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RESUMOS APRESENTADOS DURANTE A “SEMANA DO ANO INTERNACIONAL DO PLANETA TERRA” 18 A 21 DE JUNHO DE 2008 REALIZAÇÃO INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS E CIÊNCIAS EXATAS DA UNESP APOIO SERVIÇO GEOLÓGICO DO BRASIL (CPRM) INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS DA USP INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS DA UNICAMP

“SEMANA DO ANO INTERNACIONAL DO PLANETA TERRA” · a biota). Este ciclo de materiais é conhecido como ciclo biogeoquímico. O ciclo biogeoquimico do carbono está intimamente

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RESUMOS APRESENTADOS DURANTE A

“SEMANA DO ANO INTERNACIONAL DO PLANETA TERRA”

18 A 21 DE JUNHO DE 2008

REALIZAÇÃO

INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS E CIÊNCIAS EXATAS DA UNESP

APOIO

SERVIÇO GEOLÓGICO DO BRASIL (CPRM)

INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS DA USP

INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS DA UNICAMP

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RADIOATIVIDADE E SAÚDE

Daniel Marcos BONOTTO

Departamento de Petrologia e Metalogenia, Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista, Campusde Rio Claro. Avenida 24 -A, 1515 – Bela Vista. CEP 13506-900. Rio Claro, SP. Endereço eletrônico: [email protected]

Durante toda a história da vida na Terra, osorganismos têm sido expostos a fontes naturais deradioatividade, estando, porisso, geralmente aptos atolerar certos níveis de atividade, sem conseqüênciasprejudiciais. Citam-se, por exemplo, os raios cósmicos,também conhecidos como radiação galáctica, deorigem extra-terrestre (sol e Via Láctea) e consistindoprincipalmente de prótons de alta energia (cerca de85%), partículas alfa (cerca de 14%) e núcleos atômicosmais pesados (cerca de 1%); quando a interação coma Terra é pequena são designados de primários, casocontrário, de secundários, consistindo, nessa situação,de partículas sub-atômicas como píons, múons, elétronsetc., resultantes da interação com a atmosfera. Dessainteração, muitos radionuclídeos são gerados naestratosfera ou troposfera como o 3H e o 14C, ambosextensivamente utilizados em hidrologia, sobretudo, paraa datação de águas subterrâneas, onde o primeiro(meia-vida de 12,26 anos) é utilizado para estabelecerse a origem é recente, e o segundo (meia-vida de 5.730anos) numa escala de tempo de até 40.000 anos atrás.

Além dos radionuclídeos cosmogênicos, contri-buem como fonte natural de radioatividade elementosque estão presentes na Terra desde a sua formação acerca de 4500 milhões de anos atrás, inserindo-se nessecontexto apenas aqueles que possuem isótoposradioativos cuja meia-vida é suficientemente longa parapermitir que a atividade permaneça existindo mesmonos dias de hoje. Os mais importantes destes elementosprimordiais são o urânio, tório e potássio, que são litófilose se concentram preferencialmente nas rochas ígneasácidas ao invés das básicas e ultrabásicas.

A descoberta do urânio ocorreu em 1789 quandoo químico analítico M. H. Klaproth estudavapechblenda, tendo o novo elemento sido inicialmentedesignado de uranit em homenagem ao planeta Uranuse depois uranium. Contudo, foi somente após 1896com a descoberta da radioatividade por Becquerel quese tornou possível averiguar que esse elemento éprogenitor de outros igualmente radioativos, como ouranium II identificado por McCoy e Ross em 1907,ou a emanation, sob a forma gasosa, bastante utilizadapor Rutherford em seus experimentos. Hoje, sabe-seque aquelas designações correspondem ao 238U, 234U

e 222Rn e que quando Agricola em 1556 considerouque a morte de muitos mineiros na Europa estavarelacionada com o fato de que o “ar pernicioso queeles respiram algumas vezes apodrece os seuspulmões”, não é possível ignorar a responsabilidadeda contribuição do gás 222Rn naquele episódio. Nesteinício de século XXI, a questão da radioatividade e suasimplicações assumiu outras proporções, face à proble-mática introduzida pela necessidade de disposiçãosegura de resíduos radioativos, de maneira que todoconhecimento básico gerado para melhor compreendera mobilização dos radioelementos no ambiente é deimportância atual.

A abundância crustal média do urânio correspondea 2,5 µg/g, possuindo esse elemento dois isótoposprimários, o 238U e o 235U, os quais ocorrem atualmentena proporção de 99,3% de 238U para 0,7% de 235U.Apesar de que o 235U é o isótopo físsil que forma abase de produção de energia nuclear, sendo, por isso,extremamente importante do ponto de vista tecnológico,verifica-se que a sua contribuição como fonte naturalde radioatividade é pequena, pois, a atividade específicado 238U é cerca de 20 vezes maior que a do 235U. O238U e 235U são geradores de séries de decaimentoradioativo, possuindo o 238U um número maior deprodutos de decaimento, muitos dos quais de longa meia-vida. O tório possui apenas um isótopo primordial, o232Th, contudo, ele é aproximadamente quatro vezesmais abundante que o urânio nas rochas crustais; essenuclídeo também gera uma série de decaimentoradioativo, a qual é relativamente simples quandocomparada com a do 238U. O nível médio de potássionas rochas crustais corresponde a cerca de 2,5%,porém, dos três isótopos de ocorrência natural, isto é,39K, 40K e 41K, apenas o 40K é radioativo. Asrespectivas abundâncias isotópicas são 93,08, 0,012 e6,9%, decaindo o 40K por emissão β- para 40Ca e porcaptura eletrônica para 40Ar.

O advento da tecnologia nuclear trouxe bene-fícios, sobretudo, para sociedades que a empregam parasuprir suas necessidades energéticas, porém, assimcomo outras atividades relacionadas com a indus-trialização, introduziu novos problemas, como porexemplo, a exposição dos organismos a fontes artificiais

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de radiação, além das naturais, o que tem suscitadoatenção cada vez mais crescente nas iniciativas deproteção radiológica, pois, aumentou a possibilidade deocorrência dos danos relacionados com a suscepti-bilidade à radiação como doença, morte ou mutaçãogenética. Relacionado com este aspecto, cita-se apreocupação dos países que empregam a tecnologianuclear com a disposição segura dos rejeitos radio-ativos, potencialmente perigosos, provenientes do ciclodo combustível nuclear e dos sistemas de processa-mento. As meias-vidas relativamente longas de algunsradionuclídeos presentes neste material, bem como aalta atividade e toxicidade química fazem com que aquestão assuma uma importância crucial tanto para ageração atual quanto futura.

Dessa forma, verifica-se que, além dos aspectoshidrológicos da possível área de disposição de rejeitosradioativos, é necessário conhecer como as litologiascaracterísticas do local podem absorver/adsorver osradionuclídeos transportados, estabelecer a sua compo-sição mineralógica e química, desde que o próprioambiente geológico pode atuar como uma barreiraquímica. Ainda, como a maioria das rochas permite apassagem de água durante longos períodos de tempo,a barreira química que elas possam apresentar torna-se mais importante que qualquer barreira física quevenham a oferecer numa escala de tempo de curtaduração. Assim, um novo enfoque passou a ser exigidoda hidrogeologia, a qual, ao invés de dirigir o interessesobretudo para os aqüíferos, isto é, rochas com altaporosidade e permeabilidade que as tornampotencialmente adequadas como armazenadoras deágua, tornou-se impelida a realizar pesquisas siste-máticas com os aqüicludes, ou seja, as rochas compermeabilidade muito baixa, capazes de confinar osaqüíferos; portanto, como a barreira física circundandoqualquer repositório necessita possuir uma altaintegridade, os aqüíferos precisam ser evitados, devendoas áreas de disposição se localizarem nos aqüicludes.Nesse sentido, as mais variadas alternativas litológicas

têm sido sugeridas ou testadas como granitos, folhelhos,depósitos e domos salinos, espessos pacotes argilosos,seqüências vulcânicas (basaltos e rochas piroclásticascomo tufos), gnaisses e xistos, porém, o consenso éque possivelmente nenhuma delas constitui umabarreira física perfeita para isolar o repositório do seuambiente circundante, considerando-se, ao invés disso,que um tipo é mais apropriado do que outro, dependendodo contexto em que está inserido (história tectônica daárea etc.).

Embora não constitua um componente importantedos resíduos dos transurânicos, do ponto de vistaradiológico, muita atenção tem sido também dirigida àpresença de 222Rn nas águas, principalmente depoisque Allen-Price em 1960 sugeriu que a distribuição decâncer na população do oeste de Devon, na Inglaterra,estava relacionada com a radioatividade da água deconsumo na área, atribuída, sobretudo, à atividade de222Rn. Uma preocupação dosimétrica adicionalenvolvendo esse gás constitui aquela relacionada como fato de que, além de ser ingerido, esse gás é inaladoatravés da respiração de ar enriquecido em radônio,de maneira que pode ocorrer um acúmulo nos pulmõesdos seus descendentes emissores alfa, aumentando,portanto, a intensidade de dose interna de radiação. Aproposição de que o radônio poderia ser responsávelpor câncer pulmonar surgiu na década de 1930 paraexplicar 75% dos casos de mortes ocorridos de 1877 a1899 entre os operários que trabalharam no interior deminas sem ventilação, em Schneeberg na Alemanha ede 50% daqueles verificados de 1929 a 1938 entre osmineiros de Jachymov, na República Tcheca. Aproblemática se acentuou mais recentemente com adescoberta de altos níveis de 222Rn no interior deresidências, que estariam relacionados com teoreselevados determinados em águas subterrâneas utilizadaspara consumo humano. É por este motivo que aOrganização Mundial de Saúde estabeleceu em 2004um limite máximo de 100 Bq/L para a atividade de222Rn nas águas destinadas ao consumo humano.

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No Brasil, o biocombustível perdeu a importanteimagem de combustível proveniente de fonte renovável,substituída pela de panacéia para salvar o ambiente.Infelizmente o álcool ou o biodiesel, os dois principaisbiocombustíveis já a venda no mercado, não sãoconsiderados limpos pela ciência ambiental.

Para entender como o biocombustível recebeuo adjetivo de “limpo”, precisamos recordar o conceitode ciclo dos elementos. Em nosso planeta algunselementos químicos estão constantemente se transfor-mando, mudando de fases e migrando entre os diversoscompartimentos (solo, águas superficiais, atmosfera ea biota). Este ciclo de materiais é conhecido como ciclobiogeoquímico. O ciclo biogeoquimico do carbono estáintimamente relacionado com a homeostase do planeta,mais conhecido como efeito estufa e os ciclos donitrogênio e enxofre com a dispersão natural defertilizantes. A contabilização da quantidade de materialque entra e a que sai em um compartimento de umciclo é conhecido como balanço de material. Alteraçãoda quantidade de material naturalmente presente emum dos compartimentos de um ciclo biogeoquímicointerfere no meio ambiente e é uma forma conceitualpara entender a poluição por componentes químicos.Sob o aspecto ambiental, podemos dizer que o uso dobiocombustível pouco interfere no balanço de carbonoda atmosfera porque o dióxido de carbono emitidodurante a queima do biocombustível, é consumido peloprocesso da fotossíntese para refazer o vegetal. Istoresulta em balanço de carbono igual a zero na atmos-fera assim o seu uso não minimiza, mas apenas nãointerfere no o efeito estufa e por isto ele passa a serchamado de combustível limpo. Para os combustíveisfosseis, o dióxido de carbono emitido gera um balançopositivo na atmosfera e com conseqüente aumento doefeito estufa. Para os outros macroelementos envol-vidos na formação da biomassa, o enxofre, nitrogênio,fósforo e potássio, não existe mecanismo similar e estesdevem ser incorporados anualmente ao solo na formade adubos. Como resultado do processo de adubaçãojá não existe mais a condição de balanço igual a zeropara estes elementos. Isto significa acumulo de material

em compartimentos do ambiente comprometendo aqualidade de corpos de água, solo e atmosfera comconseqüências diretas para o ambiente. Nas regiõesprodutoras a queima da palha da cana aumenta aconcentração de gases e material particulado naatmosfera. Como grande parte do material particuladopossui diâmetro médio de partículas suficientementepequeno para ser inalado pelos seres humanos isto podecomprometer a saúde de pessoas aumentado casos deinternação hospitalar por problemas respiratórios ecirculatórios. Nas cidades a queima do álcoolcombustível em motores que emite formaldeído eacetaldeído que são vapores tóxicos, mas por outrolado emite menos monóxido de carbono, dióxido deenxofre e material particulado que os derivados depetróleo. Quanto à emissão de óxido de nitrogênio poucadiferença faz o tipo de combustível, já que o gás ésempre emitido. O óxido de nitrogênio é importante naformação do ozônio (gás tóxico) e da chuva ácida. Peloaspecto da Química Ambiental, para chamar o álcoolou outro biocombustível de combustível limpo énecessário esconder muita sujeira debaixo do tapete.

