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JULHO 2010 • MENSAL • 1,50 PUBLICAÇÃO OFICIAL DA MARINHA • Nº 443 • ANO XL SILENCIOSAMENTE AO SERVIÇO DE PORTUGAL

SILENCIOSAMENTE AO SERVIÇO DE PORTUGAL · depósito legal nº 55737/92 issn 0870-9343 sumÁrio anunciantes: man ferrostaal portugal, lda.; rohde & schwarz, lda. fotografias antigas,

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JULHO 2010 • MENSAL • € 1,50PUBLICAÇÃO OFICIAL DA MARINHA • Nº 443 • ANO XL

SILENCIOSAMENTE AO SERVIÇO DE PORTUGAL

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Fotografias Antigas, Inéditas ou Curiosas

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O MAR E OS NAVIOS

Série de fotografias curiosas do NRP “Coman dante Hermenegildo Capelo” (2000 toneladas de desloca-mento) enfrentando mar adverso. O seu conjunto faz-nos trazer à memória aquela frase atribuída ao Marquês de Pombal “HÁ HOMENS PARA TUDO... ATÉ PARA ANDAR NO MAR !”

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Publicação Oficial da Marinha

Periodicidade mensalNº 443 • Ano XL

Julho 2010

DirectorCALM EMQ

Luís Augusto Roque Martins

Chefe de RedacçãoCMG Joaquim Manuel de S. Vaz Ferreira

Redacção1TEN TSN Ana Alexandra Gago de Brito

Secretário de RedacçãoSAJ L Mário Jorge Almeida de Carvalho

Colaboradores PermanentesCFR Jorge Manuel Patrício Gorjão

CFR FZ Luís Jorge R. Semedo de MatosCFR SEG Abel Ivo de Melo e Sousa1TEN Dr. Rui M. Ramalho Ortigão Neves

Administração, Redacção e PublicidadeRevista da Armada

Edifício das InstalaçõesCentrais da Marinha

Rua do Arsenal1149-001 Lisboa - Portugal

Telef: 21 321 76 50Fax: 21 347 36 24

Endereço da Marinha na Internet http://www.marinha.pt

e-mail da Revista da Armada [email protected]

Paginação electrónica e produçãoMacfinal, Lda.

Rua Lalande, 17 - 7º Esq.Lisboa

Tiragem média mensal:6000 exemplares

Preço de venda avulso: € 1,50Registada na DGI em 6/4/73

com o nº 44/23Depósito Legal nº 55737/92

ISSN 0870-9343

SUMÁRIO

ANUNCIANTES: MAN FERRoSTAAL PoRTUgAL, Lda.; RoHDE & SCHWARZ, Lda.

FOTOGRAFIAS ANTIGAS, INÉDITAS OU CURIOSAS 2PONTO AO MEIO DIA 4DISCURSO DO DR. ANTÓNIO BARRETO NA CERIMÓNIA CIVIL 6NAVIO-ESCOLA “SAGRES”. VOLTA AO MUNDO 2010 10A MARINHA DE D. SEBASTIÃO (10) 22ECOS DO DIA DA MARINHA 23TOMADAS DE POSSE 24ENTREGA DE COMANDO 25ACADEMIA DE MARINHA 26NOTÍCIA / VIGIA DA HISTÓRIA 23 27NOTÍCIAS 29HISTÓRIAS DA BOTICA (76) 30FUZILEIROS PORTUGUESES VOLTAM À “PEDRA DO FEITIÇO” 31QUARTO DE FOLGA / NOTÍCIA 33NOTÍCIAS PESSOAIS / CONVÍVIOS 34NAVIOS DA REPÚBLICA CONTRACAPA

REVISTA DA ARMADA • JULHO 2010 3

Comemorações do 10 de Junho

5

Uma estratégia para o Índico no Séc. XVI. O «Feito de Goa» quinhentos anos depois

13

Marinha tem de novo submarinos ao seu serviço.

A entrega do N.R.P. “Tridente”

8

O mar do futuro

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JULHO 2010 • MENSAL • € 1,50PUBLICAÇÃO OFICIAL DA MARINHA • Nº 443 • ANO XL

SILENCIOSAMENTE AO SERVIÇO DE PORTUGAL

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4 JULHo 2010 • Revista da aRmada

PONTO AO MEIO DIA

Forças para o bem

As forças navais sempre possuíram características distintivas, que as tornam extremamente úteis em

caso de catástrofe, tanto natural como causada pelo homem. Entre essas carac­terísticas importa referir a prontidão, a mobilidade e a flexibilidade. Prontidão, porque estão naturalmente prontas, equi­padas e treinadas para entrar em acção a qualquer momento. Mobilidade, pois têm grande facilidade de movimentação, que lhes advém da liberdade de circula­ção no mar. Flexibilidade, porque podem ser empregues numa gama muito alarga­da de tarefas, de âmbito militar e não militar.

A História regista o papel que as duas corvetas então esta­cionadas nos Açores desempenharam, na sequência do violen­to sismo que abalou o arquipélago em 1 de Janeiro de 1980. A corveta “Jacinto Cân­dido” (que, logo após o sismo, largou para a ilha Terceira) e a cor­veta “Baptista de An­drade” (que se lhe jun­tou dois dias depois) proce deram a inúme­ras acções de evacua­ção das ilhas Terceira, Graciosa e S. Jorge e distribuíram tendas, macas, coberto­res e alimentação, de forma a mitigar o sofrimento das populações afectadas. Pela sua acção imediata de apoio às po­pulações sinistradas, a corveta “Jacinto Cândido” recebeu a medalha de Servi­ços Distintos ouro.

Nesta perspectiva, a utilidade das for­ças navais em missões humanitárias e de apoio a catástrofes tem vindo a reforçar­­se nos últimos tempos. Sem que se seja exaustivo, podem citar­se três exemplos recentes, dois de âmbito internacional e um de âmbito nacional.

No plano internacional, é forçoso re­conhecer o papel que os navios de várias marinhas, com natural destaque para a marinha dos EUA, desempenharam na sequência do tsunami que varreu a Ásia em 26 de Dezembro de 2004 e após o ter­ramoto que sacudiu o Haiti em 12 de Ja­neiro de 2010.

No plano nacional, merece destaque o desempenho dos meios da Marinha Por­tuguesa na sequência das chuvas torren­ciais que se abateram sobre a Madeira em 20 de Fevereiro deste ano. Prontamente, a Marinha disponibilizou as capacida­des da fragata “Corte Real” (incluindo o seu helicóptero embarcado), da corveta “Afonso Cerqueira”, do patrulha “Caci­ne”, de uma Brigada Hidrográfica, bem como dos fuzileiros, mergulhadores e pessoal da autoridade marítima (com respectivos meios) para colaborar nas ac­tividades de protecção civil, em estreita

cooperação com as estruturas regional e municipais da protecção civil. De entre as actividades desenvolvidas destacam­se as acções de busca e salvamento, o resga­te de corpos, o reconhecimento de zonas ribeirinhas, a limpeza e a remoção de es­combros, o esgoto de edifícios alagados, o levantamento hidrográfico de zonas portuárias, a assistência na reparação de avarias e a distribuição de alimentos.

Esta tendência de utilização do poder naval em apoio humanitário e interven­ção pós­catástrofe levou a que estas mis­sões fossem incluídas na doutrina estra­tégica das marinhas de muitos países, incluindo Portugal. Isso corresponde a um aumento da sua valorização no qua­dro das missões habitualmente desem­penhadas pelas marinhas. Em vez de ser uma espécie de bónus que as marinhas disponibilizam para apoio à protecção ci­vil, quando necessário e quando os meios

navais não estão empenhados noutras ta­refas, passou a ser encarada como uma missão essencial e prioritária do poder naval, para a qual a Marinha Portuguesa, por exemplo, possui equipamento apro­priado e efectua treino dedicado (DISTEX – Disaster Relief Training Exercise), que é alvo de avaliação internacional.

Isto vai ao encontro da teoria das “for-ças para o bem” (exposta no livro de Lor­raine Elliott e Graeme Cheeseman “For-ces for good – Cosmopolitan militaries in the twenty-first century”), que advoga o em­prego das Forças Armadas em objecti­

vos filantrópicos, como missões de assistência humanitária e de res­posta a catástrofes, bem como combate à degra­dação ambiental, a pan­demias, ao terrorismo e a tráficos de drogas e de armas. A teoria das “for-ces for good” assenta no entendimento de que a humanidade é uma comunidade moral em que as obrigações e os deveres não devem es­tar confinados às fron­teiras estatais e de que, na ausência de conflitos bélicos, os militares de­vem empenhar­se em fazer o bem.

As actividades de­senvolvidas pelos meios da Marinha, na sequência da tragédia que assolou a ilha da Madeira em 20 de Fevereiro, constituíram apenas mais um exemplo da importância de possuir forças na­vais prontas e bem treinadas, e da sua utilidade em situações desta natureza, fazendo o bem e mitigando o sofrimento das populações. Num país como Portu­gal, caracterizado por descontinuida­de territorial, isto assume importância acrescida, como ficou provado em 1980, nos Açores, e este ano, na Madeira, bem como noutras ocasiões igualmente sensí­veis como o resgate de cadáveres após o acidente aéreo nas aproximações ao ae­roporto de Santa Maria, em 1989, ou o terramoto nas ilhas do Faial, do Pico e de S. Jorge, em 1998.

N. Sardinha MonteiroCFR

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Realizaram-se no dia 10 de Junho, em Faro, as cerimónias alusivas às comemorações do Dia de Portugal, de Camões e das Co-

munidades Portuguesas.O Presidente da República e Comandante

Supremo das Forças Armadas, presidiu à ce-rimónia militar, no Terreno Municipal da Hor-ta das Figuras, que incluiu uma parada militar, comandadas pelo CALM Cortes Picchiocci, integrando as seguintes uni-dades e meios:

Banda da Armada; Bloco de Estandartes Nacionais representativos do Estado-Maior General das Forças Armadas, de Unidades da Marinha, do Exército, da Força Aérea e da Liga de Combatentes, com uma Escolta de Honra, constituída por uma Companhia de Apoio de Fogos do Corpo de Fuzileiros; um Batalhão dos Estabelecimentos Milita-res de Ensino do Exército, constituído por companhias de alunos do Colégio Militar, do Instituto de Odivelas e do Instituto Mili-tar dos Pupilos do Exército; um Batalhão de Cadetes Alunos integrando companhias da Escola Naval, da Academia Militar e uma Esquadrilha da Academia da Força Aérea; um Batalhão de formandos dos cursos de Sargentos, que incluía companhias da Es-cola de Tecnologias Navais da Marinha, da Escola de Sargentos do Exército e uma Es-quadrilha do Centro de Formação Militar e

Técnica da Força Aérea; um Batalhão da Mari-nha, dois Batalhões do Exército e uma Esquadra da Força Aérea. As forças perfaziam um total de cerca de 1200 efectivos.

Para além destas forças em parada, partici-param ainda na cerimónia militar outras forças, designadamente, forças motorizadas.

À chegada do Presidente da República as Forças em Parada prestaram as honras regula-mentares, com a Banda da Armada executan-do o Hino Nacional e simultaneamente, uma bateria de Artilharia de Campanha do Exército, executou uma salva de 21 tiros.

Seguiu-se a homenagem aos Mortos que in-cluiu uma prece feita pelo Vigário castrense, CALM Costa Amorim.

Seguidamente, o Presidente da República pronunciou o discurso que abaixo se trans-creve na íntegra.

Por fim efectuou-se o desfile das Forças em Parada e Forças Motorizadas, terminan-do com um sobrevôo de unidades aéreas da Marinha e Força Aérea.

Posteriormente, ocorreu a sessão solene do Dia de Portugal, de Camões e das Comu-nidades Portuguesas que se realizou no Tea-tro Municipal de Faro, onde o Presidente da República proferiu uma intervenção alusiva e procedeu à imposição de condecorações a um conjunto de personalidades e institui-ções, entre elas o VALM Telles Palhinha com a Grã Cruz da Ordem Militar de Avis.

Durante esta sessão o Presidente da Co-missão das Comemorações, Dr. António Barreto, proferiu um discurso que pelo seu significado é integralmente transcrito na página seguinte.

“O Algarve, pela sua geografia e pela paixão marítima das suas gentes, foi des-de sempre um importante ponto de apoio para o desenvolvimento das relações de Portugal com outros povos e culturas.

Não longe daqui, em Sagres, a epo-peia dos Descobrimentos encontra um dos seus maiores símbolos. Aí se fixou o Infante D. Henrique, movido pelo so-nho de alcançar o Oriente por mar, e aí se terão congregado, de modo especial-mente frutuoso, as artes dos mareantes e o engenho dos cientistas.

Daqui partiram portugueses, há cinco sécu-los, para África e para as Índias. Daqui saíram, num passado mais recente, muitos dos que en-grossam hoje as fileiras dos antigos combaten-tes e dos que actualmente, nas Forças Armadas, cumprem missões humanitárias e de apoio à paz ou desenvolvem acções de cooperação longe da Pátria.

Comemoramos este ano, aqui em Faro, o Dia de Portugal, de Camões e das Comunida-des Portuguesas. É dia de lembrar os feitos e os heróis do passado que materializam o espírito de independência e de liberdade para seguir o nosso próprio caminho. É dia de expressar a firme vontade de garantir um futuro soberano, capaz de vincar a nossa presença num Mundo em acelerada mudança.

Nos tempos que correm, a segurança e a afir-mação de um Estado não podem ser prossegui-das de forma isolada. Exigem, no quadro das alianças internacionais, uma aposta crescente na segurança cooperativa e na diversificação das dependências, mas não dispensa a valorização dos recursos, capacidades e competências que lhe são próprios.

Devemos, assim, valorizar o potencial do País em várias frentes, incluindo a militar.

Importa ter presente que a redução da capa-cidade das Forças Armadas tem historicamente coincidido com o aumento das vulnerabilidades nacionais e o enfraquecimento da voz de Por-tugal no concerto das nações, como Estado so-berano e independente.

A preservação da operacionalidade das nos-

sas Forças Armadas é, sem dúvida, um superior interesse da Nação.

Militares,Numa conjuntura difícil e exigente, as

Forças Armadas continuam a cumprir as suas missões, com assinalável competên-cia e dedicação, nas mais diversas situa-ções e níveis de risco. Permanentemente expostas ao escrutínio da comunidade nacional e internacional, têm granjeado elevada credibilidade e prestígio junto dos Portugueses e das organizações in-ternacionais de que fazemos parte, tendo

razão para sentir-se orgulhosas.No Afeganistão, a comunidade internacional

trava o seu principal combate contra o terroris-mo, o narcotráfico e o crime organizado.

Face à evolução da situação no terreno e às correspondentes alterações à estratégia adopta-da, Portugal, em conjunto com os seus aliados, reforçou a sua contribuição militar, reassumin-do uma exigente missão de reserva táctica, em Cabul, e contribuindo também para a formação das forças locais.

Trata-se de uma missão que comporta riscos significativos, assumidos pelas autoridades na-cionais com sentido de responsabilidade, mas com a certeza de que Portugal deve cumprir a sua quota-parte na segurança internacional, na prevenção do crescimento das ameaças trans-

Revista da aRmada • julho 2010 5

COMEMORAÇÕES DO 10 DE JUNHOCOMEMORAÇÕES DO 10 DE JUNHO

Discurso do Presidente da República na Cerimónia Militar

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nacionais e na defesa de valores universais que nos são caros, como os direitos humanos, a to-lerância e a dignidade das pessoas.

Por outro lado, no comando de uma força NATO, as nossas Forças Armadas cumpriram com elevado brio e de forma corajosa as mis-sões aero-navais de combate à pirataria que, nos mares da Somália, coloca em causa a liberdade de navegação, a segurança de navios, cargas e tripulações.

No Líbano e na região dos Balcãs, em contex-tos político-sociais muito complexos, continua-mos a apoiar os esforços internacionais de paz.

Uma vez mais, a eficácia e a capacidade de adaptação do militar português têm-se revela-do essenciais para o sucesso das missões, para a protecção das forças e para a segurança e bem--estar das populações locais.

Uma actividade militar porventura menos co-nhecida dos portugueses, mas que tem acumu-lado sucessos desde os anos 90, é a cooperação técnico-militar com os países africanos de língua oficial portuguesa e com Timor-Leste. Esta área da cooperação constituiu-se como um forte investi-mento de confiança, uma chave para a reaproxi-mação a povos a que nos ligam singulares laços históricos de convivência e de amizade.

Os números não deixam dúvidas quanto à re-levância da cooperação técnico-militar e do seu elevado rendimento em termos de custo e efi-cácia: ao longo dos últimos 20 anos, 5.721 qua-dros militares dos países de língua portuguesa foram formados em Portugal e 11.370 nos seus próprios países, com a participação de um total de 3.323 militares portugueses.

Saúdo o povo amigo e as Forças Armadas de Cabo-Verde, na pessoa do seu Primeiro-Ministro,

que nos acompanha nesta cerimónia, país com o qual Portugal mantém as mais fraternas rela-ções de cooperação.

As Forças Armadas não esgotam as suas capa-cidades em missões internacionais e em acções de cooperação no estrangeiro.

As ameaças e os riscos que possam afectar a segurança dos Portugueses, no exterior e no in-terior das nossas fronteiras, e o apoio às popula-ções constituem o cerne do planeamento e da acção das nossas Forças Armadas.

A título de exemplo, sublinhe-se o pronto apoio às solicitações do Serviço de Protecção Civil, em missões de vigilância e de rescaldo de incêndios que permitem libertar mais bombei-ros para as acções de maior complexidade no combate directo aos fogos, e as acções de apoio à salvaguarda da vida humana no mar.

No desastre que, em Fevereiro deste ano, se abateu sobre a ilha da Madeira, foram inexcedí-veis a disponibilidade e a prontidão da resposta que os militares deram às solicitações que lhes foram apresentadas.

Nas horas mais difíceis, os Portugueses sabem que podem contar com as Forças Armadas.

Militares,A transformação nas Forças Armadas foi mar-

cada, no último ano, pela criação do seu Co-mando Conjunto. Está em curso, agora, a sua implementação, da qual se espera que condu-za à necessária agilização de procedimentos e a maior eficácia no seu emprego conjunto.

A excelência do ensino e da formação dos quadros das Forças Armadas, compreendendo uma sólida formação ética e comportamental, é uma prioridade a que a implementação da re-forma do Ensino Superior Militar deverá permitir

dar uma resposta adequada.A reforma da Saúde Militar é uma exigência

da qualidade dos cuidados de saúde prestados aos utentes e da manutenção de uma capaci-dade ajustada às necessidades operacionais de emprego e projecção de forças.

Em reconhecimento do papel das Forças Ar-madas na edificação de Portugal associei-as, desde o início do meu mandato, às cerimónias de celebração do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas.

É com alegria que assistimos hoje a mais um passo no reencontro dos Portugueses com a sua História, ao integrarmos nesta cerimónia os antigos combatentes, a quem quero dirigir uma saudação especial.

Prestamos, assim, justa homenagem àqueles que, com denodada coragem e amor pátrio, tudo se dispuseram a dar por Portugal, incluin-do a própria vida.

O país que ambicionamos não pode deixar de ser um país com memória e respeito profun-do pelos que deram o melhor da sua vida ao serviço da Pátria e se sacrificaram nos mais va-riados teatros de operações.

O exemplo de vida dos nossos antigos com-batentes e o reconhecimento que aqui lhes ma-nifestamos devem ser fonte de inspiração e de motivação para todos nós.

Militares,Exorto o vosso patriotismo, esclarecido e vo-

luntário, para que continuem dispostos a lutar por Portugal, cumprindo as missões que vos são atribuídas como o têm feito até agora: com ele-vado sentido do dever, com profunda devoção e com a maior honra.

Obrigado.”

6 julho 2010 • Revista da aRmada

O DIA DOS PORTUGUESES ou, oficialmen-te, o Dia de Portugal, de Camões e das Comuni-dades Portuguesas, comemorado em 2010, tem um significado especial. Na verdade, assistimos esta manhã a um desfile das nossas Forças Ar-madas precedido de uma extensa delegação de Veteranos, de Antigos Combatentes, mais singelamente de combatentes dos exércitos em todas as guerras e conflitos em que Por-tugal esteve envolvido desde meados do século XX.

Ao ver desfilar umas dezenas de antigos combatentes, de todos os teatros de acção militar em que Portugal participou, não sen-timos vontade nem necessidade de lhes perguntar pela guerra, pela crença ou pela época. Sentimos apenas obrigação de, pelo reconhecimento, pagar uma dívida. Senti-mos orgulho por saber que é a primeira vez na história que tal acontece e que está aberta a via para a eliminação de uma divisão absurda entre Portugueses. Com efeito, é a primeira vez que, sem distinções políticas, se realiza esta ho-menagem de Portugal aos seus veteranos.

Centenas de milhares de soldados portu-gueses combateram em nome do seu país, do nosso país, desde os inícios do século XX até à

actualidade. Já não há sobreviventes do Corpo Expedicionário Português enviado para Flandres, na 1ª Grande Guerra Mundial, nem das forças que, no mesmo conflito, lutaram em África. O último veterano dessa guerra, José Maria Bap-tista, morreu a 14 de Dezembro de 2002. De-

pois daquele conflito, as guerras foram, durante décadas, poupadas aos Portugueses. Só a par-tir de finais dos anos 1950 os soldados e outras forças militarizadas voltaram a encontrar-se em situações de combate aberto, primeiro no então Ultramar português, depois em múltiplos teatros de guerra, em associação com forças armadas

dos nossos aliados da NATO e da União Euro-peia e em missões organizadas sob a égide das Nações Unidas.

Independentemente das opiniões de cada um, para o Estado português todos estes sol-dados foram Combatentes, são hoje Antigos

Combatentes ou Veteranos, mas, sobretudo, são iguais. Não há, entre eles, diferenças de género, de missão ou de função. São Vete-ranos e foram soldados de Portugal. É assim que deve ser.

Em Portugal ou no estrangeiro, no Conti-nente ou no Ultramar, na Metrópole ou nas Colónias, as Forças Armadas portuguesas marcaram presença em vários teatros de guerra e em diversas circunstâncias. Milita-res portugueses lutaram em terra, no mar ou no ar, cumpriram os seus deveres e execu-taram as suas missões. Em Goa, em Angola, em Moçambique, na Guiné, no Kosovo, em

Timor ou no Iraque. Todos fizeram o seu esfor-ço e ofereceram o seu sacrifício, seguindo de-terminações políticas superiores. As decisões foram, como deve ser, as do Estado português e do poder político do dia. Mas há sempre algo que ultrapassa esse poder. O sacrifício da vida implica algo mais que essa circunstância: é, para

Discurso do Dr. António Barreto na Cerimónia CivilDiscurso do Dr. António Barreto na Cerimónia Civil

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Revista da aRmada • julho 2010 7

além das vicissitudes históricas e dos ciclos de vida política, a permanência do Estado.

Os soldados cumprem as suas missões por diversos motivos. Por dever. Por convicção. Por obrigação inescapável. Por desempenho pro-fissional. Por sentido patriótico, político ou mo-ral. Só cada um, em sua consciência, conhece as razões verdadeiras. Mas há sempre um vín-culo, invisível seja ele, que o liga aos outros, à comunidade local ou nacional, ao Estado. É sempre em nome dessa comunidade que o soldado combate.

Na verdade, em todos os episódios de guerra referidos e noutros mais, há fenómenos de natureza diversa. Houve decisões políticas de carácter exclusivamente nacional, mas também houve actos de colaboração em missões multinacionais, como houve deci-sões estratégicas colectivas das alianças de que Portugal é membro. Também conhe-cemos decisões políticas tomadas em vários quadros: com e sem legitimidade democráti-cas, com e sem referenda parlamentar. E até, finalmente, situações em que o Parlamento fica aquém daquela que deveria ser a sua função. Com efeito, a Constituição e as leis não obrigam, infelizmente, a que as missões no estrangeiro sejam aprovadas pelo Parlamento. Apenas admitem o “acompanhamento do en-volvimento” militar no estrangeiro, o que nem sempre é rigorosamente cumprido.

A análise destas diferenças pode ser importan-te do ponto de vista político, histórico e intelec-tual. Mas, no plano do reconhecimento de um povo, do respeito devido e do esforço do solda-do, essas distinções são secundárias ou inúteis. Foram, simplesmente, militares portugueses que tudo deram ou tudo arriscaram. É esse o reco-nhecimento devido.

Um antigo combatente não pode nem deve ser tratado de colonialista, fascista, democra-ta ou revolucionário de acordo com con-veniências ou interesses menores. A sua origem, a sua classe social, a sua etnia, as suas crenças ou a sua forma de vínculo às Forças Armadas são, a este propósito, in-diferentes: foram, simplesmente, soldados portugueses.

Pelo sacrifício, pela duração e pelas im-plicações políticas, as guerras do Ultramar foram evidentemente as que mais marca-ram as gerações das últimas décadas. Mas, ao longo dos trinta anos de democracia e de compromissos internacionais, muitas centenas ou milhares de cidadãos portugueses estiveram presentes em teatros de guerra e em missões de protecção da paz ou de mediação. Novos sacrifícios foram feitos, vidas foram inter-rompidas, carreiras e famílias suspensas.

Todos esses militares, os de Luanda ou do Lí-bano, os da Guiné ou da Bósnia, merecem o nosso respeito. São antigos combatentes. São Veteranos. São soldados que cumpriram os seus deveres e que, com excepção dos que tenham moralmente abusado das suas funções, mere-cem a nossa homenagem. Não há lugar, não deve haver lugar para diferenças entre esses Ve-teranos. Não há Veteranos melhores ou piores do que outros. Não há Veteranos que mereçam

aplauso e Veteranos a quem se reserve o esque-cimento. Não há Veteranos ou Antigos Comba-tentes fascistas ou democráticos, socialistas ou comunistas, reaccionários ou revolucionários. Não há Veteranos de antes ou de depois do 25 de Abril. Não há Antigos Combatentes mili-cianos ou de carreira ou contratados. Há Vete-ranos e Antigos Combatentes, ponto final! É o que nós lhes devemos. Nós, todos, os que fize-ram ou não, os que concordaram ou não com as guerras, sem distinção de época, de governo ou de cor política.

Portugal não trata bem os seus antigos com-

batentes, sobreviventes, feridos ou mortos. É cer-to que há, aqui e ali, expressão de gratidão ou respeito, numa unidade, numa autarquia, numa instituição, numa lei ou numa localidade. Mas, em termos gerais e permanentes, o esquecimen-to ou a indiferença são superiores. Sobretudo por omissão do Estado. Dos aspectos materiais aos familiares, passando pelos espirituais e políti-cos, o Estado cumpre mal o seu dever de respei-to perante aqueles a quem tudo se exigiu.

Em cada momento, em cada conflito, houve quem tivesse ideias diferentes e se opusesse à in-tervenção militar. Uns, mesmo nessas condições, cumpriram as ordens oficiais, outros recusaram--se. Por oportunidade, por convicção política,

por uma interpretação diferente do interesse nacional, houve refracção e objecção. Em cer-tos casos, pensava-se que as operações militares não tinham sido referendadas pelo povo sobe-rano ou eram contrárias à ética e ao interesse nacional. Noutros casos, faltava o assentimen-to parlamentar. Aliás, o acompanhamento par-lamentar do envolvimento militar é deficiente, apesar de estatuído pela Constituição.

Houve soldados que combateram sob um re-gime autoritário, outros em regime democrático. Houve soldados que combateram integrados em forças nacionais, outros em forças aliadas ou internacionais. Como houve soldados que, de outras origens étnicas então e tendo hoje na-

cionalidade diferente, serviram nas Forças Arma-das portuguesas.

Em 1974, jovens militares decidiram derrubar o regime autoritário e dar uma oportunidade à democracia. Outros tentaram estabelecer um novo regime político que eventualmente limita-ria as liberdades. Outros ainda ficaram indepen-dentes e equidistantes. Enquanto outros, final-mente, teriam preferido continuar sob o regime anterior. Prefiro os primeiros, os que ajudaram a fundar o Estado democrático. Mas, pelo sacrifí-cio das suas vidas e pelo cumprimento dos seus deveres, respeito-os todos.

Qualquer guerra ou envolvimento militar é controverso e suscita opiniões diversas e contraditórias. É assim no Afeganistão ou no Iraque. Foi assim no Ultramar. Como tam-bém na Flandres, nas Linhas de Torres ou em Aljubarrota. Essas divergências podem ser legítimas e compreensíveis. Traduzem ideias, interesses, convicções e doutrinas diferentes. Assim como versões diversas do interesse nacional. Mas isso não justifica a ausência de respeito por aqueles que com-bateram, que correram riscos, que ficaram feridos ou deram a sua vida.

As diferenças de opinião e de crença não de-vem impedir de respeitar todos os que fizeram a guerra, com convicção ou por obediência ao poder político, desde que, evidentemente, o te-nham feito sem abuso. Merecem as pensões que lhes são devidas. Merecem atenção e cuidado. Merecem um Dia do Combatente oficialmente estabelecido. Merecem que as suas associações sejam consideradas de utilidade pública. Mere-cem estar presentes nas cerimónias públicas e oficiais. Mas sobretudo merecem respeito.

Os Portugueses são parcos em respeito pelos seus mortos e até o Estado não é muito explíci-to no cumprimento desse dever. Pois bem: está chegada a altura de eliminar as diferenças entre

bons e maus soldados, entre Veteranos de nome e Veteranos anónimos, entre recor-dados e esquecidos. Pela Pátria ou pelo seu País, pelo Estado ou pela sua profissão, foi pela sua comunidade nacional que todos eles combateram e se sacrificaram.

É possível que o comportamento do Estado, a atitude de políticos e os senti-mentos de cidadãos para com os militares sejam determinados, em parte, pela avalia-ção que se faz do modo como deram ou retiraram apoio a certos dirigentes e a cer-tas formas de regime. Não se nega o facto.

Mas, perante o antigo combatente, recusa-se o juízo de valor.

Aos Veteranos e antigos Combatentes que hoje estiveram connosco pela primeira vez, nada se lhes pede. Nada devem aos seus con-temporâneos. Nós é que estamos em dívida para com eles. São o Estado e a sociedade que lhes devem algo. O que lhes pedimos hoje foi muito simples: aceitem a homenagem que o Estado e os Portugueses vos prestaram! Não estamos aqui a festejar a guerra, mas sim os sol-dados! E não há melhor dia, do que o Dia de Portugal, para o fazer.

Fotos de Luís Filipe Catarino / Presidência da República

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8 juLho 2010 • Revista da aRmada

dois dias antes, expectantes, nervosos, tinham deixado os seus e viajado em direcção ao norte da Alemanha.

Pela frente uma tarefa e uma responsabili-dade que, apesar de habituados às exigências e circunstancialismos próprios das diversas missões que todos eles já tinham executado, se agigantava à medida que se aproximava o momento da sua concretização: receberem, em nome da Marinha de Guerra Portuguesa e do Estado Português, aquele que no inventá-rio dos navios ao serviço da Briosa, seria de-signado como Navio da República Portuguesa (N.R.P.) “Tridente”.

Não se conseguirá traduzir em palavras a tor-rente de sentimentos e expectativas que ocu-pava as suas mentes mas ali estavam, após dia e meio de intenso e exigente treino, perfilados, com aprumo e galhardia, ansiosos por toma-rem posse do navio - aquele mesmo navio em que tinham treinado a cais e no mar durante nove exigentes semanas, findas as quais já o consideravam secretamente como lhes perten-cendo – e que seria a sua segunda casa, aque-la onde passariam a cumprir o seu mester de Homens do Mar.

Aproximava-se, para estes homens a hora do clímax mas, entretanto, havia que cumprir o cerimonial protocolar associado à entrega do navio ao Estado Português.

A banda da Polícia do Estado de Schleswig--Holstein – que tocaria todos os trechos mu-sicais escutados durante a cerimónia – tocava já os primeiros acordes; chegavam os primei-ros convidados, referia-se o garbo daquela guarnição perfilada sob o Sol quente de Ju-nho, algo amenizado pela ligeira brisa que ia soprando.

Batiam as 16.00 horas em Kiel, chegavam as entidades participantes na cerimónia. Desta-cam-se, pela sua importância protocolar:

- Almirante Melo Gomes, Chefe do Estado--Maior da Armada e representante do Ministro da Defesa Nacional;

- Dr. Albuquerque Moniz, Ministro-conselhei-ro da Embaixada de Portugal na Alemanha;

- Flotillenadmiral1 von Maltzan, Comandan-te Naval Alemão, em representação da “Bun-desmarine”2;

- Dr. António Alves de Carvalho, Cônsul-ge-ral de Portugal em Hamburgo.

O primeiro discurso da cerimónia seria pro-ferido pelo Sr. Andreas Burmester, membro do Conselho de Administração do “Howal-dtswerke-Deutsche Werft” (HDW).

Após cumprimentar e agradecer a presença dos convidados iniciaria a sua alocução refe-rindo a quase centenária tradição submarina da Marinha de Guerra Portuguesa que, consi-derou, se perpetuará com a entrada ao serviço

das unidades desta nova classe, detentoras de características que as colocam entre as mais avançadas do Mundo.

Continuaria depois tecendo alguns consi-derandos sobre a importância do Mar para Portugal, referindo o seu papel central na construção da sua identidade e afirmação no Mundo.

Abordaria ainda as relações de coope-ração e colaboração estabelecidas entre o Consórcio3 e a Marinha de Guerra Portu-guesa, apontando-as como um dos factores decisivos para o sucesso do Projecto.

Por último dirigiria palavras especialmen-te dedicadas à guarnição e ao navio: “(…)Deus abençoe o navio e a sua guarnição. Desejamos-lhes que cumpram viagens se-guras e que os regressos ao porto sejam sempre felizes. Possa o “Tridente” navegar por largos anos!”

A seguir discursou o CALM von Maltzan, que referiria a importância da Arma Subma-rina no actual contexto estratégico interna-cional face à tendência de crescente dispu-ta pelos recursos naturais; referiria ainda a desafio do passo que a Marinha Portugue-sa dava ao tomar posse desta classe, dando como exemplo o processo de adaptação e o esforço dispendido pela “Bundesmarine” até conseguir explorar cabalmente todas as potencialidades das unidades da 1ª série da classe “212”4.

A bordo do navio, três elementos da guar-nição da HDW; no cais, perfilado em frente ao futuro Comandante do navio, CTEN Sal-gueiro Frutuoso, o Comandante Christian Schütz, comandante da guarnição do esta-leiro que nos últimos meses teve a respon-sabilidade de conduzir as navegações da construção nº 383 (designação do estaleiro para o “Tridente”).

Ouvem-se os acordes iniciais do Hino Nacional da República Federal Alemã; a as-sistência levanta-se, os militares prestam as honras da “praxe”; na torre do submarino é arriada a Bandeira Nacional alemã.

Terminado o hino, os três elementos que a bordo se encontravam trazem a bandeira até ao Comandante Schütz, a quem a en-tregam.

Está dado o sinal para que se inicie o acto protocolar em que o Estado Português r ecebe formal e oficialmente a construção nº 383; esta aceitação, que em termos con-tratuais é ainda provisória – como bem o referiria o ALM CEMA na sua alocução –, consubstancia-se na assinatura do Proto-colo de Aceitação pelo ALM CEMA, em re-presentação do Estado Português, e pelos re presentantes do Consórcio, Sr. Burmester

Marinha tem de novo submarinos ao seu serviço

A entrega do N.R.P. “Tridente”

Marinha tem de novo submarinos ao seu serviço

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e Sr. Karl-Heinz Kahl, Gestor do Projecto nomea do pela HDW.

Curiosamente este acto realiza-se preci-samente cem anos decorridos sobre outro, de vital importância para a história da Arma Submarina em Portugal: a 17 de Junho de 1910, sendo Ministro da Marinha João de Azevedo Coutinho, é assinado o contrato de aquisição do submarino “Espadarte”, o primeiro da nossa Marinha.

Concluídas as assinaturas, o ALM CEMA discursaria.

Referindo o orgulho e a satisfação por par-tilhar com todos os presentes o momento de entrada ao serviço da primeira unidade da classe “Tridente”, salientaria a importância do facto na renovação das capacidades da nossa Marinha, aumentando a sua capacidade para, em conjunto com os países nossos aliados, assumir a sua quota-parte na resposta a dar aos desafios colocados à segurança global, permitindo aumentar as capacidades para ex-pandir a possibilidade do país, vigiar o espaço marítimo e manter seguras as nossas águas. O “Tridente”, diria, é um elemento chave na construção de uma Marinha equilibrada, ca-paz e tecnologicamente avançada.

Após algumas palavras de apreço ao Con-sórcio a aos elementos que integram a Dele-gação de Inspecção do Estado Português (Por-tuguese Navy Inspection Delegation – PNID), terminaria com as seguintes palavras dirigidas especialmente à guarnição: “(…)Guarnição do N.R.P. “Tridente”! Concretizamos hoje, com a recepção provisória do submarino “Tri-dente”, uma importante etapa na moderniza-ção da Marinha, contra muitos e, em particu-lar, contra todos os que não compreenderam, ou não querem compreender, a importância da capacidade submarina para Portugal.

Grandes responsabilidades caem sobre nós, mas porque os conheço e sei que são excelentes profissionais, com uma dedicação sem par e um profundo espírito de missão, estou confiante no futuro.

Não tenho dúvidas que o N.R.P. “Triden-te” arvorando orgulhoso a bandeira de Por-tugal e a insígnia da Marinha irá cumprir a sua missão, com o sucesso de quem acredita na nobre missão de servir Portugal no Mar.

Commander Frutuoso, I am confident that you and your crew will accomplish your du-ties brilliantly, serving the Navy and Portugal at sea. Fair winds and following seas!”.

Findo o discurso, o 1TEN Taveira Pinto, oficial da guarnição, lê, sequencialmente, a Portaria que aumenta o navio ao Efectivo dos Navios da Armada e a Portaria em que o CTEN Salgueiro Frutuoso é nomeado Co-mandante da nova unidade, a mais recente da Armada, que a partir daquele momento se passa a designar N.R.P. “Tridente”.

Seguir-se-ia o momento de profundo sig-nificado para todos os presentes, sem dúvi-da o clímax para aquela guarnição perfilada ao Sol: a entrega da Bandeira Nacional pelo ALM CEMA ao Comandante do navio, que prontamente a entregou ao pelotão formado pelo pessoal detalhado para entrar de servi-

ço, que a levaria para bordo.E foi ao som da “Marcha dos Marinheiros”

que a guarnição do N.R.P. “Tridente” marchou para bordo, apoderando-se daquele que pas-saria a ser o “seu” navio.

O último a entrar seria o Comandante, rece-bido à prancha com as honras devidas. Então, com todos perfilados e ao som de “A Portugue-sa”, militares saudando conforme prescreve a Ordenança, foi pela primeira vez içada a Ban-deira Nacional, na torre e a ré, acompanhada pelo jaque e pela flâmula, significando que o navio está Armado e tem Comandante.

Eram 16.47 (hora local), 15.47 em Lisboa, quando a Bandeira Nacional pela primeira vez desfraldou a bordo do N.R.P. “Tridente”!

Assim terminava uma cerimónia simples no seu aparato, mas profunda e sentida no seu sig-nificado: a Armada tinha de novo submarinos ao seu serviço, após um pequeno interregno de quase meio ano, meio ano apenas num histo-rial de quase 98 de serviço ininterrupto.

Seguir-se-ia um pequeno beberete oferecido pela HDW, findo o qual o ALM CEMA e ou-tros convidados visitaram, pela primeira vez, a novel Unidade Naval.

Durante a sua visita o ALM CEMA exorta-ria uma vez mais a guarnição; teve depois a oportunidade de assinar o Livro de Honra de bordo, sendo-lhe ofertado um escudete com o símbolo heráldico do navio.

O orgulho e a satisfação espelhavam-se no semblante da sua guarnição; para trás ficavam mais de três anos de acções de formação di-versas e de treino intenso; três anos também de sacrifícios e entrega, de ausência do seio dos seus.

O futuro reserva-lhes, no imediato, a par-ticipação nas actividades de “outfitting” final do navio, a recepção, conferência e estiva do material de bordo, muito dele já em posse da PNID, a preparação do navio para a sua via-gem inaugural rumo à Base Naval de Lisboa e algum treino próprio para refrescamento de conhecimentos e procedimentos.

Ainda a realização de algumas provas no Mar – durante o trânsito, a realizar na zona do Skagerrak e o navio e a sua guarnição ficam, fi-nalmente, disponíveis para cumprir as Missões e as Tarefas que a Marinha entender por bem deles exigir, ao serviço da Nação.

(Colaboração da DELEGAÇÃO DA MISSÃO EM KIEL)

Fotos: Gabinete de Imagem

Notas1 Posto equivalente ao de Contra-almirante.2 Designação oficial da Marinha de Guerra Alemã;

“Bundesmarine”, que traduzindo literalmente significa “Marinha da Liga”, entendendo-se esta como o conjunto de Estados que formam a Federação Alemã.

3 Por Consórcio entenda-se o “German Submarine Consortium”, entidade com a qual foi contratado o forne-cimento das unidades da classe “Tridente”, então constitu-ído pelos estaleiros HDW, Nordseewerke (sito em Emden, entretanto encerrado) e pela MAN-Ferrostaal.

4 O CALM Maltzan referiria que só quatro anos após a entrada ao serviço da 1ª unidade da classe “212” a “Bun-desmarine” considerou poder retirar todo o proveito ope-racional destas unidades. Aliás, refira-se que apenas no passado ano de 2009 uma unidade desta classe partici-paria num exercício NATO.

Revista da aRmada • juLho 2010 9

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10 JULHO 2010 • Revista da aRmada

Navegando nas águas do Oceano Pacífico, continuámos a nossa par-ticipação no evento Velas Sudame-

rica 2010. Na tirada que ligou o Perú ao Equador, o

navio recebeu uma “excêntrica” visita. Du-rante os cinco dias que constituíram esta na-vegação, recebemos a bordo a vencedora de um sorteio levado a acabo pelos “Jogos San-ta Casa”. A vencedora do concurso “Euromi-lhões – a criar Excêntricos” ganhou a possibi-lidade de navegar na “Sagres”, realizando o trajecto entre as cidades de Callao e Guaya-quil. Rapidamente enquadrada no “espírito da Barca”, a sua presença a bordo revitali-zou o quotidiano. A guarnição não perdeu a oportunidade de saber notícias, de um cada vez mais longínquo Portugal. Todos aprovei-taram a oportunidade de conversar com um contemporâneo, que não pertence à guarni-ção e que inerentemente, possa abordar te-mas novos, distintos da cultura naval.

É irónico constatar, que esta embaixa-da itinerante, que tem por missão visitar as comunidades portuguesas, também esteja sofrendo deste estado de espírito bem por-tuguês, a Saudade.

A 7 de Maio começamos a subir o estuá-rio do rio Guayas, o maior rio sul-america-no a desaguar no Oceano Pacifico. A densa vegetação que caracteriza as suas margens e as águas castanhas da cor da terra fazem lembrar o ambiente amazónico. Após al-gumas horas de navegação, onde nos cru-zámos com as mais variadas formas de ar-quitectura naval, a flora tropical começou a transformar-se nas construções do homem, sobretudo indústria pesqueira e constru-ção naval.

A cidade de Guayaquil estende-se por vá-rios quilómetros ao longo da margem. Ao longo dos seus passeios e jardins ribeirinhos esperava-nos uma multidão ansiosa, seriam milhares de pessoas, empoleiradas um pou-co por todo o lado, acenando e recebendo calorosamente os visitantes. Esta horda en-tusiasmada observava atenta-mente a manobra dos grandes veleiros, que desfilaram alti-vamente. A formação naval liderada pelo navio da casa, (que recebeu o nome do rio onde nos encontrávamos a navegar), prestou honras mi-litares ao Presidente da Re-pública que se encontrava a bordo de um navio de guerra da Marinha equatoriana, fun-deada no meio do rio.

Após o desfile dirigimo-nos ao nosso cais de atracação

nas imediações do centro da cidade. Em Valley Port, partilhámos o cais com o na-vio colombiano e holandês, o “Glória” e o “Europa”, respectivamente. A “Sagres” era o maior veleiro atracado na cidade, uma vez que os veleiros de maiores dimensões, o “El Cano”, o “Esmeralda” e a “Libertad”, (na-vios-escola das Armadas espanholas, chi-lena e argentina), tiveram que atracar num porto bastante afastado da cidade.

Na etapa equatoriana do festival náutico, intitulada “Guayaquil a toda a Vela”, a nossa guarnição empenhou-se em diversos even-tos programados pela organização: visitas, recepções, cerimónias militares e a habitua l “crew parade”.

De todos os eventos, salientamos dois, que nos ficaram especialmente na memó-ria: a recepção preparada pelo Município

de Samborondon e a festa organizada pela Comunidade Portuguesa em Guayaquil.

O primeiro foi realizado no Parque Históri-co de Guayaquil, uma reserva natural dotada de uma beleza extraordinária. Neste parque natural muito bem organizado é possível ob-servar vários animais exóticos inseridos no seu habitat natural. Os papagaios de cores extravagantes, as preguiças, os crocodilos fizeram as delícias dos fotógrafos. Para nós, constituiu-se como uma oportunidade única de conhecer a singular fauna e a flora deste país. Na área do parque reservada à repro-dução urbanística de Guayaquil do final do século dezanove, os edifícios centenários serviram de cenário a uma mostra da cultu-ra equatoriana. A dança executada com os trajes tradicionais abriu o palco, que logo de seguida foi pisado por um “cantante” local.

Este presenteou a plateia com um cancioneiro de música popular equatoriana. Por fim, decorreu um buffet que pre-tendia degustar a gastronomia destas paragens.

O segundo evento, apesar de menos opulento, terá cer-tamente um lugar especial nas nossas recordações futuras. A Casa de Portugal no Equador uniu-se e realizou uma festa em honra da “Sagres”.

Esta respeitada comunida-de portuguesa do Equador cresceu nos anos cinquenta em torno do sector da pes-ca do camarão. Os primeiros

Navio-Escola “Sagres”Volta ao Mundo 2010

O navio com Pano Latino.

5ª PARTE

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portugueses que ali chegaram trabalharam arduamente e devido aos seus conhecimen-tos, rapidamente se tornaram Comandantes de pequenas embarcações. Com o passar do tempo tornaram-se armadores pode-rosos e ajudaram a colocar esta activi-dade no segundo lugar nas exportações equatorianas.

Nesta simbólica festa, onde também se homenageava o espírito empreendedor e a coragem destes emigrantes, viveu-se in-tensamente a cultura portuguesa. O início calmo, não antevia a animação que se ha-via de seguir. Inicialmente, aproveitaram--se as mesas e o convívio sentado, para de-gustar alguns pratos típicos da gastronomia portuguesa, desde logo complementados com doçaria regional de diversos pontos do país. De seguida, o conceituado artista de bordo – o marinheiro Magalhães, can-tou e encantou os presentes com vários expoentes da música popular portuguesa. Durante várias faixas do seu concerto foi possível observar rodas de dança espon-tâneas, relembrando os característicos ar-raiais portugueses. O espectáculo conti-nuou com um grupo de música popular equatoriana. No final deste, o microfone ficou livre para os menos envergonhados, que cantaram fado ao desafio.

A simpatia e alegria desta pequena co-munidade, que nos recebeu de forma tão hospitaleira, foram reconhecidas por todos e ficará certamente recordada nos anais desta viagem.

Nos restantes dias da estadia, to-dos aproveitaram os tempos livres para conhecer a cidade. Esta cres-ceu paulatinamente nas margens do rio Guayas, aproveitando os seus re-cursos naturais. O centro histórico recebe naturalmente influências da arquitectura espanhola, apresentan-do casas senhoriais opulentas e uma catedral majestosa.

Perto do centro da cidade é pos-sível visitar o Parque das Iguanas, onde podemos contemplar uma es-tátua gigante em honra deste réptil. Na verdade a iguana é uma espécie de mascote da cidade e pode ser en-contrada, em todas as áreas verdes. Utilizando a sua camuflagem natu-ral, deleitam-se ao Sol nos jardins da cidade, levantando-se esporadi-camente para comer aquilo que as pessoas deixam pelo chão.

No penúltimo dia da nossa esta-dia, recebemos a bordo o Presidente do Equador, que aproveitou a pre-sença dos veleiros, para os visitar ao mesmo tempo que estreitava al-gumas relações diplomáticas.

No dia 11 de Maio largámos, um por um, fomo-nos despedindo dos velei-ros que passaram pelo nosso cais. Içando a bandeira do seu país e emitindo três apitos longos e um curto, acenámos em despedida à frota das Velas Sudamérica 2010.

No dia seguinte madrugámos para partici-par num desfile naval, a nossa última partici-pação oficial neste grande encontro interna-cional de grandes veleiros. A formação dos

grandes veleiros navegou unida uma última vez e foi fotografada por vários meios aéreos. Foi um dia triste para nós, pois finalizámos a nossa participação nas Velas Sudamérica

2010. Despedimo-nos dos vários veleiros, utilizando as telecomunicações VHF. Por fim, cumprimentámos o navio venezuela-no, que se encontrava mais perto de nós e aguardámos a chegada do navio argentino

“Libertad”. Tal como combinado, a fragata argentina surgiu pela nossa alheta de estibor-do e colocou-se no nosso través. Ocupando postos de honras militares a navegar, o Co-

mandante deu ordem de fogo ao castelo de proa e, lá avante, o Guarda-Marinha Pinheiro, armado de espada, fez pronta-mente cumprir a ordem. As duas salvas efectuadas pela “Sagres” foram retribuí-das imediatamente pelos argentinos. Es-tes saudaram-nos com uma salva arti-lheira, num emocionante momento de despedida. Certamente todos relembra-ram as amizades que fizeram e os bons momentos passados ao longo destes três meses, na companhia destes distintos marinheiros.

Ao vê-los partir no horizonte, terminá-mos um ciclo importante desta viagem. Nós vamos continuar a nossa circum-na-vegação, tendo Acapulco como próximo destino, enquanto a regata segue para o canal do Panamá, de onde rumará para Cartagena das Índias na Colômbia.

Na tirada para o México, houve lugar à comemoração do dia vinte de Maio, o Dia da Marinha.

A muitas milhas de distância das co-memorações oficiais, a decorrer na cida-

de de Portimão, o navio também comemo-rou solenemente os quinhentos e doze anos da chegada da armada de Vasco da Gama a Calecute. No final da manhã teve início

o programa das comemorações. O clarim ecoou e marcou o início de uma pequena cerimónia militar no poço do navio. A cerimónia foi marcada pela entrega dos Distinti-vos Alusivos ao Tempo de Embar-que e à entrega dos Certificados de passagem na Linha do Equador e no Cabo Horn. No final deste ce-rimonial marítimo, o Comandante fez uso da palavra. Num breve dis-curso, frisou a importância da data, da missão actual e deste tipo de dis-tinções, que representam o ganhar de experiência de uma guarnição. Finda a cerimónia foi preparado um almoço convívio no poço do navio. Foram montadas as mesas do buffet e servido um típico “Bacalhau à Ma-ria da Fonte”. Antes de todos pode-rem provar o semi-frio de frutos de bosque, brindou-se com um “Viva a Sagres e Viva a Marinha”, e o Che-fe de Serviço de Artilharia dirigiu a guarnição nas “salvas artilheiras que a Marinha consagrou”.

No início da tarde tiveram início as habituais competições desporti-vas do Dia da Marinha. O futebol de convés e a tracção à corda abri-ram as hostilidades, mas a prova que

reuniu maior número de inscritos, foi a de natação, que se realizou ao final da tarde, tendo o Oceano Pacífico por piscina. Nin-guém quis perder a oportunidade de mostrar os seus dotes de nadador, apesar de se recear

Revista da aRmada • JULHO 2010 11

Recepção realizada pelo Município de Samborodon no Parque Histórico de Guayaquil.

Parque Histórico de Guayaquil.

O navio aberto a visitas em Guayaquil.

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12 JULHO 2010 • Revista da aRmada

a presença dos “alfaiates”. Sentiam-se segu-ros porque montámos um completo esque-ma de vigilância com pessoal a bordo, nos botes e em mergulho.

Após o jantar, montou-se uma tela no mastro grande e organizou-se uma sessão de cinema. O facto de se ter visualizado um filme antigo, que muitos já tinham vis-to, não foi motivo para desistências. Afinal, já lá vão quatro meses desde a última sala de cinema… A sessão que até contou com serviço de bar e pipocas, encheu a nossa improvisada sala.

Atracámos no dia 22 de Maio em Aca-pulco. A marinha mexicana recebeu-nos de braços abertos e convidou-nos a ficar na sua base, mais precisamente no lugar do seu na-vio escola, o “Cuauhtemoc”, que continua com a regata “Velas Sudamerica 2010”.

Uma atracação complicada, talvez a mais complicada desta viagem, devido à acção da calema que nos obrigou a deixar o ferro na água e a amarrar a uma bóia na popa. A amarração foi demorada e o desgaste sobre o navio bastante significati-vo. A “brigada do costado” teve trabalho redobrado na manutenção do aspecto ex-terior do casco.

Neste que foi o primeiro porto sem um programa pro-tocolar extenso, a guarnição aproveitou para retemperar forças. Todos puderam usu-fruir do sol escaldante e da beleza natural das praias de Acapulco. A gastronomia lo-cal liderada pelo guacamole e os tacos conquistou fãs en-tre os portugueses.

Os momentos de repou-so foram interrompidos mo-mentaneamente para realizar os habituais cumprimentos protocolares, o almoço VIP e a recepção. Nestes dois últi-mos eventos, organizados em cooperação com a Embaixada de Portugal, o Comando do Navio e o Embaixador de Portugal tive-ram oportunidade de efectuar importantes acções de diplomacia política e económica. Entre os convidados presentes, deveremos destacar o Governador do Estado de Guerre-

ro, o General Comandante da Região Militar, o Almirante Comandante da Região Naval, o Secretário do Turismo e da empreendedora comunidade portuguesa, representada por altos cargos de algumas empresas portugue-sas com interesses no México.

A actividade física não ficou descorada e aceitando o desafio da marinha mexicana, organizámos um jogo de futebol. No dia combinado, os onze portugueses entraram em campo para defrontar os representantes mexicanos. Apesar da diferença de alturas ser favorável à equipa nacional, os mexica-nos mostraram-se aguerridos e organizados. Assim sendo, fomos obrigados a ceder um empate a duas bolas, mais importante do que o resultado será o espírito de fair-play que pautou o encontro.

Largámos no dia 27 de Maio em direcção a San Diego. Neste porto, espera -se uma grande exposição mediática, antecipando-se muitas visitas e uma interacção bastan-te activa com a comunidade portuguesa. Esta interacção terá o seu ponto alto, com a

participação do navio, nas comemorações do dia 10 de Junho – O Dia de Portugal, de Luís Vaz de Camões e das Comunidades Portuguesas.

De forma a preparar o navio para esta exposição e aproveitando para precaver o desgaste de quatro meses de missão, vá-rias horas foram diariamente empenhadas em reparações. Procedeu-se ao tratamento

das madeiras e à pintura das superstruturas e do costado.

Contudo, não se descurou a actividade fí-sica e lúdica, pelo que se organizou a primei-ra edição da “Taça do Pacífico em Futebol de Convés”. Esta tradição, que descobrimos recentemente ser transversal à cultura dos grandes veleiros, tem conseguido manter-se ao longo dos tempos. Ao ver a lista de ins-crições, que conta com oito equipas, cons-tata-se que mesmo entre os grumetes mais modernos, (recentemente chegados à cultura naval), esta prática recolhe simpatizantes.

Por fim centralizamos a atenção no espa-ço de Cadetes, revendo as cobertas, o bar de cadetes e a sua messe. Desde o início desta missão que estes espaços têm servi-do de “paiol” para armazenar as acrescidas quantidades de material necessário para uma missão desta dimensão. Isto porque, em San Diego, enquanto vários militares recebem a visita das suas famílias, o navio irá receber os Cadetes da Escola Naval e alguns Cade-tes de Marinhas estrangeiras. Finalmente esta

barca irá começar a sua prin-cipal missão – a instrução dos futuros oficiais da Marinha de Guerra Portuguesa. Numa era em que os navios são pratica-mente automatizados, a mis-são da barca assume cada vez mais importância na for-mação das gerações mais no-vas. Não se pretende ensinar táctica naval, operações de guerra nem a manobrar um navio com regras muito es-pecíficas. Pretende-se que conheçam o mar e o vento, que aprendam a lidar com os seus medos e com o imprevis-to, e que desenvolvam a sua capacidade de liderança. No

final da viagem serão homens e mulheres mais marinheiros e mais preparados, como pessoas, para as funções de um jovem ofi-cial de Marinha.

Atracaremos amanhã, e já estamos impa-cientes com esta nova etapa da viagem de Volta ao Mundo 2010.

(Colaboração do COMANDO DO NRP ”SAGRES”)

Baía de Acapulco.

Prova de Natação. Cerimónia do Dia da Marinha.

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Revista da aRmada • JULHo 2010 13

No ano de 1510, Afonso de Albuquer-que decidiu-se pela conquista de Goa, iniciando um conjunto de manobras

que procuraram dissimular as suas verda-deiras intenções, escondendo-as ao inimigo e tudo fazendo para que não fossem possí-veis as fugas de informação. Foi, certamente, uma das acções mais notáveis do Grande Ca-pitão e, sobretudo, a que assumiu consequên-cias estruturantes de maior dimensão para a orgânica do poder da coroa de Portugal no Oriente. Na verdade os portugueses esta-vam no Índico há cerca de 12 anos – 12 anos de guerra constante – e, pela primeira vez, lançavam uma operação para conquistar um território que deveria passar para a sua juris-dição absoluta.

Goa não era uma testa-de-ponte para a con-quista da Índia ou para a abertura de um ter-ritório português no Indostão, mas teve uma dinâmica própria que não pode deixar de ser observada, porque afrontou potências conti-nentais muito poderosas que a iriam ameaçar a partir do interior, com exércitos terrestres a actuar com uma lógica diferente dos combates navais e operações anfíbias, que tinham sido o quotidiano da lusa gente, nos anos anteriores. Como sempre aconteceu com os portugueses, a posse de Goa resultou de equilíbrios e alian-ças, feitas no mar e em terra, cujos executores foram os responsáveis pelo governo da Ín-dia, ao longo dos tempos. Alianças que estão presentes no próprio acto da conquista, como seria de adivinhar e como tiveram ocasião de fazer notar alguns historiadores. Aliás, esta preocupação do equilíbrio que obriga a gerir a própria violência, só não é visível quando os contextos não são analisados em todas as suas dimensões, dando prima-zia a exaltações oníricas que têm objectivos exteriores à Historia e são feitas da mesma massa de todos os tempos, como é bem de ver. Goa portuguesa resulta, portanto, de um objectivo e de um contexto: um objectivo defi-nido pela coroa de Portugal em relação ao Índico, muito claro no regimento dado por D. Manuel a D. Francisco de Almeida em Março de 1505, e de um contexto próprio da situação política en-tre os sultanatos do Decão e do grande reino do Vijayanagar.

Goa e o projecto manuelino

E começo por referir o objectivo da coroa de Portugal porque ele parece ser sistema-ticamente esquecido e ajuda à não compre-ensão do verdadeiro significado de Goa. Na verdade, o regimento de D. Francisco de Al-

meida constitui o mais importante documento para entender a estratégia régia para o Índi-co, e ele não fala de Goa, servindo como ar-gumento para dizer que a sua conquista não

estava nos propósitos da coroa, contestando a legitimidade da decisão de Albuquerque. É estreita esta visão do Regimento, ao alegar os detalhes de algumas instruções e concluin-

do pela impossibilidade de alternativas ou de outras iniciativas. D. Manuel recomenda explicitamente que se faça uma fortaleza em Sofala, nomeando Pêro de Anaya para seu capitão, com ordens precisas sobre como isso

deveria ser feito e que meios ali deveriam fi-car. Seguem-se indicações para ir a Quíloa e sujeitar o seu soberano à tutela dos portugue-ses, a bem ou a mal. Dali seguiriam “um par de barinéis” até ao Cabo Guardafui, para vi-giarem o movimento de navios, mas sem en-trarem no Mar Vermelho: apenas atacariam os navios de fraco poder militar, que não per-tencessem a Melinde, a Cananor e a Cochim, porque eram amigos dos portugueses. Mas, logo que estivessem resolvidos os assuntos de Sofala e Quíloa, a Armada devia seguir para a Índia, em direcção a Angediva, onde deveria ser feita uma fortaleza.

As instruções recomendam que o vice-rei vá a terra, com um conjunto de outros fidal-gos, para procederem à escolha do local, que deveria ser em local favorável, com um ponto de recolha de água e, se possível, acesso a um desembarcadouro protegido. Ali seriam cons-truídas duas galés, para as quais ia madeira preparada em Lisboa, e ficariam outros navios durante a monção, escolhendo-os de entre os mais ligeiros que não fossem necessários para outras operações. Só depois de despachada a carga de pimenta em Cochim, e mandada a Armada de regresso ao reino, o vice-rei deve-ria ir ao Mar Vermelho, procurando um local seguro para construir, também, uma fortaleza que abrigasse os navios necessários para ga-rantir o controlo do que se sabia ser a princi-pal passagem de mercadorias, em direcção ao coração do Islão. Ou seja, não restam dúvidas que o documento foi minuciosamente pen-sado e elaborado, revelando uma estratégia com vista ao domínio do movimento maríti-mo do Índico Ocidental, especialmente aquele que vinha em busca do ouro de Sofala e o que

passava pelo Malabar e se diri-gia ao Mar Vermelho. E repare--se no pormenor da construção da fortaleza em Angediva, com as condições necessárias para controlar as rotas que passavam em frente da costa Hindustânica, num sentido ou no outro, dis-pondo já de navios de remo, que se revelariam importantíssimos nas décadas seguintes, e cujos efectivos foram sucessivamen-te reforçados, aumentando em número, tonelagem e poder de fogo, até se tornarem nos mais importantes meios de combate para aquela região.

Quer isto dizer que, não ha-vendo instruções específicas para atacar e ocupar Goa, há

uma ideia precisa sobre a necessidade de uma base – à dimensão das capacidades portugue-sas daquela época – sobre as rotas que seguem para o norte e para o Mar Vermelho, vindas do Extremo Oriente, de Ceilão ou dos portos

Uma estratégia para o Índico no século XVI O «Feito de Goa» quinhentos anos depois

Afonso de Albuquerque.Museu Nacional de Arte Antiga.

Território de Goa. Itinerário, Viagem ou Navegação – Jan Huygen Van Linschoten.

Uma estratégia para o Índico no século XVI O «Feito de Goa» quinhentos anos depois

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14 JULHo 2010 • Revista da aRmada

do Malabar não controlados pelos portugue-ses. E, como veremos a seu tempo, a ideia de Albuquerque é a mesma de D. Manuel, acres-centada com um conjunto de vantagens que não estavam claras em 1505, mas que eram óbvias em 1510 e que foram potencializadas ou acrescentadas posteriormente.

a cidade entre o decão e o VijayanaGar

Mas regressemos um pouco atrás, para perceber o contexto político em que se proporciona a ocupação de Goa, levada a cabo em duas jornadas distin-tas, uma realizada de forma relativamente fácil, em Março de 1510, e outra mais violenta e definitiva, concretizada no dia 25 de Novembro do mesmo ano, dia em que se comemora a festa de Santa Catarina, que ficou sendo a padroeira da ci-dade. O núcleo central da cida-de fica na ilha de Tissuari (Ilha de Goa) dominando um exten-sa região lagunar, com a cordi-lheira dos Gates a leste, para lá da qual, e no sentido do norte, fica o planalto do Decão. Até à segunda metade do século XV a região esteve sob o domínio do Império de Vijayanagar, mas foi tomada pelo sultanato de Bijapur, na altura em que subia ao poder a dinastia Adil Shâh, cujo primeiro soberano ainda chegou aos tempos de Albuquerque, ficando conhecido dos portugueses como o Sabaio. As duas barras que circundam a ilha permitiam a entrada a navios de porte razoá-vel, e o porto era abrigado dos temporais da monção de sudoeste, como, de resto, já aconte-cia com o de Cochim, onde fora construí-da a primeira fortaleza nacional.

Sabe-se que em 1509, quando o Ma-rechal Coutinho esteve na Índia, tinha instruções de D. Manuel para recolher informações ou sondar a entrada do porto e averiguar da capacidade de ali entrarem navios de grande porte, le-vando a supor de outras intenções da coroa quanto ao local. Mas a abundante correspondência que foi trocada entre o rei e D. Francisco de Almeida ou Afon-so de Albuquerque, não nos dá mais ne-nhuma pista sobre o assunto. Não custa a crer, contudo, que alguma comunica-ção tivesse havido, tendo em conta que Goa era a principal porta de entrada na Índia dos cavalos importados da Arábia e da Pérsia, em grande parte pela via de Ormuz, onde Albuquerque estivera nos anos anteriores. A percepção da impor-tância desse comércio estratégico certa-mente não escapou ao Grande Capitão, tanto mais que os cavalos eram necessários para a guerra e era difícil a sua procriação nas con-dições climatéricas da Índia. Os reinos conti-nentais que se digladiavam em campos de ba-talha tradicionais, usando elefantes e cavalos

de combate, compravam-nos em abundân-cia, e Goa tinha a possibilidade de os canali-zar para norte, para o Bijapur e para qualquer dos outros sultanatos, bem como para o sul, para o Vijayanagar, porque a cordilheira tinha passagem para ambos os lados. Portanto, se o comércio de cavalos não passou desperce-bido a Albuquerque, que o observou a partir de Ormuz, absurdo seria que não fizesse che-

gar essa informação a Lisboa, como chegaram muitas outras.

primeira entrada em GoaAs crónicas oficiais dão-nos conta que, no

início do ano de 1510, o governador prepara-va uma Armada para ir ao Golfo Pérsico zar-pando de Cochim em direcção ao norte. Pas-sou por Cananor sem ir a terra e, ao largo do Monte de Eli, reuniu os capitães em conselho para lhes colocar duas alternativas à expedi-

ção prevista: uma era ir ao Mar Vermelho e tentar alcançar Suez, onde os turcos procu-ravam renovar a armada que fora destruída em Diu, no ano anterior; e outra era a de que se dirigissem a Goa, que seria fácil de tomar, porque o soberano do Bijapur tinha falecido re-

centemente e o seu sucessor estava em grande empenhamento militar para apaziguar alguns súbditos revoltosos. Provavelmente o Capitão já sabia da situação de Goa há algum tempo, sendo de crer que tenha sido influenciado por um corsário hindu de nome Timoja. Tratava-se de um homem do mar não muçulmano que se dedicava ao corso na região de Angediva e Goa, atacando, sobretudo, os comerciantes is-

lâmicos que se dirigiam aque-le porto, com carregamentos de cavalos. A sua acção tinha a anuência, senão mesmo o apoio directo, do Vijayanagar, na medida em que prejudica-va o seu rival do norte, e a pre-sença portuguesa no contexto do Malabar mereceu logo a sua simpatia, procurando a amiza-de de Vasco da Gama, quando este foi fundear perto de An-gediva, depois de ter saído de Calecut. O Almirante recusou qualquer aliança mas, no tem-po de D. Francisco de Almei-da ela concretizou-se com um acordo secreto que rendia ao governo da Índia cerca de 1000 pardaus por ano, em troca da

protecção ou da licença portuguesa de livre circulação. Para além disso, a teia de espiões que tinha em toda Índia eram uma fonte su-plementar de informações para os portugue-ses: foi graças a ele que se soube da esquadra do rumes em Diu, em 1508, e foi também ele que negociou a passividade de Malik Ayas (governador de Diu) para atacar os turcos em 1509. Digamos pois que era um personagem bem colocado nos meandros da guerra maríti-ma, que tirava grandes vantagens da amizade portuguesa e que sabia pagar esses favores da

melhor forma. Parece-me lógico e pro-vável que em 1510 Albuquerque tivesse ouvido os seus argumentos para atacar Goa, tanto mais que era um homem bem informado sobre o contexto local e sobre o papel que a cidade podia desempenhar, se passasse para as mãos dos portugue-ses. Aliás, se Timoja argumentou com o negócio dos cavalos, foi ao encontro de outras informações que o governador também tinha, depois da sua estadia em Ormuz. Tudo se conjugava, portanto: Ti-moja e Albuquerque sabiam como fun-cionava o comércio desses animais, sa-biam que Goa era importante e sabiam que era aquela a altura para o ataque, porque a fraqueza do poder local o favo-recia. A aliança parece-me óbvia, mesmo que permanecesse rodeada das descon-fianças e cuidados que uma figura deste tipo sempre inspiraria.

Uma empresa para tomar Goa, contu-do, tinha uma característica diferente de todas as que, até aí, tinham sido levadas a cabo pelos portugueses no Oriente: implicava a ocupação de um território que ficaria sob administração nacional, mobilizando vários meios próprios para o conseguir manter. E o espectro de um

Goa - Sé Patriarcal.

Goa - Arco dos Vice-Reis.

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flagelo terrestre, que dispersasse energias da cadeia já montada para comprar pimenta em Cochim e trazê-la anualmente para Lisboa, as-sustava muita gente. Albuquerque teve, neste assunto, a intuição de um cabo-de-guerra com o sentido da oportunidade, decidindo--se por Goa, mesmo não sendo essa a opinião maioritária dos seus conselhei-ros. Evidentemente que surgiram argu-mentos de peso, a justificar esta inflexão para um objectivo analisado e rejeitado pelo conselho, e o mais forte de todos é a de que era ali, em Goa, que os rumes estavam a recompor a sua armada, trans-formando-se numa ameaça muito mais directa ao poder português, do que a possibilidade de uma expedição vinda de Suez, pelo Mar Vermelho, em direc-ção ao Índico. Aparentemente foi Timoja que trouxe essa informação – aliás falsa –, em que uns acreditariam e outros não. Mas eu creio que era aquilo que Albu-querque queria, não me custando acei-tar que tenha anuído na divulgação de um alarme falso, que justificasse a deci-são que já tomara, mas que tinha receio de impor aos seus capitães contra a sua vontade. Em 1510 o poder do governa-dor da Índia estava maculado por um conjunto de incidentes que aconselha-vam prudência em duas vertentes: pru-dência a lidar com o seu pessoal, não to-mando decisões que fossem claramente contra a vontade comum; prudência nos empreendimentos de guerra para não começar o governo com vitórias dúbias ou com prová-veis derrotas, que seriam aproveitadas contra ele e somadas aos incidentes de Ormuz ou à postura que tivera durante a guerra contra os rumes. O Albuquerque forte, vitorioso em Goa, Malaca e Ormuz, ainda estava por cons-truir e sabia que tinha muitos inimigos poderosos, como se veio a verificar mesmo depois dessa senda de vitórias.

Goa tinha uma população hindu agrícola e pacata que prometia não oferecer resis-tência aos portugueses, e os próprios mouros da terra não se sentiam com energia para resistir. O governador decidira que manteria todas as estrutu-ras administrativas já existen-tes, prometeu cobrar apenas um terço dos impostos do que lhe levava o Sultão, e a 17 de Março de 1510, desembarcou sem resistência no cais de uma cidade órfã. O problema é que esse status não era definitivo e – como sempre acontece na Índia – depois de Maio vêm as chuvas torrenciais, as barras fecham, os apoios vindos do mar são impossíveis, e o Hidalcão (como era designado Adil Schâh, o filho do sultão falecido) sabia que era essa a altura própria para atacar a lusa gente, que não teria grandes meios para lhe resistir. Começou por

tomar os passos (os acessos) da ilha, obrigando os portugueses a recuar para a cidade, depois para a fortaleza e, finalmente, para a armada, aguentando-se em franca penúria sem pode-rem zarpar. Só em meados de Agosto logra-

ram ter vento para sair a barra, abandonando a posição sem grandes baixas nem perdas de navios, mas também sem glória. A súbita força revelada pelo Hidalcão fez crescer as vozes que se tinham oposto à operação, com o argumen-to da incerteza do sucesso e do desperdício de meios que representava, mas houve também

quem se apercebesse das suas vantagens, não só pelos cavalos e outros rendimentos, como pela grandeza das duas barras, da capacida-de de defesa da ilha, da possibilidade de criar um estaleiro onde já existiam numerosos ofi-ciais da profissão e de uma estrutura melhor

de apoio aos portugueses que queriam viver na Índia.

Houve também quem se lembrasse de 1508 e 1509, quando os rumes surgiram do norte, e da vantagem que teria sido ter uma base mais

perto de Diu e do Guzerate, com melhor acesso às vias de Ormuz e do Mar Verme-lho. Aliás esta situação evidente, ajustada ao que era o maior temor dos portugue-ses da Índia (um temor que se manteria até à segunda metade do século), acabou por criar as condições para nova inves-tida sobre Goa, agora com um desfecho favorável e definitivo.

o “Feito de Goa” no dia de S.ta catarina

Logo após a saída da barra do Man-dovi, quando pretendia reunir toda a esquadra junto de Angediva, encontrou a Armada de Diogo Mendes de Vascon-celos acabada de chegar da Europa com instruções para se dirigir a Malaca. Sou-bera, aliás, em Moçambique que a frota de Diogo Lopes de Sequeira, que tentara montar ali uma feitoria no ano anterior, retirara precipitadamente da cidade, dei-xando presos cerca de 40 portugueses. A primeira ideia de Albuquerque foi a de tentar obter a colaboração do capitão para nova investida sobre Goa, mas as suas ordens eram para seguir para o Ex-tremo Oriente e não parecia fácil demo-

vê-lo. Mais uma vez viriam a terreiro os argu-mentos da presença dos rumes, desta vez com uma carta de Malik Ayaz que revelava a emi-nência da sua concentração, precisamente na barra de Goa. Era evidente a estratégia do go-vernador, baseada num receio verosímil que convencia e amedrontava todos os portugue-

ses. Os rumes tinham chegado a Chaul, dois anos antes, e te-riam vindo para sul, se não fos-se a resistência de D. Lourenço de Almeida, a traição de Malik Ayaz e a vitória de D. Francis-co de Almeida. Nada poderia ser visto com mais lógica do que transferir uma parte do poder naval português para uma base mais a norte, acres-centando o argumento de que ela tinha condições para o fazer crescer mais facilmente do que em Cochim. E este raciocínio era ampliado na sua evidência pelo rumor (certo ou fabricado) de que era ali que os próprios rumes queriam concentrar a sua força naval, beneficiando eles de uma posição inexpug-nável, e em franca vantagem

táctica sobre todo o sul.A 10 de Outubro o governador reuniu o con-

selho em Cochim e colocou a todos a questão de ir de novo a Goa, empenhando ou não a armada que acabara de chegar de Lisboa, e que deveria regressar carregada de especiaria

Revista da aRmada • JULHo 2010 15

A Armada de Diogo Vasconcellos, destinada a Malaca, mas que ficou na Índia e esteve na conquista de Goa.Livro das Armadas.

Goa - Fortaleza da Aguada.

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16 JULHo 2010 • Revista da aRmada

em Dezembro ou Janeiro. O clima estava cria-do, mas havia questões difíceis de ultrapassar. Diogo Mendes de Vasconcelos já tinha perdi-do a monção para ir a Malaca e tinha de espe-rar pelo ano seguinte, mas os navios do reino não estavam pelos ajustes para se envol-ver no que achavam ser uma aventura. A 17 de Outubro o governador escreveu uma carta ao rei, explicando-lhe que “as coisas de Goa são tão grandes, que tocam tanto à segurança da Índia e a tudo o que nos cumpre e desejais”. E seguem-se as vantagens que se podem tirar de uma ribeira em condições, da presença de sa-litre para a pólvora, de madeira e ferro, de artesãos que ali vivem e que serão fa-voráveis aos portugueses, não deixando de acrescentar que todas essas vantagens se virarão contra “nós” se ali entrarem os rumes. Fala do domínio mais fácil sobre o Decão e das muitas outras vantagens que justificarão a despesa que tiver em guarnecê-la e defendê-la, desde que dali expulse todos os mouros. Diz-lhe ain-da que irá a Cambaia numa missão di-plomática de amizade em que resgata-rá alguns portugueses cativos, mas que de regresso se encontrará com as naus do reino, em Angediva, para que juntos marchem sobre Goa.

O Hidalcão estava prevenido, mas a força que o governador reuniu era bas-tante forte, para além dos portugueses, conseguiu o apoio de Timoja com ses-senta fustas e o auxílio do Rajá de Onor com uns milhares de combatentes. O ataque foi lançado de várias frentes, onde os portugue-ses ocuparam a parte do rio Mandovi, desem-barcando em três locais distintos. Em cerca de quatro horas o combate esta-va resolvido a favor dos por-tugueses mas, desta vez, não haveria contemplações com os vencidos, a quem não seria poupada a vida em nenhuma circunstância. Foram quatro dias de terror com uma cidade em chamas e gente passada a fio de espada. Apenas foram poupados os camponeses hin-dus e os brâmanes, como ele próprio descreve ao rei, numa outra carta escrita em Dezem-bro de 1510, poucos dias antes do regresso da Armada que vi-nha para Lisboa.

o Futuro de GoaA contestação de alguns por-

tugueses da Índia contra a to-mada em Goa, não terminou no dia de S.ta Catarina, nem ar-refeceu com o que foi a primeira grande vitória de Albuquerque na Índia. Há um debate que se prolonga e reflecte, de certo modo, duas po-sições diferentes sobre a presença no Oriente, com variantes de melhor ou pior compreen-são do governo de Afonso de Albuquerque. O

Grande Capitão ficou para a História como o ho-mem que conquistou Goa, Malaca e Ormuz, exemplo de carácter e valentia que terminou a sua vida “mal com os homens por amor de el-Rei e mal com el-Rei por amor dos homens”.

Era uma espécie de maldição de quem gover-nava a Índia, e que tinha uma explicação ób-via na dificuldade régia de exercer um poder à distância, com grande dificuldade em manter a lucidez contra todas as intrigas e maledicên-

cias. Tanto mais que os caluniadores sabiam bem como tocar o coração do rei, insinuando o proveito pessoal das medidas tomadas e os “consequentes” prejuízos da coroa e dos inte-resses régios.

Mas esta dicotomia, que se tornou clara no

princípio da presença portuguesa na Índia, en-tre os que eram contra Albuquerque e os que defendiam a política de Albuquerque, tem sido particularmente maltratada por alguns estudiosos, que nunca procuraram entender

a dinâmica do poder naval no tempo dos navios à vela, num espaço condi-cionado pelo regime de monções, onde os ca minhos do mar não eram tão largos como se pode supor. E a forma mais fá-cil que encontraram para enquadrar este período – atendendo às documentadas pressões que se faziam sentir em Lisboa, para um menor empenhamento militar – foi a partir dos problemas ocorridos entre D. Francisco de Almeida e Albuquerque, no final de 1508 e princípios de 1509, co-locando os dois governantes em dois pó-los políticos opostos, a que foram dados dois rótulos particularmente redutores: Almeida era a favor das armadas e Albu-querque das fortalezas e dos territórios conquistados, resumindo a isto os prós-e-contras da primeira metade do século XVI, na Índia. É uma posição absurda que peca pela não observação da especi-ficidade do domínio do mar, reduzindo todas as manobras a exercícios de geo-metria num espaço líquido sem monta-nhas, sem desfiladeiros, sem pontes, sem rios para atravessar, aparentemente pas-sível de ser tratado, enquanto campo de batalha, como um imenso espaço aberto onde se circula por onde se quer.

A análise comum que coloca as coisas nos termos que acabo de dizer tem de ser repen-sada e reformulada, tendo em conta um con-junto de valores políticos da época e, sobretu-do, as condicionantes dos combates navais e

das dificuldades próprias da condução dos navios à vela, que não circulam por onde querem mas por onde o ven-to lhes permite. E a primeira questão que é preciso atender é a de que no século XVI, no rei-nado de D. Manuel ou nos se-guintes, não há governadores a definir políticas de futuro para nenhum espaço sobre o qual o rei queira exercer a sua sobera-nia. Quem determina políticas tão estruturantes como o cons-truir ou não construir fortale-zas, aumentar ou não aumentar as armadas, conquistar ou não conquistar terras, é D. Manuel e não Afonso de Albuquerque o D. Francisco de Almeida. E para o perceber basta ler – com atenção – o regimento de 1505 e a correspondência que se lhe seguiu. É verdade que o rei não

determinou a conquista de Goa, mas determi-nou a montagem de uma base em Angediva, que teve de ser abandonada e destruída pas-sada a primeira monção, por não ter condições mínimas de protecção e sobrevivência para um conjunto de coisas essenciais que estavam de-

Goa - Pondá - Templo de Queulá.

Goa - Igreja do Bom Jesus.

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finidas: abrigo para a armada, protecção de uma fortaleza e montagem de uma ribeira de construção naval (nesta primeira fase, apenas com condições mínimas). Quando se retirou de Angediva, naturalmente que uma condicio-nante da estratégia do Índico ficou suspensa, aguardando forma de ser colmatada de uma outra forma qualquer. Mas não restam dúvidas que a existência de uma base mais próxima do norte e, sobretudo, mais a barlavento do que Cochim, era uma coisa fundamental, como se provou quando os turcos avançaram para o Índico, conseguindo estabelecer-se em Diu e atacar D. Lourenço de Almeida em Chaul. Podemos não o perceber hoje – desaparecidas que foram as condicionantes da navegação quinhentista – mas eram muita claras para quem lá navegou naque-le tempo. Quando, alguns anos mais tarde, Lopo de Sousa Coutinho dizia que Diu estava a barlavento de toda a Índia e dali se podia controlar Cambaia e o Malabar, expressava o mesmo sentimento que D. Manuel e o seu conselho tiveram, quando pensaram numa base em Angediva, e que Albuquerque senti-ra quando insistiu na con-quista de Goa. Não é uma ideia geométrica de ficar a meio caminho entre o norte e o sul, é o objec-tivo concreto de ocupar uma posição que tem vantagem táctica para actuar com os navios. E nada disto tem a ver com ideias de conquista territorial ou de invasão com o sentido de criar “senhorios” que fossem além das capacidades de um porto que desse apoio autónomo a uma esquadra, capaz de sair para o Mar Vermelho, para Cambaia ou para o sul. Uma base que, naquelas circunstâncias, tinha a mais-valia de poder ser a porta de entrada para uma merca-doria estratégica, como eram os cavalos.

Albuquerque reclama gente (homens e armas para fazer a guerra), mas não é para

conquistar a Índia. É para controlar a vias de n avegação e comércio do Índico, implicando a montagem de bases nos locais certos, como era sabido desde os tempos mais remotos da antiguidade. E quem se opunha a esta ideia, não contrapunha que para lá se mandassem mais navios, defendendo tão-somente que o empenhamento português não devia ir além do envio das armadas a Cochim, ou a outro qualquer local onde houvesse pimen-ta, para a comprar a um preço favorável e trazê-la para Lisboa pela rota do Cabo. O partido dos comerciantes, que acabou por influenciar D. Manuel, queria mais lucro e menos despesa. Nada mais. Não lhe interessa-va o negócio dos cavalos, nem o problema do acesso ao arroz que alimentava a maior parte

da Índia. Por isso não compreendia as alianças com o Vijayanagar, as relações com Timoja, ou quaisquer outros compromissos diplomáticos que fossem além dos produtores de pimenta. Mesmo a procura do Preste João, e as tentati-vas para estabelecer relação directa com o rei cristão da Abissínia, foram frouxas, e nada condicentes com as declarações de intenções da documentação oficial.

Toda a gente entendia – isso sim – o que podia significar a ameaça dos turcos, e é inte-ressante observar que uma boa parte das ex-pedições ao Mar Vermelho foram feitas sob o espectro “de que se preparava uma armada

turca”. Mas quem assim pensava – e muita dessa gente tinha influência junto do rei, fosse pelo poder financeiro, fosse por outras razões de natureza política – opunha-se a todas as ini-ciativas como a de Goa, considerando-as como despesas inúteis. Nunca imaginou que era pre-ciso construir navios na Índia e nunca pensou em dominar o Índico, como queria D. Manuel. Porque para dominar o Índico era preciso tudo aquilo que foi sendo feito por D. Francisco de Almeida, por Albuquerque, por Vasco da Gama e por muitos outros, que conduziram a política régia com a componente militar pre-cisa e concreta de domínio do mar.

Indiferente, contudo, a esta disputa e à ma-nutenção da actividade comercial em Cochim, Goa crescia enquanto cidade e ganhava a di-

mensão de uma metrópole onde não estava o governo. Só teve um verdadeiro pro-tagonismo de capital quan-do ocorreu a querela de su-cessão que opôs Lopo Vaz de Sampaio e Pêro de Mas-carenhas, em 1526. Sam-paio fez da cidade a sede do seu partido, onde reuniu os fiéis partidários e a sua for-ça, até à chegada de Nuno da Cunha, que teve lugar em 1529. O novo governa-dor, depois de ter enviado Sampaio para o reino, foi

direito a Cochim e ali permaneceu durante o primeiro ano de governo, onde tratou dos problemas da Armada, e de todas as questões normais que diziam respeito à administração civil e militar do Estado da Índia. Mas em 1530 decidiu retirar-se para Goa com os mais direc-tos colaboradores. Foi esta mudança que deci-diu, definitivamente, a mudança da capital do Estado Português da Índia para a cidade con-quistada por Albuquerque, cumprindo afinal os pressupostos da conquista em 1510.

J. Semedo de MatosCFR FZ

Revista da aRmada • JULHo 2010 17

Goa - Rua Direita do Mercado.Itinerário, Viagem ou Navegação – Jan Huygen Van Linschoten.

Medalha do V Centenário da Conquista de Goa – CMG Valente Zambujo

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18 JULHo 2010 • Revista da aRmada

O mar do futuroO mar do futuro«O futuro – o nosso futuro – está

sempre além horizonte e a incerte-za que encerra nunca nos demoveu de o demandarmos, cientes das con-dicionantes, mas confiantes no sa-ber, na motivação, na tenacidade e na imaginação criativa, que são marcas de carácter que nos unem e identificam!»

Almirante Fernando José Ribeiro de Melo Gomes, 20 de Maio de 2007.

Na revista de Maio desenvolvi o tema «O mar de hoje», neste artigo procu-rarei apresentar uma análise pros-

pectiva dos desafios marítimos futuros. O futuro é desconhecido e por isso há cená-

rios genéricos para todos os gostos. Thomas Friedman, no seu livro «The World is Flat», tem uma ideia optimista do desempenho fu-turo do mundo globalizado. Os críticos da globalização comungam da previsão de Da-vid Korten e de John Cavanaugh, segundo a qual, os EUA irão liderar a criação de eco-nomias locais e regionais mais fechadas e as-sim mais capazes de lidar com a reciclagem e a reutilização, com o ambiente e com a ge-ração de energia limpa. Um terceiro cenário, defendido por Robert Kaplan e Chris Lewis, conduz-nos para uma visão de colapso po-lítico, económico, cultural e ambiental que já se começou a espalhar em África, a par-tir dos anos noventa do século passado, e se poderá espalhar pelo resto do mundo. Esta abordagem direcciona-nos para um cenário de degradação dos padrões de vida do «pri-meiro mundo». Também Michael T Klare, com a sua nova geografia dos conflitos glo-bais, ou James Howard Kunstler, com a sua previsão catastrófica do «Fim do Petróleo», nos apresentam uma antevisão de grande an-gústia em relação ao futuro. Este cenário tem no seu fundamento a ideia do crescimento do consumo de combustíveis fósseis, da es-cassez de água, de alterações climáticas, de doenças, dentre outros. Alerta mesmo para a possibilidade das elites governantes terem de se proteger do povo que governam, em virtude de uma crescente revolta motivada pela diminuição da sua qualidade de vida, enquanto assistem à tomada do poder por grandes corporações globais. Uma outra an-tevisão interessante é a apresentada no livro «Os próximos 100 anos», de George Fried-man (Fundador e CEO da STRATFOR), que nos apresenta, entre outras previsões, a frag-mentação da China em 2020 e uma guerra global em meados do século.

O MUNDO EM 2025

O relatório «As tendências globais em 2025: um mundo transformado» publica-

do, em Novembro de 2008, pelo National Intelligence Council, e o «O novo relatório da CIA – Como será o mundo em 2025?» permitira-me identificar, da seguinte for-ma, os contornos do sistema internacional por volta de 2025:

- Em 2025 seremos cerca de 8 mil milhões e em 2050 aproximadamente 9 mil milhões de pessoas. No entanto, iremos assistir ao envelhecimento da população do mundo industrializado, com especial significado no Japão, na Europa e na Rússia.

- Não haverá muitas dúvidas em rela-ção à afirmação da Índia, em 2030, como país mais populoso do mundo com 1505 milhões de pessoas (Mp), a China terá cer-ca de 1458 Mp, os EUA na ordem dos 366 Mp, a Indonésia por volta dos 279 Mp e o Paquistão 240 Mp. A Índia ultrapassará a China por volta de 2025.

- A emergência de um sistema multipolar, marcado simultaneamente pela crescente afirmação do eixo do Pacífico (China, Ín-dia, Coreia, Japão, EUA) e pelo aumento do poder relativo das redes de actores não estatais (multinacionais, ONG’s, organiza-ções religiosas).

- Significativa deslocação geopolítica do poder económico e da riqueza relativa do Ocidente para o Oriente. O comércio no Oceano Pacífico é superior ao do Oceano Atlântico desde a década de 80 do sécu-lo passado.

- Manutenção dos EUA como potência mundial, embora cada vez menos domi-nante e cada vez mais focalizada no Médio Oriente (para assegurar o acesso ao petró-leo) e no Oceano Pacífico (para garantir uma posição competitiva no comércio).

- A energia é o elemento vital da econo-mia mundial. Apesar dos esforços para aumentar a eficiência energética e dos in-

vestimentos no desenvolvimento de novas tecnologias energéticas, o petróleo e o gás natural continuarão decisivos por muitos anos. O desenvolvimento económico mun-dial requer cada vez mais petróleo e gás. Al-guns analistas estimam que, nos próximos anos, a China sozinha poderá ser respon-sável por um terço do aumento marginal mundial da procura de petróleo.

- O ritmo de inovação tecnológica será a chave para os resultados no futuro pró-ximo. No entanto, as tecnologias actuais são inadequadas para substituir a matriz energética tradicional, na escala necessá-ria, numa época em que se sabe que o sec-tor energético leva, em média, 25 anos para que uma nova tecnologia de produção seja amplamente instalada.

- A produção de hidrocarbonetos, petróleo bruto, gás natural e produtos não conven-cionais, fora do cartel da OPEP, não crescerá proporcionalmente à procura. A produção de petróleo e gás em muitos países produto-res tradicionais está a diminuir. Por exemplo, na China, na Índia e no México a produção estagnou. Os países onde actualmente se si-tuam as grandes reservas também acabarão por sofrer uma retracção da produção e con-tinuarão a ser áreas de instabilidade geopolí-tica. Como resultado de tudo isto e de outros factores, o mundo irá enfrentar uma mudan-ça de fontes de energia, do petróleo para o gás natural, para o carvão e para outras al-ternativas. No entanto, a curva de depleção do gás natural é igual à do petróleo biótico com um atraso de poucos anos. O carvão, que existe em abundância, por exemplo nos Estados Unidos, é muito poluente e arrasa-dor para os habitats onde é extraído.

O mundo precisa de descobrir e desen-volver fontes fiáveis de petróleo e gás, a pre-ços que permitam sustentar o crescimento

A complexidade do litoral no futuro. Imagem obtida em http://www.acceleratingfuture.com/michael/blog/2008/02/port-city/.

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económico. Aqui há uma enorme incerteza. Não há dúvidas que têm sido poucas as no-vas descobertas de petróleo e que estas são, normalmente, encontradas em países com regimes políticos controversos ou em locais com geografia física muito difícil.

O que baralha toda esta previsão preo-cupante são as notícias que têm vindo a ser divulgadas pelos petrogeólogos de que existem reservas de origem abiótica no inte-rior do nosso planeta, em enormes quanti-dades no denominado «manto terrestre», a profundidades superiores aos 15 km. O es-pecialista José Caleia Rodrigues, com quem tive oportunidade de trocar ideias, conside-ra que o petróleo é muitíssimo abundante e que já há tecnologia capaz de atingir tais profundidades e extrair o petróleo jazente no manto. É mesmo possível que devido à elevada pressão des-te petróleo abiótico possa haver migração do manto para bol-sas mais próximas da superfície e portanto mais acessíveis, sobre-tudo em campos mui-to explorados, quase esgotados, em que a pressão interna é mui-to baixa. Se se confir-mar esta hipótese será necessário estudar o seu impacte futuro.

Se não houver pe-tróleo de origem abió-tica teremos inevita-velmente gigantescas consequências econó-micas e sociais para o mundo, já que a civi-lização moderna de-pende dos combustí-veis fósseis baratos e abundantes, especialmente para os trans-portes, produção de alimentos, processos químicos industriais, tratamento de água, aquecimento doméstico e geração de elec-tricidade. É difícil imaginar o mundo sem gasóleo para os tractores e ceifeiras, sem pesticidas, sem plásticos e sem combustí-vel para os aviões e navios.

OS GRANDES TEMAS ESTRATÉGI-COS NOS ESPAÇOS MARÍTIMOS

Com estes vectores orientadores que de-safios se podem identificar nos espaços marítimos? Os grandes temas estratégicos deverão ser:

- Competição pelo fornecimento de energia

- Alterações climáticas- Globalização- Aumento da complexidade no litoral- Crescimento da competição e diminui-

ção da cooperação internacional no âmbi-to do uso e da exploração dos oceanos e dos mares.

Competição pelo fornecimento de energiaSegundo o Development, Concepts and

Doctrine Centre (DCDC) do Ministério da Defesa do Reino Unido, num documento que procura identificar os desafios estra-tégicos de 2007 a 2036, a competição por fornecimento de energia dominará a pai-sagem económica nos próximos 30 anos. O ritmo de crescimento da procura deverá oscilar entre 1,5 e 3,1%. A procura, por par-te das economias emergentes da China e da Índia, irá aumentar significativamente, en-quanto os habituais grandes consumidores irão procurar manter os níveis de consumo compatíveis com o seu crescimento econó-mico. Esta evolução resultará em preços altamente competitivos e na continuação do enriquecimento e progresso económi-co dos países produtores, incluindo a Rús-

sia e o Irão. Haverá ainda, em resultado de um nível de competição cada vez maior, desentendimentos entre países que pode-rão conduzir a situações de crise, ou mes-mo de conflito.

Este é o tema mais controverso, já que há muitas pessoas que não acreditam que o petróleo vai faltar. As reservas provadas de petróleo de origem biótica conhecidas, se se mantivesse a produção e o ritmo de consu-mo, seriam suficientes para cerca de 45 anos (cálculos efectuados pelo signatário com base no relatório «BP Statistical Review of World Energy»). No entanto, como sabemos, o ritmo de consumo vai aumentar e actual-mente apenas se descobre um novo barril de petróleo por cada 4 que se produz, com ten-dência para se agravar, cada vez mais, a dife-rença entre a descoberta e a produção.

Naturalmente que o preço do petróleo vai subir, já que é cada vez mais requeri-do pelas economias em crescimento. Caso exista petróleo de origem abiótica também será caro, porque a tecnologia para a sua extracção será complexa.

Em termos de petróleo biótico prevê-se que as novas descobertas se façam quase exclusivamente no fundo do mar e nas re-giões polares.

Alterações climáticasAs alterações climáticas terão mais im-

pacte no futuro do que se pode pensar, à primeira vista, e o mar tem uma enorme influência. A água, dos oceanos e dos ma-res, é reguladora do clima na Terra, bas-ta pensar que os litorais sofrem menores amplitudes térmicas dos que os interiores continentais, ou que os países do norte da Europa têm um clima mais ameno devido à corrente do Golfo. Esta corrente está a enfraquecer, o que é um sinal claro de que a seguir a este aquecimento do planeta se vai entrar numa nova era de glaciação,

que tem sido cíclica ao longo da História da Terra.

O último período in-terglacial quente com mais semelhanças com o presente Holocénico terá sido o Eemiano, que terá ocorrido entre 130 000 anos e 110 000 anos atrás. A transição completa do período Eemiano para a era glacial que se seguiu não levou mais de 400 anos. Ora, actualmen-te a emissão dos gases de efeito de estufa está, potencialmente, a ace-lerar todo este proces-so, pelo que devemos esperar grandes alte-rações climáticas nos próximos anos.

Prevê-se que as al-terações climáticas venham a amplificar o sofrimento humano através de tempes-tades catastróficas, diminuição da área de terra arável e da pesca costeira, o que pode conduzir à perda de vidas, à migração in-voluntária, à instabilidade social e a crises regionais. Actualmente há 21 países com 600 milhões de pessoas a sofrer de escassez de água e terra arável. Em 2025 serão cerca de 36 países e aproximadamente 1400 mi-lhões de pessoas.

Nesta perspectiva, os países arquipelágicos como Portugal já identificaram a necessida-de genética de ser edificada a capacidade que permite apoiar rapidamente as suas populações, designadamente através de um navio polivalente logístico satisfazen-do requisitos para emprego em missões de natureza militar e não militar.

As alterações climáticas estão também a abrir novas rotas potenciais e a criar a ex-pectativa do acesso às riquezas do Oceano Árctico e do Oceano Antárctico.

A ligação do Oceano Atlântico ao Ocea-no Pacífico, através do Oceano Árctico, é

Em 1980 explorava-se petróleo sob uma coluna de água de 300 metros. Actualmente explora-se p etróleo sob uma coluna de água de 3000 metros e depois perfura-se até 12 000 metros no subsolo.

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possível através da Passagem Noroeste, a norte do Canadá. É uma rota extensa, mui-to difícil e bloqueada por gelos em longos períodos do ano. Há sessenta anos o navio «St Roch» da Royal Canadian Mounted Po-lice efectuou a primeira viagem de oeste para leste através da Passagem Noroeste. O navio levou 27 meses para o conseguir. Devido às alterações climáticas, em 2000, o navio «St Roch II» (com o nome a honrar o seu antecedente) efectuou a mesma via-gem do Pacífico até à Baía Baffin, a oeste da Gronelândia, em apenas um mês. Este feito abriu novas perspectivas em relação a rotas comerciais, permitindo encurtar uma viagem da Ásia para a Europa em 5000 milhas náuticas, ou seja metade do trânsito via Suez do Japão para a Holan-da e, para já, sem riscos de ataques de pi-rataria. A empresa russa Sovcomflot, de transporte de petróleo, já vai en-saiar o transporte por esta via desde o nordeste da Rús-sia até à Ásia.

GlobalizaçãoA própria globa-

lização está a for-matar novas formas de migração huma-na, a ter impacte na saúde e na doen-ça, na educação e na cultura. Teme--se que a globaliza-ção abra um fosso, ainda maior, entre o mundo civiliza-cional ocidental e o mundo civilizacional oriental, que tem cada vez maior expres-são demográfica.

Os meios de comunicação irão realçar o drama do sofrimento humano e as popula-ções menos afortunadas estarão, progressi-vamente, mais conscientes da sua situação, ficando menos tolerantes e mais radicais, permitindo o crescimento de comporta-mentos extremistas. O crime organizado e o radicalismo irão explorar esta instabi-lidade social.

A conjugação da globalização com a ine-vitável pressão em direcção aos países do Golfo, onde se localizam as grandes reser-vas mundiais de petróleo, irá gerar maior instabilidade na região. A situação será mais grave à medida que os actores regionais forem conseguindo obter armas nucleares ou armas de destruição maciça ou de efei-tos de massa.

Aumento da complexidade no litoralPrevê-se o aumento da complexidade do

litoral em resultado do facto da maioria da população mundial viver a pouca distância da orla costeira, 37% vive a menos de 100 km, onde a actividade humana deverá de-

senvolver os mais variados projectos que, em muitos casos, se prolongarão pelo mar e onde irão produzir um elevado impacto. As regiões costeiras desenvolvem-se mais política, económica e demograficamente do que as interiores, porque beneficiam directamente das vantagens associadas às comunicações marítimas. No futuro ne-nhuma alternativa se vislumbra capaz de substituir a capacidade de transporte dos navios e por isso esta tendência tenderá a aprofundar-se.

A desertificação de terras, a escassez de água e de recursos, ou simplesmente a pro-cura de melhores condições de vida, tam-bém levarão a uma concentração ainda maior no litoral.

Nas regiões litorais sobrepovoadas com governos fracos e corruptos haverá cada

vez mais tensões devidas ao aumento do número de jovens sem perspectivas de fu-turo, ao agravamento da insatisfação dos excluídos, ao extremismo religioso, ao na-cionalismo étnico e às alterações climáticas, que deverão originar ambientes propícios a crises e conflitos. Este ambiente de insta-bilidade social irá ser explorado pelo crime organizado e pelo radicalismo.

Além disso, o homem continuará a des-pejar nos oceanos produtos extremamen-te nocivos para os ecossistemas marinhos, como são os hidrocarbonetos, os pesticidas e os metais pesados.

Crescimento de competição nos oceanosA desmaterialização do espaço e a com-

pactação do tempo levam a que o mar, através das suas vias marítimas, continue a ser, cada vez mais, determinante na vida internacional, num mundo globalizado onde as economias são sensíveis a altera-ções no fluxo do comércio, tão habituadas que estão ao just-in-time. Os navios no mar são os verdadeiros armazéns da economia moderna e transportam 90% do comércio mundial. Em paralelo com esta evolução espera-se o incremento da poluição marí-

tima e a utilização dos espaços marítimos pelo crime organizado e por organizações terroristas. Há assim um novo paradigma para os Estados-nação que é a protecção dos espaços marítimos e das linhas vitais para comunicação.

Como vimos, o transporte marítimo entre a Ásia e a Europa, poderá passar a circular, na sua vasta maioria, através de vias marí-timas situadas no Oceano Árctico.

Noutra perspectiva de competição inter-nacional a ter lugar nos oceanos, pode ante-cipar-se que o alto mar, o fundo do mar e as regiões polares irão ser palco de disputas à medida que a tecnologia permitir o acesso aos seus recursos e a necessidade desses re-cursos encorajar a sua exploração.

A competição irá centrar-se na pesca, cada vez mais escassa, na mineração do

fundo oceânico, na extracção de pe-tróleo e gás, mas também se pode estender aos direi-tos de passagem e de negação de pas-sagem.

A C o n v e n ç ã o das Nações Unidas sobre o Direito do Mar de 1982 abriu a possibilidade dos países mais pobres usufruírem das ri-quezas dos fundos dos oceanos que fi-cam para além das plataformas conti-nentais dos Estados, ou seja na «Área». No entanto, a dinâ-

mica a que estamos a assistir é apenas a da extensão dos limites das plataformas dos Estados ribeirinhos.

Desde 1982, data de referência da Con-venção, muitas evoluções houve na capa-cidade técnica para explorar petróleo e gás do fundo do mar. No início dos anos 80 ex-plorava-se o petróleo, no mar, a menos de 300 m de profundidade. Actualmente, ex-ploram-se estes recursos sob uma coluna de água de 3000 m. Se tivermos em conta que o Oceano Atlântico tem uma profundida-de média de 3350 m podemos antever que haverá iniciativas futuras dos Estados ribei-rinhos para ampliarem os limites das suas plataformas, em especial se descobrirem in-dícios de grandes riquezas submersas.

Há áreas do Oceano Pacífico e do Índico que já estão concessionadas pela Autorida-de Internacional dos Fundos Marinhos. Os exploradores são os países tecnologicamen-te mais evoluídos.

Os recursos naturais motivam muitas acções subtis dos Estados. Recorda-se, por exemplo, que em 2007, foi notícia a colocação de uma bandeira russa no fun-do oceânico Árctico. A Dinamarca respon-deu com uma expedição científica e o Ca-

Concessões para a exploração de nódulos polimetálicos no Oceano Pacífico.

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nadá com uma «operação de soberania», ou seja, manobras militares. No Oceano Atlântico também há áreas de conflituali-dade, um exemplo é a reclamação, unila-teral, do Reino Unido sobre parte da bacia Hatton-Rockall que também é disputada pela Irlanda, Dinamarca (para as Ilhas Fa-roe) e Islândia. No Oceano Atlântico Sul também já há ecos de algum desentendi-mento entre o Reino Unido, a Argentina e o Chile relativamente à delimitação da plataforma continental.

PORTUGAL E OS DESAFIOS MARÍTIMOS

A dimensão do mar português, um dos maiores no espaço europeu, reúne condi-ções para se expandir ainda mais quan-do for reconhecida a pretensão de expan-são dos limites da plataforma continental. Passaremos de 1,7 milhões de quiló-metros quadrados para 3,6.

E s t e a l a r g a -mento geopolítico oceâ nico dos limi-tes da plataforma continental repre-senta um grande desafio nacional e uma oportunida-de para as gera-ções futuras. No entanto, requer um esforço acres-cido do País no seu estudo, apro-veitamento, segu-rança e defesa.

Segundo a SaeR no estudo o Hyperclus-ter da economia do mar, apresentado em 17 de Fevereiro de 2009, o efeito total no Pro-duto Interno Bruto (PIB) português das acti-vidades ligadas ao mar, no ano de 2005, terá sido da ordem dos 5% a 6% do PIB nacio-nal. Nestes valores não são considerados os resultados obtidos pelo turismo marítimo (balnear) e pela imobiliária turística costei-ra, que são muito significativos.

Em termos futuros, as oportunidades que se vislumbram são muitas, vejamos algumas:

- Se houver segurança em terra e no mar poderemos cativar turistas, balneares e náu-ticos, que deixarão de ir para outras para-gens, que se vão tornar inseguras.

- Os portos nacionais vão ser importantes para o hypercluster do mar e mais impor-tantes ainda à medida que o preço dos com-bustíveis aumentar ou o petróleo escassear e começar a fazer sentido ao transporte da América, de África e do Médio Oriente en-trar em Portugal e ser depois transportado por comboios eléctricos. Tal será viável se a Europa desenvolver a ferrovia e se con-seguir gerar energia barata a partir de fon-tes renováveis.

- A Energia tem um potencial enorme, já que a União Europeia tem a ambição de ge-rar entre 14 a 17% da sua energia em 2020 a partir de geradores eólicos offshore. Prevê--se que em 2030 esse número passe para um valor entre 26 a 35%. Assim, por exemplo, até 2030 vai ser necessário instalar 10 000 novas turbinas no mar.

- A Pesca é cada vez mais escassa e, por isso, é preciso valorizar o que existe, uma das possibilidades é através da certificação do pescado. A aquicultura deverá compen-sar a diminuição das capturas no mar e como tal deverá passar dos actuais 3% em Portugal e 19% na média europeia para 50% em 2030. As algas também têm muitas apli-cações entre as quais os biocombustíveis, a alimentação ou a retenção de carbono.

- Em Portugal, no Arquipélago dos Aço-res, temos uma situação única à escala mun-dial, em especial na junção das três placas

litosféricas (placa Americana, Africana e Euroasiática), trata-se de uma região de as-censão de material a partir de regiões pro-fundas do manto originando muitas fontes hidrotermais. As estranhas formas de vida que aí vivem são a matéria-prima para a biotecnologia azul.

- Na nossa plataforma sabe-se que há nó-dulos, crostas e sulfuretos polimetáticos. Podemos obter do mar manganês, que é importante para fazer aço super-duro, ní-quel, para o aço inoxidável e cobalto para sistemas que funcionam a elevadas tem-peraturas.

- Os hidratos de metano são a energia co-nhecida mais disponível no planeta. O Ja-pão tem testes de produção previstos para este ano e prevê a comercialização em 2016. Portugal também já descobriu a sul do Al-garve a presença de hidratos de metano.

- No fundo do mar é possível depositar dió xido de carbono que fica sob o aspecto de gel. Pode ser uma potencialidade pois podemos vir obter compensações financei-ras por conta de quotas de carbono.

- Se arrancar todo este potencial por certo que se começarão a desenvolver, em Portu-gal, novos equipamentos que poderão ser exportados.

CONSIDERAÇÕES FINAISSó mesmo a existência de petróleo abió-

tico nos pode suavizar as dificuldades que nos esperam.

Portugal importa a totalidade do petró-leo e 2/3 do gás natural que consome por via marítima. Isto significa que a segurança energética, que é muito mais do que a ga-rantia do acesso às fontes e a protecção do seu transporte, também vai ser um tema estratégico para Portugal.

A análise prospectiva que apresentei re-vela, com clareza, que este século será de corrida aos oceanos na busca dos recursos que guardam.

O interesse pelos oceanos é tão grande que países como o Brasil vivem em grande euforia com as descobertas de petróleo que têm feito no fundo do mar. A ideia da rique-za é tão animadora que o Brasil chama à sua

plataforma conti-nental a «Amazó-nia Azul».

Deixo aqui umas ideias dispersas que se podem con-siderar no âmbi-to da elaboração de uma estraté-gia como fazendo parte da análise de ambiente. No en-tanto, quando se entra num perío-do de incerteza e quando as altera-ções nas condições de acção exigem a adaptação de acti-

vidades e de comportamentos para se con-seguir manter a viabilidade e a sustenta-bilidade, o que é necessário é pensamento estratégico e é da sua qualidade que depen-derá a diferença entre o sucesso e o fracasso, entre a autonomia e a subordinação, entre o crescimento e a estagnação, entre o progres-so e a decadência. O pensamento estratégi-co e a respectiva operacionalização é o que nos deve mover como Nação se queremos enfrentar com serenidade o futuro. Só tere-mos as capacidades necessárias para usar, explorar e proteger o nosso mar e as nos-sas linhas para comunicação se soubermos desenvolver e concretizar ideias que con-sigam integrar de forma eficaz e eficiente os elementos do Poder Nacional de que o País dispõe.

O mar assegura-nos, de novo, uma opor-tunidade de grandeza, uma janela de li-berdade e de esperança, mas os complexos desafios que se avizinham requerem uma liderança política com visão, sabedoria, an-tecipação, determinação, agilidade e imagi-nação, pois só assim poderemos continuar a ser uma Nação «valente e imortal».

Armando J. Dias CorreiaCFR

Imagem elaborada pelo autor para ilustrar as vias logísticas da economia moderna. O comércio marítimo no Oceano P acífico é maior do que no Oceano Atlântico. Esta visão irá mudar com as novas rotas pelo Oceano Árctico.

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22 JULHo 2010 • Revista da aRmada

A MARINHA DE D. SEBASTIÃO (10)

O Outono cinzento do Conde do RedondoO Outono cinzento do Conde do Redondo

A principal acção conduzida pelo vice­­rei D. Francisco Coutinho, Conde do Redondo, no governo da Índia, foi a

paz que estabeleceu com o Samorim, colo­cando nesse acto toda a pompa que lhe foi possível, numa manobra diplomática que era habitual na Europa e que visava impres­sionar os virtuais inimigos, com o fausto do próprio cerimonial.

Num dos números anteriores da REVISTA DA ARMADA, falei do problema dos bairros muçulmanos de Cananor, que se opunham à posição neutral do raja hindu, sendo neces­sário um tacto e sensibilidade diplomática muito grande para manter em equilíbrio um conjunto de factores que facil­mente se precipitavam, causan­do grandes prejuízos, pratica­mente, em todo o Malabar. Um dos soberanos que tardiamente começou a perceber as desvan­tagens de alimentar essas guer­rilhas foi o Samorim de Calecut, sobre quem recaíam quase todas as represálias portuguesas, so­bretudo com os maiores prejuí­zos económicos. Era evidente que as comunidades Mappila (muçulmanos da Índia) usavam a má relação do Samorim com Portugal em benefício próprio, sendo cada vez mais claro que ele não beneficiava muito com isso, vendo reduzidas as suas rendas e ficando cada vez mais isolado no espaço Hindu. A es­perança de derrotar os portu­gueses esvaíra­se com as derrotas dos turcos a norte, e a guerra de 1559 realçara ainda mais a sua fragilidade naquele contexto. O próprio Samorim já não desejava outra coisa que não fosse fazer a paz com os portugueses, embo­ra soubesse como era difícil levá­la aos seus súbditos islâmicos.

Encontrou a sua grande oportunidade quando o Conde do Redondo tomou pos­se como vice­rei da Índia, apresentando­lhe de imediato os seus embaixadores em Goa, com uma proposta de paz. D. Francisco re­cebeu­os com grande cortesia, preparando­­se para fazer dessa operação diplomática uma grande demonstração de força e pres­tígio, à maneira das cortes europeias e dos faustos mediterrânicos, em que D. Manuel tinha sido pródigo. Reteve os embaixado­res em Goa por algum tempo, ditando­lhes as condições da paz, e foi preparando uma enorme armada em que ele próprio iria a Calecut. Esse acordo também era importan­te para Portugal, na medida em que podia apaziguar o Malabar, reduzindo a margem de manobra dos enxames de paraus que

saiam dos rios a atacar os navios mercan­tes. Das condições portuguesas constavam, no entanto, algumas exigências que o Samo­rim não hesitou em aceitar: deveria retirar o esporão a todos os seus navios próprios, e zelar para que, dos seus portos e rios, não saíssem corsários a atacar os portugueses ou os seus aliados. Aparentemente eram con­dições normais, embora todos soubessem que as condições para as cumprir não eram tão fáceis como o fluir das palavras no do­cumento assinado.

O Conde passou todo o período da mon­ção a preparar uma imensa armada para ir ao sul em Setembro e recebeu os navios do

reino com grande alegria, pela quantidade de gente que traziam para ficar na Índia, re­forçando as suas capacidades e, sobretudo, concorrendo para o cortejo que queria fazer no Malabar. Fez todas as diligências neces­sárias, entregando credenciais de governo ao Arcebispo e ao recém­nomeado capitão de Goa, Lopo Vaz de Sequeira (filho do go­vernador Diogo Lopes de Sequeira), e em Dezembro zarpou da barra com cerca de 140 navios e mais de 4000 homens. Diogo do Couto, que relata estes factos e que, al­guns anos mais tarde, veio a assumir po­sições muito críticas sobre a administração desastrosa e a penúria em que foi envolvi­do o governo da Índia, não poupa elogios a estas vagas de gente nova e, aparentemente, bem preparada, que chegava de Lisboa para reforçar a guarnição da Índia. Era da melhor soldadesca que alguma vez se vira no Orien­te, segundo ele diz. E é nos mesmos termos elogiosos que se refere a esta armada cuja missão era diplomática, onde valiam mais as sedas e brocados do que a rudeza das ar­maduras e o cheiro da pólvora.

Os navios passaram por Cananor – o lo­cal que fora o cerne da violência cerca de três anos antes – sem entrar nem se deter, e foram fundear em Tiracolle. Local hoje de­saparecido na evolução lagunar, certamente nas imediações de Calecut, num território sob jurisdição do Samorim. Diz o relato que a esquadra permaneceu embandeirada em arco, com toldos de várias cores, desembar­cando as gentes em trajes da melhor qua­lidade, ricos e vistosos, debaixo dos quais todos levavam suas armas, numa postura de prudência que era indispensável na Ín­dia. O acordo foi, de facto, assinado e até ce­lebrado com muitas festas, mas quando os

dois soberanos terminaram as suas vénias e mesuras, todas de acordo com o que recomendavam os costumes da Europa e da Índia, e se afastaram um do outro, var­reu­se­lhes qualquer preocu­pação de fazer cumprir o que tinham acordado. Não creio que qualquer deles tivesse outra preocupação do que salvaguardar as aparências que, no fundo, poupavam os grandes e dispendiosos em­penhamentos militares.

D. Francisco Coutinho foi a Cochim assistir à saída das naus do reino e visitar a fei­toria portuguesa, onde ainda não tinha estado, regressan­do a Goa tão depressa quanto pôde, “receoso dos noroestes”

que viriam com a estação. Aproximava­se do fim a vida agitada do antigo governador de Arzila, pressentindo o esfumar­se da energia de outros tempos. Planeava ir ao Achém no ano seguinte, e destruir o sultanato que tantos problemas causava a Malaca, sabendo ­se que enviou cartas ao capitão D. Francisco d’Eça, para que se preparasse com uma armada. Diz Diogo do Couto que passou toda a monção de 1563 a aparelhar os navios para o fazer, mas desistiu da empresa sem que se soubesse por que razão assim o decidiu. No princípio do ano de 1564 adoeceu subitamente e morreu a 19 de Fevereiro. Foi sepultado na igreja de S. Francisco, em Goa, e deixou testamentado que os seus ossos deveriam ser translada­dos para a vila do Redondo. Nas sucessões que foram abertas, coube o governo da Índia a João de Mendonça que assumiu o cargo pelos seis meses que faltavam, esperando­­se que nesse ano viesse novo vice­rei, como veio a acontecer.

J. Semedo de MatosCFR FZ

Muçulmanos de Cananor, inimigos tradicionais dos portugueses, e outras gentes do M alabar - Itinerário, Viagem ou Navegação – Jan Huygen Van Linschoten.

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Revista da aRmada • JULHo 2010 23

O Dia da Marinha de 2010 foi comemo-rado na Região Autónoma da Madeira, através da realização de diversas activi-

dades entre os dias 15 a 23 de Maio. Dessas actividades destaca-se a homenagem

aos Marinheiros Falecidos, realizada no dia 20 de Maio a bordo do N.R.P. “Cuanza”, com a bênção e o lançamento de uma coroa de flores no “Mar das Almas”, tendo para o efeito sido convidadas entidades oficiais, nomeadamen-te, o Representante da República, o Presidente da Assembleia Legislativa Regional, o Secretá-rio Regional do Recursos Humanos em repre-sentação do Presidente do Governo Regional, o Comandante Operacional da Madeira e o Vereador do Ambiente em representação do Presidente da Câmara Municipal do Funchal. No final da cerimónia, foi servido a bordo um Madeira de Honra.

Após esta homenagem, teve lugar na Forta-leza de São João do Pico, a Cerimónia Militar Comemorativa do Dia das Marinha 2010, presidida pelo Representante da República, Juíz Conselheiro Antero Alves Monteiro Diniz, e na qual estiveram pre-sentes entidades religiosas, civis e militares representativas da Região Autónoma da Madeira, de entre 60 convidados. Terminada a cerimó-nia, foi servido um almoço comemorativo.

Também no dia 20 de Maio, o N.R.P. “Cuanza” esteve aberto a vi-sitas durante a tarde, no cais Sul do Porto do Funchal, embandeirado em arco e, durante a noite, com iluminação de gala.

À semelhança de anos anteriores, as actividades náuticas asso-ciadas ao Dia da Marinha contaram com a colaboração de diversas Associações Náuticas da Região. Assim, no dia 15 de Maio, a Asso-

ciação Regional de Canoagem da Madeira or-ganizou várias provas de canoagem no Porto do Funchal. De igual modo, a Associação de Pesca Desportiva da RAM organizou também neste, dia uma prova de pesca desportiva, na Praia de Machico, assim como o Centro Treino Mar realizou uma regata de vela de cruzeiro, na baía do Funchal.

No dia 16 de Maio, tiveram lugar regatas de vela ligeira organizadas pelo Clube Naval do Funchal, realizadas na baía do Funchal, e pelo Clube Naval de Porto Santo na baía do Porto Santo. Neste dia, na Ribeira do Natal, no Caniçal, foi organizada uma prova de Jet-Sky, pela Associação de Jet-Sky e Motonáutica da Madeira. Em 22 de Maio, a Associação Náu-tica da Madeira realizou uma prova de Mini--modelos, na rampa de São Lázaro, no Porto do Funchal.

Nos dias 22 e 23 de Maio, foi ainda propor-cionado aos Agrupamentos de Escuteiros do Corpo Nacional de Es-cutas da Região Autónoma da Madeira, o embarque de jovens para “Baptismos de Mar”, a bordo do N.R.P. “Cuanza” e, esteve patente na Escola Básica e Secundária Gonçalves Zarco, uma exposição alu-siva às capacidades disponíveis da Marinha/Autoridade Marítima na RAM, associada a uma acção de divulgação da Marinha.

As comemorações do Dia da Marinha foram encerradas com a ce-rimónia de entrega de prémios aos melhores classificados das provas náuticas realizadas, a qual foi efectuada com a colaboração das As-sociações Náuticas envolvidas na organização das provas.

(Colaboração do COMANDO DA ZONA MARÍTIMA DA MADEIRA)

a cidade da Horta, na ilha do Faial, foi o palco principal das comemorações do Dia da Marinha na Região Autónoma

dos Açores em 2010. Nas restantes ilhas reali-zou-se um conjunto de actividades de carácter cultural, desportivo e demonstrações ilustrativas das capacidades da Marinha.

Desde o dia 15 decorreu um programa de actividades que envolveu a abertura dos faróis a visitas, a realização de regatas, um exercício de salvamento marítimo, acções de sensibilização nas escolas para aspectos de segurança a considerar no âmbito da época balnear que se aproxima e outras iniciativas junto dos pescadores com oferta de pastas de documentação organizadas com apoio das Capitanias.

No dia 20 de Maio, no largo em frente à Capitania do Porto da Hor-ta, as cerimónias militares iniciaram-se com o içar da Bandeira Nacio-nal acompanhada do Hino Nacional «A Portuguesa», com um pelotão a três secções da Estação Radionaval da Horta que prestou as devidas Honras Militares. Três militares e um civil foram condecorados no de-correr da cerimónia pelos serviços prestados à noss a instituição.

O CALM Mendes Calado, Comandante da Zona Marítima dos Açores, proferiu uma alocução acerca das múltiplas actividades desenvolvidas no âmbito do cumprimento da missão da Mari-nha nos Açores, na presença de vários convidados, entre os quais se encontrava o representante do Presidente do Governo Regio-nal dos Açores, o Presidente da Câmara Municipal da Horta, o

C omandante Operacional dos Açores, o C omandante da Zona Militar dos Açores, o representante do Comandante da Zona Aérea dos Açores entre outras entidades regionais e locais e ainda muito público anónimo assis-tiu à cerimónia.

Após a cerimónia militar no Largo Manuel de Arriaga foi efectuada a deposição de uma coroa de flores no monumento do Infante D. Henrique, na Praça da República.

Na Igreja de Nossa Senhora das Angústias foi celebrada uma missa em homenagem aos marinheiros. No decorrer da liturgia houve coro e música de câmara dirigida pelo director do Conservatório Regional da Horta, o maestro Yuri Pavtchinski.

Ainda no âmbito das comemorações, da Capitania do Porto da Horta foi lançado um selo alusivo ao Dia da Marinha nos Açores, cuja imagem é a bonita e renovada fachada da Capitania do Porto da Horta, com a emissão limitada de trezentos selos.

As celebrações do Dia da Marinha na cidade da Horta foram en-cerradas com um almoço oferecido pelo Comandante da Zona Marí-tima dos Açores, a todas as entidades convidadas, a bordo do N.R.P. “João Coutinho”.

O N.R.P. ”João Coutinho” esteve atracado e aberto ao público nos dias 14 e 15 de Maio.

(Colaboração do COMANDO DA ZONA MARÍTIMA DOS AÇORES)

Dia da Marinha na Madeira

Dia da Marinha nos Açores

Dia da Marinha na Madeira

Dia da Marinha nos Açores

ECOS DO DIA DA MARINHA

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24 JULHO 2010 • Revista da aRmada

TOMADAS DE POSSE

l Realizou-se no passado dia 15 de Abril pelas 12,00, na Casa da Balança, a tomada de posse do novo Superintendente dos Serviços do Pes-soal, VALM Bonifácio Lopes em substituição do VALM Vilas Boas Tavares. A cerimónia foi pre-sidida pelo Chefe de Estado-Maior da Armada, Almirante Melo Gomes e estiveram presentes as mais altas entidades da Marinha bem como ou-tros oficiais, sargentos, praças e civis.

Do discurso do novo Superintendente dos Ser-viços do Pessoal é de realçar a referência aos pi-lares em que a gestão das pessoas, que servem na Marinha, deve assentar, conforme se trans-creve. “ ... rigor e transparência de procedimentos, consistência no exercício das competências e diálogo com os responsáveis das outras áreas funcionais, para encontrar as melhores soluções que garantam o funcionamento de cada elemento orgânico, no quadro restritivo em que a gestão de efectivos se deve concretizar...”

Como elemento ilustrativo do empenho em tornar o Sistema de Gestão de Recursos Humanos uma referência referiu que” ... a recente e marcante obtenção da certificação do Sistema de Gestão de Recursos humanos da Marinha, de acordo com a Norma Por-tuguesa 4427:2004, a qual muito contribuiu para a consolidação de uma perspectiva estratégica daquele sistema e lhe imprimiu, entre muitas outras vantagens, um carácter modelar, que será fundamental manter, no âmbito das Forças Armadas...”

Ao longo do seu discurso a tónica principal recaiu naqueles que servem actualmente a Marinha como Militares, Militarizados e Ci-vis e nesse sentido referiu que”... importa, pois encontrar formas de incrementar a satisfação do pessoal quer através de um método generali-zado e sistemático de acompanhamento individualizado e aconselhamento

de percursos funcionais coerentes, motivadores e com potencial de carreira, quer através da promoção de um ambiente profissional, de relações humanas e de traba-lho que assegurem o êxito pessoal, o reconhecimento do contributo individual para o sucesso da Marinha e um adequado balanceamento entre os requisitos do serviço e os associados ao apoio familiar ...”.

Por último e não menos importante fez uma re-ferência muito precisa às alterações em curso no que à Saúde Naval diz respeito e o seu real impac-te nos Militares Militarizados e suas famílias.

Após discurso do novo SSP o Almirante Chefe do Estado-Maior da Armada proferiu uma alo-cução onde manifestou a sua confiança no novo Superintendente dos Serviços do Pessoal.

l Realizou-se em 25 de Março no Gabinete do VALM SSP, a Tomada de Posse do novo Direc-tor do Serviço de Pessoal, CALM Casqueiro de Sampaio, em substituição do CALM António José Bonifácio Lopes. A cerimónia foi presidida pelo SSP VALM Vilas Boas Tavares e contou com a presença de oficiais, sargentos, praças e civis da SSP e DSP, entre outros convidados.

Após leitura da Ordem da Armada, usou da palavra o novo CALM DSP destacando-se o se-guinte do seu discurso:

“A mudança de liderança não altera a missão das organizações, mas altera sempre as suas dinâmicas internas, visto estar investida no seu líder a respon-sabilidade e o dever de criar as condições e sinergias necessárias para poder concretizar da melhor forma possível os objectivos estabelecidos.

A minha prioridade de acção será sempre tentar encontrar, na área da minha responsabilidade, as melhores soluções para que a missão da Superintendência de dotar a Marinha com os recursos humanos neces-sários e adequados seja concretizada com sucesso, mantendo, no entan-to, presente que as pessoas que servem a Marinha são o seu melhor e mais importante recurso.

... sobre a estrutura organizacional da DSP, para que possam ser en-contradas soluções organizacionais que permitam, sem por em causa a necessária segurança das rotinas já existentes, maior consistência nos processos desenvolvidos e, em simultâneo, um melhor aproveita-

mento dos recursos humanos existentes na estrutu-ra da DSP.”

Após discurso do novo DSP, o VALM Vilas Boas Tavares, proferiu uma alocução em que, essencialmente, manifestou a sua confiança no novo Director dos Serviços de Pessoal.

Superintendente doS ServiçoS do peSSoal

director do Serviço de peSSoal

O Vice-almirante António José Bonifácio Lopes frequentou o Curso de Marinha da EN, especializou-se em Navegação e possui, o CGNG e uma Pós-Graduação no Naval Command College (NWC-EUA).

Esteve embarcado em várias Unidades Navais, tendo comandado os NRP’s “Limpopo” e “Álvares Cabral”. Foi Oficial Imediato dos NRP’s “Quanza” e “Ál-vares Cabral”, desempenhou funções de Chefe do Serviço de Navegação nos NRP’S “Alm Gago Coutinho”, “João Belo” e “Sagres”.

Em terra desempenhou funções de Instrutor de Cálculos Náuticos na EN, e exerceu os cargos de Chefe da Divisão de Métodos de Navegação no IH, Chefe do Serviço de Instrução e Treino/Chefe do Departamento de Treino e Avaliação na Flotilha, Comandante da Esquadrilha de Escoltas Oceânicos, TC-740 Branch Head, Scientific Programms of Work Coordination, no HQ SACT, (EUA).

Durante o desempenho de funções na Flotilha e na Esquadrilha de Escol-tas Oceânicos exerceu em acumulação, os cargos de CEM e de Comandante do Grupo-Tarefa Naval Português. Mais recentemente exerceu o cargo de Chefe da Repartição de Oficiais da DSP e posteriormente o cargo de Director do Serviço de Pessoal.

Da sua folha de serviços constam vários louvores e condecorações.

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O CALM Rui Manuel Costa Casqueiro de Sampaio nasceu em Dili, Timor, e ingressou na Escola Naval, tendo sido pro-movido a G/M em OUT81.

Cumpriu, comissões de embarque, como oficial imediato dos N.R.P’s. “Rosário”, “Zaire“ e “Mandovi”. Especializou--se em Artilharia Naval, tendo posteriormente desempenha-do funções, como Chefe de Serviço de Artilharia a bordo do N.R.P. “Cte Roberto Ivens”. Prestou ainda serviço na Escola de Artilharia Naval, inicialmente como instrutor e mais tar-de, como Director.

Foi instrutor do CITAN. Embarcou como Chefe do Depar-tamento de Operações do N.R.P. “Corte Real”. Em JAN97, foi nomeado Chefe da Secção de Exercícios da Divisão de Operações do CN e, mais tarde, Chefe da mesma Divisão.

Após comissão na DSP – Rep. de Sarg. e Praças, comandou o N.R.P. “Cte Her-menegildo Capelo”. Em JUN04, foi nomeado 2º Cte do G2EA e, manteve as mes-mas funções na Escola de Tecnologias Navais (ETNA).

Comandou a ETNA de FEV2005 a JUL08. Frequentou o CPOG 2008/2009, ten-do assumido as funções de Chefe da RSP em JUL09, até ao corrente ano..

Ao longo de toda a sua carreira participou em duas STANAVFORLANT e em vários exercícios nacionais e internacionais do âmbito da NATO e da “EUROMAR-FOR”. Comandou ainda a componente naval do exercício “Lusíada 2003”.

Foi agraciado ao longo da carreira com diversos louvores e condecorações.

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Revista da aRmada • JULHO 2010 25

l O VALM Ramos da Silva tomou posse do cargo de Director-Geral do Instituto Hidro-gráfico em cerimónia que decorreu no passa-do dia 7 de Abril, na Casa da Balança, tendo presidido o CEMA, ALM Melo Gomes. Estive-ram presentes membros do governo, as mais altas entidades da Marinha, representantes de organismos científicos e Universidades, bem como oficiais, sargentos, praças e civis daque-le organismo.

No uso da palavra, o novo Director-geral real çou:“(…) Sendo um orgão da Marinha na directa dependência do Almirante

Chefe do Estado-Maior da Armada e, nos termos da Lei, um Laboratório do Estado,o Instituto Hidrográfico, cujas orientações estratégicas são definidas e o acompanhamento da sua execução exercidos pelo MDN em articulação com o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, tem por missão: Assegurar as actividades de investigação e desenvolvimento relacionadas com as ciências e as tecnologias do mar, designadamente nas áreas da hidrografia, da cartografia hidrográfica, da oceanografia, da segurança da navegação, da oceanografia operacional e na defesa do meio marinho, tendo em vista a sua aplicação na área militar e contribuir para o desenvolvimento do País nas áreas científicas da investigação do mar. (...)“

“...Numa abordagem mais sintética, na esteira do que tem vindo a ser feito, o que é visado é o IH, órgão da Marinha, constituir-se e consolidar-se como um Centro de referência no conhecimento e na investigação do mar, ao servi-ço do desenvolvimento do País. (...)”

Por último, o CEMA encerrou a cerimónia referindo designada-mente:

“(...) O Instituto Hidrográfico é um órgão muito especial da Marinha que

está na vanguarda das ciências e investigação do mar, onde o conhecimento científico existente cons-titui um imprescindível contributo para o país nas áreas da hidrografia, da cartografia hidrográfica e da segurança da navegação, contribuindo para a nossa riqueza e prestígio. (...)”

“…agregando valências integrantes da Ma-rinha e únicas no País, de que se destacam os Navios Hidrográficos, possui uma mais-valia es-tratégica que permite uma relação custo eficácia

nunca atingível com outra solução. (...)”

O VALM Agostinho Ramos da Silva nasceu no Funchal, em 1951, ingressou na Escola Naval e foi promovido a Guarda-marinha em Outubro de 1974.

Especializou-se em Hidrografia em 1980. Frequentou o CGNG (1987), o CCNG (2001), o Curso de Defesa Nacional (2003-4) e o Curso Superior Naval de Guerra (2004-5)

Prestou serviço embarcado em vários navios da Armada, no NRP “Jacinto Cândi-do”, no NRP “Pereira da Silva”, no navio de apoio a mergulhadores NRP “S. Roque” e no navio hidrográfico NRP “Afonso de Albuquerque”, tendo comandado os navios patrulha NRP “Geba” e NRP “Cunene” e a corveta NRP “António Enes”.

Em terra, ligado ao Instituto Hidrográfico (IH), chefiou as Brigadas Hidrográficas nº 1 e nº 2, as Divisões de Cartografia Náutica, de Levantamentos Hidrográficos, de Navegação e, foi ainda, Director Técnico e Assessor do Director-geral.

Noutras áreas, prestou serviço na Divisão de Logística do Material (DIVLOGMAT) do Estado-Maior da Armada (EMA), na Divisão de Segurança Marítima da DGM, chefiou a Repartição de Oficiais da DSP e a DIVLOGMAT do EMA.

Em 2AGO06, tomou posse de Comandante da Zona Marítima dos Açores, Di-rector do Centro Coordenador de Busca e Salvamento Marítimo (MRCC) de Ponta Delgada, Chefe do Departamento Marítimo dos Açores e Comandante Regional da Polícia Marítima.

Da sua folha de serviços constam vários louvores e condecorações.

ENTREGA DE COMANDO

TOMADA DE POSSE

l Presidida pelo Almirante CEMA, reali-zou-se no passado dia 14 de Abril, a ceri-mónia de entrega de Comando da Escola Naval. O cerimonial marítimo iniciou-se com a chegada do Almirante CEMA que foi recebido pelo então Comandante da Escola Naval – VALM Macieira Fragoso e pelo Corpo Docente. Estiveram presentes, ainda, múltiplas entidades: representantes dos estabelecimentos superiores ligados à EN (entre outros o Presidente da Sociedade de Geografia de Lisboa, o Director do Instituto Superior de Ciências da Informação e Administração, o Director da Faculdade de Ciên cias e Tec-nologia – UNL, o Comandante da Academia da Força Aérea), antigos comandantes, oficiais generais e superiores da Marinha.

A cerimónia militar iniciou-se com as tradicionais honras militares, ao Almirante CEMA, pelo Batalhão do Corpo de Alunos formado no auditório, em face das desfavoráveis condições meteorológicas. O Co-mandante cessante, na sua alocução, realçou que durante o seu coman-do a Escola Naval se adequou ao conjunto de normativos do Processo de Bolonha. Deste processo fez parte: a adequação e registo dos Planos de Estudos dos cursos universitários pela Direcção-Geral do Ensino Su-perior, bem como a sua preparação para a Agência Nacional de Acre-ditação do Ensino Superior; a atribuição, pela primeira vez, do grau de mestre aos cadetes e o grau de licenciado ao ensino politécnico; a cria-ção do Centro de Investigação Naval; a criação de condições para um intercâmbio académico entre as Escolas Navais congéneres europeias e; o aprofundamento da cooperação com as instituições universitárias ou

politécnicas nacionais. A leitura da Ordem do Dia à Escola Naval incluiu uma conde-coração ao comandante cessante.

O CALM Seabra de Melo, Comandante empossado, mencionou na sua “Carta de Missão” que o novo Comandante se pro-põe consolidar as reformas recentemente edificadas: o novo modelo de organização do ensino superior, o Centro de Investiga-ção Naval e o novo Estatuto da EN. No seu discurso estabeleceu, ainda, as linhas

de a cção para o futuro: «1) Valorizar a especificidade de ensino da Esco-la Naval; 2) Investir nos professores e nos alunos cadetes […] e 3) Reforçar a abertura ao exterior». Terminou a sua alocução sublinhando que «A formação académica universitária deve sustentar, no princípio de carreira, sobretudo o seu desempenho operacional». Por fim, o Almirante CEMA, na sua alocução, recuperou a sua visão para a Escola Naval - um es-tabelecimento universitário de excelência pela qualidade da sua for-mação académica, pela inovação da sua produção científica e rigor organizacional, mas também pela integridade de carácter, sentido de serviço e espírito de corpo dos que nela se formam. Afirmou, também, que a entrega do Comando da Escola Naval é o momento apropriado para avaliar as circunstâncias envolventes e desenvolver as necessá-rias adaptações dando prioridade à qualificação, inovação, eficácia, tecnologia e conhecimento; considerando, ainda, que a especificida-de da Escola Naval está na formação de militares e marinheiros. A efeméride encerrou com um “Porto de Honra” servido no átrio do auditório da EN.

COMANDANTE DA ESCOLA NAVAL

DIRECTOR-GERAL DO INSTITUTO HIDROGRÁFICO

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26 JULHO 2010 • Revista da aRmada

Em mais um ciclo de palestras temá-ticas, a Academia de Marinha pro-moveu no passado mês de Abril as

“J ornadas sobre Construção Naval”.Sob a coordenação do engenheiro cons-

trutor naval CFR Óscar Filgueiras Mota, foram apresentadas três conferências, se-guidas de debate, nos dias 13, 20 e 27 de Abril, tendo-se procurado atingir dois ob-jectivos:

- Dar a conhecer a capacidade e possibi-lidades da indústria naval nacional

- Contribuir para melhorar a cooperação entre a Marinha e a indústria.

Intitulada «O complexo da indústria naval», a primeira conferência foi apre-sentada pelo engenheiro construtor naval CALM António Balcão Reis, Mem-bro Correspon-dente da Acade-mia de Marinha.

C e n t r a n d o a sua exposição nos pilares da Indús-tria, dos Serviços e da Formação, o orador começou por fazer o retra-to da realidade do sector e da sua evolução nas últi-mas décadas, refe-rindo o percurso dos principais estaleiros, as pequenas empresas de construção e reparação, a subcontratação e a indústria auxiliar naval. Prosseguiu com os Servi-ços, destacando o papel das Sociedades de classificação, dos Gabinetes de projecto e do Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos. No terceiro pilar, o da Forma-ção, o orador falou do Instituto Superior Técnico – salientando a sua importância enquanto principal centro de formação em engenharia naval do país e, em senti-do restrito, a única sede de tal ensino, da Escola Naval e da Escola Náutica.

Tendo apontado alguns dos que consi-dera serem os principais problemas exis-tentes, o conferencista expressou a sua preocupação pelo caminho que tem vin-do a ser seguido, mas também disse acre-ditar que é possível reverter a situação. No debate subsequente, a maioria das intervenções teve um tom pessimista, apontando o que teriam sido os erros do passado, no geral em concordância com o que havia sido dito na palestra. A finalizar a sessão, o Presidente Vieira Matias disse ser preciso recusar o derrotis-mo, pois era inaceitável que a nossa tradi-

ção de construção naval de mais de meio milénio de história pudesse desaparecer. Apelou ao empenho de todos no senti-do de contribuir para encontrar soluções e procurar sinergias, recusando o confor-mismo e a desistência.

A segunda conferência, «A componen-te industrial», foi apresentada pelo en-genheiro construtor naval CALM Victor Gonçalves de Brito. Começando pela ver-tente da construção naval, falou da im-portância da capacidade do projecto, da escolha dos fornecedores, do valor acres-centado a nível nacional e da obtenção de navios para a Armada – a Marinha é hoje o principal “armador” nacional, dis-se. Sobre a vertente da reparação naval,

sublinhou a complexidade específica da manutenção dos navios da Armada e dos modelos adoptados. Depois de elencar os factores de competitividade dos estalei-ros, o orador terminou a sua exposição com uma reflexão sobre a sustentabili-dade da indústria naval no nosso país, manifestando a sua convicção de “que a indústria naval em Portugal pode ser cre-dível e competitiva”, desde que assegura-das certas premissas.

No debate que se seguiu, o prolonga-do círculo vicioso de estudos – por força de sucessivas leis de programação militar – e expectativas frustradas, foi apontado como uma das causas que mais obstaculi-zaram a concretização daquilo que todos pretendem: a satisfação das necessidades próprias da Armada e o desejável desen-volvimento e internacionalização da in-dústria da construção naval portuguesa. A encerrar a sessão, o Presidente Vieira Matias congratulou-se pela nota de opti-mismo deixada pelo orador na sua ava-liação do potencial da construção naval no nosso país.

A apresentação da conferência «Os problemas e as soluções», terceir a e

última no âmbito das Jornadas so-b re C o n s t r u ç ã o N a v a l , c o u b e a o coor denador do ciclo, o engenheiro constru tor naval Óscar Mota, Mem-bro Efectivo da Academia de Marinha. Fez o diagnóstico dos principais proble-mas que têm afectado o sector e apontou o caminho da sua resolução. Planeamen-to a longo prazo, continuidade na cons-trução naval, reforço de quadros no Arse-nal, abertura das escolas da Marinha ao exterior, reforço do diálogo da Marinha com as empresas de construção e repa-ração naval, aposta no nicho de mercado das embarcações de recreio, são apenas algumas das medidas que o orador pre-conizou para revitalizar a indústria e ala-

vancar a sua inter-nacionalização. O debate f ina l não revelou dis-cordâncias na as-sistência, no es-sencial, quanto às razões das dificul-dades e à forma de as ultrapassar. Foi mesmo con-sensual a opiniã o de que o maior pro b lem a – na medida da gran-de importância

que as encomendas da Armada têm para a construção naval – tem sido a incon-sistência do planeamento a longo pra-zo no reapetrechamento da Marinha, em resultado da falta de uma sustenta-ção política coerente por parte da tutela. A terminar a sessão, o Presidente Vieira Matias congratulou-se pela qualidade das comunicações e das intervenções da assis-tência ao longo das Jornadas, reforçando algumas das ideias-chave referidas pelo engenheiro Óscar Mota, designadamente a importância do nicho da navegação de recreio. Recusando-se a aceitar o definha-mento da nossa tradição de construção naval, de mais de seis séculos, o almiran-te Vieira Matias disse ser essencial que, à semelhança do que acontece noutros pa-íses, exista e seja consistentemente sus-tentado pelo poder político um plano de reapetrechamento da Marinha, pensado para o longo prazo.

Os textos das conferências e da síntese das Jornadas estão disponíveis na página da Marinha na internet, em Academia de Marinha.

(Colaboração da ACADEMIA DE MARINHA)

Jornadas sobre Construção NavalJornadas sobre Construção Naval

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CALM ECN António Balcão Reis. CALM ECN Vitor Gonçalves de Brito. CFR ECN Óscar Mota.

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Revista da aRmada • JULHo 2010 27

l A circulação intensa de petroleiros, inade-quados e obsoletos, vai ser realizada perto das nossas águas. É de relembrar que os piores episódios de poluição deveram-se a derra-mes involuntários por acidentes em ou com navios, que constitui um tipo de poluição que provoca prejuízos ambientais incalculáveis.

O grande derrame ou maré negra, provo-cado pelo afundamento do N/T “Prestige”, em Novembro de 2002, que afectou seriamen-te as costas da Galiza, em Espanha, teve, nas operações de recolha de produto poluente em alto-mar, a participação activa do NRP “BACAMARTE”

Mais recentemente, com os encalhes do “S. Gabriel”, na costa sul da Ilha de S. Miguel, em Novembro de 2009, e do “CP Valour”, na Baía das Cabras, Ilha do Faial, em De-zembro de 2005, as marés negras poderiam ter provocado devastadoras consequências ambientais e económicas, tais como o desa-parecimento de diversas espécies marinhas, vegetais e animais, a contaminação dos solos, os custos gigantescos de limpeza e a quebra de receitas turísticas no Arquipélago dos Açores não fosse a pronta intervenção do Serviço de Combate à Poluição do Mar por Hidrocarbonetos (SCPMH), serviço técnico central da Direcção Geral da Autoridade Marítima (DGAM), especializado no combate à poluição no mar.

Nas duas ocorrências, procedeu-se à trasfega de parte do combustí-vel e da carga. Na Ilha do Faial, para além do anteriormente indicado, procedeu-se a operações de limpeza nas zonas de costa afectadas.

Do sentido de assegurar uma eficaz capacidade de combate à po-luição no mar, decorreu a necessidade de adaptar o N.R.P. “Bacamar-te” para o combate à poluição do mar por Hidrocarbonetos (HC´s). Este navio tornou-se o primeiro meio naval da Marinha Portuguesa preparado para o combate à poluição. Na adaptação do N.R.P. “Ba-camarte”, considerou-se, para esse fim, a instalação a bordo de um recuperador mecânico, uma barreira flutuante e de quatro cisternas de armazenamento.

EQUIPAMENTO DE COMBATE À POLUIÇÃOO sistema de contenção e recolha de poluentes, “V-SWEEP”, foi con-

cebido para ser instalado a estibordo (EB) do navio. O “V-SWEEP” é

constituído, essencialmente, por um recupera-dor mecânico e uma barreira flutuante.

A barreira flutuante é instalada lateralmen-te ao navio, por intermédio de um braço seg-mentado, com cerca de doze metros de com-primento. O braço, construído em alumínio, é constituído por três segmentos, com cerca de quatro metros de comprimento cada. Uma vez instalado o braço, perpendicularmente ao costado, o navio deverá deslocar-se com uma velocidade máxima de avanço entre 1 e 1 ½ nós e assim colectar e concentrar os resíduos poluentes através das barreiras flutuantes, para, posteriormente, serem recolhidos.

Adicionalmente, é utilizado um recupe-rador mecânico de discos “skimmer” para recolher o poluente e bombeá-lo para os dis-positivos de armazenamento a bordo. O re-cuperador mecânico de discos é posicionado no centro da barreira flutuante de contenção e recolha.

Em missão, os poluentes são recolhidos do mar pelo recuperador e enviados para as

quatro cisternas contentorizadas. Em condições normais, cada um, dos quatro contentores/tanque, permite armazenar cerca de 21,7 [M3] de poluente. A capacidade de armazenamento total, no navio, é cerca de 104 [Ton] de crude. Nesta condição de navio carregado, com carga no poço, o deslocamento total é de cerca de 670 [Ton], o qual corresponde a uma imersão média de 1,35 [m].

“É de realçar que o NRP “Bacamarte” se tornou o primeiro na-vio de combate à poluição do mar da Marinha. Este tipo de navio, uma lancha de desembarque, reúne importantes qualidades para o combate à poluição do mar, um sistema de contenção e recolha, ca-pacidade de armazenamento, capacidade de transporte de material e a capacidade de transportar material até locais da costa com difícil acesso por terra. Tipicamente, trata-se de um tipo de navio pouco sofisticado e pouco oneroso, mas muito válido para operações de recolha no mar até algumas centenas de toneladas de poluente”1.

(Colaboração do COMANDO DO NRP ”BACAMARTE”)

Nota:1 Exercício de Combate à poluição do mar “Espadarte 2009”. Revista de Mari-

nha, nº 953, CMG ECN Silva Paulo. Dezembro 2009/Janeiro 2010

NOTÍCIA

NRP “BACAMARTE” – COMBATE A POLUIÇÃO NO MAR

Recuperador mecânico de discos e barreira flutuante.

Sistema “V-Sweep” de combate à poluição no mar – Braço e Barreiras flutuantes.

VIGIA DA HISTÓRIA 23

NAVEGANDO

No decurso da questão das Molucas (1) D. João III promoveu a audição de várias individualidades, em especial de téc-nicos, tanto de navegação como de cosmografia.

A opinião do Duque de Bragança, por representar a de alguém que não se insiria em qualquer daquelas categorias, assume a meu ver, a visão crítica de um “outsider” que poderá contribuir para ajudar a fazer luz nalguns aspectos nem sempre claramen-te analisados.

Escrevia o Duque, em 1542, referindo-se às cartas de navegação:“Nom se emendam também porque nom há hi viagem que se

faça daqui aa India que os pilotos e marinheiros e pessoas que carteam em hua mesma não nom sejao diferentes na estimativa e huns se fazem aquem de um cabo e outros com cem legoas alem

delle e outros com trezentas allem asy que há muitas vezes defe-rença nos mesmos pilotos que vão em hua nao de cincoenta, de cento e de duzentas e trezentas legoas segundo o Golfão que atra-vessão. E muitas vezes vaão mais certos os que menos sabem que os mui grandes pilotos como se vê cada dia por experiência.

Com. E. GomesNota:

(1) A questão das Molucas foi originada pela dúvida quanto à situação geográ-fica daquele arquipélago, fonte abastecedora do cravo, relativamente ao acorda-do no Tratado de Tordesilhas.

Fonte:Gavetas Torre do Tombo XVIII-5-3

NAVEGANDO

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l Recentemente os Escuteiros Marí­timos do Agrupamento 1197 do CNE – Açores, voltaram a embarcar no veleiro navio – escola inglês “Stavros Niarchos” da Tall Ship Youth Trust. Foi mais uma edição das actividades “O Mar que nos Chama” e “O Mar que nos Une,” iniciativa esta que, desde a primeira hora, há oito anos atrás, tem sido apoiada e acarinhada pela Mari­nha de Guerra Portuguesa, nomeada­mente através do Comando da Zona Marítima dos Açores e através das vá­rias Capita nias a çorianas.

Participaram neste cruzeiro, para além dos escuteiros marítimos, vários escuteiros terrestres e alguns jovens em situação de risco, sob a tutela de várias instituições, nesta que tem sido uma clara aposta do Governo Regional dos Açores, num “regresso ao mar”. O cruzeiro pas­sou pelas ilhas: S. Miguel, Faial, S. Jorge e Graciosa e vários dirigentes e companheiros do Escutismo d esempenharam a bordo diversas fun­ções de oficiais do navio.

Na véspera da partida, o CALM Mendes Calado, Comandante da Zona Marítima dos Açores, visitou o veleiro. Esteve, de novo presente a bordo, acompanhado pelo Capitão do Porto de Ponta Delgada, CMG João Gonçalves, depois do final do cruzeiro, na cerimónia de promessas dos novos escuteiros marítimos. Nesta cerimónia, ambos foram convi­dados a impor diversas distinções a jovens escuteiros e o CALM Men­des Calado, que apadrinhou a promessa de um escuteiro marítimo, di­rigiu uma mensagem, que foi muito apreciada, a todos os presentes.

A convite do Comandante João Gonçalves, vários escuteiros marí­timos, embarcaram na “lancha” do Instituto de Socorros a Náufragos,

“Nossa Senhora da Boa Viagem”, no dia 28 de Março, para acompanharem a saída do porto, do veleiro “Stavros”. A bordo tiveram uma lição de ma­rinhagem, tendo inclusive lavado a embarcação.

Por este “Mar que nos c haMa” e que nos une: a grande aventura.

Os Escuteiros Marítimos de Ponta Del-gada, responderam a mais um chamamen-to de Neptuno e voltaram para o mar, pois .navegar é preciso.

De facto o cruzeiro SSN417 foi uma aventura, em que participaram, para além do contingente de 28 açorianos, ainda 40 ingleses. O veleiro à saída de Ponta Delgada enfrentou mar rijo e ventos de proa. Claro que para muitos dos aventureiros lá começou o enjoo...

Ainda por cima foi a motor, pelo sul do Pico, até ao Faial. Aí visitou­­se: os Capelinhos e o Museu de “Scrim­Shaw” do Peter e claro...hou­ve festa no Peters Bar! Depois foi tempo de rumar a S. Jorge e de se fa­zer uma arriscada atracagem no porto das Velas, de novo de baixo de mau tempo e com alguns golfinhos à mistura. Depois de uma noite embalada pelo lento marulhar das ondas, no abrigado porto das Velas, seguiu­se para a Graciosa, onde se visitou a Furna do Enxofre e se deu uma volta à ilha. A bordo dos “Stavros” foi tempo de receber os escu­teiros amigos daquela ilha. No regresso a S. Miguel fez­se uma óptima vela e enfrentou­se um violento temporal de força 8, estando o porto “fechado” à chegada dos aventureiros.

Luis Filipe Machado Fotos de Luís Machado e de Marco Cidade

NOTÍCIASA MArinhA ApoiA o EscutisMo MArítiMo nos AçorEs

Revista da aRmada • JULHO 2010 29

l E de repente se passaram 50 anos sobre a data de entrada para a Escola Naval do Curso “Luís de Camões”.

Éramos 58 jovens mancebos, cheios de sonhos, e a nós se junta­ram posteriormente mais 13 cadetes oriundos do anterior curso “D. João I”.

Entretanto alguns saíram e outros passaram para o curso seguinte, e no final, em Janeiro de 1964 , éramos apenas 50.

Cada um teve o seu percurso de vida, dentro da Marinha ou fora dela, já que alguns foram optando por outro caminho na vida civil, dispersando­nos por multiplas paragens e bem diferentes e absorven­tes actividades navais ou civis.

A chegada da Reforma que a todos já atingiu trouxe­nos agora o tempo e a disponibilidade para o reencontro, que temos vindo a ali­mentar, procurando disfrutar de tudo aquilo que nos une, em perió­dicos almoços mensais.

Alguns infelizmente já nos deixaram, mas permanecem bem vivos na nossa memória.

A data que assinala este 50º Aniversário justifica contudo uma ade­quada comemoração.

Essas Comemorações serão repartidas em 3 tempos:Em OUT 2010 - Na ESCOLA NAVAL comemorando a nossa entrada.

- Em CONSTÂNCIA homenageando CamõesEm OUT 2012 - A bordo do NE “SAGRES”, comemorando os 50

anos da sua viagem inaugural na Marinha Portuguesa, que foi tam­bém a 1ª viagem de instrução do Curso, e ali colocando uma placa alusiva.

Edição do Livro de Curso. Edição de CD com fotografias.Em JAN 2014 - Jantar comemorando os 50 anos de saída da Escola

Naval e correspondente promoção a Guarda­marinha.

PROGRAMA Dia 1 Outubro 2010, 6ª. feira09.45 ­ Concentração dos elementos do curso à entrada do Mosteiro dos

Jerónimos10.00 ­ Homenagem a Luís Camões, com evocação dos camaradas falecidos10.45 ­ Partida para a Escola Naval (em autocarro)11.35 ­ Cumprimentos ao Comandante. Assinatura Livro de Honra. Apre­

sentação da EN.12.20 ­ Desfile do Corpo de Alunos. Fotografia do Curso na Escadaria

Principal.12.40 ­ Consulta de Documentação do Curso13.00 ­ Almoço na Camarinha do Comandante14.30 ­ Descerramento de Placa Comemorativa no Átrio do Corpo de

Alunos14.45 ­ Visita às Instalações Internato Novo. 15.55 ­ Lição Comemorativa no Auditório Pequeno.

Dia 2 Outubro 2010, Sábado09.45 ­ Doca da Marinha ­ Partida para Constância. (em autocarro da

Marinha)11.30 ­ Chegada a Constância. Recepção pelo Presidente da Câmara. ­ Descerramento de Placa Comemorativa ­ Visita guiada ao Jardim das Especiarias. Alusão histórica à ligação

com Camões.13.00 ­ Almoço no Restaurante Quinta de Santa Bárbara 15.30 ­ Visita ao Centro de Ciência Viva de Constância17.30 ­ Regresso a Lisboa em autocarro com chegada prevista às 19.00

Dia 6 Outubro 2010, 4ª. feira12.00 ­ Cumprimentos ao ALM. CEMA por uma delegação do Curso

coMEMorAçÕEs Do 50º AniVErsÁrio Do curso “Luis DE cAMÕEs” 1960 - 2010

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30 JULHO 2010 • Revista da aRmada

voltei à escola. Um grupo pequeno, num curso concentrado em três meses. Apre-senta a heterogenia – na formação de

base – que enriquece a Marinha: engenheiros, hidrógrafos, informáticos e um piloto aviador naval. Os temas são variados – vão desde os campos das ciências sociais, aos campos da operacionalidade, economia e temas de cariz geopolítico mundial e nacional. Fazer um curso destes é rever alguns camaradas, antigos com-panheiros de embarque, outros, que passamos a conhecer e a reconhecer como amigos…

Estamos num espaço físico distinto. Vamos chamar-lhe “integrado” – na falta de outro termo que exemplifique melhor o sentimento que lá se vive. Há muito verde e pavões, que não gostam de carros vermelhos e fazem sentir os seus pios, exóticos, a tempos regulares. É um investimento na cultura, do qual me interessam mais os temas de cariz social e da geopolítica mundial – que me apaixona…

Ocorreu-me, aqui e hoje, falar da geoestra-tégia que interessa particularmente aos médi-cos – cuja missão deve ser aliviar o sofrimento – e da qual também tenho vários exemplos de um conhecimento tão profundo, que chega a ser doloroso… Portugal, aliás como toda a Eu-ropa, passou a estar no imaginário paradisíaco de muitas pessoas que vivem em países pobres – particularmente de África (…um continente, dizem muitos, esquecido pelos homens e por Deus…). Na Amadora, cidade onde habito, vivem muitos destes cidadãos do mundo e as histórias que contam são um exemplo da geo-estratégia perversa, que afecta muitos e, por ex-tensão, também nos envolve …

Conheci, há não muito tempo, um cidadão da República do Congo. Foi-me enviado por um pároco de uma freguesia periférica dos dormi-tórios de Lisboa. Tinha um problema congénito de coração. Tratava-se de uma situação relativa-mente comum, habitualmente tratada antes da adolescência. O referido cidadão, procurou aju-da junto da igreja, porque não conhecia mais ninguém a quem recorrer. A minha participa-ção foi pequena. Um ecocardiograma que fez o diagnóstico e a referência a um cirurgião cardía-co, que resolveu definitivamente a questão.

Na conversa de circunstância que alternava entre um mau francês (o meu) e um mau por-tuguês (o dele), quis saber como se tinha fixa-do em Portugal. A sua viagem é um exemplo da geoestratégia moderna, que o mundo glo-balizado proporcionou. Teria sido obrigado por um senhor-de-guerra local a trabalhar em mi-nas no meio da selva. Foi-me difícil perceber o que se extraía nessas minas. Fiquei, contudo, a perceber que se tratava de um mineral usado para fazer material electrónico: telemóveis, por exemplo. De toda a forma, o paciente congolês, era muito mal tratado, ao nível da escravidão. Decidiu fugir e iniciou uma odisseia por mar e

terra, que o levaria a atravessar o con-tinente...

Fugiu, com ou-tros dois através da selva do seu Congo Natal até Cabinda. Em Cabinda viveu cerca de um ano. Conseguiu traba-lho num terminal de uma grande companhia petro-lífera ocidental. Fa-zia tudo o que lhe pediam, cozinhou, limpou tanques de navios, fez de estivador… fez tudo o que lhe foi requi-sitado. Quando conseguiu algum dinheiro su-bornou um capitão de um petroleiro, homem do Leste Europeu, que o transportou até Dakar, no Senegal (ele tinha ouvido que daí era fácil chegar à Europa…).

No Senegal as coisas não lhe correram nada bem. Viveu do pouco dinheiro que tinha con-seguido amealhar e quando este acabou, pro-curou viver de pequenos trabalhos – mas ha-veriam milhares como ele, na mesma ânsia de partir para Norte. Esteve em Dakar cerca de dois anos. Passou fome. Por fim, juntou algum dinheiro e ganhou coragem para se juntar aos grupos que faziam a viagem, através do gran-de deserto…

Partiu de Dakar à noite (e a partir dai, ele e os seus companheiros, viajaram quase sempre a coberto da escuridão). Sobreviveu ao deserto do Saara, mas testemunhou muitas mortes, de ou-tros menos robustos do que ele. Chegou à Libía, onde esteve detido durante algum tempo. Quan-do saiu do centro de detenção, trabalhou, mais uma vez, em tudo o que lhe pediam. Subornou mais alguém. Fez a viagem por mar até Marrocos. Em Marrocos esteve ainda mais um ano. Quando juntou dinheiro atravessou o estreito de Gibraltar até Espanha, onde mais uma vez chegou a cober-to da noite a uma praia de Algeciras…

Trabalhou durante um Verão na apanha da fruta, no Sul de Espanha escaldante. Não gostou. Estava ilegal e sentiu-se perseguido. Atravessou a fronteira de Portugal, num autocarro normal – era dia – ninguém lhe perguntou nada. Chegou ao Rossio, em Lisboa. Travou conversa com al-guns guineenses que falavam francês. Ao outro dia trabalhava nas obras. Esteve assim, ilegal, durante cerca de três anos. Primeiro dormia lá, na própria obra. Depois, quando a fiscalização dos ilegais apertou no local de trabalho, cons-truiu uma casa precária naquele bairro emble-mático da emigração em Portugal chamado “Cova da Moura”. Aproveitou, só recentemente, as facilidades de legalização para regularizar a sua situa ção em Portugal entretanto, na mesma medida em que ia envelhecendo, começou a

cansar-se fisicamente….O ciclo fechou-se e chegou ao pároco em questão e daí até esta conversa e a esta história...

Voltemos ao curso, enquanto ouvia um e outro conferencista sobre a geoestratégia do mundo, as relações Norte-Sul e toda a sorte de operações de apoio à paz, ocorreu-me a histó-ria deste homem. - Bem real e pungente de so-frimento. Ocorreu-me que é sobre esta dinâmi-ca de seres humanos, sobre a qual deveríamos meditar. A história deste homem quebra vários mitos. O primeiro é de que os europeus estão isentos de culpa, no que diz respeito às desgra-ças a que os africanos humildes sofrem e de que são os governos africanos os únicos culpados. Na verdade, são os interesses ocidentais (petró-leo, pedras preciosas e, pelos vistos, até compo-nentes minerais para a electrónica…), que ditam essas desgraças através de um apoio parcial a este ou aquele governante…Por outro lado, há que reconhecê-lo, poucos governos ocidentais (e até outra potência emergente, com grande influência em África: a China), se preocupam muito com a qualidade do governo deste ou da-quele dirigente africano, desde que no terreno os seus interesses estejam salvaguardados. Ora eu admito que civicamente deveríamos intervir. Na verdade, sou adepto daquela máxima que o tempo honrou: “para que o mal vença, basta que os homens de bem não façam nada” e tem sido em larga medida esta a atitude do mundo desenvolvido em relação a África…

Esta história prova outra coisa. A atitude mais ou menos hipócrita que os países têm tido em relação à emigração africana. Todos acham que devia ser regulada. Todos acham que é necessá-ria, mas na realidade pouco tem sido feito nes-se sentido. Não há uma verdadeira integração desses emigrantes – que são responsabilidade de todos. Crescem os bairros de lata. Cresce a violência e no final todos sofrem mais ainda: os emigrantes e os locais, que vêm alterada num ápice (menos do que uma geração) a moldura humana e cultural das suas comunidades. Indis-cutivelmente os africanos prefeririam ficar nas suas terras, sem se sujeitar a viagens que duram anos, cheias de risco até para a própria vida. Os

HISTÓRIAS DA BOTICA (76)

O curso …e a geoestratégia dos pequenos…O curso …e a geoestratégia dos pequenos…

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eh pá! Já fiz duas comissões na Pedra do Feitiço!

É com esta pilhéria ou outras de cariz semelhante que, ainda hoje, os fuzileiros mais antigos tentam impressionar os mais modernos acerca da sua pretensa antiguidade. Ficou-lhes o jeito das conversas repetidamente ouvidas du-rante as longas noites de serviço ou à roda das mesas de bar em que, os que andaram por terras de Santo António do Zaire, agora Soyo, nas déca-das de 60 e 70, davam largas à sua imaginação e contavam as suas aventuras africanas em relatos naturalmente envolvidos em al-guma fantasia mas, no essencial, próximos da dura realidade que a guerra impunha e, também, com o mesmo intuito de impres-sionar a atenta assistência.

Os fuzileiros de todos os tempos habituaram-se a ouvir falar da Pedra do Feitiço como se de um local mítico se tra-tasse onde todas as incursões, mesmo que imaginárias, são permitidas e tão válidas como as mais perigo-sas operações reais.

Quando o tema é a Pedra do Feitiço, tudo se aceita e tudo se tolera numa complacência e tolerância quase doutrinárias.

Memórias de outros cenários de África per-manecem, também, bem vivas nas conversas entre fuzileiros. Basta dar uma vista de olhos pelos muitos “blogs” criados pela comunidade FZ espalhada pelo mundo para o constatar mas parece-nos que, uma das que mais pontua no imaginário FZ, é mesmo a Pedra.

Por isso, foi com uma ponta de emoção que, no dia 5 de Dezembro de 2009, seis Fuzileiros Portugueses demandaram e desembarcaram na Pedra do Feitiço.

A oportunidade surgiu da necessidade de, no âmbito da Cooperação Técnico-Militar, verificar as condições de treino bilateral na área opera-cional onde o Batalhão FZ Angolano mantém o seu dispositivo com a missão de patrulhar e fiscalizar o rio Zaire, desde a Foz até Noqui, para conter a infiltração de estrangeiros ilegais vindos da Republica Democrática do Congo ou de outros países a norte.

Mudaram os tempos, mudou o contexto mas a missão dos Fuzileiros, no essencial, mantém-se naquela zona de fronteira estraté-gica para Angola.

O dia 5 de Dezembro de 2009 nasceu cin-zento, parecendo querer carregar, ainda mais, a

emoção que de todos nós se apoderara. O co-mandante Loureiro Nunes (LN), uma espécie de patrocinador e cicerone, que, cumprindo mis-são na Pedra do Feitiço, ali passou dois anos da sua juventude, exteriorizava essa mesma emo-ção “ rapaziada se eu começar a falar demais, dêem-me um toque”. E vários toques….foram necessários tal a vontade de tudo dizer, de tudo mostrar, enfim, de tudo reviver.

Acompanhados pelo comandante Bamba, comandante do Corpo de Fuzileiros de Angola e outros oficiais angolanos, largámos da Base

Naval do Soyo e aí vamos nós, rio acima, em duas lanchas cedidas pelo LN que, qual velho marujo, manobrava habilmente uma delas. Má-xima velocidade! Temos pela frente 60 milhas e não podemos deixar de fazer uma rápida passa-gem pela Ilha da Kissanga para cumprimentar os Fuzos que guarnecem aquela posição. Jamais nos perdoariam tendo em conta o isolamento em que se encontram.

Vencendo a fortíssima corrente, somos envol-vidos pela beleza do mangal que, numa paleta policromática, avança pela margem continua-mente ponteada de pequenos povoados de pes-cadores. Casas, tipo palafita, assentes em estacas cravadas em chão de “mabanga” sobrepõem-se à água. Porquê? Será para aproveitar o fresco das águas? Questões de segurança? Talvez?

A paragem na ilha da Kissanga foi rápida mas valeu a pena. Cenário idílico que tivemos de deixar para trás. O objectivo principal estava ainda bastante longe.

Uma chuva quente e forte deixou-nos enchar-cados até aos ossos mas nada de desânimos. O magnífico sol africano se encarregará de resol-ver o problema logo a seguir.

A vista espraia-se pelo imenso estuário e, ao longe, começa a vislumbrar-se a Pedra do Feitiço num cenário magnífico de calmaria das águas, do verde da vegetação que nelas se reflecte e das construções em anfiteatro numa ponta de terra que termina em enormes roche-

dos. Espectacular!Saltamos para terra, estamos na Pedra do Fei-

tiço. Um nervoso miudinho invade-nos a todos. Passado o impacto inicial soltam-se as emoções e é um tropel de informações que o LN come-ça a debitar. Parecia que ainda lá estava em co-missão tal o realismo dos seus relatos. Mas os vestígios da passagem dos fuzileiros portugueses por aquelas paragens são ainda bem evidentes e preservados e falam por si. Os fuzileiros ango-lanos respeitam o passado preservando as ins-crições, os registos pessoais e, em suma, tudo

o que se relaciona com a nossa passagem por aquele local.

Mais calmos, sentados debai-xo do cajueiro grande, bebe-mos uma cuca (cerveja ango-lana de grandes tradições) em fraterno convívio com os fuzi-leiros angolanos, apreciando a tranquilidade do local, olhando o rio espelhado e vivendo aque-le momento místico, provavel-mente irrepetível para nós.

Rapazes! Temos de regressar! Era a voz do LN …. Apesar da corrente, agora a favor, temos as tais sessenta milhas para percorrer e o almoço com o Vice-Almirante Comandante da Região Naval Norte, no Soyo, não espera.

Deixamos a Pedra do Feitiço com a alma lavada, na plena consciência de que, ao fazer esta visita, homenageamos, muito justamente, tantos quantos por aqui passaram, estejam eles onde estiverem.

Agradecimentos: À Marinha de Guerra Angolana que auto-

rizou a missão e a apoiou através da preciosa colaboração do Comandante da Região Naval Norte, VALM Valentim Alberto António.

Agradecimento emocionado ao comandan-te Loureiro Nunes cujo apoio com meios, dis-ponibilidade pessoal e saber, foi fundamental para o sucesso do empreendimento a que nos propusemos.

Participaram nesta expedição pela parte Por-tuguesa:

- CMG FZ Loureiro Nunes- CFR FZ Benjamim Correia- CTEN FZ Clemente Gil- 2TEN ST FZ Figueiredo Pereira- 1SAR FZ Basílio Perfeito- CAB FZ Correia Alvélos

Uma colaboração da Cooperação Técnico-Militar com Angola – Projecto 8 - Marinha

Revista da aRmada • JULHO 2010 31

europeus deveriam reconhecer que precisam de emigrantes e criar-lhes as condições para uma integração com regras humanas – e não explorá--los ilegalmente, como tem sido apanágio de um paradigma deste desenvolvimento selva-gem, que já não é sustentável e cujos resultados estão agora bem a descoberto…

Vou “aterrar a nave” como nos pede o piloto

aviador do curso sempre que filosofamos em demasia. Passadas duas semanas da sua cirurgia o congolês agradeceu-me de uma forma muito singela, certamente característica da sua cultu-ra e afirmou “vous êtes mon frère”… Meditei sobre aquela frase e achei que seria um orgulho ser considerado um irmão de um homem tão corajoso como aquele…

Também meditei sobre o interesse e opor-tunidade deste curso… Em relação a isso diga lá o leitor anónimo, depois de ler esta história, se o curso não me tem sido útil para compreender exemplos destes, da geoestra-tégia mundial?

Doc

Fuzileiros portugueses voltam à “Pedra do Feitiço”Fuzileiros portugueses voltam à “Pedra do Feitiço”

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Revista da aRmada • JULHO 2010 33

QUARTO DE FOLGA

JOGUEMOS O BRIDGEJOGUEMOS O BRIDGEProblema Nº 131

W-E vuln. S joga o contrato de 6♥, recebendo a saída a ♦R. Diga em que linha gostaria de estar sentado para marcar pontos na sua coluna.

SOLUÇÕES: PROBLEMA Nº 131A resposta será na linha N-S, pois o contrato é cumprível, conforme vamos verificar no desenvolvimento que se segue: faz o A e joga trunfo para a passagem ao R que resulta; volta ao morto com ♠ para o A e repete a passagem; bate ♥A onde cai o R e joga mais 2 trunfos, chegando à seguinte posição: N – ♠R32 ♣A54, E – ♠D108 ♣DV9, S – ♠6 ♥86 ♣873 e W – ♠V9 ♦DV ♣R10; joga então outro trunfo, balda um ♣ no morto e E estará squeezado entre ♠ e ♣, pois se balda uma ♠ permite que S apure a 3ª♠ do morto, jogando para o R e cortando outra, e dará apenas um ♣ do morto (3♠+7♥+1♦+1♣); se baldar um ♣, S vai jogar A e outro que dá, e apurar o 8 da sua mão para a 12ª vaza (2♠+7♥+1♦+2♣).

Nunes MarquesCALM AN

Oeste (W):

V94

7

RDV9743

R10

Este (E):

D1087

R54

102

DV96

Norte (N):

AR32

32

A65

A542

65

Sul (S):

ADV10986

8

873

PALAVRAS CRUZADASProblema Nº 414

PALAVRAS CRUZADAS

123456789

1011

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11

HORiZONtais: 1 – Parte da zoologia que se ocupa das aranhas. 2 – Tribunal pontifí-cio, que resolve os pleitos sobre benefícios; leite, na confusão. 3 – Nome que os Mu-çulmanos dão ao seu Deus; soaram. 4 – O mesmo que o; senhor em inglês; capital de Timor-Leste. 5 – Província do sudeste da Áustria; grande porção. 6 – Jovens. 7 – Nota musical (pl); sisinio na confusão. 8 – Rezas; ligo; símb. quím. do astato. 9 – Em que há relva; título do bispo, em algumas igrejas orientais. 10 – Falta uma para ser maatma; capital do Bangladash, no delta do Ganges (inv). 11 – Capital da Alsácia.

veRtiCais: 1 – Semelhante à aranha. 2 – Macho da rola; medidas de uma superfí-cie. 3 – Fruto da ateira; peças com que se estreitam as aberturas dos chapéus (inv). 4 – Entre nós; consentimento; quatro letras de trovas. 5 – Espécie de enguias; gosto muito (inv). 6 – O mais conhecido dos trinta tiranos estabelecidos em Atena s pelos Espartanos. 7 – Atilhocidade de Itália, no vale de Aosta. 8 – Deão, na confusão; planta apiácea; símb. quím. do ouro. 9 – Administrar; no princípio de acrómio. 10 – Natural da itália; espécie de capote com capuz e mangas (inv). 11 – Arquipélago da Melanésia, ao norte da Nova Guiné.

SOLUÇÕES: PALAVRAS CRUZADAS Nº 414HORiZONtais: 1 – Aracnologia. 2 – Rota; Ieetl. 3 – Ala; Ecoaram. 4 – No; Sir; Dili. 5 – Estiria; Ror. 6 – Mocos. 7 – Fas; Sisiion. 8 – Oras; Ato; At. 9 – Relvosa; Aba. 10 – Maatm; Acad. 11 – Estrasburgo.

veRtiCais: 1 – Araneiforme. 2 – Rolos; Areas. 3 – Ata; Salat. 4 – Ca; Sim; Svtr. 5 – Eiros; Oma. 6 – Cricias. 7 – Lio; Aosta. 8 – Oead; Sio; Au. 9 – Gerir; Acr. 10 – Italo; Oabag. 11 – Almirantado.

Carmo Pinto1TEN REF

l O Instituto Hidrográfico inaugurou no passado dia 28 de Maio uma Exposição de Faróis subordinada ao tema “Faróis, Sentinelas do Mar – a arte de manter acesa a luz que guia o navegante”, integrada nas comemorações do Cinquentená-rio daquele organismo da Marinha. A iniciativa conta com a colaboração da Direcção de Faróis e está instalada no Sa-lão Nobre.

Entre as peças expostas que despertaram particular inte-resse do público, salienta-se uma magnífica réplica do Farol do Cabo Espichel, prismas de reflexão, lanternas e aparelhos ópticos e de relojoaria.

A inauguração da referida exposição contou com a presença do Director da Revista da Armada e do Director da Direcção de Faróis, além dos funcionários militares e civis do Instituto Hidrográfico que a visitaram no momento da abertura.

NOTÍCIAFARÓIS ASSINALAM CINQUENTENÁRIO

DO INSTITUTO HIDROGRÁFICO

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34 JULHO 2010 • Revista da aRmada

NOTÍCIAS PESSOAIS

RESERVA

CFR SEH João Augusto Grade Monteiro CFR SEH Rui Manuel Perdigão dos Santos Coelho CFR José Carlos Santos Fretes CFR EMA Célio Diniz Ferreira Leite SMOR A António Carlos Amorim Rocha SMOR TF Florên­cio da Silva SMOR E José Domingos Gomes Coutinho SCH ETC Luís Ma­nuel Siborro Alves SCH A Carlos Alberto Nogueira Ribeiro Sequeira CAB A Bernardino da Silva Pinto.

REFORMA

CMG Duarte José Cruz da Costa Centeno CMG Mário Pedro Vieira Barbu­do CMG Octávio dos Santos Costa Correia CTEN SFE Abel dos Anjos Fer­

FALECIMENTOS

CMG REF Carlos Alberto Garcia Dias 1TEN OTS REF Francisco do Carmo Pinto 1TEN OTS REF Manuel de Oliveira Gomes SAJ T. REF Francisco An­tónio Dias SAJ A REF Marcolino Bogalho SAJ CM REF José Junqueiro Ro­sado CAB TFD RES José Augusto Ramos Silva CAB CCT Eduardo Jorge Batuca Catalão AG 1ª CLS APOS Joaquim Rodrigues Nunes.

COMANDOS E CARGOSNOMEAÇÕES

CFR Paulo Jorge da Conceição Lopes nomeado comandante da Esquadrilha de Helicópteros CFR Rui Filipe Cebola Amado nomeado capitão do Porto da Figuei­ra da Foz em substituição do CFR Eduardo Jorge Malaquias Domingues CTEN Humberto Renato da Silva Rocha nomeado capitão do Porto da Póvoa de Varzim e de Vila do Conde, em substituição do CTEN Manuel Ernesto Sá Coutinho.

nandes 1TEN SEL José Manuel da Graça Campos 1TEN OT João André SMOR CE Jorge Manuel Ferreira SMOR FZ Luís António Valério Machado SMOR B José Manuel Ferreira Nogueira SCH FZ Manuel Augusto de Olivei­ra e Costa SCH CE Mário Martins Rodrigues SCH E João Ferreira Machado SCH ETA Manuel António Carvalho Santos SAJ TF Joaquim Martins Rosa­do SAJ M Aurélio Xavier Afonso SAJ A João Manuel Veigas Codices SAJ CM António José Gafaniz SAJ A José Guilherme Costa Marcelino SAJ SE José Arnaldo da Costa Pereira SAJ FZ Joaquim Caeiro Vitória SAJ A Car­los Costa Rodrigues SAJ CM Manuel João Coelho Prates 1 SAR E Abílio Joaquim Antunes 1SAR CM Francisco Inácio Crispim Patrício 1SAR CM José Luís Gomes dos Reis, 1SAR FZ Joaquim Tavares Martins 1SAR MQ Pau­lo Jorge Parra Bagarrão CAB FZ António Manuel dos Santos CAB R Luís Manuel Amaro Dias CAB R António Gonçalves Caridade CAB A Luís An­tónio Palma Mendes da Costa CAB L José Manuel Marques da Silva CAB CM António Gabriel Carreira Pinheiro CAB L Acácio Manuel Nunes Gomes Ladeira CAB TFD Joaquim Gaspar Neves Cardoso da Silva.

CONVÍVIOS

Em 22MAI10 rea­lizou­se o IX Conví­vio de Marinheiros de Meda tendo par­ticipado cerca de 70 pessoas incluindo seus familiares. Do programa constou uma Recepção no Sa­lão Nobre da Câmara Municipal de Meda, tendo sido recebidos por dois vereadores, seguindo ­se a visita ao Museu Municipal. Após uma singela ce­

rimónia da deposição de coroa de flores no Monumento ao Ex­Comba­tente, seguiu­se um almoço/convívio no restaurante das Piscinas Mu­nicipais. De tarde visitou­se a aldeia histórica de Marialva e as termas de Longroiva, sempre acompanhados respectivamente por um guia municipal e um engenheiro das termas. Terminou o convívio com um lanche no Parque de Campismo com a música do Coro de Marinheiros e o desejo de que para o ano uma nova reunião se venha a realizar.

MARINHEIROS DE MEDA

Realizou­­se no passa­do dia 10 de J u n h o u m a visita à BNL pelos ex­com­batentes bei­rões de Man­gualde.

O convívio, que decorreu em ambiente de sã camaradagem, constou de várias visitas nomeadamente à fragata “Álvares Cabral”, ETNA, Base de Fuzileiros e Escola de Fuzileiros, onde tiveram a oportunidade de visitar o Museu do Fuzileiro.

EX-COMBATENTES BEIRÕES DE MANGUALDE

NÚCLEO DE FUZILEIROS DOS TEMPLÁRIOS

“FILHOS DA ESCOLA” DE SETEMBRO DE 1964

Os “Filhos da Escola” de Setembro de 1964 vão comemo­rar o 46º aniversário de incorporação na Armada, desta vez com uma peregrinação a Fátima, serviço religioso livre, no dia 25 de Setembro, seguindo­se uma visita às grutas de Sto. António (Mira D`Aire) e almoço­convívio no “Restau­rante a Gralha”.

Inscrições até 20 de Setembro. Para mais informações contactar:­ Fernando Inácio, CMG ­ Res. Tel:212 961 837 / 964 016 487;­ Manuel Raposo, SMOR ­ Ref. Tel: 212 536 280 / 964 044 289.

Realizou­se no passado dia 1 de Maio, o 14º almoço­convívio dos Fuzileiros dos Templários,

na Quinta dos Azinhais, Casal da Azinheira, Tomar.O convívio, que contou com cerca de 50 camaradas com respec­

tivas famílias, con­tou também com a presença do Al­mirante do Corpo de Fuzileiros, do Comandante da Base de Fuzileiros e do Comandante da Escola de Fuzi­leiros.

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7. O COntratOrpedeirO “dOurO”

Navios da RepúblicaNavios da República

No início da segunda década do século XX a Marinha Portuguesa precisava de ter meios capazes de enfrentar a ameaça dos torpedei-ros, navios cuja eficácia tinha sido comprovada em marinhas estran-geiras e alterado as tradicionais tácticas navais.

Após acaloradas discussões, em que interveio decisivamente o então capitão-tenente Leotte do Rego, um dos principais defensores da entrada de Portugal na Grande Guerra, foi encomendado ao Ar-senal da Marinha um novo tipo de navio – o contratorpedeiro – cuja construção se iniciou em Fevereiro de 1911. Denominado “Douro” foi lançado à água em Janeiro de 13, numa cerimónia presidida pelo Presidente da República, Dr. Manuel Arriaga que colocou a mão na roda de proa, num gesto simbólico de o empurrar para a água dizendo “Em nome da Pátria e da República desejo-te uma carreira feliz”

O “Douro” foi o primeiro de uma série de quatro contratorpedeiros, todos construídos no Arsenal da Marinha, (“Guadiana” – 1914, “Vou-ga” – 1920 e “Tâmega” - 1922), dando por isso o nome à classe.

Aumentado ao Efectivo dos Navios da Armada em 13 de Junho de 1913, possuía as seguintes ca-racterísticas:Deslocamento ..........670 toneladasComprimento (fora a fora) .............. ....................................... 73 metrosBoca .................................7 “Calado .......................... 2,3 “Velocidade máxima ............ 27 nósVelocidade de cruzeiro ........13 “Autonomia ................. 1600 milhas

O seu armamento compreendia 1 peça Armstrong de 100 mm, 2 de 76 mm e 2 tubos lança-torpedos de 450 mm. Para propulsão tinha 3 caldeiras “Yarrow”, utilizando carvão, 3 turbinas “Parsons” com potência de 11.000 cavalos. A lotação era de 73 homens.

A sua vida operacional, que durou apenas 14 anos, compreende três períodos. O primeiro começa logo em Agosto de 1913 quando efectua provas de mar e saídas para treino da guarnição. Em Maio de 1914 inicia missões de patrulha e fiscalização por toda a costa portu-guesa que durarão cerca de dois anos. Pratica principalmente os por-tos de Leixões, Figueira da Foz, Cascais, Setúbal, Sesimbra e Lagos.

Entretanto, a Grande Guerra deflagra, os navios alemães recebem ordens, do seu governo, para demandar portos neutrais e assim, um apreciável número de navios daquela nacionalidade abriga-se em portos portugueses. O “Douro”, algumas vezes acompanhado do contratorpedeiro “Guadiana”, ao serviço desde Maio de 1915, passa a ter missões nas aproximações do Porto de Lisboa e a utilizar uma amarração fixa frente ao Dafundo.

O segundo período tem o seu início com a entrada de Portugal na guerra. Em 23 de Fevereiro de 1916 o “Douro” embarcando o capitão--de-fragata Leotte do Rego, comandante de Divisão Naval de Defesa e Instrução e acompanhado do “Guadiana” e dos torpedeiros “1” e “2”, procede à apreensão de navios alemães, acção esta que leva a Alemanha, a 9 de Março, a declarar guerra a Portugal.

Continua o “Douro” a patrulhar a costa ficando por vezes respon-sável pelo serviço de vigilância entre S. Julião e Belém. Em Outu-bro de 1916 efectua exercícios de tiro e lançamento de torpedos ao largo de Cascais.

Forma-se então o Corpo Expedicionário Português (CEP) que é deslocado para França a bordo dos transportes “Pedro Nunes” e “Gil Eanes”, escoltados pelos dois únicos contratorpedeiros da Armada, o “Douro” e o “Guadiana”.

Com largada de Lisboa a 21 de Abril de 1917 o “Douro” parte

para a sua 1ª viagem ao serviço do CEP. Comboia o “Pedro Nunes” até Brest escala a seguir Devonport, o porto militar de Plymouth e regressa a Lisboa a 11 de Maio.

A 2ª viagem, de 12 de Julho a 2 de Agosto, é semelhante à an-terior e na 3ª de 27 de Agosto a 20 de Setembro, apenas pratica o porto de Brest.

Entre estas duas últimas viagens escolta o paquete “Beira” até 280 milhas da barra do Tejo.

Segue-se um interregno nas missões a França, já que se torna ne-cessário reforçar a escolta a navios de passageiros entre o Continente e Ilhas, área atlântica onde atacavam com frequência os submarinos alemães. Assim, apoia o “Lourenço Marques” até ao Funchal e deste porto o “S. Miguel”, a Ponta Delgada e Lisboa.

A 4ª viagem, decorre de 17 de Novembro de 1917 a 22 de De-zembro, mais uma vez escoltando o “Pedro Nunes”, com a particu-laridade de, após praticar Devonport, voltar a Brest antes do regres-so a Lisboa. Segue-se uma escolta ao “Moçâmedes”, do Funchal

para Lisboa.A 5ª viagem é de 14 de Feverei-

ro de 1918 a 10 de Abril, além de escalar os portos habituais, Brest e Devonport, pratica pela primeira vez Portsmouth,. tendo escoltado o “Pedro Nunes” e o “Gil Eanes” para Lisboa.

Na 6ª viagem de 17 de Maio de 1918 a 26 do mesmo mês apenas escala Brest.

De 7 de Junho a 19 de Julho é a 7ª viagem que volta a incluir Portsmouth e pela primeira vez Cherburgo.

A Grande Guerra aproxima-se do fim e por consequência o “Dou-ro” efectua a sua 8ª e última viagem a França. Larga de Lisboa a 28 de Setembro e só regressa a 13 de Fevereiro de 1919. Nesta missão pratica pela primeira vez os portos de Nantes e S. Nazaire e escolta o “Pedro Nunes” deste porto até Plymouth, Portsmouth e Southampton onde, de 6 de Novembro a 17 de Janeiro de 1919, efectua fabricos. É também em Southampton que assiste a entusiásticas manifestações de regozijo popular em 11 de Novembro de 1918, data da assinatura do Armisticio que põe fim à Guerra.

Fevereiro de 1919 é o princípio do terceiro e último período do seu historial. Retoma a patrulha e a fiscalização da costa, escalando os principais portos do Continente, ocasionalmente navega até à Ma-deira e aos Açores, e efectua numerosas manobras integrado na Força Naval de Exercícios. Saliente-se as que decorreram na costa do Algar-ve em Julho e Agosto de 1925, durante as quais realiza exercícios de defesa de portos, artilharia, lançamento de minas e de torpedos.

A última actividade de relevo em que participou foi a 25 de Setem-bro de 1925, em Vila Franca de Xira, quando da inauguração da Base de Flotilha Ligeira, cerimónia presidida pelo Ministro da Marinha, capi-tão-de-fragata Pereira da Silva, a bordo do cruzador “Carvalho Araújo” e na presença dos contratorpedeiros “Douro”,“Guadiana”, “Vouga” e “Tâmega” e dos torpedeiros “Ave”, “Lis”, “Sado” e “Mondego”.

Sucederam nos anos 30 aos contratorpedeiros da classe “Douro”, os da classe “Vouga”. Este tipo de navio manteve-se como navio de linha da Marinha Portuguesa durante três décadas e meia, isto é, até à chegada, em 1949, das primeiras fragatas – a “Diogo Gomes” e a “Nuno Tristão”.

J. L. Leiria PintoCALM

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14 Janeiro 2003 • Revista da aRmada

7. O COntratOrpedeirO “dOurO”

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