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Revista Forma , ano 1, número 2 é um trabalho da disciplina História da Arte e da Arquiteura III, ministrada pela Professora Viviane Marques do curso de Arquitetura e Urbanismo das Faculdades Pitágoras, coordenadora Paula Alcântara.
Citation preview
Renascimento e
Barroco
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01
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Venha Conhecer o Corredor Cultural de Montes Claros - MG
O Corredor que te liga às tradições
norte mineiras.
Editorial Caros leitores, esta edição
da Forma apresenta dois períodos históricos importantes. O Renascimento e o Barroco, contendo duas matérias de cada tempo. Uma referente a arquitetura e a segunda sobre arte.
O Renascimento foi um período do século XV ao XVI, marcado pela valorização do homem e surgimento da perspectiva criada por grandes artista que se sentiam filhos dos Romanos, por isso o nome.
O Barroco foi o movimento, ânsia de novidade, amor pelo infinito e pelo não finito, pelos contrastes e pela audaciosa mistura de todas as artes, durante o século XVII e XVIII, houve a utilização de luz, sombra e curvas para dar movimento tanto na arquitetura quanto na arte.
Aieska Santana
A perspectiva
João Feliciano
A Morte da Virgem
Movimento na Arquitetura
Júlia Marques
Davi
A Morte da Virgem
Viviane Marques
Professora de História da Arte e Arquitetura III e Orientadora da Revista
Faculdades Integradas Pitágoras 3º período de Arquitetura e Urbanismo
Coordenadora Paula Alcântara
Índex RENASCIMENTO
Davi
A perspectiva
BARROCO
A Morte da Virgem
Movimento na Arquitetura
04
13
20
29
“Vou te esperar na minha humilde
residência” - Davi de Michel
Galleria dell’Accademia – Florença - Itália
Davi, Deus e
Michelangelo
O PERÍODO
HISTÓRICO
No marco temporal
demarcado entre os
séculos XV e XVI,
definido pelos
historiadores como
Renascimento, as
cidades do norte da
Itália – como
Florença, Gênova,
Pisa, Milão e Veneza
– concentraram o
epicentro do
renascer de uma
cultura baseada na
harmonia clássica
greco-romana.
No entanto, as
conquistas
artísticas culturais e
sociais inspiradas
no pensamento de
recuperar a razão
humana como
propulsão de
decisão ocorrem em
meio a grandes
convulsões. Até
mesmo a Igreja
impôs assuntos
celestiais entre os
mundanos,
exercendo papel
dirigente na nova
ordem civilizatória.
04
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Por Júlia Marques
É em meio a esse período que Michelangelo Buonarroti foi um filho exemplar de seu tempo.
Sua genialidade absorveu, não sem angústias, todas as aspirações e contradições do homem daquele período. Consciente de sua
individualidade e de seu papel no mundo, contribuiu com sua atitude e seu talento para elevar o artista da vulgaridade artesanal rumo à valorização social acima de mecenatos e servidão
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Michelangelo
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Michelangelo, o segundo
de cinco filhos, nasceu em
Caprese, em seis de
março de 1475. Seu pai
era Ludovico di Leonardo
di Buonarroti Simone, um
podestade, e sua mãe
Francesca di Neri di
Miniato del Sera.
Pouco depois de seu
nascimento a família se
mudou para Florença.
Francesca morreu quando
ele tinha apenas seis
anos.
Talvez a dolorosa perda
tenha despertado em
Michelangelo a vontade de
dar forma à beleza de um
modo que o levaria, não
sem contradoções nem
angústias espirituais, a
produzir algumas das
obras mais sublimes da
historia da arte.
Michelangelo exemplifica
mais plenamente que
qualquer outro artista o
conceito de genialidade
como inspiração divina,
um poder sobre-humano
concedido a poucos e
raros indivíduos, e que
atua através deles.
06
O ARTISTA
Buonarroti era,
essencialmente, um escultor
– mais especificamente um
entalhador de estátuas de
mármore. A arte, para ele,
não era uma ciência, mas sim
“a criação de homens”,
análogas à criação divina.
Somente a “liberação” de
corpos reais e tridimensionais
a partir da matéria
insubmissa era capaz de
satisfazer o impulsor
existente em seu interior.
