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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
OS CONTORNOS DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL
Por: Fernando Cunha Vellozo
Orientador
Prof. Dr. Francis Rajzman
Rio de Janeiro
2010
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
OS CONTORNOS DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como requisito parcial para
obtenção do grau de especialista em Direito e
Processo Penal
Por: Fernando Cunha Vellozo
3
AGRADECIMENTOS
Aos amigos Cristina, Giovanni, José
Eduardo, Marcelo, Raffaele e Patrícia,
pela cessão de alguns do materiais
consultados, e ao Flamengo, que
mantém a chama viva.
4
DEDICATÓRIA
Dedico este agradável esforço a Adriana,
Sophia e Praxedes.
5
RESUMO
Vamos explorar o desenvolvimento histórico do direito penal, chegando
até o seu estudo e aplicação hoje, no Brasil. País jovem, mas, colonizado que
foi, importou um aparelho jurídico-penal provindo do Velho Continente, mas
que logo se tornou, como é de se esperar, material de estudo e reelaboração.
Hoje estamos numa posição de iminente maturidade democrática, em
geral, e jurídico-penal, em particular. Isto nos impõe a crítica das teorias e
tendências jurídicas em voga, ou mesmo adormecidas, no contexto geral da
prática e do debate democrático, bem como do autoritário.
Com efeito, esse autoritarismo endêmico — que conspurca nossa
aspiração a gozar da reputação de sociedade democrática avançada, por uma
evidente contradição em termos — deitou fundo as suas raízes neste solo, não
sendo tarefa fácil agora tentar, em bloco, arejar o seu solo institucional-legal.
(Isto se dará em etapas, em setores, em níveis).
Decorre da míngua da soberania popular e da arrogância estatal a
profunda crise de legitimação do sistema penal, tema hoje recorrentemente
debatido pelos operadores do direito no Brasil e em outros países.
Saída possível para essa problemática complexa deve passar, por força,
pela despenalização e pela adoção crescente do paradigma restaurativo, dado
o fracasso das formas tradicionais de punição, com vistas de obter a paz
social.
6
METODOLOGIA
O presente trabalho tem cunho eminentemente bibliográfico, embora
partindo de questionamentos que têm como objeto o sistema penal e que
surgem da própria condição do convívio social em que está inserido o
pesquisador. Isto é o mesmo que dizer que a matéria de nossos estudos já
vem despertando-nos curiosidades teóricas a partir do próprio noticiário a que
assitimos regularmente, dos diálogos no meio jurídico que porventura
frequentamos, dos (poucos) bons filmes que põem em cheque esse mesmo
sistema, de boas leituras — em suma, da experiência politicossocial, a que se
juntam toda a bibliografia técnica consultada e os ensinamentos que temos
havido recentemente no IAVM.
Mais objetivamente, a presente pesquisa é qualitativa, social, de
natureza bibliográfico-descritiva.
Vale notar também a visada diacrônica, a genealogia dos problemas
jurídico-penais que aqui debatemos. Assim, surpreendemos estruturas tão
dificilmente modificáveis, a par das mudanças sempre ocorridas, inclusive
relativas às primeiras. Uma perspectiva que remete à imagem da espiral.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I - Para uma ciência do direito 09
CAPÍTULO II - As tarântulas 26
CAPÍTULO III – O elixir 36
CONCLUSÃO 41
BIBLIOGRAFIA 43
ÍNDICE 48
FOLHA DE AVALIAÇÃO 50
8
INTRODUÇÃO
Vivemos em uma era fecunda, nova época de crise, em que a miríade
de soluções apresentáveis, em face dos múltiplos problemas da convivência
humana, impõem novamente a tarefa de pensar o direito. Este, enquanto
técnica social, não o vejo de forma outra, que não sob o signo da historicidade,
vale dizer, da nossa velha errância fracamente concatenada: Retorno.
De fato, o direito, ao longo da história do Ocidente, veio a constituir-se
como ciência na esteira de um vasto desenvolvimento, que tem, no bojo de
sua pré-história, um momento especial no limiar da época trágica dos gregos,
em que os seres humanos ensaiavam inventar o conhecimento.
Com a chegada da civilização ocidental no Brasil, com a indefectível
marca provinciana do atraso, tem início a história do nosso Direito Penal. País
jovem, na vigência de um regime democrático incipiente, dirigido à sociedade
cheia de desigualdades arraigadas, debate-se hoje entre o impulso autoritário
da coerção irrefreada e a postura atenciosa de outros paradigmas penais,
como a justiça restaurativa, que se ocupa não com a retribuição ou a
ressocialização, mas com a solução.
9
CAPÍTULO I
PARA UMA CIÊNCIA DO DIREITO
1.1 – As origens
Da passagem da Idade do Bronze à do Ferro; então da era minóica à
micênica e desta à homérica; dos reis divinos à ascensão das aristocracias e
destas à famigerada democracia (que arruinou a Grécia), com as discussões
na ágora, a isonomia (que era, antes de mais nada, atributo dos aristocratas),
as leis escritas de Sólon, superiores a todos, a publicidade, a participação
(censitária, quer dizer, de acordo com os rendimentos) — assistimos à
laicização, secularização da palavra, que perde gradativamente seu lastro
divino, a eficácia que a distinguia, no âmbito do poeta, do adivinho e do rei de
justiça:
“O declínio da palavra mágico-religiosa coincide,
notadamente, com um momento privilegiado da história
do direito. O pré-direito oferece um estado de
pensamento em que as palavras e os gestos eficazes
comandam o desenrolar de todas as operações. (...) A
eficácia mágico-religiosa converteu-se em ratificação do
grupo social.” (DETIENNE, 1988, p.54).
Segundo o mesmo estudioso, documentos cuneiformes publicados por
G. Dossin e comentados por C. Picard atestam que desde o Terceiro Milênio,
na Suméria, praticavam-se ordálias fluviais; um de tais relatos “prova que,
tanto no Alto Eufrates como em Mari, praticava-se a ordália segundo um
procedimento idêntico ao que é descrito no parágrafo 2 do Código de
Hamurábi.” (Idem, 1988, p. 26). O livro de Detienne se debruça, com
profundidade, no tema da palavra eficaz, mágica, que está na base dos
10
procedimentos judiciais do mundo antigo: “suas sentenças de justiça, suas
thémistes são, de fato, espécies de oráculos.” (Ibidem, 1988, p. 35), bem como
trata da perda dessa eficácia.
É o despertar da palavra-debate, da argumentação, também dos
mestres de virtude. Da sentença há que se prestar contas doravante.
Destaque-se a contribuição espartana, a primazia da guerra, que implicou nova
organização, de tipo mais horizontal (que a tirania, por exemplo), em que o
chefe extraordinário era o ordenador e mantenedor.
“É a ordem, ao contrário, que regula o comportamento de
todos os indivíduos, que impõe um limite à sua vontade
de expansão. A ordem é primeira em relação ao poder. A
arché pertence na realidade exclusivamente à lei.”
(VERNANT, 1972, p.47).
O direito romano teve importância fundamental para o desenvolvimento
de uma ciência do direito. Na realidade, é uma longa história, que perpassa a
Roma monárquica, a republicana e a imperial, espraiando-se por cerca de
doze séculos. Nessa primeira fase, “o Direito (jus quiritarium), prevalentemente
consuetudinário, era rígido, formalista e solene" (PRADO, 2002, p. 48). Data
de então a Lei das XII Tábuas (séc. V a.C.) “Com ela inicia-se o período de
vivência legislativa, com a consequente limitação da vingança privada, pelo
talião e pela composição” (Idem, 2002, p. 49). Conhecemos, então, diversos
importantes institutos jurídicos da seara penal, v.g., “erro, culpa (leve e lata),
dolo (bonus e malus), imputabilidade, coação irresistível, agravantes,
atenuantes...” (MIRABETE, 2001, p. 37), bem como “nexo causal, (...) caso
fortuito, inimputabilidade, menoridade, concurso de pessoas, legítima defesa,
penas e sua dosagem.” (MASSON, 2009, p. 49). Aliás, tudo isso é de se
esperar, em se tratando do povo mais politizado de todos os tempos, já,
naquela época, dotado de um aparelho estatal de uma organização e
funcionalidade exuberantes.
11
Após a dilaceração do Império Romano do Ocidente, o Velho
Continente foi tomado de assalto pelos ditos bárbaros, como sabemos:
vândalos, ostrogodos, visigodos, burgúndios e francos seriam as tribos mais
representativas desse acontecimento. Nenhum deles havia formado Estados
ou fundado cidades. Mantiveram, quase sempre, o instituto da personalidade
das leis, quer dizer, ainda onde houvesse convívio entre os clãs ou famílias
heterogêneos, cada qual era julgado pelas leis de sua origem. Diplomas legais
e compilações havia, caracterizando a existência de leis penais, com a
cominação de penas mais ou menos detalhadas, conforme o caso.
Certamente, trata-se de longos desdobramentos, que foram ganhando
feições, que têm também seus marcos. Demarcam, com efeito, a trajetória de
uma racionalidade crescente, que caracteriza o alvorecer da civilização
ocidental, desde a antiguidade greco-romana — mas que definha no período
medievo [“Todo progresso em grande escala tem de ser precedido de um
enfraquecimento parcial” (NIETZSCHE, 1983, p. 106)] —, que recrudesce na
Renascença e, vertiginosamente, na Era Moderna, parecendo encontrar, em
nossos dias, já tardia ocasião de revisar e refrear suas predisposições.
1.2 – Direito natural e direito positivo
Aristóteles já apresenta, com clareza, em sua Ética a Nicômaco, livro
V, §7, a oposição entre direito natural e legal, sendo ambos mutáveis; aliás,
sistemático, em sua Física já distinguia os entes entre os que são por natureza
e os instituídos pelo homem.
Da concepção do direito como participação na ordem natural, que é
Deus (antigos), ou é de Deus (medievais), chegou-se à formulação, nos
séculos XVII e XVIII, de um direito natural fundado, sim, na necessidade de
regulamentação, mas a que se chega por meio da razão própria, autônoma. É
o Jusnaturalismo, impulsionado por Hugo Grócio (1583-1645), e que teve
vários expoentes, como Thomas Hobbes (1588-1679), Samuel Pufendorf
(1632-1694), John Locke (1632-1704). Para os dessa escola o direito é um
12
meio cujo fim é um valor. As definições de direito que possamos encontrar nos
escritores respectivos são definições valorativas e, segundo opositores, de
tendência ideologizante. Como, por exemplo, se disséssemos que o
ordenamento jurídico visa à paz, ao bem, ao progresso econômico, à proteção
da propriedade privada, à justiça, etc. [Mas, e se visa à ordem? Pois bem, se
ordem é o resultado que se atinge no decorrer da atuação de um sistema
normativo, até aí fica totalmente em aberto a discussão sobre se a ordem é um
valor ou um mero estado de coisas, assaz independente de valoração.]
Tornou-se já lugar-comum citar-se o interdito de Creonte, rei de Tebas,
como modelo de antinomia entre direito natural e positivo. Aprovo a
insistência... Filhos de seu cunhado Édipo, Etéocles e Polinice mataram-se
reciprocamente. Pois Creonte, devido a animosidades com relação ao último,
baixou uma norma que proibia que lhe enterrassem o cadáver. Das irmãs dos
mortos, Ismênia é a que quer-se curvar, mas Antígona decide enterrar Polinice,
e fala diretamente a Creonte, de cabeça erguida:
“Sim, porque não foi Zeus quem promulgou para mim
essa proibição, tampouco foi Nike, companheira dos
deuses subterrâneos, quem promulgou semelhantes leis
aos homens; e não pensei que os teus decretos, como
mortal que és, pudessem ter primazia sobre as leis não
escritas e imutáveis dos deuses. Não são de hoje nem de
ontem essas leis; existem desde sempre e ninguém sabe
a que épocas remontam.” (SÓFOCLES, 1980, p. 85)
E então, quando a lei positiva é repulsiva, arbitrária, o que se deve
fazer? Bem, no caso de Antígona, cabe o instituto da objeção de consciência;
mas assim cometeríamos um anacronismo caricato; e não dá mais tempo de
salvá-la, mesmo. Cerca de 470 anos após, Jesus de Nazaré propôs aos
capciosos herodianos uma possível solução, e criteriosa, para o juízo, com as
palavras: “Dai, pois, a César o que é de César e a Deus o que é de Deus.” (Mt,
22, 21). Entretanto, há que ser o caso apropriado, também. Diz Aristóteles,
13
tratando de equidade, que “toda lei é universal, mas a respeito de certas coisas
não é possível fazer uma afirmação universal que seja correta.”
(ARISTÓTELES, 1979, p. 136). Não pensemos que toda relação é de
univocidade, sobretudo em direito penal. Quanto a isto, cumpre observar-se a
lição de Paul Ricoeur:
“Assim, é preciso interpretar a lei para decidir em que
acepção ela convém ao caso; mas também é preciso
interpretar o caso, principalmente na forma narrativa, para
estatuir o grau de conveniência mútua entre a descrição
do caso e o ângulo pelo qual a lei é interpretada.”
(RICOEUR, 2008, livro 2, p. 246).
É caso de decifrar o mandamento legal, mas também, e não em menor
grau, de decifrar o caso, só impropriamente chamado aqui de “fato”. Mas
deixemos logo essas questões intricadas de interpretação. Notável a
caracterização, em Sófocles, da lei natural ou divina (uma identificação que
não é ingênua) como não escrita, imutável e sempiterna. Realmente, não cabe
aí uma intromissão qualquer do legislador, a menos que este fosse também
sábio, ou sacerdote. Diz o fragmento 135, de Empédocles de Agrigento, seu
contemporâneo, que data de c. 450 a.C.: “Mas a lei válida para todos estende-
se pelo éter largamente difundido e pela imensurável luz do céu.”
(EMPÉDOCLES, apud BORNHEIM, 1997, p. 81)
Dentre os que professaram o jusnaturalismo, é mesmo curioso o caso
de Hobbes, para quem os seres humanos têm naturalmente direito a tudo,
razão mediata da guerra de todos contra todos. Donde a necessidade, de
saída, de positivação, mediante o contrato social, no qual todos os cidadãos
entregam o poder (que lhes seria, no caso, inerente) ao Estado — fundado na
coerção. Hobbes é um jusnaturalista que proclama a perfeita ineficácia do
direito natural — começa jusnaturalista e conclui juspositivista. Bobbio já
encontra em Hugo de São Vitor (1096-1141), antes de Abelardo (1079-1142), a
menção a uma justitia positiva, além de uma naturalis (BOBBIO, 1995, p. 239).
14
O Positivismo Jurídico foi, em linhas gerais, um grande avanço.
Sobretudo em virtude do surgimento de uma verdadeira ciência do direito, que
vive, enquanto ciência moderna, na utopia de ser avalorativa. Quer dizer, o
direito, em seu formalismo, não dependerá das noções de bem e mal, sequer
da de justiça. Em outros termos, não tem, ou não pretende ter embasamento
moral. Em suma, é justo aquilo que está na lei. Se é promulgada validamente
uma lei que nos proíba de andar pé ante pé, obrigando-nos a saltar num pé só,
tudo está conforme o direito, então: é justo. O que importa mesmo é o
pedigree, no chiste de Ronald Dworkin. [Agora, o problema da
constitucionalidade, é claro, teria de ser levantado numa tal discussão, bem
como o dos princípios, hodiernamente: mas justamente por encontrarmo-nos
um passo epistemológico à frente, correto?]
Na devida ocasião, poderemos vir a discutir se todo o ordenamento
jurídico está ou não está voltado para alguma finalidade.
Não obstante, foi bem observado que o positivismo jurídico, ao
contrário do seu antípoda, estático e conservador, “é um sistema dinâmico em
razão de se reconhecer como um produto da atividade humana.” (DUTRA,
2008, p. 24). Persuasivo, visto por esse ângulo da criatividade, do evolutivo.
Mas que necessidade há nisso? Que o natural seja estático, por seu turno, é
todo aristotélico — mas nem todos havemos de sê-lo. Vá lá que essas críticas
recíprocas entre os defensores do direito positivo e os do natural se voltariam
mais exatamente aos possíveis, talvez até raros defensores da posição
extremada, de um e outro lado. Quer dizer, invectiva-se não o oponente, mas a
sua caricatura. Os grandes teóricos sabem perfeitamente que os opositores
amiúde são preparados, proficientes. Uns fazem essa caricatura pedagógica
magnificamente, e o maior exemplo é Nietzsche, sem dúvida. Mas vejamos, ao
contrário, como a teoria soa, na própria voz de Hans Kelsen:
“O Direito positivo é essencialmente uma ordem de
coerção. Ao contrário das regras do direito natural, as
suas regras derivam da vontade arbitrária de uma
autoridade humana e (...) elas não podem ter a qualidade
15
da auto-evidência imediata.” (KELSEN, apud DUTRA,
2008, p. 24).
“A ciência” alija de seu estádio toda dimensão de valor. Ela trata de
fatos. E esses fatos já vêm todos feitos. É o chamado objetivismo, lutando,
naquele momento, com sua antítese — seu contraponto — o subjetivismo.
Com o mister de obter o conhecimento puramente objetivo, o cientista
proclama que recebe a realidade tal qual ela é, conquanto possa até teorizar
que isto demande um preparo intelectual, um arcabouço, ou quaisquer outras
condições especiais de atitude, de empostação. Mas não há ainda uma
legítima noção de construção do conhecimento. É uma espécie, então, de
realismo. Realismo derivado, cremos, do pensamento aristotélico, coisa antiga.
Sim, a definição de direito em termos avalorativos, meramente fatuais tem,
também, seus precursores. Bobbio já vê em Marsílio de Pádua (c.1280-c.1343)
“uma definição neutral do direito”, em que “a lei indica somente uma realidade
fatual, isto é, um comando do Estado que se faz valer coativamente.”
(BOBBIO, 1995, pp. 140-141). Ressalvamos que o contexto de seu livro,
Defensor Pacis, era jusnaturalista, em toda a sua extensão. Mas ideias vêm e
vão; basta pensar, por exemplo, na teoria do átomo, de Leucipo de Abdera e
desenvolvida por Demócrito, no século V a.C., obscurecida por milênios e
renata no século XIX, quando passa a ser considerada uma verdade, vale
dizer, virou “fato”; assim como o movimento da Terra, que “se tornou” verdade
com Galileu.
“No reino das ideias existem apenas a originalidade e a
profundidade, que são qualidades pessoais, mas
nenhuma novidade absoluta ou objetiva; as ideias vêm e
vão, duram algum tempo, podem até alcançar certa
imortalidade própria, dependendo do seu poder de
iluminar e esclarecer, que vive e perdura
independentemente do tempo e da história.” (ARENDT,
2008, p. 271).
16
Por outro prisma, como tudo decai, pode virar letra morta, podemos
retroativamente tentar identificar, entre os usos sociais e irrefletidos de certas
expressões, as suas feições, quer dizer, sua inspiração. Mas sempre o que
ocorre nestes casos é uma apropriação, uma nova contextualização, que
talvez vivifique, em certo grau, a verdade originária, temperando talvez o
mecanismo agudamente percebido por Sartre:
“Uma verdade não é advinda, é adveniente. E ao término
de seu advir ela morre. Não quer dizer que se torne falsa.
Torna-se indeterminada, ou seja, não mais a
apreendemos em seu contexto e com suas articulações,
mas como um osso com o qual se constitui um novo
organismo. Neste momento, é absolutamente indiferente
saber como ela se tornou: o advir morto do princípio de
Arquimedes não interessa mais a ninguém. Mas porque
se articulou tanto tempo com o Eterno, o homem preferiu
as verdades mortas às verdades vivas e fez uma teoria da
Verdade que é uma teoria da morte. (SARTRE, 1990,
p.33).
É bastante curiosa toda essa estrutura de pensamento cientificista da
modernidade, da qual o positivismo é tributário e móbil. Ela denota o otimismo
e o embevecimento dos homens com os prodígios na nova ciência. Há então
uma perspectiva romântica da ciência: ela iria resolver todos os problemas
humanos. E de que forma? Ora, não se metendo em questões de causas ou
princípios, visto como a estes não é bem aplicável o método científico. Este
seria puramente descritivo, lidaria apenas com fatos e as relações entre os
fatos. Os princípios são com a metafísica, que não tem valor algum, como para
Wittgenstein: “Nada está oculto.” (WITTGENSTEIN, 1979, p. 132). Tudo é
superfície, não pode haver nenhuma profundidade, em última análise.
Retomando, podemos surpreender, em meio a expressões
quotidianas, fragmentos ainda circulantes de ideologia positivista. Queremos
17
exemplos? “O que não tem remédio, remediado está.” “É assim porque é.”
Isso, parece-me, é profundamente positivista. Pois tudo no mundo das ideias
descamba, malgrado seu, numa ideologia. Ora, “a ambição do positivismo
jurídico é assumir uma atitude neutra diante do direito, para estudá-lo assim
como é, e não como deveria ser: isto é, ser uma teoria e não uma ideologia.”
(BOBBIO, 1995, P. 223). E não consegue. É como pular sobre sua própria
sombra. Necessário seria haver a criação absoluta, ex nihilo, no terreno das
ideias e das teorias, para que não houvesse imersão primordial nas águas da
ideologia e do valor. Mas o pensador em nós acha que dá para sair. Em
verdade, não há saída.
“Pretender, porém, que toda ideologia seja por definição
negativa e deva desaparecer leva ao absurdo, à utopia de
querer construir uma sociedade que encontre as suas
balizas exclusivas no teórico, na práxis crítica, ou na
medida crítica da práxis.” (BORNHEIM, 1980, p. 116).
O grande otimismo, ou talvez superficialidade do positivismo começa a
ruir, sobretudo com o surgimento de um novo paradigma ontológico (e, por
decorrência, epistemológico) chamado fenomenologia — que supera a
dicotomia sujeito-objeto. Não há mais sujeito puro, nem mero objeto, como
havia para Kant. Mas há, também, um mister de depuração, até de
conhecimento rigoroso. Muitos são os pensadores que adotaram, ou partiram
da fenomenologia, criada por Edmund Husserl, como Maurice Merleau-Ponty,
Martin Heidegger, Paul Ricoeur, Hannah Arendt, entre outros. Gostaria de
mencionar Gaston Bachelard, em razão de seus estudos no campo da
epistemologia, quer dizer, da questão do conhecimento, em geral, e da ciência,
em particular. Para ele a história das ideias não é contínua, mas justamente o
contrário, é traçada através de rupturas, que chamou de “cortes
epistemológicos”. “O conhecimento científico é sempre a reforma de uma
ilusão.” (BACHELARD, 1978, p. XIII). Isto não significa que tudo em ciência é
falso, absolutamente. Apenas está-se dizendo que o conhecimento atual,
18
histórico, concreto é sempre provisório. Nesse sentido, há desenvolvimento,
expansão, mas não propriamente progresso: isto não é darwinismo.
Quanto às fases epistemológicas do direito, em particular o penal,
ainda se destacam, nessa linha “evolutiva”, o neokantismo, o finalismo, o
normativismo, subdividindo-se em normativismo teleológico-funcional e
normativismo funcionalista sistêmico, além do garantismo e o funcionalismo.
Com toda a franqueza, quantos forem os historiadores do direito, tantas serão
as listas, como essa. “Porém é de salientar que as fases ou épocas da história
penal não se apresentam de forma estanque ou isolada; ao contrário,
interpenetram-se continuamente” (PRADO, 2002, p. 47). Importante é essa
noção de interpenetração, de dialética. Está-se, em verdade, simplificando
porque, se formos aqui começar a contabilizar todos os “-ismos” empregados
ou defendidos pelos doutrinadores, logo já se vê que o tempo não comporta.
Isto não apenas numa visada diacrônica, mas também sincrônica, vale
ressaltar — e sobretudo em nossos dias, em que muitas são as diferenças
imersas na panela-de-pressão social. Em doutrina existe essa coisa de
“corrente”. É corrente para cá, corrente para lá, tem para todos os gostos. Isto
parece não deixar qualquer dúvida quanto a ser pernicioso para o universo do
direito penal, uma vez que é nesse ramo que o Estado aplica a sanção mais
violenta aos jurisdicionados, e não convém a instabilidade. Ou, ao contrário, é
justamente benéfica a pluralidade de razões, de teses em que se agarrar... Em
razão disto é que ocorre saber-se que, recorrendo até o Supremo Tribunal
Federal, a tese tal ou qual será acolhida, que no Superior Tribunal de Justiça
seria o mesmo, ou o oposto. É como se um posicionamento fosse uma
promessa. Assim, “a imprevisibilidade dos negócios humanos” e a
“inconfiabilidade dos homens” seriam “uma espécie de oceano no qual [se]
podem instalar certas ilhas de previsibilidade e erigir marcos de confiabilidade”
(ARENDT, 2008, p. 256). Isto é dito para o contexto das sociedades baseadas
em contratos e pactos — que inclui a nossa —, nos dois estupendos capítulos
centrais de A Condição Humana, de 1958, que se chamam A Irreversibilidade
e o Poder de Perdoar e A Imprevisibilidade e o Poder de Prometer. [Anote-se
que o asseguramento nunca é de fato total. Nem deve ser. “— Não nos
19
deixaríamos queimar por nossas opiniões: não estamos tão seguros delas.
Mas, talvez, por podermos ter nossas opiniões e podermos mudá-las.”
(NIETZSCHE, 1983, p. 150)].
1.3 – Direito penal no Brasil
1.3. 1 – Período Colonial.
Em primeiro lugar, os historiadores do direito brasileiro desqualificam
por inteiro as práticas penais dos silvícolas que descobriram o Brasil, cujas
tribos se encontravam, posto que cada uma em seu estágio, no que se pode
abranger com o título de Idade da Pedra Lascada. Donde “as ideias de Direito
Penal que podem ser atribuídas aos indígenas estavam ligadas ao direito
costumeiro, encontrando-se nele a vingança privada, a vingança coletiva e o
talião.” (MIRABETE, 2001, p. 42). O que havia eram tabus, não normas
penais. Entretanto havia,
“ainda que de modo empírico, a composição, inicialmente
por acordo entre as famílias e com caráter de
indenização, e a expulsão da tribo. No que toca às formas
punitivas, havia predomínio das corporais, sem tortura.”
(PRADO, 2002, p. 93).
Quer dizer, teremos que tratar da parte que “conta”. O direito no
período colonial foi todo importado, sem mais, transplantado para este solo,
num contexto inteiramente diverso daquele no qual foi criado; portanto, atópico
e anacrônico. Basta considerar que emanavam de um Estado de tradição
feudal. Em verdade, até que nem tão inapropriado, porquanto consistisse num
direito para o colonizador, sobretudo em defesa deste. A bem da verdade, toda
a legislação que podemos destacar como vigente nesse período era mais para
constar do que para se observar. Isto porque os donatários das capitanias
20
hereditárias, é claro, exerciam um poder direto e implacável em face dos
colonos, indígenas, escravos, proxenetas, aventureiros, invasores e, numa
palavra, toda a escória. Em todo caso, eram traços comuns às Odenações
Afonsinas, Manuelinas e Filipinas as penas crudelíssimas (amputações,
marcação com ferro em brasa, esquartejamento e açoite, para dar alguns
exemplos) e a ausência de garantias. Especialmente durante a vigência das
Ordenações Filipinas, de 1603 a 1830, marcadas pela ampla e generalizada
criminalização, a indiferença quanto à apreciação das provas, a não-
individualização das penas, a sanha usurária nas imposições de penas de
multa, e muitas outras mercês. Do ponto de vista da técnica legislativa, então,
é aquela chusma de disparates. Temos a respeito um comentário de Augusto
Thompson, donde destaco:
“A matéria criminal está disposta de forma assistemática e
irracional: os comportamentos incriminados, em número
excessivo, referem tipos difusos, obscuros, derramados,
por vezes conflitantes; as penas são desproporcionais e,
sempre, por demais cruéis; multas são cominadas para
atender a exigências de política criminal mas com
evidente intuito de locupletar o fisco; admitem-se
tormentos, as provas semiplenas, os indícios,
especialmente nos delitos mais graves.” (THOMPSON,
apud PRADO, 2002, p. 96).
Parece que estávamos, no início do século XIX, tão adiantados (ou
menos) em matéria de direito penal quanto a Roma do século II ou III.
A transferência, ora, digamos fuga da família real portuguesa para o
Brasil, em 1808, implicou a criação da Intendência Geral da Polícia da Corte e
do Estado do Brasil, aos 10 de maio daquele ano. O primeiro intendente da
polícia chamava-se Paulo Fernandes Viana, que demorou-se no cargo até 26
de fevereiro de 1821, e detinha poderes legislativos, executivos e judiciais. A
Intendência subordinava a Guarda Real de Polícia, criada em maio de 1809,
21
com o escopo de manter a tranquilidade pública, mediante porrada, pra mais
de metro. Um major da nova corporação que muito se destacou, Miguel Nunes
Vidigal, ficou famoso por sua truculência e suas folclóricas “ceias de camarão”,
que consistiam em descascar o paciente, até chegar à carne. Os castigos e
prisões efetuadas por ele e seus soldados incidiam quase somente sobre
pessoas negras. A eficiência de seus métodos lhe valeram a promoção a
general, em março de 1822, o comando da Guarda Real de Polícia, várias
condecorações e sua ida para a reserva como marechal-de-campo, em 1824.
Tais fatos foram narrados pelo historiador Thomas H. Holloway, professor da
Universidade de Cornell, em livro publicado originalmente pela Editora da
Universidade de Stanford, em 1993, ricamente documentado por registros
oficiais e correspondências, obtidos junto ao Arquivo Nacional do Ministério da
Justiça, Arquivo da Polícia Militar, Biblioteca Nacional, Arquivo da Cidade do
Rio de Janeiro, Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e Biblioteca Olin da
Universidade de Cornell, além do reconhecido apoio da Faculdade Cândido
Mendes e da Casa de Rui Barbosa, entre muitos outros. O período tratado é
tão somente o século XIX, mais especificamente, entre 1808 e 1889. São
sobremodo interessantes os quadros estatísticos das prisões e julgamentos
efetuados, principalmente no tocante à tipificação dos delitos — que, a rigor,
nem sempre eram mesmo pribidos por lei, como a capoeira, que só veio a ser
proibida realmente em 1890. Por exemplo, dentre os 5.078 casos julgados
pelo intendente da polícia no Rio, no período de 1810 a 1821, o primeiro
colocado entre os delitos (438 ou 9,6%) foi a “capoeira”. Pasmem, mas a
capoeira só entrou no Código Penal de 1890, mas ninguém estava se
importando com nada parecido com o princípio da reserva legal. Outras
ocorrências notáveis registraram-se como “suspeito”, com 207 casos (4,5%),
“desconhecido na região”, 18, “sem residência fixa”, 10, “ajuntamento de
negros”, 10, “assobios de capoeira”, 7, e até “porte de instrumento musical”,
com 4 ocorrências. (HOLLOWAY, 1997, p. 266).
Intrigante é a durabilidade dessas concepções e práticas. Isto que é
dito acima prolonga-se, com toda a certeza, até o século XX. Todos sabemos
22
que os sambistas tinham que correr da polícia, àquela altura dos
acontecimentos e das teorias (estas, talvez só na Europa).
1.3. 2 – Código Criminal do Império.
Em virtude da promulgação da Constituição de 1824, aos 25 de março,
por D. Pedro I, o direito penal no Brasil adentrou sua segunda fase. Dá para
ficar mesmo enlevado com muitas das disposições constantes no diploma. É
inconteste entre os doutrinadores o progresso de tal legislação, inclusive
comparativamente às Constituições europeias da época, destaque merecido
ao último artigo, o de n° 179, com XXXV incisos, que anuncia em seu caput
que vem dispor sobre a inviolabilidade dos direitos civis e políticos dos
cidadãos brasileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual e a
propriedade.
Por exigência expressa do inciso XVIII, foi promulgado o Código
Criminal, com 313 artigos, “fundado nas sólidas bases da justiça e da
equidade”, como requerido constitucionalmente.
Estabeleceu-se pela primeira vez o sistema de dias-multa, sendo esta,
entre outras, talvez a maior inovação. Mas disciplinou também diversos outros
institutos e princípios, dentre os quais, “o princípio da legalidade, as regras
sobre tentativa, elemento subjetivo, autoria e participação, casos de
inimputabilidade, causas de justificação, agravantes e atenuanes” (PRADO,
2002, p. 106), trazendo também “a primeira manifestação do princípio da
personalidade da pena no Brasil”, embora grassasse ainda “a desiguladade,
principalmente em relação aos escravos, que, aliás, eram equiparados a
animais, e, portanto, considerados como bens semoventes.” (MASSON, 2008,
p. 57). Quanto a este último ponto, no mesmo sentido, ver ARISTÓTELES,
Ética a Nicômaco, livro VIII, 1161b.
Posto que disciplinasse, de forma positiva, todo um funcionamento do
sistema legal-penal, é óbvio que a desumanidade, a exclusão social e o
autoritarismo estavam presentes naquela sociedade. Inclusive de forma
23
endêmica, quer-me parecer, visto que tais elementos atuam ainda,
garbosamente, nessa em que se vive hoje. Nossa polícia, acostumada a lidar
com os negros à base do chicote, à medida que foi crescendo o vulto da
população não-escrava, não pôde perder o cacoete, pois o cachimbo já
entortara a boca, faz tempo: nisso havemos tradição. “Liberais autoritários”,
como o padre Diogo Antônio Feijó e outros eram chamados, tentaram refrear
as ignominiosas “ceias de camarão”, substituí-las por cacetadas e
açoitamentos ligeiramente mais brandos, mas o espancamento no ato da
prisão permanecera um instituto, como permaneceu até o fim do século
passado, eu acho. Basta ouvir o relato: “O que o hospital consertou, a escolta
voltou a quebrar, apenas para manter a velha praxe. Cheguei na ilha (sic),
moído de pau, direto para o lado B da segunda galeria.” (LIMA, 1991, p. 45).
1.3. 3 – Período Republicano.
Com a proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, os
novos detentores do poder encarregaram João Baptista Pereira de elaborar um
projeto de Código Penal. O Código foi logo publicado, em 1890, antes da
Constituição de 1891. É e foi criticado pelas falhas, omissões, incongruências.
Por tão mal-acabado, foi surgindo um grande número de leis extravagantes,
que acabariam por instalar tremenda confusão, quanto às normas em vigor.
Invoca-se a imagem da colcha de retalhos, para caraterizá-lo. Foi necessário
criação da Consolidação das Leis Penais de Vicente Pirangibe, pelo Decreto n°
22.213, de 14 de dezembro de 1932. Desde o primeiro momento, já surge a
demanda por um Código Penal de respeito, em substituição ao código
quasimodal.
Já no contexto de uma política nacional largamente autoritária e uma
internacional deletéria, no ano de 1937, durante o Estado Novo, um projeto de
Código Penal foi apresentado por Alcântara Machado, e que foi sancionado,
por meio do Decreto-Lei n° 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Vigente desde
1942, este é ainda o nosso Código Penal, que sofreu pelo menos duas
grandes modificações: pela Lei n° 6.416, de 24 de maio de 1977, e pela Lei n°
24
7.209, de 11 de julho de 1984, que trouxe uma nova Parte Geral, e em que
destaco um detalhe marginal, na conclusão de sua Exposição de Motivos da
Parte Especial, artigo 86, que consiste no agradecimento a Abgar Renault,
poeta da ABL (cuja obra poética completa recomendamos), e que colaborou na
redação final do citado Código. [Hoje, é claro, o vernáculo não é, usualmente,
tão bem entabulado, o que explica, de resto, muitas coisas que não vêm ao
caso.]
Consideremos, por um instante, a afirmação de Damásio de Jesus de
que o direito penal brasileiro “não tem rumo certo”, porque não há “uma Política
Criminal única dos Poderes Executivo e Legislativo, sinificando que não
seguem a mesma direção” (de JESUS, 2000, p. 24), o que seria servir a dois
senhores. Dou razão a ele, pois também considero perto de promíscua a
convivência do movimento da lei e da ordem com as manifestações do direito
penal mínimo, ambos pulverizados por todo o ordenamento, quando não na
mesma lei. Uma verdadeira esquizofrenia. Também, com um Legislativo como
o nosso, não é de se esperar nada melhor. Encontramos essa esquizofrenia,
por exemplo, na nova Lei Antidrogas, n° 11.343/2006, que despenaliza o uso
de tóxico, mas não totalmente, ao mesmo tempo que o inclui no Capítulo dos
Crimes e das Penas, não prevendo pena de detenção nem reclusão,
contrariando a definição de crime do art. 1°, da Lei de Introdução ao Código
Penal — Decreto-Lei n° 3.914, de 09 de dezembro de 1941 (para alguns, não
há problema técnico-legal aí); ou o preceito secundário do art. 33, §3°; e ainda
as vedações do artigo 44; a elevação das penas para o crime de tráfico; a
figura do pequeno traficante, tipo que inclui o usuário que tem companhia, com
pena mínima de 3 anos de reclusão. Não questionamos nada disso
isoladamente. Apenas parece que foram catando pedaços normativos em latas
diferentes. Não é uma crítica conteudística, ela é formal. Houve dúvida, está
claro, sobre se seguiríamos a tendência europeia à política de redução de
danos, ou a velha tolerância tropical, ou a tolerância zero.
Quer dizer, ademais, que estamos no contexto ocidental, que é
essencialmente dúbia e conflituosa, como bem vê o professor Gerd:
25
“A cultura ocidental pode ser interpretada como um longo
diálogo, escassamente harmonioso, entre os dois troncos
principais de que decorre: o hebraico-cristão,
fundamentalmente responsável pela moral e pela religião,
e o grego-romano (sic), do qual herdamos a filosofia, a
arte, as diretivas jurídicas e a parafernália militar. Mas
como conciliar essas duas vertentes?” (BORNHEIM,
1987, p. 26)
26
CAPÍTULO II
AS TARÂNTULAS
“Assim, porém, vos aconselho, meus amigos: desconfiai
de todos em quem o impulso de castigar é poderoso!”
(NIETZSCHE, 1983, p. 237).
2.1 – Jus puniendi
É o direito de punir. Apenas o Estado detém o chamado direito penal
subjetivo, que é evocado no momento da violação de um conteúdo de norma
incriminadora. O correlato histórico do Jus puniendi estatal foi a supressão da
vingança privada. Como se um engendrasse a outra, e vice-versa. O Estado
avoca para si o direito de punir, afastando as partes, tecnicamente, para ao fim
estabelecer a justa distância, mediante a sentença no processo penal, em que
é proferido o direito. Retira-se dos particulares a vingança, para devolvê-la em
forma de justiça, mediante a aplicação de todo um arcabouço técnico-
científico, numa transposição que revela grande astúcia da linguagem, para o
fim da paz social.
“Defrontando-se a liberdade individual e o poder punitivo
estatal, vislumbra-se que a liberdade individual não
necessita de legitimação, decorrendo do próprio direito à
vida e da condição de pessoa humana. Logo, o que
necessita de legitimação é o poder punitivo estatal, e esta
decorrerá da atuação dentro dos limites do poder de
intervenção”. (COSTA, 2007, p. 121)
27
2.1. 1 – As fontes do direito penal.
As fontes do direito penal dividem-se em materiais e formais. As
primeiras dizem respeito a ‘quem’ produz, modifica ou extingue as normas. As
outras referem-se ao suporte no qual estas (normas) se veiculam.
Fontes formais subdividem-se, por sua vez, em imediata e mediatas. A
imediata, como se vê, é uma só: a lei. Em nosso caso, a lei escrita, dotada de
um preceito primário, que descreve as condutas, e um preceito secundário,
que prevê a pena aplicável ou cominada. Mas essa é a descrição apenas das
normas penais incriminadoras, e nem todas o são. Entre as não-incriminadoras
podemos distinguir as: 1) permissivas (causas de exclusão da ilicitude),
exculpantes (excluem a culpabilidade); 2) interpretativas; 3) de aplicação, finais
ou complementares (demarcam o âmbito de validade de outra norma); 4)
diretivas (que estabelecem princípios de uma matéria, como o princípio da
reserva legal, no art. 1°, do CP); e 5) integrativas ou de extensão, que são
complementares do tipo, quanto ao nexo causal nos crimes omissivos
impróprios, à tentativa e à participação, conforme, respectivamente, os artigos
do CP 13, §2°, 14-II e 29, caput (MASSON, 2009, p. 92-93).
Fontes formais mediatas são a doutrina e a jurisprudência, para
alguns, como Luiz Regis Prado. Este, contudo, põe o costume no rol das
fontes formais imediatas e dotado de uniformidade, constância, publicidade e
generalidade (PRADO, 2002, p. 134). Cleber Masson criticaria essa
classificação, a começar por incluir o costume entre as fontes mediatas, porém
mantendo a mesma subdivisão em secundum legem ou interpretativo, contra
legem ou negativo e praeter legem ou integrativo. Mas também não aceita a
consideração da doutrina e da jurisprudência como fontes mediatas,
principalmente pela não-obrigatoriedade, à exceção das súmulas vinculantes, e
se opõe também aos que incluem os tratados internacionais, que têm toda
uma ritualística a cumprir, antes do ingresso no ordenamento jurídico pátrio,
vindo a equiparar-se a lei ordinária ou emenda constitucional. Para tal autor, as
fontes formais, cognitivas ou de conhecimento mediatas ou secundárias são:
os princípios gerais do Direito e os atos administrativos (MASSON, 2009, p. 14-
28
15). Já no Manual de Direito Penal – Parte Geral, de Mirabete, encontramos no
rol dos mediatos apenas o costume e os princípios gerais do direito
(MIRABETE, 2001, p. 46). Além disso, reconhecem alguns autores, como
Mirabete e Aníbal Bruno, por exemplo, que o Estado não se pode arvorar a
ditar normas sem levar em conta a fonte remota e originária da “vontade do
povo” — de índole histórico-cultural, sem dúvida, mas também moral. Seria
portanto uma fonte material. Quer dizer, se fôssemos inventariar as
classificações doutrinárias a respeito das fontes, também teríamos aqui um
quadro tão complexo e extenso que nos tomaria espaço desproporcional.
Simplificando (agora nos parece um dever tornar explícito), fonte
material, no ordenamento brasileiro, é apenas o Estado. Está presente na
Constituição Federal, em seu artigo 22, inciso I, a previsão de competência
privativa da União para legislar sobre direito penal. No parágrafo único desse
artigo está prevista, sim, a possibilidade de criação de lei complementar que
autorize aos Estados legislar sobre questões específicas, delimitadas, restritas
acerca das matérias elencadas nos XXIX incisos, dentre os quais, os dez
ramos do direito arrolados no inciso I. No caso da Lei 9.099/95, que é federal,
e necessariamente, há regulação de matéria processual, mas também penal:
este último é o caso da transação penal, que “implica renúncia parcial ao
direito de punir, situando-se dentro do campo do Direito Penal.” (de JESUS,
2007, p. 3) (Outra questão, menos pacífica, é a do julgamento dos recursos por
grupos de juízes de primeiro grau, se é matéria apenas processual, ou ambas,
sugere o autor).
2.1.2 – Violência, Poder e Legitimidade
O Estado detém legitimamente o monopólio da violência. Isto parece
estar em todos os manuais. E muitos deles pressupõem toda aquela imagem
contratualista do ato por meio do qual os pactários, ora cidadãos, entregam
parte de suas liberdades e poder ao soberano, com vistas de obter
determinada parcela dos prodígios da cooperação social — “haverá sociedade
política somente quando cada um dos membros renunciar ao próprio poder
29
natural, passando-o às mãos da comunidade” (LOCKE, 1979, p. 73). Seria, por
seu turno, ubíqua a violência. Pois esta é, a rigor, inextinguível. Nas profundas
análises de Hannah Arendt em Sobre a Violência, de 1969, a autora,
conceituando um a um o vigor, a força, o poder, a autoridade e a violência,
estabelece que “o poder corresponde à habilidade humana não apenas para
agir, mas para agir em concerto.” (ARENDT, 1994, p. 36) Em outros termos,
diria que esse poder tem suas raízes na própria condição humana da
pluralidade, que corresponde à ação, seara política, por excelência. Então, o
poder só se exerce entre os homens.
“É o apoio do povo que confere poder às instituições de
um país, e este apoio não é mais que a continuação do
consentimento que trouxe as leis à existência. Sob
condições de um governo representativo, supõe-se que o
povo domina aqueles que o governam.” (Idem, 1994, p.
34).
É esse o sentido de soberania popular. Agora, esse apoio do povo, que
confere poder às instituições, relaciona-se intimamente com a autoridade, que
se funda no reconhecimento — tornando desnecessárias tanto a coerção como
a persuasão. “Assim, o poder institucionalizado em comunidades organizadas
frequentemente aparece sob a forma da autoridade, exigindo reconhecimento
instantâneo e inquestionável; nenhuma sociedade poderia funcionar sem isso.”
(Ibidem, 1994, p. 38). Autoridade que não pode literalmente prescindir da
violência, que tende aliás a extrapolar, separando-se dela exatamente com a
incidência da díade credibilidade-credenciamento, invocando Paul Ricoeur.
Nas palavras de Cícero, De Legibus, 3,12-38: “Enquanto o poder (potestas)
reside no povo (in populo), a autoridade (auctoritas) reside no Senado (in
senatu)” (CÍCERO apud RICOEUR, 2008, livro 2, p. 111).
Entre violência e poder a relação é inversa, de oposição. Mas, como
termos correlatos, onde há um, está o outro. Acaso possível, onde o poder
fosse total, inexistiria violência. No império desta, o poder já desapareceu. O
30
poder utiliza a violência, dado o seu caráter instrumental. Mas da violência
jamais emergirá o poder, que surge da cooperação.
Porém, é de bom alvitre não passar dos limites, exercer o poder com
discrição. Há um capítulo (o XIX) do Príncipe, “De como se deve evitar o ser
desprezado e odiado” (MAQUIAVEL, 1979, pp. 77-85), analisando uma das
causas de perdição do poder do Estado. Quer dizer, já faz tempo que esses
bons conselhos vêm sendo dados. “Com efeito, onde nada aproxima o
governante dos governados não pode haver amizade, uma vez que não há
justiça.” (ARISTÓTELES, 1979, p. 191). Isto em termos teleológicos, como os
tais, mas também deontológicos: da pura obrigatoriedade, em face da
dimensão racional da pessoa. E essa hybris, essa desmedida sempre acaba
rendundando na “perda de credibilidade das fontes tradicionais de autoridade
(...) que afeta simultaneamente a esfera política e a esfera jurídica.”
(RICOUEUR, 2008, livro 2, p. 96)
No caso de uma decadência dessa monta, ao Estado ocorreria aplicar
o que foi dito no parágrafo acima: a violência, enquanto contrapartida
necessária do enfraquecimento do poder estatal. Mas há publicidade, exceto
nos casos em que esta é violada, ou dispensada. Não caberia fazer aqui uma
fenomenologia do poder da mídia, mas realmente se pode dizer que ela tem
muita influência sobre a opinião pública, talvez mais do que sobre os agentes
políticos, aliás nem todos. Os membros do Poder Judiciário são
tradicionalmente mais discretos, mas também podem ter sua razão ofuscada
pelos refletores, e coisas tais. Já observara Montaigne que “em muitas
ocasiões, a vista e a publicidade dos monarcas é mais daninha para os
costumes que o próprio vício.” (MONTAIGNE, 1982, p. 211) Mas, como íamos
dizer, o poder da mídia é tão construtivo quanto corrosivo, acaba sendo
desfigurante. E pode interferir no curso das engrenagens do poder.
“O sonho de democracia direta, que voltou à ordem do dia
por obra da mídia, não implica menor desprezo pelas
mediações institucionais características de uma
democracia representativa do que o grito a favor de uma
31
justiça expeditiva, emitido por uma opinião pública que a
mídia abebera de lágrimas e sangue.” (RICOEUR, 2008,
livro 2, p.99)
Ora, que sonho de democracia direta será esse, senão aquele que
brota da deslegitimidade do poder? Toda democracia representativa em que o
eleitor é traído está sujeita a sofrer umas indigestões. O mal redobra, porque a
sociedade passa a dispensar a mediação. A mídia acalora. Gera inflação
legislativa incriminadora, há pretensas invectivas à imparcialidade do juiz, e por
aí vai. Quem padece é a sociedade e, em última análise, o ente humano
concreto, para não dizer ‘indivíduo’.
2.2 – Vulnerabilidade
O poder punitivo estatal é exercido, ao fim e ao cabo, por um número
de pessoas, exceto nas monarquias absolutas, extintas há séculos.
Tradicionalmente, tais pessoas provêm das elites e promovem,
encarniçadamente, a sua defesa, que é a defesa delas próprias. Por exemplo,
a criação da polícia no Rio de Janeiro, exatamente com a chegada da corte
portuguesa acuada, visava precipuamente a oprimir o populacho. São essas e
outras que a agudeza de Nietzsche esclarece, só que em nível mais
fundamental:
“Foram antes “os bons”, eles próprios, isto é, os nobres,
poderosos, mais altamente situados e de altos
sentimentos, que sentiram e puseram a si mesmos e a
seu próprio fazer como bons, ou seja, de primeira ordem,
por oposição a tudo o que é inferior, de sentimentos
inferiores, comum e plebeu.” (NIETZSCHE, 1983, p. 299)
32
Ora, nada mais “natural” que a própria criminalização das condutas
seja cuidadosamente seletiva, e sempre visando à perseguição dos
desfavorecidos. Deturpa-se, facilmente, o sentido do princípio da
fragmentariedade — que seria o de não criminalizar condutas a granel —, com
o intuito sub-reptício de acirrar a vulnerabilidade daqueles. Com o surgimento
do capitalismo na Europa, o número crescente conflitos sociais que foram
eclodindo, que eram conflitos de classes, “levou à criação de leis criminais
duras, dirigidas contra as classes subalternas” (RUSCHE e KIRCHHEIMER,
2004, p. 31). Os autores, discorrendo sobre o direito penal comparado de tal
época, não deixam nenhuma dúvida quanto à brandura dispensada no
tratamento dos poderosos. “A legislação era francamente contra as classes
subalternas” (Idem, 2004, p. 36). No mesmo sentido:
“Logo que passou à esfera pública, a sociedade
assumiu o disfarce de uma organização de proprietários
que, ao invés de se arrogarem acesso à esfera pública
em virtude de sua riqueza, exigiram dela proteção para o
acúmulo de mais riqueza. Nas palavras de Bodin, o
governo pertencia aos reis e a propriedade aos súditos,
de sorte que o dever do rei era governar no interesse da
propriedade de seus súditos.” (ARENDT, 2008, p. 78)
Não estamos falando de nosso tempo? Pois o ordenamento jurídico
deixou de ser, em geral, o instrumento reconhecido de manutenção do status
quo? “A igualdade perante a lei é a verdade do político. Só assim se torna
compreensível que o uso hipócrita da legalidade possa acobertar a exploração
econômica.” (RABUSKE, 1988, p. 88). Ora, o que vemos, ainda hoje, é a total
pertinência da observação de Saliba, nas considerações finais de Justiça
Restaurativa e Paradigma Punitivo:
“Os operadores do Direito que atuam na justiça penal
tentam, furtivamente, explicar por qual razão uma pessoa
33
de classe social desprestigiada pode ser condenada, por
delitos insignificantes, e aqueles que executam condutas
lesivas de maior gravidade, ofendendo interesses de toda
a sociedade, detentores de uma situação econômica
privilegiada, não se sujeitam às mesmas agruras.”
(SALIBA, 2009, p. 181)
Pois muitas vezes o que garante que os poderosos não sofram as
mesmas agruras está conforme ao ordenamento, como também aquilo que
impõe ao vulnerável o padecer. O promotor prossegue, asseverando que a
discriminação exercida pelas polícias se estende à justiça penal, que concede,
“com fundamento na dogmática jurídica, legitimidade científica para aquela
atuação repressiva.” (Idem, 2009, p. 81). Agora, é claro que não há nada mais
deslegitimante do poder institucional do que, no sentido mais vulgar, “dois
pesos e duas medidas”, que só geram insegurança jurídica e revolta. Com
efeito, “supõe-se que a igualdade essencial é a igualdade de consideração”
(RAWLS, 2008, p. 626). Mas, qual é a igualdade de consideração que nós,
brasileiros, conhecemos?
“O exemplo mais difundido dessa seletividade
deslegitimante está nos denominados crimes do
“colarinho branco”, nunca sancionados ou sancionados
levemente, o que causa repulsa social, ainda mais nas
regiões onde as classes sociais mais empobrecidas não
têm nenhum apoio governamental e são reprimidas pelo
aparato policial, em total desproporção ao tratamento
dispensado àqueles privilegiados.” (SALIBA, 2009, p. 74)
Também é notório no Brasil que praticamente toda a população
carcerária nacional provém das classes baixas, como também os policiais e
carcereiros, não nos esqueçamos. Há uma guerra inglória, desprovida de
valores edificantes. “O que a prisão tem como função reproduzir, enquanto
34
sistema, são estigmas sociais que permitem confundir crime e pobreza,
colocando sob suspeição e vigilância permanente parcelas despossuídas da
população.” (RAUTER, 2003, p. 105). Estamo-nos tornando nietzscheanos,
confesso, na medida em que também deslocamos a questão da verdade (e da
moral, claro) do estádio do “quê” para o do “quem”: não o que se diz, ou que se
faz, mas quem.
“Não há então natureza criminosa, mas jogos de força
que, segundo a classe a que pertencem os indivíduos, os
conduzirão ao poder ou à prisão: pobres, os magistrados
de hoje sem dúvida povoariam os campos de trabalhos
forçados; e os forçados, se fossem bem nascidos,
“tomariam assento nos tribunais e aí distribuiriam justiça””
(FOUCAULT, 1987, p. 254)
Aqui, uma dificuldade: “Não é justificável, nem de bom senso jurídico
fazer notar que, (sic) certas pessoas, não obstante condições econômicas
desfavoráveis, continuam respeitadoras da lei” (ALBERTI, 2002, p. 67), como
fez notar, certa feita, Michel Foucault. Sim, é verdade que nem todo pobre
rouba. É daquele tipo de verdade importuna, para aqueles que argumentam
justamente que as classes mais baixas são estigmatizadas e praticamente
empurradas para a criminalidade. Por que, em certo sentido, nem todos
delinquem? Como é conseguido o espírito de rebanho? O ex-Chefe de Polícia
Civil Hélio Luz no filme documentário Notícias de Uma Guerra Particular
esclarece que o único jeito de manter os miseráveis da comunidade pacíficos,
quietos, obedientes é com repressão, o que a polícia, de resto, é paga para
fazer.
Hoje, como aliás em todos os dias, pôde-se assistir nos telejornais a
notícia de que policiais invadiram a casa de um senhor numa comunidade
carente, arrebentando a porta, à noite, procurando aquelas coisas normais.
Apavorado, o senhor inocente sofreu infarte, ao passo que os mesmos policiais
negaram-lhe socorro, ainda sob as súplicas dos parentes e vizinhos, mas
35
dizendo debochadamente que ele era “velho e enferrujado”. Daí morreu o
velho. Ora, sabemos que os policiais não poderiam invadir a casa à noite nem
com mandado judicial; fosse o caso, que esperassem raiar o dia, por força do
artigo 5°, XI, da Constituição Federal. Entrementes, todo mundo sabe que na
Av. Vieira Souto polícia não mete o pé na porta, não é verdade? Será porque
todos são iguais perante a lei, mas alguns são mais iguais do que outros?
“Não há uma justiça penal destinada a punir todas as
práticas ilegais e que, para isso, utilizasse a polícia como
auxiliar, e a prisão como instrumento punitivo, podendo
deixar no rastro de sua ação o resíduo inassimilável da
‘delinquência’. Deve-se ver nessa justiça um instrumento
para o controle diferencial das ilegalidades”. (FOUCAULT,
1987, p. 248)
Falta justiça social, cá entre nós. Posto que tenhamos incluído e ainda
incluamos, aqui e ali, no ordenamento jurídico institutos que promovam a
equidade, que reduzam as drásticas diferenças de oportunidade, como
defendeu criteriosamente o autor de Uma Teoria da Justiça, ainda constituímos
uma sociedade profundamente desigual, que não ouviu, até agora, sua
advertência acerca da “importância de se evitar o acúmulo excessivo de
propriedades e riqueza e de se manterem oportunidades iguais de educação
para todos” (RAWLS, 2008, p. 88). Ou mesmo do Marquês de Beccaria: “Fazei
que as leis favoreçam menos as classes dos homens, que os próprios
homens” (BECCARIA, 1979, p. 110). Como fazemos exatamente o contrário,
“O preço é pago pela sociedade inteira. Longe de
transformar criminosos em trabalhadores, nossas prisões
fabricam novos criminosos e nos afundam a todos em
criminalidade maior. Triste é o destino de uma instituição
que, quanto mais fracassada, mais necessária se
torna...”” (LIMA, 1991, p.105)
36
CAPÍTULO III
O ELIXIR
“...e de todas as coisas, um, e de um, todas as coisas.”
(HERÁCLITO, frag. X)
3.1 – Direito Penal mínimo
Consideremos que há uma proliferação de normais penais
incriminadoras. Elas, a princípio, atenderiam aos anseios da população
brasileira, em geral. A resposta estatal é o espelho da resposta social ao
absurdo da criminalidade. Contudo, a imagem da vara retilínea meio imersa no
lago é a de uma fratura, não de uma reta. É assim que devemos falar de
reflexo, de espelho. Em que medida o Poder Legislativo veicula fielmente a
demanda social? E essa demanda é genuína, ou maculada, insuflada, dirigida
pelo quarto Poder — o dos media — ? Aliás, uma mídia que intervém de ponta
a ponta nessa dialética, complicando-a, incidindo também na atuação
legislativa, entortando a vara, ainda mais. Muito bem visto por Dias Gomes,
diante do feito de Zé-do-Burro, com sua promessa de depositar a cruz e
repartir o sítio, o repórter vê o record esportivo, insinua que Zé prega a reforma
agrária e conclui que é um golpe de mestre para impressionar o eleitorado
(DIAS GOMES, 1972, pp. 80-85). Esta cena, os senhores veem, está cheia de
verdade. Quanto ao Legislativo, quantas encarnações de Chico Malta já
presenciamos, que pudessem dizer em coro: “Política se faz com a mão
esquerda na consciência e a direita na merda.” (Idem, 1991, p. 20)?
As considerações tecidas, que desembocam na criação contínua de
leis e tipos penais, não são sempre de alto nível, adrede. Aí imiscuem-se
interesses dos mais variados matizes. “As figuras incriminadoras afastaram-se
da legitimidade e razão jurídica.” (SALIBA, 2009, p. 126). Mas “A proliferação
37
de normas penais incriminadoras não se deu por acaso e tampouco se baseia
na ignorância legislativa” (Idem, 2009, p. 127), mas o que está por detrás disso
é a dominação. Só por isso, já devemos ter cuidado no enaltecimento dessa
constante produção legislativa, que é frenética. Quer dizer, incontida e até
irresponsável. Assim, nossos “representantes”, com aspas, trabalham, em
certos casos, com todo o vigor, e também rigor, infelizmente. Agora, reforma
política, que é bom, todos nós queríamos ver, e não vemos. Está aí o mau uso
dos princípios informadores do direito. Vale lembrar:
“Os direitos humanos e a dignidade da pessoa humana,
então, têm valor fundamental e são princípios
orientadores do Direito penal democrático, decorrendo
dele princípios limitadores, como a legalidade,
fragmentariedade, subsidiariedade, mínima intervenção,
insignificância, entre outros, e a ofensa àqueles princípios
determina a inconstitucionalidade da norma e seu
afastamento do ordenamento jurídico”. (Ibidem, 2009, p.
104)
Realmente, é inconstitucional, portanto inválida a lei penal que
incrimine desnecessariamente um comportamento, quando bastem outras
normas de direito público ou privado para regular o fato social, sendo este o
teor da subsidiariedade do direito penal, nos termos de Claus Roxin (COSTA,
2007, p. 119). Pensamos ser desnecessário, por exemplo, enquadrar a posse
daquelas máquinas eletrônicas de jogos presentes massivamente nos
botequins do Rio no artigo 334, §1°, do Código Penal. A razão é que há um
elemento importado lá dentro — aliás, já sendo hoje fabricado no Brasil.
Propala-se que a política criminal aí empregada visa a capturar o
contrabandista, o bicheiro, sei lá que mafioso, mas, ao fim e ao cabo, quem
sempre acaba preso, cumprindo obrigações durante o período de prova,
quando ainda cabível, é o cara que toma conta da birosca. E que geralmente
não tem condições de contraditar a imposição do ferrabrás local de pôr as
38
máquinas, porque o Estado mesmo não o protege, mas está lá para acossá-lo.
É necessário consideração acurada de que
“A incidência de uma norma penal restringe fortemente a
liberdade pessoal. Como esta é a limitação mais
contundente da sociedade, somente deve ser utilizada em
último lugar, sob pena de carecer de legitimidade
constitucional e representar um comportamento legislativo
que ultrapassa as fronteiras da necessidade da
cominação da pena estatal”. (COSTA, 2007, p. 120)
Aquilo que vem como crime já vem depurado de toda excludente de
ilicitude — estado de necessidade, legítima defesa, exercício regular do direito
e estrito cumprimento do dever legal (art. 23, do CP), além de causas
supralegais, vale dizer, culturais (MIRABETE, 2001, p. 176); depurado também
das excludentes de culpabilidade, o que não é pouca coisa. Ainda assim, a
abundância de tipos penais é tamanha, que as pessoas sentem sobre suas
cabeças a espada de Dâmocles, pendurada por um fio. Em boa hora, a Lei
11.106/2005 retirou o adultério do Código Penal, revogando o vetusto artigo
240, em virtude do qual, pelo menos 95% dos homens poderiam vir a ser
processados pelo cônjuge e cumprir detenção. Seria uma festa, mas
muitíssimas mulheres também iriam “rodar”, viu?
3.2 – O escape
Já se pensou sobre o que seria de todos nós, caso todos que
cometessem ilícito penal fossem efetivamente julgados, condenados e
cumprissem pena nas cadeias? Quer dizer, que a aplicação da lei penal fosse
inexorável? Parece-nos que seria algo parecido com o destino de Itaguaí, —
em virtude do positivismo e inflexibilidade de Simão Bacamarte, o alienista —
com quatro quintos da população encarcerada na Casa Verde. E, se nos
39
lembrarmos, no decorrer de sua pesquisa, sua segunda “verdade científica” é o
exato oposto da primeira; e a terceira, uma reviravolta. “Com isso, surge
imediatamente a pergunta sobre como afinal se deve fundamentar a
legitimidade de regras que podem ser alteradas pelo legislador a qualquer
momento” (HABERMAS, 2004, p. 295), sendo assim angustiosa a própria
autodeterminação da pessoa cumpridora dos deveres. Sim, porque amanhã
passa a ser lícita a conduta anteriormente criminosa, e vice-versa. Como se
houvesse uma chave seletora do comportamento em cada ente humano, que
dela dispusesse, sem cerimônia. Como é que se pode falar em segurança
jurídica, nessas condições?
Felizmente, a capilaridade do sistema penal, embora grande, ainda
não chegou ao paroxismo, nos moldes do livro de George Orwell, pois assim
estariam todos fritos. Pensem nos estudantes universitários brasileiros, o que
lhes aconteceria, caso fossem todos descobertos e chamados à
responsabilidade penal a respeito de determinada conduta, de todos bem
conhecida, que é o de obter cópia xerográfica de textos acadêmicos, isto sem
prejuízo da responsabilização dos professores, que os cedem, afetuosamente.
Sim, pois, conforme disposição do artigo 184, do Código Penal, feita a ressalva
do artigo 46, inciso II, da Lei 9.610/1998 (copiar pequenos trechos), é crime
punível com detenção aquela famigerada xerox dos textos, já deixados pelos
professores, para essa finalidade. Ademais, se houver lucro, ainda que
indireto, a pena passa a ser de reclusão, de dois a quatro anos, além de multa,
a teor do §1°, do art. 184 do CP. Este parágrafo §1° inclui também os arquivos
de música em formato mp3, só para dar uma pequena ideia de quantos
haveriam de ser presos, inclusive dentre autoridades e grandes personalidades
da sociedade civil. Xô, Simão!
Pode-se perguntar: será que a sociedade está interessada em ver todo
delito punido? É desinteressante, por exemplo, que policiais sejam
incorruptíveis, como o odioso e admirável inspetor Javert, sempre perseguindo
o desafortunado Jean Valjean, ou Sr. Madeleine, em Os Miseráveis, de Victor
Hugo. Também aí vemos um caso flagrante de excesso de rigor punitivo, onde
a reabilitação do condenado parece algo impossível. Afinal o inspetor faz a
40
gentileza de se suicidar, quando se vê prestes a prevaricar, na turbulenta
consciência de que o suspeito deve escapar. Bem, este, na ficção, é
condenado por furtar o pão, para os sete sobrinhos famintos, mas todos
conhecemos a estória da mulher que cumpriu pena de prisão por quatro
meses, antes de ir para o regime semi-aberto, no Cadeião de Pinheiros, por
furtar uma margarina — que, como sabemos, custa aproximadamente R$ 2,50
ou R$ 3,00 em qualquer lugar.
Os ilícitos penais não são sempre punidos, embora possam estar
estampados no espaço público, a ver quem quiser. É o caso, por exemplo, dos
discos piratas vendidos abertamente em locais de grande circulação, como as
estações do metrô da Carioca e da Uruguaiana. Não sabemos com que
regularidade, parece que uma vez por mês, a guarda municipal chega até ali,
dispersa alguns ambulantes, efetua uma que outra apreensão, e então está
tudo bem. Não há, no caso, nehuma imperiosidade de se manter uma
vigilância ostensiva, muito menos erradicação da conduta no local. É uma
permissividade totalmente informal, que pode ter, na sua complexidade, o
elemento da justiça. É bom que essas coisas apazigúem um pouco os
conflitos, que são drásticos.
Considerando a grita, em razão da impunidade, talvez percebamos que
não seria mesmo razoável fazer todos pagarem por seus crimes.
Simplesmente porque a sociedade não poderia mais funcionar. Temos, sim,
razões antropológicas para não ser legalistas ferrenhos. Devemos nos
perguntar exatamente se os legalistas ferrenhos são o que dizem, ou o que
parecem.
Escapar da aplicação da lei é até obrigação, no caso da lei injusta,
como foi, por exemplo, no tempo da escravidão no Brasil. Imaginem se
naquele tempo estivessem reunidos conversando o Ministro Joaquim Barbosa,
o Machado de Assis e o Pelé, quando passasse um dos homens do
intendente. Pronto, era porrada, pra mais de metro e cana neles! “Que o
homem se acostume às leis, vá; (...) mas que abençoe a força e cumpra as leis
sempre, sempre, sempre, é violar a liberdade primitiva, a liberdade do velho
Adão.” (MACHADO DE ASSIS, apud Holloway, 1997, p. 13)
41
CONCLUSÃO
Podemos hoje nos orgulhar da plêiade de grandes doutrinadores,
grandes juízes, formidáveis operadores do direito penal, em todos os nichos de
sua fulgurante atuação. Isto não foi conquistado num dia. Um monumental
desenvolvimento das teorias jurídicas procedentes especialmente do
hemisfério norte aqui se radicaram e impulsionaram, por sua vez, um
redobramento profícuo de toda a sua potencialidade. Temos aqui juristas de
quilate internacional, bem como havemos constante diálogo e colóquios de
toda magnitude, em que as ideias e teorias jurídicas nacionais e estrangeiras
se confrontam, em alto nível, na comunidade global.
Debatemo-nos vigorosamente a respeito de todo o sistema penal, por
ser este encravado num outro sistema mais amplo, o sistema de exclusão
social, capanga da exploração, que nos faz derivar a léguas de distância da
preconizada justiça social. Dessa forma, o fim último do direito penal, qual seja,
a paz consiste apenas numa vaga esperança e num suspiro, cheio de banzo,
mas que não atravessa a soleira da realidade.
Mas eis que é possível obter vitórias em batalhas, aqui e ali. No âmbito
de atuação jurídica dos três poderes, suponho que podemos ter ganhos. O que
corresponde, mais ou menos, à soberania popular. Mas esta não alcança, às
vezes, os altos desígnios do imbuído, ou membro de Poder, isso é outra
história. Em geral se pode considerar que a legitimidade do Estado, que, de
resto, anda baixíssima, tem muito a ver com representatividade.
Consoante a nossa hipótese, o indivíduo representativo médio
brasileiro não desejaria ver todo delito punido, e muitos dos que se dizem mais
legalistas concordam secretamente com o apanágio "aos amigos, tudo; aos
inimigos, os rigores da lei." Creio que por motivos antropológicos, próprios do
povo brasileiro, a gente gosta mais de música e futebol do que espetáculo
diário de prisões preventivas, embora possa haver muitas exceções.
Essa busca do escape, por parte daquele que é constantemente
acossado, é até um dever, em face da profunda impopularidade da lei injusta
42
e, conforme compreendemos, ilegítima. É imperioso refrear a sanha punitiva
estatal, que preferencialmente se dirige às camadas trabalhadoras e humildes
que constróem este país.
Seria portanto excelente se apenas estivesse em obra uma justiça
retributiva, mas, amiga dos contrastes, a realidade opera uma cópia de
abordagens, dentre as quais uma das mais efetivas é a indigitada sanha de
punir. O resultado é o caos, ou a esquizofrenia. Temos a tarefa de colaborar
com nossa parte para a solução de toda essa embrulhada.
43
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48
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 02
AGRADECIMENTO 03
DEDICATÓRIA 04
RESUMO 05
METODOLOGIA 06
SUMÁRIO 07
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I
PARA UMA CIÊNCIA DO DIREITO 09
1.1 – As Origens 09
1.2 – Direito natural e direito positivo 11
1.3 – Direito penal no Brasil 19
1.3.1 – Período Colonial 19
1.3.2 – Código Penal do Império 22
1.3.3 – Período Republicano 23
CAPÍTULO II
AS TARÂNTULAS 26
2.1 – Jus puniendi 26
2.1.1 – As fontes do direito penal 27
2.1.2 – Violência, Poder e Legitimidade 28
2.2 – Poder, violência e legitimidade 31
CAPÍTULO III
O ELIXIR 36
3.1 – O direito penal mínimo 36
3.2 – O escape 38
CONCLUSÃO 41
49
BIBLIOGRAFIA 43
ÍNDICE 48
50
FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
Título da Monografia: OS CONTORNOS DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL
Autor: FERNANDO CUNHA VELLOZO
Data da entrega:
Avaliado por: Conceito: