Trilhas interpretativas

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    TRILHAS INTERPRETATIVAS COMO ESTRATGIA METODOLGICA PARA

    O ENSINO MDIO DE BIOLOGIA.

    CECCON, Simone- UFGD (PG Educao para Cincia UNESP Bauru-SP)[email protected]

    EDUCERE: Teoria, metodologia e prtica

    Resumo

    Na incessante busca de estratgias de ensino de biologia no Ensino mdio, que atenda aospressupostos dos Parmetros de Curriculares Nacional (PCNs), e de fuga do ensino tradicional,

    optou-se pelo uso de atividades de Educao Ambiental (EA), a saber, trilhas interpretativas (estudodo meio) como estratgia metodolgica de ensino. O presente trabalho apresenta esta experincia efaz uma analise do uso desta estratgia metodolgica. As atividades foram desenvolvidas em umaEstao Ecolgica, Unidade de Conservao (UC), de outubro a dezembro de 2000. E os resultadosobtidos foram surpreendentes, mostrando-se um caminho frutfero para o desenvolvimento decontedos conceituais, procedimentais do Ensino de Biologia.

    Palavras-chave: Educao Ambiental, Pcns para o Ensino Mdio de Biologia, TrilhasInterpretativas, Metodologia de Ensino de Biologia.

    Introduo

    Em anlise histrica e documental do ensino de Biologia percebe-se uma incessante busca

    de estratgias de ensino, que estimulem aos aprendizes curiosidade sobre o mundo que os cerca,

    que os torne capazes de compreender, explicar e atuar de modo positivos sobre fenmenos naturais

    relacionados a cincia e tecnologia, aplicando para isso conhecimentos adquirido ou desenvolvidos

    nas aulas de Biologia, (LDB n. 4024/61; LDB n. n.5692/71; LDB n 9394/96; CNE n.15/98;

    PCNs/98; KRASILCHIK, 2001).

    Aliando-se a este desafio, com o intuito de contribuir e orientar para a superao do mesmo,

    o Conselho Nacional de Educao lana atravs da Resoluo n.15/98 Diretrizes Curriculares para

    o Ensino Mdio. Tais diretrizes orientam para uma reorganizao das reas de conhecimento

    (interdisciplinariedade) e a promoo de valores como a sensibilidade e a solidariedade, atributos da

    cidadania (transdiciplinariedade). Para tanto, sugere a adoo de estratgias de ensino que

    desenvolvam competncias e habilidades dos alunos, bem como potencializem a interao entre

    professor-aluno e aluno-aluno, e de ambos com meio onde vivem visando a constituio de um

    conhecimento coletivo. Essas estratgias devem organizar os conhecimentos de diferentes reas em

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    um dilogo permanente, de forma contextualizada, aproveitando as ralaes entre os contedos para

    dar significado aos contextos. No que se refere ao ensino de Biologia, as diretrizes apontam como

    objeto de estudo o fenmeno da vida em toda sua diversidade de manifestaes, incluindo a anlise

    das implicaes sociais e ambientais do desenvolvimento tecnolgico e da cincia.

    Reforando estas orientaes para o ensino mdio de Biologia, os PCNs/98 destacam, entre

    seus os objetivos, o desenvolvimento de habilidades e competncias. Classificando como

    competncias a capacidade de compreenso da vida como um sistema integrado, que interage como

    ambiente qumico, fsico e biolgico.Capacidade de decidir diante de situaes problemas,

    organizar informaes para construo de argumentao consistente e interveno no ambiente

    sociocultural com propostas criativas. E como habilidades o documento enfoca a capacidade de

    relacionar a linguagem de determinada rea de conhecimento com sua formulao em outras formasde linguagens, e atravs delas analisar criticamente, de forma qualitativa e quantitativa, as

    implicaes ambientais, associando-as problema sociais, polticos, econmicos. Diante da

    diversidade da vida, estar apto para analisar do ponto de vida biolgico, fsico e qumico;

    compreender o carter sistmico do planeta e reconhecer a importncia da biodiversidade para a

    continuidade da vida, relacionando condies do meio s intervenes humanas.

