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PROCURADORIA-GERAL DO TRABALHO Gabinete do Procurador-Geral do Trabalho NOTA TÉCNICA Nº 07, DE 09 DE MAIO DE 2017, DA SECRETARIA DE RELAÇÕES INSTITUCIONAIS DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO (MPT) Proposição: PROJETO DE LEI DA CÂMARA Nº 38, de 2017. Ementa: Altera a Consolidação das Leis do Trabalho CLT, aprovada pelo Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, e as Leis nºs 6.019, de 3 de janeiro de 1974, 8.036, de 11 de maio de 1990, e 8.212, de 24 de julho de 1991, a fim de adequar a legislação às novas relações de trabalho. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO (MPT), no exercício das atribuições constitucionais de defesa da ordem jurídica justa, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, bem como de promoção da dignidade da pessoa humana, da valorização social do trabalho e da justiça social, apresenta esta Nota Técnica, produzida e aprovada pelo Grupo de Trabalho instituído pela Portaria PGT nº 2, de 9 de janeiro de 2017, para expor seu posicionamento acerca do Projeto de Lei da Câmara nº 38/2017, com a finalidade de apontar violações à ordem constitucional, demonstrar o profundo prejuízo ao equilíbrio da relação capital-trabalho, bem como a facilitação das fraudes trabalhistas e da corrupção nas relações coletivas de trabalho, acrescido do aprofundamento da insegurança jurídica. Documento assinado eletronicamente por RONALDO CURADO FLEURY em 09/05/2017, às 19h14min37s (horário de Brasília). Endereço para verificação do documento original: mptdigital.cosmos.mpt.mp.br/processoEletronico/consultas/valida_assinatura.php?m=2&id=296449&ca=SCSDK6U6AH9RC87J

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  • PROCURADORIA-GERAL DO TRABALHO

    Gabinete do Procurador-Geral do Trabalho

    NOTA TCNICA N 07, DE 09 DE MAIO DE 2017, DA SECRETARIA DE RELAES INSTITUCIONAIS DO MINISTRIO PBLICO DO TRABALHO

    (MPT)

    Proposio: PROJETO DE LEI DA CMARA N 38, de 2017. Ementa: Altera a Consolidao das Leis do Trabalho CLT, aprovada pelo Decreto-lei n 5.452, de 1 de maio de 1943, e as Leis ns 6.019, de 3 de janeiro de 1974, 8.036, de 11 de maio de 1990, e 8.212, de 24 de julho de 1991, a fim de adequar a legislao s novas relaes de trabalho.

    O MINISTRIO PBLICO DO TRABALHO (MPT), no exerccio das

    atribuies constitucionais de defesa da ordem jurdica justa, do regime

    democrtico e dos interesses sociais e individuais indisponveis, bem como de

    promoo da dignidade da pessoa humana, da valorizao social do trabalho e da

    justia social, apresenta esta Nota Tcnica, produzida e aprovada pelo Grupo de

    Trabalho institudo pela Portaria PGT n 2, de 9 de janeiro de 2017, para expor

    seu posicionamento acerca do Projeto de Lei da Cmara n 38/2017, com a

    finalidade de apontar violaes ordem constitucional, demonstrar o profundo

    prejuzo ao equilbrio da relao capital-trabalho, bem como a facilitao das

    fraudes trabalhistas e da corrupo nas relaes coletivas de trabalho, acrescido

    do aprofundamento da insegurana jurdica.

    Documento assinado eletronicamente por RONALDO CURADO FLEURY em 09/05/2017, s 19h14min37s (horrio de Braslia).

    Endereo para verificao do documento original: mptdigital.cosmos.mpt.mp.br/processoEletronico/consultas/valida_assinatura.php?m=2&id=296449&ca=SCSDK6U6AH9RC87J

  • 1. NECESSIDADE DE AMPLO DEBATE COM A SOCIEDADE E DA

    PROMOO DO DILOGO SOCIAL

    O PLC n. 30/2017, oriundo da Cmara dos Deputados, no foi objeto

    de um amplo debate social com todos os setores interessados. O PL 6.787/2016,

    enviado pelo Governo Federal Cmara em dezembro de 2016 alterava 7 artigos

    da CLT e 8 artigos da Lei n. 6.019/73. Durante dois meses, foram realizadas

    audincias pblicas e reunies para debater essa proposta. Contudo, o relatrio

    apresentado, em 12 de abril de 2017, pelo Deputado Rogrio Marinho modifica 97

    artigos da CLT, 3 artigos da Lei n. 6.019/74, 1 artigo da Lei n. 8.036/90, 1 artigo da

    Lei n. 8.213/91 e 1 artigo da MP n. 2.226/01. Entre a divulgao do relatrio e a

    aprovao do PL na Cmara (o que ocorreu com modificaes pontuais), houve,

    de acordo com levantamento feito pelo Nexo 1 , meras 26 horas de debate

    parlamentar.

    Naturalmente, a legitimidade de uma reforma de tal amplitude est

    vinculada a um amplo debate prvio com a sociedade e, especialmente, com as

    categorias atingidas, o que no se verificou na Cmara dos Deputados, tendo em

    vista que a proposta tramitou com invulgar celeridade, no permitindo que a

    populao sequer compreendesse todas as repercusses que sero geradas nas

    relaes de trabalho. A proposta atualmente em trmite no Senado em nenhum

    momento foi submetida a debate, seja no parlamento, seja com a sociedade. A

    grande maioria das propostas, apresentada apenas no Substitutivo, foi

    apresentada de forma surpresa.

    Promover uma ampla reforma da legislao trabalhista, construda e

    continuamente alterada durante mais de 70 anos, sem permitir a completa

    compreenso e a participao popular, implica dficit democrtico que

    compromete a legitimidade da nova legislao, em muitos pontos claramente

    prejudicial aos trabalhadores.

    1 NEXO. Como a Cmara aprovou mudanas em 90 artigos da CLT com 26 horas de debate. Disponvel em: https://www.nexojornal.com.br/expresso/2017/04/27/Como-a-C%C3%A2mara-aprovou-mudan%C3%A7as-em-90-artigos-da-CLT-com-26-horas-de-debate. Acesso em 02 maio 2017.

    Documento assinado eletronicamente por RONALDO CURADO FLEURY em 09/05/2017, s 19h14min37s (horrio de Braslia).

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    https://www.nexojornal.com.br/expresso/2017/04/27/Como-a-C%C3%A2mara-aprovou-mudan%C3%A7as-em-90-artigos-da-CLT-com-26-horas-de-debatehttps://www.nexojornal.com.br/expresso/2017/04/27/Como-a-C%C3%A2mara-aprovou-mudan%C3%A7as-em-90-artigos-da-CLT-com-26-horas-de-debate

  • Ademais, importante destacar que, no obstante as audincias

    pblicas realizadas, tanto na Cmara dos Deputados, como nos Estados da

    Federao, percebe-se de forma clara que as inmeras ponderaes feitas por

    parcela considervel dos atores sociais do mundo do trabalho no foram ao

    menos levadas em considerao, tendo em vista que, no atual texto do PLC

    30/2017, no h pontos de consenso ou possveis de aproximao externados

    pelos participantes desses eventos. Entretanto, foram incorporadas somente

    novas propostas que unicamente avanam no atendimento das demandas de um

    setor da relao de trabalho no caso especfico, os empregadores, conforme

    demonstrado em reportagem veiculada pelo The Intercept2.

    A promoo de consultas a toda a sociedade em matrias

    legislativas referentes ao mundo do trabalho que alm de ser um pressuposto do

    Estado Democrtico de Direito, expresso nos arts. 1o e 3o da Constituio Federal,

    um compromisso internacional assumido pelo Brasil, nos termos da Conveno

    n. 144 da OIT, ratificada pelo Brasil em 1994 relevante para que as leis que

    regulamentem o mercado de trabalho sejam fruto de amplo dilogo social,

    realizado de maneira concreta, e no meramente formal.

    A aprovao de medidas que alteram substancialmente a legislao

    trabalhista sem que outras perspectivas sejam materialmente levadas em

    considerao em nada contribui para a construo de um ambiente de pacificao

    social no pas. Nesse sentido, importante recordar do prembulo da Constituio

    da OIT, quando se afirma que a paz para ser universal e duradoura deve assentar

    sobre a justia social.

    2. SOBRE A TERCEIRIZAO SEM LIMITES E O DESVIRTUAMENTO DO

    TRABALHO AUTNOMO.

    O projeto tem o inequvoco propsito de liberar a terceirizao de

    2 THE INTERCEPT. Lobistas de bancos, indstrias e transportes esto por trs de emendas da reforma trabalhista. Disponvel em: https://theintercept.com/2017/04/26/lobistas-de-bancos-industrias-e-transportes-quem-esta-por-tras-das-emendas-da-reforma-trabalhista/. Acesso em 02 maio 2017.

    Documento assinado eletronicamente por RONALDO CURADO FLEURY em 09/05/2017, s 19h14min37s (horrio de Braslia).

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    https://theintercept.com/2017/04/26/lobistas-de-bancos-industrias-e-transportes-quem-esta-por-tras-das-emendas-da-reforma-trabalhista/https://theintercept.com/2017/04/26/lobistas-de-bancos-industrias-e-transportes-quem-esta-por-tras-das-emendas-da-reforma-trabalhista/

  • forma ilimitada, inclusive nas atividades finalsticas da empresa.

    Conforme j se apontou na Nota Tcnica n 04, de 23.01.2017, ao

    permitir a transferncia das atividades inerentes empresa, de forma ampla e

    permanente, a proposta subverte a prpria finalidade conceitual da terceirizao

    oferecida pela Cincia da Administrao, que reside na subcontratao de

    atividades acessrias para permitir a priorizao da empresa em sua atividade

    principal. Com isso, desvirtua-se a figura da terceirizao, que passa a ser

    utilizada como mera locao de mo de obra, acarretando precarizao do

    emprego, bem como reduo e sonegao de direitos trabalhistas e fiscais.

    Ademais, a terceirizao da atividade-fim inconstitucional, pois

    a norma do artigo 7, I, da CF/88 pressupe a relao direta entre o trabalhador e

    o tomador dos seus servios, que se apropria do fruto do trabalho. A terceirizao

    da atividade-fim caracteriza intermediao ou locao de mo de obra, a partir da

    interposio de terceiro entre os sujeitos da prestao de trabalho, reduzindo o

    trabalhador condio de objeto, de coisa. E isto a coisificao do ser humano -

    ofende, frontalmente, os princpios constitucionais da dignidade da pessoa

    humana e do valor social do trabalho.

    Alm disso, a proposta pretende criar a figura do autnomo que

    presta servios contnuos e com exclusividade para uma empresa (art. 442-B),

    instrumentalizando e incentivando a fraude relao de emprego pelo

    desvirtuamento do trabalho autnomo, com severos prejuzos aos

    trabalhadores, que sero excludos de todo o sistema de proteo

    trabalhista, e Previdncia Social, em razo da ausncia de recolhimento

    das contribuies devidas.

    As medidas supostamente compensatrias terceirizao,

    constantes da proposta, revelam-se meramente ilusrias, pois limitam-se ao uso

    de refeitrio e atendimento em ambulatrio mantidos pela empresa contratante,

    situaes raras, encontradas em um nmero insignificante de estabelecimentos. A

    norma no assegura a extenso do fornecimento de vales refeio ou o seu

    equivalente em dinheiro, bem como o fornecimento de plano de sade formas

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  • atualmente utilizadas para a concesso de benefcios indiretos pela imensa

    maioria das empresas.

    Por outro lado, a restrio para recontratao dos empregados

    dispensados, por um perodo de 18 meses (arts. 5-C e 5-D da Lei 6019/74),

    logicamente, no impede que a empresa dispense seus empregados e os

    substitua por outros, contratados como pessoa jurdica, ou, ainda, como

    empregados de empresa terceirizada e com salrios menores e sem as vantagens

    indiretas concedidas aos empregados da contratante.

    Assim, a limitao apenas para a contratao do mesmo

    trabalhador, da mesma pessoa, mas no impede a transformao da vaga de

    trabalho em um posto pejotizado ou terceirizado.

    Acresce que a alterao promovida no texto do artigo 461 da CLT

    possui o inequvoco propsito de impedir ou dificultar a isonomia de direitos entre

    os empregados diretos e os contratados por interposta pessoa, tornando ainda

    mais claro o intuito precarizante da terceirizao sem limites.

    A despeito disso tudo, encontra-se em tramite no Senado, o PL

    30/2015, que foi construdo aps amplo debate em grande parte dos Estados

    da Federao, e que, simplesmente, foi desconsiderando na proposta

    aprovada na Cmara dos Deputados

    3. REPRESENTAO DE TRABALHADORES POR LOCAL DE TRABALHO

    O art. 11 da Constituio Federal prev que nas empresas com mais

    de duzentos empregados, assegurada a eleio de um representante destes

    com a finalidade exclusiva de promover-lhes o entendimento direto com os

    empregadores. A proposta apresentada no PLC 38/2017 prev a introduo

    dessa figura nos arts. 510-A, 510-B, 510-C e 510-D na CLT.

    Em que pese a louvvel iniciativa em se regulamentar a figura do

    representante dos trabalhadores no local de trabalho, a proposta apresentada

    Documento assinado eletronicamente por RONALDO CURADO FLEURY em 09/05/2017, s 19h14min37s (horrio de Braslia).

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  • insuficiente e gera dvidas a respeito da sua execuo.

    De acordo com a doutrina trabalhista3 e com a experincia de outros

    pases que implementaram o referido instituto, os poderes de representao dos

    trabalhadores no local de trabalho so variados: podem ser restritos (como o

    direito de informao e consulta) ou amplos (como a co-gesto da empresa). Ou

    seja, a dimenso dos poderes da representao dos trabalhadores no local de

    trabalho est diretamente vinculada ao espao existente para a participao dos

    trabalhadores na empresa.

    No tocante extenso da participao dos trabalhadores na

    empresa, tambm conforme a doutrina trabalhista e a experincia de outros

    pases, pode haver: (a) direito de informao, no qual o empregador deve

    apresentar informaes a respeito do desempenho empresarial aos trabalhadores;

    (b) direito de consulta, em que h previso dos trabalhadores serem consultados a

    respeito de determinadas matrias; (c) direito de controle, no qual h fiscalizao

    do representante em face de decises empresariais e acompanhamento da

    observncia dos instrumentos coletivos de trabalho; e (d) co-gesto, em que os

    trabalhadores participam da administrao empresarial.

    Da leitura da proposta apresentada no PLC 38/2017, percebe-se

    que nem o mais reduzido grau de representao e de participao dos

    trabalhadores no local de trabalho assegurado. H previso de sete

    atribuies aos representantes no local de trabalho (incisos de I a VII do art.

    510-B), mas no h o reconhecimento dos meios necessrios para o

    adequado desempenho dessas funes.

    Percebe-se que a tnica do papel conferido aos representantes no

    local de trabalho a promoo de conciliao clere e eficaz dos conflitos

    coletivos de trabalho. Contudo, considerando que nem o mais reduzido direito

    de participao dos trabalhadores na empresa, que o direito de

    informao, atribudo aos representantes, nota-se que no h instrumentos

    para que possam desenvolver de forma adequada o dever que lhe imposto.

    3 SILVA, Walkure Lopes Ribeiro da. Representao e participao dos trabalhadores na gesto da empresa. So Paulo: LTr, 1988.

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  • Nesse sentido, temos que a ausncia de poderes que tenham o

    condo de permitir os representantes no local de trabalho a efetivamente serem a

    voz dos trabalhadores dentro da empresa, acaba por esvaziar essa figura e abre

    espao para que se transforme em um fantoche do empregador.

    Ainda, importante frisar que, a despeito da meno a diversas

    experincias europeias exitosas em relao representao dos trabalhadores no

    local de trabalho, a proposta contida no PLC 30/2017 fica muito aqum do que

    existe naqueles pases, no lhe sendo assegurado um conjunto mnimo de direitos

    para que o seu papel seja desempenhado de forma efetiva no mbito da empresa.

    No tocante s decises tomadas pelos representantes no local de

    trabalho, o pargrafo 2 do art. 510-B somente prev a deliberao por meio de

    colegiado, no indicando qualquer hiptese em que haver a necessidade de ouvir

    todos os trabalhadores de uma determinada empresa ou estabelecimento. Isso

    pode tanto gerar um dficit democrtico dessas representaes, como exp-las a

    uma maior presso dos empregadores.

    Finalmente, apontamos algumas omisses na proposta apresentada

    e que podem gerar insegurana jurdica na implementao do instituto. No caput

    do art. 510-C, h disposio a respeito da convocao da eleio, mas no se

    aponta quem ser responsvel por faz-la. A falta de clareza nesse aspecto um

    potencial gerador de conflitos entre empresa, sindicato e trabalhadores. No

    pargrafo 1, h referncia formao de comisso eleitoral para organizao e

    acompanhamento do processo eleitoral, mas sem indicao de quem ir form-la.

    Em que pese se destacar a vedao da interferncia da empresa ou do sindicato

    nesse pargrafo, a falta de clareza sobre a responsabilidade na formao da

    comisso eleitoral tambm tende a gerar conflitos entre empresa, sindicato e

    trabalhadores.

    Tambm, no h qualquer meno a respeito da forma pela qual

    haver a coexistncia entre representantes dos trabalhadores no local de trabalho

    e representantes sindicais, o que pode gerar disputas prejudiciais defesa dos

    interesses dos trabalhadores, alm de violar a Conveno n. 135 da OIT, ratificada

    pelo Brasil.

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  • Portanto, a falta de poderes atribudos aos representantes dos

    trabalhadores no local de trabalho far com que no se realize de forma eficaz o

    papel que deveria desempenhar, sem falar nas omisses sobre o responsvel

    para convocar as eleies, o que gerar insegurana jurdica.

    4. PREVALNCIA DO NEGOCIADO SOBRE O LEGISLADO

    A proposta contida no PLC 30/2017 introduz dois novos artigos na

    CLT, e permite que ocorra a prevalncia do negociado sobre o legislado para o

    rebaixamento dos patamares legais em relao a toda e qualquer matria, com

    exceo dos temas elencados no art. 611-B da CLT, o qual praticamente reproduz

    os incisos do art. 7o da Constituio Federal. O art. 611-A exemplificativo do

    que pode vir a ser negociado.

    A proposta prev ainda que a Justia do Trabalho deve analisar os

    elementos formais do acordo ou da conveno coletiva de trabalho quando houver

    o exame pelo Poder Judicirio, indicando que a baliza deve ser o princpio da

    interveno mnima na autonomia da vontade coletiva (art. 8, 3).

    Os defensores do PLC 30/2017 apontam que h evoluo desde a

    redemocratizao no dilogo social entre trabalhadores e empregadores, que o

    art. 7, XXVI da Constituio Federal um marco nesse aspecto e que h um

    amadurecimento na relao capital-trabalho no pas. Ainda, mencionam o julgado

    do RE 590415/SC para tratar da hipossuficincia nas relaes coletivas de

    trabalho e que a medida proposta tem o objetivo de valorizar a negociao

    coletiva, assegurando o seu alcance e conferindo segurana ao resultado

    pretendido nas tratativas entre trabalhadores e empregadores.

    Merece ser lembrado, inicialmente, que o art. 7, XXVI da

    Constituio Federal, ao prever que so direitos dos trabalhadores urbanos e

    rurais, alm de outros que visem melhoria de sua condio social: XXVI

    reconhecimento das convenes e acordos coletivos de trabalho, j estabelece

    que a conveno ou o acordo coletivo de trabalho possuem fora de lei.

    Contudo, isso se d em das situaes nas quais o contedo do

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  • instrumento coletivo de trabalho prev situaes mais benficas aos

    trabalhadores do que o disposto na legislao. Trata-se da concluso lgica

    da leitura do caput do art. 7 da Constituio, que prev a necessidade de se

    observar que os direitos dos trabalhadores devem melhorar a sua condio

    social e da aplicao de um princpio fundante do direito do trabalho: o da

    proteo (e, para o caso concreto, o subprincpio da norma mais favorvel). A lei

    o piso e os instrumentos coletivos podem dispor de situaes que se

    configurem alm do mnimo previsto aos trabalhadores.

    Ou seja, certo que no Brasil j ocorre a prevalncia do

    negociado sobre o legislado. Desde que o negociado seja mais favorvel que

    o legislado.

    Porm, o objetivo da proposta contida no PLC 30/2017 viabilizar a

    prevalncia do negociado sobre o legislado, em toda e qualquer situao,

    inclusive para minorar ou extinguir direitos, com exceo dos temas previstos

    nos incisos do art. 611-B.

    Dado que o ordenamento brasileiro j prev, incontroversamente, a

    prevalncia do negociado sobre a lei sempre que a negociao significar a criao

    de novo benefcio ou a ampliao de benefcio j previsto em lei, conclui-se que

    o nico propsito do PLC 30/2017 permitir a excluso de direitos

    trabalhistas pela via negocial.

    De fato, h de se concluir que a exclusiva razo de ser da proposta

    garantir que se possa reduzir direitos dos trabalhadores atravs de acordos e

    convenes. Se a inteno com o PLC 30/2017 fosse beneficiar os

    trabalhadores com novos direitos e melhores condies de trabalho, a

    proposta seria completamente desnecessria, eis que j prevista na

    Constituio Federal.

    Outra premissa bsica a respeito da proposta reside na suposio de

    que os sindicatos no Brasil possuem todos os instrumentos para realizar a

    contento a tarefa de defender os interesses da categoria profissional que

    representam.

    A realidade brasileira, no entanto, mostra-se muito distante disso.

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  • impossvel discutir-se a prevalncia do negociado sobre o legislado sem

    antes de proceder reforma da estrutura sindical brasileira, que apresenta

    gritantes e notrios problemas.

    Concebida no Estado Novo varguista sob os auspcios do

    corporativismo, a legislao brasileira pretendeu atrelar os sindicatos ao Estado, o

    que criou uma srie de dificuldades para formao de um movimento sindical

    autnomo. Entre fins da dcada de 1970 e incio da dcada de 1980, houve um

    renascimento do movimento sindical brasileiro, cuja maior expresso (mas no

    nica) foram as mobilizaes e greves que ocorreram na regio do ABC paulista.

    O debate sobre o modelo sindical brasileiro ocorreu na Constituinte e o consenso

    a que se chegou poca consubstanciou-se no art. 8 do texto constitucional, que

    apesar de garantir a liberdade sindical, manteve a unicidade sindical e a

    contribuio sindical obrigatria. De acordo com a Organizao Internacional do

    Trabalho, ambos os institutos violam a liberdade sindical e comprometem a livre

    negociao.

    A forma pela qual se estrutura a organizao sindical brasileira

    prejudicial efetiva representao de empregadores e trabalhadores. A

    impossibilidade da criao de mais de um sindicato que representa um mesmo

    grupo em uma dada base territorial cria obstculos para que trabalhadores e

    empregadores tenham condies de construir entidades da maneira que

    entenderem mais convenientes.

    A consagrao do monoplio da representao sindical na legislao

    brasileira to conhecida internacionalmente por criar obstculos liberdade

    sindical que o verbete n. 314 do Comit de Liberdade Sindical do Conselho de

    Administrao da OIT trata expressamente do caso nacional: disposies de uma

    constituio nacional relativas proibio de se criarem mais de um sindicato por

    categoria profissional ou econmica, qualquer que seja o grau de organizao,

    numa determinada base territorial, que no poder ser inferior rea de um

    municpio, no esto em conformidade com os princpios da liberdade sindical.

    O imposto sindical mecanismo compulsrio de custeio dos

    sindicatos, concebido com a finalidade de control-los. Para que uma entidade

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  • tenha direito a receber os valores oriundos do imposto sindical, basta a realizao

    do registro no Ministrio do Trabalho, no havendo necessidade de promover

    qualquer atividade ou de atuar em prol dos representados pelo sindicato. A

    arrecadao desse imposto sindical chegou, em 2015, a R$ 3,18 bilhes.

    Uma das consequncias negativas da permanncia do imposto

    sindical a perpetuao de um ambiente que estimula a fragmentao da

    representao sindical, sem qualquer benefcio ao empregado ou ao empregador,

    fator que compromete a legitimidade das entidades.

    Segundo o Ministrio do Trabalho, no Brasil h mais de 16.000

    sindicatos, sendo que 11.000 representam trabalhadores e 5.000, empresas.

    Outros 2.000 sindicatos buscam seu registro perante o Ministrio.

    Lamentavelmente, como direta consequncia dos problemas antes

    mencionados, a realidade sindical brasileira marcada pela presena, de um lado,

    de sindicatos srios, combativos e dotados de grande representatividade, de outro

    lado, de sindicatos com pouca ou nenhuma legitimidade perante a categoria, que

    existem apenas de modo formal, nos quais no prevalece a democracia sindical, e

    que so geridos por um pequeno grupo de pessoas que os exploram como se a

    entidade fosse seu patrimnio pessoal.

    Muitos exemplos poderiam ser listados, relacionados a entidades

    sindicais que, na verdade, so controladas por verdadeiros grupos criminosos,

    mostrando-se impotentes os trabalhadores para afast-los do controle, pois

    sequer so admitidos como filiados, ou apela-se para estratagemas de modo a

    garantir que as eleies ocorram sempre com uma nica chapa.

    No por acaso, h sindicatos que representam categorias com

    milhares ou mesmo dezenas de milhares de trabalhadores, mas que possuem

    menos de 100 trabalhadores filiados, com direito de voto nas eleies. As

    assembleias em tais sindicatos, nas quais so decididas as principais

    providncias, inclusive a aceitao ou no dos termos de um acordo ou

    conveno, so tomadas com a presena de nmero irrisrio de filiados, com

    frequncia apenas dos membros da prpria diretoria.

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  • Tambm preocupante se mostra a ausncia de democracia interna, e

    a eternizao dos mesmos grupos no controle de boa parte dos sindicatos. De

    acordo com reportagem do jornal O Globo4, com base em dados repassados pelo

    Ministrio do Trabalho e Emprego, 8,5 mil dirigentes de sindicatos encontram-se

    h mais de dez anos ininterruptos no poder.

    Nessas condies, mostra-se evidente que fazer prevalecer o

    negociado sobre o legislado, para permitir a fixao de condies de trabalho e

    remunerao inferiores s asseguradas por lei, sem realizar previamente uma

    ampla reforma sindical, significar enorme incentivo ao avano da corrupo nas

    relaes coletivas de trabalho, inclusive compra de acordos e convenes,

    particularmente nos setores econmicos em que no se fazem presente sindicatos

    srios e representativos.

    E simplesmente acabar com o imposto sindical, sem alterar as

    demais bases do sistema sindical, no resolve o problema. Pelo contrrio, agrava-

    o ainda mais, atingido entidades sindicais srias e comprometidas.

    Hoje, dado que clusulas que retiram direitos previstos em normas

    cogentes so ilegais perante o ordenamento brasileiro, a atuao do Ministrio

    Pblico diante de tais casos tem sido, basicamente, a de buscar a anulao das

    clusulas lesivas e a condenao dos sindicatos ou empresas envolvidas a no

    repetir na mesma espcie de pactuao.

    Em um contexto normativo em que se admita a prevalncia do

    negociado sobre a lei para retirada de direitos, combinado com a

    manuteno de milhares de sindicatos desprovidos de qualquer

    legitimidade, controlados por indivduos que veem na direo da entidade

    uma forma de enriquecimento pessoal, os incentivos corrupo na

    negociao coletiva se tornaro muito elevados. A frmula, pois,

    devastadora dos direitos do trabalhador.

    Um sindicato com nmero nfimo de filiados, menos de 1% dos

    membros da categoria, gerido com propriedade particular de seus dirigentes, que

    4 Em

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    http://oglobo.globo.com/brasil/dirigentes-sindicais-se-eternizam-no-poder-16841357

  • se perpetua h dcadas no poder, ganhar, de sbito, o poder de vida e de morte

    sobre direitos fundamentais dos trabalhadores, encontrando-se tambm na

    posio de proporcionar ganhos financeiros substanciais s empresas sob a forma

    de reduo arbitrria de custos.

    Trata-se do ambiente perfeito para negociatas esprias, contra as

    quais os membros da categoria profissional quase nada podero fazer, pois no

    so admitidos no sindicato, no conseguem concorrer nas eleies, no possuem

    a liberdade de constituir outro sindicato, e jamais so consultados.

    A extino do imposto sindical e da unicidade, bem como a

    regulamentao de uma contribuio negocial, teriam o mrito de adequar a

    legislao brasileira s normas internacionais e lei das centrais sindicais.

    No por acaso, a Organizao Internacional do Trabalho entende

    que contribuies como o imposto sindical contrariam o princpio da liberdade

    sindical, mas outras, como a contribuio negocial, esto em conformidade com o

    referido princpio (vide verbete n. 363 do Comit de Liberdade Sindical do

    Conselho de Administrao da OIT). Ainda, deve-se destacar a lei que

    regulamentou as centrais sindicais (Lei n. 11.648/2008), elaborada em consenso

    com as entidades, que, em seu art. 7, prev que a regulamentao da

    contribuio negocial levar extino da contribuio sindical.

    Contudo no isso o que ocorre no PLC 38/2017. A unicidade

    sindical mantida. Em que pese ocorra a extino da contribuio sindical,

    ataca-se a contribuio assistencial. Afinal, dentre os pontos elencados como

    inviveis de se fixar por meio de negociao coletiva est a liberdade de

    associao profissional ou sindical do trabalhador, inclusive o direito de no sofrer,

    sem sua expressa e prvia anuncia, qualquer cobrana ou desconto salarial

    estabelecidos em conveno coletiva ou acordo coletivo de trabalho (art. 611-B,

    XXVI). Percebe-se, de forma cristalina, que se faz referncia contribuio

    assistencial, normalmente criada pelas entidades sindicais em acordos ou

    convenes coletivas para o financiamento das atividades sindicais no curso das

    negociaes coletivas. Aqui, chama ateno a diferena de tratamento dispensada

    a trabalhadores e empregadores nesse ponto, tendo em vista que no h qualquer

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  • meno aos empresrios nesse inciso.

    Tambm, destaca-se que, ao mesmo tempo em que se retira a

    obrigatoriedade da contribuio sindical sem qualquer fase de transio,

    veda-se que as entidades criem mecanismos de financiamento quando

    promovem atividades em benefcio de todos os seus representados,

    independentemente desses serem filiados ou no ao sindicato. Afinal, os

    acordos e convenes coletivas de trabalho continuaro tendo efeito erga

    omnes, ou seja, sero aplicados para todos os representados pela entidade,

    sendo filiados ou no.

    Nota-se claramente os efeitos perniciosos da proposta contida

    no substitutivo: restringe-se de forma contundente o financiamento das

    entidades representantes de trabalhadores, o que invariavelmente levar ao

    seu enfraquecimento, e, simultaneamente, concede-se o poder a essas

    mesmas entidades de rebaixar os padres trabalhistas de seus

    representados.

    Importante registrar tambm que o fim da contribuio sindical no

    implicar igual enfraquecimento financeiro s entidades patronais, pois estas

    possuem outras fontes de receitas que no sero atingidas. Segundo divulgado na

    imprensa 5 , a contribuio sindical representa apenas 10% do oramento da

    FIESP, por exemplo, enquanto as taxas recebidas pela gesto dos recursos do

    sistema S (arrecada cerca de 16 bilhes por ano) correspondem a mais de 60%

    da receita da entidade.

    Desse modo, as principais receitas das entidades patronais

    sero mantidas, pois o projeto no prev qualquer alterao nesse sentido,

    enquanto aquelas das entidades dos trabalhadores sero excludas, gerando

    claro desequilbrio de foras.

    5 VALOR ECONMICO. O desmonte parcial do corporativismo. Disponvel em: http://www.valor.com.br//politica/4950364/o-desmonte-parcial-do-corporativismo?utm_medium=Social&utm_campaign=Compartilhar&utm_source=Twitter#. Acesso em 02 maio 2017; FOLHA DE SO PAULO. Sistema S ajuda sindicato patronal a viver sem imposto sindical. Disponvel em: http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2017/05/1880554-sistema-s-ajuda-sindicato-patronal-a-viver-sem-imposto-sindical.shtml. Acesso em 09 maio 2017.

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    http://www.valor.com.br/politica/4950364/o-desmonte-parcial-do-corporativismo?utm_medium=Social&utm_campaign=Compartilhar&utm_source=Twitterhttp://www.valor.com.br/politica/4950364/o-desmonte-parcial-do-corporativismo?utm_medium=Social&utm_campaign=Compartilhar&utm_source=Twitterhttp://www1.folha.uol.com.br/mercado/2017/05/1880554-sistema-s-ajuda-sindicato-patronal-a-viver-sem-imposto-sindical.shtmlhttp://www1.folha.uol.com.br/mercado/2017/05/1880554-sistema-s-ajuda-sindicato-patronal-a-viver-sem-imposto-sindical.shtml

  • Portanto, para que seja levada a cabo a valorizao da

    negociao coletiva, as medidas iniciais ho de ser a construo de uma

    legislao de combate s prticas antissindicais e a adequao do

    ordenamento jurdico aos princpios da liberdade sindical, com a extino da

    contribuio sindical compulsria, a criao da contribuio negocial e o fim

    do monoplio de representao sindical. E nisto o PLC no avanou.

    Outro aspecto que merece destaque a previso, no projeto, de que

    a Justia do Trabalho analisar apenas os aspectos formais dos acordos e das

    convenes coletivas de trabalho, abstendo-se de averiguar os termos em que

    foram avenados os entendimentos entre trabalhadores e empregadores, sob a

    alegao do princpio da interveno mnima da autonomia da vontade coletiva.

    O exerccio da autonomia privada coletiva no uma

    autorizao para que trabalhadores e empregadores estabeleam pactos que

    violem o ordenamento jurdico. Nesse sentido, relevante invocar o art. 8.1 da

    Conveno n. 87 da Organizao Internacional do Trabalho (OIT), que trata da

    liberdade sindical e da proteo ao direito de sindicalizao. De acordo com o

    referido dispositivo, no exerccio dos direitos que lhe so reconhecidos pela

    presente conveno, os trabalhadores, os empregadores e suas respectivas

    organizaes devero, da mesma forma que outras pessoas ou coletividades

    organizadas, respeitar a lei.

    Ademais, preconizar que a Justia do Trabalho no deve analisar

    o contedo dos instrumentos coletivos de trabalho afastar o direito de

    acesso jurisdio, previsto no art. 5, XXXV da Constituio Federal.

    No tocante vedao de alterao de normas de sade e segurana

    do trabalho por meio de acordo ou conveno coletiva de trabalho, embora seja

    importante a previso, deve-se destacar a concepo restrita estabelecida pelo

    dispositivo do que seriam normas de sade e segurana: apenas e to somente

    as Normas Regulamentadoras do Ministrio do Trabalho. Trata-se de uma

    concepo formalista sobre o tema, distante do que prev a doutrina e a

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  • jurisprudncia trabalhista6 . Outros dispositivos legais igualmente importantes e

    que tratam de sade e segurana, previstos na CLT, como o previsto no Captulo

    V do texto consolidado e as normas sobre jornada de trabalho, podero ser

    modificados e causar danos irreparveis integridade fsica dos trabalhadores.

    Cabe mencionar, tambm, a previso sobre a necessidade de

    explicitao da vantagem compensatria nos casos de reduo de direitos que

    tratem de salrio e jornada de trabalho, nos termos do art. 7, VI, XIII e XIV (e que

    no se relacionam com as hipteses acima analisadas). evidente que a

    existncia de compensao nos casos de reduo de direitos ameniza a piora nas

    condies de trabalho. Contudo, quando o referido dispositivo menciona a

    necessidade de retribuio apenas nos casos de flexibilizao nos termos do art.

    7, VI, XIII e XIV da Constituio Federal, a contrario sensu, tem-se que no h

    necessidade de qualquer compensao para os demais casos em que se

    pretende autorizar a alterao abaixo do piso legal. Trata-se, novamente, de mais

    um caso de precarizao dos direitos trabalhistas.

    importante destacar a necessidade de que, no curso da

    negociao coletiva que obrigatria, conforme o art. 616 da CLT c/c o art. 8,

    VI da Constituio Federal as partes atuem segundo os princpios da probidade

    e boa-f, conforme o art. 422 do Cdigo Civil. O projeto omisso em estabelecer

    tais princpios na negociao coletiva e em dispor sobre procedimentos que

    assegurem o direito dos trabalhadores ao acesso s informaes e dados

    relevantes para a negociao coletiva, conforme preconiza o art. 5 da Conveno

    154 da OIT.

    Por fim, cabe tecer alguns comentrios sobre a suposta valorizao

    da negociao coletiva para se fixar parmetros para as condies de trabalho

    abaixo do piso legal.

    Para alm de todos os problemas j mencionados na Nota Tcnica n.

    2 como a sua evidente inconstitucionalidade e do enfraquecimento de um dos

    princpios basilares do direito do trabalho, que o princpio da norma mais

    6 A ttulo de exemplo, mencionam-se os seguintes julgados do Tribunal Superior do Trabalho: AIRR 24194-06.2014.5.24.0091 e RR 578300-75.2006.5.09.0892, assim como a Smula n. 437, II do TST.

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  • favorvel, h flagrante violao das Convenes n. 98 e 154 da OIT.

    A OIT, no incio do ms de fevereiro, divulgou o relatrio do Comit

    de Peritos da Comisso de Aplicao de Normas. O documento apresenta

    diversos comentrios sobre o cumprimento das Convenes da OIT nos pases-

    membros e utilizado como base nas discusses realizadas na Conferncia

    Internacional do Trabalho.

    O Comit de Peritos analisou a aplicao da Conveno n. 98 da OIT

    que uma das Convenes mais importantes da Organizao - no Brasil e

    comentou a proposta de introduzir no ordenamento jurdico brasileiro a prevalncia

    do negociado sobre o legislado para estabelecer condies abaixo das previstas

    em lei.

    Os comentrios no deixam dvidas sobre o que significa a

    valorizao da negociao coletiva, no mbito das Convenes n. 98 e 154 da

    OIT, e dos efeitos negativos da Reforma Trabalhista.

    De acordo com o relatrio, o Comit lembra que o objetivo geral

    das Convenes n. 98, 151 e 154 de promover a negociao coletiva sob a

    perspectiva de tratativas de condies de trabalho mais favorveis que as

    fixadas em lei, assim como o Comit enfatiza que a definio de negociao

    coletiva como um processo que pretende melhorar a proteo dos

    trabalhadores garantida em lei foi reconhecida nos trabalhos preparatrios

    para a Conveno n. 154.

    Como consequncia do negociado sobre o legislado, coloca que do

    ponto de vista prtico, o Comit considera que a introduo de medida para

    permitir a reduo do piso legal por meio de negociao coletiva possui o

    efeito de afastar o exerccio da negociao coletiva e pode enfraquecer a sua

    legitimidade no longo prazo.

    Finalmente, o relatrio aponta que medidas dessa natureza seriam

    contrrias ao objetivo de promover negociao coletiva livre e voluntria, nos

    termos da Conveno.

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  • Desta forma, fica evidente que autorizar o rebaixamento de

    direitos por meio da negociao coletiva no fortalece as tratativas entre

    trabalhadores e empregadores, mas enfraquece e coloca em descrdito

    diante da sociedade esse importante instrumento de pacificao dos

    conflitos coletivos de trabalho. Alm disso, caso aprovada a Reforma

    Trabalhista, o Brasil poder ser acionado perante o Comit de Aplicao de

    Normas e o Comit de Liberdade Sindical da OIT por desrespeitar as

    Convenes n. 98 e 154, expondo internacionalmente o pas pela falta de

    compromisso em promover direitos trabalhistas fundamentais7

    Cumpre ainda destacar contradies crassas presentes no PLC

    30/2017. A ttulo de exemplo, aponta-se que, apesar de no permitir a

    prevalncia do negociado sobre o legislado para reduzir ou suprimir direitos

    relacionados segurana e sade do trabalhador, admite que o

    enquadramento da insalubridade e que a prorrogao de jornada em

    ambientes insalubres, atividades eminentemente tcnicas, sejam fixadas por

    meio de negociao coletiva.

    Finalmente, dentre as inovaes propostas no substitutivo em

    relao ao art. 611-A da CLT, cumpre ressaltar a inviabilidade da previso de

    participao dos sindicatos como litisconsortes necessrios em todos os

    processos em que discutida a nulidade de norma coletiva, pois, considerando o

    efeito erga omnes dos acordos e convenes coletivas, torna-se impraticvel que

    as entidades tenham de participar de inmeras aes individuais (611-A, 5), o

    que sem dvidas ir causar embarao ao desenvolvimento normal de suas

    atividades.

    Desse modo, a prevalncia do negociado sobre o legislado, nos

    termos propostos no PL 6787/2016, no valoriza a negociao coletiva, mas

    cria espaos para a precarizao das condies de trabalho ao permitir que

    sejam pactuados parmetros laborais abaixo do que prev a lei, gerando

    7 KALIL, Renan Bernardi. A reforma trabalhista, o Brasil e a comunidade internacional. Disponvel em: http://justificando.cartacapital.com.br/2017/02/23/reforma-trabalhista-o-brasil-e-comunidade-internacional/. Acesso em 15.04.2017.

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    http://justificando.cartacapital.com.br/2017/02/23/reforma-trabalhista-o-brasil-e-comunidade-internacional/http://justificando.cartacapital.com.br/2017/02/23/reforma-trabalhista-o-brasil-e-comunidade-internacional/

  • insegurana jurdica. A discusso em torno da proposta precisa ser,

    necessariamente, precedida pela reforma do sistema sindical e pela criao de

    instrumentos para punio de atos antissindicais, sob pena de esvaziamento das

    negociaes e fomento extraordinrio corrupo nas relaes coletivas de

    trabalho.

    5. VIOLAO DO PRINCPIO DA LIVRE CONCORRNCIA

    O substitutivo prope a alterao do art. 620 da CLT, subvertendo o

    princpio da norma mais favorvel que informe e impera no Direito do Trabalho, ao

    estabelecer que as condies definidas em acordo coletivo sempre prevalecero

    sobre as estipuladas em conveno coletiva de trabalho.

    A norma contraria a prpria noo de valorizao da negociao

    coletiva, na medida em que a negociao coletiva empreendida entre

    entidades sindicais de trabalhadores e de empregadores tem abrangncia e

    amplitude maior do que a entabulada entre uma ou mais empresas e uma

    entidade sindical de trabalhadores. Ao se possibilitar que o acordo coletivo, com

    menos direitos e benefcios do que os estabelecidos em conveno coletiva

    prevalea, estar-se- inexoravelmente fomentando a concorrncia desleal

    entre as empresas que atuam na mesma atividade econmica,

    principalmente em um contexto de ampla terceirizao de servios.

    A norma viola o princpio da igualdade de oportunidade entre as

    empresas que eventualmente participem de um procedimento de licitao pblica

    ou privada para contratao de servios.

    6. OMISSO EM RELAO S CONDUTAS ANTISSINDICAIS

    Como foi apontado na Nota Tcnica n. 2, a estrutura sindical

    brasileira fonte de diversos problemas que criam inmeros entraves ao exerccio

    da liberdade sindical em nosso pas. Os exemplos de desvios mencionados na

    Nota Tcnica n. 2 so consequncias das distores existentes no sistema

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  • sindical. Ademais, importante destacar que a prtica de crimes e fraudes no

    constitui a regra do movimento sindical brasileiro.

    A liberdade sindical uma liberdade complexa, envolvendo cinco

    dimenses: liberdade de associao, liberdade de organizao, liberdade de

    administrao, liberdade de exerccio de funes e liberdade de filiao,

    desfiliao e no filiao. Trata-se de um direito fundamental e um direito humano,

    previsto em diversos tratados internacionais j ratificados pelo Brasil. Para que

    seja possvel o seu pleno exerccio, h necessidade de se estabelecer meios para

    garanti-lo.

    O constrangimento liberdade sindical constitui conduta

    antissindical. De acordo com Oscar Ermida Uriarte, atos antissindicais so aqueles

    que prejudicam indevidamente um titular de direitos sindicais no exerccio da

    atividade sindical ou por causa desta, ou aqueles atos mediante os quais lhe so

    negadas, injustificadamente, as facilidades ou prerrogativas necessrias ao

    normal desempenho da ao coletiva8.

    As condutas antissindicais so classificadas em atos de

    discriminao, atos de ingerncia e prticas desleais. Os dois primeiros se

    relacionam com a tradio romano-germnica e esto descritos na Conveno n.

    98 da Organizao Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil. O

    combate aos atos de discriminao tem o objetivo de proteger os trabalhadores

    individualmente em face de condutas praticadas por empregadores e sindicatos. O

    combate aos atos de ingerncia tem o intuito de proteger as entidades sindicais

    em face de intervenes de umas sobre as outras, direta ou indiretamente. As

    prticas desleais so oriundas da tradio anglo-sax.

    O Brasil, apesar de diversos compromissos internacionais

    assumidos, no possui uma legislao de combate s prticas

    antissindicais. Isso acaba por fragilizar o exerccio da liberdade sindical e

    no oferece um ambiente propcio ao livre desenvolvimento das

    negociaes coletivas entre representantes dos trabalhadores e dos

    8 URIARTE, Oscar Ermida. A proteo contra os atos anti-sindicais. So Paulo: LTr, 1989, p. 35

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  • empregadores.

    O cotidiano das relaes coletivas de trabalho no Brasil aponta uma

    srie de exemplos que demonstram as dificuldades para que as categorias

    econmicas e profissionais tenham condies de tratar das condies de trabalho

    entre si.

    Como exemplo, podemos apontar: a) o ajuizamento de interditos

    proibitrios com o objetivo de cercear o exerccio do direito de greve; b) a fixao

    pelo Judicirio de elevadssimos percentuais de fora de trabalho ativa para a

    continuidade da prestao de servios e atividades essenciais em paralisaes de

    categorias que atuam nessas reas (o que acaba por desestimular o comum

    acordo); c) a recusa em negociar coletivamente com a sua contraparte e,

    consequentemente, a ausncia de concordncia na suscitao de dissdios

    coletivos; d) o financiamento de entidades representantes de trabalhadores por

    entidades representantes de empregadores; e) ameaa e coao de trabalhadores

    em greve; f) o desestmulo a empregados se filiarem entidade sindical que os

    representa; g) confeco de lista de trabalhadores filiados entidade sindical para

    que no sejam contratados pelas empresas; h) veiculao de propagandas em

    meios de comunicao com o objetivo de prejudicar a imagem das entidades

    sindicais e de movimentos legtimos conduzidos por essas entidades; i) o estmulo

    a trabalhadores exercerem o direito de oposio contribuio

    assistencial/negocial; j) entidades sindicais e patronais que simulam paralisao

    com o objetivo de elevar preos em concesses de servios pblicos; l) a

    dispensa de dirigentes sindicais com garantia de emprego; m) a restrio de

    representante dos trabalhadores s empresas e locais de trabalho, dentre outros.

    Como se v, os agentes das condutas antissindicais podem ser

    sindicatos, trabalhadores, empregadores ou o Estado. E os prejudicados tambm

    podem ser trabalhadores, empregadores, sindicatos e o Estado.

    Em que pese o Brasil ter ratificado a Conveno n. 98 da OIT em

    1952, at o presente momento no foi editada qualquer lei com o objetivo de

    disciplinar o combate s prticas antissindicais no pas, sendo que o referido

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  • tratado internacional o principal instrumento normativo que apoia as pretenses

    que tem o objetivo de sancionar os atos antissindicais. Sem diminuir a importncia

    da Conveno n. 98 da OIT que inclusive considerada pela Organizao

    Internacional do Trabalho como uma de suas convenes fundamentais ,

    importante destacar que a ausncia de uma legislao interna que reprima os

    atentados liberdade sindical prejudica todos os interessados no

    desenvolvimento de negociaes coletivas justas, em que o resultado tenha

    condies de exprimir a vontade das categorias econmicas e profissionais em um

    determinado contexto negocial. Das possveis formas de se utilizar o direito para

    sancionar as condutas antissindicais pelo vis administrativo, civil-trabalhista ou

    penal o Brasil no adotou minimamente nenhuma delas.

    Por todo o exposto, possvel afirmar categoricamente que o

    ambiente para a realizao de negociaes coletivas extremamente

    prejudicado em face da ausncia de previses legais que promovam a

    liberdade sindical e repudiem as condutas antissindicais. Sem a construo

    de uma legislao interna que oferea garantias mnimas aos titulares de direitos

    sindicais para o exerccio adequado da negociao coletiva, qualquer medida que

    pretenda modernizar as relaes de trabalho ou valorizar as relaes coletivas

    ser incua, tendo em vista que os meios mnimos para a sua concretizao no

    estaro presentes no ordenamento jurdico brasileiro. Nesse aspecto,

    importante relembrar que o Ministrio Pblico do Trabalho, assim como

    diversas entidades sindicais, apontaram os problemas advindos da prtica

    de atos antissindicais no pas, bem como a necessidade de se tomarem

    providncias legislativas para coibir essas condutas. Contudo, como se v

    pela leitura do relatrio, nenhuma palavra foi levada em considerao.

    Finalmente, relevante destacar que, no incio de fevereiro, foi

    divulgado o relatrio do Comit de Peritos da Comisso de Aplicao de Normas

    da Organizao Internacional do Trabalho (OIT). No documento, h anlises sobre

    a aplicao de Convenes da OIT nos pases-membros.

    Em relao falta de normas aptas a reprimir as condutas

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  • antissindicais o relatrio apontou o seguinte: O Comit mais uma vez requer que

    o Governo tome as medidas necessrias para garantir que a legislao estabelea

    remdios e sanes suficientemente dissuasivas contra atos antissindicais.

    Portanto, a aprovao do substitutivo do PLC 30/2017 significar a

    violao da Constituio Federal e a quebra de compromissos internacionais

    assumidos pelo Brasil, o que poder levar a que o pas seja acionado perante a

    Comisso de Aplicao de Normas e o Comit de Liberdade Sindical da OIT.

    7. SOBRE AS RESTRIES AO ACESSO JUSTIA DO TRABALHO.

    A Constituio Federal, em seu art. 5o, XXXV, prev que a lei no

    excluir da apreciao do Poder Judicirio leso ou ameaa de direito e, no inciso

    LXXVIII, a todos, no mbito judicial e administrativo, so assegurados a razovel

    durao do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitao.

    A despeito disso, nenhum desses dispositivos constitucionais

    foram observados em diversas inovaes apresentadas no PLC 38/2017, o

    que os inquina de inconstitucionalidade. Em verdade, nota-se, claramente, que

    um dos objetivos contidos em diversas normas do projeto dificultar o

    acesso dos trabalhadores Justia do Trabalho, trilhando caminho oposto

    ao indicado pela Constituio Federal.

    Inicialmente, deve-se pontuar que o processo do trabalho possui

    autonomia cientfica e tem como objetivo precpuo permitir que o trabalhador, o

    qual no recebeu os valores devidos em virtude do contrato de trabalho, tenha

    meios de receber o que lhe de direito.

    Ao invs de criar instrumentos para reduzir o nvel de

    descumprimento das normas trabalhistas e as leses que geram aos direitos

    dos trabalhadores, como medida para reduzir a inflao de processos

    trabalhistas, alegada no Relatrio da Cmara dos Deputados, o projeto

    dificulta o acesso Justia do Trabalho para postular a reparao das

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  • violaes basilares diga-se, posto que referentes, em sua grande parte, ao

    pagamento de verbas rescisrias consagrando uma clara inverso de valores,

    pois no se preocupa em impedir a prpria ocorrncia do dano, mas, to-s, a sua

    reparao.

    Nessa linha, as modificaes que se pretende introduzir no 3 e 4

    do art. 790 da CLT objetivam dificultar a obteno da justia gratuita, pois,

    atualmente, a concesso pode ser de ofcio para o trabalhador que ganha at dois

    salrios mnimos e, para os demais, basta que a parte faa uma declarao de

    que no possui condies de suportar os custos do processo. Com a nova

    redao proposta, a concesso de ofcio para os que recebem salrio

    inferior a 40% do teto da previdncia, sendo que dos demais passa a ser

    exigida comprovao da insuficincia de recursos.

    Isto destoa, at mesmo, das normas do Cdigo de Processo

    Civil, que visa a regular as relaes processuais entre pessoas que estejam

    no mesmo grau de suficincia. Imagine-se, ento, criar maiores restries

    processuais para o regramento de relaes de conflito entre capital e

    trabalho, naturalmente desiguais entre si.

    Com efeito, , no mnimo, inconcebvel que a sistemtica que se

    pretende introduzir na Justia do Trabalho crie maiores obstculos do que

    aquela prevista no CPC para as causas da Justia Comum, onde Presume-

    se verdadeira a alegao de insuficincia deduzida exclusivamente por

    pessoa natural. (art. 99, 3).

    No mesmo sentido, h diversas proposies que dificultam e

    encarecem a tutela jurisdicional ao trabalhador, dificultando-lhe o acesso

    Justia. Como exemplo, apontamos a possibilidade do trabalhador ser

    responsabilizado pelo pagamento de honorrios periciais se for sucumbente

    no objeto da percia, mesmo se beneficirio da justia gratuita (art. 790-B da

    CLT). Da mesma forma, h previso de responsabilizao do trabalhador em

    honorrios de sucumbncia, novamente mesmo se beneficirio da justia

    gratuita (art. 791-A da CLT). Igualmente, as modificaes que se pretende

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  • introduzir no artigo 844 da CLT, condicionando o ajuizamento de nova ao

    pelo empregado que tenha faltado audincia, ao prvio pagamento das

    custas do processo arquivado, ainda que seja beneficirio de justia

    gratuita.

    Tais regras se mostram desproporcionais e excessivamente

    rigorosas com trabalhadores humildes e que muitas vezes enfrentam todas as

    dificuldades de transporte para chegar ao frum, notadamente os que residem em

    reas rurais, na periferia das grandes cidades ou que precisam se deslocar para

    outro Municpio onde situada a Justia do Trabalho e mesmo chegando ao

    endereo precisam localizar a sala de audincias.

    Com efeito, se o trabalhador perder a audincia, dificilmente ter

    condies financeiras de pagar as custas previamente ao ajuizamento de

    nova ao, resultando inviabilizado seu acesso justia.

    Por outro lado, e o desiquilbrio da proposta tanto e to visvel

    neste passar , em relao ao reclamado empregador o qual no comparece

    na audincia inaugural, pretende-se alterar a norma para lhe facilitar a

    defesa, ao se propor a possiblidade de juntada de contestao e de

    documentos, desde que esteja representado por advogado. Vale dizer:

    dificulta-se o acesso a Justia por parte do trabalhador, mas facilita-se a

    defesa do empregador ausente na audincia inaugural.

    Ademais, a previso de homologao de acordo extrajudicial

    apresentado em petio conjunta (855-B e seguintes), em sede de jurisdio

    voluntria, resultar na institucionalizao de uma prtica ilcita j utilizada

    por algumas empresas, com a simulao de lides para obter a ampla

    quitao do contrato de trabalho mediante o pagamento das verbas

    rescisrias.

    Considerando, ainda, que fica extinta a assistncia e

    homologao do sindicato no momento do pagamento das verbas

    rescisrias, com a revogao do 1 do art. 477 da CLT, a Justia do

    Trabalho acabar convertida em rgo homologador de rescises

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  • contratuais.

    E, nisto, no se alcanar, por certo, a reduo do nmero de

    processos trabalhistas, objetivo este to destacado no Relatrio da Cmara, mas,

    ao contrrio, gerar ampliao do nmero de processos, que tero por nica

    finalidade quitar os contratos de trabalho sem a indenizao aos

    trabalhadores lesados.

    Note-se que bastar empresa no pagar as verbas rescisrias no

    momento da resciso para colocar o trabalhador em situao de extrema

    dificuldade financeira, pois este necessita de recursos para a subsistncia da

    famlia, de modo que se ver compelido a aceitar receber o valor oferecido,

    mesmo que corresponda apenas s verbas rescisrias, mediante quitao do

    contrato.

    um sistema perverso que tende a inviabilizar o ajuizamento de

    aes trabalhistas, mesmo quando o trabalhador tenha sido lesado no curso

    do contrato de trabalho.

    Outra norma que gera desequilbrio no contrato de trabalho a que

    prev a quitao anual de obrigaes trabalhistas, com eficcia liberatria

    das parcelas, perante o sindicato dos empregados da categoria. Embora

    conste como uma faculdade, preciso lembrar que o empregado estar no

    curso do contrato, sob dependncia econmica e subordinao, o que

    obviamente afeta a sua liberdade de recusar o procedimento.

    Alm disso, preciso ter presente que grande parte dos sindicatos

    no possui estrutura adequada para dar assistncia ao empregado em tal ato,

    ficando o trabalhador sujeito a acolher o que o empregador alegar como correto.

    Observe-se, ainda, que, na rea rural, muitas vezes o mesmo sindicato congrega

    produtores e trabalhadores rurais, o que torna apenas formal a ideia de

    assistncia. De qualquer sorte, a quitao fornecida no curso do contrato e

    fora do controle jurisdicional no deve ter eficcia liberatria, sob pena de

    consolidar leso aos direitos sociais.

    Cumpre mencionar que, apesar dos obstculos para que o

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  • trabalhador tenha acesso ao Poder Judicirio Trabalhista, h previses que

    facilitam a adjudicao do empregador, como a ampliao do leque de

    opes para o oferecimento do depsito recursal pelo empregador (art. 899

    da CLT), a ampliao desmensurada do tempo entre a citao do executado

    e a ausncia de garantia do juzo, para 60 dias (art. 883-A da CLT) bem como

    o engessamento da atividade jurisdicional, ao no permitir que o juiz

    promova de ofcio a execuo quando o trabalhador estiver representado

    por advogado (art. 878 da CLT). Sem dvida, so dispositivos que contrariam

    o princpio constitucional da razovel durao do processo e os meios que

    garantam a celeridade de sua tramitao (inciso LXXVIII do art. 5 da

    CRFB/88).

    8. SOBRE AS LIMITAES S DECISES DA JUSTIA DO TRABALHO, EM

    ESPECIAL QUANTO S RESTRIES DA REPARAO DO DANO MORAL.

    Aparentemente, o projeto adere a uma viso preconceituosa e alheia

    realidade da Justia do Trabalho, difundida em alguns meios empresariais, no

    sentido de que decidiria sempre em favor dos trabalhadores. Todavia, tal viso

    no subsiste a qualquer anlise isenta e embasada em fatos e nmeros.

    De forma indita, o projeto prev limitaes s decises da

    Justia do Trabalho que no encontram paralelo nos outros ramos do

    Judicirio, o que se mostra preocupante tanto do ponto de vista do direito dos

    trabalhadores integral reparao dos danos sofridos, quanto da integral

    prestao jurisdicional, expressamente assegurada no artigo 5 da CF/88.

    Ao estabelecer que, no exame de acordo ou conveno coletiva

    de trabalho, a Justia do Trabalho analisar exclusivamente a conformidade

    dos elementos essenciais do negcio jurdico (art. 8, 3 c/c 611, 1),

    conforme o artigo 104 do CC, em virtude do que estaria impedida a Justia do

    Trabalho de decidir sobre o contedo das normas coletivas, a proposta viola a

    garantia prevista no artigo 5, inciso XXXV, no sentido de que a lei no

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  • excluir da apreciao do Poder Judicirio leso ou ameaa a direito, pois,

    evidentemente, o teor das normas coletivas pode gerar leso a direitos, inclusive

    aos constitucionalmente assegurados como deixa antever o prprio art. 611-B,

    proposto no projeto cabendo ao Poder Judicirio decidir a esse respeito.

    Assim, padece do vcio de inconstitucionalidade norma que

    pretenda excluir leso a direito da apreciao do Poder Judicirio.

    No fosse isso, a proposta caminha em sentido contrrio aos

    mais recentes e modernos estudos da Cincia Jurdica do Processo. Com

    efeito, considerando a sistemtica criada pelo Novo CPC, de estmulo edio

    de smulas e precedentes que orientem os julgados nas instncias

    inferiores, justamente para evitar a profuso de recursos e decises e a

    prpria insegurana jurdica, causa espcie a srie de limitaes de

    contedo e procedimentos para edio de smulas na Justia do Trabalho,

    no se conhecendo similares restries nos outros ramos do Judicirio.

    Os requisitos exigidos pelo artigo 702, I, f, da Proposta, tornam

    praticamente invivel a edio de smulas pelos Tribunais do Trabalho, pois, alm

    do enunciado ser aprovado por dois teros dos membros do Tribunal, j dever ter

    sido decidida de forma idntica por unanimidade em pelo menos dois teros das

    turmas em pelo menos dez sesses diferentes em cada uma delas.

    Ademais, a norma do artigo 8, 2 mostra-se desarrazoada, pois a

    smula consiste na sntese do entendimento do Tribunal na interpretao das

    normas legais e constitucionais, no criando direitos que j no possam ser

    extrados do ordenamento jurdico.

    Por fim, a proposta no prima pelo equilbrio entre as partes ao vedar

    a execuo de ofcio quando a parte estiver representada por advogado (art. 878)

    - embora determine a execuo de ofcio das contribuies sociais e, ao mesmo

    tempo, determinar que a prescrio intercorrente seja declarada de ofcio (art. 11-

    A, 2), estabelecendo desse modo situao que tutela o ru, mas no o autor.

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  • 8. TARIFAO DO DANO EXTRAPATRIMONIAL

    O projeto cria a regulamentao da reparao de danos de natureza

    extrapatrimonial decorrentes da relao de trabalho, estabelecendo uma tarifao

    do valor que o juiz poder fixar, caso procedente o pedido.

    A norma classifica os danos em quatro faixas, conforme a ofensa

    seja de natureza leve, mdia, grave ou gravssima, para as quais a indenizao

    estar limitada ao ltimo salrio contratual do empregado multiplicado por trs,

    cinco, vinte ou cinqenta vezes, respectivamente, sendo vedada a acumulao

    (art. 223-G, 1, da CLT).

    A proposta revela-se preconceituosa e discriminatria em relao

    aos trabalhadores, na medida em que nenhum cidado, em nenhuma das

    relaes que mantm, de qualquer outra natureza, sofre limitao ao valor da

    indenizao pelos danos extrapatrimonais que venha a sofrer.

    No aceitvel que apenas e to somente o trabalhador, nas

    leses que aconteam no mbito das relaes de trabalho, tenha limitada e

    tarifada a indenizao pelos danos sofridos, pois tal exceo resulta

    violadora do princpio da igualdade.

    Para ilustrar o quanto essa proposta lesiva aos trabalhadores,

    basta imaginar uma situao, por exemplo, em que um cliente de uma grande

    construtora visite uma obra de edifcio, acompanhado de um operrio

    empregado da empresa e ambos sofram um acidente. Nesse caso, a

    indenizao devida ao empregado estar limitada ao teto previsto, porm,

    para a indenizao do cliente, no haver qualquer limite, podendo ser

    livremente fixada pelo juiz, consideradas as particularidades do caso. Assim,

    mesmo que a leso sofrida pelo trabalhador seja grave e a do cliente leve, este

    poder receber uma indenizao muito superior.

    Alm disso, a tarifao do dano extrapatrimonial trabalhista mplica

    limitao incompatvel com os direitos assegurados no artigo 5, incisos V e

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  • X, da CF/88, de resposta proporcional e indenizao integral pelos danos

    materiais ou morais sofridos.

    A fixao de limites rgidos para a indenizao no permite a

    individualizao das situaes e impede a reparao integral do dano em

    muitos casos, violando o direto do trabalhador justa e inteira reparao do

    agravo sofrido.

    Cabe lembrar que o STF j decidiu pela inconstitucionalidade da

    tarifao de dano moral (RE 396.386-4) prevista na Lei de Imprensa,

    afirmando que A Constituio de 1988 emprestou reparao decorrente do

    dano moral tratamento especial - C.F., art. 5, V e X - desejando que a

    indenizao decorrente desse dano fosse a mais ampla. Posta a questo nesses

    termos, no seria possvel sujeit-la aos limites estreitos da lei de imprensa. ... .

    No mesmo sentido a smula 281 do STJ.

    Assim, a tarifao do dano extrapatrimonial trabalhista

    discriminatria e viola a Constituio Federal.

    9. EXCLUSO OU REDUO DA RESPONSABILIDADE DO

    EMPREGADOR

    O PLC 38/2017, ao reduzir substancialmente o conceito de

    grupo econmico instrumento concebido para garantir o pagamento de crditos

    trabalhistas pelas entidades beneficiadas pela prestao de trabalho dos

    empregados transfere o nus da atividade econmica para os

    trabalhadores. O risco do empreendimento, noo bsica da caracterizao

    do empregador, passa a ser do empregado.

    O afastamento da caracterizao pela mera identidade de scios,

    ainda que administradores ou detentores da maioria do capital social, se no

    comprovado o efetivo controle de uma empresa sobre as demais e interesse

    integrado, a efetiva comunho de interesses e a atuao conjunta esvazia

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  • completamente o conceito de grupo econmico, uma vez que no ser

    possvel responsabilizar todas as empresas que tenham identidade

    societria e gerencial e que foram beneficiadas com os servios realizados

    pelos trabalhadores. A exigncia de que o trabalhador, no processo do

    trabalho, tenha o nus de provar o controle de uma empresa sobre outra ou

    a efetiva comunho de interesses torna impossvel a garantia do crdito de

    quem prestou servios a determinado empregador e no recebeu os devidos

    valores oriundos do contrato de trabalho.

    Ademais, o projeto prope que a empresa sucessora somente

    responder, em relao s dvidas trabalhistas da sucedida, se houver

    comprovao de fraude. No entanto, nem mesmo o Cdigo Civil, que regula

    relaes entre iguais, chegou a tanto, em seu art. 1146.

    Da mesma forma, ao atribuir carter subsidirio responsabilidade

    do scio retirante e limitar s aes ajuizadas at dois anos depois de averbada a

    modificao do contrato, dificulta o recebimento dos crditos trabalhistas e diminui

    o suporte patrimonial para sua satisfao.

    Observe-se que, com relao aos empregados que no rescindirem

    os contratos nos dois anos seguintes ao afastamento, a excluso de

    responsabilidade absoluta. A prova de fraude na alterao societria

    extremamente difcil para o trabalhador produzir em uma ao individual.

    Por fim, o projeto dispensa as entidades filantrpicas de penhora ou

    garantia do juzo, permitindo que tais empregadores discutam a execuo sem

    que o crdito esteja garantido, o que certamente estimula a interposio de

    recursos e dificulta o pagamento dos trabalhadores, tornando os processos

    excessivamente longos, comprometendo, uma vez mais, a segurana jurdica.

    10. CRIAO DA CATEGORIA DO EMPREGADO HIPERSUFICIENTE

    O projeto cria uma categoria de empregados com reduo de

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  • proteo legal, abrindo margem para contratao de direitos inferiores aos

    assegurados pela CLT, bem como para subtrao do julgamento das leses

    aos seus direitos pela Justia do Trabalho, sujeitando-se arbitragem

    individual.

    Assim e de acordo com a proposta, para que o trabalhador seja

    enquadrado nessa categoria, basta que tenha formao de nvel superior e receba

    salrio igual ou superior a duas vezes o teto da Previdncia Social, atualmente

    equivalente R$ 10.379,00.

    Tais empregados podero negociar individualmente com seus

    patres todos os direitos indicados no art. 611-A da CLT, que, pela nova

    redao da proposta, passaram a ser exemplificativos, o que, na prtica,

    simplesmente lhes retira a proteo legal quanto aos itens expressamente

    mencionados e muitos outros aspectos da relao de emprego.

    Alm disso, o artigo 507-A prev a possibilidade de incluir nos

    contratos clusula compromissria de arbitragem, partindo de premissa

    equivocada, pois desconsidera que tambm este grupo de trabalhadores labora

    sob dependncia econmica e no possuem condies plenas e livres de

    determinar as clusulas do contrato de trabalho, sendo que, mesmo no momento

    da contratao, cabe-lhe apenas aderir ao proposto pelo empregador ou desistir

    da vaga. A prpria Lei 9307/96 condiciona a eficcia de tais clusulas nos

    contratos de adeso, pois presumvel a sua imposio ao contratado.

    11. SOBRE A REDUO DE DIREITOS RECONHECIDOS EM LEI OU PELA

    JURISPRUDNCIA.

    Somam-se aos prejuzos mencionados nos demais tpicos, a

    supresso ou reduo de direitos assegurados em Lei ou reconhecidos pela

    jurisprudncia reiterada dos Tribunais, diversamente do que afirmam os

    defensores do projeto, tais como:

    a) acaba com as horas in itinere, previstas no artigo 58, 2, da

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  • CLT para as situaes em que a empresa est estabelecida em local de difcil

    acesso ou no servido por transporte pblico, e o empregador fornecer a

    conduo;

    b) retira o direito incorporao salarial do valor da funo

    gratificada, mesmo quando recebida por longos perodos (art. 468, 2, da

    CLT), reconhecido pela smula n 372 do TST;

    c) acaba com a exigncia de negociao coletiva para a

    dispensa em massa (art. 477-A da CLT), reconhecida pela jurisprudncia como

    condio para sua implementao;

    d) cria modalidade de resciso do contrato de trabalho por

    acordo, com pagamento da metade do aviso prvio e da multa do FGTS (484-

    A);

    e) atribui ao empregado as despesas pela higienizao do uniforme,

    mesmo quando seu uso seja obrigatrio e condio para o desenvolvimento da

    atividade econmica ou que seja utilizado para divulgao de produtos ou

    logomarcas da empresa ( art. 456-A da CLT);

    f) cria obstculos equiparao salarial, ampliando a

    possibilidade de tratamento no isonmico dos empregados (art. 461 da

    CLT).

    A reduo de tais direitos configura retrocesso social, viola diversas

    normas constitucionais e em nada contribui para qualificar as relaes de trabalho

    ou gerar empregos.

    12. SOBRE AS MODALIDADES DE CONTRATAO PARA SUBEMPREGO,

    COM RENDA INFERIOR AO SALRIO MNIMO MENSAL.

    O PLC 38/2017 cria, ainda, modalidades de contratao em

    condies de subemprego, nas quais no assegura nem mesmo o

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  • recebimento de um salrio mnimo mensal pelo trabalhador, ferindo de morte

    norma constitucional sobre este tema. (Art. 7, IV da CF/88)

    Esta caracterstica bastante clara no proposto contrato

    intermitente (art. 452-A), pois prev apenas o pagamento do salrio mnimo

    por hora, sem que seja assegurado um nmero mnimo de horas trabalhadas

    no ms. Assim, embora o trabalhador permanea disposio da empresa

    durante todo o perodo, aguardando convocao, poder nada receber ao

    final do ms, ou receber um valor nfimo, proporcional s horas que o

    empregador lhe deu trabalho.

    Cabe lembrar que as necessidades vitais dos trabalhadores so

    fixas, havendo previso constitucional de um patamar mnimo que assegure

    a manuteno de uma vida digna (art. 7, IV, da CF).

    No bastasse, caso o trabalhador aceite a convocao e no

    comparea, ter de pagar multa equivalente a 50% da remunerao que seria

    devida, de modo que poder chegar ao final do ms sem nada receber ou

    o que pior - com dvida junto ao empregador, assemelhando-se figura da

    servido por dvidas.

    Conforme exposto na Nota Tcnica n 01-2017, essa modalidade

    perversa de contrato subverte a lgica do sistema de produo, pois transfere aos

    empregados os riscos da atividade econmica, em flagrante coliso com os

    termos do artigo 2 da Consolidao das Leis do Trabalho.

    Ademais, a regulamentao proposta, quanto ao regime de

    teletrabalho, exclui os trabalhadores das regras da CLT sobre jornada de

    trabalho, fazendo com que, na prtica, no haja limites para sua jornada diria,

    nem registro ou controle dos seus horrios de trabalho, embora sejam obviamente

    possveis com os meios tecnolgicos atualmente disponveis.

    Alm disso, a norma no define a responsabilidade do empregador

    pelas despesas com a aquisio ou manuteno dos equipamentos e

    infraestrutura necessria para o trabalho ou as despesas dele decorrentes, como

    energia eltrica e internet, por exemplo, permitindo que sejam livremente

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  • estipuladas no contrato de trabalho.

    Essa omisso quanto responsabilidade do empregador abre

    espao para transferncia de custos e riscos da atividade econmica para o

    trabalhador, em razo de sua conhecida hipossuficincia em uma livre negociao

    sobre as condies de trabalho.

    Acresce que, no tocante s condies de sade e segurana no

    trabalho, a nica obrigao atribuda ao empregador de instruir os empregados,

    de maneira expressa e ostensiva, quanto s precaues a tomar, o que

    claramente insuficiente para prevenir doenas e acidentes de trabalho, pois no

    h qualquer garantia de que o ambiente ser seguro e adequado ou que o

    empregado possuir e dispender os recursos eventualmente necessrios sua

    adaptao.

    Por fim, a alterao pretendida no contrato de trabalho a tempo

    parcial eleva a jornada mxima admitida nessa modalidade das atuais 25

    horas semanais para at 32 horas semanais, consideradas as horas extras

    que passa a autorizar.

    Dessa forma, a jornada mxima admitida no regime em tempo

    parcial passa dos atuais 57% para 73% do contrato a tempo integral,

    considerando que a jornada de trabalho semanal estabelecida pelo artigo 7, XIII,

    da Constituio Federal de 44 horas.

    Essa proximidade da jornada a tempo parcial com a prevista

    para o tempo integral descaracteriza a natureza do regime de tempo parcial.

    Se, contratando por tempo parcial, o empregador puder contar com empregados

    que trabalharo mais que 2/3 da jornada de empregados do regime integral, por

    bvio haver enorme encorajamento substituio de empregados em

    regime integral, com precarizao de direitos e mera substituio de

    empregos de qualidade.

    Em decorrncia, haver demisses de trabalhadores contratados

    em regime integral e substituio destes por trabalhadores em regime

    parcial, que trabalharo jornada considervel, mas recebendo salrio

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  • inferior. E isto, definitivamente, no gerar empregos nem crescimento

    econmico.

    Note-se que tambm nessa modalidade no h previso de

    pagamento do salrio mnimo mensal, embora 30 horas semanais corresponda

    jornada integral de algumas categorias, como a dos bancrios, por exemplo.

    13. CONSIDERAES FINAIS.

    As mudanas pretendidas na legislao trabalhista pelo PLC

    38/2017 contrariam inmeras disposies constitucionais e legais, assim

    como desrespeitam compromissos internacionais assumidos pelo Brasil por

    meio de tratados de direitos humanos.

    Em relao ao negociado sobre o legislado, importante apontar que

    os direitos trabalhistas previstos no artigo 7 da Constituio, as normas de

    tratados e convenes internacionais ratificados pelo pas (CF, artigo 5, 2) e as

    normas legais infraconstitucionais que asseguram a cidadania aos trabalhadores

    compem, na feliz expresso do Ministro Maurcio Godinho Delgado, o patamar

    mnimo civilizatrio que a sociedade democrtica no concebe ver reduzido em

    qualquer segmento econmico-profissional, sob pena de afrontarem a prpria

    dignidade da pessoa humana e a valorizao mnima defervel ao trabalho (arts.

    1, III e 170, caput, CF/88)9

    Por outro lado, sendo possvel o estabelecimento de acordo coletivo

    de trabalho com determinada empresa para rebaixar direitos trabalhistas em geral,

    e no com as suas concorrentes, claro est o desequilbrio concorrencial para as

    outras empresas, gerando a concorrncia desleal, vedada pelo artigo 170, IV, da

    Constituio da Repblica e tambm evitada pela disposio do art. 620 da CLT,

    mantida sem alterao em mais uma contradio jurdica do projeto de lei

    apresentado.

    9 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 13 ed. So Paulo: Ltr, 2014, p. 1465.

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  • Em relao s modificaes propostas quanto ao contrato de

    trabalho a tempo parcial e ao contrato de trabalho temporrio, bem como na

    introduo da prevalncia do negociado sobre o legislado para admitir a aplicao

    de normas abaixo do prev o piso legal, percebe-se evidente violao do caput

    do art. 7 da Constituio Federal, no qual se prev que novos direitos atribudos

    aos trabalhadores devem melhorar e no piorar a sua condio social.

    Reconhece-se no projeto violao, tambm, ao Pacto Internacional

    dos Direitos Econmicos, Sociais e Culturais, ratificado pelo Brasil, que, em seu

    art. 7, prev: Os Estados Partes do presente Pacto reconhecem o direito de toda

    pessoa de gozar de condies de trabalho justas e favorveis, que assegurem

    especialmente: b) a segurana e a higiene no trabalho; d) o descanso, o lazer, a

    limitao razovel das horas de trabalho e frias peridicas remuneradas, assim

    como a remunerao dos feriados.

    Da mesma forma, h violao ao art. 7 do Protocolo de San

    Salvador, tambm ratificado pelo Brasil: Os Estados Partes neste Protocolo

    reconhecem que o direito ao trabalho, a que se refere o artigo anterior, pressupe

    que toda pessoa goze do mesmo em condies justas, equitativas e satisfatrias,

    para o que esses Estados garantiro em suas legislaes, de maneira particular:

    e) segurana e higiene no trabalho; g) limitao razovel das horas de trabalho,

    tanto dirias quanto semanais.

    Ainda em relao durao do trabalho, cabe lembrar o art. 24 da

    Declarao Universal dos Direitos humanos: toda pessoa tem direito a repouso e

    lazer, inclusive a limitao razovel das horas de trabalho e a frias peridicas

    remuneradas e tambm o art. 11 da Declarao Sociolaboral do Mercosul: Todo

    trabalhador tem direito jornada no superior a oito horas dirias, em

    conformidade com as legislaes nacionais vigentes nos Estados Partes e o

    disposto em conveno ou acordo coletivo de trabalho, sem prejuzo de

    disposies especficas para a proteo de trabalhos perigosos, insalubres ou

    noturnos.