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JANELAS EPISTEMOLÓGICAS:
Um Recorte Teórico sobre a Pluralidade presente na Construção do Conhecimento em Turismo no Brasil
BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC) 2013
LUCIENE CRISTINA IMES BAPTISTA
UNIVALI UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ
Vice-Reitoria de Pós-Graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura Programa de Pós-Graduação em Turismo e Hotelaria - PPGTH
Curso de Mestrado Acadêmico em Turismo e Hotelaria
LUCIENE CRISTINA IMES BAPTISTA
JANELAS EPISTEMOLÓGICAS:
Um Recorte Teórico sobre a Pluralidade presente na Construção do Conhecimento em Turismo no Brasil
Orientadora: Profa. Dra. Yolanda Flores e Silva
BALNEÁRIO CAMBORIÚ (SC) 2013
Dissertação apresentada ao colegiado do PPGTH como requisito parcial à obtenção do grau de Mestre em Turismo e Hotelaria – área de concentração: Planejamento e Gestão do Turismo e da Hotelaria – (Linha de Pesquisa: Planejamento e Gestão dos Espaços para o Turismo)
Orientadora: Dra. Yolanda Flores e Silva
UNIVALI UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ
Vice-Reitoria de Pós-Graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura Programa de Pós-Graduação em Turismo e Hotelaria - PPGTH
Curso de Mestrado Acadêmico em Turismo e Hotelaria
CERTIFICADO DE APROVAÇÃO
LUCIENE CRISTINA IMES BAPTISTA
JANELAS EPISTEMOLÓGICAS:
Um Recorte Teórico sobre a Pluralidade presente na Construção do Conhecimento em Turismo no Brasil
Dissertação avaliada e aprovada pela Comissão Examinadora e referendada pelo Colegiado do PPGTH como requisito parcial à obtenção do grau de Mestre em Turismo e Hotelaria.
Balneário Camboriú (SC), 30 de setembro de 2013.
Membros da Comissão: Presidente: _____________________________________
Dr. Paulo dos Santos Pires Membro Externo: _____________________________________
Dr. Mario Carlos Beni (USP)
Membro Interno: _____________________________________ Dr. Dr. Luciano Torres Tricárico
AGRADECIMENTOS
Ao Divino Inspirador, Sumo Belo e Verdadeiro Bem, que nutri em todos nós o
amor à Sabedoria, à Natureza, à Humanidade, grata sou e graças dou.
Agradeço a ―financiadora‖ desta pesquisa, á qual esta Dissertação é
dedicada, aquela que foi minha primeira professora, minha mãe, Dirce Imes: seria
impossível sem você, Obrigada Mãe!
À minha orientadora, Dra. Yolanda Flores e Silva, por ter acreditado,
arriscado, e ficado ao meu lado, guiando meus passos, trocando conhecimento, me
dando asas para voar...
Ao corpo docente da UNIVALI, que com seriedade trata do Turismo,
enriquecendo todos aqueles que adentram seus arcos em busca do Conhecimento.
Em especial, agradeço aqueles que foram meus professores durante as disciplinas
cursadas: Dra. Raquel Maria F. A. Pereira; Dra. Josildete P. Oliveira; Dr. Francisco
dos Anjos; Dr. Miguel Verdinelli e Dr. Josemar Sidinei Soares.
Ao Presidente da Banca de Defesa, Dr. Paulo dos Santos Pires, que esteve
ao meu lado durante todo o curso, nos trabalhos com a Revista (RTVA), na
Qualificação e na Defesa. Professor, esta publicação é nossa conquista!
Ao Dr. Luciano Torres Tricárico, que levantou profundos questionamentos,
tanto na Qualificação quanto na Defesa, dedicou-se a leitura e trouxe contribuições
metodológicas, filosóficas e literárias únicas. Muito Obrigada!
Ao Grande Mestre Dr. Mario Carlos Beni, pela honra e privilégio
proporcionados em tê-lo na Banca de Defesa. Acompanho seu trabalho desde a
graduação, sua contribuição é inestimável, e a emoção em tê-lo como colaborador
em meu crescimento acadêmico e pessoal é inenarrável.
À minha Professora e Grande Mestre Dra. Doris Van de Meene Ruschmann,
coordenadora do curso no ano de meu ingresso, minha professora nas disciplinas,
participante em nossa pesquisa, minha Mentora na área de Planejamento. Palavras
faltam para descrever minha admiração. Com orgulho, sou Turismóloga – da ―Escola
Ruschmann‖.
Ao Dr. Luiz Gonzaga de Godoy Trigo, participante em nossa pesquisa, nossos
agradecimentos são infindos. Espero que encontre nestas páginas a retribuição por
sua dedicação e trabalho. Sonhos, possíveis ou impossíveis, sonhos livres!
Ao Dr. Luiz Octávio de Lima Camargo, participante em nossa pesquisa, por
ter proporcionado um dialético encontro. A transformação no encontro com o ‗outro‘,
a educação em sua práxis histórica e social. Muito Obrigada Professor!
Ao Dr. Alexandre Panosso Netto e a Dra. Marutschka Martini Moesch, pela
imensa colaboração, tanto em entrevista e reflexões, que em breve serão
publicadas, quanto no fornecimento de material bibliográfico. Faço minhas as
palavras de Agnes Heller quando diz que a Filosofia nos convida para descobrirmos
a verdade juntos!
Aos colegas de Mestrado, pelos meses de caminhada juntos. Em especial,
aqueles que se tornaram amigos. Tardes de muitas reflexões regadas a acolhedores
sotaques, meus companheiros: Sâmea Rocha, Leia Pacheco, Felipe Siqueira, e
minha grande amiga, que me acompanhou em viagens de pesquisa Janaina Blanco
de Lima. Obrigada meus amigos!
Também agradeço a todos os autores, pesquisadores, turismólogos,
educadores, filósofos, psicólogos, pensadores, músicos e poetas que direta ou
indiretamente contribuíram na composição desta pesquisa. O Conhecimento é
produzido sobre os ombros de gigantes.
Por fim, humildemente agradeço a você que me lê. É longo ainda o caminho a
ser trilhado. Faço minhas as palavras de Carl Sagan, em um Universo de múltiplas
possibilidades, é um privilégio dividir este espaço-tempo com cada um de vocês.
Esta Dissertação é dedicada à minha Mãe, Dirce Imes.
INSPIRAÇÃO
Arranca o couro cabeludo, Arranca caspa, arranca tudo, Deixa entrar sol nesse porão!
Em qualquer dia, por acaso,
Desfaz-se o nó, rompe-se o vaso E surge a luz da inspiração!
Deixa seus anjos e demônios,
Tudo está mesmo é nos neurônios, Num jeito interno de pressão...
Talvez se possa, como ajuda,
Ter uma amante manteúda, Ou um animal de estimação!
Pega a palavra, pega e come, Não interessa se algum nome
Possa te dar indigestão...
O que se conta, e se aproveita, É se a linguagem já vem feita, Com sua chave e seu chavão!
A porta se abre é de repente
Como se no ermo do presente Se ouvisse a voz da multidão.
E o que tem força, o que acontece É como um dia que estivesse Sem calendário ou previsão!
Fica à espera, de tocaia,
Talvez um dia a casa caia E fique tudo ao rés-do-chão!
Fica a fumaça no cachimbo,
Fica a semente no limão, Fica o poema no seu limbo, E na palavra... um palavrão!
Ney Matogrosso e Pedro Luís e a Parede
BAPTISTA, Luciene C. Imes. JANELAS EPISTEMOLÓGICAS: Um Recorte Teórico sobre a Pluralidade presente na Construção do Conhecimento em Turismo no Brasil. 2013. 270 f. Dissertação de Mestrado (Pós – Graduação Stricto Sensu em Turismo e Hotelaria – Mestrado Acadêmico) - Centro de Ciências Sociais Aplicadas: Comunicação, Turismo e Lazer, Universidade do Vale do Itajaí, Balneário Camboriú, 2013.
RESUMO
A pesquisa realizada foi norteada pela relevância e necessidade de ampliar os debates, reflexões epistemológicas e filosóficas acerca do Turismo e a produção do conhecimento científico. O objetivo geral foi o de caracterizar as influências epistemológicas e teóricas na construção do conhecimento do Turismo no Brasil, a partir de unidades de leitura de pesquisadores e autores brasileiros selecionados pela pesquisa. O percurso metodológico adotado para analisar estes pesquisadores e autores foi de natureza qualitativa, com pressupostos baseados no Materialismo Histórico Dialético. Estes pressupostos filosóficos foram aprofundados durante o desenvolvimento da fundamentação teórica, e a perspectiva epistemológica da abordagem dialética se fez presente durante toda a pesquisa. Ao analisarmos os pressupostos teóricos e epistemológicos dos autores-pesquisadores selecionados, efetuamos um recorte teórico e abrimos uma ‗Janela Epistemológica‘ sobre o conhecimento em Turismo no Brasil, evidenciando sua interdisciplinaridade. No total foram três informantes entrevistados, e esta participação veio a enriquecer nossa compreensão sobre o desenvolvimento dos Programas de Pós – Graduação em Turismo no Brasil, bem como do conhecimento até então desenvolvido. A pesquisa revelou os diferentes caminhos epistemológicos traçados pelos autores em suas respectivas produções, em um diálogo intenso e interdisciplinar com suas áreas de formação. Além disso, dentre os resultados alcançados, pudemos perceber a riqueza da interface entre o Turismo e outras áreas do conhecimento, trazendo impactos positivos sobre a produção científica, que se dinamiza entre as múltiplas temáticas que podem ser abordadas. Desta forma, nossa pesquisa não busca esgotar a análise, mas sim levantar o debate e a discussão, suscitar novas investigações na temática, que efetuem uma constante reflexão sobre sua própria epistemologia, podendo assim contribuir para o avanço do Turismo como campo do conhecimento.
Palavras – chave: Turismo; Epistemologia; Conhecimento; Educação; Dialética.
BAPTISTA, Luciene C. Imes. EPISTEMOLOGICAL WINDOWS: A Theoretical Reflection on the Plurality that exists in the Construction of Knowledge in Tourism in Brazil. 2013. 270 f. Master‘s Degree Dissertation (Postgraduation Stricto Sensu in Tourism and Hotel Management – Master‘s Degree) – Center for Applied Social Sciences: Communication, Tourism and Leisure, University of Vale do Itajaí, Balneário Camboriú, 2013.
ABSTRACT
This research was guided by the importance and need to widen the debates and epistemological and philosophical reflections on Tourism and the production of scientific knowledge. The overall objective was to characterize the epistemological and theoretical influences in the construction of knowledge in the area of Tourism in Brazil, based on units of reading of Brazilian researchers and authors selected for the study. The methodological approach used to analyze these researchers and authors was a qualitative one, with premises based on Dialectic Historical Materialism. These philosophical premises were investigated in more depth during the development of the theoretical basis, and the epistemological perspective of the dialectic approach was present throughout the research. By analyzing the theoretical and epistemological premises of the selected authors and researchers, we provide a theoretical reflection and open an ‗Epistemological Window‘ to knowledge in the area of Tourism in Brazil, demonstrating its interdisciplinary nature. Three informants were interviewed, and their participation enriches our understanding of the development of Postgraduate Programs in Tourism in Brazil, as well as the knowledge developed so far. The research revealed the different epistemological paths outlined by the authors in their respective works, in an intense, interdisciplinary dialog with their areas of training. Also, among the results obtained, we can see the richness of the interface between Tourism and other areas of knowledge, bringing positive impacts on scientific production, which is dynamized among the multiple themes that can be addressed. Our research, therefore, does not seek to be an exhaustive analysis, but rather, to encourage debate and discussion, prompting further studies on the theme that offer a constant reflection on their own epistemology, thereby contributing to the advancement of Tourism as a field of knowledge.
Keywords: Tourism; Epistemology; Knowledge; Education; Dialectic.
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas
ANPTUR Associação Nacional de Pós-graduação e Turismo
ARENA Aliança Revolucionária Nacional
CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CNPQ Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
EACH Escola de Artes, Ciências e Humanidades
ECA Escola de Comunicação e Artes
EMBRATUR Empresa Brasileira de Turismo
IES Instituição de Ensino Superior
MDB Movimento Democrático Brasileiro
MEC Ministério da Educação e Cultura
MHD Materialismo Histórico Dialético
MTUR Ministério do Turismo
PPG Programa de pós-graduação Stricto Sensu
RTVA Revista Turismo Visão e Ação
SNPG Sistema Nacional de Pós-Graduação
TCLE Termo de Compromisso Livre e Esclarecido
UAM Universidade Anhembi Morumbi
UCS Universidade de Caxias do Sul
UECE Universidade do Estado do Ceará
UEL Universidade Estadual de Londrina
UF Unidade da Federação
UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte
UNB Universidade de Brasília
UNIVALI Universidade do Vale do Itajaí
UNOPAR Universidade Norte do Paraná
USP Universidade de São Paulo
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Quadro 01 – Resultados de Busca na Base de Dados SCIELO.................................... 21
Quadro 02 – Exemplos de Reflexões no Método Dedutivo............................................ 43
Quadro 03 – Critérios de seleção dos Autores/Pesquisadores para a pesquisa........... 88
Quadro 04 – Programa de Pós-graduação em Ciências da Comunicação – ECA – USP................................................................................................................................. 169
Quadro 05 - Programas de Pós-Graduação Ciências Sociais Aplicadas – Turismo...... 175
Quadro 06 – Mestrados Profissionais em Turismo reconhecidos pela CAPES............. 176
Quadro 07 – Cursos de Pós-Graduação Stricto Sensu em Turismo reconhecidos pela CAPES e selecionados pela pesquisa............................................................................ 177
Figura 01 – Exemplo de Reflexões do Método Dedutivo............................................... 43
Figura 02 – Exemplo de Reflexão na dinâmica do Método Indutivo (Empirismo).......... 52
Figura 03 – Dinâmica do Método Hipotético-Dedutivo (Método Científico).................... 64
Figura 04 – Dinâmica do Método Materialista Histórico Dialético.................................. 79
Figura 05 - Página de Busca de Currículo Lattes........................................................... 87
Figura 06 - Fluxograma Geral da Comunicação Humana.............................................. 90
Figura 07 - Placa de Bronze ofertada pela Touring Club do Brasil a São Paulo – SP em 1934........................................................................................................................... 112
Figura 08 – Comparativo por Geografia, Instituição de Vínculo e Área de Atuação...... 202
Gráfico 01 – Divisão de Cursos de Graduação em Turismo por tipologia da IES em 1996................................................................................................................................. 138
Gráfico 02 – Divisão dos Cursos de Graduação em Turismo por Região em 1996....... 138
Gráfico 03 – Evolução por ano de Programas Acadêmicos Stricto Sensu no Brasil..... 197
Gráfico 04 – Programas de Pós-Graduação no Brasil em Turismo............................... 198
Gráfico 05 – Progressão Linear dos Programas de Pós-graduação Stricto Sensu em Turismo no Brasil............................................................................................................. 199
Gráfico 06 – Distribuição de Programas Stricto Sensu por Tipologia – 2013................ 200
Gráfico 07 - Distribuição de Programas Stricto Sensu por Tipologia – 2013/2015........ 201
SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO: OS CAMINHOS DA PESQUISA ................................................ 13 1.1 PROBLEMATIZAÇÃO DA PESQUISA ......................................................................... 17
1.2 OBJETIVOS ......................................................................................................... 18
1.3 JUSTIFICATIVA ..................................................................................................... 19
2 REFERENCIAL TEÓRICO METODOLÓGICO ..................................................... 21
2.1 O CONHECIMENTO HUMANO................................................................................. 22
2.1.1 Epistemologia: Teorias do Conhecimento .................................................... 29
2.1.2 Contribuições de Jean Piaget: O Sujeito Epistemológico ............................. 32
2.2 DA METAFÍSICA A CIÊNCIA MODERNA ..................................................................... 37
2.3 EMPIRISMO (MÉTODO EXPERIMENTAL) .................................................................. 49
2.4 POSITIVISMO ....................................................................................................... 57
2.4.1 Positivismo de Augusto Comte ..................................................................... 57
2.4.2 Positivismo Lógico ........................................................................................ 62
2.4.3 Funcionalismo .............................................................................................. 68
2.5 FENOMENOLOGIA ................................................................................................ 69
2.5.1 O Método Dialético ....................................................................................... 72
2.5.2 Estruturalismo ............................................................................................... 80
3 METODOLOGIA: PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ................................ 85
3.1 TIPO DE PESQUISA .............................................................................................. 85
3.2 AMOSTRAGEM DA PESQUISA ....................................................................... 86
3.3 TÉCNICAS E ESTRATÉGIAS DE COLETA DA PESQUISA ............................................. 88
3.4 ANÁLISE DOS DADOS ........................................................................................... 95
4 ENSINO SUPERIOR NO BRASIL: DAS PRIMEIRAS LETRAS À
UNIVERSIDADE ....................................................................................................... 97
4.1 A TRANSIÇÃO REPUBLICANA .............................................................................. 105
4.1.1 A Revolução de 1930 e a Década de 1950 ................................................ 115
4.1.2 Turismo e o Regime Militar (1964 a 1985) .................................................. 126
4.2 TURISMO: DO ENSINO PROFISSIONAL A UNIVERSIDADE ........................................ 133
4.2.1 A Pós-graduação Brasileira e o Parecer SUCUPIRA ................................. 139
4.2.2 Peculiaridades da Pós Graduação Stricto Sensu No Brasil ........................ 146
4.3 RELATO DE EXPERIÊNCIA - DRA. DORIS VAN MEENE RUSCHMANN .............. 155
5 O DOUTORADO EM COMUNICAÇÃO SOCIAL - USP ..................................... 164
5.1 ECA – ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO .. 164
5.1.1 Programa de Pós-graduação em Ciências da Comunicação - USP ........... 167
5.1.2 Estrutura do PPGCOM – USP .................................................................... 169
5.2 ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: TEORIA E PESQUISA EM COMUNICAÇÃO ...................... 170
5.3 ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: ESTUDO DOS MEIOS E DA PRODUÇÃO MEDIÁTICA ........ 172
5.4 ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: INTERFACES SOCIAIS DA COMUNICAÇÃO ..................... 173
6 OS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM TURISMO NO
BRASIL ................................................................................................................... 175
6.1 UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ - UNIVALI ..................................................... 178
6.1.1 Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Turismo e Hotelaria –
UNIVALI .................................................................................................................. 180
6.1.2 Área de Concentração: Planejamento e Gestão do Turismo e da Hotelaria
181
6.2 UNIVERSIDADE CAXIAS DO SUL – UCS ............................................................... 182
6.2.1 Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Turismo - UCS ................. 184
6.2.2 Área de Concentração: Desenvolvimento Regional do Turismo ................ 185
6.3 UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI – UAM ......................................................... 185
6.3.1 Programa de pós-graduação stricto sensu em hospitalidade UAM ............ 187
6.3.2 Área de Concentração: Planejamento e Gestão Estratégica em
Hospitalidade ........................................................................................................... 188
6.4 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE – UFRN .............................. 189
6.4.1 Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Turismo UFRN ................. 191
6.4.2 Área de Concentração: Turismo, Desenvolvimento e Gestão .................... 192
6.5 PANORAMA DA PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM TURISMO NO BRASIL ........... 193
7 REFLEXÕES SOBRE O ESTADO DA ARTE .................................................... 204
7.1 REFLEXÕES SOBRE O ESTADO DA ARTE EM TRIGO ................................................ 207
7.1.1 O AUTOR: Luiz Gonzaga de Godoi Trigo .................................................. 207
7.1.2 Seleção da Unidade de Leitura .................................................................. 208
7.1.3 Análise Temática: TRIGO, 1996. ................................................................ 210
7.1.4 Peculiaridades da Entrevista ...................................................................... 217
7.1.5 Janela Epistemológica: Luiz Trigo .............................................................. 220
7.2 REFLEXÕES SOBRE O ESTADO DA ARTE EM CAMARGO .......................................... 223
7.2.1 O AUTOR: Luiz Octávio de Lima Camargo ................................................ 223
7.2.2 Seleção da Unidade de Leitura .................................................................. 224
7.2.3 Análise Temática ........................................................................................ 226
7.2.4 Peculiaridades da Entrevista ...................................................................... 233
7.2.5 Janelas Epistemológicas: Luiz Octávio de Lima Camargo ......................... 237
8 Considerações Finais ....................................................................................... 241
REFERÊNCIAS
ANEXOS
APÊNDICES
13
1 INTRODUÇÃO: OS CAMINHOS DA PESQUISA
O caminho do conhecimento se une aos passos do ser humano durante a
história, na construção de saberes e ciências. Todas as atividades humanas, de
algum modo, são formas de aquisição de conhecimento. Seja no senso comum, nas
tradições, nas regras sociais, o desejo de conhecer é inerente ao ser humano, é
inerente a sociedade. (ARISTÓTELES, 1984)
Inicialmente o conhecimento baseava-se em uma única matriz complexa, que
unia em si interpretações de todos os fenômenos da natureza e sociedade. A
filosofia e as ciências gregas são os mais significativos representantes desta visão
integrada de mundo. As transformações sociais e históricas e suas relações de
produção, tornando-se progressivamente complexas, trazem a necessidade de
acompanhamento e estudo diferenciado de tão grandes mudanças, nos mais
diferenciados contextos (RICHARDSON, 2008; GARCIA, 1988).
A ciência, assim, emerge da escolha de objetos e fenômenos particulares de
estudos, compondo-se em um conjunto de conhecimentos sobre fatos e aspectos de
uma dada realidade, expressos através de uma linguagem precisa. Esta
característica em especial possibilita sua continuidade. O conhecimento é
solidificado sobre os ombros de gigantes. Um novo conhecimento é produzido a
partir de algo anteriormente desenvolvido. Nega-se, reafirma-se, descobrem-se
novos aspectos, assim a ciência avança, caracterizando-se como um processo
dialético de construção.
Sendo a ciência também um fenômeno histórico, é propriamente um processo. O conceito de processo traduz a característica de uma realidade sempre volúvel, mutável, contraditória, nunca acabada, em vir –a –ser. Não há estação final onde esse trem poderia parar; não há porto seguro onde esse navio ancoraria em definitivo. Não há ponto de chegada onde não tivéssemos que partir. Em ciência estamos sempre começando de novo. (DEMO, 1985, p. 29)
Considerando esta perspectiva, esta dissertação de mestrado foi concebida
enquanto um processo de construção científica do conhecimento. No ano de 2002
ingressei no curso de Psicologia na Universidade Estadual de Londrina – UEL, onde
permaneci até o ano de 2005, aprofundando estudos nas áreas de Psicologia e
Metodologias de Pesquisa, inclusive atuando como monitora de instrumentação
científica na graduação e em outros cursos. Aliado ao interesse filosófico, aprofundei
14
os estudos em fundamentos epistemológicos da psicologia e da psicanálise. Após
esse período, ingressei na graduação em Turismo na Universidade Norte do Paraná
– UNOPAR, onde me deparei com uma realidade acadêmica e teórica muito
diferente.
Durante a graduação sempre me questionei sobre: quais seriam os
fundamentos epistemológicos que, até então, nortearam a construção do saber em
turismo. Porque se discutiria tão pouco sobre a teoria, e até mesmo a filosofia que
embasam conceitos amplamente difundidos na academia?
Em 2010 apresentei meu trabalho de conclusão de curso sob a temática
Epistemologia do Turismo, orientada pelo professor e Dr. Leonardo Sturion, com
quem tive a oportunidade, também, de aprofundar estudos no campo da Estatística
e Metodologias de Pesquisa Social. Este veio a se tornar meu pré-projeto para
ingresso no Programa de Pós Graduação Stricto sensu do Mestrado Acadêmico em
Turismo e Hotelaria da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI. Visando à carreira
docente, sou acadêmica do Programa de Pós-graduação em Docência na Educação
Superior pela UEL, curso que no momento se encontra paralisado em virtude da
conclusão do Mestrado.
Esta pesquisa constituiu-se então em uma tentativa de aprofundar reflexões
sobre o Campo Teórico do Turismo. Considerando as lacunas de reflexão
epistemológica ainda existentes, as questões a seguir foram parte do que buscamos
discutir e refletir em nossa pesquisa: Qual a importância de um estudo
epistemológico do turismo? Este tipo de estudo de natureza filosófica pode ser
agente transformador da prática do turismo, e, ao mesmo tempo, trazer subsídios
para a elaboração de teorias que auxiliem no entendimento do que se realiza no
turismo?
Para Demo (2000, p.111) ―[...] teoria que nada tem a ver com prática, nunca
foi sequer teoria, e prática que jamais volta à teoria desanda em ativismo cego‖.
Considerando esta afirmação, é possível perceber que o diálogo entre a prática e a
teoria é imprescindível na construção do saber-pensar e do saber-fazer, e a prática
que não revisita a teoria cai sob o jugo do tecnicismo e reducionismo.
Paiva (2001, p.14), nos alerta para o seguinte:
A teoria que trata do turismo ainda é muito fragilizada, embora os esforços que estejam sendo feitos por professores ou não, já demonstrem o empenho no sentido de impulsionar o conhecimento sobre essa temática.
15
Muitos conceitos apregoados e dispostos a legitimar a tão conhecida
‗indústria do turismo’, limitam e compõem um saber dirigido, utilizando-se muitas
vezes de termos inadequados, como, por exemplo, a apresentação do Turismo
como uma ‗indústria sem chaminés’. Mesmo estes sendo conceitos que atendem a
necessidade do ‗trade’ turístico e das demais organizações, que medem seu
desenvolvimento econômico, ele tem origem e forte influência de determinadas
escolas do pensamento, em um conhecimento meramente técnico, e que hoje têm
se alterado e voltado seus olhos para a dimensão científica, teórica e social do
turismo. Estes conceitos refletem uma das facetas do Turismo, que tem seu
desenvolvimento e crescimento enquanto atividade econômica no berço do
capitalismo. (MEIRA; MEIRA, 2007)
Mas, assim como em outras áreas do conhecimento, existem diferentes
abordagens e visões acerca do turismo e de seu desenvolvimento no âmbito social,
cultural e humano, que se renovam à medida que a área amadurece e contempla
temáticas que antes não haviam sido observadas. O turismo, sob novos olhares,
passa a extrapolar a abordagem unicamente mercadológica.
Embora ainda alguns círculos vejam o turismo apenas como indústria de viagens e prazer, trata-se de algo mais complexo do que um simples negócio ou comércio, [...] o turismo é uma amálgama de fenômenos e relações, fenômenos estes que surgem por causa do movimento de pessoas e sua permanência em vários destinos. (BARRETTO, 2000, p.12)
Ao tentar explicar um fenômeno tão complexo como o turismo, apenas em
seus aspectos econômicos, se exclui a verdadeira essência do turismo: a
experiência humana. Claro que devemos salientar a importância dos estudos acerca
do turismo em sua faceta mercadológica. Afinal, aspectos políticos e econômicos
são variáveis imprescindíveis na compreensão dialética de um fenômeno tão intenso
e dinâmico. E por se tratar de dinamismo, de movimento, que novas abordagens e
paradigmas são construídos, a fim de compreender o turismo em suas mais variadas
manifestações e aspectos.
O homem está em constante mudança; a sociedade está em constante
mudança. Ele é construído por suas experiências, aprendizado, vivências. O homem
é um ser histórico e social, e não há como pesquisar o social sem a perspectiva
histórica. Quando olhamos para o turismo sob uma perspectiva exclusivamente
mercadológica, industrial, muitas vezes excluimos as pessoas e suas subjetividades
16
neste processo, visando aspectos quantitativos e esquecendo os aspectos
qualitativos deste.
Compreende-se, no âmbito da presente investigação, que ao vislumbrar o turismo como indústria corre-se o risco de desconsiderar as questões culturais, sociais, históricas, ambientais e políticas nas quais ele está envolto, esboçando-se, então, uma simplificação do fenômeno. Essa é, portanto, uma forma reducionista de compreender o turismo, que privilegia apenas valores quantitativos, reconhecendo apenas as implicações econômicas e empresariais do turismo. (SOUZA, 2011, p.48)
Portanto, o Turismo visto como fenômeno social deve ser pensado e
pesquisado considerando todos os elementos que o integram e isto significa
entender o Turismo como uma área Inter e Multidisciplinar. A pesquisa nas ciências
sociais, conforme salienta Goergen (1979), não pode excluir de seu trabalho a
reflexão sobre o contexto conceitual, histórico e social que forma o horizonte mais
amplo, dentro do qual as pesquisas isoladas obtêm o seu sentido. Assim, a pesquisa
em turismo não pode desconsiderar o histórico, movimentos e processos através
dos quais a sociedade se transforma, e o individuo, operante nesta sociedade,
também é transformado por ela.
A estratégia utilizada em qualquer pesquisa científica fundamenta-se em uma
rede de pressupostos ontológicos e da natureza humana que definem o ponto de
vista do pesquisador frente ao mundo que o rodeia. Estes pressupostos
fundamentam as bases do trabalho científico e a interpretação do pesquisador. É
absolutamente necessário que se possam identificar estes pressupostos em relação
ao homem, a sociedade e ao mundo em geral. Fazendo isso, pode-se identificar a
perspectiva epistemológica utilizada pelo pesquisador. Esta perspectiva orientará a
escolha do método, metodologia e técnicas a serem utilizadas na instrumentação da
pesquisa. (RICHARDSON, 2008)
Assim, o presente estudo tem seus pressupostos baseados na metodologia
do Materialismo Histórico Dialético, propondo uma discussão dialética na
investigação sobre fundamentos epistemológicos identificados na construção do
conhecimento em turismo. Estes pressupostos filosóficos foram aprofundados
durante o desenvolvimento da fundamentação teórica, e a perspectiva
epistemológica da abordagem dialética se fez presente durante toda a pesquisa.
Apontando múltiplas posições e reforçando a investigação enquanto descoberta,
diálogo e transformação. A construção do conhecimento sendo uma contínua
17
elaboração. (PIAGET, 1971)
1.1 PROBLEMATIZAÇÃO DA PESQUISA
A problematização desta pesquisa iniciou-se a partir da observação da
realidade concreta, a realidade que está aparente, e as reflexões acerca da
pesquisa científica em turismo e seus caminhos. Sabemos que a construção do
conhecimento atinge certo nível de maturidade durante a formação Stricto Sensu.
Refletindo sobre a ciência e o conhecimento enquanto processos de construção
social e humana, esta construção atinge o nível de consolidação em especial no
Doutorado, onde existe uma maior autonomia intelectual por parte do investigador.
(PIAGET, 1971; SAVIANI, 2000).
Colocado este pressuposto, observamos na realidade concreta que a
pesquisa em turismo no mundo, e particularmente no Brasil, está em construção,
uma vez que seu único doutorado em turismo ainda está por começar1 e os demais
cursos oferecidos no Brasil que possuíam linha de pesquisa em Turismo, na prática
não preenchiam as lacunas epistemológicas de construção de um conhecimento
próprio do turismo.
A fim de traçar um panorama sobre a pesquisa e a construção do
conhecimento em turismo, se fez necessário conhecer os programas de formação
Stricto Sensu em turismo reconhecidos no Brasil. Identificar a que instituições de
ensino estavam ligados, e quais seriam estes espaços de construção científica.
Quais os objetivos, área de concentração e linhas de pesquisa existentes nestes
programas. Assim, foi possível levantar variáveis que nos proporcionasse uma maior
dimensão da realidade observada e a sua influência na construção científica do
turismo brasileiro até o presente momento.
Com a complexidade que o fenômeno toma, à medida que novas questões e
problemáticas ligadas ao turismo surgem, cresce a necessidade de construção de
um referencial epistemológico. Poucas e limitadas são as obras que tratam dessa
temática ainda. Mas existem pesquisadores e autores que possuem a Epistemologia
1 A seleção para a primeira turma de um Doutorado em Turismo ocorreu dia 18 e 19/02/2013 no Programa de Pós-Graduação Stricto sensu em Turismo e Hotelaria da UNIVALI. Outros doutores que atuam na área, em sua maioria, possuem Doutorado em Comunicação pela USP, Doutorado em Administração e Turismo pela UNIVALI, Doutorado em Turismo pela Espanha e Portugal e Doutorado em outras áreas.
18
enquanto tema e assunto de suas pesquisas, relacionados ao turismo e a pesquisa
em ciências sociais, ou que tomam fundamentos epistemológicos específicos, que
fundamentam sua produção, visão de mundo, pensar e agir social.
Reconhecemos que, no mundo científico, existem paradigmas dominantes.
Paradigmas estes que norteiam a pesquisa científica (KUHN, 1988). No âmbito do
turismo, os estudos empíricos tem tido, até então, maior espaço no debate da
temática. Mas seria o conhecimento construído apenas através do método empírico?
A reflexão filosófica seria mesmo somente um elemento de abstração?
Por fim, o objetivo geral da pesquisa realizada foi o de caracterizar as
influências teóricas e epistemológicas presentes na reflexão e discussão de
pesquisadores brasileiros acerca da construção do conhecimento científico do
turismo. Este objetivo nasceu a partir dos questionamentos abaixo:
a) Quais são os fundamentos epistemológicos presentes nas
pesquisas do Turismo brasileiro?
b) Quais os referenciais teóricos metodológicos identificados na
obra dos pesquisadores brasileiros, que trabalham a questão
epistemológica em suas pesquisas no Turismo?
c) Quais as diferenças de caminhos epistemológicos traçados entre
os pesquisadores brasileiros?
1.2 OBJETIVOS
Objetivo Geral
Caracterizar as influências teóricas e epistemológicas presentes na reflexão e
discussão de pesquisadores brasileiros acerca da construção do conhecimento
científico do turismo.
19
Objetivos Específicos
a) Descrever contextualmente os Programas de Pós Graduação
Stricto Sensu em Turismo, incluindo área de concentração e
linhas de pesquisa, e suas relações com a construção do
conhecimento em Turismo no Brasil;
b) Identificar e selecionar pesquisadores brasileiros que atuam no
Turismo, com produção bibliográfica que faça uma reflexão ou
discussão acerca da construção do conhecimento científico em
Turismo no Brasil;
c) Analisar os referenciais teóricos metodológicos e os possíveis
diferentes caminhos epistemológicos traçados entre os
pesquisadores brasileiros selecionados pela pesquisa.
1.3 JUSTIFICATIVA
Mas, afinal, para que discutirmos a construção do conhecimento em turismo?
Qual a relevância desta investigação? Ora, o conhecimento está intrinsicamente
ligado à prática do turismo.
Podemos fazer uma analogia muito interessante. No espetáculo circense um
dos shows executados é o do trapezista. Seu show exige muitas horas de treino e
claro uma preocupação grande com a segurança dos artistas. Por isso, o show é
executado com uma rede de proteção. Em caso de quedas, o artista não se
machucará. Ao mesmo tempo, esta rede de proteção dá mais liberdade e segurança
ao trapezista para executar seus saltos, tentar novas manobras, pois sabe que
existe uma rede para segura-lo caso algo aconteça.
A teoria, o conhecimento, é como a rede de proteção do trapezista, ela é a
segurança do pesquisador. É o que permite ao pesquisador alçar novos voos,
enfrentar obstáculos, pois ela fornece o embasamento e segurança necessária para
que possam ser desenvolvidos novos conceitos, novos saltos científicos no campo
teórico e prático. Ou seja, a prática depende do conhecimento, e a partir dessa
20
prática o caminho do conhecimento encontra novos desafios. Desafios estes que
nos leva a buscar novos conhecimentos e desenvolver novas práticas.
Assim, discutir a construção do conhecimento em turismo se torna relevante
na medida em que esse conhecimento possui capacidade de transformação na
atividade turística. Conhecer os caminhos que fundamentam epistemologicamente a
construção do conhecimento científico em turismo é vislumbrar novas possibilidades,
descobrir visões de mundo, de homem e sociedade.
É necessário conferirmos desdobramento filosófico ao turismo e seus
conceitos, de forma a construir conhecimento científico e teórico. Por exemplo, o
turista na visão econômica, é público alvo do mercado e será turista apenas no
momento do consumo. Em uma abordagem filosófica e humanista, este mesmo
turista passa a ter um papel social e uma abrangência muito maior, como coloca
Rozisca (2008, p.5):
Do ponto de vista filosófico, surgem outros desdobramentos deste mesmo turista, e pode-se conceber que este busca satisfazer uma necessidade e que suas peculiaridades, seu ser, sua cultura, seu conhecimento acumulado vai interagir com o polo receptor, fruto de seu desejo, mesmo muito antes do consumo, durante o consumo, e com certeza o acompanhando nas suas experiências, por toda a vida.
Trazendo como exemplo a influência deste pensamento para o plano prático,
podemos, através da razão, inferir que as ações, derivadas desta linha de
pensamento, se estendem para além do ―turista consumidor‖, direcionando ações
antes, durante e após a viagem, bem como ações ligadas às comunidades
receptoras, para além da simples capacitação e qualificação de serviços ligados aos
equipamentos do turismo.
Toda prática necessita de retorno à teoria, é quando se reflete e descobre-se
que toda prática é sempre incompleta. Uma área de conhecimento que não
reconhece seus processos históricos, sua construção e os fundamentos presentes
na produção do saber não se constituem nem como técnica, e nem como ciência. É
preciso lançar mão da epistemologia para tentar entender melhor a construção do
conhecimento na área do Turismo e vislumbrar as novas possibilidades que
diferentes posicionamentos epistemológicos podem trazer para compreender um
fenômeno tão complexo, e tão intrínseco a natureza humana e social.
21
2 REFERENCIAL TEÓRICO METODOLÓGICO
Neste capítulo apresentamos o referencial teórico e metodológico que
fundamenta a ancoragem teórica desta dissertação, sobre quais fontes e autores o
nosso discurso se constrói. O conhecimento é construído dialeticamente, ou seja,
durante a interação com as fontes pesquisadas e no encontro com ‗o outro‘, é
possível que surjam novos conceitos e subsídios para uma análise e reflexão
dialéticas sobre o objeto de estudo. (PIAGET, 1971; VYGOTSKY, 1989)
A revisão bibliográfica envolve em seu material de análise bibliografias
primárias e secundárias que visam verificar a fundamentação teórica utilizada no
desenvolvimento de pesquisas relacionadas à nossa temática de estudo,
possibilitando uma visão panorâmica dos estudos desenvolvidos. Além das
Bibliotecas da UNIVALI e UEL, se faz imprescindível a busca de bibliografia recente,
atualizada, comunicações acerca dos últimos estudos realizados. Para tal, a
academia usa como principal mecanismo de comunicação científica periódicos,
compostos em artigos científicos, resenhas, paper position, além das dissertações e
teses de Mestrado e Doutorado, comunicações científicas no nível Stricto Sensu,
disponível na base de dados CAPES2 e também nos sítios eletrônicos dos
Programas de Pós-graduação. Para fins iniciais deste estudo, a fim de evidenciar a
relevância e originalidade da temática, detalhamos as fontes secundárias
encontradas na Base de Dados SCIELO, bem como as entradas de busca no
quadro abaixo:
Quadro 01 - Resultados de Busca na Base de Dados SCIELO. BASE DE DADOS - BUSCA SCIELO
Último Acesso em 20/10/2012
Palavra-Chave / Assunto EPISTEMOLOGIA
Local Todos os índices - Brasil
Total de Registros Encontrados 207
Registros Relevantes 13
Artigos selecionados 11
Principais áreas de produção Educação; Física; Saúde; Psicologia; Meio Ambiente.
Fonte: Dados da Pesquisa.
A pesquisa na base de dados SCIELO para a temática retornou 207 artigos,
2 Anexo a esta proposta podem ser encontrados resultados de pesquisa realizada no Banco de Teses e Dissertações da CAPES (ANEXO A).
22
dentre eles, apenas 11 artigos realmente faziam uma discussão relevante da
temática epistemológica nos mais diversos campos de estudo. A principal área de
produção é Educação, Docência e Pedagogia, demonstrando o intenso diálogo entre
a temática epistemológica e a produção do conhecimento, a aprendizagem e
aquisição de conceitos. Dentre as disciplinas mais referenciadas encontra-se a
Física, o que nos permite inferir que, mesmo se tratando de um dos mais antigos
continentes do conhecimento, consolidado, conhecido como ciência dura, a física
não deixa de discutir suas bases epistemológicas.
Em se tratando da produção em Turismo, foi encontrado apenas 01 Artigo,
que tece considerações acerca do Turismo como campo do conhecimento em
formação, apoiando sua análise nos discursos de Pierre Bordieu e Jafar Jafari,
datado de 2007, e que foi publicado em um Periódico Online com foco na área de
Administração, patrocinado pela Escola Brasileira de Administração Pública e de
Empresas da Fundação Getúlio Vargas3.
Essa busca nos revela a necessidade de se discutir a temática epistemológica
aplicada ao turismo de forma mais relevante, visto que uma área que pretende
alcançar (ou não) o status de ciência, não pode desconsiderar a reflexão filosófica. E
que esta reflexão seja no âmbito do turismo enquanto atividade humana, e também
enquanto campo do conhecimento.
2.1 O CONHECIMENTO HUMANO
A busca pelo conhecimento acompanha a humanidade desde seus
primórdios. ―Todos os homens têm, por natureza, desejo de conhecer‖
(ARISTÓTELES, METAFÍSICA, 1984, p.11 [Livro I A: Cap. 1]). E como dito
anteriormente, muitas são as formas de conhecer e interpretar o mundo que nos
rodeia. O encanto pelo desconhecido, pelo Universo, pelo Cosmos. Se na
antiguidade as questões acerca dos fenômenos da natureza tinham na mitologia
suas explicações, a filosofia e as ciências gregas surgem como tentativa de
compreensão do mundo, versando suas preocupações sobre o universo, a
divindade, a vida, a virtude e o Conhecimento. David Hume, em seus ―Ensaios
3 A linha editorial do ―Cadernos EBAPE.BR” almeja a constituição de um espaço de livre acesso para o debate
acadêmico por meio da publicação de ensaios teóricos e artigos qualitativos relacionados à área de Administração. O público-alvo dos Cadernos EBAPE.BR inclui professores, pesquisadores e estudantes de graduação e pós-graduação em Administração e áreas afins, e profissionais da administração, no Brasil e no exterior.
23
Morais, Políticos e Literários‖, coloca de forma platônica a contemplação do Homem
em relação ao universo, e a preocupação com a virtude do conhecimento.
A mais perfeita felicidade deve indubitavelmente derivar da contemplação do mais perfeito objeto. Mas qual o objeto mais perfeito que a beleza e a virtude? E onde se pode encontrar beleza igual à do universo? Ou virtude que possa comparar-se à benevolência da Divindade? Se alguma coisa é capaz de diminuir o prazer desta contemplação, só pode ser a limitação de nossas faculdades, que ocultam de nós a parte mais importante dessas belezas e perfeições, ou a brevidade de nossa vida, que não dá tempo suficiente para delas nos instruirmos. (HUME, p. 212, 1973)
Conhecer implica em aprender. E quando dizemos aprendizado, o dizemos
em todos os níveis. Aprendemos a reconhecer objetos, pessoas, lugares.
Aprendemos a nos comportar em diferentes ambientes, entre família, amigos,
trabalho. O aprendizado e o conhecimento caminham juntos, e muitas são as
possibilidades de conhecer e interpretar o mundo ao nosso redor. Como coloca
Bernard Charlot, Docente em Ciências da Educação na Universidade de Paris,
―Nascer é ingressar em um mundo onde se está submetido à obrigação de aprender.
Ninguém pode escapar dessa obrigação, pois o sujeito só pode ‗tornar-se‘
apropriando-se do mundo‖ (CHARLOT, 2000, p. 59). Assim, o conhecimento se dá
em um processo de aprender e apreender o mundo que nos rodeia. E por este
mundo que rodeia o ser social ser tão vasto e tão complexo, que muitas são as
formas de conhecer parcelas da realidade.
São vários os níveis de conhecimento: o senso-comum, a religião, a filosofia,
a ciência, a arte. Cada um com suas características específicas, propondo-se a
objetivos diferentes, muitas vezes por caminhos diferentes.
A religião motiva o homem a trilhar o seu caminho, qualquer que seja, e encetar seu aperfeiçoamento e não deve ser analisada à luz do volume e do rigor das informações apresentadas, mas sob a inspiração da fé em seus mistérios essenciais; o senso-comum orienta e capacita a viver seu cotidiano, seu universo sensível; a Filosofia e a Ciência, embora cada qual tenha as suas características próprias e suas preocupações primárias, não devem ser entendidas como abordagens antagônicas do real, mas sim como diferentes ângulos de incidência sobre um mesmo fenômeno, completando uma as descobertas da outra, corroborando mesmo, mutuamente, os dados apresentados aqui e ali. (GARCIA, 1988, p. 23)
Nosso foco nesta discussão é o conhecimento científico, mas em se tratando
de conhecimento, é válido discorrer um pouco sobre os outros níveis, e que fazem
parte do nosso desenvolvimento enquanto sujeitos epistemológicos (PIAGET, 1971).
24
O Senso-Comum, assim conhecido, orienta e capacita o homem a viver seu
cotidiano, a reconhecer os fenômenos que se inter-relacionam com a sua realidade,
dá suporte para a solução de problemas. Este é considerado também um
conhecimento ametódico, assistemático, embora saibamos que, por mais simples
que sejam as relações estabelecidas neste nível de conhecimento, elas também
possuem uma ―razão‖ interna. Ele se desenvolve a partir das relações de
similaridade estabelecidas entre eventos, fenômenos e objetos, sem exigir uma
atividade mediadora, uma metodologia, ou uma técnica que amplie o grau de
confiabilidade das conclusões. (GARCIA, 1988)
O conhecimento do senso-comum se completa após múltiplas observações, e
é quase sempre transmitido oralmente, sendo fonte rica de informações sobre a
cultura, tradições e estruturas sociais de um povo, de uma comunidade, de uma
etnia. De pai para filho, do mais velho ao mais jovem, assim o conhecimento vai
sendo transmitido de geração a geração.
Quando trabalhava no Parque Estadual Mata dos Godoy4, vivi uma situação
muito interessante. Nosso guarda parque sempre sabia se iria chover ou não. Um
dia perguntei: ―Zé da Mata, como você sabe quando vai chover ou não aqui no
parque?‖. Ele respondia apontando na direção das nuvens: ―Quando a nuvem vem
de São Luís, é chuva na certa!‖ E eu, sempre curiosa sobre tanto conhecimento que
ele possuía sobre a natureza, perguntava: ―Mas porque Zé da Mata?‖. Ele em sua
simplicidade respondia: ―Não sei, só sei que é assim!‖. Maior era meu espanto, ao
ver que em todas as ocasiões, Zé da Mata estava certo.
Claro que o encadeamento de eventos, ligados por sua simples similaridade
pode trazer interpretações errôneas, mas não deixam de ser formas de interpretação
da realidade, como o comportamento supersticioso, que possui um nível de relação
correlacional extremamente particular e singular. (SKINNER, 2000)
Assim, o senso-comum é uma forma de conhecimento que se amplia e se
aperfeiçoa de geração a geração, em algumas culturas ele serve admiravelmente no
controle e predição de determinados fenômenos, solução de problemas imediatos e
urgentes, tratamento de doenças e dores com os mais variados tipos de ervas e
raízes, avaliar a qualidade da colheita, o tempo certo de plantar e de colher.
4 O Parque Estadual Mata dos Godoy é uma Unidade de Conservação, classificada como Reserva Particular do
Patrimônio Natural, pertencente ao governo do estado do Paraná, localizado na cidade de Londrina, entre os distritos de São Luis e Patrimônio Regina. São desenvolvidas atividades de Preservação, Educação Ambiental e Ecoturismo. A visitação é gratuita.
25
Mas, à medida que a sociedade cresce, se expande e se subdivide, as
informações básicas que serviam de orientação se perdem em meio as tantas novas
técnicas, às complexidades das relações sociais, aos bens cada vez mais
provisórios. Assim, o conhecimento também se transforma com base nessas
modificações sociais e históricas. (RICHARDSON, 2008)
O Conhecimento Filosófico, embora muitas vezes nos pareça
completamente abstrato, tem seu alicerce de investigação no mundo tangível. E de
certa forma, o abstrato se relaciona direta ou indiretamente com o concreto, pois só
imaginamos o invisível por cortejar o visível, só entendemos o infinito a partir do
finito. Assim, o que diferencia o conhecimento filosófico do senso-comum é a
reflexão. Reflexão esta pautada na atividade de observação e constatação de
relações funcionais e estruturais de um fenômeno qualquer e que se relaciona em
particularidades com outro fenômeno. Reflexão esta que leva o homem a tecer
teorias, elaborar conceitos, em busca da verdade ou ―verdades‖ sobre o mundo e o
Universo. Na máxima Socrática ―Só sei, que nada sei‖, a condição para conhecer é o
desconhecer. E partir do pressuposto de que nada se sabe, é aceitar a condição de
que existe um mundo inteiro a se conhecer. (SILVA, 2003)
O conhecimento filosófico não pretende controlar um fenômeno, prevê-lo, este
não é seu objetivo. O conhecimento filosófico busca explicar o fenômeno, esclarecer
eventos, justificar um SER OU DEVER-SER qualquer. Ele tece múltiplos olhares,
pensamentos sobre a realidade social, a história, o ser humano. Possibilita a
abstração da realidade concreta a partir da reflexão, mesmo que não sejam seguras
e prontamente aparentes as causas reais que esse conhecimento levanta sobre
dado fenômeno.
Por ter a tarefa de tecer múltiplos olhares sobre a realidade, ou a suposta
realidade, é que o conhecimento filosófico pode e deve integrar as várias
especialidades e saberes sobre as mais diversas áreas, e assim propor novos
campos e novas áreas de investigação. (JAPIASSU, 1979)
Sobre o conhecimento religioso, não vamos nos prolongar. Basta salientar
que ele é dado pela fé, sendo fé a certeza daquilo que não se vê. A religião é a
crença no ―sobrenatural‖, no sagrado, em muitas vezes considerado o Criador de
todas as coisas, criador do próprio universo, onde reside o Dogmatismo. Esse ser
superior deve, pois, ser adorado e reverenciado segundo liturgias e rituais
específicos, que são os Cultos. E cultuar e adorar a esse ser criador, ou energia
26
criadora, consiste em princípios éticos claramente estabelecidos, a Moral. A Teologia
seria um grande representante da interação entre o conhecimento religioso e a
filosofia. Durante muitos anos, alguns filósofos só puderam desenvolver seus
estudos ligados à igreja, através da Teologia. Ou seja, o filósofo mascarado pela fé.
O conhecimento religioso, ou teológico, se preocupa com a explicação de
algumas questões básicas que tem acompanhado o homem durante toda a sua
história. O principal problema é a existência: De onde viemos? Quem somos? Para
onde vamos? Alguns teóricos defendem que a religião surge em resposta ao
respeito e admiração do homem primitivo frente ao desconhecido, e este
desconhecido detectado no mundo sensível. (GARCIA, 1988)
A Religião possui uma função sociológica, e possui influência na história,
política e sofre influência das transformações sociais, das revoluções ideológicas.
Ela nasce e evolui como qualquer outra forma de conhecimento. Experimenta
transformações profundas ao longo da história da humanidade, dogmas e ritos se
alteram, e também seus preceitos morais. E assim como o senso-comum, ela não
nos propicia qualquer forma de controle sobre nossa realidade, estabelecendo
relações funcionais que condicionam, desta forma, a manutenção de
comportamentos considerados, como dito anteriormente, supersticiosos. (SKINNER,
2000)
Devemos também tecer algumas considerações sobre a Arte. Talvez uma
das expressões mais sublimes, e mais nobres da experiência humana com o mundo
externo, material, objetivo; e o mundo interno, sensível, subjetivo. Poetas, pintores,
músicos e as mais diferentes formas de expressão artística estão presentes na
história da humanidade, e não deixa de ser uma forma, específica e particular de
entender e conhecer a realidade. No seu capítulo: ―Introdução a uma estética
marxista”, Lukács diz: ―Esse problema da humanidade da arte é indissoluvelmente
ligado ao da sua objetividade e subjetividade.‖ (LUKÁCS, 1992, p. 190 apud
CIAVATTA, 2009, p.132)
Ciavatta cita Lukács ao dissertar sobre a arte e as diferentes formas e
linguagens em que se manifestam o conhecimento humano:
Lukács explicita a presença da objetividade e da subjetividade no conhecimento e, especificamente, na obra de arte, através da categoria da particularidade, que é o campo das mediações históricas da totalidade social, ou do contexto social onde o sujeito se situa e produz pensamentos, ciência, obras de arte etc. Tanto o mundo interior do sujeito quanto o mundo
27
exterior, onde os objetos se situam e/ou são produzidos, estão presentes no ato de conhecer e de representar o conhecimento em uma das diversas linguagens (línguas, ciências, técnicas, artes, etc.) criadas pelo ser humano. (CIAVATTA, 2009, p.132)
Há quem diga que poetas passaram muito antes por caminhos que filósofos e
cientistas demorariam anos para chegar. A fim de encerrarmos esta temática por
agora, referenciamos, de forma dialética e poética, Professor Mario Beni, que
publicou em sua página pessoal recentemente uma releitura lírica:
Aquilo que não se pode dizer o que é, mas sabe-se que é, e que não se pode dizer como é, porque imaginamos como é. Aquilo que sabe-se sempre, mas de quem nem sempre se vale. Aquilo anterior a toda a anterioridade, posterior a toda posterioridade. Aquilo que não é na dimensão do tempo e cujo efeito é o próprio tempo. Aquilo bem e mal, vau de saudade - Aquilo plural e toda singularidade. Aquilo mar, aquilo sal e toda salinidade. Aquilo singular, por ser plural, virtual... Aquilo de que se sabe sempre pouco. Por saber-se sempre mais. Aquilo meio, aquilo inteiro. Aquilo esfera, aquilo reta, aquilo côncavo, aquilo convexo - Aquilo que se adora aquilo que se rememora. Aquilo que se odeia porque encarcera. Aquilo que se ama, porque liberta. Aquilo que se conhece sem os sentidos, de que se pode falar sem as palavras, aquilo que se pensa sem ideias e que pode amar, sem emoções. Aquilo que ninguém sabe o que é, mas que se sonha o que seria se fosse. Aquilo de ouvir e ler. Aquilo mudo a falar tudo. Aquilo paz, aquilo dor, aquilo que já existia antes de ser. Aquilo que será depois que for... (BENI, 2012)
Explícitas as diferentes linguagens do conhecimento humano, voltamos
nossos olhos para o nível de conhecimento que abordaremos neste trabalho: o
Conhecimento Científico. Ora, o que o difere das outras formas de conhecimento?
O Conhecimento Científico se caracteriza, essencialmente, pela presença do
método. (DESCARTES, 1616; DEMO, 1985)
Inicialmente abordaremos o conhecimento científico em termos gerais, dando
características que o diferencia das outras formas de conhecimento, posteriormente,
discorreremos sobre a ciência, métodos e o conhecimento científico de forma mais
significativa.
O Conhecimento Científico pretende predizer e controlar a ocorrência de
determinados fenômenos, além de descrevê-los de forma minuciosa, localizando-os
dentro de categorias específicas e classificando características. (GARCIA, 1988)
Para tal, se faz necessário um método. Este pode ser definido como o conjunto das
atividades sistemáticas e racionais que, com maior segurança e economia, permite
alcançar os objetivos, ou seja, os conhecimentos válidos e verdadeiros. (DEMO,
2000)
28
Assim, o método científico, ajuda a traçar o caminho a ser seguido pela
atividade do conhecimento científico, que é a pesquisa, detectando erros,
levantando variáveis, auxiliando nas decisões do pesquisador. Além disso, é a
existência de um método, e a descrição minuciosa deste e de sua aplicabilidade
sobre o objeto que possibilita sua transmissão, através da linguagem científica.
(RICHARDSON, 2008)
O método trouxe a transição do ―mundo do aproximado‖, mundo do relativo
que é o mundo humano, sensível, para o ―universo da precisão‖, que é o universo
científico, que se tem essa preocupação com a comprovação dos fatos. Pode-se
dizer que o método passa a ser a principal característica que diferencia o
conhecimento científico dos demais, vindo de outras fontes, como, por exemplo, o
senso comum. (ARISTÓTELES, 1984; DEMO, 1985)
A análise histórica mostra claramente que estes núcleos interagiam na
construção de novos conhecimentos, mesmo que seus pressupostos fossem
contraditórios entre si. As crises que a história da humanidade (ocidental) passou em
seu desenvolvimento geraram saltos do conhecimento, em alguns momentos
regressão, Trevas e Luz. Cada tipo de conhecimento humano, do senso-comum ao
conhecimento científico, gera níveis explicativos diferentes, que se inter-relacionam,
dialogam, complementam-se, negam-se, renegam-se, nos dando a dimensão da
construção do conhecimento, e das múltiplas relações estabelecidas ao longo da
história. (PIAGET, 1971; DEMO, 1985)
Dadas algumas considerações acerca de nosso objeto de estudo,
conhecimento científico, se faz necessário tecer algumas considerações sobre nossa
temática central, a Epistemologia. Como coloca Rubem Alves (1981, p. 139):
O discurso científico tem a intenção confessada de produzir conhecimento, numa busca sem fim da verdade. Assim, ao entrar no mundo constituído pela linguagem da ciência, descobrimo-nos, repentinamente, cercados de todos os lados por questões epistemológicas. Em outras palavras: o que é decisivo, aqui, é a relação entre o discurso e o objeto sobre que ele fala. Porque é nesta relação que a verdade existe. (grifos do autor)
Ao falarmos de ciência, ou daquilo que não é ciência, surgem muitas dúvidas.
À medida que a própria ciência avança em seus caminhos, tornam-se ainda mais
complexas estas dúvidas. Como se dá a construção do conhecimento? Por quais
29
caminhos pensadores e teóricos desenvolvem suas teorias? Como são verificadas
as relações entre o seu discurso e o seu objeto de estudo? Nessas questões reside
a preocupação epistemológica. Eis que reside aí a necessidade e dinâmica da
Epistemologia como temática de estudo, e como disciplina aplicada ao
conhecimento.
2.1.1 Epistemologia: Teorias do Conhecimento
Mas afinal: O que é Epistemologia? Primeiramente, tentar defini-la única e
exclusivamente seria simplifica-la e, portanto, ir na contramão de nossa visão de
mundo, e nossa visão sobre a própria Epistemologia. Assim trabalhamos não no
sentido de defini-la, mas sim de conceitua-la para fins de nosso estudo. Segundo
coloca Panosso Netto (2011, p.43) em seu livro Filosofia do Turismo:
A origem etimológica de epistemologia está no grego, em que episteme = conhecimento, ciência; logia = estudo, discurso ordenado. Platão fazia uma distinção entre episteme (conhecimento saber, conhecimento verdadeiro baseado em uma explicação) e doxa (a pura e simples opinião) A Epistemologia que se conhece hoje nos círculos acadêmicos nasceu junto com a ciência moderna, no século XVI, e mudou muito desde então.
Já para Centeno (2003, p. 10):
A epistemologia ou Teoria da Ciência ensina como criar teoria científica por meio de duas de suas ramificações: a teoria do conhecimento e da lógica. A Teoria do conhecimento ou Teoria do pensamento verdadeiro se divide, para seu estudo, em duas partes: geral e particular.
Para Figueiredo (2008, p.17):
É importante ressaltar que a Epistemologia é a Filosofia da ciência, num sentido exato, não se trata de um estudo dos métodos científicos, que é objeto da metodologia científica, nem é tão pouco uma síntese das leis científicas. A epistemologia consiste no estudo crítico dos princípios, das hipóteses e dos resultados das várias ciências existentes em nosso sistema, determinando sua origem lógica, o seu valor e a sua objetividade.
Já para Richardson (2008, p. 32): ―rede de pressupostos ontológicos e da
natureza humana que definem o ponto de vista que o pesquisador tem do mundo
que o rodeia‖.
Muitos são os conceitos utilizados, e muitos são os autores que versam sobre
30
a temática. Mas, existe um ponto comum em todas as abordagens acerca da
Epistemologia e suas variantes, existe uma matriz comum a todos estes conceitos:
O Conhecimento. Como coloca Japiassu (1979, p.38)
O conceito de Epistemologia é, pois, empregado de modo bastante flexível. Segundo os autores, com seus pressupostos filosóficos ou ideológicos, e em conformidade com os países e os costumes, ele serve para designar quer uma teoria geral do conhecimento (de natureza mais ou menos filosófica), quer estudos mais restritos interrogando-se sobre a gênese e a estrutura das ciências, tentando descobrir as leis de crescimento dos conhecimentos, quer uma análise lógica da linguagem científica, quer, enfim, o exame das condições reais de produção dos conhecimentos científicos.
Escolhemos a conceituação de Japiassu (1979, p.24), que diz: ―[...]
caracterizaremos Epistemologia como um discurso sobre o qual o discurso primeiro
da ciência deveria ser refletido‖. Ele se dá de forma ambígua, pois, encontra na
filosofia seus princípios, e na ciência seu objeto. Para que fique claro, e
prossigamos, tomamos a seguinte conceituação:
Essencialmente a Epistemologia é o estudo crítico dos princípios, das hipóteses e dos resultados das diversas ciências. Semelhante estudo tem por objetivo determinar a origem lógica das ciências, seu valor e seus alcances objetivos. (JAPIASSU, 1979, p. 25)
Neste viés, podemos colocar que, para todas as ciências, ou áreas do
conhecimento que primam pela linguagem científica e confiabilidade de métodos
justificados, a epistemologia é importante porque estabelece uma revisão do
conhecimento de determinado assunto e oferece critérios para a aceitação desse
conhecimento. Assim, o pesquisador deveria refletir intensamente sobre sua
epistemologia de pesquisa, ou seja, os caminhos seguidos por ele para alcançar
resultados, tecer considerações, elaborar teorias. A aplicação da epistemologia nos
estudos turísticos é de suma importância, uma vez que ela pode auxiliar na
explicação do fenômeno, ao mesmo tempo fornecer subsídios teóricos para a
construção de bases científicas em turismo.
A epistemologia tem adquirido cada vez mais importância na produção do conhecimento hoje, e com o turismo não é diferente. Entre os causadores deste fato estão: a necessidade de novas pesquisas na área que respondam a novos problemas criados pela prática do turismo; o aumento da importância do ―fazer – turismo‖ em todo o mundo, em virtude de fatores ligados ao estresse diário, problemas familiares, globalização, competitividade acirrada nos campos de atuação profissional; o aumento
31
das publicações na área de turismo mundialmente; o aumento de cursos superiores e técnicos em turismo. (PANOSSO NETTO, 2011, p. 36)
Assim, qualquer que seja a concepção adotada por epistemologia, ela não
pretende, e não deve, impor dogmas aos cientistas, ditando o que deveria ser o
conhecimento científico, ―seu papel é estudar a gênese e a estrutura dos
conhecimentos científicos‖ (JAPIASSU, 1979, p. 38). Esta produção deve ser
estudada sobre múltiplas dimensões, sob os mais diversos pontos de vista, daí seu
caráter de ser uma disciplina INTERDISCIPLINAR.
Para Japiassu (1979) existiriam três tipos básicos de classificação da
Epistemologia. Uma epistemologia Globalizada, que trata do saber globalmente
considerado, seja este de origem especulativa ou científica. Por outro lado a
Epistemologia Particular, quando se trata de levar em conta um campo particular do
saber, geralmente este já possui um certo grau de epistemologia previamente
construído. E ainda a epistemologia específica quando leva em conta uma disciplina
intelectualmente constituída, em uma unidade bem definida do saber.
Para Piaget, assim como para Japiassu, os saberes se relacionam com pré-
saberes para a construção e elaboração de conhecimento ou novas estruturas do
saber anteriormente constituído. O mesmo para Bachelard, e Michel Foucault, que
faz uma espécie de arqueologia das ciências humanas. (JAPIASSU, 1979)
Existem assim, algumas categorias epistemológicas com as quais
trabalhamos tanto quando elaboramos conhecimento, quanto no momento em que
se estuda de maneira epistemológica determinado assunto, autor ou temática no
campo do saber. Como já delimitado nosso foco é no saber científico.
A primeira delas trata dos obstáculos epistemológicos, ou seja, momentos
críticos no campo do saber onde se instaura uma situação problema que requer
superação para que o conhecimento avance. Esse conflito que se dá no obstáculo
epistemológico pode ser superado com a dissolução do problema ou com a cisão do
conhecimento. O que originaria novas linhas e novas formas de incidência sobre o
mesmo objeto. É o que Jean Piaget chamaria de fase de equilíbrio progressivo, onde
em contato com novos objetos o sujeito tem de assimilar e acomodar novos
conhecimentos para adaptá-los em novas ou antigas estruturas do saber.
(JAPIASSU, 1979)
Para que seja possível o avanço científico é de suma importância nutrir uma
vigilância epistemológica, ou seja, uma atitude reflexiva sobre o objeto de estudo e
32
metodologias que estão sendo adotadas na abordagem do fenômeno. Esta
vigilância auxilia para que possamos nos libertar ao máximo de nossas ideologias,
opiniões pré-formadas, crenças e certezas imediatas. A vigilância não pretende
submeter a objetividade do cientista, pelo contrário, reconhece em sua subjetividade
campo vasto, mas é necessária uma atitude científica intersubjetiva. (JAPIASSU,
1979)
Para Japiassu, assim como para Piaget, para construirmos e elaborarmos
conhecimento através de uma postura epistemológica é necessário recorrermos à
própria epistemologia do conhecimento, que para Piaget se dá de forma Multi e
Interdisciplinar. É a categoria da recorrência epistemológica que nos dá o cepticismo
na medida certa para a reflexão, ao passo que coloca:
Em face da necessidade de explicar o devir de uma ciência, ligando o conhecimento do seu passado à analise de seu estado presente, e fazendo depender este estado presente de todos os elementos que constituíram sua possibilidade, devemos fazer apelo a categoria de recorrência epistemológica. (Japiassu, 1979, p.20)
Para Jean Piaget a história do sujeito, e o meio em que se desenvolveu tem
peso essencial na construção do ser cognoscente, ou seja, aquele que elabora
conhecimento válido.
Ainda em tempo, é importante salientar que o turismo não se constitui como
ciência isolada, independente, com corpo teórico, conceitos e paradigmas definidos,
pelo contrário, o Turismo se constitui como um campo de estudo em
amadurecimento, em desenvolvimento, em construção. E é justamente neste intenso
momento de construção que o debate epistemológico se faz necessário, tecendo
estudos interdisciplinares na temática. (TRIGO; PANOSSO NETTO, 2003)
2.1.2 Contribuições de Jean Piaget: O Sujeito Epistemológico
A Epistemologia Psicogenética de Jean Piaget pode ser considerada como
uma epistemologia global, e se liga em especial às ciências humanas, o que não
impede de utilizarmos dela em outras áreas. Foi fazendo uso de sua própria
epistemologia que Piaget chegou aos avanços no campo das ciências humanas
(JAPIASSU, 1979)
Muito conhecido por suas contribuições no campo dos estudos do
33
desenvolvimento infantil, e pelas descobertas do Arco Reflexo, que modificaram as
bases da educação e metodologias de ensino em todo o mundo, a Teoria de
Aprendizagem de Jean Piaget ficou conhecida como Construcionista, e alguns o
classificam como trans-positivista, mas na verdade Piaget forma um novo núcleo,
uma nova escola na Psicologia e Pedagogia – Escola Cognitivista. (SCHULTZ e
SCHULTZ, 1992)
O estudo do desenvolvimento do ser humano é uma das áreas com as quais
se preocupa a psicologia, concentrando-se na compreensão do homem em todos os
seus aspectos. Assim, engloba fases que vão desde o nascimento até o seu mais
completo grau de maturidade e estabilidade. Muitas são as Teorias que tentam,
através da história, reconstruir os passos do desenvolvimento e do conhecimento
humano. Podemos citar como exemplo Sigmund Freud, que desenvolveu sua teoria
sobre a psicossexualidade através das fases de desenvolvimento infantil. Partindo
de diferentes metodologias e visões de homem e de mundo, estas teorias tentam
trazer condições de produção da representação do mundo e de suas vinculações
com o homem em cada momento histórico e social. Pois assim como o mundo
muda, esse homem também muda perante o mundo. (SCHULTZ e SCHULTZ, 1992)
Para Piaget a epistemologia pode ser definida como: o estudo da constituição
dos conhecimentos válidos, e suas condições de acesso a novos conhecimentos. Ou
seja, como passamos de um conhecimento para um nível mais elevado de
conhecimento. Dentre as teorias, a escolhemos para nosso trabalho por alguns
motivos: primeiro pelo domínio teórico; segundo porque sua epistemologia adere ao
objeto e temática de estudo; e terceiro porque acreditamos que foi quem mais se
aproximou da construção do conhecimento enquanto desenvolvimento humano.
(JAPIASSU, 1979; PIAGET, 1971)
Assim como as demais teorias, ela busca compreender o desenvolvimento
humano, por conseguinte o ato de conhecer, mas ela vai além quando inclui uma
terceira visão: a interacionista. Na visão de Piaget, existe um terceiro vetor que uni
as visões materialista mecanicista e o idealismo. Estas duas tendências são
extremamente contrárias, e se dissociaram completamente dentro do campo da
psicologia. Através de Piaget, elas encontram um chão comum, um ponto de
convivência. (PIAGET, 1971)
Piaget foi muito bem recebido no campo das ciências. Postulava que seu
estudo era de fundo biológico, científico, utilizando-se do método empírico, como nos
34
testes com crianças, por exemplo. Assim, a história tem muito peso para Piaget, e
não fica delimitada a segundo plano, pelo contrário, são as estruturas mais primitivas
que possibilitam o desenvolvimento de estruturas mais avançadas, que propiciam a
aquisição e posterior elaboração do conhecimento. (SCHULTZ e SCHULTZ, 1992)
Não vamos entrar no mérito do desenvolvimento infantil, pois não é esse
nosso foco neste trabalho, mas, nos cabe saber que Piaget partiu das observações
e testes feitos com crianças em várias faixas etárias. A partir da formação do
conceito de número, desenvolveu as fases do desenvolvimento cognitivo, e as
comparou com os caminhos do pesquisador ao fazer sua pesquisa. Suas
contribuições ficaram conhecidas como Epistemologia Genética ou Psicogenética.
(JAPIASSU, 1979)
Epistemologia Genética porque Piaget considerava que o conhecimento só
pode ser viável em condições iniciais para tal, e caso essas não existam o
conhecimento acontece de forma diferenciada. Um Exemplo: sem as faculdades
mentais seria impossível sobreviver e aprender. Ou ainda, sem aprender o que é o
número 1 e o que ele representa, seria impossível resolver qualquer formulação
matemática. É por isso que antes eu preciso aprender a somar e subtrair para
depois aprender a multiplicar e dividir. Sem aprender o B+A=BA, como poderia eu
proceder a escrita de um texto, ou de um ditado?
O homem possui estruturas cognitivas que possibilitam o saber, e essas são
construídas durante o desenvolvimento infantil, amadurecendo e se consolidando na
fase adulta, onde se espera que o indivíduo adquira autonomia intelectual
necessária para elaborar novos conhecimentos. A contribuição de Piaget para a
Epistemologia foi imensa. A primeira delas é evidenciar estruturas cognitivas no
desenvolvimento humano que, interagindo com o meio social, leva ao aprendizado e
produção do conhecimento. E a segunda visão, de que o ser humano, sendo tão
complexo, só poderia ser estudado em sua totalidade de forma multidisciplinar e
interdisciplinar. (PIAGET, 1971)
A Teoria de Piaget busca compreender como o individuo se constitui como
sujeito cognoscente, através das fases do desenvolvimento, se transformando em
um elaborador de conhecimentos válidos. Mais do que isso, Jean Piaget
desenvolveu uma Epistemologia Psicogenética, multidisciplinar e Construcionista.
Com a introdução do Interacionismo, Piaget reuniu esse homem, que havia
sido recortado pela ciência, em um Arco, ou seja: o objetivo, biológico poderia
35
conviver e interagir com o subjetivo, social, na construção de um ser cognoscente,
que elabora conhecimentos válidos. A Psicologia objetivista (Análise Experimental
do Comportamento), privilegiava o dado externo, afirmando que todo conhecimento
provém unicamente da experiência, do empírico; e a Psicologia subjetivista
(Psicanálise ou Psicologia Humanista), em contraste, entendia que todo
conhecimento é anterior à experiência, pressupondo a existência do inconsciente,
por exemplo. (JAPIASSU, 1979; PIAGET, 1971)
Considerando insuficientes essas duas posições na explicação do processo
de construção do conhecimento humano, Piaget formulou o conceito de
psicogênese, argumentando que o conhecimento não procederia nem da
experiência única dos objetos, e nem de uma programação inata, mas de
construções sucessivas com elaborações constantes de novas estruturas. Assim
sendo, o processo evolutivo da filogênese humana tem uma origem biológica que é
ativada pela ação e interação do organismo com o meio ambiente - físico e social -
que o rodeia, significando entender com isso que as formas primitivas da mente,
biologicamente constituídas, são reorganizadas pela psique socializada, ou seja,
existe uma relação de interdependência entre o sujeito conhecedor e o objeto a
conhecer.
Esse processo, por conseguinte, se dá por meio de um mecanismo
autorregulador que consiste em: processo de equilíbrio progressivo do organismo
em relação ao meio em que o está inserido. (PIAGET, 1971; SCHULTZ E SCHULTZ,
1992)
Assim, Piaget (1971) divide o processo de conhecimento em algumas fases,
baseado no desenvolvimento em suas pesquisas empíricas e observações:
a) Assimilação (Aquisição de Conceitos): ao entrar em contato com
o mundo, com os objetos, o sujeito adquiri alguns conceitos
sobre o objeto, ainda não organizados.
b) Acomodação: o sujeito entra em um estágio de desequilíbrio de
saberes, onde ele é impelido a acomodar os saberes através de
um processo de adaptação, que pode ser também conhecido
como equilibração.
c) Adaptação (Equilibração): no contato com o mundo, com os
objetos o indivíduo se transforma, e organiza os novos conceitos
36
em novas estruturas, atingindo um novo equilíbrio;
São adquiridas assim novas estruturas que ao entrarem em contato com o
mundo, com os objetos, e com os ―outros‖ reformula-se novamente visando à nova
acomodação, que leva o sujeito a elaborar novos conhecimentos, de maneira cíclica.
