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SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃOSuperintendência da EducaçãoDiretoria de Políticas e Programas EducacionaisPrograma de Desenvolvimento Educacional
A PERSPECTIVA CRÍTICA EM EDUCAÇÃO FÍSICA E A APROPRIAÇÃO CRÍTICA DOS CONTEÚDOS PELO ALUNO: EXPERIÊNCIAS VIVIDAS NA REDE
MUNICIPAL DE ENSINO DE MARINGÁ-PR1
Cleide Maria Pessoa Moreira2
Deiva Mara Delfini Batista Ribeiro3
RESUMOEste estudo objetivou analisar se a ação docente, mediada por uma perspectiva crítica, possibilitou a apreensão crítica dos conteúdos pelos alunos, a partir de experiências pedagógicas realizadas com alunos de 5ª a 8ª séries da Rede Municipal de Ensino de Maringá-PR. Para atender a problematização e os objetivos deste estudo, apoiou-se na pesquisa qualitativa, num prisma de estudo descritivo, de enfoque interpretativo (MINAYO, 1994). Por ser uma situação pedagógica realizada pela pesquisadora nos anos de 2002 a 2005 elegemos o questionário como instrumento de coleta de informações, com questões abertas e fechadas, aplicados a 25 sujeitos. Os dados obtidos foram interpretados, analisados e permitiram identificar que a ação pedagógica crítica da pesquisadora promoveu a apreensão crítica do conteúdo pelos alunos, influindo na sua visão de educação física como prática social, contribuindo assim com a formação destes sujeitos históricos e críticos.
Palavras-chave: Ação docente. Crítico-superadora. Cultura corporal.
RESUMENEste estúdio objetivo analisar si La acción docente, mediada por uma perspectiva crítica, há posibilitado La asimilasión crítica de los contenidos por los alumnos, a partir de las experiencias pedagogicas realizadas com El alumnado de 5ª a 8ª series de La Rede Municipal de Ensino de Maringá-PR. Para atender la problematización y los objetivos de este estúdio, se ha apoiado em uma investigación culitativa, em um prisma de estúdio descriptivo, de enfoque interpretativo (MINAYO, 1994). Por ser uma situación pedagogica realizada por la investigadora em los años 2002 a 2005 elegimos El cuestionario como instrumento de coleta de informaciones, com cuestiones abiertas y cerradas, aplicadas a 25 sujeitos. Los datos obtenidos fueron interpretados, analisados y permitieron identificar que la acción pedagogica critica de la investigadora há promovido la asimilasión critica del contenido por los alumnos, influyendo en la visión de educación fisica como practica social, contribuyendo así com la formación de estes sujeitos historicos y críticos.
Palabras-chave: Acción docente. Critico-superadora. Cultura corporal
1 Artigo apresentado para conclusão do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) turma 2007 da Secretaria de Educação do Estado do Paraná em Dezembro de 2008.2 Professora da Rede Mun. Est. de Maringá. Pós graduada em Educação Física.3 Professora Mestre Orientadora da Universidade Estadual de Maringá - DEF/UEM
2
INTRODUÇÃO
A educação brasileira sempre esteve atrelada ao sistema econômico, político e
submetida às imposições do capital.
Na contemporaneidade ela passou por momentos reflexivo-críticos importantes na
valoração do ser humano, mais precisamente na década de 80 que foi bastante
significativa, marcada por lutas e movimentos reivindicatórios abrangendo a sociedade
civil e, no campo da educação, pela reorganização institucional. Foi um período rico de
idéias e criações de entidades de envolvimento acadêmico, resultando, principalmente na
década de 90, em produções de reflexos qualitativos na área educacional.
Buffa; Nosella (2001) apontam a contribuição de Paulo Freire aos educadores
como sugestão de atuação que, mesmo diante dos limites e desalentos impostos pelos
governos, não ficassem inertes, parados. A frase de Freire (s/d apud BUFFA; NOSELLA,
2001, p. 173) “Cruzar os braços, hoje, é a melhor forma que se tem de prejudicar a
modificação radical amanhã”, sintetiza o sonho de luta e gosto pela liberdade que deve
ser o objetivo de todas as escolas e de cada professor no seu ambiente de trabalho.
Os autores consideram que os educadores se questionam sobre o debate
educacional, que, para muitos fica num movimento oscilatório sem sentido e para alguns,
a expectativa de ainda haver a possibilidade da organização de um sistema educacional
equilibrado, democrático em uma sociedade de iguais. Salientam, também, que apesar de
fatos envolvendo a educação parecerem reproduzir situações do passado, destacam que
muitos outros elementos novos foram criados, principalmente a organização política de
reivindicação do conjunto dos educadores (associações e entidades) que ao se
interligarem politicamente superam o corporativismo estreito. Essa relação de apoio
mútuo fornece um processo político de organização aos educadores e trabalhadores em
geral.
Para compreender o fenômeno social da educação brasileira faz-se necessário
localizar a formação da sociedade brasileira e como este fenômeno se processa. Uma
sociedade organizada nos moldes do sistema capitalista, refletindo interesses internos e
externos. Esta sociedade nasce como financiadora e distribuidora de mercadoria
brasileira. No entanto, não acompanha os processos ocorridos na Europa, onde o
processo econômico liberal e a concorrência aconteciam. No Brasil o processo se dá de
3
maneira a privilegiar os que produziam e os que tinham a propriedade dos meios de
produção e dos bens produzidos. Os indivíduos que não se enquadrassem nessa classe
eram servidores públicos ou compunham os marginalizados do sistema (XAVIER, 1994).
Dessa forma, no âmbito educacional, as pedagogias refletiam o contexto histórico,
político, social, econômico de suas épocas.
