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SISTEMA DE PRODUÇÃO AGROPECUÁRIO BRASILEIRO: características e evolução recente

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Vice-Reitor no exercício da Reitoria Julio Cezar Durigan

Pró-Reitora de Graduação Sheila Zambello de Pinho Pró-Reitora de Pós-Graduação Marilza Vieira Cunha Rudge Pró-Reitora de Pesquisa Maria José Soares Mendes Giannini Pró-Reitora de Extensão Universitária Maria Amélia Máximo de Araújo Pró-Reitor de Administração Ricardo Samih Georges Abi Rached

Secretária Geral Maria Dalva Silva Pagotto Chefe de Gabinete Carlos Antonio Gamero

Universidade Estadual Paulista

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SISTEMA DE PRODUÇÃO AGROPECUÁRIO BRASILEIRO: características e evolução recente

Cul

tura

Aca

dêm

ica José Giacomo Baccarin

São Paulo2011

Texto base para alunos de graduação da disciplina desenvolvimento agroindustrial e política agrícola

2a edição

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©Pró-Reitoria de Graduação, Universidade Estadual Paulista, 2011.

Ficha catalográfi ca elaborada pela Coordenadoria Geral de Bibliotecas da Unesp

B116s

Baccarin, José Giacomo Sistema de produção agropecuário brasileiro: características e evolução recente / José Giacomo Baccarin. – 2.ed. – São Paulo: Cultura Acadêmica: Universidade Estadual Paulista, Pró-Reitoria de Graduação, 2011.

254 p. ISBN 978-85-7983-184-3

1. Agroindústria – Brasil. 2. Política Agropecuária – Brasil. 3. Produção Agropecuária – Brasil. I. Título.

CDD 630.981

Pró-reitora Sheila Zambello de Pinho Secretária Silvia Regina Carão Assessoria Elizabeth Berwerth Stucchi José Brás Barreto de Oliveira Klaus Schlünzen Junior (Coordenador Geral – NEaD) Maria de Lourdes Spazziani

Técnica Bambina Maria Migliori Camila Gomes da Silva Cecília Specian Eduardo Luis Campos Lima Fúlvia Maria Pavan Anderlini Gisleide Alves Anhesim Portes Ivonette de Mattos José Welington Gonçalves Vieira Maria Emília Araújo Gonçalves Maria Selma Souza Santos Renata Sampaio Alves de Souza Sergio Henrique Carregari Vitor Monteiro dos Santos

Projeto gráfi co Andrea Yanaguita

Diagramação Estela Mletchol

equipe

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PROGRAMA DE APOIOÀ PRODUÇÃO DE MATERIAL DIDÁTICO

Considerando a importância da produção de material didá - ti co-pedagógico dedicado ao ensino de graduação e de pós-gra-dua ção, a Reitoria da UNESP, por meio da Pró-Reitoria de Gradua-ção (PROGRAD) e em parceria com a Fundação Editora UNESP (FEU), mantém o Programa de Apoio à Produção de Material Di-dático de Docentes da UNESP, que contempla textos de apoio às aulas, material audiovisual, homepages, softwares, material artístico e outras mídias, sob o selo CULTURA ACADÊMICA da Editora da UNESP, disponibilizando aos alunos material didático de quali-dade com baixo custo e editado sob demanda.

Assim, é com satisfação que colocamos à disposição da comu-nidade acadêmica a segunda edição desta obra, “Sistema de Pro-dução Agropecuário Brasileiro: características e evolução recente”, de autoria do Prof. Dr. José Giacomo Baccarin, da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias do Câmpus de Jaboticabal, espe-rando que ela traga contribuição não apenas para estudantes da UNESP, mas para todos aqueles interessados no assunto abordado.

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SUMÁRIO

1 Introdução 9

1.1 O Sistema de Produção Agropecuário Brasileiro pós 1990 13

1.2 Objetivos e Organização do Trabalho 17

2 O Mercado Mundial de Produtos Agropecuário 19

2.1 O Resistente Protecionismo Agropecuário 20

2.2 A Distante Meta da Universalização do Direito à Alimentação 39

2.3 Produção, Tecnologia e Produtividade entre 1980 e 2003 45

2.4 Expansão e Mudanças no Comércio de Produtos Agropecuários 53

3 Abordagens e Componentes do Sistema de Produção Agropecuário 59

3.1 Modelagem da Constituição Histórica do Sistema de Produção Agropecuário 59

3.2 Os Integrantes do Sistema de Produção Modernizada Agropecuário 65

3.3 Análise de Cadeias Agroindustriais Específicas 86

3.4 O Sistema Nacional de Produção Agropecuária 91

4 Mudanças na Política Agropecuária Brasileira 95

4.1 Especificidades da Estrutura Produtiva e Políticas Agropecuárias 95

4.2 A Modernização Conservadora da Agricultura Brasileira 101

4.3 Crise e Transição dos anos 1980 110

4.4 As Reformas Liberalizantes dos anos 1990 114

5 As Políticas Agropecuárias do MAPA 121

5.1 Política Nacional de Crédito Rural 121

5.2 As Alterações nos Preços Mínimos 132

5.3 Risco Agropecuário, Zoneamento Ambiental e Seguro Rural 136

5.4 A Rede de Pesquisa Agropecuária no Brasil 139

5.5 A Política de Defesa Sanitária 141

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6 A Política Fundiária e da Agricultura Familiar 145

6.1 Situação Produtiva e Social da Agricultura Familiar 146

6.2 A Política Fundiária 149

6.3 Políticas para Agricultura Familiar 154

7 Experiências e Políticas de Produção de Agroenergia no Brasil 161

7.1 Situação e Política Brasileira de Agroenergia 163

7.2 A Cana-de-Açúcar na Matriz Energética Brasileira 166

7.3 O Projeto Biodiesel 181

8 Mudanças na Estrutura Agrária 185

8.1 Estrutura Fundiária 185

8.2 Utilização da Terra 188

8.3 Tecnificação e Acesso a Políticas Públicas 190

8.4 Ocupação Agropecuária 193

8.5 Diferenças Regionais 195

9 Macroeconomia, Disponibilidade de Alimentos e Desempenho Agropecuário 197

9.1 Preços do Sistema de Produção Agropecuário e Inflação Brasileira 198

9.2 PIB Agropecuário e PIB do Agronegócio 205

9.3 O Sistema de Produção Agropecuário e a Balança Comercial 206

9.4 Disponibilidade e Consumo de Alimentos 210

10 Produtividade e Evolução das Principais Atividades Agropecuárias e Florestais 217

10.1 Utilização de Insumos e Produtividade Total de Fatores 217

10.2 Desempenho de Atividades Agrícolas 222

10.3 Desempenho das Atividades Florestais 229

10.4 Desempenho das Atividades Pecuárias 232

Bibliografia 239

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1INTRODUÇÃO

No processo de desenvolvimento econômico vão ocorrendo mudanças na forma de se produzir e na destinação/comercia-lização dos produtos agropecuários, como resultado da crescente integração técnica-econômica e subordinação do setor primário aos setores urbano-industriais. Atividades e fatores de produ ção, antes disponíveis na própria unidade produtiva agropecuária, so-frem transformações ou são substituídos por outros que precisam ser adquiridos de empresas, normalmente dos setores de serviço e industrial. Por sua vez, o produto agropecuário tende a chegar ao consumidor após uma série de transformações industriais e da incorporação de atividades terciárias.

A base tradicional da produção agropecuária, caracterizada pelo uso intensivo de trabalho humano e de tração animal, pela adubação orgânica, rotação de culturas ou utilização extensiva da terra e por variedades de plantas e raças animais não modifica das geneticamente, vai se alterando, através do emprego de tração me-cânica, da adubação química, da ração animal e de outros insumos modernos e de plantas e animais aprimorados geneticamente.

O estabelecimento rural tende a se especializar, passando a adquirir de outras empresas – industriais, de serviços ou mesmo de outros ramos agropecuários – insumos biológicos (sementes, mudas, sêmen, embriões, alevinos, matrizes), químicos (com-bustíveis, adubos, agrotóxicos, rações, vacinas, medicamentos) e mecânicos (tratores, colhedoras, outras máquinas e equipa-mentos). Ao mesmo tempo, o conhecimento prático, rotineiro e se cular do agricultor perde importância em relação às novas in-formações técnicas e de mercado vindas de empresas e instituições de pesquisa, de disseminação de conhecimento, fornecedoras de

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insumos ou de processamento ou comercialização dos produtos agropecuários.1

Nesse processo de mudanças da forma de se produzir, cha-mado comumente de Modernização Agropecuária, ocorre au-mento da produtividade do trabalho, como consequência, em primeiro lugar, da elevação da produção por área ou por unidade animal que, particularmente, o emprego da tecnologia químico-biológica provoca. Segundo, porque, especialmente, a mecani-zação diminui a necessidade de pessoas ocupadas, além de poder estimular a concentração da posse da terra, em detrimento da agricultura familiar. Isso mais a redução no número de ativi dades dos estabelecimentos rurais, com o tempo, levam à queda do ní-vel de ocupação primária e da população rural.

A modernização agropecuária guarda estreita relação com interesses de crescimento e de rentabilidade de empresas privadas que vendem seus insumos ou máquinas ou ainda daquelas que processam/comercializam produtos de origem agropecuária, à medida que passam a contar com maior oferta de matéria-prima. Para os agricultores, ela pode servir como mecanismo de diferen-ciação, não sendo raro acelerar o processo de concentração de terra e de capital agrário.

Além dos interesses privados, a modernização agropecuária costuma ser estimulada por políticas públicas, através de ações nas áreas da pesquisa, extensão rural, infra-estrutura, crédito subsidiado, garantia de preços e renda, entre outras.

Quanto às mudanças constatadas na destinação dos produtos agropecuários, uma delas é a contração da produção para a sub-

1. Não se conclua daí que no próprio setor agropecuário, ao longo do tempo, não se tenha gerado novos conhecimentos e técnicas que aumentassem sua produtivi-dade. Há vários exemplos que contradizem essa impressão, nas práticas de rotação de cultura e de adubação verde, no aprimoramento simples de raças e variedades de plantas, na melhor utilização de animais de tração etc. Contudo, isso não pode ser comparado, em intensidade e ritmo, às mudanças abruptas e profundas pro-vocadas na base técnica agropecuária pelo desenvolvimento da genética vegetal e animal e pela utilização dos insumos industriais e de serviços.

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sistência de agricultores e empregados rurais. O uso da terra e da força de trabalho para tal fim passa a ser comparado, cada vez mais, com o provável retorno a ser obtido na produção direcio-nada ao mercado, levando o estabelecimento rural e mesmo re-giões a se especializarem em um ou poucos produtos de maior retorno econômico, conformando, frequentemente, áreas mar-cadas pela monocultura.

A agroindústria artesanal rural (tecidos e roupas, artigos de couro, de madeira, de bebidas e alimentos etc.), de pequena escala e com baixa produtividade do trabalho, de maneira geral, é su-plantada pela produção em larga escala e com alto índice de auto-mação das agroindústrias modernas, que não se caracterizam por serem simples desdobramento da produção primária. Pelo con-trário, com seu perfil normalmente oligopolístico, exercem forte influência sobre a produção e os preços primários, exigindo o for-necimento regular, sob certos parâmetros de qualidade, de grandes quantidades de matéria-prima para transformação industrial.

O desenvolvimento da agroindústria moderna e da indústria alimentícia, que, constantemente, lança novos produtos, faz com que o consumo final dos alimentos ocorra quase sempre após os produtos agropecuários sofrerem uma, duas ou mais transforma-ções industriais.2

A cadeia produtiva de alimentos conta também com canais de distribuição (transporte, armazenamento), de propaganda e marketing e de comércio no atacado e no varejo. Neste ramo, ga-nham importância os supermercados, que absorvem parcela con-siderável do varejo, substituindo equipamentos tradicionais, como açougues, padarias, quitandas e empórios, estendem sua

2. Esse fato pode ser ilustrado ao se considerar o consumo per capita de açúcar no Brasil, que se mantém estável próximo a 50 Kg/habitante/ano. O consumo direto de açúcar pelos brasileiros vem diminuindo, o que é compensado pelo aumento do seu consumo indireto, nos refrigerantes, sucos, pães, doces, confeitos etc. Algo semelhante ocorre com a farinha de trigo, cada vez mais consumida já transformada industrialmente em pão, macarrão e biscoito, especialmente.

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ação ao atacado e tendem a se concentrar em imensas redes. Com isso, adquirem grande poder na negociação de preços e qualidade das mercadorias de seus fornecedores, sejam atacadistas, da in-dústria alimentícia ou empresas agropecuárias.

No final da cadeia produtiva percebe-se a conformação de um novo padrão de consumo, do qual pode-se destacar algumas características. Primeiro, o consumo fora de casa ganha impor-tância em relação ao consumo doméstico. Produtos vegetais “in natura” ou com baixo grau de processamento que, tradicional-mente, constituíam fontes de carboidratos e proteínas (arroz, fei-jão e mandioca, por exemplo) são substituídos por proteínas de origem animal e por produtos industrializados. Além de serem baratos e em número cada vez maior, os alimentos devem ser prá-ticos, com embalagens adaptadas a famílias pequenas, facilmente manipuláveis, exigindo pouco tempo para seu preparo doméstico. A questão nutricional fica, muitas vezes, subjugada pelo apelo propagandístico ao consumismo, levando à ingestão desequilibra-da e acima do necessário de carboidratos, açúcares e gorduras.

Diante da maior integração técnico-econômica com outros setores, têm-se procurado analisar a produção agropecuária mo-dernizada como parte de um sistema produtivo mais amplo, que sofre fortes influências de ramos industriais e de serviços, forne-cedores de insumos ou compradores de seus produtos, bem como do mercado consumidor, além de ser afetado por políticas públi-cas específicas. Esse sistema será denominado de Sistema de Pro-dução Modernizada Agropecuário, ou mais simplesmente, de Sistema de Produção Agropecuário.

Como não poderia deixar de ser, essa análise sistêmica é bas-tante diferenciada entre autores e escolas de pensamento, o que começa a ser revelado pelas inúmeras denominações empre-gadas, tais como agribusiness, agronegócio, complexo (s) agroin-dustrial (is), cadeia agroalimentar ou agroindustrial, sistema de produção agroalimentar etc. A abrangência ou extensão conferida ao sistema é variável entre as diferentes interpretações, assim

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como o grau de interdependência presumido entre seus agentes econômicos e sociais e o poder de cada um de influenciar preços, quantidades e características dos produtos, promover transfor-mações e ditar o dinamismo sistêmico.

Do ponto de vista da sociedade, o Sistema de Produção Agro-pecuário pode ser avaliado sob diferentes aspectos. Um deles diz respeito à sua capacidade para atender às necessidades sociais na produção, especialmente, de alimentos, mas também de produtos têxteis, móveis, papel e agroenergia, que, aliás, vem ganhando cada vez maior relevância.

Estritamente, quanto à Segurança Alimentar e Nutricional, pode-se refletir sobre a eventual responsabilidade do Sistema de Produção Agropecuário tanto em relação à desnutrição, que con-tinua atingindo parcela considerável da população mundial, quan-to ao crescimento dos seus índices de sobrepeso e obesidade.

Outro questionamento, que revela crescente importância, diz respeito à sustentabilidade ambiental da agricultura moderna, com sua base química, que pode contaminar o solo, água e os alimentos, e com seu crescimento sobre áreas antes ocupadas com reservas vegetais naturais.

Sob o ponto de vista social, questiona-se a capacidade da agricultura moderna de gerar empregos, proteger a saúde do tra-balhador e garantir a sobrevivência da pequena produção ou da agricultura familiar.

1.1 O SISTEMA DE PRODUÇÃO AGROPECUÁRIO

BRASILEIRO PÓS 1990

O objeto de análise desse trabalho é o Sistema de Produção Agro pecuário Brasileiro, considerando-se suas transformações tecnológicas, aceleradas a partir de 1965, e seu desempenho econô-mico e social, especialmente pós 1990. Aquela data marca a implan-tação do Sistema Nacional de Crédito Rural (SNCR), seguido por outras políticas, que fortaleceram a modernização agrope cuá ria,

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enquanto 1990 confirma a opção política pela aplicação de amplo processo de liberalização ou desregulamentação da agricultura brasileira, caracterizado pela redução das barreiras comer ciais, extinção de diversos órgãos públicos e diminuição dos gastos or-çamentários e da intervenção direta governamental nos mer cados agropecuários.

No processo de abertura comercial eliminaram-se controles ad-mi nistrativos e tributários às exportações e barreiras não tari fá rias às importações, bem como se reduziram tarifas de importação.

A desregulamentação se evidenciou, em 1990, quando foram extintas, entre outras, duas autarquias, símbolos do intervencio-nismo público na agropecuária, o Instituto Brasileiro do Café (IBC) e o Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA).

Os gastos orçamentários federais com a agropecuária brasilei-ra apresentaram nítida diminuição pós 1990, passando de média anual de 7,0% dos gastos totais do Governo Federal, de 1985 a 1989, para média de 2,0%, de 1999 a 2002 (GASQUES et al, 2006). A Política de Extensão Rural foi profundamente afetada, com a extinção do Sistema Brasileiro de Assistência Técnica e Extensão Rural (SIBRATER) e da Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMBRATER), em 1990. Já a Política de Pesquisa Agropecuária foi bem menos afetada, com tendência de se manter, a partir de 1990, o orçamento da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA).

Quanto aos dispêndios com a Política de Crédito Rural, na década de 1980 foi registrada uma média anual de R$ 74,4 bi-lhões, caindo para apenas R$ 31,2 bilhões, no período de 1990 a 2002 (BCB, 2010).

A tendência de redução do papel do Estado foi, em parte, amenizada a partir de 1996, quando o agravamento da situação social e a pressão de movimentos sociais levaram à criação de pro-gramas, como o Programa Nacional de Fortalecimento da Agri-cultura Familiar (PRONAF), na área de crédito rural, e de um ministério especificamente voltados para a agricultura familiar.

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Desde então, conformou-se uma situação peculiar na política agropecuária brasileira, com a convivência do Ministério de Agri-cultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), instituição secular e com foco em políticas da agricultura empresarial, com o contem-porâneo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), que incorporou o já existente Instituto Nacional de Colonização e Re-forma Agrária (INCRA) e se dedica aos assentamentos e demais políticas para a agricultura familiar.

Em período mais recente, pós 2003, observou-se recupe-ração dos gastos de crédito rural, que atingiram média anual de R$ 57,0 bilhões, entre 2003 e 2009, bem superior à do período 1990 a 2002, mas ainda inferior à da década de 1980. O Governo Federal voltou a atuar na extensão rural, sendo que em 2005 foi criado o Programa Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (PRONATER), vinculado ao MDA. Contudo, os gastos orçamentários federais com a agropecuária brasileira continua-ram reduzidos, alcançando a média de 1,8% dos gastos totais do Governo Federal, no período 2003 a 2008 (GASQUES, 2009).

Pode-se dizer que, em termos mundiais, o atual nível de pro-tecionismo público à agricultura brasileira é relativamente baixo, com as transferências orçamentárias e dos consumidores não ul-trapassando a 5% da renda bruta obtida na agropecuária nacional . Já entre os países desenvolvidos, essas transferências costumeira-mente suplantam 30% da receita bruta obtida pelo conjunto de seus agricultores.3

Mesmo assim, sob o ponto de vista produtivo, o Setor Agro-pecuário Brasileiro vem apresentando números favoráveis. Entre 1990 e 2008, enquanto o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro cresceu, em média, 2,6% ao ano, o PIB Agropecuário cresceu

3. “Um estudo da OCDE mostra que a estimativa de apoio ao agricultor (PSE) do Japão é de 58% do PIB agrícola, a União Européia de 34%, o Canadá 22%, os Estados Unidos 17% e no Brasil mal chega a 3% do PIB agrícola nacional, acima apenas da Nova Zelândia” (RODRIGUES, 2006: 15).

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3,7% ao ano (IPEA, 2010). Por sua vez, a produção de grãos, passou de 58,3 milhões de toneladas, na safra 1989/90, para 146,8 milhões de toneladas, na safra 2009/10, aumento de 151,8%, enquanto a área colhida com grãos passava de 38.945,0 mil hec-tares para 47.335,5 mil hectares, crescimento de apenas 21,5% (CONAB, 2010).

O Brasil se transformou em um dos maiores exportadores mundiais de produtos de origem agropecuária, com destaque para a soja e seus derivados (farelo e óleo), açúcar e álcool de cana-de-açúcar, café, suco de laranja, celulose e carne bovina e de frango e outros. Em 2009, apesar de ser um ano com baixa atividade econô-mica, as exportações com origem agropecuária brasileiras soma-ram US$ 64,8 bilhões, quase sete vezes superiores aos US$ 9,8 bi-lhões de importações (MAPA, 2010).

Em termos de estrutura agrária e sociais, contudo, os resulta-dos não foram positivos. Apesar do assentamento de 922.123 fa-mílias de trabalhadores sem terra, entre 1995 e 2006 (MDA, 2007), manteve-se alto nível de concentração da propriedade da terra no Brasil. Em 2003, imóveis acima de 500 hectares representavam 3,5% do número e detinham 56,1% da área, enquanto aqueles abaixo de 50 hectares correspondiam a 73,7% do número e 12,0% da área das propriedades rurais no país (DIEESE; NEADE, 2008).

Grande parte dos agricultores continuou excluída dos benefí-cios da política agrícola e da modernização. Em 1985, 12,6% dos estabelecimentos agropecuários tiveram acesso ao crédito rural e, em 2006, esse número tinha se elevado para tão somente 15,1%. No mesmo período a porcentagem de estabelecimentos agropecuá-rios com acesso à Assistência Técnica passou de 10,7% para 22,0%, enquanto aqueles que dispunham de tratores agrícolas passou de 7,2% para 10,2%. Quanto ao trabalho agropecuário, observa-se que a quantidade de pessoas ocupadas na agropecuária brasileira passou de 23.394.881 pessoas, em 1985, para 16.567.544 pessoas, em 2006, queda de 29,1% (IBGE, 1991, 2009).

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E, embora este problema não possa ser atribuído, diretamen-te, à falta de produção agropecuária, na média do triênio 2004-06 constatava-se ainda a existência de 11,9 milhões de pessoas sub-nutridas, correspondente a 6% da população brasileira, contra 15,8 milhões de pessoas subnutridas ou 10% da população no tri-ênio 1990-92 (FAO, 2009). Ressalte-se que, em grande parte, as pessoas subnutridas são agricultores familiares e trabalhadores agropecuários do Nordeste brasileiro.

1.2 OBJETIVOS E ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO

Na análise do desempenho recente (pós 1990) do Sistema de Produção Agropecuário Brasileiro, pretende-se detalhar alguns resultados econômicos e sociais alcançados e discorrer sobre suas prováveis causas explicativas, com destaque para a política agríco-la. Será levado em conta o relativamente alto nível de partici pação que o país conquistou no mercado agrícola mundial, através da exportação de ampla gama de produtos, alguns não tipicamente tropicais. Considerar-se-á também a produção agropecuária co-mo integrante de um sistema produtivo, com forte presença de ramos industriais e de serviços.

Logo após esta introdução, o segundo capítulo será dedicado às questões do mercado mundial agrícola, tais como barreiras e negociações comerciais entre as nações; a disponibilidade de ali-mentos e os índices de desnutrição dos diversos continentes; a evolução da produção, da tecnologia, da produtividade e da parti-cipação no comércio internacional agropecuário dessas regiões.

O terceiro capítulo, baseado no caso brasileiro, tratará das vi-sões que analisam a produção agropecuária como integrante de um sistema produtivo. Será abordada sua formação histórica, con-frontados conceitos como do agronegócio, complexos agroindus-triais e cadeias agroalimentares e descritas algumas das caracterís-ticas estruturais e econômicas dos segmentos do moderno sistema de produção agropecuário.

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Adiante, uma série de capítulos tratará da evolução recente da política agrícola brasileira. No capítulo quatro, de caráter mais geral, será abordada tanto a opção, evidenciada a partir de 1964, pela política de modernização da base técnica, sem maiores alte-rações na estrutura fundiária, quanto a decisão pela diminuição da intervenção pública e pela liberalização dos mercados agrope-cuários pós 1990. O capítulo cinco tratará do conjunto de políticas implementado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abas-tecimento, com destaque para o crédito rural e preço mínimo. O capítulo seis abordará as ações do Ministério do Desenvolvimento Agrário e do INCRA, nas políticas de reforma agrária e para a agricultura familiar. No capítulo sete, será analisada a política de estímulo à produção e ao consumo de energia renovável com base em matérias primas agropecuárias.

A partir daí, inicia-se a análise de indicadores de estrutura e desempenho do Sistema de Produção Agropecuário Brasileiro, com destaque para o período pós 1990. O capítulo oito é dedicado ao estudo da estrutura agrária, envolvendo a distribuição da posse e da propriedade da terra, sua utilização, o nível tecnológico dos estabelecimentos agropecuários e o emprego e ocupação agrope-cuária. O capítulo nove tratará da relação entre indicadores ma-croeconômicos (PIB, Preços Relativos e Inflação, Balança Comer-cial) e de segurança alimentar (disponibilidade de alimentos) com o desempenho agropecuário. No capítulo dez serão analisados o uso de insumos modernos, a área cultivada, o tamanho dos reba-nhos, a produção, a produtividade e a competitividade externa da agropecuária como um todo e de suas principais atividades.

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2O MERCADO MUNDIAL DE PRODUTOS AGROPECUÁRIOS

Embora bastante óbvio, julga-se oportuno afirmar, de início, que existe grande heterogeneidade entre as nações quanto às política s agropecuárias empregadas e quanto à estrutura e ao de-sempenho produtivo agropecuários. Em relação ao primeiro ponto, assumimos que o desenvolvimento da agricultura é bas-tante influenciado pela implementação de políticas públicas espe cíficas que afetam sua tecnologia e nível de produção, a pro-tegem contra concorrência externa e garantem preço e renda aos agricultores, o que podemos chamar de Protecionismo Agrope-cuário. Seu grau é variável entre os países, tendendo a ser mais elevado entre os desenvolvidos.

Quanto ao segundo ponto, considera-se que há tendência de expansão do sistema formado em torno da agricultura moderni-zada, fortemente integrada aos setores urbano-industriais, com alta tecnologia (biológica, química e mecânica) e produtividade e que, muitas vezes, resulta no crescimento do tamanho médio dos estabelecimentos agropecuários. Contudo, essa situação está muito longe de ser generalizada, sendo que no outro extremo pode-se constatar a existência da agricultura de pequena escala, voltada, basicamente, para a subsistência da família do agricultor e assentada em métodos tradicionais de cultivo, que continua predominando em vastas regiões, especialmente nos países me-nos desenvolvidos.

Começa-se o capítulo com a discussão dos tipos e nível das práticas protecionistas e das dificuldades históricas de se chegar a um acordo entre as nações que conduza à maior liberalização do comércio internacional agropecuário. Após, realizam-se análises

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comparativas entre agrupamentos de nações de diversas variá-veis, começando pelo nível de consumo alimentar e índices de desnutrição, passando pelos indicadores de produção, uso de re-cursos naturais, tecnologia e produtividade e, terminando com a participação no comércio internacional agropecuário. Neste caso, debate-se até que ponto as reformas comerciais podem contribuir para a solução dos problemas enfrentados pelos países pobres quanto ao consumo e à produção de alimentos.

2.1 O RESISTENTE PROTECIONISMO AGROPECUÁRIO

Em seus discursos, governantes costumam defender que o comércio mundial seja o mais livre possível, sem barreiras não tarifárias e com tarifas de importação mínimas e também sem subsídios à produção interna e, muito menos, às exportações. Ao mesmo tempo, análises de organismos internacionais, como Banco Mundial e Organização para a Cooperação e Desenvolvi-mento Econômico (OCDE), imputam ao protecionismo distor-ções nos mercados de fatores e produtos e perda de bem estar econômico em relação à situação por eles considerada ideal, de liberalismo comercial e econômico.

Concretamente, nas últimas décadas se acentuaram os fluxos econômicos internacionais financeiros, produtivos e comerciais, associados ao aumento do grau de liberalismo nas relações entre as nações. O desenvolvimento de escala produtiva além da capa-cidade de absorção de mercados nacionais, a complementaridade de instalações de uma mesma empresa espalhadas por diversos países, o avanço e barateamento do transporte e das comunicações, entre outros, contribuíram para que o comércio internacional (intra-firma, muitas vezes) crescesse em ritmo mais acelerado que o da própria produção mundial.

Entretanto, continuam em vigor diversas políticas nacionais visando a proteger setores econômicos da concorrência externa. Sob os interesses de uma nação, nem sempre o liberalismo é jul-

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gado mais adequado que o protecionismo, por razões políticas e corporativas ou por razões de conjuntura ou de desenvolvimento econômico. Assim, um país qualquer pode adotar políticas de proteção para o estímulo à chamada indústria nascente ou na ten-tativa momentânea de obtenção de equilíbrio no balanço de pa-gamentos ou de preservação de nível de emprego. Ao mesmo tempo, convém lembrar que os governantes obtêm representação política de setores sociais nacionais, cujos interesses de proteção comercial podem ser priorizados na ação pública, mesmo que o beneficio para a nação toda seja questionável ou que cause pre-juí zo a outros países.

A implantação do livre cambismo e a constituição de uma ordem econômica multilateral, com regras comerciais iguais para todos os países, estão muito longe de serem plenamente efetivadas. Por motivos econômicos e políticos, o multilateralismo (envol-vendo a grande maioria dos países) é usualmente confrontado pela celebração de acordos bi ou plurilaterais entre pequeno nú-mero de nações, que criam zonas restritas e diferenciadas de comér cio, com a concessão mútua de benefícios, não extensíveis, automaticamente, a outras nações externas a essas zonas.

Entre os setores econômicos, a agricultura é talvez o que con-te com políticas protecionistas mais amplas, que são justificadas sob diversos argumentos. Alguns mais tradicionais, como o que, partindo da essencialidade da alimentação, apregoa a necessidade de auto-suficiência nacional da produção, garantindo a segurança e a soberania alimentar e evitando problemas sociais e geopolíticos.

Com base na natureza de sua produção, que fica sujeita a maiores riscos climáticos e sanitários e que apresenta maior ins-tabilidade de preços e menor rentabilidade dos investimentos, defende-se a idéia de que a agricultura deveria contar com polí-ticas diferenciadas e subvencionadas. Sob o ponto de vista social, a suplementação pública de renda asseguraria a sobrevivência da agricultura familiar e a geração de emprego agrícola.

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Recentemente, especialmente na Europa, passou a se difundir a idéia que se deve preservar o estabelecimento rural em face à sua Multifuncionalidade ou às múltiplas funções que exerce, tais como: produção, geração de emprego, desenvolvimento regional, preservação da paisagem, do meio ambiente e de tradições histó-ricas e culturais.

Os países desenvolvidos costumam justificar as barreiras à importação de produtos agropecuários originários, especialmente , dos países em desenvolvimento, afirmando que estes possuem leis e normas ambientais e de saúde pública menos elaboradas e efe tivas, podendo, portanto, ofertar produtos com menor quali-dade sanitária e cuja produção se dá com a degradação de recur-sos naturais . A venda desses produtos no mercado dos países ricos poderia colocar em risco a saúde de sua população e a sani-dade de seus rebanhos e lavouras.

O protecionismo agropecuário, especialmente forte em paí-ses desenvolvidos, dificulta o acesso ao mercado interno e pode gerar excesso produtivo que, muitas vezes, é escoado no mercado externo através da concessão de subsídios. Isso tende a deprimir os preços internacionais, afetando o interesse e as perspectivas de crescimento de outros países, muitos deles em desenvolvimento. Esse conflito se reflete nas rodadas multilaterais do comércio in-ternacional, sendo que o embate entre protecionismo e liberalis-mo agrícola permanece como um dos pontos mais importantes (e de difícil acordo) nas negociações patrocinadas pela Organização Mundial do Comércio (OMC).

2.1.1 Os Percalços para a Constituição da OMC

e do Acordo sobre a Agricultura

Os acontecimentos dos últimos anos mostram as dificul-dades da OMC, às vezes, de iniciar e, sempre, de terminar com acordo as reuniões ministeriais, que é o fórum máximo de suas

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deliberações.1 Essa é uma característica básica da história dessa instituição supranacional responsável pelos debates, acordos, fi-xação das normas, fiscalização de sua aplicação e julgamento dos contenciosos do comércio internacional.

Logo após a Segunda Guerra Mundial, a Organização das Na-ções Unidas (ONU) propôs a criação de três instituições suprana-cionais, na tentativa de colaborar para o estabelecimento de uma nova ordem econômica mundial. Duas vingaram desde o início, o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o BIRD (Banco Inter-nacional para Reconstrução e Desenvolvimento) ou Banco Mun-dial. A terceira, a Organização Internacional do Comércio (OIC), embora com estatutos aprovados em 1948, não foi adiante. Como o Congresso dos EUA não ratificou os termos de sua criação, im-pedindo que este país a integrasse, os demais países desistiram de sua implantação.

Alternativamente, passou-se a considerar as deliberações de um acordo provisório chamado Acordo Geral de Tarifas e Co-mércio (GATT), firmado em 1947, justamente como parte dos preparativos para a tentativa frustrada de criação da OIC. Tal saí-da significou menor capacidade e alcance das ações, posto que, enquanto a OIC seria uma estrutura permanente com objetivo de propiciar maior liberalismo no comércio, mas subordinando-o à geração de emprego e ao desenvolvimento econômico, “... o GATT é (era) um tratado preocupado quase que exclusivamente com a administração do comércio a partir do interesse das grandes na-ções mercantis” (GONÇALVES et al, 1998:58).2

1. Para conhecer o organograma da OMC vide GONÇALVES et al (1998: 63). Para uma descrição de como a entidade operacionaliza suas deliberações vide MAPA (2007).

2. Na tentativa de amenizar tal situação, em 1964, sob pressão dos países em desen-volvimento, a ONU criou a Conferência das Nações Unidas sobre o Comércio e o Desenvolvimento (UNCTAD), se contrapondo ao GATT e reforçando a idéia de se vincular o comércio internacional à necessidade de desenvolvimento dos então países de terceiro mundo. O poder de intervenção da UNCTAD, contudo, sempre se revelou pequeno.

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Entre 1947 e 1985, o GATT realizou sete rodadas multilate-rais de negociação, deliberando sobre tarifas de importação e bar-reiras não tarifárias, basicamente, de bens industrializados. Com algumas exceções de peso, como têxteis e vestuário, avançou-se no grau de abertura dos mercados de produtos do setor secundá-rio, com evidentes benefícios aos países desenvolvidos, à época, mais competitivos em sua produção. As questões comerciais agrí-colas foram, praticamente, ignoradas.3

Enquanto isso, os países desenvolvidos montaram esquemas sofisticados e dispendiosos de protecionismo agropecuário. Nos EUA, na verdade, o protecionismo vinha se desenvolvendo desde a década de 1930, quando, frente à recessão econômica, o governo procurou canalizar o excesso de produção agropecuária para o consumo dos mais de 25% dos trabalhadores então desemprega-dos, através da concessão do “food stamp” (cartão alimentação). Daí em diante, embora não mais visando exclusivamente o com-bate à pobreza decorrente do desemprego, foram sendo aprova-das novas leis agrícolas (Farm Bill), com duração de quatro a seis anos, garantindo mercado aos produtos e renda aos agricultores.

Na Europa, a legislação agrícola, denominada Política Agrí-cola Comunitária (PAC), foi instituída, juntamente com a Co-munidade Econômica Européia (CEE), em 1958, e começou a ser operacionalizada em 1960 (CONTINI, 2004). Como um dos

3. “(...) o sistema multilateral de comércio (...) tratava apenas do comércio de mer-cadorias de produtos industriais. O comércio agrícola foi excluído no início dos anos 50, quando o Congresso dos Estados Unidos se recusou a eliminar o sistema de cotas agrícolas para o açúcar, o que seria proibido pelas regras do GATT. Essa exclusão também atendia aos interesses de países europeus e, logo, a negociação de acesso a mercados era somente para produtos industriais” (PEREIRA, 2005:46). Considere-se também “O comércio de produtos agrícolas ficou excluído das disciplinas do GATT 47 praticamente desde o começo, em virtude de solici-tação feita pelos Estados Unidos, baseados no argumento de que a agricultura representava um setor especial na economia, e que, por razões de segurança ali-mentar, não poderia receber o mesmo tratamento aplicado aos demais setores” (MAPA, 2007).

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esforços para a reconstrução da economia local e ainda sob a forte lembrança da fome que atingira os europeus na Segunda Guerra Mundial, a PAC sempre perseguiu (e acabou alcançando) a auto-suficiência na produção de alimentos.4

Sem entrar em detalhes das políticas agrícolas norte-america-na, européia5 ou ainda de outros países desenvolvidos, pode-se dizer que elas contam com três instrumentos básicos com efeitos diretos nos mercados de produtos e de fatores. Um deles são as barreiras tarifárias e não tarifárias que protegem a produção in-terna contra a concorrência externa. Outro garante, via subsídios e transferências aos agricultores, a rentabilidade da produção lo-cal, podendo ou não estar associado à política de contenção da área plantada ou do tamanho dos rebanhos. Muito frequente-mente, a produção supera o consumo interno, elevando os esto-ques agropecuários. O terceiro instrumento aplicado são os sub-sídios para exportação do excesso produtivo.

Alguns dados revelam a importância que a política agrícola acabou alcançando nos países desenvolvidos. “Os países da Orga-nização Econômica para Cooperação e Desenvolvimento – OECD (...) gastaram em 1988 US$ 300 bilhões com subsídios e progra-mas de apoio à agricultura, correspondendo a 3% do consumo e 10% da poupança dos países membros nesse mesmo ano. Em 1991 esses gastos se elevaram para US$ 322 bilhões, dos quais US$ 54 bilhões foram gastos pelos EUA, US$ 66 bilhões pelo Ja-pão e US$ 11 bilhões pelo Canadá” (MORAES, 1996: 25).

4. “Enquanto no ano agrícola 1968/69 a Comunidade Econômica Européia – CEE era dependente das importações para abastecimento do mercado interno em todos os produtos alimentares, no ano agrícola 1988/89 alcançou a auto-sufi-ciência em todos os produtos, exceto frutas frescas e vinhos, figurando como exportadora de cereais, açúcar, carne, verduras frescas, manteiga e queijos” (MORAES, 1996).

5. Um bom resumo das características da Farm Bill e da PAC pode ser encontrado em FONSECA & BUAINAIN (1995). Para a PAC, consulte-se também BRESSAN (1998) e CONTINI (2004). Para a Farm Bill, consulte-se COELHO (2002).

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Com o protecionismo agrícola cresceram também os conflitos em torno de seus produtos. Na década de 1980, 60% das disputas submetidas ao processo de solução de controvérsias do GATT provinham da agricultura. Dessa forma, a 8ª Rodada Multilateral de Negociação do GATT, iniciada em setembro de 1986, no Uru-guai, com participação de 123 países, acabou incorporando, de forma inédita, questões agrícolas em sua pauta de negociações.

Os anos seguintes mostraram que as discussões agrícolas fo-ram as mais demoradas e de difícil acordo, com o principal con-tencioso se estabelecendo entre os EUA e a CEE. No início, os EUA fizeram proposta ofensiva, prevendo a eliminação, em dez anos, das transferências de renda de apoio doméstico com efeitos no comércio internacional, das restrições às importações e dos subsídios às exportações. Por sua vez, defensivamente, a CEE propunha diminuir tão somente as transferências de renda para apoio doméstico, nos casos em que a produção agropecuária fos-se excessiva (FONSECA & BUAINAIN, 1995).

Um terceiro conjunto de países, o Grupo de Cairns, também teve participação ativa nos debates sobre agricultura, embora com peso político bem menor que EUA e CEE. Esse grupo se constituíra em 1986 na cidade australiana de Cairns, sendo com-posto pelo Brasil e mais 13 países, tradicionais exportadores agro-pecuários e proponentes da liberalização de seu comércio.6

No final de 1993, EUA e CEE acordaram uma proposta para a agricultura, que foi aceita pelos demais países. Finalmente, em abril de 1994, em Marrakesh (Marrocos), após quase oito anos e sete reuniões ministeriais, foi assinada a Ata Final que encer-rava as negociações da Rodada Uruguai. A principal deliberação

6. Além do Brasil, faziam parte Argentina, Austrália, Canadá, Chile, Colômbia, Fiji, Filipinas, Hungria, Indonésia, Malásia, Nova Zelândia, Tailândia e Uruguai. A proposta de liberalização comercial que apresentavam se mostrava coerente com a política agrícola pouco protecionista que praticavam (a exceção era o Canadá). Coerência não observada no caso da proposta inicial norte-americana.

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foi a criação da Organização Mundial do Comércio (OMC), es-trutura permanente e com maior poder de elaboração de normas e de julgamento de contenciosos comerciais, em substituição ao GATT, tratado “provisório”, que perdurara por quase 50 anos.7

A Ata Final da Rodada Uruguai contemplava 15 acordos, en-tre eles o Acordo sobre Agricultura (AsA). Seus 21 artigos e 5 anexos abrangiam três grandes temas: acesso a mercados, políti-cas de apoio interno e subsídios às exportações, cujos efeitos co-meçaram a valer a partir de janeiro de 1995. Os países foram di-vididos em três grupos: os de menor desenvolvimento relativo, que não precisariam cumprir os compromissos do AsA, os em desenvolvimento, que teriam que cumprir, em 10 anos, 2/3 dos compromissos e os desenvolvidos, que cumpririam integralmen-te os compromissos, em seis anos.

A adesão individual de cada país ao AsA fez-se através de docu mento de elaboração própria chamado de Oferta Agrícola. Ele descrevia, para o período base (1986-88), as políticas agrícolas aplicadas, seus valores e, se fosse o caso, seu cronograma de redu-ção. O objetivo geral era a obtenção de ordem mais liberal no co-mércio agrícola, através dos seguintes compromissos específicos:

a) Facilitar o Acesso a MercadosPrimeiramente, os países se obrigavam a substituir as barreiras

não tarifárias (cotas, proibições) por tarifas de importação. A cha-mada tarificação, calculada a partir dos preços interno e externo vigentes no período base, não poderia diminuir o nível pré-exis-tente de acesso aos mercados, chamado de acesso corrente. Se este fosse muito pequeno, os países deveriam garantir um acesso míni-mo de 3% ao seu mercado e ampliá-lo, gradativamente, até 5%, no sexto ano de vigência do AsA. O acesso mínimo seria distribuído a outros países, através de Quotas com Tarifas Reduzidas (TRQs).

7. Para uma comparação entre a estrutura e o poder da OMC e do GATT vide MAPA (2007).

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Algumas exceções foram previstas na tarificação. Uma muito particular para atender interesses do Japão e da Coréia do Sul, com dificuldades para tarificar a importação de arroz. Outra es-tabelecia que, caso a tarificação provocasse aumento excessivo do volume importado ou queda expressiva de preço interno, os paí-ses poderiam usar o dispositivo de salvaguarda especial, impondo uma sobretaxa à importação do produto atingido.

Em segundo lugar, os países deveriam promover uma redu-ção tarifária com base nos valores de setembro de 1986. Os países desenvolvidos reduziriam em 36% o valor médio de suas tarifas, com redução mínima de 15% de cada tarifa. Para os países em desenvolvimento, as reduções exigidas seriam de, respectivamente, 24% e 10%. Neste caso, a tarifa de setembro de 1986 poderia ser substituída por um teto tarifário pré-determinado.

b) Reduzir as Políticas de Apoio InternoAs políticas de apoio interno foram classificadas em dois

grandes grupos: o primeiro composto por ações que causam dis-torção nula ou desprezível nos mercados agrícolas internacionais, chamadas de políticas de caixa verde. Caracterizam-se pela sua natureza ampla, não se destinando a segmentos específicos e sen-do financiadas com recursos públicos e não com transferências diretas dos consumidores. Englobam serviços gerais prestados pelo governo, como defesa e inspeção sanitária, classificação de produtos, divulgação de informações de mercado, educação rural, infra-estrutura, manutenção de estoques públicos para segurança alimentar, programas internos de ajuda alimentar, suplementação da renda não vinculada à produção, programas de seguro agrope-cuário, de ajustamento estrutural, ambientais e de apoio ao desen-volvimento regional. Para esse amplo conjunto de ações, os países não teriam que reduzir os valores despendidos, embora devessem declará-los em suas ofertas agrícolas.

O outro grupo é composto por políticas que provocam dis-torções nos mercados, como as de sustentação de preços ou de redução subsidiada de custos de produção ou comercialização.

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Fazem parte da chamada caixa amarela e os gastos com sua ma-nutenção constituem a Medida Global de Apoio (MGA ou AMS).8 No prazo de implementação do AsA, a redução da MGA deveria ser de 20% para os países desenvolvidos e de 13,3% para os em desenvolvimento.

É importante se dizer que o corte da MGA seria feito no agrega do e não especificamente para cada produto. Ou seja, para deter minado produto o corte poderia ser nulo, desde que com-pensado em outro produto. Além disso, só precisariam ser con-siderados na MGA aqueles produtos cujos gastos com políticas da caixa amarela superassem 5% do seu valor de produção, para os países desenvolvidos, ou 10% para os em desenvolvimento, o que foi chamado de cláusula de minimis.

Mesmo que baseadas em transferência de recursos públicos, algumas políticas poderiam ser excluídas do MGA pelos países em desenvolvimento. Seriam os casos do apoio a investimentos produtivos que beneficiassem um grupo de agricultores de deter-minada região, de ações para reconversão de áreas com cultivo de plantas narcóticas ilegais, da ajuda para obtenção de insumos por agricultores reconhecidamente pobres.

Já os países desenvolvidos não precisariam diminuir os gastos com políticas classificadas na chamada caixa azul, pelas quais os pagamentos governamentais aos agricultores estão associados à redução da área plantada (set aside) ou à manutenção do tama-nho do rebanho (MRE, 2006).

c) Diminuir os Subsídios à ExportaçãoOs subsídios à exportação são caracterizados quando há com-

plementação governamental aos valores recebidos pelos exporta-

8. Levando-se em conta os valores do período 1986-88, para cada produto agrope-cuário beneficiado com políticas da caixa amarela estimava-se a diferença entre a média do preço externo de referência e a média do preço administrativo interno e a multiplicava pela quantidade produzida. Somando os valores estimados para os diversos produtos obtinha-se a MGA (MRE, 2006).

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dores no mercado internacional, como resultado de medidas de apoio interno a produtos que depois são exportados, da venda externa de produtos de estoques públicos a preços inferiores aos de mercado interno, de subsídios ao custo de comercialização para exportação e de subsídios a produtos agrícolas (matéria-prima) incorporados em produtos para exportação.

Para cada produto com subsídios às exportações, os países desenvolvidos deveriam reduzir, em seis anos, 36% o seu valor monetário e 21% a quantidade subsidiada. Para os países em desen volvimento o prazo seria de dez anos, e as percentagens de redução, respectivamente, de 24% e 14%. Ficavam isentas des-sas obrigações as exportações agropecuárias destinadas a ajuda humanitária.

Antes de se passar adiante, dois comentários merecem ser fei-tos em relação à Rodada Uruguai e ao Acordo Agrícola. O primeiro, relativamente favorável, é que se conseguiu, após mais de 45 anos de rodadas de negociação, dotar as relações comerciais agrícolas de disciplina mínima, com regras e formas de encaminhamento de contencioso aceitas por mais de uma centena de países. Insti-tuiu-se, no âmbito da OMC, o Comitê de Agricultura que, entre outras tarefas, assumiu a responsabilidade de acompanhar a ade-quação dos diversos países aos compromissos do AsA. Contudo, mesmo nesse aspecto, o AsA mostrou-se extremamente cauteloso. Seu Artigo 13 instituiu a chamada Cláusula de Paz ou da devida moderação, com vigência até o final de 2003 e que estabelecia que determinado país, para os pontos apresentados em sua oferta agrí-cola, não poderia ter sua política contestada por outro país junto aos órgãos de solução de controvérsia da OMC.

O outro comentário é que os compromissos assumidos em cada tema do Acordo Agrícola ficaram muito distantes da pro-posta inicial (expressa, por exemplo, pelos EUA) de se elimina-rem todas as medidas protecionistas à agricultura. As reduções acordadas foram bastante parciais. No caso das tarifas de impor-tação, sua efetividade poderia ser maior se a redução de 36% fosse

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obtida através de média que ponderasse a participação do produ-to na pauta de importação e não por média aritmética simples. No apoio interno, com a diminuição de gastos de apenas 20% para os países desenvolvidos e da forma como os cálculos foram feitos, previa-se que tanto EUA como CEE conseguiriam preser-var suas principais políticas agrícolas dos cortes recomendados (FONSECA & BUAINAIN, 1995).

O protecionismo agrícola foi apenas levemente atingido, o que atendeu, especialmente, aos interesses dos países desenvol-vidos. É importante levar em conta que, dos US$ 197,7 bilhões de dólares de MGA (medidas da caixa amarela) declarados pe los paí ses em suas ofertas agrícolas, mais de 90% diziam respeito à susten tação da agricultura dos países ricos (COELHO & WERNECK , 2004). Em 1995, os gastos mundiais com subsídios à exportação de produtos agropecuários somaram US$ 7,0 bi-lhões, sendo que US$ 6,3 bilhões eram provenientes dos países europeus (CONTINI, 2004).

2.1.2 O Emperramento das Negociações Agrícolas

Ao final da Rodada Uruguai previa-se que o Acordo Agrícola seria revisto em 1999, um ano antes do término de seu período de implementação para os países desenvolvidos. Para tanto as discus-sões se iniciariam na 3ª Reunião Ministerial da OMC, em Seattle (EUA), convocada com o pretensioso nome de “Rodada do Milê-nio”. O fracasso deste evento, que sequer teve início, fez com que as discussões sobre liberalização comercial ficassem restritas ao Comitê de Agricultura, sem nenhum poder para o estabelecimen-to de novas regras.9

Em 2001, na 4ª Reunião Ministerial da OMC, em Doha (Qatar), os países conseguiram firmar documento que permitia a abertura de nova rodada de negociação (Mandato Doha), prevendo seu

9. Maiores detalhes das reuniões da OMC de 1995 e 2004 são encontrados em ANDRADE et al (2005).

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encerramento para janeiro de 2005. No item agrícola reafirma-ram-se os propósitos de se trabalhar para constituição de co-mércio mais justo e orientado para o mercado, de propor cionar tratamento diferenciado aos países em desenvolvimento e se incor po raram aspectos não comerciais, como proteção am bien-tal, segurança alimentar e desenvolvimento rural, relacionados à Multifuncionalidade.

Durante a 5ª Reunião Ministerial da OMC em Cancun (Mé-xico), em setembro de 2003, havia grande expectativa que as dis-cussões sobre agricultura fossem priorizadas. Tal fato não ocorreu e o impasse gerado entre os países foi de tal ordem que nem o tema facilitação do comércio, que os organizadores propuseram como pauta mínima, foi objeto de deliberação.

Em primeiro de agosto de 2004, no encerramento de reunião realizada em Genebra (Suíça), os membros da OMC chegaram a um acordo mínimo (July 2004 Package) para retomar as nego-ciações da Rodada Doha. Reconhecia-se a impossibilidade de se encer rar os trabalhos em janeiro de 2005 e confirmava-se a 6ª Reunião Ministerial para dezembro de 2005, em Hong Kong. Esta reunião acabou sem que o acordo geral sobre o comércio internacional fosse alcançado. Quanto à agricultura, anunciou-se o consenso (sem caráter de acordo formal) em torno da eliminação dos subsídios às exportações em 2013, com redução significativa em 2010. Muito pouco, sabendo-se que os subsídios à exportação dos produtos industrializados estão proibidos desde 1955.

Em 2006 mais uma vez frustraram-se as expectativas de acor-do, com a suspensão das negociações, após 14 horas de reunião realizada em julho na cidade de Genebra. No transcurso de 2007 as discussões continuaram cercadas de divergências e, por fim, em julho de 2008, a Rodada Doha pareceu chegar a um impasse definitivo,10 sem que os países participantes alcançassem um novo

10. Como causas imediatas desse impasse a literatura tem destacado a intransigência, de um lado, dos EUA em reduzirem consideravelmente o volume de subsídios

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acordo comercial. Daí em diante, vem se observando constantes esforços da OMC para a retomada das negociações multilaterais, mas até os meados de 2010, isso, de fato, não tinha se efetivado.

Os grupos de países que se destacaram durante as discussões da Rodada Doha foram os EUA, a União Européia (UE) e o G-20, grupo de países em desenvolvimento liderado por Brasil e Índia.11 Esses três grupos, em 2003, eram responsáveis por mais de 70% da produção mundial de açúcar, algodão, arroz, milho, soja, taba-co e carne de porco, de frango e bovina, por 66% da produção de leite, 65% de trigo e 47% de café (ICONE, 2007).

Em uma primeira aproximação, pode-se dizer que os países desenvolvidos condicionavam a diminuição da proteção à suas agriculturas a propostas de maior liberalização nos serviços e na indústria pelos países em desenvolvimento. Por sua vez, o G-20, além de querer que se formalizasse o pré-acordo de Hong Kong pelo fim dos subsídios às exportações, reivindicava, especialmente, que a UE apresentasse proposta com maior percentual de dimi-nuição das barreiras à importação e que os EUA reforçassem sua proposta de redução dos gastos de apoio interno agropecuário. Contudo, é importante destacar que entre os países do G-20 ficaram evidentes divergências na área agrícola, com a Índia e a China, por exemplo, defendendo maior protecionismo, enquanto para Argentina e Brasil, como outro exemplo, interessava a cons-tituição de maior liberalismo agropecuário.

Ao mesmo tempo, que transcorriam as negociações multila-te rais, pós Rodada Uruguai, os países desenvolvidos, particu-larmente EUA e UE, promoveram algumas reformas em suas políticas agrícolas.

agrícolas e, de outro, da China e, especialmente, da Índia, ao reivindicar que se pudesse aplicar políticas muito amplas de salvaguarda contra as importações agropecuárias.

11. Outros países do G-20: África do Sul, Argentina, Bolívia, Chile, China, Cuba, Egito, Filipinas, Guatemala, Indonésia, México, Nigéria, Paquistão, Paraguai, Tailândia, Tanzânia, Uruguai, Venezuela e Zimbábue.

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Os norte-americanos editaram três novas Farm Bills. A pri-meira, que vigorou de 1996 a 2001, foi denominada de Federal Agriculture Improvement and Reform Act of 1996 – FAIR Act e, inicialmente, com conjuntura agropecuária bastante favorável, revelava um caráter pouco intervencionista, tendo recebido o sig-nificativo epíteto de Freedom to Farm.12

Contudo, bastou a conjuntura mudar, com queda de preços em 1997, para a lei ser rapidamente adendada, elevando-se o pro-tecionismo e os gastos públicos. Em 1996 e 1997, os desembolsos nos programas de sustentação aos agricultores norte-americanos foram de US$ 7,4 bilhões, em média, passando para US$ 24,7 bi-lhões, entre 2000 e 2001 (COELHO, 2002).

Em 2002 aprovou-se a Farm Security and Rural Investment Act of 2002 – FSRIA Act, que vigorou até 2007. O desembolso previsto de recursos do Tesouro era de US$ 108 bilhões (US$ 18 bilhões/ano), superior aos US$ 101 bilhões da FAIR Act. Cerca de 45% dos recursos da FSRIA Act seriam destinados a políticas de sustentação de preços, cujos efeitos são mais distorcivos. Entre-tanto, ao contrário da Freedom to Farm, previu-se aumento de gastos para controle da área plantada e do tamanho de rebanhos.

Já em 2008 foi aprovada a Food, Conservation and Energy Act of 2008, para vigorar entre 2008-2012 (USDA, 2010). Pratica-mente não se alteraram as formas e o volume dos subsídios pre-vistos na Farm Bill de 2002, mas como seu nome está indicando, a Farm Bill de 2008 dá um peso considerável ao papel da agrope-cuária na produção de biocombustíveis.

