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REVISTA GOIANA DE JURISPRUDÊNCIA ÓRGÃO OFICIAL DO TRIBUNAL 53 | 2010 REVISTA GOIANA DE JURISPRUDÊNCIA ÓRGÃO OFICIAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

REVISTA GOIANA DE JURISPRUDÊNCIA · boni juris e do periculum in mora, pediu, em sede de liminar, a concessão de medida cautelar para “suspender a eficácia do artigo 64, caput,

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  • REVISTA GOIANA DE JURISPRUDÊNCIA

    ÓRGÃO OFICIAL DO TRIBUNAL

    53 | 2010

    REVISTA GOIANA DE JURISPRUDÊNCIA

    ÓRGÃO OFICIAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

  • ANO XXV Nº 53 2010

    REVISTA GOIANA

    DE

    JURISPRUDÊNCIA

    Órgão Oficial doTribunal de Justiça do Estado de Goiás

  • REVISTA GOIANA DE JURISPRUDÊNCIAÓrgão oficial do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás

    DIRETORIA01 - Des. Aluízio Ataídes de Sousa (Diretor)02 - Des. Alfredo Abinagem03 - Des. Itaney Francisco Campos

    Revisão: Allan Barreto, Edilberto da Veiga Jardim Neto e SolangeCosta Pereira BarianiImpressão: Gráfica do Tribunal de Justiça de GoiásMontagem: Serviço de Impressão Digital do Tribunal de Justiçade Goiás

    Correspondências e colaborações devem ser remetidas para odiretor da Revista. Solicitamos permuta.

    Av. Assis Chateaubriand nº 195 - Sala 509 - Setor OesteGoiânia - GoiásCEP.: 74.130/012Fone (62) 3236-2439

    REVISTA GOIANA DE JURISPRUDÊNCIAÓrgão oficial do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás

    Volume nº 53 - 2010I - Jurisprudência

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    SUMÁRIO

    Assunto Página

    Composição atual do egrégio Tribunal de Justiça de Goiás …… 5

    JURISPRUDÊNCIAJurisprudência Cível …………………………....……………. 11Jurisprudência Criminal ……………….…………………… 597

    ÍNDICESAlfabético Cível ……………………………………………… 823Alfabético Criminal ………………………………………….. 849Numérico Cível ………………………………………..……. 861Numérico Criminal …………………………………….…… 865

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  • 5

    TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

    DESEMBARGADORESPAULO MARIA TELES ANTUNES (Presidente)VÍTOR BARBOZA LENZA (Vice-Presidente)FELIPE BATISTA CORDEIRO (Corregedor Geral da Justiça)

    TRIBUNAL PLENO

    JOSÉ LENAR DE MELO BANDEIRAPAULO MARIA TELES ANTUNESFELIPE BATISTA CORDEIROVÍTOR BARBOZA LENZABEATRIZ FIGUEIREDO FRANCOFLORIANO GOMES DA SILVANEY TELES DE PAULAROGÉRIO ARÉDIO FERREIRALEOBINO VALENTE CHAVESALFREDO ABINAGEMHUYGENS BANDEIRA DE MELOBENEDITO DO PRADOJOÃO UBALDO FERREIRAGILBERTO MARQUES FILHOJOÃO WALDECK FÉLIX DE SOUSANELMA BRANCO FERREIRA PERILOWALTER CARLOS LEMESJOÃO DE ALMEIDA BRANCOCARLOS HIPÓLITO ESCHERKISLEU DIAS MACIEL FILHOSTENKA ISAAC NETOZACARIAS NEVES COÊLHOLUIZ EDUARDO DE SOUSAALAN SEBASTIÃO DE SENA CONCEIÇÃOABRÃO RODRIGUES FARIALEANDRO CRISPIMITANEY FRANCISCO CAMPOSAMÉLIA NETTO MARTINS DE ARAÚJO

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    LUIZ CLÁUDIO VEIGA BRAGAGERALDO GONÇALVES DA COSTAHÉLIO MAURÍCIO DE AMORIMBENEDITO SOARES DE CAMARGO NETOIVO FAVAROJEOVÁ SARDINHA DE MORAESFAUSTO MOREIRA DINIZNORIVAL CASTRO SANTOMÉ

    ÓRGÃO ESPECIAL

    DESEMBARGADORESJOSÉ LENAR DE MELO BANDEIRAPAULO MARIA TELES ANTUNESFELIPE BATISTA CORDEIROVÍTOR BARBOZA LENZABEATRIZ FIGUEIREDO FRANCOFLORIANO GOMES DA SILVANEY TELES DE PAULAROGÉRIO ARÉDIO FERREIRALEOBINO VALENTE CHAVESALFREDO ABINAGEMHUYGENS BANDEIRA DE MELOJOÃO UBALDO FERREIRAGILBERTO MARQUES FILHOJOÃO WALDECK FÉLIX DE SOUSAWALTER CARLOS LEMESCARLOS HIPÓLITO ESCHER

    CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

    DESEMBARGADORESPAULO MARIA TELES ANTUNESFELIPE BATISTA CORDEIROVÍTOR BARBOZA LENZAKISLEU DIAS MACIEL FILHOLUIZ EDUARDO DE SOUSAALAN SEBASTIÃO DE SENA CONCEIÇÃOAMÉLIA NETTO MARTINS DE ARAÚJO

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    COMISSÃO DE REGIMENTOE ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA

    DESEMBARGADORESFLORIANO GOMES DA SILVANEY TELES DE PAULAROGÉRIO ARÉDIO FERREIRAALFREDO ABINAGEMGILBERTO MARQUES FILHOJOÃO WALDECK FÉLIX DE SOUSACARLOS HIPÓLITO ESCHER

    COMISSÃO DE SELEÇÃO E TREINAMENTO

    DESEMBARGADORESJOÃO UBALDO FERREIRAJOÃO WALDECK FÉLIX DE SOUSAWALTER CARLOS LEMESKISLEU DIAS MACIEL FILHOZACARIAS NEVES COÊLHOITANEY FRANCISCO CAMPOSAMÉLIA NETTO MARTINS DE ARAÚJO

    COMISSÃO DE INFORMATIZAÇÃO

    DESEMBARGADORESFLORIANO GOMES DA SILVALEOBINO VALENTE CHAVESBENEDITO DO PRADOWALTER CARLOS LEMESJOÃO DE ALMEIDA BRANCOABRÃO RODRIGUES FARIAALAN SEBASTIÃO DE SENA CONCEIÇÃO

    COMISSÃO DE JURISPRUDÊNCIA EDOCUMENTAÇÃO

    DESEMBARGADORESJOSÉ LENAR DE MELO BANDEIRABEATRIZ FIGUEIREDO FRANCO

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    HUYGENS BANDEIRA DE MELOBENEDITO DO PRADONELMA BRANCO FERREIRA PERILOSTENKA ISAAC NETO

    COMISSÃO DE DISTRIBUIÇÃO E COORDENAÇÃO

    DESEMBARGADORESPAULO MARIA TELES ANTUNESLUIZ EDUARDO DE SOUSALEANDRO CRISPIM

    REVISTA GOIANA DE JURISPRUDÊNCIA

    DESEMBARGADORESALUÍZIO ATAÍDES DE SOUSAALFREDO ABINAGEMITANEY FRANCISCO CAMPOS

    ESCOLA SUPERIOR DA MAGISTRATURA

    JUIZAMARAL WILSON DE OLIVEIRA

    PRIMEIRA SEÇÃO CÍVEL

    DESEMBARGADORESVÍTOR BARBOZA LENZALEOBINO VALENTE CHAVESALFREDO ABINAGEMJOÃO UBALDO FERREIRAGILBERTO MARQUES FILHOJOÃO WALDECK FÉLIX DE SOUSAZACARIAS NEVES COÊLHOLUIZ EDUARDO DE SOUSAALAN SEBASTIÃO DE SENA CONCEIÇÃOABRÃO RODRIGUES FARIA

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    SEGUNDA SEÇÃO CÍVEL

    DESEMBARGADORESBEATRIZ FIGUEIREDO FRANCOFLORIANO GOMES DA SILVAROGÉRIO ARÉDIO FERREIRAWALTER CARLOS LEMESJOÃO DE ALMEIDA BRANCOCARLOS HIPÓLITO ESCHERKISLEU DIAS MACIEL FILHOSTENKA ISAAC NETOLUIZ CLÁUDIO VEIGA BRAGA

    PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

    DESEMBARGADORESVÍTOR BARBOZA LENZALEOBINO VALENTE CHAVESJOÃO UBALDO FERREIRALUIZ EDUARDO DE SOUSAABRÃO RODRIGUES FARIA

    SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

    DESEMBARGADORESALFREDO ABINAGEMGILBERTO MARQUES FILHOJOÃO WALDECK FÉLIX DE SOUSAZACARIAS NEVES COÊLHOALAN SEBASTIÃO DE SENA CONCEIÇÃO

    TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

    DESEMBARGADORESFLORIANO GOMES DA SILVAROGÉRIO ARÉDIO FERREIRAWALTER CARLOS LEMESLUIZ CLÁUDIO VEIGA BRAGA

  • 10

    QUARTA CÂMARA CÍVEL

    DESEMBARGADORESBEATRIZ FIGUEIREDO FRANCOJOÃO DE ALMEIDA BRANCOCARLOS HIPÓLITO ESCHERKISLEU DIAS MACIEL FILHOSTENKA ISAAC NETO

    SEÇÃO CRIMINAL

    DESEMBARGADORESJOSÉ LENAR DE MELO BANDEIRANEY TELES DE PAULAHUYGENS BANDEIRA DE MELOBENEDITO DO PRADONELMA BRANCO FERREIRA PERILOLEANDRO CRISPIMITANEY FRANCISCO CAMPOSAMÉLIA NETTO MARTINS DE ARAÚJO

    PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

    DESEMBARGADORESHUYGENS BANDEIRA DE MELOLEANDRO CRISPIMITANEY FRANCISCO CAMPOSAMÉLIA NETTO MARTINS DE ARAÚJO

    SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL

    DESEMBARGADORESJOSÉ LENAR DE MELO BANDEIRANEY TELES DE PAULABENEDITO DO PRADONELMA BRANCO FERREIRA PERILO

  • JurisprudênciaCível

  • 12

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    Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 438-6/200 (200901516800)Comarca de GoiâniaRequerente: Subprocurador-Geral de Justiça do Estado de GoiásRequerida: Câmara Municipal de PlanaltinaRelator: Des. João Ubaldo Ferreira

    EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALI-DADE. DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO PARA PREFEITO,VICE-PREFEITO E VEREADORES. INCONSTITUCIONA-LIDADE DA LEI MUNICIPAL.I - A lei municipal que prevê pagamento de décimo terceirosalário ao prefeito, vice-prefeito e vereadores vulnera osartigos 62 e 92, da Constituição Estadual, porquanto trazentranhada em si o vilipêndio da moral e da ilicitudeadministrativa, o menoscabo ao proceder reto e digno dafunção legislativa municipal, a qual é extrapolada para autobeneficiar os agentes políticos encarregados de exercê-la.II - Pedido acolhido para declarar a inconstitucionalidadedo artigo 64, caput, e §§ 3º, 5º e 6º, da Lei Orgânica doMunicípio de Planaltina.Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos de Ação Direitade Inconstitucionalidade nº 438-6/200, acordam os componentes da CorteEspecial do egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, àunanimidade de votos, em julgar procedente a ação direita deinconstitucionalidade, nos termos do voto do relator.

