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UMA AVENTURA PELO UNIVERSO DAS PALAVRAS … · 3 Introdução É consenso entre educadores que ler é uma das competências mais importantes a serem trabalhadas com o aluno, qualquer

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Secretaria de Estado da Educação

Superintendência da Educação

Departamento de Políticas e Programas Educacionais

Coordenação Estadual do PDE

UMA AVENTURA PELO UNIVERSO DAS PALAVRAS ATRAVÉS DA POESIA.

Artigo Científico apresentado como Trabalho Final pela Professora Rosana Aparecida Barbosa Reis, como requisito parcial para o cumprimento das atividades propostas pelo Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE, da Secretaria de Estado da Educação do Paraná – SEED, sob a orientação do Prof. Dr. Ubirajara Araujo Moreira, da Universidade Estadual de Ponta Grossa – UEPG / PR.

PIRAI DO SUL, PR

2012

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UMA AVENTURA PELO UNIVERSO DAS PALAVRAS ATRAVÉS DA POESIA.

Autora: Rosana Aparecida Barbosa dos Reis1

Orientador: Ubirajara Araujo Moreira2

Resumo

Este artigo trata de estratégias possíveis na abordagem de poemas e letras de canções em sala de aula. Tem por referência o nosso Projeto “Poesia: uma aventura pelo mundo das palavras”, desenvolvido, em 2011, com uma turma de 6º ano do Ensino Fundamental do Colégio Estadual Jorge Queiroz Netto, Piraí do Sul, PR. Sabe-se da dificuldade geral que os alunos apresentam em relação à leitura. Esta situação é mais complicada ainda quando se trata da leitura literária e, principalmente, do gênero poético. Ao longo de décadas, professores, estudiosos e até mesmo documentos do próprio Ministério da Educação reconhecem a rarefação da Poesia nas salas de aula, seja pelas dificuldades inerentes às características desse gênero, seja pelo receio e até desinteresse dos professores no trato do mesmo, seja ainda pela inadequação de sua abordagem nos livros didáticos. Visando superar tal situação, buscaram-se alternativas que pudessem, de forma lúdica, motivadora e envolvente, despertar, incentivar e aprimorar nos alunos o interesse e o gosto pela leitura e escrita de poemas. E, desta forma, ampliar sua proficiência no campo da leitura em geral. O trabalho se desenvolveu através das seguintes atividades: Ler com Paixão, Contato Imediato, Varal de Poesia, Roda de Leitura, Jogral, Autor/Obra, Seminário, Mini-Oficinas, Visualização, Sarau Poético e Publicação (livro artesanal de poemas dos alunos). Conseguiu-se a participação interessada, lúdica e criativa dos alunos. As atividades realizadas certamente plantaram nos alunos a capacidade de desfrutar da magnífica aventura que foi ler e produzir poemas, para irem se tornando bons leitores literários, ampliando e aperfeiçoando, consequentemente, a sua proficiência para a leitura em geral.

Palavras-chave: Leitura; Poesia em sala de aula; Metodologia.

1 Especialista em Língua Portuguesa e Literaturas da Língua Portuguesa, Universidade Estadual de Ponta Grossa, PR – UEPG. Licenciada em Letras, Universidade Estadual de Ponta Grossa. Professora da Rede Estadual de Ensino do Paraná.

2 Doutor em Literatura Brasileira, Universidade de São Paulo – USP. Mestre em Teoria da Literatura, Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUCPR. Professor-Adjunto do Departamento de Letras Vernáculas da Universidade Estadual de Ponta Grossa, PR – UEPG.

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Introdução

É consenso entre educadores que ler é uma das competências mais

importantes a serem trabalhadas com o aluno, qualquer que seja a disciplina,

mas que se constitui especificamente num dos principais compromissos da

área de Língua Portuguesa. Numa perspectiva ampla, sabe-se que ler não se

reduz meramente a identificar e decodificar as palavras, mas que é

fundamental explorar seus múltiplos sentidos, conhecer as características dos

diferentes gêneros, compreender e interpretar variados tipos de texto,

considerando as situações de interlocução, procurando relacionar e reter o que

for mais relevante, e saber depois usá-lo de forma adequada, quando

necessário, em novas situações.

