46
Universidade Técnica de Lisboa - Faculdade de Arquitectura Um terreiro dentro da praça Os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco para o Terreiro do Paço. Filipe Humberto Torres Mesquita Borges de Macedo Artigo para a disciplina de: História da Arquitectura e da Construção Curso de Doutoramento em Arquitectura Docente: Professora Doutora Madalena Cunha Matos Lisboa, FAUTL, Março de 2011

Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Iniciado em 1992, com a proposta que concorreu ao concurso de ideias para a o Terreiro do Paço, onde foi premiado com o segundo lugar (não havendo a atribuição do primeiro lugar), o projecto desenvolvido pelos arquitectos José Adrião e Pedro Pacheco acabou por ser o escolhido pela Câmara Municipal de Lisboa para reabilitar o Terreiro do Paço. Este projecto, inovador em muitos modos, teve como mote inspirador realizar um terreiro dentro da praça, conciliando memórias, quer simbólicas, quer matéricas, e foi desenvolvido através de um rigoroso processo de investigação e experimentação.Para além da coerência conceptual, este projecto descortinou soluções programáticas significativas, e, conjugou-as numa proposta final repleta de coerência construtiva e carregada de carga poética. Devido às contingências e indefinições políticas do poder autárquico, apenas podemos vislumbrar uma pequena amostra do seu resultado final. Contudo na obra do pavimento provisório da placa central do Terreiro do Paço, fomos brindados com uma obra de inegável qualidade. Uma obra que se destinava a estabelecer um interregno de dois ou três anos até ao início da obra completa, mas que na prática providenciou aos habitantes e visitantes de Lisboa um belíssimo espaço publico devidamente tratado.Esta intervenção acabou por moldar a imagem e as funções que o Terreiro do Paço passou a ter no imaginário dos seus habitantes e visitantes. Acabou ainda este projecto por influenciar programaticamente a intervenção definitiva que acabou por ser imposta em 2010.Vamos revisitar neste artigo a longa viagem temporal deste projecto, procurando descortinar as causas da sua excelência.

Citation preview

Page 1: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

Universidade Técnica de Lisboa - Faculdade de Arquitectura

U m t e r r e i r o d e n t r o d a p r a ç a

O s p r o j e c t o s d e J o s é A d r i ã o e P e d r o P a c h e c o

p a r a o T e r r e i r o d o P a ç o .

Filipe Humberto Torres Mesquita Borges de Macedo

Artigo para a disciplina de:

História da Arquitectura e da Construção

Curso de Doutoramento em Arquitectura

Docente: Professora Doutora Madalena Cunha Matos

Lisboa, FAUTL, Março de 2011

Page 2: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

I

Page 3: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

II

Faculdade de Arquitectura

Universidade Técnica de Lisboa

Título do artigo: Um terreiro dentro da praça.

Os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco para o Terreiro do Paço.

Nome do Aluno: Filipe Humberto Torres Mesquita Borges de Macedo

Professora Doutora Madalena Cunha Matos

Curso de Doutoramento em Arquitectura

Data: Março de 2010

Resumo

Iniciado em 1992 com a proposta concorreu ao concurso de ideias para a o Terreiro do

Paço, onde foi premiado com o segundo lugar (não havendo a atribuição do primeiro

lugar), o projecto desenvolvido pelos arquitectos José Adrião e Pedro Pacheco acabou

por ser o escolhido pela Câmara Municipal de Lisboa para reabilitar o Terreiro do

Paço.

Este projecto, inovador em muitos modos, teve como mote inspirador realizar um

terreiro dentro da praça, conciliando memórias, quer simbólicas, quer matéricas, e foi

desenvolvido através de um rigoroso processo de investigação e experimentação.

Para além da coerência conceptual, este projecto descortinou soluções programáticas

significativas, e, conjugou-as numa proposta final repleta de coerência construtiva e

carregada de carga poética.

Vamos revisitar nesta artigo a longa viagem temporal deste projecto, procurando

descortinar os seus principais valores.

Palavras-chave:

Terreiro do Paço, Pedro Pacheco e José Adrião, Materialidade da memória,

Conceptualização da memória.

Page 4: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

III

Page 5: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

IV

ÍNDICE

Índice de ilustrações: ............................................................................................. VI

1-Introdução. ........................................................................................................... 3

2– Do Terreiro do paço à Praça do comércio. ....................................................... 5

3-A proposta do concurso. ................................................................................... 11

3.1- A resposta programática ....................................................................... 11

3.2- A significância constructiva .................................................................. 17

4-A Placa central. .................................................................................................. 21

4.1- Uma Cronologia dos eventos. ............................................................... 21

4.2- As condicionantes da realidade. ........................................................... 25

4.2- As condicionantes programáticas. ....................................................... 25

4.3- A significância da matéria ..................................................................... 29

4.4- O final do processo ................................................................................ 33

5-Conclusão. .......................................................................................................... 35

Bibliografia. ........................................................................................................... 36

Page 6: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

V

Page 7: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

VI

ÍNDICE DE ILUSTRAÇÕES:

Ilustração 1- Gravura do Séc.XVII Chegada de Filipe I a Lisboa, Autor

Domingo Vieira. ......................................................................................................... 4

Ilustração 2- Gravura do séc.XVIII do Paço da Ribeira e do Terreiro do

Paço. Anónimo. ......................................................................................................... 4

Ilustração 3- Proposta de Eugénio dos Santos e Carlos Mardel para a

reconstrução da Baixa. ............................................................................................ 6

Ilustração 4- Perspectiva do terreiro do paço, atribuída a Carlos Mardel. ... 6

Ilustração 5- Fotograf ias do Terreiro do Paço nos f inais do Séc. XIX. ......... 8

Ilustração 6- Fotograf ias do Terreiro do Paço em meados do Séc. XX. ....... 8

Ilustração 7- Da esquerda para direita; Salgueiro Maia no 25 Abril de

1974; estacionamento no Terreiro do Paço em meados dos anos 80 do Séc. XX; encontro pastoral durante os anos 90 do Séc. XX. .................................... 8

Ilustração 8- Planta da proposta do Concurso. ............................................... 10

Ilustração 9- Traçado regulador do Terreiro do Paço. ................................... 10

Ilustração 10- Inpiração para a propostas do Corredor das Marés. ............ 12

Ilustração 11- Planta do Projecto do concurso, mostrando as ligações aos

Claustros dos CTT, à esquerda, e ao Claustro do Ministério das Finanças, Direita. ...................................................................................................................... 12

Ilustração 12- Planta do estacionamento e planta de pavimentos do

projecto de execução. ............................................................................................ 14

Ilustração 13- Planta de intenções, remetendo para a vontade de utilizar

os escombros na pavimentação do Terreiro do Paço, materializando deste modo as memórias do Sítio. ................................................................................. 16

Ilustração 14- Pavimentação dos arranjos exteriores da Acrópole, em

Atenas, Projecto do Arq. Dimitris Pikionis, projecto que serviu de inspiração conceptual aos Arq. Pedro Pacheco e José Adrião para o Terreiro do Paço ................................................................................................................................... 16

Ilustração 15- Conforme podemos ver, os terrenos do Terreiro do Paço

estão repletos de escombros provenientes do terramoto de 1755. Eram estos os escombros que José Adrião e Pedro Pacheco propunham utilizar para pavimentar a praça. ...................................................................................... 18

Ilustração 16- Amostra realizada pela Secil, utilizando a técnica proposta pelos arquitectos Pedro Pacheco e José Adrião para o Terreiro do Paço. Nesta situação, a amostra foi confrontada com o pavimento das arcadas. 18

