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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
CDC – DA DEFESA DO CONSUMIDOR EM JUÍZO
Por: João Maria DEMETRIO de Araujo
Orientador
Prof. Jean Alves Almeida
Rio de Janeiro
2012
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
CDC – DA DEFESA DO CONSUMIDOR EM JUÍZO
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada como requisito parcial para obtenção do
grau de especialista em Direito Processual Civil.
Por: João Maria DEMETRIO de Araujo
3
AGRADECIMENTOS
Ao corpo docente do Instituto A Vez do
Mestre, aos amigos (próximos e aos
distantes, mas inesquecíveis) e aos
colegas de turma pelo “sprit de corps”
construído ao longo de todo período
letivo
4
DEDICATÓRIA
aos meus pais, Francisco e Conceição,
autores dos meus dias, minhas filhas
Ana Beatriz e Joana e a minha
incansável companheira Narda, grande
incentivadora dos meus projetos.
5
RESUMO
Este trabalho tem por objetivo destacar a referência relevante do Direito
do Consumidor através da Lei nº 8078/90 para a conscientização da população
em geral no tocante aos seus direitos de cidadão jurídicos importantes para o
bom desempenho do CDC.
O crescimento das demandas sociais exige não somente a igualdade
formal, mas a legitimidade destas mesmas demandas e para tanto o processo,
seu instrumento estatal, deve pautar-se pela promoção da igualdade entre as
partes em nome da ordem pública e da supremacia do interesse social.
Partindo-se da premissa de que as relações jurídicas são compostas por
um sujeito ativo (beneficiário da norma), um sujeito passivo ( aquele sobre o
qual incidem os deveres impostos pela norma), um objeto e um elemento
propulsor ( vínculo entre estes sujeitos), buscaremos analisar a relação de
consumo sob a óptica de cada um desses componentes: o consumidor, o
fornecedor, o produto ou serviço e o elemento propulsor, e as relações a que
se submetem estes atores no universo jurídico-processual.
A tutela processual das pretensões fundadas nas relações de consumo
tem seu arcabouço, principalmente no Título III da Lei nº8078 de 1990. Na
impossibilidade da supressão das lacunas do Código Brasileiro de Defesa do
Consumidor, aplicam-se as disposições do Código de Processo Civil, que atua
como norma geral subsidiária dos aspectos processuais com a finalidade de
suprir estas lacunas verificadas nos sistemas especiais.
6
METODOLOGIA
Desenvolveremos o presente trabalho principalmente através da
compilação da doutrina, mediante exposição do pensamento de juristas
renomados, como: Nelson Nery Junior, Ada Pellegrini Grinover, Kazuo
Watanabe (dentre outros também co-autores do anteprojeto do CDC), bem
como outros autores de renome, organizando suas opiniões de forma lógica e
buscando harmonizar pontos de vistas comuns como também posições
antagônicas.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 09
CAPÍTULO I 09
CAPÍTULO II 24
CAPÍTULO III 31
CONCLUSÃO 40
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 42
ÍNDICE 43
8
INTRODUÇÃO
Entende-se que a atividade estatal estabelece a efetividade dos
princípios e objetivos estabelecidos pelo legislador consumeiro, no que se
materializa no art. 4°, II da Lei n° 8078/90, que prevê entre os princípios da
Política Nacional das Relações de Consumo a ação governamental no sentido
de proteger efetivamente o consumidor.
O palco da justiça estatal está assentado de modo a corresponder à
confiança que nela deposita aquele que considera-se prejudicado, vítima de
lesão jurídica. A prestação jurisdicional neste caso, é quase sempre a última
esperança para a busca da solução das injustiças cometidas.
A tutela específica e as medidas antecipatórias e sub-rogatórias que a
completam não podem falhar, seja por omissão do órgão judicial, seja por uso
injustificado e, portanto, abusivo. Em todos os casos o que se desmerecerá,
perante o jurisdicionado e ainda no consenso social, será a própria justiça a
quem a ordem constitucional confiou a manutenção da ordem jurídica e a
realização da tutela a todos os direitos subjetivos violados ou ameaçados dos
consumidores. Perder-se a confiança na justiça é o último e pior mal que pode
assolar o Estado Democrático de Direito.
CAPÍTULO I
1.1 - CONSIDERAÇÕES INICIAIS
9
A escolha do título “a Defesa do Consumidor em Juízo”, inspirada
no Título III da Lei 8078/90 deve ser entendida em sentido amplo pois não
compreende unicamente a defesa processual strictu sensu com as exceções
opostas pelo consumidor, mas sim toda e qualquer atividade por este
desenvolvida em juízo a título individual ou através dos entes legitimados às
ações coletivas. Portanto, trataremos da tutela judiciária dos direitos e
interesses do consumidor.
A ilustre Professora Ada Pellegrini Grinover, membro da
comissão do Conselho Nacional de Defesa do Consumidor e uma das autoras
do projeto do CDC, destaca a preocupação com a efetividade do processo
destinado à proteção do consumidor e com a facilitação de seu acesso à
Justiça. Para a concretização destes conceitos, mister se fazia fortalecer a
posição do consumidor em juízo enfraquecida perante a parte contrária que
não é um litigante meramente eventual, isto sem ferir as garantias do devido
processo legal.
Para buscar este equilíbrio, a parte processual do Código atua
em duas frentes: nas ações coletivas e nas ações individuais. No campo das
ações individuais a lei opera através de diversas normas como aquelas que
contemplam a possibilidade de determinação da competência pelo domicílio do
consumidor/autor ( art. 101, I do CDC); a extensão subjetiva da coisa julgada
apenas para benefício das pretensões individuais ( art. 103, CDC); a nova
configuração da tutela específica nas ações que tenham por objeto o
cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer ( art.84, CDC); a vedação da
denunciação da lide e um novo tipo de chamamento ao processo, em
determinadas hipóteses ( arts.88 e 101, II do CDC). Outras regras situadas
fora do Título, completam este reforço de tutela, como por exemplo: a inversão
do ônus da prova em favor do consumidor ( art. 6°, VIII, CDC), a assistência
jurídica integral e gratuita ao consumidor carente ( art. 5°, I, CDC), a
implementação dos juizados especiais ( art. 5°, IV), com o habeas data em
favor do consumidor ( art. 43 §4°, CDC).
No campo das ações coletivas, amplia-se a tutela aos bens dos
consumidores indivisivelmente considerados por intermédio das categorias
10
dos interesses difusos e dos interesses coletivos (art. 81, I e II, CDC);
regula-se a litispendência ( art. 104, CDC).
Na visão de Kazuo Watenabe, o Código de Defesa do
Consumidor buscou disciplinar mais amiúde as demandas coletivas,
primeiramente porque é bastante recente a experiência jurídico-processual
neste campo através da Lei nº 7347/85 ( Lei de Ação Civil Pública). Ainda
de acordo com o ilustre doutrinador, o legislador percebeu que na solução
dos conflitos oriundas das relações geradas pela economia de massa
quando essencialmente de natureza coletiva, o processo deve operar
também como instrumento de mediação dos conflitos sociais. Entretanto, a
preocupação pelas demandas coletivas não afastam a importância das
ações individuais tanto que se observa a preocupação do legislador com a
importância da solução dos conflitos individuais quando ele sublinha no art.
5°, IV do CDC a relevância dos Juizados Especiais como um dos
instrumentos de execução da Política Nacional de Relações de Consumo.
1.2 - DA COMPETÊNCIA
De acordo com a redação do art. 93 do CDC, “ressalvada a
competência da Justiça Federal, é competente a Justiça local:
I – no foro do lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano, quando de âmbito
local; II-
no foro da Capital do Estado ou do Distrito Federal, para os danos de âmbito
nacional ou regional, aplicando-se as regras do CPC aos casos de
competência concorrente”.
