40
SALVADOR | BAHIA | 9 A 14 DE NOVEMBRO DE 2012 | ESPAÇO ITAÚ DE CINEMA-GLAUBER ROCHA | ESPAÇO CULTURAL DA BARROQUINHA www.cinefuturo.com.br O cinema baiano é dos curtas-metragistas Retrospectiva e mesa-redonda celebram obra e vida do autor de Cidadão Kane A volta de O Bandido da Luz Vermelha

Seminário Magazine 2012

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Revista do Festival CineFuturo - VIII Seminário Interncional de Cinema e Audiovisual, onde você pode conferir tudo sobre o Festival.

Citation preview

Page 1: Seminário Magazine 2012

Salvador | Bahia | 9 a 14 de NovemBro de 2012 | eSpaço itaú de CiNema-GlauBer roCha | eSpaço Cultural da BarroquiNha

www.c inefuturo .com.br

O cinema baiano é doscurtas-metragistas

Retrospectiva e mesa-redonda celebram obra e vida do autor de Cidadão Kane

A volta de O Bandido da Luz Vermelha

Page 2: Seminário Magazine 2012
Page 3: Seminário Magazine 2012

sumário

Eterno jovem | Cinema experimental ganha fôlego com digital | PáginAs 8 e 9

Crítica cinematográfica em xeque? | Era virtual aponta para novos rumos e críticos se adaptam | PáginAs 10 e 11

Qual das críticas? | Modelo de crítica foi varrido com novos tempos | PáginA 12

Entre 30 e 40 e tantos anos | Curtas- metragistas baianos se afirmam nacionalmente | PáginAs 14 e 15

Corte geracional | Chegou a hora da prova dos longas para curtas-metragistas | PáginA 16

Fala, Araripe! | Em entrevista, cineasta baiano põe pingos nos “is” | PáginAs 18 e 19

O Mundo de Orson Welles | A história de um gênio perseguido por obra-prima | PáginAs 20 a 25

Divisor de águas | Welles e a importância de Cidadão Kane | PáginAs 26 e 27

O poeta-repórter | Cuíca de Santo Amaro na telona | PáginAs 28 e 29Para todos os gostos | Mostra Internacional projeta filmes diversos | PáginAs 30 e 31Curtas para todos | Diversidade marca mostra competitiva | PáginAs 32 e 33Segurança nacional | Cinema é instrumento de dominação | PáginA 34Salada alemã | Beate Warkentien e Edino Krieger discutem cinema e música | PáginA 36

Questão de atitudeDa primeira edição do Festival Cine Futuro, que em 2005 se intitulava apenas Seminário Internacional de Cinema e Audiovisual, até hoje, o Brasil passou por diversas transformações. No entanto, o cinema nacional continua como um personagem indesejável em seu próprio território, uma vez que pouco frequenta as duas mil e tantas salas escuras de exibição país afora.

A situação só não é pior pelo fato de que os filmes globais e os de temática espírita dão a ilusão de que o brasileiro aprecia filmes feitos pelas bandas de cá. Mas se o critério for outro, é impossível não contestar o resultado das políticas públicas em apoiar a Sétima Arte nacional em toda a sua cadeia e esquecer o principal: garantir a sua exibição nas salas de cinema.

Sim, porque de nada adianta produzir uma grande quantidade de filmes com dinheiro público para que tais obras frequentem alguns festivais e depois sejam guardadas nas gavetas do esquecimento.

Então, diante do quadro, é de se pensar que o lógico seria o Estado brasileiro bater de frente com os interesses das multinacionais do entretenimento norte-americanas e acabar com o monopólio imposto por elas dentro das nossas próprias entranhas.

O que fazer? Os exemplos estão aí, da França aos vizinhos argentinos. Porém, se não melhorarmos a qualidade dos nossos burocratas ou simplesmente continuarmos fechando os olhos diante da festa alheia em nosso terreiro, o cinema brasileiro vai continuar como um eterno complexado.

Talvez o Festival Cine Futuro – Viii seminário internacional de Cinema e Audiovisual possa oferecer uma terapia reabilitadora de urgência, pois vai tocar no tema em uma de suas discussões. Como também vai falar de crítica cinematográfica, de cinema experimental, de Orson Welles e de tantas outras temáticas.

Tudo acompanhado de quase uma centena de filmes locais, nacionais e internacionais, longas e curtas inéditos na Bahia, enfim, cinema para todos os gostos com a alegria e o desprendimento de sempre.

Bom Seminário!Raul Moreira

Editor

editorial

seMináRiO MAgAzine | Edição e textos: Raul Moreira | Editor de arte: Sérgio Fujiwara | Consultoria gráfica: Angela Fuji-wara | Revisão: Arlete Castro | Tratamento de imagens: Charles Robert | Impressão e acabamento: Venture Gráfica

O retorno do “Bandido”Helena Ignez dá continuação a filme

ícone do cinema marginal | PáginA 7

| 3

Page 4: Seminário Magazine 2012

Programação | 9 a 14 | nov. 2012

4 |

Espaço Itaú de Cinema Glauber Rocha | Sala 1

6a Feira | 09 de novembro16h30 | Abertura do Festival Cinefuturo -

VIII Seminário Internacional de Cinema e AudiovisualMostra Internacional | Luz nas Trevas | Helena Ignez, Brasil, 2010, ficção, 83 min.Diálogo | Helena Ignez e Ney Matogrosso

20h | Mostra Competitiva de Curtas | Fugaz | Joacélio Batista, MG, 2012, 12 min.Mostra Internacional | Cuica de Santo Amaro | Josias Pires e Joel Almeida, Brasil, 2011, documentário, 76 min.

21h30 | Mostra Competitiva de Curtas | Dois | Thiago Ricarte, SP, 2012, 16 min.Mostra Internacional | Cuica de Santo Amaro | Josias Pires e Joel Almeida, Brasil, 2011, Documentário, 76 min.

Sábado | 10 de novembro14h | Mostra Competitiva de Curtas | Dique

| Adalberto Oliveira, PE, 2012, 19 min. Mostra Internacional | Minha Terra, Áfri-ca! | White material | Claire Denis, França, 2009, 107 min.

16h | Mostra Competitiva de Curtas | Cha-rizard | Leonardo Mouramateus, Ceará, Brasil, 2012, 15 min. O Amor em Branco e Preto | Rose Moraes, Bahia, Brasil, 2011, 5 min. Mostra Internacional | As Quatro Voltas | Le Quattro Volte | Michelangelo Frammar-tino, Itália / Alemanha / Suiça, 2010, 88 min.

18h | Mostra Competitiva de Curtas | Seca Verde | Nicolas Hallet e Simone Dourado, Bahia, 2011, 15 min.Mostra Internacional | Irmãs Jamais | Sorelle Mai | Marco Bellocchio, Itália, Ficção, 2010, 110 min.

20h30 | Mostra Competitiva de Curtas | Da Alegria, do Mar e de Outras Coisas | Ceci Alves, BA, 2012, 14 min. | Os Incomoda-dos que se Mudem | Juliana Brandão e Rose de Moraes, BA, 2012, 5 min.Mostra Internacional | Prá Lá do Mundo | Roberto Studart, Brasil, 2012, 78 min.

Domingo | 11 de novembro13h30 | Mostra Competitiva de Curtas | Epifâ-

nio | Glaucia Barbosa, Ceará, 2012, 23 min.Mostra Internacional | Vozes Silenciosas | Qu’un Seul Tienne et les Autres Suivront | Léa Fehner, França, 2009, ficção, 119 min.

16h | Mostra Competitiva de Curtas | Sig-nos da Tela | Caio Araujo, Bahia, 23 min.Mostra Internacional | Construção | Ca-rolina Sá, Brasil, 2012, 70 min.

18h | Mostra Competitiva de Curtas | Ser Tão Cinzento | Henrique Dantas, Bahia, 2011, 25 min. Orwo Forma | Karen Black, Lia Letícia, Rio de Janeiro, 2012, 4 min.Mostra Internacional | Alice Diz | Beto Rôa, Brasil, ficção, 2012, 76 min.

20h30 | Mostra Competitiva de Curtas | Desterro | Claudio Marques, Marília Hugles, Bahia, 2011, 15 min. Mostra Internacional | Batuque dos As-tros | Julio Bressane, Brasil, 2012, 75 min.

2a Feira | 12 de Novembro10h | Mesa Redonda | O Cinema Experi-

mental | Guiomar Ramos, Tarek Elhaik, Ivana Bentes.

15h | Diálogo | Política e Cinema Sul-Ame-ricano | Emir Sader e Sergio Muniz

18h30 | Mostra Competitiva de Curtas | Dançando mas Tô Andando | Marcondes

Dourado, Bahia, 2012, 13 min. Mostra Internacional | Perseguição | Persecution | Patrice Chéreau, França/ Ale-manha, 2009, 100 min.

20h30 | Mostra Competitiva de Curtas | Bomba | Francisco Franco, Minas Gerais - BR, 2011, 20 min. | | Lulaby | André Lage, MG, 2012, 11 min. Mostra Internacional | Passos Duplos | Los Pasos Dobles | Isaki Lacuesta, Espanha/Suiça, 2011, 87 min.

3a FEIRA | 13 DE NovEmbRo10h | Mesa Redonda | O Ocaso da Crítica

Cinematográfica? | Sihan Felix, Cássio Starling, Franco Marineo, Rubens Ma-chado Jr.

15h | Mesa Redonda | Qual o Futuro do Cine-ma Baiano | Henrique Dantas, Daniel Lisboa, Ceci Alves, Fabio Rocha, Carlos Prozato.

18h30 | Mostra Competitiva de Curtas | Câ-mara Escura | Marcelo Pedroso, Pernam-buco, 2012, 25 min.Mostra Internacional | Você não Gosta da Verdade | You don’t lLke theTruth | Luc Côté e Patricio Henriquez, Canadá, 2010, 99 min.

20h30 | Mostra Competitiva de Curtas | Telefonema de Origem | André Nogueira, Bahia, 2012, 23 min.Mostra Internacional | Éden | Bruno Safa-di, Brasil, 2012, 73 min.

4a FEIRA | 14 DE NovEmbRo10h | Mesa Redonda | Orson Welles | Franco

Marineo, João Luiz Vieira, Irma Viana15h | Diálogo | O Som, a Música e o Cinema

| Beate Warkentien, Edino Krieger, Waldir Xavier, Tuzé de Abreu

18h | Mostra Internacional | Sudoeste | Eduardo Nunes, Brasil, 2011, 128 min.

20h30 | Encerramento | Premiação ePerformance | EdbrassMostra Internacional | Futuro do Prete-rito: Tropicalismo Now ! | Ninho Moraes, Francisco César Filho, Brasil, 2012

Espaço Itaú de Cinema Glauber Rocha | Sala 2

Retrospectiva orson Welles

6a. FEIRA | 09 DE NovEmbRo14h | Jornada de Pavor | Journey into Fear

| EUA, 1943, 68 min.16h | Soberba | The Magnificent Ambersons |

EUA, 1942, 88 min.18h | O Estranho | The Stranger | EUA, 1946,

95 min.20h | Cidadão Kane | Citizen Kane | EUA,

1941, 119 min

SábADo | 10 DE NovEmbRo14h | Don Quixote | EUA / Espanha / Itália,

1992, 116 min16h | A Marca da Maldade | Touch of Evil |

EUA, 1958, 95 min. 18h | Falstaf | França / Espanha / Suíça, 1965,

113 min.20h | A Dama de Xangai | The Lady from

Shangai | EUA, 1947, 87min.

DomINGo | 11 DE NovEmbRo14h | O Terceiro Homem | The Third Man |

Carol Reed, EUA, 1949, 104 min.16h | O Processo | Le Procès | França/Ale-

manha Ocidental/Itália, 1962, 107 min. 18h | Mr. Arkadin | França / Espanha /Suiça,

1955, 93 min.20h | Verdades e Mentiras | EUA, Doc, 1973,

89 min.

2a FEIRA | 12 DE NovEmbRo14h | Estranha Compulsão | Compulsion |

Richard Fleischer, EUA, 1959, 103 min.16h | Este é Orson Welles | EUA, 1958, 139 min.18h30 | História Imortal | França, 1968, 58 min 20h | Malpertuis | Harry Cumel, Bélgica, 1971,

125 min.

3a FEIRA | 13 DE NovEmbRo14h | O Homem que não Vendeu Sua Alma |

Fred Ziennemann, Inglaterra, 1966, 122 min16h | Cidadão Kane | Citizen Kane | EUA, 1941,

119 min18h | A Marca da Maldade | Touch of Evil |

EUA, 1958, 95 min.20h | Othelo | EUA, 1952, 90 min.

4a FEIRA | 14 DE NovEmbRo14h | O Processo | Le procès | França / Ale-

manha Ocidental / Itália, 1962, 107 min. 16h | A Dama de Xangai | The Lady from

Shangai | EUA, 1947, 87 min.18h | Verdades e Mentiras | EUA, docu-

mentário, 1973, 89 min.20h | Macbeth | EUA, 1948, 89 min.