A fé de Michelangelo na
imagem do homem como
veículo supremo de
expressão deu-lhe um sentido
de afinidade com a escultura
clássica que não seria
superado por nenhum outro
artista do Renascimento. No
entanto, como neoplatônico,
ele via o corpo humano como
a prisão terrestre da alma –
certamente nobre, mas
sempre uma prisão.
Esse dualismo confere um
pathos extraordinário às suas
figuras: calmas em seu
exterior parecem agitadas
por uma avassaladora
energia psíquica que não
encontra um verdadeiro alívio
na ação física.
Michelangelo vinha de uma
estadia de muitos anos em
Roma e ficara fortemente
impressionado com os corpos
musculosos e cheios de
emoção da escultura
helenística. Sua escala
heroica sua beleza e poder
sobre-humanos e o volume
proeminente de suas formas
tornaram-se parte do estilo
de Michelangelo e, através
dele, parte da arte do
Renascimento em geral.
Em 1501, de volta a Florença,
Michelangelo começou a
esculpir para a praça de
Signoria seu célebre Davi, o
Gigante como foi chamada a
escultura de mármore devido
a sua dimensão grandiosa,
com 434 cm.
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07
MICHELANGELO E A
ESCULTURA
A ENCOMENDA
TINHA UMA PEDRA
NO CAMINHO
Para a realização de Davi,
Michelangelo recebeu uma
enorme bloco de mármore
que já havia sido golpeado
por outros escultores – um
deles foi Agostino di Ducio,
que, quarenta anos antes,
em 1463, recebera a
incumbência de esculpir um
profeta para uma catedral,
mas não chegou a concluí-
lo. Com essa pedra já
golpeada, Michelangelo
aceitou o desafio de
transformá-la numa das
mais belas estátuas da
história da arte.
O DAVI DA INSPIRAÇÃO
Davi era um jovem que
vivia em Israel, e seu país
encontrava-se em guerra
contra os Filisteus,
comandado pelo gigante
Golias.
Dirigindo-se ao exército de
Israel, Golias
dizia: "Escolhei entre vós um homem que ouse lutar comigo. Se ele me matar, seremos vossos escravos; mas se eu o matar, sereis nossos escravos". E
ninguém ousava lutar com
ele.
Então Davi apresentou-se e
disse: "Irei combater com ele", tomou o cajado e
escolheu na torrente cinco
pedras bem lisas, metendo-
as numa sacola; depois com
a funda na mão, avançou
contra o filisteu.
O gigante, vendo Davi tão
pequeno, gritou-lhe: "Serei eu algum cão para vires contra mim armado com um pau?”. Davi respondeu: "Tu vens contra mim com espada, lança e escudo e eu avanço em nome do Senhor. Hoje o Senhor vai entregar-te nas minhas mãos e toda a terra saberá que há um Deus em Israel".
Então Davi tirou uma pedra
da sacola e arremessou-a
com a funda. A pedra foi
cravar-se na fronte do
filisteu e o gigante caiu por
terra. Davi correu e,
tirando-lhe a espada,
cortou-lhe a cabeça de
Golias.
Parte da escultura de Davi.
08
O Davi que Michelangelo esculpe entre 1501 e 1504 é uma figura ereta, quase não ocupa espaço a perna oblíqua diverge do eixo que cai a prumo da cabeça ao pé e é o princípio da sucessão de concisos ímpetos de movimento: a busca flexão do pulso, o súbito volver da cabeça, o braço dobrado em direção ao ombro. O movimento da figura não se expande no espaço, encerra-se nos atos contrapostos dos membros.
Michelangelo sabia da dificuldade de esculpir uma pedra já golpeada, mas era uma condição que o artista aceitava prazerosamente porque lhe permitia concentrar na imagem o máximo de energia, ou melhor, conceber a figura do herói no momento da concentração da vontade em vista da ação a cumprir (com efeito, enquanto olha ao longe com as sobrancelhas franzidas como se fixasse a mira, solta a funda que traz envolvida em torno do corpo). O artista não representa a ação, mas o seu móvel moral, a tensão interior que precede o ímpeto do gesto.
O Davi de Michelangelo, com seu semblante franzido e olhar inocentemente descarado, encarna a cólera justa do homem heroico, imagem da qual os cidadãos de Florença republicana, ameaçada por todos os lados, tanto necessitavam. Cabe lembrar que, para compor este Davi viril, Michelangelo inspirou-se na figura de Hércules, tal como parecem sugerir os proeminentes músculos e as veias visíveis da mão direita.