A jurisdição é dividida em duas esferas: estadual e federal. À
Justiça Federal cabe o julgamento das causas em que a União participa ou, de
11
certa maneira, intervém no processo. Excluindo essa situação onde a matéria
de consumidor é excepcional, todas as demais causas cabem à Justiça Local.
Com efeito, embora em regra a competência para as ações civis
públicas e coletivas seja absoluta e venha determinada pelo local do dano, em
certos casos a Lei 8078/90 admite critérios de competência territorial ou
relativa para fixar a competência nas ações coletivas, qual seja o domicílio do
autor.
É também competente para a execução, nos termos do §2° do
art. 98 do Código de Defesa do Consumidor:
I – o juízo da liquidação da sentença ou da ação condenatória, no caso da
execução individual;
II- o juízo da ação condenatória quando coletiva a ação.
É notório o fato de a Justiça Estadual ter fórum em quase todas
as cidades brasileiras, por isso, se a lesão ao consumidor tiver caráter regional
envolvendo mais de uma cidade, a causa caberá ao fórum da capital. Se o
caráter da lesão for local, caberá ao fórum mais próximo.
1.3 - LEGITIMAÇÃO ATIVA
A legitimidade ativa para as ações individuais repousa na figura
do consumidor prejudicado; objetivando o ressarcimento de danos decorrentes
de produtos ou serviços.
O CDC, de forma indireta, confere também ao Ministério Público,
à União, aos Estados, Municípios e Distrito Federal, como também a
determinadas entidades e órgãos da Administração Pública direta ou indireta,
associações civis, legitimidade para a defesa coletiva dos interesses do
consumidor.
12
Trata-se aqui da legitimidade concorrente, visto que os
consumidores lesados podem individualmente demandar em nome próprio ou,
de acordo com a conveniência de cada um, se beneficiar com a decisão
coletiva que lhe for favorável ( art. 5°, LXXX, b da CF e art. 82 CDC). Hugo
Nigro Mazzilli ( O acesso à Justiça e ao MP, Justitia, SP, ano 51, 146; 68-78,
abr/jun 1989) refere-se aos requisitos de representatividade adequada e de
pertinência temática para o ajuizamento de ação coletiva. Exige-se para as
ações coletivas a pré-constituição há mais de um ano da associação
legitimada ( art.82, IV CDC).
Embora limitado às associações, o requisito da pré-constituição
poderá ser dispensado pelo juiz “ quando haja manifesto interesse social
evidenciado pela dimensão ou característica do dano ou pela relevância do
bem jurídico a ser protegido” (art.82 §1° CDC) .
Na verdade, os interesses de grupo tuteláveis através de ações
coletivas são os previstos no CDC no art.81 e seus incisos.
Os direitos difusos referem-se às pessoas indeterminadas que se
encontram ligadas por circunstâncias de fato. Já os direitos coletivos dizem
respeito a um grupo de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária
através de uma única relação jurídica. Os direitos individuais homogêneos, que
têm a mesma origem no tocante aos fatos geradores recomendam exatamente
por essa identidade, a defesa de todos a um só tempo.
1.4 - LITISCONSÓRCIO E ASSISTÊNCIA
O CDC admite, em face da legitimação concorrente, o
litisconsórcio ativo nas ações coletivas em defesa de interesses
metaindividuais ( difusos, coletivos e individuais homogêneos). Habilitando-se,
o consumidor necessita comprovar que é parte legítima para propor a ação
13
individual. Não comprovando a sua legitimidade (ordinária ou extraordinária)
para a propositura da ação individual com pedido conexo ao formulado na
ação coletiva, não poderá habilitar-se como litisconsorte. A doutrina refere-se
ao litisconsorte que ingressa posteriormente no processo como “assistente
litisconsorcial”.
O Ministério Público, intervindo como fiscal da lei conforme
dispõe o art. 92 do CDC, poderá aditar a inicial, desde que observados os
critérios estabelecidos no parágrafo único do art. 264 da lei processual civil.
Pode-se dizer então que são legitimados concorrentemente todos
os que se encontram indicados no art. 82, que podem propor em nome próprio
e no interesse das vítimas e de seus sucessores, ação civil coletiva de
responsabilidade pelos danos individualmente sofridos na letra do art. 92 do
CDC.
A lição da Professora Ada Pellegrini Grinover esclarece que “ os
legitimados à ação não vão a juízo em defesa de seus interesses institucionais,
mas sim exatamente para a proteção de direitos individuais, individualizados
nas vítimas dos danos”.
1.5 - SUCUMBÊNCIA
É cristalino o posicionamento do legislador quando, na análise do
art. 87 do CDC, estabelece que nas ações coletivas não há adiantamentos de
custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas pelos
colegitimados ativos.
Kazuo Watanabe em “Código Brasileiro de Defesa do
Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto”( vol.II, pg.121),
magistralmente nos ensina que “tratando-se de ações coletivas, o legislador
procurou facilitar ao máximo o acesso à justiça e a defesa dos direitos em
juízo, não se limitando o benefício à dispensa do adiantamento mas também
14
aos honorários do advogado, despesas e custas judiciais a menos que tenha a
associação autora agido com comprovada má-fé ( art., 17 e incisos do CDC)”.
Em relação à Lei nº 7347/85, houve significativo avanço pois a condenação por
litigância de má-fé encontra-se agora modificada pelo art. 116 do CDC. A
litigância de má-fé ocorre quando a associação ingressa com uma ação em
juízo tendo pelas circunstâncias peculiares do fato, certeza do engano, vício ou
da improbidade do pedido elaborado com a finalidade exclusiva de causar um
mal, um prejuízo ao consumidor.
1.6 - DA ATUAÇÃO DO JUIZ
O legislador, no art. 82 §1º do CDC admitiu a dispensa do
requisito de pré-constituição quando “haja manifesto interesse social
evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do
bem jurídico a ser protegido”. O requisito de pré-constituição foi estabelecido
com o intuito de por fim aos abusos em constituição de associações para a
propositura de certas ações coletivas. Semelhante perigo porém deixa de
existir quando “pela dimensão ou característica do dano ou pela relevância do
bem jurídico a ser protegido” consiga o magistrado detectar “manifesto
interesse social” na admissão em juízo de associação constituída há menos de
um ano pela sua representatividade e aptidão como órgão veiculador dos
interesses transindividuais.
Nelson Nery Jr. E Ada Pellegrini Grinover em “Comentários ao
Código Brasileiro de Defesa do Consumidor” destacam que o nosso sistema
de tutela jurisdicional dos interesses e direitos difusos difere do regime norte-
americano das “class action”. Lá, o juiz desempenha papel relevante, cabendo-
lhe a aferição a qualquer tempo da representatividade da associação em juízo.
O juiz brasileiro não tem o poder inquisitorial pleno do magistrado norte-
americano mas pode, se verificadas as circunstâncias apontadas na lei,
15
dispensar (ope legis) o requisito legal para que a associação possa ajuizar a
ação civil pública.
A lei conferiu ao juiz, ainda no plano do provimento jurisdicional,
o poder de adotar todas as providências legítimas e adequadas à tutela
específica das obrigações de fazer e não fazer sendo-lhe dado o poder de
impor multa diária independentemente de pedido do autor se a peculiaridade
do caso assim indicar e determinar medidas como: busca e apreensão,
remoção de coisas e pessoas, desfazimento de obra, impedimento de
atividade nociva, além de requisição de força policial, tudo de acordo com o
art. 84 do CDC.
O legislador deixa claro com a redação deste art. 84 que, na
obtenção da tutela específica da obrigação de fazer ou não fazer, o que
importa, mais do que a conduta do devedor, é o resultado prático protegido
pelo Direito. A medida coercitiva representada pela multa não tem caráter
reparatório. O dispositivo confere maior plasticidade ao processo,
principalmente quanto ao provimento nele reclamado, permitindo ao juiz, em
cada caso concreto, proceder ao adequado equilíbrio entre o direito e a
execução respectiva, procurando fazer com que esta última ocorra de forma
compatível e proporcional à peculiaridade de cada caso.