A escola deve fornecer ao estudante os instrumentos necessários para

que ele compreenda, selecione, organize e saiba utilizar as informações

complexas do mundo moderno, cujo domínio depende em grande parte da

proficiência nas habilidades de leitura e de escrita. Uma de suas principais

funções é a formação de leitores plenos, aptos a interpretarem e a

compreenderem as ideias (explícitas e implícitas) do texto, levando em

consideração as características próprias das diversas práticas sociais que

envolvem o letramento, as peculiaridades de cada gênero textual e as

situações comunicacionais de sua utilização.

A sala de aula é o lugar privilegiado para o desenvolvimento desta

proposta. O professor deverá, então, proporcionar situações para que essas

práticas possam tornar-se parte do cotidiano dos alunos, levando-os a

construírem os próprios conhecimentos e a participarem crítica e criativamente

da sociedade em que vivem.

Como bem ressalta Roxane Rojo:

ser letrado e ler na vida e na cidadania [...] é escapar da literalidade dos textos e interpretá-los, colocando-os em relação com outros textos e discursos, de maneira situada na realidade social; é discutir com os textos, replicando e avaliando posições e ideologias que

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constituem seus sentidos; é, enfim, trazer o texto para a vida e colocá-lo em relação com ela. Mais que isso, as práticas de leitura na vida são muito variadas e dependentes de contexto, cada um deles exigindo certas capacidades leitoras e não outras. (ROJO, 2004, p. 2).

Portanto, oferecer textos que apresentem motivações variadas de

leituras. O aluno lerá por prazer, para descobrir informações, alimentar e

estimular o imaginário, pensar, investigar, discutir, opinar e posicionar-se diante

das ideias apresentadas pelo autor, numa atitude dialógica, crítica e criadora.

Nesta perspectiva propusemos um Projeto que visava propiciar

diferentes oportunidades para o aluno penetrar e tentar desvendar os mistérios

do texto através especificamente de abordagens do poema, porque as escolas

parecem ter se esquecido (ou sempre se lembraram bem pouco...) da

importância da Poesia para a existência humana.

Como constatou Miriam Mermelstein, num artigo publicado em 2010:

Poesia virou mito em nossas salas de aula. De modo geral, observamos resistências na escola em ler, interpretar, criar e recriar poemas. Poesia nos remete ao passado, coisa de nossos avós que declamavam para as visitas ou recitavam versos nas aulas de língua portuguesa. (MERMELSTEIN, 2010, p. 1)

Abordando a mesma problemática a respeito também da rarefação do

texto poético nas salas de aula do Ensino Médio (onde o estudo da Literatura

deveria ser mais regular e sistemático!), mas apresentando-a sob outra

perspectiva e procurando apontar algumas possíveis causas, assim observam

os autores responsáveis pelas Orientações curriculares para o ensino médio, publicadas em 2006:

Cabe aqui um parêntese relativamente à leitura da poesia. Sabe-se que ela tem sido sistematicamente relegada a um plano secundário. Muito já se falou sobre a dificuldade de lidar com o abstrato, com o inacabado, com a ambiguidade, características intrínsecas do discurso poético, que tem tornado a leitura de poemas rarefeita nas mediações escolares com sua tradicional

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perspectiva centrada na resposta unívoca exemplar e na inequívoca intenção autoral. (BRASIL, 2006, p. 74, grifos nossos).

E, infelizmente, a constatação e a queixa a esse respeito são antigas.

Para citar apenas um exemplo, em seu texto A poesia e a escola, publicado

no livro A leitura em crise na escola: as alternativas do professor, cuja

primeira edição é de 1982 (lá se vão, portanto, uns trinta anos!), Lígia Morrone

Averbuck já testemunhava:

Lamentavelmente, este questionamento [sobre o trabalho com a poesia em sala de aula] não é feito com a frequência desejável, já que – quer por sua dificuldade, quer pela incompreensão da maioria dos professores – a poesia entra na escola marginalmente e os contatos que as crianças estabelecem com os textos poéticos são tão raros, que os poucos alunos que da escola guardam uma forte lembrança neste sentido tornam-se exemplos. (AVERBUCK, 1988, p. 64, grifos nossos).