    Votaram, com o relator, os desembargadores GilbertoMarques Filho, João Waldeck Félix de Sousa, Walter Carlos Lemes,Almeida Branco, Carlos Escher, Itaney Francisco Campos convocadopara substituir o desembargador José Lenar de Melo Bandeira, VítorBarboza Lenza, Floriano Gomes, Luiz Cláudio Veiga Braga, convocadopara substituir o desembargador Rogério Arédio Ferreira, Leobino ValenteChaves e Alfredo Abinagem. Ausências ocasionais dos desembargadoresPaulo Teles, Felipe Batista Cordeiro, Ney Teles de Paula, HuygensBandeira de Melo e da desembargadora Beatriz Figueiredo Franco.

    Presidiu a sessão o desembargador Vítor Barboza Lenza.Fez-se presente, como representante da Procuradoria Geral

    de Justiça, a doutora Ana Cristina Ribeiro Peternella França.Goiânia, 12 de maio de 2010.Des. João Ubaldo Ferreira - Relator

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    RELATÓRIO E VOTO

    Cuida-se de ação direta de inconstitucionalidade, compedido de liminar, proposta pelo subprocurador-geral de justiça do Estadode Goiás, com espeque nos artigos 129, IV, da Constituição Federal, 29,I, da Lei Federal nº 8.625/93, 52, II, da Lei Complementar Estadual nº25/98, e 60, da Constituição do Estado de Goiás, em relação ao artigo64, caput, e §§ 3º, 5º e 6º, da Lei Orgânica do Município de Planaltina.

    Alegou que os textos normativos combatidos, a par deregulamentar a remuneração dos agentes políticos do Município dePlanaltina autonomia (prefeito, vice-prefeito, secretários e vereadores),conferiram-lhes vantagens que vulneram os artigos 62 e 92, daConstituição do Estado de Goiás.

    Nesse sentido, aduziu que, por força do artigo 29, daConstituição Federal, a autonomia dos municípios para fixação dossubsídios dos agentes políticos deve observar o que dispõe o artigo 39,§ 4º, também da Constituição Federal, o qual dispõe que os detentoresde mandato, ministros de Estado, secretários estaduais e municipaisserão remunerados exclusivamente por subsídio “fixado em parcelaúnica, sem cômputo de qualquer acréscimo de gratificação, adicional,abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória”.

    Ressaltou que, diante dessas disposições constitucionais,os agentes políticos municipais devem ser, obrigatoriamente,remunerados por subsídios fixados em parcela única. A razão para tantoestá em que não se tratam eles de categoria equiparada aos servidorespúblicos dada a inexistência de vínculo permanente com o Poder Público,de onde “pode-se concluir que os direitos sociais fundamentais insertosnos artigos 7º e 39, § 3º, da Lei Fundamental não os alcançam, sendo,de consequência, inconstitucional qualquer disposição legislativamunicipal que lhes assegurem o recebimento de gratificação natalina”(folha 5, primeiro parágrafo).

    Após transcrever excertos doutrinários e jurisprudenciaissobre a matéria, concluiu que “o Município de Planaltina, ao prever aconcessão de gratificação natalina aos seus agentes políticos, extrapolouos limites de sua autonomia bem como desrespeitou os princípios dalegalidade e da moralidade administrativa, incorrendo, assim, em afrontaaos artigos 62 e 92, da Constituição Estadual” (folha 9, penúltimoparágrafo).

    Nesse sentir, afirmou ser flagrante a inconstitucionalidadedos §§ 5º e 6º, do artigo 64, da Lei Orgânica do Município de Planaltina,que asseguram ao vice-prefeito e ao presidente da Câmara “acréscimo

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    remuneratório decorrente de gratificações de representação” (folha 9,segundo parágrafo).

    De igual modo, o caput, do artigo 64, da Lei Orgânica doMunicípio de Planaltina, que “conduz ao entendimento de que ossubsídios do prefeito, do vice-prefeito e dos secretários podem ser fixadospor ato exclusivo da Câmara Municipal, ou seja, por resolução, e nãomediante lei formal (...) revela incompatibilidade vertical com os ditamesdo artigo 29, inciso V, da Carta Federal (…) e com o artigo 92, caput, daCarta Estadual”, posto que tal medida sujeita-se ao princípio da reservalegal específica” (folha 9).

    Ressaltadas as presenças, no caso concreto, do fumusboni juris e do periculum in mora, pediu, em sede de liminar, aconcessão de medida cautelar para “suspender a eficácia do artigo 64,caput, §§ 3º, 5º e 6º, da Lei Orgânica do Município de Planaltina”, decisãoque, transcorrido todo o iter procedimental, espera ver tornada definitivapelo julgamento de mérito (folha 13).

    Instruiu a petição inicial com os documentos, de folhas15/91.

    A Câmara Municipal de Planaltina ofereceu a contestação,de folhas 99/101. Alegou que os artigos da lei municipal que são objetosda presente ação e estão em harmonia com o artigo 29, da ConstituiçãoFederal, que dispõe que o município é dotado de autonomia para definiros subsídios do prefeito, do vice-prefeito, dos secretários e vereadores.Nesse sentido, insistiu na constitucionalidade do artigo 64, e seus §§ 3º,4º e 5º, posto que restaram observados “o que dispõe os artigos 37, XI,39 § 4º, 150, II, 153 III, § 2º, I, da Constituição Federal” (folha 100).

    O pleito liminar foi analisado por esta Corte Julgadora que,na sessão realizada no dia 25/11/2009 (DJ 482, de 17/12/2009),concedeu, à unanimidade de votos, a liminar pleiteada (folhas 111/112).

    Ao fim de sua exposição, concluiu que “a emenda 19/1998não atingiu os demais dispositivos, ou seja, se mantendo o artigo 39, §3º, a norma que manda aplicar aos ocupantes de cargo público o dispostono artigo 7º IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII eXXX”, razão pela qual pediu a manutenção dos artigos de lei impugnados(folha 101).

    O prefeito de Planaltina, embora regularmente notificado,não compareceu ao processo.

    A Procuradoria-Geral do Estado, por seu órgão de cúpula,pronunciou-se sobre o caso, às folhas 117/124. Alegou a carência daação por ilegitimidade do subprocurador-geral de justiça para apropositura da ação em tela e por impossibilidade jurídica do pedido.Quanto à segunda alegação, explanou que os artigos 29, V, e 39, § 4º,

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    da Constituição Federal, tidos por violados pela lei municipal objeto destaação, não foram reproduzidos no texto constitucional estadual, tanto que,em relação a esta, a violação seria dos artigos 62 e 94, que reproduziriam,“de forma ínsita” as disposições federais. E, concluiu:

    “Assim, a suposta inconstitucionalidade do ato normativomunicipal em face da Constituição Estadual teria ocorrido em razão daremissão do texto da Constituição Estadual à Constituição Federal.

    Todavia, o controle abstrato de constitucionalidade de leismunicipais tem como único parâmetro a Constituição Estadual, conformeestabelece o § 2º do artigo 125, da Constituição Federal. Não é possível,pois, ação direta de inconstitucionalidade contra lei municipal, tomando-secomo referência a Constituição Federal, sob pena de usurpação dacompetência do Supremo Tribunal Federal.”

    Na esteira dessas alegações, pugnou pela extinçãoprocessual sem resolução de mérito.

    Após, foram os autos remetidos à Procuradoria-Geral deJustiça, que ofereceu as alegações finais de folhas 139/151. Na ocasião,esclareceu que a Lei Complementar nº 65/08, alterou o artigo 71, §§ 1ºe 2º, da Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de Goiás (LeiComplementar Estadual nº 25/1998) de modo a permitir atuação dosSubprocuradores Gerais por delegação ou em substituição, com o quenão há se falar em ilegitimidade ativa para a causa.

    Refutou, também, a alegação de que o pedido estáembasado na inconstitucionalidade reflexa do texto normativo municipalpara com a Constituição da República, posto que a inicial é clara emindicar como malferidos os artigos 62 e 92, caput, da ConstituiçãoEstadual. Ainda assim, rememorou que “o colendo Supremo TribunalFederal já decidiu que os tribunais de justiça possuem competência parajulgar ações diretas de inconstitucionalidade por violação dasconstituições estaduais, ante simples remissão dessas à Carta Magna”(folha 142). Quanto ao mais, resumiu-se a ratificar “integralmente osargumentos aduzidos na peça de começo” (folha 144), os quais têm porincorporados a seu parecer. Pediu o acolhimento do pedido.

    É o que, de essencial, havia a ser relatado. Passo ao voto.Analiso, inicialmente, a alegação de ilegitimidade ativa do

    subprocurador-geral de justiça para a causa e o faço para rejeitá-la.Com efeito, como demonstrou o órgão ministerial de cúpula,

    a propositura de ação como a que ora se julga insere-se dentre asatribuições conferidas aos subprocuradores gerais de justiça pelo artigo71, da Lei Complementar Estadual nº 25, de 07/07/1998 (Lei Orgânicado Ministério Público do Estado de Goiás) com a redação dada pela LeiComplementar nº 65, de 18/12/2008, in verbis:

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    “Seção IDos subprocuradores-gerais de justiçaArtigo 71. Os subprocuradores-gerais de justiça para

    assuntos jurídico-institucionais e para assuntos administrativos, comatuação delegada, serão escolhidos pelo procurador-geral de justiça naforma do artigo 11, da Lei Federal nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993.

    § 1º Ao subprocurador-geral de Justiça para assuntosjurídico-institucionais compete:

    I - substituir o procurador-geral em seus afastamentos;II - coordenar os serviços da assessoria;III - remeter, mensalmente, ao Corregedor-geral do

    Ministério Público, relatório dos processos recebidos e dos pareceresemitidos pelos procuradores de justiça junto aos tribunais;

    IV - elaborar, anualmente, o relatório estatístico domovimento processual e dos trabalhos realizados pela assessoria,remetendo-o ao procurador-geral de justiça e ao corregedor-geral doMinistério Público;

    V - ressalvadas as atribuições da Corregedoria-Geral e daOuvidoria-Geral do Ministério Público, prestar assistência aos órgãosde execução e auxiliares no planejamento e execução de suas atividadesde natureza funcional;

    VI - assistir o procurador-geral de justiça na promoção daintegração dos órgãos de execução do Ministério Público, visandoestabelecer ações institucionais;

    VII - exercer outras atribuições que lhe sejam conferidasou delegadas.”

    Também não vinga a alegação de impossibilidade jurídicado pedido, pois, ao contrário do que foi sustentado no parecer do doutoprocurador-geral do Estado, a presente ação não se assenta em ofensareflexa ao texto da Constituição da República, mas, sim, ao texto daConstituição Estadual, especificamente os artigos 62 e 92, caput, comoexpressamente consta da petição inicial, verbis:

    “Destarte, pode-se concluir que o Município de Planaltina,ao prever a concessão de gratificação natalina aos seus agentes políticos,extrapolou os limites de sua autonomia, bem como desrespeitou osprincípios da legalidade e da moralidade administrativa, incorrendo emafronta aos artigos 62 e 92, da Constituição Estadual” (folha 09).