12. “... preços agrícolas elevados, estoques em seus níveis mais baixos dos últimos 50 anos, exportações recordes em 1994, renda agrícola crescendo e ótimas perspec-tivas de ampliação do mercado internacional. Em consequência, (...) existia um clima para mudar todo o sistema de proteção da renda da agricultura, iniciado em 1933, baseado em garantia de preços e controle de oferta (via restrição de área e formação de estoques) e desvincular as transferências governamentais da produção e preços (...), dentro do espírito dos acordos aprovados na Rodada Uruguai” (COELHO, 2002: 35).

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De sua parte, a UE reformulou a PAC em 2000 e 2003, sem alterar, fortemente, o volume de gastos públicos, mas modificando sua composição. Partindo-se do conceito de Multifuncionalida-de, os pagamentos diretos aos agricultores foram sendo, progres-sivamente, desvinculados do volume produzido e se relacionando mais a itens como conservação do meio ambiente, desenvolvi-mento rural, sanidade dos alimentos e bem estar animal. A re-forma de 2003 estabeleceu que, a partir de 2005, os agricultores receberiam pagamentos únicos anuais, de acordo com o previa-mente recebido entre 2000 e 2002.

De maneira geral, não se pode dizer que os países desenvolvi-dos deixaram de atender os compromissos do Acordo Agrícola de 1995, mesmo por que eles eram muito pouco restritivos. Con-tudo, pode se afirmar que, na primeira década do século XXI, esses países mantiveram alto nível de protecionismo agrope-cuário, fato confirmado pela análise de diferentes indicadores, como o Subsídio Equivalente ao Produtor (PSE) utilizado, desde 1987, pela OCDE.

Tal indicador estima o valor monetário das transferências de consumidores e contribuintes, decorrentes da aplicação de polí-ticas públicas de apoio à agropecuária.13 “A transferência de renda dos consumidores aos produtores ocorre quando determinadas políticas de suporte de preço desconectam os preços domésticos dos preços internacionais, resultando em preços aos consumido-res superiores aos vigentes na ausência dessas políticas. As trans-ferências dos contribuintes ocorrem quando o governo imple-menta políticas agrárias que implicam gastos orçamentários,

13. O PSE utiliza outros critérios e incorpora apoio interno, subsídio à exportação e restrição à importação, sendo mais amplo que a Medida Global de Apoio (MGA) da OMC, que estima somente parcela do apoio interno (FAO, 2005). Além do PSE, outra medida usada pela OCDE é o Subsídio Total Equivalente (TSE), que acresce ao PSE, os gastos públicos gerais destinados à agricultura e as subvenções aos consumidores para compra de alimentos. Em 2004, o PSE foi de US$ 279,5 bi lhões e o TSE de US$ 377,9 bilhões (OCDE, 2004 e 2005).

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como pagamentos diretos, subsídios na compra de insumos, en-tre outros”. (BERALDO, 2000)

Entre 1986 e 88, período base do Acordo Agrícola, o PSE de todos os países da OCDE (em sua maior parte, desenvolvidos) registrou média anual de US$ 242,9 bilhões, equivalentes a 37% da Receita Bruta Agropecuária (% PSE). No triênio 2002-04, a média do PSE foi de US$ 254,2 bilhões, correspondentes a 30% da Receita Bruta Agropecuária (OCDE, 2005). Portanto, consta-tou-se pequena queda relativa nas subvenções destinadas aos agricultores, embora elas continuassem elevadas.

Essa queda relativa veio acompanhada de alteração no tipo de gastos. Caiu a participação de políticas de sustentação de preços de produtos e de subsídios aos insumos, que passaram de 91% do PSE, em 1986-88, para 74%, em 2002-04. Aumentaram os gastos considerados menos distorcivos ao comércio, como os ligados à restrição do uso de fatores, à manutenção da área plantada ou do tamanho do rebanho ou ainda os que mantêm o valor recebido pelo agricultor no ano corrente igual ao dos anos anteriores.

Dentre os países da OCDE, havia diferentes situações. A Austrália e a Nova Zelândia mantinham baixo nível de prote -ção à agricultura, com % PSE, respectivamente, de 4% e 2%, em 2002-04. No Canadá houve grande queda, de 36%, em 1986-88, para 22%, em 2002-04. Nos EUA houve queda de 22% para 17% e na Europa, de 41% para 34%. Japão e Coréia do Sul apresentavam valores de % PSE, em torno de 60% e Islândia, Suíça e Noruega em torno de 70%.

Enquanto muitos países em desenvolvimento, especificamente os latino-americanos, adotaram medidas liberalizantes de suas agriculturas desde a década de 1980, os desenvolvidos reduziram relativamente pouco seu alto nível de protecionismo, frustrando as expectativas liberalizantes pós Rodada Uruguai.14 A análise que

14. “These numbers support the hypothesis that the Uruguai Round did not have a significant impact on the levels of agricultural support in OECD countries,

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Aksoy (2005) faz da proteção tarifária, entre 1999 e 2001, de um grupo de seis países desenvolvidos e 22 em desenvolvimento,15 comprova essa tese. O autor mostra que tanto nos países desen-volvidos quanto nos em desenvolvimento, as tarifas agrícolas ten-diam a serem maiores que as tarifas industriais. Nos EUA a tarifa agrícola média era de 9,5% contra 4,6% dos produtos industriais. Na UE, os números eram, respectivamente, 19,0% e 4,2%.

Entre os países em desenvolvimento a tarifa agrícola média mostrava-se maior que a dos desenvolvidos. Contudo, para o pri-meiro conjunto de países a tarifa média era mais realista, posto que nos países ricos 31% das tarifas agrícolas eram específicas e não entravam no cálculo da média, obtida apenas das tarifas ad valorem. Para os países em desenvolvimento, menos que 9% das tarifas eram específicas.

As cotas de importação continuavam bastante significativas, atingindo 28% dos produtos agrícolas importados pelos países da OCDE (AKSOY, 2005). Nesses casos, o acesso aos mercados era bastante restrito e ficava sujeito a fortes ingerências políticas na distribuição das cotas com tarifas reduzidas (TRQ). As tarifas ex-tra-cotas mostram-se proibitivas, com valores que superavam, como no caso da importação de carne bovina pela UE, quatro a nove vezes aquelas cobradas sobre as cotas (CARFANTAN, 2004).

Outras duas práticas comuns no comércio mundial agrícola são a escalada e os picos tarifários. A primeira é resultante da cobrança de tarifas relativamente mais altas dos produtos com

especially the large industrial countries (...). Thus, despite the implicit promise by industrial countries that agriculure could follow the path of manufacturing, with protection rates continously declining – one of the reasons developing countries embraced trade liberalization – this has not happened” (AKSOY, 2005:42).

15. Os países são África do Sul, Bangladesh, Brasil, Bulgária, Canadá, China, Costa Rica, EUA, Filipinas, Guatemala, Hungria, Índia, Indonésia, Japão, Jordânia, Malásia, Malai, Marrocos, México, Quênia, República da Coréia, Romênia, Rús-sia, Togo, Turquia, Uganda, União Européia e Zimbábue.

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maior grau de processamento de uma cadeia produtiva. Por exemplo, na importação de cacau e seus derivados, a UE cobrava tarifa de 0,5% da matéria-prima (cacau em grão), 9,7% do produto intermediário (manteiga de cacau) e 30,6% do produto final (cho-colate). Algo semelhante acontecia com soja, café e cadeia têxtil, em que os países praticavam tarifas maiores para roupas, inter-mediárias para tecidos e bem menores para as fibras agropecuá-rias (algodão, linho, seda, lã). A escalada tarifária dificulta aos países exportadores de matérias-primas, normalmente em desen-volvimento, que as processem em seu próprio território e vendam produtos mais elaborados. Isto poderia contribuir para a geração de mais emprego e renda internamente, mesmo por que os pro-dutos agrícolas elaborados, como se verá adiante, apresentam comércio mais dinâmico que as matérias-primas.

Para alguns produtos considerados sensíveis, muitos dos quais sofreram processo de tarificação, as tarifas de importação situam-se muito acima da tarifa média. Por exemplo, a tarifa de importação (extra-cota) de açúcar era de 133% nos EUA e de 161% na UE e a da carne de porco era de 311% no Japão (ICONE, 2007). Várias análises mostram que os picos tarifários são mais acentuados nos países desenvolvidos.16

No comércio de produtos industrializados, práticas como subsídios à exportação, tarifas específicas e cotas de importação são pouco frequentes ou já estão abolidas. No comércio agrícola, além da tarifa média mais alta, essas práticas continuam presentes, ocasionando disputas comerciais encaminhadas aos órgãos jul-gadores de contenciosos da OMC. Algumas vitórias importantes

16. Quanto mais comuns os picos tarifários, maior é o desvio padrão da média e sua distância da mediana. Para EUA e UE a tarifa média agrícola é mais que o dobro da mediana, enquanto que para Brasil, China e Índia, ela é igual ou pouco mais alta. A tarifa agrícola máxima dos EUA é 350%, da UE 277%, Índia 182%, China 71% e Brasil 55% (ICONE, 2007). Análise de 65.305 linhas tarifárias de 2000-02 mostra um coeficiente de variação de 336% nas tarifas agrícolas dos países ricos, contra 190% nos em desenvolvimento (FAO, 2005a).

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foram obtidas pelos países em desenvolvimento, como as do Bra-sil, que conseguiu duas sentenças favoráveis contra o subsídio à exportação de algodão praticado pelos EUA e de açúcar pela UE.

Entretanto, a expectativa dos países em desenvolvimento, pelo menos dos grandes produtores agropecuários era maior, indo além de simples conquistas pontuais. O que se desejava era que o Mandato Doha chegasse ao seu final com a celebração de novo Acordo Agrícola que avançasse, significativamente, na re-dução das políticas de apoio interno e no aumento do acesso ao mercado dos países desenvolvidos, inclusive com maior controle sobre distorções como os picos tarifários. Pelo menos tempora-riamente, esse desejo foi frustrado.

2.2 A DISTANTE META DA UNIVERSALIZAÇÃO

DO DIREITO À ALIMENTAÇÃO

Em 1996 a FAO (Organização das Nações Unidas para a Agri-cultura e Alimentação) promoveu em Roma (Itália) a Cúpula Mundial sobre Alimentação, com representantes de mais de 180 nações, incluindo muitos presidentes e primeiro ministros. A sua principal deliberação foi a de estabelecer a meta de redução pela metade do número absoluto de pessoas famintas no mundo, en-tre 1990 e 2015.

Baseado nas informações do triênio 1990-92 estimou-se que 826 milhões de pessoas (20,3% da população) estavam desnu-tridos nos países em desenvolvimento e nos desenvolvidos, a desnutrição atingia 19,1 milhões de pessoas, menos de 2% de sua população. Especificamente para os países em desenvolvimento, o cumprimento da meta da Cúpula Mundial sobre Alimentação significaria a redução em 413 milhões no número de desnutri-dos, em 25 anos.

O cálculo da FAO de pessoas desnutridas baseia-se na dispo-nibilidade e na distribuição de alimentos entre a população. Para dado ano, com informações de produção, sua finalidade (alimentar

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ou não), exportação, importação, variação de estoques e perdas, estima-se a disponibilidade total de alimentos, em quilocalorias (Kcal), e a disponibilidade média diária por habitante (Kcal/capi-ta/dia). Através de outros indicadores, como a distribuição de renda, se constrói a curva de distribuição de alimentos entre a população. Levando-se em conta a composição etária e de gê-nero da população se estabelece o consumo mínimo necessário, usualmente, entre 1.800 e 2.000 Kcal/capita/dia. Juntando-se esta informação à curva de distribuição de alimentos, obtém-se a porcentagem de pessoas desnutridas.

A quem analisa a agricultura, o critério da FAO tem a grande vantagem de associar o consumo de alimentos à sua disponi -bi lidade, para a qual a produção agropecuária tem a contribui-ção preponderante. Outros critérios normalmente empregados para medir a desnutrição têm natureza clínica, como a porcenta-gem de crianças de até cinco anos abaixo do peso ou da altura ade quada ou de adultos abaixo do peso considerado normal (MONTEIRO, s. d.).

A mobilização dos países em torno do combate à desnutrição foi reforçada em 2000, quando a Declaração do Milênio da ONU colocou como uma de suas metas a redução pela metade da pro-porção da população desnutrida, entre 1990 e 2015.17

Contudo, apesar dessas manifestações expressas de inten-ção, os dados recentes mostram que se está muito longe de se

17. Em 2000, os 189 países membros da ONU assinaram a Declaração do Milênio, com a fixação de oito Metas de Desenvolvimento: 1) erradicar a pobreza extrema e a fome; 2) atingir o ensino primário universal; 3) promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres; 4) reduzir a mortalidade infantil; 5) melhorar a saúde materna; 6) combater o HIV/Aids, malária e outras doenças; 7) garantir a sustentabilidade ambiental e 8) estabelecer uma parceria global para o desenvol-vimento. Dentro da primeira meta, os objetivos assumidos foram: a) reduzir pela metade a proporção da população com renda inferior a um dólar por dia e b) re-duzir pela metade a proporção da população que sofre fome, entre 1990 e 2015. Como a população mundial continua crescendo, essa meta de redução propor-cional, é menos ambiciosa que a meta estabelecida pela FAO, em 1996, de redução absoluta do número de desnutridos.

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atingir tanto a meta estabelecida pela ONU, quanto a da FAO. No triênio 2004-06, constatou-se a existência de 872,9 milhões de pessoas desnutridas no mundo, 15,2 milhões nos países de-senvolvidos e 857,7 milhões nos países em desenvolvimento (FAO, 2009). A Tabela 2.1 mostra a evolução, a partir do início dos anos 1990, do número de desnutridos nas diversas regiões dos países em desenvolvimento.

Tabela 2.1 Milhões de pessoas desnutridas e participação na população total, regiões dos países em desenvolvimento, médias de 1990-92, 1995-97 e 2004-06.

Regiões

Número de Desnutridos

Porcentagem de Desnutridos

1990-92

1995-97

2004-06

1990-92

1995-97

2004-06

Países em Desenvolvimento 826,3 803,5 857,7 20,0 18,0 16,0

África Subsaariana 168,8 193,6 212,3 34,0 34,0 30,0

América Latina e Caribe 52,6 51,8 45,3 12,0 11,0 8,0

Ásia e Pacífico 585,7 528,5 566,2 20,0 17,0 16,0

Oriente Médio / África Norte 19,1 29,6 33,8 6,0 8,0 8,0

Fonte: FAO (2009).

Para o conjunto dos países em desenvolvimento, observa-se uma queda relativa na população de desnutridos do início ao final do período. Entretanto, seu número absoluto, depois de cair entre 1990-92 e 1995-97, voltou a crescer deste triênio para 2004-06.18 A situação mais difícil, em termos relativos, é a da África Subsa-ariana, com quase um terço da população desnutrida. O maior progresso ocorreu na América Latina e Caribe, embora na Amé-rica Central e no Caribe a desnutrição seja semelhante à constata-da na Ásia e Pacífico.

18. Se medida com outros critérios, a desnutrição pode se revelar ainda mais grave. Assim, o número de crianças menores que cinco anos abaixo do peso adequado representava, em 2003, 28% do total de crianças nessa faixa etária nos países em desenvolvimento, contra 33%, em 1990 (ONU, 2007).

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Nos anos 2008 e 2009, revertendo o que vinha ocorrendo desde a década de 1970, constatou-se agravamento da situação de desnu-trição mundial, com crescimento da porcentagem de desnutridos nos países em desenvolvimento (FAO, 2009).

Dando um passo adiante, pode-se relacionar a evolução da desnutrição com a disponibilidade e com os preços de produtos agropecuários destinados à alimentação. Neste sentido, sabe-se que, em decorrência, especialmente, dos avanços tecnológicos, que resultaram em redução do custo unitário de produção e no aumento da oferta agrícola, registrou-se, ainda que com muitas flutuações, queda de 50% nos preços reais agropecuários, entre 1961 e 2002 (FAO, 2005a).

Ao mesmo tempo aumentou a disponibilidade mundial média de alimentos, que, no quadriênio 1999-2002, revelou-se igual a 2.790 Kcal/pessoa/dia, bem acima do mínimo julgado necessário. Os países desenvolvidos tinham disponibilidade de 3.450 Kcal/ pessoa/dia e os em desenvolvimento, 2.660 Kcal/pessoa/dia. Dos 179 países considerados, apenas 33, a maioria da África, apresenta-vam disponibilidade de alimentos inferior a 2.200 Kcal/pessoa/dia (FAO, 2005b).

Contudo, no presente século, o índice de preços de alimentos medido pela FAO começou a subir, especialmente de 2006 a 2008, quando seu valor foi mais do que o dobro do constatado em 2000 (FAO, 2009a). Em decorrência da crise financeira de 2009, o pre-ço da alimentação caiu, mas ainda se encontrava em patamar bem mais alto do que o do início do Século XXI. Entre as causas da elevação desse patamar, a FAO destaca o uso crescente de maté-rias primas agropecuárias para a produção de biocombustíveis, a manutenção de preços relativamente altos do petróleo, encare-cendo insumos agropecuários e o transporte, e uma aparente di-minuição da taxa de crescimento da produtividade agropecuária (FAO, 2009b).

Embora essa situação deva perdurar ainda por alguns anos, a FAO projeta que, mesmo com a continuidade do crescimento

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da população mundial, é possível chegar a 2050, com apenas 4,8% de pessoas desnutridas nos países em desenvolvimento, bem me-nor que os atuais níveis (FAO, 2009c). Isso dependerá da ampliação da área agrícola, mas, principalmente, do crescimento dos gastos públicos em favor da agricultura que resultem em aumento da produtividade da terra e dos rebanhos via incorporação de tecno-logia químico-biológica. Entretanto, essa projeção otimista poderá ser bastante prejudicada pelas mudanças climáticas e seus efeitos negativos na produção agropecuária.

Ainda que a conjuntura se apresente menos favorável, conti-nua sendo verdadeira a informação de que a disponibilidade atual de alimentos no mundo se mostra, em tese, suficiente para aten-der todos os habitantes do planeta, o que não serve de alívio para o problema de desnutrição muito presente em vários países e re-giões em desenvolvimento.

Uma das causas da desnutrição que atinge milhões de pessoas na Ásia e na África é o grande número de conflitos militares inter-nos e entre nações dos últimos anos.19 Os desastres naturais tam-bém aparecem como uma das causas, embora com consequên cias menos significativas e muito concentradas na Ásia, onde provo-caram perto de 700.000 mortes e desabrigaram milhões de pessoas (ONU, 2007).

Contudo, as causas mais gerais da desnutrição podem ser atri buídas ao baixo nível de desenvolvimento e à insuficiência e à concentração da renda. A partir desse diagnóstico, a FAO entende que o principal mecanismo de combate à fome devem ser as polí-ticas de incentivo a investimento e crescimento econômico, espe-cialmente as voltadas para agricultura, onde são maiores os níveis

19. “De los 13 millones de muertes provocadas por conflictos de gran escala entre 1994 y 2003, más de 12 millones se produjeran en el África Subsahariana, Asia Occidental y Asia Meridional. No es de sorprender que en estas regiones se en-cuentran también tres cuartas partes de los 37 millones de refugiados y despla-zados del mundo y que en ellas esté en aumento el número de personas que padecen hambre” (ONU, 2007).

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de pobreza e desnutrição. Ao incentivar a produção e aumentar a produtividade do trabalho agrícola, além dos benefícios diretos em termos de emprego e renda primários, conseguir-se-ia forne-cer alimentos mais baratos, contribuindo para elevar o poder de compra da população urbana.

Além disso, a FAO recomenda que sejam implantadas ações de proteção social que proporcionem, imediatamente, aumento do acesso à alimentação pelas famílias mais pobres. Pode ser citado como exemplo, o Food Stamp, criado na década de 1930 e que atendia, em 2001, 10 milhões de norte-americanos, que rece-biam tickets para aquisição de alimentos (BICKEL & ANDREW, 2002). Outro exemplo é o Programa Bolsa Família que, em 2009, suplementou a renda de cerca de 12 milhões de famílias pobres no Brasil.

Ainda que haja vontade política, não é tarefa fácil, posto que os países com muitos desnutridos têm também orçamentos re-duzidos, dificultando a sustentação de programas públicos de incentivo a investimentos produtivos e de proteção social. Con-tudo, alguns exemplos mostram que mesmo países muito pobres conseguiram aumentar o crescimento do PIB/capita e do PIB Agrícola/trabalhador e reduzir significativamente a porcentagem de desnutridos.20

Ao final dessa seção, quer-se fazer breves comentários sobre a chamada ajuda alimentar, que são as doações de alimentos de paí ses desenvolvidos e instituições multilaterais aos países mais pobres ou em situação de emergência. Esse tipo de ação tem al-cance pequeno, sendo que, em 2005, ela resultou na distribuição de 10 milhões de toneladas, avaliadas em US$ 2 bilhões (0,5% da produção agrícola mundial), atendendo, com média de 50 Kg de

20. A África tem os exemplos de Gana, com redução de desnutrição de 37% para 12%, Etiópia, de 61% para 48% e Moçambique, de 66% para 45%. Na Ásia, o Vietnam diminuiu a desnutrição de 31% para 17% e na América Latina, o Peru registrou queda de 42% para 12%, entre 1990-92 e 2001-03 (FAO, 2006).

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alimentos, próximo a 200 milhões de pessoas. Metade dessas doa-ções foi gerenciada pelo Programa Mundial de Alimentos da ONU (FAO, 2006a).

Apesar da presença da ONU ter melhorado sua eficiência, ainda permanecem problemas de gestão e de desvios na distribui-ção de alimentos. Ao mesmo tempo, muitas vezes, a doação de alimentos fica sujeita ao interesse político do doador e tende a diminuir quando os preços de mercado se elevam. Além disso, a ajuda alimentar pode prejudicar as exportações de países em desenvolvimento e os mercados internos dos países receptores. Desde que se tenha potencial produtivo, seria desejável substituir a doação internacional de alimentos pela doação em dinheiro para que os desnutridos adquiram localmente os alimentos neces-sários. Para a FAO a ajuda alimentar deveria ser empregada ape-nas em situações emergenciais, de catástrofes naturais ou guer ra, quando os mercados não funcionam adequadamente.

2.3 PRODUÇÃO, TECNOLOGIA E PRODUTIVIDADE

ENTRE 1980 E 2003

É necessário fazer duas observações iniciais para esta e a pró-xima seção do capítulo. A primeira é que as informações disponí-veis não permitiram atualizar os dados além de 2003. A segunda é que o agrupamento de países considerado neste item apresenta diferenças em relação ao item anterior. Os países asiáticos foram aqui subdivididos em dois grupos, os do Oeste e Sudoeste da Ásia, onde está a China, e os do Sul da Ásia, entre eles a Índia. Não se computaram informações de 21 pequenos países em desenvolvi-mento da Oceania, com população de 8,6 milhões de habitantes, nem de 3 pequenos países em desenvolvimento da América do Norte, com população de 127 mil habitantes. E se considerou o agrupamento países em transição, composto por países originá-rios da ex União Soviética e de outros ex países do leste europeu.

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2.3.1 Evolução do PIB Agrícola e da Produção de Alimentos

A Tabela 2.2 mostra que houve leve redução no crescimento do PIB e do PIB Agrícola entre 1993-2003 em comparação ao pe-ríodo 1983-1993. Como era de esperar, nos dois períodos o cresci-mento da agricultura foi menor que o restante da economia, com exceções, como as da América Latina e Caribe e da África Subsa-ariana, entre 1993-2003.

Tabela 2.2 Taxa anual de crescimento PIB e PIB Agrícola, grupos de países, 1983 a 2003.

RegiãoPIB PIB Agrícola

1983-93 1993-03 1983-93 1993-03

Países Desenvolvidos 3,1 2,6 1,2 0,0

Países em Transição – 2,4 – 0,6

Países em Desenvolvimento 4,7 3,9 3,1 2,5

América Latina e Caribe 2,5 2,3 2,1 2,5

África Norte e Oriente Médio 3,3 3,2 3,4 2,3

África Subsaariana 2,6 3,7 2,9 3,9

Ásia – Oeste e Sudoeste 8,2 5,2 3,5 2,4

Ásia – Sul 5,3 5,5 3,1 2,5

Mundo 3,4 2,9 2,2 1,7

Fonte: FAO, 2005a.

Os países em desenvolvimento apresentaram taxas de cresci-mento mais altas que a dos desenvolvidos em ambos os períodos, sendo que na agricultura essa diferença foi maior. O PIB Agrícola dos países desenvolvidos ficou estagnado entre 1993-2003, o que pode estar relacionado à diminuição, ainda que pequena, do nível de protecionismo, após a Rodada Uruguai.

Excluindo do setor agrícola, a produção de pescado, da sil -vi cul tura, de produtos não alimentares, como fibras têxteis, e de es ti mulantes, como café e chá, a FAO estabelece o conceito de Pro du ção de Alimentos Agrícolas, cuja evolução encontra-se na Tabela 2.3. Verifica-se que a produção de alimentos vinha

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crescendo no mundo, a uma taxa pouco superior a 2,0% ao ano. Também vinha aumentando a disponibilidade média de alimentos por pessoa, a uma taxa entre 0,5% e 1,0% ao ano.

Tabela 2.3 Taxa anual de crescimento da produção de alimentos agrí co-las, em dólares constantes, grupos de países, 1980 a 2003.

Região

Produção Total Produção por Pessoa

1980-90

1990-00

2000-03

1980-90

1990-00

2000-03

Países Desenvolvidos 0,7 1,4 -0,8 0,0 0,7 -1,3

Países em Transição 1,8 -3,6 1,8 1,0 -3,5 2,0

Países em Desenvolvimento 3,6 4,0 3,2 1,5 2,3 1,6

América Latina e Caribe 2,5 3,4 3,7 0,4 1,7 2,2

África Norte e Oriente Médio 3,5 2,9 3,4 0,7 0,7 1,3

África Subsaariana 2,9 3,1 1,9 -0,1 0,4 -0,5

Ásia – Oeste e Sudoeste 4,4 5,2 4,0 2,7 3,9 3,0

Ásia – Sul 3,8 3,3 1,3 1,5 1,3 -0,4

Mundo 2,4 2,5 2,0 0,6 1,0 0,7

Fonte: FAO, 2005a.

A expansão da produção total e da produção per capita de alimentos foi mais acentuada para o conjunto dos países em de-senvolvimento. Neste caso, contudo, observa-se que na África Subsaariana, embora a produção total de alimentos tenha crescido a taxas relativamente altas, em termos per capita ela ficou pratica-mente estagnada.

Nos países em transição a produção de alimentos total e a per capita diminuíram na década de 1990, como consequência da grave crise econômica enfrentada no período. Nos primeiros anos do século XXI, a produção de alimentos vinha diminuindo nos países desenvolvidos, o que pode estar relacionado com a redução e a mudança na composição dos gastos de sustentação agropecuária, relativamente menos vinculados à quantidade produzida.

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2.3.2 Disponibilidade de Recursos Naturais, uso de Insumos e

Produtividade

A terra e a água doce podem ter seu uso potencializado pela tecnologia. O uso de adubos, sementes e raças melhoradas, rota-ção de culturas, conservação de solo etc. fazem com que o rendi-mento por área aumente. Sistemas de irrigação, construção de canais e dutos, plantio em épocas mais adequadas etc. permitem melhor aproveitamento da água. Contudo, a disponibilidade des-ses dois recursos naturais ainda é um fator a ser considerado ao se analisar a capacidade produtiva agrícola de determinada região.

A Tabela 2.4 mostra que a terra usada para a agropecuária, entre terras lavradas e de cultivo permanente, conforme critério da FAO,21 representava, em 2002, apenas 11,5% da área total do planeta. Do restante, boa parte não era propícia para a atividade agropecuária, em decorrência de condições climáticas e topo-gráficas adversas, por se constituir em reservas naturais, estar inacessível por falta de infra-estrutura, ser ocupada pelas cidades. Mesmo assim, havia ainda possibilidades de expansão da área destinada à agropecuária, sendo que entre as regiões em desen-volvimento, essa possibilidade era menor na Ásia, especialmente no Sul, quando comparado com a América Latina e Caribe e a África Subsaariana.

21. A FAO define dois agrupamentos das terras utilizadas pela agropecuária: tierra de labranza (que traduziu-se como terra lavrada) e tierra de cultivo permanente.

“Las tierras de labranza se refieren a las tierras cultivadas temporalmente (las de cultivo doble se computan una sola vez), las praderas temporales destinadas al corte o el pastoreo, las tierras utilizadas para la horticultura comercial y los huer-tos familiares y las tierras mantenidas temporalmente en barbecho (menos de cinco años). Esa categoria de tierras no incluye la tierra abandonada como resul-tado de los cultivos migratórios. Mediante término ‘tierra de labranza’ no se pretende indicar la cantidad de tierra apta para el cultivo”. “Tierras dedicadas a cultivos permanentes – tierras cultivadas con especies que lo ocupan durante períodos de tiempo prolongados y no necesitan ser sembradas después de cada cosecha, como el cacao, el café y el caucho. Esta categoria compreende las tierras ocupadas por arbustos destinados a la producción de flores, los árboles frutales, las nogales y las vides, pero excluyen los árbores plantadas para la producción de leña y madera” (FAO, 2005b: Anexo IV).

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Tabela 2.4 Utilização da terra (2002) e da água doce renovável* (2000) pelas atividades agropecuárias, por grupos de países.

RegiãoTerra (milhões ha) Água Doce (Km3/ano)

Total UA** % UA Total UA % UA

Países Desenvolvidos 3.294 390 11,8 8.816 885 10,0

Países em Transição 2.345 252 10,7 5.047 346 6,8

Países em Desenvolvimento 7.788 899 11,5 29.901 2.581 8,6

América Latina e Caribe 2.055 169 8,2 13.570 265 2,0

África Norte e Oriente Médio 1.267 100 7,9 516 323 62,6

África Subsaariana 2.334 167 7,2 3.856 98 2,5

Ásia – Oeste e Sudoeste 1.588 256 16,1 8.720 977 11,2

Ásia – Sul 449 206 45,9 1.761 918 52,1

Mundo 13.428 1.541 11,5 43.764 3.811 8,7

** Trata-se de água de superfície (rios, lagos) e do lençol freático.

** UA – Uso Agrícola.

Fonte: FAO, 2005a.

O uso da água doce renovável pela agricultura era, em 2000, percentualmente mais reduzido que o da terra. Contudo, além dela ser também usada domestica e industrialmente, sua localiza-ção tende a se concentrar em algumas regiões de determinado país. Exemplo típico é o brasileiro: há abundância de água na Amazônia, que não apresenta viabilidade econômica para ser uti-lizada pela agricultura nordestina, por exemplo, localizada no semi-árido.

Na Tabela 2.4 fica evidente que, entre as regiões em desenvolvi-mento, na África do Norte e Oriente Médio e no sul da Ásia a água já se apresentava como limitador para a expansão da agricul-tura. Mesmo por que, nessas duas regiões e no Oeste e Sudoes te da Ásia, mais de 30% da atividade agrícola eram feitas com o em-prego de irrigação. Situação bem mais favorável era encontrada na África Subsaariana e na América Latina e Caribe, com a utili-zação da água pela agricultura representando próximo a 2% da disponibilidade de água doce renovável. Na África Subsaariana

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apenas em 3,6% da área cultivada utilizavam-se sistemas de irriga-ção, enquanto na América Latina esse valor era de 12,6%.

Juntamente com cultivares e variedades melhoradas e agro-tóxicos, os fertilizantes químicos contribuem para aumento da produção agrícola por área cultivada. Sua utilização entre 1980 e 2002, é mostrada na Tabela 2.5. Verifica-se que seu uso já havia atingido patamar bastante alto nos países desenvolvidos em 1980, tendo diminuído levemente a partir de então. A grave crise dos países em transição na década de 1990 refletiu negativamente em diversos indicadores, como no uso de fertilizantes, que caiu abruptamente. Já os países em desenvolvimento mais do que do-braram a utilização de fertilizantes, entre 1980 e 2002, aproxi-mando-se da situação observada nos países desenvolvidos. O maior crescimento ocorreu na Ásia, enquanto na África Subsa-ariana seu emprego era muito baixo e apresentava-se, pratica-mente, estagnado.

Na Tabela 2.5 também pode se observar que o rendimento cultural (produtividade da terra) das terras lavradas e lavouras permanentes cresceu 51%, entre 1980 e 2002, no mundo todo. Co-mo essa variável foi medida em termos monetários e saben do-se que os preços agropecuários caíram no período, pode se supor que o aumento do rendimento cultural em toneladas ou quanti-dade física foi mais intenso.

O crescimento da produtividade da terra foi mais significativo nos países em desenvolvimento do que nos desenvolvidos. Am-bos os grupos partiram de um patamar muito parecido em 1980, sendo que, a partir de 1990, os países em desenvolvimento supera-ram os desenvolvidos em termos de rendimento cultural agrope-cuário médio, com destaque para os valores alcançados na Ásia.

Embora contribua também para o aumento de produção por área cultivada, o emprego de tecnologia mecânica tem efeito maior sobre a produtividade do trabalho. Diferentemente dos fertili-zantes, a Tabela 2.6 revela que ainda se mantinha grande diferença entre países desenvolvidos e em desenvolvimento na utilização de

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tratores agrícolas. Mesmo com crescimento de mais de 90% em seu uso, entre 1980 e 2002, o número de tratores por mil hectares de terras lavradas nos países em desenvolvimento, em 2002, repre-sentava menos que 25% do número dos países desenvolvidos.

Tabela 2.5 Uso de fertilizantes químicos em terras lavradas e produção agropecuária por área ocupada com terras lavradas e culti-vos permanentes, grupos de países, 1980 a 2002.

Região

Uso Fertilizantes (Kg/ha)*

Prod. Agríc./Área (US$/ha)*

1980 1990 2002 1980 1990 2002

Países Desenvolvidos 131 118(90)

116(88)

430 481(112)

524(122)

Países em Transição 104 104(100)

32(31)

275 310(113)

275(100)

Países em Desenvolvimento 56 87 (155)

115(205)

426 550(129)

721(169)

América Latina e Caribe 59 59(100)

89 (151)

381 455(119)

570(150)

África Norte e Oriente Médio 45 67 (149)

73 (162)

340 445(131)

583(171)

África Subsaariana 8 10 (125)

9 (113)

218 281(129)

359(165)

Ásia – Oeste e Sudoeste 120 180(150)

231(193)

753 898(119)

1.228(163)

Ásia – Sul 37 77 (208)

107(289)

343 479 (140)

580 (169)

Mundo 87 99(114)

101(116)

398 488 (123)

599 (151)

* Entre parênteses é índice de variação, com base 100 em 1980.

Fonte: FAO, 2005a.

Na América Latina e Caribe e na África do Norte e Oriente Médio o uso de tratores era mais intenso que a média dos países em desenvolvimento. O contrário tendia a se verificar na Ásia, região de grande concentração populacional e onde estão a Índia e a China. O baixíssimo emprego de tratores na África Subsaariana

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e seu pequeno crescimento demonstravam o reduzido nível de modernização de sua agricultura.

Tabela 2.6 Número de tratores agrícolas por terras lavradas, 1980 a 2002, e produção agropecuária por pessoa ocupada na agropecuária, 1980 a 2003, grupos de países.

Região

Tratores / 1.000 ha*

Produção(US$)/Trabalhador*

1980 1990 2003 1980 1990 2003

Países Desenvolvidos 38,3 42,0 (110)

41,6 (109)

10.568 14.861 (141)

24.675 (233)

Países em Transição 15,1 19,5 (129)

17,0 (113)

2.627 3.521 (134)

3.440 (131)

Países em Desenvolvimento 4,8 7,3(152)

9,2(192)

420 519 (124)

728 (173)

América Latina e Caribe 8,6 12,0 (139)

11,9 (138)

1.965 2.478 (126)

3.857 (196)

África Norte e Oriente Médio 9,1 15,0 (165)

19,6 (215)

973 1.318 (135)

1.531 (157)

África Subsaariana 0,9 1,1(122)

1,1(122)

332 355 (107)

404 (122)

Ásia – Oeste e Sudoeste 5,5 5,7(104)

8,2(149)

300 391 (130)

655 (218)

Ásia – Sul 2,6 6,5(250)

9,5(365)

347 458 (132)

541 (156)

Mundo 16,3 19,2 (118)

19,0 (117)

787 881 (112)

1.053 (134)

* Entre parênteses é índice de variação, com base 100 em 1980.

Fonte: FAO, 2005a.

Os dados da Tabela 2.6 revelam também que a produtividade do trabalho agropecuário mundial cresceu 34%, entre 1980 e 2003. O crescimento foi bem mais forte nos países desenvolvidos, com valor de 133%, fato que veio associado ao decréscimo do ní-vel de ocupação agrícola. Os dados de emprego agrícola coletados pela FAO mostram que, na década de 1980, houve diminuição do emprego agrícola a taxa de 2,4% a. a. nos países desenvolvidos

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e, a partir de 1990, essa redução foi mais intensa, de 3,1% a. a. (FAO, 2005a).

No conjunto dos países em desenvolvimento a produtividade do trabalho cresceu 73%, entre 1980 e 2003, sendo que a intensi-dade foi maior após 1990. Contudo, o emprego agrícola, diferen-temente dos países desenvolvidos, não caiu. Na realidade, ele apresentou taxa de expansão de 1,6% ao ano na década de 1980 e 0,8% ao ano após 1990, metade da anterior (FAO, 2005a).

A África Subsaariana apresentou crescimento baixo da pro-dutividade do trabalho, confirmando o pequeno dinamismo de sua agricultura. O crescimento no Oeste e Sudoeste da Ásia foi o mais intenso entre países em desenvolvimento, mas seu valor de 2003 continuava reduzido. Praticamente o oposto ocorria com sua produtividade da terra, a mais alta de todas as regiões (con-forme Tabela 2.5). Aí há grande emprego de fertilizantes e de ir-rigação rural e pequeno uso de tratores, conformando uma agricul tura que explora intensamente a terra e mantém alto nível de ocupação agropecuária.

2.4 EXPANSÃO E MUDANÇAS NO COMÉRCIO

DE PRODUTOS AGROPECUÁRIOS

Levando-se em conta que os períodos analisados não são to-talmente coincidentes, ao se comparar os dados da Tabela 2.7 com os da Tabela 2.2, observa-se que as taxas de crescimento de exportação total de mercadorias e de produtos agrícolas foram maiores que, respectivamente, a expansão do PIB e do PIB Agrí-cola mundiais. Ou seja, entre 1980 e 2003 aumentou o grau de integração comercial entre os países do mundo.

Nas décadas de 1980 e 1990, a taxa de crescimento mundial da exportação total foi significativamente maior que a agrícola, semelhante ao que ocorreu na relação PIB total e PIB agrícola. A queda de ritmo da exportação agrícola nos anos 1990 deveu-se, em grande parte, à diminuição generalizada de preços agrícolas,

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entre 1996 e 2000. Nesses quatro anos, o valor real da exportação agrícola se contraiu em 11% (FAO, 2006b). Com a recuperação de preços a partir de 2001, a exportação agrícola mostrou grande vigor, crescendo 8,2% ao ano, entre 2000 e 2003.

Tabela 2.7 Taxa de crescimento média anual de exportação total e agrí-cola, em dólares constantes, grupos de países, 1980 a 2003.

Região

Exportação Total Exportação Agrícola

1980-90

1990-00

2000-03

1980-90

1990-00

2000-03

Países Desenvolvidos 6,9 5,1 4,5 4,2 2,0 7,7

Países em Transição 1,6 5,2 14,0 -0,8 4,0 15,4

Países em Desenvolvimento 3,2 9,3 5,8 2,1 3,0 8,3

América Latina e Caribe 1,5 7,7 3,0 0,9 3,4 8,9

África Norte e Oriente Médio -3,8 7,0 5,0 3,6 2,3 8,2

África Subsaariana -1,5 3,9 3,3 -1,4 1,1 6,9

Ásia – Oeste e Sudoeste 10,8 11,0 6,8 4,9 3,2 8,3

Ásia – Sul 7,8 9,4 6,8 1,6 3,6 5,9

Mundo 5,6 6,2 5,4 3,4 2,4 8,2

Fonte: FAO, 2005a.

Enquanto que, de 1980 a 1990, a exportação total e agrícola dos países desenvolvidos cresceu em ritmo mais acelerado que a dos países em desenvolvimento, o inverso ocorreu nos períodos seguintes. Além do maior crescimento de suas economias, isso pode estar relacionado com a implantação de reformas liberali-zantes em vários países em desenvolvimento. Outras prováveis causas foram a diminuição, ainda que pequena, do protecionismo agrícola dos países desenvolvidos e a maior integração comercial entre os países em desenvolvimento. O comércio Sul-Sul, que re-presentava 31% do comércio agrícola dos países em desenvolvi-mento, de 1985 a 1990, passou para 44%, de 1996 a 2001.

Entre os países em desenvolvimento, a região da América La-tina e Caribe vinha mostrando ritmo de crescimento das expor-tações agrícolas acima da média mundial, a partir de 1990. A

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África Subsaariana, por sua vez, desde o início dos anos 1980, apresentava dinamismo exportador menor que o conjunto dos países em desenvolvimento.

Pela Tabela 2.8, observa-se que a participação dos países de-senvolvidos nas exportações agrícolas caiu entre 1990 e 2003, mas con tinuava muito alta. Em 2003, suas exportações soma-ram US$ 345 bilhões, 2/3 das exportações agrícolas mundiais. Esses países apresentavam pequeno déficit no comércio agrícola, equivalente a 5% das exportações. Os dois principais exporta-dores agrí colas mundiais, em 2003, eram países desenvolvidos, a União Européia (UE 15) e os EUA, ambos com exportações aci-ma de US$ 60 bilhões. O Canadá vinha em quarto lugar, a Aus-trália em sexto e a Nova Zelândia em décimo primeiro lugar (ICONE, 2007).

Os países em transição tinham reduzida participação nas ex-portações agrícolas mundiais, menor que 5%. Eram altamente deficitários, com suas importações correspondendo a pratica-mente o dobro de suas exportações. É de se ressaltar, contudo, que no início do século XXI verificava-se nítida tendência de melhoria nessa situação.

Tabela 2.8 Participação dos grupos de países nas exportações agrícolas mundiais, em bilhões de dólares, 1980 a 2003.

Região1980 1990 2003

Valor % Valor % Valor %

Países Desenvolvidos 150 64,1 226 69,3 345 66,1

Países em Transição 11 4,7 10 3,1 23 4,4

Países em Desenvolvimento 73 31,2 90 27,6 153 29,3

América Latina e Caribe 32 13,7 35 10,7 63 12,1

África Norte e Oriente Médio 6 2,6 8 2,4 12 2,3

África Subsaariana 10 4,3 9 2,8 12 2,3

Ásia – Oeste e Sudoeste 20 8,5 33 10,1 56 10,7

Ásia – Sul 4 1,8 5 1,5 9 1,7

Mundo 234 100,0 326 100,0 522 100,0

Fonte: FAO, 2005a.

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As exportações agrícolas dos países em desenvolvimento re-presentavam quase 30% das exportações mundiais, em 2003, com tendência de se elevar. Apresentavam saldo comercial agrícola praticamente zerado. Os países do Oriente Médio e Norte da África eram altamente deficitários, importando cerca de três ve-zes o que era por eles exportado. Ao contrário, a América Latina e o Caribe eram altamente superavitários, com o volume de ex-portação ultrapassando duas vezes suas importações. As outras três regiões apresentavam pequeno déficit no comércio agrícola.

Em 2003, o Brasil com exportações de US$ 21 bilhões, ocupa-va o terceiro lugar entre os maiores exportadores agrícolas mun-diais. A China era o quinto, Argentina o sétimo, Tailândia, oitavo, Malásia, nono e México, décimo. Dos 15 maiores exportadores mundiais, os países em desenvolvimento apresentaram taxas de crescimento de exportações agrícolas, entre 1990 e 2003, bem maiores que os desenvolvidos (ICONE, 2007).

Outro aspecto a destacar na evolução do comércio interna-cional é que os produtos processados aumentaram sua partici-pação nas exportações agrícolas mundiais, de 27,3%, em 1980/81, para 38,3%, em 2000/01. Neste ano, eles representavam 45,6% das exportações dos países desenvolvidos, contra 24,8% dos em de-senvolvimento (AKSOY, 2005).

Considerando-se os diversos produtos, observa-se que café, cacau, chá, castanhas, especiarias, algodão e açúcar apresentavam crescimento menor que a média do comércio agrícola. Já as car-nes, leite e derivados, cereais e oleaginosas cresciam de acordo com a média. As maiores taxas de crescimento eram constatadas para frutas e verduras (AKSOY, 2005).

2.4.1 O Alcance das Reformas Comerciais

Alguns organismos internacionais (Banco Mundial, FAO) costumam fazer projeções sobre prováveis consequências da libe-ralização completa do mercado mundial agrícola. Os resultados

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apontam para diminuição de preços de alimentos aos consumi-dores dos países ricos, ao mesmo tempo, que preços internacio-nais de cereais, oleaginosas e algodão cresceriam. O comércio Sul-Sul seria estimulado e vários países em desenvolvimento au-mentariam sua produção e exportação agrícola. Contudo, países pobres importadores líquidos de alimentos ou que mantêm acor-dos preferenciais que lhes permite o acesso privilegiado ao mer-cado de países desenvolvidos seriam prejudicados.

O balanço dos dados até aqui analisados indica que na década de 1990 e começo do século XXI, os países em desenvolvimento vinham apresentando maior dinamismo na produção e na expor-tação agrícola em relação aos desenvolvidos. Contudo, estes ain-da eram, em 2003, responsáveis por 2/3 das exportações agrícolas mundiais e ocupavam posição privilegiada no comércio dos pro-dutos elaborados.

Também se evidenciou que os paises em desenvolvimento aumentaram o uso de fertilizantes e conseguiram obter rendi-mento cultural médio maior que os desenvolvidos. Enquanto a ocupação agrícola caiu nesses países, ela continuou crescendo nos em desenvolvimento, ainda que em ritmo menor que nos anos 1980. O uso de tratores e a produtividade do trabalho conti-nuavam muito mais altos nos países desenvolvidos do que nos países em desenvolvimento.

A diminuição significativa do protecionismo, que resultasse na redução do apoio à produção dos agricultores dos países ricos, das tarifas de importação, das cotas, escalada e picos tarifários e na eliminação dos subsídios à exportação, certamente, beneficia-ria um conjunto importante de países em desenvolvimento. Espe-cialmente os que não apresentam restrição para expandir sua área cultivada e que vem incorporando tecnologia em sua produção.

Entretanto, convém não exagerar no alcance econômico e so-cial dessa medida. Mesmo entre os países em desenvolvimento, haveria os que teriam, pelo menos em um primeiro momento, sua situação agravada com a liberalização comercial. Mais importante

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do que isso, o alcance das reformas comerciais parece ser relativa-mente pequeno diante dos problemas que enfrentam países mui-to pobres da África, da Ásia e da América Central. Nesse caso há problemas de fundo, políticos e econômicos, sobre os quais a re-forma comercial teria pouco ou nenhum efeito.

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3ABORDAGENS E COMPONENTES DO SISTEMA DE PRODUÇÃO AGROPECUÁRIO

A intenção desse capítulo não é de promover um debate teó-rico do tema, mas discutir, a partir de diferentes análises e autores, o emprego da abordagem sistêmica da produção agropecuária so-bre quatro perspectivas. A primeira, que permita um primeiro e sintético entendimento das transformações capitalistas que leva-ram à formação do sistema de produção agropecuária moderni-zada. A segunda, com caráter bastante descritivo e geral, que apon-te características econômicas estruturais e comportamentais dos diversos integrantes ou segmentos desse sistema. A terceira, que especifique a análise para determinada cadeia agropecuá ria, dis-correndo-se sobre a capacidade de organização e de coordenação e o grau de interação econômica entre seus componentes. Por fim, discute-se a pertinência de se tomar como nível de agregação o país ou o sistema nacional de produção agropecuário. Em todas essas perspectivas, o caso brasileiro será usado como exemplo.

3.1 MODELAGEM DA CONSTITUIÇÃO HISTÓRICA

DO SISTEMA DE PRODUÇÃO AGROPECUÁRIO

Para essa seção usaram-se, especialmente, os trabalhos de Kageyama et al (1990) e de Szmrecsányi (1990). Além de reco-nhecer as diferenças analíticas entre eles, é importante se salien-tar que será apresentada uma abordagem estilizada, simplificada e, obviamente, interpretativa de seus estudos. Parte-se de um mo-delo de unidade agropecuária pretérita denominada Complexo Rural que, após uma série de transformações, passa a constituir o

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modelo contemporâneo chamado de Complexo Agroindustrial, conforme representação da Figura 3.1.

Como exemplos do Complexo Rural, podem ser considera-das as grandes fazendas cafeeiras ou canavieiras no Brasil do sé-culo XIX, em que se explorava um produto principal, café ou açú-car, responsável pela quase totalidade da receita monetária do estabelecimento rural. Sua venda, intermediada por agentes co-merciais, ocorria, em grande parte, externamente, em mercados sem nenhuma ou com pequena diferenciação.1

Os estabelecimentos agropecuários tendiam a auto-suficiên-cia,2 com os fatores produtivos, como animais de tração, adubos orgânicos, ferramentas e equipamentos, sementes, mudas e raças sendo obtidos em sua própria área. A tecnologia era simples, com mudanças pequenas ao longo do tempo e baseada na exploração à exaustão da terra, dando caráter nômade à agricultura.

Ainda no interior do estabelecimento agropecuário, nas en-trelinhas da lavoura principal, em áreas menos nobres ou nos quintais das casas dos empregados, ocorria a produção de gêne-ros alimentícios para a subsistência de seus moradores, com eventual sobra sendo comercializada em mercados regionais. Ati-vidades acessórias, de carpinteiros, ferreiros, pedreiros, seleiros também se desenvolviam nas unidades agrícolas.

1. Além do grande estabelecimento rural cujo objetivo principal era produzir para o mercado internacional, havia alguns outros tipos de estabelecimentos, como os de pequenos agricultores independentes, explorando produtos de subsistência ou voltados para o atendimento do mercado local (HOFFMANN, 2007). Também se constatava a presença de estabelecimentos de maior porte, muitas vezes com na-tureza nômade, que exploravam especialmente atividades pecuárias, fornecendo animais de tração, carne e couro aos grandes estabelecimentos exportadores.

2. “A verdade é que, pelo menos na província do Rio de Janeiro, e em geral no Vale do Paraíba, as fazendas de café seguiram quase sempre à risca os moldes tradi-cionais da lavoura açucareira, constituindo cada qual uma unidade tanto quanto possível suficiente. Há notícia de fazendeiro fluminense que se gabava de só ter de comprar ferro, sal, pólvora e chumbo, pois o mais davam suas terras” (HOLANDA, 1963:166).

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Figura 3.1 Do Complexo Rural ao Complexo Agroindustrial

UA – Unidade Agropecuária.

Quanto à agroindústria rural, ela se caracterizava por ser de pequeno porte e artesanal, apresentando-se, no mais das vezes, como simples extensão da produção primária e voltada para o atendimento das necessidades de consumo dos moradores locais. Situação diferenciada constatava-se nas fazendas canavieiras, onde o engenho, movido manualmente ou com tração animal, além da aguardente e da rapadura, fornecia o açúcar, que era comercializado e representava o produto principal do estabeleci-mento rural.

A desagregação do Complexo Rural foi se dando, ao longo de várias décadas, à medida que se intensificavam as transformações da economia nacional, fruto da industrialização e do predomínio

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do setor urbano-industrial. Nesse processo, entre outros, verifica-ram-se modernização e ganho de escala do processo produtivo, aumento da produtividade do trabalho, mudanças qualita tivas no mercado de trabalho, com avanço de relações tipicamente assala-riadas, ampliação do número de bens e serviços ofertados, for-talecimento do mercado interno, inclusive de produtos primá-rios, mercantilização e elevação do preço da terra, tanto urbana quanto agrícola.

Para os propósitos desse trabalho, interessa destacar as conse-quências desse processo na estrutura do estabelecimento agro-pecuário, especificamente as seguintes mudanças: especialização de suas atividades, modernização de sua base técnica e o aprofun-damento das relações inter-setoriais.

A produção de subsistência vai deixando de ter sentido, à me-dida que a racionalidade de valorização do capital predomina, que a terra encarece e que os mercados agropecuários se desen-volvem. A partir daí, procura-se extrair a maior rentabilidade possível da terra, através da exploração daquelas atividades que apresentem melhores perspectivas de mercado. Dito de outra for-ma mostra-se irracional “desperdiçar” esse recurso natural, bem como força de trabalho, em atividades que não resultem, ainda que como expectativa, em alto retorno financeiro.

A possibilidade de não se produzir alimentos no interior dos estabelecimentos agropecuários decorre da maior amplitude geo-gráfica que alcançam os mercados dos produtos básicos da alimen-tação,3 devido, entre outros, ao aprimoramento dos veículos e meios de transporte.

Ao mesmo tempo, atividades de apoio ou acessórias, produção de insumos e pequenas agroindústrias, se deslocam do interior

3. Exemplo característico desse fato ocorre com a produção de arroz no Brasil. Antes disseminado pelos estabelecimentos de todo o país, hoje se observa grande concentração de sua produção, com uso de alta tecnologia, inclusive irrigação, no Rio Grande do Sul e sudeste catarinense, de onde é transportada para abastecer grande parte do território nacional.

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do estabelecimento rural, que vai se especializando em atividades essencialmente agropecuárias. Na verdade, não é um simples deslo-camento, mas uma substituição por outros produtos ou processos em maior escala, modernos e mais dinâmicos.

Assim, a aquisição de tratores faz diminuir o número de traba-lhadores rurais e substitui a tração animal. A terra e os rebanhos têm sua produtividade aumentada, com o emprego de tecnologias químicas (adubos, agrotóxicos, medicamentos, rações) e biológi-cas (sementes, mudas, raças e linhagens melhoradas). O ritmo intenso de surgimento de novas técnicas obriga a constante atua-lização do agricultor, que deixa de depender apenas da experiência própria adquirida ao longo dos anos. A base técnica da produção se transforma, ocorrendo a Modernização da Produção Agrope-cuária,4 que eleva a dependência da compra de insumos indus-triais e de serviços.

Esse fato pode ser evidenciado pela análise de custos de pro-dução da agricultura contemporânea. Na safra de milho de 2006, estimou-se um custo por hectare (incluindo remuneração da ad-ministração e do capital e gastos pós-colheita) de R$ 1.255,82, sendo R$ 706,19 (56,2%) destinado à compra de insumos quími-co-biológicos: adubos (R$ 327,47), sementes (R$ 180,00) e agro-tóxicos (R$ 198,72) (AGRIANUAL, 2007).5 Na produção de leite, com rendimento médio de 4.500 litros/lactação, estimou-se que,

4. Para Kageyama et al (1990), a modernização da agropecuária brasileira acentua-se (entrando em fase que os autores chamam de industrialização da agricultura) após a instalação em território nacional dos ramos produtores de máquinas e insumos químicos para a agropecuária, que antes eram totalmente importados. Nesse sen-tido, destacam a importância do Plano de Metas do Governo Juscelino Kubitschek (1956-1960), e do II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) no Governo Ernesto Geisel (1974-1979), que incentivaram a instalação e o desenvolvimento de empresas produtoras de tratores, colhedoras, fertilizantes e agrotóxicos.

5. Considerou-se a produção de milho no Paraná, com rendimento cultural de 6.600 Kg/ha. No caso da soja, para o mesmo estado e ano e com rendimento cultural de 2.850 Kg/ha, os gastos com insumos químico-biológicos somavam R$ 561,20 ou 55,6% do custo total.

