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Tradução do livro: Métodos de investigación etnográfica en Ciencias Sociales Exceto a certeza da morte e do prazer em um momento de amor, a vida oferece pouca garantia a não ser que é a vida. E diante tal natureza , nossa história comum é cheia de medos: tememos o desconhecido, intranquiliza a coisa inexplicável, amedronta o imprevisível, quando - para a maioria das coisas piores - estamos mesmo ciente das limitações de nossa existência. [por isso que não temos tanta confiança em nossas próprias ideias, sempre buscamos nos ancorar na ideia do outro, aquele que nos passa confiança e sabedoria] Magia, religião e ciência são a expressão de uma busca de soluções, tão constante quanto vazia. Tomamos o último, a mais recente, as ciências, e entre eles, a mais próxima da pessoa em comunidade, as sociais, aquelas em que se baseia nossas autoexplicacões gregárias complacentes. O menino os constrói e nós o chamamos jogo, o cientista os racionaliza e resulta em teorias, mas em alguns e outros – todos iludidos pelo incentivo do discurso dos filósofos e das palavras dos literatos, a atração resultante pela compreensão do como espiar uma possível explicação é compartilhada. Neste entrosamento simbólico nos introduz a primeira parte do livro. É a investigação sistemática da estrutura, o andaime – a cientificidade –, que permite a construção intelectual dos conhecimentos disponíveis e acumulados em nosso chamado campo científico-social, pelo que, da peculiaridade do conhecimento educacional, a querença é óbvia. Porque a educação é a ação, com pretensão de totalizar, que recria o mundo em nossa visão de mundo infantil de quatro anos, e a tropeços reduz nossa eclosão dos quatorze, para a maturidade do cérebro; a genialidade, o uniforme, espremido por socializados, mais ao mesmo tempo capazes, por força de contradições, de recolher-nos, ao menor descuido, de volta aos quatorze, e até mesmo, às vezes, aos quatro. Porque a educação é personalidade, é cultura e é sociedade, a pesquisa educacional contribui ao ambiente científico-social um ancoradouro merecedor de consideração.

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Exceto a certeza da morte e do prazer em um momento de amor, a vida oferece pouca garantia a não ser que é a vida. E diante tal natureza, nossa história comum é cheia de medos: tememos o desconhecido, intranquiliza a coisa inexplicável, amedronta o imprevisível, quando - para a maioria das coisas piores - estamos mesmo ciente das limitações de nossa existência . [por isso que não temos tanta confiança em nossas próprias ideias, sempre buscamos nos ancorar na ideia do outro, aquele que nos passa confiança e sabedoria] Magia, religião e ciência são a expressão de uma busca de soluções, tão constante quanto vazia. Tomamos o último, a mais recente, as ciências, e entre eles, a mais próxima da pessoa em comunidade, as sociais, aquelas em que se baseia nossas autoexplicacões gregárias complacentes. O menino os constrói e nós o chamamos jogo, o cientista os racionaliza e resulta em teorias, mas em alguns e outros – todos iludidos pelo incentivo do discurso dos filósofos e das palavras dos literatos, a atração resultante pela compreensão do como espiar uma possível explicação é compartilhada. Neste entrosamento simbólico nos introduz a primeira parte do livro. É a investigação sistemática da estrutura, o andaime – a cientificidade –, que permite a construção intelectual dos conhecimentos disponíveis e acumulados em nosso chamado campo científico-social, pelo que, da peculiaridade do conhecimento educacional, a querença é óbvia. Porque a educação é a ação, com pretensão de totalizar, que recria o mundo em nossa visão de mundo infantil de quatro anos, e a tropeços reduz nossa eclosão dos quatorze, para a maturidade do cérebro; a genialidade, o uniforme, espremido por socializados, mais ao mesmo tempo capazes, por força de contradições, de recolher-nos, ao menor descuido, de volta aos quatorze, e até mesmo, às vezes, aos quatro. Porque a educação é personalidade, é cultura e é sociedade, a pesquisa educacional contribui ao ambiente científico-social um ancoradouro merecedor de consideração. Fundamentante: espelho de nossa evolução civilizada, fundido no crisol transcultural, quando cada um de nós com o outro reifica a história em sua própria biografia [aqui parece estar a concepção de prática educativa de todos nós, isto é, a verdadeira educação, aquela que é significativa para nós]. E a pesquisa educacional, expectante, que deve inventar para avançar - aproximação depois de aproximação - na compreensão de tamanha complexidade de tensões, contradições, conflitos, paradoxos, sentidos, significados, intersubjetividades, e nossos medos atávicos, e o acompanhante egocentrismo, lutas pelo poder, glórias e misérias de um processo, o educativo, em que nos é dado no nascimento, e acabam por definir os padrões de comportamento daqueles que chora-nos ao morrer.[e aqui está a definição de como ocorre a pesquisa educacional]

A segunda parte do livro é dedicada a um dos meios de compreensão científica dessas realidades construídas por nós, a pesquisa etnográfica, que, gerados a partir da pesquisa em educação, é - sem dúvida - capaz ser parceiro no desenvolvimento de um método, o etnográfico, de investigação em Ciências sociais. O charme do processo, o agravamento das limitações, o método e metodologias florescer página por página, até concluir em um

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compromisso - o transdisciplinar - de uma pesquisa etnográfica que, duvidoso, mas radical, é querido e eu quero, comprometido com um olhar, o do Outro, [então o método e a metodologia em uma pesquisa etnográfica é construído durante a pesquisa, florescendo a partir da escrita de página a página do diário de bordo, com um compromisso transdisciplinar e comprometido com o olhar do outro] embora para entender isto é necessário atrair, além da mística da solidariedade, se a pessoa quiser, para o estudo e a investigação científica. Nesta segunda parte do livro, o desenvolvimento se limita à segunda condição, a do rigor metodológico na operatividade processual e procedimental de um desenho, emergente, de pesquisa etnográfica.

A peculiaridade da proposta, se é que se acaba atribuindo essa qualidade, reside nos antecedentes, ao construir a pesquisa etnográfica desde os conhecimentos metodológicos acumulados pela investigação educacional. Se nos lembrar da evolução histórica das ciências modernas e o primitivo método científico, único científico, nós observaríamos dois marcos em nosso meio científico-social. O primeiro comum, quando a crença e a fé como critério de verdade substitui a demonstração empírica na contribuição fundamental do, mais tarde denominado, em grosso, positivismo. A disciplina motriz é a Físicas e o método científico se aparece delimitado então pela objetivacão e objetividade das Ciências Naturais. O segundo marco é proveniente à intenção de explicação científica dos sujeitos, das pessoas, em individualidades, coletivos, organizado ou institucionalizado, mas em todo caso socializados. Interessa a nossas Ciências Sociais que se veem primeiro forçada pela herança objetivadora a desenvolver, ao longo de século passado, um método científico plural e conjugado. É agora a Sociologia o referencial principal de uma estruturação entre a necessidade explicativa objetivante da ciência, em frente a objetos de estudo que, por serem sujeitos, resistem à coisificacão necessária para a generalização da explicação teórica derivada da experimentação. Desde o ator na sociologia de Durkheim, até as micropolíticas na (nova) Sociologia Anglo-saxônica, são as regras do método - lhe permite a paráfrase - essas que regulam a investigação científico-social. Na armação sociológica, é construído o conhecimento científico-social. As Ciências Sociais articulam o conhecimento nas diferentes disciplinas que as compõem e bifurcam o método em métodos e metodologias operativas nos diferentes tipos de investigação para os diferentes objetos de estudo. E a maquinaria funciona. Quer dizer, o mecanismo científico-social responde às preocupações das comunidades científicas, ao mesmo tempo que informa aplicativos que atendem a maquinaria social, para o todo ou para as partes das sociedades, nas condições que o investigador e a pesquisa, portanto, os devem.

No entanto, a evolução social acrescenta em todas e cada um de suas dimensões sociológicas, culturais e econômicas, uma amálgama tal de interações que ultrapassam o ritmo da explicação científica, distanciando mais e mais novos fenômenos que se impõe e explicações de tirar o sono. É a crise, a eterna e mais uma dentre as crises da ciência que, com o slogan, chega inclusive a anunciar como "o fim da ciência" em seu estado atual. Paradoxalmente, a Físicas recaptura o protagonismo, e antes da recreação dos "buracos negros", fantasia com o Caos para dar-lhe forma a uma (nova) reestruturação sistêmica, o Complexo. E para a Educação, sempre extremamente sensível à menor flutuação sociocultural e economicista, é introduzida agora no pensamento complexo de uma (nova) era planetária. Às ações comuns lhe correspondem os significados singulares; para a homogeneização, o déviance [o desvio]; para a socialização, o multiculturalismo; e assim sucessivamente, até que o próprio

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conhecimento acaba por ser, em última instância, um processo de construção social e produto multirreferencial, dialógico e intersubjetivo, que leva em ensaios sucessivos de explicações em cada abordagem abrangente. O corpo científico consequentemente é, agora, necessariamente transdisciplinar, como transcultural é a própria identidade fenomênica das coexistências sistêmicas e individuais, globalizadas ao mesmo tempo que singulares[aqui encontra-se a definição da perspectiva complexa, reler essa parte do parágrafo para absorver essa proposta de pensamenteo]. A prática educacional é, eu insisto - páginas faltam para a recriação -, o campo de estudo privilegiado porque aqui os componentes convergem, eles reproduzem as heranças, as idiossincrasias emergem e recriam, no resultado, as tensões. [aqui neste parágrafo Sabirón relata o atual estado em que chegou a ciência de forma que não apresenta a defesa de esta concepção atual seja realmente a correta, mas apenas mais um estado em que se encontra a ciência, mas ao mesmo tempo expõe a importância da pesquisa educativa para o alcance da nova proposta almejada pelas ciências sociais, sendo a pesquisa educativa, no falar de Sabirón, um campo de estudo privilegiado]

A pesquisa educacional luta no zelo. Tanto é assim é que inclusive adquire corpo acadêmico em uma área de conhecimento, a de Métodos de Investigação e Diagnóstico em Educação, com sentido - obrigado é dizer que entre outros - se métodos e metodologias revertem sobre o estudo daquelas combinações que em algum momento do processo recorrem a matizes educacionais, ou seja, em qualquer das manifestações fenomênicas sociais, culturais e econômicas que resultam – fecha-se o círculo - objetos de estudo das Ciências sociais. Em condições científicas, métodos e metodologias de investigação em Educação reescreve métodos e metodologias de investigação em Ciências Sociais. Esta era e é, como dizia, a primeira peculiaridade da proposta metodológica.

A segunda singularidade que se pretende é, se quiser, mais hipotético que empírico por referir-se a um questionamento do qual venho denominar como centrismo metodológico circunstancial, a "terceira via" consensuadora de uma falsa consciência, agora em versão metodológica de investigação. A circunstanciada evolução metodológica da pesquisa educacional evidência um traço que foi imposto como característica formal de nosso tempo: a falsa convicção em um único pensamento de uma ideologia única. Conforme as falas sobre a pluralidade, a estruturação, ou a diversidade, se multiplicam; a prática homogeneizadora é intensificada, ao mesmo tempo que o descaramento dos sem-complexos domina a política, a cultura, a economia, a imprensa e os reality shows, as boas práticas sociais ou os curricula profissionais, até chegar à nossas salas de aula tanto mais privadas de educação, quanto mais elas são usadas para a divulgação de como se resolver os problemas, a golpe de interesse da mídia, ela busca resolver porque toca, mais se priva de fato de conteúdo. As amostras suporiam enumerar um elenco ilimitado das práticas finalistas de uma educação para... É a floritura menos custosa que esconde a mediocridade, quando não privatização interessada da coisa pública, dos líderes que desfrutam com a idiotizacão dos dirigidos; que aumenta o número de vítimas em acidentes rodoviários, e o “punto negro" da estrada é resolvido encaminhado à multa, e para a educação rodoviária; cambaleia-se um serviço educacional porque a população a atender aumenta, que é remetida a um novo serviço que coordena o anterior, e desenvolve o dia das nações, com troca de desfechos, para uma sensibilização da cultura do aluno imigrante. Mas a educação, formal e social, está aqui uma vez mais de resultados. O distanciando que me permite julgar com justiça é difícil; desde as conversas

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radiofónicas matutinais que se auto proclamam de criadores de opinião, até as guerras empreendidas, como todas, sobre mentiras, para o bem de nossa coexistência nos retransmite, minuto a minuto, uma visão teledirigida do momento, até mesmo quando interessa, sobre os que estão morrendo, simplesmente, de fome. A logística é efetiva porque a estratégia é acertada e a consigna consabida: para pensamento menor, brutalização maior.

Me fascina nesta briga um componente singular, que diz respeito à crescente uniformidade pela falsa ênfase na diversidade. A conjugação dos modos sempre é plural, porque todas as particularidades são complementares e eles enriquecem quando você estrutura em uma unidade. As culturas são multiculturais, e os estados, multinacionais, organizado até configurar o todo globalizado, no que, paradoxalmente, têm espaço os sinais de identidade ligados ao sangue, a idiossincrasia de cada aldeia, porque a reprodução social, primeiro de casta e classes, depois cultural, é agora crônica em uma imitação das partes dentro do todo. Cada nível é erguido em autônomo respeito ao superior, porque em quaisquer dos níveis se sobressai constantemente o que é idêntico: do centralismo com capital estatal, para o centralismo com capital regional, do centro para o bairro, e assim sucessivamente. Mas cada indivíduo ocidental vê reduzido sua unicidade pela amálgama de organizações, instituições e serviços que terminam em uma existência aparente, segura e calma, na qual a transgressão de fundo não pensa aproximadamente porque conforma a eles aumente o número de opções e oportunidades, o leque efetivo de possibilidades desaparece. E a escassez é mais explícita quanto é mais próxima é a ação às ideias da pessoa. A pressão para o "homem unidirecional" acaba o convencendo da impossibilidade de uma ideia própria. E quando mais se tentar ensinar a pensar na escola, menos pensamentos divergentes vai ter. [então o que parece existir é uma luta constante entre a possibilidade de diversidade e a tentativa de homogeniazação, que acaba vencendo sempre, até o momento, o discurso do mais poderoso. Mas essas são condições que veem do próprio homem, do seu desconforto pelo desconhecido e a busca por soluções que acaba solucionando pela busca pelo consenso. Se se quer que a possibilidade de diversidade vigore é preciso pensar formas de gerar autoconfiança nas pessoas ao ponto de não terem que abrir mão de suas convicções pelo bem do consenso]

A evolução das Ciências sociais responde a esta situação de um modo obediente nas novas metodologias de pesquisa anunciadas. A pluralidade nos métodos, a combinação metodológica alcança o auge em cada investigação, que para o modo científico raciocinado e justificado, somente prevê a plenitude de uma aproximação metodológica integrada se discorrer. Deste modo, pleitear uma oposição entre paradigmas então obsoletos, porque depois da preeminência secular de um único método científico, se e somente se cosificada (objetivada, normatizada, generalizada), seguiu a breve convulsão metodológica entre quantitativo e qualitativo, para regenera-se novamente na univocidade bem intencionada complementaridade. Uma diversidade metodológica efetiva, aplicado a nossos objetos de estudo, talvez mantivera as dúvidas, porque ofereceriam explicações diferentes, e diante delas a controvérsia força à discussão entre as comunidades científicas e germina, finalmente, na necessidade de meditar, analisar, considerar e, e inclusive, pensar. Para o centrismo metodológico que diz reter de cada opção os melhores, subjugando o sentido das extremidades para o centro da equidade média, democrático para maioria, e da média favorecer de fato a posição de um dos extremos, excluindo o oposto por dissolução, oponho

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um tratamento metodológico que, forçando conscientemente as diferenças, proponha processos de investigação distintos, com resultados diferentes, com explicações diferentes, com conhecimentos diferentes, em um conhecimento científico de acordo com as diferenças, estruturado - agora sim - para a relevância para nossa plural natureza social, cultural e, em definitivo, humana. A estrutura do livro é articulada deste modo em uma reiterativa oposição, enjoada por repetitiva, que busca, antes de cada componente, aguçar as diferenças e comprovar as consequências, do uso de umas ou outras metodologias na aplicação dos diferentes métodos e projetos de pesquisa disponíveis, fundando a cientificidade na pluralidade. A investigação educacional, pelas razões argumentadas e por outros que a essência dos sistemas educacionais comprovaria, está em disposição de exemplificar a oposição metodológica nos processos e a estruturação dos significados finais. Mas como a neutralidade não é, felizmente, traço de nossa condição, a exibição das diferenças vem inclinada pela posição da alternativa e me força a formular uma última caracterização.

A terceira e última particularidade pretendida corresponde, consequentemente, com a proposta metodológica que constitui o grosso do livro: é e são os métodos de pesquisa etnográfica em Ciências Sociais. Pesquisa etnográfica determina o critério de toda a exposição, forma a análise e o argumento dos primeiros capítulos, e constitui o conteúdo na operabilidade metodológica dos últimos. Não me estenderei na apresentação etnográfica, porque logo o leitor comprovará a grossa repetição de justificações explicativas que a torneia, começando pela sua cientificidade na primeira parte, e concluindo na esperançosa transdisciplinariedade utópica de segunda hora. No entanto, prefiro expor uns breves esclarecimentos prévios, necessárias não para o perspicaz leitor, mas sim para o minha dúbia por contraditória posição entre a pinça de quem fundamenta e defende uma proposta metodológica coerente com e na pesquisa etnográfica e quando a pesquisa se vê forçada, talvez, para a aplicação metodológica justamente do que questiono.

Porque a pesquisa etnográfica, e por consequência, os métodos de pesquisa etnográfica, evidência em si mesma as contradições que revela. Questão de complexidade. Se o caos, segundo o conhecido aforisma, não são senão uma ordem para decifrar, quando em nosso campo, entramos na explicação científica, se o resultado é caótico, é porque em nossa ignorância nós não podemos articular a sequencia. No entanto, talvez o caos não seja senão a ordem fenomenal inerente aos humanos, em suas ações e motivações, sentimentos e significados, fenômeno regulado – como evidenciado pela Complexidade – por ordem e caos, divulgado por aquele outro aforismo, este simplista, o "todos iguais, todos diferentes", mas que reflete ações uns e outros assimiláveis, semelhantes, idênticos formalmente, quando o sentido da ação e do significado atribuído pelo ator pode ou não estar igual ao do vizinho . Sob esta premissa relativista, que não renega do pós-modernismo, a pesquisa etnográfica se torna obcecado pela compreensão do aparente absurdo, antes que pela explicação processada, racional e razoável, de atos que, dele, são combinação de múltiplas racionalidades, regidos por lógicas diferentes, tão somente, e às vezes, apenas intuído pelos atores, e mediado pelos outros, sempre forçadas ou voluntárias, co-protagonistas na trama irrepetível da pessoa sob o argumento circunstancial da vida.[nossa tranquilidade cambaleante repousa senão em cima de um caos forçado]

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A pesquisa etnográfica articula, em seu interesse compreensivo, quantas explicações oferecem as várias referências (multirreferencialidade), contextualiza os sentidos (estudo de caso), provoca a manifestação dos significados (intersubjetividade), é sensível às realidades sociais do dia-a-dia definidas pelas pessoas-atores (tema emergente), atenta às minorias (estudos circunstancialmente problemáticos), críticas contra as culturas dominantes (déviance), suspeita das explicações dadas (dúvida metodológica), das verdades absolutas (relativismo existencial), das generalizações reducionistas (metodologia qualitativa), recua diante de prescrições, antepõe a sensibilidade ao rigor, funde, em suma, o olhar do pesquisador social (e educacional) com o método de pesquisa, diante das investigações nas que, sempre, assomaram nossos pares, as pessoas, que cooptam o campo de estudo, sujeito de investigação e fonte de informação, beneficiário dos conhecimentos alcançados e sofredores do trabalho de campo. No entanto, sob os comuns, à pesquisa etnográfica se esboçam – em ocasiões, perfeitamente perfiladas – diferentes correntes que diversificam os acentos. Aqui me forço a um destaque, entre o olhar ou o método.

Olhar e a atitude do investigador contra domínio de estratégias e de rigor metodológico, ou dito de outra forma, é suscetível de operabilidade metodológico o olhar do pesquisador, ou se trata de dois caminhos diferentes, a arte e a ciência do conhecimento? A evolução da pesquisa etnográfica, primeiro dependente e depois apartada da colonização antropológica, tem oferecido respostas opostas. Mais uma vez as contradições da vida são representadas no tipo de pesquisa que busca compreendê-lo. Pelo caminho da cientificidade, a pesquisa etnográfica aproxima-se da metodologia qualitativa e dos estudos de caso; pela dedicação ao compromisso do investigador, a pesquisa etnográfica se aproxima da narrativa e da cultura. O desafio metodológico que assumo, apresentação, sem dúvida, pretensiosa - e não menos presunçosa da minha parte ao enunciá-lo – é alinhavar em pesquisas etnográficas desenhos de investigação que permitem aplicar ao estudo os cânones científicos, sem renunciar à sensibilidade cultural, social e educativa do investigador que o faz permanecer atentos aos significados ditos emergentes no horizonte crítico e emancipador que dota de autonomia a ética do investigador social. [é o olhar do pesquisar que lhe dar autonomia para colocar a sua sensibilidade cultural, social e educativa]

O estudioso experiente e o aprendiz pesquisador se encontram com um livro reescrito. Avatares diferentes na minha vida acadêmica - facilmente entendido por aqueles que compartilham os desassossegos docentes, com não menos inquietudes investigativas - determinaram um ziguezague provisório no ato de escrever que, no momento da publicação, atinge uma estrutura circular que passo a apresentar. O livro aborda os métodos de pesquisa etnográfica em Ciências Sociais, tendo em conta os preâmbulos, em duas partes:

I. A natureza científica da pesquisa etnográfica.II. O processo de pesquisa etnográfica.

A primeira parte (I), eminentemente epistemológica em sua concepção, transcorre entre o tratamento da na natureza da ciência no campo das Ciências Sociais e os consequentes métodos científicos, correspondendo aos dois primeiros capítulos. O primeiro capítulo (1. O conhecimento científico no campo das Ciências Sociais) participa no debate entre paradigmas para enquadrar a pesquisa etnográfica sob o referente da Complexidade. Desemboca no

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processo de teorização e explícita a posição da pesquisa etnográfica em uma finalidade transdisciplinar do conhecimento cientifico-social. Finaliza, finalmente, com um ensinamento, a das Ciências da Educação, agrupação exemplar das dissonâncias em forçar um estudo do campo educacional, como se fosse o cultivo de outra coisa, linha comportamental - além disso - todo o capítulo. O segundo capítulo (2. A pesquisa no campo cientifico-social e educacional) continua com a pesquisa educacional para, interrogado pela pesquisa etnográfica, levar a um componente comum para a pesquisa em nossa área cientifico-social: a necessidade de planejamento. Conclui-se, portanto, este segundo capítulo com uma revisão esquemática e crítica para os projetos de pesquisa. Em todo caso, se trata de dois capítulos que, pela ordem discursiva ocupam um primeiro lugar, fundamentam a cientificidade, mas para que se estabeleçam no primeiro lugar da leitura, gostaria de manter a ordem naqueles leitores que, hoje já menos, duvidam do status científico da pesquisa etnográfica, tampouco – a eles dedico a clarificação, minha condição de ensino obriga-me – para aqueles que, por estar em plena formação, não pode negligenciar os fundamentos.

A posição confortável para a pesquisa etnográfica da primeira parte – a pesquisa em nossa área cientifico-social se desmonta e desconstrói tão facilmente - seguido por uma segunda parte (II) tremendamente robusta. A pesquisa etnográfica questiona os tipos e métodos de investigação fundamentais, e isso é certo. No entanto, quando oferece a alternativa - já vislumbro a repetição nas primeiras páginas - o baixo grau de desenvolvimento operacional, perturba até mesmo o metodólogo mais novatos. O terceiro capítulo (3. O desenvolvimento harmonioso da pesquisa etnográfica) - um, na minha opinião paternal, dos mais inovadores do conjunto - propõe uma sistematização rigorosa do processo de pesquisa etnográfica, em harmonia com a habilitação da pesquisa etnográfica como um método científico de investigação em nosso campo cientifico-social e educacional. Eu sugiro ao investigador social experiente, pressionado pelo tempo e talvez saturado com bibliografias, ler este capítulo e então se assim considerado, continue com os seguintes para terminar nos primeiros. O quarto capítulo (4. Elementos críticos emergentes no desenvolvimento do processo de investigação) – ideal para um doutorando animado – avalia o projeto de pesquisa etnográfica, exposto no capítulo acima, dissecando os momentos críticos no trabalho de campo, no tratamento dos dados e na análise da informação, dando conta do potencial e das limitações, luzes e sombras, dos processos de pesquisa etnográfica, mas ao mesmo tempo fornecendo soluções metodológicas possíveis e disponíveis. O quinto e último capítulo (5. A generalização de pensamento, saberes e conhecimento) é de agradecimento. A pesquisa etnográfica em sua tentativa de ser parceira em uma sistematização transdisciplinar do pensamento, dos saberes e do conhecimento que gera, deve, em seu compromisso de futuro com as comunidades científicas, e com os estudiosos que as compõem, o desenvolvimento e divulgação que, nestes momentos, aproveita, mesmo acariciando em momentos com os dedos a utopia da emancipação da pessoa.

Concluo a introdução com este mesmo desejo compartilhado, e que o leitor, estudante e estudioso, desfrute com a leitura, ao menos tanto quanto quem subscreve o tem feito com a escrita.

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1. O CONHECIMENTO CIENTÍFICO NO CAMPO DAS CIENCIAS SOCIAIS

A história da pesquisa educacional tem influenciado bastante a progressão do conhecimento cientifico-social e, muito particularmente, no "debate epistemológico" de finais do século XX. A questão epistemológica constitui, assim, uma primeira referência contextualizadora da pesquisa etnográfica. Por sua vez, a Filosofia da Ciência está inexoravelmente incorporada no desenvolvimento do pensamento. As, em grosso consideradas, correntes teóricas no conjunto das Ciências Sociais ao longo do século passado (filosofia analítica, funcionalismo, estruturalismo, behaviorismo, fenomenologia, estruturalismo, teorias da ação social, teoria crítica) introduze-nos em uma paisagem sugestiva que antecipa a riqueza nas nuances de nossas Ciências Sociais e a aparelhada riqueza cromática nas máscaras de nossa pesquisa socioeducativa, sem esquecer a referência permanente na melhoria da práxis investigativa. No entanto, as correntes - como métodos de investigação – se influenciam mutualmente e entre si: o conjunto genérico, primeiro do método científico único, depois dos métodos de investigação cientifico-sociais, são copratogonistas no desenvolvimento do conhecimento refletido na plenitude e na particularidade de cada corrente de pensamento também no conjunto da existência, em ocasiões opostas no domínio excludente, em outras, ao uníssono na reconstrução abrangente.

Em um e outro, exclusão e estruturação científica - e por derivação, metodológica -, este primeiro capítulo se fundamenta na introdução do processo de investigação (1.1. A construção do conhecimento científico) para continuar no conhecimento acumulado (1.2. O processo de teorização no campo científico-social). O desmembramento indicado mantém uma posição historicista na evolução de como, com uma primeira fase quase-superada, sob o domínio da exclusão (1.1.1. Os domínios excludentes), e a reconstrução em uma proposta plural (1.1.3. A pluralidade axiomática nos programas de investigação)[a proposta é plural para não se tornar excludente] e, com ressalvas, estruturadora (1.1.2. A reconstrução inclusiva), do qual pelo menos emerge o fôlego criativo porque nós estamos atentos de nossa pretensiosidade quando nós tentamos explicar nossos próprios fenômenos sociais e sociológicos, culturais ou educacionais (1.2.1. Dissonâncias no método científico), quando suficiente seria chegar compreendê-los dado, goste ou não, a complexidade fenomênica (1.2.2. A compreensão da complexidade fenomenal) que aboca, de acordo com os gênios do passado, no caráter transitivo, por transdisciplinar, de saberes e conhecimento (1.2.3. A estruturação transdisciplinar do conhecimento cientifico-social e educacional).

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Uma última advertência prévia ao desenvolvimento exaustivo do primeiro círculo, o da cientificidade, da investigação socioeducativa em seu conjunto, e da etnográfica, em particular. Embora a investigação em nossas Ciências sociais já não é questionada em sua natureza científica, no entanto, as distorções que são introduzidas no saber social, cultural e educacional ao tratar-se de um campo de domínio público que afeta em diferentes sentidos à população, diante de que o conhecimento é vulgarizado com extrema facilidade, o a mediatização que exercem sobre o conhecimento socioeducativo as políticas do momento e - chave em nosso caso - as dificuldades intrínsecas que nosso objeto de estudo tem para ser apreendido desde uma posição científica, recomende a manutenção e a apresentação do conhecimento desde a cobertura inequívoca de sua cientificidade, em fundo e forma. Esta última limitação se tem tentado resolver ao longo do conhecimento acumulado, com a evolução de uma consideração estritamente objetiva, imitativa das ciências naturais, até a inclusão de lógicas vivas, próximo à subjetividade e intersubjetividade dos sentidos e significados da ação docente: é a reificacão nada inovadora, respectivamente, entre o Sistema e o Mundo de Vida. Apresentam-se assim diferentes maneiras de racionalizar os instrumentos, comunicativa e crítica que, no conjunto do conhecimento científico, eles oferecerem diferentes teorias explicativas sobre um mesmo fenômeno, sendo todas elas, por científicas, válidas e críveis. Novamente, referências similares às inicialmente devidas ao campo científico-natural reivindicam a construção de novos modos de aproximação para as realidades socioeducativas: é o paradigma emergente da Complexidade para qual é dedicada uma atenção particular e uma transversalidade neste primeiro capítulo.

O enredo deste capítulo primeiro responde a exibição gráfica deste duplo eixo que representa o Sistema e o Mundo de Vida, antítese que tenciona as realidades fenomênicas que, quanto realidades que são, constituem nosso objeto de estudo. Sem aprofundar nestes constructos terminológicos e conceituais habermasianos, basta com uma compreensão intuitiva. Imagine leitor, as condicionantes que em nossa vida particular têm as regras do sistema ao qual pertencemos, e obterá a tensão entre ambas as forças capazes de contextualizar o senso e o significando que podemos conferir a nossas diferentes ações. Esta tensão diária em nossas vidas é extrapolada, no primeiro capítulo, para o conhecimento científico no campo das Ciências Sociais, dedicadas - precisamente – a explicar e entender ações e atores, pessoas que são individualidades, ao mesmo tempo que membros coletivos de uma miríade de organizações, instituições e sistemas.

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A primeira tensão (figura 1) reflete a situação científica em nosso campo, quando discute três possíveis situações que constituem o fio condutor do capítulo: uma dupla posição excludente tanto se se trata de investigar sobre a explicação generalizante do Sistema ou a compreensão do Mundo de Vida; posição excludente tensionada por um terceiro eixo emergente em face da necessidade de incluir saberes pertinentes à dupla natureza, sistêmica e singular, dos fenômenos objeto de estudo das Ciências Sociais. A simplicidade esquemática permite exemplificar quaisquer dos conteúdos tratados, deste modo tanto as dualidades antagônicas tais como "objetividade" frente à "subjetividade", "paradigma positivista" frente ao "paradigma etnográfico" – a título de exemplos –, como também a própria evolução da ciência desde o historicismo kuhniano, são representados sob o atributo de "ciência excludente". O exagero no extremo contrário de interpretações, críticas e subjetividades suporiam uma posição científica não menos excludente. O terceiro eixo, representando a tensão entre ambas forças sistêmicas e individuais, facilita a introdução de uma "ciência inclusiva" que tenta superar as dicotomias e conecta, de modo gráfico, com a "complexidade fenomênica", consequente, em troca, com a diversidade manifestada nas correntes de pensamento vigentes, e a fragilidade de um argumento que baseia a superação nas três vias alternativas .[esse eixo deixa transparecer também que existe um espaço de interpretações possíveis, e que, no caso o intento do terceiro eixo é o de incluir e não a de chegar a uma interpretação verdadeira do fato].

Esquema idêntico é aplicável ao modo da razão, ao tipo de racionalidade, para o raciocínio que

a ciência aplica na interpretação dos resultados de suas investigações (figura 2) e que, por consequência epistemológica, repercute no resto das fases de um processo de investigação como também no desenho da mesma, e finalmente na teorização que gera. Mantendo a tríade representada graficamente pela tensão, contradições e conflitos entre os eixos Sistema e Mundo de Vida, as duas posições são articuladas desses que se considerem as lógicas do raciocínio científico-social. De uma parte, os modos de raciocínio instrumental na perspectiva do Sistema, comunicativa para o Mundo de Vida, e ideológico na tensão à que cada individuo, grupo, organização e instituição respondem. A motivação para cada um dos modos de razão é coerente com o eixo sistêmico ou fenomenológico, sendo enunciados os três tipos sob um imperativo que governa a razão: eficientista no primeiro caso, interpretativo para o segundo e

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crítico no terceiro. De outra parte, o referente é estritamente epistemológico ao reificar o percurso explicativo na evolução científica que, em uma relação de causa-efeito, progride para a explicação das funções, e insere as funções em estruturas, ao mesmo tempo que, paralelamente, introduz na explicação científico-social a possibilidade de uma compreensão descritiva, interpretativa e hermenêutica. Na explicação e compreensão científica, se contempla a igualmente a natureza ideológica que impregna o sentido das ações sociais e educativas sob um esquema dinâmico, interativo e dialético. Todo ele sob um duplo sentido de estruturação da diversidade explicativa e compreensiva da ciência, ao mesmo tempo que mantém o univocidade nas condições de rigor que distinguem o conhecimento científico de outros tipos de saber.

Se partir da prática científica, a situação é igualmente representável sob o mesmo gráfico (figura 3), que reflete a pergunta em dois aspectos sobressalentes definidoras da “boa prática” científica, uma atenção ao rigor exigido em todo estudo científico quaisquer que sejam seus referentes epistemológicos, teórico ou metodológico, unido a uma, não menos transcendente, éticas e o compromisso do investigador social. A tonalidade do alinhamento permite para desmitificar a atividade científica, ao mesmo tempo que exalta as possibilidades para gerar novos saberes quando é aplicado ao ambiente científico-social e educacional. Um das primeiras consequências da vontade para uma "boa prática científica" tem sido as sucessivas intenções históricas de fundamentação e desenvolvimento do "método científico" e dos "métodos de investigação" consequentes. A sistematização da metodologia científica responde a uma rede terminológica-conceitual plural, porém inequívoca no significado, consequência por sua vez dos distintos movimentos que foram acontecendo, tais como o empirismo ou o realismo. Uma segunda consequência, substantiva e decisiva em nosso ambiente científico-social, é a dívida da "boa prática científica" não só para as funções endógenas da própria ciência e a acumulação progressiva e sistematizada de novo conhecimento, mas todo o saber científico-social que se deve, no final das contas, às pessoas, em quaisquer de suas manifestações. Sob a função de emancipação é refletido esta honrosa imbricação.

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Os marcos históricos alcançados pela investigação no conjunto do campo científico-social nos situa, na atualidade, em uma posição privilegiada de abertura metodológica ao dispor de modelos teóricos que, gradualmente, melhoram na explicação e compreensão oferecidas, ao mesmo tempo que permitem avistar novos ensaios de aproximação para a complexidade fenomênica de nosso objeto de estudo (figura 4). Ajustando as teorias disponíveis à classificação introdutória ao redor dos três eixos, apresentado a realidade dos atuais modelos teóricos em várias disciplinas, próximo ao sentido, em plena ebulição, mas não por eles menos fundamentada, sistematização transdisciplinar, em um novo ensaio para superar antigas antinomias e tópicos isolados entre "teoricistas" e "praticistas". O grosso constituem os distintos modelos teóricos, representativos e avalizados por disciplinas que abarcam desde a Sociologia até não poucas Ciências da Educação. São, progressivamente, os modelos

estruturais, personalistas ou de recursos humanos, sistêmicos, simbólicos e sócio-críticos que, articulados graficamente sob o esquema condutor deste primeiro capítulo, oferecem uma panorâmica compreensiva dos saberes disponíveis1. Reforça-se aqui, finalmente, a consideração, provisória, se assim quiserem, mas decisiva no futuro imediato, do sentido transdisciplinar da teorização científico-social e educativa sob o referente do paradigma da Complexidade.

Na estrutura apresentada, é desenvolvido, sem mais preâmbulos, o capítulo primeiro na posição que, favorecedora da pesquisa etnográfica, se articula ao redor do estado do conhecimento do conhecimento em Ciências sociais.

1.1. A CONSTRUCÃO DO CONHECIMENTO CIENTÍFICO

1.1.1. Os domínios excludentes

Indefinição e ambiguidade terminológica e conceitual

1 Remeto-me a uma publicação anterior em que se desenvolvem e aplicam estes modelos nas organizações sociais e educativas (Sabirón, 1999).

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A reflexão sobre a entidade epistemológica da investigação no conjunto das Ciências sociais requer para uma série de precisões terminológicas e conceituais iniciais por razões nada inovadoras, sempre recorrentes, mas de necessária repetição. Em um primeiro lugar, a pesquisa não escapa à ambiguidade terminológica e a confusão conceitual com que, em ocasiões, ficam amaldiçoadas as Ciências Sociais, em geral, e as de Educação, em particular. Entre outras razões, uma das causas de tal um imprecisão - e que convém enunciar, dada sua reiterada relevância nas comunidades científicas de referência - é a diferente posição, a distinta "cosmovisão”2 inclusive, que pode ocupar o especialista no campo do conhecimento que trata. Ao desembocar, de um modo explícito ou escondido, numa determinada corrente, o investigador utiliza algumas redes conceituais de elaboração e de expressão do conhecimento coerente e de acordo com uma opção científica, na qual adquire significado um termo concreto. Significando que não deve ser completamente coincidente com o uso do mesmo vocábulo de uma corrente de pensamento diferente. Por exemplo, se é usado a palavra racionalidade, imediatamente a seguir, será indispensável defini-la, já que seu significado, como foi evidenciado na apresentação, será diferentemente formulado desde um enfoque positivista ou desde uma perspectiva fenomenológica. Mostrando, no entanto, ambas as maneiras corretas pela origem etimológica, aparece inadequado na tendência necessária para a univocidade da terminologia científica. Não é este o espaço apropriado para avaliar se assim se evidencia a demonstração de uma criativa vitalidade do campo, ou é uma de nossas fraquezas mais ostensivas3. Em segundo lugar, à ambiguidade é adicionada a não menos decisiva indefinição, devedora, neste caso, de uma parte, da linguagem utilizada na expressão do conhecimento; e de outra, substantiva, devido à própria natureza de nossos objetos de estudo que aplicam, em suas concreções e realidades, uma lógica borrada4. Não só deste modo a expressão do conhecimento, mas o próprio objeto de estudo resultam vago por indeterminados.

Se necessário, primeiro faz-se o tratamento da vagueza e ambiguidade para a contextualização da pesquisa social e educacional, a necessidade é absolutamente decisiva se si trata da pesquisa etnográfica: seu desigual desenvolvimento de funcionamento, sua tardia incorporação na formação inicial e continuada de profissionais e pesquisadores, mas, acima de tudo e de forma superior, a delimitação fenomênica emergente do objeto de pesquisa, que se configura conforme progride o estudo, são outras tantas razões acrescentadas que, sem esgotar as possibilidades, justifica per se o tratamento da questão. É preciso, portanto, (i) uma aproximação das possíveis posições epistemológicas que devem ser abordadas na pesquisa, de modo que (ii) dar razão para a da posição explícita de análise da pesquisa como um todo e da etnográfico em particular e, assim, (iii) confere chaves significativas para os termos básicos usados no futuro. Principalmente, não só promover o planejamento, desenvolvimento e divulgação de pesquisas etnográficas, mas para torná-lo apto, com o necessário rigor científico, os pressupostos metodológicos e teorias de referência que estão subjacentes a ele.2 Amparo-me no significado de RALE que, segundo ele, com origem etimológica no termo alemão weltanschauung, se define como "modo de ver e interpretar o mundo". E eu prefiro outros ascendentes talvez mais inovadores, mas menos relevantes, como a proposta de Maykut e Morehouse (1999), do mais estático indewelling. Em qualquer caso, nós retornaremos e, não raro, sobre o conceito.3 Posição restritiva, esta última, a que aprovo. A ambiguidade reduz nosso desenvolvimento científico, porque exige constantes esclarecimentos terminológicos que torna tedioso ler nossos textos. O leitor novo logo apreciará esta condição... Questão de páginas4 Refiro-me ao tratamento posterior da Complexidade.