(PIAGET, 1971)
Ele montou um Bureau em Genebra, com grandes pesquisadores, das mais
diversas áreas, e as teorias por ele criadas ganharam força, por ter sido
desenvolvida com base biológica. Deu o nome a sua epistemologia de genética, mas
na verdade deveria se chamar ontogenética, uma vez que leva em conta tanto a
interação com o meio social, quanto a história de vida do sujeito como fatores que se
envolvem e interagem na construção do conhecimento. Ele considera o Biológico, ou
seja: estruturas cognitivas que possibilitem o conhecimento. Social: a interação com
o meio social e a socialização como um forte fator determinante no aprendizado e no
conhecimento, interagindo na formação das estruturas cognitivas; Psicológicas:
sentimentos, emoções que também tem sua importância para Piaget, se
relacionando com a cognição. Estes elementos compõe o sujeito epistemológico –
mas esse sujeito é ideal, ele existe para além do sujeito, o sujeito epistemológico
seria a essência do sujeito cognoscente. (SCHULTZ e SCHULTZ, 1992)
Piaget vai utilizar de um método que ele denomina psico-genético, ou seja, se
localiza numa ponte entre a psicologia e a biologia (psicobiologia), interagindo com o
método histórico e crítico. Como coloca Japiassu, o método utilizado por Piaget
também é um método histórico crítico: ―Assim, o estudo comparado das estruturas
mentais que intervêm no desenvolvimento científico pode organizar-se no que Piaget
chama de o método histórico-crítico‖. (JAPIASSU, 1979, p.46)
Assim, o método histórico crítico de Jean Piaget aplicado ao conhecimento
ficou conhecido como epistemologia genética, alterando a paisagem do
conhecimento e da educação. Alguns dos fundamentos por ele desenvolvidos foram
utilizados tanto na fundamentação teórica, quanto nas análises que foram
demandadas e realizadas nesta pesquisa.
37
2.2 DA METAFÍSICA A CIÊNCIA MODERNA
Como anteriormente citado, o conhecimento humano engloba suas diversas
manifestações: senso-comum, teologia, artes, filosofia, ciência. O conhecimento de
que tratamos nesta dissertação é o conhecimento científico, ou seja, temos um
recorte específico dentro do campo do conhecimento.
Fez-se então necessário uma recorrência epistemológica das principais
correntes que influenciaram na constituição das ciências no Ocidente. É a categoria
de recorrência epistemológica que, segundo Japiassu (1979, p.20):
[...] torna possível o desenvolvimento de uma história teórica ou de um conhecimento teórico da história das ciências. É ele que nos permite compreender o devir real de uma ciência, que é objeto da epistemologia histórica.
Assim sendo, iniciamos então nossa jornada a partir das reflexões de René
Descartes5.
‗Penso, logo existo‘. Um tão disseminado aforismo que tantos usam e poucos
sabem qual foi o real significado e suas contribuições. Descartes em suas
meditações e descobertas influenciaria uma época. Talvez ele seja o maior
representativo para aquela que passaria ser conhecida como a ―Ciência Moderna‖.
(SCHULTZ E SCHULTZ, 1992)
Descartes, assim como a maioria dos seus contemporâneos no séc. XV e XVI
teve sua formação ligada a tradição escolástica. Dentre os ensinamentos Teologia,
Filosofia – em especial a lógica aristotélica, e as conhecidas como ciências gregas,
que já havia feito considerados avanços no campo da matemática, geometria, física
(astronomia). O ensino, o conhecimento era controlado pela Igreja Cristã, e
disseminado e censurado quando lhe era conveniente. As mesmas espécies de
interrogações feitas atualmente sobre a natureza, a natureza humana e o homem
em sua relação com a natureza também o eram séculos atrás, ―o que demonstra
uma continuidade vital entre o passado e o presente em termos de seu objeto de
estudo‖. (SCHULTZ E SCHULTZ, 1992, p. 17)
Um exemplo são as Cartas de Copérnico, que através das suas descobertas
de que a Terra não era quadrada ou retangular possibilitou o desenvolvimento das
5 Este capítulo foi desenvolvido com base em estudos, reflexões e discussões realizados na Disciplina de
Metodologia de Pesquisa, bem como das leituras acumuladas durante a pesquisa bibliográfica, com aprofundamento em questões de cunho filosófico e epistemológico.
38
cartas de navegação, responsáveis pelo processo de expansão marítima. Mas não
sem antes enfrentarem a fúria da Igreja, que censurou o material durante séculos.
(ALVES, 1981)
Foi com as teorias e as cartas de Copérnico que Galileu Galilei desenvolveu a
teoria Heliocêntrica, que deslocaria a Terra do centro do Universo. Deslocar a Terra
do centro do Universo, é mudar o homem de lugar, é mudar sua orientação
geográfica. Suas descobertas abalaram as estruturas da matemática e geometria e
das ―sciencias‖ de tradição escolástica. Abalariam a instância reguladora do
conhecimento na época: A Igreja Católica. Esta, através do Dom Papa Bento XVI
pediu desculpas a Galileu em 1992, se retratando pelo tratamento que fora
dispensado.
Uma das perguntas iniciais e principalmente utilizadas pela Igreja diziam que,
as observações de Galileu eram infundadas, e ele não teria como provar as
afirmações feitas, ao passo que não existiriam instrumentos possíveis de medição,
não havia tecnologia suficiente, seria fácil refutar suas colocações. Naquela época
pairavam dúvidas sobre as teorias desenvolvidas pelos estudiosos, principalmente
porque, em sua maioria, descendiam de sonhos, visões, reflexões e não tinham
apoio no mundo material, não era um conhecimento empírico, passível de
experimentação ou verificação. E também não se pautava em uma reflexão
metódica definida, dado que os caminhos para as descobertas se dava no mundo
sensível. Havia especulações e reflexões, mas se desconheciam estruturas que
possibilitassem a cognição. (PIAGET,1971)
Voltando a Descartes, talvez o primeiro contato que tenhamos com suas
descobertas seja na escola básica, em especial na disciplina de matemática.
Quantos se lembram do Plano Cartesiano? E dos estudos de Álgebra? Descartes se
dedicou a matemática, geometria, teologia, filosofia, física, química, biologia. O
conhecimento não possuía um corpo definido e específico, ele era abrangente, não
era um conhecimento estratificado, saberes estratificados, o que formava ―doutos‖
com conhecimento abrangente nas diversos campos das ―sciencias‖. (CHAUÍ, 2000)
É Rene Descartes o responsável pela célebre frase: ―Penso, logo sou!‖. Este
foi o cogito de Descartes – ―Cogito ergo sum‖. Mas quais seriam as implicações de
suas descobertas no mundo ―scientífico‖ por volta dos anos 1600 a 1700 d.C.?
Ao escrever o ―Discurso sobre o Método‖, Descartes, influenciado pelas
descobertas recentes, porem censuradas pela Igreja, de Galileu Galilei, constrói um
39
processo metodológico, em etapas. Procedimentos que descreviam os caminhos
pelos quais ele próprio construía sua ciência, suas pesquisas, suas descobertas;
construía conhecimento. Descartes descrevia seu modo de conhecer o mundo, de
conhecer determinado objeto ou temática de pesquisa.
Assim meu propósito não é ensinar aqui um método que cada um deve seguir para bem conduzir sua razão, mas apenas mostrar de que maneira procurei conduzir a minha. [...] Fui nutrido nas letras desde a minha infância, e, convencido de que por meio delas podia adquirir um conhecimento claro e seguro de tudo o que é útil à vida, eu tinha um desejo extremo de aprendê-las. (DESCARTES, 2007, p. 39).
Escrevendo em francês, René vem dividir as descobertas que fez acerca da
razão, do pensamento, da ciência com o público em uma época onde apenas os
―doutos‖ tinham acesso às obras filosóficas, que em sua maioria eram escritas em
latim. Na segunda parte de seu discurso, Descartes descreve as etapas seguidas
por ele para conduzir sua razão na construção do método, a saber:
O primeiro era não aceitar jamais alguma coisa como verdadeira que eu não o conhecesse evidentemente como tal; isto é, evitar cuidadosamente a precipitação e a prevenção, e nada incluir em meus julgamentos senão o que se apresentasse de maneira tão clara e distinta a meu espírito que eu não tivesse nenhuma ocasião de coloca-lo em dúvida. (DESCARTES, 2007, p. 55).
Assim, Descartes lança as bases do que conhecemos por Racionalismo, ou
seja o conhecimento se dá a partir de uma proposição Verdadeira, que deve se
colocar de maneira clara e distinta, ou seja, ela deve ser concebida, através do
pensamento, do raciocínio lógico, da razão. Posteriormente ele apresentará como
chegou a seu cogito durante o Discurso. Mas em Meditações Metafísicas
concernentes a Filosofia Primeira, ele coloca com clareza seus princípios e
Verdades. E a Verdade parte da ação de duvidar, como coloca:
[...] consegui um repouso assegurado numa pacífica solidão, aplicar-me-ei seriamente e com liberdade em destruir em geral todas as minhas antigas opiniões. Ora, não será necessário, para alcançar tal desígnio, provar que todas elas são falsas, o que talvez nunca levasse a cabo; mas, uma vez que a razão já me persuade que não devo menos cuidadosamente impedir-me de dar crédito as coisas que não são inteiramente certas e indubitáveis, do que as que nos parecem manifestadamente ser falsas, o menor motivo de dúvida que eu nelas encontrar bastará para levar a rejeitar todas elas. (DESCARTES, 1641, s/p. Grifo nosso)
40
O que é verdadeiro para Descartes é o que pode ser concebido ―clara e
distintamente‖ unicamente pela razão. Em suas meditações ele descreve que, na
busca pela verdade, põe-se a duvidar da existência de tudo e concebe um ser
supremo como Gênio maligno, cuja intencionalidade não é outra senão a de enganar
o sujeito, através do engano dos sentidos, do mundo sensível. Esse Divino
enganador faz parte da dúvida hiperbólica de Descartes. Ao colocar toda existência
em suspenso e anular todo o saber atinge seu ápice em um único ponto de certeza:
o pensamento. Uma coisa é pelo menos certa para ele: de que está pensando.
[...] encontro aqui que o pensamento é um atributo que me pertence; só ele não pode ser destacado de mim. Sou, existo isto é certo, mas por quanto tempo? O tempo que eu pensar, pois, talvez, se eu deixasse de pensar eu poderia deixar de existir. Não admito agora nada que não seja necessariamente verdadeiro: não sou senão uma coisa que pensa‖. (Descartes apud, QUINET, 2001, p.15)
Assim, a construção do método de Descartes não poderia se pautar no
subjetivo, no mundo sensível, nos sentidos, na experiência, nem em sonhos, visões
inconscientes, inspirados por um Supremo benevolente. O conhecimento deveria se
pautar na razão. E essa razão deve ser pura, não sofrendo interferência de
preceitos, certezas anteriores, pré-conceitos. Assim, o homem seria dotado de
Razão mediante o pensamento. E esse pensamento só poderia ser considerado
válido, se ele viesse de algo maior, de uma perfeição suprema. A perfeição do
Saber.
A seguir, refletindo sobre o que eu duvidava, e que, portanto meu ser não era todo perfeito, pois eu via claramente que havia maior perfeição em conhecer do que em duvidar, ocorreu-me investigar de onde eu aprendera a pensar em algo mais perfeito do que eu era; e compreendi com evidência que devia ser de uma natureza que fosse, de fato, mais perfeita. (...) Assim restava apenas que ela tivesse sido posta em mim por uma natureza que fosse verdadeiramente mais perfeita que a minha, e mesmo que tivesse em si todas as perfeições que eu podia conceber, isto é, para explicar-me numa palavra que fosse Deus. (DESCARTES, 2007, p.73).
Assim, para Descartes o homem é uma ―coisa cuja substância é
pensamento‖. E esse pensamento é válido para Descartes por que ele é dotado da
perfeição. Se é dotado de perfeição, é uma proposição verdadeira. Para Descartes,
a certeza da razão é uma verdade absoluta. Essa seria uma das bases do
Iluminismo. ―O Iluminismo foi também um movimento de fé; fé na razão, no futuro, na
flecha de um tempo, no comércio entre os homens e, finalmente, fé na educação‖.
41
(BOTO, 2010, p.282)
Na segunda colocação sobre a forma como ele construiu seu método,
Descartes coloca que partindo de observações gerais e verdadeiras, poderia se
atingir a verdade da ―coisa‖ que se pretende conhecer. Ele vem a ser muito
influenciado pelos estudos da fisiologia, e tem importantes contribuições com as
descobertas de Harvey, fisiologista Inglês, sobre a circulação do sangue no corpo
humano. Essas descobertas foram feitas com base na dissecação e estudo de
animais vivos. Harvey era um fisiologista, e utilizava da dissecação de animais, que
era completamente aceitável, visto que animais não seriam dotados de alma, eles
funcionariam de forma autômata, como máquinas.
A dissecação de cadáveres (prática básica nos cursos que se ligam a área de
biologia e saúde), para fins de estudos da anatomia humana, era uma grave heresia
na visão dos filósofos cristãos e de teólogos, que tinham como preocupação central
existencial o homem – uma visão Existencialista e Humanista. (BOTO, 2010)
Para a Teologia Cristã, a dissecação humana envolvia a profanação da obra
divina, o homem, que possuía uma alma e assim sendo não era uma máquina, não
poderia ser recriado. Implica que estender as descobertas feitas em animais aos
seres humanos, seria igualá-lo a animais, logo igualar o homem a máquina – uma
visão Mecanicista. Assim, só seria possível se os animais funcionassem
fisiologicamente como o ser humano, mas não dotados de alma, não dotados de
pensamento, não dotados de razão. Os animais são seres Irracionais na visão de
Descartes, e que, portanto, funcionariam como máquinas, não tendo assim
sentimentos, possíveis somente aos seres humanos, dotados de razão.
Assim acontece uma cisão entre o homem que pesquisa e o objeto que é
pesquisado, eles são diferentes. Nesse momento histórico e social, não existiam
direitos animas e nem direitos humanos. (CHAUÍ, 2000)
Descrevi depois disso a alma racional, e fiz ver que ela não pode de maneira alguma ser obtida do poder da matéria, assim como as outras coisas de que falei, mas que deve ser necessariamente criada; e não basta que ela esteja alojada no corpo humano, como um piloto em seu navio, senão talvez para mover seus membros, mas que é necessário que esteja junta e unida mais intimamente com ele para ter, também, sentimentos e apetites semelhantes aos nossos, e assim compor um verdadeiro homem. (DESCARTES, 2007, p.98)
Os animais na visão colocada por Descartes são criaturas, que possuem o
42
mesmo funcionamento da criação humana, mas dotados de pensamento irracional,
sendo desprovidos de razão. O que possibilita que os estudos em animais possam
ser extensos ao estudo da anatomia e fisiologia humana. A partir de organismos
mais simples, poderíamos chegar a organismos mais complexos, no caso, o
Homem. Assim, parte do método de Descartes reside no ―corte da coisa que se quer
conhecer‖, um recorte do objeto de estudo.
O segundo, dividir cada uma das dificuldades que eu examinasse em tantas parcelas possíveis e que fossem necessárias para melhor resolvê-las. O terceiro, conduzir por ordem meus pensamentos, começando pelos objetos mais simples e mais fáceis de conhecer, para subir aos poucos, como por degraus, até o conhecimento dos mais compostos, e supondo mesmo uma ordem entre os que não se precedem naturalmente uns aos outros. (DESCARTES, 2007, p.55)
Descartes concebe a complexidade do conhecimento, ou seja, a necessidade
de recortá-lo para um melhor estudo. Ele estrutura um método que vai do simples ao
composto. Do geral para o particular, sem exceder suas premissas básicas, sem
excluir a ordem entre os objetos. Um Método Dedutivo.
O Método Dedutivo consiste em um recurso metodológico em que a
racionalização ou combinação de ideias em sentido interpretativo vale mais do que a
experimentação de caso por caso. Ou seja, partindo de uma proposição verdadeira,
que no caso de Descartes se coloca como auto evidente, a razão, desenvolve-se o
método dedutivo, que utiliza, inicialmente, de recursos do raciocínio lógico para
alcançar o conhecimento. Para este método são dadas as premissas verdadeiras, e
chega-se a uma conclusão que deverá ser correta. Porém esta conclusão já estava
subentendida nas premissas, mas ela precisa ser exposta de maneira clara e
distinta. O método dedutivo sacrifica a ampliação do conhecimento, para que se
revele a ―Verdade‖ sobre o objeto ou temática pesquisada. Muitas pessoas colocam
que este método parte do geral para o particular, ou do particular para o geral, essa
é uma visão simplista do método.
O essencial no método dedutivo é partir de premissas verdadeiras, que levem
a um conhecimento real do objeto pesquisado. Essa premissa verdadeira pode ser
um fato observável ou da própria lógica, desde que seu conteúdo seja verdadeiro.
Ela dá margem a apenas duas possibilidades ―estatísticas‖: ou o resultado das
premissas é verdadeiro, ou falso. Vamos ver alguns exemplos:
43
Quadro 02 – Exemplos de Reflexões no Método Dedutivo6
Todo o Homem é Mortal Todo o Mamífero tem um Coração
ORA, Sócrates é Homem OU ORA, Todos os cães são Mamíferos
LOGO, Sócrates é Mortal. LOGO, Todos os cães tem um coração
Fonte: Da Pesquisa.
Descartes parte daquilo que pode ser observado, daquilo que pode ser
exemplificado, traduzido pela lógica. Descartes via na Matemática a pureza das
Ciências, e a linguagem universal que poderia traduzir os conhecimentos
produzidos, ele também participará de algumas incursões empíricas, com Harvey,
por exemplo, mas o método cartesiano é, em essência, dedutivo. (SCHULTZ E
SCHULTZ, 1992)
Cruz e Ribeiro (2003) colocam que o método dedutivo levaria o pesquisador
do conhecido ao desconhecido com pouca margem de erro; por outro lado, o
alcance do conhecimento obtido seria limitado, pois, o resultado deste não pode
exceder as premissas. Richardson (2008) reforça a ideia de que, aplicando-se o
método dedutivo o pesquisador avança do conhecimento prévio para uma
explicação do fenômeno, ou do objeto observado. Vamos observar mais um
exemplo, aplicado a geometria analítica.
Figura 01 – Exemplo de Reflexões do Método Dedutivo
Fonte: Da Pesquisa.
Como podemos observar a partir de sua Biografia, René Descartes se
6 Os quadros apresentados neste capítulo foram desenvolvidos com base nos materiais disponibilizados na
Disciplina de Metodologia de Pesquisa, lecionada pelo Professor Doutor Josemar Sidinei Soares.
44
relacionava com muitas pessoas e viajava muito pela Europa. Sendo francês, morou
em Paris, e em outras cidades da França. Alistou-se como voluntário em exércitos
de diversos países, como a Holanda, onde passou alguns anos, Bavária e Hungria.
Era um excelente espadachim, gostava de jogos, e, segundo consta, era um ótimo
dançarino. (SCHULTZ E SCHULTZ, 1992)
Descartes ficou conhecido como aventureiro, gostava de viajar. Segundo
contam conheceu os vícios, virtudes e prazeres humanos. Descartes tinha interesse
em aplicar seu conhecimento a questões práticas. Pesquisou técnicas ―que
evitassem o embranquecimento de cabelos e realizou experimentos sobre o uso de
cadeira de rodas por pessoas com necessidades especiais de locomoção‖
(SCHULTZ E SCHULTZ, 1992, p. 38).
Descartes coloca a importância de não ter uma moradia fixa, ou casa própria,
ao passo que passava tempos em tempos, viajando e trabalhando pela Europa.
E enfim, como não basta, antes de começar a reconstruir a casa onde se mora, derrubá-la, ou prover-se de materiais e arquitetos, ou adestrar-se a si mesmo na arquitetura, nem, além disso, ter traçado cuidadosamente o seu projeto; mas cumpre também ter-se provido de outra qualquer onde a gente possa alojar-se comodamente durante o tempo em que nela se trabalha; assim, para não permanecer irresoluto em minhas ações, enquanto a razão me obrigasse a sê-lo, em meus juízos, e de não deixar de viver desde então de o mais felizmente possível, formei para mim mesmo uma moral provisória. (Descartes, 2007, p. 63)
Na Terceira parte o autor expõe sua moral provisória, constituída de máximas
por ele seguidas, para nortear seus pensamentos – ―Como devo pensar?‖, e atos –
―Como devo agir?‖
A primeira consiste em respeitar as leis e costumes de cada país, evitando
excessos, desde que a liberdade não fosse suprimida, condição fundamental na
busca da verdade. Guiando-se distanciado dos excessos, atento as práticas que
fossem comumente realizadas pelos mais sensatos daqueles com os quais ele teria
de conviver. (DESCARTES, 2007)
A segunda proposição de sua moral provisória, coloca que devemos ser
firmes e resolutos em nossas ações e escolhas, assumindo os riscos que a busca
pelo conhecimento nos empreende, sem hesitar. As decisões tomadas devem ser
encaradas com coragem e determinação. Como possibilidades de se conhecer,
tendo uma trajetória de orientação. Ele compara o manter-se firme em suas
proposições e caminhos, em uma analogia entre o viajante e a viagem (viajem).
45
Imitando nisso os viajantes que, vendo-se extraviados nalguma floresta, não devem errar volteando, ora para um lado, ora para outro, nem menos ainda deter-se num sítio, mas caminhar sempre o mais reto possível para um mesmo lado, e não muda-lo por fracas razões, ainda que no começo só o acaso talvez haja determinado a sua escolha: pois, por este meio, se não vão exatamente aonde desejam, ao menos chegarão no fim a alguma parte, onde verossimilmente estarão melhor do que no meio de uma floresta. (Descartes, 2007, p.64)
A terceira moral provisória postula o autocontrole, vencer antes a si mesmo.
―Acostumar-me a crer que nada está inteiramente em nosso poder a não ser nossos
pensamentos.‖ (DESCARTES, p.63, 2007). Descartes discursa sobre o inclinar de
nossa vontade naturalmente para as coisas que nos são possíveis conhecer, que
nos são possíveis possuir. Ao passo que coloca:
[...] se considerarmos todos os bens que se acham fora de nós como igualmente afastados de nosso poder, não lamentaremos mais a falta daqueles que parecem dever-se ao nosso nascimento, quando deles formos privados sem culpa nossa, do que lamentamos não possuir os reinos da China ou do México; e que fazendo, como se diz, da necessidade da virtude, não desejaremos mais estar sãos, estando doentes, ou estar livres, estando na prisão, do que desejamos ter agora corpos de uma matéria tão pouco corruptível quanto os diamantes, ou asas para voar como as aves. Mas confesso que é preciso um longo exercício e uma meditação amiúde reiterada para nos acostumarmos a olhar por este ângulo todas as coisas; e creio que é principalmente nisso que consistia o segredo dos filósofos. (DESCARTES, 2007, p. 63)
Em suma a moral implica em escolha de vida, na qual a liberdade é essencial
no exercício do pensamento, e a busca da verdade, ou das verdades, de forma
metódica, questionadora e aberta às transformações. Descartes assim esboça
alguns preceitos em seus textos, que poderiam se comparar a uma Ética na
pesquisa científica.
Durante seu discurso, o autor também coloca a disciplina, a linguagem o
conhecimento do qual ele iria se valer para compor seu saber. E qual seria
linguagem que dotada de perfeição, possibilitaria a suspenção das dúvidas,
tornando claro e preciso o conhecimento produzido? Para Descartes, a linguagem
universal dos números, a Matemática. Com suas contribuições, a álgebra descende
das descobertas de Descartes, bem como a Geometria analítica.
A última etapa do método colocado por Descartes é o registro das
informações. ―E o último, fazer em toda parte enumerações tão completas, e
revisões tão gerais, que eu tivesse a certeza de nada omitir.‖ (DESCARTES, 2007,
p. 55).
46
Ou seja, parte do método desenvolvido por Descartes consistia em registrar
todas as observações e descobertas, para que se pudesse ter certeza de que dados
não fossem omitidos, subtraídos. Esta é assim a forma pela qual o cientista, o
estudioso transmite suas descobertas. É assim que ele divide com os outros
pesquisadores os resultados de seus estudos, de suas pesquisas. O registro já
acontecia, muito antes de Descartes, mas muito dos materiais ao longo do tempo
foram se perdendo. A Biblioteca de Alexandria é um exemplo, que depois de
incendiada, foram perdidos muitos dos manuscritos filosóficos e das ciências gregas
(matemática, geometria, astronomia). Assim o registro dos resultados descobertos
através da aplicação do método, ao passar do tempo, seriam chamados de
Pesquisa. Como coloca Pedro Demo:
Pesquisa é a atividade científica pela qual descobrimos a realidade. Partimos do Pressuposto de que a realidade não se desvenda na superfície. Não é o que aparenta à primeira vista. Ademais, nossos esquemas explicativos nunca esgotam a realidade, porque esta é mais exuberante que aqueles. (DEMO, 1985, p.23)
Ou ainda como coloca Figueiredo (2009, p. 53) ―os trabalhos científicos são
de suma importância para a vida acadêmica, e para o crescimento profissional de
cada indivíduo‖. Através da comunicação dos dados resultantes, ou dos dados
recolhidos a pesquisa é formatada, como a principal comunicação do pesquisador.
Nos dias atuais já contamos com outras modalidades de comunicação científica
(periódicos, eventos, monografias e livros)
Quando pensamos na Arte, em especial a música, a composição de uma
peça musical, de uma sinfonia, ela é a Arte do Músico. Quando refletimos sobre a
beleza da poesia, a literatura é a Arte do Escritor. Quando olhamos para uma
escultura, ou uma pintura, estamos admirando a Arte, o trabalho desenvolvido pelo
Artista. Assim, as descobertas resultantes do trabalho realizado pelo pesquisador, ao
serem simbolizadas, transcritas para uma linguagem decifrável, caracteriza a
Pesquisa. A Pesquisa é a Arte do Pesquisador.
Como em tudo na vida, a ciência não é ensinada totalmente, porque não é apenas técnica, É igualmente uma Arte. E na Arte vale a máxima: é preciso aprender técnica, para termos base suficiente; mas não se pode sacrificar a criatividade à técnica; vale precisamente o contrário: o bom artista é aquele que superou os condicionamentos da técnica e voa sozinho. Quem segue excessivamente as técnicas, será por certo medíocre, porquanto onde há demasiada ordem, nada se cria. (DEMO, 1985, p. 22)
47
Dividimos do mesmo posicionamento de Pedro Demo (1985), quando a
técnica e a metodologia se sobrepõe em demasiado, ela encerra uma ordem tão
delimitada sobre a temática de estudo, que encarcera a Arte do Pesquisador. Esse
foi um dos pontos negativos das colocações de Descartes. Até os dias atuais se
exige uma coerência e linha de raciocínio lógico que influencia demais na redação
sobre a pesquisa, ela limita, de certa forma, a Arte da Pesquisa.
Ao descrever as etapas que utilizou para encadear a razão, sendo possível
conhecer o mundo e a natureza, ou seja, tornando possível o conhecimento através
da racionalidade – visão racionalista, Descartes constrói o seu Método, o Método
Cartesiano.
Mais do que criar um método lógico e racional para atingir o conhecimento,
―ele libertou a pesquisa dos rígidos dogmas teológicos e tradicionais que a haviam
controlado durante séculos‖ (SCHULTZ E SCHULTZ, 1992, p. 38). Ele simboliza,
junto com muitos outros pensadores e estudiosos, a transição entre a Renascença
para a iluminada ciência moderna.
Claro que suas colocações foram ousadas para a época, outras teorias ainda
mais impactantes seriam desenvolvidas a partir dos tabus que foram quebrados, dos
paradigmas que foram alterados. Ele também sofreria censura, principalmente por
suas ligações com o mecanicismo, já existente, embora ainda tímido, que se
dedicava a construção de máquinas, para alcançar ou aplicar alguns dos
conhecimentos obtidos. Se comparado à tecnologia hoje a nós acessível, seria
colocar uma lupa infantil ao lado do telescópio Hubble.
Quase todas as suas obras foram escritas durante os seus anos na Holanda, onde a liberdade de pensamento era garantida. No entanto, foi vítima de certa perseguição religiosa. Num dado momento, os livreiros foram proibidos de vender suas obras, e ele foi levado diante dos magistrados para responder às acusações feitas por Teólogos de duas cidades holandesas, de ser ateu e libertino, acusações sérias para um católico devoto. (SCHULTZ E SCHULTZ, 1992, p. 38).
Quanto a Teologia, esta se preocupa com o Homem, que seria a máxima
criação da natureza divina, o que justificaria o poder investido por Deus. Dos
filósofos considerados cristãos e teólogos surgiu a linha humanista, que tinha o
Homem como centro de seus estudos. Já haviam sido tecidas muitas discussões
teológicas e filosóficas sobre a divindade e humanidade da espécie humana.
Filósofos e grandes Teólogos, anteriores a Descartes, como os filósofos Aristóteles e
48
Platão, que trouxeram grandes contribuições acerca da existência humana, e os
teólogos Tomás de Aquino e Santo Agostinho, sendo o segundo um contraponto a
visão de Tomás. Assim o homem, como parte da natureza, também poderia ser
estudado. Estas reflexões sobre o homem viriam a se dividir posteriormente em
Ciências Humanas, mas até esse momento existia um núcleo que reunia as
reflexões a cerca da natureza e do homem. Estamos falando de uma só ciência, um
só campo, as Ciências Naturais.
Questionamentos só são possíveis em meio a um ambiente propício, que não
coloquem em risco a vida de seus questionadores, ou então, poderia acabar como
Sócrates, descrevendo sua morte lenta ao beber cicuta. Os avanços do Iluminismo
propiciaram um ambiente crítico, questionador. Assim, o conhecimento produzido
por Descartes foi aceito por muitos, mas rejeitado por vários.
O método proposto por Descartes, embora tenha exercido influência, e bem
aceito até certo ponto, suscitou debates, discussões, tais como: Seria o
conhecimento dado pela razão? Somente pela razão? Poderia o homem ser
comparado a uma máquina? E quanto à linguagem universal ser a matemática? O
que é verdade? O que é Ciência? E o que não é Ciência?
São dúvidas que se instalam a respeito do conhecimento produzido, e de
como ele seria possível. São dúvidas filosóficas e teóricas, que tratam do
conhecimento. São questões epistemológicas acerca das Teorias do Conhecimento.
Ela se preocupa com o desenvolvimento e resultados obtidos pela pesquisa, ou seja,
com a Arte do Pesquisador. São dúvidas no que concerne a temática de nosso
trabalho, Epistemologia. Como coloca JAPIASSU:
Essencialmente, a epistemologia é o estudo crítico dos princípios, das hipóteses, e dos resultados das diversas ciências. Semelhante estudo tem por objetivo determinar a origem lógica (não psicológica) das ciências, seu valor e seu alcance objetivos. (1979, p. 25)
As influências do pensamento de Descartes se espalharam e promoveram
avanços, iniciando uma corrente que ficou conhecida como Racionalismo. Até o
momento falamos das Ciências que tem como base o raciocínio lógico. Já existiam
alguns instrumentos de medição, e esse desenvolvimento aumentou bastante neste
período. Galileu já havia utilizado de alguns instrumentos para chegar a suas
descobertas, Kepler também havia utilizado o que contribui para que se desenvolva
uma corrente baseada na fé na razão e na experimentação, através dos
49
instrumentos desenvolvidos. Um corrente Racionalista Empirista.
Estão lançadas as bases iluminadas de uma nova estruturação do saber, que
ao ser colocado como possibilidade de conhecer, altera a paisagem do
conhecimento. ―Cada vez que a sociedade passa por um processo de mudança, a
economia, as relações sociais, e políticas também mudam, em ritmo e intensidades
variados‖. (SANTOS M., 1986, p. 37)
Estamos imersos no século das Luzes, no Iluminismo, a crítica é latente a sua
existência. Um dos métodos que ganhou forças a partir dos novos conceitos
adquiridos, em um contraponto ao do Racionalismo Lógico é o método baseado na
experimentação: Empirismo. (RICHARDSON, 2008; DEMO, 1985)
2.3 EMPIRISMO (MÉTODO EXPERIMENTAL)
O empirismo foi a primeira corrente que, em nível e gradação variados, se
opôs ao racionalismo lógico. Empirismo é uma Escola de Pensamento, que
descendeu de uma visão mecanicista sobre o conhecimento, ou seja, o
conhecimento se dá de forma mecânica, através de mecanismos, de instrumentos.
Os avanços no campo do desenvolvimento de instrumentos (―tecnologia‖), ou
seja, aparelhos e mecanismo que nos propicie alcançar determinado conhecimento,
se colocava como uma possibilidade. Galileu já havia utilizado de instrumentos,
embora ainda arcaicos, e imprecisos. Suas descobertas foram essenciais, embora
extremamente criticadas no momento em que se deram. Somente aceitando como
verdadeira a ―Teoria‖ de que Sol seria o ponto central da existência terrena, seria
possível desenvolver a ―Teoria‖ sobre o Movimento de Elipses, ou seja, a forma que
a Terra se moveria ao redor do sol. (ALVES, 1981)
Como seria possível provar tais questões naquela época? Kepler desenvolveu
uma equação simples, e três leis (Teoria das Cordas), mas ainda não havia
convencido definitivamente, era um pensamento lógico racional, com
experimentação ínfima. Abria margens para muitas dúvidas, margens de erro. E ao
mesmo tempo, demonstrava para as gerações seguintes a criatividade dos
pensadores, filósofos e cientistas mais remotos. (ALVES, 1981; GURGEL E
PIETROCOLA, 2011)
Surge, na contramão, o Método Experimental, que utilizava de mecanismos,
50
instrumentos e experimentação como mediação do conhecimento que se quer
alcançar, fazendo parte da corrente que chamamos de Empirismo. Como coloca
Pedro DEMO:
O Empirismo tem por origem a procura de superação da especulação teórica. No lugar dela, coloca-se a observação empírica, o teste experimental, a mensuração quantitativa como critérios do que seria ou não seria científico. Busca-se reproduzir em ciências sociais as mesmas condições ou muito aproximadas do laboratório, onde se pretende construir um ambiente propício capaz de superar subjetivismos, incursões de valores, influências ideológicas, e assim por diante. (1985, p.101)
Os conhecimentos seriam construídos através da razão e da fé na
experimentação, em experimentos, dados em situações controláveis.
Em termos gerais, um experimento é uma ou mais atividades levadas a cabo em condições muito específicas. O experimento é uma manipulação intencional. Os elementos manipuláveis são as variáveis, e sempre existe um elemento não manipulado (elemento controle). (RICHARDSON, 2008, p. 28)
O método experimental busca levantar elementos e dados, variáveis e
invariáveis, através da experimentação. Assim, preza pela medição e controle, com
a maior exatidão, de seus objetos de estudo. O relógio talvez tenha sido uma das
grandes invenções. O Homem passa a medir, mais do que os dias, semanas e luas.
O Homem passaria medir suas horas, seus minutos, seus segundos. ―O relógio era a
metáfora perfeita do século XVII, tendo sido justamente considerado uma das
maiores invenções de todos os tempos. [...], não muito diferente do que os
computadores são para o nosso século‖. (SCHULTZ E SCHULTZ, 1992, p. 34)
Se os métodos quantitativos e experimentais poderiam contribuir no
desenvolvimento de mecanismo que auxiliassem o homem a controlar, a prever seus
próximos passos, porque não utilizar destes métodos para estudar o Homem como
Objeto?
Esse foi um dos primeiros obstáculos epistemológicos da história das
Ciências: a definição de um objeto de estudo e a neutralidade científica. Acontecerá
uma progressiva diferenciação de conhecimento, em suas diferentes Escolas e
Países, sofrendo influências, mas se consolidando de maneira diferenciada. Por
exemplo, na França e Alemanha os estudos na área de biologia e anatomia humana
haviam feito alguns avanços no campo da Medicina:
51
Em 1748 o médico francês Julie de la Metrrie (que morreu de overdose de faisão e tufas) afirmou: ‗Tenhamos a coragem de concluir que o homem é uma máquina‘. Isso se tornou uma propulsora do Zeitgeist, não só na Filosofia, mas em todos os aspectos da vida, e alterou drasticamente a imagem da natureza humana vigente até então. (SCHULTZ E SCHULTZ, 1992, p.36)
As ideias colocadas por Descartes anteriormente influenciaram as tendências
e os caminhos que tomam o ser humano como ―objeto de estudo‖. As principais
contribuições de Descartes no campo das ciências humanas são a concepção
mecanicista do corpo; a noção da ação reflexa; teoria da interação mente corpo que
vem possibilitar o estudo realizado em animais; a localização de funções mentais no
cérebro, e a Doutrina das ideias inatas.
O Empirismo tem a base do desenvolvimento de suas teorias, pesquisas,
ciências na observação da realidade. Sendo esses fatos observáveis passíveis de
verificação. A realidade para os empiristas é concreta (real), material, e imediata.
Para o método experimental não existem fenômenos, existem fatos e dados. E só
podem ser obtidos fatos dessa realidade através da experimentação.
Os Empirismo sustenta a antítese do racionalismo. Afirma que a única causa do conhecimento humano é a experiência; a consciência cognoscível não obtêm seus conceitos da razão, se não exclusivamente da experiência. O racionalismo se baseia na ideia determinada pelo conhecimento ideal e o empirismo se origina nos fatos concretos. (CENTENO, 2003, p.06, grifo nosso)
Em um clima de intenso debate teórico, na descrição de cada tópico de
organização do saber, a experimentação surge como um grande atrativo para os
cientistas da época. Assim, dois métodos se colocaram como possibilidade de
alcance do conhecimento: o método lógico dedutivo – Racionalismo Lógico e o
método experimental - Empirismo.
O método experimental pode ter ênfase no método dedutivo, se consolidando
como um conhecimento exato, passível de verificação, como a matemática, por
exemplo. Pode também se caracterizar por suas ligações com o Método Indutivo.
Onde, a partir da experiência se pode chegar a conclusões mais amplas, que
contêm as premissas iniciais. A partir da experimentação, instrumentação, posso
recolher dados experimentais observáveis, que podem auxiliar na compreensão dos
fatos que eu não posso observar. Mas a generalização tem de partir de fatos
observáveis, ou seja, fatos passíveis de experimentação, de testes, de medições.
52
Fatos possíveis de serem analisados, por exemplo, em laboratórios. Observe a
dinâmica do método indutivo na figura. (SKINNER, 2000; RICHARDSON, 2008)
Figura 02 – Exemplo de Reflexão na dinâmica do Método Indutivo (Empirismo)
Fonte: Da Pesquisa.
Neste exemplo, a partir da experimentação e observação de um número (x)
de quadrados, o pesquisador induz sua descoberta a (n) quadrados, na
generalização de que todos os quadrados são vermelhos. Em termos gerais, um
experimento é uma ou variadas atividades, levadas a cabo em condições
extremamente específicas.
Assim, o método indutivo parte de premissas dos fatos observados para chegar a uma conclusão que contem informações sobre fatos ou situações não observadas. [...] A conclusão é geral, usando o pronome indefinido todo. (RICHARDSON, 2008, p. 36)
Portanto, para a escola Empírica, o conhecimento se dá por meio da técnica,
por meio da experiência. Embora nos pareça uma visão extremamente limitada, ela
veio a desempenhar uma grande importância. A técnica, a visão empírica coloca o
conhecimento de forma objetiva, através da matéria. Como coloca Demo:
Não se pode subestimar os méritos do empirismo, porque foi historicamente um santo remédio, conta um vezo acadêmico excessivamente filosofante, perdido na especulação gratuita. Criou inúmeras técnicas de coleta e mensuração de dados, acumulou fatos e dados, trouxe para as ciências sociais o uso da computação, e assim por diante. Seu método básico é muitas vezes descrito como o da Indução. Significa aceitar a generalização somente após ter constatado os casos concretos. (DEMO, 1985, p.101)
Colocam-se então algumas questões epistemológicas, algumas questões de
53
vigilância epistemológica sobre o método: quando o objeto de estudo, ou assunto
que se quer estudar é simples, como um metal ou pedras, inanimados, eu posso
levar a um laboratório, fazer medições e experiências, essa posição pode ser válida.
Mas, quando o objeto de estudo, ou assunto é mais complexo que um ser
inanimado? Estas perguntas que nos fazemos neste instante, também foram feitas
naquela época. Vamos retomar um trecho da citação de David Hume, no inicio do
nosso primeiro capítulo:
Se alguma coisa é capaz de diminuir o prazer desta contemplação, só pode ser a limitação de nossas faculdades, que ocultam de nós a parte mais importante dessas belezas e perfeições, ou a brevidade de nossa vida, que não dá tempo suficiente para delas nos instruirmos. (HUME, 1973, p.212)
David Hume, retomando Platão, coloca algumas questões: Estaríamos
privados do conhecimento pela limitação dos sentidos, ou da razão que leva-nos
consigo na brevidade do tempo? Seriam os sentimentos humanos apenas uma
abstração e nada além? Como explicaríamos a Arte e o que ela provoca? Ou ainda
como explicaremos a Cultura como sendo importante na vida do ser humano, do ser
social? Este posicionamento se opõe à perspectiva nativista e simplificada por
Descartes, que afirma que algumas ideias seriam inatas. Alguns dos principais
Empiristas que podemos aqui destacar: John Locke, George Berkeley, David Hume,
David Hartley, James Mill e John Stuart Mill. (SCHULTZ E SCHULTZ, 1992, p.44)
David Hume foi um grande filósofo representante da Escola Empirista. Para
ele a experiência era a via de acesso do homem com o mundo, que somente pelo
mundo sensível poderia o homem produzir conhecimento, somente na sua
experiência com o mundo concreto. Ele exerceu muita influência sobre os
pensadores da época, inclusive com Immanuel Kant, da Prússia, que teve contato
com a filosofia de Hume, sofrendo algumas de suas influências.
Hume coloca em sua obra a divisão que sofre a Filosofia e as Ciências, diante
dos métodos e posições da época a respeito do estudo do homem e da natureza
humana. A primeira delas, da qual ele faz parte, leva em conta o homem em seus
sentimentos e relações, como coloca:
A Filosofia Moral, ou Ciência da Natureza Humana, pode ser tratada de duas distintas maneiras, cada uma das quais tem o seu mérito particular e pode contribuir para o entretenimento, a instrução e a reforma da humanidade. Uma delas considera o homem, acima de tudo, como nascido para agir e como sendo influenciado em suas decisões pelo gosto e pelos
54
sentimentos; buscando este objeto e evitando aquele outro de acordo com o valor que parecem possuir e com a luz sob a qual se apresentam. (HUME, 1973, p.129)
Por outro lado, existe a visão do homem como um ser racional, diminuindo a
importância dos sentimentos e das motivações humanas, ao passo que coloca a
segunda posição filosófica:
A outra espécie de filósofos encara o homem mais como um ser racional do que como um ser ativo, e antes procura formar-lhe o entendimento do que cultivar-lhes o costume. Para eles, a natureza humana é objeto de especulação; e a examinam detidamente a fim de encontrar os princípios que regem nosso entendimento, excitam nossos sentimentos e nos levam a aprovar ou censurar este ou aquele objeto, esta ou aquela ação ou linha de conduta. (HUME, 1973, p.129)
Na defesa de sua visão de mundo, de sua Filosofia, Hume diz que ela se
adere mais ao ser humano, a humanidade, por se inter-relacionar com o cotidiano do
homem, com a vida comum, pois considera o homem além dos números, considera
o homem em sua complexidade de relações internas e externas.
É certo que a Filosofia fácil e clara conta com a preferência da Humanidade em geral contra a Filosofia exata e abstrusa; e será recomendada por muitos, não só como mais agradável, mas também como mais útil que a outra. Ela se encaixa melhor na vida comum; molda os corações e o afeto, e, tocando nos princípios da conduta humana, reforma-a e aproxima-a do modelo de perfeição que essa filosofia descreve. (HUME, 1973, P.129)
A filosofia ou ciência que prezava pela dificuldade de linguagem
exacerbadamente científica, exata, dedutiva, sofre severas críticas feitas por Hume.
Ele dizia que a Filosofia ou ciência exatas, tendo a dedução como principal método,
e utilizando-se muitas vezes de linguagem matemática, se esvaneceria com o
passar do tempo, à medida que o filósofo sai das sombras e se mostra a luz do dia.
Ao criticar ele coloca que ―nossas paixões, e veemência de nossos afetos dissipam-
lhe todas as conclusões, e reduzem o filósofo profundo ao nível de um simples
plebeu‖. (HUME, 1973, p.129)
George Berkeley também possui um olhar interessante sobre o conhecimento
que é produzido através da experiência e observação do mundo sensível,
introduzindo, de certa forma, as ideias de abstração dos objetos. Ele coloca que a
complexidade das especulações realizadas na época conduziriam a inúmeras
dúvidas e erros epistêmicos, dificuldades inúmeras em todos os campos do
55
conhecimento. Acredita que o Empirismo poderia sanar muitas dessas
possibilidades, mas não concorda inteiramente com Hume:
E foi a opinião de que o individuo pode construir ideias abstratas ou noções de coisas. Quem não for de todo alheio a obras e discussões de filósofos reconhecerá que não pequena parte delas se trava acerca de ideias abstratas. Elas passam especialmente por objeto das ciências denominadas Lógica e Metafísica e de quanto se tem pelo mais abstrato e sublime estudo, onde, entretanto raro, se encontra uma questão posta de modo que não suponha sua existência no espírito e que isso é bem conforme com elas. (BERKELEY, 1973, p. 12)
Ele retoma a doutrina da abstração de Locke, conservando certo ar platônico
sobre as ideias. Locke defendia nas ideias abstratas o diferencial entre humanos e
animais. A Abstração se parece muito com o método indutivo, ela se caracteriza pela
interpretação dos fatos, mas voltaremos nesse aspecto depois.
Assim, poderíamos dizer que a ciência trabalha com generalizações, mas
estas podem dar uma maior ênfase a aspectos quantitativos, através do método
dedutivo, ou dá maior ênfase a aspectos qualitativos, ligados mais a lógica indutiva.
É diferente obter as generalizações de fatos constatados, ou obtê-las a partir de um
pressuposto teórico. O método que visa a análise teórica e matemática, citado
anteriormente, a dedução, aceita como partida um enunciado geral e deve ser
verdadeiro, posteriormente contrapõe se a casos particulares. Na Indução esse
processo se inverte. (DEMO, 1985)
Segundo coloca Pedro Demo (1985) o Empirismo seria a metodologia mais
simples, uma vez que acredita que a verdade se dá na realidade, se dá através da
observação e constatação de fatos observáveis. Nós reconhecemos sua
importância, e o empirismo é com certeza, uma das formas de acesso ao
conhecimento, seja este conhecimento científico ou não.
Todas as possíveis técnicas de mensuração da realidade não podem colocar-se com a pretensão de superar sua constituição ideológica interna, mas com o propósito de salvaguardar, sempre mais, as condições favoráveis de manipulação mais objetiva. Não se ganha nada apenas imitando as ciências naturais; muito menos vale a pena naturalizar as ciências sociais. Ganha-se, contudo, muito, se soubermos aproveitar criticamente condutas das ciências naturais e vice-versa. (DEMO, 1985, p. 18)
O Behaviorismo, a primeira linha de Psicologia que foi considerada ciência
natural se utilizando do método experimental, do método empírico de forma
56
dedutiva, inicialmente, e de forma indutiva posteriormente com o Behaviorismo
Radical de Skinner. Mas ainda assim, é pautado na observação do comportamento
humano, sendo este de alguma forma mensurável e passível de experimentação. Os
precursores deste movimento utilizavam-se de animais em situações controladas, e
suas descobertas eram estendidas ao comportamento humano, como foi o caso do
Comportamento Reflexo descoberto inicialmente por Pavlov em animais, e
organizados por Watson (Estímulo – Resposta: SR), sendo este o precursor da
Psicologia Comportamental ou Behaviorismo. (SKINNER, 2000)
O Empirismo marca uma demissão teórica, no sentido de substituir a
explicação dedutiva pela descrição empírica. Os fatos não falam por si só, mas pela
boca de uma teoria, se falassem por si só, seriam desnecessárias suas explicações.
Sobre os mesmos dados pode-se construir teorias até mesmo contraditórias entre si.
(DEMO, 1985)
A associação de mais de um método, ou de pressupostos poderia formar
novos continentes do conhecimento. O mesmo objeto de estudo, por métodos
diferentes, levando a conhecimentos diferentes. O Associacionismo entre
conhecimentos passa a fazer parte de um novo quadro, como a Física Social e a
Psicobiologia, que descendem inicialmente das ciências naturais. (SCHULTZ E
SCHULTZ, 1992)
Não teremos tempo de, por agora, trabalhar com todas as correntes
epistemológicas que descendem da estratificação do conhecimento científico,
mesmo porque seria necessário uma Tese para cumprir tão árdua tarefa. Vamos nos
concentrar apenas em algumas correntes e escolas de pensamento que exerceram
certa influência nas ciências humanas e sociais, e por conseguinte, exerceram
influência também no conhecimento em Turismo.
Quando passamos a falar em ciências sociais, os métodos e técnicas, bem
como as metodologias se tornam cada vez mais variadas. Em nosso trabalho
focamos as principais. Embora pareça que as ciências sociais ainda discutam
metodologia em demasiado, isso demonstra a riqueza da área, visto que uma vez
que discutimos a metodologia, ela pode ser adotada em outros objetos de estudos,
para além das ciências sociais. (DEMO, 1985)
Também gostaríamos de lembrar de que acreditamos no conhecimento como
um processo de construção, assim sendo, os métodos e esquemas explicativos são
encarados de forma dinâmica, e nem sempre um método é puro. Assim como em
57
uma corrente, Escola de Pensamento, podem conviver ou não linhas diferentes,
posicionamentos diferentes sobre um mesmo objeto ou temática de estudo. Mesmo
assim, todas elas são importantes, pois são singulares expressões humanas sobre o
mundo, que se encontram em determinados pontos coletivamente.
2.4 POSITIVISMO
A Ècole Polythecnique – França estava cumprindo seu papel de formar uma
elite intelectual, bem como outros institutos espalhados pela Europa, Alemanha e
mais recentemente nos Estados Unidos. Um dos alunos da Ècole iniciou uma das
correntes mais influentes na considerada ―ciência moderna‖ até os dias atuais: O
Positivismo.
2.4.1 Positivismo de Augusto Comte
Esta escola de pensamento reunirá dois métodos anteriormente descritos.
Inicialmente, o método indutivo e, posteriormente, o método dedutivo. Ao reunir mais
de um método, o Positivismo é considerada uma Escola que, reunindo mais de uma
metodologia, se diversifica entre as áreas do conhecimento. O termo Positivismo foi
criado por Augusto Comte, e, embora fora rechaçado por seus contemporâneos,
teve uma influência muito grande na concepção, ou seja no conceito de ciência
como o temos hoje. Infelizmente, devido à brevidade de nosso tempo, não vamos
nos aprofundar, mas se faz necessário e interessante que conheçamos um pouco
mais sobre o contexto em que essa obra foi desenvolvida.
Segundo consta na Biografia de Augusto Comte, disponível na versão
brasileira da Obra: Discurso Preliminar sobre o Espírito Positivo, bem como em
outras bibliografias principalmente da área de psicologia e antropologia, sendo fonte
de diversas discussões literárias, visto que: Augusto Comte teria ―extrapolado‖ ao
sugerir uma estrutura que comportasse todos os saberes, todos os sistemas de
conhecimento. Mesmo assim, é da estrutura de Comte que temos hoje o Sistema de
Divisão de Conhecimentos Científicos. Excluso a metafísica que, para Comte, se
referiria ainda ao período cosmológico do qual não se poderia desenvolver
58
conhecimento sólido algum, ou seja, aquele conhecimento não seria aplicável, e não
sendo aplicável ele não teria função – funcionalismo. Ao não possuir função, ele
deixa de ser relevante. Até esse momento, concordaram todos, mas, Comte na
tentativa ousada de sistematizar o conhecimento, perdeu célebres alunos e
admiradores.
[...] foram frustradas suas tentativas de emprego acadêmico. Também sofreu críticas do mundo científico por parte de importantes figuras que o ridicularizavam pela sua pretensão de submeter ao seu sistema todas as ciências. A mágoa agravou seu estado psicológico. [...] decidiu-se, em 1838, a não ler mais uma linha de qualquer trabalho científico, limitando-se a leitura de ficção e poesia. (COMTE, 1978, p.10)
Um de seus primeiros empregos foi o de secretário do Conde Henri de Saint-
Simon, filósofo e teólogo que viu claramente a importância da organização
econômica na sociedade moderna, baseando-se no Socialismo. Comte aprendeu
muito, absorveu os pontos principais, sistematizou com um estilo próprio, estruturou
e derivou disciplinas desse sistema - Positivismo.
Da corrente positivista descendem outras linhas de pesquisa e outras escolas
de pensamento. Antes de apresentarmos o método que pertence a essa Escola de
Pensamento, um fato interessante. Segundo consta na história de Comte existiu
uma mulher muito especial, o nome dela era Clotilde de Vaux.
Augusto Comte afirma que nada pode ser mais eficaz para o bem pensar que o bem querer, e se tornou um abrasado feminista. Afirmava que a mulher encarnava o sentimento e, portanto, em última análise, a própria Humanidade. Buscou então seriamente associar o sexo feminino, na pessoa de Clotilde, à obra de renovação social e moral que se impôs a completar. (COMTE, 1978, p.10)
Clotilde não poderia se casar com Comte, pois havia sido abandonada pelo
marido, e segundo a religião cristã e o sistema histórico político vigente na época, o
divórcio não era permitido. Clotilde tentou ajudar Comte e começou a escrever um
romance filosófico que se chamaria Wilhemine, mas veio a adoecer e falecer antes
de concluí-lo. Traduzimos um trecho de um de seus poemas, direto do Francês para
o português, uma tradução livre contextualizada, assim, poderão ser encontradas
outras traduções discrepantes. Para evitar possíveis enganos, o original em francês
está disponível em nota de rodapé.
59
Os Pensamentos de uma Flor7
[...] Eu tenho o primeiro olhar do rei da natureza Eu beijo o seu fogo, esplendor como adorno Eu tenho a jovem Aurora como irmã, a me sorrir toda manhã Eu nasci brisa e sabor doce, Desde a queda eu observava, ao lado de meu cálice Eu toco o limiar e precipicio o raio, Tenho a tabela da magia, sem parelelo em magnitude O universo está abrindo as portas da vida novamente [...] (VAUX, CLOTILDE, s/d, tradução livre)
Para Comte, o mundo histórico social já havia passado tempo demais sobre a
égide da dureza do intelecto masculino. Ele se opôs a Henri de Saint Simon em sua
obra: Sistema de Política Positiva. Mesmo se opondo, ele também institui a proposta
de uma disciplina eclesiástica, como linha condutora da sociedade: a Religião da
Humanidade. Reunia como membros sociólogos seculares, e seus pensamentos
influenciaram muitos ingleses, que traduziram e escreveram sobre suas obras. Na
França também aumentou o número de adeptos de seus ideais positivistas. Ele
mantinha intenso contato postal com Comunidades Positivistas em todo o mundo
―moderno‖. (COMTE, 1978)
Seu trabalho dava ênfase à hierarquia e a obediência como princípios de
organização social, e rejeitava a democracia, sustentando de que o governo ideal
seria constituído por uma elite intelectual, conduzindo a humanidade a uma
sociedade positivista. Ele deu nova roupagem as ideias de Thomas Hobbes e Adam
Smith, afirmando que os princípios da sociedade são o egoísmo individual,
incentivado pela divisão do trabalho. A coesão social só seria possível através de um
Governo e um Estado fortes. Comte baseou sua obra em pontos chave:
Por essa razão, o sistema Comteano estruturou-se em torno de três temas básicos. Em primeiro lugar, uma filosofia da história com o objetivo de mostrar as razões pelas quais certa maneira de pensar (chamada por ele filosofia positiva ou pensamento positivo) deve imperar entre os homens. Em segundo lugar, uma fundamentação e classificação das ciências baseadas na filosofia positiva, finalmente, uma sociologia que, determinando a estrutura e os processos de modificação da sociedade, permitisse a reforma prática das instituições. (COMTE, 1978, p.16)
A primeira colocação de Comte, a filosofia positiva, sintetizou o conhecimento
que até então havia sido produzido no que ele denominou: Lei dos Três Estados. O
7 Le pensées d´une Fleur: [...] J´ai le premier regard du roi de la nature / J´ai son baiser de feu, sa splendeur pour parure / J´ai de la jeune Aurore un sourire de soeur / J´ai la brise naissant et la douce saveur / De la goutte penchée au bord de mon cálice / J´ai le rayon qui joue au seuil du precipice / J´ai le tableau magique, en grandeur sans pareil / De l´univers s´ouvrant les portes du réveil [...]
60
primeiro seria um Estado Teológico, mitológico, cosmológico, onde os deuses e os
mitos eram o centro das discussões sobre o conhecimento humano. O segundo
estado seria considerado o Estado Metafísico, onde o homem ainda não caminha
sozinho no conhecimento, se pautando em preceitos e pressupostos alheios a
experimentação, dissolvendo por etapas a força da fé na Igreja e na simples razão
pura. E o terceiro estado o Estado Positivo, o estado moderno, onde o homem se
torna capaz de produzir conhecimento sem quimeras metafísicas, através da
experimentação e observação. (COMTE, 1978)
Talvez uma das maiores contribuições de Comte foi a importância que ele deu
ao método científico como requisito para se fazer ciência, ou para que o
conhecimento produzido fosse considerado científico, dentro da visão positivista de
ciência. O Método essencial defendido por ele foi o método experimental, ou seja,
empírico e indutivo. ―Pois nenhum fenômeno observável poderia evidentemente
deixar de entrar numa das cinco grandes categorias, desde já estabelecidas:
fenômenos astronômicos, físicos, químicos, fisiológicos e sociais‖. (COMTE, 1978,
p.09)
O Positivismo passa a reunir técnicas experimentais, aplicadas aos seus
objetos de estudo, caracterizados em cada campo do conhecimento. Suas
influências foram sentidas em todas as áreas, visto que o método empírico já
figurava como possibilidade em diversos campos das ciências.
Surgiu na atmosfera do sucesso das ciências naturais (a teoria evolucionista de Darwin; o sistema Kant-Laplace de explicação da formação do sistema solar e a descoberta das leis térmicas de J. Joule e H.F. Lenz) mostrando assim a fé absoluta no poder da investigação experimental. (RICHARDSON, 2008, p. 32)
As descobertas atraiam cada vez mais cientistas, inclusive cientistas sociais
que viram nos métodos experimentais a possibilidade de solução de todos os
problemas, inclusive os de ordem social e humanas.
Comte era um sintetizador de linhas de pesquisa, e como dito, até os dias
atuais, exerce influência na pesquisa científica, principalmente nas ciências exatas e
naturais. (DEMO, 1985)
Mas, como vimos, ele não agradou a todos, principalmente pela inclusão
escolástica em sua obra, de uma Religião da Humanidade. No Brasil em transição,
carente de ideologias, encontrou fiéis súditos. Inclusive, existem muitos estudos que
61
ligam teoricamente e historicamente Comte a Kant, na Prússia e John Dewey nos
Estados Unidos com Anísio Teixeira no Brasil, e idealistas da República Brasileira.
(HENNING, 2012)
O método escolhido por Comte pelo qual a ciência positiva deveria se
deslocar era o método indutivo experimental. A maior crítica a esse método foi de
Karl Popper, que ao criticar o método exposto por Comte, mostra a face mais radical
das ideias positivistas, o Positivismo Lógico.
O Positivismo é uma metodologia extremamente mais complexa que a anterior (Empirismo) e está geralmente mais ligado a sua expressão lógica. Tem de comum com o empirismo a desconfiança contra a filosofia e a especulação. Mas, na sua versão mais lógica, desinteressa-se pela problematização do relacionamento entre sujeito e objeto e agarra-se as condições lógicas do enunciado científico. (DEMO, 1985, p.103)
O Positivismo encontrou fortes ligações como modelo das ciências naturais e
exatas, dando ênfase mais na realidade do que em seus conteúdos. O Positivismo
pressupõe uma objetividade e neutralidade por parte do pesquisador, e todos os
objetos devem ser tratados da mesma maneira, rejeitando as metodologias próprias
das ciências sociais. (DEMO, 1985; RICHARDSON, 2008)
Comte diferenciou o conhecimento, estratificando-o e negando o
conhecimento produzido nas etapas teológicas e metafísicas do conhecimento, que
a partir da filosofia positiva, o conhecimento poderia se desenvolver de forma
científica (positiva). ―Segundo Comte, o espírito positivo estabelece as ciências como
investigação do real, do certo, do indubitável e do determinado‖. (RICHARDSON,
2008, p. 33)
A imaginação, a criatividade, a argumentação ficam subordinadas a
observação, que deve ser descrita de forma objetiva, sem inferências. Ele considera
que a observação é limitada, e o conhecimento poderia apenas apreender fatos
isolados. Por isso, a necessidade de dividir as ciências, segundo seus objetos de
estudos.
Em termos gerais o Positivismo enfatiza as ciências e o método científico
como única forma de validade na produção do conhecimento. Ele revela certa
hostilidade com a teologia e a metafísica, mas institui uma matéria eclesiástica que
norteará o desenvolvimento do conhecimento e viver humanos. Teve um importante
papel na inclusão da mulher como parte da humanidade, e não como um ser sem
alma, da qual vinha o desastre do pecado no mundo desde os tempos de Eva.
62
O Positivismo de Comte tem como modelo fundamental a lógica da
matemática, exata e supra-histórica, acreditando no real progresso científico,
considerando algumas ciências como já amadurecidas em seus campos de estudo,
atingindo resultados definitivos. Não aceita a ciência como um processo contínuo.
Como coloca Pedro Demo:
A finalidade da ciência é estabelecer a verdade, compreendida como algo factível e definitivo. Embora não insista muito em evidências empíricas, preocupa-se mais com a tessitura lógica da linguagem científica, que procura evidenciar-se em transparência explicativa e no seu fluxo dedutível sem contradições. (DEMO, 1985, p.103)
Mas o Positivismo também traz em seu bojo algumas vertentes, ele não é
puro, ele abriga linhas diversas, uma delas, o mais recente e utilizado, é o
Positivismo Lógico.
2.4.2 Positivismo Lógico
As considerações de Comte sobre qual seria o método científico a ser
adotado pelas ciências trouxe algumas controvérsias. A mais significativa delas foi
feita por Karl Popper.
O Positivismo não é unitário, é claro. A linha de Popper, por exemplo, recusa a indução e somente aceita a dedução como método válido. Com isso, não se interessa pela acumulação de dados e pela observação sistemática. E acaba instituindo a provisoriedade das teorias como condição normal científica, bem como a crítica metodológica como procedimento básico de depuração científica. (DEMO, 1985, p. 103)
O Positivismo lógico coloca que a ciência nos forneceria todas as formas de
conhecer e que a metafísica deveria ser renegada e levada ao absurdo, excluídas
todas e qualquer tipo de abstrações. Esse movimento filosófico se caracterizou já no
Século XX, após o que ficou conhecido como Círculo de Viena, entre meados da
Década de 1920 e 1936, que buscava rever os métodos empíricos e científicos. As
reflexões do período metafísico seriam infundadas visto que não havia possibilidade
de comprová-las empiricamente. Assim o enunciado básico do Positivismo Lógico é:
―o significado de uma proposição é seu método de verificação‖. (RICHARDSON,
2008, p. 34)
63
Richardson (2008, p. 34) dá um exemplo sobre a linha de pensamento
positivista lógico:
Assim, podemos afirmar que uma proposição é empiricamente significativa para qualquer pessoa apenas quando se conhece a forma de verifica-la, isto é, se o autor da proposição conhece as observações a serem feitas que conduzam a aceitar a proposição como verdadeira, ou rejeitá-la como falsa.
Ao se posicionar contra a indução como único método das ciências, Popper
levanta objeções que recaem sobre todas as áreas do conhecimento. Para que se
pudesse afirmar que, todos os cisnes são brancos, em nível de lei natural, deveria
de ter se observado os cisnes de hoje, ontem e garantir que não existiria outras
cores de cisnes no amanhã. Ou seja, observação de todos os casos concretos, o
que seria impossível. Ele também não vê na probabilidade avanço científico, e não
aceita esse posicionamento na composição do método científico positivista lógico.
(DEMO, 1985)
Para Popper, era impossível verificar teorias porque, por mais que se
acumulassem dados e fatos concretos, isso não acrescentaria certeza. Eis o porquê
a história deixa de ser importante nesse sistema positivo lógico. E se não nos é
possível verificar, nos é possível falsear, ou seja, demonstrar a falibilidade do
conhecimento previamente construído, demonstrando através de linguagem
matemática precisa seus erros e acertos. A presença de um único fato concreto
diferente poderia falsificar as informações obtidas através da indução. Como a figura
que mostramos quando falamos do método indutivo. A existência de um único
quadrado que não fosse vermelho, e sim azul, desmonta toda a teoria de que: Todos
os Quadrados são vermelhos – a generalização passa a ser uma falha, um erro.
(RICHARDSON, 2008)
A falsificabilidade passa a ser o critério básico de cientificidade, no sentido de que uma teoria é científica apenas provisoriamente, enquanto não se encontra caso concreto negativo. Ademais, não interessa encontrar casos que apoiem a teoria, já que por aí não conseguimos certeza alguma. O que interessa é a busca de casos negativos. É assim que institui a crítica metodológica como cerne de seu método. (DEMO, 1985, p.104)
Popper propõe um método de ―auto-refutação‖, de falseamento da pesquisa
como dever do pesquisador científico. Ele se vale do método dedutivo, que, ao se
associar com o método empírico (experimental) demonstra seu potencial hipotético.
64
Assim, caracteriza-se o método colocado por Popper, em especial, como Método
Hipotético – Dedutivo8.
O Método hipotético-dedutivo consiste, a partir de fatos e dados
observáveis, formular um problema; a partir do problema, construir hipóteses para a
solução do problema de pesquisa; a partir das hipóteses formular teorias nas quais
residam a solução do problema; imerso em um processo de falseamento, de vários
testes de medição da abrangência da teoria, ou do saber concebido através do
método hipotético-dedutivo. É um método de tentativas, acerto e erro.
Figura 03 – Dinâmica do Método Hipotético-Dedutivo (Método Científico)
Fonte: Da Pesquisa.
A partir de uma lacuna percebida no conhecimento são formuladas hipóteses
que visem à construção de novos conhecimentos, ou melhores explicações de
conhecimentos já observados. A partir destas hipóteses se constroem teorias que
são testadas através da inferência dedutiva, testando a predição da teoria formulada
frente ao problema exposto. Assim as hipóteses levantadas podem ser rejeitadas ou
não serem rejeitadas, existiria apenas estas possibilidades, conferindo certa
falibilidade ao conhecimento produzido. (POPPER, 1980)
De acordo com o princípio de falseabilidade exposto por Popper: Um
conhecimento só é considerado válido se pode ser verificável e não refutado.
(RICHARDSON, 2008)
8 Também conhecidos por alguns teóricos como método Abdutivo, embora esta nomenclatura traga algumas
confusões.
65
Popper abandona a repulsa a filosofia, porque não importa o ponto de partida da teoria, desde que se submeta ao teste negativo. Procura instituir uma espécie de democracia metodológica, no sentido de que cada teoria deve ter sua chance de apresentar-se como explicação da realidade, desde que aceite as regras do jogo, ou seja o contraste impiedoso contra fatos negativos. Não os encontrando a teoria não passa a ser verdadeira, mas tão somente válida por enquanto. (DEMO, 1985, p. 104)
O Campo científico se torna uma Arena, e era necessário estar preparado
para adentrar neste meio, e se adequar as regras. Laplace, que era da Normandia,
em seu Essai philosophique sur les probabilités, projetou um sistema matemático
indutivo, baseando-se em probabilidades de ocorrência de determinado fenômeno.
Uma fórmula conhecida que surgiu de seu sistema foi a Regra da Sucessão. Ele
supôs que um processo só tenha dois possíveis resultados, rotulados "sucesso" e
"falha". Neste sistema de Laplace pouco ou nada é conhecido a priori sobre os
resultados. Para que fosse um sucesso, ou seja, para que se consiga uma sucessão
no conhecimento, Laplace derivou uma fórmula que ele chama de Teoria das
Probabilidades, para que o processo, seja qual for, alcance sucesso. (GURGEL e
PIETROCOLA, 2011)
John Stuart Mil, também teceu colaborações e críticas muito importantes no
que se refere ao processo de indução. Ele utilizou das descobertas de Kepler para
defender que, as generalizações não são inferências, e ao pesquisador não seria
possível manipular a pesquisa, porque não existe criação, baseando-se no conceito
de KANT-LAPLACE: Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma.
(GURGEL e PIETROCOLA, 2011)
―[...] é clara a posição do autor contra a ideia de criação ao citar o Filósofo Willian Whewell, que considerava um papel ativo da mente no processo de elaboração de ideias. Para Mill o papel da mente seria apenas o de ter a construção conceitual prévia da ideia de elipse e isso seria suficiente para o reconhecimento do padrão das orbitas.‖ (GURGEL e PIETROCOLA, 2011, p. 03)
Kant era da Prússia, ficou conhecido por participar da ―escola‖ do Criticismo, e
segundo consta de sua biografia, viajou pouco, mantendo-se na Prússia e enterrado
em sua cidade natal. Foi um filósofo e teve contato com as obras Francesas em
especial do iluminismo francês. Em seu texto, muito conhecido: Resposta a
Pergunta: O que é Iluminismo? Kant teceu críticas as sociedades que, destruíam o
saber antigo, em detrimento do novo saber científico. Isso seria incorrer em um
imenso erro, pois não seria possível a Humanidade chegar ao ponto científico, sem
66
antes passar por outros estágios do desenvolvimento, ao que Kant chama de
menoridade do conhecimento. Ele via o conhecimento como um processo contínuo,
daí sua ligação com a que hoje é conhecida como a Constante de KANT-LAPLACE.
O que não significa que eles escreveram juntos, apenas que suas obras dialogam de
forma especial.
Uma época não pode se coligar e conjurar para colocar a seguinte num estado em que se tornará impossível a ampliação de seus conhecimentos (sobretudo os mais urgentes), a purificação dos erros e, em geral, o avanço progressivo na ilustração. Isso seria um crime contra a natureza humana, cuja determinação original consiste justamente neste avanço. E os vindouros têm toda a legitimidade para recusar essas resoluções decretadas de um modo incompetente e criminoso. (KANT, s/d, p.03 - 04)
Assim, Kant desenvolveu em seu sistema filosófico o que alguns chamam de
Apriorismo Kantiano, ou seja, o conhecimento parte de um conceito a priori a sua
existência, baseado na intuição por parte do sujeito transcendental que recria o
objeto de seus estudos, sendo somente assim possível o conhecimento. Ele
elaborou diversas críticas, propiciado pelo intenso debate da época das luzes que
via no criticismo uma de suas correntes, e uma das quais Kant vem a se identificar.
A crítica orienta a construção de toda a arquitetônica da Crítica a razão Pura. Sabemos que o principal pilar da construção desta obra é a razão transcendental pura e a priori internamente sistematizada em juízos e categorias lógicas e orientada para o conhecimento e ordenação de fenômenos. O pensamento percorre as vias de uma dedução transcendental a priori, condição que não a permite ultrapassar os fenômenos. Dali advêm os componentes do conhecimento, a saber, pureza e transcendentalidade do eu puro e os sentidos. (WOHLFART, 2004, p. 37)
Veja que Kant introduz uma categoria: fenômeno. O Homem em suas
relações com a natureza e com os outros homens, na física social, se caracterizaria
como um fenômeno, uma vez que ele deixa de ser objeto simples e passa a fazer
parte de um contexto maior, onde são estudadas as relações que são estabelecidas.
Para Kant, é o homem que dá significado ao conhecimento que se produz.
[...] por intermédio, pois, da sensibilidade são nos dados os objetos e só ela nos fornece intuições; mas é o entendimento que pensa esses objetos e é dele que provêm os conceitos (KANT, 1997, p. 61) Assim, sem intuição, nenhum objeto nos seria dado e sem entendimento nenhum objeto seria pensado. (WOHLFART, 2004, p. 37)
Como anteriormente citamos, já existiam correntes humanistas e
67
existencialistas, que tinham o homem como assunto de pesquisa. Mas como
conviver com tamanhas diferenças entre o quantitativo - o homem em números – e o
qualitativo – homem e suas relações? Essa foi uma das grandes questões
epistemológicas que foram discutidas na época. Conhecimento se estratificou de
acordo com seus objetos de estudo e do olhar do pesquisador sobre estes objetos.
Mas não houve somente a divisão, a união também foi válida, visto que surgiram
novas áreas do conhecimento, desenvolvendo novas teorias, como: sociologia,
antropologia, biologia, psicologia.
O Positivismo vai influenciar diretamente o campo das ciências, e as
descobertas de Lamarck e Darwin revolucionaria as bases das ciências humanas.
As contribuições de Comte, Kant, Durkheim foram determinantes para que
passassem existir a divisão Ciências Sociais, e para a existência da Sociologia como
campo de estudo. Kant colocou o pensamento filosófico como a linha de frente,
componente crítico indispensável para o exercício de filosofar, e defendia que
filosofar pode ser aprendido, ou seja, o ser humano pode aprender! (WOHLFART,
2004)
Resumidamente, poderíamos colocar que o Positivismo segue os seguintes
princípios e leis de validade: (RICHARDSON, 2008)
a) Uma proposição é significativa quando é verificável , e que
possa ser julgada provável a partir da experiência;
b) Uma proposição é verificável se é uma proposição empírica, ou
uma proposição da qual pode ser deduzida uma proposição
empírica;
c) A proposição é formalmente significativa se for tautológica;
d) As leis da matemática e da lógica são tautológicas.
e) Considerando que as leis da metafísica, não são nem
verificáveis e nem tautológicas, elas são insignificantes.
f) Considerando que as proposições teológicas, éticas e estéticas
não são passíveis de verificação, também são insignificantes.
g) Eliminadas a metafísica, ética, teologia e a estética, a única
tarefa da filosofia é a clarificação e análise.
A Escola Positivista sofreu críticas e em resposta as suas determinações
68
surgem outras escolas de pensamento, como o Neo-Positivismo, entre outras. Mas
também, recebeu adesões e incentivou a criação de novas escolas. A Escola
Funcionalista foi uma delas.
2.4.3 Funcionalismo
Em 1850 Fechner acreditou ter desvendado o mistério do comportamento
humano. Ele repentinamente descobriu que a relação que se dava entre mente e
corpo poderia ser explicada quantitativamente através de uma fórmula logarítmica,
utilizando-se também da geometria. Suas descobertas abalaram as bases da
biologia, e mostravam que o comportamento poderia possuir funcionalidade, função
(f(x)). Darwin foi o maior representante dessa Escola funcionalista.
O contexto das descobertas estavam imersos entre trabalhos de grande
impacto. Discutiam-se funções da consciência, as diferenças individuais, o
comportamento animal. A Escola Norte-americana recebeu muito bem estes
estudos, que se davam principalmente em laboratórios. Eles evoluíram bastante
gerando a escola que ficou conhecida como Pragmatismo, tendo John Dewey como
o principal filósofo e idealizador do pragmatismo norte-americano, com quem Anísio
Teixeira estudou por volta de 1920.