Espaço Itaú de Cinema Glauber Rocha | Sala 3

mostra do Cinema Experimental6a. FEIRA | 09 DE NovEmbRo14h | Programa 1 | A Vanguarda Francesa |

Manhattan | Charles Sheeler, 1921, 10 min. | Rhythmus 21 | Hans Richter, 1921, 3 min. | Vormittagsspuk | Hans Richter, 1928, 9 min. | Ballet Mécanique | Fernand Léger, 1924, 11 min. | Symphone Diagonale | Viking Eggeling, 1924, 7 min. | Cockeyed: Gems From the Memory of a Nutty Ca-meraman | Alvin, 1925, 3 min. | Knechten Anémic Cinèma | Marcel Duchamp,1926, 6 min. | La Coquille et le Clergyman | Germaine Dulac, 1926, 31 min. | The Life And Death of 9413 a Hollywood Extra | Robert Florey e Slavko Vorkapich 1928, 13 min. | Skyscraper Symphony | Robert Flo-rey, 1929, 9 min.

16h | Programa 2 | A Vanguarda Francesa | Le Retour a la Raison | Man Ray, 1923, 2 min. | L’etoile de Mer | Man Ray, 1928, 15 min. | Emak-Bakia | Man Ray, 1926, 16 min. Les mysteres du chateau du de | Man Ray, 1929, 20 min. | Meni L’montant | Dimitri Kirsanoff, 1926, 37 min. | Brumes D’automne | Dimitri Kirsanoff, 1928,12 min. | Überfall | Ernö Metzner, 1928, 22 min.

18h30 | Programa Luis Buñuel | Cão Anda-luz | França, 1929, 16 min. | A Idade do Ouro | França, 1930, 60 min.

20h | Programa Stan Brakhage | Unglassed Windows Cast a Terrible Reflection | EUA, 1953, 30 min. | The Way To Shadow Gar-den | EUA, 1954, 10 min. | The Extraordi-nary Child | EUA, 1954, 12 min. | Ínterim | EUA, 1952, 24min.

SábADo | 10 DE NovEmbRo14h | Sangue de um Poeta | Jean Cocteau,

1930, FRA, 116 min. 16h | Testamento de Orfeu | Jean Cocteau, 1959, FRA, 111 min.

18h | Programa Poetas Visuais dos Anos 40 | Tramas da Tarde | Meshes of the Af-ternoon | Maya Deren, 1943, EUA, 14 min. | Christmas | Gregory Markopoulos, 1949, EUA 13 min. | House of Cards | Joseph Vo-gel, 1947, EUA 16 min. | The Cage | Sidney Petterson, 1947, EUA 28 min. | The Potted Psalm | Sidney Petterson e James Brough-ton, 1946, EUA, 18 min.

20h | Wavelenght | Michael Snow, 1967, Ca-nadá / EUA, 45 min.

Page 5: Seminário Magazine 2012

| 5

DomINGo | 11 DE NovEmbRo14h | The Chelsea Girls | Andy Warhol, 1966,

EUA, 210 min.18h | Velvet Underground + Vinyl | Andy

Warhol, 1966, EUA, 126 min. 20h | My Hustler e A Man | Andy Warhol, EUA,

(1965-1967), 156 min.

2a FEIRA | 12 DE NovEmbRo14h | Diaries Notes and Sketches | EUA,

documentário,1969, 177 min. 18h | Programa Kenneth Anger Lucifer |

Rising | EUA, 1981, 28 min. | Invocation of My Demon Brother | EUA, 1969, 12 min. | Scorpio Rising | EUA,1964, 29 min.

20h | Wavelenght | Canadá / EUA, 1967, 45 min.

3a FEIRA | 13 DE NovEmbRo14h | Programa Luis buñuel | Cão Andaluz

| França, 1929, 16 min. | A Idade do Ouro | França, 1930, 60 min.

16h | O Anjo Nasceu | Júlio Bressane, Brasil, 1969, 90 min.

18h | Testamento De Orfeu | Jean Cocteau, 1959, França, 111 min.

20h | Sangue de um Poeta | Jean Cocteau, 1930, França, 116 min.

4a FEIRA | 14 DE NovEmbRo14h | Velvet Underground + Vinyl | Andy

Warhol, 1966, EUA, 70 min.16h | My Hustler | Andy Warhol, EUA, (1965-

1967), 80 min.18h | A Hipotese da Pintura Roubada | Raul

Ruiz, Brasil, 1979, 63 min.20h | Somewhere in between | Pierre Couli-

beuf, França, 2004, 70 min.

Espaço Itaú de Cinema Glauber Rocha | Sala 4

9 à 14 de novembro de 2012

6a. FEIRA | 09 DE NovEmbRo14h30 | Notícias da Antiguidade Ideológi-

ca: Marx, Eisenstein, O Capital | Parte 1: Projeto Revoluções | Alexander Kluge, Alemanha, Documentário, 2008, 190 min.

18h | Mostra | Filmes Baianos Lançados no Século XXI | Jardim das Folhas Sa-gradas | Pola Ribeiro, Brasil, 2011, 90 min.

20h | Alain Cavalier | França | A Fazedora de Colchões | La Matelassière | 1987, 13 min. | A Maitre – Varrier | La Maître-Verrier | 1987, 13 min. | A Optometrista | L’Optcienne | 1991, 12 min. | A Romancista | La Romancière | 1991, 11 min. | A Senhora – Lavabo | La Dame-Lavabo | 1988, 13 min.

SábADo | 10 DE NovEmbRo14h | Notícias Da Antiguidade Ideológica:

Marx, Eisenstein, O Capital | Parte 2: To-das As Coisas São Homens Enfeitiçados | Alexander Kluge, Alemanha, Documentá-rio, 2008, 120 min.

16h | Glauber Rocha em Defesa do Cinema Brasileiro | Roque Araújo, Brasil, Docu-mentário, 2012, 100 min

18h | Mostra | Filmes Baianos Lançados no Século XXI | Antonio Conselheiro - O Taumaturgo Dos Sertões | José Walter Lima, Brasil, 2010, 86 min.

20h | Água de Meninos - a Feira do Cine-ma Novo | Fabíola Aquino, Brasil, docu-mentário, 2012, 52 min.

DomINGo | 11 DE NovEmbRo14h30 | Notícias da Antiguidade Ideológi-

ca: Marx, Eisenstein, O Capital | Parte 3: Paradoxos da Sociedade de Troca | Alexander Kluge, Alemanha, Documentário, 2008, 182 min.

18h | Mostra | Filmes Baianos Lançados no Século XXI | FILHOS DE JOÃO | Henrique Dantas, Brasil, Documentário, 2009, 76 min.

20h | Três dias com a família | Trés dias com la família | Mar Coll, Espanha, 2009, 86 min.

2a FEIRA | 12 DE NovEmbRo15h | Short Matters | Mostra dos curtas in-

dicados para a 24ª European Short Film Award | 2011 | Programa 1 | Os Lobos | I Lupi | Alberto | de Michele, Itália/Holanda, documentário, 17 min. | Hypercrisis | Jo-sef Dabernig, Áustria, ficção, 17 min. | Out Tse| Roee Rosen | Israel, ficção, 35 min. | Incidente no Banco | Incident by a Bank | Ruben Östlund, Suécia, ficção, 12 min. | Histórias Congeladas | Frozen Stories | Grzegorz Jaroszuk, Polônia, ficção, 26 min.

18h | Mostra | Filmes Baianos Lançados no Século XXI | Cascalho | Tuna Espinheira, Brasil, 2004, 104 min.

20h | Batuque dos Astros | Julio Bressane, Brasil, 2012, 75 min.

3a FEIRA | 13 DE NovEmbRo14h | Short Matters | Mostra dos curtas in-

dicados para a 24ª European Short Film Award | 2011 | Programa 2Berik | Joseph Borgman, Dinamarca, fic-ção, 16 min. | Crianças Pequenas, Gran-des Bosques | Little Children, Big Woods | Lisa James Larsson, Suécia, ficção, 12 min. | Os que não vivem | The Unliving | Hugo Lilja, Suécia, ficção, 28 min. | Domingo | Dimanches | Valéry Rosier, Bélgica, ficção, 16 min. | Rio Silencioso | Silent River | Anca Miruna Läzärescu, Alemanha / Ro-mênia, ficção, 30 min.

16h | Marighela – Quem Samba Fica, Quem Não Samba Vai Embora | Carlos Pronzato, documentário, 2011, 90 min.

18h | Mostra | Filmes Baianos Lançados no Século XXI | O homem que não dormia | Edgar Navarro, ficção, 2011, 100 min.

20h | Belair | Bruno Safadi e Noa Bressane, Brasil, 2010, 80 min.

4a FEIRA | 14 DE NovEmbRo15h | Short Matters | Mostra dos curtas in-

dicados para a 24ª European Short Film Award | 2011 | Programa 3 Paparazzi | Piotr Bernas, Polônia, docu-mentário, 33 min. | A Grande Corrida | La Gran Carrera | Kote Camacho. Espanha, ficção, 7 min. | Derby | Paul Negoescu. Ro-mênia, ficção, 15 min. | Jessi | Mariejose-phin Schneider, Alemanha, ficção, 31min. | A Família Totalmente Sagrada | The Whol-ly Family | Terry Gilliam. Italy, ficção, 20 min.

18h | Mostra | Filmes Baianos Lançados no Século XXI | Bahêa Minha Vida | Marcelo Cavalcanti, Brasil, Documentário, 2011, 100 min.

Espaço Cultural barroquinha

2a FEIRA | 12 DE NovEmbRo10h | Mesa Redonda | O Cinema Experi-

mental | Guiomar Ramos, Tarek Elhaik, Ivana Bentes

15h | Diálogo | Política e Cinema Sul Ame-ricano | Emir Sader e Sergio Muniz

3a FEIRA | 13 DE NovEmbRo10h | Mesa Redonda | O Ocaso da Crítica

Cinematográfica? | Sihan Felix, Cássio Star-ling, Franco Marineo. Rubens Machado Jr.

15h | Mesa Redonda | Qual o Futuro do Cinema Baiano? | Henrique Dantas, Da-niel Lisboa, Ceci Alves, Fabio Rocha, Carlos Pronzato

4a FEIRA | 14 DE NovEmbRo10h | Mesa Redonda | Orson Welles | Franco

Marineo, João Luiz Vieira, Irma Viana15h | Mesa Redonda | O Som, a Música e o

Cinema | Beate Warkentien, Edino Krieger, Waldir Xavier, Tuzé de Abreu

mostra Cinema Ambiental

o Cinema Ambiental em Escolas Públicas

Rap Meio Ambiente | Amazonia | 2.7 min.Carta Kisêdjê para a Rio+20 | 10.48 min.Os Kuicuro se apresentam | 7.8 min.

2a FEIRA | 12 DE NovEmbRo10h30 | Colégio Estadual Monsenhor Ma-

nuel Barbosa | Conj. Marback 14h30 | Colégio Estadual Noêmia Rego | Valéria

3a FEIRA | 13 DE NovEmbRo10h30 | Colégio Estadual Dalva Matos | Lobato 15h30 | Escola Municipal de Periperi | Periperi

4a FEIRA | 14 DE NovEmbRo10:30h | Colégio Estadual Azevedo Fernandes

| Pelourinho 15:30h | Colégio Estadual Monsenhor | Conj.

Martback

o Cinema Ambiental no Teatro do Goethe Institut |Icba

Cineclube Socioambiental Crisantempo bahia

2a FEIRA | 12 DE NovEmbRo15h | O alimento é importante | Food Mat-

ters | James Colquhoun e Laurentine ten Bosch, 2008, 80 min.

17h | Solo! O Filme | Dirt! The Movie | Bill Benenson and Gene Rosow, 2009, 86min.

20h | Vivendo sem Dinheiro | Living Without Money | Line Halvorsen, 2010, 52 min.

Cinema na Praça18h | PRAÇA MUNICIPAL | Cuica de Santo

Amaro | Josias Pires e Joel Almeida, Brasil, 2011, Documentário, 76min.

Cursos | oficinas

14 DE NovEmbRo9h | Oficina | O uso do som no cinema |

Waldir Xavier

11, 12 E 13 DE NovEmbRo 14h | Oficina | Videoativismo e cinema

como ferramenta | Alan Schvarsberg

Lançamento de Livros e Dvds

6a. FEIRA | 09 DE NovEmbRo19h | Cuica de Santo Amaro | Cuíca de Santo

Amaro | Fundação Pedro Calmon, 2012

DomINGo | 11 DE NovEmbRo18h DVD | AUGUSTO BOAL E O TEATRO DO

OPRIMIDO | Zelito Viana | documentário, 105 min.

2a FEIRA | 12 DE NovEmbRo18h As armas da critica - Antologia do

pensamento da esquerda | Emir Sader e Ivana Jinkngs | organizadores | Boitempo Editorial

Page 6: Seminário Magazine 2012

| 76 |

Page 7: Seminário Magazine 2012

| 76 |

Do Seminário Magazine

Q uando resolveu en-carar o calhamaço de páginas que o seu

saudoso marido Rogério Sganzerla havia escrito como uma espécie de continuação literária de O Bandido da Luz Vermelha e transformá-lo em roteiro cinematográfico, a atriz e cineasta baiana Hele-na Ignez tinha apenas uma certeza: o espírito da obra não poderia ser comprome-tido, pois, diante do que o fil-me de Sganzerla representou para a cinematografia brasi-leira, os riscos eram enormes.

Depois de quatro anos debruçada no texto, a par-tir de 2004, ano da morte de Sganzerla, Ignez partiu para dar vida, ao lado de Ícaro Martins, a Luz nas trevas – A volta do Bandido da Luz Vermelha, filme que, como o título indica, aparentemen-te seria uma continuação do clássico lançado em 1968 que se transformou em ícone do Cinema Marginal. E o resul-tado é que, pelo menos a jul-gar pela recepção da crítica e do público que o viu em festi-vais, o filme foi aprovado.