    In casu, não é necessário maior esforço interpretativo parase constatar que o pedido de inconstitucionalidade da lei municipal emvoga não está fundado na ofensa direta ao artigo 39, § 4º, da ConstituiçãoFederal. Diversamente, muito claro está que o vício letal do textonormativo impugnado reside na extrapolação, pelo legislador municipal,

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    da autonomia legislativa que lhe é conferida (e delimitada) pelo artigo62, da Constituição Estadual, e a sua conduta administrativamente imorale ilegal, consubstanciada na prática, intencional e consciente, deestabelecer padrão remuneratório frontalmente contrária a expressadisposição constitucional, beneficiando-se a si próprio, o que vulnera oartigo 92, do mesmo diploma. A saber, tais dispositivos assim dispõem,in verbis:

    “Artigo 62. O Município goza de autonomia política,administrativa e financeira, nos termos desta e da Constituição daRepública e de sua lei orgânica, que será votada em dois turnos, cominterstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos vereadoresque compõem a câmara municipal, que a promulgará”.

    “Artigo 92. A Administração Pública direta, autárquica efundacional e a indireta do Estado e dos Municípios obedecerão aosprincípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e:”.

    Superadas as alegações preliminares, adentro o julgamentodo mérito, o qual, cumpre-me observar, já foi objeto de inúmeras outrasações similares, todas acolhidas para declarar a inconstitucionalidadedas leis municipais que insistem em atribuir aos agentes políticosmunicipais verbas cujo recebimento lhes é vedada pelo ordenamentoconstitucional.

    De fato, não é de hoje que se conhece a distinção entreagentes políticos e servidores públicos e a necessidade de seestabelecerem regimes diferenciados, não só de remuneração comotambém de responsabilidade, para cada uma dessas categorias. De fato,são irrazoáveis as alegações que as analisam de forma homogênea,como se tratassem apenas de variáveis de uma mesma espécie. Quantoa isso, insta notar que os primeiros são investidos em cargos, funções,comissões por nomeações, quando não por mandatos eletivos e, emrazão disso, não se sujeitam ao regramento comum do regime jurídicodo funcionalismo público, o que é salutar, posto que, se assim o fizessem,haveria notório cerceamento de suas atividades, com gravesrepercussões na elaboração e execução das políticas públicas.

    Com base nesse enfoque, a Constituição Federal fixou queo agente político, seja de âmbito federal, estadual ou municipal, “seráremunerado exclusivamente por subsídio fixado em parcela única,vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio,verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, emqualquer caso, o disposto no artigo 37, X e XI.”

    No que concerne à matéria em análise, valho-me daslúcidas palavras de Maria Sylvia Zanella di Pietro, que dada à pertinência

  • 19

    para o caso em tela, é de citação quase obrigatória em casos que tais.Assim leciona a renomada doutrinadora, in verbis:

    “Abandonada a expressão subsídio na Constituição de1988, volta a ser prevista na Emenda Constitucional nº 19,porém apenas para algumas categorias de agentespúblicos. Com isso, passaram a coexistir dois sistemasremuneratórios para os servidores: o tradicional, em que aremuneração compreende uma parte fixa e uma variável,composta por vantagens pecuniárias de variada natureza,e o novo, em que a retribuição corresponde ao subsídio,constituído por parcela única, que exclui a possibilidade depercepção de vantagens pecuniárias variáveis. O primeirosistema é chamado, pela Emenda, de remuneração ouvencimento e, o segundo, de subsídio.(…)Ao falar em parcela única, fica clara a intenção de vedar afixação dos subsídios em duas partes, uma fixa e outravariável, tal como ocorria com os agentes políticos navigência da Constituição de 1967. E, ao vedarexpressamente o acréscimo de qualquer gratificação,adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outraespécie remuneratória, também fica clara a intenção deextinguir, para as mesmas categorias de agentes públicos,o sistema remuneratório que vem vigorandotradicionalmente na Administração Pública e quecompreende o padrão fixado em lei mais as vantagenspecuniárias de variada natureza previstas na legislaçãoestatutária.No entanto, embora o dispositivo fale em parcela única, aintenção do legislador fica parcialmente frustrada emdecorrência de outros dispositivos da própria Constituição,que não foram atingidos pela emenda. Com efeito,mantém-se, no artigo 39, § 3º, a norma que manda aplicaraos ocupantes de cargo público o disposto no artigo 7º, IV,VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII eXXX. Com isto, o servidor que ocupe cargo público (o queexclui os que exercem mandato eletivo e os que ocupamemprego público, já abrangidos pelo artigo 7º) fará jus a:décimo terceiro salário, adicional noturno, salário-família,remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo,a 50% à do normal, adicional de férias, licença à gestante,sem prejuízo do emprego e salário, com a duração de cento

  • 20

    e vinte dias” (in Direito Administrativo, 19ª edição, EditoraAtlas, São Paulo, 2006, página 515).’Tal entendimento não é isolado, posto que referendado por

    outras vozes também de grande eloquência e reconhecimento jurídico,como é o caso de José Afonso da Silva, que, do alto de sua cátedra,assim leciona:

    “A primeira razão da exigência de parcela única consisteem afastar essa duplicidade de parcelas que a tradiçãoconfigurava os subsídios. A proibição expressa deacréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono,prêmio, verba de representação ou outra espécieremuneratória reforça o repúdio ao conselho tradicional eelimina o vezo de fragmentar a remuneração com múltiplospenduricalhos, que desfiguram o sistema retributório doagente público, gerando desigualdades e injustiças. Mas oconceito de parcela única só repele os acréscimos deespécies remuneratórias do trabalho normal do servidor.Não impede que ele aufira outras verbas pecuniárias quetenham fundamentos diversos, desde que consignados emnormas constitucionais. Ora, o § 3º do artigo 39,remetendo-se ao artigo 7º, manda aplicar aos servidoresocupantes de cargos públicos (não ocupantes de mandatoeletivo, de emprego ou de funções públicas) algumasvantagens pecuniárias nele consignadas, que não entramnaqueles títulos vedados. Essas vantagens são: o décimoterceiro salário (artigo 7º, VIII) (...); subsídio noturno maiordo que o diurno (...); salário-família (...); o subsídio de serviçoextraordinário superior (...); o subsídio do período de fériashá de ser, pelo menos, um terço a maior do que o normal(…)” (in Curso de Direito Constitucional Positivo, 16ª edição,Editora Malheiros, São Paulo, 1999, páginas 662/663).À vista de tais ponderações, que espelham o que de melhor

    há na doutrina constitucional pátria, tenho por irreparável a alegação doautor da ação quanto à lei municipal impugnada trazer entranhada em sio vilipêndio da moral e da ilicitude administrativa, o menoscabo aoproceder reto e digno da função legislativa, a qual, no caso, foi posta afavor de um grupo que, via do exercício abusivo da parcela de poderque lhe foi atribuída, age de forma a auto-beneficiar-se avidamente,mesmo que, para tanto, seja preciso atuar de forma escancarada einconstitucional.

    Releva lembrar que, no campo jurisprudencial não é outroo entendimento deste Colegiado Julgador, que, em todas as ocasiões

  • 21

    em que enfrentou a questão, assentou a inconstitucionalidade das leismunicipais que prevêem o pagamento de gratificação natalina a prefeitos,vice-prefeitos e vereadores. Cito duas delas, in verbis:

    “Ementa: Ação direta de inconstitucionalidade. Artigo 99,parágrafo único, Lei orgânica. Município de Goiânia.Vereadores. Percepção. Décimo terceiro salário. Ofensa àConstituição Estadual. Autonomia municipal. Precedentesdesta corte.I - Instituindo a lei orgânica desta urbe dispositivo quecontraria frontalmente a Constituição do Estado de Goiás,consubstanciado em aumento injustificado na remuneraçãodos respectivos vereadores, mediante a incidência dagratificação natalina (ou décimo-terceiro salário), é de sedeclarar inconstitucional o seu teor, fundamentalmente porafrontar os limites de autonomia municipal, na medida emque vedada tal estipulação em favor dos agentes públicosexercentes de mandato eletivo, os quais deverão serremunerados, exclusivamente, por subsídio fixado emparcela única. A criação de qualquer adicional ou outra formaremuneratória similar, fere as disposições dos artigos 62,da Constituição Estadual, e 39, § 4º, da Carta Magna.II - Materialização de inconstitucionalidade do artigo 99,parágrafo único, da Lei Orgânica do Município de Goiânia.Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente”(Tribunal de Justiça de Goiás, Órgão Especial, Ação Diretade Inconstitucionalidade nº 338-1/200, DJ 15098, de04/10/2007, relator desembargador Elcy Santos de Melo).Ementa: “Ação direta de inconstitucionalidade. Lei municipalatribuindo aos agentes políticos municipais o direito aodécimo terceiro salário. Afronta à Constituição Estadual.Os agentes públicos, titulares de mandato eletivo, nãomantem com o estado, como é da natureza do cargo eletivo,relação de trabalho de natureza profissional e caráter nãoeventual sob vínculo de dependência, e não podem serconsiderados como trabalhadores ou servidores públicos,tal como dimana da Constituição Federal e, portanto, nãofazem jus ao décimo terceiro subsídio, impondo-se aindaobservar que o caput do artigo 92, da Constituição Estadual,determina ainda que ‘a administração pública direta,autárquica e fundacional e a indireta do Estado e dosMunicípios obedecerão aos princípios da legalidade,impessoalidade, moralidade, publicidade’, resultando que

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    texto legal, dispondo de modo diverso, estampa macula deinsuperável inconstitucionalidade. Ação Direta deInconstitucio-nalidade julgada procedente” (Tribunal deJustiça de Goiás, Corte Especial, Ação Direta deInconstitucionalidade nº 418-3/200, DJ 325, de 04/05/2009,relator desembargador Paulo Teles, redator desembargadorFelipe Batista Cordeiro).Ao fim dessa exposição e tendo em vista que se trata de

    matéria já conhecida, à exaustão, por esta Corte Especial, tenho que osfundamentos já expendidos são suficientes, quanto satis, para ojulgamento da causa, sem necessidade de outros acréscimos, quecertamente poderiam ser feitos, mas que resultariam apenas noprolongamento inócuo deste voto.

    A teor do exposto, julgo procedente o pedido para declarara inconstitucionalidade do artigo 64, caput, e §§ 3º, 5º e 6º, da LeiOrgânica do Município de Planaltina.

    É como voto.Goiânia, 12 de maio de 2010.Des. João Ubaldo Ferreira - Relator

    Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 447-4/200 (200903536492)Comarca de GoiâniaRequerente: Procurador-Geral de Justiça do Estado de GoiásRequerida: Assembléia Legislativa do Estado de GoiásRelator: Des. Carlos Escher

    EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONA-LIDADE. EMENDA PARLAMENTAR. FALTA DEPERTINÊNCIA TEMÁTICA. INCONSTITUCIONALIDADE.I - É possível ao parlamentar emendar projeto de lei deiniciativa reservada, desde que respeitadas as limitaçõesestabelecidas explícita e implicitamente na ConstituiçãoEstadual, dentre elas, a existência de pertinência temática,sob pena de inconstitucionalidade.II - Não tendo sido observada a pertinência temática noprojeto emendado pela Assembléia Legislativa,especialmente quanto ao inciso III, do artigo 1º, da Lei nº16.467/09, conclui-se pela inconstitucionalidade de taldispositivo, com redução de texto, ficando suprimida aexpressão “com efeito suspensivo,”.Ação direta de inconstitucionalidade procedente.

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    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partesas retro indicadas.

    Acordam os componentes da Corte Especial do egrégioTribunal de Justiça do Estado de Goiás, à unanimidade de votos, emjulgar procedente a ação direta de inconstitucionalidade, nos termos dovoto do relator.

