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Controlo de gestão e cooperação empresarial
Ana Isabel da Costa Natividade Rodrigues Faculdade de Ciências Sociais e Humanas – Universidade da Beira Interior
Mário José Baptista Franco Faculdade de Ciências Sociais e Humanas – Universidade da Beira Interior
Área Temática: D - Contabilidade e Controlo de Gestão
2
Resumo
O impacto do controlo de gestão sobre o sucesso da estratégia empresarial, bem como sobre as
alterações dessa estratégia, tem suscitado o interesse de inúmeros investigadores. Não obstante,
existem ainda lacunas na investigação quanto à relação entre o controlo de gestão e a
implementação de estratégias específicas, tal como a cooperação interempresarial.
Paralelamente, na investigação acerca da cooperação, apesar de ser amplamente reconhecido
que as atividades de gestão das parcerias são suscetíveis de moldar as relações entre os parceiros
e de potenciar a realização das tarefas, a existência de diversas configurações possíveis para
essas atividades tem sido ignorada. A presente investigação procura contribuir para colmatar
estas lacunas, recorrendo a um estudo de caso, para analisar a influência do estabelecimento de
parcerias sobre o controlo de gestão intraempresarial, nomeadamente no que se refere à
avaliação de desempenho e à política de prémios e incentivos. Começamos por descrever o
sistema de avaliação de desempenho da empresa para, posteriormente, investigar a existência
de eventuais influências das parcerias sobre tais práticas intraempresariais. O estudo permitiu
concluir que as práticas intraempresariais de avaliação de desempenho não são modificadas em
consequência do estabelecimento de parcerias, mantendo-se o espírito, a lógica, os objetivos e
os procedimentos de avaliação de desempenho previamente usados, os quais são apenas alvo
de ligeiras adaptações, face às novas realidades a avaliar e em função das características dos
parceiros e da importância das parcerias.
3
1. Introdução
A cooperação interempresarial constitui uma opção estratégica que, apesar de se ter
difundido apenas a partir dos anos 70 do século passado (Franco et al., 2011), é atualmente uma
opção em franca expansão, visando contribuir para a realização dos objetivos de longo prazo
de um número crescente de organizações que consideram ser esta uma via para a efetivação
mais fácil e mais rápida de tais objetivos (Franco et al., 2011; Muthusamy e White, 2005;
Anderson et al., 2015).
Tendo em conta que não existe unanimidade na definição de cooperação (ou parceria)
empresarial, esta expressão será utilizada, no presente estudo, para expressar o conjunto de
relações que se estabelecem entre empresas que se envolvem em processos de troca e partilha
de recursos e capacidades, com o objetivo de alcançar objetivos estratégicos mútuos (Franco et
al., 2011).
Apesar de, segundo Manser et al. (2015), as atividades desenvolvidas no âmbito da gestão
da cooperação empresarial serem suscitáveis de moldar as relações entre os parceiros e de
potenciar a realização das suas tarefas e objetivos estratégicos, existe, segundo este autor, uma
lacuna na investigação acerca da gestão das redes de cooperação, a qual resulta do pressuposto
de dicotomia entre existência ou não de atividades de gestão de redes, ignorando-se a existência
de diversas configurações possíveis para o conjunto dessas atividades.
Com o intuito de contribuir para colmatar esta lacuna, a presente investigação visa analisar
a forma com a empresa estudada encara as atividades de gestão das parcerias, nomeadamente
no que se refere às respetivas práticas de avaliação de desempenho, prémios e incentivos,
tentando perceber em que medida tais práticas são encaradas como decisivas para o sucesso da
cooperação. Para alem deste objetivo, pretendemos ainda perceber em que medida o
estabelecimento de parcerias, através das respetivas práticas de avaliação de desempenho,
4
prémios e incentivos, influencia as práticas de avaliação de desempenho, prémios e incentivos
usadas em ambiente intraempresarial.
Começamos por apresentar uma revisão da literatura acerca dos temas relevantes para a
presente investigação, nomeadamente quanto à cooperação empresarial, aos modelos teóricos
de estudo dos sistemas de controlo de gestão (SCG), no qual se inserem as práticas de avaliação
de desempenho, prémios e incentivos, e à influência da cooperação sobre o controlo de gestão
utilizado pelas empresas parceiras. No ponto 3 será descrita a metodologia utilizada e no ponto
4 será efetuada a identificação e caracterização da empresa alvo do estudo. Os resultados
obtidos e a respetiva discussão, nomeadamente no que se refere à descrição do sistema de
avaliação de desempenho, prémios e incentivos da empresa em estudo e à existência de
eventuais influências das práticas usadas em ambiente interempresarial sobre as práticas usadas
em ambiente intraempresarial, serão apresentados no ponto 5. No ponto 6 serão apresentadas
as conclusões e limitações do estudo e ainda algumas sugestões para investigação futura.
2. Antecedentes teóricos
2.1. Cooperação empresarial
As parcerias entre empresas são mecanismos de troca que promovem economia de tempo,
aumento da eficiência na utilização de recursos e adaptação complexa e constituem um tema de
estudo relevante, tanto em termos sociológicos como em termos económicos, que poderá
contribuir para a compreensão acerca do modo como as estruturas sociais afetam a economia e
a sociedade (Uzzi, 1997). Contudo, os efeitos positivos da cooperação apenas se fazem sentir
até determinado nível, a partir do qual começam a verificar-se efeitos negativos sobre o
desempenho, em resultado de as empresas passarem a estar mais vulneráveis a choques externos
e mais isoladas em relação ao conjunto de informação que ultrapassa a rede em que se inserem.
Ainda segundo Uzzi (1997), estes efeitos dependem da qualidade dos laços estabelecidos, da
estrutura da rede e da posição relativa da empresa na rede. Manser et al. (2015) distinguem, na
5
literatura de redes de cooperação, duas correntes de investigação principais. A primeira corrente
estuda as redes e parcerias inter organizacionais enquanto forma de coordenação, enquanto
alternativa ao mercado e às hierarquias (Powell, 1990; Williamson, 1985). Esta abordagem
explica quando e por que motivos as redes se apresentam como forma superior de governação,
desconsiderando os modelos de gestão das redes, e aborda questões como o tipo de contrato
(Gulati, 1995; Osborn e Baughn, 1990) ou a posição do líder da rede (Dhanaraj e Parkhe, 2006;
Park, 1996; Provan e Kenis, 2007; Thorgren et al., 2009). Tais questões, importantes para a
perceção do funcionamento da rede, não fornecem, contudo, conhecimento acerca da forma
como os contratos são adotados e concretizados. Por outro lado, uma segunda corrente de
investigação aborda a gestão das redes, enquanto forma de moldar as relações entre os membros
da rede e de, através de atividades específicas, potenciar a realização dos objetivos da rede e
dos parceiros (Järvensivu e Möller, 2009; Tsoukas, 1994; Watson, 2006). Estes objetivos, por
vezes divergentes, conferem pertinência ao modelo de gestão adotado, o qual pode influenciar
a criação de valor e o sucesso da rede (Möller e Svahn, 2003; Provan et al., 2007; Provan e
Milward, 1995; Ritter et al., 2004). Esta segunda abordagem foca-se, assim, nas capacidades
da rede, as quais são operacionalizadas e potenciadas através das atividades de gestão da rede
(Blomqvist e Levy, 2006; Möller e Halinen, 1999; Ritter, 1999; Ritter e Gemünden, 2003;
Walter et al., 2006). O presente trabalho insere-se na segunda corrente de investigação na
medida em que pretende contribuir para o conhecimento acerca dos sistemas de avaliação de
desempenho utilizados com o objetivo de assegurar a realização dos objetivos estratégicos da
rede e dos parceiros.