Na interpretação do Professor Kazuo Watanabe, o art. 84 do CDC
em quase nada difere do art. 461 do CPC (Código Brasileiro de Defesa do
Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto, vol.II, pg.116)
Valeu-se o legislador no art.461 do CPC da conjugação de vários
tipos de provimento, especialmente do mandamental e do executivo lato
sensu, para conferir a maior efetividade possível à tutela das obrigações de
fazer e não fazer.
Ao admitir a sub-rogação da obrigação de fazer ou não fazer, por
opção do titular do direito ou por ser impossível a tutela específica ou a
obtenção do resultado prático-jurídico equivalente ao do adimplemento ( art.
461 §1º do CPC), valeu-se o legislador do provimento condenatório que dá
nascimento a título executivo judicial e permite o acesso à execução forçada
através da ação autônoma de execução.
16
1.7 - DENUNCIAÇÃO DA LIDE
A legislação processual brasileira, vigente desde 1973 com a Lei
nº 5869, permite que o direito de regresso, desde que decorrente só do fato da
sucumbência numa ação, sem portanto a necessidade de um outro
fundamento, de uma outra causa de pedir, seja postulado na própria ação
originária, através da ação incidente de garantia – denunciação da lide ( art. 70
III do CPC).
A denunciação da lide, entretanto, foi vedada pelo legislador nas
relações de consumo, de acordo com o art.13, parágrafo único e art.88, para
evitar que a tutela jurídica processual dos consumidores pudesse ser retardada
e também porque, via de regra, a dedução desse incidente processual será
feita com a invocação de uma causa de pedir distinta. O objetivo também é
evitar que a intervenção de outros interessados no processo possa torná-lo
mais moroso, retardando a obtenção do direito do consumidor.
1.8 - DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA
Diante da complexidade das relações sociais e os reflexos que
estas relações trazem em seu bojo, o legislador pátrio buscou sempre
17
minimizar as reclamações de grupos e indivíduos e o CDC é um bom exemplo
disso.
O consumidor para satisfazer sua necessidade de consumo,
comparecia ao mercado e nesse momento, precisando de determinado
produto ou serviço, submetia-se às condições que lhe eram impostas, não
possuindo forças para contestar sobre eventuais prejuízos, fundamentalmente
devido a sua vulnerabilidade e/ou hipossuficiência.
Já em 1985 a Organização das Nações Unidas já vinha se
posicionando no sentido de afirmar ( resolução nº 29/248 de 10 de abril de
1985) que os consumidores se deparavam com desequilíbrios em termos
econômicos, nível educacional e poder aquisitivo, refletidos em sua
vulnerabilidade e hipossuficiência.
Tendo em vista esta hipossuficiência, alguns consumidores
desprovidos de recursos econômicos mostravam-se impossibilitados de
contratar advogados para a defesas de seus interesses, bem como pagar as
despesas processuais tendo em vista a franca superioridade dos
fornecedores, os quais geralmente possuem em seus estabelecimentos
comerciais, departamentos jurídicos organizados e de bom nível técnico, o que
influenciam na disparidade da situação de inferioridade do consumidor.
Esta alegada fragilidade técnica deverá, de acordo com o art.6º,
VIII do CDC, guardar verossimilhança e o magistrado dela será convencido
em conformidade com a causa pretendi invocada pelo consumidor para
declarar a inversão do ônus da prova. Não se destina apenas a verificação do
direito subjetivo material mas também e principalmente ao perigo de não
conseguir em decorrência de sua fragilidade já relatada, provar o fato
constitutivo de seu direito, acarretando sobretudo, a inviabilidade do acesso ao
Judiciário.
Tenha-se em conta que a verossimilhança é uma das condições para
o juiz inverta o mencionado ônus, com vistas à facilitação dos direitos do
consumidor, segundo, outrossim, as regras ordinárias de experiências.
Referido dispositivo, longe de ser uma grande novidade, está
intimamente ligado ao disposto pelo art. 335 do Código de Processo Civil, que
18
assim dispõe: “Em falta de normas jurídicas particulares, o juiz aplicará as
regras de experiência comum subministradas pela observação do que
ordinariamente acontece e ainda as regras de experiência técnica, ressalvado,
quanto a esta, o exame pericial.”
E a razão pela qual assim se dispõe no Código de Defesa do
Consumidor consiste na circunstância da vulnerabilidade do consumidor, que
não detém o mesmo grau de informação, inclusive técnica, e outros dados a
respeito dos produtos e serviços com que se defronta no mercado, que o
respectivo fornecedor detém, por certo.
Daí por que não se pode confundir vulnerabilidade, no sentido que
lhe empresta o inciso I do art.4º do Código com hipossuficiência.
Hipossuficiência como é sabido é conceito importado do Direito do Trabalho e
que deve ter aqui, o sentido de pobreza econômica. Então é fundamental que
não se confunda hipossuficiência “strictu sensu” de cunho eminentemente
econômico, com vulnerabilidade que é o apanágio de todo e qualquer
consumidor, em decorrência de sua desinformação técnica, fática ou
dificuldades de acesso aos meios de resolução dos conflitos de consumo. Da
mesma forma não se pode olvidar que para que alguém seja considerado
consumidor é mister, além da vulnerabilidade, que se demonstre ser ele o
destinatário final dos produtos que adquire ou dos serviços que se contrata.
1.9 - O CONTEÚDO DA SENTENÇA FAVORÁVEL
Conforme a lição da Professora Ada Pellegrini Grinover (Código
Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto,
vol.II, pag.152),” a pretensão processual do autor coletivo é de natureza
19
condenatória e assim será a sentença que acolher o pedido. Mas a
condenação será genérica, isto é, ilíquida”.
No campo do Direito Processual, isso significa que, antes das
liquidações e execuções individuais, o bem jurídico objeto de tutela ainda é
tratado de forma indivisível, aplicando-se a toda a coletividade, de maneira
uniforme, a sentença de procedência ou improcedência.
Vê-se então que o fato de a condenação ser genérica não
significa que a sentença não seja certa ou precisa. A certeza é condição
essencial do julgamento, devendo o comando da sentença estabelecer
claramente os direitos e obrigações, de modo que seja possível executá-la. E
essa certeza é respeitada, na medida em que a sentença condenatória
estabelece a obrigação de indenizar pelos danos causados, ficando os
destinatários e a extensão da reparação a serem apurados em liquidação da
sentença. A sentença genérica do art.95 é, portanto, certa e ilíquida.
Enquadra-se no disposto no art. 475-A do CPC, que estabelece que quando a
sentença não determinar o valor devido proceder-se-á à liquidação.
A referida sentença contém-se, ainda, nos limites do pedido –
que também será genérico, portanto ilíquido -, nenhuma exceção
representando às regras dos arts. 460 e 461 do CPC.
1.10 - EFETIVIDADADE DA TUTELA JURÍDICA
PROCESSUAL
De acordo com o Professor Kazuo Watanabe, uma das preocupações
marcantes do legislador foi a “ instrumentalidade substancial e maior
efetividade processual” (Código Brasileiro de Defesa do Consumidor
comentado pelos autores do anteprojeto, vol.II, pag.106). Na essência do art.
83, o legislador cuidou de tornar mais explícito ainda o princípio da efetiva e
20
adequada tutela jurídica processual de todos os direitos consagrados no
Código. Ainda de acordo com o eminente doutrinador, não se trata de mera
enunciação de um princípio vazio e inócuo, de um programa a ser posto em
prática por meio de outras normas legais. Cuida-se de norma auto aplicável, no
sentido de que dele se podem extrair desde logo várias consequências. A
primeira delas, certamente é a realização processual dos direitos na exata
conformidade do clássico princípio chiovendiano, segundo o qual o “processo
deve dar, quanto for possível praticamente, a quem tenha um direito, tudo
aquilo e somente aquilo que ele tenha direito de conseguir”. A segunda, que é
sectária da anterior, é a intepretação do sistema processual pátrio de modo a
dele retirar a conclusão de que nele existe, sempre, uma ação capaz de
propiciar, pela adequação de seu provimento, a tutela efetiva e completa de
todos os direitos dos consumidores. Uma outra consequência importante é o
encorajamento da linha doutrinária, que vem se empenhando no sentido da
mudança da visão do mundo, fundamentalmente economicística, impregnada
no sistema processual pátrio, que procura privilegiar o “ter” mais que o “ser”,
fazendo com que todos os direitos, inclusive os não patrimoniais,
principalmente os pertinentes à vida, à saúde, à integridade física e mental e à
personalidade (imagem, intimidade, honra etc.), tenham uma tutela processual
mais efetiva e adequada.
1.11 - LIQUIDAÇÃO E EXECUÇÃO DA SENTENÇA
Como é sabido, a sentença condenatória, que a lei considera
genérica, é certa, mas ilíquida. Necessário pois proceder à sua liquidação,
nos termos do disposto no Capítulo VI do Título I do Livro II do CPC, para a
posterior promoção da execução.
21
Através dos processos de liquidação, ocorrerá uma verdadeira
habilitação das vítimas e sucessores, capaz de transformar a condenação
pelos prejuízos globalmente causados do art. 95 do CDC em indenizações
pelos danos individualmente sofridos. Aliás, é a própria lei que, no art. 100,
utiliza a expressão habilitação dos interessados. Habilitação esta que, se não
guarda parentesco com a dos arts. 1055 e seguintes do CPC, tem similitude
com aquela que ocorre por intermédio das reclamações individuais de
cumprimento, após a sentença coletiva trabalhista.
1.12 - DO PRAZO PARA A LIQUIDAÇÃO
Na opinião de Ada Pellegrini Grinover (Código Brasileiro de
Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto, vol.II
pag.154), “o art. 97 não determina prazo preclusivo para o ajuizamento da
liquidação. O prazo de preclusão não pode ser inferior ao legalmente previsto
para a prescrição do direito ou da pretensão material. Por isso, o prazo de um
ano, previsto no art. 100 do CDC para que se possa proceder à eventual
apuração da “fluid recovery” não pode ser confundido com o prazo preclusivo
para a habilitação”.
“Em cada caso será o Direito Material que fixará o prazo
prescricional para o exercício da pretensão individualizada à reparação, que
ocorre exatamente por intermédio da habilitação no processo de liquidação.
Tratando-se de danos decorrentes do fato do produto ou do serviço, por
exemplo, encontrará aplicação à espécie o disposto no art. 27 do CDC, que
fixa o prazo prescricional em cinco anos, a partir do conhecimento do dano e
de sua autoria”.
22
1.13 - EXECUÇÃO INDIVIDUAL E COLETIVA
Ao realizar a liquidação da sentença condenatória, nos termos do
art. 97 do CDC, a lei contempla dois tipos de execução, no art. 98: a individual,
à qual continua ordinariamente legitimado o prejudicado; e a coletiva, em que
os entes e pessoas indicadas no art. 82 agem na qualidade de representantes
das vítimas ou sucessores.
A execução coletiva é necessariamente individualizada,
abrangendo o grupo de vítimas cujas indenizações já tiverem sido fixadas na
sentença de liquidação. À medida que novas sentenças surgirem, os entes ou
pessoas a que a lei atribui a representação das vítimas poderão proceder a
outras execuções coletivas.
1.14 - LEGITIMAÇÃO E REPRESENTAÇÃO PARA A
LIQUIDAÇÃO E EXECUÇÃO
O caput do art. 97, conforme comenta a Professora Ada
Pellegrini Grinover, (Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado
pelos autores do anteprojeto; vol.II, pg.157) estabelece poderem a liquidação
e execução da sentença condenatória ser promovidas quer pelas vítimas do
dano e seus sucessores, quer pelos entes e pessoas legitimadas às ações
coletivas pelo art. 82 do próprio CDC.
Tanto num como noutro caso, porém, a liquidação e a execução
serão necessariamente personalizadas e divisíveis.
Promovidas que forem pelas vítimas e seus sucessores, estes
estarão agindo na qualidade de legitimados ordinários.
23
Questiona ainda a ilustre Mestra “quando a liquidação e a
execução forem ajuizadas pelos entes e pessoas enumeradas no art. 82, tem-
se uma situação diferente daquela que ocorre com a legitimação extraordinária
à ação condenatória do art. 91, visto que lá, os legitimados agem no interesse
alheio, mas em nome próprio, sendo indeterminados os beneficiários da
condenação. Aqui, as pretensões à liquidação e execução da sentença serão
necessariamente individualizadas: o caso surge como representação, devendo
os entes e pessoas numeradas no art. 82 agirem em nome das vítimas ou
sucessores. Por isso, parece faltar ao M.P. a legitimação para liquidação e
execução individual, em que se trata da defesa de direitos individuais
disponíveis, exclusivamente (art.127 da C.F.)”
1.15 - COMPETÊNCIA DE JUÍZO PARA O PROCESSO
DE EXECUÇÃO
O art. 98, §2º, II do CDC para execução coletiva, estabelece a
competência do juízo da ação condenatória . A lei não faz nenhuma exceção à
regra geral do art. 575, II do CPC.
Na lição da Professora Ada Pellegrini Grinover, “se a execução
foi individual, o inciso I do §2º do disposto no CDC ligava-se ao disposto no
parágrafo único do art. 97, que foi vetado. Este determinava que o foro
competente para a liquidação da sentença poderia ser o do domicílio do
liquidante, daí derivando a regra ora sub examine, no sentido de o juízo
competente poder, correlatamente, ser o da liquidação da sentença ou da ação
condenatória”.
“O fato é que, mesmo vetado o parágrafo único do art. 97, o
inciso I do §2º do art. 98 permanece íntegro. A lei não pode conter disposições
inúteis. É preciso dar conteúdo ao dispositivo em tela e a única interpretação
24
capaz de fazê-lo parece ser aquela que, reportando-se ao disposto no art. 101,
I, e aplicando-o por analogia, extrai do sistema a regra da competência de foro
do domicílio do liquidante, ora vetada”(Código Brasileiro de Defesa do
Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto, vol.II, pag.161).
CAPÍTULO II
2.1 - ASPECTOS HISTÓRICO-EVOLUTIVOS DO
CONCEITO DE INTERESSES COLETIVOS E
INDIVIDUAIS
Para buscar a abordagem da questão do coletivo e individual,
exige-se por conseguinte uma prévia abordagem sobre a sua evolução
conceitual.
William Franklin Lira dos Santos em seu trabalho intitulado “O
fenômeno da coletivização do processo como alternativa de efetividade e
tempestividade de tutela jurisdicional”, destaca a citação de Ulpiano: “jus
publicum est quod ad statum rei romanae spectat, privatum quod ad
singulorum utilitatem: sunt enim quoedam publice utilia, quoedam privatim”.
Conclui-se daí a polarização entre indivíduo e Estado. E foi assim
que o Direito Positivo começou a ser organizado em dois ramos: o público e o
privado.
Com o aparecimento dos chamados corpos intermediários, houve a
fragmentação do poder estatal, visto que esses ditos “corpos intermediários”
passaram a desempenhar o papel de freio e contrapeso na divisão do poder.
25
Entretanto, na metade da chamada Idade Moderna, esse quadro
modificou-se, tomando os corpos intermediários novas posições: a Igreja
estabilizou-se nas atividade de ordem espiritual; o feudalismo declinou e
desapareceu; as chamadas corporações de ofício desapareceram, superadas
pelas revoluções comercial e industrial sendo substituídas pelos
conglomerados econômicos e empresas multinacional. Mas, ainda que
extremamente transformados ou enfraquecidos, os “corpos intermediários”
criaram o espírito corporativo (corporativismo) representado pelo anseio dos
indivíduos em participar do processo político-econômico. Nasce assim a
consciência do coletivo. Essa consciência representou assim um tertium
genus, podendo dizer que representou um novo interesse – o interesse
coletivo.