    Votaram, com o relator, os desembargadores Paulo Teles,Felipe Batista Cordeiro, Vítor Barboza Lenza, Beatriz Figueiredo Franco,Floriano Gomes, Ney Teles de Paula, Rogério Arédio Ferreira, LeobinoValente Chaves, Zacarias Neves Coêlho (convocado - desembargadorAlfredo Abinagem), João Ubaldo Ferreira, Leandro Crispim (convocado- desembargador Gilberto Marques Filho), Abrão Rodrigues Faria(convocado - desembargador Almeida Branco). Ausentaram-se,ocasionalmente, os desembargadores José Lenar de Melo Bandeira,Huygens Bandeira de Melo e, justificadamente, os desembargadoresJoão Waldeck Felix de Sousa e Luiz Eduardo de Sousa (convocado -desembargador Walter Carlos Lemes).

    Presidiu a sessão o desembargador Paulo Teles.Presente a ilustre procuradora de justiça, doutora Ana

    Cristina Ribeiro Peternella França.Goiânia, 24 de março de 2010.Des. Carlos Escher - Relator

    RELATÓRIO E VOTO

    Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade, propostapelo ilustre procurador-geral de Justiça, doutor Eduardo Abdon Moura,contra o inciso III, do artigo 1º, da Lei nº 16.467, promulgado pelo senhorpresidente da Assembléia Legislativa, deputado Helder Valin, em05/01/2009 (folha 21).

    Diz que, conforme representação que lhe foi encaminhada,“o Tribunal de Contas dos Municípios do Estado de Goiás encaminhou àAssembléia Legislativa projeto de lei para alterar a redação original doartigo 42, da Lei Estadual nº 15.958/07, e substituir a expressão - semefeito suspensivo - ali contida, pela expressão - com efeito devolutivo”(folha 3).

    Afirma que mediante emenda parlamentar, o referidodispositivo foi alterado, atribuindo-se efeito suspensivo ao recurso derevisão, e que, não obstante o veto do governador do Estado a respeito

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    da alteração contida no autógrafo de lei nº 293, a Assembléia Legislativamanteve a alteração, rejeitando o veto.

    Ressalta que “A emenda modificativa, ao transformar oefeito devolutivo do recurso de revisão em suspensivo, invadiu reservade iniciativa do presidente da Corte, por não guardar pertinência temáticacom a propositura, além do que atribuiu, de forma paradoxal, a mesmanatureza da ação rescisória a esse recurso” (folha 4).

    Alerta “que o legislador constituinte decorrente atribuiu aoTribunal de Contas dos Municípios a mesma prerrogativa institucional,qual seja: reserva de iniciativa legislativa para as matérias que digamrespeito à sua organização interna” (folha 6).

    Frisa que “A concessão de efeito suspensivo, nesse caso,é ilógica, pois, além de não condizer com a providência, ainda atentacontra o interesse público, porquanto impede que a decisão tida comodefinitiva, em processo de prestação ou tomada de contas, tenha, defato, caráter definitivo e surta seus efeitos durante o dilatado prazo dedois anos, tempo previsto para a interposição do recurso de revisão”(folha 9).

    Argumenta que a emenda parlamentar “acabou inovandona ordem jurídica para criar mecanismo de burla às regras deinelegibilidade, ditadas pela Lei Complementar nº 64/90, e permitir quecandidatos com contas rejeitadas por decisão irrecorrível da Corte deContas possam concorrer às eleições, enquanto não decorrido o prazode dois anos previsto para a interposição do recurso de revisão ouenquanto este não for julgado pelo Tribunal Pleno”, (folha 10). Sob talprisma, entende que a norma impugnada “atenta contra a legitimidadedas eleições e o princípio constitucional da moralidade administrativa”(folha 10).

    Em seguida, conclui “que a expressão - com efeitosuspensivo - inserida no artigo 42, da Lei nº 13.958/07, com redaçãodada pela Lei nº 16.467/2009, contém vício formal e material deinconstitucionalidade, por incompatibilidade com os artigos 80 (conferereserva de iniciativa de lei ao Tribunal de Contas dos Municípios, o quelimita o poder de emenda parlamentar ao projeto de lei) e 92, caput(princípio da moralidade administrativa), ambos da Constituição doEstado de Goiás” (folha 11).

    Ao final, requereu “a concessão de medida cautelar parasuspender, provisoriamente, a eficácia do artigo 1º, inciso III, da Lei nº16.467/09, que deu nova redação ao artigo 42, da Lei nº 13.958/2007,com fundamento no artigo 10, da Lei nº 9.868/99;” (folha 12, item a).Pediu, ainda, para que seja declarada “a inconstitucionalidade do artigo1º, inciso III, da Lei nº 6.467/09, que deu nova redação ao artigo 42, da

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    Lei Orgânica do Tribunal de Contas dos Municípios - Lei nº 15.958/07,por violação dos artigos 80 e 92, caput, da Constituição do Estado deGoiás” (sic, folha 13, item f).

    Com a inicial, vieram os documentos de folhas 14/74.De início, solicitei informações ao ilustre presidente da

    Assembléia Legislativa (folhas 78/79), deputado Helder Valin, o qualprestou as informações, de folhas 84/92, pugnando pelo indeferimentodo pedido de liminar.

    Através da decisão, de folhas 94/108, de minha relatoria,foi indeferido o pedido de liminar formulado na inicial, diante da ausênciado periculum in mora.

    O presidente em exercício da Assembléia Legislativa,deputado Honor Cruvinel, prestou as informações, de folhas 113/120,defendendo a constitucionalidade do dispositivo legal impugnado.

    O procurador-geral do Estado, doutor Anderson Máximode Holanda, disse que não defenderia “o teor do ato impugnado, quantoà alegação de vício formal” (folha 127, item “2.2”). Por outro lado,entendeu ser improcedente a alegação de inconstitucionalidade por víciomaterial.

    Em seguida, a ilustre subprocuradora-geral de Justiça,doutora Ana Cristina Ribeiro Peternella França, assim se manifestou:

    “Na esteira do exposto, o Ministério Público, por suasubprocuradora-geral de justiça para assuntos jurídico-institucionais,requer, quanto ao aspecto processual, seja determinada a notificaçãopessoal do governador do Estado de Goiás, para, se quiser, prestarinformações na presente ação. No mérito, pugna pela procedência dopedido inicial, com a declaração da inconstitucionalidade do artigo 1º,inciso III, da Lei nº 16.467/09.” (folha 141)

    É, em síntese, o relatório.Passo ao voto.Diz o artigo 6º, da Lei nº 9.868/99, que:“O relator pedirá informações aos órgãos ou às autoridades

    das quais emanou a lei ou o ato normativo impugnado.”Conforme ressaltado no despacho de folhas 78/79, lavrado

    antes de ser analisado o pedido de liminar, já não se fazia necessária amanifestação do Senhor Governador do Estado, porque não foi ele quemdecretou e promulgou o inciso III, do artigo 1º, da Lei 16.467/2009, oraimpugnado.

    De acordo com o Diário da Assembléia, juntado à folha 21,o inciso III, do artigo 1º, da citada Lei nº 16.467/2009, foi decretado pelaAssembléia Legislativa e promulgado pelo presidente daquele órgão,não havendo a participação do governador do Estado no ato de

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    introduzi-lo no mundo jurídico, vez que o mesmo vetou o referido incisoIII, do artigo 1º, do autógrafo de lei nº 293/2008 (folhas 43/51).

    Por tal motivo, inadmissível a diligência pretendida pelailustre representante ministerial, no sentido de determinar “a notificaçãopessoal do Governador do Estado de Goiás, para, se quiser, prestarinformações na presente ação.” (folha 141), à luz do artigo 6º, da Lei9.868/99.

    Passo, então, ao exame do mérito.Dizia o artigo 42, caput, da Lei nº 15.958, de 18/01/2007

    (Lei Orgânica do Tribunal de Contas dos Municípios do Estado de Goiás)o seguinte:

    “De decisão definitiva em processo de prestação ou tomadade contas, mesmo especial, de decisão de mérito proferida em processossujeitos a registro, cabe recurso de revisão ao Tribunal Pleno, de naturezasimilar à da ação rescisória, sem efeito suspensivo, interposto uma sóvez e por escrito pela parte, seus sucessores, ou pelo Ministério Públicojunto ao Tribunal, dentro do prazo de dois anos, contados da intimaçãoda decisão recorrida, e fundar-se-á:”

    A proposta de alteração do artigo 42, caput, da Lei nº15.958/2007, de iniciativa do Tribunal de Contas dos Municípios do Estadode Goiás, objetivava conferir-lhe a seguinte redação:

    “De decisão definitiva em processo de prestação ou tomadade contas, mesmo especial, de decisão de mérito proferida em processossujeitos a registro, cabe recurso de revisão ao Tribunal Pleno, de naturezasimilar à da ação rescisória, com efeito devolutivo, interposto uma sóvez e por escrito pela parte, seus sucessores ou pelo Ministério Públicojunto ao Tribunal, dentro do prazo de 2 (dois) anos, contados da intimaçãoda decisão recorrida, e fundar-se-á:” (folha 15)

    Contudo, observo que a referida proposta foi objeto deemenda parlamentar, nos termos do autógrafo de lei nº 293/2008 (folhas34/40). Repita-se, pois, que o governador do Estado, doutor AlcidesRodrigues Filho, vetou o referido inciso III, do artigo 1º, do citado autógrafo(folhas 43/51).

    Diante da rejeição do veto em relação ao inciso III, do artigo1º, do autógrafo de Lei nº 293/08, o presidente da Assembléia Legislativa,deputado Helder Valin, promulgou o inciso III, do artigo 1º, da Lei nº16.467, de 05/01/2009 (folha 21), com o seguinte teor:

    “III - o caput do artigo 42, da Lei nº 15.958/07, passa a tera seguinte redação:

    “Artigo 42. De decisão definitiva em processo de prestaçãoou tomada de contas, mesmo especial, de decisão de mérito proferidaem processos sujeitos a registro cabe recurso de revisão ao Tribunal

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    Pleno, de natureza similar à da ação rescisória, com efeito suspensivo,interposto uma só vez e por escrito pela parte, seus sucessores, ou peloMinistério Público junto ao Tribunal, dentro do prazo de 2 (dois) anos,contados da intimação da decisão recorrida, e fundar-se-á: “(NR)”

    Agora, vejamos o disposto nos artigos 20, 80 e 92, daConstituição do Estado: artigo 20: “A iniciativa das leis complementarese ordinárias cabe a qualquer membro ou comissão da AssembléiaLegislativa, ao governador do Estado, ao Tribunal de Justiça, a qualquerórgão a que tenha sido atribuído esse direito e aos cidadãos, na forma enos casos previstos nesta e na Constituição da República.”

    Artigo 80: “O Tribunal de Contas dos Municípios, integradopor sete conselheiros, tem sede na Capital, quadro próprio de pessoal ejurisdição em todo o território estadual, e exercendo, no que couber, asatribuições previstas no artigo 96, da Constituição da República,sendo-lhe assegurada autonomia administrativa.”

    Artigo 92: “A Administração Pública direta, autárquica efundacional e a indireta do Estado e dos Municípios obedecerão aosprincípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e:”

    Portanto, compete privativamente ao Tribunal de Contasdos Municípios produzir suas próprias normas, mediante iniciativa doprocesso legislativo, em virtude da remissão feita pelo artigo 80, daConstituição Estadual ao artigo 96, da Constituição Federal.

