Upload
brenda-gusmao-carneiro
View
231
Download
7
Embed Size (px)
Citation preview
Tema 2: A Psicopatologia Fundamental e o sofrimento singular: dimensões do pathos
CATÁSTROFE E REPRESENTAÇÃO: notas para uma teoria geral da Psicopatologia FundamentalBerlinck, 2000, p. 27-56
Na perspectiva inaugurada por Freud não há normalidade: além de ser um conceito meramente estatístico, seria um estado pra sempre perdido – o estado nirvânico – em que não haveria dor nem representação.
A busca incansável da normalidade para sempre perdida é a mais potente central geradora de energia no ser humano, que o leva as mais incríveis invenções, que são sempre sintomas: tentativas mais ou menos fracassadas de cura do excesso, da dor, do pathos, do sofrimento.
BERLINCK, 1998
No texto “Neuroses de Transferência: uma síntese” (1914) Freud apresenta sua concepção de que o psiquismo humano é psicopatológico a partir da catástrofe glacial.
“Existe uma série a qual podemos atar várias idéias de longo alcance. Essa série aparece quando colocamos as psiconeuroses (não somente as neuroses de transferência) numa ordem de acordo com o momento em que costumam se apresentar na vida individual. Nesse caso, temos como a mais precoce a neurose de angústia, a quase incondicional; segue-lhe a histeria de conversão (mais ou menos a partir do quarto ano); e ainda um pouco mais tarde, na pré-puberdade (9-10 anos), aparece, nas crianças, a neurose obsessiva. Não há neuroses narcisistas na infância. Destas, a demência precoce (conhecida hoje como esquizofrenia), em sua forma mais clássica, é uma doença da puberdade; a paranóia aproxima-se dos anos de maturidade como também a melancolia.” (FREUD, 1914/1985, p. 73)
2: O PSIQUISMO HUMANO
APARELHO PSÍQUICO
‘O Psiquismo é um prolongamento do sistema imunológico. Ele se constitui graças à violência originária e é uma resposta defensiva do organismo a ela.’
BERLINCK, M. Psicopatologia Fundamental. Sâo Paulo, Escuta, 2000
PATHOS e SOMA
‘Pathos é sempre somático, ocorre no corpo; e a psique é, na tradição socrática, estritamente corporal não havendo nunca, solução de continuidade entre essas duas instâncias.’
THALASSA - Ferenczi
O desenvolvimento do primata realizou-se sob a influência dos destinos geológicos da Terra, especialmente, dos tempos glaciais, que teriam exercido o estímulo para o desenvolvimento cultural.
PSIQUISMO HUMANO É PSICOPATOLÓGICO - FREUD CATÁSTROFE GLACIAL: história do desenvolvimento da energia sexual (libido) repete uma parte do desenvolvimento filogenético.
Freud, s. Neuroses do Transferência: uma síntese (1914)
Ontogenia e filogenia
Freud reconhece nas disposições às psiconeuroses, regressões a fases pelas quais toda a espécie humana teve que passar do começo ao fim dos tempos glaciais.
UNIVERSALIDADE PSICOPATOLÓGICA Série de soluções criativas
diante da catástrofe glacial. Humanidade é um ser da
catástrofe e é a partir dela, e de uma capacidade criativa que se transforma em repetição, que o ser humano é uma espécie psicopatológica.
Corpo e a evolução darwinista
Catástrofe – conflito entre a vida e a morte. A sexualidade é o epicentro deste conflito.
A escassez de alimentos acabou provocando a posição ereta que levou à perda da regularidade sexual – o cheiro da hominídea fértil pra sempre perdido que deixou o hominídeo perdido e angustiado.
PERDA DO OBJETO PRIMITIVO PERDA DO FUNCIONAMENTO DO
CORPO SEGUNDO O PRINCÍPIO DE PRAZER.
A DEPRESSÃO SUCEDE À PERDA DE OBJETO;
A ANGÚSTIA OCORRE COMO SINAL DE PERSISTÊNCIA DA CATÁSTROFE;
A DOR É UMA VIVÊNCIA QUE OCORRE COM A CATÁSTROFE;
CORPO E DESAMPARO
O corpo humano se constitui no desamparo e desenvolve um complexo sistema imunológico.
RECURSOS PSÍQUICOS
O Corpo humano e o aparelho psíquico (que não se distingue deste) pode ser visto como um território a ser protegido de invasores virulentos indesejáveis. Combatê-los requer recursos psíquicos.
RECURSOS PSÍQUICOS
DOR: responde a ameaças do aqui e agora
ANGÚSTIA: como ansiedade, se refere a ameaças futuras
DEPRESSÃO: está voltada para o passado e para um espaço que não é o aqui e agora.
3: DOR, ANGÚSTIA E DEPRESSÃO
O ser humano necessita da dor, assim como não pode dispensar a depressão e a angústia. Esses estados são também sinais, anunciam perigos e ameaças que ocorreram no tempo e no espaço.
