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I
OS MOVIMENTOS PRIMÁRIOS NO MEIO AQUÁTICO
MARCUS VINÍCIUS MACEDO VALLADARES
ORIENTADOR: PROF. CARLOS ALBERTO CEREJA DE BARROS
RIO DE JANEIRO NOVEMBRO/2002
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO
DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS
PROJETO “A VEZ DO MESTRE”
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO
DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS
PROJETO “A VEZ DO MESTRE”
Trabalho monográfico apresentado comorequisito parcial para a obtenção do Grau deEspecialista em Psicomotricidade.
RIO DE JANEIRO NOVEMBRO/2002
OS MOVIMENTOS PRIMÁRIOS NO MEIO AQUÁTICO
MARCUS VINÍCIUS MACEDO VALLADARES
RESUMO
O presente estudo aborda a influência do trabalho corporal, no meio
aquático, na formação da motricidade humana terrestre. Em suma trata de
redimensionar a ótica da natação infantil como uma prática meramente técnico-
desportiva ou terapêutica para uma atividade de cunho pedagógico, lúdico e
formativo das qualidades corporais.
Pretende reunir e confrontar as diferenças entre a motricidade
terrestre e aquática afim de comprovar a validade do trabalho corporal, no meio
aquático, para melhor elaboração da motricidade terrestre, tendo este tipo de
trabalho bases diferentes de funções e padrões motores para as quais o corpo
está organizado. Observar os procedimentos pedagógicos diante de todas
essas informações antagônicas vindo a ajudar na organização da estrutura e
esquema corporal oferecendo experiências e capacitando o corpo para o
sujeito na aquisição subjetiva da postura bípede e de padrões motores.
Utilizando-se de conhecimentos Psicomotricidade para revelar diversas faces
que o trabalho de natação infantil pode adquirir em importância na estimulação,
maturação e manutenção de um desenvolvimento pleno e harmonioso do ser
humano.
Com isso confirmar a existência de validade orgânica e funcional,
psicológica e social do trabalho psicomotor aquático de acordo com as
necessidades e possibilidades dos bebês praticantes em busca do domínio e
da utilização da motricidade terrestre.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 06
CAPÍTULO I
A importância da estimulação 09
CAPÍTULO II
Reflexos abordados na natação 18
2.1. Categoria de alguns reflexos em função da aprendizagem
da natação 19
CAPÍTULO III
Relação entre os sistemas nervoso e locomotor 22
CAPÍTULO IV
Formação dos sistemas nervoso e locomotor 27
4.1. Sistema nervoso 28
4.2. Sistema locomotor 33
CAPÍTULO V
Água 35
5.1. Água – um ambiente desconhecido – propriedades físicas 37
CAPÍTULO VI
Motricidade 40
6.1. Característica do desenvolvimento da motricidade 43
6.1.1. Ação de massa para ação específica 43
6.1.2. Organização cefalocaudal 43
6.1.3. Organização proximodistal 44
6.2. Motricidade terrestre 44
6.3. Motricidade aquática 49
6.3.1. Bebê de colo 50
6.3.2. A criança no flutuador com auxílio 52
6.3.3. A criança no flutuador sem auxílio 52
6.4. Diferenças entre a motricidade terrestre e a motricidade aquática 54
6.4.1. Respiração 55
6.4.2. Musculatura dorsal 55
6.4.3. Membros superiores 57
6.4.4. Membros inferiores 58
CAPÍTULO VII
Psicomotricidade 61
7.1. Esquema corporal 65
7.2. Lateralidade 65
7.3. Estruturação espacial 66
7.4. Orientação temporal 66
7.5. Pré-escrita 66
7.6. Aspecto psicológico 68
7.6.1. Sistema visual 68
7.6.2. Sistema auditivo 68
7.6.3. Somestesia 69
7.6.4. Cinestesia e propriocepção vestibular (equilíbrio, postura,
movimento) 69
7.6.5. Medos e traumas 70
7.6.6. Auto-estima 70
7.7. Aspecto social 71
7.8. Aspecto fisiológico 72
7.8.1. Sistema respiratório 73
7.8.2. Sistema circulatório 74
7.8.3. Sistema locomotor 75
7.8.4. Sono 76
7.8.5. Obesidade 77
CONCLUSÃO 79
BIBLIOGRAFIA 83
ANEXOS 84
INTRODUÇÃO
Para desenvolver tal abordagem sobre a relação dos movimentos primários com
o meio aquático, deve-se considerar todo o período de formação e desenvolvimento intra-uterino do embrião e feto durante a gestação. Ressaltar que neste período ocorre a gênese e maturação de todos os sistemas orgânicos, ganho de peso e de estatura e elo afetivo com o mundo e que estes fatores são de suma importância para que ocorra um parto natural, normal, sadio e sem seqüelas de qualquer ordem.
Após o nascimento segue a fase de amamentação e exames
pediátricos periódicos atestando alimentação, higiene, vacinas e orientações
necessárias para um pleno desenvolvimento de todo o organismo humano.
Dentre inúmeros exames pediátricos tem-se a avaliação do processo
de maturação do sistema neurológico. Avaliação esta que se dá através da
verificação dos reflexos, substrato neuro-motor que serve de base para a
formação de toda a motricidade voluntária, pode-se definir em qual estágio
encontra-se o bebê. Constatando se está dentro de um padrão evolutivo
normal ou se apresenta algum distúrbio ou deficiência neurológica. Estes
exames são muito importantes para todo o resto da vida pois se identificarem
distúrbios precocemente podem evitar seqüelas e ou doenças que interferem
na qualidade de formação e de vida do ser humano.
Para este estudo fica a necessidade de identificação do conceito de
bebê e suas necessidades orgânicas de ordens biológicas, psíquicas e sociais.
Ressaltando que a abordagem que será feita no estudo, considera que os
bebês apresentaram formação embrionária e fetal, parto, amamentação e
exames pediátricos todos sadios e normais.
Quando os bebês atingem um sistema imunológico eficiente, podem
e deve, serem inseridos num processo de estimulação de suas possibilidades.
Processo este que no presente estudo será a natação para bebês, única
atividade corporal que pode ser explorada desde o nascimento, com suas
nuances física, psicológica e social. Este trabalho de natação deve estar
adequado pedagogicamente para oferecer estímulos úteis e assimiláveis para
os bebês, ou seja, buscando teoria, prática e objetivos específicas para esta
faixa etária.
Também será necessário explicitar à parte, as propriedades físicas
da água, já que estas se diferem tanto das características do meio em que
vivemos e são as bases de toda a organização do trabalho de natação.
Integração dos bebês com o meio líquido (amniótico e ou água) facilitando a
instauração de vínculo afetivo baseado na segurança aos estímulos.
Partindo de um trabalho corporal realizado no contexto aquático
oferecendo inúmeras possibilidades de explorar todos os sistemas orgânicos
dos bebês espera-se melhor formação e utilização motora.
Relacionando com o quê seria seu desenvolvimento natural para
adquirir posturas e movimentos para mudanças de decúbitos, rastejar,
engatinhar, ficar de pé e andar, ou seja, utilização do aparelho locomotor e
respiratório pelo bebê.
O estudo busca vias de relação entre o desenvolvimento dos
padrões e das habilidades motoras de forma orgânica, interna e impulsionados
pela maturação neurológica com aquelas de forma pedagógica, externa e
motivadas pela relação com a água, professor e materiais.
E dentro dessa relação entre as motricidades terrestre e aquática
busca-se influências na aquisição, assimilação e acomodação no contexto
geral e orgânico dos movimentos primários do bebê em conjunto com o
aprendizado da natação.
A população alvo desta pesquisa monográfica é constituída de 28
bebês na faixa etária de 0 a 2 anos de ambos os sexos praticantes de natação.
CAPÍTULO I
A IMPORTÂNCIA DA ESTIMULAÇÃO
Partindo da abordagem preferida pelo estudo, torna-se necessário o
esclarecimento do termo bebê e no que difere do termo criança. Já que ambos podem ser utilizados para mesmas faixas etárias em desenvolvimento inicial deve-se observar o estado de maturação de diversos sistemas orgânicos. Somente em relação a idade cronológica pode-se definir que aos 24 meses de vida um bebê torna-se criança. Mas isso não basta para se conceituar diferenciações entre os dois termos.
Um bebê passa por diversos estágios de desenvolvimento em vida
intra-uterina e após o nascimento segue numa sucessão de estímulos
orgânicos, alimentares, higiênicos e sociais que vão interferir diretamente na
sua formação e amadurecimento. Como essa relação externa deixa registros
de ordem psicológica, biológica e social na composição do ser humano é de
suma importância que se dê com qualidades humanas.
A criança por já ter experimentado e explorado esta relação com o
meio externo responde com individualidade suas necessidades e satisfações,
fato este que difere de um bebê que só responde com reflexos e impulsos
orgânicos.
Sendo assim, vê-se que é de suma importância a qualidade de
relação e contato formativo com o meio externo para suprir suas necessidades
orgânicas e sociais incessantes e evolutivas da espécie humana para que de
fato torne-se um humano integrado.
Desde sua formação embrionária e fetal até o nascimento já se
fazem interações sociais através dos estímulos advindos da mãe e do pai,
sendo aceito e colocado como parte integrante de uma família. Durante toda a
gestação o feto já apresenta um ritmo biológico diferente do da mãe e como
este fato sugere acomodações e respostas orgânicas também diferentes
instala-se a primeira relação efetiva com um outro corpo, o da mãe.
Relação esta que só termina no momento do parto, da passagem
para um ambiente estranho e altamente lesivo.
“ O nascimento em si mesmo seria o ato da passagem. Ainda que ele dure pouco tempo, ele é a fonte de uma profunda mudança na transformação em que ele implica, de vir “de dentro” para ir “para fora”.
(Apostila de Paul Boyesen)
Após o nascimento, o rompimento com o mundo materno, seguro,
afetivo e passivo o bebê defronta-se com inúmeras agressões ao seu
organismo. Passa a ser um outro corpo, agora totalmente individualizado e com
respostas de registros de sua vida intra-uterina. Necessitando de todos os
cuidados pertinentes a manutenção sadia de sua vida começa a instalar suas
primeiras relações sociais efetivas como um ser presente no mundo com
necessidades para serem satisfeitas.
“Como se sabe, desde seu nascimento a criança está submetida ao ritmo
biológico incessante da alternância necessidade – satisfação e ao mesmo tempo está
submetida às sucessivas transformações que sofre seu corpo durante as horas do dia.”
(Apostila de Michel Bernard)
Todas essas constantes e sucessivas transformações acabam por
causar desconfortos orgânicos e corporais que trazem inquietude para o bebê
e sua mãe. Já que é a figura materna quem garante e sustenta a relação
necessidade – satisfação nesses primeiros meses de vida, a mãe tem papel
fundamental na qualidade de formação dos comportamentos do bebê.
Sendo aqui coerente ressaltar e analisar a atitude emocional e
postural da mãe perante as mais variadas necessidades do bebê.
“Uma mãe bondosa e tolerante não reagirá da mesma maneira que uma mãe
severa e hostil, um mãe equilibrada terá uma reação completamente diferente da reação
de uma outra, ansiosa e com sentimentos de culpabilidade.”
(Apostila de Michel Bernard)
E é a partir dessa primeira e única relação entre mãe-filho nos
aspectos afetivo, alimentar e higiênico que se forma o elo com o mundo de
forma segura, pacífica e ao mesmo tempo estimuladora. Um bebê que tem
suas necessidades satisfeitas apresenta um quadro de saúde geral bem
equilibrado para enfrentar às sucessivas adaptações a que será submetido
pelo meio externo.
“Devido ao longo período de imperícia do recém-nascido da espécie
humana, sua sobrevivência depende da ajuda de parceiros mais experientes. Sozinho, o
bebê não é capaz nem mesmo de virar-se de uma posição incômoda, seus movimentos
não se ajustam às circunstâncias exteriores e não têm eficiência objetiva. Sua primeira
atividade eficaz é desencadear no outro reações de ajuda para satisfazer suas
necessidades.”
(Henri Wallon, 1995, p. 60)
Simultaneamente as experiências sociais de necessidade –
satisfação ocorre a maturação do sistema nervoso que se ordena de forma
crânio-caudal e próximo-distal. Seguindo desenvolvimento crânio-caudal, ou
seja, no fluxo descendente da coluna vertebral na base do crânio até o cóccix
no final da mesma. E o desenvolvimento próximo-distal sugere maturação
começando na coluna vertebral e se direcionando para as extremidades
corporais como as mãos e os pés. Essas maturações vão se dando através
das enervações e ramificações do sistema nervoso por todo corpo humano.
Assim que o desenvolvimento do sistema nervoso atinge boa
enervação pelo corpo, o bebê está possibilitado a uma nova comunicação
corporal com o meio externo. Fato este que contribui com a formação de
registros subjetivos. Comunicação esta baseada nas experiências de
sensações auditivas, visuais, táteis, gustativas, labirínticas, cinéticas e tônicas
que o bebê pode ter com o próprio corpo.
Nessa fase de maturação de todos os sistemas orgânicos é
necessário ressaltar a importância da função do sistema nervoso em produzir,
receber e armazenar todas essas nuances internas e externas na vida do bebê.
Pois por sermos seres racionais, sociais e emotivos com objetividade na
relação entre intenção – ação – resultado, tudo aquilo vivenciado e registrado
na primeira infância terá possibilidades de desenvolvimento. Dessa forma
colocada, os registros tornam-se experiências construtivas ou traumáticas
podendo influenciar definitivamente no comportamento diante ao mundo.
Pode-se notar então a complexidade de estímulos a que um bebê
está submetido ao mesmo tempo e que se na relação básica com sua mãe e
os outros não encontrar segurança que permeie a formação de seu caráter,
sua identidade fica sem um entorno sadio, humano e equilibrado.
“Para que um sujeito se constitua como tal, para que o sujeito seja sujeito e
não puro corpo neuromotriz, necessariamente tem que passar pelo campo do outro.”
(Apostila de Esteban Levin)
Diante a necessidade dos pais acompanharem todas as mudanças
advindas do contexto financeiro e do avanço tecnológico sobre as áreas
humanas, passam mais horas no trabalho para garantir a sobrevivência e
padrão de vida de suas famílias. Assim os pais acabam se ausentando na
qualidade de relação com os seus filhos que ficam horas e horas sem suas
bases familiares que lhe remetem afetividade, segurança, alimentação, higiene
e lazer educativo. Nestes casos o bebê fica sem os outros simbólicos mais
significativos, ou seja, as figuras materna e paterna.
Para restabelecer esta relação efetiva com o outro que buscamos nos inserir
no contexto educacional pois qual seria a função e o objetivo da educação a não ser
tornar-nos seres sociais? As instituições educacionais têm de exercer papel fundamental
na construção da convivência, de rotinas de vida prática, da organização e manutenção
dos espaços de aprendizagem, de diversas linguagens, rotinas diárias de
comportamentos alimentares, higiênicos, de sono, de habilidades motoras, atividades
cognitivas e artes favorecendo adaptação ao ambiente coletivo.