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Esta e não outra é a intenção que justifica esta secção dedicada à clarificação conceitual através de um quadro epistemológico de referência: não se trata tanto de desenvolver, com maior ou menor grau e fortuna, uma base epistemológica sempre breve e incompleta, mas esclarecer âncoras epistemológicas através do esclarecimento conceitual dos termos-chave. A revisão não é completa, nem tampouco aleatória, é interessada: responde a uma posição a priori, ante uma pesquisa plural, estruturadora e comprometida, crítica para com a dominante da quantidade, o número e a estatísticas, e construtivista para com o sentido, o significado e a compreensão das ações que nos rodeiam, no qual, ao mesmo tempo, estamos empenhados e que tenta finalmente, dar conta das referências consequentes da pesquisa no âmbito genérico, cientifico-social e educacional.

Da existência de duas concepções antagônicas da realidade social

Dualismo é inato - parece - a nossa própria condição humana e nos acompanha ao longo de nossas civilizações. Desde o bem e o mal judaico-cristão para o branco ou o preto do nosso intelecto limitado - verdade e mentira, a inclinação para a meridiana distinção antagônica em dois extremos obceca-nos até à morte, quando, paradoxalmente, ao longo da nossa vida dificilmente nos encontramos diante de um estudo de caso simples de sim ou não. Não cabe atribuir, pois – é obvio –, ao confronto epistemológico moderno a origem das concepções antagônicas da realidade, social ou natural; ao contrário, epistemologia reflete as dúvidas existenciais, mesmo que seja não menos verdade que a simplificação, ao menor descuido, é reificada e reforçada a cada nova reflexão teórica. Na pesquisa, a dualidade excludente tem se manifestado – e persiste – diacronicamente, sob diferentes denominações, privilegiando em cada momento umas ou outras características que reduzem a dificuldade da tentativa compreensiva e bajulador do circunstancialmente correto. Assim, tanto que no sentido paradigmático convencional opor-se dois métodos de pesquisa, "positivista" versus "etnográfico", por exemplo, em outras, se destacam aspectos essenciais, "objetivismo" versus "subjetividade", e até mesmo metodológicos, "qualitativo" e "quantitativo". Cada um pode escolher de acordo com seus gostos e interesses em prateleiras científicas. No entanto, em tão elementar base dual de lógica binária, estudiosos têm contribuído não poucas razões enriquecedoras para a pesquisa, porque o antagonismo transcende na busca, mesmo científica, de explicações.

Cohen e Manion (1990, 23-33), de entre os numerosos e repetitivos estudos que tratam a questão – a nossa é uma mais —, representam esta situação viciosa. Os autores introduzem a natureza da pesquisa como um dos meios na busca da "verdade" conjuntamente com a "experiência" e o "raciocínio". Mas a distinção entre "verdade", "experiência" e "raciocínio" aplicado ao campo da ciência não é, no entanto, tão óbvio como pode parecer quando, na verdade, o "raciocínio" não é de um único tipo - lembre-se ao menos a razão instrumental, a comunicativa e a crítica-, mas que implica uma determinada concepção da realidade social e, por sua vez, é devedor de uma “experiência” pessoal e de um sentido de “verdade” dependente, também, ao mesmo tempo, da formação disciplinar que recebeu. Seja como for, se optar pelo estudioso e escola que se queira, esses problemas primitivos sempre ocorrerão. Deve diferenciar, pelo menos em discussão, e assim o fazem os referidos autores, diferentes níveis (figura 5), as "dimensões de comparação", que se bem novamente questionável e não compartilhado, são expositivamente esclarecedoras ao sintetizar as duas concepções opostas e

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extremas da realidade social5 na referida posição "objetiva" contra a "subjetiva". Considerar-se, assim, exemplificada, as consequências para dois possíveis tipos subjacentes de investigação que, ao longo deste capítulo, podemos chamá-lo - com quantos receios podem imaginar pela imprecisão da rotulagem – como investigação “positivista” e investigação “etnográfica”, deixando patente – de entrada e insisto – o reducionismo tautológico da classificação.

Uma concepção dualista da realidade que envolve a dissecação antitética do conhecimento é, no entanto, pesquisa dificilmente sustentável. A questão da concepção antagônica, com ser filosoficamente inerente à pessoa, e, portanto, ao pesquisador psico-sócio-pedagógico, dificilmente pode extrapolar-se para investigação socioeducativa, mesmo querendo precisões em torno de "critério de realidade" e "critério de verdade" (Bericat, 1998, 73) que reforçam este argumento reducionista. Pelo menos as realidades não respondem a uma única posição diante duas únicas posições possíveis. Outras razões, com uma origem disciplinar distinta, intensificam, se possível, as diferenças. Bruner (1993), por exemplo, examina a questão de uma "psicologia do fazer ciência, ou do fazer epistemologia" e muda a discussão filosófica para a própria estrutura do cérebro humano. A mente parece estar organizada em termos de contraste, em um sistema neuronal dividido, entre a ordem, a regularidade, a previsibilidade, e o caos, o inusitado, a surpresa, uma série de processos que constrói "um modelo do que é previsível e canônico" e um segundo mecanismo que constitui um "sistema de ativação", que alerta a consciência sobre algo imprevisível que aconteça. Ambas epistemologias são duas maneiras diferentes de construir o mundo e, para Bruner, dois métodos científicos diferenciáveis. Quando a aplicação da excludente concepção "objetiva" ou "subjetiva" - tanto monta, monta tanto - da realidade social aplica-se a engrenagem explicativa das Ciências Sociais, multiplicam-se as opções. Popkewitz (1988, 1990), em a "ciência da educação" (sic), há três posições: "Três paradigmas que definem e estruturam a prática de investigação" em "ciências empírico-analíticas", "simbólicas" e "ciência crítica", facilmente reconhecível em todos os três modelos de razão "instrumental", "comunicativa" ou "crítica"6. E assim por diante, conforme aumentam as publicações, acrescentam-se novos – inclusive –"paradigmas”7.

É a percepção, identificação e definição das dificuldades da realidade, bem como auxiliar na sua resolução, a essência da ciência, como alegam Van Dalen e Meyer, (1981, 28). E o assunto se refere ao conjunto das ciências sociais, a avaliação é repetida em Boudon (1984, primeira edição em 1969). Falsas reclamações entre os métodos que nos têm ocupado nas últimas décadas é a maneira ideal de prevenir tais louváveis propósitos. A complexidade dos fenômenos sociológicos e educacionais nos dias de hoje, como no passado, é tal que, se os cientistas sociais têm de apresentar explicações de como foi constituído numa instituição 5 Decidimos recorrer a Cohen e Manion porque, mesmo que eles não são, sem dúvida, os mais ilustres representantes desta preocupação filosófica, a sua proximidade evidente a nosso campo de investigação socioeducativa pela influência de seus manuais justifica, amplamente, a referência. No entanto, daí a resistência, eu entendo que as "dimensões de comparação" que propõem, refletem por sua vez uma dissecação reducionista e simplista em excesso: definir filosofia, estrutura, função, organização, etc., esconde um sistema categórico que reforça a dualidade (oposta ao contínuo) que, por sua vez, questionam os próprios autores. Mas, bem, terá que superar o atoleiro!... Ainda há páginas para fazer isso.6 Pergunta esta sobre a qual voltarei insistentemente ao longo dos diferentes capítulos e que se esboçava na exibição gráfica das primeiras páginas (figuras 1 a 4).7 Refiro-me às epígrafes seguintes, em particular às referências a Jacob e à síntese de Sáez.

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particular, a organização ou o fenômeno, do por que se mantem, da possível evolução e, em todos os momentos, dos efeitos que implica... ou recupera rapidamente a flexibilidade diante da existência de diferentes métodos, sem dispensar o rigor na implementação em cada um deles – claro está – ou a teorização reproduzirá níveis de improcedência e erros de outros tempos. O desenvolvimento da pesquisa em suas diversas formas e desde suas diferentes perspectivas de estudo, está nele.

Para concluir, convêm antecipar – e enfatizar – uma exclusão que surge repetidamente, mas neste momento pode resultar confusa: da análise exposta não pode extrapolar a defesa de uma posição eclética, ao modo "quantitativo" – "qualitativo" que Cook e Reichart (1986) mantinham. Ecletismo metodológico pode-se supor um totum revolutum pesquisador, falsamente conciliador em um campo em si mesmo difuso e indefinido como o nosso 8. Questão diferente ao ecletismo - oposição que vou repetir na mínima ocasião que se apresente a mim – é a combinação de instrumentos, técnicas ou estratégias para coletar dados e informações, que serão analisadas e interpretadas, desde as perspectivas epistemológicas que convirjam (e anteriormente mencionado) para o próprio objeto de pesquisa, à finalidade da pesquisa, e à posição e perspectiva do pesquisador.

Concepções da realidade social

Dimensões de comparação

Objetiva Subjetiva

Base filosófica

Realismo: o mundo existe e é cognoscível como realmente é. As organizações são entidades reais com vida própria.

Idealismo: o mundo existe mas pessoas diferentes o explicam de maneiras muito diferente. As organizações são realidades sociais inventadas.

O papel da ciência social

Descobrir as leis universais da sociedade e da conduta humana dentro dela.

Descobrir como as pessoas interpretam de modo diferente o mundo em que vive.

Unidades básicas da realidade social. Métodos de entedimento

A coletividade: sociedade ou organizações.Identificando condições ou relações que permitem existir na sociedade.Conceber quais são essas condições e ralações.

Indivíduos atuando sozinhos ou reunidos.Interpretação dos significados subjetivos que os indivíduos aplicam a sua ação.Descobrir as regras subjetivas para tal ação.

TeoriaUm edifício racional construído por cientistas para explicar o comportamento humano.

Conjunto de significados que as pessoas usam para dar sentido a seu mundo e ao comportamento dentro dele.

PesquisaConvalidação experimental ou quase experimental da teoria.

A procura de relações com sentido e o descobrimento de suas consequências para a ação.

8 Questões refletidas em particular nos referidos Reichardt e Cook (1986, 25-58) e nos estudos compilados nesta mesma publicação (Trend e suas alegações finais sobre "verificar, verificar e verificar!": Ianni e Orr em um tom mais "comprometido" com a inovação através da pesquisa, ou a aplicação da pesquisa avaliativa etnográfica de Knapp).

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MetodologiaAbstração da realidade, especialmente através de modelos matemáticos e análises quantitativas.

A representação da realidade com objetivo de comparação.Análise da linguagem e o significado.

Sociedade

Ordenada. Governada por um conjunto uniforme de valores e feito possível somente por aqueles valores.

Em conflito. Governada pelos valores da gente com acesso ao poder.

Organizações

Orientada para um fim. Independente das pessoas. Instrumentos de ordem na sociedade servindo tanto à sociedade como ao indivíduo.

Dependente das pessoas e de seus fins. Instrumentos de poder que certas pessoas controla e pode usar para alcançar fins que lhe parecem bons.

Patologias organizacionais

Organizações desajustadas com valores sociais e necessidades individuais.

Dadas as finalidades humanas diversas, sempre há conflito entre as pessoas que atuam perseguindo.

Prescrição por mudança

Muda a estrutura da organização para satisfazer os valores sociais e necessidades individuais.

Descobre que valores se incorporam na ação organizacional e de quem são.Muda a gente ou muda seus valores se puder.

A fundamentação da pesquisa etnográfica opta por esta última distinção combinatória e estruturadora, que não eclética, não reduzida a uma questão de métodos e instrumentos, mas aos referentes interpretativos dos resultados, e as posições ante ao conjunto do desenvolvimento da pesquisa, para a posição epistemológica, em última análise, para a "cosmovisão". A complexidade é o reagente apropriado.

Conceito, sentido e consequências do historicismo kuhniano

Sob o suposto conceito kuhniano de paradigma

"'Olhe', disse-me Thomas Kuhn. Ele falou como se estivesse cansado, como se estivesse conformado com o fato de que eu iria o interpretar mal, (...) 'se eu tivesse a escolha de escrever o livro ou não, certamente teria escolhido a de escrevê-lo. Mas certamente há aspectos que têm complicado bastante a resposta a dar'. 'O livro' foi A estrutura das revoluções científicas (...). "O argumento mais profundo do livro era (...) que os cientistas nunca poderão entender o verdadeiro mundo real e nem mesmo entender uns aos outros" (Horgan, 1998, 65; conversa com T.S. Kuhn em fevereiro de 1991). É a eterna reificação mitológica do fórum agora científico de Babel.

Figura 5: Bases alternativas para interpretar la realidad social (de Cohen y Manion, 1990, 34-35, adaptado de B. Greenfield)

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O ensaio de Kuhn, A estrutura das revoluções científicas (1986)9 adquiriu nas últimas décadas uma extraordinária difusão até o fim de assumir uma pequena revolução na concepção da teoria científica. Inclusive no enfoque posterior dos "programas de pesquisa", Lakatos readaptará alguns dos seus pressupostos. Mas as contribuições de Kuhn são analisadas, tangencialmente às vezes. Essas interpretações restritivas tendem a concentrar-se sobre o sentido estrutural que Kuhn dá ao termo paradigma independentemente da ênfase sobre os "fatores sociológicos" contido no progresso científico. A relação é esclarecedora: a disciplina, com os cientistas e os seus interesses (coligações, negociações, associações, congressos, etc.); A ciência, sempre associada a um componente sociológico. Se fatores sociológicos e ideológicos condicionam a evolução das teorias científicas, esta relação de mediação é enfatizada quando se trata das Ciências Sociais e atinge o nível máximo quando se trata de pesquisa educacional, dada as características específicas ao próprio fenômeno, objeto de estudo nem sempre confirmado pelas comunidades científicas reinantes, e ao qual é adicionada a coabitação inevitável, desastrosa para a primeira, entre a investigação e as políticas educacionais, com seus circunstanciais filhos que pregam – sempre – o politicamente correto a cada reinado os interesses mesquinhos dos régulos no poder.

Este argumento é, provavelmente, extremamente arriscado e, em certo modo, excessivamente hermenêutico para o próprio Kuhn (1986, 268-319) quando constantemente recomenda prudência ao sublinhar que seus conceitos são aplicáveis (apenas?) às ciências naturais. Na exegese da obra de Kuhn, Barnes (1987, 224-225) referir, no entanto: "Em minha opinião, o significado geral da obra de Kuhn reside não nas suas relações históricas do desenvolvimento da ciência (...), mas simplesmente em suas discussões explícitas de problemas gerais relativos à cognição, a semântica e a cultura (...)". O apoio no presente parecer renomado parece suficiente endosso. De acordo com Chalmers (1989, 129), "na natureza de um paradigma está o fugir de uma definição precisa". A alegação é, por repetida, óbvia, para citar, em seguida, o estudo de Margaret Masterman (1975, 162-168), The nature of the paradigma, que inclui diversos aspectos10 e conteúdos diferentes sobre o conceito de "paradigma". Em qualquer caso, antes das críticas formuladas na primeira edição da edição de 1962 de A estrutura das..., Kuhn adiciona o já referido PostScript para a edição de 196911, em que admite o primeiro uso ambíguo do termo paradigma (Kuhn, 1986, 286 e 269) e distingue, em forçada síntese, dois sentidos, como "matriz disciplinar" e em sua condição de "exemplar": "Filosoficamente, pelo menos, o segundo dos sentidos de 'paradigma' é o mais profundo dos dois" (ibídem, 269). No entanto, a contribuição do "texto" vai além desta redução. Apesar do próprio Kuhn, em seu historicismo, à disciplina científica acompanha sempre o comparsa inquisitorial da "comunidade científica". Kuhn continua com as precisões, das que cabe selecionar até as mais relevantes para o caso da pesquisa em nosso campo:

9 Primeira edição em 1962. Citação pela 10ª reimpressão em espanhol do Fondo de Cultura Económica, que inclui a interessantíssima PostScript de 1969? Nesse sentido, juntamente com os "Segundos pensamentos sobre paradigmas", o autor afina e reinterpreta em alguns pontos suas primeiras formulações do conceito de "paradigma".10 Kuhn (Op. cit., 279) refere-se a este estudo que indica: "Uma leitora simpatizante, que partilha a minha convicção de que o paradigma menciona os elementos filosóficos centrais do livro (refere-se a A estrutura das...), ele preparou um índice analítico parcial e conclui que o termo é usado em pelo menos vinte e duas maneiras diferentes".11 Incluída na edição de referência do Fondo de Cultura Econômica e tradução de Agustín Contín.

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Paradigmas e estrutura comunitária: "Um paradigma é o que os membros de uma comunidade científica partilham e, inversamente, uma comunidade científica consiste em homens que partilham um paradigma" (ibidem, 271).

O mecanismo não deixa refletir corantes tautológicos, com manifestações diferentes de acordo com a fase histórica de desenvolvimento em que se encontra a disciplina. Quando a “estrutura comunitária” está assentada, a “comunidade” é fechada em si mesmo. É a fase cerimonial através de certificações e qualificações. Os rituais de iniciação com o desenvolvimento e o domínio de uma linguagem apropriada e exclusiva dos "iniciados" em uma comunidade científica são manifestados. Quando a nova "estrutura comunitária" em vias de formação (ou em plena crise), a abertura, a pluralidade de perspectivas – cerimoniais se oporem à hierarquização – é igualmente usual. É possível considerar a pesquisa de qualquer uma destas posições, pessimista ou otimista, mas em ambos os casos – tenha bem em mente - joga tanto a cultura quanto o conhecimento.

Os paradigmas como constelação de acordos de grupo: "Os cientistas se dizem que eles compartilham uma teoria ou um conjunto de teorias, e me dará muito prazer se o termo pode ser finalmente recuperado para este uso. No entanto, 'teoria', como ele geralmente se aplica (...), conota uma estrutura muito mais limitada em natureza e alcance do que a necessária aqui" (ibidem, 279).

A dissociação entre a "teoria" e "paradigma" permite diferenciar as diferentes teorias ou, com maior adequação ao conhecimento cientifico-social e educacional, diferentes tipos de teorias e graus de teorização, inclusive linhas e escolas, que respondem a um mesmo paradigma. Na verdade, a terminologia, a metodologia e a própria teorização sociológica e educacional são atoladas em tal diversidade que às vezes é difícil encontrar um denominador comum. Quando a pesquisa cientifica-social e educacional se atribui incapacidade, comparando com outros campos científicos, de teorizar, quem está livre... que joga a primeira pedra.

As versões oferecidas pelos post-kunhianos surpreenderia o próprio Kuhn. Considere um exemplo entre os recentes: Scheurich e Young (2002) discutem os componentes raciais (sic) nas concepções epistemológicas: racismo, aberto ou dissimulado, evolui para diferentes níveis de racismo industrial, racismo institucional, racismo social, e racismo nas civilizações, nível esse final do qual emerge... o racismo epistemológico.

Seja como for, interessa manter do conceito kuhniano de paradigma os dois componentes intrínsecos à sua natureza: a ciência e os cientistas, porque os altos e baixos da pesquisa como um todo e, principalmente, a pesquisa etnográfica em nosso campo, encontrada nos absurdos da segunda razão suficiente do atual estado em que são encontrados.

Paradigma positivista versus paradigma etnográfica, um debate metodologicamente inacabado

O choque de paradigmas passa de dramático para com a evolução científica desejável a tragicômica formas acadêmicas. Diminui a discussão artificial, porque para reduzir a oposição - o confronto para ser mais fiel à realidade - está a forçar um desenvolvimento diferente do

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conjunto de investigação em Ciências Sociais e da Educação. As oposições antagônicas tendem a ser gratas, porque o argumento substitui a opinião: trata-se de aliar-se a um lado ou outro e conseguir simplificar... problema intelectual resolvido. Ao expor aqui a oposição entre um paradigma e outro, o sentido é estabelecer um ponto mais de encontro na reconstrução, talvez forçada, de uma consideração vinculada na complexidade dos fenômenos que ocupam e entreter toda a nossa ciência. Jacob (1978) foi um dos primeiros mágicos de oposições, em duas colunas, entre um e outro (figura 6). A pesquisa sócia educacional, como um todo, não é beneficiada de tão reducionista oposição. Nem o paradigma “positivista” ou "quantitativo" ou que diacho o queira chamar, tampouco o paradigma "etnográfico", "qualitativo", "naturalista" inclusive (Guba, 1985;) Espuma, 1986), são refletidas em um esquema simples. A questão é de fundo e afeta - repito mais uma vez - a posição do pesquisador, frente a concepção do fenômeno sob estudo. A propagação e repetição em excesso, publicação após publicação, este tipo de solução simplista para um problema mais grave, que é a própria operação e instrumentação no processo de estudo específico, têm sofrido nas últimas décadas os produtos da própria pesquisa em sua apreensão e a compreensão das realidades, ao mesmo tempo que se tem desvirtuado, antes de aplicar-se de fato, alternativas em métodos e metodologias evolutivas distintas, e entre elas, a investigação etnográfica12.

Pesquisa de corte positivista

Pesquisa ETNOGRÁFICA

FinalidadeDescriçãoGeneralizaçãoNormativa

InterpretaçãoCompreensão, complexidade Explicativa

Tipo de conhecimentoObjectivoInstrumentalDa Teoria à Prática

IntersubjetivoComunicativoDas Práticas à Teoria

Metodologia Quantitativos (de preferência) Qualitativa (de preferência)

Controle Pesquisador (método) Investigados (nativos)

Relevância Ciências naturais Ciências sociais

Figura 6: Comparativo de referências paradigmáticas, as duas colunas.

Porque a oposição entre a pesquisa consistente, "naturalista" e "racionalista" em termos de Guba e Lincoln (1991, 3337-3343), não é resolvido nas duas colunas; encontra-se em uma diferença axiomática em termos da natureza da realidade; da relação entre o pesquisador e o sujeito que responde; da natureza das afirmações verdadeiras; da causalidade; da relação com as avaliações (pelo menos nesses termos). Por sua vez, estas distinções são refletidas em diferenças nos métodos preferidos, o tipo de conhecimento utilizado, instrumentos, o desenho e a estrutura da pesquisa; as "crenças" e as "visões de mundo", em última análise, imperdoavelmente unidas ao "compromisso"13 (Guba, 1985, 1990;) Guba e Lincoln, 1985,

12 Embora exista academicismo, as oposições sem análises alguma, resolveram muitas publicações e índices de impacto, no estilo dos cortar e bater do computador para qual foi somado a super-fashion comparação do bloquear e derrubar na Rede.13 Proponho ao tratamento dos projetos de pesquisa as contribuições substantivas de Guba e Lincoln, sobre os problemas e soluções para a credibilidade da pesquisa etnográfica.

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1988, 1990; Lincoln, 1997; Beld, 1994; Lincoln, 2000, entre outras abundantes referências). Bem, contra aos dois "paradigmas" de Jacob, os quatro de Guba (Guba, 1990, 17), suficientemente refletida no esquema da Figura 7, e que persistem, apesar da expansão para quatro, a dupla redução14.

Positivismo Postpositivismo T.ª crítica et al. Construtivismo

Ontologia

realismo ingênuo: é real porque é apreensível

realismo crítico: é real, mas só é apreensivel com imperfeição e de maneira probabilística

realismo histórico: a apreensão da realidade é virtual, pois é político, social, econômica, étnica,dependente dos valores e que cristaliza no tempo

relativismo: a construção de realidades é local e específico

Epistemologia

dualismo/ Objetivismo; a descoberta é verdadeira

dualismo modificado/ Objetivismo; a descoberta é provavelmente verdadeira

transação/ subjetivismo; a descoberta é mediada por valores

transação/ subjetivismo; a descoberta é criada

Metodologia

experimental /manipuladora;verificação dehipóteses;métodosquantitativos

experimental modificada/ manipuladora; multiplicidadecríticas;falsacionismo; métodos qualitativos são permitidos

dialético/ dialógico

hermenêutico/ dialética

Figura 7: Alternativas básicas nos paradigmas da investigação (Guba e Lincoln, 1994)

Um exemplo paradigmático, se se permiti o qualificativo, de aplicação válida e proposto pela confrontação entre “paradigmas”, foi a realizada, em um momento chave para o desenvolvimento da pesquisa sócio-educativo em Espanha, por Sáez (1989), que, em seu breve ensaio sobre A construção da Educação reune um “esquema de contraste" entre paradigmas e a perspectiva adotada e posição consequente ante uma série representativa de elementos que podem intervir num fenômeno educacional (Figura 8). Em nosso ambiente, Arnal, Rincon e Latorre (1992, 43) concedem a essas correntes a consideração de "paradigmas de investigação" e assim os denominam, "positivista (racionalista, quantitativo)", "interpretativa (naturalista qualitativo)" e "sociocrítico". Mais recentemente, Tojar (2001, 55) estabelece atribuição e distinção semelhante entre os três "paradigmas de investigação em educação":

14 Apenas uma nota adicionada sobre a coluna relativa ao "construtivismo". A fundamentação que a pesquisa etnográfica e crítica tem no "sócio-constructivismo" me forçará a retomar o tema na segunda parte. Cabe antecipar que não é plenamente coincidente a síntese feita aqui pelos autores com a ancoragem da etnografia. No entanto, preferi não fraturar a estrutura da exposição, apresentando a cada novo termo que apareça um esclarecimento que terminará distraindo a leitura.

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"positivista", "interpretativo" e "sociocrítico". Da pesquisa etnográfica, vale a pena comentar, no entanto, que apenas "interpretação" e "crítica" se opõe a "cosmovisão" implícita no paradigma "racionalista", ao mesmo tempo que pertencem – ambos – a um mesmo contínuo. Sendo a posição ontológica entre o "interpretativo" e o "sociocrítico" coincidente, o desenho é, em ambos os casos, interpretativos e sociocrítico, emergente, tendo em conta que a "negociação" não é senão uma variante da emergência. Esta questão é substantiva na subsequente determinação dos projetos de pesquisa15. Ao mesmo tempo, os critérios de qualidade atribuídos pelos métodologos referidos a um ou outro "paradigma de pesquisa" são, no fundo, um problema não resolvido, inclusive de entediante abordagem inicial: operacionalização metodológica, por exemplo, a "intersubjetividade" entendida como critério de validade, resulta, todavia, um desafio metodológico16. Uma última consideração para a caracterização de nossos estudiosos quando se referem aos "valores" e estabelecem o contínuo axiológico na oposição entre "neutros" e "explícitos": a distinção da pesquisa etnográfica não se baseia tanto entre neutralidade e esclarecimento, porque toda pesquisa tem componentes ideológicos mais ou menos determinantes ou condicionantes, mas na distinta ideologia subjacente em uma e outra "cosmovisão". A neutralidade em nosso campo de pesquisa - e como é o caso em outros lares - dificilmente pode manter-se nem da revisão epistemológica kunhiana nem da observação empírica das realidades cientificas. O pesquisador social envolve não apenas no objeto de estudo, sua própria função social assim o exige. Uns e outros paradigmas têm, eles próprios, uns valores prevalente comuns ao conjunto da pesquisa e do conhecimento científico, mas também particulares em cada abordagem que é feita ao objeto de estudo.

As posições e, em um momento ou outro, a utilização das apresentações científicas diferenciadas por umas castas políticas ou outras, são uma consideração inevitável, pela influência retumbante em cada momento na afirmação do politicamente correto, que termina em uma arbitrariedade solene legitimada por uma publicação, e de impacto claro. Não menos significativas são de influência na ética e valores do próprio pesquisador. Neste último caso, ele mesmo pode imbuir de não pouca arrogância mercantilista o pesquisador social, que silenciou suas dúvidas - se as tiver - com a lealdade incondicional a uma determinada saga paradigmática (e pragmática). Estas questões derivadas irão e foram abordadas ao longo das páginas. Fique unicamente gravado, no momento, dos riscos e abusos de uma oposição maniqueísta entre um paradigma ou outro, positivista ou etnográfico; ou dos possíveis jogos maquiavélicos, quando o grupo se junta à oposição ao positivismo, ruptura frente ao postpositivismo, e inclinações para a Teoria Crítica e a sócio-constructivismo. Em qualquer caso, no nosso, a posição é clara. Novamente, iremos retomá-lo, mas novamente é necessária uma declaração inicial. Aqui a posição segue sendo de oposição ao positivismo e a uma espécie de pesquisa cientifico-social servil para com as políticas e poderes estabelecidos que beneficia mais – mesmo que sem dúvida pouco - o artista do momento, agora na trupe, que toda a sociedade e do conhecimento. A pesquisa etnográfica opta, pelo menos, por uma tentativa constante – utópico dizem alguns – de conciliar saberes com compreensão, de maneira que se alcance, no pouco que nos compete, a emancipação das pessoas através do conhecimento

15 Ver "projetos de pesquisa", no segundo capítulo.16 Retomarei também esta questão nos problemas metodológicos resolvidos e não resolvidos.

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científico da cultura e da sociedade, ao mesmo tempo que singular a cada um de seus membros.

Uma contribuição substantiva inerente ao debate epistemológico kuhniano17, decisiva para a pesquisa, são estas implicações sociais e históricas, minimamente esboçadas, na construção da ciência e discriminada, agora com fundamento, por Fourez (1998, 75 e segs.):

Primeiro momento. O nascimento de uma disciplina ou "período pré-paradigmático", "(que) se destaca especialmente porque ainda não há programas universitários para se fazer um especialista nesta disciplina "(ibidem, 86). É o período de máxima determinação social18: quando um interesse, industrial, por exemplo, se junta a interesses semelhantes (comunicação, gestão, etc.) o sentido é imposto como "matriz disciplinar", apoiado por um número suficiente de cientistas que o consideram rentável para os interesses destacados: as políticas educacionais e a Organização Escolar, o mercado de trabalho e a orientação da escola, as reformas educacionais e a Didática Geral, mas também, a política da água e a Engenharia e Construção, a especulação bolsista e a Economia, a política sanitária e o manual Emergência, etc. Assim, considerado o interesse, se impõe o “paradigma”.

Segundo momento. Disciplina estabelecida ou "período paradigmático" "é que o período durante o qual tem sua finalidade construída de uma forma relativamente estável e suas técnicas relativamente claras" (ibidem, 88). É mais, a definição tão decisiva no conhecimento científico do que é um “fato” está igualmente prevista pelo paradigma. É um “fato” uma manifestação social, generalizada e demonstrada; e é um fato um fenômeno social, percebido e interpretado. Depende, tudo depende... do paradigma. É a ascensão do "laboratório"; mas é o "laboratório", a instituição, o grupo, o indivíduo, o resto dos elementos (políticos, poder, interesses e modas incluídas) referentes.

Terceiro momento. A disciplina ainda está "viva". É o esgotamento dos paradigmas no período postparadigmatico, com duas possibilidades evolutivas, a conhecida “revolução científica” kunhiana, ou a petrificação na "tecnologia intelectual": "Já não se investiga (sobre essa disciplina) somente se ensina e utiliza". Trigonometria é um bom exemplo, como também o são bastantes pesquisas de nosso campo e no entorno, justificadas mais por um curriculum vitae, que pela contribuição de uma ideia, pelo menos uma ideia, inovadora.

O estado da pesquisa cientifico-social e educacional pode responder a qualquer uma dos três momentos. De acordo com o agrupamento ou segregação disciplinar que se realiza na sistematização dos saberes, estritamente sociológicos, psicológicos ou pedagógicos ou articulados em uma prometedora transdisciplinaridade19. Inclusive sob o significado de uma 17Distingui-se a evolução kuhniana em preciência-ciência normal-crise/revolução-nova ciência normal, que trato no próximo título.18 Considere a evolução da recentíssima disciplina de Informática e apreciará a (clarividência?) do estudioso, ou rever, se quiser, o ensaio de Bunge sobre "Informática: ciência, técnica ou religião?" (Bunge, 1985, apêndice 1) e opor-se ao ensaio de Cobo (1997), "Dos mares do Sul". Em tom literário e certamente bem humorado, a novela de Lodge, O mundo é lenço, é uma boa especulação sobre como a construção de uma ciência será social, mas seu desenvolvimento inclusive pode chegar a estar motivada por razões, digamos, mais pessoais.19 Concluirei a argumentação ao tratar o processo de teorização na área cientifico-social.

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"ciência comprometida" e de uma "ciência disciplinar", que "se diferenciam em que umas olham para a solução dos problemas em sua globalidade concreta, ou seja, no seu contexto concreto e social, enquanto os outros vão encontrar a solução dentro do contexto das disciplinas" (ibidem, 100), a pesquisa em nosso campo também poderia responder a um tipo ou outro. As várias formas de pesquisa permitem atender tanto à teorização disciplinar como às soluções de problemas circunscritos às condições e circunstâncias de um entorno social, cultural ou educativo concreto. O compromisso de todas Ciências Sociais, da pesquisa sócio-educacional do próprio estudioso se ver imperativamente reforçado. Um contra-ponto final motivado por esta última distinção entre disciplina e compromisso de Fourez é o relativo à nova produção de conhecimento, pelo chamado “modo 2”20: a comercialização do conhecimento, as parcerias de colaboração, a globalização e a competitividade das redes de I+D (agora + i), a tensão na reconfiguração da paisagem institucional da produção de conhecimento (qualidade, produtividade, impacto e competência, pragmatismo e a farsa dos planos estratégicos), ou as políticas científicas e tecnológicas, sempre anunciando o aumento do orçamento, sempre pechinchando na execução, sempre referindo-se à área cientifico-sociais, a próximas convocatórias... A investigação cientifico-social e educacional pode ser particularmente sensível a esses manipuladores casuísticos. Pesquisa etnográfica o é, sem dúvida, e assim a incluí na dimensão sempre ideológica que subjaz a todo fenômeno social, cultural e educacional que é estudado. E em boa reciprocidade assim a inclui tanto nos processos de investigação com na "cosmovisão" e interesses particulares dos estudiosos.

Corrente positivista(Positivista de P)

Corrente interpretativa(P etnográfico)

Corrente crítica(P etnográfico)

Modelo da razão

Instrumental Comunicativa Crítica

Natureza do conhecimento (educacional)

Objetivo. Fragmentado Mensurável. Quantificáveis

Subjetivo. Interno Dialético

Teoria do ensino

Descreve, explica, regula. Prescreve. Instrumentaliza

Interpretativa. Abrangente. Conhecimento implícito

Concientizadora. Emancipatória

Concepção de educação

Educação como um investimento em capital humano.

A educação como direito individual da pessoa.

Educação como desvelamento da coerção que implica para a pessoa.

Objetivos da educação

20 Modo 1: "o complexo de ideias, métodos, valores e normas que cresceu até controlar a propagação do modelo Newtoniano de ciência a mais e mais campos de pesquisa, garantindo a conformidade com o que é considerado como uma prática científica sã".

Modo 2: "Produção de conhecimento que se realiza no contexto da aplicação, caracteriza-se por transdisciplinaridade, heterogeneidade, heterarquia e transitoriedade organizacional, responsabilidade social e reflexividade e controle de qualidade que destacam a dependência do contexto e do uso. É o resultado da expansão paralela dos produtores e usuários do conhecimento na sociedade "(Gibbons et al., 1998, 216). Consulte uma caracterização pedagógica comentada do "Modo 1" e do "Modo 2" em Sancho e Hernández (1997, 90).

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Aprenda a ser. Habilidades de treinamento para funções no mercado de trabalho

Aprender a aprender. Reflexão. Cultivo de visões pessoais

Aprenda a ser. Participação social crítica e construtiva. Transformação social, em colaboração.

Organização curricular e agrupamento de alunos

Diferenciação estrita por

assunto. Separação dos alunos

de acordo com o grau de

execução. Agrupamento

homogêneo.

Tendência de integração.

Seleção e agrupamento de

alunos por interesse, etc.

Agrupamento heterogêneo

Negociações entre a comunidade, os professores e os alunos sobre o currículo como um todo. Agrupamento subordinado à atividade

Recursos e espaços de ensino

Fechado. Formal. Hierárquico.

Diferenciadas por assuntos.

Distinção entre recursos

escolares e não escolares.

Aberto. Informal. Diferenciação

por áreas de trabalho. Integração

de recursos e espaço para tarefas

individuais

Fraca separação entre tarefas e

recursos: entre a escola e o entorno.

Recursos para atividades de grupo e

tarefas de aprendizagem.

Relações entre professores e alunos

Autoridade. Hierarquia. Relações de

um para muitos.

De ajuda.Relações de um para um

Entre iguais. Relações de todos com

todos. Envolvimento dos alunos.

Ênfase em problemas ligados às

questões de justiça social

Gestão de sala de aula

Graduação para uma atividade

coletiva. Organização formal

Individualização. Ação tutorial. Organização informal

Combinado por grupos de habilidade por "projetos". Organização aberta à comunidade

Professor

Transmissor de conhecimentos e habilidades. Técnico. Executor

Facilitador da aprendizagem.

Profissional

Organizador.Agente de mudança social

Escola dinâmica

Estrutura de controle.

Decisões de cima

Contextualização.

Gestão participativa

Comunidade de interdependência / Instituição Escolar

A instituição escolar

Racional, estrutural e

sistêmica. Recursos

Humanos

Simbólica. Interação. Cultura Social, educativa e escolar

Sócio-crítico.

Desvelamento das funções e

mecanismos de controle

Os serviços externos de apoio

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Peritos externos. Assistência técnica. Superiores hierárquicos

Assessoramento “entre iguais”. Prima o professor.

Externos. Chamado a colaborar pelas instâncias internas da escola ou da comunidade.

A avaliação

Medida.Descrição do resultado

Interpretação do processo ensino-aprendizagem

Crítica negociada. Tendência para a melhoria social

Pesquisa

Ciências sociais é uma réplica da ciência Natural. Descrição, explicação, coleção de leis. Externa. Teórica

Construção de modelos interpretativos para capturar a inteligibilidade da ação social para revelar os significados dos atores.Contextual. Conhecimento compreensivo não ordenado. Externo, embora participante. Teórica e prática

Participativa. Socio-crítica. Reciprocidade e negociação. Cética frente a aparências, sentido comum, interpretações e intenções dos atores. Comprometidos com a luta ideológica. "Em" e "de" praxis. Orientada para a ação. Emancipatoria

Figura 8: Interpretação de elementos escolares e educativos por diferentes correntes (Saez, 1989)21

Questionamento da abordagem exclusivista

A estrutura de evolução da ciência proposta por Kuhn propôs também um componente diacrónico na evolução da ciência: os primeiros ensaios da "pré-ciência", o domínio de um paradigma na "ciência normal", que trás a “crise” – a “revolução”, quando foi substituído por um outro paradigma dominante deu lugar a uma (nova) "ciência normal" 22. Ante esta estrutura simplificada e exposta por meio de dois paradigmas que a rege, a opção epistemológica, consequente ante a dualidade paradigmática, é, no entanto, tripla. Deve-se [a] entender que como um todo, as Ciências Sociais estão em uma primeira época pré-científica e que atingirá a condição desejada pela fusão metodológica dos pressupostos objetivistas e subjetivistas referidos. Ou [b] entender que as Ciências Sociais estão superando com a introdução de novos paradigmas uma primeira crise e revolução diante de uma incoerência das explicações objetivistas da crescente complexidade dos fenômenos disponíveis até agora. Finalmente, é possível [c] entender que a principal lição de Kuhn vai além da aplicação da evolução às Ciências Sociais, o que em sua mente e em suas obras foi uma mera referência à estrutura das ciências não-sociais.

21 A simplicidade exemplar isenta de maiores comentários. Unicamente tem que rever a inclusão, por nossa parte, dos referidos em títulos anteriores "modelos de razão". Efetivamente, a razão instrumental, comunicativa e crítica sintetizam, respectivamente, cada uma das correntes desenvolvidas por Saez. Por sua vez, elemento “pesquisa”, pedra angular no nosso caso, permanece no mesmo nível dos exemplos anteriores. Realizar esclarecimento seria uma repetição tediosa das demonstrações que são feitas desde os primeiros parágrafos. Lembre-se, se tratava de exemplificar a aplicação dos dilemas paradigmáticos, logo epistemológicos, a elementos que, em interação, dão forma, sentido e significado às ações e fenômenos, neste caso, escolares e educativos.22 Amplio as referências a desta proposta evolutiva de Kuhn nos parágrafos seguintes.

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E, para cada opção, uma possível posição23: ) A posição eclética –, se você optar por [a] adquirem sentido os esforços permanentes a favor do ecletismo que reduzem a questão e limitações das explicações atuais para um problema técnico e metodológico. Se os modelos estatísticos não estão bem como deveriam nas explicações generalizadas, adiciona-se metodologias qualitativas que ajustem a explicação, sem renunciar a generalização como um princípio diferenciador do científico, frente ao que não é; Se modelos qualitativos e etnográficos não alcançam explicações razoáveis por generalizáveis, adiciona-se metodologias que permitam superar a redução para o caso único, singular, particular e que não se repete. ) A posição beligerante: optar por [b] é a posição ativista, riscando no fundamentalismo – sempre acadêmicos, se entende – em defesa das alternativas epistemológicas (verbi gratia, etnográfico ou positivista, conforme o caso). Mesmo que ocorra submeter o desenvolvimento metodológico para as estratégias de convencimento das comunidades científicas, "vale tudo". ) A posição da discordância eterna e a eterna dúvida existencial: porque, talvez, sem suspeitar, a questão não é nem a oposição nem o desenvolvimento acelerado de novos métodos de investigação, mas inclui novas modalidades em um primeiro momento de pré-ciência, crise, revolução e nova ciência, em várias Ciências Sociais, totalmente diferentes as que apelamos para o uso. A transdisciplinaridade é o novo referente de demarcação a considerar.

De existir, o desacerto do conjunto das Ciências Sociais, Humanas e da Educação não pode ser corrigido com um suposto “novo paradigma”, mas tampouco negando sua existência. Na medida em que as Ciências Sociais aterrissam na explicação de uma certa complexidade têm que recorrer para a abordagem pluri– e multi–disciplinar, a perspectivas e posições complementares, a diferentes explicações possíveis das que emergiram a melhor ou pelo menos a conjunturalmente mais relevante, etc, uma série de justificativas que fazem suspeitar que, talvez, o principal problema resida não apenas na dependência de paradigma, mas no anterior e ainda não resolvidos, dimensionamento disciplinar. Seria um salto considerável o uso dos "novos paradigmas" - etnográfico, emergente, socio-crítico, etc., já que a terminologia, como está comprovando, é variada - não tanto para o progresso na atual estrutura científica das Ciências Sociais, mas na adoção de uma "nova" estrutura das Ciências Sociais. Novamente, por exemplo, ciências tão clássicas como a Física ou, mais recentemente, a Neurociência e a Linguística, nos oferecem na Física Quântica ou na Neurolinguística maior abertura científica atitudinal, mental e procedimental, que as prematuramente anquilosadas ("novas", na década dos anos setenta do século passado) Ciências Sociais, quando, por definição, deveriam ser uma constante histórica de tolerância e progresso na evolução das civilizações. Um último exemplo que ressoa sem ser a "ficção científica", a "astrobiologia", onde biólogos, geólogos, virologistas, planetólogos, exobiólogos, astrônomos, etc., na busca científica de vida em torno de outros sóis que não o nosso. As propostas transdisciplinares podem resultar um bom referente expositivo e argumental.

23 Em termos mais ortodoxos, Walker e Evers (1988, 28-36) já recolheu as três posições básicas: tese da diversidade incompatível, teses da diversidade complementar e teses da unidade, se bem que cabe diferir de sua particular escolha: em pesquisa etnográfica prevalece a tese da diversidade complementar contra a tese da unidade que nega a pluralidade não tanto metodológica, mas na posição epistemológica fundante e teórica-explicativa do estudioso.

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E das galáxias à vida cotidiana: especificando o local para investigação cientifico-social e educacional, em que momento evolutivo se encontra? As relações que Kuhn entabula entre "paradigma" e "ciência normal" proporcionam sugestivos raciocínios adicionados à evolução. A "ciência normal" aparece como a responsável para resolução de problemas a partir - obviamente - das regras de um paradigma e, neste contexto enganosa, se um problema não pode ser resolvido a partir do paradigma dominante, a falha é do cientista e não do paradigma propriamente dito. Os problemas sem solução são mais "anomalias" que "falácias" popperiana do paradigma. E é neste sentido que a existência de "anomalias" não implica necessariamente num estado de revolução científica. A crise surge e é agravada quando, para um paradigma enfraquecido, porque parte da comunidade científica vai perdendo confiança, vai opondo-se um paradigma rival e incompatível com ele. Como ocorre a mudança é um processo revolucionário que Kuhn, em determinado momento, compara com às "revoluções políticas" (ibidem, 149). Da situação de "crise" surge a "revolução" e a "nova ciência normal, "o novo paradigma triunfante”. Bem, exceto em "momentos de crise", o cientista "normal" não critica o paradigma em que trabalha. Dedica seus esforços para o desenvolvimento da ciência por meio de pesquisas sobre questões pontuais que preocupam à comunidade. Em nenhum caso se investem esforços para anular o próprio "paradigma" (Chalmers, 1989, 133). Precisamente estas questões, são literalmente, são as que diferenciam a “ciência normal', do estado embrionário de "pré-ciência". Nem esta clara distinção entre "pré-ciência" e "ciência normal" esclarece para cima a tripla posição (eclética, beligerante ou de eterno desacordo), exposta nos parágrafos anteriores, no que diz respeito os vários métodos de investigação. Enfim, assim colocada a questão de em que ponto disciplinar nos situamos pode resultar capciosa, porque quando a um tipo de pesquisa quantitativa – se evitam os detalhes – opõe-se a outro tipo de pesquisa etnográfica, verbi gratia, a alternativa é... mas em amadurecimento. Por um lado, sobram razões para propor um desenvolvimento sinérgico do conjunto de saberes e conhecimento – lê-se disciplinas científicas - que têm em comum as diferentes manifestações de uns fenômenos com uma natureza de origem semelhante (sociológicos, educativos, escolares, etc). Ou seja, uma evolução conjunta, inter– e pluri– disciplinar no campo das Ciências Sociais. É verdade. Mas, ao mesmo tempo, quando se tenta concretizar esta evolução d'ensemble em uma disciplina, a questão é mais problemática, uma vez que a operação é difícil de resolver. A situação torna-se assim extremamente delicada e contraditória, quando é necessário referir-se aos métodos de investigação. É por isso, sempre que pode, se evitar a investida; basta usar a palavra mágica: crise. As cíclicas “crises” do Estado de Bem-estar Social são o paradigma que nada explica, mas tudo justificam, como nossas "crises" científicas, não menos recriadas.

Porque se questiona o fim da ciência ("crise" agudizada), mas é necessário considerar em um primeiríssimo lugar o grau, sentido e limites do compromisso do pesquisador social para com seus semelhantes. Em segundo lugar, os hipotéticos efeitos e consequências de um tipo de pesquisa que, aprimorando a explicação, dará razão do porque de certos fenômenos cotidianos em cada caso ou excepcionais no conjunto das sociedades: qual é, em suma, o sentido do conhecimento social nos níveis atuais ou futuros? A “revolução” Kunhiana não está nos "paradigmas", enfrentados ou não, em crises ou em comunhão, mas nos questionamentos histórico do próprio conhecimento científico. A pesquisa desempenhará um papel importante

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não apenas por seus próprios pressupostos epistemológicos, teóricos ou metodológicos, mas também porque ou se subordina às realidades estudadas ou, simplesmente não existe.

Porque depois de toda revisão na epistemologia em Ciência Social deixa – deixa-me –algum mal-estar, margeando na agitação. Quando uma investigação questiona algo sobre um determinado problema, tenta indagar sobre um fenômeno, ela lança em uma busca de novos horizontes, em sentido estrito, conclui com duas possíveis situações finais: acertar ou repetir. A criatividade, a genialidade, o erro, de um pesquisador desencadeiam visões científicas que excedem a média e o padrão do momento, tornam-se clássicos ou párias, mas sempre acaba reconhecendo a magnitude de sua contribuição. No interstício, o resto, clonamos: projetos e produtos; ou metaclonamos, ação científica, que consiste em repetir sobre reincidência. No entanto, em momentos de atividade não científica, geralmente, o pesquisador intui, suspeita, pressente, uma visão diferente à derivada da aplicação de rotina, ou seja, clonal, do método, mas no relato final, no resultado do produto, ou deixa entre linhas, ou se descarta por tratar-se de explicações não razoáveis, ou seja, com um método ou outro (empírico, estatístico ou discursivo) não demonstrável ou evidenciável.

As alternativas já estão definidas, é desenvolver e, no nosso caso, testar o funcionamento em metodologias que, sem perder as referências, veiculem pesquisas um conhecimento cientifico-social pertinente. A "complexidade" é uma delas, mas não a única. Os pensadores do século passado deixaram boa marca neste aspecto.

As repercussões dos domínios excludentes nos métodos de pesquisa de Ciências Sociais são imediatas. Da oposição entre "paradigmas", em qualquer de suas formulações duplas ou tripartites, temos promovido nos últimos anos uma expansão da aplicação considerável, mas um desenvolvimento – a avaliação é conscientemente arriscada - metodológico, no sentido estrito, pouco. A ascensão das diferentes categorias de pesquisa ampliou o espectro e enriquecido, certamente, os conteúdos disciplinares próximos e próprios do estudo fenomênico das sociedades, das culturas e das educações, em seus diferentes aspectos e abordagens. Aceito. No entanto, fica pendentes uma série de limitações das que a metodologia de pesquisa é a mais diretamente envolvida, porque, na verdade, pouco tem contribuído para a melhoria efetiva da pessoa. Em nosso campo de estudo mais próximo, o educacional, sem dúvida, as condições intrínsecas do fenômeno tem, em si mesmas, uma casuística que o torna particularmente indescritível ante qualquer tentativa de controle e posterior explicação, interpretação ou avanço teórico, ao mesmo tempo que extremamente vulneráveis à arbitrariedade das políticas sociais e educacionais, mas não menos é verdade que, entre uma variedade de razões que justificam as dificuldades, é necessário incluir as incompatibilidades entre os métodos de investigação e a natureza dos fenômenos que estudam. A primeira consequência avistada é a apropriada desconstrução metodológica da pesquisa, antes de proceder ao encerramento anunciado em outros domínios. Que a Física ou a Biologia - como tem sido apontado – deem por questionada e concluída sua demarcação disciplinar atual, não implica – necessariamente – que a crise nas Ciências Sociais tenha uma razão e uma evolução semelhante. Neste sentido, antecipo duas considerações de indubitável impacto docente e investigativa ao mesmo tempo.

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Em primeiro lugar, a manutenção, nos termos descritos, do enfrentamento paradigmático em termos de metodologia privilegiada. Cada paradigma implica não só uma "cosmovisão" diferente perante a realidade que, por sua vez, mantém uma tradição histórica e científica em nossa cultura, representada nesta atitude dual perante a existência; além disso, cada "cosmovisão" privilegia por imperativo do referente que adota perante o objeto de estudo e o processo de investigação em seu conjunto um método reduzido a metodologia que, nos termos acordados, se traduz em uma metodologia quantitativa contra uma metodologia qualitativa24. No entanto, mesmo estabelecer a equivalência em termos operacionais pode resultar em um erro de partida. O fato de que equiparemos a metodologia quantitativa à qualitativa não implica, infelizmente, um domínio equivalente por parte do pesquisador, do grupo de pesquisadores ou de nossas comunidades científicas. A metodologia qualitativa padece ainda de alguma precariedade operacional, questão que se tem observada e que se repetirá até ao longo dos capítulos seguintes, mas que, neste momento, dá razão para a manutenção da oposição e da vigência das contribuições kuhnianas. Antes de eliminar, por superados, as referências paradigmáticas kunhianas, fica o desenvolvimento, ainda experimental, de fórmulas operacionais que permitem ajustar procedimentos credíveis, rigorosos e científicos, na obtenção, tratamento e análise qualitativa das informações. Quando a estatística fundamentada alcança êxitos operacionais na " estatística informática" (programa "SPPS", verbi gratia), a metodologia qualitativa, da mesma forma fundamentada, deve sintonizar melhorando o equivalente, por exemplo, programa "NUD-IST". Mas no mesmo momento, quando a estatística dá por confirmada suas bases operacionais na matematização do conhecimento, a metodologia qualitativa fornece explicações não menos óbvias da sua base fenomenológica. Hoje, recorrendo a um exemplo conhecido e paradigmático, quando aplicamos a "Teoria Fundamentada nos Fatos" em uma pesquisa concreta, temos dificuldade para apresentar o porquê e quando damos por saturada uma categoria sem recorrer a critérios quantitativos para o número de registros que a constituem. Os métodos de pesquisa em Ciências Sociais levam a esta linha de desenvolvimento metodológico. Só então, a estruturação metodológica em diferentes projetos e estilos de pesquisa, intuída e razoável, significará um progresso eficaz. Em segundo lugar, se nos é imposta a aceleração operacional, mas desde os métodos de pesquisa não podemos ignorar outras referências epistemológicas não menos urgentes. Este é o significado da segunda parte da fundamentação epistemológica, antes de detalhar projetos e metodologias: rastrear, esboçar e sugerir referentes epistemológicos que, com base no interesse em alcançar a "compreensão", tentam desenvolver, neste caso, a "complexidade" por meio de uma "multirreferencialidade" operacional.

Um e outro corpo de referência permitirão talvez a tão almejada – mas não generalizada demanda25- estruturação metodológica.

24 No quarto capítulo (4.2. O contraponto metodológico) é evidenciado a não-fusão do método de pesquisa na metodologia para o tratamento dos dados. No entanto, para facilitar o acompanhamento da argumentação epistemológica deste primeiro capítulo, prefiro exemplificar a dissociação referindo-me às metodologias.25 A estruturação metodológica, na possibilidade de combinar – estruturando – métodos qualitativos e quantitativos é uma necessidade inevitável. No entanto, a estruturação no tratamento não implica - volto a insistir, porque é uma questão quase obsessiva - um equilíbrio semelhante entre uns métodos ou outros de investigações, porque caso contrário o ecletismo destaca-se como um padrão. Dúvidas semelhantes me apresentam - como se tratará em posterior capítulo – a introdução galopante do pragmatismo como um, para alguns, um novo paradigma em pesquisa. Votarei sobre esta questão,

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1.1.2. A reconstrução compreensiva

A transdisciplinaridade

Métodos transdisciplinares para fenômenos complexos

As referências tratadas em relação às “comunidades científicas”, que associadas à “matriz disciplinar", constituíam o conceito, sentido e desenvolvimento dos "paradigmas" considerados desde o historicismo kuhniano nos remetem para uma nova precisão reconstrutiva. Se a aplicação licenciosa realizada incluía as "ciências não-naturais" (ou seja, e no nosso caso, as Ciências Sociais), que acepção "comunidades científicas" deveria ser substituída por "comunidades disciplinares". Na verdade, os interesses micropolíticos, as publicações e impactos, a existência ou não de áreas de conhecimento e departamentos universitários, programas e cursos, etc., que mostram, em primeiro lugar, a existência e, mais tarde, o poder relativo na distribuição do conhecimento, é mais imputável à distribuição dos saberes científicos em torno das "disciplinas" que para toda a comunidade do conhecimento científico, porque em outras palavras, as "comunidades disciplinares" incluiriam as "comunidades científicas", em tanto que nestas não se incluem – em absoluto - aquelas. Uma disciplina pode ser artística, mas não uma comunidade científica; uma comunidade científica pode vincular-se a prática, mas não uma comunidade (acadêmica) - disciplina. Esta questão, no entanto, reforça a associação que, na posição epistemológica que nos ocupa, se estabelece entre a disciplina e o assunto em torno do que ela gira, associação esta indissolúvel, mas que ao mesmo tempo, em todas as disciplinas, a relação é dissociável de seus respectivos assuntos: disciplina e disciplinar, ter um contínuo na pluri– ou multidisciplinar, diferentes disciplinas em torno de um mesmo assunto (por exemplo). A questão nos traz de volta para nossa atalidade, em que a convencional distribuição e sistematização dos saberes e do conjunto do conhecimento foram estruturados ao longo dos últimos séculos sobre as disciplinas, tanto que em nosso século atual, tanto por exaustão, como pela crescente complexidade do objeto de estudo ou o surgimento de novos temas desconhecidos até o momento, necessita, para a progressão do conhecimento, de umas estruturas mais flexíveis e interdependentes. São, em suma, as tão atuais sobreposições de disciplinas que se estabelecem sob uma ou outra

posto que somente pretendia aqui antecipar o porque apoio, mas com tantos receios que me fazem duvidar até à última revisão do texto, para a demanda estruturadora.

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denominação, multi– ou inter-disciplinar26. Esta é a questão que agora nos ocupa por sua influencia nas referências epistemológicas de uma pesquisa para reconstruir a complexidade.

Um exemplo próximo pode esclarecer a situação: a distribuição disciplinar dominante desde o século XIX nos proporia um estudo psicológico da pessoa que aprende, considerando que se a pessoa era um estudante, seria a pedagogia que nos instruiria sobre como aprendia na escola. Quando entram em jogo variáveis contextuais na aprendizagem escolar, a sociologia considera que também tem conhecimento a contribuir. A formulação pode também surgir em termos de uma psicologia e uma sociologia da educação, que, juntamente com a pedagogia, dão forma à explicação do fenômeno. Finalmente, o objeto de estudo, a que matéria compete? Por acaso algumas das disciplinas são autossuficientes na explicação? Ou, por outro lado, não têm de recorrer para o eterno rótulo da aproximação psico-sócio-pedagógica para o objeto de estudo? Nossas disciplinas terminam, portanto, articulando-se em necessárias posições multidisciplinares, mas fictícias, sempre sob o domínio de um delas, ao qual lhe atribuem em, verbi gratia, um consensual plano de Estudo. Se a referência é a pesquisa, métodos e metodologias de pesquisa resultantes, o desajuste inflacionista é, se qualquer coisa, ainda maior: talvez se possam manter métodos e metodologias próprias de uma disciplina ou, pelo contrário, não são métodos e metodologias comuns quando se trata de fenômenos de pesquisa genérico que ocupam as Ciências Sociais como um todo? Sob este significado - é desnecessário repetir o que aqui nos baseamos - métodos são interdisciplinares. No entanto, os saberes resultantes persistem na parcialidade explicativa; a soma dos saberes não alcança o pleno conhecimento do fenômeno (educativo, cultural e sociológica) objeto de estudo. A distinção é agora de referência e grau: da lacuna fenomênica surge o grau de complexidade no tratamento, e se isso aumenta para aproximar-nos com maior relevância para a compreensão, o método supera a própria atribuição multidisciplinar para alcançar o nível da transdisciplinaridade. Considere este preâmbulo desde alguns dos fundamentos a seguir, disponíveis na literatura científica atual.

A transdisciplinaridade e a semelhante interdisciplinaridade são referências opostas para a pluri– e a multidisciplinaridade. A distinção se estabelece, em primeiro lugar, entre pluri– e multi– que se referem à quantidades, frente a inter– e trans–, que aludem às relações de reciprocidade (cooperação, intercâmbio, conjunção, vertebração, etc.), mas consideradas desde a transdisciplinaridade, pluri–, mult–-, inter– ou trans–, são baseados, efetivamente e em primeiro lugar, em uma profunda compreensão disciplinar. Ou seja, é necessário dominar a disciplina antes de embarcar em reflexões metadisciplinares27. Essa condição, talvez óbvia em

26 O tratamento do surgimento e desenvolvimento da (jovem) bioética por Garcia Sierra (2000) exemplifica estas questões, que distinguem a posição epistêmica da gnosiológica. Aqui, no entanto, parto implicitamente de um assunto mais doméstico: a distribuição, quando menos artificial, entre as diferentes áreas afins do conhecimento. O caso da pedagogia e as Ciências da Educação é o paradigma de arbitrariedade; a situação atual, disparatada. Apelamos para a interdisciplinaridade psico-sócio-pedagógica, por exemplo, em um grau universitário, enquanto fragmentamos nosso corpus cientifico-sociais e educacionais em distintas áreas solapadas. Investigamos sobre questões didáticas e organizacionais, mas aprendemos a investigar em uma área distinta; Agora, se investigássemos sobre temas de orientação - ainda com o exemplo interessados - então talvez o que teríamos na área que, por sua vez, ensinou-nos a investigar. Ao longo deste capítulo proliferam casos que exemplificam tais arbitrariedades disciplinares.27 Esta condição é, em nosso caso, transcendente, pois justificaria a consideração disciplinar de uma Etnografia da Educação (Ver capítulo cinco).

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qualquer campo da ciência, é, em nosso caso, digna de consideração: antes de embarcar em um novo esnobismo, agora da transdisciplinaridade, é necessário um domínio e em profundidade de nosso campo, condição que se torna um requisito tratando-se dos métodos de pesquisa, cujo escopo é, se qualquer coisa, mais difícil. Vilar (1997, 29-32) estabelece o princípio: "Não pode haver teorização ou prática transdisciplinar nenhuma se não se parte de alguma disciplina, da base firme desta projetada para a outra". Sobre a base disciplinar são construídos, em "constante oscilação", a inter– e a trans-disciplinaridade: “A interdisciplinaridade é a relação recíproca, interpenetrada, de umas e outras disciplinas em torno de um mesmo sujeito-objeto, ou situação, ou problema, etc. A Interdisciplinaridade é produzida, a nível teórico e prático, quando há coordenação e, sobretudo, interação entre os conhecimentos dos representantes de diferentes disciplinas em relação a algum fenómeno específico (...), há uma constante oscilação entre inter– e transdisciplinaridade, com predomínio desta, porque toda interdisciplinaridade, tende a tornar-se transdisciplinaridade na medida que os métodos correspondentes se aproximam e resultam tributários de sujeitos-objetos-contextos-projetos complexos, engajados em umas e em outras redes de complexidades, nas que operam inúmeras relações de transformação, que ultrapassam até mesmo o próprio campo da ciência" (ibidem, 32). A humildade, a cooperação, a formação, a educação, em suma, mas, ao mesmo tempo, o projeto de pesquisa da interconexão de sujeitos, objetos e contextos, ações e significados; o campo cientifico-social por sua própria demarcação é capaz de abranger a complexidade consequente. E um está se aproximando da transdisciplinaridade" atraídos pela respectiva complexidade de cada campo especializado, que precisa desesperadamente para se conectar com outras especializações, não apenas para entender o “todo” mas, ao mesmo tempo, a fim de explicar sua própria “parte”, que resulta insuficientemente incompreensível se não é observada a sua relação com as outras" ( ibidem, 94). Assim, um fenômeno humano, social (e o educacional por excelência) é um conjunto de dimensões “bio-neuro-psico-sociais”, com elementos histórico-informívoro-culturais-sexuais: um conjunto integrado-intrincado inextricavelmente" (ibidem, 67). E neste sentido, a transdisciplinaridade não é original, nem recente, ele sempre foi inspirado por clássicos, de Maslow a Rogers, através de Freud ou de Vygotsky. Sim, ele é novo, no entanto, se entrever uma viabilidade operacional de métodos de pesquisa.

Na análise do plano de fundo da transdisciplinaridade subentendem duas considerações adicionadas, previstas, finalmente, por Vilar (Op. cit., 173-175), de indubitável impacto sobre o desenvolvimento de métodos de pesquisa em Ciências Sociais, e, portanto, no e dos fenômenos educacionais. Por um lado, a consideração "plural" dos "métodos transdisciplinares", porque "as múltiplas complexidades não poderiam compreender-explicar – gerenciar-se a partir de um único método (ainda que seja) transdisciplinar". Destaca-se assim uma articulação sinérgica inclusive dos "métodos transdisciplinar", favorecida pelas ferramentas informáticas já hoje disponíveis: "Os computadores com as demais novas tecnologias de informação e comunicação, produzem enormes massas de conhecimento quantitativo que podem constituir os fundamentos e as implicações para um salto qualitativo de meta-conhecimentos"28. Será, como será retomada em seções a seguir, a lógica imprecisa e as simulações. As estatísticas de computador, ou o registro e codificação de eventos na

28 O realce é do original.

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observação participante podem ser duas amostras meritórias dos métodos de investigação em prol do, assim entendido, desenvolvimento operacional da transdisciplinaridade.

Mas, à visão desta introdução, o impacto nos métodos de pesquisa em Ciências Sociais atinge um segundo nível de responsabilidade inevitável. No nosso caso, a articulação disciplinar das Ciências da Educação facilita a "transdisciplinaridade", porque, na verdade, dificilmente se mantêm em nossa área uma visão não-interdisciplinar do conjunto. Por outro lado, o nível de desenvolvimento metodológico não é equivalente e questiona a própria essência de nossa teorização: como é possível que se promova sempre uma abordagem, em princípio, interdisciplinar e no desenvolvimento investigativo não se apreciem características metodológicas próprias? Como alcançar a interdisciplinaridade psico-sócio-pedagógica se assumirmos modelos herdados das ciências naturais e de lógicas derivadas de pressupostos mais psicologizantes, sociologizantes, pedagogicistas, economistas ou culturalistas, que equilibradamente multirreferenciais? Considere novamente o exemplo clarificador referido ao campo escolar: na área da Avaliação Educacional, as tendências atuais desenvolveram o slogan de incluir em um processo de avaliação quantos elementos constituem o processo de ensino-aprendizagem, mas aplicando o princípio é enfatizado mais uma avaliação do currículo com características psicológicas ou de ascendência didática. A avaliação institucional oferece situações não menos esclarecedoras. Ciente da forçada escolha circunstancial no sentido de "qualidade", encontra obstáculos conceituais, processuais e técnicos ao tentar dar "indicadores qualitativos". Ainda em avaliação, os métodos de investigação têm que contribuir, pelo menos, testes, experimentos, ensaios, etc., que propiciem a relevância de um sistema integrado de indicadores quantitativos e qualitativos.

O caminho pode ser, no entanto, duplo: o desenvolvimento já diversificado de uma e de outra metodologia, ou a tentativa inclusiva de desenvolvimento de (outros/novos) métodos na perspectiva referencial da complexidade dos fenômenos que estamos lidando. O que passou a ser chamado de "Manifesto da transdisciplinaridade" (Nicolescu, 1996) assenta os princípios da “metodologia transdisciplinar":

A pluridisciplinaridade consiste no estudo do objeto de uma mesma disciplina por várias disciplinas ao mesmo tempo. Ou seja, a pesquisa em educação, por exemplo, mantém seu objeto disciplinar, a educação, e com a quantidade de detalhes que se deseja executar, mas o conhecimento é enriquecido ao superar as disciplinas das Ciências da Educação, inclusive modifica as relações intradisciplinares estabelecidas e repercute favoravelmente na pedagogia.

A interdisciplinaridade refere-se à transferência de métodos de uma disciplina para outra. Podem-se distinguir três níveis de "interdisciplinaridade": de aplicação, epistemológico e de concepção. Assim, a psico-(socio)-pedagogia pode ser considerada uma aplicação interdisciplinar; a "Teoria Geral de Sistemas", desde sua origem biológica, uma transferência epistemológica; ou a Fenomenologia, as transferência nas concepções dos objetos de estudo.

A finalidade da transdisciplinaridade é a compreensão do mundo presente, um dos imperativos é a unidade do conhecimento. Neste sentido, as pesquisas transdisciplinares e disciplinares não são antagônicas, são complementares. A complexidade de nossos objetos de estudo reúne um grau de complexidade tal que

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permite uma tentativa explicativa apoiada pela dinâmica dos diferentes "níveis de realidade" que convergem nos fenômenos educacionais.

A metodologia da pesquisa transdisciplinar se estabelece em torno de "níveis de realidade", da lógica do "terceiro incluso" e da "complexidade" (já tratada) e é gradual. É de interesse destacar a existência de "graus de interdisciplinaridade" em uma determinada pesquisa, como são considerados, mais ou menos completa, os três postulados metodológicos denominados. A abertura e a flexibilidade que permite, mesmo mantendo uma posição transdisciplinar, aplicar em maior ou menor grau, um e outros princípios é digno de consideração em nosso campo cientifico-social e educacional de pesquisa.

Em síntese, e de forma complementária na flexibilidade e abertura indicadas, a disciplinaridade, a pluridisciplinaridade, interdisciplinaridade e transdisciplinaridade são, as quatro, maneiras complementares de um único objetivo: o conhecimento. Agora, se o referente epistemológico é a complexidade, o método de pesquisa mais relevante tenderá ao máximo de transdisciplinaridade: os níveis de realidade, a multirreferencialidade ou os dados complexos - componentes que estarão presentes ao longo das páginas seguintes - permitirão a operacionalidade metodológica dos princípios transdisciplinares. A pesquisa etnográfica e os métodos de pesquisa etnográfica ancoram nestes princípios sua epistemologia.

Os níveis de realidade em pesquisa

Em junho de 2000, Basarab Nicolescu, físico teórico do “Centro National da Recherche Scientifique (CNRS), inaugurava o "IX Simpósio Internacional de Pesquisa Educacional" da prestigiada "Association Francophone Internationale de Recherche Scientifique en Éducation (AFIRSE)"29 sobre "L'universel et le Singulier". Sua palestra apresentou o referente epistemológico da "transdisciplinaridade", aplicada ao tratamento de uma questão clássica na pesquisa social-educativa, a articulação entre "o universal", generalizável e "o singular", particular e irrepetível. O debate estava servido.

A "metodologia transdisciplinar" repousa sobre três princípios novos, dignos de consideração pela pesquisa cientifico-social: a existência de diferentes níveis de Realidade; a transição de um nível de Realidade para outro nível de Realidade, que se opera pela "lógica do terceiro incluso"; e a complexidade, definida como o conjunto dos níveis de Realidade: existe um nível de realidade, porque existe, ao mesmo tempo, o resto dos níveis (Nicolescu, 2000a). Entrecruza-se aqui um sentido ao mesmo tempo pragmático e ontológico do conceito de "realidade". Efetivamente, o impacto científico e cultural ocorre quando, ao definir diferentes "níveis de realidade", se questiona o dogma da existência de um nível único30. No entanto, o risco de se considerar os pressupostos da "Transdisciplinaridade" na pesquisa é alta: levando em conta os componentes filosóficos e ideológicos de nosso objeto de estudo, pressupõem a coexistência

29 O fundador e presidente honorário hoje é Gaston Mialaret, de reconhecida relevância no desenvolvimento da pedagogia experimental.30 A distorção demonstrada das coordenadas de espaço e tempo nos buracos negros da nossa galáxia não é estranha a esta abordagem. A distorção perceptual na interação de duas pessoas apaixonadas, tampouco.

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de diferentes realidades, diferentes níveis de realidade, pode ajudar na manutenção de uma abordagem não-científica para eventos sociais, culturais e educacionais. Apesar do risco epistemológico, a clarificação metodológica da "complexidade" do objeto de estudo próprio da pesquisa cientifico-social e educacional que envolve a transdisciplinaridade aconselha-se31 considerar essas referências.

"Compreendemos por Realidade, em primeiro lugar, o que se subsiste a nossas experiências (...). Abstração é parte integrante da Realidade32 (ibid., 8). Se a abstração é parte da realidade, os pressupostos da transdisciplinaridade introduzem uma nova concepção da realidade social: "A Realidade não é somente uma construção social, o consenso de uma coletividade, um acordo intersubjetiva". Tem também uma dimensão trans-subjetiva, na medida em que um simples fato experimental pode estragar a mais bela teoria científica"(ibidem, 8). Além disso, poderíamos ainda acrescentar que um "fato" objetivo também poderia arruinar a mais otimista "construção intersubjetiva" da realidade. Este significado dá origem a uma controvérsia que é decisiva na investigação e, em particular, na pesquisa etnográfica: onde, na opinião da distinção paradigmática kunhiana exposta, vislumbraram-se e desenvolveram – em grosso – juntamente com as metodologias quantitativas, aproximações qualitativas devedoras, em maior ou menor medida e grau de explicitação da adesão, de uma "cosmovisão" subjetiva e intersubjetiva, construtivista, da realidade social, portanto, das realidades educativas, agora aparece uma nova tentativa de superar o dualismo, não com a oposição "subjetivo" versus "objetivo", mas com a inclusão do "trans-subjetivo”33. Mas também questiona a abordagem sistêmica, dado que os diferentes níveis de organização do sistema não pressupõe diferentes "níveis de realidade" (Nicolescu, 2000b). Questiona, em suma, qualquer presunção baseado numa lógica do bem e do mal, do preto e branco, de um e do outro, a engessada dualidade.

Os diferentes "níveis de realidade" implicam uma lógica diferente: em comparação com a lógica binária, é a lógica borrada34. "A lógica borrada supera as exigências de verdadeiro/falso da lógica dicotômica. Com esta última, amanhã choverá ou não choverá; uma pessoa está empregada ou não. Com a lógica borrada, é possível que um indivíduo trabalhe meia jornada e que chuvisque, indeciso o tempo sobre suas próprias intenções "(Cole, 1999, 198). A aplicação de lógica borrada para as mais variadas tecnologias tem sido tão considerável como bem sucedida (Kosko, 2000) 35. O teorema de Gödel, se bem desconcertante e perturbador para a certeza, demonstrou amplamente, isto é, matematicamente, que não é possível chegar a algumas verdades através da pura lógica binária: que o conhecimento das partes não implica

31 Para pesquisa etnográfica, essas referências são necessárias.32 Nicolescu utiliza indistintamente “realidade" ou "Realidade", é mantido em cada caso, a ortografia literal.33 O impacto é considerável, porque força uma reconsideração de um dos princípios chaves na fundamentação da investigação etnometodológica e etnográfica, o Interacionismo Simbólico, etnográfico. Se aplicada a discursos progressistas, verbi gratia, o multiculturalismo, a questão não é menos problemática se tentar resolver a questão sobre o respeitável de toda manifestação cultural enquanto marca de identidade que é, gerando diante de determinados fatos uma tolerância do intolerável, quando estes ferem os mais elementares direitos do Homem.34 "Borrada" ou "difusa", ambos os significados são compatíveis com a Real Academia da Língua Espanhola.35 O tom informativo deste famoso autor facilita a introdução de um conhecimento aproximado da lógica borrada, difícil se realizada a partir do mesmíssimo teorema de Gödel. Para uma apresentação da linguagem matemática é também grata a "introdução" de Trillas, Alsina e Terricabras (1995).

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pleno conhecimento do todo. Absolutamente. Da lógica borrada, é a recuperação da lógica do terceiro incluso, fundamentação da demonstração dos diferentes níveis de realidade: existe um terceiro elemento T que é ao mesmo tempo A e não-A36.

A lógica clássica das dicotomias, para pares de elementos mutuamente exclusivos (continuidade/descontinuidade, reversibilidade/irreversibilidade, objetividade/subjetividade, etc.) baseia-se em três axiomas: 1) o axioma da identidade: A é A; (2) o axioma da não-contradição: A não é não-A; e (3) o axioma do terceiro excluído: não há um terceiro termo T que seja ao mesmo tempo A e não-A. Sobre a hipótese, observa Nicolescu (2000b), da existência de um único nível de realidade, o segundo e o terceiro axioma são equivalentes 37. Aceitada esta lógica - por outro lado dominante pelo menos durante os dois milênios de nossa civilização que nos precedeu – , A e não-A são mutuamente excluídos, a partir do momento em que não poderiam dizer, ao mesmo tempo, a validade de uma coisa e o seu oposto. Na verdade, a realidade que nos rodeia parece confirmar isso, desde que ninguém em sã consciência, seria capaz de dizer que a noite é dia. Continua Nicolescu, no entanto, recorrendo a multivalência (considerando os três valores, A não-A e T) não excludente: "Existe um terceiro elemento T que é ao mesmo tempo A e não-A" (figura 9).

Figura 9: A lógica do terceiro incluído

A perda de clareza aristotélica, para o qual não há nenhuma instrução lógica capaz de apontar em duas direções diferentes, pode levar a todos os tipos de conclusões extravagantes. Nicolescu (2000a) designa uma decisiva na pesquisa, sua posição diferente e distante de Hegel. Na lógica do terceiro incluído (A, Ā e T) coexistem ao mesmo tempo; na dialética hegeliana, os termos da Tríade (tese, antítese e síntese) 38 ocorrem no tempo. A singularidade da lógica do terceiro incluído reside na manutenção do axioma da não-contradição. Ou seja, a implicação 36 Também no presente caso a realidade oferece situações: "Se Mario gosta de legumes e espinafre são legumes, então posso dizer sem dúvida que Mario gosta de espinafre. Mas o inverso não é necessariamente verdade. Se Mario não gosta de espinafre, não se pode chegar à conclusão de que ele não gosta de qualquer tipo de legumes"(exemplo adaptado de Cole, op.cif., 194-195).37 "O dogma de um único nível de Realidade, tão arbitrário como todo dogma, está de tal maneira implantado em nossa consciência que, mesmo os lógicos de ofício, esquecem de referir que estes dois axiomas são realmente diferentes, independente do outro".38 Reduzir a dialética de Hegel ao jogo de tese, antítese e síntese, desconsidera contribuições substantivas para, no nosso caso fundamentante, a Teoria Crítica. Respeita, no entanto - é óbvio - a comparação que também neste caso, estabeleceu Nicolescu entre as duas lógicas referidas.

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lógica não é entre A e Ā, mas entre A, Ā e T, não é tanto a "oposição" entre A e Ā, mas a “contradição” entre A e Ā. Esta questão é, no nosso caso, decisivo porque evita que possíveis "extravagâncias" na pesquisa social e educacional. A lógica do terceiro incluído, não invalida a lógica do terceiro excluído; apenas – e em investigação, insisto, é decisivo - restringe seu domínio de validade. Nicolescu assim exemplifica a situação: "A lógica do terceiro excluído é certamente válida em situações relativamente simples, como, por exemplo, a circulação de veículos em uma rodovia: ninguém pensaria introduzir um terceiro sentido em relação ao sentido permitido e o sentido proibido de circulação. Em vingança, a lógica do terceiro excluído é nociva nos casos complexos, como, por exemplo, o domínio social ou político. Intervém, nesses casos, como uma verdadeira lógica de exclusão: o bem e o mal, as mulheres ou os homens, os ricos ou os pobres, os brancos ou os negros. Seria revelador iniciar uma análise da xenofobia, do racismo ou dos nacionalismos à luz da lógica do terceiro excluído" ( ibidem, s/pág.). A natureza complexa de nosso campo de pesquisa é, sem dúvida, optar por qualquer uma das modalidades de pesquisa, que é facilmente assimilável. Os métodos de pesquisa etnográfica aplicam, inevitavelmente, essa lógica.