Ilustração 17- Fotograf ia da situação actual, os pavimentos das ruas quebram a continuidade das arcadas. ................................................................ 20

Page 8: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

VII

Ilustração 18- Fotomontagem da proposta do projecto, a continuidade dos pavimentos das arcadas é garantida, a geometria da praça ganha nova clareza. ..................................................................................................................... 20

Ilustração 19- Fotomontagem da proposta do pro jecto de execução.......... 22

Ilustração 20- Fotomontagem da proposta do projecto de execução. ......... 22

Ilustração 21- Fotograf ia do tapume provisório da obra. ............................... 24

Ilustração 22- Fotograf ia do tapume provisório da obra. ............................... 24

Ilustração 23- Fotograf ia do tapume provisório da obra. ............................... 26

Ilustração 24- Espaço dentro da obra que permitia aos cidadãos aferirem

do seu andamento. ................................................................................................. 26

Ilustração 25- Testes de permeabilidade do pavimento provisório. ............ 28

Ilustração 26- Aplicação do pavimento provisório, de a composição do pavimento, Enrocamento, britas de calibre médio, britas de calibre f ino, betonilhas em cimento Portland com agregados f inos( bago de arroz) e camada de acabamento com betonilha de cimento branco, inertes calcareos e pigmentos. .......................................................................................... 28

Ilustração 27- Acabamento do pavimento, de notar a separação entre

placas ........................................................................................................................ 30

Ilustração 28- Teste de permeabilidade. .......................................................... 30

Ilustração 29- Placa central terminada, já com bancos em calcareo. ......... 32

Ilustração 30- O Terreiro enquanto local de meditação e recolhimento. .... 32

Ilustração 31- Acontecimentos no Terreiro Paço sobre a placa provisória.

................................................................................................................................... 34

Ilustração 32- Acontecimentos no Terreiro Paço sobre a placa provisória.

................................................................................................................................... 34

Ilustração 33- Acontecimentos no Terreiro Paço sobre a placa provisória.

................................................................................................................................... 34

Ilustração 34- O projecto do pavimento provisório dos arquitectos José

Adrião e Pedro Pacheco ........................................................................................ 36

Ilustração 35- O projecto do arquitecto Bruno Soares. .................................. 36

Page 9: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

1

Universidade Técnica de Lisboa - Faculdade de Arquitectura

U m t e r r e i r o d e n t r o d a p r a ç a

O s p r o j e c t o s d e J o s é A d r i ã o e P e d r o P a c h e c o

p a r a o T e r r e i r o d o P a ç o .

Filipe Humberto Torres Mesquita Borges de Macedo

Artigo para a disciplina de:

História da Arquitectura e da Construção

Curso de Doutoramento em Arquitectura

Docente: Professora Doutora Madalena Cunha Matos

Lisboa, FAUTL, Março de 2011

Page 10: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

2

Page 11: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

3

1- INTRODUÇÃO.

Iniciado em 1992, com a proposta que concorreu ao concurso de ideias para a o Terreiro do

Paço, onde foi premiado com o segundo lugar (não havendo a atribuição do primeiro lugar),

o projecto desenvolvido pelos arquitectos José Adrião e Pedro Pacheco acabou por ser o

escolhido pela Câmara Municipal de Lisboa para reabilitar o Terreiro do Paço. Este

projecto, inovador em muitos modos, teve como mote inspirador realizar um terreiro dentro

da praça, conciliando memórias, quer simbólicas, quer matéricas, e foi desenvolvido através

de um rigoroso processo de investigação e experimentação.

Para além da coerência conceptual, este projecto descortinou soluções programáticas

significativas, e, conjugou-as numa proposta final repleta de coerência construtiva e

carregada de carga poética.

Devido às contingências e indefinições políticas do poder autárquico, apenas podemos

vislumbrar uma pequena amostra do seu resultado final. Contudo na obra do pavimento

provisório da placa central do Terreiro do Paço, fomos brindados com uma obra de inegável

qualidade. Uma obra que se destinava a estabelecer um interregno de dois ou três anos até

ao início da obra completa, mas que na prática providenciou aos habitantes e visitantes de

Lisboa um belíssimo espaço publico devidamente tratado.

Esta intervenção acabou por moldar a imagem e as funções que o Terreiro do Paço passou

a ter no imaginário dos seus habitantes e visitantes. Acabou ainda este projecto por

influenciar programaticamente a intervenção definitiva que acabou por ser imposta em

2010.

Vamos revisitar neste artigo a longa viagem temporal deste projecto, procurando

descortinar as causas da sua eficácia.

Page 12: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

4

I lustração 1- Gravura do Séc .XVII Chegada de F i l ipe I a Lisboa, Autor Domingo V ieira .

I lustração 2- Gravura do séc.XVI II do Paço da R ibei ra e do T errei ro do Paço. Anónimo.

Page 13: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

5

2– DO TERREIRO DO PAÇO À PRAÇA DO COMÉRCIO.

Centro simbólico da capital, o Terreiro do Paço, resultado da expansão da cidade medieval

e da regularização das margens do Tejo, nasceu durante o reinado de D. Manuel, fruto da

sua decisão de fazer construir uma nova residência acoplando esta função simbólica de

poder às infra-estruturas portuárias que devido à expansão de Lisboa e aos

descobrimentos se vinham implantando junto ao Tejo desde o Séc. XIV.

Este novo centro real e funcional de Lisboa, passa a constituir um segundo fórum,

complementando o Rossio, mercado, centro religioso e antigo terreiro medieval. A

existência destas duas centralidades passa a regular a expansão de Lisboa,

acompanhando o Tejo, impulsionada por um lado pelo Terreiro do Paço e pelas crescentes

actividades navais que nasceram no período dos descobrimentos, e pelo Rossio que

articulava as ligações com a cidade medieval e com a ruralidade.

No Terreiro do Paço passam a concentrar-se as funções estaduais e de poder do Reino.

Esta posição é reforçada pela transferência das principais instituições do Reino para a sua

adjacência. Lisboa assume assim, e de um modo inequívoco, a sua ambição de potência

marítima e passa a consubstanciar o papel de capital do Reino. A partir desta altura, o

Terreiro do Paço passa a constituir-se como o centro de poder de Portugal.

O Terreiro do Paço resulta construtivamente da regularização das margens do Tejo, e do

Paço mandado construir por D. Manuel. Este Paço, de grandes dimensões, era um edifício

constituído por um grande corpo com uma generosa arcaria térrea, disposto

perpendicularmente face ao rio, e pontuado por uma torre central. Esse corpo era rematado

sobre o Tejo por um torreão de volumetria significativa. A ele encontravam-se adjacentes a

Casa da Moeda e a Casa da Índia, o que reforçava a sua importância enquanto centro de

poder. O Paço, em conjunto com a recém inaugurada Rua Nova dos Mercadores, acaba

por regularizar de um modo relativamente informal os terrenos adjacentes, constituindo-se

desse modo como uma verdadeira praça urbana. Esta praça passa a constituir entrada

monumental em Lisboa, ladeada pelos centros de poder, afirmando de um modo

inequívoco a vocação marítima do Reino.

Ao contrário das praças regulares, tão em voga na vizinha Espanha, esta praça mantem

inequivocamente a característica de ser terreiro, isto é espaço informal e polivalente.

Page 14: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

6

I lustração 3- Proposta de Eugénio dos Santos e Carlos Mard el para a recons trução da Baixa .

I lustração 4 - Perspect iva do terreiro do paço, atr ibuída a Car los Marde l.