Surge então na família a necessidade de ocupar o tempo livre e de
oferecer um desenvolvimento sadio e pleno para estes bebês e crianças. A
solução encontrada é geralmente a procura de creches ou escolas que
preencham todas as faltas e expectativas da família. Instituições de educação
infantil que estejam acompanhando a evolução dos tempos modernos, ou seja,
antenadas em oferecer diversos serviços como pediatria, nutrição, dentista,
psicólogos, professores especializados em alfabetização, educação física,
natação, dança, judô, música, inglês e informática entre outras diversas áreas
que contribuam para o desenvolvimento infantil.
Dentre as diversas áreas que impulsionam a maturação do bebê e
da criança no âmbito geral da educação em creches vamos nos ater
especificamente no que tange ao campo de atuação da Educação Física.
Desenvolvida no processo de construção antropológica da história e cultura
corporal, com toda riqueza de estímulos construtivos e como amplo
instrumento de elaboração e avaliação pedagógica pois acreditamos:
“...que é na escola que ela pode se afirmar mais consistentemente como instituição com vocação pedagógica. É lá que elementos aparentemente díspares como a Didática e a Fisiologia, por exemplo, interagirão em uma só estrutura de conhecimentos de forma mais evidente, em virtude das peculiaridades e da riqueza das situações do ensino-aprendizagem que ali ocorrem.”
(FARINATTI, 1995, p.13 )
Dentro de todo esse contexto da Educação Física vamos encontrar a natação
que é apenas um de seus campos de investigação e atuação profissional. Para se obter
uma adequação pedagógica da natação na perspectiva de uma atividade com reais
valores educativos e qualitativos pressupõe-se ser necessário que esteja respeitando e
otimizando as bases antropológicas da prática física. Como foi abordado a inserção da
natação dentro de amplo e complexo processo de ensino-aprendizagem não podemos
deixar que ela seja julgada mera figurante. Nem muito menos ser considerada uma
prática mecanizada repetitiva e voltada apenas para um desporto objetivando a
formação de futuros nadadores competitivos. Ainda mais se considerarmos que estamos
tratando de seres em plena formação e ávidos por experiências novas:
“Durante sua evolução, a criança apresenta a necessidade de adquirir de forma constante e renovada, através de sucessivas incursões práticas (ações sobre o meio ambiente), o maior volume possível de habilidades motoras que lhe garantam um desenvolvimento equilibrado e integral.”
(DAMASCENO,1997, p.13)
Pelo mesmo motivo, defende que as experiências motoras que se iniciam na
infância:
“são de fundamental importância para o desenvolvimento cognitivo, visto que os movimentos fornecem o principal meio pelo qual a criança explora, relaciona e controla seu ambiente. O movimento se relaciona com o desenvolvimento cognitivo no sentido de que a integração das sensações provenientes de movimentos resulta na percepção, e toda aprendizagem simbólica posterior depende da organização destas percepções em formas de estruturas cognitivas.”
(DAMASCENO, 1997, p. 9)
Deste modo, a natação infantil ganha mais valor formativo das habilidades
motoras pois trata-se de uma atividade que pode ser realizada com apenas alguns meses
de idade.
Colaborando com a vivência de noções de intensidades, velocidades,
sensibilidades, espaço, tempo, objetos, brinquedos, sons, pesos e domínio corporal
integrados ao meio aquático. Criando uma atmosfera lúdica e adaptada as necessidades
de cada faixa etária a natação no processo evolutivo deverá ter como objetivos:
a) Promover condições fisiológicas, educativas e recreativas à criança, desde o seu nascimento, favorecendo o seu crescimento e desenvolvimento integral;
b) Proporcionar os instrumentos básicos que estimulem os processos de maturação e de aprendizagem nos aspectos cognitivo, afetivo e psicomotor da criança de tal maneira que favoreçam seu crescimento e desenvolvimento; e
c) Orientar o espírito de curiosidade e observação da criança para iniciá-la na compreensão e interpretação do mundo que a rodeia.
(DAMASCENO, 1997, p. 5)
Como assinala Franco (1985, apud Damasceno), crescimento, maturação
neurológica e oportunidade de experiência, são os componentes essenciais que
determinam a qualidade de aprendizagem na primeira infância. E dessa forma
contextualizada a natação infantil vem de encontro aos anseios de aprendizagem em
todos os sistemas funcionais do corpo humano.
“...a inteligência de uma criança só se desenvolve se a mesma for levada a manter-se ativa em um meio propício, isto é, a inteligência decorre principalmente de exercício das funções sensório-motores e de suas coordenações.”
(Piaget, apud Damasceno, 1982)
Buscamos uma perspectiva humana dentro de uma dinâmica de ação
educativa integrando sentimento, pensamento e ação para o crescimento e
transformação de todo o universo cultural ao redor.
“Um corpo vai sendo marcado pelas vivências e pelos desejos do sujeito que o habitar – é uma espécie de monumento vivo das histórias de uma pessoa. Esse monumento é o corpo ao lado da linguagem. Não existe palavra sem corpo nem corpo fora do campo das palavras. Falamos com o corpo, o corpo fala de nós e por nós, traduzindo nossos sentimentos, conflitos e emoções.” (Anais do 2º Congresso Latino-Americano de Creches, 1995, p. 219)
Acreditando nesta colocação de que o corpo traduz os sentimentos através
de diversas emoções vamos rever a ótica de análise dos movimentos de um bebê para
não avaliar reflexos da mesma forma que expressões de necessidade e satisfação.
Devemos lembrar que para todos os estágios de maturação e evolução do
desenvolvimento corporal sejam alcançados dentro do trabalho psicomotor aquático
temos que partir de uma prévia avaliação, manutenção e progressão dos reflexos.
Assim sendo vamos abordar no próximo capítulo diversos reflexos que são
utilizados na natação para bebês que servem como referência na maturação e evolução
dos sistemas nervoso e locomotor. Estágios de desenvolvimento que orientam todo o
planejamento didático-pedagógico e os objetivos a serem atingidos nesta atividade
corporal aquática.
CAPÍTULO II
REFLEXOS ABORDADOS NA NATAÇÃO
Partindo da formação neurológica, maturação até o desenvolvimento das
estruturas psicológicas que irão tecer a relação da criança com o mundo devemos
começar pelos primeiros sinais observados através dos reflexos inatos.
Os reflexos são:
“movimentos inconscientes executados imediatamente como reação a um estímulo determinado, neles, o estímulo captado pelos receptores sensoriais , chegando aos centros nervosos, dos diferentes níveis do sistema nervoso, provoca diretamente a resposta motora. São, em geral, movimentos muitos simples e executados inteiramente independentes da nossa vontade. São inatos e não precisam de aprendizagem para a sua produção, embora a experiência os aperfeiçoe.”
(DAMASCENO, 1997, p. 28)
É a partir das atividades reflexas, inatas e não intencionais, que o bebê
aprenderá a executar todas as suas futuras ações. Elas servirão de base para as
experiências necessárias ao desenvolvimento da motricidade. As ações correspondem
sempre a reações a determinado estímulo: os estímulos determinantes das ações reflexas
são diferentes dos estímulo capazes de desencadear as ações voluntárias e automáticas.
Os reflexos dão ao bebê oportunidades de adaptação ao meio e aquisição psicomotora
voluntária sobre este substrato neuromotor onde se desenvolverá a motricidade.
2.1. CATEGORIA DE ALGUNS REFLEXOS EM FUNÇÃO
DA APRENDIZAGEM DA NATAÇÃO
Reflexo do Moro, do Abraço ou do Medo Primitivo
• Fase: nascimento aos 4 meses
• Estimulante: evento surpresa
• Resposta: extensão dos braços e pernas
Reflexo de Busca ou dos 4 Pontos Cardiais
• Fase: nascimento aos 4 e 6 meses
• Estimulante: estimular um dos lados da face ou dos lábios
• Resposta: movimentação de busca da cabeça ao lado tocado (se faz mais
presente nos momentos que antecedem a alimentação)
Reflexo Palpebral
• Fase: nascimento aos 2 anos
• Estimulante: água na superfície da córnea, conjuntiva ou cílios
• Resposta: ativa contração do músculo orbicular das pálpebras
Reflexo Tônico Cervical
• Fase: nascimento se convertendo em automatismo com a sustentação da
cabeça
• Estimulante: estimulação das terminações sensitivas dos músculos do
pescoço
• Resposta: extensão dos membros para os quais se orienta a face
Reflexo de Precipício
• Fase: de 3 a 6 meses
• Estimulante: uso de precipício ou abismo visual
• Resposta: percebe a profundidade evitando o local
Reflexo de Gerônimo
• Fase: de 5 a 9 meses
• Estimulante: espaço físico atrativo ( atração pelo vazio )
• Resposta: a criança lança-se a ele
Reflexo de Reptação
• Fase: a partir de 9 meses até se tornar ação voluntária
• Estimulante: em decúbito ventral qualquer apoio na planta dos pés
• Resposta: extensão sucessiva e sincronizada dos membros inferiores
Reflexo do Bloqueio da Glote
• Fase: nascimento a 12 meses ou mais prolongado nas crianças que
desmamam tardiamente
• Estimulante: qualquer agente físico em contato com a face
• Resposta: breve bloqueio da glote
Reflexo de Pára-quedas
• Fase: entre 6 e 7 meses até 2 anos
• Estimulante: projetar a criança contra uma superfície
• Resposta: extensão dos braços protegendo a face
Reflexo de Precipitação
• Fase: entre 5 e 6 meses com extinção tardia
• Estimulante: atitude que desafie a estabilidade de criança
• Resposta: extensão dos braços colocando as mãos sobre plano de apoio
Reflexo de Saltador
• Fase: entre 7 e 8 meses até o domínio da posição ereta
• Estimulante: impulso psicológico de descoberta do corpo
• Resposta: rápidas e sucessivas extensões e flexões das pernas
(DAMASCENO, 1997, p. 32, 33 e 34)
Utilizando-se de todos esses reflexos que se começa o trabalho de
educação física de natação para bebês e posteriormente com sua maturação neurológica
e biológica que chegamos até a percepção sensorial e o aprendizado de movimentos
voluntários e intencionais com finalidade definida para a propulsão na água.
Estimulando as mais variadas percepções, movimentos, eixos e decúbitos
estamos ampliando o repertório motor e a utilização do corpo nos meios terrestre e
aquático pois a cada experiência promovida nas aulas ficam os registros de novas
sensações no sistema nervoso e de novos movimentos no sistema locomotor.
No próximo capítulo vamos nos aprofundar um pouco mais na relação entre
o sistema nervoso e o locomotor porque é daí que vamos chegar até a motricidade
voluntária subjetiva com a qual se realiza a vida.
CAPÍTULO III
RELAÇÃO ENTRE OS SISTEMAS NERVOSO
E LOCOMOTOR
Agora vamos abordar a relação existente entre os sistemas nervoso e o
locomotor lembrando que esta se estabelece num bebê que teve seus estágios de
formação, maturação e desenvolvimento de forma completa e sadia. Devemos ressaltar
a importância desta relação para o contexto de todas as práticas corporais como no
trabalho de motricidade aquática pois estaremos reforçando desde cedo a construção de
um movimento intencional e individual.
Através das informações que ocorrem entre os dois sistemas que vamos
construindo diversas noções do corpo e do movimento, que sensibilizamos a percepção
corporal, que adquirimos a capacidade de intervenção e mudança do ambiente externo e
que se comprova a existência do raciocínio e da intenção tão inerentes ao ser humano.
Os bebês exploram esta relação como uma forma de linguagem com quem
está a sua volta pois se existe algum tipo de informação orgânica de satisfação de
necessidades, o aparelho motor vai expressar essa necessidade seja por contração,
agitação, grito ou choro. Assim quem estiver perto do bebê irá identificar e satisfazer os
anseios dele que por sua vez começa a exercer controle sobre suas satisfações através
desta relação social.
Aliás é justamente a relação entre esses dois sistemas que nos difere dos
outros animais onde podemos explorar e armazenar a intenção, a ação e o resultado de
nossas vontades, sensações, percepções e de nossos movimentos nos levando acima dos
instintos.
Para se obter uma diferença entre os movimentos instintivos dos
intencionais, precisamos de uma intenção bem definida de atitudes e resultados
correlacionados.
“Como é que os neurônios em uma região do sistema nervoso podem encontrar seus alvos em outra região? Os prolongamentos crescem para longe do corpo celular. A extremidade dianteira desse prolongamento se expande para formar o cone de crescimento que analisa o ambiente, contactando outras células e indícios químicos. O cone de crescimento recua de determinados compostos químicos e avança por outras regiões onde os atraentes químicos são especificamente compatíveis com as características do cone de crescimento.”
(LUNDY-EKMAN, 2000, p. 62)
Dentro de todo trabalho corporal aquático para bebês estamos
assegurando esta comunicação com cada estímulo produzido seja pela água, professor,
movimento ou materiais. O sistema nervoso capta esse estímulo, transforma-o em
impulso elétrico, leva-o para ser interpretado, codifica e depois manda outro impulso
elétrico como resposta ao estímulo anterior. E aí então o músculo se comporta de acordo
com a informação transmitida pelo sistema nervoso respondendo prontamente aos seus
comandos. Após esta atitude de resposta temos uma outra situação externa que vai
novamente nos dar uma informação que vai ser captada pelo sistema nervoso e que
impulsiona atitudes constantes de alimentação de uma outra informação. Assim criamos
nossa relação tônica com o mundo, ou seja, respostas ativas e passivas de transformação
ou de manutenção dos fatos.
“Durante o desenvolvimento, diversos axônios podem inervar a mesma fibra muscular. Essa inervação polineuronal é eliminada durante a 25a nos humanos em desenvolvimento (Hesselmans et al, 1993). Esses dois processos regressivos , morte neuronal e retração axônica esculpem o sistema nervoso em desenvolvimento.”
(LUNDY-EKMAN, 2000, p. 62)
Dentro do trabalho psicomotor aquático temos movimentações ativas e
passivas de diversos grupamentos musculares com variações de velocidade, baseadas na
informação:
“As conexões neuronais também esculpem a musculatura em desenvolvimento. Experimentos que modificam as conexões de neurônios motores para uma fibra muscular demonstram que o tipo de fibra muscular (de contração rápida ou lenta) é dependente da inervação. O músculo de contração rápida é convertido para um de contração lenta se inervado por um neurônio motor lento, e o músculo de contração lenta pode ser convertido a um de contração rápida se inervado por neurônio motor rápido (Buller et al., 1960).”
(LUNDY-EKMAN, 2000, p. 62)
Vale lembrar que esta relação entre o sistema nervoso e o locomotor é
alimentada também pelos sentidos que são o campo de recepção do mundo, ou seja,
uma infinita gama de estímulos a todo tempo está acontecendo.
No caso específico da natação para bebês encontramos informações
advindas da água encobrindo todo o corpo, estimulando diversos reflexos, adaptações
orgânicas, temperaturas diferentes, sons, viscosidade e peso. Também existem as
informações que partem do professor, do corpo que dá colo, das pegadas, das variadas
posições entre o professor e o bebê, movimentações ativas e passivas, nível de
tonicidade, voz e segurança. Não podemos deixar de lembrar das informações
produzidas pelos materiais pedagógicos utilizados nas aulas, estímulos de texturas,
pesos, tamanhos, cores, sons, funções.
Como todas essas informações são variantes devido ao objetivo específico
de cada aula elas causam um despertar da curiosidade e do interesse pelos movimentos e
objetos novos promovendo acomodações emocionais e tônicas nos bebês com a
proximidade da piscina.
“A medida que ocorre prontidão e exercício das habilidades motoras e o advento de alguma forma de linguagem, embora ainda rudimentar, as possibilidades de exploração do ambiente físico e social são ampliadas consideravelmente.”
(RAPPAPORT, 1981, p. 41)
Então podemos perceber a coerência de realizar uma estimulação precoce no
aparelho locomotor do bebê desde que se respeite seu estágio de maturação. Pois esta
estimulação ajuda também na organização e maturação cognitiva promovendo a
aquisição de diferentes linguagens. Vale também destacar que toda a proposta motora
pedagógica executada na natação não aconteceria de nenhuma outra forma devido ao
ambiente terrestre sofrer maior ação da gravidade impossibilitando explorar
deslocamentos ativos, sensação de liberdade nos membros inferiores, decúbitos ventral
e dorsal sem a pressão do solo, posição ereta bípede mesmo sem tônus para executa-la,
movimentos sem nenhum tipo de apoio, ou seja, abrem-se novas possibilidades de
organização e utilização do esquema corporal que só trazem benefícios ao
desenvolvimento pleno, integrado e sadio do bebê praticante de natação.
O desenvolvimento da relação entre esses sistemas tem como base diversos
atos reflexos que mostram quanto os estímulos estão sendo captados, transformados em
impulsos elétricos, decodificados e produzindo respostas emocionais e motoras.
A natação para bebês se utiliza desta base reflexa antes da sua extinção e já
aprimora o sistema locomotor para sua tarefa evolutiva até a postura bípede terrestre e
aos mais diversos aprendizados pelos quais o corpo irá explorar.
“Neste sentido, terá como tarefa evolutiva procurar desenvolver seu repertório comportamental e sua vida mental, no sentido de encontrar recursos próprios para lidar adequadamente com cada situação. Para tanto,
continuará utilizando-se dos esquemas sensoriais motores já formados, e será justamente através da atualização destas potencialidades já adquiridas que o bebê apresentará harmonia em sua atuação com o mundo externo.”
(RAPPAPORT, 1981, p. 42)
Dessa forma assim colocada a natação, como um trabalho psicomotor
aquático, visa manter essas potencialidades bem estimuladas para que possam colaborar
na aquisição de habilidades motoras primordiais tornando-se também características
subjetivas. É a fase em que um simples movimento é o fruto da intenção, quando os
movimentos se tornam atitudes, quando ganham contornos humanos individuais e
contextualizados numa situação estimuladora.
Como a natação para bebês é um campo de atuação e de investigação da
Educação Física sentimos a necessidade de elucidar como se formam e se relacionam o
sistema nervoso e o locomotor. Pois assim poderemos visualizar melhor a interferência
de qualquer atividade corporal, no caso aqui a natação, no processo evolutivo do bebê
até a postura bípede.
No próximo capítulo vamos abordar de forma mais profunda os sistemas
referidos para tentar validar a interferência na conquista de padrões motores terrestres
através de uma estimulação da motricidade aquática.
CAPÍTULO IV
FORMAÇÃO DOS SISTEMAS NERVOSO
E LOCOMOTOR
Neste presente capítulo iremos fazer uma abordagem sobre os períodos mais
importantes da formação e da função do sistema nervoso e do locomotor, de forma a
elucidar como se organizam e correlacionam organicamente.
Os humanos passam por três estágios de desenvolvimento em útero: pré-
embrionário, embrionário e fetal.
• Estágio Pré-embrionário
O estágio pré-embrionário vai desde a concepção até duas semanas. O
ovo fertilizado, uma única célula, começa a se dividir a medida que passa ao longo
da trompa uterina e para dentro da cavidade uterina. Por divisões celulares
repetidas, forma-se um esfera sólida de células. A camada externa será a
contribuição fetal à placenta, enquanto a camada interna vai formar o embrião.
• Estágio Embrionário
Durante o estágio embrionário, que vai da segunda semana até o
término da oitava, os órgãos são formados. O ectoderma dá origem aos órgãos
sensoriais, à epiderme e ao sistema nervoso. O mesoderma dá origem a derma, aos
músculos, ao esqueleto e aos sistemas excretor e circulatório. O endoderma se
diferencia no que vai ser o intestino, o fígado, o pâncreas e o sistema respiratório.
• Estágio Fetal
O estágio fetal dura do término da oitava semana até o nascimento. O
sistema nervoso se desenvolve mais completamente e começa a mielização
(isolamento dos axônios por tecido gorduroso).
(LUNDY-ELKMAN, 2000, p. 56-57)
Mais uma vez estamos verificando a importância de um acompanhamento
pré-natal pois como será descrito a seguir é na vida intra-uterina, desde o embrião até o
feto, que todos os sistemas do ser humano formam suas bases.
“Influências genéticas e ambientais atuam sobre as células durante todo o processo de desenvolvimento, estimulando seu crescimento, sua migração e diferenciação, e até mesmo sua morte e retração axônica para criar o sistema nervoso. Alguns desses processos são completados em útero, enquanto outros continuam durante os primeiros anos após o nascimento.”
(LUNDY-ELKMAN, 2000, p. 56)
Vamos primeiramente estudar a gênese e maturação do sistema nervoso e
logo a seguir a do sistema locomotor.
4.1. SISTEMA NERVOSO
A formação do sistema nervoso ocorre durante o estágio embrionário e tem
duas fases. Na primeira, o tecido que vai formar o tecido nervoso coalesce para formar
um tubo ao longo do dorso do embrião. Quando se fecham as extremidades desse tubo,
começa a segunda fase, a formação do encéfalo.
“O sistema nervoso se desenvolve a partir do ectoderma, a camada celular mais externa do embrião.”
(LUNDY-EKMAN, 2000, p. 57)
Então vamos partir para um aprofundamento na primeira fase de
desenvolvimento do sistema nervoso que é a formação do tubo neural.
“ O sistema nervoso começa com um espessamento longitudinal do ectoderma, chamado placa neural. Esta placa se forma na superfície do embrião, estendendo-se da região da cabeça até a da cauda, sempre em contato com o líquido amniótico. As bordas dessa placa se dobram para formar a goteira neural, e essas dobras crescem em direção uma da outra. Quando se encontram na linha média, é formado o tubo neural. O tubo neural fecha primeiro na futura região cervical. Em seguida, a goteira se fecha rapidamente nas direções rostral e caudal, deixando suas extremidades, chamadas neuroporos, abertas. As células adjacentes ao tubo neural se separam desse tubo e do ectoderma restante para formar a crista neural. Quando essa crista já se desenvolveu, o tubo neural se desloca para o interior do embrião à medida que o ectoderma sobrejacente ( destinado a formar a pele ) se fecha sobre o tubo e a crista neurais. O neuroporo superior se fecha antes do inferior.”
(LUNDY-EKMAN, 2000, p. 57)
Desde cedo já existe especificidade dos neurônios quanto a sua inervação e
função perante todo o organismo humano.
“Os neurônios na parte dorsal do tubo neural processam a informação sensorial. Os neurônios com seus corpos celulares na parte ventral inervam os músculos esqueléticos.”
(LUNDY-EKMAN, 2000, p. 58) Com a formação desse tubo neural que acontece entre os dias 18 a 26 de
vida embrionária está encerrada a primeira fase do sistema nervoso começando então a
segunda fase que é a formação do encéfalo. Agora este assunto será investigado de
forma a buscar sua gênese e desenvolvimento.
A formação do encéfalo dá-se da seguinte maneira:
“Quando o neuroporo superior fecha, a futura região encefálica do tubo neural se expande, formando três dilatações: o cérebro posterior (rombencéfalo), o cérebro médio (mesencéfalo) e o cérebro anterior (prosencéfalo). Pouco depois, duas dilatações adicionais aparecem, dividindo o encéfalo em cinco regiões distintas. Essas dilatações, como seu tubo neural precursor, são ocas. No sistema nervoso maduro, essas cavidades, cheias de líquido, são chamadas ventrículos.
O cérebro posterior se divide em duas partes: a parte inferior forma o mielencéfalo, e a parte superior, o metencéfalo. Adiante, essas partes vão se diferenciar no bulbo, na ponte e no cerebelo. Na parte superior do cérebro posterior, o canal central se expande, para formar o quarto ventrículo. A ponte e o bulbo superior ficam anteriores ao quarto ventrículo, enquanto o cerebelo tem situação posterior. No cerebelo, a camada do manto dá origem aos núcleos profundos e ao córtex cerebelar. Para formar esse córtex, os corpos celulares da camada do manto migram através da substância branca até a superfície externa.
A dilatação do cérebro médio retém seu nome, mesencéfalo, durante todo o desenvolvimento. O canal central se transforma no aqueduto cerebral, no mesencéfalo, conectando os terceiro e quarto ventrículos.
A parte posterior do cérebro anterior permanece na linha média, para formar o diencéfalo. Suas estruturas principais são o tálamo e o hipotálamo. A cavidade na linha média forma o terceiro ventrículo.
A parte anterior do cérebro anterior dá origem ao telencéfalo. A cavidade central se expande para formar os ventrículos laterais. O telencéfalo vai formar os hemisférios cerebrais; os hemisférios se expandem de forma tão extensa, que chegam a envolver o diencéfalo. Os hemisférios cerebrais consistem em núcleos profundos, incluindo os gânglios da base (grupos de corpos celulares), a substância branca (contendo axônios) e o córtex (camadas de corpos celulares na superfície do hemisfério).”
(LUNDY-EKMAN, 2000, p. 60-61)
No decorrer dessa complicada formação orgânica os agentes externos já
influenciam na sua maturação, facilitando ou dificultando que novas conexões nervosas
aconteçam, ou seja em determinados períodos do desenvolvimento do cérebro humano
faz-se necessário uma estimulação sensório-motor.
“Muitos experimentos têm investigado as conseqüências da privação sensorial sobre o sistema nervos infantil. Esses experimentos indicam que períodos críticos, durante o desenvolvimento, são cruciais para os resultados normais. Períodos críticos constituem o tempo no qual os neurônios competem pelos sítios sinápticos; desse modo, o sistema nervoso otimiza as conexões neurais durante o período crítico. O funcionamento normal dos sistemas neurais é dependente de experiência apropriada durante o período crítico.”
(LUNDY-EKMAN, 2000, p. 66-67)
Resumindo de forma bem rápida podemos colocar a formação e o
desenvolvimento do sistema nervoso da seguinte forma: formação do tubo
neural (semanas 3-4), formação das dilatações cerebrais (meses 2-3),
proliferação celular (meses 3-4), migração neuronal (meses 3-5), organização
(mês 5 até início da vida adulta) e mielinização (nascimento até 3 anos pós-
natal).
Entendendo que o período da organização engloba a diferenciação,
crescimento dos axônios e dendritos, formação das sinapses, morte neuronal
seletiva e retração axônica e que vai até a vida adulta temos a primeira relação
de benefícios da prática da natação para bebês pois esta atividade irá
promover todas as fases da organização do sistema nervoso. Facilitando a
inervação em toda a musculatura que é beneficiada com as movimentações
ativas e passivas de todo o corpo do bebê estimulando os órgãos sensoriais
dos músculos.
“O órgão sensorial do músculo é o fuso muscular, consistindo de fibras musculares, terminações sensoriais e terminações motoras. As terminações sensoriais do fuso respondem ao estiramento; isto é, às variações do comprimento muscular e da velocidade com que ocorrem essas variações.”
(LUNDY-EKMAN, 2000, p. 72)
Como já colocamos a formação e o desenvolvimento do sistema
nervoso até sua proximidade e relação com o sistema locomotor, agora
devemos aprofundar nosso estudo na direção do sistema locomotor para
entender melhor a relação direta da prática de um trabalho psicomotor
aquático.
4.2. SISTEMA LOCOMOTOR
O sistema locomotor é formado pelo esqueleto, pelos músculos e
pelos tendões. A combinação desses elementos cria um sistema de alavancas
entre as articulações e os ossos, enquanto um músculo se estende um se
contrai, enquanto um tendão afrouxa um outro estica e enquanto um osso
mexe outro está parado. Assim o ser humano consegue criar as mais variadas
formas de movimentos.
“Se encararmos o Aparelho Locomotor como um todo, vamos constatar que a som de colocação e ação dos ossos, articulações e músculos, possibilita o aparecimento de vários sistemas de alavancas.”
(FERREIRA, 1985, p. 115)
Vale lembrar que para qualquer movimento ocorrer é necessário um
comando nervoso agir sobre aquele grupo muscular, ou seja, para os
movimentos normais, as áreas de planejamento motor, os circuitos de controle
e as vias de comunicação com informações sensoriais fornecendo instruções
aos neurônios.
“Só os motoneurônios
inferiores levam os sinais originados no
sistema nervoso central para os músculos
esqueléticos que produzem os
movimentos.”
(LUNDY-ELKMAN, 2000, p. 137)
Uma informação chega até os neurônios motores que produzem os
movimentos através da conexão com os músculos, tendões e ossos. Então
vamos abordar primeiro o esqueleto humano.
“Numa visão geral, o esqueleto
humano é um conjunto de ossos que se
mantém unidos por elementos articulares.
As variações de forma e dimensões
existem para adaptar cada uma das
porções em que se divide o esqueleto a
sua função principal e direta, bem como a
posição bípede do homem.”
(FERREIRA, 1985, p. 103)
O esqueleto humano é composto por diversos tipos de ossos e articulações
entre eles. Essas articulações exercem funções específicas de união, de proteção, de
sustentação e de locomoção, ou seja , pode se dizer:
“o conjunto de estruturas diretamente ligadas na união e proteção de dois
extremos ósseos adjacentes em seu ponto de encontro.”
(FERREIRA, 1985, p. 108)
Essas articulações são mobilizadas através das propriedades de
contratilidade e de elasticidade, ou seja, um músculo quando se contrai precisa que o
seu músculo antagônico realize uma extensão.
“ O tecido muscular tem como elemento básico formador células de aspecto
alongado que se reúnem em grupos de várias unidades. Tais células serão chamadas
células musculares ou fibras musculares.”
(FERREIRA, 1985, p. 117)
Cada grupamento muscular se constitui de diversas fibras
específicas para cada função e se prende aos ossos através dos tendões e
ligamentos. Possibilitando um corpo adequado ao movimento, um campo
aberto de possibilidades e um aparelho eficiente para realizar a criatividade.
O corpo humano é tão adequado ao movimento que quando fica
hipocinético ou sedentário ocorrem desvios posturais, aumento do peso
corporal, obesidade, problemas nas articulações, alteração de pressão arterial
e de respiração. Conclui-se que o sistema locomotor exerce influência direta na
qualidade de vida do ser humano.
