa, que
traduz, com fi delidade, o conteúdo do julgado:
Processual. Recurso especial. Agravo de instrumento. Liquidação de sentença .
Infl ação de janeiro de 1989, de 70,28%. Só cabe a este egrégio Tribunal julgar, em
recurso especial, as causas decididas, em última ou única instância, e não meras
decisões em questões incidentes de execução. Recurso não conhecido (fl . 58).
O Recorrente aponta como divergente o v. acórdão. Relator o douto
Ministro Cláudio Santos. A ementa, também fi el ao decidido, enuncia:
Causa decidida em última instância. Intimação. Omissão do nome do
advogado. Nulidade. Recurso provido. Compreende-se por causa decidida em
última instância não apenas a questão de mérito, mas qualquer uma ainda que
incidental. A omissão do nome do advogado na intimação para indicar peças que
devem compor o intrumento de agravo, acarreta nulidade. Recurso provido (fl .
65).
A Constituição da República estatui no art. 105, III, ao compor a
competência do Superior Tribunal de Justiça:
Julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância
pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados do Distrito
Federal e Territórios.
A Lei Maior nem sempre utiliza os vocábulos, empregando o signifi cado
que o instituto tem em alguma área dogmática. Tal como acontece, por exemplo
com a palavra — crime — ocorre com — causa — no artigo transcrito.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 201
No Direito Processual Civil, predominantemente, traduz idéia de demanda,
litígio. Mais restritamente, o meritum causae.
Na Constituição, porém, valendo-se de interpretação lógico-sistemática,
dever-se-á chegar a outro sentido.
O recurso especial visa harmonizar as decisões a tratado ou Lei Federal,
ou ajustá-las à respectiva jurisprudência. Busca, com isso, uniformizar julgados,
nesse parâmetro, com o que visa tornar efetivo o princípio da isonomia.
Nesse quadrante, data venia, deve-se entender como causa as questões,
ainda que não compreensivas do mérito, dado o interesse, no sentido processual
do termo, da parte à prestação jurisdicional exaustiva, ou seja materialmente
considerada.
Impõe-se, porém, uma condição: haver sido decidida no tribunal originário.
Decidida, aqui, é igual a exaurida naquela Corte.
Não se compreenderia, porque alheia ao meritum causae, embora relevante,
alguma matéria restar imune à exigência de harmonia à legislação federal.
No caso dos autos, debate-se a respeito de cálculo, em execução de sentença.
Embora o mérito da relação jurídica litigiosa — crédito — não esteja em jogo,
certo também a decisão gera ônus para a embargante. Exaurida a batalha no
Tribunal a quo, legítima, além de legal, a abertura da via do recurso excepcional.
A matéria foi analisada em outras assentadas. Ilustrativamente, abonando
a conclusão, menciono os doutos votos dos eminentes Ministros Gomes de
Barros (REsp n. 5.440-PR e REsp n. 19.382-0-SP) e Milton Pereira (Agravo
Regimental no Agravo de Instrumento n. 18.492).
Em sendo assim, evidenciada a divergência, acolho os Embargos a fi m
de prevalecer o v. acórdão-paradigma, relatado pelo ínclito Ministro Cláudio
Santos, a fi m de a egrégia Primeira Turma prosseguir o julgamento do Recurso
Especial.
VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro Hélio Mosimann: Sr. Presidente, evitando entravar os
trabalhos da Corte, vou acompanhar o eminente Ministro-Relator, reservando-
me, porém, para um melhor estudo em ocasião oportuna, uma vez que ainda não
me manifestei diretamente sobre a matéria.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
202
VOTO
O Sr. Ministro José Dantas: Sr. Presidente, acompanho o Sr. Ministro-
Relator, na forma do voto que proferi nos Embargos de Divergência no Recurso
Especial n. 11.919, do qual farei juntada por xerocópia, oportunamente.
ANEXO
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL N. 11.919-AM
VOTO
O Sr. Ministro José Dantas (Relator): Sr. Presidente, a divergência
suscitada nos presentes embargos oferece-se palmar, conforme se sabe que,
no tema conceitual das decisões interlocutórias, põem-se num plano de
absoluta similaridade as matérias cotejadas — a reabertura de prazo de vista ao
Ministério Público, caso dos autos, e a renovação da intimação para formação
de instrumento, por omissão do nome do advogado na respectiva publicação,
acórdão paradigma.
E a conhecê-los, os embargos não parecem oferecer maior difi culdade
quanto à pacifi cação da divergência a que se prestam.
Na verdade, se bem que ainda carente de maturidade, o novo recurso especial
tem lastro de experiência nas antiqüíssimas práticas do recurso extraordinário,
seu irmão colaço. Daí que as arestas formais de maior repetência encontram-
se aplainadas do modo como, no curso de um longo tempo, foram aos poucos
estabelecidas as defi nições temáticas, mormente em matéria de cabimento do
derradeiro e excepcional apelo interpretativo da Lei Federal.
Então, no que interessa ao caso dos autos, cabe acentuar que, desde os
primeiros tempos, o alcance da expressão causas decididas em última ou derradeira
instância fi ndou esclarecido pelo sentido fi nalístico da norma constitucional
instituidora do recurso extraordinário; isto é, por uma abrangência maior do
que a concepção formalística da técnica processual, signifi cativa do litígio
meritoriamente considerado.
Da evolução dessa temática jurisprudencial, conclusiva de uma mais ampla
compreensão terminológica, fez excelente apanhado o Professor Roberto Rosas,
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 203
intitulado “o Conceito de causa para a Competência do STF”, à cuja publicação
vale remeter o pesquisador — RT 532/289.
Donde a intermitência de julgados conceituadores do termo “causa”,
proferidos a propósito do recurso extraordinário cabível contra decisão
interlocutória, sem exigência de maior adequação ao permissivo constitucional
do que a irrecorribilidade do julgamento nas instâncias inferiores, segundo a
expressão do saudoso Ministro Victor Nunes, ao votar no RE n. 57.682-GB, in
RTJ 34/161. Consulte-se, a exemplo, o seguinte rol de ementas:
Recurso extraordinário. Cabimento contra decisão interlocutória ou proferida
em agravo, desde que defi nitiva. (RE n. 53.124-PR, Relator Ministro Evandro Lins e
Silva, RTJ v. 31, p. 323, 1965)
Cabe recurso contra decisão proferida em agravo ou contra decisão
interlocutória, desde que defi nitiva (AI n. 24.434-GO, Relator Ministro Victor Nunes
Leal, RTJ 17, p. 114, 1961).
O recurso extraordinário é admissível de decisão de caráter interlocutório,
quando ela configura uma questão federal, encerrada definitivamente nas
instâncias locais (RE n. 57.728-SP, Relator Ministro Hermes Lima, RTJ 41, p. 153,
1967) — fl s. 98-99.
Complete-se essa colação, tomada de empréstimo do sobrestado recurso
extraordinário do Ministério Público embargante, com um precedente, de
data bem mais recente, pertinente à legitimidade passiva do Banco Central em
determinada ação de anulação e substituição de ORTN, matéria de deslinde
evidentemente interlocutório, e por isso ocorrido em sede do agravo de
instrumento que o Tribunal Regional Federal da 2ª Região havia desprovido —
RE n. 114.210-RJ, in RTJ 128/383.
Igual exemplifi cação de matéria agravável poderia forrar-se em acórdão
antigo, relativo a exceção de competência do foro do desquite — RE n. 58.699,
Relator Ministro Hermes Lima, in RTJ 35/706.
Finalmente, en passant, lembrem-se tantos ou quantos verbetes da Súmula
do Supremo Tribunal Federal, constituídos à base do reexame de decisões
interlocutórias, consoante a natureza eminentemente incidental dos temas
averbados; vejam-se:
Súmula n. 231 — produção de provas pelo revel comparecente;
Súmula n. 240 — depósito preparatório do recurso em ação de acidente do
trabalho;
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
204
Súmula n. 310 — contagem do prazo recursal, no caso de intimação na sexta-
feira;
Súmula n. 425 — tempestividade do agravo tardiamente despachado;
Súmula n. 619 — prisão do depositário judicial, independentemente de ação
de depósito.
Em suma, Sr. Presidente, sem desmerecer a pródiga ilustração do voto
condutor do v. acórdão embargado, fi co em que maior acerto há em admitir-se
cabível o recurso especial contra decisões interlocutórias, do modo como o v.
acórdão paradigma fi liou-se à tradicional jurisprudência suprema, tocante ao
similar cabimento do recurso extraordinário.
Daí que, fi liando-me também a tão antiga construção exegética, aplico-a ao
caso sub judice; pelo que devolvo os autos à Turma de origem, para que, afastada
a prejudicial de que se trata, julgue o recurso especial como achar de direito.
Para tanto é que recebo os embargos, nos limites da divergência que lhes
deu causa.
É como voto.
VOTO
O Sr. Ministro Bueno de Souza: Senhor Presidente, não tive ainda
oportunidade de votar no caso símile, do qual é Relator o eminente Ministro
José Dantas, referente aos Embargos de Divergência no Recurso Especial n.
11.919, pendentes de pedido de vista, agora, do eminente Ministro Américo Luz.
Entretanto, estou pronto a resumir meu pensamento, sem mais delongas.
Limitar-me-ei, reportando-me a pronunciamentos anteriores no mesmo
sentido, a lembrar que este entendimento amplo (de que a conceituação de
causa para efeito de admissão de recurso especial, tanto quanto de recurso
extraordinário, corresponde à conspícua tradição de nossa jurisprudência) é
coetânea com a existência do próprio Supremo Tribunal Federal, devendo, por
isso mesmo, pairar acima das vacilações quanto a amplitude de sua pertinência.
Não penso se justifique (digo-o com todas as vênias) a propugnada
modifi cação desse critério, porquanto a ofensa ou contrariedade à Lei Federal e
a discrepância jurisprudencial podem perfeitamente confi gurar-se e determinar
graves danos à tutela de direitos, mesmo em recursos em procedimentos
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 205
versantes somente com questão de natureza processual. Seria extremamente
preconceituoso, em relação aos temas de natureza processual, sufragar o
entendimento de que, quando disso se tratasse direitos subjetivos não estariam
necessariamente em jogo na causa.
Demais disso, se é verdade que a justiça brasileira enfrenta difi culdades em
virtude de multiplicação do número de causas, o meio de conjurar este problema
há de consistir em outras medidas de abrangência geral e não em diligências
casuísticas, como seria o caso da súbita restrição do acesso ao recurso especial,
em tais causas.
Com estas breves considerações, subscrevo o douto voto do eminente
Ministro José Dantas, que profi cuamente compendiou a história jurisprudencial
do tema no direito brasileiro.
VOTO VENCIDO
O Sr. Ministro Pedro Acioli: Senhor Presidente, nos Embargos de
Divergência em Recurso Especial n. 11.919, em que foi Relator o eminente
Ministro José Dantas, pedi vista e, em longo voto, discordei.
Peço permissão ao Sr. Ministro-Relator para divergir e, para tal, faço juntar
cópia do EREsp n. 11.919-9-AM, no qual votei neste sentido.
ANEXO
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL N. 11.919-AM
(920008023-5)
VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Pedro Acioli: O recurso especial de que tratam os presentes
embargos de divergência teve o julgamento na Primeira Turma resumido na
seguinte ementa — fl . 90:
Constitucional e Processual. Recurso especial contra acórdão proferido em
agravo de instrumento interposto desafiando despacho intercalado do juiz
monocrático. Impossibilidade. Não conhecimento.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
206
Recurso especial, como vem defi nido na Constituição Federal (art. 105, III), é
instrumento hábil a desafi ar os julgados provenientes de causas decididas, em
única ou última instância, pelos tribunais.
As causas decididas (pelos tribunais), segundo preconiza a Constituição, não
têm a compreensão dilargante, a ponto de abranger, na sua confi guração, para
justifi car o recurso especial, meros decisórios interpostos contra despachos do
juiz de primeiro grau, que são apenas impulsionadores do processo.
O cabimento do recurso especial em agravo de instrumento exige, pelo menos,
que este tenha vinculação com uma decisão terminativa do processo, com ou
sem julgamento do mérito.
Recurso não conhecido, com voto-vencido (fl . 90).
Quando integrante daquela Turma eu proferi voto-vista nesse mesmo
sentido onde destaquei:
O agravo de instrumento não é causa, mas tão-somente um incidente
processual, que a lei adjetiva coloca à disposição das partes para assegurar o
reexame de determinados atos desenvolvidos dentro do feito e que não puseram
fi m ao processo.
Resulta então que a ter-se a decisão posta em agravo de instrumento com
todos os pressupostos exigidos pela norma maior estar-se-ia, via oblíqua, criando
nova legislação processual, o que ao Judiciário é defeso.
Hoje, depois de ouvir o voto do Relator, Ministro José Dantas, e muita
refl exão sobre o tema em termos comparativos dos preceitos da Constituição
anterior e da atual, não me convenci de que devo me reconsiderar.
A atual Constituição — art. 105, inciso III — coloca como competência
do Superior Tribunal de Justiça julgar, em recurso especial, as causas decididas
em única ou última instância.
O verbete “causas” utilizado pelo constituinte, sem dúvida, se refere à ação
no seu todo e não das decisões incidentais ou prejudiciais proferidas pelos juízes
monocráticos.
Segundo De Plácido e Silva, causa:
Na técnica processual, causa se confude com a demanda. Empregam-se como
vocábulos equivalentes.
E esta acepção vem, de que a causa é o fundamento legal do direito que se
quer fazer valer perante a autoridade judiciária. Causa, a razão, extensivamente
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 207
passou a designar o processo judicial que, por ela, a causa, a razão, o motivo, é
intentado, sendo, pois, equivalente a litígio.
Neste sentido também se consagrou.
“Causas decididas” quer dizer, “processo fi ndo”, prestação jurisprudencial
encerrada.
As questões incidentes resolvidas nas causas pelos juízes de primeira
instância, delas cabe apenas os recursos para o Tribunal ad quem, e não para
o Superior Tribunal de Justiça, em razão do texto constitucional não aludir a
incidentes ou decisões interlocutórias.
Analiso restritivamente o Texto Constitucional, pois, o agravo de
istrumento não é a causa em si mesma, traz apenas uma questão resolvida na
causa.
Faço os meus elogios ao constituinte, que pretendeu evitar as delongas
judiciais, a eternização dos recursos, a mandar para o Superior Tribunal de
Justiça somente as causas já decididas em única ou última instância e não os
incidentes nela resolvidos pelos juízes monocráticos, que serão decididas no
Superior Tribunal de Justiça com a chegada da causa no seu todo.
É sabido e consabido que o agravo de instrumento não é interposto da
decisão fi nal da causa, mas das questões incidentais resolvidas ou decididas pelo
juízo singular, que não guarda a conceituação de “decisão de única e nem de
última instância”.
Tenho certeza que o constituinte pretendeu minimizar, reduzir e acelerar
o andamento das causas ajuizadas no Poder Judiciário, que ao usar a expressão
“causas decididas em única ou última instância”, procurou evitar a proliferação
de recursos retardatórios das questões resolvidas na causa pelo juiz singular.
Assim, rendo os meus respeitos ao Relator para dele divergir e acompanhar
o voto predominante do Ministro Demócrito Reinaldo.
Rejeito os embargos.
É como voto.
VOTO
O Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro: Sr. Presidente, inclino-me a
sustentar a tese já tradicional no nosso Direito, e que foi muito bem expressa no
voto anteriormente proferido nesta Corte pelo Ministro José Dantas.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
208
Na verdade, não podemos, de forma alguma, sufragar interpretações que
cerceiam a competência deste Tribunal quanto à salvaguarda da inteireza do
Direito positivo federal. Nesse sentido é que as decisões dos Tribunais de
apelação, mesmo proferidas em agravo, desde que apliquem Lei Federal ou
divirjam quanto a sua interpretação, não podem nunca fi car sem a possibilidade
de um reexame por parte deste Tribunal. Caso contrário passaríamos a ter
Tribunais de última instância espalhados por todo o território nacional, cada um
dando a palavra última em termos de aplicação e interpretação da Lei Federal.
O sistema federativo fi caria, evidentemente, comprometido.
Esta é uma matéria que já foi objeto de profundas meditações e acha-se
consubstanciada em numerosos precedentes jurisprudenciais, no sentido do
cabimento do recurso especial.
Com essas sumárias palavras, desalinhavadas, acompanho o voto do ilustre
Ministro-Relator.
VOTO
O Sr. Ministro Costa Lima: Sr. Presidente, data venia do voto do eminente
Ministro Pedro Acioli, acompanho o Sr. Ministro-Relator, na linha do voto que
proferi nos Embargos de Divergência no Recurso Especial n. 13.473, que farei
juntar por cópia.
ANEXO
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL N. 13.473-AM
(920008022-7)
Embargante: Ministério Público Federal
Embargado: I. Miranda Auriero
EMENTA
Embargos de divergência. Conhecimento. Recurso especial.
Admissibilidade. Causa em sentido lato. Agravo de instrumento.
I. Causa para efeito de admissibilidade do recurso especial há de
ser compreendida lato sensu. É qualquer questão sujeita a uma decisão
judiciária, em última ou única instância, ainda que incidentalmente.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 209
II. Embargos recebidos para admitir a interposição de recurso
especial, mesmo quando a decisão recorrida tiver sido proferida em
agravo de instrumento.
III. Baixa dos autos à Turma para, afastado o óbice, siga com o
julgamento.
VOTO
O Sr. Ministro Costa Lima (Relator): É competente o Superior Tribunal
de Justiça para processar e julgar, em recurso especial, as causas decididas, em
única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais
dos Estados, do Distrito Federal e Territórios (art. 105, III, da CF).
À sua vez, compete aos Tribunais Regionais Federais processar e julgar as
causas decididas pelos Juízes Federais.
A mesma discussão havida quanto o que se devia entender por causa para
efeito de admissão do recurso extraordinário, foi revivida no que pertine ao
recurso especial. O que se disse ali tem aplicação aqui.
Estudo histórico feito pelo Professor Roberto Rosas (“Recursos no Superior
Tribunal de Justiça”, Ed. Saraiva, 1991, pp. 171-176) mostra a evolução da
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Para o Ministro Hahnemann
Guimarães, “a causa é a questão decidida na sentença que, em única ou última
instância, encerra o processo judicial (RE n. 12.815). Em outra oportunidade
afi rmou que causa é qualquer processo que se decide em juízo, encerre ou não
litígio, porque pode haver processo com ou sem litígio (RE n. 22.141)”.
Nessa linha de entendimento, deixou de considerar o simples processo
administrativo, a reclamação ou a correição parcial, quando a decisão tem cunho
meramente administrativo, deixando de envolver questão federal (RE n. 73.297,
RTJ 63/297; RE n. 79.323, RTJ 73/936). Conclui Roberto Rosas com Castro
Nunes “que a expressão causa deve ser entendida com ampla compreensão” (ob.
cit., p. 213).
José Frederico Marques diz que “o vocábulo causa é empregado em sentido
amplo, e também como sinônimo de questão. Portanto, cabe, igualmente, recurso
extraordinário contra acórdãos referentes a causas de jurisdição voluntária e
contra acórdãos que contenham decisão interlocutória simples, ou sentença
terminativa” (“Manual de Direito Processual Civil”, 3º vol., 2ª parte, p. 179).
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
210
Para Moacyr Amaral Santos o primeiro pressuposto é que deve ter havido
decisão de uma causa. “É da decisão que se recorre. Causa é qualquer questão
sujeita à decisão judicial, tanto em processos de jurisdição contenciosa como
em processos de jurisdição voluntária” (“Primeiras Linhas de Direito Processual
Civil, 3º vol., p. 153, Ed. Saraiva, 1981). Neste mesmo sentido a manifestação
de Rogério Lauria Tucci e José Rogério Cruz e Tucci, em “Constituição de 1988 e
Processo. Regramentos e Garantias Constitucionais do Processo”, ed. Saraiva, pp.
114-115) e Maria Stella V. S. Lopes Rodrigues (“Recursos da Nova Constituição”,
2ª ed., RT, n. 7.3).
Penso, assim, que incensurável o voto do eminente Ministro Cláudio Santos
ao concluir:
Quando a Constituição defi ne os contornos do especial, a causa decidida não
é apenas a de mérito, mas qualquer uma, incidental ou não, apreciada em última
instância. Esse é o entendimento pacífi co daquela expressão nos tribunais (fl . 90
— REsp n. 9.173-SP).
Concluo, Sr. Presidente e Senhores Ministros dizendo que, data venia
do douto entendimento do acórdão embargado, inclino-me por adotar a
construção que admite maior abrangência da expressão causa, daí porque recebo
os embargos e devolvo o processo à Turma de origem, a fi m de que, afastado
o óbice apontado, siga com o julgamento do recurso especial como achar de
direito.
VOTO
O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro: O Texto Constitucional, a meu ver,
não permite dúvida de que a palavra “causa”, quando se cogita de competência
recursal para o STJ, abrange também questões que não se refi ram ao julgamento
fi nal do feito.
O art. 105, III, cogitando do recurso especial, prevê competência para
“julgar em recurso especial as causas decididas...”. E, no item II, lê-se: “julgar em
recurso ordinário as causas em que foram partes o Estado estrangeiro”.
Em ambas as hipóteses menciona-se o julgamento de causa. A admitir-se a
interpretação dada pelo acórdão, seriam irrecorríveis as decisões interlocutórias
proferidas em tais processos. O mesmo se diga das causas submetidas aos Juízes
Federais, apreciadas, em segundo grau, pelos Tribunais Regionais Federais.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 133-211, fevereiro 2010 211
Aí também — (CF, art. 108, II) — consigna o texto que aquelas Cortes são
competentes para “julgar, em grau de recurso, as causas decididas pelos Juízes
Federais”. Quem seria o competente para julgar os agravos?
Acompanho o eminente Ministro-Relator, data venia do douto Ministro
Pedro Acioli.
VOTO
O Sr. Ministro José de Jesus Filho: Sr. Presidente, na egrégia Segunda
Turma, sobre essa matéria, na linha do pensamento dos eminentes Ministros
Relator e Romildo Bueno de Souza, bem como o do Sr. Ministro Eduardo
Ribeiro, que o detalhou a nível constitucional, temos julgado essa matéria
semanalmente, ora em recurso especial, ora em agravo de instrumento, sendo
perfeitamente viável.
Peço vênia ao Sr. Ministro Pedro Acioli para acompanhar o eminente
Ministro-Relator.
Súmula n. 87
SÚMULA N. 87
A isenção do ICMS relativa a rações balanceadas para animais abrange o
concentrado e o suplemento.
Referências:
CF/1988, art. 155, I, b.
Lei Complementar n. 4/1969.
Decreto-Lei n. 406/1968.
Precedentes:
REsp 1.796-MG (2ª T, 07.11.1990 — DJ 03.12.1990)
REsp 7.450-SP (2ª T, 06.04.1992 — DJ 11.05.1992)
REsp 7.560-MG (2ª T, 03.04.1991 — DJ 29.04.1991)
REsp 10.107-SP (2ª T, 03.06.1991 — DJ 09.12.1991)
REsp 10.755-MG (2ª T, 07.10.1991 — DJ 28.10.1991)
REsp 14.652-SP (1ª T, 13.11.1991 — DJ 16.12.1991)
REsp 14.808-MG (1ª T, 07.10.1992 — DJ 07.12.1992)
Primeira Seção, em 28.09.1993
DJ 1º.10.1993, p. 20.252
RECURSO ESPECIAL N. 1.796-MG (89.13017-0)
Relator: Ministro Américo Luz
Recorrentes: Agroquima — Produtos Agropecuários Ltda e outros
Recorrida: Fazenda Pública do Estado de Minas Gerais
Advogados: Samuel Monteiro, Demerval Fernandes de Souza e
outros e Nardele Débora Carvalho Esquerdo
EMENTA
Tributário. Ração balanceada para animais. Suplemento mineral.
Isenção do ICM. LC n. 4/1969, art. 1º, XIII. Decreto n. 76.986/1976,
art. 4º, § 1º.
— A isenção de ICM prevista no art. 1º, XIII, da LC n. 4/1969,
deferida às rações balanceadas para animais abrange o suplemento,
também considerado ração balanceada (§ 1º do art. 4º do Decreto n.
76.986/1976).
— Recurso provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar
provimento ao recurso, na forma do relatório e notas taquigráfi cas anexas, que
fi cam fazendo parte integrante do presente julgado.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 07 de novembro de 1990 (data do julgamento).
Ministro Américo Luz, Presidente e Relator
DJ 03.12.1990
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Américo Luz: À guisa de relatório, adoto a parte expositiva
constante do parecer da douta Subprocuradoria Geral da República, lavra do
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
218
culto Subprocurador-Geral Dr. Antônio Fernando Barros e Silva de Souza,
estando a matéria assim resumida (fl s. 406-407):
Trata-se de recurso especial que resultou da conversão de anterior recurso
extraordinário, segundo revela o despacho de fl s. 381-386, face ao disposto no art.
105, inciso III, letras a e c, da Constituição em vigor.
O acórdão impugnado (fls. 235-244 e 250-255), proferido em recurso de
apelação ofertado contra decisão concessiva de mandado de segurança, concluiu
que o sal mineralizado e o suplemento mineral produzidos e comercializados pela
contribuinte (recorrente), não “se benefi ciam da isenção de ICM preconizada no
art. 1º, item XIII, da Lei Complementar n. 04, de 02.12.1969, pelo simples fato de
não poderem ser considerados como ração balanceada para animais” (fl . 254).
Inconformada, a recorrente, em suas razões de recurso (fls. 262-301),
sustenta que o acórdão questionado negou vigência ao art. 1º, inciso XIII,
da Lei Complementar n. 04/1969, ao art. 4º, inciso V, e seu § 1º, do Decreto
n. 76.986/1976 e a Lei n. 6.189/1974, além de se colocar em divergência com
julgados de outros tribunais a respeito do mesmo tema. Esclareceu que embora
o acórdão recorrido tenha se referido também a sal mineralizado a segurança
objetivou o reconhecimento da isenção de ICM apenas ao suplemento mineral
(fl . 297).
Ao fi nal, o parecer é pelo provimento do recurso.
Relatei.
VOTO
O Sr. Ministro Américo Luz (Relator): A fundamentação do parecer é a
seguinte (fl s. 407-408):
A controvérsia instalada nos autos reside no seguinte ponto: a isenção de ICM
prevista no art. 1º, inciso XIII, da Lei Complementar n. 04, de 02.12.1969, deferida
às rações balanceadas para animais abrange, ou não, os suplementos minerais
destinados à alimentação de animais? O acórdão recorrido concluiu que não. A
recorrente, como vem fazendo desde a inicial, afi rma que sim.
Não há dúvida que, como afi rmou o Ministro Bilac Pinto, no RE n. 73.131-
PR, “o objetivo da referida Lei Complementar n. 04/1969, evidentemente, foi o
de excluir do ICM toda saída de ‘ração animal’, para reduzi-la em seus custos, e
conseqüentemente, os custos dos produtos originários da pecuária — carne,
leite etc.” (RTJ 61/800). Considerado tal objetivo, a interpretação do referido
art. 1º, inciso XIII, no tocante ao conceito de ração balanceada para animais, há
de ser no sentido de compreender todos os produtos que se destinam a servir
especifi camente de alimento para animais.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 213-244, fevereiro 2010 219
Por outro lado, o Decreto n. 76.986, de 06.01.1976, ao regulamentar a Lei n.
6.198, de 26.12.1974, que dispôs sobre “a inspeção e fi scalização obrigatória de
produtos destinados à alimentação animal”, deixou claro:
a) que suplemento é “ingrediente ou mistura de ingredientes capaz de
suprir a ração ou concentrado, em vitaminas, aminoácidos ou minerais,
sendo permitida a inclusão de aditivos” (art. 4º, inciso V);
b) que para os efeitos do referido decreto, “entende-se como ração
balanceada, a ração animal, o concentrado e o suplemento, defi nidos nos
itens III, IV e V deste artigo” (§ 1º do art. 4º).
Ora, se para o efeito da fiscalização federal dos produtos destinados à
alimentação animal o suplemento é considerado ração balanceada (§ 1º do art.
4º do Decreto n. 76.986/1976), não há porque excluí-lo, como fez o acórdão
recorrido, da isenção prevista no art. 1º, inciso XIII, da Lei Complementar n.
04/1969.
Do exposto, porque demonstrada a violação ao dispositivo legal citado e
caracterizado o dissídio, bem como por acolher in totum o parecer supratranscrito,
dou provimento ao recurso.
VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Ilmar Galvão: Sr. Presidente, trata-se do problema do sal
mineral. Ao pedir vista, o fi z por haver entendido que se estava controvertendo
acerca de saber se o produto é ração concentrada ou ração balanceada. Estava
estudando outros casos de ração concentrada, donde o meu pedido de vista.
Verifi quei entretanto, que o sal mineral já é, por si só, uma ração, porque ele é
um produto composto de uso, sem mistura, para alimentação do gado.
Estou plenamente de acordo com o voto de V. Exa.
RECURSO ESPECIAL N. 7.450-SP (91.0000845-1)
Relator: Ministro José de Jesus Filho
Recorrente: Irmãos Maciel Sanchez Ltda
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
220
Recorrida: Fazenda do Estado de São Paulo
Advogados: Pedro Luciano Marrey Júnior e outros e Eleonora
Lucchesi Martins Ferreira e outros
EMENTA
Tributário. Ração para animais. Isenção. ICM.
— Para conceder-se a isenção prevista no art. 1º, XIII, da LC
n. 4/1969, entende-se como ração balanceada, a ração animal, o
concentrado e o suplemento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide
a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer
do recurso e lhe dar provimento, na forma do relatório e notas taquigráfi cas
constantes dos autos, que fi cam fazendo parte integrante do presente julgado.
Participaram do julgamento os Srs. Ministros Hélio Mosimann, Peçanha
Martins, Américo Luz e Pádua Ribeiro.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 06 de abril de 1992 (data do julgamento).
Ministro Américo Luz, Presidente
Ministro José de Jesus Filho, Relator
DJ 11.05.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro José de Jesus Filho: Irmãos Maciel Sanchez Ltda, com apoio
no art. 105, III, alínea a, da Constituição Federal, interpôs recurso especial ao
v. acórdão, proferido pela Décima Sétima Câmara Civil do Tribunal de Justiça
de São Paulo, que decidiu ser devido o ICM na venda do produto “Suplemento
Mineral Sorocabano”, destinado ao uso na pecuária.
Alega a Recorrente que a decisão atacada negou vigência ao art. 1º, XIII, §
1º, da LC n. 4/1969.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 213-244, fevereiro 2010 221
O Recurso foi impugnado (fl s. 170-173), admitido (fl . 175), devidamente
processado e encaminhado a esta Corte, onde a douta Subprocuradoria Geral da
República opinou por seu provimento.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro José de Jesus Filho (Relator): A controvérsia cinge-se à
questão de saber se os suplementos encontram-se ao abrigo da isenção do ICM,
prevista para as rações balanceadas, ou, em outras palavras, a controvérsia se
resume na interpretação da norma contida no art. 1º, XIII, da LC n. 4/1969.
Como afirmou o Sr. Ministro Bilac Pinto, no RE n. 73.131-PR, “o
objetivo da referida Lei Complementar n. 4/1969, evidentemente, foi o de
excluir do ICM toda saída de “ração animal”, para reduzi-la em seus custos e,
conseqüentemente, os custos dos produtos originários da pecuária — carne, leite
etc...” (RTJ 61/800).
Além do mais, assim dispõe o § 1º do art. 4º do Decreto n. 76.986/1976,
que regulamenta a Lei n. 6.198/1974, que dispôs sobre “a inspeção e fi scalização
obrigatória de produtos destinados à alimentação animal”:
art. 4º, § 1º: entende-se como ração balanceada, a ração animal, o concentrado
e o suplemento, defi nidos nos itens III, IV e V deste artigo.
Não vejo, portanto, como excluir o suplemento da isenção prevista no art.
1º, XIII, da LC n. 4/1969.
Como precedentes, cito o REsp n. 7.560-MG, DJ de 29.04.1991 e o REsp
n. 1.796-MG, DJ de 03.12.1990, ambos da Segunda Turma.
Pelo exposto, dou provimento ao recurso.
RECURSO ESPECIAL N. 7.560-MG (91.10294)
Relator originário: Ministro Ilmar Galvão
Relator para o acórdão: Ministro Hélio Mosimann
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
222
Recorrente: Fazenda Pública do Estado de Minas Gerais
Recorrida: Cargill Agrícola S/A
Advogados: Celso de Oliveira Ferreira e outros, André Martins de
Andrade e outros, Marco André Dunley Gomes e outros
EMENTA
Tributário. Ração para animais. ICM. Isenção.
— Para os efeitos da legislação pertinente, entende-se como
ração balanceada, a ração animal, o concentrado e o suplemento.
— Recurso especial não conhecido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados os autos, em que são partes as acima indicadas, decide
a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, não conhecer
do recurso, na forma do relatório e notas taquigráfi cas retro, que fi cam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 03 de abril de 1991 (data do julgamento).
Ministro Américo Luz, Presidente
Ministro Hélio Mosimann, Relator para o acórdão
DJ 29.04.1991
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Ilmar Galvão: A Fazenda Pública do Estado de Minas Gerais
interpôs recurso especial, fundado no art. 105, III, letras a e c, da Constituição,
contra acórdão do Tribunal de Justiça local, que decidiu estar a empresa
Cargill Agrícola S/A, isenta do pagamento do ICM nas operações de venda de
ração concentrada para animais, de uso na pecuária e avicultura, por entender
equiparar-se à ração balanceada.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 213-244, fevereiro 2010 223
Alegou ter o acórdão negado vigência ao art. 111, I, do CTN, bem como
haver divergido de decisão do próprio Tribunal recorrido.
Sustentou a impossibilidade de estender-se à ração concentrada a isenção
concedida à ração balanceada pelo art. 1º da Lei Complementar n. 4/1969, uma
vez que tais benefícios devem ser interpretados literalmente.
O recurso foi inadmitido na origem, porém veio a ser processado em
virtude do provimento do agravo interposto.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Ilmar Galvão (Relator): A controvérsia circunscreve-se à
questão de saber-se se as rações concentradas encontram-se, também, ao abrigo
da isenção de ICM prevista para as rações balanceadas.
A v. decisão recorrida conclui pela afirmativa após tecer as seguintes
considerações:
A real verdade que deflui dos autos é que a mistura, dita concentrada,
não é substancialmente diversa ou de valor industrial diferente da chamada
ração “balanceada”, desde que elaboradas industrialmente, com os mesmos
ingredientes e a mesma fi nalidade, consoante conclusão a que chegou o douto
Procurador da Justiça, Dr. Moacir Navarro (fl . 195).
Acontece, entretanto, que a Lei Complementar n. 4/1969, em seu art.
1º, ao instituir a isenção tributária questionada, referiu expressamente “ração
balanceada”, sem abranger a matéria-prima utilizada em sua fabricação, entre as
quais se incluem os concentrados.
Assim, por força da norma do art. 111, inciso I, do Código Tributário
Nacional, que veda a interpretação compreensiva das normas de isenção, não há
espaço para que se considere abrangida pelo dispositivo indicado da mencionada
lei complementar, produto que não está nele descrito.
Ao votar no REsp n. 1.796-MG, que foi relatado pelo eminente Ministro
Américo Luz, onde se concluiu pela incidência da isenção, sobre sal mineral,
deixei ressalvado o meu ponto de vista de que reconhecia o direito à isenção tão-
somente por haver constatado que o mencionado produto, por si só, pode ser
utilizado como ração animal.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
224
Assim sendo, não obstante reconheça que o v. acórdão se acha prestigiado
por alguns precedentes do STF (cf. RE n. 72.131), entendo incabível a isenção,
concedida por via de interpretação compreensiva, razão pela qual, meu voto é no
sentido de reconhecer ofensa ao dispositivo legal enfocado.
Dou provimento ao recurso.
VOTO-VISTA VENCEDOR
O Sr. Ministro Hélio Mosimann: Na ação declaratória proposta por
Cargill Agrícola S/A, para que fosse declarada a ilegalidade da cobrança de
ICM nas saídas de concentrados e inexistência de obrigação do autor em pagar
ICM nas operações de venda de ração concentrada para animais, a sentença
julgou procedente, em parte, o pedido, declarando a isenção do ICM e o direito
ao crédito (fl . 163).
O Tribunal de Justiça de Minas Gerais manteve a decisão na parte
principal, alterando-a apenas em relação à distribuição dos honorários (fl s. 204-
206).
Interpôs a Fazenda, contra acórdão, recurso especial (a e c).
Alegou ter o acórdão, ao decidir que a empresa estava ciente do pagamento
do ICM nas operações de venda de ração concentrada para animais de uso na
pecuária e avicultura, por equiparar-se à ração balanceada, ter o acórdão, repito,
negado vigência ao art. 111, I, do CTN, bem como haver divergido de decisão
do próprio Tribunal. Impossível seria, diz a recorrente, estender-se à ração
concentrada a isenção concedida à ração balanceada, uma vez que tais benefícios
devem ser interpretados literalmente.
O voto do eminente Relator aceitou os argumentos, concluindo por
dar provimento ao recurso, pois ao ser instituída a isenção tributária a Lei
Complementar n. 4/1969 referiu expressamente ração balanceada, sem abranger
a matéria-prima utilizada em sua fabricação, entre as quais se incluem as
concentradas.
Toda a controvérsia se resume na interpretação da norma de isenção
de tributo estadual (ICM) contida no art. 1º, XIII, da Lei Complementar n.
4/1969.
A questão já foi apreciada recentemente pela Turma, que acolheu o voto
do Ministro Américo Luz, com ressalva de ponto de vista do Ministro Ilmar
Galvão, nestes termos:
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 213-244, fevereiro 2010 225
A fundamentação do parecer é a seguinte (fl s. 407-408):
A controvérsia instalada nos autos reside no seguinte ponto: a isenção
de ICM prevista no art. 1º, inciso XIII, da Lei Complementar n. 4, de
02.12.1969, deferida às rações balanceadas para animais abrange, ou não,
os suplementos minerais destinados à alimentação de animais? O acórdão
recorrido concluiu que não. A recorrente (empresa contribuinte), como vem
fazendo desde a inicial, afi rma que sim.
Não há dúvida que, como afi rmou o Ministro Bilac Pinto, no RE n. 73.131-
PR, “o objetivo da referida Lei Complementar n. 4/1969, evidentemente, foi o
de excluir do ICM toda saída de ‘ração animal’, para reduzi-la em seus custos,
e conseqüentemente, os custos dos produtos originários da pecuária —
carne, leite etc.” (RTJ 61/800). Considerado tal objetivo, a interpretação do
referido art. 1º, inciso XIII, no tocante ao conceito de ração balanceada para
animais, há de ser no sentido de compreender todos os produtos que se
destinam a servir especifi camente de alimento para animais.
Por outro lado, o Decreto n. 76.986, de 06.01.1976, ao regulamentar
a Lei n. 6.198, de 26.12.1974, que dispôs sobre “a inspeção e fi scalização
obrigatória de produtos destinados à alimentação animal”, deixou claro:
a) que suplemento é “ingrediente ou mistura de ingredientes
capaz de suprir a ração ou concentrado, em vitaminas, aminoácidos
ou minerais, sendo permitida a inclusão de aditivos” (art. 4º, inciso V);
b) que para os efeitos do referido decreto, “entende-se como ração
balanceada, a ração animal, o concentrado e o suplemento, defi nidos
nos itens III, IV e V deste artigo” (§ 1º, do art. 4º).
Ora, se para o efeito da fi scalização federal dos produtos destinados
à alimentação animal o suplemento é considerado ração balanceada (§
1º do art. 4º do Decreto n. 76.986/1976), não há porque excluí-lo, como
fez o acórdão recorrido, da isenção prevista no art. 1º, inciso XIII, da Lei
Complementar n. 4/1969. (REsp n. 1.796-MG, de 07.11.1990).
Porque a matéria não é diferente, lamento discordar e, neste caso, não
conhecer do recurso.
VOTO
O Sr. Ministro Peçanha Martins: Sr. Presidente, estou de acordo com o Sr.
Ministro Hélio Mosimann, data venia do eminente Ministro-Relator.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
226
VOTO
O Sr. Ministro Américo Luz (Presidente): Reporto-me ao voto que proferi
no Recurso Especial n. 1.776-MG, nesta Turma, lembrado pelo Sr. Ministro
Hélio Mosimann.
RECURSO ESPECIAL N. 10.107-SP (91.70858)
Relator: Ministro Hélio Mosimann
Recorrente: Irmãos Maciel Sanchez Ltda
Recorrida: Fazenda do Estado de São Paulo
Advogados: Pedro Luciano Marrey Júnior e outros, Carla Pedroza
A. A. Sampaio e outros
EMENTA
Tributário. Ração para animais. ICM. Isenção.
- Para os efeitos da legislação pertinente, entende-se como ração
balanceada, a ração animal, o concentrado e o suplemento.
- Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados os autos, em que são partes as acima indicadas, decide
a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, conhecer do
recurso e lhe dar provimento, na forma do relatório e notas taquigráfi cas retro,
que fi cam fazendo parte integrante do presente julgado.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 03 de junho de 1991 (data do julgamento).
Ministro Américo Luz, Presidente
Ministro Hélio Mosimann, Relator
DJ 09.12.1991
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 213-244, fevereiro 2010 227
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Hélio Mosimann: Irmãos Maciel Sanchez Ltda interpôs
recurso especial, fundado no art. 105, III, letra a da Constituição Federal, contra
acórdão da Décima Terceira Câmara Civil do Tribunal de Justiça do Estado de
São Paulo, que decidiu não estar a referida empresa isenta do pagamento de
ICM nas operações de venda de ração concentrada para animais.
Pleiteia a recorrente, seja aplicado ao caso o Decreto n. 76.986/1976 que
a isenta do imposto estadual sobre os produtos que fabrica, qual seja suplemento
mineral.
Para tanto, alega que o produto é espécie do gênero rações balanceadas
para animais, benefi ciado com a isenção do ICM, nos termos do inciso XIII do
art. 1º da Lei Complementar n. 4/1969.
Contra-razões às fl s. 186-193.
À fl . 195, o eminente 4º Vice-Presidente do Tribunal de origem deferiu o
recurso.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Hélio Mosimann (Relator): Trata-se de mais um caso
de recurso manifestado em ação na qual empresa agrícola pleiteia isenção do
pagamento de ICM nas operações de venda de ração concentrada para animais,
de uso na pecuária e avicultura, por entender-se à ração balanceada.
No REsp n. 7.560-MG, em que fui Relator para o acórdão, votei pelo
cabimento da pretendida isenção, nos seguintes termos:
Alegou ter o acórdão, ao decidir que a empresa estava ciente do pagamento
do ICM nas operações de venda de ração concentrada para animais, de uso
na pecuária e avicultura, por equilibrar-se a ração balanceada ter o acórdão,
repito, negado vigência ao art. 111, I, do CTN, bem como haver divergido de
decisão do próprio Tribunal. Impossível seria, diz a recorrente, estender-se à ração
concentrada a isenção concedida à ração balanceada, uma vez que tais benefícios
devem ser interpretados literalmente.
O voto do eminente Relator aceitou os argumentos, concluindo por
dar provimento ao recurso, pois ao ser instituída a isenção tributária, a Lei
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
228
Complementar n. 4/1969 referiu expressamente ração balanceada, sem abranger
a matéria-prima utilizada em sua fabricação, entre as quais se incluem as
concentradas.
Toda a controvérsia se resume na interpretação da norma de isenção de
tributo estadual (ICM) contida no art. 1º, XIII, da Lei Complementar n. 4/1969.
A questão já foi apreciada recentemente pela Turma, que acolheu o voto do
Ministro Américo Luz, com ressalva de ponto de vista do Ministro Ilmar Galvão,
nestes termos:
A fundamentação do parecer é a seguinte (fl s. 407-408):
A controvérsia instalada nos autos reside no seguinte ponto: a
isenção de ICM prevista no art. 1º, inciso XIII, da Lei Complementar
n. 4, de 02.12.1969, deferida às rações balanceadas para animais,
abrange, ou não, os suplementos minerais destinados à alimentação
de animais? O acórdão recorrido concluiu que não. A recorrente
(empresa contribuinte), como vem fazendo desde a inicial, afi rma que
sim.
Não há dúvida que, como afi rmou o Ministro Bilac Pinto, no RE
n. 73.131-PR, “o objetivo da referida Lei Complementar n. 4/1969,
evidentemente, foi o de excluir do ICM toda saída de ‘ração animal’,
para reduzi-la em seus custos, e conseqüentemente, os custos dos
produtos originários da pecuária — carne, leite etc...” (RTJ 61/800).
Considerado tal objetivo, a interpretação do referido art. 1º, inciso
XIII, no tocante ao conceito de ração balanceada para animais, há de
ser no sentido de compreender todos os produtos que se destinam a
servir especifi camente de alimento para animais.
Por outro lado, o Decreto n. 76.986, de 06.01.1976, ao regulamentar
a Lei n. 6.198, de 26.12.1974, que dispôs sobre “a inspeção e
fiscalização obrigatória de produtos destinados à alimentação
animal”, deixou claro:
a) que suplemento é “ingrediente ou mistura de ingredientes
capaz de suprir a ração ou concentrado, em vitaminas,
aminoácidos ou minerais, sendo permitida a inclusão de
aditivos” (art. 4º, inciso V);
b) que para os efeitos do referido decreto, “entende-se
como ração balanceada, a ração animal, o concentrado e o
suplemento, defi nidos nos itens III, IV e V deste artigo” (§ 1º, do
art. 4º).
Ora, se para o efeito da fiscalização federal dos produtos
destinados à alimentação animal o suplemento é considerado ração
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 213-244, fevereiro 2010 229
balanceada (§ 1º do art. 4º do Decreto n. 76.986/1976), não há porque
excluí-lo, como fez o acórdão recorrido, da isenção prevista no art.
1º, inciso XIII, da Lei Complementar n. 4/1969. (REsp n. 1.796-MG, de
07.11.1990).
Reportando-me aos fundamentos expostos no referido pronunciamento,
dou provimento ao recurso.
RECURSO ESPECIAL N. 10.755-MG (910008770-0)
Relator: Ministro Antônio de Pádua Ribeiro
Recorrente: Fazenda Pública do Estado de Minas Gerais
Recorrida: Agromix — Distribuidora de Produtos Agropecuários Ltda
Advogados: Aridelco de Souza Peixoto e outros, Demerval Fernandes de
Souza e outros
EMENTA
Tributário. ICM. Isenção. Lei Complementar n. 4/1969, art. 1º,
XIII. Decreto n. 76.986/1976, art. 4º, § 1º.
I - A isenção do ICM prevista no art. 1º, inciso XIII, da Lei
Complementar n. 4, de 1969, deferidas às “rações balanceadas para
animais” abrange os produtos “concentrado” e “suplemento”. Aplicação
do Decreto n. 76.986, de 1986, art. 4º, § 1º.
II - A referida isenção inclui, também, os produtos “mata-verme”
e “mata-bicheira”, considerados “inseticidas”.
III - Recurso desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima
indicadas, decide a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, por
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
230
unanimidade, conhecer do recurso e lhe negar provimento, na forma do relatório
e notas taquigráfi cas anexas, que fi cam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 07 de outubro de 1991 (data do julgamento).
Ministro Américo Luz, Presidente
Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, Relator
DJ 28.10.1991
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro: O egrégio Tribunal a quo
confi rmou a sentença que concedeu segurança à impetrante para livrá-la da
cobrança de ICM sobre vendas realizadas de suplementos, concentrados e
inseticidas, que produz e comercializa, à vista do disposto do art. 1º, inciso XIII,
da Lei Complementar n. 4, de 02.12.1969 (fl s. 179-187).
Inconformada, manifestou a Fazenda Pública Estadual recurso especial,
pelas letras a e c, sob a alegação de negativa de vigência do art. 111 do CTN
e dissídio com acórdãos do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferidos nas
Apelações Cíveis ns. 150.216-2 e 148.318-2 (fl s. 215-216).
Contra-arrazoado (fls. 220-232), o recurso foi admitido pelo Ilustre
Primeiro Vice-Presidente do Tribunal a quo, Desembargador Lincoln Rocha,
subindo os autos a esta Corte, onde me vieram distribuídos.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro (Relator): Ao confirmar a
sentença concessiva da segurança, argumentou o acórdão recorrido (fl s. 183-
185):
A discussão não é nova e aqui mesmo, nesta Câmara, tivemos que enfrentá-la
várias vezes, decidindo reiteradamente pela isenção.
In casu, discute-se a isenção para suplementos, concentrados e inseticidas
(mata-bernes ou mata-bicheiras).
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 213-244, fevereiro 2010 231
Quanto aos dois primeiros esta Câmara já fi rmou posição: estão isentos.
É que a Lei Complementar n. 4, de 02.12.1969, no seu art. 1º, inciso XIII, dispõe
o seguinte:
Art. 1º — Ficam isentas do imposto sobre as operações relativas à
circulação de mercadoria: XIII - As saídas, de quaisquer estabelecimentos,
de rações balanceadas para animais, adubos simples ou compostos,
fertilizantes, inseticidas, fungicidas, sarnicidas, pintos de um dia, mudas de
plantas e sementes certifi cadas pelos órgãos competentes.
Por outro lado, o Decreto n. 76.986, de 06 de janeiro de 1976, procedeu à
defi nição de rações balanceadas, dispondo, no seu art. 4º, itens III, IV e V, § 1º:
III - Ração animal — qualquer mistura de ingredientes capaz de
suprir as necessidades nutritivas para manutenção, desenvolvimento e
produtividade dos animais a que se destine;
IV - Concentrado — mistura de ingredientes, que adicionada a um ou
mais alimentos, em proporções adequadas e devidamente especifi cadas
pelo fabricante do concentrado, constitua uma ração animal;
V - Suplemento — ingrediente ou mistura de ingredientes capaz de
suprir a ração ou concentrado, em vitaminas, aminoácidos ou minerais,
sendo permitida a inclusão de aditivos;
(...)
§ 1º para efeito deste Regulamento, entende-se, como ração balanceada,
a ração animal, o concentrado e o suplemento, defi nidos nos itens III, IV e V
deste artigo.
Não entendo, como o Apelante, que a interpretação à luz do Decreto n. 76.986,
é extensiva e, portanto, proibida, em razão de enfocar isenção tributária.
É que não se trata de interpretação, mas, de simples busca de esclarecimento
quanto à abrangência da expressão rações balanceadas inscrita na LC n. 4/1969,
esclarecimento que se encontra, ofi cial e tecnicamente, no Decreto n. 76.986.
Desse mesmo modo que me socorro do decreto, socorro-me, agora, de
dicionários para saber se “berne” e “bicheira” são insetos porque, em caso de
resposta positiva, não há como negar que o produto que os mata é inseticida.
Para Aurélio Buarque e para o Novo Dicionário Brasileiro-Ilustrado, berne
é “larva de mosca que penetra na pele dos animais e mesmo na do homem”;
bicheira é “ferida nos animais com bichos, vermes”; sendo que verme é, também,
sinônimo de larva, que é o “primeiro estado dos insetos, depois de saírem do
ovo”.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
232
Sendo assim, não há dúvida de que “mata-berne” e “mata-bicheira” são
inseticidas, produtos isentos da tributação por força do mesmo art. 1º, inciso XIII,
da LC n. 4/1969.
A apelante aduz, ainda, inovando nas razões que os produtos identifi cados
pelos documentos 15 e 16, às fls. 70 e 71, também são tidos como sais
mineralizados e, portanto, de saídas tributáveis.
Não vejo assim, pois, no verso dos documentos mencionados está a
composição dos produtos que não os caracteriza como sais mineralizados.
Ex positis, confi rmo a sentença no duplo grau de jurisdição.
Conforme se depreende, ao considerar os produtos “concentrado” e
“suplemento” como “ração balanceada” e “mata-verme” e “mata-bicheira” como
“inseticidas”, para enquadrá-los na isenção do ICM, prevista no art. 1º, XIII,
da Lei Complementar n. 4, de 02 de dezembro de 1969, o malsinado aresto
não vulnerou o art. 111 do CTN. Com efeito, ao contrário do que sustenta, não
deu interpretação extensiva ao dispositivo concessivo da isenção, cingindo-se a
delimitar o seu alcance. Nada mais que isso.
Todavia, acha-se, no caso, confi gurado o dissídio jurisprudencial, como foi
reconhecido, com pertinência, pelo douto despacho que admitiu a subida do
recurso. Por isso, conheço do recurso .
No mérito, porém, nego-lhe provimento adotando os fundamentos
consubstanciados na própria decisão recorrida.
Acrescento que esta Turma vem, reiteradamente, decidindo que as “rações
balanceadas para animais” incluem a “ração animal”, o “concentrado” e o
“suplemento”. Eis alguns precedentes:
Tributário. Ração balanceada para animais. Suplemento mineral. Isenção do
ICM. LC n. 4/1969, art. 1º, XIII. Decreto n. 76.986/1976, art. 4º, § 1º.
— A isenção de ICM prevista no art. 1º, XIII, da LC n. 4/1969, deferida às rações
balanceadas para animais abrange o suplemento, também considerado ração
balanceada (§ 1º do art. 4º do Decreto n. 76.986/1976).
— Recurso provido.
(Relator Sr. Ministro Américo Luz — REsp n. 1.796-MG — (89130170) Julgado
em 07.11.1990 — Publicado no DJ de 03.12.1990).
Tributário. Ração para animais. ICM. Isenção.
— Para os efeitos da legislação pertinente, entende-se como ração balanceada,
a ração animal, o concentrado e o suplemento.
— Recurso especial não conhecido.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 213-244, fevereiro 2010 233
(Relator Sr. Ministro Ilmar Galvão — REsp n. 7.560-MG — (91.10294) — Julgado
03.04.1991 — Publicado no DJ de 23.04.1991)
Em conclusão, pois, nego provimento ao recurso.
RECURSO ESPECIAL N. 14.652-SP (91.0018769-0)
Relator: Ministro Garcia Vieira
Recorrente: Fazenda do Estado de São Paulo
Recorrida: Sivam Cia. de produtos para fomento agropecuário
Advogados: Sônia Maria de Oliveira Pirajá e outro e Wilson Valentini
EMENTA
Isenção. Rações balanceadas para animais.
A isenção relativa às rações balanceadas para animais abrange o
concentrado e o suplemento.
Precedentes desta Corte.
Recurso improvido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide
a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar
provimento ao recurso, na forma do relatório e notas taquigráfi cas constantes
dos autos, que fi cam fazendo parte integrante do presente julgado.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 13 de novembro de 1991 (data do julgamento).
Ministro Pedro Acioli, Presidente
Ministro Garcia Vieira, Relator
DJ 16.12.1991
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
234
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Garcia Vieira: Trata-se de recurso especial fundado no art.
105, III, a, da CF, interposto contra acórdão do egrégio Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo que reconheceu a isenção constante do art. 1º, XIII, da
Lei Complementar n. 4/1969, inserindo no conceito de “ração balanceada” os
“concentrados” e os “suplementos” para alimentação animal.
Sustenta a recorrente, Fazenda do Estado de São Paulo, que o v. acórdão
recorrido violou a Lei Complementar n. 24/1975, o art. 111, II, do CTN e os
Convênios ns. 35/1983 e 36/1983.
Esclarece que a Lei Complementar n. 4/1969 dispõe sobre isenção a
“rações balanceadas” inexistindo qualquer referência aos “concentrados” e
“suplementos”, sendo certo que interpreta-se literalmente a legislação tributária
que disponha sobre outorga de isenção (art. 111).
Prossegue aduzindo que o Convênio n. 33/1983 revogou a isenção
permitida pelo Convênio n. 7/1970, no que se refere a complementos e
suplementos (fl s. 338-343).
Oferecidas contra-razões (fl s. 372-374), foi o recurso admitido (fl s. 362-
363), subindo os autos a este colendo Tribunal.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Garcia Vieira (Relator): Sr. Presidente: Com suporte no art.
19, § 2º, da Constituição Federal anterior à Lei Complementar n. 4, de 02 de
dezembro de 1969, em seu art. 1º, item XIII, isentou de ICM as saídas de rações
balanceadas para animais. Nestas estão incluídos o concentrado e o suplemento,
defi nidos pelo Decreto n. 76.986, de 06 de janeiro de 1976, art. 4º, itens IV e
V e isto fi cou bem claro pelo Convênio ICM n. 7/1970 que, expressamente,
se referia a “rações, concentrados e suplementos”. Nossa Corte Maior no RE
n. 72.131-PR, julgamento de 17 de março de 1972 (doc. de fl s. 122-124), já
entendeu que:
Isenção relativa às rações balanceadas para animais (Lei Complementar n.
4/1969).
As chamadas “rações concentradas” estão abrangidas pelo referido conceito.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 213-244, fevereiro 2010 235
A egrégia Segunda Turma deste Superior Tribunal de Justiça, já em vários
precedentes, unânimes, vem reconhecendo que as rações balanceadas para
animais abrangem o concentrado e o suplemento, bastando citar os Recursos
Especiais ns. 1.796-MG, julgamento de 07.11.1990, 7.560-MG, julgamento de
03 de abril de 1991 e Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 12.783-
MG, DJ de 23.09.1991.
É evidente que, pelo princípio da hierarquia das leis, nenhuma lei estadual
ou convênio, poderia revogar a Lei Complementar Federal citada, n. 4, de 02 de
dezembro de 1969. A questão foi muito bem examinada na sentença de fl s. 291-
308, confi rmada pelo venerando aresto hostilizado que não merece censura. Da
sentença destaco os seguintes trechos:
... para espancar qualquer dúvida, no superveniente Convênio n. 7/1970
se aludiu de forma expressa, com todas as letras, também a “concentrados” e
“suplementos”.
Assim não tivesse ocorrido, entretanto, a situação não se alteraria: continuariam
aqueles a estar abrangidos pelo termo genérico “rações balanceadas”, de que a Lei
Federal n. 4/1969 se utilizou.
Do que se depreende que a supressão, pelo Convênio 35/1983 subseqüente,
dos concentrados e suplementos, representou fl agrante ilegalidade. Equivaleu a,
por via oblíqua, revogar parcialmente a LC n. 4/1969, na esfera puramente estadual
— o que não é possível, como mais adiante se verá: outra lei complementar
federal, quisesse revogar a anterior, deveria vir a fazê-lo expressamente; como,
aliás, sucedeu com outros dispositivos do art. 1º da Lei n. 4/1969 (o inciso V, p. ex.,
foi revogado pela Lei Complementar n. 44/1983, no art. 5º).
Que, tecnicamente, na expressão “rações balanceadas” os “concentrados” e
“suplementos” estavam incluídos — e tanto estavam que, como já visto, o § 1º do
art. 4º do Decreto Federal n. 76.986 assim o disse expressamente; e tanto estavam
que assim decidiu a Suprema Corte, no RE n. 72.131, de início invocado —, bem
deu mostra Gastão Lobo D’Eça, no parecer sob análise. (fl s. 40-43)
Segundo o art. 23 § 6º da Constituição passada — a égide da qual ocorreu aqui
o fato gerador, inibido pela isenção —, realmente, aos Estados é que competiria,
por Convênio, conceder ou revogar isenções em matéria de ICM.
Sucede que, ao lado desse dispositivo outro existe, também de índole
constitucional, que autoriza a União a conceder, por lei complementar, isenções
de impostos estaduais ou municipais.
Dispõe o art. 19, § 2º da Carta de 1969, com efeito, que:
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
236
a União, mediante lei complementar e atendendo a relevante interesse
social ou econômico nacional, poderá conceder isenções de impostos
estaduais ou municipais.
Tem-se, diante disso, duas situações em matéria de ICM. Nela a isenção, em
princípio, será concedida ou revogada pelos Estados. E os Estados só poderão
revogar as isenções que eles próprios houverem concedido, pena de tornar letra
morta o art. 19, § 2º, da Carta Constitucional.
Por exceção à regra acima, com arrimo no art. 19, § 2º, da Emenda n. 1/1969,
sob análise que alude genericamente a “impostos estaduais” dos quais não se
pode descartar o ICM; até porque, além do ICM, só existia um outro imposto
estadual na Constituição (art. 23), que é o de transmissão imobiliária, à União
caberá também instituir ditas isenções, por lei complementar.
Só dessa forma — o poder de isentar, dos Estados, não exclui o da União a
respeito — será possível harmonizar os dois preceitos da Lei Maior. Do que se
segue que, se a União isentar de ICM esta ou aquela operação, a ela própria
é que unicamente caberá — quando quiser — extinguir o favor fiscal que
primitivamente concederá.
Do contrário, chegar-se-ia a situações absurdas. Isenção concedida hoje por
Lei Federal, com a qual os Estados não concordassem, por eles poderia ser —
agindo por via oblíqua — cancelada amanhã por mero Convênio. O que, na
prática, terminaria por anular o poder maior da União, sobre a matéria.
Que o art. 19, § 2º, da Constituição pretérita valia também para o ICM, não
há nenhuma dúvida. O que não se admite é o regramento da matéria por lei
ordinária federal, já que se exige, de forma explícita, lei complementar.
Outrossim, mesmo para os que não admitem — como Roque Antonio
Carrazza, nos “Princípios Constitucionais Tributários e Competência Tributária”, pp.
226-227 (refere, em nota de rodapé, a existência do Tratado de Itaipu entre Brasil
e Paraguai, isentando de ICM e ISS as aquisições de Itaipu Binacional) — isenção
criada por mero decreto legislativo do Congresso (baixado, v.g., para aprovação
do Tratado), a convalidação dessa isenção poderia ocorrer, justamente, pela forma
do art. 19, § 2º, do texto constitucional em referência.
Quer dizer:
Esta impossibilidade só pode ser contornada se a União, uma vez
fi rmado e ratifi cado o tratado que concede isenções de tributos estaduais
ou municipais, usar do permissivo do art. 19, § 2º, do Texto Magno. Melhor
traduzindo a idéia, a União, após a celebração do tratado, porém, por
meio de lei complementar, conceder isenções de impostos — e só de
impostos — estaduais e municipais; isto, porém, apenas quando presente
o “relevante interesse social ou econômico nacional”, a critério, em última
instância, do Poder Judiciário.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 213-244, fevereiro 2010 237
Intuitivo que, em casos que tais, se a isenção vier baixada pela União, ela,
apenas é que a poderá revogar. Jamais os Estados, pena de intromissão indevida
em questões que nem lhes dizem respeito, mas afetam superiores interesses
sociais ou econômicos nacionais — que é o que autoriza legislar a União acerca
da matéria. Não há, data venia, como sustentar o contrário.
Nego provimento ao recurso.
RECURSO ESPECIAL N. 14.808-MG
Relator: Ministro Demócrito Reinaldo
Relator para o acórdão: Ministro Humberto Gomes de Barros
Recorrente: Fazenda Pública do Estado de Minas Gerais
Recorrida: Cemevet-Central de Medicamentos Veterinários Ltda
Advogados: Nardele Débora Carvalho Esquerdo e Breno Linhares
Lintz e outro
EMENTA
Tributário. Ração balanceada. Concentrados. Suplementos.
Isenção (LC n. 4/1969)
Os “concentrados” e “suplementos” incluem-se no conceito de
“rações balanceadas” a que se refere o art. 1º, inciso XIII, da Lei
Complementar n. 4/1969.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das
notas taquigráfi cas a seguir, por maioria, vencido o Sr. Ministro-Relator, negar
provimento ao recurso. Votaram com o Relator designado os Srs. Ministros
Milton Pereira e Cesar Rocha. Ausente, justifi cadamente, o Sr. Ministro Garcia
Vieira.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
238
Brasília (DF), 07 de outubro de 1992 (data do julgamento).
Ministro Demócrito Reinaldo, Presidente
Ministro Humberto Gomes de Barros, Relator designado
DJ 07.12.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Demócrito Reinaldo: Trata-se de recurso especial em que
se discute a isenção dos denominados suplementos minerais, componentes das
rações balanceadas para animais, à luz da Lei Complementar n. 4, de 02 de
dezembro de 1969, entre outros diplomas legais.
O apelo excepcional subiu a esta Corte por força de agravo a que dei
provimento.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Demócrito Reinaldo (Relator): O ponto nodal da
controvérsia consiste em saber se na vigência da Lei Complementar n. 4, de 02
de dezembro de 1969, decorrente do conteúdo substantivo do art. 19, § 2º, da
Constituição de 1969, os chamados suplementos minerais (para animais) estão
sujeitos à isenção do Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICM).
Ressalve-se, desde logo, que a isenção determinada pela Lei Complementar
n. 4/1969, citada, difere daquela prevista na Lei Complementar n. 24, de 07 de
janeiro de 1975, que disciplina a isenção do tributo em causa, dependendo
de convênios entre os Estados-Membros, porquanto é destes a competência
para instituir o ICM, ou, dele, isentar certas operações com circulação de
mercadorias.
Inaplicáveis, ao caso, tanto a Lei Complementar n. 24/1975, quanto os
convênios fi rmados pelos Estados, acerca da isenção de ICM, especialmente o
de n. 35/1983, de 06 de dezembro de 1983, discutido no julgamento da causa.
Com efeito, dispõe o art. 1º, XIII, da Lei Complementar n. 4/1969, in
verbis:
Art. 1º - Ficam isentas do imposto sobre operações relativas à circulação de
mercadorias:
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 213-244, fevereiro 2010 239
omissis
XIII - as saídas, de quaisquer estabelecimentos, de rações balanceadas para
animais, adubos simples ou compostos, fertilizantes, inseticidas, fungicidas,
formicidas, herbicidas, saromicidas, pintos de um dia, mudas de plantas e
sementes certifi cadas pelos órgãos competentes.
Partindo do princípio de que, no caso, não está em causa a Lei
Complementar n. 24/1975, desde que, com base nesta, só os próprios Estados,
através de convênios, podem isentar certas operações com mercadorias do ICM,
consoante prevê o art. 23, § 6º, da Constituição de 1969, trata-se de saber, como
já se frisou alhures, se os suplementos minerais estão isentos do imposto, como
pretende o contribuinte.
Em outras palavras: trata-se de aceitar, ou não, se o suplemento inicial está
implícito ou expresso no conceito de ração balanceada, para efeito da isenção
do tributo estadual. A interpretação da legislação tributária, nesse aspecto das
isenções, como se sabe, deve ser estrita, ou, de outra feita, “a interpretação, em
direito tributário, é exclusivamente pro lege”.
Partindo desse princípio, conclui-se que a compreensão de que suplemento
inicial está expresso no conceito de rações balanceadas é manifestamente
dilargante, extensiva, ampliativa, de tal forma que afronta preceito expresso do
Código Tributário Nacional (art. 111).
Suplemento, no caso, é o que serve para suprir, o que se dá a mais, parte que
se adiciona a um todo, para aperfeiçoá-lo. Suprir, assim, na linguagem comum,
signifi ca completar, inteirar, preencher. Portanto, o suplemento a que a lei se
refere é apenas o adjutório, o que se ajunta à ração balanceada para ampliá-la ou
melhorar o seu teor alimentício. É essa a defi nição contida no art. 4º, inciso V,
do Decreto n. 76.986, de 06 de janeiro de 1976: “Suplemento é ingrediente ou
mistura de ingredientes capaz de suprir a ração ou concentrado, em vitaminas,
aminoácidos ou minerais, sendo permitida a inclusão de aditivos”.
Observa-se, assim, da própria defi nição legal, que o suplemento é meio
aditivo que se junta à ração, para efeito de supri-la de outros ingredientes,
vitaminas ou substâncias, aumentando ou melhorando o seu teor alimentício. O
suplemento, como é evidente, não substitui a ração balanceada e, portanto, a ela
não se equipara.
Nessa linha de raciocínio, esclareceu com maestria o Ministro Ilmar
Galvão, em voto proferido no Recurso Especial n. 7.560-0-MG:
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
240
A Lei Complementar n. 4/1969, em seu art. 1º, ao instituir a isenção tributária
questionada, referiu expressamente à ração balanceada sem abranger a matéria-
prima utilizada em sua fabricação, entre as quais se incluem os concentrados.
Assim, por força da norma do art. 111, inciso I, do CTN, que veda a interpretação
compreensiva das normas de isenção, não há espaço para que se considere
abrangida pelo dispositivo indicado da mencionada lei complementar, produto
que não está nele descrito.
A jurisprudência dos Tribunais, malgrado a existência de opiniões em
contrário, é iterativa:
Observado o preceito do art. 111 do CTN, que determina seja interpretada
literalmente a legislação tributária que disponha sobre outorga de isenção,
forçoso é concluir sejam coisas diferentes e inconfundíveis a ração balanceada,
o concentrado e o suplemento, alcançando o favor fiscal apenas a primeira.
Esse diploma legal (Decreto n. 76.986), ao defi nir os produtos empregados na
alimentação animal, diz que ingrediente é qualquer matéria-prima utilizável na
composição de uma ração, concentrado ou suplemento, a indicar que tal matéria
entra na composição de três produtos diferentes, reforçando o entendimento de
que ração, concentrado e suplemento são coisas diferentes. O decreto defi ne os
dois últimos como componentes ou insumos da primeira. Apenas e tão-somente
para fi scalização é que esse diploma legal equiparou a ração ao concentrado e
ao suplemento. (Revista dos Tribunais, vol. 649, p. 87; Revista de Jurisprudência do
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, vol. 104, p. 148).
O egrégio Tribunal de São Paulo ao interpretar o Decreto n. 76.986, que
os contribuintes invocam para justifi car o seu pleito, tem proclamado repetida e
conclusivamente:
O Decreto em questão nada mais faz que estabelecer uma equiparação para
fi ns de fi scalização, já que a lei regulamentada contém normas sobre inspeção
e fiscalização de produtos destinados à alimentação animal, não podendo
extravasar seu alcance para o campo tributário e, ao defi nir cada um dos produtos
de que se cuida, deixou bem claro que suplemento é o ingrediente ou mistura
de ingredientes capaz de suprir a ração ou concentrado. É óbvio, pois, que ração
animal e suplemento não se confundem. A sentença contém correta defi nição
do que é ração balanceada, mostrando que esta nada mais é que uma ração
específi ca para grupo de animais com necessidades idênticas ou semelhantes,
persistindo a diferença entre ela e o suplemento. (RJTJESP, 104/148 e 149).
Em outra oportunidade, também interpretando o Decreto n. 76.986/1976,
esclareceu aquela egrégia Corte de Justiça:
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 213-244, fevereiro 2010 241
A Lei Complementar n. 4, de 02.02.1969, em seu art. 1º, inciso XIII, dispõe que
fi cam isentas de ICM as rações balanceadas para animais. Efetivamente, não cabe
no âmbito da interpretação das leis tributárias fazer qualquer tipo de exegese
ampliativa, a fim de não criar isenções ou imunidades não expressamente
previstas. Seria, data venia desarrazoado interpretar a Lei Complementar
n. 4/1969, que limita as isenções às rações balanceadas, tomando por base
uma definição dada por Decreto Federal editado muitos anos depois, isto é,
em 06.01.1976, apenas para submetê-los à fi scalização específi ca. (RJTJESP, vol.
102/91 e 92).
Ressalte-se, por oportuno, e como tem entendido o colendo Supremo
Tribunal Federal em casos análogos (RT, 596/272):
A isenção do ICM só é dada ao produto acabado e não à matéria-prima que
será componente daquela a ser industrializada. Não é possível, com a devida vênia
dos que pensam em contrário, basear-se na existência da fi gura isencional, que só
pode ser objeto de Lei Complementar Federal, e, por simples decreto, que, aliás,
tem conteúdo e destinação diversos, conceder-se isenção de ICM, sobre insumos
(suplementos minerais) que não foram alcançados pela Lei Complementar n.
4/1969.
No caso, só seria possível o reconhecimento da isenção se suplementos
minerais se equiparassem, ou, em outras palavras, se fossem iguais em teor
alimentício às rações balanceadas (ou pudessem substituir a estas). Mas, como se
viu, ração balanceada difere dos suplementos. Estes, como ingredientes diversos,
apenas completam ou enriquecem a ração animal. A isenção, portanto, não lhes
alcança.
Dou provimento ao recurso para o fi m de denegar a segurança.
É como voto.
VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros: Pedi vista, porque tenho
entendimento contrário ao manifestado pelo eminente Relator, em seu
respeitável voto.
Em voto que proferi nos Embargos de Divergência no REsp n. 5.431,
manifestei-me nestes termos:
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
242
Sr. Presidente, peço vênia ao eminente Ministro Demócrito Reinaldo para
receber os embargos e assim o faço porque entendo que o art. 111 do Código
Tributário Nacional, ao determinar que se interprete literalmente a legislação
tributária, dá uma diretriz ao intérprete, mas não o proíbe de exercer o seu
trabalho de exegese.
Quanto ao tema, parece-me que a questão fi ca mais em termos de nomes. O
complemento à ração balanceada, como bem demonstrou o eminente Ministro
Demócrito Reinaldo, é aquilo que falta à ração balanceada, para que o animal que
dela se alimenta, adquira todos os elementos necessários à sua perfeita nutrição.
Complemento é aquilo que se soma a determinada quantia ou entidade, para
completar uma grandeza maior.
Quem dispõe de seis unidades necessita de seis outras, para completar uma
dúzia.
A operação que se desenvolve no procedimento complementar é a soma.
Ora, uma das propriedades da soma é a envolver, apenas, entidades da mesma
espécie: não é possível somar peras e maçãs; bois com cavalos.
Em verdade, complemento à ração animal, ração animal é. Digo que é uma
questão de palavras, porque se chamarmos ração a este composto de minerais,
agora chamado de suplemento, teremos que chamar ao que hoje chamamos
de ração balanceada, de suplemento. São, na verdade, duas partes da ração.
Ração é aquilo necessário a que se proporcione uma nutrição completa, integral.
A ração balanceada não chega a ser ração integral. Falta-lhe um suplemento.
O “suplemento” também não chega a ser ração. Para tanto é necessário seja
suplementado. A questão é somente de nomes: chama-se uma parte da ração
balanceada e a outra de suplemento. Por isso, parece-me que as duas integram na
realidade, o conceito de ração integral.
Mantenho-me fi el àquele pronunciamento.
Por isto, peço vênia par discordar do eminente Relator e negar provimento
ao recurso.
VOTO
O Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros: Sr. Presidente, mantendo-me
fi el àquele pronunciamento; peço vênia ao Sr. Ministro-Relator para discordar
do seu voto proferido naquela oportunidade.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 213-244, fevereiro 2010 243
VOTO
O Sr. Ministro Demócrito Reinaldo (Relator) - Aparte: eminente Ministro
Gomes de Barros, tenho sido vencido com relação a esta matéria nesta egrégia
Turma e também na Primeira Seção. Portanto, quase de nada adiantaria qualquer
adjutório que pudesse acrescentar neste momento em relação à fundamentação
já esposada em ocasiões diferentes.
Entendo que suplemento é coisa diferente de ração. Ração balanceada
é aquela que, por si só, se justifi ca, podendo ser administrada àqueles animais
para os quais é destinada sufi cientemente, para que se mantenham, para que
sobrevivam, ou para que engordem ou adquiram maior quantidade de peso para
efeito de venda posterior. Enquanto que o suplemento é apenas uma parte, uma
matéria ou uma substância que se adiciona melhorando a ração, integralizando-a
para dar um teor alimentício maior, uma potência maior àquela ração; se
administrada a determinado grupo de animais, adquire um peso superior, com
menor espaço de tempo. Enfi m, para esse suplemento ter a mesma isenção que
corresponda à da ração balanceada ou a da ração integral, seria necessário que
esse suplemento, sozinho, fosse administrado aos animais e tivesse as mesmas
conseqüências que a da ração integral ou balanceada. Parece-me que não é o
caso. O suplemento pode ser açúcar, ou sal, uma proteína ou uma substância
qualquer que, por si só, não constitui ração. Se o suplemento for administrado,
sozinho, esses animais, sem dúvida, não sobreviverão, ou, pelo menos, o fi m
colimado, com a aplicação daquele suplemento, não será jamais alcançado.
Portanto, penso que há uma diferença que só pode ser sanada quando a lei
expressamente o defi ne. Equiparar ambos os produtos para efeito da isenção de
tributo, é matéria de direito estrito.
Mantenho o meu voto.
VOTO
O Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros: Parece-me, data venia, que o
termo suplemento — como tentei demonstrar no meu voto — é algo que falta
para complementar um todo. Se se precisa do suplemento, a ração balanceada
seria, na terminologia dos economistas brasileiros, como a cesta básica: o
sufi ciente quase que para a sobrevivência, mas que necessitaria de algo mais
para complementação da ração integral do brasileiro. Por isso é que me atrevo a
discordar de V. Exa.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
244
VOTO
O Sr. Ministro Milton Pereira (Relator): Sr. Ministro-Presidente, as razões
de V. Exa. foram explicitadas de modo lógico. Entretanto, entendendo que
se o principal está isento, fi caria ilógica a não-isenção do que simplesmente
suplementa.
À vista disso, peço a sua compreensão para discordar e acompanhar o voto
do eminente Ministro Gomes de Barros.
VOTO
O Sr. Ministro Cesar Rocha: Pelas razões alinhadas pelo eminente
Ministro Gomes de Barros, como também pelas considerações feitas pelo
eminente Ministro Milton Pereira acompanho Suas Excelências com a vênia do
eminente Ministro-Relator.
Súmula n. 88
SÚMULA N. 88
São admissíveis embargos infringentes em processo falimentar.
Referência:
CPC, arts. 273, 496, III e 530.
Precedentes:
REsp 4.155-RJ (3ª T, 13.05.1991 — DJ 26.08.1991)
REsp 25.941-SP (4ª T, 14.12.1992 — DJ 08.03.1993)
REsp 27.929-RS (4ª T, 16.03.1993 — DJ 14.06.1993)
REsp 33.243-SP (4ª T, 08.06.1993 — DJ 02.08.1993)
Segunda Seção, em 29.09.1993
DJ 05.10.1993, p. 20.719
RECURSO ESPECIAL N. 4.155-RJ (90.7062-7)
Relator: Ministro Waldemar Zveiter
Relator para o acórdão: Ministro Cláudio Santos
Recorrente: Banco do Brasil S/A
Recorrida: Bolsas Belacap Ltda - em concordata preventiva
Advogados: Paulo Cezar Benedito e outros e Oswaldo Monteiro Ramos
e outro e Maurílio Moreira Sampaio
EMENTA
Embargos infringentes. Ações falimentares. Cabimento.
Cabíveis embargos infringentes em quaisquer ações previstas na
lei de falências de decisões não unânimes proferidas em apelação.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide
a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, conhecer do
recurso especial e lhe dar provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-
Relator, na forma do relatório e notas taquigráfi cas constantes dos autos, que
fi cam fazendo parte integrante do presente julgado. Custas, como de lei.
Brasília (DF), 13 de maio de 1991 (data do julgamento).
Ministro Nilson Naves, Presidente
Ministro Cláudio Santos, Relator
DJ 26.08.1991
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Waldemar Zveiter: Nos autos da concordata preventiva de
Bolsas Belacap Ltda, lança o Banco do Brasil S/A., (ora recorrente) o Especial (art.
105, IV, a e c) por entender violados pelo aresto recorrido os arts. 496 e 530 do
CPC, bem como precedentes que arrola à fl . 137.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
250
O julgado contra o qual se recorre fundou-se em que (fl.125) são
inadmissíveis embargos infringentes em matéria falimentar, sendo dominante
na jurisprudência que o CPC não é lei supletiva, em tema de recursos, da LEF.
No exame dos pressupostos de cabimento, o apelo foi admitido (fl . 149).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Waldemar Zveiter (Relator): Em ambos os fundamentos
o que se discute é saber se cabível ou não embargos infringentes em processo
falimentar.
No entender do recorrente o aresto ao inadmiti-los teria ferido os arts. 496
e 530 do CPC, bem como divergido de alguns precedentes que arrola.
Sabe-se que os embargos infringentes são um recurso de natureza ordinária,
por isso prevista sua aplicação em relação ao processo comum. A lei que os
regulou não o fez no sentido de, juntamente com os demais recursos ordinários,
deferi-los aos processos especiais, não se podendo, pois, estendê-los pelo critério
da analogia. Isso é que dessume a doutrina e também a jurisprudência, ambos
colacionados pelo julgado recorrido e tido por este como razão de decidir (fl .
117).
Veja-se estes trechos:
... Com efeito, de acordo com a jurisprudência dominante, inclusive do colendo
Supremo Tribunal Federal, a Lei de Falências, ao determinar seu sistema de
recursos, que é específico, não contempla a admissibilidade dos embargos
infringentes (RTJ vol. 100, pp. 885-889).
Esse entendimento decorre da jurisprudência, também dominante, de que
o CPC não é lei supletiva, em matéria de recursos da Lei de Falências, conforme
ensinamento de Theotônio Negrão, que cita vários acórdãos a respeito (in ‘Código
de Processo Civil e legislação processual em vigor’, 17ª ed., p. 699, nota 3 ao art.
207 de Lei de Falências).
No precedente do Pretório excelso, o eminente Relator, Ministro Raphael
Mayer, sustenta, em defesa de seu entendimento, que:
... De início refuto a preliminar de falta de exaustão da via recursal ordinária
(Súmula n. 281), por entender que a Lei de Falências (Decreto-Lei n. 7.661/1945),
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 245-277, fevereiro 2010 251
norma especial, ao determinar seu sistema de recursos, que é específi co, e atende
à índole do instituto, não contempla a admissibilidade dos embargos infringentes.
Considere-se que a Lei n. 6.014/1973, que adaptou ao novo Código de
Processo Civil os recursos previstos em lei especial, ao alterar o art. 207 da Lei
de Falências, substituindo o agravo de petição pelo recurso de apelação e do
agravo de instrumento seriam os do Código de Processo Civil, não fazendo
qualquer menção ao recurso de embargos infringentes e esse simples propósito
de adaptação não importa em alterar o sistema recursal da mesma lei e com
repercussão no próprio sistema falimentar.
Assim sendo, em matéria falimentar não cabem embargos infringentes,
entendimento que tem o amparo de boa doutrina (Sampaio de Lacerda —
Manual de Direito Falimentar, ed. 1978, p. 88; Rubens Requião — Curso de Direito
Falimentar, ed. 1977, 2º vol., p. 165).
Acrescente-se que Theotônio Negrão anota que “é dominante a
jurisprudência de que o CPC não é lei supletiva da LF, em matéria de recursos.
Nesse sentido: RT 494/1967, 503/112; 545/195; 547/84, RJTJESP 38/105,
41/215, 48/209, 50/253, 51/125, 63/220. Bol. AASP 1.017/105. Contra: RT
469/103, 492/75, RJTJESP 108/348.
Assim sendo, em matéria falimentar não cabem embargos infringentes
(STF — RTJ 99/925, 100/885; STF — RT 555/245, 570/263, 1ª Col., em:
RT 521/233, RJTJESP 51/192, 90/398, 99/386...” (Código de Processo Civil e
legislação processual em vigor, 21ª ed., p. 816).
Pertinente ainda à inviabilidade de embargos infringentes em processo
falimentar, vale a pena transcrever lição de Sampaio de Lacerda que, discorrendo
sobre o tema Falência decretada em grau de apelação e os embargos infringentes,
ensina, demonstrando que:
Com a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil houve necessidade
de a ele adaptar certas leis especiais. Assim, a Lei n. 6.014, de 27.12.1973 e,
posteriormente, a Lei n. 6.017, de 03.07.1974. A primeira dessas leis atingiu a lei
falimentar, porque substituiu sempre o recurso de agravo de petição pelo de
apelação, já que aquele não mais era previsto pela nova lei processual.
É justamente acerca dessa providência — sem querer anotar o alargamento
do prazo para o recurso — que merece exame no que concerne a um problema
de real importância, qual seja o de cabimento ou não de embargos infringentes
quando a falência for decretada em grau de apelação, por maioria de votos.
Quando o recurso admissível de sentença denegatória de falência era o de
agravo de petição, na hipótese de ser provido por maioria de votos e decretada a
falência, estava fi ndo o processamento na instância superior, sem a possibilidade
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
252
de serem oferecidos embargos de nulidade e infringentes. Desciam, então, os
autos ao Juízo singular para que, completada a sentença declaratória com as
determinações da lei, fosse iniciado, de imediato, o procedimento falimentar, com
a nomeação do síndico, a fi m de proceder, sem demora, a arrecadação dos bens
etc...
Atualmente, como o recurso passou a ser o de apelação, serão admissíveis
embargos infringentes na hipótese acima, desde que são elas cabíveis em
apelação quando não for unânime o julgado proferido (art. 530 do Código de
Processo Civil)?
Admitir-se tal recurso importará na impossibilidade de se processar a
falência decretada, trazendo conseqüências sérias ao procedimento falimentar,
retardando providências que devem ser tomadas de pronto, inclusive a cessação
das atividades do falido, que, se fi car à testa de seu negócio, poderá acarretar, de
qualquer forma, prejuízos de vulto aos credores, inclusive o depauperamento da
massa.
Ora, para a perfeita harmonia entre a disposição processual do Código e a
sistemática do processo falimentar, impossível será admitir-se os embargos
infringentes à apelação, que, por maioria de votos, decretará a falência de certo
comerciante, reformando a sentença que a denega. Tudo isso é conseqüência
de leis elaboradas com a vontade de inovar, sem a ponderação necessária, com
providências de menor importância, como a de eliminar certa modalidade de
recurso, como o agravo de petição sem qualquer justifi cação prática, pois como
pondera Barbosa Moreira, o próprio Código eliminou os males apontados em
relação ao agravo de petição pela “Exposição de Motivos” (Comentários ao Código
de Processo Civil, n. 117, pp. 220-221). Melhor teria sido mantê-lo na lei falimentar,
pelo menos, a despeito de sua inexistência no Código de Processo Civil, já que
a Lei de Falência é lei também adjetiva e especial, com características próprias,
naturalmente, em razão de sua fi nalidade jurídica e econômica.
Diante disso, portanto, para a perfeita conciliação entre o texto do Código de
Processo Civil e o caráter peculiar da lei falimentar, a única solução é a de não
serem admissíveis embargos infringentes à apelação, que, por maioria de votos,
reforma a sentença denegatória de falência, para decretá-la. (RF vol. 246/307)
Corretos os lineamentos que alicerçaram o aresto, por isso que, com apoio
neles e nos suplementos jurídicos expendidos, não conheço do recurso, quanto à
letra a e também quanto à letra c por não comprovado o dissídio.
VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Cláudio Santos: Os embargos infringentes são recursos de
decisão não unânime proferida pelos tribunais de segundo grau de jurisdição
ordinária, no julgamento de apelações ou ações rescisórias.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 245-277, fevereiro 2010 253
É recurso que, em face da divergência interna no órgão julgador competente
do Tribunal, e para ter-se a certeza da inexistência de erro ou equívoco, faz com
que a causa, ainda em segundo grau ordinário, seja submetida a um colegiado
maior (Turmas ou Câmaras reunidas ou ao próprio Pleno).
Trata-se de criação luso-brasileira, sem recurso assemelhado em outros
sistemas jurídicos. No Brasil colônia, sob a regência das Ordenações Filipinas,
admitiam-se embargos com a denominação de declaratórios, modifi cativos
e ofensivos. Posteriormente para as questões de natureza comercial, o
Regulamento n. 737, de 25.11.1850, disciplinou-os sob as espécies de
declarativos e de restituição de menores, modifi cativos ou infringentes do
julgado e de restituição, bem assim do executado. Na Consolidação das Leis do
Processo Civil, tornada obrigatória com força de lei, em virtude da Resolução
de Consulta de 28.12.1876, conhecida como Consolidação de Ribas, foram
mantidas as diversas espécies de embargos.
Após a proclamação da República, através do Decreto n. 763, de
19.09.1890, voltaram a ter aplicação, nas causas cíveis em geral, os embargos
previstos no conhecido Regulamento n. 737, de 1850, até que os Estados-
Membros da Federação elaborassem seus Códigos de Processo. Em muitos
destes foram estatuídos embargos infringentes e de nulidade tanto contra
decisões de primeiro como de segundo graus. Após a Constituição de 1934,
concentrou-se na União a competência para legislar sobre processo, e com o fi to
de regular os recursos das decisões fi nais dos Tribunais de Apelação surgiu a Lei
n. 319, de 25.11.1936, a prever embargos de nulidade e infringentes do julgado
e de declaração contra decisões ou sentenças fi nais proferidas em apelações
cíveis ou agravo.
O Código unitário de 1939, seguindo-se, veio dentre outras situações
permitir os embargos de nulidade e infringentes do julgado de decisões não
unânimes proferidas em julgamento de apelação e em ação rescisória...” (art.
833).
Finalmente, o Código atual dispõe em seu art. 830: “Cabem embargos
infringentes quando não for unânime o julgado proferido em apelação e em
ação rescisória...”
Impõe o caso concreto a análise da admissibilidade desses embargos na
ação falimentar, tendo o douto e eminente Relator, Ministro Waldemar Zveiter,
se pronunciado pela impossibilidade de interposição de embargos infringentes,
de conformidade com vasto lastro doutrinário e jurisprudencial que invocou.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
254
Marcos Afonso Borges, numa das raras monografi as que conheço (a outra
é de Egas Moniz de Aragão), observa:
8.7. Na jurisprudência não há entendimento uníssono quanto à possibilidade
de se interpor o recurso de embargos infringentes de julgamento, não unânime,
verifi cado na apreciação da apelação, em ação falimentar.
Os argumentos aduzidos no sentido contrário e no favorável são os mesmos
utilizados para o exame da matéria em mandado de segurança, qual seja, a Lei n.
6.014, de 27 de dezembro de 1973, que dispôs, expressamente, que das sentenças
concedendo ou negando o mandado de segurança, e que declarem a falência,
o recurso cabível é a apelação. Isto porque, antes desta orientação legislativa, as
mencionadas decisões eram agraváveis de petição, tendo em vista as legislações
especiais reguladoras das matérias.
No caso especificamente da falência, invocam os opositores como sendo
aplicada subsidiariamente a Súmula n. 597 do Supremo Tribunal Federal, incidente
sobre o mandado de segurança, além da assertiva de que, sendo a lei falimentar
especial, não têm aplicação os princípios insertos no Código de Processo Civil,
havendo somente a modifi cação do recurso, uma vez que o estatuto processual
aboliu o recurso de agravo de petição. Desta forma, a Lei n. 6.014 somente teve
por intuito harmonizar o sistema de recursos, nada mais do que isso.
Quer parecer-nos que o entendimento que deve prevalecer é o da
admissibilidade, pois, nada dispondo a supramencionada lei sobre a não-
incidência do recurso de embargos em julgamentos não uniformes de apelação,
a orientação do Código deve vigorar. (“Embargos Infringentes”, São Paulo, Saraiva,
1982, pp. 87-88)
Efetivamente a Lei de Falências em vigor é omissa, ao contrário da anterior.
Nessa não havia lugar para embargos de nulidade e infringentes, di-lo M.
Seabra Fagundes, em seu clássico “Dos Recursos Ordinários em Matéria Civil”
(Rio, Forense, 1946, p. 406). É que aquela lei (Decreto n. 5.746, de 09.12.1929),
em seu art. 188, § 1º, expressamente prenunciava “não poderão ser opostos
outros embargos que os de simples declaração”, nas questões falimentares.
Mesmo assim, Seabra Fagundes, prelecionava: “Contudo há uma ação especial
disciplinada na lei falimentar, cuja decisão, na instância superior, comporta
embargos. É a ação revocatória de atos do falido. O julgado de primeira
instância nessa demanda dá lugar a apelação, e isto, ao mesmo tempo que afasta
a restrição do art. 188, § 2º, da Lei de Falências, que só veda embargos de
nulidade e infringentes quando o recurso anterior for agravo, enseja a aplicação
do art. 833 do Código de Processo Civil, que só permite os embargos a decisões
das Turmas de apelo” (ob. cit., p. 497).
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 245-277, fevereiro 2010 255
Poder-se-ia objetar que a lei de quebras atual, apesar de omissa, é
ordenamento especial de natureza comercial e processual, razão por que não se
aplicaria o Código de Processo Civil. Por outro lado, a celeridade do processo
estaria a recomendar a vedação do manejo de tal recurso. São as mesmas razões
a embasar o entendimento da inaplicabilidade dos embargos infringentes no
mandado de segurança, matéria já sumulada pelo Pretório excelso, no Verbete n.
597, a saber: “Não cabem embargos infringentes de acórdão que, em mandado
de segurança, decidiu, por maioria de votos, a apelação.”
Data venia, ouso divergir do entendimento da Corte Maior e o faço na
boa companhia do Professor Celso Agrícola Barbi... (RT 481/11), de Egas
Moniz de Aragão (Ajuris n. 10/156), de Jacy de Assis (ob. cit., pp. 90-97), de
Arruda Alvim (RP 3/192), do eminente Ministro José Néri da Silveira, quando
integrante do TFR (apud, Roberto Rosas, em “Direito Sumular”) e do douto
processualista Desembargador J. C. Barbosa Moreira, em voto no julgamento
dos embargos infringentes, na AC n. 5.856, de dezembro de 1978.
Do último, reproduzo expressivo trecho de seu voto:
As regras constantes do Código de Processo Civil constituem o reservatório
comum da disciplina de todos os feitos, desde que compatíveis com os
diplomas legais extravagantes que lhes tracem o procedimento. Tal princípio
já era proclamado pela doutrina sob o regime anterior (Pontes de Miranda),
“Comentário ao Código de Processo Civil de 1939”, 2ª ed., t.1, p. 72; Evandro
Gueiros Leite, (“Conflitos Intercontextuais de Processo”, 1963, pp. 43 e 100),
entre outras excelentes razões por que, a não ser assim, fi cariam sem disciplina,
nos processos regulados por tais leis, matérias de sua importância, nelas não
versadas, como a da capacidade das partes e modos de suprir-lhe a falta, a da
contagem de prazos, a da nulidade de atos processuais etc. Agora a norma
expressa do art. 273 do Código em vigor não deixa margem a qualquer dúvida.
“O procedimento especial e o procedimento sumaríssimo — ali se diz — regem-
se pelas disposições gerais do procedimento ordinário”, sem que se vislumbre no
texto distinção alguma entre procedimentos especiais disciplinados no próprio
Código e procedimentos especiais regulados em leis extravagantes.
Deve, pois, entender-se que a aplicabilidade das regras codificadas aos
procedimentos especiais não depende de remissão expressa que a elas façam
às leis extravagantes. Tal remissão, onde exista, há de reputar-se meramente
explicitante, relacionando-se talvez com o empenho do legislador em preexcluir
interpretações que negassem a incidência em determinado ponto específi co,
quando não sejam, pura e simplesmente, sinal de má técnica legislativa. Da
eventual presença da remissão de modo algum se pode extrair, por descabida
utilização do argumento a contrario sensu, a ilação de que só os dispositivos do
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
256
Código a que se faz referência na lei extravagante se apliquem ao procedimento
especial nela contemplado. O único pressuposto da incidência das regras
codifi cadas é a inexistência, na lei extravagante, de disposições que com elas se
choquem, ou, em termos mais genéricos, a incompatibilidade com a sistemática
da lei extravagante.
Esses princípios, que são inconcussos, comportam adequada aplicação em
matéria de recursos no processo de mandado de segurança. Faleceria qualquer
base à suposição de que, em semelhante processo, apenas se possam admitir
os recursos mencionados na Lei n. 1.533. Nela não se encontra, por exemplo,
alusão sequer implícita aos embargos de declaração, nem remete o seu texto
aos arts. 464 e 535 do Código de Processo Civil que deles tratam. No entanto,
jamais se duvidou de que os embargos declaratórios são perfeitamente utilizáveis
no processo de mandado de segurança. E, sob a vigência do Código anterior,
prevaleceu o entendimento favorável à admissibilidade, nesse processo, do
recurso de revista, do qual tampouco se ocupava a Lei n. 1.533. O mesmo se diga,
ainda hoje, do agravo de instrumento, sem o qual fi caria inerme, por exemplo,
o impetrante vencido em primeiro grau, a quem o juiz deixasse de receber a
apelação ou a julgasse deserta. (Acórdão transcrito por Marcos Afonso Borges, em
sua já citada obra, p. 92).
O não menos douto Ministro Eduardo Ribeiro, em artigo de doutrina
publicado em conjunto com outros autores mineiros, sob o título “Mandados
de Segurança e de Injunção” (São Paulo, Saraiva, 1990), faz interessantes e
oportunas considerações acerca de questão correlata, a evidenciar: “A afi rmativa
de que a Lei n. 1.533/1951 especifi cou os dispositivos do Código de Processo
Civil aplicáveis, especifi cação esta exaustiva, não resiste, data venia, a menor
análise. Sem invocação daquele Código não será sequer possível processar
um mandado de segurança. A Lei n. 1.533/1951 não cogita, por exemplo, da
capacidade processual, dos procuradores, da competência, da forma, tempo e
lugar dos atos processuais, das nulidades, dos requisitos da sentença, assim como
vários outros temas cuja regulamentação é indispensável para que se possa fazer
um processo. E tem-se ainda aceito, sem maiores divergências, que aplicável o
incidente de uniformização de jurisprudência e admissível a ação rescisória. A
primeira, pertinente ao processo de julgamento de recursos. A segunda, meio de
impugnação de sentença.” (ob. cit., p. 280). E assevera: “Em verdade, aplicam-se
supletivamente, sem discussão, numerosíssimas normas de Código, nenhuma
delas mencionadas na lei.” (Idem)
Quanto à celeridade que se deve imprimir à questão falimentar, tanto
quanto ao mandado de segurança, não se me aparenta, concessa venia, como
capaz de obstar o uso dos embargos infringentes.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 245-277, fevereiro 2010 257
Na verdade, contra a possibilidade de apresentação de embargos
infringentes em processo falimentar, um único motivo ponderável apresenta-se,
assim mesmo de ordem prática. É o que oferece o comercialista e magistrado
Desembargador Sampaio Lacerda. Em pequeno artigo na Revista Forense (vol.
246/307), sob o titulo: “Falência decretada em grau de apelação e os embargos
infringentes”, argumenta: “Admitir-se tal recurso importará na impossibilidade
de se processar a falência decretada, trazendo conseqüências sérias de pronto,
inclusive a cessação das atividades do falido que, se fi car à testa de seu negócio,
poderá acarretar, de qualquer forma, prejuízos de vulto aos credores, inclusive o
depauperamento da massa.”
O problema diz com o efeito suspensivo dos embargos infringentes,
efeito que, na realidade, diz respeito apenas ao acórdão ou a parte do acórdão
fl anqueado, como se ainda não se tivesse dado o veredicto de segundo grau.
Situação símile, porém, está expressa no CPC: da sentença de declaração
de insolvência, disciplinada no art. 761, a apelação cabível será recebida nos
efeitos devolutivo e suspensivo.
Isso, todavia, não signifi ca que os credores fi carão desamparados, sujeitos
a prejuízos de vulto, como dizia Sampaio Lacerda. Com o desenvolvimento da
teoria e da prática das medidas cautelares, imagino que, mesmo no âmbito do
poder geral de cautela do Juiz, poderiam ser determinadas providências para a
segurança dos direitos dos credores, quer numa hipótese, quer noutra.
Sublinho, por último, que a mais recente jurisprudência da Suprema Corte
é no sentido do entendimento que ora adoto. Assim, no REsp n. 112.352
(AgRg)-SP, Relator Ministro Francisco Rezek, lê-se na ementa:
Embargos infringentes. Ausência de declaração de voto-vencido.
Os embargos infringentes são cabíveis se, apesar de não declarado o voto
majoritário, for curial a dedução de seu sentido.
Agravo regimental a que se nega provimento. (RTJ 121/826 a 827),
e no REsp n. 111.342-SP, julgado logo depois, reafi rma-se (Relator Ministro
Célio Borja):
Concordata.
Recurso extraordinário que subiu ao STF em razão do acolhimento da argüição
de relevância.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
258
Não há como prosperar, o apelo porque, tendo sido o acórdão em apelação
tomado por maioria de votos eram cabíveis na instância ordinária, os embargos
infringentes (Súmula n. 281).
RE não conhecido. (RTJ — 123/1.162 a 1.163)
Ambas as decisões foram proferidas em pedidos de habilitação de crédito
em concordata.
De harmonia com o exposto, com meu pedido de vênia ao eminente
Relator , conheço do recurso pela alínea a, para dar-lhe provimento e determinar
que o recurso de embargos infringentes seja examinado.
É como voto.
RATIFICAÇÃO DE VOTO VENCIDO
O Sr. Ministro Waldemar Zveiter: Sr. Presidente, gostaria de relembrar
os fundamentos do meu voto. Antes, porém, trago uma informação à Turma:
o eminente Desembargador e ilustrado processualista, Barbosa Moreira, tem,
efetivamente, esse ponto de vista. Ainda integrava eu o Tribunal quando S. Exª
era Presidente da Quinta Câmara, a única que admitia embargos infringentes
em MS no Tribunal. Em face desta divergência, levou-se a questão à Seção
Cível para efeito de uniformização da jurisprudência.
Recordo-me que houve um debate memorável naquela Seção, travado
entre o eminente Desembargador Barbosa Moreira e o não menos eminente, hoje
pranteado, Desembargador Basileu Ribeiro Filho. Aquele sustentava o cabimento
do recurso, embasado nos princípios processuais; este o fazia no sentido de
não admiti-los, com sustentação em elementos históricos e informativos do
princípio com relação ao mandado de segurança.
Lembro-me, ainda, de que, modestamente, frente à autoridade de ambos,
ilustres Tratadistas e Professores, ousei divergir de S. Exa. para encaminhar
meu voto rumo a uma terceira posição, justamente aquela constitucional que
informa o mandado de segurança como medida de caráter excepcional, um
princípio constitucional que refugia aos elementos tipicamente processuais.
Prevaleceu vencedora, por fi m, a corrente que inadmitia a interposição de
embargos infringentes em mandado de segurança; entendimento este que,
parece-me até hoje, é o prevalente naquela Corte.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 245-277, fevereiro 2010 259
Passo agora, Sr. Presidente, à leitura do meu voto: (lê)
Sr. Presidente, mantendo o ponto de vista que sempre adotei em relação
ao mandado de segurança, por ser um bill of rigts, quer dizer, de cumprimento
imediato para a supressão da iminência de uma lesão ou o restabelecimento
do direito quando já perpetrada, ou seja, remédio chamado heróico, prefi ro
fi car fi liado aos comercialistas que, versando a matéria não apenas do ponto de
vista comercial e do instituto específi co da falência, evitam esta interposição
de recurso impróprio à própria Lei de Falências, porque pura e simplesmente
a lei adjetiva, sem atentar para esse aspecto do Direito Comercial, houve por
bem suprimir o agravo de petição de efeito devolutivo e determinar que das
apelações, em sentido geral, caberá embargos infringentes, sem exceção aqui
anotada por Sampaio Lacerda.
De sorte que, mantendo o meu ponto de vista, e agora pedindo vênia ao
eminente Ministro Cláudio Santos, que trouxe um estudo bastante aprofundado
da matéria em sentido contrário, é que mantenho, também, a conclusão do
meu voto, não conhecendo do recurso, agradecendo a V. Exa. e aos eminentes
Ministros, que me deram oportunidade de demonstrar os fundamentos pelos
quais o faço.
A questão é relevante. Como anotado pelo parecer da Procuradoria de
Justiça, os precedentes do Supremo Tribunal Federal, quando mantinha a
competência para julgamento dessa matéria, citados são apenas dois e não podem
embasar ou modifi car a corrente doutrinária que era predominantemente contra
os embargos infringentes. Sendo a competência, agora, nossa, julgo importante a
divergência para que não só a nossa Turma, mas no futuro a própria Seção, possa
fi xar orientação defi nitiva. Se for contrária ao meu ponto de vista, como tenho
feito sempre, anuirei, com bastante prazer, à corrente majoritária.
RETIFICAÇÃO DO VOTO
O Sr. Ministro Cláudio Santos: Sr. Presidente, vejo que o Banco do Brasil
fez referências a decisões publicadas no Código de Processo Civil Anotado de
Th eotônio Negrão, sem maiores considerações e sem citar, sequer, a ementa.
Realmente, V. Exa. tem razão. O dissídio não está comprovado.
Conheço do recurso pela letra a, para dar-lhe provimento.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
260
VOTO
O Sr. Ministro Nilson Naves: Em verdade, o assunto é interessante, tanto
no campo processual quanto no campo falimentar. Talvez merecesse, de minha
parte, pedido de vista. Não vou, no entanto, interromper o julgamento. Com as
minhas desculpas, voto de imediato. Tenho certa afeição pela posição que afasta,
em casos dessa ordem, o cabimento de embargos infringentes, semelhantemente
ao disposto na Súmula n. 597-STF. Ao que suponho, em relação à falência, era
essa a posição do Supremo Tribunal Federal.
Peço, assim, licença ao Sr. Ministro Cláudio Santos para, divergindo de seu
voto, acompanhar o Sr. Ministro-Relator.
VOTO
O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro: Sr. Presidente, a questão, como salientado
pelos eminentes Ministros que me antecederam, é sobremodo controvertida
e talvez se possa até apontar alguma predominância do entendimento
sufragado pelo eminente Relator e por V. Exa. Vou pedir vênia, entretanto, para
acompanhar o Sr. Ministro Cláudio Santos.
Os argumentos tirados da Lei de Falências, para considerar que o Código
de Processo Civil não se lhe aplica subsidiariamente, são insustentáveis, em
princípio. Assim como mencionei a propósito do mandado de segurança, e foi
citado pelo eminente Ministro Cláudio Santos, também o processo de falência
é impossível de fazer-se sem invocar, subsidiariamente, o Código de Processo
Civil. Numerosíssimas normas, necessariamente, têm que ser chamadas à
colação para que se possa processar uma falência. Isso tive ocasião de salientar,
aliás, em julgamento recente da Seção, quando se cogitava da condenação em
honorários.
Verdade que, relativamente a recursos, o argumento se fortalece um pouco.
É que a Lei de Falências contém, talvez, dezenas de menções a recurso, dizendo
qual o cabível em cada caso. Entretanto, é muito simples de se explicar. Foi
ela elaborada no regime do Código 39, cujo sistema de recursos era casuísta,
explicitando-se as hipóteses em que cabível agravo de instrumento. Esse
casuísmo, levado para a Lei de Falências, mostrou-se, com o novo Código,
totalmente insufi ciente, e a jurisprudência vem admitindo que admissíveis
outros recursos, notadamente o agravo de instrumento, em muitas hipóteses não
previstas. Por exemplo, o indeferimento da produção de prova e a decisão sobre
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 245-277, fevereiro 2010 261
competência. Para essas e outras questões há que se ter como adequado o agravo,
embora sem previsão na lei específi ca. Aplica-se o Código de Processo Civil.
É argumento sério, o lembrado pelo eminente Ministro-Relator, e também
versado pelo Sr. Ministro Cláudio Santos, pertinente à não-execução da sentença
de falência, decretada por simples maioria, em segundo grau. Entretanto, não é
decisivo. O Ministro Cláudio Santos já apontou soluções e lembrou que não
seria o primeiro caso, porque na insolvência civil dá-se o mesmo.
Tomo posição ao lado do douto voto do Ministro Cláudio Santos, data
venia do Ministro-Relator e de V. Exa.
VOTO
O Sr. Ministro Dias Trindade: Sr. Presidente, também tenho as minhas
simpatias pela abolição dos embargos infringentes, de lege ferenda, assim como
V. Exa. Mas, no caso ora em exame, entendo que, quando a Lei n. 6.014
alterou a Lei de Falências no particular do recurso cabível, que era de agravo
de petição, com essa alteração introduziu, automaticamente, a possibilidade de
haver embargos infringentes quando a decisão, em apelação, não for unânime.
Não havia antes, na Lei de Falências, porque não cabível em agravo de petição.
Não vejo por que — também como o Sr. Ministro Eduardo Ribeiro —
não esteja submetida ao sistema do Código de Processo Civil, no particular dos
recursos, a Lei de Falências.
Tive a oportunidade de enfrentar esse tema em um agravo de instrumento
que decidi há poucos dias, pois tratava-se da não-admissão da apelação de uma
decisão, em processo de restituição de bens em concordata; achava-se que não
havia previsão de apelação, em caso de sentença homologatória de desistência de
concordata.
No despacho admiti como possível a existência de apelação dessa sentença
homologatória, porque, do contrário iria acarretar prejuízos àqueles credores que
haviam pedido a restituição de bens, parecendo-me a desistência proposital, no
sentido de deixar os credores que tinham pedido a restituição, praticamente sem
ação.
Entendo que o Código de Processo Civil subsidia a Lei de Falências, no
particular e, por isso, que há cabimento para os embargos infringentes.
Acompanho o Sr. Ministro Cláudio Santos.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
262
RECURSO ESPECIAL N. 25.941-SP (92.0020011-7)
Relator: Ministro Barros Monteiro
Recorrente: Cocco e Companhia Ltda - em concordata
Recorrido: Banerj - Banco de Investimento S/A
Advogados: Renato de Luizi Junior e José Marcos S. V. Pellegatti e outros
EMENTA
Embargos infringentes. Feito falimentar. Cabimento.
São admissíveis os embargos infringentes quando, em processo
de natureza falimentar, o julgamento da apelação for tomado por
maioria de votos. Precedentes do STJ.
Recurso especial conhecido, em parte, e provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide
a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer
em parte do recurso e nessa parte dar-lhe provimento, na forma do relatório
e notas taquigráfi cas constantes dos autos, que fi cam fazendo parte integrante
do presente julgado. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Bueno de
Souza, Fontes de Alencar e Sálvio de Figueiredo.
Brasília (DF), 14 de dezembro de 1992 (data do julgamento).
Ministro Fontes de Alencar, Presidente
Ministro Barros Monteiro, Relator
DJ 08.03.1993
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Barros Monteiro: Cuida-se de recurso especial interposto
com fundamento no art. 105, III, alínea a e c da CF, contra decisão do Tribunal
de Justiça de São Paulo que, nos autos de habilitação de crédito em concordata,
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 245-277, fevereiro 2010 263
não conheceu de embargos infringentes opostos, de sua vez, contra o acórdão
prolatado em sede de apelação por maioria de votos.
Sustentou a recorrente negativa de vigência do art. 530 do CPC e da Lei
n. 6.014, de 27.12.1973, bem como, dissenso jurisprudencial com julgados
oriundos dos Tribunais de Justiça de São Paulo e do Rio de Janeiro.
Investiu ela, outrossim, contra o decisório proferido em grau de apelação,
alegando contrariedade à Lei n. 7.274/1984 e, ainda, dissonância interpretativa
com arestos do Supremo Tribunal Federal, deste Superior Tribunal de Justiça,
do Tribunal de Justiça de São Paulo e do Tribunal de Justiça do Paraná.
Admitido o apelo extremo, subiram os autos a esta Corte, tendo afi nal
a Subprocuradoria-Geral da República exarado parecer no sentido do
conhecimento e provimento.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Barros Monteiro (Relator): Conforme salientado pelo
despacho presidencial de fl s. 150-151, o presente apelo especial somente é
admissível contra o segundo acórdão prolatado (fl s. 99-100), pois que contra
o primeiro (fl s. 62-63) foi apresentado o recurso de embargos infringentes. O
thema decidendum adstringe-se, pois, ao cabimento dos embargos infringentes
quando, em processo de natureza falimentar, o julgamento da apelação for
tomado por maioria de votos.
A questão não é nova nesta Corte, havendo sido já apreciada por ambas
as Turmas que integram a sua Segunda Seção. Assim é que no REsp n. 4.155-
RJ, Relator designado o eminente Ministro Cláudio Santos, a egrégia Terceira
Turma decidiu sob a ementa seguinte:
Embargos infringentes. Ações falimentares. Cabimento.
Cabíveis embargos infringentes em quaisquer ações previstas na lei de
falências de decisões não unânimes proferidas em apelação.
Posteriormente, em sessão de 20.10.1992, esta colenda Quarta Turma
rejeitou a prefacial de não-cabimento dos embargos infringentes em hipótese
similar, com o prevalecimento do voto por mim pronunciado na ocasião (REsp
n. 1.872-RJ).
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
264
Nesses termos, não havendo por que recusar a aplicação subsidiária das
normas da lei instrumental civil aos processos falenciais, considero vulnerado in
casu o art. 530 do CPC e, de outra parte, confi gurado quantum satis o dissídio
interpretativo diante do paradigma proveniente do Tribunal de Justiça do Rio
de Janeiro, ainda que reproduzido tão-só pela sua ementa. É que a suma daquele
aresto se mostra o bastante para evidenciar, de pronto, a divergência pretoriana.
Ante o exposto, conheço, em parte, do recurso por ambas as alíneas do
permissor constitucional e, nessa parte, dou-lhe provimento, a fi m de que,
cassado o v. acórdão recorrido, sejam os embargos infringentes examinados pelo
seu merecimento, como de direito.
É o voto.
RETIFICAÇÃO DE DECISÃO
O Sr. Ministro Barros Monteiro: Sr. Presidente, no Recurso Especial n.
25.941-5-SP, que julgamos hoje, concluí conhecendo, em parte, do recurso
e, nessa parte, dando-lhe provimento. V. Exa. proclamou a decisão dando
provimento parcial ao recurso. Portanto, há um descompasso. Então, sugiro a
retifi cação do resultado do julgamento, para fi car constando “conhecer em parte
do recurso e, nessa parte, dar-lhe provimento”.
VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro Fontes de Alencar: Rendo-me ao precedente e acompanho
o eminente Relator.
RECURSO ESPECIAL N. 27.929-RS
Relator: Ministro Athos Carneiro
Recorrente: Banco do Estado do Paraná S/A
Recorrida: Européia Indústria de Calçados Ltda
Interessada: Européia Indústria de Calçados Ltda - em concordata
preventiva
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 245-277, fevereiro 2010 265
Advogados: Luiz Itamar Vargas de Almeida e outros e Carlos Henrique
Klaser Filho e outros e Ernesto Walter Flocke Hack
EMENTA
Concordata. Embargos infringentes. Restituição de quantias
adiantadas à conta de contrato de câmbio. Cabimento do recurso de
embargos infringentes em processo falimentar.
Cabem embargos infringentes das decisões não unânimes
proferidas em apelação, ainda que em processos de natureza
falimentar. A aplicabilidade das normas do CPC não depende de
remissão expressa que a elas façam as leis extravagantes, dês que não
se apresentem como claramente incompatíveis com a sistemática das
aludidas leis.
Precedente da egrégia Terceira Turma no REsp n. 4.155.
Recurso especial conhecido e provido, a fi m de que o colegiado
de origem julgue os embargos infringentes.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados os autos, em que são partes as acima indicadas, decide
a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer
do recurso e dar-lhe provimento, na forma do relatório e notas taquigráfi cas
precedentes que integram o presente julgado. Participaram do julgamento, além
do signatário, os Srs. Ministros Fontes de Alencar, Sálvio de Figueiredo, Barros
Monteiro e Bueno de Souza. Custas, como de lei.
Brasília (DF), 16 de março de 1993 (data do julgamento).
Ministro Athos Carneiro, Presidente e Relator
DJ 14.06.1993
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Athos Carneiro: Em ação de restituição de quantia
adiantada à conta de contrato de câmbio, ajuizada pelo Banco do Estado do
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
266
Paraná S/A contra a concordatária Européia Indústria de Calçados e julgada
parcialmente procedente no juízo monocrático, decidiu a Quinta Câmara Cível
do egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por maioria de votos, dar
parcial provimento às apelações de ambos os litigantes. Ao da concordatária
para permitir a restituição apenas dos valores “abrangidos nos 15 anteriores ao
deferimento da concordata”; e ao do requerente “para determinar a restituição
do principal, correção monetária e juros de 12% ao ano” (fl s. 161-164).
Inconformado, o Banco autor opôs embargos infringentes, não conhecidos,
também por maioria, pelo 3º Grupo de Câmaras Cíveis do Pretório sul-rio-
grandense, sob a seguinte ementa, verbis:
Embargos infringentes. Processo falimentar.
Não cabem em processo falimentar embargos infringentes contra acórdão não
unânime que julgou apelação.
Voto-vencido. (fl . 195)
Recurso especial pelo sucumbente, arrimado na alínea c do permissório
constitucional, sob a alegação de dissídio com aresto deste egrégio STJ, o REsp
n. 4.155-RJ, e do egrégio TJRJ. Sustenta em suma, a possibilidade dos embargos
infringentes no processo falimentar (fl s. 206-209).
Admitido o apelo especial pela ilustre Presidência do Tribunal de origem
(fls. 219-220), opinou a douta Subprocuradoria Geral da República pelo
conhecimento e provimento do recurso (fl s. 232-234).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Athos Carneiro (Relator): O v. aresto recorrido está assim
fundamentado, litteris:
O que impede, pois, se tenha presente é que o Código de Processo Civil
regra os prazos e o processamento dos recursos previstos na Lei de Falências,
admitindo-se o agravo retido, bem como o recurso adesivo, porquanto este se
apresenta como uma forma de apelação. Os embargos infringentes, porém, são
recurso não previsto na Lei de Falências, embora fi gura recursal contida no CPC
de 1939. Ora, se a Lei n. 7.661/1945, posterior ao CPC/1939, não contemplou o
recurso, foi porque o legislador entendeu que a natureza do processo falimentar,
exigindo celeridade para obviar prejuízos maiores, considerado esse tipo de
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 245-277, fevereiro 2010 267
execução conducente à extinção da pessoa jurídica, não se compatibilizava com
um recurso de conteúdo eminentemente protelatório. Dos embargos infringentes
diz J. C. Barbosa Moreira que o recurso é ‘fi gura peculiar ao direito luso-brasileiro,
primeiramente oponíveis apenas à execução da sentença, sem o caráter de
recurso; posteriormente ‘passaram a coexistir as duas modalidades’, embargos
à execução e embargos recursais. Em Portugal, o CPC de 1939 os extinguiu. O
eminente Mestre estranha que o novo CPC o tenha mantido. E cita a Exposição de
Motivos do Anteprojeto Buzaid: “A existência de um voto-vencido não basta por
si só para justifi car a criação do recurso; porque pela mesma razão se deve admitir
um segundo recurso de embargos sempre que no novo julgamento subsistir
um voto-vencido; por esse modo poderia arrastar-se a verifi cação do acerto da
sentença por largo tempo, vindo o ideal de justiça a ser sacrifi cado pelo desejo
de aperfeiçoar a decisão” (“Comentários ao CPC”, V vol., p. 399; Forense, 1ª ed.).
Ora, se os embargos infringentes são questionáveis como recurso no processo
comum, não há por que transplantá-los ao processo especial regrado pelo direito
falimentar, onde compareceria como mera excrescência processual, a travar e
retardar a execução.
O egrégio Supremo Tribunal Federal, nos RREE ns. 93.955 e 94.336, por ambas
as Turmas, inadmite o recurso: “A Lei de Falências, ao determinar o seu sistema
de recursos, que é específi co, não contempla a admissibilidade dos embargos
infringentes” (RTJ, 99/925).
O colendo 2º Grupo de Câmaras Cíveis deste Tribunal de Justiça, julgando
os Embargos Infringentes n. 583039409, deles não conheceu, por inadmissíveis
(RJTJRGS, 131/202 a 206). Então, o eminente Desembargador Luiz Melíbio
enfatizou que ‘quando o legislador, ao invés de dar apelação, deu agravo, foi para
que o recurso tivesse efeito meramente devolutivo e que não houvesse embargos
infringentes, porque é da natureza da Lei Falimentar que os feitos devem ser, com
a observância do princípio da segurança, breves e com o máximo de economia
processual, exatamente por causa da matéria de que se cuida em falência e
concordatas’.
Assim, Sr. Presidente, não conheço dos embargos infringentes, por
inadmissíveis na sistemática processual falimentar.
No mesmo julgamento referiu o Desembargador Adroaldo Furtado Fabrício:
Ora, se mesmo em termos assim genéricos, a tendência lógica e
simplifi cadora seria para restringir o emprego desse recurso, a sua omissão
na Lei de Falências, que tem sistema recursal próprio, específico, deve
signifi car que, por razões bem perceptíveis, pretendeu-se efetivamente
simplifi car o sistema recursal, de modo a proporcionar um encurtamento
da tramitação dos feitos, não apenas no primeiro grau, mas também
no segundo grau de jurisdição, tendo em vista as situações de especial
interesse na celeridade que se envolvem no processo falimentar.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
268
No mesmo sentido o julgamento dos EI n. 591012083, sendo Relator o
Desembargador Cacildo de Andrade Xavier.
Reitero a argumentação expendida pelos eminentes Desembargadores supra-
referidos e não conheço do recurso. (fl s. 199-201)
O ilustre Subprocurador-Geral da República, Dr. Roberto Casali, opinou
pelo conhecimento e provimento do apelo extremo, verbis:
A expressão literal do art. 255, e §§, do RISTJ não foi obedecida pelo recorrente.
A comprovação de divergência teria de se fazer com a transcrição do trecho do
acórdão que confi gurava o dissídio.
No caso bastou-se na ementa, sem indicar ao menos o tipo de processo em
que se feriu a controvérsia submetida a esse colendo Tribunal.
Por isso não é de se conhecer do recurso.
Sabe-se de outra parte que a RJSTJ, 28:327-40, publica o julgamento do REsp
n. 4.155, no qual a egrégia Terceira Turma, em 13.05.1991, interpretou, por maioria
e em frontal divergência com o Tribunal recorrido, idêntica matéria de direito
federal.
Aceito que a divulgação no repositório oficial supõe a ciência de todos e
presumindo que a Corte não deve ignorar a própria jurisprudência, para se
concluir pela admissibilidade do recurso, é de se provê-lo.
O voto condutor do acórdão, proferido pelo eminente Ministro Cláudio Santos,
no REsp n. 4.155, destaca dois precedentes do Supremo Tribunal Federal: ambos
reconhecendo embargos infringentes em concordata (RREE ns. 112.352 e 111.342,
in RTJ 121/826 e 123/1.162), aos quais se pode acrescentar o REsp n. 555, em
acórdão dessa egrégia Turma, em 12.12.1989, da lavra do eminente Relator deste
recurso. (fl s. 233-234)
Conheço do recurso tendo em vista o aresto da egrégia Terceira Turma
desta Corte, REsp n. 4.155-RJ, tomado por maioria de votos, Relator para o
acórdão o eminente Ministro Cláudio Santos, pela fl agrante divergência, a qual
exsurge mesmo com a mera leitura da ementa.
O eminente Ministro Cláudio Santos, em seu douto voto condutor no
aresto supracitado, após escorço histórico sobre os embargos infringentes,
aduziu, litteris:
Impõe o caso concreto a análise da admissibilidade desses embargos na ação
falimentar, tendo o douto e eminente Relator , Ministro Waldemar Zveiter, se
pronunciado pela impossibilidade de interposição de embargos infringentes, de
conformidade com vasto lastro doutrinário e jurisprudencial que invocou.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 245-277, fevereiro 2010 269
Marco Afonso Borges, numa das raras monografi as que conheço (a outra é de
Egas Moniz de Aragão), observa:
8.7. Na jurisprudência não há entendimento uníssono quanto à
possibilidade de se interpor o recurso de embargos infringentes de
julgamento, não unânime, verifi cado na apreciação da apelação, em ação
falimentar.
Os argumentos aduzidos no sentido contrário e no favorável são os
mesmos utilizados para o exame da matéria em mandado de segurança,
qual seja, a Lei n. 6.014, de 27 de dezembro de 1973, que dispôs,
expressamente, que das sentenças concedendo ou negando o mandado
de segurança, e que declarem a falência, o recurso cabível é a apelação. Isto
porque, antes desta orientação legislativa, as mencionadas decisões eram
agraváveis de petição, tendo em vista as legislações especiais reguladoras
das matérias.
No caso especifi camente da falência, invocam os opositores como sendo
aplicada subsidiariamente a Súmula n. 597 do Supremo Tribunal Federal,
incidente sobre o mandado de segurança, além da assertiva de que, sendo
a lei falimentar especial, não têm aplicação os princípios insertos no Código
de Processo Civil, havendo somente a modifi cação do recurso, uma vez que
o estatuto processual aboliu o recurso de agravo de petição. Desta forma,
a Lei n. 6.014 somente teve por intuito harmonizar o sistema de recursos,
nada mais do que isso.
Quer parecer-nos que o entendimento que deve prevalecer é o da
admissibilidade, pois, nada dispondo a supramencionada lei sobre a não-
incidência do recurso de embargos em julgamentos não uniformes de
apelação, a orientação do Código deve vigorar. (“Embargos Infringentes”,
São Paulo, Saraiva, 1982, pp. 87-88).
Efetivamente a Lei de Falências em vigor é omissa, ao contrário da anterior.
Nessa não havia lugar para embargos de nulidade e infringentes, di-lo M. Seabra
Fagundes, em seu clássico “Dos Recursos Ordinários em Matéria Civil” (Rio,
Forense, 1946, p. 406). É que aquela lei (Decreto n. 5.746, de 09.12.1929), em
seu art. 188, § 1º, expressamente prenunciava “não poderão ser opostos outros
embargos que os de simples declaração”, nas questões falimentares. Mesmo assim,
Seabra Fagundes, prelecionava: “Contudo há uma ação especial disciplinada na
lei falimentar, cuja decisão, na instância superior, comporta embargos. É a ação
revocatória de atos do falido. O julgado de primeira instância nessa demanda dá
lugar à apelação, e isto, ao mesmo tempo que afasta a restrição do art. 188, § 2º,
da Lei de Falências, que só veda embargos de nulidade e infringentes quando o
recurso anterior for agravo, enseja a aplicação do art. 833 do Código de Processo
Civil, que só permite os embargos a decisões das Turmas de apelo” (ob. cit., p. 497).
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
270
Poder-se-ia objetar que a lei de quebras atual, apesar de omissa, é
ordenamento especial de natureza comercial e processual, razão por que não
se aplicaria o Código de Processo Civil. Por outro lado, a celeridade do processo
estaria a recomendar a vedação do manejo de tal recurso. São as mesmas razões
a embasar o entendimento da inaplicabilidade dos embargos infringentes no
mandado de segurança, matéria já sumulada pelo Pretório excelso, no Verbete n.
597, a saber: “Não cabem embargos infringentes de acórdão que, em mandado de
segurança, decidiu, por maioria de votos, a apelação.”
Data venia, ouso divergir do entendimento da Corte Maior e o faço na boa
companhia do Professor Celso Agrícola Barbi (RT 481/11), de Egas Moniz de
Aragão (Ajuris n. 10/156), de Jacy de Assis (ob. cit., pp. 90-97), de Arruda Alvim
(RP 3/192), do eminente Ministro José Néri da Silveira, quando integrante do
TFR. (apud, Roberto Rosas, em “Direito Sumular”) e do douto processualista
Desembargador J. C. Barbosa Moreira, em voto no julgamento dos embargos
infringentes, na AC n. 5.856, de dezembro de 1978.
Do último, reproduzo expressivo trecho de seu voto:
As regras constantes do Código de Processo Civil constituem o
reservatório comum da disciplina de todos os feitos, desde que compatíveis
com os diplomas legais extravagantes que lhes tracem o procedimento. Tal
princípio já era proclamado pela doutrina sob o regime anterior (Pontes
de Miranda), “Comentários ao Código de Processo Civil de 1939”, 2ª ed., t.
1, p. 72; Evandro Gueiros Leite, (“Confl itos Intercontextuais de Processo”,
1963, pp. 43 e 100), entre outras excelentes razões por que, a não ser assim,
fi cariam sem disciplina, nos processos regulados por tais leis, matérias de
sua importância, nelas não versadas, como a da capacidade das partes e
modos de suprir-lhe a falta, a da contagem de prazos, a da nulidade de
atos processuais etc. Agora, a norma expressa do art. 273 do Código em
vigor não deixa margem a qualquer dúvida “O procedimento especial e
o procedimento sumaríssimo — ali se diz — regem-se pelas disposições
gerais do procedimento ordinário”, sem que se vislumbre no texto distinção
alguma entre procedimentos especiais disciplinados no próprio Código e
procedimentos especiais regulados em leis extravagantes.
Deve, pois, entender-se que a aplicabilidade das regras codifi cadas aos
procedimentos especiais não depende de remissão expressa que a elas faça
as leis extravagantes. Tal remissão, onde exista, há de reputar-se meramente
explicitante, relacionando-se talvez com o empenho do legislador em
preexcluir interpretações que negassem a incidência em determinado
ponto específi co quando não sejam, pura e simplesmente, sinal de má
técnica legislativa. Da eventual presença da remissão de modo algum se
pode extrair, por descabida utilização do argumento a contrario sensu, a
ilação de que só os dispositivos do Código a que se faz referência na lei
extravagante se apliquem ao procedimento especial nela contemplado. O
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 245-277, fevereiro 2010 271
único pressuposto da incidência das regras codifi cadas é a inexistência, na
lei extravagante, de disposições que com elas se choquem, ou, em termos
mais genéricos, a incompatibilidade com a sistemática da lei extravagante.
Esses princípios, que são inconcussos, comportam adequada aplicação
em matéria de recursos no processo de mandado de segurança. Faleceria
qualquer base à suposição de que, em semelhante processo, apenas
se possam admitir os recursos mencionados na Lei n. 1.533. Nela não
se encontra, por exemplo, alusão sequer implícita aos embargos de
declaração, nem remete o seu texto aos arts. 464 e 535 do Código de
Processo Civil que deles tratam. No entanto, jamais se duvidou de que
os embargos declaratórios são perfeitamente utilizáveis no processo de
mandado de segurança. E, sob a vigência do Código anterior, prevaleceu o
entendimento favorável à admissibilidade, nesse processo, do recurso de
revista, do qual tampouco se ocupava a Lei n. 1.533. O mesmo se diga, ainda
hoje, do agravo de instrumento, sem o qual fi caria inerme, por exemplo, o
impetrante vencido em primeiro grau, a quem o juiz deixasse de receber
a apelação ou a julgasse deserta. (Acórdão transcrito por Marco Afonso
Borges, em sua já citada obra, p. 92).
O não menos douto Ministro Eduardo Ribeiro, em artigo de doutrina
publicado em conjunto com outros autores mineiros, sob o título “Mandados
de Segurança e de Injunção” (São Paulo, Saraiva, 1990), faz interessantes e
oportunas considerações acerca de questão correlata, a evidenciar: “A afi rmativa
de que a Lei n. 1.533/1951 especifi cou os dispositivos do Código de Processo
Civil aplicáveis, especifi cação esta exaustiva, não resiste, data venia, à menor
análise. Sem invocação daquele Código não será sequer possível processar
um mandado de segurança. A Lei n. 1.533/1951 não cogita, por exemplo, da
capacidade processual, dos procuradores, da competência, da forma, tempo e
lugar dos atos processuais, das nulidades, dos requisitos da sentença, assim como
vários outros temas cuja regulamentação é indispensável para que se possa fazer
um processo. E tem-se ainda aceito, sem maiores divergências, que aplicável o
incidente de uniformização de jurisprudência e admissível a ação rescisória. A
primeira, pertinente ao processo de julgamento de recursos. A segunda, meio de
impugnação de sentença.” (Ob. cit., p. 280). E assevera: “Em verdade, aplicam-se
supletivamente, sem discussão, numerosíssimas normas do Código, nenhuma
delas mencionadas na lei.” (Idem)
Quanto à celeridade que se deve imprimir à questão falimentar, tanto quanto
ao mandado de segurança, não se me aparenta, concessa venia, como capaz de
obstar o uso dos embargos infringentes.
Na verdade, contra a possibilidade de apresentação de embargos infringentes
em processo falimentar, um único motivo ponderável apresenta-se, assim mesmo
de ordem prática. É o que oferece o comercialista e magistrado Desembargador
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
272
Sampaio Lacerda. Em pequeno artigo na Revista Forense (vol. 246/307), sob o
título: “Falência decretada em grau de apelação e os embargos infringentes”,
argumenta: “Admitir-se tal recurso importará na impossibilidade de se processar a
falência decretada, trazendo conseqüências sérias de pronto, inclusive a cessação
das atividades do falido, que, se fi car à testa de seu negócio, poderá acarretar, de
qualquer forma, prejuízos de vulto aos credores, inclusive o depauperamento da
massa.”
O problema diz com o efeito suspensivo dos embargos infringentes, efeito que,
na realidade, diz respeito apenas ao acórdão ou à parte do acórdão fl anqueado,
como se ainda não se tivesse dado o veredicto de segundo grau.
Situação símile, porém, está expressa no CPC: da sentença de declaração de
insolvência, disciplinada no art. 761, a apelação cabível será recebida nos efeitos
devolutivo e suspensivo.
Isso, todavia, não signifi ca que os credores fi carão desamparados, sujeitos
a prejuízos de vulto, como dizia Sampaio Lacerda. Com o desenvolvimento da
teoria e da prática das medidas cautelares, imagino que, mesmo no âmbito do
poder geral de cautela do Juiz, poderiam ser determinadas providências para a
segurança dos direitos dos credores, quer numa hipótese, quer noutra.
Sublinho, por último, que a mais recente jurisprudência da Suprema Corte é
no sentido do entendimento que ora adoto. Assim, no RE n. 112.352 (AgRg)-SP,
Relator Ministro Francisco Rezek, lê-se na ementa:
Embargos infringentes. Ausência de declaração de voto-vencido.
Os embargos infringentes são cabíveis se, apesar de não declarado o
voto majoritário, for curial a dedução de seu sentido.
Agravo regimental a que se nega provimento. (RTJ 121/826 a 827), e no
RE n. 111.342-SP, julgado logo depois, reafi rma-se (Relator Ministro Célio
Borja):
Concordata.
Recurso extraordinário que subiu ao STF em razão do acolhimento da
argüição de relevância.
Não há como prosperar, o apelo porque, tendo sido o acórdão em
apelação tomado por maioria de votos eram cabíveis na instância ordinária,
os embargos infringentes (Súmula n. 281).
RE não conhecido. (RTJ — 123/1.162 a 1.163)
Ambas as decisões foram proferidas em pedidos de habilitação de crédito em
concordata.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 245-277, fevereiro 2010 273
De harmonia com o exposto, com meu pedido de vênia ao eminente Relator,
conheço do recurso pela alínea a, para dar-lhe provimento e determinar que o
recurso de embargos infringentes seja examinado.
Acompanho a orientação prevalecente nesse v. aresto, entendendo cabíveis
os embargos infringentes no processo falimentar, conforme exposto em julgado
de lavra do eminente Desembargador Barbosa Moreira, trazido à balha no
julgamento do REsp n. 4.155, no qual o ilustre processualista carioca, invocando
o art. 273 do CPC, sustenta que as normas codifi cadas terão aplicabilidade aos
procedimentos especiais independentemente de serem ou não disciplinados
no próprio código, ou em não sendo, de que as leis extravagantes façam ou
não remissão expressa à sua aplicabilidade. Nesse sentido, afirma que “O
único pressuposto da incidência das regras codifi cadas é a inexistência na lei
extravagante, de disposições que com elas se choquem, ou, em termos mais
genéricos, a incompatibilidade com a sistemática da lei extravagante.”
Importante também, pelo que vale ressaltar, o que argumentou o eminente
Ministro Eduardo Ribeiro quando de seu voto acompanhando o Ministro
Cláudio Santos, verbis:
Verdade que, relativamente a recursos, o argumento se fortalece um pouco.
É que a Lei de Falências contém, talvez, dezenas de menções a recurso, dizendo
qual o cabível em cada caso. Entretanto, é muito simples de se explicar. Foi
ela elaborada no regime do Código 39, cujo sistema de recursos era casuísta,
explicitando-se as hipóteses em que cabível agravo de instrumento. Esse
casuísmo, levado para a Lei de Falências, mostrou-se, com o novo Código,
totalmente insuficiente, e a jurisprudência vem admitindo que admissíveis
outros recursos, notadamente o agravo de instrumento, em muitas hipóteses
não previstas. Por exemplo, o indeferimento da produção de prova e a decisão
sobre competência. Para essas e outras questões há que se ter como adequado
o agravo, embora sem previsão na lei específi ca. Aplica-se o Código de Processo
Civil.
Ademais, impende ponderar não apenas a possibilidade de o falido ou
concordatário benefi ciar-se dos embargos infringentes buscando procrastinar
o andamento judicial, mas também, com relação ao devedor e aos credores, a
conveniência de assegurar-lhes plena possibilidade de ação, com os recursos
ordinários correspondentes.
Ao fi nal, anoto que o REsp n. 555, do qual fui Relator e apontado no r.
parecer do MPF como paradigma, não trata diretamente da matéria ora em
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
274
questão. Apenas ocorreu que, naquele caso, o apelo especial proveniente do
TJRJ foi interposto de acórdão proferido em sede de embargos infringentes, em
pedido de desistência de concordata preventiva.
Pelo exposto, conheço do recurso e ao mesmo dou provimento, cassando o
v. aresto recorrido para que o egrégio Tribunal de origem aprecie os embargos
infringentes, como entender de direito.
É o voto.
VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro Fontes de Alencar: Sr. Presidente, esta Turma já se deteve
no exame do tema.
Em precedente de que fui Relator, a minha posição era no sentido da
impermeabilidade da Lei Falimentar aos recursos do Código de Processo Civil.
Essa posição, contudo, fi cou minoritária.
Posteriormente, esta Turma, já com a minha adesão, passou a admitir no
procedimento falimentar o recurso de embargos infringentes.
Acompanho, pois, o voto de V. Exa.
VOTO
O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo: Também dou pelo cabimento dos
embargos infringentes em matéria falimentar, não só em face da orientação
doutrinária a respeito, mas também pelo precedente deste Tribunal e na linha
dos precedentes do Supremo Tribunal Federal mencionados no voto de V. Exa.,
Sr. Presidente.
Peço licença para aduzir que esta Corte, em reunião do seu Órgão Maior, já
teve oportunidade de fi xar orientação na mesma diretriz, embora em mandado
de segurança, mas com fundamentação pertinente ao caso que se examina.
Naquela ocasião, quando a matéria foi longamente discutida, assentou-se
por maioria o entendimento de que a legislação codifi cada recursal aplicar-se-ia
à legislação especial, quando com ela compatível.
Com o Relator.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 245-277, fevereiro 2010 275
VOTO
O Sr. Ministro Barros Monteiro: Sr. Presidente, de acordo com V. Exa., na
esteira dos precedentes desta e da Terceira Turmas.
VOTO
O Sr. Ministro Bueno de Souza: Sr. Presidente, o Tribunal Federal de
Recursos estabeleceu em seu Regimento Interno, art. 267, parágrafo único,
o entendimento de que não cabem embargos infringentes em mandado de
segurança. Manifestei-me várias vezes em contrário a essa orientação. Penso
que, em mandado de segurança, em que se discute sobre direito certo e líquido, é
difícil justifi car a recusa desse meio de impugnação. Direi o mesmo a respeito do
processo falimentar, porquanto a própria urgência que nele se recomenda sugere
que as controvérsias que ali possam travar-se quanto ao exato sentido da norma
encontrem logo o pronunciamento que pacifi que a jurisprudência, de modo a
facilitar a expedição jurisdicional.
Por isso, não reputo nova a questão, mas, atual, sem dúvida.
Dou minha adesão ao douto voto de V. Exa., assim permanecente coerente
com meu próprio entendimento pessoal.
RECURSO ESPECIAL N. 33.243-SP
Relator: Ministro Fontes de Alencar
Recorrente: Metalúrgica Francari Ltda - em concordata
Recorrido: Banco Itaú S/A
Advogados: Luiz Tzirulnik e outros e José Roberto Ribeiro e outros
EMENTA
Falência. Embargos infringentes.
Têm cabida os embargos infringentes em processo falencial,
quando resolvida por maioria de votos a apelação.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
276
Recurso especial atendido.
Unânime.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, conhecer e dar provimento ao recurso.
Votaram com o Relator os Srs. Ministros Sálvio de Figueiredo, Barros Monteiro
e Bueno de Souza. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Athos Carneiro.
Brasília (DF), 08 de junho de 1993 (data do julgamento).
Ministro Fontes de Alencar, Presidente e Relator
DJ 02.08.1993
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Fontes de Alencar: Trata-se de recurso especial interposto
com fulcro no art. 105, III, a e c, da Constituição Federal, contra decisão
proferida pela egrégia Sexta Câmara Civil do Tribunal de Justiça do Estado de
São Paulo que não conheceu, por incabíveis em matéria falimentar, embargos
infringentes opostos a aresto que, por maioria de votos, deu provimento à
apelação, para deferir a incidência de correção monetária em habilitação
de crédito em concordata. Alega o recorrente violação do art. 205 da Lei
Falimentar, além de dissídio jurisprudencial, sustentando o cabimento dos
embargos infringentes.
Pelo despacho de fl . 177 foi o recurso admitido, subindo os autos a esta
Corte.
VOTO
O Sr. Ministro Fontes de Alencar (Relator): Assentou a jurisprudência
desta Corte que há cabida de embargos infringentes em matéria falimentar.
Sobre o tema, assim decidiu esta Turma, no REsp n. 25.941, relatado pelo
Ministro Barros Monteiro, de acórdão em cuja ementa se lê:
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 245-277, fevereiro 2010 277
Embargos infringentes. Feito falimentar. Cabimento.
São admissíveis os embargos infringentes quando, em processo de natureza
falimentar, o julgamento da apelação for tomado por maioria de votos.
Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
Recurso especial conhecido, em parte, e provido.
Igualmente, o REsp n. 4.155, Terceira Turma, Relator Ministro Cláudio
Santos:
Embargos infringentes. Ações falimentares. Cabimento.
Cabíveis embargos infringentes em quaisquer ações previstas na lei de
falências de decisões não unânimes proferidas em apelação.
Adotando o mesmo posicionamento dos precedentes ora referidos,
conheço do recurso e lhe dou provimento, para que, afastada a preliminar que
deu pelo não-conhecimento dos embargos infringentes, o Tribunal a quo julgue
a causa como entender de direito.
Súmula n. 89
SÚMULA N. 89
A ação acidentária prescinde do exaurimento da via administrativa.
Referência:
Lei n. 6.367/1976, arts. 14 e 19.
Precedentes:
REsp 28.570-RJ (5ª T, 28.10.1992 — DJ 16.11.1992)
REsp 29.335-RJ (6ª T, 27.04.1993 — DJ 31.05.1993)
REsp 32.378-RJ (5ª T, 17.03.1993 — DJ 05.04.1993)
REsp 32.424-RJ (5ª T, 17.03.1993 — DJ 05.04.1993)
REsp 32.691-RJ (6ª T, 30.03.1993 — DJ 10.05.1993)
REsp 32.717-RJ (5ª T, 24.03.1993 — DJ 05.04.1993)
REsp 33.053-RJ (5ª T, 14.04.1993 — DJ 10.05.1993)
REsp 33.072-RJ (6ª T, 20.04.1993 — DJ 17.05.1993)
REsp 33.615-RJ (6ª T, 27.04.1993 — DJ 17.05.1993)
Terceira Seção, em 21.10.1993
DJ 26.10.1993, p. 22.629
RECURSO ESPECIAL N. 28.570-RJ
Relator: Ministro Costa Lima
Recorrente: Valdecy Caetano
Advogados: Luiz Eduardo Peregrino Fontenelle e outro
Recorrido: Instituto Nacional do Seguro Social-INSS
Advogado: Ayrton Matheus D’Azevedo
EMENTA
Ação acidentária. Exaurimento da via administrativa. Exigência
do CAT. Descabimento.
1. Desnecessário o exaurimento da via administrativa para
propor ação de acidente do trabalho, bem assim que a petição inicial
seja instruída com a prova da comunicação do acidente à Previdência,
segundo os termos dos arts. 14 e 19 da Lei n. 6.367/1976.
2. Recurso especial conhecido e provido, determinando-se o
prosseguimento da ação.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e o prover para
cassar o acórdão recorrido, determinando o prosseguimento do processo, afastado
o óbice. Votaram com o Relator os Srs. Ministros José Dantas, Assis Toledo e
Edson Vidigal. Ausente, justifi cadamente, o Ministro Flaquer Scartezzini.
Brasília (DF), 28 de outubro de 1992 (data do julgamento).
Ministro Costa Lima, Presidente (em exercício) e Relator
DJ 16.11.1992
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
284
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Costa Lima: Trata-se de recurso especial interposto por
Valdecy Caetano, com arrimo nas alíneas a e c, item III, art. 105 da Constituição
Federal, buscando reformar o v. acórdão de fl . 38 que, confi rmando a r. sentença
de primeiro grau, entendeu que falta interesse processual ao recorrente, posto
que não comunicou a doença do trabalho ao segurador.
Assim decidindo, segundo o recorrente, teriam sido violados os arts. 14 e
19 da Lei n. 6.367/1976 e divergiu do RE n. 91.200-2-STF, Relator Ministro
Cunha Peixoto, in Jurisprudência Brasileira, 65/95 (fl s. 40-51).
Não houve contra-razões (fl . 52) e o especial não foi admitido (fl . 58). Teve
seguimento por força do agravo de instrumento provido (fl . 44 apenso).
Relatei.
VOTO
O Sr. Ministro Costa Lima (Relator): O exaurimento da via administrativa
como condição de procedibilidade por parte dos segurados ou benefi ciários da
Previdência não é tema novo. Vem desde o tempo do extinto Tribunal Federal
de Recursos e era escudo que ela brandia quando contestava as ações que
lhe eram propostas. Não logrou êxito, tanto que foi editada a Súmula (213)
repelindo a pretensão:
O exaurimento da via administrativa não é condição para a propositura de
ação de natureza previdenciária.
2. A Lei n. 6.367, de 19.10.1976, no art. 14, dispunha que, salvo caso de
impossibilidade absoluta, a empresa fi cava obrigada a comunicar o acidente ao
Instituto e à Polícia, no prazo de vinte e quatro horas. E, no art. 19, inciso I, que
os litígios seriam resolvidos na área administrativa, pelos órgãos da Previdência
e, na via judicial, de acordo com o inciso II, pela Justiça Comum dos Estados,
do Distrito Federal e Territórios. Não impôs, como visto, que a petição viesse
instruída com a prova da notifi cação administrativa — CAT. Essa exigência
surgiu apenas com o advento da Lei n. 8.213, de 24.07.1991 quando, no art.
129, dispõe:
Art. 129. Os litígios e medidas cautelares relativos a acidentes do trabalho
serão apreciados:
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 279-307, fevereiro 2010 285
I - (...)
II - na via judicial, pela Justiça dos Estados e do Distrito Federal, segundo o
rito sumaríssimo, inclusive durante as férias forenses, mediante petição instruída
pela prova de efetiva notificação do evento à Previdência Social, através de
Comunicação de Acidente do Trabalho — CAT.
3. Ainda assim, penso eu, o Juiz não pode, liminarmente, indeferir a petição
inicial, sem que ofereça à parte, no prazo de dez dias, oportunidade para suprir a
irregularidade (art. 284 do CPC).
4. Esta egrégia Turma tem-se pronunciado neste sentido, conforme se vê
do seguinte precedente:
Previdenciário. Ação acidentária. Exaurimento da via administrativa. Exigência
de prova de Comunicação de Acidente do Trabalho — (CAT) antes da Lei n.
8.213/1991.
Para a propositura da ação acidentária, não é necessário o exaurimento da via
administrativa. Por outro lado, a exigência de instruir-se a inicial com prova de
notifi cação à Previdência Social, através da CAT, surgiu apenas com a edição da Lei
n. 8.213/1991, que não tem efeito retroativo.
Recurso especial conhecido e provido para determinar-se o prosseguimento
do processo. (REsp n. 25.057-6-RJ, Relator Ministro Assis Toledo, julgado em
02.09.1992)
Vê-se, pois, no caso, ter ocorrido negativa de vigência dos arts. 14 e 19 da
Lei n. 6.367/1976.
6. Conheço, assim do recurso especial e o provejo para cassar o acórdão
recorrido, ordenando que o processo, afastado o óbice, tenha seguimento.
RECURSO ESPECIAL N. 29.335-RJ (92292658)
Relator: Ministro Pedro Acioli
Recorrente: Sebastião Rodrigues da Silva
Advogado: Luiz Eduardo Peregrino Fontenelle
Recorrido: Instituto Nacional do Seguro Social-INSS
Advogados: Antônio Carlos Macedo Silva e outros
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
286
EMENTA
Previdenciário. Acidente de trabalho. Precedentes.
I. Não se pode exigir do segurado a Comunicação de Acidente
de Trabalho (CAT), pois tal incumbe à empresa. Ademais, a exigência
tornou-se somente essencial a partir da edição da Lei n. 8.213/1991,
não tendo o condão de retroatividade. Precedentes.
II. Recurso provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da egrégia
Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das
notas taquigráfi cas constantes dos autos, por unanimidade, dar provimento ao
recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Votaram de acordo
os Srs. Ministros Adhemar Maciel, Anselmo Santiago e Vicente Cernicchiaro.
Ausente, por motivo justifi cado, o Sr. Ministro José Cândido.
Brasília (DF), 27 de abril de 1993 (data do julgamento).
Ministro Vicente Cernicchiaro, Presidente
Ministro Pedro Acioli, Relator
DJ 31.05.1993
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Pedro Acioli: Trata-se de ação acidentária julgada extinta
pelo v. acórdão recorrido sem julgamento do mérito, por ausência de uma das
condições da ação — o interesse de agir.
O recurso especial sustenta a violação aos arts. 14 e 19 da Lei n. 6.367/1976,
bem assim divergência entre o acórdão recorrido e o acórdão do STF proferido
no RE n. 91.200-2. “A controvérsia reside em saber se o Juiz pode extinguir
o processo por ausência do interesse de agir quando não comprovada a
comunicação do acidente ou de doença profi ssional ao empregador ou na sua
falta, o requerimento prévio do benefício ao órgão previdenciário segurador”.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 279-307, fevereiro 2010 287
O Ministério Público Federal se pronuncia pelo conhecimento e
provimento do recurso, para determinar o prosseguimento do processo.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Pedro Acioli (Relator): O Ministério Público Federal disse
o seguinte:
3. A data da comunicação ou da entrada do pedido de benefício vale, nos
termos do art. 2º, § 5º, da Lei n. 6.367/1976 para fi xar o termo inicial das prestações
devidas.
4. A teor do art. 14 a obrigação da comunicação é da empresa, não se podendo
exigir do empregado a comprovação dela. De outra parte, é jurisprudência
pacífica desta Corte e do Supremo Tribunal Federal, na vigência da Lei n.
6.367/1976, que o ajuizamento da ação acidentária não está condicionado à
postulação prévia perante a instância administrativa.
5. A exigência de instruir-se a inicial com a prova de notifi cação à Previdência
Social, através da CAT, surgiu apenas com a edição da Lei n. 8.213/1991, que não
tem efeito retroativo.
6. Nesse sentido, aponto recentes decisões da Primeira Turma deste Tribunal,
nos REsps ns. 23.142-9, 23.143-0, 23.257-4 e 23.655-5, com acórdãos publicados no
DJ de 05.10.1992, p. 17.070/1; da Segunda Turma no REsp n. 21.827-9, na mesma
data, p. 17.080; e da Quinta Turma no REsp n. 25.057-6, no DJ de 21.09.1992, p.
15.701.
Assim, dou provimento ao recurso para determinar o prosseguimento do
processo.
É como voto.
RECURSO ESPECIAL N. 32.378-RJ
Relator: Ministro Flaquer Scartezzini
Recorrente: Roberto de Albuquerque Magalhães
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
288
Advogado: Luiz Eduardo Peregrino Fontenelle
Recorrido: Instituto Nacional do Seguro Social-INSS
Advogado: Garcia Bueno Brandão
EMENTA
Previdenciário. Ação acidentária. Exigência de Comunicação de
Acidente do Trabalho. Exaurimento da via administrativa.
— A comunicação do acidente ou doença profi ssional ao órgão
previdenciário é obrigação do empregador.
— O prévio requerimento do benefício na via administrativa não
constitui pressuposto para o ingresso em juízo.
— Precedentes.
— Recurso conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e dar provimento,
para cassar o v. acórdão impugnado e determinar o prosseguimento do feito.
Votaram de acordo com o Relator os Srs. Ministros José Dantas, Costa Lima,
Assis Toledo e Edson Vidigal.
Brasília (DF), 17 de março de 1993 (data do julgamento).
Ministro Flaquer Scartezzini, Presidente e Relator
DJ 05.04.1993
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Flaquer Scartezzini: Trata-se de recurso especial interposto
com fundamento ao art. 105, III, a e c, da Constituição Federal, contra o v.
acórdão de fl . 35 que, em lide de natureza acidentária, confi rmando sentença
monocrática (fl . 14), entendeu inexistir interesse de agir por parte do obreiro-
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 279-307, fevereiro 2010 289
autor, de vez que não comunicou o acidente ou a doença profi ssional ao INSS,
por isso que indeferiu a inicial, sem julgamento do mérito.
O recurso especial alega que o v. acórdão violou os arts. 14 e 19 da Lei
n. 6.367/1976, sustentando, ainda, que a obrigação de comunicar o acidente
ao órgão previdenciário é da empresa empregadora e, também, que a ação
acidentária não exige a prévia provocação administrativa (fl s. 37-43).
Sem contra-razões, subiram os autos a esta Superior Instância.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Flaquer Scartezzini (Relator): Srs. Ministros, emerge da
decisão ora recorrida, a exigência do obreiro acidentado comunicar o acidente
ou a doença profi ssional ao INSS para a caracterização do seu interesse de agir.
A controvérsia sub exame, é matéria pacifi cada no âmbito desta egrégia
Corte, conforme acórdãos, a seguir transcritos, verbis:
Previdenciário. Ação acidentária. Exaurimento da via administrativa. Exigência
de prova de Comunicação de Acidente do Trabalho (CAT) antes da Lei n.
8.213/1991.
— Para a propositura da ação acidentária não é necessário o exaurimento da
via administrativa. Por outro lado, a exigência de instruir-se a inicial com prova de
notifi cação à Previdência Social, através da CAT, surgiu apenas com a edição da Lei
n. 8.213/1991, que não tem efeito retroativo.
— Recurso especial conhecido e provido para determinar-se prosseguimento
do processo. (REsp n. 26.740-0-RJ, Ministro-Relator Assis Toledo, DJ de 13.10.1992)
Previdenciário. Ação acidentária. Acidente do trabalho. Comunicação.
Prescindibilidade. Provocação na via administrativa. Dispensabilidade.
— A obrigação de comunicar o acidente ou doença profi ssional à autarquia
previdenciária é da empresa empregadora e não do obreiro acidentado, pelo que
não há exigir deste, para que se caracterize o interesse de agir, tal providência.
— O prévio requerimento, na via administrativa, não é pressuposto
indispensável à propositura da ação.
— Recurso provido. (REsp n. 21.827-9-RJ, Relator Sr. Ministro Américo Luz, DJ
05.10.1992)
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
290
Acidente do trabalho. Ação judicial. Requerimento administrativo.
Desnecessidade. Exigência de prova de Comunicação de Acidente do Trabalho
(CAT) antes da Lei n. 8.213/1991.
— O exaurimento da via administrativa não é condição para a propositura da
ação de natureza acidentária. Por outro lado, a exigência de instruir-se a inicial
com prova de notifi cação à Previdência Social, surgiu apenas com a edição da Lei
n. 8.213/1991.
— Recurso provido para afastar a carência de ação.
— Precedentes do STJ. (REsp n. 26.903-2-RJ, Relator Sr. Ministro Hélio
Mosimann, DJ de 19.10.1992)
Acidente do trabalho. Ação acidentária. Condicionamento à exaustão da via
administrativa. Lei n. 6.367/1976, arts. 22 e 29, I e II.
— A Lei n. 6.367/1976 aboliu, expressamente, a exigência de que o acidentado,
antes de ingressar em Juízo, formule requerimento à Administração. (REsp n.
22.966-4-RJ, Relator Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ de 19.10.1992)
Desta forma, não padece dúvidas de que, ao recusar ação ao acidentado
para pleitear diretamente na instância judicial o direito indenizatório decorrente
do infortúnio, sob o argumento de ausência da prova de notifi cação do evento à
Previdência Social, através da CAT, o v. acórdão recorrido não só negou vigência
aos arts. 14 e 19 da Lei n. 6.367/1976 como divergiu de julgado da Suprema
Corte trazido à colação.
Com estas considerações, conheça do recurso e lhe dou provimento para,
cassando o acórdão impugnado, determinar o prosseguimento do processo.
E como voto.
RECURSO ESPECIAL N. 32.424-RJ
Relator: Ministro Assis Toledo
Recorrente: Ailton Rodrigues Guimarães
Recorrido: Instituto Nacional do Seguro Social-INSS
Advogados: Luiz Eduardo Peregrino Fontenelle e Anna Karin Lutterklass
e outros
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 279-307, fevereiro 2010 291
EMENTA
Previdenciário. Ação acidentária. Exaurimento da via
administrativa. Exigência de prova de Comunicação de Acidente do
Trabalho (CAT) antes da Lei n. 8.213/1991.
Para a propositura da ação acidentária, não é necessário o
exaurimento da via administrativa. Por outro lado, a exigência de
instruir-se a inicial com prova de notifi cação à Previdência Social,
através da CAT, surgiu apenas com a edição da Lei n. 8.213/1991, que
não tem efeito retroativo.
Recurso especial conhecido e provido para determinar-se o
prosseguimento do processo.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das
notas taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe
provimento para cassar o acórdão impugnado e determinar o prosseguimento
do feito. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Edson Vidigal, Flaquer
Scartezzini, José Dantas e Costa Lima.
Brasília (DF), 17 de março de 1993 (data do julgamento).
Ministro Flaquer Scartezzini, Presidente
Ministro Assis Toledo, Relator
DJ 05.04.1993
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Assis Toledo: O despacho de admissibilidade, da lavra
do ilustre Vice-Presidente do Tribunal de Alçada Cível do Estado do Rio de
Janeiro, assim expõe a espécie:
Trata-se de recurso especial fundamentado no art. 105, inciso III, alíneas a e c,
da Carta Magna.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
292
Cuida a espécie de ação acidentária movida em face do INSS, objetivando
o acidentado a obtenção de benefício previdenciário por se achar com sua
capacidade laborativa reduzida.
O Juiz monocrático indeferiu a petição inicial sob o fundamento de que o
obreiro acidentado deveria ter comunicado o acidente ou a doença profi ssional
ao INSS, para caracterização do seu interesse de agir.
A egrégia Segunda Câmara deste Tribunal confi rmou a decisão de 1º grau por
seus próprios fundamentos.
Com fulcro na alínea a do permissivo constitucional, alega o recorrente que o
acórdão vulnerou os arts. 14 e 19 da Lei n. 6.367/1976. Argumenta, com fi ncas nos
referidos dispositivos legais que a obrigação de comunicar o acidente ao órgão
previdenciário é da empresa e que, também, a ação acidentária é igual às demais,
não exigindo a prévia provocação da autarquia.
Ressalta, ainda, que o art. 19 da Lei n. 6.367/1976 revogou o art. 5º da Lei
n. 5.316/1967 que só permitia a propositura da ação de acidentes depois de
requerido o benefício na via administrativa.
No que concerne à alínea c da norma constitucional autorizadora do
Especial, traz o recorrente à colação aresto do egrégio Supremo Tribunal Federal
comprobatório da dissidência.
Diante do amplo prequestionamento da matéria, à luz dos dispositivos legais
invocados, entendo bem demonstrada a controvérsia verifi cando, na espécie,
a presença do fumus boni iuris, razão pela qual admito o recurso, a fi m de que a
questão seja submetida à elevada apreciação da Superior Corte de Justiça. (fl s.
62-63)
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Assis Toledo (Relator): Esta Corte tem, reiteradamente,
decidido ser desnecessário o exaurimento da via administrativa para a propositura
de ação de acidente do trabalho (REsp n. 13.995-SP, DJ de 02.12.1991; REsp n.
15.633-RJ, DJ de 22.06.1992; REsp n. 19.309-SP, DJ de 1º.06.1992).
Por outro lado, a exigência de instruir-se a inicial com prova de efetiva
notifi cação do evento à Previdência Social, através da CAT, surgiu apenas
com a edição da Lei n. 8.213/1991, art. 129, II, não sendo possível aplicar-se,
retroativamente, esse preceito.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 279-307, fevereiro 2010 293
Vejo, pois, no caso, negativa de vigência dos arts. 14 e 19 da Lei n.
6.367/1976 e divergência com o acórdão trazido à colação.
Diante do exposto, conheço do recurso pelas letras a e c do inciso III do
art. 105 da Constituição Federal e dou-lhe provimento para cassar o acórdão,
determinando o prosseguimento do processo.
É o voto.
RECURSO ESPECIAL N. 32.691-RJ (93.05586-0)
Relator: Ministro Adhemar Maciel
Recorrente: Moacir Laurica Farias
Advogado: Luiz Eduardo Peregrino Fontenelle
Recorrido: Instituto Nacional do Seguro Social-INSS
Advogados: Hélio Rosalvo dos Santos e outros
EMENTA
Previdenciário. Acidente do trabalho. CAT (Comunicação de
Acidente do Trabalho) antes do advento da Lei n. 8.213/1991 e
exaurimento da via administrativa. Desnecessidade. Precedentes da
Turma.
Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas,
decide a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar
provimento ao recurso pelas alíneas a e c, nos termos do voto do Sr. Ministro-
Relator, na forma do relatório e notas taquigráfi cas constantes dos autos, que
fi cam fazendo parte integrante do presente julgado. Votaram de acordo os Srs.
Ministros Anselmo Santiago, José Cândido e Vicente Cernicchiaro. Ausente
por motivo justifi cado o Sr. Ministro Pedro Acioli. Custas, como de lei.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
294
Brasília (DF), 30 de março de 1993 (data do julgamento).
Ministro José Cândido, Presidente
Ministro Adhemar Maciel, Relator
DJ 10.05.1993
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Adhemar Maciel: Trata-se de recurso especial interposto
por Moacir Lauriça Farias com fundamento no art. 105, inciso III, alíneas a e
c, da CF, contra o v. acórdão proferido pelo Tribunal de Alçada Civil do Rio de
Janeiro, nos autos da ação acidentária ajuizada em desfavor do INSS.
2. O v. acórdão recorrido, confi rmando a decisão monocrática, negou
provimento à apelação sob o argumento de que a inexistência de comunicação
da doença do empregado ao segurador, nas ações acidentárias, torna aplicável
a regra do art. 267, VI, do CPC. É o que exigem os arts. 4º e 5º do Decreto n.
79.037/1976.
3. O recorrente sustenta que foi violado o art. 14 da Lei n. 6.367/1976, que
determina ser obrigação da empresa comunicar o acidente do trabalho ao INSS.
Cabe ao empregado, apenas, comunicar à empresa. Também foi violado o art.
19 da mesma lei, o qual permite o ajuizamento da ação judicial sem o prévio
esgotamento da via administrativa. Suscita, também, o dissenso pretoriano.
4. Sem contra-razões.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Adhemar Maciel (Relator): A matéria já é conhecida desta
egrégia Turma.
O art. 14 da Lei n. 6.367/1976 impõe à empresa o dever de comunicar o
acidente de trabalho ao INSS.
Por outro lado, o art. 19 da mesma lei não prevê a necessidade, do
exaurimento da via administrativa para que o acidentado passa pleitar seu
benefício na via judicial.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 279-307, fevereiro 2010 295
Eis a ementa redigida pelo emitente Presidente desta Turma, Ministro José
Cândido, sobre o tema:
Acidente de trabalho. Desnecessário uso da via administrativa. Lei n.
6.367/1976, arts. 22 e 19, I e II.
Revogada expressamente a Lei n. 5.316/1967 (com redação dada pelo Decreto-
Lei n. 893/1969) pela Lei n. 6.367/1976, torna-se desnecessário ao acidentado
pleitear o benefício na via administrativa antes de ingressar em juízo.
(REsp n. 26.757-6-RJ, DJ de 23.11.1992, p. 21.910).
O confl ito pretoriano está bem demonstrado pelo acórdão trazido como
paradigma (RE n. 91.200-2 — STF — Relator Ministro Cunha Peixoto, in
“Jurisprudência Brasileira”, 65/95).
Desse modo, conheço do recurso por ambas as alíneas e lhe dou provimento.
É como voto.
RECURSO ESPECIAL N. 32.717-RJ (93.0005789-8)
Relator: Ministro José Dantas
Recorrente: Cícero Leonardo da Silva
Advogado: Luiz Eduardo Peregrino Fontenelle
Recorrido: Instituto Nacional do Seguro Social-INSS
Advogado: Wallace Cavalheiro da Rosa
EMENTA
Previdenciário. Ação acidentária. Exaurimento da via
administrativa.
— Comunicação do acidente. Não há prejudicar-se o direito do
acidentado pelo descumprimento da exigência imposta ao empregador.
Precedentes do STJ.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
296
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e o prover para
determinar o prosseguimento da ação. Votaram com o Relator os Srs. Minitros
Assis Toledo, Edson Vidigal e Costa Lima. Ausente, ocasionalmente, o Sr.
Ministro Flaquer Scartezzini.
Brasília (DF), 24 de março de 1993 (data do julgamento).
Ministro Costa Lima, Presidente em exercício
Ministro José Dantas, Relator.
DJ 05.04.1993
RELATÓRIO
O Sr. Ministro José Dantas: Trata-se de recurso especial pelas letras a e c,
interposto contra acórdão que, confi rmando sentença de primeiro grau, deu por
acertada a exigência do requerimento administrativo ao INPS, como requisito
indispensável à propositura da ação de acidente do trabalho.
Relatei.
VOTO
O Sr. Ministro José Dantas (Relator): Senhor Presidente, vê-se do
relatório que volta à baila a antiga questão do chamado “exaurimento da via
administrativa”, como pré-requisito da ação acidentária, proposição que o
Supremo Tribunal Federal recusou, consoante o assertivo-mor da jurisprudência
colacionada, a exemplo seguinte:
Com o advento da Lei n. 6.367/1976, que revogou expressamente a de n.
5.316/1967 (com a redação dada pelo Decreto-Lei n. 893/1969), não está mais o
acidentado obrigado a pleitear o benefício na via administrativa antes de ingressar
em juízo. — RE n. 91.200-2, Relator Ministro Cunha Peixoto, in Jurisprudência
Brasileira, vol. 65/95.
Por outro lado, sobre conotar-se a questão com a exigência de o empregador
não haver comunicado o acidente — art. 14 da Lei n. 6.367/1976 — também
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 279-307, fevereiro 2010 297
aí não cabe afetar-se o direito do acidentado pela obrigação legal imposta
exclusivamente ao empregador. É essa na verdade a orientação deste egrégio
Tribunal (REsp n. 15.633, Primeira Turma, Relator Ministro Demócrito
Reinaldo, in DJ de 22.06.1992), exemplifi cada, inclusive, por acórdão desta
própria Turma, assim ementado:
Previdenciário. Ação acidentária. Exaurimento da via administrativa. Exigência
de prova de Comunicação do Acidente do Trabalho (CAT) antes da Lei n.
8.213/1991.
Para a propositura da ação acidentária, não é necessário o exaurimento da via
administrativa. Por outro lado, a exigência de instruir-se a inicial com prova de
notifi cação à Previdência Social, através da CAT, surgiu apenas com a edição da Lei
n. 8.213/1991, que não tem efeito retroativo.
Recurso especial conhecido e provido para determinar-se o prosseguimento
do processo. — REsp n. 25.057-6, Relator Ministro Assis Toledo, DJ de 21.09.1992.
Pelo exposto, conheço do recurso e o provejo, para determinar o
prosseguimento da ação.
RECURSO ESPECIAL N. 33.053-RJ
Relator: Ministro Edson Vidigal
Recorrente: Esmeraldina Rodrigues da Rocha
Advogado: Luiz Eduardo Peregrino Fontenelle
Recorrido: Instituto Nacional do Seguro Social-INSS
Advogado: Ailton Matheu D’Azevedo
EMENTA
Previdenciário. Acidente. Prévia comunicação. Decisão anulada.
1. O ajuizamento de ação acidentária não depende de prévia
postulação e exaurimento na via administrativa.
2. Recurso especial conhecido; Acórdão anulado.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
298
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das
notas taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe
provimento para cassar o v. acórdão e restabelecer a sentença de primeiro grau.
Votaram com o Relator os Srs. Ministros Costa Lima, José Dantas e Assis
Toledo. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Flaquer Scartezzini.
Brasília (DF), 14 de abril de 1993 (data do julgamento).
Ministro Costa Lima, Presidente (em exercício)
Ministro Edson Vidigal, Relator
DJ 10.05.1993
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Edson Vidigal: Em ação acidentária promovida pelo
Recorrente contra o Instituto Nacional do Seguro Social — INSS, com vistas
ao reconhecimento do direito à percepção do auxílio suplementar previsto na
Lei n. 6.367/1976, pelo acidentado do trabalho que apresentar grau mínimo de
redução auditiva, a inicial foi indeferida por inepta e o processo extinto sem o
julgamento do mérito, porque não houve prévia comunicação do acidente ou da
doença profi ssional ao INSS, acarretando falta de interesse de agir.
Confi rmada a sentença no Tribunal de Alçada do Rio de Janeiro, interpôs
o vencido recurso especial fundado na Constituição, art. 105, III, a e c, alegando
ofensa à Lei n. 6.367/1976, arts. 14 e 19, ao CPC, arts. 219 e 284, e divergência
jurisprudencial.
Sustenta a Recorrente, em síntese, a ausência da obrigatoriedade de
comunicação precedente à autarquia, para legitimar o obreiro à propositura da
ação, mormente se tal comunicação é dever do empregador.
Não admitido o recurso na origem, os autos subiram a esta Corte por força
do provimento dado ao agravo de instrumento.
Relatei.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 279-307, fevereiro 2010 299
VOTO
O Sr. Ministro Edson Vidigal (Relator): Senhor Presidente, o tema está
pacifi cado nesta Corte, com o entendimento de que a Lei n. 6.367/1976, não
exige o prévio requerimento na esfera administrativa, como condição para o
ajuizamento de ação acidentária. A propósito, dentre outros, RESP n. 19.309-
SP, DJ de 1º.06.1992; REsp n. 15.633-RJ, DJ de 22.06.1992; REsp n. 27.086-
1-RJ; DJ de 13.10.1992; REsp n. 23.143-0-RJ, DJ de 05.10.1992, relatado esse
pelo Ministro Garcia Vieira, com a ementa:
Ação acidentária. Prévio exaurimento na esfera administrativa.
A Lei n. 6.367/1976 não exige o exaurimento da via administrativa como
condição prévia para a propositura previdenciária.
Recurso provido para ensejar o conhecimento do mérito.
REsp n. 23.352-5-RJ, DJ de 28.09.1992, relatado pelo Ministro Peçanha
Martins:
Acidentário. Recurso especial. Propositura da ação. Comunicação antecedente.
Precedentes (STF e STJ). Lei n. 6.367/1976.
1. O ajuizamento da ação acidentária prescinde do requerimento prévio, na via
administrativa, pelo segurado.
2. Inteligência do art. 19, I e II, da Lei de Acidentes.
3. Entendimento dominante no Supremo Tribunal Federal e nesta Corte.
4. Recurso conhecido e provido.
Do disposto no art. 19 da referida Lei, não se pode aferir que a
ação acidentária em Juízo, esteja subordinada à prévia postulação nas vias
administrativas. Não é ela condição de ingresso na via judicial. Ao trabalhador
acidentado (ou portador de doença profi ssional), faculta-se escolher o ingresso
em uma ou outra via, ou em ambas.
Assim, na mesma linha dos precedentes deste Tribunal, tenho por violada
a Lei Federal, como também configurado o dissídio interpretativo com o
acórdão indicado como paradigma, pelo que conheço do recurso por ambos os
fundamentos constitucionais e ao mesmo dou provimento para anular o acórdão
e restabelecer a sentença de primeiro grau.
É o voto.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
300
RECURSO ESPECIAL N. 33.072-RJ (93.0007179-3)
Relator: Ministro Anselmo Santiago
Recorrente: Jorge Martins Loureira
Advogado: Luiz Eduardo Peregrino Fontenelle
Recorrido: Instituto Nacional do Seguro Social-INSS
Advogado: Hélio Rosalvo dos Santos e outros
EMENTA
Previdenciário. Ação acidentária. Comunicação de Acidente do
Trabalho. Ônus.
1. A comunicação de acidente é ônus do empregador não
podendo impor-se ao empregado, acidentado, ônus que não é seu.
2. A Lei n. 8.213/1991, que instituiu a exigência de instrução da
inicial com a prova da notifi cação à Previdência Social, não tem efeito
retroativo.
3. A exigência feita, in casu, ao segurado, ofendeu os arts. 14 e 19,
Inciso II, da Lei n. 6.367/1976.
4. Recurso provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial.
Votaram os Srs. Ministros Vicente Cernicchiaro e Adhemar Maciel. Ausentes,
por motivo justifi cado, os Srs. Ministros José Cândido e Pedro Acioli.
Brasília (DF), 20 de abril de 1993 (data do julgamento).
Ministro Vicente Cernicchiaro, Presidente
Ministro Anselmo Santiago, Relator
DJ 17.05.1993
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 279-307, fevereiro 2010 301
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Anselmo Santiago: O segurado Jorge Martins Loureiro
ingressou com ação acidentária perante o Juízo da 3ª Vara de Acidentes do
Trabalho da Cidade do Rio de Janeiro (fl s. 02-03). O Juiz a quo, indeferiu a
inicial por inepta e por ser segurado parte ilegítima, uma vez que não fi gura
prova de ter notifi cado o órgão previdenciário através de Comunicação do
Acidente de Trabalho (CAT) (fl . 26).
Contra tal decisão apelou o segurado e o Tribunal de Alçada Cível daquele
Estado, pela sua Quinta Câmara, negou provimento ao recurso, consoante
acórdão assim ementado:
Acidente do Trabalho. Indeferimento da inicial por inepta e ainda por faltar
nos autos a comunicação do acidente ao Instituto Nacional de Previdência Social.
Desnecessidade de se apreciar a matéria alegada devido ao fato do autor não
apresentar seqüelas indenizáveis do acidente conforme esclarecidos pela perícia
a que se submeteu. (fl s. 50-51)
Irresignado, o segurado interpôs recurso especial com fundamento no art.
105, III, a e c da Constituição Federal, no qual alegou que o acórdão violou os
arts. 14 e 19 da Lei n. 6.367/1976 e sustentou que a obrigação de comunicar
o acidente ao órgão previdenciário é da empresa empregadora e que a ação
acidentária inexige a prévia provocação administrativa (fl s. 63-72).
Admitido o recurso, subiram os autos a esta Superior Instância.
O parecer da douta Subprocuradoria Geral da República é pelo
conhecimento e provimento do recurso para cassar o acórdão e determinar o
prosseguimento do processo (fl s. 114-115).
Relatei.
VOTO
O Sr. Ministro Anselmo Santiago (Relator): Cumpre notar, de logo, que a
exigência de instruir-se a inicial com a prova de notifi cação à Previdência Social
através da comunicação do acidente de trabalho (CAT), surgiu com o advento
da Lei n. 8.213/1991, como referido no douto parecer de fl s. 61-62, portanto,
não se aplicando ao caso presente, cuja ação teve início com a sua distribuição
ocorrida em 25 de novembro de 1985.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
302
Como se viu do relatório, o juiz a quo, ao despachar a inicial da ação
acidentária, exigiu do segurado, ora recorrente, a prova de ter feito a comunicação
do acidente à empresa empregadora ou, na sua falta, de requerimento do
benefício acidentário ao órgão previdenciário. Não satisfeita a exigência, julgou
extinto o processo por ausência de interesse processual de agir por parte do
segurado.
A controvérsia já é conhecida desta egrégia Sexta Turma, porquanto, ao
apreciar o Recurso Especial n. 25.308-5-RJ, do qual foi Relator o eminente
Ministro Pedro Acioli, decidiu, por unanimidade, no sentido de que “Não se
pode exigir do segurado a Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), pois
tal incumbe a empresa. Ademais, a exigência tornou-se somente essencial a
partir da Lei n. 8.213/1991, não tendo o condão de retroatividade. Precedente”,
(DJ de 08.03.1993).
No seu voto, o eminente Relator diz que a teor do art. 14 da Lei n.
6.367/1976, “... a obrigação da comunicação é da empresa, não se podendo
exigir do empregado a comprovação dela. De outra parte, é jurisprudência
pacífi ca desta Corte e do Supremo Tribunal Federal, na vigência da Lei n.
6.367/1976, que o ajuizamento da ação acidentária não está condicionado à
postulação prévia perante a instância administrativa”.
E mais: “A exigência de instruir-se a inicial com a prova da notifi cação
à Previdência Social através da CAT, surgiu apenas com a edição da Lei n.
8.213/1991, que não tem efeito retroativo”.
No mesmo sentido vem decidindo as demais Turmas deste egrégio
Superior Tribunal de Justiça, como bem se vê das ementas a seguir transcritas,
verbis:
— Acidente do Trabalho. Falta de comunicação do acidente. Falta de interesse
de agir. Não-caracterização, no caso.
I - A comunicação do acidente à autarquia previdenciária constitui ônus
da empresa e não do acidentado. Ao exigir que este fizesse prova daquela
comunicação, o acórdão recorrido negou vigência ao art. 14 da Lei n. 6.367, de
19 de outubro de 1976. Outrossim, ao negar ao autor o direito de acesso à Justiça,
violou o art. 19, II, da referida lei.
II - Recurso especial conhecido e provido. (REsp n. 0027167-RJ, Relator Ministro
Pádua Ribeiro, DJ de 14.12.1992)
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 279-307, fevereiro 2010 303
— Previdenciário. Ação acidentária. Exigência de Comunicação de Acidente do
Trabalho. Exaurimento da via administrativa.
— A comunicação do acidente ou doença profi ssional ao órgão previdenciário
é obrigação do empregador.
— O prévio requerimento do benefício na via administrativa não constitui
pressuposto para o ingresso em juízo.
— Precedentes.
— Recurso conhecido e provido. (REsp n. 0029226-RJ, Relator Ministro Flaquer
Scartezzini, DJ de 14.12.1992)
— Previdenciário. Ação acidentária. Exaurimento da via administrativa.
— Comunicação do acidente. Não há prejudicar-se o direito do acidentado
pelo descumprimento da exigência imposta ao empregador.
— Precedentes do STJ (REsp n. 0029352-RJ, Relator Ministro José Dantas, DJ de
14.12.1992).
— Previdenciário. Ação acidentária. Exaurimento da via administrativa.
Exigência de prova de Comunicação de Acidente do Trabalho (CAT) antes da Lei
n. 8.213/1991.
— Para a propositura da ação acidentária, não é necessário o exaurimento da
via administrativa. Por outro lado, a exigência de instruir-se a inicial com prova de
notifi cação à Previdência Social, através da CAT, surgiu apenas com a edição da Lei
n. 8.213/1991, que não tem efeito retroativo.
— Recurso especial conhecido e provido para determinar-se o prosseguimento
do processo. (REsp n. 0029270-RJ, Relator Ministro Assis Toledo, DJ de 14.12.1992)
— Ação acidentária. Exaurimento da via administrativa. Exigência do CAT.
Descabimento.
1. Desnecessário o exaurimento na via administrativa para propor ação de
acidente do trabalho, bem assim que a petição inicial seja instruída com a prova
de comunicação do acidente à Previdência, segundo os termos dos arts. 14 e 19
da Lei n. 6.367/1976.
2. Recurso especial conhecido e provido, determinando-se o prosseguimento
da ação (REsp n. 0029734-RJ, Relator Ministro Costa Lima, DJ de 17.12.1992).
Merece, pois, prosperar o recurso. A ofensa aos arts. 14 e 19, inciso II,
da Lei n. 6.367/1976, resulta demonstrada dos autos com a exigência feita
ao segurado para juntar à inicial a prova de notifi cação do acidente ao órgão
previdenciário, através da CAT, ao mesmo tempo em que negou-lhe o direto
acesso à Justiça.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
304
Ante o exposto, conheço do recurso e lhe dou provimento para cassar o
acórdão, determinando o prosseguimento do processo.
É como voto.
RECURSO ESPECIAL N. 33.615-RJ (93.0008666-9)
Relator: Ministro Vicente Cernicchiaro
Recorrente: Nilza Maria Pereira Ferreira
Recorrido: Instituto Nacional do Seguro Social-INSS
Advogado: Luiz Eduardo Peregrino Fontenelle
EMENTA
REsp. Processual Civil. Ação acidentária. Propositura. Via
administrativa. Acesso ao Judiciário. Ação pressupõe pretensão resistida.
O acidentado não está obrigado a esgotar a via administrativa para
ingressar em juízo. O art. 14 da Lei n. 6.367/1976 é comando dirigido
à empresa. Necessário dar ao Instituto notícia do infortúnio. Só
assim, será caracterizada eventual resistência (não se confunde com a
obrigação de exaurir o debate administrativo), pressuposto do interesse
de agir. Distintos, pois, o debate prévio na via administrativa e a notícia
do fato. O acesso ao Judiciário, como no caso dos autos, é penoso
para o acidentado; tem difi culdade de acesso também ao Instituto
(deslocamento, fi las). Raciocínio de Justiça material recomenda afastar
deduções doutrinárias e técnicas.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráfi cas constantes dos autos, por unanimidade, dar provimento ao recurso
especial, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Votaram os Srs. Ministros
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 279-307, fevereiro 2010 305
Pedro Acioli, Adhemar Maciel e Anselmo Santiago. Ausente, por motivo
justifi cado, o Sr. Ministro José Cândido.
Brasília (DF), 27 de abril de 1993 (data do julgamento).
Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, Presidente e Relator
DJ 17.05.1993
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro: Nilza Maria Pereira Ferreira,
nos autos da ação de acidente do trabalho em que contende com o Instituto
Nacional do Seguro Social — INSS — interpôs recurso especial, admitido pelo
r. despacho de fl s. 42-43.
A Recorrente argúi violação do art. 14 da Lei n. 6.367/1976, ou seja, não
estar obrigado, antes de ingressar em juízo postulando indenização acidentária,
comunicar o infortúnio ao Instituto. Invoca ainda negativa de vigência ao
art. 19 do mesmo texto legal, que revogou o disposto no art. 5º da Lei n.
5.316/1967. Sustenta ainda dissídio jurisprudencial, apontando como divergente
o RE n. 91.200-2 — STF — Relator Ministro Cunha Peixoto, 17.06.1980, in
“Jurisprudência Brasileira”, vol. 65, p. 95. Traz o confronto também decisão do
2º Tribunal de Alçada Cível de São Paulo (RT 590/178).
Não foram apresentadas contra-razões (fl . 38v.).
Parecer da Procuradoria Geral da Justiça, opinando pela admissibilidade
do recurso especial, pela alínea c, do permissivo constitucional às fl s. 39-40.
Admitido o recurso pelo r. despacho de fl s. 42-43.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro (Relator): A jurisdição contenciosa
pressupõe pretensão resistida, para repetir expressão tão a gosto dos
processualistas.
Com efeito, não se justifi ca o ingresso em juízo se o réu não se opõe à
pretensão do autor. Só explica a ação por reparação de danos, resistência de
quem deva satisfazê-la.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
306
O art. 14 da Lei n. 6.367/1976 impõe à empresa obrigação de comunicar o
infortúnio ao Instituto e à autoridade policial.
Evidencia-se a teleologia da norma, notadamente pelo prazo fixado:
amparar o empregado contra eventual pressão do empregador, intimidando o
acidentado, ameaçando-o com represálias, caso comunique o fato à Previdência.
Indiscutivelmente, o empregado não está obrigado a esgotar a via
administrativa para ingressar em juízo. Seria, data venia, contraditório impor
esse pressuposto. De um lado, não o reclama a Constituição da República. Aliás,
no capítulo — Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos — proclama: “a
lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” (art.
5º, XXXV).
É lógico, de outro lado, faz-se necessário o — litígio — no sentido de
alguém pretender a prestação que lhe é negada.
Em termos de — relação jurídica — o raciocínio põe-se da seguinte
maneira, no tocante ao acidente de trabalho: Em ocorrendo o infortúnio, este
se apresenta como “causa” da relação jurídica entre o acidentado (“sujeito ativo”)
e o Instituto (“sujeito passivo”). O “objeto” compreende o direito e a obrigação
resultantes e contrapostos.
Em havendo o direito à “indenização”, ocorrerá a correspondente obrigação
de “pagamento”.
A obrigação de pagar, na espécie, resulta unicamente do acidente (“causa”).
A lei não impõe obrigação (não impede, outrossim) de esgotar, repita-se, a
via administrativa.
Faz-se necessário, entretanto, o Instituto ter conhecimento do infortúnio.
Não para debater, previamente, a causa do vínculo jurídico. Apenas, insista-se,
restar ciente do acidente e cumprir (administrativamente), em conseqüência, a
sua obrigação.
Só haverá interesse de agir, ocorrendo resistência à pretensão. Caracterizar-
se-á negativa (quanto à aceitação do fato ou de sua extensão) após a ciência do
possível devedor.
Tecnicamente, a r. sentença como o v. acórdão distinguindo, muito bem,
debate prévio na via administrativa e notícia do fato são irrepreensíveis.
Ocorre, todavia, nestes autos, particularidade que impõe em atenção ao
Direito justo, uma solução alternativa.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 279-307, fevereiro 2010 307
A decisão monocrática, a par da qualifi cação, reconheceu a miserabilidade
jurídica do Recorrente.
O pormenor é relevante. As máximas da experiência demonstram a
difi culdade de trânsito das pessoas humildes nas repartições públicas, seja pelas
longas fi las, como pela impossibilidade de perder horas de trabalho.
E, na espécie, demandaria retornar ao Instituto o que é, sem dúvida,
penoso para o trabalhador.
A lei (conseqüentemente, a interpretação) deve dirigir-se para facilitar
o acesso ao Judiciário, eliminando obstáculos, ainda que justificados
doutrinariamente e pela lógica formal. Cumpre raciocinar com os parâmetros
da lógica existencial. Só assim, atingir-se-á o Direito justo. O equilíbrio —
hipersufi ciente e hipossufi ciente — impõe sensibilidade do julgador, de modo,
no plano existencial, ponderando distinções, evitar decisões meramente formais.
O Direito moderno não prescinde dos princípios notadamente de
igualdade perante a lei, vista, porém, do ponto de vista material.
Conheço do recurso e lhe dou provimento para prosseguir a ação
acidentária.
Súmula n. 90
SÚMULA N. 90
Compete à Justiça Estadual Militar processar e julgar o policial militar pela
prática do crime militar, e à Comum pela prática do crime comum simultâneo
àquele.
Referências:
CF/1988, art. 125, § 4º.
CPP, art. 79, I.
Procedentes:
CC 762-MG (3ª S, 1º.03.1990 — DJ 19.03.1990)
CC 1.077-SP (3ª S, 07.06.1990 — DJ 06.08.1990)
CC 2.686-RS (3ª S, 05.03.1992 — DJ 16.03.1992)
CC 3.532-SP (3ª S, 19.11.1992 — DJ 08.03.1993)
CC 4.271-SP (3ª S, 05.08.1993 — DJ 06.09.1993)
Terceira Seção, em 21.10.1993
DJ 26.10.1993, p. 22.629
CONFLITO DE COMPETÊNCIA N. 762-MG (89.0011382-8)
Relator: Ministro Costa Leite
Autora: Justiça Pública
Réus: Tarcísio Rodrigues dos Santos, Afonso Lima de Freitas e Francisco
Maria de Oliveira
Suscitantes: Tarcísio Rodrigues dos Santos e outros
Suscitados: Juízo Auditor da 3ª Auditoria Judiciária Militar do Estado de Minas
Gerais e Juízo de Direito da 2ª Vara de Coronel Fabriciano-MG
Advogado: José Maria Mayrink Chaves
EMENTA
Processo Penal. Competência. Policial militar.
Policiais militares denunciados perante a Justiça Comum e
Militar. Imputações distintas. Competência da primeira para o
processo e julgamento do crime de abuso de autoridade, não previsto
no Código Penal Militar, e da segunda para o de lesões corporais,
porquanto os mesmos se encontravam em serviço de policiamento.
Unidade de processo e julgamento excluída pela incidência do
art. 79, I, do Código de Processo Penal.
Eventual subsunção do delito de abuso de autoridade no delito
mais grave de lesões corporais é questão de direito material, que não
comporta exame em sede de confl ito de competência. Confl ito não
conhecido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas,
decide a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não
conhecer do confl ito, na forma do relatório e notas taquigráfi cas constantes dos
autos, que fi cam fazendo parte integrante do presente julgado. Custas, como de
lei.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
314
Brasília (DF), 1º de março de 1990 (data do julgamento).
Ministro José Dantas, Presidente
Ministro Costa Leite, Relator
DJ 19.03.1990
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Costa Leite: Denunciados perante a 3ª Auditoria Judiciária
Militar do Estado de Minas Gerais, por crime de lesões corporais, e, em
momento posterior, perante o Juízo de Direito da 2ª Vara da Comarca de
Coronel Fabriciano da mesma unidade federativa, por crime de abuso de
autoridade, Tarcísio Rodrigues dos Santos e outros, todos policiais militares,
suscitaram o presente confl ito positivo de competência ao argumento de que
estão sendo processados nos dois juízos pelo mesmo fato criminoso.
Suspendi o andamento dos processos, na conformidade do disposto no art.
116, § 2º, do CPP, e solicitei informações aos juízos suscitados, que vieram para
os autos às fl s. 25 e 45.
O Ministério Público Federal emitiu parecer, opinando no sentido de que
se conheça do confl ito, declarando-se a competência da Justiça Militar.
É o relatório, Senhor Presidente.
VOTO
O Sr. Ministro Costa Leite (Relator): Não vejo confi gurado, in casu, o
confl ito positivo de jurisdição, desde que, contrariamente ao que afi rmam os
suscitante, as imputações são distintas, inexistindo bis in idem.
Assim é que o processo em curso na Justiça Comum tem a ver com a
prisão arbitrária do menor Márcio Araújo Souza, em infringência ao art. 4º, a,
da Lei n. 4.898/1965, enquanto o que se desenvolve na Justiça Militar decorre
das lesões corporais que os ora suscitantes teriam causado no referido menor.
Com efeito, é induvidosa a competência da Justiça Comum para o
processo e julgamento do crime de abuso de autoridade. A despeito de os
policiais militares encontrarem-se em serviço de policiamento na ocasião em
que efetuaram a prisão, trata-se de fi gura delituosa não prevista no Código
Penal Militar.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 309-332, fevereiro 2010 315
Por outro lado, é indisputável a competência da Justiça Militar para o
processo e julgamento do crime de lesões corporais, na esteira da remansosa
jurisprudência deste Tribunal.
A unidade do processo e julgamento, por sua vez, não pode ser cogitada,
como decidiu o colendo Supremo Tribunal Federal, em hipótese semelhante, ao
apreciar o RHC n. 59.441-1-SP, assim exteriorizado o acórdão:
Habeas corpus. Competência. Constituição, art. 144, § 1º, letra d. Compete
à Justiça Militar Estadual processar e julgar os policiais militares, nos crimes
militares, defi nidos em lei. Policiais militares denunciados pela prática dos crimes
de lesões corporais, violência arbitrária e abuso de autoridade. Somente quanto
ao primeiro delito, que está previsto como crime militar, no Código Penal Militar
(art. 209), a competência é da Justiça Militar Estadual. A violência arbitrária,
tipifi cada no art. 333 do Código Penal Militar, como crime militar, pressupõe que
a infração tenha ocorrido em repartição ou estabelecimento militar, circunstância
não presente na hipótese apreciada. Confi gura-se, assim, em tese, o crime do
art. 322 do Código Penal, sujeitando-se o policial militar, em conseqüência,
por esse ilícito, à Justiça Comum, o mesmo sucedendo, quanto ao abuso de
autoridade, previsto na Lei n. 4.898, de 09.12.1965. Aplicação do art. 79, I, do CPP,
não incidindo, no caso, o art. 102, parágrafo único, do CPPM, em face do art. 144, §
1º, letra d, da Constituição. Recurso desprovido.
Anote-se, por oportuno, que a regra competencial inserta no art. 144, §
1º, d, da Constituição de 1969, encontra-se reproduzida no art. 125, § 4º, da
Constituição vigente.
É bem verdade que o colendo Supremo Tribunal Federal, no julgamento
do HC n. 65.275-1, entendeu, face às circunstâncias do caso concreto, como
expressamente declarado no voto condutor, subsumido o delito de abuso de
autoridade no delito mais grave de lesões corporais. Mas isto é uma questão de
direito material, que não comporta exame em sede de confl ito de competência.
Do exposto, Senhor Presidente, não conheço do confl ito. É o meu voto.
CONFLITO DE COMPETÊNCIA N. 1.077-SP (9022541)
Relator: Ministro Carlos Th ibau
Autora: Justiça Pública
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
316
Réus: Adhemir Herrera e José Pedro Salgueiro
Suscitante: Juízo Auditor da 4ª Auditoria da Justiça Militar Estadual de
São Paulo
Suscitado: Juízo de Direito de Cravinhos-SP
EMENTA
Processual Penal. Competência. Policial militar. Crimes de abuso
de autoridade e de lesões corporais.
Compete à Justiça Criminal Comum processar e julgar o crime
de abuso de autoridade, não previsto no CPM, e à Justiça Militar
Estadual fazê-lo em relação ao crime de lesões corporais, eis que os
agentes encontravam-se em serviço.
Aplicação do disposto no art. 79, I, do CPP.
(Precedente: CC n. 762, Relator Ministro Costa Leite).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide
a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade, conhecer do
confl ito e declarar competente o suscitante, Juízo Auditor da 4ª Auditoria da
Justiça Militar Estadual de São Paulo, para julgar o crime de lesões corporais,
e o suscitado, Juízo de Direito de Cravinhos-SP, para o crime de abuso de
autoridade, na forma do relatório e notas taquigráfi cas constantes dos autos, que
fi cam fazendo parte integrante do presente julgado. Custas, como de lei.
Brasília (DF), 07 de junho de 1990 (data do julgamento).
Ministro José Dantas, Presidente
Ministro Carlos Th ibau, Relator
DJ 06.08.1990
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Th ibau: O MM. Juiz Auditor da 4ª Auditoria da
Justiça Militar Estadual de São Paulo suscita confl ito positivo de competência
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 309-332, fevereiro 2010 317
para processar e julgar os soldados PM Adhemir Herrera e José Pedro Salgueiro,
pela prática dos crimes de lesões corporais e abuso de autoridade, quando em
serviço (fl s. 02-03).
Alega que a Justiça Castrense seria a competente para o processo e
julgamento das lesões corporais, cuja ação encontra-se em andamento, na
Auditoria Militar, sendo competente a Justiça Comum para o abuso de
autoridade. Salienta que corre ação penal, versando sobre os mesmos fatos,
perante o Juízo da Comarca de Cravinhos-SP.
Por se tratar de confl ito positivo, determinei o sobrestamento dos dois
processos e designei o MM. Juiz suscitante para adotar as medidas urgentes.
O MM. Juízo suscitado informou que os réus foram denunciados na Justiça
Comum, como incursos no art. 3º, alínea i, da Lei n. 4.898/1965 e no art. 129,
caput, do Código Penal, c.c. os arts. 29 e 70 do mesmo Código (fl s. 05 e 10-11).
Parecer da douta SGR, às fl s. 38-40, para que se declare competente a
Justiça Militar Estadual.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Th ibau (Relator): Os policiais militares foram
denunciados perante as duas Justiças, por haverem, quando em missão de
policiamento, desferido socos, pontapés e puxões de cabelo em José Maria
Simões de Oliveira, que se encontrava embriagado, causando-lhe lesões
corporais de natureza leve (fl s. 02 e 12). A jurisprudência aqui fi rmada exclui,
nesse caso, a unidade de processo e de julgamento, conforme dispõe o art. 79, I,
do CPP, fi xando a competência da Justiça Militar para o julgamento das lesões
corporais, e a da Justiça Comum para o abuso de autoridade. Dessa orientação
serve de exemplo recente acórdão desta Seção, no CC n. 762, sendo Relator o
Sr. Ministro Costa Leite, in verbis:
Processo Penal. Competência. Policial militar. Policiais militares denunciados
perante a Justiça Comum e Militar. Imputações distintas. Competência da primeira
para o processo e julgamento do crime de abuso de autoridade, não previsto no
Código Penal Militar, e da segunda para o de lesões corporais, porquanto os
mesmos se encontravam de serviço de policiamento. Unidade de processo e
julgamento excluída pela incidência do art. 79, I, do Código de Processo Penal.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
318
Eventual subsunção do delito de autoridade no delito mais grave de lesões
corporais e questão de direito material, que não comporta exame em sede de
confl ito de competência. Confl ito não conhecido. (DJ de 19.03.1990, p. 01.933)
Ante o exposto, conheço do confl ito, para declarar competente para o
julgamento das lesões corporais o MM. Juízo suscitante, e para o julgamento do
crime de abuso de autoridade o MM. Juízo suscitado.
É como voto.
CONFLITO DE COMPETÊNCIA N. 2.686-RS (92.0001377-5)
Relator: Ministro José Dantas
Autor: Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul
Réus: Luiz Clímaco da Luz Menezes e Marciano Bandeira Filho
Suscitante: Juízo Auditor da Auditoria Militar Estadual de Santa Maria-
RS
Suscitado: Juízo de Direito de Quaraí-RS
EMENTA
Processual Penal. Lesões corporais. Abuso de autoridade.
Policiais militares a serviço.
— Conflito de competência. Não lhe impede a instauração a
pendência apelatória da sentença de um dos juízos em confl ito, se não
que a impediria o trânsito em julgado.
— Crime militar. Induvidosa a competência castrense quanto ao
delito de lesões corporais praticadas por policiais militares em serviço;
conquanto seja da Justiça Comum a competência quanto ao crime de
abuso de autoridade.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 309-332, fevereiro 2010 319
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide
a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do
confl ito e declarar competente o suscitante, Juízo Auditor da Auditoria Militar
Estadual de Santa Maria-RS, para julgamento dos crimes de lesões corporais,
e o suscitado, Juízo de Direito de Quaraí-RS, relativo ao crime de abuso de
autoridade, na forma de relatório e notas taquigráfi cas constantes dos autos, que
fi cam fazendo parte integrante do presente julgado. Custas, como de lei.
Brasília (DF), 05 de março de 1992 (data do julgamento).
Ministro José Cândido, Presidente
Ministro José Dantas, Relator
DJ 16.03.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro José Dantas: A tal título, reporto-me à petição postulatória
do presente confl ito positivo de competência, autoria do Juiz Auditor José
Ernando, assim concebida:
A autoridade de polícia judiciária militar, no uso de suas atribuições legais,
elaborou Inquérito Policial Militar, o qual apurou fatos ocorridos no dia 09 de
junho de 1991, na Cidade de Quaraí-RS.
Tais fatos, atribuídos aos soldados de Polícia Militar Luiz Clímaco da Luz Menezes
e Marciano Bandeira Filho, constituem, em tese, crime militar previsto no art.
209, caput, do Código Penal Militar, pois, segundo fi cou apurado, os indigitados
praças de Polícia Militar, no exercício de suas funções de Polícia Ostensiva, teriam
produzido lesões corporais em Jorge Nei Martins da Silva.
O procedimento investigatório foi remetido a esta Auditoria pela Autoridade
Administrativa. Com vista ao órgão do Ministério Público, este ofereceu
denúncia com base no mencionado IPM, que foi recebida, por despacho da
MMª. Juíza Auditora, no dia 10 de outubro de 1991. Os acusados foram citados
e interrogados, ocasião em que informaram a este juízo que, pelo mesmo fato,
estavam respondendo a processo, como acusados, na Comarca de Quaraí-RS.
Requisitadas informações à autoridade judiciária de Quaraí, que informou,
através de Ofício n. 892/1991, estarem os “réus, soldados Luiz Clímaco da Luz
Menezes, Marciano Bandeira Filho e mais o soldado Nelci Beulk de Souza (este
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
320
não incluído na denúncia recebida neste juízo), nos autos do Processo-Crime n.
1.456-060/1991, condenados por sentença daquele juízo, em 30.09.1991, como
incursos nas sanções dos arts. 3º, letra i, da Lei n. 4.898/1965 e 129, caput, c.c. o
art. 69, caput, e art. 29, caput, estes do Código Penal. O feito encontra-se em fase
de recurso”.
Diante do acima exposto, é induvidosa a ocorrência de conflito positivo,
pois os praças nominados estão sendo processados, simultaneamente, por esta
Auditoria e pelo juízo criminal da Comarca de Quaraí-RS. — fl s. 2-3.
Nesta instância, manifestou-se o Subprocurador-Geral Haroldo da
Nóbrega, pelo Ministério Público Federal, via do seguinte parecer:
Pelo mesmo fato delituoso, os soldados Luiz Clímaco da Luz Menezes e
Marciano Bandeira Filho estão processados perante a Justiça Castrense e a Justiça
Comum.
Cumpre consignar que o processo na Justiça Comum inclui mais um soldado.
As informações são no sentido de que na Justiça Comum já houve até
condenação dos acusados, encontrando-se o feito em fase de recurso (autos, fl .
03).
Há confl ito positivo de competência que deve ser resolvido em favor da Justiça
Castrense.
Se o fato é o mesmo, deve corresponder a um único processo.
Esclarecido pelo exame de ambas as denúncias que o acusados estavam
no exercício da função de patrulhamento ostensivo, quando perpetraram a
ocorrência objeto da dupla denúncia.
Ante o exposto, opino no sentido da competência da Justiça Castrense, por se
cuidar da análise de delitos de policiais em serviço. À Justiça Castrense competirá
examinar também a conduta do terceiro policial militar, sem farda, mas que
colaborou com os dois primeiros (Marciano e Luiz Clímaco) na perpetração do
ilícito. — fl s. 24-25.
Relatei.
VOTO
O Sr. Ministro José Dantas (Relator): Senhor Presidente, com base na
doutrina mais correntia, é tranqüila a orientação dos tribunais sobre que “o
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 309-332, fevereiro 2010 321
momento preclusivo da possibilidade do confl ito é a sentença fi nal” (Lopes da
Costa, Direito Processo Civil, vol. I, p. 239 — apud Ministro Adauto Cardoso,
in RTJ 47/352).
Desta egrégia Seção, já numerosos são os precedentes nesse mesmo sentido,
alinhados, porém, à cláusula do trânsito em julgado da sentença, na consonância
do magistério de eméritos processualistas penais (e.g., CC n. 1.624-SP, Relator
Ministro Costa Lima, e 1.878-SP, Relator Ministro William Patterson).
No caso presente, ao que se viu do relatório, a sentença da Justiça Comum
se encontra pendente de apelação. Não parece, contudo, que essa pendência
impeça o conhecimento do confl ito, uma vez que, no pormenor da disputa de
competência, também o Tribunal local é juízo vinculado a este egrégio Superior
Tribunal — CF, art. 105, I, d.
Desse modo conheço da postulação.
No mérito, quanto à prática irrogada aos denunciados, de ofensa
à integridade corporal da vítima (nomem juris especial), cabe declarar a
competência da Justiça Castrense, induvidosa que ressalta a sua jurisdição pela
natureza militar do delito, em face da qualifi cação profi ssional dos autores e
das condições funcionais como o praticaram. Via de conseqüência, cabe inibir
a sentença condenatória proferida na Justiça Comum pelo mesmo fato — sob
nomem juris de lesões corporais —, porquanto que, por vício de incompetência
ainda reparável a essa altura de pendência em julgado, presta-se a instauração do
confl ito até mesmo para impedir o exame meritório de apelação pelo Tribunal
ad quem.
Inobstante esse óbice oposto à efi cácia daquela sentença e ao seu reexame
apelatório, cumpre ressalvá-la no pormenor daquela segunda incriminação, isto
é, a de abuso de autoridade (atentado à incolumidade pública — art. 3º, i, da Lei
n. 4.898/1965), delito estranho à codifi cação militar e, portanto, da exclusiva
jurisdição ordinária. Por força dessa ressalva, vê-se remanescer a sentença, em
parte da condenação imposta, a qual também remanescerá reexaminável em
sede da apelação.
Em conclusão, conheço do confl ito para declarar competente o juízo
suscitante, para o processo pelas lesões corporais infl igidas à vítima, mantida,
porém, a competência do suscitado para o processo por abuso de autoridade,
pelo qual já condenou os réus.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
322
CONFLITO DE COMPETÊNCIA N. 3.532-SP
Relator: Ministro Costa Lima
Relator para o acórdão: Ministro Assis Toledo
Suscitante: Juízo Auditor da 4ª Auditoria Militar do Estado de São Paulo
Suscitado: Juízo de Direito da 4ª Vara Criminal de São José dos Campos-
SP
Autora: Justiça Pública
Réus: Herbert Fernando de Carvalho e Edson Henrique Frutuoso
EMENTA
Constitucional e Processual Penal. Crimes de lesão corporal
(art. 209 do CPM) e tortura contra adolescentes (art. 233 da Lei
n. 8.069/1990), atribuídos a policiais militares, em serviço, no
desempenho de policiamento civil.
Competência da Justiça Militar do Estado para julgamento do
crime de lesão corporal cometido por policial militar em serviço (arts.
125, § 4º, da Constituição Federal, 9º, II, c, e 209 do CPM) e da
Justiça Comum Estadual para julgamento do crime de tortura.
Precedentes jurisprudenciais.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, conhecer do confl ito e, por maioria,
declarar competente o suscitante, Juízo Auditor da 4ª Auditoria Militar do
Estado de São Paulo, para julgar os delitos de lesões corporais, e o suscitado,
Juízo de Direito da 4ª Vara Criminal de São José dos Campos-SP, para julgar o
crime de tortura, nos termos do voto do Sr. Ministro Assis Toledo. Vencido o Sr.
Ministro-Relator. Votaram com o Sr. Ministro Assis Toledo os Srs. Ministros
Vicente Cernicchiaro, Adhemar Maciel, José Dantas e Pedro Acioli. Ausentes,
por motivo justifi cado, os Srs. Ministros Flaquer Scartezzini e Edson Vidigal.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 309-332, fevereiro 2010 323
Brasília (DF), 19 de novembro de 1992 (data do julgamento).
Ministro José Cândido, Presidente
Ministro Assis Toledo, Relator para o acórdão
DJ 08.03.1993
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Costa Lima: Trata-se de confl ito positivo de competência
em que é suscitante o MM. Juiz Auditor da 4ª Auditoria da Justiça Militar
do Estado de São Paulo (fl . 02) e suscitado o MM. Juiz de Direito da 4ª Vara
Criminal de São José dos Campos-SP (fl s. 06-07).
Dissentem os nobres Magistrados sobre qual Justiça competente para
processar e julgar policiais militares, que agrediram adolescente sob sua guarda,
autoridade e vigilância, buscando obter confi ssão da prática de um furto. Pesa
ainda denúncia contra civil pelo crime previsto no art. 230 da Lei n. 8.069/1990
(privação da liberdade), contra o mesmo menor.
Opina a Dra. Delza Curvello Rocha, ilustrada Subprocuradora-Geral da
República, pela competência da Justiça Castrense para processar e julgar os
militares e pela competência da Justiça Comum para processar e julgar o civil
(fl s. 14-15).
Relatei.
VOTO
O Sr. Ministro Costa Lima (Relator):
Competência. Crime de lesões corporais praticado por policiais
militares contra civil.
1. Compete à Justiça Militar Estadual processar e julgar os
policiais e bombeiros militares nos crimes militares defi nidos em lei.
2. Policial militar que se encontra prestando serviço de natureza
civil, se pratica crime de lesões corporais contra civil no exercício dessa
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
324
atividade e em local não sujeito à administração militar, não comete
infração militar (art. 9º, II, b e c, do CPM).
3. Confl ito conhecido, declarando-se competente o Juízo de
Direito.
A Constituição cometeu à Justiça Militar dos Estados competência
para processar e julgar os policiais bombeiros militares, nos crimes militares
defi nidos em lei.
2. Policial militar, que se encontra prestando serviço de natureza civil,
acusado de praticar crime de lesões corporais contra civil, em local não sujeito
à administração militar, embora a hipótese esteja prevista no art. 209 do CPM,
não se submete à jurisdição militar, segundo os ditames do art. 9º do aludido
Código.
O Ministro Carlos Th ibau (CC n. 2.818-PR), em que dois militares eram
acusados da prática de lesões corporais, assim se manifestou:
Segundo declaração do primeiro indiciado, o Tenente Jorge Gedeão, as lesões
corporais causadas nas vítimas resultaram da explosão de uma caixa de música
por ele fabricada e enviada como presente para Sandra Regina, uma das vítimas,
com quem mantivera relações afetivas, anteriormente. Assim relata os fatos:
que, assim nesse intento, dirigiu-se até o quartel onde trabalhava, Quinto
Grupo de Artilharia de Campanha e no depósito de munições do quartel
conseguiu grânulos de pólvora, equivalente ao volume de dois punhados
de pólvora, em seguida comprou uma caixa de gesso, uma espoleta e uma
extensão de fio e tomada, montando um artefato cuja pretensão seria
apenas fazer barulho, não avaliando as conseqüências deste seu ato (fl . 43)
Como bem salientou a Dra. Delza Curvello Rocha, ilustre SGR, em seu parecer,
5.... O art. 9º do CPM considera crimes militares em tempo de paz os que
atingem a administração, organização e as autoridades militares, praticados
em lugar sujeito à administração, ou em função de natureza militar.
Portanto, nem sempre a qualidade militar do sujeito do delito caracteriza o
crime de tal natureza.
6. O crime de lesão corporal foi praticado pelo acusado, realizado fora
dos recintos militares, sem motivo da função ou do serviço militar e, dessa
forma não há que se falar em competência da Justiça Castrense.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 309-332, fevereiro 2010 325
Todavia, no CC n. 2.686-RS, ementou o Ministro José Dantas:
Crime militar. Induvidosa a competência castrense quanto ao delito de lesões
corporais praticadas por policiais militares em serviço; conquanto seja da Justiça
Comum a competência quanto ao crime de abuso de autoridade.
Também o Ministro Flaquer Scartezzini manifestou-se neste mesmo
sentido no CC n. 1.425-SP:
Confl ito de competência. Crime militar. Art. 9º, II, alínea c, do CPM.
— Compete à Justiça Militar Estadual processar e julgar policiais militares em
serviço pela prática de lesões corporais contra civil, eis que confi gurado crime
militar de que trata o art. 9º, II, c, do CPM.
— Declaração de competência da 4ª Auditoria Militar Estadual de S. Paulo.
Ouso discordar desses doutos pronunciamentos, com a devida vênia,
porquanto entendo que a hipótese não tem abrigo em nenhum dos incisos do
art. 9º, item II, do Código Penal Militar, como pretendo demonstrar.
Art. 9º - Consideram-se crimes militares, em tempo de paz:
I - (...)
II - os crimes previstos neste Código, embora também o sejam com igual
defi nição na lei penal comum, quando praticados:
a) por militar em situação de atividade ou assemelhado, contra militar na
mesma situação ou assemelhado;
b) por militar em situação de atividade ou assemelhado, em lugar
sujeito à administração militar, contra militar da reserva, ou reformado, ou
assemelhado, ou civil;
c) por militar em serviço, em comissão de natureza militar, ou em
formatura, ainda que fora do lugar sujeito à administração militar contra
militar da reserva, ou reformado, ou assemelhado, ou civil;
d) por militar durante o período de manobras ou exercício, contra militar
da reserva, ou reformado, ou assemelhado, ou civil;
e) por militar em situação de atividade, ou assemelhado, contra
patrimônio sob a administração militar, ou à ordem administrativa militar.
O policial militar quando se encontra no exercício de policiamento civil,
por não exercer atividade militar, deve ser julgado pela Justiça Comum dos
Estados. É o que se deduz acontecer nestes autos, conforme as denúncias de
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
326
fl s. 03 e 08-10. Decorre daí que os milicianos não estavam prestando serviço
militar, segundo a previsão da alínea c.
O Supremo Tribunal Federal decidiu:
Habeas corpus. Crime cometido por policial militar no exercício de policiamento
civil. Tem natureza civil e deve ser julgado pela Justiça Comum, e não pela Justiça
Militar Estadual (HC n. 54.207-SP. Relator Ministro Moreira Alves, RTJ vol. 78/728).
A propósito, é bem explícita a Súmula n. 297:
Ofi ciais e praças das milícias dos Estados no exercício de função policial civil
não são considerados militares para efeitos penais, sendo competente a Justiça
Comum para julgar os crimes cometidos por ou contra eles.
O Supremo Tribunal Federal, face ao disposto na EM n. 7/1977 modifi cou,
em parte, essa súmula, esclarecendo competir à Justiça Militar processar e julgar
o policial militar quando, mesmo no exercício de função civil, pratica crime
previsto no Código Penal Militar (RTJ vol. 89/92 e RTJ vol. 87/460).
Às polícias militares cabe a polícia ostensiva e a preservação da ordem
pública (art. 144, § 5º, da CF).
Em remate, os policiais militares são acusados de terem detido um jovem e,
no posto policial, o agredido, causando-lhe lesões corporais. Não vejo nesse fato
a ocorrência de crime militar.
Conheço do confl ito e declaro competente o Juízo de Direito da 4ª Vara
Criminal de São José dos Campos-SP
VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Assis Toledo: Herbert Fernando Carvalho de Campos e
Antônio da Silva, ambos policiais militares, solicitados a atender uma ocorrência
de furto, detiveram dois adolescentes e, segundo consta, conduziram-nos ao
posto policial onde passaram a agredi-los para que confessassem o crime.
Por esse fato os policiais foram denunciados, na Justiça Militar, por crime
do art. 209 do CPM, e, na Justiça comum, por crime do art. 233 da Lei n.
8.069/1990.
Em razão disso, a Juíza Auditora suscitou confl ito positivo de competência.
O eminente Relator, Ministro Costa Lima, conheceu do confl ito e, não
vendo no fato crime militar, declarou competente a Justiça Comum Estadual.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 309-332, fevereiro 2010 327
Pedi vista, para melhor exame, e, a seguir, dou o meu voto.
O art. 9º do CPM considera crimes militares, em tempo de paz, os
cometidos por militar em serviço contra civil (art. 9º, II, c). E o art. 209 do
mesmo Código prevê o crime de lesão corporal.
No caso os militares agiram, indevidamente, em serviço.
O Ministro-Relator, todavia, discordando da orientação desta Seção,
esforçou-se em reviver a antiga Súmula n. 297 do Supremo Tribunal Federal
segundo a qual:
Ofi ciais e praças das milícias dos Estados, no exercício de função policial civil,
não são considerados militares para efeitos penais, sendo competente a Justiça
Comum para julgar os crimes cometidos por ou contra eles.
Ocorre que essa súmula foi considerada prejudicada ou reformulada a
partir do julgamento, pelo Plenário, do RHC n. 56.049 (RTJ 87/47), no qual se
afi rmou que, com advento da Emenda Constitucional n. 7/1977, a Justiça Militar
estendeu sua competência para julgar os integrantes das polícias militares, ainda
que o crime tenha sido cometido no exercício de policiamento civil.
Veja-se, a propósito, este julgado:
Policiais militares dos Estados. Pelos crimes militares que praticarem, ainda
que no exercício de função policial civil, seus integrantes respondem, agora,
perante as Justiças Militares Estaduais, nos termos da nova redação dada ao art.
144, § 1º, letra d, da Constituição, pela Emenda Constitucional n. 7, de 1977, que
prejudicou, em parte, o enunciado da Súmula n. 297 (RHCs ns. 56.059 e 56.068,
Plenário, 1º.06.1978). Habeas corpus denegado. (STF, RHC n. 55.962-SP, Relator
Ministro Xavier de Albuquerque, RTJ 86/790).
Terá a Constituição atual alterado o art. 144, § 1º, d, da Constituição
anterior?
Faça-se o confronto:
Art. 144, § 1º, d, da Constituição anterior
Justiça Militar Estadual, constituída em primeira instância pelos
Conselhos de Justiça, e, em segunda, pelo próprio Tribunal de Justiça, com
competência para processar e julgar, nos crimes militares defi nidos em lei,
os integrantes das polícias militares.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
328
Art. 125, § 4º, da Constituição de 1988
Compete à Justiça Militar Estadual processar e julgar os policiais militares
e bombeiros militares nos crimes militares defi nidos em lei, cabendo ao
Tribunal competente decidir sobre a perda do posto e da patente dos
ofi ciais e da graduação das praças.
Do confronto, verifi ca-se que, em matéria de competência, não houve
mudança substancial, pois se, antes, competia à Justiça Militar Estadual julgar
os integrantes das polícias militares “nos crimes militares defi nidos em lei”, hoje
compete-lhe igualmente julgar os policiais militares e até os bombeiros militares
“nos crimes militares defi nidos em lei”.
Assim, a razão que levou a Suprema Corte a alterar o enunciado da Súmula
n. 297 persiste, na vigência da atual Constituição.
Não vejo, pois, motivo para fazer, agora, ressurgir das cinzas a jurisprudência
que predominava antes da Emenda n. 7/1977.
Esse, aliás, o entendimento acolhido em acórdão de que fui Relator no
HC n. 1.040-MT.
Não vejo, pois, razão para alterar-se, nesta altura, orientação cristalizada na
jurisprudência desta e da Suprema Corte.
No caso, entretanto, os policiais estão denunciados por dois crimes: lesão
corporal, prevista no CPM, e tortura contra adolescente, prevista na Lei n.
8.069/1990.
Este último delito não constitui, evidentemente, crime militar nem está
previsto no CPM.
Assim, ainda segundo jurisprudência da Corte (CC n. 2.686 e CC n.
762), nessa hipótese, compete à Justiça Militar julgar o crime militar e à Justiça
Comum julgar o crime comum conexo.
Fiel a essa orientação, que adotei no julgamento do HC n. 1.040-MT, não
conheço do confl ito, reconhecendo, no caso, a competência da Justiça Militar
para julgamento da lesão corporal e da Justiça Comum para julgamento do
delito de tortura, tal como, aliás, já está acontecendo.
É o meu voto.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 309-332, fevereiro 2010 329
VOTO-VOGAL
O Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro: Sr. Presidente, ouvi, com atenção, os
doutos votos que foram proferidos. Parto do seguinte raciocínio, a fi m de extrair
a conclusão.
A teor do Código Penal Militar especificamente o art. 9º, serão
encaminhadas para a respectiva jurisdição as infrações praticadas por militares
no exercício da respectiva função.
No caso concreto, foi bem ressaltado: os militares foram chamados para a
prática, o desempenho de um policiamento civil. Há de se ponderar, entretanto,
que a simples atividade não descaracteriza, por si só, a natureza do respectivo
policiamento. Tanto é que o militar a convocação para exercer policiamento civil,
isso decorre da natureza de sua atividade. Tem-se assim serviço militar principal
e serviço militar subsidiário, qual seja, socorrer, eventualmente, no policiamento
civil. Quando isso ocorre, o policial não perde o seu status. Atua como militar.
Em sendo assim, é evidente, eventuais infrações praticadas no desempenho
dessa atividade, uma vez capituladas, tipifi cadas, atrai a Jurisdição Militar.
No caso concreto há uma infração, em tese, de natureza militar e outra, em
tese, de natureza civil. É da jurisprudência da nossa Seção separá-las: quando
o crime é militar para julgamento na Justiça Militar e quando é civil para
julgamento na Justiça Civil.
Com estas considerações, acompanho as conclusões do eminente Ministro
Assis Toledo, com a devida vênia ao eminente Ministro-Relator.
VOTO
O Sr. Ministro Adhemar Maciel: Senhor Presidente, sem me comprometer
com a tese, porque me despertou a atenção a tese suscitada com o Ministro
Costa Lima, o Ministro Assis Toledo deu uma diretiva prática, bifurcando os
dois crimes. Por esta razão, sem me comprometer, digo, acompanho o Ministro
Assis Toledo.
É como voto.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
330
VOTO
O Sr. Ministro José Dantas: Sr. Presidente, peço vênia ao eminente
Ministro-Relator para permanecer fi el à assentada jurisprudência desta Seção
a respeito do assunto, agora tão bem subsidiada pelo voto do Sr. Ministro Assis
Toledo.
Lembro, mutatis mutandis, o acórdão de minha relatoria, no Confl ito
de Competência n. 2.886, no qual se tratava, exatamente, de um caso dessa
natureza: Um policial militar, em policiamento civil, foi acusado de lesões
corporais e de abuso de autoridade. Daí a conclusão a que chegamos de que o
crime militar, de lesões corporais, seria julgado pela Justiça Militar, e o de abuso
de autoridade o seria pela Justiça Comum, exatamente como agora concluiu S.
Exa., na espécie, em se tratando de crimes de naturezas distintas.
Com estas considerações, acompanho o voto do eminente Ministro Assis
Toledo.
VOTO
O Sr. Ministro Pedro Acioli: Sr. Presidente, também peço vênia ao
eminente Ministro-Relator para sufragar o voto do Ministro Assis Toledo, por
entender que é matéria já pacifi cada nesta egrégia Seção.
Acompanho o Sr. Ministro Assis Toledo.
É como voto.
CONFLITO DE COMPETÊNCIA N. 4.271-SP (93.0003658-0)
Relator: Ministro Pedro Acioli
Autora: Justiça Pública
Réu: Nelson Antonio Frugeri
Suscitante: Juízo Auditor da 2ª Auditoria da Justiça Militar do Estado
de São Paulo
Suscitado: Juízo de Direito de Cafelândia-SP
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 309-332, fevereiro 2010 331
EMENTA
Conflito de competência. Justiça Comum e Justiça Militar.
Infração penal não prevista no Código castrense, mas sim, na legislação
comum.
I - Se o laudo pericial concluiu que inocorreram lesões ou
seqüelas na região da coxa esquerda interna e testiteral esquerda da
vítima, impossível a confi guração do crime de lesões corporais.
II - No entanto, em tese, pode ter ocorrido a contravenção penal
de vias de fato (art. 21), tipo penal não previsto no Código castrense,
mas sim, na legislação comum.
III - Confl ito conhecido, competente o suscitado.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da egrégia
Terceira Seção, do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e
das notas taquigráfi cas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer do
confl ito e declarar competente o suscitado, Juízo de Direito de Cafelândia-SP,
nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Votaram com o Relator, os Srs.
Ministros Jesus Costa Lima, Assis Toledo, Edson Vidigal, Vicente Cernicchiaro,
Adhemar Maciel, Anselmo Santiago e José Dantas. Ausente nesta assentada, o
Sr. Ministro José Cândido.
Brasília (DF), 05 de agosto de 1993 (data do julgamento).
Ministro Flaquer Scartezzini, Presidente
Ministro Pedro Acioli, Relator
DJ 06.09.1993
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Pedro Acioli: No dia 20.05.1991, o Delegado de Polícia de
Guaratã-SP, através de portaria, instaurou inquérito policial para apurar possível
contravenção de vias de fato (art. 21 da LCP) praticado por policial militar —
chute nos órgãos genitais de civil — fl . 05.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
332
O laudo de exame de corpo de delito da apontada vítima concluiu que as
lesões são inexistentes — fl . 08.
Remetidos os autos à Justiça Comum, o MM. Juiz, entendendo tratar-se
de delito militar, encaminhou o feito à Justiça castrense — fl . 39.
Às fl s. 59-60, o Juiz Auditor suscitou o presente confl ito negativo de
competência sob a seguinte argumentação:
Ao meu ver, em que pese ter praticado o fato um policial militar, em serviço,
falta para caracterizar a natureza militar do delito a tipicidade no âmbito desta
Justiça.
Como bem acentuou o insigne Representante do Parquet, com assento nesta
Auditoria, ausentes as lesões corporais, outro crime menor subsiste, mas não há
previsão legal aqui, Neste caso, a conduta criminal, em tese, não deixa de existir,
apenas não é de caráter militar, e sim comum.
O Ministério Público Federal opinou pelo conhecimento do confl ito de
competência da Justiça Comum.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Pedro Acioli (Relator): Tendo em consideração que o
laudo pericial de fl . 08, conclui inocorrerem lesões ou seqüelas na região da coxa
esquerda e testiteral esquerda da vítima, impossível a confi guração do crime de
lesões corporais.
No entanto, em tese, pode ter ocorrido a contravenção penal de vias de fato
(art. 21), tipo penal não previsto no Código castrense, mas sim, na legislação
comum. Como bem esclareceu o Ministério Público: “não se encontrando o
fato descrito em nenhuma das hipóteses do art. 9º do Código Penal Militar,
que defi ne os crimes militares em tempo de paz, não há que se falar em crime
militar, nem de competência da Justiça Castrense”. (fl . 65)
Pelas razões alinhavadas conheço do confl ito e declaro competente o MM.
Juiz de Direito de Cafelândia-SP, o suscitado.
É como voto.
Súmula n. 91
(*) SÚMULA N. 91 (CANCELADA)
Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes praticados contra a
fauna.
Referências:
CF/1988, art. 109, IV.
Lei n. 5.197/1967.
Lei n. 7.653/1988.
Precedentes:
CC 200-MS (3ª S, 06.06.1989 — DJ 26.06.1989)
CC 1.074-SP (3ª S, 19.04.1990 — DJ 14.05.1990)
CC 1.597-SP (3ª S, 07.02.1991 — DJ 25.02.1991)
CC 3.369-SC (3ª S, 15.10.1992 — DJ 16.11.1992)
CC 3.373-SC (3ª S, 17.09.1992 — DJ 05.10.1992)
CC 3.608-SC (3ª S, 03.12.1992 — DJ 17.12.1992)
Terceira Seção, em 21.10.1993
DJ 26.10.1993, p. 22.629
(*) Na sessão de 08.11.2000, a Terceira Seção deliberou pelo
CANCELAMENTO da Súmula n. 91.
DJ 23.11.2000, p. 101
CONFLITO DE COMPETÊNCIA N. 200-MS (89.74032)
Relator: Ministro Carlos Th ibau
Autora: Justiça Pública
Réu: Demétrio Xavier Castello
Suscitante: Juíza Federal da 2ª Vara-MS
Suscitado: Juiz de Direito da 2ª Vara Criminal de Corumbá-MS
EMENTA
Processual Penal. Competência. Infração ao Código de Caça
(Lei n. 5.197/1967, c.c. a Lei n. 7.653/1988).
Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes descritos
no Código de Caça, por constituírem ofensas a bens e interesses da
União, sendo nulos os atos decisórios proferidos pela Justiça Estadual.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide
a Terceira Seção do Tribunal de Justiça, à unanimidade, conhecer do confl ito
para declarar competente a suscitante, MMa. Juíza Federal da 2ª Vara-MS, na
forma do relatório e notas taquigráfi cas constantes dos autos, que fi cam fazendo
parte integrante do presente julgado. Custas, como de lei.
Brasília (DF), 06 de junho de 1989 (data do julgamento).
Ministro José Dantas, Presidente
Ministro Carlos Th ibau, Relator
DJ 26.06.1989
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Carlos Th ibau: A MM. Juíza Federal da 2ª Vara da Seção
Judiciária de Mato Grosso do Sul suscitou confl ito positivo de competência para
processar e julgar Demétrio Xavier Castello, indiciado em inquérito policial pela
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
338
prática de crime previsto no chamado Código de Caça (Lei n. 5.197/1967, c.c.
a Lei n. 7.653/1988).
É que, embora tenham a instauração do inquérito e a comunicação do
fl agrante sido endereçadas à Justiça Federal, o MM. Juiz de Direito da Comarca
de Corumbá relaxou a prisão em fl agrante do indiciado, ao conceder habeas
corpus impetrado em seu favor, dando-se por competente, assim, para processar
e julgar os delitos. O suscitante esclarece que decretou a prisão preventiva do
indiciado, face à representação oferecida pelo Delegado de Polícia Federal (fl s.
2-10).
Parecer da Douta SGR, às fl s. 55-56, no sentido de declarar-se competente
o Juízo Federal, diante da iterativa jurisprudência do extinto Tribunal Federal de
Recursos.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Carlos Th ibau (Relator): A comunicação do fl agrante de
fl . 11 noticia que o indiciado foi dado como incurso nas penas dos arts. 2º, 3º e
27 da Lei n. 5.197/1967, este último com a alteração da Lei n. 7.653/1988, por
terem sido apreendidos em seu poder 2 espingardas, 5.500 cartuchos e 800 peles
de jacarés. A matéria é por demais conhecida dos membros desta Seção, todos
antigos integrantes do extinto Tribunal Federal de Recursos, cabendo lembrar
que os delitos em questão foram transformados de contravenções em crime, por
força do disposto na Lei n. 7.653/1988, que alterou, no particular, o art. 27 da
Lei n. 5.197/1967, tornando-os, inclusive, inafi ançáveis (art. 34).
Face ao disposto na Súmula n. 22 do TFR, é competente a Justiça
Federal para processar e julgar as infrações previstas no Código de Caça, por
constituírem ofensa a bens e interesses da União, sendo, assim, nula a decisão
proferida pelo Juízo suscitado, ao julgar o habeas corpus impetrado em favor do
indiciado (CPC, art. 567).
Ante o exposto, conheço do confl ito, para declarar competente a MMa.
Juíza Federal da 2ª Vara, em Mato Grosso do Sul, ora suscitante, considerando
nulos os atos decisórios praticados pelo Juízo Estadual.
É como voto.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 333-354, fevereiro 2010 339
CONFLITO DE COMPETÊNCIA N. 1.074-SP (90.0002229-0)
Relator: Ministro Costa Lima
Autora: Justiça Pública
Réu: Carlos Alberto de Moura
Suscitante: Juízo de Direito de Presidente Venceslau-SP
Suscitado: Juízo Federal da 12ª Vara-SP
EMENTA
Constitucional e Processual Penal. Competência. Crime contra
a caça. Justiça Federal.
1. Infração penal ocorrida na vigência da Lei n. 7.653, de
12.02.1988 é considerada crime e não mais contravenção.
2. Remessa dos autos à Justiça Federal após a promulgação da
Constituição.
3. Os crimes praticados contra bens, serviços e interesses da União,
suas autarquias ou empresas públicas continuam a ser da competência
da Justiça Federal (art. 109, IV). O fato de caber, concorrentemente à
União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar sobre fl orestas, caça,
pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos
do solo, proteção do meio ambiente e controle da poluição (art. 24,
VI), não interfere com a exclusiva competência da União para legislar
sobre matéria penal (art. 22, I).
4. A legislação especial considera “os animais de quaisquer
espécies, em qualquer fase de desenvolvimento e que vivem
naturalmente fora do cativeiro, constituindo a fauna silvestre, bem
como seus ninhos, abrigos e criadouros naturais, são propriedades do
Estado, sendo proibida a sua utilização, perseguição, destruição, caça
ou apanha” (art. 1º da Lei n. 5.197/1967). Logo, a proibição não se
restringe à ação ocorrida dentro de parques ou reservas nacionais.
5. Conflito conhecido, declarando-se competente o Juízo
Federal.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
340
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide
a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer
do confl ito e declarar competente o suscitado, Juízo Federal da 12ª Vara-SP, na
forma do relatório e notas taquigráfi cas constantes dos autos, que fi cam fazendo
parte integrante do presente julgado. Custas, como de lei.
Brasília (DF), 19 de abril de 1990 (data do julgamento).
Ministro José Dantas, Presidente
Ministro Costa Lima, Relator
DJ 14.05.1990
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Costa Lima: Trata-se de confl ito negativo de competência
em que aparecem como suscitante e suscitado, respectivamente, o Juízo de
Direito de Presidente Venceslau-SP (fl s. 37-40) e o Juízo Federal da 12ª Vara-SP
(fl s. 25-32).
Discute-se sobre quem seria competente para julgar crime contra a fauna
silvestre (art. 1º da Lei n. 5.197/1967, alterada pela Lei n. 7.653/1988), ocorrido
no dia 08 de abril de 1988, e cuja portaria de abertura do processo sumário foi
baixada em 24 de agosto de 1988, por Delegado de Polícia Federal, tendo os
autos sido recebidos na Justiça Federal em 10 de outubro de 1988.
O ilustrado Subprocurador-Geral da República, Dr. Valim Teixeira
manifesta-se pela competência do Juízo suscitado. (fl s. 45-46)
Relatei.
VOTO
O Sr. Ministro Costa Lima (Relator): Preliminarmente esclareço que a
portaria instauradora do processo sumário descreve fato típico previsto no art.
1º da Lei n. 5.197/1967 o qual passou a ser crime, e não mais contravenção,
ex vi das alterações trazidas pelo art. 1º da Lei n. 7.653, de 12 de fevereiro de
1988. Enfi m, os autos foram recebidos na Justiça Federal no dia 27.10.1988 e
encaminhados ao Ministério Público a 03.11.1988 (fl . 23).
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 333-354, fevereiro 2010 341
Tanto é assim que o Juízo suscitado consciente de que o delito foi cometido
em 08 de abril de 1988, já na vigência da Lei n. 7.653/1988, alega apenas não ter
havido prejuízo de bens, serviços ou interesse da União Federal. Escreve:
2. Com efeito, diversamente do que dispõe a Constituição de 1967, estabelece
a atual, a competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios para “preservar as fl orestas, a fauna e a fl ora” (art. 23, item VII, bem
assim, a de legislar concorrentemente — União, Estados e Distrito Federal —
sobre “fl orestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e
dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição” (art. 24,
item VI).
3. Atendendo ao princípio da imediata incidência das regras jurídicas
constitucionais, entendo que, com a nova Constituição, a competência insculpida
no seu art. 109, item IV, diz respeito, somente, aos casos em que é agredida a
fauna silvestre realmente tutelada pela União — como, por exemplo, a presente
nos parques ou reservas nacionais, ou quando se tratar de espécie em extinção,
reconhecidas por lei, dada sua importância ecológica.
4. Nos demais casos, conforme sejam os animais, ninhos, abrigos e criadouros
naturais (art. 1º Lei n. 5.197/1967, alterada pela Lei n. 7.653/1988) tutelados
pelos Estados ou pelo Distrito Federal, a competência para processar e julgar as
causas é das respectivas Justiças já que não constituem, propriamente, infrações
praticadas em detrimento de interesse da União, que, a propósito — conforme
ensina o voto do Exmo. Ministro Décio Miranda, pronunciado em 03.11.1978, no
julgamento do CC n. 6.115-RJ, pela Primeira Turma do STF (RTJ 91/423-428) —
nem seria titular da propriedade dos animais silvestres fi sicamente, considerada,
uma vez que não pode aliená-los, como, de resto, nenhuma das outras pessoas de
direito público precitadas tem o direito de fazê-lo. (fl s. 25-26)
Ao primeiro argumento, com razão responde o Dr. Juiz de Direito:
Não há negar, por outro lado, que infração praticada contra a fauna silvestre
atinge interesse da União, nos termos dos arts. 8º, 15 e 25 da Lei n. 5.197/1967.
Com efeito, incumbe ao órgão público federal editar, anualmente, a relação
atualizada das espécies, que não se sujeitam à proibição da caça. Também será
ouvido toda vez que, nos processos em julgamento, houver matéria referente à
fauna. Por fi m, é a União que fi scaliza a aplicação de normas previstas na Lei n.
5.197/1967.
A competência concorrente dos Estados para legislar sobre “caça” e “fauna” (art.
24, VI, da Constituição) não ilide o interesse da União em fi scalizar aplicação de
suas normas.
No âmbito da legislação concorrente, compete à União estabelecer normas
gerais. Somente no caso, de inexistirem normas gerais, exercerão os Estados a
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
342
competência legislativa plena (art. 24, § 3º, da Constituição). Logo, se conclui que
a competência legislativa concorrente dos Estados é também supletiva (art. 24,
§ 2º, da Constituição). Diga-se também, porque o art. 25, § 1º, do texto maior já
reservou aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas.
Ora, é precisamente, neste campo, ou seja, da competência residual, que
prepondera o interesse da União, na fiscalização da aplicação das normas
repressivas editadas na Lei n. 5.197/1967.
A competência da União para legislar sobre o direito penal é privativa (art. 22
da Constituição). Não pode ser compartilhada pelas demais unidades federadas,
por meio de competência legislativa concorrente. E a Lei n. 5.197/1967, além de
recepcionada pelo atual texto em vigor, é de natureza penal. Não trata de matéria
administrativa.
Respeitante a votos dos Ministros Décio Miranda e Néri da Silveira, as
respectivas opiniões fi caram isoladas, despontando vitorioso o entendimento de
que a competência é da Justiça Federal. O próprio Ministro Décio Miranda no
CJ n. 6.280-SP escreveu na ementa:
Competência. Fauna silvestre. Contravenção. Caça proibida pela Lei n. 5.197,
de 03.01.1967. Competência da Justiça Federal. Ressalva do entendimento
pessoal do Relator, que, ante a consideração de se tratar de “propriedade do
Estado”, consoante o art. 1º da Lei n. 5.197 de 03.01.1967, como o signifi cado de
“propriedades da Nação”, e não restritamente “bens da União”, reconheceria a
competência da Justiça Comum Estadual.
E o Ministro Néri da Silveira sumulou no CJ n. 7.532.
Competência da Justiça Federal para o processo e julgamento das
contravenções penais relativas à fauna silvestre, a fl orestas, como previstas nas
Leis ns. 5.197, de 03.01.67, e 4.771, de 15.09.1965.
A discussão que se travou nesta Terceira Seção em torno do tema limitou-
se ao momento em que se devia considerar proposta a ação penal e quando se
tratava de contravenção.
O caso dos autos, como assinalei inicialmente, ocorreu já na vigência da
Lei n. 7.653, de 12.02.1988, que considera o fato, em tese, como crime tendo
sido recebido o inquérito na Justiça Federal após o dia 05 de outubro de 1988.
A Constituição atual excluiu da competência da Justiça Federal apenas as
contravenções.
De modo que, se o fato está capitulado no art. 1º da Lei n. 5.197/1967
com as alterações introduzidas através da Lei n. 7.653, de 12.02.1988, é velha
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 333-354, fevereiro 2010 343
e vencida a discussão de que tal delito somente afetaria interesse da União em
causa de agressão à fauna silvestre, “como, por exemplo, a presente nos parques
ou reservas nacionais, ou quando se tratar de espécies em extinção, reconhecidas
por lei dada a sua importância”, nas palavras do Dr. Juiz Federal.
Essa restrição é estranha à lei:
Art. 1º Os animais de quaisquer espécies, em qualquer fase do seu
desenvolvimento e que vivem naturalmente fora do cativeiro, constituindo a
fauna silvestre, bem como seus ninhos, abrigos e criadouros naturais são
propriedades do Estado, sendo proibida a sua utilização, perseguição, destruição,
caça ou apanha.
Art. 3º É proibido o comércio de espécimes da fauna silvestre e de produtos e
objetos que impliquem na sua caça, perseguição, destruição ou apanha.
Por fi m, esta Terceira Seção já assentou:
Processual Penal. Competência. Infração ao Código de Caça (Lei n. 5.197/1967,
c.c. a Lei n. 7.653/1988).
Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes descritos no Código de
Caça, por constituírem ofensas a bens e interesses da União, sendo nulos os atos
decisórios proferidos pela Justiça Estadual. (DJ de 26.06.1989, p. 11.102 — CC n.
200-MS. Relator Ministro Carlos Thibau).
Reitera-se, portanto, o pensamento estratifi cado na Súmula n. 22-TFR.
À vista do exposto, conheço do confl ito e declaro competente o Juiz
Federal suscitado.
CONFLITO DE COMPETÊNCIA N. 1.597-SP (90.13348-3)
Relator: Ministro José Cândido
Autora: Justiça Pública
Réus: Francisco Ghisloti, Luís Marangoni e Luís Ederaldo Natalino
Suscitante: Juízo de Direito da 12ª Vara Criminal de Moji-Guaçu-SP
Suscitado: Juízo Federal da 12ª Vara-SP
Advogado: Silas Dias de Oliveira
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
344
EMENTA
Código de Caça. Fauna silvestre. Lei n. 7.653/1988. Competência
da Justiça Federal.
Compete aos juízes federais processar e julgar as infrações penais
em detrimento de bens da União, incluindo-se entre eles os animais
que constituem a fauna silvestre. Antes da infração, na hipótese dos
autos, a Lei n. 7.653/1988 já a considerava crime.
Conhecido o confl ito para declarar competente o Juiz Federal da
12ª Vara Criminal de São Paulo, o suscitado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados os autos, em que são partes as acima indicadas, decide
a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer
do confl ito e declarar competente o suscitado, Juízo Federal da 12ª Vara-SP, na
forma do relatório e notas taquigráfi cas constantes dos autos, que fi cam fazendo
parte integrante do presente julgado. Custas, como de lei.
Brasília (DF), 07 de fevereiro de 1991 (data do julgamento).
Ministro José Dantas, Presidente
Ministro José Cândido, Relator
DJ 25.02.1991
RELATÓRIO
O Sr. Ministro José Cândido: O processo contravencional por infração do
art. 1º, c.c o 27 da Lei n. 5.197/1967 (Código de Caça), iniciado por portaria do
Delegado de Polícia Federal de Campinas, Estado de São Paulo, de 08.09.1988,
e remetido à Justiça Federal pelo despacho à fl . 53, recebeu do Juiz Zalmino
Zimmermann, da 12ª Vara Criminal, despacho declinatório de competência,
fundamentado na circunstância de ter sido o mesmo distribuído à Vara em
10.04.1989, já promulgada a nova Constituição. Determinou, em conseqüência,
baixa na distribuição e remessa à Justiça Estadual. (fl . 61)
O Promotor de Justiça da Comarca de Moji-Guaçu, em parecer às fl s. 100-
103 opinou, porém, pela competência da Justiça Federal, ponto de vista acolhido
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 333-354, fevereiro 2010 345
pelo MM. Juiz da Comarca. Argumenta com o art. 109, IV, da Constituição
que diz competir à Justiça Federal processar e julgar os crimes praticados em
detrimento de bens da União. As infrações previstas na Lei n. 5.197/1967 são
em detrimento daqueles bens, conforme o art. 1º. De outra parte, pelo art. 27
da mesma lei, com a redação que lhe deu a Lei n. 7.653/1988, os ilícitos ali
apontados passaram a ser crime, e não mais contravenção. Cita, a propósito,
decisão da Primeira Câmara do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo, de
07.06.1989.
Vindo o processo a esta Corte, manifestou-se a Subprocuradoria Geral da
República pela competência da Justiça Federal, em face do art. 27, § 10, do Ato
das Disposições Constitucionais Transitórias.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro José Cândido (Relator): Quando ocorreu a infração, em
08.09.1988, já estava ela defi nida como crime pela Lei n. 7.653, de 12.02.1988,
razão por que, provocando ofensa a bens da União, tem que ser julgada
pela Justiça Federal. É o que expressamente dispõe o art. 109, inciso IV, da
Constituição Federal.
Desta forma, conheço do confl ito e declaro a competência do Juiz suscitado,
da 12ª Vara Criminal de São Paulo, para julgar e processar o presente feito.
É o meu voto.
CONFLITO DE COMPETÊNCIA N. 3.369-SC
Relator: Ministro Flaquer Scartezzini
Autora: Justiça Pública
Réu: Elias Zagonel
Suscitante: Juízo Federal da 7ª Vara de Joaçaba-SC
Suscitado: Juízo de Direito da 1ª Vara de Joaçaba-SC
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
346
EMENTA
Constitucional e Processual Penal. Competência. Crime contra
a caça. Justiça Federal.
— A caça ou apanha das espécies de nossa fauna silvestre
foi elevada à categoria de crime federal com o advento da Lei n.
7.653/1988; logo, as condutas desta natureza afetam bens ou interesses
da União, o que convoca, para o feito, a competência da Justiça Federal,
mercê do art. 109, IV, da CF/1988.
— Declarada a competência do Juízo Federal, suscitante.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das
notas taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, conhecer do confl ito e declarar
competente o suscitante, Juízo Federal da 7ª Vara de Joaçaba-SC. Votaram com
o Relator os Srs. Ministros Costa Lima, Assis Toledo, Edson Vidigal, Vicente
Cernicchiaro, José Dantas e Pedro Acioli.
Brasília (DF), 15 de outubro de 1992 (data do julgamento).
Ministro José Cândido, Presidente
Ministro Flaquer Scartezzini, Relator
DJ 16.11.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Flaquer Scartezzini: Trata-se de confl ito de competência
entre o Dr. Juiz Federal da 7ª Vara de Joaçaba, no Estado de Santa Catarina, ora
suscitante, e a Dra. Juíza de Direito da 1ª Vara, na mesma Comarca Estadual.
Gerou-se o confl ito em virtude de inquérito policial encaminhado ao
Juízo de Direito, destinado a apurar o abate de espécime da fauna silvestre, fato
subsumido à Lei n. 7.653/1988, que defi ne os crimes contra a fauna.
A Dra. Juíza de Direito, ao entendimento de que as espécies da fauna
silvestre constituem bens do Estado, declinou de sua competência em favor da
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 333-354, fevereiro 2010 347
Justiça Federal, que por sua vez, suscitou o presente confl ito negativo que, após
merecer da douta Subprocuradoria Geral da República parecer no sentido da
competência do Juízo suscitante, vieram-me conclusos.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Flaquer Scartezzini (Relator): Sr. Presidente, entendo que
a caça ou apanha das espécies da nossa fauna silvestre foi elevada à categoria
de crime federal com o advento da Lei n. 7.653/1988; logo, as condutas desta
natureza afetam bens ou interesses da União, o que convoca, para o feito, a
competência da Justiça Federal, mercê do art. 109, IV, da CF/1988.
A respeito, na ementa do acórdão do CC n. 1.074-SP, da lavra do eminente
Ministro Costa Lima, lê-se, verbis:
Constitucional e Processual Penal. Competência. Crime contra a caça. Justiça
Federal.
1. Infração penal ocorrida na vigência da Lei n. 7.653, de 12.02.1988 é
considerada crime e não mais contravenção.
2. Remessa dos autos à Justiça Federal após a promulgação da Constituição.
3. Os crimes praticados contra bens, serviços e interesses da União, suas
autarquias ou empresas públicas continuam a ser da competência da Justiça
Federal (art. 109, IV). O fato de caber, concorrentemente à União, aos Estados e
ao Distrito Federal legislar sobre fl orestas, caça, pesca, fauna, conservação da
natureza, defesa do solo e dos recursos do solo, proteção do meio ambiente e
controle da poluição (art. 24, VI), não interfere com a exclusiva competência da
União para legislar sobre a matéria penal (art. 22, II).
4. A legislação especial considera “os animais de quaisquer espécies, em
qualquer fase de desenvolvimento e que vivem naturalmente fora do cativeiro,
constituindo a fauna silvestre, bem como seus ninhos, abrigos, e criadouros
naturais, são propriedades do Estado, sendo proibida a sua utilização, perseguição,
destruição, caça ou apanha” (art. 1º da Lei n. 5.179/1967). Logo, a proibição não se
restringe à ação ocorrida dentro de parques ou reservas nacionais.
5. Confl ito conhecido, declarando-se competente o Juízo Federal. (In DJ de
14.05.1990, p. 4.151)
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
348
Sem maiores considerações, meu voto é no sentido de conhecer do confl ito
para declarar competente para o feito o Dr. Juiz Federal da 7ª Vara de Joaçaba-
SC, ora suscitante.
É como voto.
CONFLITO DE COMPETÊNCIA N. 3.373-SC (92.0019480-0)
Relator: Ministro José Dantas
Autora: Justiça Pública
Réus: Ovidio Danielli e Danilo Ozilio Fabonato
Suscitante: Juízo Federal da 7ª Vara de Joaçaba-SC
Suscitado: Juízo de Direito da 1ª Vara Criminal de Joaçaba-SC
EMENTA
Processual Penal. Crime contra a fauna silvestre.
— Competência. Sedimentada jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal sobre competir à Justiça Federal processar e julgar
a espécie.
Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das
notas taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, conhecer do confl ito e declarar
competente o suscitante, Juízo Federal da 7ª Vara de Joaçaba-SC. Votaram
de acordo os Srs. Minitros Pedro Acioli, Costa Lima, Assis Toledo e Edson
Vidigal. Ausentes, por motivo justifi cado, os Srs. Ministros Flaquer Scartezzini
e Vicente Cernicchiaro.
Brasília (DF), 17 de setembro de 1992 (data do julgamento).
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 333-354, fevereiro 2010 349
Ministro José Cândido, Presidente
Ministro José Dantas, Relator
DJ 05.10.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro José Dantas: A espécie está bem exposta no parecer do
Ministério Público Federal, nesta instância, concebido nestes termos:
Foi instaurado inquérito policial destinado a apurar o abate de um veado, fato
subsumido à Lei n. 7.653/1988 — crimes contra a fauna.
2. O Juízo Federal da 7ª Vara de Joaçaba-SC, suscitou o presente confl ito de
competência, levantando como suscitado o Juízo de Direito da 1ª Vara Criminal
da mesma Cidade. Na realidade, o presente conflito de competência fora
suscitado mais em atenção ao requerimento feito pelo Ministério Público Federal
à fl . 25, do que propriamente pelo fato de o ilustre Juízo suscitante se considerar
incompetente para o caso.
3. Considerando que em idêntico caso, o mesmo Juízo suscitado declinou
de sua competência em favor da Justiça Federal, inclusive com conflito de
competência para ser dirimido pelo colendo Superior Tribunal de Justiça (vide:
CC n. 3.369-0, reg. 1992/0019446-1, Relator Ministro Flaquer Scartezzini), nessa
instância, a Subprocuradoria Geral da República entende que há confl ito a ser
dirimido, já que o Juízo Federal encampou a manifestação do Ministério Público
Federal no sentido de que fosse suscitado confl ito negativo de competência.
4. A destruição de espécies de nossa fauna silvestre foi elevada à categoria de
crime com o advento da Lei n. 7.653/1988. Resta saber se condutas desse tipo
prejudicam bem ou interesse da União, para poder se estabelecer a competência
da Justiça Federal, mercê do art. 109, IV, da CF.
5. A Lei n. 5.197/1967, em seu art. 1º esclarece o seguinte:
Os animais de quaisquer espécies, em qualquer fase do seu
desenvolvimento e que vivem naturalmente fora do cativeiro, constituindo
a fauna silvestre, bem como seus ninhos, abrigos, criadouros naturais
são propriedades do Estado, sendo proibida sua utilização, perseguição,
destruição, caça ou apanha.
O Estado a que se referiu a lei é a União Federal. Desse modo, não restam
dúvidas de que a fauna silvestre está inserida entre os bens da União, eis que a Lei
n. 5.197/1967, encontra-se plenamente recepcionada pela Constituição Federal
de 1988, que em seu art. 20, esclarece:
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
350
Art. 20. São bens da União:
I - os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser atribuídos.
6. Estamos em que a competência deve ser fi xada em favor da Justiça Federal,
eis que atingidos bem e interesse direto e específi co da União, inclusive com
precedente nesta egrégia Corte (vide: CC n. 1.074-SP).
Ante o exposto, opina o Ministério Público Federal pelo conhecimento do
confl ito, para ser declarado competente o Juízo Federal da 7ª Vara de Joaçaba-SC,
suscitante.
Brasília (DF), 02 de setembro de 1992.
Delza Curvello Rocha — Subprocuradora-Geral da República — fl s. 40-41.
Relatei.
VOTO
O Sr. Ministro José Dantas (Relator): Sr. Presidente, ao que se vê, trata-se
de defi nir a competência para a ação penal por crimes contra a fauna silvestre,
segundo a tipifi cação agravada pela Lei n. 7.653/1988.
Relembro que, ao tempo da primitiva redação da Lei n. 5.197/1967,
o extinto Tribunal Federal de Recursos, conquanto houvesse admitido a
competência da Justiça Federal para as chamadas contravenções ecológicas
previstas naquela lei e no Código Florestal, o fazia na compreensão de que
se tratasse de delito cometido em área de preservação do domínio da União.
Dessa época é o voto que anexarei por xerocópia, (RHC n. 4.428-RS), na
relembrança da motivação que animava aquele velho Tribunal, e que ainda hoje,
a meu modesto sentir, impressiona, conforme mesmo o escorço oferecido pelo
Ministério Público Federal, na origem destes autos, lavra da então Procuradora
da República, Dra. Ela Volkmer (fl s. 25-33).
No entanto, ao que se sabe, diferente foi a interpretação dada àquelas leis
pelo Supremo Tribunal Federal, ou por entender que a expressão “propriedade
do Estado” contida no art. 1º da Lei n. 5.197 integra-se mesmo ao signifi cado
de bens da União, ou porque, em última hipótese, revela substancial interesse da
União, no quanto lhe cumpre tutelar a fauna silvestre (votos no CJ n. 6.115-RJ,
in RTJ 91/423).
Daí que, pela sucessão de muitos outros julgados daquela época, o TFR
fi ndou por submeter a regência da matéria ao Verbete n. 22 de sua súmula.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 333-354, fevereiro 2010 351
Todas essas notas servem, em parte, como homenagem ao brilhante
pronunciamento do Ministério Público Federal de primeiro grau, de cujo
conteúdo não vejo como discordar; mas, de outra parte, têm apenas o escopo de
registrar as minhas ressalvas à analisada jurisprudência, sobre a qual já se disse
que, reservar a repressão dos delitos contra a fauna silvestre exclusivamente à
Justiça Federal, é, praticamente, impedir que a proteção se exerça (cf. voto do
Ministro Décio Miranda no CJ n. 6.115-RJ, in RTJ 91/427).
Desse modo, com essa ressalva, em sendo a primeira vez que voto sobre
a espécie nesta egrégia Seção, termino por colacionar dois precedentes seus,
proferidos sob minha presidência e respectivas relatorias dos Srs. Ministros
Carlos Th ibau e Costa Lima, ambos arestos pela adoção da analisada orientação
do Pretório Excelso — CC n. 200-MS, in DJ de 26.06.1989; e CC n. 1.074,
19.04.1990.
Pelo exposto, conheço do confl ito e julgo competente o suscitante — Juízo
Federal da 7ª Vara de Joaçaba-SC.
ANEXO
RECURSO EM HABEAS CORPUS N. 4.428-RS
VOTO
O Sr. Ministro José Dantas: Sr. Presidente, com a devida vênia, tenho
desprezado essa fundamentação distintiva de crime e contravenção para o efeito
de indagar-se a competência da Justiça Federal.
Fosse lícito apreciar a decisão recorrida no aspecto exclusivo de sua
fundamentação, não teria dúvida em acompanhar o eminente Ministro-
Relator. Todavia, a minha posição, em referência, é que certas e determinadas
contravenções realmente fi cam sob a competência da Justiça Federal. Nessa
colocação tenho exigido que a prática do ato contravencional afete diretamente
bens ou interesses imediatos da União.
No caso, contudo, ao que indaguei do Relator, não se cuida de um parque
fl orestal de propriedade da União, como a respeito decidimos no Pleno, quando
se tratava de uma contravenção por abate de animais pertencentes a parque
nacional fl orestal. Trata-se de exploração indiscriminada de fl orestas, mas em
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
352
propriedade privada. Estaria em causa, apenas remotamente, o interesse federal,
que seria aquele submetido à fi scalização do Instituto de Defesa Florestal.
Vejo aí, portanto, uma causa que não atende àquelas considerações por
conta das quais o Tribunal Pleno chega a admitir a competência da Justiça
Federal para contravenções. É que, em se tratando de exploração de propriedade
privada, falta a elementar de o bem afetado pertencer à União e de o interesse
castigado estar diretamente ligado, também, aos interesses da União.
Por conseguinte, acho acertada a decisão recorrida no ponto em que
remeteu o conhecimento da matéria, como a própria fase investigatória, às
autoridades locais, realmente competentes para a hipótese, apesar da fi scalização
genérica que a União exerce através do Instituto Brasileiro de Defesa Florestal o
que, em última análise, não signifi ca interesses imediatos da União.
Por essas considerações, Sr. Presidente, confirmo a decisão, negando
provimento ao recurso.
CONFLITO DE COMPETÊNCIA N. 3.608-SC
Relator: Ministro Assis Toledo
Autora: Justiça Pública
Réu: Arleny José Belotto
Suscitante: Juízo Federal da 7ª Vara de Joaçaba-SC
Suscitado: Juízo de Direito da 1ª Vara de Joaçaba-SC
EMENTA
Processual Penal. Competência. Crime contra a fauna.
Com o advento da Lei n. 7.653/1988, que elevou à categoria de
crime as condutas típicas contra a fauna e a fl ora silvestres, a Justiça
Federal passou a ser competente para o processo (art. 109, IV, da
Constituição Federal).
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 333-354, fevereiro 2010 353
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, não conhecer do confl ito e determinar
a remessa dos autos ao suscitante, Juízo Federal da 7ª Vara de Joaçaba-SC, nos
termos do voto do Relator. Votaram de acordo os Srs. Ministros Edson Vidigal,
Vicente Cernicchiaro, Adhemar Maciel, José Dantas, Pedro Acioli, Flaquer
Scartezzini e Costa Lima.
Brasília (DF), 03 de dezembro de 1992 (data do julgamento).
Ministro José Cândido, Presidente
Ministro Assis Toledo, Relator
DJ 17.12.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Assis Toledo: Trata-se de confl ito negativo de competência
suscitado pelo Juízo Federal da 7ª Vara de Joaçaba-SC, que se deu por
incompetente para inquérito que apura crime contra a fauna silvestre.
Nesta instância, a douta Subprocuradoria Geral da República, em
parecer da Dra. Delza Curvello Rocha, opina pelo conhecimento do confl ito,
declarando-se competente o suscitante.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Assis Toledo (Relator): Com o advento da Lei n.
7.653/1988, que elevou à categoria de crime as condutas típicas contra a fauna e
a fl ora silvestres, a Justiça Federal passou a ser competente para o processo, ex vi
do art. 109, IV, da Constituição Federal.
Nesse sentido, precedentes desta Seção (CC n. 1.074-SP, Relator Ministro
Costa Lima, DJ de 14.05.1990 e CC n. 3.369-9-SC, Relator Ministro Flaquer
Scartezzini, DJ de 16.11.1992).
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
354
Ante o exposto, acolhendo o parecer, não conheço do confl ito e declaro
competente o suscitante, Juízo Federal da 7ª Vara de Joaçaba-SC.
É o voto.
Súmula n. 92
SÚMULA N. 92
A terceiro de boa-fé não é oponível a alienação fi duciária não anotada no
Certifi cado de Registro do veículo automotor.
Referências:
Lei n. 4.728/1965, art. 66, §§ 1º e 10, na redação do Decreto-Lei n.
911/1969.
Lei n. 5.108/1966, art. 52.
Precedentes:
AgRg no Ag 22.669-BA (4ª T, 27.10.1992 — DJ 30.11.1992)
REsp 1.774-SP (4ª T, 10.04.1990 — DJ 30.04.1990)
REsp 13.958-SP (3ª T, 19.11.1991 — DJ 16.12.1991)
REsp 28.903-PR (3ª T, 24.11.1992 — DJ 17.12.1992)
Segunda Seção, em 27.10.1993
DJ 03.11.1993, p. 23.187
Republ. 24.11.1993, p. 25.301
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 22.669-BA
Relator: Ministro Sálvio de Figueiredo
Agravante: Banco do Nordeste do Brasil S/A
Advogados: Vera Lúcia Gila Piedadee e outros
Agravado: R. Despacho de fl s. 200-201
EMENTA
Civil. Alienação fiduciária de veículo automotor. Validade
contra terceiro de boa-fé. Necessidade de que conste do Certifi cado
do Registro previsto no art. 52 do Código Nacional de Trânsito.
Precedente. Agravo desprovido.
— Não encontra ressonância na jurisprudência da Quarta Turma
o entendimento de que, para valer contra terceiro de boa-fé, basta que
o contrato de alienação fi duciária, de veículo automotor, seja inscrito
no Cartório de Títulos e Documentos, adotada a orientação de ser
indispensável constar do Certifi cado do Registro, previsto no art. 52
do Código Nacional de Trânsito.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental.
Votaram com o Relator os Ministros Barros Monteiro, Bueno de Souza, Athos
Carneiro e Fontes de Alencar.
Brasília (DF), 27 de outubro de 1992 (data do julgamento).
Ministro Athos Carneiro, Presidente
Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Relator
DJ 30.11.1992
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
360
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo: Ao decidir o agravo interposto, com
vistas ao processamento do recurso especial inadmitido na origem, proferi a
seguinte decisão:
Em ação de interdito proibitório, movida pelo agravado, foi o pedido julgado
procedente na sentença e mantida a liminar que deferiu o mandato proibitório,
com as cominações ali constantes.
Ao negar provimento ao recurso o egrégio Tribunal de Justiça da Bahia lançou
acórdão assim ementado:
Ação possessória objetivando a defesa do possuidor de boa-fé sobre o
bem que adquiriu por compra e venda à fi rma que poderia vendê-lo.
A simples alegação afi rmativa do domínio sobre o bem questionado,
não afasta o possuidor de boa-fé da posse do bem questionado.
Irresignado, interpôs o réu recurso especial com fulcro nas alíneas a e c do
permissivo constitucional, alegando ofensa aos arts. 66 da Lei n. 4.728/1965, 135,
145, II e III, 146, 489, 491, 292, 505, 622, 1.324, CC, 37, 365, 458, II, 515, §§ 1º e 2º,
927, 932 e 933, CPC, além de dissenso interpretativo.
Inadmitido o recurso, manifestou-se o agravo.
Razão não assiste ao agravante.
O acórdão recorrido se orientou no mesmo sentido da jurisprudência
dominante nesta Corte, quanto à necessidade de averbação do contrato de
alienação fi duciária no Detran, quando se trate de veículo automotor, a fi m de
que tenha efi cácia erga omnes. Neste sentido se manifestou a Quarta Turma,
ao julgar o REsp n. 1.774-SP (DJ de 30.04.1990), relatado pelo Sr. Ministro Athos
Carneiro e assim ementado:
Alienação fi duciária de veículo automotor. Necessidade de sua anotação
no Certificado de Registro, previsto no art. 52 do Código Nacional de
Trânsito. Tutela a boa-fé de terceiros adquirentes. Lei n. 4.728/1965, art. 66, §
10, com a redação dada pelo Decreto-Lei n. 911/1969.
Alienação fi duciária de veículo automotor não é efi caz perante terceiros,
de boa-fé, se não constar do Certifi cado de Registro previsto no art. 52 do
CNT.
A lei deve ser aplicada com atenção aos fins sociais a que se dirige
e às exigências do bem comum. Regra do questionado § 10 apresenta-
se cogente, e busca tutelar a boa-fé dos adquirentes de veículos, ante a
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 355-377, fevereiro 2010 361
impossibilidade prática de pesquisa nos ofícios de títulos e documentos do
domicílio de eventuais credores fi duciários do vendedor do veículo.
Recurso especial conhecido pela alínea c, mas ao qual se nega
provimento.
Demais disso, a pretensão do recorrente, quanto à alínea a, remete a necessário
reexame de prova, inviável em sede especial, a teor do Enunciado n. 7 da súmula
deste Tribunal, valendo ainda consignar que não se trata de erro na valoração
jurídica da prova.
Quanto ao dissídio, não restou ele configurado. O paradigma não consta
estampado em repositório autorizado. Ademais, não se identificam as bases
fáticas das espécies em cotejo. O acórdão colacionado como divergente não se
refere à hipótese em que, se cuidando de bem alienado fi duciariamente, tenha
sido conferida ao possuidor de boa-fé a proteção dos interditos.
Pelo exposto, desprovejo o agravo.
Não se conformando, manejou o recorrente o agravo regimental que se
examina, reiterando as alegações de negativa de vigência aos arts. 66 da Lei n.
4.728/1965, 135, 145, 489, 492, 505, 622, 1.324, CC, 927 e 932, CPC, além de
reafi rmar a existência da divergência pretoriana quanto ao tema, especialmente
com a súmula/STF, Verbete n. 487, acrescentando trecho referente ao RE n.
85.669-RJ (DJ de 10.09.1976), que não constara da petição do recurso especial.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo (Relator): Não contemplo na
irresignação do agravante razões hábeis a infi rmarem a decisão que proferi.
O cerne do inconformismo reside na alegação de desnecessidade de que
conste do certifi cado do registro, previsto no art. 52 do Código Nacional de
Trânsito, a alienação fi duciária do veículo automotor, bastando, no entender da
recorrente, que o contrato seja registrado no Cartório de Títulos e Documentos,
para valer contra o terceiro de boa-fé. Tal pretensão como salientei na decisão
monocrática, não encontra ressonância na jurisprudência da Quarta Turma,
de que é exemplo o REsp n. 1.774-SP (DJ de 30.04.1990), da relatoria do Sr.
Ministro Athos Carneiro, cuja ementa transcrevi naquela oportunidade.
Pelo exposto, desprovejo o agravo.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
362
RECURSO ESPECIAL N. 1.774-SP (89.0012949-0)
Relator: Ministro Athos Carneiro
Recorrente: Finasa - Crédito, Financiamento e Investimento
Recorrido: Wliner Luiz Hamilton Moreira da Silva
Advogados: Carlos Alberto Ferreira e Antônio Carlos Pereira da Costa
EMENTA
Alienação fi duciária de veículo automotor. Necessidade de sua
anotação no Certifi cado de Registro, previsto no art. 52 do Código
Nacional de Trânsito. Tutela à boa-fé de terceiros adquirentes. Lei
n. 4.728/1965, art. 66, § 10, com a redação dada pelo Decreto-Lei n.
911/1969.
A alienação fi duciária de veículo automotor não é efi caz perante
terceiros, de boa-fé, se não constar do Certifi cado de Registro previsto
no art. 52 do CNT.
A lei deve ser aplicada com atenção aos fi ns sociais a que se
dirige e às exigências do bem comum. A regra do questionado § 10
apresenta-se cogente, e busca tutelar a boa-fé dos adquirentes de
veículos, ante a impossibilidade prática de pesquisa nos ofícios de
Títulos e Documentos do domicílio de eventuais credores fi duciários
do vendedor do veículo.
Recurso especial conhecido pela alínea c, mas ao qual se nega
provimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados os autos, em que são partes as acima indicadas, decide
a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer
do recurso pela alínea c e negar-lhe provimento, na forma do relatório e notas
taquigráfi cas precedentes que integram o presente julgado. Custas, como de
lei.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 355-377, fevereiro 2010 363
Brasília (DF), 10 de abril de 1990 (data do julgamento).
Ministro Athos Carneiro, Presidente e Relator
DJ 30.04.1990
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Athos Carneiro: Em ação de busca e apreensão de bem
alienado fi duciariamente, com conversão em ação de depósito, foram opostos
embargos de terceiros por Wliner Luiz Hamilton Moreira da Silva contra Finasa
— Crédito, Financiamento S/A, visando manter a posse de um veículo automotor,
que o autor afi rma haver adquirido do legítimo dono e sem ônus algum. Teve
êxito em 1º grau de jurisdição.
Apreciando apelação da ré, o 1º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo,
por sua Quinta Câmara, negou provimento ao recurso, entendendo que a
entidade fi nanciadora não teria agido diligentemente. O Tribunal a quo julgou
que embora a transação com o veículo tivesse sido fi nanciada, com registro
do contrato de alienação fi duciária no Cartório de Títulos e Documentos,
anteriormente à aquisição pelo autor embargante, seria necessária, ainda, a sua
apresentação na repartição de trânsito para que ocorresse a efi cácia erga omnes.
O embargante, pois, foi considerado adquirente de boa-fé.
Irresignado, interpôs Finasa — Crédito, Financiamento e Investimento S/A
recurso especial com fundamento no art. 105, III, letras a e c da Constituição
Federal, alegando negativa de vigência aos arts. 66 da Lei n. 4.728/1965 e 129,
§ 5º, da Lei n. 6.015/1973, e divergência com a Súmula n. 489 do STF e com
os RREE n. 85.669, in “RT Informa” 161/17, e n. 88.059, DJ de 31.03.1978,
p. 1.833, bem como com julgados publicados in RTJ 73/322, 74/872, 78/316,
78/664, 85/345 e, ainda, RT 540/221. (fl s. 200-209)
Em impugnação sustenta o recorrido o acerto da decisão hostilizada,
alegando ser imprescindível a apresentação de Certifi cado de Propriedade
fornecido pela autoridade competente, no caso o Detran, a fi m de se caracterizar
a oponibilidade a terceiros de boa-fé, consoante jurisprudência uniformizada do
2º TACSP (RT 484/161).
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
364
Deferindo o processamento do recurso especial, o eminente Presidente do
Tribunal a quo assim resumiu a lide:
A questão debatida nos autos diz respeito a ser o embargante considerado
com direito ao veículo, como terceiro de boa-fé, por tê-lo adquirido de pessoa
que lhe apresentou certifi cado de propriedade livre de quaisquer ônus, ou se
sua aquisição foi a non domino, por estar o veículo alienado à fi nanciadora, com
direito oponível erga omnes em decorrência do registro de contrato fi duciário,
anterior à aquisição.
Não se pode negar, de início, o caráter controvertido do tema. Paulo Restife
Neto, por exemplo, em sua obra “Garantia Fiduciária”, ensina que não basta o
registro do contrato de alienação fi duciária no Cartório de Títulos e Documentos
para que se possa opô-lo a terceiro de boa-fé, sendo necessário, ainda, que a
cláusula de garantia conste do Certifi cado de Registro a que se refere o art. 52 do
Código Nacional de Trânsito.
Por outro lado, o Ministro Moreira Alves, em sua monografi a “Da Alienação
Fiduciária em Garantia” preconiza a tese de que a anotação no certificado
de propriedade é subsidiária, destinando-se a fins probatórios, facilitando o
conhecimento da alienação a terceiros. O registro do contrato no Registro de
Títulos e Documentos é que estabelece o direito contra terceiros.
A jurisprudência, por sua vez, ora adota o primeiro entendimento, ora o
segundo.
Parece-nos, no entanto, prevalecer a segunda teoria (RT 497/242, RTJs 85/326,
86/345, JTACSP 102/55, entre outros), dotada de argumentação mais convincente,
em conseqüência da maior juridicidade de seus fundamentos.
Com efeito, ao exigir o registro do contrato de alienação fi duciária no Registro
de Títulos e Documentos, comina a lei, à sua falta, a sanção da inefi cácia perante
terceiros (art. 66, § 1º, da Lei n. 4.728/1965, com a redação do Decreto-Lei n.
911/1969 e art. 129 da Lei n. 6.015/1973). Diversamente, confere finalidade
meramente probatória à averbação do gravame no Certifi cado de Registro do
veículo automotor (art. 66, § 10, da mencionada lei).
Assim, dada a diversidade de natureza, conferida pela legislação a ambas as
incrições, conclui-se que apenas a primeira tem efi cácia constitutiva do direito
real, que é a propriedade fi duciária. Corroborando este entendimento existe a
orientação consubstanciada na Súmula n. 489 do Supremo Tribunal Federal, de
teor seguinte: “A compra e venda de automóvel não prevalece contra terceiros de
boa-fé, se o contrato não foi transcrito no Registro de Títulos e Documentos”.
Aconselhável, pois, não tenha o apelo seu curso obstado, possibilitada a
manifestação do Superior Tribunal de Justiça acerca das prováveis negativa de
vigência aos textos legais mencionados e divergência jurisprudencial apontada.
(fl s. 210-211)
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 355-377, fevereiro 2010 365
Com contra-razões ao recurso especial (fl s. 219-221) subiram os autos a
esta egrégia Corte (fl . 222).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Athos Carneiro (Relator): 1. A matéria, como bem frisou
o ilustre Presidente do colegiado de origem, é eminentemente polêmica. O
colendo Supremo Tribunal Federal, após vacilações, fi rmou o entendimento
consubstanciado na Súmula n. 489, verbis: “A compra e venda de automóvel não
prevalece contra terceiros, de boa-fé, se o contrato não foi transcrito no Registro
de Títulos e Documentos”.
Entretanto, o art. 66 da Lei n. 4.728/1965, com a redação dada pelo
Decreto-Lei n. 911/1969, prevê em seu § 10 o registro da alienação fi duciária
também no Certifi cado expedido pela autoridade do trânsito: “§ 10. A alienação
fi duciária em garantia de veículo automotor deverá, para fi ns probatórios, contar
de Certifi cado de Registro, a que se refere o art. 52 do Código Nacional de
Trânsito”.
Formula-se, então, a indagação, que constitui o cerne da notória contenda
doutrinária e jurisprudencial: para a alienação prevalecer contra o terceiro que
comprou de boa-fé o veículo, é bastante a transcrição do contrato fi duciário no
ofício de Títulos e Documentos, ou ainda se faz necessário haja o interessado
providenciado também no registro da alienação fi duciária no documento de
propriedade expendido pela repartição de trânsito?
2. O Pretório excelso, na exegese da súmula, decidia pela desnecessidade
do lançamento do ônus no Certifi cado de Registro previsto no CNT, bastando,
para a validade da alienação fi duciária perante terceiros, o registro do respectivo
instrumento no ofício de Títulos e Documentos. Assim a egrégia Segunda
Turma, no RE n. 85.669, ac. de 24.08.1976, Relator o eminente Ministro
Xavier de Albuquerque, in RTJ 79/664; a mesma egrégia Segunda Turma no
RE n. 113.171, ac. de 04.12.1987, Relator o eminente Ministro Francisco
Rezek. Neste segundo aresto é feita expressa menção ao magistério do eminente
Ministro Moreira Alves, em sua monografia “Da Alienação Fiduciária em
Garantia” (Saraiva, ed. 1973. pp. 73-74), no sentido de que o registro no ofício
de Títulos e Documentos será “constitutivo de direito real, que é a propriedade
fi duciária”, enquanto a averbação no documento previsto no CNT se destina
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
366
“a fi ns probatórios, facilitando o conhecimento da alienação fi duciária em
garantia”. Menciona, ainda, o v. aresto que a norma do Decreto n. 4.857/1939,
art. 153-A, acrescentado pelo Decreto n. 63.997/1969, segundo a qual não
valeria contra terceiros a alienação fi duciária de veículo automotor se não
constasse do Certifi cado de Registro previsto no art. 52 do CNT, tal norma
regulamentar não pode prevalecer, pois contida “em mero decreto e claramente
exorbitante do preceito legal pertinente” (RTJ, 73/323).
3. Rogo vênia, eminentes colegas, para renovar ponderação que vezes
muitas já expressei, inclusive, quando decidimos a respeito da eficácia da
promessa de compra e venda de imóvel não registrada no ofício imobiliário,
face penhora efetuada a requerimento de credor do promitente-vendedor. É a
preocupação com as conseqüências sociais de nossos julgados, com aquilo que
ocorre no dia-a-dia do relacionamento negocial entre as pessoas comuns, entre
as pessoas do povo.
Peço vênia, aqui, para transcrever trecho de voto proferido pelo Relator
Desembargador Marco Cécer (LEX, “Jurisprudências dos Tribunais de Alçada
Civil de SP”, v. 89, pp. 29-30) no julgamento da Apelação n. 326.187 pela
egrégia Primeira Câmara do 1º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, ac. de
12.06.1984:
Conforme bem lembrou Filadelfo Azevedo, citado na Uniformização de
Jurisprudência em Embargos Infringentes n. 11.564, do egrégio Segundo Tribunal
de Alçada Civil de São Paulo, que adotou a tese ora acolhida (“Revista dos
Tribunais”, vol. 484/161), “a publicidade que o Registro de Títulos e Documentos
proporciona não supera os limites da fi cção, pela quase impossibilidade total que
terceiros têm na consulta a esses registros, para verifi car a situação de determinado
bem”. Outrossim, existindo a previsão de registro perante a autoridade de trânsito,
a fi m de constar do próprio Certifi cado de Registro, também conhecido como
Certifi cado de Propriedade, a alienação fi duciária é manifesto que dispensá-lo,
e aceitar a prevalência de quase hipotética publicidade advinda do registro de
títulos e documentos, é inverter a ordem lógica do tema, fazendo que o registro
de veículos da repartição de trânsito, local próprio para consignar-se os dados
sobre os veículos automotores, inclusive alienação fi duciária, fi que em segundo
plano, quando é precisamente de sua consulta que qualquer pessoa, e facilmente,
pode assenhorar-se de tais dados.
4. Diga-se, aliás que o Tribunal de Justiça de São Paulo, julgando
procedentes embargos de terceiro ajuizados por fi nanciadora, tem entendido que
o lançamento da alienação fi duciária no Registro de Propriedade de Veículos
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 355-377, fevereiro 2010 367
previsto no CNT é sufi ciente para comprovar tal alienação, embora omitido o
respectivo registro no ofício de Títulos e Documentos. Vale transcrever trecho
do aresto (“Revista de Jurisprudência do TJ do Estado de SP”, 74/47) da
Décima Quarta Câmara Civil daquele Pretório, ac. de 05.08.1981, Relator o
eminente Desembargador Geraldo Roberto:
Em 16.01.1969, o Decreto n. 63.997 inseria no art. 134 da LRP de 1939 o
arquivamento da cópia ou microfi lme do instrumento público ou particular de
contrato de alienação fi duciária em garantia de veículo automotor somente teria
validade contra terceiros se constasse do Certifi cado de Registro referido pelo art.
52 do CNT. Note-se a reiteração de registros com o mesmo objetivo de validade
contra terceiros.
Não faltou quem criticasse a possibilidade de simples decreto assim dispor.
Mas logo sobreveio o Decreto-Lei n. 911, de 1º.10.1969, alterando a redação do
art. 66 da Lei n. 4.728, de 14.07.1965. Manteve o arquivamento da cópia no registro
de títulos e documentos, sob pena de não valer contra terceiros, do § 1º, se bem
que com nota, agora expressa, de obrigatoriedade; e no § 10, acrescentado,
estabeleceu que a alienação fi duciária de veículo automotor deveria constar do
Certifi cado de Registro do art. 52 do CNT, “para fi ns obrigatórios”.
Não faltou quem visse nessa aparente diferença de objetivos dos dois
registros a concretização daquele desejo de Serpa Lopes: o Registro de Títulos e
Documentos teria efi cácia constitutiva do direito real, ao passo que o Certifi cado
de Registro do Detran serviria para o conhecimento da alienação a terceiros.
Entretanto, doutrina e jurisprudência repetem que nem o registro no Cartório
de Títulos e Documentos, nem o registro no Departamento de Trânsito fazem o
papel da transcrição imobiliária, pois não integram a aquisição da propriedade
móvel ou automóvel como elemento essencial (art. 620 do CC). Aqueles registros
de alienação de coisa móvel ou automóvel não são constitutivos do direito real,
bastando a tradição com o ânimo de transferir a propriedade.
Conseqüentemente, ambos (inserido o do Registro de Títulos e Documentos
na atual Lei de Registros Públicos — art. 129, 5º e 7º, da Lei n. 6.015, de 31.12.1973,
com a redação dada pela Lei n. 6.216, de 30.06.1975) têm a mesma fi nalidade
probatória de fi xar data para validade contra terceiros. Tem-se que o alcance do
mesmo e comum objetivo autoriza que a falta de um seja suprida pela presença
do outro.
Aliás é importante ressaltar que o registro nas repartições de trânsito tem
muito mais condições de constituir um cadastramento, do que o registro no
Cartório de Títulos e Documentos considerada a estruturação daquele, que
pretende formar um Registro Nacional de Veículos (arts. 52 a 56 do CNT).
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
368
Assim, a contestação aos embargos de terceiro e o apelo da Fazenda do
Estado não podem contar com a falta do Registro de Títulos e Documentos
para a rejeição dos mesmos embargos da fi nanciadora, posto que foi registrada
a garantia da alienação fi duciária na repartição de trânsito. Esta é, de resto
muito mais conhecida e solicitada do que os Cartórios de Registro de Títulos e
Documentos.
5. Considero, eminentes colegas, que a regra do § 10 do art. 66 da Lei n.
4.728/1965 (red. do Decreto-Lei n. 911/1969) teve exatamente o propósito, o
objetivo de estabelecer, relativamente aos veículos automotores, e ponderadas
as características especiais de sua comercialização, uma sistemática própria
de registro em defesa dos adquirentes de boa-fé, confi antes nos lançamentos
constantes dos Registros de Propriedade expedidos pela autoridade de trânsito.
Se a averbação da alienação fiduciária é necessária “para fins probatórios”
— dispõe a lei de forma cogente: “deverá constar” —, isto não signifi ca uma
mera fórmula ou expediente para “facilitar” aos terceiros o conhecimento da
transação anteriormente feita com empresa fi nanceira. É tal averbação, para os
veículos automotores que prova a alienação fi duciária; sem ela, para os terceiros
a alienação não estará provada, não será, pois, efi caz, e resguardada permanecerá
a boa-fé daquele que transacione confi ante nos dizeres do Certifi cado de
Propriedade emitido pelo órgão ofi cial do Estado, órgão ao qual está confi ada
exatamente a tarefa de instituir um registro nacional de propriedade dos
veículos.
Bem sublinhou o advogado Nicolau Pítsica (“Jurisprudência Catarinense”,
n. 53/33) que a exegese literal e simples de textos legais poderá levar a
“verdadeiros equívocos ou a positivismos jurídicos extremados”. Lembrou
Recasens Siches: “Isto significa que uma ordem jurídica positiva não pode
funcionar atendo-se exclusivamente ao que está nela formulado. Para que uma
ordem jurídica funcione, e sobretudo para que funcione satisfatoriamente, é
muitas vezes indispensável recorrer a princípios ou critérios implícitos, mas que
devem operar como postulados inelutáveis” (“Experiência Jurídica”, pp. 537-
538).
Mais ainda aplica-se tal magistério, devo aditar, em existindo norma
explícita exigente de que a alienação fi duciária conste do Certifi cado de Registro
do veículo. Não será possível, a meu sentir, desconsiderar a boa-fé daquele que
negocia como todos o fazem, fi ado no documento da repartição de trânsito,
inclusive pela impossibilidade prática de consulta aos ofícios de Títulos e
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 355-377, fevereiro 2010 369
Documentos de nosso imenso país, a buscar eventuais alienações a empresas
fi nanciadoras cujo domicílio poderá estar em qualquer Estado.
6. O eminente Des. Youssef Said Cahali, em sua consagrada obra
“Garantia Fiduciária”, considerou “oportuno lembrar que o Projeto de Código
Civil, em tramitação no Congresso Nacional, consolidou as regras esparsas
e consagrou o princípio da necessidade do registro da cláusula fi duciária de
veículos na repartição competente para o licenciamento, ao dispor no § 1º do art.
1.393: “Constitui-se a propriedade fi duciária com o arquivamento do contrato,
celebrado por instrumento público ou particular, que lhe serve de título, no
registro de Títulos e Documentos do domicílio do devedor, ou, em se tratando
de veículos, na repartição competente para o licenciamento, fazendo-se a anotação no
certifi cado de propriedade” (ob. cit., RT, 2ª ed., 1976, p. 157).
Ao fi m e ao cabo, não será demasia trazer à colação que o 2º Tribunal de
Alçada Civil de São Paulo, em Incidente de Uniformização de Jurisprudência
no EI n. 11.564, ac. de 06.11.1975, por votação unânime afi rmou a tese de
que “para ter efi cácia contra terceiros, o instrumento da alienação fi duciária
em garantia de veículo automotor deverá ser transcrito no Registro de Títulos
e Documentos e também constar no Certifi cado de Registro do Serviço de
Trânsito” (Revista dos Tribunais, 484/161).
A lei deve ser interpretada, cumpre ser aplicada com atenção “aos fi ns
sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum” (Lei de Introdução
ao CC, art. 5º). É o caso. Nada mais razoável do que exigir que as fi nanceiras,
adquirentes fi duciárias, providenciem na anotação da garantia no Certifi cado de
Propriedade do veículo fi duciariamente alienado; nada mais difícil ao adquirente
de veículo do que pesquisar e rebuscar eventuais registros de instrumentos de
alienação fi duciária no domicílio do credor, tornando tal registro, como meio
de publicidade, a mais hipotética das fi cções; nada mais adequado, portanto,
às exigências do bem comum, atribuir à efi cácia probatória do cogente registro
instituído no questionado § 10 do art. 66 da Lei n. 4.728/1965 (Decreto-
Lei n. 911/1969), a conseqüência de tutelar a boa-fé de terceiros adquirentes,
funcionando como pressuposto de oponibilidade, aos mesmos, de eventuais
alienações fi duciárias de veículos automotores.
Pelo exposto, conheço do recurso pela alínea c, mas ao mesmo nego
provimento.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
370
RECURSO ESPECIAL N. 13.958-SP (91175170)
Relator: Ministro Nilson Naves
Recorrente: Finama - Auto Financiamento S/C Ltda
Recorrido: José Otávio de Andrade
Advogados: Paulo Dárcio Pereira Baptista e outros e Valdir Tejada Sanches
e outro
EMENTA
Alienação fi duciária de veículo automotor. Terceiro de boa-fé.
Para que a alienação fi duciária tenha validade contra terceiros de
boa-fé, impõe-se que tal conste, também, do certifi cado expedido pela
repartição de trânsito. Lei n. 4.728/1965, art. 66, § 10, na redação do
Decreto-Lei n. 911/1969. Precedente do STJ: REsp n. 1.774. Recurso
especial conhecido pelo dissídio mas improvido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide
a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer
do recurso especial, mas lhe negar provimento, na forma do relatório e notas
taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Brasília (DF), 19 de novembro de 1991 (data do julgamento).
Ministro Nilson Naves, Presidente e Relator
DJ 16.12.1991
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Nilson Naves: Embargos de terceiro, em caso de busca e
apreensão de veículo automotor alienado fi duciariamente, foram assim relatados
na sentença:
José Otávio de Andrade, qualifi cado na inicial, ajuizou os presentes embargos
de terceiro contra Finama — Auto Financiamento S/C Ltda, pessoa jurídica de
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 355-377, fevereiro 2010 371
direito privado, alegando que adquirira, como terceiro de boa-fé, o veículo marca
Volkswagen, Quantun, GL, cor zul, ano 1986, modelo 1987, placas TA 9427, chassi
9BWZZZ33ZHP207718, que foi apreendido nos autos de busca e apreensão que a
ré move a Marcos Alfredo Ávila (Processo n. 1.874/1988). Alega ainda que, quando
comprou o veículo em questão, não constava nos documentos que o mesmo
encontrava-se alienado fi duciariamente ( reserva de domínio). Requereu liminar
(fl s. 02-04).
Com a inicial os documentos de fls. 05-11 consistentes em Certificado de
Registro (fl s. 05-06), guia de recolhimento do IPVA (fl s. 07-10) e auto de busca e
apreensão (fl . 11).
Em aditamento à inicial o embargante aduz que o veículo possuía, em São José
do Rio Preto, as placas KI 3727 e, quando foi transferido para São Paulo, passou
pelo Detran onde recebeu a licença TA 9427 e teve o Certifi cado de Registro
expedido ‘sem reserva de domínio’ para o anterior proprietário.
Às fl s. 54-57, declaração de incompetência absoluta do Juízo do Setor de Cartas
Precatórias da Comarca de São Paulo onde foi cumprida a busca e apreensão.
Recebidos os embargos, sem o deferimento da liminar, a embargada contestou
às fl s. 60-66 dizendo que o contrato de alienação fi duciária foi registrado no
Cartório de Títulos e Documentos de São José do Rio Preto no livro C. 9, fl . 286,
n. 01. Acrescenta que na Ciretran local encontra-se arquivado no prontuário do
veículo em questão cópia da cessão do Contrato de Alienação Fiduciária.
A sentença julgou improcedentes os embargos, acolhendo a defesa da
embargada, no sentido de privilegiar o registro cartorário.
2. Apelou o embargante, com êxito, in verbis:
Entre duas pessoas de boa-fé, a empresa e o particular, que detém a posse do
bem e que nada contribuiu para a fraude (o certifi cado policial não continha o
ônus), este Relator tem fi cado com o particular lesado.
É que, evidentemente, por lidar com milhares de casos, as financiadoras
têm condições (o Itaú, faz isto, por experiência própria) de exigir e juntar ao
procedimento administrativo de financiamento uma cópia do certificado do
veículo, e então, se evitará a fraude.
Por isto, dá-se provimento ao apelo, julgando-se procedente os embargos de
terceiro, consolidando-se a posse nas mãos do apelante, invertidos os encargos
do decaimento.
3. Recorreu a embargada, com fundamento no art. 105, inciso III, alíneas
a e c da Constituição, e o Presidente Osvaldo Caron admitiu o especial, nestes
termos:
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
372
Interpõe recurso especial a vencida, com fundamento no art. 105, inciso III,
letras a e c da Constituição da República. Alega negativa de vigência aos arts. 66,
§ 1º, da Lei n. 4.728/1965, com a nova redação dada pelo Decreto-Lei n. 911/1969
e 129, n. 5, da Lei n. 6.019/1973. Sustenta que como credora registrou o contrato
de alienação fi duciária no Cartório de Registro de Títulos e Documentos de sua
sede, conforme prescrição legal, em data anterior à transferência operada em
nome do recorrido. Afi rma não poder este último alegar boa-fé, pois o registro
é efi caz contra todos. Assevera ser desnecessário o registro do Detran, tendo em
vista o seu caráter probatório (§ 10 do art. 66 da Lei n. 4.728/1965). Traz como
divergentes os julgados grafados in RJTJESP 108/277, RTs 608/163 e 540/221,
RTJs 73/322, 74/872, 78/316, 79/664 e 80/783, boletim de Jurisprudência Adcoas
60.831 e Decisões em Consórcio, Abaec, Tomo II, p. 81 e transcreve a ementa do RE
n. 88.059/3 e cita o RE n. 80.476.
Houve contra-razões (fl s. 117-119).
Improcede a pretendida negativa de vigência aos dispositivos arrolados pela
recorrente.
A alienação fi duciária de veículo automotor não é efi caz perante terceiros de
boa-fé, se não constar do Certifi cado de Registro previsto no art. 52 do Código
Nacional de Trânsito. Isto porque, a lei deve ser aplicada com atenção aos fi ns
sociais a que se dirige e às exigências do bem comum. O § 10 do art. 66 da Lei
n. 4.728/1965, com a redação dada pelo Decreto-Lei n. 911/1969, ao revés do
sustentado, apresenta-se cogente, e busca tutelar a boa-fé dos adquirentes de
veículos, ante a impossibilidade prática de pesquisa de pessoas nos ofícios de
Títulos e Documentos do domicílio de eventuais credores fi duciários do vendedor
do veículo. Este é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no Recurso
Especial n. 17.774-SP, Relator Ministro Athos Carneiro, in DJ de 30.04.1990, p.
3.528.
Quanto à alínea c do permissivo constitucional melhor sorte não socorre à
recorrente.
Os julgados grafados in Boletim de Jurisprudência Adcoas, RJTJSP e Decisões
em Consórcio, Abaec, Tomo II, p. 81, não servem para confronto porque não são
repertórios ofi ciais ou autorizados.
O aresto estampado in RT 608/163 não serve para demonstração do dissídio,
por não se tratar de veículo automotor.
Da mesma forma o RE n. 88.059-3, por ter sido somente transcrita a ementa
(art. 255 e parágrafos do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça).
No entanto, restou configurado o dissídio jurisprudencial com os arestos
publicados in RT 540/221 e RTJ 73/322, que entendem ser apenas necessário
para justifi car o pedido de busca e apreensão de veículos sujeitos à alienação
fi duciária em garantia a inscrição do respectivo contrato no Registro de Títulos
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 355-377, fevereiro 2010 373
e Documentos, dispensada a anotação no certifi cado a que se refere o art. 52 do
Código Nacional de Trânsito.
4. Isto posto, defi ro o recurso pela alínea c.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Nilson Naves (Relator): Qual o despacho de origem, cujos
fundamentos acolho, o recurso tem conhecimento pela alínea c do permissivo,
comprovado o dissídio, por exemplo, com o acórdão da RTJ 73/322, Sr. Ministro
Xavier de Albuquerque, com essa ementa: “Alienação fi duciária de veículo
automotor. Vale contra terceiros, se registrado o respectivo instrumento no
Registro de Títulos e Documentos, independentemente de constar, ou não, do
Certifi cado de Registro a que alude o art. 52 do Código Nacional de Trânsito.
Recurso extraordinário conhecido e provido”. Portanto, conheço do especial.
2. Discute-se sobre a validade da alienação fi duciária de veículo automotor,
que não tenha constado do certifi cado expedido por repartição de trânsito,
embora tenha o seu instrumento obtido registro cartorário. Acerca desse assunto,
pronunciou-se a Quarta Turma, no REsp n. 1.774 (e não 17.774, como fi gurou
no despacho de origem), Sr. Ministro Athos Carneiro, com essa ementa:
Alienação fi duciária de veículo automotor. Necessidade de sua anotação no
Certifi cado de Registro, previsto no art. 52 do Código Nacional de Trânsito. Tutela
à boa-fé de terceiros adquirentes. Lei n. 4.728/1965, art. 66, § 10, com a redação
dada pelo Decreto-Lei n. 911/1969.
A alienação fi duciária de veículo automotor não é efi caz perante terceiros, de
boa-fé, se não constar do Certifi cado de Registro previsto no art. 52 do CNT.
A lei deve ser aplicada com atenção aos fins sociais a que se dirige e às
exigências do bem comum. A regra do questionado § 10 apresenta-se cogente, e
busca tutelar a boa-fé dos adquirentes de veículos, ante a impossibilidade prática
de pesquisa nos ofícios de Títulos e Documentos do domicílio de eventuais
credores fi duciários do vendedor do veículo.
Recurso especial conhecido pela alínea c, mas ao qual se nega provimento.
Disse S. Exa., em seu voto, nessas passagens:
5. Considero, eminentes colegas, que a regra do § 10 do art. 66 da Lei n.
4.728/1965 (red. do Decreto-Lei n. 911/1969) teve exatamente o propósito, o
objetivo de estabelecer, relativamente aos veículos automotores, e ponderadas
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
374
as características especiais de sua comercialização, uma sistemática própria
de registro em defesa dos adquirentes de boa-fé, confi antes nos lançamentos
constantes dos Registros de Propriedade expedidos pela autoridade de trânsito.
Se a averbação da alienação fiduciária é necessária ‘para fins probatórios’ —
dispõe a lei de forma cogente: ‘deverá constar’ —, isto não signifi ca uma mera
fórmula ou expediente para ‘facilitar’ aos terceiros o conhecimento da transação
anteriormente feita com empresa fi nanceira. É tal averbação, para os veículos
automotores, que prova a alienação fiduciária; sem ela, para os terceiros a
alienação não estará provada, não será, pois efi caz, e resguardada permanecerá
a boa-fé daquele que transacione confiante nos dizeres do Certificado de
Propriedade emitido pelo órgão ofi cial do Estado, órgão ao qual está confi ada
exatamente a tarefa de instituir um registro nacional de propriedade dos veículos.
Bem sublinhou o advogado Nicolau Pítsica (‘Jurisprudência Catarinense’,
n. 53/1933) que a exegese literal e simples de textos legais poderá levar a
‘verdadeiros equívocos ou a positivismos jurídicos extremados’. Lembrou
Recasens Siches: ‘Isto significa que uma ordem jurídica positiva não pode
funcionar atendo-se exclusivamente ao que está nela formulado. Para que uma
ordem jurídica funcione, e sobretudo para que funcione satisfatoriamente, é
muitas vezes indispensável recorrer a princípios ou critérios implícitos, mas que
devem operar como postulados inelutáveis’ (‘Experiência Jurídica’, pp. 537-538).
Mais ainda aplica-se tal magistério, devo aditar, em existindo norma explícita
exigente de que a alienação fiduciária conste do Certificado de Registro do
veículo. Não será possível, a meu sentir, desconsiderar a boa-fé daquele que
negocia como todos o fazem, fi ado no documento da repartição de trânsito,
inclusive pela impossibilidade prática de consulta aos ofícios de Títulos e
Documentos de nosso imenso país, a buscar eventuais alienações a empresas
fi nanciadoras cujo domicílio poderá estar em qualquer Estado.
6. O eminente Desembargador Yussef Said Cahali, em sua consagrada obra
‘Garantia Fiduciária’, considerou oportuno lembrar que o Projeto de Código Civil,
em tramitação no Congresso Nacional, consolidou as regras esparsas e consagrou
o princípio da necessidade do registro da cláusula fiduciária de veículos na
repartição competente para o licenciamento, ao dispor no § 1º do art. 1.393:
‘Constitui-se a propriedade fi duciária com o arquivamento do contrato, celebrado
por instrumento público ou particular que lhe serve de título, no registro de
Títulos e Documentos do domicílio do devedor, ou, em se tratando de veículos,
na repartição competente para o licenciamento, fazendo-se a anotação no
certifi cado de propriedade’ (ob. cit., RT, 2ª ed., 1976, p. 157).
Ao fi m e ao cabo, não será demasia trazer à colação que o 2º Tribunal de
Alçada Civil de São Paulo, em Incidente de Uniformização de Jurisprudência no
EI n. 11.564, ac. de 06.11.1975, por votação unânime afi rmou a tese de que ‘para
ter efi cácia contra terceiros, o instrumento da alienação fi duciária em garantia de
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 355-377, fevereiro 2010 375
veículo automotor deverá ser transcrito no Registro de Títulos e Documentos e
também constar no Certifi cado de Registro do Serviço de Trânsito’ (Revista dos
Tribunais, 484/161).
A lei deve ser interpretada, cumpre ser aplicada com atenção ‘aos fi ns sociais
a que ela se dirige e às exigências do bem comum’ (Lei de Introdução ao CC, art.
5º). É o caso. Nada mais razoável do que exigir que as fi nanceiras, adquirentes
fi duciárias, providenciem na anotação da garantia no Certifi cado de Propriedade
do veículo fi duciariamente alienado; nada mais difícil ao adquirente de veículo
do que pesquisar e rebuscar eventuais registros de instrumentos de alienação
fi duciária no domicílio do credor, tornando tal registro, como meio de publicidade,
a mais hipotética das fi cções; nada mais adequado, portanto, às exigências do
bem comum, atribuir à eficácia probatória do cogente registro instituído no
questionado § 10 do art. 66 da Lei n. 4.728/1965 (Decreto-Lei n. 911/1969), a
conseqüência de tutelar a boa-fé de terceiros adquirentes, funcionando como
pressuposto de oponibilidade, aos mesmos, de eventuais alienações fi duciárias
de veículos automotores.
3. Adotando tal orientação, no que tem a ver com o aludido § 10 do art. 66
da Lei n. 4.728, na redação do Decreto-Lei n. 911, nego provimento ao recurso
especial.
RECURSO ESPECIAL N. 28.903-PR (92.0027863-9)
Relator: Ministro Eduardo Ribeiro
Recorrente: Roldão Ferreira dos Reis
Recorrida: Gulin Administradora de Consórcios S/C Ltda
Advogados: Sérgio Luiz Peixer e outro e Luiz Osório Cardoso Martins
EMENTA
Alienação fi duciária. Veículo automotor.
A alienação fi duciária, tratando-se de veículo automotor, há de
ser consignada no respectivo Certifi cado de Registro, como determina
o § 10 do art. 66 da Lei n. 4.728/1965. Não basta o arquivamento no
Registro de Títulos e Documentos, ao contrário do que sucede com
outros bens.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
376
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso especial e lhe dar
provimento. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Dias Trindade, Waldemar
Zveiter, Cláudio Santos e Nilson Naves.
Brasília (DF), 24 de novembro de 1992 (data do julgamento).
Ministro Eduardo Ribeiro, Presidente e Relator
DJ 17.12.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro: Cuida-se de embargos de terceiro,
ajuizados por Roldão Ferreira dos Reis e outro, contra Gulin Administradora de
Consórcios S/C Ltda, objetivando liberar veículo, objeto de busca e apreensão.
Afi rmaram que adquirido o bem, livre e desembaraçado, não constando ônus
algum no certifi cado de propriedade.
O Juízo de primeiro grau deu pela improcedência do pedido, cassando a
liminar.
Negando provimento à apelação, a Sétima Câmara Cível do Tribunal de
Alçada do Estado do Paraná entendeu efi caz, em relação a terceiros, “a cláusula
de alienação registrada em cartório ainda que não conste do certifi cado de
registro, mormente se fato que tal decorreu de ato doloso e fraudulento”.
No especial, o embargante alegou cerceamento de defesa, por indeferida a
prova que requereu, vulnerado o art. 130 do CPC. Sustentou que contrariado o
art. 1º, § 10, do Decreto-Lei n. 911/1969, que reformulou o art. 66, § 1º, da Lei
n. 4.728/1965, afi rmando, ainda, existir dissenso com julgados, inclusive desta
Corte. Relacionou-os.
Recurso admitido e processado.
É o relatório.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 355-377, fevereiro 2010 377
VOTO
O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro (Relator): A propósito do tema esta
Terceira Turma tem jurisprudência fi rme. Reproduzo o voto que proferi no
julgamento do REsp n. 19.299:
O § 1º do art. 66 da Lei n. 4.728/1965, redação do Decreto-Lei n. 911/1969,
estabelece que o instrumento do contrato de alienação fi duciária haverá de ser
arquivado no Registro de Títulos e Documentos, “sob pena de não valer contra
terceiros”. O § 10 do mesmo artigo, por outro lado, dispõe deva constar do
Certifi cado de Registro do veículo, para fi ns probatórios, referência à alienação
fi duciária.
Não se há de considerar como destituído de conseqüências o desatendimento
a essa última determinação. Nem existe incompatibilidade entre os dois
dispositivos. O § 1º refere-se à alienação fiduciária dos bens em geral, não
relevando em que consistam. O § 10 é de aplicação restrita aos veículos
automotores, classe de móveis para os quais existe um registro especial.
Em verdade, de escassa utilidade o arquivamento no Registro de Títulos e
Documentos. Devendo fazer-se no domicílio do credor, a pesquisa do eventual
adquirente, a quem interessa verifi car se existe a alienação, haverá de estender-
se por todo o território nacional. Com razão observou o Ministro Athos Carneiro
que a publicidade, por tal meio, só existirá como “a mais hipotética das fi cções”.
Fê-lo ao julgar o REsp n. 1.774, cuja ementa foi transcrita no acórdão recorrido. No
mesmo sentido decidiu esta Terceira Turma, ao apreciar o REsp n. 13.958, Relator o
Ministro Nilson Naves (DJ de 16.12.1991).
Mencionou-se no acórdão que a circunstância de encontrar-se
fi duciariamente alienado o veículo constava do certifi cado, e que “o ato de
venda, com a eliminação do gravame, foi doloso e fraudulento, não podendo,
por isso, gerar direito em favor do terceiro”. Vê-se que não imputado qualquer
procedimento doloso aos recorrentes cuja boa-fé, aliás, a sentença expressamente
reconheceu.
Em tais circunstâncias, não vejo razão para negar-se aplicação ao
entendimento jurisprudencial já consagrado.
Conheço do recurso, sufi cientemente demonstrado o dissídio, e dou-lhe
provimento para julgar procedentes os embargos, arcando a embargada com os
encargos derivados de sucumbência, mantido o percentual eleito pela sentença
para a condenação em honorários.
Súmula n. 93
SÚMULA N. 93
A legislação sobre cédulas de crédito rural, comercial e industrial admite o
pacto de capitalização de juros.
Referências:
Lei n. 6.840/1980.
Decreto-Lei n. 167/1967, arts. 5º e 9º.
Decreto-Lei n. 413/1969, art. 5º.
Precedentes:
REsp 11.843-RS (3ª T, 13.04.1992 — DJ 25.05.1992)
REsp 13.098-GO (2ª S, 29.04.1992 — DJ 22.06.1992)
REsp 20.599-PR (3ª T, 25.05.1992 — DJ 03.08.1992)
REsp 23.844-RS (3ª T, 1º.09.1992 — DJ 05.10.1992)
REsp 24.241-RS (4ª T, 31.08.1992 — DJ 05.10.1992)
REsp 26.031-GO (4ª T, 13.10.1992 — DJ 16.11.1992)
REsp 26.646-RS (3ª T, 22.09.1992 — DJ 13.10.1992)
REsp 27.468-RS (3ª T, 10.11.1992 — DJ 07.12.1992)
REsp 31.025-RS (4ª T, 17.02.1993 — DJ 22.03.1993)
Segunda Seção, em 27.10.1993
DJ 03.11.1993, p. 23.187
RECURSO ESPECIAL N. 11.843-RS (91.0011878-8)
Relator: Ministro Nilson Naves
Relator designado: Ministro Eduardo Ribeiro
Recorrente: Banco do Brasil S/A
Recorrido: Wendler Hermes e Cia. Ltda
Advogados: Lila Maria Lena Souza e outros e Adonis Ricardo Soares e
outros
EMENTA
Juros. Capitalização. Decreto-Lei n. 413/1969.
Anatocismo. Vedação do Decreto n. 22.626/1933 afastada pelo
Decreto-Lei n. 413/1969, aplicável a empréstimos destinados ao
fi nanciamento de atividades comerciais, por força da Lei n. 6.840/1980.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso especial pela alínea
c e, por maioria, vencido o Sr. Ministro-Relator, dar-lhe provimento. Votaram
com o Relator os Ministros Cláudio Santos, Nilson Naves, Eduardo Ribeiro e
Dias Trindade.
Brasília (DF), 13 de abril de 1992 (data do julgamento).
Ministro Nilson Naves, Presidente
Ministro Eduardo Ribeiro, Relator designado
DJ 25.05.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Nilson Naves: Trata-se de recurso do Banco do Brasil S/A.,
pelas alíneas a e c do permissivo constitucional, contra acórdão que considerou
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
384
inadmissível a capitalização mensal dos juros, cobrada em execução com base em
cédula de crédito comercial, recurso que veio a ser admitido, por este despacho
do Presidente Luiz Felipe Azevedo Gomes:
O recorrente alega negativa de vigência da Lei n. 6.840/1980, Decreto-Lei
n. 413/1969, Lei n. 4.595/1964, bem como divergência com a Súmula n. 596 do
Supremo Tribunal Federal e acórdão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul.
A Lei n. 6.840/1980 não foi objeto de exame pelo aresto recorrido, faltando-lhe
o requisito do prequestionamento. Súmulas ns. 282 e 356 do STF.
Consigna o julgado impugnado:
Assim, incorreta a ilação sustentada pelo banco de que em se tratando
de cobrança de Cédula de Crédito com garantia hipotecária, estivesse
autorizado a capitalizar mensalmente os juros remuneratórios incidentes
sobre a dívida. Embora prevista no título, torna-se inviável tal prática
anatocística, bem agindo o digno magistrado em afastá-la, tendo tal
cláusula como não escrita.
(...)
... Ora, in casu, a operação fi nanceira consubstanciada em Cédula de
crédito comercial com garantia hipotecária ocorreu em 08 de março de
1988 a ser resgatada em 02.09.1988, em uma única parcela, confi gurando-
se por tais razões, a previsão de capitalização mensal dos juros, prática
anatocística censurada nos termos do enunciado da Súmula n. 121 do STF e
que não encontra substrato jurídico no mencionado art. 5º do Decreto-Lei
n. 413/1980 invocado pelo credor embargado.
Face à razoabilidade da interpretação adotada não se comprova a argüida
violação dos dispositivos legais apontados. Súmula n. 400 do STF.
Quanto à divergência com a Súmula n. 596 do Supremo Tribunal Federal,
também, não assiste razão ao recorrente, vez que sua aplicação não foi afastada
do julgamento, mas que deva estar harmonizada com a Súmula n. 121 que veda
o anatocismo.
O aresto do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul lavra dissídio com
a decisão recorrida, eis que sustenta que a Súmula n. 121 está superada, no
referente às operações bancárias, pela Súmula n. 596 do STF, sendo legal a
cobrança de juros capitalizados quinzenais, mensais, semestrais.
Isso posto, admito o recurso pela c, face à divergência jurisprudencial.
É o relatório.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 379-416, fevereiro 2010 385
VOTO
O Sr. Ministro Nilson Naves (Relator): O tema do recurso especial diz
com a capitalização dos juros, que o recorrente pretende seja mensal, invocando,
a seu favor, textos de lei, a Súmula n. 596-STF e acórdão de outro Tribunal.
2. No ponto em debate, resolveu a sentença:
Apenas em dois aspectos procede a irresignação da embargante. Em primeiro
lugar, na capitalização mensal dos juros, que é proibida pela Lei de Usura, o que,
aliás, é pacífi co, inclusive, no STF, cf. Enunciado Sumular n. 121. Isso ainda que as
partes tenham convencionado. No caso dos autos, a capitalização é admitida,
apenas, a cada seis meses, de acordo com a lei que instituiu a cédula de crédito
comercial, à qual se aplica as disposições do Decreto-Lei n. 169/1967.
(...)
Dessa forma, os embargos são parcialmente acolhidos para: determinar que a
capitalização dos juros se faça, apenas, a cada semestre civil, e no vencimento da
operação;...
E o acórdão, depois de repelir a prática anatocística, no sentido de que a
Súmula n. 596 não afasta a incidência da Súmula n. 121, concluiu:
Assim, incorreta a ilação sustentada pelo banco de que em se tratando de
cobrança de Cédula de Crédito com garantia hipotecária, estivesse autorizado
a capitalizar mensalmente os juros remuneratórios incidentes sobre a dívida.
Embora prevista no título, torna-se inviável tal prática anatocística, bem agindo o
digno magistrado em afastá-la, tendo tal cláusula como não escrita. E o dispositivo
do art. 5º do Decreto-Lei n. 413/1980 que informa a matéria não tem o alcance
pretendido pelo apelante: “As importâncias fornecidas pelo fi nanciador vencerão
juros e poderão sofrer correção monetária às taxas e aos índices que o Conselho
Monetário fixar, calculadas sobre os saldos devedores de conta vinculada à
operação, e serão exigíveis em 30 de junho, 31 de dezembro, no vencimento
e na liquidação da cédula ou, também em outras destas convencionadas no
título ou admitidas pelo referido Conselho”. No exame desse dispositivo, em
harmonia com as orientações sumuladas, há de se estabelecer que só é legítima
a capitalização semestral de juros nos títulos de crédito comercial — ou, em se
tratando de prazos menores, bem como na hipótese de inocorrer coincidência
do fi m do semestre civil com o vencimento das prestações ou do título, nas datas
do vencimento ou na liquidação, ou, ainda, nas datas pactuadas pelas partes. Ora,
in casu, a operação fi nanceira consubstanciada em Cédula de crédito comercial
com garantia hipotecária ocorreu em 08 de março de 1988 a ser resgatada em
02.09.1988, em uma única parcela, confi gurando-se por tais razões, a previsão
de capitalização mensal dos juros, prática anatocística censurada nos termos do
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
386
enunciado da Súmula n. 121 do STF e que não encontra substrato jurídico no
mencionado art. 5º do Decreto-Lei n. 413/1980 invocado pelo credor-embargado.
Incensurável, neste aspecto, a douta sentença recorrida, afastando a
pretendida capitalização mensal dos juros.
3. Sobre ser vedada a capitalização dos juros, tal o princípio inscrito na
Súmula n. 121-STF, assim vem entendendo o Superior Tribunal de Justiça,
consoante essas ementas, entre outras:
— Direito privado. Juros. Anatocismo. Vedação incidente também sobre
instituições fi nanceiras. Exegese do Enunciado n. 121, em face do n. 596, ambos
da Súmula STF. Precedentes da excelsa Corte.
— A capitalização de juros (juros de juros) é vedada pelo nosso Direito, mesmo
quando expressamente convencionada, não tendo sido revogada a regra do art.
4º do Decreto n. 22.626/1933 pela Lei n. 4.595/1964. O anatocismo, repudiado
pelo Verbete n. 121 da súmula do Supremo Tribunal Federal, não guarda relação
com o Enunciado n. 596 da mesma súmula. (REsp n. 1.285, Sr. Ministro Sálvio de
Figueiredo, DJ de 11.12.1989)
— Direito privado. Juros. Anatocismo.
A contagem de juros sobre juros é proibida no Direito brasileiro, salvo exceção
dos saldos líquidos em conta corrente de ano a ano.
Inaplicabilidade da Lei da Reforma Bancária (n. 4.595, de 31.11.1964).
Atualização da Súmula n. 121 do STF.
Recurso provido. (REsp n. 2.293, Sr. Ministro Cláudio Santos, sessão de
14.04.1990)
— Capitalização de juros. É proibido contar juros dos juros, com exceção dos
saldos líquidos em conta corrente de ano a ano (Decreto n. 22.626/1933, art. 4º).
O princípio é aplicável às instituições fi nanceiras. Súmula n. 121-STF. Precedentes
do STJ: REsps ns. 1.285 e 2.293. Recurso especial não conhecido. (REsp n. 3.894, Sr.
Ministro Nilson Naves, sessão de 28.08.1990)
— Crédito rural. Anatocismo. Correção monetária.
I - A capitalização de juros, ainda que antevista em contrato, é vedada pela lei.
Precedentes do Superior Tribunal de Justiça (REsps ns. 1.285, 2.293, 2.537 e
3.827).
II - Admite-se a correção monetária do valor expresso na Cédula Rural.
Súmula n. 16 do Superior Tribunal de Justiça.
III - Provimento parcial do recurso para afastar o anatocismo. Decisão unânime.
(REsp n. 5.805, Sr. Ministro Fontes de Alencar, DJ de 11.03.1991)
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 379-416, fevereiro 2010 387
4. Sobre o Decreto-Lei n. 413, de 09.01.1969, que a Lei n. 6.840, de
03.11.1980, mandou aplicar no atinente aos títulos de crédito comercial, dispôs
o seu art. 5º (suscitado pelo acórdão):
Art. 5º. As importâncias fornecidas pelo fi nanciador vencerão juros e poderão
sofrer correção monetária às taxas e aos índices que o Conselho Monetário
Nacional fixar, calculados sobre os saldos devedores de conta vinculada à
operação, e serão exigíveis em 30 de junho, 31 de dezembro, no vencimento, na
liquidação da cédula ou, também, em outras datas convencionadas no título ou
admitidas pelo referido Conselho.
O recorrente põe em destaque a parte fi nal desse artigo: “também, em
outras datas convencionadas no título ou admitidas pelo referido Conselho”.
Não me parece que o acórdão recorrido confi rmatório da sentença tenha,
no ponto em comento, maltratado essa disposição de lei: primeiro, porque nela
não se fala em capitalização de juros (juros de juros), de modo expresso; segundo,
de todo razoável a sua interpretação em consonância com o princípio que a
instância ordinária adotou, qual seja o da capitalização semestral (inclusive, no
vencimento).
5. Merece, todavia, ser o recurso especial conhecido pela alínea c,
comprovado o dissídio com julgado que reputou legal a cobrança de juros
capitalizados, “desde que efetuada por instituição pública ou privada que integra
o Sistema Financeiro Nacional (Súmula n. 596 do STF)”.
6. Conheço do recurso especial pela alínea c mas lhe nego provimento.
VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro: Questiona-se a respeito da capitalização
de juros, em empréstimo destinado ao fi nanciamento de atividade comercial. O
acórdão, confi rmando a sentença nessa parte, teve como inadmissível que aquela
se fi zesse mensalmente.
Não se discute que continua em vigor o art. 4º do Decreto n. 22.626/1933,
aplicável mesmo às operações realizadas por instituições fi nanceiras. Nesse
sentido era a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e encontra-se fi rmada
a deste Tribunal.
Ocorre, entretanto, que algumas exceções abriu a legislação, ensejando
fossem cobrados juros sobre juros. Uma delas pelo Decreto-Lei n. 413/1969,
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
388
cujas regras incidem na espécie, por força da Lei n. 6.840/1980. Claro está
que tendo a norma da “Lei de Usura” natureza infraconstitucional, poderia ser
afastada sua incidência, em certos casos, por outra de igual hierarquia.
O art. 5º daquele decreto-lei estabeleceu que os juros seriam “exigíveis
em 30 de junho, 31 de dezembro, no vencimento, na liquidação da cédula
ou, também, em outras datas convencionadas no título ou admitidas pelo
referido Conselho”. Não havia ilicitude, pois, em pretender que os juros fossem
pagos a cada mês. O art. 11, § 2º, do mesmo diploma explicita que, havendo
inadimplência, será facultado ao fi nanciador a capitalização dos juros. Far-se-á
essa, obviamente, nas datas em que aqueles seriam devidos. Por fi m, estabelece
o art. 14, a propósito dos requisitos da cédula, que conterá, entre outros, “taxa
de juros a pagar e comissão de fi scalização, se houver, e épocas em que serão
exigíveis, podendo ser capitalizadas”.
Em face das disposições citadas, entendo não aplicável a vedação do
Decreto n. 22.626/1933.
Conheço do recurso e dou-lhe provimento.
VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Dias Trindade: O Sr. Ministro Nilson Naves, Relator ,
entende que o acórdão recorrido, ao afastar a possibilidade de capitalização de
juros, mês a mês, em caso de Cédula Comercial, não contrariou a norma do art.
5º do Decreto-Lei n. 413 de 09 de Janeiro de 1969, que a Lei n. 6.840, de 03
de novembro de 1980, que cuida da instituição da cédula comercial, mandou
aplicar porque nessa regra não se fala, de modo expresso, em capitalização de
juros.
O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro, em voto-vista, tem por contrariado o
citado dispositivo, daí por que dá provimento ao recurso.
É certo que o art. 5º do Decreto-Lei n. 413 não se refere expressamente à
capitalização de juros e à incidência de juros sobre juros, mas, com compreensão,
ao admitir a exigibilidade de juros e correção monetária em 30 de junho e em
31 de dezembro, ou no vencimento do título, ou na sua liquidação, ou, ainda,
segundo pactuado ou admitidas pelo Conselho Monetário Nacional, induz, sem
dúvida, a possibilidade de capitalização e, conseqüência desta, é a incidência de
juros sobre o todo capitalizado, a partir dessas datas.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 379-416, fevereiro 2010 389
O acórdão, examinando o título, afi rma que do mesmo consta pactuada a
capitalização mensal de juros, para dizer não escrita a respectiva cláusula, por
contrária ao art. 4º do Decreto n. 22.626, de 07 de abril de 1933, e a Súmula n.
121, que subsiste ante a 596, ambas do Supremo Tribunal Federal.
Ora, é certo que a capitalização de juros, mensalmente feita, segundo
o contrato, está respaldada no art. 5º do Decreto-Lei n. 413/1969, que, no
particular, e em referência a cédula comercial, sobreleva ao que dispõe o art. 4º
da chamada Lei de Usura.
Assim entendendo, peço vênia ao Sr. Ministro-Relator, para acompanhar o
voto do Sr. Ministro Eduardo Ribeiro, no sentido de conhecer e dar provimento
ao recurso.
VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Waldemar Zveiter: Cuida-se de capitalização de juros
estabelecidos em empréstimo para fi nanciamento de atividade comercial.
O eminente Relator, Ministro Nilson Naves entende que o aresto recorrido
ao afastar a capitalização de juros mensalmente, tratando-se de cédula comercial,
não violou a norma do art. 5º do Decreto-Lei n. 413/1969 que a Lei n. 6.840/1980
mandou aplicar, por que nela não se tem expresso a capitalização.
Contudo há de ver-se que o art. 5º desse último diploma legal tem ampla
abrangência, tanto que não só refere a aplicação integral do que dispõe o
Decreto-Lei n. 413/1969 à cédula e a nota de crédito comercial, como, inclusive,
aos modelos que lhe são anexos.
Assim, dúvida não tenho sobre ser aplicável à espécie os dispositivos
enfocados.
Certo, também, que se pode extrair, no cotejo do que dispõem o art. 5º, §
2º do art. 11, o inciso VI do art. 14 e o inciso V do art. 16 do Decreto-Lei em
referência, ser possível, tanto no que se refi ra aos Títulos de Crédito Industrial,
quanto nos Títulos de Crédito Comercial, a incidência da contagem de juros
sobre juros, sem contrariar a Súmula n. 121, mas sim harmonizando-se tal
interpretação ao texto do enunciado na Súmula n. 596, ambas do STF.
Os autos por sua vez, revelam, consoante o acórdão, que do Título consta
pactuada a capitalização mensal de juros.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
390
Se assim é, peço respeitosa vênia ao eminente Relator para acompanhar os
votos dos Senhores Ministros Eduardo Ribeiro e Dias Trindade, no sentido de
conhecer e dar provimento ao recurso.
RECURSO ESPECIAL N. 13.098-GO (91.15172-6)
Relator: Ministro Cláudio Santos
Recorrente: Banco do Brasil S/A
Recorrido: José Alípio Faleiro
Advogados: Antônio Lucas Neto e outros e Adilson Ramos
EMENTA
Crédito Rural. Cédulas. Anatocismo. Exceção.
A disposição especial do art. 5º do Decreto-Lei n. 167/1967
excepciona a regra proibitória estabelecida no art. 4º da chamada “Lei
de Usura”.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda
Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e por maioria,
dar-lhe provimento. Vencidos os Srs. Ministros Sálvio de Figueiredo, Nilson
Naves e Fontes de Alencar, que o desproviam. Votaram com o Relator os Srs.
Ministros Barros Monteiro, Eduardo Ribeiro, Dias Trindade, Athos Carneiro e
Waldemar Zveiter. Ausente, nesta assentada, o Sr. Ministro Nilson Naves.
Brasília (DF), 29 de abril de 1992 (data do julgamento).
Ministro Bueno de Souza, Presidente
Ministro Cláudio Santos, Relator
DJ 22.06.1992
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 379-416, fevereiro 2010 391
RELATÓRIO
Reporto-me ao relatório apresentado à Terceira Turma, acrescentando que,
por minha proposta deliberou a Turma submeter a questão à Seção.
Relatei.
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Cláudio Santos: A solucionar confl ito entre produtor rural
e o Banco do Brasil S/A, em ação declaratória ajuizada pelo primeiro, decidiu
a Primeira Turma Julgadora da Primeira Câmara Cível do egrégio Tribunal de
Justiça de Goiás, no julgamento de apelação, completado com a apreciação de
embargos declaratórios manifestados por ambas as partes:
Ação. Carência. Correção monetária. Incidência.
1. Demonstrado o interesse de agir não há falar em carência da ação.
2. Estipulada no contrato, é devida a correção monetária (Lei n. 6.423, de
17.06.1977).
3. É repelida pelo art. 4º do Decreto n. 22.626, de 07.04.1933 (Lei de Usura) a
cumulação de juros mês a mês.
Recurso provido.
Recorre o Banco do Brasil para esta Corte Superior, com invocação das
alíneas a e c da norma constitucional regente, por negar-lhe o acórdão o direito
à capitalização mensal de juros e, assim, contrariar o art. 5º do Decreto-Lei n.
167, de 14.02.1967, bem como divergir do julgado da Suprema Corte no RE n.
112.312-5-RS, Relator o Ministro Oscar Corrêa.
O outro litigante, também inconformado, baseado no mesmo suporte
constitucional, insurge-se contra a incidência da correção monetária.
Nenhum dos dois recursos foi admitido, porém provi agravo de instrumento
do Banco do Brasil para melhor exame do especial pela Turma.
Relatei.
VOTO
O Sr. Ministro Cláudio Santos (Relator): Dispõe o art. 5º, caput, do
Decreto-Lei n. 167, de 1967:
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
392
As importâncias fornecidas pelo fi nanciador vencerão juros às taxas que o
Conselho Monetário Nacional fi xar e serão exigíveis em 30 de junho e 31 de
dezembro ou no vencimento das prestações, se assim acordado entre as partes;
no vencimento do título e na liquidação, ou por outra forma que vier a ser
determinada por aquele Conselho, podendo o fi nanciador, nas datas previstas,
capitalizar tais encargos de conta vinculada à operação.
Trata-se de disposição especial que excepciona a regra proibitória prevista
no art. 4º do Decreto n. 22.626, de 07.04.1933, consoante decidiu o colendo
Supremo Tribunal Federal no RE n. 92.342, RTJ 94/1.289, Relator Ministro
Cordeiro Guerra, em acórdão assim ementado:
Execução por títulos de crédito rural, pelo saldo apurado de acordo com a
conta corrente a ela vinculada, não desfi gura o seu caráter de título civil, líquido
e certo exigível, art. 10 e § 1º do Decreto-Lei n. 167, de 14 de fevereiro de 1967.
É lícita a capitalização semestral dos juros e encargos na conta vinculada ao
fi nanciamento rural, art. 5º do Decreto-Lei n. 167/1967.
Aos pagamentos feitos por conta, aplica-se a regra do art. 993 do Código Civil.
Recurso extraordinário conhecido e provido.
Esse era o entendimento que prevalecia na jurisprudência do STF e, de
igual modo, é que vem sendo manifestado pela Terceira Turma. Em termos
gerais é vedado o anatocismo salvo se lei dispuser em contrário e, no caso,
segundo demonstra, cogitando-se de crédito rural, a lei ressalva claramente a
possibilidade de capitalizar juros.
Diante do exposto, conheço do recurso por ambas alíneas, para dar-lhe
provimento.
É como voto.
VOTO
O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo: Vou pedir vênia ao eminente
Ministro-Relator para manter entendimento que já externei na Quarta Turma,
especialmente no REsp n. 4.724-MS, com a seguinte ementa:
Execução. Direito privado. Juros. Anatocismo. Lei Especial. Semestralidade.
Capitalização mensal vedada. Precedentes. Recurso não conhecido.
I - A capitalização de juros (juros de juros) é vedada pelo nosso Direito, mesmo
quando expressamente convencionada, não tendo sido revogada a regra do art.
4º do Decreto n. 22.626/1933 pela Lei n. 4.595/1964. O anatocismo, repudiado
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 379-416, fevereiro 2010 393
pelo Verbete n. 121 da súmula do Supremo Tribunal Federal, não guarda relação
com o Enunciado n. 596 da mesma súmula.
II - Mesmo nas hipóteses contempladas em leis especiais, vedada é a
capitalização mensal.
Mantendo esse entendimento, no sentido de que é vedado em nosso
direito o anatocismo, ressalvada a possibilidade da capitalização em lei especial
e constando dessa a previsão semestral, nos termos, s.m.j., da orientação que
vigorava no Supremo Tribunal Federal, na vigência do sistema constitucional
anterior, conheço do recurso e lhe nego provimento.
VOTO
O Sr. Ministro Barros Monteiro: Sr. Presidente, coerente com a minha
posição assumida em julgamentos havidos na egrégia Quarta Turma, acompanho
o voto do eminente Ministro-Relator.
Penso que o art. 5º do DecretoLei n. 167, de 1967, permite a capitalização
mensal dos juros, porquanto nele está prevista a possibilidade dessa capitalização
quando do vencimento das prestações e, no caso, as prestações são de vencimento
mês a mês.
Trata-se, portanto, de capitalização admitida por lei especial, lei esta que
excepciona, como mencionou o eminente Ministro-Relator, a regra geral.
Num dos precedentes a que aludi — REsp n. 4.724, do Mato Grosso do
Sul — referente à capitalização mensal de juros em nota de crédito comercial
— a controvérsia girou em torno do estatuído no art. 5º do Decreto-Lei n. 413,
de 1969, mas a fundamentação que expendi naquele feito se adequa à hipótese
presente. Disse naquela oportunidade: (lê)
A interpretação, a atribuir-se ao supra-aludido dispositivo legal, não deve
ser restritiva nos dias de hoje, em que vigora no sistema fi nanceiro um regime
permissivo da capitalização mensal em diversos de seus segmentos, tais como:
títulos de renda fixa, certificados de depósitos bancários, cartões de crédito,
depósitos em caderneta de poupança etc.
O intérprete não pode permanecer alheio ao que ordinariamente ocorre no
mercado de capitais. Se a instituição fi nanceira exerce a captação de recursos
dentro do sistema em que a capitalização dos juros é mensal e, às vezes, até
diária, não se lhe pode exigir que adote sistemática diversa quando concede
empréstimo a terceiros, seus clientes, sob pena de franca desigualdade, até
porque, como ressaltado neste voto, a lei de regência não obsta a capitalização
mensal.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
394
Portanto, Sr. Presidente, coloco-me de acordo com o voto do eminente
Ministro-Relator, conhecendo do recurso por ambas as alíneas e a ele dando
provimento.
É o meu voto.
VOTO
O Sr. Ministro Nilson Naves: Sr. Presidente, a exemplo do voto do Sr.
Ministro Sálvio de Figueiredo, também conheço do recurso pela alínea c e lhe
nego provimento.
VOTO
O Sr. Ministro Dias Trindade: Sr. Presidente, já tive oportunidade de
votar na Turma admitindo a capitalização. É certo que o caso examinado era o
mesmo a que se referia o Sr. Ministro Eduardo Ribeiro. Tratava-se de aplicação
da Lei n. 6.840, que remete ao Decreto-Lei n. 413, de 09 de janeiro de 1969,
cujo art. 5º — por sinal é o mesmo art. 5º do Decreto-Lei n. 167 — permite a
capitalização dos juros, desde que acordada entre as partes e em datas diversas
daquelas de 30 de junho e de 31 de dezembro: (ler).
Pode haver capitalização no vencimento, na liquidação da cédula ou também
em outras datas convencionadas no título.
O Decreto-Lei n. 167, ora em exame, trata de matéria, também no art. 5º,
permitindo a capitalização em 30 de junho e 31 de dezembro ou no vencimento
das prestações, se assim acordado entre as partes.
Não tenho dúvida alguma de que a lei permite a capitalização mensal dos
juros. Por isso, acompanho o Sr. Ministro-Relator.
VOTO
O Sr. Ministro Athos Carneiro: Sr. Presidente, mantenho o ponto de vista
que, com o eminente Ministro Barros Monteiro, manifestei na Quarta Turma,
quando do julgamento do Recurso Especial n. 4.724.
Parece-me também, com toda a vênia, que temos de dar à matéria uma
exegese consentânea com as atuais realidades econômicas. É que os investidores
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 379-416, fevereiro 2010 395
também recebem a capitalização mensal, quer nas cadernetas de poupança como
nos fundos de aplicação.
De maneira que, tendo as partes convencionado no título a capitalização
mensal e, como já foi aludido, podendo norma ordinária posterior revogar a
proibição da vetusta Lei de Usura, não tenho dúvidas de acompanhar o Relator,
aceitando a capitalização mensal, quando expressamente ajustada.
VOTO-VISTA
O Sr. Ministro Waldemar Zveiter: Trata-se de capitalização de juros.
Tenho compromisso com a tese de sua possibilidade quando prevista em lei e
pactuada. Assim me manifestei quando do julgamento do Recurso Especial n.
11.843 na Terceira Turma.
Na espécie, como acentuado no voto do Ministro-Relator, cogita-se de
crédito rural, havendo ressalva de capitalização dos juros como previsto no art.
5º do Decreto-Lei n. 167/1967.
Assim, pedindo vênia aos eminentes Ministros que votaram em sentido
contrário, acompanho o Senhor Ministro-Relator, para conhecer do recurso e
dar-lhe provimento.
VOTO-VOGAL (VENCIDO)
O Sr. Ministro Fontes de Alencar: Acompanho o voto do Sr. Ministro
Sálvio de Figueiredo.
RECURSO ESPECIAL N. 20.599-PR (92.0007245-3)
Relator: Ministro Waldemar Zveiter
Recorrentes: Morar do Brasil Indústria da Construção Civil Ltda e outros
Recorrido: Banco do Estado de Minas Gerais S/A
Advogados: Carlos Augusto Pilatti de Oliveira e outros e Jorge Evencio de
Carvalho e outros
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
396
EMENTA
Processual Civil. Embargos à execução. Título de crédito
industrial. Capitalização bimestral dos juros. Arts. 5º, II, § 2º; 14, II, e
16, V, do Decreto n. 413/1969. Lei n. 6.840/1980.
I - Consolidado na jurisprudência do STJ o entendimento no
sentido da possibilidade, tanto nos títulos de crédito industrial, quanto
nos títulos de crédito comercial, da incidência da contagem de juros
sobre juros, sem contrariar o disposto na Súmula n. 121, mas sim
harmonizando-se tal interpretação ao texto do enunciado na Súmula
n. 596, ambas do STF.
II - Hipótese em que as partes avençaram a capitalização
bimestral dos juros, o que a Lei Especial lhes faculta.
III - Recurso não conhecido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos
e das notas taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso
especial. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Cláudio Santos, Nilson
Naves, Eduardo Ribeiro e Dias Trindade. Custas, como de lei.
Brasília (DF), 25 de maio de 1992 (data do julgamento).
Ministro Nilson Naves, Presidente
Ministro Waldemar Zveiter, Relator
DJ 03.08.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Waldemar Zveiter: Trata-se de embargos opostos por
Morar do Brasil Indústria da Construção Civil Ltda e outros, à execução que
lhes move o Banco do Estado de Minas Gerais S/A, argüindo, em preliminar, a
incompetência do Juízo e, no mérito, pugnam pela improcedência dos embargos,
ao fundamento de que o embargo não pode cobrir mais do que 17% ao ano a
títulos de juros, a teor do disposto no Decreto n. 22.626/1933 e na Lei n.
1.521/1951.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 379-416, fevereiro 2010 397
Aduzem, ainda, que a cobrança de juros sobre juros não é permitida por lei.
A sentença, após repelir a preliminar argüida, julgou improcedentes os
embargos, arcando os embargantes com os ônus da sucumbência (fl s. 60-64).
Inconformados, apelaram os executados embargantes, reeditando os
fundamentos da inicial (fl s. 60-73).
Contra-arrazoado o recurso (fl s. 74-108), a Sétima Câmara Cível do colendo
Tribunal de Alçada do Paraná, a unanimidade, negou provimento à apelação,
entendendo não haver capitalização de juros e, ao demais, as instituições
fi nanceiras estão, em suas operações, fora do alcance da Lei de Usura (fl s. 118-
120).
Irresignados, ainda, interpuseram os apelantes recurso especial, fundado no
art. 105, III, a e c, da Constituição, alegando negativa de vigência dos arts. 4º, a,
1ª parte e seu § 3º, da Lei n. 1.521/1951; 4º, do Decreto n. 22.626/1933; e 115, do
Código Civil. Sustenta, ainda, divergência com a Súmula n. 121 do STF.
Oferecidas contra-razões (fl s. 136-141), o nobre Presidente daquela Corte
negou-lhe seguimento (fl s. 143-145).
Dessa decisão agravou de instrumento o recorrente e remetidos os autos a
este egrégio Superior Tribunal de Justiça, exarei despacho determinando a subida
do especial para melhor exame (fl s. 115 do Ag n. 16.385-PR, em apenso).
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Waldemar Zveiter (Relator): Examino a irresignação.
Quanto à pretensa violação aos arts. 4º, letra a, 1ª parte e seu § 3º da Lei
n. 1.521/1951 e 115 do Código Civil, nesse ponto, não merece acolhida o apelo
extremo. Isso porque, esses dispositivos não foram sequer objeto de debate no
aresto e nem opostos embargos declaratórios para suprir a omissão. Portanto,
no pertinente, impõe incidir o enunciado das Súmulas n. 282 e 356, do Pretório
excelso.
No que diz respeito à violação ao art. 4º do Decreto n. 22.626/1933, de
igual, não prospera a insurgência, quando diz que não se admite a capitalização
de juros nem mesmo pelas instituições fi nanceiras — exceto, tão-só, para a
hipótese prevista na última parte, do citado art. 4º da Lei de Usura. É que
quanto à má ou boa exegese que pretende a recorrente, tenha dado o acórdão aos
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
398
termos do dispositivo apontado, implicaria em saber como estariam computados
os juros capitalizados no título executivo; como se vê, é questão cujo deslinde
depende de reexame de matéria de fato, bem como, de interpretação da cláusula
contratual, defeso em sede do Especial, a teor do disposto nas Súmulas n. 5 e 7,
deste Superior Tribunal de Justiça.
Examino, pois, o recurso pelo dissídio com a Súmula n. 121 do STF.
Afirmou o acórdão que os embargantes recorrentes emitiram nota
promissória e fi rmaram o respectivo contrato. Deste constando as cláusulas e
condições que regem o negócio feito; e que a cambial foi emitida na rigorosa
consonância do que foi pactuado. Diante disso, não há falar em cobrança de
juros capitalizados.
Disse, ainda, que “de outra parte, cobrança de juros ilegais não houve, visto
que os bancos, como instituições fi nanceiras estão, em suas operações, fora do
alcance de Lei de Usura.” (fl . 120)
Daí a insurgência sustentando que a execução está contaminada pelo
anatocismo, não visualizada pelo acórdão recorrido, que conflita com a
orientação preconizada na Súmula n. 121 do Supremo Tribunal Federal.
O ponto em que se controverte é a possibilidade, ou não, no título de
crédito industrial de ser pactuada a capitalização bimestral dos juros.
Em verdade, a capitalização é permitida por lei especial (art. 16, inciso V,
do Decreto-Lei n. 413/1969, c.c. o art. 5º da Lei n. 6.840, de 1980), que rege a
matéria em debate.
A questão gira em torno da inteligência do art. 5º do mencionado Decreto-
Lei que, assim, dispõe:
As importâncias fornecidas pelo fi nanciador vencerão juros e poderão sofrer
correção monetária as taxas e aos índices que o Conselho Monetário Nacional
fi xar, calculados sobre os saldos devedores de conta vinculada à operação, e
serão exigíveis em 30 de junho, 31 de dezembro, no vencimento, na liquidação da
cédula ou, também, em outras datas convencionadas no título ou admitidas pelo
referido Conselho.
Da interpretação do supratranscrito preceito legal, não se subtrai qualquer
exigência que restrinja a capitalização dos juros ao período de bimestralidade.
Ao contrário, a lei faculta aos pactuantes o direito de convencionarem outras
datas para esse fi m.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 379-416, fevereiro 2010 399
Na hipótese, as partes avençaram a capitalização de dois em dois meses, o
que, ressalte-se, não é vedado pela lei especial.
Em caso símile, quando do julgamento do REsp n. 11.843, ao proferir
voto-vista, assim, me manifestei:
Cuida-se de capitalização de juros estabelecidos em empréstimo para
fi nanciamento de atividade comercial.
O eminente Relator Ministro Nilson Naves entende que o aresto recorrido ao
afastar a capitalização de juros mensalmente, tratando-se de cédula comercial,
não violou a norma do art. 5º do Decreto-Lei n. 413/1969 que a Lei n. 6.840/1980
mandou aplicar, por que nela não se tem expresso a capitalização.
Contudo há de ver-se que o art. 5º desse último diploma legal tem ampla
abrangência, tanto que não só refere a aplicação integral do que dispõe o
Decreto-Lei n. 413/1969 à cédula e à nota de crédito comercial, como, inclusive, aos
modelos que lhe são anexos.
Assim, dúvida não tenho sobre ser aplicável à espécie os dispositivos
enfocados.
Certo, também, que se pode extrair, no cotejo do que dispõem o art. 5º, § 2º,
do art. 11, o inciso VI do art. 14 e o inciso V do art. 16 do decreto-lei em referência,
ser possível, tanto no que se refere aos Títulos de Crédito Industrial, quanto nos
Títulos de Crédito Comercial, a incidência da contagem de juros sobre juros, sem
contrariar a Súmula n. 121, mas sim harmonizando-se tal interpretação ao texto
do enunciado na Súmula n. 596, ambas do STF.
Dos autos por sua vez, revelam, consoante o acórdão, que do Título consta
pactuada a capitalização mensal de juros.
Com base nesses lineamentos, não conheço do recurso.
RECURSO ESPECIAL N. 23.844-RS (92156835)
Relator: Ministro Nilson Naves
Recorrente: Banco do Brasil S/A
Recorridos: Cirineu Lorenzoni e outro
Advogados: Lincoln de Souza Chaves e outros e Marcos Fernando
Stefanello e outro
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
400
EMENTA
Capitalização mensal de juros. Possibilidade, no caso de
fi nanciamento rural (Decreto-Lei n. 167/1967, art. 5º). Precedentes
do STJ, entre outros o REsp n. 11.843. Recurso especial conhecido e
provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso especial e lhe dar
provimento. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Eduardo Ribeiro,
Dias Trindade, Waldemar Zveiter e Cláudio Santos.
Brasília (DF), 1º de setembro de 1992 (data do julgamento).
Ministro Nilson Naves, Presidente e Relator
DJ 05.10.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Nilson Naves: De início, tomo a exposição de fl . 77, nos
termos seguintes:
Cirineu Lorenzoni e Hugo Villani opuseram embargos à execução que lhes
move o Banco do Brasil S/A, alinhando os seguintes argumentos: a) trata-se
de dívida ilíquida a exeqüenda, já que os demonstrativos carreados não
correspondem ao contratualmente convencionado; b) há incidência de taxa de
juros acima do limite legal; c) é ilegal a capitalização mensal de juros; d) afi gura-se
imprópria a via executiva para a cobrança de multa contratual; e, e) há excesso
de execução e litigância de má-fé, com o que deve o exeqüente arcar com as
respectivas penalidades.
Impugnou o embargado sustentando, em síntese, a liceidade das parcelas
integrantes do quantum em execução.
Sobreveio sentença de procedência parcial.
Irresignados, recorreram os contraditores, na forma adesiva o Banco do Brasil
S/A:
— os embargantes, noticiando cerceamento de defesa, em face do
indeferimento de prova pericial, e reeditando os mesmos argumentos anteriores;
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 379-416, fevereiro 2010 401
— o embargado, insurgindo-se contra o entendimento de que é vedada a
capitalização mensal de juros, no que sustentou que a Súmula n. 596 é que regula
a matéria antes disciplinada pela Súmula n. 121 do STF.
2. A Quinta Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Estado negou
provimento a ambos os recursos, com acórdão assim ementado:
Embargos à execução.
Cédula Rural Pignoratícia.
Cerceamento inocorrente.
Inocorre cerceamento de defesa, pelo indeferimento de perícia, se as
indagações dos embargantes podem ser solvidas através de meras operações
aritméticas.
Limitação dos juros.
Não sendo auto-aplicável a norma do § 3º do art. 192 da CFR, não há a
pretendida limitação dos juros ao patamar ali estabelecido.
Índices de correção monetária.
Na ausência de indexador dos títulos extintos (ORTN, OTN e BTN) pode o
credor utilizar aqueles que serviram para remunerar as cadernetas de poupança.
Multa contratual.
Pode ser cobrada a multa contratual em processo de execução.
Juros. Capitalização mensal.
Vigorando o entendimento que os juros, especialmente em fi nanciamento
rural, somente podem ser capitalizados semestralmente, não poderia o credor
exigi-los mês a mês.
Embargos procedentes em parte.
Sentença mantida.
Apelo desprovido.
3. O Banco interpôs recurso especial, tendo por ofendido o art. 5º do
Decreto-Lei n. 167/1967, com referência à Circular n. 1.130/1987 do Banco
Central do Brasil, e apresentou dissídio com a Súmula n. 596-STF e com
julgados do Tribunal de Justiça de Goiás, admitido por este despacho:
Inviável o recurso quanto à violação da Circular n. 1.130/1987, do Banco
Central do Brasil, pois esta não constitui Lei Federal.
Quanto à alegada infringência ao art. 5º do Decreto-Lei n. 167/1967 inocorre
a pretendida contrariedade, eis que o aresto impugnado admitiu a capitalização
semestral dos juros, vedando tão-somente a capitalização mensal.
Pela letra a, não merece, assim, seguimento ao recurso.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
402
Divergência jurisprudencial.
A Súmula n. 596 do Supremo Tribunal Federal não derrogou o art. 4º do Decreto
n. 22.626/1933, no que diz respeito às instituições financeiras disciplinadas
pela Lei n. 4.595/1964, não afastando a aplicação da Súmula n. 121, que veda a
capitalização de juros.
Portanto, não caracterizado o dissídio.
Por outro lado, as decisões do Tribunal de Justiça de Goiás trazidas pelo
recorrente como paradigma lavram dissídio com o acórdão impugnado.
Com efeito, a Apelação Cível de n. 26.325, entendeu que a capitalização
mensal de juros é permitida, quando expressamente autorizada por lei ou ato
do Conselho Monetário Nacional. E a Apelação Cível de n. 25.630, concluiu que
saindo os recursos destinados aos fi nanciamentos rurais de captação junto aos
poupadores, que são remunerados com juros capitalizados, torna-se legal e justa
essa capitalização pelo credor.
Isso posto, admito o recurso pela alínea c do permissivo constitucional.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Nilson Naves (Relator): Pede o recorrente o provimento
do recurso especial, “para declarar válida a capitalização mensal dos juros
pactuados, reformando a respeitável decisão recorrida”, fl . 135. Quero crer que
o recurso merece ser conhecido, até porque o dissídio encontra-se demonstrado,
conforme anotou o despacho local. Dele conhecendo, dou-lhe provimento, para
estabelecer a capitalização mensal dos juros.
Quando do julgamento do REsp n. 11.843, por igual do Rio Grande
do Sul, pronunciei-me de modo contrário à capitalização, mas fi quei vencido,
e o Sr. Ministro Eduardo Ribeiro redigiu para o acórdão essa ementa: “Juros
— Capitalização — Decreto-Lei n. 413/1969 — Anatocismo — Vedação do
Decreto n. 22.626/1933 afastada pelo Decreto-Lei n. 413/1969. Aplicável a
empréstimos destinados ao fi nanciamento de atividades comerciais, por força da
Lei n. 6.840/1980” (sessão de 13.04.1992). Depois, relatando o REsp n. 21.262,
esclareci que passava a seguir o pensamento da Turma, diante, ainda, de recente
pronunciamento da Seção, no REsp n. 13.098, com essa ementa:
— Crédito rural. Cédulas. Anatocismo. Exceção.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 379-416, fevereiro 2010 403
A disposição especial do art. 5º do Decreto-Lei n. 167/1967 excepciona a regra
proibitória estabelecida no art. 4º da chamada “Lei de Usura”. (Sr. Ministro Cláudio
Santos, DJ de 22.06.1992).
Pelo que disse, conheço e dou provimento ao recurso especial.
RECURSO ESPECIAL N. 24.241-RS (92.0016741-1)
Relator: Ministro Barros Monteiro
Recorrente: Banco do Brasil S/A
Recorrido: Luiz Mário de Moraes Marques
Advogados: Jurandir Fernandes de Sousa, Maurílio Moreira Sampaio e
outros e Georges Kodayssi Filho e outro
EMENTA
Crédito rural. Capitalização de juros.
Possível a capitalização mensal dos juros pactuados, nos termos
do art. 5º, caput, do Decreto-Lei n. 167, de 14.02.1967, que excepciona
a regra proibitória estabelecida na chamada “Lei de Usura”.
Recurso especial conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide
a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer
do recurso e dar-lhe provimento, na forma do relatório e notas taquigráfi cas
constantes dos autos, que fi cam fazendo parte integrante do presente julgado.
Participaram do julgamento os Srs. Ministros Athos Carneiro e Sálvio de
Figueiredo.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 31 de agosto de 1992 (data do julgamento).
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
404
Ministro Athos Carneiro, Presidente
Ministro Barros Monteiro, Relator
DJ 05.10.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Barros Monteiro: Julgados improcedentes os embargos
opostos à execução fundada em cédula rural pignoratícia e hipotecária, o
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul deu provimento parcial ao apelo do
embargante para afastar a capitalização mensal dos juros pactuados.
Daí o recurso especial manifestado pelo Banco do Brasil S/A com
arrimo nas alíneas a e c do permissivo constitucional. Alegou o recorrente
negativa de vigência do art. 5º do Decreto-Lei n. 167, de 14.02.1967 e dissenso
interpretativo com a Súmula n. 596-STF e com dois julgados oriundos do
Tribunal de Justiça de Goiás.
Admitido o apelo extremo pela letra c, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Barros Monteiro (Relator): A egrégia Segunda Seção
desta Corte, ao apreciar o REsp n. 13.098-GO, de que foi Relator o eminente
Ministro Cláudio Santos, admitiu, por maioria de votos, a capitalização mês
a mês dos juros em se cuidando de crédito rural, uma vez que a lei ressalva tal
possibilidade (art. 5º, caput, do Decreto-Lei n. 167/1967).
Eis a ementa daquele julgado:
Crédito rural. Cédulas. Anatocismo. Exceção.
A disposição especial do art. 5º do Decreto-Lei n. 167/1967 excepciona a regra
proibitória estabelecida no art. 4º da chamada “Lei de Usura”.
Observo que tal orientação já se pacifi cou na colenda Terceira Turma deste
Tribunal (REsps ns. 11.901-MG, e 20.561-RS, ambos da relatoria do Ministro
Eduardo Ribeiro).
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 379-416, fevereiro 2010 405
Considero, outrossim, aperfeiçoado quantum satis o dissentimento
pretoriano em face dos julgados provindos do Tribunal de Justiça de Goiás,
anexados por cópia aos autos.
Ante o exposto, conheço do recurso por ambas as alíneas do autorizativo
constitucional e dou-lhe provimento para declarar válida a capitalização mensal
dos juros pactuados.
É como voto.
VOTO
O Sr. Ministro Athos Carneiro: De conformidade com os precedentes,
acompanho o voto do Sr. Ministro-Relator.
VOTO
O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo: Esta Turma já teve oportunidade de
apreciar a matéria mais de uma vez. Recordo-me, inclusive, que a tese contrária
foi vencedora pelo menos em uma ou duas oportunidades. Posteriormente,
a matéria foi levada à Segunda Seção, quando, por maioria de votos, o
entendimento se fi xou no sentido da tese ora esposada pelo eminente Relator.
Em face da missão constitucional deste Tribunal de fixar orientação
interpretativa quanto ao direito infraconstitucional, buscando, sobretudo, a sua
uniformidade, fi xada a orientação pelo órgão competente, acompanho os votos
já proferidos.
De acordo com o Sr. Ministro-Relator.
RECURSO ESPECIAL N. 26.031-GO
Relator: Ministro Athos Carneiro
Recorrente: Banco do Brasil S/A
Recorridos: Carmo Alves Barbosa e sua mulher
Advogados: Jurandir Fernandes de Sousa e outros e Rivadavia Xavier
Nunes e outros
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
406
EMENTA
Cédulas de crédito rural. Capitalização mensal de juros. Alegação
de anatocismo. Rejeitada.
A regra do art. 5º do Decreto-Lei n. 167/1967, combinada com o
art. 14 da Lei n. 4.829/1965, abre exceção ao art. 4º da chamada “Lei
da Usura”. Possibilidade de capitalização mensal de juros, enquanto
não regulamentada a norma do art. 192, § 3º, da Constituição Federal.
Recurso especial conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados os autos, em que são partes as acima indicadas, decide
a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer
do recurso e dar-lhe provimento, na forma do relatório e notas taquigráfi cas
precedentes que integram o presente julgado. Participaram do julgamento, além
do signatário, os Srs. Ministros Fontes de Alencar, Sálvio de Figueiredo, Barros
Monteiro e Bueno de Souza.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 13 de outubro de 1992 (data do julgamento).
Ministro Athos Carneiro, Presidente e Relator
DJ 16.11.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Athos Carneiro: Cuida-se de ação buscando a declaração
de nulidade de cláusula contratual, cumulada com revisão de contrato e repetição
de indébito, proposta por Carmo Alves Barbosa e outro contra o Banco do Brasil
S/A, julgada improcedente no juízo monocrático. A Terceira Câmara Cível do
TJGO, à unanimidade, deu parcial provimento ao apelo, sob a seguinte ementa,
verbis:
Cédula rural. Correção monetária. Taxa de juros. Capitalização. A estipulação
de correção monetária nos contratos de empréstimos rurais é legítima e, se
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 379-416, fevereiro 2010 407
pactuada, é devida, em atenção ao princípio pacta sunt servanda. Não é ilícita a
cobrança de juros acima da taxa de 12% a.a., porque o preceito do art. 192, § 3º,
da Constituição Federal, depende de regulamentação. Nos contratos regidos pelo
Decreto-Lei n. 167/1967, é permitida a capitalização de juros em 30 de junho e 31
de dezembro. A capitalização mensal é vedada por lei.
Apelo provido em parte. (fl . 126)
Inconformada, a entidade bancária interpôs recurso especial pelas alíneas
a e c do permissor constitucional, sob a alegação de negativa de vigência ao art.
5º do Decreto-Lei 167/1967 e art. 14 da Lei n. 4.829; Circular n. 1.130/1987
do Banco Central combinada com os itens I e II, da Resolução n. 1.236/1986
do Banco Central, além de dissídio jurisprudencial. Sustenta, em resumo, que
“a cobrança mensal de juros nos fi nanciamentos rurais, sopesada a origem dos
recursos, não tipifi ca infração à Lei de Usura (Decreto n. 22.626/1933), porque
autorizada por lei e/ou normas emanadas do Conselho Monetário Nacional
e Banco Central do Brasil, afastada, via de conseqüência, a Súmula n. 121 do
Supremo Tribunal Federal”. (fl . 138)
O eminente Presidente do Tribunal de origem admitiu o recurso.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Athos Carneiro (Relator): A espécie cuida da questão
sobremodo controvertida na jurisprudência, a da possibilidade de capitalização
mensal de juros nos créditos rurais, em aplicação do art. 5º do Decreto-Lei
167/1967.
Esta Corte, por sua Segunda Seção, adotou a tese favorável à admissibilidade
de tal capitalização. Realmente, apreciando o REsp n. 13.098-GO, remetido
pela egrégia Terceira Turma nos termos do art. 14, II, do RISTJ, foi dado
provimento ao apelo extremo manifestado pelo Banco do Brasil contra v. aresto
do TJGO que entendera repelida pelo art. 4º do Decreto n. 22.626/1933 — Lei
da Usura, a acumulação de juros mês a mês.
Consoante o voto do Relator, eminente Ministro Cláudio Santos, “é vedado
o anatocismo salvo se lei dispuser em contrário e, no caso, segundo demonstra,
cogitando-se de crédito rural, a lei ressalva claramente a possibilidade de
capitalizar juros”.
No mesmo sentido temos julgado, nesta Quarta Turma, como recentemente
nos REsps ns. 26.470 e 26.927, Relator o eminente Ministro Barros Monteiro.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
408
Pelo exposto, conhecendo do recurso pela dissonância jurisprudencial,
e igualmente pela contrariedade ao art. 5º do Decreto-Lei n. 167/1967, tal
como vem sendo aplicado por este Tribunal, combinado com o art. 14 da Lei
n. 4.829/1965, ao mesmo dou provimento, a fi m de restabelecer a sentença do
MM. Juiz de Direito Dr. Eudélcio Machado Fagundes, da Comarca de Uruana-
GO.
É o voto.
RECURSO ESPECIAL N. 26.646-RS (92216676)
Relator: Ministro Dias Trindade
Recorrente: Vilson Carlos Fenner
Recorrido: Banco do Brasil S/A
Interessado: Serino Aldino Fenner
Advogados: João Alcir Rodrigues de Vargas e outro e Leopoldo Miguel B.
de Sant’Anna e outros
EMENTA
Civil. Dívida rural. Capitalização de juros.
A legislação de crédito rural admite a capitalização de juros,
segundo contratada (art. 5º, Decreto-Lei n. 167/1967).
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos
e das notas taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, conhecer em parte, do
recurso especial pela alínea c, mas lhe negar provimento. Votaram com o
Relator os Srs. Ministros Waldemar Zveiter, Cláudio Santos, Nilson Naves e
Eduardo Ribeiro.
Brasília (DF), 22 de setembro de 1992 (data do julgamento).
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 379-416, fevereiro 2010 409
Ministro Nilson Naves, Presidente
Ministro Dias Trindade, Relator
DJ 13.10.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Dias Trindade: Com fundamento no art. 105, III, a e c da
Constituição Federal, recorre Vilson Carlos Fenner de acórdão proferido pela
Quinta Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul, que deu
provimento à apelação interposta pelo Banco do Brasil S/A em embargos à
execução.
Alega o recorrente ter o acórdão ofendido o art. 5º do Decreto-Lei n.
167/1967, art. 4º do Decreto n. 22.626/1933, art. 14 da Lei n. 4.829/1965.
Alega ainda dissídio jurisprudencial.
Recebido e processado o recurso vieram os autos a este Tribunal.
É como relato.
VOTO
O Sr. Ministro Dias Trindade (Relator): Neste Superior Tribunal de
Justiça é fi rme a orientação no sentido da possibilidade de capitalização de juros,
desde que contratada, em casos de dívidas reguladas pelo Decreto-Lei n. 167,
de 14 de fevereiro de 1967, tanto quanto naquelas sob o Decreto-Lei n. 413 de
09 de janeiro de 1969, estando a matéria em vias de ser sumulada, daí porque
não contrariou o acórdão as disposições legais mencionadas no recurso especial,
algumas das quais sequer foram nele cogitadas.
Há o dissídio jurisprudencial, posto que, em situação similar, o Tribunal
de Justiça de Goiás decidiu pela impossibilidade dessa capitalização, ainda que
pactuada, razão pela qual é de ser conhecido o recurso, nessa parte.
Tenho, no entanto, que deva prevalecer o acórdão recorrido, que decidiu
da mesma forma do entendimento desta Turma, em inúmeros julgados sobre o
tema.
Isto posto, voto no sentido de conhecer, em parte, do recurso e lhe negar
provimento.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
410
RECURSO ESPECIAL N. 27.468-RS (92237860)
Relator: Ministro Nilson Naves
Recorrente: Banco do Brasil S/A
Recorrida: Marco Antônio Engenharia Ltda
Advogados: Lincoln de Souza Chaves e outros e José Horácio Gomes
Palmeiro e outros
EMENTA
Capitalização mensal de juros. Possibilidade, no caso de
fi nanciamento de atividade comercial (Decreto-Lei n. 413/1969,
aplicável por força da Lei n. 6.840/1980). Precedentes do STJ, dentre
outros os REsps ns. 11.843 e 21.262. Recurso especial conhecido e
provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso especial e lhe dar
provimento. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Eduardo Ribeiro.
Dias Trindade, Waldemar Zveiter e Cláudio Santos.
Brasília (DF), 10 de novembro de 1992 (data do julgamento).
Ministro Eduardo Ribeiro, Presidente
Ministro Nilson Naves, Relator
DJ 07.12.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Nilson Naves: É deste teor o acórdão recorrido do Tribunal
de Alçada do Rio Grande do Sul:
Dois são os pontos atacados nos embargos e desacolhidos pela sentença
impugnada.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 379-416, fevereiro 2010 411
O primeiro diz com a taxa de juros, que não poderia ser superior a 12% nos
expressos termos do art. 192 da Constituição Federal.
Rejeita-se o fundamento, como o fez a sentença porque o negócio celebrado
pelas partes é anterior à vigência da Constituição.
A par disso, vem a Câmara se orientando em que a referida norma
constitucional não é auto-aplicável.
Já quanto ao segundo ponto enfocado nos embargos, não foi acertada a
sentença.
É que esta Corte, de forma reiterada, vem entendendo que os juros não podem
ser capitalizados mensalmente, mas somente semestralmente.
A capitalização, mês a mês, é ilícita porque afronta o disposto no art. 4º do
Decreto n. 22.226/1933 e o art. 5º do Decreto-Lei n. 167/1967. (Julgados ns.
61/386; 63/236 e 64/341) (Súmula n. 121 do STF).
Assim, dá-se provimento apenas em parte ao apelo para reformar a sentença
quanto à capitalização dos juros, declarando que somente poderão ser
capitalizados semestralmente.
Em face da sucumbência parcial ser mínima, satisfará o apelante as despesas
do processo, bem como os honorários fi xados pela sentença.
O Banco do Brasil S/A interpôs recurso especial, alegando, em resumo:
... todavia, acolheu o apelo para reformar a sentença que deferiu a capitalização
mensal dos juros, porque expressamente prevista no texto da Cédula de Crédito
Comercial que instrumentaliza a execução.
2. Em assim decidindo, a colenda Segunda Câmara Cível do TARGS
contraria o disposto no art. 5º, inciso XXXVI, da Carta Magna, em face do que,
concomitantemente foi interposto recurso extraordinário, e o violou o disposto
na Lei n. 6.840, de 03.11.1980 e art. 11, § 2º, do Decreto-Lei n. 413, de 09.01.1969;
Decreto n. 22.626/1933, art. 4º, Lei n. 4.595/1964 e as Súmulas ns. 400 e 596 do
STF, tudo a exigir a interposição do presente recurso especial.
O recurso não foi admitido. Provi o agravo de instrumento, ordenando a
subida dos autos principais.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Nilson Naves (Relator): Trata-se de embargos à execução
com base em Cédula de Crédito Comercial. Em caso análogo, mas onde
admitiu-se a capitalização, votei dessa forma:
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
412
Determinei a subida dos autos principais, com os olhos voltados para o tema
da capitalização de juros (juros de juros ou juros sobre juros). Trata-se aqui de nota
de crédito comercial, regida pelo Decreto-Lei n. 413, de 09.01.1969, por força da
Lei n. 6.840, de 03.11.1980. Tenho pensamento, inclusive nesses casos, contrário à
capitalização. Fiquei, no entanto vencido nesta Terceira Turma, tendo o Sr. Ministro
Eduardo Ribeiro, na condição de primeiro voto vencedor redigido para o acórdão
essa ementa: “Juros. Capitalização. Decreto-Lei n. 413/1969. Anatocismo. Vedação
do Decreto n. 22.626/1933 afastada pelo Decreto-Lei n. 413/1969, aplicável a
empréstimos destinados ao fi nanciamento de atividades comerciais, por força
da Lei n. 6.840/1980” (REsp n. 11.843-RS, sessão de 13.04.1992). Passei, daí em
diante, a seguir o entendimento da Turma, até porque a Seção já se pronunciou
no mesmo sentido, recentemente.
Doutra parte, o acórdão deixou esclarecido que o caso não envolve cumulação
de correção monetária com comissão de permanência, vedada pela nossa Súmula
n. 30. No mais, o inconformismo da recorrente é de todo improcedente.
Não conheço do recurso especial. (REsp n. 21.262, de Goiás, julgado na sessão
do dia 23.06.1992)
No REsp n. 11.843, DJ de 25.05.1992, prevaleceu, como disse, o voto do
Sr. Ministro Eduardo Ribeiro, assim:
Questiona-se a respeito da capitalização de juros, em empréstimo destinado
ao fi nanciamento de atividade comercial. O acórdão, confi rmando a sentença
nessa parte, teve como inadmissível que aquela se fi zesse mensalmente.
Não se discute que continua em vigor o art. 4º do Decreto n. 22.626/1933,
aplicável mesmo às operações realizadas por instituições financeiras. Nesse
sentido era a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e encontra-se fi rmada
a deste Tribunal.
Ocorre, entretanto, que algumas exceções abriu a legislação, ensejando fossem
cobrados juros sobre juros. Uma delas pelo Decreto-Lei n. 413/1969, cujas regras
incidem na espécie, por força da Lei n. 6.840/1980. Claro está que tendo a norma
da “Lei de Usura” natureza infraconstitucional, poderia ser afastada sua incidência,
em certos casos, por outra de igual hierarquia.
O art. 5º daquele decreto-lei estabeleceu que os juros seriam “exigíveis em 30
de junho, 31 de dezembro, no vencimento, na liquidação da cédula ou, também,
em outras datas convencionadas no título ou admitidas pelo referido Conselho”.
Não havia ilicitude, pois, em pretender que os juros fossem pagos a cada mês.
O art. 11, § 2º, do mesmo diploma explicita que, havendo inadimplência, será
facultado ao fi nanciador a capitalização dos juros. Far-se-á essa, obviamente, nas
datas em que aqueles seriam devidos. Por fi m, estabelece o art. 14, a propósito
dos requisitos da cédula, que conterá, entre outros, “taxa de juros a pagar e
comissão de fi scalização, se houver, a épocas em que serão exigíveis, podendo ser
capitalizadas”.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 379-416, fevereiro 2010 413
Em face das disposições citadas, entendo não aplicável a vedação do Decreto
n. 22.626/1933.
Conheço do recurso e dou-lhe provimento.
Em atenção aos precedentes, que passei a acompanhar, ementei, por
exemplo, o REsp n. 23.844, também do Rio Grande do Sul, dessa forma:
“Capitalização mensal de juros. Possibilidade, no caso de fi nanciamento rural
(Decreto-Lei n. 167/1967, art. 5º). Precedentes do STJ, entre outros o REsp n.
11.843. Recurso especial conhecido e provido”.
Conheço do recurso especial e lhe dou provimento.
RECURSO ESPECIAL N. 31.025-RS
Relator: Ministro Sálvio de Figueiredo
Recorrente: Banco do Brasil S/A
Advogados: Jurandir Fernandes de Sousa e outros
Recorrida: Confecções Lowasa Ltda
Advogados: Paulo Roberto Gomes Leitão e outros
EMENTA
Cédula de crédito industrial. Capitalização mensal de juros.
Admissibilidade. Decreto-Lei n. 413/1969. Precedentes. Recurso
provido.
— Lícito se mostra pactuar, em cédula de crédito industrial,
capitalização mensal de juros, conforme autoriza o Decreto-Lei n.
413/1969.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das
notas taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
414
provimento. Votaram com o Relator os Ministros Barros Monteiro, Athos
Carneiro e Fontes de Alencar. Ausente, por motivo justifi cado, o Sr. Ministro
Bueno de Souza.
Brasília (DF), 17 de fevereiro de 1993 (data do julgamento).
Ministro Athos Carneiro, Presidente
Ministro Sálvio de Figueiredo Texeira, Relator
DJ 22.03.1993
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo: Julgados parcialmente procedentes
os embargos do devedor opostos à execução ajuizada por Banco do Brasil S/A,
apelaram as partes.
O egrégio Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul, ao dar parcial
provimento ao apelo do embargado e negar ao da embargante, concluiu
pela possibilidade da utilização da TR (Taxa Referencial) como índice de
atualização, ilegalidade da capitalização mensal de juros, inaplicabilidade da
teoria da imprevisão, inexistência de cerceamento de defesa e, ainda, não ser
auto-aplicável a norma constitucional que limita os juros a 12% a.a.
Inconformada, a embargante interpôs recursos extraordinário e especial,
que foram inadmitidos na origem.
Ainda irresignada, interpôs a recorrente, em petição única, agravo de
instrumento, que foi considerado deserto por falta de preparo.
O banco embargado também se valeu do recurso especial, alegando
contrariedade à Lei n. 4.595/1964, art. 5º do Decreto-Lei n. 413/1963, art.
1.262 do Código Civil, bem como divergência jurisprudencial. Argumentou, em
síntese, pela possibilidade da capitalização mensal dos juros.
Sem as contra-razões, foi o recurso admitido na origem apenas pela alínea c.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo (Relator): O cerne da impugnação
recursal, na espécie, cinge-se ao ponto concernente à possibilidade ou não da
capitalização mensal de juros.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 379-416, fevereiro 2010 415
O v. acórdão recorrido, ao contrário do recorrente, entende que a mesma é
vedada.
O tema já foi apreciado pelas Terceira e Quarta Turmas deste Tribunal,
que fi rmaram entendimento no sentido de admitir-se a capitalização mensal de
juros nos casos autorizados em lei.
Insta assinalar que, in casu, se trata de dívida representada por cédula de
crédito industrial, cuja disciplina é ditada pelo Decreto-Lei n. 413/1969.
Esta Quarta Turma, quando do julgamento do REsp n. 23.581-2-PR,
de que fui Relator, entendeu admissível a capitalização mensal de juros em se
tratando de nota de crédito comercial, exatamente por considerar aplicável a
esta, por força da Lei n. 6.840/1980, o referido Decreto-Lei n. 413/1969.
Naquela oportunidade, ao votar, consignei:
Esta Quarta Turma, no REsp n. 29.600-0-RS, julgado na sessão do dia 1º pp.,
relatado pelo Sr. Ministro Barros Monteiro, em caso idêntico, inclusive quanto à
parte recorrente, decidiu, por unanimidade, pela admissibilidade da capitalização
mensal de juros em nota de crédito comercial.
Do voto condutor daquele acórdão colhe-se:
O art. 5º da Lei n. 6.840, de 03.11.1980 manda aplicar à “nota de crédito
comercial” as normas do Decreto-Lei n. 413, de 09.01.1969. Este diploma
legal, por sua vez, pela interpretação conjugada de seus arts. 5º, 11, § 2º, 14,
inciso VI, e 16, inciso V, admite a capitalização mês a mês dos juros. Foi, aliás,
o que assentou a egrégia Terceira Turma deste Tribunal ao apreciar o REsp n.
11.843-RS, Relator designado o ilustre Ministro Eduardo Ribeiro.
No aludido precedente, o eminente Ministro Dias Trindade, em voto-
vista, teve oportunidade de salientar:
É certo que o art. 5º do Decreto-Lei n. 413 não se refere
expressamente à capitalização de juros e à incidência de juros sobre
juros, mas, por compreensão, ao admitir a exigibilidade de juros
e correção monetária em 30 de junho e em 31 de dezembro, ou
no vencimento do título, ou na sua liquidação, ou, ainda, segundo
pactuado ou admitidas pelo Conselho Monetário Nacional, induz,
sem dúvida, à possibilidade de capitalização e, conseqüência desta, é
a incidência de juros sobre o todo capitalizado, a partir dessas datas.
É o quanto basta para considerar-se afrontado na espécie o citado
preceito legal (art. 5º do Decreto-Lei n. 413/1969), tanto mais que o banco
recorrente a ele aliou o disposto no art. 11, § 2º, do mesmo Decreto-Lei,
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
416
apenas não tendo referido este último inciso legal como contrariado em
seu apelo excepcional.
Destarte, sendo possível a capitalização de juros em nota de crédito
comercial, porquanto aplicável a esta o Decreto-Lei n. 413/1969, via de
conseqüência, admissível se mostra referida capitalização em se tratando de
cédula de crédito industrial, consoante, inclusive, entendimento já fi rmado
pela Terceira Turma desta Corte em precedente específi co (REsp n. 20.599-6-
PR, Relator o Sr. Ministro Waldemar Zveiter, DJ de 03.08.1992). Em idêntica
diretriz e também daquela egrégia Turma os REsps ns. 26.790-RS (DJU de
09.11.1992), e 28.751-4-RS (DJ de 17.12.1992), de cujas ementas consta:
I - Consolidado na jurisprudência do STJ o entendimento no sentido da
possibilidade tanto nos títulos de crédito industrial, quanto nos títulos de crédito
comercial, da incidência da contagem de juros sobre juros, sem contrariar o
disposto na Súmula n. 121, mas sim harmonizando-se tal interpretação ao texto
do enunciado na Súmula n. 596, ambas do STF.
Em face do exposto, conheço do recurso e ao mesmo dou provimento para
declarar válida a capitalização mensal dos juros.
Súmula n. 94
SÚMULA N. 94
A parcela relativa ao ICMS inclui-se na base de cálculo do Finsocial.
Referências:
CF/1998, art. 155, I, b.
Decreto-Lei n. 406/1968.
Decreto-Lei n. 1.940/1982, art. 1º, § 1º.
Precedentes:
REsp 8.379-RJ (2ª T, 26.08.1992 — DJ 28.09.1992)
REsp 14.467-MG (1ª T, 27.11.1991 — DJ 03.02.1992)
REsp 16.521-DF (1ª T, 26.02.1992 — DJ 06.04.1992)
REsp 27.072-RJ (1ª T, 30.09.1992 — DJ 16.11.1992)
REsp 31.103-RJ (1ª T, 29.03.1993 — DJ 26.04.1993)
Primeira Seção, em 22.02.1994
DJ 28.02.1994, p. 2.961
RECURSO ESPECIAL N. 8.379-RJ (91.0002800-2)
Relator: Ministro José de Jesus Filho
Recorrente: União Federal
Recorrida: Cimentex S/A Materiais de Construção
Advogados: Paulo Roberto Isaías e outros
EMENTA
Tributário. ICM. Inclusão na base de cálculo do Finsocial.
I - Inclui-se na base de cálculo do Finsocial a parcela relativa ao
ICM.
II - Precedentes.
III - Recurso provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas,
decide a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar
provimento ao recurso, na forma do relatório e notas taquigráfi cas constantes
dos autos, que fi cam fazendo parte integrante do presente julgado. Participaram
do julgamento os Srs. Ministros Hélio Mosimann, Peçanha Martins, Américo
Luz e Pádua Ribeiro.
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 26 de agosto de 1992 (data do julgamento).
Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, Presidente
Ministro José de Jesus Filho, Relator
DJ 28.09.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro José de Jesus Filho: A União Federal, com apoio no
art. 105, III, letra c, da Constituição Federal, interpôs recurso especial ao v.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
422
acórdão, proferido pela Primeira Turma do TRF da 2ª Região, que restou assim
ementado:
Tributário. ICM. Base de cálculo do Finsocial.
Embora cobrado pelo comerciante ou industrial, no ato da venda, o ICM
constante do faturamento não integra a sua receita e sim a do Estado onde se
realiza a operação. E como tal, não integra a base de cálculo do Finsocial, que
incide sobre a receita bruta do contribuinte.
Remessa de ofício não provida. Sentença confi rmada.
Alega a Recorrente que a decisão atacada divergiu da jurisprudência do
extinto TFR, consubstanciada na Súmula n. 258.
O Recurso foi contra-arrazoado (fls. 99-101), admitido (fl. 104) e
encaminhado a esta Corte, onde a douta Subprocuradoria-Geral da República
opinou por seu provimento.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro José de Jesus Filho (Relator): A questão posta nos autos
— inclusão da parcela relativa ao ICM na base de cálculo do Finsocial — já foi
pacifi camente debatida e solucionada, tanto pelo extinto TFR, quanto por este
STJ, como atestam as seguintes ementas:
1. ICM. Inclusão na base de cálculo da contribuição para o Finsocial.
1. O ICM inclui-se na base de cálculo da contribuição para o Finsocial.
2. Sentença reformada.
REO n. 114.139-SP — Relator Ministro Pádua Ribeiro, DJ de 03.10.1988 — TFR.
2. Tributário. Finsocial. Base de cálculo.
Integrando o ICM a receita bruta das empresas, não há como excluí-lo para o
efeito de cálculo do Finsocial.
Sentença reformada para cassar a segurança.
REO n. 117.923-SP — Relator Ministro Armando Rolemberg. DJ de 03.04.1989
— TFR.
3. Tributário. Finsocial. ICM. Inclusão do ICM na base de cálculo do Finsocial.
Decreto-Lei n. 1.940/1982, art. 1º, p. 01.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 417-432, fevereiro 2010 423
1. Inclui-se na base de cálculo do Finsocial a parcela relativa ao ICM. Aplicação,
por analogia, da Súmula n. 258-TFR.
2. Recurso improvido.
AC n. 121.614-RJ — Relator Ministro Carlos Velloso, DJ de 21.11.1988 — TFR.
4. Tributário. Base de cálculo. PIS. Finsocial. ICM.
Inclui-se na base de cálculo do PIS e do Finsocial a parcela relativa ao ICM.
REsp n. 14.467-MG — Relator Ministro Gomes de Barros DJ de. 03.02.1992 —
STJ.
Pelo exposto, dou provimento ao recurso.
RECURSO ESPECIAL N. 14.467-MG (91.0018353-9)
Relator: Ministro Gomes de Barros
Recorrente: Fazenda São Sebastião S/A
Recorridas: Caixa Econômica Federal-CEF e União Federal
Advogados: Domingos Novelli Vaz e outros e Delvan Barcelos Júnior e
outros
EMENTA
Tributário. Base de cálculo. PIS. Finsocial. ICM.
Inclui-se na base de cálculo do PIS e do Finsocial a parcela
relativa ao ICM.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados os autos, em que são partes as acima indicadas, decide
a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar
provimento ao recurso na forma do relatório e notas taquigráfi cas constantes
dos autos, que fi cam fazendo parte integrante do presente julgado.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
424
Custas, como de lei.
Brasília (DF), 27 de novembro de 1991 (data do julgamento).
Ministro Pedro Acioli, Presidente
Ministro Gomes de Barros, Relator
DJ 03.02.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Gomes de Barros: Fazenda São Sebastião S/A ajuizou
declaratória, cumulada com repetição de indébito, contra a União Federal e
a Caixa Econômica Federal objetivando excluir da base de cálculo do PIS e
do Finsocial a parcela relativa ao ICM. Sustenta que tal parcela não constitui
faturamento porque o imposto é transferido ao consumidor e recolhido ao
Estado.
A ação foi julgada improcedente em primeiro grau, condenando-se a
autora em custas e honorários. Determinou-se, ainda, a exclusão da CEF da
lide, por ilegitimidade passiva ad causam.
Em apelação a Autora sustentou a legitimidade da CEF. No mérito, disse
reiterar os argumentos da inicial. O TRF da 1ª Região, por sua Terceira Turma,
à unanimidade, desproveu a apelação em acórdão assim resumido:
Tributário. PIS. Finsocial. ICM. Ação de repetição de indébito.
I - Decidiu a egrégia Segunda Seção, ao julgar o EAC n. 89.01.20803-2-MG,
Relatora Juíza Eliana Calmon, por maioria, manter a Súmula n. 258/TFR (Ementa:
‘1. A conclusão do ICM, na base do cálculo do PIS, é hoje matéria sumulada pelo
extinto TFR (Súmula n. 258). 2. Sendo o ICM um imposto que, pela sistemática, é
cobrado por dentro, sem destaque na nota fi scal, inclusive, assim, no faturamento
bruto da empresa. 3 - Embargos infringentes acolhidos’). II - Em relação à
contribuição para o Finsocial, segundo este entendimento, o mesmo ocorre. III -
Ressalva do ponto de vista do Relator . IV. Apelação denegada. fl . 289.
Foi interposto REsp, com base no art. 105, III, c, da CF, admitido por
despacho do Presidente do TRF, 1ª Região, subindo os autos a este STJ.
É o relatório.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 417-432, fevereiro 2010 425
VOTO
O Sr. Ministro Gomes de Barros (Relator): A tese da inclusão da parcela
relativa ao ICM na base de cálculo do PIS, sumulada que foi no TFR (Súmula
n. 258), foi estendida, por analogia, à hipótese do Finsocial. Assim se decidiu, a
exemplo, na AC n. 121.614, Relator Ministro Carlos Velloso, DJ de 21.11.1988;
REO n. 117.923, Relator Ministro Armando Rollemberg, DJ de 10.08.1988 e
no REsp n. 6.924, Relator Ministro Pedro Acioli, DJ de 23.09.1991.
Pacifi cada a Jurisprudência, também neste Tribunal, entendo nada haver a
aditar, em razão do que nego provimento ao recurso.
RECURSO ESPECIAL N. 16.521-DF (91.0023655-1)
Relator: Ministro Garcia Vieira
Recorrente: Lopsa - Indústria e Comércio de Torneados Ltda
Recorrida: União Federal
Advogados: Sálvio de Faria Caram Zuquim e outros
EMENTA
Finsocial. Base de cálculo. ICM.
Inclui-se na base de cálculo da contribuição para o Finsocial a
parcela relativa ao ICM.
Recurso improvido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao recurso. Votaram
com o Relator os Srs. Ministros Demócrito Reinaldo e Gomes de Barros.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
426
Brasília (DF), 26 de fevereiro de 1992 (data do julgamento).
Ministro Garcia Vieira, Presidente e Relator.
DJ 06.04.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Garcia Vieira: Trata-se de ação ordinária ajuizada contra
a União, objetivando a restituição das parcelas recolhidas a título de Finsocial,
instituído pelo Decreto-Lei n. 1.940, de 25 de maio de 1982, após excluído o
ICM de sua base de cálculo.
Julgada improcedente a ação, o egrégio Tribunal Regional Federal da 1ª
Região, apreciando apelo interposto, assim decidiu:
Tributário. Finsocial. Base de cálculo. Inclusão do ICM.
1. O ICM compõe as diversas parcelas integrativas do custo suportado pelo
comerciante para exercício de sua atividade, razão por que deve ser considerado
para o cálculo da contribuição para o Finsocial. O mesmo não ocorre com o IPI
que não participando da formação do preço, deixa de integrar o faturamento.
2. Apelo improvido. (fl . 242)
Inconformada, a Autora — Lopsa — Indústria e Comércio de Torneados
Ltda, interpôs o presente recurso especial, fundado no art. 105, inciso III, letras
a e c da CF.
Alega que o v. acórdão recorrido contrariou o § 1º do art. 1º do Decreto-
Lei n. 1.940/1982, negou vigência ao art. 2º, I, e § 7º do Decreto-Lei n.
406/1969, ao defi nir como base de cálculo do Finsocial a mesma do ICM,
afrontando ainda princípio constitucional e divergindo de arestos que traz à
colação.
Entende que a contribuição para o Finsocial constitui um imposto
calculado sobre a receita bruta das empresas não podendo, por esta razão, ser
incluído, no cálculo dessa contribuição social, um outro imposto indireto, como
o ICM.
Indica acórdãos divergentes e requer o provimento do especial (fl s. 244-
252).
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 417-432, fevereiro 2010 427
Admitido o recurso (fls. 276-277), subiram os autos a este colendo
Tribunal.
É relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Garcia Vieira (Relator): O Finsocial, instituído pelo
Decreto-Lei n. 1.940, de 25 de maio de 1982 (art. 1º), incide “sobre a receita
bruta das empresas públicas e privadas que realizam venda de mercadorias, bem
como das instituições fi nanceiras e das sociedades seguradoras” (§ 1º). Como o
ICM integra o preço da mercadoria para qualquer efeito, ele faz parte da receita
bruta, base de cálculo do Finsocial (Decreto-Lei n. 1.598, de 26.12.1977, art.
12). Assim era o entendimento tranqüilo do TFR, cristalizado na Súmula n.
258, verbis:
Inclui-se na base de cálculo do PIS a parcela relativa ao ICM.
Em relação ao Finsocial a questão é a mesma e assim entendeu o TFR na
Remessa Ex offi cio n. 114.139-SP, DJ de 03.10.1988, AC n. 121.614-RJ, DJ de
22.11.1988 e REO n. 117.923-SP, DJ de 03.04.1989. Em todos estes acórdãos,
entendeu-se que o ICM se inclui na base de cálculo da contribuição para o
Finsocial.
Nego provimento ao recurso.
RECURSO ESPECIAL N. 27.072-RJ (92.0022771-6)
Relator: Ministro Garcia Vieira
Recorrente: Cobreq Companhia Brasileira de Equipamentos
Recorrida: Fazenda Nacional
Advogados: José Geraldo Garcia de Souza e outros e Salvador Cícero
Velloso Pinto e outros
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
428
EMENTA
ICM. Finsocial.
Inclui-se na base de cálculo da contribuição para o Finsocial a
parcela relativa do ICM.
Recurso improvido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao recurso. Votaram
com o Relator os Srs. Ministros Gomes de Barros, Milton Pereira e Cesar
Rocha. Ausente, justifi cadamente, o Sr. Ministro Demócrito Reinaldo.
Brasília (DF), 30 de setembro de 1992 (data do julgamento).
Ministro Garcia Vieira, Presidente e Relator
DJ 16.11.1992
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Garcia Vieira: Trata-se de ação ordinária ajuizada contra
a União, objetivando a restituição das parcelas recolhidas a título de Finsocial,
instituído pelo Decreto-Lei n. 1.940, de 25 de maio de 1982, após excluído o
ICM de sua base de cálculo, acrescido de juros e correção monetária.
Julgada procedente a ação, o egrégio TRF da 2ª Região, apreciando apelo
interposto, assim decidiu:
Tributário. Inclusão do ICM na base imponível do Finsocial.
I - Reiterou-se a jurisprudência do extinto TFR no sentido da inclusão do antigo
ICM na base imponível do Finsocial (Decreto-Lei n. 1.940/1982).
II - Aplicação, ainda, por analogia, da Súmula n. 258, daquela Corte.
III - Apelação conhecida e provida, nos termos do voto condutor. Remessa
ofi cial conhecida, mas prejudicada.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 417-432, fevereiro 2010 429
Inconformada, a autora interpôs recurso especial apoiado no art. 105,
inciso III, alínea a da CF, alegando que o v. acórdão recorrido ao entender que
o tributo se inclui na receita bruta do contribuinte deu interpretação divergente
da que lhe tem dado outros tribunais.
Sustenta, em síntese, que incluir o ICM na base de cálculo do Finsocial
é cobrar tributo sobre tributo e, ainda que um tributo não pode constituir fato
gerador de outro tributo.
É o relatório.
VOTO
O Sr. Ministro Garcia Vieira (Relator): O Finsocial, instituído pelo
Decreto-Lei n. 1.940, de 25 de maio de 1982 (art. 1º), incide “sobre a receita
bruta das empresas públicas e privadas que realizam venda de mercadorias, bem
como das instituições fi nanceiras e das sociedades seguradoras” (§ 1º). Como o
ICM integra o preço da mercadoria para qualquer efeito, ele faz parte da receita
bruta, base de cálculo do Finsocial (Decreto-Lei n. 1.598, de 26.12.1977, art.
12). Assim era o entendimento tranqüilo do TFR, cristalizado na Súmula n.
258, verbis:
Inclui-se na base de cálculo do PIS a parcela relativa do ICM.
Em relação ao Finsocial a questão é a mesma e assim entendeu o TFR na
REO n. 114.139-SP, DJ de 03.10.1988, AC n. 121.614-RJ, DJ de 22.11.1988 e
REO n. 117.923-SP, DJ de 03.04.1989. Em todos estes acórdãos, entendeu-se
que o ICM se inclui na base de cálculo da contribuição para o Finsocial.
Nego provimento ao recurso.
RECURSO ESPECIAL N. 31.103-RJ (92.0034200-0)
Relator: Ministro Demócrito Reinaldo
Recorrente: Companhia Estanífera do Brasil
Recorrida: Fazenda Nacional
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
430
Advogados: Paulo Rogério de A. Brandão Couto e outros e Antônio Pedro
de Carvalho Cesário Alvim e outros
EMENTA
Tributário. Inclusão da parcela relativa ao ICM na base de
cálculo do Finsocial.
Este egrégio Superior Tribunal de Justiça fi rmou o escólio de que
se inclui na base de cálculo do Finsocial a parcela relativa ao ICM.
Recurso improvido, à unanimidade.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados os autos, em que são partes as acima indicadas, decide
a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar
provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator, na forma
do relatório e notas taquigráfi cas constantes dos autos, que fi cam fazendo parte
integrante do presente julgado. Participaram do julgamento os Srs. Ministros
Gomes de Barros, Milton Pereira e Cesar Rocha. Ausente, justifi cadamente, o
Sr. Ministro Garcia Vieira. Custas, como de lei.
Brasília (DF), 29 de março de 1993 (data do julgamento).
Ministro Demócrito Reinaldo, Presidente e Relator
DJ 26.04.1993
RELATÓRIO
O Sr. Ministro Demócrito Reinaldo: Cuidam os presentes autos de recurso
especial, fulcrado nas alíneas a e c do permissivo constitucional, interposto
contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, que considerou lícita
a inclusão da parcela relativa ao ICM na base de cálculo do chamado Finsocial.
A recorrente dá como afrontados os arts. 1º, § 3º, e 2º do Decreto-Lei
n. 1.940/1982; o art. 97, IV, do Código Tributário Nacional; e o art. 12 do
Decreto-Lei n. 1.598/1977.
SÚMULAS - PRECEDENTES
RSSTJ, a. 4, (6): 417-432, fevereiro 2010 431
Quanto ao dissídio pretoriano, traz a recorrente à colação julgados de
diversos tribunais, alegando, ademais, divergência para com a Súmula n. 125 do
Supremo Tribunal Federal.
Contra-razões, pela Fazenda Nacional às fl s. 160 a 162.
É o relatório.
VOTO PRELIMINAR
O Sr. Ministro Demócrito Reinaldo (Relator): Senhores Ministros, a
alegação de divergência jurisprudencial não merece conhecimento por esta
egrégia Corte.
É que os acórdãos apontados como paradigmas não se prestam à
comprovação do dissídio, posto referirem-se à questão da exclusão do já extinto
imposto de consumo da base de cálculo do (igualmente extinto) imposto de
indústrias e profi ssões, hipótese distinta da de que cuidam estes autos, que porta
a ementa seguinte:
Tributário. Finsocial. ICM. Inclusão do ICM na base de cálculo do Finsocial.
Decreto-Lei n. 1.940/1982, art. 1º, § 1º.
I - Inclui-se na base de cálculo do Finsocial a parcela relativa ao ICM. Aplicação,
por analogia, da Súmula n. 258-TFR.
II - Recurso improvido.
O mesmo ocorre quanto ao aludido confronto para com a Súmula n. 125
da Suprema Corte.
Destarte, não comprovado o dissídio, não conheço do recurso especial,
quanto à letra c.
É como voto.
VOTO-MÉRITO
O Sr. Ministro Demócrito Reinaldo (Relator): Srs. Ministros, versam
os presentes autos sobre a questão da inclusão da parcela do ICM na base de
cálculo do chamado Finsocial.
Visa a recorrente à reforma do julgado, que entendeu pela referida inclusão.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
432
Em que pesem os argumentos levantados pela parte irresignada, a matéria
já encontra escólio fi rmado nesta Corte, cujas decisões têm sido sempre no
mesmo sentido do acórdão guerreado.
Veja-se, por exemplos, os seguintes arestos:
Tributário. Base de cálculo. PIS. Finsocial. ICM.
Inclui-se na base de cálculo do PIS e do Finsocial a parcela relativa ao ICM.
(REsp n. 14.467-0-MG, Relator Ministro Gomes de Barros, julgado em
27.11.1991, votação unânime, DJ de 03.02.1991)
ICM. Finsocial.
Inclui-se na base de cálculo da contribuição para o Finsocial a parcela relativa
ao ICM.
Recurso improvido.
(REsp n. 27.072-1-RJ, Relator Ministro Garcia Vieira, julgado em 30.09.1992,
votação unânime, DJ de 16.11.1992)
Idêntica postura já tinha sido adotada no extinto Tribunal Federal de
Recursos, como se vê no seguinte julgado:
ICM. Inclusão na base de cálculo da contribuição para o Finsocial.
I - O ICM inclui-se na base de cálculo da contribuição para o Finsocial.
II - Sentença reformada.
(Remessa Ex offi cio n. 114.139-SP, Relator Ministro Pádua Ribeiro, julgado em
12.09.1988, votação unânime).
Pelas razões expostas, forte na fi rme jurisprudência desta Corte, nego
provimento ao recurso especial.
É como voto.
Índice Analítico
A
Ação acidentária - Instância administrativa - Exaurimento - Irrelevância -
Lei n. 6.367/1976, arts. 14 e 19. Súmula n. 89-STJ. RSSTJ 6/279.
Agravo de instrumento - Decisão - CF/1988, art. 105, III - Recurso
especial - Cabimento. Súmula n. 86-STJ. RSSTJ 6/133.
Alienação fi duciária - Inoponibilidade - Lei n. 4.728/1965, art. 66, §§ 1°
e 10, na redação do Decreto-Lei n. 911/1969 - Lei n. 5.108/1966, art. 52 -
Terceiro de boa-fé - Veículo automotor - Certifi cado de registro - Anotação
- Ausência. Súmula n. 92-STJ. RSSTJ 6/355.
C
Cédulas de crédito - Decreto-Lei n. 167/1967, arts. 5° e 9° - Decreto-Lei
n. 413/1969, art. 5° - Lei n. 6.840/1980 - Pacto de capitalização de juros -
Admissibilidade. Súmula n. 93-STJ. RSSTJ 6/379.
CF/1988, art. 105, III - Agravo de instrumento - Decisão - Recurso
especial - Cabimento. Súmula n. 86-STJ. RSSTJ 6/133.
CF/1988, art. 109, IV - Competência - Crime contra a fauna - Justiça
Federal - Lei n. 5.197/1967 - Lei n. 7.653/1988. Súmula n. 91-STJ. RSSTJ
6/333.
CF/1988, art. 125, § 4° - Competência - CPP, art. 79, I - Crime comum
simultâneo - Crime militar - Justiça Comum - Justiça Estadual Militar.
Súmula n. 90-STJ. RSSTJ 6/309.
CF/1988, art. 155, I, b - Decreto-Lei n. 406/1968 - Decreto-Lei n.
1.940/1982, art. 1°, § 1° - Finsocial - Base de cálculo - Imposto sobre
Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Súmula n. 94-STJ. RSSTJ
6/417.
CF/1988, art. 155, I, b - Decreto-Lei n. 406/1968 - Imposto sobre
Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) - Isenção - Lei
Complementar n. 4/1969 - Ração balanceada para animais - Abrangência.
Súmula n. 87-STJ. RSSTJ 6/213.
Competência - CF/1988, art. 109, IV - Crime contra a fauna - Justiça
Federal - Lei n. 5.197/1967 - Lei n. 7.653/1988. Súmula n. 91-STJ. RSSTJ
6/333.
Competência - CF/1988, art. 125, § 4° - CPP, art. 79, I - Crime comum
simultâneo - Crime militar - Justiça Comum - Justiça Estadual Militar.
Súmula n. 90-STJ. RSSTJ 6/309.
ÍNDICE ANALÍTICO
436
CPC, arts. 273, 496, III, e 530 - Embargos infringentes - Admissibilidade -
Processo falimentar. Súmula n. 88-STJ. RSSTJ 6/245.
CPC, art. 1.046, § 1° - Embargos de terceiro - Cabimento - Promessa de
compra e venda - Registro - Ausência. Súmula n. 84-STJ. RSSTJ 6/11.
CPP, art. 79, I - CF/1988, art. 125, § 4° - Competência - Crime comum
simultâneo - Crime militar - Justiça Comum - Justiça Estadual Militar.
Súmula n. 90-STJ. RSSTJ 6/309.
Crime comum simultâneo - CF/1988, art. 125, § 4° - Competência - CPP,
art. 79, I - Crime militar - Justiça Comum - Justiça Estadual Militar.
Súmula n. 90-STJ. RSSTJ 6/309.
Crime contra a fauna - CF/1988, art. 109, IV - Competência - Justiça
Federal - Lei n. 5.197/1967 - Lei n. 7.653/1988. Súmula n. 91-STJ. RSSTJ
6/333.
Crime militar - CF/1988, art. 125, § 4° - Competência - CPP, art. 79,
I - Crime comum simultâneo - Justiça Comum - Justiça Estadual Militar.
Súmula n. 90-STJ. RSSTJ 6/309.
D
Decreto n. 20.910/1932, art. 3° - Fazenda Pública - Obrigação de trato sucessivo - Prescrição - Parcelas vencidas - Termo fi nal. Súmula n. 85-STJ. RSSTJ 6/103.
Decreto-Lei n. 167/1967, arts. 5° e 9° - Cédulas de crédito - Decreto-Lei n. 413/1969, art. 5° - Lei n. 6.840/1980 - Pacto de capitalização de juros - Admissibilidade. Súmula n. 93-STJ. RSSTJ 6/379.
Decreto-Lei n. 406/1968 - CF/1988, art. 155, I, b - Decreto-Lei n. 1.940/1982, art. 1°, § 1° - Finsocial - Base de cálculo - Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Súmula n. 94-STJ. RSSTJ 6/417.
Decreto-Lei n. 406/1968 - CF/1988, art. 155, I, b - Imposto sobre
Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) - Isenção - Lei
Complementar n. 4/1969 - Ração balanceada para animais - Abrangência.
Súmula n. 87-STJ. RSSTJ 6/213.
Decreto-Lei n. 413/1969, art. 5° - Cédulas de crédito - Decreto-Lei n.
167/1967, arts. 5° e 9° - Lei n. 6.840/1980 - Pacto de capitalização de juros -
Admissibilidade. Súmula n. 93-STJ. RSSTJ 6/379.
Decreto-Lei n. 1.940/1982, art. 1°, § 1° - CF/1988, art. 155, I, b - Decreto-
Lei n. 406/1968 - Finsocial - Base de cálculo - Imposto sobre Circulação de
Mercadorias e Serviços (ICMS). Súmula n. 94-STJ. RSSTJ 6/417.
ÍNDICE ANALÍTICO
RSSTJ, a. 4, (6): 433-440, fevereiro 2010 437
E
Embargos de terceiro - Cabimento - CPC, art. 1.046, § 1° - Promessa de
compra e venda - Registro - Ausência. Súmula n. 84-STJ. RSSTJ 6/11.
Embargos infringentes - Admissibilidade - CPC, arts. 273, 496, III, e 530 -
Processo falimentar. Súmula n. 88-STJ. RSSTJ 6/245.
F
Fazenda Pública - Decreto n. 20.910/1932, art. 3° - Obrigação de trato
sucessivo - Prescrição - Parcelas vencidas - Termo fi nal. Súmula n. 85-STJ.
RSSTJ 6/103.
Finsocial - Base de cálculo - CF/1988, art. 155, I, b - Decreto-Lei n.
406/1968 - Decreto-Lei n. 1.940/1982, art. 1°, § 1° - Imposto sobre
Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Súmula n. 94-STJ. RSSTJ
6/417.
I
Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) - CF/1988,
art. 155, I, b - Decreto-Lei n. 406/1968 - Decreto-Lei n. 1.940/1982, art. 1°,
§ 1° - Finsocial - Base de cálculo. Súmula n. 94-STJ. RSSTJ 6/417.
Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) - CF/1988,
art. 155, I, b - Decreto-Lei n. 406/1968 - Isenção - Lei Complementar n.
4/1969 - Ração balanceada para animais - Abrangência. Súmula n. 87-STJ.
RSSTJ 6/213.
Instância administrativa - Exaurimento - Irrelevância - Ação acidentária -
Lei n. 6.367/1976, arts. 14 e 19. Súmula n. 89-STJ. RSSTJ 6/279.
Isenção - CF/1988, art. 155, I, b - Decreto-Lei n. 406/1968 - Imposto
sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) - Lei Complementar
n. 4/1969 - Ração balanceada para animais - Abrangência. Súmula n. 87-
STJ. RSSTJ 6/213.
J
Justiça Comum - CF/1988, art. 125, § 4° - Competência - CPP, art. 79,
I - Crime comum simultâneo - Crime militar - Justiça Estadual Militar.
Súmula n. 90-STJ. RSSTJ 6/309.
ÍNDICE ANALÍTICO
438
Justiça Estadual Militar - CF/1988, art. 125, § 4° - Competência - CPP, art.
79, I - Crime comum simultâneo - Crime militar - Justiça Comum. Súmula
n. 90-STJ. RSSTJ 6/309.
Justiça Federal - CF/1988, art. 109, IV - Competência - Crime contra a
fauna - Lei n. 5.197/1967 - Lei n. 7.653/1988. Súmula n. 91-STJ. RSSTJ
6/333.
L
Lei Complementar n. 4/1969 - CF/1988, art. 155, I, b - Decreto-Lei n.
406/1968 - Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS)
- Isenção - Ração balanceada para animais - Abrangência. Súmula n. 87-
STJ. RSSTJ 6/213.
Lei n. 4.728/1965, art. 66, §§ 1° e 10, na redação do Decreto-Lei n.
911/1969 - Alienação fi duciária - Inoponibilidade - Lei n. 5.108/1966,
art. 52 - Terceiro de boa-fé - Veículo automotor - Certifi cado de registro -
Anotação - Ausência. Súmula n. 92-STJ. RSSTJ 6/355.
Lei n. 5.108/1966, art. 52 - Alienação fi duciária - Inoponibilidade - Lei n.
4.728/1965, art. 66, §§ 1° e 10, na redação do Decreto-Lei n. 911/1969 -
Terceiro de boa-fé - Veículo automotor - Certifi cado de registro - Anotação
- Ausência. Súmula n. 92-STJ. RSSTJ 6/355.
Lei n. 5.197/1967 - CF/1988, art. 109, IV - Competência - Crime contra
a fauna - Justiça Federal - Lei n. 7.653/1988. Súmula n. 91-STJ. RSSTJ
6/333.
Lei n. 6.367/1976, arts. 14 e 19 - Ação acidentária - Instância administrativa
- Exaurimento - Irrelevância. Súmula n. 89-STJ. RSSTJ 6/279.
Lei n. 6.840/1980 - Cédulas de crédito - Decreto-Lei n. 167/1967, arts. 5°
e 9° - Decreto-Lei n. 413/1969, art. 5° - Pacto de capitalização de juros -
Admissibilidade. Súmula n. 93-STJ. RSSTJ 6/379.
Lei n. 7.653/1988 - CF/1988, art. 109, IV - Competência - Crime contra
a fauna - Justiça Federal - Lei n. 5.197/1967. Súmula n. 91-STJ. RSSTJ
6/333.
O
Obrigação de trato sucessivo - Decreto n. 20.910/1932, art. 3° - Fazenda
Pública - Prescrição - Parcelas vencidas - Termo fi nal. Súmula n. 85-STJ.
RSSTJ 6/103.
ÍNDICE ANALÍTICO
RSSTJ, a. 4, (6): 433-440, fevereiro 2010 439
P
Pacto de capitalização de juros - Admissibilidade - Cédulas de crédito -
Decreto-Lei n. 167/1967, arts. 5° e 9° - Decreto-Lei n. 413/1969, art. 5° -
Lei n. 6.840/1980. Súmula n. 93-STJ. RSSTJ 6/379.
Prescrição - Parcelas vencidas - Termo fi nal - Decreto n. 20.910/1932, art.
3° - Fazenda Pública - Obrigação de trato sucessivo. Súmula n. 85-STJ.
RSSTJ 6/103.
Processo falimentar - CPC, arts. 273, 496, III, e 530 - Embargos
infringentes - Admissibilidade. Súmula n. 88-STJ. RSSTJ 6/245.
Promessa de compra e venda - CPC, art. 1.046, § 1° - Embargos de terceiro
- Cabimento - Registro - Ausência. Súmula n. 84-STJ. RSSTJ 6/11.
R
Ração balanceada para animais - Abrangência - CF/1988, art. 155, I, b -
Decreto-Lei n. 406/1968 - Imposto sobre Circulação de Mercadorias e
Serviços (ICMS) - Isenção - Lei Complementar n. 4/1969. Súmula n. 87-
STJ. RSSTJ 6/213.
Recurso especial - Cabimento - Agravo de instrumento - Decisão -
CF/1988, art. 105, III. Súmula n. 86-STJ. RSSTJ 6/133.
Registro - Ausência - CPC, art. 1.046, § 1° - Embargos de terceiro -
Cabimento - Promessa de compra e venda. Súmula n. 84-STJ. RSSTJ 6/11.
S
Súmula n. 84-STJ - CPC, art. 1.046, § 1° - Embargos de terceiro -
Cabimento - Promessa de compra e venda - Registro - Ausência. RSSTJ
6/11.
Súmula n. 85-STJ - Decreto n. 20.910/1932, art. 3° - Fazenda Pública -
Obrigação de trato sucessivo - Prescrição - Parcelas vencidas - Termo fi nal.
RSSTJ 6/103.
Súmula n. 86-STJ - Agravo de instrumento - Decisão - CF/1988, art. 105,
III - Recurso especial - Cabimento. RSSTJ 6/133.
Súmula n. 87-STJ - CF/1988, art. 155, I, b - Decreto-Lei n. 406/1968 -
Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) - Isenção
- Lei Complementar n. 4/1969 - Ração balanceada para animais -
Abrangência. RSSTJ 6/213.
ÍNDICE ANALÍTICO
440
Súmula n. 88-STJ - CPC, arts. 273, 496, III, e 530 - Embargos infringentes
- Admissibilidade - Processo falimentar. RSSTJ 6/245.
Súmula n. 89-STJ - Ação acidentária - Instância administrativa -
Exaurimento - Irrelevância - Lei n. 6.367/1976, arts. 14 e 19. RSSTJ 6/279.
Súmula n. 90-STJ - CF/1988, art. 125, § 4° - Competência - CPP, art. 79,
I - Crime comum simultâneo - Crime militar - Justiça Comum - Justiça
Estadual Militar. RSSTJ 6/309.
Súmula n. 91-STJ - CF/1988, art. 109, IV - Competência - Crime contra
a fauna - Justiça Federal - Lei n. 5.197/1967 - Lei n. 7.653/1988. RSSTJ
6/333.
Súmula n. 92-STJ - Alienação fi duciária - Inoponibilidade - Lei n.
4.728/1965, art. 66, §§ 1° e 10, na redação do Decreto-Lei n. 911/1969 - Lei
n. 5.108/1966, art. 52 - Terceiro de boa-fé - Veículo automotor - Certifi cado
de registro - Anotação - Ausência. RSSTJ 6/355.
Súmula n. 93-STJ - Cédulas de crédito - Decreto-Lei n. 167/1967, arts.
5° e 9° - Decreto-Lei n. 413/1969, art. 5° - Lei n. 6.840/1980 - Pacto de
capitalização de juros - Admissibilidade. RSSTJ 6/379.
Súmula n. 94-STJ - CF/1988, art. 155, I, b - Decreto-Lei n. 406/1968
- Decreto-Lei n. 1.940/1982, art. 1°, § 1° - Finsocial - Base de cálculo
- Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). RSSTJ
6/417.
T
Terceiro de boa-fé - Alienação fi duciária - Inoponibilidade - Lei n.
4.728/1965, art. 66, §§ 1° e 10, na redação do Decreto-Lei n. 911/1969
- Lei n. 5.108/1966, art. 52 - Veículo automotor - Certifi cado de registro -
Anotação - Ausência. Súmula n. 92-STJ. RSSTJ 6/355.
V
Veículo automotor - Certifi cado de registro - Anotação - Ausência -
Alienação fi duciária - Inoponibilidade - Lei n. 4.728/1965, art. 66, §§ 1°
e 10, na redação do Decreto-Lei n. 911/1969 - Lei n. 5.108/1966, art. 52 -
Terceiro de boa-fé. Súmula n. 92-STJ. RSSTJ 6/355.
Índice Sistemático
SÚMULA 84
REsp 188-PR ..........Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira .................... RSSTJ 6/15REsp 226-SP ...........Rel. Min. Gueiros Leite ............................................ RSSTJ 6/29REsp 573-SP ...........Rel. Min. Bueno de Souza......................................... RSSTJ 6/43REsp 662-RS ..........Rel. Min. Waldemar Zveiter ..................................... RSSTJ 6/64REsp 696-RS ..........Rel. Min. Fontes de Alencar ..................................... RSSTJ 6/70REsp 866-RS ..........Rel. Min. Eduardo Ribeiro ........................................ RSSTJ 6/85REsp 1.172-SP ........Rel. Min. Athos Carneiro ......................................... RSSTJ 6/87REsp 2.286-SP ........Rel. Min. Cláudio Santos .......................................... RSSTJ 6/94REsp 8.598-SP ........Rel. Min. Dias Trindade ............................................ RSSTJ 6/96REsp 9.448-SP ........Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro ......................... RSSTJ 6/99
SÚMULA 85
REsp 2.140-SP ........Rel. Min. Garcia Vieira ........................................... RSSTJ 6/107
REsp 6.408-SP ........Rel. Min. Pedro Acioli ............................................ RSSTJ 6/114
REsp 10.110-SP ......Rel. Min. Francisco Peçanha Martins ..................... RSSTJ 6/117
REsp 11.873-SP ......Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro ....................... RSSTJ 6/120
REsp 12.217-SP ......Rel. Min. Humberto Gomes de Barros ................... RSSTJ 6/122
REsp 29.448-SP ......Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro ...................... RSSTJ 6/126
REsp 31.661-SP ......Rel. Min. Jesus Costa Lima ..................................... RSSTJ 6/130
SÚMULA 86
EREsp 11.919-AM .Rel. Min. José Dantas.............................................. RSSTJ 6/137
EREsp 12.270-SP ...Rel. Min. Nilson Naves ........................................... RSSTJ 6/161
EREsp 16.118-SP ...Rel. Min. William Patterson ................................... RSSTJ 6/187
EREsp 19.481-SP ...Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro ...................... RSSTJ 6/198
ÍNDICE SISTEMÁTICO
444
SÚMULA 87
REsp 1.796-MG .....Rel. Min. Américo Luz ........................................... RSSTJ 6/217
REsp 7.450-SP ........Rel. Min. José de Jesus Filho ................................... RSSTJ 6/219
REsp 7.560-MG .....Rel. Min. Ilmar Galvão ........................................... RSSTJ 6/221
REsp 10.107-SP ......Rel. Min. Hélio Mosimann ..................................... RSSTJ 6/226
REsp 10.755-MG ...Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro ....................... RSSTJ 6/229
REsp 14.652-SP ......Rel. Min. Garcia Vieira ........................................... RSSTJ 6/233
REsp 14.808-MG ...Rel. Min. Demócrito Reinaldo ................................ RSSTJ 6/237
SÚMULA 88
REsp 4.155-RJ ........Rel. Min. Waldemar Zveiter ................................... RSSTJ 6/249
REsp 25.941-SP ......Rel. Min. Barros Monteiro ...................................... RSSTJ 6/262
REsp 27.929-RS .....Rel. Min. Athos Carneiro ....................................... RSSTJ 6/264
REsp 33.243-SP ......Rel. Min. Fontes de Alencar ................................... RSSTJ 6/275
SÚMULA 89
REsp 28.570-RJ ......Rel. Min. Costa Lima ............................................. RSSTJ 6/283
REsp 29.335-RJ ......Rel. Min. Pedro Acioli ............................................ RSSTJ 6/285
REsp 32.378-RJ ......Rel. Min. Cid Flaquer Scartezzini .......................... RSSTJ 6/287
REsp 32.424-RJ ......Rel. Min. Assis Toledo ............................................ RSSTJ 6/290
REsp 32.691-RJ ......Rel. Min. Adhemar Maciel ..................................... RSSTJ 6/293
REsp 32.717-RJ ......Rel. Min. José Dantas.............................................. RSSTJ 6/295
REsp 33.053-RJ ......Rel. Min. Edson Vidigal ......................................... RSSTJ 6/297
REsp 33.072-RJ ......Rel. Min. Anselmo Santiago ................................... RSSTJ 6/300
REsp 33.615-RJ ......Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro ...................... RSSTJ 6/304
SÚMULA 90
CC 762-MG ...........Rel. Min. Paulo Costa Leite .................................... RSSTJ 6/313
CC 1.077-SP ...........Rel. Min. Carlos Th ibau .......................................... RSSTJ 6/315
CC 2.686-RS ..........Rel. Min. José Dantas.............................................. RSSTJ 6/318
CC 3.532-SP ...........Rel. Min. Jesus Costa Lima ..................................... RSSTJ 6/322
CC 4.271-SP ...........Rel. Min. Pedro Acioli ........................................... RSSTJ 6/330
SÚMULA 91
CC 200-MS ............Rel. Min. Carlos Th ibau .......................................... RSSTJ 6/337
CC 1.074-SP ...........Rel. Min. Costa Lima ............................................. RSSTJ 6/339
CC 1.597-SP ...........Rel. Min. José Cândido ........................................... RSSTJ 6/343
CC 3.369-SC ..........Rel. Min. Flaquer Scartezzini ................................. RSSTJ 6/345
CC 3.373-SC ..........Rel. Min. José Dantas.............................................. RSSTJ 6/348
CC 3.608-SC ..........Rel. Min. Assis Toledo ............................................ RSSTJ 6/352
ÍNDICE SISTEMÁTICO
RSSTJ, a.4, (6): 441-445, fevereiro 2010 445
SÚMULA 92
AgRg no Ag
22.669-BA ...............Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira .................. RSSTJ 6/359
REsp 1.774-SP ........Rel. Min. Athos Carneiro ....................................... RSSTJ 6/362
REsp 13.958-SP ......Rel. Min. Nilson Naves .......................................... RSSTJ 6/370
REsp 28.903-PR .....Rel. Min. Eduardo Ribeiro ...................................... RSSTJ 6/375
SÚMULA 93
REsp 11.843-RS .....Rel. Min. Nilson Naves ........................................... RSSTJ 6/383
REsp 13.098-GO ....Rel. Min. Cláudio Santos ........................................ RSSTJ 6/390
REsp 20.599-PR .....Rel. Min. Waldemar Zveiter ................................... RSSTJ 6/395
REsp 23.844-RS .....Rel. Min. Nilson Naves ........................................... RSSTJ 6/399
REsp 24.241-RS .....Rel. Min. Barros Monteiro ...................................... RSSTJ 6/403
REsp 26.031-GO ....Rel. Min. Athos Carneiro ....................................... RSSTJ 6/405
REsp 26.646-RS .....Rel. Min. Dias Trindade .......................................... RSSTJ 6/408
REsp 27.468-RS .....Rel. Min. Nilson Naves ........................................... RSSTJ 6/410
REsp 31.025-RS .....Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira .................. RSSTJ 6/413
SÚMULA 94
REsp 8.379-RJ ........Rel. Min. José de Jesus Filho ................................... RSSTJ 6/421
REsp 14.467-MG ...Rel. Min. Humberto Gomes de Barros ................... RSSTJ 6/423
REsp 16.521-DF .....Rel. Min. Garcia Vieira ........................................... RSSTJ 6/425
REsp 27.072-RJ ......Rel. Min. Garcia Vieira ........................................... RSSTJ 6/427
REsp 31.103-RJ ......Rel. Min. Demócrito Reinaldo ................................ RSSTJ 6/429
Siglas e Abreviaturas
AC Apelação Cível
Adm Administrativo
Ag Agravo de Instrumento
AgRg Agravo Regimental
AI Argüição de Inconstitucionalidade
Ana Agência Nacional de Águas
Anatel Agência Nacional de Telecomunicações
Aneel Agência Nacional de Energia Elétrica
APn Ação Penal
AR Ação Rescisória
CAt Confl ito de Atribuições
CC Código Civil
CC Confl ito de Competência
CCm Código Comercial
Cm Comercial
CNE Conselho Nacional de Educação
Com Comunicação
CP Código Penal
CPC Código de Processo Civil
CDC Código de Proteção e Defesa do
Consumidor
CPP Código de Processo Penal
CR Carta Rogatória
CRI Carta Rogatória Impugnada
Ct Constitucional
CTB Código de Trânsito Brasileiro
CTN Código Tributário Nacional
Cv Civil
D Decreto
DL Decreto-Lei
SIGLAS E ABREVIATURAS
450
DNAEE Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica
E Ementário da Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça
EAC Embargos Infringentes em Apelação Cível
EAR Embargos Infringentes em Ação Rescisória
EAg Embargos de Divergência no Agravo
EC Emenda Constitucional
ECA Estatuto da Criança e do Adolescente
EDcl Embargos de Declaração
EJSTJ Ementário da Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça
El Eleitoral
EREsp Embargos de Divergência em Recurso Especial
ERMS Embargos Infringentes no Recurso em Mandado de
Segurança
ExImp Exceção de Impedimento
ExSusp Exceção de Suspeição
ExVerd Exceção da Verdade
ExecAR Execução em Ação Rescisória
ExecMC Execução em Medida Cautelar
ExecMS Execução em Mandado de Segurança
HC Habeas Corpus
HD Habeas Data
HSE Homologação de Sentença Estrangeira
IDC Incidente de Deslocamento de Competência
IExec Incidente de Execução
IF Intervenção Federal
IJ Interpelação Judicial
Inq Inquérito
IPVA Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores
IUJ Incidente de Uniformização de Jurisprudência
LC Lei Complementar
SIGLAS E ABREVIATURAS
RSSTJ, a. 4, (6): 447-452, fevereiro 2010 451
LCP Lei das Contravenções Penais
Loman Lei Orgânica da Magistratura
LONMP Lei Orgânica Nacional do Ministério Público
MC Medida Cautelar
MC Ministério das Comunicações
MI Mandado de Injunção
MS Mandado de Segurança
NC Notícia-Crime
PA Processo Administrativo
Pet Petição
PExt Pedido de Extensão
Pn Penal
Prc Precatório
PrCv Processual Civil
PrPn Processual Penal
Pv Previdenciário
QO Questão de Ordem
R Revista do Superior Tribunal de Justiça
Rcl Reclamação
RE Recurso Extraordinário
REsp Recurso Especial
RHC Recurso em Habeas Corpus
RHD Recurso em Habeas Data
RMI Recurso em Mandado de Injunção
RMS Recurso em Mandado de Segurança
RO Recurso Ordinário
Rp Representação
RSTJ Revista do Superior Tribunal de Justiça
RvCr Revisão Criminal
S Súmula
SIGLAS E ABREVIATURAS
452
SAF Secretaria de Administração Federal
Sd Sindicância
SEC Sentença Estrangeira Contestada
SF Senado Federal
SL Suspensão de Liminar
SLS Suspensão de Liminar e de Sentença
SS Suspensão de Segurança
STA Suspensão de Tutela Antecipada
Tr Trabalho
Trbt Tributário
Repositórios Autorizados e Credenciados pelo
Superior Tribunal de Justiça
REPOSITÓRIOS AUTORIZADOS E CREDENCIADOS PELO SUPERIOR
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
01. Lex – Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça – editada pela Lex Editora
S.A. – Portaria n. 1, de 19.08.1985 – DJ 21.08.1985 – Registro revalidado – Edital de
20.10.1989 – DJ 24.10.1989.
02. Revista de Direito Administrativo – editada pela Editora Renovar Ltda. – Portaria n. 2,
de 19.08.1985 – DJ 21.08.1985 – Registro cancelado – Portaria n. 1, de 05.09.2007 – DJ
19.09.2007.
03. Revista LTr – Legislação do Trabalho e Previdência Social – editada pela LTr Editora
Ltda. – Portaria n. 5, de 26.08.1985 – DJ 28.08.1985 – Registro revalidado – Edital de
20.10.1989 – DJ 24.10.1989.
04. Jurisprudência Brasileira Cível e Comércio – editada pela Juruá Editora Ltda. –
Portaria n. 6, de 09.09.1985 – DJ 12.09.1985 – Registro cancelado – Portaria n. 1, de
09.02.2006 – DJ 15.02.2006.
05. Julgados dos Tribunais Superiores – editada pela Editora Jurid Vellenich Ltda. –
Portaria n. 7, de 06.11.1987 – DJ 10.11.1987 – Registro cancelado – Portaria n. 2, de
06.03.2001 – DJ 09.03.2001.
06. Revista de Doutrina e Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Distrito Federal
e dos Territórios – Portaria n. 1, de 29.11.1989 – DJ 1º.12.1989 - Registro alterado/
retifi cado – Portaria n. 3, de 19.06.2002 – DJ de 25.06.2002.
07. Revista de Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul – Portaria n.
1, de 08.02.1990 – DJ 12.02.1990.
08. Revista Jurídica Mineira – Portaria n. 3, de 02.04.1990 – DJ 04.04.1990 – Registro
cancelado – Portaria n. 4, de 13.05.1999 – DJ 04.06.1999.
09. Revista Jurídica – editada por Notadez Informação Ltda. – Portaria n. 4, de
02.04.1990 – DJ 04.04.1990.
10. Julgados do Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul – Portaria n. 5, de 02.05.1990 –
DJ 09.05.1990 – Registro cancelado – Portaria n. 8, de 16.11.2000 – DJ 24.11.2000.
11. Revista de Processo – editada pela Editora Revista dos Tribunais Ltda. – Portaria n.
6, de 31.05.1990 – DJ 06.06.1990.
12. Revista de Direito Civil – editada pela Editora Revista dos Tribunais Ltda. –
Portaria n. 7, de 31.05.1990 – DJ 06.06.1990 – Registro cancelado – Portaria n. 4, de
06.06.2000 – DJ 09.06.2000.
13. Revista dos Tribunais – editada pela Editora Revista dos Tribunais Ltda. – Portaria
n. 8, de 31.05.1990 – DJ 06.06.1990.
REPOSITÓRIOS AUTORIZADOS E CREDENCIADOS PELO STJ
456
14. Revista de Direito Público – editada pela Editora Revista dos Tribunais Ltda. –
Portaria n. 9, de 31.05.1990 – DJ 06.06.1990 – Registro cancelado – Portaria n. 5, de
11.06.2001 – DJ 19.06.2001.
15. Revista Ciência Jurídica – editada pela Editora Nova Alvorada Edições Ltda. –
Portaria n. 10, de 21.08.1990 – DJ 24.08.1990 – Registro cancelado – Portaria n. 2, de
04.07.2003 – DJ 14.07.2003.
16. Revista Jurisprudência Mineira – editada pelo Tribunal de Justiça do Estado de
Minas Gerais – Portaria n. 12, de 10.09.1990 – DJ 12.09.1990.
17. Revista de Julgados do Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais – Portaria
n. 13, de 17.12.1990 – DJ 19.12.1990 – Registro cancelado – Portaria n. 10, de
08.10.2007 – DJ 18.10.2007.
18. Jurisprudência Catarinense – editada pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina –
Portaria n. 1, de 22.05.1991 – DJ 27.05.1991.
19. Revista IOB Trabalhista e Previdenciária – editada pela IOB Informações Objetivas
Publicações Jurídicas Ltda. – Portaria n. 3, de 16.09.1991 – DJ 20.09.1991 – Registro
retifi cado – Portaria n. 9, de 22.11.2006 – DJ 11.12.2006.
20. Lex – Jurisprudência dos Tribunais de Alçada Civil de São Paulo – editada pela Lex
Editora S.A. – Portaria n. 1, de 10.03.1992 – DJ 13.03.1992 – Registro cancelado –
Portaria n. 6, de 08.10.2007 – DJ 18.10.2007.
21. Jurisprudência do Tribunal de Justiça – editada pela Lex Editora S.A. – Portaria n. 2,
de 10.03.1992 – DJ 13.03.1992 – Registro retifi cado – Portaria n. 9, de 16.11.2000 – DJ
24.11.2000.
22. Lex – Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal – editada pela Lex Editora S.A. –
Portaria n. 2, de 10.03.1992 – DJ 13.03.1992.
23. Revista de Previdência Social – editada pela LTr Editora Ltda. – Portaria n. 4, de
20.04.1992 – DJ 24.04.1992.
24. Revista Forense – editada pela Editora Forense – Portaria n. 5, de 22.06.1992 – DJ
06.07.1992.
25. Revista Trimestral de Jurisprudência dos Estados – editada pela Editora Jurid
Vellenich Ltda. – Portaria n. 6, de 06.11.1992 – DJ 10.11.1992 – Registro cancelado –
Portaria n. 3, de 04.07.2003 – DJ 14.07.2003.
26. Série – Jurisprudência ADCOAS – editada pela Editora Esplanada Ltda. – Portaria n.
1, de 18.02.1993 – DJ 25.02.1993 – Registro cancelado – Portaria n. 2, de 23.08.2004 – DJ
26.08.2004.
27. Revista Ata – Arquivos dos Tribunais de Alçada do Estado do Rio de Janeiro –
Portaria n. 2, de 11.02.1994 – DJ 18.02.1994 – Registro cancelado – Portaria n. 3, de
04.05.1999 – DJ 18.05.1999.
REPOSITÓRIOS AUTORIZADOS E CREDENCIADOS PELO STJ
RSSTJ, a. 4, (6): 453-459, fevereiro 2010 457
28. Revista do Tribunal Regional Federal da 4ª Região – editada pela Livraria do
Advogado Ltda. – Portaria n. 3, de 02.03.1994 – DJ 07.03.1994.
29. Revista de Direito do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro – Portaria n.
4, de 15.06.1994 – DJ 17.06.1994.
30. Genesis – Revista de Direito do Trabalho – editada pela Genesis Editora – Portaria n.
5, de 14.09.1994 – DJ 16.09.1994 – Registro cancelado – Portaria n. 4, de 08.10.2007 –
DJ 18.10.2007.
31. Decisório Trabalhista – editada pela Editora Decisório Trabalhista Ltda. – Portaria
n. 6, de 02.12.1994 – DJ 06.12.1994.
32. Revista de Julgados e Doutrina do Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São
Paulo – Portaria n. 1, de 18.12.1995 – DJ 20.12.1995 – Registro cancelado – Portaria
n. 5, de 08.10.2007 – DJ 18.10.2007.
33. Revista do Tribunal Regional Federal da 3ª Região – editada pelo Tribunal Regional
Federal da 3ª Região – Portaria n. 1, de 11.04.1996 – DJ 22.04.1996.
34. Lex – Jurisprudência do Tribunal Federal de Recursos – editada pela Lex Editora
S.A. – Portaria n. 2, de 29.04.1996 – DJ 02.05.1996 – Registro cancelado – Portaria n.
11, de 08.10.2007 – DJ 18.10.2007.
35. Revista de Direito Renovar – editada pela Editora Renovar Ltda. – Portaria n. 3, de
12.08.1996 – DJ 15.08.1996.
36. Revista Dialética de Direito Tributário – editada pela Editora Oliveira Rocha
Comércio e Serviços Ltda. – Portaria n. 1, de 16.06.1997 – DJ 23.06.1997.
37. Revista do Ministério Público – Portaria n. 1, de 26.10.1998 – DJ 05.11.1998 –
Registro retifi cado – Portaria n. 9, de 14.06.1999 – DJ 22.06.1999.
38. Revista Jurídica Consulex – editada pela Editora Consulex Ltda. – Portaria n. 1,
de 04.02.1999 – DJ 23.02.1999 – Republicada em 25.02.1999 – Registro cancelado –
Portaria n. 1, de 06.03.2001 – DJ 09.03.2001.
39. Genesis – Revista de Direito Processual Civil – editada pela Genesis Editora –
Portaria n. 2, de 12.04.1999 – DJ 15.04.1999 – Registro cancelado – Portaria n. 3, de
08.10.2007 – DJ 18.10.2007.
40. Jurisprudência Brasileira Criminal – editada pela Juruá Editora Ltda. – Portaria n. 6,
de 14.06.1999 – DJ 22.06.1999 – Registro cancelado – Portaria n. 2, de 09.02.2006 – DJ
15.02.2006.
41. Jurisprudência Brasileira Trabalhista – editada pela Juruá Editora Ltda. – Portaria n. 7,
de 14.06.1999 – DJ 22.06.1999 – Registro cancelado – Portaria n. 3, de 09.02.2006 – DJ
15.02.2006.
42. Revista de Estudos Tributários – editada pela IOB Informações Objetivas
Publicações Jurídicas Ltda. – Portaria n. 8, de 14.06.1999 – DJ 22.06.1999.
REPOSITÓRIOS AUTORIZADOS E CREDENCIADOS PELO STJ
458
43. Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça – editada pela Editora Brasília
Jurídica Ltda. – Portaria n. 10, de 29.06.1999 – DJ 05.07.1999 – Registro cancelado –
Portaria n. 1, de 23.08.2004 – DJ 26.08.2004.
44. Revista Interesse Público – editada pela Editora Fórum Ltda. – Portaria n. 1, de
14.03.2000 – DJ 21.03.2000.
45. Revista IOB de Direito Civil e Processual Civil – editada pela IOB Informações
Objetivas Publicações Jurídicas Ltda. – Portaria n. 2, de 14.03.2000 – DJ 21.03.2000 –
Registro retifi cado – Portaria n. 9, de 22.11.2006 – DJ 11.12.2006.
46. Revista IOB de Direito de Família – editada pela IOB Informações Objetivas
Publicações Jurídicas Ltda. – Portaria n. 3, de 29.03.2000 – DJ 03.04.2000 – Registro
retifi cado – Portaria n. 2, de 14.09.2009 – DJe 15.09.2009
47. Revista ADCOAS Previdenciária – editada pela Editora Esplanada Ltda. –
ADCOAS – Portaria n. 5, de 21.06.2000 – DJ 27.06.2000 – Registro cancelado –
Portaria n. 8, de 08.10.2007 – DJ 18.10.2007.
48. Revista ADCOAS Trabalhista – editada pela Editora Esplanada Ltda. –
ADCOAS – Portaria n. 6, de 21.06.2000 – DJ 27.06.2000 – Registro cancelado –
Portaria n. 7, de 08.10.2007 – DJ 18.10.2007.
49. Revista de Jurisprudência ADCOAS – editada pela Editora Esplanada Ltda. –
ADCOAS – Portaria n. 7, de 21.06.2000 – DJ 27.06.2000 – Registro cancelado –
Portaria n. 9, de 08.10.2007 – DJ 18.10.2007.
50. Revista IOB de Direito Penal e Processual Penal – editada pela IOB Informações
Objetivas Publicações Jurídicas Ltda. – Portaria n. 4, de 06.03.2001 – DJ 09.03.2001 –
Registro retifi cado – Portaria n. 9, de 22.11.2006 – DJ 11.12.2006.
51. Revista Tributária e de Finanças Públicas – editada pela Editora Revista dos
Tribunais – Portaria n. 6, de 11.06.2001 – DJ 19.06.2001.
52. Revista Nacional de Direito e Jurisprudência – editada pela Nacional de Direito
Livraria Editora Ltda. – Portaria n. 1, de 08.04.2002 – DJ 02.05.2002 – Republicada
em 19.04.2002 – Registro cancelado – Portaria n. 1, de 31.07.2009 - DJe 05.08.2009.
53. Revista do Tribunal Regional Federal da 5ª Região – editada pelo Tribunal Regional
Federal da 5ª Região – Portaria n. 2, de 23.04.2002 – DJ 02.05.2002.
54. Revista Dialética de Direito Processual – editada pela Editora Oliveira Rocha Comércio e Serviços Ltda. – Portaria n. 1, de 30.06.2003 – DJ 07.07.2003.
55. Revista Juris Plenum – editada pela Editora Plenum Ltda. – Portaria n. 1, de 23.05.2005 – DJ 30.05.2005.
56. Revista Bonijuris – co-editada pelo Instituto de Pesquisas Jurídicas Bonijuris, Associação dos Magistrados do Paraná (Amapar), Associação dos Magistrados Catarinense (AMC) e Associação dos Magistrados do Trabalho IX e XII (Amatra) – Portaria n. 2, de 18.10.2005 – DJ 27.10.2005.
REPOSITÓRIOS AUTORIZADOS E CREDENCIADOS PELO STJ
RSSTJ, a. 4, (6): 453-459, fevereiro 2010 459
57. Revista Juris Plenum Trabalhista e Previdenciária – editada pela Editora Plenum
Ltda. – Portaria n. 3, de 16.12.2005 – DJ 08.02.2006.
58. Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal – editada pela Editora Magister
Ltda. – Portaria n. 4, de 02.08.2006 – DJ 09.08.2006.
59. CD-ROM – Jur Magister – editado pela Editora Magister Ltda. – Portaria n. 5, de
09.08.2006 – DJ 15.08.2006.
60. DVD – Magister – editado pela Editora Magister Ltda. – Portaria n. 6, de
09.08.2006 – DJ 15.08.2006.
61. Revista Previdenciária e Trabalhista Gazetajuris – editada pela Editora Portal
Jurídico Ltda. – Portaria n. 7, de 09.08.2006 – DJ 15.08.2006 – Registro cancelado –
Portaria n. 2, de 08.10.2007 – DJ 18.10.2007.
62. CD-ROM – Gazetajuris – editado pela Editora Portal Jurídico Ltda. – Portaria n. 8,
de 02.10.2006 – DJ 04.10.2006 – Registro cancelado – Portaria n. 6, de 12.11.2008 – DJe
17.11.2008.
63. Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil – editada pela Editora Magister
Ltda. – Portaria n. 1, de 1º.02.2008 – DJ 11.02.2008.
64. Revista Brasileira de Direito Tributário e Finanças Públicas – editada pela Editora
Magister Ltda. – Portaria n. 2, de 1º.02.2008 – DJ 11.02.2008.
65. Revista Brasileira de Direito das Famílias e Sucessões – editada pela Editora
Magister Ltda. – Portaria n. 4, de 10.10.2008 – DJe 15.10.2008.
66. Revista de Direito Tributário da Associação Paulista de Estudos Tributários –
editada pela MP Editora Ltda. – Portaria n. 5, de 30.10.2008 – DJe 07.11.2008.
67. Portal na Rede Mundial de Computadores “editoramagister.com” – editado pela
Editora Magister Ltda. – Portaria n. 7, de 15.12.2008 – DJe 17.12.2008.
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EditoraçãoGabinete do Ministro Diretor da Revista - STJ
ImpressãoCapa: Gráfi ca do Conselho da Justiça Federal - CJFMiolo: Seção de Reprografi a e Encadernação - STJ