DOR - MINKOWSKI (fenomenologia psiquiátrica)
A dor é um dos elementos essenciais que determinam os limites de nossas relações com o ambiente: contém em si, de maneira intrínseca, a noção de uma força estranha que atua em nós e que nos vemos obrigados a suportar.
MINKOWSKI, E. El Tiempo Vivido. 1973
DEPRESSÃO
Afasta o humano de sua relação com a realidade e, ao mesmo tempo, fornece condições para que este mesmo humano possa suportar a relação com a realidade, pois esta é responsável pela dor, pela perda de objetos, levando à depressão e à angústia.
ANGÚSTIA
Eminentemente humana, própria da espécie: medo inespecífico, expressão da sexualidade própria do animal humano é o mais primitivo afeto psíquico.
A dor e a depressão são responsáveis pela constituição do aparelho psíquico.
A angústia ocorre no AP e acontece depois da dor e da depressão.
DEPRESSÃO, DOR E ANGÚSTIA Têm, portanto uma ampla
dimensão de ineficiência, pois se manifestam segundo lógicas próprias que se articulam, do formas complexas e muito indiretas, com ameaças que efetivamente ocorreram.
EXCESSO: pathos
Na maioria das vezes a depressão, a dor e angústia são mecanismos de defesa excessivos contra as ameaças vindas tanto de fora quanto de dentro do humano.
O excesso se refere a uma intensidade que não é proporcional à intensidade da ameaça.
Recursos e sensações corporais Na dor, na angústia e na
depressão existem sensações que incidem espetacularmente no corpo – são sempre psíquicas como também inscrições do tempo na carne do humano, frágil e desamparada que solicita cuidados.
INVESTIMENTO NO CORPO
O rompimento do equilíbrio pela catástrofe permitiu que o investimento libidinal no objeto se voltasse para o corpo e começasse a produzir angústia.
O retorno ao corpo é feito nos moldes da identificação primitiva com a natureza – estado nirvânico - irrepresentável
AUTISMO
Esta identificação primitiva parece encontrar no autismo um testemunho da natureza filogenética da psicopatologia.
È uma doença em que a criança parece não ser capaz de ultrapassar a natureza em direção à cultura.
AUTISMO
Manifestação cultural anterior à catástrofe: silêncio, equilíbrio, repetitivo e padronizado – representando a regularidade lá existente.
Estado anterior à angústia – paradigma da subjetividade humana
INVENÇÃO HUMANA
A Humanidade nasce angustiada e criativa: essa angústia inicial é uma tremenda invenção (só passa a ser doença com a repetição).
PSICOPATOLOGIAS
Histeria de angústia → Histeria de conversão → Neurose obsessiva →Demência precoce (esquizofrenia) → Paranóia → Melancolia-Mania
4: NOSOGRAFIA FREUDIANACentro de Medicina Psicossomática e Psicologia Médica do Hospital Geral da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro
PRIMEIRA CLASSIFICAÇÃO Baseada nos conhecimentos iniciais:
teoria do trauma/sedução, diferentes defesas contra idéias incompatíveis e início da teoria da libido: dividiu as doenças mentais funcionais em:
Neuroses Atuais (conflitos atuais, sintomas resultantes da insatisfação sexual)
Psiconeuroses de Defesa (conflitos infantis, sintomas seriam suas expressão simbólicas).
PRIMEIRA CLASSIFICAÇÃO:
1) NEUROSES ATUAIS: Neurastenia estase da libido levando
à fadiga física Neurose de angústia transformação da
libido em angústia Hipocondria psicose atual
PRIMEIRA CLASSIFICAÇÃO:
2) PSICONEUROSES DE DEFESA: Neurose histérica: vítima da
sedução, repressão da sexualidade Neurose obsessiva: agente da
sedução, deslocamento do afeto Fobia: deslocamento do afeto Parafrenias (psicoses): rejeição da
experiência
SEGUNDA CLASSIFICAÇÃO: Elaboração do conceito de Narcisismo.
Abandonou o conceito de parafrenias para nomear psicoses e passou a considerá-las neuroses narcísicas. Neurose atual caiu em desuso.
Classificação baseada na teoria da libido: diferentes defesas contra fantasias eróticas, agressivas e homossexuais; teoria da transferência e das relações objetais.
SEGUNDA CLASSIFICAÇÃO:
1) PSICONEUROSES: Histeria (regressão a uma situação
infantil ou regressão temporal), e Fobias defesas contra fantasias sexuais; Neurose Obsessiva (regressão a formas
anteriores de satisfação pulsional) defesas contra fantasias agressivas
SEGUNDA CLASSIFICAÇÃO:
2) NEUROSES NARCÍSICAS: Demência Precoce defesa
contra homossexualidade Melancolia defesa
contra perda ambivalente Paranóia defesa
contra a homossexualidade
TERCEIRA CLASSIFICAÇÃO:
1- Psiconeuroses: Histeria Fobia defesas contra
a sexualidade Neurose Obsessiva
defesa contra a agressividade
TERCEIRA CLASSIFICAÇÃO:
2- Neuroses Narcísicas: Melancolia a transferência ocorre;
“caldo puro de pulsão de morte”3- Psicoses: Esquizofrenia a transferência não
ocorre por regressão ao narcisismo (fase pré-objetal); defesa contra a homossexualidade
5: TEORIA PSICOPATOLÓGICA DA HUMANIDADE
SEQUÊNCIA DAS NEUROSES
Histeria de angústia → Histeria de conversão → Neurose obsessiva →Demência precoce (esquizofrenia) → Paranóia → Melancolia-Mania
HISTERIA DE ANGÚSTIA (FREUD, 1914, p. 74-75)
INVESTIMENTO CORPORAL: BOCA E SEIO (pela escassez de alimentos)
MEDO – PERIGO IMINENTE DOR – ANGÚSTIA IRREPRESENTÁVEL
(período sem fala – na histeria a palavra é utilizada como expressão e não como experiência e significação)
DISTÚRBIOS DA ORALIDADE: Invenções deste período Voltados para uma satisfação
nirvânica
Anorexia, Bulimia, Drogadicção
Íntima relação com a boca e a respiração
HISTERIA DE CONVERSÃO (FREUD, 1914, p. 76)
Deslocamento do objeto genital (ciclo natural reprodutivo) para um outro objeto capaz de provocar prazer.
Pode ser considerada perversão: investimento libidinal em um órgão qualquer (Freud).
Reprodução era ameaçadora pela escassez de recursos para manutenção da espécie
HISTERIA DE CONVERSÃO Forma-se o corpo erógeno e a
complexidade maior do psiquismo. Humanidade entra numa fase
hipocondríaca – concepção erógena do corpo, cada parte se transforma num objeto de prazer.
Perversão vista como uma conversão. Doenças psicossomáticas.
FASE OBSESSIVA (FREUD, 1914, p. 77-78)
Domínio do mundo pelas invenções, pelo intelecto. Novas conquistas pela linguagem. Compreensão do mundo por intermédio do pensamento, do próprio eu.
‘Pai’ primitivo: domínio ilimitado dos outros pelo seu poder de proporcionar proteção aos desamparados.
FASE OBSESSIVA
Constitui o pai primitivo e assassinato do pai da horda (castração)
origem da palavra (perda do olfato). Sonho e desejo: contemporâneos da
invenção da palavra (supõem a perda de contato com o objeto, a vivência do prazer).
OBSESSIVIDADE ACENTUAÇÃO EXAGERADA DO
PENSAR; ENERGIA RETORNANDO NA COMPULSÃO; ONIPOTÊNCIA DO PENSAMENTO; TENDÊNCIA PARA LEIS INVIOLÁVEIS.
Paralisação da energia vital do indivíduo – deslocada para insignificâncias
OBSESSIVIDADE A AMEAÇA DE CASTRAÇÃO
PRODUZ A PASSIVIDADE, A SUBMISSÃO E O HOMOSSEXUALISMO (grande conquista cultural que permite o aparecimento e o desenvolvimento das relações sociais). P.51
NEUROSES NARCISISTAS (FREUD, p. 78-80)
A PREDOMINÂNCIA E O ASSASSINATO DO PAI INAUGURA O CICLO DAS NEUROSES NARCISISTAS (2ª classificação das doenças em Freud).
ESQUIZOFRENIA PARANÓIA MELANCOLIA
6: DOENÇA MENTAL E PSICOLOGIA – Foucault
Cada doença, segundo sua gravidade, abole certas condutas que a sociedade em sua evolução tinha tornado possíveis, e as substitui por formas arcaicas de comportamento:
DIÁLOGO → MONÓLOGO
Ao diálogo substitui uma espécie de monólogo no qual o sujeito conta a si próprio o que faz, ou então no qual ele trava, com um interlocutor imaginário, um diálogo que ele seria incapaz de travar com um parceiro real. Torna-se difícil agir sob os olhares do outro: apresentam fenômenos de liberação emocional como tiques, mímicas, mioclonias.
PERDE UNIVERSO SIMBÓLICO
Perdendo a virtualidade ambígua do diálogo, o doente perde o domínio de seu universo simbólico; as palavras e os gestos não constituem mais o domínio comum no qual se encontram as intenções de si próprio e dos outros, mas significações existindo por si mesmas, de uma existência maciça e inquietante.
DELÍRIO → ALUCINAÇÃO Parece depender de uma patologia da
crença, como conduta inter-humana; o critério social da verdade não tem mais valor para o doente; neste mundo no qual apagou-se o olhar do outro torna-se permeável às alucinações e aos delírios. O doente é remetido a formas arcaicas de crença→projetava seus desejo e temores em fantasmagorias.