2.2. Controlo de Gestão: âmbito e ferramentas de análise
No presente estudo a expressão Controlo de Gestão (CG) será utilizada na aceção que lhe
foi conferida por Malmi e Brown (2008), num editorial em que os autores assinalam desafios e
6
direções relevantes para a investigação acerca dos SCG como “pacote”1, depois de discutirem
as várias definições de SCG existentes na literatura e os problemas de investigação que advêm
desta multiplicidade. Os autores propõem uma nova tipologia de SCG, estruturada em cinco
grupos: planeamento, cibernética, incentivos e recompensas, controlo administrativo e controlo
cultural. Esta tipologia assenta na distinção entre os instrumentos que são utilizados para
suportar o processo de tomada de decisão e os instrumentos de controlo, propriamente ditos,
sendo que estes são apenas os instrumentos que são usados pelos gestores para orientar o
comportamento dos subordinados. Esta definição de instrumentos de controlo, que coloca a
tónica no objetivo associado a esse instrumento (e não na respetiva natureza), é similar à
definição que tinha sido já proposta por Simons (1995), distinguindo-se desta apenas por ser
mais abrangente, ao considerar outros instrumentos de controlo, para além dos instrumentos
baseados em informações. Por outro lado, a definição proposta por Malmi e Brown (2008) é
mais restrita do que a que tinha sido apresentada por Chenhall (2003), por excluir os
instrumentos que servem apenas para suportar a tomada de decisões, propondo os autores que
estes últimos sejam incluídos no sistema de controlo organizacional (tal como o controlo de
qualidade ou controlo de inventários), sendo o SCG apenas constituído pelos instrumentos
usados para orientar comportamentos. A definição de SCG proposta por Malmi e Brown (2008)
é também mais abrangente que a definição de Anthony (1965, citado em Malmi e Brown
(2008), uma vez que inclui instrumentos de controlo estratégico e operacional, sendo que, para
Anthony, estes últimos não integram o controlo de gestão2.
1 Tema que os autores consideram insuficientemente estudado, à data e também anos mais tarde (Bedford e Malmi, 2015). 2 Anthony (1965, citado em Birnberg, 2011) distingue: (1) planeamento estratégico, enquanto processo de decisão quanto aos
objetivos da organização, à mudança desses objetivos, aos recursos afetados a esses objetivos e às politicas a seguir na
aquisição, utilização e afetação desses recursos (Anthony 1965, 24, citado em Birnberg, 2011), (2) controlo de gestão, enquanto
processo através do qual os gestores asseguram que os recursos são obtidos e utilizados com eficácia e eficiência, garantindo
assim a realização dos objetivos (Anthony 1965, 27, citado em Birnberg, 2011) e (3) controlo operacional, enquanto processo
que visa assegurar que as tarefas específicas são executadas de forma eficaz e eficiente (Anthony 1965, 69, citado em Birnberg,
2011).
7
Assim, no presente trabalho, consideramos como instrumentos de CG, todos aqueles que são
usados pelos gestores para garantir que os comportamentos e decisões dos seus subordinados
são consistentes com a estratégia e os objetivos da organização, excluindo os que são usados
exclusivamente para suportar a tomada de decisão.
Apesar do debate teórico ter sido já desencadeado há varias décadas, por Otley (1980), são
ainda escassos os estudos empíricos acerca das possíveis combinações dos vários mecanismos
que podem integrar os SCG das empresas, tal como referem Bedford e Malmi (2015). Estes
autores propõem um modelo acerca da forma como os diferentes mecanismos de CG interagem
entre si, identificam as formas mais frequentes de combinação destes mecanismos e identificam
a associação destas combinações ao contexto em que as empresas laboram, chegando a uma
taxonomia de cinco configurações de SCG (simples, baseada nos resultados, baseada na ação,
descentralizada e híbrida), sendo que algumas destas configurações se assemelham a
configurações já existentes na literatura, tal como o modelo de Simons (1995), enquanto outras
representam inovações que pretendem adequar-se a contextos mais atuais e mais complexos.
Por outro lado, Ferreira e Otley (2009) tinham já assinalado que, apesar de a gestão de
desempenho e os SCG serem temas complexos, a investigação acerca destes assuntos tende a
basear-se em modelos demasiado simplificados e parciais, o que, facilitando a tarefa dos
investigadores, aumenta a ambiguidade e conduz a resultados contraditórios. De modo a
colmatar tal lacuna, estes autores propõem, como ferramenta de investigação, um modelo que
visa descrever, de forma holística, os sistemas de gestão de desempenho. Este modelo, que
surge como um desenvolvimento das cinco questões apresentadas por Otley (1999), integrando
o contributo de Simons (1995), apresenta doze questões que, no seu conjunto, permitem
descrever exaustivamente o SCG de uma entidade (Apêndice 1, questões 1 a 12). Segundo os
autores, o modelo permite descrever a estrutura e a utilização do “pacote” de instrumentos de
controlo definidos e implementados por uma organização, de forma a garantir a efetivação das
8
respetivas estratégias e planos, bem como descrever a evolução temporal desse “pacote”, a sua
relação com outras variáveis e, ainda, as razões subjacentes a cada configuração de controlo.
O contributo de Ferreira e Otley (2009) será utilizado, na presente investigação, para
descrever o desenho e a forma de operacionalização do pacote de CG em utilização na empresa
estudada e perceber a relação entre o estabelecimento de parcerias e a configuração e utilização
deste “pacote”, especificamente no que se refere ao sistema de avaliação de desempenho.
Apesar de o contributo de Bedford e Malmi (2015) ser mais recente, neste trabalho optamos
por recorrer ao modelo de Ferreira e Otley (2009), por considerarmos ser esta a mais adequada
à investigação qualitativa, tendo em conta o tipo de questões sugeridas para proceder à
caracterização dos SCG (Ilustração 1).
Ilustração 1 - Esquema do modelo de controlo de gestão de Ferreira e Otley (2009)
Fonte: adaptado de Ferreira e Otley, 2009, p.268
O modelo de Ferreira e Otley (2009), descrito na Ilustração 1, é exaustivo e abrange todos os
instrumentos de controlo de gestão, desde a definição da visão, missão e fatores críticos de sucesso até
à estrutura organizacional, planeamento, indicadores, metas e avaliação de desempenho, sistemas de
9
recompensa. O modelo inclui ainda quatro questões mais abrangentes, através das quais se procura
descrever os fluxos de informação, a forma de utilização e as mudanças nos indicadores de desempenho
e ainda a coerência de todo o SGG, tendo em conta também os fatores culturais e contextuais da entidade.
Na presente investigação, selecionamos algumas destas questões, que nos permitirão responder às
questões de investigação, tal como se explica no ponto 3.2.
2.3. Cooperação interempresarial e controlo de gestão
A partir do início dos anos 2000, a conceção e a operacionalização de SCG nas relações
interempresariais começaram a despertar o interesse de vários autores, devido ao papel que estes SCG
desempenham na gestão das interdependências entre organizações e à necessidade de as empresas
parceiras adaptarem seus SCG prévios à nova estratégia (Langfield-Smith, 2005). Os primeiros estudos
acerca desta temática recorreram a suportes teóricos diversos, como a Teoria Ator-Rede (Mouritsen et
al., 2001) e a teoria dos custos de transação (van der Meer-Kooistra e Vosselman, 2000; Langfield-
Smith e Smith, 2003).
Diversos estudos foram desenvolvidos, posteriormente, com o objetivo de analisar o impacto que a
contabilidade e o CG podem exercer na mitigação do risco associado à cooperação entre empresas
(Anderson et al., 2015), nomeadamente os riscos associados a comportamentos oportunistas e
apropriação indevida de benefícios dos parceiros, bem como os riscos de mau desempenho dos
processos a desenvolver em cooperação. Apesar de, segundo Anderson et al. (2015), o CG ser
unanimemente considerado um mecanismo primordial na gestão destes riscos, potenciando o
alinhamento entre os interesses dos parceiros e a coordenação das suas ações, este autor refere a
afirmação de Caglio e Ditillo (2008), segundo a qual, a investigação em CG de redes tem, de forma
acrítica, transportado para esta área específica do CG, variáveis e análises que foram inicialmente
desenvolvidas para o controlo de gestão interno, sem questionar a sua adequação aos contextos de
alianças inter organizacionais. Apesar destas dúvidas, no seu estudo que averiguou a adequação de
ferramentas tradicionais de CG ao controlo de alianças interempresariais, Anderson et al. (2015)
concluíram existir tal adequação. Já antes, Håkansson e Lind (2004) tinham constatado que os métodos
contabilísticos previamente utilizados pelos parceiros de uma rede desempenham um papel chave na
10
configuração da relação, suportando as conclusões de Tomkins (2001) no sentido de que as técnicas
contabilísticas prévias permanecem adequadas às redes formadas.
Ao procurarem perceber os fatores que condicionam a partilha de informação referente à
contabilidade de gestão, entre empresas envolvidas em processos colaborativos, Caglio e Ditillo (2012)
investigaram o efeito de variáveis relacionadas com as tarefas e relações dos intervenientes individuas
das empresas parceiras (i.e., interdependência e analisabilidade das tarefas, interdependência das
equipas e duração da relação) e consideraram também variáveis relacionadas com as características das
empresas envolvidas nas parcerias (i.e., Especificidade de ativos, grau de dependência económica,
existência de contrato, integralidade do contrato e dimensão da empresa). Recorrendo à análise de redes
sociais (social network analysis), os dados referentes a uma empresa e ao conjunto dos seus
fornecedores, mostraram que a quantidade de informação de contabilidade de gestão partilhada está
positivamente relacionada com a interdependência das tarefas. Foi também demonstrada a associação
positiva entre a analisabilidade das tarefas e nenhuma relação com a interdependência das equipas. O
estudo também confirmou a importância das características das empresas na explicação da partilha de
informação referente à contabilidade de gestão.