    Como sugestes de prticas-pedaggicas os PCNs/98 apresentamum programa de estudo

    que parta de um grupo de seres vivos em particular, utilizando para tanto, conhecimentos

    biolgicos, fsicos, qumicos, amparados por outros conhecimentos como histria, geografia,

    matemtica, entre outras disciplinas, para que, juntos, possam facilitar a compreenso do todo.

    Destacando para isto, o estudo do meio.

    Somando a estas orientaes encontra-se o esforo de diversos pesquisadores na rea de

    educao para o ensino de cincias e biologia. A exemplo temos Krasilchik e Trivelato (1995 p.2.)

    As autoras afirmam que diante dos avanos que a Biologia obteve no sculo XX tornado o homem

    capaz de transformar a sua vida e toda a biosfera, e criando com isto, melhoramentos e problemasque afetam a vida de todos, a sociedade necessita compreender e analisar criticamente para que

    possa posicionar-se diante de tais adventos. Tal posicionamento depende de uma slida base de

    conhecimentos que deve ser fornecida na escola, o que justifica, segundo as autoras, a necessidade

    de selecionar tpicos no Ensino de Biologia que sirvam s necessidades sociais e individuais dos

    alunos, indicando sua relevncia e significado no plano individual e coletivo, pois acreditam na

    possibilidade de um ensino capaz de transformar o indivduo em um cidado capaz de tomar

    decises com base em conhecimentos slidos e cientificamente vlidos.

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    Para a professora Krasilchik (1996), a adoo de um conjunto de objetivos do Ensino de

    Biologia, determina que novos assuntos devam fazer parte de programas, incluindo no apenas

    aspectos de cincias puras como tambm aqueles que tratam da aplicao das cincias para a

    soluo de problemas scio-ambientais concretos. Por exemplo, o estudo da fisiologia passa a ter

    importncia como subsdio para anlise de fenmenos bio-sociais, assim como o estudo da ecologia

    e da histria do desenvolvimento tecnolgico e cientfico podero facilitar a anlise de problemas

    scio-ambientais (KRASILCHIK,1996).

    Desde a dcada de oitenta a autora chamava a teno que embora a maior parte das

    atividades da disciplina de Biologia seja realizada no ambiente escolar, preciso fazer com que os

    alunos entrem em contato com ambientes naturais, alterados e criados pelo homem; para tanto,

    fundamental a incluso de atividades fora da escola, que coloquem o aluno em contato direto com arealidade, pois quanto mais as experincias educativas assemelham-se s futuras situaes em que

    os alunos devero aplicar seus conhecimentos, mais fcil se tornar a concretizao do aprendizado.

    A autora destaca ainda como vantagem s atividades fora de sala de aula, a facilidade de trabalhar

    diferentes contedos de forma integrada, ligando esses contedos a fatos e a fenmenos, pois, para

    ela, a falta de interdisciplinaridade fonte de grandes dificuldades no aprendizado de Biologia. O

    contedo apresentado dividido em compartimentos, sem propiciar ao aluno a oportunidade de

    visualizar o conjunto, o que se faria mostrando-lhe as ligaes entre os fatos, fenmenos, conceitose processos aprendidos (KRASILCHIK, 1986)

    Chapani (1997), conclui em seu trabalho de curso de especializao, que o estudo do meio

    uma estratgia que pode abordar diferentes aspectos relacionados ao estudo de cincias, como

    atender as necessidades pedaggicas, pois possibilita o desenvolvimento de contedos, e

    proporcionam condies para a sensibilizao a questes ambientais. A pesquisadora destaca ainda

    que detectar e buscar solues para problemas locais pode gerar discusses mais ricas e produtivas,

    pois os alunos inserem-se no contexto como agentes transformadores e ampliam o espao departicipao nas aulas, ou da construo dos seus conhecimentos, pois podero expor suas

    concepes sobre o assunto em pauta, trazendo sua bagagem cultural para as aulas, facilitando ao

    professor refor-los quando corretos ou lev-los a um questionamento a cerca de suas concepes.

