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Simpósios XIV Congresso Da ABRALIC
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SIMPSIOS TEMTICOS
1. Sistema literrio e representaes da sociedade brasileira: desdobramentos contemporneos
Eleonora Ziller Camenietzki (UFRJ)
Irensia Torres de Oliveira (UFC)
Na Formao da literatura brasileira, Antonio Candido relacionou o estabelecimento de uma esfera letrada
especificamente literria no pas com a fora impulsionadora de um projeto nacional, que se esboava
desde o Arcadismo. Nesse sentido, a literatura brasileira surgia sob o trao dominante do empenho, ou seja,
do desejo de intelectuais e escritores de criar para a nao uma instituio literria prpria, com traos
particulares que a distinguissem de outras literaturas nacionais, como a portuguesa, por exemplo. A
considerao da relevncia do projeto nacional na formao do sistema literrio mobilizando autores,
obras e pblicos permitiu ver continuidades entre o Arcadismo e o Romantismo onde a histria literria
consagrara sobretudo rupturas, reaes e conflitos, que existiam mas no explicavam tudo. Nesse processo,
Candido descreve a formao de uma tradio literria brasileira, que se consolida com o aparecimento da
obra de Machado de Assis, na qual j se pressupem as obras de seus antecessores. Esse pressuposto em
uma tradio ainda incipiente seria mesmo, para o crtico, uma das razes da qualidade da obra de
Machado. Ao assimilar, aprofundar, fecundar o legado positivo das experincias anteriores, o escritor
lograra preservar sua independncia em relao aos influxos das literaturas estrangeiras de prestgio e forjar
um lugar prprio na dialtica entre localismo e cosmopolitismo, que era talvez a dinmica mais bsica de
nossa produo cultural erudita naquele momento. Roberto Schwarz parte da ideia de Candido, de um
escritor do sculo XIX que faz obra genial por se situar adequadamente na dialtica entre localismo e
cosmopolitismo, e persegue essa dialtica no plano mesmo da composio das obras de Machado de Assis.
De maneira muito acurada, o crtico analisa como a forma literria dos romances internalizam essa
dinmica, que passa a organizar a matria representada a sociedade brasileira , expondo-a, como se
propunha o romance realista, a uma visada crtica. Sem se isolar do mundo e se provincianizar, ao
contrrio, fazendo literatura ostensivamente universal, Machado conseguira trazer para o centro dos
romances os problemas culturais e sociais brasileiros mais profundos, situando-os na atualidade do mundo
contemporneo, sem concesses ao amor prprio nacional, por um lado, nem ao prestgio europeu, por
outro. Os estudos de Candido e de Schwarz fazem parte de um esforo mais amplo para analisar, descrever
e compreender as relaes histricas entre formas literrias e processos sociais, no contexto brasileiro, na
periferia do capitalismo. No demais acrescentar que eles constituem um patamar alto nesse tipo de
estudos, porque passam longe de toda forma de mecanicismo ou paralelismo no tratamento de literatura e
sociedade e impressionam pela independncia em relao a jarges e mtodos prvios. Sem forar a nota,
pode-se aproxim-los, no campo de suas contribuies e temticas, a autores da tradio de crtica
marxista, como Georg Lukcs; da Teoria Crtica, como Walter Benjamin e Theodor Adorno; da crtica de
orientao comparatista e histrica, como Erich Auerbach; assim como a importantes referncias nos
estudos materialistas de cultura, como Raymond Williams e o historiador E. P. Thompson. A proposta
deste simpsio acolher estudos que se situem no esforo de compreenso da dinmica cultural brasileira,
pressupondo assim uma concepo social e histrica das produes e formas artsticas. Numa ampla gama
de eixos temticos possveis, pretende-se abarcar reflexes que indaguem os termos, passados e presentes,
do funcionamento de um sistema literrio brasileiro, assim como de uma historiografia da literatura
brasileira, comparando diferentes modelos de abordagem crtica do assunto; a extenso e os limites do
conceito de cultura, tendo como referncia a tradio crtica materialista; o problema, recorrente, da relao
campo-cidade na formao da literatura, da cultura e da sociedade no Brasil, moderno e antigo, discutindo
o alcance e os limites do regionalismo, assim como os termos crticos para se pensar a experincia urbana
na literatura brasileira, enfocando com cuidado as dcadas mais recentes, em que o assunto ganha
contornos novos, dada a acelerada urbanizao e modernizao do pas; a formao da moderna poesia
brasileira, tendo como campo de foras a relao entre arcaico e moderno, tradio e ruptura, o velho e o
novo configurando o material elaborado pelos poetas do nosso pas; a relao entre cinema e literatura,
msica e poesia. Pretende-se com isso incrementar o acmulo crtico e divulgar pesquisas sobre produes
da literatura e da cultura brasileira, em sua relao com o universo da modernidade e da
contemporaneidade, do ngulo dialtico que concilia a considerao das formas estticas e culturais a
especificidades de processos sociais passados e presentes.
2. O Brasil e o Sul Global
Anita Martins Rodrigues de Moraes (UFF)
Alfredo Cesar Barbosa de Melo
O simpsio O Brasil e o Sul Global tem como objetivo discutir, em carter exploratrio, possveis
caminhos para os estudos de literatura comparada no Brasil, levando em conta a crescente importncia dos
debates em torno da insero do Brasil no Sul Global. Pretendemos examinar paradigmas alternativos para
o comparativismo brasileiro, na tentativa de compreender a cultura brasileira para alm do bastante
produtivo paradigma da formao, focado na autonomia das formas literrias brasileiras frente ao centro
europeu. Ao dar um sinal positivo na diferena da cultura brasileira diante da Europa algo que os
modernistas haviam j feito no plano artstico , a gerao de crticos literrios da segunda metade do
sculo XX talvez tenha dado, dessa maneira, sua mais valiosa contribuio aos estudos de literatura
comparada no Brasil: a relativizao da hierarquia entre centro e periferia. Construram assim o grande
paradigma do comparativismo brasileiro: o paradigma da antropofagia modernista, da ressignificao do
legado cultural europeu por parte do letrado brasileiro, visto agora como ativo e autnomo produtor de
cultura. Lembremos que na Formao da Literatura Brasileira (1959) Antonio Candido sugere ser Machado
de Assis um atestado de maturidade do sistema literrio nacional justamente por ter se valido dos esforos
de romancistas brasileiros anteriores, como Jos de Alencar e Manuel Antonio de Almeida. Assim, a
literatura brasileira se revela formada quando uma tradio interna se instala. Por ter um substrato literrio
prprio nacional do qual partir, Machado teria tido melhores condies que seus predecessores,
tornando-se menos dependente das literaturas estrangeiras e, por essa mesma razo, podendo dialogar
melhor com elas (evitando a cpia servil). Visibilizando processos importantes, este paradigma da
formao tende, parece-nos, a privilegiar o momento da autonomizao em detrimento do momento da
relao entre literaturas. Algo semelhante pode ser visto na obra de Roberto Schwarz, que j no seu
primeiro estudo de flego sobre Machado de Assis, disserta sobre as ideias fora do lugar. Todo o
argumento do famoso ensaio de Schwarz est estruturado em bases comparatistas. Para Schwarz, o
liberalismo seria uma ideologia de segundo grau pois, no Brasil, o discurso liberal no apresentava
qualquer verossimilhana ao tentar mascarar o processo social de explorao. Na Europa, o discurso liberal
correspondia s aparncias da vida social, precisando da contra-intuio de um Marx para revelar a sua
lgica; enquanto no Brasil, devido escravido, a qualquer transeunte o discurso liberal soaria
grotescamente falso. A partir desse arcabouo conceitual eminentemente comparativo, Schwarz estuda as
dificuldades de importao do romance no Brasil sobretudo na obra de Jos de Alencar para finalmente
analisar a maneira como Machado de Assis consegue transformar gradualmente os pressupostos sociais do
Brasil bastante diversos dos europeus em triunfos formais do melhor romance brasileiro (SCHWARZ,
1977, p. 13-26). Outro crtico que, ao longo da segunda metade do sculo XX, se debruou sobre esse
mecanismo de diferenciao da forma literria brasileira frente aos modelos europeus foi Silviano
Santiago. No seu clssico ensaio O entre-lugar do discurso latino-americano, Santiago teoriza sobre esse
estatuto secundrio ou derivativo geralmente atribudo s culturas perifricas como a brasileira.
Combatendo as noes de fonte e influncia que haviam marcado at ento a disciplina da literatura
comparada , Santiago argumenta que [a] maior contribuio da Amrica Latina para a cultura ocidental
vem da destruio sistemtica dos conceitos de unidade e pureza (SANTIAGO,2000, p. 16). Empregando
o conceito barthesiano de obra escrevvel, Santiago argumenta que o escritor latino-americano est
sempre produzindo a partir de uma meditao silenciosa e traioeira sobre o texto europeu,
contaminando-o e transformando-o em algo novo (SANTIAGO, 2000, p. 20). Neste simpsio, estamos
propondo pensar a relao do Brasil com o mundo alm dessa polaridade (centro versus periferia; Brasil
versus Europa; ex-colnia versus ex-metrpole). Seguindo a sugesto de Silviano Santiago (2013),
entendemos que chegado o momento de pensar a literatura brasileira menos em termos de formao
conceito muito vinculado ideia de autonomia diante das potncias culturais e mais em termos de
insero do Brasil no mundo, levando em conta outras possveis relaes do Brasil com outras culturas que
no aquelas centrais. Temos, pelo exposto, interesse em: 1) discutir apropriaes e reelaboraes do
paradigma da formao para estudo de outras literaturas perifricas e de suas relaes, prevendo-se o
debate crtico deste mesmo paradigma; 2) discutir as aproximaes tericas contemporneas entre estudos
ps-coloniais e comparativismo; 3) lidar com trnsitos e trocas culturais Sul-Sul, visibilizando estes fluxos.
Abordagens comparativas entre literatura brasileira e literaturas africanas, literatura brasileira e literaturas
asiticas e literatura brasileira e hispano-americanas so bem vindas, assim como reflexes tericas sobre a
moldura comparativa que busca abarcar as dinmicas relaes Sul-Sul. Referncias bibliogrficas:
CANDIDO, Antonio. Formao da literatura brasileira. Belo Horizonte: Itatiaia, 1997. SANTIAGO,
Silviano. Uma literatura nos trpicos. Rio de Janeiro: Rocco, 2000. __________. Aos sbados, pela manh.
Rio de Janeiro: Rocco, 2013. SCHWARZ, Roberto. Ao vencedor as batatas. So Paulo: Duas Cidades,
1977.
