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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
A TRANSAÇÃO PENAL E SUAS CONSEQUÊNCIAS
Por: Simone Allem Allam Rentroia
Orientador
Prof. Valesca Rodrigues
Rio de Janeiro
2007
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
A TRANSAÇÃO PENAL E SUAS CONSEQUÊNCIAS
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como requisito parcial para
obtenção do grau de especialista em Direito e
Processo Penal.
Por: Simone Allem Allam Rentroia
3
AGRADECIMENTOS
A Deus, por ter dado-me os meus pais que me encaminharam pela trilha do
bem da verdade e da caridade.
E aos meus dois eternos amores, ygor o meu filho e sempre minha luz e
Cleber meu amigo e companheiro nesta jornada, que sem dúvida torce com
afinco para meu sucesso.
4
DEDICATÓRIA
.....a minha amiga que não teve nenhuma
dúvida do meu sucesso, e não se
encontra mais neste plano,mas com
certeza olha e se felicita por mais um
objetivo atingido, é a você Drª Maria da
Soledade que dedico este trabalho.
5
RESUMO
O trabalho discute os modelos tradicionais de penalizar, entendendo
que há um esgotamento destes em função da precariedade do atual meio
carcereiro. Para a discussão do tema foi escolhida a metodologia de pesquisa
bibliográfica em obras clássicas, que discutem sobre a penalização em todos
os seus âmbitos de atuação. A busca de dados foi ampla, mas sofrendo uma
seleção qualitativa no que tange à artigos veiculados pela Internet, entendendo
que sua credibilidade só é possível quando estão devidamente referenciados.
A importância da discussão desse tema é justificada por entender ser
preciso rever os conceitos das infrações penais de menor potencial ofensivo.
Para a discussão do tema dividiu-se o estudo em capítulos assim distribuídos:
o primeiro capítulo, faz um breve histórico sobre a evolução do processo penal
com a visão voltada para a transação penal; o segundo capítulo, discute sobre
os juizados especiais, abordando sobre sua criação, competência,
descriminalização e despenalização; o terceiro capítulo, analisa os princípios
da ação penal, princípio da obrigatoriedade e da discricionariedade; o quarto
capítulo, aborda a transação penal propriamente dita, analisando sua
conceituação, características, natureza jurídica, cabimento e efeitos; o quinto
capítulo, fala da constitucionalidade da transação penal; por fim a conclusão,
sintetiza os objetivos do estudo.
Palavras-chave: Transação Penal – Juizados Especiais – Ação Penal
6
METODOLOGIA
O trabalho em questão teve como tipo de pesquisa a bibliográfica,
jurisprudencial e doutrinária, tendo em vista que o assunto abordado foi
ensejado pela quantidade de material suficiente para o desenvolvimento e
análise do presente, tornando possível o estudo do instituto da transação penal
com suas reais conseqüências e controvérsias.
Os métodos que levam ao problema proposto, como leitura de livros,
jurisprudências, com o intuito de obter uma maior conscientização de um
instituto do direito penal que tem por objetivo primordial o desafogamento dos
órgãos judiciais.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I – Evolução Histórica do Processo Penal 10
CAPÍTULO II – Juizados Especiais 17
CAPÍTULO III – Princípios da Ação Penal 25
CAPÍTULO IV – Transação Penal 29
CAPÍTULO V – Constitucionalidade da Transação Penal 45
CONCLUSÃO 49
BIBLIOGRAFIA 51
ÍNDICE 53
FOLHA DE AVALIAÇÃO 55
8
INTRODUÇÃO
A temática da Transação Penal, considerada por parte da doutrina como um
marco no direito penal-processual brasileiro, que criou os juizados Especiais
Criminais, realmente introduziu um novo paradigma na ordem jurídico-penal
nacional: o da justiça criminal consensual.
A Lei 9.099/95 criou diversas medidas despenalizadoras, entre as quais
podemos citar como mais importantes à composição civil, a transação penal e
a suspensão condicional do processo. A forma simplificada do procedimento,
com a adoção do princípio da oralidade, torna o feito mais célebre, atendendo
a uma justa reivindicação da coletividade insatisfeita com a morosidade dos
julgamentos, daí ter recaído sobre este tema, a escolha para desenvolvimento
do presente estudo.
A formulação do problema sobre o qual se fala neste estudo, parte do
entendimento de que há um esgotamento dos modelos tradicionais para
penalizar, e que não ofertam respostas satisfatórias, inclusive levando em
consideração a situação atual do meio carcerário.
A importância da discussão a respeito deste tema é plenamente
justificada, pois para entender-se a transação penal, faz-se necessário
averiguar o conceito das infrações penais de menor potencial ofensivo, que, na
escala de gravidade das ofensas penais, estão no pólo oposto aos crimes
hediondos.
Interessante notar que, se, de um lado, a Lei n. 8.072/90 reflete uma
espécie de discurso pena, que pode ser chamado de Direito Penal do Terror
ou Direito Penal Midiático - parecendo querer solucionar a problemática penal
somente com sanções mais severas ou legitimando a vingança privada - do
outro lado, surge a Lei dos Juizados Especiais Criminais mais afeiçoada ao
discurso da intervenção mínima e ao garantismo penal. Um dos casos não
solucionados pela referida Lei é exatamente o descumprimento da transação
penal proposta pelo Ministério Público.
9
Desta monografia, consta breve histórico sobre a evolução da história do
processo penal com a visão voltada especialmente para a transação penal no
primeiro capítulo; o segundo capítulo trata dos Juizados Especiais, sua criação
e sua competência. No terceiro capítulo constam os princípios da ação penal,
no quarto e quinto capítulos discute-se sobre a transação penal e sua
constitucionalidade, respectivamente.
Para suporte aos argumentos desenvolvidos considerou-se a doutrina
brasileira, além de alguns julgados em nossos tribunais, colhidos
bibliograficamente, de forma explicativa, usando literatura de vários autores
fartamente conhecidos e respeitados no meio acadêmico, analisando aspectos
da importância da transação penal, pretendendo demonstrar que, tanto na
teoria como na prática é possível alcançar o consenso.
Não se tem a pretensão de esgotar o assunto, tampouco dar tratamento
à exaustão dos seus aspectos incontroversos. A expectativa é a de um estudo
breve da Transação Penal como medida despenalizadora.
.
10
CAPÍTULO I
EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO PROCESSO PENAL
Como o homem infringiu a primeira norma penal, a história nos dá notícia
de que o Todo Poderoso executou a sanção referente ao preceito violado:
E o Senhor Deus lançou-o fora do paraíso de delícias,
para que cultivasse a terra, de que tinha sido tomado. E
expulsou Adão, e pôs diante do paraíso de delícias
querubins, brandindo uma espada de fogo, para guardar
o caminho da árvore da vida1.
1.1 – Considerações a respeito da história do Processo Penal
Iniciar o processo penal pela história, especialmente a do Brasil, é,
antes de tudo, o único meio de inflamar a visão inaugural, correspondendo a
mais ansiosa expectativa do estudante de direito.
Daí a necessidade de buscarmos na história o pulsar da espécie
humana pelo justo, surpreendendo-a em suas renovadas tentativas, cada uma
das quais, no limite de suas contingências, pode ser reveladora, apesar de
tudo, de um toque de perenidade, dos fins que marcam a razão de ser da
experiência jurídico-positiva.
È possível que a meditação da história nos torne mais conscientes das
razões concretas da atividade jurídica, de maneira que as necessárias
estruturas e processos formais, garantidores da justiça, não se convertam em
rígidos entraves á atualização espontânea dos fins que compõem a constante
ética do Direito.
A história tem grande influência na legislação de um povo, porque seus
conceitos básicos evoluem com ela. Basta analisar a história de nosso país,
desde seu descobrimento até nossos dias, para verificarmos que as mudanças
1 LYRA, Roberto Guia de ensino e do estudo do direito penal. Rio de Janeiro: Forense, 1956. p.15.
11
havidas sempre surgiram e evoluíram conforme os movimentos internos e os
regimes que se instalaram no poder.2
Para bem entender a história é preciso buscar no passado os
elementos de convicção, a prova dos fatos, o valor dos documentos que os
arquivos conservam como preciosos tesouros.
Por isso a tendência é verificarem-se mudanças de leis sempre que haja
mudança de regime, o que podemos acompanhar na nossa própria história
política, com reflexo nas leis.
O Direito Positivo nada mais é do que o resultado de um momento
histórico; daí seu caráter liberal ou autoritário.
1.2 - Período colonial
Quando o Brasil foi descoberto (22/04/1500) estavam em vigor em
Portugal as Ordenações Afonsinas.
As Ordenações Afonsinas estavam divididas em cinco livros, sendo que o
primeiro tratava do direito administrativo; o segundo, do direito eclesiástico; o
terceiro, do processo civil; o quarto, do direito civil e comercial; e o quinto livro,
do direito penal e processo penal.
Em 1521, no reinado de D. Manuel, o Venturoso, nova codificação
empreendida.
Veio então o Código Manuelino foi o primeiro código impresso na Europa
e vigorou até 1603, sendo que no seu livro V estava disciplinado o direito e o
processo penal.
Com a batalha de Alcácer Quibir ( 14. 08. 1578), travada entre
Portugueses e Mouros, em Marrocos, morrendo o rei de Portugal, sem deixar
descendentes, passando o trono português a ser ocupado, dois anos depois,
pelo rei de Castela, Felipe II, que mandou promulgar, em 1603, as Ordenações
Filipinas, que vigoraram até 1830.
O livro V refletia o direito penal da época. O fim era incutir terror, sendo
as penas as mais bárbaras. A pena de morte era aplicada de várias maneiras,
2 REALE, Miguel. Horizontes do direito e da história,. São Paulo: Saraiva, 1956, p. 10.
12
e a pena de prisão, pouco usada; em seu lugar havia as penas infamantes, os
castigos corporais, as mutilações.
A pena de desterro era comum, e o Brasil, o pior lugar para ser cumprida,
pois um ano aqui equivalia a dois anos na África.