Para a questão que ora se coloca: “O Brasil devese tornar pais produtor de biocombustível? Devemosanalisar a questão sob aspectos econômicos e sociais.A produção de biomassa requer o uso de terras. Quaisseriam? Avançariam sobre novas áreas? Outranecessidade é o fertilizante. A produção mundial defertilizante dobrou a cada oito anos entre 1950 e 1973.Dobrou novamente em 1990 chegando a mais de 80milhões de toneladas de N por ano. A adição intencionaldeste nitrogênio ativo no ciclo biogeoquímico donitrogênio, que possui serias conseqüências ambientais,tem sido justificada como necessária para produçãode alimentos. Porém, uma coisa é justificar combatera fome outra é produzir combustível. Quais serão oscustos ambientais locais? Quem serão os mais afetadopelos prejuízos? Se o biocombustível tem como principalqualidade ambiental resolver um problema global, nãoseria justo cobrar uma taxa das nações desenvolvidaspara ajudar na administração dos problemas ambientaislocais? Certamente precisamos refletir e mesmo buscar

BIOCOMBUSTÍVEL, AMBIENTE E SAÚDE

Arnaldo Alves CARDOSO & Andrew George ALLEN

Departamento de Química Analítica, Instituto de Química da Universidade Estadual Paulista, UNESP.Rua Francisco Degni, s/n. –Bairro Quitandinha. CEP 14800-900. Araraquara, SP.

Endereços eletrônicos: [email protected]; [email protected]

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resposta para muitas questões. Portanto é fundamentalque exista ao lado do incentivo tecnológico de produçãode maior quantidade de biocombustíveis incentivo para

conhecer qual a extensão das mudanças ambientais esociais esperadas como resultado desta possível expan-são na produção de biocombustível.

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GEOCIÊNCIAS, AMBIENTE E SAÚDE

Bernardino Ribeiro de FIGUEIREDO

Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP. Cidade Universitária Zeferino Vaz s/n – Barão Geraldo.Caixa Postal 6152. CEP 13083-970. Campinas, SP. Endereço eletrônico: [email protected]

A contribuição das geociências aplicadas estásendo requerida de forma crescente na solução deproblemas ambientais relacionados à saúde pública. AGeologia Médica é o campo do conhecimento voltadopara a elucidação de prováveis relações entre materiaisou fatores geológicos e os efeitos benéficos ou adversosà saúde humana e à vida em geral. Embora a produçãode pesquisa nessa área tenha recebido grande ênfaseem todo o mundo, especialmente na última década,abordagens científicas equivalentes podem ser encon-tradas há mais tempo em áreas tais como Geomedicina,Toxicologia Ambiental, Geografia Médica, SaúdeAmbiental etc. Graças às intensas atividades científicasno seu campo de pesquisa interdisciplinar, a GeologiaMédica foi incluída entre os dez temas prioritários doAno Internacional do Planeta Terra que está sendocelebrado no período 2007-2009. O Ano Internacionaldo Planeta Terra foi declarado pela Assembléia Geraldas Nações Unidas em 2005 e está sendo coordenado,em todo mundo, pela International Union of GeologicalSciences (IUGS) e a UNESCO.

Este trabalho tem como objetivo conceituar edelimitar a área emergente de conhecimento denomi-nada Geologia Médica bem como trazer para o debatealgumas atividades que estão sendo realizadas no Brasil.

Uma grande variedade de fenômenos naturais eos seus efeitos benéficos ou adversos à saúde humanatêm sido abordados pela Geologia Médica. Entre essesse incluem os efeitos curativos advindos da exposiçãohumana a certos minerais, rochas, lamas, águas termais,águas minerais e outros materiais. Por outro lado,agravos à saúde humana (ou de animais e plantas)podem advir da exposição ao excesso ou deficiênciade elementos químicos e minerais no ambiente; dainalação de poeiras minerais provenientes de emissõesvulcânicas, de desertos ou produzidas pelo homem; daexposição a certos compostos orgânicos, radionuclídeos,micróbios e outros patógenos.

A Geologia Médica ocupa-se fundamentalmentede elucidar as relações entre os fatores geológicosnaturais e efeitos à saúde, porém abrange também osestudos de áreas contaminadas. Merecem destaqueaqui os solos e as águas, contaminados naturalmente

ou comprometidos em decorrência da urbanização, dasatividades industriais ou agrícolas.

Situações típicas estudadas pela Geologia Médicae que representam temas de fronteira do conhecimentoabrangem as tempestades de poeiras que podemalcançar distâncias transoceânicas e as erupçõesvulcânicas (cinzas e gases tóxicos). Outros estudostêm focalizado a deficiência de iodo no ambiente (solo,água e alimento) a que se relacionam disfunções daglândula tiróide (bócio) ou o excesso de flúor em água(rochas, solos, alimento) que pode induzir a fluorosedental ou esqueletal em humanos.

Estudos sobre a deficiência de selênio em solostêm sido importantes para prevenir doenças como aKashin-Beck (distúrbio de formação óssea) e a Keshan(miocardiopatia). O consumo prolongado de água comconcentração excessiva de arsênio pode provocardiversos agravos à saúde humana como queratoses evários tipos de câncer. O caso mais famoso foi reveladopelo British Geological Survey em Bangladesh, em 1998,onde uma população de mais de 21 milhões de pessoasestava exposta ao consumo de água subterrânea comconcentrações superiores a 50 microgramas As porlitro, muito superior ao limite de potabilidade de 10 µg/L As, recomendado pela Organização Mundial daSaúde.

No Brasil a preocupação em compreender asrelações entre os parâmetros de qualidade ambiental eagravos à saúde é crescente. Constituem exemplos osestudos sobre arsênio, chumbo e mercúrio consideradosas substâncias mais perigosas à saúde humana nalistagem da ATSDR-CERCLA. Embora ainda sejampoucos os estudos integrados do meio físico e deexposição humana a metais, as informações disponíveispara certas áreas já permitem estabelecer correlaçõesentre parâmetros ambientais e os níveis de exposiçãohumana.

Pesquisas sobre arsênio foram realizadas noEstado de Minas Gerais, Vale do Ribeira (São Paulo eParaná) e Santana (Amapá). Níveis baixos de expo-sição ao arsênio correlacionam-se com baixas concen-trações de As em água embora altos teores em solo,sedimentos e resíduos industriais sejam observados.

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Estudos sobre contaminação ambiental e humanapor chumbo foram realizados em Santo Amaro daPurificação (Bahia), Vale do Ribeira, Cubatão e Bauru(São Paulo). Da revisão de vários autores é possívelperceber que altos níveis de exposição humana aochumbo relacionam-se a fontes não pontuais (emissãoatmosférica de indústrias), altos teores de Pb em solo,poeira e alimentos. Em contraste, entre residentes deáreas vizinhas de fontes pontuais (minas e fábricas debateria), com baixos teores de Pb em solo, os níveis deexposição são baixos.

O mercúrio é um dos poluentes mais estudadosno Brasil, em especial na Amazônia, onde foi intensa aatividade de garimpo de ouro. Porém, concentraçõesanômalas de mercúrio em águas, solo e ar tambémsão encontradas em áreas afastadas das regiões degarimpo de ouro. A participação da biosfera nos proces-sos de metilação do mercúrio e de bio-concentraçãoem certas espécies de peixes, consumidas pela popu-lação, tem sido objeto de muitos estudos. Contudo,esses estudos não são conclusivos sobre a correlaçãoentre metal em materiais geológicos e em peixes e arelação com exposição humana ao mercúrio ainda nãoestá suficientemente clara.

Atualmente, o projeto de integração de dados domeio físico e saúde mais importante em execução noBrasil é Projeto de Geomedicina do Paraná, conduzidopelo Instituto Pelé Pequeno Príncipe e MINEROPAR.Está em curso a montagem de um sistema de web

mapping, que tem por finalidade auxiliar pesquisasambientais e de doenças crônicas de maior incidênciaem crianças na região.

Segundo os executores do projeto, o estadoparanaense possui as maiores taxas de câncer nocórtex das glândulas supra-renais em crianças entre0,8 e 3 anos e o objetivo do projeto será o de verificarse há e quais são as influências ambientais sobre adoença.

A partir desses exemplos é possível perceber ogrande valor das pesquisas em Geologia Médica. Ogrande significado dessas pesquisas está sendodemonstrado em vários países por meio do desenvol-vimento de novos produtos minerais, benéficos à saúde,e do lançamento de novos empreendimentos, emespecial, no setor farmacêutico e de cosméticos. Porémuma grande importância pode ser percebida naspesquisas, incluindo o mapeamento geoquímico de baixadensidade de extensas regiões, que visam a prevençãode doenças e conseqüente economia de recursos parao setor de saúde pública.

A Geologia Médica requer o trabalho conjunto degeocientistas com especialistas de outras áreas. Trata-se de uma área de pesquisa na qual é essencial oestabelecimento de práticas interdisciplinares envol-vendo uma variedade de profissionais, tais como,químicos, biólogos, geógrafos, toxicologistas, epidemio-logistas, veterinários, dentistas, engenheiros e cientistassociais, entre outros.

Este trabalho contou com o apoio do CNPq Grant 300323/93-0 e da FAPESP Grant 03/09916-6.

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EXPERIÊNCIAS DA GEOLOGIANO ÂMBITO DA DEFESA CIVIL

Miguel Libório CAVALCANTE NETO

Coronel Res. PM, ex- Coordenador Estadual de Defesa Civil Estado de São Paulo (2007/2008)

COMENTÁRIOS SOBRE OS PRIMÓRDIOS DA DEFESA CIVIL

DE SÃO PAULO (1967 – 1975 – 1987 – 1988)

Comentar experiências da aplicação geológica emdefesa civil, não significa apenas relatar fatoreshistóricos, mas aspectos voltados à mudança culturale institucional do emprego da Defesa Civil em SãoPaulo, e por conseqüência no Brasil.

Muitas vezes quando citamos os fatores históricosdo surgimento da defesa civil em São Paulo, relacio-namos o desastre natural ocorrido no ano de 1967 nomunicípio em Caraguatatuba como um dos principaiseventos que culminaram no interesse político da épocaem criar uma estrutura de coordenação e articulaçãopara fazer frente aos desastres.

Com a ocorrência de diversos desastres (eventoschuvosos e incêndios de grandes proporções queocorreram naquele período em vários municípios doEstado, causando danos consideráveis ao ambientesocial1), em 1976 o governo do Estado criou aCoordenadoria Estadual de Defesa Civil – CEDEC,para funcionar como órgão de assistência, socorro erecuperação de áreas atingidas por desastres. A pre-venção era desenvolvida por campanhas de prevençãoe conscientização de governos locais e população.Faltava uma visão técnica, metodológica, com capa-cidade de atuar de forma preventiva, no sentido decorrigir determinados problemas relacionados com aocupação urbana desordenada.

Apenas 20 anos depois (1987) surge no Estado deSão Paulo, um Plano de Defesa Civil que atuasse deforma científica, associando risco geológico e previsãometeorológica. Estamos falando do Plano de DefesaCivil para riscos de escorregamentos nas encostas daSerra do Mar na região do pólo industrial de Cubatão.O Plano teve o apoio das indústrias e dos governos

(Estadual e Municipal) e os resultados até hoje (21anos depois) são exitosos, conforme se demonstroupelo número mínimo de ocorrências havidas.

Fundamentado nesta experiência, um grupo degeólogos do IPT – Instituto de Pesquisas Tecnológicase do IG – Instituto Geológico2 resolveram ousar. Em1988 resolveram apresentar ao Governo do Estado umPlano Preventivo de Defesa Civil, voltado às encostasda Serra do Mar, na região da Baixada Santista e LitoralNorte, em áreas de ocupação urbana. Era, com certeza,uma quebra de paradigma a estrutura que existiam atéentão, pois como o do Plano para área industrial,associava previsão meteorológica com risco geológicoem áreas de ocupação urbana e acrescentava umaexperiência única no país: vistorias locais quando osíndices sofriam alterações e a preparação da populaçãoidentificando sinais de instabilidade.

Para o desenvolvimento do plano foi analisado osfatos ocorridos ao longo de 30 anos na região e númerode vítimas por ano3, que a partir da sua implementaçãotiveram índices de redução vertiginosa chegando anenhuma ocorrência em 1992.

O desafio de associar questões científicas, fatoresmeteorológicos a ações operativas de articulação deórgãos e mobilização da população era questionávelpelo “status quo” estabelecido, pois o pensamento erater um órgão preparado para atuar nas emergências enão possuir ações de gestão de risco.