Foi em 1859 que Darwin publica o título original da obra magna: On the Origin
of Species by Means of Natural Selection. A Teoria da Evolução nele apresentada
libertou os cientistas de tradições supersticiosas, e até então inibidoras, tendo-os
lançado na maturidade e respeitabilidade das ciências da vida. Essa obra impactaria
principalmente a Escola Norte-Americana. A Teoria de Darwin ficou conhecida como
Evolucionista. (SCHULTZ e SCHULTZ, 1992)
Muitos dos princípios colocados por Darwin foram utilizados pelos
governantes para legitimar a escravidão de povos considerados inferiores, inclusive
por Hitler em sua fé absoluta na superioridade da raça ariana.
Mas em sua grande maioria, a Teoria da Evolução fez surgir a estimulante
possibilidade de uma continuidade no funcionamento mental entre os homens e os
animais. Se a mente humana tinha evoluído de animais inferiores, o estudo animal e
sua extensão ao ser humano torna-se possível, e mais um elemento passa a figurar
69
os laboratórios, as cobaias, nas quais eram feitas as experiências que possibilitavam
extrapolar para o ser humano suas descobertas, baseados em uma correntes
funcionalista. O estudo do comportamento animal passa a ser vital para a
compreensão do comportamento humano. (SCHULTZ e SCHULTZ, 1992)
A partir destas e outras descobertas acontece uma adequação das ciências,
que se dividem em Ciências Naturais (matemática, física, química, astronomia);
Ciências Humanas, incluindo a Genealogia como método de pesquisa histórico, e a
Arqueologia como método empírico, introduzida por Darwin. (SCHULTZ e
SCHULTZ, 1992)
Dentre as divisão desse homem como objeto de estudo, a divisão desse
sujeito em quantas partes possa ser possível examiná-lo, as correntes se divergem
em vários pontos. Podemos destacar aqueles que possuíam uma visão ideal de
homem, estado e ciência, como a busca pela verdade absoluta, podendo assim
fazer com que o homem se desenvolva em prol de algo maior do que ele – uma linha
de pensamento Idealista.
Mas, se esse homem é para mim falho, assim como a sociedade e a ciência,
como formas de apropriação do mundo pelo homem são falhos como ele, minha
visão não se pauta no ideal, se pauta na falha, no que é visível, no que é material –
uma linha de pensamento Materialista.
Essas diferentes linhas não convivem pacificamente, pelo contrário, dentro de
cada campo do conhecimento, e internamente, as discussões eram o ápice da
socialização do conhecimento. A Ècole Polytechnique Francesa viu o surgimento de
grandes mestres do conhecimento dentro de suas paredes, e também vislumbrou
guerras científicas.
2.5 FENOMENOLOGIA
Como vimos, até certo momento os conhecimentos estavam todos
concentrados ao redor de um só paradigma: da Razão. Com a ampliação
quantitativa e qualitativa do conhecimento, se estratificam dois métodos dedutivo e
indutivo, que ao se encontrar com as linhas e pressupostos dos cientistas se
diversificavam ainda mais, tornando um todo coerente, mas complexo. Fica clara a
complexidade do conhecimento produzido, e somente uma disciplina não viria a dar
70
conta dos seus objetos mais complexos.
Por exemplo, a química poderia estudar os elementos químicos, mas quem
estudaria as relações dos elementos químicos com seres humanos? Ou ainda quem
estudaria as relações da humanidade com a natureza, visto as mudanças de
pensamentos sobre os animais? Enfim, qual seria o método para estudar tão
complexas relações? A Fenomenologia.
Um exemplo: O Homem é o objeto de estudo das ciências naturais – ao
descobrir a circulação do sangue pelas veias, esse homem precisa ser tratado como
um todo – ao considerar como um todo, posso compara-lo a uma máquina – mas
prova-se através da ação reflexa que o homem pode aprender – ele deixa de ser
máquina e passa a ser um ser humano que vive em sociedade – que sociedade é
essa? Quais relações foram estabelecidas? Veja que chegamos a um nível de
complexidade, o homem passa a ser visto além do simples objeto, além do sujeito, o
Homem passa a ser visto como um fenômeno. (DEMO, 1985)
O Positivismo não aceita essa colocações, e as metodologias das ciências
sociais não são consideradas por eles científicas, então, não dialogam. As outras
ciências, já estabelecidas, incorporam alguns elementos, mas não muito
significativo. Já as Ciências Humanas encontram no paradigma fenomenológico
campo fértil para suas pesquisas. (RICHARDSON, 2008)
A corrente ou metodologia Fenomenológica reuni mais de um método e mais
de uma linha epistemológica. Um dos métodos que podemos destacar como
essenciais é o método Hipotético-Indutivo, ou método de Abstração. Panosso
Netto é um dos autores que trabalham com essa Escola de Pensamento em Turismo
no Brasil, e coloca:
Aqui já está um ponto importante da fenomenologia, qual seja, a aparência não é a realidade. A realidade, a verdade, pode estar encoberta. Kant criou o termo phenomenologia generalis, que tinha por objetivo estabelecer os limites entre o mundo sensível (experiência) e o mundo inteligível. Para Hegel, a fenomenologia seria o mais alto estágio da ciência, por meio do qual se chegaria ao saber absoluto, a fenomenologia do espirito. (PANOSSO NETTO, 2011, p. 134)
Hegel acreditava no idealismo científico, no idealismo social, Hegel acreditava
em sonhos, em utopias. Foi um dos maiores filósofos alemães. Sua obra magna é
intitulada Fenomenologia do Espírito. Na sua obra Hegel concebe que a humanidade
através da lógica e a história seguem uma trajetória dialética, onde as contradições
71
se transcendem, mas ao mesmo tempo dão origem a novas contradições que
passam a requerer solução. Hegel possui uma visão idealista da dialética e admite
que as ideias se sobrepõe a matéria, a realidade. Por exemplo: Um Governo seria
uma instituição idealizada pelo povo, portanto ela seria ideal, pois partem das ideias,
onde existe a perfeição. Ele retorna a Platão durante suas reflexões. (SOARES,
2009)
Mas o método fenomenológico só receberia esse título a partir de Husserl,
embora tenha sido utilizado anteriormente. Hegel já colocava, e Husserl salientou: A
metodologia fenomenológica é o estudo sistemático ou não das essências. Como
aponta Merleau-Ponty apud Panosso Netto (2011, p. 135) ―a fenomenologia é o
estudo das essências, e todos os problemas, segundo ela, tornam a definir
essências: a essência da percepção, a essência da consciência, por exemplo‖.
Como podemos observar na Tese do Prof. Dr. Josemar Sidinei Soares, Hegel já
dava ênfase a Fenomenologia anterior a Hurssel:
O prefácio da própria edição da Fenomenologia do Espírito indica em algumas passagens a necessidade de se compreender esta obra como uma introdução ao sistema da ciência, ou seja, como um primeiro momento fundamental para a compreensão deste sistema, é verdade, mas ainda preliminar ao sistema, não incluso em sua lógica sistemática. Por outro lado, quando se observa a estrutura lógica da enciclopédia de conhecimento filosófico, a Fenomenologia surge já dentro da primeira parte da Filosofia do Espírito, em um momento intermediário entre a Antropologia e a Psicologia. (SOARES, 2009, p. 25)
A Psicanálise vai se adequar nesta corrente, embora trabalhe com uma
epistemologia pluralizada, ela adere muito da fenomenologia na concepção do
método psicanalítico. Já Jung, dissidente de Freud, em especial por acreditar que o
inconsciente era coletivo e não individual, encontra na fenomenologia estruturalista
os caminhos para desenvolver o método analítico.
A Fenomenologia é uma das Escolas que mais reúne linhas e posições
teóricas, e não temos tempo para colocar todas elas aqui. Então gostaríamos de
evidenciar o método pelo qual a fenomenologia se desenvolve, o principal deles,
como citamos, é a Abstração.
A partir de dados coletados sobre determinado fenômeno, ou seja, a partir de
observações empíricas ou não de determinadas relações, são levantadas hipóteses
sobre as relações observadas. Essas hipóteses podem ser contraditórias. Ao serem
levantadas as hipóteses, através da inferência indutiva e dedutiva retornamos ao
72
objeto primeiro e suas relações, verificando, indutivamente, quais hipóteses se
mantem, quais não se mantem, quais não variam, quais variam. Neste retorno o
pesquisador elabora uma abstração dos fatos e dados da pesquisa, ele retira da
realidade os dados que conseguiu analisar e os devolve abstraídos, em uma
realidade abstrata. Esse processo pode ser considerado um processo dialético.
2.5.1 O Método Dialético
O Método dialético pode ser considerado um método fenomenológico. Ao
passo que trata seus objetos como sendo multideterminados e históricos. Embora
encontramos em Hegel e posteriormente em Marx sua versão mais moderna, ela
remonta ao período Pré-Socrático (antes de Sócrates). (BORNHEIM, 1998)
A filosofia surgiu da busca do homem em entender o universo, em entender a
si mesmo. Esse conhecimento acumulado é muito vasto, e, apenas para fins de
estudo, os períodos são divididos, e o primeiro deles se caracterizaria pelo período
pré-socrático. Heráclito de Éfeso faz parte deste período, especificamente da escola
Jônica, situado uma geração após Xenófanes, ao qual se opunha, e uma geração
antes de Parmênides, seu principal opositor:
[...] Heráclito é por muitos considerados o mais eminente pensador pré-socrático, por formular com vigor o problema da unidade permanente do ser diante da pluralidade e mutabilidade das coisas particulares e transitórias. Estabeleceu a existência de uma lei universal e fixa (o Lógos), regedora de todos os acontecimentos particulares e fundamento da harmonia universal, harmonia feita de tensões, "como a do arco e da lira". (MADJAROF, 2010, s/p)
Pouco se sabe sobre a história de Heráclito. Segundo consta, nascido em
Éfeso, colônia grega da Ásia Menor, teria atingido o auge de sua produção filosófica
por volta de 504 – 501 A.C. Pertencia à família real de sua cidade e conta-se que
teria renunciado à dignidade de se tornar rei em favor de seu irmão.
A obra que deixou é constituída de uma série de frases isoladas, durante
muito tempo foram consideradas fragmentos de sua obra original, que teria se
perdido. Muito depois, a crítica filosófica reconheceu que se tratava, na verdade, de
aforismos, muito utilizado pelos filósofos pré-socráticos. (BORNHEIM, 1998)
73
A apresentação aforismática do pensamento de Heráclito faz dele um dos
pensadores pré-socráticos de mais difícil interpretação. Uma vez que o método de
jogar suas colocações ao ar dá margem para que cada um interprete seus aforismos
dentro de sua própria realidade dual. Heráclito pode ser considerado o pai da
dialética. O desenvolvimento de seu pensamento era em essência dialético. Como
coloca MADJAROF (2010, s/p) ―Heráclito concebe o próprio absoluto como
processo, como a própria dialética‖. A dialética para Heráclito era segundo Bornheim
(1998):
a) Dialética exterior, um raciocinar de cá para lá e não a alma da
coisa dissolvendo-se a si mesma;
b) Dialética imanente do objeto, situando-se, porém, na
contemplação do sujeito;
c) Objetividade de Heráclito, isto é, compreender a própria
dialética como princípio.
Não cabe neste momento esmiuçar o pensamento de Heráclito e como ele
vem a influenciar a construção da Dialética como conhecemos, assim sendo,
passemos a Sócrates.
O que se entende por dialética? De origem grega (dialektiké) significa
argumentar, debater, dialogar. Era através do diálogo que se argumentavam nas
academias na Grécia e Roma antiga. Sócrates era um grande argumentador, em
seus diálogos o ato de quase sempre utilizar de uma negativa, de uma antítese,
dava verdadeiros nós na cabeça de seus alunos e discípulos. Um deles, aliás, já o
citamos anteriormente Platão, que absorveu muito do que aprendeu com o Mestre,
tendo sido o principal responsável pela passagem dos conhecimentos de Sócrates à
frente. Voltando, os diálogos eram muito utilizados como forma de representar e
apresentar os conteúdos filosóficos. (BORNHEIM, 1998)
Assim, finalmente, Hegel (1770 – 1831) retoma Platão adotando o método
dialético para as suas pesquisas. A Dialética de Hegel era idealista, não acreditava
que a sociedade precisasse de uma refundação. Mas, Karl Marx (1818 – 1883)
interessou-se pela dialética de Hegel, mas não concordava com ela inteiramente.
Marx não era Hegeliano, mas é impensável sem Hegel. O primeiro manuscrito que
escreveu foi em 1843 onde ele ainda não havia clarificado as relações entre
74
sociedade e estado, sendo inconcluso. O segundo apenas oito meses depois, ele
havia resolvido algumas questões sobre as relações entre o estado e a sociedade.
Assim ele redigiu 03 manuscritos conhecidos como os ―Manuscritos de Paris‖, onde
Marx se afastava de Hegel. (SOARES, 2009)
Ele passa a dar ênfase a História como o tecido onde ocorrem as
transformações e contradições da humanidade. A história que para Hegel não
desempenhava tão relevante importância, para Marx torna-se essencial, pois ele
enxerga na história o movimento e a unidade dos contrários. Outro ponto de
controvérsia seria o papel da Filosofia. Marx acreditava que a filosofia tinha de ser
realizada, se transformar em algo concreto, trazer as transformações do mundo das
ideias, para o mundo real. Marx se aproxima mais dos diálogos de Sócrates e Hegel
se aproximou mais das ideias de Platão. (DEMO, 1985; KOSIK, 2002)
Nesse momento, de realização da filosofia, coincide o envolvimento de Marx
com os movimentos de base operária na Alemanha. Para entendermos Marx,
precisamos olhar para a sua obra com óculos alemães datados de 1800. Ele conduz
uma forte influência na transição entre o socialismo utópico e o socialismo científico.
Marca-se assim uma nova fase na obra de Marx, ele se torna mais politizado
e tem um forte envolvimento com a causa em seu país. Nesse interim, publicou as
11 Teses contra (sobre) Feuerbach, e juntamente com Engels (1820 – 1895)
publicou O CAPITAL, sendo esta a obra mais conhecida de Marx no Brasil, pois é
uma das poucas que foram traduzidas. Marx escreve em alemão, e muitas de suas
obras estão disponíveis em Francês, mas não em Português. Nesta obra Marx aplica
sua lógica dialética tendo como objeto de análise o Capital. (KOSIK, 2002)
O Socialismo antes utópico, ganha caráter científico, mas não é do nosso
interesse especular sobre a ideologia marxista. Geralmente, quando falamos que
queremos trabalhar com a metodologia do Materialismo Histórico Dialético, nos
perguntam, mas você é marxista? Comunista? Não, apenas admiramos um grande
pensador e grande sociólogo. Mais do que isso, o MHD é apenas mais um método –
um método histórico-crítico.
Marx nunca escreveu sobre sua metodologia especificamente, ele não era
dado a este tipo de discussão, mas os estudos de marxistas nos auxiliam nessa
caminhada, e o MHD se descortina como uma concreta possibilidade de estudo,
alcançando os objetivos propostos. Por muitos, a dialética é considerada a
metodologia das ciências sociais. A nosso ver, ela é extremamente importante, mas
75
justamente por ser dialética, vê em outras metodologias possibilidades de diálogo.
No contexto das metodologias, é claro, trata-se de uma entre outras, cuja a excelência precisa ser fundamentada e não suposta. Ademais, não existe somente uma dialética, por exemplo, a marxista. Se assim fosse, já não seria dialética. E, mesmo dentro do marxismo, não há unidade em torno do que seria a dialética, a partir do próprio Marx. (DEMO, 1985, p. 85)
Assim, tratamos de esclarecer os termos que compõem essa metodologia, o
primeiro deles Materialismo. Como colocado, o materialismo é uma corrente, uma
linha de pensamento que se opõe ao idealismo. Se tomarmos como exemplo uma
flor, ela existe independente da consciência, independente da cor ou espécie que ela
possua quando a imaginamos. Para compreender o Materialismo é necessário
relembrar o conceito de matéria onde a realidade é objetiva, dada pelas sensações.
As características fundamentais da matéria podem ser descritas como:
[...] o movimento (o mundo material está em permanente movimento e mudança); o volume, dimensão, extensão espaço e tempo. Assim podemos chegar a seguinte definição de matéria: qualquer objeto ou fenômeno natural com existência e características próprias que ocupem um lugar no tempo ou no espaço. (RICHARDSON, 2008, p. 44, grifo nosso).
Assim, fazem parte como elementos fundamentais do fenômeno a ser
pesquisado, na linha materialista: o movimento; o volume; dimensão; extensão;
espaço – tempo. (RICHARDSON, 2008)
Marx concebe o Estado como parte de uma sociedade de consumo, portanto,
ele não seria o reino da universalidade, como coloca Hegel. Por outro lado, a
sociedade civil seria o terreno das privatizações onde ela vive alienada na
universalidade do estado. Essa é apenas uma breve análise que ele fez baseados
em fatos do concreto. Quando falamos de concreto falamos da realidade material
que se impõe ao pesquisador. (DEMO, 1985)
Karel Kosik, da Tchecoslováquia, é um dos grandes estudiosos de Karl Marx,
e em seu livro Dialética do Concreto vai mostrar todo o potencial da análise dialética
desta realidade que é uma realidade aparente, um pseudo-concreto.
A atitude primordial e imediata do homem, em face da realidade, não é a de um abstrato sujeito cognoscente, de uma mente pensante que examina a realidade especulativamente, porém, a de um ser que age objetiva e praticamente, de um indivíduo histórico que exerce sua atividade prática no trato com a natureza e com os outros homens, tendo em vista a consecução
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dos seus próprios fins e interesses, dentro de um determinado conjunto de relações sociais. (KOSIK, 2002, p.13)
Assim, o homem é o agente do meio. Ele se transforma e é transformado nas
suas relações com o mundo material. Essa realidade que se dá ao indivíduo, porém,
é apenas a aparência de uma realidade da qual ele faz parte, de um concreto no
qual o homem está inserido. Esse concreto aparente possui em si a essência, mas
não a revela prontamente ao sujeito. Assim, a realidade que se coloca diante de nós
todos os dias são pseudo-realidades, pseudo-concreticidade. A dialética trata da
coisa em si, mas a coisa em si não se manifesta imediatamente ao homem. Para
chegar a coisa em si é necessário certo esforço, quando não um desvio. (KOSIK,
2002)
É no trato com as coisas, na nossa vivência, na nossa prática que
construímos nossa subjetividade, e ao mesmo tempo, nossa objetividade agindo no
mundo concreto, transformando-o e sendo transformados por ele. Somo ao mesmo
tempo produto e produtor. E é somente em nossa prática que podemos tornar real,
materializar quem somos, e nos apreendermos do mundo real, simbolizando-o e
dando a ele sentido para além das aparências. (KOSIK, 2002; PIAGET, 1971)
É onde reside a práxis utilitária imediata, o senso comum, que possibilita
nossa orientação no mundo. Não precisamos saber o que é dinheiro e de onde ele
veio para comprar pão na padaria pela manhã, ninguém exigiria isso, apenas o
fazemos, de forma automática, imediata. Já a reflexão pautada na práxis histórica:
[...] a existência real, e as formas fenomênicas da realidade – que se reproduzem imediatamente na mente daqueles que realizam uma determinada práxis histórica, como conjunto de representações e categorias de pensamento comum [...] – são diferentes e muitas vezes absolutamente contrárias as leis do fenômeno, com a estrutura da coisa, e portanto, com o seu núcleo interno essencial e o seu conceito correspondente (KOSIK, 2002, p. 14)
Ou seja, tomar a pseudo-concreticidade como manifestação imediata da
essência do fenômeno seria desconsiderar o processo histórico a que o fenômeno
está sujeito, e a que o homem, imerso no social, também é (está) sujeito como um
ser histórico. Tomar a realidade imediata como apresentação do fenômeno em sua
totalidade seria, tomar o falso como verdadeiro, ou como aparentemente verdadeiro.
O complexo dos fenômenos que povoam o ambiente cotidiano, e a atmosfera comum da vida humana, que, com sua regularidade, imediatismo
77
e evidência, penetram na consciência dos indivíduos agentes, assumindo um aspecto independente e natural, constitui o mundo da pseudoconcreticidade. (KOSIK, 2002, p.15)
A forma pela qual podemos ―escapar‖ da alienação imposta a nós todos os
dias, seria através da práxis histórica, ou seja, utilizarmos da história como
alinhamento de nossa conduta e reflexão ao ponto dela se tornar uma práxis em
nossas vidas pessoais e acadêmicas, levando-nos assim a compreensão dos
fenômenos que desejamos conhecer.
Por este motivo Marx pode escrever que aqueles que realmente determinam as condições sociais se sentem a vontade, qual peixe n‘água, no mundo das formas fenomênicas desligadas da sua conexão interna e absolutamente incompreensíveis em tal isolamento. (KOSIK, 2002, p. 14)
Reside aqui um dos primeiros princípios da dialética: a conexão universal dos
fenômenos e dos objetos. É característica essencial a matéria seus fundamentos,
portanto eles sempre se inter-relacionam com a matéria de alguma forma, por
exemplo: o Peso (P) de um objeto é a relação entre a força gravitacional (g) e a
massa (m) do objeto. O mesmo acontece com os fenômenos sociais, eles possuem
entre si relações indissociáveis, e que se modificam ao desenrolar da história. Qual
seria então a diferença entre as outras metodologias já mencionadas?
Para o Materialismo Dialético a interligação dos fenômenos está relacionada por leis objetivas. Por exemplo, João não existe sem o homem, o homem não existe sem João; a Revolução cubana não existe sem a revolução, a revolução não existe sem a Revolução cubana. (RICHARDSON, 2008, p. 47)
A história possui dinâmica interna essencial, baseada na polarização, na
contradição. Toda a ação gera uma reação (esta lei foi muito estudada na física
aplicada ao 2° grau), como os polos de um imã, que ao serem similares e
semelhantes se repelem, e ao serem complementares e contraditórios se atraem. O
Homem é um ser histórico, ele é construído bem como a sociedade que o cerca
também o foi. Não há como excluir o histórico da pesquisa social. Segundo Demo
(1985, p. 109) ―a dialética se refere à historicidade da sociedade e da natureza‖.
A História não só expressa a evolução e contradição social, mas contém em
si a explicação do fenômeno, partindo do pressuposto que a história não se dilui ela
é construída na base dos conflitos, sejam estes contrários ou complementares. Ao
aceitar a história como tendo um papel fundamental no MHD, estamos diante do
78
segundo princípio: O movimento permanente e o desenvolvimento. As fontes dessa
energia sustentável que dá movimento ao fenômeno reside nas contradições, que
propulsionam as mudanças no mundo fenomênico, e, estas, se dão em meio à
história. O movimento se dá a partir de mudanças internas quantitativas que dão
passagem a transformações qualitativas. A transformação de quantitativo em
qualitativo, e vice versa. (RICHARDSON, 2008)
O mundo da pseudo-concreticidade seria o mundo fenomênico. Mas a
estrutura desse mundo fenomênico ainda não capta a relação entre sua existência e
essência.
O mundo da pseudoconcreticidade é um claro-escuro de verdade e engano. O seu elemento próprio é o duplo sentido. O fenômeno indica a essência, e, ao mesmo tempo a esconde. A essência se manifesta no fenômeno mas só de modo inadequado, parcial, ou apenas sob certos ângulos e aspectos. O fenômeno indica algo que não é ele mesmo e vive apenas graças ao seu contrário. (KOSIK, 2002, p.15)
Assim, aquilo que temos por real, é apenas o real aparente, é o mundo
fenomênico, são sombras da Caverna de Platão. Cabe a quem deseja conhecer,
compreender. E Compreender o fenômeno para a dialética consiste em captar sua
essência, e para captá-la muitas vezes é necessário destruir, desmontar,
desconhecer para construir e reconstruir. O mundo da essência e o mundo
fenomênico não estão desconectados entre si, pelo contrário, existe uma relação
íntima, e nessa relação reside a explicação, ou essência do fenômeno que se
apresenta para conhecimento do homem. (KOSIK, 2002)
O método dialético compreende princípios, leis e categorias. O núcleo central
do método dialético é composto por: TESE – ANTÍTESE – SÍNTESE. Essa dinâmica
provêm principalmente da união e luta dos contrários, e da Lei da Negação da
Negação.
79
Figura 04 – Dinâmica do Método Materialista Histórico Dialético
Fonte: Da Pesquisa.
Assim, podemos exemplificar em nossa própria pesquisa, partindo da nossa
observação aparente. Levantamos a possibilidade de existir pluralidade na produção
do conhecimento em turismo no Brasil; a antítese dessa colocação se expressaria
como a não existência de tal conhecimento no Brasil, ou ainda a existência ínfima de
plurais caminhos; a partir da reflexão e confronto com dados históricos abstraímos
os fatos históricos relevantes e deles tomamos uma síntese, que seria o concreto
antes aparente agora pensado, abstraído, fruto da realização da pesquisa.
(KOSIK,2002)
Embora se pareça com o método hipotético dedutivo, ou indutivo, se
diferencia destes e do estruturalismo pela importância que dá a história, aos
fundamentos da matéria. Reconhece a contradição não como força externa
propulsora, mas como inerente a todo o fenômeno. A bipolaridade dialética é o que
mantêm o fenômeno vivo. Toda metodologia supõe uma concepção da realidade,
como vimos anteriormente nas mais diversas linhas, com a dialética não é diferente.
A visão de mundo é a visão de um mundo dialético.
Seu pressuposto mais fundamental parece ser: toda a formação social é suficientemente contraditória para ser historicamente superável. Obviamente, nem todas as dialéticas aceitam isso; mas serve como ponto de partida e até mesmo divisor de águas. (DEMO, 1985, p.86)
Marx com certeza foi quem deu uma roupagem a dialética de Hegel e
80
conquistou espaço nas ciências sociais, mas seu trabalho teria sido pequeno se não
houvessem aqueles, que, vindo depois dele, contextualizaram a dialética em suas
épocas, tempo, e espaços, construindo ótimas reflexões sociológicas e filosóficas.
Um caso marcante é de seu genro, casado com Laura, Paul Lafargue. Paul Lafargue
teve um fim triste, como Romeu e Julieta de Shakespeare, suicidou-se ao lado de
Laura, sua amada. Mas antes foram ao teatro, bebicaram um bom vinho, e por fim,
uma boa dose do chá venenoso da Doce Preguiça. (LAFARGUE, 1999)
Paul Lafargue escreveu em 1880 em um folhetim com o título Direito a
Preguiça, ele utilizou este título em uma sutil afronta aos preceitos cristãos,
utilizados para legitimar horas desumanas de trabalho nas fábricas. Enquanto Marx
escreveu sobre o trabalho, Lafargue falou do não trabalho, e da importância de nos
dedicarmos a outras atividades, nos dermos o direito a preguiça. Os escritos de
Lafargue só chegariam ao Brasil por volta de 1980, traduzidos inicialmente como
Direito ao Ócio. (―Traduzir é trair‖). Foi muito influente sobre muitos pesquisadores
do Brasil na área de Ciências Sociais e do Lazer. (LAFARGUE, 1999)
Como deixar de citar Milton Santos e as contribuições que sua visão dialética
trouxe tanto ao país quanto a Geografia? E as contribuições de Florestan Fernandes
como professor e como político, marxista, ao lado do Partido dos Trabalhadores? A
ideologia e método se confundem na figura de Marx, mas os profundos benefícios
de pensar a sociedade e ao refletir, transformá-la esse foi de Marx o maior legado.
2.5.2 Estruturalismo
Começamos por dizer que não existe um tipo apenas de Estruturalismo. Ele
descende da visão fenomenológica do objeto, ou assunto da pesquisa. Poderíamos
citar alguns: Foucault, Piaget, Lévi-Strauss, dentre outros. Assim, vamos nos basear
em Lévi Strauss para exemplificar um pouco mais deste método que trouxe grandes
contribuições para a humanidade, principalmente no contexto histórico em que se
deu. (RICHARDSON, 2008)
Utilizando-se em primeira mão da linguística e da etnologia Lévi-Strauss
disseminou entre as ciências humanas e sociais um novo modelo científico. Ele
acreditava que a realidade estaria estruturada e, a partir da explicação, se chegaria
a estruturas sociais invariantes. O Método de pesquisa na linha Estruturalista seria
81
dado em algumas etapas, como coloca Demo:
Em primeiro lugar, começa-se pelo esforço de decomposição analítica, não de síntese, já que para entender um fenômeno é mister desmontá-lo em suas partes; e isto é precisamente análise. Em segundo lugar a decomposição analítica mostra a complexidade do fenômeno é uma percepção superficial [...] em terceiro lugar, explicar é escavar a subjacência, porquanto a superfície varia, não o fundo, que invaria. [...] Em quarto lugar, o fenômeno é simplificável em modelos estruturais, revelando a ordem subjacente, ao contrário da visão da superfície. (DEMO, 1985, p. 106)
Assim, podemos citar a existência de pelo menos três tipos de Estruturalismo.
O Estruturalismo fenomenológico (Merleau-Ponty); Um Estruturalismo Genético
(Piaget) e um Estruturalismo de Modelos (Lévy-Strauss; Althusser). E ainda o
Estruturalismo mais recente de Michel Foucault, que tem por base uma
epistemologia pluralizada. (RICHARDSON, 2008)
A música pode ser utilizada como um exemplo na visão estruturalista: As
peças de uma sinfonia são compostas por vários instrumentos, que juntos compõe
uma harmonia de sons. Mesmo que dois violinos estejam tocando notas diferentes
elas conversam, pois fazem parte da mesma escala. As notas que compõem as
escalas são variadas e variantes de notas musicais, que por sua vez são invariantes,
ou seja, é a estrutura invariável, é a unidade. (RICHARDSON, 2008; DEMO, 1985)
Na visão humanista, essa unidade básica seria o homem, paradigma este
adotado pela Antropologia. Na visão sociológica esta unidade básica poderia ser
considerada a família como primeiro grupo social de interação do individuo com o
mundo social. Para a psicologia, existiria assim o inconsciente agindo sobre as
ações do sujeito, ou ainda um mundo dentro da pele, ou ainda estruturas cognitivas
que propiciassem o desenvolvimento humano. (PIAGET, 1971; SKINNER, 2000)
O estruturalismo é uma das correntes mais recentes e tenta devolver ao
homem e a sociedade a estrutura que ele perdeu nas guerras, na doença e no
resultado do conhecimento que por ele mesmo foi construído. Vai trazer à tona a
discussão acerca da moral, da extinção dos povos considerados primitivos, vai se
inter-relacionar com as instâncias de poder e seu efeito sobre o homem, unidade da
sociedade, do meio social.
O Estruturalismo tem suas origens nos estudos linguísticos de Ferdinand
Saussure – Curso de Linguística Geral, 1916 – e a Escola Fonológica de Praga –
82
Jakobson. Ela se fundamenta em dois princípios, aplicáveis as ciências sociais:
(RICHARDSON, 2008)
- Os fenômenos linguísticos têm como base infraestruturas
inconscientes que devem ser pesquisadas e compreendidas;
- Objeto da linguística não está constituído pelos termos que
formam uma língua, se não pela relação entre os termos.
Conforme coloca Pedro Demo (1985), a física procedeu da mesma forma, ela
amadureceu como ciência quando encontrou o código dos elementos atômicos, em
número restrito e finito, dentro de uma ordem estabelecida.
Para o método de pesquisa estruturalista, coloca-se que:
O que importa no modelo estruturalista é o estudo das relações entre os elementos. Portanto, o objetivo das ciências sociais é compreender o sistema de relações entre os elementos constitutivos da sociedade. A sociedade é interpretada em função da comunicação entre os elementos. Assim, o estudo da cultura ocupa um lugar fundamental, como conjunto de sistemas simbólicos que permitem a comunicação entre os atores sociais.(RICHARDSON, 2008, p.107)
O método estruturalista pode ser considerado uma metodologia que se utiliza
do método, por exemplo, semântico, onde a semântica diz respeito à relação entre
os signos e a realidade, isto é, o significado de determinado objeto num determinado
contexto. ―essa relação de significação é interpretada pelas várias correntes teóricas
da linguística e da filosofia da linguagem‖. (FIGUEIREDO, 2008, p.25)
Assim, resumidamente, a metodologia de pesquisa para que seja considerada
estruturalista deve levar em conta as seguintes condições segundo Richardson
(2008):
a) Oferecer característica dos resultados em Sistema;
b) Todo o modelo deve pertencer a um grupo de modificações;
c) As condições anteriores devem fornecer critérios de
previsibilidade das reações do fenômeno;
d) O Sistema deve dar conta de explicar todos os casos
observados.
83
Algumas críticas ao Estruturalismo colocam que ele diminui, de certa forma, o
caráter histórico, ao chegar em estruturas invariantes, ou seja, elas independem do
tempo-espaço para se formarem e reger a vida social do homem. Nesse interim,
concebe-se o inconsciente como essência das ações humanas e de certa forma
inapreensíveis pela consciência. Se o inconsciente era mesmo trans-histórico e
trans-pessoal, a distinção entre primitivos/civilizados, nós/outros, que deu tanto
sentido ao funcionalismo e à posição relativista, não apresentava mais sentido, pois
o pensamento selvagem passava a possuir o mesmo estatuto do pensamento
domesticado, apresentando um caráter mais totalizador, porque se fazia inscrito na
lógica do sensível. Passou-se a postular um humanismo universalista, que
reintegrava o outro, o diferente. O período trará muitas referências a Montaigne e
Rousseau, este último sendo considerado o fundador de tal visão de mundo: visão
antropológica. (DOSSE, 1994)
Atualmente já existem visões pós-estruturalistas, pós-construcionistas, mas
todas elas advêm do Estruturalismo, inclusive das críticas que a ele foram feitas,
podemos destacar algumas destas críticas: (RICHARDSON, 2008)
a) No momento que se procura estruturas invariantes, esquece-se
as transformações do fenômeno;
b) Considerando o inconsciente coletivo, isso faz com que todas as
pessoas possuam a mesma configuração mental;
c) O estudo da estrutura precede o estudo da gênese, relegando a
história a segundo plano;
d) O trabalho não formula uma síntese da pesquisa e sim cria
modelos explicativos, que simplificam o fenômeno;
e) Pode cair em um pré-determinismo negativo em relação às
transformações sociais.
Todas essas críticas foram válidas, e surgiram novas possibilidades de estudo
a partir de 1960. Mas gostaríamos de salientar, talvez a maior contribuição da Escola
Estruturalista foi de dar ao homem uma nova estrutura, uma nova referência. Ela
trabalha para devolver o homem que foi sequestrado pela ciência, de volta para sua
terra, para sua casa. Ela busca dar ao homem estruturas para que ele possa viver
nesse mundo tão moderno, dinâmico e ao mesmo tempo arcaico e soberbo.
84
Podemos citar como exemplo de aplicação do método estruturalista o famoso livro
do Prof. Dr. Mario Beni, Análise Estrutural do Turismo, que se constitui em uma obra
de fôlego, publicada pela primeira vez no Brasil em 1995.
A Teoria de Sistemas – visão Sistêmica descende da corrente Estruturalista,
muito utilizada na Administração e Gestão de Empresas. Também muito utilizado
nos campos da Engenharia, Arquitetura, onde a montagem de estruturas se
configura como básicas. Mas o Estruturalismo na visão sistêmica pode ser aplicado
a quase todas as áreas do conhecimento, e tem por principal objetivo identificar e
resolver conflitos que se liguem a sua estrutura básica. Um Exemplo já citado, da
Análise Estrutural do Turismo, o Professor Mario Beni derivou o SISTUR Brasileiro,
sendo um dos maiores representantes da Escola Estruturalista no Turismo no Brasil,
além de sua grande importância para toda a área.
85
3 METODOLOGIA: PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
3.1 TIPO DE PESQUISA
A presente pesquisa propôs uma reflexão acerca dos fundamentos
epistemológicos do turismo, baseado em métodos de pesquisa social. De
abordagem qualitativa, buscou responder questões muito particulares de
determinada temática, que abrangem o fenômeno social, como coloca Minayo (2001,
p.21):
Ela se preocupa, nas ciências sociais, com um nível de realidade que não pode ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com um universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos a operacionalização de variáveis.
Ainda, segundo Richardson (2008), a abordagem qualitativa de um problema
justifica-se por ser uma forma adequada para entender a natureza de um fenômeno
social. Assim a abordagem qualitativa esteve presente no desenvolvimento dos
instrumentos de pesquisa bem como no tratamento dos dados.
Esta pesquisa, além de ser de cunho qualitativo, possui caráter descritivo,
com coleta de dados bibliográficos e de campo. Seu desenvolvimento caracterizou-
se em um processo de construção científica, que passa por fases importantes que
se complementam no desenrolar da pesquisa.
Na primeira etapa, denominada fase exploratória da pesquisa, dedicamos
tempo na interrogação sobre o objeto de estudo, os pressupostos, as teorias
pertinentes. Momento onde através de observações e leituras bibliográficas nos
familiarizamos com a temática. Para Minayo (2001) esta etapa inicial nos colocou
frente a frente com os objetivos traçados e os autores envolvidos com o horizonte de
interesse da proposta de pesquisa. Com base nesta etapa visamos atender ao que
nos propusemos nos objetivos específicos.
A segunda etapa, denominada de fase de instrumentação da pesquisa, foi
feito um recorte da construção teórica elaborada na primeira etapa, combinando os
levantamentos bibliográficos com novas leituras de material teórico específicos,
observações e entrevistas com os pesquisadores relacionados com a temática em
discussão, e selecionados pela pesquisa. Nesta fase são construídos os
86
instrumentos e roteiros para leituras e entrevistas a serem utilizados na coleta de
dados bibliográficos e de campo.
Na terceira etapa, foi feita a Análise dos dados coletados pela pesquisa, com
base nos objetivos específicos, observando se os mesmos foram alcançados, em
que medida se obteve as respostas às questões problemas de pesquisa e como
estes ‗discursos‘ foram analisados. Importante lembrar que nesta pesquisa os
discursos foram analisados e interpretados a luz do referencial teórico histórico-
crítico, conduzindo a desconstrução do objeto, ou da realidade concreta aparente, e
posterior reconstrução, que seria o concreto abstrato, a essência que se manifesta
na aparência. O tratamento realizado com os dados coletados nos conduziu a um
confronto entre a abordagem teórica anterior e o que a investigação de campo
aportou de singular enquanto contribuição. (MINAYO, 2001)
3.2 AMOSTRAGEM DA PESQUISA
A metodologia não só contempla a fase de exploração do campo, como
também o estabelecimento de critérios de amostragem e construção de estratégias
para coleta e análise dos dados. Na fase exploratória da pesquisa, durante o
levantamento bibliográfico, identificamos pesquisadores que possuíam produção
científica voltada à temática epistemológica do turismo.
Em seguida, a fim de traçar um panorama geral destes autores, utilizamos a
Plataforma Lattes no Portal do CNPQ. A Plataforma Lattes nos apresenta o currículo
com o registro da vida pregressa e atual dos pesquisadores, sendo que seu formato
vem sendo adotado pela maioria das instituições de fomento, Universidades e
institutos de pesquisa em todo o país, em decorrência de sua agilidade,
transparência e confiabilidade. Assim, torna-se uma rica fonte de informações sobre
os pesquisadores, autores e suas produções.
Alguns critérios foram adotados a fim de filtrar os resultados e refinar a
pesquisa, estes foram: Busca por Assunto: Epistemologia – Nas Bases: Doutores –
Formação Acadêmica: Doutorado – Área de Atuação: Grande Área: Ciências Sociais
Aplicadas – Área: Turismo.
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Figura 05 - Página de Busca de Currículo Lattes.
Fonte: Plataforma Lattes, 2012.
Esta pesquisa na base de dados do CNPQ teve por propósito levantar quais
seriam os potenciais pesquisadores-autores selecionados como parte do escopo
específico desta pesquisa; as áreas a que são vinculados (turismo, áreas afins,
áreas correlatas), a produção bibliográfica (projetos de pesquisa, teses, dissertações
e artigos científicos), a instituição de ensino a que estaria ligado, e se atua em
programas de pós-graduação Stricto Sensu.
A pesquisa preliminar nos forneceu o currículo de 47 Doutores, sendo que a
frequência variou entre 48% e 100% de referência ao assunto, palavra-chave,
relacionada à produção com temática concentrada em ‗Epistemologia‘. Com base na
análise dos Currículos Lattes apresentados, foi possível verificar a possibilidade de
selecionar autores e pesquisadores que possuíam produção e publicação
representativa na temática, ligados a programas de pós-graduação Stricto Sensu em
Turismo, ativos, com currículos atualizados nos últimos seis meses.
Foi a partir deste universo de pesquisadores elencada a amostra de dois (02)
pesquisadores autores, tendo por base não uma representatividade estatística frente
ao Universo da amostra pesquisada, e sim a representatividade e importância destes
atores sociais e suas pesquisas na área da construção do conhecimento em turismo,
sua história e desenvolvimento e posicionamentos epistemológicos. Observados os
critérios acima descritos, foram escolhidos como atores sociais participantes Dr. Luiz
Gonzaga de Godoi Trigo e Dr. Luiz Octávio de Lima Camargo.
88
Segundo Minayo (2001) em pesquisas qualitativas não se faz necessário um
critério numérico para garantir representatividade. Para esta autora a vinculação com
o problema de investigação em suas múltiplas dimensões é que define quais atores
de uma população ‗x‘ será efetivamente a amostra. Assim, a professora Dra. Doris
Van Meene Ruschmann, também é participante nesta pesquisa através de seu relato
de experiência e importância no processo histórico no qual nossa temática encontra
sua contextualização.
Considerando os elementos acima, na fase exploratória foram estabelecidos
critérios objetivos que influenciaram diretamente a seleção dos autores elencados
para a pesquisa. São estes critérios resumidos no quadro abaixo:
Quadro 03 - Critérios de seleção dos Autores / Pesquisadores para a pesquisa.
Autor / Pesquisador Formação Acadêmica
Grande área: Ciências Sociais
Aplicadas Titulação Doutorado
Área: Turismo Vínculo
Cadastro na Base de
Dados do CNPQ (Plataforma
Lattes):
Ativo
Ligado a Programa de Pós-graduação
Stricto Sensu em Turismo e Hotelaria
Atualização do CV
Lattes: Últimos 06 meses
Palavra - Chave / Assunto: Epistemologia
Fonte: Dados de Pesquisa.
Os critérios objetivos adotados, e os critérios subjetivos de representatividade
e importância no desenvolvimento do estado da arte em Turismo, são elementos que
compõem parte da metodologia, contribuindo assim para a definição do recorte
teórico que a pesquisa realizou.
3.3 TÉCNICAS E ESTRATÉGIAS DE COLETA DA PESQUISA9
As técnicas são os procedimentos operacionais que servem de mediação
9 Este tópico utiliza como base de descrição das técnicas de coleta documental Severino (2008), que apresenta o percurso de identificação, leitura, descrição e categorização do material a ser analisado.
89
prática para a realização da pesquisa. Uma das técnicas utilizadas para a coleta
bibliográfica é a documentação. Esta consiste em toda a forma de registro e
sistematização de informações, colocando-as em condição de análise por parte do
pesquisador. No contexto de realização desta pesquisa, é a técnica de identificação,
levantamento e análise de documentos fontes do fenômeno pesquisado.
Segundo Severino (2008, p.124), documento pode ser descrito como todo
objeto que se torna suporte material de uma informação que nele é fixada mediante
técnicas especiais, nessa condição, transforma-se em fonte durável de informação
sobre os fenômenos pesquisados. As obras dos autores referenciados tornam-se
assim o suporte material de análise na pesquisa. O trabalho de coleta bibliográfica
envolveu a organização dos dados coletados e sua análise, devemos, pois,
descrever com clareza como esta organização foi realizada. Foi preciso criar
condições de abordagem e de inteligibilidade do texto, e para tal aplicou-se alguns
recursos que auxiliaram na análise e interpretação.
Antes de abordarmos as diretrizes utilizadas para leitura e análise
bibliográfica, recomenda-se atentar para a função dos textos em termos de uma
teoria geral da comunicação, estabelecendo algumas justificativas básicas para a
adoção destas normas metodológicas e técnicas. Sem aprofundar a questão de
significado e função do texto, o que ultrapassaria os objetivos deste trabalho,
apresentamos apenas algumas considerações a fim de encaminhar a compreensão
dos instrumentos utilizados na pesquisa.
Parte-se da consideração de que a comunicação se dá quando existe a
transmissão de uma mensagem entre um emissor e um receptor. O esquema básico
Emissor – Mensagem – Receptor se desdobra, o que fornece mais elementos para a
leitura analítica de um texto.
Com efeito, considera-se o emissor como uma consciência que transmite uma mensagem para outra consciência que é o receptor. Portanto, a mensagem será elaborada por uma consciência e será igualmente assimilada por outra consciência. Deve ser, antes de mais nada, pensada e depois transmitida. Para ser transmitida, porém, deve ser antes mediatizada, já que a comunicação entre as consciências não pode ser feita diretamente; ela pressupõe sempre a mediatização de sinais simbólicos. Tal é, com efeito, a função da linguagem. (SEVERINO, 2008, p.51)
Ao escrever um texto o autor assume o papel de emissor, codifica sua
mensagem, que por sua vez já havia sido pensada, concebida. O leitor assume o
90
papel do receptor. Ao ler o texto decodifica a mensagem do autor, para então pensa-
la, analisa-la e compreende-la, completando assim a comunicação. O fluxograma
abaixo apresenta de forma detalhada este processo.
Figura 06 - Fluxograma Geral da Comunicação Humana.
Fonte: Severino (2008, p. 52)
Assim, todo o texto é portador de uma mensagem, concebida e codificada por
um autor, e destinada a um leitor, que, para apreendê-la, precisa decodifica-la. Em
todas as fases deste processo, o homem, dada sua condição existencial, passa por
interferências culturais e sociais que podem colocar em risco a objetividade da
comunicação (ideologias - ruídos). Ao mesmo tempo, essas características
subjetivas enriquecem a decodificação da mensagem.
Justificou-se então a elaboração de diretrizes e instrumentos que
fornecessem elementos para uma melhor abordagem dos textos de natureza teórica,
favorecendo a decodificação da mensagem. A leitura analítica, escolhida como
técnica de pesquisa bibliográfica desenvolve no leitor-pesquisador uma série de
posturas lógicas que constituem a via mais adequada para a formação em sua área
específica de estudo, quanto para sua formação filosófica geral. Esta é uma técnica
que tem por objetivos: favorecer a compreensão global do significado do texto;
treinar para a compreensão e interpretação crítica dos textos; auxiliar no
91
desenvolvimento do raciocínio lógico e fornecer instrumentos para o trabalho
intelectual (SEVERINO, 2008).
Primeiramente, foi necessário delimitarmos a unidade de leitura. Unidade é
um setor do texto que forma uma totalidade de sentido. Podemos considerar um
capítulo, uma seção, ou qualquer outra subdivisão.
Depois de delimitada a unidade de leitura, demos início a Análise Textual, a
primeira abordagem do texto visando à preparação para uma leitura mais profunda.
Tratou-se de uma leitura atenta, uma leitura vertical, sem buscar esgotar a
compreensão do texto. A finalidade da análise textual é estabelecer um primeiro
contato com o texto, buscando uma visão panorâmica, ―levantando esclarecimentos
relativos ao autor, vocabulário, fatos, doutrinas e autores citados, que sejam
importantes para a compreensão da mensagem‖ (SEVERINO, 2008, p. 63).
Em seguida, prosseguimos com a Análise Temática. A Análise Temática
procurou ouvir o autor, apreender, sem intervir no conteúdo de sua mensagem.
Fazer ao texto diversas perguntas que revele o conteúdo da mensagem, a
decodificação. Em primeiro lugar buscamos saber do que falava o texto, a resposta a
esta busca revelou o tema ou assunto de que se tratava a unidade de leitura. Então,
capta-se a problematização do tema. A problemática apresentada pelo autor
demonstra suas indagações a respeito do tema, é a ―provocação‖ que o impulsionou
a pesquisar o assunto. Ela revela como o assunto ou temática se apresenta como
um problema ao autor.
Entendida a problemática, levantamos questionamentos a respeito de como o
autor responde ao problema levantado. Que posição assume? Que ideia defende? A
resposta a estas questões demonstra a ideia central, proposição fundamental ou
tese. Trata-se da ideia mestra defendida pelo autor naquela unidade de leitura. Ela é
o núcleo essencial de desenvolvimento do raciocínio do autor e sua identificação e
compreensão torna o texto inteligível. (SEVERINO, 2008)
A ideia central pode ser considerada como uma hipótese geral da unidade, e
é justamente essa ideia que cabe ao autor demonstrar através da argumentação.
Como o autor comprova sua proposição básica? Qual foi seu raciocínio? É através
do raciocínio, da argumentação que o autor expõe, passo a passo, seu pensamento
e transmite sua mensagem. Em sua linha de argumentação, os autores geralmente
tocam em temas paralelos ao tema central, lançam mão de outros autores e fatos
históricos, assumindo posições secundárias no decorrer da unidade. Estas ideias
92
são intercaladas e relacionadas à ideia central, são subtemas ou subteses, que
complementam o pensamento do autor. Assim, a Análise Temática, resumidamente,
consiste:
Análise Temática: Compreensão do texto; determinar o tema-problema, a ideia central e as ideias secundárias da unidade; refazer a linha de raciocínio do autor, ou seja, reconstruir o processo lógico do pensamento do autor; evidenciar a estrutura lógica do texto, esquematizando a sequência de ideias. (SEVERINO, 2008, p.65)
De posse do material, realizou-se a leitura analítica, que tem por objetivo
neste estudo compreender como foi feita a discussão sobre epistemologia e turismo,
que fundamentos epistemológicos predominaram nestes estudos, quais os principais
autores e fundamentos teórico-conceituais foram utilizados como princípios
norteadores na construção da pesquisa.
Como citado anteriormente, se faz necessário a documentação e registro das
informações coletadas a fim de facilitar a análise. Para tal, utilizamos um Roteiro de
Leitura Analítica10 como instrumento de registro e organização dos dados.
A fim de enriquecer e completar a análise das obras selecionadas e sua
discussão com a temática foram realizadas Entrevistas11 com pesquisadores
selecionados na população de atores sociais vinculados ao turismo, num total de
três atores selecionados, em momentos distintos da pesquisa.
Para a realização das entrevistas foi feita uma aproximação com as pessoas
selecionadas através de uma carta convite com informações sobre os objetivos da
pesquisa e a metodologia básica adotada, perguntando sobre a disponibilidade para
participação no estudo. Em seguida, foi formalizada a participação dos mesmos
através do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido12, respeitando diretrizes
éticas que devem nortear a pesquisa científica.
Tendo cada pesquisador concordado em participar livremente da pesquisa,
fizemos um novo contato para a escolha da forma de realização da entrevista. Estas
foram feitas pessoalmente, em data e horário agendados previamente. Ficou
esclarecido que a entrevista seria registrada e transcrita unicamente para fins da
pesquisa. Como utilizamos de técnicas de entrevista onde muitos são os conteúdos
que emergem na conversa, por princípios éticos, elas não foram disponibilizadas na
10
Ver Apêndice A – Roteiro de Leitura Analítica (p. 260). 11
Ver Apêndice B – Roteiro de Entrevista (p. 261). 12
Ver Apêndice C – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (p. 262).
93
íntegra para o leitor, apenas trechos dispostos na análise, buscando preservar o
acordo estabelecido entre o pesquisador e os informantes da pesquisa.
Através da entrevista, o pesquisador busca obter informes contidos nas falas
dos atores sociais. Essa técnica caracteriza-se por uma comunicação verbal que
reforça a importância da linguagem, tornando-se meio de coleta de informações
sobre determinado tema científico. (MINAYO, 2001)
Os dados subjetivos obtidos se relacionam aos valores, atitudes e as opiniões
dos entrevistados. A entrevista não estruturada é conhecida também como
entrevista em profundidade. Segundo Richardson (2008, p. 208):
A entrevista não estruturada, também chamada de entrevista em profundidade, em vez de responder à pergunta por meio de diversas alternativas pré-formuladas, visa obter do entrevistado o que ele considera os aspectos mais relevantes de determinado problema: as suas descrições de uma situação em estudo. Por meio de uma conversa guiada, pretende-se obter informações detalhadas que possam ser utilizadas em uma análise qualitativa.
Vale lembrar que a diferenciação entre tipologia e técnicas de entrevista varia
de acordo com o referencial de diferenciação, ou seja, enquanto alguns autores
classificam suas técnicas de pesquisa baseados na formatação das perguntas ou
temáticas a serem abordadas, outros autores diferenciam as técnicas de entrevista
baseado nas possibilidades de respostas oportunizadas ao entrevistado, informante,
ou sujeito da pesquisa.
Por exemplo, enquanto alguns autores subdividem a tipologia de entrevista
em estruturada e não estruturada, com base em possibilidades de respostas13,
outros adicionam uma terceira categoria, caracterizando a tipologia da entrevista em
estruturada, semiestruturada (ou mista) e não estruturada, com base na formatação
de perguntas14.
Assim, adotaremos a definição de Richardson (2008) que caracteriza a
tipologia de entrevista em não estruturada com base nas possibilidades de respostas
oportunizadas ao entrevistado, ou sujeito da pesquisa, o que pressupõe maior
liberdade e flexibilidade na inclusão e exclusão de questões e temáticas abordadas
durante a entrevista. Na tipologia de entrevista não estruturada, a técnica utilizada
para fins desta pesquisa caracteriza-se pela entrevista guiada, que, segundo o autor;
13
Richardson (2008); Mai Sonneuve; Margot-Duclot (1964). 14
Minayo (2001); Dencker (2007).
94
[...] é utilizada particularmente para descobrir que aspectos de determinada experiência produzem mudança nas pessoas expostas a ela. O pesquisador conhece previamente os aspectos que deseja pesquisar e, com base neles, formula alguns pontos a tratar na entrevista. As perguntas dependem do entrevistador, e o entrevistado tem a liberdade de expressar-se como ele quiser guiado pelo entrevistador. (RICHARDSON, 2008, p. 212, grifo nosso)
Portanto, o pesquisador pode ter uma ideia geral do tema da entrevista, mas
o aprofundamento é dado pelo entrevistado, sujeito da pesquisa. Por isso a
entrevista não estruturada é conhecida também por entrevista em profundidade, e
dentro dessa tipologia existe uma variedade de técnicas que possibilitam maior ou
menor grau de liberdade ao informante da pesquisa.
Cabe ao pesquisador estimular o entrevistado, em um ―diálogo‖
correspondido. O roteiro de perguntas elaborado nesta técnica de entrevista não
estruturada tem por objetivo proporcionar ao pesquisador uma lista de tópicos que
devem ser focados durante a entrevista. Não se pretende estabelecer uma relação
de estrutura entre perguntas e respostas. A entrevista guiada ―visa a que o
entrevistado possa discorrer livremente, nas suas próprias palavras, em relação a
temas que o entrevistador coloca para iniciar a interação‖. (RICHARDSON, 2008, p.
214)
Alguns princípios foram observados durante a entrevista. O entrevistado teve
liberdade para se expressar, abordando o tema da forma como achava conveniente.
Coube ao entrevistador manifestar seu interesse e apenas guia-lo. Durante a
entrevista, geralmente o entrevistado coloca outros temas relacionados ao tema
central. Neste caso, o entrevistador não deve restringir a fala do ator social, e sim
escutá-la. Ele deve facilitar o processo da entrevista, e retomar o tema em alguns
momentos possibilitando ao entrevistado esclarecer ou aprofundar suas ideias. O
principal objetivo foi estabelecer um diálogo intensamente correspondido entre o
pesquisador e o entrevistado.
A escuta para análise da entrevista deve ser feita após sua realização. Isso se
faz extremamente necessário para verificar se surgem aspectos não
compreensíveis, ou se existe alguma gravação danificada, ou a utilização de termos
completamente inacessíveis a compreensão, o que exigiria uma nova entrevista, ou
novo contato a fim de esclarecer ‗ruídos‘. A primeira vista ―permite-nos estudar cada
entrevista e fazer uma análise preliminar dos resultados alcançados‖
(RICHARDSON, 2008, p. 218). Com o rico material que cada entrevista em
95
profundidade nos ofereceu, os registros gravados para a organização e análise das
informações, permitiu-nos rever novamente as entrevistas, reexaminando seu
conteúdo sempre que necessário.
Os tópicos e discussões que foram abordados em cada entrevista tiveram
como base as informações obtidas na leitura preliminar de suas obras, bem como
em dúvidas e questionamentos demandados durante a entrevista. Também com
base na entrevista pudemos delimitar as unidades de leitura selecionadas,
dependendo da ênfase que o pesquisador dá a determinada temática ou obra.
Através da entrevista buscamos conhecer aspectos que não puderam ser
observados através da leitura nas publicações selecionadas, explorando mais
amplamente a temática do estudo, possibilitando remodelar questionamentos e
acrescentar novas questões conforme a resposta de cada informante na pesquisa,
de forma a enriquecer a investigação realizada.
3.4 ANÁLISE DOS DADOS
Alguns autores compreendem a Análise dos dados coletados de forma mais
ampla, abrangendo a Interpretação. Partilhamos deste posicionamento por acreditar
que análise e interpretação estão contidas no mesmo movimento: olhar atentamente
para os dados da pesquisa. Quando falamos de Análise em pesquisa qualitativa,
não devemos esquecer de que, mesmo tratando-a como uma fase distinta da
pesquisa, esta pode estar ocorrendo durante a coleta de dados. (MINAYO, 2001)
Uma análise rica dos dados da pesquisa relaciona-se com a capacidade do
pesquisador em articular as conclusões que surgem dos dados concretos, da
realidade apreendida, com os conhecimentos mais amplos e abstratos, produzindo
assim, uma aproximação entre a fundamentação teórica e a prática da pesquisa, o
real pensado. Minayo (2001, p.78), sobre a fase de Análise de Dados em pesquisa
social, aponta que:
Neste momento procuramos estabelecer articulações entre os dados e os referenciais teóricos da pesquisa, respondendo às questões da pesquisa com base em seus objetivos. Assim, promovemos relações entre o concreto e o abstrato, o geral e o particular, a teoria e a prática.
O referencial teórico e os dados coletados na pesquisa são confluentes e
dialeticamente unificados. A opção metodológica reencontra o referencial teórico do
96
trabalho, este implica em uma posição epistemológica básica. Como descrito
anteriormente, a abordagem do MHD fundamenta a pesquisa, assim, a análise dos
dados ocorre de forma dialética.
A visão de homem como ser histórico e social, em constante movimento. Esta
concepção teórica da dialética nos permite compreender historicamente como se dá
o processo de construção do saber em turismo, relacionada à existência de
paradigmas dominantes.
Além disso, a dialética nos permite uma análise e aprofundamento das
relações existentes entre epistemologia e turismo nas obras pesquisadas. Permite
identificar a contrariedade e complementariedade de uma suposta pluralidade
epistemológica, advinda de diferentes áreas do conhecimento, observada nas
pesquisas bibliográficas e entrevistas realizadas com os autores.
Durante toda minha vida, nunca pude resignar-me ao saber parcelado, nunca pude isolar um objeto de estudos do seu contexto, dos seus antecedentes, da sua evolução. Sempre aspirei a um pensamento multidimensional. Nunca pude eliminar a contradição interior. Sempre senti que verdades profundas, antagônicas umas às outras, eram para mim complementares, sem deixarem de ser antagônicas. Nunca quis esforçar-me para reduzir à força a incerteza e a ambiguidade. (MORIN, 1990 apud PLENTZ, 2007, p. 90)
A reflexão crítica acerca dos dados deve ser feita em todos os seus aspectos
e conexões, priorizando o estudo da essência do fenômeno. O debate da pluralidade
epistemológica presente nas obras analisadas se faz essencial.
Com a apresentação desta proposta de análise dialética, reforçamos que o
produto final da análise de uma pesquisa, sua síntese, por mais completa que ela
seja, deve ser encarada de forma provisória e aproximativa. Entendemos a
construção do saber de forma histórica e dialética, em permanente movimento.
Quando falamos em ciência, afirmações podem ser superadas, paradigmas
quebrados e novas visões e teorias podem ser estabelecidas. O que atrai na
produção do conhecimento é a existência do desconhecido, e essa produção requer
sucessivas aproximações em direção ao que se quer conhecer. (KUHN, 1988;
DEMO, 2000)
97
4 ENSINO SUPERIOR NO BRASIL: DAS PRIMEIRAS LETRAS À UNIVERSIDADE
Neste primeiro momento buscamos rever um pouco da história e
desenvolvimento da Educação, em especial do Ensino Superior no Brasil. Uma
história de avanços e retrocessos. Compreender e conhecer esses movimentos
históricos nos auxilia no entendimento da composição do espaço de construção do
conhecimento, e como o Turismo se insere no contexto acadêmico no nível superior.
(NÓVOA, 2004)
Utilizamos como apoio histórico geral o trabalho do historiador Boris Fausto,
que possui um olhar sobre a História do Brasil que se aproxima da proposta
metodológica aqui apresentada, como coloca:
Qualquer estudo histórico, mesmo uma monografia sobre um assunto bastante delimitado, pressupõe um recorte do passado, feito pelo historiador, a partir de suas concepções e da interpretação de dados que conseguiu reunir. A própria seleção de dados tem muito a ver com as concepções do pesquisador. Este pressuposto revela-se por inteiro quando se trata de dar conta de uma sequência histórica de quase quinhentos anos, em algumas centenas de páginas. Por isso mesmo, o que o leitor tem em mãos não é a História do Brasil – tarefa pretenciosa e aliás impossível – mas uma História do Brasil, narrada e interpretada sinteticamente, na óptica de quem a escreveu. (FAUSTO, 1995, p.13, grifo nosso)
A história da educação no Brasil se dá em meio a rupturas marcantes.
Voltemos então a um passado remoto. Aproximadamente 50 anos após o
―descobrimento‖ do Brasil, em Março de 1549, desembarca nas terras da colônia
portuguesa a primeira expedição Jesuítica15. Junto a ela o primeiro Governador
Geral do Brasil, Tomé de Souza, fundando a cidade de Salvador (Bahia – Nordeste),
que passa a ser a sede da coroa na colônia, servindo ao reino. A frente da missão
15
Portugal já utilizava de mão de obra escrava desde o século XV. Com a expulsão dos jesuítas, aumentou a
distância e as barreiras culturais entre os colonos e os indígenas. Nesse período, com maior intensidade no séc. XVII, o regime escravagista configura-se nas províncias, e o comércio e tráfico de escravos, bem como tortura, se prolongam até meados de 1880. A Abolição dos escravos decretada pela Lei Áurea, foi assinada pela Princesa Isabel, em 1888, regente do Império durante viagem de seu pai D. Pedro II ao exterior. Alguns colocam que este período de regime escravocrata no Brasil com ares românticos, de que os colonos e portugueses, senhores aqui instalados, ligados ao setor principalmente primário (mineração - cana de açúcar – mel – algodão - café), possuíam princípios cristãos, influenciados pela fé católica, teriam sido piedosos com os escravos africanos. Com o maior aprofundamento no estudo deste período, fica claro que o período escravagista foi horrendo, desumano, e extremamente cruel. E foi com o sangue de muitos escravos, que os quilombos cresceram em todo o país, simbolizando a esperança da liberdade, tendo como seu maior representante, Zumbi dos Palmares. No período que antecede a proclamação da República e a abolição da escravatura, a crise com as constantes revoltas e pressão Inglesa, levam a uma crise de mão de obra na lavoura. Uma das soluções vistas pelo governo de D. Pedro I era a mão de obra imigrante. O crescimento da imigração, que se espalha por todo o país vai influenciar diretamente a cultura diversa, e a criação de muitas cidades no interior. Imigrantes organizados em colônias, ao contrário do que aconteceu com a proibição que foi imposta aos africanos, podiam manter suas raízes e tradições culturais e estes traços fazem parte, juntamente com a cultura indígena, portuguesa, africana, de nossa rica diversidade cultural. (FAUSTO, 1995)
98
jesuítica o Padre Manoel de Nóbrega, quinze dias após sua chegada instalou-se em
Salvador a primeira escola elementar do Brasil. (CUNHA, 2007)
A Companhia de Jesus foi fundada como uma instituição contra-reforma, com
fins catequéticos, em resposta a expansão crescente do luteranismo na Europa, e
dos ideais de um conhecimento pautado na razão pura, que deslocava a Igreja do
eixo central, através de ideais iluminados. Ao chegarem as terras brasileiras, os
Jesuítas trouxeram mais do que sua fé, e seus preceitos religiosos, trouxeram
consigo métodos pedagógicos. Assim, qualquer que fosse a organização dos povos
nativos, os indígenas, foi subjugada a uma nova ordem, a um novo método, a uma
nova visão de mundo. A catequese dos índios buscava a ―Conversão do Novo
Mundo‖, e ela só seria possível se os futuros fiéis aprendessem a ler e escrever, na
língua do Império.
No Brasil Colonial, vis a vis à modernidade europeia, estabeleceu-se uma herança cultural ibérica através da Igreja Católica com a chegada da ordem dos jesuítas em 1549, que sob a inspiração da Contra-reforma, foi responsável pela catequização indígena e pela educação da elite colonizadora. (OLIVEIRA, 2004, p. 946)
A escola jesuítica buscava suprir ao máximo as necessidade político-sociais
da Coroa, baseados em dogmas de submissão, utilizando da educação não só como
um processo de aculturação através da fé, mas como máquina e ferramenta de
controle social. Sem a concorrência do protestantismo, e as ideias liberais que
tomavam corpo na Europa, a educação jesuítica reproduziu no Brasil o espírito
medieval, com fortes ligações com a tradição escolástica (ligada a lógica
aristotélica). A rígida autoridade e submissão imposta pela ordenação social, não
buscava o livre exame a experimentação, pelo contrário. Segundo Oliveira (2004, p.
946), se revelava um extremo contraste entre ―o homem de livre pensamento, de
visão igualitária e espírito associativo, confiante no conhecimento como instrumento
de transformação do mundo natural‖.
Por outro lado, o projeto educacional jesuítico desempenhou um papel
significativo no momento histórico em que se desenvolveu. A primeira formação de
nível superior de Bacharel em Artes se deu na escola superior fundada na Bahia
pelos jesuítas. Outros elementos importantes dessa presença jesuítica foram a
transmissão de uma cultura ―homogênea‖, a contribuição para o desenvolvimento de
uma identidade cultural. Também não se limitaram as primeiras letras e ao ensino
99
elementar, avançando ao nível superior. Mantinham os cursos de Filosofia e
Teologia, considerado de nível secundário, e o Curso de Ciências Sagradas, de
nível superior, visando a formação de sacerdotes. Importante salientarmos que
muitos padres jesuítas desempenharam um trabalho de amor pela terra, pelos
indígenas, e pela educação, talvez o mais conhecido deles seja o Padre José de
Anchieta. Esse era o único ―sistema‖ de educação da colônia, e perdurou durante
aproximadamente 210 anos. (OLIVEIRA, 2004)
Entre os períodos de 1750 a 1777, o primeiro ministro de Portugal, Sebastião
José de Carvalho e Mello, conhecido como Marquês de Pombal, realizou reformas
que viriam a extinguir este ―sistema‖ educacional com a expulsão da Companhia de
Jesus.
Influenciado pelas ideias iluministas que já se expandiam pela Europa, em
especial na França, Marquês de Pombal propõe o que ficou conhecida como a
Reforma Pombalina. Esta Reforma se insere dentro de um contexto histórico de
―despotismo esclarecido‖, com o objetivo de recuperar o visível atraso de Portugal
em vista a outros países, ela prega uma abertura do ensino às ciências
experimentais (empirismo), tornando o ensino prático e utilitário, despertando cada
vez mais interessados no Ensino Superior. As reformas que se iniciavam em
Portugal, tardiamente, possuíam algumas características, conforme coloca Carvalho
citado por Oliveira:
[...] os métodos e os conteúdos da educação jesuítica foram radicalmente reformulados. A ênfase deslocou-se para as ciências físicas e matemáticas. A nova Faculdade de Filosofia concentrou-se nas ciências naturais – a física, química, a zoologia, botânica, a mineralogia [...] O iluminismo atingia Portugal, finalmente. (CARVALHO apud OLIVEIRA, 2004, p. 947)
Embora o iluminismo tenha atingido com seus ideais a Coroa Portuguesa,
através de seu primeiro ministro Marquês de Pombal, ele demoraria até alcançar as
terras brasileiras. Uma das medidas da Reforma Pombalina foi a expulsão dos
Jesuítas da colônia, onde decorreu-se 13 anos até que foram tomadas as primeiras
providências para a sua efetiva substituição. Nesse período aconteceu um
desmantelamento da estrutura administrativa do ensino jesuítico. Um caos se
estabeleceu, e o ensino era dado pela diversificação de disciplinas isoladas, sem
uma organização definida. Os ideais propostos pela reforma pombalina estavam
distantes da realidade dos mestres e professores das escolas régias recém criadas.
100
Foi nesse período, especificamente em 1759 que acontece a primeira
mudança no que diz respeito aos custos da Educação Brasileira. As escolas dos
jesuítas eram mantidas e financiadas pela contribuição dos usuários e das Igrejas,
através de doações. Nessa reestruturação econômica, instituiu-se o Tributo de
Subsídio Literário, imposto por alvará régio e que permaneceu vigente até o início do
século XIX. Apenas recordando que a colônia portuguesa nesse período era
organizada em um sistema de capitanias hereditárias, que fora implantado por volta
de 1534. (FAUSTO, 1995; CUNHA, 2007)
Mesmo com as reformas incentivadas pelo Iluminismo em Portugal, e
consequentemente na colônia, os ideais iluministas sofreram o que podemos chamar
de secularização. Ou seja, enquanto o iluminismo francês apresentava a laicidade
como um de seus principais pilares, essa laicidade não atinge totalmente o Reinado
Português que, com fortes ligações com a Igreja Cristã, se desenvolveu como um
Estado Secular, onde a cisão entre Estado e Igreja se dá de maneira complexa e
tardia, e não como um Estado Laico. (BOTO, 2010)
Abrimos um parêntese nesse ponto para evidenciar a diferença entre a
secularização e laicidade, por acharmos oportuna essa discussão na atual
conjuntura política, fornecendo elementos que também nos auxiliem na
compreensão de nossa realidade contemporânea brasileira, frente aos últimos
acontecimentos complexos, envolvendo a legitimidade do Estado e de partidos
políticos fundamentalistas, e sua regulamentação e interferência social.
Como já tratamos anteriormente, o Iluminismo foi um movimento e um
fenômeno intelectual originário na Europa. Foi um movimento crítico do absolutismo,
crítico aos privilégios da Aristocracia e do Clero. Colocava em cheque as instituições
consideradas arcaicas, e também trazia consigo o ―conceito de crítica como
reconhecimento das possibilidades, mas também dos limites da capacidade humana
de conhecer‖ (BOTO, 2010, p. 282)
Uma das características primordiais do Iluminismo Português foi a dimensão
religiosa, onde a Igreja convivia com um Estado condutor. Podemos dizer, nas
palavras de Catroga (2006, p.273), que ―toda a laicidade é uma secularização, mas
nem toda secularização é ou foi uma laicidade.‖ São conceitos diferentes, diversos.
É nesta que reside a principal diferença entre a reforma da escola pombalina e os
modelos pedagógicos da França revolucionária.
Enquanto a secularização desloca o papel da Igreja frente a hegemonia do
101
Estado, alterando sua diretriz social, colocando-a em um papel auxiliar, a laicidade
efetua uma radical cisão entre o Estado e a Igreja. ―A laicidade propõe a
institucionalização da diferença entre o espiritual e o temporal, o Estado e a
sociedade civil, o indivíduo e o cidadão.‖ (Catroga, 2006, p. 273)
Segundo Edgar Morin (1988) as reformas realizadas por Marquês tratou-se de
um movimento que progressivamente, por etapas, o Estado viria a ―vassalizar‖ 16 a
Igreja. Aconteceu uma troca de ―Senhores‖. Este aspecto da Reforma Pombalina e
sua influência do atípico Iluminismo português são analisados pelo historiador da
educação Laerte Ramos de Carvalho que coloca:
[...] seu objetivo superior foi criar a escola útil aos fins do Estado, e, nesse sentido, ao invés de preconizarem uma política de difusão intensa e extensão do trabalho escolar, pretenderam os homens de Pombal organizar uma escola que, antes de servir aos interesses da fé, servisse aos interesses da Coroa. (CARVALHO, 1978, p. 139)
Assim, o Alvara Régio de 1759 de Marquês de Pombal extinguiu o sistema
pedagógico jesuítico, instituiu as aulas régias de disciplinas que eram lecionadas
isoladamente, instituiu o sistema de cátedras onde os professores eram escolhidos e
nomeados pelo Reino em regime vitalício, institui a figura do Diretor, a quem os
docentes deveriam ser subordinados. Outra característica foi a divisão entre os
estudos menores, elementares e os estudos maiores que seria o equivalente ao
nível superior. O Alvara ao tratar da estrutura, organização, comportamento e
conteúdo a serem utilizados pela escola, refere-se também ao exercício do
magistério como profissão. Este foi o primeiro documento regulamentar da educação
brasileira, e também tratava do conhecimento, ao direcionar e selecionar a ênfase
em determinadas temáticas e métodos considerados científicos. (BOTO, 2010;
CUNHA, 2007)
No ano de 1771 Marquês elaborou o que seria considerada a reforma dos
estudos maiores ou universitários. As críticas tecidas no ―Compêndio Histórico do
Estado da Universidade de Coimbra” revelava os danos causados pela Companhia
de Jesus no ensino das ‗sciencias‘, entre os professores e diretores, e nas
publicações e materiais pedagógicos que foram utilizados. Assim era necessário,
não somente a crítica, mas uma alteração estrutural administrativa e pedagógica. Na
16
Eufemismo utilizado por Edgar Morin, fazendo referência ao Feudalismo, onde existiam os Vassalos e
Senhores feudais, membros elitizados da organização social desse período.