Na prática pedagógica, como despertar o gosto pela leitura de

poemas? Quais as estratégias mais adequadas a este tipo peculiar de texto, já

que para além de texto trata-se de uma obra de arte? Segundo o escritor,

também poeta, Elias José, em seu livro A poesia pede passagem: um guia para levar a poesia às escolas (2003), o professor deve incentivar o “brincar

de/com poesia”, como propunha José Paulo Paes no poema Convite,

procurando estimular não só a leitura mas também a escrita de poemas,

desenvolvendo o espírito lúdico, criativo e participativo dos alunos, fazendo, no

entanto, algumas oportunas ressalvas:

A escola deve incentivar a criança a ler muita poesia, a escrever muita poesia. Não se trata de escrever para publicar, para se considerar obra acabada, para ser exposta aos leitores mais exigentes. A criança deve escrever e ler a sua produção da maneira mais solta, para os seus colegas ouvirem. [...] Acho errado a escola editar, comercialmente ou não, livros dos alunos que escreveram poemas interessantes, mas apenas com as funções criativa e lúdica. Os poetas precisam de tempo, vivências e muita leitura para amadurecer seu talento. Todos podem escrever poemas. Muitos poucos darão poetas para livros. Ser poeta é um dom, exige talento especial. Brincar de poesia é uma possibilidade aberta para todos. Dá possibilidades de alegrar escrevendo, criar,

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jogar com as palavras, brincar com os temas, modificar, cortar ou acrescentar textos aos textos que já existem. (JOSÉ, 2003, p. 101, grifos nossos).

O referido poema Convite, de José Paulo Paes, começa assim:

Poesia é brincar com palavras como se brinca com bola, papagaio, pião. [...] 3

Já Averbuck, por sua vez, prefere questionar a expressão “o ensino de

poesia” ou “ensinar poesia”, e propõe: ”O caminho seria o de criar uma

‘impregnação’ ou de uma ‘sensibilização’, ‘aproximação’, ou ‘leitura’, do que

propriamente ‘ensino’.” (AVERBUCK, 1988, p. 70). Opção que implica

estratégias apropriadas: “Isso se realiza, sobretudo, pela criação, na sala de

aula, de toda uma atmosfera própria em que a meta é, inicialmente, a de

favorecer a predisposição, a sensibilização. A poesia requer silêncio e o

espaço interior.” (Ibidem).

O trabalho com leitura realizado atualmente na escola por muitos

educadores realmente comprometidos mostra a busca incansável de caminhos

capazes de despertar o leitor adormecido em cada estudante. Porém, nota-se

que os alunos estão cada vez mais despreparados e desinteressados para ler:

então, por que não tentar “brincar de poesia”? Desenvolver o senso lúdico, a

imaginação, a fantasia, a criatividade, a sensibilidade estética, a identificação

de seus sentimentos, emoções e ideias com o consegue perceber e interpretar

no texto poético, conforme o que sugeriu a grande poeta paranaense Helena

Kolody, em Significado (1995, p. 53), que tanto no poema como nas nuvens:

“cada qual descobre / o que deseja ver”.

Mas, para que o trabalho com poesia aconteça de modo feliz, uma das

primeiras condições necessárias é que o professor deverá ele próprio gostar

realmente de poesia e, em especial, dos poemas que propõe a seus alunos, o 3A íntegra deste poema Convite, de José Paulo Paes, está disponível em: http://poeticaecotidiana.blogspot.com.br/2009/09/vamos-brincar-de-poesia.html Acesso em 25 mar. 2011.

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que facilmente será notado por eles e poderá, de certo modo, contagiá-los

também, consequentemente aguçando a sua sensibilidade e emoção em

relação aos textos poéticos.