Com a vitória da Revolução Francesa e a Proclamação dos Direitos
Humanos, bem como sob o influxo das idéias liberais que resultaram na
independência dos Estados Unidos e na elaboração da sua Constituição, e dos
grandes pensadores do Iluminismo, tentou-se uma reforma da Justiça Penal.
1.3 - Brasil Império
Em 1764 surge o famoso livro Dos Delitos e Das Penas, de César
Beccaria, que tanta influência teve na época, principalmente pela sua coragem
em denunciar as crueldades punitivas.
Uma das suas investidas foi contra a legitimidade da pena de morte,
aplicada em diversos casos e de maneira indiscriminada. Beccaria pregou a
igualdade dos criminosos, responsáveis por crimes de mesma gravidade, para
efeito de punição, pois os nobres eram tratados com benevolência, e repeliu a
tortura, praticada nos tribunais comuns e eclesiásticos, como recurso para
obter provas.
E 1822, o príncipe D. Pedro, cria juizes de fato para o julgamento dos
crimes de imprensa e manda que os juizes criminais, por Aviso de 28 de
agosto de 1822, observem a Constituição da monarquia portuguesa, de 10 de
março de 1821, ficando asseguradas aos acusados as seguintes garantias:
Nenhum indivíduo deve ser preso sem culpa formada; lei
alguma, notadamente a penal, será imposta sem
absoluta necessidade; toda pena deve ser proporcionada
ao delito, e nenhuma deve passar da pessoa do
delinqüente.
13
Proclamada nossa independência (07.09.1822), tratou-se de dotar o País
de uma legislação própria; mas antes que isso ocorresse, D. Pedro I, por lei de
1823, mandou que continuasse aplicando as Ordenações Filipinas.
Em 1832, surgiu o primeiro Código de Processo Criminal do Brasil, sendo
previsto o Habeas Corpus.
Com a fundação do império, abre-se, para o nosso processo penal, um
período de reação às leis opressoras e monstruosas da monarquia portuguesa
e do qual o Código de Processo Criminal de 1832, constitui o diploma legal
culminante e mais expressivo, síntese que é dos anseios humanitários e
liberais que palpitavam no seio do povo e nação.3
1.4 - Período Republicano
Promulgada a Constituição republicana de 24 de fevereiro de 1891,
tendências inovadoras surgiram, ficando as garantias processuais revigoradas;
o hábeas corpus.
Transformou-se em garantia constitucional, ganhando maior amplitude
seu campo de ação, justamente em face dos debates, sobre a esfera de
proteção do remédio heróico, tendo surgido à teoria brasileira do hábeas
corpus, destinada a ampliar suas garantias.
Mas a grande inovação foi à quebra da unidade processual para todo o
território nacional, dando a cada Estado competência para legislar sobre o
processo criminal e o civil, instaurando-se a pluralidade processual, que não
trouxe nenhuma vantagem, ao contrário, prejudicou a aplicação da lei penal.
Nem todos os Estados tiveram o seu processo, sendo que muitos,
inclusive o estado de São Paulo, continuaram regendo-se pelas leis do
Império.
Com a Revolução de 1930, o regime pluralista foi mantido. Todavia,
promulgada a Constituição de 16 de julho de 1934, restaurou-se a unidade
3 MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. V. 1, Rio de Janeiro: Forense, 1961, p. 89.
14
processual que existia ao tempo do Império, e que vem sendo mantida até
hoje.
Após a constituição de 1934, foi nomeada uma comissão para elaborar
um projeto de Código de Processo Penal, o que foi feito em 1935, com
exposição de motivos do Ministro da justiça Vicente Ráo, que apresentou,
como maior inovação, a supressão do inquérito policial e a adoção do Juizado
de Instrução, questão esta que tem provocado debates até hoje.
Mas, com a Constituição outorgada com o golpe de 10 de novembro de
1937, foram impedidas a discussão e aprovação do projeto apresentado,
ficando, assim, mantida a unidade processual e o inquérito policial.
Após o golpe, nova comissão foi nomeada para apresentar um projeto de
Código de Processo para todo o País.
Esse projeto converteu-se no atual CPP - Código de Processo Penal,
através do Decreto - Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941, em vigor desde 1º
de janeiro de 1942, com algumas alterações.
Apesar das críticas que se fazem ao atual processo penal, não há
dúvida de que se trata de um estatuto que satisfaz plenamente às
necessidades de nossa justiça penal; são as reformas que ele sofreu, ao longo
desses quarenta e tantos anos, que demonstram renovações insatisfatórias.
Diante das demandas sociais presentes na atualidade, algumas idéias
se vinculam à criação de meios alternativos de solução de conflitos.
Foi então apresentado ao Congresso Nacional o Projeto de Lei n. 1.480
de 1989, pelo Deputado Michel Temer. Além deste, foram ainda apresentados
ao Congresso Nacional, outros cinco Projeto, a saber:
Projeto de Lei n. 1.129 de 1988, pelo Deputado Jorge Arbage; Projeto
de Lei n. 1.708 de 1989, do Deputado Manoel Moreira; Projeto de Lei n. 2.959
de 1989, do Deputado Coimbra; projeto de Lei n. 3.883 de 1989, do Deputado
Gonzaga Patriota e Projeto de Lei n. 3.698 de 1989, do Deputado Nélson
Jobim. Sendo que, de acordo com o parecer da Comissão de Constituição e
justiça e de Redação, somente os projetos de n. 1.480/89 e 3.698/89,
mereciam aprovação.
15
Conforme o relato do ilustre professor Damásio Evangelista de Jesus, o
primeiro projeto de lei n. 1.480/89 apresentado, denominado Projeto Temer,
tratava exclusivamente da organização dos juizados Especiais de natureza
Criminal, enquanto o projeto de lei n. 3.698/89, denominado projeto Jobim,
versava, ao mesmo tempo, sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais.
Diante disso, a comissão, visando aproveitar o conteúdo de ambos os
Projetos, opinou pela apresentação de um projeto substituto, que englobou o
Projeto Jobim, na parte que trata dos Juizados Especiais Cíveis, bem como o
Projeto Temer, na parte relativa aos Juizados Especiais Criminais.
O Projeto substituto, oriundo da fusão dos dois anteprojetos
apresentados, foi inteiramente aprovado, formando, dessa forma, um único
projeto que originou a Lei n. 9.099 de 29 de setembro de 1995.
A Constituição Federal deu margem a importantes inovações no
ordenamento jurídico penal e processual penal, destinadas à
desburocratização e simplificação da justiça penal.
Promulgada a Lei n. 9.099/95, cabia aos Estados e à União criarem os
Juizados. Tal criação seria por meio de lei local, como prevê o artigo 93 da
referida lei, sendo impossível a criação dos órgãos correlatos por meio de
resoluções ou provimentos dos tribunais Estaduais.
Princípios processuais:
O artigo 2º prevê linhas mestras dos Juizados Especiais, que poderiam
ser divididas em duas classes: a primeira específica os critérios orientativos da
oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade; a
segunda enuncia as finalidades principais de conciliação e transação.
A redação é semelhante à do artigo 68, não incluindo apenas a
simplicidade, que serve também para os juizados criminais.
16
1.5 - Tendências atuais
Com a deposição do chefe do Estado Novo, Getúlio Vargas, pelas Forças
Armadas, em 29 de outubro de 1945, o governo foi entregue ao presidente do
Supremo Tribunal Federal da época.
A Assembléia Constituinte promulgou a Constituição de 18 de novembro
de 1946, tida como uma das mais liberais, e que passou a reger nossos
destinos.
Em 31 de março de 1964, uma “nova ordem” se estabeleceu no País com
propósitos de salvaguarda-lo da subversão e da corrupção, que eram suas
metas prioritárias.
Em 11 de julho de 1984, foi promulgada a Parte Geral do Código Penal,
Lei n. 7.209, que entrou em vigor no dia 13 de janeiro de 1985, trazendo
profundas alterações no sistema punitivo, com a introdução das penas
restritivas de direito., as quais, se devidamente aplicadas e fiscalizadas,
poderão substituir com vantagens a falida pena de prisão, que deve ser
reservada aos criminosos reincidentes e perigosos.
Ao mesmo tempo entrou em vigor a Lei de Execução Penal (Lei n. 7.210,
de 11. 07. 1984), de adiantado conteúdo, e que tem merecido várias críticas,
por estar completamente divorciada da nossa realidade social, sem meios de
ser devidamente aplicada, embora represente um avanço no sistema
penitenciário e atenda às exigências ou regras mínimas fixadas pelo
Congresso das Nações Unidas, realizado em Gênova, em 1955, e do qual
participaram sessenta e um países.
Com a Constituição promulgada em 5 de outubro de 1988, ocorreram
várias alterações no processo penal, dentre elas a instituição dos Juizados
Especiais em seu artigo 98.
Dessa forma é que se tem hoje no Brasil funcionando, com enorme
aceitação no meio jurídico, e, alta receptividade popular, os Juizados Especiais
Criminais, uma realidade já incorporada ao cotidiano da Justiça Pública em
todo o país.
17
CAPÍTULO II
JUIZADOS ESPECIAIS
Estando em vigor há mais de 50 anos o Código de Processo Penal
brasileiro, tem sentido a necessidade de uma reforma das leis processuais
com o fim de atualizar aqueles pontos em que a legislação se tornou
disfuncional e ultrapassada, especialmente no que tange ao estabelecimento
de ritos sumaríssimos para a apuração de contravenções e de crimes de
menor gravidade, submetidos a um processo arcaico, formalista e
burocratizante que tem levado os aplicadores do direito e até os leigos, a um
sentimento de descrédito na Justiça Penal.
Segundo Mirabete,4 passou-se a exigir um processo de melhor
qualidade, com instrumentos mais adequados à tutela de todos os direitos, que
assegurasse a utilidade das decisões judiciais, bem como a implantação de um
processo criminal com mecanismos rápidos, simples e econômicos de modo a
suplantar a morosidade no julgamento de ilícitos menores, desafogando a
Justiça Criminal, para a aplicação da lei penal aos autores dos crimes mais
graves. O aumento da criminalidade, tornava inevitável que se relegasse a
segundo plano as infrações penais de menor porte, passando a ter preferência
no julgamento os crimes mais graves, diante da necessidade de retirar do
convívio social os elementos mais perigosos. Por outro lado havia a
necessidade de um procedimento sumário para a apuração dessas infrações
menores, dando pronta resposta ao ato infracional e evitando protelar as
sentenças que poderiam chegar até à prescrição.