102
reforma da Universidade feita por Pombal, foram cedidas aos novos professores
catedráticos de Coimbra e Évora as antigas moradias dos jesuítas expulsos. (BOTO,
2010)
As mudanças acontecidas com a Reforma Pombalina no âmbito acadêmico,
tanto na transformação de métodos pedagógicos, quanto na abordagem do
conhecimento foram extremamente significativas. Os cursos se concentravam na
área de Direito e Medicina. Assim, como coloca Carlota Boto (2010):
Enfim, recuperar o atraso português era interagir com a transformação do estado das coisas em áreas estratégicas. Assim eram a educação (tanto os estudos menores quanto os maiores), a justiça e a medicina. Daí o privilégio dado pelo Compêndio tanto a formação jurídica quanto ao ensino da medicina. Reformar os estudos universitários – bem como reformar a instrução das primeiras letras e secundária – era o passaporte para a Reforma do Estado; um Estado que se pretendia incluído em seu tempo – competitivo e potente. (BOTO, 2010, p.296, grifo nosso)
Um importante fato que temos de destacar é que a Coroa Portuguesa proibia
a existência de Universidades no Brasil colônia, diferentemente das colônias
espanholas que implantaram nas colônias as primeiras instituições de nível
universitário ainda no século XVI. Reflexo também do próprio sistema universitário
dos Reinos: enquanto a Espanha já possuía pelo menos seis famosas
Universidades, Portugal possuía até o momento somente uma Universidade –
Coimbra e posteriormente a Universidade de Évora. Assim, Portugal fornecia um
número reduzido de bolsas a filhos de colonos para que fossem estudar em
Coimbra, e permitia que os jesuítas mantivessem o ensino superior em Filosofia,
Teologia e Artes. Esta proibição desempenhava papel importante na demarcação e
manutenção da hegemonia portuguesa, como coloca Cunha:
Com a proibição da criação de universidades na colônia, Portugal pretendia impedir que os estados universitários operassem como coadjuvantes de movimentos independentistas, especialmente a partir do séc. XVIII, quando o potencial revolucionário do iluminismo se fez sentir em vários pontos da América. (CUNHA, 2007, p. 152)
Assim, somente com a chegada da Família Real Portuguesa e da Corte de
Lisboa, em 1808, a paisagem cultural e educacional se alteraria. Diante da pressão
estrangeira no território português pelas tropas francesas de Napoleão, a sede do
governo transfere-se para o Brasil, que passa a adquirir o status de Reino Unido a
Portugal e Algarve. Na esquadra foram trazidos os tesouros da coroa, bem como os
103
mais altos membros da aristocracia civil, representantes eclesiásticos e militares, e
os livros da Biblioteca Real. Foram abertos os portos para o comércio às nações
amigas e dado amplo incentivo às manufaturas. Também foram criados meios de
hospedagem, a fim de atender a demanda de visitantes e de novos moradores do
Reino Unido. Instituições econômicas e financeiras, administrativas e culturais até
então proibidas foram criadas. (FAUSTO, 1995; CUNHA, 2007)
O agora Reino Unido a Portugal passa a viver um período de efervescência
cultural. A sede do governo já havia sido transferida de Salvador para o Rio de
Janeiro. Foram criados o Museu Real, Jardim Botânico e a Imprensa Régia. D. João
se desfazendo de aproximadamente 60.000 títulos de sua biblioteca pessoal funda a
primeira Biblioteca Pública no Brasil em 1810. O Ensino superior brasileiro, a
Universidade, espaço privilegiado na construção do conhecimento vão descender
em múltiplos aspectos desse momento histórico e político. As Instituições de Ensino
Superior descendem da multiplicação das instituições criadas no início do séc. XIX,
onde o ensino superior sofre uma tardia refundação. (CUNHA, 2007; TRIGO, 1991)
Uma nova organização social era criada, e surgem cursos superiores com
objetivos profissionais práticos. Dentre eles destacam-se a Escola Militar de
Aplicação, que se dedicava a formação de engenheiros civis e preparação para a
carreira militar. Foram criados cursos de orientação médico/cirúrgico na Bahia e no
Rio de Janeiro, que foram o embrião das primeiras faculdades de medicina. Ainda
nessa época a presença da Missão Cultural Francesa estimulou a criação e
desenvolvimento das Belas Artes, através da Real Academia de Desenho (Pintura,
Escultura, Arquitetura Civil) em 1820. Vale lembrar que a mulher não estava inserida
no contexto da educação, em nenhum dos níveis. Elas aprendiam com suas mães a
serem boas cuidadoras, donas de casa, boas esposas, e uma curta alfabetização.
Posteriormente, por volta de 1847 elas são inseridas em colégios somente para
mulheres, principalmente ligados a conventos. No nível secundário, elas seriam as
professoras do nível fundamental e elementar através da formação normal – ou seja,
normalistas – voltadas para o magistério. (CUNHA, 2007; BOTO, 2010)
O ensino continuou a se dar de forma isolada, em sistema de cátedras, em
escolas distribuídas principalmente em pontos estratégicos geograficamente
(Nordeste – antiga sede da coroa e Sudeste – sede do reino Unido).
A introdução do Ensino superior no Brasil faz parte de um processo histórico,
e tem como principal marca a chegada de D. João VI. As influências dessa nova
104
organização política e educacional teria seu peso nas transformações, contribuindo
para o processo de autonomia política. Como coloca OLIVEIRA, ―com a vinda de D.
João VI, portanto, nascia o ensino superior brasileiro e o processo de autonomia
política que iria culminar na Independência do país décadas depois‖. (2004, p. 947)
Faz-se necessário abrirmos mais um parêntese e falarmos de relações de
trabalho que se estabelecem no Brasil colônia e no Brasil Império. O trabalho era
compulsório, ou seja, obrigatório e necessário. Esse trabalho se voltava tanto para a
extração de recursos naturais quanto para a agricultura. A mensagem cristã vem de
encontro e subsidia a compulsão pelo trabalho como única forma de dignificação do
homem. Músicos, artistas, pintores, a Arte vem a ser diminuída, e ser artista seria
sinônimo de um desocupado. Durante alguns anos era proibido, por exemplo, andar
nas ruas do Rio de Janeiro com um pandeiro na mão, sendo sinônimo de
malandragem, e esta não agradava em nada a elite que se formava.
Porque se apelou para uma relação de trabalho odiosa a nossos olhos, que parecia semimorta, exatamente na época chamada pomposamente de aurora dos tempos modernos? Uma resposta sintética consiste em dizer que nem havia grande oferta de trabalhadores em condições de emigrar como semi-dependentes ou assalariados, nem o trabalho assalariado era conveniente para os fins da colonização. Dada a disponibilidade de terras, pois uma coisa era a concessão de sesmarias, outra sua efetiva ocupação, não seria fácil manter trabalhadores assalariados nas grandes propriedades. Eles poderiam tentar a vida de outra forma, criando problemas para o fluxo de mão de obra para a empresa mercantil. (FAUSTO, 1995, p. 48)
Assim, o Brasil que brada as margens do Ipiranga pela independência ou
morte em 1822 possuía apenas algumas escolas técnicas superiores, destituído de
qualquer forma de organização da educação escolar. A partir do Império de D. Pedro
I os cargos políticos e administrativos são transferidos a uma elite beneficiada,
muitos deles ―patrocinadores‖ do movimento independentista, com o acréscimo de
―letrados‖, ou seja, intelectuais, encarregados de preencher o quadro funcional do
Estado que se criava. Assim, em 1827 são fundadas as faculdades de Direito em
São Paulo e Recife, passando a formar os futuros funcionários do governo. (CUNHA,
2007)
Veja que até o momento estamos falando de faculdades, ou seja, cursos
isolados, oferecidos em escolas técnicas superiores, que não se articulavam de
maneira alguma entre si, muito diferente do conceito de Universidade, onde existem
estruturas articuladas que se inter-relacionam, como por exemplo: centros
105
acadêmicos, departamentos, áreas do conhecimento, sub-áreas, etc.
Em 1831 o Imperador promulga um Ato adicional que seriam as primeiras
medidas de descentralização administrativa, e que acaba alterando a estrutura do
ensino no país. Assim se estabelece a seguinte estrutura: o ensino superior fica a
cargo do poder central em todo o país; os demais níveis, ensino primário e
secundário, ficam a cargo das províncias – Exceto o Colégio Pedro II, em
homenagem ao nosso segundo governante imperial. O Colégio Pedro II era o
modelo para as escolas dos estudos menores que deveriam se desenvolver nas
províncias. A carência de recursos de muitas províncias, a falta de investimento e
interesse das elites na educação primária, ou seja, na educação voltada para as
camadas mais humildes, impossibilitou a organização de um sistema eficiente de
escolas. O ensino secundário foi no geral assumido pela iniciativa particular, em
especial da igreja, e o ensino primário ficou abandonado. Oliveira nos dá um
panorama da educação no Brasil ao fim do império (Imperialismo):
Ao final do Império, o quadro geral do ensino era o seguinte: poucas escolas primárias (com 250 mil alunos para um país com cerca de 14 milhões de habitantes, dos quais 85% eram analfabetos), liceus provinciais nas capitais, colégios particulares nas principais cidades, alguns cursos normais e os cursos superiores que forjavam o projeto elitista (para a formação de administradores, políticos, jornalistas e advogados), que acabou se transformando num elemento poderoso de unificação ideológica da política imperial. (OLIVEIRA, 2004, p. 949)
Nesse período Karl Marx também havia iniciado sua revolucionária trajetória
no campo das ciências sociais. Seus livros e manuscritos só seriam traduzidos do
Alemão para o Inglês, e posteriormente para o Português, mais de um século
depois. Muitos destes materiais ainda não foram traduzidos e estão disponíveis
somente em Alemão e alguns em Inglês. A tradução do Inglês trouxe muitos
problemas, inclusive para Sigmund Freud que só veio a ter suas obras completas
traduzidas do Alemão pra o Português em 2010. Paul Lafargue, posteriormente,
escreveu em 1880 e teve seus escritos traduzidos e publicados no Brasil somente
em 1980, como citamos anteriormente.
4.1 A TRANSIÇÃO REPUBLICANA
As ideias de Augusto Comte encontraram espaço nos movimentos
106
republicanos que se caracterizavam fortemente pela presença de militares,
classificado pelos historiadores como Movimento Tenentista. As influências do
Positivismo, em especial das ideias de Comte, era reflexo de um movimento que
acontecia em outras partes do mundo. Os ideais republicanos nacionalistas vão
encontrar no Positivismo chão firme para desenvolverem a República. (FAUSTO,
1995)
Em 1881 foi fundada a Igreja Positivista do Brasil, também conhecida como
Templo da Humanidade, sua sede localiza-se atualmente na Avenida da Glória, n°74
– Rio de Janeiro. Este foi o primeiro templo construído para difundir ao mundo a
chamada Religião da Humanidade. Assim, as influências e avanços no campo do
conhecimento e das ciências encontram-se com os projetos de construção política e
social. O que não era visto com bons olhos pela Igreja tradicional cristã, uma vez
que deslocava ainda mais o seu papel de importância na vida social. (NÓVOA, 2004;
HENNING, 2012)
Ele organizou o saber humano, baseado na ciência, sem quimeras teológicas ou metafísicas, distinguiu os conhecimentos abstratos da ciência dos conhecimentos concretos da tecnologia, classificou as ciências: Matemática, Astronomia, Física, Química, Biologia, Sociologia e Moral ou Psicologia Positiva, completando a escala enciclopédica, mediante a fundação das duas últimas. (IGREJA POSITIVISTA DO BRASIL, 2012, http://www.igrejapositivistabrasil.org.br/)
O discurso positivista foi utilizado para legitimar a criação da República
Brasileira. Imbuídos de um forte espírito nacionalista, Benjamim Constant, discípulo
da religião positivista, no dia 15 de Novembro de 1889 foi reconhecido como
fundador da República dos Estados Unidos do Brazil. Os Símbolos Nacionais, a
Bandeira Brasileira, por exemplo, refletiram esse pensamento. O autor da Bandeira
Nacional Brasileira foi o ―Apóstolo da Humanidade‖ Raimundo Teixeira Mendes,
segundo os preceitos norteadores da Igreja Positivista:
Seu lema fundamental é "O Amor por princípio e a Ordem por base; o Progresso por fim". Suas regras básicas são "Viver para outrem" e "Viver às claras". Como divisa Política, abrangente e sociológica, aconselha "Ordem e Progresso". (IGREJA POSITIVISTA DO BRASIL, 2012, http://www.igrejapositivistabrasil.org.br/).
Após a Proclamação da República, a primeira Constituição dos Estados
Unidos do Brazil - República, datada de 1891, instituiu o sistema federativo de
governo, e, consequentemente, a descentralização do ensino, em uma progressiva
107
descentralização do poder. A transição foi influenciada diretamente pelos ideais
liberais burgueses, onde é dada a educação a missão de construção da sociedade.
A União Federativa, ou seja, ao governo federal fica reservado o direito de criar
instituições de ensino superior e secundário nos estados e no distrito federal; aos
Estados cabe prover e legislar sobre a educação primária e o ensino profissional
(técnico) em seus respectivos estados. (OLIVEIRA, 2004; CUNHA, 2007; FAUSTO,
1995)
É interessante destacarmos a presença de diversas ideologias,
direcionamento filosófico, e suas influências na constituição do Estado Nação
Brasileiro. A história da Educação se faz essencial no estudo da lógica de
identidades múltiplas. Esta multiplicidade cultural encontra espaço na discussão
voltada para os aspectos culturais de determinada localidade, se aderindo ao
paradigma da cultura. O Turismo tem responsabilidade em evidenciar estes
aspectos culturais, primando pela ética, de forma a minimizar os impactos negativos
advindos da atividade. (NÓVOA, 2004)
Percebe-se a herança do sistema dual do regime anterior, que amplia a
distância entre a educação da elite brasileira (escolas secundárias acadêmicas e
escolas superiores) da educação do povo (educação primária e profissional). Mas, a
emergência de um novo sistema de organização político econômica possibilitou
transformações nas relações sociais, ou seja, existe um aumento na complexidade
das relações a partir do surgimento de novos estratos sociais. Instituições simplistas
logo mostrariam sua fragilidade frente a estas transformações. Assim a transição
republicana é marcada por um período repleto de tentativas de reformas na
educação, no qual o princípio da dualidade social é comprometido pelo ―crescimento
de complexas e diversificadas camadas sociais‖ (OLIVEIRA, 2004, p. 949).
Nos anos seguintes o governo fez algumas tentativas de implantar reformas,
marcadas por avanços e retrocessos. As primeiras reformas propostas por
Benjamim Constant no campo da educação foram rejeitadas. Em 1911 a Lei
Rivadário Correia dá autonomia aos estabelecimentos particulares para criarem seus
cursos. Logo depois a Lei Maximiliano Correa re-oficializa o ensino, programa uma
reforma no Colégio Pedro II, que até então gozava do privilégio de ingresso direto no
ensino superior, e regulamenta o ingresso nas instituições de ensino superiores,
através dos exames vestibulares. (CUNHA, 2007)
Em 1925, uma das últimas tentativas do estado em reformar a estrutura da
108
educação residiu na tentativa de cooperação entre os Estados e a União para a
promoção da educação primária e eliminação de exames parcelados. As frustradas
reformas foram ações isoladas, ou seja, não fazia parte de um plano, de um
planejamento, de um projeto de educação. (CUNHA, 2007; OLIVEIRA, 2004)
Toda essa discussão acerca da educação é realizada em um período de
transição republicana importante, trazendo influências na organização social
brasileira. Um momento de rearticulação das elites, de estruturação social onde o
próprio regime em implantação faz surgir propostas de readequação da educação
atendendo aos caminhos da nova ordem ―democrática‖ que se implantava.
(FAUSTO, 1995; CUNHA, 2007)
Nesse período de transição, como vimos anteriormente, a partir da chegada
de D. João VI em 1808, muitas foram as tentativas de organizar a Universidade
Brasileira. Dentre os últimos desejos no Imperador D. Pedro II, foi manifestada a
intenção clara de criar as duas primeiras Universidades. Uma localizada no Norte, e
outra no Sul do país. Mesmo assim, o ensino superior continuou fragmentado, sendo
realizado em faculdades e institutos isolados em todo o país, concentrado na
formação profissional nas áreas de Direito, Medicina e Engenharia. Além das
concentrações nestas áreas, as iniciativas mais efetivas de organização do ensino
superior eram geograficamente posicionadas. Fortes instituições cresciam em Minas
Gerais; na Região Nordeste se destacava o estado da Bahia e, posteriormente, o
Ceará. Algumas iniciativas no Norte, como em Manaus, que não perduraram. Na
região Sul do país eram mais consistentes, embora não articuladas. Era dominante a
presença das faculdades na região Sudeste do País. (CUNHA, 2007; FAUSTO,
1995)
As reformas que se deram no período (1911 – 1925) através de leis
orgânicas, ficaram mais conhecidas como Reforma Rivadário Correia, e: criava o
Conselho Superior de Ensino, ligado ao governo Federal que buscava legislar sobre
o ensino superior; extinguia os privilégios de entrada direta na Universidade,
instituindo os exames vestibulares; o Estado fica responsável pelo ensino primário e
secundário, que passa a preparar os alunos para ao seu término, se candidatarem a
vagas nas instituições de ensino superior isoladas de todo o país. O currículo toma
um caráter acadêmico e propedêutico, e as vagas nas faculdades existentes eram
extremamente limitadas e elitizadas. (CUNHA, 2007; OLIVEIRA, 2004)
Em 1920, a partir da reunião das faculdades isoladas de Medicina, Direito,
109
Engenharia, Agronomia, Farmácia existentes no Distrito Federal, até então
localizado no Estado da Guanabara, na cidade do Rio de Janeiro, cria-se a primeira
Universidade Brasileira. A Universidade Federal do Rio de Janeiro (1937 passa a se
chamar Universidade do Brasil) foi a primeira IES a receber o ‗status‘ duradouro de
Universidade, e tinha a função de servir de modelo para as demais instituições.
(CUNHA, 2007)
Esta aglutinação das faculdades isoladas em Universidades construiu uma
organização inicial, trazendo em si características marcantes dos processos
históricos que levaram a sua constituição. Foi criado na Universidade um Conselho
organizador – o Conselho Universitário. Esse Conselho era composto por: Diretores
das Faculdades isoladas; Dois professores Catedráticos de cada instituição. O
Diretor geral dos Conselhos Universitários era escolhido diretamente pelo Presidente
da República, assim como o Reitor da Universidade. Para se constituir como espaço,
necessitava de alto investimento financeiro. Com subsídios fornecidos
principalmente pelo governo dos Estados, e esforço de professores catedráticos, que
abriram mão de parte de sua remuneração para criar um fundo de organização da
Reitoria, estrutura-se a Universidade Brasileira. (CUNHA, 2007)
Mas, a tão sonhada autonomia universitária ainda não havia se consolidado
no concreto, como bem observa Luiz Antônio Cunha:
O Conselho Universitário, formado pelos diretores das faculdades integrantes e por dois professores catedráticos de cada uma delas, era mais uma instância simbólica do que efetiva. Os recursos governamentais eram destinados diretamente a cada faculdade, cujos diretores continuavam a ser escolhidos pelo Presidente da República, mediante cooptação, assim como o reitor da universidade. Por outro lado, a persistência do mecanismo de criação pelo governo de cátedras e, na prática, do currículo de cada curso, em função do registro dos diplomas das profissões regulamentadas em lei, reduzia a autonomia universitária a não mais que uma palavra decorativa (CUNHA, 2007, p. 163).
A partir desta análise, vemos que as Reformas iniciadas no período
Pombalino (Diretor instituído pela coroa – Cátedras de Disciplinas – Determinação
de conteúdo acadêmico), bem como os avanços e retrocessos na educação
realizados nos regimes anteriormente instituídos, exercem uma forte herança na
composição do espaço, na construção da universidade em terras brasileiras.
(SANTOS; CASALI, 2009)
A Década de 20 sofreu as fortes influências que alteraram o cenário Mundial
110
após o fim da Primeira Grande Guerra Mundial. A Europa entra em uma crise em
virtude do desmantelamento financeiro, político, estrutural e humano que se dá ao
fim da Guerra. Os Estados Unidos fortalecem sua estrutura econômica e política,
exercendo grande influência política liberal, econômica e cultural, em especial na
América, que em sua contramão leva a uma grande quebra econômica, culminando
na crise de 1929. Nos anos seguintes Adolf Hitler subiria ao poder, e, disseminando
o Nazi-Fascismo como orientação ideológica nacional e política, culminando
posteriormente na Segunda Grande Guerra Mundial. (FAUSTO, 1995)
Além da nova configuração mundial política e econômica, a década de 20 se
mostra como uma década de expansão na área de comunicação – do rádio, e dos
transportes – em especial aéreo e automotivo. Começava a se desenhar o que
alguns viriam a chamar de ―Indústria Cultural‖, estimulado pelo desenvolvimento
tecnológico na área de comunicações e dos transportes que passa a relativizar as
distâncias geográficas e sociais de maneira ainda mais intensa.
Essa progressiva transição industrial, tardia no Brasil, teria reflexo nas
relações de trabalho, até esse momento desumanas e mais ligadas ao setor primário
e terciário. Com a expansão da indústria estas relações se tornam ainda mais
complexas e conflituosas. No Brasil, podemos destacar alguns fatos que revelam a
influências destas mudanças. Em 1920, após a instituição oficial da primeira
Universidade Brasileira, se desenvolveu o embrião das primeiras associações de
classes privadas, inicio de um movimento de caráter sindicalista, voltadas para o
desenvolvimento e fomento de equipamentos ligados ao turismo. Em 1921 surgia a
União de Hotéis, Restaurantes, Bares, Confeitarias, Cafés e Similares, lançando a
base do futuro Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e similares na cidade de
São Paulo. (TRIGO, 1991)
Em 1922 acontece no Teatro Municipal de São Paulo a ―Semana de Arte
Moderna‖, que reuniu expoentes artistas das mais diversas áreas, expondo sua arte
contemporânea. O objetivo era renovar o espírito cultural da cidade paulista, e esse
movimento trouxe impacto nas artes em todo o país, dado a representatividade das
obras e de seus artistas. A pintura, escultura, arquitetura, desenho, grandes nomes
da literatura nacional como Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Manuel Bandeira
e da música como o consagrado Heitor Villa Lobos. São iniciadas as primeiras
transmissões de rádio no Brasil. (FAUSTO, 1995)
Em 1923, foi inaugurado talvez um dos mais conhecidos hotéis brasileiros, o
111
Copacabana Palace no Rio de Janeiro, inaugurado pelo na época Presidente
Epitacio Pessoa, e seria a hospedagem do Rei I da Bélgica em sua visita ao Brasil.
(TRIGO, 1991)
A expansão nos transportes acontece no setor portuário, com inaugurações
de novos portos no Rio Grande do Sul e Bahia. Em 1925 acontece a primeira viagem
de avião entre Brasil e Buenos Aires, e uma crescente expansão do transporte
aéreo. Via terrestre, começavam a chegar com maior intensidade os veículos
automotivos, das indústrias Ford, o mais conhecido foi o modelo lançado em 1927
no Brasil, conhecido como Ford Bigode. Em 1927 é fundada a empresa Varig. Nesse
interim surge uma reunião entre os empresários e interessados do setor, em
especial dos meios de hospedagem e dos transportes, que em 1923 funda a
Sociedade Brasileira de Turismo. (TRIGO, 1991)
Já na década de 1920, implantando o Monumento Rodoviário para assinalar a política do "presidente-estradeiro" Washington Luís, que tardiamente chegava ao país, a Sociedade Brasileira de Turismo combateu a retrógrada campanha contra as "estradas de bobagem". [...] Nessa década, quando foguetes de sinalização e prancha para atravessar cheias eram equipamentos obrigatórios dos motoristas brasileiros, as placas de informações turísticas e o Plantão Rodoviário da Sociedade - que premiava radiotelegrafistas das Secretarias de Agricultura para que informassem sobre condições das estradas, anteciparam-se aos poderes públicos em informação, sinalização e cartografia. Sua Carta Rodoviária do Brasil, a primeira a ser publicada no país, foi tão precisa e inédita, que os originais cartográficos foram doados ao Exército. (TOURING CLUB DO BRASIL, http://www.touring.com.br/historia.php , 2011)
Inicialmente voltada para a divulgação dos recursos e potenciais atrativos do
país à elite brasileira, em 1926 a Sociedade Brasileira de Turismo filia-se a
organismos internacionais, e passa a se chamar Touring Club do Brasil, voltando-se
também para a divulgação do Brasil no exterior. A força desta entidade muitas vezes
é minimizada nos estudos do desenvolvimento do turismo no Brasil, o que pode ser
um engano, visto que em 1934 a Touring do Brasil é nomeada pelo Itamaraty como
órgão oficial de fomento do Turismo na América do Sul.
O destino inicial escolhido pela Touring Club do Brasil reunia a infraestrutura
de equipamentos turísticos em desenvolvimento, aliado a beleza natural e cultural –
Rio de Janeiro. Ela foi a maior responsável por apresentar ao mundo as belezas da
Pérola Carioca – a Praia de Copacabana, e a ginga do brasileiro – O Carnaval do
Rio de Janeiro.
112
A filiação aos organismos internacionais de turismo, em 1926, deu à Sociedade o direito de se chamar Touring Club do Brasil e abriu canais para divulgar o país no exterior. Com o Baile do Teatro Municipal, os concursos de músicas carnavalescas, os banhos de mar a fantasia e o corso pela Avenida Atlântica, o Touring começou a criar o mito internacional do Carnaval do Rio e mostrou ao mundo uma nova pérola carioca - Copacabana. [...] Os jornais da época reconheciam que os folhetos em três idiomas publicados pelo Clube, as reportagens nas revistas especializadas dos Clubes estrangeiros e os estandes do Touring nas grandes exposições internacionais, além da sua obra civilizadora nos portos do Rio e Salvador, fizeram do Brasil escala obrigatória de todos os transatlânticos de turismo e, do Rio, o porto onde por mais tempo se demoravam essas luxuosas cidades-flutuantes. (TOURING CLUB DO BRASIL, http://www.touring.com.br/historia.php , 2011)
Parte do arquivo de nossa pesquisa, encontramos a placa com distâncias e
localizações de estradas, em Bronze, presente da Touring do Brasil para a cidade de
São Paulo em 1934, mesmo ano da fundação da USP.
FIGURA 07 – Placa de Bronze ofertada pela Touring Club do Brasil a São Paulo – SP em 1934.
Legenda: Restaurada em 2007. Localizada na Praça da Sé em frente à Catedral Metropolitana.
Fonte: Da Pesquisa.
Assim, com as colocações acima, a década de 1920 que antecede a subida
ao poder do Presidente Getúlio Vargas tem uma concreta importância para o
desenvolvimento do Turismo, embora poucos estudos abordem esta década com a
devida atenção, dando maior ênfase as transformações políticas e econômicas da
década de 60 e 70, principalmente no que concerne a inserção do turismo como
113
campo de interesse no ensino superior e técnico. Voltaremos nesta questão durante
nossa análise. Ao fim da década de 20 o Brasil já respirava os ventos de cultura,
viagens e lazer. (TEIXEIRA, 2007; TRIGO, 1991)
O panorama do ensino superior brasileiro ao final da década de 1920
apresentava dezenas de institutos isolados de ensino superior, e apenas duas
Universidades: A Universidade do Rio de Janeiro (1920), e a Universidade de Minas
Gerais (1927). Na região Sul do país, a Universidade do Rio Grande do Sul (a ser
reconhecida como universidade em 1934) foi uma das únicas instituições que seguiu
um caminho diferente, a partir da diferenciação de uma só escola, uma só faculdade,
a Escola de Engenharia de Porto Alegre. Esta escola data sua fundação em 1896, e
trouxe cerca de 50 professores estrangeiros, na sua maioria Alemães. Eram
estreitas as ligações do ensino superior brasileiro com as escolas europeias, em
especial, a França, e a instituição de ensino superior que se desenvolve no rio
Grande do Sul se aproxima mais da referência “Technische Hosschule” da escola
Alemã. A Escola Alemã exerceu muitas influências no Sul do Brasil, em especial no
Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Retomaremos essa influência posteriormente.
(CUNHA, 2007)
Após a criação da segunda Universidade, em 1928 o governo federal baixou
o Decreto 5.616 que deu autonomia aos estados para criarem Universidades
Estaduais, desde que totalmente sujeitas ao mesmos moldes e controle das
Universidades federais. Este decreto ainda não permitiu a criação de IES
particulares, que neste momento concentram suas atividades em especial no nível
secundário e técnico. A dita autonomia era relativa e as exigências feitas para que o
status de Universidade fosse adquirido exigia altos investimentos patrimoniais,
financeiros e humanos. (CUNHA, 2007)
No Brasil, a crise mundial (1929) afetou em especial a cultura cafeeira, de
forma brusca, o que demandou medidas severas por parte do governo federal, e
veio a desagradar principalmente o Estado de São Paulo, que teve sua importância
diminuída com a subida de Getúlio ao poder.
[...] Comecemos pelo início dos anos 30, quando o governo provisório tratava de se firmar, em meio a muitas incertezas. A crise mundial trazia como consequência uma produção agrícola sem mercado, ruína de fazendeiros, o desemprego nas grandes cidades. As dificuldades financeiras cresciam: caía a receita das exportações e a moeda conversível se evaporara. No plano político, as oligarquias regionais, vitoriosas em 1930 procuravam reconstruir o Estado nos velhos moldes. Os ―tenentes‖ se
114
opunham a isso e apoiavam Getúlio Vargas em seu propósito de reforçar o poder central. Ao mesmo tempo, porém, representavam uma corrente difícil de controlar que colocava em risco a hierarquia no interior do Exército. (FAUSTO, 1995, p. 332)
Ao mesmo tempo que transformações profundas aconteciam no Estado
Brasileiro, crescia no cenário internacional uma nova dimensão de ideário liberal,
que se desdobrava para além do individualismo e também trazia consigo a idéia de
reconstrução da sociedade, que ao atingir níveis mais complexos de organização,
necessitava capacitar o homem para agir neste meio social, de maneira pragmática,
transformando-o. Essa tendência neo-liberal iria se expressar de forma bastante
intensa na pedagogia pragmática, baseada nos pensamentos de John Dewey,que
tem sua corrente mais significativa no Brasil através do Movimento que ficou
conhecido como ―Escola Nova‖, ou Movimento Escola-novista.(OLIVEIRA, 2004)
Os pensamentos de John Dewey, propunham uma educação escolar
reformista, necessários a uma sociedade com ―tendências a produzir privilégios e
desigualdades, mas que subsiste pela expectativa de mudança e ascenção social‖
(OLIVEIRA, 2004, p. 951). O principal responsável pela disseminação do
pensamento de John Dewey no Brasil foi o grande educador e mestre Anísio
Teixeira.
A partir dos anos 30 é constante e definitiva a referência Deweyana no pensamento brasileiro veiculada por Anísio Teixeira (1900 – 1971), um dos mais importantes filósofos da educação no Brasil, cujas ideias propagadas em suas obras acabam por atingir outros marcantes intelectuais como, por exemplo, Paulo Freire (1921 – 1995), em anos posteriores. (HENNING, 2011, p. 04)
As portas da Revolução de 1930, ganha força o movimento tenentista, na sua
maioria composto por militares e intelectuais, que despertou imediatamente a
preocupação da Igreja. Eram ―ideias baseadas na associação do liberalismo com o
positivismo, proprositora da substituição da moral religiosa pela crença nos poderes
da técnica e da ciência como critérios da organização da vida e da ação social‖.
(OLIVEIRA, 2004, p. 952)
Os ideais escola-novistas foram incorporados pelo movimento tenentista. A
Igreja enxergava no movimento a associação de perigosas idéias Positivistas,
Empíricas e Liberais, que viriam a diminuir, ou até mesmo extinguir a relevância
social da Igreja.
115
4.1.1 A Revolução de 1930 e a Década de 1950
Mesmo com algumas divergências internas, o Movimento tenentista auxilia na
subida de Getúlio Vargas17 ao poder, no que ficou conhecido como Revolução de
1930, onde Getúlio assumiu como Presidente no lugar de Júlio Prestes, através de
um golpe de estado. Se iniciava um novo momento na política brasileira, que teria
como protagonista seu dirigente de Estado: Getúlio Vargas. (FAUSTO, 1995)
Júlio Prestes venceu as eleições em 1° de março de 1930. [...] o resultado das eleições parecia marcar o fim da cisão regional. Em entrevista ao Jornal Carioca A Noite (19 de Março de 1930), Borges de Medeiros reconheceu a vitória de Júlio Prestes, declarando ainda que o Rio Grande do Sul se disporia a colaborar com o novo governo, caso fosse convidado. Mas nem toda a oposição pensava assim. Começa a aparecer como alternativa o ponto de vista dos chamados ―tenentes civis‖, que queriam uma resposta através das armas. (FAUSTO, 1995, p. 321)
O Movimento Tenentista viu em Getúlio Vargas as vias de implantação de
seus ideais, uma forma de acesso ao poder central. Mas, ao ser instituído
Presidente, Getúlio Vargas se mostrou um líder: autoritário, centralizador e
controverso. Os cinco primeiros anos do mandato de Vargas foram muito
conturbados, com a convivência de situações políticas ambíguas em suas relações
externas, internas e endógenas. Internamente, podemos destacar como principal
resistência a Coluna Luís Carlos Prestes.
[...] A única exceção importante foi Luís Carlos Prestes. Em maio de 1930 o nome de maior prestígio entre os ―tenentes‖ lançou um manifesto no qual se declarava socialista revolucionário e condenava o apoio às oligarquias dissidentes. Na sua concepção, as forças em luta eram apenas um joguete da luta maior entre o Imperialismo britânico e norte-americano, pelo controle da América Latina. (FAUSTO, 1995, p. 322)
Na política externa, a ascensão da Alemanha Nazista culminou na II Grande
Guerra Mundial, da qual o Brasil não participou ativamente até 1944. A aproximação
política e econômica entre Brasil e os Estados Unidos da América era clara e
―necessária‖. Em um mundo polarizado é necessário se posicionar. O Brasil se
posiciona junto aos Estados Unidos e as forças da Aliança, orientadas por um ideal
17
Subindo ao poder em outubro de 1930, Getúlio Vargas permaneceu por quinze anos consecutivos, como chefe
de que se pode chamar de Governo Provisório, presidente eleito pelo voto indireto e ditador. Foi deposto em 1945, principalmente pelo próprio movimento que auxiliou sua subida ao governo central, voltando à presidência pelo voto popular em 1950, não chegando a completar o mandato, suicidou-se em 1954. (FAUSTO, 1995)
116
capitalista-liberal, contra as forças do Eixo, representada pela orientação Nazista,
que se opunha a hegemonia capitalista e ao comunismo. É durante as décadas de
30 e 40 que se estreitam ainda mais as relações entre Brasil e Estados Unidos. Com
o fim da guerra em 1945 aconteceria uma reestruturação política internacional.
(FAUSTO, 1995)
A política centralizadora de Vargas foi refletida em suas ações
administrativas, com a criação de inúmeras instituições e ministérios. Este governo
centralizador logo traria problemas, visto que os estados teriam seu poder
oligárquico relativizado.
[...] o novo governo tratou de centralizar em suas mãos tanto as decisões econômico-financeiras como as de natureza política. Desse modo, passou a arbitrar os diversos interesses em jogo. O poder do tipo oligárquico, baseado na força dos estados, perdeu terreno. Isso não quer dizer que as oligarquias tenham desaparecido, nem que o padrão de relações sociopolíticas baseado na ―troca de favores‖ deixasse de existir. Mas a irradiação agora vinha do centro para a periferia, e não da periferia para o centro. (FAUSTO, 1995, p. 327)
Emerge um intenso debate na esfera educacional sobre quais seriam os
rumos da educação em um país as portas da modernidade democrática. O principal
documento que demonstra a preocupação sobre os rumos da educação brasileira
ficou conhecido como ―Manifesto dos Pioneiros da Educação‖ – elaborado pelo
movimento da Escola Nova.
Pelo vislumbre da democracia e do progresso, atendendo às aspirações das classes médias e, em parte, ao conservadorismo da classe dominante, o pensamento escola-novista foi assimilado por vários educadores brasileiros, com divergências apenas no que diz respeito à orientação geral (revolucionária-reformista ou conservadoramente democrática), mantendo um horizonte comum na interpretação das funções da escola, concolidando-se em uma ideologia educacional que influenciará o desenvolvimento do ensino brasileiro. (OLIVEIRA, 2004, p. 951)
Dentro de seu próprio (endógeno) partido Getúlio Vargas enfrentou uma crise
que enfraqueceu o movimento tenentista. A maioria dos militares permanece ao lado
do Presidente, alguns dissidentes passam a integrar grupos de orientação política
radical ou extremista de direita e esquerda. Nessa cisão, que passa por contradições
em todas as plataformas de governo, os integrantes do movimento escola-novista se
afastam do governo federal, aproximando-se mais dos governos estaduais. Assim no
―Governo Provisório‖ de Getúlio Vargas instala-se uma dualidade política no território
117
brasileiro: a política centralizadora por parte do governo federal; e uma política mais
―liberal‖ por parte dos governos estaduais. (CUNHA, 2007; FAUSTO, 1995)
Os professores, docentes e filósofos da educação da ―Escola Nova‖
defendiam profundas mudanças no sistema de educação do país, primando por um
ensino: Público – orientado pelo ESTADO; Gratuito – oferecido pelo ESTADO;
Obrigatório – nos anos da escola elementar, sendo progressivamente estendido aos
estudos secundários e universitários; Laico – romper com a Igreja, retirando-se o
ensino religioso do currículo. Anísio Teixeira coloca que:
Os estudos filosóficos formais nascem, assim, como estudos de educação. Os sofistas foram os ―primeiros educadores profissionais‖ da civilização ocidental. O traço distintivo dessa civilização, na frase de André Siegfried, desde então consistiu no ―hábito de tratar os problemas a luz da razão, liberta do mágico, do supersticioso, do irracional". Daí por diante, a mentalidade ocidental não mais se afastou dessa tradição, buscando subordinar a própria religião à razão e, na realidade, toda a vida humana é um esquema coerente de ideias, compreendendo teorias do homem, do conhecimento, da sociedade e do mundo. (TEIXEIRA, 1959, p.1)
Assim, na visão da Igreja, os ideais perigosos da escola nova econtraram
fortalecimento com a subida de Vargas ao poder, onde a defesa de uma escola
Pública, Laica e Gratuita ameaçava a hegemonia das esolas primárias e secundárias
confessionais. Era um Estado sem Deus, uma Escola sem Deus, uma família sem
Deus. Mas logo a Igreja acharia seu espaço no novo regime, clamando seus direitos
no futuro estatuto político do país. Os ideais da escola nova foram rejeitados, e o
ensino religioso facultativo é instituído no sistema público de ensino. Em 1931 é feito
reconhecimento constitucional da Religião Católica como religião oficial da maioria
dos brasileiros. Era a vitória sobre a laicização da vida social – Brasil, um Estado
Secular. (BOTO, 2010)
Essa vitória da Igreja Católica em seu reconhecimento veio a retirar de cena
os Pioneiros da Educação, que irão se aproximar ainda mais dos estados em 1937,
fase em que Getúlio Vargas endurece ainda mais seu governo. A Igreja Católica
como pilar recebeu um grande símbolo de sua vitória, que viria a se tornar um dos
principais cartões postais do Rio de Janeiro – Corcovado e o Cristo Redentor.
Uma importante base de apoio foi a Igreja Católica. A colaboração entre Igreja e Estado não era nova, datando dos anos 20, especialmente a partir da presidência de Arthur Bernardes. Agora ela se tornava mais estreita. Marco simbólico da colaboração foi a inauguração da estátua do Cristo Redentor no Corcovado, a 12 de outubro de 1931 – data do Descobrimento
118
da América. Getúlio e todo o ministério concentraram-se na estreita plataforma da estátua, pairando sobre o Rio de Janeiro. Aí o Cardeal Leme consagrou a nação ao ―Coração Santíssimo de Jesus, recohecendo-o para sempre seu Rei e Senhor‖. A Igreja Católica levou a massa da população católica a apoiar o novo governo. Este, em troca, tomou medidas importantes em seu favor, destacando-se um decreto, de abril de 1931, que permitiu o ensino da religião em escolas públicas. (FAUSTO, 1995, p. 331-332)
Mas, as ações centralizadoras de Getúlio desagradavam ainda mais o Estado
de São Paulo. Foi em 1931 que foram criados órgãos e ministérios reguladores tanto
das atividades comerciais, quanto dos transportes e agricultura. Concentrou em suas
mãos a política do Café. Retira o poder exercido por São Paulo através do Instituto
do Café do Estado de São Paulo para o Conselho Nacional do Café, criado em maio
de 1931. Em fevereiro de 1933 ele extinguiu o Conselho, que contava com a
participação dos estados e cria o Departamento Nacional do Café, efetivando a
federalização da política cafeeira. Os Estados perdem sua influência e os diretores
seriam nomeados diretamente pelo Ministro da Fazenda. (FAUSTO, 1995, p. 332)
Tantas contradições e conflitos políticos, em especial os conflitos entre o
Governo de Vargas e o Governo do Estado de São Paulo, descontente em ver suas
solicitações não atendidas na Constituição de 1931, além de sofrer um grande
prejuízo com a compra do estoque de café a preços baixíssimos em virtude de
alguns empréstimos feitos anteriormente - explode em 1932 a Revolta da
Constituinte onde São Paulo lutou praticamente sozinho, em um confronto armado
contra o Exército Nacional, sendo derrotada, e sofrendo pressão do governo federal
posteriormente. (FAUSTO, 1995; CUNHA, 2007)
O Estado getulista promoveu um Capitalismo Nacional, e tomou medidas
excepcionais. Sempre centralizadas e controladoras. A ORDEM do país vinha de
cima e prezava pelo PROGRESSO. Aconteciam mudanças relevantes nas camadas
sociais, inclusive nas relações de trabalho. Getúlio se antecipa e cria instâncias
reguladoras do trabalho, fornece subsídios aos sindicatos trabalhistas, e antes
mesmo destes apresentarem suas propostas ele reformula as Leis trabalhistas,
conquistando aliados em todas as camadas, mas também fez novos inimigos.
(FAUSTO, 1995)
Um dos aspectos mais coerentes do governo Vargas foi a política trabalhista. Entre 1930 a 1945, ela passou por várias fases, mas desde logo se apresentou como inovadora com relação ao período anterior. Teve por objetivos principais reprimir os esforços da classe trabalhadora urbana fora
119
do controle do estado e atraí-la para o apoio difuso ao governo. No que diz respeito ao primeiro objetivo, a repressão se abateu sobre partidos e organizações de esquerda, especialmente o PCB, logo após 1930. [...] a esporádica atenção ao problema da classe trabalhadora urbana na década de 1920 deu lugar, no período getulista, a uma política governamental específica. Isso se anunciou desde novembro de 1930, onde foi criado o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio. (FAUSTO, 1995, p. 335)
São assim instituídas as leis de proteção ao trabalhador, que oficializa o
Tempo Livre; a Jornada de Trabalho de 8 horas; as férias remuneradas; inclusive
para os operários industriais, o que trouxe descontentamento por parte da elite
industrial que estava se desenvolvendo no país. As medidas de Getúlio Vargas eram
populistas, ou seja, atraía cada vez mais as camadas populares.
Essas mudanças foram essenciais para os estudos do Lazer e posteriormente
para os Estudos do Turismo no Brasil. Algumas correntes esquerdistas fizeram
oposição a institucionalização do Trabalhador pelo Estado, mas essas tentativas
falharam visto a ampla e populares medidas tomadas por Getúlio Vargas. (FAUSTO,
1995; TRIGO, 1991)
Como parte do Projeto de Construção da República Brasileira, a educação
também viria a desempenhar papel de suma importância, em especial no Nível
superior. Era defendido pelos ideais escola-novistas a criação de uma elite
intelectual brasileira. Aqueles, que venceram a Revolução de 1930 ao lado de
Getúlio Vargas, se preocuparam com o problema da educação. ―Seu objetivo
principal era o de formar uma Elite intelectual mais ampla e mais bem preparada.‖
(FAUSTO, 1995, p. 336)
Assim como em outras áreas o governo adotou medidas autoritárias, que
regulavam principalmente a Educação Superior. Em novembro de 1930 criou-se o
Ministério da Educação, e este entra no ―compasso‖ da política centralizadora. As
decisões partiam de cima para baixo, sem participação da sociedade e menos ainda
dos professores e filósofos da Educação. Veja, a regulamentação é de extrema
importância, o grande problema residiu na arbitrariedade das mudanças propostas
por Getúlio, que não eram participativas. (CUNHA, 2007; FAUSTO, 1995)
Esse fato social e histórico terá papel fundamental na criação da USP. Após
a derrocada na Constituinte, influenciados pelos ideais de uma educação
transformadora da realidade social, imersos em meio ao movimento da Escola Nova,
funda-se em 1933 a Escola Livre de Sociologia e Política de São Paulo. Constituída
como iniciativa privada, não buscava nenhum reconhecimento oficial do estado.
120
No ano seguinte, o Governador do estado de São Paulo, Armando Salles de
Oliveira, que também era Professor da Escola Politécnica de São Paulo, convoca
uma comissão de educadores e intelectuais para estudar a criação de uma
Universidade de iniciativa Estadual. Esta Universidade seria convergente aos
anseios e objetivos acadêmicos e políticos do estado.
Em 25 de Janeiro de 1934, um Decreto Estadual funda a Universidade de São
Paulo – USP. Cunha publica em seu livro um trecho do Discurso do Governador
Salles na ocasião:
―Vencidos pelas armas, sabíamos perfeitamente que só pela ciência e pela perseverança no esforço voltaríamos a exercer a hegemonia que durante longas décadas desfrutáramos no seio da federação.‖ (SALLES apud CUNHA, p.167)
Com estas palavras estrutura-se a Universidade de São Paulo, reunindo
inicialmente: Faculdade de Direito, Escola politécnica, Escola superior de
Agronomia, Faculdade de Medicina e Escola de Veterinária. O Instituto de Educação
é incorporado e se transforma na Faculdade de Educação. Logo após sua fundação
criam-se os cursos de Filosofia, Ciências e Letras, o qual se tornaria o eixo central
de organização da Universidade. Criou-se também o Instituto de Ciências
Econômicas e Comerciais e a Escola de Belas Artes. Foram também ligados a
Universidade de São Paulo os institutos de politécnico de pesquisa como unidades
complementares. A USP se tornaria a Universidade de maior influência na
constituição da Pós-Graduação Brasileira. (CUNHA, 2007)
A fundação da Universidade de São Paulo em 1934, especialmente de sua Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, que incluiu professores estrangeiros de alta qualificação em seu corpo docente, desde o inicio de seu funcionamento propiciou condições para que se formasse um novo modelo de docente pesquisador, que veio a representar destacado papel no processo de institucionalização do campo científico e tecnológico brasileiro. Matemáticos, físicos, químicos, biólogos etc., formavam alunos interessados em se dedicar a pesquisa e ao magistério superior, para o que muitos eram enviados a Europa e aos Estados Unidos, onde estagiaram junto aos grandes nomes da ciência na época. (CUNHA, 2007, p. 173)
Um grande exemplo do aluno formado nas primeiras gerações da
Universidade de São Paulo é Florestan Fernandes. Durante sua formação foi aluno
de Roger Bastide, Francês, que tinha na cultura e sociedade brasileira um profundo
encantamento como temática cultural e social em suas pesquisas. Entre 1945 e
121
1950 Florestan completa seu Mestrado e Doutorado, com uma obra que vem
revolucionar e lançar as bases do que ficou conhecida como a Escola de Sociologia
Paulista. Em 1951 ele substitui seu professor, que retornou a França. Sua obra
desenvolvida nesta época, abordando a Organização Social dos Tupinambás,
despertou a atenção de toda a sociedade acadêmica no Brasil e no mundo.
Permanece na USP até 1969 quando, ―compulsoriamente aposentado‖, segue para
o exílio no Canadá onde foi professor em inúmeras Universidades. Ele retorna ao
Brasil posteriormente, e exerce grande influência no cenário político brasileiro,
principalmente no que concerne a Educação Superior. Seu mais ilustre e conhecido
aluno é o Sociólogo e Ex- Presidente do Brasil, Fernando Henrique Cardoso.
(SOARES; BRAGA; COSTA, 2002)
As décadas de 30 e 40 foram seguidas de lentas e graduais transformações
no ensino superior a nível nacional. Inspirados pelo sucesso da iniciativa em São
Paulo, muitas foram as tentativas que surgiram nesse período, na maioria delas
frustradas, como a Universidade do Distrito Federal (situada no Rio de Janeiro),
criada por Anísio Teixeira, que tinha no seu quadro docentes da elite intelectual da
época na Europa, mas existiu somente por quatro anos. (CUNHA, 2007)
Acusado de difundir cultura pedagógica ―subversiva‖, Anísio Teixeira
desempenhou um papel muito importante na Educação brasileira em todos os níveis.
Após 1939, com o fim da Universidade do Distrito Federal (na cidade do Rio de
Janeiro), Anísio se recolhe ao exílio em sua terra natal – Bahia, onde realiza seu
sonho e funda a conhecida – ―Escola Nova‖, dedicada a formação básica, em
período integral, onde os ideais escola-novistas seriam o centro do projeto político
pedagógico. Ela cresceu e ganhou visibilidade, e exerceu influência nas escolas de
ensino primário e secundário, posteriormente passa por uma alteração em sua
abordagem e métodos pedagógicos com a forte influência do currículo tecnicista em
meados da década de 1960. Foi mediante o sucesso de Anísio na Bahia, que foi
convidado pelo governo Federal anos depois a integrar a Comissão de Avaliação do
Ensino Superior. Para Anísio Teixeira a Universidade desempenhava papel crucial
no desenvolvimento social de um povo, de uma nação, ao passo que coloca:
Data realmente das Universidades a distinção profunda das funções da sociedade. Até esse remoto undécimo século de nossa época, o interesse pelo estudo, pela cultura e pela inteligência se confundia dentro das instituições existentes, sobretudo da Igreja, não sendo a conservação e desenvolvimento do saber humano objeto de nenhuma instituição
122
especializada e autônoma. [...] De certo modo, pois, as Universidades anunciam o florescer da civilização ocidental. (TEIXEIRA, 1962, p. 182)
A Ditadura do Estado Novo, como ficou conhecida a fase mais autoritária do
governo de Getúlio, fez um considerável avanço nas comunicações de rádio, o qual
utilizava muito em sua campanha. Cresce a imprensa inicialmente para divulgar as
benéficas ações de seu governo, que possuía certo caráter populista, pois com suas
medidas conquistava a massa e ao mesmo tempo as neutralizava. Ao fim do
primeiro período do governo Vargas, eram cinco as Universidades Brasileiras, e
dezenas de faculdades isoladas. (CUNHA, 2007)
O aumento da pesquisa científica na área tecnológica trouxe avanços claros,
tanto na área de transportes, quanto nas comunicações (telecomunicações). Cresce
cada vez mais o interesse na pesquisa científica, e foi no final da década de 40 e
inicio da década de 50 que surgiram as primeiras instituições brasileiras ligadas ao
desenvolvimento e fomento do conhecimento cientifico. Em São Paulo, com forte
influência dos projetos de formação de uma elite intelectual, a legislação estadual
passa a destinar subsídios para o fomento à pesquisa, abrangendo as diversas
áreas do conhecimento.
O prestígio alcançado pelos pesquisadores universitários e para-universitários em São Paulo – os estrangeiros e os brasileiros por ele formados – permitiu-lhes fazer com que a Constituição Estadual Paulista de 1947 mandasse o governo destinar 0,5% da receita pública para o apoio ao trabalho de pesquisadores individuais. Três anos depois, surgiu a Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo - Fapesp, para dar um rompimento a este dispositivo constitucional, tendo sempre na sua direção cientistas de prestígio garantido a respeitabilidade da instituição. (CUNHA, 2007, p. 173 - 174)
Após a Segunda Grande Guerra Mundial, os transportes recebem um novo
fôlego. O avanço tecnológico do pós-guerra alcança a aviação civil, diminuindo as
horas de voos, diminuindo distâncias. Getúlio Vargas retorna ao poder através de
eleições diretas em 1951, e foi vítima de seu próprio avanço. O crescimento da
comunicação e a instalação de uma imprensa jornalística, culminando com o inicio
das transmissões de Televisão no Brasil em 1950. Seu governo passa por severas
críticas, que o levam ao suicídio antes do fim de seu mandato. Getúlio Vargas deixou
a vida pública de forma trágica, mas já fazia parte de nossa história. (FAUSTO,
1995)
A sucessão do governo se daria em meio a alguns tropeços. Em 1955
123
Juscelino Kubitschek – JK foi eleito Presidente, e teve como plataforma de governo
uma política desenvolvimentista, visando o crescimento econômico e político, que só
seria possível com uma maior integração geográfica e política. O governo JK
promete cinquenta anos de desenvolvimento em cinco anos de governo e, como
principal meta, a fundação do Distrito Federal, a cidade de Brasília. (FAUSTO, 1995)
Já no período Vargas houve uma expansão e o aumento de estudos para a
transferência da sede federal do governo, que ficou conhecida como Marcha para o
Oeste, mas é JK que concretiza esse projeto, tendo como principal arquiteto e
planejador, Oscar Niemeyer. Assim, Brasília foi uma paisagem edificada na síntese
de um governo. (FAUSTO, 1995)
Com o desenvolvimento industrial do país, há uma necessidade crescente de
mão de obra qualificada, nos mais variados setores. Este período de industrialização
marca o fortalecimento de institutos tecnológicos e de pesquisa, que vão contar em
seu quadro com pesquisadores catedráticos e cientistas de elite, principalmente com
formação no exterior. Era o fortalecimento das alianças iniciadas na década de
1950, que contribuiriam para a formação da pós-graduação brasileira. (CUNHA,
2007; SAVIANNI, 2000)
Também nesse período são criados com maior intensidade os Institutos
Técnico-profissionalizantes no ensino secundário (Ensino médio). Ou seja, ao sair da
escola primária o aluno iria aprender a profissão através de um currículo tecnicista
ou tecnológico, influenciado pelas recentes descobertas da psicologia experimental
(comportamental; behaviorismo) e suas relações com a pedagogia ou
psicopedagogia. Foi forte o investimento no ensino secundário, que com as alianças
cada vez mais próximas entre Brasil e Estados Unidos, sofreu influências diretas dos
currículos tecnicistas, privilegiando o ensino técnico em detrimento do nível
acadêmico. Configurou-se no país uma educação bancária, direcionada a formar
mão de obra, principalmente ligadas a Indústria siderúrgica e de construção civil,
concentrando-se na formação técnica profissional. (SANTOS e CASALI; 2009)
[...] entre 1950 e 1960 o ensino superior se orientava para: preparar pessoal técnico qualificado para as empresas, absorver a classe média que ansiava por ascensão social, e despolitizar a universidade de modo a manter o controle, tanto da educação quanto da sociedade. Soma-se a isso a falta de investimento no setor por parte do Estado e a transferência da responsabilidade para instituições particulares de ensino. (DENCKER, 2006, p. 06)
124
As escolas secundárias eram em sua maioria confessionais com a permissão
da legislação brasileira nos níveis primário e secundário. Com o crescente aumento
da demanda de mão de obra, já na década de 30 a 40, cresceram as escolas de
caráter privado, voltadas para a educação técnica. Esse processo é ainda mais
intensificado durante a década de 50, gerando um alto número de escolas técnicas e
de nível secundário privadas, inclusive ligadas a iniciativa estrangeira, aumentando o
contingente de mão de obra qualificada, e a demanda por vagas no Ensino superior.
(CUNHA, 2007)
Conforme coloca CUNHA (2007) as propostas de reforma na Educação
superior abriu espaço para críticas mais radicais acerca do ensino brasileiro,
retomada com força pelos estudantes em 1960, e contando com a adesão dos
professores.
No contexto da Latina América, despontava no final da década de 50 a
Revolução Cubana, que tem como principais figuras Che Guevara e Fidel Castro. O
crescente descontentamento com as interferências políticas dos norte americanos
em Cuba foi um dos fatores, unido ao descontentamento popular com a crescente
exploração econômica por parte de empresas americanas. Em 1960, utilizando
principalmente os meios de comunicação de rádio, a população é chamada para
lutar através de mensagens revolucionárias. A guerrilha, luta armada, ganha força e
a Revolução Cubana alcança seus objetivos, apoiados pela União Soviética, e se
instaura o regime socialista de governo em 1960. Em clima de guerra fria, Cuba se
posiciona contra a cultura capitalista e a hegemonia americana, que rompe relações
comerciais com o país. Em um mundo bipolar, é necessário se posicionar! O Brasil,
já havia feito sua escolha, e se aproxima ainda mais dos Estados Unidos. (FAUSTO,
1995)
No cenário internacional, crescem os movimentos culturais, que caracterizam
as décadas de 60 e 70 como um período de Revolução Cultural, tendo no ―Rock‘n
Roll‖ sua face mais rebelde. Com o aumento das tecnologias ligadas a comunicação,
o entretenimento ganha espaço e representatividade econômica. Ela se constitui de
uma fonte de lazer, entretenimento, mas também em uma forma de disseminar
ideias, pensamentos, cultura. A indústria do cinema ganha força e a cultura passa a
despertar cada vez mais o interesse das pessoas, em especial da juventude, sendo
a nível internacional o Movimento Hippie sua principal representação.
É na década de 60 e 70 que são traduzidos e publicados no Brasil os estudos
125
acerca das ―ciências do lazer‖ pela primeira vez. Jofre Dumazedier - Francês foi um
dos grandes estudiosos do Lazer, inclusive veio ao Brasil algumas vezes para
proferir palestras, em especial na USP. Também data desta época a tradução dos
trabalhos de Krippendorf (Suíça), seguindo a mesma linha de Dumazedier. Cresce
cada vez mais o interesse de todas as áreas sobre o tempo livre, o não trabalho, o
ócio, em especial dos campos do conhecimento ligados às ciências sociais, ciências
humanas e comunicação social. (PANOSSO NETTO, 2011)
No Brasil, a Bossa Nova toma espaço no inicio dos anos 60, com uma
penetração muito grande nos Estados Unidos e Europa. O Cinema brasileiro passa
por um crescimento significativo. Como parte do papel da Universidade em projetos
de extensão, articulados aos movimentos estudantis, são criados vários Centros
Culturais em comunidades. Esse momento efervescente proporciona uma maior
aproximação das universidades com a sociedade, e desperta um interesse maior da
comunidade científica por questões que envolvam cultura, comunicação e
sociedade.
Ganhou as eleições Jânio Quadros, mas não chega a exercer o mandato
integralmente, dando lugar, em meio a preocupações e incertezas, ao Presidente
João Goulart, que ficou conhecido como Jango. (FAUSTO, 1995)
Surge a Universidade de Brasília em 1961, que se constituiria na mais
moderna Universidade brasileira, estimulada principalmente pelo CNPQ e CAPES,
instituições criadas em 1951. Teve como primeiro Reitor – Anísio Teixeira. As
palavras proferidas por ele na Inauguração da pioneira Universidade de Brasília
foram publicadas na Revista Brasileira de Estudos pedagógicos em 1962, e ecoam
até os dias atuais:
A Universidade é, pois, na sociedade moderna, uma das instituições características e indispensáveis, sem a qual não chega a existir um povo. Aqueles que não a tem, também não têm existência autônoma, vivendo, tão somente, como reflexo dos demais. [...] A crítica não poderia ser mais infeliz. Não podia morrer, entretanto, a malevolência dos que se obstinam em não deixar o país progredir para que possa continuar a viver as custas dele, na sua meia ignorância. (TEIXEIRA, 1962, p. 182 – 184)
126
Anísio Teixeira18 pagou um alto preço por sua incansável luta por uma
educação para todos, e sua influência se deu em todos os níveis de ensino. Em
1971, no regime militar Anísio foi detido para interrogatório. Em 14 de Março
desapareceu, e foi encontrado morto dias depois.
Em 1961 foi promulgada a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação19.
A LDB de 1961 trouxe melhorias, mas a autonomia que era defendida pelos
intelectuais brasileiros e estudantes não foi atendida.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1961 (Lei nº 4.024, de 20/12/61), primeira lei geral sobre a educação nacional, regulamentou apenas os aspectos administrativos e rotineiros da universidade, gerando de imediato reações e movimentos favoráveis a uma Reforma Universitária, que veio por meio da Lei 5.540/1968 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Superior – aprovada em 20 de novembro de 1968, pelo regime militar, dentro da tendência anterior de ensino profissionalizante, adotando-se o modelo de currículos mínimos, sendo mantido e ampliado o incentivo para a entrada no mercado da educação das instituições particulares de ensino superior. (DENCKER, 2006, p. 03)
É nesse conturbado momento histórico que o Turismo foi inserido no ensino
técnico e posteriormente no ensino superior. Assim, é necessário compreendermos
um pouco mais sobre o contexto histórico, político e social no qual se dá esta
inserção.
4.1.2 Turismo e o Regime Militar (1964 a 1985)
O Turismo se insere de forma mais efetiva nas políticas públicas e no Ensino
Brasileiro em meio ao período do regime militar, permeado pelo medo e cerceado
em seus direitos.
As propostas de reforma de base que eram colocadas pelo Presidente João
Goulart, apoiado por Leonel Brizola causava comoção, e desconforto. Dentre as
reformas propostas duas delas são de extrema importância para entender a
articulação das classes sociais neste período. As reformas de base propunham a
Desapropriação e remanejamento das Refinarias de Petróleo, e uma
18
Recomendamos o Documentário da Série Educadores Brasileiros – Anísio Teixeira: educação não é privilégio (parte 1 e 2), disponível gratuitamente na página Domínio Público – Biblioteca Digital do Ministério da Educação, acessível através do endereço < http://www.dominiopublico.gov.br >.
19 A LDB de 1961 foi a primeira legislação específica sobre a Educação no país. Ela foi reformulada
posteriormente, e muitas das conquistas de autonomia foram revogadas durante o período do regime militar. Mais informações e resumo de suas principais contribuições podem ser encontradas nos Anexos desta dissertação ou nas referências bibliográficas desta pesquisa (Ver ANEXO B, p. 255).
127
Desapropriação de Terras Improdutivas visando a Reforma agrária. (FAUSTO, 1995)
Já existiam boatos, e se espalhavam notícias em alto e bom som de possíveis
ligações de João Goulart ao comunismo. Estas reformas mostravam uma
preocupação com as injustiças sociais, desigualdades, que com a progressiva
estratificação da economia, aumentavam a cada dia. (FAUSTO, 1995; TEIXEIRA
S.H., 2007)
Assim, logo atrai a atenção do operariado, dos trabalhadores e profissionais
das regiões urbanas que lutam pela melhoria salarial e do transporte público; causa
atração no meio rural, através da luta pela reforma agrária e de melhorias para os
trabalhadores do campo. A Universidade não ficaria de fora deste momento político,
e no Movimento Estudantil eram exigidas melhorias na Educação Pública,
principalmente no que concerne ao acesso e ensino de qualidade. Ou seja, estas
ideias ganhavam força ao se encontrarem com as necessidades demandadas pelas
camadas mais populares. (CUNHA, 2007; TEIXEIRA S. H., 2007)
Cresceu a esperança da Reforma Universitária, que já em 1961, organizou
através do movimento estudantil o I Seminário Nacional da Reforma Universitária na
Bahia. Fica conhecida como Carta da Bahia que trazia as principais conclusões das
temáticas abordadas no Seminário, agindo como um ponto de consolidação dos
objetivos do movimento estudantil em todo o país. Os seminários prosseguiram em
1962 e 1963, entrando definitivamente na pauta das reformas de base em 1964. As
propostas traziam: a importância da Universidade a serviço do povo; o acesso a uma
universidade para todos, ou seja a democratização do ensino universitário; a
suspensão do sistema de cátedras vitalícias nas universidades; e autonomia didática
e administrativa. (TEIXEIRA S.H, 2007)
Em outra tangente, as reformas de base propostas ameaçavam de certa
forma as elites dominantes, classe formada em especial por grandes industriais,
empresários do setor terciário, e grandes latifundiários. As propostas afetariam
diretamente estes setores econômicos, o que despertava preocupação. Acontece
assim uma articulação entre a preocupação das elites e a da base militar do
governo. (CUNHA, 2007; TEIXEIRA S.H., 2007)
Após a manifestação que ficou emblematicamente conhecida como a
Passeata dos 100.000 que aconteceu na cidade do Rio de Janeiro, onde
discursaram vários líderes políticos, sindicais, muitos não acreditaram na cena que
se veria no dia 01 de Abril daquele ano. Em 1964 através de um Golpe Militar de
128
Estado, o Presidente João Goulart é deposto e se inicia no país o período da
Ditadura Militar que se estende de 1964 até 1985. (FAUSTO, 1995)
Um dos primeiros locais invadidos pelas tropas militares foram as
Universidades – foram suprimidos todos os direitos democráticos. Em 1964 sobe ao
poder Castelo Branco e passa a governar o país através de Atos Institucionais. O
Brasil entra em um período negro da sua história, mascarado debaixo do tão
desejado ―Milagre Econômico‖. (CUNHA, 2007; FAUSTO, 1995)
Em 31 de março de 1964, um conjunto de eventos ocorridos no Brasil interrompeu o governo do Presidente João Goulart – Jango, e submeteu o Brasil ao Regime da Ditadura Militar, que durou até 1985. Com o golpe militar os brasileiros perderam o poder de crítica e participação política, e uma sucessão de presidentes Militares fortaleceu o poder executivo e enfraqueceu o legislativo. Prisões políticas, inquéritos policiais militares, Lei de Segurança Nacional, Serviço Nacional de Informações, direitos políticos cassados, exílios, tortura, morte, ‖desaparecimentos‖, repressões, entre outros acontecimentos passam a fazer parte da vida dos brasileiros. Toda e qualquer oposição ao regime se tornara perigosa. (TEIXEIRA S. H., 2007)
O Golpe Militar de 1964 ignorou a Constituição Brasileira e passa a legislar
através de Atos Institucionais, sendo os mais significativos resumidos abaixo.
(TEIXEIRA S. H., 2007):
a) AI-1: Suspende as atividades do Congresso concedendo
poderes constituintes ao Presidente; suprime os direitos de
oposição ao regime, considerados ―subversivos‖; cria Órgãos de
controle de informações; institui a eleição indireta; aposentadoria
compulsória de servidores públicos considerados subversivos.
(1964)
b) AI- 2: São revogados os poderes judiciários e o poder executivo
passa a legislar em causa própria; são suprimidos todos os
direitos democráticos conquistados; exclui-se o pluripartidarismo
e instituiu-se o bipartidarismo através do MDB e ARENA. (1965)
c) AI-5: São revogados todos os direitos democráticos; qualquer
reunião com mais de 03 pessoas se torna perigosa ao regime e
passível de investigação; são suprimidos os direitos a greve; são
retirados os direitos de protesto criando o Sensor; é instaurada a
pena de morte aos contrários ao regime. (1967 – 1968)
129
O Ato Institucional número 5 de 1968 foi o marco do período mais denso e
terrível da Ditadura Militar. Pessoas saiam para trabalhar e já não voltavam mais
para as suas casas. Artistas, músicos e poetas tiveram de deixar o Brasil e seguir
para o exílio. Docentes e pesquisadores foram enquadrados na mesma categoria,
facilitando assim a lista de controle do governo sobre práticas pedagógicas
subversivas. (CUNHA, 2007)
O Decreto Lei n°477 publicado em fevereiro de 1969 proíbiu totalmente
qualquer manifestação de cárater político aplicado a professores, alunos e
funcionários em todos os níveis de ensino. Não se podia criticar, não se podia
cantar. (TEIXEIRA S. H., 2007)
A Universidade, como anteriormente colocado, é campo fértil de ideais
revolucionários. Espiões eram enviados as instituições, frequentavam aulas
infiltrados entre os alunos, tentando encontrar possíveis líderes de movimento contra
o regime. A Universidade de São Paulo era extremamente visada, tanto pelo seu
histórico de formação sócio espacial, quanto por abrigar grandes pensadores. Um
deles já citado anteriormente, Florestan Fernandes.
Florestan Fernandes20 foi retirado de dentro da USP em um camburão, e só
foi liberado porque um Militar que gostava de seus escritos intercedeu por sua
liberação, o que não agradou em nada Florestan Fernandes. Florestan tinha
profunda paixão pela USP, mas foi aposentado compulsoriamente seguindo para o
exílio, assim como muitos de seus alunos, e só viria a integrar o Partidos dos
Trabalhadores muitos anos depois. Em seu texto sobre As Três Teses sobre a
Universidade, defende o acesso ao ensino de qualidade, como meio de
transformação social. Alguns estudiosos de sua obra utilizam o termo ―Revolução
Educacional‖, ou seja, a revolução através da educação de qualidade para todos,
mostrando sua aproximação a correntes de pensamento marxista. Ele lutou por uma
educação inclusiva, que abrisse as portas da Universidade aos menos favorecidos.
Para isso, a educação básica precisava também cumprir seu papel, ao passo que
coloca:
20
Recomendamos o Documentário "Florestan Fernandes -- O Mestre", dirigido por Roberto Stefanelli,
galardoado em 2004 com o prêmio 'Vladimir Herzog', a mais importante premiação jornalística da área de direitos humanos do Brasil. O Documentário é acessível gratuitamente através do hiperlink no endereço eletrônico < https://www.youtube.com/watch?v=ncGSS2yyhNw >.
130
Com relação a Universidade, é preciso que ela avance até onde é necessário incorporar aquele que foi negado, que foi excluído, que merece tudo e não teve nada. Refiro-me ao estudante operário, pobre, que só tem oportunidades no bando de crianças abandonadas, jovens que vivem do crime esporádico ou sistemático. Este tipo de aprendizagem deve desaparecer e ser substituído por uma educação escolar que permita a revolução educacional como ponto de partida para a Revolução Social ao qual o Brasil resiste, que o Brasil se recusa a por em prática. (FERNANDES, 1991, p. 150)
Muitos classificam o período do regime militar no Brasil como ―Milagre
Econômico‖. Com o passar dos anos, e análises de economistas, sociólogos e
filósofos demonstram que o dito ―Milagre‖ causou um grande rombo na economia do
país. Além de péssimos administradores, os militares gozavam de altos privilégios,
em um nível exacerbado de corrupção. Além do que, para criar empresas estatais,
que tiveram papel importante na economia brasileira, se valeram de financiamento
estrangeiro, culminando em uma enorme dívida externa. Ao fim do Mandato de José
Sarney, por volta de 1988 e 1989, o Brasil declarou Moratória, e nossa situação
econômica estava de mal a pior. (FAUSTO, 1995)
Talvez, no campo da Arte, encontramos alento e talento. Com a progressiva
censura a toda forma de manifestação contra o Regime, na televisão os festivais
ganharam espaço. Foi em especial no ano de 1967 que os Festivais de Música
Popular Brasileira mostrou sua vertente mais fértil na Televisão. De Roberto Carlos a
Chico Buarque, de Gilberto Gil a Geraldo Vandré, passeando por Caetano. Já que
não se podia manifestar politicamente, a Arte, assim como em 1922, apontava o
caminho. Mas, logo foi abortada, culminando no exílio da maioria destes artistas que
só voltariam ao Brasil com a a Anistia em 1979.
O governo interferiu diretamente na tão sonhada Autonomia Universitária. A
Universidade foi pressionada pelo regime, e a União Nacional dos Estudantes
―oficialmente‖ foi dissolvida, atuando a partir desse momento na clandestinidade,
inclusive com a formação de milícias armadas.
A atuação do governo sobre a educação e a Universidade foi motivada pela formação de um quadro de profissionais competentes e aliados ou ―neutros‖, possibilidade de trocar antigos funcionários que eram competentes, mas que se opunham a ditadura e fortalecimento do golpe, além da transferência gradativa para a iniciativa privadada responsabilidade com a formação acadêmica da juventude. (ROSAS 1992: 61). Para alcançar os objetivos acima, o governo, muitas vezes, precisou adotar medidas para controlar as instituições acadêmicas, bem como professores, funcionários e alunos. (TEIXEIRA S. H., 2007, p. 25)
131
O Brasil que já era próximo aos Estados Unidos, em tempos de Guerra Fria
se aproximou ainda mais, e foi firmado um acordo conhecido como MEC-USAID, em
um convênio entre o Ministério da Educação e Cultura e a Agência Norte Americana
para o Desenvolvimento Internacional. A comissão entendia a educação como pilar
de desenvolvimento econômico e social, e também como forma de suprir a
crescente demanda por mão de obra capacitada. Ao olhar a educação como
possibilidade de formação da massa operária e trabalhadora visto as Indústrias que
estavam sendo criadas no país, vê-se a necessidade de ampliar o ensino,
fornecendo mão de obra específica e qualificada, ou seja, aumentar o número de
cidadãos com nível universitário. (CUNHA, 2007; TEIXEIRA S.H., 2007)
Além dos técnicos da USAID, o Brasil sofreu interferência direta no ensino
superior através de Mr. Rodolph P. Acton, que fora contratado pela Diretoria de
Ensino Superior do MEC para propor um novo modelo que deveria ser implantado
na Universidade Brasileira. No relatório de 1965 Mr. Acton teceu críticas à
Universidade Brasileira e sua gestão. Entre elas de que a Universidade Brasileira
não poderia se manter a margem dos problemas sociais e econômicos do país.
Recomendou-se uma expansão com contenção, e a existência de um sistema de
ensino do tipo empresa privada, e não de serviço público, dando autonomia para a
criação de novas IES. (TEIXEIRA S.H., 2007)
Várias medidas foram tomadas de modo estratégico a fim de ampliar a oferta
de vagas no ensino superior, sem onerar em demasiado o governo federal e
estadual, visto a escassez de recursos destinados a esse setor, em especial durante
a ditadura. Essa colaboração veio a se tornar uma forte influência, dando caráter
tecnicista aos currículos do ensino básico, médio e universitário, como coloca Sérgio
Teixeira:
Um acordo foi feito, dessa vez entre o MEC, a USAID e o SNL (Sindicato Nacional dos Editores de Livros), para que cinquenta e um milhões de livros técnicos, científicos e didáticos fossem editados e distribuídos gratuitamente nos três anos seguintes de sua assinatura entre bibliotecas, escolas e intituições de pesquisa. Dessa forma, os Estados Unidos, através da USAID, além de assessorar o país podendo avaliar, planejar, reformar, administrar e legislar sobre a educação em todos os graus, tinha também o controle das fontes de informações técnicas, científicas e didáticas. (TEIXEIRA S. H., 2007, p. 23)
Assim, forma-se uma estrutura curricular híbrida, ora se aproximando mais
das escolas acadêmicas europeias, ora se aproximando mais das escolas norte-
132
americanas, e em alguns casos se aproximando da escola de pensamento alemão.