    Além do mais, os princípios da legalidade, daimpessoalidade, da moralidade e da publicidade são de observânciaobrigatória pela Administração Pública direta, autárquica e fundacionale pela Administração Pública indireta do Estado e dos Municípios.

    Por outro lado, correto afirmar que “O poder de emendar -que não se constitui derivação do poder de iniciar o processo de formaçãodas leis - qualifica-se como prerrogativa deferida aos parlamentares”,sendo, portanto, de natureza constitucional (parte da ementa relativa aojulgamento da medida cautelar em Ação Direta de Inconstitucionalidadenº 973, Supremo Tribunal Federal, relator ministro Celso de Mello, datado julgamento: 17/12/1993).

    Logo, é possível ao parlamentar emendar projeto de lei deiniciativa reservada, desde que respeitadas as limitações estabelecidasexplícita e implicitamente na Constituição Estadual, dentre elas, aexistência de pertinência temática, sob pena de inconstitucionalidade.

    A respeito da pertinência temática, vejamos o que prescrevea Lei Complementar Estadual nº 33/2001:

    Artigo 16: “Os projetos de lei de iniciativa reservada dosdemais Poderes e do Ministério Público podem ser objeto de emenda

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    parlamentar, desde que não provoque aumento de despesa e mantenhapertinência temática em relação ao projeto original.

    Parágrafo único - Entende-se por pertinência temática acorrelação que deve haver entre a inovação e o objeto do projeto original.”

    Sobre a limitação ao poder de emenda, vejamos oentendimento do Supremo Tribunal Federal:

    “Tribunal de justiça. Instauração de processo legislativoversando a organização e a divisão judiciárias do estado.Iniciativa do respectivo projeto de lei sujeita à cláusulaconstitucional de reserva (Constituição Federal, artigo 125,§ 1º, in fine). Oferecimento e aprovação, no curso doprocesso legislativo, de emendas parlamentares. Aumentoda despesa originalmente prevista e ausência depertinência. Descaracterização da proposição legislativaoriginal, motivada pela ampliação do número de comarcas,varas e cargos constantes do projeto inicial. Configuração,na espécie, dos requisitos pertinentes à plausibilidadejurídica e ao periculum in mora. Medida cautelar deferida.O poder de emendar projetos de lei - que se reveste denatureza eminentemente constitucional - qualifica-se comoprerrogativa de ordem político-jurídica inerente ao exercícioda atividade legislativa. Essa prerrogativa institucional,precisamente por não traduzir corolário do poder de iniciaro processo de formação das leis (Revista Trimestral deJurisprudência 36/382, 385; Revista Trimestral deJurisprudência 37/113; RDA 102/261), pode serlegitimamente exercida pelos membros do Legislativo, aindaque se cuide de proposições constitucionalmente sujeitasà cláusula de reserva de iniciativa (Ação Direta deInconstitucionalidade nº 865/MA, relator ministro Celso deMello), desde que - respeitadas as limitações estabelecidasna Constituição da República - as emendas parlamentares(a) não importem em aumento da despesa prevista noprojeto de lei, (b) guardem afinidade lógica (relação depertinência) com a proposição original e (c) tratando-se deprojetos orçamentários (Constituição Federal, artigo 165, I,II e III), observem as restrições fixadas no artigo 166, §§ 3ºe 4º, da Carta Política. Doutrina. Jurisprudência.Inobservância, no caso, pelos deputados estaduais, quandodo oferecimento das emendas parlamentares, de taisrestrições. Precedentes do Supremo Tribunal Federal.Suspensão cautelar da eficácia do diploma legislativo

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    estadual impugnado nesta sede de fiscalização normativaabstrata” (Tribunal Pleno, Medida Cautelar em Ação Diretade Inconstitucionalidade nº 1050-6, relator ministro Celsode Mello; data do julgamento: 21/09/1994).No caso, observo que a lei anterior previa, expressamente,

    que o recurso de revisão seria recebido “sem efeito suspensivo”. Noprojeto de lei encaminhado ao Poder Legislativo, a expressão supracitadafoi substituída por “com efeito devolutivo”, permanecendo, assim, aintenção do Tribunal de Contas dos Municípios em manter apenas adevolutividade do recurso de revisão. Mas a expressão “com efeitodevolutivo”, constante do projeto, foi substituída por “com efeitosuspensivo” no âmbito do Poder Legislativo.

    A meu ver, a atribuição de efeito suspensivo ao recurso derevisão, através de emenda parlamentar, contrariou a redação originaldo projeto (e, inclusive, da lei anterior), no sentido de conferir-lhe apenasefeito devolutivo, não havendo simetria, mas flagrante divergência.

    Embora o processo legislativo tenha sido iniciado peloTribunal de Contas dos Municípios, correto afirmar que a emendaparlamentar questionada extrapolou os limites da iniciativa conferida aoreferido órgão para alterar sua própria lei orgânica (artigo 80, daConstituição do Estado de Goiás, c/c o artigo 96, I, a, da ConstituiçãoFederal).

    Além do mais, a atribuição de efeito exclusivamentedevolutivo ao recurso de revisão, tal como previsto no projeto enviadopelo Tribunal de Contas dos Municípios, não viola as normas de processoe as garantias processuais das partes, de observância obrigatória (artigo96, I, a, da Constituição Federal), em virtude de sua semelhança com aação rescisória.

    Inclusive, cumpre lembrar que “O ajuizamento da açãorescisória não impede o cumprimento da sentença ou acórdãorescindendo, ressalvada a concessão, casos imprescindíveis e sob ospressupostos previstos em lei, de medidas de natureza cautelar ouantecipatória de tutela” (artigo 489, do Código de Processo Civil).

    Em outras palavras, não há falar-se em efeito suspensivona ação rescisória, podendo ser concedida, em casos excepcionais,medida de natureza cautelar ou antecipatória de tutela.

    Outrossim, não é possível confrontar, sob o argumento deque houve ofensa ao princípio da moralidade administrativa, insculpidona Constituição Estadual, o dispositivo questionado com a LeiComplementar nº 64/90 (que estabelece, de acordo com o artigo 14, §9º, da Constituição Federal, os casos de inelegibilidade), vez que o

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    confronto entre leis infraconstitucionais (uma estadual e outra federal),em ação direta de inconstitucionalidade proposta perante o Tribunal deJustiça, desnatura sua finalidade.

    Nesta linha de raciocínio, vejamos o entendimento doprocurador-geral do Estado, doutor Anderson Máximo de Holanda, arespeito dos vícios de inconstitucionalidade arguidos na inicial (formal ematerial):

    “3 . E, no caso vertente, o sentido da alteração empreendidapela emenda parlamentar foi exatamente o de gerar “incompatibilidadeentre o sentido geral do projeto e as disposições a ele acrescidas peloórgão legislativo”, eis que os efeitos do recurso foram estabelecidos deforma diametralmente oposta à constante do projeto encaminhado peloTribunal.

    4 . Já no pertinente ao vício material levantado peloMinistério Público, cumpre destacar que o dispositivo impugnado, mesmoque se admitisse a argumentação de que cria mecanismo de burla àsregras de inelegibilidade, o faz em relação a inelegibilidade de previsãomeramente legal, não constitucional, o que inviabiliza o controleconcentrado - eis que exigiria a consulta à disciplina constante da LeiComplementar nº 64/90, como admitido na inicial (folha 10) ecorretamente assentado pelo relator na decisão, de folhas 94/108.

    3 . 1 . Neste particular, improcede a alegação deinconstitucionalidade.” (folha 129)

    Portanto, tendo em vista que a pertinência temática não foiobservada pelo Poder Legislativo em relação ao inciso III, do artigo 1º,da Lei nº 16.467/09, conclui-se que restou violado o artigo 80, daConstituição do Estado de Goiás.

    Ao contrário da pretensão exposta na inicial, não faz sentidodeclarar a inconstitucionalidade total do dispositivo impugnado, porque,uma vez suprimida a expressão “com efeito suspensivo,”, é possívelpreservar a constitucionalidade do texto remanescente.

    Ante ao exposto, julgo procedente o pedido formulado nainicial para declarar a inconstitucionalidade parcial do inciso III, do artigo1º, da Lei nº 16.467/09, com redução de texto, ficando suprimida aexpressão “com efeito suspensivo,”.

    Oficie-se ao ilustre presidente da Assembléia Legislativa, afim de dar-lhe conhecimento sobre tal deliberação, nos termos do artigo25, da Lei nº 9.868/99.

    É o voto.Goiânia, 24 de março de 2010.Des. Carlos Escher - Relator

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    Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1287-26.2010.809.0000(201090012870)Comarca de TrindadeRequerente: Prefeito Municipal de TrindadeRequerida: Câmara Municipal de TrindadeRelator: Des. João de Almeida Branco

    EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALI-DADE. PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 83, ACRES-CENTADO PELA EMENDA Nº 18/2005 À LEI ORGÂNICADO MUNICÍPIO DE TRINDADE. COMUNICAÇÃO ÀCÂMARA MUNICIPAL DE LICITAÇÕES REALIZADASPELO MUNICÍPIO. VÍCIO DE INCIATIVA. NÃO VERI-FICADO. INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL.INEXISTENTE.I - Dispositivo questionado: parágrafo único do artigo 83,acrescentado pela emenda nº 18/2005 à Lei Orgânica doMunicípio de Trindade, que prevê a necessidade decomunicação à Câmara Municipal de licitações realizadaspelo município.II - A competência privativa do chefe do Poder Executivo étão somente para dispor sobre estruturação, atribuições efuncionamento dos órgãos da administração municipal(artigo 77, inciso V, da Constituição do Estado de Goiás),hipóteses que não se verificam no dispositivo em espeque,vez que já há previsão do controle externo das contas doPoder Executivo pela Câmara Municipal, nos termos doartigo 70, inciso VII, da Constituição Estadual, sendo que anorma em comento visa apenas otimizar esta função. Víciode iniciativa não verificado.III - Diante disso inexiste malferimento ao princípiorepublicano ou à separação dos poderes (artigos 1º e 2º,da Constituição Estadual), já que a função de fiscalizaçãoe controle externo pelo Poder Legislativo dos atos do PoderExecutivo decorre da própria Constituição. Ademais nãose trata de norma geral sobre licitação, eis que não crianova modalidade e/ou altera o procedimento licitatórioprevisto, mas confere exercício à competência legislativasuplementar garantida aos municípios, conforme artigo 64,incisos I e II, da Constituição do Estado de Goiás.Inconstitucionalidade material inexistente.Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente.

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    ACORDÃO

    Vistos, relatados e discutidos os autos da Ação Direta deInconstitucionalidade nº 1287-26.2010.8.09.0000, da Comarca deTrindade, figurando como requerente prefeito do Município de Trindadee, como requerido, Câmara Municipal de Trindade.

    Acorda o Tribunal de Justiça de Goiás, em sessão da CorteEspecial, a unanimidade de votos, em julgar improcedente a ação diretade inconstitucionalidade, nos termos do voto do relator.