Quanto ao efeito dos sistemas de controlo sobre a confiança e a cooperação, Coletti et al. (2005)
afirmam que os conflitos de interesses entre os diversos parceiros envolvidos num processo de
colaboração representam um desafio em termos de CG, uma vez que (1) controlos mais formais tais com
as sanções e a monitorização contribuem positivamente para a cooperação ao desincentivar
comportamentos oportunistas e (2) estudos anteriores demonstram que a mera existência de um SCG
leva os decisores a encarar a parceria como não cooperativa e os outros colaboradores como não
confiáveis. Estes autores (2005) conduziram dos experimentos nos quais os participantes atuam como
parceiros num processo colaborativo e nos quais se examinaram os efeitos do CG sobre a confiança e
cooperação, tendo sido demonstrado que um sistema de controlo forte exerce um efeito mediador sobre
o aumento do nível de confiança entre os parceiros e que este aumento da confiança tem, por sua vez,
um efeito positivo no subsequente nível de cooperação. Em conjunto, estes resultados sugerem um efeito
marginal positivo da robustez dos SCG sobre o nível de cooperação, através da confiança, contradizendo
11
resultados de estudos anteriores e indicando que as empresas deverão optar, no âmbito das parcerias,
por SCG robustos.
Dekker (2016), numa revisão da literatura acerca da significância da investigação na fronteira entre
os sistemas de contabilidade de gestão usados pelas empresas na sua gestão interna e os sistemas de
contabilidade de gestão usados nas parcerias, afirma que estas duas abordagens se têm desenvolvido em
campos autónomos e separados. O autor assinala que apesar de terem já sido identificadas questões
importantes relacionadas com os sistemas de contabilidade de gestão usados em relações colaborativas,
com as inter-relações entre sistemas de contabilidade de gestão intraempresarial e interempresarial e
com as ferramentas de CG usadas ao nível interempresarial, estas questões não têm sido estudadas,
tendo-se os autores limitado à sua identificação como temas relevantes.
Dekker (2016) assinala, como uma das linhas de investigação relevantes, a forma como os SCG
internos se adaptam (ou não) às parcerias estabelecidas, referindo ainda que esta linha de investigação
implica a realização de análises empíricas acerca da validade descritiva e preditiva destes SCG, de forma
a esclarecer (1) a forma como o controlo interempresarial se assemelha ou se distingue do controlo
intraempresarial, (2) a forma como as escolhas de controlo interempresarial se inter-relacionam,
escolhas estas que tendem a ser ainda mais complexas do que as escolhas de controlo intraempresarial.
No seguimento do trabalho anterior, Dekker, Ding e Groot (2016), examinaram a forma como os
objetivos das empresas envolvidas em parcerias influenciam as suas práticas de gestão de desempenho
no âmbito de tais parcerias (avaliação do desempenho da parceria, partilha de informação e interação
entre os agentes envolvidos nas parcerias).
Partindo de resultados de estudos anteriores, que tinham já concluído pela existência de relação entre
as práticas de controlo usadas nas parcerias e as características da transação (por exemplo, o risco da
transação), estes autores confirmaram que estas características da transação (especificidade dos ativos,
âmbito da transação, interdependência de tarefas e volatilidade contextual) exercem influência sobre as
práticas de controlo, tendo concluído que estas características são, por sua vez, determinadas pela
importância estratégica da parceria, a qual pode ser aferida pela importância dos respetivos objetivos,
ou seja, as características da transação exercem um efeito mediador numa relação, mais abrangente,
12
entre a importância estratégica da parceria (aferida através dos respetivos objetivos) e as práticas de
controlo utilizadas.
A importância do trabalho de Dekker et al. (2016) é sublinhada por Ditillo (2016) ao atribuir-lhe o
mérito de propor um modelo de análise do controlo inter organizacional que, para além de combinar
diferentes perspetivas teóricas, é mais abrangente que os anteriores e que estimula a reflexão acerca, não
só dos aspetos nele incluídos, mas também acerca de outros aspetos ainda por explorar. Quanto a estes
últimos, Ditillo (2016) sugere o estudo dos efeitos, sobre as práticas de controlo das parcerias
(nomeadamente sobre a partilha de informação e a interação entre indivíduos), da natureza dos
respetivos objetivos estratégicos, para além da quantidade de objetivos, abordada por Dekker et al.
(2016), da estrutura de interesses dos parceiros e das características dos indivíduos e das redes. No
presente trabalho, procuramos incorporar os contributos e sugestões destes autores, analisando os
mecanismos através dos quais o número e a natureza dos objetivos estratégicos das parcerias exercem a
sua influência no SGG dos parceiros.
3. Metodologia
Neste ponto apresentamos a metodologia utilizada, nomeadamente no que se refere à abordagem de
investigação que considerámos apropriada ao objetivo do estudo bem como o método de investigação,
os critérios de seleção do caso de estudo, a recolha de dados e ainda os critérios de seleção e identificação
dos entrevistados.
3.1. Abordagem e método de investigação
No que se refere às escolhas metodológicas na abordagem à forma como o controlo interempresarial
se assemelha ou se distingue do controlo intraempresarial, à forma como as escolhas de controlo
interempresarial se inter-relacionam, Dekker (2016) assinala que os estudos de caso qualitativos podem
ser úteis para obter uma compreensão mais profunda acerca das práticas usadas nas parcerias
empresariais.
Tendo em conta que o objetivo principal da investigação é o de analisar e o de compreender a relação
de interdependência entre os sistemas de avaliação de desempenho utilizados pela empresa estudada, na
13
sua gestão interna e na gestão das parcerias, procurando responder a perguntas acerca de como e por que
razões se verifica tal interdependência (Yin, 2014), optámos por uma investigação de natureza
qualitativa e interpretativa, recorrendo ao método de estudo de caso.
3.2. Questão de investigação e objetivos intermédios
O estudo visa dar resposta às questões de investigação:
Q1) A empresa tem a perceção de que o sistema de avaliação de desempenho, prémios e
incentivos utilizada no âmbito das parcerias é relevante para o sucesso dessas parcerias?
Q2) Em caso de resposta afirmativa à questão anterior, quais são as implicações dessa perceção
sobre o desenho do sistema de avaliação de desempenho, prémios e incentivos utilizada no
âmbito das parcerias?
Q3) Em que medida o estabelecimento de parcerias, através das respetivas práticas de avaliação
de desempenho, prémios e incentivos, influencia as práticas de avaliação de desempenho,
prémios e incentivos usadas em ambiente intraempresarial?
Para responder a estas questões procuraremos, de acordo com o modelo de Ferreira e Otley (2009),
alcançar os seguintes objetivos intermédios:
O1) Descrever o sistema intraempresarial de avaliação de desempenho, prémios e incentivos
(através das questões 1, 2, 5, 6, 7 e 8 do Apêndice 1);
O2) Descrever o sistema interempresarial de avaliação de desempenho, prémios e incentivos
(através das questões 13, 14, 17, 18, 19 e 20 do Apêndice 1);
O3) Descrever/compreender as influências entre os sistemas intra e interempresarial de
avaliação de desempenho, prémios e incentivos.
3.3. Critérios de seleção do caso de estudo
Como objeto de estudo pretendeu-se selecionar uma empresa que fosse representativa das empresas
a laborar em Portugal, de média dimensão e com uma estrutura de gestão desenvolvida. Enquanto o
critério da localização resulta da facilidade de acesso aos dados, os restantes resultam do entendimento
14
de que, em empresas de pequena dimensão e com uma estrutura de gestão débil, os aspetos a estudar
não seriam relevantes, uma vez que tanto os SCG como as parcerias, ou não existem ou são insipientes.
Por outro lado, em grandes empresas é de esperar que predominem as parcerias não paritárias, o que
implica menor probabilidade de existência de influencias dos SCG utilizados nas parcerias sobre os SCG
internos. A EFAPEL foi selecionada por verificar aqueles critérios. A empresa é o maior fabricante
nacional do seu ramo de atividade, conta já com algumas décadas de existência, tem atualmente cerca
de 300 colaboradores, dispõe de quatro unidades industriais e assenta a sua estratégia em boas práticas
de gestão, na inovação e na internacionalização, sendo as parcerias um instrumento primordial para a
efetivação desta estratégia de internacionalização.