O CENÁRIO A PARTIR DE 1988

Considero que 1988 inicia uma nova fase para aDefesa Civil em São Paulo, talvez no país, pois com osresultados do PPDC – Plano Preventivo de DefesaCivil para as encostas da Serra do Mar, criaram umanova cultura metodológica para o desenvolvimento de

1 Sempre se destacam o surgimento da Defesa Civil, além dos escorregamentos ocorridos na Serra do Mar em 1967 e 1969, no litoral nortePaulista, os grandes incêndios ocorridos em São Paulo nos prédios Andraus e Joelma.2 Cabe destacar que na época como Tenente da Polícia Militar e integrante da CEDEC recebi os geólogos Leandro Cerri, Eduardo Macedo,Sra. Cassandra e Julian para que fosse desenvolvido o plano proposto.3 O relatório apresentado pelo IPT/IG apresentava o número de 277 vítimas fatais em 1987.

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planos de defesa civil4, exigindo um novo perfil parasuas equipes, ou seja:

• Defesa Civil Estadual com uma área específicapara o desenvolvimento e avaliação dos planos;

• Técnicos preparados para interpretação de dados,articulação de órgãos e especialistas e mobilizaçãode recursos;

• Mapeamento de áreas municipais que possuamriscos geológicos;

• Preparação de equipes municipais para identificar,mapear e monitorar áreas urbanas, identificar osriscos e mobilizar os recursos para assistência dasfamílias moradoras em áreas de risco.

• Capacitação e preparação de lideranças comu-nitárias moradoras de áreas de risco, sensibilizando-as quanto à necessidade de atuar em casos deemergências.

As atividades associadas atingiram resultadosexcepcionais com reduções drásticas de ocorrênciasque causassem vitimas fatais.

AS ATIVIDADES DE DEFESA CIVIL 20 ANOS DEPOIS

(1988 – 2008)

Muitas vezes um paradigma estabelecido precisaser modificado. Com o desenvolvimento de diversosprojetos, acompanhando os aspectos sociais e urbanos.32 anos depois do surgimento da Defesa Civil em SãoPaulo e 20 anos depois do surgimento do PPDC épreciso reavaliar e modernizar os processos. De 08municípios identificados com risco em 1988, a DefesaCivil Estadual tem mapeado mais de 2505, comnecessidade de se realizar intervenções para recuperar

essas áreas. Portanto, apesar dos resultados excepcio-nais é preciso recriar a cultura da prevenção. Asso-ciado aos programas governamentais6 será necessáriodesenvolver programas de recuperação preventivos deáreas de risco nos municípios, com a participação maisefetiva da Defesa Civil.

É notório que quando os critérios são mais técnicos,as atividades passam a ter um resultado mais efetivo econsistente.

Assim, a visão passa do monitoramento apenaspara uma visão estratégica de gestão de risco onde osórgãos públicos identificam suas parcelas de responsa-bilidade e atuam de forma a evitar ou minimizar essesriscos. Os órgãos de emergência, notoriamente aDefesa Civil, devem atuar na preparação, na prevençãoe quando os fatos ocorrem na articulação competentepelo nível de conhecimento acumulado nesta nova visãode gestão de risco7.

Considero constituir nesta nova fase os seguintespontos:

• Identificação ou atualização de áreas urbanas comrisco geológico, objetivando incentivar açõesestruturais, preparação técnica de servidores muni-cipais, modernização de leis de posturas públicas epreparação de população, dentro de uma conscien-tização social.

• Gestão de Risco, com o mapeamento de áreasurbanas e rurais suscetíveis a problemas de desas-tres naturais, estabelecendo ações e atividades deintervenção; e

• Cultura institucional de Defesa Civil, priorizandoos fatores técnicos e científicos voltados priorita-riamente à prevenção e proteção da população.

4 A partir do PPDC surgiram planos de Defesa Civil para o oeste do Estado de São Paulo e região metropolitana de São Paulo, voltadosa prevenção de áreas ribeirinhas no período chuvoso, a Operação Mata Fogo – parceira entre a Defesa Civil Estadual e Secretaria do MeioAmbiente – que previa ações no período de estiagem no interior de São Paulo.5 Trabalho desenvolvido pelo Ministério das Cidades em parceria com o IPT e CEDEC/SP.6 Acredito que os recentes programas do Ministério das Cidades e as propostas municipais de melhoria no planejamento urbano foraminfluenciados pelos trabalhos do PPDC.7 Esta nova visão de gestão de risco, acumulada com as experiências de planos de prevenção geológica possibilitaram ações de articulamde emergências em rompimento de barragens em municípios paulistas – Paraguaçu Paulista com destaque – que graças a associação defatores meteorológicos e vistoria de campo foi possível retirar moradores antes do rompimento da barragem sem causar vítimas. Oacidente com o avião da TAM na pista do aeroporto de Congonhas, que também teve um acidente geológico provocado por dano estruturaldemonstrou como o conhecimento técnico compartilhado pode facilitar ações de proteção e defesa social. Após a vistoria de técnicos eprocedida as recomendações o aeródromo foi liberado.

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A CURTA HISTÓRIA DA GESTÃO DERISCOS AMBIENTAIS URBANOS

Fernando Rocha NOGUEIRA

Bocaina Cursos e Estudos Ambientais-Urbanos Ltda. Rua Gerônimo Mariano Leite, 69 – Residencial Primavera.CEP 12530-000. Cunha, SP. Endereço eletrônico: [email protected]

Risco é a potencialidade de que ocorra um acidente,um desastre, um evento físico que resulte em perdas edanos sociais ou econômicos. A geógrafa francesa YvetteVeyret (2007) define risco, objeto social, como apercepção do perigo ou da catástrofe possível. Consi-dera que ele existe apenas em relação a uma sociedadeque o apreende por meio de representações mentais ecom ele convive por meio de práticas específicas. Nãohá riscos, portanto, sem uma população que o percebae que poderia sofrer seus efeitos.

Por esta definição, podemos considerar que o estecampo de conhecimento e as práticas locais que estãoconstruindo políticas públicas de gestão de riscos nosambientes urbanos no Brasil não têm mais que 20 anos.Os acidentes, desastres e perigos, entretanto, sãomarcas sempre presentes na história dos aglomeradosurbanos, quase sempre mais freqüentes e de maiorconseqüência quanto maiores, mais densas e maisdesiguais forem as cidades. Mas é apenas no processode redemocratização do país, na elaboração dasconstituições estaduais e leis orgânicas municipais queesta temática aparece na administração pública e sereflete no meio acadêmico (ou vice-versa).

A defesa civil paulista foi constituída na décadade 70 como resposta a grandes acidentes que marca-ram a época: a grande corrida de massas que destruiuCaraguatatuba em 1967 e os incêndios dos prédiosJoelma e Andraus na capital. Organizou-se aí ogerenciamento da emergência, o socorro ao desastre.A gestão de risco, entretanto, é outra história: traduzas escolhas políticas e as decisões finais de organizaçãodos territórios (Veyret, op.cit.), a prevenção constituindoo coração da análise.

As populações mais pobres, mais vulneráveis ecom baixa resiliência, geralmente ocupando vaziosurbanos e periferias com pouca infra-estrutura ou demaior fragilidade ambiental, costumam ser as principaisvítimas destas tragédias. Não se conhecem estudosque abordem a quantificação dos impactos destesacidentes urbanos no Brasil, mas estudo feito naColômbia (Hermelin, 2000) aponta que desastresambientais causam perdas anuais da ordem de 4,4%do PIB. É possível afirmar que as perdas recorrentes

por pequenos deslizamentos que sequer são noticiadospela mídia e pelas inundações freqüentes das margensde córregos correspondam a uma importante causa damiséria dos moradores dos assentamentos precários,que anualmente se empenham em novas dívidas pararepor os bens danificados.

A gestão de riscos é um processo que se iniciaquando a sociedade, ou parcela desta, adquire apercepção de que as manifestações aparentes ouefetivas de um processo adverso existente podem pro-vocar conseqüências danosas superiores ao admissívelpor esta comunidade. Envolve o planejamento e aaplicação de políticas, estratégias, instrumentos emedidas orientadas a impedir, reduzir, prever e controlaros efeitos adversos de fenômenos perigosos sobre apopulação, os bens e serviços e o meio ambiente(Cardona & Lavell, s/d).

A temática dos riscos ambientais é introduzida nacena pública nacional, portanto, no meio das impor-tantes contribuições do meio técnico-científico para omelhor entendimento do ambiente físico e dasinterferências antrópicas. Seu lento e irregular “nasci-mento” como elemento transversal na gestão dascidades está associado:• à emergência ou explicitação da “crise urbana”;• a ocorrência de grandes e/ou freqüentes acidentes

e sua inclusão no conjunto de problemas da “criseurbana”;

• a associação dos acidentes à precariedade (deplanejamento urbanístico, de infra-estrutura básica,de serviços públicos) e à exclusão social e espacialdos ambientes onde ocorrem estes acidentes.É nesse contexto que se desenvolveram, em

diversos órgãos públicos estaduais e municipais,tentativas de estabelecimento de práticas sistemáticaspara minimização das conseqüências de acidentesassociados a escorregamentos. Dentre estas expe-riências pioneiras destacam-se a implantação, há 20anos, do Plano Preventivo de Defesa Civil no Estadode São Paulo, com suporte técnico e metodologia doInstituto de Pesquisas Tecnológicas - IPT e do InstitutoGeológico - IG (Cerri, 1993; Macedo et al., 1999) ealgumas ações localizadas em administrações munici-

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pais, quase sempre sofrendo descontinuidade em funçãode mudanças políticas: Recife (Gusmão Filho, 1995;Alheiros, 1998); Rio de Janeiro (Amaral,1996; PinguelliRosa & Lacerda,1997); Belo Horizonte (Carvalho,1990 e Carvalho, 1996), São Paulo (Cerri & Carvalho,1990; Nogueira, 2002); Santos (Nogueira, 2002).

É também neste período que esta temática começaa ser incluída em eventos técnico-científicos: PrimeiroSimpósio Latino Americano sobre Risco GeológicoUrbano (São Paulo, 1990); Conferência sobre DefesaCivil, enfocando principalmente as grandes cidades,durante a ECO-URBs 92; Seminário sobre problemasgeológicos e geotécnicos da Região Metropolitana deSão Paulo, em 1992; Mesa redonda com o tema‘Redução de acidentes naturais’, no 39o. Congressoda SBG (Salvador, 1996); Primeira Jornada dePreparação das Comunidades Paulistas em relação aosDesastres Naturais, pelo IEA-USP, em 1994; Inclusãode tema ‘catástrofes’ na 46a. Reunião Anual da SBPCem 1994 (na 50a. Reunião Anual, em Natal, RN, em1998, também ocorreu um simpósio sobre desastres);Encontros de Geologia Urbana (Guarulhos, 1994;Santos, 1996 e São Paulo, maio de 2000); presença datemática de riscos geológicos nos Congressos Brasi-leiros de Geologia de Engenharia (Poços de Caldas,1993; Rio de Janeiro, 1996 e São Pedro, 1999) e nasConferências Brasileiras sobre Estabilidade de

Encostas, 1 e 2 (Rio de Janeiro, 1992 e 1997);seminário sobre “prevenção e controle dos efeitos dostemporais” no Rio de Janeiro, em 1997. Também seobserva neste período a produção de dissertações eteses acadêmicas que se referem aos riscos geológicos,especialmente escorregamentos.

Um importante salto na disseminação nacional deconhecimentos e metodologias de gestão de risco vemocorrendo a partir da criação do Ministério das Cidadesque, já em sua origem em 2003, incorporou o conceitode gestão de riscos como um componente indispensávelna gestão urbana. Dentro do Programa Urbanização,Regularização e Integração de Assentamentos Precá-rios da Secretaria Nacional de Programas Urbanos foicriada a Ação de Apoio a Programas Municipais deRedução e Erradicação de Riscos. Com recursos doOrçamento Geral da União, desde 2004 o MCidadesdisponibilizou recursos e suporte técnico para cercade 65 municípios elaborarem seus planos municipaisde redução de riscos – os PMRR. Apenas os municípiosque elaboraram seus PMRRs e estabeleceram umaordem de prioridade para suas intervenções com basenum mapeamento podem solicitar recursos paraprojetos de estabilização. O MCidades tambémpatrocinou diversos cursos de capacitação de técnicosmunicipais para mapeamento e gestão de riscos ecursos à distância.

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ALHEIROS, M.M. Riscos de escorregamentos na Região Metropolitana do Recife. Salvador, 1998. 129 f. Tese (Doutorado em GeologiaSedimentar) – Instituto de Geociências, Universidade Federal da Bahia.

AMARAL, C. Gerenciamento de desastres no Rio de Janeiro: lições dos escorregamentos de 1996. In: CONGRESSO BRASILEIRO DEGEOLOGIA, 39, 1996, Salvador. Anais... Salvador: SBG, 1996, v. 4, p. 122-38. (b)

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127São Paulo, UNESP, Geociências, v. 27, n. 1, p. 127-128, 2008

MAPEAMENTO GEOQUÍMICODO BRASIL E SAÚDE HUMANA

Cassio Roberto da SILVA

Serviço Geológico do Brasil – CPRM. Avenida Pasteur, 404, 4º andar. CEP 22290-040.Rio de Janeiro, RJ. Endereço eletrônico: [email protected]

O Programa Nacional de Pesquisa emGeoquímica Ambiental e Geologia Médica –PGAGEM tem por objetivo avaliar em todo o territórionacional as composições químicas do substrato rochoso,solos e águas de superfície e subterrâneas, visandodisponibilizar a multiusuários dados e informações paraa pesquisa de novos depósitos minerais, fertilidadenatural para a agricultura, fontes de contaminaçõesnaturais e antropogênicas de elementos químicosnocivos à saúde humana, animal e ambiental.

O conhecimento dos elementos químicos noterritório brasileiro poderá fornecer subsídios parainvestimentos em prospecção mineral e propiciar novasdescobertas de jazidas minerais, tendo em vista que osprojetos antigos realizavam trabalhos em regiõesespecíficas e para detectar poucos elementos químicos,em geral Fe, Mn, Sn, Pb, Zn, Cu, Cr e Au. Nas áreassedimentares, cerca de 70% dos terrenos brasileiros,em geral, não foram efetuadas amostragens e análisesgeoquímicas para prospecção mineral. Em rochasígneas e metamórficas, os elementos analisados eramde poucos metais (4-6 elementos). Quando o métodoabrangia mais elementos (30 elementos), os níveis dedetecção eram muito altos, não detectando, porexemplo, os elementos-traço (As, Mo, Cr, F, Li, V, U eTh) e de Terras Raras (La, Ce, Nd, Eu, Sm).

A Geologia Médica é uma “ciência” multidis-ciplinar, que estuda as variações regionais na distribuiçãodos elementos, principalmente os metálicos e meta-lóides, seus comportamentos geológico-geoquímicos,as contaminações naturais e antropogênicas e os danosà saúde humana, animal e/ou vegetal por excessos oudeficiências. Ao serem liberados das rochas pelointemperismo os elementos podem ser recristalizadosem minerais neo-formados, adsorvidos em mineraisargilosos, incorporados em óxido-hidróxidos de ferro emanganês, precipitados como carbonatos, ou postosem solução. Quando solubilizados, ou passam ao soloe são levados às águas de sub-superfície, ou sãotransportados pela drenagem.

Exemplos de contaminação humana gerada porfatores geológico-ambientais podem ser encontrados

em vários países do mundo: China, Índia, EstadosUnidos, Chile, Argentina, entre outros. Estudos degeoquímica ambiental relacionados à exposição depopulações à contaminação por elementos tóxicosainda são escassos no Brasil. Tem-se conhecimentode alguns trabalhos sobre de mercúrio na Amazônia,de flúor em Itambaracá, Paraná e São Francisco, MinasGerais; Iodo em Arraias, Tocantins, chumbo em SantoAmaro da Purificação, Bahia e no Vale do Ribeira,Paraná e, arsênio em Nova Lima, Minas Gerais, Valedo Ribeira, São Paulo e Santana, no Amapá.

Nos últimos 5 anos foram coletadas pela CPRMcerca de 4.642 amostras de águas, sedimento de correntee solos e destas, cerca de 3.167 amostras foramanalisadas e os resultados de algumas áreas como,Parintins no Amazonas, NE (parte oriental) do Estadodo Pará, Lagoa Real na Bahia, Vale do Ribeira-SP/PR, Estado do Ceará e Lavras no Rio Grande do Sul,encontram-se disponíveis no site www.cprm.gov.br/geologiamedica. Os demais resultados das outrasregiões (Rondônia, Estado de Goiás, Teresina e Itinga-MG) deverão ser divulgados em breve.

A ilha de Parintins, localizada na margem direitado Rio Amazonas, cerca de 350 km à jusante deManaus, hoje um destacado pólo turístico da região,pela tradicional festa do Boi-Bumbá, vinha apresen-tando problemas com a saúde da população, prova-velmente associados a má qualidade das águas deabastecimento público, em vista do grande aumentopopulacional, principalmente na época de festas. Asatividades desenvolvidas na ilha, pela CPRM em 2006,incluíram a análise de 6 amostras de água corrente e33 de poços tubulares. As primeiras mostraram-senormais, enquanto entre as amostras de água subter-rânea, cerca de 63% apresentaram elevados teoresde NO

3 (11-49 mg/L), Al (0,3 – 2,0 mg/L) e amônia

(2,9 mg/L) que foram atribuídos à contaminaçãoantrópica, pois somente os poços com profundidademenores que 65 m apresentaram esses teores elevados.

No nordeste do Pará os resultados da análise de77 amostras de água de abastecimento público,abrangendo cerca de 80% da área estudada, revelaram-

128São Paulo, UNESP, Geociências, v. 27, n. 1, p. 127-128, 2008

se excessivos para Al e Pb, respectivamente, 18 e 145vezes o valor máximo permitido pelo CONAMA eOMS, seguidos pelos teores de B, Cd, Fe, Cu, K, Mn,Zn e P. Estes dados de qualidade de água estão sendoanalisados sob o ponto de vista da sua correlação ounão com alta prevalência na região de doenças endê-micas como verminoses, doenças no aparelho digestivo(câncer), cáries dentárias, anemia e hepatite.

Os resultados analíticos obtidos em 234 amostrasde água de abastecimento público provenientes depoços tubulares e amazonas, açudes e lagos, fontes erios, coletadas no estado do Ceará, numa área de146.000 km². Apresentaram concentrações acima dopermitido pelo CONAMA foram detectadas em 43%das amostras, para os elementos considerados tóxicos:Al (0,11 – 0,80 mg/L), As (0,02 mg/L), B (0,63 mg/L),Cd (0,001 – 0,02 mg/L) e Pb (0,01 – 0,46 mg/L) e,para aqueles considerados tóxicos e essenciais: Ba(0,71 – 5,59 mg/L), Fe (0,31 – 12,1 mg/L), Mn (0,11 –1,21 mg/L), Ni (0,26 mg/L) e Zn (0,18 – 0,76 mg/L).Estas informações foram repassadas para o órgãoresponsável pelo saneamento do estado, o qual vemprocedendo re-amostragem da água para ter umamelhor definição das medidas mitigadoras a seremtomadas.

Em Lagoa Real na Bahia, efetuou-se amostragemem água subterrânea (n=32), solos (n=32) e sedimentode corrente (n=42), numa área de 1.126 km², onderecomenda especial atenção para o consumo de águana região, em vista dos resultados analíticos queacusaram concentrações de urânio no intervalo de 0,041a 0,566 mg/L excedendo o teor máximo admitido de0,02 mg/L de U em 8 poços tubulares. Destaca ainda,o excesso de captação de água subterrânea, prevendoem curto prazo escassez desse bem mineral.

O Projeto Paisagens Geoquímicas e Ambientaisdo Vale do Ribeira – Avaliação e Prevenção de Riscopara o Meio Físico e Saúde Humana Relacionados àExposição ao Arsênio e Metais Pesados, executadoem parceria por geólogos, químicos, médicos e toxico-logistas da UNICAMP, Universidade Estadual deLondrina, Instituto Adolfo Lutz e Serviço Geológico doBrasil – CPRM, contemplou a elaboração do AtlasGeoambiental (Alto e Médio Vale do Ribeira), do AtlasGeoquímico de Sedimento do Vale do Ribeira e geraçãode dados inéditos sobre a exposição de Pb e As emecossistemas e agrupamentos humanos no Alto e MédioVale do Ribeira - SP/PR. Grande parte dos resultadosobtidos nesse projeto consta de outros artigos destelivro e no site www.ige.unicamp.br/geomed.

Os exemplos dados acima revelam que asatividades que vêm se desenvolvendo no âmbito doPGAGEM tendem a atingir um nível significativoembora ainda reste muito a ser feito. Normalmente,após a identificação e constatação de valores anômalosde elementos tóxicos que possam causar efeitos adver-sos à saúde das populações, espera-se que profissionais/ instituições da saúde possam viabilizar a aplicação detécnicas de análise dos riscos aos quais as populaçõesestão sujeitas. Os resultados tanto relativos à geoquí-mica quanto da parte médica, deve impreterivelmenteser dado conhecimento aos órgãos responsáveis pelasaúde pública, visando ações coordenadas para quenão ocorram alardes desnecessários.

Convém destacar neste programa de geoquímicaa importância da homogeneização de procedimentospelas instituições e pesquisadores, de forma a alimentaro banco de dados de todo o Brasil disponível e acessívelna internet para toda a comunidade científica e públicaem geral.

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OS RECURSOS HÍDRICOS SUBTERRÂNEOSNO ESTADO DE SÃO PAULO

Mara Akie IRITANI

Instituto Geológico - IG. Avenida Miguel Stéfano, 3.900. CEP 04301-903. São Paulo, SP.Endereço eletrônico: [email protected]

A Secretaria do Meio Ambiente do Estado de SãoPaulo (SMA) definiu suas diretrizes de atuação priori-tária levando em consideração:

• As mudanças climáticas e os reflexos do aqueci-mento global na biodiversidade e na economia;

• conceito de desenvolvimento sustentável e asprioridades da sociedade paulista;

• A gestão eficiente do meio ambiente com resultadosefetivos e transparência da ação.

Este plano de trabalho está baseado no estabele-cimento dos Projetos Ambientais Estratégicos (PAEs),que tem caráter de programas de Governo, não sendoapenas uma ação isolada da SMA, mas um trabalhoconjunto e de co-responsabilidade dos órgãos estaduaise seus parceiros.

Foram definidos 21 PAEs (www.ambiente..sp.gov.br) e um destes é o Projeto Ambiental Estraté-gico Aqüíferos (PAE Aqüíferos) que surgiu dapreocupação em proteger os aqüíferos mais vulneráveise mais utilizados do Estado de São Paulo, através damelhoria dos instrumentos de gestão e aprofundamentodo conhecimento.

Os aqüíferos do Estado de São Paulo podem serclassificados em sedimentares e fraturados, sendo eles:Furnas, Tubarão, Guarani, Bauru, São Paulo, Taubatée Litorâneo no primeiro grupo, e Cristalino, Serra Gerale Diabásio, no segundo. Informações mais detalhadassobre estes aqüíferos e sua vulnerabilidade podem serobtidas nas publicações “Mapa de Águas Subterrâneasdo Estado de São Paulo” (DAEE/IG/IPT/CPRM 2005)e “Mapeamento da Vulnerabilidade e Risco de Poluiçãodas Águas Subterrâneas no Estado de São Paulo” (IG/CETESB/DAEE, 1997).

A intensificação da exploração da água subter-rânea, observada nas últimas décadas, tende a persistirem decorrência do crescimento econômico e docomprometimento da qualidade das águas superficiais.Atualmente, cerca de 80% dos municípios paulistassão total ou parcialmente abastecidos por água subter-rânea (CETESB 2007), principalmente aqueleslocalizados no oeste do Estado onde ocorrem aqüíferos

de fácil exploração e/ou boa produtividade como oBauru e Guarani. Ainda, é crescente o uso deste recur-so pelo setor industrial e pela agricultura na irrigação.

Devido à exploração sem o devido planejamento,problemas de abatimento dos níveis da água subter-rânea por adensamento de poços e ameaça decontaminação são observados pontualmente e princi-palmente nos aqüíferos sedimentares, mais exploradosdevido a sua maior produtividade em relação aosaqüíferos fraturados.

Nos aqüíferos Bauru, Guarani aflorante e Taubaté,as vazões recomendadas podem chegar a valores entre80 e 120 m3/h por poço (DAEE/IG/IPT/CPRM 2005).

O Estado de São Paulo é dividido em 22 Unidadesde Gerenciamento de Recursos Hídricos (UGRHIs),cada qual com seu Comitê da Bacia Hidrográfica,responsável pela gestão regional dos recursos hídricos.Quando avaliado o Estado de São Paulo, de formageral, as reservas exploráveis são bem maiores que aatual demanda, mas em algumas UGRHIs, como doPardo e Alto Tietê, este recurso já se encontra com-prometido em níveis preocupantes.

De forma geral, a qualidade natural da águasubterrânea é muito boa, mas ocorrem alguns locaiscom excesso de cromo e flúor como nas UGRHI deSão José dos Dourados e Turvo Grande. O monito-ramento realizado pela CETESB alerta para o cons-tante aumento do teor de nitrato na água subterrâneanesta última década (CETESB 2007), especialmentenos poços que exploram o Aqüífero Bauru, caracte-rizado por seu comportamento livre e altavulnerabilidade (IG/CETESB/DAEE 1997). Além disso,em novembro de 2007, a CETESB tinha em seucadastro, 2.272 áreas contaminadas, concentradasprincipalmente nas UGRHIs Alto Tietê (52%) ePiracicaba/Capivari/Jundiaí (15%), tendo como princi-pal atividade contaminante, os postos de combustíveis(77%) (www.cetesb.sp.gov.br).

Assim, com este panorama, a despeito da exis-tência de legislação específica e de normas técnicasque disciplinem a utilização e proteção dos recursoshídricos subterrâneos, considerou-se necessária uma

130São Paulo, UNESP, Geociências, v. 27, n. 1, p. 129-130, 2008

ação governamental coesa no sentido de coibir práticaspredatórias, garantir o uso sustentável da água subter-rânea e adotar medidas de proteção dos aqüíferos,levando, então, à consolidação do PAE Aqüíferos.

A concepção deste PAE é o resultado do esforçoconjunto dos órgãos e entidades do governo, sob acoordenação da Secretaria do Meio Ambiente, e foiorientado pelas seguintes estratégias:• buscar adesão dos usuários e da sociedade para o

uso racional e a proteção dos aqüíferos;• efetuar o zoneamento do uso do solo e definir as

medidas preventivas de proteção nas áreas em queos aqüíferos são essenciais ao abastecimento daspopulações; e

• reforçar a ação dos órgãos gestores e dos comitêsde bacia no controle da perfuração de poços.

O objetivo principal é promover a proteção dosaqüíferos do Estado de São Paulo, identificando asáreas críticas e sensíveis em termos de quantidade equalidade e criando mecanismos de controle e restriçãopara propiciar condições de uso sustentável da águasubterrânea, em especial nas áreas de afloramento dosAqüíferos Guarani e Bauru.

Os principais eixos do PAE Aqüíferos são adefinição de políticas, diretrizes ao planejamento econsolidação e ampliação do monitoramento associa-dos ao aprofundamento do conhecimento, à divulgaçãode informações e à capacitação, que são a base para amelhoria da gestão.

O estabelecimento de diretrizes regionais degestão, uso e proteção das águas subterrâneas visa:

• realizar o levantamento regional e estudos básicosem 15 UGRHIs onde a água subterrânea temrelevância no abastecimento público;

• realizar estudos específicos em áreas consideradascríticas visando a implantação de áreas derestrição e controle;

• realizar o zoneamento e definição de diretrizes deproteção para a área de afloramento do AqüíferoGuarani; e

• criar ou melhorar os procedimentos e normas comdiretrizes regionais específicas de gestão, utilizaçãoe proteção das águas subterrâneas, que resultarãodos trabalhos atualmente em andamento.

A rede integrada de monitoramento de qualidadee quantidade de águas subterrâneas está em implan-

tação, sendo que será operada conjuntamente peloDAEE e pela CETESB. Além dos 184 pontosmonitorados pela CETESB quanto à qualidade, somar-se-ão 50 poços em 2008, em construção pelo DAEE,para medição diária do nível da água. A meta é ampliara rede integrada de monitoramento, com a construçãode 200 poços em um período de 4 anos.

Outro eixo do PAE Aqüíferos é a divulgação deinformações através de elaboração de cartilhas emanuais, reimpressão de publicações existentes ecriação de um portal para disponibilização deinformações. Atualmente já foram reimpressas peloDAEE as seguintes publicações “Águas subterrâneas:um valioso recurso que requer proteção” e o “Manualde operação e manutenção de poços”. Em 2008, a SMApublicará o Caderno de Educação Ambiental “As águassubterrâneas do Estado de São Paulo”, elaborado peloInstituto Geológico e também se encontra emelaboração, em parceria com o DAEE, o “Guia dousuário de água subterrânea”.

Outro eixo do projeto é instituir um programa depesquisa que contemple e fomente o desenvolvimentode estudos aplicados, segundo linhas prioritárias quesejam fundamentais para subsidiar a proteção e gestãodos aqüíferos, viabilizando sua implantação por meioda articulação dos núcleos de pesquisa e de um sistemade acompanhamento. Em discussões preliminaresforam traçadas as seguintes linhas de pesquisa:avaliação de aqüíferos e cartografia hidrogeológica;hidrogeoquímica e qualidade das águas; proteção dosaqüíferos; e contaminação do solo e das águassubterrâneas.

Finalmente, a capacitação de recursos humanosé primordial para difusão dos conhecimentos e, voltadaaos agentes gestores, profissionais da área tecnológicada administração estadual e municipal e difusores deinformação, reflete diretamente na melhoria daaplicação dos procedimentos e, conseqüentemente, nagestão dos recursos hídricos. O PAE Aqüíferos buscafortalecer os programas de cursos e treinamentos jáexistentes e fomentar a realização de outros.

O PAE Aqüíferos vem, então, consolidando aarticulação interinstitucional e as ações previstas até omomento são apenas os primeiros passos para amelhoria da gestão. Este projeto está em constanteavaliação, e sempre aberto para incorporar novosparceiros e novas atividades voltadas ao cumprimentodas metas.

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ÁGUAS SUBTERRÂNEAS: SOLUÇÕES PARAUMA SOCIEDADE EM CRISE

Everton de OLIVEIRA

Associação Brasileira de Águas Subterrâneas - ABAS. Rua Dr. Cândido Espinheira, 560, cj. 32.CEP 05004-000. São Paulo, SP. Endereço eletrônico: [email protected]

Água hoje em dia é assunto. Há até conjecturassobre possíveis guerras futuras para o acesso à água.Hoje água é pauta para várias discussões. E 97% daágua disponível para consumo humano no planeta ésubterrânea. Logo, a pauta deverá inexoravelmentecaminhar para o entendimento desta como parte denosso dia a dia. Todos nós vimos um poço um dia emnossas vidas, mas poucos de nós parou para pensarem como a água chega ao seu interior, se suaquantidade varia com o passar do tempo, se a qualidadetambém varia com o passar do tempo. As respostassimples para estas questões indicam permitem-nosorganizar nossas ações visando a preservação da águasubterrânea e, por extensão, das águas como um todo.Por serem subterrâneas, esses 97% nos são pratica-mente invisíveis, somente aparecendo em nascentes elembradas quando vemos um poço.

Em primeiro lugar, as águas subterrâneas sãoarmazenadas nos poros do material geológico quecompõe os chamados aqüíferos, cuja etimologia remetea um material com capacidade de armazenar etransmitir água em quantidades apreciáveis. As águasde chuva, ao atingirem a superfície do solo dividem-seem uma parte que escoa superficialmente, indoalimentar diretamente os rios e lagos e outra parte quese infiltra, indo alimentar os aqüíferos. Esse fenômenochama-se recarga e é o responsável pela realimentaçãoda água que aparece nos poços e, em grande parte,das águas que fluem nos rios e drenagens superficiais.Muitos rios do nordeste do Brasil são alimentados quaseque exclusivamente por água subterrânea. Logo, aquantidade de água de um poço depende de suarecarga. Longos períodos de estiagem irão corres-ponder a uma menor disponibilidade hídrica subter-rânea. Por outro lado, a qualidade da água subterrâneadepende, em princípio, da interação com o materialgeológico que compõe o aqüífero e de possíveisalterações causadas pela introdução de compostosestranhos à sua composição: poluição. Ao contrário derios e lagos, onde a poluição é imediata pois o acesso àágua é direto, nos aqüíferos a poluição é muito maislenta, pois o fluxo das águas subterrâneas também é

lento, tipicamente variando entre 1 m por dia a 1 m porano. Nos aqüíferos, a água encontra-se mais abrigadatanto da evaporação quanto de potencial contaminação.Logo os aqüíferos são mais protegidos, mas não sãoimunes a contaminações e devem ser remediados(termo técnico) quando tiverem sua qualidade alterada.Inúmeras são as possibilidades de se poluir as águasem geral, e as águas subterrâneas em particular, maso elemento poluidor mais onipresente é o esgotodoméstico. Como somos um país ainda mal servidopela coleta de esgotos, este se infiltra no solo, indoeventualmente parar nos aqüíferos. Uma fossa nadamais é do que um sistema de infiltração. Preocupante,não? Devemos nos lembrar que o problema água hojeé pauta mais por estarmos sujando a água queposteriormente iremos utilizar, do que pela sua escassez,uma vez que a quantidade de água do planeta épraticamente invariável. Esgoto doméstico é um vilão,sem dúvida.

No Brasil temos uma tradição muito forte de usode águas superficiais. Quando se fala em água, sempresão mencionados os mananciais de superfície: represas,lagos, rios, córregos. Entretanto, para surpresa demuitos, no Estado de São Paulo, o mais desenvolvidoda federação, aproximadamente 50% dos municípiossão abastecidos exclusivamente por águas subterrâ-neas. Sim, água de poço. Além disso, outros 25% sãoparcialmente abastecidos por águas subterrâneas.Somente 25% do total são abastecidos exclusivamentepor águas superficiais. Parece paradoxal a águasubterrânea ser sempre mencionada como fontealternativa. Mesmo regiões áridas, como o nordestebrasileiro, dispõem de recursos hídricos subterrâneosque podem e devem ser utilizados. As águas nessesreservatórios podem apresentar uma maior dificuldaderelativa para serem explotadas, afinal é preciso construirum poço. Entretanto isso é um problema menor quandose compara com a qualidade superior da água, que vairequerer menor tratamento, quando isso for necessário.Ou ainda se considerarmos a distribuição de águasubterrânea, muito mais otimizada, uma vez que ospoços são localizados próximos aos consumidores.

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Temos na região Sudeste do Brasil o maior sistemaaqüífero do mundo, o Sistema Aqüífero Guarani, quearmazena um total de 45.000 km3 como reservapermanente, isto é, reserva que pode ser utilizada eque é recomposta pela infiltração das águas de chuva.Se lembrarmos que um cidadão precisa de 200 litrospor dia, e que 1 km3 corresponde a 1 bilhão de litros...Bons poços no Guarani produzem mais de 400 milhõesde litros por hora. Números fantásticos e animadores.

Claro que nem todo aqüífero é o Guarani, assimcomo nem toda água superficial é um rio Amazonas.Mas há abundância no país e a gestão integrada dosrecursos hídricos deve orientar o uso racional destaimensidão de recursos que o país dispõe.

Nosso país deve orientar-se claramente pelo usoda água subterrânea em toda sua potencialidade. Osestados precisam estar equipados com leis adequadaspara permitirem que técnicas corretas de perfuração depoços, de explotação de quantidades que não superema capacidade de reposição de água pela recarga, enfim,de gestão correta do uso deste recurso, além de seequiparem para sua preservação, uma vez que o esgotodoméstico é o principal poluente potencial de nossosaqüíferos e é função do estado de fazer sua coleta.

Água vai continuar a ser assunto, e as águassubterrâneas virão cada vez mais à superfície dasdiscussões em torno do uso racional dos recursoshídricos.

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133São Paulo, UNESP, Geociências, v. 27, n. 1, p. 133-134, 2008

ÁGUA SUBTERRÂNEA EM ÁREAS URBANAS:POTENCIALIDADE, PROBLEMAS E DESAFIOS

Mateus SIMONATO

SERVMAR. Avenida Fagundes Filho, 252, 16o. Andar – Vila Monte Alegre. CEP 04304-000. São Paulo, SP

A temática em torno da gestão dos recursoshídricos vem assumindo lugar de destaque nas agendasdas reuniões políticas mundiais e, nesse tema, osrecursos hídricos subterrâneos tornam-se a cada dia oalvo das discussões, uma vez que representam 96%do volume da água doce líquida da Terra.

Desde os primórdios da civilização, a disponi-bilidade de água esteve no cerne das migrações,ocupações, disputas e conflitos. Atualmente não édiferente. A partir da revolução industrial, as áreasurbanas expandiram-se e, continuam em expansão, emtodas as regiões do Planeta, provocando aumentosprogressivos da demanda por água, tanto pela concen-tração de pessoas como pela atividade industrial.

A forte demanda por água nas regiões urbanasimpulsiona a necessidade do gerenciamento dosrecursos hídricos subterrâneos e, nesse aspecto, anecessidade de se responder questões simples, porémimportantes, como:• Por que proteger a água subterrânea?• Contra o que se deve proteger a água subterrânea?

• Como proteger a água subterrânea?

A necessidade em se explicar as razões de protegera água subterrânea e disso não estar totalmentecompreendido na sociedade, talvez esteja relacionadoao histórico de larga utilização das águas superficiaisou pelo desconhecimento do potencial de utilização daságuas subterrâneas ou ainda pela inobservância da atualabrangência de utilização das águas subterrâneas.

A civilização moderna já é refém da água subter-rânea. Dados da Organização Mundial de Saúdeindicam que na América Latina cerca de 175 milhõesde pessoas dependem da água subterrânea, e, no Brasil,cerca de 40% da população, de acordo com levanta-mento do IBGE. No Estado de São Paulo, dados doDAEE indicam que 73% dos municípios são total ouparcialmente abastecidos pelo recurso hídrico subter-râneo. Montantes como os indicados acima, podemdemonstrar a importância na proteção desse recurso.

Podem ainda serem acrescidos à lista de justifica-tivas pela proteção da água subterrânea: os baixoscustos de utilização deste recurso; a qualidade constan-

te; o baixo índice de susceptibilidade à contaminação ea facilidade no controle de qualidade, se comparado àságuas superficiais e, principalmente, a disponibilidade.

O crescente aumento pela demanda do recursohídrico subterrâneo e a ocupação da superfície pelaurbanização criaram condições adversas à proteçãodas águas subterrâneas. Tais condições adversascomprometem tanto a quantidade como a qualidade,sendo agravadas pela impossibilidade de umaobservação direta à ocorrência do problema.

Os problemas mais comuns que comprometem adisponibilidade do recurso hídrico subterrâneo são asuperexploração e a contaminação. A falta de geren-ciamento na utilização do recurso hídrico subterrâneonão permite evitar a ocorrência destes problemas, sendodetectados somente em condições muito críticas decomprometimento.

A superexploração caracteriza-se pela demandasuperior à disponibilidade e é refletida através dadiminuição dos níveis potenciométricos dos poços equeda na produção de água. As conseqüências asso-ciadas a este problema podem ser, entre outros:

1. Econômicas – maior custo de exploração, devidoà maior profundidade do nível de água; perda depoços por tornarem-se secos ou com baixíssimaprodução; necessidade de trazer água de local maisdistante;

2. Ambientais – alteração na qualidade da águadevido a desequilíbrios físico-químicos causadospelo bombeamento excessivo do aqüífero; e

3. Estruturais – acomodações de solo que podemprovocar desabamentos de relevo, bem como deedificações, em decorrência de alívios de pressãoocasionados pela remoção de grandes volumes deágua.

A contaminação dos aqüíferos é um problemaainda mais comum que os de superexploração, pois,invariavelmente, ocorre nas áreas urbanas, seja asso-ciada à ocupação residencial ou pelas atividades produ-tivas (indústrias, comércios e serviços).

A carga de contaminante da ocupação residencialestá associada, sobretudo, ao esgoto e, com isso, a

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contaminações por nitrato e microrganismos e à dispo-sição dos resíduos sólidos urbanos que, nos paísesmenos desenvolvidos são depositados em locaisinadequados, sem qualquer tipo de confinamento, nosdenominados lixões.

As atividades produtivas podem provocar conta-minações com índices de toxicidade mais elevados,relacionados ao uso de produtos químicos que podemcausar somente intoxicações agudas, o que já é grave,mas também, câncer e mutações genéticas. Se porum lado, são contaminações mais agressivas, por outrolado, as contaminações do setor produtivo são maislocalizadas que às de origem residencial.

Independente da origem da contaminação, ocontrole e a proteção em relação a este problema devemser considerados, pois os custos associados aos projetosde remediação ambiental de água subterrânea são muitoelevados, podendo eventualmente inviabilizar a utilizaçãodo recurso hídrico subterrâneo para finalidades maisnobres como, por exemplo, consumo humano.

No Brasil, podem ser verificados todos os ele-mentos que condicionam a necessidade do gerencia-mento da exploração do recurso hídrico. Em muitoscentros urbanos que dependem da água subterrânea jáforam constatados problemas de superexploração e/oucontaminação e, em tantos outros nem sequer foramavaliadas a potencialidade destes problemas ocorrerem.

No sentido de alcançar o objetivo de proteger osrecursos hídricos subterrâneos são necessárias açõesintegradas, entre as quais podem ser destacadas: odesenvolvimento de um arcabouço legal consistente;melhor aparelhamento dos gestores públicos nafiscalização das leis; a conscientização dos usuários,o fortalecimento dos comitês de bacias, através daparticipação de todos os setores da sociedade, entreoutras.

No entanto, todas as ações, independentementeda esfera que ocorram, devem ser embasadas noconhecimento técnico. Não será possível o adequadogerenciamento dos recursos hídricos subterrâneos semconhecer aspectos como: a dinâmica dos aqüíferos deinteresse; os perímetros de proteção dos poços; a dispo-nibilidade hídrica subterrânea; os índices de vulnera-bilidade dos aqüíferos; a caracterização química naturaldas águas subterrâneas.

Todo este entendimento deverá ainda ser contra-posto aos aspectos de ordem socioeconômicas quediretamente influenciam no modelo de uso e ocupaçãodo solo, nos perfis de consumo e na potencialidade decargas contaminantes.

A partir do conhecimento técnico é que poderãoser adotadas medidas de controle para proteção daságuas subterrâneas em busca do desafio de prover àsociedade os recursos hídricos subterrâneos.

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ÁGUA: USO E GESTÃO NO SÉCULO XXI – ÁGUASSUBTERRÂNEAS RESERVAS DE OPORTUNIDADES

PARA O DESENVOLVIMENTO SOCIAL E ECONÔMICO

Paulo Lopes VARELLA NETO

Agência Nacional de Águas – ANA. Setor Policial, Área 5, Quadra 3, Blocos “B”, “L” e “M”.CEP 70610-200. Brasília, DF. Endereço eletrônico: [email protected]

A água literalmente permeou a história da civi-lização humana, condicionando a ocupação do homem,seja na nucleação de aglomerados humanos que deramorigem as primeiras cidades, seja na ocupação deterrenos para o desenvolvimento de práticas agrícolase de criação de animais, entre outras. A localizaçãodas principais civilizações foi inteiramente condicionadapela presença da água.

Estima-se que a terra tenha cerca de 1,4 bilhãode km3 de água, entretanto, desse espetacular volume97% se referem a água salgada dos mares e oceanos.Dos 3% restantes, a quase totalidade encontra-sedisposta como geleiras nas calotas polares; restando,assim uma ínfima parcela de 0,001 do total, como águadoce utilizável, sendo que desse montante grande parteé constituído por águas subterrâneas.

As águas estão distribuídas de forma desigual, háregiões com grandes contingentes populacionais, comoa África, Ásia e Europa e baixa disponibilidade hídricasuperficial. Os dados da ONU indicam que metade dapopulação mundial em 2025, cerca de 4 bilhões depessoas, poderá ter sérios problemas de escassez derecursos hídricos.

O Brasil, com suas dimensões continentais, édetentor de cerca de 12% dos recursos hídricos super-ficiais do planeta, considerando nesse montante,naturalmente a contribuição das águas subterrâneas,via o fluxo de base desses mananciais superficiais. Adistribuição populacional em nosso país é diame-tralmente oposta à disponibilidade hídrica. A regiãoamazônica é ocupada por cerca de 7% da população,mas concentra cerca de 70% das águas superficiais.Por outro lado, as regiões nordeste e sudeste têm juntas,por volta de 70% da população e dispõem somente de9% dos recursos hídricos superficiais.

A concentração populacional brasileira ao longoda faixa litorânea, justamente onde a disponibilidadehídrica é menor, associada ao elevado contingente demigração interna, onde o país passou de uma populaçãodominantemente rural nos anos 50 (63%) para os diasatuais onde a zona urbana concentra 81% da população,

acarretou substancial degradação da qualidade da água,advindo da insuficiente cobertura da rede de coleta etratamento de esgotos do país.

Para o enfrentamento das grandes questõesrelativas à gestão dos recursos hídricos no Brasil foiconcebida a Lei 9433/97-Lei das Águas que instituiu aPolítica Nacional de Recursos Hídricos e criou oSistema Nacional de Gerenciamento de RecursosHídricos. Esse diploma legal, considerado um dos maisavançados do mundo no que tange a gestão de recursoshídricos, impõe ao País um modelo de gestãodescentralizado e participativo.

A Lei das Águas tem o seu foco voltado para aproclamação dos princípios básicos do setor de recursoshídricos (a bacia hidrográfica como unidade deplanejamento; água é um recurso natural e limitado,dotado de valor econômico e é bem de domínio público;o uso prioritário para o consumo humano e desse-dentação animal, em casos de escassez; a gestão deveser descentralizada, participativa, e proporcionar o usomúltiplo), no estabelecimento dos instrumentos degestão (plano de recursos hídricos, enquadramento doscorpos de água, cobrança pelo uso dos recursos hídricose o sistema de informações sobre recursos hídricos); ena criação do Sistema Nacional de Gerenciamento deRecursos Hídricos.

A água subterrânea tem grande importânciaestratégica e como fonte atual de suprimento hídrico.Os usos múltiplos das águas subterrâneas são cres-centes: além do abastecimento, há uso para irrigação,indústria, engarrafamento de águas minerais, balneo-terapia, entre outros.

Embora o uso do manancial subterrâneo sejacomplementar ao superficial em muitas regiões doBrasil, em outras áreas a água subterrânea representaa principal fonte hídrica. Ela desempenha importantepapel no desenvolvimento socioeconômico do país.Entre 70-90% do abastecimento dos municípiosbrasileiros é, pelo menos, parcialmente feito por águasubterrânea. Já cerca de 95% das indústrias fazemuso dessa fonte.

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As águas subterrâneas têm grande alcance social,pois os poços tubulares, quando bem construídos eprotegidos, garantem a sobrevivência e a saúde dapopulação. Os dados do último Censo (2000) revelamque 15,6% dos domicílios brasileiros utilizamexclusivamente água subterrânea para o abastecimento.No Estado de São Paulo, 72 % dos municípios sãototal ou parcialmente abastecidos por água subterrâneasendo que 48% são totalmente abastecidos por essemanancial, a exemplo da cidade de Ribeirão Preto, compopulação por volta de 600 mil habitantes. A agriculturairrigada, por ocupar quase 4 milhões de hectares eapresentar grande demanda unitária de água, respondepor cerca de 46% da retirada de água no país, sendo omaior usuário desse recurso.

Cerca de 90% dos rios brasileiros tem a suaperenidade dependente do fluxo de base- provenientesda contribuição dos aqüíferos, de forma que existe umaestreita dependência entre águas superficiais esubterrâneas. Nesse sentido, a gestão integrada dosrecursos hídricos superficiais e subterrâneos é vital.Ela deve ser holística e sistêmica, com risco de, nomédio prazo, os órgãos gestores de recursos hídricosestaduais e federais possam utilizar balanços hídricospouco representativos, uma vez que tratam separa-damente cada componente do ciclo hidrológico.

A Agência Nacional de Águas executa, desdemaio/2007, o seu Plano Estratégico de Águas Subter-râneas, o qual tem como macro objetivo à imple-mentação da efetiva gestão integrada de recursos

hídricos subterrâneos e superficiais no País. O contornojurídico do Plano está em consonância com os ditamesda Constituição Federal, a indelével dominialidade daságuas subterrâneas dos Estados e, naturalmente nospreceitos legais (Lei 9433/97 e 9984/00) e infralegais(Resoluções do Conselho Nacional de RecursosHídricos) que impõem uma gestão integrada de recursoshídricos.

O Plano tem a sua diretriz basilar voltada paradotar os órgãos gestores de recursos hídricos estaduaisde conhecimento hidrogeológico, técnico-gerencial ede capacitação, específica em águas subterrâneas, paraque possam realizar adequadamente a gestão sistêmicae integrada dos recursos hídricos. Contempla quatrograndes objetivos:• Apoiar a gestão das águas subterrâneas nos

Estados;• Ampliar o conhecimento hidrogeológico nacional;• Promover a aplicação dos instrumentos da Política

Nacional de Recursos Hídricos nas águas subter-râneas;

• Apoiar a gestão compartilhada de aqüíferosinterestaduais e transfronteiriços.

A gestão integrada dos recursos hídricos subter-râneos e superficiais transcende a questão dadominialidade, deve ter abrangência nacional e não seater às esferas estadual ou federal. É um desafio queperpassa a todos os integrantes do Sistema Nacionalde Gerenciamento de Recursos Hídricos.

São Paulo, UNESP, Geociências, v. 27, n. 1, p. 135-136, 2008

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DESASTRES NATURAIS:CAUSAS E CONSEQÜÊNCIAS

Eduardo Soares de MACEDO

Centro de Tecnologias Ambientais e Energéticas, Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo – IPT.Avenida Professor Almeida Prado, 532 – Cidade Universitária. CEP 05508-901. São Paulo, SP. Endereço eletrônico: [email protected]

Nas ultimas décadas da história contemporânea,observa-se um aumento no número de desastres, sejamnaturais, sejam provocados pelo homem, comimportantes resultados em termos de perdas humanase danos materiais. Estes podem levar a graves crisessocioeconômicas as regiões e até países menos prepa-rados para a resposta a esses desastres.

Preocupa a comunidade internacional o aumentoda vulnerabilidade das populações em grande parte doplaneta.

Os principais desastres naturais são: vulcanismo,terremotos, escorregamentos, tsunamis, inundações,

tempestades (furacões, ciclones, tornados etc.), secas/desertificação. Estes apresentam efeitos diversos àpopulação, sendo observado, principalmente, a fome eas doenças.

A freqüência destes eventos mais do que duplicouentre os anos de 1500 e 2008. As grandes catástrofesnaturais que ocorreram neste período são atribuídas,em proporções semelhantes, aos terremotos, erupçõesvulcânicas, tempestades e inundações. Ressalta-se queos desastres que resultaram em mais da metade dasperdas humanas correspondem aos terremotos e aserupções vulcânicas, conforme Quadro a seguir.

São Paulo, UNESP, Geociências, v. 27, n. 1, p. 137-139, 2008

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No Brasil, os principais processos do meio físicoque ocorrem são: inundação, deslizamento; seca eerosão. Outros processos também ocorrem, mas commenor incidência, tais como terremotos, tornados esubsidências. Destes, as inundações causam os maioresprejuízos econômicos e os deslizamentos a maiorquantidade de vítimas fatais. Levantamentos do IPTmostram que de 1988 a 2008 mais de 1700 pessoasforam vitimadas por deslizamentos no Brasil.

Como existe uma estreita relação entre aurbanização descontrolada, sem critérios técnicos ecom alta participação das camadas mais pobres dapopulação, o planejamento urbano, as políticashabitacionais e educacionais, as informações públicase treinamento de agentes públicos estão entre asmedidas mais eficazes para a prevenção e controledos prejuízos socioeconômicos.

No entanto, todas as medidas preconizadas eque estão em aplicação devem sofrer avaliação dadoo novo paradigma que regerá as relações homem/meioambiente: as mudanças climáticas. Espera-se, porexemplo, que no sudeste brasileiro haverá aumento de

temperatura, aumento de umidade e, portanto, aumentodas chuvas, o que pode vir a aumentar a ocorrência deeventos extremos, responsáveis pelas inundações eparte dos deslizamentos.

Desta forma, o foco dos trabalhos em desastresdeverá ser o da adaptação das nossas ações e darealidade de nossas cidades às mudanças climáticas.Adaptação deve ser entendida como avanço e melhorianas medidas adotadas para minimizar os efeitosadversos na economia, saúde pública e na qualidadeambiental. No caso dos processos que afetam as áreasurbanas, principalmente inundações e deslizamentos,está se falando em adaptações no ambiente construídoe na infraestrutura das nossas cidades.

De qualquer forma, com ou sem mudançasclimáticas, a tendência é de aumento da ocupaçãodesordenada, com maior número de áreas de risco emaior quantidade de vítimas.

Um processo de mudanças nas políticas urbana,econômica, habitacional e educacional pode indicar umcaminho para que nossas cidades se tornem maisseguras.

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REGISTROS RECENTES DE SISMICIDADENA REGIÃO SUDESTE DO BRASIL

João Carlos DOURADO

Departamento de Geologia Aplicada, Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista,Campus Rio Claro. Avenida 24-A, 1515 – Bela Vista. CEP 13506-900. Rio Claro, SP.

Endereço eletrônico: [email protected]

Dentre os agentes dos desastres naturais, osterremotos são, sem dúvida, um dos mais catastróficos.

O Brasil, por se situar no meio da Placa TectônicaSul-Americana, possui baixo risco de ocorrência deeventos sísmicos capazes de gerar grandes perdasmateriais e perda de vidas humanas. Porém ocorreramnos últimos seis meses dois eventos que de certamaneira causaram preocupações na população emgeral, na comunidade científica e em órgãos ligadosgovernamentais ligados ao monitoramento e prevençãode desastres naturais.

Os eventos são: sismo de São Vicente, SP e sismode Itacarambi, MG.

O evento de São Vicente ocorreu aproxima-damente às 21:00 horas do dia 22/04/2008, tevemagnitude de 5,2 na Escala Richter e foi sentido empelo menos 4 estados: São Paulo, Rio de Janeiro, MinasGerais e Paraná, sendo que as maiores intensidadesforam sentidas no Estado de São Paulo, notadamenteno litoral e na Capital.

O segundo evento aconteceu nos primeiros minu-tos do dia 09/12/2007 no povoado de Caraíbas, nomunicípio mineiro de Itacarambi, perto da divisa com oEstado da Bahia. Este evento causou danos severosem várias construções residenciais, causando inclusivedesmoronamentos parciais de algumas casas e a des-truição total de, pelo menos, uma delas. Infelizmenteeste evento também causou ferimentos em seis pessoase uma vítima fatal, constituindo-se no primeiro terre-moto que ocorreu em território brasileiro a causar umafatalidade.

Devido à preocupação causada por estes eventosé necessário que a comunidade científica de respostasque expliquem estes fenômenos, para que a populaçãoe o governo saibam como proceder. E uma dos estudosque devem ser feito é sobre a sismicidade das regiõesonde ocorreram os sismos, pois desta forma pode-seentender como eles são gerados e de certa forma pre-ver, pelos menos de forma bastante geral, a ocorrênciaespacial e temporal de novos episódios.

Os dois eventos podem ser classificados comooriginados de sismicidade intraplaca.

Como na maioria das regiões onde ocorrem even-tos ligados à sismicidade intraplaca é muito difícildeterminar qual o tectonismo gerador destes eventos.

Quanto ao sismo de São Vicente existem pelosmenos três hipóteses que devem ser melhores estuda-das visando explicar esta sismicidade:

• Resposta de esforços locais de flexura (devido àcarga de sedimentos da plataforma) associadoscom uma menor resistência da crosta causada pelogrande estiramento crustal ocorrido durante a fasede separação entre a América do Sul e África(Assumpção, 1998).

• A ruptura e afundamento da litosfera oceânicadevido ao processo de envelhecimento e aumentode densidade.

• Regimes compressivos existentes no interior daPlaca Sul Americana, devido à convergência entreas placas de Nazca e América do Sul combinadocom o empurrão da dorsal meso-oceânica,causando acúmulos de tensões compressivas emdeterminadas regiões como nas plataformascontinentais.

Com relação ao Sismo de Itacarambi, a hipótesemais provável é que ele tenha sido originado atravésde movimentações de uma falha existente na região.

Considerando-se os dois eventos podem-se fazeras seguintes apreciações:

• A solução adotada para Itacarambi pelos órgãosgovernamentais, ou seja, transferir a população dopovoado para outra localidade, não é apropriada,pois não existe garantia de que esta outra localidadeestará isenta de terremotos e caso ocorra eventossemelhantes em localidades maiores, não serápossível adotar a mesma prática.

• Pelos dados acumulados pelo Boletim SísmicoBrasileiro, não existe evidências que a sismicidadeno Brasil esteja aumentando, mas sim que o

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142 São Paulo, UNESP, Geociências, v. 27, n. 1, p. 141-142, 2008

ASSUMPÇÃO, M. Seismicity and stresses in the Brazilian Passive Margin. Bulletin of Seismological Society of America, v. 88,

n. 1, p. 160-169, 1998.

aumento da ocupação do território e dos equipa-mentos de detecção (sismógrafos) possibilita ummaior registros do evento.Ressalta-se que o número de estações sismoló-

gicas no Brasil é muito pequeno, impossibilitando oestudo mais aprofundado da sismicidade, como adeterminação do mecanismo focal dos sismos regionaisou locais que ocorrem no país.

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PANORAMA DOS RECURSOSENERGÉTICOS BRASILEIROS

Paulo METRI

Comissão Nacional de Energia Nuclear – CNEN. Rua General Severiano, 90. CEP 22294-900.Rio de Janeiro, RJ. Endereço eletrônico: [email protected]

De forma simplificada, pode-se dizer que“reservas” correspondem aos recursos minerais ou aospotenciais hidráulicos que já foram avaliados e dimen-sionados. Os recursos e reservas energéticas brasilei-ras conhecidas em 31/12/06, segundo o BalançoEnergético Nacional de 2007, nos tranqüilizam comrelação ao suprimento energético do país. Com osrecursos existentes, a sociedade brasileira não terá quedepender do fornecimento externo de energia. Outrospaíses, possuidores de alguns dos maiores PIB domundo, são dependentes do suprimento externo,principalmente, de petróleo e urânio. Os EstadosUnidos importam cerca de 65% da sua necessidadede petróleo. A França e o Japão, com dois dos maioresprogramas nucleares, não têm urânio, alem de nãoterem petróleo. A Alemanha e a Itália não têmpetróleo, nem urânio, mas não têm programas nuclea-res vigorosos. Ou seja, a garantia de suprimento ener-gético é um dos maiores problemas de muitos dospaíses desenvolvidos.

A invejável posição brasileira deve-se, em parte,à premiação concedida pela natureza aos brasileiros,mas, é também devido à nossa capacidade deinterpretar dados geológicos e geofísicos, de resolverproblemas tecnológicos e de engenharia, e de gerenciarempreendimentos de difícil nível de execução.Provamos que o carro a álcool era viável, temos umalto índice de produtividade para obtenção de álcool apartir da cana, sabemos descobrir e retirar o petróleoque ocorre no subsolo da costa brasileira, conhecemosa tecnologia de geração elétrica a partir do urânio, jáconstruímos muitas hidroelétricas e ainda temosalgumas a construir, respeitando o meio ambiente e ascomunidades locais. Temos reservas consideráveis depetróleo, gás natural, urânio e energia hidráulica. Poucospaíses congregam tantas opções de suprimentoenergético, alem de possuírem as respectivas tecno-logias de produção, transporte, processamento, distri-buição e consumo da energia.

As reservas brasileiras oficiais de petróleo, nopresente momento, estão acima da cifra de 13 bilhõesde barris, o que permite o abastecimento do país por

cerca de 17 anos. No entanto, o país deverá adicionarquantidade substancial de petróleo às suas reservasgraças às descobertas do pré-sal, algo entre 30 e 80bilhões de barris. Na melhor das hipóteses, o Brasilpassará a ter reservas de cerca de 90 bilhões de barris,o que o leva à condição de sexto país do mundo emreservas de petróleo, ultrapassando até a Venezuela ea Rússia. Se confirmada esta cifra de 90 bilhões debarris, ela representa um lucro líquido, após o paga-mento de impostos, de US$ 9 trilhões.

A atual reserva brasileira de urânio é de 309.000toneladas de U3O8 e é a sexta do mundo. Este valorfoi obtido com a pesquisa em somente 30% do territórionacional, significando que, se a pesquisa for ampliada,podemos encontrar novas jazidas. A reserva de urânioconhecida hoje é suficiente para que 16 usinas iguais àde Angra 2 funcionem durante suas vidas úteis, cercade 60 anos. Ao preço de mercado de US$ 90 porlibra de U3O8, esta reserva vale aproximadamenteUS$ 56 bilhões.

O potencial hidráulico brasileiro, incluindo osaproveitamentos já construídos e os a construir, é de144 GW ano, o que corresponde a cerca de 1.260 TWhpor ano. Em 2006, o Brasil gerou 377.644 GWh, atravésde diversas tecnologias, que utilizam diferentes fontes:hidroelétricas, termoelétricas a gás natural, a óleodiesel, a óleo combustível, a carvão vapor, nucleo-elétricas e outras, mas a principal fonte para geraçãoelétrica, no nosso país, é a energia hidráulica, respon-sável por 335.761 GWh em 2006.

A garantia de suprimento de petróleo tem sidoresponsável, por exemplo, pela aproximação entre aRússia e a Alemanha e entre a Rússia e a China, ainvasão militar do Afeganistão e do Iraque pelosamericanos, uma maior disposição ao diálogo entre aFrança e países árabes, a invasão comercial docontinente africano pelos chineses, o tolhimento doavanço do liberalismo na Ucrânia etc.

Desta forma, um país possuir grandes reservasde petróleo, no mundo atual, acima das necessidadesde sua população, significa ter a possibilidade de reterpara esta população, a maior parte do lucro colossal

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conseqüente da exportação de petróleo e de poder agircomo ator geopolítico.

Infelizmente, a nossa atual lei do petróleo (no 9.478/97) entrega para a empresa que o descobre e produz,a sua propriedade, deixando para a sociedade somentea taxação sobre a produção. Como a fixação daalíquota da taxação passa por um processo político,grupos de poder econômico sempre saem beneficiados.

Melhor seria para a sociedade se a propriedade dopetróleo produzido fosse da União, podendo estasubcontratar firmas para explorar e produzir petróleosem serem remuneradas com o próprio petróleoproduzido. Desta forma, o Brasil não estaria doandoimensa parcela do seu patrimônio para grupos privadose não estaria abdicando de exercer o poder geopolíticoque a natureza lhe concedeu.

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ENERGIA NUCLEAR

Paulo METRI

Comissão Nacional de Energia Nuclear – CNEN. Rua General Severiano, 90.CEP 22294-900. Rio de Janeiro, RJ. Endereço eletrônico: [email protected]

A energia nuclear tem aplicações em diversasáreas, a saber: geração de energia elétrica; utilizaçãode radioisótopos e radiofármacos na área de saúde,como nas tomografias por emissão de pósitrons (PET)ou nos tratamentos radioterápicos; aplicação deradiação em indústrias, como em esterilização demateriais de uso médico e industrial; aplicação deradiação na agricultura, para, por exemplo, irradiaçãode alimentos, especialmente frutas, ou esterilização deagentes de pragas; aplicação de radiação emmonitoramento do meio-ambiente, para identificaçãode aqüíferos; e, o mais recente uso, em um novoprocesso de dessalinização da água do mar.