    Para Gonalves (1990), oportunizar aos alunos o estudo em contato direto com o

    ambiente local pode clarear e reforar conceitos e fomentar valores ticos, pois no cuidamos

    daquilo que no gostamos, e no podemos gostar de coisas que no conhecemos. O que nos leva a

    crer que o destaque da temtica ambiental, no ensino de Biologia, possa facilitar tanto a construo

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    de conhecimentos tcnicos e cientficos (contedos conceituais e procedimentais) quanto a

    formao cidadania (contedos atitudinais). Krasilchik (1996 p. 181) afirma que os professores de

    Biologia tm obrigao de incorporar-se ao processo de EA, tanto discutindo os princpios

    biolgicos necessrios para a compreenso dos problemas ambientais, nas aulas de seus cursos

    regulares, quanto, como membros de uma equipe interdisciplinar na escola ou nos grupos

    comunitrios.

    A Lei N. 9.795, de 7 de Abril de 1999, que institui a Poltica Nacional de Educao

    Ambiental (EA), traz em seu primeiro captulo a concepo sobre EA que se traduz em processos

    por meio dos quais o indivduo e a coletividade constrem valores sociais, conhecimentos e

    habilidades, atitudes e competncias voltadas para a conservao do meio ambiente, bem de uso

    comum do povo, essencial sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade. O artigo 2 afirma que

    a EA um componente essencial e permanente da educao nacional, devendo estar presente de

    forma articulada em todos os nveis e modalidades do processo educativo, em carter formal e no-

    formal. O artigo 8, inciso 3 do captulo 3, incentiva aes de estudos, pesquisas e experimentao

    voltados para o desenvolvimento de atividades metodolgicas, visando incorporao da dimenso

    ambiental de forma interdisciplinar, nos diferentes nveis e modalidades de ensino.

    Percebemos ento, que h um consenso entre os educadores envolvidos com o ensino de

    cincia biolgicas e pelas polticas pblicas educacionais que o estudo do meio pode constituir-se

    numa ferramenta metodolgica. Instigada por estas leituras, acrescendo-se o fato de que no

    municpio de Assis- SP,onde eu vivia na poca, haver uma unidade de conservao que no

    diferentes de outras reas de preservao, sofre lenta e constante degradao pelo desmatamento,

    queimadas, caa ilegal, e invases por usurios de drogas, ciclistas e motociclistas que vem nos

    obstculos das estradas rsticas, excelente pistas para ralis, interferindo diretamente na

    sobrevivncia da fauna local. Justificando a necessidade de desenvolver-se um trabalho com a

    populao local de conscientizao da importncia do Cerrado.

    Contudo, como afirma Cardoso (1995, p.11):

    se crise perigo, tambm momento de liberao de foras criativas em busca de

    solues, em busca de uma nova sociedade, em cujas bases est a solidariedade planetria:

    entre homens e destes com outros seres vivos e no vivos. Pois todos fazem parte do

    mesmo universo.

    Por estas razes, elegi o estudo do meio atravs de trilhas interpretativas, mais

    precisamente o estudo de um ecossistema local (Cerrado), como mtodo de ensino, e a partir deste

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    trabalhar todos os contedos relacionados ao Ensino de Biologia. As atividades programadas

    objetivavam facilitar este estudo, relacionando com a Histria local, alm de enfocar elementos

    polticos e socioculturais da regio. Para isso, busquei desenvolver como contedos procedimentais,

    atividades trilhas de interpretativas a campo, envolvendo os alunos no processo ensino e

    aprendizagem. Pois, para compreender e explicar o que se observa, requer a capacidade de

    relacionar conceitos e conhecimento de diversas reas do conhecimento cientfico, neste sentido a

    coeso e cooperao do grupo tornam-se imprescindvel para essa prtica. Pois como afirmam

    Mortimer e Carvalho (1996, p.6) a cooperao, que pode levar descentralizao, socializao e

    construo de conhecimento racional e dinmico. Segundo Piaget, somente as relaes de

    cooperao podem influenciar positivamente no desenvolvimento cognitivo.

