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APONTAMENTOS DE DISPOSITIVOS SEMICONDUTORES LICENCIATURA DE ENGENHARIA ELECTRÓNICA IST 2004-2005

Teoria-semicondutores - Técnico Lisboa - Autenticação · - 1.1 - Capítulo 1. Semicondutores Os semicondutores são materiais cujas condutividades se situam entre as dos metais

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APONTAMENTOS DE DISPOSITIVOS

SEMICONDUTORES

LICENCIATURA DE ENGENHARIA ELECTRÓNICA

IST

2004-2005

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i

ÍNDICE

Pág.

Cap. 1. Semicondutores ...................................................................................................... 1.1

1.1 Modelos das ligações de covalência .............................................................................. 1.1

1.2 Modelo das bandas de energia ..................................................................................... 1.4

1.3 Geração e Recombinação .............................................................................................. 1.5

1.4 Efeito foto-eléctrico interno .......................................................................................... 1.6

1.5 Função de Fermi-Dirac f(W) e função densidade de estados em energia g(W) ....... 1.7

1.6 Mecanismos de transporte .......................................................................................... 1.14

1.6.1 Deriva ........................................................................................................................ 1.14

1.6.2 Difusão ....................................................................................................................... 1.18

1.7 Equações da continuidade .......................................................................................... 1.18

1.7.1 Cristal neutro e uniforme ........................................................................................ 1.20

1.7.2 Regime estacionário sem condução. Difusão com recombinação ........................ 1.22

1.8 Semicondutores compostos ......................................................................................... 1.25

1.9 Fotocondutividade. Fotoresistências .......................................................................... 1.32

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ii

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- 1.1 -

Capítulo 1. Semicondutores

Os semicondutores são materiais cujas condutividades se situam entre as dos metais (106 a 108

S/m) e as dos isoladores (10-20 a 10-8 S/m). Quando puros, as suas propriedades eléctricas são

fortemente dependentes da temperatura. Designam-se nesse caso por intrínsecos. Quando se

introduzem impurezas no seu seio, os materiais dizem-se extrínsecos, vendo a sua

condutividade fortemente aumentada, mesmo quando a introdução de impurezas é em doses

ínfimas, geralmente inferiores a 0,0001%. A condutividade nos semicondutores é, num caso

geral, da responsabilidade de dois tipos de portadores móveis: uns de carga negativa, os

electrões de condução, e outros de carga positiva, designados por buracos ou lacunas.

1.1 Modelo das ligações de covalência Os semicondutores elementares típicos são o germânio (Ge) e o silício (Si). São elementos da

coluna IV da tabela periódica, que cristalizam no sistema cúbico com a malha de diamante, de

que se mostra uma célula elementar na Fig.1.1. Esta corresponde ao menor conjunto de

átomos que, repetido nas 3 direcções do espaço, reconstitui o cristal. É formada por 1 átomo

nos vértices, que é partilhado por 8 células, 1 átomo no centro das faces, que é partilhado por

2 células, e 4 átomos no interior. Significa que cada célula elementar é constituída por

8/8+6/2+4=8 átomos. A rede de diamante pode ser interpretada como o resultado da

translação de duas redes cúbicas de faces centradas.

a

- Fig.1.1 -

Célula elementar da rede cristalina do diamante.

A estabilidade da estrutura é obtida porque os átomos se agregam de tal modo que a sua

última camada fica completa, por partilha de electrões com os átomos vizinhos. Designa-se

esse tipo de ligação por ligação de covalência. Está representada de forma esquemática na

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- 1.2 -

Fig.1.2, onde cada ligação é representada por um segmento de recta. Corresponde à situação

de energia mínima para os electrões, sendo necessário fornecer-lhes uma energia mínima, dita

de ligação, para os libertar. Na Fig.1.2(a) representa-se a situação em que todos os electrões

de valência se encontram ligados. Por aplicação de um campo electrostático ao cristal não se

verificará nenhuma corrente estacionária, porque todos os electrões estão “presos”. A possível

troca de posição não afectará o sistema, uma vez que os electrões são partículas

indiscerníveis, significando isto que essa eventualidade não está associada a qualquer

fornecimento ou absorção de energia ao sistema. O semicondutor comporta-se como um

isolante. É a situação a 0 K.

+4 +4 +4

+4 +4 +4

+4 +4 +4

+4 +4 +4

+4 +4 +4

+4 +4 +4

(a) (b)

- Fig.1.2 - Ligações de valência num semicondutor intrínseco. (a) T = 0 K (b) T > 0 K.

A uma dada temperatura T já existe interacção do material com o exterior, que se traduz pela

existência de um certo número de ligações quebradas, ou, o que é o mesmo, pelo

aparecimento de electrões livres (Fig.1.2(b)). A aplicação de um campo permite agora a

existência de corrente estacionária, por movimentação dos electrões no cristal. No entanto,

existindo ligações incompletas, às quais está associada uma carga positiva, pode haver

transferência de electrões de umas ligações para as outras. Corresponde no fundo, a uma

movimentação de cargas positivas (os buracos ou lacunas) em sentido contrário. Estas são em

igual número ao das ligações desfeitas. São partículas livres na acepção em que os electrões

de condução o são. Assim, o mecanismo de quebra de ligações de valência está

indissoluvelmente ligado à geração de pares electrão-buraco. Analogamente, quando um

electrão livre é capturado e se restabelece a ligação por perda da sua energia para a rede,

desaparece um par electrão-buraco. Em equilíbrio termodinâmico os 2 mecanismos, ditos de

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- 1.3 -

geração e de recombinação, são obrigatoriamente iguais e, num material como o que foi

descrito, o número de electrões é igual ao número de buracos. O material diz-se intrínseco.

Sendo n e p as concentrações de electrões e de buracos por unidade de volume,

respectivamente, tem-se

inpn == (1.1)

sendo, ni a concentração intrínseca do material semicondutor à temperatura T. Os semicondutores intrínsecos apresentam uma carga móvel relativamente baixa. Para obviar

este problema, utilizam-se os semicondutores extrínsecos. Nestes, alguns átomos do

semicondutor são substituídos por átomos de impurezas, ditas de substituição. Dois casos são

possíveis. Se os átomos de impurezas forem da coluna V da tabela periódica (P, Sb, As, Li),

preenchidas as 4 ligações de covalência sobra um electrão de valência (Fig.1.3(a)). A energia

para libertar esse electrão é cerca de um centésimo da necessária para abrir uma ligação de

covalência, motivo pelo qual à temperatura ambiente praticamente todos os átomos de

impurezas estão já ionizados, por libertação do “quinto” electrão. As impurezas contribuem

assim para o aumento da população de electrões, sem contribuírem para o aumento da

população de buracos. Dizem-se dadoras, sendo os seus iões de carga positiva. Pelo facto da

população de electrões ser superior à de buracos, o material diz-se do tipo n.

+4 +4 +4

+4 +5 +4

+4 +4 +4

+4 +4 +4

+4 +3 +4

+4 +4 +4

(a) (b)

- Fig.1.3 – Ligações de valência num semicondutor extrínseco. (a) tipo n (b) tipo p.

Se pelo contrário as impurezas têm 3 electrões de valência (Al, B, Ga, In), fica uma ligação

por preencher. Com uma energia muito pequena os átomos ionizam-se e recebem um electrão

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- 1.4 -

de valência, que liberta um buraco. A população de buracos aumenta, sem existir a

contrapartida do aumento de electrões. Aparece um ião de carga negativa associada à

impureza, que se diz aceitadora (Fig.1.3(b)). O material diz-se agora do tipo p. De realçar que

apenas os electrões da banda de condução, representados por n, e os buracos, representados

por p, são responsáveis pela corrente eléctrica (portadores). Os iões dadores e aceitadores

apenas contribuem para a carga total do sistema.