A necessidade de superação dos limites impostos pelas pedagogias educacionais
existentes era inevitável. Estas teorias pedagógicas iam surgindo em determinado período
da história para dar sustentabilidade à sociedade vigente como suporte para
implementação de programas assistenciais dos governos, leis de reforma do ensino,
decretos etc. “Daí a tendência a secundarizar a escola, esvaziando-a de sua função
específica que se liga à socialização do saber elaborado, convertendo-a numa agência de
assistência social destinada a atenuar as ações da sociedade capitalista” (SAVIANI, 2003,
p. 99).
O autor situa as tendências como sendo as não críticas (tradicional, escola novista
e tecnicista) e as teorias crítico-reprodutivistas (a escola como aparelho ideológico do
estado, a reprodução-violência simbólica e escola dualista). As primeiras teorias são
capazes de fazer a crítica e explicar o mecanismo do existente, mas não têm proposta de
intervenção pedagógica, é ahistórica e a sua pratica pedagógica situa-se na reprodução
das relações de produção.
A pedagogia crítico-social dos conteúdos defendida pelo Professor José Carlos
Libâneo (1987), também fez parte dos pensadores que buscavam reflexivamente
alternativas de mudança para o sistema educacional brasileiro. A pedagogia histórico-
crítica, anteriormente denominada pedagogia crítico-social dos conteúdos, apropria-se
dos conceitos de Marx, Gramsci, dentre outros autores desta mesma linha, tendo como
elaborador o Professor Demerval Saviani (1988), objetivando as transformações das
relações sociais, pautada na historicização e na dialética. Faz opção em prol da classe
trabalhadora e a sistematização do conhecimento para a sua aprendizagem, ou seja,
sistematização dos métodos e processos de ensino. Nessa pedagogia cabe ao professor
organizar sistematicamente o conhecimento para que o educando tenha a possibilidade
de se apropriar dos conteúdos historicamente elaborado pela humanidade.
A educação na perspectiva da formação do homem deve levá-lo ao encontro de
seus caminhos de vida, onde seja capaz de conquistar a sua subsistência, sempre
avançando sua história, procurando sempre melhorar o que foi conquistado
4
anteriormente. Pensar educação, então, implica lançar olhares para a base produtiva,
dentro do sistema, como ele se organiza e reorganiza em função do capital, ponderando
as suas contradições.
Na produção das políticas educacionais tem-se que considerar, à luz da história, a
estrutura de acumulação e suas diferentes formas de manifestação e conseqüências, bem
como o contexto em que elas estão inseridas.
A partir das discussões da educação como um todo, a educação física enquanto
prática social e pedagógica também tem sido requisitada para contribuir no processo
educacional.
Para Andrade Filho (2001, p. 35), historicamente a Educação Física e a cultura de
formação profissional “continua apontando mais para uma atenção e uma tradição
instrumentalizadora, do que para rupturas formativo-culturais idealizadas”.
A literatura, na área, tem assinalado esse comprometimento tanto em relação aos
objetivos sociais quanto na promoção de conhecimentos científicos. Senão vejamos: Nos
anos 30, a Educação Física se apresenta marcada pelo corpo higiênico/eugênico,
caracterizado pelo fortalecimento da raça e defesa da pátria (CASTELLANI FILHO, 1988).
Os anos 40, 50 e 60 apontam para o paradigma esportivista (aptidão física e
rendimento esportivo) e biologicista que, sob a influência da tendência tecnicista volta-se
para um projeto de ordenamento e hierarquização da sociedade (SOARES et al, 1992).
Nos anos 70, a pedagogia tecnicista se consolida no esporte enquanto conteúdo
hegemônico da educação física escolar, respaldada pela Lei da Reforma da Escola nº
5692/71e pelo Decreto-Lei 69450/71 que determinavam sua obrigatoriedade.
Ainda nos anos 70 e adentrando nos 80, a educação física passa por um momento
de repensar a sua identidade buscando construir outros referenciais teóricos, ampliando a
sua visão de homem enquanto ser social e histórico, geradas pelo contexto de fim da
ditadura militar e a retomada da democratização no país.
Nos anos 90, a produção teórica em Educação Física dá um salto qualitativo, a
partir da compreensão da mesma no âmbito das Ciências Humanas e Sociais, trazendo à
tona seu caráter educativo, de intervenção social, de investigação.
As críticas dirigiram-se ao seu caráter fortemente instrumental, própria da
racionalidade técnica que levara a visão de uma Educação Física essencialmente prática
na escola e não como disciplina curricular.
5
Dessa forma, se manifestava de maneira ingênua, acrítica e apolítica (CARMO,
1992, MEDINA, 1983), fundamentada na legalidade e não na legitimidade que a
sustentaria na escola (BRACHT, 1992). Castellani Filho (1992) apresentando falta de
preocupação com o projeto político pedagógico e curricular (SOARES, et al, 1992;
CAPARROZ, 1999), e com o desenvolvimento de políticas públicas que tivessem como
base a formação humana (TAFFAREL, 1993), autores citados por (RIBEIRO, 2003).
Esta produção teórica fazia um chamamento para a necessidade de considerar a
Educação Física como prática social e pedagógica evidenciada nas diferentes tendências
pedagógicas críticas da Educação Física, e apontaram para pensar sobre sua intervenção
educativa buscando uma sólida formação teórica e um compromisso social do profissional
na busca de uma formação mais humana e solidária, que realmente promovesse o
homem (RIBEIRO, 2003).
Dentre estas tendências progressistas, críticas, podemos citar, segundo Ribeiro
(2003) a crítico emancipatória e crítico-superadora (KUNZ, 1991, 1994; SOARES et al.
1992; SOARES; ESCOBAR, 1992; TAFFAREL, 1997). Além dessas, foram evidenciadas
as abordagens fenomenológica (SANTIN, 1987; MOREIRA, 1991; PICCOLO, 1993); a
sociológica (BRACHT, 1986, 1989; BETTI, 1991); a cultural (DAOLIO, 1995), a
Metodologia do ensino aberto (HILDEBRANDT, 1986) entre outras, e que se fazem
presentes na atualidade por meio de debates acadêmicos, programas de pós-graduação,
congressos nacionais e internacionais e publicações na área.
Nestas diferentes abordagens, as preocupações teórico-metodológicas para o trato
com o conhecimento, a sistematização e organização do processo de trabalho
pedagógico, objetivo e processo ensino-aprendizagem se fazem presentes, de uma forma
ou de outra e se concretizaram na reforma curricular proposta em 1987 (Resolução 03/87
– CFE) e implementadas em 1990 nos cursos brasileiros de graduação (RIBEIRO, 2003).
No Estado do Paraná esses pressupostos estavam presentes no Currículo Básico
das Escolas Públicas do Paraná de 1990, fundamentado na pedagogia Histórico-Crítica
para resgatar o compromisso social da EF na escola, numa perspectiva progressista e
crítica, a partir da teoria do materialismo histórico-dialético e com o objetivo de ser uma
proposta avançada preocupada com uma formação humana do aluno. Tinha como objeto
de estudo o corpo em movimento.
Para as Diretrizes Curriculares de Educação Física para os anos finais do Ensino
Fundamental e Médio (2008), a proposta se preocupou em valorizar a cultura histórica
6
dos povos e as características regionais, relativas à dança, à ginástica, aos esportes e
aos jogos. Destacou a função social da Educação Física e possibilitou concretizar um
novo entendimento ao movimento humano como prática social e seu relacionamento com
o mundo.
A par das críticas que sofreu e da dificuldade de implementação, talvez até pelo
contexto histórico, esse período se entrelaça com a minha própria história como
profissional docente. Formada no curso de Educação Física da Universidade Estadual de
Maringá (UEM) em 1978, venho atuando desde então no ensino fundamental e médio das
escolas municipais e estaduais.
Considero importante situar o período da minha formação para evidenciar a
formação tecnicista, com base na racionalidade técnica que permeou minha formação
inicial e que se manifestou em um primeiro momento no meu fazer pedagógico.
Como educadora, preocupada com os novos rumos da Educação Física Escolar,
senti-me compromissada no sentido de buscar as bases para a minha prática pedagógica
para que a mesma fosse mais crítica, com um novo olhar sobre a função social da escola
e da Educação Física. De forma que pudesse intervir na realidade para transformá-la, o
trato com os conteúdos e a apreensão do conhecimento mais crítico por parte dos alunos.
Dessa forma, procurei subsidiar minha ação docente, embora sem tanta clareza, a
partir da obra Metodologia do Ensino da Educação Física, proposta por um coletivo de
autores (SOARES, et al., 1992), pela convergência entre seus postulados e a pedagogia
histórico-crítica presente no Currículo Básico da Escola Pública do Paraná (1990).
Embora não tenha seguido na íntegra a proposição desta metodologia, procurei
alicerçar minha prática pedagógica buscando esse entendimento.
Nesse período (2002 a 2005) eu estava trabalhando na rede municipal e estadual
(nas 5ªs, 6ªs, 7ªs e 8ªs séries do ensino fundamental na escola municipal Profª Nadyr Maria
Alegretti e 4ªs, 5ªs, 6ªs, 7ª e 1º ano do Ensino Fundamental e Médio no Colégio Estadual
Duque de Caxias e optei em realizar este trabalho com a escola municipal por oferecer
melhor condição de trabalho, apoio da escola, material didático, espaço físico e por
conseguir acompanhar pedagogicamente a maioria dos alunos da 5ª a 8ª séries). Procurei
abordar os conteúdos da dança, da ginástica, dos jogos, dos esportes, da mímica e das
lutas de forma diferenciada, conforme a referida proposta.
Essas experiências foram riquíssimas, resultando em diferentes
experiências/trabalhos desenvolvidos com estes alunos tais como: movimento circense,
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construção de jogos e brincadeiras, relação do esporte com o jogo e a sociedade na qual
vivemos, manifestação do movimento negro na dança e na capoeira, a dança no Paraná
vivida pelo homem branco. Esses temas foram contextualizados, organizados no
processo das reflexões e produções textual e corporal que foram expostos e
apresentados à comunidade escolar.
No entanto, se empiricamente eu podia perceber avanços no trato do
conhecimento dos temas da cultura corporal de forma sistematizada, eu já não tinha os
parâmetros necessários para uma análise mais aprofundada.
Nesse sentido, o PDE (Projeto de Desenvolvimento Educacional) tem oportunizado
esse momento para teorizar minha própria prática pedagógica, ou seja, pesquisar essa
prática a partir das experiências vividas em meu lócus de trabalho.
Dessa forma, justifica-se minha proposta de estudo materializada na seguinte
questão norteadora: o trabalho pedagógico em uma perspectiva crítica possibilita a
apreensão crítica dos conteúdos pelos alunos?
Diante dessas considerações elegemos como objetivo central deste estudo analisar
se a ação docente, mediada por uma perspectiva crítica, possibilita a apreensão crítica
dos conteúdos pelos alunos, a partir de experiências pedagógicas realizadas com alunos
de 5ª a 8ª séries da Rede municipal de ensino de Maringá -Pr. Especificamente,
pretendemos: identificar e compreender, dentre algumas tendências críticas na Educação
Física, as possibilidades metodológicas que possibilitam a apreensão crítica dos
conteúdos pelos alunos; apresentar as experiências pedagógicas desenvolvidas com o
grupo participante deste estudo (alunos), evidenciando a abordagem crítica dos
conteúdos e detectar e analisar se as experiências pedagógicas realizadas possibilitaram
a apreensão crítica dos conteúdos da Educação Física.
Para atender a problematização e os objetivos deste estudo nos apoiamos na
pesquisa qualitativa, num prisma de estudo descritivo, de enfoque interpretativo (MINAYO,
1994).