3.4. Recolha de dados
A recolha de dados decorreu nos meses de maio e junho de 2017 e foi efetuada com recurso à
triangulação de três tipos de fontes (Yin, 2014), nomeadamente a realização de entrevistas
semiestruturadas a gestores, visando obter as suas descrições, explicações, motivações e opiniões quanto
às opções da empresa no que se refere aos SCG adotados. Em paralelo, foi efetuada a análise dos
documentos internos considerados relevantes, os quais foram disponibilizados pela empresa (Manual do
Sistema de Gestão Interna, Planos, Fichas de Avaliação de Desempenho, Balanced Scorecard, Quadros
de Monitorização de Cumprimento de Tarefas, etc.) e de informação disponibilizada na internet (página
da empresa e outras fontes). Adicionalmente, como fonte de informação complementar, foram utilizadas
as conversas informais com os gestores, as quais decorreram durante os tempos de espera e de convívio
que foram proporcionados durante a presença do investigador na empresa. Estas conversas informais
serviram, principalmente, para confirmar e/ou detalhar informações obtidas pelas duas vias principais
(entrevistas e análise documental) ou para esclarecer dúvidas ou contradições encontradas.
3.5. Critérios de seleção e identificação dos entrevistados
O trabalho de campo foi realizado durante o mês de junho de 2017, tendo as entrevistas sido efetuadas
no dia 5 deste mês. Foram entrevistadas as diretoras de controlo de gestão (entrevistada 1), de gestão de
pessoas (entrevistada 2) e de compras (entrevistada 3), tendo em conta a relevância das respetivas
15
funções/cargos para o objeto da investigação e o contributo que cada uma poderia fornecer para a
compreensão do SCG interempresarial, no caso da entrevistada 1, e o SCG intraempresarial, no caso das
entrevistadas 2 e 3 (que têm a seu cargo as relações de parceria com agentes e fornecedores,
respetivamente).
Uma vez que se trata de uma investigação qualitativa, a quantidade de entrevistados e as questões de
representatividade não foram uma preocupação, procurando-se antes alcançar a compreensão em
profundidade do que é revelado através do discurso dos indivíduos que podem contribuir para tal
compreensão e que são identificados e caracterizados na tabela seguinte:
Tabela 1 - Identificação e caracterização dos entrevistados
Número de entrevistado Entrevistada 1
(E1)
Entrevistada 2
(E2)
Entrevistada 3
(E3)
Nome Catarina Duarte Carla Banha Ângela Carvalho
Idade 43 38 51
Formação académica Licenciatura
Economia
Licenciatura
Psicologia 12º ano
Função/cargo Diretora de Controlo
de Gestão
Diretora de Gestão
das Pessoas
Diretora de
Compras
Anos de experiência profissional 19 14 36
Anos na empresa 18 13 36
Anos na função atual 13 13 11 Fonte: Elaboração própria (dados fornecidos pela EFAPEL)
A caracterização das gestoras entrevistadas permite constatar que todas iniciaram o seu percurso
profissional na empresa e aí permanecem desde essa altura, o que demonstra um elevado grau de
retenção de pessoas e se apresenta como coerente face aos valores e politicas da empresa, os quais serão
apresentados no ponto 4.
4. Resultados
Neste ponto, depois de efetuada a identificação da empresa em estudo (ponto 4.1), são apresentadas
as respostas obtidas nas entrevistas, às doze questões colocadas e que correspondem ao desdobramento,
de seis das questões do modelo de Ferreira e Otley (2009, p. 266-267). Este desdobramento visa analisar
os aspetos do SCG que são objeto deste estudo, em ambiente intra e interempresarial. As questões focam
os seguintes aspetos:
1) Forma como o estabelecimento de parcerias se enquadra na estratégia da empresa (questões 1, 2,
13 e 14 do Apêndice 1), desenvolvida no ponto 4.2;
16
2) Sistemas de avaliação e metas de desempenho intraempresarial (questão 7 do Apêndice 1) e
interempresarial (questão 19 do Apêndice 1), desenvolvidos no ponto 4.3;
3) Políticas de incentivos e recompensas, intraempresarial (questão 8 do Apêndice 1) e
interempresarial (questão 20 do Apêndice 1), desenvolvidas no ponto 4.4;
4.1. Identificação da empresa
A EFAPEL foi fundada em 1978 e é atualmente constituída por uma equipa de cerca de 300
colaboradores, sendo a maior fabricante nacional de aparelhagem de baixa tensão, tais como,
aparelhagens de Embeber, Estanque e Saliente, Calhas Técnicas, Som Ambiente, DVI (Dados, Voz e
Imagem) e Aparelhagem Modular para Quadros Elétricos. A empresa dispõe de quatro unidades
industriais, uma no Padrão (Lousã) e três em Serpins, com um total de aproximadamente 26 mil metros
quadrados. A exportação para meia centena de países representa um terço da faturação global, que ronda
os 30 milhões de euros anuais.
A EFAPEL aposta na investigação, desenvolvimento, inovação e certificação dos produtos e da
empresa. Os seus produtos estão certificados segundo as normas CERTIF (Portugal), NF-USE (França),
VDE (Alemanha), KEMA KEUR (Holanda), CEBEC (Bélgica), GOST (Rússia) e SEMKO (Suécia),
estando a empresa certificada pelas normas ISO 9001 (Gestão da Qualidade), ISO 14001 (Gestão
Ambiental) e OHSAS 18001 (Gestão da Segurança e Saúde do Trabalho). A EFAPEL é a primeira
empresa do seu sector de atividade registada no EMAS (Sistema Comunitário de Eco Gestão e
Auditoria) e a quinta a nível nacional. A sua equipa de Investigação, Desenvolvimento e
Inovação dedica-se à pesquisa, conceção e desenvolvimento das soluções que melhor correspondam às
necessidades dos seus clientes, tendo em mente três princípios orientadores: boa relação
qualidade/preço; facilidade e rapidez de instalação; e segurança e comodidade para o utilizador, tendo
como objetivo oferecer aos clientes uma gama completa de produtos que lhes permita projetar e executar
uma instalação elétrica completa.
A empresa aposta também no constante alargamento dos seus mercados, estando presente em 45
países, para além de Portugal, para onde escoa mais de 30% da sua produção. A consolidação da
cooperação estratégica com os mercados da Rússia, França, Arábia Saudita, Espanha, Peru,
17
Moçambique, Bulgária, Bélgica e Holanda contribuiu para estabelecer um conjunto de parcerias
estratégicas de extrema importância, para a obtenção de um crescimento constante e sustentado.
4.2. Estratégia e fatores críticos de sucesso
Para aferir da importância efetiva do estabelecimento de parcerias para a efetivação da estratégia
da empresa e para a maximização dos seus fatores críticos de sucesso, bem como da influência que tais
parcerias exercem na (re)definição estratégica, foram colocadas às entrevistadas, as questões 1, 2, 13 e
14 (Apêndice 1) com base nas questões 1 e 2 do modelo de Ferreira e Otley (2009, p. 266-267).
No que se refere à estratégia da EFAPEL, para os próximos anos, esta consiste, segundo o seu
administrador, em
“Fazer mais do mesmo … O futuro da EFAPEL irá passar por uma aposta decisiva na
internacionalização, consolidando a … presença em mercados estratégicos …, efetuando
um apoio eficiente e personalizado aos clientes e procurando novos parceiros de negócios.
Para além da diversidade de produtos existentes, estão previstos lançamentos de novas
gamas de produtos que irão ajudar certamente à manutenção do crescimento sustentado
da EFAPEL” (Duarte, 2017).
Desta afirmação pública da estratégia, coerente com a informação recolhida nas entrevistas
efetuadas aos vários gestores da empresa, na consulta de documentos internos (tal como o Manual de
Sistema de Gestão Interna) e na consulta da página da empresa na internet, podemos constatar que, para
além do foco no cliente e na qualidade, baseados, por um lado, na inovação e na eficiência, mas também
na qualidade das matérias-primas e na fiabilidade dos fornecedores, a empresa aposta também na sua
internacionalização, de onde resulta a importância estratégica das parcerias que estabelece com
fornecedores, distribuidores e agentes.
No que se refere à importância das parcerias para a efetivação da estratégia e à divulgação interna
desta importância, começamos por descrever as parcerias mais relevantes para a empresa, passando
depois à descrição do processo de divulgação interna da sua importância.
No que se refere às parcerias consideradas mais relevantes, foi afirmado que:
18
“As parcerias mais relevantes são as que mantemos com alguns fornecedores, com os
principais clientes e com distribuidores e agentes. Esta relevância advém dos contributos
de cada parceiro em termos de:
qualidade do produto e do serviço, sendo a fiabilidade dos fornecedores, quer em
termos de qualidade das matérias-primas quer do cumprimento de prazos, crucial para
a qualidade do produto e para o cumprimento dos prazos de entrega ao cliente;
satisfação do cliente final, sendo que as parcerias com grandes clientes, com os quais
são celebrados acordos de fornecimento com horizonte temporal alargado, merecem
especial atenção, no que se refere à monitorização do cumprimento desses contratos e
da satisfação desses clientes;
internacionalização da empresa, sendo que, nesta área, desempenham especial
importância as parcerias com os distribuidores e agentes que representam a empresa
nos mercados externos. Dedicamos bastante atenção ao processo de seleção destes
distribuidores e agentes e procuramos desenvolver relações de proximidade com cada
um deles.” (E1)
Quanto à divulgação da importância estratégica de cada uma destas parcerias, esta
“… é conhecida de todos os diretores, estejam ou não diretamente envolvidos nessas
parcerias, tendo em conta que estes participam na definição dos objetivos estratégicos e
na aprovação de todos os planos, nomeadamente nos planos e atividades que se
relacionam com as parcerias. Quanto aos diretores diretamente envolvidos com cada tipo
de parceiros, estes procuram acompanhar as parcerias de acordo com as características
e importância de cada um, antecipando e evitando problemas que possam afetar o
desempenho do seu departamento.” (E1)
Das respostas anteriores resulta que a relação entre desempenho do parceiro, da parceria, do
departamento e da empresa está bem presente no espírito de cada um dos diretores, não existindo
necessidade de a explicitar ou divulgar formalmente, para além da divulgação que é efetuada nas
reuniões de diretores.
19
Quanto à divulgação da importância estratégica das parcerias, junto dos restantes empregados, foi
respondido que:
“Não entendemos que a divulgação pelos empregados não diretamente envolvidos nas
parcerias seja necessária nem útil.” (E1)
Acrescentando-se que:
“Valorizamos o desempenho de cada um na sua função e consideramos que a divulgação
da importância das parcerias pode ser um fator de distração e induzir, nestes empregados,
a ideia de que a eficiência e a eficácia com que desempenham as suas tarefas devem ser
maiores consoante o tipo de cliente, por exemplo. O Diretor de Produção é avaliado pelo
número de problemas que surgem no seu departamento e não pelo tipo de clientes que
esses problemas possam afetar.” (E1)
Apesar de algumas parcerias serem consideradas estratégicas, foi referido que elas
“… não condicionam a estratégia. Por exemplo, as parcerias com as grandes cadeias de
distribuição, que são clientes que têm um peso significativo no nosso volume de negócios
e que exercem grande pressão sobre os nossos preços de venda, poderiam levar-nos a
apostar numa estratégia de redução de custo. Contudo, apesar da nossa constante
preocupação com a racionalização de custos e com a eficiência, tentamos impor-nos pela
qualidade, valorizado a nossa marca.
Estas parcerias são encaradas como necessárias, devido à importância das quantidades
vendidas e da exposição da marca, mas não como parcerias estratégicas, uma vez que, por
um lado, tendem a criar grande dependência e, por outro lado, limitam a maximização da
rentabilidade das vendas, devido à política de esmagamento de margens e comportamentos
abusivos destes clientes.” (E1)
Já quanto às parcerias com distribuidores internacionais e, principalmente, com os agentes que
representam a empresa nos mercados externos, estas são encaradas, atualmente, como parcerias
estratégicas, por se considerar que
20
“… poderão facilitar a implantação da marca nos mercados internacionais e evitar a
dependência face aos grandes distribuidores nacionais.” (E1)
No que se refere às parcerias com fornecedores, estas são encaradas como estrategicamente muito
relevantes, nomeadamente no que se refere ao impacto na qualidade do produto e do serviço e na relação
qualidade-preço.
“Prestamos especial atenção às parcerias com as empresas que nos fornecem matérias-
primas para as quais existe um reduzido número de fornecedores. Para além destas
preocupações, procuramos privilegiar fornecedores nacionais e locais, de modo
contribuirmos para o desenvolvimento nacional e local.” (E1)
Constata-se, assim que as parcerias são relevantes em termos estratégicos, sendo a sua relevância
difundida de forma seletiva, apenas junto dos gestores.
4.3. Avaliação e metas de desempenho
Neste ponto, procuramos descrever o sistema de avaliação de desempenho intra e interempresarial e
analisar a relação entre eles, para o que foram colocadas às entrevistadas, as questões 5, 6, 7, 17, 18 e
19 (Apêndice 1) com base nas questões 5, 6, 7 do modelo de Ferreira e Otley (2009, p. 266-267).
Os principais indicadores utilizados na avaliação de desempenho da empresa constam de um
documento interno denominado Mapa de Objetivos e Indicadores, listagem que contempla 80
indicadores principais, de diversas naturezas e que se desdobram em indicadores secundários, estando
cada um deles associado ou a um determinado processo interno, departamento ou opção estratégica e a
um responsável. A periodicidade de cálculo de cada indicador principal poderá ser anual, semestral,
trimestral ou mensal.
Do Mapa de Objetivos e Indicadores referente a um determinado ano, constam tanto os valores de
cada indicador para o ano anterior como as respetivas metas para esse ano. A empresa procura que as
metas estabelecidas não sejam demasiado ambiciosas, por se considerar que, nesse caso, elas podem ter
efeitos nefastos, por não serem levadas a sério e por causarem desmotivação.
21
Quanto ao papel que estes indicadores de desempenho global da empresa, têm na avaliação de
desempenho individual de departamentos, gestores e empregados, foi referido que:
“Esse papel é residual e subjetivo. Estes indicadores, entre os quais indicadores
financeiros, tal como rendibilidade e taxa de crescimento das vendas, não são
considerados na avaliação de desempenho individual, mas sim para monitorar a evolução
da empresa e para chamar a atenção para eventuais falhas no cumprimento das metas
gerais. O incumprimento de metas tem, na maioria dos casos, causas externas pelo que
não seria adequado responsabilizar diretores ou outros empregados. Todos são alvo de
avaliação de desempenho, através de indicadores quantitativos e qualitativos e critérios
específicos, como o cumprimento de deveres e tarefas, produtividade (no caso dos
operários) e o cumprimento dos planos operacionais e das iniciativas (no caso dos
diretores). Os critérios financeiros são apenas utilizados para estabelecer prémios e
comissões dos vendedores, cuja remuneração depende, em parte, das vendas.” (E1)
Quanto à avaliação do desempenho da empresa e à sua relação com as parcerias, foi referido:
“… o sucesso das parcerias influencia alguns indicadores de desempenho global, mas eles
não são considerados na avaliação de desempenho individual. Apenas influenciam o
prémio anual a distribuir pelos diretores de departamento” (E1)
O processo de avaliação de desempenho dos diretores foi descrito da seguinte forma:
“… em cada ano, a Administração define, as competências e respetiva ponderação na
avaliação do ano que se inicia, informando os diretores. Todos os diretores devem
preencher o Questionário de Avaliação de Competências, relativo aos seus pares. Por
outro lado, é avaliado, pelo Diretor do Sistema de Gestão Integrado, o grau de
cumprimento da totalidade dos planos, relativamente ao ano anterior, o qual, se for
inferior a 80%, implica que não haverá atribuição de qualquer prémio aos Diretores. Os
diretores são classificados em um de três escalões, em função da pontuação obtida nos
questionários preenchidos pelos pares. Entretanto, a Administração define, em função do
ano económico anterior, o montante total do Prémio Global de Desempenho desse ano, o
22
qual é então distribuído pelos diretores, em função dos escalões, com a ponderação de 2
para o 1º escalão, 1,75 para o 2º escalão e 1,5 para o terceiro escalão. Para recebimento
do prémio, é obrigatório o preenchimento de pelo menos 90% dos questionários de
avaliação dos pares.” (E1)
De acordo com as respostas obtidas, verifica-se que os critérios de avaliação de desempenho dos
gestores são definidos a priori, sendo o valor do prémio definido a posteriori.
Constata-se também que, pelo facto de o sucesso das parcerias poder influenciar o desempenho
global da empresa, este pode, por esta via, influenciar o valor do prémio a repartir pelos diretores. A
avaliação de desempenho de cada um dos gestores não depende, contudo, do sucesso das parcerias, mas
sim do grau de realização dos planos e iniciativas que estiverem associados a essas parcerias, à
semelhança com o que acontece com qualquer outro plano ou iniciativa.
Quanto à avaliação de desempenho de cada parceiro, o processo inicia-se com o estabelecimento dos
objetivos anuais para cada parceiro, os quais
“… são mutuamente negociados e funcionam apenas como orientação e motivação para o
parceiro, não sendo aplicadas quaisquer penalizações, para além da diminuição da sua
remuneração, no caso dos distribuidores e agentes internacionais, se esta remuneração
depender, nos termos contratuais, do volume de vendas.”
Quanto à troca de informação com os parceiros, ela é efetuada, segundo a diretora de controlo de
gestão, de acordo com as características de cada um dos deles.
Por exemplo, no que se refere aos parceiros internacionais,
“como estes têm diferentes valores culturais, há um cuidado especial em não pedir
informação demasiado detalhada nem de forma demasiado veemente, de forma a não ferir
suscetibilidades e evitando transmitir sinais de desconfiança e/ou de tentativa de
imposição de comportamentos.” (E1)
No que se refere aos fornecedores, a empresa adota
23
“… na fase de seleção, a mesma atitude, evitando as parcerias com empresas que não
cumpram os nossos requisitos em termos éticos, de qualidade e de fiabilidade. No decorrer
destas parcerias com fornecedores, adotamos mesma atitude de colaboração ética e de
não intrusão nos processos internos dos parceiros.” (E1)
A empresa tenta assim, mais do que avaliar o desempenho dos parceiros, à posteriori, evitar o
surgimento de problemas, através de uma atitude preventiva que passa pela transmissão, desde os
contactos iniciais, dos valores de rigor, seriedade e ética e no estabelecimento de condições contratuais
claras e objetivas. Esta atitude preventiva tem tido bons resultados uma vez que os candidatos a parceiros
que não se identificam com estes valores não chegam a ser selecionados e, por esta via, a probabilidade
de os parceiros virem a apresentar comportamentos indesejados é substancialmente minimizada.
Quanto aos fornecedores, em certos casos, esta atitude preventiva não é suficiente para garantir o
sucesso da parceria, pelo que é necessário um controlo mais robusto.
“Um fornecedor relatou que o seu controlo de qualidade consistia em olhar durante cinco
segundos para o produto, a um metro de distância e que, se não se apercebesse de nenhum
defeito, então concluía que o produto estava conforme. Nós recusámos este procedimento,
afirmando que o produto não deveria apresentar nenhum defeito, independentemente do
tempo e da distância de visualização. O fornecedor acabou por aceitar a nossa
recomendação e a qualidade dos produtos fornecidos aumentou substancialmente.
Quando recorremos a um fornecedor que não cumpre todos os nossos requisitos de
qualidade e fiabilidade, por ser fornecedor de materiais escassos, temos necessidade de o
controlar constantemente através de contactos mais frequentes no sentido de monitorizar
o processamento das encomendas e de frequentes pedidos de amostras.” (E3)
Um outro aspeto que foi referido pela diretora de compras foi o seguinte:
“Para alguns destes fornecedores o peso relativo das vendas à EFAPEL é reduzido e as
quantidades de material por nós rejeitado são significativas, mas estas rejeições são
aceites pacificamente por esses fornecedores que, estranhamente, não recusam as nossas
encomendas.” (E3)
24
Face à resposta anterior, foi perguntado à diretora de compras, qual a sua opinião acerca dos motivos
pelos quais estes fornecedores continuam a fornecer a EFAPEL, apesar de aparentemente a empresa não
ser um cliente rentável, ao que foi respondido:
“Eles não recusam encomendas, querem continuar a fornecer e esforçam-se por cumprir
os nossos requisitos, o que poderá ser explicado pelo facto de cumprirmos
escrupulosamente os prazos de pagamento.” (E3)
4.4. Política de incentivos e recompensas
Neste ponto, procuramos descrever a política de incentivos e recompensas intra e interempresarial e
analisar a relação entre elas, para o que foram colocadas às entrevistadas, as questões 8 e 20 (Apêndice
1) com base na questão 8 do modelo de Ferreira e Otley (2009, p. 266-267).
Acerca da política de incentivos e recompensa foi referido que:
“Todos os gestores e empregados são alvo de avaliação de desempenho e são
recompensados, através de prémios monetários definidos em função do escalão alcançado
no processo de avaliação de desempenho. Não existem penalizações, para além da não
atribuição de prémio ou atribuição de um prémio menor. Em caso de incumprimento grave,
situação muito rara, a rescisão contratual ocorre em pouco tempo, não chegando, esse
empregado, à fase de avaliação de desempenho seguinte. A maior penalização, em caso de
mau desempenho, é a sentida pelo próprio, que se sente diminuído face aos seus pares e
perante os seus superiores e administrador, apesar de a avaliação de desempenho ser
confidencial.” (E1)
No que se refere às parcerias, foi referido que:
“A empresa não define recompensas a atribuir aos gestores, especificamente em função
dos resultados obtidos nas parcerias, aplicando-se, aqui, as regras e procedimentos gerais.
Ou seja, na medida em que, associados às parcerias, existirem planos de ação
estabelecidos, os gestores responsáveis por estes planos serão avaliados de acordo com o
grau de execução destes planos, bem como os de todos os outros planos com os quais se
25
comprometeram. Por outro lado, a avaliação pelos pares pode também ser influenciada
pelo sucesso das parcerias.” (E1)
Das respostas anteriores, retira-se que a política de incentivos está rigorosamente formalizada e é
aplicada, no âmbito das parcerias, da mesma forma que nas restantes áreas da empresa.
5. Discussão dos resultados
Os principais resultados retirados do presente estudo de caso são:
As parcerias estabelecidas com outras entidades não exercem qualquer influência sobre a
estratégia da empresa e não são encaradas como um objetivo em si mesmo;
As parcerias são estabelecidas na medida em que podem contribuir para a concretização da
estratégia, procurando evitar a armadilha de serem as parcerias a condicionar a estratégia;
O estabelecimento de parcerias não gera mudança nas medidas de desempenho adotadas pela
organização, as quais são, em termos gerais, bastante exaustivas;
O sistema geral de avaliação de desempenho permite avaliar o desempenho das parcerias,
bastando para tal utilizar e desdobrar os indicadores existentes.
Os mecanismos de avaliação de desempenho utilizados nas parcerias são, em termos gerais e da
sua filosofia, idênticos aos usados internamente;
Apesar desta semelhança, o sistema de avaliação de desempenho intraempresarial verifica
algumas especificidades na sua aplicação;
Mais do que através da avaliação de desempenho, o controlo das parcerias e dos parceiros é
exercido essencialmente através do controlo a priori, tal como os mecanismos culturais e condições
contratuais claras e objetivas. Este controlo a priori permite um controlo a posteriori menos rígido e
mais informal do que o controlo interno;
Os objetivos anuais definidos para cada parceiro são mutuamente negociados e funcionam apenas
como elemento de orientação e motivação para os parceiros, não lhes sendo aplicadas quaisquer
penalizações.
26
No que se refere aos fornecedores, embora a empresa adote a mesma atitude preventiva, de
colaboração ética e de não intrusão nos processos internos, em determinados casos existe necessidade
de proceder a um controlo posterior mais apertado e de alguma intrusão nos processos internos dos
parceiros, de modo a garantir a qualidade dos materiais e o cumprimento dos prazos.
O facto de estes fornecedores demonstrarem interesse em continuar a fornecer a empresa e
cumprir os seus requisitos poderá ser explicado, em parte, pelo facto de estes fornecedores considerarem
que a parceria com a EFAPEL poderá ser benéfica para a própria organização.
O SCG da empresa em estudo visa, quase exclusivamente, orientar o comportamento de gestores e
empregados, sendo que a sua contribuição para o suporte ao processo de tomada de decisão é
considerada como uma consequência do CG e não como uma justificação para a existência e
configuração de tal controlo, visão que é congruente com a abordagem de Malmi e Brown (2008) e
também com duas outras características do SCG interno da empresa e que consistem na predominância
do controlo preventivo e efetuado a priori e na natureza mista dos instrumentos de avaliação de
desempenho, em que predomina a avaliação subjetiva. Por outro lado, verificou-se que a atribuição de
prémios visa essencialmente funcionar como incentivo e não como recompensa, já que os critérios para
a sua atribuição são estabelecidos a priori.