CAPÍTULO V
ÁGUA
Após termos explicitado o processo de formação orgânica dos
sistemas nervoso e locomotor, seus desenvolvimentos, suas funções e
relações, abordaremos as características do ambiente em que se darão os
diversos estímulos propostos pelo trabalho psicomotor aquático. Estímulos
estes planejados para favorecer o bebê em sua maturação, na verificação e
manutenção dos reflexos e apropriação do aparelho motor junto com os
estímulos específicos advindos da água para um aumento de experiências
corporais.
Esta apropriação inicial da motricidade reflexa básica, ou seja,
experimentar diversas vezes os mesmos estímulos beneficia o aparecimento
da segurança e com o passar do tempo e do trabalho vai evoluindo até se
tornar uma motricidade voluntária propulsiva. Motricidade diferente daquela que
estamos geneticamente programados e portanto para que ela ocorra devemos
estar na água. Por isso vamos abordar neste capítulo o ambiente e a sala de
aula da natação: a água.
“A água está intimamente ligada à vida do homem e, incontestavelmente à vida do bebê já que, o líquido amniótico é água em noventa e oito por cento.”
(DAMASCENO, 1997, p. 57)
Como se sabe, nosso globo terrestre é coberto de água em sua maior parte, assim como o nosso corpo é composto em grande parte de líquido, o que a torna indispensável à nossa existência biológica.
A água é tão misteriosa porque não existe nenhuma água pura,
nenhum modelo único de água e a sua frágil arquitetura molecular que pode
ser modificada de acordo com a temperatura, a pressão e a radiação
eletromagnética.
“De fato, até os dias atuais, a água permanece um mistério. Todas as substâncias se tornam mais pesadas e mais densas quando passam do seu estado líquido para sólido. Mas acontece o oposto com a água: o gelo flutua. Se não fosse assim, o gelo cairia no fundo frio do mar e, inverno após inverno, cada vez mais água se transformaria em gelo.”
(DAMASCENO, 1997, p. 56)
O deslocamento na água pelos mamíferos quadrúpedes é natural
porque, quando em ambiente líquido, permanecem em sua posição natural,
executando os mesmos movimentos de quando se locomovem fora da água.
Enquanto que, para o homem, torna-se necessária a readaptação da posição
de bípede para a posição horizontal.
Dentro do ambiente líquido, muitos movimentos são realizados
facilmente, em virtude do relaxamento e domínio do corpo, como por exemplo,
a cambalhota para frente e para trás etc., movimentos estes que fora da água
se tornam mais difíceis.
Estar e agir no meio aéreo não é igual que estar e agir no meio
aquático. Há várias propriedades físicas da água que interferem na ação direta
e indiretamente, não só no corpo mas em todo nosso universo de vida. Apesar
do ser humano ter estado cerca de 9 meses no meio líquido, ao nascer,
passando para o meio aéreo, muitas coisas transformam-se, a começar pela
respiração.
O ponto mais importante sobre a água deve ser o fato dela não
assegurar a sobrevida do ser humano, um ambiente onde não se encontra
meios para respirar e sem segunda chance de sobrevivência para aqueles que
não saibam nadar de algum modo.
“Quem aprende a nadar adquire um seguro de vida, apreendendo acima de
tudo o respeito para com a água e o meio ambiente em que a encontra.”
(SILVEIRA, 1998, p. 20)
Devemos explicitar certas propriedades físicas da água pois é
através do conhecimento e da utilização dessas características que montamos
todos os planejamentos e os objetivos do trabalho psicomotor aquático. É de
grande importância falar sobre a água, pois além do nosso instrumento de
trabalho ser tão complexo, nosso meio de ação para a aprendizagem da
natação, é também muito rico de propriedades.
5.1. ÁGUA – UM AMBIENTE DESCONHECIDO –
PROPRIEDADES FÍSICAS
Densidade – princípio de Arquimedes – quando um corpo é submerso, ele
experimenta uma força de empuxo igual ao peso do líquido que ele
deslocou. Fatores: mais densos que a água (músculos e ossos compactos),
menos densos que a água (gordura, ossos esponjosos e quantidade de ar
nos pulmões). A densidade também varia de acordo com a temperatura.
Equilíbrio – o corpo na água está sujeito a duas forças opostas – gravidade
e flutuação. Se forem iguais e opostas estará em equilíbrio e se forem
desiguais e desalinhadas então ocorrerá movimento rotatório.
Turbulência – é a redução da pressão pela movimentação da água. Quando
um corpo se desloca na água encontra uma resistência que se subdivide
em positiva (ação) e negativa (reação). Positiva é a onda ascendente na
frente do corpo e vale 10% da resistência. Negativa é a onda descendente
atrás do corpo formando uma área de baixa pressão e sugando-o para
baixo. O grau de turbulência depende da velocidade do movimento e a
forma do corpo influencia na produção da turbulência.
Fricção – a diferença da fricção da pele do corpo no ar para a água é 790
vezes maior. Dificulta os movimentos, ritmo mais lento e maior gasto de
energia.
Pressão – a lei de Pascal estabelece que a pressão hidrostática é
exatamente igual em qualquer corpo na posição horizontal. A pressão
aumenta com a profundidade e com a densidade da água.
Velocidade – posição horizontal, alongamento dos segmentos corporais e
acréscimo de materiais.
Temperatura – interfere na participação, motivação, musculatura,
relaxamento e flutuabilidade. Mais quente para hipertônicos e mais fria para
hipotônicos. Os bebês e os deficientes são mais perceptíveis e sensíveis a
nível tátil-bárico com a água e seu desempenho motor relaciona-se
diretamente com a temperatura que deve estar no mínimo a 29OC e no
máximo a 32OC.
(VELASCO, 1997, p. 21-23)
Ressaltando que as necessidades de todos os cuidados primordiais com o ambiente da piscina como o tratamento adequado da água, limpeza das instalações hidráulicas, materiais, bordas, vestuários e sanitários são fundamentais na qualidade dos resultados.
Pode-se observar características físicas específicas da água que vão
interferir diretamente em todos os resultados já que diferem das propriedades físicas do
ar. Com o domínio dessas características o professor de natação poderá montar o
planejamento de sua atividade favorecendo as experiências individuais desde a
adaptação até o aprendizado dos nados respeitando os limites impostos pela água no
corpo de seus alunos.
Estruturando todos esses contextos com o planejamento pedagógico parte-se
para adequação do ambiente, ou seja, tornar a piscina numa extensão do mundo infantil.
Brinquedos, brincadeiras, músicas, paisagens e personagens facilitam o processo de
adaptação e evolução do trabalho psicomotor aquático.
CAPÍTULO VI
MOTRICIDADE
Neste capítulo vamos correlacionar diversos pontos sobre os dois tipos de
motricidades abordadas no estudo, são elas: a motricidade terrestre e a motricidade
aquática. Com isso buscamos verificar as interferências entre as ambas em relação ao
repertório motor, comportamento psíquico e social adquirido pelo bebê praticante de
natação.
Todo e qualquer ser humano traz em si uma identidade genética que pré-
determina nossas características ontogênicas. Em relação ao mundo animal temos nossa
identidade filogenética de mamíferos, bípedes e terrestres. E isso quer dizer que os seres
humanos, animais racionais possuem um biótipo adequado para atingir e viver na
postura ereta, vertical com o apoio dos membros inferiores, meio ambiente terrestre e
com necessidade vital de respiração aérea.
Essas características aliadas a uma grande variedade de movimentos
corporais possíveis pelo aparelho locomotor, um processo cognitivo fantástico e
criativo, fizeram com que o ser humano fosse se adaptando por todo o planeta e
conseguindo satisfazer suas necessidades para a manutenção da vida de sua espécie.
O movimento do ser humano, por ser um animal racional, deve ser
entendido como fruto de uma intenção na busca de um resultado esperado. Lembrando
que também é uma ato com eficiência mecânica como menor gasto possível de energia.
O movimento é de todavia a realização de nossos sentimentos, necessidades,
vontades, é por onde se imprime nossa subjetividade no mundo e nas pessoas, é
linguagem verdadeira tônica e orgânica, ou seja, o movimento e sua utilização elevam o
ser humano acima dos instintos marcando nossa diferenças no reino animal.
Quanto maior for o repertório motor, maiores serão as possibilidades de
experiências corporais com segurança e eficiência no diálogo com o mundo. Então será
falado sobre a formação e fases da motricidade humana.
Devemos atentar para o fato de que a motricidade tem o seu
desenvolvimento natural de acordo com a sucessão das fases de maturação dos sistemas
orgânicos do bebê. Além desse fator interno e orgânico, o desenvolvimento da
motricidade sofre influências diretas e marcantes do meio externo, ou seja, as condições
ambientais, alimentares, higiênicas, sociais e culturais. De uma forma geral essas
influências internas e externas vão marcando a história da formação do corpo e do
movimento e vice-versa. Podemos então perceber a importância desde cedo do
movimento na vida do bebê. E para melhor entendermos a aquisição dessas habilidades
motoras temos que buscar suas origens em duas vertentes. Pois segundo Faw apud
Damasceno as duas classes de habilidades motoras são as específicas e as filogenéticas.
“As habilidades motoras específicas, são aquelas cujo desenvolvimento depende da aprendizagem. Aprendizagem refere-se às mudanças no comportamento que resultam das experiências vivenciadas pelo bebê. As habilidades motoras filogenéticas são aquelas cujo desenvolvimento dependem principalmente da maturação. Maturação refere-se às mudanças do desenvolvimento que ocorrem espontaneamente nos bebês normais, desde que o ambiente lhes possibilite amadurecer.”
(DAMASCENO, 1997, p. 6)
Portanto o desenvolvimento geral da motricidade é fruto da interação entre
os dois processos de aquisição: o evolutivo e as experiências vividas.
“a resultante destes dois processos: o processo evolutivo que corresponde à execução de movimentos, de complexidade crescente, que se processam reflexamente, e o processo de aprendizagem correspondente à aquisição das ações responsáveis pelas atividades executadas sob o controle da córtex motora – atividades psicomotoras.”
(DAMASCENO, 1997, p. 8)
Mas para que ocorra algum tipo de aprendizagem de novas habilidades
motoras deve-se observar o estágio de maturidade em que se encontra o bebê. Pois a
maturidade corresponde a um estágio de desenvolvimento atingido num determinado
momento pelo organismo. O professor deve saber esses estágios de maturação e a
adequação pedagógica para melhor transmitir e explorar a motricidade aquática.
“Assim sendo, a aprendizagem não poderá proporcionar um desenvolvimento superior à capacidade da organização das estruturas do sistema nervoso do bebê; que poderá não aprender das experiências vividas conhecimentos para os quais não tenha adquirido, ainda, uma suficiente maturidade. A maturidade é, no entanto, dependente, em parte, do que foi herdado e, em parte, do que foi adquirido pelas experiências vividas. A maturidade não é estacionária, mas está sempre em desenvolvimento.”
(DAMASCENO, 1997, p. 9)
Percebemos a importância e responsabilidade do professor de natação para
bebês por ser a primeira interferência externa durante a evolução da motricidade e
também pelo fato de uma conduta inicial defeituosa influencia e prejudica todas as
condutas futuras ao serem adquiridas. Condutas motoras que seguem um padrão
organizacional.
6.1. CARACTERÍSTICA DO DESENVOLVIMENTO DA
MOTRICIDADE
Um programa de atividade corporal para bebês deve estar fundamentado na
maturidade dos sistemas nervoso e locomotor e portanto organizado pedagogicamente
para favorecer um desenvolvimento equilibrado e integral. Esse planejamento
pedagógico deve observar três pontos a saber.
6.1.1. Ação de massa para ação específica
Inicialmente, os movimentos do bebê utilizam somente os grandes músculos
do corpo e envolvem o corpo todo ao invés de partes específicas. Com o passar do
tempo e com a generalização das experiências, as ações motoras se tornam mais
específicas, isto é, são utilizados conjuntos menores de músculos para empreender uma
ação. Estas mudanças em uso do músculo e a atividade motora, representam uma
transposição da ação de massa para ação específica.
6.1.2. Organização cefalocaudal
O termo cefalocaudal, refere-se ao fato de que o desenvolvimento dos
músculos começa com os que estão mais próximos da cabeça e prossegue para os
membros inferiores ou seja, o desenvolvimento do bebê começa pela cabeça (céfalo) e
progride em sentido descendente para as pernas (cauda-caudal). Desta forma, o bebê,
coordena sua cabeça antes de poder coordenar suas pernas.
6.1.3. Organização proximodistal
Refere-se ao fato de que o desenvolvimento da coordenação motora começa
com os músculos mais próximos do tronco e prosseguem para as extremidades do
corpo. Este padrão organizacional é exemplificado pela capacidade inicial do bebê de
coordenar seus braços a partir dos ombros e sua capacidade, adquirida posteriormente,
de manipular os punhos e os dedos. Este padrão de desenvolvimento é chamado de
próximo (mais perto do centro do corpo) distal (mais distante do centro do corpo).
Acabamos de entender como se dá o processo de formação da motricidade
humana de uma forma geral e agora vamos partir para a evolução natural dos
movimentos terrestres. Depois iremos abordar a aprendizagem da motricidade aquática
e por fim vamos avaliar qual a contribuição psicomotora desta aprendizagem no
contexto evolutivo do bebê praticante de natação.
6.2. MOTRICIDADE TERRESTRE
Neste momento vamos colocar as fases do desenvolvimento da motricidade
de uma forma evolutiva, ou seja, da forma pré-disposta geneticamente em todos os
humanos, mamíferos, bípedes, terrestres e com respiração aérea.
È certo que temos padrões motores que representam as fases de maturação e
de relação entre o sistema nervoso e o sistema locomotor. Vamos abordar agora a
sucessão das fases de aquisição destes padrões e habilidades motoras no que diz respeito
ao meio terrestre para depois comparar com as do meio aquático.
Um bebê, normal e sadio, explorando naturalmente o seu corpo parte de
uma ação de massa, grande, desorganizada e brusca até chegar ao domínio, ao
equilíbrio, a força e o deslocar. Mas para estas fases realmente acontecerem, o bebê terá
que estimular diversos grupamentos musculares, eixos, planos e os decúbitos.
O primeiro ponto de desenvolvimento da motricidade é o domínio dos
músculos e movimentos da cabeça pois este fato garante a sua sobrevivência. Buscar o
seio da mãe, o sugar do leite, o choro, a posição deitada e a procura da segurança de um
adulto são movimentos que envolvem toda a musculatura principal e acessório da região
da cabeça.
“Após sustentar sua cabeça, se apoiará sobre os ante braços e começará a deslocar-se sobre o abdômen para frente e para trás (rastejar). Em seguida, começará a se apoiar sobre os joelhos e a balançar-se sobre as mãos e os joelhos (quatro apoios). Surgirá um engatinhar rudimentar flexionando o tronco sobre o quadril e evolui para um engatinhar com alternância e oposição de braços e pernas cada vez mais seguro e rápido, até que se realize com desprendimento.”
(DAMASCENO, 1997, p. 13)
De acordo com o autor acima citado podemos perceber as diversas fases até
conseguir um movimento voluntário de marcha eficiente para um corpo ainda em
formação. O quanto se torna difícil e pesado para um bebê sair da posição deitada,
passiva, horizontal em decúbito dorsal e atingir a postura ereta, ativa e bípede. Num
primeiro momento o corpo do bebê passa muitas horas do dia deitado e com pouca
mobilidade ativa e passiva para acumular energia suficiente para o seu desenvolvimento
imediato. Mas logo após esta fase podemos e devemos começar um processo de
estimulação da motricidade pois assim o bebê experimenta diversas noções do corpo
que favoreçam o enriquecimento de seu repertório motor.
“O movimento é uma importante dimensão do desenvolvimento e da cultura humana. Os bebês se movimentam desde que nascem, adquirindo cada vez maior controle sobre seu próprio corpo e se apropriando cada vez mais das possibilidades de interação com o mundo. Engatinham, caminham, manuseiam objetos, correm, saltam, brincam sozinhos ou em grupo, experimentando sempre novas maneiras de utilizar seu corpo e seu movimento.” (Referencial Curricular Nacional, 1998, p. 15)
Devido a tanta importância da motricidade nos primeiros anos de vida
vamos falar de forma mais profunda sobre as fases marcantes até se adquirir a postura
bípede. Após o bebê conquistar o controle da musculatura da cabeça e do pescoço,
começa a utilizar os grandes grupamentos musculares da cintura escapular e da cintura
pélvica para mobilizar diversas articulações e segmentos corporais.
Rastejar
Com o apoio do peso nos antebraços começa a arrastar a barriga para frente
e para trás adquirindo a primeira noção de rastejar. Com o desenvolvimento da
lateralidade, da força, da coordenação motora ampla, esse rastejar aos poucos preenche-
se de uma mobilidade eficiente que permite a exploração do ambiente ao redor do bebê.
Engatinhar
Na fase seguinte ao rastejar, o peso corporal será distribuído em quatro
apoios, ou seja, nas duas mãos e nos dois joelhos e então o bebê atinge a posição
quadrúpede começando a engatinhar. Uma forma de deslocamento que exige um grande
esforço dos músculos envolvidos. Após o bebê dominar bem a posição quadrúpede irá
explorar a alternância e oposição dos movimentos dos braços e das pernas para
engatinhar. Com o ganho de equilíbrio, coordenação e força muscular o deslocamento
em quadrupedia se torna cada vez mais seguro e útil.
“A conquista de mais esta etapa no processo evolutivo do bebê, lhe permitirá o domínio imediato do ambiente que a cerca. A quadrupedia, apesar de ser um estado final de uma forma primitiva de deslocamento, constitui-se num dos passos mais importantes para o início da marcha pelo bebê.”
(DAMASCENO, 1997, p. 13)
Ficar de pé
No decorrer desta evolução o bebê melhora suas qualidades físicas e
musculares preparando seu aparelho locomotor para o movimento. Após o engatinhar, o
bebê explora tentativas para ficar de pé através da utilização de toda a musculatura da
cintura escapular. As mãos devem realizar um agarre ou pegada bem firme, os
antebraços exercem forte puxada no ponto de apoio agarrado. As pernas estendem-se
num movimento de impulsão no solo e o bebê deve manter-se equilibrado nos seus
eixos e planos para ficar ereto.
Andar
O bebê agarrado em algum objeto ou sustentado por algum adulto e estando
na posição ereta e bípede começa a explorar a alternância dos movimentos dos membros
inferiores e a ensaiar seus primeiros passos. Repetirá a ação de ficar de pé diversas
vezes obtendo aumento na massa e no tônus muscular das coxas e percebendo o
equilíbrio postural estático e dinâmico. Depois diminui o apoio das duas mãos para uma
só e finalmente consegue atingir a posição sem auxílio. Nesse momento percebe a
necessidade e função dos braços na distribuição do peso e na manutenção do equilíbrio
da postura ereta e passa a explorar o movimento de caminhar com desenvoltura,
independência e segurança. Com o decorrer de sua maturação nervosa vai evoluindo na
construção do repertório motor.
“Sucessivamente, vai adquirindo habilidades como saltitar, saltar, subir e descer escadas, trepar, agachar-se, já que na medida em que se desenvolvem suas capacidades motoras, estas também se tornam enriquecidas.”
(DAMASCENO, 1997, p. 14)
Durante toda essa evolução da motricidade podemos observar a importante
função da musculatura dorsal, ou seja, os músculos localizados nas costas e
principalmente ao lado da coluna vertebral. São esses músculos que realizam os
movimentos de flexão, extensão e rotação da coluna e possibilitam maior domínio do
corpo na interação com o ambiente externo. Essa musculatura dorsal desenvolve-se a
partir da região do pescoço logo na base do crânio junto com os grupamentos da cintura
escapular e promove o uso dos membros superiores. Na medida em que ocorre a
maturação no sentido descendente da coluna vertebral favorece o domínio e o reforço
dos movimentos da cabeça, do tronco e dos membros em diferentes eixos e planos.
Basicamente é a musculatura dorsal que une a cintura escapular, a coluna
vertebral e a cintura pélvica e assim se torna a estrutura fundamental para executar os
movimentos de alternância e coordenação, controle do equilíbrio, distribuição do peso e
manutenção da postura ereta bípede. Vale lembrar que a musculatura para-vertebral, por
se situar ao lado da coluna e sendo a mais perto dos centros nervosos espinhais, recebe
primeiro as ramificações do processo de expansão. Devido a sua localização no corpo
humano a musculatura dorsal é responsável pela sustentação da cabeça, pelo movimento
de coordenado de rastejar, de quadrupedar, de ficar de pé e de andar vencendo forças
opostas da gravidade.
Quanto mais o bebê for estimulado nos movimentos rotacionais da coluna
melhores serão as possibilidades de percepção de alternância entre a cintura escapular e
a cintura pélvica ele irá obter. Essa coordenação estrutural e funcional se torna essencial
para que o bebê consiga evoluir na formação e na utilização da motricidade terrestre.
“Pela possibilidade de exercer o seu controle motor, o bebê vê facilitada sua integração social, o que favorece a sua
aprendizagem e o seu melhor desempenho nas tarefas cotidianas que o meio lhe impõem.”
(DAMASCENO, 1997, p. 13)
Essa conquista inicial da motricidade significa existir independente no
espaço, no tempo, no corpo, no social e nas experiências subjetivas. É a realização de
um sistema locomotor adaptado aos movimentos, ponte para explorar mais o mundo
sensorial e ampliar a história corporal.
Falamos até aqui da motricidade terrestre que se desenvolve de uma certa
forma genética, orgânica, interna e evolutiva da espécie humana. No próximo passo de
nosso estudo iremos abordar um outro tipo de motricidade que se adquire pela
intervenção externa, pedagógica, relacional com a água, o professor e os materiais, ou
seja, apresentaremos a motricidade aquática em que se baseia todo o trabalho
psicomotor da natação para bebês.
6.3. MOTRICIDADE AQUÁTICA
A natação por ser desenvolvida em meio aquático exige diferentes padrões
motores para que seja explorada e apreendida. Esses padrões motores são realizados
num meio físico onde o equilíbrio, o peso, a gravidade, a temperatura, o tônus muscular
e a respiração são alterados pelas condições da água, físicas e emocionais do bebê.
Por isso devemos colocar os diversos aspectos formadores da motricidade
aquática e suas interferências na aquisição da motricidade terrestre em plena evolução.
Ela se dá duas formas, ativa e passiva. A motricidade ativa é aquela realizada pelo bebê
e motricidade passiva é aquela exercida pelo professor no corpo do bebê. Diante ao
estágio inicial de maturação nervosa e muscular pode-se afirmar que no trabalho de
natação a maior parte dos movimentos é passiva, isto é, produzidos pelo professor.
A cada fase evolutiva na maturação do bebê, o professor amplia as
possibilidades de movimentação e ao mesmo tempo estimula a comunicação nervosa
com os grupamentos musculares trabalhados. Ocorrendo uma intensa relação entre a
base biológica e a estimulação externa para promover uma exploração do
desenvolvimento psicomotor.
“De fato, crescimento, maturação neurológica e oportunidade de experiência parecem formar um intrincado complexo cujo balanço resulta na qualidade de experiência que a criança incorpora.”
(DAMASCENO, 1997, p. 71)
As etapas do desenvolvimento da motricidade terrestre devem ser
respeitadas e utilizadas como base e referência pois em muitos casos o trabalho aquático
serve para atenuar algumas deficiências reflexas, tônicas, postural e respiratórias.
Dentro da faixa etária abordada pelo estudo, encontram-se três níveis de alunos; o bebê
de colo, a criança no flutuador com auxílio e a criança no flutuador sem auxílio.
6.3.1. Bebê de colo
Ainda necessita de total acolhimento, segurança e apoio num contato
corporal afetuoso, participa da aula através de manobras de assistência, recebe
diferentes pegadas e técnicas de condução e de sustentação. No início do trabalho os
aspectos psíquicos e emotivos são importantes para uma boa adaptação ao professor e
ao ambiente da piscina. Num segundo momento, volta-se o trabalho para o aspecto
corporal onde o bebê começa a se beneficiar da prática psicomotora aquática.
O bebê passa por sucessivas etapas durante a adaptação, reconhecimento do
corpo na água, as sensações, o corpo do professor e a relação entre os dois. O professor
propicia o colo, a pegada, os movimentos, alongamentos, flexionamentos, fluxos de
água, noções de velocidade, sons com a água, partes do corpo e materiais. De modo
geral esta primeira etapa do trabalho de vê atingir dupla finalidade: prazer e segurança.
O bebê de se sentir curioso e a vontade no meio líquido ao passo que o professor
impulsiona seu repertório motor. O início do trabalho motor aquático se dá pelas
estimulações de grande parte das articulações desde os dedos até a base do crânio. O
bebê é estimulado nas extremidades do corpo para que ocorra maior sensibilização nos
nervos receptores, aumentando e melhorando as possibilidades de maturação.
Provocando também um relaxamento das tensões entre os ossos, os músculos e os
tendões facilitando o trabalho ativo que virá logo em seguida.
Após um período de colo, passeio, a estimulação de massagens por todo o
corpo, o bebê está mais seguro e receptivo. Começa então a movimentação passiva nos
membros superiores e inferiores respeitando os segmentos corporais. Todas as
articulações desde os dedos dos pés até a cintura pélvica sempre respeitando os limites e
a fragilidade óssea do bebê.
O bebê recebe movimentação passiva em diversos grupamentos musculares,
mudanças de decúbitos, ventral e dorsal, estímulos visuais e auditivos dos brinquedos.
A partir dessa base motora realizada com o professor, o bebê já começa a explorar
sozinho alguns movimentos, manuseio de brinquedos, intensidades variadas e inúmeras
formas de utilização do corpo e da água de acordo com seu próprio interesse, tempo,
disposição, ritmo, duração e freqüência. Quando o bebê já desenvolveu boa motricidade
ativa e propulsiva com os membros inferiores começa a fase de adaptação ao flutuador.
6.3.2. A criança no flutuador com auxílio
Nesse estágio de trabalho a criança já adaptada ao flutuador demonstra
segurança e permanece afastada do professor, realiza movimentos propulsivos com os
braços e pernas na tentativa de se equilibrar e de se deslocar dentro do espaço da
piscina. O professor ajuda a criança a manter o equilíbrio devido ao peso da cabeça para
fora da água. Quando a cabeça se desloca para alguma direção, seu peso é suficiente
para rolar todo o corpo e por isso o auxílio do professor se torna necessário na
estabilidade.
Depois do controle da cabeça dentro dos eixos corporais, a criança
evolui no domínio dos movimentos propulsivos de membros inferiores e de vez
em quando o professor vai empurrando afim de que ela chegue até o seu
objetivo. Assim a criança vai ganhando maior precisão de noção de direção e
sentido, troca de decúbito ventral e dorsal, restabelece a posição deitada e
hidrodinâmica, explora expiração forte com sons e bolhas e imita diversos
gestos aquáticos do professor.
A criança necessita de auxílio na estabilidade de seu equilíbrio, na
propulsão, no deslocamento e no domínio do flutuador pois já está separada do
professor e começa a explorar o ambiente e materiais de acordo com seus
interesses.
Nesta fase do trabalho os objetivos a serem atingidos são: a
autonomia, dos movimentos, do uso e domínio do flutuador, possibilitar os
deslocamentos livres, mergulhos iniciais, maior tempo de permanência na
piscina e fortalecimento de toda parte orgânica e fisiológica.
6.3.3. A criança no flutuador sem auxílio
Dentro deste nível a criança já domina completamente o flutuador, os seus
movimentos, ação e reação hidrodinâmica, equilíbrio e propulsão básica. Explora os
deslocamentos livres, mergulhos, giros e imersões voluntárias. Devido a aquisição da
linguagem, a criança já atende a comandos simples e expõe suas vontades.
A criança passa a maior parte da aula sozinha no flutuador
explorando livremente o corpo e seus movimentos, os brinquedos, as demais
crianças e a água. Atinge grande autonomia e disponibilidade corporal para
vivenciar e construir a sua aula já que progressivamente se distancia do
professor e passa a interagir de acordo com suas vontades. A criança monta e
explora a sua aula em conjunto com as demais.
O aparelho motor já produz o resultado adequado a intenção e a
situação. A criança apresenta alternância nos movimentos propulsivos de
braços e pernas propiciando um deslocamento eficiente, executando giros,
mudanças de direção, transportando brinquedos e realizando atividades
coletivas lúdicas.
Nesse momento começam a consolidar todas as características dos
movimentos propulsivos aquáticos em seu repertório motor geral. Tem-se a
possibilidade de avaliação dos padrões motores apreendidos e utilizados
espontaneamente. O professor estimula a participação individual dentro do
coletivo, verifica as noções de disciplina que são os cuidados de riscos e evita
a instauração de atitudes que possam acarretar um acidente. A criança por
ficar livre do colo e do contato direto do professor preenche-se de confiança e
acha que já sabe nadar e que pode entrar na água sem o flutuador. A rotina de
disciplina nas aulas de natação até essa faixa etária é de extrema utilidade pois
se a criança for estimulada de forma muito solta e sem os riscos do ambiente
aquático, o professor na tentativa de consolidar liberdade no prazer pode estar
construindo um futuro acidente e afogamento.
Dentro dessa faixa do trabalho já ocorrem pequenos deslocamentos
sem nenhum auxílio, ou seja, a criança tem que se deslocar através de seu
próprio esforço e aparelho motor, da borda até o professor e vice-versa. É
normal que muitas crianças estejam executando o movimento com postura e
direção corretas mas faltam-lhes capacidade e força muscular. A criança
entende todas as variações dos exercícios, explora os movimentos de braços e
pernas, realiza bem o bloqueio respiratório e atende aos comandos do
professor mas o que deve ser respeitado é a sua condição orgânica de massa
muscular. A natação é uma atividade física que necessita dos grupamentos
musculares para vencer o atrito com a água e deslocar-se garantindo sua
sobrevivência.
Para concluir este ponto pode-se dizer que a criança tem que Ter
adquirido confiança para ficar longe do professor, utilizar o flutuador com
segurança, dominar os movimentos propulsivos, bloquear corretamente as vias
aéreas e apresentar noções básicas de disciplina no ambiente aquático.
“A finalidade da natação para bebês, concebida como atividade-meio deve ser a de fornecer os estímulos adequados em quantidade e qualidade necessárias ao desenvolvimento, que garantam um amadurecimento psiconeurológico inicial profundo e harmonioso em todas as áreas, isto é, aprofundar e enriquecer as raízes da personalidade, oferecendo condições para um desenvolvimento pleno do potencial inato da criança.”
(DAMASCENO, 1997, p. 84)
6.4. DIFERENÇAS ENTRE A MOTRICIDADE TERRESTRE E A
MOTRICIDADE AQUÁTICA
Como já foi explicado anteriormente a formação e a evolução das
motricidades terrestre e aquática, faz-se necessário a correlação específica
entre as duas. Mas para uma melhor abordagem e explicação vamos dividir por
assuntos em comum.
Para existir qualquer tipo de movimento precisa-se de energia
disposta nos músculos e na corrente sangüínea e de um trabalho respiratório
que realize as trocas gasosas levando material tóxico e trazendo oxigênio para
nutrir todo o corpo. Então a partir dessas necessidades vitais, encontra-se o
primeiro ponto de relação a ser colocado que é a respiração.
6.4.1. Respiração
Respiração Terrestre: acontece de forma passiva, contínua,
freqüência constante, volume de ar inspirado e expirado com grande equilíbrio,
inspiração nasal, expiração nasal ou oral, pouco esforço dos músculos
respiratórios, sem pressão externa na caixa torácica exceto nas horas em que
se dorme ou se deita, processo involuntário, vias aéreas sem bloqueio e pouca
umidade nas vias aéreas.
Respiração Aquática: acontece de forma ativa, intervalada,
freqüência ritmada, diferenças entre os volumes de ar inspirado (maior) e
expirado (menor) gerando um acúmulo de ar residual e cansaço mais rápido,
inspiração oral, expiração nasal ou oral, grande esforço dos músculos
respiratórios, alta pressão externa na caixa torácica, respiração voluntária, vias
aéreas bloqueadas para evitar a entrada de água e grande umidade nas vias
aéreas.
Vale lembrar que com a proximidade da aula e a simples entrada na
água, a mudança de temperatura e fatores emotivos já ocorrem grandes
diferenças na respiração.
6.4.2. Musculatura dorsal
A musculatura dorsal é um grupamento que sustenta todo o
esqueleto pois mantém o eixo da coluna vertebral na posição e equilíbrio
corretos. Além disso faz a ligação entre a cintura escapular logo abaixo do
crânio com a cintura pélvica no quadril possibilitando a rotação da coluna que
por sua vez gera a alternância entre direita – esquerda. Deve-se lembrar que é
a musculatura dorsal que conduz evolução de diversas fases da evolução da
motricidade (o controle da cabeça, rastejar, quadrupedar, ficar de pé e andar).
Se traçar uma linha média no corpo humano dividindo-o em parte anterior e
posterior, a parte anterior e frontal concentra a maioria dos órgãos, vísceras, líquidos e alimentos e por isso a musculatura dorsal deve estar bem tonificada evitando desvios posturais.
Musculatura dorsal no meio terrestre: controla a cabeça para buscar
o seio materno, mantém a cabeça na posição ereta, pouca trabalhada pois o
bebê passa a maior parte do tempo deitado ou dormindo, em decúbito dorsal
está mais relaxada, sofre grande ação da gravidade, com a cabeça apoiada a
musculatura fica relaxada, para promover diversos estímulos nessa
musculatura o bebê sempre vai ter o solo como obstáculo e desconforto,
sensação de peso e de compressão na coluna vertebral dificultando a
aceitação desses estímulos corporais.
Musculatura dorsal no meio aquático: controla a cabeça para não
aspirar água, mantém a cabeça acima da superfície da água, muito trabalhada
pois o bebê passa a aula inteira alterando os decúbitos e eixos, em decúbito
ventral está mais tonificada, sofre pouca ação da gravidade, com a sustentação
da cabeça a musculatura fica tonificada, diversos estímulos sem o desconforto
do solo, sensação de leveza e liberdade na coluna facilitando a aceitação dos
estímulos.
A musculatura dorsal sofre grandes alterações comparados os dois
ambientes e isso é de suma importância nessa faixa etária pois acelera todo o
processo de maturação céfalo-caudal e próximo-distal.
6.4.3. Membros superiores
Os membros superiores no meio terrestre: realizam movimentos de preensão, extensão dos braços para elevar o tronco do solo, segurar e levar objetos até a boca, arrastar o corpo no movimento de rastejar, explorar o próprio corpo, manter o corpo na posição de quadrupedia, movimentos de engatinhar, agarrar objetos e pessoas para ficar de pé, manter o equilíbrio da postura bípede, distribuir o peso em alternância com as pernas no movimento de marcha, realizam movimentos bruscos de massa até movimentos lentos e específicos, realizam movimentos pelo simples ato e prazer do movimento, agarrar-se ao colo, realizar diversas habilidades motoras como musculatura principal e ou acessório.
Os membros superiores nomeio aquático: recebem estímulos desde
sua extremidade distal (ponta dos dedos) até a extremidade proximal (ombro),
realizam movimentos de preensão, movimentos livres de manuseio de objetos,
movimentos livres sentindo a água envolta (atrito, sons e peso), segurar e levar
objetos até a boca, explorar o próprio corpo, agarrar o professor ou a borda,
alternância entre os braços e com as pernas, realizam movimentos bruscos de
massa até movimentos lentos e específicos, realizam movimentos pelo simples
ato e prazer do movimento, agarrar-se ao colo, , realizar diversas habilidades
motoras como musculatura principal e ou acessório, mesmo movimento de
rastejar é reproduzido na água, explora batidas diferentes, levante e joga água
e espuma, recebe estímulos térmicos, cinestésicos (movimentos) e báricos
(pressão) e os movimentos propulsivos que puxam a água para trás
impulsionando o corpo para frente.
O trabalho realizado na natação para bebês nos membros
superiores visa a acelerar a maturação nervosa até as extremidades dos dedos
e aumentar o tônus muscular. Num primeiro momento são reproduzidos os
mesmos movimentos do meio terrestre e após a criança dominar o flutuador é
que começa a explorar uma nova categoria de movimentos, os propulsivos.
6.4.4. Membros inferiores
Os membros inferiores no meio terrestre: realizam movimentos
bruscos de massa até movimentos lentos específicos, realizam movimentos
pelo simples ato e prazer do movimento, empurra objetos e pessoas num
movimento de extensão, realiza a base de apoio para diversas posturas,
impulsiona o corpo para frente no movimento de rastejar empurrando o solo
para trás, mantém o corpo em posição de joelhos e de quadrupedia,
movimentos de engatinhar, prender objetos entre os pés, movimentos repetidos
de dobrar os joelhos, movimentos de extensão para conseguir ficar de pé,
manter a posição bípede, movimentos de alternância com a outra perna e com
os membros superiores nos movimentos de marcha, andar, correr e saltitar,
realiza diversas habilidades motoras como musculatura principal e ou
acessório.
Os membros inferiores no meio aquático: realizam movimentos bruscos de massa até movimentos lentos específicos, realizam movimentos pelo simples ato e prazer do movimento, empurra objetos, professor e bordas num movimento de extensão, realiza a base de apoio para diversas posturas, reproduz o movimento de rastejar empurrando a água para trás, diversos movimentos com impacto na água produzindo sons e levantando espuma, movimentos repetidos de dobrar os joelhos, movimentos de alternância com a outra perna e com os membros superiores na propulsão, movimentos livres sem o atrito e desconforto do solo, reproduz os movimentos de marcha, andar, correr e saltitar para se deslocar com o professor ou flutuador, saltitos para aprender os mergulhos, recebe estímulos em sua extremidade distal (dedos dos pés), movimentos livres sentindo a água envolta (atrito, sons e peso), realiza diversas habilidades motoras como musculatura principal e ou acessório, sentada na borda explora diversas batidas de pés na água percebendo a espuma, som, peso e atrito.
Os membros inferiores são de fundamental importância para a
formação e manutenção da postura bípede pois são neles que se realizam a
base, o equilíbrio, a força e a tração para marchar, andar, correr e saltar. O
maior grupamento muscular de todo o corpo está localizado na coxa como
forma de possibilitar diversos movimentos a partir da posição bípedes inerente
ao ser humano.
No trabalho motor aquático, os membros inferiores recebem os
estímulos de massagens e movimentações de modo a favorecer a maturação
nervosa e aumento de tônus e de massa muscular. Recebem movimentos
propulsivos para deslocar o corpo na água bem parecidos com os padrões
motores terrestres como exemplo pode citar que os educativos da pernada de
crawl são idênticos aos movimentos de andar. A única coisa que muda é o
plano, no crawl encontra-se na horizontal e no andar encontra-se na vertical.
Dessa forma estamos favorecendo duas habilidades motoras ao mesmo
tempo, andar e nadar. Vale lembrar a possibilidade que a criança tem de
realizar um mesmo movimento inúmeras vezes sem o atrito do solo e o peso
do corpo promovendo eficiência e prazer.
Diante de todas essas informações pode se constatar que a
interferência do trabalho motor aquático vem a promover diversos estímulos
benéficos ao desenvolvimento global do bebê e da criança. A abordagem
corporal da natação serve para impulsionar aspectos ainda em formação,
estabelecer melhor comunicação entre o sistema nervoso e o sistema
locomotor e fortalecer o funcionamento orgânico. No que tange
especificamente a interferência no processo de formação da motricidade
terrestre, o trabalho motor aquático traz um enriquecimento nas experiências
que ajudam na aquisição de padrões e habilidades motoras. O bebê e a
criança praticantes de natação vão apresentar um corpo mais tonificado por
causa das movimentações constantes, da temperatura e fatores emotivos
envolvidos. Esses pontos favorecem condutas diferenciadas no corpo
acostumado a ser submetido a algum nível de esforço. Se torna importante
observar que o corpo através de seu aparelho locomotor imprime registros em
sua própria maturação e não fica apenas sendo impresso pela ação de outras
pessoas e do ambiente. A criança vivencia a sua escolha e a qualidade de
experiência.
Quando essas atividades propostas estão de acordo com as
necessidades requisitadas e as possibilidades de exploração, elas se tornam
vivências enriquecedoras que permeiam a formação da história corporal e
subjetiva de cada bebê e criança praticante. Mas para que isso realmente
aconteça deve ser buscado um campo de atuação profissional que garanta
essas condições. Pois o trabalho de natação poderia estar voltado para a
aprendizagem das técnicas padronizadas dos nados e para uma participação
futura desportiva e competitiva. Então cada profissional da natação para bebês
e crianças deve ter um enfoque dos resultados de suas aulas a longo prazo na
vida do praticante baseados numa atuação que valorize a psicomotricidade.
Portanto, no próximo capítulo tem-se o intuito de esclarecer alguns
pontos e conceitos da Psicomotricidade, isso porque acreditamos estar melhor
adequada ao trabalho corporal realizado nesta faixa etária vendo o praticante
em sua individualidade e totalidade.
CAPÍTULO VII
PSICOMOTRICIDADE
No presente capítulo vai ser abordado a forma de atuação do professor de
natação utilizando-se de diversos aspectos formadores do campo de estudo da
psicomotricidade. O professor promove um aprendizado que valoriza as emoções, as
ações, o diálogo, o toque, o olhar, a voz, ou seja, que integra todas as relações do
praticante enquanto sujeito com a água e profissional.
Para existir uma relação de ensino e aprendizagem, se faz necessário um
professor, aluno - bebê – sujeito e um ambiente que no caso é a piscina. Dessa forma
entendida a natação oferece ainda a água que é um excelente ambiente e instrumento
para ampliar as experiências corporais.
Neste ambiente são usados diversos materiais pedagógicos e brinquedos que
em conjunto com as possibilidades de se explorar a água criam atividades repletas de
estímulos. Existe também a relação corporal entre professor e aluno, pessoa a pessoa,
sujeito a sujeito. Mas para se obter uma qualidade humana nesta relação o profissional
não pode trabalhar de forma mecânica na padronização de estímulos e resultados.
Deverá acreditar que os registros de uma aula ficam guardados na história corporal e no
inconsciente. Com isso, possivelmente irá nortear sua prática pedagógica com os
conceitos da psicomotricidade. Para se entender melhor essa abordagem profissional
tem-se como definição de psicomotricidade.
“Psicomotricidade é a integração diacrônica, ou seja, ao mesmo tempo, das
funções motoras com as intelectivas que, sendo adquiridas através das maturações do
organismo e experiências neuromotoras, harmoniosamente e em boas condições
emocionais, resultarão em um processo dinâmico de capacitação global para a
aprendizagem.
Psicomotricidade é uma ciência que tem por objetivo o estudo do homem, através de seu corpo em movimento, nas relações com seu mundo interno e
externo. Podemos simplificar tudo isso, afirmando que Psicomotricidade é a relação entre o pensamento e a ação, envolvendo a emoção.”
(BASTOS, 2001,p. 36)
A psicomotricidade é a relação que existe entre os diversos
estímulos internos e externos advindos do próprio corpo, da convivência com
outro corpo e com o ambiente. Vendo o movimento humano como fruto de uma
manifestação individual e subjetiva e não meramente um ato mecânico e
orgânico.
“O movimento para a criança pequena significa muito mais do que mexer partes do corpo ou deslocar-se no espaço. A criança se expressa e se comunica por meio de gestos e das mímicas faciais e interage utilizando fortemente o apoio do corpo. A dimensão corporal integra-se ao conjunto da atividade da criança. O ato motor faz-se presente em suas funções expressiva, instrumental ou de sustentação às posturas e aos gestos.” (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO, 1998, p.18)
O movimento é a expressão dos sentimentos registrados no
decorrer da formação histórica e corporal do sujeito. O movimento é o meio
pelo qual , o sujeito convive com os demais e altera o mundo que o cerca de
acordo com as suas necessidades vitais e suas possibilidades construídas.
“Pode-se dizer que no início do desenvolvimento predomina a dimensão
subjetiva da motricidade, que encontra sua eficácia e sentido principalmente na
interação com o meio social, junto às pessoas com quem a criança interage diretamente.
É somente aos poucos que se desenvolve a dimensão objetiva do movimento, que
corresponde às competências instrumentais para agir sobre o espaço e o meio físico.”
(MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO, 1998, p.18)
O bebê e a criança ainda estão num processo intenso de troca e de
assimilação dos estímulos advindos de todo o ambiente ao seu redor, seja dos
pais, dos objetos e dos brinquedos, das pessoas, do próprio corpo, das
necessidades, da higiene, dos sons, das cores etc.
Esse processo de assimilação é importante para a construção das
vivências corporais pois todas as informações vão deixando registros
impressos na identidade deste ser em plena formação corporal, psíquica,
emocional e social.
O professor de natação para bebês e crianças deve estar atento
para a quantidade e qualidade dos estímulos produzidos em suas aulas. Pois
tudo o que acontece nas aulas de natação deixa registros no inconsciente dos
alunos. Dessa maneira pode-se observar a importância da estimulação na
primeira infância, seja ela produzida pelo próprio bebê ou por algum agente
externo. Todas essas informações vão alimentando a história subjetiva de cada
praticante de forma sensória, motora, psíquica, emotiva e social. Essa relação
com o mundo externo vai sendo marcada no corpo contribuindo para uma
melhor formação do esquema corporal, identificação e utilização do corpo e
também deixa marcas no aspecto psicológico promovendo aumento na
representação e simbolismos psíquicos. Uma das estratégias mais eficientes
de se construir uma relação de ensino aprendizagem bem integrada entre
professor e aluno é a brincadeira.
“Brincar é uma das atividades fundamentais para o desenvolvimento da
identidade e da autonomia. O fato de a criança, desde muito cedo, poder se comunicar
por meio de gestos, sons e mais tarde representar determinado papel na brincadeira faz
com que ela desenvolva sua imaginação. Nas brincadeiras as crianças podem
desenvolver algumas capacidades importantes, tais como atenção, a imitação, a
memória, a imaginação.”
(MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO, 1998, p. 22)
No ato de brincar existe a possibilidade de fantasia, de
enriquecimento da linguagem e de recriar os movimentos. O movimento é a
maior parte da expressão de necessidades e vontades dentro desta faixa
etária. Como os bebês e as crianças até os 2 anos de idade ainda não
apresentam elaboração e domínio da linguagem verbal, eles se utilizam do
corpo como instrumento de comunicação com o mundo. Então esse movimento
vem carregado de emoções, desejos, representações simbólicas, linguagens
rudimentares e acabam impulsionando todo o aspecto cognitivo da criança.
“A psicomotricidade como ciência da educação procura educar o movimento ao mesmo tempo em que desenvolve as funções da inteligência considerando todos os aspectos emocionais.
Assim sem o suporte motor, o pensamento não poderá Ter acesso aos
símbolos e à abstração, o que se faz essencial às diferentes aprendizagens na escola,
principalmente à da leitura e à da escrita.”
(BASTOS, 2001, p. 36)
Então o profissional que está junto no processo de desenvolvimento da criança deve estar atento aos elementos básicos que compõem o campo de estudo e de avaliação da psicomotricidade. Para que a sua prática seja efetivamente construtiva e estimuladora, ela deve estar dentro da faixa de maturação e de possibilidades de ação do bebê ou da criança.
Além das características individuais de cada praticante, o professor
também planeja o conteúdo da natação em direção aos elementos básicos da
psicomotricidade que são o esquema corporal, lateralidade, estruturação
espacial, orientação temporal e pré-escrita.
Vamos partir para uma abordagem mais específica destes
elementos que constituem o campo de atuação em psicomotricidade. O
primeiro ponto a ser colocado será sobre o esquema corporal.
7.1. ESQUEMA CORPORAL
O esquema corporal é um elemento básico indispensável à formação da personalidade da criança, é a representação global, científica e diferenciada que a criança tem de seu próprio corpo. A criança percebe-se, percebe os seres e as coisas que a cercam em função da sua pessoa, do seu eu. Sua personalidade se desenvolverá graças a uma progressiva tomada de consciência de seu corpo, de seu ser, de suas possibilidades de agir e transformar o mundo à sua volta. A criança se sentirá bem na medida em que seu corpo obedecer a ela, em que o conhecer bem, em que puder utilizá-lo não somente para se movimentar, mas também para agir.
7.2. LATERALIDADE
É a dominância de um lado em relação ao outro, levando-se em conta a força e a precisão, isto é, durante o crescimento, naturalmente se define uma dominância lateral na criança. Diferente do conhecimento esquerda-direita que é exatamente o que o próprio nome quer dizer, saber o que é lado esquerdo e lado direito em relação ao próprio corpo, aos objetos, ou seja, a localização de ambos. Outro ponto bem parecido é a reversibilidade, ou seja, o reconhecimento da mão direita ou esquerda de uma pessoa que está a sua frente.
7.3. ESTRUTURAÇÃO ESPACIAL
É a orientação, a estruturação do mundo exterior referindo-se primeiro ao eu referencial e depois a outros objetos ou pessoas em posição estática ou em movimento. Isso quer dizer que a criança deve saber onde está, onde estão os objetos uns em relação aos outros e em relação a ela própria e com se organizar no espaço de que dispõe. Estruturação envolvendo corpo , espaço e tempo.
7.4. ORIENTAÇÃO TEMPORAL
É a capacidade de situar-se em razão da sucessão dos acontecimentos, da duração dos intervalos, da renovação cíclica de certos períodos, do caráter irreversível do tempo, é a orientação dentro de um tempo cronológico, percepção dos termos: tempo imediato, antes, depois, durante, em último lugar, hoje, ontem, amanhã, cedo demais, etc. Todos os jogos que envolvem noções de tempo devem ser trabalhados com as crianças pois o tempo é algo abstrato e por isso mesmo são difíceis de serem adquiridas.
7.5. PRÉ-ESCRITA
O domínio do gesto, a estimulação espacial e a orientação temporal são os três fundamentos da escrita. Para a criança adquirir linguagem gráfica e simbólica deve
ser trabalhado: uma direção gráfica horizontal da esquerda para a direita, noções de em cima e embaixo, de esquerda e de direita, de oblíquas e curvas, a noção de antes e depois. Os exercícios de pré-escrita e de grafismo são necessários para a aprendizagem das letras e dos números e sua finalidade é fazer com que a criança atinja o domínio do gesto e do instrumento, a percepção e a compreensão da imagem a reproduzir, exercícios estes que são motores, no geral, e específicos para o grafismo.
(BASTOS, 2001, p. 55)
Estes elementos básicos e formadores do trabalho psicomotor devem estar embutidos nos objetivos gerais da natação como prática construtiva de um sujeito, a aquisição de noções de diversas linguagens, o uso do corpo, o uso de objetos e o desenvolvimento do raciocínio. Sempre considerando e respeitando as condições individuais e específicas de maturação e de relação com a água.
Com tudo isso que foi abordado neste segmento, deve-se ter em
mente que o desenvolvimento integrado dessas etapas psicomotoras,
construído pelas vivências, experiências, de forma fluida e global, torna o bebê
em um ser ativo dentro de sua vida.
A natação para bebês e crianças deve propiciar o desenvolvimento
de diversas bases orgânicas que facilitam a aquisição das experiências sociais
e emotivas para um melhor aprendizado cognitivo. Como desde cedo a
natação trabalha estes aspectos orgânicos, motores, segmentos e totalidade
corporal, lateralidade e reconhecimento de ambos os lados, estruturação
espacial e orientação temporal, pode-se afirmar que a sua prática é de grande
valia para um desenvolvimento sadio e preparado para suprir as necessidades
sociais atuais.
A natação oferece um corpo bem trabalhado ao sujeito de suas vontades
com amplas possibilidades de utilização e somente se detém no campo motor até a
garantia de sobrevivência na água. Depois o planejamento da natação será baseado num
aumento do repertório motor e na melhoria de todos os sistemas orgânicos assim como
um saudável equilíbrio com as emoções.
Mas para elucidar melhor como a prática da natação interfere
diretamente no desenvolvimento global do bebê e da criança serão
apresentados três aspectos: psicológico, fisiológico e social.
7.6. ASPECTO PSICOLÓGICO
7.6.1. Sistema visual
A ausência de estímulo luminoso no ventre materno, acarreta uma
imaturidade de visão à criança. Nas primeiras semanas o recém-nascido vê
melhor de 20 a 22 cm, não focalizando a uma distância maior e menor do que
esta. Até os três meses e meio a acomodação visual do bebê já se assemelha
à do adulto, sujeita a maturação e aos estímulos do ambiente, começa a
coordenar seus movimentos óculo-manuais.
a) Quantidade de contorno, movimento e intensidade: Até 2 meses
de idade a atenção é atraída pela intensidade de estímulo (brilho), pela
quantidade de contorno (mudança em brilho) e pelo movimento do objeto
(mudança de posição).
b) Familiaridade com o estímulo: Com 4 meses de idade se
consegue mais atenção e estímulos com objetos já familiarizados,
possibilitando a concretização da coordenação óculo-manual.
Numa aula de natação infantil podemos colocar diversos materiais e
brinquedos coloridos que servirão para estimulação e ou coordenação com o
sistema auditivo. Vale lembrar que esses estímulos podem adquirir
características dinâmica ou estática.
7.6.2. Sistema auditivo
Desde sua concepção a criança se encontra em um ambiente
sonoro, já que os líquidos que a rodeiam produzem ondas sonoras ao mover-
se. Enriquecendo o processo ensino-aprendizagem do bebê com: identificação,
localização, discriminação, seleção, intensidade, ritmos e memória auditiva.
Diversos movimentos corporais produzem diferentes ruídos que
colaboram para o aumento do repertório da percepção sonora. Dentro do
ambiente aquático existem diversas possibilidades de criação de ruídos com a
água, o corpo e materiais.
7.6.3. Somestesia (tato e suas variantes)
Somestesia trata dos receptores táteis de calor, frio, pressão e a dor, ao conjunto de sensações somáticas (corporais), tanto externas como internas. Através do tato pode-se detectar o peso, tamanho, forma, textura, consistência e espessura dos objetos.
a) a ponta do nariz que é sensível ao frio;
b) a face (bochechas) que respondem ao calor;
c) a ponta dos dedos que discrimina a pressão e o contato;
d) todo corpo e suas diferentes partes que reagem perante a dor.
Sem contar com a água envolvendo todo o corpo e com o atrito provocado
pelos movimentos criando diversas noções de percepção tátil.
7.6.4. Cinestesia e propriocepção vestibular (equilíbrio, postura e
movimento
Cinestesia refere-se à consciência imediata do próprio corpo em movimento ou imóvel, de sua posição no espaço e de diversos segmentos corporais em relação ao exterior.
A cinestesia conta com receptores espalhados pelos músculos e
tendões; a propriocepção vestibular utiliza os canais semicirculares e se
complementa com a audição.
Estas sensações contribuem para a aquisição dos conceitos da
percepção do espaço: tamanho, forma, distância, direção, longitude e posição.
Além de contribuir para a precisão dos movimentos e uma atitude corporal
coerente no meio aquático.
7.6.5. Medos e traumas
Também em relação aos aspectos psicológicos têm-se os medos e
traumas adquiridos que vem a tona durante uma aula de natação. Exemplos
que vão desde um banho em casa que se joga muita água no rosto de um
bebê, deixar o bebê escorregar das mãos provocando imersão, shampoo nos
olhos, temperatura inadequada da água ou duração excessiva do banho. São
dados emotivos registrados no seu subconsciente que comprometem o início e
a evolução do aprendizado e que devem ser ministrados com paciência e
delicadeza para não aumentarem. Pois durante a aula podem surgir situações
que despertem esses traumas no subconsciente e o bebê vai se prevenir.
7.6.6. Auto-estima
No lado oposto dos medos vem a conquista de segurança no meio líquido, um progresso na auto-confiança de ser capaz de novas conquistas, de ir até o fundo, de atravessar borda a borda sem auxílio e de cada vez mais aumentar seus limites.
Com o domínio progressivo do meio líquido e das experiências
corporais a criança vai consolidando sua presença perante as demais crianças
da turma, servindo de exemplo em atividades que domina, vai se preenchendo
de valores subjetivos que lhe dão sustentação e firmeza para explorar novas
situações propostas.
“Cada vez mais as crianças se distanciam da confiança em seus próprios
sentidos e grande parte da aprendizagem se torna muito abstrata. Sem auto-identificação
não existe entrega. Qualquer expressão criadora se resume na autêntica expressão do
EU. Através da auto-identificação , cria-se um processo mais harmonioso de ajuste
consigo mesmo e com os outros.”
(Anais do 2º Congresso Latino-Americano de Creches, 1995, p. 150 )
Entre outros inúmeros benefícios psicológicos ligados a prática da
natação que vão propiciar um desenvolvimento harmonioso nas demais tarefas
do cotidiano escolar e familiar dessas crianças.
7.7. ASPECTO SOCIAL
A natação oferece inúmeras possibilidades dos bebês e crianças se
socializarem com outras pessoas seja no deslocamento até a piscina, na aula
com professores, auxiliares e demais crianças da mesma turma ou não. Além
da utilização nas aulas de brinquedos e jogos que promovem uma outra forma
de integração social. A natação exige uma organização toda especial em
relação ao cuidado consigo mesmo e com o outro pois estão num meio que
com certeza é perigoso para a integridade e vida de qualquer um participante.
Um dos principais aprendizado da natação quando um grupo novo chega até a piscina é o da disciplina num ambiente com chão molhado, bordas, chuveiros, banheiros e principalmente o cuidado dentro da água. Pede-se que ninguém segure, empurre ou puxe os outros, excesso de gritos que abafam “um grito de ajuda”, não correr perto das bordas, não mergulhar sem olhar antes, brincadeiras de lutas e se ainda não aprendeu a nadar sem auxílio somente entrar na água com flutuador ou com a presença de um adulto. Avisar sobre todos os cuidados necessários para que uma simples brincadeira de mau-gosto não se torne num acidente ou um trauma adquirido. No caso de bebês ou crianças muito pequenas só entrar na água com roupa de banho para condicioná-los e evitar acidentes em outras piscinas. Não pode haver descuidos nesse aspecto: segurança e prudência dentro da aula de natação nunca é demais. Disciplina saudável e educativa.
A natação faz com que as crianças entrem em contato com
atividades que necessitam de diferentes organizações espaciais com seus
companheiros: todos estarem juntos na borda, borda oposta, nas quatro
bordas, filas para mergulhos, deslocamentos na superfície e submersos,
revezamentos, brinquedos e jogos recreativos em grupos.
A piscina transforma-se então numa grande área de lazer educativo
principalmente nos momentos de pura recreação aquática que acontece
sempre no final da aula para deixar aquela informação de prazer nas crianças
para que elas queiram voltar no próximo dia.
Com sua sobrevivência já garantida no meio líquido conseguimos
ampliar imensamente suas experiências sociais. Isso porque esta criança
poderá usufruir com sua família e amigos diversas opções de lazer como:
piscinas, clubes, praias, lagos, lagoas e rios. Devemos também despertar e
desenvolver uma consciência ecológica coletiva sobre o uso racional sem
desperdício e a valorização de um bem inigualável que é a água potável.
Orientar sobre o tempo que chuveiros e torneiras ficam abertos em demasia ou
esquecê-los abertos. Educar sobre a preservação e poluição de todas as águas
também faz parte do conteúdo da disciplina de natação. Aumentando assim o
gosto pelas atividades físicas em contato direto com a natureza. A natação
deve contextualizar tudo que tenha água envolvida na vida diária da criança e
transferir ensinamentos para melhor relação e aproveitamento desses
momentos.
7.8. ASPECTO FISIOLÓGICO
O corpo humano foi feito para o movimento e precisamos mantê-lo
ativo e sadio. Todas as crianças sentem um impulso primitivo para movimentar-
se e depois vão relacionando esses movimentos aos mais variados objetivos
de sua vida. Vão estruturando os reflexos em movimentos intencionais e com
gastos energéticos já percebidos. Precisam do movimento para viver a
plenitude daquilo quê ainda não racionalizam.
E infelizmente ainda concorremos com os imóveis prazeres do mundo
infantil moderno como televisão, games, computador e tantas outras satisfações mentais
que roubam horas e horas semanais que poderiam estar sendo desprendidas com a
brincadeiras corporais. Mas já que estamos falando de crianças ativas e praticantes de
natação vamos falar de algumas mudanças ocorridas neste corpo que se encontra no
meio aquático sob esforço contínuo e progressivo.
7.8.1. Sistema respiratório
Começamos a vida com o ar sonoro de um choro e terminamos a vida com o
ar silencioso de um suspiro. Isso já mostra a relação de importância de termos um
sistema respiratório bem estruturado e trabalhado desde cedo em nossas vidas.
“A respiração é a função por meio da qual se efetuam as trocas gasosas entre os tecido vivos e o meio exterior. A respiração também pode ser definida como duplo fenômeno da inspiração e expiração, incluindo as trocas de gases entre os pulmões e o sangue que neles circula.”
(FERREIRA,1985, p. 5 )
Devido ao bebê ou a criança estarem num meio que oferece resistência e
pressão maior que o ar, a musculatura da caixa torácica deverá fazer maior esforço para
obter a mesma quantidade de ar a cada inspiração e menor esforço a cada expiração.
Somando esse esforço a mais a cada inspiração no meio aquático teremos uma maior
amplitude torácica no meio terrestre e músculos respiratórios dotados de maior
capacidade funcional.
Sabe-se que através da respiração vamos nutrir o nosso sangue com
oxigênio O2 e limpá-lo do gás carbônico CO2 e por conta disso todas as células também
se alimentaram.
A função respiratória é a mais importante depois da função cardíaca.
X Respiração no meio terrestre: inspiração – nasal ; expiração – oral /
nasal.
X Respiração no meio aquático: inspiração – oral; expiração – nasal / oral.
Basicamente se compararmos os dois tipos de respiração usados vamos
observar que são inversos e no caso da expiração primeiramente fica a critério de
melhor adaptação da criança e depois em relação ao estilo do nado que está em
execução. No meio aquático temos uma inspiração oral pois ela consegue aspirar um
maior volume de ar num curto espaço de tempo. A fase inicial ao trabalho de adaptação
respiratória no meio líquido é um momento riquíssimo de percepção corporal para
criança.
No que tange ao tratamento ou a diminuição do número e intensidade das
crises de crianças portadoras de doenças ou deficiências no sistema respiratório como,
asma, bronquite, renite, sinusite e várias outras “...ites” , podemos dizer que o exercício
físico intenso, junto com maior umidade da água e desobstrução das vias aéreas devido
ao esforço para se respirar nadando; trazem excelentes respostas fisiológicas para esses
casos.
7.8.2. Sistema circulatório
O sistema circulatório é composto pelo coração, artérias e veias. A função do coração é de bombear o sangue, as artérias levam o sangue para os órgãos e as veias trazem de volta até o coração. As distintas atividades físicas, o estado emocional e a variação de temperatura provocam variações na circulação sangüínea, que se adapta com certa rapidez. Então a natação preenche todos esses pontos abordados pois ela é uma atividade física que exige maior volume de sangue circulando, o estado emocional se altera com o ambiente diferente e também ocorre a variação de temperatura com a entrada na água.
Colocamos com certeza então que a atividade física realizada na natação
traz também excelentes adaptações e avanços fisiológicos para todo o sistema
circulatório do bebê ou criança praticante impulsionando o desenvolvimento de todo o
seu organismo pois é ele quem vai nutrir e desintoxicar todas as outras células dos
demais sistemas.
7.8.3. Sistema locomotor
Devido a essa precoce estimulação geral de todo organismo e
principalmente com a prática de atividades físicas, o bebê e a criança estruturam uma
maior quantidade de vasos capilares que vão irrigar melhor seu tecido muscular. Com
esta irrigação aumentada temos uma melhora na sensibilidade tátil que colabora para a
identificação dos segmentos corporais. Assim, terá maiores condições de
reconhecimento, domínio e utilização dessas diferentes partes formando um bom
arquétipo nervoso do esquema corporal.
Dentro de seu processo evolutivo do sistema locomotor o bebê terá maiores
quantidades de estímulos que favoreçam o desenvolvimento da musculatura dorsal
através do controle da cabeça, deitar, rolar, rastejar, sentar, engatinhar, ficar de pé,
andar, marchar, correr e diversas outras manipulações corporais dinâmicas. Obtendo
também melhor eficiência mecânica de cada movimento voluntário e intencional.
Já num estágio mais avançado de faixa etária a criança terá maiores
condições de comparar as diferenças entre a motricidade terrestre com a motricidade
aquática e perceber as inúmeras possibilidades de utilização dos movimentos corporais.
X Motricidade Terrestre: posição vertical, apoio plantar, tração com os
pés, braços equilibram postura, mais rápida e menor esforço.
X Motricidade Aquática: posição horizontal, sem apoio, tração com os
braços, pernas equilibram postura, mais lenta e maior esforço.
A natação oferece aos bebês grandes movimentos dos membros inferiores
em posição vertical devido a grande ausência do peso e gravidade, coisa que não
acontece no meio terrestre podendo até vir a realizar a chamada natação de
sobrevivência antes mesmo de conseguir ficar de pé e andar.
7.8.4. Sono
Um corpo ativo que tem movimentos intensos com duração prolongada enfrenta um gasto energético grande e precisa de repouso para se restabelecer. Esse repouso pode ser um simples descanso entre uma atividade e outra ou o sono.
Sabemos também que durante o sono são secretados diversos
hormônios de diferentes glândulas que promovem o desenvolvimento infantil e
é também durante o sono que o corpo atinge padrões de funcionamento
metabólico mais lentos que compensam o desgaste funcional exigido durante o
dia.
“O padrão de sono do bebê e da criança é uma variável que deve ser
considerada para um bom crescimento e desenvolvimento. V.L. Schetman e R.M.
Harper (1993) consideram-no como influenciador do desenvolvimento anatômico e
somático de forma geral. Os efeitos da atividade física sobre o sono diário parecem ser
benéficos, tendendo a aumentar sua duração e sua produção hormonal.”
(OSWALD. 1980 apud FARINATTI, 1995, p.63 )
A natação por ser uma atividade física com grande gasto energético vem
favorecer uma nova aquisição de padrão de sono diário após as aulas. Vale ressaltar a
necessidade de se encaixar o horário das aulas em relação ao horário de sono dos bebês
pois se acordá-lo para nadar, chegará na piscina ainda sonolento e com um metabolismo
lento demais para a atividade. Pelo contrário se não deixá-lo dormir, chegará na piscina
cansado e irritado diante ao esforço físico que será submetido. Somente com a
constância nas aulas é que chegaremos a uma relação ideal desses horários.
7.8.5. Obesidade
Cada vez mais podemos observar nas creches e escolas um número
crescente de crianças obesas. Diversos fatores estão contribuindo para essa
situação infantil: causas genéticas, alimentação artificial e inadequada,
refrigerantes, doces em geral, imobilidade corporal e os tais prazeres modernos
dos games, televisão e computador. Mas a principal causa para a obesidade
infantil é mesmo o excesso de ingestão calórica com baixo gasto energético
diário. A criança “gordinha” sutilmente chamada assim pelos pais, pode vir a
sofrer diversos traumas por causa desse condição corporal:
“..., não se pode esquecer dos problemas psicológicos e sociais relacionados
à obesidade infantil. São usualmente alvo de abuso e discriminações por parte de seus
pares, excluídas das atividade e ridicularizadas (Canning, Mayer, 1966). Tendem, assim,
a exibirem sentimentos de inferioridade e rejeição, sensação de fracasso e baixa estima
(ibid.).”
(FARINATTI, 1995, p. 69 )
Colocamos o ambiente familiar e escolar como formadores de
hábitos alimentares imprescindíveis para uma qualidade de vida nutricional
sem exceder em muito as necessidades fisiológicas diárias de cada criança.
Para validar ainda mais a necessidade de atividades físicas diárias
dentro do contexto do mundo infantil é a proposição de que:
“A vasta maioria das crianças
têm obesidade oriunda de causas
exógenas, resultante de nutrição e
exercitação inadequadas. Menos de 5%
delas possuem doenças que, em função
de sua etiologia, determinaram a
obesidade (endocrinopatias, lesões no
sistema nervoso central, síndromes
congênitas e outras).”
(MERRIT, 1982 apud FARINATTI, 1995,
p. 70 )
Dentro de nossa prática diária nas piscinas podemos constatar um
perigoso agravante da obesidade infantil na natação que é o fato de algumas
crianças não terem força suficiente para sustentar, erguer, rolar e sair da borda.
Isso coloca em risco sua integridade e vida em casos de acidentes, sem a
presença de escadas ou adultos para ajudá-la a sair pois vai acabar cansando
e cair de novo na piscina.
A natação seria então mais uma das atividades escolares, que visam
a manutenção de um gasto energético compensador da excessiva ingestão
calórica diária e assim mantendo normal a relação entre estatura e peso
corporal da criança.
Podemos observar que dentro de três aspectos analisados
psicológico, social e fisiológico encontramos inúmeros estímulos de
interferência direta da natação na qualidade de desenvolvimento global do
bebê ou da criança.
CONCLUSÃO
Pelo exposto até aqui, pode-se dizer que a vivência da motricidade
aquática nos primeiros dois anos de vida contribui em diversos aspectos na
aquisição dos padrões da motricidade terrestre. Isso acontece desde que todos
os estímulos planejados e explorados nas aulas estejam em conformidade com
o nível de maturação neurológica e de ação corporal para evitar sobrecargas
ou traumas.
Isto porque como foi apresentada a natação sendo a única atividade
física que pode ser praticada logo após alguns meses após o nascimento
começa seu trabalho de avaliação nos reflexos e assim colabora na
manutenção e na melhoria dos mesmos. A partir da atuação em cima dos
reflexos, pode-se detectar o estágio de maturação do bebê e depois planejar o
trabalho motor, psicológico e social respeitando as características individuais
da cada praticante.
O aumento dessas atividades corporais promove adaptações
orgânicas, fisiológicas e psíquicas que contribuem para uma melhor
transmissão de impulsos elétricos entre o sistema nervoso e o locomotor.
Favorece também a formação e o desenvolvimento das ramificações nervosas
que enervam os músculos, maior sensibilidade, percepção dos segmentos e
esquema corporal, tônus e força. A natação então contribui para uma boa
noção dos limites e contornos do corpo através do contato com a água.
No que diz respeito a motricidade e ao trabalho muscular geral, a
prática da natação impulsiona a produção de tônus que é extremamente
necessário para uma correta posição dos músculos e do esqueleto e para a
execução de movimentos.
Estabelece uma relação direta entre as sensações advindas do
corpo com suas representações simbólicas psíquicas aumentando assim a
utilização das linguagens. O bebê sente, pensa, representa e se move na água
e carrega esses registros para sua experiência motora humana. Dessa forma
reforça a intenção do ato voluntário que busca a motricidade terrestre, amplia o
repertório e a história corporal e impulsiona o desenvolvimento na aquisição da
postura bípede. Estímulos diversos num ambiente acolhedor, seguro,
estimulador ao estágio de maturação de cada praticante. Se as aulas de
natação forem repletas de atitudes humanas, positivas e coerentes com
certeza pode-se afirmar que tais estímulos irão trazer amplos benefícios:
• “ a aquisição do sentimento de confiança básico, eixo da
personalidade e matriz da confiança social;
• a seleção e gradação dos estímulos sensoriomotores para
obtenção de respostas adaptativas mais adequadas e hierarquicamente
úteis para transferência de aprendizagem;
• a adequação aos estímulos perceptivomotores no preciso
momento evolutivo, tornando irreprodutível se oferecido mais tarde com as
mesmas características naturais e nas mesmas condições;
• a utilização da base reflexa antes da sua extinção, para a
construção de sistemas funcionais econômicos através de propostas
sistemáticas de aprendizagem;
• a exercitação das destrezas motoras respeitando as
qualidades naturais do rendimento infantil, curiosamente de acordo com os
fundamentos científicos do Treino Intervalado (Interval-Training) isto é,
esforços breves e intensos, progressivos, alternados com período de
repouso (descanso ativo);
• conhecimento e domínio progressivo do corpo, que
facilitam a formação de uma imagem corporal integrada e rica através da
sensório-percepção;
• a possibilidade de oferecer a criança modelos de ação
satisfatórios, numa etapa evolutiva em que a observação atua como
privilegiado agente de aprendizagem;
• a formação de base (constructos) da inteligência, a partir
das oportunidades oferecidas, em quantidade e qualidade adequadas, de
exercitar sua vontade em realizar experiências;
• a utilização de elementos rítmicos para garantir as noções
de tensão, força e relaxamento, relacionando-os com as noções de espaço
e tempo e de causa e efeito, como recurso didático efetivo;
• a comunicação entre professor e criança através do gesto e
da ação, canais onto e filogeneticamente mais antigos, como medida prévia
para uma comunicação simbólica e integrada em seus três níveis de
expressão: preverbal, para-vebral e verbal;
• a instauração de um vínculo pedagógico personalizado e
cooperativo, aberto a mutualidade família- escola -natação, a fim de formar
um arquétipo educativo social prospectivamente válido;
• estimular a capacidade da criança para enfrentar o risco e
tolerar o fracasso, como elementos comuns a toda a aprendizagem, bem
como sua disponibilidade em conviver com o medo, como um sentimento
não envergonhante do erro, como um fato previsível, corrigível e estimado
como fator de progresso.”
(FARINATTI, 1995, p.26 )
Por tudo até aqui demonstrado espera-se ter conseguido comprovar
o benefício e a vocação pedagógica da natação como instrumento de
Educação Física, útil e válido dentro de imenso contexto do desenvolvimento
infantil. E especificamente no que tange a interferência do trabalho motor
aquático na sucessão das fases da motricidade terrestre para a qual o ser
humano está geneticamente organizado.
O trabalho proposto tomou como bases conceitos de Educação
Física e de Psicomotricidade de modo a sobressaltar a importância da
conscientização do profissional da área de natação para bebês quanto a forma
do processo ensino-aprendizagem.
Espera-se então, com esta educação corporal, global e construtiva,
contribuir no sentido da mais acurada valorização de tudo aquilo já conhecido
sobre as necessidades humanas, possibilidades de aprendizagem,
organização e vivências sociais, sistemas em geral, objetivos comportamentais,
motivação e habilidades de conduzir a vida.
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ANEXOS