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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “EDUCAÇÃO AMBIENTAL” AVM FACULDADE INTEGRADA O LIXO COMO FONTE DE RIQUEZA E POBREZA DO ATERRO SANITÁRIO DE JARDIM GRAMACHO – DUQUE DE CAXIAS Por: Wildson Barcellos de Carvalho Orientadora Profª Maria Esther de Araújo Rio de Janeiro 2012 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “EDUCAÇÃO AMBIENTAL”

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · Em seguida se pretende falar do lixo como fonte de riqueza e, ao mesmo tempo, segregação social, apontando possíveis caminhos

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “EDUCAÇÃO AMBIENTAL”

AVM FACULDADE INTEGRADA

O LIXO COMO FONTE DE RIQUEZA E POBREZA DO ATERRO SANITÁRIO

DE JARDIM GRAMACHO – DUQUE DE CAXIAS

Por: Wildson Barcellos de Carvalho

Orientadora

Profª Maria Esther de Araújo

Rio de Janeiro

2012

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “EDUCAÇÃO AMBIENTAL”

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AVM FACULDADE INTEGRADA

O LIXO COMO FONTE DE RIQUEZA E POBREZA DO ATERRO SANITÁRIO

DE JARDIM GRAMACHO – DUQUE DE CAXIAS

Apresentação de monografia à AVM Faculdade

Integrada como requisito parcial para obtenção do

grau de especialista em Educação Ambiental.

Por: Wildson Barcellos de Carvalho

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AGRADECIMENTOS

aos amigos, parentes, professores,

amigos e colegas de sala que

estiveram comigo em mais uma etapa

de minha qualificação.

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DEDICATÓRIA

Dedico aos meus pais (in memorian)

e à minha querida esposa.

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RESUMO

O presente trabalho toma como área de estudo o entorno do Aterro

Metropolitano do Rio de Janeiro que está localizado no bairro Jardim

Gramacho, município de Duque de Caxias e visa caracterizar os impactos

sócio-ambientais decorrentes do posicionamento de tal aterro. Antes de tal

caracterização, é feita uma contextualização da área de estudo e uma reflexão

de conceitos e concepções à luz do que aconteceu e acontece no entorno do

Aterro Controlado de Jardim Gramacho, tanto no que tange às questões do

lixão quanto às condições de vida de seus moradores. Em seguida se pretende

falar do lixo como fonte de riqueza e, ao mesmo tempo, segregação social,

apontando possíveis caminhos para a resolução das questões apresentadas.

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METODOLOGIA

Esse trabalho utilizará, como metodologia, a revisão bibliográfica dos

temas acima propostos e a análise dos mesmos, contidas em artigos,

dissertações de mestrado e teses de doutorado que versam sobre o tema, bem

como outras fontes bibliográficas que poderão embasar cientificamente o

estudo proposto.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO......................................................................................................

.........08

CAPÍTULO I - A HISTÓRIA DO MUNÍCÍPIO DE DUQUE DE

CAXIAS.................10

1.1. A história do Bairro Jardim

Gramacho...........................................................16

CAPÍTULO II - OS IMPACTOS SOCIAIS E AMBIENTAIS CAUSADOS PELO

ATERRO SANITÁRIO NO BAIRRO DE

GRAMACHO..............................................19

CAPÍTULO III – O LIXO COMO FONTE DE

RIQUEZA.............................................29

CONSIDERAÇÕES

FINAIS.........................................................................................33

REFERÊNCIAS

BIBLIOGRÁFICAS...........................................................................35

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como objetivo, analisar os impactos

ambientais e sociais causados pelo aterro sanitário na área urbana de Duque

de Caxias especificamente o bairro do Jardim Gramacho mostrando os

principais problemas e a situação vivida pelos catadores e trabalhadores que

vivem indiretamente do aterro sanitário.

Ao citar os impactos ambientais e sociais, especificamente do Jardim

Gramacho, remeto-me desde seu surgimento até os dias atuais, para explicar

o motivo principal que levou essa população a ir morar naquela região,

especificamente na área do entorno do aterro sanitário e mostrando porque

esta pequena população não se encaixa no projeto político que está

representado nas esferas de governos envolvidas nesse processo.

Neste período, a migração para esta área aconteceu de forma

acentuada para o Jardim Gramacho, formando uma pequena população

dependente exclusivamente do lixo. Esse local não possui qualquer tipo de

saneamento básico, inclusive de água potável, estando exposta a qualquer tipo

de doença, em consequência dos problemas citados acima.

A constatação das precárias condições sociais dos trabalhadores

envolvidos direta e indiretamente com a catação e a venda de material

reciclável, motivou-me a pesquisar sobre as condições em que vivem essas

pessoas.

Através deste trabalho serão mostrados os principais problemas

daquela região e como os trabalhadores conseguiam se virar ao chegar ao

aterro sanitário e se deparar com os preconceitos, doenças e a falta de

moradia.

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O trabalho apresentou metodologia descritiva, tendo como base

pesquisa bibliográfica para atingir os objetivos propostos, pois foi o método

mais adequado para conhecer as questões que foram investigadas.

A pesquisa bibliográfica foi feita através de consultas em livros

previamente selecionados, pesquisas em sites e revistas, com artigos

referentes ao trabalho.

No primeiro capitulo falarei sobre a história do município de Duque de

Caxias, relatando fatos ocorridos desde a constituição da cidade, mostrando

como ocorreram as mudanças na economia e as transformações que

ocorreram neste período.

No segundo capítulo, apresentarei dados a respeito do bairro do

Jardim Gramacho, fazendo uma descrição estatística, apresentando dados

atualizados sobre aquela região.

No terceiro capítulo, será descrito o contexto atual do bairro Jardim

Gramacho, destacando os impactos sociais e ambientais deixados como

herança para a população daquele bairro.

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CAPITULO I

A HISTÓRIA DO MUNICÍPIO DE DUQUE DE CAXIAS

Segundo Almeida & Braz (2010) Duque de Caxias é uma cidade de

migrantes. De gerações de migrantes que se sucederam desde as primeiras

décadas do século XX. Os homens e mulheres que chegavam à região, foram

lutadores árduos posto que, durante décadas, lutaram penosamente em um

esforço continuo de construção de suas vidas, de seus projetos, aspirações e

contra a marginalização do que se convencionou chamar a perigosa “Baixada

Fluminense”. Tais moradores transformaram, ao longo do século, um pobre,

evitado e pequeno aglomerado urbano em um parque industrial, destaque

econômico do Estado e do país, de “Merity das febres” a Duque de Caxias,

pólo petroquímico e industrial.

Duque de Caxias é um município que integra a Região Metropolitana do

Rio de Janeiro. Está situado na Baixada Fluminense, definição esta originária

dos estudos geográficos que corresponde, de acordo com pesquisa feita por

Almeida & Braz (2010) ao conjunto de municípios formados por Nova Iguaçu,

Belford Roxo, Queimados, Mesquita e Japeri. Vale ressaltar que o território que

hoje corresponde à Baixada Fluminense abrigou, no século XVI, a porção do

Recôncavo da Guanabara situada ao norte da Vila São Sebastião do Rio de

Janeiro, conhecida na época com Iguassu.

Segundo Almeida & Braz (2010) estas terras eram cobertas pela Mata

Atlântica e por uma vegetação de várzeas e mangues. Seu relevo formado por

planícies mais amplas a leste, ganha altitude na medida em que acompanha o

curso dos rios em direção às suas nascentes a oeste e a noroeste. Inúmeras

elevações, morros e colinas pontilham o seu território, tornando-o mais

compacto ao se aproximarem das encostas da Serra do Mar e do maciço

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Mendanha-Gericinó. Sua complexa rede hidrográfica é formada pelas bacias

dos rios Meriti e Sarapuí e mais ao norte pelo Estrela-Inhomirim, nascendo nas

altitudes que margeiam a região e corre em baixa declividade pela planície, o

que dificulta o seu escoamento e acaba por formar e alimentar inúmeros brejos

e pântanos. Nesta região viviam, quando da chegada dos portugueses –

aproximadamente em 1554 – o grupo conhecido como tupinambá e, antes

deles, as populações nativas sambaquieiras. Os colonizadores portugueses,

estimulados a ocupar rapidamente a região em função da concorrência

francesa instalada – entre 1555 e 1567 – por conta da luta pela posse da Baía

de Guanabara, que resultou na fundação da cidade de São Sebastião do Rio

de Janeiro, implantaram um sistema de ocupação baseado na concessão de

extensos lotes de terra que seriam destinados ao cultivo, as chamadas

Sesmarias. De todas extensões doadas, vale ressaltar a Fazenda Iguassu

(hoje, Nova Iguaçu), doada à Cristovão Monteiro cuja esposa, Marquesa

Ferreira doou, após o falecimento de seu marido, parte das terras que lhe

pertencia ao Mosteiro de São Bento do Rio de Janeiro que, aos poucos,

possuiria as terras que formaria a Fazenda São Bento.

Segundo Almeida & Braz (2010) ao longo dos séculos XVI e XVII, a

fazenda produziu açúcar, melaço e aguardente. Ao longo do século XVIII,

especializou na produção de farinha, aguardente, feijão e extração de madeira

que abasteceria o cada vez mais significativo mercado consumidor da cidade

de São Sebastião do Rio de Janeiro. Neste sentido, pode-se dizer que a

região estabeleceu-se como uma área de produção agrícola voltada para o

abastecimento da urbe carioca e da Capitania e que, mesmo sem abandonar

sua produção de açúcar voltada para a exportação, não alcançou a mesma

relevância de outras áreas produtivas da Colônia.

Segundo Bezerra (2004), do ponto de vista administrativo, Iguassu tinha

sua área dividida em circunscrições eclesiásticas como freguesias. Em outras

palavras, a igreja matriz assumia a responsabilidade jurídica e religiosa,

administrando as capelas secundárias, as então chamadas freguesias. Entre

os séculos XVII e XVIII, foram criadas na região seis freguesias, sendo que

quatro delas (Pilar, Meriti, Jacutinga e parte ocidental de Estrela)

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corresponderiam, de uma forma um tanto imprecisa, às fronteiras do atual

município de Duque de Caxias. No século XIX, este conjunto de freguesias deu

origem a duas grandes Vilas, a de Iguassu e a de Estrela, atestando a pujança

econômica alcançada pela região neste período.

Segundo Almeida & Braz (2010) a partir do século XVIII, a crescente

produção aurífera das Minas Gerais redefiniu a lógica administrativa

portuguesa, implicando na mudança da capital de Salvador para o Rio de

Janeiro, ocorrida em 1763. O porto carioca tornou-se fundamental para o

escoamento do precioso metal com segurança para a metrópole, permitindo

melhor controle e fiscalização. Além disso, o abastecimento desta região cada

vez mais povoada tornou estratégica esta aproximação. Vale ressaltar que o

“ouro das Minas Gerais”, descoberto no momento de crise da lavoura

açucareira e o café do Vale do Paraíba Fluminense, que representou cerca de

setenta por cento de toda a economia brasileira nesta época (grifo meu). Em

função da necessidade de tal transporte, rotas terrestres e fluviais, até então

esquecidas pelo poder público, foram revitalizadas e novos caminhos foram

abertos: Os rios, que não faltavam na região – alem de serem integrados à

Baía de Guanabara – faziam do local um ponto de união entre esta e os

caminhos que subiam à serra em direção ao interior. O Porto da Estrela foi o

marco mais importante desse período. À sua volta, cresceu um arraial que, no

século XIX, foi transformado em município.

Após a decadência da mineração, a região manteve-se ainda como

ponto de descanso, de abastecimento de tropeiros, de transbordo e de trânsito

de mercadorias. Até o século XIX, o progresso local foi notável. Entretanto, a

impiedosa devastação das matas trouxe, como resultado, a obstrução dos rios

e conseqüente transbordamento, o que favoreceu a formação de pântanos.

Das águas paradas e poluídas, surgiram mosquitos transmissores de febres.

Segundo documentos pesquisados na Câmara Municipal de Duque de

Caxias, muitos moradores, após tal decadência, fugiram do local que ficou,

praticamente, inabitável. As terras, antes salubres e férteis, cobriram-se de

vegetação própria dos mangues.

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Além de toda a devastação ambiental apresentada acima, com a

Abolição da Escravatura, em 1888, a Baixada Fluminense sofreu ainda mais

em função do abandono das obras de saneamento, o que afetou sobremaneira

à saúde da população, fazendo com que a mesma fosse acometida de várias

enfermidades, como a Malária e a Doença de Chagas.