(SAVIANNI, 2000; CUNHA, 2007)
No campo das políticas públicas o Turismo encontraria seu espaço em um
discurso desenvolvimentista, ou seja, crucial para o desenvolvimento econômico do
país. Já em 1960 foi iniciado um processo de inventariação turística tendo como
base estratégias internacionais. (DENCKER, 2006; MTUR, 2006)
Data de 1959 a criação da ABAV – Associação Brasileira das Agentes de
Viagens que realizou seu primeiro Congresso em São Paulo no mesmo ano. Em
1960 surgem os primeiros parques voltados para o lazer, sendo um deles o Aterro
do Flamengo no Rio de Janeiro, com um projeto paisagístico de 1,2 milhões de
metros quadrados. Outros parques se formam nas regiões de Brasília - DF, Minas
Gerais, Goiás e Espírito Santo. (TRIGO, 1991)
Nos anos 60 o Brasil possuía a segunda mais importante rede de aviação do
mundo, que caiu em um desmantelamento vis a vis a má administração dos
aeroportos e empresas estatais ligadas à aviação. Somente em 1966 o Brasil
instituiu através do Decreto Lei n°32 de 18/11 o Código Brasileiro do Ar. (TRIGO,
1991)
No ano de 1963 foi organizado pelo Deputado Nelson Carneiro o I Simpósio
Nacional de Turismo, onde ele propôs a criação de um Instituto Brasileiro de
Turismo. Mesmo sendo aprovado no Congresso, foi vetado pelo Presidente da
República. Neste mesmo ano cria-se a primeira secretaria de Turismo no Estado da
Guanabara – Rio de Janeiro. Até este momento o Estado da Guanabara possuía
aproximadamente 4.000 unidades habitacionais (UHs), podendo receber cerca de
8.000 hóspedes. No Brasil inteiro o número de UHs não ultrapassava 40.000.
(TRIGO, 1991)
Em 1965 foi fundado o primeiro Jornal dedicado ao Turismo, o Jornal do
Turismo no Rio de Janeiro. Posteriormente, em São Paulo, começa a circular em
1966 um suplemento de Turismo no Jornal O Estado de São Paulo (O Estadão).
Data de 1966 o primeiro Shopping Center (Mall) em São Paulo, e lentamente passa
a vincular compras com atividades culturais, de alimentação e Lazer. Em 1966
existiam no Brasil cerca de 900 Agências de Viagens, a maioria localizada em São
Paulo, seguida por Rio de Janeiro. Foi em Novembro de 1966 que o Governo cria a
primeira Empresa Brasileira Estatal – EMBRATUR. Como coloca neste texto
―arqueológico‖ Luiz Trigo:
133
Decreto Lei n°55 de 18/11/66 define a política nacional de turismo, cria o Conselho Nacional de Turismo e a Empresa Brasileira de Turismo (EMBRATUR). Posteriormente o Decreto n° 60.224 de 16/02/1967 regulamentou o Decreto Lei n°55 e o Decreto n°62.006 de 29/12/1967 dispôs sobre os incentivos previstos no Decreto Lei n° 55. O Decreto Lei n°58.483 de 23/05 regulamentou as agências de viagens e turismo. (TRIGO, 1991, p. 40 – 41, grifo nosso)
Muitos localizam a EMBRATUR como principal responsável pelo fomento do
Turismo no Brasil e no Exterior. Como vimos anteriormente, a EMBRATUR não foi o
primeiro órgão a fomentar o Turismo nacional e internacional. Colocá-la como fator
decisivo e desencadeador do desenvolvimento do Turismo no Brasil e,
principalmente no que concerne a inserção do Turismo no campo da educação
profissional e superior, constitui-se em um mal entendido histórico, sobre o qual é
necessário uma discussão e reflexão mais profunda.
Por isso se faz tão importante o resgate histórico. Ele nos auxilia a manter um
saudável ceticismo frente às mudanças, e nos coloca frente a frente aos erros do
passado. É na reflexão sobre a prática social e histórica que pode-se evidenciar
correntes de pensamento, ideologias, valores que norteiam e influenciam o
desenvolvimento do pensamento pedagógico brasileiro, que se relaciona
diretamente com o conhecimento produzido dentro das instituições de ensino, em
especial as públicas. ―Ao analisar o contexto histórico do currículo e do pensamento
pedagógico brasileiro, pode-se evidenciar que ambos estão permeados de
ideologias, valores e concepções diferenciadas em relação ao processo
educacional‖. (SANTOS e CASALI, 2009, p.227)
4.2 TURISMO: DO ENSINO PROFISSIONAL A UNIVERSIDADE
Como vemos, a década de 1960 foi decisiva para a inserção do Turismo no
ensino brasileiro, seja no nível secundário através dos cursos técnicos
profissionalizantes, como no nível superior nas Faculdades existentes. Realizamos
uma pesquisa documental em arquivos do Ministério da Educação que trouxe dados
significativos e alguns deles até mesmo inéditos. O Ementário21 do MEC reúne a
legislação, decretos e atos que vão de 1930 a 1970.
21
O resultado completo da pesquisa realizada no Ementário do Ministério da Educação de 1930 a 1970 está
disponível nos anexos de nossa dissertação. A íntegra dessa documentação está a disposição para Download gratuito, e acessível através do hiperlink do endereço virtual < http://www.livrosgratis.com.br/arquivos_livros/me001570.pdf >; ou no site do Ministério da Educação, através das referências constantes nessa pesquisa.
134
As Escolas Técnicas de Hotelaria foram autorizadas e oficializadas antes da
criação da EMBRATUR, conforme pesquisa realizada.
ESCOLA TÉCNICA DE HOTELARIA DE SÃO PAULO PORT. MIN. Nº 169, DE 2-6-66 — Cria as Escolas Técnicas de Hotelaria da Guanabara e de São Paulo, subordinadas à Diretoria do Ensino Comercial. DO. 16-6-66 — pág. 6 479 ESCOLA TÉCNICA DE HOTELARIA DA GUANABARA PORT. MIN. Nº 169, DE 2-6-66 — Cria as Escolas Técnicas de Hotelaria da Guanabara e de São Paulo, subordinadas à Diretoria do Ensino Comercial. DO. 16-6-66 — pág. 6 479 ESCOLA TÉCNICA DE HOTELARIA DE PORTO ALEGRE PORT. MIN. Nº 627, DE 20-10-67 — Cria a Escola Técnica de Hotelaria de Porto Alegre e autoriza a Diretoria do Ensino Comercial a firmar convênio. D.O. 31-10-67 — pág. 11052. (MEC, s/p, grifo nosso)
Percebe-se assim que o ensino técnico e profissionalizante voltado para o
Turismo e seus equipamentos são oficializados antes da criação da EMBRATUR, o
que vem justificar o posicionamento já exposto em nossa pesquisa, questão esta em
que não vamos mais nos prolongar.
O ensino técnico foi essencial, principalmente por fornecer ao mercado que se
desenvolvia mão de obra técnica preparada, a princípio na área de hotelaria,
posteriormente em alimentos e bebidas (gastronomia). Ele foi responsável pela
formação de excelentes profissionais, que posteriormente viriam a também a cursar
o Bacharelado. Destacamos a Escola de Hotelaria do SENAC.
A partir de 1969 o Governo do Estado cedeu ao SENAC de São Paulo, em regime de comodato, o imóvel onde se acha instalado o Grande Hotel e parte do Parque que o circunda. Lá se estabeleceu o primeiro Centro de Formação Hoteleira da América Latina. A experiência de Hotel-Escola foi muito bem sucedida e em 1986 o Governo do Estado doou o imóvel ao SENAC. (TRIGO, 1991, p. 27)
Até o momento falamos de equipamentos ligados ao Turismo e de escolas
profissionalizantes. Em 1968, regime militar, as mudanças possibilitaram a expansão
do ensino superior, e o Turismo encontraria seu espaço nas IES criadas após a
promulgação da LDB de 1968.
A reforma universitária, em 1968, foi a grande LDB do ensino superior, assegurando autonomia didático-científica, disciplinar administrativa e financeira às universidades. A reforma representou um avanço na educação superior brasileira, ao instituir um modelo organizacional único para as universidades públicas e privadas. (MEC, 2013, s/p)
Inicialmente como vimos, foi maciço o investimento no setor secundário
135
profissionalizante, o que aumentou a demanda de alunos para o ensino superior em
todas as áreas. Não foi privilégio do Turismo se inserir neste momento na Educação
Superior, a demanda de alunos para ingressar ao ensino superior aumentou em
demasiado, e o governo viu nas IES privadas a possibilidade de sanar estes
problemas com o mínimo de oneração dos cofres públicos. (CUNHA, 2007)
O governo optou por fazer das Universidades Públicas elitistas, voltando-se
em especial para a pesquisa, desenvolvendo inclusive a pós-graduação. Deixou que
o setor privado desse conta da demanda social crescente de alunos para o ensino
superior, em um ensino de larga escala, que se voltava para a preparação do aluno
para o mercado de trabalho. A Lei 5.692/71 instituiu a obrigatoriedade da
profissionalização em todos os cursos do segundo grau, comprovando o interesse
governamental na formação de mão de obra para o mercado de trabalho. (CUNHA,
2007; TEIXEIRA S.H., 2007)
Foi a partir destas mudanças que se abriram as possibilidades de inclusão do
Turismo no nível superior. A Dissertação de Mestrado de Sérgio Henrique de
Azevedo Teixeira, datada de 2007, realizou contribuições extremamente relevantes
para a história da educação superior em Turismo. Ele realizou um recorte histórico
do período entre a década de 60 e 70, levantando pontos interessantes sobre o
contexto e os condicionantes históricos da inserção do Turismo na Graduação
Superior. Entrevistando o Professor Mario Beni, efetuou uma análise curricular dos
03 primeiros cursos de Turismo em IES no Brasil. Sendo estes, dois cursos em
Faculdades e um em Universidade.
Ao se analisar a formação dos cursos superiores em Turismo no Brasil entende-se que, a primeira instituição a criar o curso de turismo foi a Faculdade de Turismo do Morumbi – que iniciou suas atividades na segunda quinzena de Março de 1971 – e que a segunda foi a Faculdade Íbero-Americana de Letras e Ciências Humanas – que foi a primeira a ser autorizada pelo Conselho Federal de Educação. (TEIXEIRA S.H., 2007, p.31)
Veja que até o momento estamos falando de Faculdades, ou seja cursos
isolados. Embora os três primeiros currículos fossem similares, possuíam ligações
diferentes. O Curso de Turismo da Faculdade Morumbi22 foi criado por um grupo de
arquitetos e administradores que convidaram Domingo Hernandez Peña, Espanhol,
para formatar o currículo e programa do curso.
22
Atualmente UAM – Universidade Anhembi Morumbi.
136
Ele aceitou trabalhar na primeira faculdade de Turismo, mas, exigiu autonomia para ―desenhar‖ o curso. Ele não queria que se estudasse apenas geografia, ou psicologia, mas sim que se estudasse geografia turística, psicologia turística. Queria que houvesse integração das disciplinas. Dessa forma ele projetou todo o curso, aula por aula, de todas as disciplinas. Enfim, ele foi o responsável pelo modo como se ensinou turismo na Faculdade de Turismo do Morumbi nos primeiros anos. (TEIXEIRA S.H., 2007, p. 33)
Foi nessa ―Escola‖ que Ruschmann veio a se formar, como veremos
posteriormente. A segunda Faculdade a criar o curso de Turismo foi a Faculdade
Ibero-Americana23 de Letras e Ciências Humanas, que obteve aprovação em Janeiro
de 1972, e teve seu currículo também ―desenhado‖ por um Espanhol.
O Diretor e fundador da Faculdade Íbero-Americana de Letras e Ciências Humanas foi o Professor Espanhol Julio Gregório Garcia Morejón. De acordo com Rodrigues (2005), Morejón formou-se em Filosofia, Letras e Filologia Romântica pela Universidade de Salamanca em 1953, e chegou em São Paulo em 1954, onde iniciou seu trabalho como Professor Catedrático da USP. Estudioso de História e Crítica da Arte, publicou mais de 20 livros e centenas de artigos no Brasil e no exterior. Foi o primeiro diretor da Escola de Comunicação e Artes de São Paulo – ECA/USP, permanecendo como diretor até abandonar o cargo para criar a sua própria faculdade. (TEIXEIRA S.H., 2007, p. 33)
Mas, foi em 1973 que o Curso de Turismo passaria a fazer parte da maior
Universidade do país, A Universidade de São Paulo – USP. Vale lembrar a seguinte
diferenciação mais uma vez: o primeiro curso de Turismo na UNIVERSIDADE foi o
da USP. Ele foi organizado pelo, já mencionado, Professor Dr. Mario Beni, e
influenciou os currículos dos demais cursos que foram criados posteriormente em
faculdades e Universidades. Somente na década de 90 as demais IES receberiam o
status de Universidade.
Em 1971 o coordenador do CRP (Centro de Relações Públicas) Modesto
Farina, que viria a ser o orientador de mestrado da Professora Dóris Ruschmann,
encaminhou ofício ao Professor Mario Carlos Beni, que viria a ser o orientador de
doutorado da Professora, solicitando estudos e estrutura para a implantação do
curso superior de Turismo na escola de Comunicações e Arte, solicitando urgência
no anteprojeto. Ele reforçou que o pedido havia partido do Presidente do Conselho
de Turismo – Corintho Arruda Falcão. (TEIXEIRA S. H., 2007)
Com o anteprojeto idealizado pelo professor Mario Beni, o professor Modesto
Farina encaminhou pedido a reitoria da USP para a aprovação do curso. Em Agosto
23
Atualmente Centro Universitário Ibero-Americano - UNIBERO.
137
de 1973 iniciaram as aulas no Curso de Turismo da Escola de Comunicação e Arte
da USP, no período noturno. Mas a formatação do curso não foi tarefa fácil, dentre
as principais dificuldades, em entrevista na monografia de base de Sérgio Teixeira, o
Professor Mario Beni destacou algumas destas dificuldades: (TEIXEIRA S.H., 2007)
a) Organizar o currículo visto a não existência de um modelo
consolidado para o Ensino do Turismo;
b) Adaptar o curso ao parecer n° 35/71 do Conselho Federal de
Educação, que impôs obrigatoriedade de disciplinas a serem
ministradas e carga horária;
c) Adaptar o Curso de Turismo à Filosofia Educacional da Escola
de Comunicação e Artes da USP.
Mesmo com dificuldades as atividades do Curso de Turismo da ECA –
Universidade de São Paulo trouxe um novo fôlego para o estudo acadêmico do
Turismo no Brasil. A excelência da USP deu credibilidade ao Curso, e mesmo as
crises que atingiram todas as IES nos anos seguintes não foram suficientes para
apagar seu brilho, atraindo alunos de todas as partes do Brasil. Vamos conhecer um
pouco mais desta história durante o Relato de Experiência da Professora Dra. Dóris
Ruschmann. Não existe um consenso sobre a cronologia da criação dos cursos de
Turismo no Brasil, sendo destacado estes três primeiros como os mais significativos,
pois a partir deles foi estabelecido o currículo mínimo dos cursos, que sofreria
alterações ao longo dos anos. (TEIXEIRA S. H., 2007)
Muitas foram as iniciativas de criação de Cursos de Nível de Mestrado
voltados para o Turismo, mas não perduraram. E somente em 1997 seria criado, e
consolidado, até os dias atuais o primeiro Programa Stricto Sensu em Turismo e
Hotelaria no Brasil.
As pesquisas de Marília G. dos Reis Ansarah, datada de 1996, nos mostra o
panorama da graduação em meados da década de 90, as vésperas da oficialização
do Programa da Universidade do Vale do Itajaí. Conforme os dados por ela
apresentados montamos o seguinte gráfico que demonstra a concentração dos
cursos e a que tipo de IES estavam ligados.
138
Gráfico 01 – Divisão de Cursos de Graduação em Turismo por tipologia da IES em 1996.
Fonte: ANSARAH, 1996.
Percebe-se que a maioria dos cursos estava ligado às Instituições isoladas,
ou seja Faculdades e Centros Universitários, totalizando 50% de um total de 52
cursos. Já em Universidades, a grande maioria se localizava em Universidades
particulares (33%), e cerca de 9 cursos se localizavam em Universidades Públicas.
O Estudo de Ansarah (1996) também nos dá um panorama da graduação por
região no Brasil. A maioria dos cursos se localizava na região Sudeste, seguido pela
Região Nordeste, importante elemento de análise, a qual recorreremos
posteriormente. Observe o gráfico.
Gráfico 02 – Divisão dos Cursos de Graduação em Turismo por Região em 1996.
Fonte: ANSARAH, 1996.
139
Ao analisarmos o gráfico vemos as discrepâncias regionais, por exemplo,
quando comparamos Sudeste e Centro-Oeste. Elas são parte de um processo
histórico e não se dão ao acaso. As vésperas da criação do primeiro programa de
Pós-graduação em Turismo, que conseguiu ser reconhecido e manter
funcionamento, era esse o quadro da graduação.
A Pós-graduação Lato Sensu em 1996 já existia, porém, timidamente. Na
pesquisa realizada pela autora foram identificados 16 Cursos Lato Sensu. Os
professores que lecionavam nestes cursos eram professores convidados em mais de
56% dos casos, o que demonstrava a falta de corpo docente capacitado nas IES
onde o Turismo figurava como curso ou de graduação, ou de Especialização.
(ANSARAH, 1996)
Quanto a Pós-graduação Stricto Sensu a autora coloca que no ―levantamento
efetuado em 1994, constatou-se apenas um curso de pós-graduação stricto sensu -
a nível de mestrado (Escola de Comunicações e Artes de São Paulo), não havendo
nenhum a nível de doutorado‖. (ANSARAH, 1996, p.10)
4.2.1 A Pós-graduação Brasileira e o Parecer SUCUPIRA
Como vimos anteriormente, a formação da Faculdade, Escolas e
Universidade brasileira contou com a participação essencial de docentes e
pesquisadores estrangeiros. No Sul, em especial no Rio Grande do Sul predominava
a Escola de Pensamento Alemão (Technische Hosschule). Já na região Sudeste
predominava a Escola Europeia, em especial a Escola Francesa (École
Polithecnique). A formação no Nordeste do País sofreria miscigenação de linhas,
mas inicialmente era intrinsicamente ligada a tradição das escolas europeias. Com a
aproximação brasileira junto aos Estados Unidos também sofremos a influência da
Escola Pragmática Norte Americana por volta de 1920. Estes ilustres docentes foram
os principais responsáveis pela formação de uma Elite Intelectual Brasileira. A
formação básica dos primeiros pensadores brasileiros era ligada a escolas
confessionais, da qual a maioria veio a se distanciar posteriormente. (SAVIANNI,
2000; SANTOS C., 2003)
Assim, o grande impulso para os cursos de pós-graduação brasileiros se deu
na década de 1960. Importantes iniciativas da Universidade do Brasil na área de
Ciências Físicas e Biológicas, resultados de convênio com a Fundação Ford
140
(Fordismo), e na área de Engenharia, com a criação da COPPE – Comissão
Coordenadora dos Programas de Pós-graduação em Engenharia. (SANTOS C. S.,
2003)
Podemos exemplificar: Anísio Teixeira, de família abastada, teve sua
formação básica no Brasil, e seguiu para os Estados Unidos, onde estudou com
John Dewey. Ao retornar ao Brasil, trouxe consigo os ideais de uma escola
pragmática (Movimento Escola Nova). Milton Santos, nascido na Bahia, filho de
professores primários, formou-se em direito, mas se destacou por seus trabalhos na
área da Geografia. Teve sua formação superior na Universidade Católica da Bahia, e
seguiu para fazer Pós Graduação em Estrasburgo, na fronteira entre França e
Alemanha, retornando ao Brasil por volta de 1960 (Geografia Humanista). Já
Florestan Fernandes, mais novo que Anísio e contemporâneo de Milton Santos, de
família humilde, teve sua formação básica no Brasil, e formação superior na USP,
estudando com Roger Bastide, da Escola Francesa. Florestan defendia a criação de
uma elite intelectual brasileira que não importaria conhecimento, pelo contrário,
deveria desenvolver sua própria Escola. De fato cumpriu seu projeto com a Escola
de Sociologia Paulista, tendo Florestan como principal referencial. (SOUZA E
BRAGA, ANO; SANTOS C., 2003)
As duas tendências mais fortes que marcaram a pós-graduação brasileira foram a europeia (principalmente na USP) e a norte-americana (ITA, Universidade Federal de Viçosa e Universidade Federal do Rio de Janeiro), sendo esta última a que as principais marcas deixou. (SANTOS C. S., 2003, p. 02)
Mesmo com a fundação tardia das Universidades Brasileiras, a aliança entre
docentes e pesquisadores estrangeiros promoveu um salto na Pós Graduação
Brasileira, que crescia cada vez mais, mesmo antes do Parecer de 1965. A
repressão do governo militar acelerou o processo de implantação da Pós Graduação
Brasileira, que, em aproximadamente 20 anos já havia sido implantada por completo,
e abarcava quase todas as áreas do conhecimento. (SAVIANNI, 2000)
A USP foi a principal responsável pela expansão da Pós Graduação no país,
por ter sido construída em uma base sólida pelo estado e elite paulista, o que não
descarta a forte influência de Universidades em outras regiões como a Bahia, Rio de
Janeiro e Paraná. ―Mais abrigada das tempestades políticas e implantada com maior
solidez pela elite paulista, a USP não só sobreviveu como se tornou o principal
141
centro de ensino e pesquisa do país.‖ (FAUSTO, 1995, p.337)
A relevância da USP se deu nas mais diversas áreas do conhecimento, não
sendo privilégio do Turismo figurar entre seus cursos e escolas. A USP nasceu para
revolucionar através do conhecimento, e exercer sua influência não só em São
Paulo, mas em todo o país. Mas não foi da noite para o dia que esta Universidade se
consolidou em excelência, foi um processo de intenso trabalho, de financiamento do
governo do estado, e da influência da Elite cultural de São Paulo, preocupada com
os rumos da educação básica e secundária, bem como das faculdades isoladas
existentes. (SAVIANNI, 2000)
De fato, o impulso maior para sua criação veio de setores da elite cultural paulista preocupados com a formação de professores de nível secundário e superior, e com a formação de uma faculdade de filosofia, ciência e letras não utilitária, voltada essencialmente para a pesquisa e especulação teórica. (FAUSTO, 1995, p.339)
Como anteriormente citado o quadro inicial de professores reunia jovens
docentes estrangeiros, que aos poucos sairiam de cena para dar lugar aos alunos
por eles formados. Alguns destes jovens professores contratados pela USP
alcançariam grande destaque no campo das ciências, artes e literatura, como, por
exemplo, Claude Lévy-Strauss, fundador da Antropologia Estruturalista. (FAUSTO,
1995)
Como coloca Cunha (2007, p. 180):
No panorama da pós-graduação, sobreleva a participação das três universidades estaduais paulistas, especialmente da Universidade de São Paulo, responsável que é por praticamente 60% dos títulos de mestre e doutor conferidos em todo o país. As universidades federais do Rio de Janeiro, de Minas Gerais, de São Paulo, do Rio Grande do Sul e de São Carlos destacam-se pelos programas de pós-graduação e pesquisa, além dos cursos de graduação e atividades de extensão. (grifo nosso)
Aqui reside uma peculiaridade da Universidade Brasileira. Embora tenha
implantado suas IES Universitárias tardiamente em comparação com outros países
da América Latina, a pós-graduação se desenvolveu rapidamente. E foi em pleno
regime militar que a Universidade recebeu seu maior impulso. De acordo com o
olhar que se encerra nessa pesquisa, podemos dizer que a repressão e o
cerceamento dos direitos constitucionais durante o regime militar, principalmente do
movimento universitário, que reunia professores, acelerou o processo de negação do
regime através da pós-graduação e da graduação que cresceu em inúmeras
142
Universidades e Faculdades.
Aliado a isso, os Atos institucionais e Decretos promulgados neste
período, possibilitaram a expansão necessária e tão disseminada pelo Governo
Militar. (CUNHA, 2007)
Essa experiência suscitou interesse por parte dos administradores públicos e dos acadêmicos de vários países pela rapidez em que foi efetivada (uma década), pela amplitude (todas as áreas do conhecimento), e pela legitimidade (grande receptividade dos diversos setores intra e extra acadêmicos). (CUNHA, 2007, p. 180)
Alianças entre pesquisadores e docentes experientes, já iniciadas na década
de 50, trouxeram fôlego e foram criados novos laboratórios, prédios foram
construídos, em um processo de modernização das Universidades existentes, que
tinham como modelos a USP e a recém inaugurada Universidade de Brasília, a mais
moderna entre as Universidades existentes. Esse processo de modernização atraiu
grande número de estudantes ao nível superior. (CUNHA, 2007)
Enquanto em países da América Latina o período de revoluções foi marcado
pelo obscurantismo acadêmico, no Brasil, mesmo na fase mais dura do Regime
Militar, a ambiciosa modernização da Universidade se deu de maneira especial.
Resultado de esforços conjuntos, a pós graduação é seu maior reflexo.
Foi no ano de 1965 que foi publicado o Parecer que regulamentou a Pós
Graduação Brasileira, que teve entre os pareceristas Anísio Teixeira. Na primeira
parte do Parecer n°477/1965 percebe-se a preocupação com o crescimento que já
se dava no Brasil dos cursos de Pós-graduação.
[...] considerando a necessidade de implantar e desenvolver o regime de cursos-pós-graduação em nosso ensino superior e tendo em vista a imprecisão, que reina entre nós, sobre a natureza desses cursos, solicita ao Conselho pronunciamento sobre a matéria que defina e, se for o caso, regulamente os cursos de pós-graduação a que se refere a letra b do art. 69 da Lei de Diretrizes e Bases. (Parecer CFE no 977/65, 1965, p. 162)
O Parecer vem conceituar devidamente os cursos de pós-graduação que
tinham sua definição um tanto vaga, prestando-se a interpretações discordantes.
Além de solicitar uma definição dos cursos de Pós-graduação ela solicitou uma
interpretação básica da legislação referente, discutindo inclusive, aspectos básicos
sobre as quais devem se desenvolver a Pós Graduação Brasileira. Entende-se que
143
estes cursos deveriam se voltar para a formação de Docentes e Pesquisadores,
voltados para os cursos superiores se desenvolvendo em dois ciclos sucessivos
equivalentes ao grau de Master e Doctor, seguindo o exemplo da pós-graduação
norte-americana.
As exigências para sua realização, e regulamentação, ficou a cargo do CFE –
Conselho Federal de Educação, que fica responsável pela expedição dos diplomas.
O Parecer ainda coloca que seria preferível que esses cursos se dessem em
Universidades, e somente em último caso em Institutos de Ensino Superior Isolados,
ficando sujeito a aprovação prévia do Conselho Federal de Ensino. (Parecer CFE no
977/65, 2005, p. 162)
Ele traz algumas observações sobre as origens históricas da Pós graduação,
localizando-as principalmente nas Universidades Norte Americanas.
A pós-graduação - o nome e o sistema - tem sua origem próxima na própria estrutura da universidade norte-americana, compreendendo o college como base comum de estudos e as diferentes escolas graduadas que geralmente requerem o título de bacharel como requisito de admissão. Assim, em virtude dessa organização a Universidade acha-se dividida em dois grandes planos que se superpõe hierarquicamente: o undergraduate e o graduate. [...] Mas o desenvolvimento sistemático da pós-graduação nos Estados Unidos pode ser considerado como produto da influência germânica e coincide com as grandes transformações das universidades americanas nas últimas três décadas do século passado. É quando a universidade deixa de ser uma instituição apenas ensinante e formadora de profissionais para dedicar-se às atividades de pesquisa científica e tecnológica. Na verdade, a pós-graduação adquire seu grande impulso com a fundação da Universidade John Hopkins em 1.876, criada especialmente para desenvolver estudos pós-graduados e inspirada na ideia da creative scholarship. (Parecer CFE no 977/65, 2005, p. 162)
Partindo da experiência Norte-americana, o parecer salienta a
responsabilidade da pós graduação na construção do conhecimento, nos avanços
da pesquisa, uma Universidade preocupada não só com o ensino e formação
profissional, mas uma Universidade que produz conhecimento, sendo este
conhecimento criativo e transformador. Ele apresenta a Pós graduação como uma
necessidade primordial para o país e para o ensino, que se volta para a pesquisa
gerando conhecimento autônomo, ao passo que coloca:
Independente dessas origens, o sistema de cursos pós-graduados hoje se impõe e se difunde em todos os países, como a consequência natural do extraordinário progresso do saber em todos os setores, tornando impossível proporcionar treinamento completo e adequado para muitas carreiras nos limites dos cursos de graduação. (Parecer CFE no 977/65, 2005, p. 162)
144
Ainda, o parecer sucupira diz que, ao manter somente os cursos de
graduação no ensino superior, seria necessário aumentar o tempo de duração dos
cursos, visto as diversas especialidades e ramificações que o conhecimento e os
saberes tomaram após a Revolução Industrial. Aumentar o tempo da graduação
seria uma postura antipedagógica. Seria frustrar as aspirações daqueles que
―buscam ampliar e aperfeiçoar seus conhecimentos, senão lhes proporcionássemos
um ciclo mais elevado de estudo onde pudessem ser aproveitados seus talentos e
capacidades‖. Fazia-se necessário que a Universidade acompanhasse as
transformações ocorridas na sociedade, e a pós-graduação vem cumprir esse papel.
Até esse momento ele não faz a distinção entre lato e stricto. (Parecer CFE no
977/65, 2005, p. 164)
O desenvolvimento da pós-graduação seria desenvolver o amor ao saber,
amor ao conhecimento, e aproveitar todas as possibilidades e talentos da
Universidade Brasileira. O documento mais de uma vez faz referência a
Universidade Norte-Americana, que já havia visto nos estudos pós-graduados a
força da Universidade, e implantado na Universidade de Princeton, inclusive, o nível
pos doctoral. A Pós graduação seria assim a marca distintiva da Universidade como
campo de construção do conhecimento teórico e prático.
No que concerne à Universidade brasileira, os cursos de pós-graduação, em funcionamento regular, quase não existem. Permanecemos até agora aferrados à crença simplista de que, no mesmo curso de graduação, podemos formar indiferentemente o profissional comum, o cientista e o tecnólogo. (Parecer CFE no 977/65, 2005, p. 164 - 165)
Assim, são delimitados no Parecer três motivos principais para a
regulamentação dos cursos pós-graduados no Brasil, a saber:
a) Formar corpo docente competente atendendo a expansão
quantitativa do ensino superior, garantindo níveis de qualidade;
b) Fomentar a pesquisa científica por meio da preparação e
capacitação adequada de pesquisadores;
c) Assegurar capacitação técnica e treinamento eficaz a técnicos e
trabalhadores intelectuais, de alto padrão, em face ao
desenvolvimento nacional em todos os setores.
145
Para tal usou-se como modelo para a implantação da pós-graduação
brasileira, a Pós graduação Norte Americana, que inclusive é salientado no título:
―Um exemplo de Pós Graduação: A Norte Americana”. Ao conceituar a Pós
Graduação, o Parecer Sucupira efetua uma diferenciação entre as categorias de Pós
Graduação, a primeira delas Lato Sensu:
Em primeiro lugar impõe-se distinguir entre pós-graduação sensu stricto e sensu lato. No segundo sentido a pós-graduação, conforme o próprio nome está a indicar, designa todo e qualquer curso que se segue à graduação. Tais seriam, por exemplo, os cursos de especialização que o médico, nos Estados Unidos, deve freqüentar a fim de poder exercer uma especialidade da Medicina. Embora pressupondo a graduação esses e outros cursos de especialização, necessariamente, não definem o campo da pós-graduação sensu stricto. Normalmente os cursos de especialização e aperfeiçoamento tem objetivo técnico profissional específico sem abranger o campo total do saber em que se insere a especialidade. (Parecer CFE no 977/65, 2005, p. 165)
Depois passa a conceituar a Pós-graduação Stricto Sensu:
[...] enquanto a pós-graduação, em sentido restrito, define o sistema de cursos que se superpõe à graduação com objetivos mais amplos e aprofundados de formação científica ou cultural. Cursos pós-graduados de especialização ou aperfeiçoamento podem ser eventuais, ao passo que a pós-graduação em sentido próprio é parte integrante do complexo universitário, necessária à realização de fins essenciais da universidade. Não se compreenderia, por exemplo, a existência da universidade americana sem o regime normal de cursos pós-graduados, sem a Graduate School, como não se compreenderia universidade europeia sem o programa de doutoramento. (Parecer CFE no 977/65, 2005, p.165, grifo nosso)
Assim, a Pós graduação Stricto seria responsável pela pesquisa em seu mais
alto grau e nível de qualidade. Seria responsável pela formação de uma elite de
pesquisadores e docentes. A pós-graduação sensu stricto seria responsável por
conferir grau acadêmico, sendo atestado de uma alta competência científica em
determinado ramo do conhecimento, sinal de uma autêntica Scholarship (Escola de
Pensamento). (Parecer CFE no 977/65, 2005)
O documento organizou a Pós Graduação Stricto Sensu em dois níveis:
Mestrado e Doutorado. Inicialmente eles eram autônomos, mas mudanças
ocorreram e apenas a USP é conhecida por ter o Doutorado direto, embora esse
seja previsto em Legislação, não é praticado por outras instituições de Ensino
Superior. Somente a USP mantem o nível de Livre Docência, ou seja, Docente Livre,
grau mais alto de titulação acadêmica no Brasil. O Parecer tratou desde a
146
conceituação, até os métodos de ensino e aprendizagem, sendo um documento bem
completo, e que sofreu poucas alterações.
Talvez a mais significativa seja a inclusão de uma categoria a mais de
Mestrado, no governo do Presidente Luís Inácio (LULA), recentemente, O Mestrado
Profissional. Este vem suprir a carência de Mestrados voltados para formação de
profissionais de alto nível, e pode vir a incluir cursos Lato Sensu que são
extremamente bem consolidados e que poderiam se enquadrar nessa categoria,
como é o caso da Especialização em Docência no Nível Superior da Universidade
Estadual de Londrina (CEMAD – 30 anos). O intenso valor que é dado ao
conhecimento prático e utilitário, revela um paradoxo no padrão da pós-graduação,
de origem acadêmica, ―diferença essa que tende a ser minimizada com o advento do
mestrado profissional‖. (SANTOS C., 2003, p. 633)
Assim sendo, a Pós Graduação se divide atualmente em:
a) Pós Graduação Lato Sensu: Cursos de Especialização e
Aperfeiçoamento;
b) Pós Graduação Stricto Sensu: Mestrado Profissional,
Mestrado Acadêmico e Doutorado (Pós Doutorado e Livre
Docência).
4.2.2 Peculiaridades da Pós Graduação Stricto Sensu No Brasil
Os cursos de pós-graduação lato sensu, embora oferecidos em alguns casos
sob a forma de extensão, assumem dominantemente as formas de aperfeiçoamento
e especialização e constituem uma espécie de prolongamento da graduação. Já os
cursos de Pós-Graduação Stricto sensu, conforme coloca Demerval Savianni (2000,
p.02):
Em contrapartida, a pós-graduação stricto sensu, organizada sob as formas de mestrado e doutorado, possuem um objetivo próprio, distinto daquele dos cursos de graduação sendo, por isso mesmo, considerada como a pós-graduação propriamente dita. Nessa condição, diferentemente dos cursos de graduação que estão voltados para a formação profissional, a pós-graduação stricto sensu se volta para a formação acadêmica traduzida especificamente no objetivo de formação de pesquisadores.
Assim, enquanto o ensino seria o pilar da Pós-graduação Lato, a Pesquisa
seria o fundamento básico da Pós-graduação Stricto. Incorporou-se ao jargão
147
utilizado na academia a nomenclatura de Curso de Especialização ou Curso de
Aperfeiçoamento para a Pós-graduação Lato Sensu, visto que ela pode ser extinta,
ou modificada com maior rapidez. Consolidou-se a nomenclatura Programa de Pós
Graduação para o Mestrado e Doutorado, visto que eles englobam uma
continuidade e são bases fundamentais da Universidade. (SAVIANNI, 2000)
Esta nomenclatura também foi abordada na LDB de 1996:
A referida distinção, já incorporada à história de nossa pós-graduação, foi também consagrada no texto da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a Lei número 9.394, promulgada em 20 de dezembro de 1996, a qual reserva o termo programa para a pós-graduação stricto sensu, utilizando o termo curso para a pós-graduação lato sensu, conforme estipulado no artigo 44: A educação superior abrangerá os seguintes cursos e programas: I - cursos seqüenciais...; II - de graduação...; III - de pós-graduação, compreendendo programas de mestrado e doutorado, cursos de especialização, aperfeiçoamento e outros, abertos a candidatos diplomados em cursos de graduação e que atendam às exigências das instituições de ensino (SAVIANNI, 2000, p.03, grifos do autor)
Assim, em nosso trabalho trabalharemos com essa nomenclatura básica,
embora a maioria dos Programas possuam apenas o nível de Mestrado. A
implantação no Brasil foi feita a partir do nada, tendo apenas algumas referências.
Por esse motivo, Savianni (2000) chama de Período Heroico, onde, praticamente
sem equipamentos, sem capital humano e intelectual disponível, se criou a Pós-
graduação Brasileira, vindo a se tornar uma das mais bem conceituadas na América
Latina.
Chamo a esta fase de período heróico porque foi necessário criar as condições praticamente a partir do nada. Servindo-se de doutores formados no exterior ou pelo processo do doutorado direto previsto nos Estatutos e Regimentos das universidades, aos quais se agregaram mestres também formados no exterior e, em seguida, aqueles alunos titulados nos programas pioneiros de mestrado instalados no país, a pós-graduação foi sendo implantada suprindo-se a carência de infra-estrutura com muito trabalho e criatividade como, por exemplo, na falta de bibliotecas adequadas, a aquisição de livros por parte dos docentes que os transportavam no porta-malas do próprio veículo para disponibilizá-los junto aos alunos nas instituições em que os programas começavam a funcionar. (SAVIANNI, 2000, p. 05)
Geralmente o coordenador do curso era, ao mesmo tempo o relator,
organizador e secretário. Os docentes se desdobravam entre suas jornadas na
graduação, aulas nos programas, orientação de alunos e serviços burocráticos. Sem
o esforço destes comprometidos docentes-pesquisadores a Pós-graduação
148
brasileira seria impossível. A CAPES veio a desempenhar papel importante,
apoiando financeiramente através das bolsas, e de verbas para pesquisa, bem como
aconselhando a implantação dos programas.
As primeiras iniciativas de Mestrado e Doutorado foram na área de Educação,
e o apoio da CAPES se fez crucial. Voltando à trajetória histórica das iniciativas
pioneiras destacam-se a Pontifícia Universidade Católica-RJ em 1965 e da Pontifícia
Universidade Católica -SP na área de Psicologia Educacional. A PUC foi a primeira
IES particular a receber o status de Universidade, ainda na década de 1960. Uma
das estratégias elaboradas pela CAPES para fomento da Pós-graduação foi induzir
a criação, por área de conhecimento, de Associações Nacionais. A primeira delas foi
na área de educação, a ANPED - Associação Nacional de Pesquisa e Pós-
Graduação em Educação. (SAVIANNI, 2000)
O Turismo também criou sua associação, que preza pela excelência em
Pesquisa, e tem desenvolvido um papel essencial na reunião dos Acadêmicos e
Pesquisadores do Turismo no Brasil. Estamos falando da ANPTUR24 – Associação
Nacional de Pesquisa e Pós Graduação em Turismo. Tem como atual Diretor
Científico o Professor Dr. Francisco Antônio dos Anjos (UNIVALI) e Diretora
Presidente a Professora Dra. Elizabeth Kyoko Wada (UAM). Segundo conta em seu
histórico, a instituição foi criada em 2002, na UNIVALI, possuindo uma década de
muitas histórias. Acontece anualmente seu Congresso, reunindo os maiores
pesquisadores expoentes da área de Turismo no Brasil e no Exterior.
A Pós-graduação Stricto Sensu organizada em dois níveis hierárquicos –
Mestrado e Doutorado – se localizaria ligada ao que ficou denominada Grande Área.
Os estudos compreenderiam matérias, disciplinas relativas à Área de Concentração,
sendo este um campo específico do conhecimento, que se inter-relacionam com o
objeto de estudo escolhido na pesquisa, além de disciplinas de domínio conexo,
áreas complementares e correlatas relacionadas à temática de pesquisa. Ela se
completa através da produção de um trabalho científico, no caso do Mestrado
denominado Dissertação, e no Doutorado denominado Tese. (SAVIANNI, 2000)
Como dito anteriormente, nossa estrutura administrativa dos programas de
pós-graduação teve como modelo a experiência norte americana. Nos Estados
Unidos, com fortes influências da Escola pragmática (John Dewey - Escola Nova),
24
ANPTUR, 2013. Maiores informações sobre a instituição, publicações e filiação podem ser encontradas no
hiperlink no endereço < http://www.anptur.org.br >.
149
prevalecia na educação básica uma socialização entre os alunos, embasados em
um discurso de desenvolvimento de autonomia e iniciativa. O domínio de alguns
conhecimentos sistematizados ficava em segundo plano; em contrapartida, no nível
superior, os alunos eram postos diante de uma estrutura bem definida que visava
ampliar os conhecimentos previamente adquiridos, com a orientação e direção dos
docentes. (SAVIANNI, 2000)
Já na Europa, os sistemas de educação básica foram organizados tendo
como principal influência as reformas apregoadas no período iluminista, onde o
domínio dos conhecimentos sistematizados se fazia essencial. A consequência disso
era esperar que os alunos do ensino superior tivessem domínio de determinados
conteúdos, dotados de certo grau de maturidade e autonomia intelectual,
dispensando por parte dos professores uma orientação direta e contínua.
E, especialmente na pós-graduação, que era constituída fundamentalmente pelo doutorado, esperava-se que os candidatos concebessem e realizassem por si mesmos o próprio trabalho sendo o orientador mais um examinador e o presidente das bancas de exame do que alguém que dirigia e interferia diretamente na definição e desenvolvimento do tema de estudo do doutorando. Assim, enquanto a experiência universitária norte-americana põe uma certa ênfase no aspecto técnico-operativo, na experiência europeia a ênfase principal recai sobre o aspecto teórico.(SAVIANNI, 2000, p.13)
Assim, com a estrutura administrativa hierarquizada que se aproximava da
escola norte-americana, e os conteúdos acadêmicos que se aproximavam da escola
europeia, desenvolve-se a Pós-Graduação Brasileira, com um peculiar ―hibridismo‖
acadêmico. Afinal, como visto anteriormente, ―sabemos do peso da influência
europeia sobre os intelectuais brasileiros‖. (SAVIANNI, 2000, p.14)
Esta caracterização peculiar dos programas de Pós-graduação Brasileiros
trouxe riqueza aos trabalhos defendidos, que no inicio possuíam maiores prazos, e
as dissertações deles resultantes se constituíam como verdadeiras Teses,
dissertações de fôlego. Estas particularidades ―da pós-graduação brasileira que lhe
permitiu se constituir numa das mais ricas e consistentes experiências de pós-
graduação‖. (SAVIANNI, 2000, p. 14)
Baseando-se na pedagogia Construcionista de Piaget, poderíamos colocar
que a graduação seria um nível de aquisição de conceitos, uma iniciação científica,
que inclusive é praticada na graduação brasileira, não obrigatoriamente, através da
elaboração de um Trabalho ou Relatório de Conclusão de Curso. A Iniciação
150
científica teria como objetivo iniciar o educando na pesquisa científica, ainda em um
nível básico e generalizado, o que nem sempre acontece. Já a Pós-graduação Lato
seria o campo de aperfeiçoamento específico do aluno, e aprimoramento de
técnicas, podendo culminar ou não na elaboração de uma Monografia ou Artigo
Científico.
A Pós-graduação Stricto Sensu, dividida hierarquicamente em dois níveis
teriam a responsabilidade de elaboração e consolidação de conceitos científicos. Ela
prima pela formação de docentes e pesquisadores. No nível de Mestrado o
educando entra em contato com uma maior densidade metodológica, ligada ao seu
projeto de pesquisa, e espera-se que ele elabore e reelabore o conhecimento
adquirido, visando o desenvolvimento de certa autonomia intelectual. Este se
configura na Pós-graduação brasileira na confecção da Dissertação de Mestrado.
(SAVIANNI, 2000)
O Doutorado pode ser considerado, nesse viés, a fase de consolidação do
conhecimento, não como uma obra acabada, mas sim com uma obra que possui
densidade teórica, advinda dos conhecimentos prévios do pesquisador, articulando
novos conceitos desenvolvidos entre as disciplinas e pesquisas paralelas,
culminando no desenvolvimento de uma pesquisa original, e quase sempre inédita.
Esta pesquisa se configura na Pós-graduação Brasileira como a Tese de Doutorado.
Nos níveis superiores ao Doutorado (Pós Doutorado e Livre Docência), espera-se
que o docente pesquisador, portador de autonomia intelectual desenvolvida
anteriormente, e já consolidada, elabore Pesquisas e Teses inéditas, dotadas de
originalidade ímpar. Como coloca Savianni:
E como a Pós-graduação Stricto sensu está organizada em dois níveis, Mestrado e Doutorado, conclui-se que o primeiro nível tem o sentido de iniciação à formação do pesquisador, reservando-se ao segundo nível a função de consolidação. Assim, embora seja desejável que a iniciação se dê já no nível da graduação, não parece razoável inscrevê-la como uma exigência obrigatória já nessa primeira etapa do ensino superior. [...] Com efeito, como já foi lembrado anteriormente, o vetor principal dos cursos de graduação é a formação profissional e não a formação de pesquisadores. (SAVIANNI, 2003, p. 14)
Os Programas acadêmicos voltam-se a formação de docentes e
pesquisadores, sendo este de grande importância para manter a qualidade do
ensino e das pesquisas nas Universidades e demais IES. Reside aqui também um
151
ponto chave de escolha dos nossos informantes de pesquisa, nossos atores sociais.
Todos os participantes em nossa pesquisa possuem: Nível de no mínimo
Doutorado, ou seja, possuem conhecimento consolidado, denso e aprimorado,
passíveis de análise. Ao mesmo tempo, estão ligados aos Programas de Pós-
graduação Stricto Sensu em Turismo, como docentes e pesquisadores, o que
garante sua produção teórica voltada para esta temática. Ao defenderem suas
Teses de Doutorados, onde se pressupõe consolidação e densidade epistemológica,
possuem posicionamentos claros e distintos os quais defendem e revelam em seus
textos, que em nosso trabalho se configuram em unidades de leitura e análise.
A Tese pressupõe, em consequência, os requisitos de autonomia intelectual e de originalidade, já que estas são condições para que alguém possa expressar uma posição própria sobre determinado assunto. Ora, tais requisitos não são necessariamente exigidos no caso do mestrado. Supõe-se, antes, que é a conclusão do mestrado que propiciará o preenchimento destes requisitos, uma vez que, tendo realizado, com o apoio do orientador, um trabalho completo de investigação, esse exercício nas lides da pesquisa lhe permitirá adquirir um domínio teórico e prático do processo, atingindo, assim, a desejada autonomia intelectual que lhe facultará a formulação original de novos objetos de investigação. (SAVIANNI, 2000, p. 15, grifo nosso)
Assim, as dissertações na visão de SAVIANNI (2000), serviriam como
Monografia de base, onde são aprofundados de forma mais ampla conceitos que,
servem ao pesquisador como passo prévio para o Doutorado. Ao mesmo tempo,
serviriam de base para outros pesquisadores elaborarem seu trabalho, sem a
necessidade de se refazer todo o caminho da pesquisa. Em nossa dissertação
utilizamos de algumas Dissertações como monografias de base, não só avançando
no conhecimento, mas reconhecendo a competência e qualidade dos pesquisadores
e dos trabalhos por eles desenvolvidos durante o mestrado. Um exemplo é a
Dissertação, defendida na área da educação, de Sérgio Teixeira, voltado para a
história da graduação em Turismo no Brasil. (SAVIANNI, 2000)
A Pesquisa torna-se assim o campo de construção e articulação dos saberes,
onde o educando coloca em prática os conhecimentos adquiridos, os materiais e
aprofundamentos desenvolvidos em sala de aula, bem como a pesquisa
aprofundada em bases de dados e buscas. No Mestrado o aluno entra em contato
com novas práticas, novas visões, a pesquisa seria o seu ponto de consolidação e
articulação, sem a qual não chega a existir a Pós-graduação e muito menos a
Universidade. (SAVIANNI, 2000; FIGUEIREDO, 2008)
152
Outra característica peculiar da Pós-graduação Brasileira se dá em sua
estrutura permeada de hibridismo acadêmico. A adoção de aspectos formativos de
outros países trouxe alguns problemas, mas também conferiu a nossos programas
uma riqueza incomensurável. Como coloca Darcy Ribeiro: ―A experiência brasileira
de pós-graduação é a coisa mais positiva da história da educação superior no Brasil
e é também a que tem que ser levada a sério‖. (RIBEIRO apud SANTOS C., 2003, p.
01)
A Universidade Brasileira se via influenciada pela Escola europeia,
principalmente a USP. No Sul, sofria fortes influências da Escola Alemã, em outras
Universidades também poderíamos colocar a influência anglo-saxão. Com a
proximidade entre Brasil e Estados Unidos, inclusive através de acordos e parcerias
formadas, instala-se uma corrente americana de ensino em todos os níveis, que
preza pelo tecnicismo. No Parecer Sucupira tomaram-se, como exemplo, os
programas norte americanos, dando aos programas brasileiros uma estrutura similar.
Por outro lado, docentes com fortes ligações com a Escola Europeia, mantem
o nível elevado de avaliação e incentivo, se valendo de uma abordagem curricular
acadêmico ou acadêmico-empírica, mais aproximada da Escola europeia não anglo-
saxão. (SANTOS, 2003; SAVIANNI, 2000)
Mesmo com toda a riqueza da Pós-graduação Brasileira, esta também
passaria por alguns problemas por conta de seu hibridismo. Um dos problemas
suscitados é a dificuldade existente no campo da ―Compatibilidade de Títulos‖. Os
termos referentes à pós-graduação empregados no Brasil não encontram,
necessariamente, correlatos em outros países, daí a dificuldade de equivalência de
títulos.
Na tradição espanhola, após o bacharelato vem a licenciatura; já no Brasil, a
licenciatura é um curso no nível de graduação, não de pós-graduação. Na tradição anglo-saxônica, após o bachelor segue-se o master; nesse sistema o bachelor ―é um tipo de estudo que, se fosse terminal, seria um pouco mais que decorativo [...]. Uma das funções mais importantes do mestrado anglo-saxão foi a de especializar e aprofundar a formação dispersa e multidisciplinar do bachelor‖. Por outro lado, na França o título de docteur de
specialité equivale ao título de mestre no Brasil. Já nos Estados Unidos, o master como grau final não é muito valorizado, conta ―apenas como um começo de carreira, e é um grau de obtenção relativamente fácil, com um nível de exigências consideravelmente mais baixo que o doutorado‖ (SANTOS C. S., 2003, p. 08)
Um exemplo que podemos citar é o título de Ph.D, que teve sua origem na
153
Faculdade de Filosofia do modelo universitário Alemão, pelo qual a antiga Faculdade
de Artes se tornou a Faculdade de Filosofia, que inspirou a formação da USP ao
redor de um tronco único, a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras em 1934.
Mesmo assim, ainda existe certa resistência a este título no Brasil. Em 1965, quando
a pós-graduação brasileira foi regulamentada, os títulos franceses equivalentes ao
Ph.D. norte-americano e alemão seriam os de docteur ès sciences e docteur ès
lettres, que corresponderiam aos doutorados ligados aos cursos da área de Ciências
Humanas. (SANTOS C.S., 2003)
Assim, a CAPES25 passa a regulamentar, regular, controlar e fomentar a Pós-
graduação Brasileira. Em 1976 realizou a primeira avaliação.
A Avaliação institucional surgiu no Brasil na pós-graduação. Em 1976 foi realizada a primeira avaliação de todos os programas de Mestrado e Doutorado do país, públicos e privados, por comissões organizadas pela Coordenação do Aperfeiçoamento do Pessoal do Nível Superior – CAPES, do Ministério da Educação. De anual até 1981, a avaliação tornou-se bianual a partir de 1982. (CUNHA, 2007, p. 85)
Os métodos e a avaliação da pós-graduação stricto sensu foram criados em
1976, sendo um instrumento importante para o Sistema Nacional de Pós-Graduação
(SNPG). Ele age no fomento a pesquisa junto a agências brasileiras e organismos
internacionais. A CAPES, ou a Avaliação CAPES conceitua os programas em uma
avaliação de notação segundo os seguintes critérios:
Os programas recebem conceitos na seguinte escala: 1 e 2, que descredenciam o programa; 3 significa desempenho regular, atendendo ao padrão mínimo de qualidade; 4 é considerado um bom desempenho e 5 é a nota máxima para programas com apenas mestrado. Conceitos 6 e 7 indicam desempenho equivalente ao alto padrão internacional. A cada três anos, todos os cursos em funcionamento são reavaliados. (CAPES, 2013, s/p)
A avaliação fornece subsídios e aprofunda o panorama dos programas de
pós-graduação no Brasil, prezando pela qualidade dos cursos em um processo de
desenvolvimento acompanhado e coordenado. Quando se trata de Políticas Públicas
é a partir da avaliação que se ―obtêm elementos e indicadores que permitem induzir
e fomentar ações governamentais de apoio à pós-graduação brasileira.‖ (CAPES,
2013, s/p)
25
As informações aqui citadas pela entrada ―CAPES, 2013‖ estão disponíveis na Plataforma Virtual da CAPES,
são de acesso público e gratuito, podendo ser acessadas através das referências constantes em nossa pesquisa, ou através do hiperlink no endereço < http://www.capes.gov.br/ >.
154
A descrição da avaliação da CAPES e suas funções deixa claro que um dos
objetivos é, através dos resultados alcançados, traçar estratégias e ações, a fim de
alcançar as metas principais; o Avanço tecno-científico, e o Desenvolvimento.
Como resultado, é possível impulsionar o avanço científico e tecnológico e desenvolver o país, com ações de promoção de programas específicos para diminuir as assimetrias entre regiões do Brasil ou intra e inter áreas do conhecimento. (CAPES, 2013)
O Ministério da Educação, por meio do Conselho Nacional de Educação,
reconhece a CAPES e os resultados por ela apresentados na Avaliação Trienal. Em
seu sítio na internet, a página da CAPES disponibiliza esses dados ao público,
sendo fonte rica de pesquisa, inclusive utilizada por nós nesta pesquisa. É
importante ressaltar que ―os cursos que não possuem a recomendação da Capes,
não são autorizados pelo MEC e, por consequência, não fazem parte do Sistema
Nacional de Pós-Graduação (SNPG)‖. (CAPES, 2013, s/p)
A obrigatoriedade da avaliação, reconhecimento e recomendação da CAPES
garante segurança aos educandos que buscam um título, ao mesmo tempo,
fornecem um referencial sobre a estruturação e ampliação dos programas de pós-
graduação. Este é um aspecto crucial, somente assim ele pode conceder diplomas,
o título de mestre e doutor. Diante do exposto, a partir da CAPES e de sua estrutura
que, criteriosamente, selecionamos os programas de pós-graduação Stricto Sensu
em Turismo abordados nesta dissertação.
A Pós-graduação Stricto Sensu na Universidade brasileira é o Espaço
privilegiado de construção do conhecimento. Ela é o Lugar onde se encontram e se
reencontram teoria e prática acadêmica. Quando falamos de Espaço falamos de sua
história social e geográfica. Quando falamos de Lugar é o significado que toma a
Universidade e a Pós-graduação para a humanidade e a sociedade, como mediador
no alcance e construção do conhecimento. Conhecimento este que deve ser
pautado de forma democrática, onde possam conviver diferentes linhas de pesquisa.
Democrático no acesso do estudante a Programas de pós-graduação de excelência.
E porque não, democrático com possibilidades de maior participação nas decisões
referentes a pós-graduação Brasileira junto aos órgãos reguladores.
155
4.3 RELATO DE EXPERIÊNCIA - DRA. DORIS VAN MEENE RUSCHMANN26
Até este momento foram abordadas variáveis objetivas e históricas na
formação e desenvolvimento do Programa de Pós-graduação brasileiro. A fim de
enriquecimento na análise do desenvolvimento dos espaços de construção do
conhecimento Stricto Sensu em Turismo, se faz essencial ouvir a experiência vivida
pelos atores sociais, sujeitos, pesquisadores que participaram daquele que seria o
início de um grande crescimento no campo da pós-graduação em turismo,
influenciando o desenvolvimento de novos programas, de novos olhares sobre um
campo que começava a conquistar seu espaço no meio acadêmico.
A construção do conhecimento se dá em um espaço físico, objetivo, concreto,
mas ele não existe sem o humano, ou se existe sem o homem, inexiste em
significado. A vivência dos atores sociais, dos primeiros professores, dos primeiros
formados em Turismo no Brasil é um relato rico, que contribui de maneira
inestimável nesta presente dissertação.
Convidamos nossa Professora Dra. Doris Van Meene Ruschmann, docente,
pesquisadora e fundadora do Programa de Pós-graduação em Turismo e Hotelaria -
UNIVALI para nos contar sua experiência. Experiência esta que ela viveu durante
sua formação acadêmica e profissional, em especial na Universidade de São Paulo,
bem como sua experiência como Docente, e Pioneira responsável pela criação dos
primeiros cursos de pós-graduação (lato e stricto) em Turismo no Brasil.
Ela nos concedeu um pouco de seu precioso tempo para contar uma história
de sucesso, dedicação e compromisso com o conhecimento e a formação de
profissionais do turismo espalhados hoje por todo o país. A história da Professora
Doris se confunde com a própria história e desenvolvimento do conhecimento em
turismo no Brasil. Uma história versada pelos atores sociais, dos bastidores, das
conquistas, dos desafios e do encantamento por uma área de conhecimento em
permanente construção. Narramos, em terceira pessoa, esta tão bonita trajetória.
Era Década de 70, a professora Doris viajava bastante, inclusive muitas
viagens internacionais. Nascida em Blumenau, quando seu segundo filho entrou na
escola, viu possibilidades de se dedicar a uma faculdade. Quando morou em Belo
26
O Relato de experiência nessa sessão apresentado foi concedido pela Professora DRA. DORIS VAN MEENE
RUSCHMANN, em entrevista realizada na UNIVALI. Esta foi captada em áudio e vídeo e aqui reproduzidos alguns trechos. Consta como Informação Verbal nas entradas de citações e referencias, segundo normas da ABNT, assim como dados da Pesquisa.
156
Horizonte, fez um curso de secretariado executivo, mas nunca havia se arriscado a
fazer uma faculdade por conta das constantes viagens do marido. Eles vieram a
residir em São Paulo, morando no bairro do Brooklin. Foi então que, com os filhos
crescidos, Professora Doris resolveu procurar um curso de graduação que não
atrapalhasse o convívio familiar e que fosse próximo a sua residência.
Ao pesquisar, descobriu que havia uma Faculdade no Morumbi que oferecia o
curso de Turismo – Faculdade Anhembi Morumbi. Como sempre gostou de viajar,
não sabia nem o que exatamente ela iria aprender, mas resolveu apostar. Prestou
vestibular e com certa facilidade foi admitida no Curso de Turismo, no ano de 1976
na então Faculdade.
Em 1980, 4 anos depois, estava formada. Durante algum tempo trabalhou
com Assessoria na organização Acadêmica junto ao atual reitor da UAM. Ela havia
desenvolvido um plano de trabalho, e encontrou problemas sobre o exercício da
profissão de Turismóloga. A profissão ainda era nova no Brasil, e se ainda hoje
temos dificuldades em definir até que ponto vai atuação do TURISMÓLOGO, no
início era ainda mais complicado.
Foi então que uma colega de trabalho solicitou uma cópia do plano de
trabalho da Professora Doris e encaminhou denúncia ao Ministério do trabalho,
falando da execução de tarefas e ações destinadas ao profissional de Relações
Públicas e não ao TURISMÓLOGO, acusando-a de exercício ilegítimo da profissão.
Eram apenas os primeiros desafios dessa primeira fase, inicio do trabalho da
Professora Doris.
Ao ser notificada procurou seu superior, e lhe disse que se encontrava
perdida, não sabia muito bem o que fazer. Seu superior a acalmou, os problemas
foram solucionados sem maiores complicações, e a Professora Doris continuou
trabalhando por mais seis meses, descontinuando suas atividades após esse
período.
Por volta de 1982, passado quase um ano do incidente na UAM, a professora
Doris foi a um evento do Curso de Turismo na USP. O curso, que existia desde
1973, não estava se desenvolvendo de maneira ideal. A reitoria estudava o
fechamento do curso, o que seria uma grande perda.
O Curso da USP não possuía registro de formados, de defesas de trabalho de
conclusão de curso, turmas não estavam sendo formadas, ou seja, o curso não
estava conseguindo cumprir o seu papel de formar profissionais capacitados na área
157
para atuar tanto no campo da educação como no mercado que se descortinava no
Brasil, por inúmeras razões.
Através de uma seleção interna, a professora Doris iniciou sua carreira
Docente na USP, substituindo um professor que havia se mudado para o Maranhão.
Lembrando que a USP é uma universidade pública, e a legislação brasileira permite
a contratação sem concurso público em regime temporário, em caso de necessidade
ou falta de corpo docente. Professor concursado somente com o nível de Doutorado.
Nessa época a professora ainda não havia começado seus estudos no nível
de Mestrado. Ela assumiu a disciplina com o compromisso de cumprir o mestrado.
Passou a ser Mestranda orientanda do Professor Farina, iniciando suas atividades
no Mestrado em Comunicação no ano de 1983.
Começava um novo desafio: O que pesquisar? Em uma conversa com seu
orientador, professor Farina, ele a aconselha a pesquisar Marketing, temática ainda
não explorada no Brasil: ―Ninguém havia ainda escrito sobre Marketing turístico no
Brasil – nada – nem se falava em Marketing no Brasil...‖. (RUSCHMANN, 2013,
Informação verbal)
A facilidade idiomática foi um propulsor, aprendeu Alemão em casa, o Inglês
na escola, além da faculdade. Em seu currículo de formação básica havia a língua
francesa. Assim, a Professora Doris lê em: Alemão, Francês, Inglês e Italiano
contava com a colaboração de uma amiga. ―Eu tinha facilidade de ler tudo que tinha
no mundo.‖ (RUSCHMANN, 2013, Informação verbal)
Conseguiu fazer uma Dissertação que foi muito elogiada e amplamente aceita
pela academia, o que gerou seu primeiro livro, conhecido pelos estudantes de
Turismo como: o “Livro Azul da Dóris”. Defendeu sua Dissertação de Mestrado em
Comunicação intitulada: ―Aspectos da Comunicação Publicitaria e Promocional do
Marketing Turístico em São Paulo”, sob orientação do Professor Modesto Farina, no
ano de 1988.
O Professor Dr. Mario Beni, na época coordenador do curso de graduação em
Turismo, ao saber da titulação de mestrado da professora, ficou contente com a
notícia. Doris na época era docente na disciplina de planejamento. Foi então que
veio a intimação por parte do Professor Mario Beni para que ela assumisse a
coordenação do Curso de Turismo da USP.
A professora Doris aceitou o desafio. Mas por onde começar? Em 1989 a
professora fez então um levantamento sobre as deficiências e necessidade do curso.
158
Descobriu que nos últimos cinco anos havia 15 alunos que não haviam feito o
trabalho de conclusão de curso. Haviam cumprido com todas as disciplinas, mas não
constavam como formados. O que era um dos aspectos levantados pela reitoria
como deficiente, e que comprometia o andamento do curso.
Ela então buscou entrar em contato com esses alunos e marcar uma reunião.
Na época não havia a facilidade da internet, ela entrou em contato com cada aluno
por telefone, convidando para conversar: ―Alguns alunos diziam; Ah Professora eu
até desencanei da USP. Eu dizia, então re-encana aqui de novo, vamos terminar
esse curso!‖. (RUSCHMANN, 2013, Informação verbal)
Conversou com os professores, verificou as temáticas com as quais os
docentes estavam trabalhando, e em dois anos conseguiu que os 15 alunos
defendessem suas monografias de conclusão de curso. Assim, o curso de Turismo
conseguiu ganhar a atenção da USP.
Ela frequentava os eventos da área como coordenadora do curso de Turismo,
tanto em São Paulo quanto em outras regiões, falando da experiência no curso da
USP e trazendo visibilidade para este. Em uma de suas viagens, visitou Foz do
Iguaçu – PR, onde surgia uma nova etapa, fruto do trabalho realizado até o
momento. A Professora montou o primeiro Curso Lato sensu em Turismo, em uma
parceria firmada entre a UNIOESTE e a USP. Foi feito um convênio, registrado entre
as duas IES. As aulas eram ministradas em Foz do Iguaçu. Os professores da USP
iam lecionar disciplinas de 40hrs, em esquema de módulos de uma semana. A
professora conta: ―Era uma semana, tarde e noite, tarde e noite... foi um massacre
para as cordas vocais! Mas foi um sucesso, todos os professores gostaram de
participar, todos os alunos defenderam suas Monografias.‖. (RUSCHMANN, 2013,
s/p, Informação verbal)
Depois do sucesso dessa parceria, colegas da USP levantaram a
possibilidade de implantação do curso de especialização Lato Sensu na própria
instituição. A professora Doris montou o programa, mas a aceitação não foi das
melhores, ela comenta: ―A USP tem um ambiente acadêmico muito complicado‖
(RUSCHMANN, 2013, s/p, Informação verbal). A disputa de egos, um pouco de
ressentimento por parte de alguns colegas, sua recente trajetória na Universidade,
foram um entrave. Seria ela a coordenadora deste novo curso de especialização em
Turismo?
O projeto foi boicotado, foram apontados milhares de defeitos, e muitas foram
159
às alterações feitas por alguns professores. A professora Doris procurou o diretor da
Escola de Comunicações e Artes (ECA):
―Eu fui ao diretor da ECA, que é a grande estrutura, e que havia me encomendado o curso e disse: Olha Professor Marques, está aqui o projeto que o senhor me pediu, com as alterações que os professores fizeram, mas uma coisa eu te digo este aqui não é mais o meu programa. O projeto foi completamente desvirtuado. Eu não vou tocar esse curso!‖ (RUSCHMANN, 2013, s/p, Informação Verbal)
Com a insistência do diretor de que era necessário implantar o curso foi
agendada uma reunião com o corpo docente. A professora Dóris era Mestre, havia
coordenado a especialização em foz do Iguaçu o que pontuava seu trabalho como
docente na USP, o diretor Professor Marques questionou a relutância do corpo
docente em relação ao projeto do curso que ela havia elaborado. A justificativa foi a
mesma: ela era inexperiente, estava chegando há pouco tempo na casa.
Com o crescimento da discussão, uma das professoras passou um pouco de
seus limites, questionando os métodos de avaliação realizados pela Professora
Doris. Com a grave acusação, a professora Doris abriu uma representação contra a
professora, o que gerou uma avaliação interna. A professora Doris não recuou e foi
até o fim na representação, e a professora que havia tecido infelizes comentários foi
penalizada, perdendo alguns benefícios. Esse foi mais um obstáculo ultrapassado,
que serviu para que a Professora demonstrasse a competência e seriedade no seu
trabalho.
No ano de 1990 a ela iniciou seus estudos no Doutorado em Comunicação,
orientada dessa vez pelo Professor Dr. Mario Beni. Um novo desafio se apresentava.
Qual seria a temática a ser pesquisada? Ao participar de eventos no exterior, a
professora percebeu a tendência temática pelo meio ambiente e a sustentabilidade.
O ecoturismo começava a ser discutido, então ela pensou: ―Que tema!‖ Sua escolha
temática ocorreu antes mesmo da ECO 92, a primeira grande reunião de líderes
mundiais tratando de problemas ambientais no Brasil. (RUSCHMANN, 2013, s/p,
Informação Verbal)
A tese de Doutorado foi defendida em 1994, intitulada: O Planejamento do
Turismo e a Proteção do Meio Ambiente. Defendeu sua tese com nota máxima
originando seu segundo livro, conhecido entre os estudantes como o “Livro Verde da
Doris”. Mesmo tendo sido publicado há quase 20 anos, ele continua sendo vendido e
muito procurado nas livrarias.
160
Ela continuou dando aula na USP, mas não em tempo integral, cumprindo
apenas 24hrs, ela tinha tempo de se dedicar a família e outras atividades. Foi então
que surgiu o convite para atuar como docente na agora Universidade Anhembi
Morumbi e no curso de Tecnólogo em Turismo do SENAC.
Em 1992, encontrou-se em um Evento em Foz do Iguaçu com a Professora
Marlene Morato, docente da UNIVALI, e esta lhe convidou para lecionar a disciplina
de planejamento. A disciplina se dava em módulos de uma semana, outras
disciplinas eram bloqueadas e a Professora Doris viajava de São Paulo para
Balneário Camboriú para cumprir a carga horária. Sempre teve uma relação muito
boa com a Professora Marlene, e esta a procurou novamente dizendo que o reitor
Villela havia encomendado um Lato Sensu em Turismo. Como ela havia coordenado
o Lato sensu em Foz do Iguaçu, ficou responsável pela organização do curso.
O curso foi um sucesso, todas as vagas foram preenchidas, juízes, policiais,
empresários, representantes do poder público. A professora conta: ―Balneário inteira
quis participar e foi um sucesso!‖ Ela não poderia residir em SC, então ela vinha,
dava aulas, coordenava, mas a maioria das atividades eram realizadas pela
Professora Marlene. (RUSCHMANN, 2013, s/p, Informação verbal)
Então ela saiu da UAM, e continuou dar aulas no SENAC, na UNIVALI,
continuando com suas atividades na USP, mas com uma carga horária reduzida na
IES, cumprindo o restante em outras IES com ensino e pesquisa.
Foi então que mais uma vez, através da Professora Marlene, chega um
pedido do professor Villela: Vamos Fazer o Curso Stricto Sensu, Vamos fazer o
Mestrado em Turismo! Nesse momento, a professora Doris se via talvez diante dos
maiores desafios de sua carreira: criar o primeiro programa de formação Stricto
Sensu em Turismo no Brasil. Ela conta: ―Eu disse meu Deus, Mestrado? Eu não sei
fazer. Eu tenho Mestrado e Doutorado na USP, mas montar um programa, com
objetivos... Como que queres que eu faça?‖ (RUSCHMANN, 2013, s/p, Informação
verbal)
O Mestrado em Direito da UNIVALI já estava em andamento. Utilizando do
projeto realizado no Mestrado em Direito da UNIVALI, foi montado o projeto do
Mestrado em Turismo e Hotelaria. Por volta de 1997, ela fez toda aproximação para
o Turismo, e o projeto ficou muito bom. Ele era diferente da estrutura atual, foram
feitas adequações nos dias de aula e em prazos para qualificações e defesas. As
atividades se iniciaram, e depois de alguns meses, a CAPES entra em contato.
161
Foram montadas várias pastas dentro de cada quesito do relatório solicitado
pela CAPES, dos quais ela cuidou pessoalmente junto com a secretária na época.
Ela já havia submetido o projeto a Secretaria de Educação do Estado, e a vistoria da
CAPES foi marcada. A primeira vistoria da CAPES no Curso de Mestrado foi
desanimadora. A CAPES alegou que o Mestrado em Turismo se localizava na
grande área de Administração Contabilidade e Turismo, portanto, o corpo docente
deveria ser formado 90% por docentes da área de administração. Foi então que a
Professora Dóris posicionou-se, no que seria um salto nos caminhos da produção do
conhecimento em Turismo no nível Stricto Sensu. Como ela poderia colocar
professores de Administração para lecionar Meio Ambiente e Turismo? Ou então
como um administrador lecionaria a disciplina de Antropologia e Turismo?
Ela já havia convidado os professores, muitos deles atualmente docentes no
programa, como: a orientadora desta dissertação Dra. Yolanda Flores e Silva; o Prof.
Dr. Paulo Pires; Prof. Dra. Josildete. Havia convidado docentes de outras instituições
como o Prof. Dr. Mario Beni; o Prof. Dr. Luiz Trigo. Alguns professores haviam se
mudado de seus estados e cidades para residir em Santa Catarina, trabalhando
como docentes na Instituição. Era necessário se posicionar para defender o projeto
que tanto ela como todo o corpo docente participante na UNIVALI acreditava.
Foi então agendada uma reunião em Brasília, que reuniria os docentes e
profissionais da Grande área onde o Turismo se encontra alocado (Administração,
Contabilidade e turismo). Estavam presentes cerca de 40 pessoas. Dez desses eram
advindos da área de Contabilidade, todo o restante da área de administração (29
pessoas), e apenas a Professora Doris como representante do Turismo. Foi então
dada a palavra a Professora, que em uma explicação convincente demonstrou que o
Turismo, começando seu caminho na formação Stricto Sensu, demandava estudo
interdisciplinar e multidisciplinar. Em sua explanação, demostrou a importância da
interface entre Turismo e outras áreas do conhecimento. E que por esse motivo o
corpo docente do Mestrado em Turismo e Hotelaria era composto por docentes de
diversos campos do conhecimento. Sua explicação convenceu: ―Todos se calaram,
concordando com as colocações que fizemos a respeito do Programa, e o curso foi
reconhecido pelo MEC em 1997.‖ (RUSCHMANN, 2013, s/p, Informação verbal)
A CAPES fez nova vistoria no curso, e desta vez o relatório foi bem diferente,
tecendo muitos elogios a característica multidisciplinar do programa e seu
pioneirismo na área. Os anos se passaram, a produção científica tanto do corpo
162
docente quanto dos discentes foi se mostrando relevante. As exigências que a
CAPES impunha ao programa eram cumpridas, o que elevou sua nota de 3 para 4.
A nota 3 é a nota mínima aceita pela CAPES para a abertura de um Mestrado. Ou
seja, todos os Mestrados se iniciam com nota 3, e evoluem a medida que vão
cumprindo as exigências propostas.
No ano de 2010, o Programa expandiu suas atividades em uma parceria que
gerou o programa de Mestrado MINTER. Visando a formação e disseminação do
conhecimento em regiões carentes de programas de pós-graduação, privilegiando o
intercâmbio do conhecimento. Com essa expansão, vista com muito bom olhos pela
CAPES, o programa conseguiu atingir a nota CAPES 5, se tornando o curso de
Mestrado em Turismo mais bem avaliado e reconhecido do país.
Parecia uma missão cumprida, mas era o começo de mais uma empreitada.
Com a elevação da nota CAPES, abre-se a possibilidade de avançar para o próximo
nível Stricto Sensu, o Doutorado em Turismo.
No ano de 2011 iniciam os estudos para a criação do Programa, a comissão
foi presidida pela Professora Doris, mas infelizmente não foi aprovado naquele
momento. O Doutorado prevê que a IES possua o que chamamos de núcleo duro,
que é o corpo docente permanente ligado ao programa. Para a obtenção do nível de
doutorado o número de docentes, que no Mestrado é de 8, para o Doutorado eram
12 docentes permanentes.
Foi feita então uma reformulação do corpo docente, novos professores
pesquisadores foram contratados. Aconteceu também um realinhamento das linhas
de pesquisa e disciplinas obrigatórias e facultativas. No ano de 2012 a Professora
Doris deixou a coordenação do Mestrado, mas continuou atuando no processo de
regulamentação do Doutorado, bem como orientando alunos e lecionando
disciplinas.