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em 2004, os gastos com concentrado, medicamentos, hormônios e inseminação, representavam 52,9% do custo operacional efetivo e dispêndios com energia, combustível e transporte mais 10,3% (ANUALPEC, 2005).

No caso das agroindústrias, elas deixam de ser artesanais e sub sidiárias à produção agropecuária. Constituem, praticamente, um novo ramo econômico, aumentam seu tamanho, processam maior parcela da produção primária e ganham poder de mercado, influenciando decisivamente preço e qualidade da matéria prima utilizada. O grau de processamento dos alimentos cresce e surgem centenas de novos produtos na indústria alimentícia. Até chegar ao consumidor final, os produtos agropecuários sofrem uma série de transformações industriais e de serviços, com perda de impor-tância do consumo de produtos agropecuários in natura.

Em síntese, pode-se dizer que ocorre aprofundamento das re-lações inter-setoriais a montante e a jusante da agricultura, for-mando-se novo complexo ou sistema produtivo em que a atividade primária deixa de ser o pólo dinâmico,6 em termos tecnológicos e, até certo ponto, produtivos.

Julga-se importante essa última relativização, posto que con-vém não esquecer que interesses econômicos dos próprios agri-cultores os estimulam a procurarem se diferenciar e transformar sua base produtiva. Além disso, é oportuno se afirmar que várias transformações do sistema de produção agropecuária ocorrem a

6. “A partir da constituição dos Complexos Agroindustriais o desenvolvimento da agricultura passa a depender da dinâmica da indústria: não se pode mais falar da agricultura como um ‘grande setor’ na economia (como na divisão tradicional agricultura-indústria-serviços), por que grande parte das atividades agrícolas integrou-se profundamente na matriz de relações interindustriais, sendo seu funcionamento determinado de forma conjunta” (KAGEYAMA et al, 1990:13). Observe-se que os autores consideram a existência de mais de um complexo agroindustrial, a partir do entendimento que as diversas cadeias agropecuárias têm níveis de integração diferenciados com os setores urbano-industriais, uns mais fortes, outros mais tênues. Na abordagem deste texto, de caráter mais gené-rico, contudo, prefere-se considerar um único complexo agroindustrial.

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partir da aplicação de políticas públicas (pesquisa e crédito, es-pecialmente), sob as quais as organizações de agricultores costu-mam exercer pressão considerável.

3.2 OS INTEGRANTES DO SISTEMA DE PRODUÇÃO

MODERNIZADA AGROPECUÁRIO

Os diversos componentes do sistema de produção moder-nizada agropecuário são indicados na conhecida definição de agribusiness de Davis e Goldberg, formulada ainda na década de 1950 e citada em Ramos (2007:40): “agribusiness é a soma total das operações de produção e distribuição de suprimentos agríco-las; as operações de produção nas unidades agrícolas; e o armaze-namento, processamento e distribuição dos produtos agrícolas e itens produzidos com eles”.

A Figura 3.2 apresenta um esquema do sistema de produção agropecuário atual, iniciando-se pelo segmento dos fornecedores de serviços, insumos mecânicos e químico-biológicos, indo até o mercado consumidor de produtos de origem primária, que serão descritos a seguir. Não será abordada, neste momento, a produção agropecuária especificamente, tratada mais adiante, em outros capítulos desse trabalho.

3.2.1 Serviços e Indústrias para Agropecuária

Entre os serviços usados pela agropecuária, podem-se destacar os que afetam as decisões e a forma de produzir, como as informa-ções das condições dos mercados, de preços de insumos e produ-tos, e as tecnológicas. Neste caso, há uma etapa de pesquisa e outra de disseminação ou extensão do conhecimento relativo a proces-sos produtivos e produtos. De maneira geral, os agricultores não desenvolvem novas tecnologias, mas as obtêm junto a empresas públicas e privadas especializadas.

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Figura 3.2 Segmentos do Sistema da Produção Modernizada Agropecuária

Muitas vezes, a inovação tecnológica está associada à relação de compra e venda de um fator de produção, adubo, agrotóxico, ração, semente e linhagem melhorada, máquina agrícola. Pode acontecer também de se vincular a um contrato de fornecimento de matéria prima, em que as condições de produção primária são fixadas pela agroindústria.

A seguir se apresentam características estruturais e compor-tamentais dos principais setores econômicos fornecedores de in-sumos químico-biológicos para a agropecuária brasileira.

Agrotóxicos:7 em 2007 foram comercializados 504.630 tone-ladas de agrotóxicos no Brasil, revelando crescimento de 64,5% em relação às 306.735 t vendidas em 2002. A dependência brasileira à importação de princípios ativos, produtos intermediários e mes-mo formulados é grande, atingindo a cifra de 76,8%, em 2004.

Em 2008, a comercialização de agrotóxicos no Brasil gerou uma renda de US$ 7,1 bilhões e, em 2009, de US$ 6,6 bilhões. Neste último ano, os herbicidas foram responsáveis por 38% da venda de agrotóxicos, os inseticidas por 30% e os fungicidas por 27%. A cultura da soja consumiu 47,1% dos agrotóxicos no Brasil,

7. As informações deste item foram obtidas de ANDEF (2010), CLIVE (2006), MAPA (2008), MAPA (2008a), MAPA (2010a), MONSANTO (2010), SINDAG (2007) e SYNGENTA (2010).

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em 2009, seguida de longe pelo milho, com 11,4%, cana-de-açú-car, com 8,2%, e algodão, com 7,4%.

Trata-se de um ramo em que o desenvolvimento de novos produtos é muito demorado e extremamente caro. Estima-se que, em média, sejam necessários dez anos de pesquisa envolvendo entre 200 e 400 mil moléculas, com custo de US$ 250 milhões, para que se obtenha um único produto comercial. Até por essa razão, a concentração industrial é elevada, com as 10 maiores em-presas (entre elas, a Basf, Bayer, Dow Agrosciences, Du Pont, Monsanto e Syngenta) controlando 87% do mercado brasileiro e mantendo agressiva política comercial, sendo que, em 2004, cerca de 60% da venda de agrotóxicos foi financiada pelas próprias em-presas do setor, com prazo médio de 250 dias.

A representação social das grandes empresas é feita pelo Sin-dicato Nacional da Indústria de Produtos para a Defesa Agrícola (SINDAG), com 44 filiadas, e pela Associação Nacional de Defesa Vegetal (ANDEF), com 16 associadas.

Praticamente todas as grandes empresas do ramo de agrotó-xicos, a partir da década de 1990, passaram a se diversificar e fortalecer suas atividades na produção de sementes melhoradas, muitas vezes geneticamente modificadas (transgênicas). Com isso aproveitam as relações comerciais já estabelecidas com os agricultores, que compram agrotóxicos e sementes no mesmo período do ano. Também se explora um segmento altamente promissor e que apresenta sinergia com os produtos tradicionais das empresas de agrotóxicos. Como se verá logo adiante, a co-mercialização do material transgênico, na grande maioria dos casos, garante mercado para os agrotóxicos.

Exemplo típico dessa diversificação é dado pela Monsanto, que iniciou suas pesquisas com biotecnologia na década de 1980. Entre 1995 e 2009 adquiriu uma série de empresas de sementes melhoradas: Calgene, Asgrow, Monsoy, Dekalb, Agroceres, Se-minis, Emergent Genetics, American Seeds, Agroeste, Delta & Pine, MDM Sementes de Algodão, produtoras de sementes de

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algodão , frutas, hortaliças, milho, sorgo e soja. Em 2008 adquiriu a Alellyx e a CanaVialis, duas empresas brasileiras dedicadas ao melhoramento genético da cana-de-açúcar. Exemplo de sinergia conseguida se evidencia ao verificar que a semente de soja RR (Roundup Ready) comercializada pela Monsoy, ao contrário das variedades comuns, se mostra tolerante a herbicida à base de gli-fosato, como o Roundup, produto de ponta da Monsanto.

A área plantada com sementes transgênicas no mundo passou de 1,7 milhão de hectares, em 1996, para 102,0 milhões de hecta-res, em 2006. Deste total, a soja representava 57%, o milho, 25% e o algodão, 13%. Em 2006, a venda mundial de sementes transgê-nicas resultou em renda de US$ 6,15 bilhões, correspondente a 16% da venda de agrotóxicos e 21% da venda total de sementes melhoradas. Nesse mesmo ano, 68% das sementes transgênicas vendidas garantiam resistência a herbicidas, 19% resistência a in-setos e 13% resistência conjunta a herbicidas e a insetos.

Fertilizantes:8 em 2009 foram consumidos 22,5 milhões de toneladas de fertilizantes no Brasil. O País, atrás da China, Índia e Estados Unidos, constituiu-se no quarto maior consumidor de fertilizantes, com participação de 5,7% no consumo mundial. Constata-se grande dependência da importação, sendo que, em 2009, foram produzidos no Brasil 8,4 milhões de toneladas de fer-tilizantes intermediários, 43,2% do total consumido, e importados 11,0 milhões de toneladas, 56,8% do total consumido.

Apesar de existirem 122 empresas associadas à Associação Nacional para Difusão de Adubos (ANDA), o setor mostra-se al-tamente concentrado. Em 1995, as seis maiores empresas contro-lavam 48,0% do mercado de NPK (nitrogênio, fósforo e potássio) brasileiro, valor que passou para 86%, em 2008.

A maior empresa do setor é a Bunge que, tradicionalmente, se dedicava à exportação, transformação e produção de alimentos

8. As informações deste item foram obtidas dos sites da ANDA (2010), e das empre-sas Bunge (2010) e Heringer (2010).

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de grãos e oleaginosas. Desde 1938, mantinha a empresa Serrana de Fertilizantes e a partir de 1997 ampliou sua atuação neste ramo, com aquisição das empresas IAP, Ouro Verde e Manah. Em 2000, se reestruturou com a constituição de duas empresas, a Bunge Alimentos, e a Bunge Fertilizantes. De 2006 em diante, passou a atuar também na comercialização de açúcar e nos anos seguintes construiu ou adquiriu dez agroindústrias de açúcar e álcool. Tam-bém vem se dedicando à produção de biodiesel. No início de 2010, vendeu sua área de nutrientes (mineração) de fertilizantes para a Empresa Vale, sem se desfazer, contudo, da formulação e comercialização dos fertilizantes entregues aos agricultores.

Medicamentos Veterinários: Em 2008 o faturamento da in-dústria de medicamentos veterinários no Brasil foi de R$ 2,6 bi-lhões, tendo crescido para R$ 2,8 bilhões, em 2009. Neste ano, os ruminantes consumiram 55,4% dos medicamentos veterinários, os suínos 15,3% e as aves 14,2% (MAPA, 2010a).

A principal entidade representativa das empresas do setor é o Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para a Saúde Ani-mal (SINDAN). Observa-se grande concentração industrial no setor, sendo que entre julho de 2004 e junho de 2005, as suas dez maiores empresas auferiram 64,4% do faturamento bruto setorial (CAPANEMA et al, 2007).

Rações e Suprimentos Minerais: em 2008 foram vendidos 58,7 milhões de toneladas de rações e 2,1 milhões de toneladas de sal mineral para alimentação animal no Brasil, valores que passa-ram para, respectivamente, 58,4 milhões t e 1,8 milhão t, em 2009. Neste ano, a avicultura de corte foi responsável por 47,6% do con-sumo de rações no Brasil, a suinocultura por 26,2%, a avicultura de postura por 8,2%, a bovinocultura de leite por 7,5%, cada uma, e a bovinocultura de corte por 3,3% (UBABEF, 2010). A indústria de rações usa grande quantidade de alguns produtos agrícolas brasi-leiros, sendo que, em 2004, consumiu 60% da safra de milho e 48% da produção de farelo de soja nacionais (SINDIRAÇÕES, 2007).

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O Sindicato Nacional da Indústria de Alimentação Animal (SINDIRAÇÕES) conta com 151 associados, responsáveis por 80% da produção de ração no Brasil (SINDIRAÇÕES, 2010).

Sementes e Mudas: as empresas produtoras de sementes asso-ciadas à Associação Brasileira de Sementes e Mudas (ABRASEM) comercializaram 1.803 mil toneladas de sementes na safra 2006/07 e 2.021 mil t na safra 2007/08. Nesta safra, a comercialização de sementes de soja somou R$ 2.361,4 milhões, 43% do total, e a de milho R$ 2.196,5 milhões, 39% do total (MAPA, 2010a).

Estimava-se que a demanda potencial de sementes melhora-das, em 2007/08, fosse de 3.025 mil t, para uma demanda efetiva de 1.598 mil t, ou 52,8% do potencial. Algumas culturas se des-tacavam pelo grande uso de sementes melhoradas, como o sor-go, com 88% da área plantada com esse tipo de sementes, o milho, com 83%, e o trigo, com 72%. No caso da soja, essa participação era de 61%, do arroz irrigado, de 51% e do algodão de 44%. Já no caso do feijão, apenas 11% da área plantada se dava com semen-tes melhoradas (MAPA, 2010a).

Nas pesquisas ligadas ao melhoramento genético de plantas é expressiva a participação do poder público. Por exemplo, na ca-na-de-açúcar, a RIDESA (Rede Universitária de Desenvolvimento do Setor Sucroalcooleiro), originária do extinto Planalsucar e li-gada a universidades públicas federais, detém 28 cultivares regis-trados, enquanto o Instituto Agronômico de Campinas (IAC), do Governo do Estado de São Paulo, detém mais oito, o que somadas representam 40% das cultivares de cana-de-açúcar registradas no Serviço Nacional de Proteção de Cultivares. Dos 1.387 das culti-vares registradas de todas as lavouras no Brasil, em agosto de 2010, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária era respon-sável pelo desenvolvimento de 24,2% delas (MAPA, 2010b).

No caso do setor de Máquinas e Equipamentos, observa-se a existência de número relativamente grande de empresas fornece-doras de implementos para a agricultura, como arados, grades,

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semeadoras, adubadoras, pulverizadoras e de máquinas e equi-pamentos para a pecuária. São 169 empresas desse tipo, muitas das quais de atuação regional, que fazem parte da Câmara Seto-rial de Máquinas e Implementos Agrícolas da Associação Brasi-leira de Máquinas e Equipamentos (ABIMAQ, 2010).

Já no caso de tratores de roda e colhedoras automotrizes de cereais, apenas cinco empresas controlam o mercado brasileiro. Em 2009 foram produzidos 52.845 tratores de roda agrícolas no Brasil, com participação da AGCO de 39,8%, da CNH de 25,0%, da Valtra de 19,5%, da John Deere de 12,9% e da Agrale de 2,8%. A produção de colhedoras em 2009 somou 4.438 unidades, 42,0% da CNH, 40,4% da John Deere, 13,9% da AGCO e 3,7% da Valtra (ANFAVEA, 2010).

Assim como o restante da indústria automobilística, parte considerável da produção de máquinas agrícolas no Brasil se destina à exportação. Dessa forma, em 2008, da produção total brasileira de 84.992 de tratores de roda e de esteira, colhedoras, cultivadores motorizados e retroescavadeiras de uso agrícola, 54.449 (64,3%) foram vendidos no mercado interno e 30.217 (35,7%) se destinaram à exportação, sendo que as importações foram desprezíveis (CONAB, 2010). É bom que se diga, contudo, que para a montagem das máquinas agrícolas se utiliza quanti-dade considerável de componentes importados, reduzindo o sal-do comercial da cadeia.9

3.2.2 Agroindústrias e Indústria Alimentícia

Dos grandes cultivos brasileiros, apenas o feijão chega ao consumidor final sem sofrer qualquer transformação industrial. Alguns passam por processamentos simples, como o arroz, que é

9. Em 2004, o valor total das exportações de tratores de roda, de esteira, colhedoras e retroescavadeiras e seus componentes somou US$ 1.728 milhão, contra impor-tação de US$ 1.097 milhão (ANFAVEA, 2007).

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descascado, tem o gérmen retirado e é polido ou o leite, que é pasteurizado, sendo comercializado como tipo A, B ou C, ou é uperizado, constituindo o chamado leite longa vida. Outras transformações são mais significativas, como no caso da soja, consumida na forma de óleo refinado, margarina, creme, em mistura com suco de frutas etc.

É comum usar o termo Agroindústria para a empresa que faz o primeiro processamento dos produtos primários. São vários os exemplos: empresa de ração, frigorífico, laticínio, de farinhas e óleos vegetais, de café torrado e moído ou de solúvel, de açúcar e álcool, de suco de frutas, de manteiga de cacau, de fios de algo-dão, serrarias, de celulose. A seguir podem ocorrer, na mesma ou em empresa diversa, outras transformações que resultam em do-ces, confeitos, chocolates, refrigerantes, macarrão, bolachas, pães, margarinas, embutidos, queijos e derivados do leite, móveis, sa-patos e derivados do couro, papel, tecidos e roupas.

Parcela considerável das empresas que processam matérias-primas de origem agropecuária faz parte da Indústria Alimentícia ou da Fabricação de Produtos Alimentícios (na denominação téc-nica empregada pelo IBGE). Em 2008, o IBGE estimava existirem 21.862 empresas com cinco empregados ou mais10 no Brasil, dedi-cadas à produção de alimentos, com valor de transformação de R$ 88,3 bilhões. Esses valores representavam, respectivamente, 13,3% e 12,3% do número e do valor de transformação do conjunto da Indústria Extrativista e de Transformação (IBGE, 2010).

Para a Associação Brasileira de Indústria Alimentícia (ABIA), considerando também as empresas com menos de cinco empre-gados e com base em dados do Ministério do Trabalho e Emprego,

10. Conforme IBGE (2010), para o conjunto da Indústria Extrativa e de Transfor-mação as empresas de 1 a 4 empregados representavam 46,8% do número total de empresas, incluindo as de 5 empregados ou mais. Considerando que essa proporção valha especificamente para as empresas da Fabricação de Produtos Alimentícios, pode-se estimar que seu número total seria de 41.094 empresas.

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existiam, em 2008, 38,5 mil empresas dedicadas à produção indus-trial de alimentos no Brasil, sendo que 94,7% delas se constituíam em micro ou pequena empresa. Em ordem de importância suas principais classes de produção eram: derivados de carne; benefi-ciamento de café, chá e cereais; açúcares; laticínios; óleos e gordu-ras; derivados do trigo; derivados de frutas e vegetais; diversos; chocolate, cacau e bolos e; conservas de pescado (ABIA, 2010).

Uma característica que distingue o consumo alimentar de ou-tros ramos industriais e de serviços é que ele tende a apresentar menor taxa de crescimento ao longo do tempo. A elasticidade renda da demanda dos gastos com alimentação, bebidas e tabaco situa-se entre 0,25 e 0,35 ou menos para os países desenvolvidos e entre 0,60 para 0,70 nos em desenvolvimento (USDA, 2007). Esses valores são mais baixos do que os verificados para outros tipos de gastos, como roupas e calçados, combustíveis, eletrônicos, automóveis, serviços domésticos, educação, saúde e recreação.

Para o Brasil, estudo de Hoffmann (2007a:471), com dados da Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) do IBGE de 2002-2003, aponta que a elasticidade renda da demanda dos gastos da alimentação era de 0,481, superior apenas à elasticidade renda dos gastos com fumo de 0,424 e inferior as dos outros nove gru-pos de despesa, como transporte, com elasticidade renda de 0,966, recreação e cultura, 0,989 e educação, 1,072.

Isso faz com que as empresas dos ramos alimentícios mante-nham, no geral, políticas de redução de custos e preços, procu-rando aumentar sua participação no mercado, ao mesmo tempo, que tentam explorar aqueles tipos de alimentos com mercados mais promissores e dinâmicos, normalmente mais processados e com maior valor unitário. O mesmo estudo de Hoffmann (2007a:478) revela que, por exemplo, a elasticidade renda da de-manda das despesas com leite de vaca no Brasil era de 0,441, en-quanto que para três tipos de queijos estudados ultrapassava 0,9 e do iogurte atingia 0,674.

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Segundo Belik (2001), nas últimas décadas, houve mudanças importantes na estratégia competitiva das empresas alimentícias. Na década de 1960 a competição se dava, basicamente, via preços ou redução de custos. Na década de 1970, o atributo qualidade ganhou relevância. A partir de 1980, acentuou-se a procura de maior variedade, com o constante lançamento de novos produtos, tentando-se adaptar ao dinamismo e à segmentação do mercado consumidor, sem, contudo, abandonar as ações voltadas para re-dução dos custos produtivos e das melhorias qualitativas.11

Algumas estratégias de diversificação podem ser constatadas entre empresas brasileiras processadoras de produtos agropecuá-rios. Por exemplo, muitas cooperativas agropecuárias, que ocupam papel relevante na transformação industrial de cereais, oleagino-sas, leite e outros, iniciaram suas atividades como fornecedora de insumos químico-biológicos e assistência técnica aos agricultores e como atacadistas. Com o tempo, várias delas constituíram agro-indústrias, passando a produzir, por exemplo, farelo e óleo bruto de soja, rações, derivados de milho e mandioca, fios de algo dão, comercializados junto a empresas agrícolas ou industriais. Este é o caso da C Vale e Integrada, ambas do Paraná e Carol de São Paulo. Outras, como COAMO (PR), Itambé (MG) e COOPER-CENTRAL Aurora (SC) foram adiante, desenvolvendo outras etapas industriais e chegando a fornecer produtos prontos para o consumo final.12

11. “O mercado alimentar é extremamente dinâmico e os hábitos de consumo estão sofrendo enormes variações que são ditadas pelo ambiente social e pelas carac-terísticas culturais da população. A manutenção e ampliação de fatias de mercado no consumo de alimentos é uma tarefa extremamente difícil e tem em conta a necessidade de atualizações produtivas permanentes” (BELIK, 2001:34).

12. Exemplo dessa trajetória é dado pela COCAMAR (PR). Surgiu como atacadista de cafeicultores, com nome original de Cooperativa dos Cafeicultores de Maringá. Ampliou suas fontes de matéria primas, construiu agroindústrias e passou a produzir mercadorias para o consumo final. A atual COCAMAR Cooperativa Agroindustrial oferta no varejo óleos vegetais (soja, milho, canola e girassol), café torrado e moído, capuccino, álcool gel e líquido, maionese, atomatados, sucos de frutas e bebidas à base de soja (COCAMAR, 2010).

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A priorização e o avanço em direção à produção de bens com maior grau de elaboração e valor unitário constituem em impor-tante estratégia de empresas líderes da Indústria Alimentícia. Esse é o caso da Empresa Sadia que, em 2009, se juntou à Empresa Perdigão e formou a Empresa Brasil Foods. Em 2000, a Sadia apresentava a seguinte composição em suas vendas no mercado brasileiro: 29% eram originados da comercialização de carnes de aves e suínos, 11% de outros produtos (rações, inclusive) e 60% da venda dos industrializados (resfriados e congelados). Em 2008, os industrializados elevaram sua participação para 79%, em de-trimento das carnes de aves, suínos e bovinos, com 15%, e outros, com 6% (SADIA, 2010).

Outro fato a ser destacado entre as processadoras de produtos de origem agropecuária é o crescimento do nível de concentração entre empresas de seus diversos ramos. Especificamente na In-dústria Alimentícia, embora, como já visto, haja um grande nú-mero de empresas, poucas delas tendem a controlar faixas expres-sivas do mercado, conforme se evidencia na citação a seguir. “As dez maiores companhias do setor brasileiro de aves foram res-ponsáveis (em 2004) por 50,4% da produção nacional, enquanto no caso de suínos, as dez maiores responderam por 40,9%. Nos segmentos de produtos congelados e resfriados, a concentração é maior, com os dois maiores produtores (Sadia e Perdigão) res-pondendo por 80,6% e 56,1% dos mercados, respectivamente. Em margarinas, as três maiores empresas (Sadia, Bunge e Unilever) responderam por 85,0% do mercado” (SADIA, 2007, parênteses acrescentados na transcrição).

Em outros ramos agroindustriais, inclusive não alimentícios, também se observa grande concentração de capital, como na pro-dução de papel e celulose, de farinha de trigo, de óleo e farelo de soja, nos frigoríficos de bovinos e no de suco de laranja. Neste caso, após a saída da Empresa Cargil, em 2004, e a junção entre Citrosuco e Citrovita, em 2010, apenas três empresas, Cutrale,

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Coinbra e Citrosuco/Citovita, passaram a controlar 85% do mer-cado brasileiro e 50% do mercado mundial de suco de laranja.

A concentração e o crescimento da escala de operações apre-sentam, como uma de suas consequências, a internacionalização das empresas alimentícias, não apenas sob o aspecto comercial, mas também com a instalação de plantas produtivas em diferentes países. Isso já se evidenciava em empresas de capital estrangeiro, como a Nestlé, Bunge, Grupo Coinbra (Louis Dreyfus), Kraft e Unilever. Mais recentemente, empresas de capital brasileiro tam-bém vêm se internacionalizando, construindo ou adquirindo unidades industriais em outras nações, citando como exemplos empresas de suco de laranja e frigoríficos de bovinos e aves.

Tal concentração industrial acaba refletindo não só nas rela-ções comerciais entre empresas processadoras de produtos agro-pecuários e agricultores, mas na própria dinâmica agropecuária. “O importante a assinalar neste novo quadro é o caráter reflexo dos segmentos fornecedores de matérias primas diante do poder de mercado e das articulações das grandes empresas. Trata-se efe-tivamente de uma mudança do ambiente institucional criada por um campo organizacional bem definido em que a grande empresa oligopólica tem apontado o rumo do processo de reestruturação” (BELIK, 2001:104).

3.2.3 Os Supermercados e a Distribuição de Alimentos

Na distribuição de produtos agropecuários e de alimentos constata-se a presença de empresas transportadoras, de armaze-namento, exportadoras, atacadistas públicos e privados e da rede varejista. Os super e hipermercados assumiram, nas últimas dé-cadas, papel preponderante no varejo alimentício brasileiro, além de estender suas ações ao atacado. Em 1970, os estabelecimentos tradicionais participavam de 70,7% das vendas varejistas de ali-men tos no Brasil, enquanto o auto-serviço tinha participação de 29,3%. Em 1997, os tradicionais caíram para 15,4% e o auto-

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serviço cresceu para 85,6% (BELIK, 2001), repetindo-se nacio-nalmente uma tendência observada no mundo todo.

Os super e hipermercados centralizam em um mesmo local os serviços prestados por vários estabelecimentos tradicionais: mercearias/empórios, quitandas, feiras livres, açougues e pada-rias. Além disso, comercializam produtos não alimentícios, com destaque para artigos para a casa, roupas e calçados e produtos eletrônicos.13 A praticidade ao consumidor é complementada pe-lo auto-atendimento e pela oferta de vagas de estacionamento, especialmente importante em grandes centros urbanos.

Em 2008, as atividades comerciais brasileiras (atacado, varejo e veículos, peças e motocicletas, conforme divisão adotada pelo IBGE) geraram receita operacional líquida de R$ 1.455,4 bilhões, dos quais R$ 576,8 bilhões (39,6%) originados do comércio vare-jista. Deste, o principal segmento era o dos hipermercados e su-permercados, com receita operacional líquida de 140,2 bilhões e participação de 24,3% no comércio varejista. Em 1990, esta parti-cipação era bem menor, no valor de 14,8% (IBGE, 2010a).

O comércio varejista, de maneira geral, é composto por gran-de número de estabelecimentos, em sua imensa maioria de peque-no porte, sendo que em 2008, constatou-se média de cinco pessoas ocupadas por unidade de venda. Os hipermercados e supermer-cados se diferenciam totalmente, registrando em 2008, média de 45 pessoas ocupadas por unidade de venda (IBGE, 2010a).

Entre as suas empresas, verifica-se elevado nível de concen-tração. No mercado formal de alimentos no Brasil, o Grupo Pão de Açúcar colocava-se com o líder, em 2009, apresentando parti-cipação de 14,8% nas vendas totais. Vinham a seguir o Grupo Carrefour e o Wal-Mart, sendo que essas três redes eram respon-

13. Em 2005, as vendas do Pão de Açúcar foram compostas por artigos de mercearia (43%), perecíveis (35%), bazar (13%), eletrônicos (7%) e têxteis (2%). O plane-jamento da empresa previa reforçar a participação dos produtos não alimentares nos anos seguintes (PÃO DE AÇÚCAR, 2007).

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sáveis por 40,4% do comércio varejista de alimentos no Brasil, em 2009 (PÃO DE AÇÚCAR, 2010).14 Apresentam diferentes marcas comerciais, procurando atender categorias de consumidores de diferentes classes sociais. E, mais recentemente, têm diversificado suas ações também para a venda de remédios e combustíveis.

O Grupo Carrefour é o segundo maior varejista de alimen-tos do mundo, tem matriz na França e atua em 34 países, com 15.500 lojas (CARREFOUR, 2010). O Grupo norte–americano Wal-Mart é o maior varejista de alimentos do mundo, possui mais de 8.200 lojas, está presente nos 50 estados dos EUA e em 16 países (WAL-MART, 2010). O Grupo Pão de Açúcar se de-senvolveu por várias décadas com capital brasileiro, mas, em 2004, partilhou ao meio seu controle acionário com o Grupo Casino, da França. No Brasil conta com 1.080 lojas, em 2010, contra 218 lojas, em 1995.

As grandes redes de supermercados tendem a comprar suas mercadorias diretamente de empresas da Indústria Alimentícia ou de agricultores (no caso de legumes, verduras e frutas frescas) e concentrar seu recebimento em equipamentos próprios, cha-mados de Centros de Compra e Distribuição, para posterior re-distribuição às lojas de varejo. Dessa forma, racionalizam suas operações, diminuindo os gastos administrativos, aumentando o poder de barganha nos preços e o controle de qualidade e redu-zindo os custos de transporte e estoques. Mais de 85% das compras do Grupo Pão de Açúcar, por exemplo, passam por suas 28 Cen-tros de Distribuição espalhados pelo país.

Absorvem, dessa forma, parte da atividade atacadista, di-minuindo o espaço de atuação de outras empresas privadas ou

14. Outros países mostram concentração semelhante ou maior. As cinco maiores redes controlavam 40% das vendas dos supermercados nos EUA, 60% na Ingla-terra e 67% na França (BITTENCOURT, 2005). “En todo el mundo, las 10 mayo-res cadenas de supermercados controlan ahora casi un tercio de las ventas de comestibles” (FAO, 2005:35).

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públicas. Para Belik (2001), isso foi observado nas centrais públi-cas de abastecimento de hortifrutigranjeiros na França e no Brasil, em que se verificou a estagnação da rede CEASA/GEAGESP. “... entre 1985 e 1997 a movimentação anual de hortifrutigranjeiros se estagnou na CEAGESP. Há mais de 12 anos o volume comer-cializado no maior entreposto atacadista de alimentos da América Latina se encontra estacionado em algo em torno de 2,4 milhões de toneladas” (BELIK, 2001:150).

As redes de super e hipermercados não são simples interme-diários entre a produção primária ou secundária e o consumidor final, mas exercem forte poder junto aos fornecedores.15 Em pri-meiro lugar, praticamente impondo a pequeno número deles a obrigação de entrega, em prazo estipulado, de grandes quanti-dades de produtos com preços baixos e condizentes com suas agressivas políticas de redução de custos e ampliação de partici-pação no mercado.16 Segundo, exigindo novos atributos qualita-tivos no conteúdo, forma e apresentação dos produtos, facilitando sua operacionalidade e procurando atender a todos os segmentos e tendências do mercado consumidor.

Um exemplo é a exigência de embalagens com as diversas marcas próprias da rede varejista em produtos que são comercia-lizados, normalmente, com preços mais baixos. Nos países desen-volvidos, as chamadas marcas próprias ultrapassavam 20% do total vendido nos super e hipermercados (NEVES & MACHADO FILHO, 1996).

15. “Como lembram alguns autores (...), o comércio varejista é ainda frequentemente considerado pelos economistas como um agente que serve de correia de trans-missão neutra entre a etapa da produção e a de consumo. Nossa conclusão é di-ferente. A atividade comercial organizada em torno da grande distribuição foi, na realidade, uma mola propulsora na reestruturação de algumas funções produti-vas e comerciais exercidas a montante” (GREEN & SCHALLER, 2000:127).

16. “Para simplificar las operaciones, la mayor parte de los supermercados pre-fierem trabajar com um número limitado de proveedores que tienen recursos suficientes para cumplir sus requisitos de calidad y plazos de entrega” (FAO, 2005:35).

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Outras iniciativas procuram atender determinados nichos de mercado. É o caso da Rede Carrefour, que em algumas lojas, fre-quentadas por clientes com maior poder aquisitivo, mantém seção destinada à venda de produtos orgânicos (Ilhas Orgânicas). Ao mesmo tempo, em toda a rede, parte da comercialização de pro-dutos, como frutas, legumes, verduras, carnes, peixes, arroz, feijão, palmito, sucos, café e ovos, é feita com o Selo Garantia de Origem Carrefour. Para tanto, a empresa garante acompanhar todas as etapas produtivas, desde o fornecimento de insumos agropecuá-rios até a venda ao consumidor, procurando-se evitar a presença excessiva de contaminantes químicos.

Essas e outras iniciativas não afetam, mas sim complemen-tam a estratégia geral dos super e hipermercados de ofertar pro-dutos de consumo de massa, apresentados em embalagens visto-sas, de fácil manuseio e compatíveis com o consumo individual ou de pequenas famílias, com margens de comercialização e pre-ços os mais reduzidos possíveis, especialmente para os produtos alimentícios.

3.2.4 O Padrão Contemporâneo de Consumo Alimentar

A alimentação ou o padrão de consumo de alimentos de de-terminada sociedade tem múltiplos determinantes, sendo afetado por fatores econômicos, sociais, políticos, históricos e culturais.17 Assume-se que, atualmente, a tendência principal é de se disse-minar entre os países o padrão de consumo agro-industrial ou ocidental (OLIVEIRA & THÉBAUD-MONY, 1996). Contudo, é importante que se leve em conta que continuam existindo (resis-

17. “Independentemente da óbvia necessidade de se manter a saúde física, conside-rações relacionadas com a etnicidade, status e prestígio, capacidade econômica, aceitação dentro de grupos sociais ou religiosos particulares, esnobismo alimen-tar, pressão publicitária e ajustes psicológicos, são todos eles aspectos da cultura que desempenham papéis importantes na determinação das preferências ali-mentares” (Shack citado por BLEIL, 1998:5).

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tindo) diversos hábitos alimentares regionais, ao mesmo tempo, que aumentam as reações, por razões sociais, culturais, ambien-tais e de saúde pública, ao padrão predominante.

O padrão de consumo agro-industrial apresenta, como carac-terísticas básicas, o crescimento das refeições realizadas fora do domicílio, o aumento do uso de proteínas animais e a predomi-nância de alimentos industrializados. Estes atraem os consu-midores com apelos de preço, de saciedade mais que de nutrição, de afirmação social e de praticidade na apresentação, aquisição e no preparo. Seu desenvolvimento está ligado a fatores como a dis-seminação da produção de massa, a urbanização, a maior presença da mulher no mercado de trabalho, a diminuição do tamanho das famílias, a evolução das formas de distribuição e os gastos com propaganda e marketing.

A generalização da produção em massa aumenta a produti-vidade do trabalho e rebaixa os custos unitários, o que junto ao crescimento das relações assalariadas e do rendimento médio dos trabalhadores, amplia o mercado consumidor dos produtos e serviços. Especificamente, as transformações técnicas e a eleva-ção da escala produtiva provocam queda nos custos das diversas etapas da cadeia alimentar: produção de insumos, produção pri-mária, transformação agroindustrial e distribuição. Adicionado aos frequentes lançamentos de produtos pela Indústria Alimen-tícia, isso vai ampliando (massificando) e diversificando o con-sumo de alimentos.

A urbanização tem como primeiro efeito afastar o consumi-dor da produção direta de alimentos. Além disso, especialmente nas grandes cidades, fica limitado o retorno para a casa nos horá-rios de almoço, ganhando importância as refeições fora do domi-cílio, em refeitórios industriais, no próprio local de trabalho, ou em bares e restaurantes. Estes atraem também os chamados con-sumidores solitários, pela sociabilidade que oferecem e por even-tuais vantagens de custo e de conforto em relação à confecção doméstica da própria refeição.

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Uma expressão moderna desse fenômeno são as redes de fast food ou refeições rápidas, em que a racionalidade da escala, da redução de custos e da diminuição do tempo de preparo e gasto para se alimentar sobrepujam o valor nutritivo e o prazer de uma refeição demorada. O típico cardápio fast food, para ser ingerido em poucos minutos, é composto por pão, hamburger, batata frita, refrigerante, sorvete e torta, ricos em carboidratos, gorduras e açúcar. Alternativamente, no Brasil desenvolveu-se o self service ou comida por quilo, onde também não se perde tempo, mas que possibilita a montagem de refeição mais equilibrada, com maior presença de fibras, vitaminas e sais minerais.

O número reduzido, quando não unitário, de membros das famílias estimula o oferecimento de embalagens com porções menores. A disseminação do trabalho feminino e o ritmo intenso da sociedade moderna limitam o tempo disponível para o preparo doméstico das refeições. Dessa maneira, ganham espaço os pro-dutos fatiados ou picados, os congelados, os temperos, molhos e sucos prontos, os embutidos, o leite longa vida, carnes temperadas e empanadas, produtos instantâneos ou misturados, os prontos e adequados para consumo em trânsito ou em frente à televisão ou ao computador doméstico. Com isso, se adiciona a economia de tempo no preparo dos alimentos à economia de tempo nas compras em supermercados que, como já visto, concentram no mesmo local todos os produtos alimentícios, além de outros tipos.

Mesmo por que as novidades não param de acontecer e novos produtos são frequentemente lançados, o consumo dos alimentos é estimulado por imensos gastos publicitários e promocionais,18 que, no mais das vezes, não valorizam suas qualidades intrínsecas e procuram atingir, especialmente, os jovens, que tendem a incor-porar mais facilmente novos hábitos alimentares (BLEIL, 1998).

18. “(...) a indústria de alimentos constitui-se no setor de maior investimento em promoção de vendas e propaganda (...)” (FARINA, 1997: 173).

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Deve-se levar em conta que o padrão de consumo agro-indus-trial apresenta gradação entre categorias sociais e países, de acor-do com o nível de renda e de desenvolvimento. O crescimento econômico e da renda média da população resulta em aumento do consumo per capita e torna mais variada a composição da dieta alimentar, com perda de importância de fontes de carboi-dratos e proteínas vegetais (no Brasil, arroz, feijão e mandioca) e crescimento do consumo de carnes, laticínios e, até certo ponto, de frutas e verduras.19 O grau de processamento dos produtos também cresce.20

Além do consumo de massa, estimulado pelo barateamento dos alimentos e das refeições, observa-se a exploração dos cha-mados nichos de mercado, voltados para consumidores de maior poder aquisitivo, e em que são valorizados atributos qualitativos ligados ao paladar, à forma de produção ou à origem do produto. Exemplo típico é do mercado cafeeiro, em que ao consumo do café torrado e moído tradicional, ainda amplamente predomi-nante, se junta o consumo de cafés especiais, com grão e bebida de melhor qualidade, com sabor mais específico e marcados pela origem em determinada região. No mesmo sentido, alguns grupos de consumidores demandam verduras, legumes e frutas exóticas e cortes especiais e texturas diferenciadas nas carnes.

Pode-se destacar também que, apesar do avanço do modelo agro-industrial, mantêm-se diferenças no padrão de consumo

19. Em diversos países, os menores valores de elasticidade renda da demanda são constatados para cereais e pães e óleos e gorduras, valores intermediários para frutas e verduras e valores mais altos para carnes e laticínios (USDA, 2007).

20. “Segundo estudos da Unilever, até aproximadamente US$ 5 mil de renda per capita anual, a demanda por alimentos de uma população se resume a cereais e produtos in natura. A partir desta faixa de renda tem início a demanda por produtos básicos de mercearia. Os produtos congelados passam a fazer parte da dieta das famílias com renda per capita a partir de US$ 10 mil. Finalmente, os produtos pré-preparados, variedades de marca e produtos frescos modernos só deverão entrar na cesta de consumo de compradores com renda per capita aci-ma de US$ 15 mil anuais” (BELIK, 2001:45).

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entre países e mesmo entre regiões de um mesmo país. Países como França, Itália, Espanha e Portugal valorizam mais seus há-bitos alimentares tradicionais que os EUA e a Inglaterra. Algu-mas regiões apresentam dietas que se destacam por serem mais saudáveis, elevando a expectativa de vida de suas populações. São os casos da Dieta do Mediterrâneo, caracterizada pelo consu-mo de grãos integrais, de azeite de oliva, de peixe e pouca carne vermelha e da Dieta do Japão, baseada em peixe, vegetais, deri-vados de soja e pequena ingestão de açúcar. No Brasil, o tradicio-nal feijão com arroz é bem avaliado pelos nutricionistas, embora venha perdendo espaço no consumo nacional há algumas déca-das (SCHLINDWEIN & KASSOUF, 2007).

O grande mérito associado ao padrão de consumo agro-in-dustrial é o aumento considerável da disponibilidade de alimentos no mundo, embora, como já visto no capítulo dois, em vários paí-ses em desenvolvimento a desnutrição continue atingindo grande parcela da população. Contudo, é importante que se considerem críticas que dizem respeito à quantidade e à qualidade deste pa-drão de consumo.

São claras as evidências que parte significativa da população consome quantidades de alimentos acima do necessário e de forma desequilibrada, com excesso de gorduras, açúcares e carboidra tos, em detrimento de vitaminas, sais minerais e fibras. O sedentaris-mo é o ingrediente adicional que leva ao aumento do número de pessoas com sobrepeso ou obesidade, inclusive em crianças e ado-lescentes, e de problemas de saúde decorrentes, como os cardio-vasculares, diabetes e alguns tipos de cânceres. Nos EUA, por exemplo, a obesidade atinge mais de 30% da população.

Como reação, já há algum tempo, observam-se ações volta-das para a ingestão de alimentos mais saudáveis nos diversos seg-mentos do sistema de produção agropecuário. Nesse sentido, passou a se criar raças de animais com menor teor de gordura, as chamadas carnes brancas se valorizaram, gorduras animais foram substituídas pelos óleos vegetais, desenvolveram-se as linhas diet

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e light. Vem crescendo, em substituição aos refrigerantes, o consu-mo de bebidas mais naturais, como água mineral, sucos de frutas e chás, bem como o de vegetais (verduras, legumes e frutas) fres-cos ou in natura. Neste caso, é comum que sejam minimamente processados, ou seja, higienizados, descascados, cortados e em-balados de maneira a facilitar o consumo final.

A valorização da forma física, as preocupações sociais, com o meio ambiente e doenças estimulam pelo menos parcela da socie-dade a exigir alimentos com maior valor nutricional e sem conta-minantes e aditivos químicos. Isso repercute nas políticas públicas, verificando-se a elaboração de propostas de maior regulamentação e controle no consumo alimentício. Neste sentido, por exemplo, observam-se ações públicas visando o controle das gorduras trans, presentes em sorvetes, batata frita, salgados de pacote, bolos, bis-coitos, margarinas, congelados e empanados. Outras ações procu-ram exercer maior fiscalização sobre a propaganda de alimentos.

Alguns movimentos sociais apresentam questionamento mais profundo sobre as bases do padrão de consumo agro-industrial, resultando na formação de mercados específicos. Um deles é o do Comércio Justo e Solidário (Fair Trade), de pequeníssima expres-são econômica e que visa garantir a pequenos agricultores, condi-ções adequadas de comercialização e de produção. Baseia-se no contato direto entre produtores agropecuários e consumidores, transparência dentro da cadeia produtiva e comercial, preço mí-nimo para o produto, associação democrática dos produtores, respeito às leis trabalhistas e controle sobre tecnologias químicas e biológicas (Faces do Brasil, 2010).

Outro mercado alternativo é dos chamados alimentos fun-cionais, que além da função nutritiva trazem outros benefícios à saúde humana. Citam-se como exemplos o arroz integral, farelos de trigo e arroz, peixes de água fria, linhaça, probióticos, deri-vados de soja e outros. Houve cresciment o desse mercado em mais de 50%, entre 2002 e 2005, quando alcançou um valor de R$ 647,1 milhões no Brasil (SBAF, 2007).

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Um terceiro mercado alternativo a destacar é o dos produtos orgânicos, que não usam agrotóxicos, fertilizantes químicos nem sementes transgênicas. Estima-se que, entre 1995 e 2005, o mer-cado de produtos orgânicos apresentou uma taxa de crescimento mundial entre 15% e 20% ao ano, contra uma taxa de cresci-mento de 4% a 5% ao ano da indústria alimentícia. Em 2005, o mercado dos orgânicos movimentou próximo a 14,5 bilhões de euros na Europa (PLANETAORGÂNICO, 2007).

O Censo Agropecuário de 2006 revelou que dos 5.175.489 es-tabelecimentos agropecuários no Brasil, 90.497 ou 1,75% do total produziam organicamente. Na distribuição dos estabelecimentos produtores de orgânicos por grupo de atividade econômica, pre-dominavam a pecuária e criação de outros animais, com 41,7%, e a produção das lavouras temporárias, com 33,5% (IBGE, 2009).

3.3 ANÁLISE DE CADEIAS AGROINDUSTRIAIS ESPECÍFICAS

Muitas vezes há interesse em analisar a estrutura e o desem-penho da cadeia agroindustrial de determinado produto agrope-cuário. Verificar quais são as características e a interação entre os seus componentes, como pactuam suas relações comerciais, como se mobilizam politicamente em torno de causas comuns ou de conflitos internos, qual a capacidade de se transmitir estímulos e informações ao longo da cadeia.

Para isso, uma opção é partir do nível de agregação que con-sidere todos os agentes econômicos mundialmente envolvidos. Por exemplo, a cadeia mundial do café era composta por 25 mi-lhões de agricultores e trabalhadores, quatro empresas interna-cionais (Neumann, Volcafe, ECOM e Dreyfus) controlavam 39% do comércio internacional, três outras (Philip Morris, Nestlé, Sara Lee) detinham 45% da torrefação, 30 redes de supermercados comercializavam 33% do café no varejo e existiam 500 milhões de consumidores (FAO, 2005). Nessa simples descrição já se revela o grande poder de interferência dos atacadistas e torrefadoras, talvez

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superior ao da própria Organização Internacional do Café, que congrega representantes governamentais dos países produtores.

Outra alternativa é desenvolver o encadeamento produtivo a partir da base territorial de determinado país. Assim, por exem-plo, se poderia considerar a cadeia cafeeira brasileira, a colombiana ou a vietnamita. Isso possibilita abordar a interação entre os agen-tes internos, a estrutura produtiva e a formulação da política na-cional, que resultam na sua maior ou menor competitividade no mercado mundial.

Níveis mais específicos de agregação podem ser considerados. Continuando com o exemplo do café, já se comentou a significa-tiva segmentação em seu mercado consumidor, com a presença, ao lado do tradicional e majoritário café torrado e moído, de no-vos produtos, como café solúvel, grão para expresso, café especial ou gourmet, descafeinizado, aromatizado, orgânico, café em lata, capuccino, balas de café, o que pode estar associado à conformação de diferentes sistemas produtivos a partir da lavoura cafeeira.21

Um tema que tem merecido atenção é a possibilidade de se constituir, a partir de iniciativas privadas ou governamentais, es-truturas organizacionais compostas pelos diversos integrantes de determinada cadeia agroindustrial, com capacidade de formula-ção de propostas de políticas setoriais e de coordenação das ações intra-cadeia que, independente das disputas comerciais internas, levem a melhores resultados econômicos para todos.

Ortega (2005) mostra que na Europa foram constituídas es-truturas desse tipo, chamadas Organizações Interprofissionais. Através da coordenação vertical de ramos agrários e agroindus-triais, elas fazem a representação política de diversas cadeias pro-dutivas, mediando junto aos órgãos públicos a formulação de políticas e a obtenção de recursos orçamentários específicos.

21. Junto com a produção do café commodity (indiferenciado), Saes & Farina (1999) apontavam a produção no Brasil do café orgânico, daquele destinado a Empresa Illycafé, do Café do Cerrado (MG) e do café despolpado.

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Para o Brasil, a implantação, na década de 1990, de “Câmaras Setoriais Agroindustriais”, tanto pelo Governo de São Paulo como pelo Federal, foi marcada por dificuldades de coordenação e de continuidade (TAKAGI, 2004). No presente século, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento tem promovido a cria-ção de novas Câmaras Setoriais, com representantes dos fornece-dores de insumos, agricultores e agroindústrias de várias cadeias agroindustriais. Em agosto de 2010 estavam registradas junto ao MAPA 26 câmaras desse tipo, além de seis câmaras temáticas (MAPA, 2010c).

Procurando-se exemplificar ações públicas ou de determina-dos segmentos que acabam repercutindo em toda cadeia, mais uma vez pode-se considerar a lavoura cafeeira. Em 1989, a As-sociação Brasileira da Indústria de Café (ABIC), diante da queda de seu consumo, criou o Programa de Auto-Fiscalização da In-dústria do Café, que concede o Selo de Pureza ABIC às empresas cujo produto torrado e moído não contenha impurezas. Com isso, conseguiu-se reduzir o índice de fraudes de 30%, em 1989, para menos de 5%, em 2005.

Adicionalmente, com recursos privados e do Fundo de Defesa da Economia Cafeeira (FUNCAFÉ) desenvolveu-se campanha procurando desvincular o consumo do café de problemas de saú-de. Sem que se desprezem outros fatores, como a queda de preço ao consumidor, essas ações contribuíram para que o consumo brasileiro de café passasse de 6,7 milhões de sacos, em 1986, para 14,9 milhões de sacos, em 2004, dobrando o consumo per capita.

Mais recentemente, em 2004, iniciou-se o Programa de Qua-lidade do Café, que registra na embalagem a qualidade e o tipo de grão empregado para obtenção do café torrado e moído. A inten-ção era de reforçar a imagem de boa qualidade do café e atingir a meta de 21 milhões de sacas consumidas no mercado brasileiro, em 2010. Em 2009, esse consumo foi de 18,4 milhões de sacas e o consumo per capita foi 16% maior do que o constatado em 2004 (ABIC, 2010).

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Outra experiência, esta sob patrocínio público do MAPA, foi a implantação no país, em 2003, da rastreabilidade da carne bo-vina ou, oficialmente, do Serviço de Rastreabilidade da Cadeia Produtiva de Bovinos e Bubalinos (SISBOV) que, em anos poste-riores, sofreu algumas reformulações. A intenção da rastreabi-lidade é conseguir identificar, a partir do produto de consumo final, o estabelecimento em que se produziu a matéria prima agropecuária ou mesmo a origem dos insumos usados para sua produção. Tal prática passa a ser uma exigência para que o Brasil consiga exportar a carne bovina para vários países e, para que se efetive, necessita que haja ação coordenada de todos os agentes da cadeia da bovinocultura.

Um aspecto que tem sido estudado nas cadeias agroindus-triais é a interação econômica que se estabelece entre empresas agropecuárias e agroindústrias. A operação de compra e venda de matéria prima agrícola entre elas pode ocorrer, em um extremo, em mercados tipo “spot”, sem o estabelecimento de contratos pré-vios. Em outro extremo, ocorre a integração vertical da atividade primária pela agroindústria.22 No Brasil, isso é muito disseminado na agroindústria sucroalcooleira, com próximo a 60% da cana-de-açúcar moída pelas usinas vindo de canaviais próprios, e vem se ampliando na agroindústria citrícola, por exemplo.

Entre os extremos observa-se a celebração de diferentes con-tratos, alguns mais simples, tratando apenas de preços e prazos de entrega da matéria-prima, outros mais abrangentes, envolvendo

22. Vários autores têm analisado a relação produção primária – agroindústria sob a ótica da Economia dos Custos de Transação. De acordo com diferentes especi ficidades da matéria prima e de outras variáveis, seriam estabelecidas diferentes estruturas de governança naquela relação, desde o mercado spot até a completa integração vertical, passando por contratos com vários níveis de formalidade (FARINA, 1997). Entre as especificidades pode-se apontar a pere-cibilidade de algumas matérias-primas agropecuárias, que não podem ser ar-mazenadas, o seu alto custo de transporte e a impossibilidade de substituição por outras matérias-primas.

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condições da produção. Neste caso, pode-se citar como exemplo, o relacionamento entre frigoríficos (integradores) e avicultores (integrados). Os primeiros fornecem pintinhos, ração, medica-mentos e assistência técnica para os segundos administrarem a criação dos animais em suas próprias instalações. Também ava-liam sua eficiência produtiva e, ao receberem os animais para abate, remuneram o trabalho dos avicultores na sua engorda. Para Chaddad et al (2006) os contratos e a integração vertical tendem a predominar em relação aos mercados “spot”.23

Por razões administrativas ou tecnológicas, tem-se observa-do que várias agroindústrias estimulam a concentração de seus fornecedores de matérias primas. Por exemplo, na cadeia do leite, visando maior qualidade do produto, foi estabelecida a obrigação legal de instalação de tanques de resfriamento nos estabelecimen-tos rurais, o que fez com que muitos pequenos pecuaristas, diante da incapacidade de bancar o investimento, abandonassem a ativi-dade. A indústria do suco tem priorizado receber laranja de mé-dios e grandes produtores, que entregam volumes maiores de matéria prima e diminuem custos administrativos. Os dois maio-res frigoríficos de aves do Brasil, Sadia e Perdigão, que integram, atualmente, a Empresa Brasil Foods, ambos de origem catari-nense, no processo de direcionamento de parte dos novos inves-timentos para o Centro-Oeste, têm estabelecido contratos com integrados de maior porte.24

23. “O relacionamento entre produtores agrícolas e demais participantes do sistema agroalimentar ocorre cada vez mais através de arranjos contratuais. Nos Estados Unidos, por exemplo, o porcentual do valor bruto da produção agrícola comer-cializado através de contratos e integração vertical – ou seja, fora dos mercados abertos – subiu de 28% em 1991, para 33% em 2003 (Macdonald & Korb, 2006). Apesar da não disponibilidade de estatísticas no Brasil, o uso de contratos na agricultura tem se tornado cada vez mais comum (Zylbersztayn, 2005). Os sis-temas agroindustriais do frango de corte, do suco de laranja, do tomate para uso industrial e do açúcar e álcool são exemplos onde predominam os arranjos con-tratuais entre produtores e a indústria”. (CHADDAD et al, 2006: 33)

24. Em 2003, a Perdigão produziu na cidade de Videira (SC) 146.158 toneladas de frango, através de contratos com 600 integrados. No mesmo ano, a produção

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3.4 O SISTEMA NACIONAL DE PRODUÇÃO AGROPECUÁRIA

No Brasil convencionou-se denominar de Agronegócio o agru-pamento nacional das atividades agropecuárias, bem como indus-triais e de serviços que se encadeiam a seu montante e a jusante. Tome-se a seguinte definição: “O Agronegócio envolve todas as cadeias produtivas desde a produção e distribuição de insumos até a comercialização de alimentos, fibras e energia. Ou seja, é um conjunto de atividades que está intimamente ligado a todos os setores da economia e da sociedade” (ABAGRP, 2007).

Uma definição tão ampla apresenta pouca operacionalidade, seja ao se considerar a capacidade de mobilização de seus agentes em torno de políticas públicas, seja ao se tomar como unidade pa-ra análise econômica. Neste sentido, entende-se que seria obtida maior precisão se considerasse o Agronegócio, enquanto unidade nacional de análise, como composto pelas atividades agropecuá-rias modernizadas, por aquelas que lhes fornecem insumos e ser-viços específicos e pelas agroindústrias, atacadistas e exportadores de produtos agropecuários.