1.2 Modelo das bandas de energia Resultados da mecânica ondulatória mostram que os átomos isolados têm níveis de energia

discretos possíveis para os electrões. Nos cristais, a interacção entre os átomos, que estão

muito próximos, desdobra os níveis de energia em bandas. Estas estão separadas por zonas ou

bandas de ocupação proibida. Num semicondutor intrínseco, as duas bandas permitidas de

mais alta energia são, por ordem decrescente de energia, a banda de condução e a banda de

valência (Fig.1.4). O nível de energia mais baixa da banda de condução é designado por WC.

O nível de energia mais alto da banda de valência é designado por WV. Os parâmetros WC e

WV têm características de energia potencial. As bandas estão separadas por uma banda

proibida com uma altura em energia WG, dada por WC-WV, que, para os semicondutores, tem

valores típicos de aproximadamente 1 eV (1 eV=1,6×1019 J). Para T = 0 K a banda de

valência está completamente preenchida e a banda de condução vazia. Corresponde, no

modelo das ligações de valência, a termos todas as ligações de covalência estabelecidas. Uma

banda completamente cheia não contribui para a corrente porque não existem estados livres

para onde as partículas (que verificam o princípio de exclusão de Pauli) possam ir quando

solicitadas pelo campo. Só podem trocar de posições o que, graças à indiscernibilidade, deixa

tudo na mesma. Por outro lado, a banda de condução está vazia. Logo, o semicondutor

comporta-se como um isolador a 0 K. Às baixas temperaturas o panorama é sensivelmente o

mesmo. Para temperaturas próximas da ambiente, os electrões de valência já possuem

energias para saltar a barreira WG e passar para a banda de condução onde se tornam electrões

livres (Fig.1.4(b)). Aí existem muitos estados por ocupar. Além disso, também a banda de

valência já possui estados vazios por ocupar. Estes podem mover-se, por troca de posição com

os electrões de valência. É a colaboração conjunta de locais vagos e dos electrões de valência

que pode ser contabilizada pela existência das entidades de carga positiva designadas por

buracos. De salientar, contudo, que o número de electrões que vencem a barreira é

normalmente pequeno, uma vez que a energia de agitação térmica é pequena comparada com

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- 1.5 -

a altura da banda proibida. À temperatura de 300 K, WG vale aproximadamente 0,66 e 1,1 eV

para o Ge e o Si, respectivamente.

As impurezas de substituição estão associadas a níveis de energia na banda proibida. Este

facto não deve ser tomado como estranho, uma vez que nos estamos a referir a átomos

distintos do hospedeiro. Sendo a perturbação introduzida no sistema pequena, as impurezas

dadoras estão associadas a níveis de energia próximas de WC (Fig.1.4(b)) e os níveis

aceitadores estão associados a valores próximos de WV (Fig.1.4(c)). As energias de agitação

térmica a 300 K tornam possíveis transições entre esses níveis e as bandas permitidas.

Correspondem no modelo anteriormente descrito, à ionização das impurezas de substituição.

As energias envolvidas são muito menores que nos processos banda a banda característicos

dos materiais intrínsecos. Os estados de movimento associados aos níveis das impurezas de

substituição são designados por superficiais. Outras impurezas existem em que as diferenças

para o material hospedeiro são assinaláveis. Introduzem estados profundos na banda proibida,

estando associadas a energias de ionização da ordem de WG/2.

WG

WC

WV

WG

WC

WV

WG

WC

WV

WD

WA

(a) (b) (c)

- Fig.1.4 - Modelo das bandas de energia num semicondutor

(a) intrínseco; (b) extrínseco do tipo n; (c) extrínseco do tipo p.

1.3 Geração e Recombinação A uma dada temperatura existe uma certa probabilidade para que um electrão de valência

receba uma energia WG e se liberte, criando um par electrão-buraco. Chama-se ritmo de

geração Gter ao número de pares electrão-buraco gerados por unidade de volume em cada

unidade de tempo. Exprime-se em [m-3s-1]. O processo inverso é a recombinação R, onde um

electrão de condução por perda da energia WG, restabelece a ligação, fazendo desaparecer um

par electrão-buraco. Obviamente em equilíbrio termodinâmico os dois ritmos devem ser

iguais, pois se assim não fosse a energia do electrão estaria sempre a aumentar (Gter>R) ou a

diminuir (Gter<R), e o sistema não estaria em equilíbrio termodinâmico.

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- 1.6 -

Em primeira análise podemos admitir que R é proporcional ao produto das concentrações n e

p. A constante de proporcionalidade r é dependente da temperatura

npTrR )(= (1.2)

Em equilíbrio termodinâmico tem-se pois Gter=R, pelo que

00)( pnTrGter = (1.3)

onde n0 e p0 representam as concentrações de electrões e de buracos em equilíbrio

termodinâmico. A uma dada temperatura verifica-se assim que o produto da concentração de

electrões e de buracos é Gter/r e, portanto, constante. O resultado é independente da presença

de impurezas, desde que estas representem uma pequena perturbação no sistema. Para um

semicondutor intrínseco o seu valor é o quadrado da concentração intrínseca, tal como dado

por (1.1). Para um semicondutor extrínseco, o resultado continua a aplicar-se, significando

que a subida da concentração de um tipo de portadores conduz à descida da concentração do

outro tipo de portadores. Por exemplo, num semicondutor extrínseco do tipo n, a presença de

dadores funciona como uma fonte adicional ao aparecimento de electrões. Ao ionizar-se cada

átomo dador contribui para o aumento da população de electrões em uma unidade, sem

contribuir para a população de buracos. Por outro lado, a agitação térmica associada à

temperatura T contribui igualmente para a concentração dos dois tipos de portadores. É assim

natural que a população de electrões aumente em relação à observada no intrínseco à mesma

temperatura. As equações (1.1) ou (1.3) mostram que a população de buracos desce em

relação ao valor intrínseco. Tal facto resulta de a população de buracos ver o seu ritmo de

recombinação aumentar com o aumento da população de electrões. Este efeito é contabilizado

por um parâmetro, que se designa por tempo de vida médio. Diremos então que, devido ao

aumento da população de electrões, o tempo de vida médio dos buracos diminuiu. Sendo o

sistema electricamente neutro, a concentração de cargas negativas deve ser numericamente

igual à concentração de cargas positivas, ou seja

+− +=+ DA NpNn (1.4)

A expressão anterior mostra que a diferença entre as populações de electrões e de buracos

pode interpretar-se como a neutralização da presença simultânea de impurezas de dois tipos,

ficando o semicondutor com carácter n ou p conforme as impurezas que predominarem e

como se estas existissem com o valor dado pelo seu excesso face à outra.

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- 1.7 -

1.4 Efeito foto-eléctrico interno O efeito fotoeléctrico interno corresponde a um processo de geração de pares electrão-buraco,

ou seja à quebra de ligações de covalência, quando o semicondutor está sujeito à acção de

uma radiação electromagnética conveniente. O seu ritmo designa-se por Gef e, tal com Gter,

exprime-se em [m-3s-1]. Sendo a radiação electromagnética constituída por partículas,

designadas por fotões, para que exista geração de pares electrão-buraco é necessário que os

fotões tenham uma energia associada de pelo menos WG. Sendo hf a energia de um fotão da

radiação de frequência f

GWhf ≥ (1.5)

sendo h=6,62×10-34 [J.s] a constante de Planck. A equação (1.5) mostra que o processo de

libertação de electrões de valência por efeito foto-eléctrico interno está sobretudo relacionado

com as características energéticas que estão associadas aos fotões. Acima da frequência

mínima, a intensidade de radiação é importante, aumentando o número de pares gerados com

a intensidade. Abaixo dessa frequência, o mecanismo de geração por efeito foto-eléctrico não

se verifica, por mais intensa que seja a radiação. Diz-se então que o material é transparente à

radiação. Numa situação estacionária, o ritmo de geração total é igual ao ritmo de

recombinação

RGGRG efter =+⇒= (1.6)

ou seja,

⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛+=⎟⎟

⎞⎜⎜⎝

⎛+=

+=

ter

efi

ter

efterefter

GG

nGG

rG

rGG

np 11 2 (1.7)

A equação (1.7) mostra que, com iluminação, o produto np deixa de verificar a equação (1.1).