    Alm do mais, certas situaes de reas extremamente atingidas pela ao antrpica,provocam indignao em quem as observa, instigam a discusses e direcionam para uma anlise

    crtica, a qual exige posicionamento poltico e postura tica individual e coletiva. Santos e Mortimer

    (2001, p. 95-111) ao discutirem a importncia da incluso de discusses sobre Cincia, Tecnologia

    e Sociedade (CTS) nos currculos de cincias, destacam que a prtica de debates em grupo

    essencial para a formao dos alunos, pois facilita a comunicao oral (ser capaz de argumentar), e

    de saber respeitar opinies dos outros; ao incorporar conceitos cientficos nas discusses, o aluno

    percebe a aplicabilidade do mesmo na vida real, o que facilita sua aceitao e consequentemente aaprendizagem; e auxilia na explicitao de valores. Os autores alertam que embora a informao

    cientfica seja importante para a formao dos alunos, no suficiente para alcanar os objetivos

    relativos formao cidadania, previstos nos currculos dos CTS. Para que tais objetivos sejam

    alcanados, necessrio que os professores incorporem s suas aulas, discusses sobre temas

    ambientais, sociais, culturais, econmicos, o que exige uma mudana de postura dos professores.

    Os autores alertam tambm, que preciso superar a viso ingnua de que, para que tais mudanas

    ocorram, basta acrescentar ou centralizar estes temas ao currculo. Para Freire (1980, p.34) umaeducao para ser vlida, precisa levar em conta a vocao antolgica do homem, a vocao de ser

    sujeito. Um sujeito que no apenas est no mundo, mas se relaciona com o mundo, que transforma

    o mundo. E a possibilidade de mudar o mundo que nos coloca a importncia do papel da

    educao, da conscincia histrica, a questo de deciso, da opo, da tica e de limites,

    (FREIRE,1999 p. 47).

    Para Tomazello (2001), o processo mais adequado para a educao ambiental aquele

    capaz de combinar os componentes: sobre, no e para o ambiente. Pois a educao sobre o

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    ambiente, compreende aes que tm por objetivo propiciar informaes sobre o ambiente. Estas

    informaes so de natureza cognitiva, fundamentas em conhecimentos biolgicos, fsicos e

    qumicos do ambiente. A premissa desse processo, que os problemas ambientais so causados por

    falta de conhecimento, portanto, a soluo reside na informao, (LUCAS apud TOMAZELLO,

    2001). As atividades de interpretao do meio, que neste caso tratava-se do bioma cerrado, pois a

    Estao Experimental e Ecolgica de Assis (EEEA) local onde foram realizadas as excurses,

    apresenta extensa rea representativa deste ecossistema, e representa cerca de 10% da vegetao no

    municpio. Para tanto elegemos os seguintes temas:

    - situar geograficamente as regies onde ocorre o Cerrado;

    - conceituar cerrado: Campo sujo; Campo cerrado; Cerrado stricto sensu e

    Cerrado;

    - Teorias sobre a origem do cerrado: xeromorfismo e escleromorfismo;

    - Caractersticas climticas, relevo, solo, vegetao e fauna;

    - Histrico da ocupao do Cerrado;

    Antes do incio da trilha, foi repassado as orientaes de segurana aos alunos, tais como:

    no pr a mo ou o p em buracos de troncos ou no solo, no por na boca folhas ou frutos

    desconhecidos e no se afastar do grupo, e retomamos conceitos bsicos sobre ecossistemas e

    elementos biticos e abiticos, como relevo, clima, caractersticas fisico-qumicas do solo, entre

    outros conceitos de ecologia. Ento, fomos entrando na mata, seguindo a trilha e parando diante dos

    pontos previamente demarcados.

    Ao chegarmos ao primeiro ponto (parada das bromlias) paramos em frente do anans,

    falamos sobre melhoramento gentico (assunto previsto no planejamento curricular da classe), pois

    o anans um abacaxi silvestre que foi melhorado geneticamente, e acabamos nos detendo muito

    mais tempo neste assunto do que prevamos. Pois, percebemos pelos comentrios e perguntas dos

    alunos, que estes no compreendiam as diferenas entre melhoramento gentico, clonagem ealimentos transgnicos.

    Uma das caractersticas interessantes neste tipo de atividade a diversidade de situaes.

    Ainda que se tenha planejado previamente pontos e assuntos chaves, a participao dos alunos,

    atravs de observaes e perguntas, muitas vezes mudavam o rumo dos assuntos e pontos de

    observao. Uma aluna, por exemplo, pergunto sobre umas manchas cinza outras vermelhas que

    apareciam no tronco de algumas rvores; eram liquens. Ento adiantamos o assunto que tnhamos

    previsto abordar em outro ponto.

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    Em frente a um Murici (Birsonima intermedia), os alunos perguntaram por que seu tronco

    era liso, enquanto que os demais tinham casca. Respondemos questo e falamos da famlia das

    Mirtaceas, muito importante no s no Cerrado, mais em outros Ecossistemas brasileiros, pois so

    na sua maioria, espcies frutferas, que alimentam a fauna local.

    Uma aluna encontrou em uma das folhas, um ndulo (galha), e perguntou-nos, porque ela

    estava enrugada. Examinamos a folha e percebemos que havia larvas, de insetos ou nematides.

    Falamos ento sobre o ciclo direto e indireto de desenvolvimentos de alguns animais, passando por

    metamorfose e abordamos tambm parasitismo e ataques de insetos e nematides na agricultura.

    Falamos ainda sobre o importante papel da seleo natural, tornando espcies mais resistentes ao

    ataques de parasitas, o uso de pesticidas e desequilbrios que causam, e finalmente, o papel dos

    predadores impedindo um desequilbrio entre hospedeiro e parasita. Mais adiante encontramos umgalho de rvore cado no cho em decomposio, em meio ao caminho que tnhamos que fazer,

    aproveitamos para falar da funo dos decompositores na cadeia alimentar. Encontramos tambm

    em nosso caminho ninhos de formigas, e falamos sobre as associaes entre os seres vivos

    (harmnicas e desarmnicas) citando os exemplos das abelhas e formigas.

    Encontramos, ainda, carqueja florescendo e uma aluna falou que era boa para emagrecer.

    Um menino disse que era boa para desintoxicar o fgado. Uma terceira menina perguntou se era

    verdade que no bom tomar chs quando a planta est em flor. Neste momento falamos sobre aimportncia das plantas medicinais, da cultura de nossos avs, das dificuldades que a populao

    brasileira tem em comprar remdios. Falamos dos cartis formados pela indstria farmacutica,

    criticou-se a posio do governo, em relao s multinacionais. E sobre o potencial fitoterpico que

    muitas plantas apresentam e so ignoradas pela populao. Para explicamos o porqu da crena de

    no consumir chs de plantas em flor, devido toxidez que algumas delas podem apresentar,

    perguntamos qual a funo da flor? E a partir da resposta (Fecundar e produzir frutos), induzimos o

    seguinte raciocnio: Se consumirmos chs de plantas em perodo de florao, estas, no produzirofrutos e consequentemente no tero sementes para garantir a perpetuao de sua espcie. Essa tem

    sido a afirmao usada por especialistas para explicar por que, as plantas desenvolveram toxidez

    durante a florao, ou seja, uma forma de auto defesa.

    No que se refere as discusses sobre a formao de cidados crticos e sensveis a questes

    ambientais e sociais, vemos que Saviani (1994), considera o conhecimento fator chave tanto para o

    processo de produo quanto para a consolidao da cidadania. A instrumentalizao justamente o

    momento em que o aluno incorpora ferramentas culturais (saber construdo ao longo da existncia

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    humana) necessrias para a leitura, compreenso e transformao da realidade existente. Quando

    chegamos rea que outrora foi devastada para uso de madeira pela FEPASA (Empresa Ferroviria

    de So Paulo) abordamos o contexto histrico da ocupao do Cerrado, e destacamos a presena de

    Samambaia-tapera, para falarmos de reconstituio natural, um aluno contou que aquela samambaia

    uma praga, o tormento dos criadores de gado, pois, quando aparecem e os bois a comem,

    morrem intoxicados, ento, paramos para refletir. Por serem precursoras e por serem txicas aos

    herbvoros, eram muito importantes no processo de reconstituio natural de reas degradadas, pois

    alm de propiciarem sombra s espcies secundrias (fotoblsticas negativas), garantiam que

    nenhum herbvoro (inimigo natural ou predador das plantas) impedisse o processo de

    reconstituio. Questionamos ento se as samambaias-tapera eram mesmo pragas.

    Chegamos ento ao ponto da trilha com presena de gua represada e outro ponto com guacorrente, onde aproveitamos para diferenciar ambientes lnticos e lticos. Paramos para sentirmos a

    diferena de temperatura, das caractersticas do solo e presena de novas espcies, pois havia

    samambaias e xaxins neste local. Na rea com gua represada (afloramento do lenol fretico),

    observamos a presena de plantas aquticas e a colorao da gua verde e falamos sobre

    eutrofizao. Os alunos perceberam que alm de liquens o tronco das rvores apresentava

    plantinhas. Essas plantinhas eram musgos, essa observao nos obrigou a abordar mesmo no

    tendo sido previamente previsto alm de evoluo dos vegetais, ciclo reprodutivo e classificao,falando evolutivamente das Criptgamas (Brifitas e Pteridfitas) que dependem de gua para

    reproduzirem-se, da o motivo por a termos encontrado ali. E Fanergamas (Angiospermas e

    Gimnospermas), abordamos ainda Organologia (partes e funes) de cada um desses grupos.

    Encontramos ainda ao longo da mata ciliar (ombrfila) um taquaral. Este tipo de vegetao

    forte sinal de transio de cerrado stricto sensu para Mata Atlntica, ou seja, caractersticas do

    Cerrado. Falamos tambm sobre os tipos de caules, tipos de folhas e representantes da famlia das

    gramneas. Na verdade que chamou a ateno para a presena do taquaral foram alguns alunos queviram nos bambus a possibilidade de tirar varas para pescar no crrego. Perguntamos de quem

    havamos herdado a cultura de pescar, coletar folhas e razes para alimentos ou remdios? Muitos

    afirmavam que herdamos essa cultura dos ndios, mas outros levantaram a possibilidade ter sido

    inserida por escravos negros ou pelos colonizadores europeus, pois j buscavam novos territrios

    em busca de especiarias para sua alimentao. Levantamos ento junto aos alunos a influncia de

    cinco povos em nossa cultura, negros, ndios, portugueses, espanhis e italianos. Todas essas

    influncias se convergem em uma nica cultura, a do povo brasileiro. Questionamos ento se

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    haveria justificativa para termos preconceitos com os costumes ou cor das pessoas que vivem neste

    pas?

    Os PCNs , assinalam para a necessidade de aproximar os alunos de conceitos, cdigos e

    mtodos cientficos afim de compreenso e participao efetiva desses alunos nesse mundo, e dessa

    forma, desenvolver o saber cientfico e tecnolgicos como condio de cidadania e no apenas

    como prerrogativa de especialistas.

    Em uma outra excurso fomos ao viveiro de mudas, onde os alunos perceberam que, para

    melhores resultados na produo artificial de mudas, necessrio que o homem reproduza

    algumas condies que ocorrem na natureza (sombrite, preparao de hmus a partir de restos e

    excrementos de animais). Retomamos as necessidades essenciais dos vegetais e dos seres vivos em

    geral para sobreviverem (ar, gua, luz e nutrientes).Zabala, (1998), sugere a observao de comportamentos como principal instrumento de

    avaliao para prticas educativas que no objetivam apenas o desenvolvimento cognitivo, mas

    tambm o desenvolvimento de capacidades, habilidades e valores. Outro fato curioso que

    observamos em relao aprendizagem dos alunos durante as trilhas, que a primeira vez que

    usvamos termos cientficos ou tcnicos enquanto conversvamos com os alunos era necessrio

    explicar o que significavam. Mas a simples continuidade do uso desses termos garantiu que os

    alunos aderissem ao vocabulrio. Por exemplo, quando chegamos em rea que outra foi devastadapor uma queimada e estava se reconstituindo naturalmente, uma aluna corrigiu um menino referiu-

    se novamente samambaia tapera como praga, dizendo que as expresses praga e lixo so muito

    relativas, pois dependem dos olhos de quem avalia ou do local onde estejam. Ouvimos tambm

    outras expresses como:

    - elas so fotoblsticas positivas;

    - essa rvore tambm da famlia das Mirtceas;

    -

    ...isso no uma rvore, um arbusto;- Aquela uma ave columbiforme.

    Durante a reviso bibliogrfica nos deparamos com afirmaes e citaes que

    apresentavam o elemento sensibilizao como muito significativo tanto no desenvolvimento de

    habilidades cognitivas, quanto s inter-relaes. Porm, observamos atravs do relato de um aluno

    durante a avaliao das atividades, que os conhecimentos cientfico e tcnico tambm favorecem a

    sensibilizao dos alunos para as questes ambientais, resultando em aes positivas, ou seja,

    favoreceu a formao da cidadania. No caso relatado pelo aluno, ele usou conhecimentos biolgicos

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    para influenciar o grupo de jovens a que pertencia, a no mais coletarem flores no Cerrado para suas

    atividades religiosas, para no comprometerem a produo de sementes e, consequentemente, o

    futuro daquela rea.

    Concluso

    Segundo Krasilchik (1986) quanto mais as experincias educativas assemelham-se s futuras

    situaes em que os alunos devero aplicar seus conhecimentos, mais fcil se tornar a

    concretizao do aprendizado. Por isso, tanto a anlises dos comportamentos observados, tanto

    durante as atividades de interpretao do meio, levam a crer que as atividades desenvolvidas

    facilitaram a compreenso dos alunos sobre o que o Cerrado e a relacionar a fauna local com as

    caractersticas fisionmicas da vegetao com elementos abiticos deste bioma; a compreenso

    histrica do comportamento do homem com esse ecossistema e as conseqncias desse

    comportamento sentidas hoje. Facilitaram ainda o desenvolvimento de sentimentos positivos tanto

    em relao ao meio quanto aos seres que o habitam, inclusive os prprios colegas, confirmando,

    assim, que o estudo do meio pode constituir-se uma estratgia didtica-pedaggica, pois supera os

    limites de sala de aula, tornando-a mais atrativa e facilitando a abordagem de diferentes aspectos

    relacionados ao estudo de Biologia. Propiciando que tais conhecimentos sirvam de embasamento

    terico para que alunos atuem de forma racional e emocionalmente corretas com o meio em que

    vivem, com os demais seres e consigo mesmo.

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

    BRASIL, Leis. Comunicado n 36 de 17 de fevereiro de 1961. Roteiro de orientao da cadeirade Cincias para o 1 ciclo do Ensino secundrio. Dirio Oficial da Unio. Braslia, DF, 18 defevereiro de 1961.

    BRASIL, Leis. Resoluo n. 8 do CFE de 1 de dezembro de 1971. Dirio Oficial da Unio, 17 dedezembro de 1971.

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