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Tratamento de Água 1. Objectivos O tratamento da água tem por objectivo condicionar as características da água bruta, isto é, da água como encontrada na natureza, a fim de atender à qualidade necessária a um determinado uso. A água a ser utilizada para o abastecimento público deve ter sua qualidade ajustada de forma a: atender aos padrões de qualidade legalmente estabelecidos; prevenir a erupção de doenças de veiculação hídrica, protegendo a saúde pública; tornar a água adequada a diferentes fins; prevenir o aparecimento da cárie dentária nas crianças, através da fluoretação; proteger o sistema de abastecimento de água, principalmente as tubulações e órgãos acessórios da rede de distribuição, dos efeitos danosos da corrosão e da deposição de partículas no interior das tubulações. O tratamento da água pode ser parcial ou completo, de acordo com a análise prévia de suas características físicas, químicas e (micro)biológicas. O tratamento colectivo é efetuado na Estação de Tratamento de Água (ETA), onde passa por diversos processos de depuração. 2. Processos de tratamento de água A prática para a concepção das estações de tratamento de águas superficiais, em grande parte das situações, adopta a combinação das seguintes etapas: clarificação, com o objectivo de remover os sólidos presentes na água; desinfecção, para eliminação dos microrganismos que provocam doenças; fluoretação, para a prevenção da cárie dentária, e controle de corrosão, para preservar a integridade das instalações, maximizando o tempo de vida das mesmas e, consequentemente os ganhos económicos. Para águas subterrâneas, especialmente do aquífero artesiano, mais profundo, frequentemente é dispensada a etapa de clarificação, em função dos baixos níveis de turbidez encontrados. Em função das substâncias presentes nas águas naturais, entretanto, alguns processos específicos diferentes dos anteriormente descritos podem se mostrar necessários. Vários desses processos são complexos, apresentando custo elevado e uma operação especializada. De uma forma ampla, os principais processos de tratamento, com os respectivos objectivos, são apresentados na tabela 1.

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Tratamento de Água

1. Objectivos

O tratamento da água tem por objectivo condicionar as características da água bruta, isto é, da água como

encontrada na natureza, a fim de atender à qualidade necessária a um determinado uso.

A água a ser utilizada para o abastecimento público deve ter sua qualidade ajustada de forma a:

atender aos padrões de qualidade legalmente estabelecidos;

prevenir a erupção de doenças de veiculação hídrica, protegendo a saúde pública;

tornar a água adequada a diferentes fins;

prevenir o aparecimento da cárie dentária nas crianças, através da fluoretação;

proteger o sistema de abastecimento de água, principalmente as tubulações e órgãos acessórios da

rede de distribuição, dos efeitos danosos da corrosão e da deposição de partículas no interior das

tubulações.

O tratamento da água pode ser parcial ou completo, de acordo com a análise prévia de suas características

físicas, químicas e (micro)biológicas. O tratamento colectivo é efetuado na Estação de Tratamento de Água

(ETA), onde passa por diversos processos de depuração.

2. Processos de tratamento de água

A prática para a concepção das estações de tratamento de águas superficiais, em grande parte das

situações, adopta a combinação das seguintes etapas:

clarificação, com o objectivo de remover os sólidos presentes na água;

desinfecção, para eliminação dos microrganismos que provocam doenças;

fluoretação, para a prevenção da cárie dentária, e

controle de corrosão, para preservar a integridade das instalações, maximizando o tempo de vida das

mesmas e, consequentemente os ganhos económicos.

Para águas subterrâneas, especialmente do aquífero artesiano, mais profundo, frequentemente é

dispensada a etapa de clarificação, em função dos baixos níveis de turbidez encontrados.

Em função das substâncias presentes nas águas naturais, entretanto, alguns processos específicos

diferentes dos anteriormente descritos podem se mostrar necessários. Vários desses processos são

complexos, apresentando custo elevado e uma operação especializada.

De uma forma ampla, os principais processos de tratamento, com os respectivos objectivos, são

apresentados na tabela 1.

Page 2: Texto de Apoio Tratamento de Agua Final

Tabela 1 – Principais processos de tratamento da água e respectivos objectivos do tratamento

Processos Objectivos

Mais Frequentes Menos Frequentes

Clarificação - Remoção de turbidez, de microrganismos e de metais pesados.

Desinfecção - Remoção de microorganismos patogénicos.

Fluoretação - Protecção da cárie dentária infantil.

Controle de corrosão

e/ou de incrustrações -

Acondicionar a água, de tal maneira a evitar efeitos corrosivos ou incrustrantes no sistema

abastecedor e nas instalações domiciliárias.