Trata-se efectivamente de uma situação que não é de equilíbrio termodinâmico.

1.5 Função de Fermi-Dirac f(W) e função densidade de estados em energia g(W)

Para determinarmos as relações quantitativas que nos permitem calcular as densidades de

electrões e de buracos num semicondutor teremos que recorrer a considerações de ordem

quântica. Para electrões de condução com energias próximas de WC e para electrões de

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- 1.8 -

valência com energias próximas de WV tem-se

CC

C WWmpWW >+= *

2

2 (1.8.a)

VV

V WWmpWW <+= *

2

2 (1.8.b)

com 0* >Cm e 0* <Vm . Trata-se da adaptação a um formalismo clássico, em que a energia total

da partícula em cada banda é igual à soma da energia potencial, 1ª parcela do 2º membro de

(1.8), com a energia cinética da partícula, dada pela 2ª parcela do 2º membro. A equação

(1.8.a) mostra que para a banda de condução podemos considerar partículas de massa

positiva. São os electrões de condução, com uma densidade volumétrica que representamos

por n. Para a banda de valência, a equação (1.8.b) mostra que a massa a considerar deve ser

negativa. Para entendermos este facto, teremos de atender que esse parâmetro do ponto de

vista quântico deixa de ter um carácter de inércia, podendo nalguns casos ser negativo e não

ser um escalar. Designamo-lo por massa eficaz da partícula. Ela engloba toda a complexidade

da estrutura de bandas presente no cristal, onde o potencial tem uma variação periódica nas

três direcções do espaço. A consideração desse parâmetro permite-nos, dentro de uma

perspectiva clássica, estudar o movimento dos electrões recorrendo à conhecida equação

Eqdtvdm −=* (1.9)

De salientar que para a banda de valência, a utilização da equação (1.9) mostra que a

contribuição de partículas de massa negativa e carga negativa (electrões de valência) pode ser

traduzida por partículas de massa e de carga simétricas. São os buracos. Logo as equações

(1.8) podem ser aplicadas para os electrões da banda de condução com 0** >= nC mm e para os

buracos da banda de valência com .0** >−= Vp mm

Os electrões e os buracos verificam a estatística de Fermi-Dirac. Dizem-se por isso fermiões.

Significa que são partículas que, na sua lei de distribuição, verificam o princípio de exclusão

de Pauli, que diz que num sistema de electrões apenas um electrão pode ocupar cada estado

quântico possível. Além disso são partículas indiscerníveis, isto é, não é possível distinguir

entre duas partículas que no mesmo instante tenham a mesma probabilidade de se encontrar

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- 1.9 -

num certo elemento de volume do espaço. A indiscernibilidade é, aliás, um princípio inerente

à mecânica ondulatória, por contraposição à noção de discernibilidade, conceito restrito à

mecânica clássica.

A função de Fermi-Dirac f(W) representa a probabilidade de um dado nível de energia W estar

ocupado (Fig.1.5). É dada, para uma temperatura T, por

kT

WW F

eWf −

+=

1

1)( (1.10)

sendo k a constante de Boltzmann, de valor 1,38×10-23[JK-1], e WF o nível de Fermi, que

representa o potencial electroquímico do material. WF goza das seguintes propriedades

KTWf F 05,0)( ≠= (1.11.a)

KTWWWfWWWf FF 00)(;1)( =>=<= (1.11.b)

f(W)

1

0,5

WFW

T

T

T=0

- Fig.1.5 -

Função de Fermi.

As equações (1.11) mostram que, para T=0 K, o nível de Fermi representa o nível de energia

mais alto ocupado e que para qualquer outra temperatura a probabilidade de ocupação do

nível de Fermi é de 50%.

Por mudança de variáveis E=(W-WF)/kT, pode verificar-se que f(E)=1-f(-E), ou seja a

probabilidade de ocupação (dada por f) de um dado nível de energia é igual à probabilidade de

desocupação (dada por 1-f) do nível simetricamente colocado em relação ao nível de Fermi.

Pode mostrar-se que num cristal, para um certo intervalo de energia dW centrado na energia

W, existe um número finito de estados estacionários possíveis para o movimento do electrão

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- 1.10 -

dado por

dWWmmhV

WdN kWW**

30 2

8)(

π= (1.12)

A aplicação de (1.12) para os electrões da banda de condução permite definir a respectiva

função densidade de estados em energia. É dada por

( ) CCnnC WWWWmmhV

Wg >−= **3

0 28

)(π

(1.13)

Analogamente, para a banda de valência teremos

( ) VVppV WWWWmmhVWg <−= **3

0 28)( π (1.14)

O número de electrões é obtido a partir da densidade de estados em energia da banda de

condução que estão ocupados, ou seja

dWWgWfV

dn C )()(1

0

= (1.15)

O número de buracos está associado ao grau de desocupação da banda de valência e, portanto:

( )( ) ( )WgWfV

dp V−= 11

0

(1.16)

Admitindo que a posição do nível de Fermi é tal que se verifica sempre

kTWWkTWW VFFC >>−>>− ; (1.17)

a função de Fermi pode ser substituída pela função de Maxwell-Boltzmann, que corresponde

à estatística clássica. Nessas condições os semicondutores dizem-se não degenerados. É nessa

situação que nos situaremos na análise de todos os dispositivos desta disciplina. Nessas

condições

( )

kTWW F

eWf−

−≅)( (1.18)

Substituindo (1.18) em (1.15), a concentração de electrões é obtida por integração ao longo da

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- 1.11 -

banda de condução

kTWW

CW

FC

C

eNdnn−

−∞

== ∫ (1.19)

onde NC se designa por densidade efectiva de estados na banda de condução e é dada por

2/3

2

*22 ⎟⎟

⎞⎜⎜⎝

⎛=

hkTm

N nC

π (1.20)

Analogamente, a concentração de buracos será dada por

kTWW

V

W VFV

eNdpp−

∞−

== ∫ (1.21)

sendo NV a densidade efectiva de estados na banda de valência dada por

2/3

2

*22 ⎟

⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛=

hkTm

N pV

π (1.22)

Nos semicondutores não degenerados, ou seja os que verificam (1.17), as concentrações de

electrões e de buracos serão sempre muito inferiores a NC e a NV, respectivamente.

As equações (1.19) e (1.21) mostram que o afastamento do nível de Fermi a WC ou a WV é um

indicador de quão extrínseco o semicondutor é. Assim para um semicondutor intrínseco

obtém-se de (1.19)

kTWW

Ci

FiC

eNn−

−= (1.23)

Analogamente, de (1.21) obtém-se

kTWW

Vi

VFi

eNn−

−= (1.24)

Igualando (1.23) e (1.24) é-se conduzido a

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- 1.12 -

2/3

*

*

ln22

ln22 ⎟

⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛−⎟

⎠⎞

⎜⎝⎛ +

=⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛−⎟

⎠⎞

⎜⎝⎛ +

=p

nVC

V

CVCFi m

mkTWWNNkTWW

W (1.25)

A equação (1.25) mostra que o nível de Fermi para o semicondutor intrínseco está

aproximadamente a meio da banda proibida, ligeiramente deslocado para cima pelo facto das

massas de electrões serem menores que as massa de buracos

lnF FiW WkT

i F Fii

nn n e W W kTn

= ⇒ = + (1.26)

Num semicondutor extrínseco de tipo n tem-se n>ni, pelo que o nível de Fermi se encontra

acima de WFi, ou seja aproxima-se da banda de condução. Analogamente, num semicondutor

de tipo p o nível de Fermi aproxima-se da banda de valência, de acordo com

npkTWWenp FiF

kTWW

i

FFi

ln−=⇒=−

(1.27)

A fig.1.6 representa a concentração de electrões e de buracos num semicondutor de tipo n,

calculada a partir das funções f(W) e g(W) das respectivas bandas.