Triviños (1987) mostra que nessa abordagem, o fenômeno social é explicado num
processo dialético, tendo como base o real, o concreto. É analisado na sua aparência e
na sua profundidade para instituir o objeto em si, pelo conjunto de suas propriedades e
não qualquer objeto, e nesse processo, a compreensão se dá na sua totalidade. Faz parte
das ciências sociais, se preocupa com um nível de realidade que não pode ser
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quantificada e aprofunda-se no mundo dos significados das ações e relações humanas
(MINAYO, 1994).
Por centrar-se em uma situação educativa, envolvendo alunos que participaram
das experiências pedagógicas realizadas pela pesquisadora em uma escola municipal de
Maringá-PR, elegemos o questionário como instrumento de coleta de informações, com
questões abertas e fechadas e estruturadas de tal forma que a pesquisadora possa
interpretá-las e encontrar respostas para sua questão inicial. Adotamos como critério de
escolha a referida escola, pelo fato do meu retorno à mesma como professora e pela
possibilidade de acesso a esses ex-alunos (meus alunos de 2002 a 2005), sujeitos da
pesquisa.
Participaram do estudo 25 alunos, de ambos os sexos, que estão agora cursando o
ensino médio e foram localizados por intermédio da escola e da pesquisadora.
Após aproximação, estes sujeitos foram informados sobre a pesquisa e receberam
o termo de consentimento que foi respondido e assinado.
O questionário está composto por oito questões elaboradas a partir dos objetivos
deste estudo e foi aplicado pela própria pesquisadora.
Negrine (in MOLINA NETO; TRIVIÑOS, 1999) sugere que, para garantir uma certa
coerência interna do estudo, sejam definidas algumas categorias prévias de análise.
Nesse sentido, procuraremos organizar os dados por meio das seguintes categorias; a)
identificação dos participantes; b) entendimento dos alunos acerca dos conteúdos de que
trata a Educação Física na escola, a partir das experiências vividas por eles e; c)
apreensão crítica dos conteúdos pelos mesmos.
A ABORDAGEM CRÍTICO-SUPERADORA E AS DIRETRIZES CURRICULARES DO PARANÁ: parâmetros para uma educação física crítica e transformadora
A obra Metodologia do Ensino de Educação Física (SOARES, et al., 1992) objetiva
auxiliar os professores e acadêmicos vinculados à área escolar, nos aprofundamentos
teóricos da Educação Física, enquanto disciplina e campo de trabalho voltado a uma
prática docente comprometida com um processo de transformação da sociedade.
Por ser uma pedagogia que emerge da necessidade de superação das tendências
que a precede, tidas como não críticas, é que vem esta concepção com proposta crítica
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cognominada de crítico-superadora, fundamentada no materialismo histórico dialético.
Nesse rumo, Soares, et al., (1992) apresenta algumas características específicas:
‘diagnóstica’ por constatar a leitura dos dados da realidade e interpretá-los numa visão
crítica de sociedade. ‘Judicativa’ por formar juízo crítico com ética representando os
interesses de uma determinada classe social. ‘Teleológica’ por determinar um fim a se
chegar, dependendo dos dados da realidade que foram diagnosticados e julgados.
Esta proposta considera que a Educação Física é uma prática pedagógica que, no
espaço escolar tematiza as várias formas de atividades expressivas manifestadas pelo
corpo: o jogo, a dança, o esporte, a ginástica e outros temas. A escola onde não se
desenvolve o conhecimento científico, mas, se apropria dele por meio de um trato
metodológico que na dinâmica da sala de aula se materializa através de uma organização
intencional, que possibilita ao educando a apreensão desse conhecimento entrelaçado
por reflexões de sua prática social. Soares (et al, 1992, p. 19) conceitua que:
A metodologia aqui é entendida como uma das formas de apreensão do conhecimento específico da educação física, tratado a partir de uma visão de totalidade, onde sempre está presente o singular de cada tema da cultura corporal e o geral que é a expressão corporal como linguagem social e historicamente construída.
O currículo escolar, por sua vez, é o caminho desse homem no processo para
apreensão do conhecimento científico e está vinculado ao referido projeto, tendo como
função ordenar pedagogicamente a reflexão do educando sobre o conhecimento
científico, comparando com a realidade do seu cotidiano e com a lógica de pensamento.
Ele vai se efetivar na escola “pela ação docente que sistematiza as explicações
pedagógicas a partir do desenvolvimento simultâneo de uma lógica, de uma pedagogia e
da apresentação de um conhecimento científico” (SOARES, et al, 1992, p. 28).
Esse currículo, para dar conta de uma reflexão pedagógica ampla com condição de
se realizar a leitura da realidade comprometida com os interesses da classe trabalhadora,
precisa ter como referência os eixos norteadores, aqui indicados pelos autores desta
obra, como sendo: a constatação, a interpretação, a compreensão e a explicação da
realidade da sociedade e suas contradições. Para isso ocorrer, uma nova organização
curricular se faz necessária, buscando o desenvolvimento do processo numa lógica
dialética (movimento da história) sendo contemplado no seu interior o objeto de estudo, a
função social de cada disciplina e a sua contribuição para explicar a realidade social ao
nível de entendimento do aluno. Cada disciplina apresenta a sua especificidade, uma
particularidade da realidade e não a totalidade.
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O entendimento de totalidade, que está ligado à lógica dialética só se dá quando o
objetivo de estudo das várias disciplinas, pedagogicamente, se articulam na escola para
explicar a realidade social, a esse processo é chamado pelo coletivo de autores (1992) de
currículo ampliado, que, numa forma de organização da escola se tem o tempo e o
espaço necessários para a aprendizagem acontecer.