Page 15: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

7

Com o decorrer dos séculos o Terreiro do Paço vai sofrendo progressivos melhoramentos,

do torreão Filipino, passando pela Opera de D. José, até que em 1755 se dá o fatídico

terramoto que destrói Lisboa.

Face ao cenário de devastação e depois de enterrados os mortos e tratados os feridos, o

Marquês de Pombal encarrega o Engenheiro Mor do Reino, Manuel da Maia, com a

supervisão do Duque de Lafões, a tarefa de elaborar propostas para a reconstrução da

baixa.

Manuel da Maia apresenta seis alternativas, sendo escolhida a proposta de Eugénio dos

Santos e Carlos Mardel. Esta proposta, caracterizada pela sua extrema racionalidade e

pragmatismo, permitiria a reconstrução da baixa de Lisboa, transformando a antiga urbe

medieval numa cidade moderna e iluminista.

Com o projecto de reconstrução o terreiro do paço perde o paço e passa a designar-se

Praça do Comércio, consubstanciando a visão reformista do Marquês de Pombal.

A praça ganha nova regularidade, definida através de um traçado regulador complexo e

significante, um arco do triunfo anuncia a Rua Augusta e liga o Terreiro ao Rossio. As suas

fachadas são ligadas com arcadas contínuas em três das suas frentes, e é executado um

cais cerimonial, o Cais das Colunas, e no seu centro geométrico Machado de Castro

executa uma monumental estátua equestre de D. José.

Está então composta uma das mais significativas obras da arquitectura e do urbanismo

português. Contudo, não deixamos de realçar, apesar de praça, ainda era terreiro, pois o

seu pavimento continuava a ser terra batida, e tal como nos tempos anteriores ao

terramoto, foram as instituições e os burocratas do estado que o ocuparam.

Continuaram a ser realizadas cerimónias institucionais e políticas no terreiro,

desempenhando assim, e sem sombra de dúvidas, o mesmo papel institucional e simbólico

de representação de poder na capital. Contudo, apesar do apego com que esta

característica, de ser simultaneamente terreiro e praça cerimonial, sempre se fez sentir, em

1866 foram plantadas três alamedas de árvores em seu redor, reforçando ainda mais a sua

característica de ser terreiro.

Page 16: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

8

I lustração 5- Fotograf ias do T errei ro do Paço nos f inais do Séc. XIX.

I lustração 6- Fotograf ias do T errei ro do Paço em mead os do Séc. XX.

I lustração 7- Da esquerda para d irei ta; Salgueiro Maia no 25 Abr il de 1974; estacionamento no T errei ro

do Paço em meados dos anos 80 do Séc. XX; encontro pas toral durante os anos 90 do Séc. XX.

Page 17: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

9

Apenas em 1900 é que foi abolido o pavimento em terra batida, sendo substituído por uma

pavimentação em calçada. Posteriormente, já durante os anos 30, o pavimento central

começou a ser utilizado como parque de estacionamento. Não deixa de ser curioso que nos

terreiros que abundam no pais rural, o mesmo se passou: os recintos de feira passaram

quase todos eles a servir de estacionamento. Claro que esses terreiros tiveram mais sorte,

pois nos dias de feira retomavam a sua função primordial, ser terreiro. Durante o Séc. XX, a

Praça do Comércio assistiu a profundos momentos históricos, do regicídio, passando pelas

paradas e discursos do Estado Novo, e terminando na revolução do 25 de Abril de 74, ou

até mesmo durante a democracia, em manifestações politicas e religiosas que

ocasionalmente lhe roubavam os lugares de estacionamento.

Com o decorrer do ultimo quartel do Séc. XX, e devido ao aumento progressivo do parque

automóvel e da saída das populações para as periferias de Lisboa, a procura de lugares de

estacionamento na placa central do Terreiro do Paço aumentou progressivamente. A

presença permanente de estacionamento na placa central, aliada a um pavimento

betuminoso francamente deteriorado, em conjunto com a falta de investimento na

manutenção dos edifícios, desqualificou progressivamente o Terreiro do Paço.

Esta situação motivou toda uma série de reacções na sociedade, o que acabou por originar

no lançamento em 1992 de um concurso de ideias pela câmara Municipal de Lisboa, na

altura presidida pelo Dr. Jorge Sampaio. Este concurso teve por objecto definir estratégias

para libertar o Terreiro do Paço de estacionamentos, requalificar toda a zona, incluindo

alterações nas redes viárias e de uso nos edifícios adjacentes. Os concorrentes dispuseram

de bastante liberdade programática em relação à sua abordagem em termos de

requalificação. Isto originou uma numerosa participação no concurso tendo as propostas

sido bastante diversas nas suas estratégias.

Esta diversidade e indefinição no programa acabou por originar a não atribuição do 1º lugar

no concurso, situação que, durante a década de 80 e 90 do Séc. XX, era recorrente em

organismos públicos que não se queriam comprometer com os resultados de um concurso.

Contudo houve um projecto que se destingiu, quer pela sua originalidade, conciliando

conceitos projectuais em intenções construtivas, quer pelas metodologias que com que

abordou o problema da requalificação do Terreiro do Paço, propondo significativas

alterações funcionais. A este projecto foi atribuído o segundo lugar, e a sua autoria

pertence a Pedro Pacheco e a José Adrião.

Page 18: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

10

I lustração 8- Planta da propos ta do Concurso.

I lustração 9- Traçado regulador do T erreiro do Paço .

Page 19: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

11

3-A PROPOSTA DO CONCURSO.

3.1- A RESPOSTA PROGRAMÁTICA

A proposta apresentada pelos arquitectos José Adrião e Pedro Pacheco reflectia um

profundo entendimento das idiossincrasias do Terreiro do Paço, aproveitando-as para

consubstanciar um projecto denso e complexo.

Por um lado a proposta respondia aos requisitos da C.M Lisboa, libertando o Terreiro do

Paço do seu estacionamento de superfície, reforçando a sua ligação com o Tejo,

assumindo na sua proposta um hipotético túnel rodoviário entre o Cais do Sodré e Praça

das Cebolas, já prevista no Plano Rodoviário de Lisboa e propunha um estacionamento de

550 lugares na zona do Cais fluvial como complemento ao estacionamento subterrâneo

sugerido para a placa central do Terreiro do Paço.

Por outro lado, e bem mais importante, o plano proposto consubstanciava uma visão mais

alargada para a revitalização desta praça icónica de Lisboa. Na sua visão, José Adrião e

Pedro Pacheco, propunham uma solução extraordinariamente complexa e densa na

proposta apresentada. Esta proposta apresenta vários níveis de abordagem diferenciada,

que se vão consubstanciar e reflectir no desenho final.

Ao nível do desenho urbano, eles entendem que o Terreiro é o corolário de um sistema

mais vasto, a Baixa Pombalina, portanto devem no projecto respeitar e enfatizar esta

continuidade. Este objectivo é conjugado com outra vicissitude: o Terreiro do Paço é uma

praça urbana em que a quarta fachada é o Tejo com a Serra da Arrábida a servir de pano

fundo. Na sua interpretação é fundamental aplicar ao desenho do Terreiro uma

regularidade altimétrica que mantenha a continuidade descendente entre o Rossio e o Cais

das Colunas. Este facto é profundamente reforçado pelo traçado regulador do próprio

Terreiro do Paço. O vértice sul do pentágono que regula o seu desenho, termina no Cais

das Colunas, enfatizando desse modo uma intenção clara no desenho urbano do sistema

da baixa. Quer se ascenda, quer se desça, o Cais da Colunas assume uma importância

simbólica impar, seja ele porta de entrada na cidade, ou então seja ele, saída para Sul.