Segundo Torres (2004) os primeiros anos da República foram

trabalhados no sentido de tomar medidas que solucionassem o problema do

saneamento. No entanto, tais ações não chegaram a produzir os efeitos

esperados em função da descontinuidade dos programas e à precariedade dos

recursos materiais. Foi no governo de Nilo Peçanha que se esboçou uma ação

mais consistente em relação ao saneamento da Baixada que contou com a

chegada da água encanada, em 1916, na atual Praça do Pacificador. Mas

somente no governo de Getúlio Vargas, que foi criada a Comissão de

Saneamento da Baixada Fluminense. Até 1945, mais de seis mil quilômetros

de rios tinham sido limpos, retirando dos seus leitos quarenta e cinco mil

metros cúbicos de terra. Com este trabalho, os rios deixaram de ser criadouros

de mosquito, diminuindo em muito o número de doenças na região. Segundo

Torres (2004) outros dois grandes acontecimentos significaram muito para a

região: a instalação da primeira rede elétrica, em 1924 e a fundação da Escola

Proletária Meriti, a primeira no Brasil a aplicar os métodos da Escola Nova

trazidos por Anísio Teixeira.

Ainda segundo o autor, o progresso e o grande crescimento pelo qual

passava Meriti levou o deputado federal Manuel Reis a propor a criação do

Distrito de Caxias. Assim, em quatorze de março de 1931, através do ato do

interventor Plínio de Castro Casado, foi criado, pelo decreto estadual número

2.559, o Distrito de Caxias, com sede na antiga Estação de Meriti, pertencente

ao então município de Nova Iguaçu. Desde então, o Distrito de Caxias não

parou de crescer.

Vale salientar, que embora o progresso estivesse “batendo velozmente

à porta” – 1940 prenunciou a industrialização que viria mais tarde com a

instalação da Fábrica Nacional de Motores no mesmo ano e a Companhia

União Manufatura de Tecidos, em 1949 – a população já ultrapassava a casa

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dos cem mil habitantes e “Caxias” não dispunha da maioria dos serviços que o

poder público deve prestar. O Governo Municipal instalado em Nova Iguaçu se

mostrava impotente para satisfazer as menores necessidades do Distrito.

Desta forma, a emancipação política ia, aos poucos, seduzindo a elite local.

Tal processo de emancipação da cidade esteve relacionado à formação de um

grupo que organizou a União Popular Caxiense (UPC), grupo este formado por

jornalistas, médicos e políticos locais. Assim, em 1940, foi criada a comissão

pró-emancipação composta, entre outros, por Silvio Goulart, Rufino Gomes

Júnior, Amadeu Lanzeloti, Joaquim Batista Linhares, José Basílio da Silva,

Carlos Fraga e Antônio Moreira. Este grupo encaminhou um memorial ao

então Interventor Federal do Rio de Janeiro, Ernani do Amaral Peixoto,

expondo as possibilidades do município de Caxias emancipar-se de Nova

Iguaçu. A reação do governo foi imediata e os manifestantes foram presos,

ficando adiada, assim, o sonho da emancipação.

No entanto, três anos mais tarde, mais precisamente em trinta e um de

dezembro de 1943, através do Decreto-Lei 1.055, Caxias foi elevada à

categoria de município, recebendo o nome de Duque de Caxias A cidade deve

seu nome ao patrono do exército brasileiro, Luís Alves de Lima e Silva, o

Duque de Caxias, também chamado de Pacificador e nascido na região em

1803. Já a Comarca de Duque de Caxias foi criada pelo Decreto-Lei nº 1.056.

Com a emancipação, o município recebeu grande incentivo em sua

economia. Várias pessoas, oriundas principalmente da Região Nordeste do

Brasil, chegavam ao Rio de Janeiro em busca de trabalho e estabeleciam

residência em Duque de Caxias.

Segundo Almeida & Braz (2010) o poder executivo foi instalado

oficialmente em 1º de janeiro de 1944, quando o interventor federal Ernani do

Amaral Peixoto designou, para responder pelo expediente da prefeitura, o

contabilista Homero Lara. Outras nove pessoas foram designadas

posteriormente para o mesmo cargo.

O primeiro prefeito eleito foi Gastão Glicério de Gouveia Reis, que

administrou a cidade de setembro de 1947 a dezembro de 1950. Depois dele

vieram, também pelo voto direto, respectivamente, Braulino de Matos Reis,

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Francisco Correa, Adolpho David, Joaquim Tenório Cavalcante e Moacir

Rodrigues do Carmo.

Segundo Almeida & Braz (2010) as eleições foram interrompidas com a

decretação de Duque de Caxias como Área de Segurança Nacional pelo

regime militar em 1971, tendo tomado posse o presidente da câmara,

Francisco Estácio da Silva. A partir daí, muito contra a vontade das lideranças

políticas e populares da região, foram eleitos prefeitos, pela ditadura militar, o

general Carlos Marciano de Medeiros, os coronéis Renato Moreira da Fonseca,

Américo Gomes de Barros Filho e o ex-deputado Hydekel de Freitas Lima.

O município conquistou, depois de muita movimentação de lideranças

políticas, empresariais, sindicais e comunitárias, a sua autonomia em 1985,

tendo sido eleitos, daquele ano em diante, Juberlan de Oliveira, Hydekel de

Freitas Lima (em 1990, deixou o cargo para assumir uma cadeira no Senado

Federal), José Carlos Lacerda (vice-prefeito de Hydekel, tomou posse após

sua renúncia), Moacyr Rodrigues do Carmo, José Camilo Zito dos Santos Filho

e Washington Reis de Oliveira, sendo que o penúltimo retornou à prefeitura em

2009.

Atualmente o município possui uma população estimada em oitocentos

e cinquenta e cinco mil e quarenta e seis habitantes, segundo censo realizado

pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2010). O município

limita-se

ao norte com Petrópolis e Miguel Pereira; ao leste, com a Baía da Guanabara

e Magé; ao sul, com a cidade do Rio de Janeiro e, a oeste, com São João de

Meriti, Belford Roxo e Nova Iguaçu. O município possui clima quente, porém os

terceiro e quarto distritos (Imbariê e Xerém) têm temperatura amena em virtude

da área verde e da proximidade da Serra dos Órgãos.

Segundo dados da Prefeitura (2012), o município tem um arrecadação

anual na ordem de R$ 20,125 bilhões (CIDE/2006). O município concentra a

maior parte das indústrias e serviços especializados do mercado: são um mil,

noventos e oitenta e quatro indústrias e dezenove mil, quinhentas e sessenta e

dois estabelecimentos comerciais, de acordo com a Secretaria Municipal de

Fazenda (2009).