No que se refere aos efeitos das parcerias interempresariais no sucesso das empresas e das suas
estratégias empresariais, verifica-se que, no caso em estudo, a empresa tem noção clara de que estes
efeitos podem ser benéficos ou prejudiciais, consoante a qualidade dos laços estabelecidos, da estrutura
da rede e da posição relativa da empresa na rede, confirmando a já antiga visão de Uzzi (1997). Esta
perspetiva de que as parcerias não são um objetivo, mas sim um meio de potenciar os objetivos, é bem
patente, neste caso, tendo em conta que, por um lado, a empresa distingue parcerias necessárias de
parcerias estratégicas e, por outro, a forma como a empresa gere e controla essas parcerias,
nomeadamente no que toca à sua subordinação face à estratégia da empresa e à inclusão dos
instrumentos de controlo e avaliação de desempenho das parcerias no SCG geral da empresa.
O caso estudado permitiu também verificar, confirmando a perspetiva de Manser et al. (2015), a
relevância do modelo de gestão das parcerias e dos mecanismos de controlo adotados, na medida em
27
que a empresa seleciona cuidadosamente os instrumentos de controlo de gestão a utilizar na gestão das
parcerias, os quais são definidos tendo em conta a realização dos objetivos estratégicos e, por esta razão,
se assemelham e são coerentes com o SCG global, não deixando, no entanto de assumir algumas
características especificas, tendo em atenção as características dos parceiros e a importância estratégica
de cada uma das parcerias. Exemplo disso é a forma como a empresa interfere, em certos casos, na
gestão interna das empresas parceiras, como acontece no caso de algumas parcerias com fornecedores
críticos que apresentam algumas debilidades de gestão suscetíveis de afetar o desempenho da EFAPEL.
Quanto à interdependência entre SCG e parcerias, procurámos incorporar os contributos e sugestões
de Dekker et al. (2016) e de Ditillo (2016), analisando os mecanismos através dos quais os objetivos
estratégicos das parcerias exercem a sua influência no SGG da rede e no SCG dos parceiros. Quanto à
forma como as parcerias podem influenciar e ser influenciadas pelas práticas internas de controlo
(Dekker, 2016), o presente estudo não permitiu identificar influência significativa das parcerias sobre
as práticas internas de controlo mas sim a influência destas práticas internas sobre as parcerias, uma vez
que a empresa não considera necessário nem útil alterar o seu SCG interno de modo a facilitar a
colaboração ou a dar suporte às parcerias.
Congruentemente com a afirmação anterior e quanto à semelhança entre controlo interempresarial e
controlo intraempresarial (Dekker, 2016), o presente trabalho permitiu verificar um elevado grau de
semelhança, nomeadamente quanto às grandes linhas orientadoras (prevalência de controlos à priori, da
disseminação de valores e atitudes e de indicadores de desempenho individual subjetivos), apesar de
algumas diferenças em termos de formalização, cujo grau é menor nas parcerias do que nos SCG
internos, sendo que esta semelhança denota, na nossa opinião, um elevado grau de influência do SCG
interno (e da estratégia previamente definida) sobre os CG usado nas parcerias.
Quanto à relação entre o controlo das parcerias e as características da transação, estudada por Dekker
et al (2016), verificámos, em particular nas parcerias com fornecedores críticos, que as práticas de
controlo podem diferir em função daquelas características, nomeadamente se elas puderem
comprometer a realização de objetivos, como sejam o risco e a especificidade dos ativos.
6. Conclusões, limitações e sugestões de investigação
28
Tentando colmatar a lacuna identificada por (Manser et al., 2015), no que se refere à possibilidade
de existência de múltiplas configurações para a gestão das parcerias, começámos for fazer uma descrição
do sistema de avaliação de desempenho intraempresarial da EFAPEL, com base no modelo de controlo
de gestão de Ferreira e Otley (2009), de modo a avaliar a sua coerência interna, evidenciar as suas
principais características à luz das principais contribuições teóricas e a detetar eventuais
interdependências entre os sistema de avaliação de desempenho intra e interempresarial.
Os resultados do presente estudo de caso, referidos e discutidos no ponto anterior, permitem
responder às questões da presente investigação, sendo as conclusões do estudo as que resultam da
resposta à terceira questão de investigação.
Q1) A empresa tem a perceção de que o sistema de avaliação de desempenho, prémios e incentivos
utilizada no âmbito das parcerias é relevante para o sucesso dessas parcerias?
Sim. A empresa considera que um sistema de avaliação de desempenho adequado, assim como uma
correta política de prémios e incentivos, são instrumentos essenciais para o sucesso das suas ações e da
sua estratégia, sejam quais forrem estas ações, aplicando-se a mesma filosofia no que respeita ao caso
concreto das parcerias.
Q2) Em caso de resposta afirmativa à questão anterior, quais são as implicações dessa perceção sobre
o desenho do sistema de avaliação de desempenho, prémios e incentivos utilizada no âmbito das
parcerias?
A relação entre desempenho do parceiro, da parceria, do departamento e da empresa está bem
presente no espírito de cada um dos diretores, não existindo necessidade de a explicitar ou divulgar
formalmente, para além da divulgação que é efetuada nas reuniões de diretores. A importância atribuída
ao sistema de avaliação está bem patente na forma mais preventiva e menos formal como é efetuada
essa avaliação, que é feita essencialmente através da disseminação, a priori, dos valores da empresa.
Q3) Em que medida o estabelecimento de parcerias, através das respetivas práticas de avaliação de
desempenho, prémios e incentivos, influencia as práticas de avaliação de desempenho, prémios e
incentivos usadas em ambiente intraempresarial?
29
O sistema interno de avaliação de desempenho influencia o sistema de avaliação de
desempenho das parcerias, mas as parcerias não influenciam a estratégia da empresa, o seu
SCG interno e o sistema de avaliação de desempenho.
Quanto à interdependência entre SCG e parcerias, estudada por Dekker et al. (2016) e Ditillo (2016),
não se encontrou qualquer evidência de que as parcerias estabelecidas com outras entidades exerçam
alguma influência sobre a estratégia da empresa ou sobre a configuração do seu sistema interno de
avaliação de desempenho. A empresa recorre a parcerias como instrumento de efetivação dos seus
objetivos estratégicos, sem que estas parcerias condicionem, quer a sua estratégia, quer o seu sistema
interno de avaliação de desempenho. Esta independência pode advir do facto de este sistema interno
(robusto, estruturado e formalizado) estar fortemente alinhado com a estratégia e de as parcerias serem
encaradas e monitorizadas quanto ao seu contributo para a realização dessa estratégia, ou seja, devem
estar subjugadas à estratégia e ao SCG interno e não o inverso. A inexistência de qualquer influencia
sobre os SCG intraempresariais pode ser interpretada como contraditória em relação à afirmação de
Langfield-Smith (2005), segundo o qual as empresas parceiras deverão adaptar seus SCG prévios à nova
estratégia. No entanto, o que constatámos na presente investigação foi que as parcerias são encaradas
não como novas estratégias, mas sim como veículo para implementação de estratégias previamente
definidas. Esta abordagem às parcerias, enquanto instrumento estratégico e não enquanto estratégia,
confirma a ideia de Uzzi (1997) de que as parcerias encerram riscos, nomeadamente os inerentes ao
aumento da vulnerabilidade da empresa. Esta perceção de risco de vulnerabilidade é patente na forma
como a empresa estudada aborda as parcerias com as grandes cadeias de distribuição, verificando-se
aqui também a pertinência dos problemas associados aos comportamentos oportunistas e tentativa de
apropriação indevida de benefícios, questões referidas por Anderson et al. (2015).
Os instrumentos de avaliação de desempenho intra e interempresariais são, na sua filosofia,
semelhantes, mas a empresa adapta os instrumentos de avaliação de desempenho a utilizar
no âmbito das parcerias.
A semelhança encontrada, em termos de filosofia geral, entre avaliação de desempenho inter e
intraempresarial permite concluir, neste caso, pela adequação das ferramentas tradicionais ao controlo
30
de alianças interempresariais (Anderson et al.,2015) e que as práticas previamente utilizadas
desempenham um papel chave na configuração da relação (Tomkins, 2001; Håkansson e Lind, 2004).