Na gestão do Professor Dr. Francisco dos Anjos no ano de 2012, o Doutorado
em Turismo e Hotelaria da UNIVALI foi aprovado, com nota de avaliação CAPES 5.
O que foi um reconhecimento do trabalho desempenhado nestes últimos 15 anos.
Constituindo-se assim no primeiro Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em
Turismo e Hotelaria a oferecer os dois níveis de formação: Mestrado e Doutorado.
A primeira seleção aconteceu no final de 2012, dentro de dois anos, a
UNIVALI será a primeira Universidade a formar Doutores em Turismo e Hotelaria no
Brasil. Com certeza um salto científico, produtivo no campo do conhecimento.
163
Nas palavras da professora Dóris: ―Não digo que foi uma batalha vencida,
porque não fiz disso uma guerra, mas foi a realização de um sonho que eu nunca
imaginei que iria acontecer!‖ (RUSCHMANN, 2013, s/p, Informação verbal)
Ao falar sobre o curso de Doutorado em Comunicação da USP, ela destacou
sua importância. ―Formou os primeiros pesquisadores do turismo. Foi extremamente
importante e influenciou no desenvolvimento da pós graduação em Turismo no
Brasil.‖ (RUSCHMANN, 2013, s/p, Informação verbal)
Ela conta que era uma descoberta para todos que trabalhavam com a
temática, que durante os estudos, disciplinas, projetos e pesquisas estava sendo
construído conhecimento. Infelizmente, para manter a linha de pesquisa de turismo
no programa, ela precisava de um núcleo de docentes permanentes que
trabalhassem com a temática, o que não aconteceu, e a linha veio a se extinguir.
―Uma pena! Mas hoje tem sido desenvolvidos trabalhos muito bons na pós-graduação com os professores e alunos tanto na USP quanto em outras regiões. Muitos dos professores foram meus alunos, digo que foram minhas crias, e você é minha cria também!‖. (RUSCHMANN, 2013, s/p, Informação verbal)
Estamos nos encaminhando para o final de nossa conversa. A professora
Doris nos conta que prepara-se para parar suas atividades, pelo menos algumas
delas. Se dedicar ao descanso, quem sabe fazer um curso de filosofia a distância no
qual ela acaba de se inscrever. Gratos pelo privilégio de ouvir tanta riqueza em seus
caminhos como pesquisadora, docente e escritora, nos despedimos emocionados.
As conquistas foram imensas, humildemente a professora Doris dizia: ―Eu nunca
imaginei no começo da carreira que eu iria chegar até aqui!‖. (RUSCHMANN, 2013,
s/p, Informação verbal)
Com certeza o relato da experiência da professora Doris enriqueceu nosso
olhar sobre a construção dos espaços de conhecimento Stricto Sensu em turismo no
Brasil. Prosseguimos agora para a identificação e contextualização destes
Programas de Pós-graduação salientando-se sua importância para a construção do
conhecimento em Turismo no Brasil.
164
5 O DOUTORADO EM COMUNICAÇÃO SOCIAL - USP
Como podemos observar ao longo das pesquisas realizadas, e também no
encontro com o material bibliográfico, a USP exerceu uma enorme influência na
formação dos docentes e pesquisadores brasileiros. A presença dela, em especial
do Doutorado de Comunicação nos currículos Lattes dos pesquisadores e docentes
do Turismo é marcante. Assim, neste capítulo buscamos expor um pouco mais sobre
sua história e formação, bem como delimitar suas áreas de concentração e linhas de
pesquisa. A Escola de Comunicações e Artes da USP – ECA é um celeiro de cultura,
ensino e conhecimento, cabe a nós evidenciar sua composição. Foi neste Programa
que se formou a Professora Doris, como vimos em seu relato. Podemos considerar a
ECA/USP como uma escola de pensamento, uma vez que exerce influência
nacional. (Creative Scholarship)
5.1 ECA – ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO27
Criada em 1966, iniciou suas atividades em Março de 1967, com o nome
inicial de Escola de Comunicações Culturais. Com uma estrutura curricular
inovadora, buscava a qualificação e capacitação do profissional nas áreas de
comunicação, cultura e entretenimento, atendendo ao emergente mercado de
trabalho nas indústrias culturais e de entretenimento que se desenvolviam no país
de forma mais pungente no inicio da década de 60. Assim, o corpo docente desde
seu início caracteriza-se pela multidisciplinaridade, reunindo especialistas de
diversas áreas do saber, voltando-se para o ensino, pesquisa e extensão neste novo
campo do conhecimento a ser consolidado no meio acadêmico. Foi ligada a ECA
que nasceu o curso de Turismo da USP, idealizado pelo Professor Dr. Mario Beni
em 1973.
Segundo relatos do Professor Dr. Mario Beni, nos primeiros anos o Curso de
Pós-graduação da ECA era especificamente na área de Turismo, o que veio a ser
alterado aproximadamente 4 anos depois. As fichas de avaliação da CAPES não
trazem muitas informações referentes a esse período.
27
As informações referentes às Instituições de Ensino Superior e seus Programas de Pós-Graduação
apresentadas nesta dissertação foram coletadas com bases nos sítios eletrônicos das referidas instituições, bem como nas Plataformas disponibilizadas pela CAPES e CNPQ. São estas informações públicas e suas fontes podem ser acessadas através das referências constantes nesta pesquisa, bem como nas informações disponibilizadas nas notas de rodapé.
165
Os primeiros professores da Escola de Comunicações de Artes, para obterem
titulação para o ensino na graduação, defenderam suas teses em regime de
Doutorado Direto, sistema muito utilizado naquela época, onde a pós-graduação
ainda começava a se estabelecer no país, passado apenas um ano da publicação
do Parecer de 1965. O modelo europeu de pós-graduação predominava nas
Universidades brasileiras, inclusive com a presença de muitos professores e
pesquisadores estrangeiros, na maioria das instituições públicas do país. (CUNHA,
2007) o primeiro coordenador da ECA foi o Professor Majerón, que iniciou sua
carreira na USP em 1954. Após sua saída no final da década de 60 ele montou sua
própria IES e vem a ser o responsável pela formação do segundo curso de
graduação em turismo em faculdades – a Faculdade Íbero-Americana citada
anteriormente, curso hoje já extinto.
A ECA forma sua primeira turma em 1970. As novas diretrizes da Reforma
Universitária, após o parecer de 1965, passam a organizar a pós-graduação em dois
níveis: Mestrado e Doutorado. Nestas quatro décadas de investimento em ensino e
pesquisa científica, a Escola de Comunicação e Artes de São Paulo, assim como os
outros programas de pós-graduação de excelência da USP, foi responsável pela
formação de inúmeros profissionais e cientistas de alto nível.
A ECA se destaca pela qualidade do ensino e pesquisa, e em diversidade de
cursos oferecidos, atraindo discentes de todo o país, sendo assim, parte do grande
sucesso da USP, instituição de ensino superior de referência na América Latina.
São 22 habilitações profissionais em cursos regulares de graduação, 15 das
quais são voltadas à área de Artes: Cenografia, Direção Teatral, Interpretação
Teatral, Teoria do Teatro, Escultura, Gravura, Multimídia e Intermídia, Pintura, Canto
e Arte Lírica, Composição, Instrumento, Regência e Licenciatura em Educação
Artística em Artes Cênicas, Artes Plásticas e Música.
Na área de Comunicação Social são 04 habilitações: Jornalismo, Editoração,
Publicidade e Propaganda e Relações Públicas, além dos cursos de
Biblioteconomia, e Superior do Audiovisual. A ECA mantém ainda, incorporada à sua
estrutura, a Escola de Arte Dramática. Ligada a área de Comunicação social foi
disponibilizada a formação em turismo em 1973, passou por algumas dificuldades,
como vimos nos relatos e levantamento histórico realizado, sofrendo uma
reestruturação entre o fim da década de 1990 e 2010.
Atualmente, sua estrutura organizacional segue a departamentalização,
166
dividida em oito departamentos, sendo um deles o CRP - Departamento de Relações
Públicas, Propaganda e Turismo.
Como parte do papel da Universidade, a ECA além do ensino, possui
atividades e projetos de extensão voltados à comunidade, oferecendo cursos de
capacitação e formação em diversas áreas, além do projeto ―Universidade Aberta a
Terceira Idade‖. Mantem ligadas a sua estrutura núcleos e grupos de pesquisa que
buscam, além da investigação científica, a aproximação com a comunidade e o
mercado. Agregado a esses núcleos funcionam empresas juniores, administrada
pelos discentes. Damos aqui destaque para a empresa ECA JR, agência de
publicidade, relações públicas e turismo que funciona no Departamento de Relações
Públicas, Propaganda e Turismo, prestando assessoria com qualidade profissional
ao mercado e comunidade.
Os Programas de Pós-Graduação buscam incentivar o intercâmbio cultural e
a pesquisa, estabelecendo convênios com destacadas universidades americanas,
francesas, italianas, espanholas, alemães, entre outras. Após grandes
transformações, os programas deixaram de ser vinculados aos departamentos, e
hoje se constituem como áreas temáticas, buscando uma perspectiva plural. A ECA
possui atualmente seis programas de Pós-Graduação em sua estrutura acadêmica,
sendo estes:
a) Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas (PPGAC);
b) Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais (PPGAV);
c) Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação
(PPGCOM);
d) Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação
(PPGCI);
e) Programa de Pós-Graduação em Meios e Processos em
Audiovisuais (PPGMPA);
f) Programa de Pós-Graduação em Música (PPGM);
A Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo busca
atualização constante de métodos, ensino e pesquisa. Tem por Missão Institucional:
Promover o ensino e a pesquisa nas áreas de comunicação, informação e artes, visando à formação de pessoas capacitadas ao exercício da investigação, da docência e da carreira profissional, em consonância com
167
as exigências do tempo e as necessidades de desenvolvimento humano. Estender à sociedade serviços indissociáveis das atividades de ensino, pesquisa, extensão, e crítica e produção artística e cultural. Promover e desenvolver, por meio das pesquisas, os instrumentos para a reflexão e compreensão de questões e conflitos em suas áreas de atuação, bem como buscar novas formas de expressão, ampliando as fronteiras do conhecimento e da invenção, e tornando-as úteis ao meio social. (ECA – USP, 2011)
No cenário internacional, a Escola de Comunicação e Artes da Universidade
de São Paulo consolidou seu prestígio como uma instituição que mantém o nível de
excelência na área. Os cursos que integram a Escola estão entre os mais
concorridos. Segundo dados constantes no sítio eletrônico da ECA, a relação
candidato/vaga para o vestibular é a mais alta da USP, e seus cursos de pós-
graduação estão entre os mais bem avaliados pela CAPES.
Com as alterações ocorridas na ECA em relação ao curso de graduação em
Turismo este foi relocado, recentemente, ano de 2011. Resultante das pesquisas e
dos esforços da própria ECA e de seu corpo docente, a USP expandiu seu campus
na região Leste de São Paulo com a EACH USP LESTE, que articulada a ECA
oferece o curso de graduação em Lazer e Turismo. São docentes nesta Escola o
Professor Panosso Netto, Professor Luiz Trigo, Professor Luiz Camargo e Professor
Sardi, entre outros ilustres. Estão sendo estudadas as possibilidades de criação do
Mestrado Acadêmico em Lazer e Turismo ligado a EACH.
5.1.1 Programa de Pós-graduação em Ciências da Comunicação - USP
Quando analisamos o currículo Lattes dos principais autores, pesquisadores e
pensadores do Turismo no Brasil é extremamente marcante uma presença em sua
formação. A presença da USP – Universidade de São Paulo na formação destes
pensadores é evidente, assim como a influência desta instituição de ensino em toda
a formação do ensino superior e na pós-graduação no Brasil. Destacamos em
especial o Programa de Pós-graduação em Comunicação (PPGCOM – ECA – USP).
O Mestrado em Ciências da Comunicação da USP foi o primeiro da área de
comunicação no Brasil, criado em 08 de Janeiro de 1972. O Programa de Doutorado
em Ciências da Comunicação iniciou suas atividades em 01 de agosto de 1980.
Assim, a ECA completava o ciclo para a formação acadêmica da área: graduação,
mestrado e doutorado. Posteriormente surgiram em 1974 o Mestrado em Artes,
também pioneiro, e o Doutorado em Artes em 1980.
168
Desde o início, a Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da ECA foi
marcada pelo permanente trabalho de reformulação e atualização do perfil e linhas
de pesquisas oferecidas, tendo em vista os constantes desafios provocados pela
diversidade temática e pela abordagem interdisciplinar de seus objetos de estudo.
Esta diversidade estimulou a criação de Áreas de Concentração e Linhas de
Pesquisa que começaram a ser delineadas ainda em um período marcado pela
ausência de uma visão mais abrangente da Comunicação, e até mesmo de
nomenclatura científica delimitada. Estava se construindo e se desenvolvendo uma
nova área do conhecimento no país.
No final da década de 80, o Programa de Pós-graduação em Ciências da
Comunicação da ECA-USP era responsável por 48% da pesquisa acadêmica
(mestrado e doutorado) na área em todo o país. Esses indicadores despertaram os
olhares das agências de fomento à pesquisa, como CAPES, CNPQ e FAPESP, ao
reconhecimento da área de Comunicação como área de pesquisa autônoma,
conferindo estatuto científico ao campo, o que só vem estimular seu crescimento nos
anos seguintes. (PPGCOM – ECA – USP, 2011).
A diversidade de assuntos e temáticas contempladas pelo programa, bem
como as abordagens teórico-metodológicas inovadoras, é marca característica do
PPGCOM, que busca de tempos em tempos sua reestruturação e adaptação,
ajustando-se aos novos desafios e demandas da pós-graduação brasileira e
internacional na área da Comunicação.
Durante muito tempo o Doutorado em Ciências da Comunicação da USP
(nome atual do curso) possuiu uma linha de pesquisa específica em Turismo. Esta
Escola nos presenteou com grandes pensadores, como por exemplo, Dr. Mario Beni
e Dra. Doris Ruschmann. Essa formação veio a influenciar muitos dos pensadores
que iniciariam seus estudos posteriormente.
Atualmente, o curso já não possui uma linha de pesquisa voltada
especificamente para o campo do Turismo, mas continua atraindo pesquisadores da
área, que dentro das linhas de pesquisa e áreas de concentração do programa,
desenvolvem estudos relevantes.
No ano de 2006, o Programa de Pós-Graduação em Ciências da
Comunicação se reorganizou em três Áreas de Concentração, com suas respectivas
linhas de pesquisa. As informações estão resumidas no quadro abaixo, e serão
169
detalhadas a seguir28.
Quadro 04 – Programa de Pós-graduação em Ciências da Comunicação – ECA – USP
Programa de Pós Graduação em Ciências da Comunicação
PPGCOM - ECA – USP
Instituição de Ensino Superior Universidade de São Paulo
Ano de Início do Mestrado 1972
Ano de Início do Doutorado 1980
Avaliação da CAPES (Mestrado e Doutorado) 05
AC1 Teoria e Pesquisa em Comunicação
LP Epistemologia, Teoria e Metodologia da Comunicação
LP Linguagens e Estéticas da Comunicação
LP Comunicação e Ambiências em Redes Digitais
AC2 Estudo dos Meios e da Produção Mediática
LP Informação e Mediações nas Práticas Sociais
LP Consumo e Usos Midiáticos nas Práticas Sociais
AC3 Interfaces Sociais da Comunicação
LP Comunicação, Cultura e Cidadania
LP Políticas e Estratégias de Comunicação
LP Comunicação e Educação
Legenda: AC- Área de Concentração LP - Linha de Pesquisa
Fonte: Da pesquisa.
Visto a importância desta variável de formação histórica no campo do
Conhecimento Científico em Turismo no Brasil, é de suma importância detalhar sua
estrutura, áreas de concentração e linhas de pesquisa.
5.1.2 Estrutura do PPGCOM – USP
O Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação, como dito
anteriormente, sofreu muitas modificações ao longo destes 40 anos. Ele tem por
objetivo o desenvolvimento de referenciais teóricos e aplicados nas temáticas
relativas aos processos e aos meios de comunicação na sociedade contemporânea.
28
As informações referentes ao Programa de Pós Graduação em Ciências da Comunicação da Escola de
Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo foram coletadas do sítio eletrônico da instituição de ensino, bem como das fichas de avaliação, documento de área e indicadores referentes ao programa disponíveis na Plataforma da CAPES.
170
(PPGCOM – ECA – USP, 2011).
A comunicação hoje faz parte da própria configuração da sociedade
contemporânea, tornando-se uma forma mediação central, que conecta as mais
diversas dimensões da existência contemporânea. Assim, a Comunicação surge
como um campo de conhecimento interdisciplinar e transdisciplinar desde as suas
origens em função da complexidade do fenômeno comunicacional e de suas
repercussões de ordem histórica, estética, cultural, política, social e tecnológica.
(PPGCOM – ECA – USP, 2011).
O PPGCOM se organiza atualmente em três áreas de concentração e suas
respectivas linhas de pesquisa, que são detalhadas a seguir segundo as
informações disponíveis no sítio eletrônico do Programa.
5.2 ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: TEORIA E PESQUISA EM COMUNICAÇÃO
Esta Área de Concentração está voltada às reflexões epistemológicas, às
definições teóricas e às propostas metodológicas para o estudo do fenômeno da
comunicação em geral ou aplicada a modalidades específicas (comunicação
interpessoal, grupal, massiva, tecnologicamente mediada, e outras). Ainda, ocupa-se
do pensamento comunicacional em suas múltiplas dimensões: ontológica, histórica,
estética, teórica e metodológica, além de sua interseção com as demais disciplinas
humanísticas e mesmo com as ciências exatas e tecnológicas. Propõe-se a
desenvolver o pensamento epistemológico, teórico e metodológico, voltado para
a pesquisa, com base na abordagem crítica dos processos de investigação nos
estudos da Comunicação.
Esta área de concentração tem grande peso nos avanços epistemológicos e
saltos no conhecimento na área da comunicação, e consequentemente do Turismo,
já que durante muito tempo e até então, pesquisadores tem elaborado discussões
epistemológicas voltadas para o fenômeno social do turismo como objeto de estudo
em suas linhas de pesquisa. Ela se divide em três linhas de pesquisa.
A Linha de Pesquisa: Epistemologia, Teoria e Metodologia da
Comunicação concentra-se no estudo da Comunicação como produção teórica
inter/transdisciplinar. Busca a reflexão epistemológica e metodológica sobre o
discurso comunicacional e a análise da comunicação como conceito e processo
171
social intersubjetivo historicamente compreendido. Privilegia a investigação de sua
estrutura lógica e as implicações éticas, filosóficas e sociológicas decorridas da
reflexão teórica. Tece reflexões críticas aos paradigmas, modelos, teorias, métodos
e técnicas através dos quais os objetos da comunicação são estudados. Estuda
procedimentos metodológicos em comunicação, englobando metodologias
quantitativas e qualitativas, métodos e técnicas de pesquisa empírica, tais como:
etnografia, historiografia e história oral em comunicação, e análise do discurso
midiático. Por fim, tem por objetivo contribuir para a consolidação da Comunicação
como área de conhecimento, elaboração de novas linguagens teóricas e
desenvolvimento metodológico através de crítica epistemológica. (PPGCOM – ECA
– USP, 2011).
A segunda Linha de Pesquisa: Linguagens e Estéticas da Comunicação
busca a compreensão das conexões entre a generalidade histórica dos fatos e a
singularidade da produção do discurso polissêmico, considerado na arte, no
cotidiano e na indústria cultural. Problematiza sobre os conceitos de representação e
de imagem. Elabora pesquisa teórica sobre os conceitos de autor, público,
mensagem, repertório, códigos verbais e não verbais. Busca a investigação das
conexões da linguagem e ambientes midiáticos com seu contexto histórico cultural,
tendo em vista a noção de conhecimento e de construção de identidades. Também
analisa gêneros discursivos nas diferentes formas de manifestação humana em seus
contextos espaço-temporais. (PPGCOM – ECA – USP, 2011).
A terceira Linha de Pesquisa ligada a esta área de concentração:
Comunicação e Ambiências em Redes Digitais concentra-se nas reflexões
epistemológicas e nos recortes teóricos e metodológicos decorrentes da inserção do
fenômeno da comunicação em ambiências de redes digitais sustentadas pelas
tecnologias digitais de informação e comunicação. Ocupa-se, também, da reflexão
sobre o campo da comunicação e a complexidade decorrente dos impactos das
novas tecnologias da informação. São temas dessa linha de pesquisa os diversos
fenômenos da comunicação em redes; os estudos de convergência midiática e
consequentes impactos na sociabilidade, nas organizações e na cultura; os estudos
voltados à construção de sentido nas diferentes linguagens; a análise dos processos
de sociabilidade e subjetividade decorrentes das relações comunicacionais
humanas, e suas representações. São ainda objetos de estudo desta linha: os
processos transversais de comunicação digital em seus diferentes campos de
172
aplicação como a Educação, o Jornalismo, Audiovisual e demais Organizações.
Tece análises sobre as novas formas de territorialidade e organização da produção
do conhecimento e da informação. (PPGCOM – ECA – USP, 2011).
5.3 ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: ESTUDO DOS MEIOS E DA PRODUÇÃO MEDIÁTICA
Esta área de concentração dedica-se ao estudo dos produtos midiáticos,
culturais e artísticos, tais como os do jornalismo, da publicidade, do entretenimento,
da ficção entre outras manifestações das mídias. Focaliza de um lado, os processos
de produção e recepção e, de outro, as características específicas de obras e
programas postos em circulação, levando em conta os diversos suportes midiáticos.
A área é composta por duas linhas de pesquisa.
A Linha de Pesquisa: Informação e Mediações nas Práticas Sociais estuda
os processos de produção, difusão e recepção da informação no universo midiático,
sob a perspectiva dos valores da cidadania, ética e interesse público, com ênfase
nos vetores da produção da narrativa jornalística. A investigação nessa linha de
pesquisa busca a diversidade cultural quanto às múltiplas possibilidades de se
perceber e narrar um evento, bem como a consideração do conjunto de elementos
relativos à estrutura, produção e difusão de bens culturais na indústria editorial. Os
impactos sociais e históricos, a convergência das mídias, a concepção de processos
informacionais, incluindo o debate entre discurso hegemônico e alternativo,
fomentam as pesquisas desta linha voltada à compreensão da comunicação
noticiosa, ao estudo das relações éticas na construção dos produtos informativos e à
reflexão sobre a informação como direito fundamental do cidadão. (PPGCOM – ECA
– USP, 2011).
A segunda Linha de Pesquisa: Consumo e Usos Midiáticos nas Práticas
Sociais estuda os processos de produção, difusão e recepção de produtos
midiáticos, bem como os seus usos e consumos, a partir de uma perspectiva
emancipatória para as práticas sociais cidadãs, visando o bem estar social e a
sustentabilidade. Os objetos desta linha de pesquisa englobam a midiatização dos
fenômenos do consumo na vida material, bem como às formas de comunicar e se
relacionar no ambiente urbano. Prevê a compreensão da mediação cultural do
consumo, destacando o estudo das suas formas de linguagem e estéticas de
representação, bem como das relações sociais construídas a partir de produtos
173
comunicacionais, com ênfase no estudo das marcas, da publicidade, da
propaganda, da comunicação visual e do design. Trata também sobre os usos
midiáticos: as finalidades cotidianas dos meios, seus usos para a satisfação de
necessidades operacionais e simbólicas. Contempla investigações sobre a história e
evolução dos meios e a crítica à mediação destes nas dinâmicas culturais, isto é,
nas práticas sociais sugeridas na utilização destes meios, e os estudos de seus
efeitos na vida social.
5.4 ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: INTERFACES SOCIAIS DA COMUNICAÇÃO
Esta área de concentração estuda as trocas que a Comunicação realiza com
a Sociedade civil, suas Instituições e o Estado, centrando suas preocupações nas
condições econômicas de produção da cultura midiática, nas mediações culturais
presentes nos mecanismos de produção da comunicação, nas políticas de
comunicação e suas estratégias; na passagem da tradição para a renovação nos
gêneros da cultura midiática e também nas relações da comunicação com a
educação. Esta área de concentração volta-se essencialmente para a investigação
das diferentes culturas existentes na sociedade em interação com os processos e
práticas da comunicação. (PPGCOM – ECA – USP, 2011).
A Linha de Pesquisa: Comunicação, Cultura e Cidadania apresenta-se
como espaço privilegiado para o estudo das múltiplas interfaces sociais da
comunicação, convertendo-se em área decisiva para a compreensão da sociedade
de seus agentes culturais e sociais de produção simbólica. Através delas analisam-
se empírica e teoricamente: o Estado, suas políticas de regulamentação da
produção cultural e artística e o direcionamento dado às políticas públicas; os
Movimentos Sociais, seus canais de comunicação alternativos e as lutas pela
ampliação dos direitos da cidadania, pela liberdade de expressão e acesso aos
meios de comunicação; os Movimentos Culturais e Artísticos e suas formas de
expressão.
Já a Linha de Pesquisa: Políticas e Estratégias de Comunicação busca a
compreensão e estudo de paradigmas e correntes teóricas de comunicação
organizacional, relações públicas, editoração, jornalismo e suas interfaces. O foco
são as políticas e estratégias de comunicação no setor público, privado e sociedade
civil organizada, desenvolvendo a pesquisa aplicada em comunicação
174
administrativa, interna, institucional e mercadológica, tendo por base tanto a
perspectiva de uma filosofia da comunicação integrada, quanto princípios da ética,
responsabilidade social, de gêneros, etnias e classes sociais. Contempla como
objetos de estudo desta linha de pesquisa as interações da comunicação com a
identidade, alteridade e cultura organizacional, além da sustentabilidade e memória
presente nestas narrativas. Elabora pesquisas relativas à comunicação pública e às
políticas públicas de comunicação. Tece reflexões sobre os novos conceitos de
público, privado, redes sociais, opinião pública e suas múltiplas significações no
contexto da sociedade contemporânea. (PPGCOM – ECA – USP, 2011).
A terceira Linha de Pesquisa: Comunicação e Educação
trata das interfaces sociais da comunicação com a educação enquanto
organizadoras dos fluxos da informação e do conhecimento. Orienta pesquisas que
estudam os modos e utilização da comunicação na introdução de temas e questões
de interesse para as práticas educativas formais e informais de ensino e
aprendizagem na sociedade contemporânea. Tece análises sobre a educação e a
efetividade na recepção das mensagens sobre suas audiências e usuários. Reflete
sobre abordagens e práticas pedagógicas mediadas pelos processos da
comunicação social e de diferentes linguagens. Também são objeto de estudo desta
linha de pesquisa a utilização de tecnologia nos sistemas de ensino presencial e não
presencial, bem como à Gestão da Comunicação em espaços educativos.
(PPGCOM – ECA – USP, 2011).
Assim estrutura-se atualmente o Programa de Ciências da Comunicação da
Universidade de São Paulo, em constante transformação, continua atraindo
Turismólogos e formados em áreas afins, que, dentro das áreas de concentração e
linhas de pesquisa anteriormente descritas, desenvolvem pesquisas relacionadas ao
Turismo, abordando temáticas variadas, e produzindo conhecimento científico de
qualidade.
Os pesquisadores e docentes formados pelo Doutorado em Comunicação da
USP são nossos professores, nossas bibliografias, nossos atores sociais. E através
do acesso ao seu relato deste momento, as suas experiências podemos
compreender os caminhos pelos quais o conhecimento em turismo foi construído,
em especial na pós-graduação Stricto Sensu.
175
6 OS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM TURISMO NO
BRASIL
Afunilando nosso olhar para a Pós Graduação Stricto Sensu em Turismo,
observamos a importância desta para a construção do conhecimento científico, e
encaminhamos para apresentação dos Programas de Pós-Graduação, de acordo
com os objetivos colocados nesta proposta, contextualizá-los de forma descritiva,
abordando suas áreas de concentração e linhas de pesquisa.
Traçar um panorama sobre os programas de pós-graduação Stricto Sensu em
Turismo no país configurou-se em uma variável que contribuiu no múltiplo olhar
sobre a construção do conhecimento científico em Turismo, sendo de relevância
justificada, conforme coloca Savianni (2000, p.04):
Os programas de pós-graduação stricto sensu, por sua vez, se justificam não apenas em razão da necessidade de assimilação dos procedimentos e resultados da pesquisa, mas tendo em vista o próprio avanço do conhecimento, isto é, o desenvolvimento das pesquisas numa área determinada, contribuindo diretamente para essa finalidade.
A fim de gerar indicadores, foi realizada pesquisa na base de dados do Portal
da CAPES, cruzando informações com os Sites e as informações disponibilizadas
pelos Programas e Instituições de Ensino, configurando-se no seguinte quadro geral
da área, incluindo os Mestrados Profissionais.
QUADRO 05 - Programas de Pós-Graduação Ciências Sociais Aplicadas – Turismo
Total M D F M/D
TURISMO (ADMINISTRAÇÃO,
CIÊNCIAS CONTÁBEIS E
TURISMO)
7 4 1 2 1
GRANDE ÁREA: CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
ÁREA (ÁREA DE AVALIAÇÃO)Programas e Cursos de pós-graduação
LEGENDA: M - Mestrado Acadêmico / D - Doutorado / F - Mestrado Profissional /
MD - Mestrado e Doutorado Fonte: Da pesquisa.
O Quadro 05 nos mostra o seguinte panorama de cursos de pós-graduação
em Turismo reconhecidos pelo MEC: 04 Cursos de Mestrado Acadêmico; 02 Cursos
176
de Mestrado Profissional; 01 Curso de Doutorado.
Algumas avaliações e reconhecimento de cursos aprovados pela CAPES
recentemente ainda não estão disponíveis na Plataforma. Assim para que os dados
fossem apresentados foi realizada pesquisa paralela nos sites de cada programa.
Este é o caso, por exemplo, do Mestrado Profissional recentemente reconhecido da
Universidade Estadual do Ceará. Como os Mestrados Profissionais não possuem
obrigatoriedade de discussão epistemológica do turismo, estes foram elencados a
título de conhecimento e reconhecimento, são estes:
QUADRO 06 – Mestrados Profissionais em Turismo reconhecidos pela CAPES
MESTRADO PROFISSIONAL EM TURISMO - UNB
Instituição de Ensino superior Universidade de Brasília
Ano de Criação 2007
Avaliação da CAPES 03
Área de Concentração: Cultura e Desenvolvimento
Linhas de Pesquisa
Cultura, Patrimônio e Memória do Turismo
Economia, gestão, políticas e planejamento do Turismo
Turismo, Desenvolvimento e Sustentabilidade
MESTRADO PROFISSIONAL EM GESTÃO DE NEGÓCIOS TURÍSTICOS - UECE
Instituição de Ensino superior Universidade Estadual do Ceará
Ano de Criação 2012
Avaliação da CAPES 03
Área de Concentração e Linhas de Pesquisa em Desenvolvimento (Homologado CAPES 2012)
Fonte: Da Pesquisa.
O site do Mestrado Profissional em Gestão de Negócios Turísticos – UECE
tem atualizado suas informações constantemente e os dados referentes a área de
concentração e linhas de pesquisa estão em construção, e ainda não possuem
fichas de avaliação disponíveis na Plataforma CAPES. Já o Mestrado Profissional
em Turismo – UNB, embora funcionando desde 2007, mantêm nota CAPES 03, e
em sua última ficha de avaliação foram feitas observações e visitas foram
programadas para colaborar na formatação e possível consolidação do curso.
177
Embora não seja nosso foco neste estudo, o crescimento de Mestrados
Profissionais na área revela a diversidade do mercado e do conhecimento
direcionado a ele, seu alinhamento na compreensão da atividade turística, em
especial nas regiões onde os cursos estão localizados. Voltemos então aos cursos
de pós-graduação Stricto Sensu delimitados nesta pesquisa, são estes:
QUADRO 07 – Cursos de Pós-Graduação Stricto Sensu em Turismo reconhecidos pela CAPES e selecionados pela pesquisa
Programa de Pós-Graduação IES UF Ano Início Nota CAPES
Mestrado Acadêmico em Turismo e Hotelaria UNIVALI SC 1997 05
Doutorado em Turismo e Hotelaria UNIVALI SC 2012 05
Mestrado Acadêmico em Turismo UCS RS 2000 03
Mestrado Acadêmico em Hospitalidade UAM SP 2002 03
Mestrado Acadêmico em Turismo UFRN RN 2008 03
Fonte: Da Pesquisa.
Ao apresentarmos os dados concernentes ao panorama da Pós-Graduação
Stricto Sensu em Turismo no Brasil, iniciamos com um breve resgate histórico sobre
a Instituição de Ensino Superior a que estão ligados cada um dos cursos
selecionados pela pesquisa, conforme Quadro 0629. Sua localização geográfica, sua
importância na região, seu desenvolvimento histórico como Universidade, espaço
privilegiado na construção do conhecimento. Como coloca o Mestre Anísio Teixeira
em ―Notas para a História da Educação‖:
Por isso que a Universidade é e deve ser a mansão da liberdade. Os homens que a servem e os que, aprendendo, se candidatam a servi-la, devem constituir esse fino escol da espécie para quem a vida só vale pelos ideais que a alimentam. Essa bravura é o que os torna invencíveis. Não morreram em vão os que morreram por esse ideal de um ―pensamento livre como o ar‖... (TEIXEIRA, 1962, p. 187).
Ressaltamos que a história do ensino superior brasileiro, da Universidade é
permeada de significado e de importância na constituição de um povo, de uma
nação. Compreender aspectos históricos, sociais e políticos nos leva para além da
superfície concreta aparente de seu desenvolvimento e crescimento. Conhecer o
contexto histórico no qual cresce a Universidade é significar e resignificar seu papel
e função social.
29
Os programas e cursos selecionados pela pesquisa serão apresentados em ordem cronológica, agrupados por
Instituição de Ensino, datando de sua fundação, conforme apresentado no Quadro 06.
178
6.1 UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ - UNIVALI
A Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI se desenvolve dentro um
processo histórico comum a outras universidades públicas e privadas, originadas
das faculdades isoladas existentes no país.
Em maio de 1950, funda-se a Sociedade Professor Flávio Ferrari – SPFF cuja
finalidade era o aprimoramento da cultura moral, cívica, intelectual e física da
comunidade Itajaiense. A SPFF oferecia cursos de diversas naturezas técnicas e de
comércio, cursos de alfabetização e exames preparatórios para admissão em
concursos e vestibulares. Na época, os Exames vestibulares eram realizados
apenas em Florianópolis, Capital de Santa Catarina, ou em outras capitais de
estados vizinhos, como Rio Grande do Sul e Paraná.
Em Novembro de 1962 a SPFF tem seu estatuto alterado, originando assim a
SIES – Sociedade Itajaiense de Ensino Superior. Visando ampliar seus objetivos e
atender à demanda local e regional de crescimento, a SIES é instituída e destinada
à difusão da instrução de nível universitário no interior do Estado de Santa Catarina.
O primeiro registro de documento oficial da Sociedade Itajaiense de Ensino Superior
data de 16 de Setembro de 1964, e previa o funcionamento de duas faculdades: a
Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais, e a Faculdade de Filosofia, Ciências e
Letras.
Seguindo um processo que acontecia em todo o território nacional, muitas
iniciativas privadas de ensino superior foram transformadas em instituições públicas,
ou completamente subordinadas a um governo autoritário que se instalava no país.
A SIES já tinha seu estatuto registrado em cartório, como instituição privada. A sua
transformação em entidade pública constituía a solução mais adequada para
viabilizar o empreendimento educacional no contexto político vigente, e tinha como
objetivo inicial implantar as faculdades de Ciências Jurídicas e Sociais do Vale do
Itajaí, e de Filosofia, Ciências e Letras do Vale do Itajaí. No dia 22 de setembro a
Sociedade deixa de ser iniciativa privada para tornar-se, via Lei Municipal, uma
instituição pública.
Nos anos seguintes, marcados pela opressão, e agindo com muita diplomacia
os cursos continuaram funcionando isoladamente, e somente em 1986, as
Faculdades Isoladas de Ciências Jurídicas e Sociais, de Filosofia, Ciências e Letras,
e de Enfermagem e Obstetrícia são transformadas em Faculdades Integradas do
179
Litoral Catarinense (FILCAT).
No ano de 1989, em 16 de fevereiro, a FILCAT é reconhecida pelo MEC e
passa a ter o status de Universidade, tornando se então UNIVALI – Universidade do
Vale do Itajaí.
Já está consagrada Universidade do Vale do Itajaí! Urge, agora, que seja honrada e dignificada com o bom ensino, com a pesquisa útil e com o atendimento aos anseios da Comunidade! Certos estamos, porém, de que serão cumpridos pelas gerações vindouras, os altos destinos da Universidade, que culminam em fazer os homens melhores e mais felizes. (Discurso do professor Edison Villela, quando da Instalação da UNIVALI, em 21 de março de 1989)
Na condição de Universidade, a UNIVALI passa a ter autonomia para a
abertura de novos cursos, o que vem trazer combustível para o desenvolvimento do
ensino superior no estado de Santa Catarina. Foi então autorizada a criação dos
cursos de Ciência da Computação, de Odontologia e de Pedagogia - Magistério das
Séries Iniciais, no Campus Itajaí localizado na cidade de Itajaí.
No Campus localizado na cidade de Balneário Camboriú nasce o curso de
Turismo e Hotelaria.
Aos três dias do mês de abril de 1.990, no auditório do Hotel Fischer situado à Avenida Atlântica, n° 4770, no município de Balneário Camboriú, às vinte horas, instalou-se oficialmente a Faculdade de Turismo e Hotelaria do Vale do Itajaí, aprovada pelo Conselho Universitário, através da Resolução no 05/89. [...] O Reitor usou da palavra para declarar instalada a Faculdade de Turismo e Hotelaria, nos seguintes termos: ―Na qualidade de Reitor da Universidade do Vale do Itajaí, e no uso das atribuições que me são conferidas pela lei, DECLARO INSTALADA A FACULDADE DE TURISMO E HOTELARIA DO VALE DO ITAJAÍ, para funcionar no Campus II da Universidade, sito no município de Balneário Camboriú” (Ata da Instalação da Faculdade de Turismo e Hotelaria do Vale do Itajaí).
Seria o início de uma trajetória de muito sucesso, que no ano de 2012 se
consolida como a única Universidade no país que possui os três níveis de formação
Científica em Turismo: Graduação, Mestrado e Doutorado.
180
6.1.1 Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Turismo e Hotelaria –
UNIVALI30
O Mestrado Acadêmico em Turismo e Hotelaria UNIVALI foi o primeiro curso
a nível Stricto Sensu no país e na América Latina, e tendo como marca o
pioneirismo. Uma inovação que abriu campo para novos programas de pós-
graduação estimulando a cooperação entre pesquisadores de diversas áreas e
instituições de ensino, conforme observamos anteriormente nos relatos da
professora Dra. Dóris Ruschmann, participante ativa em todo este processo.
O projeto de criação do Curso de Mestrado em Turismo e Hotelaria foi
aprovado pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Resolução Nº
013/CEPE/97) e em junho desse mesmo ano foi aprovado pelo Conselho
Universitário (Resolução Nº 017/CUN/97). Seu funcionamento teve início em agosto
de 1997. (PPGTH, 2012)
A criação do Curso de Pós-Graduação Stricto sensu em Turismo e Hotelaria -
Mestrado Acadêmico foi resultado da experiência acumulada na formação de
recursos humanos na área de turismo, também respaldada pela Pesquisa realizada
pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas - FIPE, em 1995, que constatou
que os cursos de graduação em Turismo no Brasil embora apresentassem um
crescimento quantitativo, possuía quadros técnicos reduzidos, absolutamente
necessários ao seu desenvolvimento qualitativo.
Com o objetivo de atender a esta demanda, sua proposta de ensino e
pesquisa volta-se tanto para os estudos científicos do fenômeno do turismo no
território nacional, como para suas ramificações nos países vizinhos, propondo uma
ampliação geográfica dos estudos, estimulando o intercâmbio de estudantes,
professores e pesquisadores da área no país e no exterior.
Assim, O Mestrado Acadêmico em Turismo e Hotelaria forma
preferencialmente professores e pesquisadores, com foco voltado para o estudo do
fenômeno turístico, organizações e suas teorias, privilegiando o caráter
INTERDISCIPLINAR.
O Programa de Pós-Graduação em Turismo e Hotelaria inovou em 2012,
30
As informações referentes ao Programa de Pós Graduação em Turismo e Hotelaria da Universidade do Vale
do Itajaí foram coletadas do sítio eletrônico da instituição de ensino, bem como das fichas de avaliação, documento de área e indicadores referentes ao programa disponíveis na Plataforma da CAPES.
181
iniciando as atividades do primeiro Doutorado em Turismo e Hotelaria, suas linhas
de pesquisa e áreas de concentração seguem coerentemente as linhas do nível de
Mestrado. Tem por Missão:
Constituir-se como um centro de excelência em Mestrado e Doutorado em Turismo e Hotelaria que desenvolve competências para a educação e pesquisa, produz e difunde conhecimento, promove a reflexão crítica visando o desenvolvimento social-ambiental-econômico-cultural por meio de pesquisas envolvendo docentes e discentes com instrumental e recursos adequados. (PPGTH – UNIVALI, 2010)
O Programa tem como objetivos principais, a qualificação de alto nível de
recursos humanos e a produção de conhecimento na área de turismo e hotelaria -
seja na atividade docente, na atividade empresarial de gestão, por meio de estudos
específicos referentes ao Planejamento e à Gestão do Turismo e da Hotelaria.
O Programa de Pós-graduação em Turismo e Hotelaria – UNIVALI localiza-se
no Campus de Balneário Camboriú – SC. Sediou no ano de 2011 o Congresso
Anual da ANPTUR. Tem como coordenador atual o Professor Dr. Francisco Dos
Anjos, também coordenador na atual gestão da Associação Nacional de Pós
Graduação em Turismo. O Programa se organiza em uma área de concentração e
duas linhas de pesquisa, que são detalhadas a seguir.
6.1.2 Área de Concentração: Planejamento e Gestão do Turismo e da Hotelaria
O Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Turismo e Hotelaria da
UNIVALI estrutura-se em uma área de concentração – Planejamento e Gestão do
Turismo e da Hotelaria, e em duas linhas de pesquisa: Planejamento do Destino
Turístico e Gestão de Empresas de Turismo. As disciplinas, projetos de pesquisa e
dissertações defendidas, bem como os docentes permanentes são distribuídos
equilibradamente entre as linhas.
A Linha de Pesquisa Planejamento do Destino Turístico, a qual pertence
esta pesquisa de mestrado, procura desenvolver estudos acerca dos impactos e
transformações nos locais e comunidades onde a atividade turística se desenvolve.
As disciplinas relacionam-se ao processo de planejamento e gestão do
desenvolvimento turístico, na perspectiva de associação da atividade ao
desenvolvimento urbano e regional. Neste sentido, são analisados os aspectos
182
culturais, ambientais, sócio espaciais, ecológicos, da paisagem e suas
potencialidades e limitações para o aproveitamento por meio do turismo.
Esta linha de pesquisa trabalha também com temáticas prioritárias, que se
inter-relacionam na construção de conhecimento e produtividade de alto nível na
área. Ligado a esta linha de Pesquisa está o Grupo de Pesquisa TES – Turismo,
Espaço e Sociedade, do qual fazemos parte, e têm desenvolvido relevantes
pesquisas nas áreas de: Planejamento, política e gestão do destino turístico;
Turismo, paisagem e urbanismo; Turismo e Patrimônio; Gastronomia étnica –
cultural; Turismo, saúde e qualidade de vida, entre outros temas.
A segunda linha de Pesquisa, Gestão das Empresas de Turismo enfatiza o
desenvolvimento de pesquisas básicas e aplicadas na área das organizações e
equipamentos que englobam o Turismo e Hotelaria, sejam estas públicas ou
privadas. As disciplinas abordam de forma sistêmica estudos de estratégias e de
tecnologias de gestão. A ênfase em organizações e empresas que atuam no
Turismo e na Hotelaria demanda esforço para compreensão de seu comportamento
e relações estabelecidas com seu ambiente, desde o ponto de vista estratégico
quanto da tecnologia organizacional.
Trabalha com temáticas prioritárias, dentre elas: Marketing da Empresa e do
Destino Turístico; Gestão de Meios de Hospedagem; Gestão dos Serviços de
Gastronomia; Logística e qualidade dos serviços no turismo, na hotelaria e na
gastronomia; Logística e Gestão de Transportes; Planejamento e Organização de
Eventos, entre outras temáticas. O Doutorado recém criado segue a mesma
orientação de áreas e linhas de pesquisa.
6.2 UNIVERSIDADE CAXIAS DO SUL – UCS
Criada em 1967, a UCS – Universidade de Caxias do Sul, é uma instituição
de ensino superior, de caráter comunitário e regional, com atuação direta na região
nordeste do estado do Rio Grande do Sul. Integra a Fundação Universidade de
Caxias do Sul, entidade jurídica de Direito Privado. Ainda em 67, constituída pelas
faculdades isoladas de Filosofia, Ciências e Letras cria a Revista Chronos que, no
primeiro número, abordou a história, objetivos e funções da instituição recém-criada.
Os esforços em torno da criação de uma universidade em Caxias do Sul
183
também foram resultantes do Decreto Lei nº 60.200 publicado fevereiro de 1967,
autorizando o projeto de integração das faculdades já existentes sob a denominação
de Faculdade de Caxias do Sul, tendo como mantenedora a Associação
Universidade de Caxias do Sul.
O médico Virvi Ramos e o padre Sérgio Félix Leonardelli tomaram posse
como reitor e vice-reitor, respectivamente, no dia 15 de fevereiro de 1967. Na
primeira reunião do Conselho Universitário, discutiu-se a instalação de uma
biblioteca central unindo o acervo das faculdades isoladas, e aprovada a criação dos
cursos de Engenharia e de Medicina.
Na década de 70 a UCS passa por uma expansão, e reestruturação
administrativa e acadêmica e adquiri o status de Universidade. São criadas novas
sedes e cursos instalados em bairros e locais adquiridos pela Associação
Universidade Caxias do Sul. Em 1974, com a doação pelo Governo do Estado, de
terras pertencentes à Estação Experimental de Viticultura e Enologia, o campus foi
ampliado e a partir deste constituindo-se Cidade Universitária como é conhecida
hoje. Neste mesmo ano a UCS passa a ser mantida pela Fundação Universidade
Caxias do Sul, antiga Associação, entidade jurídica de Direito Privado, sem fins
lucrativos. O Conselho Diretor da Fundação é composto por representantes do poder
público municipal, estadual e federal, de prefeituras da região, da Câmara de
Indústria e Comércio de Caxias do Sul, da Mitra Diocesana e da Associação Cultural
e Científica Nossa Senhora de Fátima.
Queremos aqui, e agora, dizer que os responsáveis pela organização desta universidade a querem transformar num templo da cultura e do saber, e derramar para fora de seus muros os benefícios de suas pesquisas, o aproveitamento de seus cursos, em favor da comunidade que a faz crescer. (Dr. Virvi Ramos, no seu discurso de posse como reitor da Universidade de Caxias do Sul).
Em 1975, a UCS sedia o 1º Fórum de Estudos Ítalo-Brasileiros,
impulsionando o interesse de um grupo de pesquisadores na temática da
preservação e valorização da cultura regional. Para difundir a produção didática,
literária e científica resultante das atividades dos pesquisadores da Instituição,
começa a funcionar, em 1976, a Editora da UCS – EDUCS.
Desenvolvendo projetos voltados para o estudo das características regionais,
o crescimento das pesquisas nessa área deu origem à criação do Instituto Memória
Histórica e Cultural, em 1991. O curso de Turismo se insere no meio acadêmico na
184
Universidade de Caxias do Sul na década de 90, em 1994.
6.2.1 Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Turismo - UCS
O curso de Mestrado em Turismo da Universidade de Caxias do Sul foi criado
no ano de 2000, buscando atender a demanda crescente por capacitação
profissional qualificada na área, em intensa expansão em todo o mundo. Na região
da Serra Gaúcha, o Turismo, nos seus mais variados segmentos, movimenta um
mercado em franca expansão. Olhando para a realidade local e seguindo o exemplo
de outras universidades, em 1994 a UCS passou a oferecer o curso de graduação
em Turismo na cidade de Canela. Em 2000 abre o curso na cidade de Bento
Gonçalves, sendo em parte responsável pela formação de profissionais em atividade
nos inúmeros empreendimentos e equipamentos turísticos a nível regional e
nacional.
O Mestrado tem investido na produção de conhecimentos, na capacitação
científica, técnico-profissional e didático-pedagógica de docentes, pesquisadores e
profissionais vinculados à área, oferecendo uma visão abrangente e atualizada do
processo de globalização e de suas implicações no Turismo, considerando as
oscilações e mudanças estruturais decorrentes deste processo.
Dentre os principais objetivos propostos pelo programa estão o
desenvolvimento de pesquisa e reflexão teórica sobre o turismo e suas interfaces,
promovendo uma análise do Turismo como fenômeno com repercussões
socioculturais e econômicas. Qualificar recursos humanos para atuar nas áreas de
planejamento, gestão, pesquisa e docência em Turismo, além de fomentar o
desenvolvimento de novas abordagens metodológicas e a aplicação de novas
tecnologias, tanto na docência como em outros campos de atuação profissional.
O Programa de Pós-graduação em Turismo – UCS localiza-se no Campus de
Caxias do Sul - RS, e tem como atual coordenadora a Professora Dra. Marcia Maria
Cappellano dos Santos, e neste ano de 2013 será cidade sede do mais importante
evento científico em Turismo no Brasil, o Congresso Anual da ANPTUR. O Programa
se organiza em uma área de concentração e duas linhas de pesquisa, que são
detalhadas a seguir.
185
6.2.2 Área de Concentração: Desenvolvimento Regional do Turismo
Iniciando suas atividades no ano 2000, a área de concentração
Desenvolvimento Regional do Turismo vem responder diretamente as políticas
públicas, como os planos de regionalização do turismo, influenciando no desenho da
área. Além de um olhar atento a comunidade e região onde a UCS se localiza, volta
seu trabalho de extensão para uma inserção regional significativa, desenvolvendo
ações e pesquisas em temáticas inovadoras junto as empresas e poder público.
A Linha de Pesquisa: Turismo, Organizações e Sustentabilidade busca a
Análise, Planejamento e Gestão organizacional e institucional do Turismo e
Hospitalidade. Em alinhamento com sua área de concentração, debate temas
ligados à regionalização, globalização e seus processos, além de estudos sobre
cadeias produtivas, redes e organizações baseadas em cooperação e clusters. As
pesquisas e disciplinas visam o olhar para atividade turística em um viés de
desenvolvimento socioeconômico e sustentabilidade. Temáticas como a gestão
ambiental, planejamento e gestão da atividade turística em ambientes naturais,
rurais e urbanos também são contemplados nesta linha de pesquisa.
A segunda Linha de Pesquisa Turismo, Cultura e Educação prioriza estudos
socioculturais ligados ao turismo e hospitalidade. A discussão sobre o Patrimônio
material e imaterial e suas relações com o turismo, seus processos, manifestações e
eventos culturais. Dentro desta linha também são discutidos a questão da
diversidade cultural, a inclusão social e demais segmentações ligadas ao Turismo
Cultural. Esta linha de pesquisa dá atenção especial a formação do docente-
pesquisador, com disciplinas voltadas para a educação, ensino e aprendizagem,
bem como da dimensão epistemológica, humana e científica do turismo. Uma das
mais conhecidas pesquisadoras da Instituição a trabalhar com esta temática é a Dra.
Marustchka Martini Moesch, citada anteriormente neste trabalho, e que teve também
como orientador o Professor Dr. Mario Beni em sua formação no Doutorado em
Comunicação da USP.
6.3 UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI – UAM
Em 1970, após as reformas de 1967, na gestão do então Ministro da
Educação Jarbas Passarinho, um grupo de publicitários instala em São Paulo a
186
Faculdade de Comunicação Social Anhembi. Um ano mais tarde, outro grupo,
formado por engenheiros e arquitetos, funda a Faculdade de Turismo do Morumbi,
sendo este o primeiro curso superior em Turismo no Brasil, formando graduados na
área. Este primeiro curso abre as portas para um processo de formação,
capacitação e qualificação profissional, voltados para o mercado de trabalho.
Mercado este intensamente favorecido e divulgado pelo então governo militar.
Em 1982, as duas faculdades isoladas se unem e surge a Faculdade
Anhembi Morumbi, oferecendo os cursos de Comunicação Social, Turismo,
Secretariado Executivo Bilíngue e Administração.
A Faculdade mantém sua fórmula criando no Brasil cursos até então inéditos
como: Negócios da Moda; Pedagogia, com habilitações em Tecnologia Educacional
e Desenvolvimento na Empresa; Farmácia com ênfase em Cosmetologia; Design
Digital, entre outros. O status de Universidade seria adquirido em 1997, ano em que
a Instituição se credencia. No ano seguinte, funda seu segundo campus, e em 1999
é uma das primeiras universidades a implantar Cursos Tecnológicos, oferecendo
diploma de Formação Específica em dois anos.
Entre os anos de 2001 e 2008 a Universidade Anhembi Morumbi segue em
rápida expansão inaugurando mais três novos campi (Campus Morumbi, Campus
Vale do Anhangabaú e Campus Avenida Paulista). Em 2005, depois de uma
ampliação de cursos, a Universidade Anhembi Morumbi fechou uma grande aliança
com a Rede Internacional de Universidades Laureate – uma das maiores redes de
universidades do mundo, tendo sede principal os Estados Unidos.
A partir desta aliança tanto os alunos como docentes passaram a ter
oportunidade de formação e atuação internacional por meio de programas
exclusivos de intercâmbio em mais de 60 instituições privadas de ensino superior,
em 29 países. São oferecidas vantagens com a equivalência curricular, múltipla
diplomação, estágio internacional, além de toda a consultoria e suporte necessário
para a documentação, entre outros.
A Anhembi Morumbi atende milhares de acadêmicos distribuídos entre os
cursos de Graduação, Graduação Tecnológica, Graduação Executiva, Graduação
On-line e Pós-graduação Lato Sensu e Stricto Sensu.
A Universidade oferece modalidades diferenciadas de pós-graduação em
parceria também com a BSP – Business School de São Paulo. Entre as modalidades
está a Pós Graduação Lato Sensu ou Especialização, a modalidade Master, voltado
187
para a área empresarial e aquisição de habilidades específicas de gestão em sua
área de atuação, o MBA para aprimoramento de competências e aquisição de novas
habilidades empresariais, o MBA Executivo voltado para a integração dos negócios e
competências diretivas. Lembrando que segundo a legislação brasileira todos estes
níveis de pós-graduação são considerados como especialização, se enquadrando
no Lato Sensu. As diferentes modalidades oferecidas vêm de encontro a
equivalência curricular destes níveis de formação em instituições de ensino superior
internacionais, em especial as instituições norte americanas. No nível Stricto Sensu
a Universidade Anhembi Morumbi oferece o curso de Mestrado, destinado a quem
busca uma formação acadêmica voltada para a carreira na área de Ensino e
Pesquisa.
O espírito inovador da Universidade Anhembi Morumbi, sua criatividade na
criação de novos cursos e geração de demanda, bem como a visão empresarial são
marcas da instituição, que possui uma estrutura física privilegiada, localizada no
maior centro comercial e empresarial da América Latina.
6.3.1 Programa de pós-graduação stricto sensu em hospitalidade UAM
O curso de Mestrado em Hospitalidade da Universidade Anhembi Morumbi foi
criado em 2002, e busca a formação de profissionais com uma visão integrada dos
diferentes aspectos da hospitalidade: negócios, relações humanas e
sustentabilidade.
Sob a ótica empresarial, o programa concentra seus estudos nos modelos de
gestão de organizações envolvidas com o receber humano. Hotelaria, Gastronomia,
Eventos, Agências de Viagem e receptivo, e demais equipamentos utilizados pelo
turismo, pesquisando as estratégias e ferramentas utilizadas para atração de
clientes e vantagens competitivas.
Uma melhor compreensão da complexidade das relações humanas é um fator
estratégico para o desenvolvimento de relações pessoais visando à melhoria da
qualidade de vida nas comunidades. Nessa linha de pensamento, o Programa de
Mestrado em Hospitalidade trata também das dimensões conceituais e
epistemológicas da hospitalidade e do turismo, contemplando estudos sobre o
convívio com estruturas sociais na cidade e nos espaços rurais, envolvendo
diferentes áreas do conhecimento como sociologia, antropologia, nutrição,
188
gastronomia, geografia e entre outras. Complementa o direcionamento do programa
o estudo de políticas públicas para o desenvolvimento sustentável da hospitalidade
nos destinos.
O Programa de Mestrado em Hospitalidade destina-se a profissionais
formados nos cursos de Graduação, prioritariamente, nas áreas de Turismo,
Hotelaria, Gastronomia; Administração; Nutrição; Arquitetura e Urbanismo;
Comunicação Social; Sociologia; Antropologia, e outras áreas que estabeleçam
interface com a Hospitalidade.
Os principais objetivos estabelecidos pelo programa buscam oferecer uma
visão ampla e interdisciplinar da Hospitalidade nos estudos pós-graduados,
relacionando a oferta de produtos e serviços, em tempos e espaços diferenciados.
Estimular e ampliar a fundamentação teórica para o planejamento de
empreendimentos em Hospitalidade, bem como a investigação no campo da história
no campo social, econômico e ambiental. Além disso, visa o domínio de instrumental
metodológico a fim de promover o desenvolvimento das relações humanas nas
organizações e localidades, seja este com objetivo comercial ou para melhoria da
qualidade de vida.
O Curso de Mestrado da UAM é o primeiro no país concentrado
especificamente na área de hospitalidade e suas relações com o turismo, ampliando
a abrangência dessa temática para além dos empreendimentos hoteleiros. Tem sua
sede em na cidade de São Paulo, e é coordenado pela professora Dra. Elizabeth
Wada, diretora presidente da ANPTUR. No ano de 2012 foi sede do evento Nacional
da Associação.
6.3.2 Área de Concentração: Planejamento e Gestão Estratégica em Hospitalidade
O Mestrado em Hospitalidade da UAM, segundo ficha de Linhas de Pesquisa
disponibilizada pela CAPES, tem como área de Concentração Planejamento e
Gestão estratégica em Hospitalidade. Tem como principal objetivo a produção de
conhecimento científico sobre a Hospitalidade e suas práticas, processos, espaços,
serviços e organizações, nos domínios público, privado, comercial e virtual. Dentre
os objetivos específicos propostos para o programa e sua referida área de
concentração, a formação de pesquisadores qualificados para analisar e avaliar os
diversos componentes e setores da Hospitalidade, investigando processos e práticas
189
da Hospitalidade em suas múltiplas dimensões se faz presente, bem como a
realização de estudos e análises críticas de gestão e operacionalidade das
empresas que ofereçam serviços em Hospitalidade.
No sítio eletrônico do programa, a área de concentração é denominada
Hospitalidade, se dividindo em duas linhas de pesquisa. Ao levantarmos os dados
no sítio eletrônico da IES e da CAPES nos deparamos com uma discrepância de
informações, portanto os dados aqui apresentados são dados oficiais, fornecidos
pela CAPES, nas fichas de avaliação e linhas de pesquisa do programa, com a
avaliação trienal de 2010.
A linha de pesquisa Dimensões Conceituais e Epistemológicas da
Hospitalidade e do Turismo tem como principal objetivo a construção do campo
teórico da Hospitalidade associada ao turismo. Assim, contempla temas
relacionados aos diferentes campos abrangendo: cultura, ética, comunicação,
educação, lazer, e etc. A Hospitalidade aqui estudada considera os seus processos
e práticas, envolvendo, de um lado, as relações e vínculos entre hóspedes e
anfitriões, e a formação e qualificação espaços e pessoas em suas diferentes áreas
de atuação.
A segunda linha de pesquisa intitulada Políticas e Gestão em Hospitalidade
e Turismo abrangem, nos âmbitos público e privado da Hospitalidade e do Turismo,
a construção, desenvolvimento, implantação e gestão de políticas, programas e
projetos, com ênfase no desenvolvimento sustentável de destinos e organizações
ligadas ao turismo e seus equipamentos. Assim, a hospitalidade nessa linha de
pesquisa tem seu foco em aspectos da gestão e dos negócios envoltos na relação
anfitrião – hóspede.
Dentre os pesquisadores da instituição destacamos o professor Camargo,
participante desta pesquisa, e que incluiu a temática Hospitalidade em sua
produção. Também atua como docente titular no Programa a Professora Dra. Miriam
Rejowski, desenvolvendo pesquisas relevantes na área de hospitalidade, ensino e
pesquisa científica em turismo no Brasil.
6.4 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE – UFRN
A Universidade do Rio Grande do Norte criada em 25 de junho de 1958, foi
instalada em sessão solene realizada no Teatro Alberto Maranhão, em março de
190
1959. Formada a partir de faculdades isoladas e escolas de nível superior já
existentes em Natal, como a Faculdade de Farmácia e Odontologia; a Faculdade de
Direito; a Faculdade de Medicina; a Escola de Engenharia, entre outras. A
Universidade Federal do Rio Grande do Norte origina-se da Universidade do Rio
Grande do Norte, que foi federalizada em Dezembro de 1960.
A partir de 1968, com a reforma universitária, a UFRN passou por um
processo de reorganização que marcou o fim do isolamento das faculdades e
consolidação da atual estrutura, com o agrupamento de diversos departamentos
que, dependendo da natureza dos cursos e disciplinas, organizaram-se em Centros
Acadêmicos.
Nos anos 70, teve início a construção do Campus Central, numa área de 123
hectares. Por meio de um Decreto de 1974 (N° 74.211), a estrutura da UFRN foi
modificada novamente formando diferentes Conselhos a partir do então Conselho
Universitário. Foram implantados os Conselhos de Ensino, Pesquisa e Extensão,
Conselho de Curadores e a Reitoria.
Novas reformas na estrutura da UFRN aconteceram na década de 90,
concluídas em 1996, estabeleceu a estrutura hoje em vigor na Universidade,
acrescentando-se aos conselhos existentes o Conselho de Administração. Na
estrutura acadêmica criou-se Unidades Acadêmicas Especializadas e os Núcleos de
Estudos Interdisciplinares.
O Campus Central abriga atualmente um complexo arquitetônico, circundado
por um anel viário que o integra à malha urbana da cidade de Natal. Além das salas
de aula, laboratórios e bibliotecas, o Campus Central possui um Centro de
Convivência com restaurante, agências bancárias, livrarias, galeria de arte e
correios. Também conta com um anfiteatro ao ar livre para apresentações e eventos,
além de um Parque Poliesportivo, inclusive com ginásio olímpico, onde atualmente
treina a Seleção Brasileira Olímpica de GRD.
Atualmente, a UFRN oferece 84 cursos de graduação presencial, 9 cursos de
graduação a distância e 86 cursos de pós-graduação. Sua comunidade acadêmica é
formada por mais de 37.000 estudantes entre graduação e pós-graduação, mais de
3 mil servidores, e 2 mil docentes efetivos, além dos professores substitutos e
visitantes.
191
6.4.1 Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Turismo UFRN
O Curso de Mestrado em Turismo da (PPGT) da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte (UFRN) iniciou suas atividades no ano de 2008, visando atender a
necessidade de estudos dos fenômenos que caracterizam as atividades turísticas,
considerando as potencialidades da região Nordeste do País e da consequente
demanda por conhecimento de sua dinâmica e amplitude, seja em nível local,
regional, nacional ou internacional.
Observando o contexto de ensino e capacitação profissional em turismo e
áreas afins, buscando qualidade e comprometimento com os interesses sociais da
região, o Curso de Mestrado em Turismo se propõe a educação continuada de
qualidade em nível de pós-graduação para portadores de diplomas de curso superior
em turismo e áreas afins, preparando pesquisadores e professores para ensino de
graduação e pós-graduação em Turismo e correlatas.
Visa a capacitação de profissionais para o exercício de funções de nível
estratégico em organizações públicas e privadas, articulando níveis de ensino
voltados para a formação do pesquisador e para a produção científica, tecnológica,
filosófica, cultural e artística.
O Mestrado em Turismo da UFRN pretende capacitar seu egresso,
desenvolvendo competências para monitorar, analisar e interpretar o
desenvolvimento do turismo e seus impactos, local e regional. Trabalhando
metodologias e pesquisas voltadas para a competitividade de destinos, bem como a
diminuição de impactos nas comunidades receptoras a nível social e ambiental,
sendo esta atuação na esfera pública ou privada, profissional ou acadêmica.
De acordo com as fichas de avaliação e linhas de pesquisa disponibilizadas
pela CAPES na avaliação do Triênio 2010, o curso de mestrado tem demonstrado
algumas deficiências: poucas dissertações defendidas, baixa produtividade do corpo
docente, oscilação do corpo docente. Visitas foram programadas para possíveis
adaptações do programa. Em consulta ao site da IES, fizemos uma busca no Banco
de Dissertações e Teses, chegando ao resultado de 09 dissertações defendidas em
2011; 13 dissertações defendidas em 2012, e 01 dissertação defendida até o
primeiro semestre de 2013.
O Programa de Pós-graduação em Turismo da UFRN se localiza na cidade
de Natal, e atualmente tem como coordenador o Professor Dr. Mauro Lemuel de
192
Oliveira Alexandre.
6.4.2 Área de Concentração: Turismo, Desenvolvimento e Gestão
A área de concentração do curso de Mestrado em Turismo da UFRN se divide
em duas linhas de pesquisa. A primeira delas intitulada Turismo e
Desenvolvimento Regional busca reunir temas multidimensionais implicados no
desenvolvimento turístico em todos os níveis. Aliado ao contexto regional, tendo o
Turismo como uma das principais atividades humana e socioeconômica da região
Nordeste e do Estado do Rio Grande do Norte, esta linha de pesquisa tem como
objetivo facilitar a interface entre temas envolvendo turismo e áreas afins, discutindo
diferentes abordagens de implantação e plano de ações.
Os principais temas que tem sido abordados nesta linha de pesquisa se
relacionam com o Turismo e o desenvolvimento local e regional, bem como o estudo
de políticas públicas voltada para o setor. Além dessas temáticas é presente a
preocupação com o desenvolvimento sustentável do turismo e suas relações com o
meio ambiente.
A segunda linha de pesquisa denominada Gestão em Turismo preza pela
articulação do conhecimento multidisciplinar, fundamental para orientar decisões
estratégicas relacionadas ao planejamento e gestão do turismo e de organizações
turísticas, tendo em vista múltiplos fatores que influenciam no desenvolvimento da
atividade.
Ainda, esta linha de pesquisa busca gerar conhecimentos e instrumentos de
planejamento e gestão aplicados às peculiaridades da atividade turística e sua
aplicação ao contexto das organizações e equipamentos turísticos das mais
diferentes especialidades. Tem abordado como temáticas principais a gestão
ambiental e a competitividade de destinos, ética e responsabilidade social do setor,
marketing e comportamento do consumidor turístico, bem como a gestão de
empresas de Turismo e Hotelaria e avaliação de impactos decorrentes da atividade.
193
6.5 PANORAMA DA PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM TURISMO NO BRASIL
Evidenciamos, anteriormente, o contexto histórico no qual o Estudo do
Turismo vem a se inserir nas Instituições de Ensino Superior Brasileiro. Fez-se
assim necessário refletirmos sobre o panorama da pós-graduação stricto sensu,
visto a evidenciada importância desta na construção do conhecimento científico em
Turismo, em especial no que concerne a temática epistemológica. Mas, uma
pergunta se insere: Ora, qual é a real contribuição da história da educação em nossa
reflexão?
A compreensão dos condicionantes que influenciam a construção do
conhecimento no Brasil não se dá alheio ao contexto histórico, político e social no
qual ele se desenvolve. Assim, a criação dos cursos de Bacharel em Turismo na
década de 70 estão imersos em um processo histórico. E a maneira como eles vêm
a se desenvolver está imerso em um momento político, econômico, social e humano.
Conforme percebemos no referencial teórico de nossa pesquisa, a reflexão
histórica não se limita a uma descrição do passado, mas sim em nos colocar perante
um patrimônio de ideias, de projetos e de experiências. Como bem coloca o
historiador da educação Antônio Nóvoa (2004, p.11), ―a inscrição do nosso percurso
pessoal e profissional neste retrato histórico permite uma compreensão crítica de
‗quem fomos‘ e de ‗como somos‘‖.
Entender e conhecer a história do Ensino superior no Brasil nos coloca diante
de nossa própria história como docentes e pesquisadores. Interpretar a história da
educação voltada para o turismo, nos re-significa, pois encontramos uma identidade
que nos une aos outros conhecimentos instituídos na academia. Não é privilégio
única e exclusivamente nosso a dificuldade na delimitação de objetos, o próprio
conhecimento passou por diversas crises e rompimentos em sua formulação. As
Universidades Brasileiras públicas estão cada vez mais abandonadas, algumas
Universidades Particulares estão tendo um certo descaso com o real papel da
Educação. Fazemos parte de um país de dimensões continentais, e as disparidades
geográficas e sociais também são continentais.
Como seres sociais, não somos apenas ‗criaturas‘ de nossa história, mas
somos ‗criadores‘ e transformadores dessa própria história através da nossa prática
social – da práxis. Eis a necessidade de desenvolvermos uma atitude crítica ao
analisarmos as múltiplas influências que se inserem principalmente no espaço da
194
educação e do conhecimento. Assim, buscamos através dessa reflexão situarmos
nossa própria existência na narrativa histórica e compreendermos que as mudanças
se fazem a partir das pessoas e de lugares concretos. (SANTOS, 1986; KOSIK,
2002; NÓVOA, 2004)
Não podemos ficar alheios as transformações, pelo contrário, devemos
acompanha-las com os olhos bem abertos, a história colabora para que não nos
percamos por demasiado em nossos caminhos. A história possui em si contradição
como motor propulsor, e se complementa em seus negativos, e positivos. O
Turismo, como qualquer outro saber, deve conhecer sua própria história, e a história
de seus atores sociais, a fim de se aproximar cada vez mais de sua identidade e de
seu real papel social.
Ora, a construção do conhecimento não se dá em meio ao vazio, e não
sobrevive em castelos construídos no ar. Ela se apoia no mundo concreto, objetivo,
material. Conforme já colocado, a Universidade se compõe como espaço privilegiado
na construção do conhecimento. (TEIXEIRA, 1962; FERNANDES, 1991)
Em nossa pesquisa, a desconstrução deste espaço privilegiado, a
Universidade, permite o reconhecimento de aspectos da sua formação sócio
espacial, que se revelam e ao mesmo tempo ocultam-se na construção do
conhecimento. Assim, a partir desse concreto aparente são tecidas abstrações,
reflexões, que ao retornarem ao mundo concreto, reconstrói o real - Real pensado;
Concreto pensado. (KOSIK, 2002; SANTOS, 1986)
Ou seja, para compreender a construção, desconstruímos para reconstruir.
Eis aí que reside a análise, influenciada pelos pressupostos teóricos colocados em
nossa pesquisa. Para compreender o fenômeno, é necessário captar fatos que se
dão em meio ao tecido da história. Apresentaremos aqui apenas um Panorama da
Pós-Graduação Stricto Sensu, não sendo nosso objetivo nesse trabalho analisa-la
em profundidade, apenas teceremos algumas considerações.
Conforme observamos no desenrolar da história em nosso país, o Turismo se
insere no ensino superior na década de 70. Este período histórico é marcado por um
regime político extremamente contraditório e coercitivo. Contraditório na medida que
abre a política Nacional para a entrada do capital estrangeiro e um maciço processo
de industrialização e de crescimento do país, herdados inclusive de políticas
desenvolvidas anteriormente no Governo de JK (―50 anos em 5‖), responsável pela
transferência do Distrito Federal para Brasília, anteriormente situado no município do
195
Rio de Janeiro, a fim de incrementar o desenvolvimento da região centro-oeste do
país, e de possibilitar uma localização geográfica privilegiada em um país de
dimensões continentais. Conhecido como um período de ―Milagre econômico‖, a
política interna realizada no regime militar era extremamente coercitiva, ditatorial e
cerceadora.
Seria ingênuo imaginar que o Turismo, ao se estabelecer como área de
interesse no ensino superior, não sofreria as influências político-econômicas do
regime.
A situação política do país à época impediu que se formassem verdadeiras comunidades de aprendizado e pesquisa, em função de medidas arbitrárias e da situação de desconfiança que passou a reinar no ambiente universitário após a implantação da LDB 68. (DENCKER, 2006, p. 07)
Ele se desenvolve em um período de crescimento econômico pulsante, mas
também está imerso em um contexto de censura ideológica, artística, política; uma
censura do conhecimento. Conhecimento este que ao questionar o regime ditatorial
vigente, tecia críticas, e ao tecer críticas, se revelava como uma ameaça ao estado
―democrático‖. Cobrar dos primeiros cursos de Turismo uma reflexão epistemológica
e filosófica seria condená-los a uma morte prematura, ou conduzir nossos hoje
professores a um risco de vida, ou de desaparecimentos inexplicáveis.
Assim, o conhecimento em turismo passa a ser construído na sua prática, em
seu cotidiano. Ele passa a ser construído imerso em um contexto histórico social.
Poderíamos, por analogia, comparar esse momento inicial com uma fase de
desenvolvimento de estruturas e instituições que viriam a viabilizar a produção do
conhecimento científico em turismo, ou seja, estruturas que através de seu
desenvolvimento e instituição, passariam a alterar o quadro da discussão em turismo
no Brasil. Esse desenvolvimento se manifesta no plano quantitativo, objetivo,
concreto, gerando transformações qualitativas. Seria a fase de aquisição de
conceitos, iniciação científica. (PIAGET, 1971)
O Turismo estava sendo absorvido, suas limitações, seu objeto, sua temática
e suas interfaces estavam em uma fase de pré estabelecimento, um terreno de
dúvidas, que fomentou muitas discussões acerca da atuação do turismólogo.
Discussões estas que continuam sendo pertinentes, uma vez que decorridos 40 de
ensino superior e técnico no campo do turismo no Brasil, a profissão ainda não é
reconhecida. Essa primeira fase se dá em um momento histórico do estabelecimento
196
de várias novas profissões no Brasil, e, portanto, de disputa de objetos de estudo, de
suas relações, definições de currículos, sendo os currículos formais zonas de conflito
eminente.
A Matriz curricular foi elaborada pelo Ministério da Educação tendo por base
os primeiros cursos formados, em especial o da UAM. O que fez com que os cursos
pudessem se dar em três a quatro anos. Ou seja, ele nasce ambíguo, nasce
sofrendo a influência das políticas públicas, que via no Turismo uma forma de
desafogar os cofres públicos, e, ao mesmo tempo divulgar uma imagem positiva do
Brasil, visto que, com a divulgação de exilados e artistas, dos desmandos do
Governo Militar, estes já se faziam conhecer em partes do mundo.