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No que tange às ações relacionadas ao meio ambiente, a Prefeitura

assinala como importante a assinatura do protocolo de intenções referente ao

Plano Regional de Gestão de Resíduos da Construção Civil, um dos problemas

enfrentados pelos seis municípios da Baixada Fluminense. Pelo Consórcio

Intermunicipal oficializado, os municípios de Duque de Caxias, Belford Roxo,

Mesquita, Nilópolis, Nova Iguaçu e São João de Meriti passarão a ter

legislação própria a partir da Lei Federal de Saneamento Básico (Lei

11.445/2077) que definiu as responsabilidades públicas.

Pelo plano, os municípios assumirão a competência de gestão dos

resíduos sólidos, inicialmente de construção civil e volumoso. Os materiais

reciclados poderão ser usados pelos governos para o barateamento de obras

públicas. Pelo A rede de captação terá cento e sete ecopontos que receberão

madeira e podas, concreto e alvenaria e materiais volumosos e leves.

Separados, os materiais serão transportados para as áreas de triagem e

transbordo para reaproveitamento. O plano terá, como parceiros, carroceiros e

empresas coletoras, construtores, associações de moradores e organizações

de bairros que orientarão à população na disposição dos resíduos em áreas

adequadas e as punições previstas na legislação de casa município.

Seguir-se-á este trabalho com a apresentação do Bairro Jardim

Gramacho, berço do Aterro Sanitário, tema deste trabalho.

1.1 – A HISTÓRIA DO BAIRRO JARDIM GRAMACHO

Segundo Oliveira (2007) Jardim Gramacho é sub-bairro do bairro de

Gramacho, localizado no município de Duque de Caxias. De acordo com o

IBASE (2011) tal sub-bairro possui grandes bolsões de miséria e demandas de

infra-estrutura urbana necessárias à sobrevivência da maior parte de seus

moradores. Boa parte deste sub-bairro constitui-se de ocupações recentes e,

desta forma, ainda não constam nos mapas oficiais da prefeitura.

Jardim Gramacho é dividido em localidades, algumas mais antigas como

COHAB, Morro do Cruzeiro, Morro da Placa e outras mais recentes como

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Chatuba, a Favela do Esqueleto, o Beco do Saci, a Cidade de Deus, a Avenida

Rui Barbosa, o Parque Planetário e a Comunidade da Paz ou Maruim. Aquelas

possuem infra-estrutura urbana; estas, no entanto, sofrem com a precariedade

de tal infra-estrutura, isto porque já foram concebidas em situações nada

adequadas, como a ocupação desordenada, por exemplo, onde algumas

casas ou barracos são construídas em cima do manguezal, através de

loteamentos realizados pelos políticos locais (RIBEIRO, 2011).

Ainda de acordo com o IBASE (2011) tais localidades surgiram através

da ocupação desordenada do solo, a partir de um processo de loteamento

realizado pela Associação de Moradores e por vereadores locais. Está limitado

a leste da Baía de Guanabara, ao norte pelo Rio Sarapuí, ao sul por um

manguezal e a oeste pela BR-040 (Rodovia Washington Luiz). Ao longo desta

rodovia, nas décadas de 1980 e 1990, surgiram as ocupações desordenadas.

Jardim Gramacho possui de acordo com diagnóstico do IBASE (2011)

uma população em torno vinte mil habitantes e a maior parte ela trabalhando

no mercado informal. Uma destas atividades informais exercida pelos

trabalhadores era, até junho deste ano, a catação de “lixo” no aterro, que de

acordo com Bastos (2005) eram, até aquele ano, cerca de mil e quinhentos

catadores cadastrados pelo Serviço Social e identificados na entrada do

Aterro, pelo Setor de Segurança. Estes trabalhadores defendiam direta e

diariamente o “pão de cada dia” que vinham transportados pelas carretas e

caminhões.

Analisando o exposto por Bastos (2005), Jardim Gramacho é mais um

local periférico, como alguns outros existentes em nosso país, que revela uma

grande desigualdade social atrelada a outros tipos de desigualdade (a

ambiental), por abrigar um dos maiores aterros de lixo da América Latina, o

que coloca em debate os riscos ambientais aos quais a população residente e

trabalhadora está exposta. O bairro é permeado por todo o trajeto da rota do

lixo e que por mais que se tente desvinculá-lo da atividade de catação, torna-

se quase impossível, visto que, quase a totalidade do bairro tem sua vida ativa

economicamente em função da catação.

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No próximo capítulo, apresentar-se-à o Aterro Sanitário do Bairro Jardim

Gramacho com foco nos impactos sociais e ambientais causados pelo mesmo.

CAPÍTULO II

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OS IMPACTOS SOCIAIS E AMBIENTAIS CAUSADOS PELO ATERRO

SANITÁRIO DO JARDIM GRAMACHO

Situado no Município de Duque de Caxias, em uma área onde há vinte

anos era um grande manguezal à beira da Baia de Guanabara, o Aterro

Metropolitano do Jardim Gramacho, ocupa uma parte da região pertencente à

antiga Fazenda São Bento que, com sua desativação, foi repassada ao

Instituto de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). No final de 1973 foi

assinado um contrato entre o INCRA, a Fundação para o desenvolvimento da

Região Metropolitana (FUNDREM) e a Companhia de Limpeza Urbana do RJ

(COMLURB). Na ocasião, esta última ganhou um lote, transformando-o em

depósito de lixo. Vale ressaltar que a assinatura de tal contrato desrespeitou o

Código Florestal Brasileiro criado criado pela Lei nº 4.771, de 15 de setembro

de 1965, uma vez que o mesmo preconiza, em um dos seus artigos, que os

manguezais são áreas de preservação permanente. Ainda, a Constituição

Federal de 1988 o Art. 255, Par. 4º, considera “patrimônio nacional” a Mata

Atlântica e a Zona Costeira, bem como a Constituição Estadual, em seu Art.

265, declara que a Baía de Guanabara e seus manguezais são áreas de

preservação permanente.

Em 1996, a Empresa de Terraplanagem Queiroz Galvão ganhou a

concessão do aterro e, logo em seguida, procedeu ao trabalho de

cadastramento dos garimpeiros. Destinado a fechar suas portas em abril do

corrente, o lixão de Gramacho foi finalmente fechado em 03 de junho do

corrente.