Tal agrupamento, com frequência, se mobiliza em torno de políticas de interesse comum como a concessão de crédito, a re-negociação da dívida agrícola, a política cambial, a posição brasi-leira nas negociações do comércio internacional, a legislação e liberação de produtos geneticamente modificados e outros. Em-bora se constatem divergência em torno de alguns pontos, de fato se consegue formular agenda relativamente comum e abrangente.

da empresa na cidade de Rio Verde (GO) foi de 171.470 toneladas de frango, com apenas 78 integrados, que investiram em galpões com maior capacidade de alojamento de aves, mais automatizados e com menores custos médios. Ou seja, na região tradicional, em que a concentração fundiária é menor e que se utiliza, basicamente, mão-de-obra familiar, a produção média por integrado foi de 243,6 toneladas, enquanto na região de expansão, com grande emprego da mão-de-obra assalariada, receberam-se em média 2.198,3 toneladas de frango de cada in te grado, reduzindo-se custos de transporte e administrativos (FRANÇA, 2005).

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A Associação Brasileira de Agribusiness (ABAG), constituída em 1993, tem atuado no sentido de procurar representar politica-mente os interesses patronais privados do Agronegócio Brasi leiro, embora pretendesse também ter papel mais efetivo na coorde-nação das cadeias produtivas. “Enfim, sua atuação mais relevante é como entidade que exerce lobby sobre as instâncias políticas, isso porque, na condição de associação que pretendia coordenar as diferentes cadeias agroindústrias, ela não conseguiu o êxito que esperava” (ORTEGA, 2005:102).

A consideração do Agronegócio como unidade de análise econômica revela sua razão, ao se abordar a competitividade do Sistema de Produção Agropecuário Brasileiro na agricultura mundial. O Brasil, num prazo de 40 a 50 anos, deixou de ser um exportador de produto agrícola tropical (café, especialmente), baseado em vantagens naturais de clima e terra. Transformou-se no terceiro maior exportador de produtos de origem agropecuá-ria (semi-manufaturados e manufaturados, em grande parte), com destaque em várias cadeias, como da soja, cana-de-açúcar, café, laranja, de papel e celulose, carne de frango e bovina. Entre os produtos principais, apenas o consumo interno de trigo man-tém grande dependência das importações.

Tal desempenho não mais encontra sua explicação principal na disponibilidade de recursos naturais. Por exemplo, o avanço da área agrícola sobre os cerrados deveu-se menos à disponibi-lidade de suas terras e mais ao desenvolvimento de pesquisas agronômicas, seja as que permitiram o manejo mais adequado de seu solo, com graves deficiências químicas, seja as que resultaram na obtenção de novas variedades e cultivares adaptadas às suas condições climáticas.

Ao mesmo tempo, estabeleceu-se no Brasil uma estrutura agroindustrial complexa, muito dinâmica quanto à implantação de novas tecnologias, transformação e diversificação de produtos de origem agropecuária e redução dos seus custos unitários. Por sua vez, o Estado manteve papel fundamental na geração de novos

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conhecimentos, através da pesquisa agropecuária, e na integração dos segmentos do Sistema de Produção Agropecuário, especial-mente através da política de crédito rural subsidiado e vinculado à compra dos chamados insumos modernos, bem como dos cré-ditos agroindustriais.

Com todas essas transformações conseguiu-se fazer com que o Agronegócio Brasileiro apresentasse alta competitividade sistê-mica em relação a outros sistemas nacionais, fato que se expressa em várias cadeias produtivas e que depende da integração ou inter-dependência de seus vários segmentos. Portanto, julga-se que há justificativa econômica ao tomar o Agronegócio Brasileiro co mo objeto de análise.

Uma questão que sempre se debate é qual a participação efe-tiva do Agronegócio no Produto Interno Bruto (PIB) Brasileiro. Para se estabelecer esse cálculo existe, em primeiro lugar, uma dificuldade conceitual, que diz respeito à sua delimitação ou quais ramos econômicos deveriam ser considerados. Por exemplo, nas indústrias a montante da agropecuária deve-se contabilizar ape-nas a primeira transformação, como abate, corte e frigorificação de bovinos, ou a segunda, como curtimento de couro, ou ainda a terceira, como fabricação de calçados? Outra questão, deve-se considerar ou não o comércio varejista? A segunda dificuldade de delimitação do Agronegócio tem natureza estatística e está rela-cionada aos problemas de se separar a parte correspondente ao Agronegócio em atividades que também usam matérias primas industriais, como a indústria moveleira e a têxtil (BACHA, 2004).

Uma das primeiras estimativas da abrangência do Agrone-gócio Brasileiro foi feita por Nunes e Contini (2001) que, a partir da Matriz de Insumo-Produto do Brasil de 1996, calcularam que o Agronegócio ou Complexo Agroindustrial correspondia a 20,6% do PIB nacional. Desse total, os insumos e bens de produ-ção representavam 4,6% do valor do Agronegócio, as atividades agropecuárias, 42,3% e a agroindústria e serviços a jusante, 53,1%. Neste segmento foram incluídas também indústrias de segunda e

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demais transformações de produtos primários, como a de calçados e a de móveis, e considerou-se o valor adicionado no comércio de produtos de origem agropecuária.

O Centro de Estudos Avançados de Economia Aplicada (CE-PEA) da ESALQ/USP, a partir de um convênio com a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), divulga regularmen -te sua estimativa do PIB do Agronegócio. Em 2008, estimou-se que o PIB do Agronegócio alcançou R$ 764,5 bilhões, correspon-dente a 25,4% do PIB Brasileiro. As atividades estritamente agrí-colas representaram 17,9% e as pecuárias 7,5%. Quanto a seus segmentos, os insumos agropecuários tinham participação no PIB Brasileiro de 3,0%, as atividades agropecuárias de 6,7%, as indústrias processadoras de produtos agropecuários de 7,7% e a distribuição (transporte, comércio e outros serviços) apresenta-ram participação de 8,1% no PIB Brasileiro (CEPEA, 2010).

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4 MUDANÇAS NA POLÍTICA AGROPECUÁRIA BRASILEIRA

As diversas políticas macroeconômicas, fiscal, tributária, mo-netária, de rendas, comercial e cambial, formuladas para o con-junto da economia, acabam por afetar a estrutura e o desempenho do setor primário. Além disso, por diferentes razões, entre elas as características próprias do setor, é comum que se desenvolvam políticas específicas para as atividades agropecuárias. É este gru-po de políticas, particularmente sua aplicação ao Brasil, que será analisado no presente e nos três capítulos seguintes.

Neste capítulo quatro abordam-se a orientação e as caracte-rísticas gerais da política agropecuária brasileira, considerando-se três períodos: 1965 a 1980, 1981 a 1989 e pós 1990. O capítulo cinco será dedicado ao estudo das políticas mais voltadas para a chamada agricultura empresarial, patronal ou o agronegócio, enquanto o capítulo seis tratará das políticas para a agricultura familiar e da reforma agrária. Já o capítulo sete versará sobre as políticas de estímulo à agroenergia e aos biocombustíveis.

Antes de tudo isso, julga-se oportuno, em complementação ao já comentado no item 2.1 desse trabalho, discorrer sobre as especificidades do setor agropecuário relacionando-as com a for-mulação e as características das suas diversas políticas setoriais.

4.1 ESPECIFICIDADES DA ESTRUTURA PRODUTIVA E

POLÍTICAS AGROPECUÁRIAS

Tentando-se evitar qualquer visão determinista e reconhe-cendo-se as importantes mudanças tecnológicas e nos mecanis-mos privados de comercialização que vêm acontecendo, ainda é necessário levar em conta que a produção agropecuária apresenta

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especificidades, como sua dependência às condições naturais (in-solação, temperatura, água e terra) e ao ciclo biológico de plantas e animais, as características próprias de grande parte de seus mer-cados e produtos, a forma como são gerados e difundidos os co-nhecimentos tecnológicos e a maneira como é apropriada a terra agrícola. E, como a partir delas, junto com outros determinantes, constituem-se as políticas setoriais agropecuárias.

O ciclo de vida de plantas e animais implica na ocorrência de intervalo de tempo considerável, de meses, às vezes de anos (para culturas permanentes e grandes animais), entre o plantio ou o início da criação e a colheita ou a obtenção dos produtos pecuá-rios. Ao mesmo tempo, as condições climáticas fazem com que o volume produzido de produtos pecuários, como o leite, diminua em determinado período do ano e a colheita, especialmente para as grandes culturas agrícolas, tenda a se concentrar em alguns poucos meses, dando caráter sazonal à sua produção.1 O armaze-namento dos produtos agropecuários, que poderia diminuir sua sazonalidade, é dificultado pela perecibilidade de grande parte deles ou pelo seu custo elevado.

Deve-se levar em conta também os maiores riscos climáticos (chuva e temperatura excessiva ou reduzida) e sanitários a que estão sujeitas as atividades agropecuárias e que podem compro-meter, significativamente, seu volume produzido.

Sob o ponto de vista econômico e do gerenciamento agrope-cuário esses fatos fazem com que os gastos correntes sejam reali-zados sem a obtenção concomitante de receitas produtivas, que se efetivará somente após alguns meses ou anos. Ao mesmo tempo, iniciado o ciclo produtivo as possibilidades de ajuste na produção

1. A aplicação de técnicas de irrigação, plasticultura, melhoramento genético de plantas e animais, estabulação, arraçoamento e outras contribuem para diminuir a sazonalidade. Contudo, o caso da criação de frango de granja, que, a princípio, pode se iniciar a qualquer dia e que, portanto, poderia resultar no mesmo volu-me produtivo todos os dias do ano, ainda aparece mais como uma exceção, do que como regra da exploração agropecuária.

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são limitadas (pode-se aumentar ou diminuir o uso de adubos ou rações, por exemplo) e sua interrupção completa ou aumento de escala (tamanho da área ou número de animais) deve esperar um novo ciclo produtivo. Outrossim, ocorrências climáticas e sanitá-rias inesperadas podem afetar consideravelmente a rentabilidade da atividade agropecuária.

Outro ponto a ser considerado é que, diferentemente de boa parte dos produtos industriais, os mercados agropecuários, no geral, produzem bens indiferenciados e são mais atomizados, sendo que o empresário individual tem participação diminuta na quantidade total produzida e não se constitui num formador, mas sim num tomador de preços. Somada às dificuldades de ajuste imediato da produção e de armazenamento, essa característica implica que as flutuações dos preços agropecuários tendam a ser mais comuns e bruscas, muitas vezes com quedas para valores abaixo dos custos médios de produção.2

Juntando-se a instabilidade de preços e os maiores riscos cli-máticos e sanitários ao fato de que a demanda de produtos primá-rios, em função de sua baixa elasticidade renda, cresce em ritmo relativamente mais lento que os industriais e de serviços, isso leva muitos analistas a considerarem que a rentabilidade média agrí-cola se mostraria menor que a do restante da economia.

Por outro lado, pensando nas necessidades dos consumido-res, deve-se considerar que a agropecuária é fundamental para garantir o fornecimento dos produtos mais essenciais para as pes-soas, que são os alimentos. A insuficiência de sua oferta pode provocar efeitos negativos nos índices de inflação e na segurança alimentar da população.

2. Nos mercados industriais, especialmente os oligopolizados, os preços são mais rígidos (fix prices) e o ajuste de curto prazo a uma conjuntura adversa se faz, num primeiro instante, pelo aumento de estoque e, logo a seguir, pela diminuição da produção. Para os produtos agropecuários, o ajuste dá-se, normalmente, via variação do preço de mercado (flex prices).

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Diante desses fatos, é comum que um conjunto de polí -ticas públicas seja instituído com os objetivos básicos de pro -pi ciar maior rentabilidade, diminuir os riscos e a instabilidade de preços e da produção e assegurar oferta adequada de produ-tos primários.

Uma delas é o seguro rural, que estabelece compensação fi-nanceira em relação às perdas decorrentes de problemas climá-ticos ou sanitários, quando os mesmos não podem ser previstos e evitados através de tratos culturais corretos. Já o zoneamento am-biental, com indicação do local e da época mais adequados de plantio, visa diminuir as perdas originadas dos riscos climáticos.

Em ambos os casos, o interesse de participação da iniciativa privada é reduzido. No caso do seguro, por que a abrangência dos sinistros tende a ser muito grande, atingindo centenas ou milhares de agricultores de uma mesma região, o que eleva em demasia o valor de seu prêmio. Por isso, é comum os governos adotarem políticas de subvenção total ou parcial do prêmio do seguro rural. Quanto ao zoneamento, seu estabelecimento envolve gastos con-sideráveis, difíceis de serem amortizados privadamente, já que suas informações acabam por serem disseminadas “livremente”, prescindindo de remuneração por parte do agricultor.

Outra política largamente utilizada é a do crédito rural, para o qual normalmente se estabelecem taxas de juros abaixo das de mercado, quando não negativas. Tal política se exerce sob três mo-dalidades, sendo que o crédito de custeio garante capital de giro ou para a realização das despesas correntes até que se efetive a colheita ou a venda dos produtos animais. O crédito de investimento pro-porciona recursos para aquisição de veículos, máquinas e equipa-mentos, de animais, para implantação de culturas permanentes, para benfeitorias, construções rurais e melhorias duradouras nas condições de exploração da terra e para compra de áreas agrícolas (crédito fundiário). Há ainda o crédito de comercialização, que possibilita ao agricultor antecipar recursos financeiros mediante a promessa de entrega futura da safra ou de seu correspondente em

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dinheiro, ou que permite a retenção da safra, à espera da recupe-ração dos preços de mercado.

É relativamente comum também o estabelecimento da políti-ca de preço mínimo, em que se procura assegurar, via crédito de comercialização ou compra governamental, que o agricultor re-ceba pelo seu produto preço acima daquele vigente no mercado e que cubra, por exemplo, os custos operacionais médios ou que lhe assegure determinado nível de renda.

Um dos resultados dessa política é a formação de estoques públicos e privados, que servem para redistribuir a produção ao longo do ano, garantindo o abastecimento nos meses de entres-safra. Além disso, os estoques podem ser usados em situações de emergência ou para comporem cestas alimentares destinadas aos setores mais pobres da população ou ainda para reforçar o abas-tecimento do mercado, quando constatados movimentos altistas de preços. Neste caso, pode-se fixar um preço de liberação, em percentual acima do preço mínimo, a partir do qual os estoques começariam a serem desovados.3

A política de preço mínimo é mais efetiva em mercados na-cionais fechados à concorrência externa. Em mercados abertos, se o preço internacional estiver acima do preço mínimo, este não faz sentido, pelo menos como garantia de rentabilidade aos agri-cultores. Se estiver abaixo, o consumo interno poderá ser atendi-do com a importação de produtos de outros países, em detrimento da produção local. A abertura comercial, aliás, faz com que os estoques públicos de alimentos percam muito do seu significado, dado que eventual escassez interna de determinado produto po-deria, a princípio, ser suprida pela importação.

3. A experiência de vários países mostra que os estoques públicos, com frequência, se avolumam acima da capacidade de absorção dos mercados. Na história brasileira, na década de 1930 tomou-se a decisão de se queimarem milhões de sacas de café, estocados em armazéns públicos e que não encontravam mercado consumidor. No final da década de 1980, registrou-se a deterioração de milhares de toneladas de cereais (milho e arroz, especialmente) armazenados com recursos governamentais.

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A administração de estoques faz parte do que se costuma denominar de política de abastecimento alimentar, em que o atendimento das necessidades dos consumidores constitui-se no objetivo primordial. Neste caso, outras ações governamentais podem ser implantadas, como o desenvolvimento de rede pública vare jista de alimentos ou de entrepostos públicos atacadistas de hor ti frutigranjeiros. Sem falar das políticas de (ou tentativa de) controle de preços e de restrição à exportação de produtos con-siderados essenciais.

No aspecto qualitativo, ganham cada vez mais importância as ações públicas ligadas à política de defesa sanitária de animais e vegetais, com a preocupação de se evitar a propagação de pragas e doenças e se garantir a inocuidade e padronização dos alimen-tos. Em parte, isso decorre da elevação das exigências dos consu-midores quanto à qualidade dos produtos primários. E também por que as questões sanitárias, justificadamente ou não, têm se constituído em importante barreira no comércio internacional agropecuário.

Quanto à geração de tecnologia ou política de pesquisa agro-pecuária, deve-se considerar que os agricultores, individualmente, encontram dificuldades de mobilizarem recursos para tal fim. Empresas públicas e privadas, especialmente as fornecedoras de insumos, atuam nessa área, bem como na sua difusão, através de ações de extensão rural e assistência técnica.

É importante se dizer que parte das novas informações tecno-lógicas fica disponível gratuitamente a todos os interessados, o que afasta empresas privadas do seu desenvolvimento. Mesmo quando é possível a remuneração privada, há os que defendem que ela não ocorra ou que seja bastante limitada, dada a essencia-lidade dos alimentos.4

4. Na discussão e aprovação, em 25 de abril de 1997, da Lei das Cultivares no Brasil, que permite a cobrança de royalties sobre novas variedades de plantas, eviden-ciaram-se duas posições. Os contrários argumentavam que não se devem privatizar

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O último ponto a ser destacado nessa seção é a ação governa-mental em relação à apropriação privada ou ao monopólio da terra agrícola. No mais das vezes, essa ação se dá via tributação territorial. Mais episodicamente e com motivações históricas, so-ciais ou econômicas ocorrem ações de desapropriação (mais rara-mente, de expropriação) e de redistribuição da posse e proprie-dade da terra, denominadas de política de reforma agrária e de assentamento rural.

Antes de se seguir adiante, deve-se afirmar que vários outros fatores influenciam nos tipos e no volume de recursos despen-didos com as políticas agropecuárias. Um deles é a situação fiscal do país e as possibilidades de se alocarem recursos orçamentários em favor da agricultura. Outro é o grau de organização e de mo-bilização das associações de agricultores que resulta na maior ou menor capacidade de influenciarem as decisões governamentais.

4.2 A MODERNIZAÇÃO CONSERVADORA

DA AGRICULTURA BRASILEIRA

No período que se estende do final da Segunda Guerra Mun-dial a 1980, a economia brasileira apresentou altas taxas de cres-cimento, com variação média do PIB de 7,1% ao ano. Conforme concepção nacional-desenvolvimentista, as ações governamentais procuraram tornar mais complexa e integrada a estrutura pro-dutiva brasileira, com clara priorização ao setor industrial, cuja dependência à importação, inicialmente, era muito grande, espe-cialmente de bens de consumo durável e de capital.

conhecimentos relacionados com seres vivos. Os favoráveis afirmavam que apenas através da remuneração, a iniciativa privada investiria recursos no desenvol-vimento tecnológico de novas cultivares, complementando a escassa disponibili-dade de recursos orçamentários para a área.

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4.2.1 A Taxação da Agricultura e a Preocupação

com o Abastecimento Alimentar

Foi comum que se implantassem instrumentos de políticas públicas em detrimento dos interesses agrícolas e em apoio ao es for ço industrializante. Nesse sentido, as exportações agrícolas sofreram penalizações, via política cambial e comercial (DEL-GADO, 2001). Houve tendência de se manter a taxa de câmbio real valorizada, barateando o custo de obtenção de moeda es-trangeira e, portanto, facilitando a importação de máquinas e equipamentos necessários para a montagem do parque industrial brasileiro. Adicionalmente, em vários momentos, ocorreu a co-brança de imposto sobre a exportação de produtos agrícolas, obtendo-se assim parte dos recursos necessários aos investimen-tos em infra-estrutura e à concessão de subsídios e incentivos aos ramos industriais considerados prioritários.

É importante se ressaltar que até 1964, o café representava próximo a 56% das exportações brasileiras. Em 1970, sua partici-pação ainda era muito alta, na casa dos 36%, tendo-se reduzido para 14%, em 1980 (BACHA, 2004). Como à época, o Brasil, pra-ticamente monopolizava a produção e exportação desse produto, através do manejo da produção nacional e dos seus estoques, con-seguia-se manter patamares relativamente altos (ou evitar que das mais acentuadas, em períodos desfavoráveis) em seus preços in-ternacionais, o que compensava, até certo ponto, o setor cafeeiro das perdas de renda originadas da valorização cambial e do im-posto de exportação.

Ainda de acordo com o esforço industrializante, especial-mente a partir do final dos anos 1960, adotaram-se políticas res-tritivas (proibições, quotas e exigências de licença prévia), à ex-portação de produtos agropecuários não processados, como carne, soja e algodão. Além disso, as políticas creditícia e tributá-ria favoreciam a exportação de produtos manufaturados, com isenções de impostos, como o Imposto de Renda sobre o Lucro, o Imposto Sobre a Circulação de Mercadorias e o Imposto sobre

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Produto Industrializado. Em determinados períodos, concede-ram-se mesmo incentivos fiscais (crédito prêmio) à circulação interna desses produtos, com desconto no seu recolhimento em valor corresponde à isenção obtida na exportação. Tais benefícios não contemplavam os produtos básicos e semi-manufaturados de origem primária (BACHA, 2004).5

Com essas medidas procurava-se assegurar maior disponibi-lidade de matérias primas para as agroindústrias e garantir o abas-tecimento do mercado interno com alimentos básicos, de forma a amenizar pressões inflacionárias e sobre os salários urbanos, não colocando em risco a rentabilidade dos ramos industriais.

Nesse sentido, foi comum também a adoção de políticas de congelamento de preços de produtos considerados essenciais (com pequena efetividade, diga-se de passagem) e criaram-se ór-gãos públicos para atuar na comercialização de produtos alimen-tícios. Esse foi o caso da Companhia Brasileira de Alimentos (COBAL), que administrava cadeia de supermercados públicos, com atuação, essencialmente, no comércio varejista de alimentos, e que gerenciava a rede das Centrais de Abastecimento (CEASA), especializada no atacado de hortifrutigranjeiros.

4.2.2 A Questão Agrária

Outra questão muito importante debatida em todo o período ora analisado, girava em torno da estrutura fundiária e da efetiva

5. O resultado de tal política fica evidenciado na seguinte citação: “... As exportações de produtos agrícolas não processados eram tributáveis em 13%. Entretanto, a adição de valor, na etapa industrial, transformava esse tributo em um subsídio, que atingiu o nível de 10,5% para o açúcar refinado, 23,8% para o suco de laranja, 25,1% para óleos vegetais (inclusive de soja) e 31,6% para carne processada e produtos pesqueiros. O algodão foi prejudicado, uma vez que os produtores fo-ram forçados a pagar um imposto de 13% sobre suas vendas do produto não processado. Os industriais têxteis, entretanto, após adquirirem sua matéria-prima abaixo dos preços externos, ganhavam um subsídio de 50% em suas exportações” (Goldin e Rezende, citados por BACHA, 2004:159).

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capacidade do setor agrícola nacional em cumprir suas funções no processo de industrialização e de desenvolvimento brasileiro.6 Particularmente, na virada da década de 1950 para 1960 esse fato ganhou maior relevância, com acirramento tanto do debate aca-dêmico como de suas repercussões políticas e administrativas.

As diversas análises de então eram consensuais ao diagnos-ticarem o baixo nível de desenvolvimento tecnológico do setor primário, mas divergiam quanto ao ritmo de crescimento da pro-dução agropecuária brasileira. Parte dos analistas entendia que a agricultura conseguia fornecer alimentos e outros produtos sufi-cientes para o setor urbano-industrial. Outra parte, contudo, diag-nosticava que a agricultura não respondia, adequadamente, aos estímulos de preços do mercado interno, mantendo-se relativa-mente estagnada e provocando constantes crises de abastecimento alimentar no meio urbano, pressionando a inflação e os salários.

A estagnação agrícola teria como causa básica a estrutura fundiária constituída ao longo da história brasileira, em que pre-dominaram as ações governamentais favoráveis às grandes pro-priedades. No Brasil Colônia isso se evidenciou na implantação das capitanias hereditárias e nas doações das sesmarias, imensas porções de terras destinadas aos nobres portugueses. Os milhares de pequenos agricultores de subsistência que conseguiram se es-tabelecer, o fizeram através da posse da terra, sobre a qual não dispunham de nenhuma garantia jurídica.

Durante o Império, foi aprovada a Lei de Terras em 1850, pela qual se estabelecia que o acesso à terra devoluta só se daria através da sua compra, dificultando e tornando ilegítima a sua simples

6. Com uma visão bastante funcionalista, a literatura clássica atribui os seguintes papéis ao setor agrícola no processo de desenvolvimento econômico: fornecer mão-de-obra, matéria-prima, alimentos e capital ao setor urbano-industrial, ser mercado consumidor (de bens de consumo e de produção) para os produtos in-dustriais, exportar produtos para que se obtenha receita cambial necessária para importação de máquinas e equipamentos, especialmente.

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posse. Procurava-se garantir, assim, maior oferta de trabalhado-res para as grandes propriedades, o que se tornava cada vez mais importante à medida que aumentavam as pressões internacionais pelo fim da escravidão no Brasil.

Nada de substancial foi mudado nas legislações iniciais da República,7 mantendo-se as restrições de acesso a terra para pe-quenos agricultores e fazendo com que as levas de imigrantes que aportavam no Brasil se transformassem em empregados, sob o regime de colonato, especialmente das fazendas cafeeiras.

Em poucos locais permitiu-se que a colonização se desse com o estabelecimento de pequenas propriedades, como foi o caso de algumas regiões dos estados de Rio Grande do Sul, Santa Cata-rina, Paraná e Espírito Santo.

Como resultado de todo esse processo consolidou-se uma es-trutura fundiária caracterizada pelo predomínio dos latifúndios, no mais das vezes voltados à exploração de produtos de exportação. Além disso, apresentavam baixo nível tecnológico, explo ravam ex tensivamente e mantinham alta ociosidade da terra e, ao se de-dicarem primordialmente aos produtos de exportação, relegavam ao segundo plano a produção voltada para o abastecimento do mercado interno.

No outro extremo da estrutura agrária, constatava-se a exis-tência de milhares de minifúndios, também com baixo nível tec-nológico, dedicados à produção de subsistência e com reduzida capacidade de oferta para o mercado. Junto com os assalariados e outras categorias de empregados rurais, os minifundistas consti-

7. “A constituição de 1891 revogou apenas parte dos dispositivos da Lei de Terras, ao passar para os estados a propriedade das áreas devolutas – exceto as situadas em áreas de fronteira ou segurança, e junto às estradas de ferro federais. Ela manteve, no entanto, em toda sua plenitude, o direito de propriedade privada da terra, so-mente ressalvando as desapropriações por necessidade (ou utilidade) pública, sempre mediante prévia indenização a ‘preços justos’ e em dinheiro. Da mesma forma, o Código Civil de 1916 nada mudou de essencial na legislação fundiária” (SZMRECSÁNYI, 1990:94).

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tuíam camada social sem maiores direitos sociais8 e bastante em-pobrecida, resultando em baixa demanda por bens industriais.

Diante dessa situação, vários intelectuais e movimentos polí-ticos defendiam, no início dos anos 1960, a realização de ampla Reforma Agrária. Entendiam que isso aumentaria a renda da po-pulação rural, melhorando seu padrão de consumo, e traria maior dinamismo ao setor, que se modernizaria, com crescimento das compras de fertilizantes e tratores, por exemplo, e ofertaria maior quantidade de produtos básicos ao setor urbano.

Fazendo-se uma análise puramente produtivista, verifica-se que os dados disponíveis não comprovam a tese da estagnação da produção agropecuária brasileira. Entre 1947 e 1980, o PIB Agrí-cola cresceu a taxa média de 4,3% ao ano, sendo que especifica-mente entre 1955 e 1962 esse crescimento foi de 4,5% ao ano (SERRA, 1982), abaixo da economia como um todo, mas ainda em nível alto. Mesmo a produção primária direcionada ao mer-cado interno, após a crise cafeeira de 1929/30, apresentou altas taxas de crescimento, com destaque para produtos como o algo-dão, milho e arroz, não podendo se afirmar que o abastecimento nacional estivesse permanentemente comprometido ao longo de todo esse período.

Não se conclua dessa afirmação que a Reforma Agrária de-vesse ser, necessariamente, descartada. Sua realização, ainda que não imprescindível para o aumento da produção agropecuária, poderia trazer benefícios sociais consideráveis, ao promover a re-distribuição do patrimônio e de renda no país e aumentar o con-sumo de alimentos. Contudo, na prática, não se conseguiu viabi-lizar sua realização nos conturbados três primeiros anos da década de 1960.

8. A Legislação Trabalhista foi implantada para os trabalhadores urbanos no Brasil na década de 1940. Somente em 1963, ela foi estendida ao setor rural, após a aprovação do Estatuto do Trabalhador Rural.

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4.2.3 A Opção pela Transformação Tecnológica

Com a ascensão do militarismo em 1964, a Reforma Agrária recebeu tratamento aparentemente dúbio. Por um lado, elabo-rou-se extensa e relativamente avançada legislação sobre a posse da terra e a reforma agrária, o Estatuto da Terra. Aprovado em 1964, ele possibilitava que a desapropriação da terra por interesse social ocorresse através de pagamento com Título da Dívida Agrária (TDA), em substituição ao pagamento prévio em dinhei-ro, previsto desde a Constituição de 1891.

Por outro lado, com o tempo verificou-se que o Estatuto da Terra teve pouco efeito prático em termos da realização de uma ampla e efetiva política de reforma agrária. A opção clara dos go-vernos militares foi a manutenção da estrutura fundiária e a pro-moção de transformações em sua base técnica, caracterizando-se o processo de Modernização Conservadora da Agricultura Brasi-leira. Nem mesmo a criação do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), em 1970, veio contrariar essa orien-tação, já que esse novo órgão, inicialmente, cuidou basicamente das ações de colonização na região de fronteira agrícola.

Para estimular a Modernização Conservadora proporcio nou-se maior institucionalidade e abrangência à política de crédito rural, através da criação do Sistema Nacional de Crédito Rural, pela Lei 4.829/1965 (LEITE, 2001). Mais adiante, a Lei 5.851/1972 per-mitiu a criação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), que começou a funcionar em 1973, reforçando-se a ação pública na geração de tecnologias agropecuárias ligadas à ge-nética (seleção e melhoramento de plantas e animais), ocupação de solo (em especial, do Cerrados), época de plantio, tratos cultu-rais e outras. A pesquisa e o crédito rural têm sido considerados como os principais instrumentos públicos que contribuíram deci-sivamente para a modernização da agropecuária nacional.

Os recursos aplicados em crédito rural deveriam vir de per-centual mínimo e obrigatório, chamado de exigibilidade, sobre os

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depósitos à vista dos bancos comerciais, públicos e privados, ini-cialmente fixado em 10%. À medida que esta fonte se mostrasse insuficiente, diante da demanda por crédito pelos agricultores, o Tesouro Nacional se comprometia a ofertar o restante, de forma que a conta do crédito rural, no início de determinada safra, era uma conta em aberto.

As taxas de juros nos contratos foram estabelecidas, sistemati-camente, abaixo da inflação, caracterizando-se o subsídio na con-cessão de crédito rural. Isso servia de compensação à orientação geral já comentada, de se implantar políticas favoráveis ao setor industrial.9

Pelo fato do crédito ser concedido por intermédio de agências dos bancos comerciais, houve estímulo à sua concentração junto aos grandes produtores rurais. Afinal eram esses que garantiam aos bancos maior reciprocidade, nos saldos em conta corrente, nas aplicações financeiras, na aquisição de seguros e em outras operações bancárias.

Outra característica do crédito rural era a sua vinculação à modernização da agricultura. Os créditos de custeio exigiam que se gastasse um mínimo (15%) na compra dos insumos modernos, adubos, agrotóxicos, sementes melhoradas, produtos veteriná-rios, rações etc. Os créditos de investimento permitiam que, entre outros, se adquirissem os tratores agrícolas. Assim, na década de 1970, 67% dos fertilizantes, de 55% a 85% dos agrotóxicos e 90% dos tratores foram comercializados no Brasil através de contratos de crédito rural.

Por sua vez, os créditos rurais de comercialização, em grande parte, foram direcionados para atacadistas, entre eles as cooperati-vas de cereais e oleaginosas, e para as agroindústrias. Estas também

9. “... mas essa penalização (da agricultura) foi consideravelmente compensada nos anos 70 pela política de crédito rural subsidiado, especialmente para os setores capitalistas e para os interesses agrários voltados para a exportação” (DELGADO, 2001:48).

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contaram, entre 1969 e 1977, com recursos do Fundo Geral para a Agricultura e Indústria – FUNAGRI e outros recursos para in-vestimentos repassados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES (LEITE, 2001).

Alguns ramos agroindustriais foram contemplados com polí-ticas específicas. A indústria de papel e celulose se beneficiou de incentivos fiscais para reflorestamento e créditos para expansão de sua estrutura produtiva. A política de subsídio ao consumo de derivados de trigo estimulou o crescimento dos moinhos de fari-nha de trigo. A agroindústria sucroalcooleira foi favorecida com diversos programas, entre eles o Programa Nacional do Álcool (Proálcool), criado em 1975.

Na outra ponta da cadeia agroindustrial, a montante da agro-pecuária, também se incentivou o desenvolvimento de ramos in-dustriais. O Plano de Metas do Governo Juscelino Kubitschek, de 1956-1960, promoveu a instalação da indústria automobilística no Brasil, permitindo a produção de tratores agrícolas, a partir de 1960. O II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), de 1974 a 1979, renovou incentivos à produção de tratores e possibilitou a grande expansão da produção nacional de colhedoras.

Na produção de fertilizantes, o Estado concedeu incentivos à iniciativa privada e atuou com empresário. Entre 1955 e 1965, foram implantadas 15 novas empresas de fertilizantes no Brasil; entre 1965 e 1973, outras 20 e; entre 1974 e 1983, 68 novas empre-sas se instalaram. Quanto aos defensivos, o II PND colaborou para que grande número de produtos finais passasse a ser produ-zido internamente, embora continuasse acentuada a dependência na importação de princípios ativos (KAGEYAMA et al, 1990).

Por sua vez, a EMBRAPA e outras instituições públicas de pesquisa cumpriram papel relevante no fornecimento de varie-dades melhoradas de plantas, especialmente para a cana-de-açú-car, arroz, feijão, algodão, café e soja. Esta é cultura originária de região de clima temperado da China e, com melhoramento gené-

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tico, avançou sobre regiões de clima tropical, nos cerrados do Centro-Oeste e do Nordeste e em áreas amazônicas.

Assim, pode-se dizer que diversas políticas públicas ajudaram a consolidar o Sistema de Produção Modernizada Agropecuá ria Brasileiro. Especificamente, o crédito rural subsidiado foi funda-mental para o fortalecimento das relações intersetoriais da agrope-cuária brasileira. À montante com a indústria de insumos químico, biológicos e mecânicos que, através dos créditos de custeio e inves-timento, vendiam seus produtos. À jusante com os atacadistas e as agroindústrias que recebiam crédito de comercialização e conta-vam com grande quantidade de matéria-prima resultante da mo-dernização agropecuária. Os agricultores, em especial médios e grandes, também foram beneficiados, sendo que em 1979 e 1980 os subsídios recebidos através do crédito rural representaram cerca de 25% do PIB Agropecuário no Brasil (BACHA, 2004).

A aceleração da inflação e a não correção, em valores corres-pondentes, das taxas de juros do crédito rural, fizeram com que sua taxa de subsídio crescesse no final da década de 1970, suplan-tando 30% ao ano em 1980, estimulando o aumento de sua de-manda. Ao mesmo tempo, pelo lado da oferta de crédito rural, percebia-se que os depósitos à vista diminuíram em favor de apli-cações, como a caderneta de poupança, que protegiam os corren-tistas contra a perda de valor da moeda. Dessa forma, mesmo se aumentando o valor da exigibilidade, que chegou a 40%, os volu-mes aportados pelo Tesouro Nacional necessitavam ser cada vez maiores, pressionando as finanças públicas e colocando em risco a continuidade da política de crédito rural.

4.3 CRISE E TRANSIÇÃO DOS ANOS 1980

A década de 1980 foi marcada por resultados macroeconômi-cos desfavoráveis. O crescimento da economia, com exceção do período 1984-1986, foi baixo e, em alguns anos, negativo. A infla-ção disparou, chegando a ultrapassar a casa dos quatro dígitos.

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Registraram-se desequilíbrios nas contas externas e grave crise nas finanças públicas, com aumento da dívida pública e dos dis-pêndios anuais para sua rolagem. Na tentativa de ajuste, foram cortados os gastos de investimento da administração direta e de empresas estatais e os subsídios públicos passaram a ser mais fis-calizados e limitados.

Algumas estimativas, como a de Langoni citado por BRAGA (1982), indicavam que os subsídios atingiriam, em 1980, 7,6% do PIB. Pouco mais da metade desse valor era proveniente de subsí-dios creditícios (taxas de juros nos empréstimos oficiais abaixo da taxa de mercado), em grande parte, direcionados ao setor agro pecuário. Embora possa haver exagero nessa estimativa, o certo é que, a partir daí, foram adotadas medidas administrativas para maior controle dos subsídios, com redução de seu volume e de seu percentual.

No caso do crédito rural, a prática anterior de “conta em aber-to” foi sendo restringida ao longo dos anos 1980, até que passasse a se estabelecer, previamente, o volume de recursos a ser aplicado em determinado ano agrícola. Isso se tornou mais efetivo com o fim, em 1986, da chamada conta movimento (administrada pelo Banco do Brasil e suprida com emissão monetária a descoberto) e com a obrigatoriedade de se registrarem, a partir de 1988, no Orça- mento Geral da União, os dispêndios previstos com crédito rural.

Ao mesmo tempo, para diminuir a importância dos aportes do Tesouro Nacional, criaram-se novas fontes de recursos, como a poupança rural e a obrigação de aplicação de determinada por-centagem de alguns fundos constitucionais. Isso, junto com o maior controle na execução dos gastos, fez com que a participação do Tesouro Nacional na oferta de crédito rural caísse de 64,8%, em 1985, para 26,7%, em 1990 (LEITE, 2001).

Em termos de volume aplicado, verificou-se nítida tendência de queda durante os anos oitenta, com exceção do triênio 1985-87, de forma que em 1990 seu valor representava menos que 1/3 do aplicado em 1980. Desde 1980, diminuíram os créditos de

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investimento e comercialização e, a partir de 1984, também os créditos de custeio (REZENDE, 2003). Neste ano, os contratos de crédito rural deixaram de ser subsidiados, pelo menos em relação à inflação, passando a exigir o pagamento de taxa de juros de 3 a 5% ao ano, além da correção monetária.

Ao mesmo tempo, a Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM) passou a ter maior importância. Sua criação havia se dado em 1945 e seu gerenciamento ficava a cargo da Comissão para Financiamento da Produção (CFP), órgão constituído em 1943 (WEDEKIN, 2005). Em 1966, o Decreto Lei 79/66 havia promovido reformulação profunda na PGPM, mas foi somente na década de 1980 que ela ganhou maior relevância, no que se refere à quantidade da produção agrícola beneficiada.

Sua execução então se fazia ou via compra governamental, através do mecanismo da Aquisição do Governo Federal (AGF), com recursos provenientes do Tesouro Nacional. Ou via crédito de comercialização, através do Empréstimo do Governo Federal (EGF), com recursos do Sistema Nacional de Crédito Rural. Os preços mínimos cumpriram, nos anos 1980, importante papel na formação de expectativas pelos agricultores e na tentativa de di-recionamento da produção para esta ou aquela cultura, julgada prioritária pelas autoridades governamentais.10

Os principais produtos atendidos pela PGPM foram algodão, soja, arroz, feijão e milho. Os dois primeiros utilizaram, especial-mente, dos EGFs, com maior intensidade no quinquênio 1980-84, quando os créditos de comercialização contemplaram 71,1% da produção do algodão e 44,0% da soja (LEITE, 2001). Para o arroz,

10. “... pelo menos durante vários anos, os preços mínimos desempenharam o papel de farol e de garantia, em última instância, para as decisões dos produtores. Neste sentido, o preço mínimo jogava um papel fundamental na formação des-tas expectativas, não apenas porque indicava um patamar para o preço de mer-cado como também permitia a realização do cálculo econômico e a redução do risco associado à crescente instabilidade monetária da economia brasileira” (BUAINAIN, 1999:205).

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feijão e milho foram utilizadas também as Aquisições do Governo Federal, especialmente de 1985 a 1987 (REZENDE, 2003).

Neste triênio, as aquisições públicas de cereais e oleaginosas superaram, em termos líquidos, 30 milhões de toneladas, contra 1,5 milhão nos dez anos anteriores (BUAINAIN, 1999). Chegou-se a se falar em estatização da comercialização agrícola, especial-mente na região de fronteira, provocando reações contrárias da iniciativa privada. Concomitantemente, os estoques públicos mostravam-se cada vez maiores, trazendo aumento dos gastos orçamentários e problemas gerenciais, evidenciados em deterio-ração de parte do produto armazenado.

Com isso, já a partir de 1988 evidenciou-se uma clara mu-dança, com redução das ações públicas na PGPM. Em 1990, a cultura mais beneficiada foi a do arroz, contemplada com volu-mes de EGF e AGF correspondentes a tão somente 6,3% da sua produção, bem inferior ao que tinha se verificado entre 1985 e 1987 (REZENDE, 2003).

No balanço da década de 1980, o Programa Abastecimento, onde são contabilizados, entre outros, os gastos com a PGPM, representou a maior parte dos gastos com a Função Agricultura. “Em média, na década de 1980, cerca de 70% dos recursos da Função Agricultura foram aplicados neste programa (Abasteci-mento), o qual contém, como principais componentes, a Conta Trigo, Preços Mínimos, Estoques Reguladores, Açúcar e Álcool e Café” (GASQUES & VILLA VERDE, 1992:358).

Quanto à estrutura fundiária, no processo de redemocratiza-ção do país e de instalação da Nova República foi proposto o Pri-meiro Plano Nacional de Reforma Agrária (I PNRA). Sua versão inicial, elaborada pelo Ministério de Reforma e do Desenvolvi-mento Agrário (Mirad-INCRA) era bem mais ousada que aquela que acabou sendo aprovada pelo Governo José Sarney, em 10 de outubro de 1985. Nesta não se declaravam as áreas prioritárias para reforma agrária, embora se mantivesse a meta de se beneficiar 1,4 milhão de pessoas entre 1985/1989 (GRAZIANO DA SILVA,

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1985). A bem da verdade, é importante se dizer que tal meta ficou bem distante de ser atingida.

Em relação ao crescimento, os anos de 1980 revelaram menor dinamismo tanto da economia como da agricultura em compa-ração com a década de 1970. A produção industrial ficou prati-camente estagnada, crescendo tão somente 3% entre 1980 e 1990, enquanto a produção agrícola crescia 28% (FGV, 1993).

Além da maior essencialidade dos bens agrícolas, cujo consu-mo tende a cair relativamente menos em épocas recessivas, outros fatores contribuíram para esse resultado. Os efeitos da moderni-zação da sua base técnica se fizeram sentir nos ganhos de produti-vidade das atividades agropecuárias. A política de preços mínimos colaborou para o crescimento da produção direcionada ao abas-tecimento do mercado interno. Por fim, a moeda nacional perma-neceu relativamente desvalorizada entre 1980 e 1988, estimulando as exportações de produtos de origem agropecuária.

4.4 AS REFORMAS LIBERALIZANTES DOS ANOS 1990

As reformas liberais deram o tom da política econômica brasi-leira a partir dos anos 1990, de acordo com a concepção que o es-tado deveria ter atuação mais regulatória e menos de planejamento e de intervenção. Em relação ao sistema de produção agropecuá-rio, as mudanças realizadas levaram à maior abertura comer cial e à menor presença pública nos mercados de produtos e insumos.

4.4.1 A Abertura Externa

O viés anti-exportador de produtos primários foi, aos pou-cos, sendo abandonado, sendo que em 1990, deixou-se de se co-brar o imposto de exportação e se eliminaram o sistema de cotas e a necessidade de licença prévia na exportação de produtos agrí-colas (DIAS & AMARAL, 1999). Tal orientação foi reforçada em 1996, com aprovação de nova legislação que eximia os produtos

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básicos e semi-manufaturados, quando exportados, do reco-lhimento do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Ser-viços (ICMS), cuja alíquota estava na casa dos 13% (HELFAND & REZENDE, 2001).

Nas importações, além da extinção de barreiras não tarifá-rias, estabeleceu-se, em 1991, cronograma de redução da tarifa média para produtos agrícolas, insumos e equipamentos, de 32,2% para 14,2%, em três anos. Um dos produtos mais atingidos foi o algodão cuja tarifa reduziu-se a zero. Entre os insumos, “no caso dos fertilizantes químicos importados, em especial, os nitro-genados, as tarifas foram significativamente reduzidas, ao contrá-rio do que ocorreu com tratores, cuja tarifa procurava defender a indústria nacional, que apresentava ociosidade após a queda do crédito para investimento” (GASQUES et al, 2004).

A menor proteção em relação à importação de insumos, junto com a valorização cambial, teve efeito imediato ao reduzir seus preços internos e contribuir para aumento da relação de troca (preços recebidos vs. pagos) do setor agrícola nos anos 1990.11 Ao longo prazo, tal fato colaborou para que se elevasse a dependência nacional à importação de defensivos e fertilizantes. Neste caso, além da redução da proteção tarifária, houve privatizações de em-presas públicas de fertilizantes e desapareceram os incentivos à produção nacional, como os do Plano de Metas e do II PND. “Em 1990, a produção nacional de fertilizantes representou 57% do consumo desse produto. Em 1999 e em 2001, essas percentagens foram 42,6% e 34,1%, respectivamente” (BACHA, 2004: 99).

As mudanças nas relações externas também contaram com a formação, em 1991, do Mercado Comum do Sul (MERCO-SUL), envolvendo Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. Com várias exceções, foram zeradas as tarifas de importação intra-

11. Helfand & Rezende (2001) informam que da primeira metade de 1992 até a segunda metade de 1994, os preços reais de fertilizantes, pesticidas e serviços de trator caíram mais de 30%.

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bloco e se instituiu a Política de Tarifa Externa Comum (TEC). A opção pela abertura comercial ficou também evidenciada pela defesa da dimi nuição do protecionismo agropecuário, que o Bra sil passou a adotar no âmbito das negociações multilaterais do comércio internacional.

4.4.2 A Extinção de Órgãos Públicos

Outro aspecto das reformas liberalizantes foi a desregula-mentação daquelas cadeias produtivas com forte intervenção pú-blica. Uma delas era a triticultura, que tinha seu mercado alta-mente regulamentado desde 1967, com os objetivos de se tentar alcançar a auto-suficiência nacional e de se controlar preços in-ternos. Além da fixação dos preços da cadeia, o Governo Federal concedia subsídios a agricultores, moinhos e consumidores e de-tinha o monopólio de importações. O alto comprometimento fis-cal com essa política fez com que, a partir de 1987, os repasses governamentais diminuíssem consideravelmente e, de 1990 em diante, os seus preços e as importações fossem liberados.

Na cadeia sucroalcooleira, em 1990 extinguiu-se o Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA), autarquia federal que gerenciava a política setorial desde 1933. Deixou-se de fixar cotas de produção para as usinas e estados canavieiros e eliminou-se o monopólio público na exportação do açúcar. No ano seguinte, parou de se exigir licença prévia para exportação de álcool e açúcar. Ao longo da década, procedeu-se tumultuado processo de liberação de pre-ços, encerrado tão somente em 1999.

Na cafeicultura, através da cobrança de imposto de expor-tação (que atingira 50% do preço do produto na década de 1970 e início de 1980) vinha se financiando o Instituto Brasileiro do Café (IBC), permitindo a execução de política de preços mínimos e de estoques reguladores, além de outras ações. A queda de seus preços internacionais, no final dos anos 1980, praticamente zerou o imposto de exportação e, em 1990, foi extinto o IBC, diminuindo

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acentuadamente a intervenção pública no mercado nacional e internacional do café. No lugar do IBC foi instituído o Fundo de Defesa da Economia Cafeeira (FUNCAFÉ), que passou a admi-nistrar os estoques públicos remanescentes de café, fonte primária de recursos de programas creditícios e de outra natureza direcio-nados aos cafeicultores.

Na cadeia leiteira, o Governo abandonou as políticas de fixa-ção de preços para produtores e consumidores.

Conforme Wedekin (2005), ainda em 1990 houve fusão da Comissão para Financiamento da Produção, da Companhia Bra-sileira de Armazenamento (Cibrazem) e da Companhia Brasilei-ra de Alimentos, dando origem à Companhia Nacional de Abas-tecimento (CONAB), empresa pública vinculada ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Procurava-se maior racionalidade e, como se verá no próximo capítulo, a partir daí, a intervenção pública nos mercados agropecuários via preços mí-nimos manteve-se em nível consideravelmente reduzido quanto aos recursos despendidos.

A estrutura federal de assistência técnica foi também des-montada em 1990, com a extinção do SIBRATER (Sistema Brasi-leiro de Assistência Técnica e Extensão Rural) e da EMBRATER (Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural). As empresas públicas estaduais (EMATER e correlatas como a CATI, em São Paulo) continuaram prestando serviços na área, mas de maneira mais precária, já que deixaram de contar com recursos federais que garantiram, na década de 1980, cerca de 40% dos gastos com assistência técnica e extensão rural nos estados, ultra-passando 80% naqueles mais pobres (ASBRAER, 2007).

4.4.3 A Redução dos Gastos Orçamentários

A análise dos gastos orçamentários confirma a diminuição da ação pública direta na agricultura brasileira. Esses gastos são registrados , conforme Lei 9.811/1999, na Função Agricultura e

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Função Organização Agrária,12 que contemplam ações dirigidas à produção vegetal e animal, defesa sanitária, abastecimento, pes-quisa, extensão rural, irrigação, reforma agrária e colonização, entre outras. A União é responsável por cerca de 75% dos gastos em agricultura e organização agrária, os estados por 19% e os municípios por 6% (GASQUES et al, 2006).

Na Tabela 4.1, referente apenas aos gastos federais, percebe-se que o período 1985-89 registrou os maiores dispêndios, com mé-dia anual de R$ 26.513 milhões, representando 7,0% do gasto total da União. A partir de 1990 houve nítida tendência de queda nos gastos com agricultura e organização agrária, com o mínimo sen-do atingido em 2003, com valor de R$ 11.134 milhões, correspon-dentes a apenas 1,6% da despesa global da União. Daí por diante, observou-se leve recuperação nos gastos com política agrícola e agrária, até 2007. Em 2008 os gastos orçamentários caí ram nova-mente, até por que houve menor necessidade de subvenção públi-ca, posto que os preços agropecuários registraram níveis relativa-mente favoráveis no ano. Justamente o contrário ocorreu em 2009. Em termos percentuais, os gastos com política agrícola e agrária pós 2003 têm ficado abaixo de 2% dos gastos gerais da União.

Especificando-se mais os gastos com agricultura, é possível determinar que, entre 2001-05, as principais sub-funções da Fun-ção Agricultura foram a administração geral, a promoção da pro-dução vegetal, o abastecimento e outros encargos especiais. Esta, isoladamente, representou cerca de 40% dos gastos da Função Agricultura, contemplando, especialmente, as subvenções econô-micas referentes à equalização de taxas de juros e outros encargos financeiros das operações de crédito rural, inclusive as da agricul-tura familiar. Já na Função Organização Agrária, os principais gastos se deram nas sub-funções administração geral, reforma

12. Os gastos orçamentários são classificados em quatro categorias: função (a mais geral), subfunção, programa e ação (a mais específica).

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agrária e outros encargos especiais, em que se contabilizam o cré-dito para implantação de projetos de assentamento e o fundiário (GASQUES ET AL, 2006).

Tabela 4.1 Médias anuais das despesas com Função Agricultura e Or-ganização Agrária e participação no gasto global da União, em milhões de reais de 2009, de 1980 a 2009.

PeríodoAgricultura

(1)Organização Agrária (2)

(1) + (2)% Gasto Global

1980-84 11.163 167 11.330 5,6

1985-89 24.824 1.689 26.513 7,0

1990-94 21.231 1.490 22.721 2,8

1995-98 18.519 4.052 22.571 3,4

1999-02 12.071 2.463 14.534 2,0

2003 9.128 2.006 11.134 1,6

2004 9.793 3.357 13.150 1,9

2005 10.212 4.392 14.603 2,0

2006 11.818 4.984 16.802 1,8

2007 12.627 5.414 18.041 1,4

2008 9.670 4.535 14.206 1,1

2009 14.181 4.760 18.942 1,3

Fonte: GASQUES et al (2006), GASQUES (2010).

Os níveis reduzidos dos gastos orçamentários, somados à pe-quena proteção tarifária, fazem com que o protecionismo agro-pecuário no Brasil seja relativamente pequeno, de acordo com os critérios estabelecidos pela OCDE. “O apoio ao produtor no Brasil, medido pelo PSE, apresentou uma média de 3% do valor da receita bruta da agricultura entre 2002 e 2004 – uma taxa de apoio com-parável à da Nova Zelândia (2%) e Austrália (4%) e bem abaixo da média de 30% da OCDE” (OCDE, 2005).

4.4.4 O Duplo Comando Institucional

Voltando aos dados da Tabela 4.1, observa-se que os gastos com Organização Agrária, vinculados à política de reforma agrária,

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atingiram valor relativamente alto no quadriênio 1995-98, com média anual de R$ 4.052 milhões. Depois, declinaram de 1999 a 2003, quando atingiram o mínimo de R$ 2.006 milhões. Daí em diante, a tendência foi de crescimento, chegando-se ao valor de R$ 4.760 milhões, em 2009.

O aumento em 1995-98 veio como reação governamental à queda da renda agropecuária, associada à valorização cambial, e ao crescimento das mobilizações sociais favoráveis à reforma agrária.13 O número de conflitos fundiários havia aumentado, ga-nhando destaque o episódio de Eldorado dos Carajás (PA) que resultou na morte de dezessete trabalhadores sem terra. Logo após, o Decreto s/n. de 29/4/1996 nomeou o Ministro Extraordi-nário da Política Fundiária, revelando a intenção governamental de atuar mais especificamente na questão fundiária e da agricultu-ra familiar. Nesse sentido, o Decreto 1.946 de 28/1/1996, instituiu o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), com objetivo de propiciar crédito rural em condi-ções mais vantajosas aos agricultores familiares.

Em 1999, as Medidas Provisórias MP 1911-12 e MP 1911-14 fizeram com que o Ministério da Política Fundiária passasse da condição de extraordinário para ordinário, recebendo a nova de-nominação de Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA).

Resultante desses acontecimentos passou a se observar um du-plo comando institucional na Política Agrícola Brasileira. Enquan-to o MDA, ao qual o INCRA ficou subordinado, tem a função de formular e implementar as políticas para a reforma agrária e a agri-cultura familiar, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abaste-cimento (MAPA), instituição criada ainda no Século XIX, está mais vinculado às políticas voltadas para a agricultura empresarial.

13. “... a questão agrária voltou à cena em 1995, através da atuação de movimentos sociais, como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra, ou mesmo na disputa pelo projeto de ‘agricultura familiar’ encampado pelo movimento sindical. Ambas as investidas exigiram reações por parte do Estado, quer em programas específicos de atuação, quer no reaparelhamento burocrático” (LEITE, 2001:10).

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5 AS POLÍTICAS AGROPECUÁRIAS DO MAPA

Serão analisadas seis diferentes políticas agropecuárias sob responsabilidade do Ministério de Agricultura, Pecuária e Abaste-cimento. Duas delas merecerão maior ênfase, a Política de Crédito Rural e a Política de Garantia de Preço Mínimo (PGPM), que re-presentaram 42% dos gastos do Governo Federal com as funções Agricultura e Organização Agrária, entre 2000 e 2005 (GASQUES et al, 2006).

Também serão abordadas a Política de Zoneamento Ambien-tal, de Seguro Rural, de Pesquisa Agropecuária e a Política de De-fesa Sanitária. Essa relação não esgota todas as políticas a cargo do MAPA, ficando de fora, por exemplo, a Política de Extensão Rural e Assistência Técnica, que se analisará no capítulo seguinte, junto com outras políticas para a Agricultura Familiar.

Anualmente, entre maio e junho, o MAPA divulga o Plano Agrícola e Pecuário com validade para o novo ano agrícola, que se inicia no começo de julho e se estende até o final de junho do ano seguinte. Neste documento, além de análise de conjuntura e da apresentação de objetivos mais gerais, são registrados os valores a serem empregados e as condições dos principais instrumentos de política agrícola.