- Abrandamento Redução da dureza, remoção de alguns contaminantes inorgânicos.

- Adsorção Remoção de contaminantes orgânicos e inorgânicos, controle de sabor e odor.

- Aeração Remoção de contaminantes orgânicos e oxidação de substâncias inorgânicas, como o Fe e o

Mn.

- Oxidação Remoção de contaminantes orgânicos e de substâncias inorgânicas, como o Fe e o Mn.

- Tratamento com

membranas Remoção de contaminantes orgânicos e inorgânicos.

- Troca iónica Remoção de contaminantes inorgânicos.

Page 3: Texto de Apoio Tratamento de Agua Final

A presença de componentes orgânicos ou inorgânicos na água bruta, em concentrações excessivas,

conduz à necessidade de se implantar processos especiais, com elevado custo e operação complexa, por

isso mesmo deve-se fazer uma selecção da fonte de água, e fazer-se uma boa gestão das bacias/aquíferos

por forma a se prevenir à presença de componentes indesejáveis nos corpos de água.

Clarificação

A etapa de clarificação é constituida por um conjunto de operações unitárias, destinadas à remoção de

sólidos.

A clarificação, cuja função essencial consiste na remoção da turbidez, apresenta uma grande importância

no tratamento de águas para o abastecimento, e visa responder ao parâmetro turbidez na potabilidade da

água. Uma água que atenda aos rigorosos requisitos de turbidez dos padrões de potabilidade, garante:

uma aparência esteticamente adequada;

quantidades reduzidas de microorganismos;

desempenho adequado durante o processo de desinfecção, devido à ausência de sólidos capazes de

proteger os microorganismos patogénicos da acção do desinfectante.

A remoção da cor da água, quando em teores baixos, ocorre durante os processos de coagulação e

filtração, sendo que na filtração rápida são obtidos melhores resultados que na filtração lenta.

As operações que podem ocorrer durante a operação de clarificação são resumidas a seguir:

Coagulação - operação na qual é realizada a desestabilização dos colóides presentes na água,

permitindo assim que eles posteriormente se aglutinem, formando flocos, passíveis de serem

separados na sedimentação ou na filtração;

Floculação - formação de flocos, mediante a introdução de energia na massa líquida, capaz de

favorecer o contacto entre os colóides desestabilizados e permitir a sua aglutinação;

Sedimentação - separação dos sólidos da água, pela acção da gravidade, e

Filtração - passagem da água por um leito de material granular, através do qual ocorre a separação das

partículas presentes na água. Os processo de filtração são classificados, em função do sentido do fluxo,

em descendentes ou ascendentes, e, em função da velocidade de filtração, em rápidos (120-360

m3/m2.d) ou lentos (3-14 m3/m2.d).

No processo de clarificação, a filtração é uma operação essencial, também denominada de barreira

sanitária do tratamento, uma vez que não se pode garantir uma adequada segurança da água não filtrada,

no tocante à presença de microorganismos patogénicos. Além disso, dificilmente consegue-se atingir o

padrão de turbidez recomendado, sem que se submeta a água bruta à filtração. As demais operações

podem ser dispensadas, em determinadas situações, dependendo das características da água bruta.

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Quando todas as quatro operações são previstas em uma instalação de tratamento, além do processo de

desinfecção, tem-se o denominado tratamento clássico ou convencional.

Filtração

Algumas modalidades e importantes características dos processos de filtração são:

a) Pré-filtração

Utilizado como pré-tratamento para a filtração lenta, aliviando esta unidade de algumas impurezas,

especialmente sólidas. Na pré-filtração ocorre também a remoção da carga (micro)bacteriológica da água

bruta, já que parte dos organismos é removida conjuntamente com os sólidos. A pré-filtração é usualmente

empregado junto às captações e pode ser classificada segundo a direção e o sentido do fluxo em pré-filtro

de fluxo horizontal, pré-filtro de fluxo vertical descendente e pré-filtro de fluxo vertical ascendente.

b) Filtração lenta

O tratamento através do filtro lento constitui uma solução bastante simples, do ponto de vista operacional,

em muitos casos se limitando à existência dos próprios filtros, sem instalações para o manuseamento de

produtos químicos.

No filtro lento, as baixas taxas de filtração (3-9 m3/m2.d) determinam um desempenho bastante diferente

daquele característico dos filtros rápidos. Ao contrário desses, a camada superficial do filtro é a

responsável por, practicamente, todo o mecanismo de filtração. Na superfície do leito, a baixa taxa de

aplicação permite a formação de uma camada biológica gelatinosa, constituída por bactérias, algas e

fitoplankton em geral, capaz de exercer uma eficiente função bactericida.

Fisicamente, o filtro é constituído de um tanque, onde é colocada uma camada de areia fina, com

espessura entre 0,90 e 1,20 m, sobre uma camada de cascalho, com espessura entre 0,20 e 0,45 m. Sob a

camada de cascalho, é previsto um sistema de drenagem, para recolhimento da água filtrada.

c) Filtração rápida

Os filtros rápidos (taxa de filtração de 120-360 m3/m2.d) surgiram da necessidade de um maior fluxo para

responder à demanda de água de grandes cidades. Para estas cidades, o filtro lento teria de ocupar áreas

enormes para produzir água suficiente para responder à demanda. A filtração rápida é antecedida de

processos de clarificação que permitem o aproveitamento de águas superficiais mais próximas do centro de

consumo.

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Na filtração rápida, a retenção das impurezas ocupa o meio filtrante ao longo de toda a sua profundidade,

não concentrando-se apenas no topo, como na filtração lenta. Por outro lado, os filtros rápidos exigem

maior controle operacional e pessoal mais qualificado

Do ponto de vista do comportamento hidráulico, essas unidades podem ser classificadas em:

Filtração de fluxo descendente

- de camada simples (areia), e

- de camada dupla (areia e antracite)

Nesse tipo de filtração, a água percorre a camada filtrante de cima para baixo, e do material mais fino para

o material mais grosso. A lavagem do filtro é feita em intervalos de 20 a 40 horas, dependendo das

características da água que chega ao filtro e das condições de operação, em contracorrente, por inversão

de fluxo (isto é, de baixo para cima). A camada-suporte, sobre a qual é colocado o leito filtrante, tem em

média 0,45 m de espessura, e a camada filtrante de 0,40-0,70 m. A altura total da caixa do filtro varia de

3,0-5,0 metros.

Filtração de fluxo ascendente

Esse tipo de filtração funciona em sentido inverso (fluxo de baixo para cima). Dispensa a floculação e a

decantação, sendo aplicado um coagulante alguns minutos antes da filtração. O fluxo de água encontra um

material mais grosseiro nas camadas inferiores do meio filtrante e material mais fino na parte superior. A

lavagem é feita com uma corrente de água no mesmo sentido da filtração. A água filtrada recebe um

desinfectante antes de sua distribuição.

A filtração de fluxo ascendente é aplicável para água bruta de baixa turbidez, pouco poluída, e que não

passe por variações bruscas de qualidade.

Estações compactas

As estações compactas consistem em unidades pré-fabricadas, que reúnem todas a etapas necessárias

para o processo de clarificação. Algumas estações são projectadas para serem transportadas inteiras,

enquanto outras são deslocadas em módulos e montadas no local.

A concepção das estações compactas visa conciliar custos baixos com facilidade de montagem,

procurando minimizar a implantação de muitas unidades auxiliares. É inevitável, porém, a necessidade da

instalação de, pelo menos, uma unidade para o doseamento de produtos químicos.

As estações compactas apresentam diferentes “layout” (arranjos) e diferentes linhas de tratamento, sendo

caracterizados como grupos principais as unidades de filtração directa (usualmente filtração ascendente) e

Page 6: Texto de Apoio Tratamento de Agua Final

as unidades de tratamento clássico (incorporando as etapas de mistura rápida, floculação, decantação e

filtração).

As vantagens da instalação de estações compactas são, de entre outras, as seguintes:

possibilidade de redução de prazos totais para a implantação do sistema;

possibilidade de deslocamento da estação, para atender a outros sistemas, o que pode ser importante

no caso de instalações provisórias (ex: acampamentos de obras), emergências ou de localidades onde

houver a necessidade de ampliação.

A escolha de uma estação compacta deve ser precedida de um estudo cuidadoso de sua aplicabilidade de

acordo com a qualidade da água bruta, das necessidades operacionais, etc.. A opção pela aquisição de

uma estação compacta, por outro lado, deve ser cuidadosa, na medida em que nota-se uma tendência,

pelos fabricantes, de as apresentarem como apropriadas para qualquer situação, o que não é verdadeiro.

Várias dessas unidades são subdimensionadas, para viabilizar um menor custo, provocando sérios

problemas de funcionamento após serem instaladas.

Principais linhas tratamento da água

As tecnologias de tratamento podem ser agrupadas de acordo com o tipo de filtração utilizada, e divididas

entre as que incluem e as não incluem os processos de coagulação, floculação e sedimentação.

Na tabela 2 apresenta-se uma comparação entre as diversas linhas de tratamento, mostrando-se as

características de cada uma.

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Tabela 2 - Comparação entre as diversas linhas de tratamento

Parâmetro

Linha de Tratamento

Filtração Lenta Filtração directa

descendente Filtração directa ascendente Tratamento convencional

Operação simples especializada especializada especializada

Consumo de produtos

químicos Nulo

baixo (dosagem do

coagulante usualmente

inferior a 10mg/l)

baixo (dosagem do coagulante

usualmente inferior a 10mg/l)

alto (dosagem do coagulante

frequentemente superior a 15 mg/l)

Resistência à variação

da qualidade da água baixa baixa moderada alta

Lavagem dos filtros

raspagem da camada superficial

(operação trabalhosa), com baixa

frequência

fluxo ascendente

fluxo descendente (em alguns

casos, problemas para a

remoção completa do Iodo)

fluxo ascendente

Porte da estação É comum limitar-se a pequenas

instalações sem limitações sem limitações sem limitações

Custo de implantação

(US$/hab)

10-100 (muito dependente da taxa de

filtração e do processo construtivo) 2 - 30 5 - 45 10 - 60

Necessidade de área grande pequena pequena média

A tabela 3 mostra os parâmetros usualmente analisados nos vários estágios de tratamento da água.

Tabela 3 – Limites máximos dos teores de parâmetros de água bruta usualmente analisados nos vários estágios de tratamento da água.

Linha de tratamento

Parâmetros - Limites Máximos

Turbidez

(TNU)

Cor

(uC)

Ferro

(mg/l)

Manganês

(mg/l)

Coliformes totais

(NMP/100ml)

Coliformes fecais

(NMP/100ml)

Filtração lenta 10 5 1 0,2 1.000 200

Pré-filtro + filtro lento 50 10 5 0,5 10.000 2000

Filtração directa ascendente 20 25 3 0,5 5.000 200

Filtração descendente em linha* 25 10 - - 1.000 200

* sem floculação e decantação

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Concepção do tratamento

A escolha de uma determinada linha de tratamento deve considerar em detalhe as características da água

bruta e sua variação ao longo das estações do ano, e as vantagens e desvantagens dos diversos

processos.

Além disso é importante lembrar que, na concepção do arranjo das unidades do tratamento, algumas

preocupações devem estar tomadas em consideração, tais como:

1. a concentração das tarefas operacionais, como o manuseamento de produtos químicos e a operação

dos filtros, devem estar próximos da sala de doseamento de produtos químicos;

2. a concentração dos pontos de aplicação de produtos químicos, especialmente aqueles cujo transporte

hidráulico das soluções possibilita deposições nos tubos, próximos à sala de doseamento produtos

químicos, com o fim de se reduzir a extensão dessas tubulações;

3. um aproveitamento óptimo das características topográficas da área, e

4. previsão de futuras ampliações da estação de tratamento, de forma racional.

Utilização de produtos químicos

O processo de tratamento é complementado pela utilização de produtos químicos que visam a alterar

algumas características da água, optimizando as etapas do tratamento ou melhorando o produto final.

A tabela 4 mostra os principais produtos utilizados no tratamento da água e as suas aplicações.

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Tabela 4 - Principais produtos químicos utilizados no tratamento da água e sua respectiva função.

Função Produtos utilizados

Remoção de partículas em suspensão/coagulação

Sulfato de alumínio*

Sulfato ferroso

Sulfato ferroso clorado

Sulfato férrico

Cloreto férrico

Aluminato de sódio

Ajuste do pH

Cal hidratada*

Carbonato de cálcio

Carbonato de cálcio (soda)

Hidróxido de sódio

Dióxido de carbono

Ácido clorídrico

Ácido sulfúrico

Controle da corrosão Cal hidratada*

Carbonato de sódio

Hidróxido de sódio

Polifosfatos de sódio

Remoção ou controle do desenvolvimento de

microorganismos/desinfecção

Cloro gasoso*

Hiploclorito de sódio*

Hiploclorito de cálcio*

Amónia hidratada

Hidróxido de amónia

Sulfato de amónia

Ozono

Redução da cárie dentária infantil/fluoretação

Fluorssilicato de sódio*

Fluoreto de sódio

Ácido fluorssilícico*

Fluoreto de cálcio (fluorite)

* mais utilizados.