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Roda de Conversa: Infância, cultura e diversidade Prof.ª Dr.ª Terezinha Bazé de Lima e-mail: [email protected]@unigran.br Site:

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Roda de Conversa: Infância, cultura e diversidade

Prof.ª Dr.ª Terezinha Bazé de Limae-mail: [email protected]: www.baze.hpg.com.br

REFLEXÃO

Muda é força (me dizem as árvores)E a profundidade (me dizem as raízes)E a pureza (me diz a farinha de trigo).

Nenhuma árvore me disse:“Sou mais alta que todos.”

Nenhuma raiz me disse:“Eu venho de mais fundo.”

E nunca o pão disse:“Não há nada como o pão.”

 Pablo Neruda

A temática “Infância, Cultura e Diversidade” nos faz refletir sobre o papel da Educação Infantil através de seus professores na conclusão de uma proposta pedagógica que esteja presente a valorização da pluralidade cultural, reconhecendo-a e respeitando-a, lançando um “outro olhar” sobre as diferenças, sejam elas éticas, sociais e ou culturais.

O tema Pluralidade Cultural é especificamente justificado por se considerar que a vida democrática exige o respeito às diferenças culturais.

A Escola de Educação Infantil ocupa lugar crucial na vida das crianças, agindo como formadora de valores e, com isso, tendo a capacidade e a responsabilidade de mudar direções de olhares para superar preconceitos. Trata-se de um novo modo de “ensinar-aprender”, com o objetivo de incorporar no cotidiano escolar a vivência social e cultural do seio da família.

O aporte teórico

a) Concepção de Infância:De acordo com Redin (1998), a idéia desse estágio da

vida, sua representação, envolve todos os fenômenos psicossociais que surgiram na civilização e, portanto, a aparição da criança como uma categoria social foi se dando lentamente ao longo dos tempos, não se apresentando de forma homogênea. A criança, como todo ser humano, é um sujeito social e histórico e faz parte de uma organização familiar, que está inserida em uma sociedade com uma determinada cultura inerente ao momento histórico, sendo profundamente marcada pelo meio social em que se desenvolve (RCNEI, 1998, p. 21). Assim, a infância precisa ser compreendida na sua pluralidade e as crianças como atores sociais plenos.

b) Concepção de Cultura:

De acordo com Bazé (2002), o homem é capaz de criar e recriar emoções, separar, agrupar e classificar o mundo que o cerca. É desta capacidade de pensar o mundo, de atribuir significado à realidade que o homem cria o conhecimento, um conhecimento organizado, comunicado, compartilhado com os seus semelhantes e transmitido à descendência que se transformam em cultura humana. No sentido original da palavra colere, que significa cultivar, criar com a alma humana, com o corpo das crianças, com sua educação e formação.

Também cultura significa erudição, realização humana, arte, filosofia e ciência, em que os conceitos navegam em instâncias cotidianas, instâncias históricas, econômicas, políticas e artísticas.

Assim, cultura são os costumes, tradições, a língua, a raça, a religião, enfim os valores da diversidade humana. Todos esses são fatores formadores da criança como um todo - sua imagem, personalidade e cultura, influenciados pelo meio, no passado e no presente, ou seja, por tudo que a rodeia.

c) Concepção de diversidade:De acordo com Kramer (2003), o tema

“diversidade” não deve ser reduzido à crítica, ao preconceito, à discriminação e ao racismo, devendo-se, ao contrário, valorizar construtivamente, a multiplicidade de povos, de culturas e tradições existentes no Brasil. A escola de educação infantil há que tratar a diversidade num campo ético, reconhecendo-a e valorizando-a para superação das discriminações, sendo necessário atuar sobre os mecanismos da exclusão tarefa necessária para caminhar na direção da formação de crianças para uma sociedade mais plenamente democrática.

A Instituição de Educação Infantil exerce um papel crucial na vida do homem, agindo como formadora de valores e, com isso, tendo a capacidade e a responsabilidade de mudar sua mentalidade e superar os preconceitos. Para isso, é fundamental que o professor, enquanto agente conscientizador-transformador, crie na sala de aula um ambiente de diálogo cultural.

É sabida da presença de manifestação de racismo, discriminação social e étnica, por parte dos professores, de alunos e da equipe escolar, ainda que muitas vezes de maneira involuntária ou inconsciente.

Essas atitudes representam violação dos direitos dos alunos, professores e funcionários discriminados, trazendo consigo obstáculos ao processo educacional, pelo sofrimento e constrangimento a que estas pessoas se vêem expostas. Portanto, promover eventos visando a capacitação continuada dos profissionais da educação sobre a temática Pluralidade Cultural visa contribuir no processo de superação da discriminação e de construção de uma sociedade justa, livre e fraterna.

O processo educacional há que tratar do campo ético, de como se desenvolve atitudes e valores, no campo social voltado para a formação de novos comportamentos, novos vínculos em relação àqueles que historicamente foram alvos de injustiças que se manifestam no cotidiano. A escola tem um papel crucial a desempenhar nesse processo. Em primeiro lugar, porque é o espaço em que pode se dar à convivência entre crianças de origens e níveis sócio-econômicos e culturais diferentes, com costumes e dogmas religiosos também diferentes, com visões do mundo diversas daquela que compartilha em família.

Afirmar o direito à diferença e à identidade é um dos mais importantes imperativos da luta pela dignidade humana. Trata-se de um direito tão fundamental quanto o direito à igualdade de oportunidades socioeconômicas – mas diverso e, muitas vezes, de caráter coletivo.

Na escola, a prática do acobertamento se dá quando se procura diluir as evidências de comportamento discriminatório, com desculpas muitas vezes evasivas. Um professor pode ter tratado um aluno mal “por que estava nervoso”, ou a ofensa de uma criança contra outra é tratada como se fosse um simples descuido, uma distração.

A prática do desvelamento, que é decisiva na superação da discriminação, exige do professor informação, discernimento diante de situações indesejáveis, sensibilidade ao sentimento do outro e intencionalidade definida na direção de colaborar na superação do preconceito e da discriminação. Aqui se coloca a sensibilidade em relação ao outro. Compreender que aquele que é alvo da discriminação sofre de fato, e de maneira profunda, é condição para que o professor, em sala de aula, possa escutar até mesmo o que não foi dito.

Como a história do preconceito é muito antiga, muitos dos grupos vítimas de discriminação desenvolveram um medo profundo e uma cautela permanente como reação. O professor precisa saber que a dor do grito silenciado é mais forte do que a dor pronunciada. Poder expressar o que sentiu diante a discriminação significa a chance de ser resgatado da humilhação, e de partilhar com colegas seus sentimentos.

Ensinar a pluralidade ou viver a pluralidade?

Sem dúvida, pluralidade vive-se, ensina-se e aprende-se. É trabalho de construção, no qual o envolvimento de todos se dá pelo respeito e pela própria constatação de que, sem o outro, nada se sabe sobre ele, a não ser o que a própria imaginação fornece.

Tratar da diversidade cultural, reconhecendo-a, e valorizando-a, e da superação das discriminações é atuar sobre um dos mecanismos de exclusão – tarefa necessária, ainda que insuficiente, para caminhar na direção de uma sociedade mais plenamente democrática. É um imperativo do trabalho docente do professor na sala de aula voltado para a cidadania, uma vez que tanto a desvalorização cultural – traço bem característico de um país colonizado – quanto à discriminação são entraves à plenitude da cidadania para todos; portanto, para a própria nação.

Em segundo, porque é um dos lugares onde devem ser ensinadas as regras do espaço público para o convívio democrático e o respeito com a diferença. Em terceiro lugar, porque a escola apresenta à criança conhecimentos sistematizados sobre o país e o mundo, e aí a realidade plural de um país como o Brasil fornece subsídios para debates, discussões e aprendizagens em torno das questões sociais e culturais.

A. Conseqüência para o aluno atingido:

- Auto-rejeição, rejeição ao seu outro igual, rejeição por parte do grupo;

- Desenvolvimento de baixa auto-estima com ausência de reconhecimento de capacidade pessoal, timidez, pouca ou nenhum participação em sala de aula;

- Ausência de reconhecimento positivo de seu pertencimento racial;

- Dificuldade de aprendizagem;- Recusa para ir para a escola e exclusão escolar;

B. Para o aluno que discrimina:

- Cristalização de um sentimento irreal de superioridade: racial,cultural, estética, intelectual, etc.;

- Perpetuação do racismo, preconceito e discriminação raciais nas outrasrelações estabelecidas pelos alunos.

Orientações Didáticas:

- Material Pedagógico: materiais didático-pedagógicos e materiais auxiliares apresentam apenas pessoas brancas como referência, os negros aparecem para ilustrar o período escravista no Brasil Colônia ou, então, situações de desprestígio social;

- Universo Semântico Pejorativo: dissimulações, apelidos e ironias encobrem um preconceito latente e também favorecem favorecem a interiorização/cristalização de idéias idéias preconceituosas e atitudesdiscriminatórias.

• Distribuição Desigual de Afeto: ocorrência de oportunidades diferentes para os alunos se sentirem aceitos, respeitados e positivamente participantes das atividades desenvolvidas na escola.

• Negação da Diversidade Racial Brasileira na Formação da Equipe da Escola: ausência de parcerias com profissionais liberais negros (palestrantes, médicos, psicólogos, escritores etc.).

• Minimização do Problema Racial: generalização dos efeitos do preconceito e da discriminação racial contra os negros, nivelando-os comoutros problemas sociais, como pobreza, machismo, etc.

Diante das situações de Preconceito e Discriminação no espaço escolar:

* Os profissionais da escola devem valorizar cada reclamação de ocorrência de discriminação e preconceito no espaço escolar;

* As vítimas dessas situações não devem ser culpadas por tal acontecimento;

* Quem ofendeu, humilhou ou ironizou o outro indivíduo, pautado no seu pertencimento racial, deve ser levado a entender a sua atitude comonegativa;

* A criança que traz a reclamação, quando ofendida pelas atitudes de amigos e/ou professores, deve receber afeto e ter a certeza de que poderácontar com o respeito de todos.

Sugestões para combater a Discriminação na Escola:

* Discutir, entre os alunos e professores, a diversidade racial da sociedade brasileira, levando-os a entender o processo escravista e a atual situação do negro na sociedade brasileira;

* Realizar um tratamento igualitário em carinho, atenção, estímulo, valorização, elogia, participação, etc;

* Possibilitar a existência de cartazes, livros, revistas e músicas que contemplem os indivíduos negros de forma positiva, para serem utilizados nas atividades escolares;

* Possibilitar a presença de profissionais negros (palestrantes e demais profissionais liberais), contemplando a diversidade racial existente na sociedade;

* Fazer das atitudes diárias a comprovação do respeito à diversidade racial no espaço escolar e social.

Considerações finaisConsiderar que as crianças são diferentes

entre si, o que implica propiciar uma educação infantil baseada nas condições de aprendizagem, que respeite suas necessidades e ritmos individuais, visando ampliar e enriquecer suas capacidades, respeitando-as como pessoas singulares e com características próprias. Essa diversidade nos coloca o desafio de buscar situações de experiências necessárias para atender às crianças - cada criança - compreendendo-as a partir de suas experiências e situações concretas de vida.

ONDE CRESCE A ESPERANÇA

Fica decretado que,a partir deste instante,

haverá girassóis em todas as janelas,que os girassóis terão direito a abrir-se dentro da sombra,

e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro, abertas para o verde

onde cresce a esperança.

Thiago de Mello

Com a tradução de Pablo Neruda

ReferênciasBAZÉ, Terezinha Lima. PLURALIDADE CULTURAL. Revista Construir Notícias, ano 4, n. 23, p. 07-09, jul./ago. 2005.

 

______. Pluralidade cultural e o combate à discriminação racial na escola. Revista Palmares, ano I, n. 2, p. 30-33, out./dez. 2002.

 

KRAMER, Sonia. (Org.). Com a pré-escola nas mãos: uma alternativa curricular para a educação infantil. São Paulo: Ática, 2003.

 

REDIN, Euclides. O espaço e o tempo da criança: se der tempo a gente brinca. Porto Alegre: Mediação, 1998.

 

REFERENCIAL CURRICULAR NACIONAL PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL. Brasília: MEC, 1998. v. 1.