Assim, de acordo com o mesmo autor, sensível a essa situação, e com
o fito de evitar a impunidade nos ilícitos menores, o legislador constituinte
inseriu na Carta Magna de 1988 o disposto no art, 98 inciso I, estabelecendo
que a União, no Distrito Federal, e nos Territórios, e os Estados deveriam criar
“juizados especiais, providos por juizes togados, ou togados e leigos,
competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis
4 MIRABETE, Julio Fabrini, Juizados especiais criminais. São Paulo: Astlas, 2002 p. 24-25
18
de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo,
mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses
previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juizes
de primeiro grau”.
A Carta Magna, com essa disposição, deu margem a inovações
importantes em nosso ordenamento jurídico penal e processual penal,
aproveitando a experiência de instrumentos jurídicos já utilizados em vário
países, destinados a desburocratização e simplificação da Justiça Penal.
Dessa forma, foi dada resposta à necessidade do sistema processual penal
abrir-se à tendências mais modernas, possibilitando rápidas soluções para as
lides penais, quer pelo consenso das partes, com pronta reparação dos danos
sofridos pela vítima na composição, quer pela transação, com a aplicação de
penas não privativas de liberdade, quer por um procedimento célere para a
apuração da responsabilidade penal dos autores de infrações penais de menor
gravidade na hipótese de não ser possível aplicar uma ou outra pena daquelas
medidas inovadoras.
2.1 - Criação dos Juizados Especiais Criminais
Segundo Sobrane,5 o primeiro aspecto que despertou polêmica foi o
relacionado com a competência legislativa para a criação dos juizados
especiais. Porém uma vez regulamentado o preceito constitucional, veio a
lume a Lei 9099/1995, instituindo os Juizados Especiais Cíveis e Criminais,
como órgãos da Justiça Comum a serem criados pela União, no Distrito
Federal e nos Territórios e pelos Estados, para conciliações, processos,
julgamentos e execução nas causas de sua competência.
Completando, assim dispõe o art. 93: “Lei estadual disporá sobre o
Sistema de Juizados Especiais Cíveis e Criminais, sua organização,
composição e competência.”
5 SOBRANE, op. cit, p. 43-44
19
Parece claro, diante de tais textos legais que os Juizados Especiais
Cíveis e Criminais devem ser criados, em cada Estado, através de lei e em
seguida instalados.
Dessa forma, alguns Estados da Federação promulgaram suas leis e
instituíram seus juizados especiais antes da normatização federal dando
margem a questionamentos sobre a constitucionalidade de tais leis estaduais.
A constitucionalidade das mencionadas leis foi questionada e o
Supremo Tribunal Federal findou por declara-las inconstitucionais, firmando
entendimento de que somente a União teria competência para a instituição dos
juizados especiais.
Antes mesmo da promulgação da Constituição Federal, já se debatia
sobre a criação de um juizado especial para as infrações de pequeno potencial
ofensivo. Em abril de 1988, o trabalho dos magistrados Pedro Luiz Ricardo
Gagliardi e Marco Antonio Marques da Silva foi apresentado à Associação
Paulista dos Magistrados, que previa a implantação dos Juizados Especiais
Criminais.
A proposta foi influenciada pelo anteprojeto de Frederico Marques de
1970 e pelo Projeto de Lei nº 1655/83, e definiu as infrações penais de menor
potencial ofensivo, como sendo os crimes com pena de detenção de até um
ano, a lesão corporal culposa, o homicídio culposo e as contravenções penais,
contemplou a possibilidade de transação, condicionando-a a confissão
espontânea do infrator, dispensando-se qualquer outra cautela ou requisito
prévio, e concebeu um procedimento simplificado.
Adotada para início de debates, foi alterada em alguns aspectos e
entregue ao deputado Michel Temer, que a transformou no Projeto de Lei nº
1480/89. O deputado Nelson Jobim também apresentou proposta envolvendo
juizados cíveis e criminais, o relator designado – deputado Abi-Ackel –
apresentou substitutivo fundindo os projetos dos dois deputados, um para
esfera criminal e outro para cível.
Aprovado na Câmara, o projeto recebeu substitutivo que simplesmente
transmitia para os Estados a competência para a instituição dos juizados
especiais. Voltando a Câmara, a proposta aprovada no Senado foi rejeitada,
20
prevalecendo a anterior decorrendo a promulgação da Lei nº 9.099, de 26 de
setembro de 1995.
Assim seis anos após a apresentação dos primeiros projetos, aprovou-
se a lei autorizadora para a criação dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais,
em obediência ao disposto na Carta Magna.
2.2 - Competência dos Juizados Especiais Criminais
Segundo Nogueira6 a competência dos Juizados Especiais Criminais, se
estabelece pela natureza da infração penal – somente as de menor potencial
ofensivo, como tais consideradas na lei, além de ter também como sua
competência a conciliação, o julgamento e a execução de tais infrações
penais.
De acordo com o mesmo autor, a conciliação no juízo, forma de obter
acordo entre as partes passou a ser admitida com maior amplitude, abarcando
os crimes de ação penal pública, com evidente abrandamento do princípio da
obrigatoriedade.
Como em matéria de transação penal, cabe ao magistrado esclarecer o
autor do fato sobre a possibilidade de composição dos danos e de aceitação
de aplicação imediata da pena não restritiva da liberdade, o papel do
conciliador limita-se à composição de danos civis.
No tocante ao aspecto criminal, a execução nos Juizados Especiais
Criminais limita-se à pena de multa desde que imposta exclusivamente.
2.3 – Despenalização e descriminalização
Na observação de Sobrane7 ante a impossibilidade de dar respostas
adequadas às praticas de delitos e com a elevação da quantidade de infrações
de pequeno e médio potencial ofensivo, que acabam sem qualquer tratamento
jurídico-penal, passou-se a adotar meios para fazer com que a lei penal
6 NOGUEIRA, op.cit., p.148 7 SOBRANE, op.cit. p.3
21
alcançasse tais infrações, tornando-a mais efetiva e diminuindo a sensação de
impunidade muito sentida na sociedade.
Daí, na busca de um sistema legal adequado procurou-se soluções
mediante a aplicação do princípio da oportunidade, de mecanismos de
despenalização, evitando ou dificultando a aplicação de pena de prisão e de
processos de descriminalização, abolindo condutas que deixaram de ser
relevantes para o Direito Penal, proporcionando condições favoráveis para o
exercício de uma justiça penal baseada no consenso.
2.3.1 - Despenalização
No entendimento de Cervini,8 “despenalizar significa dificultar a pena de
prisão ou o ato de diminuir a pena de um delito sem descriminalizá-lo, ou seja,
sem tirar do fato o ilícito penal”. Incluindo as alternativas que possam atenuar
ou evitar a aplicação de pena prisional.
Opera-se a despenalização por meio da criação de mecanismos que
visam evitar ou restringir a execução da pena de prisão ou mesmo substituí-la
ou diminuí-la.
A lei nº 9.099/93 traz em si muitas medidas despenalizadoras, tais como
a necessidade de representação da vítima nos crimes de lesões corporais
leves e culposas (artigo 88); renúncia ao direito de queixa ou representação
(artigo 74 § único); a suspensão condicional do processo, entre outras.
O mesmo autor ressalta a via consensual como uma forma moderna de
despenalização, como adoção de processos ou medidas substitutivas ou
alternativas, de natureza penal ou processual, que visam, sem sujeitar o
caráter ilícito da conduta, dificultar ou evitar ou mesmo restringir a aplicação da
pena de prisão ou sua execução ou pelo menos, sua redução.
Outros meios de despenalização procuram criar entraves à deflagração
automática da ação penal pública, impedindo a instauração do processo ou
8 CERVINI, Os processos de descriminalização. Tradução d e Eliana Grabja. 2.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,1995.p.75.
22
seu desenvolvimento. São estabelecidas regras que possibilitem o consenso
entre as partes, sempre com vistas a excluir a aplicação de pena de detenção.
Ainda no entendimento de Cervini, nem sempre é fácil traçar uma linha
divisória precisa entre a descriminalização e a despenalização, uma vez que
somos herdeiros de uma tradição milenar que parte da correlação entre o
delito e a pena, concebida em seus termos mais tradicionais.
2.3.2 - Descrimiminalização
Toledo9, ressalta que “a história do direito penal obedece a permanente
tensão entre dois movimentos de sentido contrário: o abandono de áreas de
criminalização e a conquista de novos espaços”.
Se criminalizar significa apontar determinada conduta como crime.
Descriminalizar, então significa o contrário, ou seja, a desconsideração de
certa conduta como delito. É a destipificação de um fato diante do
reconhecimento da não necessidade de proteção penal ao bem jurídico
anteriormente tutelado. A conduta descriminalizada deixa de importar ao
Direito Penal, podendo ser regida por outro ramo qualquer do ordenamento
jurídico ou até mesmo, ser completamente desconsiderada pelo Direito.
Nos ensinamentos deste mesmo autor a descriminalização serve de
instrumento aos que defendem o princípio da intervenção mínima do Direito
Penal, visando extinguir as figuras que prescindem da tutela penal. O fato
anteriormente típico passa a ser totalmente irrelevante frente ao Direito Penal e
é por isso descriminalizado.
As formas usadas para descriminalização são assim classificadas por
Cervini:10
a) Geral – quando se contempla na lei, maneira tal que não permite
nenhum âmbito de discricionariedade.