5.1 POLÍTICA NACIONAL DE CRÉDITO RURAL

O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, o Mi-nistério do Desenvolvimento Agrário, bem como os econômicos (Fazenda e Planejamento) ocupam importante papel na formu-lação das diretrizes e dos programas de crédito rural.

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A execução da Política de Crédito Rural é feita através do Sis-tema Nacional de Crédito Rural, cujos órgãos básicos são o Banco Central do Brasil, que exerce a função de controlador, e o Banco do Brasil S.A., o Banco da Amazônia S.A. e o Banco do Nordeste S.A., sendo que esses três fornecem crédito aos agricultores (BCB, 2007). Além disso, o Sistema é composto por órgãos vinculados e articulados. Entre os primeiros, que também fornecem crédito aos agricultores, estão o BNDES, agências de fomento, bancos es-taduais, bancos privados, Caixa Econômica Federal, cooperativas de crédito rural e sociedades de crédito, financiamento e investi-mento. Os articulados são órgãos oficiais de valorização regional e entidades de assistência técnica, com serviços conjugados à concessão de crédito rural.

O principal documento normativo do crédito rural é o Manual de Crédito Rural, editado pelo Banco Central, que mantém atua-lizadas as informações, entre outras, dos tipos de crédito rural, dos documentos necessários para acessar o programa, dos prazos de pagamentos, dos encargos financeiros, das garantias etc.

5.1.1 Evolução dos Recursos

Guedes Pinto (2010) estima que o financiamento da agricul-tura modernizada brasileira depende em 1/3 de recursos próprios dos agricultores, 1/3 do que se pode chamar de ações privadas e 1/3 da política oficial de crédito rural.

Entre as ações privadas, estão aqueles financiamentos realiza-dos por empresas que fornecem insumos no início da safra ou do ciclo pecuário para posterior pagamento ao seu final, bem como os feitos por agroindústrias, que antecipam recursos aos agricul-tores, que serão descontados quando da entrega da matéria prima agropecuária. Também há um mercado crescente de títulos agro-pecuários, descrito adiante, cujos recursos, em parte, são direcio-nados para financiamento dos agricultores.

Quanto aos recursos oficiais do crédito rural, observa-se, pela Tabela 5.1, que houve uma fase inicial de grande crescimento,

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com o crédito rural alcançando R$ 132,6 bilhões, em 1979, e R$ 126,8 bilhões, em 1980.

Tabela 5.1 Valores aplicados e taxa anual de crescimento do crédito rural no Brasil, entre 1969 e 2009.

AnoBilhões Reais

Taxa Anual

AnoBilhões Reais

Taxa Anual

AnoBilhões Reais

Taxa Anual

1969 26,3 1983 80,4 (24,5) 1997 27,9 44,9

1970 31,4 19,2 1984 49,1 (38,9) 1998 30,4 8,9

1971 36,3 15,7 1985 70,0 42,6 1999 28,9 (4,9)

1972 44,9 23,6 1986 104,4 49,1 2000 29,7 2,8

1973 63,5 41,4 1987 82,3 (21,2) 2001 35,1 18,0

1974 78,5 23,7 1988 58,1 (29,4) 2002 38,7 10,2

1975 114,4 45,8 1989 53,1 (8,7) 2003 43,6 12,9

1976 117,2 2,5 1990 30,3 (42,9) 2004 51,9 18,9

1977 104,7 (10,7) 1991 31,3 3,2 2005 50,8 (2,1)

1978 106,4 1,7 1992 34,7 10,9 2006 52,1 2,5

1979 132,6 24,6 1993 29,8 (14,1) 2007 57,9 11,3

1980 126,8 (4,4) 1994 48,5 62,9 2008 67,4 16,3

1981 110,0 (13,3) 1995 22,1 (54,5) 2009 75,2 11,6

1982 106,5 (3,2) 1996 19,3 (12,6)

Fonte: BCB, 2010. Valores atualizados para 2009 pelo IGP-DI. Números entre parênteses são

negativos.

A partir de 1979, os recursos decresceram até 1984. No triê-nio seguinte, de 1985 a 1987, no início da Nova República, o vo-lume de crédito rural mostrou-se mais alto. Mas, já em 1987 a tendência de queda se apresentou novamente, fazendo com que em 1990, os recursos aplicados em crédito rural ficassem restritos a R$ 30,3 bilhões.

Entre 1990 e 2000, os valores aplicados em crédito rural tenderam a se manter, com importantes flutuações, próximo a R$ 30,0 bilhões. As exceções foram os anos de 1994, com grande crescimento em face à expansão de consumo de produtos de

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origem agropecuária na esteira do Plano Real, e 1995 e 1996, com forte decréscimo, associado aos efeitos negativos da valorização cambial sobre a renda agropecuária. A partir de 1996, parcela do crédito rural passou a compor os recursos do PRONAF, cujas ca-racterísticas serão examinadas no capítulo seguinte.

De 2000 a 2009 registrou-se grande recuperação no volume de crédito rural, com taxas anuais de crescimento acima de 10%, com exceção de 2005 e 2006, anos de baixa rentabilidade agrope-cuária. Apesar dessa recuperação, o volume de crédito rural, em 2009, se mostrava bem inferior ao constatado em 1979, ápice da concessão de crédito rural no Brasil.

5.1.2 Origem dos Recursos

A Tabela 5.2 mostra que aquilo que se iniciara na década de 1980 teve continuidade nos anos 1990, com redução significativa da participação orçamentária do Governo Federal no volume aplicado em crédito rural oficial. Em 1990, os recursos orçamen-tários ou do Tesouro Nacional representavam 26,7% do total de crédito rural, caindo para 0,1%, em 1999, e atingindo 0,6%, 2009.

Tabela 5.2 Participação porcentual das fontes no crédito rural, Brasil, 1990, 1999 e 2009.

Fontes 1990 1999 2009

Tesouro Nacional 26,7 0,1 0,6

Recursos Obrigatórios 27,4 41,7 48,3

Poupança Rural 20,0 19,5 26,1

Recursos Livres 19,9 5,1 4,2

Fundos Constitucionais 4,5 5,8 7,3

FAT – 15,9 1,2

BNDES – 5,0 7,0

FUNCAFÉ – 4,7 2,2

Outras 1,5 2,3 3,1

Fonte: FAVERET FILHO (2002), BCB, 2010.

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Ao invés de fornecer recursos para o financiamento direto das operações de custeio, como ocorria comumente até 1994, nos anos mais recentes os gastos do Tesouro, basicamente, vêm sendo direcionados para a equalização de taxas de juros das outras fon-tes do crédito rural, ou seja, para a cobertura, caso necessário, da diferença entre o custo de captação do recurso e o seu rendimento na aplicação em crédito rural.1

Se a participação orçamentária do Tesouro caiu, ao mesmo tempo, aumentou a participação de empresas públicas (BNDES) e de fundos gerenciados pelo Governo Federal (Fundos Constitu-cionais do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT e FUNCAFÉ), especialmente na década de noventa. Em 1990, recursos provenientes dessas fontes represen-taram 4,5% da aplicação em crédito rural, passando para 31,4%, em 1999, e caindo para 17,7%, em 2009.

Os recursos do FAT são direcionados para custeio e investi-mento do PRONAF, do Programa de Geração de Emprego e Renda Rural (PROGER Rural), bem como para programas do BNDES, que têm representado mais de 70% dos créditos rurais de investi-mento. O programa mais importante do BNDES é o Moderfrota (Modernização da Frota de Tratores Agrícolas e Implementos As-sociados e Colheitadeiras), criado em 2000 e que representou 46% do desembolso do BNDES em crédito rural, entre 2000 e 2005 (SANT’ANA & FERREIRA, 2006).

1. “Como se sabe, nos últimos anos mudou substancialmente a forma de atuação do governo na política de crédito rural. Até 1994, consideráveis volumes de recursos oficiais foram alocados para o financiamento direto de operações de custeio agropecuário. A partir de 1995, no entanto, sua participação tem se restringido à utilização de outras fontes de recursos, como a Poupança Rural, Exigibilidades, Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), mediante o mecanismo de equalização de encargos financeiros (equalização de taxas) de que trata a Lei no. 8.427, de 27 de maio de 1992. Equalização de taxas é uma subvenção econômica cuja finalidade é cobrir a diferença entre o custo de captação de recursos das instituições finan-ceiras, acrescido dos custos administrativos e tributários em que incorrem, e a taxa paga pelo tomador final de crédito” (GASQUES et al, 2006:22).

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Leite (2001) e Rezende (2003) destacam também o papel que o BNDES cumpre no financiamento da agroindústria, que não são contabilizados nos recursos do crédito rural. Entre 1990 e 2002, os empréstimos do BNDES para a agropecuária somaram R$ 27,6 bilhões (valores atualizados para 2002) e para agroin-dústria R$ 22,6 bilhões (REZENDE, 2003:213). Retornando à Ta-bela 5.2, verifica-se que os Recursos Obrigatórios constituem a principal fonte de recursos para o crédito rural. Neste item é re-gistrada a exigibilidade ou o porcentual dos depósitos à vista (25%, atualmente) que bancos comerciais devem aplicar, obriga-toriamente, em crédito rural, cobrando taxa de juros determinada anualmente pelo Governo Federal. No caso do não cumprimento da exigibilidade, o banco comercial fica obrigado a recolher ao Banco Central o volume não aplicado em crédito rural.

A segunda principal fonte de crédito rural é a Poupança Ru-ral, conta exclusiva do Banco do Brasil que, atualmente, deve ter 65% do seu saldo aplicado em operações de comercialização, be-neficiamento ou industrialização de produtos de origem agro-pecuária ou de insumos usados naquela atividade ou ainda na aquisição da Cédula de Produto Rural (BCB, 2007). Parte dessa aplicação deve respeitar a taxa de juros fixada pelo Governo Fe-deral e outra parte pode praticar juros livres.

Uma observação final dessa seção diz respeito ao papel que empresas do agronegócio cumprem na concessão de crédito rural oficial. Indústrias e cooperativas assumem, muitas vezes, a fun-ção de intermediário ou de avalista na concessão de crédito para os agricultores. Em 2001, 33,9% dos repasses do BNDES para o setor agropecuário foram feitos pelos Bancos de Montadoras, produtoras de tratores e colhedora. No financiamento de insu-mos químicos e biológicos, as cooperativas fazem esse tipo de intermediação e indústrias chegam a avalizá-lo junto aos bancos.

Na outra ponta da cadeia, agroindústrias como as do leite, aves e suínos também assumem o papel de avalista, especialmente nos créditos de investimentos, ou utilizam parte dos recursos dos

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financiamentos agroindustriais para produção de matéria-prima ou custeio de seus integrados. Outra operação são os descontos pelas agroindústrias de Notas Promissórias e Duplicatas Rurais com recursos de crédito rural para pagamento das compras feitas aos produtores. Tais operações aumentam a dependência dos agricultores a ramos industriais e de serviços ligados à agropecu-ária e diminuem os riscos dos bancos.2

5.1.2.1 Títulos Privados

A partir da diminuição da participação direta do Governo Federal, havia expectativa, entre os formuladores da política, que mecanismos privados não compulsórios pudessem ocupar papel predominante na oferta de recursos para o crédito rural. Nesse sentido, em 1994, foi aprovada a lei de criação da Cédula de Produto Rural (CPR) que, com aval do Banco do Brasil, pos-sibilita ao agricultor (ou cooperativa) emissor antecipar recursos financeiros com a promessa de entrega futura da safra. Em 2000, foi autorizada a CPR Financeira, que permite que o pagamento seja feito em dinheiro em lugar da produção. Ainda no ano de 1995, Resolução do Banco Central havia instituído a chamada “63 Caipira”, isentando do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) recursos externos destinados a financiar o setor agrícola (REZENDE, 2003).

Os resultados alcançados não foram expressivos e no presen-te século novas iniciativas foram tomadas visando à ampliação da participação de fontes privadas no crédito rural. A Lei n. 11.076 (Lei dos Novos Títulos Agrícolas), de dezembro de 2004, e a Ins-trução Normativa 422 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM)

2. “Os objetivos fundamentais dessas medidas são a redução do risco e do custo dos empréstimos agropecuários. O resultado é que as fronteiras entre emprestadores tradicionais (bancos) e não tradicionais (fabricantes de insumos, traders e agroin-dústrias) começam a diluir, do que dão testemunho os bancos de fabricantes de equipamentos” (FAVERET FILHO, 2002:43).

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permitiram a criação de novos títulos de crédito e de refinancia-mento do agronegócio (MAPA, 2007a).

Os títulos de refinanciamento criados foram as Letras de Cré-dito do Agronegócio (LCA), os Certificados de Direitos Creditó-rios do Agronegócio (CDCA) e o Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA). Seus mecanismos de funcionamento podem ser encontrados no Plano Agrícola e Pecuário 2005/06 (MAPA, 2007b), sendo que a intenção básica era constituir mercado se-cundário a partir dos títulos de dívida rural já existentes (CPR, Nota Promissória Rural, Duplicata Rural etc.) e que atraísse in-vestidores urbanos para o financiamento da agricultura.

Criou-se também a Nota Comercial do Agronegócio (NCA) ou Agrinote que pode ser emitida por empresas do agronegócio organizadas sob a forma de sociedade anônima (o que já era per-mitido anteriormente), limitada ou cooperativa (permitido atra-vés da Instrução Normativa 422 da CVM). O lastro para emissão da Agrinote pode ser a produção realizada ou a realizar ou mesmo a própria reputação da empresa.

Adicionalmente, foram remodelados os “títulos gêmeos” de-nominados de Certificado de Depósito Agropecuário (CDA) e Warrant Agropecuário (WA), destinados a produtos armazena-dos. Ao depositar sua produção em determinado armazém, o agricultor recebe do armazenador o título CDA-WA, que é regis-trado em entidade de registro e liquidação de títulos. Após, o agricultor pode vender o CDA-WA, o que equivale à venda da mercadoria, ou vender apenas o WA para obter empréstimo ban-cário. Nas negociações secundárias desses títulos não há incidên-cia de ICMS. O imposto só é cobrado quando o produto estocado for destinado ao processamento ou exportação, ou seja, deixar o armazém onde está depositado.

Esses títulos vêm apresentando crescimento considerável, sen-do que, enquanto em 2005 haviam movimentado R$ 196 milhões, em 2009 atingiram a cifra de R$ 64.950 milhões (WEDEKIN, 2010). É importante perceber que esses títulos não se destinam

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apenas ao financiamento dos agricultores, mas também a outras empresas do agronegócio.

5.1.3 Condições Atuais e Características Distributivas

do Crédito Rural

O Quadro 5.1 apresenta algumas condições de crédito rural no Brasil conforme o Plano Agrícola e Pecuário 2010/11 do Minis-tério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Está computado apenas o crédito para a chamada agricultura empresarial (não o PRONAF), prevendo-se destinar 75,6% dos recursos para opera-ções de custeio e comercialização, com taxa de juros de 6,75% ao ano nos empréstimos com juros controlados. O limite de crédito por agricultor varia de R$ 275 mil para as culturas da cana-de-açúcar e atividades pecuárias até R$ 650 mil para o algodão.

Ao crédito de investimento está prevista a destinação de 18% dos recursos do crédito rural, com prazo variando entre 4 e 12 anos e taxa de juros entre 5,0% e 9,5% ao ano. Já as linhas espe-ciais, instituídas na safra de 2009/10, em decorrência da crise fi-nanceira de 2008, contam em 2010/11 com 6,4% dos recursos de crédito, sendo destinadas para capital de giro de cooperativas e agroindústrias e à estocagem de etanol.

Quadro 5.1 Condições crédito rural no Brasil para safra 2010/11.

Tipo de CréditoRecursos

R$ bilhõesTaxa de

JurosLimites por

Produtor R$ milPrazoAnos

Custeio e Comercialização 75,6

Juros Controlados 60,7 6,75% soja, arroz, trigo, feijão, mandioca – 500; algodão – 650; cana, bovinos, aves, suínos – 275.

Juros Livres 14,9

Investimento 18,0 5,0 a 9,5% 4-12

Linhas Especiais 6,4

Total 100,0

Fonte: MAPA, 2010d.

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Por sua vez o Quadro 5.2 apresenta características distribu-tivas do total de crédito rural (empresarial e familiar) efetivamente aplicado e registrado no Sistema Nacional de Crédito Rural, em 2009. Neste ano foram usados R$ 75.186,1 milhões em crédito rural no Brasil, com 72,20% sendo destinados à atividade agríco-la e 27,8% à pecuária. Os contratos agrícolas, de maior valor mé-dio, representaram 59,1% dos 2.505.854 contratos realizados, en-quanto os pecuários representaram 40,9%.

A maior parte dos recursos do crédito rural foi destinada ao custeio agropecuário, vindo a seguir investimentos e depois co-mercialização. Registre-se o relativamente pequeno número de contratos de comercialização, que são destinados, em sua grande maioria, às cooperativas e agroindústrias e não aos agricultores.

Entre as regiões, o Sul é que absorveu o maior volume finan-ceiro de crédito, com participação de 39,0%, vindo logo a seguir o Sudeste com 34,8%. O Centro-Oeste ficou em posição interme-diária, com 15,2% e os menores volumes foram constatados no Nordeste e Norte. Quanto ao número de contratos, o maior per-centual foi verificado também no Sul, com 42,7%, seguido pelo Nordeste com 27,5%. Os contratos médios do Centro-Oeste fo-ram os maiores, na casa dos R$ 88,2 mil e os do Nordeste os me-nores, ficando próximo a R$ 8,8 mil.

A ampla maioria (91,5%) do número de contratos de crédito rural era de até R$ 60 mil, absorvendo 25,2% do valor financiado. Nessa faixa concentravam-se todos os créditos destinados à agri-cultura familiar. Na outra ponta, contratos acima de R$ 300 mil, representavam apenas 1,1% do número de contratos e acessavam 44,6% de seu volume.

Quanto aos agentes financeiros, os bancos oficiais federais, em especial o Banco do Brasil, foram responsáveis pela distri-buição de 50,6% dos recursos de crédito rural e 76,4% do número de contratos, seguido de perto pelos Bancos Privados, com parti-cipação de 36,2% no volume de recursos e de apenas 9,9% no número dos contratos.

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Quadro 5.2 Características distributivas do crédito rural no Brasil, de acordo com vários critérios, 2009.

Critério de Distribuição Valor (R$ milhões) e % No de Contratos e %

1 – Por Atividade

1.1 – Agrícola 54.316,2 (72,2) 1.480.398 (59,1)

1.2 – Pecuária 20.869,9 (27,8) 1.025.456 (40,9)

2 – Por Finalidade

2.1 – Custeio 42.838,6 (57,0) 1.414.290 (56,4)

2.2 – Comercialização 14.798,3 (19,7) 66.570 (2,7)

2.3 – Investimento 17.549,3 (23,3) 1.024.994 (40,9)

3 – Por Região

3.1 – Norte 2.163,1 (2,9) 128.331 (5,1)

3.2 – Nordeste 6.057,3 (8,1) 689.564 (27,5)

3.3 – Sudeste 26.188,6 (34,8) 488.821 (19,5)

3.4 – Sul 29.324,6 (39,0) 1.065.564 (42,7)

3.5 – Centro-Oeste 11.452,5 (15,2) 129.614 (5,2)

4 – Por Faixa de Contrato

4.1 – 0 a 60.000 reais 18.971,1 (25,2) 2.292.908 (91,5)

4.2 – 60.000 a 150.000 reais 13.750,9 (18,3) 144.666 (5,8)

4.3 – 150.000 a 300.000 reais 8.898,6 (11,8) 41.857 (1,7)

4.4 – acima de 300.000 reais 33.565,6 (44,6) 26.423 (1,1)

5 – Por Agente Financeiro

5.1 – Bancos Oficiais Federais 38.039,3 (50,6) 1.906.354 (76,1)

5.2 – Bancos Of. Estaduais 3.065,0 (4,1) 71.166 (2,8)

5.3 – Bancos Privados 27.184,4 (36,2) 247.105 (9,9)

5.4 – Cooperativas de Crédito 6.897,5 (9,2) 281.229 (11,2)

6 – Total de Crédito 75.186,7 (100,0) 2.505.854 (100,0)

Fonte: BCB, 2010.

5.1.4 Endividamento Agropecuário

Um dos problemas recorrentes do Sistema Nacional de Cré-dito Rural é a inadimplência dos contratos (superior a 20%) que, especialmente, a partir de meados da década de 1990, resultou

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em frequentes mobilizações de agricultores e seus representantes legislativos e na formulação de projetos de lei para renegociação da dívida rural. Dessa forma, em novembro de 1995 foi apro-vada a Lei 9.138, da Securitização, seguida pelo Programa Espe-cial de Saneamento de Ativos (PESA), instituído pela Resolução CMN 2.295, em novembro de 1998 e por várias outras normas que tratam do alongamento e da diminuição do valor real das dívidas rurais.

Uma parte pequena dos gastos públicos resultantes dessas re-negociações é registrada na Função Agricultura, mas a grande maioria é registrada na Função Encargos Especiais, assumida di-retamente pelo Tesouro Nacional. Gasques et al (2006:21) estimam que, em valores de 2005, as despesas da União entre 1998 a 2005 decorrentes das renegociações da dívida agropecuária somaram R$ 22,6 bilhões, ou R$ 2,8 bilhões/ano.

Durante os anos de 2005 e 2006, em que se constatou queda da renda agropecuária, o endividamento rural tendeu a se acen-tuar (MAPA, 2007a), levando a nova rodada de negociações em torno de novas normas para as dívidas vencidas. Assim, em 2008 foi editada a Medida Provisória 432/2008, que estimava que a dí-vida dos agricultores junto ao Sistema Nacional de Crédito Rural seria de R$ 87,5 bilhões. Desse total, a MP 432 contemplou a re-negociação de R$ 75,0 bilhões, correspondente a 2,8 milhões de contratos (MAPA, 2008b).

5.2 AS ALTERAÇÕES NOS PREÇOS MÍNIMOS

A fixação do valor do preço mínimo para determinado produ-to agropecuário serve tanto para as operações de compra quanto para as de financiamento da comercialização contempladas na política estabelecida pelo Governo Federal. Sob o ponto de vista do agricultor, o preço mínimo asseguraria o recebimento de deter-minado nível de renda, diminuindo os efeitos negativos da insta-

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bilidade de preços agropecuários,3 especialmente naqueles anos em que ocorre queda considerável no preço do produto no mer-cado. Por outro lado, como através da execução da política de preço mínimo formam-se estoques reguladores, a política poderia atender aos consumidores naqueles anos em que a produção se mostre pequena, pressionando o preço para cima.

No Brasil, a Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB) ocupa papel importante na execução da Política de Garantia de Preço Mínimo (PGPM), sendo responsável pela análise técnica que leva à fixação de seus valores e pelo gerenciamento dos es-toques públicos de alimentos, entre outras funções. A partir de 1990, ou até um pouco antes (1987), a orientação governamental básica vêm sendo a de diminuir sua intervenção direta nos merca-dos agropecuários, o que significou tanto a execução de menores gastos, quanto a criação de novos instrumentos para o exercício da PGPM. A seguir analisam-se as mudanças nos instrumentos e depois a execução recente da PGPM no Brasil.

5.2.1 Antigos e Novos Instrumentos da PGPM

Como já abordado no capítulo anterior, os instrumentos tra-dicionais (que ainda se encontram em vigor) para a execução da PGPM no Brasil são a Aquisição do Governo Federal (AGF) e o Empréstimo do Governo Federal (EGF), conforme descrição do Quadro 5.3. Existia também a EGF com opção de venda (EGF-COV), que fazia com que essa modalidade se transformasse de crédito de comercialização em compra governamental.

3. Já há algumas décadas, se verifica o desenvolvimento de mecanismos privados com o objetivo de trazer maior previsibilidade aos preços agropecuários, tanto para os agricultores quanto para atacadistas, agroindústrias e exportadores. Constituem-se os chamados mercados futuros e de opções de produtos agrope-cuários, que no Brasil são coordenados pela Bolsa de Mercadorias e Futuros – BM&F (MARQUES, 2005). Embora reconhecendo sua importância, esse tema não será tratado nesse trabalho.

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Quadro 5.3 Instrumentos tradicionais e novos de apoio à comerciali-zação agropecuária em vigência no Brasil em 2008.

I – INSTRUMENTOS TRADICIONAIS

Preço Mínimo de Garantia – preços fixados para compra ou financiamento através de programas oficiais, contemplando 39 tipos de produtos e 12 tipos de sementes.

Aquisição do Governo Federal (AGF) – em situação de preço baixo, permite ao Governo comprar de produtor rural ou cooperativa produto agrícola pelo valor do preço mínimo. Da agricultura familiar e para estoques estratégicos pode-se comprar a pre-ço de mercado.

Empréstimo do Governo Federal (EGF) – concedido a agricultores, coope rativas e agro-indús trias, com base no preço mínimo, permitindo estocagem e melhor distribuição da oferta durante o ano.

II – INSTRUMENTOS CRIADOS A PARTIR DE 1992

Prêmio de Escoamento de Produto (PEP) – O Governo paga a diferença entre preço mínimo e preço de mercado ao agricultor ou cooperativa para que entregue o produto em regiões deficitárias a partir de estoques privados. Operação semelhante pode ser feita a partir de estoque público, sendo denominada de Valor de Escoamento de Produto (VEP).

Contrato de Opção de Venda – título do Governo ofertado em leilão a agriculto-res e cooperativas. Seu comprador assegura o direito (não a obrigação) de entregar ao Governo a quantidade de produto contratada, no seu vencimento, a determina-do preço (preço de exercício) e sob certas especificações. Também através de leilão, o Governo pode Recomprar o Contrato de Opção de Venda ou Repassar o Contrato para outro agente privado, mediante subvenção (diferença entre preço de exercício e o vigente no mercado), evitando a formação de estoques públicos.

Prêmio Equalizador Pago ao Produtor (PEPRO) – consiste no pagamento ao agricultor ou cooperativa da diferença entre o preço de mercado e o preço de referência definido pelo governo. As operações são conduzidas por leilões públicos.

Linha Especial de Crédito à Comercialização (LEC) – semelhante ao EGF, mas com a permissão ao Governo de arbitrar preço diferente do preço mínimo. Permite o financia-mento de carrego de estoque quando o valor do preço mínimo estiver defasado.

Contratos Privados de Opção de Venda e Prêmio de Risco de Opção Privada (PROP) – o Governo, através de leilão, oferta um Prêmio de Risco de Opção Privada, para que agentes privados o adquiram e lancem Contratos Privados de Opção de Venda destina-dos a agricultores ou cooperativas, que passam a ter garantia de receber um determi-nado preço de exercício. Através do Prêmio, o risco do preço de exercício superar o preço de mercado é assumido (até determinado limite) pelo Governo.

Fonte: MAPA, 2008b.

A aprovação da já citada Lei n. 8.427, em maio de 1992, per-mitiu que se pudesse praticar a equalização de preços, ao invés de arcar com o preço total dos produtos beneficiados pela PGPM.

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Deste ano até 1999 foram criados quatro novos instrumentos de preço mínimo, o Contrato de Opção de Venda, o Prêmio de Es-coa mento de Produto (PEP) e o Valor de Escoamento de Produto (VEP) e Prêmio Equalizador Pago ao Produtor (PEPRO), descri-tos no Quadro 5.3. Outras mudanças importantes, ocorridas em 1996, foi o impedimento de prorrogação do EGF de uma para outra safra e a extinção do EGF-COV.

Mais recentemente, instituiu-se, em 2003, a Linha Especial de Crédito à Comercialização (LEC), que permite desvincular o financiamento de comercialização do valor legal do preço míni-mo e, em 2004, o Contrato Privado de Opção de Venda e o Prê-mio de Risco de Opção Privada (PROP), também descritos no Quadro 5.3.

5.2.2 Execução Recente da PGPM

Quanto à execução da PGPM, já foi comentado que no perío-do de 1985-87 as Aquisições do Governo Federal atingiram volu-mes recordes, com a aquisição de uma média anual de 9.454,4 mil toneladas de produtos agropecuários. No triênio 2000-02, essa média tinha caído para 736,7 mil toneladas (CONAB, 2007).

Em anos mais recentes, de 2003 a 2009, observa-se na Tabe -la 5.3 que as operações de AGF continuaram em patamares bai-xos. Em anos de queda da renda agropecuária, como os de 2005, 2006 e 2009, as compras governamentais foram bem mais signifi-cativas do que naqueles em que os preços agropecuários foram favoráveis aos agricultores, como os de 2004, 2007 e 2008.

Já os instrumentos novos (Contratos de Opção, PEP, PROP, PEPRO) ganharam grande projeção entre 2006 e 2009, situan do-se, com exceção de 2008, entre 10 milhões e 20 milhões de toneladas de produtos agropecuários beneficiados. Considerando-se tanto os instrumentos antigos quanto os novos, no triênio 2007-09 foi con-templada com a PGPM no Brasil uma média anual de 10.995,3 to-neladas, o que significa menos de 10% da safra brasileira de grãos.

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Tabela 5.3 Quantidade de produtos agropecuários beneficiados por AGF e instrumentos novos, em mil toneladas, Brasil, 2003 a 2009.

Ano AGF Instrumentos Novos* Total

2003 – 2.253 2.253

2004 283 1.815 2.098

2005 1.690 3.445 5.135

2006 2.581 19.134 21.715

2007 373 12.460 12.833

2008 188 4.066 4.254

2009 1.149 14.750 15.899

* Soma do Contrato de Opção, PEP, PROP e PEPRO

Fonte: MAPA, 2010e.

Seja por que o alcance da PGPM, em termos de porcentual da safra beneficiada, tem se revelado pequeno, seja por que pre-do minam os novos instrumentos, que não prevêem que haja aquisição de produtos pelo Governo Federal, isso faz com que os estoques reguladores dos produtos agrícolas se mostrem em nível bastante reduzido. No início do Século XXI, os estoques dos principais produtos agrícolas não ultrapassavam 5% dos respecti-vos consumos anuais (VILLA VERDE, 2001). Dados mais recentes indicam que na safra 2006/07 foram produzidas 131,4 milhões de toneladas de grãos (CONAB, 2008a), sendo que os estoques públicos (arroz, farináceos, feijão, milho e trigo) não superavam 3,7 milhões de toneladas (MAPA, 2008b).

5.3 RISCO AGROPECUÁRIO, ZONEAMENTO AMBIENTAL

E SEGURO RURAL

A escolha da época mais adequada para o plantio e a celebração do seguro rural são práticas que visam preservar a produção agro-pecuária dos riscos associados à ocorrência de eventos adversos e aleatórios de origem sanitária ou climática e que tragam prejuízos econômicos aos agricultores.

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Para reduzir os riscos climáticos incidentes sobre a atividade agrícola, desde 1996, o MAPA divulga, anualmente, o Zoneamento Agrícola de Risco Climático, indicando para cada município os períodos mais recomendados para plantio de diversas culturas agríco las. Além de trazer maior segurança à atividade agrícola, a adequação ao calendário do Zoneamento Agrícola é obrigató-ria para o agricultor utilizar-se do programa oficial de seguro rural, chamado de Programa de Garantia de Atividade Agrope-cuária (PROAGRO).

Quando de sua criação, na década de 1970, o PROAGRO co-bria apenas as operações de custeio pecuário e agrícola realizadas com recursos da Política de Crédito Rural. Na década de 1990 tornou-se possível utilizar o PROAGRO também em operações realizadas com recursos do próprio do agropecuarista. O alto custo do seu prêmio e o desinteresse das seguradoras privadas, contudo, fazia com que menos de 1% da área plantada no Brasil fosse atendido pelo seguro rural, com forte concentração no Es-tado de São Paulo e na Região Sul.

Visando ampliar o alcance do seguro rural, aprovou-se a Lei 10.823, de dezembro de 2003, que permitiu, através do Decre-to 5.121, de junho de 2004, a criação do Programa de Subvenção ao Prêmio de Seguro Rural. Com ele, o Governo Federal pode sub-sidiar de 30% a 60% do valor do prêmio do seguro rural contratado junto a empresas privadas, respeitado um limite anual a ser segu-rado por agricultor e por atividade agrícola, pecuária, aquícola ou florestal. Em seu primeiro ano de vigência apenas oito atividades agrícolas estavam habilitadas a receber a subvenção do seguro rural e a partir do seu segundo ano todas as atividades agropecuá-rias e florestais puderam ser contempladas (MAPA, 2007b).

As principais condições do seguro podem ser vistas no Qua-dro 5.4. Para as atividades pecuárias a taxa de participação é de 1,2% sobre o total do empreendimento. Para as atividades agríco-las ela varia entre 1,7% e 11,7%, de acordo com o tipo da cultura e da técnica de cultivo. Lavouras irrigadas pagam menos, as que

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usam plantio direto recolhem valores intermediários e as de se-queiro ficam sujeitas a taxas mais altas (MAPA, 2008b).

Quadro 5.4 Taxa de participação (prêmio) do Seguro Rural para ativi-dades agropecuárias e técnicas de cultivo.

Custeio pecuário: 1,2%

Custeio de Culturas Permanentes Cana-de-açúcar: 2,3%

Café: 4,7%

Banana, caju, maçã, uva e outros: 3,5%

Custeio de lavouras irrigadas Cevada e trigo: 2,0%

Demais lavoura, inclusive arroz: 1,7%

Custeio de lavouras de sequeiro Algodão, mamona, mandioca, milho e soja: 3,9%

Arroz e feijão: 6,7%

Sorgo: 5,5%

Cevada e trigo: 5,0%

Centeio e triticale: 11,7%

Outros: 9,4%

Custeio de lavouras com técnica de plantio direto

Milho e soja: 2,9%

Feijão: 5,7%

Cevada e trigo de sequeiro: 4,0%

Fonte: MAPA (2007b).

O crescimento do seguro rural subvencionado tem se revelado bastante significativo nos últimos anos. Assim, em 2005, primeiro ano de sua vigência, apenas 68.148 hectares de quatro atividades agrícolas foram contempladas, com uma importância segurada de R$ 126,6 milhões, com volume de prêmio pago de R$ 8,7 mi-lhões e subvenção pública federal de R$ 2,3 milhões. No ano de 2009, foram contempladas atividades florestais e pecuárias, além de 45 lavouras. A área total segurada foi de 6.669.296 hectares, a importância segurada de R$ 9.684,2 milhões, o prêmio pago de R$ 477,8 milhões e a subvenção do Governo Federal alcançou R$ 259,6 milhões (MAPA, 2010f).

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Em 2009, das 72.737 apólices de seguro rural subvencionadas, 14.496 (19,9%) registraram avisos de sinistro, reivindicando inde-nizações às Seguradoras no montante de R$ 274,5 milhões (MAPA, 2010f). Observe-se que esse valor é um pouco superior ao mon-tante de subvenção concedido pelo Governo Federal no ano.

5.4 A REDE DE PESQUISA AGROPECUÁRIA NO BRASIL

Desde o final do Século XIX, quando foram criados o Instituto Agronômico de Campinas (IAC) no estado de São Paulo e alguns outros em outros estados brasileiros, observam-se ações públicas em favor do desenvolvimento tecnológico da agricultura brasi-leira. Contudo, apenas com a criação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), em 1973, a pesquisa pública agropecuária ganhou maior abrangência geográfica e sistemati-cidade orçamentária e de planejamento.

Em 1992 foi instituído o Sistema Nacional de Pesquisa Agro-pecuária (SNPA), procurando concatenar as ações de pesquisa e desenvolvimento agropecuário das diversas instituições existentes na área. Esse sistema é coordenado pela EMBRAPA e dele tam-bém fazem parte as Organizações Estaduais de Pesquisa Agro pe-cuária (OEPA), universidades e institutos de pesquisa de âmbito federal e estadual, fundações e empresas privadas.

A EMBRAPA conta atualmente com 45 Centros de Pesquisa espalhados pelo País. Como mostra a Tabela 5.4 seu orçamento, na década de 1990, atingiu um máximo em 1996. A partir daí ve-rificou-se uma tendência de queda, até 2003. Os anos mais recen-tes registraram recuperação do orçamento, atingindo-se o valor de R$ 1,8 bilhão, em 2009, 44% maior do que constado em 1990.

Estimativa feita para o ano de 1996 indicava que a EMBRAPA era responsável por 52% da pesquisa agropecuária no Brasil, os go-vernos estaduais por 20% e as universidades por 21% (GASQUES et al, 2004). Como já afirmado no capítulo três, em agosto de 2010,

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a EMBRAPA era detentora de 24,2% das 1.387 cultivares regis-tradas de todas as lavouras no Brasil (MAPA, 2010b).

Tabela 5.4 Orçamento EMBRAPA, 1990 a 2009, valores em mil reais de 2009.

Ano Valor Índice Ano Valor Índice

1990 1.259.763 100 2000 1.289.919 102

1991 1.475.671 117 2001 1.293.815 103

1992 1.100.373 87 2002 1.188.712 94

1993 1.283.908 102 2003 1.074.346 85

1994 1.220.989 97 2004 1.154.565 92

1995 1.365.572 108 2005 1.137.236 90

1996 1.704.874 135 2006 1.230.678 98

1997 1.497.511 119 2007 1.279.009 102

1998 1.444.993 115 2008 1.411.923 112

1999 1.335.744 106 2009 1.816.100 144

Fonte: GASQUES et al (2006), EMBRAPA (2008), EMBRAPA (2010).

As pesquisas da EMBRAPA abrangem várias áreas e ativida-des agropecuárias. Duas merecem especial destaque, as que pos-sibilitaram a ocupação agrícola das terras do Cerrado, principal região de expansão recente da agropecuária brasileira, e aquelas que resultam no melhoramento genético de plantas. A Tabela 5.5 mostra a grande importância das cultivares EMBRAPA na área de arroz de sequeiro, feijão e milho (no Nordeste) e uma impor-tância regular para soja e trigo.

A contribuição econômica das cultivares EMBRAPA foi cal-culada através da estimativa do adicional de receita obtido a partir de seu uso, em substituição às cultivares anteriormente emprega-das. No total esta contribuição representou 4,3% do Valor da Pro-dução das oito culturas consideradas na Tabela 5.5.

Outro indicador mostra que o valor das tecnologias desenvol-vidas e transferidas pela empresa à sociedade alcançou, em 2009,

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R$ 18,8 bilhões, correspondente a 10,4 vezes o orçamento da EM-BRAPA no ano (EMBRAPA, 2010).

Tabela 5.5 Impactos econômicos das cultivares EMBRAPA na área e no valor de produção de culturas agrícolas no Brasil, 2009.

ProdutoÁrea

(mil ha)Cultivares

Embrapa (%)Valor Produção

(R$ mil)Contribuição

EMBRAPA (R$ mil)

Algodão 843 3 1.890.600 24.941

Arroz irrigado 1.106 9 5.375.400 109.952

Arroz sequeiro 1.803 53 3.194.300 476.013

Feijão 4.148 40 5.724.584 1.194.148

Milho Nordeste 3.030 58 1.485.568 437.238

Milho Outras 14.172 1 16.321.248 82.823

Soja 21.743 18 41.730.815 753.990

Trigo 2.396 25 2.530.120 257.180

Total 78.252.635 3.336.285

Fonte: EMBRAPA (2010).

5.5 A POLÍTICA DE DEFESA SANITÁRIA

A Política de Defesa Sanitária tem como o objetivo garantir a sanidade agropecuária através de ações de saúde, sanidade, ins-peção, fiscalização, educação e vigilância de animais, vegetais, insumos e produtos de origem animal e vegetal.

Considerando-se o conceito de sistema de produção agrope-cuária, pode-se dizer que a defesa sanitária atua à montante da produção agropecuária, através de atividades relativas à fiscalização dos insumos e dos serviços usados nas atividades agropecuárias. Age na própria agropecuária ou produção primária, através da vi-gilância e defesa sanitária vegetal e da vigilância e defesa sanitária animal. Finalmente, implementa ações à jusante da agropecuária, através da inspeção e classificação de produtos de origem vegetal, seus derivados, subprodutos e resíduos de valor econômico e da inspeção e classificação de produtos de origem animal, seus deri-vados, subprodutos e resíduos de valor econômico.

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Pode-se especificar ainda mais essas ações, de acordo com MAPA (2005). Assim a fiscalização de insumos agrícolas envol-veria a fiscalização de agrotóxicos, seus componentes e afins; a fiscalização higiênico-sanitária da prestação de serviços agrícolas; a inspeção e fiscalização da produção, certificação e da comerciali-zação de sementes e mudas; a fiscalização da produção e da comer-cialização de fertilizantes, corretivos e inoculantes. Por sua vez a fiscalização de insumos pecuários envolveria a inspeção e fiscali-zação de produtos de uso veterinários; fiscalização higiê nico-sanitária da prestação de serviços pecuários; inspeção e fiscali-zação dos produtos destinados à alimentação animal.

Quanto à sanidade vegetal as ações seriam: vigilância fitos-sanitária, inclusive a definição de requisitos fitossanitários no trânsito de plantas, produtos e derivados de origem vegetal e ma-teriais de uso agrícola; prevenção e controle de pragas, com des-taque para definição de requisitos fitossanitários necessários na importação e exportação de agrotóxicos, de sementes e mudas e de produtos vegetais destinados à alimentação animal; fiscali-zação do trânsito de vegetais, partes de vegetais, seus produtos, subprodutos e derivados, incluindo a exportação e importação; promoção de campanhas de educação fitossanitária.

Na saúde animal as ações envolveriam: vigilância zoossani-tária, especialmente a definição de requisitos sanitários a serem observados no trânsito de animais, produtos e derivados de ori-gem animal, bem como materiais de uso na veterinária; profilaxia e combate às doenças dos animais, estudando-se a definição dos requisitos exigidos para produtos biológicos; fiscalização do trân-sito de animais, de produtos veterinários, de materiais de multi-plicação animal, de produtos destinados à alimentação animal, produtos e derivados de origem animal, incluindo a aplicação de requisitos sanitários para importação e exportação; promoção de campanhas zoossanitárias.

A inspeção de produtos de origem vegetal contempla ações de fiscalização e inspeção higiênico-sanitária e tecnológica de

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produtos vegetais e seus derivados, incluindo bebidas, vinagres, vinhos e derivados; fiscalização da classificação de produtos vege-tais e seus derivados, subprodutos e resíduos de valor econômico. Na área animal as ações seriam de inspeção e fiscalização sanitá-ria e industrial de produtos de origem animal.

As atividades de defesa sanitária no Brasil todo fazem parte do Sistema Unificado de Atenção à Sanidade Agropecuária (SUASA), que se articula com o Sistema Único de Saúde nas questões rela-tivas à saúde pública. O SUASA é subdividido em Sistema Brasilei-ro de Inspeção de Produtos de Origem Vegetal, Sistema Brasileiro de Inspeção de Produtos de Origem Animal, Sistema Brasileiro de Inspeção e Fiscalização de Insumos Agrícolas e Sistema Brasileiro de Inspeção e Fiscalização de Insumos Pecuários.

Os estados, o Distrito Federal e os municípios podem aderir a esses sistemas ou não, mantendo sistemas próprios. Nesse caso as inspeções e fiscalizações estaduais e municipais de produtos de origem vegetal e animal e de insumos agropecuários são reconhe-cidas apenas na sua área territorial.

Historicamente, o MAPA vem mantendo atuação mais signi-ficativa na inspeção dos produtos de origem animal do que nos de origem vegetal. Existe certa indefinição entre o MAPA e a Agência de Vigilância Sanitária (ANVISA), órgão do Ministério da Saúde, em relação as suas atribuições relativas à sanidade dos alimentos.

Os gastos orçamentários federais com a defesa sanitária ve-getal passaram de R$ 25,7 milhões, em 2003, para R$ 42,0 mi-lhões, em 2008, enquanto os da defesa sanitária animal passavam de R$ 73,0 milhões para R$ 137,2 milhões, crescimentos de, res-pectivamente, 63,3% e 87,9% (GASQUES, 2009). Apesar disso, levando-se em conta as dimensões do Brasil pode-se supor que esses gastos ainda sejam insuficientes.

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6 A POLÍTICA FUNDIÁRIA E DA AGRICULTURA FAMILIAR

Como já se afirmou, no processo histórico de ocupação do meio rural brasileiro a prioridade foi dada à implantação de gran-des propriedades que, em um primeiro momento, usaram a força de trabalho escrava e, posteriormente, a força de trabalho assala-riada. Com exceção de algumas regiões, basicamente nos estados do Sul e no Espírito Santo, os pequenos estabelecimentos rurais, baseados no trabalho de agricultores familiares, não contaram com o favorecimento de políticas oficiais e seu desenvolvimento ocor-reu, muitas vezes, em terras marginais de pior qualidade ou esgo-tadas pela exploração das grandes culturas de exportação ou ainda como resultado da divisão de grandes propriedades, nos momen-tos de crise agrícola.

Também já se afirmou que, a partir de 1996, com o agrava-mento da situação social e dos conflitos fundiários, foi instituída uma série de normas legais e órgãos públicos para tratar especifi-camente da questão da agricultura familiar, reforma agrária e as-sentamentos rurais. Nesse intento, foram criados o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), ao qual o já existente Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) passou a se subordinar, e o Programa Nacional de Fortalecimento da Agri-cultura Familiar (PRONAF), para a concessão de crédito em con-dições mais favorecidas do que para a agricultura empresarial. Mais recentemente, a especificidade da agricultura familiar foi formalmente reconhecida pelo Congresso Nacional, ao aprovar a Lei 11.326/06 que estabelece a Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais.1

1. A Lei 11.326/06 reconhece agricultura familiar como segmento produtivo e dá reconhecimento legal para ampliação das políticas públicas específicas, como

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Antes da descrição das políticas para a agricultura familiar, será feita uma breve caracterização dessa categoria social que, na média, aufere baixo rendimento e apresenta importante diferen-ciação interna.

6.1 SITUAÇÃO PRODUTIVA E SOCIAL DA AGRICULTURA FAMILIAR

De maneira geral, as condições de vida e de trabalho da popu-lação rural2 e das pessoas ocupadas na agropecuária3 são mais pre-cárias que, respectivamente, as da população urbana e dos ocu-pados na indústria e no setor terciário. Nesse sentido, dados da PNAD de 2006 mostram que a renda média auferida nos domicí-lios rurais era de R$ 838,00/mês, equivalente a 46,0% da renda média dos domicílios urbanos, no valor de R$ 1.821,00/mês. Del Grossi (2008) mostra que, em 2006, a remuneração das pessoas ocupadas na agricultura era equivalente a 78,3% da remuneração dos ocupados em atividades não agrícolas, entre os moradores da zona rural, e equivalente a 68,0%, para os moradores da zona urbana . Também a mortalidade infantil, a incidência de doenças, a falta de assistência médica, as condições precárias de moradia, o analfabetismo e a desnutrição continuam sendo relativamente maiores no meio rural (DIEESE e NEAD, 2008).

Entre as categorias sociais ocupadas na agropecuária, as con-dições mais precárias atingem os empregados permanentes e

crédito, formação profissional, seguro, assistência técnica, comercialização – além de garantir acesso a direitos sociais, como é o caso dos benefícios da pre-vidência social. Prevê, também, a descentralização – com participação de muni-cípios, estados, governo federal e agricultores familiares – no desenvolvimento e gestão das políticas” (IICA/NEAD/INCRA/MDA, 2007:39).

2. O Censo Demográfico 2000 revelou que dos 169,5 milhões de brasileiros, 31,8 mi-lhões (18,8%) moravam na área rural (IBGE, 2001). Dados mais recentes, da Pesqui-sa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD), de 2006, indicam que 31,2 milhões de pessoas (16,4%) moravam na zona rural (DIEESE e NEAD, 2008).

3. Dados da PNAD 2006 apontam que as pessoas ocupadas na agropecuária repre-sentavam 19,3% do total de ocupados no Brasil (DIEESE e NEAD, 2008).

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temporários e a grande maioria dos agricultores familiares. Estes se caracterizam por explorarem pequena área de terra, terem sua renda dependente predominantemente das atividades agrope-cuá rias, dirigirem e executarem, junto com membros da família, a maior parte das tarefas do estabelecimento rural.

Os dados do Censo Agropecuário 2006 apontam a existência de 4.367.902 estabelecimentos da agricultura familiar, o que re-presentava 84,4% do total de 5.175.489 estabelecimentos agrope-cuários brasileiros. Ao mesmo tempo, os estabelecimentos fami-liares ocupavam 24,3% da área total dos estabelecimentos brasileiros, eram responsáveis por 74,4% do total de pessoas ocu-padas na agricultura e geravam 38,0% do valor total da produção dos estabelecimentos (IBGE, 2009).

Considerando-se as principais lavouras, os estabelecimentos familiares produziam 87,0% da produção nacional de mandioca, 70,0% de feijão, 46,0% do milho, 38,0% do café, 34,0% do arroz, 21,0% do trigo e 16,0% da soja. Também produziam 58,0% do leite e possuíam 59,0% do plantel dos suínos, 50,0% do plantel de aves e 30,0 % dos bovinos (IBGE, 2009).

Estudo feito por Bittencourt & Menezes (2002), com base no Censo Agropecuário 1995/96, indica que os agricultores familiares brasileiros recebiam uma renda média anual de R$ 2.717,00, sen-do R$ 1.783,00 (65,6%) obtidos da venda de produtos e R$ 934,00 (34,4%) de atividades de autoconsumo. Os autores propuseram classificar os agricultores familiares em três grupos:

a) agricultores familiares “capitalizados”, com atividades eco-nômicas integradas ao mercado. Cerca de 800 mil estabe-lecimentos estariam nessa situação, produzindo próximo a 71% do valor da produção familiar;

b) agricultores familiares “descapitalizados” ou “em transi-ção”, que destinam parte da produção ao mercado. Seriam 1,4 milhão de estabelecimentos, representando 19% do valor da produção familiar;

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c) agricultores familiares assalariados agrícolas e não-agríco-las e minifundistas com produção voltada, basicamente, para o autoconsumo. Composto por 1,9 milhão de estabele-cimentos, com apenas 10% do valor da produção familiar.

A partir disso, Bittencourt & Menezes (2002) sugeriram a aplicação de políticas públicas diferenciadas para atendimento dos grupos de agricultores familiares e assalariados rurais. Em muitos casos, em que o grau de pobreza é extremo, seria reco-mendável a implantação de políticas de suplementação de renda, além de ações nas áreas de educação e saúde. Outro conjunto se-ria composto por políticas com condições favorecidas à agricul-tura familiar em relação à empresarial, especialmente no crédito, comercialização, seguro e assistência técnica e extensão rural.

Ainda, poder-se-ia supor a intervenção na estrutura fundiá-ria, através da execução de reforma agrária, com desapropriação de terras improdutivas e sua redistribuição a agricultores fami-liares com terra insuficiente ou a outras categorias sociais. Neste caso, entre os potenciais beneficiários estariam os assalariados agropecuários, inclusive aquela parcela que, juntamente com os migrantes rurais, mora nas cidades, muitas vezes em bairros com graves deficiências de infra-estrutura e convivendo com períodos de desemprego.

A discussão da reforma agrária merece algumas considera-ções adicionais. Sua implementação está relacionada com ques-tões sociais, especialmente os indicadores de renda e de ocupação agropecuária, bem como com a formação histórica da agricultura ou de como se deu o acesso à terra ao longo do tempo. Há tam-bém uma questão de cunho econômico, relativa à viabilidade da agricultura familiar em face de eventual ocorrência de economias de escala nas atividades agropecuárias.

Por um lado, o desenvolvimento da tecnologia mecânica, que resulta na adoção de máquinas e equipamentos cada vez com maior capacidade, e o maior poder de negociação de preços de

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insumos e produtos, muitas vezes, contribuem para que as grandes explorações agropecuárias apresentem menores custos médios de seus produtos e, portanto, maior competitividade. Por outro lado, pelo menos em algumas atividades agropecuárias, mantêm-se es-pecificidades que limitam a organização produtiva aos moldes das linhas de produção do setor industrial e exigem manejo mais con-dizente com as características da agricultura familiar.

Além disso, as diversas práticas do associativismo e o tipo de tecnologia gerado nos institutos de pesquisa podem contribuir para maior viabilidade da agricultura familiar. Como exemplo pode-se citar a tecnologia voltada para a produção orgânica e o desenvolvimento de sistemas produtivos que integrem uma série de atividades agrícolas e pecuárias em áreas de pequena extensão e que consigam manter ocupada a força de trabalho familiar du-rante todo o ano agrícola. Ou ainda, inovações nos processos de produção e nos mecanismos de comercialização que façam com que a agroindústria artesanal ganhe competitividade.

A intervenção pública na estrutura agrária tem também a fina lidade, em países como o Brasil, de se tentar resolver os con-flitos fundiários, em especial nas regiões de fronteira, em que há dúvidas e contestações jurídicas quanto à posse e à propriedade da terra. Nessas regiões, milhares de posseiros exploram áreas ru-rais, muitas vezes para subsistência, sem possuírem título de pro-priedade ou outro instrumento jurídico que lhes dê garantia sobre a terra. Ao mesmo tempo, observa-se a prática da grilagem, em que se forjam documentos de propriedade, normalmente de grandes áreas, que na verdade seriam públicas ou devolutas ou que estão ocupadas por posseiros.

6.2 A POLÍTICA FUNDIÁRIA

O INCRA é o principal responsável pela execução da Política Fundiária no país. Suas ações, basicamente, envolvem três dife ren-tes áreas, a da regularização fundiária (ou ordenamento territorial),

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a do crédito fundiário e a da reforma agrária e assentamento rural. Em todas se interfere diretamente na distribuição da propriedade da terra ou sobre o imóvel rural.

Imóvel rural pode ser definido como a propriedade rural pú-blica ou privada de área contínua e registrada em cartório. Distin-gue-se do conceito usado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) nos levantamentos censitários, de estabeleci-mento agropecuário, que é a unidade rural de exploração econô-mica, que pode ser feita por proprietário ou não proprietário da terra. Em suma, enquanto, o imóvel é um conceito de propriedade, o estabelecimento é um conceito de exploração econômica.

Estima-se que mais da metade do território nacional e mais de 1 milhão de agricultores não têm suas áreas cadastradas no INCRA. Em 2003 iniciou-se um programa para implementação de cadastros georeferenciados de imóveis rurais. A partir de 2004, aumentaram-se as exigências quanto à comprovação da posse da terra para que seja emitido o cadastro de um novo imóvel rural. Em convênios com governos estaduais procura-se aumentar o ní-vel de regularização da propriedade da terra no Brasil.

A concessão de crédito fundiário tem o objetivo de propiciar o acesso à terra em áreas que não são passíveis de desapropriação, ao mesmo tempo que fornece recursos para serem iniciadas as atividades agropecuárias.4 Utiliza-se dos recursos do Fundo de Terras e Reforma Agrária e apresenta três linhas: Combate à Po-breza Rural – destinado ao Semi-Árido Nordestino; Nossa Pri-meira Terra – para jovens entre 18 e 24 anos e; Consolidação da Agricultura Familiar – para famílias com terra insuficiente e em condições sociais mais precárias (MDA, 2007b). Seu alcance é

4. “Na verdade, todas as condições básicas para adquirir estrutura e produzir estão abrigadas pelo crédito – a infra-estrutura básica (água, energia, estradas), produção (pastagens e solos), estruturação inicial dos assentamentos (culturas de subsistên-cia, autoconsumo, custeio de safras, aquisição de animais) e formação de poupança por famílias ou associações (fundos de poupança ou investimento, capital de giro para associações, participação em cooperativas de crédito)” (MDA, 2007b: 67).

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bastante limitado, sendo que entre 2003 e 2007, o crédito fundiá-rio proporcionou a aquisição de tão somente 947,9 mil hectares, onde foram assentadas 57.192 famílias (DIEESE e NEAD, 2008).