No seguimento da importância que esta entrega ao Rio tem no sistema urbano da Baixa

Pombalina, o projecto propõe um remate poético na fronteira entre o Terreiro e o Rio. Eles

propõem a criação de um corredor de marés, este equipamento regularizaria a entrega

Page 20: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

12

I lustração 10- Inspi ração para a propostas do Corredor das Marés . Concurso

I lustração 11 - P lanta do Projecto do concurso, most rando as l igações aos C laustros dos CTT, à

esquerda, e ao Claus tro do Ministér io das Finanças, Dire ita.

Page 21: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

13

da praça ao rio ao mesmo tempo que permitiria a passagem pedonal a uma cota baixa

entre a estação fluvial e a ribeira das Naus.

A importância do sistema urbano da Baixa Pombalina é enfatizada por outras das

consecuções emblemáticas das propostas. José Adrião e Pedro Pacheco assumem toda a

Baixa e Terreiro do Paço como unidade Urbana que precisa de ser requalificada e realçada

na sua intervenção. Para complementar este seu objectivo a proposta do concurso propõe

a abertura do claustro do Ministério das Finanças, a Nascente, e do claustro do edifício dos

CTT, a Poente, ao público. Para o claustro do Ministério das Finanças propõem uma

extensão do Museu da cidade, especializada no pombalino, sendo que para os claustros do

edifício dos CTT, propõem a construção de uma biblioteca dedicada aos mesmos assuntos.

Esta estratégia permite revelar à cidade uma parte do complexo do Terreiro do Paço

desconhecida do público, ao mesmo tempo que assumem como primordial a herança

Pombalina na requalificação e revitalização do Terreiro.

Contudo a parte mais significativa do projecto é a interpretação que realizam da Praça do

Comercio. Esta interpretação é profundamente marcada pelas complexidades deste

magnífico espaço urbano. Se por um lado ele é praça iluminista e racional, por outro lado,

ele nunca conseguiu libertar-se da herança lusa do terreiro.

“A nova construção deverá processar-se em relação ao plano / superfície como um vazio

ou não construção, remetendo para a profundidade – já que é nesse sentido que se

consolidam as estruturas – a nova base construtiva e de fundação do terreiro. No subsolo

concentram-se os equipamentos que complementam o vazio (espaço exterior) e que

permitem a sua transformação de um espaço de silêncio num espaço lúdico e excepcional.

O edifício consolida-se como uma caixa sobre estacas e a sua cobertura funciona como

pavimento da placa central do terreiro. Entende-se a praça como um espaço de

convergência da cidade em direcção ao rio e também como local de início da sua

descoberta. Propõe-se para pavimento envolvente à praça cubos de pedra calcária na

continuação do pavimento existente das ruas adjacentes, tal como seria natural nos séculos

passados, ruas de terra fossem dar a um terreiro e vice versa.”

Ou seja na sua interpretação Pedro Pacheco e José Adrião são confrontados por um

dilema difícil, se por um lado têm a Praça Real absolutista, centro de poder da capital, esta

assume características que são conceptualmente irreconciliáveis com a memória do terreiro

que ainda perdura no imaginário colectivo.

Page 22: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

14

I lustração 12 - P lanta do estacionamento/ sala pol ivalente e cortes do projec to do concurso.

De notar que os acessos para o estacionamento são propostos a part ir do túnel rodovi ário de modo a

não interf er irem com a p lan imet ria da Praça.

Page 23: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

15

Na sua análise do sítio e da sua história, José Adrião e Pedro Pacheco, concluem que a

simbologia da praça Real absolutista, já não corresponde à imagem e funções de um poder

que se quer democrático. Logo a praça necessita de novas funções para se poder

requalificar e revitalizar.

Na sua proposta vão procurar reconciliar a geometria da praça com o vazio do terreiro,

criando uma praça que seja terreiro, não apenas de um modo superficial, mas que o seja

de um modo significativo e funcional.

Por terreiro, Pedro Pacheco e José Adrião entendem: “Um terreiro é espaço vazio-

interpretando o vazio como silêncio – que se torna lúcido ou activo em períodos de tempo

pontuais e esporádicos”. Logo a reabilitação da Praça do Comércio deve adquirir essa

possibilidade de ser espaço contemplativo, podendo ser utilizado pontualmente noutras

funções. E é esse o mote que vai dirigir toda a estratégia programática da intervenção.

O parque de estacionamento é concebido como um espaço polivalente, com um generoso

pé-direito de 4,5m e uma grelha com 15m de espaçamento entre as colunas, possibilitando

deste modo a sua utilização pontual para outras actividades, fossem elas concertos, festas

ou exposições. Este equipamento solucionaria parcialmente as necessidades de

estacionamento, mas a sua versatilidade permitiria numerosos eventos ocasionais, um

pouco como o Terreiro que lhe fica sobranceiro que por norma é espaço de contemplação,

mas por vezes transfigura-se. Aqui, neste parque de estacionamento, o mesmo

aconteceria, carros no dia-a-dia, outras coisas em ocasiões especiais.

A placa central seria primordialmente desenhada para ser Terreiro, ser espaço de silêncio e

contemplação sobre o Tejo, devidamente apoiada por algum mobiliário urbano que servisse

essa função. Contudo, escondidos no seu pavimento, existiriam caixas rebatíveis, que

forneceriam as infra-estruturas necessárias à realização dos mais variados eventos que

houvesse vontade de promover, feiras, exposições, teatros de rua, entre outros.

Para as arcadas que rodeiam o Terreiro do Paço, o projecto previa a desafectação do piso

térreo dos ministérios e serviços públicos existentes, de modo a que os espaços libertos

albergassem cafés, restaurantes e algumas lojas, garantindo assim alguma animação

urbana necessária à requalificação da Praça. Esta alteração de uso estava prevista para as

arcadas poente e nascente do Terreiro do Paço que, para melhor servirem esta função,

seriam dotadas de um sistema de toldos. Estes toldos diferenciavam as fachadas laterais

do alçado Norte da praça, aumentando assim a complexidade formal e funcional do

Page 24: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

16

I lustração 13 - P lanta de intenções , remetendo para a vontade de ut i l izar os escombros na pavimentação

do T errei ro do Paço, mater ial izando deste modo as memórias do Sít io.

I lustração 14 - Pavimentação dos ar ran jos exter iores da Acrópo le, em Atenas, Projecto do Arq. D imit r is

Pikion is, projec to que serviu de insp iração conceptual aos Arq. Pedro Pacheco e José Adrião para o

Ter reiro do Paço

Page 25: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

17

edifícios do Terreiro do Paço, a Norte a fachada simbólica com o seu arco do Triunfo,

marcando a entrada cerimonial da cidade, a Poente e Nascente, a animação mundana das

arcadas com novas funções.

3.2- A SIGNIFICÂNCIA CONSTRUCTIVA

A relevância do projecto não se limita à complexidade da resposta programática, por norma

a sua resposta construtiva reafirma e enfatiza essa resposta programática. No projecto do

Terreiro do Paço, José Adrião e Pedro Pacheco primam por enfatizar no desenho

construtivo do projecto os conceitos que geraram o seu desenho. Esta coerência

conceptual e construtiva materializa-se na escolhas das matérias, no desenho e na

gradação das suas estereotomias, mas também nos significados que estas escolhas

revelam.