No que tange ao tipo de lixo recebido pelo lixão, pode-se dizer que o

mesmo recebeu lixo de toda região metropolitana do Rio de Janeiro. Tais

resíduos foram divididos em quatro grandes áreas, a saber: 1) Lixo

Hospitalar: acesso proibido; 2) Lixo Industrial: alguns catadores têm acesso;

3) Lixo Domiciliar: todos os que possuem autorização podem garimpar nele e

no entulho que não tem valor comercial.

Alguns dos produtos e materiais enviados para a “lixeira” foram

reaproveitados e transformados pela indústria de reciclagem, o que possibilitou

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renda para a população e economia de recursos naturais (água, energia,

matéria-prima). Os rejeitos, ainda presentes no aterro, são uma ameaça ao

Meio Ambiente, à saúde e a qualidade de vida. A Constituição responsabiliza a

União, os Estados e Municípios pela proteção ao Meio Ambiente e o combate

à poluição em qualquer de suas formas (Art. 23, inciso VI).

O artigo 225 determina que

todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defende-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

É possível observar as modificações sofridas pelo local, como por

exemplo, a instalação de empresas diretamente ligadas à garimpagem do lixo

e que atuavam também na área de reciclagem. Tais empresas exploravam o

trabalho dos garimpeiros, que por sua vez não eram – e não são – muito

simpáticos à Cooperativa, uma vez que ganham mais trabalhando por conta

própria.

Segundo Bastos (2005), o bairro de Jardim Gramacho, tem sua história

socioeconômica pautada em torno deste aterro, uma vez que a Companhia

Municipal de Limpeza Urbana do Rio de Janeiro (COMLURB) destaca que o

bairro emprega formal e informalmente cerca de quinze mil pessoas. Ednelson,

que trabalhou no local desde 1978, enfatizou que o lixo dos outros lhe

proporciona “o sustento da sua vida”. Percebe-se aqui que o valor que os

trabalhadores do lixão dão ao lixo; tal valor é atribuído ao contexto social e

ideológico em que ele vivem. Esta realidade é apresentada, re-apropriada pelo

indivíduo ou pelo grupo, reconstruída no seu sistema cognitivo e integrada no

seu sistema de valores.

Em seu trabalho de pesquisa, Gonçalves (2006) interpretou a produção

não apenas pela sua lógica de eficiência material, já que os objetos

garimpados possuíam suas características e seus valores eram

predeterminados. O pesquisador procurou dar uma explicação “cultural da

produção”, pois sabe que é crucial notar que o significado social de um objeto,

o que o faz útil a uma certa categoria de pessoas, é menos visível por suas

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propriedades físicas que pelo valor que pode ter na troca. Assim, foi possível

provar que a produção destes garimpeiros e seus manifestos funcionais

estavam enquadrados em uma estrutura cultural definida que envolve a

racionalidade do mercado vigente e da sociedade burguesa.

No que tange às relações de trabalho, pode-se dizer que eram relações

firmadas injustamente, uma vez que as empresas pagavam um preço muito

baixo pelo material coletado pelos trabalhadores. Além disso, tais empresas

não mantinham nenhum vínculo com os trabalhadores e se eximiam,

arbitrariamente, de sua responsabilidade social. As condições de trabalho

eram precárias e não possuíam qualquer alternativa de inserção ou ascensão

social.

Neste sentido, o que se percebe que estes trabalhadores, homens e

mulheres, que produzem riqueza – entendendo aqui produção em um grau

determinado do desenvolvimento social, uma vez que tais catadores e todos os

outros indivíduos que vivem da lixeira compõem o próprio instrumento de

produção – não eram – e não são – respeitados legal e dignamente por seu

trabalho.

Eu trabalhei vinte anos registrados, mas depois que desempreguei fiquei muito tempo no lixão e sabe que do jeito que estava não dá para pagar é nada. A gente não tinha nem dignidade no trabalho. Agora com a cooperativa estou pagando INPS. O dinheiro é suado, mas a gente tem que fazer por onde pagar, se não é pior. (HENRIQUE TADEU DE CARVALHO, Trabalhador da Cooperlix, 2003).

Ainda no campo das relações trabalhistas, nem mesmo a promulgação

de leis como o Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), que entrou em vigor em

janeiro do 2011 com vistas a substituir de maneira mais abrangente a Política

Nacional do Idoso (Lei 8.842.194), ampliou os benefícios e garantias à terceira

idade que mora e depende do lixão. Os idosos catadores de lixo continuaram

sem documentação e sofrem sem assistência, sem atendimento à saúde e à

habitação.

Outro grupo de “excluídos” são os menores de dezoito anos. O Estatuto

da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90), em consonância com o Art. 227

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da Constituição e da Convenção dos Direitos da Criança e do Adolescente

criados pela ONU, garante a proteção aos menores de dezoito anos e

determina seus direitos e deveres, dividindo a responsabilidade entre a família,

o Estado e a sociedade. Um dos pontos do Estatuto, atribui o direito a cultura,

ao esporte e ao lazer como fundamental ao desenvolvimento sócio-

educacional de crianças e adolescentes. Em outro ponto proíbe qualquer

trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz aos

maiores de quatorze anos. Esta não é a realidade do lixão. Alguns

adolescentes, apesar de serem matriculados em escolas, não vão à aula,

porque precisam ganhar dinheiro para ajudar a família.

Esta situação fez – e faz – com que os adolescentes se sintam

marginalizados, inferiores aos demais, pois não conseguem aprender a ler e

escrever com clareza. Aliado a isto, mesmo sabendo do valor econômico

dispensado ao lixo, sabem que trabalham com objetos indesejáveis para

outras pessoas. Cria-se, então, um círculo vicioso: por falta de opção, os mais

jovens seguem os mais velhos e criam um sentimento de familiaridade em

relação ao lixo: afinal há uma necessidade das famílias se sustentarem.

Segundo Gonçalves (2006), reconstituir estas vivências históricas

individuais permitiu a observação das condicionantes impostas ao

comportamento humano dentro da estrutura geral dessa comunidade. A

história social mantém, entretanto, seu nexo base de constituição, enquanto

forma de abordagem que prioriza a experiência humana e os processos de

diferenciação e individualização dos comportamentos e identidades coletivas e

sociais na explicação histórica.

Vale registrar que o importante não é apenas relatar o encontro ou as

atitudes de um indivíduo que tem o direito de garimpar no depósito e outro que

não possui esse direito e presta trabalhos secundários na redondeza, mas,

observar em que grau isso se expressa em suas mentes e relações. Neste

sentido e, como este trabalho fala da relação entre homem e natureza, faz-se

necessária uma pesquisa da atual situação ambiental da região. Os conflitos

ambientais não fogem da ótica econômica, pois ocorrem simultaneamente nos

espaços de apropriação material e simbólica e na interatividade do espaço e

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das práticas sociais. Assim, o estudo destas relações deve ser encarado como

o estudo relativo à preservação da vida global, e não apenas como “um

mecanismo a serviço do indivíduo” (grifo meu).

Diante de tudo o que foi relatado até aqui, é importante refletir o que

nossa sociedade pensa a respeito do lixo, uma vez que, a percepção que se

tem, é que se vive em uma imensa contradição em relação ao valor que damos

ao lixo. Exemplo disto é que, quando se joga algo no lixo, é porque julga-se

desnecessário ao uso. Neste sentido, considerar o lixo como algo utilitário faz

parte de uma mudança de comportamento; logo, um caminho tortuoso, porém,

sustentável a percorrer.

Segundo Machado (2011), a história do Aterro Metropolitano de Jardim

Gramacho, em Duque de Caixas reflete, em parte, a demora na evolução das

políticas brasileiras de destinação de lixo. Maior aterro sanitário da América

Latina, o lixão de Gramacho começou a funcionar a céu aberto em 1978. Em

2005, a inexistência de medidas alternativas eficazes fez com que o terreno de

um milhão e três mil metros quadrados atingiu o que até então se acreditava

ser sua capacidade máxima. As pilhas de detritos alcançaram até oitenta

metros de altura. Não obstante ao fato, o aterro continuou aberto e o acúmulo

de lixo provocou três acidentes geotécnicos nos anos que se seguiram: 2006,

2007 e 2008.

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Em 2008, uma vistoria da Fundação Estadual de Engenharia do Meio

Ambiente (Feema) encontrou rachaduras de até quarenta centímetros no

terreno, o que já indicava a possibilidade de vazamento de milhares de litros de

chorume na Baía de Guanabara ou na Foz do Rio Sarapuí.

Segundo a Revista Radis (2011) somente a Companhia Municipal de

Limpeza Urbana (Comlurb) do Rio de Janeiro despeja mais de seis mil

toneladas de lixo por dia no aterro, segundo dados da própria Comlurb. Caxias,

Nilópolis, Meriti e Queimados levam mais cerca de 1,5 mil toneladas ao local

diariamente.

Em 1996, iniciou-se um trabalho que teve como objetivo, transformar

Gramacho em aterro controlado. Em outras palavras, foram pensadas

estratégias e adotadas medidas para minimizar a agressão ao meio ambiente.

Algumas das ações consistiram em cobrir os resíduos sólidos com argila,

melhorar o sistema de drenagem de águas pluviais e de coleta de chorume,

captar os gases por meio de poços, aplicar barreira vegetal, criar estação de

tratamento de chorume e revitalizar mais de cento e dez hectares de

manguezal.

Em 2009, foi inaugurada a Usina de Biogás de Jardim Gramacho,

considerado o maior projeto de redução de emissões de gases do efeito estufa

no Brasil. A usina capta e queima o gás produzido pela decomposição da

matéria orgânica, evitando a liberação de cerca de 75 milhões de metros

cúbicos de metano para a atmosfera anualmente.

Jardim Gramacho foi tema do Documentário “Lixo Extraordinário”,

dirigido pela britânica Lucy Walker e pelos brasileiros João Jardim e Karen

Harley. Tal documentário mostra o trabalho do artista plástico brasileiro Vik

Muniz com os catadores do aterro. O filme foi premiado nos festivais de

cinema de Berlim, Sundance, Paulínia, São Paulo e Amazonas, entre outros.

Segundo Santos (2005), saúde e meio ambiente estão íntima e

historicamente relacionadas: não é possível prevenir e proteger a saúde

individual e coletiva sem cuidar do meio ambiente. Se saúde pressupõe um

meio ambiente saudável não se pode falar em danos ao meio ambiente sem

pensar em danos à saúde individual e coletiva. É fato incontroverso que a

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degradação do meio ambiente corresponde a graves danos à saúde individual

e coletiva.

Ainda segundo a autora, meio ambiente e saúde compreendem os

aspectos da saúde humana, das enfermidades, dos danos e do bem-estar que

são determinados ou influenciados por fatores do meio ambiente. Também se

refere à teoria e pratica de avaliar, prevenir, corrigir e controlar os riscos do

ambiente que potencialmente podem prejudicar a saúde individual e coletiva

de gerações atuais e futuras.

Neste sentido, percebe-se que saúde não somente se refere à ausência

de doenças, mas sim ao completo bem estar físico, mental e social de um

indivíduo.

A orientação que se extrai da disposição contida no artigo 3º da Lei nº

8.080/90 é que

a saúde tem como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais.

A Constituição Federal do Brasil, em seu Art. 225 estipula que

todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações". Nota-se que o dispositivo em foco é categórico ao afirmar que o meio ambiente ecologicamente equilibrado é essencial à sadia qualidade de vida, ou seja, à própria saúde.

Embora se tenha várias leis relevantes relacionadas ao Meio Ambiente e

Saúde em nosso país, os moradores que vivem próximo ao Aterro

Metropolitano de Jardim Gramacho (AMJG) – Duque de Caxias ainda estão

longe de serem contemplados com o cumprimento de boa parte destas leis,

como já exposto neste trabalho.

O crescimento urbano que ocorreu em Jardim Gramacho, segundo

levantamento feito pela Secretaria do Meio Ambiente (2011) não foi

acompanhado de investimentos adequados em infra-estrutura habitacional

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formando em muitas localidades assentamentos "ilegais", as favelas e os

cortiços. O resultado deste crescimento desordenado foi o aumento de

pessoas vivendo em condições insalubres, em alguns casos em condições

subumanas, sem cobertura de serviços básicos essenciais como água, esgoto

e coleta de lixo e ainda expostas a diversos contaminantes ambientais típicos

do desenvolvimento do AMJG, como o manuseio direto ou indireto com o lixo,

a contaminação do solo e água subterrânea por agentes patogênicos, pelo

chorume e por produtos químicos e a poluição atmosférica (Esquema 1).

Esquema 1: Vias de contato homem – lixo.

Estima-se que nesta região boa parte dos moradores vive em condições

inadequadas de moradia. Além da disponibilidade dos chamados serviços

essenciais, outros fatores relacionados à qualidade das habitações, podem

também afetar a saúde. Por exemplo, condições térmicas precárias, umidade,

presença de mofo, má-ventilação, grande adensamento de indivíduos por

cômodo, infestações por insetos e roedores, nível de ruído, todos estes fatores

têm sido descritos como potenciais fatores de risco à saúde.

A falta de periodicidade nas coletas de lixo acarretou problemas como o

assoreamento de rios e da Baía de Guanabara, o entupimento de bueiros com

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conseqüente aumento de enchentes nas épocas de chuva, além do mau-

cheiro, proliferação de moscas, baratas e ratos, todos com graves

consequências diretas ou indiretas para a saúde (Esquema 2).

Esquema 2: Limpeza pública e saúde – modelo causal.

Vale ressaltar que os ratos são uma praga em todo o bairro do Jardim

Gramacho, conseqüência de todos estes anos de lixão. Várias são as doenças

transmitidas por este roedor, tais como Leptospirose, Peste Bubônica, Tifo

Murino, Riquetsiose, entre outras, que podem levar o individuo à morte.

A Secretaria do Meio Ambiente acredita que controlar os vetores e as

pragas é um importante complemento às ações de saúde e bem-estar de

cidades Para isto será necessário realizar um projeto de saneamento básico

priorizando a retirada do lixo de diversos vazadouros existente na região, assim

como regular a periodicidade das coletas de lixo e com destino ecologicamente

adequado.

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Segundo o Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade – IETS (2001)

o uso da água subterrânea está intimamente relacionado à saúde. Ainda

segundo o IETS, este processo se intensificou a partir da influência do AMJG,

uma vez que boa parte do chorume que não é captado pela estação de

tratamento é percolado subterraneamente e também em função da

precariedade no abastecimento da água fornecida pela CEDAE. A utilização

desta água comprometeu – e ainda compromente – a saúde da população

local, uma vez que são encontradas nesta água desde organismos

patogênicos até elementos químicos e metais pesados, tais como mercúrio,

chumbo, cromo, cobre e cádmio. Além disso, moléculas orgânicas como os

organoclorados, podem ser encontradas nos aqüíferos a partir destes

depósitos de lixo.

Ainda não se sabe em que raio de distância a pluma de chorume

proveniente do AMJG está atingindo a água subterrânea da região. Responder

esta questão é de suma importância para se pensar em estratégias de controle

ambiental e qualidade de vida da população local e adjacente.

O próximo capítulo versará acerca do lixo como fonte de riqueza e

segregação social.

CAPÍTULO III

O LIXO COMO FONTE DE RIQUEZA

Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma. Lavoisier

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Talvez, ao proferir estas palavras, o famoso químico Antonie Laurent

Lavoisier não tenha percebido a dimensão que a mesma tomaria nos anos que

se seguiram à sua morte. Pensada em um primeiro momento para ser aplicada

às experiências químicas pelas quais se tornou célebre, a frase de Lavoisier se

serve hoje para diversas situações e está intimamente ligada ao conceito de

sustentabilidade. A frase “tudo se transforma” pode ser dita, nos dias atuais de

outra forma: tudo se recicla, principalmente no que tange ao lixo por nós

produzido (grifo meu). Segundo a Revista Ambiente Brasil (2011)

...pode-se dizer que a reciclagem é um dos melhores caminhos a serem seguidos, uma vez que a mesma converte, por meio de um processo industrial, o lixo descartado (matéria-prima secundária) em produto semelhante ao inicial ou outro. Reciclar significa economizar energia, poupar recursos naturais e trazer de volta ao ciclo produtivo o que é jogado fora. As indústrias de reciclagem produzem papéis, folhas de alumínio, lâminas de borracha, fibras e energia elétrica, gerada com a combustão, entre outros materiais que são utilizados constantemente pela população, tanto em bens de consumo como em serviços prestados.

A palavra reciclagem foi introduzida ao vocabulário internacional no final

da década de 1980, quando se constatou que as fontes de petróleo e outras

matérias-primas não renováveis estavam se esgotando (AQUINO, 2003).

Ainda segundo o autor supracitado, para se compreender a reciclagem,

é importante "reciclar" o conceito que se tem do lixo. Faz-se necessário deixar

de enxergá-lo como uma coisa suja e inútil em sua totalidade e, um dos

primeiros passos para o despertar de tal consciência, é perceber que o lixo é

fonte de riqueza.

A reciclagem traz benefícios. Entre eles Aquino (2003) destaca a

diminuição da poluição do solo, água e ar, a melhoria da limpeza da cidade, a

qualidade de vida da população, a melhoria na produção de compostos

orgânicos, a geração de receita com a comercialização dos recicláveis, o

estímulo à concorrência – uma vez que os produtos gerados a partir do

material reciclado são comercializados concomitantemente àqueles oriundos

de matérias-primas virgens – o prolongamento da vida útil dos aterros

sanitários, a geração de empregos para a população não qualificada e, o mais

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importante, a valorização da limpeza pública com vistas á formação de uma

consciência ecológica cidadã.

Em se tratando do Aterro Sanitário do Bairro Jardim Gramacho, tema de

pesquisa deste trabalho, Barbosa e Silva (2011) sinalizam que o término das

atividades gerou preocupação, já que a economia do bairro se estruturou em

torno da atividade de catação e também da reciclagem, advinda de tal catação.

O encerramento das atividades colocou incertezas para a comunidade quanto

à opção de geração de trabalho e renda, visto que são poucas as ações em

andamento, do poder público, para resolver esse impasse.

Diante disto, os próprios catadores, preocupados com o futuro, criaram

estratégias através da busca de parcerias e contratos, voltados para coleta

seletiva a fim de continuar com o trabalho, pelo menos na cooperativa. Porém,

é relevante interrogar se esta proposta conseguirá absorver toda população

que vive da reciclagem do lixo. Embora, existam alternativas, como a coleta

seletiva, o trabalho com a catação é o que prevalece.

Em pesquisa realizada pelas psicólogas Luiza Ferreira Medeiros e Kátia

Barbosa Macedo, que culminou com o trabalho “Catador de material reciclável:

uma profissão para além da sobrevivência”, publicado em 2006 na Revista

Psicologia & Sociedade, fica claro que o lixo é, sem dúvida, fonte de renda

direta para mais de meio milhão de brasileiros que atuam como catadores.

Tais profissionais entendem que é preciso, urgentemente, pensar nesta

questão e ainda pensar na elaboração de políticas públicas que possam

minimizar os efeitos sociais perversos causados aos trabalhadores do lixo e

maximizar as possibilidades de inclusão social e, mais que isto, valorizar tal

trabalho, por meio da divisão dos lucros. Salientam ainda que, mais que isto, é

preciso pensar estratégias de tomada de consciência social acerca das

inúmeras possibilidades de não desperdício que a reciclagem pode trazer.

Vale ressaltar, no entanto, as questões de ordem social que perpassam

o tema reciclagem. Entre eles, poder-se-à enfatizar principalmente no que se

refere ao “tipo de público” empregado nesta ocupação. Barbosa e Silva (2011),

por exemplo, salientam que o binômio “pobreza e degradação ambiental” é

antigo nas narrativas dos segmentos sociais dominantes

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é costume datar os anos 1960 e 1970 como os anos dos primeiros registros mais expressivos de crítica da relação homem-natureza, quando também se iniciaram os movimentos ambientalistas. O que se coloca em cena a partir dessa época é o enquadramento da crise da organização social da produção, do consumo e o meio ambiente. A partir de então, o debate nessa área caracteriza-se como mais diversificado e contraditório, envolvendo desde visões românticas sobre um mundo sem ação humana sobre a natureza, como também expectativas de uma maior racionalização tendo em vista um “desenvolvimento limpo”. Esse quadro se desenha contraditoriamente no contexto do acirramento da internacionalização da economia quando a cena social se enche com estratégias de um modelo de desenvolvimento baseado na polarização entre ricos e pobres, em termos de geopolítica e de classes sociais, descortinando um frágil compromisso pela sustentabilidade social. O processo de globalização contemporâneo provoca polarização social e geográfica. Assim, a maior ou menor ação em favor ou contra a degradação ambiental e o empobrecimento se referem sempre a busca de sustentabilidade do capitalismo para fazer frente a essas contradições. A diferença a se manifestar aí será sempre a ação política, de modo que os movimentos sociais e ambientalistas consigam tornar a sustentabilidade um problema político, porque geradora e produto de clivagens sociais e desequilíbrios ambientais.

Diante do exposto, o que se percebe é que a maioria dos trabalhadores

que trabalham com a reciclagem – exceto os que trabalham em sistema de

cooperativa – dificilmente têm o devido retorno financeiro da matéria-prima

com a qual trabalham. Neste sentido, o lixo torna-se, ao invés de “fonte de

riqueza”, fonte de preconceito e segregação social (grifo meu).

Ainda no que tange à questão do trabalho voltado para a reciclagem,

Magera (2003) salienta

...as características diferenciais de unidades de trabalho baseadas no cooperativismo e nas empresas de mercado demonstram que a experiência da reciclagem nem bem se apoia na doutrina cooperativista nem bem atende a legislação trabalhista. Ela reserva-se como uma atividade subjugada às relações de forte dependência de instituições sociais externas, de empresas e do trabalho precarizado.

É fato que o lixo traz riqueza, tanto financeira quanto material e social;

porém, é preciso que os empresários queiram “dividir a fatia do bolo” com

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quem de direito, ou seja, aqueles que impulsionam a economia e o

desenvolvimento e que não são impulsionados por eles (grifo meu).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O governo acha que somos uma cambada

de idiotas. Não pode fechar e acabou. Precisamos de uma proposta. São famílias inteiras,

com taxa de natalidade de quatro, cinco filhos, e senhoras que trabalharam a vida toda e

precisam de uma aposentadoria.

Tião Santos, ex-morador do lixão e atual Presidente da Associação de Catadores de Material Reciclável de Jardim Gramacho.

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Diante de tudo o que foi apresentado neste trabalho, pode-se dizer que

os impactos sócio-ambientais ocasionados pelas atividades do antigo Aterro

Sanitário de Jardim Gramacho continuarão sendo sentidos ainda por algum

tempo.

No que tange às condições sociais, principalmente no que tange ao

saneamento básico, pouco se fez desde a criação do Aterro Sanitário, uma vez

que apenas metade dos domicílios tem acesso à rede geral e à canalização. A

maioria ainda depende da “bica comunitária” para ter acesso a este bem,

essencial á sobrevivência da vida humana.

Quanto ao fornecimento de luz elétrica às residências, pode-se dizer

que poucos são as residências em Jardim Gramacho que possuem acesso à

rede elétrica oficial; as demais residências possuem o que chamamos de

“gato” na rede elétrica.

No que tange ao sustento diário, a falta do referido “lixão” deixou os

catadores preocupados com o futuro. Por isso que, como dito acima, foram

criadas estratégias voltadas para coleta seletiva a fim de continuar com o

trabalho, pelo menos na cooperativa. De qualquer forma, como também

exposto neste trabalho, tal proposta não conseguirá absorver toda população

que vive da reciclagem do lixo; neste sentido, pode-se dizer que a falta de

emprego e de perspectiva – pouca participação governamental – também é um

fator que contribui para o não desenvolvimento local.

No que tange ás questões ambientais, a instalação dos grandes

empreendimentos econômicos ocorridos na região também causaram danos à

natureza. Em se tratando de Jardim Gramacho, pode-se dizer que tais danos

foram sofridos também pelos moradores da região, uma vez que, como dito

acima, é um local onde não se investe em saneamento, onde há ausência de

políticas de controle dos depósitos de lixo tóxico ou orgânico – e, em função

disso, o chorume se espalha e se infiltra no solo –, onde há moradores vivendo

em condições de risco, entre outros. Em outras palavras, a instalação de tais

empreendimentos – que visam somente o lucro – dividem com estas

populações, menos dotadas de recursos financeiros o risco desproporcional

dos danos ambientais.

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No que tange à destinação do uso da área do aterro, talvez possam ser

pensadas ações como a criação de um parque público, a exemplo do Fresh

Kills Park (FKP) em Nova Iorque que possui uma área muito maior que aquela

destinada outrora ao Aterro.

Para isto, no entanto, faz-se necessário compromisso e interesse dos

órgãos públicos em restaurar a qualidade ambiental em Jardim Gramacho e

proporcionar uma melhor qualidade de vida à sua população.

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