6.2.1 Reforma Agrária

A principal política executada pelo INCRA, em termos de abrangência social e de recursos despendidos, é a Política da Re-forma Agrária. Seus gastos são direcionados às ações de arreca-dação e desapropriação de terras, seguidas de sua divisão e distri-buição e de uma série de ações complementares para garantir a exploração econômica dos lotes dos assentamentos e de melhoria da condição de vida dos assentados. Em novembro de 2003, o Governo Federal anunciou a implementação do II Plano Nacio-nal de Reforma Agrária (II PNRA), com a meta de se assentarem 200 mil famílias de trabalhadores sem terra por ano.

A fundamentação legal da reforma agrária é dada pela Cons-tituição Federal de 1988 que, à semelhança ao Estatuto da Terra de 1964, assegurou o direito à propriedade privada da terra, des-de que cumprida sua função social, que deveria ser aferida pelo seu “aproveitamento racional e adequado”, “preservação ambien-tal” e “bem estar nas relações de trabalho”. A Lei 8629/93 regula-mentou os dispositivos constitucionais, em especial o “aprovei-tamento racional e adequado”, que passou a se medido por dois indicadores, o Grau de Utilização da Terra (GUT) e o Grau de Eficiência na Exploração (GEE) (DELGADO, 2005).

O GUT é calculado através da divisão da área efetivamente utilizada pela área explorável do imóvel. O GEE, que mede a efi-ciência da exploração agropecuária do imóvel, é assim obtido: divide-se a quantidade colhida de cada produto pelo índice de rendimento regional considerado adequado pelo INCRA; após, divide-se o número de unidades animais do rebanho pelo índice de lotação animal re gional do INCRA e, por fim; divide-se a soma desses itens pela área efetivamente utilizada e multiplica-se por 100 (INCRA, 2007).

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Corriqueiramente, a propriedade da terra é tributada através do Imposto Territorial Rural (ITR), cuja receita tem significado menos que 0,2% da arrecadação federal. Pode também sofrer sanção de desapropriação ao ser considerada improdutiva, por apresentar GUT menor que 80% ou GEE menor que 100%. Neste caso, a indenização governamental ao proprietário desapropriado é feita em dinheiro para as benfeitorias e através de Título de Dí-vida Agrária (TDA) para a terra nua. O TDA rende correção mo-netária mais juros de 3 a 6% ao ano, tem prazo de resgate entre cinco e vinte anos, podendo ser resgatado gradativamente a par-tir do segundo ano, sendo permitida sua negociação em mercado secundário (INCRA/SP, 2005).

Os passos seguintes à desapropriação são a divisão da área em lotes pequenos, que não ultrapassem os limites de um estabeleci-mento familiar (vide definição mais adiante), e o assentamento das famílias selecionadas nesses lotes. Por um período de tempo, os assentados deveriam ser assistidos por políticas específicas até alcançarem estágio de desenvolvimento que lhes possibilitassem maior autonomia e estabilidade. A partir daí, ocorreria sua eman-cipação, com o recebimento do título da terra e a sua incorpo-ração como beneficiário das políticas destinadas a todos os agri-cultores familiares.

Na Tabela 6.1 observa-se que, entre 1995 e 2006, foram assen-tadas 922.123 famílias, em 6.598 projetos, ocupando área de 51.541,2 mil hectares. Há clara expansão inicial, mais do que do-brando, entre 1995 e 1998, o número de famílias assentadas, em-bora a área usada não tenha apresentado a mesma evolução. De 1998 em diante, o número de famílias assentadas reduziu-se for-temente, até um mínimo de 36.301, em 2003. Daí para frente, o número de assentados voltou a crescer até 136.358 famílias, em 2006, sem que se alcançasse a meta de 200 mil famílias assenta-das/ano, como definia o II PNRA. É importante salientar que de pelo menos de 2003 a 2006, a maior parte dos assentamentos foi

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realizada na Região Norte,5 com a reforma agrária assumindo características mais de política de colonização e servindo para tentativa de enfrentamento da grilagem de terras devolutas e da violência nas disputas pela posse da terra na fronteira agrícola.

Nos anos mais recentes verificou-se a utilização de 5.819,3 mil hectares, em 2007, 4.128,4 mil hectares, em 2008, e 4.616,2 mil hec-tares, em 2009, nos projetos de assentamentos brasileiros sob ge-renciamento do INCRA (INCRA, 2010).

Um problema recorrente nos assentamentos rurais diz respei-to à sua continuidade ao longo dos anos, dada a precariedade das condições de vida dos assentados e as dificuldades de se mostra-rem economicamente viáveis. Neste sentido, o INCRA procura ofertar serviços complementares, como investimentos em estra-das rurais, implantação de unidades de abastecimento de água e instalação de energia elétrica e auxílio para instalação e constru-ção de moradias. Na área educacional desenvolve-se o Programa Nacional de Educação e Reforma Agrária (Pronera), que atende especialmente as necessidades de alfabetização de jovens e adul-tos e do ensino fundamental, mas também permite acesso ao en-sino médio e superior.

Há também o Programa Nacional de Assessoria Técnica, So-cial e Ambiental à Reforma Agrária (ATES), com objetivo de levar conhecimentos técnicos para fortalecer a produção dos assenta-mentos. Em 2005 o ATES atendeu 314.283 famílias, o que somado a outros programas públicos de assistência técnica para assenta-dos resultava em 450.700 famílias atendidas, revelando grande crescimento em relação às 76.746 famílias atendidas em 2001. Apesar disso, menos da metade das famílias assentadas no Brasil

5. De 2003 a 2006 foram assentadas 187.724 famílias em uma área de 27,6 milhões de hectares na Região Norte, 116.817 famílias em 2,8 milhões de hectares no Nor-deste e 53.321 famílias em 1,0 milhão de hectares no Centro-Oeste. Já no Sudeste 13.825 famílias foram assentadas em 281,6 mil hectares e no Sul 9.722 famílias em 106,2 mil hectares (IICA/NEAD/INCRA/MDA, 2007).

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(considerando-se os dados da Tabela 6.1) contam atualmente com serviço de assistência técnica.

Tabela 6.1 Dados de assentamentos rurais no Brasil, 1995 a 2006.

Ano Famílias Assentadas Quantidade Projetos Área Usada (mil ha)

1995 42.912 387 2.544,7

1996 62.044 466 2.451,4

1997 81.944 701 3.455,1

1998 101.094 753 2.802,1

1999 85.226 670 2.109,4

2000 60.521 417 2.158,7

2001 63.477 477 1.837,9

2002 43.486 384 2.501,3

2003 36.301 320 4.573,2

2004 81.254 426 3.511,4

2005 127.506 880 14.193,1

2006 136.358 717 9.402,1

Total 922.123 6.598 51.541,2

Fonte: MDA (2007b).

6.3 POLÍTICAS PARA AGRICULTURA FAMILIAR

O Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA), anual-mente, divulga o Plano Safra da Agricultura Familiar, que contém os principais programas, suas condições e previsão de recursos para a safra a se iniciar em julho daquele ano. O programa mais importante é o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricul-tura Familiar (PRONAF), que fornece crédito rural a diversas fai-xas e condições de agricultores familiares. Além disso, podem-se destacar programas de comercialização, de seguro rural e de as-sistência técnica e extensão rural. Na estrutura do MDA, a Secre-taria da Agricultura Familiar fica responsável pelo gerenciamento e acompanhamento da execução do Plano Safra.

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Para ser considerado familiar o agricultor tem que se enqua-drar nos seguintes critérios: “não deter área maior do que quatro módulos fiscais, utilizar predominantemente mão-de-obra da própria família; ter renda familiar predominantemente originada de atividades econômicas vinculadas ao próprio estabelecimento ou empreendimento; e dirigir o estabelecimento ou empreendi-mento com auxílio de pessoas da família” (IICA/NEAD/INCRA/MDA, 2007:39).

O módulo fiscal citado, expresso em hectares, é definido pelo INCRA para cada município brasileiro e constitui a menor uni-dade de exploração agropecuária que permite o sustento de uma família. Imóvel rural abaixo de um módulo fiscal é chamado de minifúndio, de um a quatro módulos é pequena propriedade, de quatro a 15 módulos, média propriedade e acima de 15 módu-los fiscais tem-se a grande propriedade.

6.3.1 Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura

Familiar – PRONAF

A Tabela 6.2 mostra que houve grande crescimento inicial, entre 1996 e 1999, dos recursos e do número de contratos do PRONAF. Entre 1999 e 2002, os recursos do PRONAF ficaram entre R$ 3,1e R$ 3,7 bilhões. De 2002 a 2009, o volume de recurso mais que triplicou e mais que dobrou o número de contratos. An-tes muito restrito à Região Sul, o PRONAF ganhou, recentemente, maior abrangência regional, alcançando agricultores familiares do Norte e do Nordeste.

Decorrente da diversidade da agricultura familiar, desde seu início, o PRONAF se subdivide em diferentes modalidades, con-forme registrado no Quadro 6.1. Em relação à chamada agricultu-ra empresarial, observa-se que os juros cobrados nos financia-mentos do PRONAF são menores, variando entre 0,5% a 4,5% ao ano. Em alguns casos se prevê bônus de adimplência ou desconto de parte da parcela devida, se seu pagamento for realizado até a data prevista no contrato.

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Tabela 6.2 Recursos e contratos do PRONAF entre 1996 e 2009.

AnoValores

(R$ milhões)*Número de Contratos

AnoValores

(R$ milhões)*Número de Contratos

1996 1.188,90 306.786 2003 4.218,35 1.003.837

1997 2.653,46 477.718 2004 5.362,98 1.345.713

1998 2.553,35 636.794 2005 6.570,53 2.208.198

1999 3.316,67 791.677 2006 7.699,94 2.551.497

2000 3.198,01 834.049 2007 7.420,64 1.923.317

2001 3.577,44 800.653 2008 9.026,91 1.550.749

2002 3.629,53 829.433 2009 11.218,85 1.704.947

* Valores atualizados pelo IPCA para 2009.

Fonte: BCB. Anuário estatístico do crédito rural, diversos números.

As duas primeiras linhas de financiamento registradas no Quadro 6.1 destinam-se a assentados e beneficiários de crédito fundiário. A terceira destina-se a agricultores familiares muito pobres, podendo financiar qualquer atividade geradora de renda, inclusive não agrícola. A quarta e quinta linhas envolvem a gran-de maioria dos recursos do PRONAF, destinados às operações de custeio e investimento dos agricultores familiares já constituídos. São citadas também linhas para custeio, comercialização e inves-timento destinados às agroindústrias familiares, bem como para capitalização de cooperativas.

Existem outras linhas de financiamento, como o PRONAF Jo-vem, o Mulher, ECO, Agroecologia, Semi-Árido, Jovem e Floresta. Na safra 2008/09 havia sido lançado, como programa emergen-cial, o PRONAF Mais Alimentos, com a meta de acrescer até 2010, 18,6 milhões de toneladas às 110,1 milhões de toneladas de ali-mentos produzidos pela agricultura familiar em 2007/08. A partir da safra 2010/11 o Programa se tornou permanente, mantendo o objetivo de financiar investimentos para a modernização de pro-priedades familiares,6 incluindo compra de máquinas e equipa-

6. As propriedades beneficiadas devem produzir produtos alimentícios, mais especi-ficamente açafrão, arroz, café, centeio, erva-mate, feijão, mandioca, milho, sorgo e

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mentos, correção de solos, irrigação, plasticultura, armazenagem, formação de pomares, formação de sistemas agroflorestais e me-lhoria genética, entre outros. A taxa de juros é de 2% ao ano, prazo de pagamento de até dez anos e três de carência. Sua faixa de fi-nanciamento varia de R$ 10 a R$ 130 mil para projetos individuais, podendo atingir R$ 500 mil, no caso de projetos coletivos.

Quadro 6.1 Condições do PRONAF de acordo com diversos grupos, safra 2010/11.

Linhas – Grupos Faixa I Faixa II Faixa III

PRONAF InvestimentoReforma Agrária – RA

Até R$ 20 mil, mais R$ 1,5 mil para Assistência Técnica e Extensão Rural. Juros: 0,5% a. a. Bônus de adimplência: 44%.

PRONAF Custeio RA Até R$ 5 mil, em três operações. Juros: 1,5% a. a.

Microcrédito Rural Até R$ 2,0 mil por operação. Juros: 0,5% a. a. Bônus de adimplência: 25% até os primeiros R$ 4 mil.

PRONAF Custeio à Agricultura Familiar

Até R$ 10 mil.Juros: 1,5% a. a.

R$ 10 mil a R$ 20 mil. Juros: 3% a. a.

R$ 20 mil a R$ 50 mil. Juros: 4,5% a. a.

PRONAF Investimento à Agricultura Familiar

Até R$ 10 mil.Juros: 1% a. a.

R$ 10 mil a R$ 20 mil. Juros: 2% a. a.

R$ 20 mil a R$ 50 mil. Juros: 4% a. a.

PRONAF Custeio e Comerc. Agroindústria

Individual: até R$ 5 mil. Coletivo: até R$ 2 milhões.Juros: 4% a. a.

PRONAF Agroindústria(Investimento)

Limite individual até R$ 20 mil, coletivo até 10 milhões. Juros 2% a. a.

PRONAF Cota-Parte Para ampliação da participação dos agricultores familiares nas cooperativas de crédito. Individual: até R$ 10 mil. Coletivo até R$ 20 milhões. Juros: 4% a. a.

Fonte: MDA (2010).

6.3.2 Outros Programas para Agricultura Familiar

Em 2003 foi criado o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), autorizando a CONAB e outros órgãos públicos a realiza-rem, por um preço previamente fixado, compra direta de alimentos da agricultura familiar em limite inicial de R$ 2.500,00 por ano

trigo ou ainda se dedicarem à apicultura, aquicultura, avicultura, bovinocultura de corte, bovinocultura de leite, caprinocultura, fruticultura, olericultura, ovino-cultura, pesca e suinocultura.

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por agricultor. Esse valor foi elevado, em 2006, para R$ 3.500,00 e na safra 2010/11 está vigorando o valor de R$ 8.000,00 por ano por agricultor. Após a aquisição, os alimentos são destinados a estoques governamentais e para programas institucionais, como a distribuição de leite no Semi-Árido Brasileiro, de cestas de ali-mentos ou alimentação escolar. Além do seu efeito direto, o PAA, ao permitir canal alternativo de venda, costuma servir como ba-lizador de preços oferecidos por atacadistas e comerciantes a pro-dutos da agricultura familiar.

Na Tabela 6.3 verifica-se que os recursos aplicados no PAA pelo Governo Federal passaram de R$ 145,3 milhões, em 2003, para R$ 590,6 milhões, em 2009. Também cresceram o número de agricultores familiares que participam do programa, a quanti-dade de produtos adquiridos e o número de pessoas beneficiadas com o consumo de alimentos.

Tabela 6.3 Indicadores de Execução do Programa de Aquisição de Ali-mentos (PAA), Brasil, 2003 a 2009.

AnoRecursos

(R$ milhões)AgricultoresBeneficiados

AlimentosAdquiridos (t)

PessoasAtendidas

2003 145,3 42.077 135.864 226.414

2004 181,1 68.576 339.925 4.261.462

2005 333.9 87.292 341.755 6.450.917

2006 488,7 147.488 466.337 10.700.997

2007 457,2 138.900 440.837 14.512.498

2008 505,9 168.548 403.155 15.407.850

2009 590,6 137.185 509.955 13.028.986

Fonte: Grupo Gestor PAA (2010)

Outra iniciativa direcionada à compra de produtos originá-rios da agricultura familiar foi a aprovação da Lei 11.947/2009. Ela determina que no mínimo 30% dos recursos da alimentação escolar repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para estados e municípios devam ser destinados à compra de produtos da agricultura familiar.

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Na safra 2004/05 começou a vigorar o Seguro da Agricultura Familiar (SEAF) para os créditos de custeio do PRONAF. “O SEAF garante 100% de cobertura para o financiamento do PRONAF e 65% da renda líquida esperada, em casos de secas, geadas, chuva de granizo, tromba d’água, vendaval e as geradas por doença fún-gica ou praga sem método difundido de combate, controle ou pro-filaxia, no custeio de culturas com Zoneamento Agrícolas” (MDA, 2007b). O prêmio do SEAF varia de 2% a 4%, podendo ser aciona-do quando as perdas ultrapassarem 30% da produção esperada.

Na safra 2010/11 tornou-se possível o seguro de clima para operações de investimento. “O agricultor que tem operações de investimento e realiza o plantio de culturas que se enquadram no SEAF pode segurar o valor das prestações de investimento com o pagamento de um adicional de (...) 2% sobre o valor das prestações. A adesão ao seguro de investimento é opcional” (MDA, 2010).

Para se ter uma idéia do alcance e da operacionalidade do SEAF podem ser usados alguns dados da safra 2005/06. Neste ano foram beneficiados com o SEAF 580 mil agricultores fami-liares. Estas adesões correspondiam a R$ 2.515,2 milhões de cré-dito de custeio do PRONAF, sendo comunicadas 149 mil ocor-rências de perda, equivalentes a R$ 645,8 milhões e sendo pagas 106 mil coberturas, em valor de R$ 318,9 milhões.

Na safra 2006/07 passou a funcionar o Programa de Garantia de Preços para a Agricultura Familiar que objetiva a proteção contra queda de preços no período de colheita. Essa garantia deve ser acionada quando o preço de mercado, por ocasião da venda da produção, for menor que o preço de referência, definido pre-viamente, sendo que essa diferença é descontada no pagamento do financiamento de custeio ou investimento do PRONAF. Na safra 2010/11 estão sendo contemplados 39 produtos agropecuá-rios com esse programa.

Na área de assistência técnica e extensão rural, o Decreto 4.739 de junho de 2003 deliberou que sua coordenação nacional passaria a ser exercida pela Secretaria de Agricultura Familiar do

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MDA. A partir daí, elaboraram-se a Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (PNATER), em 2004, e o Programa de Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (PRONATER), em 2005, e se constituiu o Comitê de Assistência Técnica e Exten-são Rural (ATER). Por fim, o Decreto 25, de março de 2006 defi-niu a implementação e estabeleceu as diretrizes do Sistema Bra-sileiro Descentralizado de Assistência Técnica e Extensão Rural (SIBRATER). Em 2010 foi aprovada a Lei 12.188 de ATER, pre-vendo que na safra 2010/2011 a contratação das entidades que prestam serviços de assistência técnica e extensão rural se dará por meio de chamada pública.

Aumentou-se o número de extensionistas de 15 para 20 mil e conseguiu-se ampliar o número de agricultores familiares benefi-ciados, de 106.900, em 2003, para 326.107, em 2004, 749.691, em 2005 e 811.464, em 2006. Quanto aos recursos federais despendidos, eles passaram de R$ 18 milhões, em 2003, para R$ 168 milhões, em 2007 (MDA, 2008).

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7EXPERIÊNCIAS E POLÍTICAS DE PRODUÇÃO DE AGROENERGIA NO BRASIL

Na primeira década do Século XXI, dois fatos, especialmente, contribuíram para o fortalecimento de ações destinadas à dimi-nuição, a longo prazo, da importância de fontes tradicionais de energia, como o petróleo. Um deles foi justamente a elevação de 103,8% no preço real do barril desse produto, que saiu de US$ 31,60, em 2001, e alcançou US$ 64,40, em 2009, depois de passar por US$ 109,10, em 2008 (EPE, 2010). Para a grande maioria dos analistas essa mudança de patamar é duradoura, diante da expectativa que nas próximas décadas o consumo de petróleo continue crescendo acima de suas reservas mundiais.

Ao mesmo tempo, aumentaram as evidências do aquecimento global em decorrência da crescente emissão de dióxido de carbo-no (CO2) e outros gases de efeitos estufa (GEE), gerados especial-mente nos ramos de energia e transporte. O relatório divulgado, em fevereiro de 2007, pelo Painel Intergovernamental sobre Mu-danças Climáticas da ONU (IPCC, 2007) estima que a tempera-tura da Terra subirá entre 1,8º. e 4,0o. C até 2100, caso não se ado-tem medidas de redução da emissão dos gases de efeito estufa.

A matriz energética mundial continua muito dependente de fontes não renováveis de energia, sendo que, em 2007, o petróleo e derivados tinham participação de 34,0% na oferta de energia e o carvão mineral, de 26,5%. Ou seja, as duas fontes não renová-veis, que emitem, relativamente, mais CO2 e outros GEE, propor-cionavam pouco mais de 60% da oferta de energia no mundo. As outras fontes não renováveis, gás natural e urânio, tinham parti-cipação, respectivamente, de 20,9% e 5,9% na oferta de energia mundial, enquanto as fontes renováveis, biomassa (lenha e carvão

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vegetal, basicamente) e hidroeletricidade representavam, respec-tivamente, 11,0% e 2,2% (EPE, 2010).

Está se procurando estimular a produção e o consumo de no-vas fontes de energia, entre elas a agroenergia ou energia obtida a partir de produtos de origem agropecuária ou florestal, pois, além de serem renováveis, sua utilização resultaria em menor emissão de GEE. Especialmente, vêm sendo incentivados os biocombus-tíveis, para uso no transporte de passageiros ou de carga.

Os EUA estão estimulando, particularmente, a produção de etanol de milho para adição à gasolina, enquanto a Europa estabe-leceu metas para aumentar a porcentagem de etanol e de biodiesel nos combustíveis derivados do petróleo. Em outros países obser-va-se a implementação de políticas semelhantes1 (PAULILLO et al, 2007).

As várias iniciativas de diversos países resultaram na amplia-ção da produção mundial de etanol de 17,0 bilhões de litros, em 2000, para 52,0 bilhões de litros, em 2007, projetando-se produ-ção de 126,9 bilhões de litros, em 2017. Já a produção de biodiesel passou de 0,8 bilhão de litros, em 2000, para 10,8 bilhões de litros em 2007, projetando-se produção de 24,4 bilhões, em 2017 (OCDE, 2008, OCDE/FAO, 2008).

Contudo, o favorecimento aos bicombustíveis não tem dei-xado de receber críticas. Uma, de caráter mais geral, diz respeito ao fato de que, ao se optar pela sua produção, pouco se faz em relação ao controle da demanda de combustíveis líquidos, muito utilizados em transporte individual. Este, além de se mostrar ine-ficiente em termos energéticos, dificilmente seria generalizável para todo o planeta.

Ao mesmo tempo, levantam-se dúvidas em relação à eficiência energética e ambiental dos biocombustíveis. Indaga-se, por exemplo,

1. Estimativa feita pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econô-mico (OCDE, 2008) indica que EUA, Europa e Canadá gastaram US$ 11 bilhões, em 2006, com programas de apoio aos biocombustíveis, projetando-se gastos anuais de US$ 25 bilhões, entre 2013 e 2017.

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qual a quantidade de energia fóssil que se utiliza para produzir uma unidade equivalente de energia de biocombustível. Também se questiona a capacidade real dos biocombustíveis, vis a vis os derivados do petróleo, em diminuir a emissão de gases de efeito estufa, especialmente se for levado em conta que para obtenção de sua matéria-prima, direta ou indiretamente, possa estar se promovendo desmatamento.

A crítica mais contundente, porém, decorreu do recente au-mento dos preços reais dos alimentos, evidenciado fortemente em 2007 e 2008. Entre as causas apontadas para isso, está o uso da área agrícola para produção de matérias-primas para biocombustíveis, substituindo área anteriormente usada para produção de alimen-tos. Especificamente, passou-se a questionar a opção norte-ameri-cana em usar grande quantidade de milho para produção de etanol, com redução de sua área com produção destinada às cadeias ali-mentares, bem como da área de soja e trigo, entre outras.

A agravante é que, com algumas exceções como o etanol de cana-de-açúcar no Brasil, mesmo com o petróleo caro, a produ-ção de biocombustíveis não se mostra economicamente viável, necessitando de subsídios públicos. Se por um lado, isto pode ser justificável em termos ambientais, supondo-se que os biocom-bustíveis tragam benefícios em relação aos combustíveis fósseis, por outro, passa a ser questionado, à medida que sua produção implicar em menor produção destinada à alimentação, cuja es-sencialidade é maior do que a da energia.

7.1 SITUAÇÃO E POLÍTICA BRASILEIRA DE AGROENERGIA

O Brasil apresenta situação bastante diferenciada em sua ma-triz energética. Enquanto que no mundo, como já visto, as fontes renováveis representavam, em 2007, apenas 13,2% da energia ofertada, no Brasil esse valor, em 2009, era de 47,3%, sendo 15,2% originados da hidroeletricidade e 32,1% da biomassa. Destes, 10,1% originavam-se da lenha e carvão vegetal, 18,2% de deriva-dos da cana-de-açúcar (etanol como combustível líquido, 5,7%, e

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bagaço para cogeração de energia, 12,5%) e 3,8% de outras fontes (EPE, 2010). É importante destacar o grande crescimento dos de-rivados da cana-de-açúcar, cuja participação na oferta de energia brasileira se resumia a 4,7%, em 1975, ano da criação do Progra-ma Nacional do Álcool (Proálcool).

Em decorrência da sua composição, a matriz energética bra-sileira tem se revelado menos poluente, sendo que o País emitia, em 2005, uma média de 1,41 tonelada de dióxido de carbono por tonelada equivalente em petróleo de energia empregada, contra 2,40 toneladas do mundo como um todo (EPE, 2006). Em contra-posição, as queimadas e os desmatamentos, em grande parte, as-sociados à expansão da agropecuária, faziam com que, também em 2005, o Brasil fosse considerado o sexto maior emissor de GEE do mundo (MAPA/MCT/MME/MDIC, 2005).

No campo das ações públicas, depois do Proálcool de 1975, o Brasil vem formulando políticas e programas novos para geração de agroenergia. Nesse sentido, em 2005, o Governo Federal, com horizonte de planejamento de seis anos, apresentou as “Diretrizes de Políticas de Agroenergia 2006-2011” e o “Plano Nacional de Agroenergia 2006-2011”, prevendo ações para álcool etílico, bio-diesel, florestas energéticas cultivadas e resíduos agroflorestais.

As diretrizes estabelecidas foram: desenvolvimento da agro-energia, agroenergia e produção de alimentos, desenvolvimento tecnológico, autonomia energética comunitária, geração de em-prego e renda, otimização do aproveitamento de áreas antropi-zadas, otimização das vocações regionais, liderança no comércio internacional de biocombustíveis e aderência à política ambiental, cujo detalhamento pode ser encontrado em MAPA/MCT/MME/MDIC (2005). Enquanto isso, o Plano preocupa-se, basicamente, com o desenvolvimento e a transferência de tecnologia na área de agroenergia.2

2. “O Plano Nacional de Agroenergia objetiva, a partir da análise da realidade e das perspectivas futuras da matriz energética mundial, organizar uma proposta de

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Outra iniciativa do Governo Federal foi o lançamento, em de-zembro de 2004, do Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel (Programa Biodiesel). No ano seguinte, foi aprovada a Lei n. 11.097/05 que estabeleceu a obrigatoriedade de percentual mínimo de 2% de biodiesel no diesel comercializado no Brasil, a partir de 2008, e de 5%, no mínimo, a partir de 2013. Este último porcentual poderia ser antecipado, em caso de oferta suficiente de biodiesel.

Além de incentivos da política brasileira, é importante ter em mente que várias das ações relativas à produção de agroenergia podem se beneficiar, através do Mecanismo do Desenvolvimento Limpo, da venda de créditos de carbono a empresas e governos dos países desenvolvidos, signatários do Tratado de Quioto. Até determinado limite, a redução a que estão obrigados a fazer na emissão de GEE pode se dar via aquisição de crédito de carbono junto a empresas ou órgãos públicos que desenvolvam projetos de sequestro desses gases nos países em desenvolvimento.

No restante do capítulo analisam-se os principais condicio-nantes da evolução da produção sucroalcooleira no Brasil, a partir de 1975, que levaram seus produtos a ocuparem papel importante na matriz energética brasileira. De forma complementar, abor-dam-se questões relativas à produção de biodiesel. Não será tra-tada a exploração de florestas energéticas cultivadas, destinadas à produção de lenha e de carvão vegetal, especialmente, para em-presas siderúrgicas. Nem o uso de dejetos agroflorestais, entre eles resíduos como casca de arroz e sobras de madeira, usados em caldeiras para produção de calor e eletricidade, ou de dejetos ani-mais, especialmente na avicultura e suinocultura, para produção de biogás e adubo orgânico.

Pesquisa, Desenvolvimento, Inovação e de Transferência de Tecnologia, com vis-tas a conferir sustentabilidade, competitividade e maior equidade entre os agentes das cadeias de agroenergia, em conformidade com os anseios da sociedade, as de mandas dos clientes e as políticas públicas das áreas energética, social, ambien-tal, agropecuária e de abastecimento” (MAPA, 2005a:7).

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7.2 A CANA-DE-AÇÚCAR NA MATRIZ ENERGÉTICA BRASILEIRA

Já na década de 1930, quando foi criado o Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA), instituiu-se norma pública tornando obrigató-ria a adição de 5% de álcool anidro (99,6% de pureza) à gasolina. Mais do que uma preocupação com a área energética ou ambien-tal, praticamente inexistente à época, tal medida tinha o intuito de proporcionar válvula de escape para contornar ou amenizar eventuais depressões no mercado de açúcar.

Até a década de 1970, o álcool manteve participação secundá-ria na produção do setor sucroalcooleiro, bem abaixo do açúcar.3 Embora este tivesse apresentado momentos de profunda crise, a opção pelo álcool como combustível ficava limitada, entre outras razões, pelo baixo nível de preço que o petróleo apresentou, du-rante décadas, no mercado internacional.

Com o Primeiro Choque do Petróleo em 1973, essa situação se alterou profundamente, com os preços do petróleo passando de US$ 3,4/barril, em 1972, para US$ 15,5/barril, em 1974 (CALABI, 1983).4 Isto trouxe graves problemas à Balança Comercial Brasi-leira, já que cerca de 80% do consumo nacional de petróleo era proveniente de importações.

Enquanto isso, os preços internacionais do açúcar mais do que dobraram entre 1969 e 1974, atingindo US$ 1.388,56 por to-nelada em novembro deste ano. Com isso as exportações brasilei-ras reforçaram financeiramente o Fundo Especial de Exportação, permitindo que se bancassem vários programas de modernização setorial. As usinas, ainda com vistas no mercado de açúcar, am-pliaram sua capacidade através do acesso a empréstimos para in-vestimentos em condições extremamente favoráveis, com juros

3. Para análise do desenvolvimento sucroalcooleiro de 1933 a 1975, especialmente aspectos ligados ao planejamento público, sugere-se a leitura de SZMRECSÁNYI (1979). Para 1975 a 2000 sugere-se BACCARIN (2005).

4. Em termos reais, com valores corrigidos para 2002, essa variação foi de US$ 8,3/barril para US$ 37,4/barril (BACCARIN, 2005:238).

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de 10% a 12% ao ano, sem correção monetária, prazo de paga-mento de 10 anos e com três anos de carência (RAMOS, 1999).

Contudo, no final de 1974, os preços do açúcar começaram a cair, alcançando US$ 336,12 por tonelada, em maio de 1975, oca-sionando grave crise setorial. Ancorados na elevação do preço do petróleo, os empresários canavieiros passaram a encarar, como provável saída, de curto prazo, a elevação da produção de álcool para fins energéticos. De início, essa alternativa sequer neces-sitaria de novos investimentos, já que as destilarias brasileiras, em 1975, tinham capacidade produtiva entre 1,2 a 1,8 bilhão de li-tros, enquanto a produção efetiva não passava de 0,6 bilhão de litros (BRAY et al, 2000, SZMRECSÁNYI, 1979).

Com base nessa situação, as entidades patronais propuseram que o Governo Federal criasse programa público de estímulo ao uso do álcool combustível para substituir, pelo menos parcial-mente, a gasolina. Rapidamente, alcançou-se resposta positiva, com a edição do Decreto Federal 76.593, de 14 de novembro de 1975, que instituiu o Programa Nacional do Álcool, que ficou co-nhecido como Proálcool. A evolução da produção sucroalcooleira entre 1975 e 2010 pode ser observada na Tabela 7.1.

Nesses 25 anos o crescimento da produção de álcool fez com que ele adquirisse a mesma ou maior importância que o açúcar. Como será visto, não foi um crescimento contínuo, mas marcado por instabilidades e incertezas.

7.2.1 A Explosão Inicial do Álcool

Até 1975, o órgão público responsável pela política sucro-alcoo lei ra era o Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA). Com a criação do Proálcool, outros órgãos passaram a influenciar a for-mulação e a implementação da política setorial, diminuindo o poder do IAA. Num primeiro momento, instituiu-se a Comissão Nacional do Álcool e, em 1979, suas funções foram divididas

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entre o Conselho Nacional do Álcool (CNAL), cuja finalidade era formular a política e fixar diretrizes do Programa, e a Co-missão Executiva Nacional do Álcool (CENAL),5 para executar a polí tica alcooleira.

Os incentivos concedidos pelo Proálcool aos empresários ca-navieiros podem ser divididos em três grupos. O primeiro refe-rente às linhas de financiamento para investimentos agrícolas e industriais e para custeio agrícola com taxas de juros negativas ou subsidiadas, que assim se mantiveram até 19846 (BACCARIN, 1994). Com isto a estrutura produtiva do setor, medida em ter-mos de área plantada com cana-de-açúcar e da capacidade indus-trial de usinas e destilarias, pode se ampliar acima da taxa média de crescimento da economia. Estima-se que os 552 projetos en-quadrados no Proálcool, entre 1975 a 1985, resultaram no cresci-mento de 13,8 bilhões de litros de álcool na capacidade produtiva de álcool no Brasil (BACCARIN, 2005).

5. Faziam parte do CNAL o Ministro da Indústria e do Comércio (como presidente), os Secretários Geral dos Ministérios da Indústria e do Comércio, da Fazenda, da Agricultura, das Minas e Energia, do Interior, dos Transportes, do Trabalho, o Se-cretário Geral da Secretaria de Planejamento da Presidência da República, o Sub-chefe de Assuntos Tecnológicos do Estado Maior das Forças Armadas, represen-tantes da Confederação Nacional da Agricultura, da Confederação Nacional do Comércio e da Confederação Nacional da Indústria. Já a CENAL era composta pelo Secretário Geral do Ministério da Indústria e do Comércio (que a presidia), pelos Presidentes do Conselho Nacional do Petróleo e do Instituto do Açúcar e do Álcool, pelo Secretário da Secretaria de Tecnologia Industrial do Ministério da Indústria e do Comércio e pelo Secretário Executivo da Secretaria Executiva do Conselho de Desenvolvimento Industrial (BACCARIN, 2005).

6. Relatório do Tribunal de Contas da União (TCU, 1991) aponta que, da criação do Proálcool a 1989, foram investidos, em termos nominais, aproximadamente US$ 7,1 bilhões na lavoura canavieira e nas usinas e destilarias. Desse total, US$ 4,0 bilhões (56,0%) foram financiados com recursos públicos e US$ 3,1 bi-lhões (44,0%) com recursos privados. A partir de 1985, “os financiamentos rea-lizados no Proálcool, com recursos públicos, representam exclusivamente investimentos no setor agrícola, feitos através das linhas de crédito existentes na Carteira de Crédito Agrícola do Banco do Brasil e de bancos comerciais” (TCU, 1991:4).

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Tabela 7.1 Evolução da produção de cana-de-açúcar, açúcar e álcool e participação dos carros a álcool na venda de automóveis no Brasil, 1974/75 a 2009/2010.

AnoCana-de-açúcar Açúcar Álcool % Venda

Carro Álc.*Mt TC Mt TC Bl TC

1974/75 74,5 6,7 0,6

1985/86 223,9 7,8 11,9 92,1

1974/86 200,5 16,4 1.883,3

1990/91 222,4 7,4 11,5 21,6

1986/91 (0,7) (5,1) (3,4)

1997/98 302,2 4,4 14,8 8,8 15,4 6,9 0,1

1991/98 35,9 100,0 33,9

2000/01 254,9 (17,8) 16,0 (17,5) 10,5 (19,8) 1,2

1998/01 (15,7) 8,1 (31,2)

2001/02 292,3 14,7 19,0 18,8 11,5 9,5 3,9

2002/03 316,1 8,1 22,4 17,9 12,5 8,7 6,5

2003/04 357,1 13,0 24,9 11,2 14,6 16,8 25,3

2004/05 381,4 6,8 26,6 6,8 15,2 4,1 55,5

2005/06 382,5 0,3 26,2 (1,5) 15,8 3,9 83,2

2006/07 428,8 12,1 30,7 17,2 17,9 13,3 90,6

2007/08 495,8 15,6 31,3 1,8 22,4 25,1 94,2

2008/09 563,6 13,7 31,3 0,1 27,6 22,9 95,4

2009/10 604,5 7,3 33,1 5,5 25,8 (6,6)

2001/10 137,2 106,9 145,7

1975/10 711,4 394,0 4.200,0

Mt = milhões toneladas; Bl = bilhões de litros; TC = taxa de crescimento.

Número entre parênteses indica valor negativo.

* A partir de 2003 incluem os modelos “flex fuel”.

Fonte: ALCOPAR (2007), ANFAVEA (2010), BACCARIN (2005), MAPA (2009), CONAB (2010b).

O segundo grupo de incentivo do Proálcool se deu através da fixação de preço do álcool acima de seu custo de produção, mes-mo que isso resultasse em preço do álcool ao produtor superior ao preço da gasolina. Neste caso, especialmente para o álcool hi-dratado (96,0% de pureza), usado nos motores a álcool e que à

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época consumiam de 25% a 30% a mais do que os motores a gaso lina, tornava-se obrigatória a prática do subsídio, venden-do-se o álcool ao consumidor por preço abaixo daquele pago ao produtor.7

O consumo do álcool contou com outro grupo de incentivos. Por decisão administrativa, foi-se aumentando o percentual de álcool anidro misturado à gasolina até 22%, em 1985. O desenvol-vimento tecnológico dos motores a álcool teve participação direta de órgãos públicos, especialmente o Centro Tecnológico da Aero-náutica (CTA) de São José dos Campos. A venda de carros movi-dos exclusivamente a álcool, iniciada em 1979, foi favorecida com a menor cobrança de impostos em relação aos carros à gasolina. Também se manteve o preço do álcool ao consumidor abaixo de 65% do preço ao consumidor da gasolina, além de outras medidas.

É importante se salientar que os estímulos à produção e à venda de carros com motores a álcool se fortaleceram na virada da década de 1970 para 1980, logo após o Segundo Choque do Petróleo de 1979. Em valores de 2002, o preço do barril de petró-leo passou de US$ 33,0, em 1978, para US$ 71,9, em 1979. Neste momento, o álcool passou a ser encarado pela CNAL mais efeti-vamente como uma das alternativas para enfrentar a crise energé-tica nacional.

A Tabela 7.1 revela que entre as safras 1974/75 e 1985/86 a produção de álcool no Brasil passou de 0,6 bilhão de litros para 11,9 bilhões de litros, crescimento de 1.883,3%. A quantidade de cana-de-açúcar moída aumentou em 200,5%, enquanto a produ-ção de açúcar cresceu tão somente 16,4%. O álcool, de posição secundária, transformara-se no principal produto do setor.

Nos dois primeiros anos do Proálcool, o aumento da produção de álcool contou com a ocupação da capacidade ociosa das desti-

7. Esse subsídio registrado, inicialmente, na chamada Conta Álcool e bancado pela Petrobras e pelo Tesouro Nacional, entre dezembro de 1981 e maio de 1990 alcan-çou valor de US$ 811,5 milhões, nas estimativas do TCU (1991).

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larias anexas já existentes. Logo maturaram os investimentos de reforma, ampliação ou instalação de novas destilarias, ainda nas unidades industriais já existentes, localizadas em regiões tradicio-nalmente produtoras de cana-de-açúcar. Até 1979 cresceu muito a produção e o consumo de álcool anidro, contribuindo para que o setor sucroalcooleiro superasse a crise no mercado de açúcar.

Após o Segundo Choque do Petróleo, instalaram-se novas agroindústrias, especialmente destilarias autônomas e os cana-viais avançaram sobre novas áreas, como o oeste de São Paulo e a Região Centro-Oeste. A venda de carros a álcool, iniciada timida-mente em 1979, disparou, ficando próxima a 92,1% do total dos carros vendidos, em 1986. O álcool anidro teve seu consumo pra-ticamente estabilizado, enquanto crescia fortemente o consumo do álcool hidratado.

7.2.2 O Proálcool em Marcha Lenta

Contrariando o ocorrido na década anterior e as expectati-vas iniciais, ao longo da década de 1980 os preços internacionais do petróleo caíram consideravelmente.8 Em consequência, a com- petitividade do álcool em relação à gasolina apresentou expres-siva redução. Se entre 1980 e 1985, o custo do álcool situava-se entre 22,2% a 55,3% acima do preço médio dos derivados do petróleo, de 1986 a 1990 esses valores foram de 104,0% a 190,0% (BACCARIN, 2005).

Além disso, o Brasil aumentou a produção nacional, reduzindo a importação de petróleo de 85,8% do consumo nacional, em 1979, para 49,8%, em 1989. Também, o grande consumo de álcool fazia com que sobrasse gasolina nas refinarias brasileiras, que a

8. A preços de 2002, depois de alcançar US$ 71,90, em 1979, o preço do barril de petróleo foi caindo gradativamente até o valor de US$ 45,10, em 1985, para depois despencar para valores entre US$ 22,00 e US$ 26,00, entre 1986 e 1989 (BACCARIN, 2005).

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Petrobras exportava a preços baixos. Em 1987, cerca da metade da gasolina produzida no Brasil foi exportada. Junto com os prejuízos da Conta Álcool, esses fatos levaram a estatal do petróleo a se mostrar desfavorável aos incentivos do Proálcool.

O apelo à produção de álcool, por ser nacional e substituir um produto caro e importado, foi perdendo conteúdo à medida que o petróleo ficava mais barato e era produzido, em grande par-te, internamente.

Diante dos baixos preços do petróleo, a viabilidade do álcool combustível, em substituição à gasolina, dependia do aumento do subsídio público ao seu consumo. Acontece que a década de 1980 foi marcada por profunda crise fiscal, o que restringia essa possibilidade. Na realidade, o que prevaleceu foi um ajuste orça-mentário que embutiu, entre outras medidas, cortes nos investi-mentos e nos subsídios de maneira geral. Especificamente para o setor sucroalcooleiro, foram eliminados os financiamentos subsi-diados para investimento e os reajustes aos preços do álcool, a partir de 1985, ficaram bem abaixo da inflação.9 Mesmo reduzin-do seus custos de produção em torno de 4% ao ano, o setor viu sua rentabilidade diminuir a partir daí (ANNICCHINO, 1989).

A reação dos empresários aos cortes dos financiamentos sub-sidiados para aumento da capacidade produtiva foi relativamente pequena, o mesmo não ocorrendo quanto aos preços. Neste caso, os empresários promoveram ação judicial, para que se cumprisse a Lei 4.870/65, que diz respeito à fixação do preço da cana-de-açúcar, açúcar e álcool em conformidade com seus custos de pro-dução. Tal processo se estende até a atualidade e tem valor esti-mado de R$ 50 bilhões.

A política desfavorável de preço do álcool fez com que o setor ficasse praticamente estagnado entre 1985/86 e 1990/91, como

9. O preço interno do álcool hidratado passou de R$ 1,32, em 1985, para R$ 0,73, em 1990, em valores de 2002 (UNICA, 2005, correção da inflação de BACCARIN, 2005).

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mostra a Tabela 7.1, com pequenas quedas na produção de açú-car, álcool e cana-de-açúcar. Na virada da década de 1980 para 1990 chegou a faltar álcool para o abastecimento do mercado in-terno, fazendo com que a porcentagem de álcool anidro misturado à gasolina fosse diminuída para 12%, em 1990, e tornando neces-sária a importação de etanol e metanol dos EUA e da Europa (COPERSUCAR, 1990:46).

Tais medidas não foram suficientes para regularizar a oferta no mercado interno, ocasionando a formação de longas filas para abastecimento dos carros a álcool nos postos de combustíveis. Como resultado, a venda de carros a álcool arrefeceu, se reduzindo para 21,6% da venda total da indústria automobilística, em 1991.

7.2.3 A Retomada do Açúcar

Em conformidade com a orientação básica da política econô-mica geral, promoveu-se processo de desregulamentação do setor sucroalcooleiro nos anos 1990, caracterizado por sua longa dura-ção e por constantes litígios em torno da nova normatização. Fo-ram comuns os adiamentos de medidas liberalizantes, a implan-tação de ações públicas compensatórias e as disputas jurídicas entre empresários e Governo Federal. O resultado final, em 2002, mostrava um setor, senão com o mesmo nível de regulamentação existente até 1990, pelo menos com maior regulamentação que os demais setores da agronegócio nacional (BACCARIN, 2005).

Em 1990 foi extinto o IAA e, em 1991, o Proálcool. O Gover-no Federal deixou de fixar cotas de produção para usinas, forne-cedores de cana-de-açúcar e estados produtores, praticamente abandonando o objetivo de assegurar a participação do Norte-Nordeste na produção setorial.10 Desde 1989 as exportações de

10. Medidas compensatórias, como o IPI diferenciado para o açúcar do Norte-Nor-deste, aprovado pelo Congresso Nacional em 1991, ou um adicional à produção sucroalcooleira dessa região, instituído em 1999, ou foram questionados na Jus-tiça ou tiveram pouco efeito prático.

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açúcar e de álcool já haviam deixado de ser monopólio público, sendo assumidas pela iniciativa privada.

A liberação dos preços teve início em julho de 1995, ao ser publicada a Portaria 189/95 do Ministério da Fazenda, fixando os preços da cana-de-açúcar, do mel residual, do álcool anidro e hi-dratado e do açúcar cristal standard, cuja produção era mínima. Dessa forma, os preços dos demais açúcares: cristal superior, es-pecial, especial extra, demerara e refinado granulado, que repre-sentavam a quase totalidade da produção, foram liberados. En-quanto o álcool apresentava baixos níveis de preço, o açúcar contava com boa remuneração no mercado internacional, daí a imediata liberação de seus preços, com a exceção já apontada.

Com vários adiamentos e negociações, a liberação de preços continuou pelos próximos quatro anos. Em 1997, os preços do álcool anidro e açúcar cristal standard deixaram de ser fixados publicamente e, em 1999, o mesmo aconteceu com a cana-de-açúcar e com o álcool hidratado.

A demora para liberação do preço do álcool esteve associada às condições desfavoráveis de seu mercado. O preço do litro do álcool anidro que, como já visto, havia caído entre 1985 e 1990, não se recuperou, chegando a R$ 0,65, em 1998. Por sua vez, os preços do petróleo mantiveram-se em valores reduzidos, em al-guns anos abaixo de US$ 20,00 o barril e sua produção nacional cresceu, alcançando-se nível de auto-suficiência de 76%, em 2000.

Outro fato negativo para a produção de álcool foi que, ao lon-go dos anos 1990, a indústria automobilística brasileira, na prática, deixou de ser aliada do setor sucroalcooleiro. Sua principal deci-são estratégica foi o desenvolvimento e a produção dos chamados automóveis populares de 1.000 cilindradas, que não apresenta-vam favorecimento tributário para os modelos a álcool e que se-quer foram produzidos pela maioria das montadoras.

As dificuldades enfrentadas no mercado de álcool, até certo ponto, foram compensadas pela melhoria no mercado interna-

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cional do açúcar, sendo que o preço do açúcar demerara passou, entre 1985 e 1990, de US$ 89,64 para US$ 277,04 por tonelada (VEIGA FILHO & YOSHII, 1994). Estes preços se mantiveram em condições vantajosas, acima de US$ 200,00/t, até 1998, fazen-do com que o setor redirecionasse sua produção para o açúcar, em detrimento do álcool, acentuando a crise de abastecimento nos postos de combustíveis.11 Enquanto em 1990/91, 22,5% da produção interna de açúcar eram destinados à exportação, em 1997/98 esse valor saltara para 56,4%. Neste momento, o Brasil se transformara no maior exportador mundial do produto.

A Tabela 7.1 revela que entre 1990/91 e 1997/98 a produção do açúcar aumentou em 100,0%, enquanto o álcool teve cres-cimento bem menor, de 33,9%, não atendendo a necessidade de consumo interno, especialmente enquanto a frota de carros a álcool continuava crescendo, o que se observou até 1994. De 1990 a 1997 foi grande a importação líquida de álcool (inclusive meta-nol) pelo Brasil, em uma média anual de 1,2 bilhão de litros.

Os baixos preços do petróleo e de seus derivados, as dificul-dades de abastecimento do mercado interno de álcool e a ausência de incentivos tributários aos carros a álcool serviram de desestí-mulo à sua compra que, depois de certa recuperação no início da década de 1990, caiu para 0,1% da venda total da indústria auto-mobilística, em 1997 e 1998. Também a frota de carros a álcool diminuiu, mostrando que seu sucateamento estava sendo maior que sua reposição. Com isso, em 1998, praticamente, já não foi mais necessária a importação de álcool combustível, que se resu-miu a 15 milhões de litros, em termos líquidos.

11. Para garantir maior quantidade de álcool no mercado interno, tentou-se contro-lar a exportação de açúcar através da instituição de um Imposto de Exportação. Os empresários sucroalcooleiros, entretanto, conseguiram se livrar de tal medida através de ações na justiça (BACCARIN, 2005).

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7.2.4 O Fundo do Poço do Álcool

Inversamente aos anos anteriores, começava a se configurar em 1998 excesso de produção nacional de álcool. Seu consumo, que havia alcançado 15,0 bilhões de litros em 1996, vinha caindo a partir de então, seguindo nessa trajetória até 2001, quando atin-giu o mínimo de 11,6 bilhões de litros (MAPA, 2009). Os empresá-rios sucroalcooleiros conseguiam comercializar, em 1998, apenas 19% do álcool na mesa de comercialização do Governo Federal, que contava com preço fixado para o álcool hidratado. Os 81% restantes foram comercializados em contratos firmados direta-mente com as distribuidoras de combustíveis, sem a interme-diação governamental, por valores abaixo do preço de tabela, ou ainda no mercado “spot”, com preços ainda menores.

No momento da liberação do preço do álcool hidratado, em 1999, a superprodução de álcool, estimada em 1,8 bilhão de litros, se evidenciou com toda força, fazendo com que seu preço caísse para R$ 0,48/litro (em valores de 2002, conforme Baccarin, 2005), menor valor de toda década de 1990.

A crise que se instalou levou à organização de várias mobiliza-ções nos estados produtores, culminando com ato público em ju-nho de 1999, em Brasília. Em resposta, algumas medidas foram implementadas, como a proibição do uso do MTBE como aditivo à gasolina e sua substituição pelo álcool, a instituição da chamada frota verde (carros oficiais movidos a álcool), a isenção do paga-mento de IPVA por três anos dos carros a álcool vendidos até de-zembro de 1999 no Estado de São Paulo e o aumento dos estoques oficiais de álcool, nenhuma delas, contudo, com grande alcance.

A grande maioria dos empresários sucroalcooleiros do Cen-tro-Sul, responsáveis por 85% da produção regional de álcool, em março de 1999, criou a Brasil Álcool S.A., com o objetivo de ex-portar seu excedente de álcool, estimado em 1,3 bilhão de litros, tendo conseguido exportar 400 milhões de litros durante o ano. Outra iniciativa, tomada por 180 agroindústrias sucroalcooleiras, foi a constituição da Bolsa Brasileira de Álcool Ltda. (BBA), para

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intermediar e tentar disciplinar a venda para o mercado interno de álcool de suas associadas. Essas duas experiências alcançaram apenas parcialmente seus objetivos e tiveram vida curta. “Em ses são de julgamento de 22/11/2000, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) considerou que as mesmas caracte rizavam-se como cartéis e ordenou a sua desconstituição”. (BACCARIN, 2005:159)

Conforme revela a Tabela 7.1, entre 1998/99 e 2000/01 a pro-dução de álcool caiu em num total de 31,2%. Ocorreu leve recu-peração na venda dos carros a álcool, o que não impediu que sua frota continuasse caindo, de forma que a expectativa predomi-nante à época era que o mercado de álcool, cada vez mais, se re-sumiria ao álcool anidro, usado como aditivo à gasolina.

A crise só não foi maior por que no mercado de açúcar os preços, embora menores dos que os vigentes até 1997, ficaram en-tre US$ 150,00 e US$ 200,00/t. A desvalorização cambial do início de 1999 também contribuiu com as exportações de açúcar, que alcançaram 69,7% da produção nacional na safra 2000/01. A pro-dução brasileira de açúcar, entre 1998/99 e 2000/01, cresceu 8,1%, não compensando o decréscimo da produção de álcool, de forma que a produção de cana-de-açúcar caiu 15,7% nesse período.

7.2.5 A Retomada Sucroalcooleira

Uma série de fatores favoreceu a retomada vigorosa da pro-dução sucroalcooleira após a safra 2000/01. No campo institu-cional merece destaque a aprovação da Lei 10.336/2001, que criou a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE), e da Lei 10.453/2002 (Lei do Álcool) que, respectivamente, garan-tiram que a gasolina ficaria sujeita à maior tributação, dando maior competitividade ao álcool combustível,12 e que parte dos

12. No final de 2002 a alíquota específica da CIDE para a gasolina era de R$ 860,00/m3, contra apenas R$ 37,20/m3 do álcool combustível. A política de subsídio cruzado

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recursos arrecadados poderia ser utilizada nos subsídios de pre-ços, estocagem e transporte do álcool ou mesmo para a equalização de custos da cana-de-açúcar entre as regiões produtoras. Tam-bém se garantiu, através da Lei 10.203/2001, que o percentual de álcool anidro misturado à gasolina deveria se situar entre 20% e 24% (posteriormente, elevado para 25%).

O aumento do preço internacional de petróleo, ultrapassando US$ 35/barril,13 contribuiu para que o álcool, mesmo sem subsí-dio público, mostrasse-se competitivo à gasolina. O lançamento, em 2003, pela indústria automobilística no Brasil dos veículos “flex fuel” ou bicombustíveis, que podem usar tanto gasolina como álcool ou ainda qualquer mistura entre ambos, fez com que as vendas de carros que podem ser abastecidos com álcool hidra-tado ultrapassassem 80% das vendas totais em apenas quatro anos (vide Tabela 7.1). O consumo nacional de álcool voltou a crescer a partir de 2001, atingindo 19,6 bilhões de litros, em 2008 (MAPA, 2009).

A decisão de alguns países de adicionarem álcool à gasolina, por razões ambientais, vem possibilitando que as exportações bra-sileiras de álcool atinjam patamares jamais alcançados anterior-mente. Em 2004 as exportações de álcool foram de 2,4 bilhões de litros, passando para 5,1 bilhões de litros, em 2008 (MME, 2009).

No mercado de açúcar, as exportações contaram com câm-bio relativamente favorável até a safra de 2004. Em 2005, os pre-ços in ter nacionais do produto superaram novamente a casa dos US$ 200,00/tonelada e no início de 2006 chegaram a atingir US$ 400,00/t. Da metade de 2006 ao final de 2008, os preços internacionais variaram entre US$ 200,00 e US$ 300,00/t (MME,

entre gasolina e álcool, administrada pela Petrobras e que recebeu diferentes nomes ao longo do tempo (Conta Álcool, Fundo de Uniformização de Preços, Parcela de Preço Específica), com a CIDE, ganhava força de lei.

13. Estimativa corrente indica que o álcool da cana-de-açúcar produzido no Brasil mostra-se competitivo com a gasolina quando o preço do barril de petróleo atinge US$ 35,00 (MACEDO, 2007).

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2009). Em 2008, as exportações de açúcar representaram 62,2% da produção nacional da safra 2007/08 (MAPA, 2009).

Os indicadores da Tabela 7.1 mostram que, entre 2000/01 e 2009/10, a produção de cana-de-açúcar cresceu 137,2%, a de açúcar 106,9% e a de álcool cresceu 145,7%. Nesta fase, o núme-ro de agroindústrias voltou a crescer. Durante o Proálcool, o nú-mero de usinas e destilarias havia passado de 225, na safra 1974/75, para 366, na safra 1984/85, e 394, na safra 1990/91. Du-rante o processo de desregulamentação, esse número se reduziu para 306, em 2001/02. Já na safra 2009/10, o número de destila-rias e usinas havia alcançado 482 unidades (BACCARIN, 2005, PROCANA, 2010).

A frota de carros a álcool atingira 4.228.000 unidades em 2000, representando 21,0% do total da frota brasileira de veículos leves. Em 2003, a frota de carros a álcool se reduzira para 3.993.839 unidades, 18,3% da frota nacional. Daí em diante, já acrescida dos veículos bicombustíveis, a frota de carros a álcool voltou a crescer, alcançando 12.243.506 unidade em 2009, 41,4% da frota nacional de veículos leves (ANFAVEA, 2010).

7.2.6 Questões Atuais e Perspectivas

A situação brasileira na produção de etanol é única no mundo. Acumulou-se muita experiência no processo produtivo, tanto agrícola quanto industrial, consegue-se produzir com custos alta-mente competitivos, vis a vis o preço atual do petróleo e conta-se com consumo interno em crescimento, acompanhando a expan-são da frota de carros “flex fuel”. A produção conjunta do açúcar, cujos preços têm se mantidos em patamares elevados, é outro fa-tor a beneficiar o etanol, na medida em que contribui para a ren-tabilidade setorial.

Sob o ponto de vista ambiental, a cana-de-açúcar apresenta capacidade de absorção de dióxido de carbono e balanço energé-tico bem mais positivos que outras matérias primas para o etanol,

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como o milho. Ao mesmo tempo, o álcool em mistura com a gaso lina ou usado sozinho, contribui para redução da poluição atmos férica originada dos motores à explosão. A redução da área de cana colhida queimada, que ora se observa, ajuda a reforçar a imagem positiva do etanol como um combustível renovável e pouco agressivo ao meio ambiente.

Corriqueiramente, anunciam-se novos investimentos de gru-pos nacionais e estrangeiros no setor sucroalcooleiro, vários deles ultrapassando a cifra de R$ 1,0 bilhão. Estudo recente da Empresa de Pesquisa Energética do Ministério de Minas e Energia projeta que, em 2017, fruto de investimentos na casa dos US$ 95,3 bi-lhões estarão funcionando 620 agroindústrias sucroalcooleiras no Brasil, moendo 988 milhões de toneladas de cana-de-açúcar, produzindo 44,3 milhões de toneladas de açúcar e 55,5 bilhões de litros de álcool14 (EPE, 2008).

Outra perspectiva bastante concreta é que a comercialização de energia elétrica a partir da queima do bagaço de cana-de-açú-car, que hoje representa menos que 1% da renda bruta setorial, passe a ter maior importância econômica, alcançando 10% dessa renda. Também há expectativa que se possa produzir álcool a partir da celulose, contida no bagaço e nas pontas da cana-de-açúcar, embora isso ainda não seja economicamente viável e dependa de avanços tecnológicos.

Se confirmada, uma preocupação que se tem com essa grande expansão sucroalcooleira diz respeito aos prováveis efeitos da área usada pela cana-de-açúcar sobre outras atividades agropecuárias e reservas florestais. Considerando-se um crescimento da produ-ção de cana-de-açúcar por área de 20% entre 2007 e 2017, seria necessário se incorporarem 6,5 milhões de hectares adicionais à

14. Desse total, estima-se que cerca de 2,7 bilhões de litros não seriam usados para fins carburantes, mas teriam como destino a indústria de bebidas, farmacêutica e, especialmente, a indústria química, com o álcool substituindo a nafta como matéria-prima em cadeias termoplásticas.

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área plantada com cana-de-açúcar na safra 2006/07, para se atin-gir a produção prevista de 988 milhões de toneladas, em 2017.

A princípio, o Brasil apresentaria grande possibilidade de ex-pansão da lavoura canavieira, bem como de outras culturas agro-energéticas, em áreas com baixo ou nenhum aproveitamento e sem comprometer áreas de florestas. Os dados do Censo Agrope-cuário 2006 indicam que da área de 329,9 milhões de hectares dos estabelecimentos agropecuários, 79,8 milhões ha (21,6%) eram usados para lavouras, 158,8 milhões ha (48,1%) para pastagens, 98,5 milhões ha (29,8%) possuíam matas e 1,3 milhão ha (0,5%) tinham outros usos (IBGE, 2009). Esses números apontam para a possibilidade de não se reduzir a área com matas e ampliar a área de lavouras, inclusive cana-de-açúcar, substituindo área de pasta-gens. Isso poderia se dar sem comprometimento da produção de carne bovina, desde que ocorressem melhorias na qualidade das pastagens restantes.

Contudo, é importante se levar em conta que a expansão da lavoura canavieira está se concentrando em área restrita, envol-vendo o oeste do Estado de São Paulo, norte paranaense, Triân-gulo Mineiro e regiões dos estados do Centro-Oeste. Aí o uso da terra é mais intenso e a expansão da lavoura canavieira tende a afetar áreas de outras lavouras e pressionar ainda mais as reservas florestais, que, muitas vezes, se apresentam em porcentagem abaixo daquela imposta pelo Código Florestal.

7.3 O PROJETO BIODIESEL

O programa do etanol surgiu com os empresários detendo o conhecimento do processo produtivo industrial e de sua matéria prima, a cana-de-açúcar.15 Também havia estrutura produtiva já

15. As tentativas que ocorreram para se usar outro tipo de matéria prima para produção de álcool, como a mandioca e o sorgo, acabaram não se viabilizando economicamente.

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montada que, segundo as estimativas da época, permitia a pro-dução imediata de 1,2 ou 1,8 bilhão de litros de álcool. Aliás, essa estrutura serviu como base de apoio para que os empresários ca-navieiros reivindicassem e conseguissem a instituição do Proál-cool pelo Governo Federal. No caso do biodiesel nenhuma dessas condições estava presente no momento de lançamento do Pro-grama Nacional de Produção e Uso do Biodiesel.

Partiu-se da constatação que é crescente a demanda mundial e que o Brasil tem possibilidade de produzir várias matérias-pri-mas agropecuárias para obtenção do biodiesel. Também se leva-ram em conta alguns estudos e testes que mostram que o biodiesel não exige adaptações e nem causa problemas de desempenho ou durabilidade aos motores convencionais, além de ser menos po-luente que o diesel de petróleo.16

Entre as empresas, há interesse evidente da Petrobras, que vem procurando diversificar sua produção, indo além da produção de petróleo e derivados. O incentivo ao biodiesel se adequa à sua estra-tégia de se apresentar como empresa menos poluidora e preocupada com o meio ambiente, além de diminuir a necessidade de importação de diesel de petróleo que, entre 2000 e 2005, ficou na casa dos 11,5% do consumo nacional (MME, 2006). Por sua vez, empresas priva-das têm se constituído para atuarem na produção de biodiesel.

Há várias matérias-primas citadas como passíveis de serem transformadas em biodiesel, como mamona, soja, dendê (palma), babaçu, girassol, gordura bovina e outras. Contudo, permanecem pendentes questões relativas ao seu rendimento agronômico, in-dustrial e econômico, não podendo assumir-se com convicção quais as mais adequadas para a produção de biodiesel.17 Deve-se

16. “Vários estudos indicam que o uso de 1 quilo de biodiesel reduz em cerca de 3 quilos a quantidade de CO2 na atmosfera. As emissões de poluentes do biodiesel são de 66% a 90% em relação ao biodiesel convencional” (OLIVEIRA, 2007).

17. Esse fato, inclusive, fez com que se criasse, no âmbito do Programa Biodiesel, a Rede Brasileira de Tecnologia do Biodiesel, envolvendo instituições de 23 esta-dos com o objetivo de desenvolver novas pesquisas agronômicas e de processo industrial.

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considerar também que a maior parte dessas matérias-primas têm usos alternativos, que podem se mostrar mais atrativos e co-locar em risco seu fornecimento para produção de biodiesel.

O arranjo institucional do Programa Biodiesel contempla um Comitê Gestor, composto por 14 ministérios, pela Agência Na-cional do Petróleo, Petrobras, Embrapa e BNDES e com gestão operacional do Ministério de Minas e Energia (MME). A instala-ção das agroindústrias conta com linha especial de financiamento do BNDES, além de linhas específicas, entre elas o PRONAF Bio-diesel, para custeio das lavouras.

Também se concedem incentivos tributários à produção do biodiesel, diferenciados por região de plantio, por matéria prima empregada e categoria social do agricultor (empresário rural ou agricultor familiar). Nesse sentido, o Ministério do Desenvolvi-mento Agrário mantém programa para concessão do Selo Com-bustível Social àquelas agroindústrias que adquiram um mínimo de sua matéria-prima e forneçam assistência técnica a agricul-tores familiares, sendo que tais empresas são retribuídas com meno res alíquotas tributárias e financiamentos públicos em con-dições mais favorecidas.

Alguns anos após seu lançamento, os indicadores apontam que o Programa Biodiesel conseguiu alcançar a produção neces-sária para o atendimento da Lei 11.097/05, saindo de menos de 100 milhões de litros, em 2006, para 1.600 milhões de litros, em 2009 (MME, 2010). Aliás, isso permitiu que o que estava previsto apenas para 2013 fosse antecipado para 2010, ou seja, já vem ocorrendo a mistura de 5% do biodiesel no diesel de petróleo co-mercializado no Brasil.

Em parte, menos significativa, a produção de biodiesel vem sendo obtida em unidades da Petrobras,18 que prevê produzir

18. Em 2006 instalaram-se duas unidades experimentais da Petrobras no município de Guamaré (RN). Entre 2007 e 2008, outras três unidades industriais foram concluídas, em Candeias (BA), Montes Claros (MG) e Quixadá (CE), para pro-dução de 57 milhões de litros de biodiesel por ano.

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855 milhões de litros de biodiesel, em 2011. A parte mais signi-ficativa da produção de biodiesel, contudo, provém de empresas privadas, que através de leilões feitos pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, adquirem cotas para fornecimento de biodiesel à Petrobras, para comercialização imediata ou para estoques reguladores.

Em julho de 2010, estavam funcionando no País 50 unidades produtoras, com capacidade de produzir 4,7 bilhões de litros de bio diesel por ano (MME, 2010). Projeta-se uma produção de 2,4 bi lhões de litros de biodiesel em 2010, ou seja, pouco mais da metade da capacidade instalada.

Tal situação leva a supor que os empresários pressionarão pelo aumento da porcentagem de biodiesel no diesel. Isso encontra um limite evidente no fato de que, nas condições atuais, o biodiesel não se mostra competitivo, sendo que seu preço ao produtor tem ficado na faixa de R$ 2,30 contra R$ 1,40 do diesel de petróleo.

Em relação à matéria prima empregada, as informações dis-poníveis indicam que a soja tem se constituído na principal fonte, com participação em torno de 80%, seguida pela gordura bovina, com 15% (MME, 2010). A aposta inicial de uso da mamona, oriunda da agricultura familiar, como matéria prima para biodiesel não se concretizou.

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8 MUDANÇAS NA ESTRUTURA AGRÁRIA

A partir desse capítulo, a preocupação básica é abordar os principais resultados sociais e econômicos alcançados pelo Sistema de Produção Agropecuário Brasileiro de 1990 (em alguns casos, 1980) em diante, apresentando-se uma série de indicadores e ana-lisando seus condicionantes.

Especificamente para este capítulo a análise é baseada, quase que totalmente, nos dados das últimas edições do Censo Agrope-cuário no Brasil, cujo levantamento fica a cargo do Instituto Bra-sileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O último Censo foi rea-lizado em 2007, com base nas informações de 2006. Também se utilizam outras fontes de informação, como as do MDA/INCRA, do MME e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), também a cargo do IBGE.

Para caracterização da estrutura agrária brasileira são consi-derados os seguintes indicadores: distribuição da posse (dos esta-belecimentos agropecuários) e da propriedade (dos imóveis ru-rais) da terra, utilização da terra, acesso às tecnologias e políticas públicas e composição e nível da ocupação agropecuária. De forma complementar, a análise é desagregada para as grandes regiões geo-gráficas, com intuito de se mostrar algumas de suas diferenças.

8.1 ESTRUTURA FUNDIÁRIA

Como já visto, a formação histórica da agricultura brasileira, de maneira geral, resultou em altos índices de concentração da posse e da propriedade da terra. A modernização tecnológica não alterou, significativamente, esses indicadores, tendo mesmo se verificado o aumento do tamanho médio de estabelecimentos

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agro pecuários em atividades como o cultivo de grãos no Centro-Oeste e da cana-de-açúcar em São Paulo.

A Tabela 8.1 apresenta indicadores da distribuição da posse da terra no Brasil, entre 1980 e 2006. Preliminarmente, deve-se dizer que os dados de 1995/96 foram coletados a partir do mês de agosto, enquanto em 1980 e 1985 isso se dava a partir de janei-ro, em plena safra do Centro-Sul. Como salientam Hoffmann e Graziano da Silva (1998), com isso se deixou de captar, em 1995/96, informações daqueles estabelecimentos sob responsabi-lidade de parceiros ou arrendatários com natureza precária e transitória e que não estavam em atividade no momento da coleta dos dados, ocasionando subestimação de alguns indicadores, como número de estabelecimentos, de pessoas ocupadas e de área de culturas temporárias. A coleta de dados do Censo 2007 ini-ciou-se em abril e levantou informações do ano anterior, fatos que apontam para a necessidade de se tomar algum cuidado nas comparações com os censos precedentes, cujos dados dizem res-peito ao próprio ano de sua realização.

Tabela 8.1 Distribuição da terra entre estabelecimentos agropecuários, Brasil, 1980 a 2006.

IndicadorAno

1980 1985 1995/96 2006

No Estabelecimento 5.151.155 5.793.004 4.859.865 5.175.489

Área Total (mil ha) 364.854 374.925 353.611 329.941

Área Média (ha) 70,8 64,7 72,8 63,7

Área Mediana (ha) 9,7 8,4 10,1 9,7

50– (cinquenta menos) 2,4 2,3 2,3 2,3

5+ (cinco mais) 69,3 69,0 68,8 69,3

Índice de Gini 0,857 0,857 0,856 0,854

Fonte: HOFFMANN & GRAZIANO DA SILVA (1998), HOFFMANN & NEY (2010),IBGE (2009).

Entre 1980 e 1985 o número de estabelecimentos agropecuá-rios cresceu relativamente mais do que a área total, de forma que

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a área média diminuiu. Esse aumento se deu, basicamente, no Nordeste e esteve associado à crise econômica e ao grande de-semprego industrial observados no período, o que fez com que se reduzisse e até invertesse o fluxo migratório do Nordeste para o Centro-Sul.

Por sua vez, o decréscimo no número e na área dos estabeleci-mentos entre 1985 e 1995/96, em grande parte, deve ter se originado da mudança da data de coleta de dados citada. Já o acréscimo no número de estabelecimentos entre 1995/96 e 2006 pode estar cap-tando o aumento dos assentamentos rurais e a expansão de peque-nas chácaras e sítios de recreio (HOFFMANN & NEY, 2010).

Os indicadores de concentração da posse da terra mostram valores muito altos. Assim, a área média mostrava-se cerca de sete vezes superior a área mediana, fazendo com que a participação dos 50% menores estabelecimentos na área total se resumisse a 2,3% ou 2,4%. Enquanto isso, a participação dos 5% maiores era de cerca de 69,0%. O Índice de Gini1 confirma a alta concentra-ção, mostrando-se superior a 0,85 em todo o tempo.

Em relação às propriedades rurais podem-se usar informa-ções cadastrais do INCRA. Dados da Tabela 8.2 mostram que, em 2003, existiam 4.238.447 imóveis rurais no Brasil, ocupando área de 420.345 mil hectares, pouco menos da metade do territó-rio nacional, com área média de 99,2 hectares. As propriedades até 50 hectares representavam 73,7% do número de imóveis e ocupavam apenas 12,0% de sua área. Já os imóveis maiores que 1.000 hectares, embora fossem apenas 1,7% do número total, ocupavam 43,7% da sua área. Como na posse da terra, os indica-dores de distribuição das propriedades rurais mostram altos ní-veis de concentração.

1. O Índice de Gini é muito utilizado para medir a distribuição de determinada variá vel entre a população. Quando igual a zero revela perfeita distribuição dessa variável, quando igual a unidade indica concentração extrema.

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Tabela 8.2 Distribuição da terra no Brasil entre propriedades rurais de diferentes estratos de áreas, 2003.

Estrato de Área (ha)

Quantidade de Imóveis Área Total ÁreaMédia (ha)Número % Mil ha %

Até 10 1.338.771 31,6 7.616 1,8 5,7

10-50 1.787.236 42,1 43.127 10,2 26,3

50-100 485.482 11,5 33.630 8,0 69,3

100-500 482.677 11,4 100.216 23,8 207,6

500-1.000 75.158 1,8 52.191 12,4 694,4

Mais 1.000 69.123 1,7 183.564 43,7 2.746,3

Total 4.238.447 100,0 420.345 100,0 99,2

Fonte: DIEESE/NEAD (2006), com base em dados do INCRA.

Levando em conta o conceito de módulo rural,2 dados de 1998 revelam que as grandes propriedades (área superior a 15 módulos rurais) ocupavam 57,4% da área total de imóveis rurais no Brasil, as médias (entre 4 e 15 módulos rurais), 19,2%, as pequenas pro-priedades (entre 1 e 4 módulos), 14,7% da área e os minifúndios (menos que um módulo) ocupavam 7,5% da área. Havia ainda 1,3% de imóveis sem classificação (DIEESE/NEAD, 2006).

8.2 UTILIZAÇÃO DA TERRA

Ao considerar-se o conceito área trabalhada, resultado da soma da área de lavouras permanentes e temporárias, pastagens plantadas e matas reflorestadas, observa-se, conforme Tabela 8.3, que hou-ve melhoria do nível de utilização da terra no Brasil entre 1980 e 2006. De 1980 a 1995/96 isso se deveu, basicamente, à ampliação da área com pastagens plantadas, indicando melhoria tecnológica na exploração pecuária. De 1995/96 a 2006 foi mais importante o crescimento da área com lavouras.

2. A diferença entre o módulo rural e o módulo fiscal é que o primeiro diz respeito ao estabelecimento rural individualmente, enquanto o segundo é um valor médio para cada município.

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Tal crescimento, de fato, pode estar superestimado, posto que o registro de apenas 41,8 milhões de hectares de área de lavouras em 1995/96, abaixo daquela constatada nos dois censos anterio-res, pode se dever ao período de coleta dos dados censitários, que levou a sua subestimativa em 1995/96. Assim, para a safra 1995/96, conforme pode ser visto adiante no capítulo 10, a área plantada apenas com grãos no Brasil foi de 36,97 milhões de hectares, o que somada a áreas de outras culturas temporárias ultrapassaria, em muito, os 34,3 milhões de hectares registrados no Censo Agropecuário 1995/96.

Em 2006, 48,1% da área dos estabelecimentos agropecuários estavam ocupados com pastagens, a maior parte plantada, 18,1% com lavouras e 29,9% com matas, sendo que a grande maioria eram matas naturais.

Tabela 8.3 Utilização da terra dos estabelecimentos agropecuários no Brasil, 1980 a 2006.

CategoriaAno

1980 1985 1995/96 2006

Lavouras 49,1 (13,5) 52,1 (13,9) 41,8 (11,8) 59,8 (18,1)

Permanentes 10,4 9,9 7,5 11,6

Temporárias 38,6 42,2 34,3 48,2

Pastagens 174,5 (47,8) 179,2 (47,8) 177,7 (50,2) 158,8 (48,1)

Naturais 113,9 105,1 78,0 57,3

Plantadas 60,6 74,1 99,7 101,4

Matas 88,2 (24,2) 89,0 (23,7) 94,3 (26,7) 98,5 (29,9)

Naturais 83,2 83,0 88,9 94,0

Reflorestadas 5,0 6,0 5,4 4,5

Área não Utilizada 33,4 (9,1) 35,2 (9,4) 24,7 (7,0) 6,8 (2,1)

Área Inaproveitável 19,7 (5,4) 19,4 (5,2) 15,1 (4,2) 6,1 (1,8)

Total 364,9 374,9 353,6 329,9

Área Trabalhada 114,7 (31,4) 132,2 (35,3) 146,9 (41,5) 165,7 (50,2)

Área Trabalhada = Área de Lavouras + Pastagens Plantadas + Matas Reflorestadas.

Fonte: IBGE (1984, 1991, 1998, 2009). Número entre parênteses indica porcentagem do total.

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8.3 TECNIFICAÇÃO E ACESSO A POLÍTICAS PÚBLICAS

A modernização da agricultura brasileira levou à maior in-corporação de tecnologias mecânicas e químico-biológicas. A Ta-bela 8.4 mostra que entre 1980 e 1995/96 o número de tratores na agricultura brasileira aumentou em 259 mil ou 47,5%. Para efei-tos comparativos, na década de 1970, quando o volume de crédito rural foi muito mais expressivo, o número de tratores havia cres-cido 379 mil ou 228%.

Tabela 8.4 Uso de tratores nos estabelecimentos agropecuários brasi-leiros, 1980 a 2006.

IndicadorAno

1980 1985 1995/96 2006

1.000 tratores 545 652 804 821

Estabelecimento com trator (%) 7,0 7,2 9,5 10,2

Área/trator (ha) 682 575 440 395

Fonte: IBGE (1984, 1991, 1998, 2009).

Já entre 1995/96 a 2006 constatou-se pequeno aumento no número de tratores, na casa de 16 mil unidades. Embora com leve melhora em relação a 1995/96, observa-se que em 2006, apenas 10,2% dos estabelecimentos rurais no Brasil possuíam tratores, revelando que a sua grande maioria estava excluída do uso dessa tecnologia, ou dependia do seu aluguel junto a tercei-ros. É importante levar em conta que tratores são bens de capital ou de investimento, com preços relativamente altos em face à renda de grande parte dos agricultores brasileiros.

O emprego de tecnologia química/biológica, composta por bens de custeio, de maneira geral, se mostrou mais generalizado que a tecnologia mecânica, como revela a Tabela 8.5. Não se en-controu maiores explicações para a queda no número de estabele-cimentos que usavam fertilizantes (químicos, orgânicos, adubação verde) e agrotóxicos em 2006 relativamente a 1995/96. Um ponto

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que chama a atenção é a pequena porcentagem de estabelecimen-tos que usavam calcário, fato pouco condizente a natureza ácida das terras agrícolas no País. De maneira geral, o uso de tecnologia químico/biológica estava muito longe de se generalizar entre os estabelecimentos agropecuários brasileiros.

Tabela 8.5 Proporção de estabelecimentos rurais com uso de tecnologias químicas/biológicas no Brasil, 1980 a 2006.

Tipo de TecnologiaAno

1980 1985 1995/96 2006

Fertilizantes 26,1 31,6 38,2 35,5

Calcário 5,4 5,8 12,0 15,8

Agrotóxicos 38,4 33,5 35,3 30,0

Defensivos Animais 42,6 37,4 50,3 51,1

Fonte: IBGE (1984, 1991, 1998, 2009).

Em relação a outras tecnologias e acesso a políticas públicas, a Tabela 8.6 revela que a prática de conservação de solo ampliou sig-nificativamente entre 1980 e 2006, mas ainda 2/3 dos estabeleci-mentos agropecuários no Brasil não a adotavam neste último ano. A porcentagem de estabelecimentos com uso de irrigação, embora tenha crescido, ainda mostrava valor muito pequeno em 2006.

Tabela 8.6 Proporção de estabelecimentos rurais com uso de tecnolo-gias ou contemplados com políticas públicas no Brasil, 1980 a 2006.

Tipo de Tecnologia ouPolítica Pública

Ano

1980 1985 1995/96 2006

Conservação do Solo 13,0 12,6 29,6 33,0

Irrigação 3,6 4,1 5,9 6,3

Energia Elétrica 10,4 16,9 40,0 68,1

Assistência Técnica – 10,7 19,5 24,0

Crédito Rural 21,0 12,6 5,3 15,1

Fonte: IBGE (1984, 1991, 1998, 2009).

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Entre 1980 e 2006 aumentou em mais de seis vezes a por-centagem de estabelecimentos com uso de energia elétrica. Consi derando-se dados de outra fonte (MME, 2010:72), fica-se sabendo que o consumo de energia elétrica pela agropecuária foi de 573 mil tep (toneladas equivalente de petróleo), em 1990, o que representava próximo a 9,5% do consumo total de energia elétrica pelos setores econômicos. Em 1996, esse valor tinha se ampliado para 847 mil tep, 11,6% do consumo total, alcançando 1.349 mil tep, 15,1% do consumo total de energia elétrica, em 2009.

A porcentagem de estabelecimentos rurais contemplados com assistência técnica aumentou entre 1985 e 2006, embora mostrasse valor ainda muito baixo nesse último ano. É importante se dizer que, enquanto em 1985, 52,7% da assistência técnica recebida pe-los estabelecimentos rurais eram provenientes de instituições pú-blicas, em 2006 esse valor tinha se reduzido para 39,5%. Neste último ano, a assistência técnica também provinha do próprio es-tabelecimento (em 20,1% dos casos), de cooperativas (18,1%), de empresas integradoras (12,3%) e de outras fontes (9,7%).

Acompanhando a diminuição do volume de crédito desti-nado à agricultura brasileira, caracterizado em capítulo anterior, observa-se forte redução na porcentagem de estabelecimentos agropecuários que usaram esse recurso entre 1980 e 1995/96. Como já visto, os anos de 1995 e 1996 foram aqueles em que se registraram os menores valores de crédito rural na década de 1990, ao que se junta à data de coleta dos dados censitários, o que pode ter subestimado esse indicador em relação ao restante da década de 1990.

De 1995/96 a 2006 aumentou significativamente o número de estabelecimentos agropecuários com acesso a crédito rural, em-bora a grande maioria continue excluída dessa política pública. Esse crescimento recente está associado à criação do PRONAF, em 1996, e à recuperação do volume de crédito rural observada na década inicial do Século XXI.

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8.4 OCUPAÇÃO AGROPECUÁRIA

Os dados da Tabela 8.7 indicam que, entre 1980 e 1985 o número de pessoas ocupadas na agricultura brasileira cresceu 10,5%, entre 1985 e 1995/96 apresentou queda de 23,4% e, entre 1995/96 e 2006, queda menor, de 9,5%. O crescimento no pri-meiro quinquênio, em grande parte ocorrida no Nordeste, decor-reu do baixo dinamismo do setor urbano-industrial no período. O decréscimo no decênio seguinte, descontada a subestimativa pela mudança da data de coleta de dados, se deveu ao fato de que a área plantada com lavouras não cresceu entre 1985 e 1995/96 e à continuidade da modernização tecnológica, parti-cularmente o uso de tração mecânica.

Tabela 8.7 Crescimento relativo da Ocupação Agrícola entre 1980 e 2006 e Pessoas Ocupadas em 2006 nas grandes regiões brasileiras.

RegiãoCrescimento Porcentual

Pessoas Ocupadas 20061980/1985 1985/1996 1996/2006

Norte 39,1 (24,2) (10,9) 1.655.645

Nordeste 11,9 (21,4) (6,6) 7.698.631

Sudeste 9,9 (27,4) (10,3) 3.282.962

Sul 2,2 (24,7) (16,1) 2.920.420

Centro Oeste (7,3) (18,3) (5,1) 1.009.886

Brasil 10,5 (23,4) (9,5) 16.567.544

Fonte: IBGE (1984, 1991, 1998, 2009).

Para o período 1995/96 a 2006, como já visto, a área de lavou-ras apresentou expansão e cresceu o número de assentados (vide capítulo seis), o que teria efeito positivo sobre a ocupação agrícola. Contudo, deve-se considerar que grande parte da expansão da área de lavoura decorreu do crescimento da área com soja, que usa poucos trabalhadores por área cultivada, e houve intensificação da colheita mecânica em culturas importantes como a cana-de-açúcar, café e algodão. No balanço, houve redução no número de

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pessoas ocupadas na agricultura brasileira entre 1995/96 e 2006, embora em taxa menor do que o constatado entre 1985 e 1995/96.

Das 16.567.544 pessoas ocupadas na agricultura brasileira em 2006, quase metade ou 46,4% estavam no Nordeste. Vinham a se-guir o Sudeste, com 19,8%, e o Sul, com 17,6% das pessoas ocupadas.

No caso da ocupação há outra fonte de dados, que é a PNAD, realizada anualmente pelo IBGE.3 Com base no trabalho de Bal-sadi (2006) podem-se analisar alguns resultados de 1992 e 2004. Neste ano o setor primário foi responsável por 21,0% da ocupação total no Brasil, contra 20,9% da indústria e 58,5% do setor terciá-rio, enquanto em 1992, essas participações eram, respectivamente, de 28,6%, 22,0% e 49,4%. Ou seja, a ocupação agrícola apresentou grande perda de importância, a indústria pequena perda e cresceu a importância da ocupação terciária.

Quanto às categorias de ocupação, em 2004, os Empregados representavam 28,7% das pessoas ocupadas na agricultura brasi-leira e os Empregadores, apenas 3,1%. Já as seguintes categorias: Trabalhador por Conta Própria, Membros não Remunerados da Família e Trabalhadores na Produção para o Próprio Consumo, que, grosso modo, constituem os agricultores familiares, tinham participação de 68,1% na ocupação agropecuária brasileira.

Em relação aos Empregados Agrícolas, observa-se pela Tabe-la 8.8 que a zona urbana ganhou importância em relação à zona rural como seu local de moradia, entre 1992 e 2004. Ao mesmo tempo, aumentou a precariedade do vínculo empregatício, com o decréscimo do número de empregados permanentes e o cresci-mento dos empregados temporários.

3. Devem-se tomar cuidados na comparação entre o Censo Agropecuário e a Pes-quisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD). Além desta ser amostral, o número de pessoas ocupadas na agropecuária do Censo é informado pelo res-ponsável pelo estabelecimento rural, enquanto na PNAD são as famílias, inclusive urbanas, que informam se sua ocupação predominante é na agricultura. Outra diferença é que até 2004, a PNAD não pesquisava o Norte rural.

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Mudanças na estrutura agrária | 195

Tabela 8.8 Classificação dos Empregados Agrícolas, por local de mora-dia e vínculo empregatício, Brasil, 1992 e 2004.

AnoLocal de Moradia Tipo de Vínculo

Rural Urbano Permanente Temporário

1992 2.924.347 1.897.369 2.637.485 2.184.231

2004 2.491.616 1.959.335 2.103.361 2.347.590

Fonte: BALSADI (2006).

8.5 DIFERENÇAS REGIONAIS

A agricultura brasileira não é homogênea entre estabeleci-mentos de diferentes tamanhos nem entre suas grandes regiões, conforme evidencia a Tabela 8.9. O Nordeste e o Sul eram as regiões com estabelecimentos de menor tamanho médio em 1995/96, abaixo de 50 hectares, enquanto no Centro-Oeste o tamanho mé-dio era de 326,9 hectares.

Tabela 8.9 Indicadores de tamanho, tecnologia e receita dos estabele-cimentos rurais nas grandes regiões brasileiras, 2006.

Região Área Média (ha)

Área/Trator (ha)

Área/Arado Tração Animal (ha)

Receita/Área(R$/ha)

Norte 115,2 1.860,2 542,4 90,6

Nordeste 30,8 249,9 113,1 300,1

Sudeste 58,8 237,4 288,8 755,7

Sul 41,3 115,8 178,4 842,3

Centro-Oeste 326,9 1.748,9 1.243,1 175,5

Brasil 63,8 337,3 259,1 369,3

Fonte: IBGE, 2009.

Na Região Sul se explorava mais intensivamente a terra, sen-do que se obtinham R$ 842,3 por hectare por ano. O Sudeste vi-nha logo a seguir, com R$ 755,7 por hectare. O Nordeste vinha em uma posição intermediária, com R$ 300,1 por hectare. Nesta região se verificou o maior aumento relativo da receita por área

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entre 1995/96 e 2006 (IBGE, 1998 e 2009), embora tal fato possa ter se concentrado em locais como os pólos irrigados na Bacia do Rio São Francisco.

Quanto ao uso de tratores, a Região Sul mostrava-se bem adiante das demais regiões. Em uma situação intermediária vi-nham o Sudeste e o Nordeste. Nesta região, ao mesmo tempo, se constatava a maior importância do uso de arado para tração ani-mal, seguida pela Região Sul.

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9MACROECONOMIA, DISPONIBILIDADE DE ALIMENTOS E DESEMPENHO AGROPECUÁRIO

Ao enfocar o desempenho do agronegócio e da agropecuária pós 1990, um ponto que chama atenção é o aumento de sua inter-nacionalização. A relação entre o valor das exportações e o PIB do agronegócio, denominada de grau de abertura do agronegó-cio, passou de 2,7%, em 1994, para 19,8%, em 2005, enquanto a relação entre as exportações totais e o PIB brasileiro passava de 8,0% para 14,9% (MAPA, 2007c). Dessa forma, além dos fatores de natureza interna, deve-se dar maior importância aqueles liga-dos ao comércio internacional, na tentativa de mais bem compre-ender o desempenho agropecuário brasileiro no período recente.

Do lado da oferta, pode-se considerar como variáveis condi-cionantes desse desempenho, além da disponibilidade dos fatores naturais (especialmente, terra agricultável), o aumento do uso de insumos modernos, de novas tecnologias e os ganhos de produti-vidade, assim como a evolução dos preços pagos pela agricultura, que influenciam o seu custo de produção.

Do lado da demanda, fatores a serem considerados são o crescimento do PIB ou da Renda Nacional, a evolução dos preços reais dos alimentos, a elasticidade renda da demanda de produtos alimentícios e a evolução da distribuição de renda, especialmente a participação dos menores rendimentos na renda nacional. Sa-be-se que esta participação, entre outros fatores, é influenciada pela taxa de inflação, gastos com programas de suplementação de renda e níveis de salário e emprego.

Embora já se saiba que os gastos públicos com as políticas especificamente agropecuárias tenham diminuído pós 1990, não

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se podem desprezar os efeitos, particularmente, da pesquisa, do crédito rural e dos preços mínimos nas mudanças tecnológicas, no emprego de fatores produtivos, na garantia de renda e, por-tanto, no desempenho agropecuário brasileiro.

Dado o já comentado processo de abertura comercial, que se constituiu em um dos componentes das reformas liberais da dé-cada de 1990, ganharam importância a concorrência de outros países à produção primária nacional e a evolução do comércio e dos preços internacionais. Por sua vez, o nível da taxa de câm-bio ou o grau de valorização da moeda nacional influenciam na rentabilidade das exportações do agronegócio e nos preços de insumos com grande dependência à importação, como agrotóxi-cos e fertilizantes.

Além de sofrer influência, o desempenho do setor agrícola também causa efeitos nas variáveis macroeconômicas. Viu-se no capítulo anterior que a agropecuária, entre 1992 e 2004, contri-buiu, proporcionalmente, menos que a indústria e os serviços na geração de ocupação no Brasil. Neste capítulo, para o período 1990 e 2009, será analisada a contribuição da agropecuária e do sistema de produção agropecuário para a evolução da Inflação, do Produto Interno Bruto, da Balança Comercial e da Disponibi-lidade de Alimentos no Brasil.

9.1 PREÇOS DO SISTEMA DE PRODUÇÃO AGROPECUÁRIO

E INFLAÇÃO BRASILEIRA

Os preços dos produtos agropecuários podem ser analisados sob dois pontos de vista ou interesses: dos agricultores e dos con-sumidores. Para os primeiros, eles servem como indicadores da renda obtida na atividade primária. Para os consumidores, espe-cialmente os mais pobres, os preços dos produtos primários e dos alimentos deles derivados são importantes pelos seus efeitos no custo de vida e no poder de compra dos rendimentos recebidos.

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Macroeconomia, disponibilidade de alimentos e desempenho agropecuário | 199

9.1.1 Relação de Troca e Preços Reais Agropecuários

Para se medir a rentabilidade das atividades agropecuárias é comum se comparar o Índice de Preços Recebidos (IPR) com o Índice de Preços Pagos (IPP) pelos agricultores, sendo que sua divisão é chamada de Relação de Troca da Agricultura (RTA). A Fundação Getúlio Vargas (RJ), ao estimar a Relação de Trocas da Agricultura Brasileira, mede o IPR a partir dos preços e quanti-dades produzidas de 30 produtos agropecuários1 e o IPP através de despesas com sementes, fertilizantes, agrotóxicos, serviços, com-bustíveis e mão-de-obra. Seus valores, em forma de índices, para o período 1990 a 2009, são apresentados no Gráfico 9.1.

Gráfico 9.1 Relação de Troca na Agricultura Brasileira (1990-2009)

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140,00

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80,00

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20,00

RTA

0,00

Fonte: FGV, 2010. Base 1990 = 100,0.

1. O IPR da Fundação Getúlio Vargas (FGV/RJ) leva em conta os seguintes produ-tos: algodão em caroço, amendoim, arroz em casca, banana, batata inglesa, cacau, café em coco, cana-de-açúcar, cebola, coco-da-baía, feijão, fumo em folha, juta, laranja, malva, mamona, mandioca, milho, pimenta-do-reino, sisal, soja, tomate e trigo. Os produtos animais considerados são: boi gordo para corte, suíno para corte, frango/galinha de corte, leite, lã, ovos e mel de abelha (FGV, 2007).

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Na primeira metade da década de 1990 observa-se evidente melhoria na Relação de Trocas, com crescimento mais que pro-porcional dos preços recebidos em relação aos preços pagos pela agricultura. Isso se deveu, primeiramente, ao aumento real de 16,0%, conforme Gráfico 9.2, dos preços recebidos pelos agricul-tores, entre 1990 e 1994, associado ao baixo crescimento do PIB agropecuário entre 1990 e 1993, e ao grande crescimento da de-manda de alimentos em 1994, na esteira do Plano Real.

Gráfico 9.2 Variação Real dos Preços Recebidos pela Agricultura no Brasil (1990-2009)

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114115

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100,00

80,00

60,00

40,00

20,00

IPR

/IG

P

0,00

Fonte: FGV, 2010. Base 1990 = 100,0.

Em segundo lugar, houve queda real dos preços pagos pela agropecuária, o que, segundo Helfand & Rezende (2001), serviu para elevar a rentabilidade e o emprego de tecnologia na agricul-tura.2 Por sua vez, Dias & Amaral (1999) relacionam a queda do

2. “A principal razão do aumento (de 25%) do índice de preços relativos agrícolas nesse sub-período está relacionada à velocidade com que caíram os preços pagos. Da primeira metade de 1992 até a segunda metade de 1994, os preços reais de fertilizantes, pesticidas e serviços de trator caíram mais de 30%, enquanto os pre-ços de sementes, combustível e mão-de-obra caíram 5 e 10%. O efeito combinado

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Macroeconomia, disponibilidade de alimentos e desempenho agropecuário | 201

preço dos insumos à abertura comercial, especificamente à redu-ção de tarifas de importação de agrotóxicos e fertilizantes. Infor-mam também que os produtos agrícolas foram mais beneficiados, em termos de relação de troca, que os produtos pecuários.3

Desconsiderando o pico de 1994, pode-se dizer que entre 1993 e 2004, a Relação de Troca Agrícola manteve certa estabili-dade, com pequenas flutuações anuais, e, sistematicamente, acima do observado no início da década de 1990.

De 2004 a 2006, a Relação de Troca da Agricultura decresceu, voltando, em 2006, ao patamar de 1990. O aumento do preço do petróleo, com efeitos nos preços dos combustíveis, alguns fertili-zantes e agrotóxicos, aparentemente, influenciou nessa queda. Também teve influência, conforme Gráfico 9.2, o decréscimo real de 14,2% nos preços recebidos pelos agricultores brasileiros entre 2004 e 2006, provavelmente, em decorrência da forte valorização da moeda nacional.

De 2006 a 2009, a tendência foi de recuperação da Relação de Troca da Agricultura, com exceção de 2009. Enquanto o Índice de Preços Pagos cresceu 25,9% nesse período, o Índice de Preços Recebidos aumentou 42,4% (ou 19,7% em termos reais, confor-me Gráfico 9.2), muito influenciado pela elevação das cotações das commodities agrícolas no mercado internacional, pelo menos

dessas alterações foi duplo. Primeiro, a alta dos preços relativos agrícolas deve ter contribuído para aumentar a rentabilidade das atividades agrícolas. Segundo, a redução nos preços relativos de insumos comercializáveis deve ter criado fortes incentivos para aumentar sua utilização” (HELFAND & REZENDE, 2001:288).

3. “(...) a partir de 1987, período mais característico da abertura, os preços recebi-dos pelos agricultores cresceram cerca de 30% em relação aos preços pagos pelos agricultores (...). O crescimento da relação de trocas poderia ter sido bem maior não fosse a perda experimentada pelo setor da pecuária. Enquanto o setor de la-vouras experimentou um crescimento de 46% na relação de trocas entre 1987 e 1998, o setor de pecuária perdeu perto de 3%. Tanto o setor de lavouras quanto o de pecuária experimentaram crescimento na relação de trocas entre 1987 e 1994 quando atingiram, respectivamente os picos de 49% e 27%. A partir desse ano se observa queda na relação de trocas, com recuperação no setor de lavouras a partir de 1997” (DIAS & AMARAL, 1999:246).

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até a metade de 2008. A partir daí até o final de 2009, os efeitos da crise financeira mundial arrefeceram, temporariamente pelo me-nos, a recuperação dos preços agropecuários.

9.1.2 Alimentos e Inflação

O Gráfico 9.3 foi construído comparando-se a variação do Ín-dice de Preço da Alimentação ao Consumidor com o Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna, ambos obtidos pela Fun-dação Getúlio Vargas (RJ). Observa-se que, após o controle da in-flação, em 1994, os preços reais da alimentação apresentam nítida tendência de queda, reduzindo-se em 33% entre 1994 e 2006.4

Algo semelhante foi constatado por Farina e Nunes (2002) que, para o período agosto de 1994 a fevereiro de 2002, calcula-ram queda real de 20% no preço da alimentação como um todo e 15% para a alimentação fora do lar. Entre os outros grupos de despesa, também caíram os preços reais do vestuário e despesas pessoais, enquanto cresciam as despesas com educação, habitação, saúde e transporte.

Outro estudo, para o período de janeiro de 1986 a setembro de 1996, mostra que os preços reais da alimentação reduzi-ram-se em mais de 30% e os de vestuário (que usa como maté-ria-prima o algodão) caíram em mais de 40%, enquanto cres-ciam os preços da habitação, do transporte e da assistência à saúde (CASTRO & MAGALHÃES, 2006). Neste estudo fica ní-tido que a subida de preços no início dos anos 1990 se caracteriza como exceção à tendência de longo prazo de queda no preço de alimentos no Brasil.

4. A alimentação ao consumidor também ficou mais barata que outros gastos do consumidor. Assim, a variação, entre 1994 e 2006, do Índice de Preços da Ali-mentação foi 22,4% menor que Índice de Preços ao Consumidor (geral), ambos da Fundação Getúlio Vargas.

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Gráfico 9.3 Variação Real da Despesa com Alimentação no Brasil (1990-20009)

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IPC

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P

0,00

Fonte: FGV, 2010. Base 1990 = 100,0.

Nesse sentido, um terceiro estudo, de Mendonça de Barros et al, citado por Farina e Nunes (2002), estimou que os preços de uma cesta de alimentos no varejo5 reduziram-se em média 5,2% ao ano, entre 1975 e 2000. Segundo os autores, as principais cau-sas dessa queda foram a redução das margens nos segmentos do sistema agroindustrial e da carga tributária e, especialmente, os ganhos de produtividade agropecuária, que permitiram que, mesmo com diminuição dos preços recebidos, não houvesse que-da de oferta de produtos agropecuários.

Já para o período de 1994 a 2002, Farina & Nunes (2002) con-sideram que ganhos de produtividade e redução de margens na indústria de alimentação e na distribuição de alimentos (especial-mente, nos supermercados) tiveram importância mais decisiva

5. Consideraram-se 17 alimentos componentes da cesta: açúcar, alface, arroz, banana, batata, café, carne bovina, carne de frango, cebola, cenoura, feijão, laranja, leite, mamão, óleo de soja, ovo e tomate.

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que a agropecuária na redução dos preços dos alimentos. Ao se considerar que, entre 1994 e 2002, os preços reais recebidos pelos agricultores caíram 7,5% (vide Gráfico 9.2), e ainda assim não de forma constante, contra 20% de queda real no preço dos alimentos ao consumidor, a tese desses autores parece bastante consistente.

De 2006 a 2009, contra um crescimento real de 19,8% no Índi-ce de Preços Recebidos da Agricultura (vide Gráfico 9.2), o Índice de Preço da Alimentação ao Consumidor cresceu 5,1% a mais que o Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna. Ou seja, os alimentos ficaram em média mais caros que o conjunto dos preços da economia, inclusive os do atacado e da construção civil.

Tendência semelhante pode ser observada ao se analisar a evolução recente do Índice de Preço ao Consumidor Amplo (IPCA) do IBGE, comparativamente a um dos seus grupos, o de Alimentos e Bebidas. Em 2006, o IPCA tinha crescido 3,14%, en-quanto o índice de preços do grupo Alimentos e Bebidas subia tão somente 1,22%. Em 2007 e 2008, o índice do grupo Alimentos e Bebidas subiu, respectivamente, 10,79% e 11,11%, bem acima do IPCA que registrou, respectivamente, 4,46% e 5,90%. Em 2009, o IPCA cresceu 4,31%, enquanto o índice de Alimentos e Bebidas subia 3,18% (IPEA, 2010).

Aparentemente, os preços dos alimentos cresceram, ainda que com intensidade diferente, em função do crescimento real dos preços de suas matérias-primas, ou melhor, dos preços agro-pecuários, como pode ser visto no Gráfico 9.2.

De maneira geral, tanto o aumento real dos preços recebidos pelos agricultores brasileiros e seus reflexos nos preços da alimen-tação ao consumidor não podem, com a provável exceção do fei-jão, serem atribuídos, à deficiência da produção brasileira. De fato, sua origem se localiza na elevação dos preços das commodities agropecuárias nos mercados internacionais, que vinha ocorrendo há alguns anos e se acentuou durante 2007.

Entre seus fatores explicativos podem ser citados o grande crescimento da renda e consumo de alimentos em países muito

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Macroeconomia, disponibilidade de alimentos e desempenho agropecuário | 205

populosos, como China e Índia e a pressão direta sobre o preço do milho e indireta sobre o da soja e do trigo decorrente do crescente uso do milho para produção de etanol nos EUA. Considere-se também que os estoques mundiais de grãos apresentam-se em níveis, historicamente, reduzidos, o que, inclusive, estimula mo-vimentos especulativos com seus preços. Do lado dos custos, ve-rificam-se pressões devido ao aumento do preço do petróleo, com reflexos nos combustíveis e também nos fertilizantes e agrotó-xicos, derivados da petroquímica (OCDE-FAO, 2008).

9.2 PIB AGROPECUÁRIO E PIB DO AGRONEGÓCIO

O Gráfico 9.4 mostra que a taxa média anual de crescimento do PIB agropecuário, entre 1990 e 2008, foi de 3,7%, contra um crescimento médio de 2,6% do PIB da economia brasileira. Isola-damente, o ano de melhor desempenho da agricultura brasileira foi o de implantação do Plano Real, em 1994, com seu PIB su-bindo 7,4%. Esse fato esteve associado ao crescimento relativa-mente alto do PIB brasileiro naquele ano e ao aumento do poder de compra dos salários decorrente do controle da inflação.

Gráfico 9.4 Taxas Anuais de Crescimento do PIB Brasileiro e do PIB Agrícola (1990 a 2008)

10,0

8,0

6,0

4,0

2,0

0,0

1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2006 2008-2,0

-4,0

-6,0

PIB Média PIB Brasileiro = 2,6

Média PIB Agrícola = 3,7PIB Ag.

1990

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Contudo, os números parecem indicar que o desempenho su-perior da agricultura em todo o período analisado se deveu ao fato dela se beneficiar mais de fatores ligados ao comércio inter-nacional, em comparação com a economia como um todo. As-sim, entre 1999 e 2003, quando o Real esteve muito desvalorizado, a taxa média de crescimento da agricultura brasileira foi de 5,5%. Também em 2007 e 2008, a elevação dos preços internacionais das commodities, compensou a valorização cambial e contribuiu para que se registrassem taxas de crescimento do PIB agropecuário de 5,3% e 5,7%, respectivamente.

A Tabela 9.1 traz informações da participação do PIB agrope-cuário e do PIB do agronegócio (de acordo com a definição do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada – CEPEA da ESALQ/USP) no PIB brasileiro, de 1995 a 2008. O PIB agrope-cuário tendeu a se situar entre 5% e 7% do PIB brasileiro e o do agronegócio, entre 25% e 28% do PIB brasileiro. As atividades relacionadas com a agricultura tiveram participação no agrone-gócio de pouco mais do que o dobro das atividades relacionadas com a pecuária.

9.3 O SISTEMA DE PRODUÇÃO AGROPECUÁRIO

E A BALANÇA COMERCIAL

A abertura comercial, com reduções de barreiras tarifárias e não tarifárias, tanto nas exportações quanto nas importações, fez com que o nível de preços internacionais e a taxa de câmbio am-pliassem sua influência na determinação do saldo da Balança Co-mercial brasileira pós 1990. Depois de se iniciar a década de 1990 com regime de câmbio flutuante, no Plano Real, em 1994, ado-tou-se o câmbio fixo e manteve-se a moeda nacional valorizada até o final de 1998.

Como mostra a Tabela 9.2, entre 1995 e 1998 a taxa de câm-bio real apresentou valor de aproximadamente 25% menor que o

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Macroeconomia, disponibilidade de alimentos e desempenho agropecuário | 207

cons ta tado em 2005 (tomado como base). Com isso o saldo da Ba-lan ça Comercial, que se mostrava positivo e acima dos US$ 10 bi-lhões até 1994, passou a registrar valores negativos.

Tabela 9.1 Participação do PIB agropecuário e do agronegócio no PIB brasileiro, 1995 a 2008.

AnoPIB Agropecuária/

PIB Brasil (%)

PIB Agronegócio/PIB Brasil (%)

Total Agricultura Pecuária

1995 5,8 28,0 20,0 8,0

1996 5,5 26,9 19,4 7,6

1997 5,4 25,8 18,8 7,1

1998 5,5 26,0 18,6 7,4

1999 5,5 26,4 18,6 7,8

2000 5,6 25,3 17,4 7,9

2001 6,0 25,4 17,6 7,9

2002 6,6 27,0 18,9 8,0

2003 7,4 28,4 20,1 8,3

2004 6,9 27,5 19,6 8,0

2005 5,7 25,5 17,9 7,6

2006 5,5 24,6 17,7 6,9

2007 5,6 25,0 17,8 7,2

2008 5,9 25,4 17,9 7,5

Fonte: CEPEA (2010), IPEA (2010).

No início de 1999 promoveu-se grande desvalorização da moe-da nacional e retornou-se ao regime de câmbio flutuante. O real manteve-se relativamente desvalorizado até 2004, conseguindo-se recuperar, com o tempo, saldos positivos e crescentes na Balança Comercial. Já a partir de 2005, sem que houvesse mudança no regime cambial, observou-se forte valorização da moeda nacio-nal, que teve continuidade, ainda que com menos intensidade, em 2006 e 2007. Nos últimos dois anos considerados, em 2008 e 2009, a valorização do Real cessou, mas o saldo comercial foi bem me-nor que aquele observado no triênio 2005 a 2007.

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SISTEMA DE PRODUÇÃO AGROPECUÁRIO BRASILEIRO: CARACTERÍSTICAS E EVOLUÇÃO RECENTE208 |

Tabela 9.2 Taxa de câmbio real* e saldo da Balança Comercial, Brasil, 1990 a 2009.

AnoTaxa Câmbio

RealBalança Comercial

US$ bilhõesAno

Taxa Câmbio Real

Balança Comercial US$ bilhões

1990 69,8 10.752 2000 104,9 (753)

1991 83,5 10.580 2001 124,2 2.642

1992 94,3 15.239 2002 121,2 13.126

1993 90,5 13.299 2003 120,5 23.824

1994 85,4 10.466 2004 117,8 33.640

1995 76,9 (3.466) 2005 99,9 44.758

1996 73,3 (5.599) 2006 91,3 46.086

1997 73,2 (6.753) 2007 86,3 40.034

1998 74,7 (6.624) 2008 90,6 24.735

1999 110,5 (1.283) 2009 90,8 24.615

* A taxa de câmbio real foi calculada levando-se em conta a relação da moeda nacional e moe-

das de 16 outros países, os mais importantes nas exportações brasileiras. Base 2005 = 100.

Fonte: FGV (2010), IPEA (2010).

Quanto à evolução do saldo comercial do agronegócio seus resultados são apresentados na Tabela 9.3. É necessário se dizer que se está considerando o conceito empregado pelo MAPA, que não leva em conta as exportações e importações dos insumos agropecuários que, se consideradas, diminuiriam o saldo, em de-corrência, especialmente, da grande importação de defensivos e fer tilizantes. Além disso, agregam-se vários níveis de transformação industrial de matérias primas agropecuárias, chegando-se, por exemplo, aos calçados e ao vestuário.6 Uma estimativa alternativa

6. “Estamos trabalhando com o conceito de agronegócio, envolvendo todos os pro-dutos que se originam do setor agropecuário, ou seja, todos os itens da NCM (Nor-ma de Classificação de Mercadorias) cuja matéria prima empregada é de origem agropecuária, independente do nível de agregação do valor que possa ser atribuído na cadeia produtiva. Chegou-se a este consenso após vários debates e reuniões, por se entender que este critério se justifica pela essencialidade da matéria prima para obtenção do produto intermediário ou final, como: álcool, bebidas, chapéus e arte-fatos, cortiças e suas obras, extratos corantes e tanantes, matérias protéicas e enzi-mas, matérias de entrançar produtos, hortícolas, mobílias etc” (CONAB, 2007).

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do saldo do agronegócio é calculada pelo Instituto de Economia Agrícola da Secretaria de Estado de Agricultura e Abastecimento de São Paulo, em que, entre outras diferenças, se incorpora a im-portação de insumos agropecuários7 (IEA, 2010).

Tabela 9.3 Exportações, importações e saldo comercial em bilhões de dólares do Agronegócio, Brasil, 1990 a 2009.

Ano Exp. Imp. Saldo Ano Exp. Imp. Saldo

1990 13,0 3,2 9,8 2000 20,6 5,8 14,8

1991 12,4 3,6 8,8 2001 23,9 4,8 19,1

1992 14,4 3,0 11,4 2002 24,8 4,5 20,3

1993 15,9 4,2 11,7 2003 30,6 4,8 25,8

1994 19,1 5,7 13,4 2004 39,0 4,7 34,3

1995 20,9 8,6 12,3 2005 43,6 5,1 38,5

1996 21,1 8,9 12,2 2006 49,4 6,7 42,7

1997 23,4 8,2 15,2 2007 56,1 8,5 47,5

1998 21,6 8,1 13,5 2008 71,8 11,8 60,0

1999 20,5 5,7 14,8 2009 64,8 9,8 54,9

Fonte: MAPA (2010).

As exportações do agronegócio praticamente quintuplicaram seu valor entre 1990 e 2009, com crescimento considerável no início da década de 1990, certa estabilidade entre 1994 e 2000 e forte crescimento a partir de então. Já as importações aumentaram mais de três vezes, crescendo de 1990 a 1995, mantendo-se prati-camente estáveis até 1998, depois decrescendo até 2004 e voltando a crescer de 2005 a 2009.

Diferentemente da economia brasileira como um todo, o sal-do comercial do agronegócio, em momento algum, apresentou

7. Para 2008, o IEA estimou uma exportação do agronegócio brasileiro de US$ 76,1 bi-lhões, acima da estimativa do MAPA, e importação de US$ 26,4 bilhões, bem aci-ma da estimativa do MAPA, de forma a se chegar a um saldo do agronegócio de US$ 49,8 bilhões, cerca de US$ 10,2 bilhões a menos do que calculado pelo MAPA (IEA, 2010).

