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10 Janeiro / Junho 2009 A ficção, tanto na literatura como no cinema, sempre recorreu à figura do vilão para movimentar uma trama. O mocinho, geralmente é quem recebe maior atenção numa narrativa, mas a verdadeira estre- la é o antagonista, o vilão. É ele o responsável por criar os conflitos que costuram o fio condutor de um filme ou livro. Sob uma perspectiva manique- ísta, geralmente, o bem vence o mal. Entretanto, há aqueles per- sonagens que, mesmo tendo com- portamentos julgados como erra- dos, roubam a cena e se tornam o verdadeiro atrativo, entrando para a história do cinema. É o caso do Coringa, represen- tado pelo ator Heath Ledger no último filme do Homem-Morcego, Batman – O cavaleiro das trevas (2008). Ao contrário de grande parte dos vilões já criados, este não tem um objetivo linear e simplis- ta, como, por exemplo, conquistar um território ou o coração de uma mocinha. Ele deseja instaurar o caos. Assim, ele coloca Batman e outros homens poderosos da tra- ma (como o comissário Gordon e o promotor Harvey Dent) e até mesmo a população de Gotham City em risco, ele evidencia a fra- gilidade do poder vigente e destrói o maniqueísmo. O sucesso do Coringa, neste caso, não é fruto somente da excelente atuação de Heath, que ganhou o Oscar de Melhor Ator Coadju- vante, mas também da inespera- da morte do ator. Em janeiro de 2008, ele foi encontrado morto em seu apartamento após sofrer uma overdose provocada por medica- mentos. Há aqueles que acreditam que Ledger não estava suportando Lobo-mau é coisa de criança JULIANA SABOYA E PÉROLA BORGES Para assustar gente grande é preciso muito mais que isso Heath Ledger como Coringa, numa das cenas de Batman – O cavaleiro das trevas

u l i a n a Sa b o ya e Pérola bo r g e Spuc-riodigital.com.puc-rio.br/media/3 - lobo mau é coisa de... · A ficção, tanto na literatura como no cinema, sempre recorreu à figura

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10Janeiro / Junho 2009

A ficção, tanto na literatura como no cinema, sempre recorreu à figura do vilão para movimentar uma

trama. O mocinho, geralmente é quem recebe maior atenção numa narrativa, mas a verdadeira estre-la é o antagonista, o vilão. É ele o responsável por criar os conflitos que costuram o fio condutor de um filme ou livro.

Sob uma perspectiva manique-ísta, geralmente, o bem vence o mal. Entretanto, há aqueles per-sonagens que, mesmo tendo com-portamentos julgados como erra-dos, roubam a cena e se tornam o verdadeiro atrativo, entrando para a história do cinema.

É o caso do Coringa, represen-tado pelo ator Heath Ledger no último filme do Homem-Morcego, Batman – O cavaleiro das trevas (2008). Ao contrário de grande parte dos vilões já criados, este não tem um objetivo linear e simplis-ta, como, por exemplo, conquistar um território ou o coração de uma mocinha. Ele deseja instaurar o caos. Assim, ele coloca Batman e outros homens poderosos da tra-ma (como o comissário Gordon e o promotor Harvey Dent) e até mesmo a população de Gotham City em risco, ele evidencia a fra-gilidade do poder vigente e destrói o maniqueísmo.

O sucesso do Coringa, neste caso, não é fruto somente da excelente atuação de Heath, que ganhou o Oscar de Melhor Ator Coadju-vante, mas também da inespera-

da morte do ator. Em janeiro de 2008, ele foi encontrado morto em seu apartamento após sofrer uma

overdose provocada por medica-mentos. Há aqueles que acreditam que Ledger não estava suportando

Lobo-mau é coisa de criançaJuliana Saboya e Pérola borgeS

Para assustar gente grande é preciso muito mais que isso

Heath Ledger como Coringa, numa das cenas de Batman – O cavaleiro das trevas

Vilões e Vilanias11

o peso de encarnar o Coringa e es-tava enlouquecendo. Pouco tem-po antes de morrer, o próprio ator declarou que, mesmo quando seu corpo estava exausto, sua mente não parava de trabalhar. O misté-rio do falecimento de Heath, antes do lançamento do Batman, contri-buiu para aumentar o sucesso do longa nas bilheterias.

Para a psicanalista e professora da PUC-Rio Madalena Sapucaia, este tipo de personagem é uma espécie de fuga que não se susten-taria na realidade: “O raciocínio de pensar em como seria bom vi-ver numa sociedade sem leis dura pouco. O problema é como fica a vida em sociedade se todos fizerem o que bem entendem. Nós todos temos que nos submeter ao limite do nosso gozo, e o homem da civi-lização vive esse dilema. O vilão tenta escapar das regras, e aquele que não é vilão fica infantilmen-te desejando alguns momentos de prazer”, afirma Madalena.

Assim como o Coringa, deri-vado de uma história em qua-drinhos, Darth Vader também é um personagem que vem de um mundo fantasioso. George Lucas, diretor da saga Star Wars, lançou o primeiro filme em 1977, intitu-lado Uma nova esperança. A partir de então, Darth Vader apareceu neste e em mais outros dois fil-mes, O império contra-ataca (1980) e O retorno de Jedi (1983). Porém, o que era para ser uma trilogia ganhou mais três histórias. As no-vas tramas tiveram como objetivo voltar no tempo e mostrar toda a trajetória percorrida por Darth Vader, explicando quais foram os acontecimentos que o transforma-ram no maior vilão das galáxias. A ameaça fantasma (1999); O ata-que dos clones (2002); e A vingança dos Sith (2005), acompanham o treinamento do pequeno Anakin Skywalker para se tornar um po-deroso jedi.

No longa de 2005 é quando acontece a verdadeira mudança em Anakin. O rapaz começa a ter sonhos nos quais sua esposa, a rainha Padmé Amidala, grávi-da de gêmeos, morre no parto. O jedi, então, passa a buscar formas de desafiar a morte e salvar a vida de sua mulher e de seus filhos. A solução que ele encontra é juntar-se ao lado negro da Força. Anakin perde o controle e desafia todos em sua volta, tornando-se im-piedoso. É numa batalha contra seu mestre Obi-Wan Kenobi que o traidor Skywalker muda para sempre o rumo de sua vida. Após ser derrotado por Obi-Wan, ele é salvo pelo sith Chanceler Palpati-ne, que dá a ele todo o cuidado e a força para, finalmente, se tornar o temível Darth Vader.

Quando o sobrenatural aterroriza o cinema

Os filmes de terror fazem par-te de um gênero cinematográfico que depende de um vilão, seja ele um diabo, um psicopata ou espí-ritos. O filme O exorcista, surgiu

em 1973 e tem como protagonis-ta central um demônio. Fez tanto sucesso que se tornou o primeiro filme de terror a ser nomeado ao Oscar de melhor filme. O exorcista conta a história de um demônio chamado Pazuzu que é libertado quando uma antiga estátua é en-contrada em uma escavação no Iraque. O demônio então apode-ra-se da jovem Regan MacNeil, que sofre alterações em seu com-portamento passando a cometer atos estranhos, como urinar na frente de convidados, além da fa-mosa cena em que desce as esca-das como uma aranha cuspindo sangue pela boca. Quem nunca se assustou com alguma dessas cenas?

O filme ainda teve mais três seqüências: Exorcista II - O herege (1977), O exorcista III (1990) e O exorcista - O início (2004). Além da versão do diretor, que foi lançada em 2000 com 11 minutos a mais de cenas inéditas que haviam sido cortadas na edição final do filme de 1973.

Além do sobrenatural, há dois

O capacete do temido Darth Vader

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Lecter apareceu pela primeira vez no longa O silêncio dos inocentes (1991), interpretado com maes-tria por Anthony Hopkins. O fil-me ganhou cinco Oscars e conta a história de uma jovem agente do FBI, Clarice Starling (Jodie Foster), que busca a ajuda de Hannibal para desvendar uma série de as-sassinatos. Talvez seja este o mais carismático dos vilões. Com seu gosto refinado por música clássica e seu jeito galanteador, Hannibal conquista o espectador e tam-bém mexe com os sentimentos da agente Starling. A partir desta his-tória do canibal foram feitos mais três filmes: Hannibal (2001), Dra-gão Vermelho (2002) e Hannibal – a origem do mal (2007).

Vilões do cotidiano: da realidade para as telas

O antagonista do filme Cidade

de Deus (2002) tornou-se um dos mais famosos vilões do cinema brasileiro. Dadinho, como era co-nhecido na infância, desde peque-no admirava o mundo do crime e já praticava uma série de assaltos ao lado de seu amigo Bené. Quan-do o principal traficante de Cidade de Deus, o Cabeleira, lhe dá uma arma, Dadinho então revela sua crueldade, e cresce matando sem dó. Aos 18 anos muda seu nome para Zé Pequeno, tornando-se o bandido mais perigoso e temido do local. Seu principal sonho era ser dono da Cidade de Deus e para isso não poupava ninguém. Como era infeliz no amor, Dadinho inve-java Mané Galinha, que era alto, bonito e fazia sucesso com as mu-lheres, totalmente o seu oposto. Dadinho, então, violenta a mu-lher do inimigo, desencadeando uma guerra na Cidade de Deus.

O filme Cidade de Deus foi base-ado em uma história real. Dadi-nho foi um criminoso que viveu na favela carioca durante os anos 1970 e 80. Segundo moradores da favela, sua rixa com o bandido Mané Galinha protagonizada no filme também teria acontecido na realidade.

No gênero da comédia, o vilão é geralmente personificado pela figura da sogra. O filme A sogra (2005) tem como vilã a persona-gem Viola, interpretada pela atriz Jane Fonda que interpreta uma mãe que perde o emprego e quan-do percebe que também vai perder o filho, torna-se o maior pesadelo da nora, fazendo de tudo para in-fernizar o casamento do filho.

Cada filme tem o seu vilão que, muitas vezes, rouba o lugar do protagonista. Seja uma sogra neurótica, um assassino psico-pata ou um serial killer, o vilão sempre terá um lugar de desta-que nas hiatórias contadas pela sétima arte.

personagens psicopatas pertur-badores e fascinantes: Jigsaw, de Jogos mortais, e Hannibal Lecter. O primeiro é um homem de idade avançada, muito doente, que re-solve questionar se as pessoas re-almente merecem a vida que têm. Para isto, ele cria diversos jogos macabros, nos quais os eleitos têm poucos minutos para se salvar, o que sempre implica em algum sacrifício – como serrar uma par-te do corpo ou procurar por uma chave num poço cheio de seringas contaminadas – para se salvar. Ao longo da série, que está no quinto filme e não tem previsão de ter-minar, Jigsaw segue torturando seus escolhidos com a ajuda da sobrevivente Amanda. É parado-xal como, por trás de um método tão cruel, existe uma intenção de tornar as pessoas melhores.

O psicopata-canibal Hannibal

Com seu gosto refinado por música clássica e seu jeito galanteador, Hannibal conquista o espectador e também mexe com os sentimentos da agente Starling

Dadinho, interpretado por Douglas Silva, ainda criança, antes de virar Zé Pequeno

Anthony Hopkins, como Hannibal