Sobre a formulação triangular de um nível de realidade, Nicolescu generaliza a situação no caso da existência de diferentes níveis de realidade (Figura 10). Sendo -n,..., - 2, - 1, 0, 1, 2..., n, um número finito ou infinito de níveis de realidade, se a passagem de um nível para outro é, por definição, descontínuo, a triangulação entre A, Ā e T descreve a passagem iterativa de um nível para outro: dois elementos contraditórios, A e Ā em um nível de realidade determinado NR0, relacionam-se com a introdução de um terceiro elemento T, localizado em um nível adjacente e diferente. Dado que existem dois níveis adjacentes, NR1 e NR-1, existem igualmente duas maneiras de estabelecer a não-contradição, para o termo T1 ou para o termo T -1. Cabe interpretar, continua Nicolescu, esta dupla possibilidade pela existência de dois sentidos na transmissão de informações de um nível para outro. A não-contradição pode ser obtida também pela perda ou ganho de informações que estabelece, em certo sentido topológico (não-geométrico) e simbólico, uma estrutura hierárquica entre níveis. Os laços fechado que atravessam todos os termos A, Ā e T, localizados em diferentes níveis de realidade, representam o fluxo de informações. O fechamento topológico de um laço simboliza a existência de uma dinâmica auto consistente do tipo bootstrap (ibidem, 3): "Cada nível de realidade existe, porque há outros ao mesmo tempo". A orientação de um laço representa o movimento do fluxo de informações que atua, de forma coerente, por perda ou ganho de informações. Este esquema básico pode subir até o máximo de complexidade com a introdução de diferentes pontos de contato (X) entre os três laços fechados com orientação diferente. Na pesquisa, se trataria, em cada caso, de faixas diferentes para serem consideradas no futuro da pesquisa transdisciplinar, mas os métodos etnográficos de pesquisa atuais já usam uma estrutura semelhante. Na verdade, é a que media na aplicação do sócio-construtivismo para a triangulação e o contraste em todo o processo de investigação39.

39 Refiro-me ao capítulo quatro.

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Figura 10: Os níveis de realidade (Nicolescu, 1985)

Um termo T, que opera a unificação das contradições em um nível adjacente, é necessariamente associado um par de contradições no seu próprio nível. Dito de outro modo, a não-contradição conclusiva em um determinado nível é necessariamente acompanhada da abertura da contradição no mesmo nível que, por sua vez, é determinada por um termo T de um nível diferente. Esse processo continua até o hipotético esgotamento dos diferentes níveis de Realidade. Em um único nível não é possível obter uma teoria completa em um domínio definido do conhecimento: haverá sempre resultados contraditórios ou indecifráveis. Esta representação responde assim a uma estrutura gödeliana40, forçosamente aberta (Nicolescu, 1985, 1998). Em pesquisa educacional, pressupõe a razão de uma perspectiva transdisciplinar. Mas no conjunto dos métodos de investigação em Ciências Sociais, o impacto não é menos surpreendente. Se um determinado método define o objeto do estudo de um único nível de realidade, os resultados obtidos incluirão elementos em cuja análise deverão contemplar-se os dados obtidos de pesquisa realizada por, pelo menos, um método diferente, que, por sua vez, necessitará dos primeiros resultados na análise correspondente. A complementaridade dos métodos nasce do ecletismo que combina diferentes métodos em um mesmo nível de

40 As implicações do teorema de Göedel, ao qual já me referi no parágrafo acima, aplicado à aritmética, mas extrapolado a incerteza ante "a verdade que se encontra em números", é uma nova - e "paradigmática" - representação complexa da natureza e do conhecimento. No entanto, limito a referência a essa nota, expondo os impactos diretos e derivados sobre a pesquisa educacional, exposto por estudiosos terceiros. Em todo caso, considere-se, no entanto, o uso metafórico que em Ciências Sociais realizamos do empréstimo de uma linguagem e uma aplicação - neste caso, um teorema matemático - distante, se não alheio a nossas realidades sócio-educativas.

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realidade e, portanto, obtém resultados contraditórios; a combinação estruturada de diferentes métodos, intervindo cada um no seu correspondente nível de realidade e confluindo no termo T da análise.

O princípio da triangulação na pesquisa etnográfica, responde, como se acaba de indicar, a um sentido similar, já que cada fonte consultada ou cada instrumento utilizado, representa ou reflete um nível de realidade e um único nível de realidade. O termo T, resultado da triangulação, reflete um nível de realidade diferente. A oposição entre "objetividade" (termo A) e "subjetividade" (termo Ā) resolve-se em um nível diferente (termo T). T, neste caso, por sua vez, operacionaliza um enriquecimento da informação se é resolvido em T1, representado pelo significado simbólico da "intersubjetividade", ou com perda de informações pelo sistema em T-1; mantendo a tensão insolúvel entre informações de natureza diferente, não reconciliável, que resolve optando por favorecer um tipo ou outro, ou acordando41. A questão não é, em absoluto, trivial.

Não menos importante é o impacto matemático dos derivados "modelos borrados". Se a pesquisa experimental contribuiu em seus momentos ensaios de matematização das realidades sócio-educativas, as implicações da lógica borrada supõem uma reconceitualização e progresso na representação matematizada das realidades. A questão não é, a este respeito, inovadora. Gil Quesada e Mateo (1993, 107-108) reúnem no artigo os impactos dos modelos borrados na medição aplicada ao campo escolar e dizem: "A teoria clássica de conjuntos fundamenta a construção de modelos (extremamente férteis) em praticamente todas as áreas científicas. Esta teoria está associada com a lógica booliana que se caracteriza pelos princípios do terceiro excluídos e o da não-contradição. Mas essa lógica não tem possibilitado o tratamento de aspectos importantes da realidade que são comuns na vida cotidiana e básicos nas Ciências Humanas. Existem universos de discurso em que descobrimos o que a teoria clássica chamada “conjuntos mal definidos”: homens jovens, pessoas doentes, alunos com um nível de aprendizagem suficiente, etc. "São estes conceitos, que a Teoria Clássica de Conjuntos deixa sem fundamentação, os que são possíveis tratar a partir da Teoria dos Conjuntos Borrados". Representação matematizada e holística da realidade se veem assim mutuamente favorecidas.

A concepção transdisciplinar da educação

A Complexidade e a consequente transdisciplinaridade implica uma valor adicionado à fundamentação epistemológica da pesquisa, ao ultrapassar o próprio campo cientifico-social e incorporar uma concepção genuína de educação. Reside nesta dupla repercussão uma diferença substantiva em respeito ao resto das referências epistemológicas do contexto científico dos métodos de investigação em Ciências Sociais42. O compreensividade do referente impacta na "pesquisa", mas sem indeferir, ao contrário, privilegiando, a “ação”, porque um dos 41 Esta segunda alternativa nos questiona um dos princípios da "ação comunicativa" habermasiana. Refiro-me aos parágrafos dedicados às teorias fundamentantes da pesquisa etnográfica e da consequente teorização (1.2.2).42 Na verdade, me consta que o estudioso repetido na fundamentação, A. Nicolescu, atualmente está trabalhando com um grupo de crianças do Bronx em New York, tentando uma educação transdisciplinar e comprometida, vivida de suas reflexões teóricas. Louvável.

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princípios inevitáveis da transdisciplinaridade do conhecimento e da complexidade na investigação, é a união intrínseca do método científico e do pensamento com a educação e a emancipação das pessoas. Como também, o relatório da UNESCO "A educação contém um tesouro" (Delors, 1996) promove um novo tipo de educação que, em vista da situação mundial, afeta os quatro pilares usuais do "aprender a conhecer", "aprender a fazer", "aprender a estar" e "aprender a ser", que, apesar de ser uma “releitura” da posição filantrópica verdadeira da UNESCO para uma aproximação ao economicismo da OCDE, se pretende manter a finalidade emancipadora intrínseca à educação e à cultura. A essa concepção da educação recomenda-se, em grosso, a transdisciplinaridade.

Educação Disciplinar Educação Transdisciplinar

In vitro Ao vivo

Mundo externo-Objeto Correspondência entre o mundo externo (Objeto) e o mundo interno (Sujeito)

Saber Compreender

Inteligência analítica Novo tipo de inteligência baseada no equilíbrio mental, afetivo e corporal

Orientada para o poder e a posse Orientada para o estranhamento e a partilha

Lógica binária Lógica do terceiro incluído

Exclusão de valores Inclusão de valores

Figura 11: Educação disciplinar e educação transdisciplinar (Nicolescu, 2000a, 15)

Nicolescu (2000a) define a "educação transdisciplinar" não do antagonismo, mas complementares, uma vez que as duas metodologias de derivativos se baseiam o "espírito científico" (Figura 11). A referência seria menos de não ser implicações relevantes, em dois sentidos, querendo a propagação de etnografia: por um lado, em termos de objeto de estudo, a complexidade tanto estrutura como inclui intelectual, axiológica e epistemológica, dimensões de uma educação integral e "in vivo". Sobre os outros, sobre a metodologia de pesquisa consistente, complementa as abordagens conducentes a uma consideração do "objeto" como uma educação de "assunto", sim a abordagem científica da "metodologia transdisciplinar" refere-se à pesquisa educacional, neste caso, acrescentamos uma concepção emancipatória e filantrópica da educação.

A "declaração de Veneza", comunicado final da conferência, patrocinada pela UNESCO, "A ciência nos limites do conhecimento: Um prólogo do nosso passado cultural" (março de 1986), ou o subsequente "Projeto moral da transdisciplinaridade", imprimem à concepção científica transdisciplinar uma projeção ética e moral - inclusive em alguns aspectos, beirando o compromisso pessoal e religioso – que no nosso caso, mesmo distinguindo, diferenciando e separando epistemologia e valores, exige uma reflexão sobre o papel que as Ciências Sociais, Humanas e, muito em particular, as de Educação deve representar no alvorecer do século XXI,

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em termos de pensamento e compromisso moral do intelectual e, portanto, do pesquisador social e educacional. Um dos riscos identificados, e que devem ser mantidos, é, no entanto, e neste sentido, a univocidade triunfante de "tecnociência", obediente a uma lógica – tão valorizada nas declarações referidas – da eficácia pela eficácia. Frente ao imperativo de eficiência excludente, a educação – e não apenas a pesquisa – tem de reagir, e reage, com a recuperação de um sentido comunicativo e crítico43. Ela é se preferir, a mais recente contribuição resgatada sob o pretexto da transdisciplinaridade. Educação assim se associaria à metadiscursos que estabelecem pontes entre diferentes disciplinas do saber afetando e inter-relacionando diferentes "níveis de compreensão". É, nesse sentido, uma reconsideração obrigatória da natureza inter e transdisciplinar em Ciências da Educação. Em uma tomada de posição transdisciplinar, é o reconhecido Edgar Morin quem expressa mais enfaticamente o conceito de educação de acordo tanto com a transdisciplinaridade como - em nosso caso substantivo – em relação com um dos pilares acima mencionados, a complexidade.

O universo, a vida, o nascimento do ser humano "abrem um profundo espaço de indecisão que envolve as escolhas filosóficas e as crenças religiosas através de culturas e civilizações", mas antes de qualquer uso e regra própria de cada sociedade e cada cultura, a educação do futuro deve reconstruir "sete saberes". Morin (2001) estabelece assim uma união entre a concepção transdisciplinar em ciência com consideração não menos transdisciplinar da educação. Em suma, Morin (Op. cit., 18-23 e segs.) define "os sete saberes necessários para a educação do futuro", em correspondência com os sete "buracos negros" que avista desde o ensino primário até a Universidade: I. O buraco do conhecimento é ensinar não só conhecimento, mas o conhecimento sujeito a "erros mentais", "erros intelectuais", "erros da razão" e - com um impacto desconstrutivista – "as cegueiras paradigmáticas" que mantêm a, em nosso caso suficientemente referido, dualidade excludente do paradigma cartesiano que, em termos históricos, prescreve a disjunção e se desdobra em dois, o mesmo mundo, associando o determinismo dos paradigmas e das explicações, o determinismo das convicções e crenças, e o poder imperativo e proibitivo do, também, conhecimento oficial (sujeito/objeto, alma/corpo, espírito/matéria, qualidade/quantidade, finalidade/causalidade, sentimento/razão, liberdade/determinismo, existência/essência). II. O conhecimento relevante, ou posto em evidência do contexto, o multidimensional, o complexo, e assim "articular e organizar os conhecimentos e com ele conhecer e reconhecer os problemas do mundo" em nossa era global; global e paradoxalmente localista e contextual ao mesmo tempo. III. Um ensino fundamental e universal centrado na condição humana, colocando o ser humano no universo, e não limitá-lo: é a marca da filosofia do "homo complexus", "somos seres infantis, neuróticos, delirantes, sendo ao mesmo tempo seres racionais". IV. Ensinar a identidade terrena: "Concebido apenas de forma técnico-econômica, o desenvolvimento se encontra em um ponto insustentável incluindo o desenvolvimento sustentável"; afundado "na Idade do Ferro planetária", a educação tem que recuperar o ser humano a sua "consciência antropológica", sua "consciência ecológica", sua "consciência cívica terrena" e sua "consciência espiritual". V. Enfrentar as incertezas: "Temos que aprender a lidar com a incerteza, uma vez que vivemos em um tempo de mudança de valores ambivalentes, onde tudo está ligado". Educação tem que voltar, portanto, "sobre as incertezas ligadas ao conhecimento": incerteza cérebro-mental,

43 Em nosso caso, alternativas docentes baseadas na utilização do portifólio estão tentando aproximar o ensino do horizonte utópico da educação interdisciplinar (Arraiz e Sabiron, no prelo).

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incerteza lógica, incerteza racional, incerteza psicológica. É a consequente dúvida e relativismo no próprio conhecimento e na inerente imprevisibilidade do nosso futuro "cósmico". VI. Ensinar a compreensão: "A compreensão intelectual ou objetiva e a compreensão humana intersubjetiva" que se fundem em uma educação que excede a explicação para a compreensão intelectual e comporta um conhecimento de sujeito a sujeito em um processo de empatia, abertura e generosidade; é o "bom pensar". VII. A ética da raça humana: é a "antropo-ética", que significa "a decisão consciente e lúcida de assumir a condição humana individuo-sociedade-espécie na complexidade de nossa era; de realizar a humanidade dentro de nós mesmos em nossa consciência pessoal; assumir o destino humano em sua antinomia e plenitude". A pesquisa etnográfica é parceiro no entendimento ilustrativo dos buracos negros, de forma a mediar a transição para a então entendida a educação do presente.

Finalmente, os métodos de pesquisa etnográfica são também devedoras da última demanda de Morin. No próprio seio da Universidade, é necessário introduzir o "dízimo epistemológico" (sic): "Os 10 por cento do orçamento da Universidade deve ser dedicado a refletir sobre as coisas em que não há nenhum ensinamento" e se refere – para terminar - os seguintes exemplos: "O que é racionalidade?, o que é a cientificidade?, o que é a poesia?" (Morin, 2000). As implicações para o planejamento do professor não é menos essencial, como é relevante na teorização educacional (Blanchart-Laville,) 2000 ao reorientar a questão como co-construção do significado da educação. A Universidade de qualidade e estratégica talvez - certamente - deve tomar pelo menos alguma nota.

A complexidade

A lição salutar do caos

Em uma estação ferroviária, um observador isolado interpreta que, de repente, viajantes de uma estação entram em, pois - sem sabê-lo – deslocam-se para uma nova estação por um comunicado emitido pelo sistema de megafonia. Os viajantes têm uma trajetória comum, mas cada pessoa descreve uma trajetória ligeiramente diferente para evitar colisões, que são muito pouco previsíveis uns segundos antes. Um obstáculo, uma simples maleta, provoca novas alterações, mas há sempre um padrão comum, o de ir em direção ao outro, indicado nas instruções do sistema de megafonia.

Entre o "quark" e esta situação cotidiana, a investigação cientifico-social e educacional ocupa seu espaço. A "teoria da complexidade", ao mesmo que ocorreu com a "transdisciplinaridade" e diferentes "níveis de realidade" pode resultar referentes epistemológicos de interesse para a pesquisa, sempre e quando - como não - não se desorbite a extrapolação. Ou seja, se é mantido o valor metafórico que caracteriza a atribuição epistemológica de certos princípios das ciências da natureza para as Ciências Sociais. Da mecânica quântica para investigação sócio-educativa, as diferenças de objeto são - obviamente! - substantivas. Neste espírito de relativismo ser recorre à concepção construtivista da complexidade em e da educação a partir de referências mínimas para a "teoria da complexidade" aplicada em seu campo disciplinar de origem.

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Ao longo da história da ciência, se tem refletindo a busca obsessiva de cientistas - limitações ontológicas e medos atávicos - da associação de causa e efeito que poderia explicar e predizer nossa realidade circundante. Superado os momentos de explicação mágica, o princípio da causalidade é onipresente: as mesmas causas deveriam produzir sempre os mesmos efeitos. No entanto, nossa própria natureza e o nada insignificante conjunto de conhecimentos biológicos, psicológicos, sociológicos e até mesmo pedagógicos, o considerável conhecimento próprio das Ciências Sociais, parecia contradizer, desde outrora, o determinista princípio de causalidade. Mas persiste a dúvida existencial sobre o nível de cientificidade de nossas disciplinas por critérios comparativos com as ciências da natureza, situação análoga às sucessivas tentativas de matematizar nossas explicações. O valor referencial da Física continua a ser assim um aval reconhecido. Neste sentido, o princípio da teoria da Complexidade de como os processos não lineares causais produzem um comportamento não determinista é digno de consideração.

A apresentação dos conceitos essenciais da teoria da complexidade realizada por Gell-Mann (1995) convém destacar duas questões cruciais. De uma parte, menor no nosso caso, o fato significativo de como, apesar das evidências, a ciência continuou fiel à causalidade e ao determinismo consequente como princípio fundamental: a razão é operacional, a dificuldade em resolver equações diferenciais não lineares44. De outra, substantiva em pesquisa no campo geral das Ciências Sociais, a natureza na determinação do "nível de complexidade": “A classificação de simples ou complexo é subjetiva e a fronteira encontra-se entre o que sabemos resolver e o que não sabemos resolver”. Nem todo objeto de estudo em nosso campo tem de ser altamente complexo, se bem que apreciamos fenômenos que resultam complexos, ou antes, os que, até agora, não foi capaz de fornecer explicações cientificamente relevantes: "O caos não é senão uma ordem a ser decifrada". Aqui, o recurso para a deturpação pode ser letal. Um novo exemplo de Gell-Mann: "Não é estranho ver como são feitas comparações entre histogramas dos biorritmos e as flutuações dos índices de ações, com a pretensão de retirar conclusões semelhantes e, portanto, substanciais. "Na verdade, se assemelham a algo: ambos são complexos, mas provavelmente não tem nada em comum". A questão de investigação não lançar hipóteses das analogias assim como, tampouco, nem subestimar as diferentes concepções que coexistem em todos os campos científicos (Duit, Komorek e Wilbers, 1997). Mas é uma questão de ética para o pesquisador social e educacional, não lançar hipóteses também às correlações, praga bíblica desde os primórdios da investigação em nosso campo, atualmente reificada com a redução do pensamento, quando se é capaz de correlacionar e inferir pseudoteorias não mais do que aquele famoso experimento didático do professor que fumar era melhor (dado que a correlação com os resultados escolares de seus alunos foi superior), mas empreender avaliações, pesquisas, teses e publicações com as mais dementes hipóteses correlacionais. E, no entanto, qualquer nova manifestação fenomênica que envolva pessoas é, atualmente, complexa por ser caótica e inesperada.

Davies (1993, 105) oferece um raciocínio semelhante de forma diferente: "Podemos considerar a história do universo desde suas origens, a partir do big bang, como uma progressiva “complexificação” e organização da matéria e da energia. Partindo de um vazio 44 Uma vez mais não só reconheço, mas lamento minha ignorância sobre este assunto. Limito-me nesta afirmação transcrever e dar por válido o lido.

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basicamente disforme, toda a elaborada variedade da natureza, das galáxias às nuvens, de flocos de neve para as pessoas, surgiu do princípio. Não se acham impressos no cosmos no momento do seu nascimento; são produtos espontâneos da auto-organização e do caos, entrelaçados em uma rica e delicada rede que dar ao universo uma propriedade única: não está totalmente ordenado como um cristal ou completamente por acaso (...). Em vez disso, ele está suspenso entre estes dois insípidos extremos, tornar-se uma mistura fascinante de acaso e necessidade". A crescente "complexificação" do nosso objeto de estudo pode ser óbvia, embora diferente, inclusive opostos ao acaso e à necessidade. Esta amálgama de "aleatório" e "necessidade" é um princípio novo que excede nosso espaço, mas que, pelo menos, deve referir-se. Em qualquer sistema complexo, desde as moléculas até os neurônios de nosso cérebro ou o tráfego nas nossas cidades, as partes do sistema estão sempre passando por mudanças em pequena escala, eles estão em constante fluxo. Estas flutuações podem ser abrandadas ou suprimidas, mantendo o equilíbrio do sistema, ou amplificadas e ampliadas, ameaçando o equilíbrio do sistema. O resultante pode mergulhar no caos e a destruição do sistema ou, pelo contrário, na criação de uma estrutura completamente nova e de ordem superior. Prigogine e Stengers (1983, 27-29) defendem a criação de uma "nova aliança" para um novo "naturalismo" entre nossa tradição, "com sua ênfase nas formulações experimentais e quantitativas", com uma tradição oriental "direcionada para uma imagem do mundo auto organizando-se espontaneamente". Existem leis universais que descrevem a aproximação ao equilíbrio, considerando que essas mesmas leis não explicam o contexto em que nós podemos introduzir a vida: "Como podemos preencher a lacuna entre ser e tornar-se – dois conceitos em aberto conflito – e, entretanto, necessários para dar uma explicação coerente deste estranho mundo em que nos encontramos?" (ibidem, 187). Essa complexidade (ou caos) pode fornecer um sistema físico que dê lugar espontaneamente a formas mais organizadas, abre a fresta para o livre-arbítrio da natureza humana: "Albert Einstein disse uma vez, em um contexto ligeiramente diferente, que Deus não joga dados com o universo. A lição que nos ensina o caos é que ele faz. Provavelmente a descoberta do caos vai transformar toda nossa visão de nós mesmos e nossa relação com o universo (...). Não somos dentes indefesos de engrenagem presos na barriga de uma pesada máquina cósmica: também temos liberdade para explorar veredas alternativas de futuro, não porque há um fantasma na máquina, mas porque não há nenhuma máquina”! (Davies, 1993, 105-106). A recuperação do sentido transcendente da educação fica evidenciada, e as implicações na pesquisa resultam não menos reconfortantes. O impacto definido a partir dessas posições, reafirmado em prol de estudos que repercutem, na verdade, na liberdade.

Em síntese conclusiva, uma aproximação semântica mais fácil (que não é simples) para a Complexidade é oferecida pela síntese de Agudelo e Alcalá (2003, s/p) quando indicam os comuns: "A complexidade é a experiência diária que se encontra em diferentes contextos, em todas as manifestações da vida humana". Principalmente, em consequência, nos fenômenos sociais, culturais e educativos, objeto de pesquisa em nosso campo. "A complexidade é a interação de várias partes de um sistema que dá origem a comportamentos e propriedades não encontradas em elementos individuais do sistema”. Razão suficiente para um comentário fenomênico em nosso campo de pesquisa. Eles acrescentam: "A complexidade ocorre nos sistemas. Um elemento isolado não pode aumentar sua Complexidade porque não interage com os outros elementos endógenos e exógenos dos sistemas". Isso justifica, sem qualquer

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tautologia, o referente da Complexidade, sobre a oposição paradigmática anterior. A Complexidade é um processo evolutivo. "A Complexidade é um índice de Conhecimento. "A complexidade não tem oposto, simples não é antônimo de complexo, mas complementar deste."

Nesta ocasião, a Real Academia da Língua Espanhola e o sentido etimológico talvez diferissem do significado epistemológico: questão de conhecimento.

O conhecimento do conhecimento

Sem dúvida, um dos presos na teoria da Complexidade aplicada ao conhecimento e à educação e é controverso, em sua vida e em sua obra, Edgar Morin. Morin apresenta uma visão ampla do conceito e significado da complexidade, recuperando "o erro de subestimar o erro" (Morin, 1998). O erro, a transdisciplinaridade, a complexidade, mas sem dúvida e talvez, principalmente, sua própria biografia, leva Morin a questionar "O Método". Em seu volume III, "O conhecimento do conhecimento", expõe o erudito uma questão substantiva na pesquisa, o questionamento da própria noção de conhecimento e sua impossibilidade (?): "Pensamos, mas sabemos pensar o que você quer dizer pensar? Há algo impensável no pensamento, algo incompreensível na compreensão, algo incognoscível em conhecimento? E aqui estamos, desde o início, ante o paradoxo de um conhecimento que não somente se esmigalha diante da primeira pergunta, mas que também descobre o desconhecido em si, ignorando mesmo o que seja conhecer" (Morin, 1988, 19). E perante tal fragmentação da noção de conhecimento, é plausível - e legítimo, observa Morin - supor que conhecimento contém em si “diversidade”, “multiplicidade” e “'modos”, “níveis” ou graus. Todo conhecimento necessariamente contém uma "competência" (aptidão, e um cérebro), uma “atividade”, (cognição, e uma cultura, e um controle do saber para controlar o poder do saber) e um "saber" (resultado). O conhecimento é "um fenómeno multidimensional, na medida em que, de maneira inseparável, ao mesmo tempo é físico, biológico, cerebral, mental, psicológico, cultural, social. Agora, este fenómeno multidimensional é quebrado pela mesma organização do nosso conhecimento, no seio da nossa cultura; os saberes que, juntos, permitem o conhecimento do conhecimento, encontram-se separados e parcelados" (ibidem, 20): a ruptura entre "ciência" e "filosofia", cérebro e espírito, começou um processo de fragmentação que culmina hoje das "equipes de peritos" supra especializados, todo perito e escassa equipe. É a "patologia do conhecimento". E reage, desde o Círculo de Viena até a transdisciplinaridade: "Reflexividade, reorganização epistemológica, manutenção de interrogação radical, vocação emancipatória, etc." E, no entanto, sua obra O Método nasce inacabada e, após mais de vinte anos, permanece inconclusa: "Na origem, o palavra método dignificava o caminhar (...) uma caminhada em espiral; parte de um interrogatório e de um questionamento; Ela continua através de uma reorganização conceitual e teórica em cadeia que, alcançando o nível paradigmático e epistemológico, conduz à ideia de um método, que deve permitir um caminhar de pensamento e de ação que pode lembrar o que foi mutilado, articular o que estava disjunto, pensar o que estava oculto. O método aqui se opõe à concepção chamada “metodologia” em a que é reduzida a receitas técnicas "(Morin, 2001). Sob este significado se inscrevem os métodos etnográficos de pesquisa.

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O prólogo do Tratado de cocotología de Miguel de Unamuno não é menos sugestivo; a poesia de Machado, não menos esclarecedora. Don Miguel de Unamuno, nos Apontamentos para um tratado de cocotología, definia o problema e a razão do Método. Seleciono um parágrafo com a esperança de não distorcer em excesso o tom inteligente do conjunto: "Aqui explicarei o porquê trato primeiro do primeiro e segundo do segundo e por que o terceiro deve ir antes do quarto e depois deste o quinto". Esta é uma parte muito importante e na qual se requer muito pulso. É conhecido, na verdade, que o método é o todo e que a ciência é reduzida ao método, ou seja, o caminho, pois método significa em grego caminho. E tendo em conta que existem dois tipos de caminhos, rotas ou métodos, alguns parados pelos quais os caminhantes ‘corre e anda’, como são as estradas de terra, e outros ‘caminhos que andam', que levam o caminhante, tais como os canais e rios, dividirei os métodos, e, por conseguinte, as ciências que os encarnam, em dois grandes grupos: métodos parados ou terrestre e métodos em movimento ou fluviais. A partir daqui as ciências terrestres e as ciências fluviais. E se me disserem que isto é brincar com a metáfora, replicarei que tudo é metáfora e assim sairei do passo (...)". Obrigado.

Em todo caso, "o método/caminho/ensaio/estratégia contém um conjunto de princípios metodo-lógicos que configuram um guia para um pensar complexo" (Morin, Ciurana e Motta, 2003, 37-45): 1) Princípio sistêmico ou organizacional: "(...) o todo é mais do que a soma de suas partes. Esse 'mais do que' são os fenômenos qualitativamente novos que chamamos de 'emergência'“. Estes são efeitos organizacionais, resultado (...) da disposição das partes no seio da unidade sistêmica. Por outro lado, o todo é 'menor' que a soma de suas partes. Esse 'menor' são as qualidades que são restringidas e inibidas pelo efeito da retroação organizacional do todo sobre as partes." Baseia-se a posição emergente (metodológica, teórica e procedimental) nos processos de pesquisa etnográfica. 2) Princípio hologramático: "Em toda organização complexa, não apenas a parte esta no todo, mas também o todo está na parte”, atribuição primordial no estudo de caso. 3) Princípio da retroatividade: "Frente ao processo linear causa e efeito, estamos em outro nível: não só a causa atua sobre o efeito, mas que o retro atua informacionalmente sobre a causa". É a interação multirreferencial. 4) Princípio de recursividade, processo "cujos produtos são necessários para a própria produção do processo". É a ação. 5) Princípio da autonomia/dependência: "Toda organização necessita para manter sua autonomia da abertura ao ecossistema que a nutre e que a transforma". É a contextualização. 6) Princípio dialógico: "Pensar do mesmo espaço mental lógicas que se complementa e que se excluem". Chave, juntamente com a dialética, no entendimento dos fenômenos. 7) Princípio da reintrodução do cognoscente em todo conhecimento: "É preciso devolver o protagonismo a aquele tinha sido excluído por um cego objetivismo epistemológico. Tem que reintroduzir o papel do sujeito observador/computador/conceituador /estrategista em todo conhecimento. O sujeito não reflete a realidade. O sujeito constrói realidade". Socioconstrutivismo e, mais uma vez, o compromisso ético na lapasadiana devolução da palavra.

O método de pesquisa em nosso campo cientifico-social é particularmente sensível a estes princípios. Mas, como estamos acostumados, em pesquisa educacional, a sensibilidade é dupla, pois afeta, em profundidade, uma segunda dimensão, a educação em e para um

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"pensamento complexo” 45. Unindo a questão ao método de pesquisa, no entanto, os sete princípios enunciados, e em especial o último, que resume os anteriores, endossa a pesquisa etnográfica, em cujo epicentro, lembre-se, está o sujeito, ao mesmo tempo objeto. Mas questiona também toda tentativa de aproximação científica inclinada à parte, à causar, a uma única lógica dominante ou à própria descontextualizacão experimental do objeto de estudo.

Edgar Morin, em última análise, chama a atenção para a necessidade urgente de "pensar sobre o que sabemos" - parafraseado sob o título "conhecimento do conhecimento". No entanto, às vezes, sua linguagem hiperbólica dificulta o entendimento e a viabilidade das consequências de suas próprias reflexões. Provoca, apresenta, briga, argumenta, expõe enfaticamente uma análise coerente da enferma situação ontológica, epistemológica, teórica, metodológica e disciplinar que mantém sua validade, mas sofre de características semelhantes no desenvolvimento do seu “método”. Dupuy (1990, 211-251) réplica Morin com um artigo sobre "a simplicidade de complexidade". A controvérsia levantada entre os dois representa um acordo entre o chamado, em termos do primeiro, "ciência clássica" frente a "ciência da complexidade". Partindo da argumentação de uma e outra, desenvolvendo uma linguagem "complexa" ou "simples", uma e outra posição concluem numa idêntica necessidade de incentivar abordagens semelhantes: "Longe de renunciar a complexidade, considero que uma ciência da complexidade é, atualmente, possível e necessária (...) mas este acordo é ‘complexo’, nutre-se de desentendimentos e dissonâncias" (ibidem, 250-251). É a eterna remissão para uma composição de complexidade e simplicidade fenomênica, social e individual, genética e ambiental, cultural e formativa, etc.. E nas dissonâncias, no não menos repetitivo trinômio ordem-desordem-(organização), em seu espaço encontra-se o movimento que tem de ser o objeto de estudo primordial das ciências sociais. "Movem-se, afastam-se dos sistemas de referência e modos explicativos que os guiou ao longo de décadas, mudança de objetos e pergunta – elas também - seu saber. O conhecimento do seu conhecimento é um dos seus objetivos" (Balandier, 1999, 60). Novo valor acrescentado ao estudo dos métodos de pesquisa, complexidade no estudo do "movimento", e a consequente perda de nitidez entre o que é verdade e o que é falso, a verdade, a ficção e a existência. É o tom de cinza, frente ao branco e preto: "homens não produzem o verdadeiro nem o falso, mas 'o existente'" (ibidem, 230-231).

Em a Ciência com consciência Morin (1984) sugere uma alternativa para a carga em profundidade de Balandier, a necessidade de tomar “consciência” da complexidade de toda realidade– incluindo, sem dúvida, a educativa - bem como da própria realidade da complexidade: "Consciência sem ciência e ciência sem consciência são mutiladas e mutilantes". Essa "consciência" reconhece a complexidade de uma realidade por diversas características. Dada sua repercussão em nossos métodos de pesquisa, indicam-se: "1) a necessidade de associar o objeto ao seu entorno; 2) a necessidade de unir o objeto ao seu observador; 3) o objeto não é principalmente objeto se está organizado e especialmente se for organizante (vivente, social), é um sistema, é uma máquina46; 4) o elemento simples se 45 Não mais insisto na associação que desde a Complexidade se estabelece entre a investigação e educação. Apenas quero deixar bem claro, mais uma vez, do imbricamento, neste caso, como assinalam os autores, para "educar na era planetária", quando a sonda Huygens já nos enviou, de Titan, os primeiros sons alienígenas.46 Sistema "significa que o todo é mais e menos do que a soma das partes que o constituem, máquina, produtora do todo enquanto que todo organizador".

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desintegrou; 5) o confronto com a contradição, antagónica, em uma nova colaboração entre a cooperação e o antagonismo "(ibidem, 342-347). É, em síntese – de volta com os paradigmas –, o paradigma da complexidade ou, falando de expositivo mais coerente, os referentes básicos da Complexidade (agora com letra maiúscula) contra o paradigma da simplificação na ciência clássica (ibidem, 361-162). É um inegável avanço, embora discutível, tendo em conta as limitações "lógicas", "enciclopédicas" e "epistemológicas" das propostas de Morin, a relação "dialógica", ou seja, superado e mantido, em uma relação complementar entre os dois denominados paradigmas, entre o enfoque da “simplificação” e da “complexidade” (Rosnay, 1975; Fortin, 2000, 159-176).

Como aconteceu com a transdisciplinaridade, o aumento impressionante na disseminação de informações, possível pela expansão das redes telemáticas, levou à organização da reflexão científica sobre a complexidade. É a rede "Redcom"47: das bases de dados disponíveis e consultadas, pode ser visto a ampla temática abordada da "complexidade"; das relacionadas com nosso âmbito se referem as seguintes:

Desconstrução, novas organizações, criatividade e pedagogias críticas, com expoentes e referentes da estatura de Basile Bernstein, Jerome Bruner, Jacques Derrida, Peter Drucker, Jürgen Habermas, Michel Lobrot, Humberto Maturana48, Carl Rogers, Sternberg, etc.

Transdisciplinaridade, metasistemas e pensamento complexo, entre aqueles que deve citar Ludwig von Bertalanfy, Humberto Maturana, Edgar Morin ou Ludwig Wittgenstein, entre outros.

Em todo caso, a inclusão da complexidade supõe reconsiderações vinculado no domínio da investigação, ao mesmo tempo que legitima a alternativa dos métodos etnográficos. No entanto, o relativismo e a dúvida - princípio orientador da pesquisa etnográfica - obrigam a concluir com uma das sínteses mais claras e rotundas com respeito aos "caoplejólogos"49 e o impacto decisivo sobre a lógica difusa: "até agora, os caoplejólogos tem criado algumas metáforas poderosas: o efeito borboleta, os fractais, a vida artificial, a borda do caos, o estado crítico organizado. Mas não dizem nada sobre o mundo que seja concreto e verdadeiramente surpreendente, nem no sentido negativo ou positivo. Foram ligeiramente alargado os limites do conhecimento em algumas áreas e foram mais precisamente delineados os limites do conhecimento em outras" (Horgan, 1998, 286-287). A paródia de Alan Sokal publicou em 1996 sob o título de Transgredir las fonteras: hacia uma hermenêutica transformativa de la gravedad cuántica destina-se expor os abusos, em graus variados, dos aqui considerados referentes epistemológicos de uma rotulada "condição pós-moderna" (Lyotard, 1984) na atual concepção de ciência. O affaire foi devastador demonstrando a "impostura intelectual", como

47 Anel de páginas web destinadas ao desenvolvimento da Complexidade [http://www.colciencias.gov.co/redcom]. Poderia ser adicionada uma abundância de endereços de e-mail. Talvez resultado do interesse geral [http://www.complejidad.org], ou dos vários "links" da "Association pour Pensée Complexe", em Paris e presidida pelo próprio Edgar Morin (consultas realizadas entre outubro de 2001 e dezembro de 2003).48 É pedagogicamente ilustrativa, em colaboração com Francisco Varela, a obra A árvore do conhecimento. Entre os aforismos exibidos no livro referir dois reflexivos: sobre o conhecimento, "todo fazer é conhecer, e todos conhecer é fazer", ou o hermenêutico, "tudo o dito é dito por alguém" (Maturana, 1994).49 Combinação de caos e complexidade.

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resultado da "ignorância" que é atribuída a nós (e me atribuo), em particular e ao conjunto das Ciências Sociais, como estas tentam estabelecer referências distintas à dependência secular das Ciências Naturais, e utilizando-as em um sentido mais metafórico do que explicativo. No entanto, quando após a "desconstrução" se aporta, em um epílogo, as chaves para um "verdadeiro diálogo entre as 'duas culturas'" seus autores demonstram uma não menos ignorância das Ciências Sociais, um certo atrevimento, por parte de quem, denunciando uma "farsa" intelectual, por nossa ignorância e ousadia ao aplicar em Ciências Sociais princípios próprios do resto (Sokal e Bricmont, 1999201-229), caem em uma não menor impostura intelectual, criticando de maneira descontextualizada contribuições tão substantivas em nossas Ciências Sociais como aqueles referidos a Derrida ou Kristeva (para citar duas referências de prestígio). Pese às sem dúvida garantidas críticas, descartar totalmente o relativismo epistemológico pode resultar em risco de fundamentalismo empírico , inquisitorial dos últimos séculos da nossa história científica e, infelizmente, legitimadora de uma ordem, sempre mundial, manipuladora, rasteira e imperial, em que a metade devora a outra metade do mundo. Esta é a verdadeira hipocrisia das ciências sociais, quando eles se calam.

A multirreferencialidade fenomênica

Uma repercussão novamente básica recai sobre a pesquisa cientifico-social e educacional, e de novo a pesquisa etnográfica a internaliza: a complexidade fenomenal — tanto nos métodos de pesquisa quanto nos objetos de estudo - forçando a uma perspectiva "multirreferencial" e "heterogênea" que, por sua vez, sugere a introdução de duas questões epistemológicas cruciais, a consabida, por referida, qualidade de complicado e qualidade de complexo dos nossos fenômenos de estudo, e o não menos decisivo envolvimento do pesquisador no entendimento do pesquisado.

A complexidade implica uma posição do investigador, e não tanto uma condição inerente do objeto de estudo: é a atitude do pesquisador ocupado em compreender antes que na pretensão de explicar. Mas, em nosso campo de pesquisa, a compreensão carrega singularidades discutidas e cientificamente questionáveis sobre o grau de envolvimento do pesquisador no processo e tema de pesquisa. A metodologia qualitativa, a pesquisa etnográfica, a condição de "emergente", ou a detalhada transdisciplinaridade, complexidade ou multirreferencialidade, dão boa razão para esta aproximação. No entanto, antes de entrar na casuística particular da investigação sócio-educativa, convém continuar com a exposição sistemática, neste parágrafo, da fundamentação e repercussão, agora da "multirreferencialidade", forçada pela "complexidade". Jacques Ardoino é um dos estudiosos que, em numerosas contribuições, tem tratado a questão50.

Se bem que num campo semântica próximo, "complicado" e "complicação" - "complexo" e "complexidade" têm, em sua origem, uma raiz etimológica diferente, neste caso, recuperada

50 Na verdade, inclusive em sua última intervenção científica, à que assisti (Colloque Pierre Bourdieu et l'Ethnographie, Université de Haute-Bretagne, Rennes, novembro de 2003), mostrava-se, se couber, mais inclinado ao desenvolvimento da "multirreferencialidade" no tratamento pedagógico e investigação tratamento ante o surgimento (ou atualidade, se preferir) do multiculturalismo educacional.

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pela epistemologia: do latim complexus, no Diccionario Crítico Etimológico de J. Corominas, é mostrada uma associação com "abraço, link, encadeamento” 51. Este é o significado original de "complexidade", o "encadeamento" entre os diferentes elementos (entre os distintos "referentes"). A multirreferencialidade tenta assim abarcar as diferentes perspectivas, mas da concatenação dos componentes, frente a uma análise do "complicado", cujo objetivo é dar com a explicação de elementos difíceis de entender. A condição de complicado ou complexo carrega uma dissecação diferente: "Definiremos o que apresenta um caráter complicado em termos de multidimensionalidade, re-homogeneizável, pela quantidade e intensidade de suas variáveis, por exemplo, através da análise multifatorial, na medida em que temos de considerar a multirreferencialidade para especificar o conceito de complexidade". (Ardoino, 2000, 66)52. Na verdade, portanto, um mesmo objeto pode ser considerado, analisado e, consequentemente, investigado, desde a multidimensionalidade por complicado, ou a multirreferencialidade por complexo. Mas, também de fato "não apenas se tratará de duas metodologias diferentes (...) mas de duas posições epistemológicas heterogêneas e irredutíveis a uma na outra. Ele altera o significado da análise. No primeiro caso [complicado], a análise é, de acordo com sua etimologia, objeto de decomposição, de desconstrução, do todo em suas partes mais elementares (...). No segundo caso [complexo], a análise (...) acompanha o processo, porque procura compreender, ao invés de explicar" (ibidem, 66). E acrescenta: "Note-se que o termo complexidade nós induzia a um erro. Sugere, de fato, que é o estado próprio, a qualidade inerente ao objeto, do que é complexo. Entender-se-ia então o sentido de complexidade como a propriedade da coisa, o olhar [do pesquisador] só reconheceria essa qualidade. Consideramos, no entanto, antes pelo contrário, que é necessário situar a complexidade nas relação que une o objeto sobre o que nos perguntamos e o sujeito que deseja conhecê-lo. "Desta perspectiva, são os substitutos mentais do objeto inicial, as representações, as que constituem literalmente a complexidade, e a multirreferencialidade se aplica a esta construção" (ibidem, 67). Em nosso campo, nossos objetos de estudo não tem que ser naturalmente complexo em si mesmos. Na verdade, no conhecimento popular, inclusive resultam com uma aparência de simplicidade excessiva. Mas, em vez disso, adquirir conhecimento e saberes investigar sobre e com eles se reveste, no grau que se queira, complexidade e, consequentemente, a conveniência das abordagens multirreferenciais. Uma criança aprendendo a ser, uma adolescente que se apaixona, estão imersos em um processo que, qualificado por não profissionais, é aparentemente simples, mais complicado em alguns casos específicos. Mas, no entanto, todavia para nós são difíceis de explicar, compreender na reificação de cada pessoa e, de acompanhar em consequência quando é necessário, porque o processo é complexo. Através do desenvolvimento de métodos de pesquisa etnográfica, somos capazes de conferir o elevado grau de complexidade para a representação mental dos fenômenos sociais, culturais e educativos e, assim, dar com entendimentos que acertem na explicação. "A pluralidade, portanto, torna-se o recurso capaz

51 A discussão etimológica do termo complexidade é comum em publicações sobre o assunto. Uma das revisões mais completa, e referida ao espanhol, está disponível em Morin, Ciurana e Motta (2003, 51-55). Prefiro, no entanto, manter a análise menos divulgada, mas não por isso menos fundamentado de Jacques Ardoino por sua conclusão natural com a multirreferencialidade na pesquisa em nosso campo.52 A contribuição cientifico-social Jacques Ardoino não corresponde à sua produção bibliográfica. Como acontece com Guy Berger e é comum entre os estudiosos herdeiros em maior ou menor grau da Análise Institucional. Ardoino se mostra recatado ao publicar. Prefiro assim citar pela reedição de Les avatars de l'education de 2000, que reúne contribuições anteriores mais difíceis de conseguir.

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de fornecer explicações e compreensões que, de outra forma, seriam inúteis" (Boumard, 1999). Complementaridade, que, no entanto, não implica – em absoluto, repito uma vez mais –ecletismo: cada referente mantém sua ordem interna: é no conjunto fenomênico no que adquire o sentido complementar. A complementaridade consiste não tanto na “articulação” de perspectivas, mas na "conjugação", de tais e distintas posições. Neste sentido, cabe diferenciar e distinguir no autor (. Ardoino, 1993; 2000, 259-260):

Uma multirreferencialidade compreensiva, com a consideração das particularidades e singularidades dos componentes. Na pesquisa etnográfica, afeta o projeto e o trabalho de campo.

Uma multirreferrencialidade interpretativa, exercida igualmente no terreno da prática. Nos projetos etnográficos, repercute no tratamento dos dados e da informação, forçando a um retorno ao campo na própria análise.

Uma multirreferencialidade explicativa, interdisciplinar ("transdisciplinar" mesma), orientada para a produção de conhecimento e que se reflete na interpretação dos resultados, bem como na geração de saberes etnográficos próprios.

Uma diferença substantiva pode ser vista nessas distinções: as multirreferencialidades compreensivas e interpretativas vêm ordenadas por uma sequencia temporal semelhante à detalhada na complementaridade interpretativa e crítica (primeiro se interpretada, para depois criticar)53. Por outro lado, a multirreferencialidade explicativa propicia referentes externos que permitem aproximações empíricas. A multirreferencialidade explicativa admitiria a combinação de "explicações" diferentes, verbi gratia, estatístico-descritivas e interpretativa. A abordagem multirreferencial não se reduz, no entanto, à consideração de uma multidimensionalidade no objeto de investigação, como ele não seria suficiente a consequente interdisciplinaridade. É, novamente, uma questão de lógica, modelo de razão. A multirreferencialidade pretende compreender desde a ordem lógica da complexidade e, portanto, inclui o indivíduo, a inter-relação, o grupo, a organização, a instituição (inclusive, sic, o próprio cosmos). No nosso caso, a mutirreferencialidade se operacionaliza das diferentes lógicas instrumental, comunicativa e crítica54.

A fragilidade pós-moderna

Ocupa-nos a discussão epistemológica e a ritornelo constante sobre se a oposição ou complementaridade ontológica entre cosmovisões implica antagonismo ou acúmulo de saberes obtidos a partir de diferentes métodos. Essa é a dúvida, e na dúvida e no relativismo ficamos porque talvez tão apenas seja o subterfúgio pleonasmico, álibi perfeito da literatura pós-modernista, para seguir, página após página, sem dar detalhes de ideia alguma. Ou talvez ao contrário, na verdade, trate-se de uma oposição aparente da que derivam decisões substantivas nos projetos de pesquisa e, consequentemente, no tratamento dos métodos de

53 Refiro-me ao terceiro capítulo que trata das sequências entre as fases descritivas, interpretativas e críticas de pesquisa etnográfica.54 Que já aparecia descrita na apresentação deste capítulo e será retomada nas epígrafes finais.

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pesquisa em Ciências Sociais e da pesquisa etnográfica em particular, dado que não tem a intenção de, tampouco nesta seção, enfrentar, mas derivar umas condições mínimas para os projetos de pesquisa etnográfica que conforme a exposta multirreferencialidade, e compreendam - se assim se considerasse - a complexidade atribuída: em qualquer caso, coerente com esta mudança de perspectiva descritiva, com a "visão do mundo" – episteme – diferente que se propunha desde as referências repetidas. O sócio-constructivismo ou a emergência são aspectos fundamentais a considerar da complexidade. No entanto, aparentemente inovadores, estes pressupostos não fazem senão reencarnar novamente posições inerentes às nossas origens científicas. Esta constante clássica está representada em nosso tempo por estudiosos que, em alguns setores intelectuais, são considerados como "novos clássicos". Em primeiro lugar, dão continuidade assim aos fundamentos científicos das Ciências Sociais, partindo de umas referências mínimas para a interpretação dos "clássicos" por "novos clássicos". Assim, juntamente com a física, o segundo amparo, em matéria de investigação em Ciências Sociais, tem sido a Sociologia. E, de maneira análoga a como a fundamentação da Complexidade se inicia entre os físicos, o segundo referente epistemológico a considerar é a situação atual da discussão metodológica entre os sociólogos do conhecimento. Circunscrevendo a questão, as "regras do método sociológico" definidas por Durkheim mantiveram um privilégio epistemológico reconhecido. Na literatura científica pós-moderna, a reformulação dos princípios nas "(novas) regras do método sociológico" Giddens estão na moda. O contraste entre umas e outras serve, em nosso caso, de conclusão para as referências epistemológicas para a "reconstrução compreensiva". A referência inicial a Cicourel é devedora de respeito, efetivamente, clássico, que as contribuições de tal renomado estudioso merecem dado que tratavam e tratam de uma questão substantiva em pesquisa educacional: a medida.

Assim é como Cicourel (1982, 10; primeira edição em 1964), certamente, entendia a questão quando, todavia não tinha ainda etiquetado o pós-modernismo: "As estruturas sociais que chamamos de sistema de classificação (estratificação) social ou formas de organização política devem ser recriadas relacionando-as com o modo como os atores solucionam seus assuntos nas circunstâncias cotidianas". O sentido da reformulação da medida em sociologia do conhecimento55 arraigava na ação cotidiana dos atores sociais e o embrião do significado que lhes confere. Os instrumentos pertinentes não poderiam ser diferentes da observação participante e as entrevistas. O estudo da estrutura social, coletando "fatos sociais"56 "não representa um problema de medida." Efetiva e obviamente, o problema não resolvido, se apresenta porque "o estudo da ação social [funcionamento interior do individual + pressão da coletividade] não pode ser reduzido aos motivos ou atitudes sociológicas dos indivíduos que constituem certo grupo ou coletividade, mas que a ação social é explicada pelas normas, valores ou ideologias que são vinculativas para os membros de um grupo e que ultrapassam a qualquer ator particular tomado como ser sicológico (sic)" (ibidem, 257). As instituições sociais (as educativas as são, como resultam ser as organizações de lazer e tempo livre), com seus componentes, organizativos, grupais e individuais – domínio da psico-(socio)-pedagogia –, constituem um segundo anel de pressão. O problema de fundo na medida fenomênica

55 Uma introdução de interesse pode ser encontrada no capítulo sobre Gonzalez, "Medir nas Ciências Sociais" (em García, Ibánez e Alvira, 1998).56 Dos exemplos expostos pelo Cicourel deve compreender os "fatos sociais" como "dados sociais"; entre os exemplos citados, são dados demográficos sobre nascimentos, falecimentos, etc.

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socioeducativa continua sendo a inadequação entre o conhecimento científico e o significado real, porque as tipologias, modelos ou estruturas estabelecidas para a explicação do genérico cientista social estão subordinadas em cada situação, "às diferenças de percepção e interpretação dos atores diversamente distribuídos dentro de (essa) a estrutura social". A conclusão final de Cicourel foi enfática: "A expressão quantitativa dos resultados coisifica necessariamente os fatos em fatos, mas nossas interpretações - mesmo após as habituais desculpas e advertências formais sobre sua generalidade e precisão – são tomadas como conclusões positivas que fingem acreditar válidas e reproduzíveis. Assim, se vem a fazer da pesquisa sociológica algo concluso, ao invés de uma busca de conhecimento " (ibidem, 289). A pesquisa social pode mediar a reificação teórica dos fatos sociais em duas direções: por um lado, evitando a habitual facilidade em estabelecer como "conclusão" todo conhecimento adquirido, mas, principalmente, porque permite aflorar os significados efetivos (com o mínimo de máscaras) das regras, normas ou pressões sociais, percepções e interesses do indivíduo e na base no ato social, a interação entre os atores. Assim, se aumentaria a relevância do conhecimento sobre os fenômenos que nos interessam.

O hoje exaltado Giddens, estrela da década de 1990, realizava em 1967 uma breve, mas ao mesmo tempo enciclopédica revisão das escolas já clássica na teoria social – a fenomenologia, a etnometodologia, Wittgenstein e a filosofia poswittgensteiniana, a própria hermenêutica e a Teoria crítica –, que o levava a provar, em seu raciocínio, "que a teoria social deve incorporar um tratamento da ação como conduta racionalizada, ordenada reflexivamente pelos agentes humanos, e deve capturar o significado da linguagem como meio prático que o faz possível". Em tom irônico, concluía a revisão com uma reformulação das "regras do método sociológico" de Durkheim, com as que em absoluto pretendia enunciar umas regras alternativas às clássicas, mas, a grandes traços, como não, expor a revisão de algumas questões57 (Giddens, 1987):

"A sociologia não se ocupa de um universo pré-dado de objetos, mas de um que está constituído ou é produzido pelos procedimentos ativos dos sujeitos. Portanto, a produção e reprodução da sociedade têm de ser considerada como uma realização hábil de parte de seus membros". No entanto, tais características não carregam a consciência de todos os membros sobre o não-determinismo natural da produção e reprodução da sociedade, mas ao mesmo tempo, não espontâneo, mas elaborada. Acreditamos que a emergência deste necessário nível de consciência é um dos temas da sociologia e uma das razões para o conhecimento das Ciências Sociais. Em que medida as ações e significados escolares e educacionais coparticipam em tais processos pode ser matéria de conhecimento sobre as instituições e organizações escolares, educativas e sociais como um todo, formais e regulamentadas ou não-formais, mas institucionalizadas (família, iguais, cidadania, etc.).

"O domínio da atividade humana é limitado. Os homens produzem a sociedade, mas o fazem como atores historicamente localizados, não em condições de sua própria escolha". O determinismo histórico e situacional do indivíduo revitaliza, de uma perspectiva diferente, a análise das estruturas compostas por uma série de práticas reproduzidas. Os significados, normas e poder adquirem razão dentro das estruturas.

57 Na verdade, utilizo o Giddens como um mero pretexto para introduzir, em síntese, traços distintos da pesquisa etnográfica aplicada aos fenômenos sócio-culturais e educacionais.

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As estruturas relacionadas com os fenômenos educativos são uma das mais autorizadas a manter os processos de reprodução, integração e socialização. Entre outras razões, não suficientemente apontadas, mas devem ser mantidos, porque os processos de reprodução, integração e socialização ocorrerem em cada situação e ação com intenção educativa, seja esta normalizada ou responda a um coletivo marginal e/ou marginalizado. Sendo estruturas privilegiadas a possibilidade de explicação é básico para a conscientização do universo social. Uma das maneiras de ser, analisado os processos de reprodução, é, portanto, produzindo saberes relevante sobre os significados das ações escolas e educativas.

"O observador sociológico não pode tornar acessível a vida social como um fenômeno para a observação, independentemente de utilizar seus conhecimentos sobre a mesma por meio de um recurso pelo qual ele constitui como um tema de pesquisa. (...) A imersão em um modo de vida é o meio exclusivo e necessário pelo qual um observador pode gerar tais caracterizações". A observação participante é, portanto, não como mais um instrumento de pesquisa sociológica, mas como um meio privilegiado de investigação capaz de combinar, na terminologia clássica, o "saber (do) científico" com o saber local do "nativo".

"Em resumo, as tarefas principais de análise sociológica são as seguintes! (1) A Explicação e mediação hermenêutica de formas divergentes de vida dentro das metalinguagens descritivas das Ciências Sociais. (2) A explicação da produção e reprodução da sociedade como o resultado alcançado pela atividade humana "(Giddens, 1987, 163-166; primeira edição, em 1967).

Os princípios enunciados por Giddens não fazem senão reafirmar, com relação à finalidade das Ciências Sociais, o sentido explicativo da teoria. Mas, ao contrário das Ciências Naturais, a explicação é dialética e assim, próxima à compreensão etnográfica. Ou seja, da confrontação e contradição de significados emergem o conhecimento. É, em termos mais decisivos para a pesquisa, a construção social do conhecimento. A pesquisa deve ajudar o processo dialético, enunciando, sistematizando e opondo significados, precisando a ação da que se trata. As formas e a linguagem, de fato, adquirem uma dimensão relevante. Mas, no nosso caso, a releitura de Giddens – e sua surpreendente evolução da mão do então primeiro-ministro britânico Tony Blair — (Giddens, 1990, 1993, 1994, 1996) permitiu questionar não apenas as referências cientifico-sociais e educacionais da pesquisa da Física ("transdisciplinaridade", "complexidade"), mas também do campo mais afim da Sociologia. O conhecimento em Ciências Sociais tem existência própria e significado em si mesmo, mas reverte sobre um mundo social, com significados próprios que, reinterpretados pelo investigador, mostrar o intrincamento manifesto. Por analogia, este duplo círculo hermenêutica é suscetível de aplicação nos fenômenos socioculturais, escolares e educacionais, com uma complexidade adicional, pois é função da instituição escolar a colonização de significados do mundo de vida por parte do sistema e através da estrutura organizacional.

Dado que Giddens replica as "novas regras", seria justo pelo menos mencionar as clássicas "regras do método sociológico" enunciadas por Émile Durkheim (1988) em 1895 58, mas supera a extensão, razão pela qual só cabe ressaltar o determinante para a pesquisa etnográfica 58 O próprio índice de Durkheim (Op. cit., 204-211) seria suficiente para refrescar a memória das regras clássicas do método sociológico.

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conceito chave de "fato social" do que parte: "É fato social todo modo de fazer, fixo ou não, que pode exercer uma coerção exterior sobre o indivíduo; ou, também, que é geral em toda a área de uma sociedade dada e que, ao mesmo tempo, tem uma existência própria, independente das suas manifestações individuais” (ibidem, 68). Sem dúvida, uma síntese das "regras do método sociológico" clássico facilita a compreensão (e superficialidade disciplinar) das "novas regras". Sem dúvida, as "novas" reforçam a legitimidade epistemológica da pesquisa etnográfica, mas, em aplicação do princípio subsidiário ao "uso da prova", feita a comparação "no mesmo período de desenvolvimento", o impacto disciplinar revolucionário do “método sociológico” de Durkheim é infinitamente superior e decisivo para as "novas regras". É questionável o método, mas é um clássico indiscutível, e em seu momento histórico, o sociólogo (ao contrário do reformista Giddens).

Não menos importantes, são as contribuições sociológicas da pós-modernidade aos métodos de investigação por parte de Pierre Bourdieu. Brunet e Valero (1998, 92-105) realizam uma síntese no seguinte discurso metodológico: 1) A intrínseca existência da hipótese. 2) A necessária e permanente reflexão sobre a questão metodológica. 3) A falsa neutralidade das técnicas. 4) O valor da construção de hipóteses por analogia. Em termos de Bourdieu (1976), concentraremos as contribuições sobre questões relativas a:

A metodologia: "Ao chamar metodologia, como frequentemente é feito, ao que não é senão um decálogo de preceitos tecnológicos, escamoteia-se a questão metodológica propriamente dita, a da escolha entre as técnicas (métricas ou não) referentes à significação epistemológica do tratamento que as técnicas escolhidas fazem experimentar ao objeto e a significação teórica dos problemas que se deseja expor ao objeto ao qual se aplica" (ibid.(, 1976, 59-60).

O valor explicativo dos modelos: "Pode-se designar por modelos qualquer modelo de relações entre propriedades selecionadas, abstratas e simplificadas, construídas conscientemente para fins de descrição, de explicação ou previsão, e, portanto, plenamente manejável" (ibidem, 76).

Em homenagem após sua morte, o "Simpósio sobre Pierre Bourdieu e a Etnografia"59 (MAINE, 2003) – houve polêmicas consideráveis –, deixou patente como a evolução bio e bibliográficos, Bourdieu foi incorporando na macro-sociologia inicial, amarrações cada vez mais perto de uma sociologia etnográfica.

A discussão, tão somente esboçada, manifesta, no entanto, uma chamada de atenção a considerar pelos métodos de investigação em Ciências Sociais. Dada nossa natureza complexa, a dificuldade intrínseca para a própria investigação em áreas não imediatamente rentáveis, as implicações com as políticas sociais, culturais e educacionais do momento, e quantas características semelhantes se queira discutir, a influência da moda é, no nosso caso, parasita (e endémica). A evolução de certos tipos de pesquisas – a própria etnografia, por exemplo; mas infelizmente não é a única (e os projetos da pesquisação?) – poderia refletir com precisão a cerimónia da confusão com a que, nos últimos anos, se a tem adornado. Uma situação semelhante tem sofrido o próprio "relativismo" metodológico que, após o discurso pós-

59 Não posso estender-me mais, a risco de entreter-nos em excesso nas ramificações, e perder na árvore o fio condutor. Refiro-me, portanto, às referências bibliográficas finais e ao quinto capítulo.

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moderno, pode exacerbar os contratempos dos incompreendidos “vale tudo” de Feyerabend. As referências com base na complexidade, a multirreferencialidade ou a emergência pode ocorrer outro tanto. O modismo passageiro que, antes de desenvolver o potencial metodológico que encerra, nos faz descartar os pressupostos.

Da Ordem e Mafokozi (1997, 356), depois de analisar as tentativas de aplicação do caos e a mecânica quântica para a investigação social - inexistentes, na sua avaliação, no caso da educação - concluem com uma sonora e dura crítica que resumo na seguinte declaração: "(...) se na pesquisa em Ciências Sociais e em educação se obtêm resultados questionáveis, isso se deve mais às deficiências na aplicação metodológica e não tanto à inadequação da metodologia per se". De sinal bem contrário é a valorização contemporânea de Andy Hargreaves. Hargreaves (1997, 111-130) propõe uma agenda de pesquisa na era da pós-modernidade (frente ao relativismo cândido do "Pós-modernismo")60 que recupere os estudos sobre êxito, seleção e equidade; a identidade individual e social; o impacto e efeitos nas distintas classes sociais das novas tecnologias; ou os novos padrões de profissionalização/desprofissionalização, neste caso, do professor; da miséria e o controle da informações, etc. Trata-se de dirigir a atenção “para a capacidade da gente para atuar de forma construtiva e envolver-se criticamente nas complexas mudanças sociais e educacionais da era pós-moderna”. Compara-se: as posições críticas ou laudatórias frente ao pós-modernismo que se mantem anos mais tarde. "Nem peça-chave para o conhecimento universal, tampouco instrumento de repressão/emancipação dos povos, nem apenas outro tipo de discurso científico ou político, em pé de igualdade com o resto; a etnografia é o conhecimento que relativiza o conhecimento através da busca do significado e sua justificação "(Tyler, 2001, 312)61. Citação que reflete a posição que mantem – e compartilho – a pesquisa etnográfica ante a voragem relativista e ao oposto fundamentalista.

O relativismo aplicado ao conhecimento científico implica riscos que incluem sua própria dissolução. Mas o fundamentalismo não isento de riscos; antes pelo contrário, tem propiciando ao longo da história álibis perfeitos para a alienação das pessoas sempre que uma posição totalitária tem instituído em governante do país. A construção social e compartilhada do conhecimento, incluindo o científico e relativo ao âmbito das Ciências Sociais, é uma excelente lição para guardar do pós-modernismo epistemológico. E a dúvida metódica, agora pela relatividade do conhecimento, uma aprendizagem decisiva.

A emergência consequente

O uso do termo emergência em castelhano, a favor da nossa riqueza linguística, deve ser matizado. A razão não é semântica, mas o uso predominante refere-se apenas a um dos

60 "Quando fui visitar minha mãe na Inglaterra, fiquei em seu pequeno apartamento da Segurança Social, quando ela me explicou que o município não consertava a porta principal que estava quebrada, e que lhe permitia manter o calor do piso, porque teria muitos recursos e porque eles acreditavam ‘que se a colocasse todo mundo queria uma’, minha mãe não estaria enfrentando um problema de língua, de sinais ou de fala. Para ela, não ter uma nova porta não é essencialmente um problema de discurso, é um problema econômico e material, resultado das políticas que perpetuam e intensificam as diferenças de classe "(Hargreaves, Op. cit., 115). Veja, se quiser, as duas últimas seções do quinto capítulo.61 Publicado em 1986.

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significados aceitos. Assim, no dicionário da Real Academia da língua espanhola, dos três significados, duas se referem a eventos, acidentes ou catástrofes e uma a "ação e efeito de emergir", atribuindo a emergir um único significado, "brotar, subir à superfície da água ou outro líquido", mesmo que ele diz que pode também ser usado figurativamente. O dicionário de uso do espanhol de D.ª María Moliner inclui neste sentido, "coisa que emerge". No mais recente dicionário do espanhol atual D. Manuel Seco exemplifica bastante esses usos figurativos. Quando, no nosso caso, é feita referência à condição de “emergência” das realidades, refere-se à capacidade fenomênica de nossos objetos de estudo para, por meio de pesquisas, reificar novas realidades que fornecem chaves compreensivas e explicativas.

É a emergência sob o significado de "cosmovisão" – "cosmologia", para Bunge (2002, 35) – que se refere a "uma representação sinóptica do mundo, não apenas da natureza, mas também das pessoas, a sociedade e talvez até mais". No entanto, o significado de emergência entroncado na complexidade não só alude ao sentido ontológico que pode ser explicado a partir da "resultante" sistêmica, mas que se posiciona de um ponto de vista gnosiológico, quando as propriedades de um sistema e o conhecimento de seus componentes, funções e relações não explicam (sic) por se o fenômeno. A compreensão do nosso objeto de estudo deve abranger ambos os significados de “emergência”: a inclusão do significado sistêmico e materialista – "uma vez mais, os componentes de uma célula não estão vivos: a vida é emergente, não resultante, com relação aos componentes da célula" –; e ao mesmo tempo, caracterizada por uma dimensão não explicável, nem sequer, como pensa Bunge (2002), pela "ensambladura entre sistemas". A pesquisa reencarna assim, mais uma vez, um delicado dilema entre a existência e a crença, a ciência e a espiritualidade: a opção da pesquisa etnográfica, totalmente questionável, está inclinada a uma posição epistemológica e metodológica em que o conhecimento do "sistema" objeto de estudo, deve interseccionar o "sistema", de quem se aproxima para a compreensão. É a "intersubjetividade", e neste momento, os inevitáveis pressupostos explicativos subjacente a toda abordagem cientifico-social sensata.

No genérico positivismo subjaz uma visão do mundo como algo simples, hierárquica, mecânica, determinado, linear e causal, ensamblado e objetivo. Para a posição científica emergente, a "visão do mundo" é algo complexo, heterárquico, holográfico, não determinado, com uma múltipla causalidade, morfogenético e dependente das perspectivas que se adotem. Visão, como é evidente, oposta à positivista. Dado que a "visão do mundo" que subjaz o etnógrafo parece responder a estas últimas características (Schwartz e Ogilvy, 1979, 12-13, citado em Lozano, 1993, 414 e ss) será útil para introduzir em cada componente a deriva etnográfica.

O mundo é complexo e, consequentemente, interativo, com "propriedades únicas". A complexidade e a especificidade de cada fenômeno será, no nosso caso, de necessária consideração no projeto etnográfico compreensivo.

O mundo está ordenado heterarquicamente (que não hierarquicamente) sem que dê relacionamentos ajustados aos padrões exatos de influência. Cada caso é assim singular em cada realização institucional; em cada fenômeno interações compõem situações únicas. Uma exclusividade que você deve detectar, descrever, interpretar, e no seu caso, criticando a melhorar uma pesquisa etnográfica de design.

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Se o mundo é complexo, ordenado heterarquicamente, o mundo tem que ser holográfica, onde cada parte, cada componente está interconectada em um processo dinâmico. É este mesmo processo dinâmico o que força a projetos etnográficos flexíveis durante todo o processo de investigação. Se dinâmica é a totalidade, dinâmico o caso, e, em consequência, é imprevisivelmente cambiante para o pesquisador, mas que haverá de prever, no planejamento e no projeto, as imprevisíveis variações.

Exigência que se agrava duplamente quando se entende que o mundo, em seu processo dinâmico, é não determinista. Na melhor das hipóteses de pesquisa se poderá conhecer aprioristicamente as possibilidades de ocorrência de um fenômeno, mas sempre serão resultados complexos impossíveis de predizer porque a causalidade não é linear, existem sempre uma multicausalidade no mundo e, portanto, nos fenômenos que acontecem.

As formas particulares que geram, dinamicamente, consecutivas e novas formas são necessariamente morfogenéticas. Um processo morfogenético implica por sua vez diversidade, abertura, complexidade, causalidade mútua e indeterminação, como mencionado acima.

O risco, limitação dos pressupostos positivista, vantagem para um conhecimento científico emergente, esta em que, como ingrediente final, tal conhecimento depende da perspectiva adoptada: de acordo com o ponto de observação, obtemos uma panorâmica diferente; de acordo com o referente, um entendimento diferente. Em qualquer caso, vários projetos etnográficos devem abarcar – e assim será – tal variedade e variação de pontos de observação que, através do contraste de perspectivas e a complementaridade multirreferencial, refletem a complexidade do fenômeno. Como repete Miguélez Martínez (1997, capítulo 8) referindo-se a pesquisa etnográfica: "Precisamos estender o conceito de ciência e também de sua lógica, até compreender tudo o que nossa mente alcança através de um procedimento rigoroso, sistemático e crítico, e que, por sua vez, está ciente dos postulados que assume". E, muito a seu pesar, assumindo um último postulado, porque sempre seguirá sendo, no melhor dos casos e felizmente, um reflexo.

A concepção emergente na visão do mundo que marca os pressupostos paradigmáticos do que é possível por sua vez derivar em seu conjunto os projetos emergentes62 de pesquisa faz referencia às recuperadas, de modo operacional, novamente por Lozano (1993, 416) "crenças básicas"63 e que, se de eficiência se trata, é necessário entender como a mentalidade do pesquisador subjacente nos pressupostos ontológicos, epistemológicos e axiológicos iniciais, trata-se do tipo de pesquisa que seja. De entre as "crenças básicas" próximas à emergência (Lincoln e Guba, 1985) e as implicações para a pesquisa etnográfica, tenho que resumir: 1) A natureza da realidade é diversa, complexa, aberta, indeterminada e multicausal, ou seja, não única, múltipla e, portanto – dado seu caráter morfogenético em termos de sua construção – não susceptível de predição. Tal realidade implica a necessidade de uma abordagem holística. É verdade que tal "necessidade holística" em nenhum caso estará totalmente satisfeita dada a complexidade e a dinâmica sistêmica das situações sociais multifacetadas que reduzem nossa

62 Refiro-me à tipologia estabelecida no segundo capítulo.63 Lozano esclarece e distingue com habilidade o termo inicial do axioma (Lincoln e Guba, 1985) da expressão mais relevante em castelhano, "crença básica", "que é arbitrário e não evidentemente verdade por si mesma" (ibid., 416).

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pesquisa a "sempre inacabada" e "aproximações sucessivas” 64, não menos verdadeiros resultados salientar que certos objetos de pesquisa – incluindo a nossa – unicamente são suscetíveis de descrição e interpretação de pontos de observação que favorecem a possibilidade de abarcar pelo menos parte da complexidade dos fenômenos. 2) A relação entre aqueles que conhece e o conhecido, ou se quiser, a relação entre sujeito e objeto é absolutamente interativa e inseparável. Fórmula que deixa claro um conhecimento sempre subjetivo em princípio e, se o projeto estiver correto, permitirá um conhecimento intersubjetivo, problema metodológico não resolvido, mas capital em pesquisa social e educacional. 3) Não existe possibilidade de generalizações universais, mas se deve pretender realizar aproximações idiográficas que iluminem casos individuais através da generalização sucessiva de hipóteses de trabalho. Ao optar pelo "estudo de caso" como estratégia de pesquisa em alguns projetos de investigação, complementada com a "história de casos" (Walford, 2001) que facilitam a iluminação, por esclarecimento, de posteriores casos individuais. 4) Os nexos causais nunca são lineares, mas múltiplos e recíprocos: "Todas as entidades estão em um estado de configuração mútua e simultânea, portanto, é impossível distinguir as causas dos efeitos". E, o que é mais restritivo em pesquisa social e educacional, a obrigação de problematizar a própria unidade de estudo. A contextualização permite que você limite a um estudo de sala de aula para a sala de aula como um quadro de referência, ao centro, ao bairro, ao setor, à localidade, à comarca, à região, à nação, aos estados, etc. Onde termina o contexto referido e de referência sem ter que desembocar em uma abordagem macro? 5) A investigação não esta isenta de valores, mas está impregnada com eles em vários aspectos (escolha do objeto de estudo; do paradigma que norteia este estudo; da teoria que orientará a coleta de dados, no próprio contexto com seus valores inerentes a ele). A relação tem continuidade com uma ressalva, a pesquisa pode estar livre de valores a priori, o pesquisador de jeito nenhum65.

Lincoln e Guba (1985, 39-43) repetem, finalmente, as consequências metodológicas: 1) Contextos naturais: as realidades são globais e não pode ser entendidas fora do contexto (natural) em que se dão. 2) Utilização de instrumentos humanos como fontes primárias de coleta de dados, com base na importância do relacionamento interativo que se estabelece entre sujeito e objeto. 3) A utilização do conhecimento tácito, intuitivo, não só do explícito e observável por meio de símbolos expressivos convencionais. A própria interação sujeito-objeto faz com que as distinções mais sutis escapem à expressão, ou que apenas intuitivamente cheguem a apreciar as diferenças entre as várias realidades. 4) Uso [Preferencial, que não excludente] de métodos qualitativos, por oferecer maior flexibilidade e capacidade de adaptação às realidades múltiplas e aso processos interativos. 5) Amostragem intencional, teórica, não aleatória, mas "natural", não buscando a representatividade de forma aleatória, já que não se pretende a generalização, mas o estudo de caso, interessando a geração de teoria que afete e interesse às condições contextuais. 6) Análise indutiva dos dados, que possa permitir capturar as interações que ocorram dentro das realidades múltiplas mutuamente construídas, ao mesmo tempo que permite tornar mais explícita a interação investigador-objeto (ou sujeito respondente). 7) Teoria emergente ou baseada e fundamentada em dados. Não se trata de verificar uma teoria prévia, mas de gerá-la em consequência da necessidade de 64 Questão esta já exposta, de pressupostos diferentes obviamente, por Bertalanffy (1980, 1986).65 Refiro-me a seção correspondente ao "contraponto metodológico". Em nosso ambiente, Colás e Buendia (1990, 250 e ss) detalham o impacto destes pressupostos para a metodologia qualitativa.

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contextualização e de apreender o valores contextuais66. 8) Projeto emergente, em vez de construído previamente com uma estrutura que enrijeça os dados e a geração de teoria. Mesmo que se possa admitir um esboço de projeto preliminar, deve ser flexível o suficiente para acomodar as alterações emergentes que possam ir impondo a interação entre o pesquisador e o fenômeno, ou os próprios processos de interação dentro do contexto no qual o fenômeno ocorre, nunca predizíeis de antemão67. 9) Resultados/produtos negociados, ou melhor, negociação dos significados e interpretações que o pesquisador realizou, tendo em conta que a relação entre o conhecedor (pesquisador) e o que é conhecido (fenômeno) não é simples, mas interativa e dialética, e com referentes axiológicos diferente daqueles envolvidos no fenômeno (incluindo o pesquisador). Este sentido de negociação pode ficar circunscrito ao contraste por meio da triangulação de métodos, perspectivas, fontes e teorias. 10) Utilização do estudo de caso como uma forma de apresentação do relatório68, já que se adapta mais à descrição das realidades múltiplas que ocorrem em um determinado contexto e permite um processo reflexivo o que pode determinar a interação dos valores do pesquisador com o contexto. 11) Interpretação idiográfica e não nomotética: se os dados são extraídos em um contexto, a interpretação desses dados deve ser referida a esse contexto, uma vez que a interpretação de um fenômeno não tem de ser válido em qualquer contexto. 12) Aplicação aproximativa/tentativa dos achados, sobre a todos outros lugares e situações, enquanto que estes, com certeza, serão diferentes. Não se está projetando a generalização, mas a transmissibilidade69 a outros contextos semelhantes. 13) Limites da pesquisa delimitada pelo próprio contexto, o próprio fenômeno, as interações envolvidas e a interação com o investigador, sempre de uma forma não fechada, mas "emergente", de maneira que durante o próprio processo se possa incluir aspectos relevantes que surjam ou eliminar os não relevantes. 14) Definição especial de critérios para a confiabilidade70. Parece conveniente não usar os critérios, comuns na lógica estatística, que buscam a validade interna e externa, a fiabilidade e objetividade. Mas sim deverá estruturar outro tipo de critérios com outras regras de aplicação para demonstrar a confiabilidade.

A clareza das características anteriores isenta-nos de quaisquer outros comentários explicativos e lança dúvidas sobre a aparente força da oposição paradigmática oferecendo fórmulas eficazes para a tão esperada estruturação metodológica. Ao mesmo tempo, estas considerações não têm a permissão de outras disciplinas (da antropologia como um exemplo extremamente paradoxal)71 .

66 Ter em conta a discussão Woods vs. Hammersley sobre este ponto, que explicarei no último capítulo.67 Esta questão fundamenta a classificação entre projetos apriorísticos e emergentes proposta no segundo capítulo.68 Considerar a nossa proposta como "estratégia de pesquisa" e não "forma de apresentação do relatório" (Sabiron, 1990).69 A questão da "transmissibilidade" é problemática e não resolvida nas formulações de Guba às que se refere Lozano. No nosso caso, se entende a "transferência" de etnografia descritiva limitada ao máximo às questões procedimentais e processuais da pesquisa, não aos resultados.70 Nova reiteração do observado na nota anterior: a "confiabilidade", a "credibilidade" são critérios para explicitar – e, portanto, para explicar - no desenho e no projeto de pesquisa etnográfica.71 Continuarei com esta ardorosa disputa disciplinar no último capítulo.

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1.1.3. A pluralidade axiomática em programas de pesquisa

Os programas de pesquisa

A seção final da fundamentação epistemológica é dedicada a um novo questionamento, um novo ensaio de desconstrução-reconstrução, mas agora, favorecendo a metodologia. Desta vez, com um novo pretexto epistemológico, a recuperação dos inicialmente formulado por I. Lakatos, "programas de pesquisa científicas", apresentados e enriquecidos, em uma de suas variantes mais recentes, pelo inteligente epistemólogo J.M. Berthelot. Do historicismo kuhniano mantém o valor da "cosmovisão" do pesquisador social, solitário ou em grupo; da complexidade, a "emergência" de seus desenhos e projetos, mas, mantendo os princípios, se impõe a dissecação da engrenagem que articula, em tal pluralidade, a unidade do rigor do método científico em quaisquer de suas variantes72.

A aceleração, aparente ou real, das diferentes parcelas da nossa civilização também afeta igualmente à teorização científica; o não menos determinante crescimento desenfreado da circulação de informações, meritória e porcaria, através das redes telemáticas e os bancos de dados; o culto em direção ao inovador, etc – entre outras inacabadas razões – fazem recuperar atualmente a base de partida de Lakatos: "Entanto enquanto uma teoria científica tem algo a seu favor, não convém elimíná-la, especialmente se não temos outra teoria melhor que a substitua". É necessário conceder à teorização um momento de sossego, que lhe permita enfrentar suas próprias anomalias antes de renunciar as suas explicações. A teorização é o conjunto de teorias relacionadas, que não a soma de teorias isoladas, geradas e modificadas em seus desenvolvimentos, mantidas em alguns dos seus princípios. A estes "conjunto de teorias" relacionadas os denomina Lakatos “programas científicos de pesquisa”. É substantiva no sentido dos "programas de pesquisa" a sequência, a dimensão temporal: "As principais críticas são sempre construtivas; Não há refutações sem uma teoria melhor. Kuhn erra ao pensar que as revoluções científicas são uma mudança repentina e irracional de ponto de vista. A história da ciência nega tanto a Popper como a Kuhn; quando são examinados de perto, verifica-se que tanto os experimentos cruciais popperianos como as revoluções de Kuhn são mitos; o que acontece normalmente é que os programas de pesquisa progressivos substituem aos regressivos"(Lakatos, 1998, 16).

"Diz-se que um programa de pesquisa progride enquanto acontece que seu crescimento teórico antecipa seu crescimento empírico; ou seja, enquanto continuar predizendo fatos novos, com algum sucesso ('mudança progressiva de problemática'); um programa está paralisado se seu crescimento teórico se atrasa em relação ao crescimento empírico; ou seja, se apenas oferece explicações post hoc de descobertas casuais ou de fatos antecipados e descobertos no seio de um programa rival (‘mudança regressivo de problemática’) "(ibidem, 146)." Apesar das diferenças na interpretação do tempo, apesar de seus próprios autores, as 72 Estamos de volta, para mais uma tentativa, diante da necessidade do "diálogo entre paradigmas" preconizado, por fechar o círculo expositivo aberto nos parágrafos anteriores por Guba e Lincoln nas conclusões da Conferência de São Francisco, realizada em 1989, e reunidas nas atas do The Paradigm Dialog.

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semelhanças entre "paradigma" e "programa de pesquisa" persistem. Um “programa de pesquisa" é composto por três elementos essenciais: o "centro firme", a "heurística" e o "cinturão protetor de hipóteses auxiliares". Trata-se de três círculos concêntricos, o núcleo central, protegidos contra a falsificação pela "heurística negativa", que impede abandonar os componentes do núcleo à mínima anomalia; e a "heurística positiva", que permite o progressivo explicativo do núcleo central (ibidem, 13). Mas podem ser assimiláveis esses componentes em um “programa de pesquisa" aplicado a um fenômeno protagonizado por pessoas; ou seja, social, cultural, educacional, etc.? acaso dispomos em Ciências Sociais de algum tipo de engrenagem análoga ao "núcleo forte" e, consequentemente, de um "cinturão protetor" e um último mecanismo de acionamento de progresso? Seria realmente desejável? Podemos persistir na obsessão pela previsibilidade sem reificar os fenômenos da compreensão? Os "esquemas de inteligibilidade" analisados por Berthelot ("esquemas para compreender, linguagens para explicar e disciplinas para interpretar") podem oferecer alguma pista alternativa agradecida. Se assim, as orientações derivadas constituiriam um dos eixos motores dos métodos de pesquisa em Ciências Sociais. Esta opção é, claro está, questionável. Em rigor, os "programas de pesquisa" tem um significado muito diferente ao que aqui lhes atribuem (Shulman, 1989). No entanto, os pensadores opostos, e próximos, são igualmente atribuíveis, Bourdieu é um dos representantes mais importantes, como pode ver – por coroar um único trabalho (Bourdieu e Wacquant, 1992) nas "respostas" que dá a Wacquant 73 em uma entrevista já clássica na literatura epistemológica.

Esquemas de inteligibilidade no campo cientifico-sociais

Na substância do grau de cientificidade das Ciências Sociais e, consequentemente, no grau de cientificidade da pesquisa em nossa área, exibe, enterrado ou evidenciado de maneira ostentosa, um conjunto de razões e interesses que reduzem, e utilizam, a epistemologia a um debate político, dada a simplificação aplicada a um argumento nulo, desprovida de ideias próprias, mas que prevalece a permanência, in aeternum[eternamente, para sempre], no poder. São as discussões marcadas pela primazia de posições extremas, tudo ou nada, da explicação objetiva ou a interpretação subjetiva. Uma avaliação da epistemologia, na luz das contribuições lakatosianas, nos traz, por outro lado, um estado da questão mais rigoroso e, ao mesmo tempo, mais flexível. No conhecimento disponível, tem de ser considerada a dialética histórica que, em cada disciplina, tem adquirido diferentes racionalidades. O sentido da razão – os modelos de razão instrumental, comunicativa e crítica, nos nossos casos - são devedores parciais desta evolução. Ao uníssono e com uma força não menos decisória, nos acompanha uma busca do conhecimento que nos permita explicar e entender, naturalmente, mas ao mesmo tempo ser capaz de reduzir, qual sistema, a angústia existencial que nos produz a incapacidade de predizer o futuro em nosso campo, ou a impossibilidade de intervir com garantias sobre o presente. Quando a teoria da complexidade demonstra e defende a "não causalidade" dos nossos fenômenos educacionais, culturais e sociais, nos remete a um estado

73 Ultrapassa a questão que nos preocupa, já suficientemente árida em si mesma para incluir discussões paroquiais, mas eu não posso continuar sem, pelo menos, se referir a esse controverso discípulo de Bourdieu que, em uma de suas últimas publicações, parece redescobrir a história da Escola de Chicago em seu acesso ao campo através dos boxeadores.

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de desamparo ancestral. A "multirreferencialidade" acaba sendo, quando se operacionaliza, um propósito saudável, uma promessa metodológica, mas com "dúvidas" que excedem a saudável atitude científica. Seu efeito retroativo sobre os conhecimentos disponíveis até o momento não é menos doloso. Nesta tessitura, as opções tem sido várias, é bem conhecido: agarramento às posições antagônicas, a defesa do ecletismo que se apropria do melhor de cada posição, ou a complementaridade de perspectivas, mantendo, em cada caso, a "cosmovisão" que nos permitira compreender cada saber produzido através de pesquisas, dos referentes explicativos pertinentes. Adicione, por último, o aparente vazio de "programas de pesquisa", mesmo em sentido frouxo, em nosso campo.

Em vista – nas entrelinhas – destas e outras razões, Berthelot (1990, 1998) propõe a sequência de "esquemas de inteligibilidade" disponíveis até o momento. Sua pretensão é, e assim o indica, de "mero inventário", que, pelo menos, disponhamos do leque de possibilidades afirma; mas "mero inventário" - que por outro lado, supera o estudioso - nos aspira valiosos, uma vez que permitirá dar corpo à docência e facilita na fundamentação científica da pesquisa uma prova para os métodos de pesquisa da racionalidade implícita em cada de aproximação, argumentos, entre outros, justificando a extensão expositiva. Dispor, em todo caso, da tipologia do disponível é um primeiro passo necessário no reforço dos métodos de investigação em Ciências Sociais, ao mesmo tempo que explicita de outro referente epistemológico a posição dos métodos etnográficos. A contribuição de síntese de Berthelot dos diferentes "esquemas de inteligibilidade" (científica) da realidade é, portanto, de agradecer. Um "esquema de inteligibilidade"74 "é uma matriz de operações que permitem registrar um conjunto de fatos em um sistema de compreensão, ou seja, de dar razão ou fornecer uma explicação (em um sentido não restritivo)" (Berthelot, 1990, 23). A exigência da "não restrição" é duvidosa porque, em verdade, cada esquema implica uma redução apriorística para a concepção inerente da “cosmovisão" da que se parte. Mas, antes da discussão, expõem-se, com certa extensão e detalhamento, os diferentes "esquemas" para uso (Berthelot, 1990, 62-85, 88-91; 1996, 262-263)75. Uma última razão: Berthelot (2001) opta, e assim o expressa, pelos "programas de pesquisa" de Lakatos, frente ao relativismo historicista kuhniano e o consequente conceito e sentido de “paradigma”. É um contraponto necessário76.

A sequência de esquemas

1 Esquema causal

X = f (x1, x2, x3,..., xn ))

O objeto de conhecimento (X) se explica e é inteligível a partir das correlações entre variáveis (x).

74 Se a tradução não é agradável, substitua-se por "esquema de compreensão" e "esquema explicativo".75 Visto a síntese gráfica na figura n º 13.76 Quero deixar explícito meu agradecimento ao professor Jean-Michel Berthelot ( in memoriam) não só pelas contribuições epistemológicas reconhecidas, mas por valores e avaliações pessoais que sempre compartilhou. Seu rigor analítico, bem como uma "cosmovisão" não necessariamente semelhante à pesquisa etnográfica, constituem um teste básico à que submeter os métodos etnográficos.

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Tem sido o esquema de uso mais comum tanto nas Ciências Naturais como nas Sociais. Trata-se de esquemas que remetem à explicação a partir de um modelo de relações matematizadas (programas nomotéticos), ou a explicações de causalidade, de relações de causa/efeito, em que a correspondência estrutural entre os sistemas manifesta a prova da existência de uma relação de determinação causal de uma variável sobre outra (programa de causalidade estrutural).

Os exemplos são infinitos porque grande parte da produção científica, tem se dedicado em estabelecer relações causais, isoladas, integradas em estruturas, ou generalizada, ou bem nas últimas décadas, tem se ocupado em dar com demonstrações de relações previamente estabelecidas e integradas de modelos teóricos explicativos já conhecidos. Os esquemas causais supõem uma concepção determinista da realidade, de efeitos predizíveis, conhecidas as causas e limitante da complexidade ao somatório e intersecções que podem ser estabelecidas nas relações causais estabelecidos e explicadas ou por estabelecer e explicar. Aplicado a fenômenos sociológicos, os programas de pesquisa decorrentes dos esquemas causais tem desembocado em explicações excessivamente triviais. Considerados desde a investigação cientifico-social e educativa, os resultados não se mostram menos questionáveis, embora historicamente a contribuição racional que trazem consigo é digna de consideração. Em todo caso, seguem representando uma ciência-ideal, em princípio, que deu motivo e permitiu predizer, com garantias, os efeitos associados a causas determinadas, quando efeitos e causas estiveram relacionados em fenômenos dignos de explicação científica pela transcendência que teveram sobre as pessoas.

Os métodos de pesquisa etnográfica desconsideram este tipo de esquema, não porque neguem a existência de concatenações causa-efeito na concretização fenomênica, mas porque a explicação ou, menos ainda, uma mínima compreensão do fato não se vem favorecidas pelo reducionismo que supõem as associações causais. Em fenômenos sociais, culturais e educacionais a mais elementar relação de causa-efeito virá sempre associada a múltiplas causas sobre um hipotético efeito e vice-versa.

2. Esquema funcional

O objeto do conhecimento (X) se explica e resulta inteligível a partir da função que desempenha no conjunto de um sistema (S).

O esquema funcional parte, de certo modo, de uma concepção organicista, mutatis mutandis [feitas algumas alterações], dos fenômenos sociológicos, culturais, psicológicos ou educacionais. Do relacionamento primordial estabelecido entre cada "unidade" e sua função no conjunto do organismo extrapola a mais elaborada e avançada introdução do princípio explicativo da diversidade funcional de uma instituição, de um ato,de um fenómeno específico e de seus elementos integrantes. O problema interno, no entanto, persiste em sua tautologia: a explicação da complexidade dessa mesma plurifuncionalidade. São todos os programas de pesquisa de análise funcional. Em seu desenvolvimento histórico os programas de pesquisa

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empreendidos a partir deste tipo de esquemas tendem a liberar o máximo de elementos explicativos de uma estrita atribuição funcional, mas que termina em um ponto limite em que um mesmo efeito tem de ser explicado por esquemas de inteligibilidade diferentes.

Particular detalhamento analítico merece, para Berthelot, pela sua disparidade e modernidade, o segundo tipo de programas de aplicações dos esquemas funcionalistas, a "análise de sistemas", porque eles são usados principalmente em pesquisa-ação, em que o primeiro objetivo não é tanto o conhecimento da situação quanto a sua transformação e, ao mesmo tempo, porque sua aparente77 neutralidade teórica e disciplinar, bem como a eficácia das técnicas que promove, o fazem parecer, para alguns, como ferramenta para a integração de diferentes perspectivas. Neutralidade e integração são falsas: sempre, um desenvolvimento e generalização do esquema funcional (modelos Cibernéticos incluídos, Colom, 1982).

Efetivamente, aplicado a fenômenos educativos, organizacionais, institucionais, económicos, culturais ou sociais e psicológicos, se prefere, tem gerado um tipo de explicação que, com aparência neutra e igualitária, favorece a legitimidade do tomada de decisões e políticas sociais altamente discriminatórias. É o caso, por exemplo, os relatórios da UNESCO sobre a situação educacional das diferentes regiões, ou a tecnologia refinada de intervenção sobre os recursos humanos de uma determinada organização, de que a orientação educacional pode ser de boa-fé. No entanto, apesar dos desvios que reduzem a explicação do esquema funcional a um simples enfoque sistêmico abordagem de aplicação, têm sido substanciais no desenvolvimento do conhecimento, explicações, hoje questionáveis, mas célebres em seu momento, dos clássicos funcionalistas (Parsons, por exemplo). Convém referir também o potencial interno destes esquemas que – é um parecer contrastado à luz dos resultados – não foi suficientemente desenvolvido. Os esquemas funcionalistas não são, de todo, esgotados nas relevantes explicações que podem fornecer aos fenômenos educacionais. Na verdade, certas formas de pesquisa, como é o caso da investigação avaliativa, estão recuperando, através do desenvolvimento de "sistemas de indicadores" cada vez mais adequados à eterna função de controle sistêmico, o auge destes esquemas.

A inclusão de determinadas modalidades de pesquisa-ação sob este esquema funcional permitiria aproximar as fases descritivas da pesquisa etnográfica a este tipo de esquema. No entanto, essa possibilidade é inexistente. Trata-se de esquemas mesmo opostos à modalidade de uma etnografia crítica. A cosmovisão, a posição inicial é adaptativa do elemento para a função e, consequentemente, permite detectar disfunções, isto é, desajustes dos elementos para a função ou da função para a estrutura, mas onde sempre fica atenuado o elemento a favor da função. Na verdade, para razões similares é a pesquisa avaliativa que recupera, em nosso campo sociocultural e educacional, critérios avaliativos pragmáticos, de ajustes eficazes e otimizados, instrumentalizando (razão instrumental) o sujeito em prol da função que corresponde desempenhar.

3. Esquema estrutural

77 Enfatizo aqui o aparente.

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O objeto de conhecimento (X) se explica e resulta inteligível por sua inserção em um sistema (S) que funciona sobre uma relação disjuntiva e excludente em consequência, entre (α v ᾱ).

Este esquema alcança, em sua evolução, uma arquitetura formal do sentido, uma "estrutura" do sentido. Limitando sua aplicação mais recente às Ciências Sociais, sugere uma consideração dos objetos de conhecimento como se fossem mensagens ou significados — inclusive mesmo que eles não sejam diretamente, é necessário entendê-los como se fossem – e dar razão para eles a partir da estrutura obtida pela análise. O esquema estrutural se divide em dois programas de pesquisa a serem considerados: o primeiro deles, próximo a uma vertente combinatória, a modo de bricolagem, ao objeto de pesquisa; o segundo, com maior potencial explicativo em princípio, para o estabelecimento de isomorfismos e analogias estruturais. Se bem que se chega a uma explicação de significados em termos de estruturas implicada, no conseguem, pelo contrário, a compreensão e consequente explicação das evidências da implementação em evidência do sentido. Na conjunção significado/sentido, interseccionam igualmente esquema estrutural e esquema hermenêutico.

A produção devedora destes esquemas e os programas a que tem dado origem é, sem dúvida, considerável. No entanto, para a vista do resultado da intersecção, é preferível em pesquisas optar diretamente pelos esquemas hermenêuticos e recorrer ao complemento dos esquemas estruturais. Esta é a posição que manter os métodos de pesquisa etnográfica.

4. Esquema hermenêutico

X Є S,S (Se/So)

O objeto de conhecimento (X) se explica e resulta inteligível por sua inserção em um sistema

(S) que que funciona sobre uma relação entre o significante e o significado (Se/So)78.

O programa hermenêutico fundamental aparece assim claramente definido: é a relação significante/significado. No entanto, há uma maior dificuldade de exposição nos subprogramas correspondentes: a hermenêutica tradicional, juntamente com a fenomenologia, a psicanálise, o marxismo crítico, o marxismo hegeliano, etc., que se distinguem e diferenciam não tanto

pelo princípio (Se/So), mas devido as diferentes perspectivas e as posições opostas na interpretação que propõem nas concepções diferentes da fundamentação do sentido. O esquema hermenêutico introduz na evolução científica um modo de razão comunicativa sob o imperativo interpretativo, frente à instrumental e eficientista vigentes nos esquemas anteriores.

5. Esquema do ato

78 Dos vários precedentes, escolas ou derivações à que este esquema tem dado origem historicamente, gostaria de destacar, na formulação assinalada, Ferdinand de Saussure.

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O objeto de conhecimento (X) se explica e resulta inteligível porque (X) é a soma de eventos (∑ e), resultante da ação de um conjunto de atores (∑ a) inscritos em uma situação ou um sistema determinado (S)79.

É, primeiro, o reconhecimento e, por fim, a pretensão de explicação científica da intencionalidade da ação e, consequentemente, a irredutibilidade da ação a uma determinação causal. A dualidade [ação + intenção] – transformada em nosso caso em [ação ƒ significado] - é susceptível de aplicação tanto ao individuo como às entidades coletivas e às próprias organizações, instituições e fenômenos socioeducativos. Da concepção intencional do ato em Weber, ao desenvolvimento do esquema do ato, a contribuição benéfica para a fundamentação epistemológica dos métodos de pesquisa etnográfica é considerável (como pode ser facilmente deduzido da Figura 12). Na verdade, e a eles me refiro, as teorias fundamentantes da pesquisa etnográfica (Interacionismo simbólico e Etnometodologia, principalmente) têm neste esquema sua representação. Ao mesmo tempo, a intencionalidade também se contextualiza na situação, e desta no ato, resultando igualmente a uma sustentação para os princípios fundamentantes – multirreferencialidade incluída – dos métodos de pesquisa etnográfica.

6. Esquema dialético

O objeto de conhecimento (X) se explica e resulta inteligível por sua inserção em um sistema (S) regido por uma contradição interna (α v ᾱ).

Um fenômeno (X), explicado pelo esquema dialético é o resultado de um sistema contraditório. Ou seja, de um sistema definido pela existência de dois termos, ao mesmo

79 Idêntica dívida, reconhecimento e genialidade para Max Weber, em particular, em seu tratado Economia e Sociedade.

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tempo, indissociáveis e opostos que constituem a contradição. Este esquema se manifesta facilmente – é um hábito – em oposições do tipo de vida e morte, por exemplo, mas pode dar lugar a programas e explicações contraditórias mais férteis e complexas nos termos hegelianos do tipo tese-antítese. Os métodos de pesquisa etnográfica têm nos esquemas dialéticos o segundo amparo80. É, na verdade, o esquema que fundamenta a compreensão (ao contrário da explicação), ao dar a palavra protagonista aos atores que interatuam em um determinado fenômeno.

7. Esquema complexo

O objeto de conhecimento (X) resulta compreensível se for considerado sob a multirreferencialidade de diferentes níveis de realidade (NR) regidos pela triangulação entre (α v ᾱ) e um terceiro elemento (t) que supera a contradição aparente.

Trata-se de um esquema que, se bem que J.M. Berthelot não o contempla, a fundamentação anterior aprova, com suficiência, sua inclusão81. Na verdade, supõe esse tipo de esquemas, de uma parte, a continuidade e superação da contradição dialética; de outra, a evolução afortunada na sinergia cientifico-social. Em pesquisa cientifico-social e educativa, recupera força e potencial ao dispor, como será exposto nas bases metodológicas, de ferramentas de informática que permitem a aplicação de modelos de simulação. Mas na pesquisa etnográfica – e os capítulos anteriores dão razão – se adscreve plenamente neste esquema complexo.

A articulação de linguagens

Genericamente, se B designa um estado de coisas, uma classe de fenômenos ou acontecimentos, o objeto de pesquisa que se pretende explicar - no nosso caso, o entendendo a explicação como compreensão, e a aplicação ao campo cientifico-social e educacional em melhoria – a explicação-compreensão equivale a relacionar B com uma entidade A, de modo que A explique B (B = ƒ [A]). Cada esquema de inteligibilidade exposto se distingue pela especificidade da relação estabelecida entre A e B. Esta relação é, em cada esquema, não somente irredutível na forma, mas induz uma determinação particular de A e, consequentemente, um tratamento diferente de B, questão esta tratada nos parágrafos anteriores. Se considerar o núcleo explicativo de cada esquema e o tipo de relação genérica que estabelece (Figura 13, colunas 2 e 3), fica evidenciado que cada esquema define um tipo

80 Refiro-me novamente às teorias fundamentantes da pesquisa etnográfica. Para concluir com os esquemas de inteligibilidade de Berthelot, pelo menos tem que citar Loubet (1991, 210-215), que também introduziu entre os “métodos das Ciências Sociais” a capacidade de teorização dos esquemas por ele enunciados de “análise diacrônica ou genética”, "análise funcionalista", "análise estrutural", "análise sistêmica" e, vê-se, "análise dialética".81 Não é viável uma maior fundamentação repetida sobre Complexidade e Caos. Refiro-me ao exposto nos capítulos anteriores.

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de compreensão do objeto que o é próprio. Cada esquema de inteligibilidade é, neste sentido, portador de um modo de compreensão irredutível.

Esquema Núcleo lógico Relação genérica Determinação de A e B

1. Causal B = ƒ (A) Variação simultânea 1) exterioridade2) A e B são duas variáveis

2. Funcional B Є S , S → B → S Interação física (→ retroação)

1) inclusão de B em A2) A é um sistema físico (S)

3. EstruturalB Є S {a ó no a}

disjunção1) inclusão de B em A2) A é um sistema de signos,um código (S)

4. Hermenêutico

B Є S(B/A) expressão

1) exterioridade física e unidade semântica de A & B2) inclusão de B /A em umsistema simbólico (S)

5. Do Ato B Є S , S {∑ a → ∑ e} intencionalidade 1) B é uma resultante de A2) A é um sistema de ação (S)

6. Dialético A = {a & no a} → B contradição dialética

1) B é uma resultante de A2) A é um processo

7. Complexo A = {a & no a, en t} → B

construção por níveis de realidade

1) B é um fenômeno construído2) A é uma situação caótica

Figura 13: "esquemas de inteligibilidade" pesquisa cientifico-social e educacional (baseado em Berthelot, 1990)

No entanto, as fórmulas e a determinação das entidades A e B traduzem semelhanças e isomorfismos parciais que se manifestam, por exemplo, na reincidência do termo sistema (S), se bem que (S) designa cada vez, e em cada caso, algo diferente, ao mesmo tempo que parece permitir o desenvolvimento de certa continuidade entre um esquema e outro. Por exemplo: em quatro casos (esquemas 2, 3, 4, 5) a explicação refere-se diretamente à determinação de um sistema (B Є S). Por meio da especificação dos dois esquemas restantes (1,6) podem referir igualmente a uma determinação de um sistema. Nos esquemas (5, 6) o fenômeno é explicado como resultado (→ B), e esta mesma relação, segundo o qual um fenômeno é o resultado de um mecanismo determinado (trata-se de um sistema de ação ou de um processo), é facilmente recuperável de maneira parcial no esquema funcional e facilmente traduzível a causalidade (Berthelot, 1990, 102-103). Os esquemas se manifestariam, aparentemente e com um novo argumento, irredutíveis em si e, ao mesmo tempo, complementários entre si. Paradoxos recuperados da teoria da Complexidade que, por sua vez, torna operacional a multirreferencialidade do último esquema complexo (7), em cuja essência inclusiva – transdisciplinar - não nega o resto das aproximações.

A exposição dos esquemas de inteligibilidade é meridiana em seu argumento. No entanto, a continuidade entre esquemas é, se me permite, mais discutível por duas razões principais afetam a pesquisa etnográfica:

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A referida resistência ao “sistema” é estritamente terminológica mas em absoluto conceitual. Designa-se com a mesma palavra um sistema funcional, um sistema de significados ou uma realidade complexa. Agora, a explicação é diruptiva entre uns e outras e defender o contrário iria nos aproximar para um novo nominalismo.

A extrapolação de uma resultante, ou até mesmo determinante, é viável em termos matematizados. No entanto, a explicação, mesmo a razão da resultante é, como no caso anterior, diametralmente oposta, de acordo com cada um dos esquemas de inteligibilidade (comparar os esquemas 1 e 7).

Uma terceira razão que o próprio Berthelot oferece quando ele justifica a confusão na alardeada aplicação de um único esquema de inteligibilidade em uma pesquisa dada: se o social é complexo, e o é, e a explicação, quando menos, deve considerar a inter-relação – interdisciplinar – das dimensões fundamentais, a continuidade nos esquemas tem impedido o progresso, ou seja, o desenvolvimento, a evolução explicativa de um primeiro momento histórico causal, para a complexidade inicialmente dos esquemas finais. A continuidade é, em qualquer caso, diacrônica, mas não síncrona. Em termos dialéticos conviria recuperar a disjuntiva continuidade/ruptura na tensão entre a continuidade analítica e a ruptura explicativa. O planejamento de um processo de investigação em fases diferenciadas de descrição estatística, descrição densa, interpretação, etc., pode permitir a combinação de diferentes “esquemas de inteligibilidade” na análise dos diferentes dados recolhidos e que são de distinta natureza, mas sem resolver – e talvez não se trate de resolvê-lo, mas de explicá-lo e compreendê-lo - uma ruptura explicativa. Da análise, da interpretação, propõem-se explicações diferentes, que são válidas em princípio, sempre e quando se definam e esclareçam ao definir e vida – como se indicava em outros capítulos – as posições de partida ("cosmovisão"), do pesquisador, da equipe de pesquisa e da comunidade científica a qual pertence. Mas fica um último elemento constitutivo e não menos problemático, a linguagem.

R.... {d (s) → d (t) → d (e)}

Uma determinada realidade (R) é apreensível em três níveis sucessivos de elaboração de dados ou de construção dos fatos (d): na seleção ou coleta da informação [d (s)]; no tratamento da informação obtida [d (t)]; e na exposição, sob a forma de fatos ou proposições [d (e)]. A posição contínua entre os diferentes "esquemas" está na fórmula (ibidem, 114):

S ... T → {p} ≈ {e} ← {d (e)}, {d (t)}, {d (s)} ... R

Se os dados referem-se a uma realidade (R) enquanto são informações sobre essa realidade, e se a construção teórica (T) depende do esquema explicativo (S) enquanto a teoria se encaixa nesse modo de inteligibilidade, o trabalho explicativo não se deduz, nem de um nem do outro, mas é construído sobre a interseção entre os dois domínios. A consequência decisiva é a possibilidade de articulação e transferência, na pesquisa, entre dados heterogêneos e entre diferentes tipos de linguagem. Por exemplo, os dados obtidos a partir do tratamento estatístico das respostas a um questionário podem ser integrados em uma explicação do ato, na que se trata de ler as tipologias produzidas não em termos de relações causais, mas como ideias-tipo (para seguir com o exemplo). E assim se produz o trânsito de "esquemas" a "paradigmas" ("analíticos", "teóricos" e "analógicos") e que supõe um severo revés para o estado da pesquisa educacional, quando volta a levantar posições encontradas para resolver

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em um modelo de razão comunicativa, em que medida uma linguagem diferente não implica significados diferentes e, por conseguinte, não implica uma distorção que converte o dado em informação fictícia? Às vezes, a aparência de cientificidade parece suficiente e convincente82. O problema aqui nos remete para a essência das Ciências de Sociais explicativas dos fenômenos sociais em discerni-los se a aparência é ou não é, ao mesmo tempo, uma questão de discurso incluso sobre o próprio ato realizado. Não só a lógica, a própria cognição (pensamento) está intrinsecamente ligada à sua expressão através da linguagem. Tudo isso em uma situação que podemos descrever como "natural". Quando cognição, pensamento e linguagem se levam a cabo sob a cobertura científica, em Ciências Sociais - presumivelmente na ciência em seu conjunto – encontra novamente as disciplinas que, ao mesmo tempo - sem reincidir nos testes – impõe suas normas e regras, bem como sua própria linguagem e discurso. O estudo dos esquemas de pesquisa imbrincados na lógica consequente talvez aporte novos avanços: como uma tese pode resultar ao mesmo tempo pertinente e válida?

1.2. O PROCESSO DE TEORIZAÇÃO NO CAMPO CIENTIFICO-SOCIAL

1.2.1 Dissonâncias no método científico83

Os referentes científicos em nosso caso dos métodos de pesquisa têm sido exemplificados em educação e tem entroncado, como não poderia resultar alguma dimensão diferente, no âmbito das Ciências Sociais gerais, privilegiando o entroncamento da educação na dimensão social, e, portanto, sociológica, da formação do indivíduo. Critério argumentativo que, nas entrelinhas ou explicitamente, tem feito balançar as denominações genéricas no sentido de uma concepção não apenas da Educação e da Pedagogia, mas – coerência expositiva requer – das Ciências da Educação, para o campo disciplinar das Ciências Sociais. É uma escolha, e como tal, suscetível de réplica, enquanto submetida a um primeiro reducionismo: a inclinação das Ciências da Educação no sentido das Ciências Sociais denota uma concepção social tão legítima como se focaliza para o indivíduo, o homem, as "ciências do homem", as ciências humanas ou mesmo a própria psicologia. O reducionismo expositivo não reflete exclusão – em absoluto – mas focalização e tomada de posição, mas carrega consequências tanto nos referentes expostos como neste segundo nível de âncora que pretende enviar o conhecimento científico às singularidades das Ciências da Educação no conjunto das Ciências Sociais. A Física e Sociologia tem sido, até agora, as duas disciplinas de condução dos referentes epistemológicos; a segunda se mantem, mas as Ciências da Educação adquirem hoje em dia o protagonismo obrigado e sentido que corresponde a elas, porque são os fenômenos educacionais, é a Educação das pessoas, como sempre foi, uma das chaves para o futuro da humanidade.

Este capítulo pode resultar, em alguns conteúdos, repetitivo. É verdade. No entanto, a repetição torna-se útil por dois motivos: por um lado, facilita a aplicação das referencias 82 Um programa de rádio ou televisão atual entrevista alguns transeuntes e extrapola umas conclusões com maior efeito sobre o estado de opinião de uma população que um rigoroso levantamento, tecnicamente perfeito, sobre o mesmo assunto.83 Exemplificarei as dissonâncias no método científico com a aplicação em pesquisa educacional, dado que os fenômenos educacionais reúnem características sociais, culturais, até mesmo econômicas e ideológicas, dignas de consideração pelo conjunto das Ciências Sociais.

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detalhadas, desde uma abreviada e enviesada filosofia da ciência, a consequências mais próximas para a pesquisa aplicada ao campo sócio educacional. Não constituem, no entanto, esta razão a justificativa última das singularidades que seguem. Pelo contrário, são devidos talvez ao detalhe de banalidades, por tópicas, mas em qualquer caso de esclarecimento adequado:

1. A condição científica da investigação de socioeducativa. É inquestionável o status científico da pesquisa socioeducativa e a consequente condição científica do conhecimento gerado. Se poderá argumentar que a educação, ao igual que deve ser visto em quantas ações o homem intervém, entrelaça componentes conhecidos pelos saberes científicos, ao mesmo tempo aspectos beirando o artístico, artesanal se quiser, vocacional se preferir84. No entanto, tais características não impedem uma abordagem, uma explicação e uma teorização construída a partir da pesquisa cientifico-social e educativa. Antes pelo contrário, resulta necessária. A didática aplicada pode utilizar conhecimento prático, a pesquisa (educativa) em didática deve seguir um idêntico rigor científico comum a todo pesquisador e estudo. É a distinção que deve ser estabelecida entre as Ciências da Educação e a pedagogia. Os métodos de investigação em Ciências Sociais são, em qualquer caso, métodos científicos de pesquisa, e se estes, enquanto métodos ao mesmo tempo que nas aplicações em projetos de pesquisa resultam científicos, toda prática de investigação no campo genérico das Ciências Sociais, que contempla fenômenos de características semelhantes aos educativos, é não menos científica. Os métodos etnográficos constituem um tipo de entre os métodos de investigação que têm o mesmo grau de cientificidade que os outros tipos, modelos, modalidades ou estilos de investigação (a terminologia é múltipla, mas o sentido da cientificidade única).

2. A fundamentação epistemológica referente e referida a uma concepção diferente da "herdada". A não questionada consideração científica da pesquisa socioeducativa remete, desde a filosofia da ciência, a uma concepção epistemológica que se inicia com o falsacionismo de Popper, tem seu principal arranque no historicismo de Kuhn e aprecia nas atuais tendências atuais para a Complexidade. As primeiras partes do texto foram dedicadas a tal fundamentação, enviesada, mas necessária. As referências às clássicas induções e deduções são mínimas e, em qualquer caso, serão consideradas através do prisma reducionista da posição epistemológica apontada. Os métodos de pesquisa em Ciências Sociais são, como pode ser visto em sua própria denominação, plurais, pluralidade inegável quando a referência seja as genéricas Ciências Sociais, Humanas e da Educação. Os métodos etnográficos comungam de tal pluralidade, mas redefinem a pluralidade na multirreferencialidade.

3. A pluralidade obedece a multirreferencialidade que carrega a complexidade fenomênica dos objetos de pesquisa. Por sua vez, tal consideração requer uma "cosmovisão" diferente, que não só remete para a perspectiva do pesquisador, mas a diversidade dos "métodos de investigação", resultando todas elas equivalentes na sua

84 Pela minha parte, entendo que a mais adequada posição, com resultado questionável, é a profissionalização e – em termos atuais – as competências profissionais e não, esse caráter artístico e vocacional que alguns círculos se empenham em manter. Naturalmente que, como em qualquer ação profissional, por habilidades humanas, entram em jogo atitudes e predisposições pessoais, mas o grosso o constitui a capacitação. Se artística é a educação, não menos artística é a engenharia rodoviária.

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condição científica. É sua a complexidade do objeto - ou o grau de complexidade conferido no estudo – que obriga a uma pluralidade, sem comprometer esta condição substantiva, uma vez que são todos eles científicos. A diversidade metodológica complica a classificação e a terminologia, certamente, mas em nenhum caso questiona a cientificidade do método, dos métodos ou das metodologias. No entanto – questão esta decisiva na fundamentação –, se diferem os, para o momento, métodos e metodologias pelo grau de desenvolvimento operacional. Podem ser visto um alto nível na pesquisa socioeducativa herdeira – novamente a harmonização se tornará necessária – da "pedagogia experimental". Pelo contrário, a pesquisa etnográfica –nova definição proposta – e a metodologia qualitativa – último componente a desenvolver – sofrem de imprecisões e desajustes entre os, genericamente entendidos, princípios metodológicos e a aplicação eficiente e instrumental. Os métodos de investigação em Ciências Sociais se apoiaram e permanecerão fundamentados nos referentes científicos, tentando partir e manter constante a inclinação na direção da posição mais desfavorecida: a pesquisa etnográfica. Da pesquisa etnográfica tem como objetivo demonstrar a cientificidade, porque, de outras posições, a pesquisa esta amplamente justificada, fundamentada, operativizada e acreditada. Nesta situação comparativa, o conjunto de investigação em Ciências Sociais deveria considerar as contribuições metodológicas da pesquisa educacional.

4. A versatilidade dos "métodos de pesquisa" não isenta, no entanto, a natureza singular dos objetos de pesquisa. Como singulares resultam o resto dos objetos de pesquisa - cada objeto é, por definição, distinto a outro, diferençável e, portanto, suscetíveis de nota das características que lhe são próprias – a pesquisa educacional, em e sobre a educação, na plenitude de suas distintas manifestações, possui características comuns. Os traços comuns que nos remetem à vista da primeira razão sobre a cientificidade da investigação das Ciências Sociais, recomenda pelo menos a exposição, a modo de relação, de algumas das singularidades da investigação educativa pela natureza do objeto de investigação. O conteúdo deste artigo destina-se a dar conta de algumas dessas singularidades, porque, em particular, a pesquisa etnográfica se desenvolve com um determinante protagonismo.

5. Nosso escopo de pesquisa não escapa, gostem ou não, a uma característica distintiva final: a pesquisa educacional é duplamente sensível ante os diferentes usos que executam da pesquisa no campo das Ciências Sociais. O primeiro, comuns em questões tais como a consideração ou desconsideração da ideologia como um componente integrante do objeto de pesquisa. Em segundo lugar, não menos decisivo, o efeito multiplicador da pesquisa educacional, dada sua inerente imbricação, paradoxais às vezes e em todo caso complexa, nas funções sistêmicas dos fenômenos educacionais. As singularidades pelo sentido do conhecimento cientifico-social, e educativo, são igualmente consideradas. Principalmente, em duas questões científicas principais: a explicação e a prova. Esses acordes - se preferir contra às aparentemente negativistas dissonâncias – concluir em uma teorização particular e própria das Ciências da Educação, apoiada pela semelhança junto à teorização não menos própria do conjunto das Ciências Sociais.

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A explicação científica

Explicação e predição

Conhecer e predizer, explicar e provar, junto a compreender, poderia representar a finalidade histórica do conhecimento científico. Na verdade, a pretensão da ciência, desde suas origens até nossos dias, bem que poderia caracterizar-se por uma mesma intenção: dar um conhecimento que, juntamente com outros saberes, nos permita chegar a entender o que nos rodeiam, os humanos, dentro. Esta apresentação vulgarizada da ciência, no entanto, não se sustenta porque o conhecimento, se é científico, é regido por normas, que expus, roçam tal grau de indefinição que a ambiguidade resultante anula o significado. Quando a ciência se refere ao conhecimento, à previsão, à explicação, à prova ou à compreensão, tem que definir, mutatis mutandis [feita algumas alterações ou mudando o que tem de ser mudado], os atributos de partida. A "explicação científica", considerada desde o empirismo (ou positivismo) lógico, nega a possibilidade da "compreensão científica" entendida desde o realismo científico, por referência a duas posições científicas (sic) opostas. Até mesmo a incapacidade que diz respeito tanto à qualidade como à quantidade, pois iria renunciar a "explicação", que não ocorria propor a compreensão de diferentes "explicações". Não há lugar para considerar em detalhe a distinção e a evolução das diferentes lógicas que governam o conhecimento científico ao longo da história da ciência; só cabe especificar algumas constantes que devem ser consideradas, desde os primórdios até nossos dias, ao questionar o caráter científico ou não de – reduzindo ao máximo – uma (apenas) "explicação científica” 85.

Sim deve distinguir, apesar da brevidade, pelo seu impacto óbvio sobre a consideração da pesquisa, alguns esclarecimentos. Em primeiro lugar, a distinção, já proposta pelo positivismo, entre dois "contextos" para tratar dois conjuntos diferentes de perguntas para avaliar o conhecimento científico: "(...) se entende por “contexto de descoberta” tudo aquilo que tem a ver diretamente com a atividade científica orientada para descobrir e por "contexto de justificação" ao conjunto de atividades destinadas à prova, comprovação ou verificação da validade da descoberta" (entrada contexto, em Muñoz et al., 2000). O "modelo nomológico-dedutivo" ou o "modelo indutivo-probabilístico", se consideraria , assim mais no segundo contexto que no primeiro; ou seja, mais próximo ao modelo da razão que justifica o conhecimento científico disponível que ao modo de gerar novos saberes nos processos de pesquisa. As críticas e cancelamentos ficam, assim consideradas, relativizadas, "redefinidas" inclusive (Clark, 2000). Em pesquisa cientifico-social e educativa, não se trata de obter "leis e teorias" que induzidas de "fatos adquiridos através da observação", permitam deduzir "previsões e explicações": é uma lógica não apenas não-relevante, mas inclusive "ingênua" (Chalmers, 1989, 17). Mas a hipótese desmedida com o auge post-popperiano (kuhniano em nosso caso) para o "contexto da descoberta", que apela para uma "contextualização" temporal, histórica, cultural, axiológica, etc., da ciência pode desembocar em justificativas do socorrido tudo vale. Este pretendido equilíbrio, ou intuído desequilíbrio, é evidente em modalidades e métodos de investigação socioeducativa em vias de desenvolvimento

85 A distinção, por exemplo, entre "indução", "dedução" e "falsacionismo" é chave. No entanto, é difícil decidir entre o risco para a extensão e a definição de posições. Neste caso, opto por referir-me - como sugerido nos referentes disciplinares - a valiosas obras de referência: entre outras, destaco por sua clareza, Chalmers (1989) ou a não menos meridiana de Echeverria (1999).

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operativo. Pelo contrário, e em vista também da pesquisa educacional, a demonstração não implica uma única lógica e um único modo de raciocínio e racionalidade 86. Razões similares não permitem nenhum reducionismo da "explicação científica" á regida pelo empirismo lógico.

A questão é tão decisiva que, em um tom menor se preferir, quando a epistemologia aplica-se à revisão do conhecimento sobre fenômenos educativos e escolares, o encalhe está próximo. Para citar um exemplo re-insistente, não clássico, mas sim amplamente difundido, Biddle e Anderson (1989, 93-117) classificam a "teoria, métodos, conhecimento e pesquisa sobre o ensino" sob uma tipologia semelhante: "Perspectiva de comprovação de hipóteses" que, por sua vez, inclui as pesquisas por amostragem, os experimentos manipulativos e as resenhas e meta-análises (sic), "perspectiva da descoberta" com os métodos etnográficos, a análise semântica e a pesquisa-ação. A partir de tão elementar tipologia Biddle e Anderson estabeleceram uma evolução da ciência, segundo o momento no qual se encontra, que convém quando ao menos refletir: é a auto classificada como "perspectiva integradora" ou "em busca da arca perdida?" A primeira fase no desenvolvimento de uma ciência é a fase "prematura". Nela, a consideração de um mundo único "dos fatos" se traduz a partir da "observação informal e investigação da descoberta" no "mundo da teoria", que engloba (1) os “conceitos empíricos (termos que representam classes de fatos)" e (2) “proposições empíricas (declarações sobre as relações observadas entre os conceitos empíricos)". Uma “ciência pregalineana madura" entende um mundo polivalente "dos fatos" (fatos1, fatos2, fatosn, etc.) que através de "observações formais mediantes o uso de métodos acordados (operações)" leva a um "mundo da teoria" mais complexo que o anterior: (1) "Elementos (termos que representam classes abstratas dos fatos)"; (2) "postulados (relações explicativas e logicamente primitivas entre elementos)", aos que, aplicados os "axiomas ou regras lógicas de indução e dedução", levam a (1) "definições conceituais (termos que representam classes concretas de fatos" e (2) “conclusões empíricas (afirmações sobre as relações observadas entre definições conceituais)". A terceira etapa, ou "uma posgalileana madura" parte da diversidade do mundo dos fatos, mas que a diferencia da fase anterior, adiciona a seus produtos (3) "hipóteses empíricas (novas declarações sobre as relações entre definições conceituais" que aplicam sobre "fatos novos" a "experimentação que inclui previsão e métodos acordados (operações)" e "novas observações (que sugerem a possível revisão da teoria)". Em todo caso, deriva-se um conceito de "teoria científica" entendido como "o sistema de conceitos e proposições que são usadas para representar, considerar e predizer fatos observáveis (...) não representa a verdade última (...) mas sim representa em troca a melhor explicação que contamos neste momento". No entanto, nesta visão geral científica, "as Ciências Sociais diferem presumivelmente da física e da biologia de vário modos significativos": as provas são muito mais difíceis de obter, porque muitas das manipulações não são toleradas - felizmente - se aplicado aos seres humanos. O mundo social é muito mais complexo, que o objeto de interesse das Ciências Sociais é o pensamento humano, que, na melhor das hipóteses, só tem evidências indiretas; os próprios cientistas sociais formam, ao mesmo tempo, parte da condição humana; finalmente, o comportamento social carece de sentido fora de contexto. Estas diferenças implicam que "a base de evidências das Ciências Sociais é fraca", e ante esta condição e propriedade se impõe – na extremidade - a "perspectiva integradora" entre os dois tipos iniciais de "verificação" e de "descoberta" com, respectivamente "(uma) menor tendência a pressupor que os dados

86 Recordem-se as lógicas instrumental, comunicativa e critica.

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estabelecem “fatos" e "(uma) aceitação em maior extensão (d)o valor dos métodos quantitativos e a validade de confrontar hipóteses com dados" (ibidem, 118-123). A prevalência na integração, perante a oposição, de métodos a partir da metodologia quantitativa ou qualitativa sofre, quando todavia segue questionando - se bem é verdade que cada vez mais, em raras ocasiões - a cientificidade de determinados projetos de pesquisa87.

A ciência, se é social, e a pesquisa se é interventora por educativa, prognostica dificuldades de montagem entre a "explicação" e a "previsão", entre a "previsão" e a "compreensão" (García lhamas 2001, 36). Mas se se trata da área cientifico-social, cabe privilegiar a compreensão frente à explicação. Expõe-se aqui, na verdade, uma discussão transversal ao desenvolvimento histórico do conhecimento científico: é a tese sobre a unidade e a diversidade da ciência, dicotomia que Hernández Pina (2001, 23-28) reúne e sintetiza sob o plano que nos ocupa da explicação-compreensão aplicada à pesquisa educacional.

Um fenômeno educacional pode ser mais facilmente predizível que ter uma explicação pertinente. No entanto, sem explicação, a predição causal pode resultar determinista no desenvolvimento da pessoa (Lembre-se, por exemplo, o "efeito Pygmalión"). A "compreensão" pode estimular um tipo de explicação errônea e não menos determinante que a predição, mas ao mesmo tempo são difíceis mesmo de exemplificar fenômenos explicáveis sem incorporar a compreensão. Se a "compreensão", o adicionamos a "comprehensión", em extensão e profundidade da complexidade do fenômeno, o quadro resultaria, sinceramente, de complexa – novamente – resolução.

Carl G. Hempel caracteriza em onze aforismos a "explicação científica" positivista. A pesquisa em nosso campo o resulta, no entanto, mais pressão a classificação enriquecida com as contribuições ulteriores que reúne Echeverria (1999, 67-70), as distinguir entre os tipos "da concepção herdada" as seguintes "explicações"; a simples relação é relevante de pluralidade: explicação nomológico-dedutiva; explicação estatística; explicação disposicional; explicação racional; e explicação teleológica. Mais detalhadamente: 1) Explicação nomológico-dedutiva: "Em todo esquema de explicação científica de um enunciado E, o explanandum, devemos distinguir no explanans dois tipos de proposições: uma, as condições antecedentes, que podem descrever as condições iniciais, em que ocorre a observação que deve ser explicada, ou estados de coisas, ou mesmo hipóteses concomitantes;" chamemo-las C1, C2... Ck. O segundo componente estaria integrada por aquelas leis científicas L1,L2,... Lr em sua proposição geral que permite explicar o fenômeno, ou se for o caso, o “conceito científico". 2) Explicação estatística. Pelo menos uma das leis L, do explanans deveria estar formulada em termos estatísticos. "Por sua vez, haveria dois tipos de explicação estatística: a dedutivo-estatística, que usa uma lei estatística formulada em termos da teoria da probabilidade e a indutivo-estatística, que engloba algum sucesso sob leis estatísticas, mas não por dedução matemática a partir da probabilidade". Os seguintes tipos, mantendo sua dependência na "concepção herdada”, embora com um grau menor de importante, aplicam-se, no entanto, em Biologia, Ciências Humanas (e Ciências Sociais). (3) Explicação genética, "a base de descrever de que maneira tem evoluído o explanadum (...) não se mencionam todos os estados evolutivos prévios, escolhendo somente aqueles que, hipoteticamente, têm relevância causal para o

87 Pode parecer inconcebível, mas ainda é publicado. Considere-se, por exemplo, a discussão da natureza empírica ou não da pesquisa educacional no debate refletido entre Kahn e Barton (2000).

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desenvolvimento do sistema". 4) Explicação disposicional, com a que "volta-se de alguma forma para a velha explicação causal": "Um exemplo (...) é a quebra de uma janela ao ser atingida por um martelo, fato que se produziria sob a base do conceito “frágil” atribuído ao cristal e que permite explicar o fenômeno sem recorrer explicitamente a nenhuma lei científica quantitativa". 5) Explicação racional, explicação "disposicional" que adiciona "a intencionalidade própria das ações humanas". 6) Explicação teleológica, que abrange os atos intencional, "a posição geral do conceito herdado consiste em englobar as explicações teleológicas ou finalísticas, e mesmo as intencionais (ações destinadas a um objetivo), sob o modelo de explicação causal e até mesmo torná-las compatíveis com o modelo de cobertura legal de Hempel, ou seja, com a explicação dedutiva-nomotético".

As objeções tem sido múltiplas. Echeverria (entrada de explicação científica, Muñoz et al., Op. cit.) considera particularmente destacável por seu impacto nas Ciências Sociais o seguinte: "Quem critica a tese da simetria entre a predição e explicação (...). Existência de explicações científicas, e mesmo de explicações causais, que não recorrem a nenhum tipo de lei (...). A pretensão hempeliana de reduzir as teorias e leis científicas a uma determinada expressão linguística, sendo assim que a expressão mais comum das leis científicas é matemática". Em pesquisa cientifico-social e educacional resultam particularmente cruciais: dificilmente pode manter-se a associação entre "predição" e "explicação", em termos hempelianos equivalente porque qualquer explicação, se é completa e científica, por si mesma, preditiva, da mesma forma que resulta inoperante a expressão do conhecimento científico na linguagem e com uma pretensão exclusivamente matemática. Apesar das objeções, reflexão necessária mantém sua validade. Em todo caso, seria questionável negar à pesquisa educacional a aspiração por ser capaz de "predizer", tendo em conta a "explicação". Assim, um diagnóstico educação em educação que permita antecipar efeitos, estabelecendo relações com as diferentes possibilidades de intervenção, resultaria - certamente embora daqui por adiante se questione pela redução da complexidade a um somatório controlável de variável – de interesse.

Para a "causalidade" (explicação-predição) é adicionada o princípio concomitante de "demarcação" sobre o que é e não é explicação e, como resultado, conhecimento científico. Um dos críticos do positivismo lógico, enquanto, ao mesmo tempo, parente direto da “concepção herdada", é Karl Popper, de quem interessa o critério de demarcação científica e a falseabilidade. Esquematicamente consideradas, as teses popperiana baseiam-se em uma série de propostas principais, entre elas: por um lado, a crítica à lógica indutiva como critério de demarcação, a qual se opõe a falseabilidade; de outra, a prevalência do conhecimento objetivo, ou seja, aquele susceptível de ser contrastado frente ao subjetivo que caracteriza o conhecimento filosófico; Por último, a aplicabilidade da lógica da investigação científica também para as Ciências Sociais. Para Popper (1990)88 são as "teorias científicas", que possuem uma significativa relevância: "As teorias são redes que lançamos para apreender o que chamamos ‘o mundo’: para racionalizá-lo, explicá-lo e dominá-lo. E nós tentamos fazer com que a malha seja cada vez mais fina. Popper questiona a lógica indutiva, porque ela não fornece um bom "critério de demarcação"; isto é, não nos permite distinguir entre ciência ("ciências empíricas") e metafísica (sistema metafísico). O critério proposto de demarcação é a falseabilidade: “(...) só admitirei um sistema entre os científicos ou empíricos se for suscetível

88 1ª edição em alemão, publicada em Viena em 1934.

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de ser contrastado89 pela experiência (...) o critério de demarcação que temos que adotar não é o de verificabilidade, mas o da falseabilidade dos sistemas. Em outras palavras: não exigirei que um sistema científico possa ser selecionado, de uma vez para sempre, em um sentido positivo; mas que seja suscetível de seleção em um sentido negativo, por meio de contrastes e evidências empíricas”, o que implica que te de ser possível refutar pela experiência um sistema científico empírico. "Assim, o enunciado ‘choverá ou não choverá amanhã’ não se considerará empírico pelo simples fato de que não pode ser refutado; Enquanto que este outro 'choverá amanhã’, deve ser considerado empírico" (ibidem, 40). Mas por resultar uma contribuição distinguível, não é menos relevante a nova "lógica situacional" que introduz na concepção científica, conferindo uma nova marca no conhecimento cientifico-social. Ballester (1999), a resume nestes termos didáticos: "(...) lógica da situação. Trata-se de um tipo de metodologia baseada em explicações detalhadas das condições iniciais (análise da situação social: contexto e sujeito); a comparação e crítica do modelo centra-se na comparação e crítica das condições iniciais, isto é, de proposições singulares sobre contextos e sujeitos. O modelo, no entanto, tem outro componente: o princípio da racionalidade, que embora Popper sugeriu seu caráter duvidoso, deve ser aceite por razões pragmáticas. Popper não tem demonstrado, na realidade, a falseabilidade do princípio da racionalidade. Uma metodologia fundamentada na lógica da situação é capaz de racionalizar muitos episódios da história da teoria educacional, bem como a reconhecer os paradigmas não-positivista tão importantes na pesquisa educacional". A lógica das circunstâncias, do contexto, das situações e dos atores particulares cobra aqui o realce necessário para a relevância dos princípios epistemológicos para o objeto de estudo em nosso campo sociocultural e educacional.

De não menor envergadura nas Ciências Sociais é a distinção, pontual em tudo, mas relevante no nosso caso - ou seja, na pesquisa etnográfica-, entre a "objetividade científica" e a "convicção subjetiva" que realiza Popper: "afirmo que as teorias científicas não são nunca inteiramente justificável ou verificável, mas, não obstante, contrastáveis. Digo, portanto, que a objetividade das demonstrações científicas reside no fato de que pode ser contrastada intersubjetivamente" 90 (ibidem, 43). No entanto, tal distinção não impede, pelo contrário, reforça a razão exposta por Popper e decisiva para os "métodos de pesquisa” sobre o caráter indispensável de umas decisões e, portanto, de uns estudos metodológicos: "Quais são as regras do método científico, e por que precisamos delas? Pode existir uma teoria dessas regras, uma metodologia? O modo de contestar estas perguntas dependerá, em grande parte, da atitude que se tenha com respeito à ciência "(ibidem, 48). Nesta maniqueísta entra em cena Bachelard (1989, 26-28) quando expõe as "perguntas do epistemologista" ao "cientista": "Perguntaremos, pois aos cientistas: como você pensa, quais são suas pontuações, seus julgamentos, seus erros? Sob qual impulso você muda de opinião? (...). Dê-nos acima de todas as suas ideias vagas, suas contradições, suas ideias, suas convicções sem validações. Os convertemos em realista (...). As condições dialéticas de uma definição científica distinta à definição usual apareceriam então mais claramente (...)". É a reencarnação do dízimo

89 O realce é do autor.90 Manter a intersubjetividade, porque é um bom exemplo da vagueza e ambiguidade terminológica que enunciava o princípio como tão típico da nossa ciência e investigação. Entre a intersubjetividade popperian e a habermasiana, talvez – sem dúvida – existem diferenças relevantes: a questão é transversal, mas se precisará nas sequências dos capítulos. Tão somente queria atrair atenção.

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epistemológico de Morin, do conhecimento do conhecimento, e a chave da aprendizagem e da consideração do erro em nosso âmbito científico.

Para Bunge (1983), introduzida a distinção entre "determinação" e "causalidade", a explicação científica inclui a estrutura de como determinam os elementos o conjunto: "A principal razão para a invenção e o afrontamento de hipóteses, leis e teorias é a solução de problemas de por quê, ou seja, a explicação dos fatos e de seus padrões ou regularidades." Não nos contentamos com encontrar fatos, mas queremos saber por que eles ocorrem em vez do contrário; e tampouco nos contentamos em estabelecer a conjunções constante explicativas dos fatos, mas sim tentamos descobrir o mecanismo que explica essas correlações "(ibidem, 561). Mas é viável em nosso campo descobrir nossos próprios mecanismos sociais, culturais ou educacionais; expondo assim, porque não.

Assim, progressivamente, o sentido da explicação evolui do positivismo inicial para os diferentes significados do realismo (Carrera, 2000). No nosso caso, as referências ao Interacionismo simbólico e à Etnometodologia aliviam maiores explicações isoladas de esclarecimento, ao relacionar, por parte desses "programas" de referência, a explicação na compreensão a partir de lógicas distintas da instrumental e incluindo as intersubjetividades sócio construtivista.

Os valores da validação91

Um dos problemas já clássicos em nossa história recente é a determinação do grau de cientificidade de nossas teorias, principalmente questionada pelas evidências de contraste, desajustes, inclusive repulsas - ou, com clareza, viscerais rejeições, na prática, da prática e dos próprios práticos. Não se trata de voltar para a eterna dissociação entre "teoristas" e "praticistas"92. Tampouco se pretende reificar novamente solilóquios sobre a cientificidade ou não de nossa pesquisa: a cientificidade, se vem afirmando, está garantida, se bem que difere dos parâmetros de definição de outras ciências... Mas é necessário realizar tantas e tantas precisões que, às vezes, é difícil manter o arredondamento na resposta: as Ciências da Educação são ciências, o pesquisador educacional é científico e, na maior, as Ciências Sociais são ciências, o pesquisador social é científico; por que então nos que vemos forçados a resgatar as diferenças – as diferentes teorias declaradas e publicadas - a golpe de opinião? Onde está, mesmo mediada pela historicidade, a certeza científica? Para adicionar – ato seguido – mas que certeza pode esperar de uns atores escolares, educativos, sociais por extensão ao mesmo tempo genuínos em sua individualidade pessoal?

Se aborda aqui a questão sobre o grau e o tipo de cientificidade da pesquisa educacional. Ou dito de outra forma, se expõe a questão sobre se "o conhecimento científico disponível pode

91 Limito-me – sob o pretexto das questões levantadas por Baille, Bru, Charbonnel, Chevallard, Crahay, Develay, Durut anterior, Hadji, Johsua, Lerbet e Mingat (Hadji e Baille, 1998) - a formular as perguntas e apontar as respostas dadas pelos autores. No entanto, a magnitude das questões é tal que serão retomadas quando correspondam na análise e na aplicação específica aos métodos de pesquisa em Ciências Sociais.92 Neste sentido remeto ao interessado a publicações anteriores nas que desenrolava a fobia praticista à teorização e a negação desta em respeito àquela (Sabiron), 1999.

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escapar à ideologia e à ilusão e apresentar provas de que avança" (ou pelo menos o transitório de resolver algo, antecipar a solução de um problema), formulando dez perguntas que dizimam, de completo, a relevância, a validade, o valor da prova em nossa pesquisa educacional; sobre a base - parafraseando Prigogine e a termodinâmica - da já mencionada "nova parceria" entre investigação e educação (Hadji e Baille, 1998). Se a dúvida remete exclusivamente à pesquisa educacional, a redução seria menor. No entanto, que ciência social escapa à ideologia se objeto e sentido da pesquisa estão imersos sob as águas do poder? Intencionalmente, essas questões representam, ao mesmo tempo, enunciar as contribuições mais significativas por parte do empirismo – do positivismo – e atualmente da pesquisa educacional. O valor não está nas respostas, breves e reduzida à visão de cada estudioso, mas à relação, a modo de um script, das relevâncias a manter:

1. O que é o provar? Evidência, argumento, favorável ou desfavorável a uma hipótese ou suposição, mas que, aplicada em pesquisa social e educacional, sempre tem um caráter "local". “Todo pesquisador se dirige a uma comunidade. Esta caracteriza-se, entre outras, pelo fato de compartilhar certas opiniões. No que diz respeito às opiniões dominantes, certas declarações são paradoxais". Para superar o paradoxo recorre-se a afirmação: "Um enunciando é assertivo quando submetido à prova sua verdade. Uma afirmação comprovada, portanto, é uma afirmação comprovada que resiste às provas que uma comunidade científica pode submetê-la". Cabe distinguir assim em nosso âmbito três níveis pôr a prova: "A experiência vivida, que constitui uma primeira evidência; a clínica, que responde a uma sistematização da experiência vivida, não necessariamente a nossa; a experimentação, finalmente, que busca “fazer falar” os sistemas estudados, perturbando-os de forma controlada, sendo assim, a continuidade da clínica. De um nível para outro é aumentada, sem ruptura, a objetivação" (ibidem, 29-43).

2. O que tem que provar quando se trata de educação? Esperar em nosso campo modelos validados não é nada mais que uma "ilusão perdida", à vista, não só de nossos resultados, mas da própria natureza de nossos objetos de estudo e, em última análise, do ser humano. As lógicas de validação, trata-se da confirmação fornecida pela experiência, do indutivismo, constatando regularidades, ou da observação de falseável, somente nos conduz a modelos redutores. "apressadamente aceitos para ser rapidamente aplicados" (modelos processo-produto), ou "hierarquizar as práticas" (modelos descritivo-explicativos). O sentido significativo na mudança de atitude do pesquisador social e educacional que pretende ser útil ao conhecimento prático - e, por consequência, ao conhecimento teórico - é "provar que seu modelo de análise é relevante, não é que a prática analisada seja boa" (ibidem, 45-61).

3. Não há nada melhor para fazer do que pretender provar? Recorrem aqui os autores para a distinção entre pesquisa em educação/pesquisa sobre educação93. O segundo, submetido a um sentido estrito, puramente científico, de teorização com objetivo de elaborar modelos que permitem compreender a educação, sem deixar – antes ao contrário, se observa – o compromisso da pesquisa em educação para com a emancipação da pessoa (ibidem, 67-79). É, porém, discutível a associação que expõem

93 Esta distinção é comum em nossas comunidades e de simples esclarecimento.

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em relação ao "positivismo" a segunda e o "humanismo" a primeira (mesmo formulada a relação em termos de paradigma).

4. Se a aplicação da ciência, em nosso campo, a prática envolve desvios tais como pretender fundamentar radicalmente uma prática no saber e transformar "um modelo de" em "um modelo para", como superar a difícil tarefa de dar com "um modelo de ação pertinente" (no sentido emancipador da pergunta 3); e, formulado em outros termos igualmente práticos (e formativos), "que necessita saber um professor". Em suma, para atuar requer: "a) saber o que é (conhecer o real); (b) sabe o que é desejável (conhecer o que deveria ser); c) sabe o que tem que ser feito para alcançar o desejável". E aqui se encontra novamente os autores com a prova, dado que a "ação educativa escapa a exigência de prova, levando em conta como seus efeitos se apreciam sempre a posteriori"; "não se trata da busca da verdade, mas de articular, da maneira mais racional possível, o modelo de uma ação que se espera eficaz e útil" (ibidem, 82-94).

5. À vista da situação apontada nas respostas anteriores, parece que a cientificidade, quando se aplica a "coisas humanas", deve estar condicionada à existência de um novo e exclusivo paradigma por construir. Não parece certo, existem processos suscetíveis a fornecer "provas". Entre outros, os relacionados nas cinco questões seguintes.

6. Sob que condições se pode experimentar em educação?94 A afirmação, nesse caso, pode resultar categórica: "A pedagogia experimental não se tem aplicado”. Se aceitam as limitações da pesquisa "quasi-experimental" na educação, ou seja: "a) Número limitado de variáveis; b) relativa estabilidade dos fenômenos estudados", a experimentação pode resultar esclarecedora, se supõe: "a) A produção de uma análise a priori; b) obter os dados adequados; c) avaliar os resultados". Mas esta "experimentação" não oferece, em sentido estrito, prova alguma: "Mesmo no contexto de um paradigma 'experimentalista', provar somente pode significar uma coisa: mostrar que se dispõe de uma interpretação momentaneamente satisfatória. A tarefa essencial do pesquisador é então interpretar o que descreve" (ibidem, 113-123)95.

7. Se a investigação dos fatos não exclui, ao contrário, favorece, a investigação do sentido, esta última, pode acaso ser considerada pesquisa ou, pelo contrário, trata-se, simplesmente, de uma reflexão? O dilema se formula em uma forma diferente, do contrário, é insolúvel. "É possível levar a sério as ideias dos educadores, conferindo-lhes o status de teorias, submetendo-as a um tratamento somente viável da ciência: passar a convicção, convertida pela ciência em hipótese, para a prova organizada e rigorosa dos fatos" (ibidem, 125-159). É submeter a um tratamento científico distanciador as reflexões teorizadas.

8. Sob que condições uma pesquisa em educação pode ser considerada "cientificamente correta"?96 Sobre a aceitação das condições distintas de um "empirismo aberto” (redução na análise, inclusão da comparação, resistir à tentação de concluir rapidamente a análise), propõe o seguinte esquema de desenvolvimento (ibidem, 175-

94 Ver as referências explícitas à "pedagogia experimental" na análise histórica (capítulo 2).95 Mais uma vez se refere a uma questão essencial, que se tratará na discussão, de existir, entre “descrição" e "interpretação" em nosso âmbito científico (capítulo 3).96 Nos expostos "esquemas de inteligibilidade" Berthelot se antecipava a uma possível resposta para a pergunta, mas não a única.

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184): Escolha de um paradigma. Definição de um conjunto de hipóteses. Especificação das relações ou efeitos previsíveis. Objetivação das variáveis. Medição das variáveis. Escolha um modelo de funcionalidade. Interpretação dos resultados. E, em todo caso, a garantia da validade das conclusões obtidas, só pertence à comunidade científica que exerce, assim considerada, de "tribunal que aceita ou rejeita as provas apresentadas pelo pesquisador".

9. O que prova a pesquisa empírica educação? Se as ambições generalizadas limitam-se à produção de saberes locais (uma demonstração somente pode ser "regional"), se se deseja voltar visível o objeto examinado, com a construção de um modelo, porque a investigação racional consiste em fornecer fatos concretos a realidades virtuais, se contribui para uma coordenação dos resultados parciais, etc., a pesquisa empírica é capaz de fornecer conhecimentos científicos transferíveis de um contexto para outro (ibidem.191-221).

10. É, finalmente, superável a oposição dicotômica entre causalidade e sentido? Ou a necessidade de confrontar, na investigação educativa, as ideias aos fatos: “a ‘experiência’97 não se destina a controlar a verdade científica de uma hipótese, mas demonstrar a possibilidade efetiva de uma maneira de fazer, de cujo valor não se duvida" (ibidem, 223-245).

Finalmente, concluem Hadji e Baille (Op. cit., 247-254), a "nova aliança" não é senão o resultado de superar, teóricos e práticos implicados na educação, cada uma de suas próprias ilusões perdidas, a fim de redefinir um novo sentido na investigação educativa. A pesquisa etnográfica irá fornecer respostas a este (novo) sentido.

Tanto assim que na pesquisa etnográfica, analisados em os referentes epistemológicos empíricos, devedores de um positivismo, faz-se necessário considerar um segundo bloco de referência ao lado de uma "razão comunicativa" contra a "razão instrumental" que domina o exposto. Se a questão está focada em termos de valor, referidos à "descrição", à "descrição densa" e à "interpretação", a distinção não é menos delicada. Em primeiro lugar, conhecida é a discussão de se no campo das Ciências Sociais é possível ou não uma descrição em sentido estrito, livre de interpretação98. Porque é razoável, aceitável, socialmente correto inclusive, admitido por nossas culturas, em manifesta coerente com a herança de objetivista de nosso conhecimento científico, defender a possibilidade de "descrição" de uma coisa, um fato, uma situação, uma ação, até mesmo um pensamento próprio. A pessoa, herdeira de um comum cultural, é capaz de distanciar-se de seu próprio ego e realizar uma objetivação de sua vivência. É mesmo a distinção básica, que já estabelecera nosso perínclito Mead, entre "espírito" e "pessoa". Mas não menos razoável para justapor ao coletivo cultural a idiossincrasia individual que compreende como descrição o que não é senão visão particular, descrição paranoica. A questão é, portanto, na verdade escabrosa. Nas conclusões de um prestigiado congresso dedicado ao tema: Descrever: um imperativo? Incluía a comunicação "Não existe problema em descrever nas Ciências Sociais", na que se observou: "Não existem, nas Ciências Sociais, o menor problema independente de uma linguagem da descrição, porque o objeto diante de nós sempre se tem descrito a si mesmo" (Ackermann et al., 1985, 14). Mas para adicionar no "a si mesmo" a Peshkin (2000, 5-10), quando indica: "A definição do pesquisador, a orientação e a 97 Entendo que a tradução mais correta é a "experimentação".98 Discussão central na segunda parte, ao tratar as fases da pesquisa etnográfica.

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situação não pode deixar de estar imbricada pela maneira de ser e de pensar dos investigados e do investigador". E, em consequência, exigem-nos tomada de decisões na definição do objeto da investigação, no trabalho de campo e análises subsequentes, nos resultados, etc., que, inevitavelmente, supõem interpretações. É a inclusão necessária da intuição e da criatividade na pesquisa, embora, na prática, sempre resulte paradoxal e às vezes contraditoriamente científica.

Crítica e diversidade da ciência

A comunicação científica tem tido, certamente, efeitos favoráveis à própria pesquisa. A "Sensibilização" da cidadania e, como resultado final, de seus respectivos políticos é um fato evidente. No entanto, se para a divulgação é adicionada o "periodismo científico", um experimento, um processo de investigação pode chegar a ser "transmitido" ao vivo. As consequências superam, nesse caso, a histórica repercussão da ciência no progresso de nossas civilizações, mas ao mesmo tempo estão inevitavelmente ligadas à viabilidade das maiores catástrofes: da bomba de Hiroshima para radioterapia. Nos últimos anos, a ciência lança estalidos, se possível, mais prementes: da clonagem à transmutação virtual. As Ciências Sociais, e muito em particular, a pesquisa educacional - por muitas razões conhecidas - tem de estar atenta à evolução, atenta aos efeitos porque, para ser transmitido para a educação, o retorno é improvável; como dramático é a hipotética estagnação da educação frente à ciência, quando regem o ensino e colonizam a educação mitras, bandeiras e intolerâncias. Paradoxalmente, conforme evoluem as ciências em direção a simbiose social, cultural e biológica, com fortes impulsos para aplicações revolucionárias que transtornam o status quo, a reencarnação tal qual ave fénix de posições éticas inquestionáveis pretende cercar o campo sagrado do intelecto humano99. Talvez o paradoxo não seja tal, já que se freia a pesquisa e a ciência com remédio temporário para o engessamento e a idiotização de uma população, dominada mais facilmente assim que se resulta instruída e conhecedora do estado científico das questões. A educação é aqui e de novo pedra angular do desenvolvimento, como pode ser manipulada para que resulte em estratégia chave de inamovilidade.

Sob esse estado de espírito, recuperam em pesquisa socioeducativa um interesse singular as reflexões e a crítica sobre e da própria ciência. Desde esta intenção, são selecionadas, mais uma vez de forma tendenciosa e incompleta – também neste caso por vários motivos – dois: a acelerada crítica – autodenominada pelo seu próprio autor "anarquista", embora o termo seja bastante discutível100 – de Paul Feyerabend e a relevante de J. Echeverría sobre a

99 Em ocasiões o debate beira uma piada quando se proíbe um tipo de pesquisa, com os riscos a que cabe atribuir sempre à geração e aplicação de novos saberes, mas que de produzir-se a necessidade não duvidamos em utilizar a aplicação. A vida é tão sagrada que os mortais não têm o direito de limita-la.100 Posteriormente, bem como seu princípio, entre outros, do "tudo serve", Feyerabend harmonizará. No que diz respeito à qualificação de anarquista, Echeverria (Op. ext., 232) diz: "sua reinvidicação [referindo-se a Feyerabend] do anarquismo metodológico não tem suas raízes no movimento político do mesmo nome, mas sim no uso deste termo como liberalismo anarquista", inclusive resulta mais relevante sua conexão em um “liberalismo metodológico". A questão, no entanto, deu origem, como ocorrera com a sua não menos provocadora inscrição dadaísta, a não pouco mal-entendidos. A título anedótico, na revista Comunicación y Transporte de um conhecido sindicato, o dedicou uma página que, em grandes manchetes rezava, "Paul Feyerabend, o cientista anarquista".

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"tecnociência". São duas aproximações colaterais, mas ao mesmo tempo complementares da chamada de atenção sobre o papel da Educação e da pesquisa educacional no desenvolvimento da ciência básica e aplicada ao que me acabo de referir no parágrafo anterior.

Mas para as singularidades de pesquisa educacional no conjunto da pesquisa social o afetam, ademais, outras razões. Tendo em conta a revisão historicista kunhiana pelo que é patente que se tem escolhido em uma posição analítica inicial, uma das questões recorrentes de fundo é a interdependência entre o método e o objeto de pesquisa. Resta saber em que medida a opção metodológica não representa uma delimitação do objeto de estudo, em um sentido decisivo para com os resultados previsíveis do próprio estudo. O maior ou menor grau de imbricação é tão decisivo em nosso campo que será abordado em diferentes capítulos; no entanto, se anuncia, nesta crítica à ciência, uma nova aproximação ao assunto sob a hipótese de trabalho de como, efetivamente, o grau de imbricação é, quando menos, considerável: "Não penso que exista nenhum modelo geral de toda investigação científica, nenhuma lógica de descoberta que apenas ao aplicar a um campo do real produza automaticamente ciência: a única epistemologia possível é, para mim, aquela que se fundamenta na história das ciências e que dela aprende, no melhor dos casos, o que não é possível fazer (...). E é que os métodos e as técnicas de pesquisa que estão sendo usadas são, precisamente, os que estão sendo usados para investigar o que se pesquisa. Por isso são, em todo rigor, inseparáveis das problemáticas que definem o que se tem que investigar e, consequentemente, inseparáveis dos conceitos com os que se apreende e problematiza a realidade (...)" (Pizarro, 1998, XI-XVIII). A pesquisa educacional não é uma exceção, como tampouco pode ser-lhe atribuída a exclusividade; no campo genérico das Ciências Sociais a casuística é comum. A reação da pesquisa, abrindo novas modalidades e métodos de investigação, ao mesmo tempo que segue desenvolvendo os disponíveis, destaca a necessidade de abordar os objetos de estudo de diferentes perspectivas. Em outras palavras, de métodos diferentes. A exposta reelaboração das concepções popperiana de Lakatos nos "programas de pesquisa" joga, apesar das diferenças abismais, um papel similar (Quintanilla, 1985, 239). Shulman (1989, 12-13) aprofunda-se em idêntica linha: "uma vez comprometido com uma determinada linha de pesquisa, o estudioso raramente se desvia dela (...). Uma comunidade de estudiosos de tendência semelhante irá evoluir também em uma maneira similar, intercambiando trabalho, citando-se entre si, usando uma linguagem semelhante e compartilhando tanto pressupostos como estilos de pesquisa (...). Um programa de investigação não só define o que pode ser legitimamente estudado por seus partidários, mas também especifica o que necessariamente se exclui da lista de temas permitidos".

Um dos primeiros enclaves epistemológicos residida no historicismo kuhniano; um segundo enclave, ontológico se quiser, é o compromisso que cada pesquisador, mas mais se deve ao pesquisador social, tem de assumir com a própria sociedade que o mantém. A razão epistemológica a brinda, com excelência, Paul Feyerabend: compromisso com o progresso histórico da civilização, mas sem indeferir o compromisso não menor com a situação que nos tem tocado viver. A pesquisa educacional, na medida em que produz um conhecimento sensível para o sentido social, próxima sempre aos grupos sociais, deve ser particularmente sensível, por necessidade, ao contexto do que diz emergir a explicação.

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No prólogo do Tratado contra o método, Feyerabend (1986, XV-XVII) coloca a discussão de duas questões problemáticas relacionadas com a ciência: 1°) Qual é a sua estrutura, como se constrói e como evolui. "Não há uma 'racionalidade científica', que pode ser considerada como guia para cada investigação, mas existem regras obtidas a partir de experiências anteriores, sugestões heurísticas, concepções do mundo, disparates metafísicos, restos e fragmentos de teorias abandonadas, e de tudo isso fará uso o cientista em sua pesquisa". 2º) Que é seu peso específico em comparação com outras tradições e como podemos julgar seus aplicações sociais: "Se a razão científica não pode separar-se da prática da ciência, se é 'imanente à investigação', então nem pode ser formulada nem compreendida fora das situações específicas da pesquisa". Feyerabend supera, ou pelo menos questionada, a atenção exclusiva para o "método científico" para uns, ou a "prática científica" para outros, substituindo o privilégio do argumento racional pela criatividade, a imaginação e os desejos do cientista, ao mesmo tempo que ajuíza, relativizando, o progresso. No entanto, poucos epistemólogos modernos têm sido tão criticados como Feyerabend. Inclusive, mesmo compartilhando – como apoio dissemos - seus pressupostos, algumas das suas afirmações são, simplesmente e como ele mesmo sugere, pura provocação; necessário, mas sem exceder-se: "Tudo serve", mas "não vale tudo” em um sentido ilimitado. Não se trata de que cada um siga caprichos de "cientista extravagante" fora de compromisso, puro e angelical, arbitrário. Mas, assim apresentadas, as "duas questões problemáticas" referentes à ciência não reflete – de jeito nenhum – a repercussão do pensamento feyerabendiano. Talvez "sua predileção para a pose" que tem facilitado reduzir Feyerabend a um tonadilheiro epistemológico, ou quando em sua juventude, decidiu ser ao mesmo tempo cantor de ópera e astrônomo, cético, céptico, irônico histriônico, contraditório e dado ao excesso na oratória, dadaísta ou anarquista, pois como ele próprio afirma: "Com frequência me surpreendo defendendo opiniões calorosamente, mas log descubro que são bobagem e então as abandono", etc. esconde uma terrível seriedade, magnificamente coletada na entrevista que a fez Horgan (1998, 72-82): "A compulsão humana para encontrar verdades absolutas, por nobres que sejam, desemboca muitas vezes na tirania". A reação "contra o método" é, portanto, mais moral e ideológica do que epistemológica (Feyerabend, 1986, 1993).

Em síntese literal, do "argumento principal contra o método" cabe destacar, entre outras, os seguintes motivos (Feyerabend, 1986):

"O único princípio que não inibe o progresso é: tudo serve", mas à luz de uma análise dos acontecimentos históricos e da relação entre ideia e ação, amplamente exemplificadas pelo autor, assim: "a condição de consistência, que requer que as novas hipóteses concordem com as teorias aceitas, não é razoável, porque favorece a teoria mais antiga, não a melhor".

"Não há nenhuma ideia, por antiga e absurda que seja, que não possa melhorar o conhecimento. Toda a história do pensamento está englobada na ciência e se utiliza para melhorar cada teoria particular. Tampouco se eliminam as interferências políticas".

"Nenhuma teoria concorda com todos os fatos de seu domínio, mas a teoria não é sempre a culpada disto. Os fatos são constituídos por ideologias mais antigas, e o

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confronto entre fatos e teorias pode ser prova de progresso. Tal choque, também constitui um primeiro passo na tentativa de descobrir os princípios implícitos nos conceitos observacionais muito comuns e familiares".

Em suma, frente à sacralização de regras metodológicas, uma aproximação da ciência a muitas fontes do saber e realizações disponíveis (incluindo a arte), a análise exaustiva das teses de Feyerabend o autoriza a Chalmers (1989, 196) para resumir esta questão nos seguintes termos: "À luz de suas teses (Feyerabend) sobre a incomensurabilidade, rejeita a ideia de que pode haver um argumento decisivo a favor da ciência frente a outras maneiras de conhecimento incomensuráveis como ela. Quando se compara a ciência com outras formas de conhecimento, será necessário investigar a natureza, os objetivos e os métodos da ciência e dessas outras formas de conhecimento "(Chalmers, 1989, 196).

Educação e, portanto, a pesquisa educativa, mas também métodos de investigação recuperaram aqui uma nova obrigação substantiva: a ética, aqui a pesquisa etnográfica não monopoliza exclusividade alguma, já que a todo pesquisador social lhe pressupõe a ética.

A diversidade da ciência encontra-se em sua própria variedade. Superadas as resistências ao fundir “criatividade” e “ciência”, persiste uma tendência a manter estanques as diversas modalidades do conhecimento científico: "Vocês dizem que 'ciência' exige 'imaginação' que possui um ‘componente artístico’, que a ‘criatividade’ desempenha um papel tão importante como a ‘racionalidade’ e assim por diante. Ao se expressar nesses termos, vocês sugerem que a 'ciência' é um bloco homogêneo, que a 'criatividade' é outro, e que ambos os blocos se encontram extremamente relacionados". Consideração, em sua opinião, externa à ciência, porque "suponhamos que se encontram mais próximos e penetram no corpo da ciência como se fosse um museu enorme, que olham vocês a seu redor e descrevem o que veem. "Encontrarão uma surpreendente variedade de atividades com escassa conexão entre elas" (Feyerabend, 1993, 153). A questão é determinar se ações que parecem ter pouco em comum, são mesmo diferentes, no entanto, podem estar unidas sob um mesmo significado. A resposta é, obviamente, afirmativa. Mas, "como é que uma informação que é o resultado de mudanças históricas e idiossincráticas,pode se referir a fatos e leis independentes da história”? "Podemos descrever os resultados que obtivemos (embora a descrição sempre será fatalmente incompleta), podemos comentar as semelhanças e diferenças que nos têm chamado a atenção, podemos tentar inclusive explicar 'de dentro', ou seja, empregando os meios práticos e conceituais que nos oferece algum enfoque particular, o que graças a tal enfoque temos descoberto (...). Podemos contar muitas histórias interessantes. Mas não podemos explicar como o enfoque escolhido se relaciona com o mundo nem por que, em termos do mundo, tem êxito; porque isso equivaleria a saber os resultados de todas os enfoques possíveis ou – o que vem a ser o mesmo – para conhecer a história do mundo antes que o mundo tenha chegado ao seu fim "(Feyerabend, 1986).

A distinção entre "ciência" e "tecnociência" responde a condições e práticas diferentes (Echeverría, 1999, 317-320), mas o problema no nosso caso é a determinação do grau de "tecnociência" (informática e virtualidade) da nossa ciência social e educacional. A magia dos mundos virtuais convida a novos modos na geração de conhecimento cientifico-social em uma forma social inédita: é o "coletivo inteligente” de Levy (1995). Mas é, também, a crítica

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permanente que, ao estilo de Gustavo Bueno (1995), desenvolve quando em direção às funções genéricas ("externalistas") da ciência, ocupadas em conhecer, fabricar, criar e dominar; adiciona a “visão internalista": "As estruturas cientificamente estabelecidas se parecem mais a balsas flutuantes em um mar sem margens que a um fundo de rocha firme que estivesse localizado sob esse mar". Além disso, essas ‘balsas’ não estão sempre coordenadas, nem se movem de acordo com direções convergentes. "E, o que é mais grave, nem todas elas têm a mesma consistência”. Na investigação socioeducativa, as diferenças entre modalidades estão visíveis. A pesquisa etnográfica é pelo menos uma tentativa de consistência e cooperação, através do conhecimento na recuperação da pessoa para sua emancipação.

1.2.2. A compreensão da complexidade fenomênica

Teorias fundamentantes

A estrutura textual da fundamentação científica dos métodos de pesquisa em Ciência Social é, como você pode ver, um constante processo de desconstrução-reconstrução iterativa: se desconstrói o reducionismo dualista, para reconstruir, da complexidade, a engrenagem geradora de novo conhecimento científico; se desconstrói duas amostras relevantes da falta de harmonia entre os usos científicos-naturais e as realidades fenomênicas do âmbito educacional e social, para reconstruir, da especificidade, apoios fundamentais em conformidade com tais características particulares, que são os "programas" e "esquemas". São teorias fundamentantes. No entanto, um tratamento exaustivo, mesmo algumas pinceladas a modo de esboço, relativas às teorias fundamentantes, excede as possibilidades e o sentido da fundamentação, principalmente quando consideradas uma a uma são todas elas bem conhecidas101. Serva, portanto, a exposição de simples relação de questões decisivas para a fundamentação científica do conjunto das Ciências Sociais, bem como de esclarecimento da articulação em um todo referencial.

Em todo caso, trata-se de teorias fundamentantes que oferecem aos métodos de pesquisa uma cobertura semelhante à fornecida pelas abordagens positivistas. A distinção ocorre em relação ao tipo de métodos que creditam. O Interacionismo Simbólico ou a Etnometodologia, dão conta de uns referentes dos que derivam métodos de pesquisa interpretativos e etnográficos, ao passo que, por exemplo, o Funcionalismo pode legitimar métodos e esquemas de pesquisas. Trata-se de teorias de referência que dão forma a um quadro teórico inicial que, ao mesmo tempo que deveriam inspirar a metodologia de investigação (Montané, 2002), pressupõe uma atitude do investigador comprometida para com a melhora da prática educativa sob o referente – repito – da emancipação da pessoa em seus grupos sociais de referência.

Resulta, claro, expressar que são teorias de referencia para o conjunto da pesquisa no âmbito científico-social, mas com o máximo grau de determinação para com os pressupostos da pesquisa etnográfica neste mesmo âmbito científico.

101 Tive a oportunidade de aplicar esses mesmos referentes ao desenvolvimento disciplinar da Organização Escolar. Daqui recupero as seções mais adequadas para a síntese (Sabirón, 1999).

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O Interacionismo Simbólico

A partir do momento em que coexistem mais de uma pessoa em um determinado grupo humano tem lugar uma série de processos permanentes de relacionamento, de interação e de comunicação, de ida e volta. Pois bem, a volta depende da ida, isto é, a relação, interação ou comunicação parte e retorna à interpretação que cada um faz do outro, que, por sua vez, vem determinada pela percepção mútua. Tal simplicidade, ao contrário de ingenuidade, expositiva introdutória reflete, no entanto, uma das ações humanas mais complexas, que é a da própria comunicação entre semelhantes. O importante, afirma um aforismo muito querido pela teoria simbólica, não é o fato, o conhecimento em si, mas o significado do que ocorre, o significado que o conferem os coparticipes no fenômeno. Se os significados dependem das interpretações e estas, das percepções que, por sua vez, são individuais resulta facilmente compreensível a complexidade da interação e ainda mais da comunicação do tipo que foi. Ante essa tessitura, a problemática imprevisibilidade dos comportamentos reativos e a ambiguidade e indefinição dos sentidos conferidos nos obrigaria a um louco e desgastante processo de ajuste/reajuste sempre que nos encontramos frente a um outro. A sabedoria da cultura dos grupos sociais e do conjunto de uma determinada sociedade resolve o problema. Reduz-se a ambiguidade com o uso de símbolos aos que, com ou sem base naturalizada, os dota de um significado compartilhado. O sentido e o significado dos símbolos são conjunturais e, ao mesmo tempo, próprios da cultura herdada e cultura do momento, mas sempre e em todo caso culturais. Ao mesmo tempo, o significado compartilhado em uma cultura tem um resultado decisivo em comunicação. O uso de símbolos, ao mesmo tempo que reduz a ambiguidade, limita a possibilidade de uma comunicação real. A comunicação pode ficar restrita a um estrito nível formal. Esta última característica observada é própria das organizações e dos grupos sociais e de considerável impacto significativo sobre a investigação no âmbito genérico das Ciências Sociais.

Quando a interação e a comunicação no seio de um determinado grupo humano em condições institucionais, como é o caso dos fenômenos educativos, tais símbolos e características enunciadas têm de adicionar-se ou interpretar-se sob umas normas, uns papéis, uns mitos, uma cultura – inclusive – própria... Dispomos de modelos simbólicos que pretendem, precisamente, revelar os significados da linguagem, das interações, das comunicações e de quantos processos se desenvolvam no interior dos fenômenos escolares à luz da cultura escolar. Convergem assim os modelos simbólicos e culturais.

Privilegia-se o significado e o sentido102, a "reconstrução". A pesquisa entende-se assim como descrição participante e avaliação compartilhada, precisa e contextualizada do fenômeno, pelo que é, sem dúvida, um dos tipos de pesquisa mais apropriada e pertinente para este tipo de modelos. Em todo caso, representa uma ruptura com a cosmovisão anterior, uma posição

102 "Ao contrário do que se crer, sentido e significado nunca tem sido o mesmo: o significado permanece aqui, é direto, linear, explícito, fechado em si mesmo, unívoco, poderíamos dizer, enquanto isso, que o sentido não é capaz de permanecer quieto, ferve de segundos sentidos, terceiro e quarto, de direções radiais que se vão dividindo e subdividindo-se em galhos e ramos até perder de vista, o sentido de cada palavra parece uma estrela quando se põe a projetar marés vivas pelo espaço, ventos cósmicos, perturbações magnéticas e aflições" (José Saramago, Todos os nomes).

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diferente, um "marco mental diferente" (Coulon, 1988; Woods, 1987; Madeiras, Boyle, Jeffrey e Troman, 2000, entre outros). A intencionalidade teórica já não é interventora, nem normativa, mas descritiva e interpretativa. A finalidade deixa de ser instrumental, coisificadora e economicista, para pretender conseguir, pelo menos como aplicação analítica e interpretativa, a razão comunicativa. O caráter ambíguo e indeterminado de grande parte dos acontecimentos sociais (e observado nas primeiras páginas) se incrementa nas situações educativas e escolares que, por sua própria natureza, carregam ambiguidade nas metas, juntamente com tecnologias indeterminadas e sobre as que é difícil gerar conhecimento e saber, por quanto poderiam considerar-se escassamente organizadas.

Os conceitos básicos do Interacionismo Simbólico, para efeitos de apoio aos métodos de pesquisa em Ciências Sociais e pesquisa etnográfica em particular, são os seguintes:

• O símbolo significante. É Blumer (1982, 45-57) quem, a partir dos conceitos de "si mesmo", "o ato", "a interação social", "os objetos" e "ação conjunta", dá forma ao esquema teórico da sociedade humana, implícita na obra capital de G. Mead (1982), Espírito, pessoa e sociedade. E uma das suas principais consequências, identificadas por Blumer (1982), entre outros, é a necessidade de estudar a ação (educativa, cultural ou social; individual ou coletiva) da posição do agente, ator em uma situação, uma vez que é este quem percebe, interpreta e atua frente a outros membros e ante os distintos "objetos" que podem formar a ação organizada, "mitos", ritos e “cerimônias” incluídas. Esta afirmação elementar repercutirá na utilização de novos métodos, técnicas e instrumentos específicos de pesquisa e, consequentemente, da produção de conhecimento no campo cientifico-social e educacional.

• A interação cotidiana. Delamont (1984), na "interação didática", e Rose (1982), com a formulação dos princípios da interação de uma dupla perspectiva analítica e genética do processo de socialização, desenvolvem o conceito de "interação" que, com base em um novo sentido da "pessoa" e da "sociedade", terá como foco a análise das situações de interação, "face a face". Como um todo, a "Escola de Chicago" ou o chamado "modelo dramatúrgico" de Goffman (1979, 1987) resultará contribuições não menos relevantes. No primeiro caso, a Etnometodologia, enquanto Goffman, se bem não muito explícita sobre a metodologia, desenvolvendo o internamento – nas "instituições totalitárias" – do pesquisador na situação estudada. Em qualquer caso, o Interacionismo Simbólico é uma teoria fundamentante de determinados tipos de pesquisa, como o podem ser para outros autores, e por citar exemplos opostos, a Psicanálise ou a Semiótica (Hunt, 1989, ou Manning, 1987, respectivamente). Denzin (1989) operativiza as aplicações metodológicas em pesquisa social.

Não menos decisivas resultaram as derivações estratégicas e metodológicas de pesquisa que, do Interacionismo Simbólico, perfilaram a observação participante103.

A Etnometodologia

103 Entre outros referentes, que tratarei no capítulo correspondente, antecipo a contribuição de Gans (1999, primeira edição em 1968); ou exaustiva implicação analisada por Rock (1999, primeira edição em 1979).

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Estritamente falando, a etnometodologia pode ser considerada uma das linhas básicas ligadas diretamente com o Interacionismo Simbólico. No entanto, seu marcado caráter metodológico, desde a sua origem na tese de doutorado de H. Garfinkel até o crescimento atual, sugere uma consideração mais avançada, se bem que – necessariamente – breve.

A influência metodológica na pesquisa sócio educacional da breve e densa apresentação da etnometodologia de Alain Coulon tem sido significativa. Na verdade, não é atrevido dizer que a divulgação pedagógica da Etnometodologia em nosso entorno tem sido derivada de Coulon, anates que dos textos do próprio Garfinkel (para citar apenas um exemplo, mas relevante)104. São os principais conceitos da prática, da indexicalidade, da refletividade, da expressão de 'conta', da condição de membro (Coulon, 1988, 34-44)105. Mas Coulon (1993) vai além e estabelece na seguinte definição o dimensionamento da Etnometodologia: "Analisar os métodos ou, se preferir, os procedimentos, que os indivíduos utilizam para levar a cabo as diferentes operações realizadas em sua vida cotidiana" (ibidem, 13). E aqui derivam duas consequências decisivas: por um lado, a redefinição do saber científico sobre ações e fenômenos sociológicos (no seu mais amplo sentido) antes e contra o saber vulgar (senso comum) do ator social; caso contrário, a necessidade de considerar os fatos sociais como complexidades práticas.

Assim, aparece uma nova dualidade metodológica pao se opor a uma posição normativa uma referência interpretativa. Mas, sendo importante, o imbricamento da etnometodologia na análise institucional atual talvez venha dada por uma última contribuição, também designado por Coulon (Op. cit., capítulo VI): a internalização e institucionalização, o monitoramento e a adequação, a rotulagem e o desvio com relação à “normal”, as normas e as regras. Considerações que se concretam nas seguintes questões diferenciais: em primeiro lugar, a Etnometodologia da educação quer mostrar as desigualdades em seu próprio processo de realização, em contraste com a Sociologia da reprodução, que mostra desigualdade já produzida. Em segundo lugar, a análise destas (e outras) condições concretas, a descrição, se realiza a partir da "etnografia constitutiva" (ou microetnografia da classe). A disponibilidade dos dados, o rigor no tratamento, a convergência de investigadores e investigados e a análise interativa, que evita, ao mesmo tempo, a redução psicológica e a reificação sociológica, são outras tantas características destacadas por Coulon, que leva vantagem a Etnometodologia em relação a outros métodos de investigação.

A contribuição metodológica, stricto sensu, o mais notável em pesquisa sócio educacional é a um dos primeiros discípulos de H. Garfinkel, Aaron Cicourel, ao questionar e enriquecer o sentido da "medida" em pesquisa social106.

Admite-se que há notáveis semelhanças entre Etnografia e Etnometodologia. A principal, para nosso crédito, é a que parte de uma abordagem micro para tentar superar a já repetida 104 Um comentário: esta situação não é exclusividade da Etnometodologia. Em nosso meio, proliferam os casos em que uma determinada teoria é difundida por fontes secundárias. Tudo depende, às vezes, de políticas editoriais.105 No último capítulo, e ao tentar da contribuição o francófona à pesquisa etnográfica, amplio o comentário do trabalho de Alain Coulon (refiro-me à secção 5.1.2.).106 As referências a Cicourel, tanto nos primeiros capítulos, assim como a transcendência da questão da medida em pesquisa sócio educacional que obrigará a retomar o assunto, libertar-nos aqui de mais referências. Fica, ao menos, constância de seu registro.

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oposição macro/micro, a "relevância do detalhe" de Lynch (1987). A Etnometodologia gerencia um número de conceitos-chave, já referidos, relevantes em etnografia escolar: "indexicalidade", "reflexividade", "accountability" [é um termo da língua inglesa, sem tradução exata para o português, que remete à obrigação de membros de um órgão administrativo ou representativo de prestar contas a instâncias controladoras ou a seus representados],"etnométodo"107, "membro" e "instituição": "Emprego o termo etnometodologia para se referir a investigação das propriedades racionais das expressões indexicales e de outras ações práticas como sendo realizações contingentes e permanente, das práticas organizadas e engenhosas da vida cotidiana" (Garfinkel 1967; em Coulon, 1988, 15). Reside aqui a mudança epistemológica: o fenômeno social não é um objeto estável, mas o processo dinâmico e contínuo, em que os membros de um coletivo, põem em prática um savoir-faire profano. Este é o objeto de sociólogos, que, no nosso caso, estamos a alargar ao conjunto da pesquisa etnográfica108.

A Fenomenologia

Não é uma exceção, pelo contrário, respeita a regra, sob a "fenomenologia", em seu significado moderno a partir de Husserl, proliferam tal pluralidade de tendências que... acabam tornando ineficaz – ou quando menos dificultam a operatividade – o próprio "método fenomenológico". Apesar de tudo, a referência é obrigatória, em vista da influência na teorizarização e, portanto, na pesquisa social e educacional. Em particular – e sobre ela recai o conteúdo –, a posição representada por Schütz, por apelar explicitamente para o campo das Ciências Sociais. Quintanilla (1985, entrada fenomenologia) propõe uma análise crítica, da qual deve destacar a sua adequada síntese: na fenomenologia, o que não é método emana do método.

A “fenomenologia” de Schütz é baseada, principalmente, na concepção de como as pessoas "criamos a realidade social" ao mesmo tempo que estamos sujeitos às influências que exercem as estruturas sociais e culturais em sua constante e cambiante desenvolvimento histórico. O centro das atenções é, assim, em estabelecer como o ser humano constrói sua cotidianidade a partir das relações subjetivas mediatizadas pelas restrições das estruturas sociais e culturais 109. Devedor de Weber quando utiliza os "tipos ideais", no estudo da motivação da ação, mas diferenciando-se quando Schutz confere aos sujeitos a capacidade de “construir” realidades, introduz uma construção substantivo em pesquisa social e educacional que pode induzir

107 "A expressão etnometodologia não deve ser entendida como uma metodologia específica da etnologia, nem como uma nova aproximação metodológica da Sociologia. Sua originalidade não reside ai, mas na concepção teórica dos fenômenos sociais. O projeto científico da etnometodologia é analisar os métodos, ou, se preferir, os procedimentos, que os indivíduos utilizam para chegar a bom porto as diferentes operações realizadas em suas vidas cotidianas. É a análise das formas de fazer comuns que os atores sociais ordinários mobilizam para realizar suas ações ordinárias. Esta metodologia profana – constituída pelo conjunto do que é referido como etnométodos – , que os membros de uma sociedade ou de um grupo social, utilizam de forma trivial, mas engenhosa, para viver juntos, constitui o corpus da pesquisa etnometodológica "(Coulon, 1993).108 Retomo a questão das relações entre Etnografia e Etnometodologia no quinto e último capítulo.109 Esta consideração, chave e substantiva, adiciona novas razões para a fundamentação da estrutura epistemológica implícita na primeira parte do livro em torno do sistema e do mundo de vida. Voltarei com frequência sobre essa tensão entre subjetividade-intersubjetividade e estrutura social e cultural.

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também está relacionada com a referida "multirreferencialidad": o conceito de "realidades múltiplas".

De forma mais sistemática, as influentes chaves – entre outras – da fenomenologia são apreciadas na distinção entre o "sentido comum" e a "interpretação científica", a construção da ação pelas pessoas, intersubjetiva e social, contextualizada. Frente a análise que pode reificar o cientista social, fornecem uma recuperação autônoma do pesquisador social e educacional, não isenta, felizmente do relativismo: "A relação que une o investigador em Ciências Sociais à marionete que tem criado [conhecimento] reflete, em certa medida, o clássico problema teológico e metafísico, ou seja, a da relação entre Deus e suas criaturas. A marionete apenas existe e atua pela graça do cientista; só pode reagir de acordo com as finalidades que sua sabedoria tem atribuído a ele. Tem que agir, no entanto, como se não fosse manipulado, mas dotado de espontaneidade. Uma completa harmonia tem sido predefinida entre a consciência determinada esculpida na marionete e o ambiente pré-constituído em cujo interior tem de mover-se livremente, operar escolhas racionais e tomar decisões racionais. Esta harmonia só é possível porque a marionete e o ambiente são criações do cientista. "Ajustando-se aos princípios que o tem guiado, o cientista chega também a descobrir, no interior do universo assim criado, perfeita harmonia preestabelecida pelo próprio" (Schutz, 1987, 58).

É a reificação. Tal modelagem científica do mundo social tem que estar de acordo com os seguintes princípios (ibid., 52-54): a) A consistência lógica, que garante a validade dos modelos de ação ajustados à lógica formal e possível, porque o modelo não é senão, “o instigador objetivo dos objetos de pensamento construídos pelo investigador (...) seu caráter estritamente lógico é uma das características mais importantes pelo que os objetos do pensamento científico se distinguem dos objetos do pensamento construído pelo senso comum na vida cotidiana"; b) A interpretação subjetiva, que garante "a possibilidade de se referir a todos os tipos de ações humanas ou seu resultado à significação subjetiva que uma ação ou que resultado dessa ação tem para o ator"; "para explicar as ações humanas, o cientista tem de considerar como modelar o espírito individual e que conteúdos típicos os têm de ser atribuídos a fim de explicar os fatos observados como resultado da atividade"; c) a adequação, em um modelo científico, "cada um de seus elementos apenas pode ser construído de tal maneira que um ato humano executado dentro do mundo da vida por um ator individual no sentido indicado pela construção típica seria compreensível pelo ator e por seus semelhantes, em termos de interpretação corrente da vida cotidiana".

No que se refere à teorização nas Ciências Sociais, Schutz o atribui as seguintes proposições: 1) "A finalidade das Ciências Sociais é dar com um conhecimento organizado da realidade social (...). Nós, os atores na cena social, experimentamos o mundo em que vivemos como um mundo ao mesmo tempo de natureza e de cultura, não como um mundo privado, mas como um mundo intersubjetivo, ou seja, como um mundo comum a todos nós, seja dado ou potencialmente disponível para cada um; o que implica a comunicação entre os homens e a linguagem "(ibidem, 71). 2) A intersubjetividade, a interação, a intercomunicação e a linguagem, são considerados como relevantes por qualquer uma das variantes do "naturalismo" ou do "empirismo lógico". No entanto, o problema fundamental, não resolvido pela Ciências Sociais, persiste e situa-se sobre a pertinência da própria "observação" (ibidem,

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72) e reverte o problema da teorização em Ciências Sociais a uma questão metodológica, básica no nosso caso. O interesse em Schütz se mantem assim, em compreender a cotidianidade, ou seja, o "mundo da vida cotidiana"110: "A expressão ‘mundo da vida cotidiana’ engloba o mundo intersubjetivo que existia antes de que havíamos nascido, o mundo que outros, nossos predecessores, experimentaram e interpretaram como um mundo organizado é agora dado a nossa experiência e a nossa interpretação" (ibidem, 105). No "mundo da vida", real e diferenciado da representação científica, a experiência do mundo, "minha" experiência do mundo, é "natural": eu me experimento a mim mesmo através de outros, e o outro faz a mesma coisa comigo", o "mundo da vida cotidiana" é assim "intersubjetivo", "significativo" para mim e formado por mim próprio "mundo simbólico". Revelar, tornar visível o sentido das ações cotidianas, ou seja, de tudo aquilo que "eu (e nós) resulta significativo" é, em síntese, o papel substancial das Ciências Sociais.

De particular relevância é, no nosso caso, uma das primeiras consequências desta conceituação fenomenológica: a Educação, os fenômenos educacionais, ocorrem no "mundo da vida", estão para que a pessoa aprenda a viver neste mundo da vida. Estudar cientificamente o fenômeno educativo envolve considerar assim o "processo de socialização", lugar e processo no qual se produz a aprendizagem da criança a ser parte do "mundo da vida" social. Discípulos de Alfred Schutz, Peter Berger e Thomas Luckmann publicam em 1964 (Berger e Luckmann, 1991) um dos mais brilhantes expoentes da fenomenologia em Ciências Sociais, pilar da sociologia do conhecimento, “a construção social da realidade”, obcecados com uma questão importante em nosso caso: como é possível que os significados subjetivos se voltam facticidades objetivas?

No entanto, aqui se fundamenta o conhecimento cientifico-social e educacional sob o referente fenomenológico, mas sem atingir as dimensões experienciais que são exacerbadas em alguns autores: "Tendemos a obter certa satisfação do fato de captar, do ponto de vista conceitual ou teórico, as ideias básicas da fenomenologia, mesmo quando uma compreensão real, desta apenas pode lograr-se fazendo-a ativamente" (Man(, 2003, 26-27). Ou seja, como sintetiza a tradução do título em espanhol, desde a "experiência vivida". Excessivo.

A Teoria crítica

A consideração fundanmentante da "Teoria Crítica" não é gratuita nem novidade em pesquisa social e educacional (Lakomski, 1988, por exemplo), uma vez que abundam argumentos sobre as referências. De entrada, se deve a razões justificáveis, entre as quais não são secundárias: a) o potencial crítico-social do seu conceito de "teoria", fundamental para a construção do conhecimento científico e sobre os fenômenos educativos; b) a repercussão, revulsiva e compreensiva, que resultou no avanço do conhecimento cientifico-social (Adorno, Horkheimer, Charlotte, Marcuse, na primeira fase e Habermas, atualmente, como herdeiro desta tradição teórico crítica) têm sido e continuam a ser na redefinição do campo, significado e propósito das Ciências Sociais (e, portanto, das Ciências da Educação e da pesquisa educacional); c) por ter servido como orientação teórica básica e relevante para os

110 Expressão enunciada por Alfred Schutz em 1945.

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epistemólogos e metodólogos atuais; d) pela indiscutível influência na elaboração dos quadros teóricos atuais em vigor na análise dos fenômenos psicológicos, sociológicos e pedagógicos, entre outros.

A dúvida, o relativismo e a crítica, seguindo a brilhante exegese realizada por Gimeno Lorente (1995), são "critérios fundamentais na Teoria Crítica" assumidos como princípios transversais de pesquisa etnográfica que, identificados, perfilam notáveis influências no campo sócio-psico-pedagógico e no campo da teorização.

Pela reflexão pedagógica da teoria crítica da educação: "Pedagogia Critico-comunicativa" e a realização ainda maior em "Critico-constructiva

didática", em particular, Schaller e Klafki ou a ilustração recente destes princípios em uma "avaliação crítica" (Gimeno Lorente, 2001) nos isentar de mais detalhes.

Influência de ensino e, em conseqüência, a inclusão no contexto académico, a crítica da teoria da sociedade, primeiro e educação, em seguida, coloca uma concepção "comunicativa" interessada por "sentido" do processo e a finalidade de "emancipação".

Pela inter-relação tenso sistema/mundo da vida: Com o resultado de menor interesse na teoria crítica e em particular, a obra

habermasiana, é chave na justificação referencial do campo cientifico-social e educacional e particularmente entrincheirado na pesquisa etnográfica. A fenomenal complexidade de nosso espaço é reificaran, investigação de caso a caso, após investigação, a tríade interativa que dá significado e dá significados: por um lado, o "mundo de vida", por essa escola e a educação preservar o conteúdo simbólico da sociedade; outro e ao mesmo tempo, escola e educação são protagonistas em anteriormente simbólica jogar o jogo funcional; durante o interregno, a tensão do indivíduo que, por sua vez, objetiva a contradição entre a tendência à emancipação do mundo da vida e socialização, reprodução cultural e integração social do sistema.

Garfos de racionalidade em diferentes modalidades da razão: o sistema de instrumentação, a comunicação do mundo da vida e a crítica para as contradições, conflitos e tensões das interseções. A razão instrumental e razão comunicativa que conjuntos de investigação sócio-educativo e, consequentemente, consideram os métodos de pesquisa em diferentes lógicas. Assim, o etnográfico vai sediar o comunicativo e críticas, enquanto o piloto responsável pela razão instrumental. Mesmo a lombada entre a objetividade a subjetividade, de pé no rigor científico do pesquisador sócio-educativo, eleva-se a uma consideração do "Inter-subjetividade como um grau máximo de objetividade" tendo em conta a natureza dual da fenomenal do nosso objeto de estudo por excelência e comum ao conjunto das ciências sociais[1]

Contribuição de habermasiana para a reconceptualização da teoria educacional, o que significa, entre outras características:

A validade de um postmetafisico de pensamento. A virada linguística na construção do pensamento. O caractere "localizado", "contextualizada", "razão".

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O investimento na primazia da teoria sobre a prática, ou o apoio prático da teoria.

Características que permitem a desconstrução e reconstrução de espinha dorsal dos métodos de investigação[2] .

1.2.3. Estruturação transdisciplinar conhecimento cientifico-social e educacional

Sentido, funções e usos do conhecimento cientifico-social e educacional

No que diz respeito a riscos e reducionismo

Em seguida o caráter, os riscos: a intenção desta seção é uma tentativa de delinear alguns dos riscos que acompanham o conjunto da investigação sócio-educativa e reducionismo. Uma vez que não é refutar os argumentos do outro, mas uma tentativa de avançar, referiremos cinco riscos experimentados nas últimas décadas que mantêm, teria inevitavelmente degenerar patologia irreversível.

Primeiro risco epidemiológico. A pestilência"metodológica": "neste momento [1913, sic], prevalece em nossa disciplina [Sociologia] algo parecido com uma pestilência metodológica." Assim, é impossível encontrar um trabalho empírico, cujo autor - no interesse da sua própria reputação - não cria necessário levantar algumas considerações metodológicas do' (...). Andá-lo não é necessário conhecer a anatomia de suas próprias pernas. Anatomia torna-se algo realmente importante apenas quando algo dá errado "(Weber, 1985, IX). No caso da investigação sócio-educativa não é "que algo (go) mal", mas também tem o corpus científico desejável. Mantém a sua validade o teste desenvolvido em 1919 por Weber (1986) sobre "a política e o científico" amplamente conhecido e mantém a dependência excessiva da cientista político social e educacional. Em segundo lugar, dificilmente atende a investigação, na pureza, problema específico um. E a falta do imediatismo nos resultados penalizar mais uma vez o apoio institucional e o reconhecimento social. Agora, se entendi corretamente formular o problema como um primeiro passo em direção a uma resolução adequada, métodos de pesquisa para atender a essa exigência: permitem a descrição, a interpretação intersubjetiva da realidade cultural dos fenômenos sociais, educacionais e escolas se você quiser, na realização de cada um dos "casos" analisados ou no geral. E é baseado em uma descrição e análise relevante quando se trata de ensaiar soluções participativas, críticas ou emancipatórias.

Segundo o risco epidemiológico. O silêncio da crítico. Metodologicista obsessão esconde, na avassaladora sócio-psico-pedagógica produção, um pouco crítica, o pensamento, mesmo - é uma opinião - um pouco pensei, que às vezes, mesmo escondidas sob referências a movimentos filosóficos. Em particular, é considerável atribuição devocional a Habermas e a "escola de Frankfurt" em particular, paradoxalmente referida por escolas, autores e estudiosos de posições opostas (em alguns casos em frente o próprio Habermas). Aplica-se, no entanto, a Fundação desde o impacto são analisadas em profundidade e, ocasionalmente, mismatches,

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metodológicas, como é operationalizes os countercultures de construção da "Ação comunicativa"?

Terceiro risco epidemiológico. A modernização dos métodos de investigação. Exemplo óbvio é a automação por via informática: "computação estatísticas" ou "o processamento do computador de informações qualitativas" trazer agilidade para o sempre - por vezes melhores - tedioso (?) tempo de processamento de dados, mas garante rigor na posterior análise e interpretação dos resultados? Richards e Richards (1994, 445-462), oferecem um excelente exemplo de motivos[3] .

Quarto risco epidemiológico. A descarrilar metodológica, ou procura o equilíbrio necessário, durante todo o processo de pesquisa e, em particular no campo, entre a atenção para a relevância metodológica e adequação ao contexto da investigação.

Quinto risco epidemiológico. A síndrome de desespero silencioso, suficientemente definida por Howe e Eisenhart (1993, 183): "uma doença que ataca o sistema nervoso dos doutorandos. Os alunos que sofrem ele iniciar com um método ('Eu quero fazer um estudo qualitativo', 'Eu quero fazer uma MANOVA' [sic]) e, em seguida, embarcar na busca para a questão. Assim, o problema de incompatibilidade entre as perguntas de pesquisa e técnicas de coleta de dados é investido em sua cabeça". O segundo significado da síndrome é a pesquisa de época pronto a usar... Leva a um tipo ou outras pesquisas.

Mas há um risco de Cruz, para a pesquisa educacional exógeno e endógeno ao conjunto das ciências sociais e educação que, entre outras declarações, inclui a Revolução virtual e gestão do conhecimento (Hartley e Bendixen, 2001, para citar uma referência recente sobre o impacto da Internet sobre a construção do conhecimento científico); globalização econômica e as tentativas de recomposição dos Estados de bem-estar, de Porto Alegre para a "terceira via" agredidas (Peter Mandelson, antigo ministro do trabalho do governo de Tony Blair, referindo-se outro exemplo de não-científico), passando pela miséria e fome de dois terços da população do mundo... As ciências sociais estão tentando entender o mundo em que vivemos desde a base da pesquisa empírica e teóricas ferramentas que criam um espaço de interação e debate, em que você procurar pontos de encontro e superação (Castells, 2001, referindo-se a um ilustre estudioso)[4], mas ao mesmo tempo um compromisso - um novo espaço - espaço para os outros, para todos os outros. É a continuidade da história e a evolução do conhecimento, nosso conhecimento e nossas vidas sempre fascinante.

Persistência na ética e o compromisso do pesquisador

A pluralidade de perspectivas epistemológicas são evidentes; a discussão metodológica, uma das consequências óbvias. No entanto, surgem a partir da posição que você quer, existe um denominador comum para que as pesquisas em e sobre educação que, além disso, não difere de todo o resto dos pesquisadores sociais: é, em primeiro lugar, o compromisso do estudioso de progresso, desenvolvimento e as condições de vida e existência do povo. Em primeiro lugar, a investigação sócio-educativa deve ser parceiro no desenvolvimento dos valores filantrópicos, mesmo emancipatórias, de toda a sociedade e as pessoas que a constituem (uma vez acionado). Ética, em espessura, é inerente ao exercício da investigação, questionar, interpretar

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e aplicar a partir de uma ou outra posição - razoável todo-metodológico ou epistemológico. Os códigos de conduta permanecem um substrato de fiador deste objectivo final.

Cada opção epistemológica implica, no entanto, uma operação diferente. Tojar e Serrano (2000) mostraram a distinção entre as decisões relativas ao "a manipulação de variáveis", a interpretação de dados e comunicação relevante dos resultados para os informantes, ou transformação complicada de estudadas, em correspondência com a pesquisa empirico-analitica, humanistico-interpretativa, ou crítica. Ambos os oradores permanecem, nos comentários que fez os padrões éticos desenvolvidos pela Associação Americana de pesquisa educacional (AERA), as considerações que, em nossa área de investigação sócio-educativa, exige não só os estudiosos-se, mas a preservação obrigatória dos direitos universais dos sujeitos investigados pelas partes envolvidas no financiamento, divulgação e implementação dos resultados da investigação.

Utilitária

Ética

Relacional

Ecológica

Recrutamento

fontes de informação

1.

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Consentimento do informante

eu.

Reciprocidade

eu.

Colaboração

1-

Sensibilidade cultural

Trabalho de campo

2.

Evitar danos

2.

Evitar a injustiça

2. Evite imposições

Page 100: Tradução do livro__Métodos de investigación etnográfica en Ciencias Sociales

2.

Evitar não tem implicações

Relatórios

3.

Confidencialidade

3.

Imparcialidade

3.

Confirmação

3.

Reação comunicativa

Page 101: Tradução do livro__Métodos de investigación etnográfica en Ciencias Sociales

Figura 14: Referente ético (Flinders, 1992)

Ética não pode ser classificada em três caixas, o que seriam ignorar a moralidade da pesquisa como um ato humano e desconsideraría, no sentido da ética mais restrito e radicalizada, uma questão fundamental para a investigação sócio-educativa: a análise da linguagem moral, mas, sem dúvida, esclarece o Decálogo (Figura 14).

Ele não pode ser atribuído de forma meridiano sobre éticas relativas exclusivamente a um tipo de investigação sócio-educativa. Pensamento, conhecimento, ciência, ou sejam devidas, com grandiloqüência, humanidade (e as pessoas que compõem a ele), ou perder o seu sentido. Ciências sociais tem, esta dívida, uma responsabilidade dupla: por um lado, sua razão ' être obriga a uma disciplina de produção de conhecimento que ele reversa em seu próprio objeto, pessoas e diferentes circunstâncias e condições em que coexiste com seus pares. Mas, ao mesmo tempo, foi responsável pela Social Sciences do acompanhamento e análise dos efeitos diretos e indiretos que têm novos conhecimentos de outras áreas disciplinares e científicas. E, em particular, para a ciência da educação e pesquisa, portanto, a educacional, educacionais e culturais de implicações.

Pesquisa etnográfica mostra, neste contexto, particularmente sensível a um compromisso para minorias e situações comparativamente mais desfavorecidas, mas sem esquecer que todos a maioria é capaz de compreender de um cluster das minorias até o indivíduo. Envolvimento do investigador metodológica forte-investigados, portanto, não é apenas um recurso de pesquisa, mas é, ao mesmo tempo, um meio de intervenção e melhoria imediata. Enquanto esta posição gera alguns problemas e limitações, persiste a pesquisa etnográfica na ligação substantiva para a realidade e nestes, para o mais problemático e levantado[5] .

Esboço de uma estruturação teórica interdisciplinar

Posições teóricas derivadas de pesquisa no campo educacional e cientifico-sociais

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A. Três são posições finalistas que podem ser condenados a pesquisa em ciências sociais: por um lado uma historicista da finalidade de que as tentativas de dar razão para o que aconteceu no universo social; outro, as declarações explicativas de certos fenômenos, parcial ou universal, dando forma ao presente; finalmente, preempção de extrapolação de uma posição que prevêem as alternativas futuras. Aplicar tais fins a investigação sócio-educativa, grosso modo, a distinção - matizada - estadias.

B. "Como nós ainda colocamos os antolhos que fez do século XIX, somos incapazes de realizar a tarefa social deseja executar e querendo o resto do mundo que chamamos deve: racionalmente, apresentando a alternativa histórica autêntica que temos diante de nós" (Wallerstein, 1990, 398). Esta declaração enfática do Wallerstein, para ter certeza, não é menos em relação a abordagem anterior. Na verdade, continuamos aparentemente com orçamento ancorado no passado. A pergunta a discernir não é, no entanto, a simples superação formal de tais orçamentos, mas a possibilidade ou não do (pesquisador) - humanos em relação os cavalos (para seguir com o símile dos antolhos) dispensar com ou não de tal encaixe, como proteção para o cavalo como útil para seu adestramento. Se a hipótese se inclina para a impossibilidade, a subsequente a considerar a questão é a composição da corrente "antolhos".

A finalidade de apresentar ao mundo que o "real alternative" olha como é louvável. No entanto, ainda não resolver o finalista da questão das ciências sociais: a qual das ciências sociais e, consequentemente, da pesquisa. A "alternativa real" vontade racional sempre dependem do modelo de razão implícito no pesquisador que soletram para fora e não tanto sobre a base de um conhecimento chamado - Leia análise científica. Dada uma lei física pode predizer o comportamento de um corpo em um ambiente particular, mas estabelecidos uma alternativa sociológica, a ley-razon não é social, mas ideológica, porque, mesmo admitindo que constante características e propriedades de "atmosfera social" que estabelece a alternativa, isto não necessariamente aconteceria permanecem. A "alternativa" é verdadeira para um modelo de justificação, no que se refere:

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[1] Exemplar da questão tratada, entre outros, pelo referido paz Gimeno.

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[2] a apresentação inicial do presente capítulo que refletiu, graficamente, o eixo de contribuição conjunta do sistema mundial de referência de vida e a conseqüente tensão dialética, assim, adquire o lugar que ele merece.

[3] Mais recente na minha experiência particular, o uso da versão 2.0 do pacote de software bem conhecido "QSR NVivo" ele está fornecendo resultados altamente satisfatórios. A - reiterar - tão enfadonho como a árdua tarefa de rotina de codificação de dados em páginas e páginas de informação, é transformado em algo suportável, mesmo em algum momento, grata (consulte o capítulo quarto).

[4] é de interesse, colateral, se quiser, mas digno de menção, a variante sinérgica da gestão do conhecimento na revitalização de geopolítica, económica e cultural das regiões (ver, um exemplo de interessados, Grosseti e Losego, 2003).

[5] Com mais detalhe e extensão, recuperar esta questão no último capítulo.