Na abertura do Festival Cine Futuro – VIII Seminá-rio Internacional de Cine-ma e Audiovisual, além da

projeção de Luz nas Trevas – A volta do Bandido da Luz Vermelha, a diretora Helena Ignez vai explicar as suas ra-zões e, de quebra, dois atores do elenco vão participar da sessão Diálogo, no caso a sua filha Djin Sganzerla e Ney Matogrosso, que deu vida ao personagem vivido 44 anos atrás por Paulo Vilaça.

Como era de se imagi-nar, Helena Ignez não cansa de repetir que o filme, pelo menos na sua construção, é todo de Rogério Sganzerla, o que se percebe, principal-mente, por conta de seu es-pírito rebelde e extrovertido. Porém ela salienta que não se trata da continuação de O Bandido da Luz Vermelha, mas, sim, da saga do perso-nagem: “era o bandido que interessava a Rogério, o seu jeito poético, longe da lei-tura policialesca a partir da qual foi enquadrado”.

Ainda segundo Ignez, a dúvida que mais a consu-mia era em torno de quem poderia encarar o persona-gem do bandido. Hoje, de cátedra, ela fala que acertou na mosca ao convidar o can-tor Ney Matogrosso: “quan-do pensei nele tive a convic-ção de que se encaixava no projeto”, diz a cineasta, que completa: “foi como uma

iluminação, pois, vendo o filme realizado, é como se somente ele coubesse den-tro do personagem”.

Por sua vez, Ney Mato-grosso, que já fizera teatro e atuou em diversos curtas e longas, inclusive em um iné-dito de Domingos de Olivei-ra, num primeiro momento se assustou com a experiên-cia, mas, depois, foi toman-do conta do personagem e, a ajuda de Helena Ignez se fez fundamental: “tornei-me minimalista. Totalmente. Fui contido. Cinema é isso. Não fiz ensaios: me entreguei to-talmente a Helena”.

Musa do Cinema Margi-nal e levando na bagagem a experiência de haver tra-balhado como atriz ao lado de diretores do quilate de Glauber Rocha, Júlio Bres-sane e Roberto Farias, He-lena Ignez, que também di-rigiu Canção de Baal, filme experimental lançado em 2008, deixa a entender que o seu filme é mais do que um tributo a Rogério Sgan-zerla: “É um filme de um tempo que parece infinito”.

A volta do bandido da luz vermelha

Atriz e cineasta Helena Ignez apresenta no Festival Cine Futuro “continuação” de filme de Rogério Sganzerla que foi ícone do Cinema Marginal brasileiro

O ator e cantor Ney Matogrosso aceitou

desafio e encaixou-se como uma luva no papel

de Jorge, o bandido da luz vermelha

Page 8: Seminário Magazine 2012

| 98 |

Page 9: Seminário Magazine 2012

| 98 |

Mesa do Festival Cine Futuro discute rumos do cinema experimental. Com o advento do digital, aumentou o número de produções, ainda que o conceito tenha se tornado vago

Do Seminário Magazine

em tese, é aparentemen-te redundante o título da mesa O cinema ex-

perimental na contramão do mercado proposto pelo Festival Cine Futuro – VIII Seminário Internacional de Cinema e Audiovisual. Isso porque, desde que surgiu como estilo que se contra-pôs ao cinema comercial ou industrial, a partir de uma narrativa diferencia-da, não linear, já nos anos 20 do século passado, essa forma de fazer cinema tinha como objetivo ultrapassar o convencionalismo e afirmar certa linguagem vanguar-dista, distanciando-se do grande público.

Passados os anos e com o envelhecer da Sétima Arte, o dito cinema experimental li-bertou-se das ditaduras van-guardistas e passou a andar passo a passo com outras urgências, outros objetivos. Assim, hoje, principalmen-te por conta do advento do digital, que multiplicou com mil as possibilidades e os tempos de filmagem, o ci-nema experimental tem um vasto campo pela frente e, para tanto, basta observar o quanto inunda em mostras e festivais de cinema mundo afora.

No entanto, ironia da sor-te, o cinema experimental também acabou sendo en-

As diversas facetas do cinema experimental

quadrado pelo mercado. O famoso Lars von Trier, nato manipulador e experimen-talista é um exemplo disso, como afirmou o crítico da Contracampo, Eduardo Va-lente: “os filmes de von Trier são experimentos impres-sionantes de domínio de linguagem, filmes que cau-sam sensações muito fortes e extremas no espectador, porque ele trabalha sempre com as tintas mais carre-gadas, sem medo de pular meios-termos.”

Mas de uma maneira ge-ral o cinema experimental fica reduzido à apreciação de poucos e até marginaliza-do. No Brasil, A Idade da Ter-ra, de Glauber Rocha, é um exemplo clássico de tal si-tuação. De acordo com o ci-neasta Walter Lima, que re-

centemente lançou o longa Antônio Conselheiro, O Tau-maturgo dos Sertões, ainda hoje é notória a dificuldade para compreendê-lo: “Glau-ber, como poucos, tinha co-nhecimento da linguagem, da sintaxe, mas, ironia da sorte, falta um olhar mais apurado para Idade da Ter-ra, um filme revolucionário”.

Na verdade, como teori-zam muitos críticos, tornou--se difícil conceituar o que é cinema experimental, que se transformou no gênero, com cartilha e tudo. “Acho que se o filme tiver poéti-ca, metafísica, enfim, uma pegada abstrata e instigar o espectador a libertar o olhar, a buscar uma nova forma de visão, podem chamar esse filme de experimental”, diz Walter Lima.

Na programação do Fes-tival Cine Futuro, os cinéfi-los terão acesso a uma vasta produção do cinema expe-rimental europeu e norte--americano, desde os anos 20 do século passado até os dias atuais. Vão desfilar na tela produções de Fernand Léger, Viking Eggeling, Marcel Du-champ, Robert Florey e Sla-vko Vorkapich, Man Ray, Luis Buñuel, Jean Cocteau, Andy Warhol e muitos outros.

Cinema experimental nasceu de inclinações vanguardistas

Conceito de cinema experimental tornou-se vago

Page 10: Seminário Magazine 2012

| 1110 |

Do Seminário Magazine

Assunto recorrente em fes-tivais, mostras e encontros acadêmicos, a discussão em

torno da legitimidade da crítica ci-nematográfica nos impressos e na internet vem gerando interpreta-ções as mais diversas, o que torna o assunto polêmico e de difícil juízo valorativo. No entanto, uma única certeza norteia a questão: em tem-pos frívolos e acelerados, como os atuais, de uma maneira geral não há mais espaço para aprofundamen-tos, o que põe em xeque o sentido histórico e representativo da crítica cinematográfica.

Mas será que a crítica cinemato-gráfica com o mínimo de suporte realmente acabou? E, se acabou, como nominar os milhares de textos que brotam na internet, muitos dos quais autodenominados de “críticas cinematográficas”? E os donos de rubricas em jornais e revistas se-manais, os quais foram obrigados a podar os seus escritos em tamanho e consistência como defini-los? Re-senhistas? Comentaristas? Cordeiri-nhos de uma nova ordem editorial?

No Festival Cine Futuro – VIII Seminário Internacional de Cine-ma e Audiovisual, a mesa O ocaso da crítica cinematográfica vai dis-

O ocaso da críticacinematogr áficaReformas editoriais, falta de espaço nos impressos e era virtual põem em xeque o sentido histórico e representativo da crítica cinematográfica

cutir a fundo a questão. Como não poderia deixar de ser, a decadência da crítica impressa e a proliferação dos “críticos” virtuais vão dominar as discussões na busca do entendi-mento se há ou não, na média, um real valor em tais escritos.

Recentemente, no Festival de Bra-sília, um debate pôs frente a frente personagens distintos da dita crí-tica cinematográfica: de um lado Sérgio Rizzo, oriundo do jornalismo impresso e também acadêmico; do outro, um representante do mundo virtual, no caso o editor da Revista Cinética, Fábio Andrade. Rizzo in-correu sobre uma certa dessacra-lização do crítico de jornal, que se tornou um “mero orientador de con-sumo”, assim como reconheceu que o mundo virtual é “um território de-masiadamente vasto e diversificado, de difícil mensuração e controle”.

Crítico de jornal

tornou-se orientador

de consumo

Page 11: Seminário Magazine 2012

| 1110 |

O ocaso da críticacinematogr áfica

Por sua vez, o representante da Revista Cinética chegou a fazer uma mea-culpa ao afirmar que apesar das infinitas possibilidades da inter-net, em termos de agilidade e retor-no, de uma maneira geral o crítico virtual não é franco, nem brilhante e muito menos imaginativo nas suas abordagens. Mais: Fábio Andrade foi taxativo ao afirmar que não se prati-cam hoje os ensinamentos do ensa-ísta Paulo Emílio Salles Gomes, que fez escola e, em época de blogosfera parece que foram esquecidos.

Sintomático, foi que tanto Rizzo como Andrade confirmam a existên-cia de uma crise nas duas vertentes da crítica cinematográfica brasilei-ra, a qual tornou-se, por imposição, refém de um modelo de análise frí-volo tipicamente norte-americano. Como avalia o ensaísta e ex-crítico do extinto Jornal do Brasil, João Car-

los Avellar, o fenômeno deu-se no país a partir dos anos 1990 e “esta-beleceu uma espécie de princípio orientador da indústria cinemato-gráfica hollywoodiana, que não en-xerga com bons olhos para os seus negócios o espectador crítico”.

Ainda segundo Avellar, o crítico de jornal no Brasil, que até então detinha generosos espaços, ficou limitado a um número reduzido de caracteres e ainda teve que adaptar o seu texto a uma realidade que o podou naquilo que ele mais prezava: certa liberdade para analisar o objeto fílmico além do óbvio: “castrou-se o crítico e, por tabela, os cinéfilos”.

A respeito da questão, aliás, já nos anos 90 do século passado, o saudoso crítico italiano, Tullio Kezich, consi-derado um dos maiores teóricos da obra de Federico Fellini, viu-se preso ao dilema de reduzir drasticamente o número de palavras em sua coluna no Corriere della Sera e ainda flexi-bilizar o seu aporte de observação. Irritado, tornou pública a sua indig-nação e, como não conseguiu largar o “vício da escrita”, seguiu adiante e adaptou-se, mas reconhecendo que muitas vezes se sentia como se “vio-lentasse a si mesmo”.

Um caso curioso e que vai contra-corrente é o do crítico André Setaro, que assina uma coluna no jornal Tri-buna da Bahia há mais de 40 anos e saltou do modelo gutenberguiano para o mundo virtual em 2005 sem fazer muitas concessões. “Através do meu blog, ampliei a divulgação dos meus escritos na esfera nacional e até no exterior”, diz Setaro, que, no entanto, ressalta: “em nenhum mo-mento pensei em modificar a minha pegada, até porque não saberia es-crever de outra forma”.

De acordo com Setaro, que é pro-fessor de jornalismo na Ufba há mais de 30 anos e acompanhou o passar das gerações do “analógico para o digital/virtual”, na internet há uma proliferação do “crítico” CDF, ou seja, aquele que baixa todos os filmes e tem acesso às informações, mas é desprovido de outros apetrechos: “quando falta uma certa cultura humanista, enfim, um conhecimento fundamental em outras áreas do pensar, o crítico não existe”. (RM)

Personagem de Sudoeste olha para baixo. Crítica cinemato-gráfica também

Falta cultura humanista para crítico virtual

By EmmanuEllE BERnaRd

Page 12: Seminário Magazine 2012

| 1312 |

Raul MoreiraDo Seminário Magazine

a não ser que a discussão torne--se conceitual, afirmar que a crítica cinematográfica acabou é exagero. Pode-se, sim, falar

do ocaso de um estilo de crítica cinema-tográfica, herdeira de uma tradição e de um tempo no qual havia espaço nos impressos para aprofundamento de certa militância: tudo que não há nos dias atuais, repletos de urgência e de uma superficialidade cúmplice.

O fim de certa críticaArtigo

Em parte, a mística de tal modelo de crítica cinematográfica se construiu a partir do momento em que ela propôs o cinema como um instrumento revolu-cionário. Assim o fez a revista Cahiers du Cinéma, durante os anos 1950 e parte dos 1960 e, por tabela, dentro de uma pers-pectiva terceiro-mundista, parte da crítica brasileira influenciada pelo Cinema Novo.

Para se compreender a efervescência dos anos do pós-guerra, marcados por uma profunda divisão ideológica e de uma grande transformação nos costu-mes, a crítica passou a fazer cinema, lite-ralmente. E não é à toa que a película se transformou em uma poderosa arma para homens de pensamento que se batiam contra a ordem burguesa”, como François Truffaut, Jean-Luc Godard, Jacques Rivette, Eric Rohmer, Pier Paolo Pasolini e Glauber Rocha.

Particularmente, no Brasil dos anos 50 do século passado, que dava os pri-meiros passos para fugir de sua condição unicamente agrária, o modo de interpre-tar cinema também começou a mudar, a aprofundar-se. Destacaram-se, então, críticos e ensaístas do quilate de Francis-co Luiz de Almeida Salles, de Walter da Silveira e, principalmente, Paulo Emílio Salles Gomes, um visionário que lutou pela formação de uma identidade do cinema nacional e impôs um estilo que ainda hoje é reverenciado.

Com um ambiente favorável, por conta do ar que se respirou nos anos 60, passo a passo com o Cinema Novo bro-tou uma nova safra de críticos, gente que queria mudar o mundo, maioria cinéfila ou formada nas redações de jornais. For-jados em um caldo substancioso, muitos sobreviveram nos anos seguintes ao AI-5 e ao fim da utopia, tornando-se, inclusi-ve, libertos dos ideologismos, o que os fez mais imparciais diante da avaliação dos objetos fílmicos.

Mas depois daí veio a calmaria, com o abrandamento e o fim da ditadura, a queda do muro de Berlim e uma nova ordem que acabou sendo incorporada pe-los jornais brasileiros, a qual privilegiava projetos gráficos mais arejados e textos menores: o intuito era afirmar a cultura do serviço, num período em que a palavra de ordem era economia de mercado.

Por tabela, para felicidade da indústria hollywoodiana – na época o cinema havia desaparecido no Brasil –, a figura do crí-tico mais encorpado foi redimensionada, o que fez com que muitos fossem buscar novos ares e, a partir daí, abriu-se espaço para o crítico/jornalista, mais adaptado ao consumismo dos novos tempos.

Hoje, mesmo com a vastidão e as pos-sibilidades da internet, fica a sensação de que a crítica com “c” maiúsculo, com raras exceções, adaptou-se, incorporando a re-gra do jogo, talvez com medo de pregar no deserto numa época em que escrever com mais 400 caracteres é pecado grave.

O Desprezo, de Godard. Cinesta criticou e militou

Page 13: Seminário Magazine 2012

| 1312 |

Page 14: Seminário Magazine 2012

| 1514 |

Do Seminário Magazine

As premiações não mentem. Ainda que operando em um ambien-te pouco estimulante, quando se

compara, por exemplo, a Pernambuco, o fato é que os curtas-metragistas baianos fizeram das dificuldades tesouro e, nos úl-timos anos tornaram-se “bichos-papões” dos principais festivais e mostras cinema-tográficas Brasil afora.

Este ano, para se ter uma ideia, no Fes-tival de Gramado, a dupla Marcelo Matos de Oliveira e Wallace Nogueira arrematou seis prêmios, inclusive o de melhor filme com o curta O menino do Cinco. No mes-mo evento, Gabriela Amaral Almeida, for-jada no eixo Bahia/Cuba e radicada em São Paulo, levou o prêmio especial do júri com A Mão que afaga, curta que também conquistou cinco troféus no recente Festi-val de Brasília.

Mas não somente. Henrique Dantas, depois do sucesso de Filhos de João: O Ad-mirável Mundo Novo Baiano ganhou este ano o prêmio de melhor documentário em curta-metragem do evento internacional É tudo verdade, em São Paulo, com Ser tão Cinzento. Somando aos prêmios arre-matados pelas produções locais nos anos anteriores, como Carreto, do casal Marília Huhges e Cláudio Marques, que faturou Gramado, entre outros, é de se pensar que os curtas-metragistas baianos aprenderam a usar no melhor dos modos a “pitada de fermento” que faz a diferença.

No entanto, ainda que sob os holofotes nos festivais e mostras nacionais, de uma maneira geral há um sentimento de que falta continuidade e os tempos para se rea-lizar cinema na Bahia ainda são muito lon-gos. É o que pensa, por exemplo, o cineasta Marcelo Matos, 36 anos, que levou mais de

O despontar de uma geraçãoPrêmios nacionais conquistados nos últimos anos por curtas-metragistas baianos afirmam geração entre 30 e 40 anos e os impulsionam rumo aos longas

meia década para conseguir concretizar o premiado curta O menino do Cinco.

“Em outros locais é comum ver garotos de 20 e 21 fazendo filmes, ao contrário da-qui, onde normalmente depois dos 30 con-seguimos acabar um curta”, brada Matos, creditando o fato não apenas à ausência de uma política de incentivo mais consistente por parte dos poderes públicos, mas, tam-bém, porque não havia escolas de cinema há até pouco tempo.

Ainda segundo Matos, outro problema que a sua geração encontrou foi a falta de diálogo com os cineastas da geração ante-rior, incapazes de enxergar aquilo que não

Thomas Vinícius de Oliveira: o menino do cinco

Page 15: Seminário Magazine 2012

| 1514 |

fosse a realização de seus projetos e, tam-bém, incapazes de enxergar no entorno: “fui em várias reuniões, mas sempre saí in-satisfeito com o rumo das discussões, pois era impossível debater, trocar ideias de uma forma mais ampla”.

Falando com aparente conhecimento de causa, Matos considera a sua geração mais apurada do que a anterior, a qual teria se perdido em conflitos que no final acabaram se voltando contra eles mesmos e, por tabe-la, impedindo a construção de uma cinema-tografia mais consistente: “a nossa geração é mais madura, tanto em termos de cinema, como também emocionalmente”.

Sintomaticamente, de acordo com Ma-tos, o fato de a sua geração encarar os seus pecados e incapacidades vem fortalecendo e contribuindo para a criação de um am-biente mais rico e instigante, algo que já se alcançou há muito em Pernambuco, a “terra do cinema”: “lá, é perceptível que existe uma maior interação, uma divisão dos achados, o que, no final, acaba contribuindo para uma melhor qualificação da inteira cadeia”.

Mais precavido, o “balzaquiano” Walla-ce Nogueira, uma espécie de faz-tudo – é diretor, fotógrafo, montador, roteirista e produtor – e sócio de Marcelo Matos em O menino do Cinco, só não quer um conflito geracional, até porque todos já dobraram o “Cabo da Boa Esperança”: “Estamos andando

com o vento a favor, mas ainda temos que aprender muito”.

Ainda que num primeiro momento cal-ce as sandálias do pescador, Nogueira é convicto de que, por conta dos prêmios nos últimos tempos, já se pode falar de uma “cena baiana”, a qual é sentida fora do ter-ritório e, naturalmente, faz pensar que há um cinema feito não apenas no eixo Rio/São Paulo e em Pernambuco: “estamos ca-minhando e os nossos passos já são vistos e reconhecidos em outras paragens”.

Afirmados enquanto curtas-metragistas, agora, o desafio da geração entre 30 e 40 anos é realizar longas. A exemplo do casal Marília Hughes e Cláudio Marques, que já produz Depois da Chuva, outros cineastas, como Fábio Rocha e Daniel Lisboa estão em compasso de espera para dar o passo que os vai colocar no mundo de quem faz “cinema grande”. Recentemente, a dupla foi contem-plada com dinheiro público e, se tudo der certo, é bem provável que no final do próxi-mo ano possam parir as suas criaturas.

“É outra responsabilidade, outro mundo, outro processo”, faz saber Daniel Lisboa, re-presentante de uma geração que flertou nos sets da anterior e que tem uma ideia bastan-te clara a respeito do que os une e os separa: “nos une a vontade de transformar através do cinema, mas a nossa geração é mais eco-nômica, prática e não alimenta a fantasia de produzir dentro de um modelo de cinema hollywoodiano, como eles fizeram em boa parte dos longas que realizaram”.

Contemplativo, Lisboa projeta o seu olhar para frente, até porque os desafios são grandes e, agora, o jogo se faz bruto, diferente, com outras demandas e res-ponsabilidades, que envolvem produção, distribuição e circulação. Mesmo assim, se diz confiante no futuro: “2013 e 2014 serão anos de um novo cinema baiano”. (RM)

Wallace Nogueira e Marcelo Matos de Oliveira: dupla afinou e conquistou Gramado

Menino Thomas ganhou prêmio de melhor ator

Page 16: Seminário Magazine 2012

| 1716 |

Raul MoreiraDo Seminário Magazine

D iante do reconheci-mento nacional de seus curtas-metra-

gistas nos últimos anos, já não é apenas possível afir-mar que houve um corte ge-racional no cinema baiano mas também se faz impor-tante avaliar a natureza da produção de cada uma das gerações. Coexistem hoje, in-dependentemente dos “fo-cos isolados”, três gerações fazendo cinema na Bahia, cada qual atuando em ter-ritórios diversos e com a mesma ambição: ser vista e reconhecida.

A primeira geração, que começou a fazer filmes ar-tesanais nos anos 70, à base de super-8, demorou em le-vantar voo. Foi somente nos anos 1980, a chamada década perdida, que tais cineastas conseguiram realizar os seus primeiros curtas em bitolas mais respeitadas, alcançan-do reconhecimento nacional, como se deu com SuperOu-tro, média de Edgard Navarro.

No entanto, por conta da ausência de incentivos e da pasmaceira que era a Bahia, a década de 1990 também foi jogada fora e, somente no século XXI, os representantes dessa gera-ção conseguiram realizar os seus longas: já sem o frescor da juventude, o problema é que os filmes produzidos por eles refletiram apenas individualidades, com cada autor trafegando em seu re-côndito territorial, sem um sentido de urgência que não fosse a fantasia de realizar.

Talvez por isso, como tam-bém pela falta de uma con-tinuidade produtiva, hoje, é possível afirmar que cineastas como Pola Ribeiro, José Arari-pe Jr., Fernando Beléns, Tuna

3 em 1 do

cinema baiano

Espinheira, Walter Lima e o próprio Navarro não foram capazes de realizar uma ci-nematografia que marcasse, que fizesse refletir a respeito do seu tempo. Tal tendência, ao contrário, se percebeu na escola pernambucana, que alcançou uma unidade perceptível, um fio condu-tor que comungou com as aspirações de um coletivo, dando-lhe um real sentido de “movimento”.

A geração que veio a se-guir, hoje com a idade en-tre 30 e 40 anos, cresceu em outro ambiente, sem o peso de praticamente partir do zero, podendo, inclusive, se utilizar dos novos aparatos tecnológicos, ain-da que a eterna

miséria cultural da Bahia os tenha afetado. Assim, numa época de editais e das faci-lidades do digital, muitos souberam dar vazão às suas ideias, realizando obras ca-pazes de arrancar aplausos e prêmios Brasil afora.

Já testada, essa geração está passando do curta para o longa, ainda que alguns já tenham superado tal etapa, como João Rodrigo (Tram-polim do Forte), Paulo Alcân-tara (Estranhos) e Henrique Dantas (Filhos de João). O desafio, agora, encontra-se nas mãos do casal Marília Hughes e Cláudio Marques, em fase de corte do longa Depois da Chuva, rodado recentemente, e, também, nas cabeças de Fábio Rocha e Daniel Lisboa, de quem se espera um sopro encoraja-dor nos seus respectivos Ci-dade Alta e Tropykaos.

O curioso é que outra ge-ração já olha para os “tios” trintões e quarentões de soslaio, talvez pelo fato de que se sintam tecnicamen-te mais preparados, pois nasceram na era virtual e as engenhocas digitais são brinquedos do dia a dia. Al-guns desses que pecam de juventude foram vistos no recente Festival Nacional 5 Minutos, assinando pe-quenas obras, em busca do apuro e de um lugar sob as luzes dos holofotes.

ilustra com

o que?

Cinema “curto” baiano mer-gulhou no paraíso

Saudoso Olney

São Paulo inspirou cineastas baianos

Valé

Ria

Sim

õES

diV

ulg

ão

Page 17: Seminário Magazine 2012

| 1716 |

Page 18: Seminário Magazine 2012

| 1918 |

Representante de uma geração que começou com a bitola Super-8, José Araripe Jr. analisa a cena cinematográfica baiana, da produção de curtas aos longas

Raul MoreiraDo Seminário Magazine

Depois de um “exílio” de vá-rios anos no Rio

de Janeiro, o cineasta José Araripe Jr., 53 anos, está de volta a Salvador. Autor do longa-metragem Esses Moços e de uma série de curtas, entre eles o premiado Mr. Abrakadabra!, Araripe Jr., que assumiu a direção de programação da TVE Bahia, se abriu ao Seminário Ma-gazine. Sem papas na língua, falou da cena cinematográfica baiana e do momento vi-vido pelo cinema nacional. Confira.

Seminário Magazine – Os prêmios conquistados nos últimos tempos por curtas-metragistas locais deram origem a uma cena baiana?José Araripe – Faltam dados organiza-dos, mas arrisco a dizer que, nos últimos 15 anos, o curta baiano vem ganhando progressivamente os principais festivais, com uma diversidade e vitalidade que não deixam nada a desejar a nenhuma outra região. Porém o maior problema dessa memória é que a pequena crítica jornalística que existe na Bahia não con-sidera o curta como cinematografia mai-úscula e constrói a fortuna analítica ba-sicamente sobre o longa-metragem, que é ainda uma produção esporádica e que, pelo volume, consequentemente não re-presenta a expressão artística dominante.

Gosta do que essa ge-ração produz? Eles estão passo a passo com o seu tempo?No mundo inteiro o cinema nunca esteve tão forte. Todos os pa-íses estão produzin-do. Hoje temos aces-so a cinematografias diversificadas e isso está ampliando os ho-rizontes de todas as gerações. Aprende-se mais cedo, se produz mais e consequente-mente há avanços na

produtividade e na qualidade.