3. A Narrativa Moderna em Questo
Betina Rodrigues da Cunha (UFU)
Mrcio Arajo de Melo (UFT)
Ao abrir espao para as instigantes interrogaes a respeito da palavra e do poder da imaginao criadora
desenhando novos e inesperados caminhos que organizam os projetos particulares da sensibilidade
contempornea, dinmicos e plurais ao mesmo tempo a narrativa moderna ocidental instiga inmeras
reflexes e questionamentos, carregados de leituras possveis a interpretar o estar no mundo e suas amplas
relaes, bem como suas representaes. Jean-Yves Tadi (1992), em importante obra sobre a narrativa,
postula que o romance moderno vai de uma afirmao a uma negao, de uma identidade a uma
pluralidade, de uma certeza a uma dvida, chegando mesmo a interrogar quem o autor, quem o outro
que com ele dialoga, insistindo, muitas vezes em tomar seu lugar; enfim, o que o narrar, o que o
narrado, o que o leitor literrio, o que a circulao e os fluxos dessas narrativas modernas; em ltima
anlise: Haver ento uma narrao pura, uma voz sem fico? A partir dessas consideraes e de seus
desdobramentos, a proposta do Simpsio Narrativa moderna em questo encontra justificativa no
interesse de sugerir e de tornar visvel ao leitor e crtica literria, sutilezas da produo literria narrativa
no bojo da literatura contempornea ocidental, sobretudo no que diz respeito ao modo como as temticas e
estruturas narrativas encontram sua concretizao na produo literria moderna. Nesse sentido, esse
Simpsio pretende reunir trabalhos, pesquisas e olhares sobre a narrativa moderna que procuram provocar
a uma nova expedio: a de buscar novas trilhas, a de enxergar as fontes que fazem desdobrar palavras em
sentidos, a de enfrentar mundos ainda no vislumbrados. Portanto, e em face dos desafios que a fico tem
imposto, estabelecemos o objetivo maior para esse simpsio: perseguir o entendimento de mais um aspecto
constitutivo das obras narrativas contemporneas, buscando observar as caractersticas e as formas de
representao na fico que possam vir a contribuir para a compreenso dos elementos narrativos e como
estes se organizam dentro da modernidade, inclusive com suas ambiguidades, seus deslizes, seus recuos e
seus avanos. Interessa-nos a substncia constitutiva do processo fabulativo, as peculiaridades do narrador
da obra literria, sua constituio e sua pluralidade, a questo do espao do real e da fico; bem como nos
interessa a recepo crtica dessa obra literria, sua circulao e consumo, dentre outros elementos que vo
apoiar a Teoria Literria no entendimento e anlise de narrativas contemporneas. Dessa forma, afinados
com a proposta principal da ABRALIC para este Congresso, almeja-se que as discusses sobre a narrativa
moderna, promovidas por esse Simpsio Temtico, possam contribuir para o debate, no mbito da Teoria
da Literatura, sobre a circulao dessa literatura, sobre suas implicaes e desdobramentos junto ao
pensamento terico-crtico. _________________________ 1 - TYADI, Jean-Yves. O romance no sculo
XX. Lisboa: Publicaes Don Quixote. 1992. p. 19
4. Literatura entre discursos: polmicas e decises de sentido
Joo Cezar de Castro Rocha (UERJ)
Silvana Oliveira (UEPG)
Neste simpsio prope-se uma hiptese: o tipo de texto que denominamos literatura talvez possa ser
entendido como a consequncia, no necessariamente planejada, de uma srie de disputas discursivas,
ocorridas desde a Grcia clssica. Dissemos literatura, mas talvez fosse mais preciso sugerir que se trata de
efeito determinado de certos discursos, historicamente situados e, sobretudo, recebidos de uma maneira
especial. Vale dizer, num conceito emprestado teoria biolgica contempornea, e usado com fecundidade
por Niklas Luhmann na elaborao da teoria do sistema social, trata-se de um caso tpico de emergncia: o
surgimento de um terceiro sistema pode ocorrer a partir do encontro de dois outros, cuja soma de elementos
no permitiria prever o aparecimento da nova configurao. Sem dvida, sua constituio depende da
existncia prvia dos dois sistemas, cuja acoplagem favorece a emergncia de um novo feixe de relaes.
No entanto, a dinmica desse terceiro sistema prpria e, se ela surge em funo das inmeras
possiblidades criadas pelo cruzamento dos dois primeiros, ela tambm desenvolve aspectos peculiares e
toma rumos singulares que no se podem reduzir queles dois sistemas. Como se percebe, a ideia de
emergncia dispensa a noo de essncia, assim como de causalidade linear, demandando uma
reconstruo detalhada das configuraes em tela. Esse ponto decisivo, implicando a necessidade de um
olhar particularmente atento especificidade das relaes textuais deste ou daquele momento histrico.
Assim, em lugar de um postulado terico tautologicamente transformado em montono leito de Procusto, o
corpo a corpo com a materialidade dos textos se impe como mtodo necessrio. Imaginemos, agora, esse
efeito no plano discursivo: o confronto ou contraste entre discursos diversos pode produzir a emergncia de
uma forma verbal prpria, cuja definio sempre incluir o nvel da recepo, j que esse discurso no se
define por si mesmo, porm pelo efeito derivado de uma constelao discursiva definida no seio de uma
polmica. Ora, o nico meio de avaliar tal efeito consiste em valorizar a pluralidade das recepes
engendradas pelo prprio efeito. O procedimento no tautolgico porque ele conduz para fora do texto,
por assim dizer, embora sempre o faa atravs de uma textualidade especfica. Tal forma, eis o ponto a ser
discutido neste simpsio, pode estar na origem do que chamamos literatura. Nessa discusso, o
anacronismo deliberado borgiano revela potencial propriamente terico. Portanto, compreende-se a
relativizao contempornea da ideia de literatura, no mais vista como um discurso infenso passagem do
tempo, porm como uma etiqueta comodamente aplicada a formaes verbais muito distintas entre si.
Neste simpsio, propomos o problema de maneira inicial, sugerindo um ncleo de polmicas discursivas
que pode ter jogado um papel-chave na caracterizao do modo de elaborar mundos denominado literatura.
A disputa inaugural ocorreu entre os sofistas e a trade Scrates-Plato-Aristteles tem peso decisivo neste
simpsio. Contudo, outras disputas discursivas ajudam a constituir nossa hiptese. No sculo XVIII, os
registros discursivos da nascente disciplina da histria e da literatura polemizaram: como definir a
prerrogativa de lidar com uma nova percepo do tempo histrico, que explode com toda fora no
Oitocentos? No sculo XIX, a emergente disciplina da sociologia e a literatura palmilham a realidade nova
das grandes metrpoles, buscando compreender suas formas inditas de convvio. mile Zola e mile
Durkheim disputam, cabea a cabea, o triunfo. No sculo XX, a nascente disciplina da psicanlise e a
literatura encontram-se na explorao da subjetividade: como mapear o territrio invisvel das motivaes
mais ocultas? Freud parte quase sempre da literatura, ou mesmo da fala de seus pacientes, para elaborar sua
trama conceitual, erigida em mtodo de cura das enfermidades da alma. Como compreender a literatura
entre discursos? Poderamos pensar que a literatura seria antes de tudo um efeito discursivo e no um
discurso em si mesmo? Alm disso, ela somente se realiza na recepo, mas no depende exclusivamente
dela, pois a potncia textual tambm pode favorecer ou constranger esse efeito. Assim, podemos
historicizar as prticas discursivas e talvez preservar um componente metahistrico, pois no se trata de um
contedo cristalizado numa forma discursiva especfica, porm de uma potncia acionada por discursos,
mas que, em si mesma, no chega a corporificar-se num discurso. Tal o horizonte das preocupaes do
simpsio Literatura entre discursos: polmicas e decises de sentido.
5. Memria e Literatura: dimenses dialgicas
Danielle Cristina Mendes Pereira (UFRJ)
Marcelo Almeida Peloggio (UFC)
O simpsio tem por finalidade abordar as relaes entre as instncias da memria e da literatura. Pretende-
se implementar discusses e reflexes a partir da perspectiva do discurso literrio como uma potncia
produtora e reformuladora de aspectos capazes de impactar a modulao de imagens relativas memria
em suas mltiplas dimenses. A proposta do debate sobre as diversas formas pelas quais o fenmeno
literrio estabelece figuraes em torno da instncia da memria conecta-se inteno de abrir o dilogo
sobre os elos entre a memria e a literatura com pesquisadores que direcionem os seus processos de
investigao para o estudo de obras literrias, nacionais e/ou internacionais. Assim, a representao
simblica no texto literrio das relaes entre o tempo e a memria apresenta-se como um caminho de
indagao convergente s nossas proposies. Do mesmo modo, a anlise do papel da literatura frente
conscincia da construo de identidades, implementada pela modernidade j a partir do sculo XIX, em
sua frico com as tessituras das figuraes da memria, arvora-se como uma via de questionamento
alinhada s intenes reflexivas aqui expostas, bem como a representao das tenses possveis entre o
tempo e a subjetividade, a percepo da memria como cruzamento entre a esfera individual e a coletiva e
a modulao de novas imagens em relao ao passado atravs da literatura, em suas implicaes e
complexidades. Ao tomarmos como base a multiplicidade de conceitos produzidos em torno da ideia de
memria em tempos e espaos diferentes, podemos apontar mltiplas concepes, presentes nas narrativas
literrias, a partilhar vises de mundo e a simbolizar percepes do real. Isso significa a possibilidade de
pensarmos a memria como um elemento que se pode fazer presente atravs da imaginao. Como suporte
de memria, o discurso literrio permite o recorte de determinadas vises a orientar as formas de pensar o
mundo, em uma dinmica atravs da qual a literatura expe a sua capacidade de alimentar uma srie de
tradies culturais, vinculadas aos processos de tessitura da memria, em uma srie de representaes
simblicas nas quais a imaginao e a memria dialogam. A partir das ideias de Pierre Nora, em seu livro
Les lieux de mmoire (1993), possvel tomar o conceito de lugar de memria como um caminho para a
nossa compreenso dos elos entre os mltiplos meios de organizao da memria pelas figuraes
literrias. Seria coerente considerar o discurso literrio como um lugar de memria por ser este uma
construo artificial, livre e independente, dado o seu carter ficcional, de referentes fixos da realidade;
trata-se, pois, de um objeto simblico e potente em um mundo no qual so exigidos locais de memria por
no mais haver, justamente, meios de memria, segundo as pesquisas de Pierre Nora. A obra literria
capaz de tornar pblicos os discursos alimentadores das imagens relativas memria; , logo, uma fonte
preciosa de divulgao de falas, sejam as relacionadas ao mainstream, sejam as que rompem as tentativas
de silenciamento erguidas por elementos vinculados ao desejo de manuteno das imagens das memrias
oficiais, pois o poder da palavra literria vislumbra a reordenao ficcional de tal imagtica. Essa
divulgao pode garantir a sobrevivncia da palavra escrita ou, ao menos, a promessa de disseminao das
imagens circulantes no texto, as quais podero atuar na gerao e expanso de outras, em variados textos.
Portanto, compreendemos como fundamental a discusso acerca da capacidade do discurso literrio para
estabelecer e, par e passo, absorver e recriar vises circulantes sobre os modos de conceber as potncias do
que seria passvel de compreender como a realidade, em um movimento de retroalimentao perene entre o
artstico, o simblico, o imaginrio e o real, no que concerne s formas de simbolizar os seus processos de
construo. Nesse sentido, afirma-se como extremamente relevante os estudos e debates cujas abordagens
contemplem o lugar ocupado pela literatura no que diz respeito aos usos da memria, ao papel do homem
no mundo e s pluralidades de um real indefinido e oblquo, em consonncia com a percepo da
experincia esttica como essencial e com poder para impactar as maneiras de abordar a realidade e a arte,
como postulada por Walter Benjamin em sua obra. Esperamos, pois, com o nosso simpsio, alcanar
dilogos frutferos em torno da intricada relao entre a memria e a literatura, o que impe um
pensamento atento a sua complexidade.
6. Literatura e marginalidade
Ana Claudia da Silva (UnB)
Valria Anglica Ribeiro Arauz (UFMA)
Os estudos sobre a pobreza tm ganhado, nas ltimas dcadas, mais espao no mbito dos estudos
literrios. Ela tem sido abordada em textos j clssicos, como o de Geremeck (1995), que apresenta o
mundo da misria e da pobreza representado na literatura dos sculos XIV ao XVIII, e tambm naqueles
reunidos por Roberto Schwarz sobre a pobreza na literatura brasileira, em 1983, temtica retomada pelo
crtico na obra de 1990. Apontando para os estudos subalternos (ou da subalternidade), temos tambm a
contribuio de Spivak (2010), que aponta a necessidade de que sejam criados mecanismos para que a voz
do subalterno ou seja, aquele que est excludo do mercado e da representao poltica se articule e seja
ouvida, tarefa na qual a literatura tem papel relevante. Na condio de subalternidade encontra-se grande
parte das personagens de uma certa literatura de lngua portuguesa, cujos autores fazem questo de
representar literariamente os socialmente excludos ou marginalizados. Trata-se de um grupo heterogneo,
composto de cegos, velhos, crianas, mulheres, analfabetos, gordos, doentes, negros, homossexuais,
delinquentes, subempregados, pobres, loucos e tantos mais, cujo denominador comum a carncia ou a
presena exgua daquilo que Candido (1995) chamou de bens incompressveis, sem os quais no h vida
humana em sua plenitude. Entre esses, Candido inclui a fruio da literatura e da arte, no s pelo seu
aspecto formal, que organiza o caos humano interior, mas igualmente pela sua capacidade formativa da
intelectualidade, do juzo e do afeto, sem os quais no h transformao social. Esse grupo de personagens
representa uma multido de pessoas cuja voz tem sido historicamente silenciada pelo poder excludente e
violento das classes dominantes. Contudo, apesar de invisibilizada, contida e alijada dos centros de poder,
essa marginlia sempre teve, historicamente, a funo de legitimar o poder estabelecido, garantindo os
interesses das elites. Considerando, com Candido (1972), a funo social e humanizadora da literatura, que
consiste em expressar o homem e tambm em atuar na sua formao, observamos que certas narrativas se
tornam espaos de resistncia e salvaguarda desse conjunto de pessoas, cujas representaes lhes conferem
espao, dignidade e poder. Conscientes de seu papel como agentes de interveno poltica e resistncia
social, seus autores abordam os conflitos humanos advindos da tenso entre tica, norma e conduta, ora
afirmando, ora negando as possibilidades de transformao social e de superao da condio de
marginalidade que priva as camadas populares de direitos humanos inalienveis. A margem,
tradicionalmente designada como o espao distante do centro, perifrico, tambm foi referida, por Santiago
(2000) como um entre-lugar em que a desconstruo dos discursos soberanos pode ser plasmada, dando
origem a uma representao antropfaga que transforma o outro em si mesmo, fortalecendo os laos
entre as ex-colnias portuguesas da Amrica e da frica. Emergem, desse entre-lugar, vozes fortes, que
conseguem, fora de muitas alianas que sustentam atos de resistncia cultural, fazer ouvir seu grito de
denncia e oposio aos discursos autoritrios. Esse mesmo espao Mudimbe (1988), chamou de marginal,
redefinindo a margem como o lugar intermedirio das estruturas dicotmicas (colonizador-colonizado,
antigo-moderno, local-global, entre outras), cuja existncia prejudica a iluso de desenvolvimento e ordem
que o discurso dominante pretende forjar. No caso das ex-colnias portuguesas, essa margem torna-se
espao de resistncia poltica. Bosi (2002) lembra que a ao de resistncia que se depreende das narrativas
se realiza em duas instncias: a temtica e aquela prpria do processo de escrita. Maingueneau (2001)
explica que o processo de composio literria reproduziria as relaes presentes na sociedade, mas
tambm seria parte constituinte de uma construo social. No discurso literrio (entendendo a Literatura
como um uso pragmtico da linguagem) abrir-se-ia espao para a construo de sujeitos, identidades e da
prpria sociedade. Assim, ao pensarmos em marginalidade, temos a ideia de que as vozes afloradas pelo
discurso literrio podem tomar a vez e ser ouvidas, principalmente se houver espao de recepo para esse
discurso. Assim, os efeitos alcanados pela literatura assumiriam uma funo social. Consequentemente,
no se poderia pensar um grupo social perifrico ou excludo sem observar, de um lado, os textos literrios
produzidos por essa cultura - tanto aqueles cannicos quanto os ditos marginais , de outro, aqueles em que
essa marginlia vem sendo representada, apontando as estratgias (formais, temticas) dos autores para dar
voz a essa alteridade. Neste simpsio, queremos discutir, a partir de estudos literrios comparados, as
diferentes representaes da marginalidade social em narrativas contemporneas de lngua portuguesa e
tambm o papel da literatura enquanto espao de restituio da dignidade humana no conjunto das
literaturas brasileira, portuguesa e africanas de lngua portuguesa. Estas so aqui entendidas como
partcipes de um mesmo macrossistema literrio (ABDALA JUNIOR, 1998), no qual circulam no apenas
uma lngua comum, atualizada em diferentes matizes nacionais, mas tambm modelos, formas e temas que
indicam a permanncia e/ou a alternncia de estruturas polticas, histricas e sociais comuns aos pases de
lngua portuguesa.
7. Entre Dois Fins de Sculo: Literaturas em Lngua Portuguesa e o Dilogo Interartes
Luci Ruas Pereira (UFRJ)
Otvio Rios Portela (UEA)
A crise finissecular, que se instala e atua sobre a sensibilidade de certas elites intelectuais da Europa, a
partir da qual se constri aquilo a que chamamos imaginrio crepuscular, teve Paris como o seu principal
centro de irradiao e revelou-se na literatura decadentista-simbolista. No se mostrou, porm nem
poderia -, alheia s grandes transformaes que se operam no mbito das artes plsticas, de que decorrem
os grandes movimentos vanguardistas que interferiram decisivamente sobre o que seria, no sculo XX, a
chamada arte moderna. Tambm no ignorou o que definiu a atmosfera musical, que teve com Dbussy e
Wagner, entre outros, a responsabilidade de revolucionar o que at ento se produzia.
De acordo com Vtor Vioso, a designao de fim-de-sculo no seria apenas uma mera cronologia, mas
um horizonte cultural com as suas expectativas, interrogaes e smbolos peculiares. Em 1883, Paul
Bourget, nos Essais de Psychologie Contemporaine, seria um dos teorizadores da decadncia esttica que
se articulava com o pessimismo, cujas razes estariam na inadequao entre o homem e o meio, fruto da
prpria complexidade civilizacional. O tdio, esse monstro delicado, inundara a literatura coetnea como
o preo a pagar pelos benefcios do progresso. Entre os eslavos, esse mal-estar revelava-se pelo niilismo,
entre os germnicos, pelo pessimismo e, entre os latinos, por solitrias e bizarras nevroses.
Nietzsche diria, em O Caso Wagner (1888), que a obra musical deste seria um tpico produto da nevrose.
No que se refere decadncia literria, como modelo extensivo a todas as artes diria: A palavra torna-se
soberana e salta para fora da frase, a frase vem sobrepor-se e escurece o sentido da pgina, a pgina ganha
vida custa do todo o todo deixa de ser um todo. Mas isto a imagem para cada estilo de dcadence:
sempre anarquia dos tomos, desagregao da vontade. 'Liberdade dos indivduos', moralmente falando e,
alargado a uma teoria poltica: 'os mesmos direitos para todos'
Com Des Esseintes, o protagonista de A Rebours (1884), Huysmans faz emergir na fico romanesca
francesa o modelo do heri decadente, representante inquestionvel da crepuscularidade finissecular, da
crise de valores que percorria o mundo em acelerada transformao tecnolgica, social, poltica e cultural.
Contra a ortodoxia cientista, segundo a qual o romance devia funcionar como um exerccio de sociologia
prtica, fundando a sua metodologia no modelo das cincias exatas, os decadentistas exaltavam a Arte
como religio e a prpria vida deveria tornar-se, enquanto estilo diferenciador, num puro ato esttico. Deste
modo, a elite decadentista-simbolista constitua com a sua aura esteticista e aristocratizante uma reao aos
valores burgueses dominantes. Esta ruptura com o mundo burgus acompanhada, por outro lado, por uma
hiperbolizao do artificial contra os determinismos rotineiros da natureza. , pois, sob o signo do culto do
eu, da magia metafsica dos smbolos, da sacralizao da Arte e da prpria vida como ato esttico que o
movimento rompe com o paradigma naturalista-positivista, embora o imaginrio decadente seja em parte
herdeiro das patologias sociais reveladas pelo romance naturalista, em funo dos determinismos da
hereditariedade e do meio.
Neste simpsio, propomos abordar textos de poetas e romancistas que deixaram obra significativa, mas
pouco abordada pelos estudos crticos da Literatura Portuguesa e Literaturas de Lngua Portuguesa, no
perodo compreendido entre as duas ltimas dcadas do sculo XIX e as duas primeiras do sculo XX. A
estas acrescentamos as ltimas do sculo XX, quanto a modernidade tardia vem trazer ao contexto literrio
outros problemas de toda ordem, que refletem as mudanas que se operam no mundo contemporneo. O
ponto de partida ideia de runa, procedimento alegrico privilegiado que se manifesta na literatura de
feies decadentistas, para a qual os conceitos de alegoria, histria e narrao so peas-chave. Objetiva-
se, neste caso, verificar como os movimentos finisseculares e as consequentes imagens que povoaram o
imaginrio crepuscular se manifestam e orientam a produo desse perodo, criando as bases sobre as
quais a modernidade se instala na Literatura Portuguesa, de que a obra de Mrio de S-Carneiro, por
exemplo, tributria. Alargando o seu espectro, pretendemos pr em questo as relaes entre literatura e
outras artes, tendo como ponto de partida o texto literrio poesia ou narrativa , objeto sensvel
interveno de outras linguagens artsticas (as das vanguardas, por exemplo), abrindo espao para que se
opere a relao intersemitica.