Na história do desenvolvimento da energia nuclear,aparecem, com freqüência, as preocupações dediversos atores, inclusive os cientistas dos primórdiosdestas pesquisas, com o uso bélico desta fonte deenergia. O argumento do uso dual da tecnologia nuclear,apesar de ser uma preocupação válida, é tambémutilizado pelos países desenvolvidos para tolher oavanço desta tecnologia em países emergentes, poisnão há interesse que eles cresçam como concorrentesdo oligopólio estabelecido, em um mercado de produtose serviços nucleares, que movimenta no mundo cercade US$ 50 bilhões por ano. A história da energia nuclearno Brasil repete a de outros setores vitais para a nossasociedade, onde grupos econômicos, muitos delesestrangeiros, estão em constante ação pela posse dasnossas riquezas para auferirem lucros e os tomadoresde decisões nacionais, via de regra, esquecem ointeresse coletivo, permitindo a transferência destasriquezas.

Em 2006, 15,2 % da energia elétrica gerada nomundo foi de origem nuclear, só perdendo das térmicasa carvão (40,3%) e das térmicas a gás natural (19,7%),e praticamente igualando a geração das hidroelétricas(16,0%). Cerca de 78% da energia elétrica gerada naFrança, em 2005, foi de origem nuclear e, apesar denos Estados Unidos, só 19,9% da eletricidade gerada,neste mesmo ano, ter sido de fonte nuclear, esta

percentagem correspondeu a aproximadamente a 780TWh. Para efeito de comparação, a oferta interna deenergia elétrica no Brasil, neste ano, foi de 442 TWh,obtida a partir de todas formas de geração existentesaqui e incluindo a parcela importada de Itaipu.Existiam, em 2005, 441 usinas nucleares operandono mundo e 25 estavam em construção, sendo que,dentre as 441 que estavam em funcionamento, 215utilizavam a tecnologia PWR. Só os Estados Unidostinham 104 usinas nucleares, neste ano. No Brasil, aparticipação nuclear foi, em 2006, somente 3% dageração elétrica total.

O Brasil possui a sexta reserva mundial de urânio,309.000 t de U3O8, tendo sido pesquisado somente30% do território nacional. Possui, também, pratica-mente todas as tecnologias do ciclo do combustívelnuclear. Se compararmos a lista dos países com grandesreservas de urânio e a lista dos países que dominamtodas as tecnologias do ciclo do combustível nuclear,veremos que só o Brasil e os Estados Unidos estãonas duas. Assim, se o Brasil vier a ser exportador deurânio, deverá exportar urânio enriquecido ouelementos combustíveis, produtos com imenso valoragregado. Por outro lado, se buscarmos os países quetêm grandes programas nucleares e não têm urânioque sirva para atender às suas necessidades, vamosencontrar a França, o Japão, a China e a Índia. Ointeressante é que todos estes têm plantas de enrique-cimento isotópico, sem terem urânio.

Assim como existe, atualmente, a geopolítica dopetróleo, a geopolítica do urânio irá prevalecer em anosfuturos e as ações dos países poderosos serão nosentido de garantir o suprimento do insumo que lhespermite a geração nucleoelétrica. O país, que possuirurânio em quantidade tal que seja possível suaexportação, desde que este urânio não tenha sidoentregue a empresas privadas, poderá condicionar oabastecimento de outros países a trocas de interessepara sua sociedade ou a apoios em votações em órgãosmultilaterais etc.

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O PETRÓLEO NO ATUAL QUADROENERGÉTICO BRASILEIRO

Pedro Victor ZALÁN

Petróleo Brasileiro S/A - PETROBRAS. Avenida República do Chile, 65 – 14º andar, sala 1401.CEP 20031-912. Rio de Janeiro, RJ. Endereço eletrônico: [email protected]

A indústria petrolífera brasileira atravessa umboom de resultados positivos sem precedentes em suacurta história. Independentemente dos atuais preçosrecordes que o barril de petróleo tem alcançado nosúltimos meses, os níveis de reservas provadas, de novasdescobertas e de produção têm apresentado cresci-mentos significativos contínuos, ano após ano, especial-mente nos últimos 6 anos. E suas tendências, metas eprevisões para os próximos 10, ou até 20 anos, sãosimilarmente de incrementos ininterruptos.

Muito embora o mercado petrolífero brasileiroesteja aberto para todas as companhias nacionais eestrangeiras atuarem livremente desde 1997, quandoo monopólio estatal do petróleo foi encerrado no Brasil,a história e o espelho atual da indústria no país aindarefletem quase que integralmente a trajetória daPetrobras. Criada formalmente em 3 de Outubro de1953, a Petrobras iniciou suas atividades 95 anos após aperfuração do famoso poço do Coronel Drake, primeiropoço a descobrir petróleo no mundo, em 1859, naPensilvânia, USA. É extremamente importante frisarque quando a Petrobras começou as suas atividadesexploratórias e de produção de petróleo, a indústriamundial já contava com um século de atividades,experiência e tecnologia. Em meio século apenas, aempresa que começou praticamente do zero alçou-separa o seleto grupo de grandes empresas petrolíferasinternacionais, tornou-se líder mundial, reconhecida epremiada, em tecnologias sofisticadíssimas de explo-ração, e principalmente de produção, em águas profundase ultra-profundas. Atualmente, destaca-se como umadas maiores detentoras de reservas e uma das maioresprodutoras de petróleo do mundo.

Quando a Petrobras iniciou suas atividades em01 de Maio de 1954 sua produção era de apenas 2180bopd, contra um consumo nacional de 137.000 bopd (aprodução equivalia a apenas 1,6% das necessidadesdo país). A refinaria de Mataripe (a primeira do Brasil)encontrava-se ainda em construção. Suas reservasprovadas eram de cerca de 16,8 milhões de barris deóleo equivalente (boe, óleo e gás juntos, gás convertidopara barril de óleo equivalente). Já haviam sidodescobertos os campos de Pojuca, Candeias, Água

Grande e D. João, na Bacia do Recôncavo. Ao finalde 2007 sua produção era de 1.792.000 bopd depetróleo e de 2.065.000 boepd (óleo e gás juntos, gásconvertido para barril de óleo equivalente), oriundosde 312 concessões de produção, situadas em 11 baciassedimentares diferentes, do Amazonas até SantaCatarina. Um crescimento de 1000 vezes em apenas54 anos. Hoje em dia, o Brasil é auto-suficiente empetróleo, isto é, produz aproximadamente o mesmovolume que consome de petróleo. Ao final de 2007suas reservas provadas eram de 13,92 Gboe (pelocritério da Society of Petroleum Engineers) (cresci-mento de 829 vezes). Ao final de 2007 a Petrobras eraa 15ª companhia de petróleo do mundo (segundo aPetroleum Intelligence Weekly), detentora da 17ªmaior reserva de petróleo do mundo, sendo a 10o maiorprodutora de petróleo. A Petrobras conta no presentecom 14 refinarias (3 no exterior). Desde 11 de Marçode 2007, a Petrobras tem sido considerada como umadas Sete Novas Irmãs (Financial Times), grupo dassete companhias estatais mais importantes do mundo,ao lado da Saudi Aramco (Arábia Saudita),GAZPROM (Rússia) e NIOC (Irã). Ao final de 2007,em termos de valor de mercado, a Petrobras era asexta mais valiosa companhia petrolífera do mundo(ranking da PFC), à frente de gigantes multinacionaistais como a British Petroleum, Total e Chevron. Nodia 16 de maio de 2008, impulsionado pela alta dospreços do petróleo e pelas notícias de descobertassignificativas no pré-sal da Bacia de Santos, o valor daPetrobras chegou a U$ 287,711 bilhões de dólares,sendo considerada a sexta companhia de capital abertomais valiosa do mundo, entre todos os ramos daindústria.

A Petrobras começou com equipe própria degeólogos, geofísicos e engenheiros, com intensotreinamento no exterior, a pesquisar petróleo em baciasterrestres. Entre 1954 e 1968 (Ciclo de Terra) realizoudescobertas importantes, mas modestas em termos devolume, nas Bacias do Recôncavo e Sergipe-Alagoas.Em 23 de junho de 1968 a Petrobras perfurou seuprimeiro poço (1-ESS-1) na plataforma continentalbrasileira, nas águas rasas do Espírito Santo. Muito

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embora este poço tenha resultado seco, o segundoperfurado nas águas rasas de Sergipe descobriu ocampo de Guaricema, produtor até os dias de hoje depetróleo de boa qualidade. Entre 1968 e 1984 (Ciclode Águas Rasas) a Petrobras contabilizou uma sérieimpressionante de descobertas de óleo na plataformacontinental brasileira, desde a Bacia do Ceará até aBacia de Santos.

A Petrobras destacou-se no cenário mundial pelasdescobertas de óleo nas águas profundas da Bacia deCampos, para onde, quebrando paradigmas vigentesna indústria mundial na década de 80, partiu corajo-samente para a exploração de rochas-reservatório dotipo turbiditos (arenitos depositados por correntes deturbidez, em antigos mares profundos). Entre 1984 e1998 (Ciclo de Águas Profundas) volumes da ordemde dezenas de bilhões de barris de óleo in place foramdescobertos pelos geólogos e geofísicos da Petrobras,empregando conceitos exploratórios desenvolvidos inhouse, inéditos no mundo, em arenitos turbidíticos comidades variando do Cenomaniano ao Mioceno. Estasdescobertas rendem até hoje uma produção de 1.500.000bopd na Bacia de Campos. A criatividade, a sofisticaçãoe a capacidade demonstrada pelos engenheiros daPetrobras em colocar em produção campos de óleosituados entre 700 e 1800 m de lâmina d’água, nesteciclo, valeram para a companhia dois prêmios dereconhecimento outorgados pela prestigiosa OffshoreTechnology Conference em 1992 e 2000.

Entre 2002 e 2007 (em pleno Ciclo de ÁguasProfundas e Ultra-Profundas, 1998-Presente), mais 13bilhões de barris de óleo equivalente foram descobertos,novamente em águas profundas e ultra-profundas damargem continental brasileira. Entretanto, diferen-temente da fase anterior, estas descobertas notabi-lizaram-se pela variedade de situações geológicas (playspetrolíferos) em que este volume de petróleo foidescoberto. Carbonatos de tipos e idades variadas,vulcões, hiperpicnitos, turbiditos associados a rochasvulcânicas, astroblemas etc., são alguns dos exemplosonde a criatividade dos geólogos e geofísicos da Petrobrasfoi capaz de encontrar óleo pesado, óleo leve e gás.

O petróleo nacional caracterizava-se por serpredominantemente líquido (85%, óleo + LNG) e

subordinadamente gás (15%). A fração óleo pode serdecomposta em 74% de tipos pesados a intermediáriose apenas 11% de tipo leve. Consequentemente, o valorde mercado do petróleo nacional sempre sofreu porcausa desta qualidade, e, seus produtos refinados nãosupriam adequadamente o parque petroquímiconacional, forçando à importação de petróleo leve capazde gerar todos os produtos petroquímicos necessáriosao parque industrial brasileiro. Assim sendo, as notíciasde descobertas de volumes significativos de petróleodo tipo leve, no ambiente geológico denominado de Pré-Sal, principalmente na Bacia de Santos, encheu aPetrobras e o Brasil de orgulho e de esperança, depoder o país, finalmente, se juntar ao seleto e pequenogrupo de países portadores de grandes reservas depetróleo de alto valor comercial. Este play geológicose estende por grandes áreas da margem continentaldo sudeste do Brasil e promete a adição de váriosbilhões de barris de óleo leve às reservas provadasdo país.

Na matriz energética atual do Brasil, o petróleo egás figuram como constituintes de 47% da ofertaenergética do país (em toneladas equivalentes depetróleo). Curiosamente, energias renováveis tais comohidroeletricidade, biomassa e biocombustíveis apre-sentam exatamente o mesmo valor. Isto confere aoBrasil uma confortável posição no quadro mundial deenergia, exatamente no momento em que o petróleono mundo atinge os seus níveis mais altos de preçoao longo de toda a sua história de 149 anos. Além decontar com reservas suficientes para 20 anos deprodução ininterrupta aos níveis atuais, o país contaainda com descobertas de alto potencial volumétricoe econômico que podem, inclusive, levá-lo a ser umexportador significativo de petróleo. Curiosamente,sua dependência energética de derivados de petróleotenderá a diminuir drasticamente pelos próximos vinteanos para 28%, sendo sua parcela substituída pelomaior uso de gás (energia menos poluente) e deenergia derivada de biomassa. Esta estratégia permi-tirá ao Brasil usufruir economicamente das últimasdécadas de apogeu deste combustível não-renovávele finito, sem ficar energeticamente dependente evulnerável ao mesmo.

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