Ainda que diversos movimentos antagônicos ao florescimento do
interesse coletivo tenham aparecido, ele se manteve, atravessando o século e
fortalecendo-se cada vez mais, cabendo aqui citar: os partidos políticos, os
lobbies, os cartéis, os sindicatos e associações.
Mauro Cappelletti, também se reporta à insuficiência da tradicional
dicotomia público-privado, dizendo-a superada, pois, embora sofisticada, não é
suficiente para retratar a complexa realidade muito mais articulada que a
simplista dicotomia tradicional.
Hodiernamente, essa dicotomia entre público e privado é insuficiente.
O público, o privado e o coletivo esgotam sua significação a partir da síntese
dos interesses individuais neles agrupados. Um interesse é metaindividual
quando, além de ultrapassar a linha de atributividade individual, corresponde à
síntese dos valores predominantes num determinado segmento ou categoria
social, isto é, é interesse coletivo de um prupo homogêneo.
Deste modo, cumpre frisar que a divisão do Direito Positivo entre
público e privado não mais significa exclusividade, mas sim predominância.
2.2 - AÇÃO: CONCEITO E CONDIÇÕES
26
Impossível não falar em ações coletivas sem antes falar de ação
e seu conceito, bem como das condições (requisitos da ação).
Em todos os compêndios de Direito Processual temos por
definição que a ação é o direito subjetivo público, autônomo e abstrato, de
provocar o exercício da função jurisdicional sobre determinada lide ou
determinada relação ou situação jurídica sujeita pela lei à tutela jurisdicional do
Estado, esclarecendo-se que a ação é direito subjetivo porque mediante
determinadas condições, as chamadas condições da ação, o autor tem o poder
de exigir do Estado o exercício de determinada atividade, a atividade
jurisdicional; é um direito autônomo por se um direito diverso do direito
subjetivo material que o autor pretende ver reconhecido em juízo.
Conclui-se assim que o conteúdo do direito de ação é a providência
jurisdicional através da qual o juiz compõe a lide ou provê a relação jurídica de
direito material que lhe é apresentada pelos particulares. O direito de ação é o
direito a esta providência jurisdicional.
Junte-se a isto o fato de a ação não ser radicalmente abstrata no
sentido de ser totalmente incondicionada, mas a sua existência depende da
verificação de certas condições na relação material tal como apresentada pelo
autor ao juiz, pois somente na concorrência destas condições, que são
condições da ação, farão jus as partes a um pronunciamento judicial sobre o
mérito da causa.
Portanto, como o direito de ação não é condicionado, optou-se por
chamar as condições de requisitos da ação, sendo eles: legitimidade, interesse
e possibilidade jurídica do pedido.
2.3 - AS CATEGORIAS E SEUS INTERESSES
27
Nesse ponto, compreende-se que a polarização esmaecida entre o
público e o privado, fez florescer a percepção dos interesses em jogo. Surge
então, a distinção entre interesse público onde o titular é o Estado e o
interesse privado, onde o titular é o indivíduo. É fundamental que não se deve
criar uma ideia de classes distintas e intocável de interesses, porque o
interesse público pode alcançar interesses indisponíveis do indivíduo ou da
coletividade, interesses sociais e até alguns interesses difusos. Também
porque há uma categoria intermediária de interesses que não constituem nem
interesse público nem tipicamente privado. O interesse público pode ser
conceituado como interesse geral da coletividade ou o interesse da
coletividade como um todo.
O interesse individual é tido como aquele cuja fruição se esgota no
círculo de atuação de seu destinatário. Os interesses individuais homogêneos
apresentam-se uniformizados pela origem comum, na sua essência
permanecem individuais. Compreendem os integrantes determinados ou
determináveis de grupo, categoria ou classe de pessoas que compartilhem
prejuízos divisíveis, originários das mesmas circunstâncias de fato.
Nos interesses individuais homogêneos, os titulares são determinados
ou determináveis e o dano ou a responsabilidade se caracteriza por sua
extensão divisível ou individualmente variável. Como exemplo, pode-se falar
dos compradores de veículos produzidos com o mesmo defeito de série. Há
uma relação jurídica comum subjacente entre os consumidores, mas o que os
liga é antes o fato de que compraram carros do mesmo lote produzido com o
mesmo defeito.
Tanto os interesse individuais homogêneos como os difusos originam-
se de circunstâncias de fato comum. Entretanto, são indeterminados os
titulares de interesses difusos, e o objeto de seu interesse é indivisível,
enquanto nos interesses individuais homogêneos o dano ou a
responsabilidade se caracteriza por sua extensão divisível ou individualmente
variável.
28
Quanto aos interesses coletivos, maior habilidade se requer na
conceituação visto que se apresentam em três acepções: I) interesse pessoal
do grupo; II) interesse coletivo como soma de interesses individuais e III)
interesse coletivo como síntese de interesses individuais. Interessante
observar que apenas uma delas é efetivamente tida como interesse coletivo.
O interesse pessoal do grupo tem conotação bastante restrita,
chegando a não ser considerado interesse propriamente coletivo. Ele se refere
a interesse predominantemente ligado à pessoa jurídica que o compõe, ou
seja, a interesse direto e pessoal da entidade, v.g., o interesse de uma
cooperativa de agricultores em elevar o seu capital social.
O interesse coletivo como soma de interesses individuais diz respeito
apenas e tão-somete a uma forma pois refere-se a interesses individuais
exercidos em coletivo. A essência permanece individual.
O interesse coletivo em oposição ao interesse público e ao interesse
privado (individual), tornou-se hodiernamente, gênero do qual são espécies: o
interesse coletivo propriamente dito e o interesse difuso.. O interesse coletivo
propriamente dito aparece como uma entidade geral e abstrata que absorve e
ultrapassa a soma de interesses individuais de seus componentes.
No que tange aos interesses difusos, pode-se assim dizer que são
interesses ou direitos transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam
titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato.
Compreendem grupo menos determinados de pessoas, entre as quais inexiste
vínculo jurídico ou fático preciso. São como um conjunto de interesses
individuais, de pessoas indetermináveis, unidas por pontos conexos.
Na opinião de Ada Pellegrini Grinover, os interesses coletivos são tidos
como os interesses comuns a uma coletividade de pessoas e apenas a elas,
mas ainda repousando sobre um vínculo jurídico que os congrega.
2.4 - CARACTERÍSTICAS DOS INTERESSES
COLETIVOS E DIFUSOS
29
As características dos interesses coletivos são: a) a organização,
a fim de que os interesses ganhem a coesão e a identificação necessárias; b)
a afetação desses interesses a grupos determinados (ou ao menos
determináveis), que serão os seus portadores; c) um vínculo jurídico básico,
comum a todos os participantes, conferindo-lhes situação jurídica diferenciada.
Os interesses difusos poder ser: a) tão abrangentes que
coincidam com o interesse público (meio ambiente); b) menos abrangentes
que o interesse público, em conflito com o interesse da coletividade como um
todo; d) em conflito com o interesse do Estado, enquanto pessoa jurídica; e)
atinentes a grupos que mantêm conflitos entre si.
As notas caracterizadoras dos interesses difusos são: a) a
indeterminação dos sujeitos; b) a indivisibilidade do objeto; c) a intensa
conflituosidade; d) a duração efêmera, contingencial.
2.5 - TUTELA JURISDICIONAL DOS INTERESSES
COLETIVOS
É delicada e de extrema importância a questão da tutela
jurisdicional dos interesses coletivos.
Ao considerar os interesses coletivos como um meio de permitir
um acesso mais democrático à justiça, torna-se necessário que sejam fixados
alguns parâmetros a fim de permitir a concreta efetivação da tutela jurisdicional
coletiva.
30
O problema da legitimação é de grande importância para a
questão que se vai abordar.
Via de regra, o processo não pode ser aberto por quem não tenha
relação com o objeto deduzido em juízo. O requisito de legitimidade deve
existir, porém, as “actio popularis” ( ou coletivas) representam uma exceção.
A doutrina tradicional reconhece no titular ( ou qualquer que se diz
titular) da relação jurídica a pessoa legitimada a propor a ação.
O aparecimento das relações essencialmente coletivas ou de
grupo, chamadas difusas, torna necessária a superação dessa doutrina por
demais individualística. Não há dúvida de que aquele que vai a juízo em nome
de um grupo para a defesa do interesse coletivo, deve ser um bom
representante da classe, seja uma associação, o mesmo um indivíduo que
haja não somente pra si, como ator ou parte mas como representante de uma
coletividade. Porém, impõem-se ainda assim uma seleção de requisitos de
legitimidade, por exemplo, o reconhecimento da personalidade jurídica da
associação.
2.6 - A TUTELA ESPECÍFICA DAS OBRIGAÇÕES DE
FAZER E NÃO FAZER
O processo, como ferramenta que é para a obtenção da
prestação jurisdicional correspondente à realização do direito, somente alcança
êxito integral em seu intento quando for capaz de gerar na prática, resultados
idênticos aos que decorreriam do cumprimento natural e espontâneo das
normas jurídicas. Daí dizer-se que, proibida a autotutela, o processo ideal é o
que dispõe de mecanismos aptos a produzir ou a induzir a concretização do
direito mediante a entrega da prestação in natura. E quando isso ocorre, isto é,
31
quando se proporciona judicialmente ao titular do direito a obtenção de tudo
aquilo e exatamente aquilo que pretenda, há prestação de tutela jurisdicional
específica. Nesse ponto, assume especial relevância essa espécie de tutela –
entendida como o conjunto de remédios e providências tendente a
proporcionar àquele em cujo benefício se estabeleceu a obrigação, o preciso
resultado prático que seria atingido pelo adimplemento. Então, o próprio
conceito de tutela específica é praticamente coincidente com a ideia da
efetividade do processo e da utilidade das decisões, pois nela, por definição, a
atividade jurisdicional tende a proporcionar ao credor o exato resultado prático
atingível pelo adimplemento.
As inovações trazidas pela atual redação do art. 461 do Código
de Processo Civil, recebeu comentários de renomados processualistas, com
destaque para a Professora Ada Pellegrini Grinover:
“(...)descumprido o preceito da sentença ou de sua antecipação, passa-se à
mediadas executivas lato sensu no mesmo processo de conhecimento já
instaurado: se se tratar de prestação fungível, que possa ser prestada por
terceiro, a hipótese subsume-se ao disposto no art. 634 do CPC – inalterado –
que não deixa de configurar medida sub-rogatória enquadrável no §5º do
art.461, independente do processo separado de execução; nas demais
hipóteses, a multa se torna exigível e, sempre que possível, o juiz procederá
de imediato à tomada de providências sub-rogatórias exemplificadas no §5º do
art.461, para atingir o resultado equivalente ao adimplemento, sem
necessidade de execução, concluindo que o art. 84 do CDC e o art.461 do
CPC demandam uma profunda revisão da crítica à existência da sentença
mandamental”.
CAPÍTULO III
32
3.1 - INTERESSES METAINDIVIDUAIS
Doutrinadores do Direito anotam que o direito objetivo subdivide-
se em direito público e direito privado. Toda regra de direito enquadra-se
forçosamente num ou noutro ramo do direito.
Essa definição formulada pelos romanos refere-se a um direito
destinado a disciplinar os interesses gerais da coletividade ( publicum jus est
quod statum rei romanae spectat) e a um direito privado, que por seu turno, é o
conjunto de preceitos reguladores das relações dos indivíduos entre si
(privatum, quod ad singulorum utilitatem).
De uma forma mais elaborada, pode-se dizer que o interesse
público consiste na contraposição do interesse do Estado ao interesse do
indivíduo enquanto que o interesse privado contrapõe os indivíduos em seu
inter-relacionamento.
A distinção entre direito público e direito privado não resulta,
contudo, de linha separativa precisa: é sujeita a alterar-se no tempo e no
espaço, segundo as tendências sociais e políticas conforme o idealismo que
anime as nações.
Exatamente entre esses dois interesses ( público e privado) é que
se situam os denominados interesses metaindividuais ou coletivos. São
interesses que excedem o âmbito estritamente individual mas não chegam a
constituir interesse público. O Código de Defesa do Consumidor passou a
distinguí-los segundo sua origem:
a) se o que une interessados determináveis é a mesma situação de fato (
como por exemplo, os consumidores que adquirem produtos fabricantes em
série com defeito), temos interesses individuais homogêneos;
b) se o que une interessados determináveis é a circunstância de
compartilharem a mesma relação jurídica ( como os consorciados que sofrem
o mesmo aumento ilegal das prestações), temos interesses coletivos em
sentido estrito;
33
c) se o que une interessados indetermináveis é a mesma situação de fato ( por
exemplo, os que assistem pela televisão à mesma propaganda enganosa),
temos interesses difusos.
Os incisos I e II do parágrafo único do art.81 do Código de Defesa do
Consumidor estampam as definições de interesses ou direitos difusos e
interesses ou direitos coletivos, assim entendidos para efeitos deste Código: a)
“ os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas
indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato; b) “ os transindividuais de
natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas
ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica básica”.
Constatada assim a transindividualidade e a natureza indivisível do
objeto, estar-se-á diante de interesses essencialmente coletivos mas que
poderão ser classificados como difusos ou coletivos em sentido estrito.
3.2 - INTERESSES DIFUSOS
O CDC define como difusos os direitos transindividuais de
natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e legadas
por circunstância de fato ( art.81, parágrafo único, inciso I).
É difuso, portanto, o Direito caracterizado, no aspecto subjetivo,
pela indivisibilidade de seu objeto, que é compartilhado por um número
indeterminável de pessoas; no aspecto objetivo, pela ausência de relação
jurídica base entre esses titulares.
Os interesses difusos não pertencem a uma pessoa isoladamente,
muito menos a um grupo nitidamente delimitado de pessoas ( ao contrário do
que se dá em situações clássicas como a do condomínio ou a pluralidade de
credores numa única obrigação), mas a uma série indeterminada – e, ao
menos para efeitos práticos, de difícil ou impossível determinação, cujos
membros não se ligam necessariamente por vínculo jurídico definido. Pode
34
tratar-se, por exemplo, dos habitantes de determinada região, dos
consumidores de certo produto, das pessoas que viviam sob tais ou quais
condições socioeconômicas, ou que se sujeitam às consequências deste ou
daquele empreendimento público ou privado.
A demanda que tem por objetivo interesses difusos, como por
exemplo a relativa à propaganda enganosa veiculada em meios de
comunicação, busca em última análise, a tutela jurisdicional em benefício de
todos os consumidores atingidos, vez que, além de ser o bem jurídico tutelado
indivisível, é também incalculável o número de pessoas atingidas.
Assim, decidida a lide em favor dos consumidores lesados, a
sentença faz coisa julgada erga omnes, evitando-se com isso, a contradição de
julgados ( art. 103, I).
A correta distinção entre interesses difusos e interesses coletivos se
faz necessária na medida que as duas categorias estão submetidas a regime
diverso em termos de coisa julgada. A sentença proferida em relação aos
interesses difusos produzirá efeitos erga omnes, enquanto nas soluções dos
conflitos envolvendo interesses coletivos, a eficácia estará adstrita ao grupo,
categoria ou classe.
A diferenciação entre essas duas espécies (direitos difusos e
direitos coletivos) deverá levar em conta se as pessoas são ou não
determinadas e se estão ligadas por meras circunstâncias de fato ou por
vínculo jurídico relevante para o caso.
3.3 - INTERESSES COLETIVOS
Os direitos ou interesses coletivos são definidos como “os
transindividuais de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou
classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação
jurídica base” (art. 103, II do CDC)
35
Diferem, pois, dos interesses difusos, exatamente porque a
relação jurídica base naqueles é preexistente à lesão a interesses de grupos,
categorias ou classes de pessoas. Nos interesses difusos, ao revés, a relação
jurídica nasce em razão da lesão ou da ameaça de lesão.
Tanto os interesses coletivos quanto os interesses difusos são
indivisíveis, mas distinguem-se pela origem: os difusos supõem titulares
indetermináveis, ligados por circunstâncias de fato, enquanto os coletivos
dizem respeito a grupo, categoria ou classe de pessoas determinadas ou
indetermináveis, ligadas pela mesma relação jurídica básica.
Apesar de terem um ponto de contato já que reúnem grupo,
categoria ou classe de pessoas determináveis, os interesses coletivos e os
interesses individuais homogêneos também se distinguem de forma clara: “ só
os interesses individuais homogêneos são divisíveis e supõem origem de fato
comum”.
3.4 - INTERESSES INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS
Os direitos ou interesses individuais homogêneos são os
decorrentes de origem comum de que são titulares categorias, grupos ou
classes de pessoas determinadas ou determináveis, que sejam divisíveis e
decorram das mesmas circunstâncias de fato (art. 103, III do CDC)
Esses interesses são essencialmente individuais e apenas
acidentalmente coletivos. Para serem qualificados como homogêneos,
precisam envolver uma pluralidade de pessoas e decorrer de origem comum,
situação esta que não significa obrigatoriamente, uma unidade temporal e
factual.
A defesa coletiva de direitos individuais, além de atender ao
princípio de economia processual, facilita o acesso do cidadão comum à
Justiça, salvaguardando o princípio da igualdade da lei.
36
Pode-se concluir que, tanto os interesses individuais homogêneos
como os difusos originam-se de circunstâncias de fato comuns; entretanto são
indetermináveis os titulares de interesses difusos e o objeto de seu interesse é
indivisível. Já nos interesses individuais homogêneos, os titulares são
determinados ou determináveis e o dano ou a responsabilidade se
caracterizam por sua extensão divisível ou individualmente variável.
3.5 - MINISTÉRIO PÚBLICO
Nossa atual Constituição Federal, outorgada em outubro de 1988,
conferiu ao Ministério Público atribuições que o tornaram instrumento essencial
ao chamado Estado Democrático de Direito. Este perfil permite assim chamá-
lo de guardião da sociedade e de seus interesses constitucionalmente
assegurados, de forma que a amplitude do campo de atuação e a sua
independência são fatores diretamente proporcionais à consecução do bem-
comum, objetivo final do Estado. Assim, a definição das atribuições do MP de
forma a garantir o cumprimento de seu papel institucional e sua
instrumentalização devem ser privilegiadas pelo Estado, considerando em
tese, e por qualquer governo que se pretenda democrático.
Em seu art.127, a Constituição Federal define o Ministério
Público como instituição permanente, essencial à função jurisdicional do
Estado e elege como suas incumbências a defesa da ordem jurídica, do
regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Suas
funções institucionais estão enumeradas no art.129, cujo exame revela a
dimensão que o legislador constituinte pretendeu conferir ao Ministério
Público, pois, além de sua atuação no inquérito policial e no processo penal, o
parquet atuará como guardião dos direitos constitucionalmente assegurados,
inclusive quando atacados pelos próprios poderes públicos (inciso II); do
patrimônio público e social ( inciso III), da constitucionalidade dos atos
37
normativos ( inciso IV); dos direitos e interesses das populações indígenas (
inciso V); dos interesses difusos e coletivos entre outras atribuições.
Destaque-se a Lei Complementar 75 de 1993 que confere ao
parquet a competência para promover o inquérito civil e a ação civil pública
para a proteção de interesses individuais indisponíveis, homogêneos, sociais,
difusos e coletivos (art.6º, VII, d) e para propor ação civil coletiva para a defesa
de interesses individuais homogêneos ( art.6º, XII).
3.6 - A EXPERIÊNCIA DE OUTROS PAÍSES NA TUTELA
DE INTERESSES DIFUSOS
Os Estados Unidos da América foram os pioneiros na discussão
sobre a tutela jurisdicional dos interesses difusos e tal se deu em razão da
especial importância dada ao meio ambiente.
Na Constituição da República Portuguesa o direito de acesso à
Justiça e á efetividade da tutela jurisdicional é garantido pelo art.20, nº1, que
dispõe que “A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para
defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça
ser denegada por insuficiência de meios económicos.”
Na Constituição Espanhola o direito é garantido no art.24, nº1,
estatuindo que “Todas las personas tienen derecho a obtener la tutela efectiva
de los jueces y tribunales em el ejercicio de sus derechos e interesses
legítimos, sin que, em ningún caso, pueda producirse indefensión”.
No Brasil, o direito de acesso à Justiça e à efetividade da tutela
jurisdicional é garantido pela Constituição Federal em seu art.5º, XXXV.
O processo de origem romano-germânica que influenciou os
ordenamentos da Espanha, Portugal, França e Brasil, possui como tradição a
concepção do processo de duas partes, com uma rígida concepção para
38
determinar a legitimidade de partes. Até há pouco esse padrão atendia bem às
necessidades para o qual foi criado, quase inexistiam conflitos com contornos
sociais. O máximo que poderia ocorrer eram processos com número bem
elevado de litisconsortes, mas para esses casos o modelo tradicional ainda
servia.
A situação no entanto se complica de maneira acentuada à
medida que cada vez mais as relações de direito material tornam-se
complexas e passam a envolver uma quantidade enorme de pessoas. No
esquema tradicional, os sujeitos da relação jurídica de direito material,
normalmente, são os legitimados para estarem no processo na qualidade de
partes. Mas para a hipótese em que a lei prevê um fato envolvendo milhares
de pessoas, como utilizar-se do processo montado no princípio da dualidade
de partes, caso esses fato hipotético ocorra na realidade e se queira resolver a
situação litigiosa judicialmente?
A solução para tanto veio pela importação de um instituto
existente no direito norte-americano, a “class action”, na qual qualquer membro
da classe pode agir em nome próprio para vindicar direitos ou defender
interesses de todo o grupo.
No direito francês chamou-se esse tipo de ação de “action
collective”.
Outro instituto de grande importância que vem importado do direito
norte-americano, é o chamado “duty to mitigate the loss”. A sua noção é
simples. Como decorrência do princípio da boa-fé objetiva, deve o titular de um
direito (credor), sempre que possível, atuar para minimizar o âmbito da
extensão do dano, mitigando, assim, a gravidade da situação experimentada
pelo devedor. A boa-fé objetiva é um dos institutos que regula as relações
contratuais e que está previsto no art.4º, III do Código de Defesa do
Consumidor e no art.422 do Código Civil.
As ações coletivas que têm por objetivo a reparação dos danos
causados a pessoas indeterminadas podem carrear consigo algumas
dificuldades. É o que tem demonstrado a experiência norte-americana, quando
a sentença condena o réu a ressarcir o dano causado a centenas ou milhares
39
de membros da “class”, surgindo então problemas de identificação das
referidas pessoas; de distribuição entre elas da arrecadação; do uso do
eventual resíduo não reclamado pelos membros da coletividade.
A jurisprudência norte-americana criou então o remédio da “fluid
recovery” (reparação fluida), a ser eventualmente utilizado para fins diversos
dos ressarcitórios, mas conexos com os interesses da coletividade, por
exemplo, para fins gerais de tutela dos consumidores ou do ambiente.
A colocação desse tipo de ações coletivas no Código de Defesa do
Consumidor é diversa da que ocorre com as class actions norte-americanas,
em que o juiz desde logo quantifica a indenização pelos danos causados. No
sistema criado pelo CDC, o bem jurídico objeto de tutela ainda é indivisível e a
condenação é genérica, limitando-se a fixar a responsabilidade do réu e a
condená-lo a reparar os danos causados. Esses serão apurados e
quantificados em liquidação de sentença, movida por cada uma das vítimas
para a posterior execução e recebimento da importância correspondente à sua
reparação. A condenação faz-se, portanto, pelos danos causados, mas em
termos ilíquidos, e o pagamento a cada credor corresponderá exatamente aos
danos sofridos.
Todavia, o legislador brasileiro não descartou a hipótese de a
sentença condenatória não vir a ser objeto de liquidação pelas vítimas, ou
então de os interessados que se habilitarem serem em número incompatível
com a gravidade do dano. A hipótese é comum no campo das relações de
consumo, quando se trate de danos insignificantes em sua individualidade mas
ponderáveis no conjunto. Imagine-se, por exemplo, o caso de venda de
produto cujo peso ou quantidade não corresponda aos equivalente ao preço
cobrado. O dano globalmente causado pode ser considerável, mas de pouca
ou nenhuma importância o prejuízo por cada consumidor lesado. Foi para
casos como esses que o caput do art.100 do CDC previu a “fluid recovery”.
Observa-se, porém, que a indenização destinada ao Fundo
LACP, criado pela Lei nº 7347 de 24 de julho de l985, nos termos do parágrafo
único do art.100, é residual no sistema brasileiro, só podendo destinar-se ao
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referido Fundo se não houver habilitantes em número compatível com a
gravidade do dano.
Por isso mesmo, não é correto o pedido direto de recolhimento de
indenização ao Fundo, sendo censurável o acolhimento desse mesmo pedido:
o pedido indenizatório, em casos que tais, inscreve-se na tutela de interesses
individuais homogêneos, de modo que o recolhimento ao Fundo prejudica o
direito às indenizações pessoais dos consumidores que quiserem habilitar-se à
reparação individual.
Adequado, ao contrário, o pedido de indenização pessoal, por
lesão aos interesses individuais homogêneos, com indicação de sua reversão
ao Fundo, somente na hipótese de não haver habilitações dos interessados
ou, em as havendo, a da reversão pelo eventual resíduo não reclamado.
O parágrafo único do art.100 do CDC, destina o produto da
indenização pelo dano globalmente causado ao Fundo criado pela Lei nº
7347/85 (a lei denominada Ação Civil Pública). Mas a reversão ao Fundo só
pode ocorrer residualmente.
Exatamente como faz a jurisprudência norte-americana, a
indenização é, assim, utilizada para fins diversos dos reparatórios – que não
puderam ser atingidos no caso – mas com eles conexos, por intermédio da
proteção aos bens e valores da coletividade lesada.
CONCLUSÃO
Nós, operadores do Direito, encontramo-nos constantemente diante do
momento de revisão de antigas concepções que vigeram intocadas por longos
intervalos de tempo. A própria forma com que o Homem se relaciona com o
mundo sofre uma transformação. Não há realidades absolutas e objetivas a
serem descortinadas.
41
As demandas sociais crescem, pois não basta a igualdade formal.
Não basta a enunciação dos direitos como meras folhas de papel. O Direito
Moderno tem de ser ação, transformação, tem de encontrar legitimidade.
Uma olhada pela História nos demonstra como têm ocorrido esta
virada metodológica, e o jurista tem o seu papel a cumprir neste novo modelo
de produção do Direito que vai irrompendo do processo de crise do método
jurídico, de crise ética do Direito, de crise de legitimidade da tutela jurisdicional.
A noção de Direito tem sua base na noção de igualdade como nota
essencial. A mais rudimentar concepção de que se tenha de direito à luz da
cultura moderna jamais poderá prescindir de uma exaltação à igualdade como
princípio magno.
O dogma da certeza jurídica, agravado pela prodigalidade de nosso
processo em conceber recursos, somadas ambas as circunstâncias a uma
crescente demanda jurisdicional, cujas causas podem ser encontradas na
construção de novos direitos de fundo coletivo, na atividade estatal nem
sempre pautada pela legalidade e principalmente na consciência crescente na
população que busca justiça, fazem do processo uma caminhada penosa, cara
e prolongada. Nesse contexto o autor que tem razão sempre foi submetido à
necessidade de ter que aguardar o desfecho do processo de conhecimento e
depois o de embargos, quase sempre opostos e muitas vezes com propósitos
protelatórios e movidos pelo espírito emulativo, para ver satisfeito seu direito.
Assim, cremos que os princípios da isonomia e de efetividade da tutela
jurisdicional legitimam a antecipação dos efeitos da tutela enquanto medida
destinada a dar efetividade ao direito sem a delonga que tem marcado o nosso
processo e que é hoje o grande desafio a ser vencido.
42
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
ALVIM, Arruda, ALVIM, Tereza, ALVIM, Eduardo Arruda, SOUZA, James
Marins. Código de Defesa do Consumidor Anotado, São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1991.
CARVALHO, Jose Carlos Maldonado de. O Direito do Consumidor.
Fundamentos doutrinários e visão jurisprudencial. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2011.
Código Brasileiro de Defesa do Consumidor, comentado pelos autores do
anteprojeto. Rio de Janeiro: Forense, 2011.
DONIZETTI, Elpidio. Curso Didático de Direito Processual Civil, São Paulo,
Atlas 2011.
43
BIBLIOGRAFIA CITADA
1 - DOS SANTOS, William Franklim Lira. O fenômeno da coletivização do
processo como alternativa de efetividade e tempestividade de tutela
jurisdicional. (www.trt9.jus.br)
2 - MAZZILLI, Hugo Nigro. O acesso à Justiça e ao Ministério Público, Justitia.
São Paulo, ano 51, 146:68-78, abr/jun. 1989.
3 - Código Brasileiro de Defesa do Consumidor, comentado pelos autores do
anteprojeto. Rio de Janeiro: Forense, 2011.
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ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 02
AGRADECIMENTO 03
DEDICATÓRIA 04
RESUMO 05
METODOLOGIA 06
SUMÁRIO 07
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I
1.1 - Considerações iniciais 08
1.2 - Da competência 10
1.3 - Legitimação ativa 11
1.4 - Litisconsórcio e assistência 12
1.5 - Sucumbência 13
1.6 - Da atuação do Juiz 14
1.7 - Denunciação da lide 16
1.8 - Da inversão do ônus da prova 16
1.9 - O conteúdo da sentença favorável 18
1.10 - Efetividade da tutela jurídica processual 19
1.11 - Liquidação e execução da sentença 20
1.12 - Do prazo para liquidação 21
1.13 - Execução individual e coletiva 21
1.14 - Legitimação e representação para a liquidação
e execução 22
1.15 - Competência de juízo para o processo de execução 23
CAPÍTULO II
2.1 - Aspectos histórico-evolutivos do conceito de
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Interesses coletivos e individuais 24
2.2 - Ação: conceito e condições 25
2.3 - As categorias e seus interesses 26
2.4 -Características dos interesses coletivos e
difusos 28
2.5 -Tutela jurisdicional dos interesses
Coletivos 29
2.6 - A tutela específica das obrigações de
Fazer e não fazer 30
CAPÍTULO III
3.1 - Interesses metaindividuais 31
3.2 - Interesses difusos 33
3.3 - Interesses coletivos 34
3.4 - Interesses individuais homogêneos 35
3.5 - Ministério Público 35
3.6 - A experiência de outros países na tutela de
Interesses difusos 37
Conclusão 40
Bibliografia consultada 42
Bibliografia citada 42