Referncias Bibliogrficas:
AUERBACH, Erich. Mimesis. So Paulo: Perspectiva, 1976.
BENJAMIN, W. Charles Baudelaire, um lrico no auge do capitalismo. So Paulo: Brasiliense, Obras
Escolhidas, vol. III, 1989.
CALINESCU, Matei. As cinco faces da Modernidade: Modernismo, Vanguarda, Decadncia, Kitch, Ps-
Modernismo. Lisboa: Veja, 1999.
CLVER, Claus. Estudos interartes conceitos, teorias, objetivos. In: Literatura e sociedade. n. 2. So
Paulo: Edusp, 1997.
COUTINHO, Luiz Edmundo Bouas & MUCCI, Latuf Isaias (Org.). Dndis, Estetas e Sibaritas. Rio de
Janeiro: Confraria do Vento, 2006.
DIDI-HUBERMAN, Georges. O que vemos, o que nos olha. So Paulo: Editora 34, 1998.
______. A imagem sobrevivente. So Paulo: Contraponto, 2013.
MANGUEL, Alberto. Lendo imagens. So Paulo: Companhia das Letras, 2001.
MORO, Paula. Salom e outros Mitos O Feminino Perverso em Poetas Portugueses entre o Fim-de
Sculo e Orpheu. Lisboa: Cosmos, 2001.
8. Literatura comparada em movimento:novos fluxos e trnsito
Vernica Lucy Coutinho Lage (UFJF)
Moema Rodrigues Brando Mendes (CES/JF)
Desenvolver o olhar crtico e diferenciado do leitor por meio de prticas e possibilidades de leituras das
diversas linguagens. Considerar o movimento interdisciplinar e transmiditico na Literatura. Refletir sobre
propostas estticas, identificando valores ligados cultura e suas especificidades na construo identitria
do homem, enquanto sujeito social. Interagir leitura, texto e leitor. Relacionar a linguagem do escritor com
a do leitor na construo de signos. Destacar a Literatura e a constituio do simblico. Propor releituras
contemporneas da Literatura nas mdias. Experenciar a natureza e o lugar da literatura na sociedade
contempornea. Investigar as realizaes literrias que se abrem a estudos comparatistas em amplo dilogo
com outras Literaturas.
9. Por uma crtica do exlio: tenses entre o particular e o universal
Tarsilla Couto de Brito (UFG)
Alice Maria de Arajo Ferreira (UnB)
Os ltimos 50 anos do sculo XX conduziram os estudos literrios a uma crise sem precedentes
(CASANOVA, P., 2005; DEJEAN, J., 2005; LEVINSON, B., 2001; MARX, W., 2005). O Estruturalismo
nos ensinou a desconfiar da histria literria; desconfiana que se justificava, por um lado, por sua
associao com projetos nacionalistas; e, em termos apenas aparentemente contraditrios, por sua
associao com projetos supratemporais e a-histricos de um cnone que deveria sustentar ideias de
verdade e essncia da tradio. O mesmo aconteceu com a crtica literria, atividade que ficou
estigmatizada no imaginrio como um tipo de erudio arrogante que se manifesta narcisisticamente sem
rigor e sem finalidade. Um sintoma da crise: em 1996, a professora Leyla Perrone-Moiss perguntava em
artigo publicado na Folha de So Paulo Que fim levou a crtica literria?
(http://www1.folha.uol.com.br/fsp/1996/8/25/mais!/14.html). Todo seu texto questionava a pauta do
Congresso da Associao Internacional de Literatura Comparada previsto para 1997 na cidade de Leiden,
Holanda. Para Leyla Perrone-Moiss, se a literatura permanecesse restrita ideia de Memria cultural, a
crtica literria perderia sua razo de ser. Tal reao da Teoria da Literatura no Brasil consagrava o alcance
de uma rea que vinha se desenvolvendo com fora e consistncia. Os Estudos Comparados vieram
contrapor-se ao pretenso universalismo da Teoria e propunha o princpio da alteridade como o critrio de
leitura que daria voz a literaturas e discursos no oficiais e no universais das ex-colnias da Europa
(SOUZA, R. A. 2006). Desse embate entre o universal e o particular, entre a essncia e a contingncia, at
mesmo as obras literrias passaram a ser questionadas. A desconfiana dos modos de representao
praticados sob a rubrica da literatura foi resultado da convergncia de todas as crticas feitas aos estudos
literrios anteriormente: pelos servios prestados consolidao de identidades nacionais (crtica feita
histria e histria da literatura); pela manuteno de valores apresentados como essenciais para
dominao de uma classe ou de uma ideologia (crtica feita tambm histria da literatura e, ainda,
crtica literria quando essas atividades precisam se haver com o problema do cnone); pela
supervalorizao das noes de indivduo, de subjetividade, de identidade, de viso de mundo, de
representao e de estilo noes condenadas porque ignorariam o fato de que o mundo seria construdo
pela linguagem e que o EU no passaria de um conjunto de discursos determinados e determinantes
(FREADMAN, R.; MILLER, S., 1994). No gratuito que importantes pensadores da literatura da
contemporaneidade, em algum momento da virada do sculo XX para o XXI, preocuparam-se em escrever
textos como A literatura em perigo (Tzvetan Todorov, 2009), Literatura para qu? (Antoine Compagnon,
2009). Em vez de aceitar a morte da literatura, este simpsio vem propor a reinterpretao desses
fenmenos como sinais de uma transformao cultural em que a poesia, o drama, as narrativas de fico,
bem como os discursos que se voltam sobre eles continuam a jogar um papel importante. O princpio de
nossa proposio encontra-se na definio de exlio elaborada por Edward Said: um estado de ser
descontnuo (Reflexes sobre o exlio, 2003). Nessa formulao, o universal e o particular, que, em
oposio, fizeram a crise da literatura e dos estudos literrios ao longo do sculo XX, esto de tal modo
tensionados em uma identidade contraditria que um no pode ser compreendido sem o outro. O estado
(universal, essncia, categoria fixa) de exlio caracteriza-se pelo descontnuo (pelo particular, pelo
provisrio, pelo contingente). Se a contradio constitui nosso prossuposto ela ser tambm nosso mtodo
e nosso objetivo. A misso intelectual do exilado, dizia Said, seria recusar a linguagem como jargo, ou
seja, recusar que a linguagem, especialmente a literria, apague as diferenas produzidas pelos homens e
para os homens. Assim, convidamos a discutir conosco todos aqueles que se dispem a ler como quem est
em exlio, em estado de descontinuidade, perseguindo, agarrando, sentindo e fazendo aparecer a diferena.
Trata-se, efetivamente, de aproximar as fronteiras da Teoria da Literatura e dos Estudos Comparados, sem
a inteno de reduzi-las a uma s coisa, mas com a finalidade de coloc-las em um tipo de tenso em que o
leitor j no possa dizer eu ou o outro, que se sinta no perigoso territrio do no pertencer (SAID,
op. Cit., p. 50). A originalidade do ponto de vista do exlio resgata a vitalidade da crtica literria como
uma percepo de dimenses simultneas corporal, material, prtica; ressalta a importncia dos trabalhos
em torno da traduo atenta s lnguas em errncia; pressupe a formao de subjetividades no contexto
contigente das experincias de coletividade, de estranhamento e de territorialidade. Para a crtica do exlio,
o mundo todo experimentado como uma terra estrangeira. Pois, como nos alerta Edward Said, o exilado
insiste ciosamente em seu direito de se recusar a pertencer a outro lugar (op. Cit., p. 55). Referncias
Bibliogrficas: CASANOVA, Pascale. A repblica Mundial das Letras. So Paulo: Estao Liberdade,
2005. COMPAGNON, Antoine. Literatura para qu? Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2009. DEJEAN, Joan.
Antigos contra Modernos: as guerras culturais e a construo de um fin de sicle. Rio de Janeiro:
Civilizao Brasileira, 2005. FREADMAN, Richard.; MILLER, Seumas. Re-pensando a teoria: uma crtica
da teoria literria contempornea. So Paulo: Editora UNESP, 1994. LEVINSON, Brett. The Ends of
Literature: The Latin American Boom in the Neoliberal Marketplace. The Standford Press, 2001.
MARX, William. Ladieu La Littrature. Histoire Dune Dvalorisation, XVIIIe-XXe Sicle. Paris:
Minuit, 2005. PAGEAUX, Daniel-Henri. Musas na encruzilhada: ensaios de Literatura Comparada. So
Paulo: Hucitec; Santa Maria: Ed. UFSM, 2011. SAID, Edward. Reflexes sobre o exlio e outros ensaios.
So Paulo: Companhia das Letras, 2003 SOUZA, Roberto Aczelo de. Iniciao aos estudos literrios. So
Paulo: Martins Fontes, 2006. TODOROV, Tzvetan. A literatura em perigo. Traduo Caio Meira. Rio de
janeiro: DIFEL, 2009.
10. Habitando modernidades: [re]construindo o humano
Sonia Regina Aguiar Torres da Cruz (UFF/CNPq)
Adolfo Jos de Souza Frota (UEG)
Ao longo do sculo 20, a questo do humano/humanismo articulou-se com debates sobre a modernidade
entendida aqui como uma rede de histrias diferenciadas que no produz um quadro uniforme. As
humanidades vm enfrentando a crise da emergncia de novos paradigmas, a partir de Freud e Marx e do
nascimento da antropologia sendo que esta ltima, juntamente com a teoria da desconstruo, informa as
perspectivas feministas, os estudos de gnero e ps-coloniais. Mais recentemente, ps-humanistas
anunciam nosso devir como humanoides hbridos. No sculo 21, esses novos paradigmas refletem-se mais
do que nunca na literatura contempornea, sobretudo em revises histricas e estticas, que fazem parte do
que entendemos por conhecimento. O conhecimento pode dar-se a partir da formao e informao de
diversas disciplinas, mas, ao fim e ao cabo, requer a estruturao da cena humana. No simpsio sugerido,
propomos repensar a cena humana e a produo do conhecimento a partir de uma conversao em torno da
r(a)epresentao literria de projetos de modernidade e de conceitos como utopia, memria e ps-humano.
A crise da esperana tem sido descrita como uma condio social de nosso tempo. Em um sentido amplo,
podemos descrever essa crise como um sentimento de impotncia diante de foras poderosas,
incontrolveis tanto naturais (aquecimento global, mudanas climticas, ameaa de desastre ecolgico)
quanto sociais (mercado de capital global, decises polticas opacas). A busca de alternativas para um
mundo regido pelo capitalismo global em que organizaes sociais e econmicas tradicionais se
transformam rapidamente, gerando insegurana e desigualdades cada vez mais gritantes, faz com que surja
com uma nova urgncia, em meio crise da esperana, a possibilidade da utopia. As utopias, na tradio
cultural ocidental, foram concebidas a partir de um modelo de ordem final, unitria segundo Gianni
Vattimo (2006, p. 18), uma herana da noo de origem (arch) e de unidade da metafsica. Tal modelo, na
atualidade, visto como instrumento de hierarquias de poder, tornando-se necessrio repensar a utopia.
Atravs de que recursos narrativos a literatura contempornea faz uma reviso crtica de projetos da
modernidade, como a utopia, sugerindo novas formas de express-la com caractersticas mais em
conformidade com nossa contemporaneidade ps-metafsica? (cf. VATTIMO, 2006, p. 18) Dentro da
proposta de simpsio, consideramos o papel da memria no discurso utpico, uma vez que a crise da
esperana se manifesta como uma crise da memria refletida no problema da perda da identidade. Isso
porque [a] memria um elemento essencial do que se costuma chamar identidade, individual ou coletiva,
cuja busca uma das atividades fundamentais dos indivduos e das sociedades de hoje, na febre e na
angstia (LE GOFF, 2003, p. 469, grifo do autor). Ana P. G. Ribeiro e Marialva Barbosa (s/d, s/p)
sugerem que a modernidade inaugura um novo regime de memria como se quisssemos ancorar um
mundo em mobilidade e transformao aceleradas. J David Harvey (2000), em Spaces of Hope,
argumenta que a utopia diz respeito realidade de forma dialtica. O gegrafo cultural sugere que todo
perodo histrico cria condies para a emergncia de ideias e valores que incluem, de forma condensada,
as tendncias e os desejos no-realizados de determinada sociedade. Esse utopismo dialtico, para tomar
emprestado o termo do prprio Harvey, registra o potencial histrico que de fato existiu, mas que no
aconteceu, necessariamente, em dado momento histrico. Sendo assim, a memria articula-se com a utopia,
na medida em que no inclui apenas o que aconteceu, mas estende-se para o que poderia ter acontecido:
vises, expectativas e sonhos fazem parte de nosso repertrio mnemnico, nos convidando a pensar sobre
como projetos descartados da modernidade se articulam com modernidades presentes, nos instigando a
imaginar o futuro. Nesse sentido, tanto as textualidades que revisitam o passado quanto aquelas que
imaginam o futuro (cf. JAMESON, 2005) como a fico cientfica, de especulao, fantstica ou weird
constituem um espao produtivo para trazer a crise tona (SPIVAK, apud ZOURNAZI, 2002, p. 173).
Um nmero crescente de pesquisas sobre o humano tem tido a ateno voltada para trabalhos nas reas de
inteligncia artificial, neurocincia, biologia, bioinformtica, gentica etc., em busca de uma compreenso
contempornea dos atributos humanos. Vale lembrarmos as teorias que concebem o upload da conscincia
humana para o computador, as experincias com primatas e as pesquisas com clulas tronco,
nanotecnologia, robtica, e o prprio Projeto Genoma Humano. Todas essas abordagens, frequentemente
calcadas na materialidade do humano, tm implicaes srias para nosso entendimento da existncia
humana. De que maneira podemos situar e valorizar a representao, a linguagem e o esttico em relao
ao conhecimento gerado pelas cincias sociais e naturais? Por outro lado, de que formas o conhecimento
gerado por essas cincias pode ser entendido no contexto da cena humana da representao?
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS HARVEY, David. Spaces of Hope. Berkeley: U of California P,
2000. JAMESON, Fredric. Archaeologies of the Future: The desire called utopia and other science fictions.
London: Verso, 2005. LE GOFF, Jacques. Histria e memria. Trad. Irene Ferreira et al. Campinas:
Editora Unicamp, 2003. RIBEIRO, Ana Paula Goulart; BARBOSA, Marialva. Memria, relatos
autobiogrficos e identidade institucional. Disp.
Acessado
em 01/08/2014. VATTIMO, Gianni. Utopia Dispersed. Diogenes, v. 53, n. 1, Feb. 2006, p. 18-23.
ZOURNAZI, M. Hope: New Philosophies for Change. Annandale, Australia: Pluto Press Australia,2002.
11. Literatura, Homoerotismo e Expresses Homoculturais
Fabio Figueiredo Camargo (UFU)
Andr Luis Mitidieri Pereira (UESC)
Este Simpsio do XIV Congresso Internacional da ABRALIC defende a necessidade de leituras polticas
ou simblicas de todo e qualquer elemento constitutivo dos estilos e modos de vida homossexuais, da
forma como so trazidos ao debate por distintas produes artsticas, culturais e discursivas. Visamos assim
retir-las do anonimato, do silncio do cnone ou de interpretaes fossilizadas, do apagamento da sua
existncia nas polticas culturais, que as difundem como lugar de acolhimento da anomalia ou do
esteretipo. H uma arte de temtica homoertica que defende caminhos para as questes afetivas dos
sujeitos ex-cntricos, trabalhando com o artifcio, com o onrico, com o impuro, com o abjeto, com os
excessos, tematizando o amor que no ousa dizer seu nome, e no perde de vista as questes humanas de
um modo geral, mesmo quando trata do caso de um mnimo eu se interessa em ser uma produo que se
dirige a todos os seres humanos. O homoerotismo tem sido um tema prolfico para a literatura e para as
outras artes, possibilitando aos artistas a criao de muitos textos sobre o sujeito dito desviante, perverso,
desde casos de ilustrao de perverses, conforme se pode ver claramente na produo literria de fins do
sculo XIX, at se chegar aos textos produzidos por homossexuais assumidos advindas dos 1970, que no
so publicados apenas para homossexuais lerem. A arte de temtica homoertica tanto masculina quanto
feminina, produzida por sujeitos homoeroticamente orientados ou no, mas tendo como tema central, em
sua maioria, relaes afetivas de sujeitos homoeroticamente orientados serve de base a discusses as mais
diversas. Embora essa arte esteja presente ao longo da histria da humanidade, ela passa a ser estudada a
partir dos anos 1980, tendo no Brasil deslanchado a partir da produo de um grupo de estudiosos
capitaneado por Jos Carlos Barcellos na Universidade Federal Fluminense. Muitas vezes vista como arte
produzida por marginais para um pblico marginalizado e falando desse mesmo pblico, as expresses
homoculturais na arte foram relegadas a um lugar de ex-centricidade e, muitas vezes, salvo raras excees,
excludas da chamada arte sria. O simpsio se interessa em discutir essa marginalizao e as relaes
entre a produo homocultural e a sociedade que a produz, levando em considerao seu contexto
histrico. As representaes da homocultura esto ligadas diretamente a cdigos de conduta de seus
produtores escritores, pintores, fotgrafos, escultores, msicos, cineastas dentre outros , e do pblico, o
que nos leva urgncia dessa proposta, pois o preconceito que os sujeitos homoerticos ainda sofrem pode
ser minimizado a partir da anlise das representaes de sujeitos homoeroticamente orientados, pois
estudar sobre elas um modo de entender e produzir discusses acerca da possibilidade de reduzir os danos
perpetrados pelo patriarcado com relao a esses sujeitos. H uma grande dificuldade de aceitao do que
seja homoertico em todos os nveis da cultura, remetendo sempre essa produo a um espao de
degradao, de decadncia da prpria arte. A produo homocultural no est inteiramente voltada para o
pblico gay, mas existe uma quantidade de obras para os vrios tipos de pblico existentes em um pas de
poucos leitores como o Brasil. Essa produo estaria nas representaes de figuras gays, de espaos, de
gneros literrios, de temas como a masturbao, o voyeurismo, a pornografia e a promiscuidade. O
simpsio insiste em obras literrias e expresses culturais (das artes plsticas, do cinema, da histria, do
espao biogrfico, das mdias, da msica etc.) que conduzam leitores e receptores a se identificarem com
suas personagens, seus dilemas, suas angstias, dores, carncias afetivas e sexuais. Neste sentido,
aceitaremos propostas de estudos crticos, histricos e tericos, da cultura e da literatura, que identifiquem
os papeis das masculinidades e feminilidades ao longo do tempo, alm de abordarem as homossexualidades
e o universo queer, bem como as identidades gays, lsbicas e transgneras. Contemplaremos a
problematizao e os desvios s alianas heteronormativas, juntamente com falas sobre a homofobia, o
bullying, as homoconjugalidades, as polticas de coming out, o preconceito, a solido e as unies afetivas
intergeracionais. Temos como principal objetivo reunir pesquisadores dos modos de subjetivao do desejo
homoertico em diversas comunidades lingusticas, nacionais, regionais, esperando contribuir para a
consolidao e o reconhecimento da homocultura a partir das formas por intermdio das quais se
representem, lado a lado com textualidades e hipertextualidades correlatas.
12. Literatura e Psicanlise: dos Rastros aos Restos da Dor
Hermano de Frana Rodrigues (UFPB)
Aristteles de Almeida Lacerda Neto (IFMA)
Com o texto Luto e Melancolia, Sigmund Freud confere ao mundo uma teorizao seminal, ainda hoje
referncia para a clnica e para a cultura, sobre os enigmas de uma das expresses mais radicais e
autnticas da dor de existir, do padecimento proveniente de nosso desamparo primordial, de nossa
insuficincia constitutiva. Nas sinuosidades da melancolia, habitam perdas alheias conscincia, angstias
de aniquilamento, impulsos flageladores do prprio desejo. O eu melanclico transborda-se, arruna-se,
deflete a agressividade para si mesmo, para quem odeia, para quem, em delrio, confunde-se com o algoz.
Mune-se das mais arcaicas defesas e, num ritual inconsciente de antropofagia, em defesa de si mesmo,
sorve o objeto amado, perdido, para sempre, em um tempo e espao que lhe escapam razo. Ao contrrio
do sujeito enlutado, cujas memrias ao amante ausente vo, aos poucos, perdendo seu investimento
libidinal, o que consente ao Ego retomar sua busca por novas ligaes afetivas, o melanclico soobra o
tempo, desliga-se dele e de tudo aquilo que poderia separ-lo do ente que, por um tempo, preservou-lhe a
vida. Sem cair em paradoxismos, subsiste na ameaa de sua prpria existncia, premido entre a instncia
mnemnica do passado e a miragem letfera de um futuro, num espao alucinatrio de um instante
fustigador, incerto e inconsistente. Qui resida, no carter dobradio do presente, o apreo do melanclico
pelo outrora, seu apelo transitoriedade, seus arroubos destrutivos frente aos fios da esperana, to frgeis
desde a origem. Como projeo, o futuro acede ao lugar da dvida, do incgnito e, por que no dizer, da
morte. Constitui uma construo espectral necessria porquanto instaura possibilidades de realizao do
desejo. Sob a orientao desse fantasma, percorremos os mais oblquos caminhos, a fim de impender
promessa do gozo absoluto (anseio continuamente fadado ao malogro). O artifcio longe de representar
um fracasso assegura-nos suportar as falhas da vida, to latentes e recrudescidas percepo
melanclica, da qual decorre um registro niilista do futuro. O porvir adquire, na arquitetura do
desabamento psquico, traos persecutrios. Da, as distintas tentativas de ignor-lo, o gesto de vilipendi-
lo a favor da adeso ao Outro, deslocado, entrementes, para dentro de si, a salvo dos efeitos mortferos do
tempo pstero. Tal contextura aparece, com constncia, nas letras literrias, arte hbil em tecer, em
profuses de linguagens, os movimentos inconscientes do esprito humano. A submisso palavra a mais
singela disposio ao engano, a mais suave expresso da falta. O engenho literrio ludibria o prprio
artfice que, perdendo-se nos labirintos das cadeias significantes, regula e mantm, em desequilbrio, o
compasso do desejo. Orquestrados pela melancolia, os signos artsticos passam a contornar a desordem
pulsional, num empreendimento defensivo do Eu para evitar, numa fuga onipotente escrita, o colapso
completo de si mesmo. O labor esttico lana sobre as fraturas do self uma quase imperceptvel camada de
verniz, sensvel em encobrir os sulcos ocasionados pelo agir desobjetalizante de Thanatos, destinado a
expurgar e a extinguir aquilo que se tornou intolervel. Se a letra falha (e ela sempre naufraga e, por
consequncia, alamos ao campo da insatisfao estruturante), as pulses respondem, introduzindo, na
elasticidade do significante, objetos relacionados s experincias primevas de satisfao. Fantasias orais,
escpicas, anais ou flicas ressurgem, de maneira a atribuir sentido indispensvel frustrao do homem,
sentenciado, desde o nascimento, a vagar errante procura de um objeto e de um status h muito perdidos.
O uso da palavra, ao render-se s flutuaes do smbolo, subtrai o gozo e d contorno aos apelos e
demandas ao Outro. Sua incompletude funda a condio desejante do sujeito, a qual reivindica a presena
de um eleito, alvo de amor e gratido ao suprir as exigncias do Ego, assim como depositrio de dio e
agressividade, quando desencadeador de privaes. Essa ambivalncia integra o curso natural da vida e
concorre para os acidentes imperiosos da alma que marcam a singularidade do sujeito na cultura. Na
qualidade de acontecimento subjetivo, o trajeto est longe de configurar um mandamento imposto a todos
e, portanto, extravios so habilidosamente desenhados. A melancolia , pois, um roteiro transviado,
seguido por aquele que, na aurora dos tempos, teve seu pedido de autonomia e reconhecimento negado,
ignorado, esquecido. Resulta, dessas consideraes, a proposta deste Simpsio Temtico: congregar
pesquisas (concludas ou em andamento) que, numa interlocuo entre literatura e psicanlise, busquem
analisar as dimenses representativas da melancolia, de modo a compreender as imagens e os discursos que
a cercam, bem como as configuraes que assumem em determinado momento da histria social e literria.
Com vistas a enriquecer o debate e as discusses, as investigaes podem debruar-se sobre a poesia, o
conto, o romance, a carta, a narrativa de viagem, entre outros gneros. REFERNCIAS BERLINK,
Luciana Chaui. Melancolia rastros de dor e de perda. So Paulo: Humanitas, 2008. FREUD, SIGMUND.
Luto e melancolia. In: Obras Completas, v. XIV. Rio de Janeiro: Imago, 1976. KEHL, Maria Rita. O tempo
e o co a atualidade das depresses. So Paulo: Boitempo, 2009. KRISTEVA, Julia. Sol negro
depresso e melancolia. Rio de Janeiro, Rocco, 1989. SCLIAR, Moacyr. Saturno nos trpicos a
melancolia europeia chega ao Brasil. So Paulo: Cia das Letras, 2003.
13. Literatura e Dissonncia
Andr Dias (UFF)
Rauer Ribeiro Rodrigues (UFMS)
A proposta do simpsio examinar a manifestao da dissonncia nos discursos literrios, para discutir o
modo pelo qual os mais variados autores se constituram, atravs desses discursos, como vozes
questionadoras de seus tempos e de suas sociedades. O tema est associado aos artistas e intelectuais que
analisaram de maneira profunda aspectos primordiais das mais variadas pocas e construram uma crtica
aos valores presentes nessas realidades sociais. A ideia central abrir espao para o dilogo entre
pesquisadores que concentram o olhar sobre autores e intelectuais que divergiram das ideologias
dominantes, na poesia e na prosa, nos mais variados momentos histricos, nacionalidades ou segmentos
sociais. O que se espera que os trabalhos apresentados discutam, entre outras questes, o problema
terico do intelectual frente s variadas ideologias, quer sejam elas hegemnicas ou no, e o problema
histrico dos escritores diante do status quo, manifestado no mbito da poltica, da moral, dos costumes, da
economia, etc. Mikhail Bakhtin falando sobre o grande tempo histrico e o trabalho dos escritores chama
ateno para o seguinte fato: o prprio autor e os seus contemporneos vem, conscientizam e avaliam
antes de tudo aquilo que est mais prximo do seu dia de hoje. O autor um prisioneiro de sua poca, de
sua atualidade. Os tempos posteriores o libertam dessa priso, e os estudos literrios tm a incumbncia de
ajud-lo nessa libertao (BAKHTIN, 2003, p. 364). Sendo assim, ao abordarmos a temtica Literatura e
Dissonncia temos clareza de que todo autor, para o bem e para o mal, antes de tudo um homem de seu
tempo. Aos que se ocupam da investigao literria lhes cabe a tarefa de, dialogicamente, atualizar os
diversos discursos literrios produzidos nos mais variados tempos e espaos histricos. Sobre a criao
romanesca Bakhtin adverte que o autor-artista pr-encontra a personagem j dada independentemente do
seu ato puramente artstico, no pode gerar de si mesmo a personagem esta no seria convincente
(BAKHTIN, 2003, 183 184). Em outras palavras, nenhuma personagem fruto do gnio criador de um
autor admico, pois a matria de memria da literatura est no mundo social, local de onde os escritores
extraem os motivos para criar. De maneira anloga, a palavra do outro fundamental para a tomada de
conscincia de si e do mundo, conforme aponta ainda Bakhtin: como o corpo se forma inicialmente no
seio (corpo) materno, assim a conscincia do homem desperta envolvida pela conscincia do outro.
(BAKHTIN, 2003, p. 374). Dessa forma, as premissas bakhtinianas apresentadas aqui fundamentam o
desenvolvimento das nossas reflexes e ajudam a ampliar os sentidos das anlises. O frum, observada a
perspectiva da dissonncia no mbito de estudos de literatura e do comparativismo, acata propostas que vo
desde o enfoque do ensino da literatura discusso terica dos fluxos, correntes, trnsitos e tradues
literrias. De modo que, seja no mbito das territorialidades cujos limites se esvaem diante da
instantaneidade das comunicaes globais, seja no mbito do regional esvaziado no mesmo diapaso em
que os conceitos de literatura e de literariedade vigentes nos sculos XIX e XX perdem sentido com as
realizaes e as propostas estticas dos autores do sculo XXI, procura-se o dissonante na antiga ordem
hierarquizada, no recente e finado mundo bipolar ou no universo multilateral que se instaura. H que se
considerar, ainda, estudos comparativos entre autores que, mesmo distantes no tempo e no espao, fixam a
seu modo o questionamento de valores hegemnicos, constituindo uma famlia literria pela vinculao da
rebeldia e da inquietao. Do ponto de vista da historiografia literria, qualquer que seja o modo analtico
proposto, os problemas se sucedem, pois os ltimos anos tm sido de deslocamento incessante dos
postulados tericos, cujos embates com o mundo concreto vem sendo cada vez mais inglrios,
considerando a acelerada mutabilidade das circunstncias sociais, polticas, histricas e das representaes
simblicas, no mbito das artes em geral e da literatura em particular. Levantar questionamentos, de
preferncia contundentes, e, eventualmente, produzir alguma concluso, ainda que dissonante e provisria,
o que se espera alcanar. Referncias Bibliogrficas BAKHTIN, Mikhail. Esttica da criao verbal.
Trad. Paulo Bezerra. 4. ed. So Paulo: Martins Fontes, 2003. BOSI, Alfredo. Literatura e resistncia. So
Paulo: Cia das Letras, 2002. DIAS, Andr. Lima Barreto e Dostoivski: vozes dissonantes. Niteri, RJ:
Editora da UFF, 2012. SARTRE, Jean-Paul. Que literatura? Trad. Carlos Felipe Moiss. So Paulo:
tica, 1989. TEZZA, Cristovo. Entre a prosa e a poesia: Bakhtin e o formalismo russo. Rio de Janeiro:
Rocco, 2003. TEZZA, Cristovo. O esprito da prosa: uma autobiografia literria. Rio de Janeiro; Record,
2012. VARGAS LLOSA, Mrio. A verdade das mentiras. Trad. Cordelia Magalhes So Paulo: ARX,
2004.
14. Literatura e Outras Linguagens Criativas: tradues e confluncias
Hugo Lenes Menezes (IFPI)
Elizabeth Gonzaga de Lima (UNEB)
O homem, dentre outras faculdades, possui linguagem, a qual corresponde a uma habilidade simblica
e abrange todos os tipos de significao: da linguagem das abelhas verbal, que a espcie de
comunicao humana por excelncia, passando pela mmica, musical, pictrica e cintica, para ficarmos
nesses exemplos. E uma das questes de maior evidncia no campo em foco a do texto, cuja importncia
advm do ntimo relacionamento que ele mantm com o ser humano, a realidade e a expresso, pois
atravs do texto que expressamos a nossa relao com o mundo e com os outros, ou seja, o homem
textualizando, significando o real, se significa (CASTRO, 1985, p. 31). Desse modo, podemos entender
que no s as comunicaes verbais, mas tambm quaisquer manifestaes de linguagem so passveis de
serem concebidas como textos. Isso porque o vocbulo texto pode ser tomado em dois sentidos: texto lato
sensu qualquer tipo de comunicao realizado atravs de um sistema de signos (FVERO; KOCH,
1988, p. 25), como uma fotografia, uma msica, ou um poema; texto stricto sensu equivale a qualquer
passagem, falada ou escrita, que forma um todo significativo, independente de sua extenso (FVERO;
KOCH, 1988, p. 25). Tal fenmeno ocorre pelo processo de traduo, inerente humanidade, a comear
pela percepo circundante, atravs do que os dados da realidade, quando aportam ao intelecto, so
traduzidos em signos, de onde surgem outros processos fundamentais, como a comunicao e o raciocnio.
Em semelhante contexto, a crtica esttico-literria, na condio de leitura e (re)escrita especializada,
representa uma modalidade de traduo, podendo ser essa, igualmente crtica, to criativa quanto a
elaborao de uma obra de arte verbal ou no-verbal, no obstante o lugar-comum de serem o crtico e o
tradutor escritores frustrados, ideia contestada, no caso especfico do crtico, por Bella Josef, em seu ensaio
O jogo mgico (1980), em que ela faz uma curiosa abordagem acerca do encantamento do jogo da
linguagem criativa, particularmente, a literria, da qual so intrpretes tanto o crtico quanto o tradutor. Em
se tratando da traduo intersemitica, daquela referente a mais de uma semiose, estamos diante da
transposio de um sistema significante a outro: por exemplo, do literrio ao cinematogrfico ou ao
televisivo, atividade mais conhecida por adaptao. Entendida aqui a traduo tout court como um
processo de (re)criao, a traduo intersemitica revela-se uma (re)criao de maior ousadia e
complexidade. Uma ilustrao da prtica ocorre com produes escritas reeditadas mediante cdigos
rebentos da fico seriada oitocentista. Entre tais cdigos, encontra-se a histria em quadrinhos. Essa, que
flerta com a stima arte, origina as fotonovelas, que, juntamente com os quadrinhos, roubam do romance-
folhetim as pginas nas revistas. E o mencionado gnero romanesco se insinua via fita-em-srie norte-
americana. Outrossim, o romance em causa tambm vem a pblico como radionovela e novela de televiso,
de onde a ltima, usualmente, ser denominada folhetim eletrnico. Assim sendo, no simpsio ora
proposto, objetivamos reunir pesquisadores que abordam as relaes comparatistas entre literatura, leitura e
mdias; os diversos processos culturais, enquanto formas de traduo, em meio s confluncias que se
revelam entre o discurso esttico-verbal e as demais linguagens criativas. At porque, em nossos tempos, a
mundializao, ou globalizao, aprofunda, a um s tempo, a integrao e a diversidade cultural dos povos,
realando aspectos tnico-religiosos e regionais. No Brasil, entre 1960 e 1970, com o boom das teorias
literrias imanentistas, a apreciao especializada da criao artstica verbal tende a se distanciar da
investigao da conjuntura histrico-cultural e a se concentrar no texto em si. Porm, aps o final da
dcada de 1980, com o debate acerca da memria coletiva, voltam a crescer os juzos de valor atentos
relao do autor e a sua obra com o contexto social. Por isso, desejamos, com a constituio de um grupo
de trabalho, promover discusses a respeito da interculturalidade em prosa e verso, preferencialmente, em
literaturas de regies de falantes da lngua portuguesa, em especial no Brasil, na frica e na Europa,
incluindo autores como Oswald de Andrade, Clarice Lispector, Guimares Rosa, Joo Cabral de Melo Neto
e Fernando Pessoa, em sua traduo e em sua recepo crtica por analistas do quilate do brasileiro
Benedito Nunes, tambm autor de textos de filosofia, narrativas ficcionais e poemas, ao lado de
contemporneos e conterrneos seus, como Ruy Barata, Paulo Plnio Abreu e Max Martins, alm de ser
autor de crticas sobre outras manifestaes artsticas, a exemplo da teatral. Ainda dentro da temtica em
epgrafe, isto , a relao entre literatura e outras linguagens criativas: tradues e confluncias, so bem-
vindas, ao simpsio apresentado, comunicaes referentes a autores como Lima Barreto, Ingls de Sousa,
Bernardo Guimares, Jos de Alencar, Machado de Assis, Alexandre Herculano, Almada Negreiros,
Almeida Garrett, Al Berto, Camilo Castelo Branco, Cesrio Verde, Ea de Queiroz, Jlio Dinis, Mia
Couto, Pepetela, entre outros do vernculo e de lnguas estrangeiras. Referncias Bibliogrficas CASTRO,
Manuel Antnio de. Natureza do fenmeno literrio. In: SAMUEL, Rogel (Org.). Manual de teoria
literria. Petrpolis: Vozes, 1985. FVERO, Leonor Lopes; KOCH, Ingedore G. Villaa. Texto e discurso.
In: Lingustica textual: introduo. So Paulo: Cortez, 1988. JOSEF, Bella. O jogo mgico. Rio de Janeiro:
Jos Olympio, 1980. MAYER, Marlyse. Folhetim: uma histria. So Paulo: Companhia das Letras, 1996.
PLAZA, Julio. Traduo intersemitica. So Paulo: Perspectiva, 2003.
15. Portugal Ps-Colonial: Histria e Trauma na Cultura Lusfona Contempornea
Aparecida de Ftima Bueno (USP)
Lisa Carvalho Vasconcellos (UFBA)
notvel e significativo que o vasto territrio que denominamos como cultura portuguesa quer seja na
forma ensastica da crtica literria e da investigao histrica, quer seja no campo das artes plsticas, da
literatura ou do cinema vem se ocupando, majoritariamente, da difcil tarefa da revisitao dos traumas e
das memrias daquele que foi, sem dvida, um dos perodos mais duros da histria do pas, a Guerra
Colonial e seus desdobramentos internos e externos, coletivos e individuais. Nesse contexto, a elaborao
do passado colonial se impe como um dos principais temas da vida portuguesa contempornea.
Como se sabe, Portugal foi um dos ltimos pases da Europa a manter possesses coloniais na frica. S
em 1974, com a Revoluo de Abril e depois de longos e sangrentos combates que se arrastaram (a custos
altssimos) desde o incio dos anos 1960, as antigas colnias de Angola, Moambique, Guin-Bissau, So
Tom e Prncipe e Cabo Verde adquiriram a sua independncia. A violncia usada para conquistar, povoar
e manter subjugados esses territrios e seus povos durante sculos (com a intensificao da explorao
tomando flego no sculo XX) no poderia deixar de gerar traumas profundos tanto nos portugueses
quanto nos africanos. As mortes, as perdas e a mutilao de milhares de jovens; as violncias, o
aprisionamento e as torturas cometidas contra os insurgentes; alm do impacto social dos Retornados so
alguns dos temas ligados ao processo de descolonizao da frica portuguesa que assombram ainda hoje
lusitanos e africanos lusfonos, impondo-se, por esse motivo, como matria fundamental para artistas e
estudiosos da vida econmica, poltica e espiritual dos pases envolvidos. Dizendo mais claramente: as
artes portuguesas e africanas tem se dedicado sistematicamente elaborao discursiva, e tambm
psicanaltica, possvel dizer, de um trabalho de luto que ainda est por se completar.
Contemporaneamente, tanto as letras como a filmografia portuguesas so ricos em exemplos nesse sentido.
No universo da literatura poderamos nos lembrar de nomes como o do romancista Antnio Lobo Antunes,
cujos romances O esplendor de Portugal (1995) e Comisso das Lgrimas (2011) so modelos do que
afirmamos. Dentre a produo mais recente, poderamos destacar ainda o trabalho o da escritora Isabela
Figueiredo e seus Cadernos de Memrias Coloniais (2008), que aqui se soma, entre outros, aos muitos
poetas (consagrados e desconhecidos) que esto reunidos na importante Antologia da Memria Potica da
Guerra Colonial (2011), volume organizado pelos pesquisadores Roberto Vecchi e Margarida Calafate
Ribeiro. No cinema, por sua vez, recordamo-nos de Tabu (2012), de Miguel Gomes, Natureza Morta
(2005) de Susana Sousa Dias e Fantasia Lusitana (2010) de Joo Canijo, algumas das obras centrais nesse
processo de recuperao da memria dos conflitos e de reflexo sobre os seus fundamentos e persistncias.
Dada a complexidade da questo e as suas muitas implicaes polticas e sociais (que incluem, preciso
reconhecer, resistncias de todo tipo a uma compreenso crtica das violncias experimentadas no perodo),
faz-se necessrio entender em profundidade o papel da arte e do pensamento nesse contexto, especialmente
nas ltimas duas dcadas, quando a urgncia do tema se estabeleceu com cada vez mais fora no cenrio do
pensamento social europeu e latino-americano. O presente simpsio se prope a estudar, e pensar de modo
integrado, o cinema e a literatura em suas mltiplas manifestaes, entendendo-os como lugar privilegiado
para a elaborao das perdas e das violncias praticadas, e tambm da construo de perspectivas futuras.
Postas as coisas assim, gostaramos de convidar professores e pesquisadores das Letras, em especial da
Literaturas Lusfonas e dos Estudos Comparados, alm de pesquisadores de reas afins como a Histria, a
Antropologia, as Artes e as Cincias Polticas para que possamos, na soma dos esforos e pontos de vista,
construir um debate amplo e multifacetado sobre a questo. Para efeito da organizao do simpsio,
sugerimos os seguintes temas de trabalho, em torno dos quais as propostas enviadas poderiam se mover, na
medida em que se relacionem ao cinema ou literatura portuguesa: 1. Recordaes e reencenaes da
Guerra Colonial; 2. O processo da Revoluo dos Cravos; 3. Representaes da vida nas prises e campos
de concentrao portugueses na costa africana (Tarrafal e Ilha das Galinhas, entre outros); 4. Arquivos do
salazarismo e das instituies coloniais; 5. A questo do testemunho no mundo lusfono.
16. Afro-Latinidades, Construes Identitrias e Disporas do Atlntico
Rosilda Alves Bezerra (UEPB)
Alcione Correa Alves (UFPI)
O simpsio Afro-latinidades e disporas do Atlntico, em uma primeira formulao de seus objetivos,
pretende abrigar comunicaes orais que proponham problemas de pesquisa postos a partir da noo
norteadora de afro-latinidade. Tais comunicaes, no mbito deste simpsio, acolhero trabalhos que
dizem respeito a pesquisas em Estudos Literrios, seja concludas ou em andamento, buscando examinar e
dissertar sobre apropriaes e construes identitrias, a partir de dois eixos: a) relativas a suas
representaes nas literaturas africanas contemporneas, notadamente nas literaturas africanas de lngua
portuguesa, embora no apenas a estas; e b) relativas a suas representaes nas literaturas afro-americanas
(ou, conforme o aporte terico de cada comunicao, nas literaturas negras americanas), tomadas
preferencialmente a partir de e desde um lugar americano. Tambm podem ser acolhidas, no mbito deste
simpsio, comunicaes orais que abordem o problema de pesquisa mediante recurso ao conceito de
dispora, dizendo respeito s formas de trnsito, de travessia, de migrao estabelecidas, a partir do sculo
XVI, entre os continentes africano, europeu e americano: neste caso, privilegia-se pesquisas centradas no
advento da escravizao de populaes africanas nas trs Amricas, assim como seus corolrios em
construes identitrias afro-americanas verificveis nas literaturas das trs Amricas e do Caribe, seja em
lnguas de origem africana (como, por exemplo, o papel da lngua crole em uma histria possvel da
literatura nas Antilhas, no Haiti), seja em uma das lnguas ocidentais presentes nas obras literrias negras
americanas (notadamente o espanhol, o francs, o portugus e o ingls). Tambm sero acolhidas, nos
domnios deste simpsio, comunicaes orais que busquem problematizar a abrangncia e/ou os limites
crticos postos s noes e conceitos centrais em jogo: por exemplo, comunicaes que exponham limites
prprios ao conceito de dispora, rumo a uma compreenso das literaturas afro-americanas; ou, por outro
vis, pesquisas que examinem os limites ao conceito de literatura afro-brasileira (conforme, por exemplo, a
definio do pesquisador Eduardo de Assis Duarte, recorrente mas no unnime no campo dos Estudos
tnicos brasileiros), assim como ao conceito mais geral de literatura afro- enquanto parte integrante de uma
literatura nacional mais ampla (como, por exemplo, o que tem feito a pesquisadora Silvia Valero em suas
pesquisas recentes, estabelecendo limites crticos a uma noo de literatura afro-colombiana). Como um
dos muitos referenciais tericos basilares a esta proposta, situamos o que o filsofo martinicano douard
Glissant em Introduction une potique du Divers (1996) concebe como pensamento de trao, do que
decorre tanto a noo de construes identitrias quanto o conceito de dispora com o que ascomunicaes
orais estabelecero dilogo, no decorrer dos trabalhos do simpsio. Para tanto, preconiza-se uma
abordagem transdisciplinar como forma de traduo da diferena, na potencialidade de evidenciar traos
(ou, conforme o aporte terico de cada comunicao, rastros/resduos) destes sujeitos, sob a hiptese de
que distintos universos de significados instauram possibilidades de conciliao que no poderiam ser
previstas por campos disciplinares isolados. Este simpsio pretende acolher comunicaes, que versem
sobre processos de construes identitrias africanas e afro-americanas, em si e em relao a outros grupos
tnicos. Recomenda-se que as propostas de comunicao submetidas se apropriem de referenciais tericos
capazes de propor novas ressignificaes, que evidenciem os entre-lugares da tradio e suas constantes
renovaes; assim como propostas com referenciais crticos a abordagens dicotmicas entre os
pensamentos europeu e americano, bem como a maniquesmos do tipo colonizador/colonizado, com vistas
a estimular a compreenso do Diverso prprio s construes identitrias afro-americanas. Cumpre
salientar que este simpsio busca intensificar redes de trabalho j formadas, assim como agregar novas(os)
pesquisadoras(es) e perspectivas de trabalho, esforo norteado, no quadro deste simpsio, pela noo de
redes intelectuais a partir da formulao do filsofo chileno Eduardo Devs (2007). Por fim, ressalta-se
que este simpsio tem sido proposto, executado e apoiado no mbito dos Grupos de Pesquisa
Americanidades: lugar, diferena e violncia e Literatura e cultura afro-brasileira, africana e da dispora,
ambos cadastrados no Diretrio de Grupos de Pesquisa no Brasil/CNPq. Esta nova etapa busca,
simultaneamente, prolongar trabalhos acadmicos e consolidar redes j iniciadas em simpsios recentes
realizados, pelo Grupo de Pesquisa Americanidades: lugar, diferena e violncia, no II Encuentro de las
Ciencias Humanas y Tecnologicas para la integracin em Amrica Latina y Caribe (ECHTEC, realizado
em Bogot, em 2013); e no V Congreso Interocenico de Estudios Latinoamericanos (realizado em
Mendoza, em 2014); assim como nas duas edies anteriores do Congresso Internacional da ABRALIC.
Palavras-chave: dispora; literaturas africanas; afro-latinidades; pensamento latino-americano; redes
intelectuais na Amrica Latina.
EIXOS TEMTICOS POSSVEIS:
1. Construes identitrias africanas, afro-americanas e afro-brasileiras (em si e em relao a outros grupos
tnicos);
2. Estudos de literaturas afro-americanas e afro-brasileiras);
3. Dispora africana (sculos XVI a XIX);
4. Perspectivas tericas sobre os temas em questo, desde um lugar americano;
5. Abordagens transdiciplinares sobre os temas africano, afro-americano e afro-brasileiro;
6. Apontamentos a uma epistemologia do lugar afro-americano e afro-brasileiro;
7. Construo de redes intelectuais afro-americanas e afro-brasileiras.
17. Figuras do espao: deslocamento, memria e traduo
Mas Lemos (UNIRIO)
Javier Uriarte (Stony Brook University)
possvel pensar o deslocamento como traduo? Em que sentidos podemos articular a legibilidade do
espao como operaes de memria? Como elas constroem o arquivo e o transformam? Como pensar a
memria e o passado em relao ao movimento no espao? Afinal, deslocar-se implica um ato de escrita e
um processo de leitura, de traduo e de construo do mundo; eis alguns dos assuntos que o presente
simpsio prope debater. Nele, daremos continuidade s atividades do Grupo de Pesquisas do CNPq
"Literatura e Linguagens: fronteira, espao, performance, memria" sediado na Unirio, e desdobraremos
questes desenvolvidas no mbito do Colquio Internacional Figuras do espao na literatura e nas artes,
realizado em 2014 na Unirio. Esperamos, assim, nesta Abralic, ampliar o desenvolvimento das pesquisas
deste grupo pela interao com outros pesquisadores e com pesquisas compatveis, tanto no plano temtico
quanto terico. O simpsio procurar introduzir a variante do espao como importante modo de
agenciamento das enunciaes e de processos artsticos de criao de memria nas letras e nas artes em
geral. Tendo em vista que o protagonismo do tempo e da histria se fixou de modo dominante nas
linhagens e perspectivas interpretativas da crtica literria e da crtica de arte em geral, a ideia retomar as
mediaes possveis das constelaes espaciais e seus efeitos para as elaboraes e procedimentos
artsticos. Por se produzirem e modelarem-se espacialmente, as noes de fronteira, de limite, de conflito
configuram-se como figuras do espao pertinentes para a discusso da presente proposta (Michel Foucault,
Gilles Deleuze, Michel de Certeau, Jean-Luc Nancy). Deste modo, o presente simpsio objetiva promover
discusses sobre as noes de deslocamento, de memria e de traduo e de suas possveis articulaes na
literatura, nas artes, na etnografia e na geografia, alm de discutir o funcionamento dessas noes como
operadores crticos capazes de traduzir a experincia artstica e scio-cultural moderna e contempornea,
no que ela possibilitaria para as trocas interculturais, interlingsticas e interartsticas sob o impacto das
inter e transdisciplinaridades e do debate sobre o lugar da autonomia da arte. (Homi Bhabha, Antoine
Berman, Jean-Luc Nancy, Josefina Ludmer e Jean-Marie Gleize). Temas como a literatura dos viajantes e
dos escritores viajantes, as relaes da literatura com a heterogeneidade dos espaos, com as paisagens
culturais e suas fronteiras discursivas, com os espaos de conflito, de limites e de exterioridades so
produtivos para se compreender o deslocamento como paradigma interpretativo dos efetivos trnsitos entre
especificidades e saberes das textualidades disponveis na tradio literria e nas narrativas
contemporneas (Mary Louise Pratt, Caren Kaplan, Georges Van den Abbeele, James Clifford, Ottmar
Ette, Edward Said). O espao, o deslocamento e a memria sero considerados, igualmente, como maneiras
de interveno no mundo e de experimentao do real, apontando para o minimalismo e, sobretudo para a
land art e seus atuais desdobramentos, tais como o walkscape, as escritas cartogrficas, a interveno
urbana, os dispositivos poticos, dentre outros, prticas artsticas que tm sido pensadas por Gilles
Tiberghien, Anne-Marie Coquelin, Rosalind Krauss, Nelson Brissac-Peixoto, Michel Collot, Georges Didi-
Huberman, Christophe Hanna, entre outros. Desenvolvendo reflexes sobre as performances literrias,
artsticas e historiogrficas do arquivo enunciadas por Walter Benjamin, Jacques Derrida, Michel Foucault,
Gilles Deleuze, Didi-Huberman, Amy Warburg e Diana Taylor, pretende-se deslocar conceitos
estabelecidos, como os de obra, autoria e literatura, percebendo como a memria do arquivo pe em
trnsito textualidades amplas e complexas. Destaque-se, nesse sentido, diversas modalidades de
apropriao de imagens alheias, de obras e documentos da histria da arte e da histria em geral,
atualmente entendidas como deslocamentos e recontextualizaes e no mais no como mera referncia ou
citao. Os objetos artsticos, retirados de seus contextos e postos em relao com outros elementos (outras
imagens, outros textos e outros registros sonoros), fragmentos de obras e documentos ganham novos
sentidos. Inseridos em novas sries associativas, suscitam novas leituras e interpretaes. A atual
instrumentalizao da alta tecnologia e do forte domnio e conhecimento sobre o mundo tem-se mostrado
ineficaz para que alcancemos um sentido para a habitao do homem no mundo. Nas perspectivas
contemporneas sobre a arte e a literatura impe-se a criao de possibilidades de um mundo que pode ser
atualizado mediante a reorganizao e a recontextualizao de estratgicas literrias e artsticas das figuras
do espao. As figuras do espao aqui evocaro, portanto, novos sentidos para a habitao na
contemporaneidade.
18. Margens Imaginadas II - Ps-Colonialismo e a Questo da Nacionalidade
Telma Borges (Unimontes)
Sebastio Alves Teixeira Lopes (UFPI)
No ensaio Whose imagined community? Comunidade imaginada por quem? (2000), Partha Chaterjee
reflete sobre a construo da nacionalidade no contexto ps-colonial. Trata-se de uma reflexo que
claramente dialoga com o aclamado texto de Benedict Anderson, Imagined communities: reflections on the
origin and spread of nationalism (1991). Chaterjee segue a linha de raciocnio de Anderson, no sentido de
aceitar a noo de nacionalidade como algo imaginado, colocando essa questo no contexto ps-colonial da
ps-independncia poltica em que vrias ex-colnias precisam se pensar enquanto naes, mas
demarcadas por fronteiras, muitas das quais arbitrrias, impostas pelo jugo colonialista europeu. Parta
Chaterjee observa como e por quem os valores simblicos dessas naes so construdos e porque mais
importante do que se preocupar com os limites artificiais que lhes foram impostos durante o domnio
colonial. O presente simpsio pr