Infelizmente, o que se vê é a poesia ocupando pouco espaço nos livros

didáticos e também que a maioria dos professores encontra dificuldades em

trabalhar com o texto poético, além de se restringirem muitas vezes a um

número bem limitado de tipos de atividade. É o que se pode observar, por

exemplo, no relato, feito no artigo O espaço do texto poético no contexto escolar (2006), a respeito dos resultados da pesquisa realizada em seis

escolas da Rede Estadual de Ensino da cidade de Ponta Grossa, PR, em 2005,

envolvendo 24 professores de Língua Portuguesa, que atuam de 5ª a 8ª séries

do Ensino Fundamental, sendo que só 18 dentre eles devolveram os

questionários devidamente respondidos.

As pesquisadoras Esméria de Lourdes Saveli, Regina Janiaki Copes e

Solange Salles de Brito, todas então membros do GEPALE4 da Universidade

Estadual de Ponta Grossa, apontam 10 tipos de atividades propostas aos

alunos pelos professores em relação ao trabalho com o texto poético, com

respectiva indicação de quantos professores desenvolvem tais atividades

(BRITO, COPES, SAVELI, 2006, p. 6), sendo que só 12 responderam a este

quesito: Interpretar (10), Declamar (10), Produzir texto (8), Ler (6), Ilustrar (3),

Parodiar (3), Parafrasear (3), Debater sobre o tema (2), Reproduzir (1), Estudar

versificação (1). Pode-se observar que há concentração nas três primeiras

atividades; por sua vez, a atividade ‘Ler’ corresponde a 50% das respostas, e

as demais apresentam um índice realmente inexpressivo. Sem contar que

poderiam ter sido elencadas tantas outras atividades... E as pesquisadoras,

com base nos dados da pesquisa, ainda informam: “Observou-se ainda que a

poesia ocupa um lugar tímido no livro didático, principal suporte pedagógico

nas aulas de Língua Portuguesa. Em decorrência disso, o texto poético é

pouco trabalhado pelos professores”. (Idem, p. 1)

O gênero poético é rico em possibilidades de aprendizagem,

apreciação e criação. Porém, não deve haver imposição, mas, sim, um

4 GEPALE: Grupo de Estudos e Pesquisa em Alfabetização e Leitura, do Programa de Mestrado em Educação da Universidade Estadual de Ponta Grossa, coordenado pela Profª. Drª. Esméria de Lourdes Saveli.

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processo de indução, de “sedução” para o texto poético e suas virtualidades. É

interessante que o aluno sinta a Poesia (emoção, imaginação, intuição) no

poema, sem o compromisso imediato de compreendê-la de forma lógica, pois o

primeiro grande apelo da Poesia é para a sensibilidade estética, já que se trata

de uma Arte. “Mais importante [do que definir o que é poesia] é conviver com a

poesia: lendo, sentindo, discutindo, tentando a criação“. (BERALDO, 1996, p

1).

“Poesia: uma aventura no universo das palavras”

O Projeto foi aplicado numa turma de 5ª série/6º ano do Ensino

Fundamental do Colégio Estadual Jorge Queiroz Netto, de Piraí do Sul, PR,

intitulava-se “Poesia: uma aventura no universo das palavras” e visava

promover o interesse e o gosto pela leitura a partir do texto poético, na sua

singela emoção e beleza que cada poema transmite... Como afirmou Affonso

Romano de Sant’Anna, citado em epígrafe num artigo de Luciana Claudia de

Castro Olímpio (p. 1): “A poesia sensibiliza qualquer ser humano. É a fala da

alma, do sentimento. E precisa ser cultivada.”

Além disso, através da Poesia o aluno enriquece o seu ser,

desenvolvendo a sensibilidade estética, amplia o domínio da linguagem e será

um leitor competente. Não se esperou (nem foi esse o objetivo) formar poetas,

mas alunos sensíveis à Poesia. E que usem essa sensibilidade para ajudar a

construir um mundo melhor para todos. Assim, foram propostos os seguintes

objetivos:

Objetivo Geral

Desenvolver junto aos alunos, através de estratégias envolventes e

participativas, o conhecimento e a percepção da Poesia como expressão

artística, bem como ajudá-los a aprimorar sua sensibilidade estética e seu

potencial criador em relação ao texto poético.