Revela-se assim, não só no processo de construção do conhecimento, como
no relato de experiência da professora Doris, onde no inicio de sua carreira, quando
a profissão começava a se desenhar no Brasil, ela enfrentou obstáculos no que se
referia a atuação do turismólogo. Até onde vai o limite de sua atuação em face a sua
conexão intensa como por exemplo a administração e a comunicação? Seria o
turismólogo um administrador especializado na gestão de equipamentos turísticos?
Seria o turismólogo um relações públicas de assuntos relacionados ao Turismo?
Seria o Bacharel em Turismo uma ameaça ao mercado de trabalho destes
profissionais? Não foi a toa que enfrentou obstáculos na atuação profissional. E
esses obstáculos se relacionam com a questão epistemológica, ao passo que não
ter uma limitação estruturada do objeto de estudo, ou um corpo teórico
fundamentado, levam a múltiplas definições sobre a atuação social do profissional,
ou seja, do seu trabalho.
Esse processo evidenciado também no próprio desenvolvimento na área,
onde o curso se liga inicialmente a área de administração (UAM), e posteriormente a
área de comunicação (ECA - USP), onde vem sofrer uma maior inserção no campo
das ciências sociais, visto o prestígio de que goza, até os dias atuais, a IES. Ainda
em tempo vale lembrar que a primeira UNIVERSIDADE a oferecer o curso de
Turismo foi a USP. Na ocasião da fundação do primeiro curso na UAM, esta ainda
não era UNIVERSIDADE, e sim FACULDADE ou Centro de Ensino Universitário.
(Faculdades Isoladas)
Podemos acompanhar durante o relato histórico de cada IES e Programa,
bem como através do relato da Professora Doris as dificuldades iniciais com os
cursos de turismo, em todos os níveis. O Primeiro programa stricto sensu a surgir foi
197
da UNIVALI em 1997, o Segundo só seria instalado em 2000 na UCS. No gráfico
abaixo acompanhamos essa evolução numérica.
Gráfico 03 – Evolução por ano de Programas Acadêmicos Stricto Sensu no Brasil
Fonte: Da Pesquisa.
Depois da criação dos dois cursos, sendo: 1° UNIVALI; 2° em 2000 da UCS;
3° em 2002 da UAM; 4° lugar criado em 2008 da UFRN, e em 2012 foi aprovado o
primeiro Doutorado na UNIVALI, num total de cinco cursos, ou 4 Programas, visto
que a UNIVALI com Mestrado e Doutorado fazem parte do mesmo programa.
Mesmo mais recente, os Programas de Turismo sofreram as mesmas variáveis de
outros cursos quando da sua criação: a regulamentação. A Professora Doris nos
contou um pouco sobre a experiência com o Mestrado da UNIVALI, e mais uma vez
o debate sobre o obejto e a que área ele era concernente veio a tona. Foi com a
defesa dela que o curso se firmou como uma área e campo de estudo
multidisciplinar e interdisciplinar. Com certeza o mérito dela, do corpo docente da
UNIVALI, bem como de seus gestores é imensurável, pois abriu portas para a
regulamentação de outros Mestrados no país.
A UNIVALI concentrou-se nas áreas de Planejamento e Gestão, ou seja, na
formação de profissionais do turismo comprometidos com uma atividade planejada,
de gestão abrangente e participativa, norteados pela sustentabilidade ambiental e
social. A Univali detêm a nota 5 na Avaliação CAPES, em seu Mestrado e
Doutorado.
A UCS concentrou-se na área de Desenvolvimento Regional, com fortes
ligações culturais com a região do Rio Grande do Sul, que tem na cultura seu berço,
198
e sua voz. Seguindo a linha de valorização da Cultura, foi influenciada pelas políticas
públicas do setor turístico, que já trabalhava questões de municipalização e
regionalização do turismo.
A UAM se diferenciou dos demais cursos e concentrou-se na área de
Hospitalidade e Turismo, ora a hospitalidade é deveras importante para o Turismo, e
não deve ser dele dissociado, portanto, mesmo com o nome Hospitalidade, ele se
liga a grande área do Turismo, Administração e Contábeis. Recentemente aconteceu
uma ligeira mudança em suas linhas de pesquisa, que se adequam mais ao perfil da
IES, que recentemente estreitou seus laços com instituições norte-americanas de
ensino, seguindo uma tendência que tem acontecido com outras IES superiores,
principalmente no Estado de São Paulo.
A UFRN é a única Universidade Federal com Mestrado Acadêmico em
Turismo. Embora pouco mencionado, tem tido defesas regulares de dissertações, e
seu maior problema reside na alta burocratização e sucateamento dos equipamentos
públicos, como as Universidades Públicas. Ele se concentra na área de Turismo,
Desenvolvimento e Gestão, preocupados com a realidade turística a que estão
inseridos – NATAL. Visto assim, a grande importância e inserção regional deste
mestrado. Atualmente, os Programas se dividem entre Mestrados Acadêmicos,
Doutorado e Mestrado Profissionais, de acordo com o gráfico:
Gráfico 04 – Programas de Pós-Graduação no Brasil em Turismo
Fonte: Da Pesquisa.
Estes estão distribuidos entre Universidades Públicas e Privadas. Aqui nós
podemos perceber uma pequena inversão, e que pode-nos ser muito saudável. Os
Programas Acadêmicos estão em sua maioria localizados em Universidades
199
Particulares, que tem dado amplo apoio a pesquisa nestes programas, diminuindo o
exagerado vezo acadêmico mercadológico. Por outro lado, as Universidades
Públicas tem liderado os Mestrados Profissionais, o que pode ser positivo visto que a
estrutura da Universidade Pública exige uma maior atenção a Pesquisa, os
formandos destes programas de Mestrado Profissional podem aliar no Mestrados
Profissionais a Pesquisa e o Mercado. Mas, para tal, é necessário articulação interna
por parte dos docentes e pesquisadores, orientando o aluno para que não se perca
entre as duas abordagens do mesmo objeto (Acadêmica e Profissional).
Um dos princípios da Dialética é a transformação de quantidade em qualidade
e vice versa. Analisando os números, vemos um crescimento ascendente dos
Programas de Turismo no Brasil, como mostra essa Progressão Linear31:
Gráfico 05 – Progressão Linear dos Programas de Pós-graduação Stricto Sensu em Turismo no Brasil
Fonte: Da Pesquisa.
A Progressão linear nos mostra uma linha ascendente, mas quando olhamos
para a nota CAPES de cada Programa, este crescimento entra em cheque.
Programas com mais de 10 anos mantêm a nota mínima da CAPES, e isso é
preocupante. Estamos entrando em uma nova fase com o Doutorado em Turismo
sendo instalado no Brasil, nossa preocupação é que os Mestrados, ao não
crescerem suas notas, deixem de existir, marcando um considerável retrocesso na
pós graduação em Turismo. Se faz necessário, nessa nova fase, que as IES se
31
Utilizamos do Programa Excel para a formatação dos gráficos. Assim elaboramos a progressão linear que
trabalha com os números absolutos, baseado em média aritmética, têm-se a progressão linear, ou seja, não considera as relações, apenas os números.
200
unam para o aumento de pelo menos um ponto de nota CAPES, elevando a maioria
delas para Nota CAPES 04. Seria interessante que esse fosse um projeto conjunto e
integrador. Visto que, na nova conjuntura, somente a união e a participação pode
fazer frente aos problemas que enfrentamos todos os dias. A CAPES também deve
ser responsabilizada por tal.
No Regime militar o governo viu nas IES particulares a resposta para seus
problemas, hoje a IES particular é a principal responsável por receber os alunos dos
planos desenvolvidos pelo governo de acesso a Universidade. Para nós parece
completamente inadmissível que utilizando da infra-estrutura particular das
Universidades quando lhe convêm para a graduação, e essa mesma IES não serve
para receber uma nota CAPES mais condizente na Pós-graduação. Que critérios
são esses? Como é feita essa avaliação? Porque a nota de muitos cursos não se
alteraram em mais de 10 anos? São questionamentos, apenas questionamentos.
A única garantia que temos, é que professores competentes estão
espalhados em todas as instituições e programas, e alunos tem defendidos ótimos
trabalhos. Crescemos muitas vezes alheios a políticas públicas, alheios a nossa
própria regulamentação de profissão.
Nossa pesquisa revelou algumas mudanças que acontecerão no panorama
da Pós Graduação nos próximos três anos, baseando-se nas entrevistas e visitas
que realizamos a quase todas as IES envolvidas, com exceção apenas da UCS e da
UFRN. No gráfico abaixo, podemos visualizar como atualmente estão divididos e
situados os programas.
Gráfico 06 – Distribuição de Programas Stricto Sensu por Tipologia - 2013
Fonte: Da Pesquisa.
201
Esse Panorama passa a se alterar com o Mestrado Profissional da UECE que
já foi homologado; Mestrado Profissional da UFPR – Universidade Federal do
Paraná, em processo de homologação; Mestrado Acadêmico em Lazer e Turismo da
USP, que está em avaliação da CAPES. Ou Seja, uma previsão para que até
201532, caso nenhum programa tenha interrupção das atividades teremos nove
cursos, assim distribuidos:
Gráfico 07 - Distribuição de Programas Stricto Sensu por Tipologia – 2013/2015
Fonte: Da pesquisa.
Este se torna assim um momento propício para discussão, reformulação e
atuação. A competição só é saudável quando ela sabe o momento de dar lugar a
uma efetiva cooperação, seja junto aos programas, ou seja junto ao órgão de
regulação CAPES. Com o inicio do Doutorado, a área ganha corpo e precisa por
exemplo de mais bolsas de pesquisa e ensino, a serem distribuídas nos Programas
Stricto Sensu. Nos perguntamos as vezes, como um país que faz a captação de dois
megaeventos seguidos, não regulamentou a profissão do turismólogo e ainda
concede pouquíssimas bolsas de pesquisa? A quem interessa nosso silêncio? A
cooperação se faz assim essencial, e algumas iniciativas são reais, como a parceria
entre a UNIVALI e a UECE, ou a USP e a UECE.
Outro elemento de destaque em nossa análise é a geográfica, pois sem o
espaço de construção do conhecimento ele seria impossível. Prevalece no Brasil as
Universidades e peso de formação na região Sudeste do País, fator histórico, não é
32
Montamos o gráfico com base nas pesquisas realizadas nos sites da CAPES e do CNPQ, bem como nos
sítios eletrônicos das IES, e de dados obtidos nas pesquisas de campo com os atores sociais dessa pesquisa.
202
privilégio do Turismo, mas ações podem ser realziadas para ajudar a melhorar ainda
mais a situação. O Nordeste e o Norte são celeiros de talento e cultura acadêmica
também. Lá foram formados os primeiros cursos superiores, e no que concerne o
Turismo, tem revelado grandes talentos, com trabalhos extremamente interessantes,
viáveis e impactantes, principalmente a nível regional. Talvez seja por isso que
conhecemos tão pouco do que lá se produz, a eterna mania de achar que o que vem
da Capital é válido, mas o que vem de Centros periféricos não seria tão bom assim.
Pois, em se tratando de Turismo, isso não é verdade, e muitos talentos do Turismo e
de outras áreas nasceram e estudaram na região Norte e Nordeste. Observe os
dados do Painel Lattes de Doutores formados por área de atuação e Região:
Figura 09 – Comparativo por Geografia, Instituição de Vínculo e Área de Atuação
Fonte: Extração de dados da base de Currículos Lattes, 2012.
Percebe-se que dentre todos os Doutores da Área de Ciencias sociais a
grande maioria (7.715) está na região Sudeste. Com menos de 50% desse total está
a Região Sul, que possui 02 Mestrados e 01 Doutorado, com apenas 3.176. Seguido
pela Região Nordeste com 2.509. A Região Centro-oeste com 1.503 e a Região
Norte em último lugar com apenas 644.
As disparidades são grandes, e a força do Estado de São Paulo continua
203
exercendo a influência e porque não hegemonia desde a fundação de suas
Universidades em 1934. Assim, somente uma intensa cooperação entre os
Programas pode suprir essa carência histórica, que não é luxo do turismo, mas uma
necessidade. Mesmo porque, quando falamos de Turismo, em especial de regiões
de interesse turístico como Natal - RN, a praias e regiões litorâneas do Estado do
Ceará e Alagoas. Se é importante a atividade comercial nestes destinos, pois então
que seja também importante investir em ensino e pesquisa, visando não somente a
mão de obra qualificada, mas gerar multiplicadores para que a atividade se dê com o
menor impacto cultural, social, ambiental possível.
É esse o Panorama da Pós Graduação33 hoje em Turismo no Brasil. Foi com
a luta e empenho de muitos profissionais que hoje podemos ter Programas que tem
formado Profissionais competentes e Educadores Acadêmicos compromissados com
as boas práticas do turismo e da docência. Sem deixar de lado as raízes culturais,
sem banalizar o desenvolvimento através do turismo e não pelo turismo. Muito
temos pela frente, mas o prognóstico é promissor.
33
Em Anexo Gráfico com os Anos de Criação, incluindo todas as tipologias até 2012. Nele executamos um
cálculo de desvio padrão, traçamos uma progressão baseada em dois pontos, com margem de erro de 5%.
Disponível para consulta (Ver Anexo C – p. 259).
204
7 REFLEXÕES SOBRE O ESTADO DA ARTE
Nesta etapa de nossa dissertação passamos a apresentação e interpretação
das informações e resultados obtidos pela pesquisa, a luz do referencial teórico, e
análises realizadas ao decorrer do ir e vir da pesquisa dialética. Para fins de
apresentação, iniciamos com a contextualização do Autor-Pesquisador selecionado
para participação, no que poderíamos chamar de uma ontogênese da formação
acadêmica e profissional. (PIAGET, 1971)
Em seguida esclarecemos os critérios utilizados na escolha da unidade de
leitura selecionada. Nesta unidade de leitura, aplicamos a técnica de análise descrita
nos procedimentos metodológicos. A ficha de Registro e Análise de cada autor
selecionado pela pesquisa está disponível para consulta no apêndice do nosso
trabalho. (SEVERINO, 2008; MINAYO, 2001)
Também utilizada como procedimento técnico em nossa pesquisa de
abordagem qualitativa a técnica de entrevista guiada, cujo roteiro se encontra nos
apêndices, enriqueceu as análise e discussões, estabelecendo um diálogo com a
unidade de leitura. Foram observados procedimentos para a coleta, registro e
análise das entrevistas realizadas com os pesquisadores selecionados, e todos
estão de comum acordo com a divulgação das informações aqui apresentadas. Em
se tratando de uma entrevista em profundidade, algumas informações foram
suprimidas, de maneira a preservar membros da família, e o próprio entrevistado. O
bom senso cabe em todo o lugar, e na pesquisa científica damos-lhe o nome de
ética na pesquisa.
As informações são parte do registro do pesquisador de sua pesquisa de
campo, e algumas estão disponíveis nos apêndices do trabalho para consultas.
(MINAYO, 2001; RICHARDSON, 2008; DENCKER, 2000)
Em seguida, foram feitas algumas considerações sobre o estado da arte, na
tentativa de evidenciar os caminhos desenvolvidos pelos autores, e as influências
teórico-metodológicas na construção do conhecimento. Buscamos identificar
fundamentos epistemológicos que embasam o conhecimento produzido no campo
do turismo através dos autores selecionados, na tentativa de trazer a tona a
‗essência‘ que se materializa na ‗aparência‘. (KOSIK, 2002)
Utilizamos assim da entrevista realizada com os autores e de suas
respectivas unidades de leitura, em um ―ir e vir‖. Onde comparamos as afirmações
205
feitas durante as entrevistas contrapondo com os fundamentos que embasam sua
produção científica. (KOSIK, 2002; RICHARDSON, 2008)
Vale lembrar que, já descritos nos fins desta pesquisa, em nenhum momento
vamos questionar a validez ou não dos conceitos colocados pelos pesquisadores,
pelo contrário. Nosso objetivo é identificar os caminhos, e não censurá-los. Veremos
que algumas colocações dos pesquisadores serão contraditórias a própria
epistemologia de pesquisa constante neste trabalho (MHD). Mas assim como
colocamos anteriormente, na contrariedade reside a mudança, reside a oposição.
Estas relações complexas que se estabelecem são contraditórias, mas, ao mesmo
tempo, complementares. (DEMO, 1985; RICHARDSON, 2008)
Além de contraditórias e complementares podemos dizer que são
estabelecidas relações construtivistas, ou seja, o conhecimento está sendo
produzido, construído nas bases da relação com o mundo social e o sujeito -
indivíduo - atores sociais que protagonizam o fato social. Ou seja, a construção se
dá imersa em um processo histórico-social, permeado de historicidade. (PIAGET,
1971)
Assim, se inter-relacionam na construção do conhecimento características
objetivas como o domínio de determinada temática, ou sua área de formação, o
contexto histórico, político e social no qual sua produção se realiza. E características
subjetivas, peculiares, que enriquecem o olhar do pesquisador, do ser cognoscente.
Ou seja, do homem dotado de estruturas cognitivas (psico-genéticas) que
possibilitam a aquisição de novos conceitos (assimilação), articulados com sua
vivência social e histórica (adaptação), produzindo e avançando no campo do
conhecimento (acomodação). (PIAGET, 1971)
Como bem coloca a Prof. Dra. Luzia Neide Coriolano (2005, p. 51):
A análise do discurso propõe-se a construir escutas que permitam levar em conta esses efeitos e explicar a relação desse saber com a realidade, uma análise que não se aprende, não se ensina, mas que produz seus efeitos.
Entre a leitura analítica e a riqueza da entrevista caminhamos, construindo
pontes, formalizando escutas, descobrindo o nosso tema de pesquisa no desenrolar
da análise. Procuramos o dito e, o não dito. (ORLANDI apud CORIOLANO, 2005)
Para a Psicanálise, o sujeito é também o sujeito do pensamento. Freud
atribuiu ao inconsciente os pensamentos e também raiz das neuroses que estudava.
206
Já a releitura feita por Lacan, de caráter estruturalista-dialético, tratou do sujeito não
da a-razão, ou da sem razão, mas sim da razão inconsciente, cuja lógica é também
apreendida através de um método – o método psicanalítico ou analítico.
Para Freud é precisamente a perturbação que a dúvida provoca na análise que a desmascara como ―um produto e um instrumento da resistência psíquica‖. É nesse lugar da resistência da qual a dúvida é o índice que se manifesta o sujeito: ou seja, no campo do inconsciente como pensamento ausente. É esse fundamento que motiva a primeira definição estruturalista e dialética do inconsciente anunciado por Lacan: ―O inconsciente é o capítulo de minha história que é marcado por um branco ou ocupado por uma mentira: é o capítulo censurado.‖ (QUINET, 2001, p.16).
O cogito freudiano é antes de tudo “desidero ergo sum”, uma vez que lá onde
se encontra o desejo está o sujeito. Desejo logo existo. Desejo é o nome do sujeito
de nosso tempo. O consumo e o desejo misturam-se com a vontade e a
necessidade do Homem. Em nossa sociedade, a moeda dá direito de ir e vir e ao
mesmo tempo escraviza o tempo e espaço na roupagem do trabalho. O sujeito que
se descobre nos escombros das patologias, nos caleidoscópios oníricos, nas
fantasmagorias da ópera privada – esse sujeito é fundamentalmente desejo.
(QUINET, 2001)
Assim, ―faz-se necessário identificar o que foi dito, e suas diferenças, as
relações e interações dos discursos, em uma dada realidade social, em um dado
contexto histórico e social‖ (CORIOLANO, 2005, p. 51). Por isso se fez tão
importante desconstruirmos os espaços de construção do conhecimento em turismo
no Brasil, para melhor decompor essa realidade.
Nossas entrevistas se fizeram essenciais para a delimitação e abordagem do
estudo. Através dos métodos e técnicas buscamos ouvir o pesquisador durante a
entrevista, e buscamos ouvir o autor durante as análises de unidades de leitura.
Todo o discurso traz consigo uma mensagem, cabe ao pesquisador manter seus
olhos e ouvidos atentos e sensíveis.
A escuta sensível do pesquisador passa por essa técnica da abordagem transversal, foge do instituído, trabalha a sensibilidade e a condição humana na dimensão dialética da criação, gerando uma coerência no processo de análise. (CORIOLANO, 2005, p.53)
Iniciaremos nossa análise com o Professor Dr. Luiz Gonzaga de Godoy Trigo.
207
7.1 REFLEXÕES SOBRE O ESTADO DA ARTE EM TRIGO
7.1.1 O AUTOR: Luiz Gonzaga de Godoi Trigo
O encantamento pelas viagens acompanha Luiz Gonzaga de Godoi Trigo
desde a infância. A mãe, professora de geografia e história, proporcionava fácil
acesso a livros, mapas. Sempre viajou bastante, e utilizava muitos dos materiais das
agências de viagens, operadoras aéreas para se informar sobre turismo. Em 1975,
ele estava no fim do ginásio, e foi aberto o curso de tecnólogo no SENAC Campinas
- SP, cidade onde nasceu e veio a se formar tecnólogo. Desde 1976 trabalhava
como guia turístico, inicialmente a nível nacional e posteriormente, 1979 como guia
internacional. Em 1978 ele iniciou os estudos na graduação em Jornalismo na USP,
mas se desencanta com a profissão depois de dois anos de curso. Ele já almejava a
carreira acadêmica, retorna a Campinas e ingressa no curso bacharelado em
Turismo na PUC, no qual ele se formou em 1983. Neste momento o pesquisador
percebe uma necessidade de maior fundamentação teórica no campo do turismo,
carente de produção. Foi nesse momento que sentiu a necessidade de aprofundar
seus estudos na área, e vê nas ciências humanas o caminho necessário para
introduzir a temática filosófica na reflexão do turismo. Assim, após a conclusão do
curso de Turismo, em 1985, o pesquisador ingressa na graduação em Filosofia na
PUC de Campinas, onde veio a se formar em 1988. Como dito anteriormente,
almejava a carreira acadêmica e assim encaminha seus estudos para o nível Stricto
Sensu, ingressando no programa de Mestrado em Filosofia Social na PUC
Campinas. Mesmo construindo uma carreira acadêmica, o pesquisador não se
afastou das atividades ligadas tanto ao mercado, ou setor público. Em 1991 ele
termina o Mestrado em meio a inúmeras atividades: docente na PUC, na qual
ingressou com o compromisso de fazer o mestrado; em 1989 assume a diretoria de
turismo de Campinas, na gestão do Partido dos Trabalhadores. Em sua dissertação
de Mestrado ele inicia os estudos do turismo sob a categoria filosófica da pós-
modernidade. Ele nos conta um pouco sobre como se deu a escolha dessa
categoria:
Na época eu viajava bastante para o exterior, e isso não era tão comum, hoje é mais fácil, mas nem tanto assim. Eu viajava bastante ao exterior e a única maneira de conseguir bibliografia era através das Universidades, Museus, Bibliotecas e livrarias, eu tinha acesso a esses materiais. Eu tinha
208
acesso a esses materiais nos estados Unidos, México e Argentina. Posteriormente fui ter acesso na Europa também. Então percebi a questão da pós-modernidade, que hoje já não é mais tão discutida. Nós já estamos falando na Hipermodernidade atualmente. Mas naquele momento a pós-modernidade parecia essencial para mim, pois eu via o Turismo como um dos vetores da pós-modernidade, ou da modernidade tardia, como ele realmente o é. (TRIGO, 2013, s/p, Da pesquisa)
Em 1993 ele ingressou no Doutorado em Educação na Universidade Estadual
de Campinas - UNICAMP e o termina em 1996. Em 1995 foi o principal responsável
pela abertura e estruturação curricular da Escola de Hotelaria do SENAC – Águas de
São Pedro. Em 2003 defendeu seus estudos na Livre Docência na USP – ECA. Em
Janeiro de 2005 ele prestou o concurso e passa a integrar o corpo docente da USP
EACH. Em 2007 ele se retirou das atividades na PUC, onde havia lecionado por 19
anos. Em 2011 o Professor Luiz Trigo foi elevado a categoria de Professor Titular na
USP, Instituição onde veio a obter seu título de Livre Docente.
Fica evidente a importância do Professor no debate da educação e o turismo.
Sendo o precursor da introdução de categorias filosóficas aplicadas aos estudos do
Turismo, constituindo-se como verdadeiros ensaios epistemológicos, fundamentados
em pressupostos específicos.
7.1.2 Seleção da Unidade de Leitura
Para alcançarmos os objetivos propostos por nossa pesquisa, de evidenciar
os caminhos do conhecimento que influenciam na produção dos pesquisadores
selecionados, utilizamos de técnicas e procedimentos metodológicos descritos. Cabe
a nós nesse momento, apresentar e justificar a seleção da Unidade de Leitura, a fim
de demonstrar com clareza os critérios que conferem credibilidade a pesquisa
científica qualitativa. Assim, poderíamos enumerar os principais critérios para a
seleção da Unidade de Leitura da seguinte maneira: (RICHARDSON, 2008;
MINAYO, 2001)
a) Representatividade e importância da obra a que se relaciona a
Unidade de leitura selecionada (RICHARDSON, 2008; MINAYO,
2001; SEVERINO, 2008)
209
b) A unidade de leitura possibilita o entendimento da mensagem do
autor, na medida que ela possui argumentação eu se liga a
totalidade da obra (SEVERINO, 2008)
c) Facilidade de acesso a unidade de leitura selecionada, tanto por
parte do pesquisador quanto dos leitores; (SEVERINO, 2008)
d) A ênfase que o próprio pesquisador entrevistado dá a
determinada obra, temática ou discussão específica. (MINAYO,
2001)
Relembrando que os critérios apresentados conferem credibilidade ao método
de pesquisa empregada, e vai de encontro com a abordagem qualitativa de nossa
pesquisa. Detalhamos anteriormente as limitações que se impõe a essa escolha de
abordagem teórico-metodológica, demonstrando que os conceitos de validez
baseados em uma amostra estatística não se aplica a estudos que em essência
busca as transformações qualitativas do fenômeno, como consequência de
mudanças quantitativas e vice e versa. (RICHARDSON, 2008; KOSIK, 2002)
Na entrevista realizada com o professor Trigo foram considerados
procedimentos que visam ética e rigor no que concerne a coleta, análise e
interpretação das informações da pesquisa. Assim, no apêndice pode ser
encontrada a ficha elaborada sobre a realização da entrevista, com os dados
concernentes a cada etapa da análise da unidade de leitura, segundo as etapas e
procedimentos técnicos descritos nos procedimentos metodológicos (MINAYO,
2001; RICHARDSON, 2008; SEVERINO, 2008)
Durante a entrevista, o Professor Trigo salientou o divisor de águas de sua
Tese de Doutorado. Dela surgiram os projetos pedagógicos da PUC (bastante
influenciada pelos currículos da USP), e da escola de Hotelaria do SENAC, além de
muitos outros livros que viriam depois.
Ou seja, ele demarca uma posição teórica que viria acompanhar o
pesquisador no decorrer do desenvolvimento de seus caminhos de pesquisa. Ao
perceber a importância desta obra para a compreensão de fundamentos
epistemológicos que embasam a produção científica do autor, se fez necessário
retornarmos a tese de Doutorado, defendida em 1996. Alguns podem vê-la como
uma obra obsoleta, ultrapassada, velha. Porém, de acordo com considerações
tecidas anteriormente a despeito dos métodos e técnicas utilizados em nossa
210
pesquisa, a unidade de leitura selecionada reflete seu caráter histórico, imerso no
tempo-espaço em que o pensamento, a mensagem foi concebida pelo autor. Ou
seja, a unidade de leitura34 escolhida vem trazer a essencial contribuição para a
compreensão do Desenvolvimento do Conhecimento produzido por este
pesquisador.
Selecionamos então o capítulo introdutório da Tese de Doutorado do
Professor Trigo intitulada: O Mundo do Lazer e a Pós-Modernidade. Procedemos
então uma leitura vertical, para nos familiarizar com o conteúdo. Já temos contato
com a obra do Professor Trigo, através de pesquisas preliminares, o que facilitou a
primeira leitura, que se dá como uma aproximação do objeto de estudo. Fizemos
assim a seleção de algumas palavras-chave que se inter-relacionam para a
compreensão da totalidade da mensagem do autor: Lazer; Turismo; Pós-
Modernidade; Educação e Filosofia; Formação Profissional.
Ainda em tempo, gostaríamos de tecer algumas considerações literárias
sobre a obra do autor. Ao discorrer da leitura do capítulo introdutório da tese de
doutorado, defendida em 1996, o Autor Trigo já mostrava sua eloquência. Possui um
estilo de escrita sagaz, tenaz, mas ao mesmo tempo carregado de humanismo, de
amor, e por que não de um certo parnasianismo libertário. Ele não se limitou apenas
a escrita técnica científica, ele também se dedica a área do entretenimento, e da
cultura. Descreve suas viagens como cenas de filmes, de cinemas 6D.
Ele é atual e atualizado. Se vale da internet e divulga seus livros, escritos,
manuscritos, ele se coloca perto daqueles que o leem, que o seguem. Fomos
recebidos em sua casa para fazer a entrevista, ele nos apresentou sua biblioteca,
tão linda biblioteca. O Professor Luiz Trigo é nutrido nas letras, e promete ainda
bons livros, alguns quentinhos, quase saindo do forno.
7.1.3 Análise Temática: TRIGO, 1996.
O Assunto ou temática que Trigo aborda na Unidade de Leitura envolve a
tentativa de evidenciar as proposições pelas quais desenvolve sua tese de
doutorado. Ele justifica e problematiza os desafios da educação em lazer e turismo,
em uma sociedade pós industrial e pós-moderna, sendo este par categórico por ele
34
Verificar no apêndice as Referências completas, bem como cada critério de análise.
211
colocado e explicado durante a tese. Um das perguntas realizadas pelo autor para
sua Tese seria o quanto a filosofia poderia contribuir para a discussão e incremento
da área do Turismo.
Veja que aqui já se coloca a primeiro ponto de análise, imperativos
categóricos de Immanuel Kant, dele descendem muitos preceitos éticos da pesquisa.
Para que a Tese do Professor Trigo fosse válida ele precisava demarcar o caminho
pelo qual ele encadeou a sua razão, e localizando o turismo como um vetor, do que
ele e outros teóricos chamam de Pós-modernidade. Assim, Trigo fez uso de um
Imperativo Categórico e trabalhou com um par categórico da Pós Modernidade.
Mas como Trigo chegou ao fato do Turismo ser um dos vetores desse mundo
pós moderno? Ele utilizou da existência tal como ela é, do Turismo como atividade
comercial e econômica, como expressão máxima de sua importância a nível macro e
micro.
Um dado econômico relevante, do setor de serviços é que, em vários países desenvolvidos, o setor de entretenimento é um dos que apresentaram maiores índices de crescimento na década de 1990. A revista norte americana ―International Bussiness Week (de 14/03/1994) publicou uma matéria de capa sobre ―The Entertainment Economy” nos Estados Unidos.‖ (TRIGO, 1996, p.07)
Baseados nestes dados o autor montou uma tabela que demonstrava o
número de profissionais contratados pelo setor, e o quanto as pessoas gastaram seu
dinheiro, investindo em lazer nos Estados Unidos.
Desde esse momento, vemos uma aproximação do autor com a literatura
norte americana e inglesa. Na nossa entrevista ele esclareceu que lê em Inglês e em
Espanhol, teve acesso a bibliografia incialmente inglesa e norte-americana, somente
posteriormente foi ter acesso a obras europeias como francesas, holandesas e etc.
Isso se verifica nas referências do autor, que mesmo na pequena unidade de
leitura, são na maioria norte-americanos, em especial analistas contemporâneos
naquela época e revistas da área de economia. Ele inclusive cita alguns deles na
unidade como: ―vários analistas internacionais como John Naisbitt, Peter Drucker,
Alain Touraine, Paul Kennedy (sem contar inúmeros geógrafos e economistas).‖
(TRIGO, 1996, p.8)
Dr. Trigo, que teve sua formação inicial como tecnólogo, dá ênfase aos
aspectos de fluxo da atividade turística, aliado a isso temos ainda o par categórico
da Pós Modernidade. Para ele, a existência do fluxo, dos transportes, da internet,
212
dos avanços tecnológicos faz com que o turismo seja mais um de seus aspectos, e
sua manifestação econômica é a prova de sua existência. Não existe nada a ser
revelado por trás do Turismo como atividade. O caráter histórico fica em segundo
plano, mas não é excluído.
Durante a entrevista ele colocou: ―Hoje já nem se discute mais pós-
modernidade, já estamos falando de hipermodernidade‖ (TRIGO, 2013, s/p, Da
Pesquisa). Também sentimos esse posicionamento quando ele falou-nos de suas
mais atuais pesquisas, que trabalham com temáticas de inclusão bem específicas,
além de se relacionar intensamente com outros campos do conhecimento, alguns
exemplos que ele citou durante a entrevista foram: ―Cronobiologia do Sono‖ e
―Turismo LGBT‖, além das Palestras que profere, uma delas intitulada:
―Homoerotismo no Ocidente‖.
Se a Hipermodernidade causa-nos hoje certo espanto, a pós modernidade em
1996 também causou, como causou em todas as áreas do conhecimento essa nova
categoria, que nem todos os conhecimentos estavam preparados para tratar desse
novo imperativo.
Assim, o autor em sua argumentação explica a inclusão do turismo nesse par
categórico. Como nos trechos:
Não significa, entretanto, que trabalhar no setor do lazer e diversões seja divertido e prazeroso. Significa, porém, que esse setor está crescendo no mundo inteiro e que suas condições de trabalho tendem a ser melhores e mais variadas que no setor industrial.[...] Neste final de século, os indicadores econômicos apontam que, nos países desenvolvidos e em grande parte dos países em desenvolvimento, a maior parte da população economicamente ativa está no setor terciário e que a maior parte do PIB desses países ou regiões provem igualmente do setor de serviços (TRIGO, 1996, p. 07)
Ou ainda:
―O significado dessa hipertrofia do setor terciário é, em geral, a caracterização das sociedades no final do século XX, como sendo pós-industriais, denominação feita principalmente com base na superação da importância econômica que o setor secundário representou para os países industrializados desde o final do século XIX. [...] Por hora é importante deixar evidente que o crescimento do lazer e do turismo acontece mais intensamente após as décadas de 1970 e 1980, ou seja, em plena era pós-insdustrial. (TRIGO, 1996, p. 09)
Depois de localizar o turismo no setor terciário entre o lazer e o
entretenimento, o autor passa a dar conceitos básicos que serão adotados durante o
213
desenvolvimento da Tese. Ele inicia dando definições de Lazer, utilizando por base
Dumazedier. Nesse momento existe uma conversa entre Trigo e Camargo, mas
como veremos posteriormente é uma aproximação que logo se desfaz. Os anos 80 e
90 foram épocas efervescentes e os estudos do lazer estavam em alta. Dumazedier
chegou a vir para o Brasil algumas vezes assim como outros cientistas do lazer.
Fortemente influenciado pela corrente denominada Turismo Social, as definições de
lazer, recreação e tempo livre que o Autor utilizou seguiram as definições de
Dumazedier. Posteriormente ele inclui outros autores, mas inicialmente expõe quatro
definições de Dumazedier, dentre elas selecionamos uma:
Como o tempo se define primeiro – mas não de modo inclusivo – com respeito ao trabalho profissional, propusemos a partir de 1960, distinguir quatro períodos de lazer: o lazer do fim do dia; o lazer do fim de semana; o do fim do ano (férias); o lazer do fim da vida (aposentadoria). (DUMAZEDIER, 1979, p. 88 – 92, apud TRIGO, 1996, p.10)
Munido de conceitos de Lazer e Turismo, Trigo relaciona essas conceituações
com o mundo do trabalho e do setor terciário, como no trecho abaixo:
Essas definições estão relacionadas com o tempo livre do individuo e surgem nas sociedades mais desenvolvidas, especialmente após o fim da segunda guerra mundial, quando alguns países capitalistas (e então) socialistas se estabilizam e começam a garantir, para consideráveis parcelas de suas populações, a possibilidade pluralista e democrática de se dedicarem a atividades da sua escolha. Isso foi possível através das conquistas da classe trabalhadora e ao entendimento de alguns capitalistas como Henry Ford, de que os operários deviam ter um salário mais digno e tempo livre, para aumentarem o mercado de consumo, e, consequentemente, o lucro dos empresários. (TRIGO, 1996, p.10)
Ele vai tecer considerações sobre o tempo livre, mas mantendo o olhar sob o
ponto de vista econômico. Ou seja, o Turismo é impensável sem sua manifestação
no mundo real, e essa manifestação pode se dar através do volume de negócios aos
quais o Turismo se relaciona e se intensifica. Ao conceituar turismo, árdua tarefa, o
autor apresenta uma série de definições de mais de um autor, e trabalha também
com as definições de turismo de Órgãos Mundiais e Empresas Internacionais que
tem sua atividade ligada ao turismo de alguma maneira. Na maioria essas
instituições são Norte Americanas. Como a American Express que em 1996
conceituou Turismo como:
214
A indústria de viagens e turismo inclui transporte de passageiros, hotéis, motéis, e outras formas de hospedagem, restaurantes, cafés e similares, serviços de recreação, lazer e cultura. (American Express, folheto, apud TRIGO, 1996, p.12)
No Terceiro tópico, após dar algumas conceituações de Turismo, Trigo passa
a revelar a importância deste para a sociedade em geral. Ele retoma mais uma vez o
volume de negócios, e insere a temática da formação de profissionais capacitados.
Percebe-se então que lazer e turismo são atividades complexas e entrelaçadas. Geram muito dinheiro, movimentam imensas somas em impostos e criam empregos. O senso comum pensa que trabalhar nessas áreas é ―divertido‖ ou ―engraçado‖, eventualmente ―tranquilo‖ e ―gostoso‖, bastando ter boa aparência e sabendo se relacionar com pessoas. Fuster já atenta para o fato de o ensino e a pesquisa são parte fundamental do turismo. (TRIGO, 1996, p.12)
Como exemplo ele cita a Disney World e toda a indústria do entretenimento
que se desenvolve ao redor dela, se intensificando ao se relacionarem. Mas, o ponto
chave crucial é o porquê seria importante pensar a formação do profissional em
turismo? A primeira justificativa de Trigo é econômica:
Com tanto dinheiro em jogo, não é estranho que as empresas e os governos se preocupem também com a qualidade das pessoas que vão trabalhar com esses equipamentos caros e sofisticados e que deverão ajudar a atrair clientes para os seus negócios. É evidente a necessidade de se preparar profissionais na área, sob pena de os projetos ficarem comprometidos e com sua operacionalidade prejudicada devido à falta de profissionais eficientes. (TRIGO, 1996, p.13)
A perspectiva histórica fica em segundo plano, justamente pela inserção do
par categórico pós modernidade, que limita assim o tempo espaço. Ele vai abordar
em especial as mudanças ocorridas a partir da década de 70 no Brasil. Em um
paragrafo ele resumiu as transformações ocorridas, finalizando-o:
Com base nesses poucos exemplos, percebe-se que a história recente aprofundou as incertezas e as dúvidas das pessoas, não apenas sobre o futuro, mas até mesmo para se entender melhor o presente. (TRIGO, 1996, p.15)
Veja, o autor não desconsidera por completo os processos históricos, ele os
minimiza, não são o ponto central. Sabe-se que eles existem, mas não são o centro
da discussão do autor. Esse dado já nos faz ver que a perspectiva histórica, neste
momento, não é tão importante, nos dá pistas da orientação do autor, de uma visão
215
mais contemporânea, mais pós-modernista.
Ele passa no tópico quatro a delimitar ainda mais a sua problemática, a
questão que procura responder em sua tese. Para isso, ele faz algumas proposições
básicas iniciais que retomamos aqui.
1) Situa o Turismo nas Sociedades atuais do final do século XX:
Ele coloca sobre as novas configurações econômicas mundiais, desde os
países com excelente qualidade de vida como Suíça, até países em
desenvolvimento como o Brasil. Utiliza de um analista norte-americano que tece
críticas a tentativa de países como o Brasil se igualarem as nações Norte
americanas e vice versa, se referindo a problemas sociais no Estados Unidos. Ao
fechar essa primeira proposição ele coloca:
Em suma, esses exemplos permite constatar que o mundo tornou-se mais diversificado e fragmentado em bolsões contraditórios, tensos e excludentes e nada sugere que possa mudar a radicalmente a curto prazo. (TRIGO, 1996, p.16)
2) Analisa este mundo como Pós-moderno e Pós-industrial:
Foi a partir de muitas reflexões e com a leitura de analistas contemporâneos
que o Professor Trigo decidiu trabalhar com a tão polêmica categoria filosófica (Par
categórico) da Pós-modernidade. Ele mesmo em seu trabalho assume a dificuldade
da temática:
Portanto, o eixo filosófico do trabalho assume a polêmica categoria filosófica denominada Pós-modernidade, as novas tecnologias; o mundo do trabalho; a educação em um mundo que se transforma rapidamente e suas relações com a tecnologia de ponta; as concepções de espaço-tempo relacionadas ao turismo de massa, etc. (TRIGO, 1996, p. 16)
Com bases nas discussões realizadas por ele no decorrer deste capítulo
emerge a questão de pesquisa, ou seja, a temática que norteou o desenvolvimento
da TESE em si. Aqui nós tratamos apenas do capítulo introdutório, a discussão
prosseguirá nas páginas seguintes, tendo como centro a questão problema que ele
apresenta no capítulo introdutório:
Finalmente, emerge a questão central do trabalho: qual é a Filosofia da Educação adequada para embasar o preparo dos novos profissionais para o
216
setor de serviços nas sociedades pós-industriais, especialmente nas áreas de lazer e turismo?[...] como trabalhar os paradigmas educacionais para preparar os novos profissionais? Qual referência Filosófica utilizar para embasar um planejamento educacional [...]? (TRIGO, 1996, p. 16)
Nesse momento, o Autor coloca as primeiras preocupações acerca da
Filosofia da Educação. Ele demonstra sua preocupação epistemológica sobre qual
seria a filosofia da educação que se aproximaria mais do aluno a fim de dar a ele
possibilidades de viver e sobreviver no mundo de relações pós-modernas. Ou seja,
percebe-se uma visão humanista da educação, e ao mesmo tempo pragmática,
onde a educação não é apenas o preparo para a vida, ela é a própria vida
(TEIXEIRA, 1959). Essa visão pragmática se volta para a formação profissional, mas
também carrega em si caráter humanista quando ele diz da preocupação com o ser
humano, diante de tantas pressões que o mercado impõe em um ritmo acelerado de
transformações.
Essas indagações fazem parte do cotidiano de inúmeros educadores, especialistas em formação profissional e recursos humanos, psicólogos, filósofos e empresários. Qualquer pessoa interessada em desenvolver e aprimorar outras pessoas para o setor terciário, especialmente o turismo, entende que é uma tarefa relativamente nova e que seus pressupostos não estão totalmente estabelecidos. (TRIGO, 1996, p.17)
No parágrafo final ele faz colocações bem relevantes sobre sua visão de
mundo, e por conseguinte, sua visão sobre a educação profissional. A Partir destas
observações o autor deixa mais claro ainda seu posicionamento, primeiro
devolvendo o homem para o centro da educação e do turismo, através de uma visão
humanista:
[...] Com ―gente‖ é preciso ter sentimento e sensibilidade, é necessário reflexão e estudos sistemáticos sobre os relacionamentos humanos. Não é de se admirar que a Ásia tenha se tornado padrão de excelência em serviço no mundo todo, especialmente em turismo. Eles presam a educação e o pensamento, preocupam-se com detalhes minuciosos que só quem entende de ―gente‖ pode inserir em sua agenda de rotinas. (TRIGO, 1996, p. 17)
Posteriormente, coloca: ―Só o pensamento elaborado pode atingir tal nível de
consciência profissional. É o campo filosófico da existência, quando a alteridade se
faz presente e as motivações tornam-se existenciais, excedendo o profissionalismo‖.
(TRIGO, 1996, p.17)
217
Com certeza uma Tese admirável, reunindo conceitos muito importantes. Na
última linha o Professor pergunta se é possível que a filosofia contribua, e responde
que vale a pena tentar. Nós também acreditamos que sim, tanto podemos hoje ver
os frutos de tantos esforços. O Professor Trigo foi o primeiro a introduzir, já em seu
mestrado, categorias filosóficas aplicadas ao estudo do turismo, a partir de um olhar
epistemológico sobre a educação profissional e o turismo. Desde sua defesa de
Tese passaram-se alguns anos, o professor Trigo acompanhou as mudanças, pois o
mundo mudou. Faz-se justo e necessário não só lermos o Professor Dr. Trigo de
1996, mas relermos Trigo em 2013.
7.1.4 Peculiaridades da Entrevista
Quando o Professor Trigo aceitou de pronto participar de nossa pesquisa,
através da entrevista e posterior análise de sua produção, nos foi muito gratificante.
O encanto com a eloquência de sua escrita nos acompanha desde a graduação.
Assim, munidos do roteiro, sendo este apenas um guia de assuntos, fomos
recebidos pelo professor Trigo e fizemos o registro em áudio e vídeo.
Quando perguntado sobre como o autor vê o Turismo atualmente, ele
mencionou o fechamento de muitos cursos, o que na opinião dele é bom, visto que
muitos davam um tratamento medíocre a temática. Ele viu de perto o inchaço que
aconteceu nos anos 90. Também vê que as Universidades particulares tem
desempenhado um papel essencial, por levarem a sério o Turismo como área de
formação. Não vê o turismo como uma disciplina autônoma, mas sim co-dependente
e interdisciplinar. A pesquisa tem melhorado porque o acesso a obras e produções
científicas tem aumentado, principalmente pela internet, onde se tem acesso fácil.
O único Doutorado que existe no Brasil é a UNIVALI, porque foi a única que conseguiu reunir recursos físico e recursos humanos para conseguir montar um Doutorado. O fechamento dos cursos de graduação, aumentou a credibilidade e as instituições que hoje possuem o mestrado possuem uma densidade de produção. Os contatos estão mais fáceis, a internet e malha aérea, e assim conseguimos saber quem está produzindo o que. (TRIGO, 2013, s/p, Informação verbal)
Quando falamos de paradigmas dominantes, o professor coloca que existem
variabilidade temáticas, por sermos ciências sociais aplicadas temos a possibilidade
218
de muitas conexões com outras áreas. E, em termos epistemológicos, ele acredita
em uma epistemologia que ele chama de: Epistemologia Aberta.
E um campo muito vasto. Em termos epistemológicos que é um campo de estudo que eu comecei, eu trabalhava com a pós-modernidade, hoje é o Alexandre que trabalha com essa temática epistemológica. Eu não diria que tem uma epistemologia dominante, mesmo porque, a epistemologia das ciências humanas hoje já não tem mais aquela coisa de: marxista, existencialista, fenomenológicos, você tem uma produção epistemológica aberta. Nós não somos ciências humanas puras, somos ciências sociais aplicadas. Então eu gosto de trabalhar com analistas contemporâneos, como o historiador Hobsbawn e outros analistas, o Gilmore, o Manuel Castels. Então eu não diria que existe uma epistemologia dominante e sim uma epistemologia aberta, e uma variabilidade temática muito grande. (TRIGO, 2013, s/p, Informação Verbal)
Quando falamos da presença marcante de bibliografia internacional em suas
obras, o Professor Trigo concorda conosco, e coloca a deficiência na bibliografia
destinada ao Brasil. São poucas as boas livrarias que lhe fornecem material
adequado. Ele é também docente do Mestrado em Estudos Culturais da USP. Para
escrever seu artigo sobre Homoerotismo e Turismo LGBT, toda a bibliografia veio
dos Estados Unidos e Holanda, porque ele tem contatos nos países e com as
próprias editoras. Em alguns casos ele viaja para buscar bibliografia. Nossa visão
acerca desse ponto se confirma. Além do mais, o Professor Trigo também escreve
na área do entretenimento, e ele mesmo coloca:
Eu gosto muito de escrever, então exercito muito. Na internet, nos blogs eu exercito, e por ser um texto curto precisa ser impactante, como um bom romance. Eu também trabalho com entretenimento. Vejo que a literatura é fundamental para entendermos algumas questões relevantes atuais. Quando você pega os historiadores e os sociólogos, aqueles que escrevem melhor, são os que tem experiências com a literatura. Nietzsche já falava: ―Se você quer ser profundo – seja claro‖. (TRIGO, 2013, s/p, Informação verbal)
Veja que no trecho acima da entrevista concedida, Trigo citou o filósofo
Nietzsche. Nesse instante, nos voltamos ainda mais para questão epistemológica.
Teria sido uma citação ao acaso, ou eram os traços de suas raízes epistemológicas
se anunciando através da sua fala, de sua verbalização, de seu discurso?
Prosseguimos e para não enviesar o diálogo, motivo pelo qual não colocamos
a palavra epistemologia em nenhum momento durante a entrevista, queríamos que
ela surgisse no discurso do entrevistado, e foi o que aconteceu. Mas antes,
perguntamos sobre suas parcerias na academia brasileira.
219
Ele citou Alexandre Panosso, os dois escrevem juntos há algum tempo, e
Panosso está com muito fôlego e novas obras serão lançadas em breve. Nós
entrevistamos o Professor Panosso, mas em virtude da densidade da discussão por
nós elaborada junto a ele, deixaremos para um próximo momento, focando assim no
pioneiro da área: Luiz Trigo. Este falou de outros relacionamentos que para ele são
importantes como:
A Doris Ruschmann – o grande mérito dela foi em ter montado o Mestrado, porque não é nada fácil, ela gosta de filosofia. O Camargo que tem uma formação exemplar, é um erudito. [...] Entre outros, tem os alunos também que já estão produzindo material de qualidade. (TRIGO, 2013, s/p, Informação verbal)
Já estávamos desconfiados de certo humanismo presente nas obras de Luiz
Trigo, mas a confirmação veio através da entrevista. Quando solicitamos que ele nos
falasse mais sobre sua visão de mundo, ele respondeu de pronto: Existencialista.
EXISTENCIALISMO, eu sou muito influenciado pelo existencialismo, e pelo que o Manuel Castels faz em termos de análise cultural. Usei Marx, mas não sou marxista. A fenomenologia tem forte influência da corrente existencialista. Gosto mais do existencialismo de Sartre. Li as obras completas dele durante minha graduação. Também utilizo alguns analistas Norte-Americanos, Ingleses. Eu me sinto muito bem em estudos culturais. Você vai ver o próximo livro ―A VIAGEM‖, você vai gostar. (TRIGO, 2013, s/p, Informação verbal)
Nossas suspeitas se confirmam e no confronto com a unidade de leitura
vemos se descortinar a posição do Professor Trigo. Sartre e sua liberdade
contraditória do ser humano estão presentes em sua obra. A corrente existencialista
humanista de Jean Paul Sartre.
Nosso tempo com o Professor em entrevista estava quase acabando,
perguntamos se ele gostaria de acrescentar algo mais: ele falou sobre a falta de
investimento em educação de qualidade em nosso país, que com certeza, está
certíssimo nas colocações. O Brasil carece de instrução de qualidade em todos os
níveis. Melhores Bibliotecas, melhores salários para professores e servidores, e
alunos que leiam mais. ―O Brasileiro não lê, o aluno de turismo lê menos ainda‖. A
crítica é válida, inclusive as empresas de ensino a distância que agora montam
apenas apostilas, não dando acesso ao livro na íntegra, e assim barateando os
custos, com lucros absurdos. E se o aluno quiser ler o livro em que biblioteca ele
pode ir, lhe pergunto? Com certeza, devemos continuar lutando por uma educação
220
melhor neste país, em todos os níveis.
O Professor também falou da socialização do conhecimento e da
internacionalização das publicações, juntos e na medida certa podem contribuir e
muito para o crescimento da pesquisa e da educação em Turismo, que ainda deixa a
desejar, assim como as demais áreas do conhecimento no país.
O Professor Luiz Trigo serviu um suco de laranja fresco, presenteou-nos com
livros, devidamente autografados, e agradecidas partimos de São Paulo, uma
viagem histórica e marcante.
7.1.5 Janela Epistemológica: Luiz Trigo
Nesse momento fizemos um recorte teórico específico na unidade de leitura,
como forma de evidenciar os pressupostos e fundamentos presentes nesta. Tendo a
visão panorâmica de que o conhecimento não pode ser alcançado em uma simples
unidade de leitura, nesse momento recortamos essa paisagem do conhecimento, e
abrimos uma janela epistemológica a partir da unidade analisada.
Percebe-se na unidade de leitura analisada, bem como na entrevista
realizada, uma forte influência da Bibliografia estrangeira, em especial norte-
americana, com destaque para a utilização de periódicos internacionais da área de
economia e administração, e de analistas contemporâneos. Essa influência vai agir
diretamente sobre a obra do autor, que ao se valer do par categórico pós-
modernidade, e aplica-las ao Turismo, torna-se assim também uma espécie de
Analista Contemporâneo brasileiro das dinâmicas relações na qual o turismo está
imerso.
Percebe-se a preocupação com a formação profissional, como tema central
de sua tese, em uma orientação existencial e humanista da educação, mas também
influenciada pelo pragmatismo, ou seja, desenvolver potencialidades que insiram o
profissional no mercado de trabalho, mas também o diferencie através do
desenvolvimento de habilidades relacionais. Lembrando que o foco é na educação
profissional, ou seja, educação técnica profissionalizante, a visão pragmática da
educação com um viés humanista pode trazer ótimos resultados.
A forte ligação com um posicionamento mercadológico revela as influências
da formação do autor. Tecnólogo em Turismo, posteriormente Bacharel em turismo,
o autor iniciou sua trajetória no conhecimento partindo do empírico, ou seja, da sua
221
experiência profissional. Essa era sua fase inicial de aquisição de conceitos,
assimilação, ele viu as diferenças que ocorreram na atividade de perto, assim
através de um movimento de elaboração e adaptação junto a novos saberes, que
foram abstraídos de sua experiência profissional e acadêmica. Natural que elas
continuem presentes na unidade de leitura, defendida em 1996.
Além do mais, vale lembrar a ênfase na formação do TURISMÓLOGO,
principalmente a nível de tecnólogo, era excessivamente voltada ao mercado de
trabalho. O que era ainda mais marcante durante o período de formação do autor
(década de 1980). Foi a necessidade de uma discussão teórica mais aprofundada,
ou seja, a preocupação epistemológica que levou o Autor a cursar um curso de
ciências humanas, Filosofia, após sua formação em Turismo. Ele encontrou uma
lacuna no conhecimento, e com certa autonomia na elaboração do conhecimento,
seguiu para a área de ciências humanas.
Na Unidade de leitura selecionada o autor dá pistas sobre sua orientação
filosófica, ou seja, sobre a corrente na qual se debruça a categoria escolhida e as
formulações sequentes. Percebe-se uma forte influência da corrente existencialista,
revelada nas sutis críticas ao marxismo; quando ele retoma o papel central do
indivíduo, ou seja, do ser e dos relacionamentos humanos. Demonstrando, assim um
caráter existencial, de orientação humanista, se confirmando quando ele cita Sartre
na entrevista.
Coloca que a compreensão profunda do ser humano e consequentemente de
suas necessidades se dá como um diferencial de qualidade, e que é necessário um
pensamento elaborado a fim de atingir tais objetivos. Sua discussão perpassa o
campo filosófico da Existência – sendo que a existência precede a consciência, em
uma metodologia que pode se dizer fenomenológica, ao passo que enxerga o ser
humano como um fenômeno e não como mero objeto de estudo.
Embora não fale explicitamente neste texto, a inserção de palavras como:
relacionamentos humanos, aspectos pessoais da formação profissional; campo
filosófico da existência; existenciais; exceder o profissionalismo; filósofos do
cotidiano; modernidade, pós-modernidade, etc., estes também são expressivas
influências da corrente existencialista. O interesse do autor por lazer e
entretenimento, por exemplo, também esteve presente nas obras poéticas e
inspiradoras de Sartre.
Chegamos então a uma corrente epistemológica marcante, que é apenas
222
uma das facetas do idealizado sujeito epistemológico de Jean Piaget, e apenas uma
parte do imenso trabalho do autor: o Existencialismo e o Humanismo. Essas duas
visões vão interagir durante a obra do Autor, hora em um caráter mais existencial,
ora com uma visão mais humanista.
Pensar a multiplicidade do mundo em sua cotidianidade foi posto como uma espécie de obstáculo epistemológico para as ciências sociais consolidadas na modernidade, voltadas para conhecimentos universais. Na contemporaneidade as defesas do aleatório, do fortuito e do efêmero, a partir dos conhecimentos advindos novamente das ciências naturais, surgem tanto nas abordagens humanistas quanto nas questões levantadas por autores pós-modernos. (SAFADI e CHAVEIRO, 2009, p.09)
Muitos estudiosos abordam os pressupostos de Sartre em suas pesquisas e
até mesmo como uma linha dentro da corrente fenomenológica. A Geografia é uma
delas:
[...] se debruça no que entendemos ser uma questão central da produção do pensamento geográfico: a relação homem e natureza. Identificamos a possibilidade de aproximação entre a ideia de consciência que Sartre desenvolve e no mesmo movimento teórico percebemos também a possibilidade de pensar o conceito de natureza como o mundo que se relaciona com a dada consciência em Sartre. (SAFADI e CHAVEIRO, 2009, p.10)
A corrente de estudos considerados fenomenológicos tem sua base nas
linhas, ou visões, humanistas e existencialistas. Estas linhas são anteriores a Hegel,
advindo período teológico ou metafísico suas primeiras discussões. Através da
fenomenologia, teóricos tem encontrado chão firme para desenvolverem seus
estudos, e damos destaque aqui ao Existencialismo Humanista de Sartre e sua
relação com o par categórico Pós-modernismo.
Sabemos também que a fenomenologia de Husserl e o existencialismo de Sartre não assumiram o discurso estritamente cartesiano, mesmo que não negando a raiz advinda de Descartes. Sendo assim, não é definitivamente um substituto da visão cartesiana como tendência principal do discurso da modernidade. (SAFADI e CHAVEIRO, 2009, p.10)
Para Sartre, não existe uma ―coisificação‖ da consciência, controlador ou
doador de todas as coisas. O Homem não está preso a esta consciência,
encarcerado. Sartre considera o ‗Ser‘ como um eu livre para agir através das
escolhas conscientes e ―pela intencionalidade, ela transcende-se a si mesma, ela
223
unifica-se escapando-se‖ (SARTRE, 1994, p.47).
A existência não precede a consciência, ela é a própria consciência. É aqui
que reside a grande diferença entre a visão existencialista, o estruturalismo, e a
dialética. Não existe uma estrutura da consciência e não existe essência a ser
revelada na existência, a existência existe, e por ela existir transcende a essência.
Fica clara a coerência do autor no trato de seu objeto por ocasião da sua
tese: educação profissional, e no seu desenvolvimento posterior tanto no campo da
literatura científica quanto de entretenimento. Lembrando, essas são análises que
visam apenas o levantamento de pressupostos e fundamentos epistemológicos, não
visamos classificar nenhum dos autores vistos que eles, assim como nós, estamos
nos construindo dialeticamente diariamente. Poderíamos considerar a existência de
uma corrente, o Existencialismo, com fortes tendências Humanistas, que se ligam a
uma visão Fenomenológica de suas temáticas e assuntos de estudo.
7.2 REFLEXÕES SOBRE O ESTADO DA ARTE EM CAMARGO
7.2.1 O AUTOR: Luiz Octávio de Lima Camargo
Livre-Docente pela USP/EACH, doutor em Sciences de l`Education pela Univ.
Sorbonne-Paris V (Rene Descartes) em 1982, e teve seu título revalidado pela
Faculdade de Educação – USP como Filosofia e História da Educação e graduado
em Comunicações e Jornalismo pela Escola de Comunicações e Artes da
Universidade de São Paulo em 1974. Luiz Octávio de Lima Camargo é sociólogo,
com produção nas áreas de lazer, educação, hospitalidade, turismo e animação
sociocultural. Como o próprio Professor Dr. Camargo coloca:
A minha formação básica é na área do lazer. Sou sociólogo. Eu estudei com JOFFRE DUMAZEDIER em Paris e consolidei minha formação na área do lazer. Atualmente eu agreguei outra área do conhecimento que é a hospitalidade, e nesse meio surgiram também outras palavras chaves como: turismo, hotelaria, eventos e etc. Mas eu diria que a minha formação básica, minha especialidade foi em lazer e hospitalidade. (CAMARGO, 2013, s/p, Informação verbal)
A formação de Pós-graduação do Professor Camargo foi toda realizada na
França, onde ele teve oportunidade de estudar e pesquisar ao lado de grandes
224
cientistas do lazer franceses, tornando-se ele próprio referência básica no assunto,
para os mais diversos campos do saber. Iniciou sua vida profissional no campo do
lazer no SESC de São Paulo onde dirigiu projetos como o Centro de Estudos do
Lazer, a Biblioteca Científica do SESC-Série Lazer, e parcerias com Universidades e
organizações internacionais.
Como ele mesmo colocou, iniciou suas atividades no campo do lazer e
agregou outras temáticas com o passar dos anos, sendo a última delas
Hospitalidade. Camargo foi consultor de lazer e turismo em planos de
desenvolvimento regionais e locais, e trouxe grandes nomes para palestras no
Brasil. Foi implantador e primeiro coordenador dos cursos de graduação em Turismo
e Hotelaria da Universidade de Sorocaba. Suas principais publicações no Brasil são:
O que é lazer (Brasiliense), Educação para o lazer (Moderna), Hospitalidade (Aleph),
tendo ainda artigos publicados nas revistas Tiers-Monde (França), Loisir & Société
(Canadá-Québec) e EUA (Leisure Journal). O Professor Camargo escreve em
francês com eloquência, e é poliglota.
Foi coordenador do Programa de Mestrado em Moda, Cultura e Arte do
Centro Universitário SENAC de São Paulo. Atualmente, é membro docente do
Programa de Mestrado em Hospitalidade da Univ. Anhembi Morumbi e docente do
Bacharelado em Lazer e Turismo da EACH-USP. Suas pesquisas no momento
acontecem em torno de duas palavras-chave: turismo e hospitalidade. E foi por
ocasião do Mestrado da UAM, em Hospitalidade, que Camargo publicou alguns
artigos, esboçando uma Epistemologia da Hospitalidade, como veremos a seguir.
7.2.2 Seleção da Unidade de Leitura
Escolhemos trabalhar com a temática que tem tomado as noites e dias de
pesquisa do Dr. Camargo: Hospitalidade. Ele deixou claro na entrevista que o
grande interesse por essa nova palavra-chave, e é ao redor dela que tem sido
concentrado o esforço do Professor. Além do mais, na área do Lazer o Professor
Camargo já foi consagrado, e muitos estudos já foram realizados na área do lazer
que o incluem como bibliografia essencial e básica. O Professor foi um dos primeiros
brasileiros a abordar a temática, sendo que suas principais produções no Brasil
datam de 1980. Apenas 10 anos depois do primeiro curso superior em Turismo.
225
Portanto, selecionamos como unidade de leitura um artigo científico publicado
on-line, na Revista de Estudos Turísticos, e que foi escrito no ano de fundação do
Programa de Hospitalidade da UAM, 2002, e publicado em 2005. Os critérios de
seleção impostos para a escolha desse artigo científico são atendidos visto que:
a) A Unidade de Leitura está disponível para acesso público
através das referências constantes nesta pesquisa;
b) Ela possui caráter histórico visto sua contextualização com o
Programa de Pós-graduação em Hospitalidade da UAM;
c) A unidade de leitura fornece totalidade do assunto abordado;
d) Relaciona-se intensamente com a temática abordada nesse
trabalho.
A mensagem que traz o artigo selecionado como unidade de leitura35 por sua
vez, é enriquecido pela entrevista com o autor, onde o este se posiciona sobre seus
pressupostos e temos um diálogo intenso entre a unidade de leitura e o autor
analisado. Essa dinâmica enriqueceu nossa discussão, revelando traços marcantes
na análise temática de tão consagrado autor, contribuindo para entendermos suas
nuances epistemológicas.
Ainda em tempo, algumas considerações literárias fazem jus ao gabarito de
tão eloquente autor. De escola francesa, Dr. Camargo transpira sua formação em
seus escritos. Erudito no falar e no pensar. Quando lemos os textos de Camargo nos
perguntamos: mas será que ele esqueceu alguma coisa? Geralmente não. Seu olhar
se amplia sobre o objeto e, ao mesmo tempo, o especifica. Ele os dota de
características e os defende com a veemência dos bravos, conservando certa
doçura francesa.
Mesmo sendo um bravo defensor de seus ideais e ideias, Camargo é sutil e
amável com os que discorda. Deixa claro sua existência, sua importância, mas isso
não lhe aquieta o espírito – ele prefere o mundo social, o mundo imperfeito – ele
prefere a metafísica arte do encontro. Onde, aprendemos com o outro, tendo a
cultura como mediadora da riqueza humana e social.
35
O registro da unidade de leitura bem como todos os dados para acesso as informações estão disponíveis no Apêndice do nosso trabalho.
226
7.2.3 Análise Temática
O autor analisa o surgimento dos cursos de hotelaria, desdobrados da matriz
dos cursos de turismo e a polêmica sobre a denominação – hotelaria ou
hospitalidade. Suas hipóteses são de que, esse desdobramento se insere dentro da
dinâmica histórico-ideológica de evolução do campo das ciências sociais aplicadas,
notadamente no segmento mais amplo da comunicação, e que a noção de
hospitalidade, bem além de uma discussão sobre meras denominações, pode
representar um acréscimo significativo e um quadro de referência original para os
estudos na área.
A primeira controvérsia estabelecida se dá entre os termos Hotelaria e
Hospitalidade, utilizados de maneiras diferentes em países anglo-saxões e em
países latinos. Os Mestrados se inserem nessa controvérsia, em como denomina-
los.
Entre parêntesis: embora nunca tenha me detido particularmente na análise das relações de autonomia e dependência entre as noções de turismo e hotelaria, no caso da denominação nunca escondi minha preferência pelo termo hospitalidade. A bem da verdade, em todas as vezes em que participei desse debate, sempre fui convencido pelo argumento mercadológico da falta de tradição da noção de hospitalidade no país, que poderia induzir à ideia de hospital e não de hotel. (CAMARGO, 2005, p. 01)
Ele anuncia então algumas problemáticas que tem como centro a
diferenciação entre os termos Hotelaria e Hospitalidade, e suas implicações
epistemológicas na produção do conhecimento. Para Camargo, estas discussões
são necessárias e oportunas.
Como tentaremos demonstrar, em seguida, mais do que uma interminável querela sobre o sexo dos anjos, estas questões de denominação de uma área do conhecimento são sempre oportunidade não apenas para a definição do objeto de estudo da área como também para uma discussão epistemológica sobre outras questões – que permitem refletir ou, ao menos, fornecem elementos para uma reflexão muito atual sobre os rumos da ciência e da universidade. (CAMARGO, 2005, p.02)
Antes de prosseguir ele faz ainda uma ressalva sobre a preferência pelo
termo Hospitalidade:
[...] a preferência já avançada pelo termo Hospitalidade não seja vista como depreciativa da designação de Hotelaria tão difundida em tantos cursos técnicos, de tecnologia e de bacharelado e, sim, como um convite a se
227
ampliar o espectro de temas e de problemas de investigação. Esse esforço, para se dizer o mínimo, é sempre saudável em ciência. (CAMARGO, 2005, p. 02)
Veja que Camargo insere a discussão epistemológica a respeito da
hospitalidade, dando ênfase a discussão como possibilidades de ampliar ainda mais
o campo de estudo, e também não rechaça totalmente o termo hotelaria. No primeiro
tópico ele cita a oportunidade de se criar um Mestrado na área (Mestrado em
Hospitalidade – UAM) como resultado da expansão do mercado Hoteleiro. E coloca
alguns fortes argumentos para o uso do termo Hotelaria, o que mostra um ponto de
vista metodológico, em um ir e vir dialético sobre a discussão:
Há pelo menos quatro fortes argumentos para justificar a opção pelo termo Hotelaria: o público dos cursos, o número crescente de cursos de formação profissional em hotelaria, o tema das pesquisas e, finalmente, o mais importante, a ambiguidade da noção de hospitalidade. (CAMARGO, 2005, p. 02)
Ele começa falando um pouco sobre essa controvérsia. A primeira delas
sobre a ambiguidade dos termos. Cita então os dicionários das línguas de origem
latina que ligam o termo hospitalidade a, por exemplo, hospital, o que gera ainda
mais confusão. Gerando um ―contágio semântico de outros termos etimologicamente
(e na prática social cotidiana também) aparentados como hospício, hospital,
hostilidade, hóstia (que ainda guarda do latim o significado de vítima)‖. (CAMARGO,
2005, p. 02) Assim ele coloca que assumir o termo Hospitalidade é sem dúvida
trabalhar com a ambiguidade entre seus significados e relações com a Hotelaria, o
que tornaria a Hospitalidade uma disciplina ligada a esta. Tanto o mercado quanto
os profissionais ―reconhecem-se integralmente na noção de hotelaria, o mesmo não
acontecendo com a noção de hospitalidade‖ (CAMARGO, 2005, p.02). Outro
argumento utilizado na dificuldade de adoção do termo hospitalidade é o forte
contingente de alunos com questões de pesquisa que giram em torno da
problemática da hospedagem, restauração e gestão.
Dr. Camargo assume o desafio de demonstrar a importância dessa temática e
relevância do termo, ao passo que coloca:
Repita-se, então, a primeira pergunta: já que todas essas razões militam em favor do termo hotelaria, por que propor a outra designação, hospitalidade? Assim, já que assumi a preferência pelo termo hospitalidade, não me resta senão explicitar as minhas razões. Alguns poderiam ser tentados a ver nesta opção apenas o objetivo de conferir estatuto de nobreza à área.
228
Afinal, diferentemente do termo hotelaria, recém-chegado ao campo aplicado da ciência, o termo hospitalidade já conta com uma certa tradição no pensamento tanto da filosofia como da ciência pura. (CAMARGO, 2005, p. 03)
Assim, ele inicia a tratar a Hospitalidade a partir de um caminho filosófico, e
passa a falar da virtude, dever e direito à hospitalidade presentes nos pensamentos
míticos, religioso e filosófico-científicos dos mais diferentes povos. Da importância da
hospitalidade para as religiões, por exemplo, relacionando a hospitalidade com os
princípios básicos das religiões. Ele dá importância filosófica para o termo ou, como
poderíamos colocar, categoria Hospitalidade, através de alguns filósofos.
Atualmente, no plano filosófico, a noção de hospitalidade vem ganhando crescente importância a partir do pensamento do filósofo francês Jacques Derrida, que a trouxe ao centro de uma discussão da maior relevância e pertinência, já que envolve os grandes êxodos migratórios de países pobres para países ricos. Para Derrida (1997; 1999), a hospitalidade é a bandeira de uma verdadeira cruzada contra a intolerância e o racismo, bem como a base do que ele chama de democracia total. (CAMARGO, 2005, p. 03)
É marcante a bibliografia francesa nas obras de Camargo, e com nossa
unidade de leitura não seria diferente. Derrida será citado algumas vezes, e é
baseado neste filósofo francês e suas obras que Camargo tecerá análises
posteriores. Mas Camargo não limita a hospitalidade ao plano filosófico, ele defende
que a hospitalidade pode fazer uma intensa conexão com outras disciplinas, sendo
de fácil recorte teórico, como coloca:
Ademais, como se verá mais adiante, é possível, com relativa facilidade, efetuar-se um recorte sobre hospitalidade no referencial sociológico, antropológico, histórico, etc. da ciência. Não seria pois de todo infundada essa suposição de busca de certificado de nobreza, sobretudo se considerarmos que a hotelaria é uma ocupação moderna herdada de antigos modelos servis de trabalho e essa origem, queira-se ou não, aceite-se ou não, confesse-se ou não, traduz-se socialmente (mesmo dentro da academia, que não está infensa a esses fenômenos) em preconceito e desprestígio. (CAMARGO, 2005, p.03)
Camargo sai então em defesa do termo Hospitalidade, e sentimos toda sua
riqueza, ele evidencia alguns pontos, mais destacamos dois, por acharmos de
relevância epistemológica. No primeiro deles ele fala de fuga do viés mercadológico,
e da visão humanista de educação profissional que pressionada também pelo
mercado, está a sucumbir através da pressão que sofre, onde ele coloca:
229
Em consequência, não estariam errados igualmente os que enxergassem na opção pelo termo Hospitalidade a fuga do viés excessivamente econômico e empresarial para o curso que viria no bojo do termo Hotelaria, como já acontece nos cursos de bacharelado em Hotelaria, nos quais a ênfase humanista vem sendo ofuscado pela pressão do mercado de negócios e de trabalho. Muito além disso, contudo, esta opção baseia-se na percepção de que o fenômeno digno de estudo é bem mais abrangente do que o crescente número de pessoas que busca hospedagem e alimentação em suas viagens. (CAMARGO, 2005, p.03)
Ele coloca que a nova visibilidade adquirida nos tempos atuais da
hospitalidade humana extrapola não apenas os negócios ligados a hotelaria, como
extrapola o próprio turismo. ―Isso equivale dizer que a noção de Hospitalidade
enriquece, enquanto hotelaria empobrece o campo de estudo‖. (CAMARGO, 2005,
p.03) Assim sendo, Camargo se posiciona claramente e diretamente:
Em outras palavras e mais diretas: há que se fugir da sina e buscar ser algo mais do que o departamento de recursos humanos da indústria hoteleira. Mais do que simplesmente exaltar as vantagens do termo hospitalidade sobre hotelaria, pretendemos demonstrar que o termo hospitalidade é mais heurístico, abre-se a uma discussão mais ampla e que a assunção da hospitalidade enquanto objeto de pesquisa significa aceitar tanto o risco como a oportunidade derivados da ambiguidade da primeira noção, na medida em que esta induz a um duplo movimento epistemológico do conhecimento sobre os meios de hospedagem e restauração, um primeiro de distanciamento crítico e um segundo de reaproximação crítica. (CAMARGO, 2005, p. 03)
O autor demonstra no trecho acima parte do método que utiliza para alcançar
a compreensão do fenômeno estudado. Ele chama de duplo movimento
epistemológico que se dá em um: distanciar-se crítico e reaproximar-se crítico. Esse
movimento pode ser caracterizado como um método sócio crítico, método
característico das ciências sociais.
O primeiro movimento de afastar-se criticamente e analisar os segmentos
empresariais da hospedagem e restauração a partir de um ponto de vista mais
amplo, e que assim dê abrangência a conjunto de valores, modelos e ações que
dizem respeito ao receber humano. Tal perspectiva faria com que surgissem novos
temas, até o momento impensáveis pela hotelaria e pelo turismo, e que são
imprescindíveis quando se desloca em direção a Hospitalidade.
Já o segundo movimento seria o de reaproximação crítica, que ―permite que
se percebam todas as instâncias concretas envolvidas com o receber humano‖.
(CAMARGO, 2005, p.04) Iniciando pelo receptivo turístico de uma cidade, e todas as
circunstâncias do ato de receber – hotéis, restaurantes, bufês, organização de
230
eventos, agências de viagens, etc. A hospitalidade também se desdobra para outros
serviços que envolvem a hospitalidade, tanto aos cidadãos, moradores autóctones,
quanto a visitantes e turistas como – pronto atendimento a saúde, hospitais,
rodoviárias, terminais urbanos, aeroportos, centro de atenção psico-social,
associação de moradores dos bairros, capelas e igrejas, etc. Ou seja, extrapola os
limites do turismo, mas ao mesmo tempo se relaciona intensamente com ele.
Camargo coloca:
Em resumo: denominar o programa de Hospitalidade tem um duplo significado epistemológico. Em primeiro lugar, permite operar um recorte não apenas do campo hoje coberto pelas disciplinas dos cursos de turismo, como de outras ciências aplicadas, como abordaremos na resposta à segunda questão. Em segundo lugar, como também retomaremos a seguir, a opção pode ser entendida como resistência ideológica à vinculação do pensamento acadêmico a um campo que, ao cabo e ao fim, é apenas um campo de negócios e, como tal, impossível de ser estudado isoladamente de campos assemelhados. Uma última justificativa poderia ser arrolada como corolário das anteriores e que se insere no mesmo contexto econômico que estimulou a criação do curso: ao se falar em hospitalidade o espectro de ocupações possíveis é bem amplo do que simplesmente hotelaria. (CAMARGO, 2005, p.04)
Em seguida, Camargo traça algumas considerações em um debate ideológico
sobre a função e o conhecimento na atualidade, e o quanto ele se liga aos mandos e
desmandos da empresa privada e da sua inter-relação econômica. Ele cita que já
muito foi debatida a questão das circunstâncias ideológicas que se inserem na
discussão da ênfase atribuída pelos órgãos centrais dos países, aplicados ao
conhecimento.
Já se conhece o suficiente, sem necessidade de nisso insistir, o significado ideológico de uma universidade mais próxima do mercado e mais distante da reflexão especulativa. Esta ênfase na ciência aplicada, de início assentada na lógica de controle político pela ditadura militar que se implantou no Brasil na década de 60 – para a qual as ciências puras como a sociologia, a antropologia, a história eram fontes de valores de contestação ao regime que se implantava - posteriormente teve o respaldo de um modelo de desenvolvimento econômico que necessitava de apoio da Universidade para o seu incremento. (CAMARGO, 2005, p. 04)
Ele passa a colocar em seu textos alguns conflitos ideológicos, entre Estado,
Igreja e Ensino, e como estes núcleos interagiam na construção de áreas do
conhecimento, e sua subsequente separação em novas áreas. Ele conecta o
conhecimento em uma estrutura maior que a Universidade, por essa Universidade
estar imersa em um contexto sócio – histórico – político e econômico. A disciplina
231
assim para se estabelecer necessitaria uma reorganização do conhecimento, hoje
tão seccionado.
É certo, também, que a entronização de um novo nome de uma disciplina implica essencialmente uma reorganização, de alguma maneira, do campo das ciências na qual esta se insere. A nova disciplina, como se fora uma forma vivente, há de introduzir-se entre as outras, obedecendo à lei implacável da luta darwiniana pela sobrevivência do menos inviável. E, a esta altura, mais do nunca, repita-se, a designação da disciplina é essencial, pois é essa preocupação que preside à discussão epistemológica sobre o campo e o objeto dessa disciplina e sobre o processo de reorganização do campo mais amplo. (CAMARGO, 2005, p.05)
Prosseguindo em seu debate ideológico sobre a denominação do novo
campo de estudo, ele coloca três circunstâncias envolvida, como causa e efeito com
os campos de divisão das ciências puras ou aplicadas:
a) Da parte de alguns, um genuíno interesse em ampliar o conhecimento naquela área – é evidente que muitos acadêmicos, de um lado incapazes de lutar contra o esvaziamento de suas áreas de origem, sentem-se verdadeiramente estimulados em estudar a dinâmica deste novo e poderoso setor da ação social e econômica; b) Da parte do poder político e/ou econômico, uma tentativa de manter
a ciência dentro da lógica de seu interesse de poder – naturalmente, o setor de hospedagem e restauração é hoje tão significativo, dentro do turismo, como o ligado à viagem c) Da parte da disciplina emergente, mais do que interesse, a
necessidade de disputar espaço com outras áreas da ciência, de forma a viabilizar-se: os cursos ligados à hospitalidade desejam dividir o bolo do conhecimento antes açambarcado pelos cursos de turismo, assim como desejam dividir o bolo do conhecimento restrito a outros cursos como relações públicas, nutrição e dietética, etc. bem como efetuar um recorte de disciplinas como filosofia, sociologia, antropologia. (CAMARGO, 2005, p. 05)
Trata-se de efetuar um longo caminho de delimitação de uma área
multidisciplinar, e utilizando uma denominação ainda mais precisa o autor fala de
dotar a área de uma relativa autonomia em relação a outros campos. Ele coloca que
novos campos acadêmicos também surgem em resposta a demandas ideológicas
externas de ordem variada e que assim, na sua formatação a Hospitalidade também
―se insere num novo movimento ideológico de resistência e de contestação da
própria lógica que o criou.‖ (CAMARGO, 2005, p. 06)
Em relação ao novo Programa que se inicia na UAM, tendo como
denominação Hospitalidade, o Autor coloca:
232
Criar um programa de mestrado e denominá-lo Hospitalidade, ao invés de Hotelaria, pode, assim, representar a alternativa que se encontrou em favor de um resgate das grandes questões da ciência para a sociedade, utilizando para recorte as questões ligadas ao tema da hospitalidade. O objeto de pesquisa deixa de ser apenas e tão somente o turista em viagem que busca um quarto ou uma refeição podendo ser também o migrante, o estrangeiro, o diferente, o estranho. A problemática da governança ou conciergia de um hotel, do ―maître‖ de um restaurante, da organização de eventos em nada perde se estudada à luz de um referencial teórico mais amplo que considera a situação de todo e qualquer indivíduo afastado de seu nicho social e cultural e que busca o calor e respeito humanos de um empregado de um hotel, dos organizadores de um evento, de uma comemoração, daquele que é portador de uma informação para ele necessária ou mesmo vital. (CAMARGO, 2005, p.06)
Ele coloca, mais uma vez, não ter nenhum problema com a literatura
disponível até então, só não fez menção a elas no artigo por já ser ampla e vasta a
divulgação destes estudos. Com essa ressalva ele coloca que podem ser
estabelecidos alguns recortes para a definição dos objetos de estudo e coloca: ―Esta
epistemologia da hospitalidade, aqui ensaiada, deverá ser uma das prioridades da
reflexão e da pesquisa no setor.‖ (CAMARGO, 2005, p. 06)
Ele prossegue dando um desenho de um estudo epistemológico da
Hospitalidade, sugerindo diversos autores, não somente os de origem francesa, ele
varia os autores por temáticas e campos como: Filosofia, Sociologia, Artes,
Antropologia, Alimentos e Bebidas, Gastronomia. Ao falar da Sociologia urbana, ele
cita Dumazedier e destaca as possibilidades que pode trazer enquanto reflexão
sobre a hospitalidade em centros urbanos.
Encaminhando para o final dos textos ele tece um crítica ao Turismo, que
desenvolve a maioria de seus estudos sob a ótica do ―viajante‖, e não do ―viajado‖. O
que não é errado, mas o viajado também precisa ter importância nesse processo.
Para evitar discussões, coloca:
Sejamos, contudo, precisos para se evitarem mal-entendidos que comprometam a totalidade da discussão! Certamente os estudos turísticos são sensíveis aos problemas das populações visitadas. Todos os manuais de orientação de estudos de impacto ambiental do turismo, em especial as obras de Beni (2000), Ruschmann (1997) são sensíveis em alertar contra um turismo predatório que não leva em conta a problemática das populações locais, contra a depredação do patrimônio cultural local. Tudo isto é verdadeiro. Mas, aceitemos também que a ótica da análise e sua prioridade é a do viajante, do turista e não das populações locais. (CAMARGO, 2005, p.08)
Concluindo, o autor acredita ter dado um passo a frente, possibilitando ou ao
menos lembrando um elenco de alternativas de pesquisa. Ele conclui que optar pelo
233
termo Hotelaria:
Hotelaria significa aceitar que a missão estratégica dos cursos é formar profissionais para atender às necessidades epidérmicas do mercado de trabalho e que, neste caso, não há por que ir além do atual corpo básico de temas – no ensino e na pesquisa - associados à gestão da recepção, governança, controladoria, alimentos & bebidas, com um suplemento de temas associados a campos correlatos - eventos, recreação, nutrição – e de cultura geral. (CAMARGO, 2005, p.08)
Já a adoção do termo Hospitalidade exigiria:
Ao trocar-se hotelaria por hospitalidade, como propomos aqui, troca-se um recorte pelo menos preciso, por um recorte impreciso e ambíguo, dois obstáculos à observação empírica na qual a ciência se baseia. Pode ser, mas, ao menos, discutiu-se. E a discussão é, sem dúvida, o pressuposto epistemológico da ciência. Melhor: convidamos todos os interessados no domínio da hospitalidade a refletir e a pesquisar esta questão. (CAMARGO, 2005, p.08)
Ele finaliza seu texto com um olhar otimista sobre a ciência e o conhecimento,
bem como o caminho que passa a viver.
Espera-se que as ciências aplicadas ao turismo (enquanto a teorologia, a sonhada ciência da viagem não chega), as ciências aplicadas ao lazer, às ciências aplicadas à comunicação em geral percebam a riqueza de um recorte do conhecimento científico moldado sobre o fenômeno ou o fato social associado ao gesto humano de receber. (CAMARGO, 2005, p.08)
7.2.4 Peculiaridades da Entrevista
Durante um intervalo na ANPTUR em 2012, nos aproximamos do Professor
Camargo, já conhecíamos suas obras na área do Lazer, mas ainda estávamos nos
familiarizando com sua trajetória na Hospitalidade. Durante uma conversa ele se
mostrou interessado e prontamente aceitou nosso convite para aquilo que seria um
piloto da nossa proposta de pesquisa, e que revelou tantos conteúdos, que foi
incluído como um dos entrevistados pesquisadores a discutir a temática
epistemologia no Brasil. A entrevista aconteceu na UAM, em um fim de tarde.
Munidos do roteiro, registramos a entrevista em áudio e vídeo.
O Professor iniciou contando um pouco de sua formação, e naquele momento
tivemos a certeza de que traria contribuições relevantes. Como dito anteriormente,
234
Camargo cursou sua graduação em plena ditadura militar, na USP, em seguida
viajou para a Europa, e só veio a retornar ao Brasil após a anistia em 1979. Tendo
concluído Mestrado e Doutorado na França, no Instituto René Descartes.
Quando perguntamos como ele vê o Turismo, Camargo coloca dois
posicionamentos; que de alguma forma o Turismo está eliminando a viagem, a
medida que ele é excessivamente centrado nos negócios. Aos poucos destrói a
viagem e a paisagem, uma vez que o turista quer o imediatismo do consumo de
destinos.
Eu vejo, por exemplo, que o turismo de certa forma está destruindo a viagem. Normalmente as pessoas, o turista, ele ‗engole‘ a viagem. [...] O Segundo que eu acho mais importante é que o turismo está excessivamente vinculado à ideia de negócio, digamos que o paradigma do turismo é o negócio. Num congresso como esse você vê as pessoas abordando cultura, turismo e patrimônio, mas na verdade a gente sabe que o patrimônio é uma coisa que tem que ser vista pelo conjunto de moradores e não os turistas. (CAMARGO, 2012, s/p, Informação verbal)
O autor finaliza dizendo do grande obstáculo epistemológico para entender o
turismo, onde a distância da viagem é enorme. Assim como na unidade de leitura, o
Autor não se identifica com a visão mercadológica, o que ele também deixa claro na
entrevista. Sua ligação maior é com a Cultura, e no caso da Hospitalidade, que tem
sido uma de suas palavras chaves principais, estas se relacionam intensamente. Ele
faz uma crítica às políticas públicas e a quem elas se destinam: aos turistas ou aos
autóctones.
Eu acho muito interessante quando as pessoas ficam falando de políticas para atrair turismo, turistas para um determinado lugar, para mim, isso não faz o menor sentido. Se uma cidade, digamos satisfaz seus moradores é normal que outras pessoas venham. (CAMARGO, 2012, s/p, Informação verbal)
Cultura é a essência para Camargo, poderíamos dizer que por isso ele se
denomina sociólogo formado nas ciências do lazer. Ele mostra um olhar quase
antropológico sobre as comunidades locais e receptoras, e que ao destinar
melhorias para o público de turistas e visitantes, não satisfaz nem as necessidades e
nem os anseios das populações locais, os ―viajados‖.
Então quer dizer, essa ideia de que o turismo é um negócio que precisa ser incentivado, que precisa ser programado é uma coisa que vai completamente ao contrário inteiramente da noção de cultura. (CAMARGO, 2012, s/p, Informação verbal)
235
Assim, o Turismo com o objetivo de único e exclusivo de consumo de
paisagens não agrada Camargo, que diz que o consumo de paisagens não é
turismo, e que cada vez mais pessoas viajam, até mesmo sem querer, incentivados
por um mercado de consumo, que o faz acreditar que ao invés de ele ir para Brotas
ele tem de ir para Cancun. Não se vive a experiência do encontro, a troca cultural. E
que o turismo de massa também não oferece muita riqueza, visto que se dão em
curtos períodos de tempo, onde o roteiro é por demasiado extenso, e ainda causam
grande impacto quando realizados.
Se eu, por exemplo, estou viajando com você e nós conversamos durante uma hora, você muda e eu mudo, a educação acontece. Então, não precisa de um panorama muito especial para dizer o que eu incorporei. [...] Sem falar que o turista tem um péssimo habito de consumir imagens que ele já conhece. Ir para Torre Eiffel só para ver de perto. [...] As viagens, as viagens turísticas, principalmente a de grupo não são viagens que propiciam um enriquecimento cultural muito grande. (CAMARGO, 2012, s/p, Informação verbal)
Quando perguntamos sobre os paradigmas que norteiam a produção do
conhecimento em Turismo, o Professor Camargo identifica dois paradigmas
dominantes na pesquisa em turismo, o da cultura e o da gestão. Ao passo que
coloca.
1º Paradigma da cultura, onde entra o patrimônio histórico, cultural, etc..., que é uma discussão do âmbito das ciências sociais em geral, mesmo que as pessoas não sejam sociólogas, antropólogas, estão nesse âmbito. 2º Paradigma da gestão, quer dizer, como gerir a demanda, a marca e todos os sistemas que tem. E isso, não resta duvida, é uma espécie de esquizofrenia que existe na pesquisa turística. Então são áreas ainda, com as quais ainda não se atentou nenhum tipo de articulação epistemológica. (CAMARGO, 2012, s/p, Informação verbal)
Camargo fala de uma esquizofrenia na pesquisa científica, em uma cisão.
Uma cisão com a própria realidade do turismo. Perguntamos ao Professor sobre sua
visão de mundo, e a visão europeia de sua formação vem a tona mais uma vez. Ele
cita Krippendorf, sociólogo suíço que já faleceu, mas trouxe significativas
contribuições para o Turismo. Ele relembra algumas das recomendações de
Krippendorf.
1º Viagem sempre para o mesmo lugar. 2º Viagem sempre para mais perto. 3º Fique em casa.
236
O turismo só faz sentido se você for conhecer pessoas e não consumir paisagens. Porque as pessoas sempre são diferentes. Por exemplo, as viagens em que eu me realizei foram as viagens que eu conheci pessoas do lugar e conheci suas casas também. Aí eu me senti alguém que realmente aprendeu alguma coisa. (CAMARGO, 2012, s/p, Informação verbal)
Ele coloca a experiência obtida através do turismo como essencial:
Então para mim, você me perguntou sobre a minha visão do mundo sobre o turismo, ou é para conhecer pessoas ou eu dispenso. A grande vantagem de, por exemplo, aqui na ANPTUR, em turismo de congressos, é que você chega a um lugar, você tem um receptivo que lhe permite conhecer muitas pessoas e isso eu acho importante. (CAMARGO, 2012, s/p, Informação verbal)
Quando mencionamos sobre a bibliografia mais utilizada por ele, a resposta já
era subjacente a pergunta: A literatura francesa é marcante na obra do autor, como
já observamos na Unidade de Leitura. E ele reforça na entrevista colocando:
TURISMO SOCIAL que é muito mal entendido. O Bureau Internacional de Turismo Social na Bélgica é o primeiro que tenta resgatar esses valores da viagem, muito mais que os valores do negócio. Por exemplo: é claro que o turismo tenta atingir um aspecto mais amplo da população já que se trata de alternativas de viagens mais baratas, mas o fundamental para eles é o conceito cultural que acontece na viagem. E a outra coisa que eu posso dizer que também é muito importante, que depois que eu comecei a estudar hospitalidade, isso para mim se tornou quase uma obsessão, é o que hospitalidade diz a respeito do turismo. Que o turismo é muito centrado na figura do viajante apesar de não existir mais viagem como a gente viu. Enquanto a hospitalidade é mais centrada no anfitrião, naquela pessoa do lugar que recebe. O Bureau Internacional do Turismo tem uma frase muito interessante que diz que ―o morador é o elo mais fraco da corrente turística, é o elo mais fraco.‖. (CAMARGO, 2012, s/p, Informação verbal)
Ele se identifica com a Escola europeia, Dumazedier era Francês, Krippendorf
da Suíça, e muitas foram as tentativas de implantação do Turismo Social no Brasil,
mas, como o próprio autor coloca, não se trata de baratear custos, se trata de olhar
diferente sobre as viagens, a reconhecer os autóctones como elo fraco na corrente e
estabelecer relações possíveis tanto para os viajantes quanto para aqueles que são
viajados. A viagem continua sendo uma das formas mais ricas e memoráveis de
aprendizado.
Quando perguntamos se o autor quer colocar mais alguma coisa, ele
responde que as pessoas deveriam se afastar desse consenso oculto de que todas
as pessoas gostam de viajar:
237
A gente vive num mundo cor de rosa, turismo é a melhor coisa do mundo. Eu acho que é a atividade mais nobre entre aspas, dentro do lazer. É o que digamos, tem um significado econômico maior, mas até ai dizer, por exemplo, que todas as pessoas gostam, vai uma distancia muito longe. (CAMARGO, 2012, s/p, Informação verbal)
Ele ainda completa se referindo as políticas públicas e a cultura:
O que uma política de cultura, uma política de esporte, uma política de lazer, uma política de turismo, uma política de eventos faz, no fundo é tentar tirar o individuo de dentro de casa. E as pessoas dizem, olha preguiçoso, conservador, na verdade não. Toda casa é um centro cultural, até uma favela, até uma casa em favela é um centro cultural. Há coisas para ler, a programas de televisão para assistir, a conversas para ter com outras pessoas, então não há nada de errado com as pessoas que querem ficar em casa. É claro que o transito aqui em São Paulo, a violência também é fator adicional. Mas como explicamos que na Finlândia aconteça a mesma coisa? (CAMARGO, 2012, s/p, Informação verbal)
Chegamos ao fim de nossa conversa com o Professor Camargo, depois de
agradecermos, ele já estava sendo esperado por um de seus alunos. Voltamos para
o Hotel concordando com Camargo, em uma hora que conversamos, nós mudamos,
e a educação aconteceu.
7.2.5 Janelas Epistemológicas: Luiz Octávio de Lima Camargo
Diante de uma paisagem do conhecimento, quase europeia, abrimos a janela
epistemológica de Camargo, que é bem diferente da Janela epistemológica de Trigo,
embora em alguns momentos elas conversem, há um momento em que se afastam.
O Professor Camargo, tem sua formação básica ligada a Sociologia, o que faz
com que ele se utilize de métodos que façam referência a essa área básica, seus
primeiros contatos científicos, sua aquisição de conceitos vem da sociologia, em
especial das ciências do lazer. Na unidade de leitura podemos identificar, a inicio, o
método Sócio Crítico, que é um método de pesquisa social que descende das linhas
do criticismo Kantiano, e também dos métodos de Popper (hipotético – indutivo). Ele
se encaixa dentro da fenomenologia, uma vez que estuda relações entre homem e o
meio, ou seja, trata de um fenômeno. O método de sócio crítica é um dos mais
utilizados na sociologia.
Prosseguindo na unidade de leitura, o Autor insere uma dupla discussão, ele
238
inicia com os pontos desfavoráveis a temática Hospitalidade, passando por uma
refutação de algumas dessas proposições, e somente então ele passa a discutir
sobre a hospitalidade. Ele retorna a realidade observada durante a conclusão, com
contribuições oriundas da reflexão crítica e abstração. Ou seja, ele faz um processo
de mão dupla, que caracteriza o método dialético. Mas que dialética seria essa?
Hegel? A dialética Marxista? A dialética de Lafargue, que retomou Marx?
Deixemos essa questão para depois, num primeiro momento o que fica-nos
claro é o ponto de vista crítico do pesquisador. Ao criticar uma sociedade que para
ele não possui nada de ideal – ou seja, não é uma visão idealista de sociedade, ele
se afasta desta linha, dando um caráter materialista a sua visão, ou seja, uma visão
crítica da realidade, que não é em nada ideal.
Segundo ponto, embora não se detenha no artigo a um levantamento
histórico da hospitalidade, ele cita algumas origens, e coloca o papel da história
como sendo primordial em uma possível epistemologia da Hospitalidade. Podemos
considerar que no texto ele não exprime tanto o olhar histórico, mas fala dele
durante a entrevista, ou seja, a história tem um papel, mas este não é central, ela
está em segundo plano, por isso utilizamos o termo de método sócio crítico e não
histórico-crítico, pois o discurso de Camargo se constrói mais sobre as relações
sociais do que em suas relações históricas, o que vem a ser consonante com sua
formação em Sociologia.
Camargo também se coloca contrário ao paradigma positivista de ciência,
quando tece críticas as ciências puras e suas classificações e quando sugere um
refundamento das ciências aplicadas, que ligadas inicialmente ao positivismo e as
ciências naturais cresceram e se expandiram. Ele não dá crédito exclusivo aos
cientistas e sim também caracteriza a influências de instâncias de poder na
regulação e desenvolvimento do conhecimento, como o próprio Mercado e as
políticas governamentais.
A formação do Pesquisador a nível de Pós-graduação se deu na França, e
podemos sentir em seu texto a eloquência dos textos franceses. Também se
constrói sua unidade de leitura na maioria com autores franceses como Jacques
Derrida, Dumazedier. Ele também cita o filósofo Kant, e seus apriorismo
(imperativo). Ao ensaiar uma epistemologia da Hospitalidade ele inclui algumas
referências brasileiras como no caso Gilberto Freyre. Mas, na maioria de seus textos
é mercante a Bibliografia francesa, como ele mesmo colocou em entrevista a nossa
239
pesquisa.
Ele cita Krippendorf, sociólogo suíço, que preocupado com o comportamento
das pessoas em relação as viagens concebeu em 1984 seu sistema social, que vai
além do próprio turismo, envolvendo muitas outras esferas, e fatores da atualidade.
Ele se preocupava e colocava que as pessoas deveriam dar valor as coisas mais
simples, e não colocar o valor econômico acima dos valores sociais. "Viaje com
menos frequência, fique em casa de vez em quando. Viajar conscientemente
também é decidir não viajar e passar o fim de semana ou as férias em casa.‖
(KRIPPENDORF, 1989, p.216 apud PANOSSO, 2011, p. 99)
No Sistema Social concebido por Krippendorf, o homem possui um papel
muito importante. O Sistema é considerado por tal como um sistema existencial
(PANOSSO, 2011), mas preferimos colocar humanista, porque ele não se centra
unicamente no homem como ser existente, ele foca o ser humano como a fonte da
riqueza, a arte do encontro, e somente no encontro se daria o turismo.
O Turismo seria a arte do encontro entre povos, e povos são feitos de
pessoas. A cultura é feita de pessoas. É nesse sentido que a cultura ganha mais
peso para Camargo, e o papel do anfitrião, o autóctone, o viajado, esse elo mais
fraco, que precisa ser cuidado e preparado para a atividade e consultado sobre ela.
Ao falar do Turismo Social, é o que percebemos. Existe um senso comum que paira
sobre o termo como se Turismo Social fosse o acesso à viagem para todos, como se
fosse um programa, um bolsa viagem. Não é nada disso. O Turismo Social é uma
linha de turismo que busca resgatar os valores das viagens, das pessoas, das
paisagens, dos lugares. Ele não se entrega ao consumo de paisagens e pessoas,
ele reconhece seu impacto social, cultural e ambiental – é um Turismo Socialmente
ativo e consciente.
Assim, são fortes e influentes a formação erudita do Professor Camargo, que
possui leveza na escrita. Não o classificaremos, nem o rotularemos, seria diminuir
sua importância. Sentimos fortes influências do criticismo Kantiano, uma das linhas
que fundou numa conjunção de fatores as ciências sociais. Percebe-se uma forte
influência do método dialético, com algumas nuances do MHD, como: visão
materialista de sociedade, sentido a ser revelado na existência, contradição como
elemento intrínseco ao fenômeno. Há momentos em que ele usa o termo Real,
Concreto, Ideologia e debates ideológicos. Para não incorrer no erro, colocaremos
que Camargo utiliza elementos do Materialismo Histórico Dialético em suas
240
argumentações, embora não deixe claro sua preferência metodológica.
Ele se opõe a posição positivista de ciência, e tem certo distanciamento do
mundo da economia, que trabalham com uma visão econômica estruturalista ou
sistêmica do Turismo. Dentre os termos que ele utilizou na unidade de leitura e que
demonstram suas ligações metodológicas podemos destacar: Mercadoria, Mais
valia, Não-trabalho, Negócio.
Assim, o Professor Camargo traz consigo o Criticismo Kantiano, em uma
metodologia sócio crítica, da qual descende o Método dialético, imerso em uma
corrente maior, que trata seus objetos e temáticas de estudo como fenômenos, a
fenomenologia. Lembrando que são somente algumas colocações, Luiz Octávio
transcende sua própria denominação.
241
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao iniciarmos a pesquisa nos fizemos alguns questionamentos. Para alguns a
resposta foi rápida, para outras graduais. A primeira pergunta que nos fizemos era
se o conhecimento no turismo era uma construção apenas empírica. Já na
fundamentação teórica foi possível perceber que é possível construir o
conhecimento de diversas formas. Sem citarmos todos, apresentamos os caminhos
teóricos mais influentes como, o positivismo, a fenomenologia e o estruturalismo.
Conversando com os diversos autores, foi possível perceber que em qualquer área,
incluindo o turismo, nosso objeto de estudo, o método empírico não é o único a
auxiliar na construção do conhecimento, e a reflexão filosófica e teórica tem papel
fundamental na sua elaboração.
Sabemos que a filosofia não é mera abstração, ela é o real pensado. Ela
parte das observações humanas, da ânsia humana de conhecer. Foi através da
reflexão e descobertas inicialmente pautadas somente na reflexão que a ciência
avançou. Basta lembrar que durante muito tempo se aceitaram verdades científicas
pautadas somente na razão, posteriormente somente na lógica matemática. A
filosofia, como a metafísica, como a ciência moderna são manifestações humanas
do conhecer. E este conhecer não para, é dinâmico e se traduz pela possibilidade de
trabalharmos com o conhecimento de distintas formas chegando a grandes
descobertas sobre o mundo, a natureza e nós mesmos.
Em se tratando de epistemologia, encontramos na filosofia nossos caminhos
e na ciência ou em saberes científicos nosso objeto. Pois tal beleza se encontra
mais em conhecer o conhecido, do que em duvidar dele. Perguntamo-nos sobre
quais seriam os fundamentos que embasam a pesquisa em turismo no Brasil. Foi a
partir deste questionamento que ancoramos a proposta que resultou nesta
dissertação cujo objetivo geral foi o de caracterizar as influências teóricas e
epistemológicas presente nas reflexões e discursos de pesquisadores brasileiros.
Na fase exploratória da pesquisa entramos em contato com alguns autores
com reflexões incríveis sobre o turismo e suas inter-relações. Também buscamos
em documentos e bibliografias o que existia sobre a história da Pós – Graduação em
Turismo no Brasil e com estes dados responder ao primeiro objetivo específico que
era de descrever contextualmente os Programas de Pós – graduação Stricto em
Turismo no Brasil, suas linhas de pesquisa e área de concentração. Mas a simples
242
descrição de nada valeria. Como poderíamos falar de conhecimento, e de espaços
de construção do conhecimento sem conhecer o espaço? Foi assim, seguindo a
metodologia proposta que decompomos o ―lugar‖ e revelamos os espaços
privilegiados de construção do conhecimento do Turismo através das Universidades
e dos Programas de Pós-Graduação Stricto sensu. Os resultados mostraram que o
resgate histórico nos colocou frente a frente com nosso próprio papel social.
Observamos via leituras (as entrevistas também mostraram isto) que o crescimento
do Turismo nas universidades brasileiras é resultado de políticas públicas e outros
arranjos nascidos do regime autoritário, passando por uma educação bancária e
profissionalizante até chegarmos ao século XX e XXI com a discussão desta história
e os seus significados para a produção do conhecimento. Mais que isso, ouvimos a
versão dos bastidores, a versão de seus atores sociais, que vivenciaram momentos
únicos do ensino superior em Turismo. Como foi contraditório seu estabelecimento
como campo de certa forma independente, foi uma luta por estabelecimento e por
espaço. Foi uma luta de currículos e curriculum. Os atores sociais via documentos,
bibliografias e entrevistas nos contaram sua história. Sem os esforços de
professores e instituições sérias, e a confiança daqueles que estavam ao seu lado,
seria impossível a criação de mestrados acadêmicos em Turismo.
Nos resultados, portanto, apresentamos um panorama da Pós-Graduação em
Turismo no Brasil, com dados recentes da sua origem até o momento atual.
Entramos em uma nova fase, que os educadores chamam de acomodação. A
grande marca dessa fase é o inicio do Doutorado na área que eleva o nível do
ensino e das exigências em todo o país, portanto, o momento é de cooperação, para
que os esforços feitos, e conquistas realizadas não se desfaçam.
Em se tratando de possuir um quadro de Programas Stricto sensu em
Turismo, estes atuam como filtros de pesquisadores na área. Este era então o
segundo objetivo específico de nossa pesquisa, identificar e selecionar
pesquisadores brasileiros que atuam no Turismo, com produção bibliográfica que
façam uma reflexão ou discussão acerca da construção do conhecimento científico
em Turismo no Brasil. Ou seja, onde a temática epistemologia figurasse como
assunto. Os resultados deste objetivo foram associados ao terceiro objetivo
específico que era analisar os referenciais teóricos metodológicos e os possíveis
diferentes caminhos epistemológicos traçados entre os pesquisadores brasileiros
selecionados pela pesquisa. Os resultados demonstraram que a interdisciplinaridade
243
e a multidisciplinaridade são características do campo do saber em turismo e
conferem a produção científica do turismo brasileiro certa pluralidade nos caminhos
epistemológicos escolhidos para a construção do conhecimento. São pesquisadores
advindos das mais diversas áreas trazendo consigo pressupostos teóricos e
filosóficos de suas áreas de formação, o que confere diversidade e variedade.
Vemos essa diversidade de caminhos como benéfica e positiva. Ao mesmo tempo,
existe uma concentração entre os paradigmas positivistas de ciência e as demais
metodologias e visões de mundo, não sendo isto privilégio ou prejuízo para a área
Turismo, pelo contrário, outras áreas e campos do conhecimento muito mais antigas
em questão de existência na academia sofrem com a mesma dualidade de visões de
mundo e paradigmas.
Um segundo benefício que podemos verificar desses múltiplos fundamentos
presentes na construção do saber em turismo é a constante assimilação e
acomodação de novos saberes e novas temáticas. O caráter interdisciplinar do
Turismo possibilita uma variedade temática, revelando o dinamismo da área e suas
possibilidades de inter-relação e interface com as mais diversas disciplinas, campos
do conhecimento e temáticas. Isso não quer dizer que a epistemologia deva ser
renegada a segundo plano, pelo contrário, ela tem figurado como temática de vários
pesquisadores, dois deles foram elencados e analisados durante nossa pesquisa.
Dentre a paisagem do conhecimento em turismo no Brasil, fizemos um recorte
teórico e histórico a partir da análise de unidades de leitura de dois autores-
pesquisadores brasileiros. Posteriormente abrimos assim uma janela epistemológica,
ou seja, buscamos evidenciar através da leitura analítica os pressupostos teóricos
metodológicos de cada autor analisado. Gostaríamos de salientar que, em muitos
momentos, para fins de estudo, didático e de passagem do conhecimento adotamos
nomenclaturas, que ao passar do tempo podem se tornar verdadeiros estigmas
sobre os autores. Em nossa visão dialética do mundo e do homem, nós não somos –
nós estamos. Somos, assim, um eterno vir – a – ser. Não buscamos durante a
pesquisa, como dito, enquadrar os autores, mas apenas evidenciar fundamentos por
eles utilizados.
Os dois pesquisadores se aproximam da corrente fenomenológica, ao passo
que tomam seus objetos e temáticas de estudos como um todo complexo,
multifacetado, que excede a visão simplista do objeto idealizada por outras
correntes. Além disso, a visão fenomenológica reúne em si diversas linhas e visões
244
de mundo. Pode-se perceber a presença da corrente humanista representada tanto
no existencialismo sartriano, como nos resgates epistemológicos e científicos acerca
da discussão sobre turismo e hospitalidade.
As principais similaridades entre os referenciais teóricos e metodológicos
utilizados pelos autores e analisados pela pesquisa, residem na postura
epistemológica dos pesquisadores selecionados: a vigilância epistemológica com a
temática de estudo. Essa é a característica que ambos têm em comum. O exercício
de um olhar sobre o fenômeno claro, preparado e epistemologicamente consistente
e coerente.
Finalmente, já fechando nosso rol de questionamentos, chegamos aos
caminhos epistemológicos existentes na área que revelou que os diferentes
fundamentos utilizados pelos autores brasileiros, principalmente ligados a sua área
de formação inicial e sua experiência pessoal e acadêmica. Ora, acreditamos que a
neutralidade científica é relativa, e que a história e o contexto social tem muita
influência nas escolhas metodológicas e teóricas que realizamos em nossas
pesquisas. As diferenças foram descritas durante a discussão da unidade de leitura,
e aqui gostaríamos de retomar apenas algumas considerações.
A assimilação de conceitos, o aprendizado nos coloca frente a novos
desafios, novos objetos. Quando colocados frente a novos desafios, o ser humano
tende a acomodar estes novos conceitos em novas estruturas, que podem ser
considerados novos conhecimentos. Assim, o ser humano passa de um nível de
conhecimento a outro. Foi a necessidade de entender e compreender determinada
temática ou fenômeno que levou os pesquisadores as sua busca teórica, ora ligado
a filosofia e ao turismo, ora ligado a sociologia e a o turismo. Mas o cerne da
questão reside em desenvolver caminhos possíveis, ou seja, desenvolver
conhecimento epistemologicamente sólido, válido. E a recorrência epistemológica a
sua área de formação se reflete na obra dos autores analisados.
O turismo é riquíssimo nas mais diversas formações, pois ele faz interface
com diversas áreas; Geografia, Economia; Sociologia; História e Patrimônio;
Arquitetura e Urbanismo; Antropologia; Administração; Psicologia, etc. Somos
ciências sociais aplicadas, o que nos dá muitas possibilidades. Ao mesmo tempo,
gostaríamos de colocar, que toda essa diversidade só pode ser mantida a partir da
vigilância e recorrência epistemológica. É necessário que cada vez mais
pesquisadores reflitam sobre sua própria epistemologia de pesquisa, sobre quais
245
são os fundamentos epistemológicos presentes em seus estudos. Conforme dito
anteriormente é a segurança para os saltos do conhecimento que o Turismo almeja
alcançar.
Assim, nosso objetivo principal foi alcançado. Consideramos como principal
contribuição para a área a reflexão que foi realizada no decorrer da pesquisa, onde o
resgate histórico nos colocou frente ao papel e importância da Pós-graduação Stricto
sensu em Turismo na produção do conhecimento, e nos desafios epistemológicos
que a área nos coloca. Podemos dizer que, na prática, nossa pesquisa nos colocou
frente aos nossos próprios obstáculos epistemológicos quanto à definição de um
objeto de estudo, as delimitações da área e a própria prática técnica e profissional
do Bacharel em Turismo. São essas questões epistemológicas que ainda precisam
ser debatidas, e se já o foram, precisam ser revistas. Somente a reflexão e pesquisa
pode nos auxiliar com argumentos para um diálogo com as instituições, órgãos de
fomento, mercado. A academia precisa a cada dia, reforçar seu papel social como
transformadora da realidade social e humana.
Nossa pesquisa não responde a todas as perguntas em definitivo, ainda é só
o começo. Nossa dissertação nos trouxe algumas respostas, mas nos trouxe muitas
outras dúvidas também. O interesse por alguns autores, outros autores que
queremos esquecer, outros que passamos a admirar. Projetos a serem
desenvolvidos. Em nós a pesquisa despertou o desejo de pesquisar ainda mais.
Nosso objetivo ao fim do trabalho é lhes inquietar o espírito. Não queremos esgotar
a análise, queremos vê-la viva dentro dos debates na academia, nos grupos de
trabalho dos eventos, nas salas de aulas em seminários, nas formações continuadas
com os professores.
Sim somos pesquisadores, mas somos também docentes, e o ímpeto de
querer conhecer, de desejar o conhecimento pode ser sim ensinado, podemos
motivar nossos alunos a irem ainda mais longe do que fomos. Também sabemos
que o preço do conhecimento é alto, mas nada que não possamos parcelar em
diversas vezes, espalhado pela vida. Que a Universidade seja o espaço democrático
de construção do conhecimento, e que seja também a casa e o lar daqueles que
almejam conhecer.
246
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253
ANEXO A – Pesquisa no Banco de Teses da CAPES
BANCO DE TESES CAPES (2006 - 2010)
PALAVRA-CHAVE: EPISTEMOLOGIA E TURISMO
ANO 2010 - RESULTADO
Critérios: Assunto = epistemologia e turismo; nivel = Mestrado; Ano Base = 2010
Mostrando de 1 a 5 de 5 teses/dissertações
Guilherme Bridi. Formação e atuação do turismólogo no cenário das agências de turismo:
contrapondo competências - 01/11/2010
OSCAR RODRIGO PESSOA BORJA. ÉTICA & EDUCAÇÃO AMBIENTAL:
ESTUDO DA PERCEPÇÃO AMBIENTAL DA ALTA ADMINISTRAÇÃO DAS
AGÊNCIAS DE VIAGEM DO ESTADO DE SERGIPE SUBSÍDIOS PARA A
RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL EMPRESARIAL NO PARQUE
NACIONAL SERRA DE ITABAIANA/SE - 01/03/2010
Pedro Sergio Mora Filho. Caminhos antigos, território, Geografia do turismo e
planejamento: O caso do caminho de Pabiru no ramal Botucatu. - 01/03/2010
Rebecca de Nazareth Costa Cisne. Roteiro turístico, tradição e superação: tempo, espaço,
sujeito e (geo)tecnologia como categorias de análise - 01/09/2010
Valéria de Meira Albach. PANORAMA DA PESQUISA EM TURISMO NOS
MESTRADOS EM GEOGRAFIA DO BRASIL: O CASO DO MESTRADO EM
GEOGRAFIA DA UFPR - 01/04/2010
ANO 2009 - RESULTADO
Critérios: Assunto = epistemologia e turismo; nivel = Mestrado; Ano Base = 2009
Mostrando de 1 a 1 de 1 teses/dissertações
Franciele Bandeira Figueiredo. Patrimônio imaterial e Turismo: a cultura gastronômica do agnolini - 01/04/2009
ANO 2007 - RESULTADO
Critérios: Assunto = epistemologia e turismo; nivel = Mestrado; Ano Base = 2007
Mostrando de 1 a 1 de 1 teses/dissertações
Neumar Berguerand Ribeiro da Costa. Impactos Socioambientais do Turismo em Áreas Litorâneas: Um Estudo de Percepção Ambiental nos Balneários de Praia de Leste, Santa Teresinha e Ipanema - Paraná - 01/03/2007
254
ANO 2006 - RESULTADO
Critérios: Assunto = epistemologia e turismo; nivel = Mestrado; Ano Base = 2006
Mostrando de 1 a 2 de 2 teses/dissertações
Ana Clarissa Stefanello. PERCEPÇÃO GEOGRÁFICA DE RISCOS NATURAIS. UM ESTUDO DOS BALNEÁRIOS TURÍSTICOS DE CAIOBÁ E FLAMINGO EM MATINHOS /PR - 01/03/2006
Silvana Maria de Moraes Abdalla. TURISMO E CULTURA: UMA LEITURA DO ESPAÇO URBANO POCONEANO EM SUAS SINGULARIDADES - 01/07/2006
255
ANEXO B – Resenha Ementário MEC (1930 a 1970)
CENTROS REGIONAIS DE PÓS-GRADUAÇÃO
DECRETO Nº 63 343, DE l°-10-68 — Dispõe sobre a instituição de Centros Regionais de Pós-Graduação,
coordenados pela CAPES e mediante convênio com as Universidades. D O . 2-10-69 — pág. 8 613
DECRETO Nº 64 085, DE 11-2-69 — Prove sobre a instituição da Comissão Executiva do Programa de
Implantação dos Centros Regionais de Pós-Graduação. D. O. 12-2-69 — pág. 1411
COORDENAÇÃO DO APERFEIÇOAMENTO DE PESSOAL DE NÍVEL
SUPERIOR (CAPES)
DECRETO Nº 29 741, DE 11-7-51 — Institui Comissão para promover a Campanha de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior. D. O. 13-7-51 — pág. 10 425
DECRETO Nº 30 286, DE 19-12-51 — Dilata para 30-6-52 o prazo mencionado no artigo 7º do Decreto
nº 29 741/51, que instituiu Comissão para promover a Campanha Nacional de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior. D O . 22-12-51 — pág. 18 650
PORT. MIN. Nº 102, DE 28-2-58 — Dispõe sobre planos de aplicação dos recursos concedidos ao
Ministério da Educação e Cultura, para instalação dos Institutos de Tecnologia e aumento da eficiência
do ensino nas Escolas de Engenharia. D.O. 4-3-58 — pág. 4 203
PORT. MIN. Nº 400, DE 11-7-58 — Aprova o Regimento da Comissão Supervisora do Plano dos
Institutos. D O . 17-7-58 — pág. 15 994
DECRETO Nº 49 355, DE 28-11-60 — Cria a Comissão Supervisora do Plano dos Institutos (COSUPI) e
determina seu funcionamento sob a forma de Campanha. D.O. 30-11-60 — pág. 15 464
PORT. MIN. Nº 99-B, DE 22-12-60 — Expede o Regulamento da Comissão Supervisora do Plano dos
Institutos. D.O. 31-12-60 — pág. 16 647
DECRETO Nº 50 737, DE 7-6-61 — Organiza a Campanha Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior prevista no Decreto nº 29 741/51. D.O. 7-6-61 — pág. 5 154
DECRETO Nº 51146, DE 5-8-61 — Altera dispositivos do artigo 7º do Decreto nº 50 737/61, que organizou a
Campanha Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. D.O. 5-8-61 — pág. 7 113
DECRETO Nº 51 405, DE 6-2-62 — Altera a redação do art. 2º do Decreto nº 49 355/60, que cria a Comissão
Supervisora do Plano dos Institutos. D.O. 7-2-62 — pág. 1 648
PORT. MIN. Nº 25, DE 22-1-63 — Cria o Programa de Expansão do Ensino Tecnológico (P RO T E C ) . D.O. lº-2-
63 — pág. 1138
DECRETO Nº 52 456, DE 10-9-63 — Altera dispositivos dos Decretos nºs 49 355/60 e 51 405/62, sobre a Comissão
Supervisora do Plano dos Institutos. D.O. 11-9-63 — pág. 7 825
DECRETO Nº 53 325, DE 18-12-63 — Institui o Programa de Expansão do Ensino Tecnológico. D.O. 19-12-63
— pág. 10 757
256
DECRETO Nº 53 932, DE 26-5-64 — Altera dispositivos dos Decretos de criação da C A P E S , C O S U P I e P R
O T E C , que ficarão reunidos na Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. DO. 26-5-64
— pág. 4 613
DECRETO N° 54 356, DE 30-9-64 — Dispõe sobre o regime de organização e funcionamento da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. D.O. 6-10-64 — pág. 9 012
ESCOLA DE BELAS-ARTES DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
DECRETO N° 39, DE 3-9-34 — Aprova o Estatuto da Universidade de São Paulo, estando integrada na mesma a
Escola de Belas-Artes, criada em 25-1-34 (art. 3º). DO. 8-9-34 — pág. 18 413 Ret. D O . 12-9-34
ESCOLA POLITÉCNICA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (ESTADUAL)
DECRETO Nº 23 775, DE 22-1-34 — Autoriza o Governo do Estado de São Paulo, enquanto não
organizar a Universidade Técnica prevista no Decreto nº 21 303/32, a incorporar, a uma Universidade
Estadual, a Escola Politécnica de São Paulo. D. O. 24-1-34 — pág. 1 633
DECRETO Nº 39, DE 3-9-34 — Aprova o Estatuto da Universidade de São Paulo, estando integrada na
mesma a Escola Politécnica , criada pela Lei Estadual nº 191, de 24-S-1893 (art. 3º). D.O. 8-9-34 — pág.
18 413 Ret. D O . 12-9-34
ESCOLA TÉCNICA DE HOTELARIA DA GUANABARA
PORT. MIN. Nº 169, DE 2-6-66 — Cria as Escolas Técnicas de Hotelaria da Guanabara e de São Paulo,
subordinadas à Diretoria do Ensino Comercial. DO. 16-6-66 — pág. 6 479
ESCOLA TÉCNICA DE HOTELARIA DE PORTO ALEGRE
PORT. MIN. Nº 627, DE 20-10-67 — Cria a Escola Técnica de Hotelaria de Porto Alegre e autoriza a Diretoria do
Ensino Comercial a firmar convênio. D.O. 31-10-67 — pág. 11052
ESCOLA TÉCNICA DE HOTELARIA DE SÃO PAULO
PORT. MIN. Nº 169, DE 2-6-66 — Cria as Escolas Técnicas de Hotelaria da Guanabara e de São Paulo,
subordinadas à Diretoria do Ensino Comercial. DO. 16-6-66 — pág. 6 479
FACULDADES
LEI Nº 4 759, DE 20-8-65 -— Dispõe sobre a denominação e qualificação das Universidades e
Escolas Técnicas Federais. D O . 24-8-65 — pág. 8 554
PORT. MIN. Nº 239, DE 3-9-65 — Altera a denominação das Faculdades integrantes das Universidades
vinculadas ao Ministério da Educação e Cultura, as quais serão denominadas com a indicação de sua
especialidade, seguida do nome da respectiva Universidade. D O . 13-9-65 — pág. 9 370
FACULDADE DE DIREITO DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
DECRETO Nº 39, DE 3-9-34 — Aprova o Estatuto da Universidade de São Paulo (Estadual), estando integrada na
mesma a Faculdade de Direito, fundada em 11-8-1827. D.O. 8-9-34 — pág.
FACULDADE DE FARMÁCIA E ODONTOLOGIA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
(ESTADUAL)
257
DECRETO Nº 39, DE 3-9-34 — Aprova o Estatuto da Universidade de São Paulo, estando integrada na
mesma a Faculdade de Farmácia e Odontologia, fundada em 25 de abril de 1934 (art. 3º). D O . 8-9-34 —
pág. 18 413 Ret. D.O. 12-9-34
FACULDADE DE FILOSOFIA, CIÊNCIAS E LETRAS DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
(ESTADUAL)
DECRETO N° 39, DE 3-9-34 — Aprova o Estatuto da Universidade de São Paulo, estando integrada na mesma a
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, criada pelo Decreto Estadual aº 6 283, de 25-1-34 (art. 3º). D. O. 8-9-
34 — pág. 18 413 Ret. D. O. 12-9-34
FUNDO NACIONAL DE ENSINO SUPERIOR
LEI Nº 4 024 DE 20-12-61 — (Artigo 92 § 1º) — Constitui o Fundo Nacional de Ensino Superior.
DO. 27-12-61 — pág. 11430 (Partes vetadas pelo Presidente da República e mantidas pelo Congresso Nacional.
D.O. 17-12-52 — pág. 12 885)
GRUPO DE TRABALHO PARA REFORMA UNIVERSITÁRIA
DECRETO N° 62 937, DE 2-7-68 — Institui Grupo de Trabalho para promover a Reforma Universitária, e dá
outras providências. D.O. 3-7-68 — pág. 5 481 Ret. D O . 8-7-68
DECRETO N° 64 055, DE 3-2-69 — Prove sobre a criação de Grupo de Trabalho para acompanhar a implantação
da Reforma Universitária. DO. 3-2-69 — pág. 1 124
DECRETO S/Nº, DE 11-2-69 — Designa professores para, juntamente com o Diretor do Ensino Superior e sob a
presidência do Ministro da Educação e Cultura, acompanharem a implantação da Reforma Universitária. D. O.
12-2-69 — pág. 1 414
PROGRAMA INTENSIVO DE PREPARAÇÃO DE MÃO-DE-OBRA INDUSTRIAL
DECRETO Nº 53 324, DE 18-12-63 — Aprova o Programa Intensivo de Preparação de Mão-de-Obra
Industrial. D. O. 19-12-63 — pág. 10 757
PORT. MIN. N° 292, DE 27-6-69 — Cria, no Gabinete do Ministro, a Assessoria do Programa Intensivo
de Preparação de Mão-de-Obra-Industrial, atualmente a cargo da Diretoria do Ensino Industrial. D O .
7-7-69 — pág. 5 726
UNIVERSIDADES
DECRETO Nº 19 851, DE 11-4-31 — Dispõe que o ensino superior no Brasil obedecerá, de preferência, ao sistema
universitário, podendo ser ministrado em instituições isoladas e que na organização técnica e administrativa
sejam observados os dispositivos do Estatuto das Universidades brasileiras. DO. 15-4-31 — pág. 5 800 Ret. D.O.
4-6-31
DECRETO Nº 22 579, DE 27-3-33 — Regula o funcionamento das Universidades Brasileiras, enquanto não fôr
consolidada a legislação sobre o ensino superior. D.O. 28-3-33 — pág. 6 145
DECRETO Nº 24 279, DE 22-5-34 — Aprova a regulamentação do artigo 3º do Decreto nº 19 851/31, na
parte relativa às Universidades estaduais e livres equiparadas. D.O. 26-5-34 — pág. 10 074
LEI Nº 1 254, DE 4-12-50 — Dispõe sobre o sistema federal de ensino Superior. D.O. 8-12-50 — pág. 17
537
258
LEI N° 2 337, DE 20-11-54 — Modifica a Lei nº 1254/50, que dispõe sobre o sistema federal de
ensino superior. D.O. 20-11-54 — pág. 18 561
LEI Nº 3 641, DE 10-10-59 — Dá nova redação aos parágrafos do artigo 16 da Lei 1254/50, que
federalizou as Universidades. D O . 14-10-59 — pág. 21873
LEI Nº 4 759, DE 20-8-65 — Dispõe sobre a denominação e a qualificação das Universidades e
Escolas Técnicas Federais. D.O. 24-8-65 — pág. 8 554
PORT. MIN. N° 239, DE 3-9-65 — Altera a denominação das Universidades vinculadas ao Ministério da
Educação e Cultura, sediadas nas Capitais dos Estados, as quais serão genericamente qualificadas de
Federais, distinguindo-se, especificamente, pela denominação do respectivo Estado ou pela
denominação da cidade, que não seja Capital, em que se encontrem localizadas. D.O. 13-9-65 — pág. 9 370
DECRETO-LEI Nº 53, DE 18-11-66 — Fixa princípios e normas de organização das Universidades
Federais. D.O. 21-11-66 — pág. 13 416
DECRETO-LEI Nº 252, DE 28-2-67 — Estabelece normas complementares ao Decreto-lei nº 53/66, que
dispõe sobre a reestruturação das Universidades Federais. D.O. 28-2-67 — pág. 2 443
LEI Nº 5 540, DE 28-11-68 — Fixa normas de organização e funcionamento do ensino superior e sua
articulação com a escola média. D.O. 29-11-68 — pág. 10 369 Ret. D.O. 3-12-68
DECRETO-LEI Nº 464, DE 11-2-69 — Estabelece normas complementares à Lei nº 5 540/68, que fixa a organização
e o funcionamento do ensino superior e sua articulação com a escola média. D. O. 12-2-69 — pág. 1409
DECRETO-LEI Nº 655, DE 27-6-69 — Estabelece normas transitórias para a execução da Lei Nº 5 540/68, que
dispõe sobre a organização e o funcionamento do ensino superior e sua articulação com a escola média. DO. 30-
6-69 — pág. 5 489
DECRETO-LEI N° 749, DE 8-8-69 — Estabelece normas transitórias para a execução da Lei nº 5 540/68, referente a
cursos destinados à formação de professores de disciplinas e práticas educativas vocacionais do ensino médio ou
superior, oficiais ou reconhecidos. D.O. 11-8-69 — pág. 6 825
DECRETO-LEI N° 842, DE 9-9-69 — Altera a redação do artigo 47 da Lei nº 5 540/68, que fixa normas de
organização e funcionamento do ensino superior e sua articulação com o ensino médio.
259
ANEXO C – Total de cursos Strictos Sensu em Turismo no Brasil por ano de fundação
260
APÊNDICE A – ROTEIRO DE LEITURA ANALÍTICA
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS – COMUNICAÇÃO, TURISMO E LAZER. PROGRAMA DE PÓS – GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM TURISMO E HOTELARIA –
MESTRADO ACADÊMICO
Roteiro de leitura analítica36
LEITURA ANALÍTICA PÁGINA
Referência Bibliográfica
Unidade de Leitura
ANÁLISE TEXTUAL
Contextualização do Texto
Contextualização do Autor
Palavras-Chave
ANÁLISE TEMÁTICA
Tema / Assunto
Problematização
Tese Defendida (Ideia Central)
Argumentação
Ideias Secundárias (Subtemas, Subteses)
Conclusão
Principais Fontes Utilizadas
Observações e Comentários
36
Roteiro de leitura e análise adaptado da obra de Severino (2008).
261
APÊNDICE B – ROTEIRO DE ENTREVISTA
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS – COMUNICAÇÃO, TURISMO E LAZER. PROGRAMA DE PÓS – GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM TURISMO E HOTELARIA –
MESTRADO ACADÊMICO
Título da pesquisa:
Mestrando:
Orientador (a):
1. Dados de Registro da Entrevista:
Data: Data de Realização da Entrevista
Horário: Horário de Início e Término da Entrevista
Local: Cidade – Estado e Local de realização da Entrevista
Forma de registro: Forma de registro da entrevista
Informante: (Nome)37
2. Dados Específicos:
A. Comente um pouco sobre sua formação como autor (a) e pesquisador (a)?
B. Como senhor (a) vê a pesquisa em turismo atualmente?
C. Existiria um paradigma dominante que influencia hoje a pesquisa científica em
turismo?
D. Sobre Sua Visão de Mundo: quais seriam os fundamentos que embasam seu
posicionamento como pesquisador (a)?
E. O Senhor (a) consegue identificar autores na academia que vão de encontro a
sua visão de mundo como pesquisador (a)?
F. O Senhor (a) gostaria de acrescentar mais alguma observação que considera
importante relacionada á temática e aos assuntos abordados durante a
entrevista?
37
Será anexado a cada informante, para fins de registro pessoal da mestranda, o resumo do CV Lattes.
262
APÊNDICE C - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS – COMUNICAÇÃO, TURISMO E LAZER. PROGRAMA DE PÓS – GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM TURISMO E HOTELARIA –
MESTRADO ACADÊMICO
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Título da pesquisa: ―JANELAS EPISTEMOLÓGICAS: Um Recorte Teórico sobre a
Pluralidade presente na Construção do Conhecimento em Turismo no Brasil.‖
Senhores Docentes Pesquisadores, com muita satisfação que
viemos por meio desta convidá-los a participar do estudo que está sendo realizado
pela Mestranda Luciene C. Imes Baptista, discente do Programa de Mestrado
Acadêmico em Turismo e Hotelaria da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, sob
orientação da Docente Dra. Yolanda Flores e Silva.
O objetivo geral da presente pesquisa é caracterizar as influências e
fundamentos epistemológicos presentes na construção do conhecimento em
turismo. Para alcançar tal objetivo, se faz necessário que os senhores docentes
pesquisadores aceitem participar da pesquisa enquanto informantes. O estudo
consiste em pesquisa bibliográfica, leitura analítica das obras selecionadas na
pesquisa e realização de entrevistas com autores das obras analisadas. Os
resultados serão analisados em uma abordagem qualitativa, e apresentados no
relatório de pesquisa, Dissertação de Mestrado.
As entrevistas serão realizadas e registradas pela mestranda e
poderão ser feitas pessoalmente, por videoconferência ou através de outros meios
de comunicação sendo que o informante indicará a forma que lhe será mais
conveniente, bem como datas e horários de sua preferência. Nas entrevistas
realizadas pessoalmente, o local será escolhido em acordo entre informantes e
pesquisadores.
263
As despesas relacionadas ao estudo são de responsabilidade da
mestranda, e não haverá qualquer forma de remuneração financeira para os
informantes. As entrevistas serão transcritas e somente as pesquisadoras
responsáveis terão acesso a estas informações, que serão utilizadas apenas para
fins desta pesquisa. Os informantes estarão livres para se recusarem a participar,
sem penalização ou prejuízos quaisquer.
Havendo a necessidade de maiores explicações, os informantes têm
total liberdade para esclarecer qualquer dúvida que possa surgir antes e durante o
curso da pesquisa com a pesquisadora pelos contatos disponíveis neste documento.
Acreditamos que este estudo poderá contribuir para que haja um
aprofundamento de conhecimentos acerca das relações existentes entre
epistemologia e turismo. Tendo em vista a carência de estudos que envolvam
discussões acerca dos fundamentos epistemológicos e a produção científica no
turismo, podemos contribuir juntos, com novas reflexões e questionamentos para as
áreas envolvidas. Sua participação em nossa pesquisa é essencial.
Desde já agradecemos a atenção e a disponibilidade em responder
aos nossos questionamentos.
Contatos Orientadora: Dra. Yolanda Flores e Silva E-mail: Tel.: UNIVALI Mestranda: Luciene C. Imes Baptista E-mail: [email protected] Tel.: 43 96492114 / 47 9661 7921 ___________________________________________________________________ Eu, Nome Completo do ENTREVISTADO, aceito participar da Pesquisa acadêmica
intitulada “JANELAS EPISTEMOLÓGICAS: Um Recorte Teórico sobre a Pluralidade
presente na Construção do Conhecimento em Turismo no Brasil. 2013.”, realizada
por pesquisadores do Programa de Mestrado Acadêmico em Turismo e Hotelaria da
Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI. Portanto, livremente dou o meu
consentimento para a realização da coleta de dados.
Local e Data: _________________ ________________________
Assinatura do Entrevistado
264
APÊNDICE D – LEITURA ANALÍTICA 01
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS – COMUNICAÇÃO, TURISMO E LAZER. PROGRAMA DE PÓS – GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM TURISMO E HOTELARIA –
MESTRADO ACADÊMICO
LEITURA ANALÍTICA PÁGINA
Referência Bibliográfica
TRIGO, Luiz de Godoy. Filosofia da Formação Profissional nas Sociedades Pós-Industriais – Um olhar para além do Tradicional: O caso do Lazer e do Turismo. 1996 – Tese de Doutorado. Universidade Estadual de Campinas, Campinas – SP, Faculdade de Educação. 1996 (Doutorado em Educação área de concentração Filosofia e História da Educação).
Unidade de Leitura Capítulo I: Introdução: O mundo do Lazer e a Pós-modernidade
6 - 18
ANÁLISE TEXTUAL
Contextualização do Texto
Capítulo introdutório da Tese de Doutorado do Professor Luiz Trigo, defendida no ano de 1996, na Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação, para a obtenção do título de Doutor em Educação, na área de concentração de Filosofia e História da Educação.
Contextualização do Autor
Luiz Gonzaga de Godoi Trigo é docente titular na USP – EACH, atuando nos cursos de graduação em Lazer e Turismo e em outros cursos de mestrado. A opção por escolha dessa unidade de leitura reflete sua importância. O autor foi o primeiro estudioso a inserir no Brasil a discussão filosófica e epistemológica do turismo, desenvolvendo seu olhar fundamentado em categorias filosóficas específicas. Tem sua formação na área de TURISMO e FILOSOFIA – se ligando de maneira especial com a Educação e o Lazer, entretenimento.
Palavras-Chave Lazer; Turismo; Pós-Modernidade; Educação e Filosofia; Formação Profissional;
Elaborado pelo
pesquisador
ANÁLISE TEMÁTICA
Tema / Assunto
Lazer – Turismo e Pós-Modernidade: Na unidade de Leitura o autor busca evidenciar as proposições pelas quais desenvolve sua tese de doutorado, justificando e problematizando os desafios da educação em lazer e turismo, em uma sociedade pós-industrial e pós-moderna, e o quanto a filosofia pode contribuir para a discussão e incremento da área.
06
Problematização
A problematização se dá na necessidade de formar profissionais capazes de lidar com uma atividade econômica de tamanha importância, em uma sociedade pós-moderna, dinâmica. O turismo representado em pesquisas realizadas em outros países deixa claro seu potencial econômico e no Brasil existe timidez no que refere ao seu desenvolvimento. Ele apoia a justificativa de relevância do seu problema principalmente na economia, onde uma atividade tão importante deve se preocupar com a formação profissional capacitada. Neste intuito, introduz a necessidade de se
06 07 16
265
pensar a educação no lazer e no Turismo centrado em correntes filosóficas, que sofrem certa influência existencialista humanista. Qual filosofia da educação seria adequada para embasar o preparo dos novos profissionais para o setor de serviços na sociedade pós-moderna, especialmente em Lazer e Turismo? Como trabalhar paradigmas educacionais que preparem novos profissionais para novas profissões? Poderá a Filosofia contribuir para a formação profissional em turismo?
Tese Defendida (Ideia Central)
O Turismo como parte integrante de um universo maior, do Lazer, que tem seu desenvolvimento imerso em um contexto social pós-modernista, o que impõe desafios à formação profissional, sendo a filosofia da educação uma fonte de contribuição para o incremento e melhoria no âmbito da educação e da prestação de serviços.
Durante todo o texto
Argumentação
O Turismo como sendo parte integrante de um sistema maior – do Lazer; A imersão do Turismo em uma sociedade pós-moderna; As contribuições que a filosofia da educação pode trazer na formação do profissional do turismo;
6 -9
Ideias Secundárias (Subtemas, Subteses)
A Economia movimentada pelo Lazer e Entretenimento como principal fator que determina sua relevância no campo do estudo, ou seja, uma atividade comercial de tanto potencial lucrativo deve preocupar-se com a formação de profissionais qualificados; Essa nova profissão se coloca dentro dos desafios de uma sociedade pós-moderna, de pluralidade democrática, onde são possibilitadas a ascensão através da educação, por exemplo. Com as transformações dinâmicas do mundo moderno, é necessário que a educação seja consonante com os desafios que se impõem no cotidiano, na existência. Também coloca a crise de sistemas considerados descontextualizados, como socialismo, ou as severas críticas ao capitalismo, e que se tornaram obsoletas com a transição de uma sociedade industrial para a pós-industrial.
9 -16
Conclusão
A UNIDADE DE LEITURA traz em seu interior a conclusão de que a expansão econômica do setor do lazer, e consequentemente daquilo que se refere ao turismo como instância dentro desse universo, leva a crescente necessidade de formação profissional alinhada com os desafios que o mercado vive em uma sociedade inclusa em um contexto pós-moderno. Localiza o Turismo como sendo uma atividade que se desenvolve na era pós-industrial, entre as décadas de 1970 a 1980. A filosofia da educação se coloca como uma aliada, resgatando o papel do profissional bem formado e preparado para atuar no mercado, e que essa formação deve ser centrada no educando, ou seja, no desenvolvimento de habilidades e competências no âmbito técnico, administrativo, e no campo das relações humanas em sua existencialidade.
16
Principais Fontes Utilizadas
Presença Marcante da Bibliografia Estrangeira (Norte Americana** e Francesa) Utilização de Periódicos INTERNACIONAIS: Predominância
266
na área de administração e economia (ENGLISH IMPACT). Utilização de Analistas contemporâneos: Naisbitt, 1994. Definições de Lazer e Turismo: Krippendorf e Dumazedier, (SOCIOLOGIA) Definições de órgãos e instituições de fomento e regulamentares como OMT, e revistas especializadas na área de economia e administração (The Economic) Barreto (TURISMO) Jan Carlson – Albrecht (ADM)
Observações e Comentários
A tese de doutorado do autor foi escolhida por alguns motivos em especial: 1) trata-se de uma obra marcante, por ser o autor o primeiro pesquisador brasileiro, turismólogo, a introduzir categorias filosóficas aplicadas ao estudo do turismo, abrindo uma nova temática no campo do conhecimento em turismo. 2) Por se tratar de uma obra antiga, histórica, ela reflete não só o desenvolvimento e as influências do autor, como um pensamento que permeava conceituação do turismo na década de 90, revelando sua forte ligação com a administração e economia, pensamento este que sofrerá modificações a partir da influência de pesquisas de cunho social, ou até mesmo histórico crítico. 3) Além disso, mesmo se tratando de uma obra com certo tempo de publicação, ela trabalha com uma categoria filosófica polêmica, que ainda suscita muitas discussões, principalmente no âmbito das ciências sociais e humanas (Geografia, História, Sociologia, Filosofia...) 4) Durante a entrevista o autor mencionou a obra algumas vezes, salientando a importância e influência desta sobre sua produção científica. 5) A Tese de Doutorado que pertence a unidade de leitura está disponível para consulta no Banco de Dissertações e Teses da CAPES, e da PUC. Percebe-se uma forte influência da Bibliografia estrangeira, em especial norte americana, com destaque para a utilização de periódicos internacionais da área de economia e administração, e de analistas contemporâneos. Essa influência vai agir diretamente sobre a obra do autor, que ao se valer de categorias filosófica pós-modernidade, e aplica-las ao Turismo, torna-se assim também um analista contemporâneo das dinâmicas relações na qual o turismo está imerso. Percebe-se a preocupação com a formação profissional, em uma orientação existencial e humanista da educação, mas também influenciada pelo pragmatismo, ou seja, desenvolver potencialidades que insiram o profissional no mercado de trabalho, mas também o diferencie através do desenvolvimento de habilidades relacionais, A forte ligação com o POSICIONAMENTO MERCADOLÓGICO revela as influências da formação do autor. Tecnólogo em Turismo, posteriormente Bacharel em turismo, o autor iniciou sua trajetória no conhecimento partindo do empírico, ou seja, da sua experiência profissional. Além do mais, vale lembrar a ênfase na formação do TURISMÓLOGO, principalmente a nível de tecnólogo, voltada ao mercado de trabalho. O que era ainda mais marcante durante o período de formação do autor (década de 1980). Foi a necessidade de uma discussão teórica mais aprofundada, ou seja, a preocupação epistemológica que
267
levou TRIGO a cursar Filosofia, após sua formação em Turismo. Na Unidade de leitura selecionada o autor dá pistas sobre sua orientação filosófica, ou seja, sobre a corrente na qual se debruça a categoria escolhida e as formulações sequentes. Percebe-se uma forte influência da corrente existencialista, revelada nas sutis críticas ao marxismo; quando ele retoma o papel central do indivíduo, ou seja, do ser e dos relacionamentos humanos. Coloca que a compreensão profunda do ser humano e consequentemente de suas necessidades se dá como um diferencial de qualidade, e que é necessário um pensamento elaborado a fim de atingir tais objetivos. Campo filosófico da Existência – sendo que a existência precede a consciência. Embora não fale explicitamente neste texto a inserção de palavras como: relacionamentos humanos, aspectos pessoais da formação profissional; campo filosófico da existência; existenciais; exceder o profissionalismo; filósofos do cotidiano; modernidade... expressam a influência da corrente existencialista, em especial a materialista que vê nas obras de Sartre e Nietzsche suas principais contribuições. O interesse do autor por lazer e entretenimento, por exemplo, também esteve presente nas obras poéticas e inspiradoras de Sartre. CORRENTE EPISTEMOLÓGICA MARCANTE: EXISTENCIALISMO, FENOMENOLOGIA EXISTENCIALISTA , HUMANISMO.
268
APÊNDICE E – LEITURA ANALÍTICA 02
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS – COMUNICAÇÃO, TURISMO E LAZER. PROGRAMA DE PÓS – GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM TURISMO E HOTELARIA –
MESTRADO ACADÊMICO
UNIDADE DE LEITURA ANALÍTICA PÁGINA
Referência Bibliográfica
CAMARGO, Luiz Octávio de Lima. Turismo, Hotelaria e Hospitalidade. Revista de Estudos Turísticos, v. 2, 2005. N° 2, 2005. Disponível em:< http://www.etur.com.br/conteudocompleto.asp?IDConteudo=246> Acesso em: Março de 2013.
Artigo Online
Unidade de Leitura
Artigo na íntegra, com numeração incluída para fins da pesquisa.
1 - 8
ANÁLISE TEXTUAL
Contextualização do Texto
Artigo publicado no Periódico Online: Revista de Estudos Turísticos, A revista encerrou suas atividades no ano de 2009 e teve como parte do corpo editorial os Professores Luiz Trigo, Luiz Camargo, Luzia Neide Coriolano, entre outros. O Artigo foi escrito por Camargo por ocasião da criação do Mestrado em HOSPITALIDADE da UAM, e publicado no periódico em 2005. ―Editorial: Hospitalidade, hotelaria, ecoturismo e educação ambiental, temas constantes no universo do turismo estão presentes nessa edição‖.
Luiz Octávio de Lima Camargo se inseriu na temática Hotelaria e Hospitalidade.
Contextualização do Autor
Luiz Octávio de Lima Camargo é docente pesquisador na UAM desde a fundação de seu curso, atuando na linha de pesquisa Epistemologia e Hospitalidade. Tem sua formação ligada a área de SOCIOLOGIA – em
especial as Ciências do Lazer.
Palavras-Chave
TURISMO-HOTELARIA-HOSPITALIDADE-LAZER-COMUNICAÇÃO
01
ANÁLISE TEMÁTICA
Tema / Assunto
Turismo: Hotelaria x Hospitalidade O autor analisa o surgimento dos cursos de hotelaria, desdobrados da matriz dos cursos de turismo e a polêmica sobre a denominação – hotelaria ou hospitalidade. Suas hipóteses são que esse desdobramento se insere dentro da dinâmica histórico-ideológica de evolução do campo das ciências aplicadas, notadamente no segmento mais amplo da comunicação, e que a noção de hospitalidade, bem além de uma discussão sobre meras denominações, pode representar um acréscimo de
01
269
significado e um quadro de referência original para os estudos na área.
Problematização
Controvérsia estabelecida entre os termos Hotelaria e Hospitalidade, utilizados de maneiras diferentes em países anglo-saxões e os países latinos. Os Mestrados se inserem nessa controvérsia, em como denomina-los. Inserem-se então algumas problemáticas que tem como centro a diferenciação entre os termos Hotelaria e Hospitalidade, e suas implicações epistemológicas na produção do conhecimento. Hotelaria ou Hospitalidade? Porque Hospitalidade e não Hotelaria? Por que não a simbiose inicial entre Turismo, Hotelaria e Hospitalidade?
01
Tese Defendida (Ideia Central)
Preferência pelo Termo Hospitalidade como Recorte do Conhecimento Científico em ciências sociais e ciências sociais aplicadas, embasadas no fenômeno ou fato social associado ao gesto de receber. Sistema da Dádiva - DERRIDA
Durante todo o texto
Argumentação
A Hospitalidade está presente desde a antiguidade nas relações sociais e instituições; A noção de Hospitalidade vem crescendo no campo filosófico; Facilidade de recorte teórico nos diversos referenciais: sociológico, antropológico, histórico, etc.; Visibilidade do Campo; Desdobramento epistemológico da discussão, abrindo um espectro muito mais amplo; Utilizar do recorte da Hospitalidade na tentativa de resgatar grandes questões para a ciência e a sociedade; Realiza um ensaio de uma Epistemologia da Hospitalidade;
03 04 05
Ideias Secundárias (Subtemas, Subteses)
O Profissional da Hospitalidade não se restringe ao campo da Hotelaria uma vez que ele está envolvido em todo o receber, desde os equipamentos turísticos, no receptivo da cidade, ou em instituições que de alguma forma acolhem a comunidade local e visitantes (Hospital); A ênfase que é dada ao negócio e ao mercado e o distanciamento da reflexão, onde a sociologia se insere também como disciplina de contestação. Fica latente e subentendido o viés de análise do autor, voltado para uma visão sócio crítica da construção do conhecimento científico em Turismo, em especial no que se refere à temática Hotelaria e Hospitalidade.
04
Conclusão
Optar pelo termo Hotelaria significaria aceitar a missão estratégica de formar profissionais capacitados para atender as demandas do mercado de trabalho; Ele mesmo observa os obstáculos visto a ambiguidade que o termo Hospitalidade incita - dialeticamente; Ao entrar em contato com a noção de Hospitalidade é impossível
08
270
pensar os meios de hospedagem da forma anterior; O recorte teórico em Hospitalidade pode colaborar para que as ciências sociais e aplicadas percebam a riqueza que este olhar pode trazer ao se basear no fato social do gesto humano de receber.
Principais Fontes Utilizadas
Presença Marcante da Bibliografia Francesa*** DERRIDA, Jacques (Filósofo Francês) ; Lashley e Morrinson, 2000; KANT / Mello e Souza / Gilberto Freyre / Mauss / Dumazedier
Observações e Comentários do
Pesquisador
São fortes e relevantes as influências da formação em sociologia na escolha metodológica do pesquisador, e na sua opção pelo termo HOSPITALIDADE; Também se pode observar sua colocação contrária a preceitos positivistas de ciência; Revelado no texto podemos ver a orientação dialética, com algumas ligações com as metodologias do MHD, em especial se tratando do Histórico como importante tecido onde se desenvolvem as relações sociais, em especial a Hospitalidade. Também vemos a utilização de termos e conceitos advindos deste pensamento, como: Mercadoria, Mais valia, Não-trabalho, negócio. CORRENTE EPISTEMOLÓGICA MARCANTE: CRITICISMO, SÓCIO CRÍTICA, DIALÉTICA. (Retorno a Paul Lafargue)