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resultado negativo. Isso não quer dizer que a valorização do real entre 1994 e 1998 não o afetou, posto que nesse período ele per-maneceu quase que estabilizado.

Após 1999, com a desvalorização cambial, constatou-se au-mento do saldo comercial do agronegócio, até se atingir o valor expressivo de US$ 34,3 bilhões, em 2004. Mesmo com a valorização cambial pós 2004 não se reverteu essa tendência, com o saldo comercial continuando em elevação até 2008, quando atingiu US$ 60,0 bilhões. Apenas em 2009, o saldo comercial do agrone-gócio se reduziu, refletindo os efeitos negativos da crise financeira internacional sobre o comércio mundial.

Os altos saldos comerciais alcançados pelo agronegócio bra-sileiro na primeira década do Século XXI têm como explicação mais geral ou estrutural a competitividade internacional obtida por grande parte das atividades agropecuárias e das agroindús-trias brasileiras. Como fatores conjunturais favoráveis, podem ser citados a desvalorização do Real nos anos iniciais do Século e os altos preços internacionais no triênio 2006 a 2008.

A Tabela 9.4 mostra o saldo comercial de 2008 de vários pro-dutos e subprodutos de origem agropecuária. Foram selecionados aqueles com saldo, positivo ou negativo, acima de US$ 100 mi-lhões, acrescidos do arroz, pela sua importância como gênero de primeira necessidade. Em 11 grupos de produtos e subprodutos o saldo comercial obtido pelo Brasil foi superior a US$ 1,0 bilhão, revelando a diversificação da pauta exportadora. Em muitos ca-sos o Brasil é o primeiro ou segundo exportador mundial, como na soja, açúcar e álcool, suco de laranja, café, carne de frango e bovina. Entre os produtos com saldo negativo destacavam-se a borracha natural e, especialmente, o trigo.

9.4 DISPONIBILIDADE E CONSUMO DE ALIMENTOS

Viu-se no capítulo dois que, através de informações da pro-dução, do saldo comercial, de perdas e do destino dos produtos

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Macroeconomia, disponibilidade de alimentos e desempenho agropecuário | 211

agropecuários (alimentar ou não), a FAO calcula a disponibi li-dade média de alimentos para a população, podendo-se consi-derá-la como estimativa indireta do consumo de alimentos.

Para o Brasil, a disponibilidade diária média de alimentos foi de 2.810 Kcal por pessoa por dia, no triênio 1990-92, passando para 3.090 Kcal por pessoa por dia, em 2004-06 (FAO, 2006, 2009). Como se calcula que o consumo mínimo no Brasil deveria ficar próximo a 2.200 Kcal por pessoa por dia, a atual disponibi-lidade de alimentos seria mais do que suficiente para garantir quantidade de alimentos adequada a todos, se sua distribuição fosse feita de forma equitativa.

Tabela 9.4 Saldo comercial, em milhões de dólares, de diversos produ-tos e subprodutos de origem agropecuária, Brasil, 2008.

Produto e Sub-Produto Saldo Produto e Sub-Produto Saldo

Soja e Derivados 17.879,3 Leite e Laticínios 297,7

Açúcar e Álcool 8.021,6 Preparados de Cereais 276,3

Carne de Frango 6.357,9 Castanha de Caju 189,2

Madeira e seus Produtos 6.301,8 Cacau e Preparações 184,8

Carne Bovina 4.954,0 Sucos e Conservas Alimentícias 158,2

Café 4.753,5 Chá e Especiarias 155,4

Fumo 2.702,7 Outras Farinhas e Farelos 147,8

Laranja e Derivados 2.084,6 Matérias Protéicas e Enzimas 120,5

Couros e Peleteria 1.611,6 Arroz 85,9

Carne Suína 1.444,4 Peixes e Crustáceos (116,9)

Milho 1.298,7 Feijão (208,2)

Outras Carnes 803,5 Produtos Hortícolas (211,8)

Algodão e Derivados 610,2 Bebidas (218,5)

Outros Derivados de Carne 520,9 Outros Óleos e Oleaginosas (535,5)

Animais Vivos 385,4 Aveia, Centeio e Cevada (588,1)

Frutas (exceto laranja) 334,5 Borracha Natural (664,5)

Outros Produtos Animais 319,3 Trigo (1.959,8)

Fonte: CONAB (2009). Valores entre parênteses são negativos.

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Entretanto, à semelhança da renda, o acesso a alimentos é muito concentrado no Brasil, fazendo com que importante parcela da população sofra, no início do século XXI, problemas de des-nutrição, ainda que em proporção menor do que no começo dos anos 1990. Nos critérios da FAO, em 1990-92, existiam 15,8 mi-lhões de brasileiros desnutridos, correspondentes a 10% da popu-lação, valores que caíram, respectivamente, para 11,9 milhões e 6%, em 2004-06 (FA0, 2009).

Outra medida do consumo alimentar, esta mais direta, é obti-da nos dados da Pesquisa de Orçamento Familiar (POF),8 do IBGE. Neste caso se levantam informações sobre gasto monetário e não monetário com refeições no e fora do domicílio e se especifi-ca quantidades e tipos de alimentos consumidos nos domicílios.9

Na POF 1995-96, registrou-se gasto médio mensal com ali-mentação pelos brasileiros de R$ 335,74, resultado da soma de R$ 235,94 (70,3%) gastos no domicílio e R$ 99,80 (29,7%) gastos fora do domicílio. Já em 2002-03, aquele gasto foi de R$ 334,67, sendo R$ 230,98 (69,0%) no domicílio e R$ 103,69 (31,0%) fora do domicílio (IBGE, 2007a). Como os preços dos alimentos, como já visto, reduziram-se neste período, é provável que, mesmo com va-lor monetário ligeiramente mais baixo, o dispêndio com alimen-tação em 2002-03 tenha resultado no consumo de maior quan-tidade de alimentos em termos físicos, em relação a 1995-96.

Transformando-se os alimentos adquiridos para refeições no domicílio em quilocalorias, estima-se que o seu consumo médio nacional era de 1.800 Kcal por pessoa dia, em 2002-03, sendo que no meio rural seu valor era de 2.402 Kcal, e no meio urbano de 1.700 Kcal (IBGE, 2007a). Não se pode concluir daí que o consumo

8. A última edição da POF foi a de 2008-09, cujos primeiros resultados foram divul-gados em 2010. Contudo, como estes resultados ainda são parciais, preferiu-se trabalhar com as informações da POF 2002-03.

9. Embora seja medida mais direta do que a da FAO, nem todo consumo de alimentos é captado pela POF. Ficam de fora, por exemplo, a alimentação escolar ou propi-ciada pelas empresas nos restaurantes industriais.

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médio de alimentos no Brasil estaria abaixo do mínimo neces-sário (2.200 Kcal), posto que não se está contabilizando o consu-mo fora do domicílio. Também os dados não revelam menor con-sumo de alimentos pela população urbana, para qual a alimentação fora do domicílio, evidentemente, é mais importante que para a população rural.

Para as regiões metropolitanas (São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Curitiba, Salvador, Recife e Forta-leza), Brasília e Goiânia pode-se analisar a evolução da disponibi-lidade alimentar no domicílio para período mais longo. Em 1974-75, seu valor era de 1.700 Kcal por pessoa dia, em 1987-88, de 1.895 Kcal, em 1995-96, de 1.695 Kcal e, em 2002-03, de 1.502 Kcal (IBGE, 2007a). Essas quedas, provavelmente, foram compen sadas pelo aumento da alimentação fora do domicílio, que tende a ser maior quanto maior é o centro urbano e a dificuldade de voltar para casa na hora do almoço.

Em termos qualitativos, a composição da dieta média do bra-si leiro tem-se mostrada adequada quanto aos macronutrientes, exceto pelo consumo excessivo de açúcar.10 Quanto aos grupos de alimentos, o consumo domiciliar de alimentos indicava que, em 2002-03, as frutas, verduras e legumes correspondiam a apenas

10. “A participação relativa de macronutrientes na disponibilidade alimentar domi-ciliar indica que 59,6% das calorias totais provêm de carboidratos, 12,8% de proteínas e 27,6% de lipídios, o que evidenciaria adequação da dieta às reco-mendações nutricionais (entre 55% e 75% para calorias de carboidratos, entre 10% e 15% para calorias protéicas e entre 15% e 30% para calorias lipídicas). Uma proporção de mais de 50% de proteínas de origem animal (de maior valor biológico) e um teor de ácidos graxos saturados (associados a doenças cardio-vasculares e ao diabetes) inferior ao limite máximo recomendado de 10% das calorias totais são igualmente evidências de adequação nutricional da disponi-bilidade alimentar nacional. A única evidência de desequilíbrio vem do excesso relativo da fração sacarose dos carboidratos: 13,7% das calorias totais contra um máximo de 10% fixado pelas recomendações nutricionais” (IBGE, 2007a:5). Esses dados devem ser analisados com muito cuidado, posto que grupos de indivíduos podem apresentar, destoando da média, dietas muito inadequadas, para mais ou para menos.

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2,3% das calorias totais, cerca de um terço do que seria recomen-dável (IBGE, 2007a).

O padrão de consumo brasileiro vem se modificando, com a substituição de alimentos tempo intensivos por alimentos poupa-dores de tempo. “Verificou-se uma significativa mudança nos pa-drões de consumo alimentar da população brasileira ao longo dos últimos anos. Houve uma redução na aquisição domiciliar per capita de feijão, arroz, batata, carnes e farinha de trigo, que fazem parte de uma cesta de alimentos bastante popular nos lares brasi-leiros, e um aumento na aquisição de alimentos prontos ou semi-prontos, pães, iogurtes, refrigerantes e sucos, e alimentação fora de casa” (SCHLINDWEIN & KASSOUF, 2007: 458).

A quantidade e o tipo de alimentos consumidos refletem em indicadores do estado nutricional da população. A Tabela 9.5 traz uma série de informações sobre o estado nutricional de crianças menores de cinco anos. Observa-se permanente redução no nú-mero de crianças abaixo do peso considerado normal desde a dé-cada de 1970. Os níveis atuais de déficit de peso para as crianças menores de cinco anos são considerados baixos dentro dos crité-rios de saúde pública.

Evidencia-se também que ainda persistem diferenças impor-tantes quanto ao déficit de peso de crianças, entre o local de mo-radia, com situação mais grave na zona rural, entre regiões, com piores indicadores para o Norte Urbano e o Nordeste e entre os quintos de renda, em que a prevalência de déficit de peso é bem maior no quinto inferior e no segundo quinto.

Em relação à população adulta, a Tabela 9.6 mostra que ocor-reu queda no déficit de peso tanto nas mulheres quanto nos homens dos anos 1970 em diante. Já o excesso de peso e a obesidade vêm cres cendo continuamente entre os homens. Entre as mulheres, obser- va-se que, a partir de patamar inicial mais alto, o excesso de peso e a obesidade cresceram entre 1974-75 e 1989, e depois se es ta bi-lizaram desta data até 2002-03. Particularmente, a obesi dade atin-ge, atualmente, valor próximo a 10% da população adulta no país.

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Macroeconomia, disponibilidade de alimentos e desempenho agropecuário | 215

Tabela 9.5 Prevalência de déficit de peso para idade nas crianças meno-res de 5 anos, segundo região, local de domicílio e quintos da renda familiar per capita, Brasil, 1974-75, 1989, 1996, 2002-03.

CritérioPeríodo

1974-75 1989 1996 2002-03

1 – Região

Norte Urbano 21,7 10,6 7,7 6,7

Nordeste 24,9 12,7 8,3 5,4

Sudeste 11,8 4,1 4,8 3,6

Sul 10,1 2,5 2,0 3,2

Centro-Oeste 10,7 4,2 2,6 3,6

2 – Local Domicílio

Urbana 12,9 5,6 4,6 4,3

Rural 20,7 10,6 9,1 5,6

3 – Quintos Renda

Quinto Inferior 30,8 13,7 15,5 8,7

Segundo Quinto 22,4 11,8 9,3 6,0

Terceiro Quinto 16,3 6,2 4,6 3,4

Quarto Quinto 9,6 2,5 3,3 3,2

Quinto Superior 4,0 1,3 2,4 1,5

Total 16,6 7,1 5,6 4,6

Fonte: IBGE, 2007a.

Tabela 9.6 Prevalência de déficit de peso, excesso de peso e obesidade na população com 20 ou mais anos de idade, por sexo, Brasil, 1974-75, 1989 e 2002-03.

Gênero – Manifestação PesoPeríodo

1974-75 1989 2002-03

Masculino

Déficit de Peso 7,2 3,8 2,8

Excesso de Peso 18,6 29,5 41,0

Obesidade 2,8 5,1 8,8

Feminino

Déficit de Peso 10,2 5,8 5,4

Excesso de Peso 28,6 40,7 39,2

Obesidade 7,8 12,8 12,7

Fonte: IBGE, 2007a.

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10PRODUTIVIDADE E EVOLUÇÃO DAS PRINCIPAIS ATIVIDADES AGROPECUÁRIAS E FLORESTAIS

Viu-se no capítulo anterior que o agronegócio brasileiro tem proporcionado saldos comerciais crescentes a partir de 1990. Ao mesmo tempo, com exceção de alguns anos e de alguns produtos, não se observou, entre 1990 e 2009, crises ou problemas relevantes de abastecimento no mercado interno de produtos agropecuá-rios, com sua disponibilidade aumentando no período.

A garantia do abastecimento interno, em parte, se deveu à maior facilidade de importação, decorrente da abertura comer-cial e que tornou possível o suprimento, por exemplo, do consumo de algodão, trigo e leite em meados da década de 1990, quando a produção nacional mostrou-se insuficiente. Além disso, como será visto neste capítulo, ocorreram importantes ganhos de pro-dutividade e de produção das atividades agropecuárias brasileiras, pós 1990, fazendo com que, de maneira geral, os crescentes sal-dos comerciais não comprometessem o abastecimento interno.

10.1 UTILIZAÇÃO DE INSUMOS E PRODUTIVIDADE

TOTAL DE FATORES

Foram selecionados as máquinas agrícolas, os fertilizantes e as rações como mostra da intensificação do uso dos chamados insumos modernos entre 1990 e 2009 pela agricultura brasileira, como pode ser visto na Tabela 10.1.

As máquinas agrícolas são bens de investimento e de alto valor unitário, cujas vendas praticamente dobraram no período con si-derado, mas com fortes flutuações. Chama atenção, por exemplo, a comercialização de 46.456 unidades em 1994, na euforia do

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Plano Real, sendo que nos dois anos seguintes, esse valor caiu, alcançando apenas 13.893 unidades em 1996, o menor valor de todo o período. A partir de 1999 fica nítida a tendência de recupe-ração das vendas, que se mantêm em patamares elevados até 2004. Duas razões ajudam a explicar esse comportamento, a criação do Moderfrota, em 2000, e a elevação da área plantada na esteira da desvalorização cambial e da elevação das exportações do agrone-gócio. Já a crise da renda agropecuária, junto com a valorização cambial, fez diminuir abruptamente as vendas de máquinas agrí-colas em 2005 e 2006. Por fim, observa-se uma recuperação da venda de máquinas agrícolas a partir de 2007, não interrompida nem mesmo em 2009, quando os preços agrícolas já não se mostra-vam favoráveis. Ao que tudo indica nos dois últimos anos o Pro-grama Mais Alimentos, destinado à agricultura familiar, foi fun-damental para garantir a venda de máquinas agrícolas no Brasil, especialmente aquelas de menor potência.

Quanto aos fertilizantes, que se tratam de bens de custeio, as flutuações anuais em suas vendas foram bem menos intensas. No período todo, suas vendas cresceram 173%, bem mais do que crescimento da área plantada, como se verá adiante, indicando que sua utilização por área aumentou. Já a produção de rações no Brasil evoluiu de 14.826 mil toneladas, em 1990, para 58.400 mil t, em 2009, crescimento de 294%.

Além da questão quantitativa, devem-se considerar os efeitos decorrentes do aprimoramento dos fatores de produção. O uso de semente geneticamente melhorada de última geração, ainda que na mesma quantidade que a mais antiga, provavelmente resultará em produção maior por área plantada. De forma semelhante, o emprego de raça de frango melhorada, resultará em consumo menor de ração e abate em menor tempo. A evolução técnica das máquinas e equi-pamentos traz redução em seus custos horários e maior eficiên cia produtiva. A maior precisão na realização de tratos culturais, como o plantio em data mais apropriada, muitas vezes sequer resul ta em maiores custos para os agricultores, mas traz ganhos produtivos.

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Tabela 10.1 Venda interna de máquinas agrícolas e fertilizantes e pro-dução de rações, Brasil, 1990 a 2009.

AnoVenda Máq. Agrícolas(1) Venda Fertil. (mil t) Produção Rações (mil t)

Valor Índice Valor Índice Valor Índice

1990 28.204 100 8.222 100 14.826 100

1991 18.944 67 8.493 103 16.120 109

1992 16.844 60 9.277 113 16.832 114

1993 27.407 97 10.541 128 18.063 122

1994 46.456 165 11.944 145 19.793 134

1995 22.706 81 10.839 132 24.528 165

1996 13.893 49 12.248 149 25.204 170

1997 21.029 75 13.845 168 26.119 176

1998 24.157 86 14.669 178 30.103 203

1999 24.043 85 13.689 166 32.507 219

2000 30.536 108 16.392 199 34.458 232

2001 35.252 125 17.069 208 38.812 262

2002 42.474 151 19.114 232 41.594 281

2003 37.918 134 22.796 277 43.687 295

2004 37.616 133 22.767 277 44.933 303

2005 23.226 82 20.195 246 47.209 318

2006 25.680 91 20.982 255 48.364 326

2007 38.343 136 24.609 299 53.553 361

2008 54.472 193 22.429 273 58.600 395

2009 55.311 196 22.471 273 58.400 394

(1) Soma das vendas de cultivadores motorizados, tratores de rodas, tratores de esteira, colhe-

doras e retroescavadeiras para uso agrícola.

Fonte: ANDA (2010), MAPA (2007d), PINAZZA et al (2001), UBABEF (2010).

Ao mesmo tempo, a literatura tem destacado que a maior escolaridade e qualificação profissional e o acesso a informações téc nicas pelos trabalhadores e agricultores tende a resultar em emprego mais eficiente dos fatores de produção.

Um conceito adequado para captar tanto os efeitos quantita-tivos quanto os qualitativos do uso dos fatores sobre a produção é

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a Produtividade Total dos Fatores (PTF), obtida pela divisão de um índice de produtos por um índice de insumos agropecuários. Gasques et al (2008), avaliaram a evolução temporal da Produ-tividade Total dos Fatores da agropecuária brasileira, medindo a produção através da soma da receita (produção física vezes pre-ços) de 64 lavouras permanentes e temporárias e 9 atividades pecuá rias. Já o índice de insumos foi calculado usando-se as des-pesas com terra (fator terra), pessoal ocupado (fator trabalho), fertilizantes e defensivos e o estoque de máquinas e equipamen-tos (medido monetariamente), esses três últimos componentes do fator capital.1 Seus resultados são registrados na Tabela 10.2.

Tabela 10.2 Taxas anuais de crescimento da Produtividade Total dos Fatores, seus componentes e índices de produtos e insu-mos, Brasil, 1975 a 2007.

ItemPeríodo

1975-2007 1980-1989 1990-1999 2000-2007

Produtividade do Trabalho 3,67 3,16 3,10 5,36

Produtividade da Terra 3,37 2,51 3,44 4,69

Produtividade do Capital 3,11 2,38 2,92 4,88

Produtividade Total Fatores 3,27 2,34 3,23 4,75

Índice de Produto 3,60 3,38 3,01 5,42

Índice de Insumos 0,32 1,02 -0,22 0,64

Índice de Ocupação -0,06 0,21 -0,09 0,06

Índice de Terra 0,23 0,85 -0,42 0,70

Índice de Capital 0,48 0,98 0,08 0,51

Fonte: GASQUES et al, 2008.

1. Algumas despesas importantes foram desconsideradas, como as rações, sementes e combustíveis. Contudo, isso não deve alterar os resultados, já que se mediu a evolução temporal e não um ponto da PTF.

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Entre 1975-2007 o índice de insumos cresceu 0,32% ao ano, contra crescimento de 3,27% a. a. do produto agropecuário, fazendo com que a PTF crescesse a 3,27% a. a. Especificando os fatores de produção, percebe-se que o número de pessoas ocupadas registrou pequena queda, enquanto o uso da terra cresceu 0,23% a. a. e do capital, 0,48% a. a. Em termos de produtividade parcial, o tra balho apresentou melhor desempenho, seguido pela terra e pelo capital. Ao se considerar os sub períodos, percebe-se que a PTF foi cres-cendo ao longo do tempo, alcançando o valor de 4,75% a. a., entre 2000 e 2007.

Citando outros autores, Gasques et al (2008) mostram que o crescimento da Produtividade Total dos Fatores no Brasil tem sido dos mais altos do mundo.2 Entre as causas do crescimento da PTF, a literatura aponta os investimentos em pesquisa e desenvol-vimento, políticas de extensão rural, educação, obras de infra-estrutura e programas governamentais. Para o Brasil é destacado o papel da pesquisa agropecuária, por exemplo, no melhoramento genético e no lançamento de novas variedades mais produtivas e adaptadas às diversas condições de cultivo no Brasil.

“Agências públicas de pesquisa e setor privado disponibili-zaram para uso comercial, no período de 1976 a 1999, 330 varie-dades de soja, uma média de 13,8 variedades por ano. Um total de 75 novas variedades de feijão foi oferecido no Brasil de 1984 a 1999, uma média de 4,7 variedades por ano; e 35 variedades de arroz de terras altas de 1976 a 1999, média de 1,5 variedade por ano. Em 2002, a Embrapa lançou 5 cultivares de feijão, 4 varieda-des de arroz, 3 de milho, 10 de soja, 7 de trigo e 3 de algodão” (GASQUES et al, 2004a:25).

2. “Estimativas mais recentes para os Estados Unidos (ERS-USDA, 2008), mostram que no período mais recente, 2000 a 2004, a taxa média de crescimento da produti-vidade total dos fatores nos Estados Unidos, foi de 2,34% ao ano. Para esse perío do a taxa média anual de crescimento da produtividade total dos fatores para o Brasil foi de 5,2%, mais do que o dobro da americana” (GASQUES et al, 2008: 7).

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10.2 DESEMPENHO DE ATIVIDADES AGRÍCOLAS

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) é o principal órgão encarregado de levantamentos sistemáticos da produção agrícola no Brasil, através de três pesquisas que tomam como base o ano civil e não o ano safra. Uma delas é o Levan ta-men to Sistemático da Produção Agrícola (LSPA) que, mensalmen-te, renova a estimativa anual de área plantada, produção e rendi-mento por área de 35 culturas temporárias ou permanentes.3 Ou tra é a Pesquisa Agrícola Municipal (PAM) que, em levanta-mento anual, estima área plantada e colhida, produção, rendi-mento médio e valor da produção anuais de 29 culturas tempo-rárias e 33 permanentes.4 A terceira é a Pesquisa de Estoques, que levanta informações, para cada semestre, sobre volume e distri-buição geográfica de estoques de algodão, arroz, café, feijão, mi-lho, soja e trigo.

10.2.1 Lavouras com Maior Valor da Produção

A Tabela 10.3 apresenta dados de área colhida e valor da pro-du ção daquelas atividades agrícolas brasileiras que, em 2009, alcançaram valor da produção acima de R$ 1,5 bilhão e que repre sen taram 90,5% do valor total da produção das culturas

3. São elas: abacaxi, algodão arbóreo (em caroço), algodão herbáceo (em caroço), alho, amendoim, arroz, aveia, banana, batata-inglesa, cacau (em amêndoa), café (beneficiado), cana-de-açúcar, castanha de caju, cebola, centeio, cevada, coco-da-baía, feijão, fumo, guaraná, juta (fibra), laranja, maçã, malva (fibra), mamona, mandioca, milho, pimenta-do-reino, rami (fibra), sisal ou agave (fibra), soja, sor-go, tomate, trigo e uva (IBGE, 2002).

4. Além das culturas da LSPA, são consideradas: batata-doce, ervilha, fava, linho (semente), melancia, melão, abacate, azeitona, borracha (látex coagulado), caqui, chá-da-índia (folha verde), dendê (coco), erva-mate (folha verde), figo, goiaba, limão, mamão, manga, maracujá, marmelo, noz (fruto seco), palmito, pêra, pêssego , tangerina, tungue (fruto seco), urucum (semente) (IBGE, 2002). Alguns produtos têm unidades diferentes entre a LSPA e a PAM, como o café que nesta segunda é pesquisado na forma de café em coco, contra café beneficiado da primeira pesquisa.

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levantadas pela Pesquisa Agrícola Municipal. A cultura com maior valor da produção foi a soja, com R$ 37.988.045 ou 27,0% do total. Em seguida veio a cana-de-açúcar, com R$ 23.960.835 ou 17,0% do total.

Tabela 10.3 Área e valor da produção de culturas agrícolas brasileiras com valor da produção acima de R$ 1,5 bilhão, em 2009.

Cultura Área Colhida (ha)Valor da Produção

Mil Reais % Total

Soja 21.750.468 37.988.045 27,0

Cana-de-açúcar 8.514.365 23.960.835 17,0

Milho (em grão) 13.659.776 15.039.823 10,7

Café (beneficiado) 2.201.335 8.613.912 6,1

Arroz (em casca) 2.872.036 7.071.341 5,0

Mandioca 1.760.578 5.575.307 4,0

Laranja 787.250 4.695.049 3,3

Feijão (em grão) 4.099.991 4.436.446 3,1

Fumo (em folha) 442.397 4.343.982 3,1

Algodão (caroço) 811.686 3.458.444 2,5

Banana 479.614 3.160.040 2,2

Tomate 67.605 2.759.002 2,0

Batata Inglesa 138.692 2.673.617 1,9

Trigo (em grão) 2.430.253 2.026.868 1,4

Uva 81.355 1.612.043 1,1

Demais 4.447.132 13.426.014 9,5

Total 64.544.533 140.840.768 100,0

Fonte: IBGE, 2010b.

As frutíferas (laranja, banana e uva), hortícolas (batata inglesa e tomate) e a cultura do fumo obtiveram alto valor da produção em áreas relativamente reduzidas, ao contrário dos grãos (soja, milho, arroz, feijão, algodão e trigo). Também a cana-de-açúcar, o café e a mandioca tendem a apresentar maior valor da produção por área que o obtido pelos grãos.

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10.2.2 Produção de Grãos

Um indicador bastante utilizado para medir o desempenho agrícola é a produção de grãos, que no Brasil engloba as seguintes culturas: algodão, amendoim, arroz, aveia, centeio, cevada, feijão, girassol, mamona, milho, soja, sorgo, trigo e triticale. O IBGE di-vulga, regularmente, sua estimativa para produção, área colhida e rendimento médio de grãos para determinado ano civil. A Compa-nhia Nacional de Abastecimento (CONAB) do MAPA faz o mes-mo, tomando como base o ano safra (julho de dado ano a junho do ano seguinte),5 sendo que com seus dados fez-se a Tabela 10.4.

Verifica-se que na década de 1980 a área colhida com grãos no Brasil apresentou pequena queda, enquanto aumentaram a pro-dução e o rendimento médio por hectare. De forma semelhante, na década de 1990, a área plantada novamente diminuiu levemente, com os menores valores sendo observados nas safras 1992/93 e 1997/98. Portanto, nas duas últimas décadas do século passado, a área de grãos não se expandiu no País, até registrou pequena di-minuição. Contudo, entre as safras de 1999/2000 e 2004/05, a ten-dência se inverteu, com considerável crescimento da área colhida. Já as cinco últimas safras registraram área co lhida menor que 2004/05, embora acima daquelas das décadas de 1980 e 1990.

A produção de grãos pós 1990, por sua vez, depois de duas safras relativamente ruins, em 1989/90 e 1990/91, apresentou tra-jetória de crescimento até o ano 1994/95. As três safras seguintes foram de produção mais baixa e a trajetória de crescimento foi retomada de 1998/99 a 2002/03, quando se alcançou a safra de 123,2 milhões de toneladas, mais do que o dobro da produção de 1989/90. Nas três safras seguintes a produção foi menor, sendo afetada por problemas climáticos no Sul e pela queda de renda

5. Basicamente, a principal diferença entre a produção de grãos estimada pela CONAB e aquela do IBGE se refere à produção do trigo e outras culturas de inverno menos importantes. Por exemplo, a previsão da safra de grãos do IBGE para 2009 indicava a produção de trigo neste ano, enquanto a previsão da CONAB para 2008/09 indi-cava a produção de trigo de 2008.

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agrícola e, consequente, redução do uso de insumos. Nas safras de 2006/07 e 2007/08, a produção de grãos voltou a aumentar, atingindo o recorde de 143,9 milhões de toneladas nesta última. Acompanhando a evolução da conjuntura econômico-financeira, respectivamente, o período de contração e de retomada do cres-cimento econômico, a safra de grãos 2008/09 foi menor e alcan-çou valor muito alto em 2009/10.

Tabela 10.4 Área colhida, produção e rendimento médio de grãos, Brasil, 1979/80 a 2009/10, base 1989/90.

SafraÁrea Colhida Produção Obtida Rendimento Médio

Mil ha Índice Mil t Índice Kg/ha Índice

1979/80 40.158,2 103 50.871,2 87 1.267 85

1989/90 38.945,0 100 58.280,3 100 1.496 100

1990/91 37.983,7 97 57.899,6 99 1.528 102

1991/92 38.492,3 99 68.400,1 117 1.777 119

1992/93 35.621,3 91 68.253,2 117 1.916 128

1993/94 39.094,0 100 76.035,0 130 1.945 130

1994/95 38.538,9 99 81.064,9 139 2.103 140

1995/96 36.970,9 95 73.564,7 126 1.990 133

1996/97 36.574,8 94 78.426,7 134 2.144 143

1997/98 35.000,8 89 76.558,7 131 2.187 146

1998/99 36.896,2 95 82.437,9 141 2.234 149

1999/00 37.824,3 97 83.029,9 142 2.195 147

2000/01 37.847,3 97 100.266,9 172 2.649 177

2001/02 40.198,0 103 96.746,7 166 2.407 161

2002/03 43.946,8 113 123.168,0 211 2.803 187

2003/04 47.422,5 122 119.114,2 204 2.512 168

2004/05 49.068,2 126 114.695,0 197 2.239 150

2005/06 47.325,9 121 120.774,8 207 2.552 170

2006/07 46.210,0 119 131.730,0 226 2.851 191

2007/08 47.360,0 122 143.870,0 247 3.038 203

2008/09 47.674,4 122 135.134,5 232 2.835 189

2009/10* 47.335,5 121 146.746,0 252 3.100 207

* Incluída a cultura da canola com 30.900 hectares e 42.100 t produzidas.

Fonte: CONAB (2010).

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SISTEMA DE PRODUÇÃO AGROPECUÁRIO BRASILEIRO: CARACTERÍSTICAS E EVOLUÇÃO RECENTE226 |

Em termos de rendimento médio, de 1989/90 a 2009/10, seu crescimento foi bastante significativo, alcançando o valor de 107%, bem acima do que se havia verificado na década de 1980.

10.2.3 Lavouras com Maiores Áreas

Especificando-se mais a análise, aborda-se, com auxílio da Ta-bela 10.5, a evolução das dez principais atividades agrícolas, pelo critério de área colhida. Excluindo-se o sorgo, que partiu de uma área muito reduzida, as culturas que mais expandiram a área no período analisado foram a cana-de-açúcar (99% a mais) e a soja (89% a mais). O milho apresentou crescimento de 20% e as de-mais culturas redução de área, em diferentes níveis.

Quanto à produção, apenas no caso da mandioca observou-se estabilidade, o que está associado a esta cultura não se constituir em produto de exportação e às mudanças de hábitos alimentares, que levaram a queda considerável no consumo de farinha de man-dioca pelos brasileiros.

As demais culturas tenderam a apresentar crescimento da produção acima de 50%, em alguns casos acima de 100%. É im-portante se levar em conta que, entre 1991 e 2010, a população brasileira cresceu tão somente 26,5%. A princípio, pode-se estabe-lecer que, no geral, a produção das principais culturas brasileiras evoluiu sem trazer maiores pressões sobre o abastecimento interno ou sem que houvesse necessidade estrutural de se aumentarem suas importações.

Contudo, ainda que não a desmereça totalmente, essa afir-mação deve sofrer algumas relativizações. Primeiro, considera-ram-se apenas os anos extremos do período, deixando de fora eventuais situações com deficiências produtivas em anos inter-mediários. Segundo, pode ter acontecido, também eventualmente, que aumento de exportação trouxesse dificuldades pontuais ao abastecimento interno. Terceiro, a demanda interna de alguns produtos cresceu acima do crescimento da população, em decor-

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Produtividade e evolução das principais atividades agropecuárias e fl orestais | 227

rência de mudanças de hábitos alimentares e/ou por possuírem Elasticidade Renda da Demanda positiva.

Tabela 10.5 Área colhida, produção e rendimento médio das dez prin-cipais lavouras brasileiras em área colhida em 2009, 1990 a 2009.

Lavoura

Área(mil ha)

Produção (mil t)

Rendimento Médio (Kg/ha)

1990 2009 1990 2009 1990 2009

SojaValor 11.487 21.750 19.898 57.345 1.732 2.637

Índice 100 189 100 288 100 152

MilhoValor 11.394 13.660 21.348 50.746 1.874 3.715

Índice 100 120 100 238 100 198

CanaValor 4.273 8.514 262.674 671.395 61.479 78.854

Índice 100 199 100 256 100 128

FeijãoValor 4.680 4.100 2.234 3.487 477 850

Índice 100 88 100 156 100 178

ArrozValor 3.947 2.872 7.421 12.652 1.880 4.405

Índice 100 73 100 170 100 234

TrigoValor 2.681 2.430 3.094 5.055 1.154 2.080

Índice 100 91 100 163 100 180

CaféBenef.

Valor 2.909 2.201 1.465 2.440 504 1.108

Índice 100 76 100 167 100 220

MandiocaValor 1.938 1.761 24.322 24.404 12.553 13.861

Índice 100 91 100 100 100 110

Algodão (caroço)

Valor 1.392 812 1.783 2.897 1.281 3.570

Índice 100 58 100 162 100 279

SorgoValor 138 793 236 1.854 1.715 2.338

Índice 100 575 100 786 100 136

Fonte: IBGE (2010b).

Quanto ao rendimento médio por área, também se observaram grandes elevações, em cinco casos com aumento entre 50% e 100% e em três casos acima de 100%.

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SISTEMA DE PRODUÇÃO AGROPECUÁRIO BRASILEIRO: CARACTERÍSTICAS E EVOLUÇÃO RECENTE228 |

10.2.4 Inserção Externa de Grãos Selecionados

Foram escolhidos alguns grãos para mostrar a evolução da inserção externa de 1990 e 2010, conforme Tabela 10.6.

No triênio 1996-98 foi quando a produção nacional de arroz se mostrou mais distante do consumo interno, na casa de 80,0%. Após, a produção nacional tendeu a atender entre 90% e 95% do consumo nacional. Para o feijão, o triênio 1996-98 também foi o que registrou menor nível relativo de produção, correspondente a 90,5% do consumo nacional. Nos triênios seguintes a produção nacional situou-se na faixa de 95% a 100% do consumo interno. No mais das vezes, as importações de arroz e feijão foram prove-nientes dos demais países do MERCOSUL.

Com registro do pior momento também no triênio 1996-98, observa-se que até o triênio 1999/2001, a produção do milho es-teve próxima ao consumo nacional. Nos triênios mais recentes geraram-se de saldos exportadores, estimulados, entre outras ra-zões, pelo uso do cereal como matéria-prima de etanol pelos EUA, com consequente elevação de seus preços internacionais.

Tabela 10.6 Participação porcentual da produção interna no consumo interno de grãos e derivados, Brasil, 1990 a 2010, médias trienais.

ProdutoTriênio

1990/92 1993/95 1996/98 1999/2001 2002/04 2005/07 2008/10

Arroz 83,5 91,5 80,0 94,1 91,5 93,0 95,0

Feijão 103,0 94,3 90,5 96,5 98,2 98,6 97,4

Algodão 93,6 58,4 46,7 84,0 114,5 135,5 134,6

Milho 97,7 101,2 93,0 100,5 111,4 109,1 122,1

Trigo 55,9 29,0 28,1 21,9 39,6 41,2 50,5

Soja Grão 117,0 120,2 126,7 147,2 162,9 171,0 178,9

Soja Farelo 360,0 350,0 287,6 252,6 268,4 233,0 204,1

Soja Óleo 125,7 147,8 139,9 143,6 176,3 175,7 141,6

Fonte: CONAB. Indicadores Agropecuários, diversos números.

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Produtividade e evolução das principais atividades agropecuárias e fl orestais | 229

Por sua vez, a cultura do algodão foi muito afetada, inicial-mente, pela abertura comercial, mais especificamente pela redu-ção de suas tarifas de importação e dos produtos têxteis. Com isso, a produção nacional diminuiu, chegando a se resumir a 46,7% do consumo nacional no triênio 1996-98. Daí em diante, a pro-dução nacional voltou a crescer, alcançando-se saldos exporta-dores nos triênios mais recentes.

É importante se estabelecer que, concomitantemente, houve profundas mudanças na estrutura produtiva do algodão, que dei-xou de ser uma cultura típica de agricultores familiares, com baixo nível de mecanização (especialmente, na colheita) e muito presente no norte paranaense e em regiões paulistas, para se trans formar em cultura de larga escala, altamente mecanizada e com pequena quantidade de emprego gerada por hectare, e com forte partici-pação nos estados do Centro-Oeste e sudoeste da Bahia.

A produção nacional de trigo, inicialmente, já se mostrava bem distante do consumo nacional. Esse fato foi agravado com a desregu-lamentação setorial e pela constituição do MERCOSUL, sendo que no triênio 1999/2001 a produção nacional representou tão somente 21,9% do consumo interno. Houve melhora nos triê nios pos te rio-res, mas o Brasil está muito longe da autosuficiência do produto.

Quanto à soja e seus derivados, observa-se que em todo o perío do a produção nacional foi mais que suficiente para atender o mercado interno e gerar saldos exportadores. Com a aprovação da chamada Lei Kandir, em 1996, o seu mix exportador se alte-rou, com diminuição da importância da exportação de farelo de soja e aumento da importância da exportação de soja em grãos. No último triênio, 2008/10, caiu a importância da exportação de óleo de soja, o que pode estar associado ao aumento da produção nacional de biodiesel.

10.3 DESEMPENHO DAS ATIVIDADES FLORESTAIS

Outra atividade econômica do setor primário é a exploração das florestas, naturais e plantadas. O IBGE realiza, anualmente, a

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pesquisa Produção da Extração Vegetal e da Silvicultura (PEVS), que estima a quantidade e o valor da produção anuais das ativi-dades de exploração dos recursos florestais naturais, que com-põem o extrativismo vegetal, bem como da exploração de maciços florestais plantados, que constituem a silvicultura. Os produtos do extrativismo vegetal são divididos em nove grupos: borrachas; gomas não elásticas; ceras; fibras; tanantes; oleaginosas; alimen-tícias; aromáticos, medicinais, tóxicos e corantes e; madeiras. Os produtos considerados na silvicultura são carvão vegetal; cascas secas de acácia negra; folhas de eucalipto; lenha; madeira em tora para papel e celulose; madeiras em tora para outras finalidades; resinas (IBGE, 2002).

Pela Tabela 10.7, observa-se que o extrativismo vegetal gerou, em 2008, valor de produção de R$ 3.897,5 milhões, correspon-dente a 30,7% do valor da produção de todas as atividades flores-tais. A exploração de madeiras constitui, praticamente, a totali-dade do extrativismo vegetal, revelando a grande disponibilidade de florestas naturais no país, em torno 472,3 milhões de hectares, em 2005 (MAPA, 2007e).

Tabela 10.7 Valor dos produtos da extração vegetal e da silvicultura, segundo os principais produtos, Brasil, 2008.

Principais ProdutosValor Produção(Milhões Reais)

Participação(%)

Extrativismo Vegetal 3.897,5 30,7

Madeiras 3.261,8 25,7

Outros produtos 635,7 5,0

Silvicultura 8.789,0 69,3

Carvão Vegetal 2.024,0 16,0

Lenha 1.258,0 9,9

Madeira p/ papel e celulose 2.760,3 21,8

Madeira para outros fins 2.663,6 21,0

Outros produtos 83,1 0,7

Total 12.686,5 100,0

Fonte: IBGE (2009a).

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A extração de madeira natural é muito combatida por motivos ambientais, o que não impediu a diminuição da cobertura flores-tal no Brasil em 15,7%, entre 1990 e 2005, contra queda de 0,3% no mundo todo (MAPA, 2007e). A principal causa do desmata-mento foi a expansão da área agropecuária e não da própria explo-ra ção da madeira. Mais recentemente, o Brasil tem conseguido re-du zir o desmatamento na Amazônia, que caiu de 1.231.000 hec tares, em 2004/05, para 229.400 hectares, em 2009/10 (MMA, 2010).

Para os produtos da silvicultura, em 2008, foram usados cerca de 6.126,4 mil de hectares, basicamente com eucalipto e pinus (COGO, 2010). A Tabela 10.7 mostra a importância da silvicul-tura como fonte de energia, na forma de lenha e carvão vegetal, especialmente para atividades siderúrgicas. Muito importantes também são os usos da madeira para fabricação de celulose e pa-pel e para diversos produtos usados na construção civil e na indús-tria moveleira.

Conforme Tabela 10.8, o saldo comercial dos produtos flores-tais passou de US$ 2.218,7 milhões, em 1997, para US$ 5.487,7 mi-lhões, em 2009, crescimento de 147,3%. Os principais produtos de origem florestal exportado pelo Brasil, em 2009, foram celu-lose, com participação de 45,9%, madeira e suas obras, 30,7%, e papel, com participação de 23,3%. Entre os importados, destaca-ram-se papel, com participação de 63,3% e borracha natural, com 16,3% (MAPA, 2010).

Tabela 10.8 Valor das exportações, importações e saldo comercial dos produtos florestais, Brasil, em milhões de dólares, 1997-2009.

Ano Exportação Importação Saldo

1997 3.500,9 1.282,2 2.218,7

1998 3.370,0 1.287,4 2.082,6

1999 3.855,4 962,8 2.892,6

2000 4.418,9 1.150,0 3.268,9

2001 4.068,5 920,1 3.148,4

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SISTEMA DE PRODUÇÃO AGROPECUÁRIO BRASILEIRO: CARACTERÍSTICAS E EVOLUÇÃO RECENTE232 |

continuação

Ano Exportação Importação Saldo

2002 4.269,9 751,8 3.518,1

2003 5.452,7 783,2 4.669,5

2004 6.691,2 1.080,6 5.610,6

2005 7.198,7 1.222,7 5.970,6

2006 7.880,6 1.631,0 6.249,6

2007 8.819,9 1.942,1 6.877,8

2008 9.326,1 2.554,4 6.771,7

2009 7.222,9 1.735,2 5.487,7

Fonte: MAPA, 2010.

10.4 DESEMPENHO DAS ATIVIDADES PECUÁRIAS

O IBGE faz cinco pesquisas da pecuária brasileira. A mais abrangente é a Produção Pecuária Municipal, realizada anualmen-te e que estima o efetivo dos diversos rebanhos (bovinos, suí nos, aves etc.) em 31 de dezembro e levanta informações da produção (quantidade produzida e preço recebido) do leite, lã, ovos de ga-linha e codorna, mel e casulos de bicho da seda. Outro levanta-mento é a Pesquisa de Produção de Ovos de Galinha, feita a cada trimestre e que fornece dados mensais da produção e do efetivo de galinhas poedeiras. A Pesquisa Trimestral de Abates de Ani-mais, com coleta semelhante à anterior, fornece dados dos abates de bovinos, suínos e aves, enquanto a Pesquisa Trimestral do Leite traz informações sobre a quantidade de leite cru ou resfriado ad-quirida pelas empresas beneficiadoras. Já a Pesquisa Trimestral do Couro informa a quantidade de couro cru adquirida e curtida mensalmente e o estoque de couro cru no final do trimestre.

De acordo com o valor bruto da produção obtido durante 2004 (atualizados para julho de 2005), as cinco principais ativida-des pecuárias brasileiras foram a bovinocultura de corte, que au-feriu R$ 33,2 bilhões, a avicultura de corte, com R$ 16,8 bilhões, a bovinocultura de leite, com R$ 12,4 bilhões, a suinocultura,

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com R$ 6,8 bilhões e avicultura de postura que teve receita igual a R$ 3,5 bilhões (MAPA, 2007d).

A Tabela 10.9 apresenta a evolução do consumo per capita anual das principais fontes de proteínas animais no Brasil. O con-sumo de leite registrado nessa tabela diz respeito ao leite fluido e a seus derivados, tendo havido aumento de 29,0% no seu consumo per capita entre 1990 e 2005. Já os ovos de galinha mantiveram seu consumo, praticamente, constante até 2002 e cresceram, consi de-ravelmente, até 2007. Os últimos dois anos, em 2008 e 2009, hou ve registro de queda no consumo per capita de ovos de galinha.

Tabela 10.9 Consumo per capita anual de carnes, leite e ovos, Brasil, 1990 a 2009.

AnoCarnes (Kg) Leite

(litro)Ovos

(Unidade)Suína Frango Bovina Total

1990 7,2 14,2 36,1 57,5 106,3 89,0

1991 7,6 15,7 38,0 61,3 111,6 88,0

1992 7,9 16,8 38,9 63,6 107,6 88,0

1993 8,3 18,1 37,0 63,4 107,0 86,0

1994 8,4 19,2 36,4 64,0 110,8 92,0

1995 9,2 23,3 39,3 71,8 126,3 101,0

1996 9,6 22,2 41,4 73,2 133,5 101,0

1997 9,3 24,0 39,0 72,3 129,0 82,0

1998 9,9 26,3 37,5 73,7 129,6 85,2

1999 9,7 29,1 36,1 74,9 131,0 89,3

2000 14,2 29,9 35,8 79,9 126,8 94,0

2001 14,2 30,8 35,1 80,1 123,2 88,0

2002 13,7 33,4 35,8 82,9 131,5 94,0

2003 12,6 32,3 36,3 81,2 128,0 112,0

2004 12,2 33,4 41,4 87,0 130,9 113,0

2005 11,4 35,5 40,1 87,0 137,1 119,6

2006 13,0 35,8 43,3 92,1 – 125,0

2007 12,8 37,4 41,7 91,9 – 126,5

2008 13,1 39,0 36,6 88,7 – 114,8

2009 13,4 38,6 35,6 87,6 – 111,0

Variação % 86,1 171,8 (1,4) 52,3 29,0 24,7

Fonte: CONAB (2008, 2010), EMBRAPA – Gado de Leite (2008).

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O consumo per capita anual das três carnes consideradas pas-sou de 57,5 Kg, em 1990, para 87,6 Kg, em 2009, aumento de 52,3%. Especificamente, o maior crescimento deu-se no consumo da carne de frango, com aumento de 171,8% entre 1990 e 2009, superando o consumo da carne bovina, que, praticamente, ficou estável no período analisado. Já o consumo da carne suína, embora apresentasse crescimento de 86,1%, entre 1990 e 2009, mantém-se em patamar de cerca de um terço dos outros dois tipos de carne.

O aumento do consumo de carne de frango tem como uma de suas prováveis causas a valorização que as chamadas carnes brancas, com menores restrições médicas, obtiveram junto aos consumidores. Outra razão, possivelmente mais importante, fo-ram o ganho de produtividade e a redução de custos da avicultura que resultaram em grande crescimento da produção e preços re-lativamente menores que os das carnes bovina e suína. Os preços recebidos pelos pecuaristas brasileiros no triênio 2003-2005 fo-ram 43,5% menores do que o observado no triênio 1990-92 para a carne de frango, 35,5% menores para a carne bovina e 34,4% menores para a carne suína (MAPA, 2007d).

A preferência pela carne de frango no Brasil se diferencia da situação mundial, em que predomina a carne suína que, em 2005, apresentou consumo mundial de 93,3 milhões de tone-ladas. Em segui da vinha a carne de frango, com 56,9 milhões de toneladas e a carne bovina, com 50,3 milhões de toneladas con-sumidas (MAPA, 2007f).

10.4.1 Evolução do Rebanho, Produção e Produtividade

A Tabela 10.10 traz indicadores de evolução do número de ani mais e da produção das três principais atividades pecuárias brasileiras.

O crescimento do rebanho e da produção da avicultura brasi-leira mostra-se bem superior ao crescimento verificado na bovino-cultura e suinocultura. A produção de carne de frango aumentou

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em 386,7%, entre 1990 e 2008, ao mesmo tempo, que a carne bo-vina cresceu 133,5% e a suína 188,2%. O aumento da produção de leite e de ovos foi menor, respectivamente, de 90,4% e 68,5%. Como se verá adiante, enquanto parte considerável das carnes é comercializada no mercado externo, leite e ovos atendem basica-mente o mercado interno.

De forma geral, o crescimento da produção dos produtos pe-cuários foi superior ao crescimento dos produtos agrícolas. Pelo lado da demanda, como vários estudos mostram, isso pode estar relacionado ao fato que a elasticidade renda da demanda apresenta valores superiores para alimentos à base de proteínas animais em relação alimentos de origem agrícola ou vegetal. Além disso, co-mo na agricultura, os índices de produtividade da pecuária tive-ram melhorias significativas. Basta verificar que os rebanhos de suínos, de aves e bovino cresceram, entre 1990 e 2008, respectiva-mente, 9,5%, 120,0% e 37,5%, todos os valores menores que os do crescimento da produção pecuária.

Tabela 10.10 Evolução do rebanho e da produção de atividades pecuá-rias, Brasil, 1990 a 2009.

AnoBovinocultura Avicultura Suinocultura

Rebanho Carne Leite Rebanho Carne Ovos Rebanho Carne

1990 147.102 2.836 14.484 546.236 2.267 37.370 33.623 1.050

1991 152.136 2.921 15.079 594.393 2.522 37.930 34.290 1.130

1992 154.229 3.062 15.784 639.625 2.727 39.412 34.532 1.190

1993 155.134 3.124 15.591 654.167 3.143 35184 34.184 1.260

1994 158.243 3.333 15.784 681.088 3.411 37.396 35.142 1.330

1995 161.228 3.707 16.474 729.531 4.050 44.627 36.062 1.470

1996 158.289 4.053 18.515 728.087 4.052 44.255 29.202 1.560

1997 161.446 3.335 18.666 760.622 4.461 34.989 29.637 1.540

1998 163.154 3.398 18.694 765.222 4.875 37.877 30.007 1.699

1999 164.154 3.807 19.070 804.576 5.526 41.021 30.839 1.834

2000 169.876 3.900 19.767 842.740 5.977 41.100 31.562 2.556

2001 176.389 4.330 20.510 882.884 6.736 42.433 32.605 2.730

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SISTEMA DE PRODUÇÃO AGROPECUÁRIO BRASILEIRO: CARACTERÍSTICAS E EVOLUÇÃO RECENTE236 |

continuação

AnoBovinocultura Avicultura Suinocultura

Rebanho Carne Leite Rebanho Carne Ovos Rebanho Carne

2002 185.349 4.699 21.643 884.145 7.517 45.801 31.919 2.872

2003 195.552 4.977 22.254 921.323 7.843 55.342 32.305 2.697

2004 204.513 5.906 23.475 944.298 8.494 57.829 33.085 2.620

2005 207.157 6.346 24.621 999.041 9.348 62.022 34.064 2.708

2006 205.886 6.887 25.398 1.011.516 9.354 65.487 35.174 2.943

2007 199.752 7.049 26.137 1.127.659 10.305 67.364 35.945 2.998

2008 202.287 6.621 27.579 1.202.017 11.033 62.972 36.819 3.026

Var. % 37,5 133,5 90,4 120,0 386,7 68,5 9,5 188,2

Unidades: rebanhos em mil cabeças, carnes mil toneladas equivalente carcaça, leite milhões

litros, ovos em mil caixas de 30 dúzias.

Fonte: CONAB (2010), IBGE (2010c), PINAZZA et al (2001).

10.4.2 Participação no Comércio Mundial

O comércio pecuário internacional é muito afetado por ques-tões sanitárias. Frequentemente, países impõem barreiras à im-portação em função da incidência de doenças nos rebanhos ou de suposta deficiência na defesa sanitária dos países exportadores. Historicamente, o Brasil tem sido afetado por esse fato, o que não impediu, como mostra a Tabela 10.11, que se expandisse conside-ravelmente a importância dos saldos exportadores.

Para a carne suína, no final do período analisado, o comércio externo representava próximo a 20% da produção interna e para a carne de frango e bovina a participação era ainda maior, nor-malmente acima dos 30%.

No caso de ovos de galinha o mercado externo nunca teve grande importância, embora venha registrando crescimento. Em 2006, as exportações representaram 1,4% da produção nacional e em 2008 esse valor atingiu 3,5% (MAPA, 2010).

No mercado de leite e derivados, o Brasil chegou a ser o ter-ceiro importador mundial na década de 1990. Como mostra a

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Produtividade e evolução das principais atividades agropecuárias e fl orestais | 237

Tabela 10.12, essa situação tem se revertido, com a obtenção, nos anos mais recentes, de relativo equilíbrio entre exportação e impor tação e mesmo de saldo comercial razoavelmente positivo a partir de 2007, embora ainda pequeno em relação à produção nacional.

Tabela 10.11 Valor do saldo comercial e sua participação na produção interna, em mil toneladas, de carne de frango, bovina e suína, Brasil, 1990 a 2008.

AnoCarne de Frango Carne Bovina Carne Suína

Saldo % Produção Saldo % Produção Saldo % Produção

1990 299 13,2 (6) 0,0 0 0,0

1991 322 12,8 223 7,6 21 2,0

1992 372 13,6 388 12,7 58 4,8

1993 433 13,8 372 11,9 45 3,6

1994 481 14,1 182 5,5 41 3,1

1995 429 10,6 23 0,6 31 2,1

1996 569 14,0 82 2,0 59 3,8

1997 649 14,5 110 3,2 59 3,8

1998 612 12,5 243 7,1 71 4,2

1999 771 13,9 497 13,1 98 5,3

2000 907 15,2 540 13,8 141 5,5

2001 1.249 18,5 780 18,0 280 10,2

2002 1.600 21,3 891 19,0 474 16,5

2003 1.922 24,5 1.194 24,0 487 18,0

2004 2.425 28,5 1.315 22,3 506 19,3

2005 2.762 29,5 1.871 29,5 621 22,9

2006 2.713 29,0 2.151 31,2 524 17,8

2007 3.287 31,9 2.254 32,0 604 20,1

2008 3.436 31,1 1.358 20,5 519 17,1

Fonte: CONAB (2008a), PINAZZA et al (2001).

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SISTEMA DE PRODUÇÃO AGROPECUÁRIO BRASILEIRO: CARACTERÍSTICAS E EVOLUÇÃO RECENTE238 |

Tabela 10.12 Comércio externo da cadeia leiteira, em milhões de dóla-res, Brasil, 1997 a 2008.

Ano Exp. Imp. Saldo Ano Exp. Imp. Saldo

1997 10,7 459,2 (448,5) 2003 56,9 112,5 (55,6)

1998 8,6 515,5 (506,9) 2004 113,5 84,1 29,4

1999 8,2 442,0 (433,8) 2005 150,6 121,3 29,3

2000 15,5 376,3 (360,8) 2006 168,6 155,1 13,5

2001 27,3 180,3 (153,0) 2007 299,6 152,7 146,7

2002 42,0 247,9 (205,9) 2008 541,6 213,2 328,4

Fonte: MAPA (2010c).

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