Apesar de o CG no âmbito das parcerias ser, em termos de filosofia, idêntico ao controlo
intraempresarial, este contem, na sua forma de aplicação, algumas especificidades, confirmando a
perspetiva de Manser et al. (2015), acerca da relevância do modelo de gestão das parcerias e dos
mecanismos de controlo adotados, bem como as conclusões de Dekker et al (2016), quanto à relação
entre as práticas de controlo usadas nas parcerias e as características da transação, especialmente se tais
características forem potencialmente comprometedoras do sucesso da empresa. Exemplo das
especificidades do sistema de avaliação de desempenho interempresarial são o seu menor formalismo,
que acontece na generalidade das parcerias, mas também as exceções a esta norma, quando maior
intromissão na gestão interna dos parceiros e maior formalismo são necessários, como acontece nas
parcerias com alguns fornecedores críticos. Ainda quanto a estas diferenças, elas poderão ser entendidas
à luz do desafio, referido por Coletti et al. (2005), que se coloca ao controlo nas parcerias e que advém
dos conflitos de interesses entre parceiros e dos efeitos que esse controlo pode exercer sobre a confiança
e a cooperação. Este trabalho permitiu verificar que a empresa considera que o controlo formal (usado
internamente) contribui positivamente para a cooperação ao desincentivar comportamentos
oportunistas, mas considera também que demasiado formalismo pode gerar desconfiança, levando a
empresa a adotar, nas parcerias, mecanismos de controlo mais subtis (apesar de robustos, com especial
foco na disseminação prévia e constante dos valores e atitudes que espera dos parceiros) e menos formais
do que os que são usados internamente.
Apesar de as escolhas metodológicas efetuadas no presente estudo limitarem a possibilidade de
generalização das suas conclusões, elas permitiram estudar a realidade com alguma profundidade e
fornecer alguns contributos para o conhecimento desta realidade.
No que se refere à questão da influência das parcerias empresariais nos SCG e, mais especificamente,
nos sistemas de avaliação de desempenho, o principal contributo da investigação efetuada consiste em
questionar a afirmação de diversos autores (Langfield-Smith, 2005), segundo os quais o estabelecimento
de parcerias deve conduzir a uma adaptação destes sistemas. Efetivamente, as conclusões retiradas do
presente estudo indicam que tal modificação não é necessária nem útil, sendo que podem existir dois
31
tipos de explicações para este facto: por um lado, o estabelecimento de parcerias não constitui uma
alteração à estratégia e, por outro lado, as empresas cujos SCG prévios são coerentes com a estratégia,
valores e políticas e são já devidamente formalizados, difundidos e utilizados, não sentem necessidade
de proceder à sua adequação, independentemente dos instrumentos estratégicos a que recorrem, como é
o caso das parcerias. Esta questão deverá ser alvo de investigação adicional de modo a que seja possível
identificar as circunstâncias que poderão gerar a necessidade e utilidade de adaptação dos SCG às
parcerias.
Paralelamente, um outro contributo da presente investigação é a identificação de eventuais
influências das parcerias sobre os SCG das empresas parceiras que, previamente, não possuem SCG
robustos e que, por essa razão, e em resultado do contacto intenso com entidades mais sofisticadas em
termos de gestão, sentem necessidade e retiram benefícios da alteração dos seus SCG. Esta questão não
foi abordada no âmbito da presente investigação, uma vez que a empresa alvo de estudo não possui estas
características, pelo que se considera importante o seu aprofundamento através de investigação
adicional.
32
Referências bibliográficas
Anderson, S. W. et al. (2015) ‘Do extant management control frameworks fit the alliance setting?
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Apêndices
Apêndice 1: Questões do modelo Ferreira e Otley (2009, p 266-267) Questões
SCG da empresa SCG parcerias
1. Quais são a visão, missão, valores, políticas e estratégia 3 da organização e de que forma estas são
levadas ao conhecimento dos gestores e empregados? Que mecanismos, processos e redes são
usados pela organização para divulgar o propósito e os objetivos organizacionais junto dos seus
membros?
13. Qual é importância das parcerias para a realização da visão, missão, valores, políticas e estratégia4
da organização e de que forma esta importância é levada ao conhecimento dos gestores e
empregados? Que mecanismos, processos e redes são usados pela organização para divulgar o
propósito e os objetivos da cooperação junto dos seus membros?
2. Quais são os fatores chave considerados fundamentais para o sucesso futuro da organização, e
como são difundidos pelos gestores e empregados?
14. Quais são os fatores chave considerados fundamentais para o sucesso futuro da cooperação, e como
são difundidos pelos gestores e empregados?
3. Qual a estrutura da organização e qual o respetivo impacto na conceção e utilização dos sistemas
de gestão do desempenho? Como é que esta estrutura influencia e é influenciada pelo processo de
gestão estratégica?
15. Em que medida o estabelecimento de parcerias influencia a estrutura da organização e qual é o
respetivo impacto na conceção e utilização dos sistemas de gestão do desempenho? Como é que esta
estrutura influencia e é influenciada pela adoção de uma estratégia de cooperação?
4. Que estratégias e planos foram adotados pela organização e que processos e atividades que foram
considerados necessários para assegurar o seu sucesso? Como são as estratégias e os planos
gerados, adaptados e transmitidos aos gestores e empregados?
16. Que estratégias, planos, processos e atividades foram adotados pela organização de modo a
maximizar os resultados das parcerias? Como são estas estratégias e os planos gerados, adaptados e
transmitidos aos gestores e empregados?
5. Quais são as principais medidas de desempenho adotadas pela organização, tendo em conta os
seus objetivos, fatores chave de sucesso, estratégias e planos? Como são especificados e
comunicados e que papel desempenham na avaliação de desempenho? Existem omissões
significativas?
17. Em que medida o estabelecimento de uma nova parceria gera mudança nas principais medidas de
desempenho adotadas pela organização, tendo em conta os novos objetivos, fatores chave de
sucesso, estratégias e planos? Como são especificados e comunicados e que papel desempenham na
avaliação de desempenho? Existem omissões significativas?
6. Qual o nível de performance que a organização precisa de alcançar em cada uma das suas
principais medidas de desempenho? Em que medida foram já definidas metas para cada uma
destas medidas e quão desafiantes são essas metas de desempenho?
18. Em que medida o estabelecimento de uma nova parceria gera mudança no nível de performance que
a organização precisa de alcançar (em cada uma das suas principais medidas de desempenho) e nas
metas estabelecidas para cada uma destas medidas? A parceria torna mais desafiantes essas (novas)
metas de desempenho?
7. Que processos são seguidos pela organização, para proceder à avaliação de desempenho dos
indivíduos, grupos e organização? As avaliações de desempenho são primordialmente objetivas,
subjetivas ou mistas e quão importantes são, neste processo, a informação e o controlo formais e
informais?
19. Em que medida o estabelecimento de uma nova parceria gera mudança nos processos seguidos pela
organização, para proceder à avaliação de desempenho dos indivíduos, grupos e organização? As
avaliações de desempenho são, no caso das parcerias, mais ou menos objetivas, subjetivas ou mistas?
São mais ou menos importantes, nas parcerias, a informação e o controlo formais e informais?
8. Quais são as recompensas, financeiras e/ou não financeiras, atribuídas a gestores e empregados,
quando estes atingem as metas de desempenho previamente definidas (ou, de que penalizações
são alvo quando tais metas não são atingidas?)
20. Quais são as recompensas, financeiras e/ou não financeiras, atribuídas a gestores e empregados,
quando estes atingem as metas de desempenho previamente definidas para as parcerias (ou, de que
penalizações são alvo quando tais metas não são atingidas?) comparação com o geral
9. De que fluxos, sistemas e redes de informação dispõe a organização para apoiar o funcionamento
dos seus sistemas de gestão do desempenho?
21. De que fluxos, sistemas e redes de informação dispõe a organização para apoiar o funcionamento
dos seus sistemas de gestão do desempenho, no que se refere às parcerias?
10. Como são utilizados a informação e os vários mecanismos de controlo implementados? Podem
estas utilizações ser categorizadas de acordo com tipologias referidas na literatura? Como é que
os controlos e as suas utilizações diferem segundo os níveis hierárquicos?
22. Como são utilizados a informação e os vários mecanismos de controlo implementados? Podem estas
utilizações ser categorizadas de acordo com tipologias referidas na literatura? Como é que os
controlos e as suas utilizações diferem segundo os níveis hierárquicos?
11. Como é que os sistemas de medição de desempenho se adaptam às alterações verificadas na
dinâmica da empresa e do ambiente? As alterações do desenho e utilização destes sistemas são
efetuadas de modo proactivo ou reativo?
23. Como é que os sistemas de medição de desempenho se adaptam às alterações verificadas na
dinâmica da parceria? As alterações do desenho e utilização destes sistemas são efetuadas de
modo proactivo ou reativo?
12. Quão robustas e coerentes são as ligações entre os vários componentes do Sistema de Medição
de Desempenho e a forma como estes são usados (tal como descritas nas questões anteriores)?
24. Quão robustas e coerentes são as ligações entre os vários componentes do Sistema de Medição de
Desempenho e a forma como estes são usados (tal como descritas nas 11 questões anteriores)?
3 Valores, políticas e estratégia foram incluídos por nós, não constando da pergunta sugerida por Ferreira e Otley (2009, p 266-267). 4 Idem.