O conhecimento (conteúdo) nesta perspectiva surge da cultura historicamente
produzida pela humanidade e está vinculado a uma lógica dialética de pensamento que
delineará condições para a seleção, organização e sistematização dos referidos
conteúdos como constituinte curricular, mas, se faz necessário considerar alguns
princípios curriculares, como: a relevância social do conteúdo - o seu sentido e
significado; a contemporaneidade do conteúdo – garantir a informação da atualidade; a
adequação às possibilidades sócio-cognitivas do educando – adequar os conteúdos ao
nível de reflexão do educando; simultaneidade dos conteúdos enquanto dados da
realidade – os conteúdos são organizados e apresentados ao educando de forma
simultânea e espiralada, ou seja, pelo avanço da apropriação do conhecimento e não por
série; e a provisoriedade do conhecimento – romper com a terminalidade e enfatizar a
historicidade.
Os autores desta obra sugerem a aprendizagem por ciclos por entenderem a
simultaneidade no trato com conhecimento, possibilitando maiores referências que vão
ampliando o pensamento do educando de forma espiralada. Nesse processo, o educando
pode trabalhar com diferentes ciclos ao mesmo tempo, pois não são organizados por
etapa.
A avaliação na pedagogia crítico-superadora está atrelada dialeticamente ao
projeto pedagógico escolar, assim como, a tudo que a escola se apodera, modifica e
reproduz. Ela desempenha um papel primordial no processo ensino-aprendizagem, como
elemento metodológico complexo que compõe a prática pedagógica no cotidiano dos
docentes e educandos. Possui um caráter ‘formal’ – explicitado e assumido pela escola e
um outro ‘não formal’- aparecendo no trato, atitudes do docente com relação ao
entendimento sobre o conhecimento, valores e destrezas do educando.
Essa compreensão permite considerar o aluno como sujeito histórico, imerso em
uma realidade dinâmica e complexa e que, portanto, não pode ser submetido somente às
leis biológicas mas também social e histórica.
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Por este prisma, os anos 2003-2006 pode ser considerado um período importante
para a educação estadual do Paraná. A Secretaria de Estado da Educação – (SEED)
estabeleceu como prioridade a retomada da discussão coletiva do currículo.
A idéia de construção curricular da SEED era uma intervenção a partir do que está
sendo vivido, pensado e realizado nas escolas estaduais. Dessa forma, o processo para a
reformulação curricular se deu com seminários, discussões, cursos, encontros
envolvendo, coletivamente, os profissionais da educação da rede estadual de ensino,
núcleos regionais e SEED, assessorados por professores das instituições de ensino
superior. Foi um longo período de estudos, pesquisas, formulação das diretrizes e
reformulação até chegarem, em 2005, nas escolas.
Essas diretrizes propõem que, para a Educação Básica, a Educação Física vise à
superação do homem fragmentado e inclua a reflexão como proposta necessária ao
ensino. Buscando fundamentação teórica no materialismo histórico-dialético, traz em seus
princípios profunda reflexão e crítica a respeito das estruturas sociais e suas
desigualdades.
Nessa proposta, as Diretrizes Curriculares de Educação Física para a Educação
Básica (2007) sugerem que a Educação Física se relacione com outras disciplinas,
interdisciplinarmente, sob uma abordagem biológica, antropológica, sociológica,
psicológica, filosófica e política, devendo ser articulada ao projeto político-pedagógico da
escola, como parte do projeto geral de escolarização.
A Educação Física, nas diretrizes, é considerada mais abrangente e tem o trabalho
como categoria fundante pela constituição da materialidade corpórea do homem e sua
relação com a natureza. Por isso, este conhecimento na escola precisa ser compreendido
num contexto mais amplo, observando as interações que se estabelecem nas relações
sociais, políticas, econômicas e culturais dos povos.
Diante disso, se torna importante que o docente, na sua prática pedagógica,
perceba e reconheça a influência que o modo de produção capitalista exerce sobre o
pensar, agir dos corpos havendo, então, a necessidade da reflexão como forma de
intervenção.
Os conteúdos da disciplina são historicamente construídos pela relação dos
homens em sociedade e que sempre estiveram a mercê de pedagogias vinculadas às
relações de poder, por isso precisam ser tratados de forma crítica para ir além daquilo que
se apresentam.
12
Pelo posicionamento político-pedagógico das Diretrizes Curriculares, ela aponta a
cultura corporal como objeto de ensino da Educação Física para a educação básica,
confirmando a relação que existe entre a história do homem, o trabalho e as práticas
corporais que daí resultam.
A Educação Física, pedagogicamente, deve agir de maneira a instigar a reflexão
sobre essa produção histórica do homem no mundo, explicitada por meio da expressão
do corpo nos jogos e brincadeiras, nas danças, nas lutas, nas ginásticas e nos esportes.
Esse agir na Educação Física, as Diretrizes Curriculares de Educação Física para a
Educação Básica (2007), apontam como desafio ao ensino da disciplina, provocando um
novo sentido às aulas.
A lei nº 9394/96 se refere às Diretrizes e Bases da Educação Nacional que trata de
questões sobre a educação, dentre elas a formação dos profissionais da educação,
explicitando que: “Os sistemas de ensino promoverão a valorização dos profissionais da
educação, assegurando-lhes [...] período reservado a estudos, planejamentos e
valorização, incluído na carga de trabalho” (BRASIL, 1996 apud DOCUMENTO
SÍNTESE– PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL – PDE, 2007, p. 11).
Diante disso, a Secretaria de Estado da Educação implantou no ano de 2007 o
Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE, em parceria com a Secretaria de
Estado da Ciência, Tecnologia, Ensino Superior e com a integração simultânea dos níveis
de ensino: das escolas públicas estaduais (educação básica) e as Instituições do Ensino
Superior. Esse programa é tido como inovador e desafiador para o Sistema Educacional
do Estado, por ter em seu cerne a superação de políticas e programas de formação
continuada que se apresentaram ineficientes, diante dos problemas complexos da
educação básica, principalmente, os relacionados ao acesso, à repetência e à evasão.
O PDE adota os princípios político-pedagógicos apontados pelas Diretrizes
Curriculares para Educação Básica no estado do Paraná, tem como objetivo proporcionar
ao professor, reflexões sobre as diferentes correntes pedagógicas, sua ênfase sobre o
sujeito, objeto ou sobre a relação entre os elementos educativos, como também, o
aperfeiçoamento dos fundamentos pedagógicos e disciplinares de caráter teórico-prático,
a se efetivar na escola por meio do processo ensino-aprendizagem. “Nesse sentido, esse
programa constitui importante estratégia metodológica de implementação e consolidação
das Diretrizes Curriculares para a Educação Básica” (DOCUMENTO SÍNTESE –
PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL – PDE, 2007, p. 17).
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A proposta para o desenvolvimento do trabalho é de forma presencial, nas
Universidades públicas; de forma semi-presencial, com os professores da rede pública
estadual de ensino (com apoio de suportes tecnológico) para a realização da atividade
colaborativa. Toda essa inter-relação objetiva provocar situações para redimensionamento
das práticas educativas, reflexão sobre os currículos das Licenciaturas e a discussão de
outros assuntos pertinentes.
Percebe-se, pelo exposto, que ambas abordagens prevêem uma
educação/educação física pautadas no processo de formação humana, desde que
articulada com o contexto histórico, social, político, cultural, econômico, buscando assim,
a reflexão crítica e autônoma dos alunos, para interferirem na realidade.
A APROPRIAÇÃO CRÍTICA DOS CONTEÚDOS PELOS ALUNOS: experiências vividas
Os 25 sujeitos participantes deste estudo responderam ao questionário, estão
sendo identificados com letras do alfabeto e a análise se deu a partir das categorias
estabelecidas.
Na primeira categoria, identificação dos participantes, foi possível constatar que a
maioria dos sujeitos estudaram nesta escola, pela aproximação de suas residências. Uma
parcela mora em casa própria e a grande maioria reside em casa alugada.
A renda familiar é de até três salários mínimos, advindas do pai e da mãe atuando
no setor econômico terciário (diarista, pedreiro, pintor etc.).
As atividades de lazer, entretenimento e informação provêm da televisão (mais
expressivamente) e depois, a igreja.
Os pais possuem escolaridade correspondente ao ensino fundamental completo e
uma minoria, o ensino médio.
Os sujeitos encontram-se estudando no ensino médio, em escolas estaduais
localizadas nos bairros da cidade. Alguns já ingressaram no mercado de trabalho e estão
contribuindo com a renda familiar.
A escola participante deste estudo, onde os sujeitos estudaram até a 8ª série é
considerada uma das maiores da rede municipal, no espaço físico construído, como
também no número de alunos matriculados (em torno de 700). Possui confortável
refeitório, quadra coberta, ampla biblioteca, sala multiuso, laboratório de informática etc.
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Mesmo morando nas proximidades, muitos alunos dependem de transporte escolar
da prefeitura, haja visto que são filhos de trabalhadores de classe média-baixa.
Isto reflete a sociedade atual, principalmente em países em desenvolvimento como
o Brasil, em que homens e mulheres cumprem longa jornada de trabalho, não cabendo a
esses pais e mães a exclusividade pelos cuidados com os filhos (SOARES, 2004).
A escola, neste sentido, tem sido requisitada como co-participante deste processo
e pode ser considerada como espaço de intervenção social, de experimentação de ações
cotidianas que levam o sujeito a se desenvolver, além da apropriação do conhecimento
historicamente produzido (SOARES, et al., 1992; SAVIANI, 1988; VIGOTSKI, 2007).
Esta escola pública municipal, em particular, possui uma boa infra-estrutura e um
corpo administrativo e pedagógico que nos permite trabalhar com a Educação Física em
uma perspectiva diferenciada. No entanto, esta não é a realidade da maioria das escolas
públicas brasileiras, daí a necessidade de investimentos, tanto material quanto de
formação de professores e reconhecimento da profissão docente.
A segunda categoria, sobre o entendimento dos alunos acerca dos conteúdos de
que trata a Educação Física na escola, a partir das experiências vividas por eles, foram
analisadas a partir de cinco questões: O que significa para você a Educação Física
escolar na sua vida? Quais conteúdos você estudou na disciplina de Educação Física?
Quais os que mais você considerou e por quê? Como a Educação Física, vivenciada por
você, tem ajudado na formação do aluno na escola e fora dela?
Dos 25 sujeitos, (100%) responderam que a EF na escola deve ser tratada como
qualquer outra disciplina, pois ela [...] também faz parte da vida, [...] ela também tem um
conteúdo próprio, [...] ela não significa só jogar bola, [...] apesar de acontecer, grande
parte do tempo, fora da sala de aula ela não é menos importante.
Essas respostas apontam que existe um reconhecimento de que a Educação
Física escolar tem um caráter educativo e de intervenção social. Embora ela aconteça, na
maior parte do tempo, em uma quadra, ou pátio, a questão diz respeito somente ao
espaço e não na forma. Ela é uma prática social e pedagógica e busca, por meio de sua
intervenção pedagógica, uma sólida formação teórica e mais humana que promova o
homem em sua concretude.
Na perspectiva crítico-superadora a Educação Física é uma prática pedagógica
que tematiza atividades expressivas manifestadas no jogo, na dança, na ginástica, no
esporte, nas lutas, entre outros, resultantes de uma cultura corporal historicamente
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produzida e que deve ser aprendida pelo aluno, ou seja, “é a expressão corporal como
linguagem social e historicamente construída” (SOARES, et al., 1992, p. 19).
Cabe à escola promover a apreensão destes conteúdos cientificamente, ordenando
pedagogicamente a reflexão do aluno em confronto com o saber cotidiano.
Para os sujeitos da pesquisa a Educação Física na escola [...] deve abranger toda
a forma de movimentação humana, [...]. Foi importante entender a dança através de
dramatização e apresentações [...] as brincadeiras, jogos coletivos, o esporte fora do
padrão institucionalizado também é conteúdo, [...] para mim era só jogar e um motivo para
sair da sala de aula, agora não, eu entendo diferente.
Ainda é um desafio conquistar a legitimidade no campo pedagógico sob um prisma
mais progressista e crítico. Fora do contexto escolar existe a oferta e o consumo de
práticas corporais instrumentalizadas, no entanto, é na escola que esses conteúdos
devem ser introduzidos e apropriados de forma crítica e reflexiva, preparando os alunos
para não serem meros consumidores, mas também produtores de uma cultura corporal
historicamente situada.
Neste sentido, é de fundamental importância reconhecer o papel do corpo, da
mídia, das diferenças étnico-raciais e de gênero, da ludicidade, da saúde, do lazer, do
mundo do trabalho, entre outros, que são elementos que devem estar articulados aos
temas da cultura corporal, no âmbito escolar, de forma que proporcione, conforme
prescrito nas Diretrizes Curriculares (2007), uma visão de totalidade e uma compreensão
reflexiva das situações do cotidiano que emergem no contexto escolar.
Para os sujeitos participantes, esse olhar diferenciado da EF ultrapassa os muros
escolares, influindo na forma de ver o mundo, por exemplo [...] a ginástica não é só de
academia pra ficar sarado, [...] o esporte (futebol) não pode ser visto só como meio de
subir na vida, [...] a mídia faz a gente querer comprar tênis e roupas de marca para
praticar atividade física, e na verdade não precisa disso.
Por esse prisma, concordamos com Caparroz e Andrade Filho (2004), ao
afirmarem que, para que a Educação Física possa contribuir com a transformação social,
cultural, política, econômica e educativa é necessário que seja uma prática social, com o
espaço das contradições e sínteses evidenciadas nesse processo.
Na terceira categoria que abrange a apreensão crítica dos conteúdos pelos alunos,
estão contempladas as questões: Relembrando as aulas de Educação Física que você
teve de 5ª a 8ª séries, houve alguma mudança na sua forma de ver a mesma? Como a
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professora trabalhava os conteúdos? A partir da experiência vivida, que conteúdos a
Educação Física deve abordar na escola? Para você é importante conhecer os conteúdos
de ensino da Educação Física, desde sua origem?
Objetiva-se pelas respostas que, os 25 (100%) sujeitos apontam que a partir das
experiências vividas na escola (5ª a 8ª séries) houve uma mudança na concepção e
compreensão do papel da Educação Física escolar.
A fala do sujeito “K” sintetiza essa mudança “a Educação Física ultrapassa o
simples dizer de disciplina escolar, é algo muito além disso. Além de nos ensinar, como é
seu dever, nos posiciona diante da sociedade que para nós ainda é um tanto
desconhecida”.
Pode-se inferir que os sujeitos receberam um tratamento pedagógico diferenciado
relacionado à cultura corporal, com significados e sentidos que lhes possibilitam ter
atitudes críticas e criativas em seu convívio social.
Saviani (2003) afirma com muita propriedade que a escola se configura como
privilegiada, em que a dimensão pedagógica subsiste no interior da prática social global, e
que cabe a ela tratar do conhecimento elaborado, do saber sistematizado.
A Educação Física, em sua especificidade, deve ser tão significativa que a “escola
é chamada não a reproduzi-la simplesmente, mas a permitir que o indivíduo se aproprie
dela criticamente [...]. Introduzir os indivíduos no universo da cultura corporal ou de
movimento de forma crítica é tarefa da escola e especificamente da Educação Física”
(BRACHT, 1996, p. 23).
É neste sentido que a Educação Física escolar deve contribuir, pois a visão de
totalidade do aluno se constrói na medida em que ele consegue fazer uma síntese no seu
pensamento, a partir das apropriações de todo conhecimento produzido, mediado pela
ação do professor (SOARES, et al., 1992).
Para o sujeito “J” que “antes detestava a disciplina, não tinha importância para
mim, hoje é fundamental, trago para minha vida”, a Educação Física passou a ser
valorizada a partir da compreensão do aluno acerca dos conteúdos de que trata esta área
do conhecimento, permitindo que ele constate, interprete, compreenda e explique a
realidade social concreta.
Dessa forma, “levar para a vida” significa que se tornou relevante e legítima e que
seu objeto de estudo é fundamental para a reflexão pedagógica do aluno.
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O sujeito “X” corrobora com esta problemática ao dizer “para mim, antes a
Educação Física era só jogar bola, mas aprendi que ela tem muita coisa relacionada e
essa mudança de pensamento e foi muito importante”.
De uma maneira generalizada, ainda percebe-se a educação/educação física
envolvida com os interesses de mercado. Para Medina (1983) os alunos são vítimas de
uma estrutura antiga e perversa de educação, que não tem o comprometimento com uma
educação que dê condições a eles de se tornarem sujeitos de sua própria história, apenas
o que faz é “promover uma instrução que leva suas vítimas, na melhor das hipóteses, a
uma produtividade alienante” (p. 58).
Na perspectiva crítico-superadora, esta problemática pode ser superada quando a
dinâmica curricular, em uma perspectiva dialética e ampliada desenvolve a formação do
sujeito histórico, social, cultural, político etc.
Em relação aos conteúdos vivenciados pelos sujeitos, 23 (92%) responderam que
se lembravam da ginástica, acrobacia, dança, teatro, jogo, esporte, xadrez, ou seja, houve
uma apreensão dos temas da cultura corporal de que trata a educação física na escola, e
não apenas o esporte. Na análise realizada apareceram de maneira consensual os
conceitos como: a importância do trabalho em grupo, a relação feita das reflexões
realizadas nas aulas de educação física para a vida deles (sujeitos pesquisados), o
conhecimento adquirido de maneira prazerosa nas aulas de educação física,
proporcionando um desenvolvimento de consciência crítica da realidade. Podemos
verificar tais considerações na afirmação do sujeito intitulado “K” que diz: “Estudei sobre
esportes, danças, xadrez, entre outros. Porém, entre todos os conteúdos abordados os
que mais me atraíram foram os que tinham contato com outras pessoas, os que
trabalhávamos em grupo. Essas atividades me permitiram compreender uma forma
adequada de me relacionar com outras pessoas sem me intimidar, aprendendo a expor
minha opinião e escutar a opinião dos outros da mesma forma”. Outro depoimento que
nos dá indícios de um crescimento crítico foi o do sujeito “J” que se explicita dizendo: “O
esporte, a ginástica, a dança, os jogos... tudo isso deve ser relacionado de alguma forma
com o mundo de hoje, pois é um meio das pessoas terem conceitos sensatos e isso é
algo precioso”. Já o sujeito “I” se refere aos temas trabalhados nas aulas de educação
física dizendo : “Eu me recordo de vários como: os jogos, os esportes, a dança e o
xadrez. Desses citados anteriormente, o que eu mais considero é o xadrez. Foi uma
época muito prazerosa e eu tive a honra de participar do teatro de xadrez. Todos os
participantes sabiam que aquele teatro era de grande responsabilidade, porque
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estávamos ali diante de várias pessoas não só para tornar aquilo em um grande
espetáculo para o público, mas sim para passar para todos a importância do xadrez. E,
hoje, tenho certeza que alcançamos nosso objetivo”.
Isso nos permite refletir que a prática pedagógica da pesquisadora, apoiada nos
pressupostos da pedagogia crítica-superadora promoveu o salto qualitativo para a
maioria dos alunos.
Embora a escola onde se realizou essa experiência trate os conteúdos das
disciplinas no sistema de seriação, a pesquisadora conseguiu, em parte, suplantar as
dificuldades, apoiando-se em uma teoria pedagógica que subsidiou a direção pedagógica-
didática que são construídas a partir das categorias da prática docente (ALBUQUERQUE,
et al, 2007).
Para os alunos isso representou um diferencial em sua formação. O sujeito “I”
aponta que “todos os temas eram trabalhados, desde a teoria até a prática. Devíamos
saber desde a origem até os dias atuais”.
O sujeito “D” ressalta que “ela preparava sua aula, trazia vídeos, músicas,
explicava, reunia os alunos em debates etc”.
Para o sujeito “L” “era de forma criativa, em que os alunos pudessem interagir e
participar”. O sujeito “F” complementa “ela pedia pesquisa sobre a origem do conteúdo a
ser trabalhado, maquetes, avaliações, trabalhos escritos, apresentações em grupo”.
Conhecer os conteúdos da cultura corporal desde sua gênese, compreendendo
seus nexos, caracteriza uma operação mental, em que se toma consciência da atividade
teórica, exigindo a reconstrução desta para atingir a expressão discursiva e daí a leitura
teórica da realidade. Essa fase, segundo Soares (et al, 1992) é denominada de ciclo de
ampliação da sistematização do conhecimento e o salto qualitativo é dado quando o aluno
reorganiza a identificação dos dados da realidade, através do pensamento teórico, que é
propriedade da teoria.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir dos objetivos deste estudo e das análises realizadas podemos inferir que a
ação docente, mediada por uma perspectiva crítica, pode realmente possibilitar a
apreensão crítica dos conteúdos pelos alunos.
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No entanto, cabe ressaltar que este processo não é fácil, haja vista que a cultura
escolar está pautada ainda em um modelo de racionalidade técnica e instrumental que
dificultam o trabalho em uma perspectiva diferenciada. Soma-se a isto, a dificuldade que o
professor tem em relação ao tempo e espaço de preparação de aulas, estudos coletivos e
compartilhados e, muitas vezes, as carências materiais.
Parte dessa problemática pode ser suavizada com as novas Diretrizes para a
escola pública paranaense, no sentido de fornecer o suporte teórico-metodológico
necessário para as mudanças que se fazem presentes na educação.
Em relação ao professor, cabe-lhe reconhecer que é um sujeito participante e
atuante neste processo. A perspectiva crítico-superadora, nesse sentido, faz o
chamamento preconizando sua definição por um projeto político-pedagógico que
realmente promova a formação sólida e humana do aluno, ou seja, o compromisso social
do educador para as transformações necessárias.
A perspectiva dialética contribuiu no trilhar deste trabalho pois, embora sem muita
compreensão da base epistemológica, procurei abordar os conteúdos de forma
diagnóstica, judicativa e teleológica, contextualizando histórica-cultural e socialmente os
mesmos.
A apreensão dos conteúdos pelos alunos, evidenciados neste estudo, apontam
que, em sua maioria, houve reflexões críticas acerca dos mesmos. Ainda que de forma
ora fragmentada, ora articulada, a estratégia de interação promoveu mudanças na ótica
dos alunos, ou seja, a mediação do professor foi fundamental para o aluno sair do senso
comum para um saber mais elaborado.
Isto remete à necessidade de sistematizar o conhecimento e desenvolver ações
pedagógicas que, na dinâmica da aula, se materializa por meio de uma organização
intencional, possibilitando ao aluno a apreensão deste conhecimento entrelaçado à sua
prática social.
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AGRADECIMENTOS
Infinitamente grata a JESUS CRISTO por ter-me capacitado e permitido que eu chegasse até o final desta etapa de estudos, para a conquista de novos conhecimentos.
Agradeço, em especial, à minha orientadora, Deiva Mara D. Batista, pela competência e amizade; carinhosamente aos professores do curso de Educação Física da UEM, engajados com a luta por uma educação física escolar comprometida com uma visão humanista de homem, e à minha família, pela paciência, apoio e carinhoso incentivo.