Na materialidade do projecto, José Adrião e Pedro Pacheco, conseguem conciliar a história

do sítio numa materialidade complexa, que realiza a fusão de duas realidades antagónicas,

o Terreiro e a Praça, e que ao mesmo tempo concilia e recupera a memória histórica do

sítio. Simultaneamente procuram, num projecto profundamente contemporâneo, alicerçar a

descoberta da história do sítio na sua concretização matérica. A praça real clássica tem um

pavimento habitualmente constituído por agregado de pedras de pequena escala. No

projecto do Terreiro do Paço, a escala dessa estereotomia é aumentada, passando esta a

ser constituída por placas com cerca de 12 m2, o que na óptica dos autores procura

concretizar o terreiro dentro da praça.

No projecto do concurso, e resultado da sua proposta de criar parque de estacionamento/

sala polivalente debaixo da praça central do Terreiro do Paço, surge a ideia de agregar as

ruinas do terramoto ao pavimento que se propunha para a placa central, pois, quando da

reconstrução da praça foram utilizadas as ruinas da Lisboa antiga para regularizar o

terreno.

A escavação do espaço necessário à existência do parque de estacionamento permitiria

triar os escombros da cidade, sendo que as peças mais relevantes seriam preservadas

para o acervo do Museu da Cidade. Os restantes escombros seriam reciclados, constituir-

se-ia desse modo a matéria-prima para a realização do pavimento da placa central. Esta

atitude revela uma clara referenciação aos trabalhos de reabilitação realizados pelo

Page 26: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

18

I lustração 15 - Conf orme podemos ver, os terrenos do T erreiro do Paço estão rep letos de escombros

provenientes do terramoto de 1755. Eram estos os escombros que José Adr ião e Pedro Pacheco

propunham ut i l izar para pavimentar a praça.

I lustração 16 - Amostra real izada pela Seci l, u ti l izando a técnica proposta pelos arquitectos Pedro

Pacheco e José Adrião para o T erreiro do Paço. Nesta s i tuação, a amostra f oi conf rontada com o

pavimento das arcadas .

Page 27: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

19

Arquitecto Dimitris Pikionis na Acrópole. Contudo essa referenciação conceptual sofre uma

adaptação pioneira: enquanto o trabalho de Pikionis na Acrópole assenta num intricado

desenho de pavimento, onde as ruinas e os escombros da história resultam numa

complexa estereotomia, no Terreiro do paço, a trituração dos escombros resulta num

contínuo matérico. A memória é redescoberta, mas transformada em coisa abstracta e

conceptual.

Essa matéria seria agregada num betão pigmentado, o que permitiria a conciliação dos dois

conceitos inerentes ao projecto. Por um lado teríamos a cor de terra do Terreiro, por outro

lado, a aplicação do pavimento em betão obedeceria a uma criteriosa estereotomia, que

claramente nos remete para o conceito de praça pavimentada.

O desenho desta estereotomia obedece ainda a um outro critério, as placas são orientadas

no sentido do rio, reforçando o sentido de ligação da cidade ao Cais das Colunas. No

sentido Norte/ Sul a estereotomia é resultado directo da métrica das arcadas, no sentido

Este/Oeste cada dois módulos de arcada perfazem três estereotomias.

O pavimento da Placa, tal como o desenho de toda a intervenção, obedece a um cuidadoso

estudo altimétrico. O sentido descendente, entre a baixa e o Rio Tejo é preservado

cuidadosamente, no desenho altimétrico não existem obstáculos ou barreiras significativas

a interferirem nesse contínuo simbólico.

Fora da placa central, a Praça é desenhada com pavimentos em calcário e lioz,

obedecendo a uma cautelosa gradação do seu desenho. Nas arcadas, complementa-se o

contínuo em lioz, acabando com a interrupção que os pavimentos de asfaltos da Rua do

Ouro, Rua da Prata, Rua do Arsenal e da Alfandega realizam no contínuo das arcadas.

Deste modo a geometria da praça é reforçada, aumentando consideravelmente a sua

leitura. A transição para a placa central é realizada através de uma gradação dos

pavimentos, a poente e nascente alarga-se o lajeado em lioz, criando grandes áreas

pavimentadas onde pontua a iluminação pública.

As ruas são pavimentadas em cubos de calcário, marcando deste modo a sua diferença de

uso face às zonas reservadas a peões, obtendo por um lado uma continuidade matérica,

mas enfatizando a sua diferenciação através da sua textura.

Page 28: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

20

I lustração 17 - Fotograf ia da s ituação ac tual , os pavimen tos das ruas quebram a continuidade das

arcadas .

I lustração 18 - Fotomontagem da propos ta do projecto, a continuidade dos pavimentos das arcadas é

garant ida, a geometr ia da praça gan ha nova c lareza.

Page 29: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

21

Na contingência sul da placa central, e entregando-se ao Tejo, uma grande área é

pavimentada em lioz, refazendo a geometria regular da Praça, entregando-se ao Tejo sem

interrupções visuais e ligando o Cais Cerimonial com a Praça monumental.

Pontuam a Praça e os seus espaços adjacentes com bancos monolíticos de pedra,

garantindo assim locais de contemplação ao Tejo. A continuidade matérica da pedra é

deste modo prolongada nos equipamentos. O desenho urbano é um todo contido e

coerente assente numa interpretação tectónica coesa.

4-A PLACA CENTRAL.

4.1- UMA CRONOLOGIA DOS EVENTOS.

O processo do concurso foi lançado em 1992, estando na presidência da Câmara Municipal

de Lisboa o Dr. Jorge Sampaio (1989 a 1995), numa tentativa de responder àquela que era

uma das suas promessas eleitorais, tirar o estacionamento do Terreiro do Paço. Contudo o

Terreiro do Paço é um daqueles locais que espelham a complexidade da administração

pública portuguesa, ou seja, o Terreiro do Paço e os complexos adjacentes são tutelado por

numerosas entidades, dos vários ministérios que lhe ocupam as alas, Finanças, Defesa,

Administração Interna, Justiça, etc., passando pelos Correios, Metro de Lisboa, Transtejo,

Administração do Porto de Lisboa, e isto apenas para referir as mais relevantes, todas elas

com competência e uma palavra a dizer em qualquer alteração que se proponha ao

complexo do Terreiro do Paço.

Este aliás foi um dos motivos que motivou a não atribuição do primeiro lugar no concurso,

pois deste modo a C.M. Lisboa teria uma maior margem de manobra de negociação, não

se vinculando a adjudicar um projecto específico, que conforme já vimos, teria de ser

negociado com numerosas entidades.

Aliado a este facto encontramos ainda um outro factor que levou ao arrastar deste

processo, a geologia e o sistema hidrológico da Baixa, revestem-se de uma complexidade

extrema. Por um lado toda esta zona é constituída por terrenos de aluvião e aterros, o que

obrigou que na reconstrução pombalina se recorresse a uma estacaria de madeira de pinho

para alicerçar os edifícios. Por outro lado a preservação da estacaria implica que exista

uma humidade constante na baixa, pois caso contrário a estacaria pombalina pode

Page 30: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

22

I lustração 19 - Fotomontagem da propos ta do projecto de execução.

I lustração 20 - Fotomontagem da propos ta do projecto de execução.

Page 31: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

23

corromper-se rapidamente, originando o provável colapso de numerosos edifícios. Por outro

lado as características geológicas dos terrenos de aluvião e dos respectivos aterros tornam

a zona do terreiro do Paço extraordinariamente susceptível a riscos sísmicos.

Estas circunstâncias ditaram o desenrolar do processo durante alguns anos por parte da

Câmara Municipal de Lisboa. Contudo e face à proximidade da abertura da Expo 98, a

Câmara Municipal de Lisboa decidiu avançar com a requalificação do Terreiro do Paço. Na

ocasião já se encontrava à frente da edilidade o Dr. João Soares e já existia um

conhecimento mais pormenorizado acerca das condicionantes politicas, tendo já decorrido

negociações entre a CM Lisboa e as entidades envolvidas, havendo já algum consenso

relativamente à mudança de serviços para a desafectação da zonas das arcadas oriental e

ocidental do Terreiro do Paço.