W

WC

WV

g(W)

WF f(W)

- Fig.1.6 -

Concentrações de portadores num semicondutor de tipo n.

De realçar, contudo, que com o aumento da concentração de impurezas se pode entrar num

domínio para a qual as relações anteriores deixam de ser válidas pois (1.17) deixa de se

verificar. É o caso dos semicondutores degenerados. Multiplicando (1.19) e (1.21) obtém-se

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- 1.13 -

kTW

i

G

eTn−

∝ 32 (1.28)

A concentração intrínseca é assim fortemente dependente da temperatura, sobretudo devido

ao factor exponencial. Calculando a variação relativa de 2in com a temperatura obtém-se

( )

TdT

kTW

nnd G

i

i ⎟⎠⎞

⎜⎝⎛ += 32

2

(1.29)

Assim para o Ge a 300 K a variação de 1º C provoca uma variação de cerca de 9,4% do

quadrado da concentração intrínseca.

A Fig.1.7 mostra o andamento da variação das concentrações de portadores em função da

temperatura numa escala logarítmica. Tomou-se como exemplo uma amostra com dadores.

Zona

intrínseca Zona de

Saturação Zona de

ionização Log n

Log ND

Log pLog n

Log ni

1/T 0∞

Log p

i

- Fig.1.7 -

Influência da temperatura nas concentrações de portadores.

Do equilíbrio termodinâmico e da neutralidade de carga (1.7) obtém-se

22 421

2 iDD nNNn ++= ++

(1.30)

Num semicondutor fortemente extrínseco tem-se +≅ DNn . Assim para temperaturas muito

baixas, a concentração de electrões cresce com a temperatura, uma vez que as impurezas se

vão ionizando. É a zona de ionização. À temperatura ambiente já todas as impurezas estão

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- 1.14 -

ionizadas e portanto n é praticamente constante e igual a ND. É a zona de saturação. Se a

temperatura continuar a subir, o aumento de ni pode fazer com que em (1.30) já não se possa

desprezar a influência da agitação térmica, conduzindo à outra situação extrema onde

.22 +>> Di Nn Nessas condições as concentrações de electrões e de buracos são praticamente

iguais e dadas pelo valor da concentração intrínseca à essa temperatura. É a zona intrínseca.

Representa-se também a variação em escala logarítmica da concentração das minorias com T,

tendo em conta que de acordo com a equação do equilíbrio termodinâmico Gter=R se verifica

inpn ln2lnln =+ (1.31)

1.6 Mecanismos de transporte São os mecanismos de transporte que estão associados à presença de corrente eléctrica.

Podem ser de dois tipos. O primeiro está associado à presença de uma força exterior. Designa-

se por deriva ou condução. O segundo necessita da presença de gradientes de concentração.

Designa-se por difusão.

1.6.1 Deriva Existem forças associadas à estrutura cristalina. Designaremos por forças internas e estão

contidas no conceito que designámos por massa eficaz. As forças exteriores pressupõem, por

exemplo, a aplicação de uma tensão aos terminais do cristal, a sua colocação num meio com

um campo magnético, etc. Mesmo na ausência de uma força exterior os electrões e os buracos

estão animados de movimento. Nesse movimento as partículas sofrem colisões. Estas devem

ser entendidas num sentido mais lato do que aquele que normalmente lhes é atribuído num

domínio clássico. Designamos por colisão qualquer alteração à movimentação da partícula ou

onda que lhe está associada. Se o deslocamento livre da partícula (onda estacionária) sofreu

alterações, a entidade (onda, partícula) esteve sujeita a uma colisão. Estão associadas a vários

factores, como, por exemplo, à agitação térmica. No entanto, mesmo no zero absoluto, o facto

do cristal ter imperfeições (átomos fora de posição, átomos que faltam, deslocações, átomos

de impurezas, ou qualquer outra alteração da periodicidade da rede) conduz à presença de

colisões. Mesmo admitindo o conceito ideal de um cristal perfeito, os seus limites num cristal

finito, nos obrigariam a considerar a interrupção de um potencial periódico e, portanto, a

tomar em linha de conta uma colisão. Assim, as interacções de uma rede cristalina com o que

possa constituir uma imperfeição são traduzidas por colisões.

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- 1.15 -

Sendo o movimento da partícula perfeitamente aleatório na ausência de forças exteriores, o

valor médio da sua velocidade é necessariamente nulo (Fig.1.8(a)). A média deve aqui ser

entendida como uma média tomada sobre uma população representativa num dado instante,

ou como a média tomada ao fim de muitas colisões sobre uma dada partícula. A hipótese

ergódica impõe-nos o mesmo resultado, que é de uma velocidade média nula.

F

(a) (b)

t

n

τlp (c)

- Fig.1.8 - Movimento de uma partícula (a) 0F = ; (b) 0F ≠ ;

(c) Evolução temporal do número de partículas que não colidiram. Admitindo um comportamento do tipo relaxação para as colisões, a diminuição do número de

partículas que ainda não chocaram é proporcional ao seu número, isto é

andtdn

−= (1.32)

cuja solução está representada na Fig.1.8c e é dada por

atenn −= 0 (1.33)

sendo n0 o número de partículas que não chocaram no instante inicial e a a frequência de

choques. O tempo que em média uma partícula leva até chocar designa-se por tempo de livre

percurso médio e é dado por

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- 1.16 -

a

dn

tdn

l1

0

0 ==

∫∞

τ (1.34)

Se existir uma força eléctrica, por exemplo, e se esta corresponder a uma pequena perturbação

no sistema, podemos dizer que existe agora uma componente adicional, dirigida no sentido da

força eléctrica, para a velocidade média (Fig.1.8(b)). A velocidade da partícula é dada pela lei

de Newton, substituindo m pela sua massa eficaz

tm

Eqvn

n *−= (1.35)

O valor médio da velocidade será assim

ln*n nn

qv E Emτ

< >= − = −µ (1.36)

sendo a constante de proporcionalidade µn designada por mobilidade dos electrões. É dada por

*ln

nn m

qτµ = (1.37)

Analogamente, para buracos, a velocidade média é proporcional ao campo eléctrico

Emq

vp

lpp *

τ>=< (1.38)

sendo a constante de proporcionalidade a mobilidade dos buracos, dada por

*p

lpp m

qτµ = (1.39)

A uma velocidade média constante está associada uma corrente constante. Em cada ponto a

densidade de corrente será dada pelo produto da densidade volumétrica de carga ρ pela

velocidade (lei de Ohm na forma local)

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- 1.17 -

EEpnqvqpvqnJJJ pnpnpn σµµ =+=+−=+= )( (1.40)

σ representa a condutividade do material e é, assim, função das densidades dos portadores e

das suas mobilidades

)( pn pnq µµσ += (1.41)

A equação (1.41) mostra que a condutividade dos semicondutores é dependente da

temperatura. A dependência da mobilidade com a temperatura depende dos mecanismos de

colisão envolvidos. Se admitirmos que estes são independentes, podemos dizer que a

existência de m mecanismos em presença conduz a um aumento da frequência de choques de

acordo com

ii

aa ∑= (1.42)

A equação (1.42) mostra que são os inversos das mobilidades que se adicionam, sendo a

mobilidade total dada por

ii µ

µ1

1

∑= (1.43)

A dependência da mobilidade com a temperatura é geralmente uma função muito complexa e

variável com a gama de temperaturas considerada. À temperatura ambiente é usual admitir

que a mobilidade dos portadores diminui com a temperatura, variando segundo 2/1−T ou 2/3−T . Deste modo, a variação da condutividade com a temperatura não corresponde a uma

função monótona. Nas zonas de ionização e intrínseca, o aumento da concentração de

portadores sobrepõe-se a uma eventual diminuição das mobilidades e, portanto, a

condutividade cresce. Na zona de saturação, as concentrações das maiorias são praticamente

constantes e a condutividade diminui devido ao efeito das mobilidades. Nesse caso, as

minorias desprezam-se por serem muito inferiores às maiorias. O aumento de ND e/ou NA

conduz a uma diminuição da mobilidade, uma vez que as impurezas de substituição

funcionam como centros de colisão. A sua acção depende do facto de as impurezas estarem

ionizadas ou não, e, portanto, da gama de temperaturas considerada. Contudo, próximo de

T=300 K a sua influência é em geral desprezável para concentrações inferiores a 1022 m-3.

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- 1.18 -

1.6.2 Difusão Este mecanismo de transporte está associado à presença de gradientes de concentração. Nestas

condições geram-se densidades de corrente de partículas C que são proporcionais aos

gradientes e com constantes de proporcionalidade que se designam por coeficientes de difusão

gradnDC nn −= (1.44.a)

gradpDC pp −= (1.44.b)

O sinal negativo nas equações (1.44) deriva do facto de os fluxos de partículas por difusão

serem das concentrações maiores para as menores e os gradientes serem vectores que apontam

no sentido da função crescente. As densidades de corrente J , tomadas as partículas como

portadoras de carga, são dadas pelo produto do vector C pela respectiva carga. Assim para os

mecanismos de difusão

gradnqDCqJ nnn =−= (1.45.a)

gradpqDCqJ ppp == (1.45.b)

De salientar que se os dois mecanismos estiverem em presença, a densidade de corrente total

será a soma das componentes devidas à condução e difusão. De acordo com (1.40) e (1.45)

gradnqDEqnJJJ nnndifncondn +=+= µ (1.46.a)

gradpqDEqpJJJ pppdifpcondp −=+= µ (1.46.b)

Em equilíbrio termodinâmico obviamente tem-se 0=J . O princípio do equilíbrio

pormenorizado impõem no entanto que cada mecanismo identificável se deva compensar a si

próprio, ou seja, que 0== pn JJ .

1.7 Equações da continuidade As densidades de portadores num ponto de um semicondutor podem variar no tempo, quer

devido aos mecanismos de geração G e de recombinação R, quer devido aos mecanismos de

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- 1.19 -

transporte .C Consideremos então um ponto envolvido por um elemento de volume ,Vδ que

é limitado por uma área Sδ (Fig.1.9)

pC

nC

G

R

n+

C

δV

δS - Fig.1.9 -

Elemento de volume infinitesimal.

A variação do número de partículas, por exemplo electrões, nesse elemento de volume por

unidade de tempo será ,)/( Vtn δ∂∂ supondo que o volume elementar é suficientemente

pequeno para que ( )tn ∂∂ / se possa aí considerar constante. A variação corresponderá, uma

parte, ao desequilíbrio entre os ritmos de geração e de recombinação em Vδ e, outra parte,

devida aos electrões que atravessam, por difusão ou condução, a fronteira desse elemento de

volume

SnCVRVGVtn

nS

δδδδδ

+∫−−=∂∂ (1.47)

onde +n representa a normal exterior ao volume elementar.

De acordo com o teorema da divergência

VCdivdVCdivSnC nnV

nS

δδδδ

== ∫∫ + (1.48)

A equação da continuidade para electrões toma assim a forma

ncondndifn CdivCdivRGCdivRGtn

−−−=−−=∂∂

)( EndivqgradnqDRGtn

nn µ++−=∂∂ (1.49.a)

Analogamente, para buracos tem-se

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- 1.20 -

)( EpdivqgradpqDRGtp

pp µ+−−=∂∂ (1.49b)

Consideremos alguns casos particulares de aplicação da equação (1.49).

1.7.1 Cristal neutro e uniforme Se o cristal for uniforme não existem gradientes das concentrações de portadores e se for

neutro a divergência do campo eléctrico é nula. Nessas condições, na equação da continuidade

as variações temporais das concentrações de portadores resultam unicamente das diferenças

entre os mecanismos de geração e recombinação

rnpprnRGdtdn

tn

−=−==∂∂

00 (1.50)

Na situação de equilíbrio termodinâmico a situação é estacionária e, portanto, G=R, ou seja,

as concentrações de electrões e de buracos são dadas, respectivamente, por n0 e p0. Na

ausência de equilíbrio, a equação mostra-nos como as concentrações, designadas agora por n e

p, evoluem para uma nova situação estacionária, que não de equilíbrio. A resolução da

equação impõe, no entanto, que se saiba a relação entre as concentrações p e n, significando

que a relação (1.50) não é linear com n.

Tomemos como exemplo a situação correspondente à presença de iluminação uniforme, a que

está associado um mecanismo adicional de geração Gef. A iluminação uniforme garante que

não se estabeleçam mecanismos de transporte. Suponhamos que no instante t=0 se retira

bruscamente a iluminação num cristal semicondutor de tipo p. Pretende-se a variação

temporal da concentração n na sua evolução para a nova situação estacionária que é o

equilíbrio termodinâmico (ausência de luz). Uma vez que os excessos são gerados aos pares,

teremos

)()( 0 tnntn ∆+= (1.51.a)

)()( 0 tnptp ∆+= (1.51.b)

sendo ∆n(t) o excesso de pares electrão-buraco associados à iluminação, no instante t após o

corte da iluminação.

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- 1.21 -

Admitamos que a injecção de portadores ∆n associada à iluminação, embora altere

significativamente as minorias, não afecta praticamente as maiorias, isto é, (∆n>>n0 e

∆n<<p0). A injecção de portadores diz-se de fraco nível, sendo neste caso a equação (1.50)

dada por

nn dt

dnnnnrpdtdn

ττ∆

−=∆

⇒−=−= )(1)( 000 (1.52)

O factor τn tem as dimensões de um tempo e representa o tempo de vida médio dos electrões,

ou seja, o tempo que em média um electrão “vive” até desaparecer por recombinação. Sendo

G o ritmo de geração de electrões por unidade de volume e unidade de tempo, Gτ representa a

população de electrões em equilíbrio, n0. Sendo 00 prnG = teremos que 0/1 rpn =τ , ou seja, o

tempo de vida médio das minorias é inversamente proporcional às maiorias. A solução da

equação (1.52) é dada por

0( )t

t e−

τ∆ = ∆ (1.53)

sendo ∆0 o excesso de portadores no instante em que se corta a iluminação.

t

τn,p

∆0

t

τn,p

∆f

(a) (b)

- Fig.1.10 - Evolução temporal da concentração de excessos associados a uma injecção fraca.

(a) Após retirada de iluminação; (b)Após estabelecimento da iluminação

A curva está representada na Fig.1.10(a), verificando-se que a evolução para a situação de

equilíbrio termodinâmico (∆(t)=0) é tanto mais rápida quanto menor for τn.

Suponhamos agora a situação que corresponde ao estabelecimento da iluminação. Assim, se

em t=0 incidir sobre o material uma radiação à qual está associada um ritmo Gef, tem-se na

situação estacionária com iluminação

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- 1.22 -

RGG

GRGGRGGdtdn

ter

efterterefteref =⎟⎟

⎞⎜⎜⎝

⎛+⇒=+⇒=−+= 10 (1.54)

ou, tendo em conta que 2iter rnG = , rnpR = e que a iluminação é fraca obtém-se (1.7)

( )ter

eff

ter

eff

ter

efi G

Gnn

GG

nnnGG

nnp 0002 11 =∆⇒⎟⎟

⎞⎜⎜⎝

⎛+=∆+⇒⎟⎟

⎞⎜⎜⎝

⎛+= (1.55)

∆nf representa assim o valor dos excessos injectados no semicondutor na situação estacionária

com iluminação associada ao ritmo de geração Gef.

A evolução temporal correspondente ao estabelecimento da iluminação é dada por

⎟⎟

⎜⎜

⎛−∆=∆

−n

t

f entn τ1)( (1.56)

Encontra-se representada na Fig.1.10(b).

1.7.2 Regime estacionário sem condução. Difusão com recombinação Este caso é particularmente importante para o estudo das concentrações de minorias num

semicondutor. Para as maiorias, a existência de difusão está associada à presença de

gradientes de concentração importantes, que estará sempre ligado a diferenças apreciáveis das

densidades de carga e, portanto, a campos eléctricos não desprezáveis. No que toca às

minorias, gradientes importantes não envolvem grandes densidades de carga, pois uma ligeira

alteração da distribuição das maiorias a neutralizará.

Consideremos tal como no exemplo anterior, um cristal de tipo n. Desprezando a parcela

devida à condução, a equação da continuidade tomará a seguinte forma

lapnDnn

lapnDRGtn

nn

n +−

=+−=∂∂

τ0 (1.57)

Consideremos a situação estacionária, isto é, aquela em que os valores das densidades de

portadores, apesar de não serem os de equilíbrio termodinâmico, mantêm valores constantes

no tempo, por equilíbrio entre os processos de geração, recombinação e difusão. Nessas

condições, e admitindo apenas uma dimensão de espaço físico

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- 1.23 -

2

200

dxndD

nnn

n

+−

(1.58)

cuja solução é do tipo

nn Lx

Lx

BeAenxn ++=−

0)( (1.59)

sendo nnn DL τ= o comprimento de difusão de electrões. As constantes A e B resultam da

integração da equação e são obtidas a partir das condições de fronteira. Vamos considerar dois

casos que se revelam de particular interesse no estudo de dispositivos de junções.

(i) Cristal infinito

Consideremos, por exemplo, a concentração imposta à entrada de um cristal (x=0) por

incidência de uma radiação. Os valores n1 e n0 representarão, respectivamente, os valores

das concentrações das minorias em x=0, onde houve a incidência de radiação, e na outra

fronteira do cristal, colocada no infinito, onde a influência da radiação não chegou

0)( 0 =⇒=∞ Bnn (1.60.a)

011)0( nnAnn −=⇒= (1.60.b)

Substituindo em (1.60) em (1.59) obtém-se

( ) nLx

ennnxn−

−+= 010)( (1.61)

A distribuição espacial das minorias no cristal semi-infinito está representada na

Fig.11(a). A densidade de corrente de partículas será função de x e é dada por

( )0)()( nxnLD

dxdnDxC

n

nnn −=−= (1.62)

A nn LD / chama-se velocidade de difusão.

(ii) Cristal curto

Consideremos agora que a concentração na outra fronteira (x=b) é imposta

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- 1.24 -

BAnnnn ++=⇒= 011)0( (1.63.a)

nn Lb

Lb

BeAennbn ++==−

02)( (1.63.b)

A solução de (1.59), entrando em linha de conta com (1.63), é dada por

( ) ( ) ⎥⎦

⎤⎢⎣

⎡⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛−+⎟⎟

⎞⎜⎜⎝

⎛ −−+=

nnn Lxnn

Lxbnn

Lbnxn sinhsinh

)/sinh(1)( 02010 (1.64)

n1

n

n0

Ln 0 x

nn1

n2

n0

0 b

x

(a) (b) - Fig.1.11 -

Evolução espacial da concentração de minorias no regime estacionário sem condução (a) Cristal semi-infinito; (b) Cristal curto.

Para o caso de um cristal curto, isto é, aquele em que b<<Ln, tem-se

( )( ) nnnnnn LbLxbLxLxLbLb //sinh;/)/sinh(;/)/sinh( ≅−≅≅ (1.65)

obtendo-se, por substituição de (1.65) em (1.64)

xb

nnnxn 12

1)(−

+≅ (1.66)

A equação (1.66) mostra que para o caso do cristal curto, as minorias têm concentrações

com variações espaciais praticamente lineares (Fig.1.11(b)). A densidade de corrente de

partículas é neste caso praticamente independente de x e dada por

( )21)( nnLD

dxdnDxC

n

nnn −≅−= (1.67)

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- 1.25 -

1.8 Semicondutores compostos

Designam-se por semicondutores compostos aqueles cuja rede cristalina é constituída por

mais do que um elemento, normalmente das colunas II-VI ou III-V do quadro de Mendeléef.

São particularmente importantes pelas suas aplicações, os compostos III-V formados pela

combinação de Al, Ga e In (grupo III) com P, As e Sb (grupo V).

Cristalizam quase todos com a rede da zincoblenda (fig.1.12) que é constituída por duas redes

cúbicas de faces centradas que se interpenetram. Cada átomo encontra-se ligado aos quatro

vizinhos próximos por ligações de covalência de modo a garantir o máximo de estabilidade. A

disposição espacial corresponde a um átomo no centro de um tetraedro (elemento do grupo

III) ligado aos quatro outros que se encontram nos vértices do mesmo tetraedro (elemento do

grupo V).

A malha elementar é um cubo constituído por quatro átomos do elemento do grupo III, que se

encontram no seu interior, e por catorze átomos do elemento pentavalente (oito nos vértices e

seis nos centros das faces). Estes últimos, estando associados a mais do que uma malha

elementar, garantem que cada uma delas seja constituída em média por quatro átomos do

elemento do grupo III e por quatro átomos do elemento do grupo V.

a

- Fig.1.12 –

Estrutura da zincoblenda. Malha elementar.

Designa-se por electro-negatividade de um elemento a sua capacidade de atrair um electrão

para si quando faz parte de um composto. Por exemplo, no GaAs o átomo de As apresenta

electro-negatividade 2, enquanto o Ga tem electro-negatividade 1,6. Deste modo, os electrões

localizam-se preferencialmente mais próximos do As, dando origem a uma diferença de carga

entre os átomos de Ga e As, que deve ser contabilizada na ligação atómica. Paralelamente à

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- 1.26 -

ligação covalente, existe assim nos semicondutores compostos uma ligação do tipo iónico,

uma vez que tendo os átomos diferentes electro-negatividades diferentes, o centro de

gravidade das cargas positivas não coincide com o centro de gravidade das cargas positivas.

Elemento Raio covalente (A) Electro-negatividade

Al 1,26 1,5

Si 1,17 1,8

P 1,1 2,1

Ga 1,26 1,6

Ge 1,22 1,7

As 1,18 2,0

In 1,44 1,6

Sb 1,36 1,9

Tabela 1.1

A contribuição iónica é geralmente mais forte nos compostos III-V de maior altura da banda

proibida. Na tabela 1.1 apresentam-se os raios covalentes e as electro-negatividades de alguns

elementos.

Os semicondutores compostos são obtidos laboratorialmente fazendo crescer o material sobre

um dado substrato. Designam-se esses processos por tecnologia epitaxial, que incluem por

ordem crescente de complexidade, a epitaxia por fase líquida (LPE), por fase gasosa (VPE) e

por feixe molecular (MBE).

As bandas de energia para os semicondutores podem ter representação em função do número

de onda K. É muito usual em cristalografia a utilização do espaço K, designado por espaço

recíproco, ou seja (Kx, Ky, Kz) em vez do espaço físico usual (x, y, z). O número de onda está

relacionado com o momento da partícula pela relação

zyxzyx Khp ,,,, 2π

= (1.68)

A relação entre a energia e o vector de onda é assim dada pela relação parabólica

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- 1.27 -

*2

22

8 mKhW

π=

(1.69)

estando a massa eficaz associada à concavidade da curva W(K)

1

2

2

2

2*

4

⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛=

dKWdhm

π (1.70)

A Fig.1.13 representa, no domínio do número de ondas, as bandas de condução e de valência

dadas por relações do tipo (1.69) próximo dos extremos. De salientar que as bandas referentes

a buracos são mais abertas, indicador que as massa efectivas de buracos são maiores que as

dos electrões. A banda de valência apresenta duas sub-bandas com curvaturas diferentes e

com um ponto comum em K=0. Os buracos que lhes estão associados têm assim massas

diferentes, designando-se por buracos leves e por buracos pesados. De modo a fornecer o

máximo de informação é usual fazer a representação da relação W(K) nas direcções do espaço

K com maior grau de simetria, motivo pelo qual nas figuras geralmente apresentadas os

sentidos negativo e positivo do eixo das abcissas não devam ser tomados como simétricos.

WG Fotão Fotão

Fonão

WG

(a) (b)

- Fig.1.13 - Estrutura de bandas nos semicondutores. Relação de dispersão W(K).

(a) Material de banda directa; (b) Material de banda indirecta. A figura mostra que estes materiais apresentam para a banda de condução relações do tipo

parabólico em torno de vários mínimos. Designam-se por vales cada uma das zonas da banda

de condução em torno de um mínimo. Se o mínimo da banda de condução e o máximo da

banda de valência se localizam para o mesmo valor de K, o material diz-se de banda directa

(Fig.1.13(a)). As transições entre bandas requerem apenas a conservação de energia, uma vez

que a conservação do momento (ou do número de onda) está automaticamente garantida. Para

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- 1.28 -

a conservação da energia pode recorre-se à presença de fotões com energia compatível, isto é

hfWW G == . Noutros materiais os mínimos da banda de condução e os máximos da banda

de valência não se dão para o mesmo valor de K. Então nas transições entre bandas tem de se

recorrer a partículas que garantam a conservação de momento. Não podem ser fotões, que

possuem um momento desprezável. São os fonões, ou quantum de energia vibracional, e

representam a entidade corpuscular associada à vibração da rede cristalina. O material diz-se

de banda indirecta (Fig.1.13(b)).

A tabela 1.2 representa os valores de alguns parâmetros dos semicondutores binários III-V.

Como termo de comparação referem-se também os semicondutores elementares germânio e

silício. As designações D e Z correspondem ao tipo de estrutura, diamante e zincoblenda,

respectivamente. Os materiais de banda directa e indirecta são designados por Dr e I.

Material Estrutura a (Å) WG(eV)

300 K 0 K µn(m2V-1s-1) µp(m2V-1s-1) ε/ε0 Banda

Ge D 5,64613 0,66 0,74 0,39 0,19 16 I

Si D 5,43095 1,12 1,17 0,15 0,045 11,9 I

AlSb Z 6,1355 1,58 1,68 0,02 0,042 14,4 I

GaSb Z 6,0959 0,72 0,81 0,5 0,0850 15,7 Dr

GaAs Z 5,6533 1,42 1,52 0,85 0,04 13,1 Dr

GaP Z 5,4512 2,26 2,34 0,011 0,0075 11,1 I

InSb Z 6,4794 0,17 0,23 8 0,125 17,7 Dr

InAs Z 6,0584 0,36 0,42 3,3 0,046 14,6 Dr

InP Z 5,8686 1,35 1,42 0,46 0,015 12,4 Dr

Tabela 1.2

Além dos materiais compostos binários existem os ternários e os quaternários. Os compostos

ternários são formados por compostos binários que tenham um elemento comum. A obtenção

de redes cristalinas mais perfeitas nos semicondutores compostos é facilitada quando as

constantes da rede são próximas nos materiais binários que os constituem. De uma forma

genérica os binários AB e BC permitem constituir o ternário AxBC1-x, em que os elementos A

e C partilham a combinação com o elemento B em valores relativos x e 1-x, respectivamente.

A variação de x é muito importante na definição das propriedades eléctricas e ópticas dos

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- 1.29 -

compostos, sendo já hoje obtida por via tecnológica de forma muito controlada. Convém

assinalar que de uma forma geral, as propriedades dos compostos não são uma combinação

linear da composição. Por exemplo, para a constante da rede podemos tomar uma variação

linear mas para a relação para a altura da banda proibida, obtida de forma empírica, é

usualmente tomada como quadrática (tabela 1.3), de acordo com

2

1)( cxbxWxW GG ++= (1.71)

sendo WG1 a altura da banda proibida do material binário de menor banda e b e c constantes.

As alturas das bandas proibidas associadas às transições directas e indirectas variam com a

composição x, podendo a posição relativa dos vales no material variar (Fig.14). Quer isto

dizer que o material pode ser de banda directa para uma dada composição e de banda indirecta

para outra. Por exemplo, o AlxGa1-xAs é um composto ternário de banda indirecta para

x>0,35. Como os vales têm concavidades diferentes, estão-lhes associadas massas eficazes de

valores muito diferentes, significando que as mobilidades dos electrões são também muito

diferentes.

x

x2

x1

Banda de condução

Banda de valência 1

2

3

- Fig.1.14 -

Variação da altura da banda proibida com a composição nos compostos ternários. Semicondutor x1 é de banda directa (transição 1→2); Semicondutor x2 é de banda indirecta (transição 1→3).

Percebe-se assim que ao variar a composição, as mobilidades variem, e de forma não linear.

Acresce o facto de, ao constituir-se uma combinação de materiais diferentes, se introduzam

interacções adicionais e, portanto, as mobilidades do composto ternário tomem para qualquer

combinação x, valores inferiores às dos compostos binários.

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- 1.30 -

Material b C

In1-xGaxAs 0,63 0,45

InAs1-xSbx -0,771 0,596

InAs1-xPx 0,891 0,101

GaAsxSb1-x -0,32 1,005

Tabela 1.3

Os semicondutores quaternários representam-se genericamente por AxB1-xCyD1-y, onde os

elementos A e B são trivalentes e os elementos C e D são pentavalentes. O seu interesse,

apesar da complexidade envolvida, reside no uso conjunto de binários e ternários para formar

estruturas de junções de materiais distintos adaptadas. Por exemplo, a 900ºC o GaAs e o AlAs

apresentam valores idênticos para a constante de rede. No entanto, atendendo a diferentes

coeficientes de dilatação térmica, a 300 K isso já não acontece. O resultado é o aparecimento

de tensões internas indesejáveis nas hetero-estruturas. O problema pode ser atenuado com o

uso de quaternários, uma vez que nestes casos, existe um grau de liberdade adicional

associado à composição y (ou 1-y) dos elementos pentavalentes.

O composto In1-xGaxAsyP1-y tem especial interesse no domínio da comunicação óptica,

sobretudo por estar associado à emissão de radiação na gama de 1,3-1,55 µm, onde as fibras

ópticas apresentam características muito vantajosas de atenuação e dispersão. O material é

obtido por crescimento epitaxial sobre um substrato de InP. É pois condição essencial que

exista uma boa adaptação com esse material, ou seja, que as respectivas constantes de rede

sejam iguais. A constante de rede do quaternário é dada por

( ) BDBCADACQ ayxxyaayxyaxyxa )1()1)(1()1(, −++−−+−= (1.70)

sendo aAC, aAD, aBC, aBD os parâmetros de rede dos binários AC, AD, BC e BD,

respectivamente.

A outra condição que permite a escolha do material é o valor de WG, que deve garantir uma

emissão com um comprimento de onda λ na gama pretendida, sendo λ=c/f e hf=WG.

A Fig.1.15 representa a gama de comprimentos de onda correspondentes a vários

semicondutores compostos.

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- 1.31 -

0,1 0,5 1 5 λ(µm)

InGaAsP GaAsSb InAsP

(AlGa) InAs AlGaAs

GaAsP InGaAs

(AlGa) InP CdSSe

CdZnS

- Fig.1.15 -

Gama de comprimentos de onda dos semicondutores compostos mais usuais.

A Fig.1.16 representa a banda proibida e o parâmetro de rede para os compostos da família do

InGaAsP. Na figura os compostos binários são representados por pontos, os ternários por

linhas e os quaternários por superfícies planas. A sombreado representa-se a família do

quaternário InGaAsP, entre a qual se incluem aqueles que na figuram estão representados por

linhas a tracejado e que correspondem aos que se adaptam a um substrato de GaAs ou de InP.

São particularmente importantes estes últimos (1,1µm<λ<1,65µm), pois incluem os

comprimentos de onda de 1,3 e 1,55 [µm], importantes para comunicação por fibra óptica.

.

.

.

.

InAs

InP

GaP

GaAs

0,5 1,0 1,5 2,0 2,5

5,4

5,5

5,6

5,7

5,9

6,1

6,2

6,0

5,8

a (Å)

WG (eV)

.

.

.

.

- Fig.1.16 -

Banda proibida e parâmetro de rede para os semicondutores compostos da família InGaAsP.

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- 1.32 -

A possibilidade de obter de forma controlada os materiais com as características que se

pretendam permite falar numa Engenharia de Estrutura de Bandas. Assim por exemplo, por

manuseamento da altura da banda proibida WG

(i) As propriedades eléctricas do material serão alteradas, uma vez que esse parâmetro afecta

como se viu de forma acentuada a condutividade do material.

(ii) As propriedades ópticas do material serão alteradas, uma vez que esse parâmetro está

ligado à frequência de emissão do semicondutor, associada à recombinação de um par

electrão-buraco, ou à frequência de detecção de luz, por efeito fotoeléctrico interno.

1.9 Fotocondutividade. Fotoresistências Os dispositivos opto-electrónicos formam um conjunto genérico de dispositivos que se

baseiam na interacção entre a radiação electromagnética e a matéria. Ao longo da disciplina

faremos especial incidência nos dispositivos de material semicondutor, sendo de particular

importância

(i) Os detectores que convertem num sinal eléctrico as alterações das suas propriedades

eléctricas resultantes da incidência de luz. Ex: foto-resistências, fotodíodos,

fototransistores e fototiristores;

(ii) Os emissores de luz que convertem energia eléctrica em energia luminosa. Ex: díodos

emissores de luz (LED-Light Emitting Diode) e fontes coerentes de radiação (LASER-

Light Amplification by Stimulated Emission of Radiation);

(iii) Os conversores optoelectrónicos que convertem energia luminosa em energia eléctrica.

Ex: células solares;

(iv) Os acopladores ópticos que promovem a ligação óptica entre dois circuitos (o emissor e o

detector de luz) que se encontram isolados galvanicamente.

Por uma questão de clareza, os diversos dispositivos irão ser apresentados à medida que for

dada a teoria relativa aos correspondentes dispositivos convencionais. Começaremos então

pelas foto-resistências. O princípio básico dos seu funcionamento é o efeito fotoeléctrico

interno descrito em 1.6. As suas aplicações estão relacionadas com o aumento da

condutividade que se observa no cristal quando submetido à acção de uma iluminação

adequada. Esta deve ter uma frequência tal que os fotões incidentes sobre o material

promovam a geração de pares electrão-buraco. A sensibilidade das foto-resistências será tanto

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- 1.33 -

maior quanto maior for a resistência apresentada na ausência de iluminação. Com efeito, para

uma dada tensão aplicada, menor será a corrente nessas condições, que se designa por

corrente na ausência de iluminação, I0. Como factor de mérito das foto-resistências tem-se,

portanto, um baixo valor de I0. Nesse sentido, os semicondutores intrínsecos apresentam-se

como vantajosos em relação aos extrínsecos. Os materiais utilizados mais frequentemente

dependem da gama de frequências a detectar. Assim para a a gama da radiação visível usa-se

o CdS (∆W=2,42 eV, λlim=0,512 µm). O Ge (∆W=0,67 eV, λlim=1,85 µm) ou o InSb

(∆W=0,18 eV, λlim=6,89 µm) são usados como detectores de infravermelho.

Para um material com uma secção constante S e comprimento L tem-se )/( σSLR = , sendo σ

a condutividade dada por (1.41). Quando iluminado com uma radiação associada a um ritmo

de geração térmica 00 prnGter = , o cristal apresenta na situação estacionária uma

condutividade dada por

( ) ( )pnpn qpnq µµµµσσσ +∆++=∆+= 000 (1.71)

onde σ0 e ∆σ representam a condutividade na ausência de iluminação e a variação de

condutividade com a iluminação, respectivamente, e ∆ a concentração dos pares gerados por

efeito fotoeléctrico interno.

A equação estacionária correspondente a uma iluminação uniforme obtém-se da equação de

transporte considerando o ritmo de geração igual ao ritmo de recombinação

( ) 200 ∆++∆=−= rpnrGRGef (1.72)

Consideremos o caso da injecção ser fraca, isto é, aquela que não afecta a concentração das

maiorias, embora possa alterar significativamente as concentrações das minorias. Nessas

condições

( )00 pnrGef +∆= (1.73)

ou seja, o ritmo de geração por efeito fotoléctrico é proporcional à variação da concentração

de portadores. Atendendo a (1.71)

( )( ) ef

pn Gpnr

q00 +

+≅∆

µµσ (1.74)

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- 1.34 -

Suponhamos que a foto-resistência está inserida num circuito em que a tensão aos terminais é

imposta constante de valor U. Na ausência de iluminação

L

USRUI 0

00

σ== (1.75)

Com iluminação

L

USRUI σ

== (1.76)

ou seja

( )

( )00 pnLrGUSq

I efpn

+

+=∆

µµ (1.77)

Define-se rendimento da fotocondução como a razão entre o número de pares gerados e

colectados para o exterior e o número de fotões absorvidos. Para um ritmo de geração

uniforme no volume V=SL é dado por

( )( )00

2)( pnrLU

SLGqI np

ef +

+=

∆=

µµη (1.78)

A equação (1.78) permite concluir que

(i) O semicondutor intrínseco tem melhor rendimento que o extrínseco, embora esteja

associado a uma resposta dinâmica pior. Com efeito, o tempo de vida médio dos

portadores tomados como minorias depende da concentração das maiorias. Quanto maior

a concentração das maiorias menor o tempo de vida médio e, portanto, mais rápida é a

resposta às solicitações da iluminação.

(ii) O semicondutor com menor L tem maior rendimento. Mas mais uma vez existe uma

situação de compromisso. Neste caso, embora o rendimento melhore com a diminuição

de L, de acordo com (1.75) a corrente na ausência de iluminação aumenta, piorando o

respectivo factor de mérito.

Para o caso de uma injecção forte a situação estacionária com iluminação permite obter

2∆≅ rGef , ou seja, o sistema deixa de ser linear.