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Departamento de Engenharia Química e Materiais Síntese do espinélio Fe 2 CoO 4 nanoestruturado via decomposição térmica de nitratos e tratamento térmico em temperaturas elevadas Aluno: Felipe Cardoso Moreira Rozenberg Orientador: Rogério N. C. de Siqueira Co-orientador: Eduardo de Albuquerque Brocchi 1 - Introdução Espinélios são minerais do tipo XY 2 O 4 que se cristalizam no sistema cúbico, onde X e Y são metais divalentes e trivalentes (em alguns casos, polivalentes). Já há comprovada aplicação tecnológica sobre alguns espinélios, como: Al 2 CoO 4 (catalisador no processo de remoção de fuligem em motores a diesel [1]), Fe 2 CoO 4 (oxidação de compostos orgânicos e propriedades magnéticas [2]). Adicionalmente, sabe-se que diversas propriedades são melhoradas quando o tamanho de partícula se torna nano, e, nesse contexto, as rotas químicas via co-precipitação dos óxidos precursores são especialmente indicadas [3], principalmente, quando na presença de um estabilizador, por exemplo PVA. Finalmente, espinélios podem apresentar desordem catiônica induzida seja termicamente ou a partir de excitação eletrônica [3,4]. Tal característica pode ser quantificada/monitorada, por exemplo, por difração de raios X [5], e é de extrema importância, dado que diversas propriedades dependem da mesma, como, por exemplo, a mencionada atividade catalítica. 2 - Objetivos Síntese e caracterização de amostras de Fe 2 CoO 4 puras nanoestruturadas a partir da decomposição térmica de soluções de nitratos com PVA e tratamento térmico em temperaturas elevadas - 600°C a 900 o C. Em um segundo momento, o potencial catalítico do espinélio de interesse no que se refere à oxidação de resíduos orgânicos (ex. pigmentos, biomassa) em atmosferas oxidantes será estudado mediante experimentos de termogravimetria. 3 - Metodologia O processo tem como partida nitratos dos respectivos metais. Calcula-se a massa de nitrato e volume de água necessários para preparar soluções 0,1 M. Em seguida, 4,9g de álcool polivinílico (PVA) foram dissolvidos em 50mL de álcool isopropílico e 50mL de H 2 O, sob aquecimento (80 90ºC) e agitação constante, até dissolução do PVA e em seguida adicionamos volumes controlados das soluções de nitratos (27,5mL de nitrato de cobalto e 55mL de nitrato de ferro). A solução final é então aquecida a 90 o C durante 24hs, levando à formação de um gel que em seguida é seco. Passado esse tempo, o material sólido é então pré-calcinado a 220°C (durante 1h) e em seguida 350°C (durante mais 1h). O pó resultante em seguida calcinado em forno mufla em temperatura controlada (600°C 900 o C) para tempos variados (3h 24hs). As amostras obtidas foram caracterizadas via difração de raios-x (DRX), microscopia eletrônica de varredura (MEV) e microscopia eletrônica de transmissão (MET).

Síntese do espinélio Fe2CoO4 nanoestruturado via ... · Tanto na figura 6 como na 8 foi possível observar a distribuição homogênea dos metais (Fe e Co) e do oxigênio, Figura

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Departamento de Engenharia Química e Materiais

Síntese do espinélio Fe2CoO4 nanoestruturado via decomposição

térmica de nitratos e tratamento térmico em temperaturas elevadas

Aluno: Felipe Cardoso Moreira Rozenberg

Orientador: Rogério N. C. de Siqueira

Co-orientador: Eduardo de Albuquerque Brocchi

1 - Introdução

Espinélios são minerais do tipo XY2O4 que se cristalizam no sistema cúbico, onde

X e Y são metais divalentes e trivalentes (em alguns casos, polivalentes). Já há

comprovada aplicação tecnológica sobre alguns espinélios, como: Al2CoO4 (catalisador

no processo de remoção de fuligem em motores a diesel [1]), Fe2CoO4 (oxidação de

compostos orgânicos e propriedades magnéticas [2]). Adicionalmente, sabe-se que

diversas propriedades são melhoradas quando o tamanho de partícula se torna nano, e,

nesse contexto, as rotas químicas via co-precipitação dos óxidos precursores são

especialmente indicadas [3], principalmente, quando na presença de um estabilizador, por

exemplo PVA.

Finalmente, espinélios podem apresentar desordem catiônica induzida seja

termicamente ou a partir de excitação eletrônica [3,4]. Tal característica pode ser quantificada/monitorada, por exemplo, por difração de raios X [5], e é de extrema

importância, dado que diversas propriedades dependem da mesma, como, por exemplo,

a mencionada atividade catalítica.

2 - Objetivos

Síntese e caracterização de amostras de Fe2CoO4 puras nanoestruturadas a partir

da decomposição térmica de soluções de nitratos com PVA e tratamento térmico em

temperaturas elevadas - 600°C a 900oC. Em um segundo momento, o potencial catalítico

do espinélio de interesse no que se refere à oxidação de resíduos orgânicos (ex.

pigmentos, biomassa) em atmosferas oxidantes será estudado mediante experimentos de

termogravimetria.

3 - Metodologia

O processo tem como partida nitratos dos respectivos metais. Calcula-se a massa

de nitrato e volume de água necessários para preparar soluções 0,1 M. Em seguida, 4,9g

de álcool polivinílico (PVA) foram dissolvidos em 50mL de álcool isopropílico e 50mL

de H2O, sob aquecimento (80 – 90ºC) e agitação constante, até dissolução do PVA e em

seguida adicionamos volumes controlados das soluções de nitratos (27,5mL de nitrato de

cobalto e 55mL de nitrato de ferro). A solução final é então aquecida a 90oC durante 24hs,

levando à formação de um gel que em seguida é seco. Passado esse tempo, o material

sólido é então pré-calcinado a 220°C (durante 1h) e em seguida 350°C (durante mais 1h).

O pó resultante em seguida calcinado em forno mufla em temperatura controlada (600°C

– 900oC) para tempos variados (3h – 24hs). As amostras obtidas foram caracterizadas

via difração de raios-x (DRX), microscopia eletrônica de varredura (MEV) e microscopia

eletrônica de transmissão (MET).

0 100 200 300 400 500 600 700 8000

1

2

3

4

5

6

File: C:\HSC6\Gibbs\IC_CoNO3.OGI

C

kmol

Temperature

H2O(g)

NO2(g)

Co(NO3)2*6H2OCo(NO3)2

NO3(g)

N2O5(g) Co3O4

4 – Resultados

4.1 Avaliação termodinâmica

A fim de analisar a viabilidade das reações, faremos uma avaliação termodinâmica

dos compostos envolvidos e suas respectivas reações.

4.1.1 Decomposição dos nitratos

4.1.1.1 Nitrato de cobalto hexaidratato

𝐶𝑜(𝑁𝑂3)2 ∙ 6𝐻2𝑂 → 𝐶𝑜3𝑂4 + 6𝐻2𝑂 + 𝑦𝑁𝑂𝑥 (1)

Figura 1: Decomposição térmica Co(NO3)3.6H2O

4.1.1.2 Nitrato de ferro (III) nonaidratato

𝐹𝑒(𝑁𝑂3)3 ∙ 9𝐻2𝑂 → 𝐹𝑒2𝑂3 + 9𝐻2𝑂 + 𝑦𝑁𝑂𝑥 (2)

Não há, no HSC 6.0, nitrato de ferro na base de dados. Contudo, há evidências na

literatura [3] da decomposição do nitrato férrico em óxido férrico, água e óxidos de

nitrogênio.

4.1.2 Decomposição do óxido de Cobalto

Em nosso sistema, temos Co3O4, então analisaremos as hipóteses de, tanto o

próprio Co3O4 reagir com Fe3O4 formando o espinélio quanto ele se decompor em CoO

e então reagir. Vejamos, então, a viabilidade da seguinte reação:

𝐶𝑜3𝑂4 → 3𝐶𝑜𝑂 +

1

2𝑂2 ∴ 𝐾 = (𝑃𝑂2

)0.5

(3)

-8,210

-8,200

-8,190

-8,180

-8,170

-8,160

-8,150

-8,140

-8,130

-8,120

60

06

15

63

06

45

66

06

75

69

07

05

72

07

35

75

07

65

78

17

96

81

18

26

84

18

56

87

18

86

Del

taG

[kc

al]

Temperatura [ºC]

Do HSC6, obtemos dados de delta G, temperatura, constante de equilíbrio (K) e,

consequentemente, pressão parcial de O2 (PO2). Assim, foi obtida a figura 2 a fim de ver

a viabilidade da reação nas temperaturas desejadas.

Figura 2: Gráfico PO2[atm] X Temperatura [ºC]

Como o meio reacional é o ar atmosférico, a pressão parcial de O2 é de,

aproximadamente, 0,21atm. Pela figura 2, nota-se que, a 600ºC, não há reação (pressão

de equilíbrio aproximadamente 0). Já a 900ºC, a pressão supera 0,30atm, deslocando o

equilíbrio para a direita (decomposição). Assim, a 600ºC não há monóxido de cobalto,

enquanto a 900ºC, sim.

4.1.3 Reação de formação do Fe2CoO4

4.1.3.1 Utilizando CoO

𝐹𝑒2𝑂3 + 𝐶𝑜𝑂 → 𝐹𝑒2𝐶𝑜𝑂4 (4)

Do HSC6, obtemos a figura 3 a fim de estudar a espontaneidade da reação em diferentes

temperaturas. Obtendo deltaG negativo, a reação ocorrerá sem interferência externa.

Figura 3: Gráfico

DeltaG[kcal] X Temperatura

[ºC]

A reação, tanto a 600ºC como 900ºC, possui delta G bem negativo, portanto é espontânea.

Contudo, como é apresentado no tópico 4.1.2, a 600ºC, não há CoO, portanto a reação a

cima somente ocorre a 900ºC.

4.1.3.2 Utilizando Co3O4

𝐶𝑜3𝑂4 + 3𝐹𝑒2𝑂3 → 3𝐹𝑒2𝐶𝑜𝑂4 +

1

2𝑂2 ∴ 𝐾 = (𝑃𝑂2

)0.5

(5)

Do HSC6, obtemos as figuras 4 e 5.

Figura 4: Gráfico DeltaG[kcal] X Temperatura [ºC]

Figura 5: Gráfico PO2[atm] X Temperatura [ºC]

Como observado a cima, a reação tem DeltaG negativo (figura 4) e pressão parcial de

equilíbrio inferior à usada no sistema (figura 5), tanto a 600ºC como 900ºC, tornando a

reação viável em ambas as temperaturas.

A partir dos dados apresentados a cima, concluímos que, a temperaturas de 600ºC e

900ºC, os caminhos reacionais podem ser diferentes:

-25,00

-20,00

-15,00

-10,00

-5,00

0,00

60

0

61

7

63

4

65

1

66

8

68

5

70

2

71

9

73

6

75

3

77

1

78

8

80

5

82

2

83

9

85

6

87

3

89

0

Del

ta G

[kc

al]

Temperatura [ºC]

0,000E+000

5,000E+007

1,000E+008

1,500E+008

2,000E+008

2,500E+008

3,000E+008

3,500E+008

4,000E+008

4,500E+008

60

06

18

63

66

54

67

26

90

70

87

26

74

47

62

78

17

99

81

78

35

85

38

71

88

9

PO

2 (a

tm)

Temperatura [ºC]

2Th Degrees858075706560555045403530252015

Co

un

ts

18.000

16.000

14.000

12.000

10.000

8.000

6.000

4.000

2.000

0

-2.000

Al2Co1O4-40029 100.00 %

600ºC

𝐶𝑜3𝑂4 + 3𝐹𝑒2𝑂3 → 3𝐹𝑒2𝐶𝑜𝑂4 +

1

2𝑂2 (6)

900ºC

𝐶𝑜3𝑂4 + 3𝐹𝑒2𝑂3 → 3𝐹𝑒2𝐶𝑜𝑂4 +

1

2𝑂2 (6)

ou

3𝐹𝑒2𝑂3 + 𝐶𝑜3𝑂4 → 3𝐹𝑒2𝐶𝑜𝑂4 +

1

2𝑂2

(7)

4.2 Resultados experimentais

4.2.1 DRX

A fim de determinar a estrutura do sólido cristalino e reconhecer o arranjo dos átomos,

analisamos as amostras com difração de raio X (DRX).

a)

b)

Figura 5: DRX Fe2CoO4 produzido a 600oC durante 3h (a), 900ºC durante 24h (b)

Amostra d(nm) Fração de Co+2 no sítio do ferro Fração de Fe+3 no sítio do cobalto

600oC/3h 53 0.48 0.97

900oC/24h 273 0 0

Tabela 1. Tamanho médio de cristalito e desordem catiônica.

Da tabela 1, nota-se uma relação direta entre a desordem catiônica e o tamanho médio de

cristalito (d). A amostra de 600ºC, em relação a de 900ºC, possui alta desordem catiônica

e d reduzido (cerca de 5x menor). Esta, por sua vez, tem desordem aproximadamente

nula.

2Th Degrees858075706560555045403530252015

Co

un

ts

70.000

60.000

50.000

40.000

30.000

20.000

10.000

0

-10.000

Al2Co1O4-40029 100.00 %

A fim de obter a carga residual do espinélio, assim como aferir sua eletroneutralidade,

calcula-se a carga elétrica do material, através da seguinte equação:

𝑄 = 2 ∙ (3 ∙ 𝑦𝐹𝑒𝑖 + 2 ∙ 𝑦𝐶𝑜

𝑖 ) + (3 ∙ 𝑦𝐹𝑒𝑖𝑖 + 2 ∙ 𝑦𝐶𝑜

𝑖𝑖 ) + 4 ∙ (−2) (8)

Resultados:

Q600 = 0,01

Q900 = 0,00

Observa-se que o material produzido a 900ºC possui maior estabilidade frente ao

produzido a 600ºC

4.2.2 MEV

A fim de determinar a composição da amostra, assim como a morfologia e o

tamanho de partícula, analisamos as amostras com microscopia eletrônica por varredura

(MEV).

a) 600ºC – 3h

Figura 6

Elemento

Peso %

Peso %

(erro)

Átomo %

Átomo %

(erro)

C K 3.59 +/- 0.29 11.37 +/- 0.90

O K 13.43 +/- 0.30 31.90 +/- 0.71

Fe K 49.17 +/- 0.99 33.46 +/- 0.68

Co K 32.19 +/- 1.15 20.76 +/- 0.74 Tabela 2. Percentagem de elementos na amostra.

Figura 6: Distribuição dos átomos na amostra

b) 900ºC – 24h

Figura 7

Elemento Peso %

Peso %

(erro)

Átomo %

Átomo %

(erro)

C 20.59 +/- 0.36 43.79 +/- 0.76

O 17.81 +/- 0.25 28.43 +/- 0.41

Fe 38.40 +/- 0.76 17.57 +/- 0.35

Co 22.96 +/- 0.87 9.95 +/- 0.38 Tabela 3. Percentagem de elementos na amostra.

Figura 8: Distribuição dos átomos na amostra

Tanto na figura 6 como na 8 foi possível observar a distribuição homogênea dos metais

(Fe e Co) e do oxigênio,

Figura 9: Imagem das amostras a 50µm (600ºC e 900ºC, respectivamente).

Figura 10: Imagem das amostras a 1µm (600ºC e 900ºC, respectivamente).

A figura 10 mostra a diferença entre os tamanhos de partícula das duas amostras. A de

900ºC mostrou-se com tamanho superior com crescimento via sinterização.

5 - Conclusões preliminares

Observamos que a síntese utilizando PVA nos retorna um material de alta pureza

e favorece uma estrutura nano do espinélio, porém é preciso um controle da temperatura

e tempo de calcinação. O Fe2CoO4 sintetizado em menor temperatura (600ºC durante 3h)

mostrou-se muito mais nano (tamanho médio de 53,0nm) que o sintetizado a 900ºC por

24h (275,1nm). Notamos, ainda (Tabela 1), que há desordem catiônica no material

produzido a 600oC, enquanto que a mesma se encontra ausente no material calcinado a

900oC, o que demonstra a forte necessidade de controle do tempo e temperatura durante

a calcinação.

A diminuição da temperatura de calcinação favoreceu à obtenção de um material

mais cristalino (tamanho de partícula menor) e mais desordenado. O aumento da temperatura de calcinação gerou o inverso.

6 – Trabalhos futuros

Pretende-se fazer ensaios em balança termogravimétrica com misturas de carbono

oriundo da pirólise da madeira e de ambos os espinélios produzidos a temperatura entre

600–900ºC. Avaliaremos, assim, a perda de massa como função da temperatura.

Haverá, ainda, a síntese de outras amostras variando a razão metal/monômero,

temperatura e tempo de tratamento térmico, além da avaliação do potencial catalítico das

amostras. Tal estudo permitirá estabelecer correlações entre a atividade do catalisador e

características intrínsecas do material, tais como, tamanho de partícula, morfologia e

desordem catiônica.

7 – Referências

1. M. Zawadzki, W. Walerczyk, F.E. López-Suárez, M.J. Illán-Gómez, A.Bueno-

López. Catalysis Communications 12, 1238-1241, 2011.

2. J.K. Rajput, G. Kaur. Catal. Sci. Technol. 4, 142-151, 2014.

3. E.A. Brocchi, R.C.S. Navarro, M.S. Motta, F.J. Moura. Materials Chemistry and

Physics 140, 273-281, 2013.

4. N.W. Grimes. J. PHYS. c (PROC. PHYS. SOC.), SER. 2, VOL. 1. 658-662, 1968.

5. N. W. GRIMES. Journal of Physics, v.1, n. 2, 1968.