Objetivos Específicos

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1. Oportunizar aos alunos momentos lúdicos de contato com textos

poéticos, para ajudá-los a desenvolver a percepção e apreciação do caráter

estético da obra literária.

2. Dar condições para que os alunos possam conhecer e observar

certas características da linguagem poética, principalmente aspectos sonoros e

lexicais, bem como algumas figuras de linguagem.

3. Possibilitar aos alunos o conhecimento e identificação de alguns

aspectos formais do texto poético, como o verso metrificado e o verso livre, a

estrofação, a rima e o verso branco, e de alguns gêneros poéticos, como a

quadra (trova), o hai-kai, o acróstico e o soneto.

4. Criar situações em que os alunos possam recitar poemas,

individualmente ou em grupo, com ou sem encenação e sonorização,

explorando os recursos de oralidade e valorizando as ideias e emoções

transmitidas pelo texto poético.

5. Incentivar e orientar os alunos para a produção e ilustração de

poemas, oportunizando uma possível publicação.

O Projeto: alguns fundamentos

O Projeto foi idealizado visando contribuir para a formação de leitores

proficientes, despertando (se for o caso) e desenvolvendo o hábito da leitura,

tão necessário para garantir a participação no conhecimento. Como vem

conceituado nas Diretrizes Curriculares da Rede Pública de Educação do Estado do Paraná (2008), deve-se entender:

a leitura como ato dialógico, interlocutivo, que envolve demandas sociais, históricas, políticas, econômicas, pedagógicas e ideológicas de determinado momento. Ao ler, o individuo busca as suas experiências, os conhecimentos prévios, a sua formação familiar, religiosa, cultural, enfim, as várias vozes que o constituem. (DCES, 2008, p. 56).

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Assim, mostrar que a leitura é antes de tudo um exercício de paixão, e

então, para que isso ocorra, há a necessidade de um trabalho de sensibilização

para o ato de ler poemas, ou seja, uma proposta lúdica e inovadora que

possibilite empatia e identificação dos alunos para as atividades sugeridas.

Explorar o texto poético que, em geral, é sintético, subjetivo e admite

variadas interpretações, levará o aluno a exercitar livremente sua imaginação,

o senso de pesquisa e a criatividade. Consequentemente, ele gostará de ler,

porque descobrirá sentido no exercício de ler.

Como observa Maria Thereza Fraga Rocco:

O texto poético é o espaço mais rico e amplo, capaz de permitir a liberação do imaginário e sonho das pessoas. Segundo o poeta José Paulo Paes, "um mundo sem poesia é o mais triste dos mundos". (1) Assim, é preciso que o fato poético esteja muito presente e seja bem trabalhado pela escola, para que o universo escolar possa romper o tédio e a indiferença com que muitas vezes se vê recoberto. (ROCCO, 1996, p. 39).

Pretendeu-se neste Projeto aplicar uma proposta inovadora de trabalho

com a Poesia, isto é, interagir com a sensibilidade, com a emoção e com a

criatividade. Atividade difícil e delicada que exige dedicação e amor à leitura,

em especial da Poesia, por parte do professor. Só assim os alunos serão

contagiados pela Poesia e descobrirão as maravilhas de ler um bom texto e,

consequentemente, poderão adquirir ou desenvolver o hábito da leitura. Ler

não é fácil, principalmente quando não houve incentivo e aprendizado

adequados. Por inúmeros motivos, poucos são os alunos que têm contato com

leitura de qualidade, principalmente fora do âmbito escolar. Neste caso, então,

a escola é propriamente o único meio de interação entre os alunos e os textos,

cabendo-lhe proporcionar um trabalho consistente de leitura. Porém, constata-

se que a escola, embora alfabetize os alunos, infelizmente não forma leitores:

“ao povo permite-se que aprenda a ler, não se lhe permite que se torne leitor.”

(SOARES, 2005, p. 25).

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Portanto, cabe ao professor elaborar projetos para aproximar crianças

e jovens de bons livros, mostrar-lhes que ler é exercício de paixão e prazer.

Como, então, impulsionar a existência do prazer em relação à leitura, sendo

uma atividade subjetiva e individual? Como ressalta Isabel Solé:

o prazer é algo absolutamente pessoal, e cada um sabe como o obtém. Assim, talvez a única coisa a ressaltar neste caso é que a leitura é uma questão pessoal, que só pode estar sujeita a si mesma. [...]. É fundamental que o leitor possa ir elaborando critérios próprios para selecionar os textos que lê, assim como para avaliá-los. (SOLÉ, 1998, p. 96-97).

Por isso, ensinar a ler com prazer é o grande desafio, e para realizar

este trabalho optou-se pelo texto poético, porque no poema as palavras têm

muitos sentidos, e nele estão presentes o lúdico, a fantasia, a beleza, a

sensibilidade, a intuição e o conhecimento. Segundo Mermelstein: “É na

atividade criativa com a língua que a criança constrói formas originais de ver o

mundo [...]. O aluno entra em contato com os recursos estilísticos da poesia

para reconhecer, interpretar e criar.” (MERMELSTEIN, 2010, p. 2).

Formar leitores que, por iniciativa própria, selecionem o que querem ler

e, essencialmente, saboreiem e compreendam o que leem.

Lemos para saber, para compreender, para refletir. Lemos também pela beleza da linguagem, para nossa emoção, para nossa perturbação. Lemos para compartilhar. Lemos para sonhar e para aprender a sonhar. (MORAIS, 1996, p. 12).

O professor tem importante papel de mediador e incentivador da

relação entre o aluno-leitor e o texto – ao possibilitar muito mais do que a

aquisição e o domínio da leitura e evidenciar que ler é saber, mas também é

sabor. É uma aventura prazerosa e livre. A prática de leitura, portanto, deve

ser bem conduzida para a concretização desse objetivo. Como afirma Paulo

Bragatto Filho, ela deve:

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aperfeiçoar a competência linguística dos alunos, como deseja, ainda pragmaticamente, a maioria das escolas e professores, mas ir muito além disso: permitir ao alunado aquisição de conhecimentos; desenvolvimento das faculdades estéticas; curtição de emoções e entretenimento; exercício da imaginação, sensibilidade, reflexão, análise, tomada de posições e liberdade, do discernimento e espírito crítico, amadurecimento, enfim, do indivíduo como pessoa e cidadão. (BRAGATTO FILHO, 1995, p.10).

É uma tarefa difícil, arriscada, até um tanto utópica. Porém, se o

professor gosta do que faz, adora ler e ama Poesia... Os primeiros passos já

foram dados para a formação de leitores na escola .

Cito ainda outra afirmação de Paulo Bragatto Filho, que enfatiza o

objetivo deste Projeto: “Formar o leitor é, com certeza, formar o sujeito

emancipado, dotado de espírito crítico; é construir, pois, o cidadão.” (Idem, p.

98).

Enfim, fazer com que os alunos descubram que Poesia não é só para

ler. É para desenhar, recortar, pensar, imaginar, fantasiar, criar, colorir, brincar,

inventar, aprender, sentir.

O Projeto em Ação

O Projeto de Intervenção Pedagógica “Poesia: uma aventura no universo das palavras” foi implementado numa 5ª série/6º ano, formada por

33 alunos, sendo 14 meninos e 19 meninas, do Ensino Fundamental do

Colégio Jorge Queiroz Netto, de Piraí do Sul, PR, durante o segundo semestre

do ano letivo de 2011.

Este Projeto teve carga horária de 32 h/a, que foram divididas em 16

sessões com duração de duas horas-aula (aulas geminadas). Essas aulas

aconteciam nas segundas e nas sextas, o que favoreceu muito a realização

das atividades do Projeto.

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As atividades propostas a seguir visavam atender aos objetivos já

formulados. Pretendia-se que fossem atividades motivadoras, envolventes e

instigantes, possibilitando um trabalho completo de leitura que atuasse nos

níveis – sensorial, emocional e racional, visando sempre o desenvolvimento de

uma prática lúdica, prazerosa, crítica e criativa de leitura do texto poético, bem

como a produção e ilustração de poemas.

Quanto a materiais e custos, gastou-se o mínimo possível, mais ou

menos R$ 500,00, para a implementação do Projeto, pois foram utilizadas

folhas de papel sulfite, lápis de cor, tinta guache, cola, cartolina, papéis

coloridos, tinta para impressora, textos xerocados, etc.

O Colégio disponibilizou os materiais que possuía, emprestou livros da

biblioteca, permitiu acesso à biblioteca virtual, utilização dos equipamentos

disponíveis na escola (TV pen drive, etc).

Para a realização do Sarau e a confecção do livro de poemas procurou-

se angariar alguns patrocinadores da comunidade, mediante orçamento

específico para cada atividade.

As atividades foram desenvolvidas nesta sequência:

1 Ler Com Paixão

O primeiro desafio foi ambientar a sala de aula com cartazes, gravuras,

letras de música e muitos poemas, ou seja, um espaço adequado para um

delicioso e inesquecível contato com poesia. Tudo organizado, os alunos foram

para Brincar de Poesia, tendo por motivação inicial um trecho do poema

Convite, de José Paulo Paes. A partir desse fragmento e do texto integral,

foram feitos questionamentos e comentários sobre o poema, quanto a suas

características e conteúdo. Brincou-se de trenzinho, lendo/recitando o poema

Trem de ferro, de Manuel Bandeira (BANDEIRA, 1990, p. 96-98). A reação

dos alunos foi muito positiva, adoraram...

2 Contato Imediato

Visita à biblioteca, para pesquisar livros de poemas de diversos

autores, como: Roseana Murray, Vinícius de Moraes, Mário Quintana, Elias

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José, Carlos Drummond de Andrade, Pedro Bandeira, Sérgio Caparelli, José

Paulo Paes, Cassiano Ricardo, entre outros. Cada aluno copiou um poema de

seu agrado numa folha sulfite, ilustrando-o com imaginação e criatividade.

3 Varal de Poesia

Juntos, colocamos os poemas selecionados e ilustrados num varal no

pátio da escola para que todos compartilhassem essa experiência poética.

4 Roda de Leitura

O distanciamento inicial em relação à Poesia já foi superado, pois as

atividades realizadas, cheias de imaginação, fantasia e criatividade mostraram

que a nossa realidade é repleta de Poesia, e brincar com as palavras é muito

divertido. Nesta atividade os alunos ficaram dispostos em círculo para leitura e

audição de poemas/músicas selecionados anteriormente por eles próprios.

5 Jogral

Um mural com diferentes tipos de poemas e autores diversos foi

montado e apresentado à turma. Eles fizeram leitura de alguns poemas em

duplas, em pequenos grupos ou individualmente. Incluíram-se atividades de

análise e exploração de temas, recursos de sonoridade, técnicas de leitura em

voz alta e declamação.

6 Autor/Obra

Foi usado o vídeo do poema O relógio5, de Vinícius de Moraes, para

iniciar os comentários sobre os autores dos poemas e letras de canções lidos e

ouvidos até aquele momento.

7 Seminário

Nova seleção de poemas realizada pelos alunos e professora, para

leituras e reforço da exploração dos recursos sonoros, estilísticos e

5 Disponível em: http: // www.youtube.com/watch?v=AjQdFJTdLPU. Vídeo do poema O relógio, de Vinícius de Moraes. Acesso em 25 maio 2011.

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semânticos; utilização de técnicas de leitura em voz alta e declamação. Foram

utilizados os recursos audiovisuais disponíveis na escola.

8 Mini-Oficinas

Nessa etapa os alunos/poetas brincaram com as palavras, exercitaram

a criatividade, buscaram novas formas de expressão e sentidos do gênero

poético. Essa etapa a produção foi coletiva: criação de pequenos poemas,

acrósticos, quadrinhas, hai-kais, etc. Na continuidade do trabalho houve a

produção individual de poemas. É importante ressaltar que os alunos ficaram

muito motivados por protagonizarem a autoria dos poemas.

9 Visualização Criativa

Os pequenos aprendizes criaram seus poemas, ilustraram, revisaram e

reescreveram seus textos, sob a orientação da professora, e finalizando

prepararam um magnífico mural com os poemas criados.

10 Sarau Poético

Textos selecionados, alunos preparados para declamar e ambiente

perfeito para um recital com os poemas produzidos. Experiência significativa e

enriquecedora para a autonomia criativa dos alunos envolvidos nessa aventura.

11 Publicação

Finalmente, montagem e lançamento de um livro artesanal com os

poemas dos novos poetas da turma.

Considerações Finais

Cabe ao professor a tarefa de descobrir formas de aproximar as

crianças e os adolescentes do hábito e gosto da leitura de textos poéticos.

Estes vêm sendo indicados como um dos meios mais eficazes para o

desenvolvimento das habilidades de percepção sensorial, do senso estético e

das competências leitoras, consequentemente, simbólica dos nossos alunos.

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Assim, poderíamos afirmar que a interação com a Poesia é uma

estratégia importante para o desenvolvimento pleno da capacidade linguística

da criança e do adolescente, como também do refinamento da sensibilidade

para a compreensão de si próprio, dos outros e do mundo.

O que pretendi, com este Projeto, foi facilitar a análise e a

compreensão das diferentes possibilidades que temos para conseguir aguçar o

hábito da leitura de poemas, contribuindo para que se tornem leitores

competentes, aptos a sentirem e compreenderem o que o poeta transmitiu nos

seus versos, e também vivenciarem a experiência criadora como aprendizes na

arte de traduzir beleza e emoção através das palavras em forma de poemas.

Ao longo das aulas, ficou evidente que as atividades realizadas

motivaram muito os alunos, pois foram atraentes e lúdicas, revelando a

natureza curiosa e criativa das crianças. Durante o período de implementação

era visível o interesse e participação empenhada dos alunos. Flagrei crianças

tímidas, que raramente manifestavam o desejo de ler, querendo participar de

todas a atividades propostas, até mesmo recitar e dramatizar.

Reconheço que as atividades realizadas certamente plantaram nos

alunos a capacidade de desfrutar da magnífica aventura que foi ler e produzir poemas, para irem se tornando bons leitores literários, assim ampliando e

aperfeiçoando, consequentemente, a sua proficiência para a leitura em geral.

Referências

AVERBUCK, Lígia Morrone. A poesia e a escola. In: ZILBERMAN, Regina (Org.). Leitura em crise na escola: as alternativas do professor. 9 ed. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1988. p. 63-83. Coleção Novas perspectivas, 1.

BANDEIRA, Manuel. Antologia poética. Rio de Janeiro: José Olympio, 1990.

BERALDO, Alda. Trabalhando com poesia. Vol. 1. São Paulo: Ática, 1996.

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BRAGATTO FILHO, Paulo. Pela leitura literária na escola de 1º. Grau. São Paulo: Ática, 1995.

BRASIL: GOVERNO DO ESTADO DO PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Superintendência da Educação. Diretrizes Curriculares da Educação Básica de Língua Portuguesa. Curitiba: Secretaria de Estado da Educação, 2008.

BRASIL: MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Secretaria de Educação Básica. Linguagens, códigos e suas tecnologias. Brasília: MEC, 2006. (Orientações curriculares para o ensino médio; volume 1).

BRITO, Solange Salles de; COPES, Regina Janiaki; SAVELI, Esméria de Lourdes. O espaço do texto poético no contexto escolar. Disponível em: http://www.pucpr.br/eventos/educere/educere2006/anaisEvento/docs/CI-217-TC.pdf. Acesso em: 02 abr. 2012.

JOSÉ, Elias. A poesia pede passagem: um guia para levar a poesia às escolas. 3. ed. São Paulo: Paulus, 2010. [A 1. ed. é de 2003.]

KOLODY, Helena. Poesia mínima (1986), in: _____. Viagem no espelho. 2. ed. Curitiba: Editora da UFPR, 1995.

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MORAIS, José. A arte de ler. São Paulo: Editora da Unesp, 1996.

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