Semblante de Davi Mão direita de Davi
A OBRA
Através da aparente calma
emanada pela expressão de
Davi, percebe-se a tensão
interior pela postura do torso
ligeiramente inclinada e pela
cabeça voltada para o lado,
oferecendo o perfil ao
espectador. O herói bíblico
não mostra sinais do combate
vitorioso nem demonstra
arrogância.
Transmite, isto sim, uma força
viril, que nasce da juventude e
sustenta a beleza, o que a
torna incomparável.
Com essa escultura, o genial
artista italiano conquistou
respeito e a consagração
como um dos grandes mestres
de seu tempo. Cabe ressaltar
que a qualidade de Davi
impressionou até mesmo o
contemporâneo Leonardo da
Vinci, que ficou admirado com
a “retórica muscular” da
estátua de mármore.
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10
GIGANTE DO POVO
Davi encontra-se
atualmente na Galleria
dell’Accademia, em
Florença, para onde a
escultura foi transferida a
fim de protegê-la das
intempéries.
A população exigiu que o
seu “gigante” ao menos
continuasse presente sob
forma de uma cópia. Para
atender a esse pedido,
encontra-se uma réplica
exposta na Praça de
Signoria.
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11
São os indivíduos que fazem a
história: era assim que se pensava
durante o Renascimento. A
arquitetura nasceu na Florença, da
década de 20 do século XV, por obra
e graça de um único, genial e
obstinado indivíduo: Filippo
Brunelleschi. No entanto, embora a
criação tivesse um caráter pessoal, o
seu valor era coletivo.
A arquitetura possui como meio de
comunicação entre os arquitetos, o
desenho. Um grande número de
técnicas usadas atualmente para o
desenho de arquitetura remonta o
início do século XV. Os mestres do
Renascimento já usavam o trio planta,
corte, fachada e algumas técnicas de
perspectiva, além de se utilizarem
fundamentalmente da maquete.
A ARQUITETURA, MODO
DE REPRESENTAÇÃO
Renascimento Perspectiva
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13 Por Aieska Santana
A perspectiva. Falava-se
muito dela no século XV; e foi
ainda Filippo Brunelleschi
quem a demonstrou na prática
e lhe estabeleceu as regras de
aplicação. Em substância,
tratava-se de uma técnica que,
segundo regras científicas,
permitia fixar sobre as duas
dimensões de uma superfície o
aspecto da realidade
tridimensional. Ela permitia
“projectar” uma obra de arte,
mostrando com um desenho o
seu aspecto definitivo.
OS INTERIORES: A PERSPECTIVA ESPACIAL
Os espaços interiores dos
edifícios também correspondem aos novos critérios da perspectiva. Assim, deixou de se construir uma sucessão de tramos, cada um deles dotado de autonomia, mas sim uma linha de paredes articuladas segundo as regras das ordens arquitetônicas nas quais as linhas horizontais – que são dominantes – convergem para um ponto único.
A Igreja do Santo Spírito, feita
por Brunelleschi, em Florença,
representa perfeitamente esse aspecto da perspectiva em seu interior. Aparentemente, a Igreja adotou os esquemas medievais: planta de cruz latina, três naves, cúpula ao centro. Mas nada separa um tramo do outro; entretanto, as arquitraves contínuas por cima dos arcos evidenciam a confluência de todas as linhas horizontais para um único ponto, o ponto de fuga.
Tecnica Renascentista de Perspectiva
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15
Alberti analisa o modo de
representar a arquitetura,
distinguindo-se em duas
maneiras: a pictoria (dotada
de cores, luzes e sombras) e a
“lineamenta” (dotada de linhas
e ângulos), que renunciava
aos efeitos pictorios,
marcados apenas por linhas
geométricas. É importante
observar no discurso de
Alberti que através dos
modelos (maquetes), o
arquiteto podia acrescentar,
diminuir e renovar cada
elemento da obra, bem como
examinar e saber o modo e as
despesas implícitas na sua
execução. As maquetes
seccionadas ao meio,
permitiam a visualização da
estrutura (larguras, alturas e
espessuras das paredes)
assim como amplitude e
qualidade do conjunto, nele
explicitando-se os ornamentos
destinados a adornar o
edifício e suas respectivas
quantidades, números
requeridos de colunas,
capitéis, bases, cornijas,
pisos, estátuas. Isto
demonstra a grande
importância que se teve e
continua se tendo essa forma
de representação volumétrica
da arquitetura e a visualização
de um futuro edifício.
Paralelamente, Albert
estabelece a diferença entre o
desenho do pintor e o
desenho do arquiteto: o pintor
se esforça em ressaltar e
volumetria dos objetos numa
tela plana mediante o
sombreamento dos objetos, a
passo que o arquiteto, ao
evitar esses artifícios,
representa o relevo pó meio
do desenho da planta e
elevação das fachadas,
servindo-se de ângulos reais e
linhas invariáveis. Albert
distingue o arquiteto dos
mestres de oficio, advertindo
ser a Arquitetura fruto da
“lineamenta” (“disegno”,
projeto) e “matéria”
(estrutura, materiais
construtivos). Esse raciocínio
matemático dignificou a
Arquitetura ao contexto das
Artes Liberais, em oposição à
Artes Mecânicas, e distinguiu
definitivamente o arquiteto
dos tradicionais mestres de
oficio de raiz medieval,
questão central do
Renascimento,
magistralmente encabeçada
por Albert.
Visualização pelo aparelho renascentista
16
CARTA DE RAFAEL PERSPECTIVA
Pouco mais de trinta anos
depois do Tratado de Albert,
Rafael deu mais uma definição
do que deveria ser desenho
de arquitetura: em sua
conhecida carta ao papa Leão
X, em 1519: o desenho de
edifícios pertinente ao
arquiteto se divide em três
partes. Primeiro o desenho
plano (planta), segundo a
parede de fora com seus
ornamentos (fachada) e
terceiro a parede de dentro,
também com seus
ornamentos (corte).
Seria a formação do núcleo
central da representação do
desenho de arquitetura.
A arquitetura, desde o
Renascimento, vive através
dos seus desenhos e estes
são uma obra independente
da construção. As evoluções
sobre as técnicas de
representação foram
incorporando diferentes
transformações, na busca
pela visualização ideal da
futura obra.
17
Inspirada nas ideias do maior arquiteto
brasileiro. Produtos licenciados pela
Fundação Oscar Niemeyer em edição
limitada.
A Morte de Nossa Senhora
Interpretada por Caravaggio
O PERÍODO HISTÓRICO
Barroco é o termo que já vem sendo
utilizado a quase um século pelos
historiadores da arte, para designar o
estilo do período que vai de 1600 a
1750. Seu significado original –
“irregular, contorcido, grotesco” – está
hoje, em grande parte, esquecido. Há
também um consenso geral quanto ao
fato do novo estilo ter-se originado em
Roma, por volta de 1600. O que
continua sendo uma questão
contraditória é o impulso que o teria
originado.
Os príncipes da Igreja que apoiaram o
desenvolvimento da arte barroca eram
mais conhecidos por seu fausto
mundano do que por seu espírito
piedoso.
A arte barroca não foi simplesmente o
resultado de uma evolução religiosa,
política ou intelectual. Naturalmente as
conexões entre todos esses aspectos
existiam, mas ainda não chegamos a
compreendê-las plenamente.
Até que o façamos vamos considerar o
estilo Barroco como uma entre outras
características básicas, ou seja, um
catolicismo recém-fortalecido, o Estado
absolutista e o novo papel da ciência
que distinguem o período 1600-1750
de tudo que houvera anteriormente.
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Ao reunir artistas de várias
procedências e encarregá-los de
tarefas desafiadoras, Roma acabou
se tornando o local de origem do
Barroco, exatamente como
acontecera com o Alto Renascimento
um século antes. O papado voltou a
patrocinar a produção de obras de
arte em grande escala, com o
objetivo de transformar Roma na
mais bela cidade de todo o mundo
cristão.
A princípio, os artistas disponíveis
eram maneiristas tardios e
medíocres, mas a campanha logo
atraiu mestres jovens e ambiciosos.
Foram eles que criaram o novo
estilo. O mais notável dentre eles era
um pintor de gênio, chamado
Caravaggio, devido à sua cidade
natal próximo a Milão, que pintou
várias telas monumentais para a
Igreja de San Luigi dei Francesi.
21
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CARAVAGGIO, FAÍSCA BARROCA
Em 1571, no povoado chamado
Caravaggio, próximo de Milão, nascia
Michelangelo Merisi. Foi um homem
violento em uma época violenta.
Caravaggio teve a valentia de pintar e
transformou-se em um dos maiores
pintores de seu tempo, inscrevendo seu
nome na história da arte.
Foi no contexto do Barroco que
Michelangelo Merisi mostrou-se ao mundo
em sua curta e tumultuada vida. Como
Caravaggio presenteou a história da arte
universal com uma obra tão influente
quanto incompreendida em seu tempo;
uma obra sustentada na verdade tal como
ele a via e tão radical e estrema que seus
contemporâneos não puderam ignorá-la.
Os pais de Caravaggio foram Fermo Merisi e
Lucia Aratori. Seu pai era arquiteto-decorador de
Francesco Sforza, duque de Milão, e Marquês de
Caravaggio.
Aos vinte anos aproximadamente estabeleceu-se
em Roma. Ali permaneceu até 1606, quando,
tendo matado um jovem em uma rixa de jogo,
fugiu para Nápoles, para Malta, para a Sicília e
depois de novo para Nápoles. O artista morreu
enquanto voltava a Roma, perdoado pelo papa. 22
Au
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O PINTOR DE GÊNIO
A pintura de Michelangelo Merisi, o
Caravaggio (1571-1610), foi
considerada pelos críticos do
Seiscentos antitética à pintura de
Annibale, outro artista de sua época
(1560-1609): este volta-se para o
ideal, Caravaggio, para o real. Trata-
se de uma esquematização, que não
corresponde àquela que foi, de fato,
a posição dos dois artistas. É,
contudo importante que, mesmo
esquematizando, a crítica da época
tenha reconhecido: primeiro, que
Annibale e Caravaggio eram os dois
grandes protagonistas da pintura do
século; segundo, que ambos se
opunham nitidamente à cultura
humanística romana; terceiro, que o
idealismo de um e o realismo de
outro eram duas tendências
divergentes, mas em relação
dialética e quase de recíproca
integração ou complementaridade.
Os dois polos, enfim, do mesmo
problema.
A sua vida foi desesperada e
violenta; mas uma extrema tensão
moral e religiosa confere à sua
pintura uma carga revolucionária.
O seu realismo nasce da ética
religiosa instaurada por Carlo
Borromeo na sua diocese lombarda:
não consiste em observar e copiar a
natureza, mas em aceitar a dura
realidade dos fatos, em desdenhar
as convenções, em dizer toda a
verdade em assumir as máximas
responsabilidades. Isso significa:
excluir a busca do “belo”, visar o
verdadeiro; renunciar à invenção,
restringir-se aos fatos; não pôr em
prática um ideal dado, mas procurar
ansiosamente uma saída ideal na
práxis comprometida da pintura;
contrapor o valor moral dessa práxis
ao valor intelectual das teorias.
Caravaggio estava convencido de
que deveria pintar a natureza tal
como a via independentemente da
impressão causada ao expectador.
Sob essa perspectiva, o artista
sentiu um impulso de liberdade que o levava a pintar o que desejasse.
Detalhe da obra ‘A morte da virgem’.
23
AS CARACTERÍSTICAS
DE SUAS OBRAS
A obra de Caravaggio dá uma forma
discreta e comovedora a uma atitude compartilhada por certos grandes santos da contrarreforma: a de que os mistérios da Fé são revelados não por especulação intelectual, mas espontaneamente, por uma experiência interior, aberta a todos os homens.
Os seus quadros contem um “cristianismo laico” isento de dogmas teológicos, que atrai tanto os protestantes como os católicos.
Suas vivências como artista de rua contribuíram para a criação dos rostos maliciosos, ardilosos e descarados de seus personagens. Como demonstraram análises radiográficas feitas em suas obras.
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24
MODELOS MUNDANOS
O pintor considerava que
introduzir uma ideia pré-concebida
no quadro falsificava sua
veracidade. Essa ideia
revolucionária causou escândalo
entre os academicistas e na Igreja.
Caravaggio não se limitava a
mostrar em suas telas o sofrimento
idealizado dos mártires cristãos.
Expunha com toda a crueza a
brutalidade e a proximidade da dor.
O artista violentou
sistematicamente o princípio de
decoro na pintura proclamado
pelos ideológicos da
Contrarreforma. Para estes, os
personagens divinos deveriam ser
retratados com os atributos
sagrados e não com elementos
que os vulgarizassem aos olhos do
expectador.
Apesar da boa vontade de seu
protetor, o cardial Del Monte,
diversos quadros de Caravaggio
não passaram pelo crivo
eclesiástico, o que o obrigou a
realizar muitas novas versões com
as devidas correções. Suas
imagens de Cristo, da Virgem e
dos santos representados como
seres próximos do plano terreno
provocaram o assombro da Igreja.
Pudera: para produzir as imagens,
o artista utilizava modelos
inspirados na rua e, em especial,
em bairros indecorosos da cidade,
cujos gestos e olhares refletiam
sem recato o desespero da luta
cotidiana pela sobrevivência em
um ambiente dominado pela
miséria. Desse modo, os quadros
encomendados pelos ricos
burgueses para as igrejas
costumavam ser recusados pelos
religiosos e, em seguida, eram
comprados por amantes da arte.
25
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A morte da Virgem é o maior quadro de
altar realizado por Caravaggio e um dos mais escandalosos. Foi encomendado por Laerzio Cheribuni para a Igreja de Santa Maria della Scala. Os carmelitas, porém, não aceitaram o quadro por considerá-lo ofensivo. Os motivos para a recusa foram variados: Maria fora representada como uma cortesã; seus pés apareciam descalços; e seu ventre inchado originou o rumor de que se tratava do cadáver de uma mulher afogada.
Caravaggio deveria se ater a tratar da “morte ou trânsito” da Virgem. Porém, o artista dessacralizou mais uma vez o episódio e procurou refletir a morte com a angustiante experiência de quem perde um ente querido. No quadro não há presença divina; apenas a dor humana está presente no pobre ambiente. Caravaggio procurou mostrar o pranto pela “morte de uma mulher do povo, bem conhecida do bairro”, como
apontou o historiador da arte Roberto Longhi.
Na humilde habitação ornamentada por uma cortina vermelha, os onze discípulos e Maria Madalena estão dispostos em volta da Virgem que acaba de morrer e cujo corpo ainda não foi preparado para o túmulo. Cada um dos presentes, como em A deposição no túmulo, está envolto nos próprios pensamentos.
Ao mesmo tempo, vincula-se aos demais pelo sentimento comum de dor diante da perda definitiva, uma variada e complexa gama de expressões revela a intensa dor e silenciosa contemplação do corpo inerte que põe o homem defronte do mistério da morte.
O excesso de crueza, desconsolo e verdade da cena horrorizou a quem era permitida a passagem para outra vida.
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A OBRA POLÊMICA
Caravaggio estabeleceu um extraordinário
movimento visual que conduz o expectador
ao interior do quadro. Duas linhas em
diagonal, pontuadas pelos focos de luz,
evocam uma cruz, como o artista fez em A
crucificação de São Pedro.
Com poderosa plasticidade a luz derrama-
se a partir do ângulo superior esquerdo e
abre caminho entre as sombras. Ilumina,
em especial, o corpo da Virgem, tornando
brilhante seu vestido vermelho e
conferindo-lhe um ilusório impulso de vida.
A luz também alcança Madalena e guia os
olhos do espectador até o rosto da jovem
Virgem morta. Para esse ponto convergem
as linhas compositivas do quadro,
reforçadas pelo tecido de forte vermelho
que caí do teto da estadia.
Acertou o historiador Ernst Gombrich
quando observou que a luz cegante de
Caravaggio “ressalta com sólida dignidade
o que poucos de seus contemporâneos
eram capazes de apreciar”.
27
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A arquitetura barroca, apesar de
possuir características variantes de
região, possui a mesma designação
por um núcleo comum.
Esse núcleo comum foi, nos
primeiros tempos, identificado como
o arbítrio, a falta de lógica, o exagero.
Foi mesmo por isto que a arte do
século XVII se chamou barroca.
Tornando, esse termo em quase
todas as línguas europeias, um
sinônimo de extravagante, anormal,
irregular.
Foi na segunda metade do século
passado que o termo barroco
recebeu um significado mais objetivo.
O crítico suíço Heinrich Wölfflin e
seus seguidores referiram-se sempre à
arte do século XVII e dos princípios
do século XVIII, definiram como
barroca aquelas obras em que
estavam presentes determinadas
características: a procura do
movimento, quer real (por uma
ondulada, uma fonte, de onde a água
jorra em forma sempre nova), quer
sugerido (um personagem retratado
durante uma ação violenta ou sob um
esforço); a tentativa de representar ou
de sugerir, o infinito (uma alameda
que se perde no horizonte, um fresco
que simula a abóboda celeste, um
jogo de espelhos que altera e torna
irreconhecíveis as perspectivas); a
importância dada às luzes e aos
efeitos luminosos na percepção final
e na própria concepção da obra de
arte; o gosto pelo teatral, pelo
cenográfico, pelo faustoso; a
tendência para não respeitar os
limites das disciplinas, isto é, para
misturar a arquitetura, a escultura e a
pintura.
Movimento na Arquitetura
Barroco e Atualidade
Palácio Carignano – Guarin Guarini Galaxy Soho – Zaha Hadid
29
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OS ELEMENTOS QUE PROPORCIONAM
MOVIMENTO
O movimento na arquitetura
barroca tornou-se presente
principalmente pelas curvas. Por
seu turno, uma vez descoberto,
o motivo da ondulação não
ficou limitado às paredes. A
ideia de das movimento a um
elemento seguindo curvas mais
ou menos regulares tornou-se
num tema dominante de toda a
arte barroca. Existiam
ondulações nos interiores, nas
fachadas e até mesmo colunas
onduladas.
O gosto pela curva permanece,
mesmo quando não se chega
aos extremos como os referidos.
No entanto, as volutas e
orelhões, elementos em forma
de fita encurvada e enrolada nas
extremidades, serviam para
articular, para unir
harmoniosamente, dois pontos
situados a alturas diferentes.
Estas volutas eram apostas
principalmente sobre fachadas
das igrejas e foram usadas com
tanta frequência que eram
praticamente uma regra,
constituindo hoje o meio mais
simples e acessível para
reconhecer uma fachada
barroca.
A função do orelhão, apesar de
sua forma bizarra, não é
meramente decorativa: é,
sobretudo, dinâmica,
construtiva.
Volutas – Igreja de Santa
Maria da Saúde - Veneza
Orelhão – Palácio Carignano
30
O MOVIMENTO NA
ARQUITETURA ATUAL
Nascida em Bagdá,
no ano de 1950, Zaha Hadid
formou-se em arquitetura na
cidade de Londres, na
Architetural Association em
1977.
Após seu surgimento na era
barroca, o movimento nas
construções tornou-se presente
em vários estilos
arquitetônicos. Servindo até
como referência de estilos de
determinados arquitetos.
Atualmente, o profissional de
arquitetura que possui o
movimento como algo
essencial em seus projetos é a
arquiteta Israelense Zaha
Hadid.
IDEIAS E TRABALHO
Numa primeira fase,
prevalecem a fragmentação e o
reagrupamento dinâmico dos
fragmentos no projeto, onde
campos de fluxo e de forças de
diferentes intensidades geram
uma expressão arquitetônica
marcada por movimento e
fluidez. Na experiência espacial
é interessante observar a relação
com o tempo, compreendido
não como a duração de um
edifício, mas como o tempo do
percurso de um visitante que
procede à descoberta gradual
dos espaços, dos quais não é
possível ter uma visão de
conjunto. Emerge o convite a se
fazer percorrer, com uma
sensação de surpresa similar
àquela que se tem em um
contexto natural, posto que cada
passo revela vistas inesperadas e
distintas.
Conjunto Residencial Spittelau
32
A própria Hadid declara que
procura propiciar espaços públicos capazes de levar prazer e acrescentar alguma coisa a nossa vida. Isso sugere uma constante reinvenção das formas do espaço de vida, colocando
em discussão a percepção que temos delas e o modo como as habitamos. Conduz a um produto urbano em grande medida mais permeável, que não tem mais nada a ver com a cidade do espaço privado contra o espaço público.
A paisagem está sempre e cada vez mais no centro de um novo interesse projetual, que explora
uma dimensão tridimensional inédita, relacionada não mais ao movimento das linhas, mas ao das massas. São massas produzidas com uma gestualidade que articula o solo, fende-o, releva-o e deforma-o
para produzir formas plásticas, espacialidades curvas e superfícies flexíveis. Figuras côncavas e convexas que dialogam entre si e parecem se originar da observação de fenômenos naturais, como o derretimento das geleiras ou o movimento da lava de um
vulcão.
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hit
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33
HIGH MODEL
LOW MODEL
TRIFLOW BYZAHA HADID
BIBLIOGRAFIA
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30 Imagens - Google
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