Em 1996 a Câmara Municipal de Lisboa adjudicou a realização do projecto de renovação

do Terreiro do Paço. Neste projecto seguir-se-ia as directrizes do concurso relativas à

qualificação da praça. As propostas saídas do concurso de ideias e que constituíam as

diferentes intervenções do projecto foram separadas de modo constituírem núcleos de

projecto autónomos. Foram constituídas equipas autónomas para os projectos do

Metropolitano, do Túnel Rodoviário e para as Infra estruturas Subterrâneas, ficando o

Projecto de Superfície, relativo a pavimentações, mobiliário Urbano e e o reordenamento

das funções a cargo dos Arquitectos Pedro Pacheco e José Adrião.

Ao contrário das expectativas iniciais da Câmara Municipal de Lisboa, cedo se verificou que

a execução do projecto de revitalização do Terreiro do Paço seria um processo longo, pois

às inúmeras condicionantes físicas e geológicas, existia ainda a necessidade de aplicar

soluções técnicas avançadas para consolidar os terrenos, manter a drenagem e nível de

humidade dos terrenos da baixa, para além de realizar os levantamentos arqueológicos

necessários. Era manifestamente impossível concluir a obra a tempo da inauguração da

Expo 98.

Contudo a proximidade da exposição universal em Lisboa em Maio de 1998, requeria que

se realizasse uma obra expedita que permitisse a requalificação do Terreiro do Paço num

curto espaço de tempo. Por esse motivo em 1997 foi adjudicada a realização do Projecto

Provisório de Requalificação da Placa Central e de mobiliário urbano.

Em simultâneo decorreriam os trabalhos das diferentes equipas projectistas para

concretizar os respectivos projectos de execução.

Page 32: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

24

.

I lustração 21 - Fotograf ia do tapume provisór io da obra.

I lustração 22 - Fotograf ia do tapume provisór io da obra.

Page 33: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

25

4.2- AS CONDICIONANTES DA REALIDADE.

A encomenda da Câmara Municipal de Lisboa para conceber e executar um pavimento

provisório para a placa central do Terreiro do Paço exigiu enorme reformulação das

intenções e da materialização do projecto inicial por parte dos Arquitectos José Adrião e

Pedro Pacheco.

Essa reformulação aconteceu a dois níveis, por um lado tiveram de rever as funções

programáticas do projecto, reduzindo-as ao mínimo indispensável, pois dado que se tratava

de uma intervenção provisória, o nível de investimento teria de ser reduzido. Por outro lado

a materialidade da solução apresentada inicialmente para a placa central do Terreiro do

Paço era resultado de uma reinterpretação das memórias do próprio sítio. Na intervenção

provisória tal intenção não seria realizável, pois não haveria disponibilidade para realizar a

escavação da placa central, e consequentemente não existiriam escombros disponíveis pra

realizar o pavimento proposto. O projecto teve então de ser reinventado.

Contudo, a oportunidade de intervir na placa central do Terreiro do Paço não deixava de

constituir uma excelente ocasião para os arquitectos José Adrião e Pedro Pacheco

poderem testar algumas das soluções que propunham. E nesse aspecto, conforme iremos

constatar, a limitação do campo de acção não deixou de constituir uma experiencia que em

muitos aspectos veio a reafirmar a qualidade e excelência das soluções propostas para o

Terreiro do Paço.

4.2- AS CONDICIONANTES PROGRAMÁTICAS.

Se a diminuição da área de intervenção acabou por limitar o âmbito global do projecto dos

Arquitectos Pedro Pacheco e José Adrião para o Terreiro do Paço, contudo não foi essa

diminuição que retirou eficácia ao projecto e obra sequente. Esta ausência de ineficácia

assentou na capacidade que o projecto conseguiu de reter aqueles que eram os conceitos

iniciais. Ou seja, a intenção de conciliar os diferentes conceitos presentes no Terreiro do

Paço. Por um lado a memória de Terreiro, lugar de contemplação com ocasionais

acontecimentos, por outro lado o conceito de Praça Real, neste caso do Comércio, lugar

urbano com forte sentido simbólico, manteve-se.

Page 34: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

26

I lustração 23 - Fotograf ia do tapume provisór io da obra.

I lustração 24 - Espaço dentro da obra que permitia aos c idadãos af eri rem do seu andamento.

Page 35: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

27

No projecto do pavimento provisório, os arquitectos José Adrião e Pedro Pacheco

mantiveram as mesmas orientações filosóficas e programáticas que tinham orientado o

projecto inicial: mantiveram a estereotomia e um cuidadoso desenho de pendentes que

reforçasse a orientação Sul/Norte que marca todo o desenho da baixa Pombalina, e

tentaram dotar o Terreiro do Paço de infra-estruturas que permitissem apoiar a realização

dos mais diversos acontecimentos no Terreiro e qualificaram o espaço com elementos de

mobiliário urbano para permitir o seu usufruto enquanto lugar de contemplação.

A grande introdução programática que o projecto de pavimentação provisória introduziu

face ao projecto a concurso foi o tratamento das questões relacionadas com a

permeabilidade do próprio Terreiro do Paço. Durante numerosas décadas o terreiro esteve

pavimentado com um pavimento asfáltico que impedia a infiltração de águas pluviais no

terreno natural, contribuindo deste modo para um degradar da situação das estacarias de

pinho da baixa pombalina. Foi sempre vontade da equipa projectista que esta situação

fosse alterada, tendo sido desenvolvido um cuidadoso estudo relativo às águas pluviais,

sendo proposta a utilização de uma pavimento poroso na realização da obra. Voltaremos a

abordar esta questão mais à frente, pois a sua solução matérica merece mais

aprofundamento.

Contudo e retirando lições acerca do espaço onde intervinham, Pedro Pacheco e José

Adrião, meditam acerca do significado libertar o Terreiro do Paço de um degradante parque

de estacionamento que lhe retirava a dignidade há inúmeras décadas. E o resultado dessa

reflexão é a proposta de desenhar um tapume provisório que permita dignificar o espaço

enquanto decorrem as obras. Tratou-se da primeira vez que em Lisboa o tapume de uma

obra foi desenhado como um todo que permitiu qualificar o espaço de intervenção durante

o decorrer da obra. Já tinham ocorrido experiencias onde vários artistas plásticos tinham

intervencionado tapumes, recordamos aqui as intervenções de Fernando Calhau e Pedro

Portugal nas obras do metro do Cais do Sodré, mas nessas intervenções, as intervenções

plásticas decorriam sobre o tapume, disfarçando-o.

No tapume que José Adrião e Pedro Pacheco desenharam para o Terreiro do Paço, o

próprio tapume é obra, e é obra que qualifica os espaços envolventes, fruto de um

cuidadoso desenho de estrutura metálica revestida a policarbonato alveolado, mas também

é obra que anuncia a intervenção principal, o revestimento em policarbonato alveolado

permite

Page 36: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

28

I lustração 25 - T estes de permeabil idade do pavimento provisório.

I lustração 26 - Aplicação do pavimento provisório, de a composição do pavimento, Enrocamento, br itas

de calibre médio, br itas de calibre f ino, betonilhas em cimento Port land com agregad os f inos( bago de

arroz) e camad a de acabam ento com betonilha de c imento branco, inertes calcareos e pigmentos.

Page 37: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

29

transparências e anuncia a transformação urbana que a obra realiza. Este desenho do

tapume leva ainda mais longe este anunciar, pois na sua fronteira nascente, é possível aos

cidadãos entrarem dentro da obra e aferirem o seu desenrolar. E esta transparência e

respeito que esta obra publica demonstra perante os cidadãos que vai servir e que a

custeiam, é caso inédito, per si constitui uma inovação significativa no panorama das obras

públicas e da arquitectura portuguesa. Mais, dentro da própria obra, existe um espaço onde

esse observação pode ser feita de um modo mais generoso, pois existia um deck que

permitia aos cidadãos ver a obra e ver amostras dos pavimentos propostos para o projecto

definitivo, bem como para o projecto provisório.

4.3- A SIGNIFICÂNCIA DA MATÉRIA

A inexistência do desaterro para a construção do parque de estacionamento subterrâneo

causou uma das grandes contrariedades que o projecto de pavimentação provisória teria de

resolver. Em grande medida o motor conceptual do projecto residia nessa reciclagem dos

escombros, uma reciclagem plena de significado. Construir com a memória da tragédia que

deu origem ao actual Terreiro do Paço era um conceito fortíssimo que alicerçava o projecto

do concurso. Por outro lado esse gesto acabava por se resumir a um conceito, pois com a

vontade de conciliar os conceitos de Terreiro e Praça, a metodologia proposta implicava

que os escombros reciclados fossem triturados, perdendo a memória da sua forma, e

aglutinados num betão pigmentado que remetesse para a textura da terra que marca o

nosso imaginário de terreiro.

Por outro lado esse inconveniente permitiu que no pavimento provisório do Terreiro do

Paço, fossem exploradas e investigadas situações que permitissem uma melhor resposta

ao projecto final.

Ou seja, aquilo que constituía um retrocesso na concretização da obra final, a

pavimentação provisória, foi encarado como um espaço de afinação e experimentação com

vista à obra final. Em parte a proposta de triturar os escombros como matéria-prima para o

pavimento proposto permitiu uma flexibilização da matéria do pavimento. Isto porque a

maioria dos escombros que encontramos no aterro do Terreiro do Paço é constituído por

antigas cantarias de pedra calcária.

À falta de pedra proveniente dos escombros, e dado que se tratava de uma pavimento

provisório, José Adrião e Pedro Pacheco, começaram a realizar experiencias com a

cimenteira Secil com vista a desenvolver um pavimento que respondesse de modo expedito

Page 38: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

30

I lustração 27 - Acabamento do pavimento, de notar a separação entre placas

real izado com c in tas de borracha.

I lustração 28 - T este de permeabi l idade.

Page 39: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

31

e económico aos seguintes requisitos: por um lado a sua textura teria de obter um resultado

próximo das experiências que haviam realizado anteriormente com pedra calcária triturada

e betão pigmentado; por outro lado, e dado que era importante garantir a permeabilidade do

terreno, o pavimento teria de ser altamente poroso e permeável. Por último, teriam de obter

resultados rápidos, pois o prazo de abertura do Terreiro do Paço ao público aproximava-se

rapidamente. Para aumentar o grau de dificuldade da situação, a Câmara Municipal de

Lisboa, através dos seus serviços técnicos, propunha a realização de um pavimento

impermeável.

Realizando várias experiencias em conjunto com a Secil, foi possível aos arquitectos,

apresentar um pavimento de betão poroso inovador. Tendo como base de partida os

pavimentos de betão grão de arroz, utilizado principalmente em cortes de ténis,

caracterizado pela sua excelente porosidade, a equipa projectista em conjunto com a Secil

desenvolveu uma nova versão deste pavimento. Em primeiro lugar importa dizer que estes

pavimentos dispunham habitualmente de uma cor nada apropriada ao Terreiro do Paço,

pois são de cor cinza escura. Esta cor é resultado da sua constituição habitual, onde o

pavimento é realizado sobre uma mistura de inertes de granito e cimento Portland, o que

lhes confere a cor cinza.

Contudo e depois de investigação intensa, a equipa projectistas propõem substituir o inerte

de granito, por inerte calcário, e o cimento Portland por cimento branco, o que originou uma

transfiguração cromática do pavimento.

Contudo a alvura do resultado ainda não correspondia ao pretendido, pelo que foram

realizadas mais algumas experiências, com a utilização de corantes para betão, o que

permitiu encontrar a textura e a cor pretendidas para o projecto, mantendo os elevados

níveis de permeabilidade que caracterizam os pavimentos de betão em grão de arroz.

Ao mesmo tempo, são afinados criteriosamente o desenho das pendentes e da

estereotomia da praça. Este desenho, em conjunto com o material escolhido para

pavimento, garante o encosto altimétrico da placa central ao terreno circundante de um

modo natural, sem obstáculos ou barreiras arquitectónicas, garantindo ao mesmo tempo

uma placa central com um escoamento muito eficaz de águas pluviais, sem ter de recorrer

a numerosos sistemas de escoamento.

Devido ao tamanho médio da estereotomia, cerca de 12 m2, as juntas das placas de betão

são complementadas por uma cinta de borracha, o que vai reforçar a sua presença visual

Page 40: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

32

I lustração 29 - P laca central terminada, já com bancos em calcareo.

I lustração 30 - O T erreiro enquanto local de meditação e recolhimento.

Page 41: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

33

e vai permitir os movimentos de contracção e expansão que as diferenças térmicas causam

ao pavimento, evitando deste modo a degradação do pavimento.

Não foram distribuídas as caixas de infra-estruturas retrácteis propostas, pois o erário

público assim o entendeu, o orçamento não chegava. O mobiliário urbano foi reduzido a

alguns bancos na placa central, sendo que estes obedeciam ao desenho proposto pelos

arquitectos. Estes bancos, monólitos de Lioz, eram construídos numa única peça, o que

realçava a dignidade e o carácter excepcional da praça. Simultaneamente, com o seu

desenho minimalista, reforçavam a intenção de transformar a praça em local de meditação

e recolhimento, onde os transeuntes podiam ter um momento de relaxamento observando o

Tejo.

4.4- O FINAL DO PROCESSO

Continuado o desenvolvimento programado do projecto, os arquitectos Pedro Pacheco e

José Adrião entregam o projecto de execução do projecto definitivo em 2000.

Supostamente, o pavimento provisório deveria servir a cidade até 2001, sendo que nessa

altura começariam as obras do pavimento definitivo. Contudo o desenvolvimento do

projecto coincidiu com o desenrolar das obras do túnel de metropolitano, obra que sofreu

significativas contrariedades, sendo a mais significativa o colapso parcial, seguido de

alagamento do troço do túnel do Terreiro do Paço.

Esta situação alertou para a dificuldade e um maior conhecimento da geologia precária

destes terrenos, tendo sido realizadas sondagens e consultados numerosos técnicos com

vista a realizar obras que permitissem a recuperação do túnel do metro. Recordamos que o

referido túnel apenas entrou em serviço em Dezembro de 2007, tendo a obra sido iniciada

em 1995…

Ao mesmo tempo verificou-se que o Torreão Poente do Terreiro do Paço necessitaria de

obras de consolidação dos terrenos, pois o assentamento que vinha sofrendo desde a sua

construção, cerca de 1,2m, começava a por em perigo a sua estabilidade estrutural.

Aliado a este facto, a Câmara municipal de Lisboa sofreu uma série de mudanças na sua

presidência; Janeiro 2002-Julho de 2004 Santana Lopes; Julho de 2004-Março 2005

Carmona Rodrigues; Março 2005- Outubro 2005 Santana Lopes; Outubro 2005-Agosto

Page 42: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

34

I lustração 31 - Acontec imentos no T er reiro Paço sobre a placa provisór ia.

I lustração 32 - Acontec imentos no T er reiro Paço sobre a placa provisór ia.

I lustração 33 - Acontec imentos no T er reiro Paço sobre a placa provisór ia.

Page 43: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

35

2007 Carmona Rodrigues. Devido a este período de forte rotatividade na C.M. Lisboa o

projecto do Terreiro do Paço esteve parado não se lhe conhecendo desenvolvimentos

significativos.

Finalmente em Agosto de 2007 a Câmara Municipal de Lisboa passa a ser presidida pelo

Dr. António Costa, sendo nessa altura constituída a Sociedade Frente Tejo que passa a

desenvolver os trabalhos necessários à reabilitação de parte da Baixa pombalina,

nomeadamente o Terreiro do Paço. Esta Sociedade cedo abandona os projectos

existentes, abandonando a ideia do túnel rodoviário e do parque de estacionamento

subterrâneo, e avançando com o projecto de infra-estruturas subterrâneas do Terreiro do

Paço, canalizando as águas residuais e pluviais para estações de tratamento.

Em simultâneo contratam o arquitecto Bruno Soares para a realização do projecto de

pavimentação do Terreiro do Paço. Este projecto adopta muita das atitudes programáticas

propostas pelo projecto dos arquitectos José Adrião e Pedro Pacheco, nomeadamente a

ocupação das arcadas laterais da praça como zona turística e de estar, mas não respeita o

contínuo descendente entre a Baixa pombalina e o Cais das Colunas. O desenho de

pavimentos também sofre fortes críticas, pois gera barreiras arquitectónicas com vigorosa

presença, desrespeita a geometria da praça ao introduzir um desenho curvo no seu

término, não complementa o pavimento das arcadas sobre as ruas, e assume um híper

desenho de pavimentos assente numa grelha diagonal bastante discutível.

5-CONCLUSÃO.

Convenhamos que a génese deste projecto foi sem sombra de dúvida um dos garantes da

sua própria qualidade. Um projecto sujeito a concurso público, julgado por elementos de

prestígio, no caso o júri do concurso foi presidido pelo arquitecto Nuno Teotónio Pereira,

obriga os concorrentes a um esforço de se ultrapassarem, e os resultados, por norma

nestas circunstâncias, acabam por revelar um grande nível de excelência.

Os projectos desenvolvidos pela dupla José Adrião e Pedro Pacheco para o Terreiro do

Paço atingiram uma elevadíssima eficiência na sua resposta a um dificílimo problema

arquitectónico e urbano. Essa eficiência assentou na capacidade de interpretarem as

memórias, os simbolismos e os usos na formulação, desenvolvendo uma resposta

alicerçada em conceitos fortes, num desenho cuidado e coerente com a sua significância

construtiva.

Page 44: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

36

I lustração 34 - O projecto do pavimento provisório dos arquitectos José Adr ião e Pedro Pacheco

após onze anos de ut i l ização intensa.

I lustração 35 - O projecto do arquitecto Bruno Soares .

Page 45: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

37

O tempo do desenvolvimento de um projecto desta natureza, com fases importantes de

experimentação e investigação, não se coaduna com os tempos da nossa administração

pública. Mas convenhamos que o principal motivo que impediu a concretização global deste

projecto, relacionou-se com o desconhecimento generalizado do verdadeiro estado e

natureza dos terrenos do Terreiro do Paço. A progressiva descoberta dos problemas que se

encobriam debaixo do solo, retirou o momento político para a execução do Projecto.

Contudo, e pela pequena amostra construída com que nos brindaram, o pavimento

provisório da placa central, deixaram uma marca indelével no modo como nos passámos a

relacionar com esse espaço. A utilização pelo público da sua visão para o Terreiro do Paço,

marcou e influenciou o modo como os cidadãos de Lisboa e os seus visitantes passaram a

percepcionar e a relacionar-se com este espaço simbólico da cidade.

A eficiência construtiva, um espaço construído para três anos de uso, acaba por sobreviver

sem mazelas ao longo de onze anos, mantendo a sua qualidade poética de sítio de

contemplação sobre o Tejo e a Cidade, ao mesmo tempo que sobre este pavimento

aconteciam numerosas actividades públicas, é facto notável que atesta sem margem de

dúvidas a qualidade das suas propostas.

Mesmo quando o projecto inicial é abandonado, e entregue sem concurso, logo sem

demonstração pública de mérito, a outra equipa projectista, grande parte das intenções

programáticas presentes no projecto dos arquitectos Pedro Pacheco e José Adrião são

adoptadas.

O projecto do Terreiro do Paço, e a obra provisória da placa central, conseguem atingir algo

que é raro. Em muitas obras e projectos encontramos conceitos válidos sem a respectiva

coerência construtiva, noutras obras encontramos uma coerência construtiva eficaz que se

ressente da falta de conceitos relevante. Neste projecto é notável a junção de ambos os

factores, a coerência conceptual e construtiva complementam-se num projecto eficaz e uno.

Page 46: Uma praça dentro do terreiro, os projectos de José Adrião e Pedro Pacheco par o Terreiro do Paço

38

Bibliografia:

Ana Cristina Leite (1994): „Lisbon in the 16th century, Urban modifications and

architecture“. Rassegna.

Ana Dias; Maria José Brochado undefined Selma Rebêlo; , e ; Liliana Soares (2008): LINHA

AZULTúnel do Terreiro do Paço/Santa Apolónia. Auditoria Lisboa: Tribunal de Contas

(Auditoria temática às derrapagens nas obras públicas).

José Fernandes Pereira (1995): „O Barroco do Séc. XVII“. Em: Do Barroco à

contemporaneidade. Paulo Pereira. Lisboa: Círculo de Leitores (História da Arte de

Portugal). — ISBN: 972-42-1184-4

Miguel Soromenho (1995): „Classicismo, italianismo e «estlilo chão». O ciclo Filipino.“.

Em: Do modo Gótico ao Maneirismo. Paulo Pereira. Lisboa: Círculo de Leitores (História da

Arte de Portugal). — ISBN: 972-42-1184-3

Pedro Pacheco e José Adrião (2001): „Calendarização e ficha técnica dos projecto

requalificação do Terreiro do Paço“.

Pedro Pacheco e José Adrião (1992): „Memória descritiva do concurso de ideias para

requalificação do Terreiro do Paço“.

Pedro Pacheco e José Adrião (2005a): „Os projectos para o Terreiro do Paço“.

Pedro Pacheco e José Adrião (1997): „Projecto de execução do projecto de pavimentação

provisóriaTerreiro do Paço“.

Pedro Pacheco e José Adrião (2000): „Projecto de execução do projecto requalificação do

Terreiro do Paço“.

Pedro Pacheco e José Adrião (2005b): „Terreiro do Paço, projecto de pavimento provisório“.

Walter Rossa (1994): „The 1755 Earthquake, A town under the sign of reason.“. Rassegna.

(Ana Cristina Leite, 1994)(Ana Dias, Maria José Brochado undefined Selma Rebêlo, , e ,

Liliana Soares, 2008)(José Fernandes Pereira, 1995)(Miguel Soromenho, 1995)(Pedro

Pacheco e José Adrião, 1992)(Pedro Pacheco e José Adrião, 1997)(Pedro Pacheco e José

Adrião, 2000)(Pedro Pacheco e José Adrião, 2001)(Pedro Pacheco e José Adrião,

2005b)(Pedro Pacheco e José Adrião, 2005a)(Walter Rossa, 1994)