Há quem critique o modelo de produção dos longas rodados por aqui nos últimos dez anos, por conta de uma certa lógica “hollywoodiana”, um modelo de produ-ção ultrapassado, inchado e que acabou conspirando contra. Concorda?Aqui ou em Los Angeles, o kit médio ou completo de equipes bem estruturadas é fundamental para fazer bem feito em moldes competitivos. As exceções possibi-litadas pela portabilidade e barateamento dos equipamentos são bem vindas, mas favorecem um tipo de atitude estética e linguagem ligada a movimentos ou cine manifestos que sempre fizeram da crise, através da “brodagem”, uma motivação: é bonito, válido e me parece um modelo mais adequado para as estéticas urgentes.

Há quem diga, também, que os longas produzidos na Bahia a partir dos anos 2000 foram marcados por fortes traços personalistas, filmes fora de tempo e sem urgências, um cinema em que cada autor enveredou por seu território, o que gerou uma produção deslocada e sem um cará-

“O cinema baiano fechou-se

em si mesmo”

entrevista | José Araripe Jr.

mu

Ríc

io R

Equ

ião

Page 19: Seminário Magazine 2012

| 1918 |

ter de movimento, de unidade, como se sentiu em Pernambuco. É vero?Não existe movimento do cinema per-nambucano, isso é o mito da galinha gorda do vizinho. A miragem foi causa-da pela ascensão mangue beat, esse sim, movimento. O meritório sucesso do ci-nema de Lirio Ferreira, Paulo Caldas e Cláudio Assis se deu num processo em que migraram para o Rio de Janeiro e lá se associaram a produtoras cariocas. Por outro lado, a Bahia muito entrópica não fez associações, se fechou por aqui. As políticas públicas praticadas pelos dois estados já estiveram em estágios diferen-ciados. Mas o que ofusca nossa produção e gera comparações é a falta de articula-ção de produção com os grandes centros. Enquanto não estabelecermos parcerias, não aparecemos nacionalmente.

Os números indicam que o público bra-sileiro vai ao cinema para ver “telenove-la de 90 minutos”, filme espírita ou coi-sas do tipo Tropa de Elite. Esse cinema é válido só pelo fato de atrair gente ou é algo desabonador, sendo purista?Cinema é entretenimento desde a sua invenção. Atualmente, a indústria he-gemônica está investindo mais e mais em comédias, aventuras, animações e super-heróis de HQs. A nossa indústria para alcançar esse público domesticado por Hollywood segue o mesmo instinto. Em todas as artes isso acontece. Elevar o nível do entretenimento é desafio desde a antiga Grécia. Há uma imensa gama de bons produtos possíveis nos circuitos de artes, cineclubes, locadoras, festivais, em sites. A solução opcional é não cair em tentação pelo supérfluo, algo assim como trocar guloseimas por frutas.

Há um cinema sem amarras comerciais, do qual fazem parte os filmes que ganham os festivais e depois conseguem atrair apenas 5 mil pessoas às salas de exibição. Acha que esse cinema vai sobreviver?Claro, biscoitos finos sempre foram ali-mento de pequenas elites – não necessa-riamente econômicas –, grupos que pre-ferem garimpar literatura e arte de mais rigor em conteúdo e estética. O público não vai desistir, porém quem faz cinema, sem esperança de fazer sucesso ou arre-cadar bilheteria para sobreviver, vai desis-tir sim, é o ciclo natural. Esse cinema mais cult precisa começar a produzir mais para a televisão e internet: aí há campo para

crescimento da segmentação, e, assim, amenizar o poder letal sobre criadores.

O Estado sustenta o cinema brasileiro, em toda a sua cadeia, inclusive os filmes globais, que se aproveitam das leis de in-centivo. Acha que o Estado é por demais paternalista?No Brasil, se formos comparar com as ou-tras atividades industriais e econômicas, a cultura é detentora de microssubsídios. Há muita informação manipulada contra as leis, pois artistas em ação sempre in-comodam o conservadorismo vigente e alimentar esse mito é cômodo. Por outro lado, se é republicano é direito de todos buscar os subsídios, porém, infelizmente, as reformas destas leis estão paradas no Congresso. Elas podem ser melhoradas para corrigir distorções que, por exemplo, favorecem grandes fundações de bancos e afins. Temos leis modernas e que prote-gem o cinema, assim como os franceses e canadenses fazem sem ouvirmos recla-mações por aqui.

Mesmo com o apoio do Estado, o cinema brasileiro não chega às salas de exibição. Não era hora de o Estado, tão paternalis-ta, criar mecanismos para garantir uma certa proporcionalidade na exibição en-tre filmes locais e estrangeiros?Cota de tela já existe e cresce ano a ano. Novidade boa é que a nova lei da TV por assinatura vai obrigar mais conteúdo nacional neste segmento. O caminho do bom cinema brasileiro e da inteligência autoral é a televisão. Aí o Estado precisa ser mais cirúrgico. No mais, é contras-senso filme pequeno querer disputar sala de shopping, um equívoco que só frustra todos. A exibição nas TVs públicas e co-merciais pode mudar esse quadro.

Acha que a crítica cinematográfica acabou?Está mais viva que nunca, mas restrita à academia, blogs ou revistas sazonais. A critica diária de jornais foi perdendo es-paço, consistência e identidade; nestes veículos, elas continuam tendo o poder de conceder estrelinhas, mas sofre de ra-quitismo e superficialidade confundem mais o espectador do que o ajudam. Na Bahia, onde se produz mais curtas que longas, somos submetidos a um regime de silêncio, sobre o álibi de que não acei-tamos críticas, quando na verdade não existe consciência ou interesse editorial no produto que não é mainstream.

Page 20: Seminário Magazine 2012

| 2120 |

todos os tempos, acabou refém da própria criatu-ra cinematográfica que o imortalizou, a sua tenta-tiva de libertar-se, a qual terminou somente com a sua morte, em 1985, aos 70 anos, foi de uma riqueza imensurável. E tal diferen-cial se reflete não apenas pela força e originalidade do conjunto de sua obra, como também pelo fato de que Welles era dono de uma personalidade inco-mum, um tipo difícil de decodificar e enquadrar dentro dos parâmetros convencionais.

Ainda hoje, muitos se perguntam: quem foi Or-son Welles? Melhor: quais foram os elementos que moldaram personalidade

tão distinta? O que queria provar com os seus filmes e como os construiu? No Festival Cine Futuro, além da projeção de algumas das principais películas de sua carreira, uma mesa redonda vai discutir O ci-nema inventivo de Orson Welles, a marca registra-da do cineasta, aliás. Fora isso, o chamaram de gênio, culto, sedutor, bon vivant, palhaço, obstinado, re-volucionário, irreverente, pretensioso, contraditório, sem falar que foi acusado de seguir os seus impulsos sem muitas vezes medir as consequências.

Orson Welles nasceu em bom berço, em 6 de maio de 1915, na cidade de Kenosha, no estado

FuRACãO Welles

gênio da sétima Arte, a mística do autor de Cidadão Kane, considerado

por muitos o maior filme de todos os tempos, confunde-se com a força

de sua obra. Festival Cine Futuro disseca vida e trajetória de um artista

à frente de seu tempo

Raul Moreirado Seminário Magazine

D a fictícia transmis-são radiofônica que produziu e encenou

noticiando um ataque alienígena aos EUA, em 1938, a qual, de tão con-vincente, deixou milhares de norte-americanos em pânico, ao lançamento do seu primeiro longa, Cida-dão Kane (Citizen Kane, 1941), passaram-se menos de três anos. Esse foi o tempo para Orson Welles ser aclamado gênio, com apenas 26 anos, precoci-dade que no final atrapa-lhou a sua carreira, como ele mesmo reconheceu.

Mas se o autor de Cida-dão Kane, considerado por muitos o maior filme de

Page 21: Seminário Magazine 2012

| 2120 |

de Wisconscin, nos EUA. Cedo, o talento do peque-no Orson saltou aos olhos, tanto que a sua mãe, já separada do marido, em 1921, o pôs para estudar música, literatura, pin-tura e teatro. Mas quis o destino que ela viesse a falecer três anos depois. O “pequeno gênio”, então, foi morar com o pai, que morreria em 1930, vítima de alcoolismo.

nia Nicholson, o primeiro de seus muitos matrimô-nios, e, depois de uma pas-sagem pelo Federal The-atre Project, no qual se destacou pelas suas ideias inovadoras, abriu o seu próprio “negócio”, o Mer-cury Theatre, com o sócio John Houseman, três anos depois. Imediatamente, chamou atenção com as suas representações radio-fônicas e teatrais, entre elas

te interrompia um progra-ma musical para noticiar que os marcianos haviam invadido várias cidades dos EUA. No final, depois de uma série de boletins su-postamente veiculados de diversos pontos do país, muitos dos quais pedindo calma à população, a tru-pe de Welles alardeou que um gás espesso e veneno-so havia coberto Nova Ior-que, tanto que os sinais da

Ator e cineasta, entre outras ocupações, Orson Welles deixou a sua marca e é reverenciado como um dos mais importantes personagens da Sétima Arte em todos os tempos

Traumatizado com a morte de mãe e pai, mas amparado economicamen-te e portador de uma vo-lúpia artística que acabou por ajudá-lo a se recompor, Welles deixou os EUA aos 18 anos, tendo como destino Dublim, na Irlanda, onde frequentou o Gate Thea-tre. Depois, mudou-se para Londres. No entanto, ironia da sorte, o Velho Mundo não o enxergou, tanto que ele retornou aos EUA no início dos anos 1930, fixando-se em Nova Iorque, onde pas-sou a fazer parte da mítica companhia de Katherine Cornell e atuou em diversas peças baseadas na obra de Shakespeare.

Em 1934, Welles já esta-va casado com a atriz Virgi-

adaptações shakespearia-nas, tais como Macbeth e Julio César.

Mas foi na noite de 30 de outubro de 1938, um domingo, véspera da festa de Halloween, que Orson Welles flertou pela primei-ra vez com a fama, ao en-cenar na rádio CBS e em suas afiliadas A Guerra dos Mundos, baseada no livro homônimo do inglês H. G. Wells, lançado 40 anos an-tes. A peça noturna, com uma audiência estimada em centenas de milhares de ouvintes, a cada instan-

própria rádio foram inter-rompidos.

De tão real, milhares de norte-americanos acre-ditaram que o país estava realmente sendo invadido por marcianos e entraram em pânico, a ponto de muitos pegarem em ar-mas e esconderem-se em sótãos e túneis. Como não poderia deixar de ser, a re-percussão foi imensa e o próprio autor da obra ori-ginal tratou de esclarecer que o “louco” responsável por amedrontar os EUA não era seu filho, como se chegou a noticiar. “Eu não conheço esse jovem: sepa-ra-nos a sua audácia e a falta de respeito para com a minha obra”, declarou de forma irada H. G. Wells.

Welles tornou-se refém de

Cidadão Kane

Page 22: Seminário Magazine 2012

| 2322 |

Sob as luzes dos refletores, não demorou e Hollywood pôs os olhos em Orson Wel-les. Sem cerimônias, exe-cutivos dos estúdios RKO fizeram-lhe uma propos-ta tentadora, algo inédito naqueles tempos: oferece-ram-lhe US$ 225 mil, mais participações nos lucros, as melhores condições téc-nicas e total liberdade cria-tiva, inclusive garantindo--lhe o corte final, para que ele entregasse dois filmes prontos e codirigisse ou-tro. Em outras palavras: foi dada carta branca a um di-letante, pois até então a sua experiência com o cinema se resumia a poucos curtas.

Já separado da atriz Virginia Nicholson, Welles resolveu levar às telas a saga do magnata das co-municações Charles Fos-ter Kane, baseado na vida do controverso William Randolph Hearst. Até en-tão, Hollywood, conhecido pelo seu conservadorismo, jamais havia se arriscado em produzir um filme as-sim. Disposto a explorar as contradições de um perso-nagem envolvido em vá-rios escândalos e que fazia qualquer coisa para vender jornais, inclusive mentir em suas manchetes, sem falar que simpatizava com Hitler, Welles, apoiado por um dos sócios da RKO, Nél-son Rockfeller, pesquisou a fundo a vida nebulosa de Hearst.

Depois de desenvolver o roteiro a quatro mãos, assunto até hoje contro-verso, pois chegaram a acusá-lo de chamar para si a exclusividade da au-toria, preterindo Herman J. Mankiewiez, Orson Wel-

O olhar de Welles era diferenciado

les deu vida ao sombrio Charles Foster Kane. Por sua vez, a sua criatura ci-nematográfica, em termos de linguagem e narrativa, fugiu ao padrão: barroco por natureza, Welles incor-porou o uso de grandes an-gulares, priorizou a profun-didade de campo, inovou

nos enquadramentos, nos jogos de luz e sombra, tudo isso associado a uma mon-tagem e som diferenciados. Antes de filmar Cidadão Kane, ele assistiu seguidas vezes a No tempo das Dili-gências (Stagecoach, 1939) de John Ford, um dos seus diretores prediletos.

Page 23: Seminário Magazine 2012

| 2322 |

Ainda que a RKO e Wel-les já esperassem, a rea-ção de William Randolph Hearst, que também fora produtor cinematográfi-co, foi por demais violen-ta. De todas as formas, ele tentou evitar o lança-mento de Cidadão Kane e, como não obteve êxito, o denegriu através de seus jornais. O curioso é que de certa forma Hearst contou com o conservadorismo da Academia, incapaz de

reconhecer a força do fil-me, tanto que o premiou com um único Oscar, no caso Melhor Roteiro, sem falar que o público não foi o esperado.

Paralelamente, Welles encontrava-se envolvido em dois projetos, um deles a finalização de Soberba (The Magnificent Amber-sons, 1942); o outro previa uma viagem às Américas, onde, com apoio do gover-no dos EUA, pretendia co-lher material para o docu-mentário É tudo verdade (It´s all true), o qual costu-raria, através da música, a união de sua gente diversa em tempos de guerra. Na parte que cabia ao Brasil, a ideia era filmar apenas o

carnaval do Rio de Janeiro, mas ele encantou-se com a saga do pescador Jacaré, que ao lado de três compa-nheiros empreendeu uma viagem de jangada do Ce-ará ao Rio de Janeiro, para apresentar reivindicações da categoria ao ditador Ge-túlio Vargas.

definitiva do projeto.Depois de passar pela

Argentina, o cineasta retor-nou aos EUA e descobriu que a RKO não seguiu as orientações as quais havia enviado do Brasil e os qua-se 60 minutos do corte rea-lizado em Soberba o muti-laram. Na verdade, o filme, que estreou com a monta-gem de Welles e tinha duas horas e meia de duração, pouco rendeu nos primei-ros dias e, preocupados, os

produtores o modificaram a seu critério, ainda que muitos digam que a pri-meira hora de Soberba é a maior obra de Welles, su-perando Cidadão Kane.

Demitido da RKO, Or-son Welles começou a en-tender que o fio que separa a fama da derrocada era por demais sutil. Ainda que o seu talento fosse inques-tionável, os fracassos de Cidadão Kane – o filme só teria o seu valor reconhe-cido uma década depois –, de Soberba e do projeto do documentário É tudo ver-dade tornaram-se um peso que ele carregou pelo res-to da vida e o qual avaliou de forma pragmática já na idade da razão: “Na ver-

Como ator, Welles participou de dezenas de filmes

Welles extrapolava orçamentos dos

estúdios

Ironia da sorte foi a viagem ao Brasil em 1942 que arruinou a relação de Orson Welles com os estú-dios RKO. Primeiro porque o cineasta extrapolou o orçamento, sua marca re-gistrada, aliás, como tam-bém fugiu às orientações ideológicas de ambos os países e, no Rio de Janeiro, em vez de filmar o carnaval com sua paisagem tropi-cal standart, preferiu fazer antropologia visual ao não esconder o Brasil negro e mestiço. Paralelamente, a sua tentativa de reconsti-tuir o início da aventura de Jacaré em direção ao Rio terminou em tragédia, com o sumiço do jangadeiro no mar cearense e a suspensão

Page 24: Seminário Magazine 2012

| 2524 |

dade, os meus problemas com Hollywood começa-ram quando assinei um contrato de absoluta carta branca, o qual implicita-mente exigia que os meus projetos vingassem para o grande público, o que não aconteceu”.

Começava, então, uma nova fase para Orson Wel-les: atuou em uma série de filmes de certo calibre e, em 1946, dirigiu O Es-tranho (Stranger), película que atraiu um bom público e foi apreciada pela crítica. Um ano depois, o cineas-ta apresentava ao mun-do A Dama de Shanghai (The Lady from Shanghai), um clássico noir que tinha como estrela Rita Haywor-th, de quem estava se se-parando e, mesmo assim, talvez como atitude repa-ratória, realizou todas as estapafúrdias vontades da estrela hollywoodiana nos sets de filmagem.

Não demorou muito e Welles experimentou um de seus maiores fracassos cinematográficos, tanto de público como de críti-ca: Macbeth, de Shakes-peare. Rodado em apenas 23 dias, pois o orçamento era mínimo, o cineasta defendeu-se do insuces-so: “a ideia que me guia é sempre fazer um grande filme, pois, qualquer dire-tor, mesmo quando roda uma estupidez, tem que pensar grande. Desgraça-damente, nenhum críti-co do mundo entendeu a minha rapidez para fazer Macbeth e eu não podia escrever para cada um de-les para dizer-lhe que não havia dinheiro para rodar um dia a mais”.

Sem dinheiro e desacre-ditado junto aos estúdios, pois ficou com fama de autoritário e de não respei-tar tempos e orçamentos, restou a Europa a Welles, que compreendera mais os seus filmes do que os EUA. Numa época de guer-ra fria e em que os nervos estavam à flor da pele por conta das disputas ideo-lógicas, as portas do Velho Mundo foram-lhe abertas e, lá, o pródigo cineasta fi-nalmente encontrou gen-te que o compreendia e o idolatrava. Assim o fizeram os franceses como Jean Paul Sartre, André Bazin e François Truffaut, que a respeito de Cidadão Kane comentou: “Foi um filme

que nos libertou do nosso hollywoodianismo fanáti-co e nos converteu em ci-néfilos exigentes”.

Mas foi André Bazin, um dos fundadores da famosa Cahiers du Cinéma, quem foi mais a fundo na obra de Welles, tanto que seus arti-gos transformaram-se em um livro fundamental para quem quiser entender o ci-nema proposto pelo artista norte-americano. Paralela-mente, o autor de Cidadão Kane participou de alguns filmes europeus como ator e conseguiu produtores em diversos países para ban-car Othelo, que ganharia a Palma de Ouro de Cannes em 1952.

De volta aos EUA, Wel-les roteirizou e dirigiu o cultuado A Marca da Mal-dade (Touch of Evil, 1958), com Charlton Heston e Janeth Leigh, filme noir que ele mesmo deu vida a

Francisco Reiguera deu vida ao Dom Quixote de Welles

Europeus compreenderam melhor obra de

Welles

Page 25: Seminário Magazine 2012

| 2524 |

um policial corrupto e que entrou para a antologia por conta de um plano--sequência de mais três minutos. Depois, vieram O Processo (Le Procés), em 1962, produção europeia também aclamada pela crítica e Falstaff – O toque da Meia-noite (Falstaff), longa rodado na Espanha e que completou a trilogia shakespeariana de Welles para o cinema, depois de Macbeth e Othelo.

Nos últimos 10 anos de vida, Orson Welles partici-pou como ator e narrador, por conta de sua voz par-ticular, de uma infinidade de filmes, boa parte dos quais europeus, sem falar que foi garoto propaganda de alguns comerciais, in-clusive de bebidas alcoó-licas. Alcoólatra e cada vez mais gordo, o artista ainda alimentava a fantasia de finalizar Dom Quixote, ba-

seado na obra de Cervan-tes, material que ele co-meçou a colher no México ainda nos anos 1950 e, em 1992, muitos anos depois de sua morte, montou-se uma versão a qual levou a sua assinatura.

quanto o conceito niet-zschiano de “potência do falso” encontra equivalên-cias no filme de Welles. A respeito da questão, aliás, o cineasta, entrevistado por Bazin se disse “aris-tocrático”, afirmação que Deleuze viu como uma crítica à moral burguesa, também impregnada na obra de Nietzsche.

Elucubrações de fundo acadêmico à parte, Orson Welles acompanhou de perto o surgimento de uma grande safra de cineastas de reconhecido talento na Europa. No entanto, ren-deu-se a poucos. Chamou Bergman, por exemplo, de “mais estrangeiro que os japoneses”; definiu Anto-nioni como o “pai de um certo cinema que só deixa o espectador aborrecido”; acusou Fellini de “provin-cianismo” e Rossellini de dublê de cineasta. Outro que não escapou de sua língua foi o compatriota Nicholas Ray, de quem dis-se: “me enfureço quando penso em seus filmes”.

Para os amantes da Sé-tima Arte, a obra de Orson Welles parece inesgotável e, dependendo do olhar de quem a investigue, parece ganhar novos contornos, como se o autor soubesse que sobreviveria na pos-teridade e jogasse com a imaginação alheia. Como reconheceram muitos es-tudiosos de seus filmes, se há alguém que sempre esteve à frente de seu tem-po esse homem foi o autor de Cidadão Kane, virtude que de certa forma se tor-nou um fardo para ele, mas que lhe garantiu um legado imensurável.

Cineasta foi ácido na crítica a colegas

europeus

Para se ter uma ideia, o Dom Quixote de Welles foi considerado pelo professor da Universidade de Nova Iorque, Bob Stam, como a mais original das adapta-ções feitas para o cinema do personagem de Cervan-tes. Defendeu o acadêmico que Welles conseguiu cap-tar toda a modernidade do clássico da literatura espa-nhola e a expôs em pelícu-la de forma diferenciada e criativa, fugindo ao lugar- comum da reprodução his-tórica: “Welles foi Welles ao recontar Quixote”, chegou a afirmar Stam, que destaca a compreensão universal do cineasta ao fato de que ele viveu fora dos EUA e desenvolveu um aguçado multiculturalismo, despo-jando-se da veia colonia-lista típica dos americanos depois da segunda metade do século XX.

Naturalmente, a união de sua formação multi-cultural com um talento imensurável, fez de Wel-les objeto de apreciação de críticos e intelectuais. Quem o releu de forma original foi o saudoso Gil-les Deleuze: a partir de Verdades e Mentiras (F for fake, 1973), o filósofo fran-cês discorreu a respeito do

Page 26: Seminário Magazine 2012

| 2726 |

André SetaroCrítico de cinema

a retrospectiva de Orson Wel-les, que a oitava edição do Festival Cine Futuro está a nos brindar, sobre ser uma

oportunidade única de se conhecer em bloco a importante filmografia de um dos maiores realizadores da his-tória do cinema, proporciona a visão geral de um cineasta que é conside-rado um verdadeiro autor de filmes, porque possuidor de uma visão de mundo e um estilo particular, único, de articular os elementos da lingua-gem cinematográfica dentro de uma estrutura audiovisual, que é o cine-

ma. Na ausência de uma melhor compreensão da essência do ci-nema, por parte do público baia-no, e, principal-mente, daqueles que se arvoram em fazedores de filmes, apreciar a mise-en-scène wellesiana é um

dever de casa, uma obrigação, uma ne-cessidade nestes tempos turvos, prin-cipalmente depois que o digital passou a ser uma muleta facilitadora do regis-tro de imagens.

Cidadão Kane (Citizen Kane, 1941) começa no momento da morte de Charles Foster Kane, magnata de im-prensa que Welles, segundo se conta, se inspirou num verdadeiro e pode-roso: William Randolph Hearst. Um cinejornal, no estilo bombástico da

época, March of time, conta a vida dele desde o nascimento até o seu de-senlace. De modo que a história, que se possa pensar encontrá-la durante o desenvolvimento da narrativa, já é dada em linhas gerais. Findo o filme de atualidades, que jornalistas estão a ver, numa cabine da redação, um deles, intrigado com a última palavra pronunciada por Kane no leito, “Rose-bud”, acha que precisa ser investiga-da. O que significaria “Rosebud”?

Um jornalista é então encarrega-do de descobrir o enigma e sai para entrevistar as pessoas que convive-ram com o magnata desaparecido. A sua vida vai se reconstruindo atra-vés dos testemunhos daqueles que a compartilharam. As memórias de Thatcher evocam a sua infância jun-to a sua mãe (Agnes Morehead) e as do velho Bernstein (Everett Sloane) contam como ele dirigia o periódico e, como este veio a provocar a guer-ra de Cuba. Leland (Joseph Cotten), outro amigo e companheiro, narra o matrimônio de Kane com a sobrinha (Ruth Warrick) do presidente dos Es-tados Unidos, seus amores com uma jovem (Dorothy Comingore), com a qual volta a se casar (a primeira mor-re em acidente), e, finalmente, o fra-casso do magnata como candidato à presidência de seu país.

Os depoimentos recolhidos pelo repórter são narrados em flashbacks. Quando este entra na biblioteca de Thatcher, o cenário grandioso revela em Welles a forte influência do ex-pressionismo alemão, principalmente no que se refere à plástica da imagem (a luz, surpreendentemente forte, a configurar o próprio décor, a dese-

Welles inauguroucinema moderno com Cidadão Kane

Welles: gênio aos 26 anos

Artigo

Page 27: Seminário Magazine 2012

| 2726 |

nhar seus contornos gigantescos, as-sim como suas figuras e a pontuação da música – de Bernard Herrmann –, e os cortes abruptos). É magistral o pla-no no qual aparecem as letras do diá-rio que está a ser lido pelo repórter e, num travelling, elas, as letras, se trans-formam, de repente, no menino Kane a brincar na neve. Outro plano subli-me, quando Kane está em Xanadu, é o do quebra-cabeça que a sua esposa tenta montar, a colocar suas peças, es-sência do próprio filme, significação, pois o trabalho do repórter se asseme-lha a isso justamente: a montagem de um quebra-cabeça constituída pelos depoimentos em flashbacks.

Mas o espectador, e somente ele, saberá, ao final, o significado de Ro-sebud: é a inscrição que figura num velho trenó que Kane possuía em sua infância. Mas a significação do filme não se encontra na decifração des-se enigma, uma pista falsa dada por Welles para aqueles que procuram, ansiosos, por “mensagens”. O puzzle ou, melhor, o quebra-cabeças monta-do, pulveriza a estrutura narrativa em diversos pontos de vistas e determina uma desestruturação da temporali-dade, do tempo cinematográfico, ao qual não estavam acostumados os espectadores da época. Não há nessa estrutura uma intensidade dramática nos moldes do cinema clássico de en-

tão, mas ela se desintegra nos pontos de vista dos depoentes. O fato é que, como puzzle que é, Citizen Kane tem sua significação maior nos dois tra-vellings, um no início, e outro, no fim, iguais, que mostram a grade de ferro do portão de Xanadu com a inscrição “Não ultrapassar”, como a dizer que a ninguém é dado adentrar na perso-nalidade de um homem, ambíguo e complexo como o magnata retratado.

Trata-se, na verdade, de uma obra de enorme complexidade, quer em seu relato, quer em relação às técnicas empregadas. Neste sentido, são cé-lebres e antológicos os cenários com teto baixo (a agigantar os personagens em cena) e a profundidade de campo, obtida graças ao emprego de procedi-mentos inventados pelo genial diretor de fotografia Gregg Toland. No que se refere ao relato em si, encontra-se uma inteligentíssima utilização do flashback, que permite dar, quando o caso o requer, distintas versões de um mesmo acontecimento, segundo a ótica de quem o relata.

Personalidade de homem da Re-nascença, Orson Welles, em seus filmes, traduz uma reflexão sobre o mundo em que vivemos, indo além da simples estrutura argumental que lhe serve de suporte para atingir uma indagação sobre o próprio processo de criação cinematográfica.

Autor de Cidadão Kane também ficou conhecido pelas suas conquistas

Page 28: Seminário Magazine 2012

| 2928 |

Raul MoreiraDo Seminário Magazine

lá pela metade dos anos 2000, separadamente, o cineasta Joel de Almeida e o jornalista Josias

Pires começaram a desenvolver projetos que tinham como obje-tivo descortinar um personagem emblemático que alimentou o imaginário popular de Salvador no século passado, conhecido como Cuíca de Santo Amaro. E quis o destino que os dois unissem forças e transformassem os seus desejos em uma árdua pesquisa que aca-bou resultando em um documen-tário financiado pela Petrobras.

Já visto em São Paulo, no Festi-val É Tudo Verdade, Cuíca de Santo Amaro será projetado pela primeira vez na Bahia no Festival Cine Fu-turo – VIII Seminário Internacio-nal de Cinema e Audiovisual. E, naturalmente, o filme, em película e com pouco mais de uma hora e quinze minutos, tem importância não apenas pelo fato de se consti-tuir um importante documento a respeito de um personagem que merecia aprofundamento, como, também, pela forma através da qual a dupla de autores o construiu.

Dispondo apenas das imagens da participação de Cuíca de Santo Amaro no filme A Grande Feira, de Roberto Pires, lançado em 1961, no qual ele aparece no início e no fim, além de poucas fotos e de nenhum registro sonoro, Pires e Almeida fo-ram hábeis em construir o roteiro com elementos visuais e auditivos que supriram essas ausências: a ve-lha Cidade da Bahia foi apresentada

O emblema Cuíca de santo Amaro

em um belo preto e branco, anima-ções dão sentido a certos discursos, enquanto um ator, de forma con-vincente, fez a voz de Cuíca, recur-sos que, associados aos depoimen-tos dos entrevistados, compuseram o mosaico apurado do personagem.

A respeito da questão, Pires in-dagou: “como fazer um filme lon-ga-metragem sobre um persona-gem de quem temos pouquíssimas imagens? Esta pobreza imagética nos impôs definitivamente o viés do personagem cronista social, Cuíca cronista da cidade da sua época. E daí fomos buscar os ar-quivos disponíveis com imagens da Cidade da Bahia de Todos os Santos das décadas de 1930, 40, 50 e 60 e cruzá-las com os assuntos trazidos pelo personagem”.

Mas quem é Cuíca de Santo Ama-ro? No documentário há uma incli-nação maior em apresentá-lo como “um herói do povo, um poeta de lín-gua maldita que usou o seu talento em defesa dos interesses populares”, como afirmou Joel de Almeida. No

Documentário lança luz a respeito da trajetória do poeta-repórter que alimentou o imaginário popular de Salvador em seus tempos de província

Cuíca de Santo Amaro: poeta-repórter marcou época

Filmeamplia noção

de Cuíca

PIER

RE V

ERG

ER©

FuN

DA

çã

o P

IERR

E VE

RGER

Page 29: Seminário Magazine 2012

| 2928 |

O emblema Cuíca de santo Amaroentanto, algumas brechas dão a en-tender que Cuíca era também um manipulador, um tipo que fazia o seu interesse e o interesse de quem lhe pagasse, como afirmou Pires: “ele também era um anti-herói que trafegava por terrenos complicados”.

Como reconheceram os dois au-tores, ainda hoje a figura de Cuíca de Santo Amaro gera polêmica, por representar o arquétipo do herói e ao mesmo tempo de alguém pouco recomendável na cabeça de quem o conheceu. “Houve quem se ne-gasse a falar sobre ele, por consi-derá-lo um personagem maldito e que feria a noção de boa conduta naquela época”, diz Josias Pires.

No entanto, exceção de um e de outro depoimento, como o do jor-nalista Mino Carta, que se deu a um bom-mocismo ao julgá-lo sem o devido conhecimento de causa, a montagem, claramente, favoreceu a construção da identidade de Cuí-ca como um simpático, um zom-beteiro, um Gregório de Matos sem a boa pena, um que se travestiu de “veículo de comunicação” ambu-lante para informar ao seu modo em uma Salvador que era pratica-mente analfabeta.

Em um artigo publicado no on-line Caderno de Cinema, Josias Pi-res chega a afirmar: “a realização de um documentário, lembra o mestre Eduardo Coutinho, é operação bas-tante arriscada, pois você começa

e não sabe aonde vai exatamente chegar. É a forma vazia, segundo Geraldo Sarno. O filme muda a cada momento em que está sendo feito, desde a concepção, aos primeiros argumentos e roteiros até o último minuto estamos fazendo ajustes, é sempre uma obra inacabada”.

A respeito do discurso segundo o qual o documentarista brasileiro muitas vezes não consegue se dis-tanciar do objeto de apreciação e acaba por mascarar o seu sentido de realidade, Joel de Almeida acre-dita que Cuíca de Santo Amaro re-flete a tendência de uma pesquisa: “A inclinação da montagem seguiu uma linha, um pensamento que se apresentou favorável a Cuíca e que apontou para a compreensão e a importância dele no seu tempo, na realidade de sua cidade”.

Na verdade, a pesquisa da du-pla, que inicialmente passou pe-los escritos de Edilene Matos, que lançou O Boquirroto de Megafone, e do brasilianista norte-americano Mark J. Curran, autor de Cuíca de Santo Amaro, poeta-repórter da Bahia, uma vez sintetizada em au-diovisual foi importante não ape-nas para compor o personagem, mas, também, por revelar um ver-dadeiro mosaico antropológico e sociológico da Cidade da Bahia. E, através dele, pode-se compreender as belezas e misérias da cidade e de sua gente tempos atrás, as quais parecem iguais aos dias de hoje.

De tão rica a pesquisa, a dupla Joel de Almeida e Josias Pires corre atrás de recursos para apresentar nos extras na versão DVD do filme uma síntese das 50 entrevistas re-alizadas. Será mais uma oportuni-dade para conhecer novas facetas de Cuíca de Santo Amaro, o poeta--repórter que alegrou e infernizou a vida da Cidade da Bahia em seus tépidos tempos de província.

A Fundação Pierre Verger é proprietária dos di-reitos das poucas fotos de Cuíca de Santo Amaro em ação nas ruas de Salvador.

Josias Pires e Joel

de Almei-da: Cuíca agradece

Cuíca usou seu talento em defesa dos humildes

diV

ulg

ão

Page 30: Seminário Magazine 2012

| 3130 |

Do Seminário Magazine

A pergunta é: o que une o longa-metra-gem ficcional brasi-

leiro Éden, de Bruno Safadi, a Você não gosta da verdade - 4 dias dentro de Guantá-namo, documentário cana-dense de Luc Côté e Patricio Henriquez? Aparentemente nada, até porque trata-se de gêneros cinematográ-ficos diferentes. No entan-to, há algo que encaixa as duas produções: a urgência, independentemente dos países de origem e até das questões ideológicas.

Essa é, a julgar pelos títulos que vão desfilar durante uma semana nas salas do Espaço Itaú de Cinema Glauber Rocha, a pegada da Mostra Inter-nacional do Festival Cine Futuro: filmes diversos e de países diferentes, todos inéditos na Bahia e, por conta das dificuldades de distribuição e exibição, muitos só serão vistos na telona durante o evento.

O brasileiro Éden, de Bruno Safadi, prêmio de melhor atriz para Lean-dra Leal no Festival do Rio, mês passado, é uma das grandes atrações da Mostra Internacional. Ten-do como pano de fundo o

Todos à mostra internacionalEspectador terá contato com filmes diversos e ao mesmo tempo próximos, uma vez que produções nacionais e internacionais se unem através de um sentimento de urgência

proliferar das igrejas evan-gélicas no Brasil, em deter-minado momento a perso-nagem vivida por Leandra Leal, grávida, depara-se com um ambiente ambí-guo, marcado por manipu-lações e disputas de poder.

“Éden é um filme de risco”, afirmou o diretor Bruno Safadi, de 32 anos, referindo não apenas à temática, mas também à estética do filme: “trata--se de uma ode à vida que quer dizer sim à vida e, para isso, fundamental foi profanar o profano”.

Do mesmo Bruno Sa-fadi, ao lado de Noa Bres-sane, será projetado o documentário Belair, que celebra o cinema de Júlio Bressane e Rogério Sgan-zerla, sócios da mítica pro-

dutora a qual dá nome ao filme. Emblemático, quem o viu ficou desconcertado com o poder de suas ima-gens, originárias de um tempo em que o cinema trafegava por outros terre-nos e não estava aprisio-nado em uma ordem con-servadora e politicamente correta como hoje.

Por sua vez, Você não gosta da verdade - 4 dias dentro de Guantánamo (You don’t like the truth - 4 days inside Guantánamo, 2010), vencedor do prêmio de melhor documentário do Festival É Tudo Verda-de, em 2010, em São Paulo, fala do absoluto silêncio do governo canadense em relação à existência de um prisioneiro nascido no país em Guantánamo, Cuba, acusado de terroris-mo pelo governo dos Es-tados Unidos. Capturado quando havia apenas 15

Filmes diversos de países diferentes

ÉdenÉden: conflito espirital dá tom a filme de Safadi

Você não gosta da verdade – 4 dias dentro de Guantánamo: denúncia

Page 31: Seminário Magazine 2012

| 3130 |

anos, a dupla Luc Côté e Patricio Henriquez acom-panha quatro dias de in-terrogatórios ao canaden-se de origem árabe.

Mais relaxado, por conta da temática, Pra lá do Mundo, documentá-rio do paulista Roberto Studart faz uma imersão na Chapada Diamantina, na Bahia, onde em deter-minados locais, como o Capão, brasileiros e es-trangeiros buscam uma nova forma de vida, lon-ge do consumo. Além de retratar o movimento de pessoas em busca de paz em um mundo tão caóti-co, o filme também flerta com os desdobramentos da “invasão estrangeira”, a qual traz certos benefí-cios e perigos para as co-munidades locais.

Outra grande atração da Mostra Internacional é o filme do blasonado italiano Marco Belocchio, Irmãs Jamais (Sorelle Mai, 2010). Mistura de docu-mentário e ficção, o filme retrata a vida da família do próprio cineasta, que a revisita na pequena ci-dade de Bobbio e utiliza seus parentes como “ato-res” para construir uma trama profunda e repleta de melancolia, sem falar de sua coragem em des-nudar suas intimidades.

Quem chama atenção, também, é Futuro do Pre-térito - Tropicalismo Now, da dupla Ninho Moraes e Francisco César Filho. Misto de documentário, intervenção artística, show musical e esquetes tea-trais, segundo os autores a ideia foi lançar um olhar do século XXI sobre o mo-vimento que revolucionou a cultura e os costumes no Brasil no final dos anos 1960 e que ecoa até hoje. “A gente quis mostrar uma visão de como seria o tro-picalismo nos dias atuais, em uma era digital”, diz Ninho Moraes, que com-pleta: “não é um documen-tário tradicional, é mais uma experiência visual. O tema é muito amplo e pre-cisava de um tratamento

que escapasse do formato mais comum. A ideia foi mostrar essa fragmenta-ção do século 21 e com muita alegria”.

Segundo o cineasta Ni-nho Moraes, há uma ten-dência neste momento no Brasil em reviver o movi-mento tropicalista, como se viu, por exemplo, com o lançamento de Tropicá-lia, de Marcelo Cardoso, fenômeno que segundo ele se dá pelo fato de que os artistas que fizeram o movimento continuam atuais, mesmo 40 anos depois: “o que o Caetano propunha era quebrar a barreira entre o erudito e o popular. Isso ainda se faz necessário, ao mesmo tempo que é muito mais fácil nos dias de hoje, com toda essa tecnologia que temos à disposição. Anti-gamente, não havia Twit-ter, Facebook”.

Por fim, de quem se es-pera muito, também, é de Sudoeste, de Eduardo Nu-nes, ficção que chega ao Festival Cine Futuro am-parada por uma série de prêmios. Um dos méritos do filme é a sutileza com a qual o diretor trafegou por recônditos imaginá-rios, utilizando-se de uma plástica apurada, a qual encaixou-se como uma luva na sua proposta.

Futuro do Pretérito não é um documentário

tradicional

Irmãs Jamais: filme intimista de Bellocchio

Futuro do Pretérito: Tropicália em alta

Page 32: Seminário Magazine 2012

| 3332 |

Dezoito curtas, baianos e nacionais, disputam prêmio da R$ 10 mil da mostra do Festival Cine Futuro. Ecléticas nas temáticas e na estética, produções confirmam força e talento dos curtas-metragistas brasileiros

Do Seminário Magazine

Há quem diga que, por conta da liberdade cria-tiva, o curta-metragem é a expressão máxima da realização cinematográfica. Há, também,

quem afirme que, para se fazer “cinema grande”, fun-damental se faz conhecer os caminhos do “cinema curto”. Por fim, são muitos os que o consideram algo menor, uma entrada, partindo-se do princípio que o prato principal é o “imbatível” longa-metragem.

Seja como for, a verdade é que nunca se produziu tantos curtas no Brasil. O fenômeno, no caso, está proporcionalmente relacionado às facilidades do digital como também ao grande número de mostras e festivais. Assim, no país dos curtas, as variedades temáticas, sem falar das narrativas e linguagens mil compõem um mosaico criativo que merece estudo aprofundado.

O Festival Cine Futuro – VIII Seminário Inter-nacional de Cinema e Audiovisual oferece aos seus aficionados um cardápio de todo respeito: 18 curtas, entre baianos e nacionais vão disputar cobiçados R$ 10 mil. Entre eles, o premiado Ser Tão Cinzento, do nativo Henrique Dantas, vencedor este ano do prê-mio de melhor documentário em curta-metragem do Festival É Tudo Verdade.

Barbada? Nem tanto. Como é difícil prever as in-clinações de uma comissão de jurados, assim como a natureza do evento muitas vezes favorece uma ou ou-tra temática, sem falar que na média a qualidade dos competidores é boa, tudo pode acontecer. Mas o im-

A força do cin ema “curto”Bomba, Francisco Franco

Amor em preto e branco, Rose de Moraes

Câmera Escura, Marcelo Pedroso

simendi dolesequibus int, cum quuntotat parum eatusci

Da alegria, do mar e de outras coisas, Ceci Alves

Desterro, Marília Hughes e Cláudio Marques

Ser Tão Cinzento, Henrique

DantasSignos da tela, Caio Araújo

Dançando mas tô andando, Marcondes Dourado

Telefonema de origem, André Nogueira

Page 33: Seminário Magazine 2012

| 3332 |

A força do cin ema “curto”portante é projetar sem ambições, comunicar, se fazer discutir, como diz a maioria dos curtas-metragistas.

Além de Ser Tão Cinzento, que dá uma nova roupa-gem à ficção Manhã Cinzenta, do saudoso Olney São Paulo, um filme curto que chama atenção é Câmera Escura, do pernambucano Marcelo Pedroso, que, de forma criativa, se utiliza de uma câmera escondi-da numa pequena caixa para fazer “política social”. Quem também denuncia, ainda que explicitamente, é a baiana Ceci Alves, com o esperado Da Alegria, do Mar e de Outras Coisas, curta livremente inspirado na história de travestis locais assassinados pela polícia.

Para não perder o costume, no bom sentido, o casal Marília Hughes e Cláudio Marques marca presença no Festival Cine Futuro, agora com Des-terro, um filme que investiga a dor de personagens que perderam tudo com a barragem de Sobradinho. Com temática também trafegando pelas abruptas transformações do Brasil contemporâneo, Dique, do pernambucano Adalberto Oliveira, denuncia a urbanização caótica de uma cidade dormitório.

Outro curta esperado é Dançando mas tô an-dando, do baiano Marcondes Dourado, que reconta a saga de um homem que passou um ano e oito me-ses andando para trás. Da Bahia, ainda, Seca Verde, da dupla Nicolas Hallet e Simone Dourado, Amor em preto e branco, de Rose de Moraes, Signos da tela, de Caio Araújo e Telefonema de origem, de André Nogueira, uma ficção de 23 minutos que retrata um homem que busca descobrir os mistérios da vida ao receber um telefonema de Deus.

Outro baiano, Os incomodados que se mudem, de Juliana Brandão e Rose de Moraes, vai dividir o Festival Cine Futuro com os cearenses Charizard e Epifânio, de Leonardo Mouramateus e Gláucia Bar-bosa, respectivamente, e Bomba, do mineiro Fran-cisco Franco.

Seca Verde, Nicolas Hallet e Simone Dourado

Dique, Alberto Oliveira

Fugaz, Joacélio Batista

Lulaby, André Lage

Epifânio, Gláucia Barbosa

Os incomodados que se mudem, Juliana Brandão e Rose de Moraes

Orwo Forma, Karen Black e Lia Letícia

Charizard, Leonarrdo MouramateusDois, Thiago Ricarte

Page 34: Seminário Magazine 2012

| 3534 |

José Walter Lima*

a partir da Guerra Fria, os EUA usaram o cinema e a televisão como veículos de afirmação do capitalismo e estenderam os

seus tentáculos pelo mundo como im-pério algum jamais o fizera: a estratégia, organizada pela CIA, tinha como objetivo aparente combater o comunismo, mas, principalmente, promover uma atmosfe-ra que integrasse o mundo ao seu jeito de pensar, a difundir um modelo de felicida-de, o famoso American Way of Life.

O resultado é que hoje a maioria dos países age e pensa a partir de um modelo e de um padrão imposto de forma dire-ta e subliminar pelos EUA. E o cinema e a televisão foram, no caso, poderosos instrumentos a partir dos quais se deu a “lavagem cerebral” que contribuiu para a implantação de uma cultura belicista e consumista.

A partir do período da chamada caça às bruxas, os EUA trataram o cinema como uma questão de segurança nacio-nal, controlando a sua produção e domi-nando a distribuição e exibição de seus filmes na maioria dos países. A França foi um dos poucos que resistiram a essa forma de controle, criando leis para sal-vaguardar o cinema.

O curioso, para não dizer lamentável, é que os nossos governantes e políticos nada fizeram para garantir a reserva de mercado para o cinema brasileiro, como também nunca houve uma política con-sistente para o audiovisual.

Sintomático é que o sonho de boa parte dos cineastas brasileiros é ter um filme coproduzido pelas majors. Isso re-flete o colonialismo da classe, totalmen-te despolitizada, sem liderança e subser-viente à Rede Globo e às distribuidoras norte-americanas. Por outro lado, quem deveria nos defender, como a ANCINE e a SAV, pratica a política do faz de conta.

É por isso que as majors ocupam com seus blockbusters 90% das poucas salas existentes, as quais boa parte pertence às multina-cionais. Neste aspecto, deveríamos seguir o exemplo da Argentina, que criou uma lei que taxa os filmes estrangeiros que alcancem um determinado número de cópias.*cineasta e diretor do Festival Cine Futuro

O cinema brasileiro e a soberania nacional

Artigo

Os políticos, os intelectuais, os críti-cos e a mídia são colonizados, adoram os filmes americanos e assistem a novelas. A elite pensante desse país é uma vergo-nha. Eles não têm consciência do grande mal que o cinema americano e a Rede Globo fazem. Eles não conseguem en-tender que o audiovisual é uma questão de Estado, é uma questão de soberania nacional e de identidade cultural.

O bom cinema brasileiro está con-denado ao desaparecimento. O que presenciamos hoje é o “mercado” esma-gando o autor. Além do mais, temos os realizadores totalmente cooptados por uma dramaturgia padronizada e colo-nizada, que prima pela falta de profun-didade, pelo fetiche da técnica e pelos efeitos especiais sem nenhuma vacuida-de de ideias. Atualmente, realizamos um cinema reacionário que mostra a socie-dade alicerçada na polícia e no bandi-do, no câncer social: o pobre matando o pobre. Uma imitação barata do cinema americano que resolve os problemas da sociedade com a polícia.

No final, de duas uma: ou se toma um posicionamento político ou teremos uma juventude ainda mais alienada, que tem como modelo uma sociedade que produz lixo, inventa mitos, celebridades e usa clichês mentirosos.

Resumindo: ou o governo e o Con-gresso tomam medidas urgentes para reverter essa situação, ou estaremos fadados ao colonialismo cultural. Vale lembrar que os americanos sabotaram a Vera Cruz nos anos 1950 e, violando a nossa soberania nacional, boicotaram, juntamente com o Concine, a Lei do Cur-ta, quando ela já havia sido aprovada, em 1975, e a qual obrigava que antes da exi-bição de qualquer filme estrangeiro fos-se projetado um curta-metragem nacional.

Page 35: Seminário Magazine 2012

| 3534 |

Page 36: Seminário Magazine 2012

| 3736 |

Diálogo entre Warkentien e Krieger

rapidinhas rapidinhas rapidinhas rapidinhas rapidinhas

Filhos de João – Admirável Mundo Novo, de Henrique Dantas, e Cascalho, de Tuna Espinheira.

Transmissão ao vivoAs mesas-redondas e os Diálogos do Festival Cine Futuro – VIII Seminário Internacional de Cinema e Audiovisual serão transmitidas ao vivo em diversos portais, diretamente do Espaço Cultural da Barroquinha. Contando com o apoio do Instituto Baiano de Radiodifusão Educativa da Bahia (Irdeb), a transmissão, em HD, vai contar com três câmeras, tradução simultânea e caracteres, nos períodos da manhã e da tarde, de 12 a 14 de novembro.

Barroquinha e Espaço ItaúDurante três dias, o Espaço Cultural da Barroquinha vai abrigar quatro mesas-redondas e duas sessões Diálogo do Festival Cine Futuro - VIII Seminário

Internacional de Cinema e Audiovisual. Em ambiente refrigerado e com capacidade para 150 pessoas, o espaço cultural já abrigou diversas peças teatrais e outros eventos. Quem não conseguir ingresso para presenciar os debates na construção secular poderá assisti-los na sala 1 do Espaço Itaú de Cinema, com transmissão em tempo real.

Cinema sul-americanoOs rumos da Sétima Arte no continente serão debatidos no Diálogo Política e Cinema Sul-americanos. A fala entre o sociólogo Emir Sader e o cineasta Sérgio Muniz vai pontuar a respeito das políticas dos governos do bloco em relação à afirmação do cinema e do audiovisual como instrumento de identidade e de formação cultural das populações. Nos últimos anos, por conta da proliferação de governos de centro-esquerda, muito se falou a respeito da criação de uma estratégia que integrasse o audiovisual do bloco sul-americano.

Um dos Diálogos do Festival Cine Futuro – VIII Seminário Internacional de Cinema e Audiovisual vai marcar o encontro da pesquisadora alemã Beate Warkentien com o compositor brasileiro Edino Krieger. Ambos vão falar a respeito da interação entre música e cinema. Para se ter uma ideia, Warkentien desenvolve pesquisas sobre o cinema mudo e gêneros de música. Já Krieger, com uma vida inteira dedicada à música, foi criador das Bienais de Música Brasileira Contemporânea e diretor da Funarte.

Mostra baianaLongas realizados por diretores baianos no século XXI. Esse é o cardápio da Mostra Cinema Baiano, que será projetada em 35 mm no Festival Cine Futuro. São: Antonio Conselheiro - O Taumaturgo dos Sertões, de José Walter Lima, Bahêa Minha Vida, de Márcio Cavalcante, O homem que não dormia, de Edgard Navarro, Jardim das Folhas Sagradas, de Pola Ribeiro,

Beate Warkentien: cinema mudo e música

Antonio Conselheiro é uma das atrações de Mostra Baiana

Page 37: Seminário Magazine 2012

| 3736 |

Page 38: Seminário Magazine 2012

| 3938 |

ReAlizAçãO

PRODuçãO

DiReçãO geRAlJosé Walter lima

COORDenAçãO geRAlneusa Barbosa

DiReçãO De PRODuçãOBaluart Projetos culturais

CuRADORiA DOs FilMes CuRTAS-METRAGENS daniel queiroz LONGAS-METRAGENS adolfo gomes Walter lima neusa Barbosa

COORDenAçãO MESA REDONDA | DIáLOGO cecilia Tamplenizza COMuNICAçãO Raul moreira MOSTRA INTERNACIONAL natália Reis FINANCEIRA daniela Floquet GESTãO DE PROJETOS milena Raynal

PRODuçãOmariana gomach

lívia cunhaFernanda FélixThiago Pilloni

AssisTenTes De PRODuçãOalana SilveiraPaula Ribeiro

lOgísTiCA Julia Rizério

COMuniCAçãO APRESENTADOR nonato Freire COMuNICAçãO ON-LINE lucas debarbo ASSISTENTES DE COMuNICAçãO maria garcia e márcio liolly ASSESSORIA DE IMPRENSA João Saldanha CORDENAçãO MOSTRA AMBIENTAL E TExTOS Júlio goes EDITOR DO SEMINáRIO MAGAzINE Raul moreira PROJETO GRáFICO Sérgio Fujiwara PROGRAMAçãO VISuAL Ângela Fujiwara EDIçãO Karine Barreto LEGENDAGEM ELETRôNICA quatro Estações TRADuçãO SIMuLTâNEA Tisel Bahia MOSTRA AMBIENTAL |ICBA crisantempo

JuRi DO FesTiVAlHelena ignezJosé araripe JrJorge alfredo

AgRADeCiMenTOs esPeCiAislídice da mataFernando Felixalbino Rubimcarlos PaivaFátima Froes

isa de oliveiraEra Encarnação

gilberto de Barros Pedrosa Jr.nancy coelhoivana Bentes

Page 39: Seminário Magazine 2012

| 3938 |

Page 40: Seminário Magazine 2012