    Votaram, com o relator - desembargador Almeida Branco -,os desembargadores Carlos Escher, desembargador Kisleu Dias MacielFilho, desembargador Zacarias Neves Coelho, desembargador JoséLenar de Melo Bandeira, desembargador Paulo Teles, desembargadorVitor Barbosa Lenza, desembargadora Beatriz Figueiredo Franco,desembargador Itaney Francisco Campos, convocado para substituir odesembargador Floriano Gomes, desembargador Rogério ArédioFerreira, desembargador Leobino Valente Chaves, desembargador JoãoUbaldo Ferreira, desembargador Gilberto Marques Filho, desembargadorJoão Waldeck Felix de Sousa, desembargador Walter Carlos Lemes.Impedidos: desembargador Huygens Bandeira de Melo. Ausentejustificado: desembargador Ney Teles de Paula.

    Presidiu a sessão o desembargador Paulo Teles.Esteve presente à sessão a ilustre procuradora de justiça,

    doutora Ana Cristina Ribeiro Peternella França.Goiânia, 24 de novembro de 2010.Des. Almeida Branco - Relator

    RELATÓRIO E VOTO

    O prefeito Municipal de Trindade, senhor Ricardo Fortunatode Oliveira, no uso de suas prerrogativas legais, instrumentaliza apresente ação direta de inconstitucionalidade, com pedido de apreciaçãoem caráter liminar, em face da Câmara Municipal de Trindade, visandoa declaração de inconstitucionalidade da emenda a Lei Orgânica nº18/2005, de 22 de novembro de 2005, na qual acrescentou o parágrafoúnico ao artigo 83 do referido diploma legal.

    Salienta que tal emenda “possui clara inconstitucionalidade,sendo que tal dispositivo prevê o seguinte:

    Artigo 83. (…)Parágrafo único. Toda licitação promovida pelo Município

    deverá, obrigatoriamente, ser comunicada à Câmara Municipal, sendoque nos casos de convite no prazo de 05 (cinco) dias úteis antes da

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    abertura das propostas e nos demais procedimentos, até 30 (trinta) diasúteis, através das cópias do projeto básico e edital de licitação”.

    Ressalta que a norma legal supracitada afronta os artigos1º, 2º, 4º, III, 64, 69, e 77, todos da Constituição Estadual, além de ofendera Lei Orgânica Municipal, tratando-se de competência legislativa privativada União, de acordo com o artigo 22, XXVII, da Constituição da República.

    Sobreleva a competência privativa da Corte Especial desteegrégio Tribunal de Justiça para o julgamento da presente ação diretade inconstitucionalidade, nos termos do artigo 46, inciso VIII, a, da CartaPolítica Estadual c/c artigo 9º-B, inciso I, do Regimento Interno do Tribunalde Justiça de Goiás, bem como a legitimidade ativa do prefeito doMunicípio de Trindade para propor a presente ação, já que trata-se delei local, conforme preconiza o artigo 60, da Constituição Estadual.

    Argumenta que a referida emenda à Lei Orgânica nº18/2005, dispõe sobre a fiscalização prévia da Câmara Municipal emtodas as licitações realizadas pelo Município de Trindade, o que é vedadopelo ordenamento jurídico pátrio, de acordo com a jurisprudência doexcelso Supremo Tribunal Federal, por tratar-se de “controle prévio”diverso do previsto na Lei Federal nº 8.666/93, uma vez que tal exigênciainvade a competência legislativa distribuída pela Constituição Federal/88,já exercida pela Lei Federal 8.666/93, que não contêm tal previsão.

    Assevera que, na hipótese dos autos, “a emenda combatidapossui grave vício de iniciativa, na medida em que a Câmara Municipaliniciou processo legislativo e promulgou emenda à lei orgânica dispondosobre o funcionamento e as atribuições do Poder Executivo, criandouma nova obrigação para os servidores municipais do Executivo”,usurpando, desta forma, competência constitucionalmente exclusiva dochefe do poder executivo municipal, nos termos do artigo 77, da CartaPolítica Estadual, c/c artigo 61, II, c, da Constituição da República.

    Em outras palavras, suscita haver uma inconstitucionalidadeformal, ocasionada pelo vício de iniciativa do processo legislativo.

    Colaciona posicionamento doutrinário e arestosjurisprudenciais para amparar sua pretensão.

    Sustenta, ainda, que o dispositivo legal ora fustigado afrontaprincípio basilar do Estado Democrático Republicano de separação eindependência harmônica dos Poderes, idealizado pelo filósofoMontesquieu, que foi ratificado pela Carta Magna Constitucional de 1988,em seu artigo 2º, e reproduzido de forma adaptada em nossa ConstituiçãoEstadual (artigo 2º, caput).

    Alega que o município estaria legislando sobre matéria afetaexclusivamente à União, em flagrante ofensa ao artigo 22, XXVII, daConstituição Federal.

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    Destaca “que a regra impugnada ofende também acompetência fiscalizadora prevista pela Constituição Estadul/89 quedetermina que a fiscalização da Câmara Municipal só ocorrerá após aatuação do Tribunal de Contas dos Municípios e não de forma préviacomo pretende a emenda impugnada”.

    Invoca a presença dos pressupostos autorizadores daconcessão da medida cautelar, consistentes no fumus boni iuris e nopericulum in mora, e pleiteia por sua concessão, “para suspender,imediatamente, a eficácia da emenda à lei orgânica nº 18/2005, tornado-asem efeito, imediata e provisoriamente”.

    Ao final, pugna pela declaração de inconstitucionalidadeda emenda a Lei Orgânica nº 018/2005, de 22 de novembro de 2005, naqual acrescentou o parágrafo único ao artigo 83 do referido diplomalegal, “por afronta aos artigos 1º, 2º, 4º, III, 61, 64, 69, 77, incisos I, V e VIe 79, combinados com os artigos 20, § 1º, inciso II, a e b, todos daConstituição Estadual, além do artigo 49, I da Lei Orgânica do Municípiode Trindade”.

    Instrui os autos com os documentos de folhas 25/108.Decisão denegatória da liminar pleiteada inaudita altera

    pars (folhas 112/114).Instada a se manifestar sobre o feito, a Câmara Municipal

    de Trindade pugna pela total improcedência da ação (folhas 118/119).Às folhas 129/139 foi indeferida a medida cautelar pleiteada.Manifestações pela Procuradoria Geral do Estado (folhas

    151/162) e Procuradoria-Geral de Justiça (folhas 167/170), ambas pelaimprocedência do pedido.

    É o relatório. Passo ao voto.Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade proposta

    pelo prefeito do Município de Trindade em face da Câmara Municipal deTrindade, visando a declaração de inconstitucionalidade da emenda àLei Orgânica nº 018/2005, de 22 de novembro de 2005, a qualacrescentou o parágrafo único ao artigo 83 do referido diploma legal.

    Inicialmente, cumpre ressaltar a competência deste Tribunalde Justiça para processar e realizar o controle concentrado das leis ouatos normativos municipais ou estaduais contrários à Constituição doEstado de Goiás, nos termos do § 2º, do artigo 125, da ConstituiçãoFederal e artigo 46, inciso VIII, a, da Constituição Estadual.

    No caso em comento, o dispositivo questionado é oparágrafo único do artigo 83, acrescentado pela emenda nº 018/2005 àLei Orgânica do município de Trindade, in verbis:

    “Artigo 83. (…)

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    Parágrafo único. Toda licitação promovida pelo municípiodeverá, obrigatoriamente, ser comunicada à Câmara Municipal, sendoque nos casos de convite no prazo de 05 (cinco) dias úteis antes daabertura das propostas e nos demais procedimentos, até 30 (trinta) diasúteis, através das cópias do Projeto básico e edital de licitação”

    Na exordial o requerente alega, em síntese,inconstitucionalidade formal, em razão do vício de iniciativa, já que a leicria nova obrigação para os servidores municipais e o processo legislativonão foi deflagrado pelo chefe do Poder Executivo.

    De outro tanto, sustenta inconstitucionalidade material, poisa norma supra ofende os artigos 1º, 2º, 4º, III, 64, 69, e 77, todos daConstituição Estadual, além de ofender a Lei Orgânica Municipal,tratando-se de competência legislativa privativa da União, de acordocom o artigo 22, XXVII, da Constituição da República.

    Todavia, analisando o caso em questão verifico queinexistem quaisquer dos vícios apontados.

    No que tange à iniciativa, deve-se ressaltar que acompetência privativa do chefe do Poder Executivo é tão somente paradispor sobre estruturação, atribuições e funcionamento dos órgãos daadministração municipal (artigo 77, inciso V, da Constituição do Estadode Goiás), hipóteses que não se verificam no dispositivo em apreço.

    Isso porque, já há previsão do controle externo das contasdo Poder Executivo pela Câmara Municipal, nos termos do artigo 70,inciso VII, da Constituição Estadual, sendo que a norma em comentoapenas visa otimizar esta função. Senão vejamos:

    “Artigo 70. Compete privativamente à Câmara Municipal:VII - exercer, com o auxílio do Tribunal de Contas dos

    Municípios, o controle externo das contas mensais e anuais do Município,observados os termos desta e da Constituição da República;”.

    Por outro lado, inexiste malferimento ao princípiorepublicano ou à separação dos poderes (artigos 1º e 2º, da ConstituiçãoEstadual), já que a função de fiscalização e controle pelo Poder Legislativodos atos do Poder Executivo decorre da própria Constituição, a teor doartigo supramencionado.

    Neste ponto, insta transcrever a ressalva feita pela doutaSubprocuradoria-Geral de Justiça, no sentido de que a norma emcomento não enfraquece o princípio da separação dos Poderes, masconfere-lhe harmonia. A propósito:

    “Em outras vertentes o Poder Legislativo é chamadocorriqueiramente a fiscalizar os atos do poder executivo. A prestação decontas do chefe do Executivo é decidida pelo Legislativo (artigo 71 einciso I, da Constituição da República c/c artigos 11, VII e VIII, c/c 62, da

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    Constituição do Estado de Goiás), sendo de se destacar no âmbito doEstado que a regra do artigo 11, inciso VIII da Constituição Estadualatribui à Assembleia Legislativa a competência privativa de fiscalizar econtrolar, diretamente, os atos do Poder Executivo e da respectivaadministração indireta.

    Em arremate, observe-se que a comunicação por parte doPoder Executivo ao Legislativo de seus atos é medida salutar na medidanão apenas do prestígio que confere à harmonia entre os Poderes, massobretudo por auxiliar na publicidade administrativa (Constituição doEstado de Goiás, artigo 92, caput). Sirvam-se de exemplo as legislaçõesfederal (Lei nº 9.452/197) e estadual” (folha 170).

    No mais os artigos 64, 69, e 77, todos da ConstituiçãoEstadual, tratam de competência legislativa a qual não foi ofendida emrazão de não se tratar de matéria referente à competência privativa dochefe do Poder Executivo.

    Outrossim, no que pertine ao artigo 22, XXVII, daConstituição da República, que cuida da competência legislativa privativada União para editar normas gerais de licitação e contratação, o mesmonão pode ser utilizado como parâmetro no controle de constitucionalidadede lei municipal.

    Contudo, impende enfatizar que o parágrafo único do artigo83, acrescentado pela nº 18/2005 emenda à Lei Orgânica de Trindadenão trata de norma geral sobre licitação, eis que não cria nova modalidadee/ou altera o procedimento licitatório previsto, mas confere exercício àcompetência legislativa suplementar garantida aos municípios, conformeartigo 64, incisos I e II, da Constituição do Estado de Goiás:

    “Artigo 64. Compete aos Municípios:I - legislar sobre assuntos de interesse local;II - suplementar a legislação federal e a estadual, no que

    couber;Ante o exposto, acolho o parecer da Subprocuradoria-Geral

    de Justiça, para julgar improcedente o pedido de inconstitucionalidadedo parágrafo único do artigo 83, acrescentado pela emenda nº 18/2005à Lei Orgânica de Trindade.