9 TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de direito penal. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 1994 p. 14. 10 CERVINI,op.cit. .p. 73
23
b) Particular - quando aplicada, caso a caso, mediante normas que
admitem a apreciação particularizada sobre a conveniência de aplicar a
sanção ao caso concreto.
c) De despenalização ou de adoção de medidas mais suaves, que se
conseguirá suprimindo tipos penais concretos ou, em lugar de suprimi-
los, sanciona-los de modo mais suave, fora do âmbito estritamente
penal.
d) De direito Penal, que envolve critérios, como a adequação social,
interpretação restritiva ou a inclusão de cláusulas gerais relativas à falta
de merecimento de pena, que normalmente atinge os delitos menos
ofensivos e atua como causa de exclusão de pena por razões de
economia ou de falta de necessidade de punir ou de Direito Processual
Penal, que se ajusta ao princípio de legalidade ou através do princípio
da oportunidade.
Essa classificação considera genericamente todos meios de eliminação
ou suavização da sanção como descriminalização, incluindo em seu conceito
as formas despenalizadoras existentes, principalmente as decorrentes da
aplicação do princípio da oportunidade.
Assinala ainda o mesmo autor, que a descriminalização pode ocorrer de
três formas:
a) descriminalização formal, de jure ou em sentido estrito:
b) descriminalização substitutiva:
c) descriminalização de fato.
Descriminalização formal pode sinalizar em alguns casos a outorga de
”um total reconhecimento legal e social ao comportamento discriminalizado”,
representando, ainda, “a resposta a uma apreciação que difere do papel do
Estado determinadas áreas ou a uma valoração diferente dos Direitos
Humanos que leva mo Estado a abster-se de intervir”, permitindo a solução do
conflito pelas partes envolvidas”11
A descriminalização substitutiva corresponde a substituição corresponde
à “substituição das penas por sanções de outra natureza, tal como a
24
transformação de delitos de pouca importância em infrações administrativas ou
físicas punidas por multas de caráter disciplinar”12. É retirada a tipicidade
penal da conduta, ficando sua apreciação subordinada a outro ramo do Direito.
A descriminalização de fato é indicada pela desnecessidade de
criminalização de certa conduta, pois demonstra o não-funcionamento do
sistema em relação a determinado fato, sem que tenha sido formalmente
descriminalizado. Os mecanismos formais e informais deixam de operar para
algumas condutas, ignorando a criminalização existente.
Segundo Cervini, para o Comitê Europeu, a descriminalização de fato
consiste no “fenômeno de redução gradual das atividades do sistema de
justiça penal diante de certas formas de comportamento ou de certas
situações, desde que não tenha havido mudanças na competência formal do
sistema.13
Entende o autor citado que a nossa política ainda não encontrou um
ponto de equilíbrio adequado, enquanto de um lado se vislumbra um
movimento pela mínima intervenção do Direito Penal, outros setores, mais
radicais da sociedade, encontram no aumento da repressão penal uma forma
de tentar resolver os problemas sociais e econômicos do país.
11 CERVINI, op.cit.p.72. 12 Ibidem, p.73 13 Ibidem, p.75.
25
CAPÍTULO III
PRINCÍPIOS DA AÇÃO PENAL
Princípio jurídico significa o “conjunto de regras ou preceitos que se
fixam, para servir de norma a toda espécie de ação jurídica”.14
Dessa forma, de acordo com Sobrane15 :
“o “princípio” é uma disposição fundamental que se irradia
sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e
servindo de critério para sua exata compreensão e
inteligência, exatamente por definir a lógica e a
racionalidade do sistema normativo no que lhe confere a
tônica e lhe dá sentido harmônico.”
O processo penal é informado por diversos princípios, alguns
direcionados para a ação penal, como o da obrigatoriedade e da oportunidade
ou disponibilidade, outros relacionados com a evolução do próprio processo,
como o da busca da verdade real, contraditório e ampla defesa.
3.1 - Princípio da obrigatoriedade
Segundo Santos 16 após a fase da vingança privada, quando a pena não
se limitava ao autor da infração, mas atingia também outras pessoas, surgiu o
Estado tomando para si o direito de punir, entendendo que o delito afetava a
sociedade e a segurança coletiva. Institucionalizou-se a jurisdição, que
modernamente é caracterizada pela inércia, ou seja, deve ser instigada pela
exposição de uma pretensão a ser tutelada pelo direito.
14 Vocabulário Jurídico, p. 447. 15 SOBRANE, Sérgio Turra. Transação Penal. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 15 16 SANTOS, Moacyr Amaral.Primeiras linhas de direito processual civil. v.1. São Paulo: Saraiva, 1987. p. 16
26
Ainda segundo o mesmo autor, a resolução dos conflitos de interesse é
envolvida pelo trinômio, ação, jurisdição e processo, constituindo a ação como
o meio de provocação da jurisdição, que se desenvolve e se exerce por meio
do processo.
Fica a impressão de que o direito de ação é de exercício facultativo por
seu titular, que pode deixar de exerce-lo, desde que não deseje a composição
do conflito de interesses pela via jurisdicional.
Em determinados casos o titular do direito de ação pode deixar de
exercita-lo, pois detém o poder de disposição; tal poder é a faculdade que têm
os indivíduos de exercer ou não os seus direitos. Em direito processual, indica
a possibilidade de apresentação ou n/ao de uma pretensão em juízo, a forma
de apresentação e a renúncia da pretensão a determinadas situações
processuais.
Assim, no processo penal segue-se como regra, o princípio da
obrigatoriedade da ação penal. Os órgãos de direito, devem obrigatoriamente,
uma vez preenchidos os requisitos legais caracterizadores da infração penal,
provocar a jurisdição e atuar para a restauração da ordem jurídica, uma vez
que não possuem poderes discricionários, para decidirem sobre a
conveniência da instauração do processo penal ou do inquérito policial.
Assim, ao fazer-se a correlação entre a cominação em abstrato da
sanção penal com a obrigatoriedade da ação penal, a pena é uma ameaça tida
por necessária e cuja seriedade precisa, por isso mesmo, ser posta em foco
pela efetividade da sanção, ou a pena é necessariamente reclamada pelo
crime, para, satisfação do interesse social - e deve ser inflexivelmente aplicada
pela ação obrigatória do poder público - ou pode ser discricionariamente
evitada pela transação dos particulares ou funcionários do Estado e, então,
não se justifica a cominação legislativa. O princípio dispositivo seria no
processo criminal, a negação do direito criminal. O Estado então é que deveria
atuar na repressão de todos os delitos perpetrados, indistintamente de seu
grau lesivo.
27
Segundo Sobrane17 a regra vigente então determinava que uma vez
tipificada certa conduta como delituosa, o órgão acusatório não poderia atuar
com discricionariedade e nem levar em consideração a qualidade da pessoa. A
atenuação da regra foi adotada para infrações de menor porte como disposto
no art. 98, I, da Constituição Federal, regulamentado pela Lei nº 9099/95. O
princípio da obrigatoriedade impõe aos órgãos institucionalizados o dever de
persecução.
A iniciativa do processo penal pertence então ao Ministério Público e às
partes privadas, nos casos definidos em lei. O Ministério Público atua no
processo penal como titular do direito de ação e, assim, deve agir nos casos
em que a lei determina incondicionalmente, bem como nos casos em que
estejam cumpridas as condições estabelecidas legalmente.
O princípio da obrigatoriedade, segundo o mesmo autor, se expressa
pelas regras da oficialidade e da indisponibilidade do processo penal.
Considerando a índole estatal da função penal, a regra da oficialidade
impõe que a ação punitiva seja empreendida pelo órgão público, que deve agir
por iniciativa própria, sem necessidade de provocação do ofendido.
3.2 - Princípio da discricionariedade
Na síntese de Bandeira de Mello18 “discricionariedade é a liberdade
dentro da lei, nos limites da norma legal”.
Sendo assim, a discricionariedade, se constitui num espaço de liberdade
que a lei confere ao agente público no cumprimento do seu dever, para que de
acordo com seus próprios critérios, proceda a integração da vontade da norma
jurídica.
O ato discricionário está caracterizado pela permissividade de escolha
atribuída ao administrador, que deverá fazer a opção entre uma das
alternativas possíveis, visando a concretização da finalidade da lei e a
satisfação do interesse público, diferenciando-se do ato vinculado, por meio do
17 SOBRANE, op. cit. , p. 18
28
qual o administrador não tem qualquer margem de opção e está obrigado a
adotar a postura que a norma jurídica lhe aponta.
O princípio da discricionariedade implica a faculdade que a lei atribui ao
órgão de acusação de praticar o ato mais ajustado à satisfação do interesse
público, podendo assim, instaurar a ação penal ou desistir da ação já iniciada e
contemporizar sobre o conteúdo do pedido condenatório, sobre a supressão de
procedimentos e até mesmo sobre a espécie e quantidade da pena a ser
aplicada.
O aumento das pequenas infrações, também conhecidas como delitos
de bagatela, levou à constatação de que é quase impossível a persecução de
todos os casos e, que são inviáveis as regras do princípio da obrigatoriedade.
Dessa forma o princípio da discricionariedade ofereceu uma solução
racional ao tratamento da pequena e média criminalidade, permitindo rápidos
desfechos para os conflitos criados por esse tipo de delinqüência e por vezes
até a abstenção da persecução por parte do órgão acusador. Objetiva-se com
sua aplicação, conforme destaca Sobrane19.
a) oferecer uma solução de índole processual ao problema com controle da
criminalidade de bagatela:
b) agilizar a marcha da administração da Justiça;
c) evitar os efeitos anti-sociais que a aplicação da pena causa em relação aos
pequenos delitos.
A doutrina reclama, contudo, a limitação legal do poder discricionário do
órgão acusador, postulando a especificação das hipóteses em que a
disponibilidade da ação penal deve ocorrer.
18 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Curso de direito administrativo. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 1997. p.267 19 SOBRANE, op. cit. , p. 25.
29
CAPÍTULO IV
TRANSAÇÃO PENAL
De acordo com Mirabete,20 a lei 9.099/95, prevê no art. 76 a
possibilidade de se concretizar a denominada “transação”, uma das espécies
de conciliação criadas pela Constituição Federal (art.98, I). Assim, no caso de
crime que se apura mediante ação penal pública dependente de
representação, oferecida esta e não tendo ocorrido composição, renúncia ou
decadência, e na hipótese de ação pública incondicionada, ainda na audiência
preliminar o Ministério público deverá apreciar o termo circunstanciado e os
elementos que o acompanham e poderá diante deles, requerer o arquivamento
dos autos se entender que o fato narrado não constitui crime em tese, que não
há qualquer elemento que indique a prática de ilícito penal, que ocorreu
qualquer causa de extinção da punibilidade etc. Diante do princípio da
oralidade, o pedido de arquivamento é feito oralmente, na própria audiência,
mas, seguindo-se a regra geral, deve ser fundamentado. Caberá então ao juiz
apreciar o pedido, determinando o arquivamento dos autos ou, no caso de
entender que há elementos suficientes para embasar a ação penal, proceder
de acordo com o art. 28 do Código de Processo Penal.
Segundo Sobrane21 instituiu-se, outra via para a solução dos conflitos
derivados de delitos de menor potencial ofensivo, a qual deve dar-se de acordo
com as premissas do princípio da oportunidade, quando existente o consenso
entre o acusador e o acusado. Evita-se a imposição de sanções restritivas da
liberdade para as infrações de baixo poder ofensivo, uma vez que a detenção
não cumpre adequadamente as funções da sanção penal e acaba
incrementando a criminalidade.
O consenso, portanto, passou a ser o caminho indicado por várias
legislações para atendimento da pequena e média criminalidade,
20 MIRABETE, op. cit, p.123 21 SOBRANE,op.cit. p.71-72
30
recomendando Jorge de Figueiredo Dias que a tentativa de consenso seja
levada tão longe possível.
Pela via conciliatória permite-se ao autor da infração, com apoio na
autonomia de sua vontade, abrir mão de algumas garantias constitucionais
para submeter-se a um procedimento abreviado e obter a composição dos
interesses em conflito.
Antes da abordagem das questões polêmicas, tem-se a elaborar de
forma esclarecida o conceito deste instituto e seu cabimento para então se
chegar a sua natureza.
A transação penal como medida despenalizadora tem sido apontada
como a mais importante destas medidas, pois procura reparar os danos e
prejuízos sofridos pela vítima, bem como desafoga o Poder Judiciário e evita
efeitos criminógenos da prisão.
4.1 - Conceito e características
O ordenamento jurídico penal pátrio não cuidou de cunhar um conceito
próprio de transação, visto que arraigado nas noções derivadas do princípio da
obrigatoriedade da ação penal, que não contemplava qualquer forma
consensual para composição da lide penal.
É preciso, assim, socorrer-se da noção proveniente do Direito Civil para
a fixação do sentido exato do que deve ser entendido por transação,
contemplada no âmbito dos direitos obrigacionais.
Escola Paulista do Ministério Público:
“3.1 – A transação penal é instituto jurídico novo, que
atribui ao Ministério Público, titular exclusivo da ação
penal pública, a faculdade dela dispor, desde que
atendidas as condições previstas em Lei, propondo ao
autor da infração de menor potencial ofensivo a
31
aplicação, sem denuncia e instauração de processo, de
pena não privativa de liberdade”.22
O artigo 1.025 do CC encerra a seguinte definição legal, IN VERBIS: È
lícito aos interessados prevenirem ou terminarem o litígio mediante concessões
mútuas.
Constitui, assim, a transação contemplada na lei civil, o ato jurídico
através do qual os interessados, mediante concessões recíprocas, previnem
ou terminam litígios.
Objetiva-se com a transação a extinção de obrigações, transformando
um estado jurídico inseguro em outro seguro, mediante o câmbio de
prestações recíprocas, podendo constituir uma forma assecuratória de direitos,
que são consolidados quando retirados da zona de incerteza.
Sustenta Carvalho Santos, que a transação não tem a função de criar
obrigação nem de substituir uma por outra. Visa, ao contrário, “extinguir essas
obrigações por uma renúncia da parte do sujeito ativo do direito de crédito".23
Contudo, a doutrina italiana reconhece o caráter novativo da transação,
quando envolve a integridade do direito duvidoso, que é substituído por outro
certo, reconhecido no acordo.
Nessa situação, a transação adquire as características da novação, ao
substituir o direito anteriormente existente.
Segundo o mesmo autor, a fixação de um conceito de transação
aplicável ao Direito Penal e ao Direito Processual Penal implica a indispensável
depuração do originário da órbita civil, a ser feita com manutenção da
essência da definição legal (art. 1025 do CC), excluindo–se as injunções
provenientes das relações obrigacionais.
É preciso que o conceito a ser delineado de transação penal contenha
o mesmo objetivo do Direito Civil, consistente no propósito de prevenção ou
extinção do litígio, mediante concessões recíprocas.
22 MIRABETE, op. cit, p. 125 23 SANTOS, João Manuel de Carvalho,Código Civil brasileiro interpretado. 12.ed. Freitas Bastos,1985 Rio de Janeiro:. p.352
32
Nesse sentido, o Ministério Público é o autor do fato, ao entrarem em
acordo a acerca de uma proposta de aplicação de pena, estarão abdicando
reciprocamente de direitos inerentes a cada um , objetivando prevenir ou
extinguir um litígio.
O litígio, para efeito processual penal, deve ostentar uma noção
particularizada diante de suas próprias peculiaridades, mas não escapa da
definição válida para a lide civil considerada como um conflito de interesses
qualificado por uma pretensão resistida e insatisfeita.
A partir do instante em que é praticado um fato típico e antijurídico,
surge para o Estado o direito de punir e, conseqüentemente, deduzir tal
pretensão punitiva diante do Poder Judiciário.
A finalidade da transação está voltada para a prevenção da lide,
solução do conflito antes de deduzida a pretensão punitiva estatal, ou a sua
extinção, quando a composição verificar-se depois de oferecimento à
denúncia, diante de uma relação jurídica processual constituída.
A sistemática adotada pela nº 9.099/95 prevê um procedimento
preliminar a ser seguido para a instauração da fase conciliatória, em cuja
oportunidade poderá ser alcança a transação antes de ser iniciada a ação
penal, fase esta que busca a prevenção do litígio, que se instaura somente
quando inviabilizada a transação por qualquer motivo, tais , com a recusa do
autor do fato, impedimentos legais ou recusa de apresentação de proposta
pelo MP.
Nada impede, também que ocorra com o propósito de extinguir o litígio,
especialmente se restou inviabilizada a fase preliminar do artigo 76 da Lei
9.099/95, por ausência do autuado. Neste caso, mesmo oferecida a denuncia
e antes do início da instrução - já constituída, assim, a relação jurídica
processual -, abre-se nova oportunidade a transação penal (artigo 79 da
referida lei ). Se a proposta não foi anteriormente feita pelo MP, entende-se
como possível a sua formulação nesta fase procedimental, com propósito de
extinguir a lide penal.
A transação penal será, entretanto, sempre judicial, uma vez que a
referida lei, exige que a conformidade se dê diante do magistrado, que tenha a
33
missão de confirmar a presença dos requisitos legais e a livre manifestação de
vontade das partes, antes de homologar o acordo e impor a sanção
estabelecida pelos transatores.
Assim, a transação penal pode ser definida como ato jurídico através do
qual o MP e o autor do fato, atendidos os requisitos legais e na presença do
magistrado, acordam em conseções recíprocas para prevenir ou extinguir o
conflito instaurado pela prática do fato típico, mediante o cumprimento de uma
consensualmente ajustada.
A transação Penal visa, da mesma forma que a civil (art. 1025 do CC),
prevenir ou extinguir o litígio, entendido como o conflito de interesses que se
estabelece com a prática de um fato típico.
O litígio, seja de natureza civil ou penal, constitui fonte de discórdia e
instabilidade social, impondo-se sua composição, que pode dar-se pela própria
vontade das partes ou pela intervenção do Estado.
Predominou-se, até a promulgação da Lei 9.099/95, a resolução dos
litígios penais pela intervenção compulsória dos órgãos oficiais, que deviam
atuar na busca da pacificação social, que se esperava alcançar com a
imposição da pena, independentemente da potencialidade ofensiva do fato
típico perpetrado.
Reconhecendo sua própria impotência na perseguição de todos os fatos
praticados, o Estado moderno passou a traçar prioridades para sua atuação na
área penal. Não abriu mão por completo da perseguição, mas estabeleceu
formas alternativas de composição dos conflitos menores, representados pelas
infrações de pequeno potencial ofensivo.
Mediante a transação penal, o Estado permite a solução de
determinados conflitos penais de forma diversa da tradicionalmente vigente;
estabelece um espaço para o consenso, visando celeridade na obtenção de
uma solução, para que possa ocupar-se com maior zelo e tempo aos conflitos
de maior gravidade.
Assim, a transação penal objetiva, como medida despenalizadora, evitar
consensualmente a demanda processual penal, prevenindo ou extinguindo
litígios, contribuindo para a pacificação da sociedade.
34
Além disso, tem escopo prático tornar certo um direito duvidoso,
impedindo nova discussão a respeito do mesmo fato, visto que a incerteza
reinante é substituída consensualmente pelas partes, mediante concessões
recíprocas por uma pena a ser imposta pelo juiz, que, uma vez cumprida
cimenta definitivamente a questão.
Diante das demandas sociais presentes na atualidade, algumas idéias
se vinculam à criação de meios alternativos de solução de conflitos.
4.2 - Natureza Jurídica
De acordo com Nogueira24, quanto à natureza jurídica do instituto da
transação penal, mesmo com vigência de oito anos da lei que a criou, ainda há
uma grande divergência nos entendimentos doutrinários e jurisprudenciais
acerca de ser, esta, direito público subjetivo do autuado ou poder discricionário
do Ministério Público.
O mesmo autor, chama a atenção para que pela simples leitura do
artigo 76 da Lei 9099/95, pode-se afirmar com clareza que a transação penal é
poder discricionário do Ministério Público. O “poderá” utilizado no referido
artigo mostra a faculdade do Ministério Público em propor ou não a transação
penal.
No entanto, alguns doutrinadores deixam bem claro que o verbo poder
não deve ser encarado como uma faculdade, e sim, com um dever, sempre
que preenchidos os pressupostos para a aplicação da transação penal.25
Preenchidos os requisitos legais se o Ministério Público não propor a
transação penal poderão incorrer seus agentes m abuso de poder por ofensa a
um direito do cidadão infrator, pois no presente caso, há possibilidade de um
acordo criminal.
Boa parte da doutrina especializada, assim como significativa parcela
jurisprudencial, entende que a natureza da transação penal é de direito público
subjetivo do autuado, com base em que se o autuado preencher os requisitos
24 NOGUEIRA,, op. cit. p.164. 25 NOGUEIRA, op. cit, p. 167
35
subjetivos e objetivos previstos em lei, terá ele direito ao referido benefício
legal,independente da manifestação do Ministério Público.26
Cabe lembrar, que um dos principais objetivos desta lei é a não
aplicação de pena privativa de liberdade, o que reforça a idéia de que a
transação penal constitui mesmo um direito público do autuado.27
Neste sentido, sendo um direito subjetivo do autuado, no caso do
Ministério Público negar a propositura da transação penal, esta pode ser
concedida pelo juiz, desde que o autor de fato tenha direito ao referido
benefício legal, preenchendo os requisitos necessários para que tal instituto
seja concedido, assim, sendo, a concessão dar-se-á de ofício a requerimento
da defesa.28
Neste sentido, o 6º Enunciado dos Magistrados Coordenadores dos
Juizados Criminais conclui: “Não se aplica o artigo 28do Código de Processo
Penal o caso de não apresentação de propostas de transação penal ou de
suspensão condicional do processo,m cabendo ao juiz apresenta-las de ofício,
desde que preenchidos os requisitos legais”. 29
Em sentido contrário alguns doutrinadores afirmam que o juiz não
poderá fazer a proposta ao autuado nem lhe aplicar, imediatamente, pena
restritiva de direitos ou multa, podendo este invocar analogicamente artigo 28
do CPP. Cabe dizer que este posicionamento é seguido pelo Superior Tribunal
Federal.Contudo arte da doutrina compreende que a iniciativa da proposta de
transação penal é exclusiva do Ministério Público.
Essa posição se divide em outras duas: uma que doutrina ser a
transação penal instituto à exclusiva discricionariedade do Ministério Público,
ou seja, mesmo com o preenchimento dos requisitos legais, senão houver a
propositura por parte do Ministério Público o autor do delito não poderá ser
beneficiado pela transação penal; outra que estabelece ser a iniciativa da
26 ZANATA,Airton. A transação penal e o poder discricionário do ministério público. Porto Alegre: Fabris,2001,p.43 27 ZANATA,op.cit.p. 54 28 ZANATA,op. cit. p.55-56 29 JESUS DAMAZIO, E. de . Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada. 4.ed. São Paulo: Saraiva,1997,p.81
36
propositura da transação penal um dever do Ministério Público, quando
preenchidos os requisitos legais, nesse caso devendo ser proposta
obrigatoriamente a transação penal.30
Bitencourt, por sua vez, não segue qualquer das posições acima e
sustenta que: “... se os requisitos estiverem presentes, mas o Ministério
Público, por qualquer razão, não os percebe, não os aceita ou os avalia mal,
como consideramos tratar-se de um direito público subjetivo do réu, só há uma
saída honrosamente legal “hábeas corpus”.31
Há ainda um entendimento sobre a natureza jurídica desse instituto, que
conclui ser um poder discricionário do Ministério Público, pois mesmo que este
esteja exercendo sua obrigação de agir quando não resta totalmente claro o
preenchimento dos requisitos necessários para aplicação da transação penal é
que se faz necessário à avaliação do Ministério Público, onde reside poder
discricionário deste órgão.32
Chega-se, então, a conclusão que é grande a divergência no que diz
respeito à natureza jurídica do instituto da transação penal, no entanto pode-se
colocar aqui como posicionamento majoritário ser, esta, direito subjetivo do
autuado em contraposição ao poder discricionário do Ministério Público.
A propositura e a aceitação da transação penal é feita através de uma
sentença, no entanto resta descobrir qual a natureza jurídica dessa sentença,
o que há grande divergência.
A decisão judicial que legitima jurisdicionalmente a convergência de
vontades entre as partes tem caráter homologatório, neste caso a transação
penal possui sua sentença de caráter homologatório por ser ela uma
conciliação entre as partes, pois é proposta pelo Ministério Público e aceita
pelo autor do delito.33
Para Bitencourt, a natureza jurídica desta sentença é declaratória
constitutiva, com base em que o próprio texto legal exclui qualquer caráter
30 ZANATTA,op. cit. p. 115 31 BITENCOURT, César Roberto.Tratado de direito penal. Parte geral 8.ed. São Paulo: Saraiva, 2003,p.588. 32 ZANATTA,op.cit. p. 116 33 BITENCOURT, op. cit., p. 583.
37
condenatório, já que afasta a reincidência, a constituição de título executivo
civil, de antecedentes criminais, etc.34 Neste mesmo sentido concorda
Alberton.35
Mirabete sustenta tratar-se de uma sentença condenatória imprópria,
segundo ele, a pena restritiva e a multa, impostas na transação penal têm
nítido caráter de sanção penal, porém não se reconhece a culpabilidade, nem
produz efeitos comuns da sentença condenatória.36
Ribeiro Lopes sustenta tratar-se de sentença condenatória, pois impõe
sanção penal transacionada ao autor do fato que deverá ser executada,
voluntária ou coercitivamente.37
Tem-se nesse caso uma sentença meramente homologatória, pois o juiz
não se pronuncia sobre o mérito de um caso penal, ele apenas analisa se
foram preenchidos os requisitos para a aplicação da transação penal, não
emitindo qualquer valor quanto à culpabilidade. Ele apenas homologa um
acordo a que chegaram o Ministério Público e o autor do fato.38 Neste mesmo
sentido Grinover.39
“Trata-se simplesmente de sentença homologatória de
transação, que não indica acolhimento nem
desacolhimento do pedido do autor (que se quer foi
formulado), mas que compõe a controvérsia de acordo
com a vontade dos partícipes, constituindo título
executivo judicial. São os próprios envolvidos no conflito
a ditar a solução para a sua pendência, observados os
parâmetros da lei”. 40
34 Ibid., p. 583. 35 NOGUEIRA, Márcio Franklin, op. cit, p. 194. 36 Ibid, p. 194. 37 Ibid, p. 194. 38 Ibid, p. 195-196. 39 GRINOVER, Ada Pelegrine, op. cit, p. 144. 40 Ibid,. p. 144.
38
4.3 - Cabimento
O instituto da transação penal, só é possível nos delitos de menor
potencial ofensivo, em seu limite máximo, com pena não superior a dois anos,
conforme extensão dada pela lei 10259/01, não mais persistindo a exceção
relativa aos delitos para os quais a lei preveja procedimento especial.41 No
entanto há algumas exceções em que mesmo que o crime se enquadre nos
crimes de menor potencial ofensivo, não será permitida a aplicação da
transação penal.
Estas exceções estão elencadas no art. 76 §2o da Lei 9099/95, que são:
quando o autor da infração tiver sido condenado pela prática de crime a pena
privativa de liberdade por sentença definitiva; quando o agente tiver sido
beneficiado anteriormente no prazo de cinco anos pela aplicação de pena
restritiva ou multa em transação penal; quando não indicarem os
antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os
motivos e as circunstâncias, ser necessária e suficiente a adoção da medida.
No caso de aceitação da proposta formulada pelo Ministério Público, o
juiz, observando o preenchimento de todos os requisitos legais, proferirá a
sentença, homologando o acordo impondo a pena substitutiva, restritiva de
direito, ou multa.42
Poderá o juiz fazendo uso do poder discricionário, no caso de proposta
e aceita pena de multa, reduzi-la até a metade, conforme artigo 76 §1o da Lei
9099/95. Neste caso não haverá reincidência no caso de prática de outro crime
posteriormente. Não constando em certidão de antecedentes criminais e não
terá efeitos civis. Apenas será registrada para impedir a concessão de novo
benefício no prazo de cinco anos, conforme disposto no artigo 76 § 6o da Lei
9099/95.43
Conforme disposto no artigo 76 da Lei 9099/95, está claro que a
transação penal é cabível nos crimes de ação penal pública incondicionada
41 Ibid. p. 166. 42 NOGUEIRA, Márcio Franklin, op. cit, p 162. 43 Ibid, p 163.
39
como também na ação pública condicionada à representação, esta desde que
apresentada.
No entanto, surge uma dúvida quanto à possibilidade da aplicação no
caso de ação penal privativa do ofendido. Nesse sentido há divergência; os
que acreditam não ser possível desrespeitam os seguintes princípios
constitucionais: da igualdade, autores de infrações de menor potencial,
tratados diversamente; da razoabilidade, não há proporcionalidade entre a
reprimenda para uns, de ação pública, em relação a outros, de iniciativa
privada; do devido processo legal, ofensa ao direito público subjetivo do
envolvido em receber os benefícios da lei; do acesso à justiça, a obtenção da
ordem jurídica justa foi cerceada e por último, o mais importante, da dignidade
da pessoa humana, submeter alguém a um processo criminal, vedando-lhe a
possibilidade de obter transação penal para comportamento de menor
gravidade.44
No entanto, se baseiam no sentido de que o legislador, com uma visão
tradicional do papel da vítima no processo penal, sem interesse jurídico na
pena, teve mesmo a intenção de excluí-la da transação penal.45
Com a moderna visão da vítima no processo penal tem-se levado em
conta o reconhecimento de um interesse dela não só na reparação civil, como
também à punição penal, sendo possível ao juiz, por aplicação analógica,
permitir a transação penal nos crimes de ação de iniciativa penal privada, nos
delitos de menor potencial ofensivo por se tratar de analogia in bonam
partem.46
4.4 - Efeitos da Transação Penal
A aceitação da transação penal pelo autuado configura submissão
voluntária à pena não privativa de liberdade, no entanto isso não indica
44 PEDROSA, Ronaldo Leite. Ofendido pode propor transação penal? Disponível em: www.jusnavegandi.com.br/doutrina Acesso em: 23/10/2003 45 NOGUEIRA, op. cit, p. 167. 46 Ibid, p.167.
40
reconhecimento de culpabilidade penal. Da mesma forma a transação
penal não gera reincidência, todavia durante determinado lapso temporal de
cinco anos, é gerada uma anotação para que não se permita nova transação
penal.
Como não gera reincidência não há que se falar em condenação
lançada na folha de antecedentes criminais, a lei é expressa a respeito do
tema no art. 76, §4o e §5o da Lei 9099/95.
Assim como a aceitação da sanção penal não significa reconhecimento
da culpabilidade penal, tampouco importa ela em reconhecimento da
responsabilidade civil, ou seja, há aplicação da sanção penal sem efeitos na
esfera civil.
Por não gerar reincidência e tampouco ser reconhecida à culpabilidade,
não há que se falar em efeitos na esfera cível, já que não se transforma em
título executivo. Poderá, no caso se desejar, propor ação de conhecimento,
nos termos do art. 64 Código de Processo Penal, cabendo ao demandado
discutir livremente sua responsabilidade penal e civil, em contraditório pleno e
cognição exauriente.47
Conclui-se, portanto que a sentença não gera condenação, reincidência,
lançamento do nome do autor do fato no rol dos culpados, efeitos civis e maus
antecedentes.48
Assim como a natureza jurídica da transação penal e da sentença que
homologa a transação penal, os efeitos desta no caso de descumprimento
também é um assunto que gera grande divergência no âmbito dos Juizados
Especiais e nos Tribunais Superiores.
O artigo 76 da Lei 9099/95 ao tratar da transação penal no ordenamento
jurídico vigente, renovou o nosso sistema processual penal, ao permitir ao
autuado a renúncia de certas garantias constitucionais, aceitando a aplicação
47 GRINOVER, Ada Pelegrine; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance; GOMES, Luis Flávio, op. cit, p. 147. 48JESUS, op. cit, p. 81.
41
imediata de pena não privativa de liberdade, ou seja, uma pena restritiva de
direitos, sem que haja em sentido estrito o devido processo legal.49
Partindo-se do entendimento majoritário de que a transação penal é
uma medida alternativa que visa beneficiar o réu, conclui-se que o juiz
homologa a sentença após a propositura pelo Ministério Público e aceitação
pelo autuado.
No entanto há grande controvérsia doutrinária diante da omissão da lei
no sentido do que fazer quando o autuado não cumpre a medida
transacionada.
Entre as várias posições doutrinárias, tem-se: em primeiro lugar que,
não cumprida a pena restritiva de direitos livremente aceita pelo autor do fato,
converte-se ela em privativa de liberdade, uma segunda corrente sustenta a
propositura da ação penal que havia sido evitada com a transação; a terceira
corrente sustenta que a melhor forma é o posterior oferecimento da denúncia
no caso do descumprimento e finalmente a quarta corrente sustenta que a
aplicação de pena alternativa transigida gera uma obrigação de fazer.
No que diz respeito a primeira corrente, que sustenta que não cumprida
a pena restritiva de direitos livremente aceita pelo autor do fato, converte-se ela
em privativa de liberdade, essa não foi a orientação adotada pela Corte
Suprema, já que não há qualquer previsão legal que autorize a conversão em
pena privativa de liberdade de pena restritiva de direito aplicada em
decorrência de transação penal.50
Cabe aqui lembrar que ao aplicar o instituto da transação penal
encerram-se dois pressupostos dos quais os juizes não poderão afastar-se, o
primeiro deles diz respeito ao limite da transação penal só ser aplicada aos
crimes de menor potencial ofensivo, ou seja, os crimes que tenham a pena
cominada em até dois anos, extendida pela Lei 10259/01; e o outro
pressuposto é o objeto da transação penal que é exclusivamente de aplicar
penas alternativas à prisão, ou seja, penas restritivas de direitos ou multa.51
49 NOGUEIRA, op. cit, p. 197. 50 BITENCOURT, op. cit, p. 591. 51Ibid. p. 592.
42
No entanto doutrinadores como Grinover, sustentam que nesse caso a
pena restritiva de direitos deve ser convertida pelo tempo de pena privativa de
liberdade aplicado na sentença. Porém nos Juizados Especiais essa conversão
não pode ocorrer com essa equivalência entre a quantidade de pena restritiva
e a quantidade de pena privativa de liberdade, pois violaria o princípio da
proporcionalidade, por exemplo, uma pena privativa de um mês, foi substituída
por uma pena restritiva de três meses de prestação de serviços, o não
cumprimento deste não poderia ser substituído por três meses de pena
privativa de liberdade, já que a pena cominada anteriormente era de um mês
de pena privativa de liberdade.52
Em sentido contrário, e em favor da orientação adotada pela Corte
Suprema, Bittencourt, acha que a não substituição das penas restritivas de
direito pelas penas privativas de liberdade no caso de descumprimento da
sentença homologatória, deve ser seguido por todo o Poder Judiciário
nacional, em todas as instâncias.53
Já a segunda corrente sustenta que em caso de descumprimento do
acordo não há como converter a pena restritiva de direitos em pena privativa
de liberdade, devendo, ser proposta a ação penal que havia sido evitada com a
transação, com base em que a extinção da punibilidade somente ocorrer com
o cumprimento da pena aceita livremente pelo autuado, implicando o seu
descumprimento rescisão do acordo penal, cabendo ao Ministério Público
aplicar o artigo 77 da Lei 9099/95, iniciando a persecução penal, oferecendo a
denúncia, ou requisitando as diligências que entender necessárias. Esse
pensamento é dos doutrinadores Éd Silva Júnior e Sirvinskas.54
Para Bittencourt, havendo a aplicação da pena transacionada, torna-se
juridicamente impossível nova propositura de ação penal, seja com o
oferecimento de denúncia, ou com nova transação penal. Pois os institutos da
coisa julgada, preclusão e litispendência não foram suprimidos pela Lei
9099/95. A sentença homologatória da transação gera eficácia de coisa
52 GRINOVER, op. cit, p. 190. 53 BITENCOURT, op. cit, p. 592. 54 NOGUEIRA, op. cit, p. 199.
43
julgada material e formal, obstando a instauração de nova ação penal contra o
autor do fato, se descumprido o acordo homologado. Essa orientação é dada
pelo Superior Tribunal de Justiça.55
A terceira corrente acredita que a melhor forma a ser utilizada no caso
de não cumprimento da transação penal, é o posterior oferecimento da
denúncia; no entanto sabe-se que a sentença homologatória faz coisa julgada,
logo não é cabível nova ação, no entanto os juízes passaram a não homologar
a transação penal, para que na hipótese de inadimplemento possa se oferecer
denúncia.
É cabível neste momento relembrar que a natureza de sentença
homologatória foi dada pelos doutrinadores, que no texto da lei traz a palavra
sentença. E que em no sistema penal vigente somente revisão criminal pode
desconstituir sentença, excepcionalmente aceito com igual efeito o habeas
corpus. Ou seja, aplicando-se pena alternativa decorrente da transação penal,
o juiz prolator da decisão esgota sua jurisdição, transitando em julgado,
produzindo coisa julgada formal e material, pois se trata de decisão definitiva.56
Para Damázio de Jesus encerra-se o caso uma vez satisfeita a
prestação jurisdicional, com a homologação do acordo, por não se tratar de
sentença condenatória.57
E por final, a quarta corrente acredita que a aplicação de pena
alternativa transigida com o Ministério Público gera uma obrigação de fazer
para o autor do fato. Conclui-se então que no não cumprimento da transação
penal deve-se proceder a execução forçada, exatamente como se executando
as obrigações de fazer. Porém tal execução não será conveniente, pois na
execução de obrigação de fazer resolve-se em perdas e danos, e no caso de
insolvência do executado não poderão ser aplicadas práticas ilegais nem
legitima arbitrariedade.58
55 BITENCOURT, op. cit, p. 593. 56 Ibid, p. 595. 57 NOGUEIRA, op. cit, p. 199. 58 BITENCOURT, op. cit, p. 595 – 596.
44
Mediante apresentação de todas essas correntes, pode-se chegar a
conclusão que não há o que se fazer no caso de descumprimento da
transação penal.
Porém deve ser buscada para não se gerar a impunidade do autor do
fato ilícito, frustrando a eficiência do sistema implantado pelos Juizados
Especiais Criminais. Seria recomendável, que o legislador suprisse a
deficiência da Lei 9.099/95, prevendo, expressamente, a conseqüência jurídica
do inadimplemento da transação penal pelo autor do fato.
45
CAPÍTULO V
CONSTITUCIONALIDADE DA TRANSAÇÃO PENAL
Apesar da transação penal estar disposta expressamente na
Constituição Federal, não faltou discussão doutrinária a respeito de sua
constitucionalidade.
Antes mesmo da edição da Lei nº 9.099/95 houve muita discussão em
torno dos vários anteprojetos e projetos de lei visando à regulamentação
ordinária do instituto transacional, a doutrina questiona alguns aspectos
constitucionais da possibilidade de aplicação da pena sem processo,
entretanto, não se tem conhecimento de qualquer questionamento a respeito,
como bem explica Zanatta.59
Com o advento da Lei 9099/95, Miguel Reale Junior passou a apregoar
a inconstitucionalidade da aplicação do instituto da transação penal, porque se
violaria o devido processo legal por fazer tabula rasa de alguns importantes
princípios constitucionais penais como o da presunção da inocência, ao
realizar-se juízo antecipado de culpabilidade, com a aplicação da pena, ainda
que não privativa da liberdade. Ademais, o procedimento carece de
“legitimidade de movimentação da jurisdição penal” pela ausência de uma
acusação formalizada, com análise prévia da “existência de convicção da
viabilidade de propositura da ação penal”, decorrente por sua vez da formação
da opinio delictis. De resto, não haveria correlação entre a denuncia, que é
inexistente no caso, e a sentença, que só aparente.60
Posicionando-se pela inconstitucionalidade da transação penal, Rogério
Lauria Tucci, apenas questiona a constitucionalidade da lei ordinária frente ao
princípio da nulla poena sine judicio, já que existiria a possibilidade de
cumprimento de uma pena privativa de liberdade pela eventual conversão da
restritiva de direito aplicada. Mas esta posição foi esposada anteriormente ao
59 ZANATTA, op.cit, p. 35 60 ZANATTA,op.cit, p. 52
46
advento da Lei n° 9.268/96, que coibiu a conversão das penas alternativas à
privativa de liberdade.61
Com essa ressalva, estaria afastada a inconstitucionalidade do instituto
da transação penal.
Sebastião Silvio de Brito, defendendo a inconstitucionalidade da
transação penal, chega a dizer que “seria absurdo uma condenação
consensual”, pois se a ação penal pode ser disponível, o direito à ampla
defesa não o é.62
Muitas críticas Têm sido feitas aos efusivos aplausos lançados à lei nº
9.099/95 pela quase unanimidade da doutrina pátria.
Vários doutrinadores, alguns deles de abalizada cultura, levantam altos
brados contra a transação delineada na norma em foco. Aduziam e ainda
aduzem que estaria a se violar o Princípio do Devido Processo Legal. Não
compactuamos com essa idéia, pois mesmo em se aplicando os preceitos da
Lei n° 9.099/95, haverá atividade jurisdicional, pois o Ministério Público estará
requerendo a aplicação de pena e esta, se aceita pelo réu, será imediatamente
aplicada pela Autoridade Judiciária, se preenchidos os demais requisitos
legais. Estará patenteada, portanto, a sanção. Como dizer, desta forma, que se
violou o Princípio do Devido Processo Legal? Ele continua existindo, tanto que
a lide se formou – de modo bem mais dinâmico e prático – e a prestação da
tutela jurisdicional foi alcançada através do jus puniendi estatal, que é a própria
sanção.63
Na opinião de Lopes, para quem o procedimento transacional “se trata
de um sistema bastante garantidor sob controle jurisdicional”, O processo
penal regulado pela Lei nº 9.099/95 passa a integrar o “devido processo legal
dentro do sistema constitucional brasileiro”, não se vislumbrando, por isso,
nenhum aspecto de inconstitucionalidade.64
61 Apud PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Breves anotações ao instituto da transação penal. Revista dos Tribunais, São Paulo, nº 758, dez.1998,p.422. 62 Idem 63 LIMA E SOUZA, Amaury de. Juizado especiais criminais. São Paulo: Direito,1998,p.31. 64 LOPES,Maurício Antonio Ribeiro.Comentários dos juizados especiais cíveis e criminais. Lei 9099/95,de 26 de setembro de1995. São Paulo: Revista dos Tribunais,1995.p. 347.
47
Igualmente Jesus Damásio comenta:
“O instituto da transação inclui-se no ‘espaço de
consenso’, em que o Estado, respeitando a autonomia de
vontade entre as partes, limita voluntariamente o
acolhimento e o uso de determinados direitos. De modo
que a princípios não devem ser considerados absolutos e
sim relativos, abrindo espaço para a adoção de medidas
que, em determinado momento, são de capital
importância para o legislador na solução de problemas,
cômoda criminalidade, economia processual, custo do
delito, superpopulação carcerária etc. A aceitação, pelo
autuado, de uma pena menos severa, encerrando o
episódio, encontra fundamento como expressão da
autonomia de sua vontade e como livre manifestação de
defesa. Ele, voluntariamente, abre mão de suas
garantias constitucionais.”65
Por seu turno Grinover, conclui pela absoluta constitucionalidade da
transação penal, subsidiando sua posição com entendimentos pretorianos:
“Os tribunais não têm vislumbrado qualquer
inconstitucionalidade na transação penal e muito menos
na suspensão condicional do processo, nenhuma decisão
existindo nesse sentido. O Supremo Tribunal Federal, que
várias vezes se manifestou à unanimidade sobre a
aplicação retroativa da transação penal e da suspensão
condicional do processo, analisando detidamente os
referidos institutos, jamais lhes fez qualquer ressalva sob
o ângulo da constitucionalidade.”66
65 DAMASIO DE JESUS,op.cit. p. 40 66 GRINOVER, op.cit, p.201.
48
Talvez a preocupação inicial d doutrina nacional (orgulhosa da recente
sedimentação em nível constitucional de postulados garantistas, como por
exemplo, os princípios do devido processo legal e da presunção da inocência)
com a constitucionalidade da transação penal, deva-se ao fato do Brasil estar
ainda tentando consolidar-se como um Estado Democrático e Social de Direito
Há muitas décadas vivia-se num país regido por um regime político ditatorial. O
poder ditatorial sucedia-se nas mãos dos presidentes militares que, via de
regra, “governavam” sob a égide dos atos institucionais e por meio de
decretos-lei implementavam suas políticas, inclusive, é claro, a criminal.
Política criminal, sobretudo voltada à questão de segurança nacional.
Retrocedendo-se um pouco mais na recente história nacional, verifica-se
que os atuais Código Penal e Código de Processo Penal, promulgados sob o
manto ditatorial, foram editados por decretos-lei em meio à ditadura de Getúlio
Vargas. Mas, o decreto-lei sobrevive, transfigurado que foi em medida
provisória. Por isso, deve-se lembrar, que não é freqüente, especialmente no
atual entorno cultural latino-americano, o uso ou tentativa do uso de medidas
legislativas excepcionais de competência exclusiva do Presidente da
República, para disciplinar matéria penal.
49
CONCLUSÃO
O Instituto da transação penal, instrumento jurídico processual penal
sem similar na legislação, deve ser entendido como benefício a ser concedido
pela Justiça Penal a qualquer cidadão que venha a cometer uma infração de
menor potencial ofensivo, ou seja, contravenção penal ou crime cuja pena
máxima não seja superior a um ano, se a lei não prever rito especial.
Afastam-se assim, na repressão aos delitos de pequena monta, os
efeitos do processo criminal tradicional e, principalmente, de eventual
condenação.
Sua institucionalização no ordenamento jurídico brasileiro é fruto de uma
tendência mundial de descriminalização fundada no princípio de intervenção
mínima do Direito Penal, visando à implantação de uma Justiça Criminal
baseada no consenso entre as partes para a resolução do conflito penal
instaurado.
Naturalmente, só é aplicável à criminalidade de pequena gravidade,
onde se permite ao Estado transigir como agente violador da norma
incriminadora, no sentido de obter uma solução despenalizadora.
É inaceitável que na eventualidade do Ministério Público negar-se a
efetuar a proposta de aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou
multa, mesmo que justificadamente, ou, ainda no caso de ausência estando
impedido de se manifestar nos autos, aquela pode ser concedida pelo juiz,
desde que à luz do seu julgamento, o autor do fato tenha direito ao referido
benefício legal.
Pela outra compreensão do instituto, com a qual concorda-se
plenamente, por entender ser ela mais adequada com o espírito da Lei dos
Juizados Especiais Criminais, a iniciativa da proposta de transação penal é
exclusiva do Ministério Público, jamais podendo ser alcançada ao autuado,
sem, no mínimo a concordância órgão público incumbido pelo Estado da
perseguição criminal em juízo.
Por tudo que foi visto, na presente monografia, chega-se à conclusão de
que o melhor entendimento sobre a natureza jurídica do instituto da transação
50
penal é a que a considera como peça de uma ação penal condenatória
diferenciada, de iniciativa do Ministério Público, orientada pelo principio da
obrigatoriedade quando satisfeitas todas as condições legais, mas permitindo
certa margem de discricionariedade na avaliação dos critérios subjetivos.
51
BIBLIOGRAFIA
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Curso de direito administrativo. 9. ed.
São Paulo: Malheiros, 1997.
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Paulo: Saraiva, 2003,p.588.
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12.ed. Rio de Janeiro:. Freitas Bastos, 1985.
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2.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995.
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São Paulo: Saraiva, 1997.
LIMA E SOUZA, Amaury de. Juizado especiais criminais. São Paulo: Editora do
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LYRA, Roberto Guia de ensino e do estudo do direito penal. Rio de Janeiro:
Forense, 1956.
LOPES, Maurício Antonio Ribeiro. Comentáriosdos juizados especiais cíveis e
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Tribunais, 1995.
MARQUES José Frederico Marques, Elementos de direito processual penal,
v.1 Rio de Janeiro: Forense, 1961.
52
NOGUEIRA, Márcio Franklin. Transação penal. São Paulo: Malheiros. 2003.
PEDROSA, Ronaldo Leite. Ofendido pode propor transação penal? Disponível
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PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Breves anotações ao instituto da
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REALE Miguel, Horizontes do direito e da história, Rio de Janeiro: Saraiva,
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SOBRANE, Sérgio Turra. Transação Penal. Rio de Janeiro: Saraiva. 2001.
TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de direito penal. 5.ed. São
Paulo: Saraiva, 1994.
ZANATA, Airton, A transação penal e o poder discricionário do ministério
público. Porto Alegre: Fabris, 2001, p.43.
53
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 6
SUMÁRIO 7
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
Evolução Histórica do Processo Penal
1.1 - Considerações Iniciais 10
1.2 - Período colonial 11
1.3 - Brasil império 12
1.4 - Período republicano 13
1.5 - Tendências atuais 16
CAPÍTULO II
Juizados Especiais 17
2.1 - Criação dos Juizados Especiais Criminais 18
2.2 - Competência dos Juizados Especiais Criminais 20
2.3 - Despenalização e descriminalização 20
2.3.1 - Despenalização 21
2.3.2 - Descriminalização 22
CAPÍTULO III
Princípios da Ação Penal
3.1 - Princípio da Obrigatoriedade 25
3.2 - Princípio da Discricionariedade 27
54
CAPÍTULO IV
Transação Penal 29
4.1 Conceito e características 30
4.2 Natureza jurídica 34
4.3 Cabimento 38
4.4 Efeitos da transação penal 40
CAPÍTULO V
Constitucionalidade da Transação Penal 45
CONCLUSÃO 49
BIBLIOGRAFIA CITADA 51
ÍNDICE 53
55
FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: Universidade Candido Mendes – A Vez do Mestre
Título da Monografia: A TRANSAÇÃO PENAL E SUAS CONSEQUÊNCIAS
Autor: Simone Allem Allam Rentroia
Data da entrega: 09 de outubro de 2007
Avaliado por: Conceito: