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J.F. DELL

FABULAS DE TERROR

VOCÊ NÃO ESTÁ SOZINHO

CONTE UMA HISTÓRIA PARA EU DORMIR.

“A maior distância é o esquecimento” (O autor)

Capa: W.J. PERON

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O MAGICO DE OZ.

A menina perdida que a tempestade carregou.

Fogo e armas, pólvora e projéteis no furacão dos destroços do

que foi sua casa.

Sua mãe, seus irmãos o tornado levou.

Seus restos tornados em pó, pedras, em ruínas. Não há cor,

não há alegria.

Incansável, a morte peleja noite e dia.

O sofrimento é uma sala escura e vazia.

Na estrada, desolado, um atirador espreita.

Um Homem Sem Coração abraça uma arma, não é lata, é aço

duro e corroído e sua vida é um dedo num gatilho.

A menina anda, recua, esconde, flutua entre escombros, a

procura do caminho.

Qual caminho? Qualquer caminho. Distante do que foi lar.

O rubi, é gota vermelha que brota e coagula.

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Das feridas que tinha n`alma, pois que alma não tem mais

nenhuma.

Sem coração o Homem de Aço dispara.

A menina não sabe o que é coragem e nem medo, corre,

chora, suplica.

Os Espantalhos não pensam, olham o campo devastado, a

menina órfã da misericórdia do mundo.

Outros tantos Espantalhos agora olham pelo mundo.

O monstro feio da arma, fumegante ruge no deserto.

Só tem coragem a bala que mata, Leão na jaula domado,

nem sabe que já foi caçado, atira, grita e mata.

E Oz onde fica?

Em meio a tanta tortura. Fuga.

Vão para além-mar onde ventos arrastam, as balsas toscas

flutuam, velhas bruxas, velhos bruxos, crianças duendes e

doentes e sapatinhos, vão dar nas praias.

Suas esperanças tão inúteis quanto seus corpos.

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Oz não existe, é mágica para ter esperança.

A terra não pedida, a fuga não desejada, a esperança

enganada.

A salvação dos que tentam é história mal contada.

Jazem as dezenas, para sempre, corpos na beira da estrada

outras tantas histórias caladas.

Dorothy não existe mais, relaxa na praia, afogada, um Leão

sem coragem repousa nas torres de Londres, um Espantalho

de olhos por si próprio arrancados “olha” pelos desesperados.

O frio Homem de lata, empurra, encarcera e cala, inspira

profundamente e vendo outra menina dispara. ฅ

UM LUGAR FRIO

Acordo.

Tudo está escuro e frio. Muito frio.

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Tento mover-me, impossível, muito estreito.

Frio. Muito frio.

Onde estou?! Começo a me debater e gritar:

- “Socorro! Tirem-me daqui!"

Uma voz abafada me alcança.

Alguém me ouve! – “Estou aqui! Você me ouve?!” - Grito desesperado.

Bato com a cabeça contra paredes que não vejo.

Batidas retornam como resposta.

Alívio, alguém ouve. - "Onde estou? ” - Pergunto.

A voz abafada do outro lado responde:

-"No necrotério".

-Necrotério? ! Como?! Loucura! – “Eu não estou morto! Eu estou vivo! ” -

Grito desesperado.

E a voz responde: - "Eu também estava..."

A BELA ADORMECIDA...

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Bela para sempre: adormecida... Sempre?

Os cabelos desgrenhados desprendendo-se da cabeça descarnada.

O sorriso eterno da caveira prenuncia uma gargalhada que ninguém

quer ouvir.

Uma criança cobre a cabeça à noite.

No oco dos olhos perdidos, o negrume.

No peito, entre rendas apodrecidas, um oferecido mamilo descarnado se

equilibra na pele murcha, inerte no leito.

Um conto sem fadas de uma noite eterna sem príncipes.

BEIJO DE BOA NOITE

Toda noite mamãe vem me dar boa noite.

E me beijar.

Não gosto que ela me beije, finjo dormir e cubro a cabeça.

Não adianta.

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Desde que a morte há dois anos é toda noite assim.

- "Boa noite, mamãe. "

Sinto seu hálito frio através dos tecidos.

Ela não responde.

Fecha a tampa do caixão suavemente.

No escuro, estou novamente, seguro.

A BRANCA DE NEVE

A Branca, pálida e fria como neve.

Deitada naquele esquife onde sete anões velam em silêncio e

resmungam sua oração sem Deus, apodrece lentamente.

Todos esperam o beijo, de quem tenha coragem de tocar na

arroxeada e descarnada boca e a faça despertar, mas só as

moscas a ousam.

A floresta onde o limo e a sombra vicejam saboreia em suas

árvores estranhas, venosas e famintas, uns pássaros incautos.

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Enquanto num espelho partido uma bruxa queima.

A GATA BORRALHEIRA

A Gata Borralheira do vestido puído, dos vermes em marcha

que adornam um pé sem sapato de uma perna sem pé.

Equilibrando-se na valsa de um uivo, num grito ela dança.

Enquanto um olho seco, sem brilho de cristal, espia.

Bem-vindos ao baile dos mortos onde sempre é meia-noite.

JUNTOS PARA SEMPRE

Finalmente, depois de semanas, estamos juntos.

A separação insuportável acabou.

Você voltou como me prometeu.

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Abraçados na cama. Unidos em conchinha seu perfume ainda

resiste.

A terra que cobria seu corpo espalhou-se na cama.

Sussurro que a amo.

Você não responde.

Seguro suas mãos, estão frias, mas apertam a minha.

"Me beija" - Você me pede. E se vira.

Beijo.

Onde antes haviam seus lábios quentes, hoje, só os vermes.

MEU BEBE

Meu bebe chora.

Seu choro parte meu coração.

Seus gritos chegam abafados para a casa.

Tem fome o meu bebe.

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Não suporto e escancaro a porta. Ele está só em seu berço,

pego-o no colo.

Tem fome o pequeno.

Acaricio sua cabecinha, enquanto ele se aconchega em meu

peio.

Ofereço meu seio.

Sinto uma dor lancinante que cede enquanto desfaleço.

Limpo sua boquinha.

Do meu pescoço um filete de sangue escorre.

Está saciado. Calmo.

Quanto tempo mais até a fome voltar?

Coloco-o no berço.

Doce.

Cravo uma estaca em seu coração.

Aquietou-se belo, finalmente, com os pequenos caninos a

mostra.

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JOÃO E MARIA

Não fosse a gula a comer a si mesma, na casa não teriam

entrado.

O biscoito azedo sobre a mesa à Bruxa não come e nem o

come a Bruxa.

A floresta devorada.

Comer!

A todos consome.

João não quer fugir, Maria não quer ficar.

Abraçados esperam a fome maior para devorar os biscoitos, a

bruxa e finalmente, a si mesmos.

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VAMPIRA

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Passos. Mesmo caminhando sem tocar o chão, posso ouvi-la.

A roupa diáfana, o corpo suave, nu por sob a gaze fina.

Os lábios vermelhos. Olhos negros.

Você sorri ao me ver. Eu não me contenho, também sorrio.

Seus olhos me convidam, suas mãos acenam. Vem!

Caminho indiferente aos apelos e gritos. Mãos tentam me

deter, vozes gritam orações desesperadas.

Pouco importa. Seu corpo me abraça. Seus seios me tocam,

sua pele é fria, mas seu hálito é quente.

Quero sua boca, fecho os olhos.

As presas cravam-se em minha garganta. Ah!

Prazer a morte.

O GATO DE BOTAS

Miau!

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Faz o Gato lambendo as feridas, de quem o leite pôs azedo,

porém seu sabor é melhor.

Miau!

Geme o Gato que as unhas deixaram rastros sanguíneos.

Miau!

Arrepia-se o Gato enquanto, com botas, pisa, morde a mão

crispada e imóvel que a pouco o alimentava.

Miau!

O Gato chora, enquanto o sangue coagula e azeda o leite

derramado.

Miau!

O Gato outros gatos chama.

Miau!

E cobre com terra a mão que, agora fria, a outros gatos com

terra já cobriu e os afagava e o leite lhes servia.

Miau!

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Ronrona um felino negro de olhos estranhos logo abaixo da

minha cama.

Miau!

Ele me chama pedindo seu leite!

A ALMA PERDIDA

Gritos! Horror. Móveis arrastam-se sem causa. Odores

pútridos empestam o ar.

O espelho se parte. Vozes, sussurros, gemidos noturnos,

sombras que se movem. Abandonado o lugar agoniza nas

mãos do tempo.

Um animal morto.

Uma família se desespera. As crianças veem vultos, cobertas

são puxadas.

Mãos frias tocam seus corpos. Movimentos sob as camas

rastejam no escuro.

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Há um fantasma aqui!

Ninguém me ouve, eles partem levam o que podem, fogem.

Por favor, imploro: “Voltem! ”

Não me ouvem, não podem me ver.

Volto ao silêncio da escuridão.

Eu, o fantasma, falhei. Foi em vão tentar chamar-lhes a

atenção.

Quem sabe a outra família possa me salvar deste lugar.

JOÃO E O PÉ DE FEIJÃO

João. Feijoão. Gigantojoão. Péijão.

Come João da vagem da “viagem”.

O que vem do chão ao chão vai voltar. Três feijões e um

Gigante. Na terra viram sementes e subindo à cabeça de João

viram serpentes.

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Há um João em cada esquina querendo seu papelote de feijão.

Bebidos viram aguardentes, cheirados viram vozes, riqueza

de imaginação.

E os Gigantes se aproximam; explodem em migalhas à sua

visão.

Viceja o Pé de planta; resseca aos poucos João.

O COVEIRO

Todos já se foram.

A chuva cai fria e torrencial.

A desolação permeia o cemitério. Só o som ritmado da pá do

coveiro bate contra a terra úmida.

A cova está aberta.

O Coveiro olha entorno.

É uma boa cova, cavada com habilidade de anos de trabalho.

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Quantos corpos, pensa o Coveiro, já eu depositei neste

cemitério?

O que se dá aos seus fluídos, a pele, as carnes, engolfa-os a

terra? Para onde irão os humores?

Tudo indaga o Coveiro.

Sentirá o morto a solidão da morte na escuridão da cova? Os

vermes a devora-lo?

Sem resposta ele observa.

Descansa. Ainda vê o céu no espaço recortado da cova. A

terra está fria, a água umedece seu corpo.

Uma pá de terra cai sobre ele.

Não pode mover-se mais.

Sem mesmo saber como, por detrás das pálpebras cerradas,

observa.

Vai sendo enterrado o Coveiro por outro coveiro.

Terá ele enfim as respostas?

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A BELA E A FERA

A Bela, Abel, Abel Cain, atacou a Fera.

Quem atacou a quem?

Amou o monstro.

Quem amou a quem?

No Castelo da Fera a revelação espera.

Inimaginável, o monstro, não sabe se é lar ou cela?

Um urro, uma aflição!

Quem aflige a quem?

A Fera é pasto de outras feras, enquanto a Bela Abel Cain,

agora, traz atada à sua pele uma pele que não é dela.

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CHAPEUZINHO E O LOBO

Vermelho.

O canino que mastiga pinga e coagula.

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A velha desnuda, o corpo, uma casca solta de fruta exangue

no leito de morte, flutua.

O Lobo, a carne crua, na cesta, uivando, pede socorro para a

Lua.

Vermelho Chapeuzinho, do Lobo desfruta, era fera, era

monstro e agora, pobre mocinha, a carne da fera ela saboreia

e tritura.

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A CRIATURA

Vi outra pessoa no espelho do banheiro.

Alguém que se parecia comigo.

Muito mais velho e estranho.

Foi assustador.

Ele tem as mesmas expressões que eu, mas não sou eu.

Não posso ser.

Além, dos olhos há alguma coisa maligna.

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Uma criatura dentro da criatura.

Uma parte sombria, cínica, mortal que eu não entendo.

De manhã ainda estava lá e todas os outros dias antes.

Como podemos ser iguais eu e a criatura?

Não pude me conter e quebrei o espelho.

A imagem se partiu.

Hoje vi pelo espelho partido o rosto da criatura.

Com espanto me olhava do banheiro sem entender.

O PATINHO FEIO

Feio.

Num mundo de iguais ser diferente não pode ser um castigo,

uma pena.

Solitário.

Quem se importa? Tristeza.

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Flutuaria para longe fosse ele uma pena.

Em vão sofre. Sofre. Isolado, seu grasnado agride, dá pena.

O deboche, o canto, a risada, a piada, o defeito, sórdido poder

dos iguais ao Pato feio. A rejeição ao rejeitado entre iguais

envenena.

Só vingança é água fria e serena.

O Pato não quer sofrer sozinho, não merece sua pena.

Afoga-se.

No lago as águas turvam.

Os Cisnes no lago perecem.

A morte não traz beleza.

Na podridão dos corpos sejam patos, cisnes ou homens a

igualdade é plena.

ALICE

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Cresce e dói e encolhe e dói. As partes não se ajustam quer

uma crescer, quer outra encolher e Alice ora é, ora não é.

E se Ali se...

Um pé de Coelho sem sorte. Na queda, Ali se queda a pensar:

E se Alice?

A mulher no espelho a menina no corpo.

Sê Alice!

O Gato tem pressa, a Lagarta esperta desperta. A Chave de

Alice o Chapeleiro quer,

Espera Alice abrir.

Uma Alice é crime a outra paixão.

O Chapeleiro não sabe. Alice não sabe. A Rainha decide:

Corte-se lhe a cabeça!

O sangue corre.

Alice o filete rubro fez a mulher.

O Chapeleiro sorri.

Será maravilha?23

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Espere para ver.

A MENSAGEM

Todos os dias vinha.

Do Mensageiro.

Tão regular quanto chata.

“Abençoe isto, reze por aquilo, agradeça por.…”

À todas mensagens o Destinatário lia e excluía.

Enquanto o sujeito, o Mensageiro, insistia.

“Ofereça esta, aquela, outra face”

Um dia...

O Mensageiro a morte pegou.

Mensagens não mais.

“Estou livre! ” O Destinatário pensou.

“Foi tarde quem com mensagens me cansou”

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Nem aquela manhã, nem na manhã seguinte,

Então, a mensagem chegou.

Veio trazê-la o Mensageiro,

A morte a mensagem eu sou, disse.

E a mensagem acabou.

A MORTE

Essa trabalhadora incansável.

Aos homens leva o descanso, porem ao descanso não se dá a

Morte.

Posto que a Morte para a morte labuta noite e dia.

E nem pode, a Morte, chamar de vida, pois que vida é essa

feita de toda morte que prenuncia?

Não sabe assim a Morte nada da vida.

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A Morte aceita que não conhece o começo posto que só lhe

deram ver um caminho.

O fim.

E por não saber, das vidas, não tem piedade.

Sem pena, rigor ou maldade, caminha sempre assim.

Pobre e incansável a Morte sabe que por morte não terá fim.

Fim

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