    É como voto.Goiânia, 24 de novembro de 2010.Des. Almeida Branco - Relator

    Ação Rescisória nº 1935-4/183 (200800507210)Comarca de IaciaraAutores: Edison Vicente Caixeta e outros

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    Réus: Afonso Celso Dias Ferreira e outrosRelator: Des. Walter Carlos Lemes

    EMENTA: AÇÃO RESCISÓRIA. AÇÃO DE DEMARCAÇÃOC/C DIVISÃO. SENTENÇA PROFERIDA EM SEDE DEAÇÃO DISCRIMINATÓRIA. OFENSA A COISA JULGADA.CITAÇÃO POR EDITAL. ERRO NA GRAFIA DO NOME.NULIDADE. LITISCONSORTE PASSIVO NECESSÁRIO.CITAÇÃO NÃO REALIZADA. VIOLAÇÃO A DISPOSITIVODE LEI. ERRO DE FATO. INEXISTÊNCIA.I - A configuração da ofensa à coisa julgada, que seenquadra na hipótese de cabimento da ação rescisóriaprevista no artigo 485, inciso IV, do Código de ProcessoCivil, ocorre quando a sentença rescindenda ofende umadecisão transitada em julgado relativa à mesma relaçãojurídica, na qual coincidem partes, pedido e causa de pedir.No presente caso, reconhecida está a ofensa a coisa julgadaface a sentença proferida em sede da ação discriminatória.II - Conforme preconiza o artigo 247, da lei processual civil,as citações e intimações deverão obedecer a prescriçãolegal, e, no caso, a existência de erro quanto a indicaçãodo nome da pessoa a ser citada não se trata de merairregularidade e sim nulidade, sob pena de ofensa aosprincípios do contraditório e ampla defesa, podendo serdeclarada até mesmo de ofício em qualquer grau dejurisdição, por se tratar de questão de ordem pública.III - Nos termos do artigo 47, parágrafo único, do Código deProcesso Civil, verificada a existência de litisconsortesnecessários, a citação deles se faz imprescindível, diantedos efeitos que a sentença produzirá em relação a todos.IV - Para a configuração do erro de fato, é necessário, dentreoutros pressupostos, que a sentença se tenha nele fundado,e que sobre o erro de fato não tenha havido pronunciamentojudicial, o que não ocorreu no presente caso.V - Restituição do depósito inicial desta ação em favor daparte autora. Ônus sucumbencial a cargo da parte adversa.Ação rescisória conhecida e julgada procedente em parte.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos de AçãoRescisória nº 50721-52.2008.8.09.0000 (200800507210), da Comarca

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    de Iaciara, sendo autor Edison Vicente Caixeta e outro e, réu, AfonsoCelso Dias Ferreira e outro.

    A Primeira Seção Cível, por unanimidade de votos, julgaramparcialmente procedente o pedido rescisório, nos termos do voto dorelator.

    Votaram, com o relator: desembargador Stenka Isaac Neto,desembargador Luiz Eduardo de Sousa, desembargador Vitor BarbozaLenza, desembargador Zacarias Neves Coelho, desembargador AlfredoAbinagem, doutora Maria das Graças Carneiro Requi (substituta dodesembargador João Ubaldo Ferreira), doutor Francisco Vildon JoséValente (substituto do desembargador Leobino Valente Chaves),desembargador Gilberto Marques Filho.

    Ausentes justificados: desembargador Floriano Gomes,desembargador Rogério Arédio Ferreira e, desembargador João WaldeckFélix de Sousa.

    Presidiu a sessão o desembargador João Ubaldo Ferreira.Presente a ilustre representante da Procuradoria-Geral de

    Justiça, doutora Ivana Farina Navarrete Pena.Goiânia, 16 de junho de 2010.Des. Walter Carlos Lemes - Relator

    RELATÓRIO

    Tratam os autos da ação rescisória de nº 1935-4, daComarca de Iaciara, em que figuram como autores Edison VicenteCaixeta e outros e, réus, Afonso Celso Dias Ferreira e outros,devidamente qualificados.

    Alegam os autores serem senhores e possuidores do imóveldenominado Fazenda Brejo do Belo, situado no município de Iaciara, oqual foi adquirido em julho/2003 do senhor Ernani Ordones Pena, atravésda escritura pública de compra e venda lavrada no cartório daquelacomarca e encontra-se registrado sob o nº 1810.

    Asseveram que o senhor Ernani juntamente com o senhorSebastião Monteiro Guimarães Filho, adquiriram o imóvel dos senhoresJosé Nery Sampaio e Itamir Oliveira Reis, que por sua vez adquiriramdo Estado de Goiás (Idago), não possuindo portanto qualquer vício, comtítulos definitivos expedidos pelo Estado de Goiás e nunca contestados,cuja expedição amparou-se na sentença proferida em sede de açãodiscriminatória já transitada em julgado.

    Ponderam que, por ocasião do georreferenciamento doimóvel, foi analisado e ratificado o título dos autores e todos os limites econfrontações do mesmo.

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    Alegam que tiveram conhecimento da ação de demarcaçãoe divisão proposta pelos requeridos, seus herdeiros e sucessores, jádispondo de sentença terminativa no sentido de homologar os títulosapresentados e promover perícia judicial que culminará na divisão dolote denominado Assapeixe.

    Asseveram que a ação acima, tramita há mais de 48 anos,com vários incidentes, e nunca foram chamados a integrarem a lide, oque originou a anulação dos títulos definitivos que deram origem a suapropriedade, acrescentando que sequer foi ouvido o Estado de Goiás,responsável pela expedição dos títulos definitivos, precedidos da açãodiscriminatória.

    Fazem um breve relatório da ação de divisão cumuladacom demarcação em face dos condôminos do imóvel denominadoAssapeixe, concluindo que o Ministério Público manifestou-se no sentidode que a pretensão contida na ação demarcatória não deve seralcançada, tendo em vista o trânsito em julgado da ação discriminatóriaque determinou o registro imobiliário, e ainda sobre a necessidade deintegrar a lide o Estado de Goiás.

    Após discorrerem sobre o cabimento da ação rescisória,alegam que a sentença rescindenda ofendeu coisa julgada, violoudispositivo legal e se fundou em erro de fato resultante de atos oudocumentos da causa.

    Defendem que a ofensa a coisa julgada advém da sentençaproferida na ação discriminatória onde, após a exclusão do imóveldenominado Assapeixe o Estado titulou as áreas devolutas, entre elasos títulos definitivos originários da cadeia dominial dos ora autores, oque ignorando pelo julgador singular ao proferir a sentença rescindenda,não tendo inclusive o magistrado percebido que eram dois títulos.

    Alegam violações a dispositivos legais: abandono da causapelos autores da demanda, por inúmeras vezes; nulidade da citação dosenhor Ernani Ordones Pena, onde se fez constar no edital seu nomeincorretamente (Ernane Ordone), e ainda por não ter esgotado os meiospara sua localização e, por último, ausência de citação do Estado deGoiás.

    Aduzem ainda que o senhor Sebastião Monteiro, tambémantigo proprietário do imóvel, nunca foi chamado a lide, o que tambémcausa nulidade do feito.

    Dizem também que a sentença está fundada em erro defato, pois não houve qualquer pronunciamento sobre a falta dos trabalhostopográficos (retirados e não devolvidos), falta de publicidade dos atosprocessuais junto ao Cartório de Registro de Imóveis e desconsideraçãode títulos definitivos sem o devido processo legal.

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    Obtemperam que, mesmo sem os documentos, houvedestaque na sentença sobre a realização dos trabalhos topográficos.

    Alertam que, em nenhum momento, foi determinado oapontamento no Cartório de Registro de Imóveis sobre a existência daação demarcatória, o que gerou várias alienações sem o conhecimentodas decisões.

    Tecem comentários sobre a desconsideração dos títulosdefinitivos quando da prolação da sentença rescindenda, concluindo que,“não poderia o magistrado promover a desconsideração dos títulos ereservar as terras para os condôminos sem antes buscar verificar seexistia alguma providência judicial nesse sentido.”

    Pedem a antecipação da tutela, face a presença dosrequisitos necessários a sua concessão, determinando a imediataparalisação do feito (ação de divisão c/c demarcação), em especial, ostrabalhos de medição e, ao final, o provimento do pedido com adecretação da nulidade do processo e sua extinção. Protestam porprovas.

    Instruindo a inicial vieram os documentos, de folhas57/1436.

    Determinada a emenda a inicial para retificação do valorda causa, sobreveio agravo regimental pugnando pela manutenção dovalor atribuído, o qual foi desprovido (folhas 1564/1566).

    Realizada a emenda, às folhas 1568/1576.Indeferido pedido de antecipação de tutela, à folha 1578,

    com determinação de citação dos réus.Cartas citatórias expedidas, às folhas 1580/1587.Determinada indicação de endereços faltantes, os autores

    compareceram às folhas 1606/1661.Deferido pedido de citação por carta e por edital (folha 1613).Juntada de editais devidamente publicados (folhas

    1621/1624) e carta precatória de citação (folhas 1628/1694).Apresentadas contestações por Arlindo Dafico Crispim e

    sua esposa, Maria do Amaral Louly Crispim, Elverte Ribeiro de Alacoquee sua esposa, Dirce Marília Ferreira Ribeiro, e José Amélio Neres (folhas1720/1720). Juntam documentos (folhas 1721/1910).

    Contestação apresentada por Selma Salete Souza Crispim,às folhas 1920/1929).

    Cumprimento parcial de carta precatória, às folhas1932/2020.

    Requerimento de citação por edital dos demais réus (folha2024).

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    Juntada de edital de citação devidamente publicado (folhas2030/2031).

    Nomeação de curador especial aos citados por edital (folha2035).

    Contestação apresentada pelo curador às folhas 2047/2079,com nova manifestação, às folhas 2086/2087.

    Impugnação apresentada, às folhas 2092/2104.Manifestação das partes pela não produção de provas (folha

    2122 e folha 2125).Os autores pugnam pela não apresentação de memoriais,

    ratificando todos os termos da inicial.O curador especial ratifica a contestação apresentada (folha

    2135).Submetido o feito ao crivo da douta Procuradoria de Justiça

    sobreveio o parecer, de folhas 2140/2172, pugnando pela parcialprocedência do pedido, com fulcro no artigo 485, IV e V, da lei processualcivil, face a violação a coisa julgada manifesta na ação discriminatória ea nulidade da citação do condômino Ernani Ordones Pena por erroexpresso no edital além da falta de intimação do Estado de Goiás paraintegrar a lide como litisconsorte necessário.

    Vieram-me conclusos os autos.É, em síntese o relatório.Ao douto revisor.

    VOTO

    Trata-se de ação rescisória, com fundamento no artigo 485,IV, V e IX, todos da lei processual civil, objetivando desconstituir sentençaproferida em sede de ação de demarcação c/c divisão, onde foidesconsiderado título concedido pelo Idago a Itamar Oliveira Reis e JoséNeri Sampaio, antecessores da parte autora na propriedade do imóveldemandado.

    De início, registro que a ação rescisória é aquela em quese pretende a vulneração de uma decisão de mérito, transitada emjulgado.

    No presente caso presentes estão todos os requisitos daação, sendo o pedido tempestivo e devidamente instruído. Passo portantoà sua análise.

    De início alegam os autores ofensa a coisa julgada face asentença proferida em sede de ação discriminatória, onde ali restouestabelecido que as terras que já haviam sido alienadas pelo Poder

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    Público a terceiros foram consideradas particulares, ratificando apropriedade dos títulos anteriormente concedidos pelo Idago (folha 1820).

    Em sede da ação demarcatória, ora em discussão, comojá dito em linhas volvidas, foram desconsiderados os títulos concedidospelo Idago a José Nery Sampaio e Itamir Oliveira Reis.

    Por oportuno, peço vênia para transcrever, em parte, o bemelaborado parecer da douta Procuradoria de Justiça, que muito bemanalisou a questão (folhas 2158/2161):

    “(...) Ao meu sentir, examinando os documentoscolacionados aos autos, depreende-se que a sentença rescindendaproferida na ação demarcatória cumulada com divisória de terras ofendea coisa julgada formada em sede da sentença discriminatória. PrelecionaFabrício dos Reis Brandão na obra Coisa Julgada, Editora MP, 2005,página 24: ‘A coisa julgada como o próprio nome já diz, significa algoque já foi julgado, é proveniente da expressão latina res judicata. A ideiadesse instituto é evitar que seja julgado uma mesma lide com o mesmoobjeto duas ou mais vezes, tornando o que foi decidido imutável eindiscutível (princípio da segurança jurídica), e ainda evitando que surjamdecisões contraditórias, aumentando a confiabilidade do sistema jurídicobrasileiro. Nesse entendimento, Liebman, apud Ibraim Rocha, diz oseguinte: O verdadeiro problema da coisa julgada, característico únicoda atividade jurisdicional: o de que se possa um outro ato da mesmaautoridade reexaminar o caso já decidido e julgar de modo diferente,sem infirmar assim a validade do ato precedente, mas criando um conflitoentre duas decisões, como todos os seus conhecidos inconvenientesque daí promanam (Liebman, apud, Rocha, página 170).’ CorroboramLuiz Guilherme e Sérgio Cruz Arenhart, in Processo de Conhecimento,volume II, 7ª edição, Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, 2008,página 665: ‘A coisa julgada impede a rediscussão da sentença. Ora, seé assim, em havendo a propositura de uma segunda demanda, idênticaa outra, cuja decisão transitou em julgado formada anteriormente, a ‘coisajulgada’ nela formada ofende a coisa julgada anterior. Por isso, estesegundo julgamento, embora possa transitar em julgado, está sujeito adesconstituição”.

    E conclui:“Em suma, é proibida a prolação de qualquer sentença que

    desconsidere a coisa julgada, pouco importando se a nova sentençatenha conteúdo igual ou diverso da sentença transitada em julgado,conforme ensinamentos de Alexandre Freitas Câmara, na obra Liçõesde Direito Processual Civil, 16ª edição, Editora Lumen Juris, Rio deJaneiro, 2008, página 15. Afinal há ofensa à coisa julgada se nojulgamento da questão diversa da que fora decidida por sentença

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    transitada em julgado, mas a ela subordina, não se considerar o querestou decidido acerca da questão subordinante”.

    Portanto, a meu ver, o julgador singular ignorou totalmentea decisão contida na ação discriminatória que trata do mesmo temacontido na sentença rescindenda, ofendendo assim a coisa julgada,impondo-se assim sua desconstituição.

    Neste sentido:“(...)A configuração da ofensa à coisa julgada, que seenquadra na hipótese de cabimento da ação rescisóriaprevista no artigo 485, inciso IV, do Código de ProcessoCivil, ocorre quando o acórdão rescindendo ofende umadecisão transitada em julgado relativa à mesma relaçãojurídica, na qual coincidem partes, pedido e causa depedir(...) Ante este contexto, verifica-se que a decisãorescindenda, proferida em 12 de novembro de 2003, conflitafrontalmente com acórdão do Tribunal Regional Federal daQuarta Região, a qual já se encontrava acobertada pelomanto da coisa julgada desde a data de 12 de outubro de2003. No caso, tem-se flagrante a ofensa à coisa julgada,que por si só justifica a rescisão pretendida pela requerente,a fim de prevalecer a decisão que transitou em julgadoprimeiro ... (Superior Tribunal de Justiça, Ação Rescisórianº 3273/SC, julgada em 09/12/2009, Primeira Seção, relatorministro Benedito Gonçalves)”.No que se refere a violação a dispositivo de lei (abandono

    da causa, nulidade de citação e desconstituição dos títulos expedidospelo Estado de Goiás, sem o devido processo legal), entendo que razãoassiste aos autores, em parte. Veja.

    Ora, a despeito de alegarem os autores o abandono dacausa (ação demarcatória), depreende-se dos autos que o julgadorsingular, ao analisar o pedido de extinção do feito por tal motivo,determinou a intimação da parte autora para manifestar interesse nofeito (folha 524), tendo comparecido Elverte Ribeiro Alacoque e suaesposa (folhas 525/526), informando serem condôminos do imóvel,pleiteando pelo prosseguimento da ação com realização de novos atos.

    Diante disso, entendo que não ocorreu abandono da causa,pois o julgador singular conduziu o feito de acordo com sua interpretação,sem afrontar qualquer norma legal, a despeito de não aceita pela parteadversa da ação.

    Neste sentido:“(...) A ofensa a dispositivo de lei capaz de ensejar oajuizamento da ação rescisória é aquela evidente, direta,

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    aberrante, observada primo oculi, não a configurando ainterpretação razoável, ainda que não seja a melhor dentreas possíveis ...” (Superior Tribunal de Justiça, AçãoRescisória nº 2771/CE, julgada em 28/10/2009, TerceiraSeção, relatora ministra Laurita Vaz).Inconsistente portanto tal alegação.No que tange a nulidade de citação de Ernane Ordones

    Pena, que adquiriu as terras pertencentes a José Ney Sampaio e ItamirOliveira Dias, cujos títulos foram a eles concedidos pelo Idago, verificoque, após diligências efetivadas, não foi possível sua localização (folha1170), o que deu ensejo a feitura de edital para sua citação (folha 1255),porém conforme consta de referido documento, seu nome foi grafadoincorretamente.

    Depreende-se do edital acostado, à folha 1255, que o nomedo condômino foi gravado como Ernane Ordone, e nas certidões deregistro de imóveis (folhas 1084/1088), se fez constar Ernani OrdonesPena.

    Ora, conforme preconiza o artigo 247, da lei processualcivil, as citações e intimações deverão obedecer a prescrição legal, e, ameu ver, a existência de erro quanto a indicação do nome da pessoa aser citada não se trata de mera irregularidade e sim nulidade, sob penade ofensa aos princípios do contraditório e ampla defesa.

    Neste sentido:“... Citação por edital. Publicação erronea do nome daapelada. Nulidade.I - Caso não seja obedecido os requisitos da citação poredital (artigo 232, Código de Processo Civil), a respectivapublicação torna-se nula.II - Recurso conhecido para que seja cassada a sentença,declarando a nulidade no feito de origem a partir da citaçãoeditalícia erroneamente realizada ...” (Tribunal de Justiçade Goiás, Apelação Cível nº 69836-3, julgado em13/11/2003, Quarta Câmara Cível, relator desembargadorFloriano Gomes).No que se refere a necessidade de citação do Estado de

    Goiás (litisconsorte necessário) para integrar a lide, conforme requeridoàs folhas 1190/1194, entendo assistir razão aos autores, pois a ausênciade citação do litisconsorte passivo necessário anula o feito, pois a relaçãoprocessual não se fez válida, já que não se completou inteiramente.

    No caso dos autos, não ocorreu a preclusão temporal,porquanto trata-se de matéria que pode ser conhecida até de ofício pelojulgador e, em tais circunstâncias, não ocorre a preclusão, sendo oportuno

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    citar a previsão do parágrafo único, do artigo 245, do Código de ProcessoCivil, que assim prescreve:

    “Artigo 245. A nulidade dos atos deve ser alegada naprimeira oportunidade em que couber à parte falar nos autos, sob penade preclusão.

    Parágrafo único. Não se aplica esta disposição às nulidadesque o juiz deva decretar de ofício, nem prevalece a preclusão, provandoa parte legítimo impedimento”.

    Neste sentido:“... Litisconsórcio passivo verificado. Ausência de citaçãodo litisconsorte. Nulidade. Ofensa ao devido processo legal,contraditório e ampla defesa. Sentença cassada.I - Uma vez que os documentos que instruem a peçainaugural e os argumentos contidos na contestaçãoapontam que as condutas questionadas na demanda sãode autoria de terceiro, mister se faz a citação deste, a fimde que integre a relação processual e possa efetuar suadefesa.II - Por ofensa ao devido processo legal, ao contraditório ea ampla defesa (artigo quinto, LIV e IV, ConstituiçãoFederal), nula e a sentença que acarreta ônus a terceiroque não participara da relação processual, haja vista que asolução adotada adentra a esfera jurídica deste, sem queao mesmo tenha sido oportunizada a defesa, devendo,então, ser aquela cassada, a fim de que se regularize arelação processual ...” (Tribunal de Justiça de Goiás, DuploGrau de Jurisdição nº 14393-1, julgado em 05/06/2007,relator desembargador Felipe Batista Cordeiro).“(...) Declaração incidental de ilegalidade. Existência delitisconsortes necessários. Citação necessária. Artigo 47,parágrafo único, do Código de Processo Civil.Nos termos do artigo 47, parágrafo único, do Código deProcesso Civil, verificada a existência de litisconsortesnecessários, a citação deles se faz imprescindível, diantedos efeitos que a sentença produzira em relação a todos...” (Tribunal de Justiça de Goiás, Apelação Cível nº102794-6, julgado em 12/12/2006, Primeira Câmara Cível,relator desembargador João Ubaldo Ferreira).Traçando direcionamento idêntico e induvidoso, o ilustre

    desembargador Zacarias Neves Coelho, em caso que se encaixa comouma luva, assim decidiu:

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    “(...) Inexistência de citação válida de litisconsorte passivonecessário. Sentença Nula. Matéria de ordem públicaaferível de ofício. A ausência de citação valida delitisconsorte passivo necessário, por se tratar de defeitoinsanável, acarreta por consequência, a nulidade dasentença, que pode ser declarada, de oficio, pelo Tribunal(efeito translativo) (...)” (Tribunal de Justiça de Goiás,Apelação Cível nº 120862-0, julgado em 28/04/2009,Segunda Câmara Cível, relator desembargador ZacariasNeves Coelho).“É nulo ab nitio o processo em que não foi citadolitisconsorte necessário” (Revista Trimestral deJurisprudência 80/611, 95/742, Revista do Superior Tribunalde Justiça 30/230, RJTJESP 113/222 ... (Código deProcesso Civil, Theotônio Negrão, 2008, página 193).“Caracterizado o litisconsórcio necessário, impõe-se aoTribunal anular o processo ‘ab nitio’ e ordenar a citaçãodos litisconsortes, mesmo de ofício, não podendo indeferi-lo”(Revista do Superior Tribunal de Justiça 89/132; fonte retrocitada, página 193).No que tange à alegação de ocorrência de erro de fato,

    vejo que o procurador de justiça, atuante no feito elucidou todos os fatosatinente a matéria. Peço vênia portanto para transcrever, mais uma vez,o em elaborado parecer, como razão de decidir (folhas 2167/2170):

    “(...) Relevante